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PSICOLOGIA JURÍDICA
PROFA. ANA CRISTINA DE ALENCAR BEZERRA OLIVEIRA

Olá estudantes do Curso de Psicologia Jurídica!


Sejam muito bem vindos(as) ao material complementar de apresentação do curso!!
Aqui vocês encontrarão informações pontuais sobre os temas abordados nos diferentes
Módulos do curso, assim como referências complementares e materiais sugeridos, para que
sigam investindo cada vez mais no processo de qualificação profissional de vocês.
Aproveitem para conferir também os textos disponibilizados como anexos!
Confiram e aproveitem!!

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MÓDULO I: Histórico e princípios fundamentais da Psicologia Jurídica
O Módulo I do curso de Psicologia Jurídica versa sobre uma apresentação geral acerca
da interface entre o Direito e a Psicologia, assim como da trajetória histórica da Psicologia
Jurídica no Brasil.
A Psicologia, enquanto ciência e profissão, tem cada vez mais ampliado o seu potencial
de ação e o seu campo de intervenção a partir da articulação e interface com outras áreas de
conhecimento, dentre elas o Direito. A medida em que novas demandas sociais, conflitos e
normativos passam a compor o cenário social e jurídico do país, mais urgente e necessária se
torna a importância das contribuições da Psicologia para as especificidades do Sistema de
Justiça. A inserção da realidade psicológica dos diferentes atores envolvidos nos conflitos
judiciais nos respectivos nos autos dos processos, visa ampliar a compreensão dos conflitos e
em especial potencializar as estratégias a serem aplicadas para a resolução e/ou
enfrentamento dos mesmos. Com isso, torna-se cada vez mais relevante a compreensão dos
processos jurídicos e os aspectos subjetivos que os permeiam e atravessam, em especial com
a possibilidade de uma escuta diferenciada dos envolvidos em tais conflitos, visando somar ao
processo decisório dos operadores do Direito.

O Direito pode ser entendido como uma importante área do conhecimento que tem
origem nos fatos sociais que envolvem aspectos culturais, valores, e costumes. Sendo assim,
objetiva, diante dos conflitos que se apresentam ao Sistema de Justiça, encontrar uma
resolução pacífica para os mesmos. Segundo Sanches (2011) as normas jurídicas são os
recursos utilizados pela ciência do Direito para alcançar a pacificação dos conflitos.

Sendo assim, ao Direito cabe a utilização das leis como instrumento para a organização
das relações sociais, sendo o cumprimento das mesmas elemento essencial para uma boa
convivência social. Mas e como pensar a interface então com a Ciência Psicológica?

O conhecimento psicológico acerca do homem, ou seja, das inúmeras possibilidades


de análise, avaliação e intervenção junto ao comportamento humano configura-se como
importante contribuição para a compreensão da organização das relações sociais a partir de
aspectos subjetivos, e não mais apenas normativos.

Num primeiro momento histórico dessa parceria entre Direito e Psicologia, é possível
observar especial interesse entre a produção de instrumentos de medida e avaliação do

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comportamento humano, a produção de psicodiagnósticos e a explicação para
comportamentos socialmente considerados desviantes, a exemplo da prática de crimes.

É nesse contexto que a Psicologia do Testemunho ganha relevância, na expectativa de


que a aplicação do instrumental técnico da Psicologia seja determinante para a identificação
da “verdade” em processos que envolvam a participação de testemunhas.

Os diferentes momentos que marcam a construção gradual e contínua desta interface


Direito & Psicologia são importantes indicativos de como a compreensão dos aspectos
subjetivos dos conflitos torna-se relevante quando da tomada de decisão final, mediante
sentença. É neste contexto que se entende a Psicologia como uma área de conhecimento
autônoma e independente, consequentemente não subordinada ao Sistema de Justiça. As
contribuições da Psicologia devem portanto serem entendidas numa perspectiva de
ampliação da compreensão dos conflitos, de forma a auxiliar no processo decisório dos
magistrados.

É a partir desta compreensão de complementariedade que se dá a configuração da


Psicologia Jurídica como uma área de atuação emergente para o profissional de Psicologia. O
termo Psicologia Jurídica foi utilizado pela primeira vez com a publicação do “Manual de
Psicologia Jurídica” pelo médico e psicólogo Emílio Mira Y López em 1945. Na época o autor
já defendia a ideia de que a articulação entre a Psicologia e o Direito possibilitaria uma melhor
compreensão do comportamento humano, sendo um auxílio fundamental quando da tomada
de decisões pelos juristas (LEAL, 2008).

Conforme a Resolução CFP nº 23 de 13/10/2022 que versa sobre as especialidades em


Psicologia, é possível identificar como definição de Psicologia Jurídica a seguinte: “É a área de
atuação profissional da Psicologia no âmbito do Sistema de Justiça e em serviços que compõem
o Sistema de Segurança Pública e o Sistema de Garantia de Direitos que executam sentenças
judiciais, como o Sistema Prisional e o Sistema Socioeducativo” (CFP, 2022).

Considerando as inúmeras possibilidades que tal perspectiva conceitual proporciona


ao profissional de Psicologia Jurídica, torna-se primordial o exercício de reflexões críticas e
cotidianas acerca dos perigos de tais práticas vinculadas a processos de excessiva
“patologização” e/ou “judicialização” de conflitos interpessoais cotidianos. Não cabe ao
psicólogo jurídico fomentar processos de estigmatização e/ou exclusão sociais.
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É fundamental o reconhecimento do profissional de Psicologia Jurídica como aquele,
dentre outras ações, que “realiza procedimentos técnicos de acolhimento, orientação,
avaliação e encaminhamento a todos os indivíduos ligados ao fenômeno da violência, inclusive

com objetivos preventivos”. Essa perspectiva visa superar o estigma de que a


contribuição da Psicologia na interface com o Direito se limita à avaliação, classificação e
normatização de indivíduos. Para isso torna-se imprescindível que tal profissional atue
também no planejamento e execução de políticas de cidadania e direitos humanos. De acordo
com Leal (2008), “a Psicologia Jurídica corresponde a toda aplicação do saber psicológico às
questões relacionadas ao saber do Direito” (p.180).

É possível reconhecer na história da Psicologia Jurídica no Brasil que a mesma está


atravessada por diferentes demandas e temáticas que se atualizam constantemente. A
Psicologia Jurídica ainda é percebida como uma área emergente frente às práticas tradicionais
do profissional psicólogo no Brasil. Dentre as principais possibilidades de atuação deste
profissional é possível identificar: situações que envolvem a expectativa de explicação e
resolução de comportamentos criminosos ou ditos “anormais”; assim como no
enfrentamento de conflitos intrafamiliares, situações de violência contra crianças,
adolescentes, mulheres, ou violência social em geral; assim como quando da proposição de
estratégias de intervenções para conflitos psicossociais. Para que seja possível conhecer um
pouco mais sobre essa história, fica a indicação do artigo intitulado: Reflexões sobre Psicologia
Jurídica e seu panorama no Brasil (anexo).

A partir dessa importante reflexão crítica reforça-se o compromisso do profissional de


Psicologia, e em especial do Psicólogo Jurídico quanto à defesa e proteção dos Direitos
Humanos. Essa prerrogativa da interface da prática psicológica em defesa dos direitos
humanos encontra-se registrada nos princípios fundamentais que subsidiam o Código de Ética
do Profissional Psicólogo, sendo fundamental refletir e apropriar-se de tais referências (CFP,
2005).

A relevância dos Direitos Humanos para a formação em Psicologia em geral poderá ser
melhor compreendida a partir do acesso ao texto original da Declaração dos Direitos Humanos
da ONU (ONU, 1948). A relação desses princípios com a prática em psicologia jurídica está nas
recorrentes situações de violação de direitos que caracterizam muitos dos conflitos
judicializados e tratados pelo Sistema de Justiça e correlatos.

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“O psicólogo jurídico deve estar apto para atuar no
âmbito da Justiça, considerando a perspectiva
psicológica dos fatos jurídicos; colaborar no
planejamento e execução de políticas de cidadania,
Direitos Humanos e prevenção da violência; fornecer
subsídios ao processo judicial; além de contribuir para
a formulação, revisão e interpretação das leis”. (LEAL,
2008, p. 183)

É importante ter claro que ao falar em Direitos Humanos se fala da necessária garantia
e afirmação de todos os direitos e liberdades considerados fundamentais para todas as
pessoas, sem distinção. É neste sentido que tal temática encontra estreita relação com a
prática em Psicologia Jurídica; em especial no que tange à valorização da pessoa humana
quando da avaliação, análise e intervenção junto aos conflitos representados no cenário
jurídico.
Para isso a Psicologia deve considerar a noção de cidadania, direitos e a qualidade da
relação do Estado com seus cidadãos, assumindo o compromisso com uma postura ética e de
proteção de tais direitos. Segundo Rosato (2011), os Direitos Humanos devem ser
fundamentados no respeito à igualdade entre os homens sem qualquer tipo de distinção,
assim como a proteção à dignidade humana. Tal perspectiva fundamenta-se numa teoria
moderna e contemporânea que considera que todos os seres humanos possuem o mesmo
valor e que por isso compartilham de um rol comum de direitos considerados inalienáveis.
Assim como o é para os Direitos Humanos, a dignidade humana também deve ser
entendida como um princípio fundante para a prática psicológica, na medida em que visa o
desenvolvimento do ser humano e de suas condições de vida (ROSATO, 2011).

Esta perspectiva de cuidado e proteção aos direitos humanos como inalienáveis deve
permear a prática psicológica em geral e em especial no contexto jurídico quando a mesma se
aplica a referência de práticas avaliativas. No campo prático do psicólogo jurídico várias
situações de violação de direitos humanos são frequentes e exigem desse profissional um
olhar ampliado para com a compreensão dos diferentes atores envolvidos. São comuns

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situações que exigem deste profissional a avaliação psicológica de sujeitos com histórico de
abandono familiar, institucionalização, violência intrafamiliar, violência doméstica, situações
de abuso sexual infantil, prática de atos infracionais, acompanhamento de medidas
socioeducativas, convivência com a precariedade dos serviços penais, dentre vários outros.

No contexto da avaliação psicológica no cenário forense duas práticas merecem


destaque neste momento: a perícia psicológica e a atividade de assistência técnica. A prática

pericial está prevista nos normativos brasileiros enquanto uma ação auxiliar do juízo,
na medida em que representa a decisão do magistrado pelo uso do recurso de uma avaliação
realizada por um especialista na matéria em análise, permitindo um maior embasamento
teórico-científico quando da sua tomada de decisão.

