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Nutrição Clínica 32 (2013) 497e502

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Nutrição Clínica
página inicial da revista: http://www.elsevier.com/locate/clnu

Recomendações endossadas pela ESPEN: Terapia nutricional em grandes

queimadurasq

Anne-Françoise Rousseaua, Marie-Reine Losserb, Carole Ichaic, Mette M. Bergerd,*

aCentro de Queimados e Departamento de Cuidados Intensivos Gerais, Hospital Universitário, Liège, Bélgica
bDepartamento de Terapia Intensiva, Hospital Universitário, Nancy, França
cUnidade de Terapia Intensiva Médica e Cirúrgica, Hospital Saint-Roch, Universidade de Medicina de Nice, Nice, França
dServiço de Medicina Intensiva para Adultos e Centro de Queimados, Hospital Universitário (CHUV), Lausanne, Suíça

q
Grupo de especialistas da Société Française d'Anesthésie-Réanimation (SFAR), Société Francophone de Nutrition Clinique (SFNEP),
Société de Réanimation de langue Française (SRLF).

artigoinfo resumo

Historia do artigo: Antecedentes e objetivos:A terapia nutricional é a pedra angular do tratamento de queimaduras desde a fase inicial de
Recebido em 21 de janeiro de 2013 ressuscitação até o final da reabilitação. Embora vários aspectos da terapia nutricional sejam semelhantes em queimaduras
Aceito em 17 de fevereiro de 2013
graves e outras condições de cuidados críticos, a fisiopatologia da lesão por queimadura com suas principais alterações
endócrinas, inflamatórias, metabólicas e imunológicas requer algumas intervenções nutricionais específicas. O presente texto
Palavras-chave:
desenvolvido pelas sociedades de língua francesa, é atualizado para fornecer recomendações baseadas em evidências para a
Lesão por queimadura
prática clínica. Métodos:Um grupo de especialistas em queimaduras utilizou a metodologia GRADE (Grau de Recomendação,
Cuidados intensivos
Avaliação, Desenvolvimento e Avaliação) para avaliar ensaios clínicos de queimaduras em humanos entre 1979 e 2011. As
Baseado em evidências
recomendações, sugestões fortes ou sugestões resultantes foram então avaliadas pelos especialistas não especializados em
Glicose
Substratos queimaduras de acordo ao seu acordo (forte, moderado ou fraco).
Hipermetabolismo Resultados:Foram feitas oito recomendações principais. Fortes recomendações foram feitas em relação a, 1)
alimentação enteral precoce, 2) os requisitos elevados de proteína (1,5e2 g/kg em adultos, 3 g/kg em crianças), 3) a
limitação da entrega de glicose a um máximo de 55% da energia e 5 mg/kg/h associada a glicemia moderada (alvo -
8 mmol/l) controle por meio de infusão contínua, 4) à substituição precoce de oligoelementos e vitaminas associados
e 5) ao uso de estratégias não nutricionais para atenuar o hipermetabolismo por meios farmacológicos (propranolol,
oxandrolona) e físicos (cirurgia precoce e sala termoneutra) nas primeiras semanas após a lesão. Sugeriu-se, na
ausência de calorimetria indireta, o uso da equação de Toronto (Schoffield em crianças) para determinação da
necessidade energética (risco de superalimentação) e a manutenção da administração de gordura - 30% da oferta
total de energia.
Conclusão:A terapia nutricional em grandes queimados possui especificidades baseadas em evidências que contribuem para
melhorar o desfecho clínico.
- 2013 Elsevier Ltd e Sociedade Europeia de Nutrição Clínica e Metabolismo.

