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T - II/2023

DIREITO CONSTITUCIONAL
UNIDADE 1 AULA 1...........................................................................................................................................5
Já na Idade Média, a Magna Carta de 1215 representa o grande marco do constitucionalismo medieval,
estabelecendo, mesmo que apenas formalmente, a proteção a importantes direitos individuais dos cidadãos
perante o rei.....................................................................................................................................................5
1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL.........................................................................................................................5
De um modo bastante simplista, podemos conceituar Estado como a organização de uma sociedade sobre
um território determinado, dotada de soberania. Nessa definição estão os elementos tradicionalmente
descritos como necessários à existência de um Estado: soberania, povo e território......................................5
1.1.1 Constitucionalismo....................................................................................................................................... 5
Constitucionalismo é o movimento do século XVII na Inglaterra e do século XVIII nos Estados Unidos e na
França que teve como objetivo a limitação do poder, através de uma nova organização do Estado e o
estabelecimento de direitos e garantias fundamentais....................................................................................5
Neste mesmo sentido, afirma Canotilho (2003) que o constitucionalismo é: "(...) o movimento político, social
e cultural que, sobretudo a partir de meados do século XVIII, questiona nos planos político, filosófico e
jurídico os esquemas tradicionais de domínio político, sugerindo, ao mesmo tempo, a invenção de uma
forma de ordenação e fundamentação do poder político".............................................................................5
O constitucionalismo inglês tem origem na Revolução Gloriosa (1688 - 1689). Esta revolução trouxe algo sem
precedentes na História Inglesa, a concepção da supremacia do parlamento.................................................6
O Bill of Rights é o primeiro documento oficial que garante a participação popular, por meio de
representantes parlamentares, na criação e cobrança de tributos, sob pena de ilegalidade e veda, ainda, a
instituição de impostos excessivos, nem tampouco punições cruéis e incomuns............................................6
Diferentemente, o constitucionalismo norte-americano e francês é fruto das revoluções burguesas do século
XVIII (Revolução Americana e Revolução Francesa)..........................................................................................7
A esmagadora maioria dos países do mundo, incluindo o Brasil, adotaram o modelo francês/norteamericano
de Constituições formais e escritas ………………………………………………………………………………………………………………………..7
Assim, podemos estabelecer um conceito de Constituição a partir do século XVIII na maioria dos países do
mundo, qual seja: "é a ordenação sistemática e racional da comunidade política explicitada em um
documento escrito que organiza o Estado e estabelece direitos fundamentais".............................................7
1.1.2 Neoconstitucionalismo................................................................................................................................. 8
O Neoconstitucionalismo é o movimento da segunda metade do século XX (pós-guerra) que tem como
objetivo desenvolver um novo modo de compreender, interpretar e aplicar o Direito Constitucional e as
Constituições advindas do mesmo...................................................................................................................8
Teremos três grandes marcos fundamentais do neoconstitucionalismo..........................................................8
- Filosófico: pós-positivismo..............................................................................................................................8
- Teórico: conjunto de teorias que vão explicitar a força normativa da Constituição, expansão da jurisdição
constitucional, e nova dogmática da interpretação constitucional...................................................................8
As seis (6) principais características do neoconstitucionalismo são.................................................................9
- Constitucionalização do Direito e a Constituição como centro do ordenamento jurídico..............................9
- Força Normativa da Constituição - Busca pela concretização dos direitos fundamentais, tendo como
fundamento a dignidade da pessoa humana. Se o constitucionalismo estabeleceu direitos e garantias
fundamentais, o neoconstitucionalismo trabalha na concretização destes direitos....................................... 9
- Judicialização da Política e das relações sociais. Com o neoconstitucionalismo tudo se judicializa. Tudo
deságua no Poder Judiciário. No Brasil e no mundo diversas situações têm chegado ao Poder Judiciário para
que este decida.................................................................................................................................................9
- Desenvolvimento de novas Teoria da Norma, Teoria das Fontes e Teoria da Interpretação.........................9
Hoje em dia se considera que as normas constitucionais se dividem em duas espécies: princípios e
regras...................................................................................................................................................................... 9
Já na Teoria das Fontes, nasce a ideia de que o direito não nasce apenas do legislador.................................10
Já falamos que o Poder Judiciário passa a ser protagonista nas ações governamentais e criador do
Direito..................................................................................................................................................................... 10
1.1.3 Transconstitucionalismo................................................................................................................................ 10
É o entrelaçamento de ordens jurídicas diversas (estatal, internacional, transnacional, supranacional), em
virtude do enfrentamento dos mesmos problemas constitucionais................................................................10
1.1.4 Sentidos de Constituição.........................................................................................................................10
Temos quatro grandes sentidos de Constituição. Sociológico, Político, Jurídico e Cultural..............................10
- Sociológico: formulada em 1863 por Ferdinand Lassalle. Ele define a Constituição como sendo os fatores
reais de poder (econômicos, militares, religiosos) que regem a sociedade.....................................................10
A Constituição, segundo a conceituação de Lassale, seria, então, a somatória dos fatores reais do poder
dentro de uma sociedade.................................................................................................................................11
- Político: surge em 1920 por Carl Schmitt. para ele, a Constituição pode ser definida como as decisões
políticas fundamentais do povo (Poder Constituinte).......................................................................................11
- Jurídico: formulada também no século XX. Temos dois autores como expoentes desta teoria: Hans Kelsen
com seu livro "Teoria Pura do Direito" de 1961 (segunda edição, primeira edição em 1934) e Konrad Hesse
com sua obra "Força Normativa da Constituição" de 1959..............................................................................11
- Cultural: também do século XX, do autor Peter Haberle. Para ele, a Constituição deveria ser entendida
como um produto da cultura. Ela é o retrato de um povo em um determinado momento............................11

UNIDADE 1 AULA 2...........................................................................................................................................14


1.1.5 Classificações das Constituições.............................................................................................................14
1.1.5.1 Quanto ao Conteúdo............................................................................................................................14
Quanto ao conteúdo, toda Constituição será classificada em: Formal e Material............................................14
- Formal: é aquela formalizada em um documento dotado de supremacia em relação às outras normas do
ordenamento jurídico.......................................................................................................................................14
Resumo da Pirâmide de Kelsen.........................................................................................................................15
Mas, como nós modificamos uma Constituição Formal?.................................................................................15
A única forma de se alterar uma Constituição Formal é mediante procedimentos especiais que ela mesma
determinar.............................................................................................................................................................. 15
Procedimento de Emenda Constitucional.......................................................................................................15
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir...............................................16
- Material: é um conjunto de normas escritas, ou não, dentro da Constituição Formal e que dizem respeito
às matérias tipicamente constitutivas do Estado e da sociedade (matérias mais
importantes)............................................................................................................................................................ 16
Não, é possível ter Constituição Material fora da Constituição Formal............................................................16
Dentro da Constituição Formal só existem normas materialmente constitucionais? No caso da Constituição
brasileira, não...................................................................................................................................................16
1.1.5.2 Quanto à Estabilidade..........................................................................................................................17
- Rígida: é aquela que requer procedimentos especiais para sua modificação. Pelo que já vimos no item
anterior, Constituição de 1988..........................................................................................................................17
- Flexível: é aquela que NÃO determina em seu texto nenhum requisito para a sua alteração, não possuindo,
assim, grau de dificuldade para a sua modificação que se dará da mesma maneira que as leis
comuns................................................................................................................................................................... 17
- Semirrígida ou semiflexível: é a Constituição que possui uma parte rígida, que necessita de procedimentos
especiais para ser modificada, e uma parte flexível, que não precisa de procedimentos especiais para ser
modificada.............................................................................................................................................................. 17
1.1.5.3 Quanto à Forma....................................................................................................................................17
- Escrita: é aquela escrita e sistematizada em um documento, elaborada em um procedimento único por um
Poder Constituinte. Este é o caso da nossa Constituição de 1988.- Não escrita: é aquela elaborada de forma
esparsa no decorrer do tempo, fruto de um processo de construção
histórico………………………………………..17/18
1.1.5.4 Quanto ao Modo de Elaboração..........................................................................................................18
- Dogmática: equivale à escrita quanto à forma. Tudo falado acima para a Constituição Escrita vale aqui
também. Ela é chamada de dogmática porque traz os dogmas de um país em um determinado
momento................................................................................................................................................................ 18
- Histórica: equivale à não escrita quanto à forma. Tudo falado acima para a Constituição Não Escrita vale
aqui também. É aquela elaborada de forma esparsa ao longo do tempo, fruto de um processo de construção
histórico.................................................................................................................................................................. 18
1.1.5.5 Quanto à Origem..................................................................................................................................18
- Promulgada: é aquela elaborada com a participação popular, ainda que por meio de representantes.
É sinônimo de Constituição Democrática. Ela tem legitimidade popular. É o caso da Constituição brasileira de
1988. Além delas, tivemos as Constituições brasileiras de 1891, 1934 e 1946, todas
promulgadas........................................................................................................................................................... 19
- Outorgada: é aquela elaborada sem a participação popular. É sinônimo de Constituição Autocrática.
Não tem legitimidade popular..........................................................................................................................19
Constituição Autocrática. Não tem legitimidade popular.................................................................................19
No Brasil, também já tivemos algumas Constituições impostas: 1824, 1937, 1967 e 1969.............................19
- Cesarista ou bonapartistas: é aquela elaborada sem a participação popular, mas após sua produção o povo
é chamado a referendar ou não o documento. Trata-se de uma consulta plebiscitária via
referendo................................................................................................................................................................. 19
1.1.5.6 Quanto à Extensão...............................................................................................................................19
- Sintética: é uma Constituição resumida, sucinta e que só apresenta matérias constitucionais em seu texto
(organização do Estado e direitos e garantias fundamentais)...........................................................................19
- Analítica: é aquela Constituição prolixa e de cunho detalhista e que não apresenta apenas matérias
constitucionais em seu texto. É o caso da nossa Constituição de 1988............................................................20
1.1.5.7 Quanto à Finalidade.............................................................................................................................20
- Garantia: é aquela que se volta para o passado. São tipicas dos Estados Liberais dos séculos XVIII e XIX. São
Constituições abstencionistas ou negativas, ou seja, que não intervêm no Estado e na
sociedade............................................................................................................................................................... 20
- Balanço: é aquela que se volta para o presente. São tipicas dos Estados Socialistas do século XX.
São Constituições de cunho marxista...............................................................................................................20
- Dirigente: é aquela que se volta para o futuro. São tipicas dos Estados Sociais do século XX, fruto do
constitucionalismo social e do Welfare State ou Estado de bem-estar social...................................................20
Dirigismo constitucional. São comuns em seus textos as normas programáticas. A nossa Constituição de
1988 se enquadra neste caso..........................................................................................................................20
1.1.5.8 Ontológica - Karl Loewenstein. Assim, a classificação ontológico é aquela que visa fazer uma análise
da relação do texto da Constituição com a realidade social vivenciada pelo texto..........................................21
- Normativa: é aquela em que há uma adequação entre o texto e a realidade social.....................................21
- Nominal: é aquela em que NÃO há uma adequação entre o texto e a realidade social. É o caso da
Constituição brasileira de 1988.........................................................................................................................21
- Semântica: é aquela que trai o significado do termo Constituição. Porque ao invés de limitar o poder, ela
legitima o poder autoritário, ao invés de regulá-lo...........................................................................................22
Quadro Geral de Classificação das Constituições..............................................................................................22

UNIDADE 1 AULA 3...........................................................................................................................................25


Poder Constituinte...........................................................................................................................................25
1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL.........................................................................................................................25
1.1.6 Poder Constituinte..................................................................................................................................25
Os Poderes Constituídos são o resultado dessa criação, isto é, são os poderes estabelecidos pela
Constituição............................................................................................................................................................ 25
1.1.6.1 Conceito..................................................................................................................................................... 26
Podemos identificar dois tipos de legisladores nesses Estados: o legislador constituinte, com competência
para elaborar normas constitucionais; e o legislador ordinário, com competência para elaborar as demais
normas do ordenamento jurídico.....................................................................................................................26
O Poder Constituinte........................................................................................................................................26
Com efeito, o Poder Constituinte é o poder de elaborar e modificar normas constitucionais. É, assim, o poder
de estabelecer a Constituição de um Estado, ou de modificar a Constituição
já.existente.............................................................................................................................................................. 26
1.1.6.2 Titularidade................................................................................................................................................ 26
A teoria do poder constituinte está relacionada com a legitimidade do poder, com a soberania nacional e a
soberania popular em um dado Estado............................................................................................................26
1.1.6.3 Formas de Exercício - Poder Constituinte Originário...........................................................................26
No primeiro caso, temos o denominado Poder Constituinte Originário Histórico e, nos demais, o Poder
Constituinte Originário Revolucionário.............................................................................................................26
Assim, temos que o Poder Constituinte Originário Histórico seria o verdadeiro Poder Constituinte Originário
estruturando, pela primeira vez, o Estado........................................................................................................27
Poder Constituinte Originário Revolucionário seriam todos os posteriores ao histórico, rompendo por
completo com a antiga ordem e instaurando uma nova..................................................................................27
Modos distintos para exercício da titularidade do Poder Constituinte: democrático (Poder Constituinte
Legítimo) ou autocrático (Poder Constituinte Usurpado).................................................................................27
O exercício autocrático do poder constituinte caracteriza-se pela denominada outorga:
estabelecimento da Constituição pelo indivíduo, ou grupo, líder do movimento revolucionário que o alçou
ao poder, sem a participação popular..............................................................................................................27
O exercício democrático do poder constituinte ocorre pela assembleia nacional constituinte ou convenção: o
povo escolhe seus representantes (democracia representativa), que formam o órgão constituinte, incumbido
de elaborar a Constituição do tipo promulgada...............................................................................................27
1.1.6.4 Espécies - Originário e o Derivado.......................................................................................................27
Classicamente, temos duas espécies de Poder Constituinte identificadas pela doutrina: Originário e o
Derivado...........................................................................................................................................................27
Mais modernamente, vem se falando também na existência do Poder Constituinte Difuso e do Poder
Constituinte Supranacional...............................................................................................................................27
O Poder Constituinte Originário é inicial, autônomo, ilimitado juridicamente, incondicionado, soberano na
tomada de suas decisões, um poder de fato e político, permanente. O poder constituinte originário é aquele
que cria a CF, que, por sua vez, tem a função de estruturar o Estado..............................................................27
O Poder Constituinte Originário é: (atribui-se ao Poder Constituinte Originário a característica de ser
ilimitado juridicamente)..................................................................................................................................27
- inicial, pois instaura uma nova ordem jurídica, rompendo, por completo, com a ordem jurídica
anterior;............................................................................................................................................................28
- autônomo, visto que a estruturação da nova constituição será determinada, autonomamente, por quem
exerce o poder constituinte originário;.............................................................................................................28
- ilimitado juridicamente, no sentido de que não tem de respeitar os limites postos pelo direito
anterior;............................................................................................................................................................28
- incondicionado e soberano na tomada de suas decisões, porque não tem de se submeter a qualquer forma
prefixada de manifestação;...............................................................................................................................28
- poder de fato e poder político, podendo, assim, ser caracterizado como uma energia ou força social, tendo
natureza pré-jurídica, sendo que, por essas características, a nova ordem jurídica começa com a sua
manifestação, e não antes dela; e.....................................................................................................................28
Forma de Estado: federal ou unitária; a forma de governo República ou Monarquia; o sistema de governo
presidencialista ou parlamentarista; e o regime de governo ou regime político, democracia ou
autocracia.............................................................................................................................................................
Lembrando que, conforme dissemos mais acima, o Poder Constituinte Originário se subdivide em: Histórico
e Revolucionário...............................................................................................................................................28
Já o Poder Constituinte Derivado, também denominado instituído, constituído, secundário, de segundo grau
ou remanescente, é criado e instituído pelo Poder Constituinte Originário.....................................................28
Ao contrário deste (Originário), ele deve obedecer às regras colocadas e impostas pelo Poder Constituinte
Originário, sendo derivado, limitado e condicionado aos parâmetros a ele impostos…………………………………..28
- derivado, porque é instituído pelo Poder Constituinte Originário.................................................................28
- limitado, ou subordinado porque encontra limitações constitucionais expressas e implícitas, não podendo
desrespeitá-las, sob pena de inconstitucionalidade.........................................................................................28
- condicionado, porque a sua atuação deve observar fielmente as regras predeterminadas pelo texto
constitucional...................................................................................................................................................28
O Poder Constituinte Derivado se subdivide em: Reformador, Revisor e Decorrente.....................................28
O Poder Constituinte Derivado Reformador tem a capacidade de modificar a Constituição, por meio de um
procedimento específico; estabelecido pelo Originário, sem que haja uma verdadeira revolução. É poder
responsável pela alteração e ampliação do texto constitucional, que se manifesta através das emendas
constitucionais, bem como os tratados de Direitos Humanos com força de emenda
constitucional.......................................................................................................................................................... 28
- temporais: quando a Constituição estabelece um período durante o qual o seu texto não pode ser
modificado;............................................................................................................................................................ 28
- circunstanciais: quando a Constituição veda a sua modificação durante certas circunstâncias excepcionais,
de conturbação da vida do Estado;...................................................................................................................29
- materiais: quando a Constituição enumera certas matérias que não poderão ser abolidas do seu texto pelo
reformador; e...................................................................................................................................................29
- processuais ou formais: quando a Constituição estabelece certas exigências no processo legislativo de
aprovação de sua modificação, tornando este distinto e mais trabalhoso do que aquele estabelecido para a
elaboração das demais leis do ordenamento...................................................................................................29
O Poder Constituinte Derivado Revisor também é fruto do trabalho de criação do Originário, estando,
portanto, a ele vinculado. É um poder condicionado e limitado às regras instituídas pelo Originário.............46
"A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto
da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão
unicameral"............................................................................................................................................................ 29
Ficou fixado como limite material o mesmo determinado ao Poder Constituinte Derivado Reformador, qual
seja, o limite material fixado nas chamadas "cláusulas pétreas", contidas no artigo 60, § 4º da
Constituição............................................................................................................................................................. 29
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: o voto, separação dos poderes
e os direitos individuais e garantias individuais................................................................................................29
O Poder Constituinte Derivado Decorrente é o poder que a Constituição atribuiu aos Estados-Membros e ao
Distrito Federal para se auto-organizarem, por meio da elaboração de suas próprias
Constituições........................................................................................................................................................... 29
Artigo 25 da Constituição: "Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios desta Constituição"...................................................................................................30
Os municípios não dispõem de Poder Constituinte Derivado Decorrente.......................................................30
Cabe a ele, portanto, alterar o conteúdo, o alcance e o sentido das normas constitucionais, mas de modo
informal, sem qualquer modificação na literalidade do texto da Constituição.................................................30
O poder constituinte difuso se instrumentaliza de modo informal e espontâneo, por intermédio das emendas
à Constituição e que decorre dos fatores sociais, políticos e econômicos, alterando se o seu sentido
interpretativo, e não o seu texto, que permanece intacto e com a mesma
literalidade............................................................................................................................................................. 30
A mutação constitucional pode ocorrer de três maneiras................................................................................30
Por fim, o Poder Constituinte Supranacional (transnacional ou global) é o poder de fato encarregado de fazer
e reformular as Constituições transnacionais, supranacionais ou globais........................................................30
Resumo das características das Constituições Federais do Brasil.....................................................................31

UNIDADE 1 AULA 4...........................................................................................................................................34


INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 34
O mais correto seria inferir que a positivação dos direitos e garantias fundamentais se deu a partir da
Revolução Francesa, com a Declaração dos Direitos do Homem em 1789, e das declarações de direitos
formuladas pelos Estados Americanos em 1776, ao firmarem sua independência em relação à
Inglaterra................................................................................................................................................................. 34
A primeira geração de direitos e garantias fundamentais surgidos será conhecida como direitos
negativos................................................................................................................................................................ 34
1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS..................................................................................................35
Classificação do gênero direitos e garantias fundamentais em espécies: direitos e deveres individuais e
coletivos; direitos sociais; direitos de nacionalidade; partidos políticos; e remédios
constitucionais..................................................................................................................................................35
Os direitos fundamentais e as garantias fundamentais..................................................................................35
1.2.1 Características dos direitos fundamentais. Imprescritibilidade, Inalienabilidade, Irrenunciabilidade,
Inviolabilidade, Universalidade, Efetividade, Efetividade, Interdependência, Complementaridade,
Concorrência e Relatividade ou Limitabilidade...............................................................................................36
Imprescritibilidade: os direitos fundamentais não desaparecem pelo decurso do tempo..............................36
Inviolabilidade: impossibilidade de sua não observância por disposições infraconstitucionais ou por atos das
autoridades públicas.........................................................................................................................................36
Efetividade: a atuação do Poder Público deve ter por escopo garantir a efetivação dos direitos
fundamentais...................................................................................................................................................36
Interdependência: as várias previsões constitucionais, apesar de autônomas, possuem diversas intersecções
para atingirem suas finalidades; assim, a liberdade de locomoção está intimamente ligada à garantia do
habeas corpus, bem como à previsão de prisão somente por flagrante delito ou por ordem da autoridade
judicial..............................................................................................................................................................37
A liberdade de locomoção está intimamente ligada à garantia do habeas corpus...........................................37
Complementaridade: os direitos fundamentais não devem ser interpretados isoladamente, mas sim de
forma conjunta com a finalidade de alcançar os objetivos previstos pelo legislador
constituinte......................................................................................................................................................37
Relatividade ou Limitabilidade: os direitos fundamentais não têm natureza absoluta. Nenhum direito é
absoluto, havendo, muitas vezes, conflito de interesses...................................................................................37
1.2.2 Classificação em gerações ou dimensões...............................................................................................37
Direitos fundamentais de segunda geração......................................................................................................38
Direitos fundamentais de terceira geração.......................................................................................................38
CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: Gerações clássicas..............................................................39
1.2.3 Restrições................................................................................................................................................39
No Estado de Defesa, um pouco mais brando, poderemos ter as restrições previstas no artigo 136 da
Constituição......................................................................................................................................................39
Resumo das Gerações dos Direitos fundamentais................................................................................................
Estado de Sítio - restrições ainda maiores a direitos e garantias fundamentais - Estado de Defesa................40
1.2.4 Deveres Fundamentais............................................................................................................................40
Dimoulis e Martins (2011) identificam os seguintes deveres fundamentais: dever de efetivação dos direitos
fundamentais; deveres específicos do Estado diante dos indivíduos; deveres de criminalização do Estado;
deveres dos cidadãos e da sociedade; dever de exercício do direito de forma solidária e levando em
consideração os interesses da sociedade e deveres implícitos.........................................................................40
deveres dos cidadãos e da sociedade: como exemplos, os autores citam o dever do serviço militar
obrigatório (artigo 143 da Constituição) e a educação enquanto dever do Estado e da família
(artigo 205);.....................................................................................................................................................41

UNIDADE 1 AULA 5...........................................................................................................................................43


Os direitos individuais são reconhecidos como um ramo dos direitos fundamentais e ancorados nos
princípios dos direitos humanos de primeira geração,....................................................................................43
1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS..................................................................................................44
1.2.5 Direitos Individuais e Coletivos...............................................................................................................44
1.2.5.1 Direito à Vida (Este é o direito mais básico de todos os direitos fundamentais).................................44
O direito à vida possui duplo aspecto: aspecto biológico (integridade ffsica e psíquica) e amplo (condições
materiais e espirituais mínimas).......................................................................................................................44
1.2.5.2 Direito à Liberdade (primeira geração)................................................................................................44
Princípios do Direito à liberdade: Princípio da Igualdade; princípio da legalidade...........................................44
1.2.5.3 Princípio da Igualdade..........................................................................................................................44
1.2.5.4 Princípio da Legalidade........................................................................................................................46
O princípio da legalidade..................................................................................................................................46
Ao particular é lícito fazer tudo aquilo que a lei não proíba, enquanto ao Poder Público só é permitido fazer
o que a lei autoriza............................................................................................................................................46
1.2.5.5 Direito à Liberdade de Expressão........................................................................................................46
Direito de resposta............................................................................................................................................47
Direito fundamental de acesso à informação...................................................................................................48
1.2.5.6 Direito à Liberdade de Crença Religiosa e Convicção Política e Filosófica..........................................49
Escusa de consciência, objeção de consciência ou ainda alegação de imperativo de consciência...................49
1.2.5.7 Direito à Inviolabilidade Domiciliar.....................................................................................................50
Para entrar em um domicílio sem consentimento do morador........................................................................50
1.2.5.8 Direito à Propriedade Privada.............................................................................................................50
1.2.5.9 Devido Processo Legal..........................................................................................................................51
Do devido processo legal derivam, ainda, outros princípios pertinentes às garantias processuais, como o
princípio do juiz natural, a só admissibilidade de provas lícitas no processo, a publicidade do processo, a
motivação das decisões....................................................................................................................................51
1.2.5.10 Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa........................................................................................52
ampla defesa....................................................................................................................................................52
contraditório............................................................................................................................................................ 52
Atenção: Não são exigíveis no âmbito do processo criminal, a garantia constitucional do contraditório e
ampla defesa: Inquérito Policial, tampouco do Inquérito Policial Militar (IPM), porque, no sistema jurídico
brasileiro, o Inquérito Policial e o IPM afiguram-se como mera fase investigatória, de natureza
administrativa.......................................................................................................................................................... 52
1.2.5.11 Vedação à Prova Ilícita........................................................................................................................52
1.2.5.12 Princípio da Presunção de Inocência.................................................................................................53
1.2.5.13 Princípio da Não Autoincriminação...................................................................................................53
Tem direito o preso segundo o direito à não autoincriminação.......................................................................53

UNIDADE 1 AULA 6...........................................................................................................................................57


Remédios constitucionais ou jurídicos são: são mecanismos que garantem aos cidadãos os direitos
fundamentais previstos na Constituição Federal quando o Estado não cumpre seu dever, seja por despreparo,
ilegalidade ou abuso de poder..........................................................................................................................58
1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS..................................................................................................58
1.2.6 Remédios Constitucionais.......................................................................................................................58
Dois tipos de remédios constitucionais: remédios administrativos (direito de petição e direito de certidão) e
remédios judiciais (habeas data, habeas corpus, mandado de segurança, mandado de injunção e ação
popular).................................................................................................................................................................. 58
1.2.6.1 Habeas Corpus Historicamente, o habeas corpus...............................................................................59
O habeas corpus pode ser: repressivo (liberatório); preventivo (salvo-conduto).............................................59
Conforme a jurisprudência do STF, não é cabível o uso de habeas corpus para: impugnar decisões do
Plenário ou de qualquer das Turmas do STF; impugnar determinação de suspensão dos direitos políticos;
impugnar penalidade imposta mediante decisão administrativa de caráter disciplinar ; impugnar decisão
condenatória à pena de multa, ou relativa a processo em curso por infração penal; impugnar a
determinação de quebra de sigilo telefônico, bancário ou fiscal; discutir o mérito das punições
disciplinares militares; questionar afastamento ou perda de cargo público e pena de exclusão de militar ou
de perda de patente; controvérsia sobre a guarda de filhos menores; discutir matéria objeto de processo de
extradição; o questionamento de condenação criminal quando já extinta a pena privativa; impedir o
cumprimento de decisão de sequestro de bens imóveis; discutir a condenação imposta em processo de
impeachment; impugnar o mero indiciamento em inquérito policial; impugnar omissão de relator de
extradição……………………………………………………………………………………………………………………………………………………..……….59
1.2.6.2 Mandado de Segurança (... para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus
ou habeas data...que não seja os inerentes à liberdade de locomoção e ao acesso ou retificação de
informações...)......................................................................................................................................................... 60
Mas, o que são direitos líquidos e certos? é aquele que pode ser demonstrado de plano mediante prova pré-
constituída, sem a necessidade de dilação probatória. Ou é aquele demonstrado de plano, de acordo com o
direito, e sem incerteza, a respeito dos fatos narrados pelo impetrante. É o que se apresenta manifesto na
sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da
impetração.............................................................................................................................................................. 61
Autoridade coatora: aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua
prática..................................................................................................................................................................... 61
O Mandado de Segurança pode ser: repressivo de ilegalidade ou abuso de poder já praticado, ou preventivo,
quando estivermos diante de ameaça a violação de direito líquido e certo do impetrante. O prazo para
impetração do Mandado de Segurança é de 120 dias,.....................................................................................61
1.2.6.3 Mandado de Injunção - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”....................................................................................62
requisitos para impetração do Mandado de Injunção......................................................................................62
Não caberá Mandado de Injunção....................................................................................................................62
1.2.6.4 Habeas Data - ...para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante,
constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público… a) direito
de acesso aos registros relativos à pessoa do impetrante; b) direito de retificação desses registros e c) direito
de complementação dos registros. E contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que
esteja sob pendência judicial ou amigável"......................................................................................................63
1.2.6.5 Ação Popular - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo
ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas
judiciais e do ônus da sucumbência.................................................................................................................64

UNIDADE 1 AULA 7...........................................................................................................................................67


1.3 PODER EXECUTIVO.....................................................................................................................................69
No Brasil, o artigo 76 da Constituição nos diz que: "O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da
República, auxiliado pelos Ministros de Estado".............................................................................................71
1.3.1 Funções - A função tipica do Poder Executivo é administrar. As funções atipicas são a legislativa e a
de julgamento........................................................................................................................................................ 71
1.3.2 Investidura.................................................................................................................................................... 71
1.3.3 Impedimentos e Vacância......................................................................................................................72
Em caso de vacância do presidente e vice-presidente......................................................................................72
1.3.4 Responsabilização do Presidente da República......................................................................................73
1.3.4.1 Crimes de Responsabilidade................................................................................................................73
caracterizarão crime de responsabilidade........................................................................................................73
1.3.4.2 Crimes Comuns....................................................................................................................................74
3 importantes imunidades processuais do Presidente da República................................................................74

UNIDADE1 AULA 8..........................................................................................................................................78


1.4 PODER LEGISLATIVO.................................................................................................................................79
1.4.1 Funções....................................................................................................................................................... 79
1.4.2 Estrutura...................................................................................................................................................... 80
1.4.3 Câmara dos Deputados.........................................................................................................................81
1.4.4 Senado Federal......................................................................................................................................82
1.4.5 Imunidades Parlamentares...................................................................................................................84
As imunidades parlamentares são tradicionalmente classificadas em: imunidade material e imunidade
formal................................................................................................................................................................... 84
1.4.5.1 Imunidade Material...........................................................................................................................84
1.4.5.2 Imunidade Formal..............................................................................................................................85
1.4.6 Prerrogativa de Foro..............................................................................................................................86
1.4.7 Tribunal de Contas da União (TCU).......................................................................................................87

UNIDADE 1 AULA 9.........................................................................................................................................90


1.5 PODER JUDICIÁRIO...................................................................................................................................90
1.5.1 Funções....................................................................................................................................................... 91
Em linhas gerais, há 3 características básicas da jurisdição: lide, inércia e definitividade..............................92
1.5.2 Garantias do Poder Judiciário...............................................................................................................92
1.5.3 Organização da Carreira........................................................................................................................93
1.5.4 Garantias aos Magistrados....................................................................................................................94
O artigo 95 da Constituição garante aos membros do Poder Judiciário a: vitaliciedade, inamovibilidade e
irredutibilidade de subsídio............................................................................................................................94
1.5.5 Vedações..................................................................................................................................................... 94
1.5.6 Supremo Tribunal Federal (STF)............................................................................................................95
As competências do STF: competência originária e competência recursal....................................................96
UNIDADE 1 AULA 10.......................................................................................................................................98
1.6 FORÇAS ARMADAS...................................................................................................................................98
São funções das instituições militares............................................................................................................99
1.6.1 Regras Gerais.........................................................................................................................................99
O oficial só perderá o posto e a patente se: indigno do oficialato ou com ele incompativel, pena privativa de
liberdade superior a 2 anos,...........................................................................................................................100
1.6.2 Hierarquia e Disciplina..........................................................................................................................101
1.6.3 Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).................................................................................102
1.6.4 Habeas corpus em punições disciplinares militares.............................................................................104
1.6.5 Serviço Militar Obrigatório....................................................................................................................105

DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

UNIDADE 2 AULA 1.........................................................................................................................................111


2.1 CONCEITO DE CRIME................................................................................................................................112
FORMAÇÃO DO CRIME: FATO TÍPICO + ILÍCITO + CULPÁVEL = CRIME............................................................113
2.1.1 Fato Típico: produzir um resultado, haja um dano efetivo ou pelo menos uma possibilidade real de
dano e ter um nexo de causalidade entre a conduta e o resultado - (conduta, resultado, nexo de
causalidade e tipicidade).................................................................................................................................... 113
2.1.1.1 Conduta - elemento fundamental da teoria do crime. (por ação (conduta comissiva) ou por omissão
(conduta omissiva)..........................................................................................................................................114
Exemplo de Conduta.......................................................................................................................................114
Omissão de socorro (IMPORTANTE. CAI EM PROVA)......................................................................................114
Falamos aqui no dever de solidariedade........................................................................................................115
Entretanto, a ideia de dolo é muito importante ao Direito.............................................................................115
Tipos de Dolo: dolo direto e dolo eventual.....................................................................................................116
A culpa trabalha com a inobservância de regras de cuidado..........................................................................116
Logo, é a inobservância de uma regra de cuidado que vai levar à prática do crime culposo.........................117
O Código Penal em seu artigo 18, II traz três modalidades de crimes culposos: por imprudência, negligência
e imperícia......................................................................................................................................................117
Imprudência: é um "fazer". O sujeito faz, ele não observa a regra de cuidado, agindo, fazendo
algo....................................................................................................................................................................... 117
Negligência: é um “não fazer”. Eu sou um policial e tenho o costume de andar armado..............................117
Imperícia: é a falta de aptidão técnica. Ela é voltada sempre para os profissionais.......................................118
Por fim, imprudência, negligência e imperícia são modalidades do que chamamos de culpa
inconsciente......................................................................................................................................................... 118

UNIDADE 2 AULA 2.........................................................................................................................................122


2.1 CONCEITO DE CRIME................................................................................................................................122
2.1.1.2 Resultado - é a modificação do mundo exterior causado por uma ação. (conceito
naturalístico.)......................................................................................................................................................... 122
Crime material: é aquele em que o legislador descreve um resultado (o resultado é normativo) e o crime só
se consuma quando o resultado naturalístico efetivamente ocorre. Veja que há uma coincidência dos dois
resultados (naturalístico e normativo)............................................................................................................123
Crime formal: o resultado naturalístico não necessariamente coincide com o da definição que o legislador
deu....................................................................................................................................................................... 123
Crimes de mera conduta: são aqueles em que o legislador descreve apenas a conduta; ele não descreve o
resultado. Eles se consumam com a simples realização de um comportamento, comissivo ou omissivo, não
importando as eventuais consequências........................................................................................................124
2.1.1.3 Nexo de causalidade - é o liame, a ligação, o elo entre a ação e o resultado....................................124
“Relevância da Omissão..................................................................................................................................126
2.1.1.4 Tipicidade - é o conjunto de elementos descritivos contidos na norma penal incriminadora (aquela
que tem um comando e uma sanção)............................................................................................................126
Elementos Subjetivos: dizem respeito à vontade qualificada do agente, ou seja, a finalidade. Por excelência,
é o dolo. Excepcionalmente, teremos também a culpa. Lembrando que o agente só responderá por culpa se
estiver expresso no tipo penal........................................................................................................................127
Elementos Objetivos: são aqueles que se referem à própria materialidade do crime, ou seja, a forma de
execução, o tempo, o lugar..............................................................................................................................127
Furto qualificado............................................................................................................................................127
Elementos Normativos: são aqueles que vão demandar um juízo de valor...................................................127
gráfico do crime..............................................................................................................................................128

UNIDADE 2 AULA 3.........................................................................................................................................130


2.1 CONCEITO DE CRIME................................................................................................................................130
2.1.2 Ilicitude........................................................................................................................................................ 130
2.1.2.1 Estado de Necessidade - é para situações de perigo e não de agressão, como na Legítima
Defesa………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………….131
Perigo Atual: como já adiantamos acima, perigo pode ser representado por ataques de animais, forças da
natureza, acidentes, calamidades, catástrofes ambientais.............................................................................131
Novamente, temos um exemplo de Estado de Necessidade.......................................................................….131
Que não provocou por sua vontade: você não pode ter se colocado na situação acima de perigo atual por
vontade própria. Aqui, por vontade entenderemos dolo...............................................................................132
Nem podia de outro modo evitar: o Estado de Necessidade deve ser a última opção do agente (ultima ratio).
Sempre deve se buscar a opção menos gravosa.............................................................................................132
Direito próprio ou alheio: o Estado de Necessidade pode ser para mim ou para terceiros. No mesmo caso
acima do barco...............................................................................................................................................133
Cujo sacriffcio nas circunstâncias não era razoável exigir-se: na verdade, o que se quer dizer com este último
requisito é que eu tenho dois bens jurídicos igualmente protegidos.............................................................133
2.1.2.2 Legítima Defesa - 5 requisitos cumulativos para ser configurada......................................................134
- Utilizar moderadamente: aqui a lei quer dizer que você deve agir com razoabilidade, proporcionalidade,
bom senso, moderação...................................................................................................................................134
Dos meios necessários: o meio deve ser suficiente e eficaz...........................................................................134
Para repelir injusta agressão: aqui vamos entender que repelir quer dizer para fazer cessar a
agressão............................................................................................................................................................... 135
Atual ou iminente: ou seja, é aquele que está ocorrendo ou aquele que está em vias de ocorrer................135
- A direito seu ou de outrem: a legítima defesa contempla o direito próprio ou alheio.................................136
2.1.2.3 Estrito Cumprimento do Dever Legal.................................................................................................136
- Estrito Cumprimento: o agente atua dentro dos exatos limites daquele dever que lhe foi imposto............136
Dever Legal: é um dever imposto pela lei a qualquer pessoa.........................................................................136
2.1.2.4 Exercício Regular de Direito...............................................................................................................136
Exercício Regular: o agente deve agir dentro das regras. Bitencourt (2012) entende que: "Regular será o
exercício que se contiver nos limites objetivos e subjetivos, formais e materiais impostos pelos próprios fins
do Direito"......................................................................................................................................................136
Direito: diferentemente da obrigação, o direito não é algo imposto, mas sim facultado a você....................136
A legítima defesa.............................................................................................................................................136

UNIDADE 2 AULA 4.........................................................................................................................................140


2.1 CONCEITO DE CRIME - (IMPUTABILIDADE)..............................................................................................140
2.1.3 Culpabilidade - possibilidade de reprovação da conduta ilícita, de quem tem capacidade genérica de
entender e querer – 3 elementos: imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de
conduta diversa..............................................................................................................................................140
Imputável: aquele a quem pode ser imputada a conduta criminosa e responderá pelo que fez, isto é, será
responsabilizado criminalmente pelos seus atos............................................................................................141
Semi-imputável: este seria o meio termo.......................................................................................................141
Inimputável: aquele a quem não pode ser imputada a conduta criminosa....................................................141
Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado (artigo 26 do CP).............................141
Inimputáveis - por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da
ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito........................................................141
Redução de pena............................................................................................................................................141
Imputável: quem não se encaixa no conceito do caput, nem no do parágrafo único do artigo 26 do Código
Penal. ………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………..142
Semi-imputável: fica no meio termo..............................................................................................................142
Maioridade Penal (artigo 27 do CP)................................................................................................................142
Imputável: maior que 18 anos........................................................................................................................143
Inimputável: menor que 18 anos....................................................................................................................143
Semi-imputável: é o caso do artigo 28, §2º do Código Penal.........................................................................145

UNIDADE 2 AULA 5.........................................................................................................................................145


2.1.3 Culpabilidade.............................................................................................................................................. 148
2.1.3.2 Potencial Conhecimento da Ilicitude - conheça ou possa conhecer a ilicitude do fato.....................148
2.1.3.3 Exigibilidade de Conduta Diversa......................................................................................................150
Coação Moral Irresistivel................................................................................................................................150
Obediência Hierárquica: relação hierárquica funcional; limites da ordem; e a ordem não pode ser
manifestamente ilegal....................................................................................................................................152
Caso sejam cumpridos todos estes requisitos, quem será responsabilizado criminalmente não será o agente,
mas sim o autor da ordem..............................................................................................................................152
Recusa de obediência.....................................................................................................................................153
Não é culpado quem comete o crime.............................................................................................................154
Obediência hierárquica...................................................................................................................................154

UNIDADE 2 AULA 6.........................................................................................................................................156


2.2 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL MILITAR....................................................................................................156
2.2.1 Conceito...................................................................................................................................................... 157
Fase de investigação preliminar: persecução penal pré-processual, fase que será realizada pelas Autoridades
de Polícia Judiciária Militar (artigo 7º do CPPM)............................................................................................157
Fase judicial do processo de persecução penal: fase em que serão efetivamente produzidas as provas em
juízo perante uma autoridade judiciária, onde serão garantidos o contraditório e a ampla defesa ao
acusado................................................................................................................................................................ 157
2.2.2 Finalidade.................................................................................................................................................... 157
2.2.3 Princípios..................................................................................................................................................... 158
2.2.4 Aplicação..................................................................................................................................................... 159
Fontes de Direito Judiciário Militar.................................................................................................................159
Aplicação subsidiária......................................................................................................................................159
Suprimento dos casos omissos.......................................................................................................................159
Tempo de paz..................................................................................................................................................160
Tempo de guerra.............................................................................................................................................160

UNIDADE 2 AULA 7.........................................................................................................................................163


2.3 POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR...................................................................................................................164
2.3.1 Conceito...................................................................................................................................................... 164
Polícia Judiciária Comum: exercida pelas Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal..............................164
Polícia Judiciária Federal: exercida pela Polícia Federal..................................................................................164
Polícia Judiciária Militar: exercida pelos militares...........................................................................................164
2.3.2 Atividades.................................................................................................................................................... 164
2.3.3 Núcleo de Polícia Judiciária Militar......................................................................................................164
2.3.4 Atribuições do N-PJM............................................................................................................................165
2.3.4.1 - Orientação Jurídica..........................................................................................................................165
2.3.4.2 - Investigação e Perícias.....................................................................................................................165
2.3.4.3 - Execução Penal.................................................................................................................................166
2.3.5 - Forma de Atuação do N-PJM...............................................................................................................166
2.3.6 - Composição do N-PJM.........................................................................................................................167
Elemento Organizacional (EOrg): um Oficial Superior, Chefe do EOrg, caso este seja um Departamento, ou
Encarregado.......................................................................................................................................................... .167
2.3.7 - OM com Potencialidades para a realização de Perícias na MB.........................................................168

UNIDADE 2 AULA 8.........................................................................................................................................170


2.4 INQUÉRITO POLICIAL MILITAR.................................................................................................................170
2.4.1 Conceito...................................................................................................................................................... 171
2.4.2 Competência da Autoridade Nomeante...............................................................................................171
2.4.3 Atribuições do Encarregado..................................................................................................................173
2.4.4 Atribuições do Escrivão.........................................................................................................................175
2.4.5 Oitiva........................................................................................................................................................... 176
2.4.5.1 Confissão.................................................................................................................................................. 178
Retratabilidade e divisibilidade.......................................................................................................................179
2.4.5.2 Acareação................................................................................................................................................. 179
2.4.6 Exames Periciais....................................................................................................................................180
Suspeição de peritos e intérpretes..................................................................................................................181
2.4.7 Reconhecimento de Pessoas e Objetos................................................................................................182
Reconhecimento de coisa...............................................................................................................................182

UNIDADE 2 AULA 9.........................................................................................................................................185


2.4 INQUÉRITO POLICIAL MILITAR.................................................................................................................185
2.4.8 Crime Militar.........................................................................................................................................185
Crimes militares em tempo de paz.................................................................................................................186
2.4.8.1 Crime Propriamente Militar...............................................................................................................187
2.4.8.2 Crime Impropriamente Militar - são os crimes comuns em sua natureza, cuja prática é possível a
qualquer cidadão, civil ou militar....................................................................................................................188
Competência e requisitos para a decretação..................................................................................................188
2.4.9 Providência Preliminar da Detenção de Indiciado...............................................................................189
2.4.10 Buscas Domiciliares.............................................................................................................................189
2.4.11 Apreensão e Restituição dos Bens......................................................................................................189
2.4.12 Violação de Sigilo................................................................................................................................190
2.4.13 Relatório.................................................................................................................................................... 190
2.4.14 Solução...................................................................................................................................................... 190
2.4.15 Prazos para Conclusão e Prorrogação.................................................................................................192
2.4.16 Remessa de IPM..................................................................................................................................192

UNIDADE 2 AULA 10.......................................................................................................................................196


2.5 ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA MILITAR DA UNIÃO......................................................................................196
2.5.1 Introdução.............................................................................................................................................196
2.5.2 Superior Tribunal Militar (STM)............................................................................................................198
2.5.3 Circunscrições Judiciárias Militares......................................................................................................198
2.5.4 Conselhos de Justiça Militar..................................................................................................................199
TEMA: DIREITO
1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL
1.1 TEORIA DA CONSTITUIÇÃO
1.1.1 Constitucionalismo.
1.1.2 Neoconstitucionalismo.
1.1.3 Transconstitucionalismo.
1.1.4 Sentidos de Constituição.
1.1.5 Classificação das Constituições.
1.1.5.1 Quanto ao Conteúdo.
1.1.5.2 Quanto à Estabilidade.
1.1.5.3 Quanto à Forma.
1.1.5.4 Quanto ao Modo de Elaboração.
1.1.5.5 Quanto à Origem.
1.1.5.6 Quanto à Extensão.
1.1.5.7 Quanto à Finalidade.
1.1.5.8 Ontológica.
1.1.6 Poder Constituinte.
1.1.6.1 Conceito.
1.1.6.2 Titularidade.
1.1.6.3 Formas de Exercício.
1.1.6.4 Espécies.
1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
1.2.1 Características.
1.2.2 Classificação.
1.2.3 Restrições.
1.2.4 Deveres Fundamentais.
1.2.5 Direitos Individuais e Coletivos.
1.2.5.1 Direito à Vida.
1.2.5.2 Direito à Liberdade.
1.2.5.3 Princípio da Igualdade.
1.2.5.4 Princípio da Legalidade.
1.2.5.5 Direito à Liberdade de Expressão.
1.2.5.6 Direito à Liberdade de Crença Religiosa e Convicção Política e Filosófica.
1.2.5.7 Direito à Inviolabilidade Domiciliar.
1.2.5.8 Direito à Propriedade Privada.
1.2.5.9 Devido Processo Legal.
1.2.5.10 Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa.

1
1.2.5.11 Vedação à Prova Ilícita.
1.2.5.12 Princípio da Presunção de Inocência.
1.2.5.13 Princípio da Não Autoincriminação.
1.2.6 Remédios Constitucionais.
1.2.6.1 Habeas Corpus.
1.2.6.2 Mandado de Segurança.
1.2.6.3 Mandado de Injunção.
1.2.6.4 Habeas Data.
1.2.6.5 Ação Popular.
1.3 PODER EXECUTIVO
1.3.1 Funções.
1.3.2 Investidura.
1.3.3 Impedimentos e Vacância.
1.3.4 Responsabilização do Presidente da República.
1.3.4.1 Crimes de Responsabilidade.
1.3.4.2 Crimes Comuns.
1.4 PODER LEGISLATIVO
1.4.1 Funções.
1.4.2 Estrutura.
1.4.3 Câmara dos Deputados.
1.4.4 Senado Federal.
1.4.5 Imunidades Parlamentares.
1.4.5.1 Imunidade Material.
1.4.5.2 Imunidade Formal.
1.4.6 Prerrogativa de Foro.
1.4.7 Tribunal de Contas da União (TCU).
1.5 PODER JUDICIÁRIO
1.5.1 Funções.
1.5.2 Garantias do Poder Judiciário.
1.5.3 Organização da Carreira.
1.5.4 Garantias aos Magistrados.
1.5.5 Vedações.
1.5.6 Supremo Tribunal Federal (STF).
1.6 FORÇAS ARMADAS
1.6.1 Regras Gerais.
1.6.2 Hierarquia e Disciplina.
1.6.3 Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

2
1.6.4 Habeas corpus em punições disciplinares militares.
1.6.5 Serviço Militar Obrigatório.

3
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Seja muito bem-vindo ao nosso curso sobre Direito!
Ao longo do nosso curso teremos 4 Unidades de Ensino: Direito Constitucional; Direito Penal
Militar e Direito Processual Penal Militar, Direito Administrativo Disciplinar Militar e Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA).
O Direito é a ciência que cuida da aplicação das normas jurídicas vigentes em um país, para
organizar as relações entre indivíduos e grupos na sociedade. Claro que não temos a menor pretensão de
esgotar os assuntos, tampouco de formarmos aqui bachareis em Direito, mas sim trazer alguns
conhecimentos básicos da matéria e que poderão ser muito úteis nas atividades de Assessoria em Estado-
Maior a serem desempenhadas no futuro, além de tentar plantar uma sementinha para que você aprofunde
ainda mais os seus estudos na área jurídica. Com certeza, um campo muito complexo, porém bastante
apaixonante e gratificante.
Iniciaremos pelo princípio, pelo ramo do Direito mais importante na atualidade, que é o Direito
Constitucional, que é aquele ramo do direito que se dedica à análise e interpretação das normas
constitucionais, consideradas Leis Supremas de um Estado soberano e compreendidas como o ápice da
pirâmide normativa de uma ordem jurídica e tem como função regulamentar o poder estatal, delimitando-
o e garantindo os direitos considerados fundamentais.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar constitucionalismo;
- Conceituar neoconstitucionalismo;
- Conceituar transconstitucionalismo; e
- Citar os sentidos da Constituição.

INTRODUÇÃO:
Ao estudar a Antiguidade clássica, já podemos identificar timidamente entre os hebreus o
surgimento de uma espécie de constitucionalismo, estabelecendo-se no Estado teocrático limitações ao
poder político ao assegurar aos profetas a legitimidade para fiscalizar os atos governamentais que
extrapolassem os limites bíblicos.
Muito tempo depois, já no século V a.C., podemos citar a experiência das Cidades-Estados gregas
como importante exemplo de democracia constitucional, na medida em que a democracia direta,
particular a elas, consagrava o único exemplo conhecido de sistema político com plena identidade entre
governantes e governados, no qual o poder político está igualmente distribuído entre todos os cidadãos
ativos.

4
Já na Idade Média, a Magna Carta de 1215 representa o grande marco do constitucionalismo
medieval, estabelecendo, mesmo que apenas formalmente, a proteção a importantes direitos individuais
dos cidadãos perante o rei.
E como isso chegará ao Direito Constitucional como conhecemos hoje?
É exatamente isso o que veremos agora.
Vamos lá!?

1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL


De um modo bastante simplista, podemos conceituar Estado como a organização de uma
sociedade sobre um território determinado, dotada de soberania. Nessa definição estão os elementos
tradicionalmente descritos como necessários à existência de um Estado: soberania, povo e território.
Todo Estado possui a sua Constituição, veremos que não necessariamente um documento
formalmente escrito, que, dentre outras coisas, tratará da organização deste Estado. Trata-se de um
conceito fático Constituição, que independe da existência de um texto escrito, ou mesmo normas, escritas
ou não, referentes a essa organização.
A expressão Direito Constitucional nasce com um movimento chamado constitucionalismo. Em
sua origem, o Direito Constitucional refere-se, tão somente, à ordem jurídica fundamental do Estado
liberal. Portanto, o Direito Constitucional nasceu inspirado pelos valores do pensamento liberal.
Com o seu desenvolvimento, em um período seguinte, o Direito Constitucional, aos poucos, foi se
desvinculando dos ideais puramente liberais. A Constituição assume uma nova feição, de norma jurídica e
formal, protetora dos direitos humanos.
Então, antes de adentrarmos no estudo do Direito Constitucional propriamente dito, precisamos
trazer algumas noções iniciais de Teoria da Constituição.

1.1 TEORIA DA CONSTITUIÇÃO


1.1.1 Constitucionalismo
Constitucionalismo é o movimento do século XVII na Inglaterra e do século XVIII nos Estados
Unidos e na França que teve como objetivo a limitação do poder, através de uma nova organização do
Estado e o estabelecimento de direitos e garantias fundamentais.
Neste mesmo sentido, afirma Canotilho (2003) que o constitucionalismo é: "(...) o movimento
político, social e cultural que, sobretudo a partir de meados do século XVIII, questiona nos planos
político, filosófico e jurídico os esquemas tradicionais de domínio político, sugerindo, ao mesmo tempo, a
invenção de uma forma de ordenação e fundamentação do poder político".
Perceba que no conceito que apresentamos, há um constitucionalismo inicial na Inglaterra e cerca
de 100 anos depois um outro constitucionalismo nos Estados Unidos e na França.
E há diferença entre eles?

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Naturalmente que sim. Inclusive, existem diversos movimentos constitucionais. Historicamente,
estes foram os mais importantes e, claro, possuem diferenças entre si. E começaremos a construir este
conhecimento na tabela abaixo:

Constitucionalismo Inglaterra Estados Unidos / França


Período Século XVII Século XVIII
Revolução Americana e
História Revolução Gloriosa
Revolução Francesa
Limitação do Poder Supremacia do Parlamento Separação dos Poderes
Declaração de Direitos (Bill of
Direitos Declarações de Direitos
Rights)
Constituição Material, Histórica e não Escrita Formal e Escrita

O constitucionalismo inglês
tem origem na Revolução Gloriosa
(1688 - 1689). Esta revolução trouxe
algo sem precedentes na História
Inglesa, a concepção da supremacia
do parlamento. No âmbito do
constitucionalismo inglês o poder foi
limitado, justamente pela ideia da
supremacia do parlamento. Eles
chegaram para o rei e disseram: "a partir de hoje, existe algo que vai mandar mais que você. Você reina,
mas não governa, quem governa é o parlamento". Acabou-se a farra do poder absoluto do rei da
Inglaterra. E assim, foi inaugurado o constitucionalismo. Houve também a declaração de direitos,
chamada Bill of Rights (1689), documento elaborado pelo Parlamento Inglês e imposto aos
soberanos, num ato que declara os direitos e a liberdade dos súditos e define a sucessão da coroa. Este
documento é considerado um dos pilares do sistema constitucional do Reino Unido que estabelece limites
aos poderes do monarca e declara os direitos do Parlamento, incluindo regular deliberação parlamentar,
eleições livres e liberdade de expressão no Parlamento. O Bill of Rights é o primeiro documento oficial
que garante a participação popular, por meio de representantes parlamentares, na criação e cobrança de
tributos, sob pena de ilegalidade e veda, ainda, a instituição de impostos excessivos, nem tampouco
punições cruéis e incomuns.
Os ingleses inauguraram o constitucionalismo, mas não exatamente aquele que nós estamos mais
acostumados aqui no Brasil, desde 1824. Eles produziram uma Constituição material, histórica e não
escrita ou costumeira. Eles não acreditavam no papel. O papel aceita tudo. Você já ouviu isso em algum
lugar?rs... Para eles, o papel mudava nada. O que mudaria um país não seria um pedaço de papel, mas sim

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suas práticas. E até hoje é assim. Atualmente, ainda não há na Inglaterra uma Constituição formal e
escrita. Um documento único que você pega e pode sair por aí carregando no braço, no bolso ou baixar
em um tablet ou smartphone e levar para qualquer lugar.
Diferentemente, o
constitucionalismo norte-
americano e francês é
fruto das revoluções
burguesas do século XVIII
(Revolução Americana e
Revolução Francesa). A
limitação do poder e a
organização do Estado e
da sociedade não se dará
pelas práticas, mas sim por um documento formal escrito. Eles disseram para o rei ou presidente: "a partir
de hoje, existe algo que vai mandar mais que vocês, e não é o parlamento, mas um pedaço de papel
escrito chamado Constituição". E pela primeira vez na História, tivemos um papel escrito que vai
constituir um Estado, uma sociedade e que estará acima de todos. Surge a era do Governo das Leis, e não
mais dos homens.
E qual é o movimento constitucional de maior sucesso na História?
É só perceber uma coisa, nós temos mais o modelo inglês ou o
modelo francês/norte-americano nos últimos dois séculos? Por exemplo, o
Brasil adotou qual modelo? A esmagadora maioria dos países do mundo,
incluindo o Brasil, adotaram o modelo francês/norte-americano de
Constituições formais e escritas.
Assim, podemos estabelecer um conceito de Constituição a partir
do século XVIII na maioria dos países do mundo, qual seja: "é a
ordenação sistemática e racional da comunidade política explicitada em
um documento escrito que organiza o Estado e estabelece direitos
fundamentais".
A ideia de que todo Estado deva possuir uma Constituição e de que esta deve conter limitações ao
poder autoritário e regras de prevalência dos direitos fundamentais desenvolve-se no sentido da
consagração de um Estado Democrático de Direito e, portanto, de soberania popular.
Assim, de forma expressa, o parágrafo único do artigo 1º da Constituição concretiza que "todo o
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição".

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1.1.2 Neoconstitucionalismo
Também chamado de constitucionalismo contemporâneo, o neoconstitucionalismo é o movimento
da segunda metade do século XX (pós-guerra) que tem como objetivo desenvolver um novo modo de
compreender, interpretar e aplicar o Direito Constitucional e as Constituições advindas do mesmo.
Teremos três grandes marcos fundamentais do neoconstitucionalismo.

- Histórico: Constituições do pós-guerra, todas enfocando a perspectiva de redemocratização e Estado


Democrático de Direito.

Ex.: Constituição da Itália (1948), Lei Fundamental de Bonn (1949), Constituição da França (1958),
Constituição de Portugal (1976), Constituição da Espanha (1978), Constituição do Brasil (1988).

- Filosófico: pós-positivismo. Trata-se de um fenômeno extremamente complexo. Mas, em linhas gerais,


é um fenômeno que visa superar a dicotomia entre os direitos naturais e o direito positivado, pois visa ir
além da legalidade estrita, a legitimidade não advém apenas da legalidade, porém sem desconsiderar o
direito posto. Procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas
O direito que vai nos reger é o positivo, embora permeado por uma interrelação deste Direito com a
Moral, com a Ética e com a Justiça. Apesar destes serem conceitos bastante subjetivos, conseguimos
estabelecer um padrão mínimo dentro desta subjetividade. Portanto, temos uma reaproximação entre:
Direito e Moral, Direito e Ética, Direito e Filosofia e Direito e Justiça.

- Teórico: conjunto de teorias que vão explicitar a força normativa da Constituição, expansão da
jurisdição constitucional, e nova dogmática da interpretação constitucional. A Constituição deixa de
ser um documento meramente político e simbólico e passa a ser um documento efetivamente jurídico de
vinculação de condutas com a correspondente expansão da jurisdição constitucional, ademais de novos
métodos de interpretação que vão além dos métodos clássicos. Com isso temos a nova hermenêutica
constitucional.

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As seis principais características do neoconstitucionalismo são:

- Constitucionalização do Direito e a Constituição como centro do ordenamento jurídico. Todo o


Direito se constitucionaliza. Tudo passa a girar em torno da Constituição. Ela deixa de ser um documento
paralelo e passa a ser o documento. A Constituição é o cara agora! É ela quem manda no pedaço. Hoje em
dia, falamos em Direito Civil Constitucional, Direito Penal Constitucional, Direito Processual Civil
Constitucional, Direito Processual Penal Constitucional, o modelo constitucional do processo.
Antigamente, você entrava no gabinete de um juiz e encontrava um Código Civil, um Código Penal, um
Código de Processo Civil, um Código de Processo Penal, mas nunca uma Constituição. Para que? Não
servia para muita coisa. Hoje em dia não. Não como ele fundamentar nada, seja em âmbito civil, penal
tributário ou qualquer outra vertente do Direito sem o uso da Constituição. Com isso, temos a invasão da
Constituição, ela invade todo o sistema jurídico, trazendo a ideia da ubiquidade constitucional, que
significa que a Constituição está em todos os lugares do ordenamento jurídico ao mesmo tempo. Há ainda
a noção de filtragem constitucional, ou seja, qualquer norma só tem sentido se estiver de acordo com a
Constituição.

- Força Normativa da Constituição

- Busca pela concretização dos direitos fundamentais, tendo como fundamento a dignidade da pessoa
humana. Se o constitucionalismo estabeleceu direitos e garantias fundamentais, o neoconstitucionalismo
trabalha na concretização destes direitos.