As práticas periciais e de emissão de laudos técnicos foram legitimadas como prática


profissional do psicólogo no Brasil a partir da regulamentação da profissão, com o Decreto nº
53.464/1964 que define, dentre as várias funções do psicólogo a de realizar perícias e emitir
pareceres sobre a matéria de psicologia (BRASIL, 1964).

Desta forma, o profissional de psicologia poderá atuar como perito junto ao Sistema
de Justiça sempre que convocado pelo juiz, sendo portanto considerado um profissional “de
confiança do juiz”. O perito deve utilizar pesquisas e estudos técnicos especializados para
fundamentar suas conclusões, bem como sua experiência profissional especializada no tema
em análise. Deverá ainda respaldar sua avaliação e a produção do seu laudo pericial numa
análise criteriosa dos quesitos apresentados, respaldado por um reconhecido saber teórico-
técnico e científico sobre o tema. Sua prática se caracteriza como uma importante
contribuição na avaliação do tema em questão, assim como dos envolvidos no conflito, a partir
de aspectos subjetivos e emocionais implicados no mesmo.

Assim como a legislação permite a atuação do psicólogo enquanto perito há também


a previsão da possibilidade de atuação enquanto assistente técnico. Os assistentes técnicos
são considerados profissionais especializados, de confiança de uma das partes em um
processo judicial, sendo inseridos no processo a partir do interesse manifesto destes. Sua
participação tem por objetivo o assessoramento da parte contratante, garantindo assim o
direito ao contraditório frente aos resultados do laudo produzido pelo perito, não sendo os
assistentes técnicos portanto sujeitos a impedimento ou suspeição legais (CFP, 2010).
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No caso da prática psicológica em assistência técnica, a mesma deverá ser frmalmente
requisitada por uma das partes envolvidas no conflito, cabendo ao profissional um processo
cuidadoso e qualificado técnica e teoricamente dos resultados apresentados pelo perito
quando da produção do laudo pericial. O assistente técnico não deve ser reconhecido como
um auxiliar da Justiça na medida em que sua atuação não depende da convocação do juiz,
sendo a mesma uma opção de uma das partes. Os resultados da atividade de assistência
técnica deverão ser apresentados mediante a produção de um parecer técnico devidamente

respaldado pelo profissional especialista, com a devida fundamentação teórico-técnica


e científica de suas conclusões e apontamentos.

É imprescindível que a atuação do psicólogo enquanto perito e/ou assistente técnico


no Sistema de Justiça esteja respaldada por todas as orientações e recomendações técnicas e
éticas que perpassam a atividade de avaliação psicológica. Para tanto é fundamental que o
psicólogo que atua nesse contexto esteja ciente das possibilidades de sua atuação e dos
recursos disponíveis para a realização de um bom trabalho técnico. É fundamental proteger o
resultado desse trabalho de informações que extrapolem os quesitos previamente formulados
pelos interessados e que devem ser respondidos na integralidade, sempre a partir de uma
postura profissional responsável e comprometida eticamente.

Para isso é fundamental a atenção à situação de validade e autorização para uso dos
recursos de testes psicológicos nos termos do Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos, de
responsabilidade do Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2018). Para conhecer um pouco
mais sobre as especificidades da prática psicológica configurada como perícia ou assistência
técnica no âmbito da Justiça, acesse as Resoluções do Conselho Federal de Psicologia que
tratam do tema, assim como da produção dos respectivos documentos técnicos – Resoluções
CFP: 08/2010, 17/2012 e 06/2019 anexas).

MÓDULO II: A Psicologia Jurídica aplicada às questões da Infância e Juventude


Na sequência do curso, o Módulo II aborda a articulação da Psicologia Jurídica com as
questões afetas à Infância e Juventude partindo da compreensão básica da Doutrina de
Proteção Integral aplicada na construção e implementação do Estatuto da Criança e do
Adolescente, representado na Lei 8.069/1990 (BRASIL, 1990).
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No que tange à temática da Infância e Juventude muitas das mudanças legais têm
gerado novas demandas ao profissional de psicologia, na medida em que socialmente as
crianças e adolescentes passam gradativamente a assumir uma condição de sujeitos de
direitos. O advento do Estatuto da Criança e do Adolescente representa uma mudança
paradigmática que impacta sobremaneira na organização e funcionamento de várias
instituições sociais, dentre elas a família, a escola e consequentemente a Justiça.
Ao profissional de Psicologia que atua nas questões da Infância e Juventude no
contexto jurídico é fundamental ter sempre em vista a Doutrina da Proteção Integral que
subsidia o texto legal do Estatuto da Criança e do Adolescente, e que assegura prioridade à
proteção e ao bem estar de crianças e adolescentes, em especial quando estes têm algum de
seus direitos mais fundamentais violados ou colocados em risco.
Partindo de uma análise histórica da compreensão da infância é possível transitar em
diferentes representações do universo infanto juvenil. No Brasil, a replicação do modelo
higienista nos normativos nacionais pode ser observada na produção dos chamados Códigos
de Menores de 1927 e 1979, fundamentados na chamada Doutrina da Situação Irregular
(SANTOS, 2010). Tais Códigos, marcados por uma perspectiva assistencialista, permitiam ao
Estado a intervenção direta nas configurações familiares com a suspensão do então chamado
“pátrio poder”, justificada quando em situações que caracterizassem “abuso de autoridade,
negligência, incapacidade e/ou impossibilidade de exercer o seu poder” (SANTOS, 2010, p.
211).
Com a edição da Declaração dos Direitos da Criança pela Organização das Nações
Unidas em 1959 (ONU, 1959) disponível como anexo, teve início a discussão sobre a
necessidade do reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos. No
Brasil os efeitos desta Declaração foram notados apenas quando da elaboração e edição do
Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990. Desta forma, o ECA segue sendo o principal
instrumento legal que regulamenta e consolida os direitos democráticos e constitucionais
aplicados à Infância e Juventude no Brasil. Em seu Art. 2º define “criança como a pessoa até
doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”
(BRASIL, 1990). A mudança que o ECA representa, possibilita que as crianças e os adolescentes
passem a ser considerados sujeitos de direitos e tenha resguardados a proteção integral
quando em situação de vulnerabilidade social.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em
geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade,
a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
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alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a)
primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços
públicos ou de relevância pública; c) preferência na
formulação e na execução das políticas sociais públicas; d)
destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas
relacionadas com a proteção à infância e à juventude. (BRASIL,
1990 - original sem grifo).

Uma das principais mudanças estabelecidas pelo ECA, é o reconhecimento do caráter


universal dos direitos conferidos a todas as crianças e adolescentes independente da classe
social e/ou das condições socioeconômicas. No âmbito da configuração e organização do
Sistema de Justiça, o ECA possibilitou a criação das Varas de Infância e Juventude em
substituição aos Juizados de Menores. Essa mudança exigiu (e ainda exige nos dias atuais) dos
profissionais de Psicologia Jurídica uma revisão nas possibilidades práticas de avaliação e
intervenção, sendo, portanto, necessário o investimento teórico e técnico no
desenvolvimento de novas atividades e estratégias de atuação junto a este segmento
populacional.

Uma das temáticas que mais demanda a atuação de profissionais de psicologia jurídica
junto às crianças e adolescentes envolve a vivência de situações de violência. Segundo Chauí
(1999) a violência pode ser entendida como a “conversão de uma diferença e de uma
assimetria numa relação hierárquica de desigualdade, com fins de dominação, exploração e
opressão... Uma ação que trata o ser humano não como sujeito, mas como coisa”.

Ao profissional de Psicologia Jurídica que atua com situações de violência intrafamiliar


contra crianças e adolescentes é fundamental, quando da sua análise, considerar a dimensão
e referência do dano psíquico que a situação de violência vivida produziu ou produz na ou
para a criança e/ou o adolescente. Isso implica na avaliação e identificação do grau de
comprometimento, físico e psíquico decorrente do ato violento (GONÇALVES, 2010, p. 284).

As práticas, avaliativas ou interventivas, do profissional psicólogo devem reconhecer e


validar o que prevê o Art. 5º do ECA ao indicar que “nenhuma criança ou adolescente será
objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais” (BRASIL, 1990).

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Para que a criança e o adolescente sejam tratados, no decorrer do processo judicial e
quando da tomada de decisão no cenário jurídico, como sujeitos de direitos, é fundamental o
cuidado para com o registro de suas vivências, a credibilidade conferida ao relato de sua dor,
e a veracidade e autenticidade de seus conflitos. Cabe então ao profissional de psicologia
reconhecer e considerar as diferentes manifestações infantis frente à expressão de seus
sentimentos e emoções, valendo-se muitas vezes de recursos lúdicos e adaptados ao universo
infanto juvenil quando das atividades de avaliação e/ou estudo psicossocial.

O profissional que irá atuar em situações de violência contra crianças e adolescentes


precisa estar apto e devidamente qualificado para o reconhecimento dos diferentes tipos de
violência, das mais diversas possibilidades de manifestação e das combinações entre mais de
um tipo de manifestação violenta. Os principais tipos de violência identificados contra crianças
e adolescentes envolvem: a violência física mediante atos violentos, intencionais e que geram
marcas físicas; a violência sexual que compreende ações invasivas e jogos sexuais que
estimulam sexualmente crianças e adolescentes com vistas à satisfação sexual de outrem; a
violência psicológica que envolve dinâmicas de depreciação, inferiorização e desqualificação
das crianças e/ou adolescentes; bem como as situações de negligência que se caracterizam
pela omissão de pais e/ou responsáveis quanto aos cuidados básicos com as crianças e/ou
adolescentes, sendo comumente caracterizadas por vivências de exposição a situações de
risco e abandono. Os efeitos da vivência de violência podem variar de condições físicas (como
ferimentos internos ou externos) como alterações psíquicas com a manifestação de distúrbios
(leves, moderados ou graves) manifestos em comportamentos de agressividade, retraimento
ou depressão, entre outros.

Diante da suspeita e/ou identificação de alguma situação que represente uma ameaça
ou a violação explícita dos direitos das crianças e adolescentes o Estatuto prevê em seu Art.
98 a possibilidade da aplicação, pelo Sistema de Justiça, das medidas protetivas. Entende-se
que tais medidas de proteção são prioritárias e devem ser acionadas adequadamente quando
da suspeita, mesmo que ainda precoce, de que a criança ou adolescente encontra-se em
situação de risco.

Outra importante referência normativa no que tange às situações de violência vividas


por crianças e adolescentes é a Lei 13.010/2014, popularmente conhecida como a “Lei da
palmada”. Esta lei prevê que toda “criança e adolescente têm o direito de ser educados e
cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de
correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto,... por qualquer pessoa encarregada

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de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los” (BRASIL, 2014). Para além das medidas
protetivas já definidas no texto do ECA, esta legislação específica prevê como possibilidade de
intervenção do Conselho Tutelar a aplicação de medidas como o encaminhamento dos
responsáveis: a programa de proteção à família; a tratamento psicológico ou psiquiátrico; ou
a cursos e/ou programas de orientação; bem como a obrigação de encaminhar a criança a
tratamento especializado e até mesmo a formalização de uma advertência.