1. Introdução cuidado (UTI) tratamento1,2; a segunda é que o tratamento de queimaduras

Queimaduras graves continuam sendo um grande problema de saúde em
todo o mundo. Mas há boas notícias: a primeira é que a grande maioria das lesões
são pequenas lesões “bagatelas” que podem ser tratadas em ambulatório, com
pouco menos de 10% das vítimas necessitando de internação hospitalar, e apenas
algumas necessitando de cuidados intensivos
* Autor correspondente. Serviço de Medicina Intensiva Adulto e Centro de Queimados,
CHUV BH-08.612, Rue du Bugnon 46, CHe1011 Lausanne, Suíça. Tel.:º41 21 314 2095; fax:º
41 21 314 3045.
Endereço de email:mette.berger@chuv.ch (MM Berger).
melhorou tremendamente nas últimas 3 décadas, resultando em uma
redução tanto da mortalidade quanto das sequelas. As queimaduras graves,
ou seja, aquelas que atingem mais de 20% da superfície total de queimadura
(TBSA) com ou sem lesão por inalação, representam uma condição específica
quando comparadas às patologias gerais de terapia intensiva. Pacientes
gravemente doentes queimados são caracterizados por um forte estresse
oxidativo, uma intensa resposta inflamatória e uma prolongada resposta
hipermetabólica e catabólica com duração de meses, todos proporcionais à
gravidade da lesão (profundidade e extensão). A terapia nutricional constitui
parte integrante do tratamento, desde o início precoce da reanimação
inicial.

0261-5614/$ever matéria inicial - 2013 Elsevier Ltd e European Society for Clinical Nutrition and Metabolism. http://
dx.doi.org/10.1016/j.clnu.2013.02.012
498 A.-F. Rousseau et ai. / Nutrição Clínica 32 (2013) 497e502

O corpo da literatura sobre nutrição de queimaduras aumentou nas
últimas 3 décadas, enquanto alguns estudos importantes devem ser
concluídos em 2013. A American Burn Association (ABA) publicou
diretrizes para o tratamento de queimaduras em 2001,3
com base em uma pesquisa do Medline, incluindo os anos de 1966 a 1998.
Como muitos aspectos da gestão evoluíram desde aquela data, e
particularmente aqueles relativos às necessidades energéticas, as
sociedades de língua francesa incluíram uma revisão da terapia nutricional
em grandes queimaduras em suas próximas diretrizes globais de nutrição.
2. Material e métodos
Especialistas encarregados da nutrição de queimaduras foram
nomeados com base em sua experiência por delegados de três
sociedades científicas: Société Française d'Anesthésie-Réanimation
(SFAR), Société de Réanimation de Langue Française (SRLF) e Société
Francophone de Nutrition Clinique et Métabolisme (SFNEP ).
Com base em uma pesquisa PUBMED incluindo estudos humanos de
1979 a 2011, os especialistas produziram uma revisão da literatura e
elaboraram uma versão francesa de recomendações usando a metodologia
GRADE (Grau de Recomendação, Avaliação, Desenvolvimento e Avaliação),4
que foi validado pelo grupo ampliado de especialistas especializados em não
queimaduras. Este método leva em consideração a qualidade das limitações
do estudo de evidência, inconsistência dos resultados, caráter indireto da
evidência, imprecisão, viés de relato, o equilíbrio entre benefícios versus
danos e relevância do ponto final.
A qualidade da evidência de cada estudo usado para apoiar as
recomendações foi sistematicamente especificada (a tabela online
suplementarfornece a lista dos estudos incluídos na análise). A
qualidade da evidência global foi, portanto, modulada para cima ou