- Judicialização da Política e das relações sociais. Com o neoconstitucionalismo tudo se judicializa. Tudo
deságua no Poder Judiciário. No Brasil e no mundo diversas situações têm chegado ao Poder Judiciário
para que este decida.

Ex.: Clonagem, pesquisa com células-tronco, manipulação genética, política de quotas, Lei da Ficha
Limpa, interrupção terapêutica da gestação de feto anencefálico, dentre diversos outros exemplos.

Obs.: com isso temos um relativo deslocamento de poder do Executivo e do Legislativo para o Judiciário,
o qual passa a ser protagonista nas ações, inclusive no que tange a implementação de políticas públicas.

- Reaproximação entre Direito e Moral, Ética, Filosofia e Justiça

- Desenvolvimento de novas Teoria da Norma, Teoria das Fontes e Teoria da Interpretação: no que tange
a Teoria da Norma, temos o reconhecimento da Força Normativa dos Princípios. Os princípios jurídicos
passam a ser tão normas quanto as regras. Até pouco tempo atrás, norma era regra e o princípio era usado
apenas para questões secundárias. Hoje em dia se considera que as normas constitucionais se dividem em
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duas espécies: princípios e regras. Veja que agora estão em pé de igualdade. Já na Teoria das Fontes,
nasce a ideia de que o direito não nasce apenas do legislador. Já falamos que o Poder Judiciário passa a
ser protagonista nas ações governamentais e criador do Direito. O Direito não mais emana só do
Legislador. O Poder Judiciário passa a efetivamente criar o Direito. Podemos citar a existência de
súmulas vinculantes, a repercussão geral dos recursos extraordinários, o novo Código de Processo Civil
(CPC), então, temos muitas hipóteses em que o Poder Judiciário pode interferir na criação e mutação do
Direito. Além disso, temos uma expansão da jurisdição constitucional e dos Tribunais Constitucionais.
Por último, na Teoria da Interpretação, temos os novos métodos de interpretação, que vão além dos
métodos clássicos, ou seja, uma nova hermenêutica constitucional.

1.1.3 Transconstitucionalismo
É o entrelaçamento de ordens jurídicas diversas (estatal, internacional, transnacional,
supranacional), em virtude do enfrentamento dos mesmos problemas constitucionais, ou seja, esse
fenômeno ocorre quando temos ordens jurídicas diferenciadas enfrentando concomitantemente as mesmas
questões de natureza constitucional. Essa teoria decorre diretamente da recente tendência mundial de
globalização.

Ex.: Na ADPF 101, o STF foi chamado a decidir sobre a possibilidade de


importação de pneus usados pelo Brasil. Só que ao mesmo tempo em que
discutíamos isso, o MERCOSUL, a União Europeia, a Organização Mundial
do Comércio (OMC), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a
Organização Mundial do Meio-Ambiente também o faziam. Todos discutiam
o mesmo tema concomitantemente. Apesar de parecer um tema relativamente
bobo, pense na abrangência disso, no impacto econômico que isso pode gerar.
Quantos veículos automotores temos em circulação no Brasil? E quantos pneus cada um consome e o
impacto ambiental que isso acarreta? Então, esse foi um tema de transconstitucionalismo.

E qual dessas ordens deve prevalecer? A interna estatal, a internacional, a transnacional ou a


supranacional? Em princípio, não deve uma ordem prevalecer sobre as outras. O que deve imperar é o
diálogo entre as ordens, chamado de conversações constitucionais para que decisões mais legítimas e
justas sejam tomadas.

1.1.4 Sentidos de Constituição


Temos quatro grandes sentidos de Constituição.

- Sociológico: formulada em 1863 por Ferdinand Lassalle. Ele define a Constituição como sendo os
fatores reais de poder (econômicos, militares, religiosos) que regem a sociedade. E o pedaço de papel que
chamamos de Constituição? Ele a chamava de "Constituição folha de papel", que seria diferente da

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Constituição real, formada pelos fatores real de poder. Dizia ainda que a "Constituição folha de papel"
sucumbe diante da Constituição real. Não seria um pedaço de papel que conduziria uma sociedade, mas
sim a economia, o poderio militar, religioso, a mídia, entre outros fatores. Conforme Lenza (2015):

Valendo-se do sentido sociológico, Ferdinand Lassale, em seu livro iQué es una Constitución?,
defendeu que uma Constituição só seria legítima se representasse o efetivo poder social, réfletindo
as forças sociais que constituem o poder. Caso isso não ocorresse, ela seria ilegítima,
caracterizando-se como uma simples ''folha de papel". A Constituição, segundo a conceituação de
Lassale, seria, então, a somatória dos fatores reais do poder dentro de uma sociedade.

- Político: surge em 1920 por Carl Schmitt. para ele, a Constituição pode ser definida como as decisões
políticas fundamentais do povo (Poder Constituinte). E a nossa Constituição, o que seria? Ele a chamaria
de legislações constitucionais. E, por sua, vez, as leis constitucionais sucumbiriam diante da Constituição,
que são as decisões políticas fundamentais do povo. Para Schmitt, democracia era a identidade entre
governante e governado, ou seja, o povo era o governante e o governante era um líder que traduzia a
vontade do povo. Segundo Lenza (2015): "Pode-se afirmar, portanto, em complemento, que, na visão de
Carl Schmitt, em razão de ser a Constituição produto de certa decisão política, ela seria, nesse sentido, a
decisão política do titular do poder constituinte".

- Jurídico: formulada também no século XX. Temos dois autores como expoentes desta teoria: Hans
Kelsen com seu livro "Teoria Pura do Direito" de 1961 (segunda edição, primeira edição em 1934) e
Konrad Hesse com sua obra "Força Normativa da Constituição" de 1959. Este sentido é totalmente
diferente dos anteriores. Para o sentido jurídico, a Constituição é entendida como uma norma prescritiva
de dever-ser, que vincula condutas e rege o Estado e a sociedade. Veja que há uma ênfase maior no
aspecto jurídico. O documento constitucional garantiria um mínimo de segurança jurídica sobre uma
sociedade. Lenza (2015) esclarece: "Hans Kelsen é o representante desse sentido conceitual, alocando a
Constituição no mundo do dever-ser, e não no mundo do ser, caracterizando-a como fruto da vontade
racional do homem, e não das leis naturais".

- Cultural: também do século XX, do autor Peter Haberle. Para ele, a Constituição deveria ser entendida
como um produto da cultura. Ela é o retrato de um povo em um determinado momento. Ela tem fatores
econômicos, fatores políticos, fatores jurídicos, mas não somente. Ela é uma conjunção de todos os
fatores. Haberle vai dizer então que Lassale, Schmitt, Kelsen, Hesse, todos estavam corretos, porém suas
teorias eram incompletas. Uma teoria não excluiria a outra. A Constituição é a cultura de um povo e a
cultura de um povo envolve aspectos econômicos, militares, religiosos, políticos e jurídicos. Apenas um
detalhe, a Constituição como produto da cultura é condicionada e condicionante da cultura. Elas se
influenciam mutuamente. Nesse sentido, pode-se dizer que a Constituição é produto de um fato cultural,
produzido pela sociedade e que nela pode influir.

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VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já aprendeu
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O constitucionalismo pode ser corretamente definido como um movimento que visa limitar o
poder e estabelecer um rol de direitos e garantias individuais, o que cria a necessidade de se instituir uma
carta, em regra escrita, que possa juridicizar essa relação entre Estado e cidadão, de forma a se gerar mais
segurança jurídica.

2) ( ) O constitucionalismo brasileiro inspirou-se fortemente no modelo constitucional do Estado da


Inglaterra.

3) ( ) O neoconstitucionalismo é caracterizado por um conjunto de transformações no Estado e no


direito constitucional, entre as quais se destaca a prevalência do positivismo jurídico, com a clara
separação entre direito e valores substantivos, como ética, moral e justiça.

4) ( ) Na concepção de Constituição em seu sentido político, formulada por Carl Schmitt, há uma
identidade entre o conceito de Constituição e o conceito de leis constitucionais, uma vez que é nas leis
constitucionais que se materializa a decisão política fundamental do Estado.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) O que assegura aos cidadãos o exercício dos seus direitos, a divisão dos poderes e a limitação do
governo pelo direito é:

(A) o constitucionalismo.

(B) a separação de poderes.

(C) o principio da legalidade.

(D) o federalismo.

(E) o Estado Democrático de Direito.

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6) A expressão constitucionalismo, como apontam os juristas, é de origem recente e traduz o resultado
dos movimentos contrários a determinados modelos de governo que foram predominantes em
denominada quadra histórica. Nessa trilha, o constitucionalismo traduz:

(A) centralização de governo.

(B) limitação do poder.

(C) vitória do proletariado.

(D) democracia socialista.

(E) governo das elites.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 E
5 A
6 B

RECADO FINAL:
Na aula de hoje começamos os nossos estudos de Direito, mais precisamente com o Direito
Constitucional. Trouxemos alguns conceitos ainda bem iniciais, porém muito importantes sobre Teoria da
Constituição. Falamos sobre constitucionalismo, neoconstitucionalismo, transconstitucionalismo e
citamos os sentidos da Constituição.
Na próxima aula, ainda trataremos destas questões teóricas iniciais, trazendo as classificações das
Constituições.
Tente dar uma revisada nestas noções iniciais passadas nesta aula, pois eles nos ajudarão, e muito,
a entender os conceitos que serão trabalhados na próxima aula.
Então, bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Na última aula iniciamos os nossos estudos sobre Teoria da Constituição, falando sobre o
constitucionalismo e a sua evolução histórica até os dias de hoje.
Nesta aula, vamos estudar as classificações das Constituições. Existem quase 30 classificações
trabalhadas por diversos autores, mas aqui, vamos trabalhar apenas as 8 que julgamos mais interessantes.
Partiu!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Classificar as Constituições.

INTRODUÇÃO:
Algumas Constituições possuem texto extenso, dispondo sobre as mais diversas matérias. Outras
apresentam texto reduzido, versando, tão somente, sobre matérias substancialmente constitucionais,
relacionadas com a organização básica do Estado e aos direitos e garantias fundamentais. Algumas
permitem a modificação do seu texto por meio de processo legislativo simples, idêntico ao de
modificação das demais leis, enquanto outras só podem ser alteradas por processo legislativo mais
dificultoso, solene. A depender dessas e de outras características, recebem da doutrina distintas
classificações.
E exatamente sobre isso, é o tema desta aula, Classificação das Constituições.
Vamos que vamos!!!

1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL


1.1.5 Classificações das Constituições
Existem diversas classificações para as Constituições. Aqui, vamos trabalhar apenas as mais
importantes.

1.1.5.1 Quanto ao Conteúdo


Talvez o mais básico e o mais utilizado de todos. Quanto ao conteúdo, toda Constituição será
classificada em:

- Formal: é aquela formalizada em um documento dotado de supremacia em relação às outras normas do


ordenamento jurídico. Esta Constituição sempre estará acima de qualquer outra norma jurídica. Trata-se
de uma verdadeira relação de hierarquia entre as normas. Todas as normas infraconstitucionais terão que
buscar seu fundamento na Constituição. Não há como falar deste assunto sem trazer a tão famigerada
Pirâmide de Kelsen.

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Apesar de a Constituição estar acima das demais normas, em regra, é possível se modificar uma
Constituição Formal. Isso é, inclusive, necessário, para que ela se adéque a novas realidades sociais, ainda
mais nos dias de hoje, em que o mundo é extremamente mutável e célere.
Mas, como nós modificamos uma Constituição Formal?
Uma Lei Ordinária pode modificá-la?
Não! A Constituição não está sempre acima das demais normas do ordenamento jurídico? Não
seria lógico que uma mera lei, dotada de menor força, pudesse modificá-la.
A única forma de se alterar uma Constituição Formal é mediante procedimentos especiais que ela
mesma determinar. Procedimentos estes mais complexos que aqueles necessários para se promulgar uma
simples lei.

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A nossa Constituição de 1988 é formal e em seu artigo 60 traz o procedimento de Emenda
Constitucional:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:


I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se,
cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de
defesa ou de estado de sítio.
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,
considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser
objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.

- Material: é um conjunto de normas escritas, ou não, dentro da Constituição Formal e que dizem respeito
às matérias tipicamente constitutivas do Estado e da sociedade (matérias mais importantes). São as
normas que organizam o Estado e as que estabelecem os direitos e garantias fundamentais.
A Constituição Material só existe dentro da Constituição Formal?
Não, é possível ter Constituição Material fora da Constituição Formal.

Exs.: Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90); Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003); Código
de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).

Não seria factível que uma Constituição tivesse, sei lá, 10.000 artigos.
Então, teremos muitas matérias constitucionais colocadas na legislação infraconstitucional. Uma
série de temas de organização do Estado e de direitos e garantias fundamentais não estão na Constituição
Formal, nem por isso deixam de ser matérias constitucionais.
Atente que as matérias constitucionais que estão dentro da Constituição Formal vão ter
supremacia, somente podendo ser modificadas por procedimentos especiais que a própria Constituição
determinar. Já as matérias constitucionais fora da Constituição Formal não serão dotadas desta
supremacia.
Outra perguntinha, dentro da Constituição Formal só existem normas materialmente
constitucionais?

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No caso da Constituição brasileira, não.
O ideal seria que a Constituição só tivesse matérias constitucionais, mas no Brasil, não é assim. A
nossa Constituição tem normas que só são formalmente constitucionais.
Em nossa Constituição existem normas material e formalmente constitucionais e normas só
formalmente constitucionais.

Ex.: Artigo 242, §2º da Constituição - "O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será
mantido na órbita federal". Norma só formalmente constitucional.

1.1.5.2 Quanto à Estabilidade

- Rígida: é aquela que requer procedimentos especiais para sua modificação. Pelo que já vimos no item
anterior, a nossa Constituição de 1988 é rígida.

- Flexível: é aquela que NÃO determina em seu texto nenhum requisito para a sua alteração, não
possuindo, assim, grau de dificuldade para a sua modificação que se dará da mesma maneira que as leis
comuns. Qualquer procedimento comum pode alterar o conteúdo da Constituição. Portanto, estas
Constituições estão no mesmo nível das leis, não há qualquer hierarquia, tampouco supremacia.

Ex.: Constituição inglesa.

- Semirrígida ou semiflexível: é a Constituição que possui uma parte rígida, que necessita de
procedimentos especiais para ser modificada, e uma parte flexível, que não precisa de procedimentos
especiais para ser modificada.

Ex.: Constituição brasileira de 1824.

Obs.: tanto a Constituição rígida como a flexível podem ser alteradas. A diferença entre elas está no
processo legislativo de alteração da Constituição. Na rígida verificamos um processo legislativo mais
árduo e mais solene do que o processo de alteração das leis ordinárias, enquanto na flexível a dificuldade
de alteração da Constituição e das leis é a mesma, motivo por que, do ponto de vista formal, não existe
hierarquia entre Constituição flexível e lei não constitucional ordinária.

1.1.5.3 Quanto à Forma

- Escrita: é aquela escrita e sistematizada em um documento, elaborada em um procedimento único por


um Poder Constituinte. Este é o caso da nossa Constituição de 1988.

17
- Não escrita: é aquela elaborada de forma esparsa no decorrer do tempo, fruto de um processo de
construção histórico.

Ex.: Constituição inglesa.

Na Constituição não escrita, podem existir documentos escritos?


Cuidado com a pegadinha!
Sim, pode!
Como vimos, a Constituição não escrita é aquela elaborada de forma esparsa no decorrer do
tempo. Então, teremos documentos escritos, mas eles estarão esparsos, e não reunidos em um único
documento, como ocorre com a Constituição escrita.
Continuando o exemplo, na Constituição inglesa, nós temos diversos documentos escritos, tais
como: a Magna Carta de 1215, a Petição de Direitos de 1628, o Bill of Rights de 1689, Act of Settlement
de 1701, dentre outros. Perceba que há uma construção histórica que conduz o Direito Constitucional
britânico, o qual está previsto em diversas normas esparsas que vão tratar da organização do Estado
britânico e dos direitos e garantias fundamentais.
Além disso, veremos um pouco mais a frente que no Reino Unido os costumes jurídicos vinculam
os cidadãos e o Estado e também poderão fazer parte da Constituição, desde que tratem de temas
constitucionais. Por exemplo, não está escrito em lugar algum que é proibido à rainha ou ao rei negar
sanção real aos projetos aprovados no Parlamento. Mas, já se vão mais de 400 anos que um rei ou uma
rainha não nega a sanção real a um projeto do Parlamento. Chegou lá, sanciona. Por que? Porque na
época da Revolução Gloriosa foi trazida a ideia de que o rei reina, mas não governa, dando fim à tirania
do Estado Absolutista.

1.1.5.4 Quanto ao Modo de Elaboração

- Dogmática: equivale à escrita quanto à forma. Tudo falado acima para a Constituição Escrita vale aqui
também. Ela é chamada de dogmática porque traz os dogmas de um país em um determinado momento.
Logo, pelo que vimos acima, a Constituição brasileira de 1988 é dogmática.

- Histórica: equivale à não escrita quanto à forma. Tudo falado acima para a Constituição Não Escrita
vale aqui também. É aquela elaborada de forma esparsa ao longo do tempo, fruto de um processo de
construção histórico.

1.1.5.5 Quanto à Origem


Quanto à origem democrática ou não do documento. Houve participação do povo na elaboração?

18
- Promulgada: é aquela elaborada com a participação popular, ainda que por meio de representantes. É
sinônimo de Constituição Democrática. Ela tem legitimidade popular. É o caso da Constituição brasileira
de 1988. Além delas, tivemos as Constituições brasileiras de 1891, 1934 e 1946, todas promulgadas.

- Outorgada: é aquela elaborada sem a participação popular. É sinônimo de


Constituição Autocrática. Não tem legitimidade popular. No Brasil, também já
tivemos algumas Constituições impostas: 1824, 1937, 1967 e 1969 (alguns
defendem que foram apenas emendas à Constituição de 1967, outros dizem que se
tratou, na verdade, de outra Constituição). Esta aqui ao lado é a capa da
Constituição de 1824, do Brasil Império.

- Cesarista ou bonapartistas: é aquela elaborada sem a participação popular, mas após sua produção o
povo é chamado a referendar ou não o documento. Trata-se de uma consulta plebiscitária via referendo.

Exs.: Napoleão na França, Augusto Pinochet no Chile, Saddam Hussein no Iraque.

1.1.5.6 Quanto à Extensão

- Sintética: é uma Constituição resumida, sucinta e que só apresenta matérias constitucionais em seu texto
(organização do Estado e direitos e garantias fundamentais).

Ex.: Constituição Norte-Americana de 1787, que possui apenas 7 artigos.

19
- Analítica: é aquela Constituição prolixa e de cunho detalhista e que não apresenta apenas matérias
constitucionais em seu texto. É o caso da nossa Constituição de 1988.

Exs.: Constituição portuguesa de 1976 e Constituição espanhola de 1978.

1.1.5.7 Quanto à Finalidade

- Garantia: é aquela que se volta para o passado. São típicas dos Estados Liberais dos séculos XVIII e
XIX. São Constituições abstencionistas ou negativas, ou seja, que não intervêm no Estado e na sociedade.
Visavam apenas a garantir direitos já assegurados pelas revoluções contra ataques do Poder Público.
Tinham como mote impedir a volta da tirania e do absolutismo, limitando o poder e garantindo alguns
direitos fundamentais.

- Balanço: é aquela que se volta para o presente. São típicas dos Estados Socialistas do século XX. São
Constituições de cunho marxista.

- Dirigente: é aquela que se volta para o futuro. São


típicas dos Estados Sociais do século XX, fruto do
constitucionalismo social e do Welfare State ou
Estado de bem-estar social. São aquelas que
estabelecem uma ordem concreta de valores para o
Estado e a sociedade. Portanto, estabelecem uma
pauta e uma série de programas a serem cumpridos
pelo Estado e a sociedade, temos aí o chamado
dirigismo constitucional. São comuns em seus textos
as normas programáticas. A nossa Constituição de
1988 se enquadra neste caso.

20
1.1.5.8 Ontológica
Estudo proposto por Karl Loewenstein. Ele propõe que além do texto, sejam analisadas as relações
sociais subjacentes ao texto. A ontologia busca o estudo de um determinado ser, ou seja, a essência de
alguma coisa. Busca-se aquilo que vai tão fundo naquela coisa, que o diferencia de todo o resto existente,
o que realmente esta coisa é.
Assim, a classificação ontológico é aquela que visa fazer uma análise da relação do texto da
Constituição com a realidade social vivenciada pelo texto.
Profundo, não!?rs

- Normativa: é aquela em que há uma adequação entre o texto e a realidade social.

- Nominal: é aquela em que NÃO há uma adequação entre o texto e a realidade social. É o caso da
Constituição brasileira de 1988.

- Semântica: é aquela que trai o significado do termo Constituição. Porque ao invés de limitar o poder, ela
legitima o poder autoritário, ao invés de regulá-lo.

Por fim, vejamos o quadro abaixo de legitimidade e efetividade de cada tipo destas Constituições:

Constituição Legitimidade Efetividade


Constituição Normativa SIM SIM
Constituição Nominal SIM NÃO
Constituição Semântica NÃO SIM

21
Por fim, podemos resumir no esquema abaixo tudo o que vimos nesta aula:

22
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Novamente, vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já
aprendeu até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A diferença entre Constituição rígida e flexível é que esta última pode ser alterada e aquela não.

2) ( ) Na concepção teórica da Constituição em sentido ontológico, de Karl Loewenstein, uma das


classificações que se apresenta é a de Constituição semântica, que é aquela cujas normas dominam o
processo político, ou seja, quando o processo político se submete às normas constitucionais.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) A Constituição que, resultante dos trabalhos de um órgão constituinte, sistematiza as ideias e os


principias fundamentais de teoria política e do Direito dominante no momento, quanto ao modo de sua
elaboração, denomina-se:

(A) flexível.

(B) formal.

(C) semirrígida.

(D) outorgada.

(E) dogmática.

4) Quanto ao grau de estabilidade, as Constituições se classificam em:

(A) flexíveis, rígidas, semirrígidas ou semiflexíveis.

(B) promulgadas, outorgadas, cesaristas e pactuadas.

(C) analíticas e sintéticas.

(D) escritas e costumeiras.

(E) rígidas e flexíveis.

23
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 E
4 A

RECADO FINAL:
Nesta aula falamos sobre as classificações das Constituições. Existem várias outras, mas
trouxemos apenas aquelas que julgamos mais importantes e interessantes.
Na próxima aula, terminaremos esta parte introdutória de Teoria da
Constituição e avançaremos ao estudo dos direitos e garantias fundamentais.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

24
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Nesta aula, finalizaremos nossos estudos sobre a Teoria da Constituição.
Agora, falaremos sobre o Poder Constituinte. Aula bastante teórica e com conceitos muito
importantes, aos quais teremos que manter toda a nossa atenção voltada.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Poder Constituinte;
- Definir a Titularidade;
- Citar as Formas de Exercício; e
- Citar as Espécies.

INTRODUÇÃO:
A análise do Poder Constituinte, como o conhecemos hoje, remete-se indispensavelmente, aos
movimentos constitucionalistas do Século XVIII, que teve como foco a real participação dos cidadãos na
formação de um Estado Democrático de Direito.
Gerado nos estudos do abade francês Joseph Sieyés, o Poder Constituinte, é fundamentalmente um
poder de características políticas e filosóficas, haja vista fundar-se na disposição constitucional que irá
gerenciar a vida de determinada nação.
O próprio movimento constitucionalista se remete à análise do Estado e a conformação no qual
este se expôs durante a história, tendo como foco inicialmente a delimitação de sua teoria, no intuito de
construir fundamentos teóricos pertinentes e necessários ao rompimento com Absolutismo reinante à
época.
E este será o tema desta aula, o Poder Constituinte.

1.0 DIREITO CONSTITUCIONAL


1.1.6 Poder Constituinte
A Teoria do Poder Constituinte foi originalmente concebida pelo abade francês Emmanuel Sieyès,
no século XVIII, em sua obra “O que é o Terceiro Estado?”.
Nesse Trabalho, concluído às vésperas da Revolução Francesa, o autor trouxe a tese inovadora,
que rompia com a legitimação dinástica do poder. Ao mesmo tempo, colocava por terra as teorias
anteriores ao iluminismo, que determinavam que a origem do poder era divina.
Esta teoria se alicerça na distinção entre Poder Constituinte e Poderes Constituídos. O Poder
Constituinte é o poder que cria a Constituição. Os Poderes Constituídos são o resultado dessa criação, isto
é, são os poderes estabelecidos pela Constituição.

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Segundo Canotilho (2003): "o poder constituinte se revela sempre como uma questão de 'poder',
de 'força' ou de 'autoridade' política que está em condições de, numa determinada situação concreta,
criar, garantir ou eliminar uma Constituição entendida como lei fundamental da comunidade política".

1.1.6.1 Conceito
Como vimos na aula anterior, nos Estados que adotam Constituição do tipo rígida, há uma
diferenciação marcante entre o processo legislativo de elaboração de normas constitucionais e o processo
legislativo de elaboração das demais normas infraconstitucionais.
Podemos identificar dois tipos de legisladores nesses Estados: o legislador constituinte, com
competência para elaborar normas constitucionais; e o legislador ordinário, com competência para
elaborar as demais normas do ordenamento jurídico.
Com efeito, o Poder Constituinte é o poder de elaborar e modificar normas constitucionais. É,
assim, o poder de estabelecer a Constituição de um Estado, ou de modificar a Constituição já existente.

1.1.6.2 Titularidade
Paulo e Alexandrino (2015) nos ensinam que:

A teoria do poder constituinte está relacionada com a legitimidade do poder, com a soberania
nacional e a soberania popular em um dado Estado. Nasceu do fortalecimento do racionalismo, em
oposição ao poder absoluto das monarquias de direito divino, com a substituição de Deus pela
nação, como titular da soberania. Para Sieyes, o titular legítimo do poder constituinte seria
unicamente a Nação.
Contemporaneamente, porém, é hegemônico o entendimento de que o titular do poder constituinte
é o povo (e não mais a nação), pois só este tem legitimidade para determinar quando e como deve
ser elaborada uma nova Constituição, ou modificada a já existente. A soberania popular, que é, na
essência, o poder constituinte do povo, é a fonte única de que procedem todos os poderes públicos
do Estado. Mesmo nos regimes ditatoriais é o povo o único e legítimo titular do poder constituinte
(o que se dá, nesse caso, conforme será explicado no item seguinte, é a usurpação desse poder).

Então, podemos concluir que para a doutrina mais moderna, a titularidade do Poder Constituinte
pertence ao povo. Isso fica bem claro quando lemos o artigo 1º, parágrafo único da Constituição: "Todo o
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição".

1.1.6.3 Formas de Exercício


O Poder Constituinte Originário pode se manifestar na criação de um novo Estado ou na
refundação de um Estado, com a substituição de uma Constituição por outra, como ocorre no caso de
golpe, revolução, desagregação social, ou mesmo, se assim desejar o povo, em períodos de normalidade
social. No primeiro caso, temos o denominado Poder Constituinte Originário Histórico e , nos demais, o
Poder Constituinte Originário Revolucionário.
26
Assim, temos que o Poder Constituinte Originário Histórico seria o verdadeiro Poder
Constituinte Originário estruturando, pela primeira vez, o Estado. Poder Constituinte Originário
Revolucionário seriam todos os posteriores ao histórico, rompendo por completo com a antiga ordem e
instaurando uma nova.
Em que pese a titularidade do Poder Constituinte pertencer sempre ao povo, podemos verificar
dois modos distintos para o seu exercício: democrático (Poder Constituinte Legítimo) ou autocrático
(Poder Constituinte Usurpado).
Conforme lição de Paulo e Alexandrino (2015):

O exercício autocrático do poder constituinte caracteriza-se pela denominada outorga:


estabelecimento da Constituição pelo indivíduo, ou grupo, líder do movimento revolucionário que
o alçou ao poder, sem a participação popular. É ato unilateral do governante, que autolimita o seu
poder e impõe as normas constitucionais ao povo (e, teoricamente, a si mesmo).
O exercício democrático do poder constituinte ocorre pela assembleia nacional constituinte ou
convenção: o povo escolhe seus representantes (democracia representativa), que formam o órgão
constituinte, incumbido de elaborar a Constituição do tipo promulgada.

Então, a outorga corresponde à criação de forma autocrática da Constituição através do exercício


do Poder Constituinte pela única vontade do tirano, sem qualquer representação ou participação popular.
Já no exercício democrático do Poder
Constituinte, o povo, legítimo titular do poder
constituinte, democraticamente, confere poderes a seus
representantes especialmente eleitos para a elaboração e
promulgação da Constituição.
Finalizando o tema, Paulo e Alexandrino (2015)
nos esclarecem que:

Seja qual for a forma de exercício do poder constituinte - legítima ou mediante usurpação - um
ponto deve ficar claro: sempre que houver ruptura da ordem constitucional estabelecida, e sua
substituição por uma outra, ocorre manifestação do poder constituinte, ou seja, a nova
Constituição será sempre obra do poder constituinte, mesmo que imposta mediante exercício
ilegítimo desse poder.

1.1.6.4 Espécies
Classicamente, temos duas espécies de Poder Constituinte identificadas pela doutrina: Originário e
o Derivado. Mais modernamente, vem se falando também na existência do Poder Constituinte Difuso e do
Poder Constituinte Supranacional.
O Poder Constituinte Originário é inicial, autônomo, ilimitado juridicamente, incondicionado,
soberano na tomada de suas decisões, um poder de fato e político, permanente.

27
- inicial, pois instaura uma nova ordem jurídica, rompendo, por completo, com a ordem jurídica anterior;
- autônomo, visto que a estruturação da nova constituição será determinada, autonomamente, por quem
exerce o poder constituinte originário;
- ilimitado juridicamente, no sentido de que não tem de respeitar os limites postos pelo direito anterior;
- incondicionado e soberano na tomada de suas decisões, porque não tem de se submeter a qualquer
forma prefixada de manifestação;
- poder de fato e poder político, podendo, assim, ser caracterizado como uma energia ou força social,
tendo natureza pré-jurídica, sendo que, por essas características, a nova ordem jurídica começa com a sua
manifestação, e não antes dela; e
- permanente, já que o Poder Constituinte Originário não se esgota com a edição da nova Constituição,
sobrevivendo a ela e fora dela como forma e expressão da liberdade humana, em verdadeira ideia de
subsistência.

Lembrando que, conforme dissemos mais acima, o Poder Constituinte Originário se subdivide em:
Histórico e Revolucionário.
Já o Poder Constituinte Derivado, também denominado instituído, constituído, secundário, de
segundo grau ou remanescente, é criado e instituído pelo Poder Constituinte Originário. Ao contrário
deste, ele deve obedecer às regras colocadas e impostas pelo Poder Constituinte Originário, sendo
derivado, limitado e condicionado aos parâmetros a ele impostos.

- derivado, porque é instituído pelo Poder Constituinte Originário.


- limitado, ou subordinado porque encontra limitações constitucionais expressas e implícitas, não
podendo desrespeitá-las, sob pena de inconstitucionalidade.
- condicionado, porque a sua atuação deve observar fielmente as regras predeterminadas pelo texto
constitucional.

O Poder Constituinte Derivado se subdivide em: Reformador, Revisor e Decorrente.


O Poder Constituinte Derivado Reformador tem a capacidade de modificar a Constituição, por
meio de um procedimento específico; estabelecido pelo Originário, sem que haja uma verdadeira
revolução.
A doutrina classifica as limitações que podem ser impostas pelo Poder Constituinte Originário à
atuação do Poder Constituinte Derivado Reformador, ao modificar o texto constitucional, nos seguintes
grupos:

- temporais: quando a Constituição estabelece um período durante o qual o seu texto não pode ser
modificado;

28
- circunstanciais: quando a Constituição veda a sua modificação durante certas circunstâncias
excepcionais, de conturbação da vida do Estado;
- materiais: quando a Constituição enumera certas matérias que não poderão ser abolidas do seu texto
pelo reformador; e
- processuais ou formais: quando a Constituição estabelece certas exigências no processo legislativo de
aprovação de sua modificação, tornando este distinto e mais trabalhoso do que aquele estabelecido para a
elaboração das demais leis do ordenamento.

O Poder Constituinte Derivado Revisor também é fruto do trabalho de criação do originário,


estando, portanto, a ele vinculado. É um poder condicionado e limitado às regras instituídas pelo
Originário.
Encontra-se previsto no artigo 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o
qual dispõe: "A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da
Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão
unicameral".
Como o próprio texto constitucional prescreve, após 5 anos, contados de 05/10/1988, seria
realizada uma revisão na Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso
Nacional, em sessão unicameral. Esta revisão constitucional deveria dar-se após, pelo menos, 5 anos,
podendo ser feita posteriormente, mas apenas uma única vez, sendo impossível uma segunda produção
de efeitos. Tratou-se de um procedimento simplificado de alteração do nosso texto constitucional.
Em se tratando de manifestação de um Poder Derivado, os limites foram estabelecidos pelo
próprio Poder Constituinte Originário. Ficou fixado como limite material o mesmo determinado ao Poder
Constituinte Derivado Reformador, qual seja, o limite material fixado nas chamadas "cláusulas pétreas",
contidas no artigo 60, § 4º da Constituição:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:


§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.

Este procedimento, ocorrido ao longo de 1994, gerou 6 Emendas Constitucionais de Revisão, não
sendo mais possível nova manifestação do Poder Constituinte Derivado Revisor em razão da eficácia
exaurida e aplicabilidade esgotada da aludida regra.
O Poder Constituinte Derivado Decorrente é o poder que a Constituição atribuiu aos Estados-
Membros e ao Distrito Federal para se auto-organizarem, por meio da elaboração de suas próprias
Constituições, isto é, se trata da competência atribuída pelo Poder Constituinte Originário aos Estados-
Membros e ao Distrito Federal para criarem suas próprias Constituições, desde que observadas as regras e

29
limitações impostas pela Constituição da República. Entendimento cristalino que pode ser obtido da
simples leitura do artigo 25 da Constituição: "Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e
leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição".

Obs.: os municípios, embora dotados de autonomia política, administrativa e financeira, com competência
para elaborar suas próprias Leis Orgânicas (artigo 29 da Constituição), não dispõem de Poder Constituinte
Derivado Decorrente.

O Poder Constituinte Difuso é um poder de fato que atua na etapa da mutação constitucional,
meio informal de alteração da Constituição. Cabe a ele, portanto, alterar o conteúdo, o alcance e o sentido
das normas constitucionais, mas de modo informal, sem qualquer modificação na literalidade do texto da
Constituição.
É chamado de difuso porque não vem formalizado no texto das Constituições. É um poder de fato
porque nascido do fato social, político e econômico. É meio informal porque se manifesta por intermédio
das mutações constitucionais, modificando o sentido das Constituições, mas sem nenhuma alteração do
seu texto expresso.
Nas palavras de Lenza (2015):

Se por um lado a mudança implementada pelo poder constituinte derivado reformador se verifica
de modo formal, palpável, por intermédio das emendas à Constituição, a modificação produzida
pelo poder constituinte difuso se instrumentaliza de modo informal e espontâneo, como
verdadeiro poder de fato, e que decorre dos fatores sociais, políticos e econômicos, encontrando-
se em estado de latência. Trata-se de processo informal de mudança da Constituição, alterando-
se o seu sentido interpretativo, e não o seu texto, que permanece intacto e com a mesma
literalidade.

A mutação e a nova interpretação não poderão macular os princípios estruturantes da


Constituição, sob pena de se caracterizar inaceitável interpretação inconstitucional.
Por fim, o Poder Constituinte Supranacional (transnacional ou global) é o poder de fato
encarregado de fazer e reformular as Constituições transnacionais, supranacionais ou globais. Agindo de
fora para dentro, o Poder Constituinte Supranacional busca estabelecer uma Constituição supranacional
legítima.
O Poder Constituinte Supranacional tem sua fonte de validade na cidadania universal, na
multiplicidade de ordenamentos jurídicos, no desejo dos povos de se integrarem e interagirem, propondo
um redimensionamento no conceito clássico de soberania, com o fim de elaborar Constituições que
ultrapassem fronteiras domésticas de um Estado, em nome de uma integração maior, com vistas a
alcançar uma comunidade de nações.

30
Ex.: O exemplo prático do intento de concretização do
poder constituinte supranacional é o que se prenuncia na
Europa, em que os diferentes Estados soberanos integrantes
da União Europeia têm analisado a viabilidade da adoção de
uma Constituição transnacional democrática.

Resumindo o que vimos ao longo desta aula, temos o seguinte gráfico:

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para testar os seus conhecimentos. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Poder Constituinte Originário se esgota quando é editada uma Constituição, razão pela qual,
além de ser inicial, incondicionado e ilimitado, ele se caracteriza pela temporariedade.

2) ( ) O poder de reforma recebe, doutrinariamente, as mais diferentes denominações, sendo seus


sinônimos as expressões poder constituinte derivado ou poder constituinte de segundo grau.

3) ( ) A revisão constitucional, prevista no ADCT, é considerada norma constitucional de eficácia


exaurida e de aplicabilidade esgotada, não estando sujeita à incidência do poder reformador.

4) ( ) O sistema constitucional vigente criou a figura do poder constituinte derivado revisor, cuja
manifestação, prevista no artigo 3º do ADCT, deve ocorrer a cada dez anos, visando manter atual o texto
da Constituição.
31
5) ( ) O poder constituinte originário, por ser aquele que instaura uma nova ordem jurídica, exige
deliberação da representação popular, razão pela qual não se admite a outorga como forma de sua
expressão.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

6) O Poder Constituinte derivado decorrente consiste:

(A) no estabelecimento da primeira Constituição de um novo país.

(B) na possibilidade de se alterar o texto constitucional do país, respeitando-se a regulamentação especial


prevista na própria Constituição.

(C) na possibilidade de os Estados-membros se auto-organizarem através de suas Constituições Estaduais


próprias, respeitando as regras limitativas da Constituição da República.

(D) no estabelecimento de uma Constituição posterior de um velho pais.

(E) no fato de não estar sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar a sua vontade.

7) O processo formal de mudança das Constituições rígidas, por meio da atuação do poder constituinte
derivado, com a aprovação de emendas constitucionais, segundo os procedimentos estabelecidos na
própria Constituição pelo legislador constituinte originário, é próprio:

(A) da revisão constitucional e da mutação constitucional.

(B) da mutação constitucional e da reforma constitucional.

(C) da reforma constitucional e da revisão constitucional.

(D) da mutação constitucional e do poder constituinte derivado decorrente.

(E) do poder constituinte derivado reformador e da mutação constitucional.

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GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 C
4 E
5 E
6 C
7 C

RECADO FINAL:
Concluímos nesta aula o nosso estudo sobre Teoria da Constituição,
falando sobre o Poder Constituinte. Conceituamos este Poder, bem como
definimos sua titularidade, citamos suas formas de exercício e suas espécies.
Fechamos, então, esta parte mais introdutória e na próxima aula já
começaremos a estudar o que muitos consideram ser um dos pontos mais
importantes do Direito Constitucional, que são os direitos e garantias
fundamentais.
Tente tirar um tempinho para revisar estas primeiras aulas, pois elas
serão a base de nossos estudos.
Dito isto...
Até a próxima aula!

33
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Agora que já concluímos o estudo inicial sobre Teoria da Constituição, podemos avançar mais um
pouco nos nossos estudos de Direito Constitucional. Nesta aula, começaremos a ver o que muitos
consideram ser um dos pontos mais importantes deste ramo do direito, que são os direitos e garantias
fundamentais.
Vamos nessa!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as características dos direitos fundamentais;
- Classificar os direitos fundamentais;
- Citar as hipóteses de restrição aos direitos fundamentais; e
- Citar os deveres fundamentais.

INTRODUÇÃO:
Parte da doutrina vai dizer que a origem dos direitos e garantias fundamentais teria sido a Magna
Carta inglesa de 1215, o que não parece ser exatamente a acepção mais correta, pois os direitos e
garantias ali constantes não tinham propriamente a pretensão de assegurar liberdades aos cidadãos em
geral, mas sim, prioritariamente, garantir liberdade e poder político a algumas classes específicas da
aristocracia inglesa, mediante a limitação dos poderes do rei.
O mais correto seria inferir que a positivação dos direitos e garantias fundamentais se deu a partir
da Revolução Francesa, com a Declaração dos Direitos do Homem em 1789, e das declarações de direitos
formuladas pelos Estados Americanos em 1776, ao firmarem sua independência em relação à Inglaterra.
Como estudamos em aulas anteriores, estes foram os principais marcos do surgimento do
constitucionalismo ocidental, que tinham como objetivos principais a limitação do poder estatal e,
justamente, o estabelecimento de direitos e garantias fundamentais.
Neste contexto, os primeiros direitos e garantias fundamentais surgem com este intuito de impor
limites e controles aos atos praticados pelo Estado e suas autoridades constituídas em face dos cidadãos.
Assim, nasceram para resguardar uma esfera mínima de proteção à liberdade do indivíduo frente à
ingerência abusiva do Estado. Por esta razão, esta primeira geração de direitos e garantias fundamentais
surgidos será conhecida como direitos negativos, pois exigirão que o Estado se abstenha de fazer alguma
coisa, será um não fazer do Estado em respeito a esta liberdade assegurada ao indivíduo.
Resumindo, os direitos e garantias fundamentais surgiram como normas que visavam à restrição
da atuação estatal, exigindo deste uma abstenção em favor da liberdade individual do cidadão. Somente
no século XX, com o reconhecimento dos direitos e garantias fundamentais de segunda geração,
denominados direitos sociais, os direitos fundamentais passaram a ter feição positiva, uma vez que

34
passaram a exigir uma atuação efetiva estatal, um fazer do Estado, uma prestação positiva no sentido de
garantir o bem-estar de seus cidadãos.

1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS


O Título II da Constituição classifica o gênero direitos e garantias fundamentais nas seguintes
espécies:

- direitos e deveres individuais e coletivos;


- direitos sociais;
- direitos de nacionalidade;
- direitos políticos;
- partidos políticos; e
- remédios constitucionais.

Considerando o nosso tempo exíguo, no estudo da nossa matéria, abordaremos apenas a primeira e
a última espécies acima, direitos e deveres individuais e coletivos, que terão grande fundamento no artigo
5º da Constituição. Entretanto, ressalta-se que apesar de estarem amplamente elencados neste artigo, os
direitos e deveres individuais e coletivos não se restringem apenas a isso, sendo encontrados ao longo de
toda a Constituição, entendimento pacífico tanto na doutrina, quanto na jurisprudência.
Falamos em direitos e garantias fundamentais, mas eles não são sinônimos. Há diferença entre
eles. Nesta seara, Paulo e Alexandrino (2015) nos esclarecem que:

Os direitos fundamentais são os bens em si mesmo considerados, declarados como tais


nos textos constitucionais.
As garantias fundamentais são estabelecidas pelo texto constitucional como
instrumentos de proteção dos direitos fundamentais. As garantias possibilitam que os indivíduos
façam valer, frente ao Estado, os seus direitos fundamentais. Assim, ao direito à vida corresponde
a garantia de vedação à pena de morte; ao direito à liberdade de locomoção corresponde a garantia
do habeas corpus; ao direito à liberdade de manifestação do pensamento, a garantia da proibição
da censura etc.

Assim, os direitos fundamentais são os bens jurídicos propriamente ditos concedidos aos
indivíduos pela própria Constituição, enquanto as garantias são os instrumentos por meio dos quais é
possível o exercício desses direitos, bem como a correspondente reparação, nos casos de violação.

Ex.: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos - artigo 5º, VI da Constituição (direito), garantindo-se na forma da lei a proteção aos locais de
culto e suas liturgias (garantia).

35
Ex.: direito ao juízo natural (direito) - o artigo 5º, XXXVII, veda a instituição de juízo ou tribunal de
exceção (garantia).

Por fim, devemos ter em mente que não há uma lista fechada de direitos e garantias fundamentais,
sendo um conjunto aberto, dinâmico e mutável no tempo. Este é o entendimento que podemos inferir do
exposto no artigo 5º, §2º da Constituição: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais
em que a República Federativa do Brasil seja parte".

1.2.1 Características
Apesar de serem bastante diferentes entre si, podemos elencar algumas características comuns aos
direitos fundamentais, tais como:

- Imprescritibilidade: os direitos fundamentais não desaparecem pelo decurso do tempo.


- Inalienabilidade: não há possibilidade de transferência dos direitos fundamentais a terceiros. Como são
conferidos a todos, são indisponíveis; não se pode aliená-los por não terem conteúdo econômico-
patrimonial.
- Irrenunciabilidade: em regra, os direitos fundamentais não podem ser objeto de renúncia. O que pode
ocorrer é o seu não exercício, mas nunca a sua renúncia, ou seja, o titular de um direito fundamental não
tem poder de disposição sobre ele, não podendo abrir mão de sua titularidade. Atualmente, a doutrina
mais moderna vem aceitando, diante de um caso concreto, a renúncia temporária e excepcional a direito
fundamental. Assim, a renúncia voluntária ao exercício de um direito fundamental é admitida, desde que
em um caso concreto, a renúncia geral de exercício é inadmissível.

Ex.: reality shows. São programas em que


os participantes em um caso específico e
por um tempo determinado renunciam,
durante a exibição do programa, à
inviolabilidade da imagem, da
privacidade e da intimidade em troca do
recebimento de um possível, além de
fama e reconhecimento.

- Inviolabilidade: impossibilidade de sua não observância por disposições infraconstitucionais ou por


atos das autoridades públicas.
- Universalidade: devem abranger todos os indivíduos, independentemente de sua nacionalidade, sexo,
raça, credo ou convicção político-filosófica.
- Efetividade: a atuação do Poder Público deve ter por escopo garantir a efetivação dos direitos
fundamentais.
36
- Interdependência: as várias previsões constitucionais, apesar de autônomas, possuem diversas
intersecções para atingirem suas finalidades; assim, a liberdade de locomoção está intimamente ligada à
garantia do habeas corpus, bem como à previsão de prisão somente por flagrante delito ou por ordem da
autoridade judicial.
- Complementaridade: os direitos fundamentais não devem ser interpretados isoladamente, mas sim de
forma conjunta com a finalidade de alcançar os objetivos previstos pelo legislador constituinte.
- Concorrência: podem ser exercidos cumulativamente, quando, por exemplo, o jornalista transmite uma
notícia (direito de informação) e, ao mesmo tempo, emite uma opinião (direito de opinião).
- Relatividade ou Limitabilidade: os direitos fundamentais não têm natureza absoluta. Nenhum direito é
absoluto, havendo, muitas vezes, conflito de interesses. Os direitos fundamentais encontram limites nos
demais direitos igualmente consagrados na Constituição. Cabe salientar que NÃO existe hierarquia entre
direitos fundamentais. A solução ou vem discriminada na própria Constituição (ex.: direito de
propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual
direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos
fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição. Assim, na hipótese de conflito entre
direitos fundamentais, o intérprete deverá realizar um juízo de ponderação, consideradas as características
específicas de cada caso.

1.2.2 Classificação
Os direitos fundamentais são tradicionalmente classificados em gerações ou dimensões, levando-
se em conta o momento de seu surgimento e reconhecimento pelos ordenamentos constitucionais.
Como já adiantamos acima, os
direitos fundamentais de primeira
geração estão intimamente relacionados
com o princípio da liberdade. Basicamente,
foram os direitos civis e políticos,
reconhecidos nas Revoluções Francesa e
Americana. Caracterizam-se principalmente
pela imposição ao Estado de um dever de
abstenção, de não fazer, de não interferência,
de não intromissão na esfera de
autodeterminação de cada indivíduo. São
chamadas de liberdades individuais, tendo
como foco principal a liberdade da pessoa
individualmente considerada, sem qualquer

37
preocupação com desigualdades sociais. Surgiram no fim do século XVIII, como uma resposta do Estado
liberal ao Estado absoluto. Dominaram todo o século XIX, haja vista que os direitos de segunda geração
somente aparecem no século XX.
Esta geração de direitos se limita a impor restrições à atuação do Estado, em favor da liberdade do
indivíduo. Por esse motivo são referidos como direitos negativos.

Ex.: direito à vida, à liberdade, à propriedade, à liberdade de expressão, à participação política e religiosa,
à inviolabilidade de domicílio, à liberdade de reunião.

Já os direitos fundamentais de segunda geração vão exigir uma atuação efetiva do Estado,
correspondendo às liberdades positivas, reais ou concretas, acentuando o princípio da igualdade entre as
pessoas (igualdade material). São os direitos econômicos, sociais e culturais.
Surgiram com os movimentos sociais do século XIX que ocasionaram, no início do século XX, o
aparecimento da segunda geração de direitos fundamentais, responsável pela gradual passagem do Estado
liberal, de cunho individualista, para o Estado social, centrado na proteção aos mais necessitados e na
busca da igualdade material entre as pessoas.
Estes direitos fundamentais irão manifestar-se principalmente através da implementação de
políticas e serviços públicos, exigindo do Estado prestações sociais, sendo, por isso, denominados
direitos positivos.

Ex.: direito à saúde, educação, trabalho, habitação, previdência social, assistência social.

Por sua vez, os direitos fundamentais de terceira geração consagram os princípios da


solidariedade e da fraternidade, sendo atribuídos genericamente a todas as formações sociais,
protegendo interesses de titularidade coletiva ou difusa.

Ex.: direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à defesa do consumidor, à paz, à


autodeterminação dos povos, ao patrimônio comum da humanidade, ao progresso e desenvolvimento.

Os direitos fundamentais de terceira


geração não se destinam especificamente à
tutela de interesses individuais, de um grupo
ou de um determinado Estado. Sua
titularidade é difusa ou coletiva, uma vez que
visam à proteção de coletividades, e não da
pessoa individualmente considerada,
expressando a ideia de fraternidade e
solidariedade entre os variados povos e
Estados soberanos.

38
Perceba que a idéia destas três primeiras gerações de direitos fundamentais corresponde ao que foi
defendido lá atrás na Revolução Francesa - liberdade, igualdade e fraternidade.
Estas são as três gerações clássicas de direitos fundamentais. Mais recentemente, discute-se a
existência de uma quarta e quinta gerações de direitos fundamentais, em complementação às três
dimensões já consagradas. Porém, não há consenso na doutrina quanto a isso. Desta forma, também não
entraremos muito em detalhes neste ponto. Ficaremos apenas com as três dimensões mais tradicionais.

1.2.3 Restrições
A nossa Constituição reconhece algumas ocasiões excepcionais e gravíssimas em que serão
permitidas restrições ou suspensões temporárias de direitos fundamentais sem necessidade de qualquer
autorização prévia do Poder Judiciário, que são o Estado de Defesa e o Estado de Sítio.
No Estado de Defesa, um pouco mais brando, poderemos ter as restrições previstas no artigo 136
da Constituição:

Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de


Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais
restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente
instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as
áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a
vigorarem, dentre as seguintes:
I - restrições aos direitos de:
a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;
b) sigilo de correspondência;
c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;
II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública,
respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

39
Já na ocorrência de um Estado de Sítio, considerando a gravidade da situação, poderemos ter
restrições ainda maiores a direitos e garantias fundamentais. Segundo o artigo 139 da Constituição, se o
Estado de Sítio for decretado com fundamento em comoção grave de repercussão nacional ou
ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa,
poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:

- Obrigação de permanência em localidade determinada;


- Detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
- Restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de
informações e à liberdade ele imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
- Suspensão da liberdade de reunião;
- Busca e apreensão em domicílio;
- Intervenção nas empresas de serviços públicos; e
- Requisição de bens.

Já podemos perceber uma quantidade maior de restrições que podem ser impostas se comparadas
ao Estado de Defesa.
Por outro lado, não há na nossa Constituição um rol taxativo de restrições quando o estado de sítio
for decretado com fundamento em declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada
estrangeira, o que nos leva a concluir que nestes casos, poderão ser impostas restrições e suspensões
temporárias a quaisquer direitos e garantias fundamentais. Note que estamos falando de casos de guerra.
Cabe ressaltar que estas restrições ou suspensões a direitos fundamentais serão tomadas
diretamente por autoridades administrativas competentes, sem necessidade de qualquer autorização
judicial prévia. Todavia, não há nada que impeça que posteriormente estas medidas sejam contestadas
junto ao Poder Judiciário, a fim de reparar eventuais abusos ou excessos cometidos na sua execução.

1.2.4 Deveres Fundamentais


Hoje em dia, além dos direitos fundamentais, tem se trabalhado o conceito de deveres
fundamentais. Assim, diante da vida em sociedade, devemos pensar, também, a necessidade de serem
observados os deveres, até porque normalmente a observância dos direitos de alguém passa
necessariamente pela observância dos deveres de outra pessoa.
Dimoulis e Martins (2011) identificam os seguintes deveres fundamentais:

- dever de efetivação dos direitos fundamentais: sobretudo os direitos sociais e garantias das
instituições públicas e privadas. Estamos diante da necessidade de atuação positiva do Estado, passando-
se a falar em um Estado que tem o dever de realizar os direitos, aquela ideia de Estado prestacionista;

40
- deveres específicos do Estado diante dos indivíduos: como exemplo, os autores citam o dever de
indenizar o condenado por erro judiciário, o que se dará por atuação e dever das autoridades estatais;
- deveres de criminalização do Estado: a Constituição determina que o Poder Legislativo edite atos
normativos para implementar os comandos, como no caso do artigo 5º, XLIII, devendo haver a
normatização do crime de tortura;
- deveres dos cidadãos e da sociedade: como exemplos, os autores citam o dever do serviço militar
obrigatório (artigo 143 da Constituição) e a educação enquanto dever do Estado e da família (artigo
205);
- dever de exercício do direito de forma solidária e levando em consideração os interesses da
sociedade: como exemplo, os autores citam o direito de propriedade que deve ser exercido conforme a
sua função social (artigo 5º, XXIII, da Constituição);
- deveres implícitos: segundo Dimoulis, "existem tantos deveres implícitos quantos direitos
explicitamente declarados", consistindo referidos deveres em ação ou omissão. E conclui no sentido de
que "o direito de urna pessoa pressupõe o dever de todas as demais (quando se aceita a tese do efeito
horizontal direto) e, sobretudo, das autoridades do Estado".

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para verificar o que você já aprendeu até aqui.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) As garantias fundamentais são estabelecidas pelo texto constitucional como instrumentos de


proteção dos direitos fundamentais.

2) ( ) O direito à vida é um direito fundamental de natureza absoluta.

3) ( ) A nossa Constituição não prevê qualquer situação em que sejam permitidas restrições ou
suspensões temporárias de direitos fundamentais.

41
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) O direito à saúde, educação, trabalho, habitação, previdência social e assistência social são exemplos
de direitos fundamentais de:

(A) primeira geração.

(B) segunda geração.

(C) terceira geração.

(D) quarta geração.

(E) quinta geração.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 B

RECADO FINAL:
Na aula de hoje começamos os nossos estudos sobre os direitos e garantias fundamentais, ponto
importantíssimo do Direito Constitucional.
Citamos as principais características dos direitos fundamentais e classificamos estes direitos
fundamentais. Trouxemos algumas hipóteses de restrição aos direitos fundamentais e abordamos também
os chamados deveres fundamentais.
Na próxima aula, avançaremos ainda mais no mundo dos direitos e garantias fundamentais.
Tire um tempinho para reler todos os conceitos passados nesta aula, pois eles serão essenciais ao
melhor entendimento das próximas aulas.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

42
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Agora que já falamos genericamente nos direitos e garantias fundamentais, precisamos mostrar
alguns destes direitos. Claro que não conseguiremos trazer todos, mas pretendemos trabalhar aqueles mais
interessantes, trazendo algumas peculiaridades que lhe são inerentes.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever o Direito à Vida;
- Descrever o Direito à Liberdade;
- Descrever o Princípio da Igualdade;
- Descrever o Princípio da Legalidade;
- Descrever o Direito à Liberdade de Expressão;
- Descrever o Direito à Liberdade de Crença Religiosa e Convicção Política e Filosófica;
- Descrever o Direito à Inviolabilidade Domiciliar;
- Descrever o Direito à Propriedade Privada;
- Descrever o Devido Processo Legal;
- Descrever o Direito ao Contraditório e Ampla Defesa;
- Descrever a Vedação à Prova Ilícita;
- Descrever o Princípio da Presunção de Inocência; e
- Descrever o Princípio da Não Autoincriminação.

INTRODUÇÃO:
Antes de tudo, é preciso lembrar que a luta por direitos na história mundial é uma construção,
isto é, o reconhecimento do que são ou não direitos variou e ainda varia de época para época e de lugar
para lugar.
Após as grandes revoluções burguesas, ocorridas a partir do século XVII, os indivíduos passaram
a ser considerados pessoas com direitos que deveriam ser respeitados na sociedade. Passou-se a
reconhecer direitos como à liberdade, à segurança e à propriedade privada.
Os direitos individuais são reconhecidos como um ramo dos direitos fundamentais e ancorados
nos princípios dos direitos humanos de primeira geração, que foram os primeiros conquistados pela
humanidade e baseados nas liberdades individuais civis clássicas, no direito à vida e nos direitos
políticos de participação, todos com base na igualdade.
Os direitos e deveres individuais e coletivos garantidos pela ordem jurídico-constitucional
brasileira não se resumem aos constantes do artigo 5º da Constituição, sendo este meramente
exemplificativo.

43
1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
1.2.5 Direitos Individuais e Coletivos
Grande parte dos direitos fundamentais individuais e coletivos se encontram no artigo 5º da
Constituição. Porém, não podemos nos esquecer que há direitos fundamentais individuais e coletivos
espalhados por todo o texto constitucional. Não temos a pretensão de esgotar este assunto, até porque
seria impossível fazê-lo em apenas uma aula. Vamos apresentar aqui apenas aqueles direitos que
julgamos mais interessantes a discussão.

1.2.5.1 Direito à Vida


O direito à vida se encontra expresso no caput do artigo 5º. Este é o direito mais básico de todos
os direitos fundamentais, até porque sem vida, nenhum outro direito pode ser gozado, ou sequer cogitado.
Porém, precisamos relembrar que nenhum direito fundamental se reveste de caráter absoluto, nem mesmo
o direito à vida.
A Constituição protege a vida de forma geral, não só a extrauterina como também a intrauterina.
O direito à vida não se resume ao mero direito à sobrevivência física. O direito individual
fundamental à vida possui duplo aspecto: sob o aspecto biológico se traduz no direito à integridade física
e psíquica; em sentido mais amplo, significa o direito a condições materiais e espirituais mínimas
necessárias a uma existência condigna à natureza humana.

1.2.5.2 Direito à Liberdade


O caput do artigo 5º da Constituição traz também de forma genérica o direito à liberdade. Neste
sentido Paulo e Alexandrino (2015) afirmam que este direito:

(...) Trata-se da própria essência dos direitos fundamentais de primeira geração (por isso mesmo
também denominados liberdades públicas).
A ideia de liberdade de atuação do indivíduo perante o Estado traduz o cerne da ideologia liberal,
de que resultaram as revoluções do final do século XVIII e início do XIX. A doutrina essencial do
laissez faire exigia a redução da esfera de atuação do Estado e de sua ingerência nos negócios
privados a um mínimo absolutamente necessário.

O direito à liberdade previsto no caput do artigo 5º da Constituição deve ser considerado de forma
mais ampla possível. Ele vai compreender não apenas a liberdade física, de locomoção, mas também a
liberdade de crença religiosa, de convicções, de expressão de pensamento, de reunião, de associação,
dentre vários outros direitos. Boa parte dos direitos que veremos nada mais são do que desdobramentos
deste princípio.

1.2.5.3 Princípio da Igualdade


Encontra-se previsto no artigo 5º, caput e inciso I. Neste sentido Paulo e Alexandrino (2015) nos
ensinam que:

44
A igualdade é a base fundamental do princípio republicano e da democracia. Tão abrangente é esse
princípio que dele inúmeros outros decorrem diretamente, como a proibição ao racismo (art. 5 º,
XLII), a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por
motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX), a proibição de qualquer discriminação no
tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência (art. 7º, XXXI), a
exigência de aprovação prévia em concurso público para investidura em cargo ou emprego público
(art. 37, II), o princípio ela isonomia tributária (art. 150, II) etc.