Todas as ações que visam assegurar a proteção e o bem estar das crianças e
adolescentes têm por objetivo possibilitar uma convivência familiar e comunitária saudável e
favorável ao desenvolvimento infanto juvenil. Diante de impossibilidade dessa convivência
cabe ao Sistema de Justiça a avaliação e aplicação de medidas que possibilitem o
encaminhamento de tais crianças e/ou adolescentes em situação de vulnerabilidade e/ou
risco às famílias substitutas.

Neste contexto torna-se relevante as mudanças provocadas com o advento da Lei


12.010/2009 que dispõe sobre a adoção. Segundo tal normativo (BRASIL, 2009) “na
impossibilidade de permanência na família natural, a criança e o adolescente serão colocados
sob adoção, tutela ou guarda”. Cumpre destacar que todos esses recursos devem ser
considerados como estratégias excepcionais sendo portanto imprescindível a observação dos
seguintes cuidados: deverá ser realizada a preparação gradativa e o acompanhamento da
condição de todos os envolvidos, processo que deve contar com a participação e colaboração
ativa de profissionais de Psicologia; os adolescentes deverão ter o consentimento sobre a
aplicação do recurso da família substituta colhido em audiência; e os grupos de irmãos
deverão permanecer juntos, salvo exceções. Dentre as possibilidades de família substituta
destaca-se que a adoção se caracteriza como um processo definitivo de perda do poder
familiar e constituição de uma nova referência familiar a partir da validação do Sistema de
Justiça.

Neste cenário de atuação em questões afetas à infância e juventude, torna-se


primordial ao profissional de Psicologia Jurídica a iniciativa de valorização da escuta ativa de
crianças e adolescentes, de forma a considerar no processo de avaliação e/ou intervenção sua
realidade, tanto física, social e comunitária, quanto psíquica e emocional.

Neste contexto a prática da escuta especializada enquanto uma prática profissional


qualificada teórica e tecnicamente, visa identificar possíveis prejuízos de natureza cognitiva,
emocional, comportamental, física e social. Evitando com isso a potencialização dos mesmos
quando da intervenção do Sistema de Justiça no conflito em questão.
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É neste contexto que se torna relevante o conhecimento técnico de recursos que
potencializem essa escuta enquanto uma escuta diferenciada e especializada. Neste interim
identifica-se como importante instrumento o Protocolo Brasileiro de entrevista forense com
crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência (SANTOS et.al, 2020). Acesse o
documento na íntegra como anexo deste material e conheça um pouco mais sobre as
especificidades deste importante recurso técnico.

Ainda no contexto da Psicologia Jurídica aplicada às questões da infância e juventude


é possível discutir sobre os atos infracionais praticados por adolescentes. Tal recurso está
melhor especificado nos Artigos 103, 104 e 105 da Lei 8.069/1990 na medida em que se
considera ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal (BRASIL,
1990). Sendo definido como penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, deve ser
considerada a idade do adolescente à data do fato identificado como ato infracional (mínimo
de 12 anos completos). Torna-se relevante ainda a compreensão de que ao ato infracional
praticado por criança se aplicam as medidas protetivas previstas no art. 101 do ECA.

As mudanças registradas no ECA no que tange ao ato infracional possibilitam o


reconhecimento dos adolescentes, quando na condição de infratores, enquanto sujeitos
portadores de direitos individuais e processuais, até então inexistentes nos termos dos
Códigos de Menores. Dentre os principais direitos individuais assegurados no ECA aos
adolescentes em conflito com a lei, é possível citar:

- a identificação dos responsáveis;


- a comunicação aos pais e/ou responsáveis;
- a privação de liberdade somente mediante flagrante;
- a internação prévia à sentença pelo prazo máximo de 45 dias;
- a garantia do devido processo legal, a previsão de defesa técnica por advogado e o
direito de ser ouvido pela autoridade competente.
O texto legal do Estatuto fomenta, a todo momento, o reconhecimento da criança e
do adolescente como “pessoas em desenvolvimento”, privilegiando as competências e
capacidades da população infanto-juvenil. Com isso, a responsabilização que fundamenta a
proposta das medidas socioeducativas deve ser entendida como de cunho social e não penal
ou criminal, sendo os mesmos reconhecidos pelo Sistema de Justiça como inimputáveis. A
principal função das medidas socioeducativas passa a ser pedagógica, de aprendizado e
‘ressocialização’.

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O Art. 112 do ECA define diversas medidas socioeducativas aplicáveis aos adolescentes
infratores, variando as mesmas entre a prática da advertência até a internação em
estabelecimento educacional, sendo essa a mais invasiva e complexa no que tange à privação
de liberdade (BRASIL, 1990).
O profissional de Psicologia Jurídica poderá ser convocado a atuar com essa temática
e esse público alvo em diferentes contextos práticos e que envolvem tanto o Sistema de
Justiça, com estratégias avaliativas, estudos psicossociais; quanto com atividades de
acompanhamento e intervenção quando do cumprimento dos diferentes tipos de medidas
socioeducativas. Sendo assim, torna-se imprescindível a esse profissional o conhecimento da
legislação do ECA mas também da Lei 12.594/2012 que institui o Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo (BRASIL, 2012). Este é um normativo ainda muito recente
quando avaliada sua proposta desafiadora de operacionalização das medidas socioeducativas.
Sendo assim, o mesmo impõe importantes desafios aos profissionais de psicologia na medida
em que exige a proposição de novas ações, assim como um novo entendimento sobre como
o ato infracional pode ser configurado no contexto da Doutrina da Proteção Integral e não
mais numa lógica punitiva e repressora.
Torna-se imprescindível ao profissional de Psicologia Jurídica que atua neste contexto
e com este público-alvo conhecer o documento de referência editado pelo Conselho Federal
de Psicologia intitulado “Conheça as 10 razões da Psicologia contra a redução da maioridade
penal” disponível como anexo do presente material.

MÓDULO III: A Psicologia Jurídica e o Direito de Família


No Módulo III é chegado o momento de conhecer e refletir um pouco sobre as
demandas e desafios direcionados ao profissional de Psicologia Jurídica no âmbito do Direito
de Família. Esta temática está diretamente relacionada às mudanças observadas na
contemporaneidade no que tange às estruturas e dinâmicas familiares. Novas configurações
e dinâmicas familiares impactam na estrutura de novos conflitos no Sistema Familiar, o que
consequentemente se reflete em novas demandas direcionadas ao Sistema de Justiça. Tais
demandas refletem a expectativa que dificuldades, muitas delas de natura psíquica e/ou
relacional, possam ser resolvidas objetivamente a partir de uma sentença judicial. Estratégias
para enfrentamento de tais conflitos assim como a reflexão crítica acerca de temas
emergentes, como o da alienação parental, são desafios cotidianos encontrados pelo
psicólogo jurídico que atua com questões de Família.

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Quando a prática do Psicólogo Jurídico se aplica aos conflitos das Varas de Família,
torna-se primordial a este profissional considerar o caráter dinâmico das relações familiares e
das fases do desenvolvimento da criança ou adolescente envolvidos, quando da realização de
suas avaliações e/ou intervenções. Segundo Da Silva (2016) é possível indicar que o trabalho
a ser realizado pelo profissional psicólogo neste contexto não se caracteriza como preventivo
na medida em que a problemática retratada pela família já indica uma dinâmica psíquica
bastante comprometida. Quando isso ocorre, é importante que o psicólogo esteja preparado
para acolher o nível de desgaste e estresse emocional que o conflito já gerou até o momento
da sua intervenção, de forma a não subestimar o sofrimento implicado na situação em análise
quando da produção da sua avaliação técnica acerca do conflito e seus desdobramentos.
Para a autora o objetivo deste trabalho deve ser “o de destacar e analisar os aspectos
psicológicos das pessoas envolvidas em que se discutam questões afetivo-comportamentais
da dinâmica familiar, (...) e que garantam os direitos e o bem-estar da criança e/ou
adolescente, a fim de auxiliar o juiz na tomada de decisão que melhor atenda às necessidades
dessas pessoas” (DA SILVA, 2016, p.80).
Diante de situações de intenso sofrimento psíquico decorrente dos conflitos familiares
em análise, cabe ao psicólogo jurídico conhecer e demarcar os limites éticos da sua
intervenção institucional, e se julgar necessário e pertinente deve aconselhar e orientar os
membros da família a buscarem acompanhamento especializado e/ou específico para além
do Sistema de Justiça, a exemplo da psicoterapia (individual ou familiar).
A depender da especificidade do caso e/ou conflito e análise, o resultado da avaliação
psicológica pode ser a recomendação pela suspensão temporária do processo judicial por
determinado período para que uma intervenção do tipo psicoterapia possa ser aplicada aos
envolvidos fora do contexto jurídico, de forma a melhor prepará-los para a decisão judicial
acerca do conflito em questão. Situações assim podem ser importantes quando da preparação
de genitores para a definição de uma nova estrutura de guarda de filhos menores decorrente
de um processo de litígio, por exemplo.
É fundamental ao profissional de Psicologia que atua no contexto jurídico dos conflitos
familiares a compreensão histórica das evoluções e mudanças culturais, sociais que a
instituição família assumiu, reconhecendo inclusive o impacto de tais mudanças nos
normativos e leis que regem essa matéria no campo jurídico. A compreensão desse panorama
histórico possibilita ao profissional psicólogo a compreensão da problemática de forma
contextualizada psicossocialmente, sendo possível a proposição de recomendações e

