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A Moeda

1. Introdução
Para os Clássicos a moeda seria um símbolo sem larga significação, não seria mais do que
um véu envolvendo, para comodidade das trocas, as realidades económicas, sem de modo algum as
modificar.
Esta forma de ver o papel da moeda na economia foi abandonada pelos economista
modernos, para os quais a moeda não é apenas um instrumento de troca, pelo facto de ser também
procurada como mercadoria, para fins de entesouramento, para fins de constituição de reservas
líquidas. A procura de moeda não visaria, sempre e necessariamente, outros bens, por ela
adquiridos. Frequentemente teria por objecto a própria aquisição de moeda.
Este ângulo de visão, tendo elevado a moeda a elemento central da Economia, abriu novas
perspectivas ao seu estudo e permitiu também uma revisão de diversas questões, designadamente as
respeitantes às flutuações económicas.
A moeda pressupõe uma economia de troca. Em estruturas nas quais cada um limite o
consumo à própria produção, a moeda não tem razão de existir. Em estruturas económicas baseadas
na troca, haverá que distinguir a troca directa e a troca indirecta, ou monetária.
As dificuldades encontradas nas trocas directas, situaram os homens perante a necessidade
de utilizar um instrumento geral de trocas. E como tal surgiu a moeda. Foi para o desempenho da
função de instrumento geral de trocas que historicamente apareceram todas as moedas. Qualquer
estrutura económica que conheça os benefícios da divisão do trabalho carece, em virtude da
extensão das trocas, de criar um instrumento que as facilite. E o instrumento chamado a
desempenhar essa função é a moeda. Assim, a moeda-instrumento geral de trocas, apresenta-se
como consequência da divisão do trabalho.
A moeda veio resolver as dificuldades das trocas directas. Porque, estando todos, ou quase
todos, dispostos a recebê-la em troca de bens ou de serviços, não é contudo aceite em pagamento
porque dela se necessite directamente para consumo próprio, mas porque é um instrumento geral de
aquisição de bens ou serviços que se pretenda obter. Qualquer pessoa está disposta a ceder um bem
que possui, ou a realizar determinados trabalhos, em troca de moeda, porque sabe que os ouros
estão também dispostos, em troca dessa mesma moeda, a ceder os bens, ou a prestar os serviços, de
que ela careça.
Compreende-se também a comodidade que representa avaliar cada objecto apenas em
unidades monetárias e não em relação aos diversos objectos pelos quais poderia ser trocado.

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2. Funções da moeda
Tem-se geralmente reconhecido a dificuldade em definir a moeda. Parece preferível
apreender a respectiva noção através das funções que a moeda desempenha.
A moeda tem de ser entendida pelas suas funções e não pela sua substância. Tem servido
como moeda, objectos muito diversos. Além das placas metálicas e das actuais notas de banco,
muitos outros objectos funcionam e poderão vir a funcionar ainda, como instrumentos monetários.
Não podendo, pois, caracterizar-se a moeda pela sua substância, importa caracterizá-la pelas
suas funções que são três:
a) Instrumento Geral de Trocas
A função central da moeda é de servir como meio de troca. A moeda é utilizada geralmente
como contraprestação de um bem ou de um serviço, desde que a troca indirecta ou
monetária se substituiu à troca directa. Na sua generalidade, as transacções realizam-se
através de meios monetários.
b) Reservatório de Valores
Da função da moeda de instrumento geral de trocas resulta também a de reservatório de
valores. Ter moeda é ter valor acumulado. Temos de considera-lo em dois níveis distintos: é
o valor intrínseco da moeda e o valor que ela representa, com o qual podemos comprar todo
o tipo de bens.
Desde que a moeda constitui um potencial permanente de trocas, susceptível de ser utilizado
em qualquer momento e em relação a todos os bens negociáveis, ela pode constituir também
uma reserva de valores, sempre e imediatamente disponíveis para quaisquer transacções.
Cada sujeito económico, na posse de certa quantidade de moeda, sabe que, a todo o
momento, poderá adquirir os bens de que necessita, mais facilmente do que se tivesse à sua
disposição uma poupança constituída por mercadorias da mais diversa natureza. Porque a
moeda é mais facilmente aceite em quaisquer transacções do que outros bens.
c) Medida Comum de Valores
Desde que as várias transacções se efectuam utilizando a moeda como intermediário, o valor
de cada objecto que se troca passa a ser expresso em moeda. A esta expressão monetária do
valor dos bens dá-se o nome de preço. E precisamente porque a moeda é o Instrumento geral
de trocas, o valor dos diversos bens é definido em relação à moeda, é definido em unidades
monetárias. Também, sendo a moeda aceite como instrumento geral de trocas, passou
automaticamente a desempenhar a função de padrão de valores, o que quer dizer que o valor
dos diversos bens é referido a unidades monetárias. A moeda é usada para medir o valor das
coisas. Tal como medimos os pesos em quilogramas, medimos o valor em moeda.

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3. A importância da moeda ligada à estabilidade do valor da moeda
– O Padrão da Moeda
Foi equacionado o problema do padrão monetário, da importância de um padrão monetário.
A unidade monetária utilizada para efeito de avaliação do valor dos bens, em que se
exprimem os preços dos bens, é designada por unidade monetária padrão, ou, simplesmente
padrão monetário.
Em termos monetários há a necessidade de ter um padrão monetário. O padrão monetário
traz estabilidade nacional e estimula o comércio internacional. A referência do padrão monetário dá
garantia do valor da moeda, dá estabilidade.
Após a 2ª Guerra Mundial, dá-se o nascimento do Fundo Monetário Internacional, que teve
como tarefa criar um padrão monetário, em termos mundiais. Como moeda padrão foi adoptado o
dólar americano, porque os E.U.A. detinham a maior parte das reservas de ouro. Em termos
monetários, ter dólares era o mesmo que ter ouro.
Padrão monetário é a existência de um valor de referência para a consecução de uma
disciplina monetária. O valor de referência, durante muito tempo, foi um metal precioso, o ouro.
Os sistemas monometalistas, em primeiro lugar, com o ouro e depois a prata e os sistemas
bimetalistas de ouro e prata, foram aqueles que marcaram a problemática do valor da moeda. Foi lá
que se encontraram os padrões de referência da moeda.
Porque é que os povos queriam um padrão de moeda?
O padrão de moeda tem dois efeitos importantes para o desenvolvimento de uma economia:
a) O padrão da moeda dá garantia, dá estabilidade nas relações monetárias, porque à
volta do padrão há a fixação do valor da moeda. Primeiro do valor de referência, depois dos
múltiplos e dos submúltiplos e a partir do momento em que esse valor está determinado,
sabe-se o valor dessa moeda, sabe-se quanto vale cada moeda e sabe-se quanto é que cada
moeda em termos das moedas estrangeiras tem também como referencial determinado e
fixo. A estabilidade do valor da moeda acaba por ser uma estabilidade que se repercute nas
relações comerciais. A existência de um padrão, atendendo a estes dois aspectos
fundamentais é desde logo uma garantia de estabilidade do valor da moeda.
b) Num segundo momento, todo esse conjunto, padrão mais estabilidade do valor da
moeda, que estão interligados, trazem outra forma de estabilidade que é a estabilidade das
relações comerciais e quando digo estabilidade das relações comerciais, reporto-me a
relações comerciais abertas. Não numa lógica proteccionista, mas antes numa lógica de livre
comércio e de livre cambista.
Sempre que houve preocupação de os países se abrirem em termos de relações abertas, de
comércio, foi porque criaram estabilidade monetária. E para haver estabilidade monetária é

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indispensável haver disciplina monetária. Quando há disciplina monetária, constrói-se a base de um
padrão.
Sem estabilidade monetária há um convite às práticas proteccionistas. Cada um fecha-se no
seu canto e procura evitar que a instabilidade monetária se repercuta em perdas e eventualmente
ganhos. Normalmente, perdas significativas que acabam por retrair o comprador económico,
levando a práticas comerciais muito reduzidas e até mais proteccionistas.
A estabilidade de uma relação monetária e cambial segura é essencial para que as
economias se desenvolvam. É a grande máxima que se pode retirar da existência de um padrão.
A busca de um padrão, sempre foi uma busca assente numa mobilidade monetária. Relações
cambiais e relações de comércio assentes numa unidade monetária e que se podem traduzir pela
troca directa.
1) O monometalismo e bimetalismo
Olhando para as funções da moeda, sobretudo o valor da moeda, representa valor, mas ela
em si encerra valor. Houve a preocupação de trazer bens, eles próprios importantes, com valor
intrínseco, um referencial do padrão. Por isso é que o padrão foi o padrão ouro e padrão prata. Não
era um metal qualquer. Eram metais nobres, eles próprios sinónimos de valor, com valor intrínseco
e que simultaneamente representavam valor.
O ouro e a prata, especialmente o ouro, foram escasseando, como todo o bem económico
que o é. Este foi escasseando largamente, a partir do momento em que o ouro tem duas grandes
utilizações: O ouro artístico e o ouro monetário.
O ouro monetário não estava à disposição das pessoas, mas sim das instituições. Eram os
bancos centrais, eram os agentes institucionais que tinham conhecimento e acumulavam o ouro
monetário. Todos os cidadãos, dentro do padrão monetário ouro, que tinham o ouro como
referência, sabiam que os haveres líquidos que cada um acumulava, tinham referência ao ouro e que
no limite poderiam trocar aqueles seus haveres líquidos por ouro. Valiam uma quantidade de ouro,
de acordo com o padrão que em cada momento era determinante. No entanto não o faziam, porque
esse ouro não servia para fazer o tráfego tradicional das relações comerciais. Na prática, era mais
uma referência do que exequível. No entanto ter ouro, saber que o país tinha ouro, era reconfortante
porque estava prevenido contra crises económicas, estava numa estabilidade global.
O ouro começou a escassear e a prata começou a entrar em linha de conta. Iniciaram-se os
sistemas bimetalista. É claro que o ouro tinha maior valor do que a prata. São os sistemas
monometalistas assentes no ouro e os sistemas bimetalista assentes no ouro e na prata na prata.
2) O Câmbio
O ouro passa a ter o valor de referência no meio destes valores da moeda e do câmbio, sendo
que câmbio é o preço da moeda nacional expressa em termos das moedas estrangeiras. Estabelece a
relação entre as diversas moedas existentes em determinada região, país, continente, etc.

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A partir do momento em que se passou a verificar uma situação como a que acabamos de
definir, vingou uma lei fundamental neste relacionamento entre as diversas moedas. Foi a lei de
Gresham.
3) A lei de Gresham
A lei de Gresham vem dizer que a má moeda expulsa a boa moeda.
Ao longo do tempo, sempre tivemos moeda cunhada em diversos materiais, uns mais nobres
do que outros, dependia do nível de desenvolvimento das sociedades. No entanto uns mais
importantes do que outros. O ouro tem duas finalidades, a monetária e a artística.
Esta lei foi retirada de uma análise empírica a partir da análise fáctica, da qual se retiraram
conclusões. A verificação desta afirmação de que a má moeda expulsa a boa moeda é que a boa
moeda que ele considerou como tal era a moeda que estava reservada para finalidades não
monetárias. Era reservada a finalidades de activos de garantia. A má moeda era aquela que seria
usada no tráfego comercial habitual. Para o comércio era a má moeda. A boa moeda ia para a
reserva dos bancos. Quando ele dizia que a má moeda expulsa a boa moeda estava a referir-se ao
mercado, porque o ainda hoje temos no mercado é a má moeda. A outra é boa demais para estar no
mercado das nossas trocas.

Temos de ver toda esta situação na perspectiva de que as reservas de ouro dos países se
esgotaram e assim têm de procurar outros activos que tenham tanto valor como o ouro e há toda
uma arquitectura à volta do dólar em termos de Sistema Monetário Internacional. O que interessa
neste momento é que os países querem reservas de ouro e acumulam-nas enquanto tal porque têm aí
uma garantia das suas relações com outros países e do que podem fazer em termos de comércio
internacional. O que significa que para o tráfego comercial normal podem ter outras formas
monetárias, que cada vez mais, já estão numa linha de desmaterialização da moeda.
Sabemos que a moeda tem três funções essenciais. Desde sempre existiu a busca de um
padrão. O padrão é o elemento mais importante de toda esta construção, porque se há padrão, há
estabilidade e logo há comércio. Se não há padrão, não há estabilidade, há comércio, mas reduzido
ou de relações autárcitas ou proteccionistas. Há uma inversão total do modelo de desenvolvimento.
Se o agente económico se fechar sobre si mesmo, sobre aquilo que produz e se fechar ao que vem
de fora, a outros produtos com quem possa entrar em concorrência, acaba por desenvolver
economias de auto-suficiência. Não entra em comércio, não recebe produtos de fora, nem põe à
disposição de outros, aquilo que produz. Está fechado.
Se pelo contrário se abre ao exterior, em termos microeconómicos, ele começa a abrir no
sentido de produzir mais, a diversificar a produção. São os multiplicadores a funcionar.
Passando para a linha macroeconómica, entre países. O país que se fecha, por exemplo,
Portugal no tempo do Salazar, no Estado Novo, fechados ao exterior, em que a única abertura era às

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colónias. Não tínhamos relações comerciais com outras organizações internacionais, por várias
circunstâncias, entre as quais políticas e porque não éramos credíveis em termos de comércio
internacional. Quando começamos a ser, começamos a abrir e passamos a fazer parte da EFTA,
CEE, EU, etc.

4. O valor da moeda
Tudo isso é possível a partir do momento em que há uma moeda com estabilidade, valor, ou
seja com câmbio fixo e com valor. Se não houver um padrão, um valor fixo entre cada moeda, com
as outras moedas e que oscile com frequência, provoca instabilidade. Os mercados ou são mandados
pelo poder político e aí há um valor tabelado que não se altera. É um mercado mas não de
concorrência ou se é um mercado de concorrência onde tem que haver estabilidade, só poderemos
permitir uma oscilação mínima, por acção da oferta e da procura. O livre fluxo da oferta e da
procura é que vai determinar a oscilação do valor deste bem que é a moeda.
Aquele preço só tem dois cambiantes possíveis. Ou oscila livremente ao sabor da oferta e da
procura e é tão perturbante para o observador como a ausência de mercado e a ausência de valor
fixo, porque é grande e permanente a oscilação ou então é fixo porque está de longe à cabeça,
porque não funciona como mercado e é ditado pelo poder político. Por isso se nós queremos
mercado, temos de aceitar duas coisas:
• A flutuação do valor da moeda, do câmbio vai existir.
• Estabelecer limites para a oscilação para cima e para baixo. Para cima é o princípio da
revalorização. Há um determinado valor de X. Tendo presente que as condicionantes de
mercado podem ditar o aumento do valor, em vez de X, é de x+y. Então temos de verificar
se aquele x+y ainda está dentro do patamar máximo que eu defini como máximo.
Da mesma forma, para baixo tenho que admitir que o valor da moeda, do câmbio não tem de
ser sempre o mesmo e pode começar a desvalorizar. A economia está menos forte e por isso
a desvalorização pode ser o reflexo dessa economia menos forte. Nessa perspectiva de
mercado, se eu quero admitir que isso aconteça, tenho de dizer que a desvalorização só é
admitida até determinado nível, agora para baixo, o que significa que eu determinei o valor
da referência e admito a oscilação de 1% para cima e de 1% para baixo. Significa que, tendo
eu determinado o padrão médio de X, admito uma oscilação de 2%, um por cento para cima
e um por cento para baixo. Não admito oscilações para além de 1%, para cima ou para
baixo.