Porém, temos que observar que a nossa Constituição


busca garantir não somente a igualdade formal, mas,
principalmente, a igualdade material.
O princípio da igualdade determina que seja dado
tratamento igual aos que se encontram em situação equivalente e
que sejam tratados de maneira desigual os desiguais, na medida
de suas desigualdades. Ele obriga tanto o legislador quanto o
aplicador da lei. Novamente, Paulo e Alexandrino nos explicam
que:

O princípio constitucional da igualdade não veda que a lei estabeleça tratamento diferenciado entre
pessoas que guardem distinções de grupo social, de sexo, de profissão, de condição econômica ou
de idade, entre outras; o que não se admite é que o parâmetro diferenciador seja arbitrário,
desprovido de razoabilidade, ou deixe de atender a alguma relevante razão de interesse público.
Em suma, o princípio da igualdade não veda o tratamento discriminatório entre indivíduos,
quando há razoabilidade para a discriminação.

Logo, a nossa Constituição permite sim o tratamento discriminatório, desde que haja algum
motivo plausível, como políticas de ação afirmativa no sentido de se assegurar a igualdade material e não
apenas a formal entre os indivíduos.

Ex.: Lei Maria da Penha e Sistema de Cotas Raciais.

Ainda quanto ao Princípio da Igualdade, não há qualquer impedimento a tratamento


discriminatório em concurso público, desde que haja razoabilidade para a discriminação, em razão das
exigências do cargo. Restrições como a fixação de idade mínima e máxima e de altura mínima, previsão
de vagas exclusivamente para determinado sexo e outras podem ser previstas em concursos públicos,
desde que as peculiaridades das atribuições do cargo justifiquem.
É clara a Súmula 683 do STF, a qual dispõe que: O limite de idade para a inscrição em concurso
público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela
natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.
Entretanto, temos que observar que estas restrições só serão lícitas se previstas em lei, não sendo o
edital meio idôneo para impor restrições a direito protegido constitucionalmente.

45
1.2.5.4 Princípio da Legalidade
O artigo 5º, II da Constituição afirma que: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei". Paulo e Alexandrino (2015) explicam que este enunciado:

Trata-se do princípio da legalidade, base direta da própria noção de Estado de Direito, implantada
com o advento do constitucionalismo, porquanto acentua a ideia de "governo das leis", expressão
da vontade geral, e não mais "governo dos homens", em que tudo se decidia ao sabor da vontade,
dos caprichos, do arbítrio de um governante.

O princípio da legalidade surgiu com o constitucionalismo e o Estado de Direito, opondo-se a toda


e qualquer forma de poder autoritário. Este princípio vai se verificar de forma diferente ao particular e ao
Poder Público. Neste ponto, Lenza (2015) esclarece que:

No âmbito das relações particulares, pode-se fazer tudo o que a lei não proíbe, vigorando o
princípio da autonomia da vontade, lembrando a possibilidade de ponderação desse valor com o da
dignidade da pessoa humana e, assim, a aplicação horizontal dos direitos fundamentais nas
relações entre particulares, conforme estudado.
Já no que tange à administração, esta só poderá fazer o que a lei permitir. Deve andar nos "trilhos
da lei", corroborando a máxima do direito inglês: rufe of law, not ofmen. Trata-se do princípio da
legalidade estrita, que, por seu turno, não é absoluto! Existem algumas restrições, como as
medidas provisórias, o estado de defesa e o estado de sítio, já analisados por nós neste trabalho.

Resumindo, o Princípio da Legalidade nos diz que ao particular é lícito fazer tudo aquilo que a lei
não proíba, enquanto ao Poder Público só é permitido fazer o que a lei autoriza.

1.2.5.5 Direito à Liberdade de Expressão


Trata-se de um direito muito caro à
qualquer democracia. Podemos ver o direito à
liberdade de expressão no artigo 5º, incisos IV,
V, IX e XIV.
O artigo 5º, IV diz que: "é livre a
manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato". Este inciso assegura a qualquer
pessoas a livre manifestação dos pensamentos,
sendo, porém, vedado que o faça sob anonimato.
Na verdade, este inciso estabelece uma espécie de cláusula geral que, em conjunto com outros
dispositivos, asseguram a liberdade de expressão nas suas diversas manifestações:

- liberdade de manifestação do pensamento (incluindo a liberdade de opinião);


- liberdade de expressão artística;
- liberdade de ensino e pesquisa;

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- liberdade de comunicação e de informação (liberdade de "imprensa"); e
- liberdade de expressão religiosa.

Em geral, a vedação ao anonimato impede o acolhimento de denúncias anônimas (delação


apócrifa). Entende o STF que a instauração de procedimento criminal originada apenas em documento
apócrifo seria contrária à ordem jurídica constitucional, que veda expressamente o anonimato, ofenderia a
dignidade da pessoa humana, permitindo a prática do denuncismo
inescrupuloso, e impossibilitaria eventual indenização por danos
morais ou materiais.
Veja bem, não é ilícita a denúncia anônima, como vemos por
exemplo no Disque Denúncia. O que é proibido é a denúncia e a
instauração de procedimento criminal com base estritamente e
denúncia anônima. Neste sentido, Paulo e Alexandrino (2015) nos
esclarecem que:

É muito importante destacar, entretanto, que o poder público não está obrigado a desconsiderar, de
pronto e em definitivo, as denúncias anônimas que receba. O que a jurisprudência do STF não
admite é a instauração de procedi mento formal - processo administrativo disciplinar, processo
penal etc. - com fundamento, exclusivamente, em delações apócrifas. Em outras palavras: as
denúncias anônimas não podem, por si, isoladamente , fundamentar a instauração de procedimento
formal contra o denunciado. Mas a autoridade competente deve adotar medidas investigativas
informais - procedimentos administrativos internos, com a devida discrição - para apurar,
sumariamente, a veracidade dos fatos denunciados. Ao final, se comprovada a plausibilidade dos
eventos narrados, aí, sim, poderá ser instaurado o procedimento formal, com o fim de apurar a
responsabilidade do possível infrator.

A Constituição nos traz em seu artigo 5º, V os direitos de


quem sofra algum dano decorrente da indevida manifestação por
terceiros: "é assegurado o direito de resposta, proporcional ao
agravo, além da indenização por dano material, moral ou à
imagem".
Trata-se do tão famigerado direito de resposta. Paulo e
Alexandrino (2015) afirmam que:

O direito de resposta está orientado pelo critério da proporcionalidade, isto é, a resposta deve ser
assegurada no mesmo meio de comunicação em que o agravo foi veiculado, e deve ter o mesmo
destaque e a mesma duração (se em meio sonoro ou audiovisual) ou tamanho (se em meio escrito).
Deve-se ressaltar que o direito de resposta não afasta o direito à indenização.
O direito de resposta e o direito à indenização por danos morais e materiais - anote-se que essas
indenizações são cumuláveis - aplicam-se tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas que
sejam ofendidas pela expressão indevida de juízos ou opiniões (...).

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Primeiramente, temos que observar que o direito de resposta e o direito a uma eventual
indenização não são excludentes. É perfeitamente cabível a percepção cumulativa de ambos. É muito
comum verificarmos o direito de resposta ao longo de campanhas eleitorais. Um candidato acusa o outro
de alguma coisa, e o acusado recorre à Justiça Eleitoral para obter o seu direito de resposta, que será
proporcional à acusação feita.
O direito de resposta se aplicam tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas que sejam
ofendidas pela expressão indevida de juízos ou opiniões.
Já o artigo 5º, IX garante a vedação
à censura prévia, nos seguintes termos: "é
livre a expressão da atividade intelectual,
artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença".
Mesmo com o fim da censura
prévia, temos que, novamente, relembrar
que nenhum direito fundamental se reveste
de caráter absoluto, encontrando limites em
outros valores protegidos constitucionalmente, sobretudo, na inviolabilidade da privacidade e da
intimidade do indivíduo e na vedação ao racismo.
Podemos verificar esta dicotomia na internet. Esta ferramenta junto às redes sociais permitem que
cada um que tenha acesso a elas possua voz ativa no mundo. Todo cidadão pode expor livremente seus
pensamentos, atingindo e influenciando simultaneamente inúmeras pessoas em diversas localidades.
Assim, qualquer forma de censura prévia à liberdade de expressão via internet deverá ser considerada
inconstitucional. Entretanto, ao contrário do que muitos pensam, a internet não se trata de uma terra sem
lei, um mundo à parte e eventuais extrapolações no direito à livre manifestação de pensamento também
serão igualmente puníveis. Tudo que é válido no mundo real, também será no mundo virtual.
Por fim, o artigo 5º, XIV da Constituição assevera que: "é assegurado a todos o acesso à
informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional".
Em relação ao direito de informação, este alberga apenas o direito a informações que sejam de
interesse público ou geral, não contemplando aqueles que interessem apenas à esfera privada de uma
determinada pessoa. Quanto a isso, Paulo e Alexandrino se manifestam da seguinte forma:

Consoante afirmado acima, o direito fundamental de acesso à informação, como ocorre com todos
os demais, não é absoluto. Ele se refere, essencialmente, a informações que possam ser de
interesse público ou geral, não cabendo dele cogitar quando se trate de informações que digam
respeito exclusivamente à intimidade e à vida privada do indivíduo, as quais são objeto de
proteção constitucional expressa (art. 5º, X). Por outras palavras, todos têm o direito de acesso a
informações que possam ser de interesse geral, mas não existe um direito de acesso a informações
que só interessem à esfera privada de determinada pessoa (...).

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Por outro lado, percebemos também que a Constituição garante a
proteção do sigilo da fonte. Proteção esta mais voltada à atividade jornalística,
uma vez que permite a obtenção de informações, as quais, sem esta garantia,
provavelmente não conseguiriam alcançar. Em muito momentos, a proteção ao
sigilo da fonte é justamente o que permitirá o direito de acesso à informação.
Neste ponto, Paulo e Alexandrino ensinam que:

Com efeito, o fato de o sigilo da fonte ser estabelecido como uma garantia fundamental permite
que o indivíduo que possua informações que julgue devessem ser tornadas públicas, mas se
reveladas diretamente por ele colocariam em risco sua segurança, ou trariam para ele qualquer
outra espécie de prejuízo, transmita essas informações a um jornalista em quem confie, para que
este as torne públicas, sem declinar o nome de sua fonte. Bastará que o informante confie na
palavra do jornalista (ou em outro profissional que trabalhe com divulgação de informações),
porque sabe que existe a garantia constitucional de que o Estado não terá possibilidade de impor
qualquer sanção ao jornalista que se recuse a revelar a fonte de sua informação.

Perceba que a garantia do sigilo da fonte não afeta a vedação ao anonimato. Quem veicular a
notícia, o fará em seu próprio nome, arcando com as eventuais responsabilidades decorrente disto. Logo,
embora a fonte seja sigilosa, a divulgação da notícia não será.

1.2.5.6 Direito à Liberdade de Crença Religiosa e Convicção Política e Filosófica


Você já deve ter ouvido que o nosso Estado é laico. Isso quer dizer que o Estado não possui uma
religião oficial. Não quer dizer que o Estado seja contra alguma religião, mas sim que ele tem uma
posição neutra no campo religioso, adotando uma imparcialidade em assuntos religiosos, não apoiando ou
discriminando qualquer religião.
O direito à liberdade de crença religiosa e convicção política e filosófica se encontra esculpido no
artigo 5º, VIII: "ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se
a cumprir prestação alternativa, fixada em lei".
A parte final do dispositivo supracitado traz a denominada escusa de consciência, objeção de
consciência ou ainda alegação de imperativo de consciência, possibilitando que o indivíduo recuse
cumprir determinadas obrigações, notadamente as militares, ou praticar atos que conflitem com suas
convicções religiosas, políticas ou filosóficas, sem que essa recusa implique restrições a seus direitos.
Paulo e Alexandrino (2015) explicam que:

A escusa de consciência não permite, entretanto, que a pessoa simplesmente deixe de cumprir a
obrigação legal a todos imposta e nada mais faça. Nesses casos - de haver uma obrigação legal
geral cujo cumprimento afronte convicção religiosa, filosófica ou política -, o Estado poderá impor
a quem alegue imperativo de consciência uma prestação alternativa, compatível com suas crenças
ou convicções, fixada em lei. Se o Estado estabelece a prestação alternativa e o indivíduo recusa o
seu cumprimento, aí sim poderá ser privado de direitos.

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Vamos desenvolver um pouco mais este tema na última aula desta Unidade de Ensino, quando
falarmos sobre o Serviço Militar.

1.2.5.7 Direito à Inviolabilidade Domiciliar


O artigo 5º, XI diz que: "a casa é asilo inviolável do indivíduo,
ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador,
salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".

Paulo e Alexandrino (2015) explicam que:

A inviolabilidade não alcança somente a "casa", residência do indivíduo. Na verdade, o conceito


normativo de "casa" é abrangente e se estende, inclusive, a qualquer compartimento privado não
aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade, compreendendo, observada essa
específica limitação espacial (área interna não acessível ao público), os escritórios e consultórios
profissionais, as dependências privativas da empresa, o quarto de hotel etc.

O exposto acima é o entendimento jurisprudencial para a palavra "casa". Segundo o texto


constitucional, sem o consentimento do morador, só se pode adentrar em um domicílio:

- por determinação judicial: somente durante o dia; e


- em caso de flagrante delito, desastre, ou para prestar socorro: durante o dia ou à noite, NÃO
necessitando de determinação judicial.

1.2.5.8 Direito à Propriedade Privada


O artigo 5º, XXII da Constituição nos diz
que: "é garantido o direito de propriedade".
Assim como todos os outros direitos que
tratamos, o direito de propriedade também não é
absoluto. O nosso ordenamento jurídico em
diversos dispositivos deixa assente que a
propriedade deve atender a uma função social,
como no artigo 5º, XXIII: "a propriedade
atenderá a sua função social".
Assim, em diversos pontos da nossa Constituição está assegurado o direito de propriedade, porém
o proprietário tem alguns deveres, como, por exemplo, o dever de uso adequado da propriedade
(mormente no que concerne a sua exploração econômica). Assim, não pode o proprietário de terreno
urbano mantê-lo não edificado ou subutilizado (artigo 182, § 4º da Constituição), sob pena de sofrer
severas sanções administrativas; não pode o proprietário de imóvel rural mantê-lo improdutivo, devendo

50
atender às condições estabelecidas no artigo 186 da Constituição. O desatendimento da função social da
propriedade pode dar ensejo a uma das formas de intervenção do Estado no domínio privado: a
desapropriação.
Outrossim, o direito de propriedade deverá ceder quando isso for necessário à tutela do interesse
público, como ocorre nas hipóteses de desapropriação por utilidade ou necessidade pública, de
requisição administrativa (artigo 5º, XXV da Constituição), de requisição de bens no estado de sítio
(artigo 139, inciso VII da Constituição). Ainda, quando a utilização da propriedade for feita de forma
altamente lesiva à sociedade, o Estado poderá impor sua perda, tanto na esfera penal, quanto na
administrativa (artigo 5º, XLVI, b; e artigo 243 da Constituição).
O direito de propriedade abarca não apenas os bens corpóreos, mas também os incorpóreos. Assim
explica Paulo e Alexandrino (2015):

O direito de propriedade assegurado na Constituição como direito fundamental abrange tanto os


bens corpóreos quanto os incorpóreos. Quanto à propriedade de bens incorpóreos merece
específica proteção constitucional a denominada "propriedade intelectual". A propriedade
intelectual abrange os "direitos de autor" e os direitos relativos à "propriedade industrial", como a
proteção de marcas e patentes.

Por fim, o direito de propriedade não é incompatível com a incidência de tributos sobre o valor de
determinados bens ou do patrimônio em geral. Em respeito ao direito de propriedade, entretanto, não
pode a carga tributária representar um ônus tão elevado que chegue a assumir caráter confiscatório (artigo
150, IV da Constituição).

1.2.5.9 Devido Processo Legal


O artigo 5º, LIV da Constituição afirma que: "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens
sem o devido processo legal".
Paulo e Alexandrino (2015) ensinam que:

O princípio do devido processo legal (due process of law) consubstancia uma das mais relevantes
garantias constitucionais do processo, garantia essa que deve ser combinada com o princípio da
inafastabilidade de jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) e com a plenitude do contraditório e da ampla
defesa (CF, art. 5º, LV). Esses três postulados, conjuntamente, afirmam as garantias processuais do
indivíduo no nosso Estado Democrático de Direito. Do devido processo legal derivam, ainda,
outros princípios pertinentes às garantias processuais, como o princípio do juiz natural, a só
admissibilidade de provas l ícitas no processo, a publicidade do processo, a motivação das
decisões.

O princípio do devido processo legal deve ser entendido como uma garantia de proteção ao direito
de liberdade do indivíduo, mas também em qualquer processo restritivo de direito. Significa dizer que
deve ser assegurada ao indivíduo paridade de condições em face do Estado, quando este intentar restringir
a liberdade ou o direito a qualquer de seus bens jurídicos constitucionalmente protegidos.

51
1.2.5.10 Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa
Diz assim o artigo 5º, LV da Constituição: "aos litigantes, em processo .judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes".
No tocante a estes direitos, Paulo e Alexandrino (2015) ensinam que:

As garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa são indissociáveis, caminhando


paralelamente no processo administrativo ou judicial. Estão, também, intimamente ligadas ao
princípio do devido processo legal (due process of law), pois não há como se falar em devido
processo legal sem a outorga da plenitude de defesa (direito de defesa técnica, direito à
publicidade dos atos processuais, direito à citação, direito à produção de provas, direito de recurso,
direito de contestação etc.).
Por ampla defesa entende-se o direito que é dado ao indivíduo de trazer ao processo,
administrativo ou judicial, todos os elementos de prova licitamente obtidos para provar a verdade,
ou até mesmo de omitir-se ou calar-se, se assim entender, para evitar sua autoincriminação.
Por contraditório entende-se o direito que tem o indivíduo de tomar conhecimento e contraditar
tudo o que é levado pela parte adversa ao processo. É o princípio constitucional do contraditório
que impõe a condução dialética do processo (par conditio), significando que, a todo ato produzido
pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-se, de apresentar suas contrarrazões, de levar
ao juiz do feito uma versão ou uma interpretação diversa daquela apontada inicialmente pelo autor.
O contraditório assegura, também, a igualdade das partes no processo, pois equipara, no feito, o
direito da acusação com o direito da defesa.

Conforme a jurisprudência do STF o postulado da ampla defesa e do contraditório inclui:

- direito de as partes obterem informação de todos os atos praticados no processo;


- direito de manifestação, oral ou escrita, das partes acerca dos elementos fáticos e jurídicos constantes do
processo; e
- direito das partes de ver seus argumentos considerados.

Igualmente, a jurisprudência do STF entende que no âmbito do processo criminal, a garantia


constitucional do contraditório e ampla defesa não são exigíveis na fase do Inquérito Policial, tampouco
do Inquérito Policial Militar (IPM). Isso porque, no sistema jurídico brasileiro, o Inquérito Policial e o
IPM afiguram-se como mera fase investigatória, de natureza administrativa, destinados a subsidiar a
atuação do Ministério Público. Voltaremos a este ponto na nossa segunda Unidade de Ensino, quando
tratarmos sobre o IPM.

1.2.5.11 Vedação à Prova Ilícita


O artigo 5º, LVI da Constituição estabelece que: "são inadmissíveis, no processo, as provas
obtidas por meios ilícitos".
A prova ilícita é aquela obtida com infringência ao direito.

52
A prova ilícita não pode ser utilizada nem no processo judicial, nem nos processos
administrativos. A simples presença de prova ilícita nos autos não invalida, necessariamente, todo o
processo, se existirem nele outras provas lícitas e autônomas, isto é, colhidas sem necessidade dos
elementos informativos revelados pela prova ilícita.
Quando constatada a presença de provas ilícitas nos autos de um processo, deve se fazer a
separação das provas lícitas das ilícitas, podendo o processo ter o seu curso continuado, com base
unicamente nas provas lícitas nele presentes.
Porém, a prova ilícita originária
contamina todas as demais provas obtidas a
partir dela, todas as provas decorrentes da ilícita
são também ilícitas. É a aplicação, entre nós, da
denominada famosíssima Teoria dos Frutos da
Árvore Envenenada (Fruits of the Poisonous
Tree).

1.2.5.12 Princípio da Presunção de Inocência


Este princípio se encontra previsto no artigo 5º, LVII da Constituição que aduz: "ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
O indivíduo é presumido inocente, cabendo ao Estado comprovar a sua culpabilidade. Ela é
decorrente de um antigo e conhecidíssimo brocardo latino que diz: "in dubio pro reo", segundo o qual,
existindo qualquer dúvida na interpretação da lei ou na capitulação do fato, adota-se aquela que for mais
favorável ao réu.
Ainda com fundamento no postulado da presunção da inocência, o STF entende que no
julgamento de matéria criminal, havendo empate na votação a decisão beneficiará o réu, que restará
absolvido.

1.2.5.13 Princípio da Não Autoincriminação


O preso tem o direito de permanecer calado para não se autoincriminar com as declarações
prestadas, seja no inquérito policial, seja perante a autoridade judiciária (artigo 5º, LXIII da Constituição).
A rigor, conquanto referida ao preso, essa garantia constitucional abrange toda e qualquer pessoa,
perante qualquer esfera do Estado, pois, diante da presunção de inocência, que também constitui garantia
fundamental do indivíduo, a prova da culpabilidade incumbe exclusivamente à acusação. Assim,
conforme tem sido reiteradamente afirmado pelo STF, qualquer pessoa que seja objeto de investigações
administrativas, policiais, penais ou parlamentares, ostentando, ou não, a condição formal de indiciado -
ainda que convocada como testemunha -, possui o direito de permanecer em silêncio e de não produzir
provas contra si própria.

53
Conforme o STF, o preso tem o direito de ser informado a respeito dessa garantia constitucional
(direito ao silêncio), sob pena de nulidade absoluta do interrogatório. Logo, a falta da advertência - e da
sua documentação formal - faz ilícita a prova que, contra si mesmo, forneça o acusado, ainda quando
observadas as demais formalidades procedimentais do interrogatório.
Em face desse entendimento, o STF considera ilícita a gravação clandestina de "conversa
informal" do indiciado com policiais, por constituir dita conversa informal modalidade de
"interrogatório", o qual - além de realizar-se sem as formalidades legais do interrogatório no inquérito
policial - se faz sem que o indiciado seja advertido do seu direito ao silêncio.
Ademais do direito à não autoincriminação, a Constituição assegura expressamente ao preso o
respeito à integridade física e moral (artigo 5º, XLIX da Constituição), o direito de receber assistência de
sua família e de advogado (artigo 5º, LXIII da Constituição), a garantia de que a sua prisão e o local em
que ele se encontra serão comunicados imediatamente ao juiz competente e a sua família ou a pessoa por
ele indicada (artigo 5º, LXII da Constituição), o direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou
por seu interrogatório policial (artigo 5º, LXIV da Constituição), bem como a garantia de que a prisão
ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária (artigo 5º, LXV da Constituição).

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma nova pausa em nossos estudos para verificar o que foi aprendido até aqui. Responda
às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A vedação constitucional ao anonimato impede a utilização de peças apócrifas como prova formal.

2) ( ) A inviolabilidade do domicílio abrange qualquer compartimento habitado onde alguém exerce


profissão ou atividades pessoais, podendo, por exemplo, ser um trailer, um barco ou um aposento de
habitação coletiva.

3) ( ) São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito
à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

4) ( ) É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.

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II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) As garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, com os meios e recursos a ela


inerentes, são asseguradas aos litigantes nos processos:

(A) judiciais cíveis e criminais.

(B) judiciais e administrativos.

(C) judiciais de natureza criminal.

(D) judiciais e administrativos que tenham por objeto a demissão de servidor público.

(E) judiciais.

6) A casa é asilo inviolável do indivíduo. Por isso, nela ninguém pode penetrar sem o consentimento do
morador, salvo em caso de flagrante delito ou:

(A) para prestar socorro em caso de desastre ou para cumprir determinação judicial.

(B) desastre, ou para prestar socorro, ou, de dia ou à noite, por determinação judicial.

(C) desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

(D) para prestar socorro, ou, em qualquer hora do dia ou da noite, mediante determinação judicial,
necessária esta mesmo em caso de desastre.

(E) de dia ou à noite, por determinação judicial.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 C
4 C
5 B
6 C

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RECADO FINAL:
Nesta aula, estudamos alguns direitos e garantias individuais e coletivas. Obviamente não tivemos
qualquer pretensão de tentar esgotar o assunto, visto que uma única aula, com certeza, é muito
insuficiente para tal. Mas, conseguimos separar alguns direitos que julgamos mais interessantes e tratar
algumas nuances que lhe são peculiares. Descrever o Direito à Vida; o Direito à Liberdade; o Princípio da
Igualdade; o Princípio da Legalidade; o Direito à Liberdade de Expressão; o Direito à Liberdade de
Crença Religiosa e Convicção Política e Filosófica; o Direito à Inviolabilidade Domiciliar; o Direito à
Propriedade Privada; o Devido Processo Legal; o Direito ao Contraditório e Ampla Defesa; a Vedação à
Prova Ilícita; o Princípio da Presunção de Inocência; e o Princípio da Não Autoincriminação.
Ainda falando sobre direitos e garantias fundamentais, na nossa próxima
aula veremos uma matéria que também é de suma importância ao Direito
Constitucional, que são os Remédios Constitucionais.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Esta será a nossa última aula sobre direitos e garantias fundamentais.
Mais especificamente, falaremos sobre uma das espécies de garantias fundamentais, que são os
remédios constitucionais, assunto importantíssimo no nosso Direito Constitucional.
Estudaremos os 5 remédios constitucionais que o nosso ordenamento jurídico nos põe à disposição
para resguardar nossos direitos fundamentais.
Vamos aos nossos estudos!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar os Remédios Constitucionais;
- Descrever Habeas Corpus;
- Descrever Mandado de Segurança;
- Descrever Mandado de Injunção;
- Descrever Habeas Data; e
- Descrever a Ação Popular.

INTRODUÇÃO:
Antes de iniciarmos propriamente esta matéria, precisamos fazer uma simples pergunta.
O que é um remédio?
Bom, em linhas gerais, um remédio é qualquer
substância ou recurso utilizado para obter cura ou alívio de
uma dor ou de uma doença.
Neste sentido, os remédios constitucionais, ou
remédios jurídicos, são instrumentos previstos no
ordenamento jurídico brasileiro que deveriam ser de
conhecimento de todos os cidadãos do nosso país. Isso
porque são mecanismos que garantem aos cidadãos os direitos fundamentais previstos na Constituição
Federal quando o Estado não cumpre seu dever, seja por despreparo, ilegalidade ou abuso de poder.
A ideia é que os remédios constitucionais servirão como uma espécie de cura ou alívio a alguma
lesão ou ameaça de lesão a algum direito fundamental do indivíduo.
Na vida real, cada remédio se presta a cura ou alívio de alguma dor ou doença específica. E aqui,
vale o mesmo raciocínio. Para cada tipo de lesão ou ameaça lesão a algum direito fundamental, teremos
um remédio específico que irá atuar. Como será demonstrado no decorrer desta aula, cada remédio
constitucional possui suas próprias características.
Então, mãos à obra!

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1.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
1.2.6 Remédios Constitucionais

Já estudamos que desde o surgimento do constitucionalismo, a função básica das Constituições,


além de organizar o Estado, é assegurar direitos e garantias fundamentais. A nossa atual Constituição de
1988 elenca um enorme conjunto de direitos aos indivíduos. No intuito de assegurar efetividade a esses
direitos, ela elenca também as chamadas garantias. Dentro destas garantias, destacam-se os remédios
constitucionais.
Segundo Paulo e Alexandrino (2015):

A expressão "remédios constitucionais" designa determinadas garantias que consubstanciam meios


colocados à disposição do indivíduo para salvaguardar seus direitos diante de ilegalidade ou abuso
de poder cometido pelo Poder Público. Não se trata de meras proibições endereçadas ao Estado,
como ocorre com a maioria das demais garantias; os denominados remédios são instrumentos à
disposição do indivíduo para que ele possa atuar quando os direitos e as próprias garantias são
violadas.

Existem dois tipos de remédios constitucionais: remédios administrativos (direito de petição e


direito de certidão) e remédios judiciais (habeas data, habeas corpus, mandado de segurança, mandado de
injunção e ação popular). Nesta aula, iremos deter os nossos esforços apenas nos remédios constitucionais
de natureza judicial.

58
1.2.6.1 Habeas Corpus
Historicamente, o habeas
corpus foi a primeira garantia de
direitos fundamentais, concedida
por “João Sem Terra”, rei inglês,
na Magna Carta, em 1215, e
formalizada, posteriormente, pelo
Habeas Corpus Act, em 1679.
Vejamos o que nos diz o
artigo 5º, LXVIII da Constituição:
"conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou
coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".
Do próprio texto, já podemos inferir que o habeas corpus se presta a garantir o direito de
locomoção do indivíduo, que contempla o direito de ir, vir e permanecer, contra ilegalidade ou abuso de
poder.
O habeas corpus pode ser:

- repressivo (liberatório): quando o indivíduo já teve desrespeitado o seu direito de locomoção (por
exemplo, já foi ilegalmente preso); ou
- preventivo (salvo-conduto), quando alguém se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua
liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (a restrição à locomoção ainda não se
consumou).

Para o ajuizamento do habeas corpus é irrelevante a nacionalidade do impetrante, podendo


qualquer estrangeiro se valer da ação em defesa do seu direito de locomoção em território nacional.
Entretanto, exige-se que a ação seja redigida em português, sob pena de não conhecimento pelo Poder
Judiciário.
Outrossim, não é necessário constituir um advogado para se impetrar um habeas corpus.
Conforme a jurisprudência do STF, não é cabível o uso de habeas corpus para:

- impugnar decisões do Plenário ou de qualquer das Turmas do STF, visto que esses órgãos, quando
decidem, representam o próprio Tribunal;
- impugnar determinação de suspensão dos direitos políticos;
- impugnar penalidade imposta mediante decisão administrativa de caráter disciplinar (advertência,
suspensão, demissão, destituição de cargo em comissão, cassação de aposentadoria etc.), ou trancar o
andamento do correspondente processo administrativo, porque nessas hipóteses não está em jogo a
liberdade de ir e vir;

59
- impugnar decisão condenatória à pena de multa, ou relativa a processo em curso por infração penal a
que a pena pecuniária seja a única cominada (Súmula 693 do STF);
- impugnar a determinação de quebra de sigilo telefônico, bancário ou fiscal, se desta medida não puder
resultar condenação à pena privativa de liberdade;
- discutir o mérito das punições disciplinares militares;
- questionar afastamento ou perda de cargo público, bem assim contra a imposição da pena de exclusão de
militar ou de perda de patente ou de função pública (Súmula 694 do STF);
- dirimir controvérsia sobre a guarda de filhos menores;
- discutir matéria objeto de processo de extradição, quando os fatos não são líquidos quanto à definição
do crime;
- o questionamento de condenação criminal quando já extinta a pena privativa de liberdade (Súmula 695
do STF);
- impedir o cumprimento de decisão que determina o sequestro de bens imóveis;
- discutir a condenação imposta em processo de impeachment, pela prática de crime de responsabilidade,
visto que tal condenação, de natureza política, não põe em risco a liberdade de ir e vir da autoridade;
- impugnar o mero indiciamento em inquérito policial, desde que presentes indícios de autoria de fato que
configure crime em tese; e
- impugnar omissão de relator de extradição, se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não
constava dos autos, nem foi ele provocado a respeito (Súmula 692 do STF).

O artigo 142, § 2º da Constituição, estabelece não ser cabível a impetração de habeas corpus em
relação a punições disciplinares militares. Trata-se da impossibilidade de se analisar o mérito das
referidas punições. Entretanto, NÃO abrangem os pressupostos de legalidade da punição. Trataremos
mais a fundo deste tema na última aula desta Unidade de Ensino.

1.2.6.2 Mandado de Segurança


Vamos ler o que nos traz o artigo 5º, LXIX da Constituição: “conceder-se-á mandado de
segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data,
quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
Temos assim, que o Mandado de Segurança
será cabível quando se verificar o cometimento de
alguma ilegalidade ou abuso de poder por autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do Poder Público a direito líquido e certo,
que não seja os inerentes à liberdade de locomoção e
ao acesso ou retificação de informações relativas à

60
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de
caráter público.
Logo, o Mandado de Segurança será utilizado quando praticada alguma ilegalidade ou abuso de
poder por uma autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público contra direito líquido e certo.
Mas, o que são direitos líquidos e certos?
Lenza (2015) nos responde que: “O direito líquido e certo é aquele que pode ser demonstrado de
plano mediante prova pré-constituída, sem a necessidade de dilação probatória. Trata-se de direito
manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da
impetração".
Já nas palavras de Paulo e Alexandrino (2015):

Direito líquido e certo é aquele demonstrado de plano, de acordo com o direito, e sem incerteza, a
respeito dos fatos narrados pelo impetrante. É o que se apresenta manifesto na sua existência,
delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração.
Se a existência do direito for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu
exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não será cabível o mandado de
segurança. Esse direito incerto, indeterminado, poderá ser defendido por meio de outras ações
judiciais, mas não na via especial e sumária do mandado de segurança.

Por isso, em regra, as provas devem ser pré-constituídas no momento da impetração da ação.
Outrossim, a jurisprudência majoritária entende que a liquidez e a certeza se dá sobre os fatos
alegados pelo impetrante e não sobre o direito em si, que poderão ser discutidos em juízo.
Conforme o artigo 6º, § 3º, da Lei nº 12.016/2009, considera-se autoridade coatora aquela que
tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática.
Equiparam-se às autoridades os representantes ou órgãos de partidos políticos e os
administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas
naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições
(artigo 1º, § 1º da Lei nº 12.016/2009).
A lei deixa claro que não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial
praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de
concessionárias de serviço público (artigo 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2009).
O Mandado de Segurança pode ser repressivo de ilegalidade ou abuso de poder já praticado, ou
preventivo, quando estivermos diante de ameaça a violação de direito líquido e certo do impetrante.
O prazo para impetração do Mandado de Segurança é de 120 dias, a contar da data em que o
interessado tiver conhecimento oficial do ato a ser impugnado, sendo este um prazo decadencial, não
passível de suspensão ou interrupção.

61
1.2.6.3 Mandado de Injunção
Leiamos o artigo 5º, LXXI da Constituição:
“conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta
de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos
direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.
Do texto constitucional, podemos identificar 2
requisitos para impetração do Mandado de Injunção e
ainda introduzir um terceiro.

- norma constitucional de eficácia limitada, prescrevendo direitos, liberdades constitucionais e


prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
- falta de norma regulamentadora, tornando inviável o exercício dos direitos, liberdades e prerrogativas
supracitados (omissão do Poder Público); e
- transcurso de razoável prazo para a elaboração da norma regulamentadora.

Quanto a este ponto, Lenza (2015) nos ensina que:

(...) o mandado de injunção surge para "curar" uma "doença" denominada síndrome de
inefetividade das normas constitucionais, vale dizer, normas constitucionais que, de imediato,
no momento que a Constituição entra em vigor (ou diante da introdução de novos preceitos por
emendas à Constituição, ou na hipótese do art. 5º, § 3º), não têm o condão de produzir todos os
seus efeitos, precisando de ato normativo integrativo e infraconstitucional.

Além disso, Paulo e Alexandrino (2015) nos esclarecem que:

Observa-se, assim, que não é qualquer omissão do Poder Público que enseja o ajuizamento do
mandado de injunção, mas apenas as omissões relacionadas a normas constitucionais de eficácia
limitada de caráter mandatório, ou seja, normas constitucionais que devem ter a sua plena
aplicabilidade assegurada, exigindo-se, para tanto, a edição de norma infraconstitucional
regulamentadora (não se trata de simples faculdade conferida pela Constituição ao Poder Público).

Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), não caberá Mandado de Injunção:

- se já existe norma regulamentadora do direito previsto na Constituição, ainda que defeituosa;


- diante da falta de norma regulamentadora de direito previsto em normas infraconstitucionais;
- diante da falta de regulamentação dos efeitos de medida provisória não convertida em lei pelo
Congresso Nacional; e
- se a Constituição Federal outorga mera faculdade ao legislador para regulamentar direito previsto em
algum de seus dispositivos.
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O Mandado de Injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa, física ou jurídica, que se veja
impossibilitada de exercer um determinado direito constitucional por falta de norma que o regulamente.
No polo passivo do Mandado de Injunção, devem figurar os órgãos ou autoridades públicas que
têm a obrigação de legislar, mas estejam omissos quanto à e laboração da norma regulamentadora.

1.2.6.4 Habeas Data


O habeas data está previsto no artigo 5º, LXXII da Constituição, conforme abaixo:

LXXII - conceder-se-á habeas data:


a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de
registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou
administrativo

Segundo Paulo e Alexandrino (2015):

O habeas data é remédio constitucional, de natureza civil, submetido a rito sumário, que se destina
a garantir, em favor da pessoa interessada, o exercício de pretensão jurídica discernível em seu
tríplice aspecto: a) direito de acesso aos registros relativos à pessoa do impetrante; b) direito de
retificação desses registros e c) direito de complementação dos registros.

O habeas data está regulado na Lei 9.507/97, a qual em


seu artigo 7º, III nos traz outra hipótese de cabimento da medida:
"para a anotação nos assentamentos do interessado, de
contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas
justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável".
É irrelevante a natureza jurídica da entidade, a qual poderá
ser pública ou privada. O aspecto que determinará o cabimento
ou não da ação será o fato de o banco de dados ser de caráter
público.

Ex.: Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) / SERASA. Tratam-se de entidades de natureza privada, mas o
seu banco de dados é de caráter público (as informações sobre os consumidores podem ser acessadas por
terceiros).

Por fim, só será cabível o habeas data diante da negativa da autoridade administrativa em fornecer
ou retificar as informações solicitadas pelo cidadão. Ou seja, primeiramente deve se fazer a respectiva
solicitação e apenas se esta for negada é que se poderá impetrar o habeas data.

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1.2.6.5 Ação Popular
Vejamos o que dispõe o artigo 5º, LXXIII da Constituição :

qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de
custas judiciais e do ônus da sucumbência

Logo, a Ação Popular é o remédio


constitucional disponível a qualquer cidadão para
obter a anulação de quaisquer atos ou contratos
administrativos ilegais e lesivos ao patrimônio
público, podendo ser utilizada tanto de forma
preventiva, como repressiva.
O campo de proteção da Ação Popular é
bastante amplo, abrangendo tanto o patrimônio
material quanto o patrimônio moral, o estético, o
histórico, o ambiental. Assim, ela não se atém
apenas ao âmbito de prejuízo patrimonial público,
alcançando também questões não econômicas,
como a moralidade administrativa, o meio
ambiente, o patrimônio histórico e cultural, desde que haja alguma ilegalidade na ação do Poder Público.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para verificar o que você já aprendeu até aqui.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Não é cabível habeas corpus para impugnar os pressupostos de legalidade de punição disciplinar
militar, ainda que não se questione o mérito desta.

2) ( ) O Mandado de Injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa, física ou jurídica, que se veja
impossibilitada de exercer um determinado direito constitucional por falta de norma que o regulamente.

64
3) ( ) Antônio pretende obter informações de seu interesse constantes de banco de dados de um órgão
público. Sendo seu pedido indeferido na esfera administrativa, Antônio terá que impetrar habeas corpus
junto ao Poder Judiciário, a fim de obter as informações desejadas.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Ao direito à probidade e à moralidade da Administração Pública a Constituição consagra uma garantia:

(A) Habeas Corpus.

(B) Habeas Data.

(C) Ação Popular.

(D) Mandado de Injunção.

(E) Mandado de Segurança.

5) Autoridade administrativa recusa-se ilegalmente a fornecer certidão de tempo de serviço requerida por
funcionário público, que dela necessita para pedir a aposentadoria. É cabível, nesse caso:

(A) Mandado de Injunção;

(B) Habeas Data.

(C) Mandado de Segurança;

(D) Ação Civil Pública.

(E) Habeas Corpus.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 E
4 C
5 C

65
RECADO FINAL:
Nesta aula citamos e descrevemos os cinco Remédios Constitucionais
que a nossa Constituição nos disponibiliza para assegurar nossos direitos
fundamentais.
Trouxemos algumas peculiaridades sobre cada um dos Remédios
Constitucionais: habeas corpus; Mandado de Segurança; Mandado de Injunção;
habeas data; e Ação Popular.
E assim, encerramos os nossos estudos acerca dos direitos e garantias
fundamentais.
Na nossa próxima aula, já começaremos a ver os Poderes Constitucionais.
Dito isto...
Até a próxima aula!

66
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Quando falamos em separação dos três poderes pensamos imediatamente em Executivo,
Legislativo e Judiciário, mas de onde surgiu essa separação? Quais são as atribuições de cada esfera? Há
um poder superior ao outro ou existe uma independência harmônica? Como que estes poderes se
relacionam entre si?
Bem, a partir da aula de hoje, começamos a responder estas e outras indagações.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as funções do Poder Executivo;
- Descrever a investidura nos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República;
- Descrever as hipóteses de Impedimento e Vacância do cargo de Presidente; e
- Citar as hipóteses de responsabilização do Presidente da República.

INTRODUÇÃO:
Ao longo da história diversos autores falaram sobre a corrente Tripartite (separação do governo
em três), sendo Aristóteles o pioneiro em sua obra “A Política” que contempla a existência de três órgãos
separados a quem cabiam as decisões de Estado. Eram eles o Poder Deliberativo, o Poder Executivo e o
Poder Judiciário.
Em seguida Locke, em sua obra “Segundo Tratado Sobre o Governo Civil”, defende um Poder
Legislativo superior aos demais, o Executivo com a finalidade de aplicar as leis, e o Federativo, mesmo
tendo legitimidade, não poderia desvincular-se do Executivo, cabendo a ele cuidar das questões
internacionais de governança.
Posteriormente, Montesquieu cria a tripartição e as devidas atribuições do modelo mais aceito
atualmente, sendo o Poder Legislativo aqueles que fazem as leis para sempre ou para determinada época,
bem como, aperfeiçoam ou revogam as já existentes; o Poder Executivo – o que se ocupa o Príncipe da
paz e da guerra -, recebendo e enviando embaixadores, estabelecendo a segurança e prevenindo invasões;
e por último, o Poder Judiciário, que dá ao Príncipe a competência de punir os crimes ou julgar os
litígios da ordem civil. Nessa tese, Montesquieu pensa em não deixar em uma única mão as tarefas de
legislar, administrar e julgar, já que a concentração de poder tende a gerar o abuso dele.
Moraes (2007) sintetiza muito bem estas ideias da seguinte forma:

A divisão segundo o critério funcional é a célebre “separação de poderes”, que consiste em


distinguir três funções estatais, quais sejam, legislação, administração e jurisdição, que devem ser
atribuídas a três órgão autônomos entre si, que as exercerão com exclusividade, foi esboçada pela
primeira vez por Aristóteles, na obra “Política”, detalhada posteriormente, por John Locke, no
Segundo Tratado de Governo Civil, que também reconheceu três funções distintas, entre elas a
67
executiva, consistente em aplicar a força pública no interno, para assegurar a ordem e o direito, e a
federativa, consistente em manter relações com outros Estados, especialmente por meio de
alianças. E, finalmente, consagrada na obra de Montesquieu O Espírito das Leis, a quem devemos
a divisão e distribuição clássicas, tornando-se princípio fundamental da organização política liberal
e transformando-se em dogma pelo art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de
1789, e é prevista no art. 2º de nossa Constituição Federal.

Podemos perceber que esta idéia de separação dos poderes foi sendo construída ao longo do
tempo. É, contudo, Montesquieu, dando prosseguimento às idéias de Locke, o grande responsável pela
inclusão do poder de julgar entre os poderes fundamentais do Estado quando construiu a tese da
desconcentração do poder centralizado, na figura da tripartição dos poderes. Afirmava Montesquieu que:
todo homem que detém o poder tende a abusar dele.

Segundo o artigo 2º da Constituição: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre


si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Note que a nossa Constituição reconhece a independência
dos poderes, porém diz que eles devem atuar de forma harmônica. Isso ocorre porque, na verdade, o
poder é uno e indivisível. Não há como se separar o poder. O Estado é um só. O que a Teoria da
Separação dos Poderes realmente nos quer dizer não é que existam três poderes propriamente ditos, mas
sim que as competências para o exercício do poder serão dividas entre três órgãos independentes entre si.
A separação dos poderes, portanto, é uma forma de descentralizar o poder e evitar abusos, fazendo com
que um poder controle o outro ou, ao menos, seja um contrapeso. Esse mecanismo assegura que nenhum
poder irá sobrepor-se ao outro, trazendo uma independência harmônica nas relações de governança.
68
No pensamento de Montesquieu, cada Poder teria uma função específica como prioridade, ainda
que pudesse exercer, também, funções dos outros poderes dentro de sua própria administração.
Assim, o chamado Sistema de Freios e Contrapesos consiste no controle do poder pelo próprio
poder, sendo que cada Poder teria autonomia para exercer sua função, mas seria controlado pelos outros
poderes. Isso serviria para evitar que houvesse abusos no exercício do poder por qualquer dos Poderes
(Executivo, Legislativo e Judiciário). Desta forma, embora cada poder seja independente e autônomo,
deve trabalhar em harmonia com os demais Poderes.

1.3 PODER EXECUTIVO

69
O Brasil adota o presidencialismo como sistema de governo desde a primeira Constituição da
República, promulgada em 1891, sendo mantido por todas as posteriores Constituições, inclusive pela
Constituição Federal de 1988.
Em toda a nossa história republicana, só tivemos a adoção do parlamentarismo durante um breve
período de vigência da Constituição de 1946: da promulgação da Emenda Constitucional nº 4, de
02/09/1961, que o instituiu, até a promulgação da Emenda Constitucional nº 6, de 23/01/1963, que
restabeleceu o presidencialismo.
Nossa atual Constituição de
1988 delegou ao eleitorado brasileiro a
competência para, mediante plebiscito,
definir a forma e o sistema de governo
a vigorar no Brasil, conforme artigo 2º
do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT); o plebiscito,
realizado em 21/04/1993, confirmou a
opção do legislador constituinte originário pela república e pelo presidencialismo.
No sistema presidencialista, as funções de Chefe de Estado e Chefe de Governo encontram-se nas
mãos de uma única pessoa, o Presidente da República. Já no parlamentarismo, a função de Chefe de
Estado é exercida pelo Presidente da República (República parlamentarista) ou Monarca (Monarquia
parlamentarista), enquanto a função de Chefe de Governo, pelo Primeiro-Ministro, chefiando o Gabinete.
Como Chefe de Estado, o Presidente da República representa o Estado brasileiro nas suas
relações internacionais, e corporifica a unidade interna da Federação.
Como Chefe de Governo, cabe ao Presidente a gerência dos negócios internos do Estado
brasileiro, sejam os de natureza política, sejam os de natureza administrativa, exercendo, com isso, a
liderança da política nacional, pela orientação das decisões gerais e pela direção da máquina
administrativa.
Vejamos algumas outras características:

- presidencialismo: criação norte-americana; eleição do Presidente da República pelo povo, para mandato
determinado; ampla liberdade para escolher os Ministros de Estado, que o auxiliam e podem ser
demitidos a qualquer tempo;
- parlamentarismo: produto de longa evolução histórica; adquiriu os contornos atuais no final do século
XIX, recebendo forte influência inglesa; o Primeiro-Ministro, que é quem exerce, de fato, a função de
Chefe de Governo, é apontado pelo Chefe de Estado, só se tornando Primeiro-Ministro com a aprovação
do Parlamento; o Primeiro-Ministro, também, não exerce mandato por prazo determinado, pois poderá
ocorrer a queda de governo por dois motivos, a saber: se perder a maioria parlamentar pelo partido a

70
que pertence, ou através do voto de desconfiança; possibilidade de dissolução do Parlamento,
declarando- se extintos os mandatos pelo Chefe de Estado e convocando-se novas eleições.

No Brasil, o artigo 76 da Constituição nos diz que: "O Poder Executivo é exercido pelo Presidente
da República, auxiliado pelos Ministros de Estado". Este artigo exemplifica o que explicamos acima
sobre o sistema presidencialista.

1.3.1 Funções
Na clássica doutrina da separação dos poderes, que já estudamos, a função executiva compreende
a solução e administração de casos concretos individualizados, de acordo com as leis gerais e abstratas
elaboradas pelo Legislativo. A função executiva, por sua vez, é tradicionalmente dividida em função de
governo, com atribuições políticas e de decisão, e função administrativa, com três objetivos distintos:
intervenção, fomento e prestação de serviço público.
Nos dias de hoje, as funções estatais não são exercidas com exclusividade, cabendo a cada Poder o
desempenho de determinadas funções típicas, mas também de algumas funções próprias de outros
Poderes (atípicas).
A função típica do Poder Executivo é administrar, compreendendo não só a função de governo,
relacionada às atribuições políticas e de decisão, mas também a função meramente administrativa, pela
qual são desempenhadas as atividades de intervenção, fomento e serviço público.
As funções atípicas são a legislativa e a de julgamento. Assim, além de gerir, política e
administrativamente, a coisa pública, o Poder Executivo também legisla (expedição de medidas
provisórias) e julga (questões administrativas).

1.3.2 Investidura
O Presidente e o Vice-Presidente da República são eleitos pelo sistema eleitoral majoritário de
dois turnos, pelo qual se sagra vencedor aquele candidato que obtiver a maioria absoluta dos votos
válidos, sendo que, se esta não for alcançada no primeiro turno, há que se realizar um segundo turno.
A eleição do Presidente da República implicará a do Vice-Presidente com ele registrado, isto é, o
eleitor, ao votar para Presidente, estará, também, votando no Vice-Presidente.
Não existe um limite de vezes para que o mesmo cidadão seja eleito Presidente da República.
Entretanto, a Constituição veda a possibilidade de mais de uma reeleição para períodos sequenciais.
São requisitos para a candidatura aos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República:

- ser brasileiro nato;


- estar no pleno gozo dos direitos políticos;
- possuir alistamento eleitoral;
- possuir filiação partidária;

71
- possuir idade mínima de 35 anos; e
- não estar inelegível.

No Brasil, o mandato presidencial é de 4 anos e tem início em 1º de janeiro do ano seguinte ao de


sua eleição (artigo 82 da Constituição), sendo permitida uma única reeleição para o período subsequente
(artigo 14, § 5º da Constituição).

1.3.3 Impedimentos e Vacância


Segundo o artigo 79 da Constituição: "Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e
suceder- lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente".
Os impedimentos são os afastamentos temporários do Presidente, como a hipótese de ausência
do País, situações em que caberá ao Vice-Presidente substituí-lo no exercício pleno da Presidência.
O Presidente e o Vice-Presidente da República NÃO poderão, sem licença do Congresso
Nacional, ausentar-se do pais por período superior a 15 dias, sob pena de perda do cargo (artigo 83 da
Constituição).
Já a vacância é o afastamento definitivo do Presidente, decorrente de morte, de renúncia ou de
perda do cargo em razão de pena imposta pela prática de crime comum ou de responsabilidade, situações
em que caberá ao Vice-Presidente sucedê-lo.
Apenas o Vice-Presidente sucederá o Presidente definitivamente em caso de vacância. Logo,
ocorrendo a vacância do cargo de Presidente, o Vice-Presidente suceder-lhe-á definitivamente, seja qual
for o período faltante para o término do mandato.
Caso ocorra a vacância de ambos os cargos, o artigo 81 da Constituição nos dirá o procedimento a
ser seguido:

Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa
dias depois de aberta a última vaga.
§ 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os
cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei.
§ 2º - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.

Resumindo o artigo acima, caso a vacância ocorra nos 2 primeiros anos do mandato, teremos
eleição direta, 90 dias depois de aberta a última vaga. Já se ocorrer nos 2 últimos anos do mandato,
teremos uma eleição indireta para ambos os cargos será feita 30 dias depois da última vaga, pelo
Congresso Nacional.
Tanto nos casos de impedimento, quanto nos casos de vacância, até que sejam realizadas as novas
eleições, diretas ou indiretas, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente
da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal e o Presidente do Supremo Tribunal
Federal, sendo esta a linha sucessória presidencial após o Vice-Presidente.

72
1.3.4 Responsabilização do Presidente da República
A Constituição prevê a possibilidade de responsabilização do Presidente da República, tanto por
infrações político-administrativas, quanto por infrações penais comuns.

1.3.4.1 Crimes de Responsabilidade


Os crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas, que poderão ser cometidas
no desempenho da função pública e que poderão resultar no impedimento para o exercício da função
pública (impeachment).
A nossa Constituição traz em seu artigo 85 as condutas do Presidente da República que
caracterizarão crime de responsabilidade:

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a
Constituição Federal e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos
Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de
processo e julgamento.

A competência para processar e julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade


é do Senado Federal (artigo 52, I da Constituição), após autorização da Câmara dos Deputados, por
dois terços dos seus membros (artigo 51 , I da Constituição).
Determina a Constituição que, durante o julgamento do Presidente da República por crimes de
responsabilidade pelo Senado Federal, funcionará como Presidente o Presidente do Supremo Tribunal
Federal (artigo 52, parágrafo único). Neste processo, o Senado Federal não estará atuando como órgão
legislativo, mas sim como órgão judicial.
Qualquer cidadão pode oferecer a acusação contra o Presidente da República pela prática de
crime de responsabilidade.
O processo de impeachment tem início na Câmara dos Deputados, a partir da apresentação da
denúncia. Cabe privativamente a essa Casa autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração do
processo contra o Presidente da República.
O exame realizado pela Câmara dos Deputados, sobre a procedência ou improcedência da
acusação, é de natureza política, sendo bastante discricionário.

73
Na realidade, a Câmara dos Deputados não examinará propriamente se houve cometimento de
crime de responsabilidade, mas sim a conveniência político-social da permanência do Presidente da
República na condução do país.
A acusação oferecida à Câmara dos Deputados coloca o Presidente da República na condição de
acusado, razão pela qual lhe deverá ser assegurado o direito ao contraditório e ampla defesa.
Admitida a acusação pela Câmara dos Deputados, o processo será encaminhado ao Senado
Federal, para julgamento.
Da mesma forma que ocorre na Câmara dos Deputados, o julgamento do Senado Federal tem
natureza eminentemente política. O Senado Federal apreciará não somente a caracterização da conduta
do Presidente da República, mas também a conveniência política do seu afastamento do cargo.
No momento em que é instaurado o processo de julgamento pelo Senado Federal, o Presidente da
República ficará suspenso de suas funções, somente retornando ao exercício da Presidência se for
absolvido ou se, decorrido o prazo de 180 dias, o julgamento não estiver concluído, hipótese em que
retornará ao exercício das suas funções, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo (artigo 86, §
lº da Constituição).
A condenação do Presidente da República pela prática de crime de responsabilidade, que somente
será proferida pelos votos de dois terços dos membros do Senado Federal, em votação nominal aberta,
acarretará a perda do cargo, com a inabilitação, por 8 anos, para o exercício de função pública, sem
prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis (artigo 52, parágrafo único da Constituição).
Segundo a jurisprudência do STF, a renúncia ao cargo, apresentada depois de iniciada a sessão de
julgamento não paralisa o processo de impeachment.
Igualmente o STF entende que o Poder Judiciário NÃO dispõe de competência para alterar a
decisão proferida pelo Senado Federal no processo de impeachment, uma vez que o Senado Federal tem
competência constitucional exclusiva para este julgamento.

1.3.4.2 Crimes Comuns


O Presidente da República dispõe de prerrogativas e imunidades em relação ao processo que vise à
sua incriminação pela prática de crime comum. A Constituição outorgou ao Presidente da República 3
importantes imunidades processuais.
Primeiramente, o Presidente da República só poderá ser processado e julgado, por crime comum
ou de responsabilidade, após a autorização da Câmara dos Deputados, por maioria qualificada de dois
terços dos seus membros (artigo 86 da Constituição).
A segunda imunidade em relação ao processo obsta que o Presidente da República seja preso, nas
infrações comuns, enquanto não sobrevier sentença condenatória (artigo 86, § 3º da Constituição).
Por fim, na vigência do seu mandato, o Presidente da República NÃO responderá pela prática de
atos estranhos ao exercício de suas funções presidenciais, isto é, por atos que não guardem conexão com o
exercício da Presidência da República (artigo 86, § 4º da Constituição).

74
O Presidente da República dispõe de prerrogativa de foro. Com efeito, deferida a autorização da
Câmara dos Deputados, por dois terços dos seus membros, será ele julgado, nos crimes de
responsabilidade, pelo Senado Federal e, nas infrações comuns, pelo STF (artigo 86 da Constituição).
Após a autorização da Câmara dos Deputados, se o STF receber a denúncia ou queixa-crime, o
Presidente da República ficará suspenso de suas funções pelo prazo máximo de 180 dias, sem prejuízo do
regular prosseguimento do processo (artigo 86, § 1º da Constituição).
Destaca-se que a prerrogativa de foro só permanece durante o exercício do mandato. Encerrado o
exercício do mandato, qualquer que seja o motivo, os processos criminais em trâmite no STF serão
remetidos para prosseguimento na Justiça Comum.
Finalmente, caso o Presidente da República seja condenado pelo STF pela prática de crime
comum, a decisão condenatória com trânsito em julgado acarretará a suspensão dos seus direitos políticos
e, em consequência, a cessação imediata de seu mandato. Nesse caso, a perda do mandato é consequência
da própria condenação, não dependendo de nenhum outro ato formal, seja do Supremo Tribunal Federal,
seja das Casas do Congresso Nacional.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para verificar o que você já aprendeu até aqui.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Presidente e o Vice-Presidente da República são eleitos pelo sistema eleitoral majoritário de


dois turnos.

2) ( ) A vacância é o afastamento temporário do Presidente, como a hipótese de ausência do País,


situações em que caberá ao Vice-Presidente substituí-lo no exercício pleno da Presidência.

3) ( ) Para que seja instaurado processo criminal contra o Presidente da República, é necessária a
autorização do Senado Federal.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

75
4) Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente da República ou vacância dos respectivos
cargos, serão sucessivamente chamados ao exercido da Presidência:

(A) o Presidente do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados e o Ministro-Chefe do Estado-Maior das
Forças Armadas.

(B) o Presidente do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados e o do STF.

(C) o Presidente do STF, o do Senado Federal e o da Câmara.

(D) o Presidente da Câmara, o do Senado Federal e do STF.

(E) o Presidente da Câmara, o do Senado Federal e o Ministro-Chefe da Casa Civil.

5) No tocante à responsabilização do presidente da República, assinale a opção correta.

(A) Tratando-se de crime de responsabilidade, a decisão proferida pelo Senado Federal pode ser alterada
pelo STF.

(B) São alternativas as sanções de perda do cargo de presidente e de inabilitação, por 8 anos, para o
exercido de função pública.

(C) É assegurada ao Presidente da República na Constituição a prerrogativa de somente ser processado,


seja por crime comum, seja por crime de responsabilidade, após o juízo de admissibilidade pela Câmara
dos Deputados.

(D) Compete ao STF processar e julgar originariamente o presidente da República nas infrações penais
comuns e nas ações populares.

(E) O Presidente da República não pode ser responsabilizado criminalmente durante o exercício do seu
mandato.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 D
5 C

76
RECADO FINAL:
Nesta aula, iniciamos os nossos estudos sobre os Três Poderes,
começando pelo Poder Executivo.
Citamos as funções típicas e atípicas do Poder Executivo, descrevemos
como se dá a investidura nos cargos de Presidente e Vice-Presidente da
República; citamos as hipóteses de impedimento e vacância do cargo de
Presidente; bem como citamos as hipóteses constitucionais de responsabilização
do Presidente da República.
Na próxima aula, avançaremos um pouco mais nos estudos sobre os Poderes.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

77
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Na última aula falamos sobre o Poder Executivo, trazendo diversas peculiaridades inerentes àquele
Poder.
Ainda na temática dos Três Poderes, falaremos nesta aula sobre o Poder Legislativo, representado
pelos congressistas, cidadãos que devem elaborar normas de direito de abrangência geral, aplicadas à toda
sociedade e ao Estado.
Mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as funções do Poder Legislativo;
- Descrever a Estrutura do Poder Legislativo;
- Descrever a Câmara dos Deputados;
- Descrever o Senado Federal;
- Citar as Imunidades Parlamentares;
- Descrever a Prerrogativa de Foro; e
- Descrever o Tribunal de Contas da União (TCU).