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intervenções melhor contextualizadas com o cenário contemporâneo de muitos sistemas
familiares.
Como exemplo é possível identificar que as tradicionais referências da família
patriarcal impactavam, e ainda impactam atualmente, na forma como culturalmente os
papéis parentais eram(e são) organizados no contexto familiar. Segundo Brandão (2010), é
importante reconhecer a assimetria com que eram definidas e justificadas as diferenças nos
papéis sociais atribuídos aos homens e às mulheres no funcionamento familiar. Ao marido era
atribuída a responsabilidade pela manutenção financeira enquanto à esposa eram conferidas
as obrigações acerca da moral familiar. A defesa da harmonia e dos costumes na família era a
pedra angular de uma estrutura conjugal fundamentada exclusivamente na valorização moral
do casamento legal e monogâmico. Com isso qualquer configuração familiar que divergisse de
tal modelo era automaticamente considerada inadequada, desestruturada e/ou anormal
(ALVES E BARSTED, 1987 apud BRANDÃO, 2010).
Mudanças significativas no cenário jurídico acerca do Direito de Família podem ser
observadas em meados do final da década de 60 e no decorrer da década de 70, período em
que importantes mudanças sociais influenciaram na configuração familiar e nas relações
estabelecidas entre homens e mulheres. Dentre algumas das mudanças mais significativas
tem-se: os fundamentos do movimento feminista, o advento da pílula anticoncepcional, e a
introdução da mulher no mercado de trabalho, dentre outros. Um novo ideal de maior
‘igualdade’ requerido nos relacionamentos conjugais colocou em xeque os papéis
tradicionalmente exercidos por homens e mulheres e em 1977 (com a promulgação da Lei
6.515 em 26 de dezembro de 1977 – a chamada “Lei do Divórcio”) a dissolução do casamento
se tornou uma realidade, sendo então juridicamente validada.
Aliadas a tais mudanças no universo jurídico que trata do Direito de Família, é
imprescindível ao profissional de Psicologia Jurídica o conhecimento técnico e qualificado
acerca do chamado Ciclo de Vida Familiar (McGOLDRICK & CARTER, 1995). Conhecer e
reconhecer diferentes momentos deste ciclo de desenvolvimento compreendendo e
problematizando diferentes fontes de conflito, assim como recursos para superação dos
mesmos, são competências necessárias ao profissional psicólogo diante da necessidade de
uma avaliação, orientação e/ou recomendação em processos judiciais dessa natureza. Casais
com filhos pequenos, adolescentes ou adultos vivenciam diferentes desafios no que tange ao
desenvolvimento e configuração do sistema familiar. Com isso diferentes demandas, recursos
e responsabilidades parentais precisaram ser consideradas quando da conclusão e/ou
orientação sobre determinado conflito familiar no âmbito jurídico.

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É possível identificar a relação entre os desafios legais frente aos diferentes momentos
do ciclo de vida familiar quando se está diante de processos de litígio que envolvem a disputa
de guarda de filhos menores. Uma importante mudança decorrente dessa nova legislação foi
a necessária discussão da condição de guarda dos filhos quando da ocorrência do divórcio. O
Art. 15 da nova lei conferia a um dos genitores, quando do divórcio, a guarda unilateral dos
filhos, restando ao outro cônjuge o direito de visita assim como fiscalizar a sua manutenção e
educação (BRASIL, 1977). Segundo Brandão (2010) esse período foi marcado pela referência
naturalizada da mulher como a principal cuidadora dos filhos, restando às mães o papel
preferencial de guardiã dos filhos quando das situações de divórcio. É possível observar ainda
nos dias de hoje, uma inclinação dos tribunais em atribuir preferencialmente às mães a guarda
dos filhos menores quando da dissolução do casamento, sendo este cenário alterado
gradativamente em função de importantes mudanças sociais e legais.
Com a promulgação da chamada “Constituição Cidadã” o casamento civil deixou de ser
a única forma legítima de constituição da família, e o conceito de família foi ampliado de forma
a legitimar uma diversidade de uniões já existentes. É nesse contexto que o conceito de família
se tornou cada vez mais plural, passando a contemplar, por exemplo, modelos monoparentais
(BRASIL, 1988). Foi ainda a partir do texto constitucional de 1988 que a previsão de igualdade
de direitos para ambos os cônjuges começou a se tornar uma pauta relevante, na medida em
que o Art. 5º, inciso I da Constituição Federal define que “homens e mulheres são iguais em
direitos e obrigações” (BRASIL, 1988). Somada a tal mudança, a Constituição reconhece as
crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, conferindo à responsabilidade da família,
da sociedade e do poder público a proteção dos mesmos, com absoluta prioridade (BRASIL,
1988, Art. 227).
Desde então importantes decisões de natureza jurídico civil têm impactado na forma
como a instituição família tem sido reconhecida pelo Sistema de Justiça. Como exemplo é
possível citar a decisão do Superior Tribunal Federal em 2011 que reconheceu a união entre
pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, conferindo com isso os mesmos direitos e
deveres aos companheiros das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo. Os argumentos
utilizados na decisão defendiam que o não reconhecimento da união homoafetiva contraria
preceitos fundamentais como igualdade, liberdade e o princípio da dignidade da pessoa
humana, todos previstos e assegurados no texto da Constituição Federal de 1988. Essa nova
orientação legal ampliou o entendimento acerca das diversas possibilidades de configurações
familiares reconhecida enquanto entidade jurídica e portadora de direitos e deveres. Tais

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mudanças possibilitaram, por exemplo, a adoção conjunta por casais homoafetivos no cenário
de novas configurações de relações parentais.
Toda essa contextualização sócio histórica e jurídica torna-se relevante para o
entendimento dos desafios atuais que os conflitos recorrentes nas Varas de Família
representam para os profissionais de Psicologia Jurídica. Uma mudança importante se dá na
compreensão do que caracteriza um vínculo de conjugalidade e sua dissolução mediante o
divórcio, assim como a diferença do que representa o vínculo de parentalidade, entendido
agora como indissolúvel a despeito da situação conjugal dos genitores. Ressentimentos pelo
fim da relação conjugal não devem contaminar o exercício das relações parentais. Em função
disso tem se tornado cada vez mais comum a referência de que existe “ex-marido” e “ex-
esposa” mas nunca “ex-pai” ou “ex-mãe”.
Neste sentido, em situações de divórcio que envolvem a guarda de filhos menores, é
fundamental que a diferenciação entre os papéis conjugais e os parentais seja preservada,
devendo os filhos permanecerem sendo alvos de cuidados, afeto e proteção por ambos os
genitores. Segundo Féres-Carneiro (1998, apud DOS SANTOS, 2010), com a separação conjugal
é comum que os filhos manifestem sentimentos de medo, raiva, culpa e tristeza sendo que a
superação da crise familiar decorrente da separação depende em grande parte da qualidade
da relação estabelecida entre pais e filhos.
Não cabe assim ao psicólogo jurídico a decisão pela escolha do “melhor ou pior”
genitor para assumir a guarda e os cuidados para com a criança e/ou o adolescente envolvidos
na disputa familiar. O cuidado para com a distinção das funções conjugais das parentais deve
ser preservado pelo psicólogo jurídico quando de sua análise e avaliação em processos de
disputa de guarda.
No contexto de avaliações afetas às questões familiares na Justiça, o psicólogo deve
escutar ambas as partes do processo, independente das informações já disponíveis, sendo
fundamental a compreensão do conflito a partir das diferentes perspectivas dos envolvidos
no mesmo, mesmo que essas sejam contraditórias ou antagônicas. Segundo Shine (2005) cabe
ao psicólogo jurídico dar visibilidade aos fatores psicológicos manifestos na problemática e
“se o processo judicial é o de guarda, a avaliação psicológica buscará as potencialidades e as
dificuldades de cada um dos genitores à luz do relacionamento e das necessidades especificas
do (a) filho (a) em questão” (p.3).
É neste contexto que o advento da guarda compartilhada, regulamentada pela lei
13.058 de 2014, se caracteriza como um dispositivo jurídico que visa assegurar a custódia
conjunta dos filhos menores para ambos os genitores (BRASIL, 2014). Segundo Brandão

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(2010), tal instrumento visa assegurar o respeito ao direito inalienável da criança de manter o
convívio familiar e com isso ser educada por ambos os pais; devendo ambos os genitores
assumir as responsabilidades e funções educativas, e participar ativamente do
desenvolvimento dos filhos.
Ainda no cenário dos conflitos familiares decorrentes de situações de litígio quando da
dissolução conjugal, é possível identificar a polêmica e controvérsia que atravessa a temática
da “alienação parental”. Historicamente entende-se que tal proposta deriva da obra de
Richard Gardner em meados da década de 80 nos EUA. O médico psiquiatra utilizou de sua
experiência enquanto perito em diversos casos nos tribunais norte americanos para formular
a proposta da alienação parental, sendo a mesma alvo de duras críticas e inúmeros
questionamentos, a maioria deles ainda sem respostas em função da carência da devida
fundamentação científica.
A despeito desta controvérsia e da carência de fundamentações teórico-científica para
a proposta defendida por Gardner o sistema jurídico brasileiro conta com uma lei específica
que trata deste tema e que data de 2010. A Lei n.º 12.318/2010 dispõe sobre a alienação
parental definindo-a como “a interferência na formação psicológica da criança ou do
adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a
criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor
ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este” (BRASIL,
2010). A legislação em questão apresenta um rol de exemplos de atos de alienação parental,
na expectativa de que os mesmos possam ser constatados quando das práticas periciais – a
exemplo daquelas realizadas por psicólogos jurídicos. Dentre tais atos é possível identificar no
texto legal:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor
no exercício da paternidade ou maternidade; II - dificultar o
exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de
criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício
do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir
deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes
sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e
alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra
genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou
dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII
- mudar o domicílio para local distante, sem justificativa,
visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente
com o outro genitor, com familiares deste ou com
avós (BRASIL, 2010, Art. 2º).

Importante demarcar que a avaliação da presença ou não de práticas tipificadas na


legislação como de alienação parental deve ser feita com muita cautela e parcimônia pelo
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profissional de psicologia, não sendo suficiente para sua identificação a indicação básica de
presença ou ausência de tais aspectos. A configuração familiar, assim como a qualidade e
dinâmica das relações que a compõem deverão ser consideradas no processo avaliativo da
presença ou não de tal fenômeno.

Ainda no âmbito da discussão sobre a alienação parental é possível identificar a


polêmica acerca da temática da proposição da classificação nosológica de uma nova síndrome
intitulada “Síndrome de Alienação Parental – SAP”. Tal proposta segue sendo de
responsabilidade do médico psiquiatra Richard Gardner que sugere a descrição da SAP como
um distúrbio infantil que surge, em geral em processos de disputa de guarda, e que manifesta-
se por meio de uma campanha de difamação realizada pela criança contra um dos genitores
(genitor alienado) sem que haja justificativa para tal, e sob a influência (e/ou programação)
do outro genitor (genitor alienante) para que a criança rejeite e/ou odeie o genitor alienado
(GARDNER apud DE SOUSA, 2010). Cumpre registrar, no entanto, que a proposta de Gardner
não foi incorporada aos instrumentos de classificação nosológica dos transtornos psíquicos
vigentes (DSM V e CID 11), não sendo portanto passível de classificação diagnóstica enquanto
Síndrome. Fato é que os atos identificados e nomeados como decorrentes de “alienação
parental” afetam sobremaneira a qualidade das relações parentais, assim como podem
acarretar e desencadear uma série de conflitos de ordem psíquica e relacional que podem
comprometer o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes envolvidos. Devendo
tais impactos serem avaliados pelo profissional de Psicologia Jurídica responsável por cada
caso.