Como é que se pode evitar oscilações para além deste limite de 1%, para cima ou para
baixo?

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É aqui que entram as autoridades monetárias, que entram a comprar ou a vender aquela
moeda que está a sofrer uma oscilação de concorrência de mercado. É o mercado a funcionar de
forma controlada, porque quando eu defino o padrão, digo logo, que aquela moeda deve valer X em
relação a outras moedas. Esse valor deve manter-se estável, no entanto, o mercado não é hermético
e por isso pode sofrer oscilações no sentido de revalorização e de desvalorização. Por isso a regra
será determinar até onde posso aceitar a revalorização e a desvalorização. É a determinação de uma
banda de 2% em que é 1% para cima e 1% para baixo.
Verdadeiramente este câmbio é estável mas não é fixo. É um mercado controlado.
Outra situação é a do mercado errático ou flutuante. O valor da moeda sobe e desce ao sabor
do mercado. Não é controlado pelo mercado. É o mercado que dita o que quer em cada momento. É
tão preocupante o câmbio errático como o câmbio fixo ou até mais porque o operador económico
nunca consegue saber como está o câmbio. Ao fazer um negócio, o preço pode ser um e quando
fizer o pagamento pode ser outro. Mais baixo ou mais alto. Isso leva a mecanismos de defesa por
parte dos operadores económicos, para se protegerem contra estas oscilações imprevisíveis. A
moeda é um bem económico como outro qualquer e todo este relacionamento se desenvolve no
mercado de concorrência, à volta de uma relação económica em que joga a escassez e a raridade do
bem económico com as necessidades ilimitadas. Neste caso com as regras próprias do microcosmo
dos mercados económicos em geral. É este o mercado monetário.
A realidade monetária é uma realidade bastante dinâmica que, vai acompanhando a
evolução da civilização de hoje, o modelo internacional de globalização, de esbatimento da
importância das fronteiras, dos negócios globais e da importância de uma política monetária sólida.
Quanto à nossa participação na unidade económica e monetária, não nos podemos esquecer
que tendo nós perdido a nossa soberania, relativamente ao aspecto monetário, a verdade é que ela
tem, neste caso particular, uma repercussão que nós bem conhecemos. Ao nível financeiro, porque
para garantir o referencial, a garantia, a estabilidade da moeda Euro, nós temos que garantir uma
determinada política financeira que nos iniba de praticar défices excessivos, sob pena do valor fixo
da importância do Euro ser abanada e prejudicar genericamente a economia europeia.
A manutenção do padrão não é fácil. O padrão é muito importante pelas repercussões que
tem no valor da moeda em si, pelas repercussões que tem no estimulo ou não ao comércio e pela
importância que tem no equilíbrio das relações económicas globais em que haja um nivelamento do
poder económico dos Estados.
Devido à escassez, fomos perdendo a ligação, mais directa, ao ouro e promovemos a busca
de novos referenciais de valor que o substituíssem.
O Fundo Monetário Internacional surge numa altura em que a Europa andava perdida, sem
padrão monetário, devido à guerra. Finda a guerra, os países, por influência dos EUA, apostaram

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em ditar novas regras do comércio internacional, para o qual precisavam de um padrão. O padrão, a
disciplina monetária, foi tarefa do FMI.

5. As Formas Monetárias – Tipos de Moeda


a) A Moeda Metálica
A moeda metálica tinha um aspecto que depois as outras formas monetárias não revestiram.
Quando ela era metálica, em metais preciosos, ouro e prata, havia o valor intrínseco da moeda, dado
o material em que era feito e aquilo que representava. A moeda tinha o valor facial, mas tinha o
valor intrínseco do metal em que era cunhada. É o ouro, a prata e outros metais menos nobres.
O valor intrínseco do metal em que ela é cunhada e o valor que ela representa é que depende
da unidade monetária que estiver a considerar.
A moeda metálica foi sempre convertível num 2º padrão, o estalão que tenha sido
determinado em cada momento e foi a primeira espécie monetária.
Ao longo do tempo as relações económicas foram evoluindo e foram surgindo novas formas
monetárias.
Quando nós passamos para outras formas monetárias, como a nota (moeda bancária), o valor
facial é algum, está lá expresso, mas o valor corpóreo dessa forma monetária é muito menor. É a
diferença entre o metal e o papel.

b) A Moeda-papel
A moeda-papel que mais tarde vai transformar-se em papel-moeda. Surgiu como moeda
representativa e depois evoluiu para moeda-papel fiduciária. A moeda-papel surge como moeda
representativa, a partir do momento, em que os bancos tinham a obrigação de aquela moeda só
entrar em circulação se tivesse, na proporção, na dimensão, garantia de conversão em ouro. Só
estaria em circulação, moeda-papel que tivesse cobertura em ouro nos bancos centrais, nas
entidades institucionais. Era a altura em que dominava a regra do 1/3. Em que o banco tinha de
garantir que a moeda-papel em difusão tivesse correspondência em termos de ouro, de 1/3 em
depósito nos cofres do Banco Central, para garantir que as pessoas que tivessem esse tipo de
moeda, pudessem a qualquer momento trocá-lo por valor equivalente em ouro.

c) A Moeda-papel fiduciária
A moeda-papel transforma-se em moeda fiduciária quando a partir de determinado momento
deixa de ser exigida a convertibilidade da moeda-papel em ouro, no padrão. A moeda metálica, por
natureza, sempre foi convertível directamente no padrão. A moeda-papel já começa a ser uma forma
diferente, nova. Surge a partir do momento em que os bancos estão a receber os depósitos dos
clientes e percebem que não precisam de os ter ali, parados. Podiam ter uma parte parada, para o

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caso de os clientes virem reclamar o seu depósito, mas podiam aproveitar parte do depósito feito e
fazer negócio, como fazem os bancos presentemente. Pegam no dinheiro e fazem aplicações.
Têm de garantir duas coisas ao cliente:
• Por um lado, se estão a fazer a aplicação do dinheiro do cliente, têm de remunerar
aquele depósito com que estão a fazer negócio.
• Por outro lado, têm de garantir a devolução do dinheiro quando o cliente reclama o
retorno do dinheiro depositado.
Estas mecânicas do trato da moeda e dos títulos de crédito começam a despontar em
Inglaterra e só depois se vão difundindo. Mais adiante na História, o paradigma dos bancos centrais,
vai encontrar nos bancos Ingleses e no Banco Alemão a grande referência de como devemos
perspectivar o Banco Central com melhores práticas.
Depois disto tudo a moeda-papel ainda se vai transformar em papel-moeda.

d) O papel-moeda
Quando surge o papel-moeda, a convertibilidade é inexistente. Torna-se moeda bancária.
O facto de aparecer um tipo novo de moeda não que dizer que os outros tipos desapareçam.
Uma não afasta a outra. Elas vão aparecendo e vão-se acumulando.

e) A Quase-moeda
Depois da moeda-papel vamos encontrar a chamada quase-moeda. O próprio nome é
elucidativo num aspecto. Ela é moeda porque também desempenha as funções da moeda, só que
não tem disponibilidade imediata. Este tipo de moeda são depósitos bancários, mas não podem ser
depósitos à ordem. São depósitos a prazo e com pré-aviso. Significa duas coisas:
• O banco tem a garantia de estes depósitos só serem levantados no prazo de
vencimento ou dentro do pré-aviso. O banco tem a garantia de que pode aplicar o
dinheiro.
• Porque o aplica, vai ganhar dinheiro e por isso vai remunerar o dono desse dinheiro e
o dono do dinheiro tem o direito de reaver o dinheiro no final do contrato.
Portanto esta moeda não é de utilização imediata. Por isso se diz que é uma quase-moeda.

f) Outra quase-moeda
É outra forma monetária da qual fazem parte os cartões de crédito.
O cartão de crédito vem mostrar a desmaterialização da moeda. A moeda metálica surgiu
com uma configuração corpórea, em metal, metal nobre (ouro e prata). Depois surgem outras
figuras monetárias mas sempre com a preocupação de relacionar essas novas formas, de uma forma
indirecta, com o padrão. No padrão nunca encontramos o valor da moeda-papel relacionado com o
ouro. Vemos é que a moeda-papel se corporiza em moeda metálica e que esta é que tem a relação

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com o ouro, com o padrão. Acaba por ser triangular. No entanto a relação ao padrão, ao ouro,
sempre esteve presente.
Depois vamos para outras formas monetárias onde já são muito mais afastadas as ligações à
moeda metálica. Vamos ainda para a moeda representativa. Na moeda fiduciária esta ligação é
ainda menor. Com o papel-moeda já não há qualquer ligação ao padrão ouro, já não há
convertibilidade. A quase-moeda e a outra quase-moeda, no seu conjunto dão-nos o stock monetário
ou massa monetária. A massa monetária, composição diversificada da moeda existente em cada
momento numa sociedade, vai-nos servir para determinar a velocidade de circulação da moeda e
para determinar com base em tudo isso, o valor da moeda, em termos de politica económica.
Stock monetário é o conjunto, o pacote das formas monetárias existentes na sociedade em
determinado momento.

6. A desmaterialização da moeda
Da evolução da moeda extrai-se uma tendência no sentido da sua desmaterialização. Esta
existe a partir do momento em que, continuando com as formas monetárias, já não estamos na
moeda metálica, mas estamos na moeda escritural, aí já com formas um pouco mais sofisticadas,
entre as quais o cartão de crédito. O cartão de crédito é a desmaterialização, por excelência, da
moeda e que vale tanto como outra qualquer. Qualquer um dos tipos de moeda vale tanto como a
moeda metálica.
Já houve várias teses sobre o valor da moeda. A metalista, que tem a ver com o momento
em que a moeda metálica surge. A moeda metálica tinha o valor intrínseco e o valor monetário. O
valor intrínseco é o valor do metal em que a moeda foi cunhada e o valor monetário é o valor que
ela representa.
Neste tipo de moeda já é possível reconhecer, nalguma medida, o processo de
desmaterialização da moeda. No entanto a moeda metálica ainda constitui uma mercadoria devido
ao seu valor intrínseco, podendo ser utilizada directamente, e não apenas como instrumento de
trocas. Ainda quando desligada da ideia de obtenção de meios de pagamento, parece aproximar-se,
ao menos, da função da moeda de reservatório de valores.
Mas, se na moeda metálica se encontra já uma certa tendência para a desmaterialização, na
moeda-papel essa tendência é mais acentuada, pois o papel no qual a moeda é estampada oferece
escasso valor como mercadoria. A moeda-papel ainda apresenta uma certa materialidade, que
desaparece completamente com a moeda escritural ou moeda bancária.
A moeda bancária é constituída pelos saldos dos depósitos à ordem, ou parte deles, e
corresponde a um mecanismo semelhante ao da moeda escritural. No caso dos depósitos à ordem,
os depositantes podem a todo o momento levantar os respectivos saldos. A moeda escritural é
constituída por estes saldos ou por percentagem deles.

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Os saldos dos depósitos a prazo ou com pré-aviso não constituem moeda, porque por meio
deles, os depositantes não mantêm uma reserva monetária, líquida, imediatamente e a todo o tempo
disponível para a realização de qualquer pagamento. São denominados de quase-moeda.
Os depósitos à ordem apresentam esta disponibilidade ou liquidez, precisamente porque os
seus saldos podem a todo o momento ser movimentados pelos depositantes. Estão por isso
próximos do modelo escritural.
A partir daqui, vamos ter outras posições doutrinárias, que vão enumerar sobre o valor da
moeda e qualquer que seja a tese sobre o valor desta, temos que ter consciência, de que, quanto
mais moeda monetária houver em circulação, quanto maior for o M (stock monetário), mais risco,
em determinadas situações, de poder haver inflação. Mais risco pode haver de uma moeda em
circulação ter menor valor. Quanto mais moeda, menor valor. Como qualquer produto em qualquer
mercado. Se há um excesso de moeda em circulação, é natural que o valor no tráfego comercial seja
menor. Porque há muito, significa que o bem que teoricamente é escasso, se torna menos escasso e
que por isso vale menos. Com a moeda também é assim. Quando há cunhagem de moeda, há uma
desvalorização. Ligado à cunhagem de moeda há inevitavelmente uma desvalorização desta. Ao
contrário, quando é retirada moeda da circulação, a que fica torna-se mais escassa e portanto mais
valiosa, mais rica, mais importante. É uma reserva e que funciona efectivamente como reserva. É
um aspecto que tem a ver com o valor da moeda.

7. A Inflação
Outro aspecto importante, que nós conhecemos, tem a ver com a inflação. A inflação tem a
ver com o aumento dos preços, desencadeado pelo aumento da massa monetária em circulação, que
depois pressiona os mercados. Isso é que faz subir os preços, mas só faz subir os preços, se aquele
aumento dos fluxos monetários, da moeda em circulação, não for acompanhado de um aumento dos
fluxos reais.
Fluxos monetários são a massa monetária. Os fluxos reais são o que se produz, nos bens e
serviços.
Quando há massa monetária a circular em grande quantidade, um aumento da massa
monetária, porque, por exemplo, o país cunhou moeda, as pessoas passam a ter mais moeda na mão.
A seguir, vão fazer aquilo que qualquer cidadão faz, enquanto agente económico, vão tentar
consumir. Porque têm dinheiro, vão ao mercado consumir.
Se o mercado não responder em termos de fluxos reais, em produtos, em bens e serviços,
vamos verificar que os produtos que estão no mercado vão subir exponencialmente. O produtor não
tem que ter, nem mais, nem menos eficiência. Só tem que aproveitar-se do mercado.
O mercado caracterizou-se por, no momento em que estava mais ou menos equilibrado, ter
havido uma injecção monetária nos bolsos do consumidor. Este vai consumir, tem preferência por

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consumir e tem apetência por consumir. Tendo dinheiro, vai ao mercado e vai acontecer que os bens
ficam escassos à posteriori, o que provoca aquela pressão. Isto significa que os bens que lá estão,
em termos daquela escassez, passam eles próprios a ficar mais caros.
Isto para dizer, e relacionado com tudo isto, está o problema da inflação.
Inflação é quando há um aumento da massa monetária em circulação, não acompanhada do
aumento dos fluxos reais. Fluxos reais são a produção de bens e serviços. Fluxos monetários são a
moeda em circulação.
Aí há inflação, podendo haver tensões inflacionistas. Tensões inflacionistas são quando não
há ainda uma inflação generalizada. É uma inflação por medida, por sectores em que há uma tensão.
Uma tensão inflacionista, a prazo, transforma-se em inflação generalizada. Da mesma forma que a
inflação pode ser ditada dentro de um país, também pode ser importada. Um país que esteja
dependente do exterior, quando importa os produtos, importa tudo o que vem atrás. Se por acaso, a
produção naquele país, já carrega uma grande dose de inflação no seu índice de preços, o país
importador traz consigo aquela inflação importada.
Sempre que havia desvalorização da moeda, (actualmente menos, porque os países,
especialmente os da zona Euro, já não são soberanos quanto à emissão de moeda e aos mecanismos
monetários, na medida em que é o Banco Central Europeu que controla estas operações. Não são os
países que vão determinar, nem a revalorização, nem a desvalorização da moeda.), era bom, no
sentido de tornar as nossas exportações mais baratas e as nossas importações mais caras. Tinha o
reverso da medalha de gerar tensões inflacionistas. Os produtos tornavam-se mais caros.
Muitas vezes, a emissão de moeda, seja moeda metálica ou escritural é vista como a forma
de chamada, hipoteticamente, esterilização do poder de compra. Isto quer dizer que se quer cortar,
condicionar, evitar o consumo. Então nada melhor do que criar uma situação de emissão de moeda
para que ela passe a valer menos e as pessoas gastam mais para comprar o mesmo. É uma forma de
limitar o valor daquela figura monetária.
Diga sucintamente o que é a inflação?
Quando se fala de Inflação vamos relacionar duas variáveis: preço e quantidade de bem. É
uma relação de preço e quantidade. Depois vamos ver como é que se relacionam entre si tendo
presente os dois agregados: oferta e procura.
Há inflação quando há uma descompensação entre a massa monetária em circulação e a
quantidade oferecida, não acompanhada pela produção. Quando no mercado, a quantidade oferecida
é insuficiente para a procura, sobe o preço. Ao contrário quando é superabundante relativamente à
procura, baixa. Quando é insuficiente relativamente à procura, quando há menor quantidade
produzida, face à procura, há muita procura, todos querem o produto. A tal quantidade de bens reais
é insuficiente, face à massa monetária. Como todos têm dinheiro, todos querem comprar. Só não
compram porque o produto é escasso. Quem está a oferecer tira partida disso, vai inflacionar o