INTRODUÇÃO:
A Constituição de 1988 adotou o modelo de separação de poderes flexível, de modo que todos os
poderes não exercem exclusivamente as funções estatais que lhes seriam típicas, mas também
desempenham funções denominadas atípicas, isto é, assemelhadas às funções típicas de outros poderes.
Assim, tanto o Judiciário quanto o Legislativo desempenham, além de suas funções próprias ou típicas
judiciária e legislativa, funções atípicas administrativas, quando, por exemplo, exercem a gestão de seus
bens, pessoal e serviços. Por outro lado, o Executivo e o Judiciário desempenham, também, função atípica
legislativa (este, na elaboração dos regimentos dos tribunais - artigo 96, I, a da Constituição; aquele,
quando expede, por exemplo, medidas provisórias e leis delegadas - artigos 62 e 68 da Constituição).
Finalmente, o Executivo e o Legislativo também exercem, além de suas funções próprias, a função atípica
de julgamento (o Executivo, quando profere decisões nos processos administrativos; o Legislativo,
quando julga autoridades nos crimes de responsabilidade, na forma do artigo 52, I, II, e parágrafo único,
da Constituição). A este mecanismo de controles recíprocos entre os poderes, damos o nome de sistema
de freios e contrapesos (checks and balances).
Esse mecanismo visa garantir o equilíbrio e a harmonia entre os poderes, por meio do
estabelecimento de controles recíprocos, ou seja, através da previsão de interferências legítimas de um
poder sobre outro, dentro dos limites admitidos na própria Constituição. Não se trata de subordinação de
um poder a outro, mas, sim, de mecanismos limitadores específicos impostos pela própria Constituição,

78
de forma a propiciar o equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para
evitar o arbítrio e o desmando de um poder em detrimento do outro.
Assim, te convido agora a mergulhar no mundo do Poder Legislativo.
Vamos lá!?

1.4 PODER LEGISLATIVO


Ao Poder Legislativo incumbe, como função precípua, a elaboração das leis. Entretanto, o
Legislativo não é livre para elaborar leis; ele deve obedecer, formal e materialmente, às disposições
constitucionais. Por isso, a própria Constituição prevê que um outro Poder, o Executivo, aprecie o projeto
votado no Legislativo e, caso entenda que ele não se coaduna com a Constituição, vete o projeto,
impedindo que ele venha a se tornar lei. Além disso, a mesma Constituição confere a outro Poder, o
Judiciário, a atribuição de declarar uma lei inconstitucional, afastando sua aplicação em determinado
caso, ou mesmo retirando-a do ordenamento jurídico.

1.4.1 Funções
As funções típicas do Poder Legislativo são legislar e fiscalizar. Assim, seguindo os
mandamentos constitucionais do processo legislativo, cabe ao Poder Legislativo elaborar as normas
jurídicas gerais e abstratas.
Por outro lado, quando atuando em sua função de fiscalização, cabe ao Congresso Nacional
realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Poder Executivo
(artigo 70 da Constituição), o que será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU);
fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos
os da Administração Indireta (artigo 49, X da Constituição), bem como investigar fato determinado, por
meio da criação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) (artigo 58, § 3º da Constituição).
79
De forma atípica, o Poder Legislativo são administrar e julgar. Por exemplo, o Legislativo
administra quando dispõe sobre sua organização interna, ou sobre a criação de cargos, quando promove
um concurso público para nomeação de cargos efetivos, quando nomeia ou exonera servidores. Já quanto
a competência julgadora, na última aula, trouxemos o principal exemplo, que é quando o Senado Federal
julga determinadas autoridades da República nos crimes de responsabilidade (artigo 52, I, II, e parágrafo
único da Constituição).

1.4.2 Estrutura
Vejamos o que diz o artigo 44 da Constituição: "O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso
Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal".
Em âmbito federal no Brasil vigora o bicameralismo federativo, isto é, o Poder Legislativo é
composto por duas Casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, a primeira constituída por
representantes do povo, escolhidos proporcionalmente à população de cada Unidade da Federação, e a
segunda, por representantes dos Estados-Membros e do Distrito Federal, sendo 3 senadores de cada
Unidade da Federação.
Normalmente, o Congresso Nacional atua através da manifestação das duas Casas Legislativas,
separadamente, tramitando as propostas em cada Casa, de modo autônomo e sem qualquer subordinação
entre elas, cada uma obedecendo, além da Constituição, ao seu próprio Regimento Interno.
Entretanto, existem algumas situações excepcionais, previstas na própria Constituição, em que as
Casas terão que deliberar sobre determinados assuntos de forma conjunta. Embora na sessão conjunta as
Casas atuem simultaneamente, as votações serão consideradas em separado, isto é, a contagem de votos
se dá entre os representantes de cada Casa, separadamente. Nesse caso, os trabalhos dos congressistas
serão orientados pelas regras do Regimento Comum do Congresso Nacional.

Ex.: artigo 57, § 3º da Constituição.

Art. 57. O Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a


17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro.
§ 3º Além de outros casos previstos nesta Constituição, a Câmara dos Deputados e o Senado
Federal reunir-se-ão em sessão conjunta para:
I - inaugurar a sessão legislativa;
II - elaborar o regimento comum e regular a criação de serviços comuns às duas Casas;
III - receber o compromisso do Presidente e do Vice-Presidente da República;
IV - conhecer do veto e sobre ele deliberar.

A sessão conjunta não pode ser confundida com a sessão unicameral. Paulo e Alexandrino (2015)
nos esclarece que:

80
Na sessão conjunta, o Congresso Nacional atua bicameralmente. Assim, embora as discussões e
votações ocorram no mesmo recinto, ao mesmo tempo, a maioria pretendida deverá ser computada
entre os membros de cada uma das Casas, separadamente. Vale dizer, maioria absoluta em sessão
conjunta do Congresso Nacional é maioria absoluta apurada na Câmara dos Deputados (entre
deputados) e no Senado Federal (entre senadores), separadamente. Exemplificando: o veto do
chefe do Executivo a projeto de lei é apreciado em sessão conjunta do Congresso Nacional, e só
pode ser rejeitado pelo voto de maioria absoluta; assim, se todos os 513 Deputados votarem a
favor da rejeição, mas dos 81 Senadores apenas 30 votarem a favor da rejeição, o veto não será
rejeitado, pois a exigida maioria absoluta da sessão conjunta não foi alcançada (afinal, embora 543
congressistas tenham votado a favor da rejeição, a maioria absoluta não foi alcançada entre os
integrantes do Senado Federal).
Na sessão unicameral, o Congresso Nacional atua como uma só Casa, composta de 594
congressistas, e a maioria pretendida será atingida pelo voto desses parlamentares em conjunto.
Significa dizer que maioria absoluta em sessão unicameral é maioria apurada entre os 594
congressistas, independentemente da Casa Legislativa a que pertençam. Exemplificando: na
revisão constitucional, as emendas à Constituição eram aprovadas por maioria absoluta, em sessão
unicameral; assim, se 300 Deputados votassem a favor da aprovação da matéria, a emenda estaria
aprovada, ainda que nenhum Senador votasse favoravelmente.

1.4.3 Câmara dos Deputados


A Câmara dos Deputados é composta de representantes do povo, eleitos pelo sistema
proporcional (que valoriza o voto nos partidos políticos e não, propriamente, no candidato em si), para
mandatos de 4 anos, permitidas sucessivas reeleições.
A representação de cada Unidade da Federação é proporcional à população, isto é, quanto mais
populoso, maior será o número de representantes do respectivo ente federado na Câmara dos Deputados.
Todas as Unidades da Federação deverão contar no mínimo com 8 e no máximo com 70 deputados
(artigo 45, § 1º da Constituição).
Os requisitos para a candidatura ao cargo de Deputado Federal são os seguintes:

- ser brasileiro nato ou naturalizado (artigo 14, § 3º, I da Constituição);


- ser maior de 21 anos (artigo 14, § 3º, VI, c da Constituição);
- estar em pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, § 3º, II da Constituição);
- ter alistamento eleitoral (artigo 14, § 3º, III da Constituição);
- ter domicílio eleitoral na circunscrição (artigo 14, § 3º, IV da Constituição); e
- ter filiação partidária (artigo 14, § 3º, V da Constituição).

O artigo 51 da Constituição traz as competências privativas da Câmara dos Deputados:

81
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:
I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o
Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado;
II - proceder à tomada de contas do Presidente da República, quando não apresentadas ao
Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa;
III - elaborar seu regimento interno;
IV – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos
cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva
remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;
V - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.

1.4.4 Senado Federal


O Senado Federal é composto por representantes dos Estados e do Distrito Federal, de forma
paritária, assegurando-se, assim, o equilíbrio federativo. Desta forma, os senadores não representam o
povo, mas sim os Estados e o Distrito Federal.
Cada Unidade Federativa elege 3 senadores, com mandato de 8 anos, permitidas sucessivas
reeleições. Assim, o Senado Federal é formado por 81 senadores. Diferentemente da Câmara dos
Deputados, na qual há renovação integral dos seus representantes a cada quatro anos, no Senado Federal a
representação de cada Estado e do Distrito Federal é sempre renovada parcialmente, de quatro em quatro
anos, alternadamente, por um e dois terços.
Os senadores são eleitos pelo princípio majoritário simples, ou seja, considera-se eleito o
candidato que obtiver o maior número de votos nas eleições, excluídos os em branco e os nulos, sempre
em um só turno de votação.
Cada senador é eleito com dois suplentes, ou seja, ao elegermos um senador estamos, na
realidade, elegendo três candidatos, o titular e o primeiro e segundo suplentes. Esses últimos só exercerão
efetivamente a cadeira em caso de afastamentos ou impedimentos, temporários ou definitivos, do titular.
Os requisitos para a candidatura ao cargo de Senador são os seguintes:

- ser brasileiro nato ou naturalizado (artigo 14, § 3º, I da Constituição);


- ser maior de 35 anos (artigo 14, § 3º, VI, a da Constituição);
- estar em pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, § 3º, II da Constituição);
- ter alistamento eleitoral (artigo 14, § 3º, III da Constituição);
- ter domicílio eleitoral na circunscrição (artigo 14, § 3º, IV da Constituição); e
- ter filiação partidária (artigo 14, § 3º, V da Constituição).

O artigo 52 da Constituição traz as competências privativas do Senado Federal:

82
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de
responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e
da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho
Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da
República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;
III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de:
a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição;
b) Ministros do Tribunal de Contas da União indicados pelo Presidente da República;
c) Governador de Território;
d) Presidente e diretores do banco central;
e) Procurador-Geral da República;
f) titulares de outros cargos que a lei determinar;
IV - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes
de missão diplomática de caráter permanente;
V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;
VI - fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida
consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades
controladas pelo Poder Público federal;
VIII - dispor sobre limites e condições para a concessão de garantia da União em operações de
crédito externo e interno;
IX - estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios;
X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão
definitiva do Supremo Tribunal Federal;
XI - aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral
da República antes do término de seu mandato;
XII - elaborar seu regimento interno;
XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção
dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva
remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;
XIV - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.
XV - avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua estrutura e
seus componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do
Distrito Federal e dos Municípios.
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo
Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos
do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função
pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

Vejamos o quadro comparativo abaixo:

83
1.4.5 Imunidades Parlamentares
As imunidades são prerrogativas outorgadas constitucionalmente aos membros do Congresso
Nacional, para que eles possam exercer suas funções constitucionais com independência e liberdade de
manifestação, por meio de palavras, discussão, debate e votos.
Tratando-se de prerrogativa de direito público, as imunidades NÃO podem ser objeto de renúncia.
pelo parlamentar.
As imunidades parlamentares são tradicionalmente classificadas em: imunidade material e
imunidade formal.

1.4.5.1 Imunidade Material


Está prevista no artigo 53 da Constituição: "Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e
penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos".
Paulo e Alexandrino (2015) lecionam que:

A imunidade material protege o congressista da incriminação civil, penal ou disciplinar em relação


aos chamados "crimes de opinião" ou "crimes da palavra", tais como a calúnia, a difamação e a
injúria. Trata-se de prerrogativa concedida aos congressistas para o exercício de sua atividade
legislativa com ampla liberdade de expressão, fomentando o debate de ideias, a discussão e o voto
nas questões de interesse dos seus representados.

Assim, em virtude desta imunidade material, não cabe qualquer responsabilização penal, civil ou
administrativa do congressista pelo cometimento de eventuais crimes contra a honra em decorrência das
suas opiniões, palavras e votos.
Paulo e Alexandrino (2015) ainda nos esclarecem que:

84
A imunidade material é absoluta, permanente, de ordem pública. A inviolabilidade é total, haja
vista que as palavras e opiniões sustentadas pelo congressista ficam excluídas de ação repressiva
ou condenatória, mesmo depois de extinto o mandato. Se protegidas pela imunidade material,
essas manifestações são lícitas e, portanto, o parlamentar não responderá por elas, não será
investigado, incriminado ou responsabilizado, nem mesmo após a cessação do mandato.

Por fim, cabe ressaltar que a imunidade material só protege os congressistas quando suas
manifestações se derem no exercício do mandato. Logo, opiniões, palavras e votos proferidos sem
qualquer relação comi o desempenho do respectivo mandato não são protegidos pela inviolabilidade.
Se as manifestações parlamentares guardarem conexão com o desempenho do mandato, ou
tiverem sido proferidas em razão dele, estarão protegidas pela imunidade, qualquer que seja o- local em
que tenham sido proferidas, ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa.

1.4.5.2 Imunidade Formal


A imunidade formal está prescrita no artigo 53, § 2º, da Constituição: "Desde a expedição do
diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime
inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para
que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão".
A imunidade protege o parlamentar desde a expedição do diploma pela Justiça Eleitoral. O
diploma é o atestado expedido pela Justiça eleitoral certificando a regular eleição do candidato, sendo a
diplomação realizada antes da posse.
Paulo e Alexandrino (2015) nos esclarecem que:

Cabe ressaltar que a imunidade formal não afasta a ilicitude da conduta criminosa do parlamentar.
Na realidade, ressalvadas as situações protegidas pela imunidade material; anteriormente
estudadas, nas quais há o afastamento dos crimes de opinião, os parlamentares, respondem pelos
crimes porventura praticados segundo as mesmas leis aplicáveis aos indivíduos em geral.
Entretanto, corno o interesse público recomenda que o parlamentar não seja afastado de sua
atividade congressual em razão de processos arbitrários ou perseguições políticas, que poderiam
trazer significativos prejuízos à atividade legislativa, a imunidade formal lhe outorga certos
"privilégios" no curso de sua incriminação, seja em relação à prisão, seja em relação à
possibilidade de sustação do andamento do processo perante o Poder Judiciário.

Ressalta-se que a imunidade formal impossibilita a prisão do parlamentar não apenas em relação
aos crimes praticados após a diplomação, mas, também, em relação aos crimes anteriores.
A única situação em que se admite a prisão do parlamentar é a de flagrante de crime
inafiançável. Mas, mesmo nesse caso, a manutenção da sua prisão dependerá de autorização da Casa
Legislativa, e não da vontade do Poder Judiciário. Como visto acima, a Constituição determina que no
caso de prisão em flagrante por crime inafiançável os autos deverão ser remetidos dentro de 24 horas à
respectiva Casa, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. Se a Casa

85
Legislativa não autorizar, o parlamentar será posto em liberdade, independentemente da gravidade de sua
conduta criminosa.
Além dessa garantia em relação à prisão, a imunidade formal incide, também, sobre o processo de
incriminação do congressista, com a possibilidade de que a Casa Legislativa suste o andamento da ação
perante o STF, conforme artigo 53, §§ 3º ao 5º da Constituição:

§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o
Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político
nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o
andamento da ação.
§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta
e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.
§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato.

1.4.6 Prerrogativa de Foro


O foro especial em razão da função de congressista está prevista no artigo 53, § 1º da
Constituição: "Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento
perante o Supremo Tribunal Federal".
Portanto, cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF) processar e julgar, originariamente, os
membros do Congresso Nacional pela prática de crimes comuns (artigo 102, I, b, da Constituição).
Essa competência do STF para julgar os congressistas alcança todas as infrações penais a eles
eventualmente imputadas.
A prerrogativa de foro também impõe que todos os inquéritos policiais contra congressista sejam
instaurados perante o STF, ao qual caberá ordenar toda e qualquer providência necessária à obtenção de
dados probatórios essenciais à demonstração da alegada prática delituosa, inclusive a decretação da
quebra do sigilo bancário, bem como determinar a adoção de quaisquer outras medidas com vistas à
apuração dos ilícitos.
Entretanto, a prerrogativa de foro não alcança as ações de natureza cível ajuizadas contra
congressistas. A competência do foro especial restringe-se às ações de natureza penal, não abrangendo,o
julgamento de quaisquer ações civis. Significa dizer que não cabe ao STF processar e julgar,
originariamente; as causas de natureza civil.
A prerrogativa de foro tem como termo inicial a diplomação do congressista e como termo final, o
término do mandato, ou seja, os congressistas só dispõem de foro especial perante STF na vigência do
mandato.
Aqui, faz-se uma pequena ressalva, devido ao caráter unitário do julgamento, o STF entende que a
cessação do exercício da função pública depois do início do julgamento não faz cessar a prerrogativa de
foro. Assim, uma vez iniciado o julgamento de um congressista pelo STF, a perda superveniente do
mandato eletivo não afastará a prerrogativa de foro, isto é, o STF prosseguirá o julgamento.

86
1.4.7 Tribunal de Contas da União (TCU)
Os Tribunais de Contas são órgãos
vinculados ao Poder Legislativo, que o
auxiliam no exercício do controle externo
da administração pública, sobretudo o
controle financeiro. NÃO existe
hierarquia entre os Tribunais de Contas e
o Poder Legislativo.
Os Tribunais de Contas NÃO praticam atos de natureza legislativa, mas tão somente atos de
fiscalização e controle, de natureza administrativa.
Apesar de receberem a denominação de "Tribunais", as Cortes de Contas NÃO exercem
jurisdição, NÃO pertencendo ao Poder Judiciário.
O TCU é integrado por 9 Ministros. Os requisitos para a investidura no cargo de Ministro estão
enumerados no artigo 73, § 1º da Constituição:

Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito
Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que
couber, as atribuições previstas no art. 96.
§ 1º Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão nomeados dentre brasileiros que
satisfaçam os seguintes requisitos:
I - mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade;
II - idoneidade moral e reputação ilibada;
III - notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração
pública;
IV - mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os
conhecimentos mencionados no inciso anterior.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das


entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação
das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle
externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder (artigo 70 da Constituição).
Este controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do TCU (artigo
71 da Constituição).
O TCU dispõe de competência para julgar, administrativamente, as contas dos administradores e
demais responsáveis por recursos públicos, no âmbito dos três Poderes da União - Executivo, Legislativo
e Judiciário (artigo 71, II da Constituição).
Todavia, o TCU NÃO dispõe de competência para julgar as contas do Presidente da República,
cabendo-lhe, neste caso, apenas apreciá-las, mediante a elaboração de parecer prévio, meramente
opinativo, no prazo de 60 dias (artigo 71, I da Constituição), porquanto é o Congresso Nacional quem
dispõe de competência para julgar as contas do Presidente da República (artigo 49, IX da Constituição).

87
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para verificar o que você já aprendeu até aqui.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Cada um dos vinte e seis estados da Federação mais o Distrito Federal elegem três senadores,
totalizando oitenta e um senadores com mandato de oito anos, havendo para cada senador dois suplentes.

2) ( ) A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União será exercida


pelo TCU, mediante controle externo.

3) ( ) Compete privativamente ao Senado Federal proceder à tomada de contas do Presidente da


República, quando não apresentadas ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da
sessão legislativa.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) As imunidades parlamentares - material e formal - constituem garantia significativa para o exercício do


mandato concedido pelo povo aos integrantes do Poder Legislativo:

(A) As imunidades podem ser objeto de renúncia.

(B) A imunidade parlamentar material obsta a propositura de ação penal ou indenizatória contra o
membro do Poder Legislativo pelas opiniões, palavras e votos que proferir e exige relação de pertinência
com o exercício da função.

(C) A imunidade parlamentar formal somente garante ao integrante do Poder Legislativo a


impossibilidade de ser ou de permanecer preso.

(D) A imunidade parlamentar material será aplicável somente nos casos em que a manifestação do
pensamento ocorrer dentro do recinto legislativo.

(E) as imunidades parlamentares impedem qualquer tipo de responsabilização civil, penal ou


administrativa.

88
5) O Deputado Federal ou Senador pego em flagrante durante prática de crime:

(A) poderá ter sua prisão decretada, independentemente de o crime ser inafiançável ou não.

(B) poderá ter sua prisão decretada, apenas se o crime for inafiançável.

(C) não poderá ser denunciado judicialmente, salvo mediante prévia autorização da Casa legislativa
respectiva.

(D) poderá ser denunciado judicialmente ao Superior Tribunal de Justiça, independentemente de


autorização da Casa legislativa respectiva.

(E) em hipótese alguma poderá ser preso.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 B
5 B

RECADO FINAL:
Nesta aula, avançamos um pouco mais nos nossos estudos sobre os Três Poderes, falando sobre o
Poder Legislativo.
Citamos as funções típicas e atípicas do Poder Legislativo; descrevemos sua estrutura, focando na
Câmara dos Deputados e no Senado Federal; citamos as chamadas imunidades parlamentares;
descrevemos, ainda, a prerrogativa de foro; e, por fim, concluímos descrevendo o Tribunal de Contas da
União (TCU).
Na próxima aula, vamos concluir este assunto, abordando o último Poder que falta, o Poder
Judiciário.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

89
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Nas últimas aulas começamos a falar sobre os Três Poderes. Já tratamos sobre o Poder Executivo e
o Legislativo, bem como as peculiaridades inerentes a cada Poder.
Nesta aula, finalizaremos este assunto, falando sobre o Poder Judiciário. Vamos tentar expor as
funções e a estrutura deste Poder, além da carreira dos Magistrados e concluiremos tratando um pouco
sobre o Supremo Tribunal Federal (STF), órgão máximo do nosso Poder Judiciário.
Vamos nessa!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as funções do Poder Judiciário;
- Citar as garantias do Poder Judiciário;
- Descrever a organização da carreira da Magistratura;
- Citar as garantias aos Magistrados;
- Citar as vedações aos Magistrados; e
- Descrever o Supremo Tribunal Federal (STF).

INTRODUÇÃO:
Pode-se afirmar que não é possível conceber um Estado de Direito sem um Poder Judiciário
independente, responsável não só pela solução definitiva dos conflitos, mas também pela garantia da
integridade do ordenamento jurídico, mediante a aferição da compatibilidade entre os atos estatais e a
Constituição.
Observa-se que a plena independência entre os Poderes Executivo e Legislativo não é um
pressuposto obrigatório para termos um Estado de Direito, visto que no sistema parlamentarista a relação
entre os Poderes Executivo e Legislativo não é propriamente de independência, mas sim de colaboração,
uma vez que a manutenção do exercício do poder por parte de um depende da vontade do outro.
Diferentemente, seja qual for o sistema de governo (presidencialista ou parlamentarista) o Poder
Judiciário sempre e obrigatoriamente deve ser um Poder plenamente independente, em um Estado
Democrático de Direito, incumbido da guarda da Constituição, a fim de conferir efetividade, dentre
outros, aos princípios da legalidade e da igualdade.

1.5 PODER JUDICIÁRIO


Os órgãos que integram o Poder Judiciário foram enumerados no artigo 92 da Constituição:

90
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm
sede na Capital Federal.
§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território
nacional.

O Supremo Tribunal Federal (STF) e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território
nacional e, assim como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), têm sede na Capital Federal (artigo 92, §§
1º e 2º da Constituição).

1.5.1 Funções
O Poder Judiciário tem por função típica a jurisdicional, inerente à sua natureza, pela qual lhe
compete, coercitivamente, em caráter definitivo, dizer e aplicar o Direito às controvérsias a ele
submetidas. Exerce, ainda, funções atípicas, de natureza executivo-administrativa (organização de suas
secretarias; concessão de licença e férias a seus membros, juízes e demais servidores), bem como de
natureza legislativa (elaboração do regimento interno).
Cintra, Grinover e Dinamarco (2005) nos dão um bom conceito sobre jurisdição:

91
(...) uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em
conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa
pacificação é feita mediante a atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado
em concreto para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função sempre por meio do
processo, seja expressando imperativamente o preceito (através de uma sentença de mérito), seja
realizando no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da execução forçada).

Em linhas gerais, há 3 características básicas da jurisdição: lide, inércia e definitividade.


Em regra, alguém terá uma pretensão resistida, insatisfeita. Não sendo ela pacificamente resolvida,
quem se sentir lesado poderá "bater às portas do Judiciário" apresentando a lide, que, substituindo a
vontade das partes, dirimirá o conflito, afastando a resistência e pacificando com justiça.
Já por inércia, temos que o Judiciário só se manifesta mediante provocação.
Por fim, a definitividade, na medida em que as decisões jurisdicionais transitam em julgado e,
acobertadas pela coisa julgada, não mais poderão ser alteradas.

1.5.2 Garantias do Poder Judiciário


A Constituição conferiu importantes garantias ao Poder Judiciário, como meio de lhe assegurar
autonomia e independência para o imparcial exercício da jurisdição. Essas garantias, portanto, não devem
ser vistas como privilégios dos magistrados, mas sim como prerrogativas que asseguram, ao próprio
Poder Judiciário, a necessária independência para o exercício de suas relevantes funções constitucionais,
sem ingerência e pressões dos Poderes Legislativo e Executivo.
Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira (artigo 99 da
Constituição). Paulo e Alexandrino (2015) nos explicam que:

Em razão da autonomia financeira, os tribunais elaborarão suas próprias propostas orçamentárias,


desde que dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes
orçamentárias. Desse modo, o Poder Judiciário, embora não disponha de orçamento próprio, tem
assegurado constitucionalmente o direito de elaborar sua proposta orçamentária, com a
participação ativa na fixação dos limites de gastos da lei de diretrizes orçamentárias.

A autonomia administrativa confere aos Tribunais do Poder Judiciário a competência para:

- eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de
processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos
respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;
- organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo
exercício da atividade correicional respectiva;
- prover, na forma prevista na Constituição, os cargos de juiz de carreira da respectiva jurisdição;
- propor a criação de novas varas judiciárias;
- prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, os cargos necessários à administração da
Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei; e
92
- conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem
imediatamente vinculados.

1.5.3 Organização da Carreira


O ingresso na carreira da magistratura, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, dar-se-á
mediante a realização de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) em todas as fases, exigindo-se do bacharel em Direito, no mínimo, 3 anos
de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação.
A promoção do magistrado na carreira será feita alternadamente, por antiguidade e merecimento,
atendidas as seguintes normas:

- é obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de
merecimento;
- a promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva entrância e integrar o juiz a
primeira quinta parte da lista de antiguidade desta, salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o
lugar vago;
- aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza
no exercício da jurisdição e pela frequência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de
aperfeiçoamento;
- na apuração de antiguidade, o Tribunal somente poderá recusar o juiz mais antigo pelo voto
fundamentado de dois terços de seus membros, conforme procedimento próprio, e assegurada ampla
defesa, repetindo-se a votação até fixar-se a indicação; e
- não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não
podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão.

O juiz titular residirá na respectiva comarca, salvo autorização do Tribunal.


O ato de remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por interesse público, fundar-
se-á em decisão por voto da maioria absoluta do respectivo Tribunal ou do CNJ, assegurada ampla defesa.
Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes
e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.
Nos Tribunais com número superior a 25 julgadores, poderá ser constituído órgão especial, com o
mínimo de 11 e o máximo de 25 membros, para o exercício das atribuições administrativas e
jurisdicionais delegadas da competência do Tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por
antiguidade e a outra metade por eleição pelo Tribunal pleno.

93
A atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedadas férias coletivas nos juízos e Tribunais de
segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão
permanente (artigo 93, XII da Constituição). Esta vedação NÃO alcança o STF, tampouco os demais
Tribunais Superiores.

1.5.4 Garantias aos Magistrados


O artigo 95 da Constituição garante aos membros do Poder Judiciário a: vitaliciedade,
inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio.
Em relação aos juízes de primeiro grau, a vitaliciedade só será adquirida após o cumprimento do
estágio probatório, no qual não há que se falar em vitaliciedade, a perda do cargo dependerá de
deliberação do Tribunal a que o juiz estiver vinculado. Uma vez cumprido o estágio probatório, o
magistrado só perderá o seu cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado.
A inamovibilidade assegura que os magistrados somente poderão ser removidos por iniciativa
própria, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão adotada pelo voto da maioria absoluta
do respectivo Tribunal ou do CNJ, assegurada ampla defesa. A inamovibilidade não impede, ainda; que o
magistrado seja removido por determinação do CNJ, a título de sanção administrativa, assegurada ampla
defesa (artigo 103-B, § 4º, III da Constituição).
A irredutibilidade do subsídio, assegurada aos magistrados, tem por escopo evitar que a sua
atuação seja objeto de pressões, advindas da redução de sua espécie remuneratória, garantindo-se, com
isso, a dignidade e a independência necessárias ao pleno exercício de suas funções.
Entretanto, esta garantia contempla apenas a chamada "irredutibilidade jurídica", ou seja, a
irredutibilidade nominal do subsídio, e não a sua irredutibilidade real. Significa dizer que a
irredutibilidade não assegura o direito à atualização monetária do valor do subsídio em face da perda do
poder aquisitivo da moeda (inflação), mas tão somente que o seu valor nominal não será reduzido. A
irredutibilidade não impede, tampouco, a incidência ou o aumento de tributos sobre o valor do subsídio,
ainda que isso implique sua redução nominal.

1.5.5 Vedações
A fim de assegurar maior imparcialidade ao exercício de suas funções, a Constituição estabelece
algumas vedações aos magistrados, que dizem respeito a atividades e condutas consideradas
incompatíveis com a missão de membro do Poder Judiciário. Destarte, é vedado aos magistrados:

- exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;
- receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;
- dedicar-se à atividade político-partidária;
- receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou
privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; e

94
- exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento
do cargo por aposentadoria ou exoneração.

Essa última vedação, denominada quarentena, tem por objetivo reforçar a independência e a
imparcialidade do Poder Judiciário. Visa evitar o tráfico de influência ou exploração de prestígio pelo ex-
magistrado perante o juízo ou Tribunal do qual se afastou.

1.5.6 Supremo Tribunal Federal (STF)


O STF se compõe de 11
Ministros, nomeados pelo Presidente
da República, após aprovação pela
maioria absoluta do Senado Federal,
dentre cidadãos de notável saber
jurídico e reputação ilibada, com
mais de 35 e menos de 65 anos de
idade.
Como não existe regra
predeterminada para o preenchimento
das vagas, o Presidente da República é livre para escolher, desde que observados os requisitos
constitucionais a seguir apontados, submetendo o nome à aprovação do Senado Federal. Caso haja a
aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal, o Presidente da República fará a nomeação. Com a
nomeação, cabe ao Presidente do Tribunal dar a posse, momento em que ocorre a imediata aquisição da
vitaliciedade.
São os seguintes os requisitos para a escolha dos Ministros do STF:

- idade entre 35 e 65 anos;


- ser brasileiro nato;
- ser cidadão, no pleno gozo dos direitos políticos; e
- possuir notável saber jurídico e reputação ilibada.

Um ponto interessante a ser observado é que a Constituição em nenhum momento menciona que
os Ministros do STF devam ser, obrigatoriamente, bacharéis em Direito, tampouco que sejam originários
da carreira da magistratura, embora haja a exigência de notável saber jurídico.
E o que é notável saber jurídico?
Bom, aqui estamos diante de um conceito jurídico indeterminado. Não há como se dizer a priori o
que é ou não "notável saber jurídico". Isso deverá ser analisado caso a caso.
O Tribunal Pleno dispõe de quorum para deliberação se presentes pelo menos 8 dos 11 Ministros.

95
O Presidente do STF é eleito diretamente pelos seus pares para um mandato de 2 anos, sendo
expressamente vedada a reeleição. Tradicionalmente, são eleitos para os cargos de Presidente e Vice-
Presidente do Tribunal os dois ministros mais antigos que ainda não o exerceram.
As competências do STF se encontram nos artigos 102 e 103 da Constituição, podendo ser
divididas em: competência originária (quando o STF processa e julga, originariamente, a matéria, em
única instância) e competência recursal (quando o STF aprecia a matéria a ele chegada mediante recurso
ordinário ou extraordinário).

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos mais uma pausa em nossos estudos para verificar o que você já aprendeu até aqui.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Magistrado só poderá exercer uma função no Magistério se estiver em disponibilidade.

2) ( ) Desde seu ingresso na carreira, o Magistrado só poderá perder seu cargo por sentença judicial
transitada em julgado.

3) ( ) Somente poderão ingressar no STF os Ministros que exerceram durante dois anos suas funções no
STJ.

4) ( ) A Constituição veda aos juízes que se aposentarem ou forem exonerados o exercício da advocacia
no juízo ou Tribunal do qual se afastaram até o decurso de três anos após o desligamento.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) É integrante do Poder Judiciário o:

(A) Tribunal de Contas da União (TCU).

(B) Juiz Militar.

(C) Juiz de Paz.

(D) Ministério da Justiça.

(E) Ministério dos Direitos Humanos.

96
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 E
4 C
5 B

RECADO FINAL:
Nesta aula, concluímos os nossos estudos sobre os Três Poderes, falando sobre o Poder Judiciário.
Citamos as funções típicas e atípicas, além das garantias, do Poder Judiciário, descrevemos a
organização da carreira da Magistratura, citando as garantias e as vedações impostas aos Magistrados. Por
fim, descrevemos o Supremo Tribunal Federal (STF).
Na próxima aula, já sairemos deste tema e falaremos sobre algo de suma importância à nossa
carreira, que são as disposições constitucionais sobre as Forças Armadas.
Bons estudos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

97
DIREITO CONSTITUCIONAL

Olá, Aluno(a)!
Esta é a última aula desta nossa primeira Unidade de Ensino: Direito Constitucional. Ao longo das
últimas aulas, estudamos a Teoria da Constituição, analisamos os direitos e garantias fundamentais
contidos na nossa Constituição, e falamos sobre os três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Nesta aula, estudaremos algo de suma importância para nós, que são as disposições constitucionais
sobre as Forças Armadas.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as regras gerais aplicáveis às Forças Armadas;
- Conceituar Hierarquia e Disciplina;
- Descrever as Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO);
- Explicar a aplicação do habeas corpus em punições disciplinares militares; e
- Descrever o Serviço Militar Obrigatório.

INTRODUÇÃO:
A História das Forças Armadas muitas vezes se confunde com a História de nosso próprio país.
Até os dias atuais são instituições de elevada importância à política brasileira interna e externa.
Em que pese desde a Guerra do Paraguai o Brasil não sofrer nenhuma grande ameaça externa, as
Forças Armadas continuam com sua relevante atuação tanto no âmbito militar, com operações de paz no
Haiti e no Líbano, como internamente em missões de garantia da lei e da ordem em várias unidades
federativas do Brasil, apoio ao Programa Mais Médicos, Eleições, ENEM e diversas outras políticas
sociais, as quais muitas não seriam possíveis de serem concretizadas sem o auxílio das Forças Armadas.
Reconhecendo toda a importância das Forças Armadas, a Constituição dedicou um capítulo inteiro
a elas.
Nesta aula, nós estudaremos alguns dispositivos constitucionais que tratam sobre as Forças
Armadas.
Vamos lá!?

1.6 FORÇAS ARMADAS


O instrumento militar responsável pela defesa do Brasil é constituído pelas Forças Armadas,
compostas pela Marinha do Brasil (MB), pelo Exército Brasileiro (EB) e pela Força Aérea Brasileira
(FAB).

98
São funções das instituições militares:
assegurar a integridade do território nacional;
defender os interesses e os recursos naturais,
industriais e tecnológicos brasileiros; proteger os
cidadãos e os bens do país; garantir a soberania da
nação.
Também é missão das Forças Armadas a
garantia dos poderes constitucionais constituídos e,
por iniciativa destes, atuar na garantia da lei e da
ordem para, em espaço e tempo delimitados,
preservar o exercício da soberania do Estado e a
indissolubilidade da Federação.
As Forças Armadas atuam sob a direção superior do Ministério da Defesa (MD), que tem a
incumbência de orientar, supervisionar e coordenar as atividades desenvolvidas por essas instituições.
Os membros das Forças Armadas são denominados militares (artigo 142, §3º da Constituição) e
estão sujeitos a toda uma legislação específica. Passemos agora a tratar dos dispositivos constitucionais
que regem as Forças Armadas.

1.6.1 Regras Gerais

Segundo o artigo 142 da Constituição:

As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições
nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a
autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos
poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
99
Então, podemos perceber que a MB, o EB e a FAB constituem as Forças Armadas, sendo
consideradas instituições nacionais permanentes e regulares, destinadas à defesa da Pátria, à garantia
dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Além disso, tratam-se de instituições nacionais, regulares e permanentes. Quanto a isso, Silva
(2003) nos ensina que:

(...) concebendo-as como instituições nacionais, reconhece-lhes a Constituição a importância e


relativa autonomia jurídica decorrente de seu caráter institucional: declarando-as permanentes e
regulares, vincula-as à própria vida do Estado, atribuindo-lhes a perduração deste. Essa posição
constitucional das Forças Armadas importa afirmar que não poderão ser dissolvidas, salvo por
decisão de uma Assembléia Nacional Constituinte. E, sendo regulares, significa que deverão
contar com efetivos suficientes ao seu funcionamento normal, por via de recrutamento, nos termos
da lei.

As Forças Armadas se organizam com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade e


comando supremos do Presidente da República, que tem por atribuições nomear os Comandantes das
Forças, além de promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhes são privativos, em
conformidade com o artigo 84, XIII da Constituição.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:


XIII - exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os Comandantes da Marinha, do
Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhes
são privativos.

Segundo o artigo 5º, caput e §1º da LC nº 97/99, os cargos de Comandante da Marinha, do


Exército e da Aeronáutica são privativos de oficiais-generais do último posto da respectiva Força, sendo
assegurada aos referidos Comandantes precedência hierárquica sobre os demais oficiais-generais das três
Forças Armadas.

Art. 5o Os cargos de Comandante da Marinha, do Exército e da Aeronáutica são privativos de


oficiais-generais do último posto da respectiva Força.
§ 1o É assegurada aos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica precedência
hierárquica sobre os demais oficiais-generais das três Forças Armadas.

Considerando as peculiaridades inerentes à atividade militar, a própria Constituição trará algumas


disposições específicas aos militares.
Ao militar são proibidas a sindicalização e a greve (artigo 142, §3º, IV da Constituição). Além
disso, o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos (artigo 142, §3º,
IV da Constituição), sendo inclusive passível de submissão a Conselho de Disciplina (Praça) ou Conselho
de Justificação (Oficial). Mas, trataremos especificamente deste assunto na Unidade de Ensino 3.
O oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele
incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal

100
especial, em tempo de guerra (artigo 142, §3º, VI da Constituição). Ademais, o oficial condenado na
justiça comum ou militar a pena privativa de liberdade superior a 2 anos, por sentença transitada em
julgado, será submetido ao mesmo julgamento mencionado acima (artigo 142, §3º, VII da Constituição).

1.6.2 Hierarquia e Disciplina


Como já dissemos, as Forças Armadas são instituídas sobre dois pilares básicos: hierarquia e
disciplina. O artigo 14 do Estatuto dos Militares nos explica o significado de ambas as expressões:

Art. 14. A hierarquia e a disciplina são a base institucional das Forças Armadas. A autoridade
e a responsabilidade crescem com o grau hierárquico.
§ 1º A hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da
estrutura das Forças Armadas. A ordenação se faz por postos ou graduações; dentro de um mesmo
posto ou graduação se faz pela antigüidade no posto ou na graduação. O respeito à hierarquia é
consubstanciado no espírito de acatamento à seqüência de autoridade.
§ 2º Disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos,
normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento
regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de
cada um dos componentes desse organismo.
§ 3º A disciplina e o respeito à hierarquia devem ser mantidos em todas as circunstâncias da
vida entre militares da ativa, da reserva remunerada e reformados.

Na verdade, estes pilares básicos se estenderão a toda a caserna, influenciando todos os aspectos
da vida militar, desde os mais simples até os mais complexos, sendo verdadeiros axiomas da atividade
militar. A hierarquia e a disciplina são a base institucional das Forças Armadas, sendo que a autoridade e
a responsabilidade crescem de acordo com o grau hierárquico. A ordenação da autoridade se faz por
postos ou graduações e, dentro de um mesmo posto ou graduação, pela antiguidade.

- Posto: é o grau hierárquico do oficial, conferido por ato do Presidente da República ou do Comandante
da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica e confirmado em Carta Patente.
- Graduação: é o grau hierárquico da praça, conferido pela autoridade militar competente.

As patentes, com prerrogativas, direitos e deveres a elas inerentes, são conferidas pelo Presidente
da República e asseguradas em plenitude aos oficiais da ativa, da reserva ou reformados, sendo-lhes
privativos os títulos e postos militares e, juntamente com os demais membros, o uso dos uniformes das
Forças Armadas (artigo 142, §3º, I da Constituição).

101
1.6.3 Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO)
Realizadas exclusivamente por ordem expressa da Presidência da República, as missões de
Garantia da Lei e da Ordem (GLO) ocorrem nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais
de segurança pública, em graves situações de perturbação da ordem. Paulo e Alexandrino (2015) nos
esclarecem que:

Observe-se que a competência das forças armadas para a garantia da lei e da ordem é meramente
subsidiária, uma vez que essas atribuições são ordinariamente desempenhadas pelas forças da
segurança pública, que compreendem a polícia federal e as polícias civil e militar dos estados e do
Distrito Federal. Tanto é assim que a intervenção das forças armadas na defesa da lei e da ordem
depende da iniciativa de um dos Poderes constitucionais, vale dizer, do Supremo Tribunal Federal,
do Congresso Nacional ou da Presidência da República. Sem a provocação de um desses Poderes,
a atuação das forças armadas na garantia da lei e da ordem pública é inconstitucional.

Reguladas pelo artigo 142 da Constituição, pela Lei Complementar nº 97/99, e pelo Decreto nº
3.897/2001, as operações de GLO concedem provisoriamente aos militares a faculdade de atuar com
poder de polícia até o restabelecimento da normalidade.
Nessas ações, as Forças Armadas agem de forma episódica, em área restrita e por tempo
limitado, com o objetivo de preservar a ordem pública, a integridade da população e garantir o
funcionamento regular das instituições. Estas disposições se encontram no artigo 15 da Lei
Complementar nº 97/99:

102
Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes
constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de responsabilidade do
Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da Defesa a ativação de órgãos
operacionais, observada a seguinte forma de subordinação:
I - ao Comandante Supremo, por intermédio do Ministro de Estado da Defesa, no caso de
Comandos conjuntos, compostos por meios adjudicados pelas Forças Armadas e, quando
necessário, por outros órgãos;
II - diretamente ao Ministro de Estado da Defesa, para fim de adestramento, em operações
conjuntas, ou por ocasião da participação brasileira em operações de paz;
III - diretamente ao respectivo Comandante da Força, respeitada a direção superior do
Ministro de Estado da Defesa, no caso de emprego isolado de meios de uma única Força.
§ 1o Compete ao Presidente da República a decisão do emprego das Forças Armadas, por
iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos poderes
constitucionais, por intermédio dos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Senado Federal
ou da Câmara dos Deputados.
§ 2o A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer
dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da
República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.
§ 3o Consideram-se esgotados os instrumentos relacionados no art. 144 da Constituição
Federal quando, em determinado momento, forem eles formalmente reconhecidos pelo respectivo
Chefe do Poder Executivo Federal ou Estadual como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes
ao desempenho regular de sua missão constitucional.
§ 4o Na hipótese de emprego nas condições previstas no § 3 o deste artigo, após mensagem do
Presidente da República, serão ativados os órgãos operacionais das Forças Armadas, que
desenvolverão, de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado, as
ações de caráter preventivo e repressivo necessárias para assegurar o resultado das operações na
garantia da lei e da ordem.
§ 5o Determinado o emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, caberá à
autoridade competente, mediante ato formal, transferir o controle operacional dos órgãos de
segurança pública necessários ao desenvolvimento das ações para a autoridade encarregada das
operações, a qual deverá constituir um centro de coordenação de operações, composto por
representantes dos órgãos públicos sob seu controle operacional ou com interesses afins.
§ 6o Considera-se controle operacional, para fins de aplicação desta Lei Complementar, o
poder conferido à autoridade encarregada das operações, para atribuir e coordenar missões ou
tarefas específicas a serem desempenhadas por efetivos dos órgãos de segurança pública,
obedecidas as suas competências constitucionais ou legais.
§ 7o A atuação do militar nos casos previstos nos arts. 13, 14, 15, 16-A, nos incisos IV e V
do art. 17, no inciso III do art. 17-A, nos incisos VI e VII do art. 18, nas atividades de defesa civil
a que se refere o art. 16 desta Lei Complementar e no inciso XIV do art. 23 da Lei n o 4.737, de 15
de julho de 1965 (Código Eleitoral), é considerada atividade militar para os fins do art. 124 da
Constituição Federal.

A decisão sobre o emprego excepcional das tropas é feita pela Presidência da República, por
motivação ou não dos governadores ou dos presidentes dos demais Poderes constitucionais.
103
Exemplo de uso das Forças
Armadas na Garantia da Lei e da
Ordem foi o emprego de tropas em
operações de pacificação do Governo
estadual em diferentes comunidades
do Rio de Janeiro. Também, o uso de
tropas federais nos estados do Rio
Grande Norte e do Espírito Santo,
devido ao esgotamento dos meios de
segurança pública, para a preservação
da ordem pública e da incolumidade
das pessoas e do patrimônio.
As Forças Armadas também atuaram nos limites legais da GLO durante a Conferência das Nações
Unidas para o Desenvolvimento Sustentável do Rio de Janeiro (Rio + 20), em 2012; na Copa das
Confederações da FIFA e na visita do Papa Francisco a Aparecida (SP) e ao Rio de Janeiro durante a
Jornada Mundial da Juventude, em 2013; na Copa do Mundo 2014 e nos Jogos Olímpicos Rio 2016.
Além disso, operações de GLO são adotadas para assegurar a tranquilidade e lisura de processos
eleitorais em município sob risco de perturbação da ordem.
No início de 2014, o Ministério da Defesa publicou o Manual de GLO, confeccionado por
assessores civis e militares, com o objetivo de padronizar as rotinas e servir de instrumento educativo e de
doutrinação para as forças preparadas para atuar nesse tipo de ação.

1.6.4 Habeas corpus em punições disciplinares militares


Trata-se um ponto bastante polêmico no âmbito do Direito Militar.
O habeas corpus foi a primeira garantia de direitos fundamentais que se tem notícia, tendo sido
concedida pelo rei inglês ''João Sem Terra", na Magna Carta, em 1215, e formalizada, posteriormente,
pelo Habeas Corpus Act, em 1679.
O artigo 5º, LXVIII da Constituição diz que: “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém
sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder”.
Logo, qualquer cidadão que sofrer ou se sentir de alguma forma ameaçado de ter cerceado o gozo
de sua liberdade de locomoção poderá impetrar um habeas corpus. Trata-se de um remédio constitucional
ao cerceamento da liberdade de ir e vir.
Entretanto, a própria Constituição traz algumas exceções a esta liberdade. Uma delas é a
impossibilidade da utilização do habeas corpus em punições disciplinares militares (artigo 142, §2º da
Constituição). Já podemos visualizar aqui a utilização dos princípios basilares da hierarquia e disciplina
nas atividades militares. Esta exceção contempla justamente isso.

104
Entretanto, pelo entendimento atual da doutrina e jurisprudência majoritária, caberá habeas
corpus quando o ato disciplinar impuser, em desconformidade com lei ou com regulamento, prisão ou
detenção ao militar. Segundo Távora e Alencar (2011):

Se a sanção importa em prisão disciplinar contra militar, ainda que se cuide de uma das
modalidades de exclusão da esfera do habeas corpus, deve ser ele admitido em situações
excepcionais, tais como nos casos de incompetência da autoridade, falta de previsão legal para a
punição, inobservância das formalidades legais ou excesso de prazo de duração da medida
restritiva da liberdade.

Nessa linha: "A legalidade da imposição de punição constritiva da liberdade, em procedimento


administrativo castrense, pode ser discutida por meio de habeas corpus. Precedentes" (RHC 88.543, Rel.
Min. Ricardo Lewandowski, j. 03.04.2007, DJ de 27.04.2007).
Na verdade, conforme a jurisprudência do STF, existe a possibilidade de impetração de habeas
corpus para a análise, pelo Judiciário, apenas dos pressupostos de legalidade do ato administrativo de
punição: hierarquia, poder disciplinar, ato ligado à função e pena suscetível de ser aplicada
disciplinarmente. Entretanto, estão excluídas as questões relativas ao mérito da respectiva sanção
administrativa.

1.6.5 Serviço Militar Obrigatório


A prestação do serviço militar é
obrigatória, ficando as mulheres e os eclesiásticos
isentos de tal compulsoriedade em tempos de paz,
sujeitando-se, porém, a outros encargos que a lei
lhes atribuir.
O brasileiro que não se apresentar para a seleção na data prevista para a fixação do contingente de
sua classe ou que, tendo-o feito, ausentar-se sem a ter completado, será considerado refratário (artigo 24
da Lei nº 4.375/64). Já o convocado selecionado e designado para incorporação, ou matrícula, que não se
apresentar à Organização Militar que lhe for designada dentro do prazo marcado, ou que, tendo-o feito,
ausentar-se antes do ato oficial de incorporação ou matrícula, será declarado insubmisso (artigo 25 da Lei
nº 4.375/64).
Apesar de obrigatória, alegando-se imperativo de consciência, decorrente de crença religiosa,
convicção filosófica ou política (direito de escusa de consciência), às Forças Armadas competirá, na
forma da lei, atribuir serviço alternativo em tempo de paz (artigo 5º, VIII, c/c o artigo 143, §§ 1º e 2º).
De acordo com o artigo 3º, §2º da Lei nº 8.239/91, entende-se por Serviço Militar Alternativo o
exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, em
substituição às atividades de caráter essencialmente militar. Por sua vez, o artigo 3º, §3º da mesma Lei
fixa que o Serviço Alternativo será prestado em organizações militares da ativa e em órgãos de formação
de reservas das Forças Armadas ou em órgãos subordinados aos Ministérios Civis, mediante convênios

105
entre estes e os Ministérios Militares, desde que haja interesse recíproco e, também, sejam atendidas as
aptidões do convocado. Ao final do período de atividade previsto será conferido Certificado de
Prestação Alternativa ao Serviço Militar Obrigatório, com os mesmos efeitos jurídicos do Certificado
de Reservista (artigo 4º da Lei nº 8.239/91).
Havendo recusa da prestação alternativa nos termos da Lei nº 8.239/91, ter-se-á por sanção a
declaração da perda dos direitos políticos (artigo 15, IV, da Constituição).

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já aprendeu
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A punição disciplinar militar imposta sem que haja previsão legal é passível de impugnação via
habeas corpus.

2) ( ) A Constituição garantiu aos militares o direito de sindicalizar-se, entretanto não podem participar
de reuniões fora do serviço portando armas.

3) ( ) A competência das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem é meramente subsidiária,
uma vez que essas atribuições são ordinariamente desempenhadas pelas forças da segurança pública.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Sobre as Forças Armadas, é correto afirmar:

(A) caberá habeas corpus em relação a quaisquer punições disciplinares militares.

(B) ao militar é proibida a greve e permitida a sindicalização.

(C) é vedado ao militar, ativo ou inativo, a filiação a partidos políticos.

(D) as mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo de paz sujeitos,
porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.

(E) O brasileiro que não se apresentar para a seleção na data prevista para a fixação do contingente de sua
classe ou que, tendo-o feito, ausentar-se sem a ter completado, será considerado insubmisso.

106
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 D

RECADO FINAL:
Na aula de hoje estudamos algumas peculiaridades inerentes às Forças Armadas e como que ela
está regulada na Constituição. Citamos algumas regras gerais aplicáveis às Forças Armadas,
conceituamos os princípios basilares básicos das Forças Armadas: Hierarquia e Disciplina; descrever as
Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e como ela está regulada em nosso ordenamento
jurídico, explicar a polêmica existente acerca da possibilidade ou não de impetração de habeas corpus em
punições disciplinares militares e finalizamos falando sobre o Serviço Militar Obrigatório.
Assim, encerramos esta Unidade de Ensino. Apesar da vasta matéria e do pouco tempo que temos
para passá-la, esperamos que vocês tenham gostado e aproveitado para conhecer um pouquinho mais
sobre o nosso Direito Constitucional, com certeza, o ramo do Direito mais importante nos dias de hoje.
Na próxima aula, já iniciaremos uma nova Unidade de Ensino, Direito Penal Militar e Direito
Processual Penal Militar, áreas que normalmente os alunos gostam bastante de estudar e que sempre
geram muitos questionamentos.
Dito isto...
Até a próxima aula!

107
REFERÊNCIAS:

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal: Centro Gráfico, 1988.

________. Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964. Lei do Serviço Militar. Brasília, DF.

________. Lei nº 8.239, de 4 de outubro de 1991. Dispõe sobre a prestação de Serviço Alternativo ao
Serviço Militar Obrigatório. Brasília, DF.

________. Lei Complementar nº 97, de 9 de junho de 1999. Dispõe sobre as normas gerais para a
organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas. Brasília, DF.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra:


Almedina, DL 2003, 2003.

CINTRA, AC de A.; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do
processo. Malheiros editores, 2005.

DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 3ª ed. ver. atual. e
ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado/Pedro Lenza.–19. ed. Rev. atual e ampl. São
Paulo: Saraiva, 2015.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. 14. ed.; São
Paulo: Método, 2015.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

TAVORA, Nestor e ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 5ª ed. Jus
Podivm, 2011.

108
TEMA: DIREITO
2.0 DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR
2.1 CONCEITO DE CRIME
2.1.1 Fato Típico.
2.1.1.1 Conduta.
2.1.1.2 Resultado.
2.1.1.3 Nexo de causalidade.
2.1.1.4 Tipicidade.
2.1.2 Ilicitude.
2.1.2.1 Estado de Necessidade.
2.1.2.2 Legítima Defesa.
2.1.2.3 Estrito Cumprimento do Dever Legal.
2.1.2.4 Exercício Regular de Direito.
2.1.3 Culpabilidade.
2.1.3.1 Imputabilidade.
2.1.3.2 Potencial Conhecimento da Ilicitude.
2.1.3.3 Exigibilidade de Conduta Diversa.
2.2 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL MILITAR
2.2.1 Conceito.
2.2.2 Finalidade.
2.2.3 Princípios.
2.2.4 Aplicação.
2.3 POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR
2.3.1 Conceito.
2.3.2 Atividades.
2.3.3 Núcleo de Polícia Judiciária Militar.
2.3.4 Atribuições do N-PJM.
2.3.4.1 Orientação Jurídica.
2.3.4.2 Investigação e Perícias.
2.3.4.3 Execução Penal.
2.3.5 Forma de Atuação do N-PJM.
2.3.6 Composição do N-PJM.
2.3.7 OM com Potencialidades para a realização de Perícias na MB.
2.4 INQUÉRITO POLICIAL MILITAR
2.4.1 Conceito.
2.4.2 Competência da Autoridade Nomeante.
2.4.3 Atribuições do Encarregado.

109
2.4.4 Atribuições do Escrivão.
2.4.5 Oitiva.
2.4.5.1 Confissão.
2.4.5.2 Acareação.
2.4.6 Exames Periciais.
2.4.7 Reconhecimento de Pessoas e Objetos.
2.4.8 Crime Militar.
2.4.8.1 Crime Propriamente Militar.
2.4.8.2 Crime Impropriamente Militar.
2.4.9 Providência Preliminar da Detenção de Indiciado.
2.4.10 Buscas Domiciliares.
2.4.11 Apreensão e Restituição dos Bens.
2.4.12 Violação de Sigilo.
2.4.13 Relatório.
2.4.14 Solução.
2.4.15 Prazos para Conclusão e Prorrogação.
2.4.16 Remessa de IPM.
2.5 ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA MILITAR DA UNIÃO
2.5.1 Introdução.
2.5.2 Superior Tribunal Militar (STM).
2.5.3 Circunscrições Judiciárias Militares.
2.5.4 Conselhos de Justiça Militar.

110
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Iniciamos agora a disciplina Direito Penal Militar e Direito Processual Penal Militar. Falaremos de
diversos assuntos interessantes e que afetam o nosso dia a dia na caserna, tais como: o conceito de crime;
o Código de Processo Penal Militar (CPPM), o funcionamento da Polícia Judiciária Militar (PJM), além
de uma visão geral do Inquérito Policial Militar (IPM) e da Organização Judiciária Militar da União.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar crime;
- Conceituar fato típico do crime; e
- Descrever a conduta criminosa.

INTRODUÇÃO:
Antes de entrarmos efetivamente no estudo do Direito Penal Militar e no Direito Processual Penal
Militar, nós temos que entender o que é o crime. O que isso quer dizer? Como esse fenômeno afeta o
nosso cotidiano? Todos os dias diversos veículos de comunicação nos trazem notícias de práticas de
crime. Uma verdade que temos que encarar é que não há sociedade sem crime. O crime é uma ação
humana. Está ligado à conduta humana, e, portanto, faz parte da própria sociedade.
De uma forma geral, o crime é um desrespeito à alguma regra social, é uma violação a uma norma
eminentemente jurídica, é um desvio de comportamento. Em que pesem as vastas possibilidades de
definições de crime, aqui para nós, será trabalhado o conceito jurídico de crime. Vamos ver!?

2.0 DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR


De um modo geral, a história do Direito Penal Militar e do Direito Processual Penal Militar não
difere muito, em sua origem, do Direito Penal Comum e do Direito Processual Penal Comum,
respectivamente.
Nas palavras de Neves e Streinfinger (2012):

Ainda que não se possa definir com exatidão o momento em que surgiu um Direito voltado à
atividade bélica, pode-se, em linhas gerais, afirmar ter sido em tempos remotos, acompanhando o
aparecimento dos primeiros exércitos. A estes se segue a criação de um órgão julgador
especializado na apreciação dos crimes praticados em tempo de guerra, no sítio das operações
bélicas.

Então, percebemos que, na verdade, a origem da Justiça Militar e todo o arcabouço referente a este
ramo do Direito surge em decorrência da criação de Exércitos regularmente constituídos para a defesa e
expansão de território.

111
Além disso, pelas peculiaridades da área militar, em que pesem as influências do Direito Penal
Comum e do Direito Processual Penal Militar Comum, o Direito Penal Militar e o Direito Processual
Penal Militar desenvolvem-se conjuntamente, ganhando maior notabilidade com o começo da atividade
beligerantes, por conseguinte, exigindo a apreciação dos fatos criminosos por uma ótica diferente,
resultando na origem da Justiça Militar.
Passemos agora então ao conceito de crime.

2.1 CONCEITO DE CRIME


Nós vamos estudar o crime praticado. Nós vamos analisar a conduta praticada pelo agente. Se nós
formos definir crime, nós podemos ter uma série de definições, todas obviamente ligadas à ciência que
está estudando esse fenômeno. Não há sociedade sem crime. O crime é uma ação humana e está ligada à
conduta humana, e, portanto, ele faz parte da própria sociedade. Não há um Estado que não tenha uma
legislação repressiva ao crime.
Podemos dizer que crime é uma violação a uma regra social, sendo o desvio de um
comportamento esperado. Para a psicologia, o crime terá uma definição, porque o exame que esta
ciência fará de um criminoso será uma análise que levará em conta seu comportamento psíquico. Da
sociologia, da antropologia, o conceito vai ser outro, porque o objeto de análise do crime para essas duas
ciências levará em conta os parâmetros sociais, antropológicos e isso vai ser a forma como essas ciências
vão se ocupar do crime. Para nós, a definição será outra. Para nós, por exemplo, o menor não comete
crime. Mas como se eu o vi atirando e matando? É verdade, ele cometeu um crime, mas sob o prisma
sociológico, sob o prisma antropológico; o crime vai permitir esse tipo de análise, porque o crime é por
excelência uma ação humana. O estudo do Direito Penal é muito interessante porque ele estuda o ser
humano na sua essência. Um estudo mais simples de psicologia já demonstra que na realidade o que
fazemos desde criança é conter pulsões, porque o crime é inato à condição humana.
E o que nos interessa aqui? Por que nós vamos estudar o crime, aquela ação de alguém que ofende
um bem jurídico? Porque nós estamos em busca da aplicação da pena. À prática do crime corresponderá a
uma pena. Se vamos aplicar uma pena, que vai ser a resposta penal à prática do crime, nós vamos ter que
analisar essa conduta. O sujeito atirou e matou. Para que ele cometa o crime e seja, portanto, passível de
pena, teremos que analisar esta conduta sob alguns aspectos. O primeiro deles eu vou ter que analisar o
fato em si, porque o crime é um fato, um fato jurídico. Por que é um fato? Qualquer acontecimento é um
fato. E esse é um fato jurídico, porque ele tem repercussão no mundo jurídico. Logo, faremos uma análise
completa do fato como um todo. Faremos o que um médico faz quando vamos a um consultório. Ele
começa a analisar. A cada pergunta que ele nos faz, ele vai diminuindo as possibilidades de patologias até
que ele chega a uma possibilidade de testar uma doença e vai prescrever um medicamento que é comum
para aquela doença. É mais ou menos isso que faremos quando estivermos estudando uma ação sob o
prisma do Direito Penal.