Esta temática tem exigido de profissionais da Psicologia Jurídica que atuam nas Varas
de Família uma leitura crítica e contextualizada, de forma a evitar que estereótipos de gênero
sejam fomentados, assim como a problematização dos riscos da patologização excessiva de
conflitos interpessoais e familiares.

É neste contexto crítico e qualificado teórica e tecnicamente que recomenda-se o


acesso ao conteúdo da Nota Técnica nº 04/2022 editada pelo Conselho Federal de Psicologia
(em anexo). Tal documento reforça o compromisso do profissional de Psicologia, quando da
produção de avaliações e/ou intervenções psicológicas, da devida fundamentação ética e
científica em sua prática profissional. O cuidado ético com o compromisso da fundamentação
teórica e técnica científica que atravessa a discussão sobre a alienação parental se sustenta
também na necessidade de refletir criticamente acerca de situações e conflitos familiares que

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possam fomentar e/ou validar situações de violência intrafamiliar, sejam elas de natureza
física, mas também psicológica.

No contexto da discussão sobre situações de violência intrafamiliar é que se faz


relevante conhecer, debater e traçar estratégias para o enfrentamento da violência doméstica
contra as mulheres. Tal tema é permeado por reflexões que remetem as diferentes situações
que reforçam práticas de hierarquia de gênero e que podem, consequentemente, subsidiar
práticas de violência de gênero. Neste interim torna-se fundamental a compreensão da
premissa de a violência de gênero, que fundamenta as diferentes práticas de violência
doméstica, se justifica em relações de desigualdade reforçadas pela diferença entre homens
e mulheres, sendo reservado ao universo feminino a noção de inferioridade e sujeição; ao
mesmo tempo que ao universo masculino é conferida a noção de superioridade e poder.

Sendo assim, é pertinente identificar na configuração das relações cotidianas, e em


especial nas relações de gênero, como a violência se torna banalizada. Essa banalização pode
ser representada em pequenos hábitos do dia a dia e que acabam por acomodar os indivíduos,
alheios a uma reflexão crítica sobre a mesma. Segundo Alemany (2009), as violências
praticadas contra as mulheres em razão do seu sexo podem assumir diferentes formas,
incluindo atos que lhe infligem sofrimentos físicos, sexuais ou psicológicos, mediante ameaça,
coação ou força e que tem por finalidade intimidá-las, puni-las, humilhá-las e/ou atingi-las na
sua integridade física e na sua subjetividade (p.271). Essa definição nos permite identificar a
violência contra a mulher como um tipo de violência de gênero, considerando que é a sua
identificação com o referencial de feminino que lhe torna vulnerável e suscetível aos atos
indicados acima. A violência contra a mulher pode ser compreendida, em linhas gerais, a partir
da assimetria identificada entre as percepções e posições socialmente conferidas aos homens
e às mulheres na sociedade.

O fenômeno da violência contra a mulher precisa ser compreendido em sua


complexidade e diferentes manifestações, sendo identificado no contexto privado das famílias
de todas as classes sociais, devendo, no entanto, ser enfrentado enquanto uma questão de
saúde pública. Esta justificativa se dá em decorrência dos prejuízos que acarreta a todos os
envolvidos: as mulheres que são alvo das diferentes violências e precisam ser acolhidas; os
filhos que sofrem os impactos da violência no seu desenvolvimento psíquico e relacional, os
agressores que precisam refletir acerca dos atos violentos praticados e serem
responsabilizados pelos mesmos, assim como os demais atores sociais que sofrem o impacto,
direto ou indireto, da violência.
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Segundo Hirigoyen (2006), a violência exercida por um homem contra uma mulher
precisa ser entendida como um fenômeno cultural e social mas que tem também elementos
psicológicos, o que torna o tema pertinente à análise e intervenção dos profissionais de
Psicologia Jurídica. É muito comum que configurações familiares violentas sejam repetidas
como padrões relacionais por várias gerações, sendo a lealdade entre os membros um
importante aspecto que justifica a sua transmissão transgeracional; oculta muitas vezes,
enquanto um segredo desse sistema familiar.

Segundo Ribeiro & Bareicha (2008) a violência se constrói no contexto relacional e por
isso deve ser entendida para muito além do espaço físico em que ocorre. O nível de assimetria,
as condições de hierarquização e subordinação entre os envolvidos devem ser objeto de
análise e avaliação por parte dos psicólogos jurídicos que atuam com essa temática. Inúmeros
são os casos em que a convivência das mulheres em relações violentas ocorre por muitos anos
até que a denúncia ocorra e o sistema de justiça seja acionado como alternativa de
intervenção e proteção das mulheres.

A violência doméstica contra a mulher em geral, se manifesta de forma rotineira e num


processo de “escalada”, mesclando atos de violência emocional, física e sexual que muitas
vezes só terminam quando da prática do feminicídio. No contexto do Sistema de Justiça, a
violência contra a mulher muitas vezes não consegue alcançar os instrumentos previstos para
denúncia e consequente enfrentamento, haja vista dois movimentos que inviabilizam sua
visibilidade: as inúmeras dificuldades encontradas pelas mulheres para provar a violência
sofrida, assim como a frequente indulgência para com os homens autores de violência. As
consequências da violência sofrida pelas mulheres têm um grande potencial destrutivo, seja
privando-as de sua liberdade de ir e vir, do seu sentimento de segurança, da sua autoconfiança
e autoimagem, da sua capacidade de construir relacionamentos seja nas limitações impostas
ao seu pleno desenvolvimento humano (ALEMANY, 2009).

Na construção do processo de enfrentamento à violência contra a mulher alguns


recursos merecem destaque, a exemplo da Convenção de Belém do Pará, realizada em junho
de 1994 e que valida a Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência
contra a mulher. O texto validado na convenção defende que “a eliminação da violência
contra a mulher é condição indispensável para seu desenvolvimento individual e social e sua
plena e igualitária participação em todas as esferas de vida”. Para conhecer mais sobre as
premissas discutidas e validadas na Convenção acesse o texto na íntegra, disponível como
anexo.
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No contexto dos recursos jurídicos propostos pelo Sistema de Justiça Brasileiro para o
enfrentamento da violência contra a mulher é possível identifica a Lei 11.340/2006, conhecida
como “Lei Maria da Penha”. Tal normativo visa “criar mecanismos para coibir a violência
doméstica e familiar contra a mulher” (BRASIL, 2006). A Lei Maria da Penha, tem ainda por
finalidade tipificar em seu artigo 7º as diferentes formas de violência interpeladas contra as
mulheres:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a


mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como
qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde
corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer
conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da
autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno
desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante
ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação,
isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, violação de sua intimidade,
ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou
qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde
psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual,
entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não
desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da
força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer
modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer
método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à
gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule
o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a
violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de
seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais,
bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os
destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência
moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006).

O diferencial da Lei Maria da Penha frente à proposta de coibição e enfrentamento da


violência contra a mulher reside também nos recursos previstos na Lei para a
operacionalização de ações de proteção e cuidado, tanto para as mulheres que sofrem
violência quanto para com seus filhos. É neste contexto que se identificam as medidas
protetivas de urgência.

Para conhecer um pouco mais sobre as possibilidades de atuação do profissional de


psicologia no acompanhamento e intervenção junto a esta temática acesse a publicação do

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Conselho Federal de Psicologia intitulada “Documento de referência para atuação de
psicólogos(as) em serviços de atenção à mulher em situação de violência” em anexo.

Torna-se relevante ainda a indicação de que A Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006) em
seu Art. 35 prevê a criação e implementação de Centros de reeducação e reabilitação para
agressores, o que permite a interpretação de que ao buscar estratégias e recursos para coibir
e enfrentar a ocorrência de violências contra a mulher, o normativo também está interessado
num recurso que possa intervir junto aos agressores, compreendendo que a problemática
precisa ser enfrentada a partir de todos os envolvidos no conflito e numa perspectiva
relacional.Essa perspectiva fundamenta-se na crença e expectativa de que o trabalho a ser
realizado com os autores de violência não se restringe a uma terapêutica que vise a
recuperação do indivíduo, considerando que a violência não deve ser entendida como um
atributo pessoal, mas sim um fenômeno construído e naturalizado cultural e
psicossocialmente. A proposta da intervenção portanto não deve fundamentar-se enquanto
tratamento, na medida em que não se deve patologizar a violência, sob o risco de limitar a
compreensão sobre tal fenômeno (ANDRADE & BARBOSA , 2008).

MÓDULO IV: A Psicologia Jurídica e o Direito Penal


No módulo IV o desafio está em discutir a interface da Psicologia com o Direito Penal
a partir da reflexão acerca do conceito de crime e de como o mesmo se relaciona com a
Psicologia. O delito ou crime pode ser entendido a partir de diferentes aspectos, a depender
do saber aplicado ao seu estudo e compreensão. Diferentes campos do saber compreendem
o crime a partir de perspectivas distintas. A Filosofia e a Ética analisam a prática de crimes a
partir dos aspectos morais presentes no mesmo; ao mesmo tempo em que a Sociologia avalia
e estuda a dinâmica da conduta desviada a partir das expectativas sociais e do rompimento
com essas. Já a Criminologia, e em especial a Criminologia Crítica, aborda o crime como um
problema social e dinâmico (BARATTA, 2011). Para o Direito o crime deve ser um
comportamento ou ação tipificado em lei enquanto tal e ter prevista uma pena para quando
da sua ocorrência. É preciso então refletir como tal tema é compreendido pela Psicologia e
quais as contribuições que a ciência psicológica tem para com essa discussão.
Considerando a interface do Direito com a Psicologia, De Sá (2010) propõe em sua obra
intitulada “Criminologia Clínica e Psicologia Criminal” que o trabalho do Psicólogo Criminal (ou
Criminólogo Clínico), deve se dar no sistema prisional, visando o entendimento e a
compreensão de indivíduos ou grupos que se envolveram com a delinquência, estudando
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também a instituição prisional e suas especificidades, visando o desenvolvimento de
intervenções que promovam a reintegração social dos presos de forma positiva e saudável.
Diferentes escolas de criminologia apresentam diversa explicações para a
compreensão do fenômeno do crime, possibilitando o entendimento do mesmo a partir de
uma ótica multicausal e complexa. Numa perspectiva da Criminologia Crítica é possível refletir
como a Psicologia pode contribuir com essa leitura das práticas criminosas que busca discutir
como a justiça se aplica a uma estrutura social permeada pela desigualdade. É neste sentido
que se torna relevante o estudo do comportamento criminoso, do sujeito que pratica crimes,
da condição da vítima assim como das estratégias e recursos disponíveis para a integração
social de pessoas em cumprimento de pena e/ou medida de segurança.
A trajetória história das penas enquanto estratégia de punição remonta da vingança
privada fundamentada na Lei de Talião “olho por olho e dente por dente”. A referência da pena
como estratégia de vingança foi sustentada por premissas religiosas até a criação do Estado e
sua institucionalização. A pena passou então a ser utilizada para regular o poder de punir
mediante a quebra das regras sociais (WOLFF, 2005). Sob forte influência do cristianismo a
pena passou a ser entendida como uma possibilidade de reconciliação com Deus na medida
em que se esperava um arrependimento genuíno do sujeito apenado. Foi na experiência da
internação em mosteiros e da reclusão em celas para fins de penitência e oração que surgiu a
configuração da privação de liberdade.
É somente no início do século XIX, com o processo de reforma do Direito Penal, que
teve início o chamado “período humanitário da pena”, sendo o seu principal exponencial
teórico Cesare Beccaria e sua obra “Dos delitos e das penas” (BECCARIA, 2000). Este período
é marcado por um processo gradual de abrandamento do sistema penal, sendo os suplícios
em praça pública substituídos por penas de privação de liberdade e reclusão, mesmo que
ainda por tempo indeterminado. A função da pena deixou então de ser punitiva para assumir
uma perspectiva retributiva, na medida em que o castigo empregado ao indivíduo que pratica
crimes passou a gerar uma expectativa de exemplo, devendo prevenir a ocorrência de novos
delitos.
A obra de Michel Foucault intitulada Vigiar e Punir é um clássico que possibilita a
compreensão do surgimento não apenas das prisões enquanto espaços destinados a guardar
criminosos, mas em especial da reflexão acerca de sua função histórica de controle e
disciplina, representada em estratégias de vigilância individual incessante. Para Foucault
(2001) o poder disciplinar “tem como função maior ‘adestrar’” e “o sucesso do poder
disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico e a sanção

