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Overlord - Volume 12 - A Paladina Do Reino Sacro - Parte 1 - (Black)
Overlord - Volume 12 - A Paladina Do Reino Sacro - Parte 1 - (Black)
Reino Sacro | 1
オーバーロード Ilustrado por so-bin
Aviso Legal:
A tradução de OVERLORD — para inglês e português — é feita e revisada de fã para fã,
não monetizem em cima da obra e não compactuem com quem o faz. Se quiserem e pu-
derem contribuir com o autor, comprem o livro ou ebook (japonês, inglês ou português)
em sua livraria de preferência.
Sobre:
A obra faz uso de muitos anglicismos, ainda mais por se basear em RPGS, então há mui-
tos termos em inglês e tentei preservar vários desses aspectos em alguns termos, nomes
de armas, itens, raças e coisas do tipo.
Claro, algumas coisas precisam de adaptação, outras é preciso generalizar. Dito isso,
pode não agradar aos adeptos do Dia do Saci em vez do Halloween. Estejam avisados.
Créditos:
CRÉDITOS PT-BR:
ainzooalgown-br.blogspot.com
CRÉDITOS EN-US:
overlordvolume10.blogspot.com
REFERÊNCIA DE NOMES:
overlordmaruyama.wikia.com
Atenção: Se baixou este arquivo de outro link que não o oficial do blog. Ou se tem muito
tempo que baixou e deixou guardado, que tal dar uma conferida no blog? Talvez esta seja
uma versão desatualizada :)
Autor:
Maruyama Kugane
Ilustrador:
so-bin
Capítulo 01: O Imperador Demônio Jaldabaoth
Parte 1
Reino Sacro Roble, uma nação cujo território situa-se na península à sudo-
A liderança estava intimamente ligada às facções do templo. Era um país muito religioso,
embora não tanto quanto a Teocracia Slane.
Além disso, havia duas características especiais sobre a geografia do Reino Sacro Roble.
A primeira consistia em sua terra dividida nas metades do norte e sul pelo mar. Claro,
as metades não eram completamente separadas. Em vez disso, havia uma baía gigan-
tesca entre elas — 40km de comprimento e 200km de largura — o que fazia sua geogra-
fia parecer um “つ”.
Assim, algumas pessoas os chamavam de Reino Sacro do Norte e Reino Sacro do Sul.
A entrada da península ostentava uma grande Muralha, com mais de 100km de compri-
mento de norte a sul.
Fôra construída para resistir às invasões das muitas tribos demi-humanas que ocupa-
vam as colinas a leste do Reino Sacro, entre eles e a Teocracia.
Essa grande Muralha, construída através do dispêndio de muito tempo e recursos, era
um testemunho silencioso de como a existência dos demi-humanos era perturbadora
para o Reino Sacro.
É verdade que havia certos demi-humanos que eram mais fracos que humanos, como
os Goblins sendo um bom exemplo disso.
Seja em altura, força física, conhecimento ou a taxa em que produziam magic casters,
eram uma raça inferior aos humanos em todos os sentidos.
Ainda assim, até meros Goblins possuíam a capacidade de ver no escuro, e se tirassem
proveito do fato de que seus pequenos corpos poderiam facilmente se mesclar no ambi-
ente — por exemplo, para lançar uma emboscada noturna em uma floresta —, eles cer-
tamente seriam inimigos problemáticos para os humanos.
Eles fizeram isso para impedir que os demi-humanos dessem um único passo em suas
terras.
Eles fizeram isso para deixar o mundo saber que suas terras não pertenciam aos demi-
humanos.
Fizeram isso para que os demi-humanos entendessem que qualquer tentativa de colo-
car os pés em suas terras seria enfrentada com resistência ímpar.
♦♦♦
A fim de mantê-la funcionando em plena capacidade, tiveram que manter uma grande
quantidade de mão de obra permanente no local. A liderança do Reino Sacro já havia
calculado quanto de força de combate seria necessária para derrotar uma tribo invasora
de demi-humanos. A resposta foi que o país entraria em colapso antes que os demi-hu-
manos os atacassem.
Embora não tivessem o luxo de alçar tropas que não seriam utilizadas, havia a necessi-
dade de colocar uma quantidade adequada de mão de obra ali.
Se tratava de um ataque noturno lançado por uma raça chamada Srush. As característi-
cas mais distintas de sua raça eram; mãos de ventosas, línguas com toxina paralisante
— capaz de se estender a uma longa distância do corpo — e membros mais evoluídos de
sua espécie poderiam até mudar a cor de pele como se usassem a magia 「Camouflage」.
Muitos vilarejos haviam sido perdidos, e tal foi a tragédia que se desenrolou naquela
época que até hoje ainda havia rumores sobre se os Srushs ainda estavam escondidos
dentro das fronteiras do Reino Sacro.
Eles queriam deixar a Muralha completamente ocupada a fim de evitar que tal tragédia
ocorresse de novo, mas posicionar tropas em cada ponto ao longo de sua extensão so-
brecarregaria a nação. O compromisso que a nação propôs foi construir pequenos fortes
No entanto, o diligente planejamento feito pela liderança do Reino Sacro havia se trans-
formado em uma forma de obsessão. Mesmo contramedidas como uma linha defensiva
de fortalezas não podiam tranquilizá-los.
Na verdade, a Muralha era incrivelmente maciça do ponto de vista humano. Mas nem
tanto para raças várias vezes mais altas que os humanos ou que possuíam a capacidade
de voar. Por essas razões, até mesmo a Muralha sendo tão resistente como tal, ainda não
era, de modo algum, uma garantia de segurança absoluta quando se consideravam as
muitas habilidades especiais dos demi-humanos.
O Rei Sagrado da época era um homem prudente e até preparara um estratagema para
quando a Muralha fosse rompida. Sua solução consistia em mobilizar toda a nação.
Por essa razão, os cidadãos do Reino Sacro foram recrutados como uma forma de ser-
viço nacional. Todos os adultos, homens e mulheres, gastariam uma certa quantia de
tempo necessário em treinamento militar, depois do qual seriam designados para o de-
ver de sentinela na Muralha. A esperança era que se tornassem a mão de obra com a qual
protegeriam suas terras, isso caso os demi-humanos atravessassem à Muralha.
Todas as residências acima de um certo tamanho também foram fortificadas. Isso deu
aos aldeãos locais e poder de luta suficiente para resistir até que o exército regular pu-
desse chegar, permitindo que esses vilarejos servissem como postos militares avança-
dos. No final, os vilarejos do Reino Sacro Roble estavam muito melhorem protegidos do
que os de outros países, e também podiam funcionar como bases militares.
♦♦♦
A linha da fortaleza do Reino Sacro era composta de três fortalezas ligadas pela Muralha.
Cada uma delas protegia um dos três únicos portões fortificados ao longo de toda sua
extensão — mais de 100km de comprimento—, que também funcionavam como guar-
nições para despachar tropas para as fortalezas vizinhas. Se os demi-humanos invadis-
sem e uma ordem geral de mobilização fosse dada, elas se tornariam áreas de batalha
onde as tropas se reuniriam para atacar o inimigo.
Quando o sol se pôs lentamente no horizonte, a terra avermelhada foi lentamente en-
charcada pelo véu da noite.
Um homem de aparência intensa estava parado com um pé nas ameias, olhando para a
terra — nos contrafortes ocidentais. Depois disso, ele colocou o pé no chão.
Seu pescoço era grosso e seus músculos do peito eram impressionantes o suficiente
para que pudessem senti-los até mesmo através de sua espessa armadura. Seus braços
poderosos se destacavam bem de suas mangas enroladas. Não havia melhor maneira de
descrevê-lo do que “atlético”, independentemente de qual parte olhasse.
Seu rosto era como um pedregulho, desgastado por condições adversas, e as sobrance-
lhas grossas e o bigode despenteado delineavam uma natureza primitiva e selvagem. Seu
corpo poderoso e sua aparência austera deveriam combinar perfeitamente, mas seus
olhos quebraram totalmente essa noção.
O vento carregava as nuvens finas a velocidades incríveis, mas mesmo a noite estrelada
além de seu fino véu não conseguia produzir luz estelar suficiente para iluminar a terra.
O homem virou as costas para as colinas e olhou para os homens à sua volta.
Eles eram guerreiros ferozes, que confiavam nele e que o seguiam. Justamente por estar
cercado por tais guerreiros que ele se permitia um momento de relaxamento.
“—Ei, alguém perguntou ao meteorologista como vai ser o clima hoje à noite?”
A pergunta foi feita em uma voz poderosa que convinha a seu corpo poderoso. Os sol-
dados se entreolharam e um deles falou em nome do grupo.
No entanto, o homem que chamou Orlando de “Senhor” não o fez para zombar. Seu res-
peito por ele era evidente em sua atitude e tom. Nem foi só esse homem; todos os solda-
dos presentes, cada um dos quais caminhava e falava como um hábil veterano de muitas
batalhas, sentiam o mesmo em relação a Orlando.
“Como assim?”
“Hm? Não, não precisa fazer isso. Nosso trabalho acabou. O que acontece depois é as-
sunto para os que virão depois.”
♦♦♦
Orlando Campano.
A razão pela qual tal homem permaneceu em um cargo tão baixo resultou de dois pro-
blemas que Orlando teve.
O primeiro foi porque ele era muito livre — odiava receber ordens.
Quando esses dois pontos se juntaram, eles levaram a um estilo de vida que dizia: “Se
quer me dizer o que fazer, tem que quebrar minha cara então”. Se ele encontrasse um
inimigo digno, ele diria: “Você parece bastante forte. Que tal uma luta?”. E então lutariam
até que um deles desmaiasse.
Em seu ramo de serviço havia um tipo que gostavam de evitar ao máximo, ou seja, aque-
les que se destacavam negativamente e ainda por cima não obedeciam às ordens corre-
tamente. Em circunstâncias normais, dificilmente seria estranho se ele fosse discipli-
nado ou dispensado desonrosamente. No entanto, ele não tinha encontrado tal destino,
puramente devido à sua força. Além disso, havia aqueles que admiravam homens como
ele.
Os tipos mais durões, que não gostavam de receber ordens de nobres mesquinhos, en-
contraram no modo de vida de Orlando, pela força de seu braço, sendo algo muito mais
empolgante.
Sua unidade era um esquadrão de delinquentes composto por pessoas muito violen-
tas— ou melhor, estavam mais para uma gangue do que um esquadrão.
Eram bastante numerosos, por isso chamá-los de companhia não seria estranho. Além
disso, seus membros podem não ser tão fortes quanto Orlando, mas eram todos lutado-
res habilidosos, o que o levou a assumir um cargo não oficial que seus superiores não
podiam tolerar, mas sobre o qual não podiam fazer nada.
♦♦♦
Aquele homem parecia bem magro em comparação com a forma musculosa de Orlando.
No entanto, não era esguio como um galho. Em vez disso, ele tinha uma aura austera e
severa. Se alguém forjasse e reformasse um homem, removendo tudo que não estivesse
relacionado à sua função pretendida, se produziria um indivíduo compacto como o ser
que se aproximava.
Além disso, seus olhos estreitos estavam afiados, como se ele estivesse prestes a atacar
a qualquer momento. Até mesmo suas pupilas estreitas não pareciam pertencer a al-
guém envolvido em trabalhos lícitos. Em termos educados, ele era um assassino. Em ter-
mos menos polidos, ele era um genocida.
“Falando do diabo e aqui ele aparece. Gostaria de encontrar o senhor aqui, Vigilante
Noturno-san. É bom vê-lo~.”
O outro homem não emitiu nenhum som quando se aproximou deles com passos silen-
ciosos. Ele estava vestido de maneira muito diferente de Orlando.
Em contraste com isso, o outro homem usava uma armadura de couro leve com encan-
tamentos. Havia um brasão de coruja costurada em seu peito direito, enquanto o em-
blema do Reino Sacro adornava sua esquerda.
“...Orlando. Ainda não recebi o seu relatório de turno. Além disso, é essa a atitude que
você deve tomar com um superior? Isso é praticamente insubordinação. Quantas vezes
tenho que lembrar você disso?”
Quando Orlando o saudou de maneira desleixada, os homens sob ele saudaram também.
Era uma saudação adequada, do tipo que nunca dariam a um nobre ou a qualquer oficial
superior. Foi uma saudação que demonstrou respeito genuíno.
O homem suspirou com um “haaah”. Foi um suspiro feito por alguém que sabia que sua
conduta era inaceitável, mas que também sabia que falar sobre isso seria inútil.
A razão pela qual Orlando saudou este homem, apesar de relutante, foi porque ele havia
derrotado Orlando.
Eu gostaria de te derrotar uma vez e antes que eu saia deste lugar. Em seus termos. O que
me diz, Sargento de Pelotão Pavel Baraja?
O homem — Pavel Baraja — foi apelidado de “Vigilante Noturno”. Como Orlando, ele
era um dos Nove Cores. O arco maciço e requintado em suas costas brilhava com a luz
fraca da magia, e a aljava pendurada em sua cintura brilhava da mesma maneira. Ele era
um arqueiro, assim como sua aparência sugeria. Ele era um excelente atirador, com uma
reputação de precisão perfeita.
“Eu penso isso o tempo todo, mas trabalhar à noite é difícil. Os demi-humanos se saem
bem na escuridão, mas é difícil encontrar seus traços e muito menos combatê-los.”
“É por isso que estamos aqui. A única maneira de ganhar magias e talentos comparáveis
aos demi-humanos — deixando a parte da visão de lado — é através do treinamento. E
nós recebemos esse treinamento.”
“Sim, sim. O mesmo vale para aquela filha de quem você tem tanto orgulho, certo?”
Este era um homem cuja expressão permanecia inalterada mesmo no meio de uma be-
bedeira. A única exceção era quando surgia o tópico de sua filha e esposa. Era aí que o
problema estava.
“Mas até hoje eu não tenho idéia do porquê ela quer se tornar uma paladina. Ela é uma
menininha fraca, nunca foi do tipo que pensa força é tudo — francamente, ela até cho-
rava quando via lagartas —, posso até ter dito que poder era tudo agora a pouco, isso
não se estende até minha esposa... ela pode parecer assim em alguns aspectos... Mas, bem,
ela é adorável porque cresceu parecendo comigo— não, tadinha dela por se parecer co-
migo. Uma pena que ela não leve jeito algum com espadas. Só para o arco. Se ela pudesse
aprimorar suas habilidades nisso... Mas não quer, ela quer ser uma paladina e essa merda
toda—”
Ele deixou o monólogo sinuoso fluir em um ouvido e sair pelo outro, fazendo os ruídos
apropriados em resposta quando eles eram necessários, mas parece que ele ainda tinha
sido descoberto.
Não, eu não estava. Acho que parei depois da terceira vez que contou isso.
Depois de ouvir a mesma coisa cerca de cinco ou seis vezes, sob circunstâncias normais,
Orlando teria retrucado infeliz “Claro que não”. No entanto, tomar esse tom com Pavel
seria um erro terrível. Isso porque ele sabia que ele certamente responderia: “Então eu
vou contar tudo de novo.”
O rosto de Pavel mudou drasticamente. Era uma expressão feia e diabólica que colocava
Orlando em guarda, o fato era que o outro homem estava simplesmente envergonhado.
“Além disso—”
Apenas uma coisa poderia superar o assunto sobre sua filha. E isso era o trabalho.
“O trabalho noturno não bagunça seu relógio biológico? Seu corpo não fica estranho?”
“...Quantas vezes já fez essa pergunta? A resposta é a mesma de sempre; não é nada para
se preocupar. Ainda assim, por que continua fazendo essa pergunta? Quer que eu res-
ponda o quê?”
Ele sabia a causa disso, mas ele ainda encarava sua rápida mudança de atitude.
Ele queria dizer, mas Orlando não queria passar por tudo isso novamente.
“...Hah. O que eu realmente quero dizer? Bem, é uma pergunta e tanto... Eu estava pen-
sando que seria um problema se o homem que me derrotou ferrasse seu corpo à toa e se
aposentasse por causa de algo tão besta. É claro que, quando eu vencer o senhor, essas
coisinhas não terão mais importância.”
No passado, Orlando estava se achando o tal quando foi designado para essa área; pen-
sar naqueles dias o envergonhava. Soldados habilidosos se reuniam em torno dele em
admiração, alimentando seu ego cada vez mais, e de alguma forma, ele acabou lutando
uma batalha simulada com Pavel.
Orlando respeitava Pavel por esse motivo. Ao mesmo tempo, ele nutria o desejo de
vencê-lo na próxima vez. Desta vez, ele lutaria com Pavel em seu campo de especializa-
ção, combate à distância e sairia vitorioso lá.
“É isso? Quer lutar comigo, é? Por enquanto estou no pico da condição física, sem defi-
ciência alguma.”
É exatamente isso. Não é óbvio? Eu quero uma luta daquelas. Quero colocar minha vida
em risco. Mas isso não será permitido, ou será? Enfim, se possível, eu gostaria que tivésse-
mos uma batalha que fosse praticamente à beira da morte. É assim que quero que seja.
No entanto, Orlando permaneceu em silêncio. Isso porque seus instintos diziam que
não havia como saber onde a besta diante de seus olhos iria. E, de fato, o que Pavel disse
depois confirmou esses instintos.
“Ainda assim, tenho que me desculpar. Você deve saber o porquê também. Há pouquís-
simas pessoas que podem vencer você em seu estado atual, ainda mais em combates
corpo a corpo, e eu não sou uma delas.”
Essas palavras não saíram da boca de Orlando. Isso porque ele sabia que seria apenas
um insulto a um adversário digno.
Ele se lembrou das habilidades de Pavel usando um arco. Ele ainda não estava confiante
de que poderia evitar seus ataques e encurtar a distância ao mesmo tempo.
“Bem, se era apenas isso, creio que seja hora de fazer o seu relatório.”
“Não precisa se apressar, Chefe. Ainda não é hora da mudança de turno, ou é? Até por-
que, o sino ainda não tocou.”
De fato, o sinal que sinalizava uma mudança de turno ainda não havia soado.
“Ainda precisa se preparar para mudar de turno, não? Há coisas para fazer antes de o
sino tocar. Já deveria estar se aprontando para quando o sino tocar.”
“Não acha que é cedo demais? Venha conversar um pouco com a gente.”
“...Hah. Está persistente hoje, mais do que o habitual. Quer me dizer algo por acaso?
Pelos Deuses... se quer falar algo, apenas desembucha, rapaz.”
Embora reconhecesse o outro homem como alguém com quem podia conversar aber-
tamente mesmo o respeitando, Orlando era do tipo que não falava com as pessoas pre-
cisamente porque as respeitava. Isso porque ele queria ser visto como um homem que
podia andar pelas próprias pernas.
“...Hahhh. Mas tem algo mais aí. Diga logo, e já aviso que pagar caro se no fim não passar
de bobagem.”
“Bem, é quê...”
“Oras, porque o senhor é o homem que eu mais respeito nessa nação, Chefe. Se sequer
tentar me impedir, então não terei mais dúvidas.”
“...Você não é um O.N.C? Se terminou o seu período de recrutamento, não será eu que
vai impedir você.”
O Reino Sacro praticava o recrutamento. Por isso, às vezes chamavam àquelas pessoas
que escolhiam ser soldados de carreira, para diferenciá-los das pessoas que haviam sido
recrutadas. Pavel e todos os seus homens eram O.N.Cs, já Orlando tinha alguns sargentos
e recrutas sob seu comando.
Ser questionado por fez o rosto de Pavel mudar pela primeira vez, não contando quando
o assunto da esposa e da filha surgisse. Orlando conseguiu percebê-lo com seus extraor-
dinários sentidos de percepção adquiridos por ser um guerreiro. Ninguém ao redor de-
les havia notado isso.
“...Bem, se eu for pela lei, tenho que aceitar. Eu não posso impedir você... Mas reconheço
que sentiremos a falta de um homem tão forte. Deveria ter ido em sua jornada de guer-
reiro mais cedo, não? Por que agora? É porque não há mais ataques demi-humanos?”
Desde aquela época, há meio ano, os demi-humanos pararam de atacar essa fortaleza.
No passado, atacavam uma ou duas vezes por mês, em grupos de algumas dúzias de cada
vez.
Agora eles só viam por aqui, claro, ainda eram demi-humanos com habilidades físicas
superiores, e muitos deles possuíam habilidades especiais. Esses eram números que po-
deriam abater facilmente todo um posto avançado em um ataque.
Tanto Orlando quanto Pavel haviam passado por muitas situações em que precisavam
enviar tropas de elite para operações de resgate.
“Você sabe que eu não gosto de matar os demi-humanos, certo? O que eu gosto mesmo
é de lutar com pessoas fortes para assim me tornar mais forte.”
“Ah, e depois há o Garra do Demônio, Imperador Bestial, Rei Cinzento, Trovão Fogo-
Gélido e o Lança Espiralada.”
O rei de uma certa tribo demi-humana, muitos também o chamavam de Senhor da Des-
truição.
Esse apelido veio do fato de que era habilidoso em Artes Marciais que destruíam armas
e seu estilo de luta que girava em torno de tais técnicas. Um inimigo mortal do Reino
Sacro pois já havia derrotado muitos guerreiros famosos, e mesmo lutado com Orlando
no passado. Naquela época, ele havia destruído a espada longa de Orlando, mas não pa-
rou por aí, espada curta e machadinha, e até mesmo um podão usado para cortar árvores
para lenha também.
Embora tivesse quebrado todas as armas de Orlando, o Grandioso Rei se retirou depois
de ver os reforços enviados da fortaleza. De certo modo, poder resistir até a chegada do
“Eu quero enfrentar ele de novo, mas... eu acho que ainda não posso vencer. Creio que
só esses a quem chamam de heróis podem, caso contrário, duvido muito. Por falar nisso...
também ouviu falar, não é, Chefe? Como aquele grande guerreiro, Gazef Stronoff, morreu
em batalha.”
“Ah, ouvi sim. É apenas disso que o Alto Comando fala no momento, sobre como isso
afetará os países vizinhos.”
A morte de Gazef Stronoff, conhecido como o mais poderoso guerreiro do Reino Re-
Estize, foi motivo de grande interesse para os soldados do Reino Sacro — particular-
mente os habilidosos.
“Eu ouvi uns detalhes por alto. Aparentemente, ele duelou com um magic caster conhe-
cido como o Rei Feiticeiro e foi derrotado. Mas francamente, o fato de que ele realmente
desafiaria um magic caster a um duelo é bem difícil de aceitar.”
Orlando concordou.
No entanto, o termo “magic caster” era bastante amplo. Os magic casters divinos pode-
riam, depois de usar magias que aumentassem suas habilidades físicas, acabar mais for-
tes que um guerreiro meia boca. Além disso, os paladinos, que eram o orgulho desta na-
ção, também podiam usar magia, então, até certo ponto, não se podia dizer que eles não
eram um tipo de magic caster. Nesse caso, ele poderia entender as razões do duelo.
“...Além disso, outros dizem que o Rei Feiticeiro massacrou um exército inteiro. Aparen-
temente, ele convocou uns monstros gigantes que faziam sons de cabras, ou ovelhas, algo
assim.”
“Eu nunca ouvi falar desse tipo de coisa. Sério que faziam sons de cabras? Que magic
caster estranho.”
“Justamente por causa de gente como esse magic caster estranho, que preciso fazer mi-
nha jornada.”
“...O que ele tem a ver? Não entendi onde quer chegar.”
“E isso significa?”
“...Então vai sair por aí desafiando nossos conterrâneos? Mesmo com a certeza de que
não pode vencer?”
Alguns dos oponentes contra os quais Orlando não conseguiu vencer eram colegas dos
Nove Cores.
E então, fora dos Nove Cores, havia a sacerdotisa mais poderosa da nação, Kelart Cus-
todio.
Em outras palavras, eram algumas das pessoas mais fortes nessas terras, e desafiá-las
certamente causaria grandes rupturas no país. Se fosse apenas uma batalha simulada,
tudo ficaria bem, contanto que fosse contra um colega dos Nove Cores, mas nunca seria
permitido um duelo mortal.
Era preciso ter um grande ego para usar o próprio epíteto para adornar o nome de um
país, mas isso não era totalmente impensável. Mais precisamente, foi um testemunho de
que quem o fez teve o poder e apoio necessário.
Graças aos ensinamentos dos templos do Reino Sacro, o homem comum tanto odiava
quanto desprezava os undeads. Até mesmo Pavel não era exceção.
Pensou Orlando. Pavel não os odiava por serem inimigos do Reino Sacro, mas sim por
serem inimigos de sua esposa.
Porém, ele não poderia trazer isso à tona. Mesmo que fosse uma conversa mais curta se
comparada às que envolviam sua filha, ainda seria uma conversa tediosa.
Não havia como esconder o fato de que o Reino Feiticeiro, com seus exércitos de mortos,
era inimigo intolerável do Reino Sacro. Muitas pessoas os incitaram a enviar tropas
quando pensaram em como as pessoas na Capital de E-Rantel do Reino Feiticeiro devem
estar sofrendo. No entanto, o Reino Sacro enfrentava a ameaça dos demi-humanos, e eles
não seriam capazes de conduzir operações militares em outros países sem primeiro pa-
cificar a região montanhosa.
Os sentimentos das pessoas à parte, a resposta da liderança ao Reino Feiticeiro foi nada
além das críticas desanimadas.
“...O Reino Feiticeiro, hm. Bem, se for cara de pau o bastante, deve conseguir ir até lá
como um membro do exército. Eles veem o Reino Feiticeiro como uma ameaça que perde
apenas para os demi-humanos. Parece que querem até se aliar à Teocracia por isso.”
“É, isso mesmo. Bem, deixando isso de lado, se a sua afiliação não mudar, você pode
receber ajuda do país e pular aquela burocracia da imigração... eu acho. Se passar, será
uma dádiva de Deus para as pessoas que querem saber mais sobre o funcionamento in-
terno do Reino Feiticeiro.”
“Seu idio... a maneira como diz isso tão a sério é praticamente a receita perfeita para
dar muita dor de cabeça.”
“Se chegasse ao ponto de virar um incidente internacional, até você poderia se envolver,
huh.”
O vento frio passou por eles. Por um tempo, Pavel ficou em silêncio, sua estava expres-
são inalterada, mas depois disso, ele começou a resmungar “Vou sentir falta dessa sua
cara feia”.
Orlando sorriu maliciosamente. Era um sorriso feroz e bestial, mas ele estava sendo
incomumente tímido. Pavel não disse “não vá”, mas também não disse “vá”. Apenas de-
cidiu deixar subentendido que ele sempre haveria um lugar para ele nesse pelotão.
“Bem, vida tem dessas coisas... Mas eu voltarei depois que me tornar mais forte. Aí vou
te ensinar umas liçõezinhas!”
Quando Orlando riu, Pavel riu de volta. A risada deles era tão bruta quanto duas feras
selvagens que rosnavam uma para a outra.
Parece que era hora de mudar para o turno da noite. Eles haviam conversado bastante,
mas poderiam engajar em alguma outra conversa. Quando Orlando pensou isso, essa
idéia evaporou-se de sua mente quando o sino continuou a tocar.
A visibilidade estava nítida à mais de 400 metros de distância. No passado, lá havia flo-
restas e árvores, mas o país realizou um grande projeto de paisagismo como parte da
construção da Muralha.
Contudo, nas regiões mais afastadas das extensas planícies — onde havia colinas e ou-
tras obstruções — eles viram brilhos na escuridão e sombras negras em movimento.
“Chefe...”
Os Snakemen tinham cabeças como uma cobra e corpos escamosos humanoides, assim
[Homens-lagartos]
como caudas. Eram demi-humanos considerados parentes próximos dos Lizardmen .
Suas cabeças serpentinas davam mordidas venenosas e suas lanças estavam cobertas de
poderosas toxinas. Um combate próximo com eles deveria ser evitado o máximo possí-
vel.
Claro, Orlando e seus homens eram veteranos experientes e possuíam uma resistência
muito alta a venenos. Mas as escamas forneciam alguma proteção, ainda assim, não eram
duras o suficiente para defletir por completo armas de metal. Eles podem ser habilidosos
com suas caudas, mas pode-se simplesmente considerá-las como outra arma. Além disso,
eles tinham a vantagem durante à noite devido a seus órgãos sensoriais ofidianos, mas
isso não era um problema.
Cabe a gente liderar uma investida? Não, no momento em que chegarem aqui, a unidade
do Chefe já terá atirado em todos até a morte.
Os Snakemen desprezavam os objetos frios, por isso não usavam armaduras de metal e
outros itens semelhantes. Como resultado, seria uma tarefa simples para arqueiros de
primeira linha, como Pavel e seus homens, enchê-los de flechas.
“...Chefe?”
Orlando ficou brevemente perplexo com a falta de resposta. Ele olhou para Pavel e viu
uma expressão de irritação evidente naquele rosto tipicamente vazio.
“...Só vai aumentando... Será que— que droga! Eu já vi membros de outras espécies!
[Ferratos] [Cabernos]
Armats, Ogros e aqueles são o que, Cabens?”
“Como assim?”
Houve até casos em que alguns deles atacaram o Reino Sacro depois de serem expulsos
de suas terras.
Então isso deveria ser algo assim. Porque se não fosse, então—
Ele não sabia quem havia dito isso. Talvez a pessoa que o tenha dito tenha pensado que
ele falava consigo mesmo, mas parecia límpido o suficiente para seus ouvidos.
Raça, cultura e religião. Assim como poderia haver muitas nações compostas de mem-
bros da mesma espécie, criar uma nação coesa era uma tarefa muito difícil. Era ainda
mais difícil quando as espécies dos membros eram diferentes. Portanto, unir as tribos
demi-humanas nas colinas era uma tarefa quase impossível.
Se algo assim tinha acontecido, significava então o início de uma batalha pela sobrevi-
vência do Reino Sacro.
Unir todas essas raças exigiria poder, isso era óbvio. Entre a humanidade, a sabedoria
e a riqueza se qualificariam como uma forma de poder, mas as raças demi-humanas va-
lorizavam o poder bruto. Em outras palavras—
“Me responda em sua posição de guerreiro. Por que acha que esses caras escolheram
vir justo nessa fortaleza — em um lugar tão bem defendido? Ou, eles estão servindo de
isca para extrair nossas forças, para diminuir nossas defesas. Ou—”
“Eles estão confiantes em romper com um ataque frontal. Vinte por cento da força de
luta do Reino Sacro está aqui, querem nos esmagar como baratas.”
Apesar de sentir o olhar aguçado de Pavel ao seu lado, Orlando não parou de falar.
“Ao mesmo tempo, eles vão usar essa fortaleza como uma cabeça-de-ponte. Então, vão
esmagar o moral do Reino Sacro e aumentar seu próprio moral. É isso?”
“Haha! Uma guerra dessa proporção só ocorreu uma vez antes na história do Reino Sa-
cro, e agora haverá outra em nosso tempo de vida! Quem diria, não!?”
“Entendo, Chefe! Ei, vocês aí! Essa ofensiva vai ser um inferno! Peguem suas armas re-
servas!”
Se o inimigo fosse um exército, eles teriam que gastar muito tempo formando suas tro-
pas. Isso era especialmente verdade se contassem várias raças entre seus números. No
entanto, o mesmo aplicava-se aos defensores. Como eram um exército, precisariam de
tempo para se prepararem. Isso era verdade mesmo na linha de frente.
Havia uma quantidade chocante de coisas que precisavam ser feitas. Não havia tempo
para o ócio.
Parte 2
Quando as tropas inimigas se formaram lentamente, Pavel sentiu uma dor aguda na
garganta.
Quanto mais devagar o inimigo atacasse, mais forças eles poderiam reunir para essa
fortaleza e mais tempo teriam para dar a ordem de mobilização. Esse era o cenário per-
feito para seus oficiais comandantes, mas Pavel não compartilhava sua opinião.
Mesmo estando organizados por espécie, nenhuma consideração parecia ter sido dada
a coisas como as armas que manejavam, suas respectivas táticas, suas várias caracterís-
ticas raciais, e assim por diante.
Seus homens não relataram ter visto algo assim até agora.
Todavia, tinha que haver um comandante. Caso contrário, mesmo formando em unida-
des seria muito difícil.
“Ele não pode ficar escondido para sempre. Certamente vai dar às caras no campo de
batalha.”
Dada à natureza dos demi-humanos, seus líderes eram fortes, com isso apareceriam
uma demonstração de força.
demi-humanos. Além disso, ele também tinha a Mantle of Shadow, um manto adequado
[ B o t a s do Silêncio]
para se misturar em sombras e conduzir emboscadas, Boots of Silence, eliminava o som
[C o l et e d e R e s i s t ê n c i a ]
de seus passos, Vest of Resistance, para melhorar sua resistência contra vários ataques,
[ A n e l d a deflexão]
Deflection Ring, um anel que o protege de armas à distância e muitos outros itens. Estes
eram um sinal de quanto à nação de Pavel o valorizou.
Ordenou a seus subordinados, que estavam escondidos ao lado dele como se tivessem
desaparecido durante a noite.
Normalmente, eles seriam equipados com itens mágicos para melhorar sua resistência
a tais habilidades especiais, mas Orlando não tinha recebido tais itens. Se desse azar, ele
poderia ser abatido na hora.
Ele fechou os olhos para limpar seu desconforto, e a figura de uma mulher apareceu na
mente de Pavel.
Ela era uma dos Nove Cores, a mulher conhecida como A Branca.
Ela também me preocupa, mas de um jeito diferente. Ela é ignorante e muitas vezes traz
problemas para às pessoas à sua volta. É por isso que O Rosa tem tanta dificuldade... por
que minha filha quer se juntar a ela? Não bastava seguir o caminho normal, encontrar um
bom homem, se apaixonar por ele e se casar— chega!
Ele sacudiu a preocupação por sua filha que inundou seu coração.
Ao mesmo tempo, ele olhou para as linhas demi-humanas, para arejar seus pensamen-
tos.
Ele não sabia quantos demi-humanos ficavam no sopé das montanhas, mas havia mui-
tos pavilhões ao longe. Esses pavilhões não usavam camuflagem; o único magic caster
de 3º nível nesta fortaleza já o havia verificado do céu.
Em outras palavras, realmente havia muitas unidades de combate reunidas aqui hoje.
As coisas não terminariam em uma única rodada.
Ele tirou um boneco de madeira esculpida do bolso do peito de sua panóplia e depois o
beijou.
O boneco estava gasto porque o havia tocado inúmeras vezes, e os olhos e a boca escul-
pidos estavam desbotados. Ela já havia crescido e amadurecido desde então, então ele
queria que ela fizesse uma estatueta que se parecesse mais com ele. Mas talvez ela não
tivesse percebido as intenções de seu coração, pois ela não mostrava sinais de querer
refazê-lo.
Foi provavelmente por causa de suas longas viagens de plantão aqui, mas ele raramente
teve a chance de ver sua esposa e filha. Ele se sentia cada vez mais distante dela com
cada dia que passava. No passado, ela o teria abraçado imediatamente, mas em algum
momento ela não o abraçou mais depois que ele voltava para casa.
“Ela cresceu independente do pai”, sua esposa sorriu dizendo, mas isso era uma coisa
importante para Pavel.
Se eu pudesse tirar dois meses de licença, gostaria de ir acampar em família, como costu-
mávamos fazer.
Sua filha ouvia com muita atenção sempre que ele lhe ensinava o conhecimento de um
ranger. Era isso que ele pretendia. Dito isso, ele sabia que provavelmente não funciona-
ria.
Sua filha raramente estava em casa devido ao seu objetivo de se tornar uma paladina.
Quando Pavel voltou para sua casa depois de uma longa ausência, sua filha estava sem-
pre ausente.
Seria melhor se ela se casasse com o filho do vizinho, afinal... não, alguém que morasse
perto, ou não, alguém que permanecesse na vizinhança.
O modo de vida de uma paladina era o menos adequado para sua filha. Ele estava ob-
servando-a todo esse tempo, então ele tinha certeza disso.
Sua filha havia escolhido esse caminho porque admirava a imagem da sua mãe como
uma paladina. No entanto, isso não era suficiente para ser uma paladina.
Ainda fico na dúvida se minha menina sabe desse lado deles... Por enquanto eu não quero
que ela saiba...
Seu ajudante murmurou para si mesmo em voz baixa, o que trouxe Pavel aos seus sen-
tidos.
“Ahhh, tem sim. Mas não se preocupe. Tudo o que precisa fazer é me dar suporte.”
Além de seu ajudante, o humor dos homens ao redor dele relaxou um pouco.
E assim que Pavel quebrou seu costume de estar com o rosto vazio — embora ele não
tenha percebido —, pois com um singelo sorriso estava presente.
Apesar dos muitos demi-humanos à sua volta, ele não estava acompanhado. Havia vá-
rios motivos para tal; ele não precisava de escolta; era muito arrogante ou talvez fosse
um mensageiro cuja morte não seria sentida?
“Devemos matá-lo?”
“Ainda não. Mas mude para um lugar onde seja fácil atirar e aguarde meu comando.”
Depois de sussurrar suas ordens, seus homens avançaram em tropas, como uma som-
bra se alongando.
Ele era o general inimigo ou apenas um simples mensageiro? Pavel estudou-o com cui-
dado para descobrir.
Esse demi-humano... a que espécie pertence? Acho que nunca vi um desses antes... e o que
há com essas roupas? É uma roupa tribal? Essa máscara é algo assim também?
Ele definitivamente não era humano. Havia uma cauda vindo de trás de sua cintura.
O mais perturbador era a roupa do demi-humano. Pode-se pensar nisso como uma fan-
tasia tribal e, de fato, parecia que poderia o caso. Porém, mesmo a essa distância, poder-
se-ia dizer que a roupa era de excelente qualidade, mesmo quando comparada a dos hu-
manos.
Não foi apenas Pavel. Todos os soldados que esperavam nas paredes da Muralha engo-
liram em seco enquanto observavam cada movimento que o demi-humano fazia. Em
meio ao clima opressivo no ar, o demi-humano se aproximou ao ponto de estar a 50 me-
tros de sua localização.
“Pare aí mesmo! Mais adiante e estará invadindo o território do Reino Sacro! Isto não é
lugar para vocês, demi-humanos! Saiam imediatamente!”
A voz fôra alta o suficiente para que até Pavel, que estava à alguma distância, sentisse
que era alto. Veio do homem no comando da fortaleza, um dos apenas cinco generais do
Reino Sacro. Ele imaginou que podia sentir a voz do homem em uma armadura cheia de
cicatrizes de batalha ressoando em suas entranhas.
A razão pela qual ele só tinha um oficial de equipe a seu lado provavelmente era porque
não tinha a intenção de fazer com que os outros fossem pegos se o inimigo lançasse um
ataque. Em seu lugar havia muitas tropas com escudos torres escondidos atrás deles,
prontas para sair e avançar se alguma coisa acontecesse.
Em contraste, a voz do demi-humano era gentil e aprazível aos ouvidos. Parecia se in-
filtrar no coração de todos os homens. Mesmo a essa distância, ainda alcançava os ouvi-
dos de Pavel.
Pavel franziu a testa, não havia necessidade de dizer isso à oposição, mas ele já sabia
que o general não era um homem perspicaz. Portanto, ele deveria ter considerado esse
resultado como inevitável.
“Entendo, mas é claro. Já que disse quem és, temo que possa ser rude não responder na
mesma moeda. Saudações, senhoras e senhores do Reino Sacro. Chamo-me Jaldabaoth.”
“Ohh! Sinto-me honrado por saberes de meus feitos. De fato, fui o arquiteto daquela
magnífica festa em Re-Estize. No entanto... o título de ‘Arquidemônio’ simplista... sim, eu
queria saber se poderias abordar-me como o Imperador Demônio Jaldabaoth.”
“Então, o que diabos veio fazer aqui? Por que trouxe esses demi-humanos?”
“Eu vim aqui para transformar seu país em um inferno. Desejo que os lamentos, amal-
diçoamentos e gritos sejam ouvidos eternamente por aqui. Infelizmente, meu passa-
tempo de desfrutar dessa maravilhosa sinfonia da agonia de milhões de humanos é im-
possível, por isso eu os trouxe comigo. No meu lugar, eles mergulharão sua lamentável
raça em um charco de desespero, extrairão dor e sofrimento de todos vocês.”
Neste ponto, Pavel aprendeu o significado do mal. O que os santos homens gritavam
sobre os “demi-humanos perversos” era nada mais que propaganda para elevar o espí-
rito de luta. Foi praticamente conversa pra boi dormir. De um ponto de vista simplista, as
invasões demi-humanas eram nada mais do que ir à fazenda para se alimentar.
Ele não permitiria que aquele demônio pisasse nas terras do Reino Sacro, onde sua es-
posa e filha estavam.
“Esta é a primeira linha da defesa do Reino Sacro! É também a última linha de defesa!
Além de nós está a paz do povo do Reino Sacro! Acha que vamos deixar você fazer o que
bem entende por aqui!?”
Todavia, uma rodada de aplausos fora do lugar estragou tudo. Depois de bater palmas
por um tempo, o demônio falou.
“Cães de guarda que protegendo o berço, hm? Não posso dizer que desaprovo. É muito
importante proteger àquilo que tem valor— de fato, tens minha aprovação. Sendo esse
o caso, darei às pessoas que capturarei aqui minhas boas-vindas.”
A maneira como ele ria enquanto falava fazia parecer que estava se divertindo.
Jaldabaoth não falava particularmente alto. Portanto, teria sido compreensível se sua
voz não fosse para onde Pavel estava. Mesmo assim, as palavras chegaram a ele com uma
limpidez sobrenatural, como se estivessem sido sussurradas atrás de suas orelhas.
Magias e itens mágicos que amplificavam o som existiam, e era muito provável que Jal-
dabaoth estivesse usando algo assim. Porém, ele não podia esquecer o sentimento desa-
gradável que parecia como um encosto agarrado às suas costas.
“Eu não aceitarei a rendição ou qualquer coisa do tipo. Entretenham-me com o melhor
de sua capacidade. Então — vamos começar.”
Não havia necessidade de esperar pelos comandos do General. A Eles fôra autorizado
um certo grau de independência, pois as oportunidades para atacar o comandante ini-
migo não estavam prontamente disponíveis. Esperar pela aprovação de seu superior
pode resultar na perda de uma chance de ouro.
Pavel levantou-se.
Nós não lhe daremos tempo para fugir ou se defender. Se quer culpar qualquer coisa, culpe
sua própria arrogância por ter saído sozinho para as linhas de frente!
“—Disparar!”
As flechas soltas dos arcos puxados ao máximo percorreram caminhos retos, cada uma
golpeando o corpo de Jaldabaoth sem se desviar nem um pouco do alvo.
Pavel rapidamente colocou sua segunda flecha enquanto pensava em como Jaldabaoth
havia se defendido contra à saraivada.
Alguns monstros eram capazes de anular ataques através de suas qualidades especiais.
Por exemplo, licantropos e afins eram quase invulneráveis se alguém não usasse armas
de prata contra eles.
Ele considerou que Jaldabaoth poderia ter uma habilidade similar. Nesse caso, que tipo
de ataque poderia violar as defesas de Jaldabaoth?
Pavel preparou uma flecha de prata. Também estava imbuída com o poder da justiça.
“...Agora, permitam-me fazer minha jogada. É um presente singelo, mas ficaria muito
feliz se os senhores o aceitassem. Esta é uma magia de décimo nível: 「Meteor Fall」.”
Pavel sentiu algo acima dele, aproximando-se com velocidade fatal. Olhando para cima,
ele viu uma massa de luz.
Era uma gigantesca rocha incandescente — não, era algo maior que isso.
A luz gradualmente encheu sua visão, e por um momento ele vislumbrou as formas de
sua esposa e filha em meio à luz.
Ele sabia que era uma ilusão. Sua filha tinha idade suficiente para escolher seu próprio
caminho na vida. Mesmo assim, a filha que ele viu ainda era jovem, e sua esposa, que a
segurava, ainda parecia muito jovem.
Droga, se eu não disser que ela ainda parece jovem, ela provavelmente vai me matar—
♦♦♦
O meteoro rasgou o céu da noite e atingiu à parede, onde desfragmentou em uma ex-
plosão. Um estampido estrondoso ecoou por toda parte. A enorme onda de choque es-
magou tudo o que tocou e quebrou à Muralha.
Claro, Demiurge sabia que alguns humanos poderiam suportar tais coisas. Por exemplo,
alguns dos tolos que haviam entrado na Grande Tumba de Nazarick, a terra sagrada cri-
ada pelos Seres Supremos. No entanto, ele havia feito uma pesquisa minuciosa de ante-
mão e havia verificado que tais humanos não existiam aqui.
Demiurge limpou o terno com as mãos. Ele não tinha sido banhado com detritos ou
terra, mas a poeira da explosão havia chegado até ele, então havia um ligeiro cheiro de
terra ao seu redor. Ou melhor, ele teria feito isso mesmo que não fosse o caso. Afinal,
esse era um item valioso do grande Ser que o fizera.
Claro, Demiurge tinha muitas outras roupas além desse conjunto, mas isso não signifi-
cava que ele poderia tratá-lo descuidadamente por causa disso.
Enquanto pensava em seu poderoso criador, ele sorriu por trás de sua máscara, e então
olhou para os lamentáveis seres humanos.
Se ele seguisse com um ataque, o tumulto se tornaria muito mais aparente e, nesse
ponto, o assalto demi-humano provocaria uma derrota completa. Porém, ele não havia
usado a magia de agora a pouco para esse propósito.
Demiurge só poderia lançar um número muito pequeno de magias; havia apenas uma
outra magia de 10º nível disponível para ele. Seu verdadeiro poder estava em suas ha-
bilidades, e embora ele tivesse usado essa magia de agora para conservar suas forças, a
cena diante de seus olhos já se mostrou suficientemente trágica.
Não havia sinal de um contra-ataque. Parece que eles estavam tentando desesperada-
mente coletar informações e se reagrupar.
O comandante deles não está morto... e a confusão deles não parece vir de alguma suspeita
em relação a nós... será que estão mesmo bem?
Demiurge virou as costas para os humanos, voltando para a formação composta de seus
escravos.
Ele não estava em guarda contra a possibilidade de ser atacado por trás.
Ele podia se dar ao luxo de ser tão negligente por causa de todas as informações que
reunira.
De fato ele poderia ser classificado como um dos Guardiões de Andar mais fracos, en-
tretanto estava confiante na vitória na batalha. Isso porque ele sabia como as batalhas
eram travadas, por isso confiava na vitória. Isso quer dizer que, caso não for possível
vencer ele fugiria, a menos que fosse ordenado a não o fazer.
Havia apenas uma pessoa que Demiurge não poderia derrotar — em outras palavras,
havia apenas um oponente contra o qual Demiurge não poderia se preparar o suficiente
para assegurar sua própria vitória.
Ele era o supremo governante da Grande Tumba de Nazarick — Ainz Ooal Gown.
Esse Ser Supremo era aquele a quem Demiurge devia sua lealdade.
Produzir uma grande quantidade de undeads estava nos planos dele. Uma vez que isso
esteja feito, ninguém será capaz de prejudicar o Ainz-sama. Quão temível ele é. Parece que
os outros ainda não percebem quão alegre é ser governado por tal Ser Supremo—
Houve um baque. Esta foi a primeira vez que aconteceu algo que Demiurge não espe-
rava. Ele se virou para olhar a fonte do som.
“O, o Chefe está morto. Ele era o homem que eu queria derrotar!”
Demiurge avaliou o homem pela sua aparência. Ele chegou imediatamente a uma res-
posta.
Em outras palavras, não era nada além de lixo. Ainda assim, ele era um dos Nove Cores
— embora nem todos fossem impressionantes, ele achava que seria bom capturá-lo e
realizar todo tipo de experimento com ele.
“Uoooooooh!”
Lento. Tão lento. Se esta é a extensão de sua velocidade, não deveria ter usado mais seu
cérebro? Por exemplo, usando 「Silence」 para aproximar-se silenciosamente e fechar a
lacuna entre nós...
Essa era uma distância que seus companheiros teriam conseguido encurtar em um ins-
tante. O homem — lentamente — avançava em sua direção.
Como devo matá-lo? Se eu terminar com ele de forma mais limpa possível, então quando
eu o levar de volta, eu posso— oh, ele finalmente chegou.
Depois de garantir que não se sujaria pelo sangue do homem, Demiurge deu uma ordem.
Um olhar de perplexidade apareceu nos olhos do homem que acabara de perfurar sua
própria garganta com as lâminas que segurava. Seus olhos nublaram-se como bolas de
gude quando ele desabou no chão.
Demiurge se virou, caminhou até o lado do homem e o pegou pelo colarinho com um
único dedo indicador antes de retornar à sua formação.
Depois que ele voltou para suas tropas, os representantes das várias tribos — não seus
líderes — se reuniram diante dele.
Um tipo ansiava por sangue fresco e via os humanos como alimento. Eles obedeceriam
aos fortes e obedeciam de bom grado aos comandos de Demiurge. Os outros tipos eram
aqueles que foram obrigados a se ajoelhar diante do terror imposto por Demiurge, e eles
o obedeceram devido a incentivos negativos como o medo.
Dizendo isso, ele agarrou o ombro de um heteromorfo que havia escolhido a esmo. Sua
espécie era conhecida como Zern. Depois de fazer isso, ele arrancou a pele do ombro da
criatura.
Mesmo Demiurge estando entre os Guardiões de Andar mais fracos, ele ainda podia fa-
zer isso.
O heteromorfo cuja pele — e parte da sua carne — foi arrancada caiu no chão em in-
tensa agonia, gritando sem palavras.
Sua bondade era genuína quando dirigida a seus companheiros de Nazarick. Ele era
uma pessoa muito gentil quando se tratava de seus amigos. No entanto, para todos os
outros, sua gentileza era apenas equivalente ao cuidado que alguém dava às ferramentas.
Depois de receber suas ordens, os demi-humanos voltaram para suas várias tribos. O
heteromorfo rolando no chão não foi exceção.
Demiurge ativou uma de suas habilidades e convocou uma grande quantidade de de-
mônios que pretendia usar como buchas de canhão.
Embora os monstros convocados devessem saber uma parte do que o convocador sabia,
a informação geralmente vinha de forma muito vaga. Seria melhor considerá-la como a
capacidade de distinguir um amigo do inimigo. Portanto, era importante dar comandos
verbais às criaturas invocadas.
Certamente, alguém com o intelecto de Ainz-sama poderia até prever as ações dos tolos...
eu ainda estou muito longe disso. Por falar nisso, seria bom se eu pudesse compartilhar
essas informações com o Ainz-sama...
Senhoras e senhores do Reino Sacro, tenho um desejo sincero. Por favor, permitam que o
Ainz-sama se divirta com vosso sofrimento... Enfim, como o Ainz-sama ajustará meus pla-
nos para um melhor resultado?
Oh, aprender com as ações do Ainz-sama, progredir em direção a melhorar a mim mesmo,
além de aprofundar ainda mais minha lealdade. Maravilhoso!
Para Demiurge, que nascera para servir os Seres Supremos, nada era mais prazeroso
do que se empenhar ao máximo para seu mestre.
Parte 3
A notícia de uma aliança entre os demi-humanos — uma que incluía um exército maciço
— esmagando a mais forte fortaleza central e suas vastas quantidades de soldados, as-
sim como atravessar à Muralha, já havia começado a se espalhar por todo o Reino Sacro.
Um demônio que causou grande destruição no Reino, e ele usou uma magia poderosa
para rasgar à Muralha como papel de seda.
Já que o território do Reino Sacro estava esticado em torno das bordas norte e sul de
uma baía central, quaisquer tropas mobilizadas seriam naturalmente formadas em dois
exércitos — o Exército do Reino Sacro do Norte e o Exército do Reino Sacro do Sul.
“Isso é sério? Depois de tudo, este lugar vai se tornar um campo de batalha então...”
A primeira foi sua bela aparência. Seu rosto era tão belo quanto uma flor recém-flores-
cida, cheia de ternura e dignidade, e era elogiada como “O Tesouro de Roble”, já seu ca-
belo radiante e vibrante parecia como fios de ouro. Uma vez que se assemelhava a uma
auréola de anjo, muitos que viram seu sorriso gentil descreveram-na como uma santa.
A outra qualidade era a excelência dela como uma magic caster divina. Ela era um gênio
que podia usar magias de 4º nível com a tenra idade de 15 anos, e ela subiu ao trono com
o apoio firme do antigo Rei Sagrado e dos templos.
Quase dez anos se passaram desde então, enquanto certas vozes desaprovavam sua ex-
cessiva gentileza, ela não cometera nenhum erro que pudesse ser considerado crítico e
assim governou o Reino Sacro até hoje. Contudo, essa regência não era sólida e as intri-
gas ocorriam fora de vista.
