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Gabarito do Simulado

Data Nome Tipo questão Ano Questões

20/04/2023 empresarial 23 Jurisprudência 2023 5

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Questão 1

Para a caracterização da infringência de marca, não é suficiente que se demonstrem a


semelhança dos sinais e a sobreposição ou afinidade das atividades, é necessário que a
coexistência das marcas seja apta a causar confusão no consumidor ou prejuízo ao titular
da marca anterior, configurando concorrência desleal.

CERTO Resposta correta

ERRADO
Comentários
NOÇÕES GERAIS SOBRE O TRADE DRESS

Antes de explicar o que decidiu o STJ, irei fazer uma breve revisão sobre o
trade dress. Se estiver sem tempo, pode ir diretamente para os comentários
ao julgado.

Proteção ao conjunto-imagem (trade dress)

Antes de analisar o julgado, é importante fazer uma revisão sobre o que é o


trade dress.

Trade dress ou conjunto-imagem consiste no conjunto de elementos


distintivos que caracterizam um produto, um serviço ou um estabelecimento
comercial fazendo com que o mercado consumidor os identifique. É o
conjunto de caraterísticas visuais que forma a aparência geral de um
produto ou serviço.

Nas palavras do Min. Marco Aurélio Bellizze:

“O conjunto-imagem (trade dress) é a soma de elementos visuais e


sensitivos que traduzem uma forma peculiar e suficientemente
distintiva, vinculando-se à sua identidade visual, de apresentação do
bem no mercado consumidor.”

Ao contrário de outros países, no Brasil ainda não existe uma legislação que
proteja, de forma específica, as violações ao trade dress. Apesar disso, a
jurisprudência tem protegido os titulares das marcas copiadas. Nesse
sentido:
(...) A despeito da ausência de expressa previsão no ordenamento jurídico
pátrio acerca da proteção ao trade dress, é inegável que o arcabouço legal
brasileiro confere amparo ao conjunto-imagem, sobretudo porque sua
usurpação encontra óbice na repressão da concorrência desleal. Incidência
de normas de direito de propriedade industrial, de direito do consumidor e
do Código Civil. (...)

STJ. 3ª Turma. REsp 1677787/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em


26/09/2017.

Trade dress é diferente de marca e desenho industrial

O conjunto-imagem distingue-se dos institutos denominados “marca” e


“desenho industrial”.

Tanto a marca, como o desenho industrial e o conjunto-imagem têm, em


comum, a finalidade de designar um produto, mercadoria ou serviço,
diferenciando-o dos concorrentes.

Apesar da finalidade ser semelhante, eles possuem características


diferentes.

Marca

É um sinal que designa a origem do produto, mercadoria ou serviço.

A marca cria um vínculo duradouro entre o bem e a pessoa que o colocou


em circulação
As marcas, para serem registradas, devem atender à distintividade ou
novidade relativa, ou seja, dentro do mercado em que se insere o produto, o
sinal visivelmente perceptível deve se distanciar do domínio comum, a fim
de propiciar a utilização comercial exclusiva por seu titular. Esta fruição
exclusiva, que será assegurada por meio do registro, pode se estender
indefinidamente no tempo, desde que promovidas as tempestivas
prorrogações. Isso porque o direito de exclusividade da marca tem por
escopo assegurar ao consumidor a correspondência entre o produto
designado e a empresa que o colocou em circulação.

Desenho industrial

Protege a configuração externa de um objeto tridimensional ou um padrão


ornamental (bidimensional) que possa ser aplicado a uma superfície ou a
um objeto.

O desenho industrial insere no mercado uma inovação estética em objeto


comum ou facilmente reproduzível em escala industrial.

O desenho industrial, por se caracterizar em uma inovação estética


facilmente reproduzível em escala industrial, a partir de sua publicidade,
passa a integrar o estado da técnica. Nota-se, portanto, que o
desenvolvimento de desenhos industriais movimenta-se, ao longo do tempo,
numa crescente, podendo ser posteriormente incorporada pelos produtos de
seus concorrentes de forma lícita e regular. Ao seu desenvolvedor (autor) é
assegurado, mediante registro, o direito de exploração exclusiva, porém
temporária (até, no máximo, 25 anos), nos termos do art. 108 da Lei nº
9.279/96.

Trade dress
O denominado trade dress, não disciplinado na legislação nacional atual,
tem por finalidade proteger o conjunto visual global de um produto ou a
forma de prestação de um serviço. Materializa-se, portanto, pela associação
de variados elementos que, conjugados, traduzem uma forma peculiar e
suficientemente distintiva de inserção do bem no mercado consumidor,
vinculando-se à identidade visual dos produtos ou serviços.

Como vimos, apesar de não haver legislação específica, a proteção do trade


dress é assegurada com fundamento no dever geral de garantia de livre
mercado, ou seja, no dever estatal de assegurar o funcionamento saudável
do mercado, de forma a expurgar condutas desleais tendentes a criar
distorções de concorrência.

Violação ao trade dress

O trade dress é violado quando uma empresa imita sutilmente diversas


características da marca concorrente (normalmente a líder do mercado)
com o objetivo de confundir o público e angariar vendas com base na fama
da marca copiada.

A proteção jurídica que se dá ao trade dress existe para se combater a


utilização indevida de elementos e caracteres que, relacionados à marca,
personalizam e distinguem produtos e serviços ofertados no mercado, a
exemplo de embalagens, cores, designs, desenhos, decorações, dentre
outros - os quais, por vezes, não integram o registro dessa marca, mas
possuem alto poder de influência na liberdade volitiva dos consumidores.