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normalizadora” (p. 143). Foucault justifica a criação da instituição-prisão como uma
aparelhagem destinada a tornar os indivíduos dóceis e úteis, através de um trabalho preciso
sobre seu corpo, com o controle do tempo quando da quantificação da pena (ou perda da sua
liberdade) e com o objetivo maior de transformar os indivíduos (FOUCAULT, 2001, p.196).
Ao psicólogo que atua nos termos do que prevê a Lei de Execução Penal - LEP (Lei 7.210
de 1984) é imperativo uma reflexão de qual a contribuição que a Psicologia tem a oferecer
para tema tão peculiar e complexo. É possível dividir tais desafios em duas principais
perspectivas distintas: a da lógica avaliativa e a do acompanhamento psicológico às pessoas
privadas de liberdade no contexto prisional.
Na perspectiva avaliativa é importante considerar o que a lei prevê como prática
avaliativa no contexto da execução penal. O Art. 5º da LEP prevê que os condenados serão
classificados, segundo seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da
execução penal (BRASIL, 1984). Essa classificação deve então ser feita por Comissão Técnica
de Classificação – CTC, responsável por elaborar o programa individualizador da pena do preso
condenado. Dessa forma, a primeira contribuição que a lei em questão direciona ao
profissional de psicologia é quanto à avaliação da personalidade do sujeito criminoso após sua
condenação, de tal forma que a mesma ofereça subsídios para a forma como sua sentença
será cumprida devendo contemplar os objetivos da execução penal, indicados no Art. 1º da
referida Lei: “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições
para a harmônica integração social do condenado e do internado” (BRASIL, 1984).
De acordo com Carvalho (2010) à equipe que compõem a CTC (inclusive o psicólogo,
conforme Art. 7º da Lei 7.210/1984), compete atuar no local da execução da pena, como
observatório do cotidiano do apenado, não sendo sua função a produção de exames periciais
e pesquisas criminológicas para subsidiar decisões judiciais (p. 142). Caberia assim a esse
profissional a realização de Exame de Personalidade com foco na pessoa do preso, sua história
e realidade psicossocial para além inclusive do crime cometido, haja vista a utilização de tal
recurso avaliativo estar diretamente relacionada ao processo de individualização da pena. Os
resultados desse exame devem então subsidiar os trabalhos da Comissão Técnica de
Classificação - CTC no planejamento e execução de um “projeto terapêutico” individualizado
para cada preso.
À Comissão Técnica de Classificação compete criar estratégias de acompanhamento e
avaliação do programa individualizador da pena e da resposta do preso ao mesmo, reforçando
a premissa de sua atuação no acompanhamento da execução da pena e não na perspectiva
avaliativa do preso (DE SÁ (2010).

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A mudança na Lei de Execução Penal que data de 2003 (Lei 10.792 de 2003) retirou da
Comissão Técnica de Classificação a atribuição de emitir parecer à autoridade competente
sobre as progressões e regressões de regime. Com essa mudança a CTC, e consequentemente
os psicólogos que a compõem, deixaram de contribuir com uma dinâmica prognóstica do
crime, sendo essa uma importante mudança para a prática do psicólogo jurídico que atua no
sistema prisional, em respeito aos fundamentos do Código de Ética Profissional (CFP, 2005),
assim como na defesa dos direitos humanos das pessoas presas.
A Lei de Execução Penal, no entanto, prevê no Art. 98 que na falta do estabelecimento
penal do tipo Centro de Observação, as avaliações deverão ser feitas pela CTC (BRASIL, 1984).
Esta previsão é fonte de intensa polêmica entre os profissionais de psicologia que atuam no
sistema prisional, haja vista a incompatibilidade das ações de avaliação/perícia e de
acompanhamento psicológico, recorrente também no contexto prisional de atuação.
Cumpre refletir no quanto a prática da avaliação psicológica aplicada ao contexto
prisional é complexa. Inicialmente é fundamental que tais atividades encontrem respaldo nas
orientações técnicas e científicas que regem as atividades de avaliação psicológica como um
todo, preservando as orientações configuradas no âmbito do Sistema de Avaliação de Testes
Psicológicos (CFP, 2018), assim como as premissas definidas no Código de Ética do Profissional
Psicólogo (CFP, 2005).
A lei prevê diferentes tipos de estabelecimentos prisionais ao considerar o perfil do
preso, o tipo de regime no qual a pena definida em sentença será cumprida e as possibilidades
de assistência que o Estado poderá oferecer. Os tipos de estabelecimentos penais são: Cadeia
Pública – destinada à custódia de presos provisórios; Penitenciária – destinada ao
cumprimento das penas privativas de liberdade em regime fechado; Colônia Agrícola –
destinada ao cumprimento de pena em regime semi aberto; Casa do Albergado – destinada
ao cumprimento de pena em regime aberto; Centro de Observação – destinado ao processo
avaliativo de realização dos exames criminológicos e triagem em geral e o Hospital de Custódia
e Tratamento Psiquiátrico destinado à custódia das pessoas internadas em medida de
segurança.
É neste contexto que os Art. 10 e 11 da LEP definem a previsão das assistências ao
preso, internado e egresso do sistema prisional:
Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do
Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à
convivência em sociedade.
Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.
Art. 11. A assistência será: I - material; II - à saúde; III -jurídica;
IV - educacional; V - social; VI - religiosa. (BRASIL, 1984).

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Numa perspectiva de transição de uma prática exclusivamente avaliativa para o
atendimento de uma lógica mais assistencial, tem-se a proposição do acompanhamento
psicológico (ou psicossocial) das pessoas privadas de liberdade durante o processo de
execução da pena. Tal prática é habitualmente entendida como afeta à chamada Psicologia
Penitenciária e destaca a relevância da desmistificação da visão de que a prática psicológica
aplicada ao contexto prisional de atuação é de natureza estritamente pericial (FRANÇA, 2004).
Para isso torna-se necessária uma mudança paradigmática que possibilite compreender o
“campo social” no qual os sujeitos que vivenciam o conflito se constituem; entender como as
transformações no campo social atingem a constituição da subjetividade dos sujeitos
envolvidos no conflito e com isso possibilitar a construção de um outro olhar, uma outra
escuta para o indivíduo que praticou crime e para o conflito e a realidade social em análise.

Nesse contexto de mudança paradigmática é relevante apresentar a proposta da


Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema
Prisional – PNAISP (BRASIL, 2014). A discussão dessa proposta tem sua origem no ano de 2003
com a implementação do Plano Nacional de Saúde no Sistema Prisional, o qual previa a
garantia de acesso das pessoas presas às ações e serviços de atenção básica à saúde com a
implementação de unidades básicas de saúde nos estabelecimentos prisionais. O Plano previa
ainda a composição de equipes de saúde específicas para o sistema prisional e atuando in loco,
as quais contavam, obrigatoriamente, com a participação do profissional de psicologia, dentre
outros, caracterizando-se como uma equipe de atuação interdisciplinar.

A reformulação da proposta e consequente promulgação da Política no ano de 2014


reforça a proposta de que quando da implementação dos serviços de atenção básica nos
estabelecimentos prisionais, os mesmos devem contar, obrigatoriamente com a atuação de
equipes interdisciplinares denominadas de Equipes de Saúde no Sistema Prisional - ESP (Art.
9º, BRASIL, 2014). Sendo assim, torna-se relevante destacar ao profissional de psicologia que
compõe tais equipes que sua prática deve primar pelo fomento e fortalecimento de políticas
públicas no campo criminal que objetivem o acompanhamento da pessoa presa, a retomada
dos laços sociais por meio de instituições comprometidas com a promoção da saúde e bem-
estar, que lhe proporcionem o acesso ao suporte necessário e ao processo de
acompanhamento psicossocial, assegurando o acesso à atenção integral à saúde.

Outra ação que merece destaque na discussão da prática psicológica aplicada ao


contexto da execução penal remete às intervenções que visam o processo de reintegração
social do preso e do egresso do sistema prisional. Importante nesse momento considerar a

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proposta apresentada por De Sá (2010) de que as estratégias de reintegração social devem
contar com a participação de técnicos, dentre eles os psicólogos, mas não devem se pautar
pelo tipo de crime ou de pena imputada ao preso. São as dinâmicas relacionais do sujeito
encarcerado com o contexto social do qual faz parte que devem compor as estratégias de
reintegração social traçadas. Isso implica entender que os conflitos presentes na relação do
sujeito com seu contexto social representam as contradições e desafios dessa convivência,
sendo que qualquer mudança nessa relação é de corresponsabilidade de todos os que dela
participam, e não apenas daquele que cometeu o delito. Considerando serem todos
corresponsáveis não devem ser estabelecidas relações assimétricas, sendo que ninguém deve
ser reconhecido como tendo poder sobre o outro, sendo a coerência e transparência das
relações o principal recurso para a chamada reintegração social (DE SÁ, 2010).