para baixo pelo peso desses três fatores adicionais. A cada
recomendação foi assim atribuído um nível final de evidência que
determinou a sua redação: “recomendamos” (ou “não recomendamos”)
para uma recomendação forte, “sugerimos fortemente” (ou “não
sugerimos fortemente”) para uma recomendação moderada,
“sugerimos” (ou “não sugerimos”) para uma recomendação fraca. Cada
recomendação foi então avaliada por todos os especialistas em uma
escala de 1 a 9 (1¼desacordo, 9¼acordo). Foi calculada uma pontuação
mediana (após exclusão das classificações mais altas ou mais baixas, se
necessário) que poderia cair em uma das 3 zonas: [1e3]¼desacordo; [4e
6]¼indecisão; [7e9]¼acordo. Se o intervalo de confiança da mediana
estivesse dentro da primeira ou última zona, a força da recomendação
era considerada fraca ou forte, respectivamente. Com esta
metodologia, a força da recomendação tem que
ser distinguido do nível de concordância (ou discordância) obtido a
partir do voto dos especialistas: por exemplo, é possível propor uma
recomendação fraca com uma concordância forte, ou inversamente
uma recomendação forte com concordância fraca (por exemplo, para o
uso de rhGH em crianças).
3. Recomendações
Os pacientes com queimaduras graves estão, antes de tudo, gravemente doentes.
Por padrão, as recomendações gerais de UTI se aplicam. Muitos estudos humanos de
alta qualidade, ou seja, randomizados e controlados por placebo com um número
razoável de pacientes, foram publicados durante o período, investigando questões
específicas de queimaduras graves, permitindo uma classificação GRADE razoável (tabela
1).
3.1. Via de alimentação
O trato gastrointestinal está particularmente em risco durante a fase inicial de
ressuscitação de queimaduras devido ao grande estresse resultante das
queimaduras e do tratamento necessário para manter a vida. Como resultado do
maciço vazamento capilar precoce causando um choque hipovolêmico, grandes
quantidades de cristaloides são necessárias durante os primeiros 24e48 h para
manter a pressão arterial. A ressuscitação volêmica causa edema generalizado,
inclusive no intestino, contribuindo para o desenvolvimento de íleo paralítico caso
o trato gastrointestinal não seja utilizado precocemente. A permeabilidade
intestinal também é significativamente aumentada logo após a lesão em
comparação com outras condições de UTI.5
Alimentação enteral muito precoce, ou seja, iniciada nas primeiras 6e12
h após a lesão por via gástrica está associada a inúmeras vantagens
clínicas e biológicas, como atenuação dos níveis de hormônio do
estresse, da resposta hipermetabólica,6resulta em aumento da
produção de imunoglobulinas,7redução de úlceras de estresse,
reduzindo o risco de desnutrição e déficit de energia.8,9
A via gástrica deve ser tentada primeiro, mantendo-se a opção de
acesso pós-pilórico ou mesmo gastrostomia endoscópica percutânea
(PEG) como backup em caso de disfunção pilórica nos pacientes
queimados mais graves.
A escolha da solução de alimentação não difere de outros pacientes
críticos com preferência por soluções poliméricas, de alta energia e alto
nitrogênio.10As fibras são recomendadas desde o início, pois esses pacientes
estão expostos a um alto risco de constipação devido aos importantes
movimentos de fluidos e altas doses de sedativos e opioides
freqüentemente necessários para analgesia. A nutrição parenteral (NP) é
uma alternativa indicada apenas em caso de alimentação enteral