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preço, vai aumentar o preço. Claro que uma mera elevação do preço, não gera imediatamente,
inflação. É necessário que haja uma continuidade da situação para que se gere inflação. Num
primeiro momento até poderemos ter tensões inflacionistas, que é algo muito mais suave. Inflação é
quando já está instalada a tal clivagem entre a quantidade oferecida e o poder aquisitivo, a procura
que é expressa no poder aquisitivo dos cidadãos e nessa medida poderemos dizer de uma forma
clara e inequívoca que há inflação se for uma situação continuada.
A uma pergunta como a que foi formulada não se limitem a dizer que é um alta generalizada
dos preços. Está certo mas é curto para uma resposta oral ou escrita.
Significa que há que dizer um pouco mais e explicar aquela outra questão que nós já vimos,
usando aquela terminologia da descompensação e dos fluxos reais, que é a produção e os fluxos
monetários, que é o dinheiro que nós temos nas mãos. Portanto a partir do momento em que há
poder aquisitivo, mas há quantidade insuficiente de produtos, é natural de que quem oferece veja ali
negócio e os preços aumentem.
Num primeiro momento gera uma situação de pressão sobre a oferta para que esta aumente.
Mas também, desde que se detecta a falência da quantidade oferecida, face à pressão da procura, vai
demorar um pouco de tempo para que a produção acompanhe aquela apetência do mercado e
responda à realidade do mercado. Demora um tempo entre a constatação da necessidade de
aumentar a produção, a produção efectiva e depois a sua distribuição.
Quando falamos da inflação é um efeito microeconómico que relaciona quantidade de bens
e preço. Portanto as duas varáveis, quantidade e preço faz entrar em jogo os dois agregados que são
a oferta e a procura. São os elementos desta relação em que a quantidade oferecida, logo a oferta, é
insuficiente para satisfazer a procura. Nessa medida a procura vai pressionar e o mercado não
consegue responder num primeiro momento. A pouca quantidade oferecida vai ver os seus preços
disparar, que é a reacção natural de qualquer produtor. Vai procurar tirar partido do negócio e o
primeiro movimento será o de fazer subir os preços. O segundo movimento é o de aumentar a
produção, apesar de saber que com o aumento da produção, os preços, a prazo vão descer. Se
aumenta a quantidade, num segundo momento, os preços vão descer. Mas aquela necessidade de
acompanhar a pressão da procura é praticamente inevitável.
Isto leva-nos àquela outra formulação técnica de que a inflação é uma relação de
descompensação entre os fluxos reais, que aqui são escassos, face aos fluxos monetários, que são
mais alargados. A tal pressão da procura que se exprime através do poder aquisitivo face aos fluxos
reais da produção, que são os bens produzidos.

8. A velocidade de circulação da moeda


A velocidade de circulação da moeda é a velocidade em que, cada uma das unidades
monetárias é dada em pagamento, durante um determinado período de tempo. A velocidade de

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circulação monetária é o ritmo da circulação da moeda. É o número de vezes que cada unidade
monetária é dada em pagamento. Quanto mais ela circular, maior significado tem para a economia.
Tenho que limitar o período de tempo em que vou fazer a análise. Pode ser uma semana, um
mês ou um trimestre. O interesse de calcular a velocidade de circulação da moeda é para determinar
o número de vezes que aquela unidade monetária foi dada em pagamento. Com base nisso, eu sei
qual é o fluxo de transacções que foram realizadas. Assim consigo saber qual é a sanidade daquela
economia, a dinâmica da economia. A velocidade de circulação da moeda mostra o dinamismo de
uma actividade económica numa determinada sociedade, num determinado período, num
determinado momento. A velocidade de circulação da moeda tem que ser calculada por áreas
monetárias, ou seja, para a moeda metálica, para a moeda fiduciária e para a quase-moeda. Todas
elas têm uma velocidade de circulação diferente. Numa sociedade mais tradicional, em que se usa
ainda muito a moeda metálica, será esta que deve ser medida. As outras têm muito menos
importância.
A velocidade de circulação da moeda serve para medir a utilização que determinada
sociedade faz de cada espécie monetária, e o reflexo que isso tem no comércio que seja
desenvolvido. Além disso serve para ver o dinamismo na actuação económica daquela sociedade.
A velocidade de circulação da moeda mostra o aspecto de comércio em dois níveis. Não
apenas de quem compra mas também o potencial de envolvimento da oferta. A análise tem de ser
feita dos dois lados, de quem compra e de quem vende. Quando dizemos que a economia é
dinâmica, é porque muitos foram comprar mas também muitos foram oferecer, foram vender.

9. Massa Monetária, Preços e Quantidades Transaccionadas.


A massa monetária ou stock monetário é o resultado da relação entre a multiplicação, é o
rácio entre os preços e a quantidade transaccionada.
Aí vamos entrar em linha de conta com a velocidade de circulação da moeda. Não há
circulação monetária sem velocidade de circulação da moeda.
A velocidade de circulação da moeda (v) é diferente consoante estamos a raciocinar em
termos de moeda metálica ou de moeda escritural. São os dois grandes tipos de moeda. Para
sabermos a velocidade da massa monetária, temos de entrar em linha de conta com as duas varáveis.
O M(massa monetária) será igual a PT (preços vezes transacções), em que P (preços) e T
(transacções), logo quantidade transaccionada. Igual a P x T. M=PT, sendo P e T uma
multiplicação. O M é a massa monetária em circulação que resulta da quantidade transaccionada
(PT), expressa em unidades monetárias.
A massa monetária num determinado momento, numa determinada sociedade, e é ao
momento que ela é calculada e não é ao período, vai ser o resultado dos preços (P) vezes o (T) que
é a quantidade transaccionada. Isto para a massa monetária.

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A velocidade de circulação da moeda (v) é que nos dá a relação que nós temos de calcular
para a moeda metálica e para a moeda escritural, que são os dois grandes tipos de moeda. A partir
daí poderemos ter que considerar que a massa monetária comporta duas componentes. Uma tem a
ver com a velocidade de circulação de uma e de outra.
Portanto o M, agora na lógica da velocidade de circulação, é igual a mv e igual m’v’. Em
que o M é a massa monetária (o dinheiro).
Agora, em termos de velocidade de circulação, teremos que considerar a velocidade de
circulação para a moeda metálica (mv), em que o m é a moeda metálica e o v é a velocidade da
moeda metálica. Teremos também de considerar a velocidade de circulação para a moeda escritural
(m’v’) em que m’ é a moeda escritural e o v’ é a velocidade de circulação da moeda escritural. A
massa monetária ligada à velocidade de circulação da moeda. O M (stock monetário ou massa
monetária), a velocidade de circulação da moeda vai dar-nos um m vezes v. Fisher vem dizer que
uma massa monetária/stock monetário tinha que considerar a moeda metálica, mas também tinha
que considerar a moeda escritural. Há aqui um somatório de mv e m’v’ que aqui é a moeda
metálica e a moeda escritural. A massa monetária (M) é o somatório dos produtos destas duas
moedas. A massa monetária em termos de composição é a relação entre preços e transacções.
Quando quiser calcular o M tenho que ter em conta, não apenas esta composição M = mv, mas
também o m’v’, referente à moeda escritural e à sua velocidade de circulação, o que nos leva à
seguinte igualdade: M = mv + m’v’.

10. A disciplina monetária e o FMI


Disciplina monetária é garantir uma relação fixa de valore, entre as diversas moedas dos
países membros do FMI, subordinado a regras em que houve um padrão. Neste caso o padrão era
uma relação dólar-ouro. É a última vez em que vê o ouro com padrão. Não só o ouro mas ligado ao
dólar. As regras para a disciplina monetária tinham si ditadas por Keynes e White, que
determinaram as regras, a formatação, o estatuto do FMI e sobretudo do sistema monetário
internacional.
Nos anos 70, os estatutos do FMI vieram a sofrer uma 1ª alteração em que é banida a
referência ao ouro. Significou que, os estatutos foram integralmente revistos para abolir qualquer
referência escrita ao ouro. Estabelece um novo referencial. São os direitos de saques especiais. Os
direitos de saques especiais são moeda, são créditos que são concedidos para que os países que
deles precisem, os utilizem, dentro dos mercados de intenções para que foram determinados. É uma
linha de crédito atribuída ao país, para que possa fazer todo o dispêndio que está já combinado,
acordado com o FMI.
Isto para concluir que os países não podiam estar dependentes do ouro e então nos anos 70 é
abolido a referência ao ouro.

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1) Síntese
Sem padrão não há nada. Cada um, fixa o valor da moeda ao momento. Não há nada de
estável. Cada país fecha-se no seu comércio. Há uma retracção das relações comerciais, porque é
tudo demasiado flexível e pouco estável. É um convite ao proteccionismo em vez de livre-
cambismo.
Enquanto o livre-cambismo é a abertura dos mercados, o proteccionismo é o fecho desses
mercados.
O padrão traz com ele a estabilidade das trocas.

11. O FMI e Criação do Sistema Monetário Internacional


O FMI criou o Sistema monetário Internacional em que um dos aspectos foi determinar um
padrão monetário.
O padrão já não podia ser o ouro e a prata devido à sua escassez. Achou-se que havia uma
moeda que era muito forte. Era o dólar. A sua fortaleza advinha do facto de os USA nunca terem
tido guerra no seu território, de terem das maiores reservas de ouro mundiais. Assim a relação da
sua moeda com o ouro tinha consistência. Tinham os activos, mas tinham também o ouro. Eram
também um dos países ganhadores da guerra. Os USA avançaram com o Plano Marshall. O Fundo
Monetário Internacional e o Sistema Monetário Internacional vieram determinar que no centro do
sistema, como padrão internacional estava o dólar na sua relação com o ouro. Com base nesta
relação estabeleceu-se um determinado valor ou seja x dólares valiam uma onça de ouro fino.
Depois porque se queria manter a estabilidade daquela moeda, determinou-se que todas as
moedas do sistema, todos os países membros acabassem por fixar um determinado valor, atendendo
à moeda de referência e à relação de referência do dólar-ouro. Tendo presente que não ia ficar fixa
ad-eternum, mas também não se ia admitir que oscilasse permanentemente, determinou-se que o
valor fixado para cada moeda, poderia oscilar numa base de 1% para cima, no sentido da
revalorização e de 1% para baixo, no sentido da desvalorização. O leque da oscilação estava ali
muito bem determinado num total de 2%, relativamente ao valor padrão e não mais, sob pena de
consequências económicas e monetárias. Aqui não temos o câmbio fixo, embora tivesse sido
determinado um valor de referência, mas esse valor tinha de ser sempre determinado. A partir daí
admitia-se que o mercado, consoante estivesse em superabundância ou pelo contrário em escassez,
pudesse oscilar um bocadinho e esse bocadinho até já estava balizado (1% para cima e 1% para
baixo). Estes câmbios assim determinados, são os câmbios que estavam fixados.
O dólar ficou no centro do sistema. Era o padrão que não era dólar-dólar, mas dólar-ouro. O
dólar tornou-se moeda de referência, mas também moeda de intervenção, porque se os países
membros do Sistema Monetário Internacional precisassem de fazer intervenções nos mercados
internacionais, intervenções até para equilíbrio, não é só para fazer investimento, mas também para

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equilibrar as contas à escala internacional, podiam-no fazer em ouro, mas podiam e deviam fazê-lo
em dólares.
Os USA assumiram uma responsabilidade muito grande. Os seus dólares tinham que ter
cobertura no ouro que tinham acumulado. É isso que de algum modo isso vem provocar a falência
do sistema. Não de imediato, mas ao longo dos anos. Os países membros do Sistema Monetário
Internacional passaram a acumular dólares nos Bancos Centrais, nas suas reservas. O grande perigo
que os USA corriam é de que todos pedissem a sua conversão em ouro. Não havia ouro suficiente
para satisfazer aqueles pedidos na totalidade. À data ter dólares era tão bom como ter ouro e nessa
perspectiva ter dólares era o mesmo que ter ouro. A conversão de 1/3 existiu à posteriori, quando se
percebeu que se todos viessem pedir a convertibilidade dos seus dólares em ouro, os haveres
Americanos não davam para cobrir. Então começou a reduzir-se até se chegar ao momento em que
a solução foi solicitar a mudança dos estatutos do FMI. Onde estava a referência do dólar-ouro, foi
retirada. O ouro foi banido dos estatutos. A referência ao ouro pertence ao passado. Foi na altura em
que os USA e o FMI ganham o estatuto que diz que no centro do sistema está o dólar. Agora, o
dólar ligado aos Direitos de Saques Especiais, que é uma moeda escritural.
Direitos de Saque Especiais (DSE) (Special Drawing Rights-SDR) Uma forma de activo
financeiro internacional criado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em 1970 e que é por ele
administrado. Destinava-se a ser um meio de pagamento internacional que suplementaria o papel
desempenhado pelo ouro e pelos dólares americanos no saldar das balanças de pagamentos entre os
países. Os DSE podem ser trocados por moedas nacionais junto do FMI ou ser detidas por um país
como parte das suas reservas. São apenas trocados entre bancos centrais, não sendo utilizados nas
transacções comerciais. São igualmente utilizados como unidade de conta internacional, sendo o seu
valor determinado através da média ponderada das cinco principais moedas do comércio
internacional.
Na moeda escritural, a grosso modo, é garantido o papel que faz a moeda escritural. Não
tem ouro. Esta alteração ocorre nos anos 60 e 70. A alteração dos estatutos do FMI ocorre nos anos
70. É aí que acaba o ouro monetário.
Para nos posicionarmos neste domínio, para nós percebermos, por um lado, a ligação do
padrão relativamente à estabilidade da moeda, estabilidade cambial, logo ao comércio como
incentivo ao comércio em termos de fluxo e perante um novo modelo de práticas comerciais. Fluxo,
porque há mais, há aumento. Um novo modelo, outro tipo de prática comercial, não proteccionista,
mas livre cambista. Há mais comércio, em termos de fluxo e ao mesmo tempo o tipo de qualidade
do comércio que é liberal no mercado e não proteccionista. É uma maior expansão das práticas
comerciais. É a importância da existência de mercado. Estamos sempre à procura da estabilidade
cambial, que não é o câmbio fixo. O câmbio fixo é rígido. Uma vez fixado, mantém-se. O câmbio é
ambulante, sobe e desce consoante o mercado. Aquilo que muitas vezes encontramos são os

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câmbios estáveis em que o grande paradigma é o estável, no sentido em que se tem a consciência de
que é mercado e que este é dinâmico e que pode oscilar. Temos é que controlar as oscilações, para
cima e para baixo, sob pena de se poder descambar no câmbio errático.