A finalidade precípua de tal amparo legal é coibir confusão e má associação


por parte do público consumidor, garantindo, por outro lado, o exercício da
livre concorrência.

Exemplo de violação ao trade dress


Em um caso concreto, o TJ/SP entendeu que uma empresa cuja marca era
“Uai in box” teria violado a trade dress da “China in box”.

Além do nome parecido, a empresa “Uai in box” também oferecia comida em


delivery com pacotes iguais ao da “China in box”.

EXPLICAÇÃO DO JULGADO

Vamos agora verificar o caso concreto analisado pelo STJ:

J&F Participações S/A é proprietária da marca Neutrox, condicionador de


cabelos bastante conhecido no mercado nacional desde a década de 70.

A marca está registrada do INPI estampada em um tubo cilíndrico com cor


vermelha na tampa e dizeres evidenciados em cor amarela, apresentando-se
desta forma há anos ao público consumidor.

A sociedade empresária Dragão Química Indústria e Comércio Ltda. possui


um outro produto, também relacionado com os cuidados dos cabelos,
denominado Tratex.

A J&F entendeu que o Tradex possuía uma semelhança muito grande com o
Neutrox e que estaria havendo violação de seu direito de marca.

Diante disso, a J&F ajuizou ação inibitória por violação a direito de marca e
prática de concorrência desleal, cumulada com indenização por perdas e
danos e antecipação de tutela contra a Dragão Química, a fim de compelir
esta última a se abster de usar os produtos e materiais informativos ou
publicitários que contenham o sinal Tratex, idênticos ao produto Neutrox,
além de condená-la ao pagamento de indenização por danos morais e
materiais decorrentes do uso indevido da marca.
A autora requereu que a ré se abstivesse de utilizar os elementos
característicos e essenciais de sua marca, sob pena de multa diária, assim
como a condenação ao pagamento de perdas e danos pelo uso indevido da
marca e de danos morais.

O juiz julgou o pedido procedente, mas o TJ/RJ deu provimento à apelação


da ré.

De acordo com o TJ/RJ não foi demonstrado o parasitismo comercial nem


imitação a configurar ato de concorrência desleal, haja vista que os
elementos da embalagem eram uma tendência de mercado, o que
desconfigurou o ineditismo que daria direito à exclusividade na utilização
dos sinais e elementos que formam o conjunto visual dos produtos.

Sendo assim, também não foi constatada ilicitude e prejuízo.

Irresignada, a JEF interpôs recurso especial.

O STJ deu provimento ao recurso?

NÃO.

Em regra, as cores e denominações não são registráveis como marca, a não


ser que tenham sido combinadas de forma muito peculiar.

Dessa forma, para a caracterização da infringência de marca, por usurpação


ou arremedo de sua “roupagem”, não é suficiente que se demonstrem a
mera semelhança de cores, embalagens, sinais, sobreposição ou afinidade
das atividades. É necessário que o ato apontado como desleal seja de tal
relevância que a coexistência das marcas, em decorrência da identidade de
suas trade dresses, cause confusão no consumidor ou prejuízo ao titular da
marca anterior, a impor uma ação do Estado a fim de reprimir a conduta.
É isso que se extrai a partir da interpretação dos incisos VIII e XIX do art. 124
da Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96):

Art. 124. Não são registráveis como marca:

(...)

VIII - cores e suas denominações, salvo se dispostas ou combinadas


de modo peculiar e distintivo;

(...)

XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com


acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar
produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar
confusão ou associação com marca alheia;

O STJ já decidiu nesse sentido:

Por força do art. 124, VIII, da Lei n. 9.279/1996 (LPI), a identidade de cores
de embalagens, principalmente com variação de tons, de um produto em
relação a outro, sem constituir o conjunto da imagem ou trade dress da
marca do concorrente - isto é, cores “dispostas ou combinadas de modo
peculiar e distintivo” -, não é hipótese legalmente capitulada como
concorrência desleal ou parasitária.

A simples cor da lata de cerveja não permite nenhuma relação com a


distinção do produto nem designa isoladamente suas características -
natureza, época de produção, sabor etc. -, de modo que não enseja a
confusão entre as marcas, sobretudo quando suficiente o seu principal e
notório elemento distintivo, a denominação.
Para que se materialize a concorrência desleal, além de visar à captação
da clientela de concorrente, causando-lhe danos e prejuízos ao seu
negócio, é preciso que essa conduta se traduza em manifesto emprego de
meio fraudulento, voltado tanto para confundir o consumidor quanto para
obter vantagem ou proveito econômico.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.376.264/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe
de 4/2/2015.

E como se analisa essa possível confusão?

Isso deve ser examinado caso a caso. A possibilidade de associação


indevida e confusão entre as marcas deve ser analisada diante de cada caso
concreto.

A doutrina, contudo, nos fornece alguns parâmetros.

Filipe Fonteles Cabral e Marcelo Mazzola listaram sete critérios para a


avaliação da possibilidade de confusão de marcas, por eles denominado
“Teste 360º”:

a) grau de distintividade intrínseca delas;

b) grau de semelhança entre elas;

c) legitimidade e fama do suposto infrator;

d) tempo de convivência delas no mercado;

e) espécie dos produtos em cotejo;

f) especialização do público-alvo; e
g) diluição.

Nenhum desses elementos deve se sobrepor aos demais, sendo certo que o
resultado da avaliação de um critério isoladamente não confirma nem
elimina a colidência das marcas sob exame. O grau de relevância de cada
item do teste só poderá ser sopesado pelo examinador diante do caso
concreto (O Teste 360º de Confusão de Marcas. Revista da Associação
Brasileira da Propriedade Intelectual, nº 132, set/out de 2014, p. 17).