“Eu entendo sua tristeza, Calca-sama, mas as pessoas que vivem em Kalinsha fazem isso
porque se prepararam para um dia como este. No passado, houve também... aquela ba-
talha, onde essa cidade foi o coração dos combates. É por isso que as paredes aqui são
ainda mais altas e resistentes do que em qualquer outro lugar.”
Ela era tão bonita quanto a Rainha Sagrada, seus olhos continham um olhar frio e afiado,
como o fio de uma lâmina. Ela estava vestida com uma armadura prateada reluzente e
uma sobrecota. Estas eram as vestimentas tradicionais da Capitã da Ordem Paladina, um
antigo artigo de obras-primas mágicas. A coisa mais importante era a espada em sua
cintura, cujo nome era conhecido por todos no Reino Sacro.
Foi renomada como uma das quatro Espadas Sagradas, a espada sagrada Safarlisia.
Um dos Treze Heróis, conhecido como Cavaleiro Negro, carregava quatro espadas —
Hyumilis, a espada do mal. Kilineiram, a espada amaldiçoada. Crocdabal, a espada cor-
rompida e Sfeiz, a espada da morte. Esta era uma das quatro espadas que existiam como
contrapartida a elas. Aliás, as outras três espadas sagradas eram conhecidas como a es-
pada da lei, a espada da justiça e a espada da vida.
Empunhar uma espada poderosa geralmente leva à pessoa a ficar viciada em seu poder
e a negligenciar os fundamentos da esgrima. Portanto, o fato de portar uma espada que
normalmente nunca carregaria era um sinal de sua determinação inabalável de se juntar
à próxima batalha e vencê-la.
Uma amiga íntima de Calca e a Capitã mais forte na história da Ordem Paladina, uma
façanha fundada graças às suas proezas de combate. Ela era “A Branca” dos Nove Cores.
“Isso, isso. E também enviamos todos os não-combatentes para se abrigarem, para que
não haja baixas entre eles. Em vez disso, a senhora não acha que o problema mais ur-
gente após a guerra serão as despesas durante os combates?”
Mesmo que a forma de seus olhos e boca variassem um pouco, seu rosto ainda tinha
uma semelhança próxima à de Remedios. No entanto, essas fracas diferenças foram su-
ficientes para mudar a impressão que os outros tinham dela. Ela sempre parecia estar
tramando algo — ou em termos menos educados, que ela estava cercada por uma aura
sinistra.
Era a irmã de Remedios, mais jovem do que ela por dois anos, Kelart Custodio.
Era de conhecimento público que ela poderia usar magia divina de 4º nível. No entanto,
isso foi apenas uma mentira para enganar os tolos; aqueles próximos a ela sabiam que
poderia lançar magias de 5º nível.
Essas irmãs eram conhecidas como as Gênias Custodio, as asas gêmeas da Rainha Sa-
grada.
Até agora, por ser uma mulher, muitos nobres tinham suas dúvidas sobre a ascensão de
Calca ao trono e se perguntaram se ela havia feito algo com ou para essas irmãs. Portanto,
muitas vezes falavam mal de todas as três ao mesmo tempo.
Muitos rumores sobre elas haviam sido esclarecidos, mas uma parte específica da fo-
foca permaneceu. Todas as três eram solteiras — sem nem mesmo um amante — e assim
foi dito que o relacionamento delas era tudo menos comum. Por mais que Calca negasse,
ela não conseguia se livrar daquele boato e foi uma grande fonte de frustração para ela.
“Só de ouvir isso me dá dor de cabeça. É muito ruim que não possamos ganhar nada
mesmo se vencermos.”
“Ainda assim, eles dizem que os demi-humanos desta vez estão bem equipados. Por que
não vender seus equipamentos?”
“Isso mesmo— você sabe que eu não posso aprovar isso, Nee-sama. Suponha que ven-
damos essas armaduras, onde venderíamos? Você não pensou nisso, não é? Só podemos
vendê-las no exterior, mas armaduras de demi-humanos serão vendidas a preços ínfi-
mos. Além do mais, devemos evitar o fortalecimento dos arsenais de outros países até
que a parte destruída da Muralha seja reconstruída. Em particular, espero que eles não
caiam nas mãos do Reino Feiticeiro.”
“Hã? Você não gosta do Reino Feiticeiro? Nunca ouvi você dizer isso no tribunal.”
Calca ponderou a respeito. Como parte do clero e Rainha Sagrada, ela não gostava deles.
No entanto, como chefe de estado—
“—O dever de um rei é amar sua nação, amar seu povo e conceder-lhe paz. Enquanto
ele fizer isso, tudo ficará bem, não?”
“Eu concordo com a Nee-sama. Os undeads — Eu não acho que eles poderiam amar
como a senhora os ama, Calca-sama.”
“O que seus ajudantes disseram? Kelart, conte-me nosso plano para lidar com Jaldaba-
oth.”
A Rainha Sagrada não participava de reuniões estratégicas. Em vez disso, ela caminhava
em meio aos soldados para aumentar o moral deles. Mesmo que as tropas do Reino Sacro
fossem mais bem treinadas do que as de outras nações, elas eram, até a última análise,
recrutas. Motivá-los era importante.
“Sim. Já estamos discutindo como lidar com situações em que os demi-humanos cercam
essa cidade, contornam-na, avançam para o sul, se dividem para realizar objetivos dife-
rentes e assim por diante.”
Foi nessa época que ela reafirmou sua crença de que as irmãs eram parecidas, mas não
iguais. Se ela tivesse perguntado à irmã mais velha, a resposta que receberia faria com
que ela quisesse arrancar os cabelos em frustração.
“Dada a trajetória de invasão dos demi-humanos até agora, é mais provável que eles
escolham cercar esta cidade. Mas há um problema com isso.”
“Mm, sim.”
Remedios também não participara das reuniões, já que ela era guarda-costas de Calca.
No entanto, o fato de não ter entendido algo que a Rainha Sagrada percebeu instantane-
amente se devia a outro problema.
“...Nee-sama. Estou falando sobre o demônio que causou estragos no Reino, Jaldabaoth.
Ainda não há como dizer o quão astuto ele é, os demônios são hábeis em esquemas e
truques. Ele pode adotar um plano que não previmos.”
Embora houvesse muita coisa que ela queria dizer a líder da Ordem Paladina, Calca re-
sistiu à vontade de fazê-lo.
“Sim. Normalmente, tudo o que temos a fazer é esperar que os reforços do sul cheguem,
mas temos relatos dizendo que Jaldabaoth usou um poder misterioso para destruir à
Muralha em um único golpe. Enquanto esse tremendo fator de incerteza estiver em
jogo...”
Qualquer um ficaria aborrecido quando pensasse no que havia acontecido com a Mura-
lha, mas Calca sabia o que estava acontecendo.
Remedios não gostava de pensar, e era uma pessoa muito teimosa. Isso era uma falha,
mas também foi a razão pela qual ela poderia incorporar à justiça absoluta.
Remedios, no entanto, a mataria sem qualquer dúvida. Além disso, ela insistiria que foi
justa e não sentiria nenhum remorso por isso. Em seu coração, qualquer coisa que fizesse
pelo bem da nação e do povo era aceitável.
Quando subiu ao trono na posição de Rainha Sagrada, Calca declarou a suas duas ami-
gas íntimas: “Eu concederei felicidade aos pequenos e farei um país onde ninguém irá cho-
rar.”. Em resposta, Remedios disse: “Eu irei apoiá-la e defendê-la em sua justa causa.”.
Com essa promessa em seu coração, ela era mais direta do que qualquer outra pessoa,
seu coração estava cheio de convicção, e o brilho em seus olhos dava-lhe um ar de faná-
tica.
Alguém assim era claramente perigoso, ainda assim, Calca não se distanciara da amiga.
Os impulsos justos de amar os outros, amar a paz, odiar o mal e o desejo de ajudar os
fracos eram todas as coisas que ela receberia de bom grado.
E foi por causa dessa natureza dela que o que ela achava que tinham coisas em comum.
Ela não pensava muito antes de falar, tudo o que dizia vinha direto de seu coração.
Se o poder repousasse nas mãos de uma pessoa, era natural que ocorressem lutas pelo
poder. Mesmo que um vencedor fosse decidido, a batalha contra a suspeita, o ciúme e o
medo continuariam, até que um lado acabasse morrendo.
Calca havia sido libertada dessa maldição no meio do caminho. Isso porque ela havia
alcançado um poder mágico que a classificava como alguém forte, mesmo quando com-
parado às gerações passadas de Reis Sagrados. Outros a haviam elogiado por isso e seu
coração pôde ficar em paz. Portanto, Calca poderia deixar de lado seus preparativos
mentais para assumir o trono como a Rainha Sagrada, mas seus irmãos não se sentiam
da mesma maneira.
Havia apenas um irmão mais velho entre seus parentes em quem ela podia confiar; Cas-
pond.
Já que ela viveu nessa tormenta por um longo tempo, Remedios era uma espécie de
oásis espiritual para Calca.
“Uhum. Aquele poder inacreditável me faz pensar no poder dos Deuses Demônios das
histórias.”
“Nee-sama, nem os Deuses Demônios eram tão poderosos assim. Pelo que sabemos, Jal-
dabaoth pode ser uma entidade superior aos Deuses Demônios.”
“O que lhe preocupa, Calca-sama? Dizem por aí que ele foi derrotado pelos aventureiros
do Reino. A senhora não acha que poderíamos fazer o mesmo?”
“E falando nisso, os ajudantes de ordens sentem que, dado que a Muralha foi atingida
apenas uma vez, ele deve ter problemas em usar aquilo sucessivamente.”
“Um pensamento lógico. Se ele pudesse usar repetidamente, então teria feito. Já que não
o fez, é porque só poderia atacar uma vez.”
Calca concordou com a opinião de Remedios. Se fosse possível fazer, não havia razão
para não usar repetidamente o ataque.
“...Bem, podemos recrutar aventureiros que possuem classificação alta, do tipo que es-
tão acostumados a derrotar monstros e coisas assim, como parte da mobilização de
nosso povo. Se reunirmos todo o nosso poder de luta, Jaldabaoth dificilmente será um
adversário imbatível. Mas o fato é que ele já foi derrotado uma vez antes.”
“Verdade. Apesar de que eu ainda acho que falhamos, não obtivemos informações de-
talhadas sobre as atividades do Jaldabaoth no Reino.”
“Não, eu não quis dizer isso, Kelart. Você não é a culpada. A culpa é minha, já que não
prestei atenção às notícias a respeito de outros países.”
“Nee-sama...”
“Bem, certamente não é minha culpa. Eu fiz meu trabalho protegendo à Calca-sama e
derrotando monstros! Eu não errei em meu trabalho. Isso é o que eles chamam de fazer
uso apropriado de talento!”
“...Será que Jaldabaoth estava por trás daqueles incidentes em que todas as pessoas de
vários vilarejos desapareceram?”
Algum tempo atrás, os moradores de alguns vilarejos desapareceram. No final, eles não
conseguiram coletar nenhuma informação que apontasse para um culpado, mas era pos-
sível que Jaldabaoth estivesse puxando as cordas por trás das cenas.
Seus olhos pareciam estar perguntando: “Você não contou a Nee-sama sobre isso?” Por-
tanto, Calca deu-lhe uma resposta que pôs essas dúvidas em repouso, ela deu um sorriso
cansado.
Traduzido, isso significava: “É claro que eu disse a ela. Contei sobre como Jaldabaoth ata-
cou a Capital Real, como os aventureiros derrotaram o Jaldabaoth, os outros demônios que
apareceram e como o Capitão Guerreiro derrotou todos eles. Eu contei tudo... então ela
deve ter esquecido tudo, deve ter entrado em um ouvido e saído no outro.”
Kelart não respondeu, apenas ficou enrolando uma mecha de cabelo em volta do dedo.
Já que Remedios não pensava, então tinha que haver alguém para cobrir suas burradas.
E essas duas eram as responsáveis por isso.
Ela podia compadecer profundamente pelo sofrimento que passavam com Remedios.
No entanto, a inocência da mesma — ou estupidez, se alguém não estivesse inclinado a
ser educado — também tinha um efeito calmante, então seus pontos positivos e negati-
vos se cancelavam mutuamente.
“...Hah. Eu só conheço os detalhes por alto, mas aparentemente ele lutou com outro de-
mônio, algum do tipo escamoso.”
“Então foi isso. Bem, se ele tivesse derrotado o Jaldabaoth, as coisas não teriam termi-
nado assim. Não me diga que os aventureiros adamantite são mais fortes do que aquele
demônio?”
“Bem, tudo o que ele sabe é como usar uma espada. Se ele tivesse ataques anti-demônio
como nós, tenho como provável que as coisas teriam sido diferentes.”
Remedios imediatamente entrara em ação. Em momentos assim, ela ainda era a pri-
meira a agir.
O ar do início do outono entrou e o ar aquecido por seus três corpos fluiu para fora.
O ar fresco e estimulante trouxe consigo o som de sinos tocando. Isso era prova de que
o que ela ouvira antes não era um som fantasma causado por zumbidos em seus ouvidos.
Não, teria sido muito melhor se ela tivesse ouvido apenas zumbidos.
“Vossa Majestade!”
Ela reconheceu o primeiro homem a entrar no quarto enquanto ele gritava no topo de
sua voz — ele era o chefe de equipe.
“Não há tempo para perder! Vossa Majestade! É Jaldabaoth! Jaldabaoth apareceu dentro
da cidade! Ele começou a destruir a cidade com muitos demônios em seu encalço! Além
disso, os demi-humanos estão se movendo! Parece que estão avançando nesta direção!”
“O que disse!?”
“Nós avistamos o exército demi-humano nas proximidades. Não sabemos como enga-
naram nossas sentinelas, mas fomos alimentados com informações falsas! A luta vai co-
meçar a qualquer momento!”
“Embora isso desvie muito de nossos planos, começaremos o combate com o Jaldabaoth
agora. Enquanto ganhamos tempo, prepare-se para engajar o exército demi-humano.
Transmita minhas ordens para os aventureiros!”
Claro, ela não tinha intenção de subestimar o demônio que poderia facilmente destruir
à Muralha. Mas a sensação de que poderiam derrotá-lo já era um erro por si só? Não teria
sido melhor recuar até que tivessem aprendido tudo sobre o inimigo?
Não.
Se eles não lutassem agora, então quando iriam lutar? Embora fosse importante conhe-
cer o inimigo, agora era a única chance que tinham de atacar com todas as suas forças.
Depois disso, o desgaste da batalha esgotaria seus recursos e tornaria cada vez mais di-
fícil reunir as forças que eles poderiam comandar agora.
Além disso, recuar continuamente até que completassem suas operações de coleta de
informações estava essencialmente pedindo que seu país fosse pisoteado.
“...Eu vou deixar os pequenos viverem seus dias de felicidade, e fazer deste país um lu-
gar onde ninguém será ferido.”
“Certamente, Calca-sama!”
Porém, essas eram palavras que ela havia falado no passado, antes de conhecer como o
mundo realmente funcionava. Com as coisas nesse estado caótico, parecia um objetivo
quase impossível de alcançar.
“Hmph! Ele ficou convencido agora que cruzou à Muralha, mas quem diria que nem se
deu o trabalho de trazer seu exército de demi-humanos consigo!”
“...Não abaixe sua guarda, entendeu? É assim que você trata um oponente tão forte?”
“Não abaixarei, Calca-sama! Não serei descuidada em nenhum aspecto! Com esta es-
pada sagrada, vou aliviar os ombros do demônio do peso de sua cabeça e a apresentarei
a senhora!”
Isso foi o que Calca refletiu, mas não era um pensamento de preocupação. Isso porque
Remedios se transformava em uma pessoa diferente quando entrava no campo de bata-
lha.
“Ahh~ não se esforce tanto em trazer a cabeça dele, sua lealdade já me deixa muito feliz.
Nesse caso, com relação ao plano de derrotar Jaldabaoth... você pode nos comprar algum
tempo?”
“Mas é claro. Sua serva já despachou uma força de combate avançada para executar
nossos planos.”
Naquele momento, Calca sentiu uma fincada no seu coração. Pois a realização dessa or-
dem estava implicitamente enviando-os para morrer. Os soldados sairiam para lutar
contra Jaldabaoth, apesar de não terem chance de vitória.
Um de seus deveres como monarca era trocar as vidas de poucos pela sobrevivência de
muitos. Portanto, ela não podia chorar ou lamentar. Os soldados estavam dando suas
vidas por ela, então ela precisaria fazer um espetáculo para convencê-los de que essa era
uma tarefa gloriosa.
Ela precisa desempenhar o papel da rainha suprema, a Rainha Sagrada que era respei-
tada acima de todas as outras.
O bater das palmas das suas mãos foi o sinal para todos começarem a mover-se.
Parte 4
Remedios agarrou sua espada sagrada e cortou um demônio ao meio — seus Vice-Ca-
pitães lhe disseram o nome, mas ela tinha esquecido completamente. Imbuída de poder
sagrado, a lâmina poderia infligir ferimentos graves a seres malignos, e estava fazendo
Ela olhou para um soldado caído — não um dos soldados da vanguarda, mas um patru-
lheiro local — e Remedios gritou de raiva.
Sua armadura de couro havia sido cortada e as mãos junto a seu abdômen estavam
manchadas de vermelho escuro. Ela podia até ver o rosado de suas entranhas. Seu rosto
estava bem além do ponto de palidez, agora era algo branco como se sem sangue algum.
Embora ela não tivesse quase nenhum conhecimento médico, suas próprias experiên-
cias forneciam informações suficientes para que fizesse um julgamento. Não houve
tempo para enviar os soldados feridos de volta a um ponto de coleta de vítimas. Ela pre-
cisaria tratá-los no local com magia.
Os soldados ainda não estavam mortos e tão pouco sobreviveram milagrosamente, nem
mesmo eram tão bons ao ponto de consegui-lo; então esse era o objetivo dos demônios?
Dito isso, ela não tinha idéia do que os demônios estavam planejando.
“Comecem a curá-lo!”
Remedios foi acompanhada não só pelos paladinos de elite atrás dela, mas também por
vários sacerdotes. Sua ordem foi dirigida a eles.
“Não seria melhor deixar os médicos da retaguarda ajudá-lo? Se usarmos a mana dos
sacerdotes aqui, poderemos ficar sem quando lutarmos contra Jaldabaoth, isso pode ser
o objetivo dos demônios—”
“—Ahhh, você fala demais! Isso é uma ordem! Cure-o ao ponto em que ele possa se mo-
ver por conta própria! Além disso—”
“Ótimo!”
A magia de cura reparou as feridas dos soldados rapidamente. Claro, a recuperação não
foi completa. Afinal, era apenas uma magia de 1º nível, e não poderia restaurar comple-
tamente um soldado à beira da morte. Mesmo assim, foi o suficiente para curar os solda-
dos ao ponto de poderem cambalear até uma área segura. Como os soldados não esta-
vam mais em perigo de morte, não havia necessidade de curá-los ainda mais. Remedios
ainda se lembrava do incessante incômodo de sua irmã para usar sabiamente recursos
limitados.
“Atenção, bravos soldados, não se movam e escutem. Nós fizemos os primeiros socorros
em suas feridas, então recuem. Depois disso, deixem os médicos da retaguarda cuidarem
de vocês.”
Remedios começou a correr na frente de suas tropas. Sua armadura de metal era mais
leve e mais fácil de se mover do que aparentava e, dada suas habilidades físicas, ela po-
deria chegar ao seu destino mais rápido do que qualquer outra pessoa. No entanto, sua
irmã, Calca e seus ajudantes muitas vezes lhe disseram: “Não vá avançando desse jeito o
tempo todo!”, Então Remedios reprimiu o desejo de correr com toda a força e anulou o
desejo de recuperar o tempo perdido.
As ruas se estendiam diante deles. A evacuação fôra concluída há muito tempo e por
isso não havia ninguém lá.
“Capitã, se seguirmos essa avenida, virarmos à direita duas vezes, chegaremos à praça
onde aguardaremos Jaldabaoth. Deseja que façamos uma investigação adiante?”
“Não, esperem pela Calca-sama e minha irmã — e os aventureiros. Depois disso, façam
suas verificações finais e em seguida, ergam o estandarte bem alto!”
A operação envolveria Calca e sua guarda pessoal, Kelart e membros escolhidos dos
templos, aventureiros de alta classificação e um pelotão de paladinos de elite de Reme-
dios. As quatro unidades se separaram e depois foram para a localização de Jaldabaoth.
Originalmente, eles deveriam ter se formado em um único grupo e saído juntos. No en-
tanto, Jaldabaoth possuía uma habilidade de ataque de área que pôde derrubar à Mura-
lha, então eles decidiram se separar para evitar serem destruídos quando suas forças
estivessem concentradas. A razão pela qual tinham pendurado aquela bandeira à distân-
cia foi para que mesmo se Jaldabaoth visse a bandeira e a atacasse, isso não prejudicaria
o resto do grupo.
“O ataque de quebrar à Muralha de Jaldabaoth pode ser usado mais de uma vez, Isan-
dro?”
Um deles era um espadachim comum, mas se destacava em outras áreas, era Gustav
Montagnés. Agora, ele estava coordenando os paladinos que estavam reforçando as mu-
ralhas da cidade, então não estava aqui.
Havia outro, que atualmente estava do lado de Remedios. A pessoa a quem Remedios
dirigiu sua pergunta era também um dos Nove Cores, Isandro Sanchez, chamado de “O
Rosa”.
“Se ele pode usar aquilo várias vezes, então não tenho idéia do porquê ainda não o fez.
Pode fazer mais sentido considerar que pode haver alguma condição ou algum tipo de
atraso até que ele possa usar novamente.”
“Faz muito sentido. Eu acho que dividir foi algo muito paranoico.”
“Não, muito pelo o contrário. Talvez ele esteja conservando sua força para produzir algo
bem poderoso. Não devemos ser descuidados.”
A política em particular fazia sua cabeça doer. Ela ficou completamente perplexa com a
razão pela qual os nobres desaprovaram o fato de que uma mulher subiu ao trono tor-
nando-se a Rainha Sagrada.
Eles sentiram o mesmo sobre o título de Calca, que foi a corruptela do título de “Rei
Sagrado” para um substantivo feminino. Eles protestaram muito, tanto por ter uma mu-
lher regendo-os, quanto por um novo termo tinha que ser criado para ela.
Mas no fim, seria mais simples entender se era apenas uma questão de quem era mais
forte ou mais fraco.
“E a Calca-sama?”
“Ainda não.”
“Então é isso... bem, é hora de começar a lançar magias defensivas de duração prolon-
gada. Assim que a Calca-sama chegar, nós avançaremos em Jaldabaoth primeiro e servi-
remos de isca para chamar sua atenção. Mantenham suas motivações fortes e cuidado
com os ataques especiais que o inimigo tiver.”
Eles haviam confirmado que a tropa avançada havia sido eliminada e, se o alvo tivesse
mudado de local, os aventureiros responsáveis pelo reconhecimento teriam dito a eles.
Se não havia notícias deles, isso significava que Jaldabaoth não saíra da praça onde apa-
recera.
“Aquele demônio desgraçado está fazendo pouco caso de nós. Provavelmente pensa
que, se puder matar todos nós aqui, ele poderá conquistar o país facilmente.”
“Não, Capitã. Também é provável que ele esteja tentando ganhar tempo. Se estivermos
presos aqui lutando contra Jaldabaoth, o exército de demônios poderá ganhar em outro
lugar.”
“...Entendo. Então isso também é possível... esse Jaldabaoth é muito astuto, huh.”
“Eu acho que ele é bom nisso justamente por ser um demônio.”
Assim que Remedios jurou para os deuses, a bandeira final foi erguida, como se esti-
vesse esperando por aquele momento.
“Vice-Capitão!”
Ela virou uma esquina, correu de novo, depois virou uma esquina mais uma vez.
E então, ela viu uma pessoa de aparência suspeita, parada no meio de uma praça pin-
tada de vermelho vivo e coberta com os corpos dos mortos. Uma cauda projetava-se da
cintura daquela pessoa.
Sua descrição era quase idêntica à fornecida pelos soldados que escaparam.
Ele não tinha asas de morcego nem chifres curvados, e o único sinal de sua inumanidade
era sua cauda. Do ponto de vista deles, ele era pouco mais que um homem com uma
máscara.
Contudo—
“Você é Jaldabaoth!?”
Sua irritação cresceu quando Jaldabaoth a evitou sem esforço, e ela a girou novamente.
Remedios sabia que, por mais tempo que ela investisse em seus estudos, nunca seria
capaz de se destacar nos meios acadêmicos. Por essa razão, ela passou todo o tempo
melhorando suas habilidades de luta, pois entendeu que era mais talentosa nessa área.
Assim, ela se tornou conhecida como a melhor guerreira dessa nação.
A evasão de Jaldabaoth não foi um acidente. Ele fez uma demonstração de presunção
pois tinha a força para tal. Poucos seres humanos poderiam acompanhar a batalha que
estava prestes a acontecer, e ela precisaria se aprimorar ainda mais com a magia.
“Recuar! Todos vocês, recuem! —Não, formem um perímetro! Esse demônio é forte!”
Dizendo isso, ela recuou com seus homens. Seus subordinados recuaram mais que ela,
mas ela não podia ir muito longe. No máximo, ela poderia se mover quatro metros para
trás, em um intervalo onde poderia dar um único passo e depois cortá-lo.
“Haaa... que garota otimista tu és. O que foi? Será que é porque viu algo vermelho?”
Jaldabaoth virou-se para Calca, expondo suas costas indefesas à Remedios. No entanto
— seus instintos lhe disseram que Jaldabaoth poderia estar apenas esperando que ela o
atacasse por trás, então ela ficou sem ação.
“Ei, vocês duas! Ele é muito forte! Se não recuarem com seus soldados, eles só vão mor-
rer por nada!”
Remedios manteve distância de Jaldabaoth enquanto circulava em torno dele até que
ela ficou na frente das duas.
“Ela está certa, Nee-sama. É melhor o atacarmos ao mesmo tempo, não acha?”
Seus olhos continuaram fixos em Jaldabaoth enquanto ela ouvia os sussurros atrás dela.
Talvez ele estivesse planejando liberar o seu poder de quebrar muralhas; se ele fizesse
algum movimento em falso, ela avançaria para golpeá-lo.
“Certamente... Sua escrava atacou-me sem dizer uma palavra. O que terias feito se ti-
vesses confundido um estranho com minha pessoa? Bem, interessa-me que existam sel-
vagens no Reino Sacro que são incapazes de falar. Ah, só para ter certeza, a senhorita é
quem ocupas o trono do Rei Sagrado?”
“Certamente.”
“Tudo que precisa saber é que ele é Jaldabaoth, e tudo o que precisamos fazer depois
disso é matá-lo e mandá-lo de volta para o inferno. Conversar com ele vai manchar sua—”
As palavras confusas de Calca fizeram Remedios inclinar a cabeça. Era algum sinal que
tinham combinado antes?
Kelart parecia estar conjurando magia na retaguarda, porque uma onda de calor ardia
dentro de seu corpo, acompanhada por uma força incrível. Seu ataque a partir de agora
havia sido evitado, mas agora ela estava confiante de que poderia acertar agora. Nesse
ponto, Remedios pensou:
Então é isso...
“—Ainda assim, sou generoso, então dialogaremos um pouco mais. Alguma pergunta?”
Jaldabaoth apertou a região dos olhos de sua máscara, um movimento que Remedios
viu Calca, Kelart e seus Vice-Capitães executarem muitas vezes no passado.
“...Além disso, rogo que se preparem até que se satisfaçam. A visão de vocês — que estão
desesperadamente preparando-se para me derrotar — sendo pisoteados e suas vidas
sendo tomadas por um poder que supera o pior de seus pesadelos; na verdade, é uma
Havia uma sugestão firme como aço na voz de Calca, e Remedios calou a boca. Foi ape-
nas uma ligeira mudança de tom, mas por experiência, Remedios sabia que Calca estava
zangada.
“Mas, mas se eu recuar, não vou poder golpeá-lo se ele fizer algo estranho...”
“Ah, relaxe. Não atacarei até que terminemos nossa conversa, ou até atacar-me por
conta própria.”
“Remedios!”
“—Entendido.”
Remedios recuou como ordenado, e sua irmã sussurrou para ela através de seu elmo.
“Calca-sama está tentando aprender mais com a oposição. Você precisa ignorar o que
esse demônio diz e aguentar isso por ora.”
Huun~
Remedios fez uma careta, seu rosto aparentemente dizendo, “não estou nada feliz com
isso”.
Seu oponente era um demônio. Sendo esse o caso, elas deveriam considerar que tudo o
que ele disse era provavelmente uma mentira. Tomar iniciativa atacando-o economiza-
ria esforço e neurônios. Contudo, impedir as intenções de sua mestra era o mesmo que
trair sua lealdade. Assim, ela cerrou os dentes para suportar isso.
“Então, Imperador Demônio Jaldabaoth. Eu tenho umas perguntinhas. Por que veio
aqui? Se deseja afundar este país, por que não se mover com o exército demi-humano da
fortaleza? Ou poderia ser—”
“—Ah, não há necessidade dizer-lhe mais nada. Eu posso imaginar o que desejas. Mas
parece que se enganas. A razão de minha presença aqui, sozinho, não é para conversar
com a senhorita.”
“Há duas razões pelas quais eu vim sozinho. A primeira é porque esmagá-los apenas
usando minha força aprofundará vosso desespero muito mais do que se fossem mortos
em uma batalha caótica com as forças demi-humanas. A outra razão é — para evitar co-
meter os mesmos erros que cometi em Re-Estize. Eu não esperava encontrar um guer-
reiro tão poderoso quanto eu. Portanto, o fato de eu ter vindo sozinho é para constatar
se existe um ser comparável a mim.”
“Disso eu tenho certeza — não há nenhum. É por isso que eu lhes dei todo esse tempo.
Se alguém assim existisse, estaria nessa cidade — preferencialmente ao seu lado, a pes-
soa mais importante da nação. No entanto, não encontrei ninguém assim. Isso inclui
aquelas ratazanas choronas se escondendo.”
“Seu desgraçado! Ousa dizer que somos mais fracas do que esse tal guerreiro?”
Remedios não podia fingir que não ouvira, como resultado esqueceu sua tolerância e
gritou de raiva. As palavras de Calca e de sua irmã já estavam meio fora de sua cabeça,
mas a ordem para não o golpear já estava praticamente desaparecendo.
“Isso é exatamente o que estou dizendo. Não ouviste? É tudo o que desejas saber, Rainha
Sagrada-sama?”
Havia 5 Anjos que seguravam espadas de fogo, convocados através da magia de 3º nível
[Arcanjo das C hamas] [Anjos
— Archangel Flames . Havia mais 20 convocados através da magia de 2º nível, Angel
G u a r d i õ e s ]
Guardians. E então, havia um único anjo que Calca havia convocado antes de chegar aqui
[ P r i n c i p a d o da Paz]
— um Principality Peace.
Mesmo não se lembrando de quais poderes os Anjos possuíam, ela lembrou que o Prin-
cipality Peace que Calca invocou poderia usar magias divinas de baixo nível e poderia
usar habilidades como 「Protection From Evil」, 「Smite Evil」 e 「Mass Silence」,
entre outras. Isso porque tinha visto Calca invocá-los várias vezes no passado.
Sentindo a intenção assassina ao seu redor, Remedios entendeu que ela não precisava
mais se segurar, e então atacou. Normalmente, os sacerdotes a apoiariam com magias de
Não — ela negou a última dedução. Isso seria impossível agora. Seus instintos — sua
capacidade de farejar o mal — disseram-na que Jaldabaoth estava bem ali.
Talvez o sangue espumoso que estavam tossindo fosse devido à perfuração em seu
peito causando hemorragia interna, sangue estava inundando seus pulmões. Com seu
último traço de vida, um único aventureiro fez seu último golpe em Jaldabaoth.
Jaldabaoth deixou os golpes o atingirem como uma chuva de verão, no entanto, não ha-
via nenhum sinal de que ele tivesse sido ferido.
Já que estavam aqui, era coeso presumir que esses aventureiros seriam bastante habi-
lidosos. Era razoável supor que estariam empunhando armas sagradas como parte de
seus preparativos. Mesmo assim, eles não fizeram nem mesmo um arranhão nele, mos-
trando assim, que esse demônio era um ser que possuía um altíssimo poder.
Nos poucos momentos que levou as condições de batalha mudarem, Remedios gritou
“Yeeart!” fazendo sua investida e o cortou diagonalmente com sua espada sagrada.
Jaldabaoth deu um passo para trás, e aquelas coisas parecidas com asas tentáculos —
não, possivelmente eram tentáculos — jogaram os aventureiros perfurados para ela.
—Depois ativou uma Arte Marcial, deu um passo à frente fazendo uma estocada.
“《Golpe Sagrado》!”
Ela infundiu o poder sagrado dentro de sua espada no instante em que as garras fizeram
contato com o gume.
Essa era uma técnica elementar para os paladinos, foi originalmente planejada para ser
usada no momento em que a lâmina cortasse profundamente à pele de um oponente,
mas isso não significava que não pudesse ser usada como um ataque de toque. A maior
parte do poder divino simplesmente dispersava na superfície, então não causaria muito
dano, mas ela ainda o usara. Isso porque, no momento em que os aventureiros foram
mortos, seus instintos de paladina — que sua irmã chamava de “instinto animal” — gri-
tavam que ela precisava mostrar que ainda podiam resistir a Jaldabaoth e, com isso, im-
pedir que o moral dos soldados circundantes caísse.
“Entendo...”
Os Anjos se espremeram entre Remedios e Jaldabaoth quando ela recuava. Eles lança-
ram seu ataque enquanto flutuavam na altura da cabeça.
“Tch!”
O som metálico que soou quando sua espada sagrada fez contato com as garras de Jal-
dabaoth mostrou quão duras eram. Além disso, o fato de que ele poderia facilmente es-
capar de um golpe magicamente aprimorado — embora de uma forma um pouco desa-
jeitada — mostrou o quão alta eram suas habilidades físicas.
Havia apenas algumas pessoas que poderiam lidar com um ser tão poderoso. Normal-
mente os Anjos invocados através das magias de 2º e 3º nível se destacavam em matar
monstros, mas aqui, eles só serviam para atrapalhar a batalha. Em particular, as grevas
dos Anjos flutuando para frente e para trás eram bem incômodas.
Sua irmã lançou uma magia. No entanto, desapareceu diante do rosto de Jaldabaoth
como se tivesse sido desviada.
Calca emitiu dois raios de luz. Ela provavelmente estava pensando que seria um custo
válido, desde que um deles pudesse afetar a imunidade de Jaldabaoth, mas infelizmente
o ataque de sua mestra foi tão ineficaz quanto o de sua irmã.
Com isso ficou claro que ele possuía uma resistência mágica muito alta. Em outras pa-
lavras—
O fato era que, embora os Anjos tivessem a vantagem aérea e o cercassem por todos os
lados, Jaldabaoth ainda estava bastante sereno. Mas isso foi apenas natural. Mesmo de-
pois de estar cercado por tantas pessoas, nem um único ataque atingiu Jaldabaoth.
Os aventureiros correram para recolher seus companheiros que haviam caído aos pés
de Remedios. Mesmo que seus corpos imóveis estivessem nitidamente mortos, eles
ainda acreditavam na fraca probabilidade de que isso não era verdade.
“...Que incômodo. Mesmo que não sejam nada mais que insetos, um enxame é deveras
desagradável.”
De fato, ser capaz de negar as magias lançadas e pela retaguarda e escapar perfeita-
mente dos ataques físicos o fez parecer esmagadoramente superior. Contudo—
A menos que seus invocadores fossem especialistas, os monstros convocados eram ge-
ralmente mais fracos que seus invocadores. Portanto, houve casos em que os ataques
dos Anjos acabaram sendo inúteis.
Os Anjos no ar voaram rapidamente para Jaldabaoth como um só. Eles não usaram suas
espadas, mas o pressionaram.
Esse era um fato assustador sobre monstros invocados. Já que eram seres que não mor-
riam mesmo quando mortos, eles poderiam ser inteiramente utilizados dessa maneira.
O fluxo de Anjos vinha como uma enorme cachoeira, sem parar ou descansar, os contra-
ataques fluindo em direção a Jaldabaoth deixaram Remedios olhando com admiração.
Contudo—
Remedios tinha se movido sutilmente para entrar em uma abertura na defesa de Jal-
dabaoth, uma falha fatal que foi exposta quando ele estava em guarda contra os Anjos
vindos de cima.
“—Quê!?”
“Yeeart!”
Ela ativou uma habilidade, e depois suas Artes Marciais, usando sua espada sagrada
para golpear com toda a força.
Ela tinha escolhido conservar o maior poder de sua espada sagrada, pois seus instintos
lhe disseram que não era o momento para aquele golpe poderoso, que só podia ser usado
uma vez por dia.
Atingido pelo golpe mais forte que conseguiu reunir, Jaldabaoth voou para trás como
se estivesse sendo esmagado no horizonte, até colidir com uma loja do outro lado da
praça.
“—Droga!”
“Ainda não acabou! Como ele poderia ter voado tão longe!?”
De fato, não só permitira que Jaldabaoth escapasse do cerco, como lhe dera a chance de
se esconder em uma casa.
A razão pela qual eles poderiam enfrentar inimigos como Jaldabaoth era porque po-
diam cercar seu oponente e forçá-los a enfrentar muitas pessoas ao mesmo tempo. Per-
mitir que ele se escondesse em uma casa apertada era muito perigoso.
Além disso, as ações de Jaldabaoth mudariam agora. Era possível que ele parasse de
brincar e os levasse a sério.
Gritou Calca.
Normalmente, Remedios perguntava e então Calca respondia, mas agora o oposto era
o caso. Durante a batalha, ela era mais capaz de fazer a escolha certa do que as outras
duas.
Depois de ouvir isso, os sacerdotes lançaram magias de ataque uma após a outra.
Eles desmoronaram a casa em pouco tempo. Entretanto, era difícil acreditar que Jal-
dabaoth tivesse sido esmagado sob os destroços que caíam. Mesmo Remedios em sua
armadura encantada poderia sobreviver a isso tudo, a menos que ela fosse muito aza-
rada. Além disso—
Remedios olhou para sua lâmina, que não estava manchada de sangue.
Teria ele dissipado o impacto do golpe apenas voando? Teria ele usado uma Arte Mar-
cial como 《Fortaleza》 ou algo assim? Ou foi uma habilidade apenas demoníaca? Havia
muitas possibilidades para isso, mas as coisas se tornariam problemáticas se ela não
conseguisse perceber o que havia acontecido.
Arrogante daquele jeito? Duvido muito, a menos que esteja gravemente ferido...
“Nee-sama, vamos realizar o ritual do Fogo Sagrado? Fazer isso para prejudicar um opo-
nente... é realmente algo certo para uma paladina?”
“Tudo bem, se a Remedios acha que é o melhor caminho, vamos prosseguir. Ou melhor,
é o que precisa ser feito. Já que ele é um demônio, não há motivo para não o machucar.”
Muitos demônios eram resistentes ao fogo, mas o Fogo Sagrado fazia jus ao nome, e a
resistência ao fogo tinha apenas metade da eficácia contra ele.
Disse Calca olhando fixamente para frente. Pelo canto de seu olho, Remedios viu a ir-
mãzinha murmurando “Hum...”.
Simplificar o ritual do Fogo Sagrado colocaria muita pressão no corpo do usuário. Isso
não era algo que ela, como uma das subordinadas de Calca e encarregada de mantê-la
segura, deveria recomendar. Entretanto, seria ainda pior se dessem tempo a Jaldabaoth.
“Se você acha que esta é a melhor maneira, então faremos. Mas se eu o fizer sozinha,
não poderei ajudá-la depois. Tenha isso em mente, por favor... Enfim, pode acender o
fogo imediatamente?”
“Entend—”
“Nee-sama!”
“Eu sei!”
Jaldabaoth realmente tinha sido enterrado sob a casa. Portanto, usar o ataque do Fogo
Sagrado naquele momento foi a escolha certa. Elas não pensaram que ele poderia ter
perdido a consciência por causa do choque de ter sido enterrado sob os escombros.
Remedios sussurrou suas últimas palavras para as outras duas. Ao mesmo tempo, Re-
medios também recuou, permitindo que os Anjos formassem uma parede ao longo do
perímetro entre elas e Jaldabaoth.
“Hmmm. Realmente rogo para que se afastem. Seria deveras decepcionante se morres-
sem pela onda de choque de meu levante.”
“...Jaldabaoth...?”
Isso porque ele parecia completamente diferente do Jaldabaoth de antes. Isso a fez se
perguntar se ele havia trocado de lugar com outro demônio. Porém, não poderia haver
muitos demônios que se parecessem com isso.
Com certeza, isso era Jaldabaoth. Essa era a verdadeira forma de Jaldabaoth.
Ele bateu as asas de fogo e chamas queimavam no final de sua longa cauda. Seus braços
musculosos e grotescos também estavam em chamas. Seu rosto perverso tinha uma ex-
pressão de ira.
Jaldabaoth falou com uma voz grave, tão profunda que parecia tremer um abismo den-
tro de seus estômagos. Deu um passo à frente e a massa de Anjos pressionando-se contra
ele foi forçada a recuar.
Ignorava cada ataque que os Anjos faziam, enquanto levantava lentamente as mãos co-
bertas de chamas e depois as cerrava em punhos. Sua forma de fogo se assemelhava a
uma bomba vulcânica incandescente.
Jaldabaoth socou com uma velocidade extraordinária, nem mesmo a treinada visão de
Remedios conseguiu capturar uma única estrutura desse movimento. Apenas aquele
único golpe foi suficiente para exterminar todos os Anjos que estavam formando uma
parede para Remedios.
Remedios engoliu em seco quando testemunhou aquele poder avassalador que poderia
facilmente abater vários Anjos em um único golpe, ela então agarrou o punho de sua
espada sagrada com mais força. Suor minava e parecia que estava fazendo suas roupas
mudarem de cor sob sua armadura.
“—Yeeeeeeeaaart!”
Remedios gritou para banir seu medo. Embora fosse um movimento imprudente, se ela
não fizesse sua investida agora, estaria essencialmente admitindo a derrota para ele em
seu coração. Ela agarrou sua espada sagrada com força e saltou para frente.
Ela usou toda a força de seu corpo em um grande golpe de cima para baixo.
“...Eh?”
A espada, feita de um metal desconhecido que era mais duro que adamantite, bateu na
pele de Jaldabaoth.
Ela olhou para cima e viu que Jaldabaoth não dava bola para ela. Era semelhante a como
um ser humano não se importaria com um verme rastejando pelo chão.
“É irritante lidar com isso de mãos vazias... Vejam só, há uma excelente arma aqui.”
Jaldabaoth deu um passo à frente, sem prestar atenção à Remedios. Seu corpo massivo
a empurrou para o lado.
“O qu—? D-Droga!”
Esse desgraçado não está parando de jeito nenhum, para o que está olhando—
O rosto de Remedios ficou pálido quando ela olhou na direção que Jaldabaoth estava
indo. Calca e Kelart estavam lá.
“Vocês aí, façam alguma coisa! Parem ele! Rápido, parem ele!”
Remedios gritou suas ordens para os paladinos atrás delas. Não tinha como fazem
muita coisa, mas ela não podia deixar que Jaldabaoth chegasse à Calca e Kelart.
Os paladinos e sacerdotes fecharam fileiras diante das duas, formando uma parede. Que
parede pateticamente fraca.
Os paladinos batiam com suas as espadas, os sacerdotes lançavam suas magias, mas
nada do que fizessem sequer impedia Jaldabaoth por um segundo. Ele andou com indi-
ferença, sem dizer uma palavra.
As pessoas que tocaram as chamas ao redor dele gritavam e desabavam no chão, mas
Jaldabaoth não parecia querer atacar.
Jaldabaoth fôra expulso pelos aventureiros do reino. Ela estava no mesmo nível de
aventureiros adamantite, talvez até mais forte. Nesse caso, por que ela não podia fazer
nada que prejudicasse esse demônio?
Tenho que dar um jeito! Preciso encontrar algo! Deve haver um modo de feri-lo!
Ela tinha quase certeza que havia alguma razão para a invencibilidade de Jaldabaoth.
Assim como alguns monstros eram altamente resistentes a todos os metais que não fosse
prata, deve haver algum tipo de habilidade defensiva racial protegendo seu corpo.
Até este ponto, sempre tinham sido seus Vice-Capitães ou Kelart ou Calca dando ordens.
Tudo o que ela tinha que fazer era obedecer. No entanto, todos os três não tinham nada
a dizer agora.
A frustração começou a tomar conta de Remedios, mas ela estava certa sobre uma coisa.
Contanto que as duas escapassem, Jaldabaoth seria impedido de atingir seus objetivos.
As duas pareciam entender isso também, porque se viraram e correram sem hesitar.
Foi o melhor que poderiam fazer. Não havia tempo para ninguém bancar o idiota em
um campo de batalha real. Mesmo se Remedios morresse, enquanto a Rainha, a chefe de
estado, sobrevivesse, ainda haveria esperança. Mesmo se o pior cenário se desenrolasse
e a Rainha Sagrada morresse, contanto que sua irmã ainda estivesse viva e conseguissem
recuperar seu corpo, eles poderiam trazê-la de volta à vida.
De repente, Jaldabaoth sumiu e a espada em sua mão não atingiu nada além de ar.
“QUÊ!?”
Remedios entrou em pânico e olhou em volta, e então um lamento de dor chegou aos
seus ouvidos. O coração de Remedios estremeceu. O som veio da direção para onde ha-
viam fugido.
O poder dos itens mágicos que ela possuía suprimira seu terror, mas sua ansiedade
continuava crescendo. Se sua irmã e seus guardas fossem mortos, então apenas Calca
poderia enfrentar Jaldabaoth. Ela era o pináculo do Reino Sacro; se ela caísse, o país de-
sabaria com ela.
Remedios sempre achara que sua força de braço e a agilidade de pés estavam no auge
da capacidade humana, e era uma fonte silenciosa de orgulho para ela. No entanto, este
momento foi a primeira vez que ela entendeu que não era nada além de falsa vaidade.
Ela só precisa sobreviver a um ataque. Mesmo se ficar ferida, temos muitos sacerdotes
aqui. Ainda há esperança, por favor, não morra.
Remedios dizia isso a si mesma enquanto corria e viu que Jaldabaoth se apoderara de
Calca. Ela não teve o luxo de verificar a segurança de Kelart.
A mão maciça de Jaldabaoth estava fechada em volta das pernas de Calca. Mãos essas
que estavam envoltas em chamas. Ela ouviu algo como carne chiando sob a armadura
aquecida, e seu rosto emoldurado pelo elmo parecia ter ensandecido de dor enquanto
pressionava o maxilar.
Jaldabaoth ia fazer algum tipo de exigência? Tendo tomado uma posição de luta, Reme-
dios viu a si mesma duvidando das palavras que ele disse em seguida.
“—Hã?”
“Desde o momento em que a vi pela primeira vez, senti que serias uma excelente arma.”
Ele levantou o braço, erguendo Calca para sua linha de visão. Jaldabaoth flexionou os
braços. Parecia que ele estava praticando o maneio de uma arma.
Foi então que Remedios percebeu as intenções de Jaldabaoth. Ele pretendia usar a Rai-
nha Sagrada, Calca Bessarez, como uma arma.
Um sorriso cruel apareceu naquele rosto de pura ira, e Jaldabaoth se aproximou dela.
Remedios procurou ajuda e, atrás de Jaldabaoth, viu os sacerdotes que protegiam Calca
e Kelart caírem no chão.
Os sacerdotes estavam imóveis, mas sua irmã ainda estava se movendo levemente. Tal-
vez ela tivesse secretamente lançado alguma magia.
Kelart ainda está viva! Mas quem devo salvar primeiro— tenho que perguntar ao Isandro.
“Retirada!”
“—O quê? Não quereis lutar? Depois de todo meu esforço para obter uma arma com a
qual eu poderei esmagá-los... 「Fireball」.”
Jaldabaoth estendeu a mão que não estava segurando Calca e usou um ataque de 3º
nível. Uma bola de fogo voou e explodiu, imolando os paladinos dentro de sua área de
efeito.
Protegidos por magias de resistência ao fogo, os paladinos por pouco saíram vivos.
Mesmo assim, foi uma magia para qual estavam preparados, não haveria sentido em al-
guém morrer.
O corpo de Jaldabaoth se flexionou levemente quando ele levantou o braço que segu-
rava Calca.
Splat.
Calca não conseguiu se proteger a tempo e seu rosto se espatifou violentamente no chão.
Depois disso, Jaldabaoth levantou lentamente o braço de novo e Calca pendeu frouxa-
mente da mão, tendo perdido a vontade de resistir a ele.
Seu elmo estava aberto. Isso foi para elevar o moral das tropas com sua beleza.
No entanto, aquele lindo rosto agora era uma massa de carne pisada. Parece que a ponte
do nariz foi esmagada, pois a parte do rosto correspondente aquela parte do rosto dela
era uma extensão lisa agora.
“Idiota! Pare!”
Jaldabaoth balançou a arma no paladino, com uma velocidade que não parecia estar
segurando um corpo humano.
Os humanos podem ter peles mais macias do que outras espécies, mas humanos fortes
podem envolver seus corpos em ki ou magia, e se ainda estiverem conscientes, eles po-
dem ser capazes de suportar um golpe sem serem feridos.
Talvez tivesse saído pelo impacto, pois o elmo dela tinha caído e seu longo cabelo ba-
lançava descontroladamente ao vento. Seu rosto de ponta-cabeça era um amálgama de
sangue, o nariz esmagado e os dentes da frente quebrados, os olhos arregalados; ainda
assim, um leve gemido emanava de sua garganta. Sua beleza, considerada um tesouro
nacional, desaparecera sem deixar vestígios. Seu estado atual era muito trágico para ca-
ber em palavras.
“Pra que caralhos você serve, então!? Esse cérebro não serve pra coisas assim!?”
“Eu nunca imaginei que isso pudesse acontecer! Não há nada que possamos fazer além
de recuar!”
“Vejam só. Humanos são realmente desprezíveis, como podem discutir diante do ini-
migo? Bem, os preparativos estão finalizados. Já perdi tempo demais com isso.”
“O quê?”
“Já é hora de meu exército chegar à cidade. Preciso estourar os portões e inaugurar uma
tempestade de carnificina e morte.”
“Não preciso de permissão alguma. Tudo que precisas fazer é aceitar. Digamos que será
um presente celestial.”
Jaldabaoth levantou a mão que não segurava Calca e, então, como se estivesse procu-
rando alguma coisa — apontou para o céu.
“—PARE!!!”
Remedios gritou porque ela não sabia o que ele iria fazer.
No entanto, todos ficaram sem saber o que fazer, como se de mãos atadas. Isso porque
eles não podiam atacar Jaldabaoth, que mantinha a Rainha Sagrada como refém.
Não, todos estavam com medo de que, se o atacassem, ele usaria o corpo de Calca como
escudo. O que fariam se Calca morresse pelos seus golpes?
U Não havia nada de adorável em seu rosto. Não havia nada em sua aparên-
cia que fizesse quem a notasse desejar dar uma olhada a fundo. No entanto,
ela ainda chamava atenção, embora em um sentido negativo.
Seus olhos negros se inclinaram para cima, dando a impressão de que ela estava cons-
tantemente olhando para os outros, enquanto as olheiras faziam as pessoas pensarem
que ela era o tipo de pessoa que andava por aí com criminosos em becos sem saída.
Era útil para andar entre as multidões, mas uma vez que ela chegasse aos portões da
cidade e outros lugares, ela receberia escrutínio e vistorias intensas das autoridades lo-
cais.
Acima dela, o céu estava coberto de nuvens escuras, dando aos observadores a impres-
são errada de que estava quase ao anoitecer quando ainda era dia.
Neia suspirou cansadamente, depois reuniu os sentidos que herdara de seus pais e ca-
minhou em direção à rua que levava à estalagem onde estava hospedada.
A razão pela qual ela tinha que ser tão cautelosa, mesmo em uma cidade, era porque
sentia um forte sentimento de exclusão em relação a si mesma, sendo uma estrangeira,
desde que entrara nessa cidade.
Afinal, quando ela usava um manto com o capuz na cabeça, não havia como saber se era
estrangeira. No entanto, ela não estava enganada sobre a tensão no ar. Ela espiou os
transeuntes e viu que seus rostos estavam abatidos e seus passos pesados. Era como se
vestissem a escuridão do inverno que os circundava.
