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REDAÇÃO

distanciamento entre os interlocutores,


provocado pelo emprego de palavras com
De domingo significados pouco conhecidos.
– Outrossim… inadequação vocabular, demonstrada pela
seleção de palavras desconhecidas por parte
– O quê?
de um dos interlocutores do diálogo.
– O que o quê?
– O que você disse.
– Outrossim? Palavras jogadas fora
– É. Quando criança, convivia no interior de São
– O que é que tem? Paulo com o curioso verbo pinchar e ainda o ouço
por lá esporadicamente. O sentido da palavra é o
– Nada. Só achei engraçado.
de “jogar fora” (pincha fora essa porcaria) ou
– Não vejo a graça. “mandar embora” (pincha esse fulano daqui). Teria
– Você vai concordar que não é uma palavra de sido uma das muitas palavras que ouvi menos na
todos os dias. capital do estado e, por conseguinte, deixei de usar.
– Ah, não é. Aliás, eu só uso domingo. Quando indago às pessoas se conhecem esse
verbo, comumente escuto respostas como “minha
– Se bem que parece mais uma palavra de
avó fala isso”. Aparentemente, para muitos
segunda-feira. falantes, esse verbo é algo do passado, que deixará
– Não. Palavra de segunda-feira é “óbice”. de existir tão logo essa geração antiga morrer.
– “Ônus”. As palavras são, em sua grande maioria,
– “Ônus” também. “Desiderato”. “Resquício”. resultados de uma tradição: elas já estavam lá
antes de nascermos. “Tradição”,
– “Resquício” é de domingo.
etimologicamente, é o ato de entregar, de passar
– Não, não. Segunda. No máximo terça. adiante, de transmitir (sobretudo valores culturais).
– Mas “outrossim”, francamente… O rompimento da tradição de uma palavra equivale
– Qual o problema? à sua extinção. A gramática normativa muitas
vezes colabora criando preconceitos, mas o fator
– Retira o “outrossim”.
mais forte que motiva os falantes a extinguirem
– Não retiro. É uma ótima palavra. Aliás é uma uma palavra é associar a palavra, influenciados
palavra difícil de usar. Não é qualquer um que direta ou indiretamente pela visão normativa, a um
usa “outrossim”. grupo que julga não ser o seu. O pinchar, associado
(VERÍSSIMO. L.F. Comédias da vida privada. Porto Alegre: LP&M, 1996) ao ambiente rural, onde há pouca escolaridade e
No texto, há uma discussão sobre o uso de refinamento citadino, está fadado à extinção?
algumas palavras da língua portuguesa. Esse uso É louvável que nos preocupemos com a
promove o(a) extinção das ararinhas-azuis ou dos micos-leão-
marcação temporal, evidenciada pela presença dourados, mas a extinção de uma palavra não
de palavras indicativas dos dias da semana. promove nenhuma comoção, como não nos
tom humorístico, ocasionado pela ocorrência comovemos com a extinção de insetos, a não ser
de palavras empregadas em contextos formais. dos extremamente belos. Pelo contrário, muitas
caracterização da identidade linguística dos vezes a extinção das palavras é incentivada.
interlocutores, percebida pela recorrência de VIARO, M. E. Língua Portuguesa, n. 77, mar. 2012 (adaptado)

palavras regionais.