tabela 1
Resumo das declarações.

Tema Nota Acordo

Indicação A terapia nutricional deve ser iniciada precocemente em até 12 horas após a lesão, preferencialmente por via B forte
Rota enteral. Recomendamos priorizar a via enteral, sendo raramente indicada a administração parenteral C forte
Requisitos de energia e Recomendamos considerar a calorimetria indireta como padrão-ouro para avaliar os requisitos de energia. Se não estiver disponível ou não for D fraco
equações preditivas adequado, recomendamos o uso da equação de Toronto para adultos queimados. Para crianças queimadas, sugerimos usar a fórmula de Schoffield

Proteínas Os requisitos de proteína são maiores do que em outras categorias de pacientes e devem ser fixados em torno de 1,5e2,0 g/kg em D forte
adultos e 1,5e3 g/kg/dia em crianças.
Sugerimos fortemente considerar a suplementação de glutamina (ou alfa-cetoglutarato de ornitina), mas não arginina Sugerimos C fraco
Glicose e glicemia fortemente limitar a entrega de carboidratos (prescritos para fins nutricionais e de diluição de medicamentos a 60% da ingestão total D forte
ao controle de energia e não exceder 5 mg/kg/min tanto em adultos como em crianças.
Sugerimos fortemente manter os níveis de glicose abaixo de 8 mmol/l (e acima de 4,5 mmol/l), usando infusão intravenosa contínua D forte
de insulina
lipídios Sugerimos monitorar a entrega total de gordura e manter a energia da gordura <35% da ingestão total de energia C fraco
Micronutrientes Sugerimos fortemente associar, tanto em adultos como em crianças, uma substituição de zinco, cobre e selénio, bem C forte
como de vitamina B1, C, D e E.
Modulação metabólica Recomendamos fortemente o uso de estratégias não nutricionais para atenuar o hipermetabolismo e o hipercatabolismo B forte
em adultos e crianças (temperatura ambiente quente, cirurgia de excisão precoce, betabloqueadores não seletivos e
oxandrolona).
Ao contrário dos adultos, recomendamos administrar rhGH para queimar crianças com queimaduras TBSA > 60% B fraco
 A.-F. Rousseau et ai. / Nutrição Clínica 32 (2013) 497e502
falha, ou contra-indicação para o último. A NP implica um
monitoramento ainda mais rigoroso da glicemia e adesão às
necessidades energéticas do paciente para evitar superalimentação. Os
efeitos deletérios atribuídos à NP foram observados no final dos anos
80 no contexto da “hiperalimentação”11que foi entregue sem controle
de glicose apertado.
Esses problemas de acesso também se aplicam a crianças nas quais a
colocação do tubo pós-pilórico é ainda mais fácil, ocorrendo quase
automaticamente com as tentativas de colocação gástrica.
3.2. Requisitos de energia
Pacientes com queimaduras graves desenvolvem uma resposta
hipermetabólica importante e prolongada, grosseiramente proporcional à
gravidade da lesão: essa resposta é causada pela importante resposta
endócrina ao estresse, a resposta inflamatória (mediadores múltiplos), os
fatores clássicos idade e sexo e o extensão e tempo de cicatrização da ferida.
Os requisitos de energia após grandes queimaduras aumentam
significativamente acima do gasto energético de repouso basal (GER), mas o
aumento é variável ao longo do tempo,12e grosseiramente proporcional à
área de superfície corporal queimada (TBSA). No final dos anos 70, enquanto
se desenvolviam os cuidados com queimaduras, a observação clínica de
perda maciça de peso e as medições metabólicas levaram ao
desenvolvimento do conceito de “hiperalimentação” que frequentemente
resultava em superalimentação massiva, pois a entrega de 5000 kcal/dia era
considerada normal com a equação histórica de Curreri.13Mas as equações
iniciais baseadas no peso mais baseadas no TBSA não consideraram as
mudanças ao longo do tempo: vários estudos mostraram que o aumento do
GER foi mais pronunciado durante as primeiras semanas, diminuindo
progressivamente a partir de então. Os avanços no tratamento de
queimaduras reduziram a magnitude da resposta hipermetabólica,
resultando em alvos de alimentação mais moderados.
Por outro lado, as necessidades nutricionais calculadas com base nas
equações usuais de peso fixo da UTI (25e30 kcal/kg/d) resultam em
subalimentação.14Além disso, os fatores de estresse usados para modular