Com amparo nos critérios acima expostos e nos mencionados dispositivos


legais (art. 124, VII e XIX, da Lei nº 9.279/96), conclui-se que, apesar das
características de notoriedade e similaridade entre os produtos
comercializados pelas partes, não houve prática de concorrência desleal por
parte da DRAGÃO em relação a J&F, seja por falta de originalidade e
pioneirismo seja pela própria vulgarização da roupagem utilizada, não
havendo se falar em confusão ou má-associação entre os consumidores.

Assim, o TJ/RJ e o STJ concluíram que não havia originalidade/pioneirismo


nas roupagens utilizadas. Essa era a tendência de mercado na época. Além
disso, houve uma vulgarização das roupagens utilizadas, sendo elas
também empregadas por diversas outras marcas do mesmo segmento.
Logo, não se pode fazer que tenha havido confusão ou má-associação entre
os consumidores.

Supressio
Além disso, o STJ entendeu que a pretensão da autora estaria fulminada
pela supressio.

O instituto da supressão (supressio), também conhecida como verwirkung, é


uma expressão (decorrência) do princípio da boa-fé objetiva e serve para
limitar o exercício de direitos subjetivos.

A supressio significa que...

- o credor de uma relação jurídica não exerceu seu direito por longo tempo,

- de forma que isso gerou a justa expectativa no credor de que ele


continuaria sem exigir esse direito,

- podendo-se considerar, portanto, que aquela obrigação contratual deixou


de existir.

“O não exercício de certo direito, por parte de seu titular, em considerável


lapso temporal, infunde a crença real e efetiva de que esse direito não mais
será perseguido, criando na outra parte um verdadeiro sentimento de
confiança de que não há sequer interesse daquele em pleiteá-lo.” (Min.
Moura Ribeiro)

Assim, a supressio é como se fosse a renúncia tácita a um direito pelo seu


não-exercício ao longo do tempo.

Segundo restou consignado nos autos, desde os anos 70,m as referidas


marcas utilizam tais conjunto-imagens. Isso significou a perda do interesse
na defesa desse direito, por carência de animus por parte da

J&F.
Portanto, é evidente a generalização das trade dresses examinadas que,
embora similares, valeram-se de elementos e caracteres de domínio comum,
seguindo a tendência de mercado ditada pela líder internacional: embalagem
cilíndrica com corpo ou conteúdo amarelo, carregando nome, sinais e tampa
na cor vermelha - ao longo de todo esse período, sem notícias de confusão
ao consumidor ou desvio de clientela, até porque, sequer se destinavam ao
mesmo público.

Desse modo, não há que se falar em concorrência desleal ou ofensa a direito


marcário ou a propriedade industrial, intelectual e autoral.

Em suma:

Para a caracterização da infringência de marca, não é suficiente que se


demonstrem a semelhança dos sinais e a sobreposição ou afinidade das
atividades, é necessário que a coexistência das marcas seja apta a causar
confusão no consumidor ou prejuízo ao titular da marca anterior,
configurando concorrência desleal.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.726.804-RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em


27/09/2022 (Info 752).

DOD Plus – julgado correlato com conclusão diversa

Como explicado acima, a possibilidade de associação indevida e confusão


entre as marcas deve ser analisada diante de cada caso concreto. Veja um
outro caso no qual o STJ reconheceu a colidência entre as marcas:
Caso Red Bull x Power Bull

Red Bull é uma marca de energéticos, conhecidíssima tanto no Brasil como


no restante do mundo. Ela foi registrada no INPI em 1993.

Em 2010, a empresa Funcional Drinks Ltda registrou, no INPI, a marca


Power Bull, para também ser utilizada em bebidas energéticas.

Ao tomar conhecimento disso, a Red Bull ajuizou ação contra a empresa


Funcional Drinks Ltda e contra o INPI pedindo a nulidade desse registro.

Assim, discutiu-se se havia colidência entre as marcas de bebida


energética Red Bull e Power Bull.

As empresas em conflito atuam no mesmo segmento mercadológico,


fornecendo produto similar, que podem estar presente nos mesmos locais
de venda e que visam o mesmo público.

Existe uma proximidade grande nas marcas considerando que ambas


utilizam o termo “bull”, diferenciando-se apenas pelo acréscimo dos
vocábulos “red” e “power”.

Diante desse quadro, o STJ reconheceu que havia o risco de a empresa Red
Bull, notoriamente mais antiga e conhecida, ser indevidamente associada
ao produto concorrente.

A associação indevida a marca alheia, prevista no art. 124, XIX, da Lei nº


9.279/96, pode ser caracterizada pelo risco de vinculação equivocada
quanto à origem dos produtos contrafeitos, ainda que inexista confusão
entre os conjuntos marcários.

O STJ entendeu também que havia risco de diluição da marca. Isso porque
não existem, no Brasil, outras bebidas registradas com o elemento “bull”,
de forma que a utilização pela marca concorrente gera um da expressão na
classe de bebidas.

Vale ressaltar que o fato de haver marcas com o elemento “bull” no exterior
não interessa se no Brasil não existe. Isso porque a diluição da marca no
exterior não é suficiente para afastar a distintividade do registro no Brasil.

Tendo sido reconhecida a colidência entre marcas, o STJ declarou a


nulidade do registro da marca Power Bull e condenou a empresa ré a se
abster de utilizar essa marca.

STJ. 3ª Turma. REsp 1922135/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 13/04/2021 (Info 692).

Questão 2

Na apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores, somente serão


computados os votos daqueles que efetivamente se manifestaram pela aprovação ou
rejeição do plano de recuperação, não se considerando a abstenção para qualquer efeito.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será


discutido, elaborado e executado um plano com o objetivo de recuperar a
empresa que está em risco de ir à falência.