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Juridicamente, é possível se apontar variadas definições de crime. Vejamos o que diz a Lei de
Introdução ao Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei 3.914/41) em seu artigo 1º:

“Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de


detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de
multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de
prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.”

Como pode se perceber a nossa definição legal de crime não é muito esclarecedora. Então, coube à
doutrina se preocupar em definir o conceito de crime. Trabalharemos aqui com o conceito analítico de
crime, que pode ser mais facilmente visualizado pela equação abaixo:

Crime = Fato Típico + Ilícito + Culpável

Então, o crime para nós será um fato típico, ilícito e culpável. Destarte, para considerarmos um
fenômeno como crime, ele obrigatoriamente deverá se enquadrar nos três itens acima. Ele terá que ser
simultaneamente um fato típico, ilícito, e culpável. Ao longo deste primeiro tópico abordaremos de modo
bastante tranquilo sobre todos estes aspectos.

2.1.1 Fato Típico


Antes de mais nada, para se falar em fato típico, há que ter uma conduta e essa conduta tem que
produzir um resultado. Para haver crime, a lei exige que haja um dano efetivo ou pelo menos uma
possibilidade real de dano a algum bem tutelado. Além disso, eu preciso ter um nexo de causalidade entre
a conduta e o resultado, a ação X foi a causadora do resultado Y. Se a ação X não foi a causadora do

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resultado Y, eu não tenho o nexo causal entre ação e resultado. Então, essa ligação entre conduta e
resultado, nós vamos chamar de nexo de causalidade.
Por fim, há ainda a tipicidade, que vai impor que para o fato ser considerado típico, ele deverá
cumprir com todos os requisitos previstos no tipo penal.
Ficou confuso?
Calma!
Nos próximos parágrafos vamos clarear ponto a ponto estes elementos: conduta, resultado, nexo
de causalidade e tipicidade.

2.1.1.1 Conduta
Vamos começar estudando a conduta, que é o primeiro elemento do fato típico. Aliás, é o
elemento fundamental da teoria do crime. Mas antes de entrar na análise da conduta, eu vou dizer a vocês
que essa conduta pode ser por ação (conduta comissiva) ou por omissão (conduta omissiva).
Normalmente, falaremos em crime por ação, que é o comportamento humano voluntário
finalisticamente dirigido a um fim. Uma ação que viola alguma regra penal. Mas, seria possível eu
cometer um crime fazendo absolutamente nada? Se eu estou parado, nada fiz, como eu vou responder por
um crime?
Vejamos:
Ex.: imagine que você foi à Praia de
Ipanema na Licença de Pagamento. Em
uma bela sexta-feira de março com aquele
típico calor escaldante do verão da Cidade
Maravilhosa. E ao entrar na água, você se
depara com uma criança que está se
afogando bem na sua frente. E o que você
faz? Absolutamente nada! Você
simplesmente cruza os braços. Mas, onde
está o seu dever de solidariedade? Vamos
ler o que diz o artigo 135 do Código Penal:

Omissão de socorro
Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança
abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente
perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de
natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

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Podemos até dizer: “eu não fiz nada, eu simplesmente cruzei os braços, não me mexi, como vou
responder pelo crime? O problema é que este crime se dará exatamente por omissão. O que o legislador
quer neste caso é que eu aja. A conduta criminosa vai ser praticada quando eu me omito.
Obviamente se trata de um exemplo bastante simplificado. Em um caso real, teríamos que analisar
diversas outras nuances. Mas a ideia aqui é só mostrar que o legislador vai estabelecer alguns tipos penais
em que vai exigir de nós um agir. Quando eu cruzo os braços, eu cometo o crime exatamente porque
cruzei, quando ele queria que eu me movimentasse. Atente que o tipo penal menciona "sem risco
pessoal". O legislador não quer que eu me movimente em direção à morte, ele quer que eu não me omita.
Se você não sabe nadar, não há como você salvar a criança. Porém, você pode buscar ajuda, pode
procurar alguém que saiba nadar para salvá-la.
Falamos aqui no dever de solidariedade. O que se pune aqui é a falta de solidariedade. Então ele
destaca pessoas que possuam alguma fragilidade social, como o idoso, o desamparado, o inválido, a
criança abandonada, essas pessoas que serão mais vulneráveis à defesa pessoal e quer que a sociedade,
por solidariedade, prestem auxílio a elas. Se não pudermos fazê-lo, que ao menos comuniquemos à
alguma autoridade competente para que o faça. O que eu tenho aqui? Um tipo de crime omissivo. Assim,
a conduta criminosa pode ser uma ação (conduta comissiva) ou uma omissão (conduta omissiva).

Ação (conduta comissiva)


Conduta
Omissão (conduta omissiva)

Notemos que ambas violam os preceitos legais de modos distintos. No crime comissivo, há a
violação de uma proibição, enquanto no omissivo, há o descumprimento de uma ordem legal de agir.
Então, já falamos que a conduta criminosa pode ser comissiva ou omissiva. Porém, esta conduta
criminosa também pode ser dolosa ou culposa. E o dolo se constitui como o elemento subjetivo da
conduta.
O agente quando ele pratica um crime, na verdade, ele dirige a sua conduta, a sua energia a um
resultado, ou seja, é uma energia canalizada para uma finalidade específica. Portanto, ela está dirigida
finalisticamente ao resultado. O dolo é natural. O dolo é um querer. Eu quero fazer algo, eu vou lá e faço.
O dolo em si não é algo normativo, tampouco é uma criação do Direito. Por exemplo, estou com sede.
Vou à geladeira, pego uma garrafa, encho um copo de água e bebo. Eu dirigi finalisticamente a minha
ação, a fim de beber aquela água e saciar a minha sede. Portanto, eu tive dolo ao tomar aquele copo de
água.
Entretanto, a ideia de dolo é muito importante ao Direito. Em diversos momentos o Direito terá
que se utilizar desta noção para solucionar variados casos e isso não apenas no Direto Penal, mas em
diversos ramos do Direito. O agente quando dirige intencionalmente sua conduta em direção a um

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resultado, isso me basta. Se ele tem a consciência de que aquilo é ilícito ou não, não vai fazer diferença
nenhuma para que o dolo seja caracterizado.
E no Direito Penal, o preceito é que os crimes sejam cometidos de forma dolosa. A regra é que os
crimes tenham como elemento subjetivo o dolo. Claro que nem sempre será assim. Toda boa regra tem a
sua exceção, principalmente quando estamos falando de Direito. Excepcionalmente, teremos o
cometimento de crimes na modalidade culposa. Porém, a exceção tem que estar expressa, isto é, sempre
que o crime admitir a modalidade culposa, o legislador vai ter que dizer expressamente que o crime
admite a modalidade culposa.

Exs.: homicídio culposo (artigo 121, §3º do Código Penal; lesão corporal culposa (artigo 129, §6º do
Código Penal); incêndio culposo (artigo 250, §2º do Código Penal).

O Legislador ainda vai diferenciar dois tipos de dolo. Tanto o artigo 18, I do Código Penal, como
o artigo 33, I do Código Penal Militar dirão a mesma coisa: “Diz-se o crime: doloso, quando o agente quis o
resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”.
Assim, teremos o dolo direto quando o agente quis o resultado e o dolo eventual quando o agente assume
o risco de produzir aquele resultado. Neste, embora o sujeito não queira diretamente o resultado, ele assume o
risco de produzi-lo.. É o tradicional “caguei”. Ele se coloca em uma posição que o resultado pode
acontecer. Um exemplo interessante que temos disso são os “pegas” ou "rachas" (forma de corrida
clandestina praticado em áreas urbanas, rurais ou rodovias com automóveis e/ou motocicletas).
Antigamente se entendia que uma morte ou uma lesão corporal ocorrida em decorrência de um acidente
em uma corrida deste tipo ensejaria o referido crime na modalidade culposa. Hoje, o entendimento sobre
estas corridas já mudou e a jurisprudência majoritária considera como sendo dolo eventual, pois ao pegar
o seu veículo automotor e imprimir uma velocidade excessiva principalmente em trechos urbanos
automaticamente você estaria assumindo o risco de causar um acidente e consequentemente uma lesão
corporal ou até mesmo a morte de terceiros.
Agora que já falamos sobre o dolo, vamos nos debruçar sobre a culpa, nosso último assunto da
aula de hoje.
A culpa trabalha com a inobservância de regras de cuidado. O sujeito vai responder pelo crime
culposamente porque ele não observou alguma regra de cuidado exigida pela sociedade. Na realidade, no
crime culposo o agente dirige finalisticamente a conduta em direção a um resultado lícito e por conta da
inobservância de uma regra de cuidado, ele vai acabar entrando na ilicitude. Não existe a intenção de se
cometer qualquer ilícito, mas ao não se ter o devido cuidado, o agente acaba incorrendo em alguma
prática criminosa.
Normalmente, ninguém sai de casa pela manhã e pensa “hoje eu vou atropelar e vou matar a
primeira pessoa que aparecer na minha frente”, mas ele está arriscado a voltar para casa com o infortúnio
de ter, por um descuido, um homicídio culposo ou uma lesão culposa. Ninguém está livre disso. A culpa é
algo bastante comum em acidentes de trânsito, que geram normalmente lesões corporais culposas ou

116
homicídios culposos, porque no fundo são
inobservâncias de regras de cuidado,
provavelmente o motorista não queria sofrer
um acidente e lesionar um terceiro, mas ele
estava dirigindo com o pneu "careca" e ao
tentar frear em um cruzamento, o carro
simplesmente não parou a tempo,
ocasionando um acidente e consequentemente
lesionando ou matando um terceiro.
Logo, é a inobservância de uma regra de cuidado que vai levar à prática do crime culposo.
Então, teremos que ter uma conduta. Além disso, o resultado não pode ser previsível. A doutrina
trabalhará com este conceito de previsibilidade objetiva. E o que é isso?
Previsibilidade objetiva significa simplesmente que um cidadão prudente, no meu lugar, ele
poderia evitar esse resultado. Assim, o que eu vou fazer para saber se o crime é culposo ou não, eu vou
botar um cidadão médio, uma pessoa prudente no lugar do agente. Se este indivíduo prudente agir
exatamente como o agente agiu, eu não tenho crime culposo, não há culpa. Eu não tenho inobservância de
regra de cuidado. Vamos exemplificar:

Ex.: Um motorista dirigindo na Avenida Brasil (Rio de Janeiro) com a velocidade autorizada, normal, e
um sujeito se joga de uma passarela, bate no carro e morre. Acredito que com qualquer pessoa que tivesse
ao volante daquele automóvel isso teria acontecido. Então, eu vou colocar o motorista médio no lugar
dele. Talvez, alguém com reflexos superaguçados pudesse desviar, mas não é isso que o legislador pede.
Ele pede um cidadão comum. Seria possível desviar de alguém caindo em cima do seu veículo em plena
Avenida Brasil? Não é previsível o fato de pessoas voarem em cima dos carros na Avenida Brasil. Neste
caso, não haveria a lesão corporal culposa ou o homicídio culposo.

O Código Penal em seu artigo 18, II traz três modalidades de crimes culposos: por imprudência,
negligência e imperícia.

- Imprudência: é um "fazer". O sujeito faz, ele não observa a regra de cuidado, agindo, fazendo algo. Eu
estou dirigindo um automóvel na Avenida Presidente Vargas (Rio de Janeiro), o semáforo ficou amarelo e
eu acelero, provocando uma colisão. Eu fui imprudente. Eu não observei uma regra de cuidado. Eu não
queria provocar o acidente, eu não assumi o risco, mas inobservei uma regra de cuidado. A luz amarela no
semáforo significa "atenção" e não o comumente conhecido "acelera que ainda dá".

- Negligência: é um “não fazer”. Eu sou um policial e tenho o costume de andar armado. A prudência me
recomenda que, ao chegar em casa, eu deva colocar munição de um lado e arma de outro, se possível
trancadas em um cofre ou outro compartimento seguro, especialmente se eu tenho crianças em casa. E aí

117
eu vou negligentemente, deixando de ter o cuidado devido, e largo a minha arma municiada em cima da
mesa, a criança curiosa pega a arma e causa um acidente. Eu deixei de fazer, eu me omiti na cautela, no
meu dever de cuidado que eu tinha que ter.

- Imperícia: é a falta de aptidão técnica. Ela é voltada sempre para os profissionais. Aquele profissional
sem uma determinada aptidão técnica. Um médico sem aptidão técnica para um determinado
procedimento cirúrgico e cause uma lesão, um dano no paciente. Ele é imperito. Não confundir a
imperícia com a inobservância de norma técnica. Nesta, eu conheço a técnica, mas eu não a utilizo. Na
imperícia, eu sou profissional, mas não tenho a habilitação que eu deveria ter para aquela função que
estou exercendo.

Obs.: Imprudência, negligência e imperícia não se excluem. Um indivíduo pode agir com imperícia e
imprudência ou negligência ao mesmo tempo. Não há problema. Estas são apenas formas que o legislador
estabeleceu de inobservância de regras de cuidado. Porque isso é crime culposo. Ou seja, diz-se o crime
culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia, ou seja,
quando o agente inobserva alguma regra de cuidado. Só que ele resolveu dar estas três formas:
imprudência ao fazer, quando deveria se omitir, negligência por não fazer, por se omitir, quando deveria
fazer e a imperícia do profissional.

Lembrando que os crimes culposos têm que estar previstos em lei. O crime só será culposo se a
norma o previr como culposo. Se não, ainda que o sujeito inobserve a regra de cuidado, ele não
responderá criminalmente na modalidade culposa.
Por fim, imprudência, negligência e imperícia são modalidades do que chamamos de culpa
inconsciente. Bem, mas espera aí... Se temos uma culpa inconsciente é porque...
Exatamente!
A doutrina também reconhece a culpa inconsciente. E como é isso?
A culpa consciente ocorre quando o agente, embora prevendo o resultado, acredita sinceramente
na sua não ocorrência, dando continuidade à sua conduta. Ele se acha tão bom, mas tão bom, que ele
simplesmente não crê que seja possível algo dar errado. Vamos exemplificar com a situação do "racha"
ou "pega":

Ex.: Imagine que os motoristas estão lá nas duas filas A e B alguém fala para um dos motoristas: “você
vai matar alguém saindo aqui em alta velocidade”. “Caguei se matar”, ele responde. É um caso de dolo
eventual. Agora a pessoa diz: “você vai matar alguém saindo aqui em alta velocidade”. “Não vou, eu sou
o cara, eu acredito sinceramente na minha perícia, não existe a mínima possibilidade de eu acertar
alguém, eu faço isso aqui há muito tempo, sou piloto de fuga!”, ele responde. Neste caso, ele não estaria
assumindo o risco. Ele não quer o resultado, mas acaba acertando alguém. Ele acreditava sinceramente na
inocorrência do resultado. Eu tenho aqui uma hipótese de culpa consciente.

118
Vejamos que é uma linha bem tênue que separa a culpa consciente do dolo eventual. E qual a
diferença entre elas? Vejamos o que nos diz Bitencourt (2012):

Os limites fronteiriços entre dolo eventual e culpa consciente constituem um dos problemas mais
tormentosos da Teoria do Delito. Há entre ambos um traço comum: a previsão do resultado
proibido. Mas, enquanto no dolo eventual o agente anui ao advento desse resultado, assumindo o
risco de produzi-lo, em vez de renunciar à ação, na culpa consciente, ao contrário, repele a
hipótese de superveniência do resultado, e, na esperança convicta de que este não ocorrerá, avalia
mal e age.

Na culpa consciente, o sujeito acredita sinceramente que ele tem a perícia para fazer algo, mas
acaba causando o resultado, enquanto no dolo eventual o agente assume uma postura de indiferença à
produção ou não do resultado, é o tradicional "caguei".
Como já dissemos, antigamente acidentes decorrentes desses “pegas” ou "rachas" resultavam em
homicídios ou lesões corporais culposas. Atualmente, a jurisprudência vem tratando isso como dolo
eventual, ela está esvaziando a tal da culpa consciente neste caso. Veja que em um caso concreto é muito
difícil avaliar se o agente agiu com dolo eventual ou culpa consciente.

119
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já aprendeu
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) As três modalidades de crimes culposos previstos no Código Penal são: imprudência, negligência e
imperícia.

2) ( ) Ocorre o dolo direto quando o agente quer o resultado e o dolo eventual quando apesar de não
querer, ele assume o risco de produzi-lo.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) São elementos do fato típico, EXCETO:

(A) conduta.

(B) resultado.

(C) tipicidade.

(D) nexo causal.

(E) ilicitude.

4) A culpa consciente ocorre quando o agente:

(A) mesmo sem previsão do resultado que é previsível, avança na ação.

(B) quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

(C) prevê o resultado, mas espera, sinceramente, que possa evitá-lo, pelo emprego de suas habilidades.

(D) não quer o resultado, mas assume o risco de produzi-lo.

(E) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado.

120
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 E
4 C

RECADO FINAL:
Na aula de hoje começamos os nossos estudos acerca do conceito de crime. Com certeza uma aula
bastante densa, mas sobre uma matéria muito interessante.
Aprendemos sobre a conduta do agente, que é apenas o primeiro elemento do fato típico.
Antes de passar à próxima aula, sugiro dar uma relida nos pontos que por ventura tenham ficado
obscuros, pois na próxima aula continuaremos a falar sobre o conceito do crime, abordando os demais
elementos do fato típico: resultado, nexo causal e tipicidade.
Nesta primeira aula, trouxemos alguns conceitos iniciais de crime, mas que serão de suma
importância para a boa evolução da nossa disciplina.
Dito isto...
Até a próxima aula!

121
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula iniciamos o estudo do Direito Penal Militar e Direito Processual Penal Militar.
Demos início falando acerca do conceito de crime, mais precisamente sobre o fato típico. Já vimos como
se porta a conduta do agente. Nesta aula concluiremos este estudo abordando os demais pontos do fato
típico: resultado; nexo de causalidade; e tipicidade. Partiu!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar crime material;
- Conceituar crime formal;
- Conceituar crime de mera conduta;
- Descrever nexo de causalidade; e
- Descrever tipicidade.

INTRODUÇÃO:
Já falamos bastante sobre a conduta do agente. Mas, toda conduta é criminosa? Essa é fácil, hein.
Mas, quais os demais elementos que precisaremos para enquadrar uma conduta como um fato típico?
Como faremos a ligação entre a conduta e o resultado?
Nesta aula, trataremos destes e de outros assuntos que cercam o mundo do crime...

2.1 CONCEITO DE CRIME


2.1.1.2 Resultado
O resultado, como regra, é a modificação do mundo exterior causado por uma ação. Então, o
sujeito age e altera de alguma forma esse mundo exterior. Eu tenho uma vida, o sujeito atira e põe fim a
essa vida. O sujeito tem o seu patrimônio e vem o furtador e subtrai o bem que lhe pertence. Então, com
sua ação ele provoca um resultado que é a modificação do mundo exterior. Quando falamos que o
resultado é uma modificação do mundo exterior, estamos dando um conceito de resultado, que é o
conceito naturalístico.
Entretanto, diferentemente do que falamos na aula anterior sobre o dolo, aqui o resultado pode ser
também normativo, que é o resultado cujo conceito não advém dessa
modificação visível, mas é um conceito legal, ele resulta da violação de um
bem protegido por lei. Então, eu vou dizer que ocorreu o resultado quando a
norma estabelecer o bem jurídico protegido e este for violado. Como
exemplo, podemos citar o crime de violação de domicílio. Por que alguém
invade a casa de outrem? Se você for analisar o resultado naturalístico,
possivelmente é algo que está além do próprio ingresso desautorizado. Mas

122
para a lei, basta o mero ingresso. No momento em que o sujeito ingressa na sua casa sem a sua
autorização, o resultado já está consumado. Na verdade, o agente queria muito mais do que isso, ele
entrou porque queria perturbar, roubar, ou praticar outro crime mais grave, mas a lei se satisfaz com o
mero ingresso no domicílio. Então, eu tenho aí o resultado normativo. O resultado vai existir no momento
em que o bem jurídico é violado, independentemente se o agente entrou sem permissão, não fez
absolutamente nada e foi embora, mesmo assim resta consumado o crime de violação de domicílio.
Assim, em relação ao resultado podemos classificar o crime em 3 tipos: crime material; crime
formal e crime de mera conduta.

- Crime material: é aquele em que o legislador descreve um resultado (o resultado é normativo) e o crime
só se consuma quando o resultado naturalístico efetivamente ocorre. Veja que há uma coincidência dos
dois resultados (naturalístico e normativo).

Ex.: homicídio simples. O artigo 121 do


Código Penal (CP) e o artigo 205 do
Código Penal Militar (CPM) trazem o
crime de homicídio simples: "Matar
alguém", com pena de reclusão de 6 a 20
anos. Este crime só se consuma com o fim
da vida. Eu tenho um resultado normativo,
o crime somente se consuma quando a
vítima efetivamente morre, que é
exatamente o mesmo resultado naturalístico. Logo, temos a coincidência de ambos os resultados,
naturalístico e normativo. Boa parte dos crimes são materiais.

- Crime formal: o resultado naturalístico não necessariamente coincide com o da definição que o
legislador deu. Não é só a modificação do mundo exterior, mas essa modificação do mundo exterior na
maneira descrita pelo legislador, ou seja, como está na lei.
Ex.: extorsão. O artigo 158 do
CP diz o seguinte: “Constranger
alguém, mediante violência ou
grave ameaça, e com o intuito de
obter para si ou para outrem
indevida vantagem econômica, a
fazer, tolerar que se faça ou
deixar fazer alguma coisa”. O
resultado que o extorsionário

123
quer é a vantagem econômica, é o dinheiro, mas se ele não conseguir o dinheiro ele ficará apenas na
tentativa. Mas, neste caso, o legislador pune o simples constrangimento, ainda que ele não tenha
alcançado seu objetivo, que era o dinheiro (se ele alcançar, teremos o exaurimento do crime, que ensejará
uma pena mais grave). O resultado naturalístico, a modificação no mundo exterior que ele queria era a
vantagem patrimonial. Porém, no momento em que ele constrangeu, o crime já está consumado. O
legislador descreve o resultado naturalístico, mas o crime se consuma com a simples descrição legal,
bastando apenas o resultado normativo. O agente constrange pela vantagem econômica. Ele não vai
constranger por nada. Ele constrange em busca de se apropriar do patrimônio alheio. Novamente, no
momento em que ele constrange com o intuito de obter vantagem econômica, ele já praticou o crime,
mesmo que não tenha recebido nada, uma vez que este crime é formal. O legislador até descreveu o
resultado naturalístico, que é a obtenção da vantagem econômica, mas o legislador se satisfez com o
simples constrangimento.

- Crimes de mera conduta: são aqueles em que o legislador descreve apenas a conduta; ele não descreve
o resultado. Eles se consumam com a simples realização de um comportamento, comissivo ou omissivo,
não importando as eventuais consequências.

Ex.: associação criminosa. O artigo 288 do CP traz que é


crime: "Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o
fim específico de cometer crimes". Vejam que está
descrita apenas a conduta. Se 3 ou mais pessoas se
associam para a prática de crime, pronto, este já está
caracterizado. Ah, mas eles nem começaram a praticar o
crime. Não importa. A lei já pune. O legislador manda
punir a mera conduta, independente do resultado que o sujeito queria.

Recapitulando, no crime material, o legislador descreve a conduta e o resultado, e o crime só se


consuma com a ocorrência do resultado. No crime formal, ele descreve a conduta e o resultado, mas o
crime se consuma não com aquele resultado descrito, mas se consuma antes. Já no crime de mera
conduta, ele só descreve a conduta.

2.1.1.3 Nexo de causalidade


O nexo causal é o liame, a ligação, o elo entre a ação e o resultado. Eu só posso imputar o
resultado a quem agiu em sua direção. Em outras palavras, eu só posso imputar o resultado a quem lhe
deu causa.

Ex.: A está no telhado de um prédio e B no telhado do prédio vizinho. Eles possuem um inimigo comum,
C. Quando C passa na rua, A e B atiram. A perícia não consegue detectar qual foi a arma, qual foi a
munição que causou a morte. Só poderemos imputar o resultado morte em quem deu causa. Relação de
124
causa e efeito. Neste caso simplesmente não sabemos quem matou C. O que faremos neste caso? Já que
eu não sei quem matou e não posso imputar a morte aos dois, ambos responderão por tentativa de
homicídio, caso contrário, um deles estaria sendo apenado em excesso. A solução dada pela lei é tentativa
de homicídio para os dois, mesmo havendo um cadáver. Mas por quê? Porque neste caso não
conseguimos estabelecer o nexo causal entre a ação e a morte. Mas, vejam que com a tentativa
conseguimos. Os dois quiseram a morte, mas um deles não alcançou por circunstâncias alheias à sua
vontade. Qual foi essa circunstância alheia à sua vontade? O outro conseguiu primeiro. Mas, quem
conseguiu primeiro? Não sei. Porque não conseguimos estabelecer uma relação de causalidade entre a
ação e o resultado consumado (morte). Entretanto, conseguimos demonstrar que ambos tentaram o
homicídio.

O artigo 13 do CP e o artigo 29 do CPM tratam do nexo causal da seguinte forma: "O resultado,
de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a
ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido".
O que é causa? Causa é aquela ação sem a qual o resultado não teria ocorrido. Então, no momento
em que eu tiro aquela ação e o resultado não acontece, significa que aquela causa foi eficiente, foi a causa
efetiva do resultado. O que eu faço? O agente atirou no sujeito. Aí fazemos o processo hipotético na nossa
mente: eu tiro o disparo e o homicídio não acontece. Então, no momento em que eu fiz esse processo
hipotético de eliminação, eu eliminei essa ação e o fato não ocorreu, significa dizer que essa ação é a
causa do resultado. Deste modo, vamos pegar todas as causas que antecedem ao resultado. Vamos separar
as relevantes e, posteriormente, vamos suprimindo uma a uma hipoteticamente na nossa mente. Por
exemplo, o sujeito, antes de atirar, fez uma refeição. Eu tiro a refeição. O resultado teria ocorrido? Sim,
teria. Logo, a refeição não é causa do resultado morte.
Qual é o problema deste conceito acima? É que ele pode nos levar ao infinito. Se começarmos a
pegar todas as causas precedentes, vamos chegar à fabricação da arma. Se não houvesse fabricado a arma,
o agente não teria atirado. No momento em que eu tiro a fabricação da arma, eu afasto a conduta, pelo
menos do modo como ela foi praticada. Se não tivessem forjado o aço, talvez não tivessem fabricado a
arma. E o que vamos fazer? Temos que fazer dois acréscimos: (1) vamos pensar no nexo causal associado
ao elemento subjetivo do tipo. Uma arma é fabricada para ter um efeito de letalidade, ainda que ela seja
usada defensivamente, mas o fabricante da arma não a fabricou para matar “José”. Ele nem o conhece.
Ele fabrica a arma para ser vendida para as forças de segurança, para ser utilizada como meio de defesa
ou como meio de ataque em situações especiais de conflitos internos e externos. No momento em que
João atira em José, só podemos pensar numa relação de causalidade associada à vontade de João. Pode ser
até que tenha sido culposo, mas este elemento subjetivo vai ser o freio para que eu não vá para o infinito.
Porque daqui a pouco vamos acabar imputando a conduta à mãe de João. Porque se a mãe não tivesse tido
esse João, José não teria morrido. Portanto, teremos que associar isso ao elemento subjetivo, sob pena de
eu ir ao infinito. (2) vamos dizer que se considera causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não
teria ocorrido, como ocorreu.
125
Vejam que estamos falando não apenas de ação, mas de omissão também. Qual a omissão capaz
de dar causa a um resultado em morte, por exemplo? A omissão é um não fazer. Do nada, nada surge.
Paramos tudo, não vai acontecer nada. Mas para resultar a morte, por exemplo, não é qualquer omissão.
Lembremos do exemplo da última aula em que uma criança se afogava na Praia de Ipanema. E ao ver a
criança se debatendo, o que você faz? Nada! Neste caso, o resultado morte para você não vai ter tanta
relevância. Você não irá responder pela morte em si, mas pela omissão de socorro (artigo 135 do CP).
Mas e se fosse a mãe? E o tutor, o curador, a babá, ou o cuidador? Estes sim, vão responder pelo resultado
morte. A lei vai atribuir maior relevância à omissão em alguns casos. São os casos de crimes omissivos
impróprios ou comissivos por omissão. Outro exemplo envolvendo mãe. Na verdade, ela quer a morte do
bebê e o que ela faz? Ela cruza os braços e não o amamenta. Ela vai responder porque quis o resultado
morte e alcançou esse resultado que é comissivo por excelência. Mas, como ela o faz? Não amamentando
o bebê. Vejamos o artigo 13, §2º do CP:

“Relevância da Omissão
§2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o
resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado”

O nexo causal na omissão é normativo, ou seja, advém da lei. Porque na realidade dos fatos, do
nada, nada surge. Acontece sim, se eu tiver o dever de evitar aquele resultado. E eu quero aquele
resultado e consigo pela omissão. Assim, a omissão é normativa, porque ela vem de um conceito legal. O
legislador considerou como relevantes as três hipóteses que ele enumerou como o dever de cuidado, por
causa da posição de garantidor da inocorrência do resultado. Apenas nestas hipóteses a omissão será
penalmente relevante para alcançar o resultado comissivo. Se eu me omiti num socorro e não estou nesta
posição de garantidor, eu vou responder apenas pela omissão de socorro. Agora, se eu era o salva vidas
daquela praia e ao ver uma criança se afogando, simplesmente cruzo os braços, aí a minha omissão passa
a ser penalmente relevante e eu vou responder pelo resultado morte e não apenas por omissão de socorro.

2.1.1.4 Tipicidade
O que é tipicidade?
Tipicidade é o conjunto de elementos descritivos contidos na norma penal incriminadora (aquela
que tem um comando e uma sanção).
Em cada norma penal incriminadora, nós temos um conjunto de elementos descritivos. Se a norma
tem vários elementos descritivos, o fato somente será típico se o agente preencher todos.
Quando dizemos que um fato é típico, queremos dizer que o agente, com a sua conduta, preencheu
todos esses elementos. Por exemplo, um sujeito pega um celular acreditando ser de propriedade de
outrem, porém, mais tarde percebe que era o seu, comprado recentemente. Não há a prática do crime de

126
furto, pois o furto só ocorre quando se subtrai coisa alheia móvel. Então, para se enquadrar como furto o
celular (a coisa) teria que ser alheia, mas, na verdade, já era propriedade dele mesmo. Há que se
preencher todos os elementos.
Então, quando um fato ocorrido se amolda perfeitamente a uma descrição prevista no tipo penal,
temos o que se chama de adequação típica, ou juízo positivo de tipicidade. Assim, a adequação do fato ao
tipo penal gera a tipicidade.
Na tipicidade, vamos encontrar:

- Elementos Subjetivos: dizem respeito à vontade qualificada do agente, ou seja, a finalidade. Por
excelência, é o dolo. Excepcionalmente, teremos também a culpa. Lembrando que o agente só responderá
por culpa se estiver expresso no tipo penal.

Ex.: No homicídio simples se fala apenas em matar alguém. Está ali o dolo, o legislador não precisa dizer
“matar alguém dolosamente”. Agora ao prever a modalidade culposa, esta possibilidade deve estar
expressa.

- Elementos Objetivos: são aqueles que se referem à própria materialidade do crime, ou seja, a forma de
execução, o tempo, o lugar.

Ex.: No furto qualificado a própria norma penal incriminadora vai descrever sobre forma, modo, meio de
execução, lugar do crime descrito na norma penal incriminadora, todos eles são elementos objetivos da
tipicidade. Vejamos o que diz o artigo 240, §4º ao §6º do CPM:

Furto qualificado
§ 4º Se o furto é praticado durante a noite:
Pena reclusão, de dois a oito anos.
§ 5º Se a coisa furtada pertence à Fazenda Nacional:
Pena - reclusão, de dois a seis anos.
§ 6º Se o furto é praticado:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprêgo de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas:
Pena - reclusão, de três a dez anos.

- Elementos Normativos: são aqueles que vão demandar um juízo de valor.

Ex.: injúria. O artigo 140 do CP e o artigo 216 do CPM trazem o crime de injúria: "Injuriar alguém,
ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro". Mas, o que vem a ser dignidade? E decoro? São elementos
normativos do tipo, porque vamos ter que emitir um juízo de valor sobre eles.

127
A norma penal incriminadora pode trazer os três diferentes elementos, como só pode trazer um ou
dois destes elementos. Comete o crime aquele que adéqua a sua conduta ao tipo penal. O sujeito vai
cometer o crime quando adequar tipicamente a sua conduta à norma.
O fato será atípico quando faltar um dos elementos descritos na norma penal incriminadora. No
exemplo do celular, o agente subtrai uma coisa própria. Faltou um elemento: coisa alheia. Logo, a sua
conduta é atípica. Ele não amoldou a sua conduta à norma. O tipo penal não se enquadra, não encaixa.
Não vai existir crime. A atipicidade vai implicar a inexistência do crime. Se eu não tenho o fato típico, eu
não tenho crime, por ser este um de seus elementos. Para que o fato seja típico, precisaremos ter
tipicidade.
Por fim, atualizando o nosso gráfico do crime, temos o seguinte:

Conduta

Resultado
Fato Típico
Nexo de Causalidade ou Nexo Causal
Crime Ilícito
Tipicidade
Culpável

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Novamente, façamos mais uma pequena pausa para avaliar o que você já aprendeu nesta aula.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Para haver fato típico é indispensável a existência de relação de causalidade entre a conduta e o
resultado.

2) ( ) O resultado, como regra, é a modificação do mundo exterior causado por uma ação.

3) ( ) Tipicidade é o conjunto de elementos descritivos contidos na norma penal incriminadora.

128
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) O Código Penal, ao tratar da relação de causalidade do crime, considera causa a

a) emoção ou a paixão.

b) delação.

c) ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

d) excludente de ilicitude.

e) descriminante putativa.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 C
4 C

RECADO FINAL:
Nesta aula concluímos o assunto fato típico. Mas, não acabou não. Aliás, longe disso. Esse foi
apenas o primeiro dos elementos da equação do crime.
Na próxima aula, veremos o segundo elemento: ilicitude; e estudaremos as quatro causas legais de
excludentes de ilicitude, assunto muito interessante de se estudar.
Novamente, faço a sugestão para reler estas duas primeiras aulas, pois estes assuntos são
cumulativos e estão intimamente interligados.
Não deixe a matéria acumular!
Dito isto...
Até a próxima aula!

129
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula concluímos o assunto fato típico. Nesta aula, estudaremos acerca da ilicitude do
deste fato. Na verdade, abordaremos as causas legais de excludentes de ilicitude. Assunto muito
interessante e que gera inúmeras discussões interessantes. Calma, calma... Devagar e sempre. Vamos que
vamos!!!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever Estado de Necessidade;
- Descrever Legítima Defesa;
- Descrever Estrito Cumprimento do Dever Legal; e
- Descrever Exercício Regular de Direito.

INTRODUÇÃO:
Já vimos o que é o fato típico para o Direito Penal.
Imagine agora que você está passeando tranquilamente por uma rua do seu bairro com a sua
família em um fim de semana e subitamente surge um indivíduo portando uma faca querendo subtrair seu
celular. Você percebe que há uma barra de ferro caída no chão, então rapidamente você consegue pegá-la
e desfere golpes na cabeça deste indivíduo, deixando-o desacordado. Este é um fato típico? Com certeza!
Quando eu ofendo a integridade corporal de alguém eu me enquadro na situação de lesão corporal. Neste
exemplo, temos tudo do fato típico: conduta, resultado, nexo causal e tipicidade. Agora vou fazer uma
outra pergunta. Apesar do fato ser típico, houve a prática de crime? Por que?
Exatamente isso que veremos nesta aula. Falaremos sobre as famosas excludentes legais de
ilicitude.

2.1 CONCEITO DE CRIME


2.1.2 Ilicitude
Até agora só estudamos o fato típico e a ilicitude será o nosso segundo elemento da equação do
crime. E qual a relação do fato típico com a ilicitude? O fato típico tem uma função indiciária da ilicitude.
Quando o sujeito pratica um fato típico, há uma “fumaça” de que ele também seja ilícito. Com o fato
típico, vê-se um indício de ilicitude. Por exemplo, quando um médico pega um bisturi e abre o peito de
um paciente, temos os 4 elementos do fato típico: conduta, resultado, nexo e tipicidade. Quer dizer que
todo cirurgião é criminoso? Aqui, existe um indício de ilicitude. Mas, o indício é uma mera "fumaça", é
uma possibilidade. Mais adiante voltaremos a este exemplo.
Quando o sujeito está respondendo a um Inquérito Policial Militar (IPM), ele é indiciado, porque
há uma grande possibilidade de ele vir a ser tornar réu. Mas, isso quer dizer que ele seja automaticamente

130
culpado. Não necessariamente. Ao longo do processo serão produzidas diversas provas, a fim de que ao
término se chegue à conclusão acerca de sua culpa. O fato típico indica uma possibilidade de ilicitude. Se
o fato é típico já há um bom indício de ilicitude. Eles estão ligados. Mas o fato pode não ser ilícito, ele
pode ceder a causas que excluem a ilicitude da conduta, as quais passamos a ver agora.

2.1.2.1 Estado de Necessidade


Muita gente confunde o Estado de Necessidade com a Legítima Defesa, outra excludente de
ilicitude. O Estado de Necessidade é para situações de perigo e não de agressão, como na Legítima
Defesa. Esta é humana, aquele pode ser representado por ataques de animais, forças da natureza,
acidentes, calamidades, catástrofes ambientais. Bitencourt (2012) diz que: "O estado de necessidade
caracteriza-se pela colisão de interesses juridicamente protegidos, devendo um deles ser sacrificado em
prol do interesse social".
Possui 5 requisitos cumulativos para ser caracterizada. Vejamos o que nos diz o artigo 24 do CP:
"Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não
provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir-se".
Exatamente deste texto que tiraremos os cinco requisitos do Estado de Necessidade.

- Perigo Atual: como já adiantamos acima, perigo pode ser representado por ataques de animais, forças da
natureza, acidentes, calamidades, catástrofes ambientais. Imagine que você esteja em um local costeiro. É
emitido um alerta de tsunami e você na praia do nada vê o mar recuar. Você avista um carro na rua e
percebe a aproximação do dono. Então, você vem correndo, joga o proprietário do veículo no chão,
subtrai o carro dele e foge da localidade. Então, se usando de violência, você subtraiu para si coisa alheia
móvel. Você praticou um fato típico. É crime? Não, não é crime. Apesar de praticar um fato típico, para
ser crime, deve haver um fato típico, ilícito e culpável. E aqui você agiu com uma excludente de ilicitude,
o Estado de Necessidade. Ah, mas não é justo! O carro era dele. Exatamente, você tomou o carro dele na
marra para poder fugir. Ah, mas isso é errado. Errado é morrer! Claro que há vários outros detalhes a
serem debatidos, mas por ora este exemplo já nos serve para ter uma noção inicial de como funciona o
Estado de Necessidade. Outro exemplo, um naufrágio em que se tenha um bote e não há como todos
entrarem. Um sujeito está correndo para entrar no bote e você o pega, o derruba, entrando no bote na sua
frente. A ideia aqui é a mesma. Você agiu em Estado de Necessidade. Agora o perigo aqui deve ser atual.
Diferentemente do que veremos na Legítima Defesa, aqui no Estado de Necessidade não se aceita o
perigo iminente, ou seja, não é aquele que está em vias de acontecer, é aquele que já está acontecendo.
Imagine que você está em uma rua, onde não há para onde você correr, não há árvores para você escalar.
A rua é um completo vazio. De repente, surge um cachorro enorme correndo em sua direção. Você olha
para os lados e não vê solução. Até que você percebe que tinha um carro estacionado ali. Então você
quebra o vidro do carro e se esconde. Você acabou de praticar um fato típico de dano. Você destruiu ou

131
deteriorou uma coisa alheia móvel. Mas, apesar de ser um fato típico, haverá o crime de dano? Não.
Novamente, temos um exemplo de Estado de Necessidade.

- Que não provocou por sua vontade: você não pode ter se colocado na situação acima de perigo atual por
vontade própria. Aqui, por vontade entenderemos dolo. Então o agente não pode ter se colocado naquela
situação dolosamente. Vejamos que se falamos estritamente em dolo, não há objeções a configuração do
Estado de Necessidade em situações, nas quais o agente tenha se colocado naquela situação de perigo
culposamente. Ele poderá se valer do Estado de Necessidade.

Ex.: Imagine que em uma Licença de


Pagamento, você pega o seu iate e vai
pescar com mais três amigos. E você é
um piloto mediano, conhece a carta
náutica, conhece bem a localidade, as
características do fundo. Porém, por
alguma inobservância de regras de
cuidado, você acaba causando um
acidente e o barco vai afundar. Vocês
estão em quatro, mas você percebe que só há três coletes a bordo. Dois já correm pegam um colete cada
um e pulam na água, tentando nadar em direção a uma ilha. Sobrou um colete para duas pessoas. Quem é
que vai ficar com o colete? Veja que você se encontra diante de um perigo atual. Você provocou
dolosamente o acidente? Não, foi por culpa. Então, você pode muito bem imobilizar de alguma forma o
seu amigo, pegar o colete e se salvar. Novamente, um caso de Estado de Necessidade. Não é porque você
causou o acidente culposamente, que você não poderá se valer do Estado de Necessidade. A proibição
ocorreria somente se você houvesse cometido o acidente dolosamente. Pense, por exemplo, que você tem
esta mesma embarcação, mas que ela seja financiada e que você tem seguro e está na onça para pagar as
prestações. Você pensa "vou causar um acidente", vou afundar esta embarcação e o seguro resolve o
problema. E aí acontece a mesma coisa. Só que desta vez você causou o acidente dolosamente. Neste
caso, você não poderá se valer do Estado de Necessidade para excluir a ilicitude do crime, nem da
agressão ao seu amigo, muito menos da fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro, que é
um tipo de estelionato (artigo 171, §2º, V do CP).

- Nem podia de outro modo evitar: o Estado de Necessidade deve ser a última opção do agente (ultima
ratio). Sempre deve se buscar a opção menos gravosa. Pense no exemplo acima, o barco vai afundar.
Sobrou um colete para duas pessoas. Porém, digamos que exista uma ilha a cerca de uns 200 metros e
você é um exímio nadador, mas o seu amigo não sabe nadar. Você não precisa daquele colete. Você

132
consegue nadar tranquilamente 200 metros. Não é a sua última opção. Então, caso você agrida o seu
amigo e pegue o colete, você não poderá alegar o Estado de Necessidade.

- Direito próprio ou alheio: o Estado de Necessidade pode ser para mim ou para terceiros. No mesmo caso
acima do barco. Imagine agora que nesta embarcação estavam você, sua pequena filha de 4 anos e mais
dois amigos e igualmente tinham apenas três coletes. Mesmo já trajando um dos coletes, você poderia
agredir um dos seus amigos, a fim de pegar o último colete para sua pequena filha. Da mesma forma,
você estaria agindo em Estado de Necessidade, pois estaria salvando direito alheio.

- Cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigir-se: na verdade, o que se quer dizer com este
último requisito é que eu tenho dois bens jurídicos igualmente protegidos. Por exemplo, novamente no
caso do barco. Tem a sua vida e a vida do seu amigo. O Direito protege objetivamente a vida de ambos.
Nenhuma prevalece sobre a outra. Ambos os bens jurídicos que se encontram ali em uma situação de
perigo atual são igualmente protegidos. A questão é não há como salvar as duas. Eu posso salvar apenas
uma e a outra terá que ser sacrificada. E como que isso funciona. O bem salvo tem que valer mais ou a
mesma coisa que o bem sacrificado.
Aqui temos que fazer uma pausa para explicar um pouco melhor. O conceito passado acima é o
entendimento constante no Código Penal, que segue a Teoria Unitária. Esta teoria diz que só existe um
Estado de Necessidade, que é o Estado de Necessidade Justificante. Entretanto, o Direito Penal Militar
adota a Teoria Dualista, a qual reconhece a existência de dois Estados de Necessidade: Estado de
Necessidade Justificante e Estado de Necessidade Exculpante. Neste é possível que o bem jurídico
salvo valha menos que o bem sacrificado. Esta é uma importante diferença entre o Direito Penal e o
Direito Penal Militar.

Ex.: Imaginemos que eu entre em uma casa em chamas e eu só tenho tempo e equipamento para executar
um salvamento. Eu avanço pelo corredor. Eu olho para a esquerda e percebo por uma fresta que há três
pessoas trancadas em um cômodo. Já na direita, eu ouço uma pessoa pedindo socorro em outro cômodo.
Eu estou de posse de uma ferramenta com a qual eu posso arrebentar a porta da esquerda ou posso
arrebentar a porta da direita. É o mesmo trabalho. Mesmo tempo e mesma força. Eu posso escolher
qualquer uma delas. Porém, eu tenho três pessoas no cômodo da esquerda e apenas uma no da direita. Eu
só tenho tempo para executar um salvamento antes que a casa inteira desmorone. A pergunta é: para qual
lado eu devo ir? A resposta é fácil. Eu vou para a esquerda, porque ali há três pessoas e do outro lado,
apenas uma. Três vidas valem mais do que uma. Então, eu tenho que dar preferência a salvar mais vidas.
Concordam? Muito bem. Fácil, né!? Mas, vamos inserir um pequeno detalhe a este exemplo. E se aquela
pessoa que está na direita for a minha mãe. Ah, se for a minha mãe, é claro que eu vou salvá-la. Para
mim, a minha mãe vale mais do que três desconhecidos. Agora, eu vou poder alegar Estado de
Necessidade? Então, aqui começa a complicar um pouquinho. Segundo o Direito Penal, não. O Código

133
Penal olha objetivamente a situação. E de forma objetiva, você está salvando uma vida em detrimento de
três. Ah, mas para mim a vida da minha mãe vale muito mais que a de três desconhecidos. Sim, para mim.
Porém, neste ponto o Direito Penal é bastante objetivo. Assim, neste caso eu não conseguirei me safar
alegando Estado de Necessidade. Já o entendimento do Direito Penal Militar é diverso. Vejamos o que diz
o artigo 39 do CPM:

Art. 39. Não é igualmente culpado quem, para proteger direito próprio ou de pessoa a quem está
ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição, contra perigo certo e atual, que não
provocou, nem podia de outro modo evitar, sacrifica direito alheio, ainda quando superior ao
direito protegido, desde que não lhe era razoavelmente exigível conduta diversa.

Perceba que o artigo diz que não é culpado quem para direito próprio ou de pessoa a quem está
ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição sacrifica direito alheio, ainda quando superior ao
direito protegido, desde que não lhe era razoavelmente exigível conduta diversa. Podemos notar que à
exceção da questão do valor do bem sacrificado, os demais elementos do Código Penal Militar são
semelhantes aos do Código Penal. Sem adentrar a questão de quem seriam estas pessoas "a quem está
ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição", o importante é que diferentemente do que ocorre
no Direito Penal, o Direito Penal Militar nestes casos irá reconhecer o Estado de Necessidade, aqui
chamado de Estado de Necessidade Exculpante.

2.1.2.2 Legítima Defesa


Assim como vimos no item anterior, a Legítima Defesa também terá 5 requisitos cumulativos para
ser configurada. Claro, que para facilitar o nosso estudo os cinco requisitos daqui serão diferentes dos
cinco requisitos de lá. Existe uma falsa impressão de que a Legítima Defesa seria apenas para a vida,
integridade física ou patrimônio, o que não é verdade. A Legítima Defesa não é só para estes bens, ela
contempla todos e quaisquer bens jurídicos. Vamos dar uma olhada no que assevera o artigo 25 do CP:
"Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem".
Assim como no Estado de Necessidade, do texto tiraremos os cinco requisitos da Legítima Defesa.

- Utilizar moderadamente: aqui a lei quer dizer que você deve agir com razoabilidade,
proporcionalidade, bom senso, moderação. A palavra chave é moderação. Legítima Defesa não é
vingança. Legítima Defesa é você fazer cessar uma agressão que você está sofrendo. Não se pode passar
dos limites, uma vez que o excesso será punível, porém se fizer menos do que tinha que fazer, corre-se o
risco de não se conseguir repelir a agressão.

- Dos meios necessários: o meio deve ser suficiente e eficaz. A congregação de ambos busca a um ponto
de equilíbrio. Este ponto de equilíbrio será exatamente o meio necessário a repelir a injusta agressão. E se

134
em um caso concreto eu tiver mais de um meio possível, qual que eu escolho? Escolho aquele que for
mais direcionado ao que eu preciso.

Ex.: tem uma pessoa desarmada correndo em minha direção. Eu tenho um spray de pimenta, uma taser,
uma pistola e um fuzil. Qual eu devo usar? Bom, vamos analisar o caso. Se ele tiver um porte físico
pequeno, em que eu consiga reagir com maior facilidade, eu posso usar o spray de pimenta, ele vai cair e
eu vou conter. Foi suficiente e eficaz. Agora, e se for alguém com porte físico mais avantajado e que eu
saiba que possua conhecimentos de artes marciais? Bem, eu não posso me dar ao luxo de eventualmente
perder a minha arma e ser rendido. Talvez neste caso seja melhor utilizar o taser. Ele vai tomar o choque,
vai cair e será contido. Em suma, o meio suficiente e eficaz vai depender do caso concreto. Há que se
fazer uma análise do cenário. Agora e se eu tivesse apenas um meio disponível? Digamos que eu só tenha
o fuzil. Se só existe um meio disponível, vai ter que ser com esse mesmo. Agora, teremos que focar mais
ainda no requisito anterior, usar com moderação. É o tradicional uso progressivo da força.

- Para repelir injusta agressão: aqui vamos entender que repelir quer dizer para fazer cessar a agressão.
Novamente, não se trata de vingança. Se a agressão já cessou, você não pode fazer mais nada. Outro
ponto é que a agressão tem que ser injusta. Injusto é sempre quem começa. Ah, mas eu estava certo.
Ninguém tem o direito de agredir os outros. Quem começou está errado. Não podemos confundir a
agressão com a mera provocação. Somente a agressão permite a legítima defesa. Conforme Bitencourt
(2012):

Define-se a agressão como a conduta humana que lesa ou põe em perigo um bem ou interesse
juridicamente tutelado. Mas a agressão, contudo, não pode confundir-se com a mera provocação
do agente, que é, digamos, uma espécie de estágio anterior daquela, devendo-se considerar a sua
gravidade/intensidade para valorá-la adequadamente.

Então, injusta é aquela agressão não protegida pela lei. E existe agressão protegida pela lei? Claro
que sim. Se eu tenho que prender alguém, por exemplo, a execução de um mandado de prisão e ele
resiste, eu posso usar a força necessária para conter o sujeito e conseguir efetuar a prisão. Fatalmente eu
vou acabar causando uma agressão a este sujeito, mas estarei protegido pela lei, desde que eu não atue
com excesso. Aliás, não apenas nesta, mas em todas as excludentes de ilicitude, se o agente agir com
excesso, ele responderá por isso. Lembrando o que falamos em Estado de Necessidade, não podemos
confundir agressão com perigo. Quando falamos em agressão, estamos falando em uma ação humana.

- Atual ou iminente: ou seja é aquele que está ocorrendo ou aquele que está em vias de ocorrer. Por
exemplo, alguém está efetuando disparos de arma de fogo contra você. Esta agressão é atual, ela já está
ocorrendo. Agora, se o sujeito ao te ver, direcionar a mão dele em direção a cintura, a fim de sacar uma
arma para então efetuar os disparos contra você, este já é um caso de agressão iminente. Ainda não há

135
agressão propriamente dita, mas ela está em vias de acontecer. Você não precisa esperar que ele saque a
arma, aponte e dispare para caracterizar a legítima defesa.

- A direito seu ou de outrem: a legítima defesa contempla o direito próprio ou alheio.

2.1.2.3 Estrito Cumprimento do Dever Legal


Seria ilógico imaginar uma situação em que a lei fosse te punir por ter cumprido algum
mandamento que ela mesma impõe. Bitencourt (2012) observa que: "Ocorrem situações em que a lei
impõe determinada conduta e, em face da qual, embora típica, não será ilícita, ainda que cause lesão a
um bem juridicamente tutelado".
Para conseguirmos configurar esta excludente, deverão ser observados dois requisitos:

- Estrito Cumprimento: o agente atua dentro dos exatos limites daquele dever que lhe foi imposto.

Ex.: dois policiais indo cumprir um mandando de prisão são recebidos a tiros e acabam entrando em uma
situação de confronto com criminosos. Eles sofrem uma agressão injusta, vendo suas vidas em risco.
Então, eles reagem e acabam matando o criminoso que deveria ser preso. Os policiais mataram este
bandido em estrito cumprimento de dever legal ou em legítima defesa? Este é um exemplo clássico e que
muita gente erra. Este é um caso de legítima defesa, pois ele estava se defendendo de uma agressão
injusta. Existe algum dever legal de matar um criminoso? O policial tem o dever legal de matar pessoas?
Não existe pena de morte no Brasil. Vamos desconsiderar situações de guerra ou outras exceções. Em
situações normais do dia a dia, se não existe a pena de morte no Brasil, ninguém possui esta obrigação de
matar alguém. Neste caso, o dever legal era de proceder a prisão do indivíduo. O resultado morte veio da
Legítima Defesa. O policial nunca matará alguém no Estrito Cumprimento do Dever Legal!

- Dever Legal: é um dever imposto pela lei a qualquer pessoa. É comum pensarmos que apenas os
servidores públicos têm deveres impostos pela lei. De certo que é muito mais fácil de se imaginar um
dever legal imposto a um servidor público. Por exemplo, ao policial é determinado que ele prenda quem
quer que se encontre em uma situação de flagrante delito. Por outro lado, e os pais? Eles não possuem o
dever de prover educação aos filhos menores? Este não é um dever imposto pela lei? E aqui, não importa
se os pais são servidores públicos ou não. Estamos falando da qualidade de serem pais.

Ex.: um policial prende alguém na situação de flagrante delito. Um policial encontra um indivíduo na rua
portando armas de fogo de uso restrito, ameaçando outras pessoas. Ao dar voz de prisão ao indivíduo, ele
resiste à prisão. O policial consegue imobilizá-lo e o algema. Ele poderá alegar constrangimento ilegal e
cerceamento de liberdade? O policial está cerceando o direito de ir e vir daquele indivíduo? Sim! O
policial pode interferir na liberdade de locomoção de qualquer pessoa? Não, a não ser que ele esteja no
estrito cumprimento de um dever legal e a lei impõe à autoridade policial que detenha quem se encontrar
na situação de flagrante delito.
136
2.1.2.4 Exercício Regular de Direito
Assim como no item anterior, esta excludente também será dividida em dois requisitos:

- Exercício Regular: o agente deve agir dentro das regras. Bitencourt (2012) entende que: "Regular será o
exercício que se contiver nos limites objetivos e subjetivos, formais e materiais impostos pelos próprios
fins do Direito". Lembra daquele exemplo do médico lá do início da aula. Então, as intervenções médicas
e cirúrgicas, consentidas pelo paciente, constituem, em regra, exercício regular de direito, claro, quando
exercidas em conformidade com as normas estipuladas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e
demais órgãos reguladores desta atividade.

- Direito: diferentemente da obrigação, o direito não é algo imposto, mas sim facultado a você. Estamos
falando de qualquer liberdade que seja fomentada ao agente, como por exemplo a prática esportiva.
Alguém é obrigado a praticar alguma arte marcial? Não, é um direito. Caso goste, você se inscreve em
alguma academia e inicia a prática. Agora, ao praticar o esporte, o agente deve se ater ao seu exercício
regular. Cada esporte terá regras próprias. Não é crime quando a violência esportiva decorre do exercício
regular nos estritos termos da disciplina que regulamenta o esporte. Em alguns esportes, já se espera que
hajam danos, porém este resultado danoso oriundo de atividades esportivas autorizadas e regularizadas
pelo Estado, constitui exercício regular de direito. Como diz Bitencourt (2012): "O limite do lícito
termina necessariamente onde começa o abuso, uma vez que aí o direito deixa de ser exercido
regularmente, para mostrar-se abusivo, caracterizando sua ilicitude".

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma nova pausa para averiguar o seu aprendizado. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Mesmo no caso de exercício regular de um direito, o agente responderá pelo excesso doloso ou
culposo.

2) ( ) Para o reconhecimento da legítima defesa, a agressão injusta deve ser atual, pois o agente não pode
ser beneficiado pela excludente se a agressão ainda não se iniciou.

137
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) Imagine dois náufragos em alto mar disputando um único colete salva-vidas, após um raio destruir
totalmente o barco que utilizavam. Sobre esta situação é correto afirmar que:

(A) nenhum deles pode invocar a legítima defesa contra o outro, mas sim o estado de necessidade.

(B) caso um dos náufragos morra, o sobrevivente não cometerá crime porque agiu no exercício regular de
um direito.

(C) ocorrendo o falecimento de um deles, o sobrevivente responderá por induzimento, instigação ou


auxílio a suicídio.

(D) o estrito cumprimento do dever legal é a única causa de exclusão de ilicitude que pode ser aplicada
aos fatos, em caso de morte de um dos náufragos após a disputa.

(E) eventual sobrevivente responderá pelo crime de homicídio culposo, pois o raio causou o naufrágio.

4) A legítima defesa:

(A) é meio de exclusão da ilicitude em face de qualquer injusta agressão, desde que os bens jurídicos
atacados sejam o patrimônio, a vida ou a integridade corporal.

(B) é cabível ainda que o bem agredido esteja submetido a outra forma de especial proteção, como o
proprietário que ameaça o inquilino para que preserve o imóvel.

(C) se legitima como forma de exclusão da ilicitude diante de agressão injusta, entendida como aquela
realizada mediante comportamento do agressor que implique crime doloso.

(D) quando praticada em excesso, após cessada a agressão, implica punição na modalidade culposa.

(E) exclui a ilicitude da conduta quando repele agressão injusta que esteja ocorrendo ou em vias de
ocorrer, desde que a ação defensiva seja moderada e utilize os meios necessários.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 A
4 E

138
RECADO FINAL:
Vencemos mais uma etapa da nossa equação do crime.
Na aula de hoje falamos sobre todos os aspectos mais importantes relacionados à ilicitude do
crime. Agora já sabemos dois dos elementos do crime: fato típico e ilicitude.
Na próxima aula, começaremos a falar sobre o terceiro e último elemento: culpabilidade.
Dito isto...
Até a próxima aula!

139
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula concluímos o assunto ilicitude. Nesta aula, iniciaremos os nossos estudos acerca da
culpabilidade, último elemento da equação do crime. Será que sempre quando alguém comete um fato
típico, sem qualquer excludente de ilicitude, ela estará praticando um crime? O que acontece no caso de
menores de idade? O que é maioridade penal? Vixe, cheiro de polêmica no ar...
Calma, vamos manter a nossa pressão 12 por 8 e enfrentar todas estas polêmicas nesta aula. Partiu
feroz!!!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever imputabilidade.