Em circunstâncias normais, ela poderia ter pensado que era por causa do tempo nu-
blado. No entanto, ela sentia uma sensação de aprisionamento — ou talvez uma inomi-
nável melancolia—pairava aqui, na capital do Reino Re-Estize, deveria ter se originado
de alguma outra fonte.
Talvez seja porque não faz muito tempo que foram derrotados em. Ainda assim, em com-
paração com o povo do Reino Sacro, parece que sorriem de orelha a orelha.
Quanto mais pensava nisso, mais deprimida ficava, assim Neia tateou à cintura em
busca de salvação. A sensação fria do aço subiu pela mão.
Era a espada que carregava, estampada com o brasão da Ordem dos Cavaleiros do Reino
Sacro, que servia como prova de sua identidade.
Somente depois de completar seu treinamento e ser oficialmente nomeada como pala-
dina que sua lâmina de confiança seria encantada com magia. Esse foi um dos rituais
adotados para aqueles que seguiram o caminho de um paladino. Embora fosse pouco
mais que um pedaço afiado de aço até que ela oficialmente se tornasse uma paladina,
ainda era uma arma pessoal que a acompanhara por longos anos de treinamento e prá-
tica. Não se poderia culpá-la pelo desenvolvimento do hábito de a acariciar quando se
sentia desconfortável.
A sensação do aço a acalmou, mesmo que um pouco, e ela exalou uma nuvem de vapor
branco. Então abriu a capa e acelerou o passo.
Seus passos ficavam lentos e arrastados sempre que pensava nas más notícias que es-
tava levando. No entanto, justamente por não gostar da sensação que ela teve que se
mover rapidamente, para pôr um fim nisso o mais rápido possível.
Era uma pousada de alta classe, com preços tão elevados quanto sua reputação. Dizia-
se que estava entre as cinco melhores do Reino.
Enquanto pensava sobre o estado trágico de sua terra natal, o Reino Sacro do Norte, ela
não podia deixar de se sentir culpada por como estava usufruindo de tal luxo enquanto
seus compatriotas estavam sofrendo.
A verdade era que a líder da delegação de embaixadores se opunha a ficar aqui preci-
samente devido ao luxo exacerbado. Ela disse que deveriam reduzir suas despesas nessa
jornada e usar o dinheiro restante em outro lugar.
A lógica do líder assistente fôra irrefutável. Ninguém no grupo protestou contra, exceto
sua líder, que era movida pela emoção e não quis aceitar a proposta, sua teimosia a im-
pedia de aceitar. Contudo, depois de um longo impasse, ela finalmente foi persuadida
por todos os outros membros da delegação a escolher, ainda com relutância, essa pou-
sada.
Todos entendiam que não podiam fazer despesas desnecessárias. A fim de cumprir suas
tarefas o mais rápido possível, até mesmo Neia, uma escudeira, fôra contratada para re-
alizar missões.
O objetivo da visita da delegação ao Reino não era outro senão assegurar ajuda ao Reino
Sacro. Portanto, Neia e os outros membros da delegação estavam circulando pela cidade
tentando marcar consultas com pessoas importantes ou influentes do Reino.
Qualquer um poderia marcar uma consulta, até mesmo uma escudeira. Não houve pro-
blema com essa parte do pensamento da líder.
Mas Neia era a única escudeira entre a delegação, os restantes eram bons paladinos.
Mesmo que ela fizesse uma consulta, o que a outra parte pensaria no futuro, se desco-
brissem que outras pessoas tinham sido visitadas por paladinos, enquanto elas merece-
ram apenas uma simples escudeira?
Isso certamente os deixaria infelizes. Até Neia tinha boa noção disso. No entanto, apesar
de seus protestos indiretos, as ordens dadas a ela não haviam mudado. Como escudeira,
havia pouco que ela pudesse dizer a respeito. Dito isso, Neia não desistiu.
Se fosse um fracasso pessoal, ela poderia aceitá-lo de bom grado. Todavia, isso poderia
levar o Reino Sacro a perder mais ajuda do Reino. Neia não podia descartar a possibili-
dade de que seus fracassos levassem a que mais de seus conterrâneos morressem,
mesmo que dissesse um simples: “Sim, eu entendo”.
Por outro lado, o fato de uma mera escudeira ter imediatamente entrado em ação sem
esperar por ordens só tornara a líder ainda mais infeliz. Ela parecia pensar que tudo era
culpa de Neia. Felizmente, o líder assistente conseguiu acalmar as coisas, mas agora a
líder da delegação tinha uma impressão ruim de Neia.
Neia tinha sido selecionada para essa delegação de embaixadores apenas por causa de
seus sentidos aguçados, que haviam garantido segurança na estrada até aqui. Pedir-lhe
para contribuir de outras formas era exigir demais dela.
Neia deveria se encontrar com um nobre de menor importância —não era alguém do
alto escalão no Reino — então não poder marcar uma consulta com ele não era um
grande revés, mas mesmo assim sua líder reclamaria com ela.
...Geralmente, quando um estranho quer se encontrar com alguém importante com urgên-
cia, é lógico que vão precisar de algum tempo pra saber mais da pessoa e ver se a história
bate. Então, uma reunião urgente só daqui a uma semana no mínimo.
Bem, pelo menos isso não soava como se ela estivesse apenas reclamando da recusa da
outra parte.
De acordo com as instruções da líder, em poucos dias deixaremos a Capital Real... nossa
líder, huh...
Sua líder estava o tempo todo no limite ultimamente. Ela não parecia capaz de controlar
suas emoções adequadamente.
No passado, ela não era assim. Neia sabia muito bem disso. Antigamente ela era uma
pessoa lerda... ou sem noção, se alguém não estivesse inclinado a ser educado. No en-
tanto, desde a batalha em que haviam perdido a Rainha Sagrada, houve uma mudança
dramática em sua personalidade.
Como escudeira, a única coisa que podia fazer com as broncas irracionais de sua líder
era abaixar a cabeça, ficar quieta e aceitá-las.
Mesmo assim, isso não era nada comparado ao que os sobreviventes no Reino Sacro
estavam passando. Tudo o que ela tinha que fazer era manter a cabeça baixa e suportar
a tempestade.
Depois de se preparar para o pior — ou talvez tivesse desistido de resistir — Neia che-
gou à frente da estalagem.
Como era de esperar de uma pousada de alta classe, ela não entrou imediatamente em
uma sala, mas sim em uma pequena sala. Parece que foi projetada para os hóspedes lim-
parem a sujeira de seus calçados.
A portaria ficava bem à frente de onde entrara na sala, enquanto o bar estava à sua
direita e as escadas à sua esquerda. Havia sofás usados para receber convidados perto
destes locais.
Não havia lareiras de aquecimento dentro da sala. No entanto, o fato de que ainda havia
uma diferença de temperatura, apesar de sua ausência, provavelmente se devia a um
item mágico.
Os magic casters no Reino Sacro geralmente eram sacerdotes e, embora pudessem fazer
alguns itens mágicos, poucos deles eram úteis na vida cotidiana. Nesse aspecto, o Reino
Re-Estize era tecnologicamente superior ao Reino Sacro. Sendo esse o caso, e quanto ao
Império? Seu pai havia mencionado uma vez sobre as tecnologias mágicas de lá, quanto
avançado tecnologicamente ele seria?
Embora ela nunca tivesse tido a chance de visitá-lo, Neia ainda nutria uma vaga sensa-
ção de admiração pelo Império.
Tipicamente, uma garota que vivesse em um vilarejo só seria capaz de ver seu vilarejo
ao longo de sua vida. Como Neia carecia de qualidades distintivas como guerreira, ela
poderia passar sua vida inteira servindo sua nação e nunca ter a chance de visitar outros
países.
Nesse caso, a chance de viajar para o exterior, que essa viagem lhe oferecera, era equi-
valente a um tênue raio de sol vazando de uma nuvem sombria.
Considerando a questão das despesas, apenas a líder e o líder assistente deveriam ficar
aqui; os outros membros deveriam ter ficado em hospedarias mais baratas. Contudo,
economizar centavos pode fazer o outro lado pensar que não havia futuro para o Reino
Sacro. No final, o líder assistente conseguiu convencer sua líder dessa dura verdade.
Neia chegou à porta do recinto de seus superiores e deu algumas batidas, logo depois
se abriu ligeiramente. No interior viam-se paladinos em guarda e posicionados no perí-
metro.
Diante dela havia um cômodo grande. Havia uma longa mesa no meio, onde sua Capitã
estava sentada.
Ela deu uma olhada nos documentos empilhados na mesa diante deles. A maioria havia
sido riscado.
“—Como foi?”
“Eu sinto muito. Eles negaram por falta de tempo. Disseram que gostariam de pelo me-
nos duas semanas.”
“Tch...”
O estômago de Neia deu uma fisgada. Ela estava expressando seu descontentamento
em Neia, ou melhor, para os nobres que os rejeitaram? Embora tanto a primeira quanto
a última parecessem prováveis, Neia não ousaria esclarecer um assunto tão cabeludo.
“Que seja. Agradeço por sair em meio a este frio. Volte para o seu quarto e descanse.”
“Sim, senhor!”
Neia reprimiu seu suspiro de alívio com as palavras de Gustav. Com o intenso desejo de
sair imediatamente, Remedios a chamou e ela por sua vez, parou.
“...Eu queria perguntar antes, mas você realmente disse a eles que queríamos abrir as
negociações o mais rápido possível?”
“Então não foi por causa de suas fracas habilidades de negociação, não é?”
“Ah, bem—”
Ela queria dizer, mas quem ousaria retrucar? Além disso, ela já sabia que não seria ca-
paz de escapar dessa reprimenda, independentemente de como respondesse.
“...Capitã. Não são apenas os nobres a quem ela pediu que recusaram. Outros nobres
rejeitaram o pedido de uma reunião do mesmo modo. Entre eles, alguns nobres que in-
dicaram que não podiam ceder ajuda ao Reino Sacro, mas que queriam conversar mesmo
assim.”
Remedios olhou para Gustav, que parecia ter falado para pôr um fim na conversa. Am-
bos ficaram em silêncio, mas a tensão no ar aumentou.
“—Neia Baraja.”
“Sim!”
Ela ainda está desconfiada de mim. Neia tinha mentalmente balançado os ombros em
derrota, mas não expressou isso externamente, em vez disso, respondeu em um tom tí-
mido.
Gustav tinha agora se posicionado entre as duas, mas Remedios não lhe deu atenção e
continuou encarando Neia.
“Enquanto perdendo tempo aqui, nosso povo está sendo abatido pelos demi-humanos
liderados por Jaldabaoth. Além disso, quatro das grandes cidades já caíram, fora as in-
contáveis cidadezinhas e vilarejos.”
A cidade fortaleza de Kalinsha, que era a mais próxima da Muralha, e a primeira a ser
atacada pelos demi-humanos.
Em outras palavras, a maioria das grandes cidades do norte estava agora sob o controle
das hordas demoníacas de Jaldabaoth.
“Sim, senhora!”
Além disso, o que era mais convincente era o fato de ninguém achar que Jaldabaoth,
como um governante demoníaco, concederia qualquer forma de tratamento humano a
seus prisioneiros humanos.
“Agora, sabendo de tudo isso, você ainda volta de mãos vazias? Você realmente tentou
o seu melhor? Normalmente teria algo para mostrar, se realmente tivesse tentado, não?”
Olha quem fala, de que adianta ser Capitã da Ordem Paladina do Reino Sacro se nem con-
segue resgatar esses prisioneiros?
Ela queria muito retrucar com essas palavras. No entanto, como escudeira do Reino
Sacro, ela não poderia dizer tal coisa.
“Já que pede desculpas, o que planeja fazer para se redimir? O que pode fazer para mos-
trar resultados concretos?”
No coração disso, Neia era apenas uma cidadã comum do Reino Sacro. Ela não tinha
status de nobreza, poder ou a riqueza. Ela sequer era paladina, apenas uma escudeira.
Não havia nada que Neia, como pessoa, pudesse oferecer a um nobre do Reino, algo que
pudesse gerar algum apelo para eles. Nesse caso, tudo o que ela podia fazer se resumia
em—
“Estou perguntando como você pretende fazer isso. O esforço inútil é—”
“—Capitã.”
Gustav interrompeu Remedios quando ela estava prestes a dizer alguma coisa.
“Por que não deixar as coisas como estão por enquanto? Afinal, já é hora de começar-
mos nossos preparativos, não? As estimadas aventureiras da Rosa Azul chegarão em
breve. Se demorarmos muito a recebê-las, será um insulto à boa vontade que demons-
traram, não acha?”
“Tem razão. Escudeira Baraja, trabalhe mais e dê o seu melhor da próxima vez.”
“Entendido!”
Remedios fez um movimento de enxotar com as mãos. Em outras palavras, ela estava
dizendo: “Se apresse e dê o fora daqui”.
Mesmo que estivesse cansada disso, Neia estava gritando internamente “Até que enfim!”
enquanto vibrava de alegria quando saiu do cômodo. No entanto, seu aliado de agora se
transformou em seu adversário mais terrível em um piscar de olhos.
Por um momento, as palavras de Gustav fizeram Neia ver tudo desvanecendo. Porém,
ela querendo ou não, esse tema lhe dizia respeito, já que ela era uma escudeira.
Remedios olhou para o ajudante de ordens. Era completamente diferente do jeito que
ela olhou para Neia. Seus olhos estavam tão carinhosos que parecia que ela havia mu-
dado de personalidade em algum momento, e isso deixou Neia confusa.
“O principal motivo para trazê-la conosco foi por ela ter sentidos excepcionais. Talvez
possa haver coisas que só ela possa notar.”
Embora fosse muito inferior em relação ao pai, ela nutria algum orgulho pelo fato de
que seus sentidos eram mais afiados do que aqueles que só tinham sido treinados como
paladinos. Ela estava muito feliz que seus talentos pudessem servir sua nação, mas esse
sentimento estava sendo constantemente desgastado. Agora, ela estava começando a
ressentir-se do fato de que havia sido selecionada.
“...Escudeira Baraja. Como acabamos de dizer, você permanecerá no canto da sala e ou-
virá nossa conversa. Se notar algo anormal, informe-nos. Agora volte para o seu quarto
e se refresque antes de voltar.”
“Entendido!”
Pensou Neia, mas depois Gustav seguiu atrás dela assim quando ela se apressou para
sair. Depois que eles saíram da sala, ele falou baixinho para ela.
Neia parou no meio do caminho, virou-se e então expressou as dúvidas que estivera
abrigando em seu coração durante todo esse tempo.
“...Eu fiz algo pra perturbar a Capitã? Quero dizer, ouvi dizer que a batalha em que per-
demos aquela cidade mudou ela completamente, então o que aconteceu?”
“Sem saber como desabafar a dor e a raiva que sente, a Capitã decidiu descontar em
você. Eu acho que a razão pela qual ela não faz isso conosco foi porque nós lutamos e
sofremos com ela.”
Em outras palavras, tudo isso foi porque Neia não havia participado daquela batalha.
Metade dos colegas de Neia viajaram para a mesma cidade e muitos deles acabaram
morrendo. A razão pela qual Neia não estava naquela metade foi devido à sua sorte, e
não por causa de qualquer escolha que tivesse feito.
“Ouça com atenção; por favor, aguente firme. Na situação que estamos, a Capitã é in-
substituível para o Reino Sacro.”
“...Mesmo se ela ficar com raiva e jogar os problemas dela nas costas dos outros?”
“É.”
Gustav olhou para ela com uma expressão de dor nos olhos.
Neia ficou frustrada, ela queria dizer umas boas verdades na cara dele. Tudo bem que
ela sabia quanto aquela mulher era forte, mas ainda assim, Neia também fez sua parte
para trazê-los em segurança ao Reino. Ela tinha visto os vigias demi-humanos e tinha
sido mais cuidadosa do que qualquer outra pessoa quando acamparam à noite. Neia teve
o papel em guiar a delegação de embaixadores ao seu destino. Sendo esse o caso, Neia
não pensava que fosse menos valiosa do que aquela mulher.
Era preciso suportar isso pelo bem daqueles que sofriam no Reino Sacro. Permitir per-
der qualquer um desses bravos guerreiros prolongaria o sofrimento de inúmeras pes-
soas, e esse seria o curso de ação mais tolo que se possa imaginar.
Quanto tudo isso acabasse, ela estaria livre desse dever quando retornasse para casa.
Assim, tudo o que ela teria que fazer era suportar por mais algum tempo.
♦♦♦
Ela não era uma fã, mas a reputação delas chegava até no Reino Sacro, e isso fez o cora-
ção de Neia vibrar. Eram grandes mulheres que ascenderam a alturas que ela mesma
não conseguia alcançar. Pessoalmente, ela gostaria de fazer todos os tipos de perguntas.
Obviamente, ela não ousaria fazer tal coisa aqui.
Elas são... uma das três equipes de aventureiros adamantites no Reino. A Rosa Azul... elas
são incríveis...!
Mesmo ouvindo suas descrições e nomes através dos rumores, esta foi a primeira vez
que ela as viu em carne e osso. Havia uma grande discrepância entre como ela as imagi-
nava em suas histórias e como realmente eram.
De pé à sua frente estava a líder da Rosa Azul. Uma sacerdotisa que trazia o símbolo
sagrado do Deus da Água, manejadora da espada amaldiçoada, Kilineiram — Lakyus Al-
vein Dale Aindra.
Seus belos traços eram tais que até suas companheiras podiam se apaixonar por ela, e
era difícil acreditar que ela fosse uma aventureira de primeira classe, algo que só os gê-
nios da luta poderiam ser. Se ela usasse um vestido, seria a própria imagem de uma prin-
cesa dos sonhos de uma plebeia como Neia.
Aquela linda mulher falou com uma voz gentil que combinava com a imagem que Neia
tinha pensado.
Remedios, que se levantou para recebê-las, assentiu levemente para expressar sua gra-
tidão.
“Eu não posso agradecer-lhe o suficiente por aceitar o nosso convite, honradas inte-
grantes da Rosa Azul.”
“Nós que estamos gratas por receber um convite da paladina que tem uma espada sa-
grada e que tem habilidades para empunhá-la, Remedios Custodio-sama.”
“Ah, eu sou a única que deveria ser feliz em conhecer a manejadora de uma espada de-
moníaca. Ghrum... Por favor, sentem-se. As pessoas ao nosso redor são todos paladinos
do Reino Sacro. Seria bom se todos pudéssemos ouvir. Erm, se tiver tempo depois disso,
gostaria muito de ver a espada demoníaca que possui.”
As integrantes da Rosa Azul sentaram-se à sua maneira. Algumas delas já haviam cru-
zado os braços e segurado os cotovelos. Isso faria alguém se perguntar se essa atitude
ousada veio de saber do poder que possuíam ou se elas estavam simplesmente agindo
de uma maneira que melhor se encaixava.
“Não, não há necessidade. Notícias de suas façanhas se espalharam pelo Reino Sacro.
Ah, e embora seja um pouco tarde para isso, sou o Vice-Capitão da Ordem Paladina, Gus-
tav Montagnés.”
“Ah—”
“—Sim. Não ouvimos nada além de coisas boas sobre vocês. Na verdade, suas façanhas
heroicas enchem meu coração de fascínio.”
Parece que Remedios queria dizer alguma coisa, mas Gustav a interrompera. Depois
disso, ele sorriu para Lakyus como se não houvesse problema algum.
“Isso é muito agradável. Mesmo que eu deseje perguntar sobre os detalhes que ouviu,
estamos aqui hoje para atender a uma solicitação. Não é nossa intenção desperdiçar o
valioso tempo de nossos clientes. Sendo esse o caso, vamos discutir os detalhes do pe-
dido.”
Provavelmente se tratavam das ladinas gêmeas, conhecidas como Tia e Tina. Apesar de
serem membros da Rosa Azul, que era famosa mesmo no Reino Sacro, não havia rumores
ou contos de seus feitos. Elas eram uma dupla cercada de mistérios.
Ela sentiu como se tivesse sido empurrada para o centro das atenções, saindo das som-
bras para o meio de um palco. Pensamentos como: “Por quê?”, “Como assim?”, “O que está
acontecendo?” e outras frases semelhantes apareciam a todo instante em sua mente.
“Aquela garota não tem o corpo de uma guerreira. Diferente da nossa Massa de Múscu-
los.”
A pessoa que respondeu foi Gagaran, a Guerreira Encantadora, sua constituição era tão
bruta como uma casa de concreto.
“Exatamente o que eu disse... Ela não é uma guerreira, não importa como você olhe para
ela. Agora isto aqui é uma guerreira.”
“Ei ei, dá pra treinar seu corpo com experiência, você sabe muito bem.”
“Hei! É impressão minha, ou você ficou chata desde que foi treinar comigo? Ei!”
“Nada mudou. É só que minhas costelas doem quando você me agarra com sua força
ridícula quando estou dormindo—”
“Não tem problema. O nome dela é Neia Baraja. Ela tem sentidos aguçados, e ela fez
muitas contribuições durante a nossa jornada aqui.”
“Compreendo.”
A resposta foi curta e sem emoção, nem mesmo houve fofura de algum tipo.
“Evileye—”
A magic caster arcana, Evileye. Ela poderia usar magias poderosas, mas nunca removia
sua máscara sob quaisquer circunstâncias. Ela tinha uma estatura muito pequena — al-
guns rumores diziam que ela poderia ser de uma espécie diferente, alguma com pequeno
porte.
“Por mim tudo bem. Eu não levo muito jeito com essas coisas.”
“Capitã...”
“...Hehe~ Bem, a chefe do outro lado deu sua aprovação — e quanto a nossa? Além disso,
depois de pagar a taxa apropriada pela informação, eles serão nossos clientes. Não va-
mos nos preocupar até que a questão do dinheiro venha à tona. Será melhor selar o
acordo o mais cedo possível, não?”
“Haaah...”
“Bem, nossa chefe aceitou, então vamos firmar os detalhes antes de falar sobre o paga-
mento? Acho que deseja falar daquele que está fazendo o que bem entende no seu país.
É o tal do Jaldabaoth?”
“Então já sabia?”
“Ei ei, acha que não saberíamos algo que os nobres sabem? O Reino tem comerciantes
que também usam rotas marítimas, esqueceu? Além disso, as Guildas de Aventureiros
também trocam informações. Mas e então, o que tem a dizer? Quer compartilhar o que
sabe? Francamente, seríamos mais felizes em obter informações do que dinheiro.”
“Mm... talvez, posso ter um momento para discutir isso com o Gustav?”
Evileye acenou para indicar que eles deveriam prosseguir, e então Remedios e Gustav
se levantaram e entraram em um cômodo adjacente — um quarto.
Gagaran apontou para a jarra de água e os copos em volta enquanto se dirigia à Neia.
Ela queria se elogiar por seu tom perfeito e por não deixar sua voz tremer.
Depois que Gagaran serviu água para todas, Remedios e Gustav retornaram.
“Nós pagaremos sua taxa, então pode nos dizer o que sabe?”
Huh~
Pensou. Por alguma razão, Neia teve a sensação de que Remedios, que se queixara da
despesa de ficar em uma pousada, não aprovaria isso. No entanto, Gustav provavelmente
a convenceu. Neia não fazia idéia de como que ele havia conseguido.
“Pode ser. Porém, penso que será mais fácil nós informarmos o que precisa saber se
você contar exatamente qual o estado do Reino Sacro neste momento.”
“Mm. Ei.”
Evileye apontou o queixo para uma das ladinas. Em resposta, ela rapidamente estendeu
a mão e pegou a bolsa, jogando-a de leve para cima e para baixo em sua mão. Então ela
pegou e acenou para Evileye.
“Tudo bem. Então eu, Evileye, explicarei as coisas... como eu disse há pouco, perguntar
por todas as informações que temos sobre Jaldabaoth é um pouco como tentar medir
uma nuvem. Vamos começar falando sobre o que aconteceu aqui. Mas antes disso, quero
ter certeza. O Jaldabaoth que viram se parece com isso aqui?”
Evileye pegou uma caneta e um papel ao lado da mesa e começou a desenhar com mo-
vimentos fluídos. No entanto, a imagem que ela produziu só podia ser considerada como
rabiscos infantis na melhor das intenções.
Remedios estava prestes a dizer: “Não, não é bem assim...” antes de uma das gêmeas
pegar o papel e rasgá-lo ao meio.
Enquanto Evileye estava furiosa, a outra gêmea pegou a caneta e desenhou rapida-
mente em um novo pedaço de papel, então mostrou à Evileye o produto acabado. A ma-
gic caster mascarada murmurou, “Uguu...” em um tom descontente. A verdade era que
era de muito maior qualidade do que seu desenho.
Sua aparência era muito difícil de descrever com palavras. Ele estava vestido com rou-
pas estrangeiras e usava uma máscara estranha. Depois de ver o retrato falado, Reme-
dios cerrou os punhos e rosnou como uma fera selvagem.
“É esse desgraçado.”
Depois de ver isso, as gêmeas e Evileye cessaram suas brigas e olharam para Remedios.
“Então, nós verificamos uma coisa, é a mesma pess— digo, demônio. Bem, se demônios
como esse aparecessem um após o outro, estaríamos com problemas. Agradeçam aos
céus por essas pequenas misericórdias, assim eles dizem. Vejamos—”
Evileye então começou a narrar os eventos que ocorreram na Capital Real, e Neia estre-
meceu em seu coração.
Ela sabia que Jaldabaoth era forte. E ela sabia que o exército de demônios e aquele de-
mônio escamoso existiam, então ela não ficou chocada com eles. Mas o fato de que ha-
viam cinco empregadas demônio que poderiam, cada uma, tomar conta de uma equipe
inteira de aventureiros adamantite, aprofundou seu senso de total desespero.
Eu não acho que alguém tenha visto essas empregadas demônio no Reino Sacro. Então
elas são o trunfo de Jaldabaoth? E pensar que tem esse ás na manga...
A pergunta de Gustav fez com que as aventureiras olhassem uma para a outra, mas no
final ainda foi Evileye quem falou em nome de todas.
“Só para deixar bem claro, esse valor é apenas uma hipótese. Pode ser maior, ou menor,
então espero que tenha isso em mente. Estimamos que a dificuldade desse demônio es-
teja em torno de duzentos.”
“Duzentos...”
Gustav ofegou. Neia quase ofegou também, mas conseguiu resistir a esse impulso. Al-
guns dos paladinos que ladeavam as paredes não tiveram tanto sucesso. Remedios foi a
única a permanecer calma, sua expressão estava inalterada.
“A dificuldade de duzentos nunca apareceu nesse mundo antes... bem, os Dragões anti-
gos seriam cerca de cem.”
“Um Dragão antigo... eu nunca lutei com um assim, isso seria o mesmo que a Deidade
Guardiã dos oceanos?”
[Dragão M a r i n h o ]
A Deidade Guardiã do oceano referia-se a um Sea Dragon — uma subespécie de Dragão
— que habitava o oceano.
Tinha dois braços e pés e uma cauda longa e grossa que substituía às asas atrofiadas.
Parecia mais uma serpente do que um Dragão, e seu intelecto estava no mesmo nível ou
superior ao da humanidade. Era um ser bastante benevolente que protegeria navios se
fosse devidamente venerado.
Neia teve a sorte de vê-lo uma vez, ao longe, quando eles tinham ido à Rimun de férias.
Ele havia levantado a cabeça bem acima da superfície dos mares, era uma visão majes-
tosa o suficiente para ganhar o título de Deidade Guardiã. Era difícil imaginar que um ser
humano pudesse derrotar dita criatura.
“Capitã Remedios. Se nós usarmos a Deidade Guardiã como base... hm, se houvesse um
pescador aqui ele estaria olhando com desaprovação para nós. Ainda assim, isso signi-
fica que ele é duas vezes mais forte que um Dragão antigo.”
“De fato. Nós determinamos que ele é mais forte do que os lendários Deuses Demônios
que foram derrotados pelos Treze Heróis. Ou seja, sua aparição no mundo humano seria
uma grande tragédia e várias nações serão destruídas. Isso é o quão poderoso ele é.”
“Embora eu saiba que, quando Jaldabaoth estava causando estragos no Reino, ele foi
expulso por Momon-dono. Isso significa que o Momon-dono deve ser tão poderoso
quanto, não?”
“Ou significa que — ele usou algum tipo de item especial ao derrotar o Jaldabaoth?”
“Eu não acho que ele usou qualquer item desse tipo. No entanto, Momon-sama lutou
magnificamente quando duelou com Jaldabaoth. Eu estava lutando contra as subordina-
das de Jaldabaoth naquela época, então não vi a luta completa, mas foi uma batalha sem
igual. Uma batalha travada por um herói entre os heróis, um campeão entre os campe-
ões.”
“É, é mesmo?”
Tudo o que Gustav pôde fazer foi espremer essas palavras de sua boca depois de ser
esmagado pela presença de Evileye enquanto ela vagava entre a fantasia e realidade.
“Então ele lutou com o Jaldabaoth — aquele monstro — e o expulsou? Isso é verdade?”
“O quê? Está insinuando que, o que eu vi com meus próprios olhos foi uma mentira?”
Evileye respondeu à pergunta de Remedios com rispidez. Gustav lutou para banir a in-
quietação no ar.
“Ah, não, o que nossa Capitã queria dizer é se a Escuridão pôde atacar algum ponto fraco
de Jaldabaoth, talvez pudéssemos fazer algo assim também. Peço desculpas por isso não
ter ficado claro.”
“Não, nós que devemos pedir desculpas pelo tom imaturo que nossa Evileye está to-
mando com uma cliente.”
Essa resposta veio de Lakyus. Basicamente, quando dois lados estavam em atrito, os
outros entravam em cena para suavizar as coisas.
“Hm... bem, assumindo que Jaldabaoth realmente tenha algum ponto fraco, Momon-
sama deve ter descoberto ao atacá-lo. Ainda assim, é difícil imaginar que um demônio
daquele porte deixaria suas fraquezas desprotegidas.”
“Tem razão... talvez ele tenha usado um item ou um subordinado para compensar isso.”
Mesmo esta sendo a primeira vez que ela tinha ouvido falar das empregadas demônio,
Jaldabaoth já tinha mostrado poderosos demônios vassalos.
Depois de questionar os demi-humanos cativos, eles sabiam que havia pelo menos três
deles.
“Então, você pode nos dizer em detalhes sobre o demônio escamoso que mencionou
anteriormente?”
“Sim, eu lutei com um, então vou tomar o lugar de Evileye e descrevê-lo em detalhes.”
Ela descreveu suas habilidades e como lutaram contra ele. O conto de Lakyus terminou
com Brain Unglaus — um homem no nível de Gazef — matando esse demônio.
“...Isso é estranho. Jaldabaoth não fez nenhum movimento depois de conquistar a capi-
tal do Reino Sacro, mas esse demônio escamoso está comandando os exércitos demi-
humanos em seu lugar. Ele foi mesmo derrotado?”
“Estranho... mas conhecemos relativamente bem o Brain, e eu não acho que ele estava
mentindo. Provavelmente não é um demônio único, apenas um de alto nível.”
“Ou seja, Jaldabaoth pode invocar esse demônio quantas vezes quiser desde que certas
condições sejam feitas? Ou talvez ele possa convocar o mesmo demônio várias vezes?”
Neia não podia lançar magias, mas tinha ouvido isso durante seus estudos.
Em outras palavras, quando uma magia de invocação estava ativa, conjurar outra magia
do mesmo tipo faria com que a anterior terminasse. Os monstros invocados atualmente
retornariam de onde vieram e novos monstros seriam convocados em seu lugar.
“É meio confuso. O método de invocar demônios que ele usa ainda é um mistério.
Mesmo que pareça que ele estava convocando-os com magias, ele não poderia ter con-
vocado vários demônios tão poderosos assim... Mas supondo que pode, por que ele não
fez isso no Reino? Talvez se ele seja um magic caster que se especializou em invocações,
assim, ele poderia simultaneamente convocar várias cópias de tal criatura...”
“É o que parece. Mas isso se refere à situação em que Jaldabaoth os invoca com magia.
Se ele usasse algum tipo de habilidade especial para fazer isso, seria outro assunto com-
pletamente diferente.”
“Não, esclareça as coisas agora. Só essa última parte que eu não consegui acompanhar.”
“Agora que comentou, aquela empregada inseto asquerosa foi uma das convocações do
Jaldabaoth também?”
Todos se viraram para olhar para Neia depois que ela falou nervosamente, e a tremenda
pressão a fez se arrepender de fazê-lo. Talvez fosse melhor que alguém que não seja ela
trouxesse esse assunto. No entanto, a sorte tinha sido lançada, e depois de firmar sua
determinação, ela perguntou:
“Esta pode ser uma questão muito básica, mas de onde vem esse Jaldabaoth? O nome
de Jaldabaoth é conhecido desde os dias imemoriais?”
“Ninguém sabe. Fomos atrás de todo o tipo de literatura, mas não conseguimos encon-
trar esse nome em nenhuma delas. Também tentamos procurar pistas com base em sua
aparência, mas da mesma forma, também não conseguimos avanço algum.”
“Poderia ser um pseudônimo? Talvez ele tenha causado problemas com um nome dife-
rente no passado?”
Neia não sabia quase nada sobre demônios e Anjos, mas se uma magic caster adaman-
tite disse isso, então deveria ser verdade.
“Quanto às suas origens, se ele viesse do outro lado do continente, seria natural que não
houvesse nenhuma informação a respeito... mas depois de pensar muito, todas as possi-
bilidades parecem igualmente prováveis, e por isso não há como saber onde se originou.”
“Ho...”
“Com muito custo conseguimos pressionar Jaldabaoth nessa forma, mas logo depois,
ele revelou sua verdadeira forma...”
“Sim, não tenho objeções. Se pudermos aprender mais sobre ele a partir de sua aparên-
cia, esconder essa informação seria prejudicial.”
“Ainda não decidimos. Em todo caso, significa que não sabe nada sobre essa forma dele?”
“Compreendo. Então, assim que tomarmos nossa decisão, entraremos em contato ime-
diatamente.”
“Mas nesse caso, teremos que considerar o pior cenário possível — a possibilidade de
que a aparição no Reino tenha tido a intenção de criar uma falsa impressão, então ele
deliberadamente se absteve de mostrar seu verdadeiro poder.”
“Podemos concluir que o nosso país era o verdadeiro objetivo, e seus planos para o
Reino Re-Estize são outros?”
“Possivelmente. Se o Reino fosse sua principal prioridade, ele teria mostrado sua ver-
dadeira forma como fez no Reino Sacro, não? Ou será porque ele se assustou tanto com
a força do Momon-sama e escolheu proteger sua verdadeira identidade em vez de deixar
seu plano ser arruinado? Eu realmente não quero pensar que seja isso.”
As palavras de Evileye deixaram a sala em um silêncio sepulcral, tão profundo que até
os sons fracos da respiração pareciam altos. Quem falaria primeiro? Nesse clima tenso,
Lakyus provou sua bravura.
“Então, vamos deixar isso claro — estamos no mesmo barco que vocês. Queremos saber
mais sobre Jaldabaoth. E para ser honesta, tudo o que aprendemos é basicamente uma
análise do nosso encontro com ele. Não temos idéia dos objetivos, da verdadeira identi-
dade ou das habilidades desse demônio.”
“Talvez possamos convocar demônios para aprender sobre Jaldabaoth... Mas fazer isso
pode manchar a alma... E mesmo que convoquemos demônios de baixo nível, é bem pro-
vável que eles não saibam nada sobre demônios de alto nível. Se for assim, precisaremos
entrar em contato com um adepto em invocações...”
Evileye foi a primeira a complementar as palavras de Lakyus, seguido por uma das gê-
meas.
Pensou Neia.
Claro, pode haver alguns especialistas no campo que se esconderam nas sombras, mas
eles normalmente ficavam isolados e sem contato com o mundo exterior.
“Ficar sentada esperando a morte é frustrante pra caralho. Na próxima vez que esse
monstro vier ao Reino, quero socar aquela fuça arrogante com minhas próprias mãos.
Só que pra fazer isso, preciso saber o máximo possível dele.”
“Além disso, ele não estava liderando nenhum demi-humano no Reino. Se ele recrutou
os demi-humanos devido ao seu fracasso aqui, então precisamos ser ainda mais caute-
losas com ele.”
Essas palavras foram ditas por Gagaran e seguida pela outra gêmea.
“Pagaremos uma quantia igual às taxas que receberíamos por informações desse tipo.”
“Que seria? Mesmo estando disposta a atender seus desejos, não podemos fazer tudo...
No entanto, se quiser fazer contato com nobres de grande poder, isso pode ser providen-
ciado.”
“Mesmo? Agradeço imensamente. Mas não estávamos pensando nisso — poderia vir ao
nosso país e lutar ao nosso lado?”
A sala ficou em silêncio mais uma vez. Durou vários segundos — não, talvez fosse mais
longo. O próximo som que ouviram foi o de Lakyus encostando na cadeira.
Evileye deu de ombros, como se dissesse que não havia nada que pudesse ser feito a
respeito.
“Jamais pediríamos que lutasse contra o Jaldabaoth. Tudo o que precisa fazer é esperar
na retaguarda e ajudar com magia de cura.”
Ela estava correta. A metade norte do Reino Sacro estava agora subjugada pelos
Beastmen de Jaldabaoth, e tudo o que podiam fazer era montar uma fraca resistência.
Muitas das pessoas tinham sido encarceradas em campos, e os paladinos sobreviventes
estavam escondidos em cavernas como soldados derrotados.
Eles ainda mantinham o sul, onde as forças do Exército e Jaldabaoth estavam derro-
tando aos poucos, então dizer que eles estavam à beira da extinção pode ser preciso.
Para Neia, que sabia o que estava acontecendo, as palavras de Gustav soavam mais
como mentiras do que a verdade.
“Me recuso.”
Remedios sentou-se para fazer sua pergunta, e Evileye rejeitou categoricamente. Dada
a maneira como todas da Rosa Azul permaneciam em silêncio, ela definitivamente não
estava sozinha em sua opinião. Todas devem se sentir da mesma maneira.
“...Sendo franco com vocês... nós poderíamos tê-los parado em cima da hora, mas esta-
mos sem saída. O Reino Sacro está em ruínas, mas as tropas do sul ainda estão intactas.
Porém, eles sozinhos não serão suficientes para derrotar Jaldabaoth.”
“A razão pela qual ainda não fomos completamente conquistados, é porque a nossa Ma-
rinha tem imobilizado o exército de Jaldabaoth no litoral norte, mantendo-os longe. Se
Jaldabaoth conseguir descobrir alguma maneira de lidar com isso e avançar suas tropas
para o sul, eles não serão capazes de oferecer a menor resistência.”
Embora parte da razão para isso tenha sido porque eles não compartilharam suas in-
formações de inteligência, também foi devido à antiga rixa entre o norte e o sul.
Desde o início, muitos dos nobres do sul sempre protestaram contra o fato de uma mu-
lher — pulando à frente de seu irmão mais velho na linha de sucessão — ser coroada
como Rainha Sagrada pela primeira vez na história.
Por essa razão, a fim de evitar uma divisão entre o norte e o sul, a ex-Rainha Sagrada
ignorou alegações infundadas de: “A Rainha Sagrada assumiu esta posição porque teve
alguma tramoia com os templos, pois foi secretamente ajudada por Kelart Custodio.”.
Depois disso, o sul deixou de protestar com questões desse tipo e assim conseguiu evi-
tar um confronto em grande escala, mas isso ocorreu apenas porque o norte e o sul es-
tavam em um equilíbrio de poder. Agora que o norte estava em ruínas, o sul não tinha
mais nenhum motivo para se conter. Assim, o sul começou a desprezar o norte.
Mesmo em face da invasão de Jaldabaoth, os humanos ainda nutriam esses tipos de res-
sentimentos. Neia simplesmente achava risível essa rinha. Além disso, houve rumores
de uma luta pela posição de ser o próximo Rei Sagrado, e isso só serviu para deixar Neia,
uma plebeia, ainda mais decepcionada.
“Exato. A Marinha tem poucos recursos contra os demônios alados, e suas batalhas im-
põem uma terrível peagem de recursos. Se isso continuar, não conseguirão segurar o
exército de Jaldabaoth para sempre. Precisamos de mais força para superar essa situa-
ção! Por favor, eu imploro, empreste sua força a nós! Tudo o que precisamos é de um
mês ou dois! Podemos pagar o valor que pedir! Eu lhe imploro, por favor salve o Reino
Sacro.”
Quando Gustav inclinou a cabeça para elas, Neia e os outros paladinos disseram “Por
favor!” E fizeram uma reverência também.
A sala ficou em silêncio mais uma vez, e então a voz de Lakyus se espalhou.
“Por favor, levantem a cabeça. E sinto muito, mas não podemos ir ao Reino Sacro.”
“POR QUÊ!?”
Neia levantou a cabeça com o grito repentino de Remedios. Ela viu Remedios se levan-
tar da cadeira e encarar Lakyus.
“Já que entende, por que não quer nos ajudar!? E não é só você, o mesmo vale para os
nobres desse país e do nosso país! Nenhum de vocês entende! Não é hora de se unir e
lutar como um!?”
“...A razão pela qual os nobres não lhe emprestam sua força é um pouco diferente da
nossa. O que sabe sobre o Reino Feiticeiro?”
Era um lugar assustador governado pelos undeads, uma cidade tirada do Reino e usada
como o coração de uma nação. Isso foi tudo que um cidadão comum do Reino Sacro sabia.
Quando Remedios disse algo similar, Lakyus sorriu amargamente para ela.
“Isso é verdade, e é muito preciso... mas está errado em algumas partes... É verdade que
os undeads estão em toda parte, mas lá os humanos vivem vidas seguras e pacíficas.”
“Existem muitos tipos, e o Rei Feiticeiro é O governante dos undeads. Ordenar os unde-
ads sob o seu comando para não prejudicar os seres humanos e fazer cumprir essa or-
dem é uma questão simples para ele.”
“Evileye... Mm, em todo caso, nós ainda temos o Reino Feiticeiro diante de nossos olhos
para lidar, então por isso ficam receosos de ajudarem o seu país. Além disso, perdemos
muitas pessoas durante a batalha com o Reino Feiticeiro, o que terá graves consequên-
cias no futuro. Os nobres que parecem bem-sucedidos à primeira vista, dificilmente es-
tão tão bem quanto pensa.”
“Mesmo assim, não é Jaldabaoth um problema que deve ser resolvido o mais rápido
possível? O fato é que inúmeras pessoas estão sofrendo por causa de Jaldabaoth. E esse
Feiticeiro seja lá o que, ainda não prejudicou ninguém, não é mesmo?”
“...Lutar em dois frontes de uma só vez, ainda mais exaurido, é muito perigoso. Eu confio
que eu não preciso lhe dizer isso, certo?”
“Além disso, é o mesmo conosco. Duas de nós foram mortas em combate com Jaldaba-
oth e, embora tenham sido ressuscitadas, ainda não recuperaram toda a força. Se inva-
dirmos o território de Jaldabaoth nesse estado, todas poderemos ser mortas.”
“Até parece que tudo sempre sai como dito, ela realmente acredita que—”
“Tia! Se contenha. Ghrum.. Eu sinto muito, mas eu não acho que as coisas vão acabar
como imagina. Enquanto envolver o risco de enfrentar Jaldabaoth, recusaremos esse tra-
balho. Precisamos nos tornar mais fortes do que somos agora e nos prepararmos para o
futuro... Isso é apenas uma hipótese, mas precisamos nos preparar para o caso de Jal-
dabaoth decidir atacar o Reino novamente.”
Os rostos de todas da Rosa Azul estavam indiferentes. Parece que elas não poderiam
ser influenciadas.
Respondeu Evileye.
“Ou melhor, procurar ele deveria ser a primeira coisa que deveriam ter feito, não?”
“...Quem?”
“Você já ouviu falar, não é? Sim, Momon-sama está agora no Reino Feiticeiro e é um dos
subordinados do Rei Feiticeiro. Portanto, você provavelmente terá que convencer o Rei
Feiticeiro a ajudá-los.”
“Grh!”
Neia entendeu como ela se sentia. Qualquer cidadão do Reino Sacro teria sentimentos
muito complexos sobre pedir algo a qualquer um daquela laia.
“...Se essa é a melhor maneira de derrotar Jaldabaoth, então vamos fazer isso. Ou melhor,
é tudo que podemos fazer. Se pudermos, vamos depositar nossas esperanças nesse Mo-
mon—”
“Er, sim! Você pode, por favor, escrever uma carta nos apresentando ao Momon-sama?”
Parte 2
Depois que a conversa com a Rosa Azul terminara, a delegação diplomática do Reino
Sacro, à qual Neia pertencia, fez uma partida antecipada da Capital Real. Isso porque já
tinham visto que ninguém no Reino estava disposto a ajudar o Reino Sacro, pesquisar a
verdadeira forma de Jaldabaoth demandaria vários meses, e também porque eles sabiam
que o único capaz de derrotar Jaldabaoth era Momon.
Além disso, pensar no sofrimento dos cidadãos do Reino Sacro os deixou ansiosos em
conseguir fazer algo por eles.
Eles deixavam seus cavalos descansar o mínimo possível, às vezes até lançando magias
neles, e viajavam para o leste ao longo das estradas a velocidades que viajantes comuns
não podiam igualar.
Eles passaram pelo vilarejo final do Reino, agora estavam na zona intermediária entre
o Reino e o Reino Feiticeiro.
As colinas suavemente altas bloqueavam as linhas de visão dos viajantes, e podiam vis-
lumbrar ocasionalmente uma floresta primitiva bem densa. Parecia que um monstro po-
deria dar as caras a qualquer momento. Originalmente tinha sido território do Reino,
então chance de serem atacados por monstros era bem menor. Mas não significava que
havia desaparecido completamente.
Em um terreno como esse, o senso de visão e o olfato de Neia se aguçaram e ela seguiu
em frente.
Não há sinal de criaturas fazendo emboscadas por aqui. Nenhum rastro de carnívoros de
grande porte perto da estrada também.
Não era que ela se ressentisse dos calos vindos de seus treinos com afinco. Foi simples-
mente o desgosto por sua falta de talento.
Ela poderia ter herdado os sentidos aguçados de seu pai, mas, infelizmente, ela não re-
cebera nada de sua mãe.
A mãe de Neia era uma paladina famosa no seu tempo e possuía excelentes habilidades
com a espada. No entanto, sendo filha dessa mulher, Neia não tinha talento para a espada,
não importava o quanto praticasse. Estritamente falando, as técnicas do arco transmiti-
das pelo pai significavam que ela podia usar os arcos habilmente, mesmo sem treina-
mento.
Vendo por um lado otimista, o fato era que Neia teve a sorte de herdar a metade de sua
herança genética. No entanto, as habilidades usadas pelos paladinos, que Neia admirava,
só podiam ser usadas com armas brancas. Para Neia, que queria se tornar uma paladina,
ser talentosa com armas de longo alcance era um desperdício.
Ela endireitou a cintura e ajustou sua posição na sela. Ela havia passado muito tempo a
cavalo depois de deixar a Capital Real, e sua bunda e coxas estavam bastante doloridas
agora.
Ela poderia ter pedido aos Paladinos que usassem magia de cura de baixo nível para
ficar livre da dor. No entanto, ela era uma menina e estava um pouco envergonhada de
pedir uma coisa dessas. Além disso, ainda não estava em um nível em que afetaria sua
capacidade de manejar as rédeas, o que tornava ainda mais difícil pedir.
...Vou aplicar umas ervas depois, como de costume. Preciso agradecer ao papai por isso.
No passado, quando eu disse que minha bunda doía, ele veio correndo fazendo aquela cara
de mal dele... Eu o agradeci? ...Hah.
“Então, vamos cavalgar até o Reino Feiticeiro? Ou vamos montar acampamento à noite?”
“Se não ocorrerem imprevistos, acho que conseguiremos chegar antes do pôr do sol.
Mas podemos ser surpreendidos por uma força invasora. O que devemos fazer?”
Remedios puxou as rédeas e seu cavalo desacelerou, e então ela começou a falar com
Gustav.
Bem, daqui em diante deve ser o domínio do Reino Feiticeiro... mas onde estão suas tropas?
E cadê as fortalezas? Havia fortalezas do lado do Reino...
Normalmente, haveria fortes nas fronteiras de um país, mas não havia nenhum aqui.
Como o Reino Feiticeiro era apenas uma cidade, eles concentraram todas as suas forças
na cidade?
A suave encosta corria entre as colinas. Ao longe, ela podia ver um pedaço de floresta
sem folhas devido ao inverno.
As palavras que seu pai havia murmurado casualmente laceraram seu coração como
um espinho.
Seu pai havia escolhido morar na cidade por causa de sua mãe. Sem sua mãe em sua
vida, ele teria escolhido ficar em um vilarejozinho perto da floresta, vivendo da genero-
sidade da natureza.
Quando ainda era criança, ela sentia que viver em um ambiente natural era uma chatice.
No entanto, depois de fazer essa jornada, ela pôde entender o que seu pai quis dizer. Isso
foi um sinal de maturidade? Ela deveria ser capaz de falar sobre coisas diferentes com
seus pais agora.
—Será um incêndio!?
Havia um objeto parecido com fumaça branca lá. Não, não era fumaça, mas sim neblina.
E—
“E daí?”
Depois Neia relatou para a retaguarda, Remedios tirou o elmo. Havia um olhar confuso
no rosto.
“Sim. De acordo com o mapa, não há grandes lagos ao redor, mas há um grande bloco
de neblina à frente. Tenho certeza que deve ser uma ocorrência anormal.”
O bloco de névoa espessa e leitosa parecia se espalhar mais e mais, e parecia que che-
garia à Neia e aos outros a qualquer momento.
Seu pai a havia ensinado sobre todos os tipos de fenômenos naturais, e quando ela pon-
derou a situação com base nesse conhecimento, a aparência dessa neblina era realmente
muito estranha.
Essa pergunta veio de Gustav, que havia percebido o que estava acontecendo antes de
Remedios.
Em outras palavras, ele estava perguntando se esse nevoeiro era uma daquelas miste-
riosas ocorrências. Todavia, Neia não havia reunido qualquer informação sobre essas
“Minhas mais sinceras desculpas, mas não tenho informações a respeito desse nevoeiro
adiante.”
Outra questão difícil. Quem poderia dizer que eles coletaram informações suficientes?
A névoa estava ficando espessa o suficiente para que os cavalos não pudessem avançar
através dela. Dado o que aprenderam antes, não havia penhascos perto de E-Rantel. Se
avançassem devagar, deveriam poder lidar com o que surgisse. Contudo, esse nevoeiro
rapidamente fez com que hesitassem em atravessá-lo, por mais devagar que viajassem.
Cheirava a vapor de água e nada mais. Não havia nada sobre isso que a incomodasse.
No entanto, isso foi exatamente o que a incomodou.
“Capitã, esse nevoeiro pode ter sido gerado por um monstro? Meu pai disse uma vez
que alguns monstros tinham a capacidade mágica de gerar neblina, assim, se escondiam
nela para perseguir suas presas.”
“...Atenção homens, saquem suas lâminas! Quem ainda estiver na estrada, saia imedia-
tamente!”
Neia e os Paladinos moveram seus cavalos como indicado e saíram da estrada, ficando
apenas nas periferias. A essa altura dos eventos, a névoa espessa parecia engolir o
mundo inteiro.
Era espessa o suficiente para que ela mal pudesse distinguir seus companheiros ao seu
lado, e a visibilidade era zero além de 15 metros. Mal-estar ferveu em seu peito, e ela
imaginou que viu espectros no movimento das correntes de ar do nevoeiro.
Seria bom se ela pudesse determinar o que estava se aproximando deles pelo som, mas
estava cercada por cavaleiros totalmente protegidos. Cada movimento fazia com que o
metal de suas armaduras farfalhasse, e isso dificultava a audição de Neia. Sob essas con-
Quando ela percebeu a grandeza de seu pai mais uma vez, ela desesperadamente levan-
tou os ouvidos para ouvir.
“Essa neblina é muito estranha; não fica tão denso assim nem no mar.”
“Estamos prestes a chegar à cidade do Reino Feiticeiro, não? Ainda existem monstros
tão próximos dos limites da cidade? Ou essas bizarrices acontecem precisamente porque
estamos chegando perto?”
“Eu não sei... será algum tipo de magia defensiva que utilizam?”