Logo, em vez de a empresa ir à falência (o que é nocivo para a economia,


para os donos da empresa, para os funcionários etc.), tenta-se dar um novo
fôlego para a sociedade empresária, renegociando as dívidas com os
credores.
Fases da recuperação

De forma resumida, a recuperação judicial possui 3 fases:

a) Postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho


de processamento;

b) Processamento: vai do despacho de processamento até a decisão


concessiva;

c) Execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação


judicial.

Plano de recuperação

Em até 60 dias após o despacho de processamento da recuperação judicial,


o devedor deverá apresentar em juízo um plano de recuperação da empresa,
sob pena de convolação (conversão) do processo de recuperação em
falência.

Este plano deverá conter:

• discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a serem


empregados (art. 50);

• demonstração de sua viabilidade econômica; e

• laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor,


subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.
Credores são avisados sobre o plano, podendo apresentar objeções

Após o devedor apresentar o plano de recuperação, o juiz ordenará a


publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do
plano e fixando prazo para a manifestação de eventuais objeções.

Desse modo, os credores serão chamados a analisar esse plano e, se não


concordarem com algo, poderão apresentar objeção.

O prazo para os credores apresentarem objeções é de 30 dias.

Se não houver objeção dos credores

Caso nenhum credor apresente objeção ao plano no prazo fixado, considera-se


que houve aprovação tácita.

Nessa hipótese, não será necessária a convocação de assembleia-geral de


credores para deliberar sobre o plano. Isso é muito raro de acontecer na
prática.

Se houver objeção por parte dos credores

Havendo objeção de algum credor, o juiz deverá convocar a assembleia-geral


de credores para que ela decida sobre o plano de recuperação apresentado.

A assembleia-geral, após as discussões e esclarecimentos pertinentes,


poderá:

a) aprovar o plano sem ressalvas;


b) aprovar o plano com alterações;

c) não aprovar o plano.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:

A empresa Alfa Ltda pediu recuperação judicial.

O plano de recuperação foi apresentado pela empresa, tendo sido aberto


prazo de 30 dias para que os credores se manifestassem se concordavam,
ou não, com o plano.

A Caixa Econômica Federal apresentou objeção, nos termos do art. 55, da


Lei nº 11.101/2001:

Art. 55. Qualquer credor poderá manifestar ao juiz sua objeção ao


plano de recuperação judicial no prazo de 30 (trinta) dias contado da
publicação da relação de credores de que trata o § 2º do art. 7º desta
Lei.

(...)

O simples fato de já ter havido objeção, obriga que o juiz determine a


realização da Assembleia Geral de Credores:

Art. 56. Havendo objeção de qualquer credor ao plano de recuperação


judicial, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para
deliberar sobre o plano de recuperação.
(...)

O magistrado designou a data da Assembleia Geral de Credores.

Os arts. 42, 45, § 1º, 46 e 58 da Lei nº 11.101/2005 trazem regras sobre a


votação da Assembleia Geral:

Art. 42. Considerar-se-á aprovada a proposta que obtiver votos


favoráveis de credores que representem mais da metade do valor
total dos créditos presentes à assembléia-geral, exceto nas
deliberações sobre o plano de recuperação judicial nos termos da
alínea a do inciso I do caput do art. 35 desta Lei, a composição do
Comitê de Credores ou forma alternativa de realização do ativo nos
termos do art. 145 desta Lei.

(…)

Art. 45. Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas


as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar
a proposta.

§ 1º Em cada uma das classes referidas nos incisos II e III do art. 41


desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que
representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à
assembléia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores
presentes.
(...)

Surgiu, no entanto, uma dúvida a respeito da contagem dos votos no


momento da Assembleia: como devem ser consideradas as abstenções
para apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores,
no âmbito de recuperação judicial? Se algum dos credores se manifestar
pela abstenção, isso deverá ser computado como voto favorável ou
contrário à aprovação do plano?

Nem favoráveis nem contrários:

Na apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores,


somente serão computados os votos daqueles que efetivamente se
manifestaram pela aprovação ou rejeição do plano de recuperação, não se
considerando a abstenção para qualquer efeito.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.992.192-SC, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel.
para acórdão Ministro Raul Araújo, julgado em 6/12/2022 (Info 760).

Conforme dispõem os arts. 42 e 45 da Lei n. 11.101/2005, a aprovação da


proposta do plano de recuperação judicial apresentada pelo devedor exige a
obtenção de “votos favoráveis de credores que representem mais da metade
do valor total dos créditos presentes à assembleia-geral”.

No entanto, diante da lacuna na lei quanto à qualificação do credor que,


apesar de presente na assembleia geral, se abstém do exercício do seu
direito de voto, não se mostra viável compreender, que aquele que não
manifesta sua posição, independentemente do motivo, anuiu com o plano
proposto, de modo a computar sua abstenção como apta a compor a
aprovação do plano de recuperação judicial.

Nessa hipótese, não se apresenta possível a aplicação do disposto no art.


111 do Código Civil:

Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os


usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade
expressa.

Não se aplica esse dispositivo porque a Lei nº 11.101/2005 impõe a


necessidade de votação favorável da maioria dos credores, ou seja, é
imprescindível a declaração de vontade expressa favorável para a aprovação
do plano de recuperação.

Desse modo, não é possível conferir-se uma interpretação extensiva ao art.


45 da Lei nº 11.101/2005 para atribuir à abstenção a qualidade de voto
“positivo (sim)”, porquanto a lei de recuperação judicial exige a manifestação
expressa e favorável dos credores, para efeito de aprovação do plano
recuperacional, sendo inviável a mera presunção de anuência.