a equação de Harris & Benedict mostraram ser muito inexatos ou
totalmente errados. A superalimentação causa morbidade, como infiltração
hepática gordurosa e aumento da morbidade infecciosa.11,15Em crianças, a
equação de Hildreth e Galveston incorre no mesmo risco de
superalimentação.
Pelas razões acima, a calorimetria indireta é o padrão-ouro para
determinação das necessidades energéticas tanto em adultos quanto
em crianças. Praticamente, as medições são feitas no estado
alimentado, e os resultados da análise são arredondados para o valor
superior a 100, sem excederº10% do valor medido. Na ausência dessa
ferramenta, a equação de Toronto (mesa 2), que se baseia na análise
de regressão múltipla de um número importante de estudos
calorimétricos, é uma alternativa bem validada.16,17
Em crianças, e na ausência de calorimetria, a equação de Schofield
surge como uma alternativa razoável, tendo em conta que pode
mesa 2
Melhores equações preditivas de acordo com a literatura de queimaduras.
Idade Equação Requisito (kcal/dia)
categoria
adultos Toronto - 4343º (10.5 % TBSA)º (0,23
º (0,84 REE por Harris-Benedict «bruto»)º
(114 t ) - (4,5 dias após a lesão)
Garotas Schoffield (16,97 peso em kg)º (1618 altura em cm)
3e10 anos º371.2
Rapazes Schoffield (19.6 peso em kg)º (1033 altura em cm)
3e10 anos º414,9
Garotas Schoffield (8365 peso em kg)º (4,65 altura em cm)
10e18 anos º200
Rapazes Schoffield (16.25 peso em kg)º (1372
10e18 anos º515,5
Ingestão calórica)
altura em cm)
499
subestimar os requisitos,18e que o resultado do cálculo deve ser arredondado
para cima. Para os médicos acostumados com as equações mais antigas, os
resultados da equação de Schoffield podem parecer muito baixos: esse
sentimento deve ser atenuado pelo conhecimento de que as crianças foram
massivamente superalimentadas até o final dos anos 80 com complicações graves
relacionadas.15A principal desvantagem da equação de Schofield é ser uma
equação fixa, não integrando mudanças ao longo do tempo.
Pacientes com queimaduras graves parecem ser tão sensíveis à
superalimentação quanto outros pacientes gravemente enfermos. Devido
aos importantes volumes de soluções de dextrose a 5% administrados
durante a primeira semana para tratar a hipernatremia e/ou ao uso do
sedativo lipossolubilizado propofol em muitos centros, é particularmente
importante incluir essas fontes não nutricionais de carboidratos e lipídios
em a contagem total de energia.19
3.3. Proteínas e aminoácidos específicos
As necessidades de proteínas foram consideradas em torno de 1,5e 2 g/
kg/d desde o início dos anos 80.20A ingestão de proteína acima de 2,2 g/kg/d
não tem mais efeitos benéficos na síntese líquida de proteína.21
Ingestões de proteína de até 3 g/kg/d foram relatadas em crianças sem
vantagem real.22
A glutamina é um aminoácido tornando-se condicionalmente
essencial para pacientes queimados. É um substrato favorito para
linfócitos e enterócitos. Alguns pequenos estudos monocêntricos sobre
a suplementação de glutamina em pacientes queimados foram
realizados, mas apresentam muitas variações em termos de dose, via e
duração da administração, população estudada ou objetivos.
Observam-se resultados inconstantes quanto ao impacto nas
complicações infecciosas, tempo de internação e mortalidade.23e28Um
grande estudo americano sobre queimaduras em andamento deve
fornecer respostas. Atualmente, é difícil recomendar uma dose precisa,
uma via ou duração da administração. As doses relatadas para outros
pacientes críticos provavelmente devem ser consideradas: 0,3 g/kg/d
durante 5e10 dias. Em crianças queimadas, a administração durante
menos de 3 dias demonstrou não ter efeito.29
O alfa-cetoglutarato de ornitina, disponível apenas na França para
administração enteral, é o precursor da glutamina e, portanto, uma
alternativa. A administração durante a fase aguda do tratamento de
queimaduras parece melhorar a cicatrização de feridas.30. A ingestão diária
de 30 g dividida em 2 ou 3 bolos tem se mostrado eficiente em melhorar o
balanço de nitrogênio.31,32
Atualmente, não há evidências na literatura para recomendar a
suplementação de arginina em pacientes queimados.33