“...Vamos deixar a magia fora disso, ou minha cabeça vai começar a doer. Se ver alguma
coisa me avise e de modo que fique fácil de entender. Se for um monstro, vamos matá-lo
para que o Rei Feiticeiro nos deva um favor quando pedirmos a ele para enviar o Momon.
Que tal?”
“E como acha que isso vai acabar? Dizem que limpar monstros dentro das fronteiras de
um país é da responsabilidade do país...”
Talvez tenha sido porque tinha concentrado todas as suas energias em ouvir atenta-
mente, que a conversa entre a Capitã e Gustav era ouvida como se estivessem ao seu lado.
Ainda assim, ela não estava confiante de que poderia fazer esse feito se estivesse mais
longe. O que seu pai faria nessa situação?
Eu não posso confiar em alguém que não está aqui! Preciso andar com minhas próprias
pernas!
Entretanto, permaneceu o fato de que ficar aqui só limitaria suas habilidades. Nesse
caso, ela deveria perguntar se poderia se afastar sozinha para verificar a situação?
Já estava claro para ela que Remedios não ia muito com sua cara. Se ela pedisse e fa-
lhasse, não havia como dizer como seria punida. Seria melhor evitar causar mais proble-
mas para si mesma.
Além disso, seria ruim se a Capitã deixasse de confiar na minha orientação por causa disso.
Neia se esforçou para tentar se convencer. No entanto, seria muito ruim para sua saúde
mental se eles corressem perigo por algo que ela poderia ter evitado.
Só então, Neia viu algo pelo canto do olho, algo que ela não poderia deixar passar des-
percebido.
Em meio ao denso nevoeiro, ela vislumbrou o contorno sombrio de algo enorme vindo
do Reino Feiticeiro.
“...Eu não vejo nada. Sinto muito, mas o nevoeiro é muito espesso e não consigo ver nada.
Tem alguma coisa lá?”
Ela ouviu o paladino tatear sua cintura e puxar a espada com fluidez, então o som dele
segurando firmemente o punho da espada.
“Ah, não é nada. Pensei ter visto algo, talvez seja apenas engano.”
“Mesmo? Bem, se acha que há algo lá, tem que nos avisar, mesmo se não for nada.”
Depois de agradecer-lhe com uma expressão sincera no rosto, Neia se virou para a
frente. Se alguém dividisse as mulheres do mundo entre aquelas que eram adequadas
para sorrir e aquelas que não deveriam sorrir, Neia cairia na última categoria. Até
mesmo uma palavra de agradecimento vindo dela seria melhor entregue com uma ex-
pressão séria do que com um sorriso.
Neia continuou estudando atentamente o bloco de nevoa. Era possível que só Neia pu-
desse ver pois todos estavam muito longe, mas ela tinha certeza de que não se enganara.
Talvez sua interação com o paladino tenha restaurado seu ânimo, mas Neia decidiu di-
zer algo a Capitã. Todavia, ela ainda estava conversando com Gustav.
“É muito perigoso avançar nesse nevoeiro. Vamos esperar um pouco mais e se não hou-
ver nada vamos desmontar e descansar. Por falar nisso, existem monstros emissores de
neblina no mar?”
“Ela não cometeria um erro desses. Temos que dar a ela os devidos créditos, ela nos
trouxe com segurança até aqui, não é? Quando estávamos saindo do Reino Sacro, os
demi-humanos patrulhando perto da Muralha quebrada também não nos localizaram.
Sem ela não teríamos conseguido, não é?”
Lembranças vieram em sua mente, de como ela pedira que ficassem para trás enquanto
ela explorava sozinha em meio à chuva congelante, rastejando no chão e ficando toda
enlameada, a fim de evitar ser notada por habilidades de emboscada de rangers.
Por ser a única vanguarda, caso fosse vista, Neia seria morta. Não havia dúvidas quanto
a isso. Mesmo assim, Neia tinha continuado com a determinação de uma morte certa,
agarrando-se à crença de que estava fazendo isso para salvar seus compatriotas em so-
frimento.
É isso aí, não estou dando tudo de mim porque quero que alguém me elogie ou algo assim.
Ela tentou o seu melhor para se convencer. Mesmo que a Capitã se recusasse a reconhe-
cer suas contribuições, os outros certamente aprovariam seus esforços, mesmo que não
o dissessem.
Querer ser elogiada ou recompensada por trabalhar é coisa de crianças. Isto é o que sig-
nifica ser um escudo da humanidade. Reprimir emoções, transformar-se num escudo, tudo
para afastar a dor e o sofrimento das pessoas, isso é o dever de uma paladina. Tenho cer-
teza que a Capitã pensa assim também. Ainda assim... ela poderia falar mais baixo, não?
Não, talvez os dois pensem que já estão falando baixo.
Pessoalmente, Neia acreditava que eles não deviam se perder tanto no bate-papo, mas
sim ficar de olho nos arredores. Especialmente Remedios, cujo senso de perigo e habili-
dade de luta a classificavam como a mais capaz de responder a um ataque.
Ela anulou a frustração em seu coração e se concentrou no vulto que havia visto. Parte
disso foi porque ainda não havia reunido a força necessária para interrompê-los, e tam-
bém porque não queria continuar ouvindo a conversa.
De fato, Neia havia discernido a verdadeira natureza da sombra; um navio que flutuava
no mar.
Além disso, era um grande navio, semelhante a uma galeaça. Foi uma coisa momentâ-
nea, e prontamente velada novamente pela forte neblina, de modo que nem ela tinha
certeza de ter visto um navio.
É claro que tal coisa não era possível pelo bom senso.
E dado às informações que ela possuía a respeito das redondezas, o próprio Gustav já
havia dito que não havia lagos nas proximidades. Não, mesmo que houvesse, apenas um
louco navegaria com uma galeaça em um lago.
Se esta fosse uma região costeira, seria possível que alguém tivesse usado um antigo
navio como fortaleza ou movido para terra seca para algum outro propósito. De fato,
havia vários exemplos de tais coisas no Reino Sacro. No entanto, fazer isso longe de lagos
ou oceanos era impossível.
Ainda assim, seus olhos se recusaram a olhar para outras locações, ela ficou exami-
nando repetidas vezes.
Neia guinchou um “Eeh!?” em resposta à pergunta do cavaleiro que ela havia conver-
sado antes.
“Você está olhando muito nessa direção, então viu alguma coisa lá, certo?”
Eu vi uma sombra que parecia um navio. Se realmente dissesse isso, eles provavelmente
pensariam que ela era louca. Certamente Neia pareceria uma. Nesse caso, o que ela de-
veria dizer?
“Mesmo que seja um engano, poderia confirmar se viu alguma coisa? Vai ajudar se algo
acontecer por lá.”
Ela espiou de um lado para o outro. Todo mundo estava ouvindo a conversa de Neia
com o paladino, e todos olhavam em sua direção. Já que era assim, ela não poderia sim-
plesmente blefar ao dizer “Oh, eu estava enganada”.
“Não, não é bem assim. Tive a sensação de que vi uma construção ou algo parecido.”
“...Tem certeza?”
“Não muita. Apenas me pareceu ser. É bem provável que seja um engano.”
“Eu não tenho certeza. No entanto, o fato é que não vimos nenhuma fortificação do
Reino Feiticeiro perto das estradas, ou perto dos vilarejos. Coisas assim estariam fora de
lugar caso não estivesse nas fronteiras.”
Mesmo ela sentindo que era um navio, seria melhor se dissesse que vira uma constru-
ção que parecia um navio em vez de um navio propriamente dito.
“Eu acredito nela. Embora— você não verificou se era uma construção mesmo, não é?”
“Não consegui, foi só por um momento. Pode ser algo completamente diferente.”
“Capitã Custodio, em todo caso, acho que esperar no nevoeiro é a melhor opção. Eu não
acho que quaisquer fortificações no Reino Feiticeiro permitirão que estrangeiros en-
trem.”
Mesmo que eles estivessem ostensivamente vigiando, a atenção de todos estava focada
em um único ponto. Isso porque todos queriam verificar o que Neia tinha visto.
A névoa espessa continuou a obscurecer toda a visão, e assim que todos estavam come-
çando a perder o interesse pela tal construção, algo aconteceu.
“—Quê!?”
Neia não pôde responder à pergunta do paladino. Dizer que era um navio seria malu-
quice.
A pergunta da Capitã foi muito razoável. No entanto, uma vez que Neia não havia dito o
que realmente era, tudo o que ela podia dizer até o final era que parecia algum tipo de
construção.
“Mas está se movendo agora, não é? Além disso... a sombra parece estar ficando mais
escura; está vindo em nossa direção?”
De fato, se isso fosse realmente um navio, então ele poderia se mover na direção deles.
Em outras palavras — esse navio era um que poderia navegar sobre a terra.
Indiscutivelmente era um navio, e movia-se como se navegasse nas ondas. Filas de re-
mos longos e grossos se projetavam de seus lados, remando como se estivessem real-
mente empurrando a água.
As palavras em choque que escaparam da boca de Remedios falaram por todos no grupo.
“Um navio que viaja pelo nevoeiro... parece que me lembro de ouvir algo assim antes...”
“Eu não esperava nada menos de você, Gustav! Vamos, tente se lembrar, tenho certeza
de que consegue. Você me ensinou todos os tipos de coisas no passado, sei que vai dar
conta. E aí, quer que eu balance sua cabeça por você?”
“Menos, por favor. Além disso, não sou especialista em nada. É só porque nossa Capitã
não tem cabeça boa para tais fatos, o que requer que eu me lembre dessas coisas em seu
lugar.”
“Acho que lhe mimamos até demais. Depois que mandarmos o Jaldabaoth de volta para
o inferno, farei tudo que puder para que você compense todos os anos que menosprezou
conhecimento acadêmico. E por falar nisso, me lembrei. É um Navio Fantasma. Eu ouvi
alguns marinheiros comentarem sobre, é um tipo de navio que aparece fora da neblina.
É uma embarcação que deveria ter afundado, mas que navega mais uma vez, e é dirigido
pelos undeads.”
“Oh! Sim, ouvi dizer que os Navios Fantasmas são precedidos por uma névoa espessa...
Atenção, entrar em formação! Se é um navio fantasma, então enfrentaremos os undeads!
É o inimigo!”
Mesmo os paladinos não conseguiram evitar o abalo vindo pela ordem da Capitã.
“Espere! Tenha calma, Capitã Custodio! O Reino Feiticeiro que é nosso destino é gover-
nado por um rei undead, então e se este for um dos navios do Reino Feiticeiro?”
“O quê!? Ele trouxe um Navio Fantasma para a terra seca e depois usou? ...Que merda é
essa?”
Um undead que pode controlar seus iguais. No entanto, que tipo de undead poderia
colocar um Navio Fantasma, que originalmente teria navegado pelos mares, sob o seu
comando?
Era gigantesco, ainda maior do que o maior navio da Marinha do Reino Sacro, “Martelo
de Ferro do Rei Sagrado”. Se não estivesse tão dilapidado, daria uma impressão de tre-
mendo poder.
O último de seus três mastros flutuava na popa, enquanto os outros tinham velas qua-
dradas regulares. No entanto, elas estavam todas rasgadas e esfarrapadas, e não pare-
ciam que poderiam cumprir seu propósito de impulsionar uma embarcação.
Havia um gume anormal na maneira como sua proa se projetava adiante. Parecia muito
impressionante, como se tivesse sido polida. Além disso, brilhava com uma luz fraca e
mística, e dava a sensação de que o navio estava orgulhoso de si mesmo.
Depois disso, a característica mais atraente foi a bandeira que tremulava em cima do
mastro principal. Ela tinha o símbolo do Reino Feiticeiro.
Logo, o navio passou pela lateral do grupo — que estava congelado no lugar pela visão
bizarra.
Ninguém conseguiu se mexer e então a neblina começou a diminuir. Aquele navio des-
pejava nevoeiro enquanto navegava? Não, se fosse esse o caso, então a neblina teria fi-
cado mais densa quanto mais perto estivessem do navio, de modo que eles não deviam
sequer ver o casco. Foi provavelmente como uma espécie de camada ocultante que en-
volvia a área ao redor do navio com neblina.
Ou talvez seja uma gaiola para evitar que sua presa escapasse.
O Rei Feiticeiro... um rei undead. Ele pode ser uma criatura muito assustadora.
Quando ela soube que ele tinha convocado seres gigantescos que berravam como ca-
bras vindas de uma origem incerta, ela as tinha imaginado como ovelhas adoráveis, en-
tão talvez Neia pudesse ter subestimado o Rei Feiticeiro, mesmo que pouco.
Assim como os paladinos viam os undeads como inimigos, os undeads poderiam consi-
derar os paladinos como seus inimigos também. Se fosse esse o caso, o destino de seu
grupo estaria na palma da mão do—
O Rei Feiticeiro é undead, mas ele permite que os seres humanos vivam... Que tipo de ser
ele é realmente? Bem, não que eu vá saber, não passo de uma escudeira mesmo.
Parte 3
Ao longe, ela podia ver o anel mais externo das muralhas de E-Rantel — a capital do
Reino Feiticeiro —, e o imponente portão inserido nela.
No entanto, nenhum deles conseguiu desviar a atenção de Neia das duas gigantescas
estátuas que flanqueavam o portão.
Elas representavam uma criatura que possuía um cajado bizarro que se assemelhava a
serpentes se enrolando umas nas outras. Essas estátuas provavelmente foram feitas à
imagem do Rei Feiticeiro, Ainz Ooal Gown.
Apesar de estar a uma boa distância delas, Neia pôde ver o intrincado detalhamento das
estátuas. Com toda a probabilidade, ela não seria capaz de encontrar uma falha nelas
mesmo que estivesse nos sopés das estátuas.
Então, ela viu várias criaturas em forma humana trabalhando perto das estátuas.
Eh? Ah... não são grandes demais? Será ilusão, ou são tão altas quanto aqueles muros?
Estátuas são grandes, mas desse jeito... quem são aquelas pessoas trabalhando lá?
Gigantes eram essencialmente seres humanos muito grandes, mas além de seus corpos
poderosos, eles também possuíam habilidades raciais. Graças a essas habilidades, eles
poderiam suportar ambientes que os humanos precisariam de grande esforço para so-
breviver, então normalmente faziam suas casas em tais lugares. Nesse ponto, eram uma
espécie demi-humana que tinha pouco a ver com os humanos, que só podiam viver nas
planícies.
Algumas raças que eram habilidosas em magia eram mais avançadas que a humanidade.
A raça sozinha não determinava a bondade ou a maldade de um ser. Um dos Treze He-
[Gigante Marinho]
róis era um Gigante. No Reino Sacro, os Gigantes conhecidos como S e a Giant, às vezes
apareciam para negociar.
Nesse caso, o que esses Gigantes estavam fazendo em uma cidade de undeads?
“Aquele Rei Feiticeiro comanda Gigantes!? Eu nunca ouvi falar de algo assim antes.”
Eles haviam reunido uma grande quantidade de informações em preparação para sua
jornada ao Reino Feiticeiro. É claro que muitas dessas informações eram incompreensí-
veis, de modo que não se poderia dizer que elas tivessem êxito em seu objetivo, mas isso
ainda contava como fazer sua devida diligência. Tanto o Navio Fantasma quanto os Gi-
gantes eram motivos de mistério.
Pensou Neia. Mas tal característica distintiva deveria ter aparecido em seus relatórios.
“Entendido!”
“Mm, entendi. Então vamos! Ergam as bandeiras! Mantenha seus peitos estufados! Não
desonrem o nome dos paladinos do Reino Sacro!”
Com isso, o grupo lentamente guiou seus cavalos para o Reino Feiticeiro.
Eles olharam para a aparência dos Gigantes, e sua pele era branco-azulada, enquanto
seus cabelos e bigodes eram brancos. Eles pareciam estar vestidos com roupas primiti-
vas feitas de pele de algum tipo de animal, bem como uma armadura de cota de malha
primorosamente manufaturadas.
“H-hmm~.”
“Entendo. Então, se tivermos que lutar contra um deles, devemos usar fogo, é isso?”
“Bem, basicamente sim. Os aventureiros mythril devem ser capazes de vencê-los com
facilidade. No entanto, eles podem treinar e aprender como nós, e às vezes você pode
encontrar um com habilidades de guerreiro. Aí sim precisará ter cuidado.”
Gigantes.
Pode-se treinar para ser um guerreiro, um magic caster ou um ladino. Não apenas os
humanos podiam se treinar em tais técnicas. Criaturas com vantagens raciais geral-
mente não estavam inclinadas para tal treinamento, mas caso algumas delas se empe-
nhassem em ter essas habilidades, isso as tornaria adversários muito difíceis.
O pai de Neia adisse incontáveis vezes: “Feras intimidam usando a aparência. Mas um
inimigo poderoso que não aparenta ser uma fera é muito assustador.”
“H-mm~ Bem, eu nunca lutei com um Gigante antes. Ainda assim, os Ogros são um
pouco diferentes.”
“Tome cuidado para não os insultar mencionando Ogros na mesma frase que tem Gi-
gantes. Para os Sea Giants, pelo menos, seria como comparar um macaco com um hu-
mano. Bem, isso é um boato de um bardo, então não há como dizer se é verdade mesmo.”
“H-mm~ O Reino Sacro não pode contratar Sea Giants, mas o Reino Feiticeiro pode em-
pregar Frost Giants. Qual deles é mais forte?”
Embora a Capitã obviamente quisesse que os Sea Giants fossem mais fortes, o impor-
tante agora era o tipo de tratamento que esses Frost Giants enfrentavam no Reino Feiti-
ceiro.
Eles eram tratados como amigos, escravizados com força, ou foram pagos pelos seus
serviços em um relacionamento mutuamente benéfico?
Não havia como distinguir dado ao modo que os Gigantes silenciosamente trabalhavam.
Ainda assim, parece que são excelentes trabalhadores. O Reino Sacro já trabalhou com
demi-humanos no passado, mas se eles expandissem o escopo disso, poderiam fazer muito
mais coisas. Claro, o Reino Sacro nunca faria isso.
O Reino Feiticeiro aceitara apenas gigantoides? Ou também tomou outras raças estra-
nhas? Se ela encontrasse demi-humanos aqui semelhantes aos que atacaram o Reino Sa-
cro, ela poderia controlar a raiva dentro de seu coração?
Por exemplo, o que aconteceria se ela encontrasse um Snakeman aqui? Seria um Snake-
man que veio de uma terra além do Reino Sacro, que vivia em paz com os humanos nesta
nação. Talvez não seja possível usar um apelo emocional para dissuadir os outros por
mostrar hostilidade, mas dadas as circunstâncias atuais, eles teriam que fazer exata-
mente isso.
“Podemos entrar apenas por aqui? Que tal entrar por outro portão?”
Os portões podem estar abertos, mas os Gigantes estavam trabalhando. Ela estava pre-
ocupada se eles se importariam com humanos passando perto de seus pés.
“Nós vamos entrar mesmo assim. Se souberem que os emissários do Reino Sacro entra-
ram por outra porta pois ficaram com medo de Gigantes, todos que ouvirem isso rirão
de nós.”
Normalmente, eles teriam sido parados do lado de fora dos portões, mas já que previa-
mente enviaram alguém para anunciá-los, foram conduzidos por soldados humanos que
pareciam guardas de rua, e o grupo passou pelos portões, sob a luz de lanternas mágicas.
“Bem-vindo à E-Rantel, cidade do Reino Feiticeiro. É a primeira vez que nos visitam,
honrados paladinos?”
“Ah, sim.”
“Entendo. Peço perdão pelo incômodo, mas poderiam descer do cavalo, por favor?”
Pensou Neia. Mesmo que fosse um pouco imprudente conduzir pessoas que se chamam
de emissários de outra nação, eles tinham justificativas em fazê-lo.
Não houve protestos quando o grupo desceu de seus cavalos e obedeceu às instruções
de “Por aqui, por favor”, o que os levou a uma enorme porta ao lado dos portões.
Indo pelo senso comum, isso deveria ser uma torre lateral, uma combinação de quartéis
de tropas e uma base de defesa.
“Por favor, entrem. Esta cidade é diferente das cidades do Reino e Império, não se limita
apenas aos lugares, então os visitantes de primeira viagem terão que participar de um
seminário na sala à frente.”
“Um seminário?”
“Sim. Isso é para minimizar distúrbios desnecessários. Somente pessoas que participa-
ram desta palestra podem entrar na cidade. Vamos adiante?”
Eles tinham vindo até aqui, então obviamente não podiam recusar o pedido de compa-
recer. Embora fosse de se esperar, a resposta de Remedios foi um “sim” com ênfase.
Naturalmente, eles não podiam recusar isso, mas da mesma maneira natural, Remedios
tinha uma expressão de gentileza no rosto.
A espada de Remedios era um tesouro divino do Reino Sacro. Apenas por portá-la, ela
nem precisaria se ajoelhar diante do Rei Sagrado. Ela não podia entregar tal tesouro nem
mesmo antes de se encontrar com o rei desse reino, e depois de ouvir isso, o soldado
assentiu em compreensão.
“Esse é o caso? Creio que não podemos fazer nada para evitar. Por favor, permaneça
como está e entre, o mesmo vale para todos. A verdade é que guardar suas espadas foi
planejado para garantir sua segurança. Nesse caso, por favor, prometam-me que não vão
“Assim espero, confio em sua promessa. Primeiro, vou pedir ao guarda desta área para
esperar lá fora.”
Dentro do Reino Sacro, esse foi um juramento absoluto que pode até atrair suspiros de
surpresa daqueles que o viram, mas era muito mais suavemente recebido em outros pa-
íses. Depois da resposta branda, o guarda bateu na porta.
A seguir, a porta se abriu devagar e o que apareceu de repente diante de seus olhos
foi—
Neia fez “Hiiiiii”, com uma voz que estava em algum lugar entre um suspiro e um gemido.
Sua armadura de placas de cor preta estava coberta de rendilhado vermelho que lem-
brava vasos sanguíneos, e estava coberta de espinhos. Chifres demoníacos projetavam-
se de seu elmo aberto, logo abaixo revelava um rosto humano apodrecido. Suas órbitas
vazias continham pontos de luz vermelha cheios de ódio e antecipação de carnificina.
“Nada vai acontecer se não sacarem suas espadas! Mas se fizerem isso, serão instanta-
neamente mortos! Depois disso, estarão fadados ao sofrimento eterno! Por favor, não
me faça ter que testemunhar algo assim de novo!”
Seu grito de pesar soou como se ele tivesse experimentado esse tipo de coisa antes.
Teria ele pessoalmente testemunhado tal evento no passado?
O undead está olhando lentamente para Neia e os outros. Havia a sensação de que es-
tava esperando que eles desembainhassem suas lâminas.
“...S-sério?”
A voz trêmula de Remedios estava em algum lugar entre surpresa, medo e consternação.
Neia sentia o mesmo. Era impensável uma nação possuir tantos undeads de tão extraor-
dinário poder.
“A-Ah, com licença. Essa criatura está sob o controle de Sua Majestade — o Rei Feiti-
ceiro?”
“É exatamente isso. Além disso, ele governa alguns que são mais poderosos do que esse.”
“E não é perigoso?”
“Na verdade, não. Não houveram incidentes dentro da cidade onde pessoas foram mor-
tas sem antes provocá-los.”
Os undeads eram seres que odiavam os vivos. Como alguém que poderia dominá-los
completamente e impedi-los de prejudicar criaturas vivas, o Rei Feiticeiro deve ser uma
pessoa verdadeiramente incrível. Neia ficou profundamente impressionada com o poder
do Rei Feiticeiro.
“...Entendo. Ah. Então, você pode nos levar para dentro da sala?”
“Sigam-me.”
Mesmo ele dizendo que esta criatura era governada pelo Rei Feiticeiro, as linhas de co-
mando que os ligavam não eram visíveis a olho nu. Isso fez com que andar na frente dele
fosse várias vezes mais assustador do que ir antes. Para eles, era como alguém dizer que
um carnívoro andando fora da jaula não traria problema algum, pois sua barriga estava
cheia.
Não havia nada de errado com essa lógica quando se considerava qual vida valia menos.
Mesmo assim, apesar de sua determinação em proteger os fracos, ela como escudeira
era um assunto bem diferente.
Neia se preparou para o que estava por vir, fechou os olhos e então se aproximou.
Depois de dar vários passos para frente, ela lentamente abriu os olhos. Ela não havia
sido abatida. Então acelerou o ritmo e apressadamente passou pelo undead.
Depois de ver Neia ter atravessado em segurança, os outros paladinos a seguiram. Nin-
guém foi atacado e eles chegaram ao seu destino.
O soldado abriu a porta, revelando uma longa mesa e muitas cadeiras simples.
Remedios fez uma indicação com o queixo e Gustav tirou uma pequena bolsa e entre-
gou-a ao soldado que os trouxera para cá. Era gorjeta.
Sua rejeição foi tão feroz que foi quase como um grito de desespero.
O soldado levantou as mãos acima da cabeça, totalmente sem vontade de tocar aquela
bolsa.
Todos ficaram chocados com a reação dele, assim como Neia. Ela não conseguia pensar
em nenhum motivo para a reação do soldado.
“Todos nós somos pagos por Sua Majestade, então permitam-me recusar sua demons-
tração de consideração.”
“Mas você nos concedeu uma exceção... isso nem é uma soma muito grande, o que me
diz?”
“Obrigado, mas não há necessidade. Eu vou esperar do lado de fora até que o seminário
termine.”
Gorjeta era uma coisa natural. Não dar gorjeta também não era um problema, mas a
maioria das pessoas de alto escalão davam gorjeta. Naturalmente, algumas pessoas fize-
ram isso para minimizar o tempo necessário para inspeções de bagagem e pedir às pes-
soas que cuidassem de vários assuntos pequenos, mas eles não haviam feito tais solici-
tações. No fim, eles estavam simplesmente fazendo o que seria esperado das pessoas de
sua hierarquia.
Se essa foi uma instrução do Rei Feiticeiro, então qual foi seu objetivo ao fazê-lo?
“Não nos disseram onde sentar. Então sentem-se onde estiver livre.”
Depois que todos se sentaram como a Capitã havia dito, pouco tempo se passou antes
que a porta se abrisse mais uma vez.
Era uma criatura cuja espécie tinha parte superior do corpo de um humano e parte in-
ferior do corpo de uma cobra, um Naga.
[Nagas Mari nhas]
Havia várias ramificações da raça Naga — por exemplo, os Sea Nagas, que ocasional-
mente apareciam ao longo das orlas do Reino Sacro —, mas a filogenia de suas subespé-
cies não eram claras. No entanto, todos eram demi-humanos que não tinham boas inten-
ções para a humanidade, mas Neia não se sentia terrivelmente amedrontada.
Tudo isso foi graças à criatura negra de agora a pouco. Comparado a isso, ela poderia
ao menos reunir uma resposta racional para toda essa situação.
Ah! Então foi pra isso? Aquela criatura assustadora não se destinava apenas a amedron-
tar as pessoas, mas também a entorpecer do choque de ver os demi-humanos? Eles real-
mente pensaram muito bem em como fazer os demi-humanos coexistirem com os huma-
nos...
O Naga deslizou pela sala silenciosa, sem prestar atenção à resposta do grupo enquanto
se movia na frente deles, e então se curvou ligeiramente.
Essa foi uma advertência muito razoável, e Neia deixou a tensão fluir de seus ombros.
“Está escrito em seus rostos. Todavia, gostaria que se lembrassem que muitas raças an-
dam pelas ruas do Reino Feiticeiro. Os senhores já viram os undeads que caminham or-
gulhosamente de cabeça erguida pelas ruas. Mesmo se eles atacarem os senhores por
serem indivíduos perigosos, sacar suas lâminas para eles sem motivo seria um crime
sério, não?”
“Um momento por favor. Quer dizer que devemos fugir se uma criatura perigosa apa-
recer?”
“Esse não é o caso. Mesmo que haja entidades perigosas na cidade, nenhuma delas irá
prejudicá-los. Mesmo assim, há casos em que as pessoas sentem medo, ou sentem que
podem ser atacadas, e assim sacam as armas sem hesitar. É disso que este velho estava
falando.”
“Oh, sim... das muitas criaturas perigosas que andam por aqui, aqueles que mais alar-
mariam os senhores são provavelmente os subordinados de Sua Majestade.”
“Uma vez que ficarem aqui por mais de um dia, sua cautela diminuirá e não se importa-
rão mais com eles. Bem, o primeiro dia é o maior problema. E, claro, sacar suas armas
em legítima defesa é perfeitamente aceitável.”
“Sim, sim. Além disso, magia de controle mental será usada no curso de investigar cri-
mes nesta cidade. Por favor, lembrem-se disso.”
Os olhos de Neia se arregalaram. E ela não foi a única a fazê-lo. Uma comoção irrompeu
dos paladinos. Como seu representante, Remedios declarou sua opinião.
Em geral, magia de controle da mente não era usada quando se questionava pessoas
sobre crimes.
Por exemplo, usando 「Dominate」, alguém poderia tornar qualquer pessoa um crimi-
noso por um breve período de tempo. Ao usar 「Charm」, pode-se encontrar um bode
expiatório para qualquer crime. O fato de que a magia do controle da mente poderia ser
usada para fabricar os culpados, fez com que ela fosse vista como um ato rudimentar
praticado apenas por tiranos.
“Os tribunais também usam meios semelhantes. Oh, mas posso dizer com segurança
que Sua Majestade não os obrigará a falar falsidades. Nesse ponto, não precisa se preo-
cupar.”
Como alguém poderia acreditar nisso? O uso da magia do controle da mente significava
que, uma vez que uma nação decidisse que alguém era um indivíduo perigoso, eles po-
deriam pintá-lo como criminoso e depois lidar como desejassem. Nenhum ser humano
confiaria em um ser undead que eles nunca haviam conhecido antes.
“Tem mais uma coisa que eu gostaria de perguntar... vão entrar, ou preferem dar meia-
volta e sair?”
“...Não, não podemos fazer isso. Por favor, permita nossa entrada.”
“Ho. Essa foi a resposta mais rápida até agora. Os comerciantes geralmente pediam
tempo para discutirem entre si. Então, vamos continuar.”
Depois disso, Ryraryus contou em como “cavalos undeads puxavam carruagens ao longo
das estradas”, e outras coisas estranhas que pareciam bagunçar a mente. No entanto,
quando ele disse: “Às vezes, os Dragões voam por cima, por isso não se assuste ou deixe
seus cavalos saírem do controle”, seu rosto se contraiu.
Ter Dragões voando sobre uma cidade não era algo que pudesse ser resumido como um
“grande incidente”.
Dragões eram criaturas contra as quais até heróis totalmente armados e preparados
podiam morrer em combate. Foi por isso que todos os guerreiros sonhavam em matar
um Dragão. Matar uma criatura esmagadoramente superior com a força que haviam
aprimorado ao longo dos anos, usando apenas seus companheiros e suas armas, era um
feito glorioso e uma ação que só o mais superlativo dos guerreiros poderia realizar.
Estamos bem com os undeads, porque já os vimos como guardas, mas Dragões... não, se
ficarem apenas voando no céu como uma sentinela deve ficar bem, certo? Além disso, eles
têm muitas categorias devido à idade, e sua força varia muito dependendo da idade...
Dragões recém-nascidos ainda eram Dragões. No entanto, um Dragão tão pequeno seria
mais facilmente controlado do que a criatura undead de antes.
“Isso encerra o seminário. Obrigado por ouvirem. Enfim, os senhores poderiam seguir
o soldado de volta ao portão depois de sair dessa sala?”
“No passado, este velho aqui teria pensado em tais atos. Agora, porém, isso é estrita-
mente proibido. Além disso, depois de conhecer Sua Majestade, sinto que não faz sentido
me envolver em conflitos com outras formas de vidas inferiores.”
“Ele é dez vezes mais poderoso do que pode imaginar. Deixando-o de lado, até seus su-
bordinados são extraordinariamente poderosos... simplesmente, não há cidade mais se-
gura do que aquela que Sua Majestade defende.”
“Este velho aqui não sabe o porquê vieram. No entanto, deixe-me dar um sábio conselho
que uma amiga com quem eu tomo chá — uma viúva — me disse. Declarar oposição à
Sua Majestade seria extremamente tolo. Um homem sábio imediatamente se jogaria a
seus pés e imploraria por misericórdia.”
Havia uma crua sensação de realidade nessas palavras. Mesmo ele dizendo que tinha
ouvido de uma amiga, era mais parecido que o Naga chamado Ryraryus estava falando
por experiência pessoal.
Neia fez uma reverência para Ryraryus de onde estava, na parte de trás do grupo, antes
de sair da sala.
Parte 4
A delegação caminhava pelas ruas de E-Rantel. O destino do grupo era a estalagem que
os guardas do portão tinham dito que era o estabelecimento de classe mais alta da cidade,
a Pousada Brilho Dourado.
As palavras de Ryraryus lhe deram a impressão de que essa nação estava cheia de demi-
humanos e undeads. No entanto, a realidade era diferente — a maioria dos pedestres
eram humanos.
Os únicos undeads que ela viu foram grupos do mesmo undead que tinham visto perto
dos portões da cidade, bem como undeads em forma de cavalo com corpos de ossos e
névoa que puxavam carruagens. Não havia outros tipos além desses.
Um grupo de Goblins marchava pelas ruas em formação impecável, cada um deles irra-
diando a aura de um veterano experiente. Isso imediatamente quebrou a impressão que
Neia tinha de Goblins. Não, não foi apenas ela quem teve essa impressão. Suspiros de
surpresa vieram do contingente de paladinos.
Havia também uma demi-humana com um rosto de coelho usando uniforme de empre-
gada, bem como um demi-humano bípede, parecido com sapo, mas ela só tinha visto um
exemplo de cada um na cidade.
Parece mais normal do que eu imaginei... bem, não é normal, mas ainda assim, é muito
semelhante a uma nação humana. Dificilmente daria pra dizer que está sob o domínio de
um aterrorizante rei undead.
Não havia olhares de medo nos rostos dos cidadãos andando pelas ruas. Neia não tinha
certeza se isso era porque se resignaram, se acostumaram ou decidiram que não havia
necessidade de se preocuparem em viver com os undeads. No entanto, não havia sinais
de caos nas ruas. Às vezes, ela até ouvia o som de crianças rindo.
Remedios estava se dirigindo a três Dwarfs que trabalhavam ao lado da estrada. Havia
[Esqueletos]
também três Skeletons realizando trabalhos de terraplanagem sob as ordens dos
Dwarfs.
O choque cultural que ela recebeu depois de entrar na cidade foi tão grande que ver
Skeletons já havia se tornado algo aceitável. Havia até uma sugestão de alívio em sua
mente, que vinha de ver um oponente contra o qual ela podia vencer.
“Perdão por falar sem descer do cavalo. Somos do Reino Sacro e estamos procurando a
pousada conhecida como Pousada Brilho Dourado. Poderia informar o caminho?”
“Sabe que tudo o que fizemos foi apontar pra onde fica, né?”
“Bem, quando a gente comprar um bom rango, vamos agradecer aos homens e mulhe-
res do Reino Sacro por isso.”
“Hm? Ué, não sabe? Estamos pavimentando as estradas. Sua Majestade veio pedir pes-
soalmente. A maioria dos residentes daqui fazem o trabalho, estamos aqui pra servir
como consultores técnicos.”
“São Skeletons que Sua Majestade emprestou, não sabia disso? Ah, escuta o que eu digo,
quando se trata de trabalho manual, esses carinhas são os melhores. Certamente mudou
minha visão deles.”
“Não tem nada de mais nisso... Bem, acho que não dá pra evitar já que não estão acos-
tumados. Ainda assim, é de se esperar no Reino Feiticeiro, não? Eu ouvi que os undeads
estão mostrando potencial nos vilarejos próximos também. Afinal, eles podem comple-
tar tarefas tediosas como plantar e assim por diante com apenas uma ordem. Quero di-
zer, esses carinhas não se cansam, não dormem e não comem. Fora que, eles também
entendem o que queremos dizer, quando recebem uma tarefa dentro de suas possibili-
dades eles a fazem muito bem. É assim que as coisas são agora, ninguém precisa traba-
lhar como escravo. Até o nosso país está começando a usá-los.”
“Por seu país, quer dizer uma nação dos Dwarfs separada do Reino Feiticeiro?”
“Oh, isso aí. É de onde viemos, mas agora ficamos no distrito demi-humano do Reino
Feiticeiro.”
“Distrito demi-humano?”
“Sim. É onde todas as raças não-humanas vivem. Dizem que costumava ser o distrito
pobre da cidade, mas foi demolido. Aí reconstruíram pra permitir que raças de todos os
tipos vivam vidas dignas. Bem, pode demorar um pouco até que esteja completo, mas o
trabalho nas residências para raças menores do que vocês — nós, por exemplo — já
começou.”
“Entendo. Mas se o distrito pobre foi derrubado, para onde foram os residentes origi-
nais?”
“A gente não sabe direito, mas acho que foram enviados pros vilarejos ou algo assim.
Há muitos vilarejos abandonados em ruínas ao redor da cidade, ouvi dizer que foram
pra lá para ajudar nos campos e a reconstruir as casas. É aí que ser capaz de comandar
“E quem liga com o preço!? O importante é que é gostoso! Ainda mais o vinho! Olha
minha barriga, engordei muito quando vim morar aqui!”
“Se eu voltar balofo desse jeito, minha esposa vai gritar ‘Onde tá minha parte!?’ pra mim.
É melhor perder peso antes de voltar pra casa!”
“Mais uma coisa, há aqueles undeads em forma de cavalo. Sabe como se chamam?”
“Sei lá. Mas isso não importa, não acha? Quero dizer, eles não prejudicam ninguém. Po-
dem ser um saco de ossos, mas são parrudos, transportam mercadorias como nenhum
outro, já viu?”
“Entendi... obrigada!”
Depois de se despedir dos Dwarfs, o grupo continuou em direção à pousada mais uma
vez.
Neia ficou perplexa. Ela pensara que isso seria o que mais interessaria a Capitã.
“...Oras, Gustav. Foi porque você estava todo estranho quando viu aquilo.”
“Estava...?”
“...Bem, um nome vem à mente... mas devo estar enganado. Não pode ser o que pensei.
Eu não posso imaginar uma criatura undead como essa poderia ser controlada.”
Gustav levou dois paladinos à pousada. Alguns minutos depois, um deles retornou.
“Capitã, reservamos os quartos com sucesso. Os estábulos estão atrás da estalagem, en-
tão eles gostariam que levássemos os cavalos para lá.”
“Sim, senhora!”
Ela amarrou as rédeas dos cavalos a uma árvore em frente à estalagem e depois levou-
os aos estábulos, um de cada vez. Cuidar de cavalos era o trabalho de um escudeiro, mas
a estalagem também era obrigada a ajudar, e assim Neia aceitou sua boa vontade e en-
trou na estalagem.
Talvez isso seja para evitar que o fedor dos estábulos entre.
Do lado de fora, parecia ser do mesmo tipo que a estalagem do Reino, mas depois de
ver o interior, poderia dizer que estava um nível acima da última. Ela até se sentiu um
pouco envergonhada por andar neste lugar com corpo sujo — o banho para eles era es-
sencialmente apenas enxaguar com água até que eles achassem que não fediam — de
suas longas viagens.
Neia deu um passo à frente para a acomodação que o pessoal da estalagem havia lhe
dito e bateu na porta.
“Quem é?”
“Então vamos buscar uma audiência com o Rei Feiticeiro como planejamos. Gustav, es-
tou contando com você.”
“Claro, Capitã. Mas o que mais devemos fazer além disso? O plano original era encontrar
pessoas no poder e pedir sua ajuda...”
Já que Momon era um aventureiro, eles originalmente planejavam ir para a Guilda dos
Aventureiros. Entretanto, de acordo com Ryraryus, a Guilda dos Aventureiros agora es-
tava praticamente fechada, e os pedidos eram realizados pelos subordinados do Rei Fei-
ticeiro.
“De todo modo, vamos deixar algo na Guilda. Talvez possamos atrair alguns aventurei-
ros ociosos que podem ir ao Reino Sacro.”
Apesar de que esse não seja o caso da nossa incrivelmente talentosa Capitã, que se tornou
uma paladina sem passar por nada disso...
“Ah, quando eu estava reunindo rumores no Reino, fui levado a acreditar que esta seria
uma cidade triste e sombria. Mas é muito mais comum do que eu esperava... confio que
deixar algumas pessoas lá fora não representarão problema algum, correto?”
“É difícil afirmar agora, mas creio que não haja um perigo imediato.”
“Não é? Então, Alguns de vocês irão aos templos, veremos também se alguém está dis-
posto a nos apresentar ao Momon.”
“Ainda assim, somos paladinos. Para onde devemos ir, a não ser aos templos?”
Gustav tinha uma expressão amarga no rosto. Remedios abordou um ponto importante.
“Bem, seria bom ver e ouvir diretamente sobre a vida na cidade através dos moradores,
além do que o Rei Feiticeiro nos permitiu ver, não acha?”
“Tem razão...”
Mas o que deveriam fazer se vissem algo que eles, como paladinos, não poderiam tole-
rar?
Gustav ainda estava ponderando a questão, por isso ainda estava hesitante.
Paladinos são personificações da justiça. Então, se agirmos como deveríamos, isso pode
resultar no Rei Feiticeiro se sentindo insultado. Se, como resultado, ele se recusasse a aju-
dar o Reino Sacro e milhares sofressem, ainda seria a coisa certa a fazer?
Ela lembrou que seu pai lhe dissera que não entendia a justiça de um paladino. Ela não
tinha dado muita atenção a isso durante seus dias de treinamento, com o objetivo de se
tornar uma paladina. Mas talvez o seu coração tenha se tornado suave e fraco por causa
do estado atual do Reino Sacro, pois começou a questionar isso recentemente.
Talvez suas dúvidas pudessem ser esclarecidas se ela pudesse perguntar à sua mãe,
mas ela não estava mais entre os vivos.
Ela ficou muito feliz em enterrar seu coração e mente no trabalho. Dessa forma, ela não
precisava pensar em coisas desnecessárias.
E então, com a testa coberta de suor, Neia terminou de limpar as armaduras de todos.
♦♦♦
Sua audiência com o Rei Feiticeiro veio antes do esperado. Neia não pôde esconder sua
surpresa. Isso porque estava previsto que ocorresse no dia seguinte ao que Gustav tinha
ido advogar seu caso.
Era muito indigno em comparação com os palácios reais do Reino Re-Estize ou do Reino
Sacro. Contudo, esse era o domicílio do Rei Feiticeiro. Como essa cidade fôra outrora
uma cidade regional do Reino, ele provavelmente decidiu usar o pequeno palácio exis-
tente depois de assumir o controle.
Por que um rei que detinha o domínio sobre tantos undeads daquele nível escolheria
ficar em um antigo palácio tão decaído?
Tenho a sensação de que há algum motivo pra isso... se ele desejasse um palácio de luxo,
tudo o que teria que fazer é ordenar artesãos como aqueles Dwarfs e a mão de obra undead
deles para construir um...
Havia bandeiras penduradas nas pontas das lanças cruzadas. À direita estavam as ban-
deiras do Reino Feiticeiro e, à esquerda, as bandeiras do Reino Sacro.
Abaixo das bandeiras havia uma passagem pela qual eles podiam passar.
Depois disso, a música tocou. Mesmo sendo uma música que ela não tinha ouvido antes,
era provavelmente melhor aceitar isso como parte da cerimônia como um todo.
Das profundezas de seu cérebro, Neia recordou uma palestra que recebera uma vez.
O fator mais importante para resistir a magias é ter uma mente sem perturbações.
Não, não havia como essa música ser um ataque mágico. Se fosse uma armadilha, não
haveria necessidade de levantar a bandeira do Reino Sacro.
Neia entrou de modo que desse a entender que fosse orgulhosa e corajosa. Ela passou
a examinar os arredores.
Havia uma guarda de honra e bandeiras do Reino Sacro. Esse era um sinal claro de que
o Rei Feiticeiro estava recebendo sua delegação como convidados de honra; em outras
palavras, ele reconheceu Neia e os outros como embaixadores oficiais no Reino Feiti-
ceiro, o que significava que Neia também tinha que defender a reputação do Reino Sacro.
Ela caminhou ao longo do caminho abaixo das bandeiras penduradas, e no final da pas-
sagem estava—
Seu rosto era elegante e atraente. Seu vestido branco incalculavelmente caro estava li-
vre de manchas.
Seu sorriso compassivo foi o suficiente para torná-la uma mulher que poderia ter sido
confundida com um anjo. No entanto, ela não era um. A prova estava no par de asas ne-
gras brotando de sua cintura.
“Eu, eu sou grata pela calorosa recepção. Sou a líder da delegação diplomática do Reino
Sacro, Remedios Custodio, e estou muito grata por ter organizado preparativos para se
encontrar conosco.”
Albedo estava sorridente e sua presença deixou Remedios tropeçando em suas palavras.
Sua beleza sobrenatural era tal que até mesmo um membro do mesmo sexo — não, era
precisamente porque eram do mesmo sexo — seria engolido por seus encantos. A linha
de visão de Albedo passou rapidamente por todos, incluindo Neia.
“Senhores, Sua Majestade os está esperando, então eu vou guiá-la à câmara de audiên-
cias. Se não for um incômodo, poderiam me seguir?”
Eles não poderiam carregar armas na presença de um rei, então normalmente seriam
solicitados a entregar suas armas. Esta também seria uma demonstração de confiança
na outra parte.
“Normalmente, nós as guardamos por segurança, mas não há necessidade. Pode car-
regá-la em seus braços.”
Remedios também estava com cara de “Por quê?”. Certamente alguém que passou todo
o tempo ao lado da Rainha Sagrada teria ainda mais motivos para questionar isso.
“Então, nosso país aceitará graciosamente a boa vontade de Sua Majestade... Posso pe-
dir-lhe que segure as espadas de todos, exceto a minha? Peço desculpas, mas carrego um
tesouro nacional do meu país, então espero que entenda os motivos que me levam a não
a deixar em suas mãos.”
“Claro.”
Albedo olhou para o lado e a criatura undead que apareceu pegou suas espadas por
segurança.
Talvez alguns dos paladinos estivessem insatisfeitos em dar suas espadas para os unde-
ads, mas já que sua Capitã havia ordenado, não havia como recusar.
Não havia como dizer o que ela estava pensando enquanto mantinha aquele belo sor-
riso. Em vez disso, a única coisa que aquele sorriso parecia dizer eram suas boas inten-
ções, como se estivesse esbanjando bondade genuína em Neia e nos outros. Mas a avali-
ação de Neia estava correta? Por exemplo, se esse não fosse o caso—
—Ela permitiu que pessoas armadas ficassem diante de seu mestre. Foi devido às ordens
do Rei Feiticeiro? Ou... é porque ela sabe que não há jeito de machucar ele?
O Rei Feiticeiro era um poderoso magic caster. Foi devido a essa arrogância que ne-
nhum paladino do Reino Sacro poderia derrotá-lo?
Ou talvez ele tenha guardas undeads alocados nas proximidades. Albedo-sama não parece
ter nenhuma habilidade de luta...
♦♦♦
A sala do trono também não era tão luxuosa quanto imaginara. Parece que também ti-
nha sido redesignada logo após a tomada da cidade.
Além disso, a bandeira atrás do trono era igualmente impressionante. Não havia como
dizer o que havia sido usado para tecê-la, mas havia uma profundidade em sua tonali-
dade que sua simples cor preta não conseguia expressar adequadamente. Uma ligeira
alteração nos níveis de luz pode fazer pensar que era um roxo profundo.
Remedios ordenou.
Enquanto Neia ficava surpresa com a forma como Remedios poderia tomar uma decisão
como essa, ela não ofereceu resistência quando genuflectiu e abaixou a cabeça. Ela
aprendera essa prática cerimonial por ser escudeira. Dito isso, sua experiência com reis
limitava-se a quando vislumbrou o Rei Sagrado uma vez, em sua posição de escudeira.
Ela abaixou a cabeça enquanto movia os olhos, olhando freneticamente para os paladi-
nos ao seu redor.
Claro, isso foi uma decisão tomada com base em olhar para as costas deles. Talvez se
ela os olhasse de frente, eles poderiam diferir um pouco de si mesma.
Vai ficar tudo bem! Eu não fui repreendida por ninguém mesmo na frente do Rei Sagrado-
sama. Papai disse que eu também fui bem e até me elogiou.
Enquanto Albedo falava de sua posição à frente, destacada do grupo, Neia ouviu um som
muito fraco que só ela podia captar, como a de rasgar papel, seguida pelo som de passos
e um som de *gatsun* de algo forte contra o chão. Logo, ela sentiu alguém sentado no
trono.
Foi muito difícil respirar durante esse tempo. Olhar para cima cedo ou tarde demais
seria uma quebra de etiqueta.
Seu rosto era de um crânio descarnado. Pontos de luz vermelha brilhavam dentro de
suas órbitas. Verdadeiramente, sua aparência se encaixava a um undead. No entanto,
Neia sabia que ele era algo completamente diferente.
Ele estava vestido mais ricamente do que um nobre estaria na festa para celebrar a he-
rança de seu título.
Além disso, ele usava luvas que eram da mesma cor de suas roupas, com placas de metal
que brilhavam em todas as cores do arco-íris. Uma de suas mãos segurava um cajado
místico que parecia sete serpentes se enrolando umas nas outras. Essa deve ter sido a
fonte do som de agora a pouco.
No entanto, foi o halo de brilho de obsidiana atrás dele que foi verdadeiramente sur-
preendente.
Nesse caso, o Rei Feiticeiro não poderia ser descrito como um dos undeads aos olhos
de Neia. Misteriosamente, seu rosto esquelético não a assustou. De fato, alguém poderia
até dizer que ele tinha um ar de pureza e divindade sobre ele.
Ele era um ser poderoso, um ser temível, um ser cujo poder excedia a capacidade da
mente humana de compreender — em outras palavras, ele era um Ser Supremo.
Neia se esqueceu de Albedo, que estava ao lado do trono, e olhou continuamente para
o Rei Feiticeiro.
O que a trouxe de volta aos seus sentidos foi a voz do Rei Feiticeiro, que disse:
“Bem, vamos dar prosseguimento. Já percorreu um longo caminho desde o Reino Sacro,
Custodio-dono, e isso vale para todos, senhoras e senhores da Ordem Paladina.”
“Ótimo. Então, diga-me o estado atual do Reino Sacro. Falar sem erros ou omissão per-
mitirá que nós, o Reino Feiticeiro, possamos melhor ajudá-los.”
Depois que Remedios indicou seu entendimento, ela abriu seu coração a respeito do
estado do Reino Sacro.
Neia não entendeu o raciocínio de Remedios, o que a levou a ser tão solícita. Mas, era
muito provável que Remedios achasse que pensar em si mesma seria problemático
agora.
O conteúdo de seu discurso era exatamente como o que Gustav dissera à Rosa Azul, e
ela acabou dizendo que a situação na linha de frente estava em um estado tenso. Ela
provavelmente não queria dizer que o Reino Sacro estava na véspera da destruição para
outro país, muito menos para um rei undead.
O brilho carmesim nos olhos do Rei Feiticeiro desapareceu de repente, e então reacen-
deu um momento depois.
“Como eu pensava. Também preparei uma resposta para essa eventualidade — minha
resposta é não.”
“Mesmo isso sendo uma mácula em minha nação, Momon é, por enquanto, vital para a
paz do meu país. É precisamente porque ele está por perto que as pessoas podem viver
despreocupadas.”
“Senhoras e senhores do Reino Sacro, parece que viram minhas tropas undeads e as
consideraram bastante satisfatórias. Então, não aceitariam um empréstimo dessas tro-
pas no lugar de Momon? Eu confio que todos já viram que os undeads que eu comando
são bastante poderosos. Eles devem ser capazes de eliminar meros demi-humanos.”
Era verdade que os undeads ostentavam muitas vantagens como tropas. Eles não pre-
cisavam comer, podiam ficar à espreita no meio da floresta primitiva, e poderíamos
chamá-los de um exército ideal.
“Nesse caso, certamente nós paladinos podemos ficar para trás e completar o trabalho
de construir confiança do povo nos undeads, não poderíamos? Muitas pessoas sabem
que os paladinos são os inimigos dos undeads. Portanto, não seria muito eficaz nos dei-
xar ficar para trás e declarar que os undeads de Vossa Majestade são confiáveis?”
Após um breve período de cogitação, o Rei Feiticeiro virou o rosto para a mão que não
carregava seu cajado.
“...Hm. Parece que lidar com estrangeiros não é apropriado, não. Sei que se pode confiar
em alguém que passou pelas mesmas alegrias e tristezas que eles mesmos; mas certa-
mente não há como acreditar em alguém que apareça do nada e diga que os undeads são
amigos, não é? Como eu pensei, não há como ficarem no lugar de um aventureiro ada-
mantite, que já é famoso em toda a cidade.”