Por fim, ao credor que, presente na assembleia geral, se abstém de votar,


deve ser conferido o mesmo tratamento dado ao credor ausente, ou seja,
não pode compor o quórum de deliberação, seja pelo valor do crédito seja
pelo número de credores, pois a abstenção não pode influenciar no
resultado da deliberação pela aprovação ou rejeição da proposta.

Questão 3

Ao produtor rural que exerça sua atividade de forma empresarial, é facultado requerer a
recuperação judicial, desde que esteja inscrito na Junta Comercial há mais de dois anos.
CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Recuperação judicial

A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por


objetivo viabilizar a superação da situação de crise do devedor, a fim de
permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam
preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.

A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual


será construído e executado um plano com o objetivo de recuperar a
empresa que está em vias de efetivamente ir à falência.

Nas palavras do Min. Luis Felipe Salomão:

“A recuperação judicial é instrumento jurisdicional de superação da


crise econômico-financeira da atividade empresarial. Revela-se como
artefato viabilizador do desenvolvimento econômico, social, cultural e
ambiental, na medida em que promove a continuidade da atividade
econômica da empresa com potencial de realização.”

Fases da recuperação

De forma resumida, a recuperação judicial possui três fases:

a) postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho


de processamento;
b) processamento: vai do despacho de processamento até a decisão
concessiva;

c) execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação


judicial.

Requisitos para a recuperação judicial

A recuperação judicial é um processo judicial, ou seja, é um pedido que será


formulado ao juiz.

Para isso, no entanto, é necessário que a devedora cumpra alguns requisitos


previstos no art. 48 da Lei nº 11.101/2005:

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no


momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de
2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos,
cumulativamente:

I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por


sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí
decorrentes;

II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de


recuperação judicial;

III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de


recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção
V deste Capítulo;

IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio


controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos
nesta Lei
Requisito temporal de 2 anos

O primeiro requisito para que a empresa possa requerer a recuperação


judicial é que ela esteja exercendo regulamente suas atividades há, no
mínimo, 2 anos (caput do art. 48) no momento do pedido.

O prazo de 2 anos tem como objetivo principal conceder a recuperação


judicial apenas a empresários ou a sociedades empresárias que se acham,
de certo modo, consolidados no mercado e que apresentem certo grau de
viabilidade econômico-financeira capazes de justificar o sacrifício dos
credores.

Segundo Marlon Tomazzete, apenas em relação a empresas sérias,


relevantes e viáveis “é que se justifica o sacrifício dos credores em uma
recuperação judicial. Uma empresa exercida há menos de dois anos ainda
não possui relevância para a economia que justifique a recuperação.” (Curso
de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. São Paulo:
Atlas, 2011, p. 60).

ý (Delegado PC/BA 2018 VUNESP) Poderá requerer a recuperação judicial o


devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades
empresariais pelo período mínimo de seis meses. (errado)

A partir de quando se começa a contar esse prazo de 2 anos?

Em regra, da data de inscrição na junta comercial competente.


Logo, no pedido de recuperação judicial, deverá ser juntada uma certidão
emitida pela respectiva junta comercial na qual conste a inscrição do
empresário individual ou o registro do contrato social ou do estatuto da
sociedade.

Desse modo, estão proibidos de requerer recuperação judicial, os


empresários “de fato” ou “irregulares”, isto é, aqueles que exercem a
atividade empresarial de modo informal, sem registro na junta comercial.

Por que se falou “em regra”? Existe alguma exceção?

SIM. O caso do empresário rural.

Todo empresário, antes de iniciar suas atividades, deverá se inscrever no


Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, isto é, na Junta
Comercial. É o que prevê o art. 967 do Código Civil:

Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público


de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua
atividade.

Para o empresário rural, todavia, o Código Civil concedeu a faculdade de se


registrar ou não perante a Junta da sua unidade federativa. Por isso, o
dispositivo utiliza o verbo “pode”:

Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal


profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968
e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de
Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de
inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário
sujeito a registro.

Ora, se pode ele requerer inscrição, significa que o empreendedor rural,


diferentemente do empreendedor econômico comum, não está obrigado a
requerer inscrição antes de empreender.

Desse modo, o empreendedor rural, inscrito ou não, está sempre em


situação regular; não existe situação irregular para este, mesmo ao exercer
atividade econômica agrícola antes de sua inscrição, por ser esta
facultativa.

Por isso, se exerce atividade de produção de bens agrícolas, esteja inscrito


ou não, estará em situação regular, justamente porque poderia se inscrever
ou não.

Assim, os efeitos decorrentes da inscrição são distintos para as duas


espécies de empresário:

• Para o empreendedor rural, o registro, por ser facultativo, tem o efeito


constitutivo de equipará-lo, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a
registro, sendo tal efeito apto a retroagir (ex tunc), pois a condição regular de
empresário já existia antes mesmo do registro.

• Já para o empresário comum, o registro, por ser obrigatório, somente pode


operar efeitos prospectivos (ex nunc), pois apenas com o registro é que
ingressa na regularidade e se constitui efetivamente e validamente,
empresário.
O registro do produtor rural, portanto, apenas o transfere do regime do
Código Civil para o regime empresarial, com efeito ex tunc, pois não o
transforma em empresário regular, condição que já antes ostentava apenas
em decorrência do anterior exercício da atividade econômica rural.

Assim, a qualidade de empresário rural regular já se fazia presente desde o


início do exercício profissional de sua atividade, sendo irrelevante, para fins
de regularização, a efetivação da inscrição na Junta Comercial, pois não
estava sujeito a registro.