12. O Padrão Monetário e a sua Importância


O que é um padrão monetário?
Um padrão monetário, está sempre ligado ao ouro, à prata ou ao dólar, ou a qualquer moeda
forte. Quando não é ao ouro e à prata é ligado a uma moeda forte. Nessa linha o dólar já representou
esse papel de padrão. Representou esse papel de padrão porque por detrás da moeda estava uma
economia forte. A economia Americana do pós II Guerra Mundial era uma economia forte, que
sustentava aquele desafio de constituir a referência do sistema monetário.
Qual era a importância de um padrão?
Um padrão monetário tem uma finalidade concreta e específica. Garantir a estabilidade das
moedas, do valor das moedas. Por seu turno, a estabilidade das moedas, tem ela própria, um
interesse específico, que é contribuir para o fomento das relações das transacções do comércio,
porque há garantia, há confiança para os operadores económicos. Gera garantia, gera confiança para
os operadores económicos.
Se pensarem em países como o Brasil, que antes de ter uma moeda estável, um padrão, tinha
um comércio muito errático, porque não havia confiança para os operadores ou entre os operadores
para terem a certeza de que um negócio que começava hoje com um valor de X, se ia concretizar
algum tempo depois e a moeda continuava a ter aquele valor aproximado. Estamos a falar de
mercado e das oscilações normais e naturais do mercado. Não havia essa garantia, uma vez que era
tipo electrocardiograma, ainda por cima em esforço. Era altamente irregular. Era um convite a que
não houvesse transacções e se as houvesse eram em circuito fechado. A ausência de padrão gera a
instabilidade do valor da moeda e esta gera a atrofia do comércio internacional. Os países ou não
comerceiam, não há relações de comércio ou aquilo que fazem é negociar com o que está mais
próximo, mas na base da reciprocidade. Assim o país (A) aceita o comércio com o país (B) se esse
país (B) permitir a sua entrada (A) no seu comércio (B). Numa base de reciprocidade. Se assim não
for é proteccionismo puro. Cada um fecha-se sobre si, autárcito.
Assim significa que a ausência de padrão, tem reflexos em termos de atrofiar a própria
moeda. A moeda é mesmo um instrumento de trocas, mas em termos domésticos, nacionais. Não
mais do que isso. Não funciona como um instrumento de trocas em termos internacionais, porque o
comércio internacional se retrai.
Essa é a importância do padrão. A busca de um padrão esteve sempre subjacente a todas as
relações monetárias ao longo dos séculos. De tal maneira que em cada momento a importância do
padrão em causa levou a que se encontrasse para corporizar o padrão, metais nobres. Não era uma

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coisa de 2ª ordem. Não era impunemente que era o ouro ou a prata, que tinham até um valor
próprio, intrínseco grande.
O ouro monetário e a prata começam a escassear. Dá-se a II Guerra Mundial. Nos períodos
de guerra há sempre um esboroar do padrão monetário porque há uma alteração completa das
relações comerciais e económicas, dentro do país e entre países, independentemente se estão do
mesmo lado ou em campos opostos. A economia de guerra tem contornos muito próprios,
específicos. Ela gera, em países que até eram de economia livre, nacionalizações. Países que eram
de mercado aberto, situações de proteccionismo. Tudo à conta da excepção e da contenção da
situação, a todos os títulos porque a economia de guerra é exigente em termos do esforço financeiro
para o esforço de guerra. Isso leva a que, do ponto de vista monetário, o padrão já não seja uma
preocupação, porque é difícil de manter.
Tudo o que digo à volta do padrão, significa que em cada momento, quando se encontra um
padrão, se estabelece uma relação de valor entre as moedas e o padrão. Depois há que garantir a
manutenção daquele valor. Garante-se esse valor, fazendo compras ou vendas da divisa em causa
para garantir a estabilidade do respectivo mercado em que as autoridades monetárias compram ou
vendem ou compram e vendem as suas reservas daquela moeda, daquela divisa, para garantir o
nível do preço.
Compras e vendas. É obvio que manter um mercado de compra e venda, pressupõe que haja
uma certa estabilidade social e política e que paralelamente os países se sintam confortáveis nas
compras e vendas para não perderem.
É esse esforço de compra e venda dos activos monetários que leva a que se pense duas
vezes, de que mais vale esquecer o padrão, não importar mais o padrão e o padrão que se vá. Depois
mais tarde, quando se recuperar a paz, então, podemos voltar outra vez ao que era antigamente ou
seja à estabilidade. Primeiro estabilidade política depois civil e monetária.
O que é um padrão monetário?
Um padrão monetário é uma referência monetária. Normalmente o referencial funciona
como padrão. É um bem económico escasso. Um padrão não pode andar para aí aos pontapés,
porque não sendo escasso é banal. Um padrão por essência é uma realidade que enforma aquilo que
nós vemos como um bem económico escasso e tem desde logo, à partida, o privilégio ao ser
escasso, de ter intrinsecamente um valor por ele próprio. Só que aqui vai funcionar o seu valor
supletivo, de ele ser o referencial de valor de moedas.
Qual a importância de um padrão monetário?
A busca de um padrão é sempre uma preocupação das sociedades monetárias, porque
havendo padrão há equilíbrio das moedas que pertencem àquele sistema. Havendo esse equilíbrio
das moedas, há um estímulo a que haja comércio. Havendo esse estímulo de comércio, não é
qualquer tipo de comércio, é um comércio aberto. Porque havendo confiança, os operadores

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económicos sentem que se podem afoitar nas relações comerciais e querem fazer essa actividade
comercial. Porque sabem que o valor que a moeda tem de manhã, será o mesmo à tarde, à noite e no
dia seguinte. Se a moeda oscilar, até já sabem qual vai ser o tipo de oscilação, dentro de baias,
dentro de patamares.
Conhecendo as regras, o operador económico vai para o comércio, vai para as transacções.
Não apenas entre os vizinhos, mas pode ir mais longe. Passa de um comércio restrito, muitas vezes
com aspectos de proteccionismo, para um comércio mais alargado, livre-cambista e em que quer
comerciar de uma forma alargada, ampla.
A existência de um padrão é logo um estímulo a que a própria qualidade do comércio seja
comércio livre-cambista da oferta e da procura. Não um comércio proteccionista.
A ausência do padrão leva à desconfiança, ao receio de que as relações comerciais não
sejam tão proveitosas quanto seria desejável e como tal à retracção do comércio. O máximo que se
pode fazer é um comércio bilateral, estrito. Este país com aquele ou este operador económico com
aquele, a troco de que eu dou-lhe algumas vantagens, mas, se ele me der as mesmas do lado de lá. É
a reciprocidade. Da mesma forma que, quanto muito, eu até poderei ter uma tendência para ser
proteccionista. Fecho o meu mercado, as minhas condições são minhas e não quero que ninguém
entre, porque consegui um pico de desenvolvimento, que qualquer um que entre me vai perturbar
aquele arranjinho. Nessa perspectiva eu fico ali com uma má qualidade de transacções muito
grande, uma vez que muito restrito.
Padrão igual a estabilidade, igual a comércio, logo comércio livre.
Estas sequências são lógicas e redundam sempre naquele ponto de dizer-se que então por
tudo isto o comércio explode, no sentido de que vale a pena fazer. Quando não há é o inverso.
Quando não há nada disso os países vivem em regimes autárcitos, em termos de países fechados.
Quanto muito, dão um passo adiante, começam a abrir-se, mas sempre na lógica da reciprocidade,
país a país, bilateralismo. Nada de multilateralismo, que é um luxo. Bilateralismo e sempre numa
lógica de reciprocidade.
Como vimos, fala-se nisso no pós-II Guerra Mundial, porque antes tinha sido o período
desse fechamento dos mercados, por força da ausência do padrão. A partir do momento em que se
retoma a vivência da paz, no pós-II Guerra Mundial, da recuperação económica, foi dito:
Então temos que alterar completamente o modus operandi de tudo isto. Nessa perspectiva
vamos criar condições para que não se volte aquilo que era antes. Nada melhor, em termos
internacionais, do que haver um compromisso dos Estados, no sentido do não retorno ao período
anterior, que tinha sido muito negativo e de fraco desenvolvimento económico. Até de ausência de
desenvolvimento económico. Nessa base avançaram com o FMI, para a disciplina monetária. É tal a
importância da busca do padrão que antes, até de se avançar para o comércio, se foi avançar para a
recuperação e reconstrução económica dos países envolvidos. Mas depois a seguir, em primeiro,

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arranjar um padrão, FMI – Sistema Monetário Internacional. Só depois é que se avançou para o
comércio. Tudo nasceu na mesma altura, mas como não se pode fazer tudo ao mesmo tempo, foram
por prioridades, tendo sempre presente que o padrão é que era vital. O padrão é a tal referência de
valor. A importância do padrão de estabilidade é a busca daquela divisa que à data conseguia
garantir maior estabilidade. Era o dólar porque tinha por deras uma economia sólida, uma economia
que se tinha mantido mais ou menos incólume no período da guerra. Os Americanos não tiveram a
guerra no seu território e nessa perspectiva conseguiram naquele concerto global dos países estar
numa situação mais folgada o que a generalidade. Os USA assumiram a responsabilidade que foi o
compromisso de ter a sua moeda como moeda de referência, de intervenção e de padrão daquele
sistema monetário internacional.
O que é que aconteceu na II Guerra Mundial para se chegar ao FMI?
A II Guerra Mundial não fugiu à regra. Notem toda a sequência de situações difíceis de
suprir. Por um lado, a I Guerra Mundial. Depois o pós-guerra. O pós-guerra é sempre um período
complexo em termos de recuperação, mais ou menos lenta, consoante as capacidades de quem está
a sustentar a recuperação económica dos países envolvidos na guerra. As economias mais ou menos
devastadas. Entra o período da recuperação e logo quase de seguida temos a crise de 1929, com
tudo o que ela trouxe. Sai-se da crise de 1929 e quase se entra na II Guerra Mundial. É uma
sucessão de acontecimentos em que o seguinte é pior do que o anterior e que no seu conjunto são
terríficos para garantir a estabilidade económica.
Do ponto de vista monetário, uma vez mais, não havia preocupação dos países em manter a
estabilidade da moeda e os câmbios que relacionavam as diversas moedas entre si, também já
sofriam umas oscilações mais ou menos gritantes. Por isso, ainda se estava a sair da guerra, ainda
não se estava no pós-guerra, começou a germinar a ideia, entre os USA e o Reino Unido, de no pós-
guerra, começar a preparar o que nunca tinha havido antes. Uma disciplina monetária internacional.
Esta ideia ia, até, mais além. Lançava as bases de organizações internacionais que iriam
formatar o relacionamento entre os estados de uma forma completamente diferente do que tinha
acontecido até então.
É isso mesmo que vai acontecer. Vamos ver como os protagonistas efectivos dessa
mudança, em termos fácticos, Keynes do lado Inglês e White do lado Americano, vão formatar o
FMI.
Foram, basicamente, lançados três pilares do que ficou conhecido pela Ordem Económica
Internacional. Assente, desde logo e de início, a existência de uma disciplina monetária
internacional, com um padrão, com uma moeda de referência de intervenção e de valor. A moeda de
referência neste semi-sistema monetário internacional foi o dólar, porque:
• Os USA não tiveram guerra no seu território.

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• Os USA tinham, em termos de reservas de ouro, ainda uma percentagem muito
significativa (cerca de ¾ ) do ouro mundial. Portanto podiam dizer que estavam folgados.
De tal forma folgados que até assumiram um auxilio financeiro aos países devastados pela
guerra. Foi o auxílio Marshall.
Tinham uma situação comparativamente melhor que a situação da Europa. O Sistema
Monetário Internacional, nascido então, foi concebido nesta lógica:
• O padrão era o dólar. Os USA assumiram que a sua moeda era a tal moeda no centro
do sistema.
À data ainda havia aquela ligação idílica ao ouro. É a última vez que vemos uma moeda, e
uma moeda de um centro de um sistema, ligar-se ao ouro. Porque logo de seguida o ouro monetário
desaparece. Portanto, estabeleceu-se uma relação fixa de valor entre o dólar e o ouro. No centro do
semi-sistema monetário internacional estava uma relação fixa de valor entre o dólar e o ouro e era
tal o conjunto de reservas de ouro que os USA tinham, que assumiram o papel de que ter dólares ou
ouro era igual, em termos de valor, de importância. Assim ao estabelecer este compromisso de
relação dólar-ouro, os USA aceitaram que todos os operadores económicos institucionais e
internacionais, que acumulassem dólares nos seus haveres, nas suas reservas, pudessem, pelo menos
teoricamente, chegar à porta e dizer que tendo dólares, os quisessem trocar por ouro. Era o mesmo.
Aquele valor que se tinha fixado. X dólares valiam Y gramas de ouro. Isto mostrou a preocupação
do padrão e de uma estabilidade cambial. Foi fixado esse valor de referência e depois cada país
definiu os respectivos câmbios em função daquele valor de referência. Assumiu o compromisso de
que, porque é mercado, o preço de cada divisa, cambialmente falando, pode oscilar. Aquilo que se
queria é que essa oscilação não fosse como tinha ocorrido antes, errática. Os câmbios erráticos que
variavam constantemente ao longo do dia e que podiam até ser suspensos. Esta estabilidade só se
consegue, como qualquer preço, fazendo compras e vendas. Andamos sempre à volta do mercado e
do câmbio que é o preço de uma moeda expresso em termos das outras moedas.
A partir do momento em que se estabeleceu, no caso do Sistema Monetário Internacional,
uma relação de valor fixa entre o dólar e o ouro e depois todos os outros países do sistema também
estabeleceram o respectivo câmbio dentro da mesma lógica, assumiram o compromisso de o câmbio
fixado, o valor fixado, seria mantido estável. Não fixo, mas estável. Há uma diferença entre o fixo e
o estável. O fixo não se altera e normalmente decorre do poder de autoridade que determina que é
X. Nesta situação não há mercado e não havendo mercado, não há oscilações. Só altera quando a
autoridade altera aquilo que estipulou. Quando falo em estabilidade estou a respeitar, desde logo, a
existência de mercado. A assumir e a aceitar a existência do mercado como um ser vivo, uma
realidade dinâmica que vai sofrer alterações. Só tenho que controlar essas alterações para evitar que
me escapem do controlo. Eu tenho que controlar as baias em relação às quais admito a oscilação do
mercado. Ora também à data, no Sistema Monetário Internacional o que foi definido, para lá