3.4. Carboidratos e controle glicêmico
O número de estudos recentes que investigam as necessidades de
carboidratos em queimaduras é limitado. Alguns estudos isotópicos
sofisticados conduzidos em adultos15e pediátrico34pacientes queimados e
revisões e diretrizes recentes35e37permitir recomendar para entregar 55e
60% da energia na forma de carboidratos sem exceder 5 mg/kg/min tanto
em adultos como em crianças: esse número corresponde a 7 g/kg/dia em
um paciente adulto padrão.
Em relação ao controle glicêmico e à terapia intensiva com insulina (ITT),
provavelmente se aplicam as evidências recentes e as advertências de
outras categorias de pacientes críticos38: a terapia intensiva com insulina
acarreta um risco de hipoglicemia, que provavelmente é particularmente
elevado em pacientes queimados, pois suas necessidades nutricionais são
elevadas e frequentemente administradas em períodos de tempo mais
curtos (com taxas de bombeamento elevadas de até 150 ml/h) devido à
frequente interrupções da alimentação associadas às inúmeras intervenções
sob anestesia que o seu tratamento requer.
No entanto, um controle razoável com metas de glicose entre 5 e 8
mmol/l está associado a benefícios clínicos significativos como
500 A.-F. Rousseau et ai. / Nutrição Clínica 32 (2013) 497e502
mostrado por ambas as retrospectivas39e42e prospectivo43estudos de
queimaduras. Os benefícios observados incluem melhor pega do enxerto,
menos complicações infecciosas e diminuição da mortalidade. O corte exato
para benefício ainda não foi definido, cabendo ao clínico as recomendações
gerais da UTI, de glicose 6e8 mmol/l (100e150mg/dl).
Novas estratégias de controle da glicose também foram investigadas em
queimaduras, mas ainda não podem ser recomendadas como prática clínica geral.
A metformina, que reduz a glicemia por vários mecanismos, pode ser uma
alternativa à insulina em alguns casos44,45mas o risco de acidose láctica deve ser
considerado. A exenatida, uma nova incretina que inibe a secreção de glucagon,
pode reduzir as necessidades exógenas de insulina, conforme mostrado em um
estudo preliminar de queimaduras pediátricas.46
3.5. lipídios
Pequenas quantidades de gordura são necessárias para prevenir a
deficiência de ácidos graxos essenciais: poucos estudos estão disponíveis
sobre as necessidades lipídicas em queimaduras. Os dois estudos
disponíveis47,48mostram que pacientes queimados parecem ser
particularmente sensíveis à carga lipídica total. O impacto negativo no
tempo de internação e no risco de infecção foi relatado com a ingestão total
de lipídios atingindo 35% das necessidades energéticas em comparação com
15%. Como as preparações industriais atuais fornecem 30e52% da energia
total como gordura, a limitação da ingestão de gordura requer composição
hospitalar. Devido a essa aparente sensibilidade, recomenda-se também
monitorar a ingestão de lipídeos não nutritivos, como o administrado com o
sedativo propofol, que pode chegar a 15e30 g/dia em adultos.
O lugar dos ácidos graxos ômega-3 ou outros ácidos graxos mono
ou poli-insaturados ainda não foi definido: também nesta área, há
testes em andamento.
3.6. Requisitos de micronutrientes
Os doentes com queimaduras graves têm necessidades aumentadas de
micronutrientes (ou seja, oligoelementos e vitaminas) devido à sua resposta
hipermetabólica, às suas necessidades de cicatrização de feridas e às
importantes perdas cutâneas exsudativas que caracterizam as queimaduras
com feridas abertas. Um intenso estresse oxidativo está associado à lesão
por queimadura que em combinação com a intensa resposta inflamatória
contribui para o esgotamento das defesas antioxidantes endógenas que são
altamente dependentes de micronutrientes.49
A entrega de ingestões padrão de micronutrientes resulta
invariavelmente em síndromes de deficiência clínica que se tornam
clinicamente visíveis no final do primeiro mês, com atraso na
cicatrização de feridas e complicações infecciosas: os déficits biológicos
já são detectáveis no final da primeira semana.
As soluções industriais de alimentação enteral ou as soluções
multivitamínicas e multitraços parenterais são insuficientes para cobrir
as elevadas necessidades dos pacientes com queimaduras graves. A