Então, o produtor rural é regido pelo Código Civil, enquanto não registrado e,
querendo, passa ao regime jurídico empresarial, após a inscrição é
facultativa.

Inscrição de empresário na Junta Comercial é ato declaratório

Há doutrinadores que sustentam que o registro apenas declara a condição


de empresário individual, tornando-o regular, mas não o transforma em
empresário. O próprio STJ já afirmou a natureza declaratória atribuída ao
registro efetivado pelo empresário na Junta Comercial.

Assim, nos termos da teoria da empresa, a qualidade de empresário rural


também se verificará sempre que comprovado o exercício profissional da
atividade econômica rural organizada para a produção ou a circulação de
bens ou de serviços, independentemente da efetivação da inscrição na
Junta Comercial.

No caso de empresário rural, para fins de cômputo desses 2 anos, é


possível aproveitar o tempo em que ele não estava registrado
O empresário rural, para fazer o pedido de recuperação judicial, deve estar
registrado.

Assim, o registro empresarial deve ser anterior ao pedido de recuperação


judicial.

No entanto, pelas razões acima explicadas, esses 2 anos, exigidos pelo


caput do art. 48, não precisam ser exercidos após o registro. No caso de
empresário rural, o exercício da atividade econômica rural pelo prazo de 2
anos pode ser computado somando-se ao período anterior e posterior ao
registro.

Dessa feita, o registro empresarial deve, sim, ser realizado antes da


impetração da recuperação judicial (critério formal). Contudo, a
comprovação da regularidade da atividade empresarial pelo biênio mínimo
(art. 48 da Lei nº 11.101/2005) será aferida pela manutenção e continuidade
do exercício profissional (critério material).

Em suma:

O cômputo do período de dois anos de exercício da atividade econômica,


para fins de recuperação judicial, nos termos do art. 48 da Lei nº
11.101/2005, aplicável ao produtor rural, inclui aquele anterior ao registro
do empreendedor.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.811.953-MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado
em 06/10/2020 (Info 681).

STJ. 4ª Turma. REsp 1.800.032-MT, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Acd. Min.
Raul Araújo, julgado em 05/11/2019 (Info 664).
Tema

Essa conclusão foi agora reafirmada em recurso especial repetitivo:

Ao produtor rural que exerça sua atividade de forma empresarial há mais


de dois anos, é facultado requerer a recuperação judicial, desde que
esteja inscrito na Junta Comercial no momento em que formalizar o
pedido recuperacional, independentemente do tempo de seu registro.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.905.573-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado
em 22/06/2022 (Recurso Repetitivo – Tema 1145) (Info 743).

Lei nº 14.112/2020

A Lei nº 14.112/2020 promoveu algumas mudanças nos parágrafos do art.


48 da Lei nº 11.101/2005. Veja os dispositivos que interessam para fins do
julgado analisado:

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no


momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de
2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos,
cumulativamente:

(...)

§ 2º No caso de exercício de atividade rural por pessoa jurídica,


admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste
artigo por meio da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), ou por meio de
obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir a ECF,
entregue tempestivamente. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de
2020)

§ 3º Para a comprovação do prazo estabelecido no caput deste


artigo, o cálculo do período de exercício de atividade rural por pessoa
física é feito com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural
(LCDPR), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que
venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto sobre a
Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial, todos
entregues tempestivamente. (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

§ 4º Para efeito do disposto no § 3º deste artigo, no que diz respeito


ao período em que não for exigível a entrega do LCDPR, admitir-se-á a
entrega do livro-caixa utilizado para a elaboração da DIRPF. (Incluído
pela Lei nº 14.112, de 2020)

§ 5º Para os fins de atendimento ao disposto nos §§ 2º e 3º deste


artigo, as informações contábeis relativas a receitas, a bens, a
despesas, a custos e a dívidas deverão estar organizadas de acordo
com a legislação e com o padrão contábil da legislação correlata
vigente, bem como guardar obediência ao regime de competência e
de elaboração de balanço patrimonial por contador habilitado.
(Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

Desse modo, nos termos do dispositivo transcrito acima, caso o registro


ocorra após o início de suas atividades, a comprovação do exercício dessas
atividades pelo prazo mínimo exigido para o requerimento de recuperação
poderá ser realizada nas formas especificadas nos §§ 2º ao 5º.

O ponto mais importante está no novo § 3º do art. 48 porque ele permite que
o produtor rural pessoa física (e não apenas o que atue como pessoa
jurídica) possa pedir recuperação judicial. Nesse caso, ele verá obedecer a
regra do art. 70-A:
Art. 70-A. O produtor rural de que trata o § 3º do art. 48 desta Lei
poderá apresentar plano especial de recuperação judicial, nos termos
desta Seção, desde que o valor da causa não exceda a R$
4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais). (Incluído pela
Lei nº 14.112/2020)

Questão 4

É possível suspender a habilitação de crédito até que se resolva a controvérsia quanto à


existência dele bem como a seu respectivo valor em juízo arbitral, em observância a
cláusula compromissória estabelecida entre as partes.

CERTO Resposta correta

ERRADO

Comentários
Imagine a seguinte situação hipotética:

Alfa Energia S.A é produtora independente de energia elétrica.

Em março de 2010, a Alfa celebrou contrato fornecimento de energia elétrica


com a indústria Beta Ltda.

A Alfa forneceria energia elétrica e a Beta pagaria a contraprestação


mensalmente segundo a quantidade de energia utilizada.

No contrato firmado, havia uma cláusula compromissória.

Em que consiste a chamada cláusula compromissória?


A cláusula compromissória, também chamada de cláusula arbitral, é...