INTRODUÇÃO:
Já sabemos que o crime necessita de três elementos para sua configuração. Para sua existência
precisam estar caracterizados algum fato típico, ilícito e culpável. Já estudamos os dois primeiros
elementos. Nesta aula iniciaremos o terceiro e último. Você já ouviu falar em menor de idade cometendo
crime? Pois é... Muitas vezes ouvimos isso em diversos noticiários. Mas, quantas vezes você já escutou
que apesar de cometer um crime o menor de idade não ficaria preso? Ué, como assim? O menor de idade
comete crime e não acontece nada!? Como isso é possível? Será que o menor de idade realmente comete
crime? Bom, estas e mais perguntas começarão a ficar mais claras a partir desta aula.
Nesta aula, começaremos a tratar sobre o assunto culpabilidade.

2.1 CONCEITO DE CRIME


2.1.3 Culpabilidade
Culpabilidade consiste na possibilidade de reprovação da conduta ilícita, de quem tem capacidade
genérica de entender e querer, e podia, nas circunstâncias em que o fato ocorreu conhecer a sua ilicitude,
sendo-lhe exigível comportamento que se ajuste ao direito.
Ela se divide em três elementos: imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e
exigibilidade de conduta diversa.

2.1.3.1 Imputabilidade
Para iniciar, vejamos o que nos diz Bitencourt (2012) sobre este tema: "Imputabilidade é a
capacidade ou aptidão para ser culpável, embora, convém destacar, não se confunda com
responsabilidade, que é o princípio segundo o qual o imputável deve responder por suas ações".
Antes de mais nada, precisamos entender o que significa ser imputável. Imputabilidade é a
capacidade de ser considerado reprovável por aquilo que você fez, ou seja, é a capacidade de ser

140
responsabilizado por seus atos. Para tal, ao tempo da ação ou da omissão, o agente deve ter a capacidade
de entender o caráter ilícito do fato e de se determinar de acordo com esse entendimento.
O tema imputabilidade compreende o estudo dos artigos 26 a 28 do Código Penal. E é isso que
faremos aqui. Para ser considerado imputável, o agente deve se enquadrar ao mesmo tempo em todos os
critérios estabelecidos por estes três artigos. Este é o primeiro ponto a compreender. Para o indivíduo ser
considerado imputável, ele terá que cumprir cumulativamente os requisitos destes três artigos.
O segundo ponto é que podemos ter três situações possíveis. O indivíduo pode ser considerado:
imputável, semi-imputável e inimputável, conforme a seguir:

- Imputável: aquele a quem pode ser imputada a conduta criminosa e responderá pelo que fez, isto é, será
responsabilizado criminalmente pelos seus atos. Sempre que o indivíduo apresentar condições de
normalidade e maturidade psíquicas mínimas para que possa ser considerado como um sujeito capaz de
compreender a licitude de seus atos.

- Semi-imputável: este seria o meio termo. Existem algumas gradações entre a imputabilidade e a
inimputabilidade que podem exercer influência decisiva na capacidade de entendimento e discernimento
da pessoa. O semi-imputável até será responsabilizado criminalmente pelos seus atos, mas responderá
com redução de pena (de um a dois terços). Então, ele responde, mas "responde mais ou menos".

- Inimputável: aquele a quem não pode ser imputada a conduta criminosa. Consequentemente não
responderá pelos atos que eventualmente tenha feito. No momento do cometimento do crime, por algum
motivo o agente não possuía capacidade para discernir o certo do errado, sendo incapaz de avaliar suas
atitudes.

- Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado (artigo 26 do CP):


Há algumas condições psíquicas que comprometem a capacidade intelectual para compreender a
ilicitude do fato, como nos casos de determinadas doenças mentais, ou de desenvolvimento mental
incompleto ou retardado. Para iniciar à análise deste ponto, precisamos antes ler o que está escrito no
artigo 26 do Código Penal.

Inimputáveis
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Redução de pena
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de
perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era
inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.

141
- Imputável: quem não se encaixa no conceito do caput, nem no do parágrafo único do artigo 26
do Código Penal. É aquele agente que responderá normalmente por seus atos.

- Semi-imputável: fica no meio termo. É o caso do parágrafo único do artigo 26 do Código Penal.
O agente responde penalmente pelos seus atos, mas responderá com redução de um a dois terços da pena.
A pena aplicada é menor porque algo mitiga a capacidade de compreensão do agente, apesar de não
aniquilar completamente esta capacidade, ele não possui total discernimento sobre seus atos.
- No momento da conduta (nem antes, nem depois, no exato momento da conduta).
- Não era inteiramente capaz (tem alguma capacidade) de:
- entender o caráter ilícito do fato; ou
- determinar-se de acordo com esse entendimento.
- Em razão de:
- perturbação da saúde mental; ou
- desenvolvimento mental incompleto; ou
- desenvolvimento mental retardado.

- Inimputável: é o caso do caput do artigo 26 do Código Penal.


Deve-se observar cumulativamente os requisitos abaixo para se caracterizar a inimputabilidade:
- No momento da conduta (nem antes, nem depois, no exato momento da conduta).
- Era inteiramente incapaz (sujeito com 0% de capacidade) de:
- entender o caráter ilícito do fato; ou
- determinar-se de acordo com esse entendimento.
- Em razão de:
- doença mental; ou
- desenvolvimento mental incompleto; ou
- desenvolvimento mental retardado.
Cumprindo-se estes três requisitos, o agente estará isento de pena.
Existem três sistemas definidores dos critérios fixadores da inimputabilidade: biológico;
psicológico; biopsicológico. Temos aqui a utilização do sistema biopsicológico. Este sistema trabalhará
tanto com o lado biológico do agente (saúde mental), quanto com o seu lado psicológico (entendimento
do caráter ilícito da sua conduta).

- Maioridade Penal (artigo 27 do CP):


Vejamos o que diz o artigo 27 do Código Penal: "Os menores de 18 (dezoito) anos são
penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial". Percebam que
temos aqui apenas o sistema biológico, e mais, não há a possibilidade de semi-imputabilidade, porque ou

142
o indivíduo é maior que 18 anos ou é menor. Não existe nada entre estes dois momentos. Este critério
busca no corpo uma causa de inimputabilidade. Neste caso, não comporta meio termo.
Vejamos o que nos traz os ensinamentos de Bitencourt (2012):

A imputabilidade, por presunção legal, inicia-se, no âmbito do Direito Penal de adultos, aos
dezoito anos. Para definir a “maioridade penal” a legislação brasileira seguiu o sistema biológico,
ignorando o desenvolvimento mental do menor de dezoito anos, considerando-o inimputável,
independentemente de possuir a plena capacidade de entender a ilicitude do fato ou de determinar-
se segundo esse entendimento, desprezando, assim, o aspecto psicológico.

Podemos resumir tudo isso no seguinte:

- Imputável: maior que 18 anos.


- Inimputável: menor que 18 anos.

Só precisamos nos aprofundar em um


ponto. Até quando alguém é menor de 18
anos? Até o dia do aniversário de 18 anos? Até
a hora exata do aniversário de 18 anos? Até a
véspera do aniversário de 18 anos? Até o dia
seguinte ao aniversário de 18 anos? O ano
seguinte? O ano anterior? Enfim, até quando?
O indivíduo é menor de uma idade até o último instante da véspera de completar essa idade.
Quando ele entra no dia do aniversário, independente do horário de nascimento, ele já é maior dessa
idade. Então, alguém se torna maior de 18 anos a partir do primeiro instante do dia do aniversário de 18
anos. Fazendo uma releitura disso, por este critério, qualquer pessoa será inimputável até o último
instante da véspera do seu aniversário de 18 anos.
Notem que este critério biológico é bastante objetivo. Não se procura aqui saber se o agente tem
consciência do que ele está fazendo, se ele tem noção do que ele está fazendo é errado, se aquilo é um
conduta proibida pela lei. Nada disso importa. Por este critério, olharemos apenas a idade do agente. Só
precisamos saber quantos anos tem o agente. Se for maior de 18 anos, responderá criminalmente por seus
atos, caso contrário, não. Não importa se o agente com 17 anos já possua total discernimento sobre o que
está fazendo. Novamente, o critério biológico é objetivo.
Por estes motivos nunca poderemos dizer que um menor cometeu um determinado crime ou uma
contravenção penal. Falaremos que o menor cometeu um ato infracional ou um ato análogo a crime e que
será tratado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e não pelo Código Penal. Destarte. Embora
uma determinada conduta possa ser descrita como crime ou contravenção penal, por não haver a culpa,
não há como imputar a prática do delito, em razão de a imputabilidade se iniciar apenas aos 18 anos,
motivo pelo qual não será aplicada a pena a menores de idade, mas tão somente medidas socioeducativas.

143
- Emoção, paixão e Embriaguez (artigo 28 do CP):
Observemos o que nos diz o artigo 28 do Código Penal.

Emoção e paixão
Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal:
I - a emoção ou a paixão;
Embriaguez
II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
§ 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito
ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
§ 2º - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente
de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade
de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

- Imputável: o artigo supracitado ao dizer que "não excluem a imputabilidade penal", na verdade,
já está nos mostrando quem são as pessoas consideradas imputáveis.

- Emoção e Paixão: não adianta alegar


que cometeu um determinado crime por forte
emoção. Emoção e paixão não excluem a
imputabilidade penal. O agente responderá da
mesma forma. Pode-se citar como exemplo os
crimes passionais.

- Embriaguez voluntária dolosa: também conhecida apenas como embriaguez voluntária. Neste
caso o agente ingere a substância porque quer ficar embriagado. O agente bebe porque quer ficar bêbado.
Simples assim.

144
- Embriaguez voluntária culposa:
ou apenas embriaguez culposa.
Diferentemente da anterior, aqui o agente
não bebe para ficar bêbado, ele bebe por
motivos diversos, para se soltar, para
confraternizar, enfim motivos variados,
mas acaba ficando bêbado. O agente não
queria ficar bêbado, mas ao misturar
substâncias, não se alimentar direito,
ingerir muito rápido e demasiadamente a
substância, acaba se pondo em situação de
embriaguez. Por uma inobservância de
dever de cuidado, acaba ficando bêbado.
Apesar de culposa, o agente bebeu porque quis.

- Embriaguez voluntária preordenada: ou somente embriaguez preordenada. Neste último caso, o


agente bebe para se sentir capaz de praticar o crime. O agente queria praticar o crime, mas tinha coragem.
Então, ele bebe para se desinibir e poder praticar a conduta criminosa.

- Semi-imputável: é o caso do artigo 28, §2º do Código Penal.


- No momento da conduta (nem antes, nem depois, no exato momento da conduta).
- Não era inteiramente capaz (tem alguma capacidade) de:
- entender o caráter ilícito do fato; ou
- determinar-se de acordo com esse entendimento.
- Em razão de embriaguez involuntária incompleta proveniente de caso fortuito ou força
maior (álcool ou substância de efeitos análogos). Também conhecida como embriaguez acidental.

- Inimputável: é o caso do artigo 28, §1º do Código Penal.


- No momento da conduta (nem antes, nem depois, no exato momento da conduta).
- Era inteiramente incapaz (sujeito com 0% de capacidade) de:
- entender o caráter ilícito do fato; ou
- determinar-se de acordo com esse entendimento.
- Em razão de embriaguez involuntária completa proveniente de caso fortuito ou força
maior (álcool ou substância de efeitos análogos). Pode-se falar também em embriaguez acidental.

Ex.: Temos o clássico exemplo de um sujeito que está visitando uma fábrica de cachaça. Durante a visita
ele perde o equilíbrio e cai dentro de um tonel repleto de cachaça, vindo a ingerir demasiadamente este
produto. Ele consegue sair do tonel, porém completamente embriagado. E neste momento ele pratica
145
algum crime. Ele não responderá criminalmente, pois no momento do crime, ele estava inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar de acordo com este entendimento em
razão de uma embriaguez completa, a qual ele não deu causa, uma vez que decorreu de um acidente.

Novamente, se o agente cumprir estes três requisitos, estará isento de pena.


Por fim, assim como ocorrido no caso de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto
ou retardado, aqui também se utiliza o sistema biopsicológico de imputabilidade.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Mais uma pausa. Vamos fazer agora a nossa revisão. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Código Penal adota em todos os seus sentidos o sistema biopsicológico para a imputabilidade.

2) ( ) Para o direito brasileiro, todo menor de idade, independente do seu grau de maturidade, é como
considerado como semi-imputável, respondendo pelos seus crimes, mas com atenuação de um a dois
terços da pena.

3) ( ) Será excluída a imputabilidade penal do indivíduo que tenha praticado crime no momento de
emoção, por se considerar que ele não estava inteiramente capaz de entender o caráter ilícito da ação.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) A embriaguez:

(A) culposa isenta de pena o agente, uma vez que este agiu sem dolo.

(B) isenta o agente de pena, quando ao tempo da ação ou omissão ele se encontrava sob efeitos de
completa embriaguez involuntária e, em decorrência desta, não possuía capacidade alguma de entender o
caráter ilícito do fato ou de assim se determinar.

(C) assim como a emoção e a paixão se constituem como excludentes de ilicitude.

(D) voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos, implica a inimputabilidade do
agente se, ao tempo da ação ou da omissão, ele era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do
fato ou de se determinar de acordo com esse entendimento.

(E) preordenada é causa de exclusão da imputabilidade.

146
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 E
4 B

RECADO FINAL:
Na aula de hoje avançamos mais um pouquinho, rumo a completar os nossos estudos sobre o
crime. Iniciamos a abordagem acerca da culpabilidade, trazendo o que tem de mais importante sobre
imputabilidade penal.
Mas, isso foi só o começo. Na próxima aula ainda retomaremos este assunto, abordando os temas:
potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa.
E, assim, concluiremos nosso estudo sobre o crime.
Dito isto...
Até a próxima aula!

147
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula começamos a falar sobre culpabilidade e trouxemos o primeiro requisito, que é a
imputabilidade. Nesta aula, traremos os outros dois requisitos para que seja possível configurar a
culpabilidade do agente: potencial conhecimento da ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa. E,
assim, finalmente encerraremos o nosso estudo sobre o crime e poderemos avançar ao próximo tópico,
que será sobre o Código de Processo Penal Militar (CPPM).
Sem mais enrolação, vamos fechar de vez o assunto crime e seguir adiante. Partiu feroz!!!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever o potencial conhecimento da ilicitude; e
- Descrever a exigibilidade de conduta diversa.

INTRODUÇÃO:
Já falamos sobre fato típico, ilicitude e imputabilidade. Não é possível! Com isso tudo eu tenho
que ter um crime aqui. Será possível alguém deixar de cometer um crime alegando que desconhecia a lei?
Ah, essa é fácil hein... Será!? E se o agente estava simplesmente cumprindo ordens? Teremos um crime
também? Mas, e se a ordem foi absurda?
Ai ai ai, eu achando que já estava acabando, já está confundindo tudo de novo...rs
Calma, calma, devagar e sempre!
Vamos passo a passo...
Nesta aula, encerraremos o assunto culpabilidade.

2.1 CONCEITO DE CRIME


2.1.3 Culpabilidade
2.1.3.2 Potencial Conhecimento da Ilicitude
Para que o Direito sancione uma determinada conduta do agente, é necessário que este conheça ou
possa conhecer a ilicitude do fato. A ausência de conhecimento da proibição não afasta o dolo, mas sim, a
culpabilidade.
Agora você deve estar se perguntando, mas e aquele negócio de não poder alegar que não se
conhece a lei? Eu sempre ouvi que não se podia alegar o desconhecimento da lei para se safar de
eventuais sanções. Como é que fica isso?
De fato existe um Princípio Geral de Direito que fala exatamente isso, que ninguém pode alegar
desconhecimento da lei. Aliás, um princípio bastante antigo, aplicado desde o Império Romano.
Inclusive, isso está devidamente positivado no Direito Brasileiro no artigo 3º da Lei de Introdução às

148
Normas do Direito Brasileiro, a qual diz que: "Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a
conhece".
De acordo com os ensinamentos de Bitencourt (2012):

A ignorantia legis é matéria de aplicação da lei que, por ficção jurídica, se presume conhecida por
todos. Enquanto o erro de proibição é matéria de culpabilidade, num aspecto inteiramente diverso.
Não se trata de derrogar ou não os efeitos da lei, em função de alguém conhecê-la ou desconhecê-
la. A incidência é exatamente esta: a relação que existe entre a lei, em abstrato, e o conhecimento
que alguém possa ter de que seu comportamento esteja contrariando a norma legal. E é exatamente
nessa relação — de um lado a norma, em abstrato, plenamente eficaz e válida para todos, e, de
outro lado, o comportamento em concreto e individualizado — que se estabelecerá ou não a
consciência da ilicitude, que é matéria de culpabilidade, e nada tem que ver com os princípios que
informam a estabilidade do ordenamento jurídico.

Vivemos em uma sociedade de risco, que não aceita arcar com a constante ameaça de que outros
cometam atos ilícitos, sem que sejam responsabilidades por isso. Para viver em sociedade, temos que
pagar o preço de conhecer as nossas obrigações e não violá-las, pois se o fizermos, seremos punidos.
Logo, sempre que for possível ao agente ter conhecimento, pelo menos potencial, do Direito e agir de
forma diversa, a ele será aplicada alguma sanção. O Direito reprovará o comportamento de alguém apenas
quando for possível a este indivíduo realizar a escolha: comportar-se em conformidade ou contrário ao
Direito.
Entretanto, nem sempre será possível conhecer a ilicitude do fato. Não estamos falando aqui da
desídia do agente, mas sim de situações em que não se poderia exigir que ele agisse em conformidade
com algo que ele simplesmente não possui o potencial conhecimento. Logo, existirão algumas exceções à
aplicação do princípio de que ninguém pode alegar desconhecimento da lei. E o Código Penal traz uma
destas possibilidades. Vejamos:

Erro sobre a ilicitude do fato


Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se
inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.
Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência
da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

Inescusável significa indesculpável, vencível ou evitável. O que a lei nos diz é que se o erro de
proibição for inevitável, o agente estará isento de pena. Ao contrário, se for evitável a culpabilidade até
é atenuada, mas ele continuará respondendo por sua conduta. Vejam que no erro de proibição o agente
sabe plenamente o que está fazendo, mas por algum motivo supõe erroneamente que seria permitido. O
agente pensa que é lícito algo que, na verdade, é ilícito.
Temos um célebre e conhecidíssimo exemplo desta situação.

149
Ex.: Um turista holandês aportou em seu cruzeiro de viagens no Porto Maravilha, Rio de Janeiro. Como
essa era a primeira vez que saía da Holanda, não perdeu tempo e foi conhecer a belíssima orla carioca,
indo à praia de Copacabana, uma das praias mais famosas do mundo. Ao chegar lá se deparou com alguns
menores fumando maconha. Apesar de achar um pouco estranho o fato de serem menores, uma vez que
na Holanda tal atividade só é lícita a maiores de idade, ele resolveu procurar algum local para comprar
também a sua maconha. Caminhou por toda orla de Copacabana e não encontrou um coffee shop. Mas,
avistou em uma pequena viela o que ele acreditou se tratar de um "vendedor ambulante de maconha".
Algo incomum na Holanda, visto que lá a comercialização só é lícita em estabelecimentos devidamente
autorizados, mas como também já tinha visto menores fazendo uso e não encontrou outros locais para
venda, resolveu comprar. No momento em que estava comprando, aparece uma viatura da polícia militar.
O traficante sai correndo e ele sem entender nada é detido pela polícia e encaminhado à Delegacia
Especial de Apoio ao Turismo. O que aconteceu aqui? Ele chegou e comprou a maconha na mão de um
traficante, para uso próprio. E quando ele comprou a maconha na mão do traficante para uso próprio, ele
praticou a conduta prevista no artigo 28 da Lei nº 11.343 (Lei de Entorpecentes), que diz: "Quem
adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes
penas". Então, objetivamente ele dirigiu finalisticamente sua conduta para o resultado. Temos
configurado o fato típico e ele não se encontra amparado por qualquer causa de excludente de ilicitude.
Mas, na realidade, quem é este indivíduo? É um turista holandês que saiu pela primeira vez de seu país. O
sujeito está acostumado a comprar a droga num determinado local, em uma certa quantidade, ele está
autorizado, na Holanda. E ele chega ao Brasil e não percebe que não pode fazer o mesmo e é detido. Ele
praticou algum crime? Não. Falta a ele potencial consciência da ilicitude. Ele estava convicto de que
estava fazendo algo permitido, até mesmo por ter observado menores fazendo uso ostensivo de
entorpecentes nas ruas. Ele está em erro de proibição.

2.1.3.3 Exigibilidade de Conduta Diversa


Por fim, tem que ser possível exigir do agente uma conduta diferente daquela que ele praticou.
Logo, para que não haja crime neste ponto, teremos que estar diante de uma situação de inexigibilidade de
conduta diversa. E quando isso ocorrerá? Existem algumas causas legais previstas que veremos agora.

- Coação Moral Irresistível:


Primeiramente temos que fazer uma distinção. Existe coação irresistível tanto no campo moral
quanto no campo físico. Naturalmente, quando estivermos diante de uma coação irresistível o indivíduo
não responderá pelo crime, mas sim o coator. Em ambos os casos, a irresistibilidade da coação será
medida pela gravidade do mal ameaçado.
Como dissemos, existem dois tipo de coações irresistíveis. Na coação física irresistível, o coator
interfere no corpo físico do agente.

150
Ex.: Várias pessoas mais fortes
que eu me seguram, uma
segura meus braços, outra
segura minhas pernas, não
deixando que eu me debata.
Então, uma pega meu braço e
estica, abre os meus dedos e
coloca dentro do gatilho de
uma arma. E contra a minha
vontade, ela puxa o meu dedo,
desferindo um disparo. Mesmo eu forçando o meu dedo em direção contrária, pois eu não tinha intenção
de disparar aquele gatilho, ela era mais forte que eu e com todos me segurando, eu já tinha pouco controle
do meu corpo, ela supera o meu esforço e ocorre o disparo. Veja que foi o meu dedo que tocou e disparou
o gatilho. Mas, eu agi livremente? Não! Eu estava fisicamente coagido por terceiros. Esta coação
interferiu no meu corpo físico. Eu não possuía controle sobre o meu corpo. Aqui, estamos diante de uma
coação física irresistível.

Já na coação moral, não é o controle do corpo que é tomado, é o controle da mente, é psicológico.
O agente tem pleno controle do seu corpo, mas não de sua vontade.

Ex.: Exemplo clássico de filme hollywoodiano de roubo a banco, em que um alguns criminosos vão à
casa do gerente de uma agência bancária, fazendo sua como refém, amarrando todo mundo no sofá e fala
para o gerente: "você vai agora ao banco, pegará todo o dinheiro existente no cofre, colocará em bolsas, e
vai trazer no seu carro até o estacionamento do shopping da rua X, que lá uma das minhas equipes já o
estará aguardando. Você tem exatamente 30 minutos para executar esta ação, senão toda sua família
estará morta quando você voltar para casa".

Veja que em nenhum momento o gerente do banco foi coagido fisicamente. Ele não foi arrastado
até o banco. O gerente continua com pleno controle de suas atividades motoras. Ele pega o seu carro,
dirige até o banco, abre o cofre e foge com o dinheiro. A questão aqui é o controle psicológico. O gerente
não tem como controlar psicologicamente esta situação. Logo, estamos diante de uma situação de coação
moral irresistível.
Nas palavras de Bitencourt (2012) temos que:

151
Coação irresistível, com idoneidade para afastar a culpabilidade, é a coação moral, a conhecida
grave ameaça, uma vez que a coação física exclui a própria ação, não havendo,
consequentemente, conduta típica. Coação irresistível é tudo o que pressiona a vontade impondo
determinado comportamento, eliminando ou reduzindo o poder de escolha, consequentemente,
trata-se da coação moral.

Em ambos os casos, o agente não cometerá crime. Porém, há diferenças. Quando a coação
irresistível for física, ela acaba com o elemento fato típico do crime, haja vista na verdade não ter havido
conduta deste agente (ausência de conduta), ele simples serviu como um instrumento para que um terceiro
cometesse aquele crime. Já quando a coação irresistível for moral, ela eliminará a culpabilidade. Perceba
que o agente possui controle sobre o seu corpo e age, o fato é típico. Entretanto, não há como exigir-lhe
uma conduta diversa da que ele teve. Novamente, aqui quem responderá criminalmente será o coator.

- Obediência Hierárquica:
Aqui teremos que observar três requisitos cumulativos: relação hierárquica funcional; limites
da ordem; e a ordem não pode ser manifestamente ilegal.
A relação hierárquica funcional significa
que estamos diante de uma relação de serviço
público. A doutrina majoritária entende que se
estivermos diante de uma relação privada, não
teremos hierarquia. Assim, a hierarquia privada
não seria abrangida por este dispositivo.
Além disso, o agente deve se ater aos
exatos limites da ordem emanada. Ele não deve
nem ficar aquém, tampouco ir além do que
ordenado. Nem mais, nem menos. Ele deve
cumprir exatamente aquilo que lhe foi ordenado.
Por fim, perceba que não foi falado que a
ordem não pode ser ilegal, mas sim que ela não
pode ser manifestamente ilegal. O que ocorre é
que esta ilegalidade não pode ser de fácil percepção.
Bitencourt (2012) sintetiza tudo isto da seguinte forma:

Sintetizando, em virtude da subordinação hierárquica, o subordinado cumpre ordem do superior,


desde que essa ordem não seja manifestamente ilegal, podendo, no entanto, ser apenas ilegal.
Porque, se a ordem for legal, o problema deixa de ser de culpabilidade, podendo caracterizar causa
de exclusão de ilicitude. Se o agente cumprir ordem legal de superior hierárquico, estará no
exercício de estrito cumprimento de dever legal. A estrita obediência de ordem legal não
apresenta nenhuma conotação de ilicitude, ainda que configure alguma conduta típica; ao
contrário, caracteriza a sua exclusão

Caso sejam cumpridos todos estes requisitos, quem será responsabilizado criminalmente não será
o agente, mas sim o autor da ordem.
152
Ex.: um Delegado da Polícia Federal dá uma ordem a um agente federal: "arromba a porta". O agente
deve arrombar a porta. Não é para ele meter o pé, arrombar a porta, puxar a pistola, efetuar dois disparos,
fazer um rolamento e efetuar mais um disparo. Não foi isso que o Delegado mandou fazer. A ordem foi
simplesmente: "arromba a porta". Vamos dizer que ele cumpra exatamente o que lhe foi ordenado. Já
teremos ticado dois requisitos: relação hierárquica funcional e limites da ordem. Ele mete o pé na porta e
a arromba, somente. Depois, descobrem que não havia qualquer motivo para ingresso naquela residência.
Não havia flagrante delito, tampouco qualquer ordem judicial. O delegado deu a ordem sem ter motivo
legal para entrar na residência. Estaremos diante de um caso manifesto de abuso de autoridade. Quanto a
isso não pairam quaisquer dúvidas. Agora, vamos analisar. Quem foi que meteu o pé na porta? Ah, foi o
agente. Então, quem praticou o abuso de autoridade? O agente? Será? Se ele estiver em obediência
hierárquica, ele não responderá, quem responderá será a autoridade que deu a ordem. E esta ordem não
pode ser manifestamente ilegal. Esta ordem era ilegal? Sim! Não havia qualquer autorização para
ingressar àquele imóvel. Vamos mudar um pouquinho a pergunta. Para o agente, aquela ordem era
manifestamente ilegal? Vamos lá, o camarada era um agente federal. Quem deu a ordem foi um Delegado
da Polícia Federal. O delegado tem que ser, entre outras coisas, bacharel em Direito, além de ter que
prestar o concurso público para ingresso na carreira policial. Logo, ele tem que ter um conhecimento
jurídico razoavelmente elevado. Logo, teoricamente este delegado deveria ter o conhecimento de quando
ele pode ou não ingressar em imóvel alheio. Então, se ele mandou arrombar a porta, é óbvio que na
cabeça do agente naquela fração de segundos passa que se o delegado está mandando arrombar a porta é
porque ele tem que arrombar a porta. Ele tem o conhecimento de quando o agente pode fazer isso e se ele
está mandando o agente meter o pé na porta, é porque ele tem que meter o pé na porta. O agente não vai
imaginar que aquela ordem era ilegal. Ele é o delegado. Com certeza ele tem ciência de algum flagrante
que esteja ocorrendo dentro daquele imóvel ou ele tem um mandado judicial no bolso dele. Ele só fez isso
porque ele estava seguindo uma ordem de um superior hierárquico. E ele seguiu estritamente o que foi
determinado, logo ele estava em obediência hierárquica e não responderá criminalmente pelo abuso de
autoridade, mas sim o delegado que deu a ordem ilegal.
Finalmente, cumpre fazer uma pequena distinção entre o servidor civil e o militar. Uma
ilegalidade pode ocorrer pelo mero descumprimento de uma formalidade legal. O servidor civil não é
obrigado a cumprir uma ordem ilegal.
Já na área militar as coisas funcionam um pouquinho diferente. Por questões de hierarquia e
disciplina, os militares não podem arguir a legalidade das ordens superiores. Os militares possuem o
dever legal de obediência. Cabe ressaltar que, diferentemente do Direito Penal comum, existe o crime de
insubordinação, previsto no artigo 163 do Código Penal Militar:

Recusa de obediência
Art. 163. Recusar obedecer a ordem do superior sôbre assunto ou matéria de serviço, ou
relativamente a dever impôsto em lei, regulamento ou instrução:
Pena - detenção, de um a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave.

153
Note que em nenhum momento o artigo acima trata sobre a legalidade ou não da ordem. O militar
mesmo tendo convicção da ilegalidade da ordem, deverá cumpri-la. Mas, como assim? Eu sempre ouvi
que ordem errada não se cumpre. É verdade, o imaginário militar realmente possui algumas nuances
deveras interessante. De fato, quem te falou isso também não estava totalmente errado, só não se atentou
a um pequeno detalhe. Veja o que diz o artigo 38, §2º do Código Penal Militar:

Não é culpado quem comete o crime:


Obediência hierárquica
b) em estrita obediência a ordem direta de superior hierárquico, em matéria de serviços.
1° Responde pelo crime o autor da coação ou da ordem.
2° Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso, ou há
excesso nos atos ou na forma da execução, é punível também o inferior.

Conseguiu perceber a sutileza da diferença? O Código Penal Militar, diferentemente do Código


Penal comum, não fala em "estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior
hierárquico", mas sim em "ato manifestamente criminoso". O que apesar de parecido, é bem diferente.
Para o militar poder se safar, não basta que a ordem dada seja manifestamente ilegal, ela tem que ser
manifestamente criminosa. Pois, se a ordem, apesar de ser manifestamente ilegal, não for manifestamente
criminosa, o militar não responderá por aquela ilegalidade, mas poderá responder pelo crime de
insubordinação. Ou seja, aquele dito popular militar de que ordem errada não se cumpre, não é
exatamente bem assim. Da próxima vez que te falarem isso, conserte dizendo que não é a ordem errada,
mas sim a ordem manifestamente criminosa que não se cumpre.
Tanto na hipótese do servidor civil quanto do militar, quando houver excesso, isto é, quando o
subordinado for além daquilo que lhe ordenou o superior, por conta própria, ambos responderão pelo fato.
Por fim, resumimos abaixo o que aprendemos sobre crime:

Conduta

Resultado
Fato Típico
Nexo de Causalidade ou Nexo Causal

Tipicidade
Crime Ilícito
Imputabilidade

Culpável Potencial Conhecimento da Ilicitude

Exigibilidade de conduta diversa

154
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos à nossa tradicional pausa nos nossos estudos para examinar o que você aprendeu sobre
crime até o momento. Responda às questões abaixo.
I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.
1) ( ) O erro sobre a ilicitude do fato sempre isenta o agente de pena.
2) ( ) Sempre que o fato for cometido sob coação moral ou em obediência à ordem de superior
hierárquico, somente é punível o autor da coação ou da ordem.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) A coação moral irresistível e a obediência hierárquica excluem a:

(A) tipicidade e a culpabilidade, respectivamente.

(B) culpabilidade.

(C) culpabilidade e a tipicidade, respectivamente.

(D) punibilidade e a ilicitude, respectivamente.

(E) tipicidade.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 B

RECADO FINAL:
Finalmente chegamos ao fim do estudo sobre o crime. Falamos todo o indispensável sobre o fato
típico, ilícito e culpável, fechando a nossa equação do crime.
Na próxima aula já avançaremos a outro tema, que será um breve estudo acerca do Código de
Processo Penal Militar (CPPM).
Novamente, deixo a sugestão de antes de avançar à próxima aula, você aproveite para tirar um
tempinho e revisar o que falamos aqui sobre crime.
Sei que é um tema bastante espinhoso, mas também muito interessante de se estudar.
Dito isto...
Até a próxima aula!
155
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Agora que nós já conversamos bastante sobre crime, podemos passar a ver como funciona a parte
instrumental disso tudo. Nesta aula veremos o Código de Processo Penal Militar (CPPM). Ele que irá
disciplinar o que nós iremos fazer quando nos depararmos com a prática de algum ilícito penal. Traremos
o conceito e mencionaremos a finalidade, os princípios aplicáveis a este ramo do Direito e mostraremos
como e quando se aplica o Código. Então, vamos trabalhar!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Código de Processo Penal Militar (CPPM);
- Citar a finalidade do CPPM;
- Citar os princípios do Direito Processual Penal Militar; e
- Descrever a aplicação do CPPM.

INTRODUÇÃO:
No Direito Processual Penal Militar estudamos a série de atos concatenados que devem ser
praticados no âmbito da Justiça Militar, para que o Estado possa determinar o Direito objetivo que deve
ser aplicado a cada caso.
A lei processual penal militar também disciplina as atividades da Polícia Judiciária Militar, que
será a matéria da nossa próxima aula, e a condução do Inquérito Policial Militar (IPM), que será alvo das
duas aulas posteriores, que é a peça informativa que fornece subsídios ao Ministério Público Militar
(MPM) para oferecimento da denúncia.
Na aula de hoje, traremos o conceito e os princípios aplicados ao Direito Processual Penal Militar,
bem como demonstraremos também a sua finalidade e a aplicação do Código de Processo Penal Militar
(CPPM).
Vamos que vamos!!!

2.2 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL MILITAR


Em 1969 entraram em vigor o Código Penal Militar (Decreto-lei 1.001/1969) e o Código de
Processo Penal Militar (Decreto-lei 1.002/1969). À época também foram preparadas novas normas penais
gerais, mas estas, apesar de publicadas, nunca entraram realmente em vigor.
O resultado é que as normas penais militares que utilizamos hoje apesar de antigas, ainda são mais
recentes que as normas penais comuns, o que gera alguns conflitos entre o Direito Processual Penal e o
Direito Processual Penal Militar.

156
2.2.1 Conceito
O Processo Penal é o instrumento da jurisdição penal.
O Processo Penal é a forma/metodologia pela qual é estruturado o exercício da jurisdição penal,
pela qual o Estado vai dizer se o acusado é inocente ou culpado, correspondendo ao conjunto de atos
sucessivos e coordenados, praticados por órgão jurisdicional, auxiliares e partes processuais, cujo objetivo
é a solução do conflito de interesses entre poder punitivo e direito de liberdade.
O poder punitivo é o poder monopolizado que o Estado tem de condenar seus cidadãos que
cometem condutas típicas, ilícitas e culpáveis. É um poder chamado de autolimitado, ou seja, o próprio
Estado condiciona o poder punitivo ao devido processo legal, que falaremos mais adiante.
O processo penal, por si só, já representa alguma limitação ao poder punitivo. Se não houvesse
processo penal, a condenação poderia ser aplicada imediatamente após o cometimento do crime.
O CPPM é o documento que regulamenta o sistema processual
penal militar, além de toda a persecução penal, tanto na investigação
preliminar quanto na fase judicial, onde estarão formalmente
instrumentalizados todo o passo a passo a ser desenvolvido no âmbito da
Justiça Militar para apurar e solucionar os casos de crimes militares.
A persecução penal é o direito que o Estado tem de perseguir a
efetiva aplicação da pena ao acusado. Decorre diretamente do poder
punitivo do Estado, haja vista que se o Estado tem o direito de punir,
também tem de perseguir a condenação. A persecução tem natureza bifásica.

- Fase de investigação preliminar: persecução penal pré-processual, fase que será realizada pelas
Autoridades de Polícia Judiciária Militar (artigo 7º do CPPM). É preciso, antes de haver um processo, que
seja apurada a autoria e materialidade do fato, que darão base à persecução penal judicial. A investigação
preliminar visa à apuração da autoria e materialidade do fato, antes de que realmente se inicie o processo.
O procedimento administrativo mais comum é o IPM, porém há outros.

- Fase judicial do processo de persecução penal: fase em que serão efetivamente produzidas as provas em
juízo perante uma autoridade judiciária, onde serão garantidos o contraditório e a ampla defesa ao
acusado.

2.2.2 Finalidade
A função do Direito Processual é estudar os atos praticados pelo Estado quando uma demanda é
levada à sua apreciação. O Estado detém o monopólio da violência legítima, e somente o Poder Judiciário
tem a competência de dizer o direito aplicável a cada caso concreto.
Quando outros instrumentos não são eficazes para a solução dos atritos ocorridos na sociedade,
surgem os conflitos de interesses, ou seja, a relação jurídica se torna conflituosa. Já que de outras

157
maneiras não há como solucionar aquele problema, é chegada a hora de entregá-lo para outra pessoa,
então entregaremos ao Estado-juiz. Este se incumbirá de resolver o conflito entre autor e réu, através de
uma outra relação jurídica, que será a relação jurídica processual, que tem esta outra figura, o Estado-
juiz que irá tentar solucionar o conflito, dando a lei para o caso concreto, que é a sentença de mérito.
Basicamente, o Direito Processual é o ramo do direito que vai servir para resolver conflitos que já
nasceram. Tradicionalmente, é para isso que o processo existe: resolver conflitos. Enquanto o direito
material vai regular a relação para que não haja conflitos, o processo, basicamente, entra quando o
conflito já está instaurado, para remover esse conflito.
O CPPM tem como finalidade estabelecer as diretrizes e o regramento a ser observado para que o
Estado-juiz, consubstanciado na Justiça Militar, consiga solucionar as lides a ele apresentadas.

2.2.3 Princípios
No Direito Processual Penal Militar também são observados
diversos princípios aplicáveis ao Direito Processual Penal.
Primeiramente, temos princípio do devido processo legal, previsto
no artigo 5°, LIV, da Constituição da República, o qual determina que
ninguém seja privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo.
O princípio do contraditório e da ampla defesa (artigo 5°, LV, da Constituição) são
consequências lógicas do devido processo legal. Segundo estes princípios, todos os atos do processo
devem ser informados aos litigantes, para que estes possam ter a oportunidade de com os meios e recursos
permitidos no ordenamento jurídico influenciar as decisões tomadas a seu favor.
Já conforme o princípio do juiz natural, (artigo 5°, LIII, da Constituição) ninguém pode ser
processado e nem sentenciado, a não ser pela autoridade competente. Se um crime militar foi cometido e
precisa ser julgado, deve haver a atuação do conselho competente.
Pelo princípio da presunção de inocência (art. 5°, LVII), enquanto não houver o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória, presume-se que o réu seja inocente. Cabe ao Estado provar que o
réu cometeu o crime, e não o contrário.
Pela característica do Processo Penal de impor sanções graves, deve ser observado o princípio da
busca da verdade real, que privilegia o conhecimento da verdade dos fatos, ou seja, pelo entendimento
do que realmente aconteceu, e não apenas do que foi apresentado no processo.
Por força do princípio da publicidade, os atos processuais em regra são públicos. Qualquer pessoa
pode ter acesso aos autos do processo e ao conteúdo dos atos processuais. A lei pode, contudo, restringir
este acesso, em nome da defesa da intimidade ou do interesse social.
Se estiverem presentes os requisitos para propositura da ação penal, a denúncia deve ser oferecida.
Este é o princípio da obrigatoriedade ou da indisponibilidade, e é adotado pelo artigo 30 do CPPM.

158
Obrigatoriedade
Art. 30. A denúncia deve ser apresentada sempre que houver:
a) prova de fato que, em tese, constitua crime;
b) indícios de autoria.

Perceba que o dispositivo penal traz que caso haja prova do fato que, em tese, constitua crime e
indícios da autoria, o Ministério Público deve apresentar a denúncia, não é uma faculdade, é uma
obrigação. Não há margem de escolha de conveniência e oportunidade para apresentação da denúncia,
havendo os requisitos acima, o Ministério Público terá que apresentá-la.
Por fim, são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. E não somente,
todas as demais provas decorrentes de uma prova ilícita também são consideradas ilícitas.
Ficaremos apenas com os princípios supracitados, porém estes são apenas alguns dos princípios
aplicáveis ao processo penal militar, existem vários outros, mas estes são os mais importantes para termos
em mente.

2.2.4 Aplicação
As normas do CPPM regem o processo penal militar, tanto em tempo de paz quanto em tempo de
guerra, conforme o artigo 1º do CPPM:

Fontes de Direito Judiciário Militar


Art. 1º O processo penal militar reger-se-á pelas normas contidas neste Código, assim em
tempo de paz como em tempo de guerra, salvo legislação especial que lhe fôr estritamente
aplicável.
Divergência de normas
§ 1º Nos casos concretos, se houver divergência entre essas normas e as de convenção ou
tratado de que o Brasil seja signatário, prevalecerão as últimas.
Aplicação subsidiária
§ 2º Aplicam-se, subsidiàriamente, as normas dêste Código aos processos regulados em leis
especiais.

Veja que coisa interessante nos traz o §1º do artigo acima. Sempre quando houver conflito entre o
CPPM e convenção ou tratado internacional do qual o Brasil faça parte, deverá ser aplicada a norma
internacional. Além disso, o artigo 3º do CPPM nos informará quais serão as fontes subsidiárias do
Direito Processual Penal Militar:

Suprimento dos casos omissos


Art. 3º Os casos omissos neste Código serão supridos:
a) pela legislação de processo penal comum, quando aplicável ao caso concreto e sem
prejuízo da índole do processo penal militar;
b) pela jurisprudência;
c) pelos usos e costumes militares;
d) pelos princípios gerais de Direito;
e) pela analogia.

159
Já vimos que o CPPM rege o processo penal militar. Destarte, estas fontes subsidiárias acima
somente serão utilizadas quando houver omissão do CPPM. A simples alteração no Código de Processo
Penal (CPP) ou até mesmo no Código de Processo Civil (CPC) não autorizará a aplicação automática das
novidades ao processo penal militar.
Por fim, o artigo 4º do CPPM nos mostrará a aplicação da lei processual penal militar no tempo e
espaço, tanto em tempo de paz, quanto em tempo de guerra:

Aplicação no espaço e no tempo


Art. 4º Sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, aplicam-se as
normas dêste Código:
Tempo de paz
I - em tempo de paz:
a) em todo o território nacional;
b) fora do território nacional ou em lugar de extraterritorialidade brasileira, quando se tratar
de crime que atente contra as instituições militares ou a segurança nacional, ainda que seja o
agente processado ou tenha sido julgado pela justiça estrangeira;
c) fora do território nacional, em zona ou lugar sob administração ou vigilância da fôrça
militar brasileira, ou em ligação com esta, de fôrça militar estrangeira no cumprimento de missão
de caráter internacional ou extraterritorial;
d) a bordo de navios, ou quaisquer outras embarcações, e de aeronaves, onde quer que se
encontrem, ainda que de propriedade privada, desde que estejam sob comando militar ou
militarmente utilizados ou ocupados por ordem de autoridade militar competente;
e) a bordo de aeronaves e navios estrangeiros desde que em lugar sujeito à administração
militar, e a infração atente contra as instituições militares ou a segurança nacional;
Tempo de guerra
II - em tempo de guerra:
a) aos mesmos casos previstos para o tempo de paz;
b) em zona, espaço ou lugar onde se realizem operações de fôrça militar brasileira, ou
estrangeira que lhe seja aliada, ou cuja defesa, proteção ou vigilância interesse à segurança
nacional, ou ao bom êxito daquelas operações;
c) em território estrangeiro militarmente ocupado.

Note que o artigo já começa falando em "sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito
internacional", ratificando o comentário feito no início deste item, quando abordamos a ocorrência de um
eventual conflito entre o CPPM e convenção ou tratado internacional do qual o Brasil faça parte, quando
será aplicada a norma internacional.
Aqui estão basicamente as mesmas regras trazidas pelo Código Penal Militar: territorialidade e
extraterritorialidade incondicionada. Neste entendimento, assevera Neves e Streifinger (2012):

Como sabemos, no Direito Penal comum vige, como regra, o princípio da territorialidade e,
como exceção, o princípio da extraterritorialidade.
Ao tratar da extraterritorialidade, a doutrina penal comum enumerou alguns princípios que
a definem como o princípio do pavilhão, da nacionalidade, da defesa e da justiça universal.

160
Assim, podemos perceber que o CPPM se aplicará não apenas em todo âmbito nacional (princípio
da territorialidade), mas há alguns casos que ensejarão também sua aplicação fora do território nacional,
concebendo o princípio da extraterritorialidade.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Novamente, façamos aquela nossa pausa para avaliar o avançar dos nosso estudos. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) As normas do CPPM regem o processo penal militar, tanto em tempo de paz quanto em tempo de
guerra.
2) ( ) No Direito Processual Penal Militar também são observados diversos princípios aplicáveis ao
Direito Processual Penal.
3) ( ) Havendo divergência entre o CPPM e convenções ou tratados internacionais de que o Brasil seja
signatário, prevalecerá a aplicação do CPPM.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) No caso de omissão do CPPM, este NÃO deverá ser suprido:

(A) pelas normas de tratados e convenções.

(B) pela jurisprudência.

(C) pelos usos e costumes militares;

(D) pelos princípios gerais de Direito.

(E) pela analogia.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 E
4 A

161
RECADO FINAL:
Na aula de hoje estudamos um pouco sobre o Código de Processo Penal Militar (CPPM). Ele é
quem efetivamente dará o norte para as nossas ações quando nos depararmos com um eventual
cometimento de algum ilícito penal.
O assunto da nossa próxima aula, Polícia Judiciária Militar, está intimamente ligada ao CPPM,
uma vez que é nesta lei onde estão previstas todas as competências, atribuições e formas de atuação desta
atividade militar.
Dito isto...
Até a próxima aula!

162
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Agora que já conhecemos um pouco sobre o Código de Processo Penal Militar, podemos falar de
uma atividade importantíssima no cotidiano da caserna, que é a atividade de polícia judiciária militar. Em
algum momento de sua carreira você já viu algum agente da Polícia Federal a bordo investigando o
cometimento de um crime militar? Não? Nem eu. Nesta aula vamos conhecer um pouquinho mais sobre a
estrutura da MB para fazer frente ao exercício das diversas competências da Polícia Judiciária Militar.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Polícia Judiciária Militar;
- Citar as atividades da Polícia Judiciária Militar;
- Citar as atribuições dos Núcleos de Polícia Judiciária Militar (N-PJM);
- Descrever a forma de atuação do N-PJM; e
- Citar a composição do N-PJM.

INTRODUÇÃO:
Aconteceu um determinado crime a bordo. O que fazemos? Ligamos para a Polícia Federal? Não,
né. Mas, por que os militares são os responsáveis pela investigação em crimes militares se a Polícia
Federal possui uma estrutura muito maior para atender a estas demandas?
Em âmbito militar, a atividade de polícia judiciária será exercida por militares e tem como
principal atividade apurar a existência de infrações penais militares, sua autoria e o elemento subjetivo
com que se conduziu o responsável, através da investigação policial, sendo instrumentalizado na esfera
militar pelo Inquérito Policial Militar (IPM), procedimento administrativo sumário com característica
inquisitiva e caráter de instrução provisória, servindo de base à pretensão punitiva do Estado formulada
pelo Ministério Público Militar, titular da Ação Penal de Iniciativa Pública.
Estudaremos de forma mais aprofundada o IPM no próximo capítulo.

163
2.3 POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR
2.3.1 Conceito
A atividade de polícia judiciária é uma função típica dos órgãos de segurança do Estado. No
Brasil, podemos citar três espécies de polícias judiciárias:

- Polícia Judiciária Comum: exercida pelas Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal.
- Polícia Judiciária Federal: exercida pela Polícia Federal.
- Polícia Judiciária Militar: exercida pelos militares.

A atividade de Polícia Judiciária Militar (PJM) é decorrente da atribuição conferida à Autoridade


de Polícia Judiciária Militar (APJM) pelo artigo 7º do Código de Processo Penal Militar (CPPM), o qual
atribui aos Titulares de OM a responsabilidade pela apuração de fatos que se considerem crimes militares.

2.3.2 Atividades
A atividade de PJM pode se desenvolver tanto sobre o aspecto da prevenção quanto na repressão
aos ilícitos penais.
Preventivamente, a PJM visa proteger o patrimônio, instalações e demais bens jurídicos tutelados
na legislação penal, por meio de medidas de caráter educativo, de orientação e de segurança nas áreas de
sua atuação.
Repressivamente, cabe à PJM atuar nos delitos que deixam vestígios, onde se faz necessária a
realização de perícia, de modo a contribuir para a elucidação da prática delitiva.

2.3.3 Núcleo de Polícia Judiciária Militar


Com o propósito de reduzir a dependência da MB em relação aos órgãos de investigação externos
e, com isso, instrumentalizar e tornar mais ágil e eficiente os procedimentos para a apuração dos crimes
militares, cada Comando de Distrito Naval deverá implementar a criação de um Núcleo de Polícia
Judiciária Militar (N-PJM).
A criação do N-PJM não implica qualquer inibição ao exercício do poder de polícia judiciária por
parte dos titulares de OM, os quais continuarão a exercê-lo em toda a sua plenitude, competindo-lhes as
atribuições previstas no artigo 8º do CPPM. O emprego do N-PJM é voltado para a provisão de respaldo
técnico, principalmente pericial, ao exercício do poder de polícia judiciária.

164
Art. 8º Compete à Polícia judiciária militar:
a) apurar os crimes militares, bem como os que, por lei especial, estão sujeitos à jurisdição
militar, e sua autoria;
b) prestar aos órgãos e juízes da Justiça Militar e aos membros do Ministério Público as
informações necessárias à instrução e julgamento dos processos, bem como realizar as diligências
que por êles lhe forem requisitadas;
c) cumprir os mandados de prisão expedidos pela Justiça Militar;
d) representar a autoridades judiciárias militares acêrca da prisão preventiva e da insanidade
mental do indiciado;
e) cumprir as determinações da Justiça Militar relativas aos presos sob sua guarda e
responsabilidade, bem como as demais prescrições dêste Código, nesse sentido;
f) solicitar das autoridades civis as informações e medidas que julgar úteis à elucidação das
infrações penais, que esteja a seu cargo;
g) requisitar da polícia civil e das repartições técnicas civis as pesquisas e exames necessários
ao complemento e subsídio de inquérito policial militar;
h) atender, com observância dos regulamentos militares, a pedido de apresentação de militar
ou funcionário de repartição militar à autoridade civil competente, desde que legal e fundamentado
o pedido.

2.3.4 Atribuições do N-PJM

2.3.4.1 - Orientação Jurídica

- assessoria no exercício das atividades de PJM;


- orientação e assessoria na condução de IPM;
- orientação na elaboração de APF; e
- auxílio no atendimento de requisições judiciais.

2.3.4.2 - Investigação e Perícias

- preservação do local do crime;


- realização de perícias no local do crime;
- controle e coordenação com OM com capacidade de realização de perícias;
- controle e coordenação com órgãos externos especializados;
- emissão de laudos;
- apoio técnico eventual na condução de sindicâncias; e
- controle do cadastro de peritos.

165
2.3.4.3 - Execução Penal

- supervisão da execução penal desenvolvida pela OM responsável pelo acautelamento de presos;


- controle da situação dos criminosos militares;
- apoio na execução de mandados de busca, apreensão, escolta e prisão;
- apoio no atendimento de diligências;
- apoio na solicitação e na prestação de informações à Justiça;
- apoio nas representações para promoção de prisão; e
- apoio na apresentação de militares e servidores civis requisitadas pela Justiça.

2.3.5 - Forma de Atuação do N-PJM


O N-PJM manterá um serviço de atendimento às Autoridades de Polícia Judiciárias Militares, com
acesso direto, funcionando nas dependências do Comando de Distrito Naval, em regime de 24 horas em
dias úteis e de sobreaviso em rotinas de domingo.
Na medida em que forem qualificados militares como peritos, o N-PJM manterá uma equipe
pericial de plantão, para atuação na cena do crime, a qual deverá ser isolada tão cedo quanto possível.
O acionamento do N-PJM para apoio na lavratura de flagrante ou para levantamento de dados na
cena do crime será procedido pela própria Autoridade de Polícia Judiciária ou seu representante legal,
normalmente o Oficial de Serviço, pelo processo mais expedito, formalizado posteriormente.
A solicitação de assessoria ou orientação jurídica por parte do N-PJM poderá ser encaminhada
pelo Titular da OM ou pelo próprio Encarregado do Inquérito ou Auto de Prisão em Flagrante, utilizando-
se dos meios de comunicação disponíveis e mais rápidos ao pronto atendimento.
O N-PJM atua nas solicitações de apoio técnico para execução de perícias, as quais deverão
sempre ocorrer dentro de um processo investigatório formal pré-estabelecido.
As solicitações de perícias que possam ser atendidas pelas OM com potencialidade serão
encaminhadas a essas OM com cópia para o Comando de Distrito Naval, para acompanhamento pelo N-
PJM.
As OM situadas na área do Comando de Distrito Naval, com capacidade de realização de perícias,
indicarão formalmente ao N-PJM os militares designados como Elementos de Ligação, considerando
inclusive o acionamento fora do horário do expediente.
As solicitações de perícias que necessitem de apoio externo serão encaminhadas aos órgãos
competentes com cópia para o Comando de Distrito Naval, para acompanhamento pelo N-PJM.
O N-PJM centralizará a execução de mandados de busca, apreensão e prisão determinados pela
Justiça, com o concurso da Seção de Inteligência do Comando de Distrito Naval, para coleta e análise de
dados, de OM de Fuzileiros Navais da área, para os serviços de escolta, e de OM da área responsável pelo
recolhimento de presos.

166
Em situações eventuais, para fatos de grande complexidade ou repercussão na mídia, mediante
entendimento prévio entre as autoridades envolvidas, o ComDN poderá assumir a condução de IPM
dentro de seu respectivo território.
Compete ainda ao N-PJM prestar assessoria à Seção de Comunicação Social do Comando de
Distrito Naval na confecção de notas à imprensa, relacionadas com a ocorrência de crimes cometidos por
militares, que afetem a imagem da MB ou tenham grande repercussão externa.
Os Comandantes dos Distritos Navais, à luz do que estabelece o artigo 7º do CPPM, poderão,
dentro da sua cadeia de comando, avocar para o Comando do Distrito Naval e posteriormente delegar a
condução ao N-PJM, de autos de IPM afetos à apuração de determinados crimes, especificamente aqueles
de grande repercussão e/ou de maior complexidade, dadas as melhores condições que possui para a sua
condução, inclusive no aspecto de comunicação social.

2.3.6 - Composição do N-PJM


Cada Comando de Distrito Naval deve avaliar, objetivamente, em face da demanda de
procedimentos de polícia judiciária militar, a estrutura adequada ao funcionamento do N-PJM. A
composição sugerida é a seguinte:

- Elemento Organizacional (EOrg): um Oficial Superior, Chefe do EOrg, caso este seja um Departamento,
ou Encarregado. Caso o EOrg seja em nível de Divisão: um Oficial Superior Ajudante e cerca de três
Praças de apoio, para as tarefas administrativas necessárias (militares voltados para o atendimento
telefônico e demais atividades de secretaria);
- Primeiro Sub-EOrg: a fim de atender às necessidades de Apoio Jurídico do próprio EOrg, como também
das OM sediadas em sua área de jurisdição, no tocante ao assessoramento relativo à condução de IPM e
de APF, com um a dois Oficiais bacharéis em Direito e três Praças, preferencialmente estudantes ou
bacharéis em Direito;
- Segundo Sub-EOrg: incumbido das Investigações de Campo (perícia de local de crime e,
excepcionalmente, execução de mandados cuja complexidade recomende a sua execução por militares
especializados), recomenda-se que seja constituída de três a cinco equipes, cada uma constituída por uma
dupla de 2°/3° SG; e
- Terceiro Sub-EOrg: voltado às perícias em si, providenciando a distribuição das evidências para análise
e controlando a prontificação dos laudos, realizados por órgãos civis e militares, além de proverem o
apoio de fotografia e desenho necessários ao EOrg, de cinco a seis 2°/3° SG, recomenda-se que seja
constituída por dois desenhistas e dois fotógrafos.

Exceto o Sub-EOrg de Apoio Jurídico, preferencialmente composto por Oficiais e Praças


Bacharéis em Direito, os demais Sub-EOrg devem ser chefiados por Oficiais, auxiliados, cada um, por

167
uma Praça antiga (1° SG) com notório saber na área pericial e ter outras Praças, estas da graduação de
2°/3° SG, todas, preferencialmente, com curso superior.

2.3.7 - OM com Potencialidades para a realização de Perícias na MB


Cada Comando de Distrito Naval deverá identificar, dentro da sua área de jurisdição, as OM com
potencialidades para a realização de perícias no âmbito da MB, de modo a evitar a subordinação da MB à
necessidade da realização de perícias por outros órgãos da Administração Pública.
No Anexo A do capítulo 7 da DGPM-315 estão identificadas as OM da MB, com potencialidades
para a realização de perícias, sem prejuízo de outras que sejam identificadas pelos N-PJM.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Pausa para nossa tradicional verificação de aprendizagem. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O N-PJM manterá um serviço de atendimento às Autoridades de Polícia Judiciárias Militares, com


acesso direto, funcionando 24 horas diariamente nas dependências do Comando de Distrito Naval.

2) ( ) O N-PJM centralizará a execução de mandados de busca, apreensão e prisão determinados pela


Justiça.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) São atribuições do N-PJM, EXCETO:

(A) orientação e assessoria na condução de IPM.

(B) preservação do local do crime.

(C) ouvir testemunhas;

(D) realização de perícias no local do crime.

(E) controle da situação dos criminosos militares.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 C

168
RECADO FINAL:
Na aula de hoje falamos sobre uma atividade ainda pouco conhecida na Marinha do Brasil, que é a
atuação da Polícia Judiciária Militar, bem como dos seus núcleos espalhados por todos os Distritos
Navais. Trouxemos as atividades exercidas, as atribuições dos núcleos, descrevemos ainda sua forma de
atuação, bem como mencionamos sua composição.
Na nossa próxima aula, veremos um assunto intimamente ligado a esta noção de Polícia Judiciária
Militar que é o Inquérito Policial Militar (IPM).
Dito isto...
Até a próxima aula!

169
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Nesta aula teremos uma visão ampla sobre o Inquérito Policial Militar (IPM). Na primeira parte,
veremos as atribuições dos agentes envolvidos e os procedimentos mais corriqueiros realizados. Ao longo
deste tópico, conversaremos bastante a respeito de como acontece o fenômeno criminal na caserna, as
suas implicações e quais as providências a serem tomadas nas mais diversas situações que podem ocorrer.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar IPM;
- Citar as competências da Autoridade Nomeante;
- Citar as atribuições do Encarregado;
- Citar as atribuições do Escrivão;
- Descrever oitiva;
- Conceituar exames periciais;
- Descrever os procedimentos para realização de exames periciais; e
- Descrever o procedimento de reconhecimento de pessoas e objetos.

INTRODUÇÃO:
Agora que já debatemos bastante sobre o fenômeno crime, podemos passar ao próximo passo. Um
crime foi praticado. Ok, mas o que eu faço? Quais as medidas a serem tomadas? O que é um IPM? Para
que serve? Mas, se é crime, por que as investigações não correm a cargo de um Delegado da Polícia Civil
ou Delegado da Polícia Federal em um Inquérito Policial?
Estas e outras indagações passaremos a responder agora.

2.4 INQUÉRITO POLICIAL MILITAR


Um Inquérito Policial é um procedimento administrativo que se destina à apuração de fatos que
possam constituir um crime. O Inquérito Policial comum é conduzido por uma autoridade policial
(Delegado da Polícia Civil ou Delegado da Polícia Federal, que são os órgãos de polícia judiciária no
Brasil). Entretanto, quando falamos em crimes militares, reconhecendo as idiossincrasias da caserna, a lei
estabelecerá toda uma estrutura especial própria para atender a estas demandas. No próximo tópico
estudaremos um pouco mais a fundo a Organização Judiciária Militar da União.
Neste tópico, veremos uma das peculiaridades inerentes a estes processos. Quando falamos em
crimes militares, estes não serão averiguados através de um Inquérito Policial, mas sim por um Inquérito
Policial Militar (IPM), tampouco será conduzido por um Delegado de Polícia Civil ou Delegado da
Polícia Federal.