reposição das perdas e o aumento das necessidades nutricionais não
podem ser cobertos pela via enteral (devido ao antagonismo de
absorção e competição entre oligoelementos entregues em doses
supranutricionais).
Em relação às necessidades de vitaminas, os estudos clínicos
investigaram principalmente as vitaminas B, C, E e D.50A ingestão adicional
de tiamina normaliza o metabolismo de lactato e piruvato.51Benefícios
clínicos foram demonstrados com redução do estresse oxidativo e melhora
da cicatrização de feridas usando doses de vitamina C e E 1,5e3 vezes
superior à ingestão diária recomendada em crianças e adultos.52Os
resultados não são tão claros com a vitamina D, que é deficiente e contribui
para o desenvolvimento de osteoporose em pacientes com grandes
queimaduras. As ingestões padrão são obviamente insuficientes: 400 UI/dia
de vitamina D2 não melhoram a densidade óssea.53
As necessidades nutricionais de vitamina C demonstraram
permanecer elevadas durante toda a fase aguda (0,5e1g/dia).
Recentemente, a vitamina C foi administrada em doses iniciais muito
altas (0,66 mg/kg/h por 24 h) desde o início dos anos 2000 em estudos
com humanos e animais. Este tratamento parece estabilizar o
endotélio, reduzindo assim o extravasamento capilar e a necessidade
de ressuscitação volêmica em cerca de 30%.54Esta intervenção não é de
forma alguma nutrição convencional, mas uma terapia adjuvante à
ressuscitação e requer validação (NCT01587261).
Entre os oligoelementos, três demonstraram ser particularmente importantes
na imunidade e na cicatrização de feridas de adultos e crianças vítimas de
queimaduras. Cobre (Cu), selênio (Se) e zinco (Zn) são perdidos em grandes
quantidades com as perdas exsudativas, as perdas persistem enquanto a ferida da
queimadura não for fechada.55A duração dos requisitos elevados de substituição
é, portanto, determinada pela superfície queimada: 7e8 dias para queimaduras 20
e40%, 2 semanas com queimaduras 40e60% e 30 dias para queimaduras > 60%
TBSA. A substituição precoce desde a admissão está associada à redução da
peroxidação lipídica, melhora das defesas antioxidantes, melhora da imunidade
com menor incidência de complicações infecciosas, melhora da cicatrização de
feridas e menor tempo de internação na UTI.56,57A competição entre Cu e Zn pela
absorção intestinal (transportador de metalotioneína) torna ineficiente a
administração de doses enterais de substituição.
As mesmas considerações se aplicam a crianças que usam doses de
substituição calculadas proporcionalmente ao seu peso corporal ou
superfície corporal.58
3.7. Tratamento não nutricional do hipermetabolismo
Além da nutrição enteral precoce,59várias estratégias não nutricionais
são recomendadas para atenuar a resposta hipermetabólica à queimadura:
manutenção da temperatura ambiente de enfermagem em 28e30 C,60
excisão precoce e cobertura de queimaduras profundas61e administração de
agentes estimuladores da síntese proteica (betabloqueadores não seletivos,
oxandrolona). O controle da dor e a instituição precoce do programa de
terapia de exercícios são medidas aditivas essenciais para a ressuscitação
metabólica, como em qualquer paciente de UTI.
Os benefícios dos betabloqueadores não seletivos são mais bem
demonstrados em crianças,62eles parecem ser menos importantes em adultos. O
uso de propranolol em uma dose titulada para reduzir a frequência cardíaca basal
em 20% diminui a liberação de citocinas ou hormônios do estresse e diminui tanto
o hipermetabolismo quanto o hipercatabolismo.63e66
Diminuição da mortalidade67e tempo de permanência68foi demonstrado
após a administração de oxandrolona (10 mg/12 h). Além disso, são
descritos efeitos benéficos na perda de peso, catabolismo protéico e tempo
de cicatrização, bem como no metabolismo ósseo, ambos durante a fase
aguda68e70e períodos de reabilitação.71,72. Efeitos semelhantes são
observados em crianças (0,1 mg/kg/12 h). A administração de oxandrolona
requer um monitoramento rigoroso da função hepática.
Propranolol e oxandrolona são as duas farmacoterapias com melhor
custo-benefício para hipermetabolismo em queimaduras. Um papel para a
terapia combinada está atualmente em teste (NCT00675714). Recomenda-se