Portanto, ela não poderia refutá-lo com lógica. Isso foi particularmente verdadeiro para
Remedios, que era do tipo impulsionado por suas emoções.
“—Muito bem. Então vamos mudar o assunto. Gostaria de perguntar sobre algumas
pessoas que a senhorita não mencionou, Custodio-dono. No passado, Momon me disse
que Jaldabaoth comandava empregadas de considerável poder. Senhoras e senhores,
posso perguntar se encontraram pessoas vestidas assim no Reino Sacro?”
“Entendo... pode ser que as empregadas possam ser o trunfo de Jaldabaoth, não é? Ou
isso significa que elas estão ativas em outros locais?”
“...Então eles ainda não se infiltraram no sul? Talvez eu tenha ficado preocupado em vão.
Humm...”
“Eu não disse isso. Mas estava pensando que se ele possuísse peões tão poderosos, por
que ele ainda não os usou...? Eu acredito que pedi para serem completamente francos no
começo, não é? Portanto, deixe-me ir direto ao ponto — que tipo de remuneração o
Reino Sacro pode me oferecer em troca da provisão da ajuda da minha nação?”
Essa foi uma pergunta perfeitamente normal e inteiramente esperada. Todavia, res-
pondê-la era muito difícil.
Ainda assim, não poder-se-ia concluir que a resposta de Remedios estivesse errada.
Houve momentos na história em que isso foi tudo o que um paladino precisara para
mergulhar em uma batalha de vida ou morte.
Por exemplo, se alguém defendesse um vilarejo pobre que não pudesse pagar uma com-
pensação adequada e ainda desafiasse uma horda demi-humana, esse alguém seria con-
siderado um exemplo dos moldes de um paladino.
“É bem típico esperar que um paladino diga isso. Talvez um dos meus amigos do pas-
sado pudesse estar disposto a agir apenas por isso. Mas infelizmente, essas palavras não
podem me mover. Eu já disse antes, dispense lisonjeio sem sentido. Pode oferecer-me
algum benefício tangível?”
Ele está dizendo que o Momon-dono é amigo do Rei Feiticeiro? Já que está se dirigindo a
ele com tanta familiaridade. Será que ele não é apenas um subordinado?
Não.
Nesse caso, mesmo que eles fizessem um pacto com o Rei Feiticeiro, não havia garantia
de que esse pacto seria realmente honrado. Não, antes disso, era muito duvidoso que
esse grupo tivesse o direito de representar sua nação. Em última análise, o verdadeiro
propósito dessa delegação de embaixadores foi criar simpatia entre os cidadãos comuns
que não entendiam a situação.
Por essa razão, eles não tinham capacidade de fazer promessas. Ninguém pode repre-
sentar um país inteiro por si mesmo; o único que poderia fazer isso era seu rei.
O Rei Feiticeiro levantou levemente o queixo, para indicar que o homem deveria conti-
nuar.
“Muito obrigado. O que Vossa Majestade pede é algo que não podemos garantir. Mesmo
se nós reivindicarmos o território do Reino Sacro, restaurar a terra que foi devastada
por Jaldabaoth levará muito tempo. Não acredito que possamos oferecer-lhe qualquer
coisa que prometermos aqui com algum grau de urgência. No entanto, há uma coisa que
desejo dizer a Vossa Majestade, que é o perigo que Jaldabaoth representa.”
“Hm... continue.”
“Em outras palavras, está dizendo que agora é a melhor hora para matá-lo, dado que
ele deu as caras. Portanto, deve-se cortar o mal pela raiz assim que possível. É isso o que
está querendo dizer?”
“É como diz. Eu não esperava nada menos de Vossa Majestade. Portanto, podemos im-
plorar para que despache o Momon-dono?”
“Nesse caso—”
Assim que o rosto de Gustav se iluminou de alegria, o Rei Feiticeiro estendeu a mão
para detê-lo batendo o cajado no chão.
“Ainda assim, despachar o Momon ainda é muito difícil. Mesmo se ele vencer o Jaldaba-
oth, a ausência de Momon levará ao desconforto em nossa situação política e alarmará
as pessoas. Nesse caso, o que deve ser feito? Se eu tivesse mais tempo para estabilizar a
política interna da minha nação, eu enviaria o Momon — com a aprovação dele, é claro.
Dado o que acabou de dizer, seu povo deve ser capaz de aguentar um pouco mais, não?”
“Mas, mas é claro... posso saber quanto tempo isso vai levar?”
A Primeira-Ministra, que estava de pé ao lado dele durante esse tempo, relatou ao seu
mestre pela primeira vez.
Cinco anos...
“Realmente... isso é um fato. Eu deveria ter considerado a situação do seu país. Afinal, é
um pedido de uma nação amistosa.”
“Nosso país fará o melhor para acelerar o processo. Albedo, qual é o tempo mínimo ne-
cessário para realizar isso?”
“Nesse caso, que tal três anos? Mas isso pode levar a inquietações em nosso país.”
“É inevitável. Estaríamos salvando uma nação amistosa, afinal. Eu suponho que haverá
alguma perda de vidas de nossa parte... bem, metaforicamente falando.”
“...Ghrum. Então, que tal isso? Nós já aceleramos o processo em dois anos.”
Ele já havia feito uma concessão de dois anos, mas até três anos era muito longo. Quanto
dano poderia ocorrer durante esse tempo? E então, havia a questão de saber se o Reino
Sacro poderia até sobreviver como nação durante esse tempo — não, não havia como.
Todavia, se eles protestassem contra, talvez até mesmo a promessa de enviar Momon
depois de três anos pudesse ser desconsiderada também.
Talvez ela tivesse vindo aqui por este momento. Ela deveria apostar sua vida nisso.
“Eu sou Neia Baraja, uma escudeira da Ordem Paladina do Reino Sacro. Eu entendo que
isso é extremamente rude, mas, por favor, permita-me solicitar o envio antecipado do
Momon-dono.”
“Neia! Como se atreve uma simples escudeira como você implorar um favor ao Rei Fei-
ticeiro!?”
Havia apenas uma coisa que veio à mente quando Neia ouviu a repreensão de Remedios.
Se quer matar sua escudeira por sua conduta desrespeitosa, por favor, espere um pouco
mais.
“Ah, não se preocupe com isso. Seu nome é Neia, não é? Nesse caso, qual o prazo que
você gostaria que eu enviasse o Momon?”
“Eu sinto que ele deveria ser enviado o mais rápido possível, mesmo que seja apenas
por um dia de diferença.”
“E você insiste em seu pedido, mesmo sabendo que enviar o Momon irá prejudicar o
Reino Feiticeiro?”
“Sim!”
Ela fechou os olhos, porque sabia que poderia ser abatida a qualquer momento.
“Vossa Majestade! Peço sinceras desculpas pelo desrespeito da minha escudeira! Nunca
abrigamos nenhuma intenção de prejudicar o Reino Feiticeiro.”
“Não, não se importe. Como residente do Reino Sacro, é natural querer salvar a própria
pátria, mesmo às custas dos outros... Uhum. Albedo, podemos reduzir para dois anos?”
Enquanto ela se banhava na voz daquele poderoso e absoluto governante, o leve tremor
nos ombros de Albedo deve ter sido porque ela estava desconfortável com o desafio im-
prudente que acabara de receber.
“Neia... Baraja. Que tal dois anos? Talvez ainda possa ser muito longo, mas os senhores
devem ser capazes de aguentar enquanto os exércitos do sul permanecerem, não?”
De fato, dois anos era muito tempo. No entanto, ela não poderia prevalecer ainda mais
sobre a generosidade do Rei Feiticeiro.
A gratidão em sua voz fôra genuína, pois ela sentia que a probabilidade da salvação de
sua nação havia surgido neste instante.
“Está bem. —Capitã Custodio, ela é uma boa serva. Se ela não amasse seu país tão pro-
fundamente, como uma mera escudeira ousaria pleitear tanto com o rei de outra na-
ção? ...Eu não estou zombando dela, é claro.”
“De forma alguma, tenho certeza que ela deve estar muito feliz com as palavras de Vossa
Majestade.”
Mais uma vez, o cajado bateu no chão em sincronia com seus passos, da mesma forma
que quando ele entrou. Esses sons se afastaram ainda mais e logo ouviram o som da
porta se fechando. O Rei Feiticeiro provavelmente havia saído da sala.
“Ele partiu.”
Quando Neia levantou a cabeça, viu Albedo de bochechas vermelhas sorrindo e di-
zendo:
♦♦♦
Neia se preparou para ser repreendida por Remedios, e com certeza, depois que eles
voltaram para a pousada, ela veio.
“Capitã Custodio! Tenha calma! Não há como negar que as ações da Escudeira Baraja
foram rudes, mas no final, ela nos salvou um ano de espera. Isso não é algo digno de
louvor?”
“Não fale bobagens! A coisa toda poderia desaparecer como fumaça por causa dela!
Além disso, você quer que eu a elogie por agir por conta própria? Tenho cara de idiota
por acaso!?”
“—Então sente muito por isso? Talvez tenha tido sorte desta vez, mas você pode assu-
mir a responsabilidade se a situação for de mal a pior?”
“Então por que se intrometeu e fez aquilo? Mas que merda passava por sua cabeça!?”
“Se a necessidade surgir, eu sinto que a senhora deveria tirar a minha vida e oferecê-la
ao Rei Feiticeiro como uma desculpa por minhas ações.”
Os olhos de Remedios se arregalaram quando ela ouviu isso. No entanto, eles rapida-
mente se estreitaram em desgosto mais uma vez. Ao lado dela, o Vice-Capitão Gustav
assentiu vigorosamente no que parecia ser respeito.
“E acha mesmo que isso basta para ganhar perdão? Você acha que uma vida como a sua
será o suficiente como um pedido de desculpas?”
“Eu não sei, mas tenho certeza de que a senhora e os outros poderão pensar em alguma
coisa, Capitã.”
Foi como a Capitã disse. Era provável que mesmo a execução de Neia não fosse sufici-
ente para ganhar o perdão do Rei Feiticeiro. Ainda assim, Neia ainda havia dito aquilo na
câmara de audiências porque três anos era tempo demais para esperar.
Será que a Capitã estava disposta a aceitar esperar por três anos? Por que estou sendo
repreendida por alguém que não fez nada? Eu sei que as vidas das pessoas do Reino Sacro
estão na balança, então eu não devo agir por vontade própria. Mesmo assim, alguém de-
veria ter feito algo lá na audiência...
Qual o problema desde que houvesse um bom resultado? Ou o processo era mais im-
portante? Ela provavelmente não poderia dar uma resposta como essa.
Mesmo assim, era um tanto injusto levar bronca de alguém que sequer tomou a inicia-
tiva para fazer algo.
Obviamente, Neia tinha uma boa idéia do que aconteceria caso dissesse isso. Portanto,
ela permaneceu quieta e simplesmente abaixou a cabeça.
“Capitã, isso basta. Graças aos esforços dela, economizamos um ano de espera. Recom-
pensas e punições precisam equilibrar a balança. Talvez devesse elogiá-la de forma se-
melhante.”
Parecia que a Capitã ainda não estava satisfeita com o sermão enquanto se virou e saiu.
Definitivamente não passava de uma mentira deslavada. Uma mentira que ninguém po-
deria colocar panos quentes.
Talvez Gustav tivesse percebido seus pensamentos pela expressão, mas ele a olhou nos
olhos e sorriu amargamente.
“Enfim, vou ter uma conversinha com a Capitã. Evite se encontrar com ela por agora, ou
as coisas podem ficar um pouco espinhosas. Eu poderia incomodá-la para dar uma volta
lá fora por um tempo?”
Uma vez fora da pousada, Neia vagou sem rumo pelo frio do inverno.
Mesmo com o pedido de ir para fora, onde ela deveria ir nesse país?
Neia se tateou nos bolsos e tirou uma pequena bolsa de couro. Havia pouco dinheiro
dentro, apenas algumas moedas de cobre e prata do Reino Sacro. Se essas não pudessem
ser usadas, Neia ainda tinha uma moeda de ouro comercial. Seria mais do que suficiente
para obter uma refeição.
No entanto, essa moeda de ouro foi o último dinheiro que os pais de Neia lhe deram.
Onde ela deveria gastar esse dinheiro tão especial para ela?
Depois de virar a estrada como ordenado, ela ouviu a voz dizer: “Pegue o beco à es-
querda.” Neia obedeceu silenciosamente.
Depois de dar vários passos, Neia se virou e falou o nome do dono da voz.
“Vossa Majestade, é ousadia perguntar o porquê o senhor veio aqui? Eu não consigo vê-
lo por causa da magia?”
“Entendo, então é por isso que foi tão obediente. Já sabia quem eu era, hm?”
Ele havia mudado a vestimenta para um manto preto despretensioso, mas mesmo as-
sim brilhava como veludo. Parece que era uma peça de roupa muito bem feita.
“Sim, é como Vossa Majestade diz. Também... posso perguntar onde estão os seguidores
de Vossa Majestade?”
“Não, não há nenhum. Afinal, ter seguidores por perto tornaria as coisas problemáticas.”
“Hm, eu quero falar com sua Capitã em particular, então por favor vá chamá-l— não,
seria melhor fazer isso em um quarto... Você pode me ajudar a abrir a janela do seu
quarto? Eu vou entrar por lá.”
Esse foi um pedido bizarro. Até porque, ela não tinha essa liberdade para fazê-lo. No
entanto, ela estava lidando com o rei deste país e um rei que havia concordado em ajudar
o Reino Sacro. Ela não podia fazer nada para arruinar sua boa vontade.
A palavra “assassinato” passou pela mente de Neia, mas se o Rei Feiticeiro quisesse fa-
zer isso, ele poderia tê-lo feito na câmara de audiências.
“Uhum... por acaso você está em missão? Se fosse esse o caso, eu deverei pedir desculpas
à sua Capitã.”
“Eh?”
“...Eh?”
“...Se não é uma missão, então está em seu tempo livre, não? Bem, é muito valioso— mm,
eu deveria pedir desculpas a você por ceder seu precioso tempo de descanso, pois estou
pedindo que faça coisas.”
“Nã-não, não é nada disso, enfim, vou abrir a janela para o quarto da Capitã agora.”
Aquelas palavras amáveis vindas de um terceiro foram como alguém aplicando gentil-
mente um emplasto revitalizante a uma mão coberta de arranhões e hematomas. Elas
penetraram no coração de Neia e a surpreendera.
Neia correu com todas as suas forças e voltou rapidamente para a pousada.
É claro que correr não era permitido dentro de um estabelecimento de luxo como este,
mas isso não era motivo para Neia andar devagar. Tudo o que ela podia fazer era se mo-
ver o mais rápido que pudesse, sem causar qualquer ofensa, mas apesar de tudo isso,
podia sentir os olhares gelados dirigidos a ela pelos funcionários da pousada. No final,
em meio a tudo isso, Neia finalmente chegou ao quarto da Capitã.
“Licença.”
Ela disse; agora não era hora de lembrar cada um dos pontos de etiqueta. Neia então se
virou para Remedios, que estava dentro da sala, e disse:
Neia podia sentir os olhos de todos olhando para trás de suas costas.
Do ponto de vista de uma terceira parte, essa foi uma ação inesperada. Era natural que
um paladino gritasse com ela. Era ainda menos tolerável para uma paladina que já havia
sido encarregada da segurança da Rainha Sagrada.
Contudo, Neia os ignorou quando ela inclinou a parte superior do corpo para fora da
janela e acenou para o Rei Feiticeiro, que deveria estar do lado de fora.
“O que pensa que está fazendo, Escudeira Baraja? Não bastasse abrir as janelas assim,
ainda mente sobre a presença do Rei Feiticeiro.”
Olhando para trás, ela viu uma paladina de rosto vermelho. Sua raiva era compreensível.
Contudo—
“Já está de bom tamanho, eu acho. Ela quebrou as regras pois eu pedi. Se a culpa deve
ser atribuída, então deixe cair sobre mim.”
Neia viu um paladino pegando a espada longa em sua cintura e, freneticamente, tentou
detê-lo.
Depois de descer do peitoril da janela, o Rei Feiticeiro examinou o interior da sala com
o porte régio de um rei.
Após a menção de seu nome, Neia caiu de joelhos antes de qualquer outra pessoa. Um
momento depois, ela ouviu os paladinos atrás dela simultaneamente fazendo a genufle-
xão.
“Muito bem... Levantem-se, o tempo é curto, se for conveniente, podemos ter uma rá-
pida conversa, Capitã Custodio?”
“Não temos objeções, Vossa Majestade. Por favor, venha por aqui.”
Quando Neia se levantou, ela exalou — bem a tempo de encontrar os olhos do Rei Fei-
ticeiro, que havia se virado. É claro que não havia globos oculares nas órbitas dos olhos
do Rei Feiticeiro, então dizer que ela olhava nos olhos dele era pura imaginação de Neia.
O tom natural do Rei Feiticeiro o fez soar como se ele genuinamente não soubesse.
Ainda assim, suas palavras continham um poderoso senso de sarcasmo.
“Sim!”
Embora Neia não gostasse muito de participar, por algum motivo ela queria saber o
porquê o Rei Feiticeiro escolhera visitá-los.
Remedios e Gustav encararam o Rei Feiticeiro de suas posições na mesa, enquanto Neia
e os outros ficaram ao lado das paredes. Do mesmo modo quando receberam a Rosa Azul.
“Então, Vossa Majestade, por favor, permita-me fazer uma pergunta direta. Posso per-
guntar o porquê o senhor agraciou nosso humilde alojamento?”
Havia um senso de realidade nas palavras do Rei Feiticeiro que não podiam ser retru-
cadas.
“Embora eu tenha decidido enviar o Momon em dois anos... se concordar com um pe-
dido meu, seria impossível enviar alguém a par com o Momon do Reino Feiticeiro?”
“...Posso saber a natureza do pedido que Vossa Majestade deseja fazer? Dependendo da
natureza do pedido, eu oro para que nos perdoe se não pudermos dar uma resposta ime-
diata a Vossa Majestade.”
“Mas é claro. Dado o seu estado atual, eu posso imaginar... agora, chamá-los de resistên-
cia seria inusitado nesta situação, mas o fato é que os senhores provavelmente são um
bando de guerrilheiros escondidos em cavernas, estou errado?”
Por que o Rei Feiticeiro poderia falar sobre a verdadeira natureza de suas circunstân-
cias? Como ele tinha adivinhado isso? A analogia da caverna foi particularmente impres-
sionante.
Os rostos da Capitã e Gustav eram máscaras de pedra, apenas os olhos se moveram para
olhar para Neia. Eles devem ter pensado que ela havia vazado a verdade para o Rei Fei-
ticeiro. Portanto, Neia balançou a cabeça, para indicar:
“A força do sul está intocada, porém não procurou cooperar com eles e conduzir opera-
ções conjuntas. Isso é porque existe uma divisão entre vocês e os nobres do sul. Sendo
esse o caso, uma vez que você — que não conseguiu proteger a Rainha Sagrada — caia
sob o comando do novo Rei Sagrado, provavelmente será muito difícil manter sua posi-
ção anterior. Portanto, é impossível que me ofereça terras, títulos, concessões comerci-
ais e outros privilégios. Capitã, se realmente manter suas palavras sobre este assunto, a
“Da mesma forma, você não pode usar os tesouros de seu país como barganha. Por
exemplo, a espada sagrada que carrega, Capitã Remedios. Se realmente tentasse nego-
ciá-los, o máximo que poderia fazer seria tratar os tesouros de seu país como tendo sido
saqueados por Jaldabaoth e depois entregá-los a mim. Todavia, isso é muito perigoso. Se
alguém informar ao próximo Rei Sagrado que os tesouros realmente foram obtidos atra-
vés de você, a confiança em seus paladinos provavelmente irá afundar como uma pedra
no lago. Em outras palavras, é inútil. Portanto, senhoras e senhores, tudo o que podem
fazer já foi feito na câmara de audiências, informando-me de sua situação. Imagino que
eu tenha acertado em cheio, dadas as expressões em seus rostos.”
Perfeito. Ele foi primorosamente perfeito. Neia não sentiu nada além de respeito pela
interpretação do Rei Feiticeiro sobre a situação.
Pensou Neia.
Neia uma vez encontrou a Rainha Sagrada de perto, mas a Rainha Sagrada simples-
mente a cumprimentou, e Neia não teve a chance de interagir de verdade com um ver-
dadeiro monarca. Para Neia, agora era a primeira vez que ela se encontrava com um
governante absoluto — um detentor de uma dignidade e discernimento que superava
todos os outros, além do poder incrível — ou, em outras palavras, um ser perfeito. Este
choque de realidade deixou uma impressão indelével no coração de Neia.
“Dito isso, qualquer um poderia ter imaginado sua real situação. Na verdade, estou um
pouco envergonhado de vir aqui e falar essas coisas... Eu acredito que nenhum de vocês
chegou a pensar que eu não consideraria isso, correto?”
“Maravilhoso. Se eu tivesse sido considerado como um idiota que não poderia nem pen-
sar nisso, eu não seria capaz encarar meus subordinados que sempre trabalharam tanto
por mim... agora, com base em tudo isso, deixe-me ser claro sobre o que eu quero — isso
seria, as empregadas. Eu quero elas.”
“...Ah, sinto muito. Eu não fui claro. Como direi isso? Acredito que, durante nossa reu-
nião anterior, surgiu o tópico de Jaldabaoth, que ele possui empregadas poderosas. Isso
é o que eu quero. Qual grau de conhecimento mágico você possui?”
“Nenhum.”
Depois que Remedios disse isso, o Rei Feiticeiro olhou em volta, como se buscasse ajuda.
“Então, então esse é o caso... bem, sendo assim, eu me pergunto onde deveria começar
a explicar... ah, bem, isso também... Ah— imagine que Jaldabaoth acorrentou as empre-
gadas a ele por algum mecanismo. Portanto, meu plano é derrotar Jaldabaoth, tomar essa
fórmula para mim e depois colocar as empregadas sob meu controle. Dessa forma, meu
país ganhará poderosos lacaios.”
“Elas foram avistadas no Reino, afinal. Acho difícil imaginar que elas não estejam lá. Ou
talvez elas não apareçam até que Jaldabaoth seja encurralado?”
“Não vamos colocar a carroça na frente dos bois. De todo modo, eu não estou pedindo
para produzirem algo que possa substituí-las. No máximo, vou apenas descartar isso
como um esforço desperdiçado. Porém, existe a possibilidade de que elas possam ter
aparecido sem o disfarce de empregada, então minha solicitação provavelmente incluirá
os subordinados de Jaldabaoth também. Ah, vale a pena mencionar que ele pode ter
usado algum tipo de item especial para dominá-las, então pretendo acrescentar uma
condição de que qualquer um dos itens mágicos de Jaldabaoth que não possam ser con-
siderados propriedade do Reino Sacro serão meus. Pode acontecer que as empregadas
que devastaram o seu Reino Sacro possam acabar se tornando parte do meu Reino, e,
nesse caso, espero contar com o seu esquecimento de seus ressentimentos contra elas,
pois elas cairão sob meu domínio.”
“O senhor quer dizer que deseja que perdoemos as pessoas que podem devastar o nosso
país?”
“Vossa Majestade, a Capitã quer dizer que, como forasteiros, será muito difícil conven-
cer as vítimas a esquecer seus ressentimentos.”
“...Não, então, apenas diga que as empregadas foram dominadas pela magia do Rei Fei-
ticeiro e levadas embora. Isso deve acalmar um pouco o ódio deles, não?”
Neia pensou quando ouviu o Rei Feiticeiro falar. Se ainda se recusassem a aceitar os
termos do Rei Feiticeiro depois que ele fizera tantas concessões, era muito provável que
ficassem de mãos vazias para qualquer negociação.
Claro, esses eram termos extraordinariamente favoráveis para o Reino Sacro. Se eles
não aproveitassem essa oportunidade, a única palavra para descrevê-los seria “tolos”.
“—Vossa Majestade!”
“Por favor, permita-nos discutir isso por um momento! Por favor, nos dê algum tempo!”
Vocês ainda precisam discutir assuntos depois que ele se comprometeu tanto?
Mesmo Neia sentiu que não seria estranho para o Rei Feiticeiro repreendê-los. Mas—
“Muito obrigado. Então, vamos discutir rapidamente as coisas. Eu rezo para que o se-
nhor seja paciente, apesar deste desserviço.”
“Sim, nossa conclusão é que vamos respeitar todos os termos de Vossa Majestade.”
“Eu não estou pedindo para que me obedeça. Eu estou simplesmente fazendo uma troca.
Enfim, isso não importa. Bem, creio que deveríamos colocar isso por escrito, mas eu não
tenho o equipamento necessário e selos. Acertaremos os pormenores mais tarde... Não
se importaria se eu usar a escrita do Reino, não é?”
“Há pessoas aqui que podem ler, então não há problema. Então, seria precipitação de
minha parte o incomodar para nos apresentar à pessoa que está a par com o Momon?”
“Ahh, ele está diante de vocês neste exato momento — em outras palavras, eu.”
O silêncio encheu a sala mais uma vez, e Neia e os outros não conseguiram falar en-
quanto olhavam.
As palavras de Remedios fizeram Neia congelar no lugar, mas havia um homem que fez
um movimento por causa dessas palavras.
“Por favor, por favor, espere um momento, Capitã. Há outra coisa que precisamos per-
guntar a Sua Majestade antes disso.”
“Ah, tem certeza que não haverá problemas se Vossa Majestade deixar sua nação e for
para o Reino Sacro? Eu não sei quanto tempo isso vai levar.”
“M-mas, mesmo assim, certamente ter o governante de uma nação em pessoa é muito—”
“Depois de me ouvir, não concluiu que eu iria em pessoa? Eu disse que pretendo derro-
tar Jaldabaoth e trazer as empregadas sob meu controle, entendeu? Seria muito difícil
“Claro que há problemas com isso! Vossa Majestade! Brincar com essas coisas real-
mente não ajuda em nada a nossa causa!”
“Mas não é brincadeira. Ninguém além de mim pode derrotar Jaldabaoth. Além disso,
eu vou sozinho. Eu não levarei exército algum. Por isso eu vim sozinho para discutir o
assunto em particular com os senhores.”
“Mas se Vossa Majestade sofrer uma lesão irrecuperável de Jaldabaoth, isso seria muito
ruim para o relacionamento entre nosso país e o Reino Feiticeiro!”
“É como o Gustav diz. Vossa Majestade, realmente não há problemas a esse respeito?”
“Nenhum mesmo.”
“Mas—”
Depois de estender a mão para parar Gustav, Remedios fez uma profunda reverência e
disse:
♦♦♦
“O que você está pensando!? Recrutando um rei! O REI de um país! Para lutar com Jal-
dabaoth e tudo mais!”
Ele poderia não operar por senso comum, mas isso era simplesmente sem sentido.
“E daí? Você não acha que é irrelevante o que acontecer com os undeads?”
“...De um lado tem um demônio e do outro um ser undead. Não seremos prejudicados
independentemente de quem for eliminado. Você não acha?”
Os olhos de Gustav se arregalaram. Isso não era aceitação da opinião de sua Capitã, mas
choque com o que sua Capitã acabara de dizer.
“Ambos são inimigos da humanidade. Então, idealmente, seria melhor se ambos os la-
dos se destruíssem... Enfim, não vamos apenas sentar e colher os louros. Mesmo se o Rei
Feiticeiro for ferido até a morte por Jaldabaoth, não tiraremos vantagem de sua situação.
E ISSO É TUDO.”
“...Capitã. Se o Rei Feiticeiro, que controla tantos undeads, for destruído, então quando
estes undeads forem libertados, isso não causará uma quantidade incrível de destrui-
ção?”
“—Capitã!”
“De muitos modos. É tudo pelo bem da nossa nação. É para salvar as pessoas que mais
sofrem. Não é como se eu esperasse que as sementes do sofrimento se espalhem para
outros países. Eu também desejo a vitória do Reino Feiticeiro, uma vez que está auxili-
ando o Reino Sacro.”
Como assim?
Neia pensou enquanto olhava para Remedios, que estava dizendo tudo isso em um tom
calmo e uniforme.
Essa mulher é realmente a Capitã da Ordem Paladina do Reino Sacro, Remedios Custodio?
Neia não estava certa sobre sua situação. Afinal, ela sempre a olhava de longe. Entre-
tanto, ela sentiu que esta era uma pessoa completamente diferente da Capitã que ela
tinha ouvido falar.
Pensou Neia. Não, ela não estava sozinha. Olhando em volta, ela viu que os paladinos
que estavam perto dela tinham a mesma expressão. Neia deve ter a mesma aparência
deles.
“Não, nada, absolutamente nenhuma. Não devemos pensar sobre o que devemos fazer
depois de levar o Rei Feiticeiro conosco?”
“Bem, se o Rei Feiticeiro não estiver de historietas e realmente puder lutar contra Jal-
dabaoth, que tal a retomada da capital? E então podemos pedir a ele para derrotar Jal-
dabaoth logo depois disso.”
“...Isso seria ruim. Sua Majestade disse que ele pretende derrotar Jaldabaoth, reivindi-
car as empregadas para si mesmo e, em seguida, retornar ao seu país. Creio que devemos
deixá-lo derrotar Jaldabaoth por último, a fim de colher os maiores benefícios... Se se-
guirmos sua sugestão, Capitã, não teremos forças para derrotar os demi-humanos res-
tantes.”
Gustav fez uma pausa para pensar e depois fez uma sugestão.
“Boa! Uma excelente idéia. Afinal, há pessoas importantes que precisamos resgatar.”
“Além disso, os nobres que podemos resgatar certamente apreciarão seus libertadores.”
A maioria dos nobres não havia expressado sua aprovação à Rainha Sagrada e, segundo
a avaliação da Capitã, não havia ninguém que gostasse dela.
No entanto, deve haver alguns nobres do norte com laços de sangue para os nobres do
sul. Se lhes fizessem um favor, deveriam poder fazer um pedido formal aos nobres do
sul.
“Hein? Haaaahh! Por-por favor espere! Eu não posso servir um rei ou algo assim como
uma escudeira!”
Normalmente, ela teria concordado imediatamente, mas agora ela estava desesperada-
mente tentando recusar. Isso não era algo que ela pudesse casualmente aceitar. Deve
haver algo errado com a cabeça de Remedios.
—Gustav se intrometeu:
“Se não tivermos alguém de status apropriado para o servir como serva, isso será con-
siderado um insulto para com Sua Majestade.”
Mulheres que não podiam lutar há muito tinham fugido para o sul. No entanto, isso não
queria dizer que elas não existissem. O Exército de Libertação ainda abrigava algumas
mulheres. Gustav estava prestes a citar algumas quando a Capitã o interrompeu.
“Precisamos de uma mulher envolvida com a Ordem Paladina. Se eu desse ordens a uma
mulher do sacerdócio, o que acha que os templos fariam? Minha irmã não está mais por
Ah, tá... Estão simplesmente jogando tudo em cima das minhas costas, né!?
“Eu vou lutar na linha de frente, esqueceu? Se não bastasse isso, ainda quer que eu vá
acompanhar o Rei Feiticeiro? Devemos ceder toda autoridade a ele?”
“Mesmo usando ele, não podemos impor que ele faça algo. Haverá problemas de confi-
ança, e se o Rei Feiticeiro ver que não temos poder de luta, pode até decidir conquistar
o Reino Sacro enquanto estiver lá...”
Depois de ver a agonia de Gustav, Neia percebeu o fato de que seus aliados poderiam
acabar se voltando contra eles.
“—Tudo bem. Embora eu possa não ser suficiente para a tarefa, vou trabalhar ardua-
mente e fazer o meu melhor.”
“Ahh. Preste atenção. Sua missão é amansar o Rei feiticeiro e deixar ele mais suscetível
às nossas intenções. Bajule-o e o mantenha de bom humor.”
Não apenas era um pedido impossível. Mas também um absurdo. Ela não tinha confi-
ança de que pudesse fazer uma coisa dessas. No entanto, independentemente do que ela
dissesse, Remedios não mudaria de idéia. Neia baixou a cabeça em resignação.
“Entendido! Farei o meu melhor para atingir esse objetivo e espero contar com a ajuda
de todos aqui.”
Mesmo quando o desespero encheu seu coração, Neia ficou surpresa que ela estava re-
almente se sentindo um pouco alegre.
Neia olhou discretamente para o Rei Feiticeiro, que se sentava de frente a ela e olhava
para fora.
Mesmo que o dito cujo fosse um temível rei dos mortos, ela não mais sentia a grandio-
sidade opressiva que ele mostrou quando os encontrou na câmara de audiências.
Provavelmente fôra devido a passar mais tempo conversando com o Rei Feiticeiro du-
rante sua jornada.
Nesse tempo de convívio, uma coisa que Neia aprendeu foi que o Rei Feiticeiro era ex-
tremamente magnânimo.
Era verdade que o Rei Feiticeiro agia com a dignidade de um soberano, cada ação refle-
tia sua qualidade de monarca.
No entanto, quando Neia sentou na carruagem com ele, de vez em quando, ele agia como
uma pessoa comum. Além disso, recentemente essas ocorrências foram ficando cada vez
mais frequentes.
Com toda probabilidade, o Rei Feiticeiro considerou que Neia ficaria nervosa ao com-
partilhar a mesma carruagem que ele e, em sua generosidade, escolhera agir mais como
um plebeu. A razão pela qual esses incidentes estavam recorrendo mais e mais certa-
mente foi porque suas habilidades estavam melhorando.
A razão pela qual ele não agiu assim em relação aos outros foi provavelmente porque
eles ainda estavam desempenhando o papel de paladinos.
E pensar que ele trataria os cidadãos de outro país dessa maneira... que homem compas-
sivo ele é...
O que ele estava olhando? Para os paladinos andando ao lado da carruagem? Ou talvez
algo mais, algo que Neia não viu—
“Eh—! Não, minhas desculpas, Vossa Majestade! Não há nada em seu rosto...”
“Suponho que deve ser muito incômodo andar de carruagem em completo silêncio. Sim,
nesse caso, vamos conversar.”
Embora ela tivesse se acostumado um pouco com isso, conversar com o Rei Feiticeiro
sempre fazia seu estômago doer.
“Sinto que houve — e ainda há — pouca intimidade entre nós, por isso não quis fazer
perguntas que pudessem interferir em sua privacidade, mas já estamos compartilhando
a mesma carruagem por vários dias. Suponho que podemos ser honestos um com o outro
agora. Neia Baraja, pode me falar sobre você?”
“Sobre mim?”
Até mesmo falar sobre si mesma era um assunto muito vago. Ela não tinha idéia do que
poderia dizer para agradar ao Rei Feiticeiro.
“Sim, isso mesmo. Por exemplo, o porquê quis se tornar uma escudeira. Que tipo de
trabalho faz uma escudeira. Você poderia me falar a respeito?”
Depois de inclinar a cabeça, Neia começou a falar sobre o que ele lhe pedira, mas não
era um assunto empolgante. Falar sobre família e o trabalho de uma escudeira não era
particularmente interessante.
Além disso, me disseram para não revelar nada ao Rei Feiticeiro sobre assuntos dentro do
país, mas isso deve bastar.
Por outro lado, se ela tivesse que encobrir esses detalhes, não haveria nada sobre o que
falar.
Logo, a história monótona sem estrutura acabou, e o Rei Feiticeiro assentiu profunda-
mente.
“Entendo, interessante. Então você é uma arqueira, uma raridade entre as escudeiras,
Srta. Baraja.”
“Minhas habilidades não são boas o suficiente para que eu me chame orgulhosamente
de arqueira, Vossa Majestade. Eu sou simplesmente melhor no tiro com arco do que na
esgrima, e a verdade é que as pessoas me repreenderam e me disseram que eu deveria
me concentrar mais em treinar minhas habilidades com a espada.”
“...Não acho que seja assim, claro que uma candidata à paladina que tenha afinidade por
armas de longo alcance é algo bem raro. Se aceita um conselho, sugiro aprimorar suas
habilidades de arco. Já que há outros mais adequados para a esgrima, então você deve
permitir que essas pessoas lidem com a esgrima.”
“—Muito obrigada.”
As palavras do Rei Feiticeiro foram sinceras, e fez Neia sentir que ele estava sincera-
mente pensando: Que combinação estranha; ela deve estar percorrendo um caminho
rumo a uma vocação rara. Contudo, ela não tinha idéia do que fazer com o que o Rei
Feiticeiro disse em seguida, e seus murmúrios incomodaram Neia.
“Sinto-me envergonhado por deixar que apenas a senhorita lide com a tarefa de me
acompanhar. Ou melhor, não se limita apenas à senhorita; o mesmo vale para o resto de
seus paladinos. A melhor maneira de usar suas habilidades seria lhe posicionar do lado
de fora.”
Foi por isso que falar com esse rei era tão ruim para o coração dela.
Não só estava no auge de seu país, mas também era um indivíduo poderosíssimo. En-
tretanto, ele não tinha escolhido conversar como se tivesse um rei na barriga, mas sim
se rebaixou até poder olhar olho a olho antes de envolvê-la em uma conversa.
Não! Eu não posso deixar Vossa Majestade me mimar assim! Se eu não me rebaixar um
pouco mais—
Neia se recompôs.
“Todo mundo sabe que eu fui designada como seguidora de Vossa Majestade, então
rogo para que não leve isso em consideração. Além disso, não há trabalho mais impor-
tante do que acompanhar Vossa Majestade.”
“Bom ouvir isso... Ainda assim, eu gostaria de oferecer-lhe alguma forma de recom-
pensa.”
No passado, o Rei Feiticeiro havia mencionado o assunto de pagamento. Ela havia recu-
sado, é claro, mas parece que ele estava abordando o assunto novamente. Neia imedia-
tamente começou a pensar em como rejeitar sua oferta sem causar ofensa, mas o Rei
Feiticeiro ainda não havia terminado.
Um rei estava realmente se curvando para alguém como ela, que não era nada mais do
que uma escudeira.
Era natural que um rei carregasse o peso de sua nação sobre seus ombros. Desprezar
um rei seria o mesmo que desprezar o país inteiro. A idéia de que um país vivia através
de seu rei era uma noção muito comum.
Em outras palavras, o fato de um rei estar se curvando era o mesmo que uma nação se
curvando. É claro que não era impensável quando um rei fazia isso para alguém de alta
posição.
No entanto, Neia era pouco mais do que cidadã de outro país e com toda honestidade,
não havia necessidade dele se desculpar com alguém do status social de Neia.
Não dá pra acreditar. Sua Majestade é inteligente e muito esperto, ele certamente deve
saber o significado de se curvar. Mesmo assim, ele ainda se curvou pra mim— Droga. Não
posso ficar convencida assim. Eu não tenho valor algum. Isso simplesmente mostra quão
magnânimo o Rei Feiticeiro é; ele até trata uma plebeia com respeito. Ah! Mas ele não deve!
“Por favor não faça isso! Vossa Majestade! Por favor, levante a cabeça!”
Sim. Era o que ela deveria ter dito antes de mais nada.
O Rei Feiticeiro olhou para cima e Neia suspirou bem baixo. E sendo sincero, se mais
alguém tivesse visto o que acontecera agora, algo terrível teria acontecido.
“Vossa Majestade—”
“Sua serva é de origem humilde, mas eu juro que até que o trabalho de Vossa Majestade
esteja completo, vou ser leal e fielmente servirei a ti.”
Desde que um rei lhe dera sua deferência, era natural que ela devolvesse em igual mo-
eda.
Neia ignorou a voz em sua cabeça que dizia que ele não era o rei do Reino Sacro, e se
curvou.
“Ontem passamos em segurança pelas ruínas do muro pela graça do poder de Vossa
Majestade. Escolhemos uma rota que nos tornará mais difíceis de descobrir, por isso
pode levar um pouco mais de tempo, mas acredito que chegaremos à nossa base amanhã
ou no dia seguinte.”
“Mesmo? Creio que ainda temos algum tempo, não? Conte-me sobre aquele assunto de
antes. Além disso, eu ainda não sei o porquê está focada em se tornar uma paladina. Dado
o seu talento para o arco, certamente deve ter havido algum outro caminho que poderia
ter tomado. Por que almeja ser uma paladina? Por uma questão de justiça? Ou talvez seja
o orgulho de sua nação?”
“Não—”
Quando ela estreitou os olhos, o que veio à mente foram suas experiências pessoais:
Ela era uma paladina muito habilidosa com a espada, completamente diferente de Neia.
“Ah, não. Minha mãe sempre dizia que eu não deveria ser uma paladina. E minha mãe
não podia fazer o trabalho de ser mãe, mesmo ela sabendo lavar a roupa e costurar, ela
era completamente incapaz de cozinhar e fazer coisas do tipo. Ela fazia tudo de forma
desleixada, a carne assada estava sempre malcozida, esse tipo de coisa.”
Portanto, era natural que seu pai fosse quem cozinhava em casa. Quando era jovem, ela
até pensou que era o cotidiano para todas as famílias.
“...Hmmm. Bem, mesmo ela não gostando da idéia, ela não a impediu em momento al-
gum de tentar ser uma paladina, ao meu ver ela era uma boa mãe.”
“Ah, nem tanto. Quando eu disse à minha mãe que queria ser escudeira, ela pegou a
espada e disse, ‘Só deixo se puder me derrotar!’. O único motivo de eu ter conseguido ser
aprovada, foi porque meu pai veio correndo me proteger. Sozinha eu jamais teria dado
conta.”
“...Ahhhh, mm, erm, como direi isso... é uma boa família... mm.”
“Sim. Era comum os vizinhos nos encararem de um jeito estranho, eu acho que éramos
uma boa família.”
“...Isso é realmente ótimo... É, mas ainda não me disse o que lhe motiva a tornar-se uma
paladina. Não pensou em trilhar os passos de seu pai? Por sinal, ele era dono de casa?”
“Não, meu pai também foi um soldado que serviu meu país. Mas nunca pensei em seguir
os passos dele... e o motivo? Acho que é porque herdei esses olhos dele, então eu acabei
me ressentindo por isso...”
Neia pressionou os dedos indicadores nos cantos dos olhos e os moveu em círculos.
Quando era jovem, suas amigas costumavam dizer: “Que cara feia é essa? Tá com raiva
de mim?” e assim por diante, isso a levava a sempre reclamar com seu pai. Uma certa
ocasião sua mãe acabou ouvindo as reclamações e Neia levou um castigo.
Pensou Neia.
“Mas, acho que depois que me tornei escudeira, comecei a ver as coisas de outro modo.
Não sei quando começou, mas de um tempo para cá comecei a pensar nisso como um
presente do meu pai. Bem, só queria não ter herdado esse olhar feio.”
“Meu pai lutou contra o exército de Jaldabaoth na Muralha e morreu. Perdi contato com
minha mãe e não sei o que aconteceu com ela, mas acho que ela deve ter morrido durante
a defesa da cidade. Afinal, ela era do tipo que teria lutado até o amargo fim.”
O Rei Feiticeiro curvou-se para ela mais uma vez. Como esta foi a segunda vez, o impacto
não foi tão grande. No entanto, foi o suficiente para fazer Neia se sentir ansiosa.
“Por favor, por favor, levante a cabeça! Como o senhor pôde se curvar a alguém como
eu!?”
“Sem pensar nas consequências indaguei sobre seus familiares mortos. Embora não
soubesse antes, agora que conheço os fatos, um pedido de desculpas se faz muito justo e
necessário.”
Não, isso não está certo, é assim que deve ser entre iguais. Um rei não é igual a um cidadão
de outro país. Além disso, somos nós que solicitamos sua ajuda...
“Erm— bem, essas exceções estão em todo lugar. Se alguém ver Vossa Majestade se
curvar para mim— ah— eles podem desprezá-lo, Vossa Majestade, pois sou apenas uma
escudeira.”
Ele provavelmente estava dizendo que as diferenças culturais de suas nações dificulta-
vam romper os laços de estranheza, mesmo que ele quisesse mostrar sua sinceridade,
isso o atrapalhava.
“Já sei. Embora isto não cumpra o papel de um pedido de desculpas adequado, vou em-
prestar-lhe isso, Srta. Baraja.”
—Hah?
Era maior do que o que poderia estar escondido dentro de suas vestes. Neia piscou vá-
rias vezes, mas a realidade se recusou a mudar.
Elementos do arco eram feitos com partes de animais, mas não parecia cru ou ensan-
guentado; em vez disso, ela sentiu que emanava uma aura sacrossanta.
Ela poderia dizer de relance. Em outras palavras, esse arco era uma obra-prima que
precisava ser descrita com a palavra “super”.
“É chamada de Ultimate Shooting-Star Super, feito com a antiga arte do ofício rúnico.
Por várias razões, eu estava o carregando para emprestar para outra pessoa. Ah, nor-
malmente haveriam runas esculpidas aqui, mas você não pode vê-las agora por causa do
desgaste de uso. O que acha?”
Normalmente, ela deveria recusar. Isso era muito provável que fosse um tesouro naci-
onal do Reino Feiticeiro. No entanto, alguém emprestaria tal tesouro a um seguidor de
outro país?
“O que acha? Não tem problema se aceitar. Seu trabalho é me fazer companhia e me
proteger, não é? Nesse caso, seria bom equipá-la com uma boa arma, estou errado?”
“Ngh!”
“Ahh, sinto muito. Acha isso muito chamativo? Nesse caso, tenho algo mais discreto, o
Great Bow Special, que também é um produto do ofício rúnico.”
“P-Por favor, não se incomode! Estou mais do que satisfeita! Por favor, não saque mais
armas!”
As palavras de Neia saíram como um grito triste quando implorou ao Rei Feiticeiro que
parasse de tirar armas de suas vestes. Se outra incrível arma fosse pega em sua frente,
Neia não achava que seria capaz de manter seus sentidos. Além disso, ter apenas um
artigo desse consigo já implicava em passar o dia inteiro tomando extremo cuidado para
não o danificar.
“Vossa Majestade! Eu humildemente aceito esse Ultimate Shooting-Star Super que o se-
nhor me deu a honra de portar!”
Devido aos acessórios e decorações, ele dera a impressão de ser muito pesado, mas era
surpreendentemente leve em mãos. No momento em que o segurou, ela sentiu o corpo
se fortalecer, como se o poder estivesse fluindo para dentro de si, ou isso era apenas
devido a chocante leveza do arco?
Ah, só piora. Eu queria me tranquilizar com o pensamento de que não era nada mais do
que um item mágico de aparência extravagante. Eu... eu realmente posso me ferrar com
isso. Até onde sei... Isso pode ser melhor que a espada sagrada... eh? Calma, muita calma
nessa hora... não, certamente não pode...
“O que achou? Para mim, não é algo de se orgulhar, sabe? Se gostar de alguma outra —
se quiser uma arma melhor, por favor me avise.”
Era uma situação ruim. Se o assunto continuasse, as coisas poderiam ir para um cami-
nho extremamente ruim. Ela não podia começar a imaginar o que aconteceria se uma
escudeira acabasse com equipamentos melhores do que a hierarquia de poder militar
no Reino Sacro.
Deixar que outra pessoa segurasse isso seria muito perigoso, então Neia agarrou-se a
ele com força.
Ela sorriu para o Rei Feiticeiro enquanto assentia. Mesmo com um sorriso um pouco
seco, ela conseguiu esconder habilmente seus pensamentos.
Não é melhor eu deixar escondido? Se possível, eu prefiro enrolar com um pano ou algo
assim— mas eu não posso fazer uma coisa dessas com a arma que Sua Majestade me em-
prestou pra protegê-lo... Ah... droga, minha cabeça tá começando a doer. E segundo ele;
uma arma dessas não é nada de mais...? Os padrões de Sua Majestade são muito altos... E
se eu acabar estragando esse arco, quem vai pagar? Eu? Ahhh, minha barriga dói... Só
quero esquecer que tô segurando isso... Gr!
“—Hoh.”
Ele respondeu com uma voz calma que era tremendamente diferente da que ele havia
usado até então. Neia ficou desconfortável se ela cometera algum tipo de erro.
Ele havia nomeado seu país análogo ao nome. Assim, Neia imaginou que o Rei Feiticeiro
estava ansioso para se mostrar, o que provavelmente foi o motivo que o levou a construir
aquelas enormes estátuas de si mesmo para proclamar seu poder àqueles que o rodea-
vam.
“As estátuas não apenas mostraram a grandeza de Vossa Majestade, mas também de-
monstraram seu poder! Nós não temos estátuas assim no Reino Sacro!”
Isso definitivamente não era mentira. Não obstante o tamanho, seriam necessárias téc-
nicas de engenharia que tivessem sido refinadas até uma arte para produzir um produto
semelhante à vida real. Havia uma estátua de tamanho semelhante de um Sea Dragon
em um lugar chamado Farol do Cabo, mas era mais rudimentar, e parecia bastante paté-
tica depois de ter sido desgastada pelas intempéries.
“Meus subordinados estão planejando levantar estátuas como aquelas em vários luga-
res de minha nação.”
“Entendo. Realmente seria uma boa maneira de declarar toda a glória de Vossa Majes-
tade!”
“...Uh, mm. Mas sinto que colocar estátuas à minha semelhança dentro do meu país é
meio que... como direi? Enfim, meus subordinados quiseram construir estátuas minhas
de cem metros no meio da cidade para que o mundo me visse... acho que eles se empol-
garam com o conceito de maior é melhor.”
O Rei Feiticeiro tossiu para limpar a garganta, e foi aí que surgiu uma questão na mente
de Neia:
No entanto, o Rei Feiticeiro estava falando quando essa pergunta ecoou em sua cabeça,
e ela não pôde interrompê-lo.
“Ahhh!”
Neia não só havia esquecido que o Rei Feiticeiro estava morto, mas também nutria sen-
timentos de genuíno respeito por ele.
“Há outros meios de declarar minha grandeza ao mundo, por exemplo; permitir que
meu povo tenha uma vida pacífica. Agora, estátuas à minha imagem...? Desejo ser conhe-
cido pela paz do meu governo.”
“Vossa Majestade é um undead, mas por que passa tanto tempo pensando nas pessoas?”
Neia não achava que a compaixão do Rei Feiticeiro pelas massas fosse uma atuação. Ela
até começou a se perguntar se ele era de fato um undead.
“...Não cheguei a pensar no que me motiva. Mas sinto que deve ser um bom caminho a
seguir, não?”
Ou — foi porque ele era undead? Ele tinha essa perspectiva justamente por ser alheio
à vida?
“Até porque, se realmente tivesse cem metros de altura, haveria reclamações sobre eu
impedi-los de receber luz solar suficiente e assim por diante.”
O Rei Feiticeiro seguiu com o que soou como uma piada, que só serviu para perfurar a
humildade deste incrível monarca no coração de Neia mais uma vez. Este homem era
verdadeiramente o Rei entre os Reis.
♦♦♦
Havia uma fonte subterrânea em um canto da caverna e, embora o teto não fosse muito
alto, era muito espaçoso, o suficiente para um cavalo e uma carruagem entrarem. Além
disso, cogumelos, que emitiam luz branca-azulada brotavam ao redor — tinham cerca
da metade da altura de um homem —, de modo que não precisavam de outras fontes de
luz.
A razão pela qual sabiam desse lugar fôra porque os paladinos tinham sido enviados
aqui para exterminar um monstro que fizeram dessa localidade seu covil.
Quando saíram fugidos, eles reformaram o local e o dividiram em vários setores, cada
um servindo a um propósito diferente. Eles até conseguiram fazer com que seus quartos
de dormir parecessem quartos bem acomodados. Eles cortaram as árvores ao redor da
Havia um total de 347 pessoas aqui: 189 paladinos, 71 sacerdotes — incluindo apren-
dizes e outros funcionários do ramo — assim como 87 plebeus com nenhum outro lugar
para onde ir. Naturalmente, qualquer resquício de privacidade estava totalmente fora
de questão.
Mesmo assim, eles não podiam deixar o rei de outro país ficar com todos os outros.
E obviamente, não poderiam dizer que gostariam que ele usasse magia de teletrans-
porte para que fosse descansar no Reino Feiticeiro.
No final, eles tiveram que alocar as coisas dos outros para longe e criar uma sala privada
para o Rei Feiticeiro.
“...Hm.”
“...Embora eu não tenha a intenção de insultar sua pessoa, tenho algumas perguntas
sobre essa coisa toda e espero que possa responder da melhor maneira possível. Parece
que vocês não estão escondendo seus rastros; isso não é um problema? Ou alguém vai
cuidar disso?”