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daquele padrão dólar, da relação dólar-ouro e do estabelecimento de uma relação fixa de valor,
admitiu-se que as moedas pudessem oscilar um pouco para cima e um pouco para baixo. A
oscilação admitida foi de 1% para cima, no sentido da revalorização e 1% para baixo no sentido da
desvalorização. O que significa que, se por acaso, qualquer moeda, por força das circunstâncias,
estivesse a raiar a ultrapassagem de 1%, superior ou inferior, a autoridade monetária desse país
tinha a obrigação de intervir, comprando ou vendendo, consoante a situação. Se por acaso, para
estabelecer outra vez o valor de referência, tivesse que vender, vendia. Se tivesse que comprar,
comprava. Se vendia estava a diminuir a sua reserva. Se tivesse de comprar estava a gastar outros
activos para repor o equilíbrio. Estabilidade significa garantir o equilíbrio daquele mercado cambial.
A partir daqui nós temos duas coisas:
o Prosseguiu-se e conseguiu-se a existência de um padrão com uma moeda forte de
referência.
o Paralelamente o reconhecimento de que o mercado cambial vai funcionar, numa base
de estabilidade, com câmbios estáveis, o que é completamente diferente dos câmbios
fixos e erráticos ou flutuantes.
O objectivo era que os cidadãos e os operadores económicos ganhassem confiança e se
lançassem no comércio. Não no comércio doméstico, mas na grande dimensão do comércio
internacional. O objectivo neste pós-guerra, devido à ordem económica internacional, era fazer da
existência de um Sistema Monetário Internacional, o catapultar das economias para um alargamento
à escala transnacional. Não se ficarem ali limitados às respectivas barreiras fronteiriças, mas
ultrapassar essas barreiras e lançarem-se no comércio em termos mundiais. Um comércio para o
qual a ordem internacional do pós-guerra criou outra realidade. Teoricamente deveria ter sido uma
Organização Mundial do Comércio. Não aconteceu isso. Ficaram um período muito longo a ver
uma realidade diferente, que foi o GATT. Um acordo institucionalizado “General Agreement on
Tarifs and Trade”, que como tem a ver com tarifas aduaneiras e com o comércio. Este está
vocacionado para outra vertente não monetária, mas a vertente do comércio internacional numa
lógica de não proteccionista mas de livre cambista e de fomento desse mesmo comércio.
Há uma sinergia, por um lado, entre a existência do Sistema Monetário Internacional e por
outro entre a existência do GATT, onde eles são parceiros do mesmo projecto, que é estimular o
desenvolvimento económico e o comércio.
À data do pacote que é ordem económica internacional do pós-guerra vai também uma
vertente vocacionada para o comércio internacional, livre cambismo. Há ainda um 3º vector que
tem a ver com o auxílio às economias dos países devastados pela guerra. Surgiu essencialmente sob
a forma do BIRD – Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento. O BIRD vem mais
tarde a dar, progressivamente, o Banco Mundial, o Grupo do Banco Mundial que sempre teve a

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finalidade de auxílio aos países devastados pela guerra e depois essencialmente aos países menos
desenvolvidos. Estes são os três pilares da ordem económica internacional do pós-guerra.
O FMI conseguiu manter-se inalterado, com esta fisionomia até aos anos 70. É nos anos 70
que os estatutos do FMI sofrem a 1ª grande alteração. Essa 1ª grande mudança, situo-a por uma
razão simples. É uma realidade que não é estática, é mutável, mas sobretudo porque à data, nos anos
70, na conferência da Jamaica, como o ouro era cada vez mais escasso e os USA não queriam
assumir o compromisso por mais tempo, porque já estavam com défice na balança de pagamentos,
de ser a salvaguarda das moedas do Sistema Monetário Internacional. Nessa perspectiva
conseguiram fazer uma alteração aos estatutos do FMI. Os estatutos foram totalmente revistos para
suprimir toda e qualquer referência ao ouro. Onde havia referência dólar-ouro, ficou dólar. Passou-
se por um período em que a relação era dólar-dólar, à espera do que viria a acontecer.
Subsequentemente a moeda de referência passou a ser, olhando às funções do FMI, que é
emprestar dinheiro aos países, não já em dólares mas em direitos de saque especiais. O direito de
saque especial é uma moeda escritural. É mais fácil e prático de fazer. É no fundo, um cabaz. Um
package de moedas com maior credibilidade e onde entram as moedas mais representativas, de
maior representatividade e que são aquelas moedas que têm por detrás, economias sólidas e
consolidadas. Não podem ter períodos de instabilidade. Têm que ser de confiança para entrarem no
cabaz. Foram direitos de saque especiais que nós aproveitamos quando foi da nossa outra utilização
dos apoios do FMI. Os países, por exemplo Portugal, havia uma facilidade que o FMI desenvolvia
que eram as cartas de intenções e depois recebia-se dinheiro. Sacava-se sobre o fundo que o país
tem e sacava-se, ao abrigo dessa cota, uma determinada quantia de direitos de saque especiais.
Era a forma de intervenção que o FMI tinha sobre as economias nacionais que se colocavam
para beneficiarem desse apoio a coberto de determinadas condições, que exige que os países se
portem bem e levem as suas economias no sentido de um certo desenvolvimento para amortizarem
uma situação negativa.
Nesta questão do FMI, há dois pontos nevrálgicos. É a questão do padrão e a ligação padrão
monetário – estabilidade, confiança, logo mais comércio, que é um comércio livre cambista, não
proteccionista.

13. O que é o FMI?


O FMI é, em termos técnicos, uma organização dita de cooperação intergovernamental.
Digo-o assim porque nós temos, por um lado, as de cooperação e por outro lado as de integração
(CEE e as outras comunidades que nasceram ao mesmo tempo que ela e actualmente está tudo
centralizado na EU). A diferença é que nas de cooperação, os países acordam cooperar entre si e
mantém integral a respectiva soberania. No caso da integração, que começou essencialmente
económica, mas em que já uns laivos de integração política que nós vemos na EU, designadamente

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na matéria da moeda. O que acontece é que os países acabam por colocar em conjunto as
respectivas soberanias. Há uma entidade supranacional que gere matérias que já escapam à
soberania dos estados e os países colocam em comum o exercício dos poderes soberanos, de tal
maneira que, eles já estão por essa via, a abrir o caminho, a prazo, para uma integração política.
Voltando às organizações de cooperação, onde se inclui o FMI, cada país é independente, é
soberano, na sua área, na área daquela organização, na área da moeda e do sistema monetário.
Simplesmente eles acordam em respeitar uma disciplina comum, que no caso do FMI foi a
disciplina criada sobre a batuta do Sistema Monetário Internacional.
Qual é o interesse do FMI?
O FMI é, desde logo, aquela organização que teve a seu cargo a criação de uma disciplina
monetária à escala internacional, com tudo o que isso tem de bom. O que tem de bom é a
estabilidade monetária, de confiança do comércio e estímulo ao comércio. Estabilidade e confiança
na moeda, logo estímulo ao comércio. E, porque o FMI surgiu a par da tal mudança de paradigma.
Antes era o proteccionismo das poucas relações comerciais que existiam. A partir do FMI, do fim
da II Guerra Mundial, o novo paradigma que se instalou, que foi criado, visou abrir os contornos a
um comércio aberto, um comércio em mercado e sem limitações. O FMI está também dentro desta
lógica, embora ele não dê uma achega directa para o dito comércio internacional aberto, mas está a
viabilizar essa abertura por via de uma disciplina monetária. No fundo cada uma das organizações
internacionais nascidas no pós-guerra, teve uma vocação específica.
O BIRD, que depois mais adiante no tempo vem a dar o Banco Mundial, que existe hoje,
teve uma função que foi o equilíbrio e a reconstrução económica do pós-guerra. Depois de
ultrapassadas as suas funções fundamentais, o BIRD veio a recrear-se, adquirindo novas funções
que têm surgido, cada vez mais fortes, de auxílio ao subdesenvolvimento.
Hoje não se fala em subdesenvolvimento. Há um certo pudor em falar assim, embora
saibamos que quando dizemos países menos desenvolvidos, são os países subdesenvolvidos. Países
que têm um nível de desenvolvimento muito baixo, um nível de rendimento per capita muito baixo,
que ainda precisam de dar o salto do desenvolvimento económico e depois do crescimento.
O Banco Mundial que já deixou para trás a tal função de recuperação económica do pós-
guerra, bem se percebe. Basta olhar para os países que estiveram envolvidos na guerra e o que são
hoje. Países industrializados, desenvolvidos. O Banco Mundial está, hoje, vocacionado para apoio
àqueles países que ainda não atingiram esse patamar de desenvolvimento, os países menos
desenvolvidos. Aí dá apoios financeiros a taxas de juro muito baixas e que são um incentivo ao tal
desenvolvimento que esses países têm que melhorar.
O Banco Mundial tem actualmente outra tarefa, muito actualizada que é relativa àquilo que
é o paradigma económico dos nossos dias. É de Estado regulador. Já houve o período do mercado
com Adam Smith, houve o período do intervencionismo nas décadas de 60 e 70. Depois houve uma

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fartura relativamente a essa intervenção do Estado e começou a detectar-se falhas na intervenção ou
seja, imperfeições nessa intervenção. Isso fez com que, imediatamente começassem a correr
rumores de que era necessário mudar de paradigma ou seja, voltar ao mercado e essa volta ao
mercado significou o abandono daquele intervencionismo com o retorno ao mercado. Não já ao
mercado do Adam Smith, com excessos dos clássicos, mas a um neoliberalismo combinado com o
monetarismo. Neste novo modelo o Estado continua a ter um papel, mas não já um papel de
intervenção. O papel que o Estado tem agora é de regulador. Depois de um período de liberalismo,
sucedeu-se um período de intervencionismo e depois vem o período da regulação. No liberalismo é
o Estado mínimo. No intervencionismo é o Estado máximo, mas sempre presente. Na regulação o
Estado desonera-se de tarefas que dantes ele tinha assumido. Transfere-as para outrem que são os
Privados. Ou é o Estado ou é o Privado. Se não é o Estado é o Privado que vai desenvolver aquelas
tarefas. E o Estado que podia dizer que já passou aquela pasta e vai desenvolver outras tarefas, mas
tal não acontece, porque continua presente como regulador.
Mas porque é que ele surge a regular e o que é que ele regula?
Ele regula o funcionamento do mercado, no sentido de que ele vai evitar que o mercado
funcione de uma forma desbragada, selvagem. Nessa perspectiva ele limita-se a criar condições
para que isso não aconteça. O Estado não vai actuar à posteriori, depois de o mercado ter falhado,
mas vai prevenir as falhas do mercado. Ele vai regular o mercado para evitar as falhas do mercado.
Está presente, é regulador. O Estado regulador é o novo paradigma. É uma preocupação que os
países, isoladamente, têm de prosseguir as finalidades da regulação e quando há privatizações,
necessariamente o Estado é mais do que nunca regulador. Tem que regular para ver como as coisas
ocorrem em termos do papel que é agora cometido à iniciativa privada.
Mas também as organizações internacionais, como o Banco Mundial e o FMI têm o papel de
estimular essa passagem de paradigma.
Como é que estimulam?
O Banco Mundial é constituído por um conjunto de países, onde necessariamente são os
países menos desenvolvidos que têm de acomodar o seu modelo económico, que também estão
presentes e que recebem dele apoios financeiros. Nada melhor do que fazer depender a atribuição
desses apoios financeiros do respeito por todo um conjunto de regras já do novo paradigma. O
Banco Mundial quando concede apoio financeiro a um país menos desenvolvido para ele se
desenvolver, vai fazer depender a outorga daqueles empréstimos, de o país fazer certas reformas,
nomeadamente a diminuição do sector público. Em vez de seguir aquele exemplo, que é muito
tradicional nos países menos desenvolvidos, de um sector público muito alargado,
desmesuradamente grande, porque nos países menos desenvolvidos, o sector público é a entidade
empregadora por natureza. À mesa do orçamento sentam-se as pessoas que não têm outra forma de

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ganhar emprego. São funcionários do Estado. Nessa perspectiva o Estado ganha uma dimensão
excessiva que se salda por um custo muito elevado em termos orçamentais.
Assim, uma entidade com o Banco Mundial, que empresta dinheiro a esses países para eles
melhorarem e superarem o seu nível de desenvolvimento, vai fazer depender a atribuição desses
dinheiros, de esses países fazerem reformas dolorosas, porque vão colocar pessoas no desemprego,
mas vão diminuir, emagrecer o sector empresarial do Estado. Fazem esta diminuição, substituindo
por um lado, e por outro vão fazer investimentos reprodutivos para onde canalizam aquela mão-de-
obra. Isto é um processo. É estrutural. É um processo longo. É assim que nós vemos hoje o Banco
Mundial, como um agente de mudança do paradigma económico. É ele que dá o dinheiro. É ele que
vai pôr as condições, como por exemplo, diminuir o sector público ao mínimo indispensável,
rentabilizar os investimentos, etc.
O FMI quando nasceu lá atrás, nasceu com uma vocação concreta. Nasceu com a finalidade
de dotar, em termos internacionais, o mundo de uma disciplina monetária. Já sabemos que os
países, os cidadãos, as empresas, os agentes económicos andam sempre à procura de um padrão
monetário. Sentem-se diminuídos sem esse padrão. Sem padrão não há estabilidade, não há
confiança, não há comércio. É difícil quebrar esta sequência. O FMI através do Sistema Monetário
Internacional conseguiu isso. Conseguiu-o com alguns altos e baixos, com algumas mudanças nos
seus estatutos nos anos 70 e depois em 76, estando hoje vivo e operativo. O FMI continua a
emprestar aos países, agora é-lhe indiferente se aos países mais ou menos desenvolvidos, aos países
que precisam de apoio financeiro, de apoio directo, para o equilíbrio das suas finanças e economia.
A vocação do FMI é de actuação sobre a estrutura económica, mas não em termos de fundo, não em
termos estruturais, porque isso é uma vocação mais do Banco Mundial do que do FMI. As
condições do FMI são muito mais pesadas para quem solicita o empréstimo, porque as taxas de juro
são mais duras, mais pesadas. Custa mais caro. O país se puder optar, dependendo do que vai fazer
com aqueles apoios financeiros, prefere recorrer ao Banco Mundial, porque as condições são mais
favoráveis para o país, do que recorrer ao FMI, que é mais pesado. O apoio e a terapêutica que
impõe aos Estados é mais dolorosa. São normalmente políticas contracionistas. Nunca
expansionistas. Quando se fala do FMI e da ideia de apertar do cinto, significa redução de salários,
privilégios, benefícios, etc. Porque o país quando recorre ao FMI é porque as suas finanças estão
doentes. É uma política de contracção e redução de despesas. Se o país não cumpre o contracto que
estabeleceu com o FMI, são-lhe aplicadas sanções. O FMI nunca intervém sem ser pedido. É um
organismo de cooperação económica. Não se impõe. Claro que a opinião pública internacional faz
pressão sobre o país em causa para que o faça. No entanto o país tem que estar disponível, por um
lado pedir, mas por outro estar disposto a seguir aquilo que o FMI vai impor. É a regra de quem
empresta.