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A discussão empreendida sobre o (des)uso do tem como principal finalidade cercear as
verbo “pinchar” nos traz uma reflexão sobre a variações linguísticas que comprometem o
linguagem e seus usos, a partir da qual bom uso da língua portuguesa.
compreende-se que torna-se, na contemporaneidade, o grande
referencial de aprendizagem do aluno, que deve
as palavras esquecidas pelos falantes devem
valorizá-la em detrimento de sua variação
ser descartadas dos dicionários, conforme
linguística de origem.
sugere o título.
o cuidado com espécies animais em extinção é
mais urgente do que a preservação de palavras.
o abandono de determinados vocábulos está “No mundo nom me sei parelha,
associado a preconceitos socioculturais. mentre me for como me vai;
as gerações têm a tradição de perpetuar o ca ja moiro por vós, e ai!,
inventário de uma língua. mia senhor branca e vermelha,
o mundo contemporâneo exige a inovação do queredes que vos retraia
vocabulário das línguas. quando vos eu vi em saia?
Mao dia me levantei,
que vos entom nom vi feia!”
(Cantiga da Ribeirinha, Paio Soares de Taveirós)
A língua sem erros
No trecho do cantiga trovadoresca acima, temos
Nossa tradição escolar sempre desprezou a
um exemplo de:
língua viva, falada no dia a dia, como se fosse toda
errada, uma forma corrompida de falar “a língua de variação geográfica
Camões”. Havia (e há) a crença forte de que é variação diatópica
missão da escola “consertar” a língua dos alunos, variação histórica
principalmente dos que frequentam a escola variação social
pública. Com isso, abriu-se um abismo profundo variação situacional
entre a língua (e a cultura) própria dos alunos e a
língua (e a cultura) própria da escola, uma
instituição comprometida com os valores e as Internet e a importância da imprensa
ideologias dominantes. Felizmente, nos últimos 20
Este artigo não é sobre a pornografia no
e poucos anos, essa postura sofreu muitas críticas
mundo virtual nem tampouco sobre os riscos de as
e cada vez mais se aceita que é preciso levar em
redes sociais empobrecerem o relacionamento
conta o saber prévio dos estudantes, sua língua
humano. Trata de um dos aspectos mais
familiar e sua cultura característica, para, a partir
festejados da internet: o empowerment
daí, ampliar seu repertório linguístico e cultural.
(“empoderamento”, fortalecimento) do cidadão
BAGNO, Marcos. A língua sem erros. Disponível em:
http://marcosbagno.files.wordpress.com. Acesso em: 5 nov. 2014. proporcionado pela grande rede.
De acordo com a leitura do texto, a língua ensinada É a primeira vez na História em que todos,
na escola ou quase todos, podem exercer a sua liberdade de
expressão, escrevendo o que quiserem na internet.
ajuda a diminuir o abismo existente entre a
De forma instantânea, o que cada um publica está
cultura das classes consideradas hegemônicas
virtualmente acessível aos cinco continentes. Tal
e das populares.
fato, inimaginável décadas atrás, vem modificando
deve ser banida do ensino contemporâneo, que
as relações sociais e políticas: diversos governos
procura basear-se na cultura e nas experiências
caíram em virtude da mobilização virtual, notícias
de vida do aluno.
antes censuradas são agora publicadas na rede,
precisa enriquecer o repertório do aluno,
etc. Há um novo cenário democrático mais aberto,
valorizando o seu conhecimento prévio e
mais participativo, mais livre.
respeitando a sua cultura de origem.

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E o que pode haver de negativo nisso tudo? O perigo da internet não está propriamente
A facilidade de conexão com outras pessoas tem nela. O risco é considerarmos que, pelo seu sucesso,
provocado um novo fenômeno social. Com a todos os outros âmbitos devam seguir a sua mesma
internet, não é mais necessário conviver (e lógica, predominantemente quantitativa. O mundo
conversar) com pessoas que pensam de forma contemporâneo, cada vez mais intensamente
diferente. Com enorme facilidade, posso encontrar marcado pelo virtual, necessita também de outros
indivíduos “iguais” a mim, por mais minoritária que olhares, de outras cores. A internet, mesmo sendo
seja a minha posição. plural, não tem por que se tornar um monopólio.
O risco está em que é muito fácil aderir ao (CAVALCANTI, N. da Rocha. Jornal “O Estado de S. Paulo”,
12/05/14, com adaptações.)
seu clube” e, por comodidade, quase sem perceber,
ir se encerrando nele. Não é infrequente que dentro Pelas características da organização do discurso, a
dos guetos, físicos ou virtuais, ocorra um processo respeito do texto pode-se afirmar que se trata de
que desemboca no fanatismo e no extremismo. uma:
Em razão da ausência de diálogo entre dissertação de caráter expositivo, pois explica,
posições diversas, o ativismo na internet nem reflete e avalia ideias de modo objetivo, com
sempre tem enriquecido o debate público. O intenção de informar ou esclarecer.
empowerment digital é frequentemente utilizado narração, por reportar-se a fatos ocorridos em
apenas como um instrumento de pressão, o que é determinado tempo e lugar, envolvendo
legítimo democraticamente, mas, não raras vezes, personagens, numa relação temporal de
cruza a linha, para se configurar como intimidação, anterioridade e posterioridade.
o que já não é tão legítimo assim… dissertação de caráter argumentativo, pois faz a
A internet, como espaço de liberdade, não defesa de uma tese com base em argumentos,
garante por si só a criação de consensos nem o numa progressão lógica de ideias, com o
estabelecimento de uma base comum para o objetivo de persuasão.
debate. descrição, por retratar uma realidade do mundo
Evidencia-se, aqui, um ponto importante. A objetivo a partir de caracterizações, pelo uso
internet não substitui a imprensa. Pelo contrário, expressivo de adjetivos.
esse fenômeno dos novos guetos põe em destaque expressão injuntiva, por indicar como realizar
o papel da imprensa no jogo democrático. Ao uma ação, utilizando linguagem simples e
selecionar o que se publica, ela acaba sendo um objetiva, com verbos no modo imperativo.
importante moderador do debate público. Aquilo
que muitos poderiam ver como uma limitação é o
que torna possível o diálogo, ao criar um espaço de Sobre os tipos textuais, é correto afirmar, exceto:
discussão num contexto de civilidade democrática, Os tipos textuais são caracterizados por
no qual o outro lado também é ouvido. propriedades linguísticas, como vocabulário,
A racionalidade não dialogada é estreita, já relações lógicas, tempos verbais, construções
que todos nós temos muitos condicionantes, que frasais, etc.
configuram o nosso modo de ver o mundo. Os tipos textuais são: narração, argumentação,
Sozinhos, nunca somos totalmente isentos, temos descrição, injunção e exposição.
sempre um determinado viés. Numa época de Geralmente variam entre cinco e nove tipos.
incertezas sobre o futuro da mídia, aí está um dos Possuem um conjunto ilimitado de
grandes diferenciais de um jornal em relação ao que características, que são determinadas de
simplesmente é publicado na rede. acordo com o estilo do autor, conteúdo,
composição e função.
Imprensa e internet não são mundos
Os tipos de textos apresentam características
paralelos: comunicam-se mutuamente, o que é
intrínsecas e invariáveis, ou seja, não sofrem a
benéfico a todos. No entanto, seria um
influência do contexto de nossas atividades
empobrecimento democrático para um país se a
comunicativas. De maneira predeterminada,
primeira página de um jornal fosse simplesmente o
apresentam vocabulário, relações lógicas,
reflexo da audiência virtual da noite anterior. Nunca
tempos verbais e construções frasais que
foi tão necessária uma ponderação serena e
acolhem os diversos gêneros.
coletiva do que será manchete no dia seguinte.