170
2.4.1 Conceito
O IPM é o conjunto de diligências efetuadas pela Polícia Judiciária Militar destinado a reunir os
elementos de convicção referentes à autoria e à materialidade de um crime militar, a fim de que o
Ministério Público Militar possa ter um panorama confiável da historicidade do fato criminoso ocorrido e,
a partir daí, reúna as condições de oferecer ao Juiz uma hipótese suficientemente crível de como, onde,
por que, e por quem o crime militar foi praticado.
Trata-se de uma apuração sumária de fato que seja tipificado na lei como crime militar e de sua
autoria. Tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade precípua é a de colher indícios sobre:

- a existência do infração penal;


- sua autoria; e
- o elemento subjetivo com que se conduziu o responsável.

Estes serão os elementos obtidos pelo IPM e que servirão de base para o oferecimento de
denúncia pelo Ministério Público, se for o caso. Nas palavras de Lobão (2010): "O inquérito policial
militar é a atividade investigatória da polícia judiciária militar, com a finalidade de apurar a infração
penal militar e indicar seu possível autor, realizando a primeira fase da persecutio criminis, que
prossegue com a propositura da ação penal militar pelo MP".
E aqui é importante que você saiba que no IPM não será necessário respeitar o contraditório e a
ampla defesa, pois este procedimento serve apenas à colheita das evidências acima para subsidiar a
propositura de ação penal por parte do Ministério Público Militar (MPM). Claro que, sempre quando
possível, é importante darmos a oportunidade de contraditório e ampla defesa ao indiciado, apesar de não
ser obrigatório.
Nem em todos os casos de cometimento de crime militar será necessária a abertura de um IPM.
Conforme o artigo 27 Código de Processo Penal Militar (CPPM), se, por si só, for suficiente para a
elucidação do fato e sua autoria, o auto de prisão em flagrante delito substituirá o inquérito, dispensando
outras diligências, salvo o exame de corpo de delito no crime que deixe vestígios, a identificação da coisa
e sua avaliação, quando o seu valor influir na aplicação da pena. Então, em casos de prisão em flagrante é
possível que o IPM seja substituído pelos autos de prisão em flagrante, desde que ele tenha os requisitos
supramencionados.

2.4.2 Competência da Autoridade Nomeante


Segundo o artigo 7° do CPPM, a instauração do IPM compete às autoridades no exercício da
polícia judiciária militar. Doravante chamados de Autoridades Nomeantes. Notadamente em OM
comandadas ou dirigidas por Oficiais-Generais, é possível que esta atribuição seja delegada a oficiais da
ativa, para fins especificados e por tempo limitado, obedecidas as normas regulamentares de competência,
comando e hierarquia. A delegação para instauração do IPM deverá recair em Oficial de posto superior ao

171
do indiciado, seja este Oficial da ativa, reserva, remunerada ou não, ou reformados. Segundo Lobão
(2010):

Ao tomar conhecimento da infração penal militar por meio da notitia criminis espontânea, ou
provocada, a autoridade da polícia judiciária militar, em cujo âmbito de comando ou chefia
ocorreu a infração, expedirá portaria, com observância da hierarquia militar, instaurando inquérito
ou delegará suas atribuições de polícia judiciária ao subordinado hierárquico.

O IPM sempre é iniciado com a correspondente Portaria de Instauração, preferencialmente


dentro do prazo máximo de 48 horas, após o conhecimento do fato a ser apurado. Veja bem que não se
fala a partir da ocorrência do fato, mas sim a partir do momento em que o fato chega ao conhecimento da
autoridade competente, até porque não teria como a autoridade competente mandar instaurar a abertura de
um IPM sobre algo que ele sequer sabia que havia ocorrido. Outro ponto interessante é que a norma fala
em "preferencialmente". Não há qualquer problema que o IPM seja aberto em 72 ou 96 horas após o
conhecimento do fato. Quando a norma menciona o prazo preferencial de 48 horas, o que ela quer dizer é
que quanto mais rápido o procedimento for aberto, em tese mais fácil será de se conduzir o procedimento,
uma vez que quanto maior o lapso temporal para abertura do procedimento, maior será a probabilidade de
que as provas necessárias à elucidação do caso se percam.
Nesta mesma “Portaria de Instauração”, a Autoridade Nomeante também fará a designação do
Encarregado da IPM, recaindo, sempre que possível, sobre Oficial de posto não inferior a Capitão-
Tenente, observando-se o contido no artigo 15 do CPPM. Havendo necessidade de substituição do
Encarregado, no curso das investigações, esta será feita por meio de nova Portaria da Autoridade
Nomeante, na qual deverá conter a motivação do ato.
Por questões de hierarquia e disciplina, se, durante as investigações, o Encarregado verificar a
existência de indícios contra Oficial mais antigo, emitirá um relatório parcial, apontando os fatos e
documentos que apresentam indícios de ilícito penal, bem como os envolvidos, sem realizar juízo de
valor quanto à ação do mais antigo e remeterá os autos à Autoridade Nomeante, de acordo com artigo 10,
§5° do CPPM. Neste momento podem ocorrer duas coisas:

- Caso a Autoridade Nomeante entenda NÃO proceder o alegado indício, restituirá os autos por meio de
despacho, determinando o prosseguimento do feito; ou

- Caso a Autoridade Nomeante entenda proceder o alegado indício, nomeará outro Encarregado.

Já a designação do Escrivão, também poderá ser feita pela Autoridade Nomeante na própria
“Portaria de Instauração”. Caso não seja feita, caberá ao respectivo Encarregado do IPM fazê-lo, também
por Portaria.

172
Quando o IPM se destinar à apuração de crime por parte de oficial, obrigatoriamente o Escrivão
será um Oficial Subalterno, nos demais casos a função será exercida por um suboficial ou sargento. Na
falta destes, qualquer pessoa idônea poderá desempenhá-la, sendo denominado Escrivão ad hoc.
Tanto o Escrivão designado, quanto o Escrivão ad hoc prestará o compromisso legal de manter os
autos em sigilo e de cumprir fielmente o contido nas normas, lavrando o competente “Termo de
Compromisso”.
Havendo indiciado ou não, será transmitida mensagem ao Comando do Distrito Naval em cuja
jurisdição for instaurado, à DPMM, ao CPesFN ou à DPCvM, conforme o caso. O respectivo Órgão de
Direção Setorial, o COMIMSUP, o GCM e o CIM serão endereçados de informação da citada mensagem,
que deverá conter os seguintes dados: posto, nome e NIP do encarregado, data da instauração, número e
data da portaria de instauração, posto, graduação ou categoria, especialidade, NIP e nome do indiciado
(seja oficial ou praça), se houver, e resumo do fato que deu origem ao IPM. Quando o fato envolver
atividades administrativas ou técnicas, deverá ser informada, também, à Diretoria relacionada com a
atividade afetada. Caso o IPM envolva Oficial-General como indiciado, a mensagem deverá, também, ter
como endereçados de informação o Comandante da Marinha e o Chefe do Estado-Maior da Armada
(artigo 10, § 4° do CPPM).
Outrossim, quando o IPM for instaurado para apurar extravio ou avaria de material controlado, o
órgão responsável pelo seu controle deve constar como endereçado de informação na mensagem.
Independentemente da mensagem, situações envolvendo a MB, especialmente com ocorrência de
vítimas, fatais ou não, e/ou danos materiais substanciais que por sua natureza ou magnitude, possam
interessar às demais Forças, aos órgãos de administração pública, à mídia e à própria sociedade, deverão
ser prontamente comunicadas ao comando superior, de modo que a informação chegue ao CM,
tempestivamente, evitando que o conhecimento seja através da imprensa. A informação telefônica deverá
ser sucedida de mensagem, com a precedência necessária, informando os dados mais relevantes.

2.4.3 Atribuições do Encarregado


Temos sempre que ter em mente que a principal
função do Encarregado é empregar todos os esforços e
se utilizar de todos os meios cabíveis para descobrir a
verdade dos fatos. Sua principal missão é chegar a uma
resposta acerca dos fatos narrados e que precisam ser
investigados.
Para a formação dos autos do procedimento, o
Encarregado deverá cumprir, no que couber, os
procedimentos preconizados no artigo 13 do CPPM,
quais sejam:

173
- Ouvir o ofendido;
- Ouvir o indiciado;
- Ouvir testemunhas;
- Proceder a reconhecimento de pessoas e coisas, e acareações;
- Determinar que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outros exames e perícias;
- Determinar a avaliação e identificação da coisa subtraída, desviada, destruída ou danificada, ou da qual
houve indébita apropriação;
- Proceder a buscas e apreensões;
- Tomar as medidas necessárias destinadas à proteção de testemunhas, peritos ou do ofendido, quando
coactos ou ameaçados de coação que lhes tolha a liberdade de depor, ou a independência para a realização
de perícias ou exames.

Ao longo do procedimento, o Encarregado determinará ao Escrivão as providências a serem


tomadas, por meio de “Despacho”, em continuação a documentos, ou no verso destes. Este é o documento
hábil por meio do qual o Encarregado dá as ordens ao Escrivão.
Além disso, todas as solicitações externas determinadas pelo Encarregado serão feitas por meio de
ofício, por ele mesmo assinado, incluindo-se uma eventual convocação para comparecimento de militares
ou civis. Sempre que for requisitado militar ou servidor público civil da MB, lotado em outra OM ou na
inatividade, seu comparecimento será solicitado por meio de ofício. Quando a requisição se der no âmbito
da própria OM, serão feitas por meio de Comunicação Interna (CI) do Encarregado à autoridade a que
estiver subordinado o requisitado, devendo ser juntada cópia desses documentos aos autos.
O notificado ou o
recebedor da notificação
firmará recibo na cópia,
retendo o original. O recibo
deverá conter, além da
assinatura do recebedor, o
local, a data e a hora do
recebimento, sendo firmado de
próprio punho. No caso do
notificado ser analfabeto, esta
condição deverá ser expressa
no recibo, que será então
firmado por duas testemunhas,
perfeitamente identificadas. A testemunha deverá ser cientificada, por ocasião da notificação, que poderá
comparecer acompanhada de advogado. No caso de recusa de testemunha ou ofendido em comparecer, o

174
Encarregado oficiará ao Juiz Auditor da CJM correspondente, participando o ocorrido e solicitando a sua
notificação com base no artigo 347, §2º do CPPM .
Toda intimação, notificação e convocação deverá ser comunicada aos interessados, com
antecedência mínima de 3 (três) dias.
Por fim, o Encarregado do IPM só poderá
limitar o acesso do advogado a elementos de prova
relacionados a diligências em andamento e ainda não
cumpridas, ou seja, que ainda não foram juntados aos
autos, desde que tal acesso comprometa a eficiência, a
eficácia ou a finalidade das diligências. Em razão dos
princípios do contraditório e da ampla defesa, a regra é
que tanto o indiciado, quanto o seu advogado tenham
amplo conhecimento de todos os autos e diligências
que sejam produzidas ao longo do procedimento de
investigação, de modo a não ser de qualquer forma
cerceado o direito da defesa. Qualquer limitação ao acesso do indiciado e seu advogado aos autos ou a
diligências devem ser motivadas e fundamentadas.
Assim, temos que o Encarregado do IPM, quando solicitado, permitirá ao advogado do indiciado
ou ofendido, tomar conhecimento dos autos, copiar peças e fazer apontamentos. Tal solicitação deve ser
consignada nos respectivos autos. A solicitação só será negada se ameaçar a segurança da sociedade, do
Estado ou de instalações militares, bem como acarretar divulgação de segredos militares ou se for
prejudicar o andamento das investigações. O advogado deverá juntar procuração dos autos.

2.4.4 Atribuições do Escrivão


Talvez a principal atribuição do Escrivão seja a de zelar pela organização dos autos e pelo fiel
cumprimento das determinações exaradas pelo Encarregado. Enquanto, o Encarregado se debruça nos
elementos de prova em busca de tentar
elucidar os fatos narrados dentro do prazo
que lhe foi conferido, o Escrivão é quem se
preocupa mais com os aspectos formais do
procedimento, é ele quem registra em termo
declarações, depoimentos e informações de
autores, suspeitos, vítimas, testemunhas e
demais pessoas envolvidas no procedimento;
lavra os diversos autos e expede as
respectivas comunicações pertinentes,
realiza a autuação, movimentação, remessa e

175
recebimento de documentos, processos e demais procedimentos legais; formaliza autos e termos de
apreensões, depósitos, restituições, acareações e reconhecimentos de pessoas e coisas, dentre outros
previstos na legislação processual, alusivos aos procedimentos investigatórios, utilizando-se de técnicas
de digitação; expede e subscreve notificações, intimações, ofícios, ordens de serviço, requisições e outros
atos atinentes ao desenvolvimento do procedimento; assessora o Encarregado quanto aos prazos, técnicas
e formalidades legais dos procedimentos; executa os atos dos procedimentos investigatórios, adotando
normas técnicas e jurídicas para o cumprimento das formalidades processuais; quando determinado,
acompanha o Encarregado em diligências externas; além disso ainda realiza toda a gestão documental do
procedimento. Enfim, são diversos afazeres muito importantes, os quais com certeza contribuirão para o
sucesso ou não das investigações. Na verdade, o Escrivão é quem efetivamente "põe ordem na casa".
Sempre que o Encarregado determinar a execução de alguma providência através de um
“Despacho”, o Escrivão ao receber os autos lavrará um “Termo de Recebimento”.
Então, o Escrivão dará cumprimento ao “Despacho” e, logo após, lavrará uma “Certidão”, na qual
definirá, perfeitamente, a maneira como foram cumpridas as determinações do Encarregado ou justificará
as razões que o impediram de cumpri-las.
Ao término, entregará os autos ao Encarregado, mediante a lavratura de um “Termo de
Conclusão”, devendo adotar este procedimento nas demais situações em que vier a restituir os autos ao
Encarregado. Conclusão é o termo mediante o qual o Escrivão submete o IPM ao exame e despacho do
Encarregado.

2.4.5 Oitiva
O termo oitiva significa o ato ou a faculdade de ouvir. Em Direito Processual, o termo oitiva
expressa o ato de ouvir uma testemunha ou daqueles que se encontram envolvidos no processo que está
sendo julgado.
Há 4 tipos de elementos possíveis de serem ouvidos em um IPM: ofendido; indiciado; testemunha
ou informante. Na verdade, se considerarmos que o informante é uma espécie de variação da testemunha,
teríamos apenas 3 tipos de elementos a serem ouvidos.
Interessante notar que o item 8.13 da DGPM estabelece uma ordem de preferência para a oitiva:
"O encarregado deverá, preferencialmente, ouvir o(s) ofendido(s), em seguida, a(s) testemunha(s), e, por
último, o(s) indiciado(s).".
Primeiramente, temos que notar que a norma fala em preferencialmente, ou seja, não é obrigatório.
Mas, sempre que possível, assim deve ser feito. E há um motivo para isso. Inicialmente, a norma sugere
que escutemos o ofendido, pois teríamos de pronto uma visão da vítima acerca dos fatos, daquele que teve
os seus direitos embaraçados. Posteriormente, as testemunhas trariam uma visão um pouco mais imparcial
da situação e, por último, o indiciado teria a possibilidade de contradizer todas as provas que foram
produzidas ao longo do procedimento, sendo a fiel expressão dos princípios do contraditório e da ampla
defesa.

176
Aliás, mesmo que em algum momento tenha que ser invertida a ordem das oitivas por qualquer
motivo, o indiciado tem o direito de ter a última palavra. Caso isso lhe seja negado, isto poderia trazer
prejuízos efetivos à sua defesa, podendo culminar, inclusive, na nulidade de todo o procedimento.
Desta forma, a fim de evitar eventuais transtornos administrativos, e até mesmo judiciais, sugere-
se que se siga a ordem estabelecida na norma. Se, por algum motivo, não for possível, de qualquer forma,
o indiciado deverá ter a oportunidade de apresentar a última palavra.
A oitiva das testemunhas, do ofendido e do indiciado, exceto em caso de urgência inadiável, que
constará da respectiva assentada, devem ser realizadas durante o período que medeie entre as 07:00 e
18:00 horas (artigo 19 do CPPM).
As oitivas não
deverão ser, normalmente,
realizadas por mais de
quatro horas consecutivas,
sendo facultado um
descanso de 30 minutos,
sempre que tiver de prestar
declarações além daquele
termo. O depoimento que
não ficar concluído até às
18:00 horas será encerrado, para prosseguir no dia seguinte, em hora determinada pelo Encarregado
(artigo 19, §2° do CPPM).
É prudente que a inquirição do indiciado seja acompanhada por duas testemunhas, nomeadas
pelo Encarregado, as quais assinarão o “Termo de Interrogatório”. Isso visa evitar que futuramente o
indiciado alegue que foi coagido ou que de alguma forma teve qualquer um de seus direitos cerceados.
Se, durante o curso das investigações, o encarregado verificar a existência de indícios contra
qualquer testemunha ou ofendido, que leve ao enquadramento de algum destes como indiciado, deverá
notificá-lo (Termo de Interrogatório) e interrogá-lo nesta condição.
Após o depoimento, o termo deverá ser lido e assinado pelo depoente e pelas testemunhas, caso
haja, que rubricarão, também, as folhas que não contiverem assinatura.
Poderão ser ouvidos, à semelhança das testemunhas, os menores de 14 anos, os doentes ou
deficientes mentais, os ascendentes, descendentes, sogro, sogra, genro, nora, cônjuge, separado
judicialmente/divorciado, irmão ou pessoa que tenha vínculo de adoção com o indiciado, observado o
disposto nos artigo 352, §2º e artigo 354 do CPPM, estando isentos do compromisso de dizer a verdade
e, sendo, assim, denominados informantes, sendo esta a principal diferença entre a testemunha e o
informante.
A testemunha deverá ser cientificada, por ocasião da notificação, que poderá comparecer
acompanhada de advogado. Por ocasião da oitiva, deverá ser cientificado de que não está obrigado a

177
prestar esclarecimentos acerca de fatos criminosos que tenha participado, nos termos do artigo 296, § 2°
do CPPM, além de tomar conhecimento dos artigos 343 a 346 do CPM (são as hipóteses dos crimes de
denunciação caluniosa; comunicação falsa de crime; auto-acusação falsa; e falso testemunho ou falsa
perícia). Assim vemos que em decorrência do Princípio da Não Autoincriminação, a única hipótese em
que uma testemunha poderá mentir ou omitir fatos é quando ele tiver cometido algum ilícito e o seu
depoimento puder vir a prejudicá-lo de alguma forma. Ninguém é obrigado a se autoincriminar ou a
produzir prova contra si mesmo (nem o indiciado, nem o ofendido, nem a testemunha). Nenhum
indivíduo pode ser obrigado, por qualquer autoridade, a fornecer involuntariamente qualquer tipo de
informação ou declaração ou dado ou objeto ou prova que o incrimine direta ou indiretamente.
Enfatiza-se que todos os depoentes poderão depor
acompanhados por seus advogados, mediante a apresentação da
carteira de habilitação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e
procuração, nos autos sujeitos a sigilo, podendo copiar peças, tomar
apontamentos, em meio físico ou digital, e apresentar razões e
quesitos.
O ofendido, indiciado, testemunha ou informante será qualificado(a) no início do texto do termo.
A qualificação deverá conter, conforme o caso: nome, NIP, posto ou graduação ou profissão, filiação,
data de nascimento, naturalidade, nacionalidade, estado civil, número de cartão de identidade civil e
militar e órgão expedidor, CPF, título de eleitor, residência e local de trabalho, grau de instrução,
endereço eletrônico e telefone para contato. Quando conhecido ou declarado, deverá constar, também, o
apelido. Após a qualificação, o depoente será informado do motivo da oitiva e este fato constará do
correspondente Termo.
Se o indiciado ou a testemunha se recusar a assinar o termo de depoimento, este deverá ser
firmado por duas testemunhas, para este fim convocadas pelo Encarregado, sendo este fato mencionado
no fim do depoimento e antes das assinaturas. As folhas que não contiverem assinatura serão rubricadas
pelas testemunhas.

2.4.5.1 Confissão
A confissão é o reconhecimento formal de autoria da ocorrência que está sendo apurada no IPM.
Caso o indiciado confesse a culpa, deverá ser firmado o respectivo termo. Nos casos de confissão,
teremos que observar os artigos 307 a 310 do CPPM.

Validade da confissão
Art. 307. Para que tenha valor de prova, a confissão deve:
a) ser feita perante autoridade competente;
b) ser livre, espontânea e expressa;
c) versar sôbre o fato principal;
d) ser verossímil;
e) ter compatibilidade e concordância com as demais provas do processo.

178
Silêncio do acusado
Art. 308. O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para
a formação do convencimento do juiz.
Retratabilidade e divisibilidade
Art. 309. A confissão é retratável e divisível, sem prejuízo do livre convencimento do juiz,
fundado no exame das provas em conjunto.
Confissão fora do interrogatório
Art. 310. A confissão, quando feita fora do interrogatório, será tomada por têrmo nos autos,
observado o disposto no art. 304.

Antes de tudo, temos que entender que a confissão não importa na dispensa de outras diligências,
as quais sirvam para elucidar o fato. Já houve um tempo em que a confissão era considerada a "mãe de
todas as provas" e que com a simples confissão o caso já era dado como encerrado. Entretanto, nos dias
de hoje as coisas não funcionam mais assim. Atualmente, a confissão é considerada apenas mais um
elemento de prova, o qual se somando a todo o arcabouço probatório investigado levará a autoridade
julgadora a formar sua convicção. Claro que ainda se trata de uma prova bastante robusta e com muito
peso, mas que hoje não tem por si só a capacidade de encerrar o caso. Há a necessidade de a confissão ser
confirmada pelos demais fatos apurados no procedimento.

2.4.5.2 Acareação
Sempre que houver divergência em declarações sobre fatos ou circunstâncias relevantes entre
indiciados, testemunhas,
indiciados e testemunhas, e o
ofendido ou entre ofendidos
(ou seja, entre todo mundo),
será cabível a acareação
(artigos 365 e 366 do
CPPM), sendo lavrado o
“Termo de Acareação”.
Então, a acareação se trata de
uma forma de apurar a
verdade de declarações ou
depoimentos, confrontando
duas pessoas frente a frente.
A autoridade que realizar a acareação explicará aos acusados quais os pontos em que divergem e,
em seguida, os reinquirirá, a cada um de per si e em presença do outro.

179
2.4.6 Exames Periciais
A prova pericial consiste em exame, vistoria e avaliação, as quais devem ser realizadas por
profissionais habilitados e conhecedores daquele determinado assunto em que a perícia está envolvida. O
Encarregado e o Escrivão, por mais cultos e inteligentes que sejam, não são conhecedores de todas as
técnicas disponíveis e por não terem os conhecimentos científicos ou técnicos necessários, procuram
pessoas de sua confiança que
entendam daquela matéria, a qual
eles precisam de uma resposta.
Os exames periciais deverão
ser procedidos de acordo com o
preconizado nos artigos 314 a 346
do CPPM, sendo sempre realizados
por dois peritos. Caso haja apenas
um perito especialista ou em
condições de proceder a perícia, tal
fato deve ser informado
circunstanciadamente no corpo do Termo de Compromisso.
Nas áreas em que já estiver em funcionamento o Núcleo de Polícia Judiciária Militar (N-PJM), as
solicitações de perícias necessárias deverão ser a ele encaminhadas, observando o que dispõe o capítulo 7
da DGPM-315.
Inexistindo o N-PJM na área do Comando do Distrito Naval onde é realizado o IPM, o
Encarregado deverá procurar pessoas habilitadas a realizarem a perícia.
Neste casos, os peritos serão nomeados por Portaria do Encarregado, preferencialmente, dentre
os oficiais da ativa, lotados na área e que possuam formação técnica compatível com os exames que
irão proceder, atendidas as especialidades, de acordo com os artigos 48, 49 e 318 do CPPM, devendo
prestar o compromisso de desempenhar fielmente a função, declarando com verdade a tudo que descobrir
e encontrar, mantendo o sigilo das investigações e cumprindo as determinações contidas na legislação
processual militar vigente. Ressalta-se que o encargo de perito e o de intérprete não podem ser recusados,
salvo motivo relevante que o nomeado justificará, o qual será alvo de apreciação.
Como peritos, também poderão ser designados militares pertencentes às outras Forças
Armadas, conforme entendimentos prévios entre os respectivos Comandos.
Na designação dos peritos deverão ser considerados os casos de suspeição e impedimento
previstos nos artigos 52 e 53 do CPPM, se verificáveis.

180
Impedimentos dos peritos
Art. 52. Não poderão ser peritos ou intérpretes:
a) os que estiverem sujeitos a interdição que os inabilite para o exercício de função pública;
b) os que tiverem prestado depoimento no processo ou opinado anteriormente sôbre o objeto
da perícia;
c) os que não tiverem habilitação ou idoneidade para o seu desempenho;
d) os menores de vinte e um anos.
Suspeição de peritos e intérpretes
Art. 53. É extensivo aos peritos e intérpretes, no que lhes fôr aplicável, o disposto sôbre
suspeição de juízes.

Podemos resumir dizendo que não poderão atuar como peritos aqueles que: não estejam em pleno
gozo de suas faculdades mentais; não sejam habilitados para tal; já tenham atuado de algum outro modo
no procedimento (como testemunha, por exemplo), pois já estariam com sua opinião de alguma forma
viciada; tenham algum interesse na causa.
Caso necessário, poderão, também, ser solicitados os serviços de pessoas estranhas às Forças
Armadas, mas de comprovada experiência técnica no assunto e de conhecida idoneidade moral.
Então, a pessoa que suprirá o Encarregado do IPM das noções que ele humanamente não consegue
ter controle, denomina-se perito e de seu trabalho resultará a elaboração de um Laudo de Exame
Pericial, que é o resultado do conhecimento técnico sobre aquele determinado assunto. Então, o perito
escreve o laudo, que passa a ser uma prova, sendo juntada aos demais documentos já existentes nos autos.
Os quesitos (questões que exigem respostas ou opiniões) a serem formulados aos peritos devem
ser feitos de acordo com as circunstâncias e o que se deseja esclarecer, devendo o Encarregado ter o
máximo de atenção em sua formulação.
Em regra quem formula os quesitos é o Encarregado, porém temos que lembrar que aos advogados
das partes, já com a respectiva procuração anexada aos autos, também é permitido que, dentre outras
coisas, apresentem quesitos a serem respondidos pelas perícias.
Além disso, a Autoridade Nomeante, se julgar necessário,
poderá solicitar das autoridades policiais todas as diligências e exames
que se fizerem necessários ao esclarecimento do fato. Quando existir no
local um instituto técnico de criminalística poderá, também, ser este
órgão solicitado para a realização dos exames periciais, observando-se
em todos os casos os procedimentos previstos no capítulo 7 da DGPM-
315.
Eventualmente, quando o fato ocorrer fora da jurisdição militar, será solicitada à Delegacia
Policial, pelo Encarregado, cópia da ocorrência, com os respectivos termos de depoimento das
testemunhas e de declaração dos envolvidos. Idêntico procedimento se observará quanto à solicitação de
Boletim de Socorro ao Hospital, do Exame Pericial ao Instituto de Criminalística e do Exame de Corpo de
Delito ou do Laudo de Exame Cadavérico ao Instituto Médico Legal.

181
2.4.7 Reconhecimento de Pessoas e Objetos
O reconhecimento de pessoas e objetos, ao ser efetuado pelo depoente, será firmado,
respectivamente, no “Termo de Reconhecimento de Pessoa” ou no “Termo de Reconhecimento de
Objetos”. Os artigos 368 a 370 do CPPM vão detalhar um pouco mais para gente como é realizado este
reconhecimento.

Formas de procedimento
Art. 368. Quando houver necessidade de se fazer o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á
pela seguinte forma:
a) a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva
ser reconhecida;
b) a pessoa cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras
que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se a apontá-la quem houver de fazer o
reconhecimento;
c) se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de
intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a
autoridade providenciará para que esta não seja vista por aquela.
§ 1º O disposto na alínea c só terá aplicação no curso do inquérito.
§ 2º Do ato de reconhecimento lavrar-se-á têrmo pormenorizado, subscrito pela autoridade,
pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.
Reconhecimento de coisa
Art. 369. No reconhecimento de coisa, proceder-se-á com as cautelas estabelecidas no artigo
anterior, no que fôr aplicável
Variedade de pessoas ou coisas
Art. 370. Se várias forem as pessoas chamadas a efetuar o reconhecimento de pessoa ou
coisa, cada uma o fará em separado, evitando-se qualquer comunicação entre elas. Se forem varias
as pessoas ou coisas que tiverem de ser reconhecidas, cada uma o será por sua vez.

Podemos verificar que o procedimento é bem parecido mesmo com o daqueles filmes
"hollywoodianos" que povoam o imaginário popular.

182
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma meia pausa no assunto IPM, para testar o que você já conseguiu absorver desta
primeira parte. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) No IPM são obtidos os elementos que servirão de base para o oferecimento de denúncia pelo
Ministério Público Militar.

2) ( ) Quando o IPM for instaurado para apurar extravio ou avaria de material controlado, o CCIMAR
deverá constar como endereçado de informação na mensagem de abertura.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) Sobre a designação do Encarregado de um IPM, é correto afirmar que

(A) será feita na Portaria de Autuação, onde o Encarregado também assumirá as atribuições que lhe foram
delegadas pela Autoridade Nomeante.

(B) será feita pela Autoridade Nomeante em uma Portaria própria denominada Portaria de Designação de
Encarregado.

(C) sempre que possível, recairá sobre Oficial de posto não inferior a Capitão-Tenente.

(D) a função deverá ser exercida por um Oficial Subalterno, quando houver Oficial como indiciado.

(E) na falta de um Oficial a bordo, qualquer pessoa idônea poderá desempenhar a função, sendo
denominado Encarregado ad hoc.

4) No IPM, os ascendentes, descendentes, sogro, sogra, genro, nora, cônjuge, irmão ou pessoa que tenha
vínculo de adoção com o sindicado serão ouvidos

(A) na condição de testemunhas, estando isentos do compromisso de dizer a verdade.

(B) na condição de testemunhas, tendo compromisso de dizer a verdade.

(C) na condição de informantes, estando isentos do compromisso de dizer a verdade.

(D) na condição de informantes, tendo compromisso de dizer a verdade.

(E) não poderão ser ouvidos.

183
GABARITO:

QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 C

RECADO FINAL:
Na aula de hoje aprendemos o conceito de IPM, falamos um pouco sobre algumas atribuições da
Autoridade Nomeante e como são feitas as designações do Encarregado e Escrivão, bem como também
citamos suas atribuições.
Além disso, descrevemos os procedimentos para realização de oitivas e de exames periciais.
Apesar de serem conceitos iniciais, todos eles serão muito importantes para que consigamos
avançar em nossos estudos.
Então, antes de avançarmos à próxima etapa, sugiro mais uma vez dar uma relida nos pontos
abordados nesta aula. Quaisquer dúvidas, podem sempre contar conosco para ajudar.
Dito isto...
Até a próxima aula!

184
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula começamos a ver o procedimento do Inquérito Policial Militar (IPM). Trabalhamos
o conceito, falamos um pouco sobre as atribuições da Autoridade Nomeante e como são feitas as
designações do Encarregado e Escrivão e suas atribuições. Descrevemos também os procedimentos para
realização de oitivas e de exames periciais. Na aula de hoje, iremos finalizar este assunto, tratando sobre
alguns outros procedimentos mais específicos do IPM, além do relatório, solução e remessa dos autos
para Circunscrição Judiciária Militar competente. Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever crime militar;
- Descrever crime propriamente e impropriamente militar;
- Citar as providências preliminares da detenção de indiciado;
- Descrever as buscas domiciliares;
- Descrever a apreensão e restituição dos bens;
- Descrever o Relatório;
- Descrever a Solução;
- Descrever como é realizada a remessa do IPM; e
- Citar os prazos para conclusão e prorrogação do IPM.

INTRODUÇÃO:
Já comecei a entender o que é um IPM. Ele serve para apurar o cometimento de crimes militares.
Mas, o que é mesmo um crime militar? Ouvi dizer que alguém indiciado em um IPM poderia ser preso a
qualquer momento. Como assim? Mas, vai precisar de ordem judicial? Flagrante delito? Será possível a
realização de buscas domiciliares? Apreensão de bens?
Nossa, quantas perguntas...rs
Vamos ficar tranqüilos, porque na aula de hoje falaremos sobre tudo isso e muito mais.
Partiu!?

2.4 INQUÉRITO POLICIAL MILITAR


2.4.8 Crime Militar
Existem diversos critérios possíveis para se classificar um crime como sendo militar. Podemos
definir o critério em razão da matéria, da pessoa, do lugar, do período ou da própria lei. No caso
brasileiro, o nosso ordenamento jurídico escolheu pelo critério em razão da lei. Assim, teremos que crime
militar será aquele definido como tal na lei penal militar. Simples assim. Neste sentido, entendem Neves e
Streifinger (2012):

185
Ocorre que multiplicidade de critérios definidores conduzia, inexoravelmente, à impossibilidade
de uma exata concepção, havendo momentos na história da legislação penal militar brasileira em
que um critério se sobrepunha ao outro, o que forçosamente influenciou o legislador penal de 1969
a adotar todos os critérios enumerados, sem que houvesse a prevalência clara de um deles, o que
levou à conclusão de que o critério adotado em nosso país para a configuração do crime militar foi
o critério ratione legis, ou seja, crime militar é aquele delineado como tal pela lei penal militar.

Legal, os critérios estarão na lei. Mas que critérios são esses?


Os critérios estão previstos no artigo 9° do Código Penal Militar (CPM):

Crimes militares em tempo de paz


Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
I - os crimes de que trata êste Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum,
ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial;
II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados:
a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou
assemelhado;
b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração
militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou
em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou
reformado, ou civil;
d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou
reformado, ou assemelhado, ou civil;
e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a
administração militar, ou a ordem administrativa militar;
f) revogada.
III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as
instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do
inciso II, nos seguintes casos:
a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar;
b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou
assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de
função inerente ao seu cargo;
c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação,
exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras;
d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de
natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem
pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquêle fim, ou em
obediência a determinação legal superior.
§ 1o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares
contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri.
§ 2o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das
Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no
contexto:

186
I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou
pelo Ministro de Estado da Defesa;
II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não
beligerante; ou
III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de
atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição
Federal e na forma dos seguintes diplomas legais:
a) Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica;
b) Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999;
c) Decreto-Lei no 1.002, de 21 de outubro de 1969 - Código de Processo Penal Militar; e
d) Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

Novamente, para o Direito Penal Militar brasileiro, são crimes militares aqueles enumerados
acima pela lei. Note que em várias partes o artigo supracitado se vale de conceituações ligadas aos outros
critérios para eleição dos crimes militares. Ainda assim, apesar de em alguns momentos a lei se utilizar
dos demais critérios, será crime militar aquele definido acima na lei penal militar.

2.4.8.1 Crime Propriamente Militar


Crime propriamente militar é aquele que só pode ser praticado por militares, pois consiste na
violação de deveres restritos, que lhes são próprios. Mas, como toda
boa regra tem a sua exceção, existe uma exceção a esta regra. Há um
caso em que um civil poderá cometer um crime propriamente militar.
É o crime de insubmissão, previsto no artigo 183 do CPM. Aliás,
interessante notar, que neste caso apenas um civil poderá cometer este
crime. Apenas o civil pode deixar de se apresentar para incorporação,
haja vista o militar já estar incorporado à Força.
Quando houver necessidade da detenção do indiciado militar no decorrer de um IPM para apurar o
cometimento de crime propriamente militar, com o propósito de melhor elucidar os fatos, ela
independerá de flagrante delito ou de ordem judicial, devendo o Encarregado, lavrar o competente
“Mandado de Prisão” e imediatamente providenciar:

- a comunicação da prisão às autoridades judiciária militar e do Ministério Público;


- a comunicação da prisão ao Comando do Distrito ou Comando Naval em cuja área ocorreu a detenção, à
DPMM e ao CPesFN, quando envolver militar do CFN;
- a comunicação à família do preso, ou a qualquer pessoa por ele indicada, do local onde o mesmo se
encontra detido; e
- a autorização para que seja prestada assistência pela família do preso ou por seu advogado, se este assim
o desejar.

187
A detenção será por até trinta dias, podendo ser prorrogado, por mais vinte dias, pelo
comandante do Distrito Naval, mediante solicitação fundamentada do Encarregado e por via hierárquica
(artigo 18 do CPPM).
A detenção do indiciado não subordinado à Autoridade Nomeante será solicitada pelo
Encarregado por meio de ofício, que conterá anexo, o “Mandado de Prisão” e uma cópia deste, onde será
passado o recibo, o qual será, posteriormente, juntado aos autos. Cópia desse ofício será encaminhada ao
Comando do Distrito Naval ou Comando Naval, em cuja área ocorrer a detenção, e à Autoridade
Nomeante.
A liberação do indiciado preso se fará por meio de despacho exarado pelo próprio Encarregado,
sendo imediatamente comunicada ao juízo da Circunscrição Judiciária Militar competente, com cópia à
DPMM, ao CPesFN ou à DPCvM, conforme cabível.

2.4.8.2 Crime Impropriamente Militar


Crimes impropriamente militares são os crimes comuns em sua natureza, cuja prática é possível a
qualquer cidadão, civil ou militar. Quando, no curso das investigações, surgir necessidade da prisão do
indiciado que tenha praticado crime impropriamente militar, deverá o Encarregado solicitar a decretação
da prisão preventiva, com base nos artigos 254 e 255 do CPPM, ao Juiz-Auditor da Circunscrição
Judiciária Militar competente.

Competência e requisitos para a decretação


Art 254. A prisão preventiva pode ser decretada pelo auditor ou pelo Conselho de Justiça, de
ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade encarregada
do inquérito policial-militar, em qualquer fase dêste ou do processo, concorrendo os requisitos
seguintes:
a) prova do fato delituoso;
b) indícios suficientes de autoria.
No Superior Tribunal Militar
Parágrafo único. Durante a instrução de processo originário do Superior Tribunal Militar, a
decretação compete ao relator.
Casos de decretação
Art. 255. A prisão preventiva, além dos requisitos do artigo anterior, deverá fundar-se em um
dos seguintes casos:
a) garantia da ordem pública;
b) conveniência da instrução criminal;
c) periculosidade do indiciado ou acusado;
d) segurança da aplicação da lei penal militar;
e) exigência da manutenção das normas ou princípios de hierarquia e disciplina militares,
quando ficarem ameaçados ou atingidos com a liberdade do indiciado ou acusado.

188
2.4.9 Providência Preliminar da Detenção de Indiciado
Antes do indiciado ser levado ao local onde ficará detido, ou por ocasião de sua liberação, será
submetido a exame médico, a fim de atestar sua saúde mental e integridade física, devendo o resultado
ser juntado aos autos.
Caso o indiciado se recuse à submissão do exame médico, o Encarregado deverá oficiar ao Juiz
Auditor que decidirá. Em nenhuma hipótese, poderá ser usada força física para tal finalidade, sob pena de
ser cometido ilícito penal de constrangimento ilegal. Igualmente, o Encarregado deverá fazer consignar a
recusa nos autos do IPM, com a assinatura de duas testemunhas capazes e idôneas.

2.4.10 Buscas Domiciliares


Quando para apuração dos fatos forem necessárias ações que envolvam buscas domiciliares, o
Encarregado mandará lavrar o “Termo de Informação para Busca, Apreensão e Prisão” e solicitará ordem
judicial nesse sentido ao Juiz-Auditor competente. Concedida a ordem, será procedida a diligência, de
conformidade com os artigos 179 e 180 do CPPM, observando-se o prescrito no inciso XI do art. 5° da
Constituição da República.

2.4.11 Apreensão e Restituição dos Bens


Quando, em qualquer fase do inquérito, for constatada pelo Encarregado lesão a patrimônio sob a
administração militar, ele deverá solicitar à Autoridade Judiciária, por ofício, com cópia ao GCM e
Consultoria Jurídica Adjunta junto ao Comando da Marinha (CJACM), o sequestro dos bens adquiridos
pelo indiciado com os proventos da infração penal, ainda que já tenham sido transferidos a terceiros, por
qualquer forma de alienação, ou por abandono ou renúncia, conforme artigos 199 a 201 do CPPM.
O Encarregado NÃO poderá, em hipótese alguma, alienar bens apreendidos ou deles dispor,
mesmo que seja alegado ressarcimento de prejuízos.
O Encarregado pode restituir peças apreendidas que julgar não mais interessar à apuração ou à
Ação Penal que possa ser instaurada, quando não houver dúvidas quanto ao direito do reclamante ou
quando a coisa apreendida não seja irrestituível, conforme o disposto nos artigos 190 a 198 do CPPM. A
medida deve preceder de comunicação à autoridade judiciária competente. Para efetuar restituições, o
Encarregado deverá despachar nos autos determinando a restituição. A entrega será feita perante duas
testemunhas, que assinarão o respectivo “Termo de Restituição”.
Não poderão ser restituídos, em tempo algum, os instrumentos do crime que consistam em coisas:

- cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;


- que, pertencendo às Forças Armadas, estejam em poder ou em uso do agente, ou de pessoa não
autorizada; e
- que, sendo de uso exclusivo de militares, estejam em poder ou em uso do agente, ou de pessoa não
autorizada.

189
2.4.12 Violação de Sigilo
Se, no curso das investigações, surgir necessidade de se obter informações que impliquem
violação (quebra) do sigilo bancário, fiscal ou das comunicações telefônicas (por escuta), o Encarregado
solicitará, fundamentadamente, à autoridade judiciária militar competente para que expeça ordem judicial
neste sentido.

2.4.13 Relatório
Terminado o IPM, o Encarregado emitirá um “Relatório”
constituído de duas partes: a primeira conterá uma exposição do que
ficou constatado e a segunda, a conclusão a que se chegou: se o fato
constitui transgressão disciplinar ou há indícios de ilícito penal,
pronunciando-se, neste último caso, justificadamente, sobre a
conveniência da prisão preventiva do indiciado, nos termos legais
(artigo 22 do CPPM).
No Relatório, o Encarregado deverá, se for o caso, apontar a existência de indícios de
responsabilidade administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos à Administração
Pública, nos termos previstos na Lei nº 12.846/2013 e no Decreto nº 8.420/2015, deverá submeter à
apreciação do respectivo ODS, por meio de ofício explicativo, via cadeia de Comando, para a análise
sobre a possibilidade de apuração por meio de Investigação Preliminar (IP) ou Processo Administrativo
de Responsabilização (PAR).
Os autos do IPM serão remetidos à Autoridade Nomeante por meio de ofício de remessa. Nesse
caso, o escrivão deverá lavrar o “Termo de Remessa”, a fim de que conste nos autos a expedição do IPM
para a Autoridade Nomeante.

2.4.14 Solução
A Autoridade Nomeante examinará as conclusões expostas no “Relatório”, pelo Encarregado, e
decidirá, por meio de “Solução”, a qual será exarada dentro dos prazos previstos para conclusão do IPM.
Quando a autoridade de polícia judiciária militar superior tiver delegado sua competência
instauradora a outra autoridade de polícia judiciária militar subordinada, ou quando a autoridade de
polícia judiciária militar houver delegado suas atribuições a Oficial, aquele que recebeu a delegação, ou
seja, a autoridade de polícia judiciária militar que instaurou o IPM, enviará o IPM para a autoridade
delegante, para que homologue ou não a solução apresentada, para que adote as providências necessárias
para a instauração de processo administrativo disciplinar militar, na hipótese de restarem indícios de
transgressão disciplinar, ou determine novas diligências, se as julgar necessárias. A autoridade delegante
poderá, em discordando da solução dada ao IPM pela autoridade delegada, avocá-lo para dar solução
diversa. A avocação é providência extraordinária, só se justificando quando se fizer de forma
fundamentada.

190
Quando ficar constatado que
o fato apurado constitui
contravenção disciplinar, ou que
além da conduta considerada crime
militar, foi constatada a existência
de contravenção disciplinar, a
Autoridade Nomeante fará constar
da Solução e deverá adotar as
providências necessárias para que o
militar seja levado a julgamento
pelas contravenções apuradas, ocasião em que, se for o caso, será imposta punição disciplinar. Não será
sobrestado o julgamento e muito menos o cumprimento de eventual punição disciplinar.
A autoridade de polícia judiciária militar (Autoridade Nomeante) não poderá aplicar punição
disciplinar militar com sede apenas nas provas colhidas no IPM, dado que este procedimento não
comporta contraditório, sendo necessário que a autoridade instaure, com fulcro nos elementos colhidos no
IPM, processo administrativo disciplinar, deferindo ao acusado a ampla defesa e o contraditório previsto
no artigo 5º, LV da Constituição.
Quando o infrator não estiver servindo sob as ordens da Autoridade Nomeante, serão extraídas
cópias do “Relatório” e da “Solução”, as quais serão encaminhadas à autoridade sob cujas ordens estiver
o infrator, para que sejam tomadas as medidas julgadas convenientes, e posterior comunicação à
Autoridade Nomeante.
A solução de IPM é ato privativo da autoridade que determinou a instauração “ex officio”, não se
atendo à pessoa ocupante do cargo, mas sim à autoridade que dele advém. Quando a instauração decorrer
de determinação de autoridade superior, caberá a esta homologar a “Solução” ou avocá-la, dando outra
diferente. A “Solução” dada por outrem, no impedimento, só é admitida em caso plenamente justificável,
que, nela, deverá estar explicado.
Caso a Autoridade Nomeante julgue os dados apurados insuficientes para fundamentar sua decisão
final ou considere a existência de fatos novos e conhecidos após o “Relatório”, deverá restituir os autos ao
Encarregado. Entretanto, os prazos para conclusão não serão alterados.
A autoridade que mandou instaurar o IPM, concluindo tratar-se de ato demeritório praticado por
militar, procederá ao encaminhamento de cópia dos autos para a autoridade competente, solicitando
instauração de correspondente Conselho de Disciplina ou de Justificação.
Quando a Autoridade Nomeante concluir haver indícios de responsabilidade administrativa e civil
de pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos à Administração Pública, nos termos previstos na Lei nº
12.846/2013 e no Decreto nº 8.420/2015, deverá submeter à apreciação do respectivo ODS, por meio de
ofício explicativo, via cadeia de Comando, para a análise sobre a possibilidade de apuração por meio de
Investigação Preliminar (IP) ou Processo Administrativo de Responsabilização (PAR).

191
2.4.15 Prazos para Conclusão e Prorrogação
Os prazos para realização de IPM são de 20
(vinte) dias se o indiciado estiver preso, contado
esse prazo a partir do dia em que se executar a
ordem de prisão; ou em 40 (quarenta) dias nos
demais casos, contados da data em que se instaurar
o inquérito. Este último prazo poderá ser
prorrogado por mais vinte dias pelo ComImSup,
desde que não estejam concluídos exames ou
perícias já iniciados, ou haja necessidade de
diligência, indispensáveis à elucidação do fato. O pedido de prorrogação deve ser feito em tempo
oportuno, de modo a ser atendido antes da terminação do prazo.
Não haverá mais prorrogação, salvo dificuldade insuperável, a juízo do Comandante da Marinha.
Os laudos de perícias ou exames não concluídos nessa prorrogação, bem como os documentos colhidos
depois dela, serão posteriormente remetidos ao juiz, para a juntada ao processo.
Serão deduzidas dos prazos determinados as interrupções decorrentes de quando se encontram
indícios contra oficial de posto superior ou mais antigo no curso do inquérito.

2.4.16 Remessa de IPM


Estando o IPM solucionado, a Autoridade Nomeante remeterá os autos do inquérito diretamente
ao Juiz-Auditor da Circunscrição Judiciária Militar onde ocorreu a
infração penal, acompanhados dos instrumentos desta, bem como dos
objetos que interessem à sua prova, informando, ainda, acerca das
diligências que não puderam ser concluídas.
Quando ficar constatado que o fato, conforme apurado, não
caracteriza contravenção disciplinar, nem crime, a Autoridade
Nomeante deverá encaminhá-lo à CJM correspondente, pois o
arquivamento só poderá ser feito pelo Juiz-Auditor competente (artigo
24 do CPPM).
Por ocasião do envio dos autos, cópias do “Relatório” e da “Solução” deverão ser encaminhadas
ao Comando do Distrito Naval em cuja jurisdição ocorreu o fato, à DPMM ou ao CPesFN ou à DPCvM,
conforme o caso, ao Órgão de Direção Setorial e ao CIM.
Quando o IPM for instaurado em navio, cópias do “Relatório” e “Solução” serão encaminhadas,
também, ao correspondente Comando de Força ou COMIMSUP, e ao ComemCh, quando for o caso.
Sendo apurada avaria, extravio ou dano a bens da Fazenda Nacional, desvio de numerário ou de
material cadastrado ou controlado, a relação dos bens com os respectivos valores será remetida à OM

192
responsável pelo controle do material e ao CCIMAR, sendo informadas as providências adotadas para
indenização, quando for o caso, além de anexadas cópias do “Relatório” e da “Solução” do IPM.
Quando o fato envolver ação administrativa, deverão também ser encaminhadas cópias do
“Relatório” e da “Solução” à Diretoria relacionada com a atividade afetada.
A Autoridade Nomeante não poderá determinar o arquivamento do inquérito, mesmo que esteja
evidenciada a inexistência de crime, visto que a apresentação da denúncia ou o pedido de arquivamento
do IPM são atribuições exclusivas do Ministério Público Militar, de acordo com o artigo 24 do CPPM.
Os autos do IPM, depois de recebidos na Auditoria, não podem ser devolvidos à Autoridade
Nomeante, a não: mediante requisição do Ministério Público, para diligências por ele consideradas
imprescindíveis ao oferecimento da denúncia; ou por determinação do juiz, antes da denúncia, para o
preenchimento de formalidades, ou para complemento de prova que julgue necessária.
O arquivamento dos autos não impede a instauração de novo IPM, se novas provas aparecerem em
relação ao fato, ao indiciado ou terceira pessoa, ressalvadas as hipóteses de extinção de punibilidade
(artigo 25 do CPPM).
Quando apurado comprometimento de qualquer aspecto correlato ao Plano de Segurança Orgânica
de OM isolada ou Complexo Naval, cópia da “Solução” deverá ser encaminhada ao ComOpNav onde
será analisada pela Subchefia de Inteligência Operacional, visando identificar causas de falhas, de forma
a, posteriormente, propor melhorias a serem implementadas nas orientações técnicas em vigor. Em caso
de necessidade, o ComOpNav poderá solicitar o envio do Relatório, ou partes do mesmo, para
complementar sua análise.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você aprendeu
sobre IPM. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Caso o indiciado ao ser detido se recuse à submissão do exame médico, o Encarregado deverá
tentar persuadi-lo, podendo, inclusive, utilizar-se de força física para tal finalidade.

2) ( ) Crimes impropriamente militares são aqueles que só podem ser praticados por militares, pois
consistem na violação de deveres restritos, que lhes são próprios.

3) ( ) A Autoridade Nomeante examinará as conclusões expostas no Relatório, pelo Encarregado, e


decidirá, por meio de Solução.

193
4) ( ) Quando ficar constatado que o fato, conforme apurado, não caracteriza contravenção disciplinar,
nem crime, a Autoridade Nomeante deverá arquivar os autos na OM, por 5 anos e, após esse prazo,
remetê-los à DPHDM para arquivo.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Acerca da apreensão e restituição de bens ao longo do procedimento de IPM, pode se afirmar que:

(A) o Encarregado poderá alienar bens apreendidos ou deles dispor, desde que seja para ressarcimento de
prejuízos ao erário.

(B) quando for constatada pelo Encarregado lesão a patrimônio sob a administração militar, ele deverá
proceder diretamente ao sequestro dos bens adquiridos pelo indiciado.

(C) o Encarregado não pode restituir peças apreendidas mesmo que julgar não mais interessar à apuração
ou à Ação Penal que possa ser instaurada, ainda que não haja dúvidas quanto ao direito do reclamante e a
coisa apreendida não seja irrestituível.

(D) não poderão ser restituídos os instrumentos do crime que pertencendo às Forças Armadas ou sendo de
uso exclusivo de militares, estejam em poder ou em uso do agente, ou de pessoa não autorizada.

(E) em hipótese alguma serão restituídos os objetos utilizados para cometimento do crime, mesmo que
não interessem mais ao processo.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 C
4 E
5 D

194
RECADO FINAL:
Na aula de hoje concluímos o assunto IPM. Descrevemos o crime militar, diferenciando os
propriamente e os impropriamente militares, falamos também sobre alguns procedimentos bastante
específicos do IPM e trouxemos algumas considerações sobre o Relatório do Encarregado e a Solução da
Autoridade Nomeante. Mencionamos ainda como é realizada a remessa do IPM à Circunscrição
Judiciária Militar e citamos os prazos para conclusão e prorrogação do IPM.
Na próxima aula, veremos o outro lado. Depois de enviarmos o procedimento para a Justiça, para
onde ele vai? Por onde vai tramitar?
Dito isto...
Até a próxima aula!

195
DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Finalmente chegamos ao término do nosso capítulo de Direito Penal Militar e Direito Processual
Penal Militar. Já falamos bastante sobre o que é o crime. Trouxemos também um pouco sobre o nosso
Código de Processo Penal Militar. Mencionamos o exercício das atividades de Polícia Judiciária Militar.
Também relembramos conceitos relativos ao Inquérito Policial Militar, que é um procedimento um pouco
mais próximo do nosso dia a dia na caserna. E agora para finalizar, traremos uma ideia ampla sobre a
Organização Judiciária Militar da União. Mencionaremos as competências e traremos algumas
peculiaridades desta justiça especializada, que faz parte do nosso dia a dia. Sem mais delongas, Vamos ao
trabalho!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar os órgãos do Poder Judiciário;
- Descrever o Superior Tribunal Militar (STM);
- Citar as Circunscrições Judiciárias Militares; e
- Descrever os Conselhos de Justiça Militar.

INTRODUÇÃO:
A Justiça Militar da União é a mais antiga do país, criada em 1808. Porém, passou a integrar o
Poder Judiciário apenas a partir da Constituição de 1934. Ela decorre da própria existência das Forças
Armadas. Até hoje, talvez seja uma das mais desconhecidas do público em geral. Mas, a partir de agora
isso não será mais assim, pois nesta aula traremos todo o necessário para que tenhamos um conhecimento
mínimo sobre o funcionamento desta Justiça, que é tão importante à nossa carreira militar e tanto
influencia o nosso cotidiano.
Faço um convite a você para acompanhar atentamente a esta aula e descobrir melhor como
funciona este mundo jurídico militar.
Vamos que vamos!!!

2.5 ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA MILITAR DA UNIÃO


2.5.1 Introdução
O Poder Judiciário tem como função típica a jurisdicional,
que é inerente à sua natureza. Antes de passarmos à organização
Judiciária Militar da União, precisamos ter uma visão geral do Poder
Judiciário brasileiro.
O artigo 92 da Constituição da República enumera os órgãos
do Poder Judiciário, conforme a seguir:

196
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm
sede na Capital Federal.
§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território
nacional.

Podemos organizar da seguinte forma:

Do acima exposto, já podemos tirar que a Justiça Militar se trata de uma justiça especializada, a
quem compete processar e julgar os crimes militares, tendo competência exclusivamente penal, sendo
composta pelo Superior Tribunal Militar e pelos Juízes Militares instituídos por lei.

197
A Justiça Militar, em nível federal, é constituída, em primeira instância, pelos Conselhos de
Justiça Militar e, como órgão recursal e de jurisdição superior, pelo Superior Tribunal Militar.
Ao contrário do que ocorre nas demais Justiças, na Justiça Militar da União não há julgamento por
órgão singular. Como veremos a seguir, o conselho é composto por cinco juízes: um Juiz Federal da
Justiça Militar (juiz togado, concursado) e quatro juízes militares sorteados.

2.5.2 Superior Tribunal Militar (STM)


O Superior Tribunal Militar (STM) é composto por 15 Ministros vitalícios, nomeados pelo
Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal. A composição do plenário
se dará da seguinte forma:

- 3 Oficiais-Generais da Marinha, da ativa e do posto mais elevado da carreira;


- 4 Oficiais-Generais do Exército, da ativa e do posto mais elevado da carreira;
- 3 Oficiais-Generais da Aeronáutica, da ativa e do posto mais elevado da carreira; e
- 5 Civis, dos quais:
- 3 advogados de notório saber jurídico e conduta
ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade
profissional;
- 1 juiz federal de carreira da Justiça Militar; e
- 1 membro do Ministério Público Militar.

Foi apenas na Constituição de 1946 que se consagrou o nome atual: Superior Tribunal Militar
(STM).
O STM atua apenas na esfera federal, não possuindo jurisdição sobre feitos das Justiças Militares
Estaduais, funcionando apenas como um tribunal recursal das primeiras instâncias. Perceba pelo gráfico
acima que não existe qualquer órgão intermediário entre as primeiras instâncias e o STM.

2.5.3 Circunscrições Judiciárias Militares


Em tempos de paz, a lei divide o território nacional para efeito de administração da Justiça Militar
em doze Circunscrições Judiciárias Militares (artigo 2° da Lei 8.457/92):

1ª - Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo;


2ª - Estado de São Paulo;
3ª - Estado do Rio Grande do Sul;
4ª - Estado de Minas Gerais;
5ª - Estados do Paraná e Santa Catarina;
6ª - Estados da Bahia e Sergipe;

198
7ª - Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas;
8ª - Estados do Pará, Amapá e Maranhão;
9ª - Estados do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso;
10ª - Estados do Ceará e Piauí;
11ª - Distrito Federal e Estados de Goiás e Tocantins;
12ª - Estados do Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia.

2.5.4 Conselhos de Justiça Militar


Nas Circunscrições Judiciárias Militares existem as Auditorias, que são os órgãos de primeira
instância com competência para julgar os processo penais militares oriundos da Marinha, do Exército e da
Aeronáutica.
Nestas Auditorias, os julgamentos em primeira instância são realizados pelos Conselhos de Justiça
Militar, composto por 1 juiz de carreira e 4 juízes militares leigos, tendo todos direito a um voto com o
mesmo peso, sendo as decisões tomadas pela maioria dos votos.
Lenza (2015) nos explica que: "Essa composição plúrima por juiz togado e juízes leigos
(militares) se justifica em razão da necessidade de se harmonizarem os conhecimentos técnicos com a
experiência da caserna, tendo como pano de fundo a ideia de hierarquia e disciplina, base da
organização militar".
Para efeito de composição dos Conselhos, nas respectivas Circunscrições, os comandantes dos
Distritos Navais organizarão, trimestralmente, a relação de todos os oficiais em serviço ativo, com os
respectivos postos, antiguidade e local de serviço, remetendo-a ao Juiz Federal da Justiça Militar
competente para que, então, se proceda ao sorteio, nos termos dos artigos 19 a 22 da Lei nº 8.457/92.
Nas Auditorias, existem 2 espécies de Conselhos: o Especial e o Permanente.
O Conselho Especial de Justiça é constituído pelo juiz federal da Justiça Militar, que o presidirá,
e por 4 juízes militares, dentre os quais 1 oficial-general ou oficial superior. Todos os juízes-militares
devem ser mais antigos que o acusado. Possui competência para processar e julgar oficiais, exceto
oficiais-generais, cuja competência originária é do STM (artigo 6º, I, alínea a da Lei nº 8.457/92), nos
crimes militares.
Este Conselho Especial (artigo 23 da Lei nº 8.457/92) é constituído para cada processo e
dissolvido após a conclusão dos seus trabalhos, reunindo-se, novamente, se sobrevier nulidade do
processo ou do julgamento, ou diligência determinada pela instância superior, sendo que os juízes
militares que o integrarem serão de posto superior ao do acusado, ou do mesmo posto e de maior
antiguidade.
Apesar de haver alguma discussão a respeito, é importante que você saiba que o entendimento
majoritário atual é o de que a existência do Conselho Especial de Justiça não ofende o princípio do juiz
natural.