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O COMÉRCIO
Tinha-se ficado com o proteccionismo e viu-se que este não levava a lado nenhum, que no
pós-II Guerra Mundial entendeu-se que agora o novo paradigma deveria prosseguir a expansão do
comércio livre, de mercado. Entendeu-se que se deveria criar uma organização para o efeito. Foi
aquilo a que se chamou Organização Mundial do Comércio. Só que problemas entre países, como
respeitabilidade, por um lado com os USA e por outro com a Europa, levaram a que o primeiro
modelo da OMC não passasse do papel. Foi chumbado paralelamente em termos nacionais e na
Europa. Um dos pilares da ordem económica do pós-guerra estava parado. Para não se perder tudo,
foi-se a esse acordo e retirou-se um capítulo. Sobre esse capítulo, do acordo global, construiu-se o
GATT. A outra que surgido como uma organização internacional, a OMC, veio a dar lugar, porque
não foi possível mais, a um acordo (um acordo é um pouco diferente) internacional ligado, apesar
de tudo com instituições, mas muito reduzido. Apesar de tudo, produziu o seu efeito até ao final d o
século passado quando finalmente surgiu a Organização Mundial do Comércio, através de reuniões
que ficaram conhecidas por Rounds.
São os três pilares. Desenvolvimento, por um lado, BIRD – Banco Mundial. Disciplina
monetária – Fundo Monetário Internacional. Uma mecânica de comércio no sentido da liberalização
do comércio à escala mundial. Numa linha de comércio livre, com reciprocidade nas trocas e
mesmo a dita cláusula da nação mais favorecida, da extensão da cláusula da nação favorecida a
todos os países. Portanto o comércio livre, bem alargado que surgiu, não sob a forma de uma
instituição, de uma organização, mas sob a forma de um acordo institucionalizado. O GATT foi
ficando. Muito próximo de nós, num passado recente, virou finalmente para OMC que existe
actualmente. A OMC que quis surgir lá atrás, nos anos 40, veio finalmente a surgir, agora já na
viragem do século.
O Banco Central Europeu vem a propósito do que hoje já existe na Europa. Um modelo
muito especifico de integração, que é a integração económica. Quando falamos do Banco Central
Europeu, estamos a falar da entidade que tem um papel predominante, máximo na condução da
política monetária a nível Europeu. Quando digo que tem um papel máximo, quero dizer que tem
um papel de quem dita a regra e impõe a regra, negoceia, porque todos os países à volta da mesa
negoceiam. Depois aí, embora possam o mesmo voto, há uns que são mais fortes que os outros. A
Alemanha e a França têm mais peso do que Portugal ou a Espanha. Significa que já estamos a falar
na lógica da integração Europeia. A tal integração que surgiu também na sequência da II Guerra
Mundial. Houve a recuperação económica. Depois avançaram as principais organizações de
cooperação económica (FMI, Banco Mundial, GATT), mas nasceram mais tarde, no início dos anos
50, as organizações internacionais de intervenção económica. São a CECA (Comunidade
Económica do Carvão e do Aço), a CEE e o EURATOM. Estas organizações surgiram,
essencialmente, económicas. Nunca tiveram, às claras, pretensão de ser mais do que integração
28 - 43
económica. E digo às claras, porque sub-repticiamente, percebia-se que se tudo corresse bem, a
prazo, elas visavam uma integração mais forte. Com um contorno político. Tentaram-no no final
dos anos 50 e início dos anos 60, mas as coisas correram mal, por via dos projectos da Comunidade
Europeia de Defesa e da Comunidade Política Europeia. Claramente dois modelos políticos.
Política obviamente e defesa que é politica, não foram além do projecto. Nunca surgiram como
comunidade. Ficaram como projectos que falharam e mostraram que o mundo Europeu, a CEE, à
data constituída por seis países de formação originária, não estava ainda preparada para dar o salto
de uma integração estritamente económica para uma integração política.
Depois a CEE começou a crescer com os alargamentos progressivos. Num dos alargamentos
dos anos 80, entra Portugal. A CEE continuou a crescer. No final dos anos 80, início dos anos 90, a
comunidade resolve dar um salto qualitativo e passa de Comunidade Europeia a União Europeia.
Ao mesmo tempo, com o tratado de Maastricht ocorreria, por um lado, a mudança de Comunidade
em União e por outro lado ocorreu uma outra reunião que foi a criação de uma disciplina monetária
própria Europeia, sob a forma de União Económica e Monetária. Da união económica e monetária,
no papel, o que avançou foi a união monetária. A união económica ficou a aguardar nova
oportunidade, numa outra ocasião mais adiante. Essa ocasião ainda não surgiu. Verdadeiramente, o
que temos hoje é a união monetária, embora se continue a dizer união económica e monetária. Esta
união monetária é corporizada no papel-moeda ou na moeda metálica, que é o EURO.
Temos aqui uma moeda única para a Europa. Mas nem toda porque o Reino Unido não
aderiu. Ficou de fora da moeda única Europeia. Continuou a ter a sua moeda própria, a libra.
Para disciplinar a moeda única Europeia foi criado o Banco Central Europeu (BCE). O BCE
é a entidade que gere a disciplina da moeda única, em termos de garantir um conjunto de regras, que
ficaram primariamente estipuladas no tratado de Maastricht. Mas ao mesmo tempo, entendeu-se que
aquelas regras, que foram acordadas por todos os países membros, podiam não ser suficientes. Há
certos países, que hoje são países da União Europeia e que já o eram à data e não têm um bom
histórico em termos de disciplina monetária, sobretudo, finanças. São um pouco assimétricos. Não
são de confiança, porque umas vezes têm orçamentos equilibrados, mas depois são capazes de
desequilibrar profundamente os orçamentos. Umas vezes intervém mais e outras menos. Foi por
causa deles, para garantir a sustentabilidade das finanças públicas que foi celebrado aquilo que tem
sido o espartilho para todos os países europeus e o quebra-cabeças e o pesadelo para os países
europeus, que é o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Este Pacto de Estabilidade foi moldado à
imagem e semelhança das exigências Alemãs. A Alemanha quando entrou nesta situação da adesão
à moeda única, para o projecto da moeda única europeia, ainda no tempo do Helmut Kohl e do
Miterrand, já tinha ultrapassado os fantasmas da II Guerra Mundial, da recuperação económica,
devido à sua capacidade de recuperação.

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Quando foi para preparar a entrada no Euro, países que não tinham uma grande capacidade,
pelo menos a mesma capacidade de uma Alemanha, ou de outro país grande, para entrar no Euro,
fizeram tudo o que podiam para entrar no Euro. Portugal foi um deles. Durante uns tempos andou
com as finanças muito certinhas e entrou. No entanto os países grandes que já sabiam que os países
do sul, do qual fazemos parte, não são de confiança. Fazem um grande esforço inicial, mas depois
relaxam. Então, para evitar este relaxe, criaram o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Depois das
regras rigorosas de Maastricht, ainda se criou, pouco depois, regras ainda mais rigorosas. Reforçou-
se aquelas regras para uma duração subsequente. As regras do Tratado eram para estar presentes até
os países entrarem na moeda. O Pacto de Estabilidade e Crescimento são regras que apesar de os
países já lá estarem, continuam a respeitar. Porque apesar de fazerem parte do clube, continuam a
ter que respeitar a disciplina monetária e a disciplina financeira. Têm porque entraram, cumpriram.
Agora vão ter de cumprir e cumprir sempre. Este cumprir sempre significa que a Comissão
Europeia vai estar sempre a controlar, todos os anos, para saber como vai ser o orçamento de cada
país. O Banco Central Europeu é a entidade, que por um lado dita as regras monetárias para os
países da Zona Euro, acciona ou manda a Comissão accionar os mecanismos de sanções, no caso de
os países prevaricarem nas regras que estão no Tratado e que estão depois reforçadas no Pacto de
Estabilidade e Crescimento.

14. A União Económica e Monetária do ponto de vista


monetário.
A União Económica e Monetária foi “vendida” porque os Estados, do ponto de vista
monetário, perdiam a soberania e perderam.
Em termos históricos quando nós olhamos para a história, vemos que a forma de anular um
povo, para começar, é tirar-lhe a língua, em que a língua é reduzida a dialecto. Perde aquela
qualidade distintiva relativa a outros povos. Depois procurar esconder ou não desenvolver o culto
da História, o hino ou as músicas que faziam parte da História do país. Também a moeda, porque
esta sempre foi um instrumento externo de independência e autonomia, muito forte, dos países.
A partir do momento em que entramos na política de uma moeda única, há um reforço de
uma pertença de todos a um espaço comunitário. Cada um per si perdeu sinais de soberania. Basta
ter perdido a moeda do país para que esta passe a estar na história.
Dificilmente se volta atrás porque a mudança é de tal maneira estrutural que voltar atrás dá
tanto ou mais trabalho do que seguir nesse sentido. Perdeu-se a soberania, mas foi dito, para dourar
a coisa, a Comunidade Económica Europeia sempre foi muito bem acolhida pelos países porque era
fonte de dinheiro que advinha aos Estados. Quando aderimos à CEE éramos constantemente
massacrados com aquela informação de quanto recebíamos por dia. Eram os fundos financeiros
comunitários com que fazíamos as reformas na agricultura, na indústria, fazíamos as infra-

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estruturas. Por isso mesmo é que na entrada na CEE, nós estávamos mais ou menos anestesiados
relativamente à Comunidade, porque era mais o aspecto positivo e nunca ninguém diria que havia
ali aspectos negativos, devido ao dinheiro que se recebia. Claro que à data não havia e não tem que
haver, necessariamente, mas para os mais ortodoxos e conservadores, vêm a progressão da
Comunidade Europeia num sentido que hoje até já os preocupa. Agora esta última passagem, não
foi o Acto Único Europeu. O Acto Único Europeu, quando a pessoa vê que o mercado comunitário
perde as fronteiras e vê as vantagens. As tais vantagens que permitem ultrapassar fronteiras de
forma mais fácil, quer vá em lazer, quer vá em negócios. Claro que o Espaço Schengen e a abolição
das fronteiras facilita a passagem do bem mas também facilita a passagem do mal. Passa o crime
organizado, o tráfico de pessoas, o branqueamento de capitais. Passa tudo o que é criminoso. Passa
tudo com a mesma facilidade. Não há fronteiras, não há controle.
Mas de algum modo podemos dizer que esse salto qualitativo foi muito mais libertador do
cidadão comunitário e sobretudo ajudou a dar-lhe aquele sentimento de pertença, ao Espaço
Europeu. A partir daí deu-se outro passo, que foi a criação da União Económica e Monetária. A
partir do momento em que os países ficam destituídos de um símbolo de soberania, que é a moeda,
verdadeiramente, muita gente olhou, eu diria, de revés para aquele passo que foi vendido como mais
um passo para completar o processo de integração económica. Não foi um passinho, a partir do
momento em que já tem uma conotação politica manifesta. Uma coisa é eu dizer que fiz a união
aduaneira, acabei com os direitos alfandegários entre o espaço dos Estados membros. Outra coisa é
eu fazer o mercado comum fazendo a união aduaneira, e um pouco mais, mas sempre económico. É
económico, mas quando eu chego a este ponto e digo que faço isto e faço ainda a criação de uma
moeda única, em que as vossas moedas, ponham-nas na prateleira, é histórico. Passa a haver uma
única moeda e é uma entidade comunitária que vai ditar o que é que vocês todos vão fazer. Nessa
situação as podem não gostar. Os mais puristas acharam que aqui, e correctamente, já há integração
política.
A integração política não tem de surgir sob a forma de um Presidente da República
comunitário ou de um Presidente dos Estados Unidos da Europa, que em termos globais não existe.
São pequenos passos que já têm uma pesada conotação política.
Quando chegamos a este ponto vemos uma agravante. Isto faz com que pessoas importantes,
que eram Europeístas ferrenhos, actualmente continuem Europeístas mas sejam críticos do rumo
que a coisa assumiu. Porque agora como temos a União Económica e Monetária, ficamos todos com
a ideia de que a União Económica e a União Monetária já estão ambas concretizadas. Mas temos
que ver que a União Monetária ainda não se concretizou. Só a União Monetária é que está
concretizada.
Foi dito que: Vocês aqui, perderam a soberania, mas estejam descansados que continuam a
ser soberanos em termos financeiros, em termos orçamentais. Há um orçamento nacional e há um

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orçamento comunitário mas que é para a Comunidade. Cada um faz o seu orçamento. O orçamento
do país A é discutido e autorizado dentro do país pelas instâncias competentes, ou seja, apresentado
pelo Governo e aprovado pelo Parlamento, o mais democraticamente possível. Isto em termos
exclusivamente nacionais. É o governo do país que vai determinar os impostos e vai determinar os
níveis dos impostos. Este é outro aspecto da soberania dos Estados. Lançar impostos e estabelecer
os níveis da carga fiscal. Só que da forma com as coisas estão organizadas, nós vemos que do ponto
de vista monetário, porque importa garantir à luz do modelo económico ou financeiro da União
Monetária, que há certos parâmetros que têm que ser respeitados. Os tais parâmetros, os tais
critérios que estão enunciados no Tratado de Maastricht e estão reforçados no Pacto de Estabilidade
e Crescimento.
Dois deles têm a ver, exclusivamente, com o aspecto financeiro, com o orçamento. É o
défice e a dívida.
Significa que se um país, membro da Zona Euro, que pensa que o seu governo ainda é
completamente independente, relativamente ao aspecto financeiro, e se verifica que não é, porque se
o seu défice orçamental for superior ao parâmetro fixado em Maastricht e reforçado no Pacto de
Estabilidade, então incorre em défice excessivo. Isso significa que vai ser penalizado porque não
tem acesso aos fundos financeiros comunitários. Passa também a ser contribuinte líquido do
orçamento comunitário e até repor o equilíbrio está diminuído relativamente aos demais membros
da Zona Euro. A União Económica e Monetária é uma construção perversa porque para estar tudo
bem na parte monetária, o país tem que supostamente abdicar, e na prática abdica, da dita soberania
na parte financeira. É-lhe dito: Na parte financeira fazes o teu orçamento como muito bem entendes.
Ninguém te obriga a nada. Mas cuidado, o teu défice tem que estar abaixo dos 3%, porque se estiver
acima, és penalizado. Não é na parte orçamental, mas é na parte monetária e na parte monetária diz-
se que o défice tem que ser inferior a 3%. A regra monetária é que interferir com o teu desempenho
e a tua performance em termos financeiros. Isto leva a que cada vez mais se diga que a forma como
as coisas estão construídas, que a prazo e não pode ser tão longínquo como isso, é tempo de a
própria União Europeia arrancar para a construção da União Económica.
A União Económica vai exigir um orçamento federal, em que cada país é um Estado de um
grande Estado, o dito Super-Estado Europeu, em que a própria Comunidade vai finalmente
ultrapassar um painel que a tem atrofiado muito do ponto de vista do seu orçamento comunitário.
O seu orçamento tem três grandes receitas próprias. São grandes, mas são pequenas em
termos de caudal de receitas. O que significa, no fundo, que o orçamento comunitário é um
verdadeiro orçamento público, mas é um orçamento insuficiente para as pretensões que a União,
hoje, tem. Tem muitas ambições mas tem pouco dinheiro. É uma pretensão que não tem
sustentáculo nos meios financeiros. Necessita de um orçamento mais robusto.

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Mas onde é que vai buscar a receita?
Há uma ideia que de vez em quando aparece, de criar um imposto Europeu. Não é uma boa
solução devido à carga fiscal de cada país. Isso equivale a ter de suportar mais um imposto para
alimentar o orçamento comunitário.
O Banco Central Europeu é a entidade que tem a seu cargo a gestão da matéria da política
monetária da Zona Euro.
O Banco Europeu de Investimentos (BEI) de que todos os Estados membros são sócios, são
associados, dá apoios financeiros. O BEI é um banco que encontramos em projectos Portugueses e
que muitas vezes são desenvolvidos por privados portugueses. As PPP’s onde há sempre um grande
apoio financeiro do BEI.

