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AÇÃO, DISCURSO E PODER: UMA BREVE APRESENTAÇÃO DO

CONCEITO DE AÇÃO DENTRO DA VIDA ATIVA

Samuel de Oliveira Botelho, Maria Cristina Müller, e-mail:


samuelbotelho34@gmail.com

Universidade Estadual de Londrina/Centro de Letras e Ciências


Humanas /CLCH.

Área e sub-área do conhecimento: Filosofia/Filosofia Política.

Palavras-chave: Ação; Discurso; Poder.

Resumo

Na presente pesquisa pretende apresentar o conceito de ação em Hannah


Arendt. O problema que embasa a pesquisa diz respeito a seguinte questão: é
na atividade da ação, em conjunto com o discurso, que o poder é gestado?
Inicialmente se faz necessário apresentar o conceito de vita activa que consiste
em três atividades, o trabalho, a obra e a ação. Cada atividade tem pelo menos
uma condição que é correspondente: o trabalho tem como condição a vida, a
obra, a mundanidade e a ação, a pluralidade. O conceito de ação relaciona-se
com o discurso e sendo o discurso uma expressão própria do agente – aquele
que age –deparamo-nos com o discurso como único para cada ser humano
que age. A hipótese que esta pesquisa apresenta diz respeito a ideia de que a
ação, por conta da sua diferença com outros fazeres, é resguardada pelo
domínio público, como reunião artificial de pessoas que ali expressam suas
ideias, opiniões e pontos de vistas e por isso é nessa atividade – a da ação –
que se gesta o poder. A pesquisa tem como resultado a demonstração da
importância da atividade da ação para a compreensão da política e do poder de
Arendt; bem como se percebeu o desenvolvimento de conceitos que estão em
diálogo com a tradição filosófica e que tem sua reavaliação na filosofia
arendtiana.

Introdução

Hannah Arendt pretende entender o processo de destruição da dignidade


humana no mundo, assim como destruição das atividades humanas. Em seu
livro A Condição Humana, a autora desenvolve conceitos como pluralidade,
natalidade, ação, discurso, poder e outros, que foram rejeitados, principalmente
por tratarem da valorização da diferença no discurso, da ação como iniciadora
de um novo processo e do poder como relação entre os seres humanos. Foi a

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rejeição e o desrespeito de tais ideias como constitutivas da condição humana
que pode ter feito surgir um pensamento de tirania e negação do humano. A
constituição de humanidade, que é concebida primeiramente pelos gregos e
que é trazida de volta por Arendt diz que são sinônimos “[...] as expressões
‘viver’ e ‘estar entre os homens’ (inter homines esse), ou ‘morrer’ e ‘deixar de
estar entre os homens’ (inter homines esse desinere)” (ARENDT, 2016, p. 10);
assim, todo o sentido de vida se relaciona, em sua plenitude, com a ação, isto
é, se dá pela vida em conjunto com outros seres humanos. Demonstraremos
neste texto o percurso de Arendt para uma “[...] reconsideração da condição
humana” (ARENDT, 2016, p. 6), que tem como principal papel uma reafirmação
da pluralidade dentro do espaço público, assim como uma definição de poder
que garante essa pluralidade.
Participantes e Métodos

O método adotado foi o de pesquisa bibliográfica a partir de uma abordagem


teórico-conceitual dos escritos de Arendt, para que assim se possa identificar o
sentido atribuído pela autora à ação. O principal material utilizado para a
pesquisa foi o livro A Condição Humana de Hannah Arendt, além dos textos de
comentadores.

Resultados e Discussão

Hannah Arendt propõe uma análise da condição humana que leva em conta o
contato que os seres humanos têm em cada evento de suas vidas e que dentro
desse contato os homens são condicionados, “[...] tudo aquilo com que eles
entram em contato torna-se imediatamente uma condição de sua existência”
(ARENDT, 2016, p. 11). Tudo aquilo que “[...] toque a vida humana ou
mantenha uma duradoura relação com ela assume imediatamente o caráter de
condição da existência humana” (ARENDT, 2016, p. 12). As condições da
existência humana são: a vida, natalidade e a mortalidade, a mundanidade, a
pluralidade e a Terra (ARENDT, 2016, p. 14).
Hannah Arendt usa o termo vita activa para designar três atividades:
trabalho, obra e ação. Cada atividade tem como correspondente uma condição
da existência humana, sendo estas condições correspondentes: vida,
mundanidade, pluralidade.
O trabalho é uma atividade privada, nele se busca a manutenção e
preservação da vida, onde se tem dependência total da natureza para se gerar
bens de consumo. O trabalho está ligado com a condição humana da vida, na
medida em que pretende garantir as necessidades biológicas do corpo humano
(CORREIA, 2007, p. 42).
Com a obra, devemos designar todos os artefatos de criação humana,
que são projetados pela mente humana e tem o papel de auxílio nos afazeres