Em linhas gerais, a atuação do profissional de Psicologia Jurídica no cenário dos


estudos sobre o comportamento criminoso gera muitos questionamentos e curiosidades
acerca da relação possível de ser estabelecida ente o comportamento considerado anormal
ou desviante e a prática de crimes. O primeiro estereótipo a ser desconstruído remete à ideia
de causalidade que associa de forma linear a prática de crime com a presença de algum
transtorno psíquico.

No cenário legal, o recurso que possibilita uma análise cuidadosa da relação


identificada entre a presença de transtornos mentais e a prática de crimes é a medida de
segurança, entendida a partir do reconhecimento da inimputabilidade penal definida no Art.
26 do Código Penal Brasileiro que estabelece: ser “isento de pena o agente que, por doença
mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da
omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento” (BRASIL, 1940).

É necessário esclarecer que o portador de transtorno mental considerado incapaz


quando da prática de um crime não sofrerá sanção penal do tipo pena. Sendo tal sujeito
absolvido criminalmente e na sequência submetido, compulsoriamente e por determinação
em sentença, a uma medida de segurança. Tal medida poderá ser configurada como do tipo:
ambulatorial ou de internação (cumprida em estabelecimento penal do tipo Hospital de
Custódia e Tratamento Psiquiátrico). Tal definição irá depender do potencial ofensivo do crime
praticado e das condições clínicas e sociais do sujeito em questão, avaliadas pelo juiz quando
da sentença, mediante respaldo de laudo pericial. A premissa básica que fundamenta o
recurso jurídico da medida de segurança é a de que os doentes (mentais) devem ser tratados

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e os criminosos devem ser punidos. Sendo assim, a medida de segurança não visa atribuir
culpa ao doente mental infrator da lei, mas sim impedir um novo perigo social. É percebida
como uma medida de prevenção, de tratamento e de assistência social relativa ao estado
perigoso dos inimputáveis.

A medida de segurança é aplicada pelo juiz nos casos em que, mediante prévia
realização de exame de sanidade mental realizado por perito médico psiquiatra, sejam
identificados indícios diagnósticos de transtorno mental que caracterizem o sujeito como
alguém perigoso e que, portanto, oferece risco quando do convívio social. Sendo assim, o
elemento decisivo para a indicação ou não da aplicação do recurso da medida de segurança é
o grau de periculosidade identificado no portador de transtorno mental que cometeu o crime.
Segundo Daufemback (2012), “o conceito de periculosidade está reservado apenas às pessoas
que infringiram a lei e foram consideradas doentes mentais, elas não são responsáveis pelos
seus atos, mas são socialmente perigosas” (p. 58).

A aplicação da medida de segurança diferente do recurso da pena, não tem uma


definição prévia de tempo máximo, sendo registrado apenas que o prazo mínimo de aplicação,
que deve ser de um (01) a três (03) anos, quando o paciente deverá então ser submetido a
uma nova avaliação psiquiátrica. Caso seja identificado, mediante a realização de perícia do
tipo exame de cessação de periculosidade, que o paciente não oferece mais risco quando da
convivência social, o paciente terá sua desinternação autorizada pelo juiz. A ausência de limite
máximo de duração condiciona a extinção da medida à cessação do estado de periculosidade
do indivíduo; sendo que a medida de segurança transcorre por período indeterminado,
independente da remissão dos sintomas decorrentes do transtorno mental.

O que se observa é que a Lei de Execução Penal substituiu a nomenclatura de


manicômio judiciário por Hospital de Custodia e Tratamento Psiquiátrico – HCTP, sem
necessariamente romper com o modelo asilar de tratamento ofertado aos pacientes ali
internados (BRASIL, 1984). A partir dos últimos estudos realizados acerca da estrutura e
funcionamento dos HCTPs é possível observar em seus resultados o caráter asilar de
funcionamento, caracterizado pela sistemática ausência de recursos e de metodologia
interdisciplinar, precariedade na composição da equipe, condições problemáticas de
infraestrutura e falta de articulação com programas de rede social, o que acaba por
comprometer qualquer estratégia de desinternação e/ou desinstitucionalização de tais
pacientes (DAUFEMBACK, 2012, p. 66).

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Ainda no âmbito das reflexões sobre a psicopatologia forense torna-se relevante a
discussão acerca do diagnóstico do Transtorno de Personalidade Anti Social, comumente
denominado de Psicopatia. Historicamente é possível atribuir as primeiras descobertas e
incursões sobre essa possibilidade diagnóstica, mesmo que ainda de forma incipiente, ao
médico Philippe Pinel e sua hipótese diagnóstica acerca da existência de uma “mania sem
delírio”. Para Pinel era possível identificar, dentre as diferentes manifestações de loucura
(entendida como uma desrazão) sintomas de uma mania em que a razão era preservada,
sendo o comprometimento observado quando das expressões afetivas por tais indivíduos. Um
teórico de relevância exponencial para o desenvolvimento científico de um conceito de
“homem delinquente” foi Cesare Lombroso. Sua obra, sustentada no estudo da anatomia
cerebral de vários criminosos buscava identificar uma relação causal entre aspectos
fisioanatômicos de tais indivíduos e o crime praticado pelos mesmos numa lógica determinista
de uma causalidade nata.

A primeira vez, no entanto, que o termo psicopatia foi utilizado, foi na obra do médico
Kraepelin ao referenciar o termo personalidades psicopáticas para indicar uma forma de estar
no mundo e não uma condição de adoecimento; sendo tais indivíduos considerados
deficientes quanto à afetividade e a volição. É na obra de Hervey Cleckley intitulada “A
máscara da sanidade” que os transtornos psicopáticos da personalidade passaram a ser
entendidos como um quadro de insanidade sem a presença dos sintomas típicos das psicoses
(PERES, 2008). Foi Clekley o responsável pela identificação de uma listagem de critérios
amplamente utilizada para o diagnóstico até então de psicopatia.

Segundo Abdalla-Filho, Chalub & Telles (2016) em contextos forenses os traços da


personalidade identificada como “psicopática” em geral são averiguados e medidos a partir
do uso do instrumento intitulado “Psychopathy Checklist – Revised (PCL-R)” de autoria de
Robert Hare. Este instrumento caracteriza-se como uma escala psicométrica composta por 20
itens responsáveis pela avaliação de 04 faces que explicam os aspectos: interpessoal, afetivo,
estilo de vida e antissocial dos indivíduos que cometeram crimes. Existem ainda outros
instrumentos para avaliação da chamada “psicopatia” mas ainda não validados para uso e
aplicação na população brasileira, a exemplo do Inventário de Personalidade Psicopática (IPP).

Dentre alguns dos fatores elencados na PCL-R proposta por Hare para caracterizar
indivíduos psicopatas, é possível identificar os seguintes:

- Problemas de conduta na infância;


- Impulsividade e ausência de autocontrole;
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- Encanto superficial, notável inteligência;
- Egocentrismo patológico, auto valorização e arrogância;
- Grande pobreza de reações afetivas básicas;
- Falta de sentimentos de culpa e de vergonha;
- Manipulação do outro com recursos enganosos;
- Mentiras e insinceridades;
- Conduta antissocial sem aparente arrependimento;
- Falta de capacidade para aprender com a experiência da vida, dentre outras.
No Brasil, a Escala PCL-R foi validada para aplicação nos processos de avaliação
psicológica forense pela médica psiquiatra Hilda Morana. A aplicação da escala contempla a
realização de uma entrevista semi estruturada na qual são coletadas importantes informações
sobre diversas áreas da vida do indivíduo possibilitando além da produção de um histórico
detalhado da sua trajetória de vida, a configuração de um padrão interpessoal de
funcionamento de suas relações. Outras fontes de informações relevantes poderão ser
utilizadas quando da coleta de dados que auxiliam na avaliação geral do indivíduo e de sua
conduta criminosa, a exemplo de registros criminais e do processo penal como um todo.
Torna-se relevante no entanto a discussão crítica e atual acerca da aplicação, ou não,
do termo psicopatia para fins diagnósticos. Tal nomenclatura não pertence mais à classificação
nosológica atual na medida em que não está registrada como entidade diagnóstica nem na
CID-10 e nem no DSM – 5. Na trajetória histórica de registros e classificações nosológicas é
possível identificar o uso de tal nomenclatura nas edições do DSM III e DSM III-R, ainda na
década de 80. O termo técnico empregado atualmente no entanto é o de Transtorno de
Personalidade Antissocial – TPAS, sendo classificado no DSM – 5 como um dos 10 tipos
possíveis de transtorno de personalidade (ABDALLA-FILHO, CHALUB & TELLES, 2016).

É fundamental ao profissional de psicologia jurídica que atua na produção de


avaliações psicológicas de indivíduos criminosos o entendimento de que a presença de TPAS
como hipótese diagnóstica não é suficiente para um prognóstico criminal, considerando que
segundo Kaplan & Sadock (2009) “o transtorno da personalidade anti-social é caracterizado
por atos anti-sociais e criminosos contínuos, mas não é sinônimo de criminalidade. Em vez
disso, trata-se de uma incapacidade em conformar-se às normas sociais que envolvem muitos
aspectos do desenvolvimento adolescente e adulto do paciente”.

O transtorno de personalidade em geral, quando do processo de avaliação psicológica,


deve ser entendido como diferenciado das doenças mentais, haja vista o caráter duradouro

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das manifestações clínicas e comportamentais constantes e por representarem extremos de
uma variação da personalidade que provoca desajuste do indivíduo em relação ao meio em
que ele está inserido, provocando um comprometimento do funcionamento do indivíduo nos
mais diversos contextos de vida, em especial o interpessoal e o social. Em geral, as
características que configuram esse quadro surgem no final da infância, início da adolescência,
persistindo durante a fase adulta (ABDALLA-FILHO, CHALUB & TELLES, 2016).