15. A questão monetária ao nível da Comunidade Europeia


Para falar na questão Europeia, não poderemos deixar de fazer uma pequenina entrada, no
que é a Comunidade Europeia. Inicialmente surgiram três comunidades. A CECA (Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço), a CEE (Comunidade Económica Europeia) e EURATOM
(Comunidade Europeia de Energia Atómica). Surgiram as três nos anos 50. A primeira em 1951. As
outras duas em bloco em 1957. O seu nascimento foi um acontecimento inovador. Já havia muitas
organizações internacionais, mas não com esta fisionomia. Esta fisionomia é de integração Europeia
e económica. As outras eram de cooperação económica. Estas são de integração económica e
surgem na sequência da II Guerra Mundial. Não são uma exigência dos USA. Porque as outras, o
BIRD, o FMI e o GATT, foram uma exigência dos USA. Exigência de uma potência vencedora
sobre outras potências vencedoras, mas uma potência vencedora que tinha algo que as outras não
tinham, capacidade financeira. Deu o seu apoio por via do Plano Marshall, mas deu também a sua
exigência em termos de uma nova fisionomia da ordem económica internacional, aliás da criação da
ordem económica internacional.
A CECA, a CEE e o EURATOM são uma consequência de um movimento claramente
Europeu. Aquilo que ficou conhecido pelos pais da construção Europeia, Jean Monet e Robert
Chiman, que vieram lançar as bases de um novo tipo de organização, já muito mais exigente do
ponto de vista da interligação estreita entre os povos. Avançaram com a dita integração económica e
procuraram fazer aquilo que por via de regra dava resultado. O que dava resultado era trilhar o
vector económico ou seja, fazer com que os países se aproximassem a pensar sempre numa maior
homogeneidade económica. A CECA foi eminentemente económica, centrada a propósito de dois
sectores económicos, carvão e aço. Os dois sectores tinham estado envolvidos numa forma mais
directa e absoluta no caso da guerra. A CEE já deu um passo mais longo porquanto procurou
integrar todos os sectores da economia. Não apenas uma integração vertical, mas agora uma
integração horizontal. Portanto muito mais ambiciosa. Um projecto de maior folgo. Precisamente

33 - 43
porque ambos correram muito bem e sobretudo a primeira tinha corrido, mesmo, muito bem a
vários níveis, entre o aparecimento de uma e de outra, houve alguém que pensou em dar logo um
passo para a integração política.
Tudo começou com a integração económica, com a CECA. Correu muito bem. De tal
maneira os mesmos que estiveram na CECA, resolveram fazer um desvio e entrar logo na
integração política. A dois níveis: Procurar uma Comunidade Europeia de Defesa e uma
Comunidade Política Europeia. Mais política do que isto era difícil. Política Europeia é política
pura. Comunidade Europeia de Defesa, obviamente, a defesa é um sector muito importante em
termos de soberania dos Estados. O que aconteceu logo com essas duas iniciativas, foi que elas
ficaram logo no papel, no sentido em que foram criadas, no papel, em tratados, o esboço de uma e
de outra, das comunidades, mas não foram além disso. Quando os parlamentos dos países membros,
os ditos seis, os países do Benelux, a Alemanha, a França e a Itália, procuraram apreciar a matéria
de aprovação daqueles tratados, não conseguiram. Aqueles projectos foram repudiados. Ficaram só
como projecto. Isso mostrou que os que os países podiam estar disponíveis para uma integração
económica mais forte, passando de um sector apenas, carvão e aço, para toda a economia, mas não
ir além disso em termos de dar logo um passo de gigante em termos políticos. Isso mostrou a todos
os construtores da Europa, os países da Europa, verdadeiramente perceberam, que o mundo
Europeu, não estava ainda preparado para uma integração política. Significou que ia continuar a
integração económica, como continuou.
Isto foi em 1957, ano de criação da CEE com uma integração horizontal e a partir daí até ao
início dos anos 90 temos a integração económica. Cada vez mais evoluída, mas sempre e só
integração económica.
A CEE nasceu com base na união aduaneira. O 1º passo que os países (os ditos seis) deram
foi no sentido de acabar com os direitos alfandegários entre os mercados deles.
Dentro do perímetro dos 6 foi a abolição dos direitos alfandegários, mantendo para o
exterior, face aos chamados terceiros países, uma pauta aduaneira comum. Entre os países membros
era como se não houvesse quaisquer barreiras, como se fosse um mercado nacional, entre uma
província e outra. Ao nível dos países não havia fronteiras em termos de tráfego comercial, mas já
havia face ao exterior. Significou que tendo cada um a sua pauta aduaneira própria, elas tiveram de
ser harmonizadas no sentido do exterior. A união aduaneira foi o desmantelamento dos direitos
alfandegários no espaço interno daqueles países e a harmonização das respectivas pautas
aduaneiras, numa única que seria depois a pauta aduaneira daquele conjunto.
Isto já foi um passo muito significativo e importante no sentido de que para este efeito os
seis apareceram face ao exterior como um bloco e esse bloco era reflectido na existência de uma
pauta aduaneira única comum. Entre os países membros nada de direitos alfandegários, nem
medidas de efeito equivalentes. Livre comércio entre os seis com o desmantelamento desses direitos

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alfandegários. Notem como esse desmantelamento leva a que os países, deliberadamente
assumissem que prescindiam, em termos orçamentais, do produto resultante da cobrança daqueles
direitos. Se por acaso isso não tivesse acontecido, qualquer relação entre os seis países resultaria na
cobrança de direitos alfandegários. A partir do momento em que aceitam que entre si não houvesse
direitos alfandegários a cobrar, eles prescindem automaticamente daqueles direitos. Em vez de
aumentarem, as suas receitas públicas desapareciam.
Isso é um dado importante porque temos de pensar que eles não eram beneméritos. Tinha
que haver uma base de sustentação daquele projecto Europeu, que era um projecto de maior folgo.
Se por acaso essa base partia do princípio ou pressupunha o perder daquelas receitas, outros ganhos
iriam surgir. Numa lógica de perdas e ganhos, logicamente outros ganhos iriam ter. Os Estados
perdem deliberadamente esses direitos alfandegários e a partir daí, por via da pauta aduaneira
comum, quem vai cobrar os direitos alfandegários, já não são os países, mas a Comunidade no seu
conjunto. A pauta é comum e com ela nós temos a primeira receita pública verdadeiramente
comunitária. Adiante iremos falar nas receitas comunitárias do orçamento comunitário, do
orçamento da CEE, onde iremos encontrar a pauta aduaneira comum. A pauta aduaneira comum
não é a pauta do país A ou do país B, é daquele conjunto de 6 países, depois 9, 12, 15, 27 e 28. A
pauta é da comunidade e tem a ver com a cobrança de direitos alfandegários do bloco de países,
face a terceiros países. Isso foi o que ficou da união aduaneira.
Sobre a união aduaneira foi construído logo de seguida o Mercado Comum. Este já partiu do
pressuposto que foi conseguido na união aduaneira, da livre circulação das mercadorias. Acabam
com os direitos alfandegários e as medidas de efeito equivalente, que é como se fossem direitos
alfandegários. Acabam com esses obstáculos e então as mercadorias circulam livremente.
O Mercado Comum vai dizer o seguinte. Sobre a liberdade de circulação das mercadorias,
há que ir mais longe. Criar outras liberdades de circulação. O Mercado Comum é o protótipo das
várias liberdades. Vai acrescer:
A liberdade de circulação de trabalhadores,
A liberdade de circulação de estabelecimento,
A Liberdade de circulação de capitais,
A liberdade de circulação de serviços.
Com isto nós temos a 4 liberdades.
É a liberdade de circulação de trabalhadores e não de pessoas. É importante ver a diferença.
Trabalhadores assalariados e independentes. Comporta os dois tipos. A liberdade de
estabelecimento tem a ver com as empresas. Esse é um pacote. Depois a liberdade de circulação de
serviços e a liberdade de circulação de capitais. Destas liberdades, aquela que surgiu mais
rapidamente conseguida foi a liberdade de circulação dos trabalhadores. Notem que à data, aquilo
que a comunidade (CEE) mostrou é que o seu modelo de política económica era assente no mercado

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e na concorrência, no modelo liberal. Portanto não esquecer os anos 50. Aquilo que ela procurou
dizer foi que o mercado desregulado, por via da concorrência, vai permitir, se houver excesso de
mão-de-obra numa região ou num país e faltar noutro, há que criar condições aliciantes para que o
excesso de mão-de-obra do país em que está a mais, tenha atractivo para se deslocar para o pais,
dentro do perímetro comunitário, em que acusa falta, escassez daquela mão-de-obra. Porque
achavam eles que qual mão invisível, o excesso de um lado iria para onde havia falta. Onde o preço
que era elevado baixava e onde o preço que era baixo subia e assim havia um equilíbrio. A mão-de-
obra é como outro bem qualquer, com especificações inerentes, mas é um bem em que o mercado
acusa défice ou superàvit, de um lado ou de outro. Se eu fizer deslocar de onde havia excesso, e por
isso a remuneração era baixa, para uma outra região, logo outro mercado, onde havia défice, logo o
preço era alto, então passa a haver uma oferta mais equilibrada e preço vai tender a subir onde era
baixo e a baixar onde era alto.
Independentemente se isso se conseguiu muito ou pouco, a verdade é que num primeiro
momento até se conseguiu, mas o que interessa aqui sublinhar é que por via da política económica
que se seguiu e que é a grande mancha do funcionamento da Comunidade Europeia, foi, é e será,
aquilo que nós observamos. Pondo no papel estas regras, procurou-se o equilíbrio entre regiões que
eram mais deficitárias em determinadas realidades, que neste caso era o trabalho e procurar de
algum modo o equilíbrio global. Daqui nós tiramos a 1ª conclusão. O 1º esforço de liberdade de
circulação das pessoas, não foi do cidadão, foi do trabalhador. Só mais adiante, no mercado interno
e o mercado interno vai-nos apontar para a 2ª metade dos anos 80, é que o individuo, o Europeu é
visto, não como a sua força de trabalho, mas como o cidadão que hoje está aqui e pode andar a
percorrer todo o espaço comunitário. Não para ir trabalhar, mas tão simplesmente para viajar, para
se deslocar pelo espaço da Comunidade. Não se desloca de um sítio onde tem o local de trabalho
para trabalhar e exercer o seu trabalho num outro espaço da Comunidade. Num primeiro momento
cada um de nós, cada um dos Europeus foi visto como a sua fonte de trabalho, força de trabalho,
razão pela qual a liberdade de circulação de trabalhadores foi traduzida em que cada trabalhador
podia deslocar-se. Depois vai haver um conjunto de medidas a favor da ligação familiar ou seja vai
o trabalhador e depois vai a família. Isto mostra que o grande motor de toda esta movimentação foi
o indivíduo em busca de trabalho. O Mercado Comum ditou esta livre circulação de factores, onde
foi mais rápida a livre circulação do trabalho e a liberdade de estabelecimento ao nível das
empresas. Menos, mas também com algum movimento conseguido e rápido ao nível da prestação
de serviços. Menos ao nível dos capitais. A liberdade de circulação de capitais demorou mais a
desenvolver-se.
Como podemos ver, a Comunidade nasceu sob o signo da integração económica. Ela nunca
enganou ninguém. Basta olhar para o nome. Comunidade Económica Europeia. O que não significa
que na sua génese, no Tratado de Roma de 1957, não ficasse mais ou menos implícito, que logo que

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pudessem, aquela comunidade de seis países, que depois se iria eventualmente alargar, como
alargou, não iria deixar de tentar uma integração política, ou com laivos políticos.
Depois daquela experiência tão negativa da Comunidade Política Europeia e da Comunidade
Europeia de Defesa, não se afoitaram a dar esse passo que seria um passo de gigante. Na união
aduaneira todos os países quando entram e constituem qualquer coisa na Comunidade têm sempre
um período transitório. A própria constituição da Comunidade Económica Europeia teve um
período transitório de 12 anos. O grande esforço muito desejado por todos, aquela realização que
poderia ter sido em 12 anos, mas foi em menos de 10. Foi conseguido em menos tempo do que
estava previsto. Depois o próprio mercado comum realizou-se rapidamente. As liberdades, umas
mais rápidas que outras, mas foi-se realizando. Chegámos aos finais dos anos 60 com tudo
realizado, consolidado. Estamos à beira da década de 70. Foi a década de todas as crises
económicas.
O FMI teve um grande safanão. Foi muito abanado, porque o dólar começou a ver que a sua
posição de moeda de referência era uma posição que iria perturbar o equilíbrio interno da sua
economia interna e por isso procurou sair dessa posição. Veio a consegui-lo, mas já nos anos 70.
Entre conseguir e não conseguir, foi um período longo, em que umas vezes havia padrão e outras
não havia padrão. Umas vezes havia estabilidade e outras vezes não havia. Já sabemos que quando
há estabilidade, há confiança, há comércio. Não há estabilidade, não há confiança, não há comércio
quando não há padrão. Agora imaginemos a grande confusão que era. Juntamos a isso as crises
petrolíferas e outras crise estritamente nacionais de cada país e que foram muitos os problemas.
Daqui resultou que os anos 70 do ponto de vista da integração Europeia, foram anos sem grande
história. Embora tivessem avançado para um primeiro esforço de uma integração monetária que nos
surge sob a forma do ECU (European Currency Unit). O ECU já com uma certa vontade de uma
moeda comum. Teve o seu êxito durante algum tempo e conseguiu uma coisa importante.
Funcionou como um padrão.
Aquilo que os países e as organizações procuram, ao nível de país ou mais alargado, de
organização, é ter um padrão. Tem reflexos a nível da estabilidade e do comércio. O ECU mostrou
que a CEE tinha uma ânsia muito grande de se dotar de uma disciplina monetária própria, face à
disciplina do Sistema Monetário Internacional. O Sistema Monetário Internacional existia. Os
países da CEE eram e são membros do Fundo Monetário Internacional, participavam nas regras do
Sistema Monetário Internacional e cumpriam-nas, mas verdadeiramente queriam algo mais deles,
mais exclusivo, até mais rigoroso do que o Sistema Monetário Internacional, uma vez que lá os
países são mais do que os países membros da CEE. Então, ficou assente que quando pudesse, a
CEE iria delinear uma disciplina monetária própria. Esta pretensão já vem lá de trás, dos finais dos
anos 60.