O Rei Feiticeiro fez sua pergunta em um tom de voz despretensioso — como se estivesse
lendo alguma coisa —, e então os olhos de Neia se arregalaram.
“Vossa Majestade. Não realizamos nenhum trabalho de ocultação até hoje; será que de-
liberadamente nos deixaram passar despercebido? ...Mas por quê?”
Ao longo desta jornada, Neia tornou-se plenamente consciente de que o Rei Feiticeiro
era um indivíduo extremamente sábio. Portanto, ela pensou que ele poderia fornecer
imediatamente a resposta, e seus pensamentos não estavam enganados.
“...Há muitas possibilidades, mas em circunstâncias normais, essa seria a mais prová-
vel...”
Por um momento, Neia pensou que não deveria ouvir sozinha a resposta do Rei Feiti-
ceiro, mas sim na presença da Capitã. Todavia, ela não conseguia controlar a crescente
curiosidade.
“Talvez seja porque não querem perder você de vista— ou melhor, o Exército de Liber-
tação?”
“Hm— bem, não se ofenda com a comparação, mas digamos que encontrou um ninho
de ratos causando problemas, caçar um por um é meio desagradável, não? A melhor
coisa a fazer seria esperar que todos os ratos se reunissem e, em seguida, matar todos
de uma vez.”
Faz todo sentido! É exatamente como Sua Majestade diz. Eu acho difícil imaginar qual-
quer outra possibilidade. Ele já pensou isso tudo em apenas alguns minutos depois de ter
chegado aqui... é como se ele soubesse exatamente o que o inimigo está pensando, ele é
incrível...
“Bem, enquanto a situação continuar a mesma, não haverá nada para se preocupar. No
entanto, não estou falando apenas da situação aqui. Mudanças no lado do inimigo podem
levar a uma chance muito alta de serem atacados, o que seria problemático.”
Neia não sentiu nada além de respeito pela inteligência do Rei Feiticeiro ao destacar os
pontos mais delicados das circunstâncias atuais.
“Eh? Mas certamente Vossa Majestade deve estar cansado da longa jornada. Nós prepa-
ramos um quarto minimamente digno, não seria melhor descansar um pouco antes de
continuar?”
Os undeads, seres que não sentiam fadiga. Foi por isso que tentar fugir de um undead
de velocidade comparável era muito difícil de acordo com as lições que aprendera.
Mesmo isso sendo de conhecimento comum, as experiências de Neia com o Rei Feiticeiro
haviam destruído completamente sua percepção dos undeads. Às vezes, ela até se via
pensando que ele era apenas um magic caster humano em uma máscara de crânio.
Embora ela soubesse que “nos”, neste caso, se referia ao Reino Sacro e ao Rei Feiticeiro,
também poderia ser interpretado como falando sobre Neia e o Rei Feiticeiro. Isso fez
Neia se sentir um pouco acalorada.
Quando o paladino do lado de fora viu o arco que Neia estava segurando, seus olhos se
arregalaram de surpresa.
Esta foi a primeira vez que ela trouxe o arco que recebera do Rei Feiticeiro do lado de
fora da carruagem. Isso porque o Rei Feiticeiro não saíra da carruagem desde que lhe
emprestara o arco. No final, ninguém mais tinha visto até agora.
...Ficou surpreso, né? Mm. Eu sei como se sente. Uma arma dessas não deveria estar na
mão de uma escudeira como eu...
Enquanto o paladino o olhava de cima a baixo, Neia se virou para encarar a carruagem
e fez uma reverência.
Embora ela estivesse simplesmente olhando para o chão, depois de sentir que o Rei
Feiticeiro havia descido, Neia levantou a cabeça e perguntou ao paladino:
Provavelmente tinham ouvido o essencial através da Capitã e os outros que tinham ido
à frente deles, mas os presentes ainda não podiam deixar de olhar embasbacados para o
Rei Feiticeiro.
O Rei Feiticeiro não vai ficar bravo por isso, né? Afinal, ele é um governante muito gentil.
No entanto, quanto mais gentis as pessoas eram, mais assustadoras costumavam ser
quando ficavam com raiva.
A fim de evitar tal acontecimento, deveria ela dizer-lhes que estavam sendo rudes? In-
felizmente, ela não podia falar com todos e cada um deles pessoalmente, e não era um
problema que pudesse ser resolvido apenas com diálogo. Afinal, para os cidadãos do
Reino Sacro — para todos os seres vivos — os undeads eram fundamentalmente o ini-
migo.
Contarei à Capitã depois... bem, já é bom que eles não tenham sacado suas armas.
De repente, Neia sentiu que o Rei Feiticeiro havia produzido um pedaço de papel e que
ele estava olhando para as letras escritas nele. Embora Neia estivesse interessada no que
estava escrito lá, ela não podia ver as letras devido à maneira como estavam escondidas
em sua mão.
Finalmente, eles foram levados para uma sala dividida por uma cortina suspensa, e os
sons de uma ruidosa troca de opiniões vieram de dentro.
“Deixe-os entrar.”
Não há como Sua Majestade não sentir esse climão... talvez ele simplesmente não se im-
porte com as briguinhas de homens irrelevantes. É assim que um rei se porta?
“Atenção. Diante de nós está Sua Majestade, o Rei Feiticeiro Ainz Ooal Gown. Incapaz
de ignorar a situação de nossa nação, ele veio aqui sozinho para nos ajudar. Vocês vão
se referir a ele com todo o respeito!”
“Saudações. Eu sou o Rei Feiticeiro, Ainz Ooal Gown. Eu vim a esta terra para ajudá-los,
não em nome da minha nação, mas em meu nome. Dito isso, embora possa parecer um
pouco súbito, notei algumas coisas durante minha jornada até aqui, assim, gostaria de
buscar suas opiniões. Por favor, permitam que minha seguidora explique.”
Neia retransmitiu as indagações do Rei Feiticeiro para todos os presentes. Após o breve
discurso, um silêncio pesado encheu a sala.
Remedios dirigiu sua pergunta para Neia, que estava ao seu lado.
“Antes disso, quero saber sua opinião. Eu vim para lutar contra Jaldabaoth, não para
liderá-los. Se eu acabar participando demais de suas sessões de planejamento estraté-
gico, não acha que as coisas vão se tornar muito problemáticas depois de derrotar Jal-
dabaoth?”
Esse deve ser o melhor caminho. Sua Majestade pode ser undead, mas tudo o que ele diz
faz todo o sentido. Ele certamente respeitará qualquer acordo que façamos também. Agora,
neste exato momento, se quer salvar os aflitos, ficar um tempo de joelho pro rei de outro
país deveria ser a escolha certa a ser feita, não?
“A única que pode estar acima de nós é Sua Majestade Sagrada, a Rainha Sagrada. La-
mentavelmente, não podemos aceitar ordens do rei de outra nação.”
“—!”
Você deveria estar disposta a fazer qualquer coisa pra salvar as pessoas! Não é justamente
por isso que pedimos ao rei de outra nação, ainda mais um rei tão incrível desses?
Neia baixou a cabeça. Isso era para esconder as emoções sombrias e sujas que ficavam
no interior de seu coração.
“Podemos perguntar qual o curso de ação que Vossa Majestade tomaria em nossa posi-
ção?”
“Se fosse eu, hm? Bem, a coisa lógica seria mover imediatamente sua base para um novo
local.”
Todos na sala, incluindo Remedios, tinham um olhar angustiado. Isso porque eles não
sabiam de nenhum outro lugar que fosse adequado como esconderijo.
“A julgar pelo modo que me olharam, os senhores não tem outro lugar. Nesse caso, pre-
cisam planejar suas operações futuras sob a suposição de que quanto mais rápido mo-
verem seus homens, mais cedo o exército de Jaldabaoth atacará... Enfim, já que é tudo,
vou me retirar para a minha sala.”
Assim que Neia estava prestes a segui-lo, o Rei Feiticeiro estendeu a mão para detê-la.
“Perdoe-me, mas gostaria que ficasse aqui e ouvisse a opinião dos outros em meu nome,
Srta. Baraja.”
“O que me diz? Haverá algum problema com meu pedido, Capitã Custodio?”
Depois de ouvir isso, o Rei Feiticeiro virou-se para sair com o paladino designado para
ser seu guia.
“Então esse é o tal do Rei Feiticeiro... Capitã Custodio. Tem certeza que é o mais certo a
se fazer? Espero que a cura não seja pior que a doença. Já temos problemas demais.”
“Pensava o mesmo. Beber veneno no futuro para escapar da agonia do presente... não é
isso que os indigentes fazem?”
“Já falamos sobre isso antes, não? Não me faça repetir. O veneno já está em nossa boca.”
Sem usar “Sua Majestade”, huh. Eles não vão prestar o devido respeito?
Neia ficou irritada com a dramática mudança de atitude que demonstraram no mo-
mento em que o Rei Feiticeiro se foi.
Se alguém entendesse a atitude dos cidadãos do Reino Sacro para com os undeads, en-
tão a atitude deles era apenas o esperado. Pelo contrário, era o desagrado de Neia que
era anormal. Por que ela se sentia assim?
“Bem, no momento ele é inútil e estamos de mãos atadas... pelo menos vimos concreta-
mente como ele pode nos ajudar... mas em nossa posição de sacerdotes, podemos ter
problemas para neutralizar esse veneno, não?”
Como é que é, inútil? Alguém percebe um erro que cometemos e até fornece uma solução,
e em resposta não são apenas ingratos, mas ainda pensam em como usá-lo. Ah, acho que
entendi tudo. O que eu sinto na presença de Sua Majestade é algo que o Reino Sacro agora
não tem... um senso de integridade. É por isso que me sinto assim...
Depois de compartilhar uma carruagem com ele, ela teve a chance de perceber o fato
de que, apesar de ser um dos undeads, o Rei Feiticeiro demonstrou ser um rei digno de
respeito.
“Ah, isso? Sua Majestade disse que me emprestaria essa arma enquanto durasse a mi-
nha missão.”
“...Posso dar uma olhada, Escudeira Baraja? Eu gostaria de ver se o arco está encantado
com qualquer magia sinistra.”
O sacerdote ficou aturdido. Era um rosto que dizia que ele não esperava ter seu pedido
negado.
“Esta é uma arma que recebi de Sua Majestade para proteger sua pessoa. Não permitirei
que saia de minhas mãos.”
Ela não permitiria que alguém que só pensasse em usar um aliado o tocasse nem por
um único momento. Neia abaixou a cabeça enquanto respondia, para não deixar os ou-
tros verem que a raiva em seu coração queimava em seus olhos.
O ar na sala congelou.
Hmm~ pelo menos não perderam a noção e sabem que vão ter problemas se Sua Majes-
tade descobrir.
“Um momento, Capitã Custodio, não seria melhor deixar a Escudeira Baraja retornar ao
lado do Rei Feiticeiro—dono?”
Neia notou um dos sacerdotes olhando para o arco por um momento. Logo de início ela
entendeu o que estava nas entrelinhas, mas apesar da raiva que fervia em seu coração,
ela não deixou transparecer suas palavras ou ações.
“Ela tem razão... Gustav, o que você acha que devemos fazer?”
“Sua Majestade disse isso na frente de todos. Se a deixarmos agora, provavelmente cau-
sará mais problemas no futuro.”
Vocês discutem isso de um jeito que parece que eu nem estou aqui.
“E então, considerando o que o Rei Feiticeiro disse, o que devemos fazer? Alguém pro-
põe algo a respeito de deixar esse lugar ou procurar refúgio?”
Talvez alguém com as habilidades de ranger de seu pai, Pavel, pudesse encontrar um
lugar adequado para passarem longos períodos. No entanto, não havia ninguém assim
aqui.
“O Rei Feiticeiro— Sua Majestade disse anteriormente que, se não fizermos nada, Jal-
dabaoth também não fará nada. Nesse caso, por que não procurar um novo lugar antes
de agir?”
Essa sugestão, feita por um dos paladinos, encontrou aprovação dispersa. No entanto,
Neia sabia muito bem que resolver o problema não adiantaria nada. No final, tudo o que
isso faria seria causar uma pilha de problemas no futuro.
“O problema não é apenas encontrar um novo lugar, mas também a questão das provi-
sões. Ainda estamos no inverno, então a comida é fácil de preservar, encontrar o sufici-
ente para nos ajudar durante toda a estação não é fácil. Mesmo que não tenhamos ga-
rantido a cooperação do Reino, não devemos pelo menos comprar alguma comida deles?
Isso não ajudaria as coisas?”
“Vice-Capitão-dono, eu entendo o que está tentando dizer. Mas sem alimento, não po-
demos fazer nada. No final, precisamos de alguma maneira de obter rações do sul, não?
Ou talvez mudar a nossa base para mais perto do litoral, para que possamos importar
do Reino.”
“Provavelmente ainda não perceberam que o perigo bate à porta. Nossa marinha está
sendo drenada lentamente. É como se estivessem apertando a corda em nosso pescoço
a cada dia que passa.”
“Então, precisamos de algo para fazer o sul querer nos ajudar, é isso?”
“...Quanto a ressuscitar a Rainha Sagrada-sama... isso pode ser feito? Afinal, uma vez que
possamos resolver isso, tudo o mais será discutível.”
“Infelizmente, de acordo com o que aprendemos com a Rosa Azul, até mesmo uma ma-
gia de quinto nível terá dificuldade em funcionar sem cadáver ou se estiver muito dani-
ficado.”
“Temos que considerar nossas opções, o que mais podemos fazer? Se a Rainha Sagrada-
sama fosse ressuscitada, então apenas o principal problema, Jaldabaoth, permaneceria.”
“—Vamos deixar isso de lado por um momento. Nós discutimos isso enquanto viajáva-
mos pelos outros países, mas nosso principal objetivo seria atacar os campos e libertar
as pessoas.”
“Entendo. Todas as pessoas do Reino Sacro são treinadas em combate. Nesse caso, libe-
rar apenas um único vilarejo nos dará uma certa quantidade de força de combate... su-
pondo que eles estejam dispostos a ajudar, é claro. Porém, nesse caso, isso não pioraria
o problema alimentar?”
“É por isso que estou dizendo que devemos atacar os campos. Deverá haver comida lá.”
“Entendo!”
“Vamos começar os preparativos. Nesse caso, Escudeira Baraja, retransmita isso para o
Rei Feiticeiro—”
Gustav estava certo, mas por alguma razão, algo parecia errado.
No entanto, Neia não podia se opor sem saber de suas reais intenções.
“Entendido!”
♦♦♦
Neia e Gustav se dirigiram para a sala do Rei Feiticeiro juntos. Sua porta era pouco mais
que um pedaço de pano, mas um paladino ainda estava na frente dela. Estaria lá para
ficar de olho em pessoas que pudessem prejudicar o convidado ou vigiar o convidado?
Desde que ordenara a dispensa do guarda, vir aqui definitivamente significava que ele
tinha outra coisa em mente além de contar sobre o plano. Era difícil imaginar que que-
riam assassiná-lo. No entanto, se isso realmente acontecesse, ela precisaria usar sua
arma e ser o escudo do Rei Feiticeiro.
Depois que foi concedido, Gustav deu um passo para dentro da sala.
Não havia nada a ser feito com o fato de que as paredes da caverna eram de rocha, mas
até a mobília estava em um estado triste.
No entanto, a cama onde o Rei Feiticeiro estava sentado era extremamente bonita. Ela
reluzia com brilho preto, como se fosse feita de ônix. Além disso, havia lençóis brancos
sobre ela.
Qualquer outra pessoa teria ficado assustada com a visão dessa linda cama que havia
sido produzida de lugares desconhecidos. No entanto, para Neia, ela há muito tempo vi-
nha pensando que tais assuntos não eram nada para serem ponderados quando se tra-
tava do Rei Feiticeiro. Além disso, era possível que ele simplesmente tivesse se teletrans-
portado para casa e voltado com uma cama.
Ainda assim, era uma questão diferente para Gustav, que não conhecia o Rei Feiticeiro
como Neia.
“Oh, isso?”
“Eu fiz com magia. Quanto ao cobertor, também o fiz com magia. Porém não tenho idéia
de onde essa lã de cem por cento veio, mas é bem macia. Tenho certeza que quem deitar
poderá ter um descanso confortável.”
Mesmo depois de receber essa resposta, tudo o que Gustav pôde fazer foi responder
rigidamente: “Ah, ahh”. Entretanto, Neia não teve a intenção de criticá-lo por isso. Afinal,
ela também estava olhando para longe e pensando:
“Bem, eu entendo o porquê a Srta. Baraja voltou. Mas o que lhe traz aqui, Vice-Capitão-
dono?”
“Ah, ah, sim! Embora eu não tenha intenção de menosprezar a Escudeira Baraja, achei
que seria mais apropriado, sendo o Vice-Capitão, esclarecer os próximos passos; e é por
isso que estou aqui.”
Só então, algo preto parecia se misturar com os pontos vermelhos de luz que serviam
como os olhos do Rei Feiticeiro.
“Eu dei aquelas ordens porque senti que ela poderia realizá-las. Interferir nessa ques-
tão pelo peso de sua posição como superior é comparável a menosprezar meu julga-
mento. Espero que entenda como isso me desagrada, estamos entendidos?”
Até agora, não importava os olhares de julgamento, a falta de educação de alguns, o Rei
Feiticeiro nunca havia mostrado sua infelicidade à Neia. Mas, pela primeira vez, ele es-
tava claramente irritado. Essa raiva nasceu de sua confiança em Neia, ser valorizada as-
sim fez brotar uma nascente de aconchego em seu peito. Ele foi o único que tinha essa
opinião sobre ela.
“Esse pedido de desculpas deve ser dirigido a ela. Enfim, vamos deixar esse assunto de
lado por enquanto. Vá em frente e me informe.”
Gustav resumiu brevemente os detalhes do que havia sido dito, mas sua única resposta
foi um vago “Hmm”.
“Entendo. Então— o que espera que eu faça? Ou está dizendo que realmente veio ape-
nas para me informar disso?”
“Claro que não; eu queria perguntar se Vossa Majestade tinha alguma opinião.”
Ele queria pedir emprestado o intelecto do Rei Feiticeiro. Isso foi o que preocupou Neia
sobre sua insistência em ir junto. Ordenar aquele paladino a sair também era por esse
motivo. Se ele ouvisse o que Gustav dissera, se soubesse que o Vice-Capitão havia abai-
xado a cabeça para o rei de outro país, que também era um dos undeads, as coisas iriam
morro abaixo.
Era claro que eles estavam desamparados sem o poder do Rei Feiticeiro. Assim, logo a
notícia circularia por todo o povo. O “x” da questão era apenas saber se ocorreria mais
cedo ou mais tarde.
O que o povo do Reino Sacro deveria estar fazendo era espalhar o quão misericordioso
e compassivo o Rei Feiticeiro tem sido e depois tratá-lo com gratidão.
Ainda assim, mesmo que Neia dissesse a todos, era provável que ninguém acreditasse
nela. Eles podem até pensar que ela foi objeto de uma magia de 「Charm」 ou similar.
O que eu faço pra fazer com que todos confiem no Rei Feiticeiro? Acho que devo começar
mudando a primeira impressão que as pessoas têm dele. É claro que eu não posso dizer
algo rude como: “Por favor, permita que mais pessoas o acompanhem...”
Enquanto Neia ponderava o assunto, o Rei Feiticeiro ainda estava falando com Gustav.
“...Não, já tivemos essa conversa. Não vou me intrometer em seus planos de batalha.”
“Eu rezo para que o senhor nos dê um norte para seguir, pois estamos sem saída. Gos-
taríamos de evitar a possibilidade de falha, por menor que seja.”
“E essa é a razão pela qual eu não posso. O que acha que acontecerá se atender às mi-
nhas sugestões e a operação terminar em fracasso, como fica minha imagem? Não pre-
tendo assumir essa responsabilidade, está ciente disso?”
“Sim. Portanto, eu sinto que o que discutirmos aqui deve permanecer em segredo entre
mim, Vossa Majestade e Escudeira Baraja.”
“Srta. Baraja também? Não prefere deixar ela de fora desse tipo de assunto?”
“Não, por várias razões, seria melhor se houvesse uma terceira parte. Além disso, com
alguém com suas habilidades por perto, poderemos ter mais idéias.”
“...Hm, então podemos discutir brevemente o assunto. Srta. Baraja, eu acredito que está
bem com isso, não é?”
“Nesse caso... Há vários pontos na operação que sugeriu agora que me incomodaram. O
primeiro é a questão das provisões. Concordo que pode haver estoques de alimentos nos
campos de prisioneiros, mas não sinto que haverá muito. Analise toda a situação até
agora com calma, realmente acha que eles alimentariam seus cativos adequadamente?
Se dependesse de mim, eu diminuiria sua ingestão diária de alimentos e os enfraqueceria
para que eles não tivessem chance de se revoltar. Além disso, há a questão de forçar que
sirvam como soldados depois de resgatá-los. E quanto as armas? Já as transportou para
esta caverna?”
“Não, ainda não. Eu gostaria de pensar que poderíamos obter os dos campos.”
“Nesse ponto eu concordo. Quanto mais o tempo passar, mais ódio nutrirão pelo seu
país. Mas ainda creio que seria melhor fazer algo a respeito da situação alimentar. Na
verdade, sinto que buscar a ajuda do sul é a melhor escolha em muitos aspectos. O que
pode ser feito para conseguir isso mais facilmente?”
“A família real ajudará. Mesmo a Rainha Sagrada-sama jaz falecida, eu não acho que
todos os membros da realeza foram exterminados. Poderíamos ajudar os membros da
família real apoiados pelos nobres do sul, e depois pedir que os nobres do sul cooperem
conosco. Se der certo, teríamos também um refúgio seguro... falando disso, Vossa Majes-
tade. A Rainha Sagrada está morta, mas talvez Vossa Majestade possa fazer alguma coisa
sobre isso?”
“Ressurreição.”
Ele disse em um tom tão casual que Neia duvidou de seus ouvidos por um momento. A
magia de ressurreição pode ser considerada o segredo supremo da magia divina. Pou-
quíssimos humanos poderiam usá-la. Quantas pessoas neste mundo poderiam falar es-
sas palavras tão facilmente?
“Naturalmente, esperarei alguma forma de compensação por tal feito. Então onde está
o corpo? Em que estado é?”
“A falta de um corpo complica muito as coisas. Mesmo com um, o dano ao corpo já im-
plica em alguns problemas. Sem um cadáver intacto, há uma chance de que, se eu usasse
a magia de ressurreição, poderia se tornar um dos undeads.”
A Rainha Sagrada se tornando um ser undead não só seria problemático, mas poderia
mergulhar todo o Reino Sacro na guerra.
“Hoh, prisioneiros, então? ...Possui alguma informação sobre onde eles podem estar?”
“Absolutamente nenhuma.”
Respondeu Gustav com uma sacudida de cabeça. O Rei Feiticeiro olhou para o teto.
“Uhum. Parecem que realmente estão criando planos à medida que avançam, não é?”
“Faz sentido...”
“Como eu pensava, uma organização sólida para permitir que todos os subordinados
lidassem com todos os tipos de situações é essencial. Além disso, é preciso vários apara-
tos de coleta de informações.”
“Por isso esperávamos que Vossa Majestade pudesse nos ajudar. Posso saber se o se-
nhor poderia prover auxílio com sua magia?”
“Bem, a magia não é tão onipotente... para começar, precisamos de informações deta-
lhadas sobre os campos de prisioneiros. Possuem algum mapa detalhado que eu possa
ver?”
“Infelizmente eu—”
Neia o interrompeu.
Mapas eram o tesouro de um reino. Quanto mais precisos fossem, mais úteis eles eram
na batalha. Permitir que uma possível nação inimiga aprendesse em demasia sobre a
geografia de um país fazia muito mais mal do que bem. Portanto, Gustav deve ter plane-
jado recusar.
“Ah, nesse caso, deixe-me dar uma olhada depois. E sinto muito lhe incomodar nisso,
mas me conte tudo o que sabe sobre o terreno, Srta. Baraja.”
“Entendido!”
Depois que os dois conversaram, Gustav puxou a cortina e saiu. Uma vez que os sons de
seus passos se desvaneceram, o Rei Feiticeiro resmungou:
“Você não precisa se preocupar com isso. Eu vim aqui por interesse pessoal, as valiosas
empregadas demônios de Jaldabaoth.”
“Sim.”
O peito de Neia queimava. Realmente, ter tudo que se fazia sendo validado por outros
encheria alguém de felicidade.
“Ainda assim, aquilo é realmente abusar da boa vontade. Estou surpreso que uma orga-
nização que estilhaça tão facilmente tenha resistido por tanto tempo.”
“—Sentimos muito.”
“Como seria maravilhoso se pudéssemos unir o grupo dessa maneira. Parece uma or-
ganização dos sonhos.”
O Rei Feiticeiro de repente olhou para o teto, mas seus olhos pareciam estar olhando
para algo mais distante.
“Ah, haah. Não, não assim. Infelizmente, meu país não é um grupo assim. Bem... kuku.”
Parte 2
Se fossem longe demais, as chances de ser descoberto por batedores inimigos aumen-
tavam drasticamente.
Portanto, eles decidiram atacar o campo de prisioneiros mais distante dentro do que
podiam deslocar em sua viagem.
Neia fez uma pergunta ao Rei Feiticeiro, que estava cavalgando ao lado dela.
“Vossa Majestade, faremos nossa aproximação a cavalo até chegarmos à aldeia. Seus
preparativos estão completos?”
“Ah, estão sim. Mas... há detalhes da operação que ainda não sei. Que tipo de tática usa-
rão? Estou um tanto ansioso.”
“Kuku, eu poderei ver algumas das táticas do Reino Sacro em funcionamento. Quais ha-
bilidades usarão para derrubar os portões do acampamento? Será que voam sobre as
A tática básica de cerco do Reino Sacro era lançar um ataque em duas frentes com Anjos
do ar e infantaria do solo. Eles provavelmente fariam a mesma coisa desta vez. Ou me-
lhor, eles não tinham a mão de obra para fazer qualquer outra coisa.
“Avante!”
“Ohhh!”
A Capitã esporeou o cavalo, que começou a se mover, e os paladinos seguiram atrás dela.
Ainda estavam a alguma distância do vilarejo, de modo que não conseguiam galopar a
toda velocidade, mas sim em um trote.
“Os paladinos estão transportando toras recém cortadas; pretendem usar aríetes?”
“Então não vão usar magia, mas o arrombarão por meios físicos, um aríete? Não vão
usar escadas ou coisas assim? A magia dos paladinos pode fazê-los atravessar paredes?”
Havia vários tipos de magias, como arcana, divina e espiritual. A magia que os paladinos
usaram caia na categoria “outros”, e normalmente lançam magias na forma de bênçãos.
Cavaleiros Negros, que eram paladinos corrompidos, também usavam magias do tipo
bênção.
Pelo que Neia vira e ouvira, não havia magias que permitissem fazer escadas.
“Nem eu. Mas bem, ouvi dizer que existem algumas magias de paladino que permitem
que eles voem, embora sejam de nível muito alto.”
Realmente, ele fazia jus a ser o Rei Feiticeiro. Ele possuía grande conhecimento até so-
bre magias que não podia conjurar.
“Isso é porque o inimigo pode usá-las. Foi preciso muito esforço para memorizar cada
magia existente. Já que eu não era talentoso, eu tive que compensar isso com muito tra-
balho e esforço. Quanto mais souber, mais perto estará da vitória, embora isso tenha sido
o que um amigo me disse, hm.”
Ela não podia acreditar no que ele disse sobre não ter talento. No entanto, havia algo
mais importante que ela tinha a dizer.
Era bem provável que alguém tão capaz quanto o Rei Feiticeiro já tivesse elaborado um
plano mais eficaz do que o Exército de Libertação. Foi por isso que ele estava agindo
dessa maneira.
“Hm? Não, aliás, eu não deveria. Ah— digamos que; libertar este campo de prisioneiros
não é trabalho meu, mas sim de vocês. Atacar esses campos de prisioneiros é o primeiro
passo para aprenderem como se faz as coisas. Eles precisam perceber isso por si mesmos,
é por isso que deve ser feito assim.”
O Rei Feiticeiro estava certo. Ou melhor, tudo o que ele disse estava certo.
No entanto, apenas por hoje, Neia queria pedir emprestado a força do Rei Feiticeiro.
Isso porque essa guerra foi travada para salvar as massas de sofrimento, e ela queria
escolher um caminho que fosse mais rápido e que pudesse salvar mais pessoas.
“Eu concordo plenamente com o que Vossa Majestade disse. Porém, eu rezo para que
ainda nos dê uma ajudinha.”
Ela soube imediatamente que estava sendo muito rude. Todavia, Neia ainda inclinou a
cabeça e implorou ao Rei Feiticeiro mesmo assim.
O Rei Feiticeiro olhou para a frente por um tempo antes de falar novamente.
“Uhum... Neia Baraja. Não me faça repetir tantas vezes. O fracasso é a mãe do sucesso.
As consequências vindas de não dependerem de mim e, em vez disso, pensarem por si
mesmos, mesmo que acabem levando ao fracasso, não devem ser temidas, mas sim abra-
çadas. Isso porque, são os fracassos necessários para o sucesso.”
Mas com o poder do Rei Feiticeiro, eles podem salvar mais vidas.
Seus pensamentos andaram em círculos, e ela não conseguiu encontrar uma resposta.
Depois disso, só restou Neia rezar para que os sacrifícios vindouros não fossem em vão.
O terreno ao redor do vilarejo era irregular, mas havia torres de vigia. Se fizessem uma
abordagem direta, eles definitivamente seriam vistos. No entanto, também era um fato
que esta era a única maneira utilizável para um ataque.
Parecia haver sentinelas na torre de vigia acima do portão. Logo, bateram nos sinos de
alarme e uma comoção surgiu de dentro do vilarejo.
Ela pensou que as coisas seriam problemáticas se de imediato fortalecessem sua defesa.
No entanto, não pareciam tão bem treinados, considerando como estavam correndo por
aí e dando a eles muito tempo para se prepararem.
Contudo, nem todos os paladinos eram assim. Cerca de dez continuaram montados e
começaram a circular em torno do vilarejo.
“Srta. Baraja, eu acredito que o dispersar de algumas tropas ao redor da área é para
interceptar qualquer demi-humano do campo que esteja tentando fugir com os reportes
de batalha. Se alguém fugir; mesmo que ganhem a batalha, perderão a guerra.”
Ele havia visto através das táticas dos paladinos com extrema facilidade. A única coisa
que Neia pôde pensar foi no quão incrível ele era.
Ainda assim, isso levantou uma questão. Onde o Rei Feiticeiro aprendera essas táticas?
Uma criatura demi-humana de pelagem resistente não usaria armaduras. Com garras
afiadas, usar espadas era obsoleto. Os humanos usavam armaduras e carregavam espa-
das por causa de seus corpos frágeis.
Do mesmo modo, alguém de vasto poder como ele não precisaria aprender tais táticas,
já que seriam irrelevantes. Mas porque o transcendentalmente poderoso Rei Feiticeiro
sabia de táticas de cerco?
“Hum? Por conhecimento quer dizer— ah! Minhas previsões de agora? Uhum. Essas
táticas foram ensinadas a mim por um dos amigos que mencionei antes. Depois disso, eu
as testei em combate. Bem, eu aprendi muitas coisas, mas eu não esperava que elas fos-
sem colocadas em prática aqui.”
“...Já que era amigo de Vossa Majestade, certamente se trata de um ser muito poderoso
também?”
Huhu, o Rei Feiticeiro riu alegremente. Foi o tipo de risada que alguém teria quando
relembrava o passado.
Talvez ele tenha se transformado no que é hoje com o poder da magia, mas isso seria
um assunto desconcertante. Isso não deveria ser possível. Para o conhecimento de Neia,
os undeads eram coisas naturais. Contudo—
Do outro lado do oceano, além da montanha e nas profundezas das florestas — deveria
haver algo lá fora. Os sábios poderiam ridicularizar os problemas de Neia ao dizer a ela
que as respostas deveriam estar lá também.
“Não, eu não estou lhe culpando. Apenas fiquei um pouco preocupado quando a vi se
afastando a cavalo... a batalha está prestes a começar, e eu entendo que se sinta descon-
fortável.”
Só então, Remedios plantou sua bandeira no chão e sacou sua espada sagrada.
“Atenção! A primeira batalha para salvar esta terra de Jaldabaoth está prestes a come-
çar! A justiça triunfará!”
Houve uma resposta acalorada de “A Justiça Triunfará!” ao grito de Remedios. Uma vez
que se reuniram, eles começaram sua investida.
“Então começou. Srta. Baraja, não seria melhor começar a se mover se quiser lutar?”
“Não, meu dever é acompanhar Vossa Majestade. Abandonar Vossa Majestade para lu-
tar é—”
“Hm, mm, é isso? Então, então vamos falar sobre outra coisa... Por acaso emprestou essa
arma para ninguém?”
“Nem mesmo uma vez! É uma arma que Vossa Majestade me emprestou! Eu não ouso
permitir que alguém além de mim toque nela!”
Seu tom soava um pouco deprimido, mas não havia como adivinhar suas intenções.
Eu fiz alguma coisa pra ofender Sua Majestade? ...Não tenho certeza do que está aconte-
cendo, mas talvez eu deva pedir desculpas?
“Ah— esta é uma oportunidade rara. Olhei em volta, mas não notei nenhum demi-hu-
mano escondido com magia de invisibilidade. Talvez devêssemos avançar um pouco
para observar as condições do campo de batalha. Duvido que haja algum problema em
deixar os sacerdotes aqui... O que acha?”
“Como desejar.”
Seria muito desrespeitoso dizer ao Rei Feiticeiro — alguém de intelecto ímpar — que
avançar seria perigoso.
Quando o som dos sinos tocou no campo de prisioneiros, ela se aproximou do Rei Fei-
ticeiro que avançava. Foi então que a luta começou.
As torres com arqueiros dispararam flechas. Eles não estavam mirando nos Anjos, mas
em Remedios que liderava o ataque. Era natural mirar nela, dado que não estava carre-
gando escudo e sequer havia chance de acertar aliados.
Ela facilmente cortou todas as flechas que vinham em sua direção usando a espada,
mantendo a velocidade enquanto corria.
Como se para contra-atacar, vários Anjos correram para a torre onde arqueiros esta-
vam. Instantes depois, três cadáveres de Bafolks caíram da torre.
Vários Anjos passaram pelo portão. Neia não podia ver o que estavam fazendo a partir
daqui, mas provavelmente estavam tentando manter a resistência Bafolk ocupada.
Veio de uma torre de vigia acima do portão. Os Anjos deveriam ter tomado aquele lugar.
No entanto, um único Bafolk apareceu lá. Porém, o problema estava no que o Bafolk es-
tava segurando.
“Saiam!”
O Bafolk segurava uma menina, com cerca de seis ou sete anos, e ele tinha uma lâmina
afiada apontada para ela.
A garota estava vestida com roupas imundas — o rosto também parecia sujo — e seu
corpo tremia de um lado para o outro. Ela ainda estava viva? Eles não conseguiram de-
tectar nenhum sinal de vida dela. Parecia demonstrar como todos dentro do acampa-
mento tinham sido tratados.
“Será quê!?”
“É apenas um corte superficial; ela ainda não está morta. Caso contrário, seu valor como
refém seria—”
“—Atenção, recuar!”
Eles podiam ver o Bafolk apressadamente trocando posições no topo da torre de vigia.
Eles trocaram os soldados que haviam sido feridos na batalha anterior com os Anjos por
novos combatentes.
Neia pegou lentamente o arco que ela havia recebido emprestado. O Bafolk parecia es-
tar usando a garota como um escudo. Portanto, ela tinha uma área muito pequena na
qual mirar. Matá-lo em um acerto seria muito difícil.
Só então, o Rei Feiticeiro rapidamente estendeu a mão, como se bloqueasse seu tiro.
“Eu não pretendo insultá-la, mas é melhor parar. Não há mais sentido nisso.”
Magia sacerdotal poderia congelar o inimigo no lugar. Muitas pessoas aprovaram isso,
mas as magias tinham um alcance efetivo. Eles poderiam fazer algo estando afastados
assim? A refém seria morta? Todas essas perguntas e mais voaram de um lado para o
outro, mas não havia sinal de que uma resposta tivesse sido alcançada.
Depois que ele falou, os outros se viraram para olhar o Rei Feiticeiro como um.
“Não sabem, Capitã Custodio. Principalmente você. Agora que o inimigo sabe que os
reféns são eficazes, vocês perderam parte de sua força, e eles a usarão de exempl—”
Como se esperasse por essas palavras, a cabeça da refém foi cortada fora. Eles podiam
ver seu sangue vermelho brilhante jorrando mesmo daqui. O Bafolk soltou o corpo da
menina que caiu fracamente no chão.
Remedios foi a primeira a se recuperar e, enquanto ela gritava, Neia também caiu em si.
“Hmph!”
O punho cerrado de Remedios tremeu fortemente. Então, como se para desabafar seus
sentimentos, ela ordenou:
“Recuem imediatamente!”
Ela podia ouvir o som de dentes rangentes de Remedios. Era alto o suficiente para que
alguém pudesse pensar que ela estava esmigalhando seus dentes.
“M-mas—”
“Péssima jogada. Acabaram de mostrar ao inimigo que os reféns são eficazes e deu a
eles muito tempo para se preparar. Se o inimigo fizer algo para quebrar sua vontade de
lutar novamente, isso não causará ainda mais dano?”
Remedios com o rosto completamente vermelho olhou para o Rei Feiticeiro como se
estivesse olhando para o inimigo.
“Se isso continuar, seu ataque surpresa será inútil. Além disso, eu posso ouvir os sons
de algo se movendo por lá. Se eles montarem barricadas, quebrá-las levará mais tempo,
e as coisas serão mais problemáticas—”
“—Cale a boca!”
“Quem tem uma idéia? Uma maneira de resolver isso sem que ninguém morra!?”
Claro que ninguém tinha uma solução tão conveniente. Por exemplo, se eles tivessem
alguém adepto de habilidades de infiltração, essa situação poderia não ter surgido. No
entanto, não havia ninguém assim por perto.
Até Remedios deveria ter entendido isso. Se seus instintos animais analisavam a situa-
ção da batalha e diziam que não havia jeito, então esse método não existia.
Por que ela estava ansiosamente nervosa em não deixar uma pessoa morrer?
“Capitã Custodio.”
“Na nossa situação, não acham melhor terminar a luta com apenas algumas baixas?”
Remedios gritou.
Ele meramente a apoiou, mas para Neia, foi como cem milhões de fortes ovações.
“Calado!”
Remedios vociferou novamente. Entretanto, isso não era algo que ela deveria estar di-
zendo a um rei de outro país que tinha vindo até aqui para salvá-la. Havia ações que eram
aceitáveis, mas outras seriam inaceitáveis.
“O que precisamos agora é agir, não sentar e ficarmos frustrados... Ah, que seja. Eu irei
virar a situação ao seu favor.”
“Eu não recuo! Quem pensa que sou? Acha mesmo que uma mísera vida humana signi-
fica algo para mim?”
“O-o quê!?”
“Nosso objetivo é matar cada um dos Bafolks aqui! Não importa o que aconteça com os
humanos! 「Widen Magic: Fireball」!”
O Rei Feiticeiro estendeu a mão com um brado, e a bola de fogo que voou para a frente
explodiu em chamas, englobando o Bafolk e o garoto que ele estava segurando.
Todos no topo foram mortos pelo ataque. O Bafolk e seu refém caíram da parede em
direção ao Rei Feiticeiro.
A magia que se seguiu destruiu os portões meio já arruinados. Além disso, jogou longe
os Bafolks que erigiam barricadas atrás dele, abrindo um enorme buraco em suas defe-
sas.
“Venham, paladinos! Ataquem! Matem os Bafolks lá dentro até não sobrar nenhum!”
“—Capitã!”
“Grrrrgh! —Avançar!”
“—Srta. Baraja. Achou que eu salvaria o garoto com uma magia além de sua imagina-
ção?”
De fato, o pensamento passou pela cabeça dela. No entanto, o Rei Feiticeiro deve ter
alguma razão para suas ações.
“De fato, eu poderia ter feito isso. Usando as várias magias que aprendi, salvar um único
menino seria uma tarefa trivial. Mas eu não poderia fazê-lo. Isso porque eu não podia
permitir que os Bafolks me vissem resgatar um garoto.”
A dúvida abarcou o rosto de Neia pela primeira vez, e o Rei Feiticeiro gentilmente ex-
plicou:
“Se eu permitisse que soubessem que reféns são eficazes contra nós, os cativos seriam
usados como escudos de carne para bloquear nossos ataques em batalha. Os paladinos
ficariam sem ação e poderiam acabar sendo feridos ou mortos. Devido à nossa extrema
falta de mão de obra, até mesmo um paladino a menos seria uma grande desvantagem...
pelo menos, de acordo com as Leis de Lanchester.”
“Por outro lado, uma vez que saibam que os reféns são inúteis, eles simplesmente vão
vê-los como obstáculos. Agora, que estão sendo atacados e o inimigo está prestes a atra-
vessar os muros, acha que eles vão perder tempo matando prisioneiros? Assassinar pes-
soas que não podem resistir será uma prioridade muito baixa.”
Neia acompanhou o Rei Feiticeiro enquanto levava o garoto para o lugar onde Reme-
dios havia fincado sua bandeira.
O Rei Feiticeiro colocou o garoto no chão. Neia molhou um pano com água de um odre
e limpou a sujeira no rosto do menino.
“Talvez não seja sensato o que vou lhe dizer, mas permita-me mesmo assim. Eu sou o
Rei do Reino Feiticeiro, e não o rei das pessoas que residem nesse país. Por isso pude
fazer o que fiz. Eu escolheria salvar a vida de mil pessoas em troca de uma única vida.
Mas se esse garoto fosse cidadão da minha nação, eu priorizaria salvá-lo. Se não pode
aceitar isso—”
“—De forma alguma, eu só posso sentir gratidão por tal ato. Eu posso entender como o
senhor se sente... Vossa Majestade é justo.”
Mesmo ela sentindo que isso o deixara sem palavras, o misericordioso e compassivo
Rei Feiticeiro a respondeu.
“...Eh? Ah, não, de forma alguma eu sou justo. E para ser sincero, a justiça deve ser de-
terminada pelos outros. O que me motiva é muito simples. Bem, eu queria que o mundo
soubesse de meu nome...”
Se quer que o mundo o conheça, então, de certo modo, Sua Majestade gostaria de ser o
centro das atenções?
“Enfim, não fique pensando demais no que falei... também falo coisas sem sentido. Tudo
o que desejo é ser feliz com meus filhos. É algo simples, mas, ao mesmo tempo, é tudo
para mim.”
Ela não achava que o Rei feiticeiro, devido a seus traços raciais, pudesse ter filhos. Por-
tanto, ele provavelmente não quis dizer crianças no sentido de manter sua linhagem,
mas em um sentido mais amplo. Parecia que ele considerava os cidadãos de sua nação
como seus filhos.
Ele é um homem gentil em todos os sentidos da palavra... na verdade, que mundo maravi-
lhoso seria se até a criança mais frágil pudesse viver em felicidade. O que ele estava pen-
sando quando tirou a vida desse garoto?
Quando olhou para o perfil de seu rosto, ela viu algo como pesar por matar uma criança.
“Bem, isso foi inútil. Nesse caso, vamos deixar o assunto por aqui. Srta. Baraja, embora
eu não leve muito jeito para frases bonitas, espero que encontre a justiça que procura.”
“...Posso fazer mais uma pergunta? Se seus próprios subordinados fossem tomados
como reféns, o senhor teria feito a mesma coisa?”
“...Bem, são apenas reclamações bestas da minha parte, mas já tenho problemas demais
para resolver com meus subordinados.”
“No passado, eu perguntei a eles por curiosidade: ‘O que fariam se os fizessem de reféns
para forçarem uma negociação comigo?’ Naquela ocasião, cada um deles prontamente
disse que preferiria morrer do que ser um incômodo para mim. ‘Não’, eu disse a eles.
‘Vocês não poderiam dizer que esperariam até que eu os salve?’ E coisas assim... Embora
me agrade ver a lealdade deles, isso ainda é, como devo dizer...? Meus subordinados são
um pouco fanáticos demais.”
Enquanto rotacionava seus pulsos, o Rei Feiticeiro continuou com uma voz cansada.
Assim que Neia começou a pensar: Por que alguém em sua posição tem essas preocupa-
ções desnecessárias? Remedios apareceu no portão, carregando uma espada longa man-
chada de sangue, sua armadura respingada de sangue. Embora ela tivesse removido o
elmo, sua franja estava presa na testa pelo suor. Ela parecia totalmente exausta.
Remedios não disse nada, simplesmente voltou para dentro com um olhar vazio no
rosto.
“Muito obrigado.”
“Sim. Questionamos várias das pessoas que resgatamos, e eles disseram que ‘Eles esta-
vam esfolando os prisioneiros’. Parece que os ‘eles’ em questão não eram demi-humanos,
mas sim demônios enviados por Jaldabaoth...”
Mesmo ela sentindo que a Capitã estava usando suas emoções como uma desculpa para
sua grosseria, esse não parecia ser o caso.
Assim que Neia estava começando a se sentir surpresa, o Rei Feiticeiro ao lado dela
inclinou a cabeça em perplexidade.
“Por que a pele? Qual o motivo? Estavam as comendo? Como pele de galinha?”
“Não, sinto muito. Eu também não faço idéia. Por que Jaldabaoth faria uma coisa dessas?”
Cerca de dez minutos depois, eles poderiam começar a ver formas humanas espalhadas
pelo portão.
Eram os cativos. Assim como o menino que havia sido tomado como refém, eles esta-
vam vestidos com roupas esfarrapadas e surradas que não pareciam resistir ao frio do
inverno. Os paladinos que deveriam tê-los escoltado até a porta simplesmente passaram
por eles e desapareceram atrás do portão. Teriam eles feito isso porque tinham poucas
pessoas para lidar com os prisioneiros, ou era porque o trabalho de supressão ainda es-
tava em andamento, ou os dois?
Isso foi provavelmente porque tinham visto a forma do Rei Feiticeiro. E então, algumas
pessoas continuaram a se aproximar. Talvez sentissem que o Rei Feiticeiro estava ape-
nas usando uma máscara ou algo assim.
O homem ofegou pesadamente, e então se ajoelhou ao lado do garoto que Ainz havia
colocado aos pés de Neia. Não, seria mais correto dizer que ele desabou ali.
O homem acariciou a bochecha do menino e, depois de ver por si mesmo que o menino
estava morto, começou a chorar de tristeza.
Enquanto o pai gritava aos prantos o nome do filho, o Rei Feiticeiro disse calmamente:
Neia olhou para o Rei Feiticeiro em surpresa. Agora é a hora de dizer esse tipo de coisa?
No entanto, certamente o sábio Rei Feiticeiro não teria revelado a verdade se não ti-
vesse uma boa razão.
Por um momento, os olhos do pai se encheram de medo. Isso porque ele percebeu que
o rosto do Rei Feiticeiro não era artificial. Então, olhou para o lado em busca de ajuda, e
encarou Neia.
No entanto, antes que Neia pudesse dizer alguma coisa, o Rei Feiticeiro falou primeiro.
“Então posso perguntar uma coisa? Por que você não protegeu seu filho? Seu filho foi
trazido diante de mim como refém.”
“Eu protegi sim! Mas eles o tiraram de mim! Aqueles desgraçados eram mais fortes, eu
não pude fazer nada!”
“Sendo assim, tenho outra questão. Por que você ainda está vivo?”
“Quero saber o porquê não morreu para proteger seu filho. Nem todas as vidas têm o
mesmo valor. Você quem deveria ter valorizado a vida dessa criança, não eu. Vamos,
diga-me o porquê não lutou até a morte para protegê-la?”
Eles devem ter sentido mal-estar, medo e raiva do Rei Feiticeiro que tirou a vida do
menino.
“Você é o único que não conseguiu protegê-lo. Não empurre essa culpa para os outros.
Você que é fraco, e culpado por tudo isso. Além do mais, parece estar equivocado. Já per-
cebeu que eu sou muito mais poderoso do que os Bafolks que tanto teme? ...Embora eu
possa perdoar alguns insultos dado que compadeço pela perda de seu filho, eu lhe ma-
tarei aqui mesmo se não me respeitar.”
“Exato. Eu posso dizer isso pois sou forte. Justamente por você ser tão fraco, que ele foi
levado, que coisa, não? Os fortes predarem os fracos, é uma sequência muito natural de
eventos.”
“Exatamente. Os fortes fazem o que bem entendem, e os fracos sofrem o que precisam
sofrer. É assim que o mundo funciona. A mesma regra se aplica a mim. Em face de um
oponente mais poderoso, eu não teria escolha senão sofrer. É por isso que eu busco po-
der.”
Sua Majestade deve estar buscando poder pois quer proteger sua nação, proteger os filhos
de seu país. Então o poder, acima de tudo, é a coisa mais importante...
“Bem, originalmente, os fracos como vocês deveriam ter sido defendidos pelo Reino
Sacro, por aqueles que são sua força... Eu realmente tenho pena de vocês. Se estivessem
sob minha proteção — sob a proteção do meu país, o Reino Feiticeiro, algo assim poderia
nunca ter acontecido. Isso porque eu teria usado todas as minhas forças para proteger
as pessoas e derrotar os Bafolks.”
Os argumentos do Rei Feiticeiro foram frios e sem emoções, mas ao mesmo tempo ex-
pressavam a verdade do mundo.
Se eles não pudessem se opor às suas palavras cheias de razão, eles escolheriam pro-
testar com suas emoções? Porém, seu medo do Rei Feiticeiro os impediu de fazê-lo.
“Ei, ele não é um dos undeads? O que um undead está fazendo em um lugar como esse?”
O pai não podia dizer nada ao Rei Feiticeiro porque já foi avisado, e então dirigiu sua
ira para Neia.
No entanto, antes que Neia pudesse responder, o Rei Feiticeiro interveio, como espe-
rado.
Ao ouvir isso, o pai questionou Neia com os olhos. No entanto, ela não podia dizer nada.
Se o povo desse país fosse suficiente para derrotar Jaldabaoth, o Rei Feiticeiro não es-
taria aqui.
O homem com medo abraçou o cadáver do menino, e então ele se virou e correu. As
pessoas para as quais o homem corria também tinham olhares de medo em seus rostos.
Neia ouviu o Rei Feiticeiro dizer alguma coisa, mas ela não sabia se ele estava se diri-
gindo ao homem em fuga ou a si mesmo.
“Mesmo eu seria oprimido se fosse fraco. Portanto, não se pode esquecer de buscar
força. Eu preciso gravar em meu coração o fato de que seres de poder comparável ao
meu existem por aí.”
Parte 3
Eles não estavam se deixando levar pelo ímpeto da vitória. Pelo contrário, havia várias
razões pelas quais não podiam fazer mais nada. A mais esmagadora foi devido aos esto-
ques de alimentos nos campos de prisioneiros serem menores do que haviam estimado.
Isso, por sua vez, foi o resultado das estratégias duplas dos demi-humanos, que não
alimentavam seus prisioneiros o suficiente, e constantemente transportavam comida de
uma pequena cidade próxima.
Claro, Jaldabaoth saberia disso também. Sendo esse o caso, era muito provável que ele
despachasse uma tropa enorme, uma que Neia e os outros não seriam capazes de derro-
tar.
Embora ambos os cursos opostos de ação tivessem seus próprios méritos e deméritos,
eles acabaram indo com o último, depois que a Capitã da Ordem Paladina, Remedios,
insistiu que seria o correto.
Se eles realmente fossem da linhagem real, era muito provável que a situação melho-
rasse. Mesmo se eles não fossem da realeza, seria uma dádiva de deus se fosse um grande
nobre com um certo grau de status e conexões. Eles até mesmo poderiam usar a ação de
salvar sua vida como um favor a ser pago, assim, pediriam aos exércitos do sul que cola-
borassem, o que possivelmente resultaria em reforços.
“Vossa Majestade, o senhor realmente acha que haverá um membro da família real ou
um nobre influente lá?”
Neia fôra autorizada a cavalgar por respeito ao status do Rei Feiticeiro. Caso contrário,
o tipo de cavalo que uma escudeira de baixa patente como Neia teria permissão para
montar teria sido algum velho animal de carga.
“Eu acho que é uma armadilha. Mesmo que não seja, a cidade será guarnecida com mui-
tas forças militares e, dependendo da situação, pode haver demônios. A Capitã Custodio
deveria estar bem ciente disso. Mesmo assim, ela decidiu lutar uma batalha às cegas. Às
vezes, é preciso apostar tudo em uma única jogada.”