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Assinale a alternativa que melhor expresse o efeito
de humor contido na tirinha:
Eça de Queirós, um dos maiores escritores do
realismo português, é conhecido por sua prosa O discurso feminista de Susanita é responsável
onde ele criou novas formas de linguagens, pelo efeito de humor, já que o tema é tratado de
neologismos e mudanças na sintaxe. O trecho forma irônica, denotando certo machismo por
abaixo é de sua obra mais emblemática “O primo parte do autor da tirinha.
Basílio” Mafalda opõe-se ao discurso da amiga
"Ficara sentada à mesa a ler o Diário de Susanita e, através de suas feições em todos
Notícias, no seu roupão de manhã de fazenda os quadrinhos, percebe-se nitidamente seu
preta, bordado a sutache, com largos botões de descontentamento.
madrepérola; o cabelo louro um pouco A linguagem verbal não contribui para o melhor
desmanchado, com um tom seco do calor do entendimento da tirinha, pois todo efeito de
travesseiro, enrolava-se, torcido no alto da cabeça humor está contido na linguagem não verbal
pequenina, de perfil bonito; a sua pele tinha a através da expressão exibida por Mafalda no
brancura tenra e láctea das louras; com o cotovelo
último quadrinho.
encostado à mesa acariciava a orelha, e, no
Susanita apresenta um discurso de acordo
movimento lento e suave dos seus dedos, dois
com as teorias feministas que pregam a
anéis de rubis miudinhos davam cintilações
libertação das práticas tradicionalmente
escarlates."
atribuídas à mulher. Contudo, no último
De acordo com os gêneros textuais, a intenção do
quadrinho, a personagem defende o uso de
autor foi
uma tecnologia que apenas reforça os padrões
relatar sobre a manhã da personagem. tradicionais.
narrar os fatos habituais daquela manhã. A linguagem não verbal observada na tirinha
descrever aspectos da personagem e de suas contradiz, em alguns momentos, o que se
ações. compreende na linguagem verbal.
apresentar o principal jornal lido pela
personagem.
dissertar sobre a roupa utilizada pela
Sobre as charges e tirinhas, é incorreto afirmar:
personagem.
As charges são poderosos veículos de
comunicação, constituindo um gênero que alia
a força das palavras a imagens e muito bom
humor.
No Brasil, a charge é comumente utilizada com
a intenção de tecer críticas políticas e sociais,
sempre preservando como traço predominante
o humor.
Assim como nas charges, as tirinhas
apresentam uma linguagem permeada pelo
bom humor, aliando as linguagens verbal e não
verbal para a construção de sentidos do texto.
As charges e as tirinhas não podem ser
consideradas como gêneros textuais, visto que
a linguagem não verbal é a linguagem
predominante.
A linguagem verbal e a não verbal atuam juntas
na construção de sentido pretendido pelo
autor.

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As charges utilizam os recursos do desenho e do
humor para tecer algum tipo de crítica a diversas
situações do cotidiano. Sobre a charge do
chargista Duke, analise as seguintes afirmações e
julgue aquelas que são verdadeiras:

I. Através das expressões do torcedor, podemos


notar que ele se encontra entusiasmado com a
realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil;
II. Através da gradação na mudança de expressão
do torcedor, podemos perceber que ele possui
uma visão crítica sobre a realização da Copa no
Brasil;
III. Não podemos afirmar que exista qualquer tipo
de comentário crítico nas entrelinhas da
charge, pois essa tem apenas a função de
divertir o leitor;
IV. Podemos inferir que o entusiasmo inicial pela
realização dos jogos no Brasil foi substituído
por uma postura pessimista por parte da
personagem retratada.

São verdadeiras:

I e III.
I, IV e III.
II e IV.
I, II e IV.
II e IV.

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