iniciar a administração após a fase de ressuscitação: no final da primeira
semana para propranolol e um pouco mais tarde para oxandrolona. É
importante observar que a administração precoce (ou seja, durante a
primeira semana) de ambas as drogas isoladamente ou em combinação está
sob investigação. A duração do tratamento atualmente não está definida,
mas pode corresponder ao tempo de internação, exceto durante eventos
sépticos. De acordo com dados escassos,73uma administração prolongada
durante a fase de reabilitação pode ser considerada.
A administração de hormônio de crescimento humano recombinante (rhGH) não é
recomendada em adultos queimados. Ao contrário da população geral de cuidados
intensivos,74nenhum impacto adverso na mortalidade foi observado em pacientes
queimados. No entanto, os efeitos do rhGH não são melhores do que a oxandrolona,69
enquanto revela hiperglicemia adversa.75Em crianças queimadas, o tratamento
com rhGH parece ser uma estratégia eficaz e segura, provavelmente relacionada a
uma comprovada deficiência de GH associada ao crescimento
 A.-F. Rousseau et ai. / Nutrição Clínica 32 (2013) 497e502
deficiência (atrofia). Nesta população, o tratamento com rhGH (0,05e
0,2 mg/kg/d) demonstrou melhorar a cicatrização do local doador76,77e
para reduzir o hipermetabolismo e o déficit de crescimento.78,79
A duração ideal do tratamento ainda não foi determinada: até agora
tratamentos de até um ano foram testados e mostraram-se seguros.
4. Conclusão
A nutrição artificial de pacientes que sofrem grandes queimaduras é uma
terapia altamente específica. A alimentação enteral precoce, iniciada nas primeiras
12 horas após a lesão, é parte integrante da ressuscitação inicial. As necessidades
nutricionais não são constantes ao longo do tempo, mas geralmente são
substancialmente maiores do que as de outros pacientes gravemente enfermos:
as fórmulas preditivas baseadas no peso são, conseqüentemente, imprecisas.
Além disso, as deficiências de oligoelementos se desenvolvem precocemente nos
pacientes com queimaduras mais graves devido às perdas cutâneas exsudativas.
Grandes queimaduras precisam de uma suplementação precoce com quantidades
supranutricionais de zinco, cobre e selênio para prevenir complicações
relacionadas à deficiência. Problemas nutricionais e metabólicos relacionados à
queimadura requerem a implementação precoce de estratégias complementares.
As terapias não nutricionais são essenciais para reduzir o hipermetabolismo e o
hipercatabolismo (alta temperatura ambiente, excisão e cobertura precoce da
ferida, betabloqueadores não seletivos e agentes anabolizantes). O uso rotineiro
de propranolol e oxandrolona atingiu um nível de evidência muito alto. Mais
grandes estudos são necessários para precisar algumas de suas modalidades
ideais.
Conflitos de interesse
Os autores não têm nenhum conflito de interesse a declarar. Não houve
patrocínio industrial do processo de diretrizes.
Agradecimentos
Os especialistas trabalharam sob a presidência dos ProfessoresNoel Cano (
Unidade de Nutrição Humana, INRA e Universidade de Clermont), Dominique
Hurel (Unidade de Terapia Intensiva, Hospital F. Quesnay, Mantes-La-Jolie),Jean-
Yves Lefrant (Unidade de Cuidados Intensivos Cirúrgicos, Hospital Universitário,
Nîmes),Jean Charles Preiser (Departamento de Cuidados Intensivos, Hospital
Universitário Erasme, Bruxelas) eFabienne Tamion (Unidade de Terapia Intensiva
Médica, Hospital Universitário, Rouen)
Três autores (AFR, MRL, MMB) contribuíram igualmente com as
recomendações e fizeram a busca no Medline, analisaram os ensaios,
elaboraram as recomendações, participaram das reuniões de votação e
contribuíram com as diversas etapas do manuscrito. CI forneceu
respaldo científico, participou das reuniões e contribuiu com a
finalização do manuscrito. Gostaríamos de agradecer ao Dr. Eric
Bourgeois, que contribuiu para a pesquisa de literatura enquanto
trabalhava no Hôpitaux de l'Assistance Publique em Paris.
Apêndice A. Dados suplementares
Dados complementares relacionados a este artigo podem ser encontrados emhttp://
dx.doi.org/10.1016/j.clnu.2013.02.012.
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