- uma cláusula prevista no contrato,

- de forma prévia e abstrata,

- por meio da qual as partes estipulam que

- qualquer conflito futuro relacionado àquele contrato

- será resolvido por arbitragem (e não pela via jurisdicional estatal).

Exemplo:

“Cláusula 5.1.2 Eventuais controvérsias que porventura surgirem na


interpretação ou execução deste contrato serão resolvidas por meio de
arbitragem, segundo a Lei nº 9.307/96 e o Código de Processo Civil
brasileiro (este aplicado de forma apenas subsidiária à Lei de Arbitragem e
ao Regulamento da Câmara de Arbitragem).”

A cláusula compromissória está prevista no art. 4º da Lei nº 9.307/96:

Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as


partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os
litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.
Voltando ao caso hipotético:

Em julho de 2014, a Beta tornou-se inadimplente, ou seja, parou de pagar as


parcelas do contrato.

Em razão disso, a Alfa notificou extrajudicialmente a Beta da resolução do


contrato, oportunidade em que solicitou o pagamento dos débitos em atraso
e da multa rescisória prevista no contrato.

A Beta, com base nos cálculos que ela fez, pagou R$ 600 mil, mas a Alfa
afirma que o pagamento foi incompleto e que ainda falta quitar R$ 400 mil.

Pedido de recuperação judicial

Em agosto de 2015, a Beta ingressou com pedido de recuperação judicial e


não indicou como um dos seus débitos dívida que tinha com a Alfa.

A Alfa pediu, então, a habilitação de seu crédito (R$ 400 mil), requerendo que
fosse incluída como credora quirografária na recuperação judicial.

A Beta impugnou este crédito reafirmando que não havia mais nada a ser
pago para a Alfa.

Diante desse cenário, o juiz da recuperação judicial proferiu decisão


suspendendo a habilitação do crédito de Alfa até que a existência desse
crédito e o respectivo valor fossem decididos por meio da arbitragem
prevista no contrato.

Foi correta a providência adotada pelo magistrado?

SIM.
No caso concreto, o órgão julgador entendeu que os documentos
destinados à habilitação de crédito não faziam prova do crédito, sendo
necessário apurar a própria existência do crédito e seu valor no Juízo
arbitral, tendo em vista a existência de cláusula compromissória.

Sobre o tema, confira o seguinte julgado do STJ no qual se afirmou a


competência do juízo arbitral para apurar a existência, ou não, dos créditos
que serão submetidos à recuperação judicial:

(...) 5. A natureza do crédito (concursal ou extraconcursal) não é critério


definidor da competência para julgamento de ações (etapa cognitiva)
propostas em face de empresa em recuperação judicial, mas sim as regras
ordinárias dispostas na legislação processual.

6. O que constitui competência exclusiva do juízo universal, segundo a


jurisprudência deste Tribunal, é a prática ou o controle de atos de execução
de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em
recuperação judicial.

7. Segundo a regra da kompetenz-kompetenz, incumbe aos próprios


árbitros decidir a respeito de sua competência para avaliar a existência,
validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória.

8. O deferimento do pedido de recuperação judicial não tem o condão de


transmudar a natureza de direito patrimonial disponível do crédito que a
recorrida procura ver reconhecido e quantificado no procedimento arbitral.

9. Reconhecida a competência do tribunal arbitral para processamento e


julgamento da demanda perante ele proposta – que se limita à apuração
dos créditos inadimplidos no âmbito do contrato de prestação de serviços
celebrado entre as partes –, não há falar em nulidade da sentença parcial
por ele proferida, revelando-se escorreita a conclusão do acórdão
recorrido.
10. De acordo com o entendimento desta Corte, a interposição de recursos
cabíveis não implica litigância de má-fé nem ato atentatório à dignidade da
justiça, ainda que com argumentos reiteradamente refutados pelo Tribunal
de origem ou sem alegação de fundamento novo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.212/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe


3/11/2021.

Em suma:

É possível suspender a habilitação de crédito até que se resolva a


controvérsia quanto à existência dele bem como a seu respectivo valor
em juízo arbitral, em observância a cláusula compromissória estabelecida
entre as partes.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.774.649-SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, julgado em


25/10/2022 (Info 759).

Questão 5

Não é possível o juízo de falência autorizar modalidade alternativa de alienação de ativos,


diante da rejeição da proposta pela assembleia-geral de credores.

CERTO

ERRADO Resposta correta

Comentários
Falência
Falência é o processo coletivo de execução forçada de um empresário ou
sociedade empresária cuja recuperação mostra-se inviável.

Finalidade

A falência tem como objetivo reunir os credores e arrecadar os bens, ativos


e recursos do falido a fim de que, com os recursos obtidos pela alienação de
tais bens, possam os credores ser pagos, obedecendo a uma ordem de
prioridade estabelecida na lei.

Legislação aplicável

Atualmente, a falência do empresário e da sociedade empresária é regida


pela Lei nº 11.101/2005.

Realização do ativo

Depois que os bens da massa falida forem arrecadados, ou seja, listados e


organizados formalmente, eles serão vendidos a fim de arrecadar dinheiro
para pagar os credores.

Essa venda dos bens da massa falida é chamada pela lei de “realização do
ativo” e está disciplinada nos arts. 139 a 148 da Lei.

Modalidades ordinárias de realização do ativo


A Lei de Falências prevê, em seu art. 142, as seguintes modalidades
ordinárias (comuns) de alienação do ativo:

Modalidades ordinárias de alienação do ativo

Antes da Lei 14.112/2020 Depois da Lei 14.112/2020

a) leilão; a) leilão eletrônico;

b) pregão; e b) processo competitivo


organizado promovido por
c) proposta fechada. agente especializado.