Se não procurassem a ajuda do sul quanto antes, logo as pessoas começariam a morrer
de fome. Caso acontecesse, Neia sabia que o Exército de Libertação não seria capaz de
continuar.
Pouco tempo tempos eles viram seu objetivo, a pequena cidade, ao longe.
Eram cidadãos do Reino Sacro que haviam sido resgatados dos campos de prisioneiros.
A razão pela qual os paladinos os pressionaram para o serviço militar quando deveriam
estar descansando foi porque descobriram que havia muito mais demi-humanos na ci-
dade do que nos primeiros campos de prisioneiros.
Havia muito mais pessoas enfraquecidas do que o esperado, por isso não se esperava
que fossem bons soldados de infantaria. Mesmo assim, era melhor do que nada, e assim
eles foram mobilizados.
Com o atual nível de habilidade de Neia seria difícil manter uma força militar tão grande
fora dos olhos de batedores demi-humanos, então eles precisavam se mover o mais rá-
pido possível.
E o resultado disso foi que as pessoas só ficaram cada vez mais exaustas, e o número de
adultos sentados em vagões de carga só cresceu. O fato de que realmente puderam dor-
mir nos vagões em meios as sacudidelas e ruídos, só serviu para mostrar o quão cansa-
dos estavam. Em contraste, as crianças estavam correndo alegremente.
Mesmo nesse estado, todos serão arrastados pra batalha assim que chegarem. Será que
vão mesmo ficar bem?
Durante suas reuniões de estratégia enquanto a caminho da cidade, eles decidiram ata-
car imediatamente ao alcançá-la. Isso porque eles não tinham provisões e nem tempo.
Atacar uma cidade cheia de inimigos, e durante o dia, era extremamente perigoso.
Seria mais fácil se aproximar à noite, mas seria muito desvantajoso para os humanos,
que não tinham habilidades de visão noturna. Em particular, as batalhas noturnas eram
muito perigosas para os cidadãos, que só tinham o treinamento de combate que haviam
recebido como recrutas.
As fileiras de batalha já haviam sido formadas à frente deles. À sua frente estavam os
paladinos. Atrás deles haviam milicianos segurando muros de madeira que haviam feito
depois de destruir os campos de prisioneiros, e nos fundos os sacerdotes.
O plano era o mesmo que o da última vez, usar Anjos para suprimir os inimigos nos
muros enquanto os paladinos derrubavam os portões; uma tática que dependia da força
bruta para tudo. O trabalho dos cidadãos-soldados foi amplamente limitado a assustar o
Mesmo eles desejando aproveitar de sua força para um cerco como este, ninguém ousou
pedir nada durante as reuniões. Em cima disso, o Rei Feiticeiro não prestou atenção aos
olhares suplicantes dirigidos a ele, afinal, já estava posicionado no escalão de trás.
Mesmo sendo uma cidade pequena, era muito grande para os padrões da região. Seus
portões levadiços eram reforçados com ferro, e havia buracos assassinos acima. As pa-
redes não eram feitas de madeira, mas sim de pedra. As paredes e portões também eram
muito melhores do que os dos campos de prisioneiros, que eram em grande parte feita
dos materiais retirados dos aldeões. No entanto, como essa cidade tinha menos de
10.000 habitantes, não poder-se-ia dizer que fosse inexpugnável.
Parecia que os demi-humanos eram os mesmos Bafolks que haviam encontrado anteri-
ormente nos campos, mas, como esperado, os que defendiam essa cidade eram tropas
muito hábeis.
Talvez fosse algum tipo de habilidade, mas não afetava os Anjos ou os paladinos que
derrubavam os portões abaixo dele. Foi por causa de uma área estreita de efeito, ou foi
apenas eficaz em aliados? Os detalhes não eram claros. No entanto, seria bom lembrar
que ele possuía algum tipo de habilidade especial.
Os Bafolks empurravam suas longas lanças do outro lado da ponte levadiça — de dentro
da cidade — para os paladinos, que as bloquearam com escudos pontiagudos.
Graças a defesa, os inimigos não conseguiram acertar os paladinos a encargo dos aríetes.
Remedios, por outro lado, cortava as lanças longas que tentavam perfurá-la.
É claro que, como era inverno, a maré poderia mudar se ficassem encharcados e a tem-
peratura caísse, mas no momento não representava problema.
Se tivessem usado óleo fervente em vez de água, suas espadas teriam escapulido facil-
mente de suas mãos. Talvez o óleo fosse precioso para os demi-humanos, que não fize-
ram tais preparações.
Os civis avançavam devagar enquanto carregavam placas de madeira que haviam tra-
zido para usarem como escudos. Claro, seria melhor se tivessem sido feitas de metal,
porém, não puderam fazer nada quanto a isso dada a falta de armas adequadas. Pode
não ser terrivelmente resistente, mas era melhor do que nada, e os cidadãos-soldados
escondidos atrás deles começaram a girar suas fundas. Eles estavam mirando nos demi-
humanos lutando com os Anjos. Obviamente, uma vez que não estavam acostumados ao
combate, as pedras que lançavam atingiam os Anjos com mais frequência do que os Ba-
folks.
Mesmo que estivessem recebendo ataque dos aliados, os Anjos eram resistentes a ata-
ques não-encantados, então não representava um grande problema. Basicamente, fun-
cionava apenas como redução de danos e não imunidade, de modo que os cidadãos-sol-
dados computavam danos mínimos aos Anjos. Em suma, as pedras das fundas causavam
mais bem do que mal no curso da batalha.
Toda vez que um Anjo era derrotado, os sacerdotes convocavam um novo e o direcio-
navam para o combate. Embora houvesse poucos deles, esse inesgotável e incansável
suprimento de novas tropas continuava se acumulando, e a resistência demi-humana
começou a ruir.
“...Mm. Depois de considerar que a oposição poderia usar magia defensiva, eles deve-
riam ter jogado água fria. Combinado com o frio do inverno, isso faria com que a tempe-
ratura corporal do oponente despencasse... afinal, a maioria das pessoas lançariam ma-
gias para se proteger contra o fogo.”
Foi difícil responder seu julgamento. Ninguém tinha morrido ainda, havia apenas feri-
dos, então Neia ficou sem saber o que dizer.
“Falando nisso, não haverá problema caso não participe da batalha, Srta. Baraja? Você
deve ser capaz de acertar alguns com o arco que lhe dei.”
Neia foi designada para ficar de guarda pelo lado do Rei Feiticeiro. Usar seu próprio
corpo como escudo para protegê-lo. Portanto, ela não tinha sido ordenada a lutar.
Porém, assim como antes, o Rei Feiticeiro parecia muito ansioso para ela usar aquele
arco.
Ele quer que eu use a arma? Eu poderia tentar dar um tiro daqui, mas errar o primeiro
tiro com uma arma emprestada seria—
Assim que Neia ficou hesitante sobre como responder, um intenso barulho veio da di-
reção do portão da cidade. Olhando para cima, parece que a ponte levadiça fôra que-
brada. O barulho era uma combinação da alegria dos paladinos e dos gritos de ânsia dos
demi-humanos.
Quando o portão da cidade caísse, os paladinos iriam inundar a cidade como uma ava-
lanche.
A visão aguçada de Neia viu através da estreita abertura dos portões antes dos paladi-
nos terem chegado lá.
Um Bafolk estava segurando uma criança, ainda mais jovem que antes, e dando ordens
aos paladinos do outro lado do portão da cidade.
Embora sua voz não fosse transmitida para eles, era possível imaginar as ordens que
haviam sido dadas.
Disse Remedios, mas quem franzira a testa após tirar o elmo foram os demais.
Talvez fosse porque sabiam o que tinha acontecido no primeiro campo de prisioneiros,
mas todos tinham semblantes de que não estavam de acordo com essa negociação.
Mesmo quando o Rei Feiticeiro se aproximou, eles ainda não haviam encontrado uma
resposta.
Ou melhor, todos estavam tentando pensar em como dizer à Remedios que a idéia de,
“Precisamos salvar aquela criança, de qualquer modo” não daria certo.
Depois de propor alguns planos descompromissados que acabaram sendo uma perda
de tempo, várias pessoas trocaram olhares, e logo Gustav levantou a voz para gritar:
“Capitã!”
“Não é a primeira vez que passamos por isso! Mesmo que tivéssemos tempo, mesmo se
discutíssemos mais, não há como! Nós não podemos salvar aquela criança!”
Depois de ouvir o que Gustav disse, Neia sabia que a Capitã continuaria a reunião de
estratégia mesmo depois que o Rei Feiticeiro deixara a tenda de comando. Ao mesmo
tempo, ela sabia que os paladinos não seriam capazes de resolver esse problema sem
derramar sangue.
“Capitã! Não podemos vencer essa batalha sem sacrifício! Neste momento, devemos sa-
crificar poucos para salvar muitos!”
Está morta, mas antes que Gustav pudesse dizer, Remedios gritou para interrompê-lo.
“O próximo Rei Sagrado ainda não foi nomeado! Não devemos assim proteger os ideais
da Rainha Sagrada-sama, a quem nós juramentamos nossas espadas? De que vale um
voto de lealdade quando nós mesmos o quebramos?”
Neia entendeu.
Remedios estava presa, ligada aos desejos da pessoa a quem ela havia prometido sua
lealdade.
Como eram cavaleiros da Rainha Sagrada, que amava o povo, não podiam fazer nada
que pudesse prejudicar o povo.
A única pessoa que poderia quebrar seus laços foi a próxima pessoa a quem ela ofereceu
sua lealdade.
“Isso está errado? Para quem vocês juraram suas espadas? Vocês todos passaram pela
cerimônia para serem ordenados como paladinos! A QUEM VOCÊS ACHAM QUE A OR-
DEM PALADINA SERVE!?”
Seu tom mudou em um instante. Depois de perder o controle, ela se acalmou imediata-
mente, e sua voz estava cheia de uma frieza congelante:
“A Rainha Sagrada estava errada em desejar a felicidade dos pequenos e uma nação
onde ninguém precisaria chorar?”
“Ela não estava errada! Mas... dependendo da situação... talvez precisemos mudar.”
Ela não era governada por sua lealdade aos desejos da Rainha Sagrada, a quem ela se
comprometera a servir.
Remedios disse que deveriam se guiar pela justiça. Por mais espinhoso que seja o cami-
nho, por mais difícil que seja prosseguir, alguém deveria esquecer todas as dificuldades
e seguir em frente sem prestar atenção ao que estava ao redor.
Sacrificando os poucos para salvar muitos, ou salvar a todos não importando se fossem
poucos ou muitos; qual destes seria verdadeiramente justo?
Claramente, foi o último. Porém, era idealista demais, e uma pessoa normal imediata-
mente desistiria. No entanto, mesmo depois de saber disso, Remedios ainda insistia em
salvar todos.
Ela manteve firmemente um ideal que uma pessoa normal abandonaria imediatamente.
Por isso ela era a Capitã dos paladinos, a paladina do mais alto escalão dentre todos eles.
Remedios era a única que buscava seu grande ideal de justiça, e aqueles que não conse-
guiam entender isso eram dignos de pena.
Se alguém considerasse a justiça do Rei Feiticeiro de “Matar um para salvar mil” como
a justiça de um rei, então a justiça de “Um ou mil, todos são iguais” de Remedios também
era um ideal, quiçá a forma mais intensa de justiça.
Por exemplo, se Remedios fosse mais forte — se ela possuísse um poder divino que
Neia não pudesse imaginar, ela poderia salvar a criança e salvar os habitantes da cidade.
Nesse caso, não teria havido problemas.
Executar a justiça requer força. Ahhh, eu quero me tornar forte... desse jeito, eu posso aca-
bar com a mácula de Jaldabaoth deste país...
“...Perdoe-me por interferir neste impasse, mas não chegarão a uma conclusão desse
modo.”
“Vossa Majestade...”
“Capitã Custodio. Já passamos por isso e sabe que servirá apenas para informar os ini-
migos sobre a eficácia dos reféns. Do meu ponto de vista, você não poderá conquistar
essa cidade sem sacrificar ninguém.”
“Certamente não. Mas deve haver uma maneira melhor de fazer isso. Um caminho onde
ninguém precisa ser sacrificado e onde ninguém precisa ficar triste!”
Em resposta a essa voz, que soava como se estivesse tirando sangue da garganta, o Rei
Feiticeiro deu uma resposta direta.
“Creio que tal maneira seja inexistente... já perdemos muito tempo aqui. Se isso conti-
nuar, o passado vai se repetir novamente.”
Remedios mordeu o lábio com força. Um pequeno fio de sangue correu por ele.
“Quê—!!”
“Hm. Deixe o resto comigo. Agora é tarde, duvido que consiga resolver com apenas uma
baixa, isso mesmo que façam uma investida com o anseio de morrer.”
“Tem certeza!?”
“Vossa Majestade tem conservado sua mana para lutar contra Jaldabaoth; usar sua
mana não faria com que sua luta contra Jaldabaoth seja desfavorável?”
“Certamente, Srta. Baraja. Mas não há outro caminho para salvar mais pessoas... não
posso garantir que não haverá perdas, mas pelo menos haverá muito menos do que se
tentar sozinha. O que me diz? Deixará que eu resolva isso?”
Remedios inclinou a cabeça e saiu sem dizer uma palavra. Ela caminhou em direção à
cidade — onde os cidadãos-soldados estavam olhando com olhos inquietos.
“Sinto muitíssimo, Vossa Majestade. Como Vice-Capitão, rogo para aceite meu pedido
de ajuda no lugar da Capitã.”
“Humm... Bem, então permita-me uma indagação supérflua, mas pretende me agrade-
cer por isso, certo?”
Todos os presentes ficaram confusos com a pergunta do Rei Feiticeiro, mas imediata-
mente responderam de acordo. Neia não deixou de perceber o desconforto em seus co-
rações, afinal ele havia feito uma pergunta bem razoável.
Dizendo isso, o Rei Feiticeiro partiu para os portões da cidade sem esperar por uma
resposta.
Depois de incitar essas duas magias, ele acenou com a mão e conjurou várias sombras
trêmulas.
Elas irradiavam uma aura única para os undeads, que os vivos não podiam suportar.
Suas formas translúcidas exibiam expressões de miséria.
[Aparições]
Eles eram Wraiths. Neia tinha ouvido uma vez nas aulas de monstrologia que eles to-
mavam a forma das espécies que os viam. No entanto, suas aparências bizarras pareciam
sombras de três pessoas misturadas, ao contrário do que as aulas a ensinaram.
[Aparições S u p e r i o r e s ]
“Atenção, High Wraiths.”
Mesmo ela se perguntando se era realmente certo não explicar em detalhes o que eram
aqueles undeads, o Rei Feiticeiro que poderia fazer planos de batalha tão perfeitos cer-
tamente não teria negligenciado esse ponto.
“High Wraiths. Como são seres incorpóreos, eles podem atravessar paredes e outros
obstáculos... mas não podem atravessar tudo... provavelmente não quer saber os deta-
lhes, não é? Resumindo, eles fazem parte dos meus preparativos para tomar a cidade.
Enfim, é melhor espere aqui, Srta. Baraja...”
“Usar o quê?”
O Rei Feiticeiro criou um colar com um pingente de pentagrama, com uma grande cor-
nalina no centro.
“Esse item concede imunidade ao medo. Os High Wraiths têm a capacidade de incutir
terror nos corações... Mas agora está protegida. Esteja ciente que andará em um caos
completo. Pessoas motivadas pelo medo podem mostrar, às vezes, uma tremenda força.
Até eu posso não ser capaz de proteger-lhe, então a hora de desistir é agor...”
“Complicado né...? Estamos em guerra. Onde já se viu, uma guerra sem vítimas?”
Claro, não foi isso que Remedios quis dizer. O Rei Feiticeiro não poderia ter confundido
o significado de suas palavras. Esta foi provavelmente a maneira do Rei Feiticeiro de
contar uma piada, mas mesmo assim...
Talvez essa possa ser a única fraqueza do Rei Feiticeiro. Assim que esse pensamento
veio à mente de Neia, eles chegaram nos arredores dos portões da cidade.
O Rei Feiticeiro indicou os paladinos mais recuados e então, ele entrou nos portões da
cidade, como se estivesse entrando em um campo vazio.
Logo, o Rei Feiticeiro avançou em direção ao Bafolk que mantinha a criança como refém.
Era difícil dizer que tipo de expressão o demi-humano estava fazendo. Provavelmente
foi choque. Os outros demi-humanos ao redor do Bafolk provavelmente tinham os mes-
mos olhares em seus rostos. Não, mesmo Neia ficaria chocada se de repente visse o Rei
Feiticeiro.
“...Um, um undead!?”
“De fato. E acredito que vocês são os ‘the living’, acertei? Me lembro de aprender essa
palavra de idioma estrangeiro há muito tempo, mas não sei se pronunciei corretamente.”
“O-o quê? O que é você? Tá de sacanagem... você realmente é... não, um humano?”
“Você mesmo! Você controla esse undead aí, né? Que sujeito esquisitão, hein!”
Pensamentos de: Eu não sou uma necromante, ou: Você está sendo rude com o Rei Feiti-
ceiro, percorreram a mente de Neia, mas ela permaneceu em silêncio.
Todos os sinais de vida fugiram do rosto do menino. Seus olhos vidrados refletiam o
rosto do Rei Feiticeiro, mas ele não reagiu. Mesmo assim, ele ainda engasgou baixinho
quando seu captor agarrou sua garganta.
Neia refletiu. A razão pela qual podia pensar calmamente era porque ela era apoiada
pela muralha ambulante que era o Rei Feiticeiro.
Talvez tivesse percebido alguma coisa, mas o Bafolk deu um passo para a retaguarda
enquanto ainda mantinha seu refém.
Mesmo assim, eles não pareciam querer matar seus reféns para lhes ensinar uma lição.
Pois provavelmente pensaram: Será que os reféns vivos realmente funcionariam com os
undeads, que eram os inimigos dos vivos?
Neia sentiu algo como um vento sombrio passando por ela. Nesse momento, todos os
Bafolks ficaram sem ação. Desde que o Rei Feiticeiro dera as caras, todos os demais per-
maneceram imóveis, estudando cada movimento que ele fazia, mas essa mudança foi
extrema demais. Seus olhos e bocas se abriram, e seus rostos se torceram de uma ma-
neira feia. Além disso— não foi apenas os Bafolks. Até mesmo as crianças quase sem vida
faziam feições semelhantes.
Mesmo não conseguindo ler os rostos dos demi-humanos, Neia entendia as expressões
humanas. O medo estava escrito nos rostos das crianças. Era um medo absoluto, inima-
ginável e avassalador.
“Hegh-Hiiiiieeeee!”
E então, acima deles — inúmeros gritos ecoaram perto dos muros da cidade. Depois
disso, ela ouviu os baques de carne sendo golpeada.
Neia ficou brevemente distraída por aquele som, então quando olhou para frente nova-
mente, para o rastrilho—
—Um barulho estridente soou. Era o som dos pedaços de portão pulverizado caindo
como chuva.
“...Como eu pensava, destruir edificações drena muita mana... mesmo que eu não faça
uso com muita frequência, acho que só me resta aceitar o fato de que preciso escolher
meus alvos para conseguir o melhor efeito. Pequenas coisas geram grandes impactos no
futuro.”
O Rei Feiticeiro murmurou para si mesmo ao passar pela colina de destroços do portão,
ninguém apareceu para bloquear o caminho.
A rápida mudança de situação deixou Neia confusa e incapaz de se mover. Uma vez que
recuperou a calma, ela sorriu para si mesma.
Neia correu atrás do Rei Feiticeiro, e ele se virou na frente do imóvel Bafolk.
Ele disse, enquanto indicava os demi-humanos imóveis e as crianças que estavam se-
gurando:
O Rei Feiticeiro riu e, em seguida, caminhou pelos Bafolks, como se para preencher as
lacunas entre eles.
“Gooooohhh!!”
Um Bafolk de aparência forte caiu de cima com um grunhido, segurando uma lança.
Provavelmente pulou da muralha da cidade.
Estava com olhos vermelhos e espumando pela boca. Não estava claramente em um
estado mental normal. Parecia que ele tinha enlouquecido.
O Bafolk enlouquecido não parecia mais capaz de distinguir entre amigo e inimigo.
“Haja paciência...”
O Bafolk levantou a lança. Ele golpearia com isso? Neia apressadamente tentou sacar
seu arco.
Com movimentos rápidos, um golpe veio da esquerda para direita apertando a cabeça
do Bafolk.
Talvez fosse porque o Rei Feiticeiro era surpreendentemente forte, mas o Bafolk não
conseguia escapar das garras do Rei Feiticeiro, não importando quanto se debatia.
Tendo desistido disso, o Bafolk veio com outra jogada; agarrou a parte da frente da lança
Contudo, o Rei Feiticeiro não recuou. Talvez uma magia defensiva tivesse impedido o
golpe.
Isso claramente foi uma lesão letal. Não, pode-se dizer que era ainda pior do que uma
lesão fatal.
Neia perguntou ansiosa, o Rei Feiticeiro apenas limpou as mãos enquanto respondeu
indiferente:
“Esmagar o crânio? Às vezes indivíduos quando ficam berserker, eles não voltam a si
mesmo quando fatalmente feridos. Mas basta destruir o cérebro que o empecilho é re-
solvido... Esse era dos fracos, um pouco mais duro do que uma casca de ovo... é apenas
uma piada, tudo bem?”
“Srta. Baraja, chame os paladinos. Diga-lhes para proteger esta área para que possamos
continuar juntos.”
“Sim, senhor!”
Neia correu para fora em alta velocidade, para onde os paladinos estavam. Quando ela
olhou para lá, viu vários Bafolk deitados nos pés dos paladinos.
Como não poderiam ter fugido do portão, provavelmente eram os Bafolk que, em sua
tentativa de fugir do Rei Feiticeiro, que era a fonte do medo, escolheram pular das pare-
des e esse foi o resultado.
A questão do porquê nenhum outro Bafolk apareceu depois que os portões da cidade
foram violados imediatamente desapareceu.
Neia ouviu gemidos seguidos de lamentações. Isso a fez pensar que esta cidade inani-
mada estava gemendo.
“Eu ordenei àqueles undeads que invoquei que espalhassem o medo. Esse é o resultado.
Alguns reféns podem ter sido pegos na confusão... Só nos resta tratar isso como um triste
acidente. Desista deles.”
Ela moveu os olhos para o outro lado, e uma horda de Bafolks corria na direção deles,
com olhares desesperados — provavelmente — em seus rostos. Eles pareciam apenas
presas, e Neia até sentiu um pouco de pena.
Eles devem ter sido expostos a um medo extraordinário. Caso contrário, por que corre-
riam em direção a alguém ainda mais poderoso do que a criatura undead da qual esta-
vam fugindo?
“Hm... não há sinais de humanos então? Nesse caso — 「Maximize Widen Magic: Fire-
ball」.”
O Rei Feiticeiro lançou uma bola de fogo no centro da horda de Bafolks, e ela irrompeu
em um incêndio maciço. Depois disso, corpos desmembrados caíram para todo lado.
“Mesmo que esperar aqui possa ser a melhor coisa a fazer... o inimigo parece ter um
líder. Ele está esperando em uma praça perto do centro da cidade, e tem resistido ao
medo dos High Wraiths, vamos seguir em frente... o que você acha?”
Toda vez que davam um passo à frente, gritos assustadores pareciam ecoar por toda
parte, como se um grande massacre estivesse ocorrendo. Além disso, devido à falta de
higiene dos demi-humanos, seus resíduos de carne, fezes e urina estavam por toda parte,
o que fez Neia franzir o nariz.
“...Falando nisso, Srta. Baraja, o que deve ser feito com aquilo?”
Ela olhou na direção para onde o Rei Feiticeiro estava apontando. Havia um grupo de
humanos nus.
Eles estavam exaustos, desnutridos, mas suas vidas não pareciam estar em perigo.
O ataque à cidade tinha como objetivo libertar as pessoas. Mesmo que ela continuasse
seguindo o Rei Feiticeiro, Neia não teria qualquer utilidade. Nesse caso, ajudá-los agora
e levá-los a um lugar seguro era a coisa certa a fazer. No entanto, havia uma coisa que a
deixava desconfortável.
O que ela deveria fazer se as pessoas fossem atacadas por demi-humanos enquanto es-
tavam sendo evacuadas?
Que ridículo. Por que estou hesitando? A Capitã teria escolhido ajudá-los sem qualquer
hesitação. E a razão pela qual eu não posso é... é por causa da força... afinal?
“Você parece confusa, hm. Vamos deixá-los aí por enquanto. Não deve haver nenhum
demi-humanos nas proximidades. Creio ser o caminho mais seguro. Vamos indo.”
“Sim!”
Mesmo ainda tendo suas dúvidas, Neia continuou seguindo o Rei Feiticeiro até a praça
da cidade. Por que o Rei Feiticeiro poderia avançar sem a menor hesitação? Embora ela
tivesse suas dúvidas, ela se convenceu dizendo: “Ele deve ter lançado alguma magia”.
Logo mais, os dois chegaram a uma praça que parecia um mercado central com ruas
por toda parte.
“Hm... como eu pensava, resolver toda essa situação sem sacrifícios era impossível.”
Ela olhou na direção que o Rei Feiticeiro olhava, havia cadáveres humanos misturados
com cadáveres demi-humanos. Provavelmente as pessoas foram pisoteadas até a morte
no caos induzido pelo medo.
Mesmo que o Rei Feiticeiro estivesse brincando, se tivessem invadido a cidade usando
a força bruta dos paladinos o resultado seria equivalente ou até pior. O fato era que;
deixar o Rei Feiticeiro usar seu poder avassalador minimizaria o número final de vidas
perdidas.
Havia ali um demi-humano que era maior que todos os seus pares.
As pontas de seus chifres estavam envoltas em uma casca de ouro incrustada de joias,
também usava uma armadura peitoral verde que tinha padrões semelhantes a um casco
de tartaruga, assim como uma capa marrom-avermelhada feita de couro de animal bem
trabalhado. Sua mão esquerda segurava um grande escudo com um topázio encravado,
enquanto sua mão direita espada bastarda cuja lâmina era amarela clara. Sua panóplia
ilustrou vividamente a coragem e a ferocidade de um guerreiro corajoso.
Ele era o mais temível e bem treinado dos demi-humanos. Era provavelmente um Rei,
ou algum tipo de ser de alto escalão.
“Nada mau. Você conseguiu conquistar a cidade e forçar minha tribo até este ponto...
Você, que controla o inimigo dos vivos, usuária da magia do medo. Diga seu nome.”
“—Não, espere, calma aí. Você entendeu errado. Não sou eu!”
“...O quê?”
“Estou impressionado que percebeu bem rápido. De fato, ela é a minha mestra.”
O que deu nele pra dizer isso? Eu juro que não entendo o sensor de humor dele.
“Eh?”
Cintilando sua capa com os movimentos régios, o Rei Feiticeiro virou-se para saudar o
demi-humano diante dele.
“Eu sou a entidade que colocou os undeads em seu encalço. Eu sou o rei eterno que
governa um país à nordeste, o governante do Reino Feiticeiro, o Rei Feiticeiro Ainz Ooal.
E qual é seu nome?”
“Ela é minha seguidora. Bem, então o que você quer fazer? Prefere ser morto por mim?
Ou ajoelhar-se em servidão? A escolha é toda sua.”
Buser ergueu o escudo e avançou, alçando a espada em posição horizontal. Ele parecia
um bode prestes a atacar.
“Mm... Então eu vou brincar com você por um tempo— Srta. Baraja, apenas sente-se e
assista. Me diga uma coisa, bode. Você está equipado com todos os tipos de itens mágicos,
mas eu não detecto magia dessa coisa na sua cintura. Isso é algum tipo de item especial?”
“...Percebi. Eu simpatizo com seus sentimentos. Estar na moda é algo bem valorizado.
Minhas empregadas me ensinaram isso muito bem... Enfim, vamos começar. 「Create
Greater Item」.”
Depois de lançar sua magia, uma espada preta apareceu na mão do Rei Feiticeiro.
Nesse caso, as armas seriam usadas somente depois que ficasse sem mana e opções. Os
magic casters arcanos sabiam bem disso, e por isso evitavam combate armado.
O Rei Feiticeiro deve ter escolhido lutar corpo a corpo por algum motivo.
—Será que ele gastou muita mana? Que problemão... Sua Majestade veio aqui pra lutar
com Jaldabaoth...
A magia para convocar aqueles undeads deve ter sido de nível muito alto...
Embora ela não soubesse quão poderosos os High Wraiths eram, definitivamente eram
mais fortes do que os Wraiths comuns. Portanto, invocar tantos deles exigiria uma
grande quantidade de energia.
Em circunstâncias normais, toda vez que um sacerdote conjurasse uma magia para con-
vocar anjos, ele convocava um de cada vez. Se eles estivessem dispostos a convocar anjos
mais fracos, poderiam convocar múltiplas entidades. Por essa lógica, ele deve ter usado
uma magia de nível bem superior — possivelmente uma magia inimaginavelmente po-
tente do 6º Nível.
O sexto nível era um reino onde ninguém havia explorado antes. Segundo a lenda, a
Rainha Sagrada poderia usar magias do 4º Nível. Isso estava dois níveis acima dela.
Poderia ser um reino além do conhecimento comum, mas o Rei Feiticeiro poderia ter
conseguido torná-lo uma realidade.
Neia olhou para as costas do Rei Feiticeiro enquanto ele enfrentava o demi-humano. O
demi-humano visto acima do horizonte dos ombros do Rei Feiticeiro era muito forte, e
nenhuma quantidade de ajuda vinda de Neia teria utilidade. No entanto, o Rei Feiticeiro
se portou com a postura majestosa de um soberano, sem nenhum sinal de que estivesse
entrando em uma briga que não poderia vencer.
Eles fecharam a lacuna entre si, até ficarem ao alcance dos golpes um do outro. Buser
lançou o primeiro ataque.
“《Investida de Escudo》.”
Foi uma investida súbita, feita com um escudo na frente de si mesmo. E o Rei Feiticeiro
recebeu-o de frente com sua espada.
Como esperado, não havia como receber a força daquele corpo massivo quando em sú-
bita investida. O Rei Feiticeiro foi jogado longe. Não, seus pés ainda estavam firmemente
plantados no chão quando ele aterrissou, então o jogado longe estava um pouco fora de
lugar. Em vez disso, seria mais sensato dizer que foi um recuo.
Embora o fato do Rei Feiticeiro — que poderia esmagar o crânio de um Bafolk com suas
próprias mãos — ter sofrido um recuo seja surpreendente, certamente um corpo feito
de ossos não seria capaz de se defender completamente contra esse ataque. Pelo que
Neia sabia, havia uma Arte Marcial avançada chamada 《Fortaleza》 que poderia anular
completamente a força de um impacto, mas essa era uma técnica que somente um guer-
reiro veterano poderia usar.
Suas idas e vindas eram muito rápidas para os olhos de Neia. As únicas coisas que ela
podia ver claramente eram os breves momentos em que suas lâminas colidiam e fricci-
onavam.
Caso Neia se intrometesse nessa batalha, ela certamente sofreria cortes fatais.
Ambos tinham força de braço equivalente, então quando cruzavam lâminas, seus ata-
ques e defesas aconteciam simultaneamente.
Ela deveria ficar impressionada com o modo como Buser poderia manusear uma lâmina
tão pesada com uma mão, ou mostrar respeito ao Rei Feiticeiro por empunhar uma es-
pada de duas mãos mesmo sendo um magic caster?
Neia estava presenciando uma batalha de altíssimo nível, do tipo que nunca tinha visto
antes, ela estava certa de que não poderia interferir.
Para não atrapalhar a luta, Neia foi saindo de fininho até ficar atrás de um pedaço de
cobertura.
Trocam golpes assim, mas nenhum está ferido... falando nisso, o Rei Feiticeiro parece
anormalmente forte...
O cérebro de Neia não conseguia mais acompanhar um magic caster que podia lutar
com uma espada desse modo.
Tudo o que Neia poderia fazer era atribuir isso a alguma forma incrível de magia que
ela nunca tinha ouvido falar antes.
Mesmo assim—
Se demorar muito, não há dúvida de que o Rei Feiticeiro vai ganhar. Não, ele estava pla-
nejando prolongar a batalha por causa disso?
Os undeads não sentiam fadiga e não seriam abalados em combates prolongados. Tudo
desfavorável a Buser.
Neia ficou chocada. O Rei Feiticeiro de repente arremessou sua enorme espada em Bu-
ser.
Depois disso, uma luz hemisférica apareceu em torno de Buser e recebeu o impacto da
espada.
Nada bom!
Neia se preparou para sair de trás de sua cobertura. O Rei Feiticeiro estava desarmado
agora—
“—Huh?”
Em algum momento, uma alabarda preta aparecera nas mãos do Rei Feiticeiro.
Buser deve ter se sentido da mesma maneira que Neia. Seus olhos estavam tão largos
quanto pires.
“Você não incitou magia alguma, como fez isso...? E cadê aquela espada que jogou em
mim...?”
“Eu simplesmente conjurei silenciosamente uma magia. Não se preocupe com isso...
Certo, meu subordinado me ensinou isso, mas não estou muito confiante em minhas ha-
bilidades. Peço desculpas antecipadamente se por ventura eu me atrapalhar um pouco.”
O Rei Feiticeiro preparou sua alabarda. Ele irradiava uma estranha sensação de opres-
são.
Os guerreiros geralmente favoreciam armas dentro das mesmas classes amplas. Espa-
das, machados, maças, esse tipo de coisa.
Assim que Buser baixou a espada para tentar bloquear o ataque, a alabarda subiu de
repente.
Um movimento que exigiria considerável força de braço para executar, mas Buser le-
vantou sua espada para bloqueá-lo em um instante.
Como esperado, o Rei Feiticeiro se favorecia com a espada e não parecia muito habili-
doso com a alabarda. Embora ele pudesse executar elegantemente os ataques como en-
sinado em algum livro, parecia haver algo estranhamente esquisito em seus ataques, e
até mesmo Neia conseguia identificá-lo com os olhos.
“「Sandstorm」!”
Mesmo ela duvidando que o Rei Feiticeiro tivesse olhos, ter uma visão completamente
bloqueada era uma tremenda desvantagem.
Uma era uma Arte Marcial que Neia não tinha ouvido falar, enquanto a outra era uma
técnica avançada, um ataque poderoso que causaria dano adicional. Depois de usar os
dois, Buser estava mais rápido do que antes.
As decorações dos chifres de Buser brilhavam com uma luz bizarra e ele parecia uma
estrela cadente.
“YEEEEEEAAART!”
“Hmph!”
“Haha!”
—E Buser riu.
Neia começou a entrar em pânico, mas no momento seguinte, ela congelou quando viu
Buser olhando com os olhos arregalados.
“Está ileso!”
“...Bem. Eu fiz essa arma com a minha magia, não viu? Como poderia ser quebrada tão
facilmente?”
“Ah, vejo que já teve experiência em lutar contra adversários com armas criadas magi-
camente, mas é perigoso estar preso a dogmas. Quero dizer, pode haver adversários que
podem fazer armas que você não consegue quebrar.”
O Rei Feiticeiro soltou sua alabarda, que desapareceu como se tivesse derretido no ar.
A mesma coisa deve ter acontecido com a espada de antes.
Depois disso, o Rei Feiticeiro fez um movimento de agarrar, e agora ele tinha duas es-
padas longas de cor preta, uma em cada mão.
“...E então, o que fará? Não me diga que o ataque de antes foi sua estratégia para a vitó-
ria? Será que não quer me ajudar a ganhar mais experiência?”
“...Se tiver mais trunfos, seria melhor que os usasse quanto antes, não? Eu não sou gentil
o suficiente para deixar um inimigo inútil viver.”
Neia se sentiu nervosa novamente. Até ela notou isso. Buser, um guerreiro muito me-
lhor que ela, não poderia deixar de perceber.
“Oh. Então foi isso que pensou. Realmente, você estaria correto em pensar assim. Mas
infelizmente não é o caso.”
“Cuidad—!”
Buser avançou para esfaquear aquele corpo desprotegido mais rápido do que Neia po-
deria gritar.
E então—
“...O quê!?”
Ele gritou com cada golpe que fazia. Isso porque o Rei Feiticeiro estava ileso apesar de
sofrer todos os golpes.
Buser levantou o escudo e usou uma Arte Marcial. Porém, o Rei Feiticeiro permaneceu
impassível, apesar de ter recebido um golpe de escudo.
O Rei Feiticeiro deu de ombros de uma forma exagerada e, ao mesmo tempo, arrancou
um dos nove anéis que usava do dedo.
Ele não fez mais nada. Esse foi o único movimento que o Rei Feiticeiro fez. No entanto
— uma onda de ar anormalmente assustadora e congelante encheu o ambiente.
Neia olhou apressadamente para o céu. Ela quase pensara que o sol houvesse desapa-
recido. Mas o sol ainda estava lá, banhando-os com seu brilho.
—Então essa emanação assustadora e sombria poderia ser algo liberado pelo Rei Feiti-
ceiro? Poderia um único indivíduo fazer algo assim?
Este, este é o Rei Feiticeiro. Esta é a verdadeira forma do magic caster que matou um
exército de dezenas de milhares...
Buser, por outro lado, deu um passo trêmulo para trás. Era como se ele estivesse sendo
empurrado por uma pressão invisível irradiada pelo Rei Feiticeiro.
Buser podia sentir aquela presença anormal mais intensamente do que Neia. Ele enten-
deu claramente o fato de que o Rei Feiticeiro não era um adversário que pudesse vencer.
A maneira que seu pêlo estava arrepiado provava isso.
“Espere, calma aí. Vai com calma, só um segundo. Estou te implorando, calma aí, cara!”
Buser levantou a mão direita e deixou a espada que estava segurando cair no chão.
“Hm.”
“Eu tenho informações sobre o Jaldabaoth. Que tal? Deve ser muito útil pra você, não
acha? Definitivamente será útil.”
“Sei.”
“Oh.”
“...Espere, por favor espere! Isso não é tudo! Se o senhor quiser, eu posso te dar parte—
não, todo o meu tesouro! Isso deve bastar pra poupar a minha vida, né?”
Buser olhou freneticamente ao redor, e então olhou para o Rei Feiticeiro mais uma vez:
“Sim, sim. Não, não é isso. Eu tenho mais, muito mais além disso. Eu posso te ajudar a
conseguir o que o senhor quiser— não. Eu definitivamente vou pegar qualquer coisa pro
senhor! Eu juro! Por favor acredite em mim!”
“Mm. O que eu realmente quero, é algo que você nunca será capaz de obter.”
Neia sentiu a irritação no tom do Rei Feiticeiro. Naturalmente, Buser, como aquele que
o confrontara, deve ter sentido isso ainda mais fortemente.
Ele estava rindo como um tom servil. A atitude régia que ele demonstrara quando os
enfrentara na praça não estava em lugar nenhum.
“Eu sinto muito se eu disse algo errado. Digo, eu peço perdão. Eu admito. Foi minha
culpa. Eu sei disso.”
“Hm...”
“Então, então, o que me diz? Eu-eu— vos-vosso servo, pode ser útil pro senhor. Hehe.
Ah, que estupidez a minha em querer ser inimigo do grande rei dos mortos. S-se o senhor
me der uma chance de compensar esse erro, eu iria... hehe, o senhor não vai se arrepen-
der!”
Uma pose patética. Ainda assim, Neia não pensava dessa maneira. Não, ela já havia acei-
tado que essa era a ação apropriada que um inimigo deveria tomar quando confrontada
com a verdadeira forma do Rei Feiticeiro. Ao mesmo tempo, ela lembrava vividamente
“Sabe... eu gosto daqueles que entendem que estão errados e trabalham arduamente
para corrigir seus erros.”
“Agora morra.” O Rei Feiticeiro disse enquanto erguia seu dedo delgado.
“HIIIIEEE! Não, não, não! Eu não quero morrer!! Calma aí!! Estou te implorando!!! Por
favor, eu imploro!!! Eu tenho valor sim!!!! — Eu sou útil o suficiente pra te fazer feliz!!!!
É sério!!!!! ACREDITE EM MIM!!!!!”
“Todas as coisas que vivem devem morrer. A diferença está em quão cedo ou tarde elas
encontrarão seu destino.”
Neia olhou fixamente para a rapidez com que uma criatura viva podia fugir quando sua
morte estava nas mãos de outrem.
“Ridículo. — 「Death」.”
Nada aconteceu. Não houve grande explosão, nem um grande amonte de relâmpagos
rugindo.
“Bem, é uma pena sobre a informação... enfim, as coisas são o que são. Se opõe, Srta.
Baraja?”
“Jura? Então vá encontrar os paladinos. Diga-lhes que cuidei do líder dos demi-huma-
nos. Ainda assim... que lamentável...”
Parte 4
Tanto a retomada da cidade quanto a libertação de seus cidadãos foram triviais diante
do poder do Rei Feiticeiro.
Esse resultado só foi possível devido à presença do Rei Feiticeiro, a ponto de algumas
pessoas pensarem: Se ao menos tivéssemos entregado tudo a ele desde o início, talvez não
precisássemos perder ninguém.
Todos sorriam enquanto Neia e o Rei Feiticeiro desciam a rua, era incerto se estavam
regozijando por terem sido libertados ou derramando lágrimas por uma tigela de sopa
quente.
Embora tivessem sido informados de que sua liberdade foi graças à ajuda do Rei Feiti-
ceiro, uma vez que viram o Rei Feiticeiro andando em pessoa, os olhos dos residentes
ficaram cheios de choque, confusão e aversão, mas era minimamente esperado.
Claro, se Neia podia aceitar essa recepção já era uma questão inteiramente diferente.
Mesmo ela desejando fazer alguma coisa no caso de o Rei Feiticeiro estar descontente,
aparentemente o próprio homem não parecia se importar. Sendo esse o caso, seria muito
rude de Neia agir por conta própria.
Neia se dirigiu às costas do Rei Feiticeiro, que estava andando na frente dela.
O Rei Feiticeiro estava olhando para a palma da mão, e ele não olhou para Neia.
“Hum. Eu estou indo para aquele grande edifício no centro da cidade. Pretendo investi-
gar quanto antes, pode ser uma base inimiga. Os paladinos estão ocupados em libertar
os residentes capturados, distribuir comida, tratar os feridos, aprisionar os demi-huma-
nos capturados e outras coisas.”
Como aquele que havia conquistado a cidade, as tarefas menores foram dadas aos cida-
dãos-soldados e aos paladinos. Nesse caso, um simples trabalho de inspeção já poderia
ter sido feito no atual objetivo do Rei Feiticeiro.
O Rei Feiticeiro parou de andar por um momento e depois olhou atentamente para Neia.
Então deu de ombros e continuou andando.
“Ah, uhum. Na verdade, coloquei meus subordinados do lado de fora para garantir que
os paladinos não se aproximem. Então duvido que tenham verificado.”
“—Srta. Baraja. Eu lhe contei muitas coisas até agora, mas seria melhor se considerasse
assuntos por conta própria de tempos em tempos. Por exemplo, a razão pela qual somos
nós investigaremos o edifício.”
O Rei Feiticeiro olhou para a palma da mão novamente. Dentro havia um item usado
por aquele demi-humano — o falecido Buser. O Rei Feiticeiro estava avaliando o item
enquanto andava, usava o poder da magia para examiná-lo cuidadosamente.
[Atirador d e A r e i a ]
Pelo que o Rei Feiticeiro disse, a espada era chamada de Sand Shooter, a armadura era
[ C a s c o d e Tartatuga] [ M é r i t o de Lanza]
conhecida como Turtle Shell, o escudo era chamado de Lanza's Merit, os revestimentos
[Investida s e m H e s i t a ç ã o ] [Anel do
dos chifres eram chamados de Charge Without Hesitation , os anéis eram Ring of the
S e g u n d o Olho] [ A n e l d a Celeridade] [ M a n t o da P r o t e ç ã o ]
Second Eye e Ring of Haste, enquanto a capa chamava-se Mantle of Protection.
Também parecia haver outros itens mágicos como o colar, etc. Embora dissesse que
nenhum deles possuía encantamentos impressionantes, o Rei Feiticeiro ainda parecia
muito feliz com os espólios da luta.
Neia desviou os olhos do Rei Feiticeiro e voltou a olhar para o chão e então fez o que lhe
fôra pedido, ponderar a razão que os levava a investigar pessoalmente aquele edifício.
No entanto, ela não chegou à nenhuma resposta que a fizesse pensar, Já sei!
Entretanto, se pedisse por uma dica, ele certamente ficaria desapontado. Só de pensar
no Rei Feiticeiro, que ela tanto respeitava, a julgando como uma inútil e a deixando de
lado foi aterrorizante.
Quando se aproximou, eles se afastaram para permitir que o Rei Feiticeiro e Neia pas-
sassem.
Neia não tinha certeza de qual nobre havia governado a cidade. Mas dado o tamanho da
cidade, ele deve ter sido mais do que um barão, mas menos que um conde.
“Sim. Nem mesmo os undeads entraram aqui. Nós somos os primeiros. Seja cuidadosa.
Pode haver mais demi-humanos que ainda não foram subjugados.”
Ela hesitou sobre se deveria dizer “O senhor não deveria entrar”, mas a outra Neia em
sua mente disse que tudo ficaria bem se fosse o Rei Feiticeiro.
“Preciso entrar. Esse é o quartel-general inimigo e pode ser o covil do líder dos demi-
humanos. É um edifício grande, então julguei ser o caso — pode haver um ser poderoso
nos esperando, a par com o Buser. Não quero deixar sequer uma ponta solta aqui.”
“Ah!”
Assim que soube a resposta para sua pergunta, Neia balançou a cabeça em compreen-
são. Ao mesmo tempo, a gratidão fluiu em seu coração pela compaixão do Rei Feiticeiro.
Ele não deixou os paladinos se aproximarem, para manter eles são e salvos! Ao contrário
do que disse antes, tenho quase certeza que o motivo dele não ter me dito foi por se sentir
envergonhado por lutar em prol de outras pessoas. É isso mesmo ou estou viajando?
Mesmo Neia entendendo que pensar assim sobre o Rei Feiticeiro era muito rude, por
algum motivo ela sentiu que o Rei Feiticeiro era um fofinho.
O Rei Feiticeiro olhou para o rosto de Neia enquanto a indagava. Neia assentiu, e ele
pareceu feliz quando respondeu: “Ah, que bom”.
Ele está realmente feliz que eu pude entendê-lo... que pessoa amável e gentil ele é.
“Sua serva entende o porquê Vossa Majestade não deseja chamar a atenção dos outros!”
“...Hm? Ah... exatamente. Então... você entende, não é? Prefiro manter certa discrição.”
“Sim, senhor!”
“Sim!”
Como escudeira, ela sentiu que era errado deixar o Rei Feiticeiro ir na frente, mas o Rei
Feiticeiro jamais permitiria que Neia fosse a vanguarda. Neia olhou com admiração para
as costas da pessoa generosa e magnânima diante dela. Como sua subordinada, assistir
a um rei liderar o caminho era uma visão que realmente aquecia seu coração.
“Onde devemos começar nossa procura? Não parece haver nenhum sinal dos outros
nos arredores...”
“Mm... sua visão e audição são muito boas, Srta. Baraja, mas e o seu olfato?”
“Para ser honesta, eu não estou muito confiante no meu olfato. Mas acho que sou me-
lhor do que a maioria. Quanto ao paladar, acho que o meu é apenas mediano. Bem, eu
nunca provei veneno antes, então eu não posso ser uma provadora de veneno ou algo
assim...”
Quando ele disse “morte e ódio”, sua aura régia pareceu ser mais dominante, realmente
dignas de um rei.
“Morte e ódio?”
“—Por aqui.”
O Rei Feiticeiro partiu. Não havia sinais de hesitação em seus passos. Ele andava como
se estivesse familiarizado com esse lugar e com o que havia pela frente.
Morte e ódio... essas coisas não devem ter um cheiro... ou será que Sua Majestade, que é
undead, consegue sentir? Isso significa que quem estiver fazendo esse odor está esperando
aqui!
Neia agarrou o arco que recebera emprestado do Rei Feiticeiro. Dependendo das cir-
cunstâncias, ela teria que servir como escudo vivo do Rei Feiticeiro e dar um passo à
frente para disparar seu arco.
Parecia uma porta de prisão, no meio de uma residência regular da nobreza. A justapo-
sição encheu Neia com um poderoso sentimento de mau presságio. Parecia que ela tinha
sido jogada em um lugar desconhecido e tenebroso.
“E isto é...”
Era impossível para Neia fazer essa escolha. Depois de ver Neia sacudir a cabeça, o Rei
Feiticeiro deu de ombros e abriu a porta.
Dada a força do Rei Feiticeiro, ele abriu a porta de ferro com facilidade. No entanto, era
surpreendentemente espessa, por isso deve ter sido feita especialmente para algum pro-
pósito.
Ah não! Eu não posso acreditar que realmente deixei Sua Majestade entrar de peito aberto
em lugar desconhecido! Eu sou uma idiota!
Mesmo que a pesada porta lhe dava uma idéia do que esperar, o interior da sala pareceu
estranho. Isso lhe dava a impressão de ser uma câmara de tortura — embora ela só ti-
vesse ouvido descrições de como seria uma.
Havia bastões na parede que brilhavam com uma luz vermelha fraca. Não era uma luz
natural, mas sim criada por magia.
Havia uma mesa de madeira assim como duas cadeiras. Mais para dentro havia outra
porta, também de ferro.
O Rei Feiticeiro estava no centro da sala, examinando cuidadosamente cada canto dela.
Foi quando Neia notou algo na mesa.
“...Vossa Majestade. Isso parece um pedaço de papel, mas o que está escrito?”
O Rei Feiticeiro tirou um monóculo de um bolso. Talvez ele tenha notado o olhar sur-
preso no rosto de Neia, pois logo em seguida ele começou a explicar.
“Este é um item mágico que pode decifrar idiomas escritos. Infelizmente, drena uma
grande quantidade de mana. —Srta. Baraja, conhece algum humano que possa decifrar
esses caracteres?”
“Exatamente. Ou pelo menos, alguém que saiba o que são essas letras. Ou quem sabe...
qualquer humano que tenha um Talento que lhes permita decifrar idiomas.”
Neia era simplesmente uma escudeira da Ordem Paladina. Ela não teve a chance de ou-
vir sequer boatos de pessoas assim.
Claro, ela tinha ouvido alguns rumores de seus amigos escudeiros. Por exemplo, “Um
amigo meu tem um Talento que permite saber quantos graus a água quente tem”, ou “Te-
nho um parente é marujo; ele pode andar cinco passos na água, mas mais do que isso e ele
afunda”, e assim por diante. A maioria eram Talentos chatos. Não havia informações so-
bre pessoas que possuíam Talentos que o Rei Feiticeiro queria saber.
Certamente a Capitã da Ordem Paladina teria entrado em contato com todos os tipos de
informações de inteligência. Entretanto, Neia não sabia o que pensar de Remedios. A Ca-
pitã realmente ocuparia sua memória com essas informações?
O Rei Feiticeiro provavelmente estava tropeçando em suas palavras pela mesma razão
que Neia.
“Hm? Ah, eu não pretendia nada. Mas se houvesse alguém que pudesse decifrar o ar-
quivo de inteligência que o Jaldabaoth deixou para trás, nossos planos futuros mudariam,
não acha?”
“Se não houver ninguém capaz de traduzir, então terei que gastar mana para tal. Mas
isso me deixa em desvantagem e assim preciso ser mais cauteloso com Jaldabaoth. Se eu
o encontrar depois de gastar uma grande quantidade de mana, minha única opção seria
fugir... mas a curiosidade fala mais alto. Pode ter informações úteis, eu preciso ler.”
O Rei Feiticeiro colocou seu monóculo e olhou para o papel. Embora não houvesse si-
nais visíveis de ativação, deveria ter surtido efeito. O Rei Feiticeiro parecia estar deci-
frando agora. Dito isso, o Rei Feiticeiro não tinha olhos, então simplesmente parecia que
ele estava lendo.
Neia tinha visto sacerdotes cambalearem trêmulos depois de usarem muita mana, mas
não havia sinais disso no Rei Feiticeiro. Obviamente, comparar o Rei Feiticeiro a um reles
sacerdote era o ápice da grosseria. Foi provavelmente porque ele tinha enormes reser-
vas de mana.
Neia ouviu muitos sons fracos de respiração no interior e seu nariz captou o cheiro de
sangue.