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humanos. O domínio da natureza é parte importante da obra, nela o homem
consegue moldar a natureza e transformá-la em um objeto totalmente diferente.
São os bens da obra que devem garantir conforto aos homens por meio dos
objetos que são fabricados para durar mais que as vidas dos fabricantes.
A ação e o discurso são as formas com que os humanos têm para
aparecer aos outros humanos, quando alguém age, isso implica o discurso.
Com o discurso feito, podemos nos comunicar dentro do mundo comum, tendo
o discurso extrema importância para a ação (ARENDT, 2016, p. 221).
O agir tem como plano geral a iniciativa, o início se dá pelo nascimento,
pelo fato de cada ser humano passar pelo nascimento, podendo iniciar algo
novo. A iniciativa cria a possibilidade do novo, de algo que não existia e passa
a existir a partir de um ato inicial de uma pessoa, tendo sua característica no
imprevisível, tomando como parte as ações que são inesperadas. Já o discurso
se torna importante porque anuncia o ator, que com as palavras se comunica
com os outros, revelando sua identidade. Dentro do discurso os seres humanos
desvelam seu “eu”, que é “[...] a identidade única e distinta do agente”
(ARENDT, 2016, p. 223).
Dentro de cada ação discursiva existem dois mundos que se interpõem
aos seres humanos, esses mundos estão compostos pelos interesses das
pessoas. A “[...] maior parte da ação e do discurso diz respeito a esse espaço-
entre [in-between], que varia de grupo de pessoas” (ARENDT, 2016, p. 226).
Um dos espaço-entre diz respeito ao caráter de mundo físico, de mundanidade,
onde a realidade objetiva é tratada, e objetos tangíveis o solidificam, podendo
relacionar os homens uns com os outros por meio de objetos, como por
exemplo na obra, onde os homens precisam trocar seus bens de fabricação.
Mas também tem outro espaço-entre que recobre o primeiro, sendo totalmente
diferente do primeiro. Neste segundo espaço-entre o caráter objetivo da obra é
retirado para a entrada da subjetividade da ação e do discurso (ARENDT,
2016, p. 226). Este mundo subjetivo é denominado de “teia” de relações
humanas, nele o “quem” é revelado, assim como toda a diferença é afirmada.
Arendt se preocupa com o poder como formador do espaço-entre dos
humanos, ele é “[...] que mantém a existência do domínio público” (ARENDT,
2016, p. 248). Devendo buscar sua forma material na “[...] convivência entre os
homens” (Arendt, 2016, p. 249), como uma organização de pessoas que
garante o desenvolvimento da ação. No poder, a fundação legitima que é dada
naquele “[...] momento inicial em que as pessoas se uniram para agir em
concerto” (MULLER, 2002, p. 23). A garantia do poder é dada pela convivência
que busca na fala e na ação sua efetivação. “O Poder passa a existir entre os
homens, quando agem em conjunto, e desaparece no instante em que se
dispersam” (MULLER, 2002, p. 11).

Conclusões

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Concluímos que o pensamento de Hannah Arendt trouxe ferramentas para
entender a condição humana e a relação que cada condição tem com as
atividades da vita ativa. Dentro do processo de compreensão feito por Arendt, a
organização correta dessas condições com as suas atividades, pode trazer de
volta aquilo que é a capacidade mais humana e que tem todo o significado
dentro dos assuntos humanos, que é o discurso e a ação (ARENDT, 2016, p.
218-219). Dentro da pesquisa feita por Arendt, o papel da fala e do discurso
deve ressaltar a diferença na condição humana da pluralidade e sempre iniciar
algo novo na condição da natalidade. O poder surge nesta atividade da ação; o
poder não enquanto mando e obediência, mas enquanto capacidade dos
homens e mulheres reunidos e constituindo o espaço-entre de trazer a
novidade no mundo, isto é a liberdade.
Agradecimentos

Agradeço ao CNPq, instituição financiadora do presente projeto, pela


oportunidade de desenvolver a presente pesquisa; agradeço a minha
orientadora, professora Doutora Maria Cristina Müller, pelos esclarecimentos,
sugestões e correções ao longo do desenvolvimento da pesquisa; e ao grupo
de estudos, pelo auxílio na compreensão dos textos da autora.

Referências

ARENDT, H. A Condição Humana. Tradução Roberto Raposo; revisão técnica


e apresentação Adriano Correia. 12. Ed. rev. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2016.

CALVET DE MAGALHÃES, Theresa .Ação, Linguagem e Poder: Uma releitura


do capítulo V [Action] da obra The Human Condition. In: CORREIA, Adriano.
(Org.). Hannah Arendt e a condição humana. 1ed. Salvador: Quarteto,
2006b, v. 1, p. 35-74.

CORREIA, Adriano. Hannah Arendt. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.

MÜLLER, M. C. Hannah Arendt: o resgate da política. Parte I: o conceito de


ação. Crítica (UEL), Londrina-PR, v. 5, n.19, p. 271-280, abr./jun. 2000.

________. Hannah Arendt: O resgate da Política - Parte II - Vita Contemplativa:


a faculdade de julgar e sua intrínseca politicidade. Crítica (UEL), Londrina/PR,
v. 6, n. 23, p. 403-419, abr./jun. 2001.

________. Hannah Arendt: o resgate da política - Parte III - O conceito


comunicativo de poder em Hannah Arendt. Crítica (UEL), Londrina, v. 7, n.25,
p. 11-45, abr./set. 2002.

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