Modalidade extraordinária de realização do ativo

As formas acima listadas constituem-se na regra geral, ou seja, são os modos


comuns de realização do ativo.
A Lei, no entanto, de forma sábia e prudente, previu que poderia haver
situações em que não daria tempo ou não seria justificável fazer a alienação
pelos meios ordinárias. Daí deixou em aberto a possibilidade de os bens da
massa falida serem vendidos de outras formas mais simples, desde que
isso seja justificado e autorizado pelo juiz. Tal possibilidade é chamada de
alienação extraordinária. Veja o que diz o art. 144:

Art. 144. Havendo motivos justificados, o juiz poderá autorizar,


mediante requerimento fundamentado do administrador judicial ou
do Comitê, modalidades de alienação judicial diversas das previstas
no art. 142 desta Lei.

A modalidade extraordinária de realização do ativo precisa ser aprovada pela


assembleia-geral de credores. Isso estava previsto no art. 145, com a
redação anterior à Lei nº 14.112/2020:

Art. 145. O juiz homologará qualquer outra modalidade de realização


do ativo, desde que aprovada pela assembleia-geral de credores,
inclusive com a constituição de sociedade de credores ou dos
empregados do próprio devedor, com a participação, se necessária,
dos atuais sócios ou de terceiros. (Redação anterior à Lei nº 14.112,
de 2020)

Atualmente, está previsto no § 3º-B do art. 142:

Art. 142 (...)


§ 3º-B. A alienação prevista nos incisos IV e V do caput deste artigo,
conforme disposições específicas desta Lei, observará o seguinte:
(Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

I - será aprovada pela assembleia-geral de credores; (Incluído pela Lei


nº 14.112, de 2020) (Vigência)

II - decorrerá de disposição de plano de recuperação judicial


aprovado; ou (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

III - deverá ser aprovada pelo juiz, considerada a manifestação do


administrador judicial e do Comitê de Credores, se existente. (Incluído
pela Lei nº 14.112, de 2020)

Feita essa revisão, veja agora o caso concreto apreciado pelo STJ:

Determinada empresa estava em processo de falência.

O juiz convocou uma assembleia-geral para votar proposta de realização


alternativa de alienação de ativos da massa falida.

Foi realizada assembleia-geral de credores, na qual se rejeitou a proposta de


realização alternativa do ativo, sendo registrado em ata que, dos 15 credores
presentes, 9 rejeitaram a proposta, enquanto 6 credores se abstiveram de
votar.

Mesmo assim, o administrador judicial da falência e o Ministério Público


opinaram favoravelmente à realização à modalidade alternativa de alienação
de ativos.
Diante disso, o juiz, mesmo diante da rejeição da proposta pela assembleia-
geral de credores, autorizou a modalidade alternativa de alienação de ativos.

Vale ressaltar que os fatos acima narrados ocorreram antes da Lei nº


14.112/2020.

O juiz poderia ter tomado essa decisão?

SIM.

O magistrado agiu conforme autorizava o § 3º do art. 145 da Lei nº


11.101/2005, antes da Lei nº 14.112/2020. Veja:

Art. 145 (...)

§ 3º Não sendo aprovada pela assembleia-geral a proposta


alternativa para a realização do ativo, caberá ao juiz decidir a forma
que será adotada, levando em conta a manifestação do
administrador judicial e do Comitê. (Redação anterior à Lei nº 14.112,
de 2020)

Esse dispositivo legal estabelecia que, mesmo não aprovada a proposta pela
assembleia-geral, o juiz poderia autorizá-la, com base em seu poder
discricionário, devendo, no entanto, levar em consideração as manifestações
do administrador judicial e do comitê de credores, caso exista.

Luiz Antonio Guerra afirma que “essa regra, excepcional, é uma das poucas
hipóteses contempladas na Lei de Recuperações e de Falências em que o
juiz poderá adotar posição divergente da decisão adotada em assembleia”
(GUERRA, Luiz Antonio. Falências & Recuperações de Empresas. Crise
econômico-financeira. Vol. 3. Brasília/DF: Guerra editora, 2011, p. 848).

O art. 145, § 3º, devia ser analisado conjuntamente com o disposto no art.
144, que exige motivo justificado para autorização judicial de modalidade
alternativa de realização do ativo.

E depois da Lei nº 14.112/2020, o juiz continua podendo autorizar mesmo


se a proposta for rejeitada pela assembleia?

SIM.

A Lei nº 14.112/2020 revogou o § 3º do art. 145 da Lei nº 14.112/2020. No


entanto, essa possibilidade de o juiz decidir pela modalidade alternativa foi
transportada para o art. 142, V, e § 3º-B, III:

Art. 142. A alienação de bens dar-se-á por uma das seguintes


modalidades:

(...)

V - qualquer outra modalidade, desde que aprovada nos termos desta


Lei.

(...)

§ 3º-B. A alienação prevista nos incisos IV e V do caput deste artigo,


conforme disposições específicas desta Lei, observará o seguinte:
(Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

I - será aprovada pela assembleia-geral de credores; (Incluído pela Lei


nº 14.112, de 2020) (Vigência)
II - decorrerá de disposição de plano de recuperação judicial
aprovado; ou (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)

III - deverá ser aprovada pelo juiz, considerada a manifestação do


administrador judicial e do Comitê de Credores, se existente. (Incluído
pela Lei nº 14.112, de 2020)

Em suma:

É possível o juízo de falência autorizar modalidade alternativa de


alienação de ativos, mesmo diante da rejeição da proposta pela
assembleia-geral de credores.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.798.915/SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira,


julgado em 04/10/2022 (Info 754).

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