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Entramos nos anos 80. Os anos 80 vão trazer para os países e também para a CEE, alguma
mudança. Para começar a CEE passa a chamar-se as Comunidades Europeias e rapidamente passa a
chamar-se Comunidade Europeia. Esteve por detrás um movimento institucional mas que é
importante sublinhar. Estas organizações tinham uma estrutura institucional. A CECA, a CEE e o
EURATOM tinham uma estrutura institucional. Cada uma destas comunidades tinha um Conselho
de Ministros, uma Assembleia Legislativa, que mais adiante veio a dar o Parlamento Europeu.
Todas elas tinham uma Comissão. No caso da CECA chamava-se Alta Autoridade, mas que era um
paralelo da Comissão da CEE e do EURATOM. Cada um tinha um Tribunal de Justiça. Há uma
multiplicação excessiva de organizações com o custo inerente. Houve um momento em que se
resolveu fundir as Comunidades, em termos, apenas das instituições. Elas continuavam autónomas.
Assim o Conselho de Ministros reunia para discutir as questões da CECA e aplicar o tratado de
Paris. O mesmo órgão reunia para discutir as matérias da CEE e aplicava o Tratado de Roma da
CEE. O mesmo Conselho reunia para aplicar o Tratado do Euratom e aplicar o Tratado de Roma do
Euratom. Era a mesma entidade. Aqui há uma preocupação de racionalização e a par dessa
racionalização sabemos que a Comunidade Europeia já está a posicionar-se para uma evolução que
veio a ocorrer já nos anos 90. Essa posição passou ainda, previamente, no final dos anos 80, pelo
lançamento do mercado interno. É nessa altura que surge o mercado interno ou Mercado Único. O
Mercado Único, quem o vir, numa primeira abordagem, diz que é como se fosse o prolongamento
do Mercado Comum. E de facto é.
O que é que nós temos com o mercado interno?
Temos o desmantelamento total e absoluto das barreiras físicas, das barreiras técnicas e das
barreiras fiscais. É claro que em termos de projecto, não quer dizer que se tenha conseguido logo
tudo. Foi um processo longo, de muitos anos, mas foi um processo que se foi desenvolvendo numa
linha de harmonia legislativa e que ao nível dos cidadãos vai mostrar aquela diferença que referia há
pouco. Enquanto no Mercado Comum foi o cidadão, enquanto trabalhador, que ganhou a liberdade
de circulação no Espaço Comunitário, agora no Mercado Interno ou Mercado Único é o cidadão por
si que ganha essa liberdade. Quer vá trabalhar, quer não vá fazer nada. Pode circular livremente e
goza das liberdades inerentes. Esta realização do Mercado Único/Mercado Interno foi muito
importante porque abriu caminho a uma finalização da integração económica. Quando chegamos a
esse ponto temos uma Comunidade Económica Europeia que tem já um grande desenvolvimento da
sua integração económica. Já tinha feito a união aduaneira, o seu Mercado Comum. Já tinha todas
as liberdades de circulação oleadas e a funcionar e agora com o Mercado Interno era como se de um
grande Mercado Único Nacional se tratasse. Só tinha que dar mais um passo para completar a
integração estritamente económica. Era avançar definitivamente para a questão monetária. É isso
que vai fazer no início dos anos 90. Aquilo que hoje temos, o projecto comunitário da moeda única
vai surgir no início dos anos 90, mais concretamente em 1992 com o Tratado de Maastricht.

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Quando a Comunidade procura, ao mesmo tempo, fazer dois em um, através de uma conferência
inter-governamental, passar de Comunidade a União Europeia. É aí que é a grande mudança de
tudo. Que vai mudar a linha de funcionamento de uma mera Comunidade para uma União e ao
mesmo tempo uma outra conferência inter-governamental que promove o nascimento da União
Económica e Monetária, consubstanciada essencialmente na moeda única, aquela que temos
actualmente.
Isto leva a pensar que nos estamos a aproximar a passos largos do momento em que o
projecto que era económico, ia começar a ter alguns aspectos de projecto político porque a
existência de uma moeda única que assente na eliminação das moedas nacionais vai ter, claramente,
aspectos de integração política. Vamos encontrar, numa base económica, o federalismo a entrar,
com força através da moeda.

16. O espartilho das regras de Maastricht e do Pacto de


Estabilidade e Crescimento.
A disciplina da Zona Euro naquilo que foi verdadeiramente a construção Europeia da União
Económica e Monetária é construção monetária.
A parte económica ainda vive essencialmente dos poderes dos Estados. No entanto, isso não
pode ser interpretado numa óptica estritamente linear. De qualquer modo, onde nós vimos, desde o
início da génese da União Económica e Monetária, que era a efectiva transferência de poderes
soberanos, das instâncias nacionais dos Estados, para as instâncias Europeias, era ao nível
monetário. Numa época em que já primavam os dogmas monetaristas e não já os dogmas
Keynesianos. Esses tinham já ficado lá para trás. Os dogmas monetaristas consentâneos com a
disciplina económica dos países grandes da União Europeia, à data, nomeadamente a Alemanha,
mas não só. Nós vemos que a economia da Zona Euro da parte monetária teria de ser seguidista
relativamente às teses de Freedman e companhia. De Ricardo e companhia. A moeda, o Estado e a
concorrência eram pedra de toque desta construção da Zona Económica e Monetária.
Para garantir a estabilidade do Euro, porque o Euro passa a ser a moeda de referência, vimos
isso com o FMI e antes do FMI, a necessidade da moeda de referência ser uma moeda estável. Por
via da estabilidade, há estabilidade, há confiança. Há confiança, há comércio. É aquela sequência
inevitável. Garantir essa estabilidade interna, intracomunitária e depois manter o crédito da própria
moeda Europeia face ao exterior. Para isso, a moeda não podia andar a saltitar. Tinha que ter a
estabilidade que era fundamental. De forma como foi delineado o programa, essa estabilidade era
conseguida a partir do momento em que os países garantissem a estabilidade e a sanidade das
finanças públicas. Finanças públicas sãs. Quando se fala em finanças públicas sãs, são finanças
públicas que não apresentem défices orçamentais significativos. É aqui que nós vemos com esta

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formulação, que uma disciplina que era de uma área monetária, mas primordial, tinha implicações
inevitáveis ao nível das finanças públicas.
No início houve a ideia de que nem todos os países poderiam aderir ao Euro. Nem todos os
países tinham estrutura para aderir ao Euro. Não é que não quisessem, mas o esforço de entrada era
de tal maneira exigente que esses países, aqueles que sendo desenvolvidos, porque os países
Europeus são todos desenvolvidos, uns mais do que outros. Uns têm uma situação económica mais
favorável do que outros. Aqueles países que tradicionalmente, têm assimetrias, embora
desenvolvidos, têm assimetrias de desenvolvimento. Isso repercute-se no seu crescimento, no seu
desenvolvimento, quer económico, quer depois também em termos sociais. Têm essas assimetrias.
Têm dificuldades em manter uma certa homogeneização do seu espaço interno, versus da União
Europeia. Teriam também muito mais dificuldades comparativamente aos ditos grandes que têm
uma situação económica consolidada e de longa data. Os outros, os que têm mais dificuldades, os
que têm o passo mais lento, em relação a esses é que se achava que não iam conseguir. O que
aconteceu é que os países fizeram um grande esforço. Esses mesmos, ditos países menos dotados,
fizeram um grande esforço, como é o caso de Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda. São os quatro
que hoje estão com grandes dificuldades. Por algum motivo é. Eram países que do ponto de vista
financeiro estavam habituados a devaneios financeiros ou seja períodos de pico, períodos de
recessão. Estabilidade era algo que não existia. Não existia e nessa conformidade houve a
consciência, até porque se estavam a ver grandes esforços e esses esforços podiam ser compensados
e conduzir a que entrassem. Então decidiu-se amarrá-los a um compromisso. Tinham conseguido
entrar, mas agora teriam que se manter assim. É um compromisso de amarrá-los ao cumprimento de
critérios que já estavam no Tratado de Maastricht. Estavam lá estabelecidos como condição para os
países poderem aceder ao Euro. Com o Pacto de Estabilidade e Crescimento celebrado pouco tempo
depois e depois de se ver que os países até estavam a cumprir, veio amarrá-los ao cumprimento, à
manutenção desse cumprimento já no pós. Fizeram esforço para entrar, mas agora mantenham esse
esforço com perseverança ao longo do tempo. Se as condições forem positivas, óptimo. Se não
forem positivas, introduzam medidas restritivas para que consigam, no final, produzir o efeito das
ditas finanças sãs. Essas medidas restritivas podem ser ao nível da situação laboral, fiscal, da prática
fiscal, do corte de subsídios, etc. Uma coisa têm de ter presente. Têm que estar sempre atentos. Não
pisar o risco. Porque se pisarem o risco, cá estou eu para detectar, dar conhecimento ao Conselho e
o Conselho mandata-me para eu introduzir um processo por défice excessivo.
O que é o défice excessivo?
Défice excessivo é ultrapassar o limiar que, primeiro, o Tratado de Maastricht e depois o
Pacto de Estabilidade impõem.

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O Pacto de Estabilidade é rígido com todos aqueles dogmas que nem sequer se admitem
discutir. Foi estabelecido, não se discute e há que cumpri-los religiosamente sob pena de ter o
processo em cima.
Qual é o problema de ter um processo instaurado?
O processo significa desde logo, independentemente de a nível dos países membros, de se
perceber que aquele tinha prevaricado, em termos das ditas finanças sãs, tinha ultrapassado o défice,
tinha começado a fazer mais despesa do que aquilo que produzia. A comissão para lá de chamar a
atenção a esse respeito, impunha imediatamente, estabelecia um calendário para o país repor a
situação de equilíbrio. Tinha que reequilibrar o orçamento num tempo curto (1,2, no máximo 3
anos). Este prazo depende do diferencial do défice, daquilo que o país tem e do que deveria ter para
esbater aquele défice. Este é um aspecto. Há outro ponto fundamental. Para os países que ainda
tinham necessidade de aceder aos fundos financeiros comunitários, e todos os quatro países em
causa precisam de apoios financeiros comunitários em termos dos fundos financeiros estruturais,
com carácter premente. Nesta situação são-lhe cortados os apoios financeiros comunitários. Em
segundo lugar o país prevaricador torna-se contribuinte líquido do orçamento comunitário.
---------------------------- xxx ----------------------------- xxx -------------------------------
Normalmente os países sempre procuraram aceder aos fundos financeiros comunitários.
Aquele afluxo de recursos que um país aproveita para fazer os desenvolvimentos estruturais e
infraestruturais de que carecia para dar o salto qualitativo de desenvolvimento. No caso Português
aproveitamos o FEDER, FEOGA, o Fundo Social Europeu. Após a adesão aproveitamos
largamente os fundos e até tivemos programas específicos (PEDAP para a agricultura). Tivemos
programas específicos para ajudar o crescimento da economia Portuguesa. Todos estes fundos
tinham uma vocação estrutural, o que significa que os problemas não eram conjunturais, eram de
fundo. Para isso as isenções financeiras tinham por finalidade promover a recuperação económica,
tendo presente que essa recuperação não era só estalar os dedos. Era algo a prazo em termos de
efeito e em termos de investimento. Uma grande condensação de investimentos em 2 ou 3 anos.
Não se faz um investimento condensado em 2 ou 3 anos para falarmos logo em desenvolvimento
económico.
Um país como o nosso, quando teve défice excessivo deixou de ter apoios financeiros. A
partir daí o país deixou de ter esse acesso e tornou-se contribuinte. O país passou a contribuir para o
orçamento comunitário e passou a não ir buscar nada. O processo de recuperação do défice
excessivo para uma situação de equilíbrio, que é o patamar exigido, não é uma coisa que se faça de
um momento para o outro. É uma situação difícil que o país vai viver, em 2 ou 3 anos e que poderá
ser mais curto se for possível introduzir medidas draconianas em termos de combate ao défice. São
aquelas medidas pesadas, do ponto de vista social, mas que têm um reflexo em termos económicos
no orçamento de Estado, que permitem reequilibrar certas verbas do orçamento.

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O défice excessivo, deu para ver que na aplicação das regras comunitárias, a Comissão
Europeia tem um duplo critério. Considera dois pesos e duas medidas. De tal maneira que nós
fomos o exemplo. Prevaricamos e fomos o exemplo para todos de que não éramos de confiança.
Depois disso outros países, dos chamados grandes, também tiveram situações a raiar o défice
excessivo e nada lhes aconteceu (França, Itália, Alemanha).
Quando os países, lá atrás procuraram cumprir os critérios de convergência, a Comissão
fechou os olhos ao caso da Grécia. A certa altura até foi dito, em termos públicos que a Grécia não
tinha preenchido rigorosamente os critérios. Mas houve um fechar de olhos. Percebe-se porquê.
Porque, politicamente, a construção da Zona Euro é a integração política. Nós falámos que é a
integração monetária. De facto é. Dá a sensação que é uma vertente económica da integração. E é.
Mas mais do que isso é uma integração política. Foi levada aos ombros pela construtora das
instâncias comunitárias como um exemplo acabado de integração política. E mais seria se todos os
países entrassem. Não era indiferente se entrassem todos ou quase todos ou se entrassem apenas os
quatro grandes.
Inicialmente pensou-se que entrariam os quatro grandes e que os outros ficariam à porta,
com os olhos postos no exemplo daqueles que tinham entrado com facilidade e que entrariam
quando também fossem grandes. No entanto a lógica foi de entrarem todos e fez-se tudo para que
entrassem todos, inclusive a Grécia que não cumpriu os critérios para entrar.
Há um outro ponto que não podemos deixar de referir. Quando nós vemos os critérios
identificados em Maastricht e retomados no Pacto de Estabilidade e Crescimento, de que o défice
não pode ser superior a 3% do PIB, este valor de 3% é absolutamente aleatório. Estes 3% podiam
ser 1,5%, 2% ou 4%. Porque à data, em termos económicos, havia uma certa folga. Vivia-se bem
em termos dos diversos países e daquele conjunto de países Europeus, da União Europeia. Por isso
mesmo achou-se que a situação iria permanecer boa durante muito tempo. Assim, 3% era exigível,
viável e razoável. Só que a situação começou a ficar difícil. Atingir e ultrapassar os 3% tornou-se
uma coisa concreta. Os países começaram a ter necessidade de passar a desenvolver, ao invés
daquilo que tinha sido “vendido”, a adoptar políticas Keynesianas. A partir daí estragam tudo,
porque a política Keynesiana vai exigir aos países que façam investimentos. Se vão fazer
investimentos, vão escangalhar, uma vez mais, o equilíbrio mais ou menos postiço, do orçamento.
Porque há investimento, logo há aumento da despesa pública. Logo aí, nós temos um défice que vai
surgir e que não pode ser superior a 3% do PIB. É inevitável que vai ultrapassar os 3% do PIB.
Depois como os dinheiros não são eternos. Há dinheiros certos que vão ser canalizados para essas
obras. Necessariamente que a dívida também vai surgir e vai crescer, consoante a magnitude do
investimento público e privado.
Estamos a falar do conjunto. Pisar o risco. A partir do momento em que haja um inflexão da
política económica, não já monetária, estritamente limitada à iniciativa privada e à concorrência e

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agora pelo contrário, com uma política Keynesiana, com investimento público, é quase inevitável
que esses patamares são ultrapassados.
Podemos dizer, que ninguém manda os países da Zona Euro adoptar políticas Keynesianas.
Eles assumiram um compromisso na mecânica da Zona Euro de que eram monetaristas. Não
Keynesianos. O Keynesianismo foi um devaneio da juventude, há décadas atrás. Agora eles são
monetaristas.
Isso é tudo muito bonito, se os países não tivessem de fazer desenvolvimentos
infraestruturais e esses desenvolvimentos estruturais só se conseguem ao nível do desenvolvimento
e não do mercado. O Privado não faz sozinho. Tem que haver uma contrapartida do Estado ou até
do Estado, só.
Tudo isto devia ser diferente se a União Europeia tivesse um orçamento que pudesse ir ao
encontro das necessidades dos Estados. Mas não tem. Nós sabemos que até o próprio
funcionamento dos fundos financeiros comunitários, para funcionarem, cada vez mais a
Comunidade diz aos Estados:
Vocês têm que pôr cá a vossa parte, porque se não puserem cá a vossa parte, não avança
nada. Vocês, se não têm dinheiro, ponham em conjunto com os Privados, orçamento público e
orçamento privado, um pacote nacional, para depois nós darmos o remanescente.
Com estas limitações globais de desenvolvimento, andam todos com a corda na garganta.
Leva a que haja aquilo que se diz, que não é uma zona monetária óptima.
Síntese:
A União Económica e Monetária é claramente o pico da integração económica, mas foiu
movida por motivos políticos. O mexer na moeda, o acabar com as moedas nacionais, são sinais
exteriores da integração política.

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