MÓDULO V: Desafios contemporâneos em Psicologia Jurídica:


A proposta do Módulo final do curso de Psicologia Jurídica é apresentar temáticas que
se caracterizam como desafios contemporâneos ao profissional de Psicologia que atua na
interface com as demandas do Direito. Dentre tais temas é possível identificar a discussão das
alternativas penais enquanto estratégias de transformação e enfrentamento à inoperância do
modelo penal atual, caracterizado por sucessivas condições de violação de direitos.
Muito se questiona sobre a eficácia do modelo prisional atual, tanto no que tange ao
efeito preventivo da ocorrência de novos crimes, quanto na reintegração daqueles que
experimentam a condição punitiva da privação de liberdade. É fato que a população prisional
no Brasil cresce num ritmo acelerado, revelando que as condições de superlotação e os dados
crescentes de encarceramento não contribuem para a reversão deste cenário negativo quanto
à ineficácia do modelo prisional atual (BRASIL, 2016).
Os dados registrados pelo Sistema de Informações Penitenciárias – InfoPen acerca do
perfil da população prisional no Brasil denunciam uma tendência do sistema penal à
seletividade, registrando dentre a população prisional altos quantitativos de jovens, do sexo
masculino, negros, com baixa escolaridade e sem qualificação profissional; presos em sua
maioria pela prática de crimes contra o patrimônio e/ou tráfico de drogas (BRASIL, 2016).
É no contexto crítico da ineficácia e da seletividade excludente do modelo prisional
que prima pelo encarceramento, que a discussão das medidas alternativas à prisão surge,
como uma nova forma de pensar e atuar numa antiga problemática. Essa possibilidade
inovadora reconhece a necessidade de configuração e implementação de novas estratégias
de enfrentamento à complexidade que caracteriza a prática de crimes. Nesse contexto crítico
de avaliação do sistema penal, as medidas alternativas à prisão surgem como estratégias de
modificação do sistema penal, considerando para tanto os efeitos maléficos do cárcere e a
concepção do Direito Penal Mínimo, que estabelece o uso da pena privativa de liberdade
apenas nos casos extremos, em que seja justificado o afastamento do indivíduo do convívio
social.
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É a partir do normativo conhecido como “Regras de Tóquio” que a Organização das
Nações Unidas propõe regras mínimas para a elaboração de medidas não privativas de
liberdade. Tais regras visam assegurar garantias mínimas aos indivíduos submetidos às
medidas alternativas ao aprisionamento, com vistas a promover e fomentar a participação da
coletividade no processo da Justiça Criminal, reforçando junto aos indivíduos que praticaram
crimes o sentido de responsabilidade para com a sociedade (ONU, 1990). Em linhas gerais, o
documento fundamenta-se na premissa de que as penas substitutivas à prisão podem
constituir um meio eficaz de tratar os “criminosos” no contexto social, sendo essa estratégia
de interesse do indivíduo e também da sociedade.
Alguns dos objetivos fundamentais das Regras de Tóquio (ONU, 1990) podem ser
reconhecidos quando do encorajamento da sociedade para que participe de forma mais ativa
do “tratamento dispensado ao indivíduo criminoso”, possibilitando a esse indivíduo o
desenvolvimento de maior consciência e responsabilização pelas consequências de sua
conduta criminosa. Pretende-se com isso possibilitar um equilíbrio maior entre os direitos do
criminoso, os direitos das vítimas, e as preocupações da sociedade quanto à manutenção da
segurança pública e a necessidade de ações de prevenção ao crime.
Para a efetivação de tais objetivos algumas medidas alternativas à pena de prisão são
sugeridas, e podem ser assim apresentadas:
1. Sanções verbais, proferidas pela autoridade jurídica;
2. Preservação da liberdade durante o processo penal, ou seja, antes da decisão
do tribunal;
3. Pagamento de multas, em valores proporcionais aos danos causados e/ou
compatíveis com a realidade econômica dos infratores; em favor da vítima ou
instituição designada pelo juiz;
4. Perda de bens e valores, como forma compensatória pelo delito praticado;
5. Reparação/Indenização à vítima, mediante pagamento de serviços e/ou
tratamentos decorrentes do crime praticado;
6. Penas restritivas de direitos, como a limitação em realizar determinadas
atividades e/ou frequentar determinados lugares definidos em audiência;
7. Prestação de serviços à comunidade, em instituições parceiras e de fins sociais;
conforme determinação judicial, sendo necessário o devido monitoramento e
acompanhamento do poder judiciário;
8. Outros tipos de tratamento em meio aberto, a exemplo de tratamento
especializado para dependência química.

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No Brasil a referência das alternativas penais à prisão está prevista no ordenamento
jurídico desde a década de 90 com a edição da Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995 (BRASIL,
1995). Essa legislação prima pela celeridade dos processos judicias de menor complexidade
(no contexto cível) e infrações penais de menor potencial ofensivo (no contexto criminal).
Fomenta assim a possibilidade de mediação e resolução consensual e pacífica dos conflitos
em análise. As contravenções penais ou crimes respaldados nesta legislação são aqueles em
que a pena máxima prevista não ultrapasse 02 (dois) anos.

Ainda no cenário da discussão sobre práticas contemporâneas que visam ampliar as


contribuições da Psicologia para o Sistema de Justiça, é possível identificar as estratégias de
Mediação de conflitos. No contexto jurídico brasileiro, assim como em outras partes do
mundo, a prática da mediação de conflitos tem sido um recurso muito útil no que tange ao
desenvolvimento de estratégias técnicas e interventivas que possibilitem, por exemplo, ao
casal em litígio desenvolver competências para gerar a própria solução do conflito (BRANDÃO,
2010).

A mediação pode ser entendida como uma forma amigável e pacífica de tentativa de
solução de conflitos, na qual as próprias pessoas envolvidas podem construir a solução do
problema através do diálogo, com ajuda de uma terceira pessoa imparcial – o mediador – que
facilita a comunicação entre eles. Trata-se assim de uma alternativa consensual, dinâmica e
mais célere de promoção da pacificação social almejada no cenário jurídico e legal.

Os meios alternativos de resolução de conflitos (negociação, conciliação, mediação e


arbitragem) são instrumentos de maior eficiência e pacificação social. A mediação e a
negociação de conflitos aparecem como meios dialogados e cooperativos de solução de
questões individuais ou coletivas, apresentando-se como possibilidades para resoluções mais
eficazes, inclusivas e pacíficas. Tais métodos estimulam o diálogo entre as partes, o que
possibilita a restauração e manutenção dos vínculos preexistentes, na medida em que os
envolvidos se dispõem a resolver conflitos e, também, a restaurar a relação social entre as
pessoas em conflito.

A mediação, pode ser então compreendida como uma ação promotora de


possibilidades de restabelecimento de relacionamentos entre as partes, fazendo com que elas
entendam a origem do conflito e, assim, possam resolvê-lo de maneira autônoma. Tal prática
estrutura-se na busca pelo diálogo, respeito, igualdade e solidariedade à dignificação do ser
humano. É entendida como uma forma consensual de resolução de conflitos, de reconstrução

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do diálogo e da escuta entre as pessoas em litígio, por meio de um terceiro que atua como
facilitador da reaproximação das partes.

Este recurso tem uma forte aplicabilidade no cenário dos conflitos familiares, em
especial em situações de litígio que envolvem a necessidade de reorganização da dinâmica
familiar em função da manutenção de vínculos, considerando a existência de filhos menores
ou a aplicação da proposta de guarda compartilhada.

Ainda no cenário de estratégias que visam a pacificação social e a prevenção da


violência, identifica-se o recurso da chamada Justiça Restaurativa, respaldada pela Resolução
nº 12/2002 editada pela Organização das Nações Unidas (ONU, 2002).

Esta é uma abordagem que oferece aos ofensores, vítimas e comunidade um caminho
alternativo para a justiça; promovendo a participação segura das vítimas na resolução da
situação e oferecendo às pessoas que assumem a responsabilidade pelos danos causados por
suas ações uma oportunidade de se reabilitarem perante aqueles a quem prejudicaram. Sua
fundamentação é o reconhecimento de que o comportamento criminoso não apenas viola a
lei, mas também prejudica as vítimas e a comunidade e por isso as pessoas envolvidas ou
afetadas pelo crime devem ter participação ativa na reparação do dano, amenizando o
sofrimento que o crime causou e, sempre que possível, tomando providências para prevenir
a recorrência do dano.

Em linhas gerais, os principais objetivos da Justiça Restaurativa são: promover a


tolerância e a inclusão, possibilitar o acesso à verdade, encorajar a expressão pacífica e a
resolução de conflitos, construir o respeito pela diversidade e promover práticas comunitárias
responsáveis (ZEHR, 2008).

Os processos estruturados a partir da proposta de Justiça Restaurativa podem ser


adaptados a vários contextos culturais e às diversas necessidades de diferentes comunidades,
tendo um amplo alcance e aplicabilidade. Tais processos são adaptados principalmente a
situações em que a participação é voluntária e cada parte tem a oportunidade de, com
segurança, ter um diálogo facilitado com o objetivo de se chegar a um entendimento e acordo
comuns.

A abordagem da Justiça Restaurativa valoriza que as vítimas participem ativamente e


sejam com isso tratadas de forma justa e respeitosa quando da busca por reparação e
indenização. Ao participar do processo, as pessoas que são tidas como vítimas têm assegurado

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um espaço de fala para expressar o que seria um resultado aceitável para o processo, e com
isso podem tomar as medidas necessárias e possíveis para o seu encerramento, seja este de
natureza objetiva ou subjetiva.

É neste contexto de preocupação com as condições das pessoas que sofrem os


conflitos no âmbito jurídico na condição de vítimas que se torna relevante as reflexões afetas
ao campo de estudos da chamada Vitimologia.

A partir do texto da Declaração dos Princípios Básicos de Justiça relativos às Vítimas da


Criminalidade e de Abuso de Poder de 1985 (ONU, 1985), é possível conceituar as vítimas
como “as pessoas que, individual ou coletivamente, tenham sofrido um prejuízo,
nomeadamente um atentado à sua integridade física e um sofrimento de ordem moral, uma
perda material, ou um grave atentado aos seus direitos fundamentais como consequência de
atos ou omissões violadores das leis em vigor num Estado-membro, incluindo as que proíbem
o abuso de poder”. Também se inclui na definição de “vítima”, quando apropriado, a família
próxima ou as pessoas a cargo da vítima e as pessoas que tenham sofrido um prejuízo ao
intervirem para prestar assistência às vítimas em situação de carência ou para impedir a sua
vitimização.

Um dos principais objetivos de estudo da Vitimologia é o de garantir o reconhecimento


universal e eficaz dos direitos das vítimas, sem qualquer referência de culpabilização das
mesmas, visando sua condição de autonomia e não vitimização. Dentre tais direitos é possível
destacar: o acesso à justiça e tratamento equitativo; a obrigação do autor do crime quanto à
restituição e reparo do dano causado; a previsão de indenizações sempre que possível e
necessário; a previsão de acesso à assistência material, médica, psicológica e social de que as
vítimas necessitam.

A proposta de todas as temáticas apresentadas e suas respectivas provocações e


polêmicas no decorrer deste curso é a de possibilitar e fomentar reflexões críticas e éticas no
que tange as diversas interfaces entre a prática psicológica e o mundo do Direito. Enquanto
profissional de Psicologia Jurídica é imprescindível o desenvolvimento constante de
habilidades, técnicas e pessoais, que proporcionem maior qualidade de escuta, acolhimento,
reflexão crítica e parcimônia quando do exercício prático de avaliações, orientações e/ou
intervenções no contexto jurídico do Sistema de Justiça.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Dicionário crítico do feminismo. São Paulo: Editora UNESP, 2009, p. 271-276.

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