Ela segurou seu arco com força, pensando em se apertar no espaço entre o Rei Feiticeiro
e a porta, mas o Rei Feiticeiro a deteve com a mão.
“Mm... Srta. Baraja. Quem usou esta sala não era demi-humano, mas demônio. E afirmo
isso porque aquele pedaço de papel contém detalhes a respeito dos experimentos que
os demônios estavam realizando.”
“...Experimentos demoníacos?”
“Isso. Parece que fizeram coisas como cortar os braços e depois recolocá-los em outras
criaturas, ou cortar o abdômen do sujeito e trocar os órgãos internos. Eles começaram
com parentes de sangue como um grupo de controle, e ramificaram-se para combina-
ções de seres humanos e outras formas de vida — não apenas demi-humanos, mas tam-
bém animais — e então eles os curavam com magia para ver quais mudanças ocorre-
riam.”
“...Demônios são assim. Depois de realizar esses experimentos, é natural que eles dese-
jem que seus participantes sejam testados. Em particular, eles querem mantê-los vivos
pelo maior tempo possível até descobrirem o porquê morreram.”
Dizendo isso, o Rei Feiticeiro se virou, de costas para a porta. Então, com o polegar na
altura dos ombros, ele indicou a porta atrás. Por alguma razão, Neia sabia o que viria a
seguir.
“Algumas dessas cobaias estão lá. Ainda estão vivos apesar de terem suas barrigas aber-
tas.”
Ela havia antecipado isso, mas a realidade cruel ainda — que por um instante — tingia
sua mente completamente de branco. Após se recuperar do impacto, ela queimava com
ódio pelos demônios que haviam conduzido experiências tão desumanas.
“Entendido!”
Não havia necessidade de questionar a razão pela qual eles tinham que ser chamados.
Neia correu com todas as suas forças.
No canto de sua mente, ela ouviu uma voz perguntar: É realmente correto deixar Sua
Majestade aqui sozinho? mas esta era uma ordem de um homem poderoso que era ao
mesmo tempo confiável e sábio. Não havia necessidade de se preocupar. Ele não come-
teria um erro. A voz desapareceu em um instante.
♦♦♦
“Veja isso. Este papel contém os nomes das pessoas que estão lá e o que aconteceu com
elas. Além disso, há outros trabalhos com coisas semelhantes escritas, ou talvez outras
coisas — os planos de Jaldabaoth, por exemplo. Eu não tenho muita certeza disso. Con-
segue entender o que está escrito?”
“Eu não faço idéia. Mas o senhor entende, não é Vossa Majestade?”
“Ah, sim, usando o poder deste item mágico. Mas ele drena uma enorme quantidade de
mana. Essa mana deve ser conservada para a batalha contra Jaldabaoth. O que eu quero
saber é; algum de vocês conhece alguém que possa ler esses caracteres? Qualquer um
que tenha a chance de entendê-lo serve.”
“Não, eu não tenho nenhum contato com gente assim. Talvez haja entre os nobres do
sul... Porém, eu acho que a possibilidade disso é muito baixa.”
“Que infortúnio... então como pretende lidar com isso? De minha parte, espero que se
esforce mais para tentar decifrar essa escrita deles.”
“Terei de recusar. Este é um tesouro da minha nação. O sentimento é o mesmo lhe pe-
dem para emprestar a espada sagrada em sua cintura. Para um magic caster como eu,
itens mágicos como esses são mais valiosos do que espadas.”
“Compreendo. Então vamos trabalhar arduamente juntos. Além disso, temos um novo
problema. Parece que há Orcs como prisioneiros. Como eles devem ser tratados?”
Aparentemente, os Orcs não atacaram o Reino Sacro por vontade própria, mas foram
trazidos por Jaldabaoth. Eles não haviam fornecido nenhuma informação útil quando
questionados, e a Ordem dos Paladinos não sabia como lidar com eles.
“Mm... interessante. Poderia me dizer onde eles estão? Há algum problema em deixá-
los para mim?”
Gustav forneceu uma descrição simples da localização. Como a cidade não era muito
grande, provavelmente não se perderiam.
Depois de esboçar um mapa grosseiro em sua mente, a porta da cela se abriu e um sa-
cerdote de aparência exausta apareceu.
“Começamos usando magia de cura nos sobreviventes. Esta é a primeira vez que tenta-
mos curar as cobaias de tais experiências desumanas, então vamos ficar aqui e observá-
los. Se eles estiverem bem, vamos movê-los para fora. Pelo menos é isso que eu acho.”
“Entendo. Logo mais enviaremos alguns paladinos e milicianos para ajudá-los na tarefa
de trazer essas pessoas.”
Depois de ver o sacerdote sair e concluir que não havia mais nada a fazer, os quatro
foram para seus respectivos destinos.
Naturalmente, o Rei Feiticeiro e Neia se separaram dos outros dois e se dirigiram para
a localização dos Orcs.
“Como eu disse, já que há demônios por perto, seria bom se tivéssemos alguém que
pudesse ver as formas originais dos tipos metamorfos.”
“O metamorfismo é uma forma de ilusão? Estou mais familiarizada com truques simples,
como ilusões de iniciantes.”
“Para começar, o metamorfismo é muito diferente das ilusões, mas explicar isso vai de-
morar muito, então vou pular isso por enquanto. No entanto, olhar para as ilusões é
muito perigoso, sabia? As ilusões são um tipo terrível de magia que se torna mais assus-
tadora quanto mais habilidoso for quem a conjurar. Além disso, existem aqueles ilusio-
nistas que não estão satisfeitos com uma compreensão superficial e optam por se espe-
cializar nesse caminho.”
“E quando se especializam?”
“Ah, sim. Por exemplo, existem magias como 「Perfect Illusion」, que podem desafiar
todos os cinco sentidos. E além disso, há aqueles que refinaram suas ilusões até o limite
máximo, que podem usar certa habilidade a cada poucos dias para enganar o próprio
mundo.”
Uma ilusão que poderia enganar um mundo estava além de sua capacidade de imaginar.
“Pelo que eu sei, é uma magia que permite reescrever qualquer aspecto do mundo, se
não me engano... Bem, simplesmente, usar uma ilusão como essa poderia até trazer os
mortos de volta à vida?”
“Eh!? O senhor tem certeza de que uma ilusão pode fazer isso?”
“Oh, sim. Uma ilusão que engana o mundo — o maior segredo das ilusões. Ao enganar
o próprio mundo, uma ilusão pode se tornar real.”
Tudo o que ela conseguia pensar era “NOSSA!”. Mesmo alguém dizendo que o pináculo
da ilusão poderia fazer tal coisa, era tão incrível que ela não entendia muito bem se era
fantasia ou realidade.
“Não, eu nunca ouvi falar disso antes. O Reino Feiticeiro faz essas coisas?”
“Meu país também não tem essa prática. Eu pretendo implantar no futuro, mas isso exi-
girá um esforço considerável... pode acabar sendo uma questão de dez ou mais anos no
futuro.”
♦♦♦
Os Orcs foram mantidos em um edifício cujas janelas estavam fechadas por fora. Era
uma estrutura bastante grande, provavelmente a segunda ou terceira maior da cidade.
Havia muitos paladinos reunidos na entrada. Parece que eles estavam em guarda contra
o que estava dentro.
Depois de ver o Rei Feiticeiro se aproximar, os paladinos curvaram-se diante dele para
expressar seu respeito.
“Eu ouvi da Capitã Custodio que os Orcs estão aí dentro. Posso entrar?”
“Mas a Capitã nos ordenou que ficássemos posicionados aqui. Não podemos deixar nos-
sos postos.”
Dizendo isso, o Rei Feiticeiro passou entre os paladinos e abriu a porta. Naturalmente,
Neia estava seguindo-o.
Havia um odor azedo no ar que ardia o nariz de Neia. Não era gás venenoso, mas o
cheiro lembrava Neia de quando ela havia seguido um paladino para uma prisão. Além
disso, havia outros cheiros misturados — cheiros que a faziam querer vomitar.
“Mas isso...”
Quando ouviu a Capitã mencionar mais cedo, ela pensou sobre o porquê os Orcs haviam
sido especialmente trazidos aqui.
Neia sabia que estava prestes a descobrir a verdade, mas, ao mesmo tempo, isso desdo-
brou as asas de sua imaginação. E se não fossem apenas os Orcs? Se houvesse uma
grande aliança contra Jaldabaoth, os demi-humanos que desejassem lutar contra ele se
uniriam ao estandarte do Reino Sacro?
Apenas andando, ela percebeu que aquele lugar era mais sujo do que uma cadeia.
O lugar estava imundo de sangue, vômito e outros fluidos. As condições eram tão terrí-
veis que não havia como imaginar o que havia acontecido aqui.
Neia observou a bainha do manto do Rei Feiticeiro. Mesmo preocupada sobre como
suas roupas magníficas poderiam estar manchadas, ela não poderia dizer a ele para es-
perar do lado de fora. Afinal, ninguém poderia falar pela sabedoria do Rei Feiticeiro.
Orcs...? Não-humanos?
Neia estava confusa. Ela nunca havia considerado a possibilidade de que os Orcs tives-
sem famílias e criassem filhos. Os Orcs que foram para o Reino Sacro eram invasores.
Eles eram inimigos odiados. Portanto, ela parou de pensar neles como se fosse algo mais
que isso.
“Um undead!”
“Mamãe—! Socorro—!”
“Meu filho—!!!”
Depois que o Rei Feiticeiro gritou sua ordem, a sala barulhenta ficou em silêncio. Claro,
isso foi apenas por um momento. Ela imediatamente encheu de volta com uma balbúrdia
que era várias vezes mais alta que antes. Eles estavam se lamentando sobre as mesmas
coisas. Não, parecia haver mais vozes lamentando seu destino e implorando misericór-
dia por seus filhos, independentemente do que acontecesse a eles mesmos.
“...Haaah.”
O Rei Feiticeiro suspirou, como se estivesse cansado. Depois disso — ele bateu na porta.
Suas mãos brancas ossudas possuíam poder incrível, e a porta quicou, balançando-se até
atingir a parede fazendo um barulho tremendamente alto. Os demi-humanos se calaram
imediatamente.
“Calem-se. O próximo de vocês que falar sem permissão deve ficar pronto para morrer.”
O Rei Feiticeiro deu um passo para dentro de uma sala que parecia ter sido congelada
em silêncio — com alguns pais tentando desesperadamente cobrir as bocas de seus fi-
lhos — e todos os demi-humanos se afastaram dele.
“Eu não vim aqui para matá-los. Pelo contrário, estou aqui para salvá-los.”
Normalmente, Neia, uma humana, teria muita dificuldade em tentar ler o rosto de um
demi-humano, como um Orc. Mas, só desta vez, Neia estava absolutamente confiante em
si mesma.
“Vai ser muito cansativo explicar para cada um de vocês. Que venha algum represen-
tante.”
Um momento depois, um Orc parecia prestes a se levantar, mas o Orc ao lado o deteve.
No entanto, ele ainda deu um passo à frente.
Ele poderia ser um Orc magro, mas que nitidamente outrora possuiu um corpo forte.
“Pensei que tinha dado minha permissão, parece que ninguém entendeu. Você, o Orc
que deu um passo à frente, eu permito que fale. Comece declarando o seu nome.”
“Dyel, então. Aqui está a minha primeira pergunta. Há pessoas aqui que você não co-
nhece ou cujas personalidades mudaram drasticamente?”
“Claro que sim. Ele é meu inimigo. Ou melhor, poderia dizer que vim para cá — para o
Reino Sacro — para matá-lo.”
Seus rostos ainda diziam “Impossível”, como esperado. De fato, Neia poderia ter pen-
sado da mesma maneira antes de entender o Rei Feiticeiro. Entretanto, Neia era dife-
rente agora.
“É como Sua Majestade diz. Eu sou uma cidadã do Reino Sacro. Com isso já devem ter
entendido, certo? Jaldabaoth liderou um exército aliado de demi-humanos para invadir
meu país.”
Pensou ela, mas para Neia, julgar o sexo de um Orc seria muito difícil também. Prova-
velmente o mesmo valia para eles.
“Nosso povo não atacou seu país. Ninguém das tribos Orcs tinha intenção de ajudar o
Jaldabaoth. Foi por isso que a gente tá aqui, é a punição pra todos que ousaram desafiar
ele.”
“Ah, parece que eu fiz uma pergunta que não deveria ter feito. Devo trazer um pouco de
água? Ou quer outra coisa?”
A atitude do Rei Feiticeiro parecia ter mudado. Por alguma razão, ele parecia muito
nervoso. Talvez se sentisse culpado por perguntar aos Orcs sobre uma questão que havia
trazido lembranças ruins. Embora possa ser um tanto rude pensar nele dessa maneira,
o Rei Feiticeiro parecia um pai tentando consolar os filhos de outrem por algo que seus
próprios filhos haviam feito.
Isso é algo que apenas um rei tanto de humanos quanto de demi-humanos como seus sú-
ditos faria...
Para o povo do Reino Sacro, os demi-humanos eram o inimigo. Portanto, sob circuns-
tâncias idênticas, eles não diriam nada amável ou reconfortante.
“A gente não quer mais nada. Só imploro que o senhor não pergunte o que aconteceu.
Acredite quando digo que não gostaria de ouvir, foi uma... experiência infernal. Se for
uma ordem, só vai restar a gente cumprir, mas tudo que eu peço é que seja longe dos
outros. Por favor.”
Depois de ouvir os soluços e choros das Orcs fêmeas, Neia começou a sentir um pouco
de medo do que havia acontecido com eles.
“...Que problemão.”
O Rei Feiticeiro murmurou para si mesmo, mas tanto aconteceu que Neia não sabia so-
bre o que ele estava se referindo.
“Ah, erm, bem. Já que você parece odiar Jaldabaoth, por que não discutir a questão de
nos unirmos, já que temos um inimigo comum?”
“Uma vez a gente já nutriu esse sentimento, mas agora é algo que nosso povo não quer
mais pensar. Nosso povo teve o espírito quebrado pelas coisas diabólicas que acontece-
ram aqui. A gente não tem mais coragem alguma.”
“—Por favor, permita recusar em nome de nosso povo! Estou bem ciente dos perigos
de contrariar o senhor, mesmo se nosso povo fechar um acordo, assim que a gente achar
uma brecha no caminho vamos dar o fora. Traição é uma das coisas mais sem honra que
existe. Melhor morrer de outro jeito do que sofrer uma morte angustiante.”
“O quê...”
O Rei Feiticeiro provavelmente ficou um pouco confuso com essa recusa firme. No en-
tanto, Neia entendeu as motivações de Dyel. Isso porque até conhecer o Rei Feiticeiro,
Neia também sentia que o undead era o inimigo de tudo o que vivia.
“...Nem tanto, mas meu domínio não é um lugar temível. Há muitos demi-humanos que
moram lá, sabia disso?”
“Mentira! Soa como uma mentira! Não minta pra gente assim! Tá falando de demi-hu-
manos undeads, não é?”
Dyel parecia ter ficado meio insano, mas ele era exatamente como ela tinha sido no pas-
sado. Então, como alguém que tinha alguma experiência nesses assuntos, ela deveria
contar a ele sobre a verdadeira face do Reino Feiticeiro.
“Sua Majestade está dizendo a verdade. Ele é um grande homem que, apesar de ser
undead, também possui um coração cheio de compaixão por todas as coisas vivas. Ele
ama seus filhos, ele governa os demi-humanos de forma justa e recebe o respeito de seus
subordinados. Como prova disso, até construíram enormes estátuas dele que surpreen-
dem a todos que as veem—”
Já que ele disse “por favor”, ela não teve escolha senão ficar quieta.
“Além disso, eu vi uma demi-humana parecida com coelho. Eu não sou uma cidadã do
Reino Feiticeiro. Portanto, passei pouco tempo lá. Mesmo assim, foi o suficiente para eu
entender o que estava acontecendo. As pessoas que moram lá não estavam sofrendo,
nem tinham olhares, exatamente o oposto de vocês agora. E, claro, nenhum deles tinha
sequer um arranhão.”
Os demi-humanos olhavam para seus corpos magros. Seus músculos haviam encolhido,
e eles eram pouco mais que pele e osso.
“É como ela— é como a Srta. Baraja diz. Enfim, vocês provavelmente não acreditarão
em mim. Entretanto, uma vez que se tornem meus vassalos, eu nunca permitirei que
sofram tal crueldade novamente. Eu posso jurar isso em meu nome, Ainz Ooal Gown. A
razão para isso é porque tudo o que eu governo pertence a mim. Caso sejam danificados,
será o mesmo que danificar minha propriedade. Vocês poderão levar vidas sossegadas.
Se não desejarem minha regência, não vou forçá-los a fazê-lo. Vivam como bem enten-
derem. De todo modo, vou me preparar para mandá-los de volta para suas casas.”
Essa foi a primeira vez que Dyel deixou de lado suas noções preconcebidas. Neia podia
senti-lo olhando para o próprio Rei Feiticeiro.
Era difícil para as pessoas depositarem sua fé em benefícios oferecidos a elas sem ne-
nhum compromisso, mas uma transação mutuamente benéfica era mais confiável. Pa-
rece a mesma lógica aplicada aos demi-humanos.
“Não há problema. Eu pretendo usar tudo a meu alcance. E se Jaldabaoth fizer um rei-
nado de terror, pode haver demi-humanos que o trairão também. Por falar nisso, tem
certeza que não vão mesmo ajudar na luta contra o Jaldabaoth?”
“...Não dá. Já dissemos os motivos. Não temos a força de vontade pra isso agora.”
“Huh. Que pena. E sobre ir para o Reino Feiticeiro, ainda pretendem negar?”
“Seria bom viver sob a proteção de um ser poderoso como o senhor. Mas não é uma
decisão que dá pra tomar assim. A gente vai pensar no caso e dependendo do resultado,
a gente pode acabar confiando no senhor.”
“Dyel!”
“Donbass. Eu sei o que quer dizer. Mas com a aparição do Jaldabaoth, fez a gente perce-
ber que somos nada, a gente não pode proteger às aldeias sozinho. Mais cedo ou mais
tarde, esse vai ser o destino do novo povo.”
O Orc chamado Donbass mordeu o lábio e olhou para baixo. Ele entendeu esse ponto
também.
“Mesmo? Quando forem ao meu país, então eu, o Rei Feiticeiro, oferecerei meu apoio
total. Muitas espécies vivem em minhas terras. Quando este dia chegar, espero que tra-
balhem junto com elas — viva com elas como cidadãos do meu país.”
Demi-humanos são vistos como o inimigo no Reino Sacro, mas no Reino Feiticeiro eles são
vistos como seres com quem se pode coexistir. De onde surgiu essa enorme diferença?
É por causa de Sua Majestade, huh... Porque Sua Majestade possui um poder incrível. Como
eu pensei... o poder é o que é importante...
“Eu providenciarei rações necessárias até que vocês retornem às suas aldeias. Além
disso, vou fornecer soldados para defendê-los. Voltar para casa em segurança no estado
que se encontram exigirá muito tempo e esforço.”
“Entendido.”
Neia saiu da sala depois de responder, e ela se sentiu um pouco solitária. As palavras
do Rei Feiticeiro faziam perfeito sentido e, embora pudesse entendê-las, ela não podia
aceitá-las.
Enquanto ela estava do lado de fora da porta quebrada, os sons de respiração dos Orcs
de dentro da sala começaram a diminuir. Era como se estivessem desaparecendo da sala
e, na verdade, esse provavelmente era o caso.
O Rei Feiticeiro disse uma vez que; enquanto se lembrasse de um local, ele poderia se
teletransportar para lá. Ele deve ter usado essa magia.
A sala estava vazia. Ele deve ter usado uma magia potente, alguma que Neia nem con-
seguia imaginar, para teleportar todos os Orcs para longe. Ou talvez ele tivesse usado
algum outro meio — talvez um item.
“Então, vamos nos encontrar com a Capitã Custodio e ouvir sobre nossos planos futuros
diretamente dela.”
♦♦♦
Gustav parecia completamente diferente de quando o encontraram mais cedo. Ele es-
tava animado, como se a luz da esperança estivesse brilhasse nele, até sua voz parecia
“Sim! Há uma pessoa muito importante que o senhor deve conhecer. Venha por aqui.”
Como queriam apresentar-lhe alguém, deveria ser um nobre poderoso, ou alguém rela-
cionado à família real.
O Rei Feiticeiro — seguido por Neia, por algum motivo — foi guiado para uma certa sala
por Gustav.
Continha várias cadeiras simples de madeira. Remedios estava sentada em uma delas,
assim como um homem magro.
Os dois se viraram para olhar o Rei Feiticeiro quando entrou, e ambos se levantaram.
“Este é o irmão real, em cujas veias flui o sangue do nosso Rei Sagrado, Caspond-sama.”
De fato, seu rosto lembrava o perfil do segundo Rei Sagrado que adornava as moedas
de ouro do Reino Sacro. Neia piscou com o fato de que alguém como ele tinha sido preso
aqui.
“Caspond-sama. Este é o Rei do Reino Feiticeiro de Ainz Ooal Gown, Sua Majestade Ainz
Ooal Gown, que veio ajudar nossa nação.”
“Ohhh! Palavras não podem expressar minha gratidão, Vossa Majestade. Eu estou hon-
rado em conhecê-lo. Como outros já disseram, eu sou o irmão que foi eclipsado pela mi-
nha extraordinária irmãzinha.”
Quando o irmão real disse algo que era muito difícil de responder, Remedios ficou com
um olhar irritado, que parecia dizer: “Você tá menosprezando ela?”, ainda assim, ele era
o próximo sucessor da posição da falecida Rainha Sagrada, então ela não poderia sus-
tentar a mesma atitude que manteve até anteriormente. Assim, Remedios simplesmente
olhou para baixo sem dizer nada.
Neia observou e imaginou o que eles estavam fazendo, e um momento depois o Rei Fei-
ticeiro estendeu a mão, que Caspond apertou.
Apertar as mãos e balançar era uma prática que surgiu entre os de maior status.
Isso convenceu Neia. Com o canto do olho, ela viu que Caspond também estava assen-
tindo e fazendo sons de aprovação.
“Vossa Majestade, peço desculpas por cumprimentá-lo neste traje surrado. Teria sido
bom se eu pudesse ter trocado antes da sua chegada, mas...”
“Não há nada para se envergonhar. Uma mera roupa não pode denegrir um homem de
classe. O senhor deve estar exausto de sua longa estadia na prisão. Por que não nos sen-
tamos antes de conversarmos?”
“Eu sou grato por sua gentileza. Então, permita-me aproveitar de sua boa vontade.”
O Rei Feiticeiro foi o primeiro a liberar seu aperto de mão, e Caspond sentou-se depois
dele.
“De todo modo, fico feliz em ver que Vossa Alteza está sã e salva. Se me permite, como
chegou a ser preso aqui?”
“Isso aconteceu porque eu fugi para cá. O Barão Bagnen cuidou muito bem de mim—
Como ele está? Capitã Custodio. Eu acredito que o levou embora depois que ele falou
comigo.”
“As feridas do Barão Bagnen não são severas e sua vida não está em perigo. Porém,
devido à sua condição física precária e grande exaustão, ele ainda está dormindo.”
“Os sacerdotes não podem usar magia para ajudá-lo? Agora seria a hora de usar seu
intelecto, não?”
“Os sacerdotes esgotaram sua mana remanescente para curar os feridos e estão atual-
mente descansando. Eu sinceramente peço desculpas, mas se a situação não é crítica, eu
sinto que é melhor deixá-los conservar a mana.”
“Se esse é o caso, então não podemos evitar, Capitã. Mas ele foi quem me trouxe aqui e
lutou desesperadamente para me proteger. Se possível, por favor— ah, entende o que
estou dizendo, não é?”
“Isso é porque eu tenho medo de demônios usando magia para se esconder entre os
cativos.”
“Ah, minhas desculpas. Por favor, responda em meu nome, Vice-Capitão. Não me lem-
bro de ninguém assim.”
“Se isso incomoda o Rei Feiticeiro, é um claro indicativo de ser uma questão vital. Eu
vou perguntar de novo. Você pode jurar aos deuses que não conhece?”
Os dois paladinos assentiram, e então o olhar de Caspond se voltou para Neia. Certa-
mente ele não tinha idéia de quem ela era, certo? Quando Neia percebeu, ela rapida-
mente assentiu também.
“Então mesmo a Escudeira Baraja não sabe... hm, o que há de errado? Você parece con-
fusa. Eu ouvi o seu nome da Capitã. Estou muito grato que você possa servir ao lado de
Sua Majestade.”
A voz de Neia estava tremendo. Quando ele a viu naquele estado, o Rei Feiticeiro e Cas-
pond riram alegremente. Então, eles retomaram seus olhares sérios — embora o Rei
Feiticeiro não tivesse expressões faciais, é claro.
“Nesse caso, precisaremos que as pessoas que foram capturadas mostrem um álibi
umas às outras...”
“Por outro lado, as ilusões são mais problemáticas. Com ilusões, pode-se ter os rostos
dos outros. Por exemplo...”
O Rei Feiticeiro lançou uma magia e seu rosto esquelético se transformou no de Cas-
pond.
“Isso é uma ilusão. No entanto, ilusões de baixo nível como essa podem ser capazes de
mudar o adorno de alguém, mas não a voz de uma pessoa. Além disso, não podem imitar
memórias e pensamentos. Portanto, serão imediatamente expostas se alguém próximo
ao indivíduo falar com eles.”
“Há muitas maneiras de disfarçar a roupa e a voz. Então, a melhor maneira é falar com
eles e verificar se há algo fora do lugar.”
Aquelas perguntas pros Orcs devem ter sido pra isso, Neia refletiu.
“Entendo... acredito que todos vocês ouviram, certo? Verifiquem isso imediatamente.”
“Um momento por favor. Também deve considerar a possibilidade de um demônio ficar
furioso ao ser exposto. Não acha que deixar uma pessoa poderosa como a Capitã Custo-
dio ficar ao seu lado para protegê-lo seria melhor?”
“Tem razão. Compreendo suas intenções. Vou realizar investigações com a Capitã de
testemunha.”
“Irmão Real-dono. Isso é tudo que eu queria verificar. Se tem mais a dizer, então faça as
honras.”
“Então — Vossa Majestade. Quanto aos nossos planos futuros, sinto que é necessário
que nos dirijamos para o sul, nos conectemos com as forças locais e depois lancemos um
ataque em grande escala. Isso porque havia vários nobres presos comigo e gostaria de
“Mm. Eu não entendo como agem os nobres de seu país, mas se acha que será o melhor,
então fique à vontade para fazê-lo... Não vai atacar os outros campos de prisioneiros e
resgatar os cativos lá?”
“Ainda não é hora para isso. Levar muitas pessoas a áreas controladas pelo Jaldabaoth
é muito óbvio, e nossa taxa de avanço se tornará muito lenta. Desejo evitar um resultado
no qual perdemos mais do que ganhamos ajudando os outros.”
“...Então, por que não deixar os civis fugirem para o sul enquanto atacamos sozinhos os
campos de prisioneiros?”
“Capitã Custodio. Você foi autorizada a estar presente, mas eu não pedi a sua opinião.”
Caspond falou em um tom que era completamente diferente de como ele se dirigia ao
Rei Feiticeiro.
“Eu também aprovo a opinião do Irmão Real— não, a opinião de Caspond-dono. Ainda
assim, dois campos de prisioneiros, incluindo este lugar, já foram retomados. Eu imagino
que possa continuar aplicando habilmente a experiência adquirida aqui, não é?”
“Eu não sinto que podemos recuperar essa terra sem mortes ou feridos. O número de
vítimas crescerá das dezenas, para as centenas ou milhares. Há coisas mais importante
em jogo.”
Quando ouviram suas palavras, de colocar o povo em segundo plano, Neia viu uma ex-
pressão de choque nos rostos de Remedios e Gustav. Quanto à Neia, ela calmamente pen-
sou:
“Caspond-sama, o senhor mudou. No passado, era um grande homem que era tão gentil
com as massas quanto Sua Majestade Sagrada.”
O rosto de Caspond se torceu. Seus lábios se curvaram, mostrando os dentes. Seu olhar
afiado estava cheio de zombaria.
Ele era como uma pessoa completamente diferente, ou talvez fosse mais correto dizer
que miasma negro dentro de si tivesse sido forçado a emergir.
“O senhor pode fazer o que quiser depois de tê-los questionados. Porém eu já libertei
os Orcs.”
“Não podemos fazer nada quanto a isso, então. Que pena. Bem, os Orcs provaram a mi-
séria ao meu lado... ainda assim, o senhor poderia entregá-los para mim, que tal em troca
da espada sagrada?”
“Eu sou um magic caster. O que eu faria com uma espada mesmo se a entregasse para
mim?”
Por outro lado, o rosto inexpressivo de Remedios contrastava com os traços pálidos de
Gustav.
Soava como uma piada, mas Caspond provavelmente estava falando sério.
“Eu gostaria de poder fazê-lo. Mas antes disso, quero entrevistar alguns dos prisionei-
ros e enviar mensageiros para o sul. Eu acho que levará uma semana se apressarmos as
coisas. Quando tomarmos essa terra de volta, eu lhe oferecerei uma gratificação corres-
pondente à sua gentileza, além do que a Capitã Custodio já providenciou.”
“Sim. Proteger toda essa gente de uma só vez será muito difícil. Se for possível, acredito
que precisaremos pegar emprestado reforços do sul, ou talvez obter algum tipo de trans-
porte, como cavalos e carruagens.”
“Esclarecerei as coisas de uma vez por todas. Nós não vamos fugir para o sul de imedi-
ato. Vamos lutar com o exército de Jaldabaoth aqui.”
Embora Remedios não fosse boa em pensar, ela era muito confiável quando se tratava
de batalha. Gustav assentiu enquanto ouvia as palavras confiantes de sua Capitã.
Quando os dois se viraram com olhares interrogativos, Caspond sorriu com crueldade
e explicou-se.
“Você ouviu também, não foi? O Rei Feiticeiro está conservando sua mana para a bata-
lha contra o Jaldabaoth...”
“Isso seria problemático. Depois que ele derrotar Jaldabaoth e tomar as empregadas
demônios, o Rei Feiticeiro retornará ao Reino Feiticeiro. Antes disso, precisamos que ele
diminua a quantidade de demi-humanos que invadiram essa nação. Portanto, devemos
nos colocar em risco.”
“É assim que é, Capitã. Portanto, você deve fazer o Rei Feiticeiro lutar. Como fizemos
um acordo, precisamos de uma boa razão para quebrá-lo.”
“Correto. Ou melhor, colocaremos em prática nosso plano de fugir para o sul, mas como
demoraremos mais do que esperávamos, ficaremos cercados pelo exército de Jaldabaoth.
Sem opções, não teremos escolha a não ser buscar a força do Rei Feiticeiro. O que me
dizem?”
Remedios e Gustav olharam um para o outro como se dissessem: Ele está certo. Con-
tudo—
“Eu tenho uma pergunta. E se a mana que o Rei Feiticeiro gastar se tornar uma desvan-
tagem durante a batalha contra o Jaldabaoth?”
A irmã mais jovem de Remedios era uma sacerdotisa. Se ela dissesse: “Eu ouvi isso dela”,
ninguém poderia refutar.
“Vamos libertar alguns demi-humanos de propósito, isso deve atrair o exército de Jal-
dabaoth aqui. Precisamos fazer isso antes de ficarmos sem rações, não se esqueçam.”
Os três já haviam compartilhado o que sabiam. Depois de uma série de batalhas, o exér-
cito de Jaldabaoth tinha menos de 100.000.
O exército era formado por doze espécies, além de seis outras espécies que não eram
suficientemente numerosas para se qualificarem como exércitos por direito próprio, um
total de dezoito espécies.
• Armats — Uma espécie de rato bípede com pelagem de ferro. Eram considerados
parentes próximos dos Quagoas.
• Pteropus — Uma espécie que vive em penhascos. São muito adeptos ao voo de
longa distância. No entanto, voar parece exigir muita força, então eles só podem
voar por determinado período de tempo por dia, depois disso eles não podem
sequer planar. Se não voarem, eles podem rasgar armaduras usando o vento, en-
tão defender contra eles se provou muito difícil. Eles se tornavam uma espécie
mais forte quando não podiam voar.
As seis raças restantes não eram particularmente numerosas, mas cada uma delas era
bastante poderosa:
• Ogros — Já apresentados.
• Puri Uns — Uma raça ogroide com o poder de controlar a terra, podem ser con-
siderados uma espécie superior. Possuem habilidades especiais associadas à
terra.
• Vah Uns — Semelhante ao Puri Uns, seres controladores de água. Têm habilida-
des especiais relacionadas à água.
• Nagarajas — Se parecem com cobras com corpos e braços escamosos. Uma es-
pécie completamente diferente dos Nagas, suas espécies não se dão bem. Eles
nasceram com a habilidade de conjurar muitas magias, e às vezes até se equipa-
vam com espadas e armaduras.
• Spriggans — Uma espécie que consegue alterar livremente seu tamanho de pe-
queno à grande porte. Fundamentalmente são uma boa espécie, Spriggans mal-
vados são muito raros. Dito isso, Spriggans bons e ruins ficam incontroláveis
quando zangados.
“De acordo com o Rei Feiticeiro, a base pode estar sob vigilância, correto? Assim, se
souberem de nossos números, eles podem não enviar muitas tropas. Isso funcionaria a
nosso favor. Só que há um problema.”
“A comida.”
“Sim. Os sacerdotes podem fazer comida, mas é bem pouco antes de ficarem sem mana.
Eles também não podem se alimentar como demi-humanos.”
Remedios e Gustav tinham semblantes de desagrado. Todos os três sabiam que demi-
humanos atacavam humanos.
Portanto, mesmo que tentassem matar de fome os invasores, todos sabiam que perde-
riam no final. Isso porque os campos de prisioneiros dos demi-humanos poderiam ser
considerados um armazém.
“Já estamos verificando. Também estamos procurando por quaisquer ferreiros que pos-
sam modificar equipamentos demi-humanos para uso humano.”
Os três continuaram discutindo seus preparativos para o cerco. Depois de mais uma
hora, chegaram a uma conclusão que puderam aceitar e os três sorriram.
♦♦♦
No entanto, era um exército enorme cuja escala excedeu em muito as suas expectativas.
Parte 5
Ainz olhou para a cidade, havia uma comoção em pânico com a aparição do exército
demi-humano, e lentamente colapsou.
Claro, nem todas as palavras e ações foram planejadas, então ele improvisou um pouco,
mas mesmo assim Ainz estava contando com os desenvolvimentos do plano de Demi-
urge.
Isso é demais para mim. Isso foi o que Ainz pensou quando viu pela primeira vez as ins-
truções.
Se Ainz fosse uma pessoa de excelência, talvez pudesse seguir essas instruções e de-
sempenhar o papel de um perfeito Rei Feiticeiro. No entanto, para seu pesar, as aptidões
de Ainz eram perfeitamente normais, ou talvez até abaixo do normal.
Ele se lembrou das repetidas indagadas: “Eu não entendo, descreva com mais detalhes”,
e Demiurge respondendo com humildade: “Como eu poderia fazer algo tão grosseiro com
sua sagacidade, Ainz-sama?” levando a um intenso vai e vem. Albedo se intrometeu no
meio do caminho, e Ainz — que começara em grande desvantagem — acabara com uma
derrota completa.
Se isso fosse uma brincadeira por parte de Demiurge, ele poderia ser capaz de lidar de
alguma outra forma, mas isso era fruto da confiança e do respeito de seu subordinado.
Em particular, isso ficou muito claro por meio de pronunciamentos como: “O senhor
certamente será capaz de chegar a uma conclusão melhor, Ainz-sama — como alguém tão
insignificante quanto eu poderia limitá-lo com minhas palavras e ações?”
Se você fosse guiado pelo senso comum, por que o rei de outro país viria sozinho...? Que
argumento irracional... ainda assim, eu vim até aqui. Apesar de ter criado alguns proble-
mas ao longo do caminho e me descuidado algumas vezes, ainda cheguei até aqui...
Demiurge e Albedo não poderiam ter considerado minhas aptidões mentais antes de jogar
tudo nas minhas costas...
...Tudo bem meu eu, se recomponha. Será mais fácil depois que eu passar por isso.
O plano chegara aos estágios intermediários vitais, e essa era a pior parte.
De acordo com Demiurge, se formassem uma linha defensiva nesta cidade, eles ataca-
riam até que houvesse 85% de baixas.
Já que Demiurge pensava que deveria ser assim, ele nunca poderia vir com um plano
melhor. Se todas essas mortes trouxessem benefícios à Nazarick, então que morram.
Além disso, Ainz pensava que; Quanto mais mortes, mais benefícios Nazarick colherá, e
coisas assim.
No entanto, o problema estava no fato de que Demiurge havia pedido a Ainz que alguns
humanos daqui não fossem mortos.
Se fosse apenas isso, ele selecionaria alguns ao acaso e pronto, mas havia mais um po-
rém.
Ou seja, humanos que se dedicavam a Ainz, ou que poderiam ser convencidos a se juntar
ao lado de Ainz.
“『Eu sinto que deve haver vários humanos que são tão dedicados ao senhor quanto aque-
les Dwarfs, então rogo que me diga seus nomes, e quando eu fizer a minha jogada, eu terei
o cuidado de não matá-los.』”
Quando recebeu essa mensagem, ele teve sérias dúvidas da seriedade de Demiurge, até
pensando coisas como: Isso é algum tipo de brincadeira, né?
Sob essas circunstâncias, quantas pessoas seriam dedicadas a um ser de sua natureza?
Mesmo assim, ele não podia dizer a Demiurge que não havia nenhum.
Demiurge acreditava sinceramente que Ainz poderia fascinar vários humanos. Então, o
que aconteceria se dissesse a Demiurge que ele não tinha conseguido essa proeza?
O Dwarf que Demiurge estava se referindo deveria ser Gondo Firebeard, mas foi sim-
plesmente uma jogada de sorte. Sem querer ele havia feito um acerto crítico em uma
fraqueza de Gondo, e tal sorte não se repetiria.
E precisamente por ter Gondo ao seu lado que ele havia conseguido conquistar os cora-
ções dos ferreiros rúnicos. No entanto, não havia ninguém assim no Reino Sacro.
Havia uma pessoa com quem ele havia tido um relacionamento amigável, Neia Baraja,
mas isso era tudo.
Ele até lhe dera um item mágico para melhorar seu relacionamento, não necessaria-
mente apenas por esse motivo, mas ainda não sabia se tinha dado resultado. Ela apenas
o encarava o tempo todo com raiva, então não deveria esperar nada de bom.
Ainz se perguntou.
Será que a imagem de Ainz que Demiurge mantinha em seu coração não desmoronaria
completamente?
No Reino Dwarf, eu disse ao Demiurge que eu não era tão inteligente, mas naquela época
não pareceu que ele acreditou em mim... que droga. Que tipo de pessoa eu sou nos olhos
dele? Ou melhor, parece que estou ficando cada vez maior na mente dele; estou imaginando
coisas? Normalmente, não seria o contrário?
As altas expectativas de seus subordinados consumiam sua paz. Não que fossem pesa-
das demais; mas machucavam.
No passado, ele havia ponderado quão pesado e dolorosa a palavra “lealdade” poderia
ser. Em particular, a parte em que seus subordinados viam Ainz como um grande ser era
a mais dolorosa de todas.
Ele está esperando muito de mim — quanto maior a altura, pior será a queda. É por isso
que eu disse que não sou ninguém incrível...
Claro, estas não eram runas dos Dwarfs. As runas esculpidas não tinham poder algum.
Este foi um equipamento feito com as técnicas de YGGDRASIL.
“Haaaa...”
Ainz suspirou. Ele tinha várias armas assim. O plano original era emprestar essas armas
ao Reino Sacro.
O povo do Reino Sacro ficaria impressionado com o poder esmagador da espada e pen-
saria: Então este é o poder do armamento rúnico, que por sua vez melhoraria a reputação
das armas rúnicas do Reino Feiticeiro.
Esta foi a outra razão pela qual ele emprestou o arco para Neia.
Ele sentiu que as pessoas do Reino Sacro iriam ver essa arma e secretamente as pedi-
riam emprestadas de Ainz.
Contudo—
Por que ninguém pediu emprestado? Eu até pensei que por ser bem chamativo, ia aconte-
cer muitas fofocas... Eu acho que deveria ter forçado ela a entrar na linha de frente e a feito
lutar, huh...
Ele rapidamente verificou seu manto e outros lugares amassados antes de colocar a
espada de volta em sua dimensão de bolso. Então colocou as mãos atrás das costas, olhou
para a porta como um soberano e falou em voz alta:
“Quem é?”
Não havia como saber se era uma voz masculina ou feminina pela porta. Normalmente,
ele deveria ter perguntado o nome do visitante, mas Demiurge já havia dito a ele que
alguém estava vindo, e assim Ainz concedeu sua permissão sem qualquer hesitação.
A pessoa que entrou no quarto de Ainz fechou a porta atrás de si e seu corpo mudou de
forma.
Tinha uma cabeça em forma de ovo com uma boca e dois olhos que pareciam buracos
de bola de boliche. Suas mãos de três dedos eram tão finas quanto patas de insetos.
“Eu sinceramente peço desculpas pelas muitas ofensas que fiz ao senhor durante meus
deveres. Eu rezo para que me perdoe.”
“Não se preocupe. Você estava apenas fazendo o seu trabalho. Não há nada para ser
desculpado.”
“Você não está muito ocupado agora? Deve haver muitas coisas que precisa conduzir,
não? E tem alguém lá fora? Se houver, teremos problemas se não mantivermos a voz
baixa.”
“Está bem. Ninguém vai se opor ao seu servo vindo sozinho para vê-lo, Ainz-sama.”
“Sei...”
“Oh, sim.”
Dito isso, Ainz sabia muito bem o motivo do Doppelgänger ter vindo.
“Me perdoe. Este que vos fala se refere ao assunto de antes — a questão daqueles hu-
manos que são devotados ao senhor e cujas vidas devem ser poupadas, Ainz-sama.”
“Hm...”
Claro, ele não podia sair do quarto. Em última análise, ele só podia andar de canto em
canto. Não havia como dizer onde os olhos do Doppelgänger estavam olhando, mas Ainz
estava certo de que estavam seguindo seus movimentos, o que de fato era verdade. E,
certamente, seria muito assustador se não fosse assim.
O tempo estava se esgotando. Enquanto Ainz pensava com todas as forças, ele de re-
pente parou.
—Ele não conseguiu encontrar a resposta. No entanto, ele não sabia como continuar
enrolando.
Se fosse humano, seu coração estaria batendo agora, mas seu corpo não tinha órgãos
que pudessem se mover dessa maneira.
“Uhum. Olha, serei franco. Não há seres humanos que precisem ser salvos. Deixe alguns
vivos se necessário.”
Eu era assim. No primeiro dia de setembro, lá estava eu de mão levantada dizendo que
esqueci de fazer o dever de casa.
No entanto, desta vez, eu fiz acontecer! Meu sonho de infância se tornou realidade! Eu
queria me tornar um adulto assim no passado, agora se tornou realidade! Oh, que coisa
maravilhosa!
Atenção a— melhor parar, né? Ficar de desculpinhas não vai ajudar em nada.
Portanto, embora tenha atrasado um pouco, conseguimos publicar o livro antes tarde
do que nunca.
Bem, deve estar dentro da margem de erro. Não, a verdade é que foi porque muita coisa
aconteceu. Sério, houveram muitas coisas, boas e ruins.
Falando nisso, eu comprei vários ebooks enquanto estava no hospital, ebooks são real-
mente ótimos! Antigamente eu não pensava que eram tão úteis.
Eu acho que seria bom OVERLORD ter uma versão em e-book. Portanto, decidi disponi-
bilizar toda a obra em formato digital.
É aquilo, né? Há coisas que só nos damos conta do quanto é bom depois de experimen-
tar. Assim, em nossa vida nos deparamos com muitas situações que não entendemos até
as vivenciarmos.
Aliás, ainda nessa tangente, os e-books que eu li eram mangás, especificamente comé-
dias românticas.
Em particular, as pessoas que estão segurando esse livro, assim como um certo hospital
que fiquei. Ficarei feliz em poder encontrá-lo novamente no próximo volume.
Maruyama Kugane
Glossário
292
Ilustrações
Glossário
294
Glossário
296
Glossário
298
Glossário
300
Glossário
3 0 2
Glossário
3 0 4
Glossário
306
Glossário
Glossário
-Magias, Habilidades & Passivas-
Tradução livre de seus nomes -Termos & Terminologias-
-Metamagia-
Maximize Magic: ..... Maximizar Magia - aumenta o poder
-Raças & Monstros-
destrutivo da magia.
Maximize Widen Magic: Maximizar Ampliar Magia – au- Angel Guardian: ............................................. Anjo Guardião.
menta o poder destrutivo e a área de efeito. Archangel Flame: ............................... Arcanjo das Chamas.
Penetrate Magic: ....Magia Penetrante - aumenta a pene- Armat: Ferrato. Os kanjis abaixo do furigana são 鉄鼠人,
tração mágica da magia. algo como Homem-Rato de Ferro. 鉄鼠 vem da lenda de
Twin Penetrate Magic: Duplicar Magia Penetrante – du- ratos demônios do Japão.
plica a magia e adiciona efeito de penetração mágica. Bafolk: ....... Os kanjis abaixo do furigana são 山羊人, algo
Widen Magic: . Ampliar Magia - aumenta a área de efeito como Homem-Cabra da Montanha.
da magia. Bafolklord: ................................................... Soberano Bafolk.
Beastman: .........................................................Homem-Besta.
Blader: .... Lancetu. Os kanjis abaixo do furigana são 刀鎧
-Itens- 蟲, algo como Inseto de Armadura Espada.
Tradução livre & Curiosidades Caben: .... Caberno. Os kanjis abaixo do furigana são 洞下
人, algo como Homem da Caverna.
Boots of Silence: ....................................... Botas do Silêncio. Doppelgänger: .. Raça com capacidade de copiar aparên-
Charge Without Hesitation:..... Investida sem Hesitação. cia e habilidades. É uma palavra do idioma alemão que
Deflection Ring: ......................................... Anel da Deflexão. designa uma “duplicata andante”.
Great Bow Special: ........................... Grande Arco Especial. Dwarf: ................................................................................. Anão.
Mantle of Protection: ........................... Manto de Proteção. Frost Giant: ...................................................... Gigante Gélido.
Mantle of Shadow: .................................. Manto da Sombra. Ghast:Lívido. Aparentemente um subtipo de Ghouls, se
Ring of Haste:.......................................... Anel da Celeridade. fosse traduzir de acordo com o kanji, ignorando o kata-
Ring of the Second Eye: ................. Anel do Segundo Olho. kana, seria algo como “Carniceiro Vasculhador”.
Sand Shooter: ............................................ Atirador de Areia. High Wraith:............................................. Aparição Superior.
Turtle Shell: ........................................... Casco de Tartaruga. Hill Giant: ....................................................Gigante da Colina.
Ultimate Shooting-Star Super: ... Super Estrela-Cadente Horuner: .... Cavelloz. Os kanjis abaixo do furigana são 馬
Final. 人, algo como Homem-Cavalo.
Vest of Resistance: ............................ Colete de Resistência. Lizardman: .................................................. Homem-Lagarto.
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Magelo: Mistíneo. Os kanjis abaixo do furigana são 魔現 caracterizado como criaturas com corpos formados por
人, algo como Povo Místico. galhos e folhas de árvores.
Medusa: . Na mitologia grega, era um monstro ctônico do Stone Eater: ... Comedores de Pedra - Os kanjis abaixo do
sexo feminino, uma das três Górgonas. Filha de Fórcis e furigana são 石喰猿, algo como Macaco Comedor de Pe-
Ceto, quem quer que olhasse diretamente para ela seria dra.
transformado em pedra. Undead: ................................................................... Morto-Vivo.
Merman: ...........................................................................Tritão. Vah Uns: .... Os kanjis abaixo do furigana são 水精霊大鬼,
Naga: ......Do sânscrito: नाग, nāga, é uma palavra em sâns- algo como Ogro Espírito da Água.
crito e páli que designa um grupo de divindades da mito- Zern: .Bernul. Os kanjis abaixo do furigana são 藍蛆, algo
logia hindu e budista. Normalmente têm a forma de uma como Verme Índigo.
enorme cobra-real, com uma ou várias cabeças. Zoastia:...... Os kanjis abaixo do furigana são 獣身四足獣,
Nagaraja: .... Do sânscrito: नागराज nāgarāja. Raja significa algo como Besta Quatro-Patas.
Rei, ou seja, na mitologia é Rei dos Naga. Zombie: ............................................................................ Zumbi.
Orthrou: .... Bestauro. Os kanjis abaixo do furigana são 半
人半獣, algo como Meio Homem Meio Besta.
Principality Peace:..................................Principado da Paz. -Honoríficos & Tratamentos-
Pteropus: .. Os kanjis abaixo do furigana são 翼亜人, algo
como Homem Alado. Claro, Pteropus também é uma Dono: . 殿 | どの - O sufixo “dono” vem da palavra “tono”,
classificação dada a morcegos conhecidos como Raposa- que significa “senhor”. Seria semelhante ao termo “meu
voadora. senhor”. Na época dos samurais, costuma-se denotar um
Puri Un: ..... Os kanjis abaixo do furigana são 土精霊大鬼, grande respeito ao interlocutor.
algo como Ogro Espirito da Terra. Sama:様 | さま- O sufixo “Sama” é uma versão mais res-
Sea Dragon: .................................................. Dragão Marinho. peitosa e formal de “san”. A tradução mais próxima do
Sea Giant: ..................................................... Gigante Marinho. termo “sama” para o português seria “Vossa Senhoria”.
Sea Naga: ........................................................... Naga Marinha. No Japão, é importante referir-se a pessoas importantes
Skeleton: ................................................................... Esqueleto. ou a alguém que admira e é muito importante, no império
Snakeman: ....................................................... Homem-Cobra. antigo era muito usado para se referir a rainhas.
Spidan: Aranhuman. Os kanjis abaixo do furigana são 人 San: ... さん - O sufixo “San” é um honorífico que pode ser
蜘蛛, algo como Humano Aracnídeo. usado em praticamente todas as situações, indepen-
Spriggan: ...... Classe de fadas pertencentes ao folclore da dente do sexo da pessoa. Normalmente é usado para
Cornualha. Eles são seres descritos como tendo uma pessoas que temos pouca ou nenhuma intimidade. Tam-
aparência grotesca, possuindo corpos pequenos, magros bém usado quando a pessoa considera o interlocutor
e enrugados. Na cultura moderna, tem sido geralmente como um de igual hierarquia.
Calca: Seu epíteto em japones é 聖王女 (seiō onna), que, dependendo do contexto, pode
ser “Rainha Sagrada”, “Princesa Sagrada” e até mesmo “Dama sagrada”. Mas como ela
ocupa a posição de Rei Sagrado, houve uma preferência por “Rainha” para adequar seu
epíteto à sua ocupação.
Viúva do Chá. Vieram me questionar dizendo que na tradução no Nigel não fala nada
de viúva, e de onde tirei isso? Muito simples... Você viu alguma tradução desatualizada
do Nigel... O Ryraryus diz em japonês “わしの茶欲み友達, 未亡人殿が言っていたが. Aí
meu caro, use quantos tradutores quiser, pergunte a um especialista, o que preferir...
MAS ele diz claramente “未亡人”, ou seja, viúva. E tanto na tradução oficial em inglês,
quanto na versão atualizada da tradução de fã inglesa é viúva também.
Piadoca do Ainz sobre a estátua ter mais de 100 metros. No Japão tem a lei “Nissho-
ken” que significa algo como “lei do direito à luz do sol”. Resumindo a origem da parada,
rolou um processo judicial em Tóquio no ano de 1976, onde construíram um prédio bem
alto que fez sombra no bairro ao lado. Os moradores venceram a causa e cada um foi
indenizado em no equivalente a 7 mil dólares. O Juiz disse, “A luz do sol é essencial para
uma vida confortável e, portanto, o direito do cidadão de desfrutá-la em seu lar deve ser
devidamente protegida por lei”.
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A justiça é perturbada graças ao ataque do hediondo Imperador Demônio
Jaldabaoth.
O Reino Sacro, que se orgulha de sua longa paz e que é defendida por uma
Grande Muralha, é atacado de surpresa por um exército aliado de demi-hu-
manos e enfrenta a destruição pelas mãos do Imperador Demônio Jaldaba-
oth.
ISBN 978-4047348455
ISBN 978-4047348455
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