199
Já o Conselho Permanente de Justiça é constituído pelo juiz federal da Justiça Militar, que o
presidirá, e por 4 juízes militares, dentre os quais pelo menos 1 oficial superior. Ele tem competência para
processar e julgar as praças nos delitos previstos na legislação penal militar.
O Conselho Permanente (artigo 24 da Lei nº 8.457/92), uma vez constituído, embora o nome
"permanente", funcionará durante três meses consecutivos, coincidindo com os trimestres do ano civil,
podendo o prazo de sua jurisdição ser prorrogado nos casos previstos em lei. O oficial que tiver integrado
o Conselho Permanente não será sorteado para o para o trimestre imediato, salvo se para sua constituição
houver insuficiência de oficiais.
Para ajudar a entender as diferenças entre um e outro Conselho, observe o quadro abaixo:

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Última pausa deste capítulo. Vamos revisar o que foi aprendido nesta aula sobre a Organização
Judiciária Militar da União. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Superior Tribunal Militar é composto por 15 Ministros vitalícios.

2) ( ) O Conselho Especial de Justiça é constituído para cada processo e dissolvido após a conclusão dos
trabalhos.

200
3) ( ) Atualmente a Justiça Militar divide o território nacional em dez Circunscrições Judiciárias
Militares.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Sobre o Conselho Especial de Justiça, pode-se afirmar que:

(A) será composto por 5 juízes militares leigos, sendo obrigatoriamente todos mais antigos que o acusado.

(B) é inconstitucional, pois sua previsão ofende o princípio do juiz natural.

(C) tem competência para processar e julgar os oficiais-generais das Forças Armadas.

(D) é constituído para cada processo e dissolvido após a conclusão dos trabalhos.

(E) é constituído a cada três meses, coincidindo com os trimestres do calendário civil.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 E
4 D

RECADO FINAL:
Ufa! Sobrevivemos a mais um assunto.
Terminamos nesta aula o assunto que tínhamos a tratar sobre Direito Penal Militar e Direito
Processual Penal Militar, temas bastantes densos, mas muito prazerosos de se estudar. Claro, que não
temos a pretensão de em tão pouco tempo esgotar estas temáticas, mas sim trazer os principais pontos que
podem ser úteis ao desenrolar de nossas carreiras. E, quem sabe, colocar aquela pontinha de curiosidade e
estímulo para que você continue buscando mais conhecimentos nesta área.
Na próxima aula já começaremos a tratar de outra temática, que é o Direito Administrativo
Disciplinar Militar, disciplina que também será muito afeta ao nosso ramo de atividade. Apresentaremos
alguns conceitos bastante específicos aqui da caserna.
Vale aquilo que sempre viemos falando. Não deixe a matéria acumular. Antes de começar o
próximo capítulo, tente tirar um tempinho para uma revisão, verificar os pontos que não foram tão bem
compreendidos, refazer os exercícios. Com certeza, estes passo serão muito importante para o seu
aprendizado e para o seu sucesso no curso.
Dito isto...
Até a próxima aula!

201
REFERÊNCIAS:
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral, 1. 17 ed. - São Paulo: Editora
Saraiva, 2012.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal: Centro Gráfico, 1988.
________. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar. Brasília, DF.
________. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF.
________. Decreto-Lei nº 3.914, de 09 de dezembro de 1941. Lei de Introdução do Código Penal
Brasileiro. Brasília, DF.
________. Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro. Brasília, DF.
________. Lei nº 8.457, de 4 de setembro de 1992. Organiza a Justiça Militar da União e regula o
funcionamento de seus Serviços Auxiliares. Brasília, DF.
________. Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Lei de Tóxicos. Brasília, DF.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. Editora Saraiva, 2015.
LOBÃO, Célio. Direito processual penal militar. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
MARINHA DO BRASIL. Diretoria de Ensino da Marinha. DGPM-315. Normas sobre justiça e
disciplina.
NEVES, Cícero Robson Coimbra; STREIFINGER, Marcello. Manual de direito penal militar. São
Paulo: Editora Saraiva, 2012.

202
T - II/2023
DIREITO ADMINISTRATIVO
UNIDADE 3 AULA 1...........................................................................................................................................206
3.1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO..........................................................................................207
3.1.1 Histórico...................................................................................................................................................... 207
3.1.2 Conceito...................................................................................................................................................... 207
3.1.3 Princípios Básicos da Administração Pública........................................................................................208
3.1.3.1 Legalidade - "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" 208
3.1.3.2 Impessoalidade........................................................................................................................................ 209
3.1.3.3 Moralidade............................................................................................................................................... 209
3.1.3.4 Publicidade............................................................................................................................................... 211
3.1.3.5 Eficiência.................................................................................................................................................. 213
UNIDADE 3 AULA 2...........................................................................................................................................216
3.1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO..........................................................................................216
3.1.4 Poder de Polícia - uma restrição, limitação dos direitos individuais, notadamente da liberdade e
propriedade em virtude do interesse coletivo................................................................................................216
3.1.4.1 Conceito................................................................................................................................................... 217
Poder de polícia – definição............................................................................................................................217
3.1.4.2 Características.......................................................................................................................................... 218
Discricionariedade e a Vinculação..................................................................................................................218
Autoexecutoriedade: o ato de polícia pode ser imediatamente executado...................................................219
Coercibilidade........................................................................................................................................................ 219
3.1.4.3 Atuação.................................................................................................................................................... 220
3.1.4.4 Ciclo de Polícia - ordens de polícia ou legislação, consentimento de polícia, fiscalização e Sanções. .221
3.1.4.5 Limites...................................................................................................................................................... 224
3.1.4.6 Polícia Administrativa X Polícia Judiciária.........................................................................................224
UNIDADE 3 AULA 3...........................................................................................................................................229
3.2 DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.................................................................................................230
3.2.1 Conceito...................................................................................................................................................... 230
3.2.2 Ilícito Administrativo Disciplinar - O ilícito administrativo disciplinar é toda conduta do servidor que,
no âmbito de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las, contraria dispositivo
estatutário............................................................................................................................................................. 230
São três os requisitos cumulativos para que sobreviesse o erro administrativo escusável............................231
3.2.3 Princípios - Princípio do Devido Processo Legal, Princípio da Ampla Defesa e Princípio do
Contraditório......................................................................................................................................................... 231
3.2.4 Direito Administrativo Disciplinar e o Direito Penal.............................................................................233
3.2.5 Direito Administrativo Disciplinar Militar.............................................................................................234
UNIDADE 3 AULA 4...........................................................................................................................................237
3.3 ESTATUTO DOS MILITARES.........................................................................................................................237
3.3.1 Conceito...................................................................................................................................................... 237
Na ativa...........................................................................................................................................................239
Na inatividade.................................................................................................................................................239
3.3.2 Obrigações Militares.............................................................................................................................239
3.3.2.1 Valor Militar.......................................................................................................................................239
Art. 27. São manifestações essenciais do valor militar...................................................................................240
3.3.2.2 Ética Militar........................................................................................................................................240
3.3.3 Deveres Militares - as atividades, atos e circunstâncias que envolvem uma determinada obrigação
legal, moral ou ética......................................................................................................................................242
os deveres militares........................................................................................................................................242
3.3.4 Direitos........................................................................................................................................................ 243
3.3.5 Prerrogativas............................................................................................................................................... 246
Prerrogativas dos Militares.............................................................................................................................247
UNIDADE 3 AULA 5...........................................................................................................................................250
3.4 REGULAMENTO DISCIPLINAR PARA A MARINHA (RDM).........................................................................250
3.4.1 Conceito...................................................................................................................................................... .250
3.4.2 Contravenções Disciplinares - toda ação ou omissão contrária às obrigações ou aos deveres militares
estatuídos nas leis, nos regulamentos, nas normas e nas disposições em vigor............................................251
situações agravantes da contravenção disciplinar..........................................................................................252
situações atenuantes da contravenção disciplinar..........................................................................................253
consideradas justificativas ou dirimentes da contravenção disciplinar.........................................................253
3.4.3 Penas Disciplinares................................................................................................................................253
As penas disciplinares são as seguintes..........................................................................................................253
para Suboficiais...............................................................................................................................................253
3.4.3.1 Competência............................................................................................................................................ 254
3.4.3.2 Cumprimento........................................................................................................................................... 255
3.4.3.3 Imposição................................................................................................................................................. 256
3.4.4 Recursos...................................................................................................................................................... 256
UNIDADE 3 AULA 6...........................................................................................................................................259
3.5 CONSELHO DE DISCIPLINA........................................................................................................................260
3.5.1 - Autoridades Nomeantes.....................................................................................................................260
3.5.2 Conceito...................................................................................................................................................... 260
3.5.3 Submissão a Conselho...........................................................................................................................260
Procedido incorretamente no desempenho de cargo.....................................................................................261
Tido conduta irregular....................................................................................................................................261
Praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe.....................................261
Considera-se meio lícito de comunicação social.............................................................................................261
3.5.4 Direitos do Acusado..............................................................................................................................262
3.5.5 Composição do Conselho de Disciplina................................................................................................262
Não podem fazer parte do Conselho..............................................................................................................262
3.5.6 Portaria de Afastamento das Funções..................................................................................................263
3.5.7 Prazos.......................................................................................................................................................... 263
Vejamos os demais prazos envolvidos no Conselho de Disciplina: tabela......................................................263
3.5.8 Libelo Acusatório...................................................................................................................................264
3.5.9 Inspeção de Saúde.................................................................................................................................265
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR..........................................................................................267
UNIDADE 3 AULA 7...........................................................................................................................................267
INTRODUÇÃO....................................................................................................................................................... 267
3.5 CONSELHO DE DISCIPLINA........................................................................................................................268
3.5.10 – Início dos Trabalhos..........................................................................................................................268
3.5.10.1 – Convocação...................................................................................................................................268
3.5.10.2 - Compromisso.................................................................................................................................268
3.5.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos.............................................................................................269
3.5.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes.................................................................................269
3.5.10.5 - Apresentação das Testemunhas.....................................................................................................269
3.5.11 Oitiva......................................................................................................................................................... 269
3.5.12 Defesa por Escrito................................................................................................................................270
3.5.13 Exame dos Autos.................................................................................................................................271
3.5.14 Acusado Inativo...................................................................................................................................271
3.5.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento.......................................................................271
3.5.16 Deserção do Acusado..........................................................................................................................273
3.5.17 Conduta Inconveniente do Acusado...................................................................................................273
3.5.18 Substituições............................................................................................................................................. 273
3.5.19 Relatório.................................................................................................................................................... 274
3.5.20 Solução...................................................................................................................................................... 274
3.5.21 Remessa.................................................................................................................................................... 275
3.5.22 Decisão e Recursos..............................................................................................................................275
Resumo de Poder Administrativo....................................................................................................................
UNIDADE 3 AULA 8...........................................................................................................................................279
3.6 CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO...................................................................................................................280
3.6.1 Autoridades Nomeantes.......................................................................................................................280
3.6.2 Conceito...................................................................................................................................................... 280
3.6.3 Submissão a Conselho...........................................................................................................................280
Procedido incorretamente no desempenho de cargo.....................................................................................281
conduta irregular............................................................................................................................................281
Praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe.....................................281
3.6.4 Direitos do Justificante..........................................................................................................................282
3.6.5 Composição do Conselho de Justificação.............................................................................................283
3.6.6 Portaria de Afastamento das Funções..................................................................................................283
3.6.7 Prazos.......................................................................................................................................................... 284
3.6.8 Libelo Acusatório...................................................................................................................................285
3.6.9 Inspeção de Saúde.................................................................................................................................285
UNIDADE 3 AULA 9...........................................................................................................................................288
3.6 CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO...................................................................................................................289
3.6.10 Início dos Trabalhos.............................................................................................................................289
3.6.10.1 – Convocação...................................................................................................................................289
3.6.10.2 - Compromisso.................................................................................................................................289
3.6.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos.............................................................................................290
3.6.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes.................................................................................290
3.6.10.5 - Apresentação das Testemunhas.....................................................................................................290
3.6.11 Oitiva......................................................................................................................................................... 290
3.6.12 Defesa por Escrito................................................................................................................................291
3.6.13 Exame dos Autos.................................................................................................................................292
3.6.14 Justificante Inativo..............................................................................................................................292
3.6.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento.......................................................................292
3.6.16 Deserção do Justificante......................................................................................................................294
3.6.17 Conduta Inconveniente do Justificante...............................................................................................294
3.6.18 Substituições............................................................................................................................................. 294
3.6.19 Relatório e Remessa............................................................................................................................295
3.6.20 Decisão...................................................................................................................................................... 296
UNIDADE 3 AULA 10.........................................................................................................................................298
3.7 AUDIÊNCIA DO COMANDANTE................................................................................................................299
3.7.1 Contravenção Disciplinar......................................................................................................................299
3.7.2 Competência............................................................................................................................................... 299
3.7.3 Princípios Aplicáveis..............................................................................................................................300
3.7.3.1 Devido Processo Legal........................................................................................................................300
3.7.3.2 Discricionariedade................................................................................................................................... 301
3.7.3.3 Razoabilidade e Proporcionalidade - princípio dos princípios. são considerados dois dos princípios
mais importantes no Direito……………………………………………………………………………………………………………………..302
Adequação: se a medida é idônea, apta a determinado fim..........................................................................303
Necessidade: ligada à "proibição do excesso". Se existem duas medidas possíveis a escolhida deve ser a
mais suave, a mais branda……………………………………………………………………………………………………………………….303
Proporcionalidade em sentido estrito: aqui devemos ponderar a solução que apresente um bônus maior
que o ônus. Vamos ter que ponderar entre os prejuízos e os beneffcios em se adotar ou não uma
medida……………………………………………………………………………………………………………………………………………………………..303
3.7.3.4 Motivação................................................................................................................................................ 303
deverão ser motivados....................................................................................................................................304
3.7.3.5 Contraditório e Ampla Defesa............................................................................................................304
3.7.4 A Audiência...........................................................................................................................................305
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)
UNIDADE 4 AULA 1...........................................................................................................................................313
4.1 CONVERGÊNCIA ENTRE O DIDH E O DIH..................................................................................................314
4.1.1 Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH)............................................................................314
não autoriza a suspensão dos direitos determinados seguintes artigos.........................................................315
Requisitos para a declaração do estado de emergência três critérios............................................................316
4.1.2 Direito Internacional Humanitário (DIH) - tem a finalidade de reger as normas referentes condução das
hostilidades e as normas de proteção e distinção entre combatentes e civis em casos de conflito
armado................................................................................................................................................................. 317
4.1.3 A interação entre o DIDH e o DIH.........................................................................................................319
UNIDADE 4 AULA2............................................................................................................................................323
4.1.4 Aplicação do DIDH e DIH no Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos Como avaliar
a integração do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e do Direito Internacional Humanitário
(DIH) no momento da aplicação e efetivação de seus postulados?................................................................323
Artigo 29. Normas de interpretação...............................................................................................................324
4.1.5 Desafios da interação do DIDH e do DIH..............................................................................................326
4.1.5.1 Alguns problemas da aplicação dos Direitos Humanos em conflitos armados................................326
4.1.5.2 A interrelação entre o DIDH o DIH - o respeito à integridade física e moral da pessoa....................327
Resumos de Método de Interpretação e Princípios de Interpretação da Constituição...................................328
UNIDADE 4 AULA 3...........................................................................................................................................331
4.2 DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)................................................................331
4.2.1 Conceito...................................................................................................................................................... 331
Direito Internacional Humanitário..................................................................................................................331
funções do DICA..............................................................................................................................................332
4.2.2 A evolução histórica do DICA................................................................................................................332
4.2.3 Regras fundamentais do DICA...............................................................................................................336
Estas regras fundamentais do DICA podem ser resumidas nas seguintes......................................................337
4.2.4 Princípios fundamentais do DICA - limitar, na medida do possível, as calamidades da guerra, por meio
da conciliação das necessidades militares, determinadas pela situação tática e o cumprimento da missão, de
acordo com as exigências impostas pelos princípios de caráter humanitário, conforme exposto a
seguir……………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………….338
princípios de caráter humanitário – Distinção, Limitação, Proporcionalidade, Necessidade militar,
Humanidade......................................................................................................................................................... 338
Distinção: distinguir os combatentes e não combatentes...............................................................................338
UNIDADE 4 AULA 4...........................................................................................................................................342
Descrição cronológica dos tratados................................................................................................................343
4.3.1 Direito de Genebra................................................................................................................................343
Conheceremos agora as principais características das quatro convenções....................................................344
A I Convenção de Genebra protege os soldados feridos e enfermos durante a guerra terrestre...................344
A II Convenção de Genebra protege os militares feridos, enfermos e náufragos durante a guerra
marítima............................................................................................................................................................... 344
III Convenção de Genebra aplica-se especificamente aos prisioneiros de guerra...........................................344
A IV Convenção de Genebra estabelece a proteção aos civis, inclusive em território ocupado.....................344
4.3.2 Artigo 3° Comum...................................................................................................................................345
“miniconvenção” dentro das quatro Convenções de Genebra e as suas principais disposições....................345
4.3.3 Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra...............................................................................346
O 1º Protocolo - conflitos armados internacionais (incluindo guerras de libertação nacional)......................346
O 2º Protocolo - conflitos armados não internacionais de certa magnitude..................................................346
O 1º Protocolo - proíbe arma cujo efeito primário seja ferir com fragmentos que não possam ser
detectados no corpo humano com raio x………................................................................................................. 347
O 2º Protocolo - proíbe o emprego de minas, armadilhas e outros artiffcios contra a população
civil....................................................................................................................................................................... 347
O 3º Protocolo - estringe o emprego de armas incendiárias..........................................................................347
O 4º Protocolo - sobre Armas de Laser “Cegantes”, proíbe o emprego e transferência.................................348
4.3.4 Direito de Haia - é de interesse fundamental ao comandante militar em terra, mar e ar.....................348
terceiro tipo de direito, o chamado Direito Misto - contém disposições que tratam tanto da proteção das
vítimas de guerra quanto de conceitos operacionais.....................................................................................348
três categorias................................................................................................................................................348
4.3.5 Direito de Nova York ou Direito Misto - o conjunto de normas originadas no âmbito da Organização
das Nações Unidas (ONU)...............................................................................................................................348
Resumo de Direito Internacional Público (DIP)...............................................................................................
Resumo dos Direitos de Tratados Internacionais (Genebra, Haia, Nova York)................................................
Resumo dos Tribunais Penais Internacionais..................................................................................................
Resumos dos caminhos para Tratados Internacionais Humanitários..............................................................
UNIDADE 4 AULA 5...........................................................................................................................................351
4.4 PROTEÇÃO DO DICA.................................................................................................................................351
4.4.1 Civis - qualquer pessoa que não pertença a uma das categorias de pessoas a que se refere o Artigo 4
letra A, alíneas 1, 2, 3 e 6, da Terceira Convenção e Artigo 43 do presente Protocolo...................................351
Artigo 4.º - São prisioneiros de guerra............................................................................................................352
Estatuto do combatente e do prisioneiro de guerra.......................................................................................353
Artigo 43.º......................................................................................................................................................353
Forças armadas...............................................................................................................................................353
4.4.2 Conduta com prisioneiro de guerra, feridos, enfermos e náufragos...................................................354
4.4.2.1 Prisioneiros de guerra........................................................................................................................355
Proibição da perffdia - os atos que apelem, com intenção de enganar, à boa fé de um adversário para lhe
fazer crer que tem o direito de receber ou a obrigação de assegurar a proteção prevista pelas regras do
direito internacional aplicável nos conflitos armados....................................................................................356
São exemplos de perffdia os atos seguintes...................................................................................................356
são exemplos de astúcias de guerra: uso de camuflagem, engodos, operações simuladas e falsas
informações........................................................................................................................................................... 357
Proteção geral aos prisioneiros de guerra.......................................................................................................357
4.4.2.2 Enfermos detidos - pessoas, sejam militares ou civis, que devido a um traumatismo, ou uma
enfermidade e outros distúrbios ou incapacidades de ordem ffsica ou mental tenham necessidade de
assistência ou cuidados médicos, e que se abstenham de todo ato de hostilidade.......................................358
4.4.2.3 Náufragos - pessoas, sejam militares ou civis, que se encontrem em situação de perigo no mar ou em
outras águas em consequência de um infortúnio que as afete ou que afete a nave ou aeronave que as
transportava.......................................................................................................................................................... 358
artigo 18 da II Convenção de Genebra............................................................................................................359
4.4.3 Conduta com Pessoal de Saúde e Capelães..........................................................................................359
4.4.4 Espiões e Mercenários..........................................................................................................................361
UNIDADE 4 AULA 6...........................................................................................................................................364
4.4 PROTEÇÃO DO DICA.................................................................................................................................364
4.4.5 Procedimentos com unidades sanitárias e meios de transporte sanitário..........................................364
Dos navios-hospitais - devem figurar na notificação compreenderão a tonelagem bruta registrada, o
comprimento da popa à proa e o número de mastros e de chaminés...........................................................366
4.4.6 Pessoal sanitário e religioso..................................................................................................................367
4.4.7 Bens Culturais - são bens móveis ou imóveis que têm grande importância para o patrimônio cultural
dos povos, qualquer que seja a sua origem ou o seu detentor......................................................................368
52º do I Protocolo às Convenções de Genebra: proteção geral dos bens de caráter civil...............................368
O quadro resumo a seguir facilita o estudo e a pesquisa do tema.................................................................369
4.4.8 Localidades e Zonas sob Proteção Especial..........................................................................................399
4.4.9 Principais símbolos e distintivos...........................................................................................................370
UNIDADE 4 AULA 7...........................................................................................................................................373
4.5 CONFLITO ARMADO INTERNACIONAL (CAI)............................................................................................373
4.5.1 Natureza do conflito..............................................................................................................................375
são três as situações em que deve ser aplicado o regime jurídico de Conflito Armado
Internacional........................................................................................................................................................ 375
4.5.2 Os sujeitos ativos e passivos.................................................................................................................375
Potência protetora é aquele Estado neutro no conflito, responsável pela salvaguarda dos interesses das
partes beligerantes no país inimigo e, em particular, de velar pela aplicação das
Convenções.......................................................................................................................................................... 376
4.5.3 Aplicação em razão do tempo...............................................................................................................377
4.5.4 Aplicação em razão do lugar.................................................................................................................377
4.5.5 Estados Neutros - O principal direito do Estado neutro é o da inviolabilidade; seus principais deveres
são a abstenção e a imparcialidade................................................................................................................378
UNIDADE 4 AULA 8...........................................................................................................................................382
4.8 CONFLITO ARMADO NÃO INTERNACIONAL (CANI).................................................................................382
Protocolo Adicional II contém, em particular..................................................................................................383
4.6.1 Natureza do conflito -é regulamentado expressamente pelo Artigo 3º comum às Convenções de
Genebra e pelo Protocolo Adicional II,............................................................................................................385
características de conflito armado não internacional.....................................................................................386
4.6.2 Os sujeitos ativos e passivos.................................................................................................................386
4.6.3 Aplicação em razão do tempo...............................................................................................................388
4.6.4 Aplicação em razão do lugar.................................................................................................................388
UNIDADE 4 AULA 9...........................................................................................................................................391
4.7 GUERRA NO MAR.....................................................................................................................................391
São consideradas Zonas de Guerra Naval........................................................................................................391
4.7.1 Passagem Inocente - com o propósito de: sem penetrar nas águas interiores, dirigir-se para as águas
interiores, ou delas sair, ou fazer escala..........................................................................................................392
4.7.2 Imunidades – navios-hospital; de salvamento; salvo-conduto; transporte de prisioneiros de guerra;
missões humanitárias; transporte de bens culturais; navios de passageiros somente civis; missões religiosas,
filantrópicas ou cientificas; pequenos barcos pesqueiros; hajam se rendido e balsas e botes salva-
vidas…………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………….392
4.7.3 Bloqueio e Zonas de Exclusão – Bloqueio é uma operação beligerante que tem por finalidade evitar
que navios e aeronaves de todos os Estados, inimigos e neutros, entrem ou saiam de específicos portos,
aeroportos e áreas costeiras pertencentes, ocupadas, ou sob controle de um Estado inimigo.
para limitar a interferência com o comércio neutro.......................................................................................393
Será estabelecido seguindo os critérios abaixo relacionados.........................................................................393
Zonas de Exclusão são áreas marítimas notificadas internacionalmente pelas partes beligerantes com o
objetivo de conter a área geográfica do conflito, ou para manter o tráfego mercante neutro a uma distância
segura das áreas de hostilidades, efetivas ou potenciais................................................................................394
4.8 GUERRA NO AR.........................................................................................................................................394
UNIDADE 4 AULA 10.........................................................................................................................................399
4.9 ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS..........................................................................................................399
4.9.1 Tribunal Penal Internacional (TPI).........................................................................................................399
A doutrina contemporânea reconhece que o julgamento pelas práticas de crimes de guerra e as
consequentes sanções devem se realizar após o término do conflito, e de preferência por um
tribunal neutro.................................................................................................................................................... 399
O Estatuto do TPI prevê o julgamento de pessoas envolvidas em crimes: de genocídio;...............................400
Crime de genocídio é qualquer ato cometido com a intenção de destruir, no todo ou em parte, uma nação,
etnia, raça ou grupo religioso, tais como........................................................................................................400
São considerados crimes contra a humanidade os atentados contra bens jurídicos individuais fundamentais,
tais como a vida, a integridade ffsica, a saúde e a liberdade, cometidos tanto em tempo de paz como de
guerra, como parte de um ataque generalizado ou sistemático, realizado com a participação ou tolerância do
poder político.................................................................................................................................................401
são crimes contra a humanidade....................................................................................................................401
São consideradas crimes de guerra as ações e/ou omissões proibidas pelas normas do DICA, segundo os
correspondentes acordos internacionais e os princípios e regras reconhecidos pelos respectivos Estados-
Partes.................................................................................................................................................................... 401
São leis e costumes da guerra que não podem ser violados (TPI)..................................................................401
4.9.2 Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV)....................................................................................402
4.9.2.1 História..................................................................................................................................................... 402
Por fim, estamos face a uma situação de perffdia (ou de abuso grave) quando se utiliza o emblema em
tempo de conflito armado para proteger combatentes armados ou material de guerra. Este abuso grave
constitui, de acordo com as Convenções de Genebra, um crime
de guerra............................................................................................................................................................. 404
4.9.2.2 Funções.................................................................................................................................................... 404
As funções do CICV são as seguintes..............................................................................................................404
4.9.2.3 Princípios Fundamentais – Humanidade, Imparcialidade, Neutralidade, Independência, Voluntariado,
Unidade, Universalidade.................................................................................................................................405
4.9.2.4 Órgãos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.........................406
As Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho..........................................................406
A Federação das Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho tem as seguintes
funções................................................................................................................................................................. 406
A Conferência Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.....................................................407
O Conselho dos Delegados do Movimento.....................................................................................................407
A Comissão Permanente da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho...........................................................407
Resumo de análise de Conflitos Armados.......................................................................................................
TEMA: DIREITO
3.0 DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR
3.1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO
3.1.1 Histórico.
3.1.2 Conceito.
3.1.3 Princípios Básicos da Administração Pública.
3.1.3.1 Legalidade.
3.1.3.2 Impessoalidade.
3.1.3.3 Moralidade.
3.1.3.4 Publicidade.
3.1.3.5 Eficiência.
3.1.4 Poder de Polícia.
3.1.4.1 Conceito
3.1.4.2 Características
3.1.4.3 Atuação
3.1.4.4 Ciclo de Polícia
3.1.4.5 Limites
3.1.4.6 Polícia Administrativa X Polícia Judiciária
3.2 DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR
3.2.1 Conceito.
3.2.2 Ilícito Administrativo Disciplinar.
3.2.3 Princípios.
3.2.4 Direito Administrativo Disciplinar e o Direito Penal.
3.2.5 Direito Administrativo Disciplinar Militar.
3.3 ESTATUTO DOS MILITARES
3.3.1 Conceito.
3.3.2 Obrigações Militares.
3.3.2.1 Valor Militar.
3.3.2.2 Ética Militar.
3.3.3 Deveres Militares.
3.3.4 Direitos.
3.3.5 Prerrogativas.
3.4 REGULAMENTO DISCIPLINAR DA MARINHA
3.4.1 Conceito.
3.4.2 Contravenções Disciplinares.
3.4.3 Penas Disciplinares.
3.4.3.1 Competência.

203
3.4.3.2 Cumprimento.
3.4.3.3 Imposição.
3.4.4 Recursos.
3.5 CONSELHO DE DISCIPLINA
3.5.1 - Autoridades Nomeantes.
3.5.2 Conceito.
3.5.3 Submissão a Conselho.
3.5.4 Direitos do Acusado.
3.5.5 Composição do Conselho de Disciplina.
3.5.6 Portaria de Afastamento das Funções.
3.5.7 Prazos.
3.5.8 Libelo Acusatório.
3.5.9 Inspeção de Saúde.
3.5.10 – Início dos Trabalhos.
3.5.10.1 – Convocação.
3.5.10.2 – Compromisso.
3.5.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos.
3.5.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes.
3.5.10.5 - Apresentação das Testemunhas.
3.5.11 Oitiva.
3.5.12 Defesa por Escrito.
3.5.13 Exame dos Autos.
3.5.14 Acusado Inativo.
3.5.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento.
3.5.16 Deserção do Acusado.
3.5.17 Conduta Inconveniente do Acusado.
3.5.18 Substituições.
3.5.19 Relatório.
3.5.20 Solução.
3.5.21 Remessa.
3.5.22 Decisão e Recursos.
3.6 CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO
3.6.1 Autoridades Nomeantes.
3.6.2 Conceito.
3.6.3 Submissão a Conselho.
3.6.4 Direitos do Justificante.
3.6.5 Composição do Conselho de Justificação.

204
3.6.6 Portaria de Afastamento das Funções.
3.6.7 Prazos.
3.6.8 Libelo Acusatório.
3.6.9 Inspeção de Saúde.
3.6.10 Início dos Trabalhos.
3.6.10.1 – Convocação.
3.6.10.2 – Compromisso.
3.6.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos.
3.6.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes.
3.6.10.5 - Apresentação das Testemunhas.
3.6.11 Oitiva.
3.6.12 Defesa por Escrito.
3.6.13 Exame dos Autos.
3.6.14 Justificante Inativo.
3.6.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento.
3.6.16 Deserção do Justificante.
3.6.17 Conduta Inconveniente do Justificante.
3.6.18 Substituições.
3.6.19 Relatório e Remessa.
3.6.20 Decisão.
3.7 A AUDIÊNCIA DO COMANDANTE
3.7.1 Contravenção Disciplinar.
3.7.2 Competência.
3.7.3 Princípios Aplicáveis.
3.7.3.1 Devido Processo Legal.
3.7.3.2 Discricionariedade.
3.7.3.3 Razoabilidade e Proporcionalidade.
3.7.3.4 Motivação.
3.7.3.5 Contraditório e Ampla Defesa.
3.7.4 A Audiência.

205
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR
Olá, Aluno(a)!
Iniciamos agora a disciplina Direito Administrativo Disciplinar Militar. Conversaremos a respeito
de como surgiu o Direito Administrativo e como ele influencia a vida na caserna, além de quais são os
principais princípios que regem este ramo do Direito. Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Explicar o histórico do Direito Administrativo;
- Conceituar Direito Administrativo; e
- Citar os princípios básicos da Administração Pública.

INTRODUÇÃO:
O que é Direito Administrativo? Como surgiu? Como ele pode influenciar o nosso dia a dia?
Quais os princípios que regem este ramo do Direito?
O Direito Administrativo é uma disciplina não codificada. A legislação administrativa brasileira é
esparsa, não temos propriamente a existência de um Código de Direito Administrativo. Então, nossa
legislação é bastante vasta. Dessa forma, podemos citar, por exemplo, a Lei 8.666/93 que vai tratar das
licitações e dos contratos administrativos, a Lei 8.112/90 que é o estatuto dos servidores civis federais. Já
no âmbito militar, podemos mencionar a Lei 6.880/80, Estatuto dos Militares e a Medida Provisória
2.215-10/01, a qual dispõe sobre a remuneração dos militares das Forças Armadas.
Enfim, quando falamos sobre Direito Administrativo, há um amplo arcabouço jurídico que vai
regular as relações neste ramo do Direito, a qual começaremos a explorar a partir de agora.
Vamos nessa!?

206
3.1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO
Agora que já falamos rapidamente sobre o Direito Administrativo, podemos passar a nos
aprofundar na matéria. Para uma melhor compreensão dividimos em quatro etapas:
- Histórico;
- Conceito;
- Princípios Básicos; e
- Poder de Polícia.

3.1.1 Histórico
O Direito Administrativo é considerado um ramo relativamente novo no Direito, quando
comparado a outros ramos como, por exemplo, o Direito Civil, que tem sua origem no antigo Império
Romano. Assim, o Direito Administrativo é uma ciência jurídica nova, que vai integrar o ramo do Direito
Público e como tal, ainda se encontra em constante evolução e aperfeiçoamento.
Mais precisamente, ele surge como uma ciência, um ramo do Direito, no século XVIII, que é um
momento em que temos o estabelecimento do Estado de Direito. É a partir deste tal Estado de Direito que
a Administração, o Estado, passará a criar as suas próprias normas jurídicas e estará, de alguma maneira,
submetido a essas próprias normas jurídicas. Esta é a grande característica do Estado de Direito. Há uma
submissão do Estado, do governo à lei. Pode-se dizer que o Direito Administrativo surge justamente para
regular a conduta do Estado, a conduta da Administração Pública. Sendo assim, é um ramo do Direito
que, na realidade, vai resguardar o cidadão.
Historicamente, o Direito Administrativo tem o seu surgimento identificado com dois grandes
movimentos revolucionários, a Revolução Francesa em 1789 e a Revolução Americana de 1776,
movimentos estes que tinham como uma de suas bandeiras a limitação dos poderes do Estado Absolutista
e o respeito às normas. Portanto, será um "caminhar em conjunto" do Direito Administrativo e do Estado
Liberal até os dias de hoje.

3.1.2 Conceito
Com o avanço da normatização através de princípios e normas voltados à atuação do Estado, o
Direito Administrativo se tornou um ramo autônomo dentre as matérias jurídicas.
Se tivéssemos que definir o Direito Administrativo, poderíamos dizer que ele é um conjunto de
normas jurídicas, que se subdividem em regras e princípios.
O Direito Administrativo se trata de um ramo do direito público, que irá disciplinar a função
administrativa, os órgãos, as pessoas jurídicas e os agentes públicos que desempenham esta função.
Portanto, o Direito Administrativo irá sistematizar, estruturar e disciplinar o funcionamento da
Administração Pública, assim como planejar e executar as atividades que o Estado deve desempenhar.
Ficaremos aqui com o conceito esculpido por Carvalho Filho (2017), o qual assevera que o Direito
Administrativo seria "o conjunto de normas e princípios que, visando sempre ao interesse público, regem

207
as relações jurídicas entre as pessoas e órgãos do Estado e entre este e as coletividades a que devem
servir".

3.1.3 Princípios Básicos da Administração Pública


A própria Constituição da República, em seu artigo 37 traz quais são os princípios básicos a serem
praticados pela Administração Pública, quando diz: "A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte".
Eles são denominados princípios expressos e formam o famoso LIMPE: legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Os princípios presentes no artigo 37 da Constituição têm que pautar a conduta da Administração
Pública, do administrador e podem ser considerados como diretrizes fundamentais para a Administração
Pública no Brasil.
Há também um outro grupo de princípios chamado de princípios reconhecidos. A doutrina
entende que estes estariam expressos no artigo 2º da Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo
federal, o qual diz que: "A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade,
finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório,
segurança jurídica, interesse público e eficiência".
Ao ler o texto da supramencionada lei percebe-se que alguns dos princípios são os mesmo que já
constam na Constituição, todos os demais serão os princípios reconhecidos. Apesar de todos serem muito
importantes e pautarem a conduta do administrador e da Administração Pública, na nossa aula veremos
apenas os principais, que são os princípios constitucionais expressos.

3.1.3.1 Legalidade
O Princípio da Legalidade também encontra guarita no artigo 5º, II da Constituição, a qual
assevera que: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
Na verdade, este é o princípio da legalidade genérica, que vigora para o direito privado. Isso
significa que o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, esta é a legalidade genérica. E há
também a legalidade administrativa, que vimos mais acima.
Há uma célebre frase que sintetiza ambas as legalidades em um
único conceito: “ao particular, cabe fazer tudo aquilo que a lei não
proíbe, mas a Administração só pode atuar de acordo com a lei”.
Então, a ação da Administração Pública só pode se dar nos
termos da lei. Logo, enquanto o particular pode fazer tudo aquilo que a
lei não proíbe, a Administração Pública só pode fazer aquilo que a lei
autoriza. Assim, quando se fala em princípio da legalidade para a

208
Administração Pública, fala-se em uma submissão total à lei. O atuar da Administração Pública tem que
ser conforme à legislação e estar submetido integralmente à ela.
A origem do princípio da legalidade está no Estado Democrático de Direito. A partir do momento
em que a Administração Pública passou a editar as suas próprias normas, passou também a se submeter a
elas. É importante saber que a legalidade administrativa vai na verdade proteger as liberdades dos
cidadãos, a chamada autonomia particular e, ao mesmo tempo, vai limitar a autoridade dos governantes.
Desta feita, simultaneamente, a legalidade administrativa garantirá, com essa limitação de autoridade, a
autonomia pública, a noção de cidadania. Por isso o princípio da legalidade é tão importante, pois, ao
mesmo tempo, garante a liberdade das pessoas (autonomia privada) e também a autonomia pública, ou
seja, a democracia, uma vez que a legalidade administrativa limitará a atividade do administrador público.

3.1.3.2 Impessoalidade
Algo impessoal é aquilo que pertence a nenhuma pessoa em especial. Isso significa que a
Administração Pública, na sua atuação, deve evitar favorecimentos e perseguições, não podendo atuar
tendo em vista uma pessoa específica ou determinada.
A Administração Pública tem de ser impessoal, isto é, tratar os administrados que se encontrem
em uma mesma situação jurídica da mesma maneira. O princípio da impessoalidade está intimamente
ligada ao conceito de interesse público. Logo, a Administração Pública, no seu atuar, tem que buscar o
interesse da coletividade.
O princípio da impessoalidade sempre exigirá a observância dos interesses coletivos, sob pena de
haver desvio de finalidade, que é uma das modalidades do abuso de poder. O desvio de finalidade se
verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente,
na regra de competência (artigo 2º, parágrafo único, e da Lei nº 4.717/65). Existem duas modalidades de
abuso de poder: o desvio de finalidade, ou desvio de poder e o excesso de poder. O abuso de poder é
como se fosse um gênero e apresentará duas espécies, o excesso de poder e o desvio de poder (ou desvio
de finalidade).
A diferença é que no excesso de poder o agente tem uma determinada competência e a extrapola,
por isso é uma modalidade de abuso de poder; enquanto no desvio de finalidade, o agente público age
dentro da sua competência mas se desvia do interesse público, da finalidade do interesse coletivo, que é a
finalidade, a qual deve nortear a sua conduta.

Ex.: um prefeito que resolve desapropriar uma casa de seu desafeto político para fins de tombamento. Na
verdade, o agente nessa situação, não agiu premido do interesse público, mas de seu próprio interesse de
prejudicar o seu desafeto político e assim, nesta hipótese, age com desvio de finalidade.

3.1.3.3 Moralidade
Ao longo da sua carreira, você já ouviu falar que "não basta ser honesto, tem que parecer ser
honesto"?
209
Isso pode nos trazer uma reflexão, nem tudo que é legal, é moral; assim como nem tudo que é
ilegal, é imoral.
Já estudamos sobre o Princípio da Legalidade, mas o que o Princípio da Moralidade vem nos
dizer, é que não basta ser legal, também tem que ser moral. Logo, a atuação da Administração Pública
brasileira tem que se pautar não apenas pela legalidade, mas também pela moralidade. A Administração
Pública deve atuar de forma legal e moral, e não apenas esta ou aquela.
Este princípio expressa uma das características do neoconstitucionalismo que é exatamente essa
reaproximação entre o Direito e a Moral.
Mas, o que vem a ser neoconstitucionalismo?
Nós temos no pós-guerra o pensamento de um velho constitucionalismo europeu ligado ao
positivismo jurídico com a ideia de idolatria da lei. Este velho constitucionalismo existente no continente
europeu não foi capaz de evitar os sistemas totalitários, como o nazismo, ao contrário, em diversos
momentos até serviu de base a estes sistemas. Então, percebe-se que após a segunda guerra a insuficiência
do positivismo jurídico fica muito clara, surgindo a figura do neoconstitucionalismo, justamente como um
movimento para modificar, alterar as bases do Direito Constitucional.
Dessa forma, tem-se como características principais de tal movimento justamente a aprovação de
constituições de cunho mais social, com previsão de um amplo catálogo de direitos fundamentais assim
como também de normas programáticas e o conceito de força normativa da Constituição. Todas estas
ideias vão despontar com esse movimento que vai reestruturar as bases do Direito Constitucional e o
princípio da moralidade está exatamente na base no neoconstitucionalismo.
O que se tem no artigo 37
da Constituição é o conceito de
moralidade constitucionalizada.
É importante perceber que não é
uma moralidade qualquer, pois
não é ampla, genérica e irrestrita.
A ideia da moralidade aqui, no
Direito Administrativo, é restrita
e condiz com a noção de bom
administrador, com um agente
público que possui noção dos
preceitos éticos e que sabe distinguir entre o bom e o mau. Portanto, está ela intimamente ligada à
concepção de um bom administrador, este que é conhecedor da lei e dos preceitos éticos, os aplicando
então no exercício da sua função administrativa.
O princípio da moralidade também aparece esculpido no artigo 2º, parágrafo único, IV da Lei
9.784/99, que diz: "Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé".

210
Podemos perceber que o princípio da moralidade tem uma ligação muito grande com o princípio
da legalidade. Tem-se, por exemplo, a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/92), a qual prevê
diversas situações de falta de probidade na Administração Pública.
E o que é propriamente a improbidade administrativa?
É justamente essa conduta do agente público, do administrador, que de alguma maneira irá ferir os
princípios básicos da Administração Pública. Então, um ato de improbidade administrativa é um ato
desonesto, desleal, que de alguma maneira fere um dos princípios do Direito Administrativo, estes que
são o norte, pois devem pautar a conduta do administrador.

3.1.3.4 Publicidade
A ideia deste princípio é que os
atos da Administração Pública devem
ter a mais ampla divulgação possível.
Sendo assim, a regra na Administração
Pública é a publicidade dos atos
administrativos, estando relacionada ao
conceito de transparência. Dessa forma,
quando se fala em publicidade está
implícita a noção de transparência.
Logo, os atos da Administração devem ter a maior transparência possível. Portanto, como já foi dito, a
regra é a publicidade, sendo a falta de publicidade a exceção.
Carvalho Filho (2017) assevera que:

Outro princípio mencionado na Constituição é o da publicidade. Indica que os atos da


Administração devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, e isso
porque constitui fundamento do princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade
da conduta dos agentes administrativos. Só com a transparência dessa conduta é que poderão os
indivíduos aquilatar a legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem.

Obviamente, existem hipóteses de exceção à publicidade, como, por exemplo, o sigilo, situado no
artigo 5º, XXXIII da Constituição, o qual traz que: "todos têm direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo
da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da
sociedade e do Estado".
Note: "segurança da sociedade e do Estado". Estas são as hipóteses de sigilo, que excepcionam a
regra de que a publicidade dos atos é que deve reger o Direito Administrativo.

211
Ao se falar em publicidade, fala-se em
publicação nos órgãos oficiais, que é justamente
uma das características da publicidade. Sendo
assim, dar publicidade, eventualmente, a um
pronunciamento, um ato administrativo.
Destarte, é por intermédio da publicação nos
órgãos oficiais que aquele ato administrativo ou
aquele pronunciamento realmente ganhará conhecimento.
Logo, em que pese o surgimento e a democratização do uso das redes sociais, a publicação que
interessa e tem relevância é a publicação dos órgãos e entidades estatais, nos seus respectivos diários
oficiais, podendo ser impresso ou de forma eletrônica. Sendo assim, é como se a publicidade tivesse um
aspecto: a publicação, e por intermédio desta é que se faz o ato administrativo, o pronunciamento
oponível a terceiros.
Então, qual publicação que tem efetivamente valor jurídico?
Afixar alguma coisa na esquina ou fazer um post em uma rede social, podem até serem úteis, mas
não possui qualquer valor jurídico. Imagine alguém que é aprovado em um concurso público. Tal pessoa
será nomeada em um diário oficial, que irá relatar todo o trâmite do concurso. Esta publicação que consta
no diário oficial é que, de fato, tem valor. Pode-se publicar qualquer coisa em qualquer lugar. Contudo, a
publicação que nos interessa, aquela que possui valor jurídico é a referente aos órgãos oficiais de
imprensa.
A principal finalidade do princípio da publicidade está ligada ao conceito de controle social. Para
isso serve a divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, para a fiscalização, o controle
social, do povo, este que é o titular do poder constituinte originário. Portando, o povo é que deve
controlar e fiscalizar quais são os atos que a Administração Pública vem praticando.
A essência do princípio da publicidade está relacionada a esta noção de fiscalização da
Administração Pública por parte da sociedade. Existe, inclusive, um direito subjetivo de recorrer ao
Estado em busca de tais informações. O cidadão tem o direito de reivindicar informações do Estado, se
fazendo valer através de: mandado de segurança, habeas data, ação popular, direito de certidão, direito de
petição e etc. Existem vários instrumentos pelos quais se pode reclamar o princípio da publicidade.

Ex.: na esfera judicial, existe o artigo 93, IX da Constituição, que traz o princípio da publicidade nos
processos judiciais:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da
Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias
partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à
intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

212
Perceba que a própria Constituição vai nos dizer que, em algumas hipóteses, pode haver limitação
ao princípio da publicidade. Neste caso, ao ponderar os direitos à intimidade e o interesse público à
informação, a própria legislação estabeleceu algumas restrições ao princípio da publicidade.

3.1.3.5 Eficiência
O princípio da eficiência é o mais
novo de todos. Ele foi inserido na
Constituição em 1998 pela Emenda
Constitucional nº 19, que ficou conhecida
como Reforma Administrativa, que
supostamente tinha como intenção a
implantação de uma administração gerencial na Administração Pública brasileira.
Temos como contexto da época, estávamos na época do governo de Fernando Henrique Cardoso,
em que era defendido o discurso da pós-modernidade, da privatização, da ineficiência do Estado e da
necessidade de sua desburocratização.
Neste sentido, Carvalho Filho (2017) nos explica que:

Com a inclusão, pretendeu o Governo conferir direitos aos usuários dos diversos serviços
prestados pela Administração ou por seus delegados e estabelecer obrigações efetivas aos
prestadores. Não é difícil perceber que a inserção desse princípio revela o descontentamento da
sociedade diante de sua antiga impotência para lutar contra a deficiente prestação de tantos
serviços públicos, que incontáveis prejuízos já causou aos usuários. De fato, sendo tais serviços
prestados pelo Estado ou por delegados seus, sempre ficaram inacessíveis para os usuários os
meios efetivos para assegurar seus direitos. Os poucos meios existentes se revelaram insuficientes
ou inócuos para sanar as irregularidades cometidas pelo Poder Público na execução desses
serviços.

Eficiência significa exatamente a qualidade do serviço público prestado e está ligada à ideia de
economia, de recursos e tempo, assim como à otimização dos mesmos. Segundo Carvalho Filho (2017):

A eficiência não se confunde com a eficácia nem com a efetividade. A eficiência transmite sentido
relacionado ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa; a ideia diz
respeito, portanto, à conduta dos agentes. Por outro lado, eficácia tem relação com os meios e
instrumentos empregados pelos agentes no exercício de seus misteres na administração; o sentido
aqui é tipicamente instrumental. Finalmente, a efetividade é voltada para os resultados obtidos
com as ações administrativas; sobreleva nesse aspecto a positividade dos objetivos. O desejável é
que tais qualificações caminhem simultaneamente, mas é possível admitir que haja condutas
administrativas produzidas com eficiência, embora não tenham eficácia ou efetividade. De outro
prisma, pode a conduta não ser muito eficiente, mas, em face da eficácia dos meios, acabar por ser
dotada de efetividade. Até mesmo é possível admitir que condutas eficientes e eficazes acabem por
não alcançar os resultados desejados; em consequência, serão despidas de efetividade.

213
Com isso chegamos ao fim dos cinco princípios expressos no artigo 37 da Constituição que
pautam a conduta do administrador público, sendo os nortes que este deve seguir no exercício de sua
função administrativa.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos nossa primeira parada no estudo do Direito Administrativo para relembrar o que já vimos
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Direito Administrativo se trata de um ramo do direito público, que irá disciplinar a função
administrativa, os órgãos, as pessoas jurídicas e os agentes públicos que desempenham esta função.

2) ( ) "Ao particular, cabe fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, mas a Administração só pode atuar de
acordo com a lei" é a síntese do Princípio da Legitimidade.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) São princípios constitucionais controladores da atuação na Administração Pública:

(A) legalidade, impessoalidade, eficiência, conveniência e oportunidade.

(B) moralidade, revogabilidade, pessoalidade, publicidade e motivação.

(C) legalidade, moralidade, publicidade, impessoalidade e conveniência.

(D) finalidade, moralidade, impessoalidade, eficácia e publicidade.

(E) legalidade, moralidade, impessoalidade, eficiência e publicidade.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E

214
RECADO FINAL:

Nesta aula estudamos algumas noções bem iniciais sobre o Direito Administrativo. Falamos sobre
os princípios básicos expressos na nossa Constituição, que norteiam a Administração Pública brasileira.
Apesar de iniciais, estes são conceitos que nos acompanharão por toda a nossa caminhada nesta
Unidade de Ensino, Direito Administrativo Disciplinar Militar.
Procure sempre tê-los em mente. Quando necessário, pare um pouquinho e volte a esta aula
sempre que precisar relembrar algo.
Dito isto...
Até a próxima aula!

215
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na última aula começamos a falar sobre o Direito Administrativo. Vimos um breve histórico,
conceituamos o Direito Administrativo e trouxemos os principais princípios aplicados a este ramo do
Direito.
Nesta aula, abordaremos um ponto importantíssimo à atuação de qualquer servidor público, civil
ou militar, que é o exercício do Poder de Polícia. Tema bastante abrangente e que possui muitas nuances,
as quais devemos estar atentos. Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Poder de Polícia;
- Citar as características do Poder de Polícia;
- Descrever a atuação do Poder de Polícia;
- Descrever o ciclo de polícia;
- Citar os limites do Poder de Polícia; e
- Diferenciar a polícia administrativa da polícia judiciária.

INTRODUÇÃO:
A sociedade contemporânea se caracteriza por ser hipercomplexa e plural. Nota-se que o impacto
das ações de um indivíduo gera reflexos em outros e que essa é cada vez maior. Considerando que estas
interações são cada vez mais crescentes, entra em cena a necessidade da utilização do poder de polícia, a
fim de controlar e coordenar estas mútuas correlações entre as ações dos indivíduos.
O fundamento geral do poder de polícia está na soberania estatal, numa ideia de domínio
eminente, que significa o poder que o Estado tem sobre os seus bens e sobre as pessoas que estão em seu
território. Esse poder da Administração Pública deve ser exercido no interesse da coletividade.
Por que uma Prefeitura apreende as mercadorias de um comerciante ambulante? Por que a mesma
Prefeitura fecha estabelecimentos comerciais? Por que as OM ligadas à Autoridade Marítima apreendem
e/ou multam embarcações em situação irregular?
Nesta aula trataremos em detalhes o conceito, a expressão, a atuação no exercício do Poder de
Polícia, algo deveras importante ao exercício da atividade pública.

3.1 INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO


3.1.4 Poder de Polícia
A finalidade do poder de polícia é o interesse da coletividade. Porém, o poder de polícia vai
consistir em uma restrição, limitação dos direitos individuais, notadamente da liberdade e propriedade em
virtude do interesse coletivo.

216
Nenhum direito é absoluto, nem mesmo o da dignidade da pessoa humana e, o poder de polícia
funcionará como um limitador da liberdade e da propriedade em prol do direito público. Isso significa
dizer que o direito de liberdade, assim como o de propriedade, precisa ser exercido dentro de alguns
parâmetros. Pode-se entender que existe o poder de polícia para disciplinar a limitação ao regular
exercício dos direitos.

3.1.4.1 Conceito
O poder de polícia é uma prerrogativa do direito público e está dentro da ideia já vista que poderes
são prerrogativas para se alcançar o interesse público. Ele estará calcado na lei e irá autorizar a
Administração Pública à restringir os direitos individuais, especialmente os direitos de liberdade e de
propriedade em prol deste interesse público.
Importante perceber neste conceito
é a noção de prerrogativa; de que o poder
de polícia tem que estar alicerçado na lei e
que, o que ele irá fazer é estabelecer uma
restrição/limitação nos direitos individuais.
Assim, o poder de polícia é uma atividade
administrativa, uma prerrogativa do poder
público, que vai, em prol do interesse
público, restringir, de alguma maneira, os
direitos individuais. As limitações serão
sempre impostas em prol da coletividade.
O fundamento do poder de polícia será
sempre o interesse público.
Contudo, o poder de polícia não é somente imposto aos particulares, pois os demais entes
públicos, também terão que se conformar a este poder de policia, que muitas vezes será editado por elas
mesmas. Se, por exemplo, tem-se uma medida de polícia editada pela União, todos os outros entes
(Estados, Distrito Federal e Municípios) também estarão sujeitos às determinações deste poder de polícia.
Na verdade, quando se fala em restrição imposta aos particulares, tem que se entender que também será
uma limitação imposta aos demais entes, bem como às outras pessoas jurídicas de direito público.
A melhor definição legal que encontraremos para poder de polícia está no artigo 78 do Código
Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), o qual diz que:

Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando


direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse
público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do
Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou
coletivos.

217
Apesar de estar longe de ser uma definição perfeita, pelo menos a definição legal traz em linhas
gerais a concepção do poder de polícia, salientando o aspecto ligado às restrições que a Administração
Pública pode instituir sobre os direitos.
Já nas palavras de Carvalho Filho (2017) o poder de polícia seria: "a prerrogativa de direito
público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a restringir o uso e o gozo da liberdade e
da propriedade em favor do interesse da coletividade".
Basicamente, temos que ter em mente que o poder de polícia serão diversas atividades
administrativas desempenhadas pela Administração Pública, as quais com base na lei irão limitar e/ou
restringir liberdades individuais e o gozo da propriedade em prol do interesse público.

3.1.4.2 Características

- Discricionariedade e a Vinculação:
Existe uma grande divergência na doutrina se o poder de polícia seria uma atividade discricionária
ou vinculada. Prevalecia a ideia de que seria uma atividade discricionária. Entretanto, como a evolução da
sociedade contemporânea, as relações estão cada vez mais complexas, sendo que hoje não seria mais
cabível falar-se em um juízo integralmente discricionário vinculado. Não há mais como falar na
existência de um ato que seja integralmente vinculado, nem um ato que seja integralmente discricionário.
O que existe são as chamadas matizes de predominância. Assim, o que vai realmente diferenciar um ato
vinculado de um ato discricionário será a predominância e não a exclusividade. Então, se há a
predominância de elementos vinculados à lei, tem-se um ato vinculado; se há a predominância de
elementos onde há certa esfera de liberdade, uma esfera de ação, tem-se um ato discricionário.
Logo, tecnicamente, hoje é mais correto se falar em graus de vinculação (de subordinação à lei,
ou uma margem maior para o administrador público), e não que um ato é integralmente vinculado ou
totalmente discricionário. É assim que a doutrina hoje se refere. Com isso, no poder de polícia é possível
se vislumbrar tanto atos que estariam mais para atos vinculados, como atos mais voltados para atos
discricionários.

Ex.: a concessão de uma licença para dirigir ou para construir. A licença será sempre um ato vinculado e
definitivo. Há também esse aspecto de definitividade. Neste caso, predomina a vinculação. Por outro lado,
pode-se citar a autorização que uma Prefeitura dá para fechar uma rua, a fim de que possa se realizar uma
festa junina em uma determinada comunidade. Neste caso, estaríamos diante de um ato discricionário do
Poder Público.

Então, temos como expressões de atos vinculados do poder de polícia a concessão de licenças, e a
autorização como exemplo de um ato discricionário de poder de polícia. Estes dependerão da
conveniência e da oportunidade da Administração Pública, podendo a qualquer momento, revogar esta
autorização. Por isso se diz que a autorização é um ato discricionário e um ato precário.

218
Ainda que haja bastante controvérsia de que se é um ato discricionário ou um ato vinculado, a
doutrina mais moderna vai falar em graus de vinculação. E aí se consegue vislumbrar tanto atos mais
vinculados quanto atos mais discricionários, em se tratando de poder de polícia.

- Autoexecutoriedade:
Significa que o ato de polícia pode ser imediatamente executado. Ou seja, a Administração
Pública não precisará de nenhum outro poder para executar aquele ato de polícia. Por isso ele seria um ato
auto-executório. Trata-se desta prerrogativa que a Administração Pública tem de poder, com seus próprios
meios, executar suas decisões, sem a necessidade de interferência de nenhum outro Poder.
Obviamente, como quase tudo no Direito, temos exceções. Nem todos os atos envolvendo o poder
de polícia são auto-executórios.

Ex.: a cobrança da multa não é auto-executória. Para que haja a cobrança da multa, é necessária a
intervenção ao Poder Judiciário, essa cobrança só se efetiva completamente pela ação própria na via
judicial. Veja bem que não estamos falando na aplicação da multa. Evidentemente, o Poder Público pode
aplicar multas sem solicitar a interferência de ninguém. Agora, se a pessoa multada não pagar
espontaneamente o valor cobrado, a Administração Pública não poderá simplesmente ir lá na conta
bancária do camarada e confiscar o dinheiro, ela terá que fazer a cobrança em juízo.

A autoexecutoriedade significa punição sumária? Quando a Administração Pública está nesse


exercício de poder de polícia, é possibilitado ao sujeito se defender? Existe o contraditório e a ampla
defesa, quando se fala em autoexecutoriedade?
Sim. Deve haver o processo administrativo para o sujeito se defender, para que ele possa ter
direito ao contraditório e à ampla defesa. Só após esse processo é que se pode falar em
autoexecutoriedade do poder de polícia.
Novamente, teremos exceções e serão duas. Nos casos de urgência, em que se têm os interesses
da coletividade em risco iminente. Nestes casos, pode-se dizer que não haveria essa oportunidade do
exercício do contraditório e da ampla defesa, pois não haveria tempo hábil. Outra hipótese é quando há a
flagrância, em que também não haveria a oportunidade de se oferecer o contraditório e a ampla defesa.

Ex.: um comerciante ambulante que vende produtos piratas. A Guarda Municipal dá o flagrante e
apreende essas mercadorias. Se fosse oferecido o contraditório e a ampla defesa a este ambulante, não
seria possível a apreensão. O que pode, e deve ocorrer, é o contraditório e a ampla defesa serem
oferecidos a ele em um momento posterior.

- Coercibilidade:
O poder de polícia é uma expressão da supremacia do Estado, do seu poder de império. Então, o
Estado pode se valer da força para implementar o seu poder de polícia. Este poder de polícia pode se
concretizar à revelia da vontade da parte. Não importa se o particular discorda do exercício desse poder

219
de polícia. A Coercibilidade, esse grau de imperatividade da medida de polícia irá se impor,
independentemente da vontade ou opinião do particular.
Quando se fala em Coercibilidade, é preciso ter atenção para os princípios da proporcionalidade e
razoabilidade. Devemos pensar em uma atuação da Administração que tem que se dar dentro dos
parâmetros desses princípios.

3.1.4.3 Atuação
Quando se fala em exercício do poder de polícia é necessário compreender que é da essência de
sua atuação o fato de ser preventiva, destinando-se à preservação do interesse público em geral e
impedindo ou paralisando atividades que sejam consideradas antissociais. Esta seria a essência do poder
de polícia, a preservação do interesse público no sentido geral, atuando de modo mais preventivo.
Contudo, isso não é absoluto, a atuação do poder de polícia pode ser tanto preventiva, quanto repressiva.
Podemos falar em poder de polícia preventivo e repressivo.
Quando, por exemplo, são editados normas ou atos normativos de caráter genérico e abstrato, de
cunho mais impessoal, podemos falar em exercício de poder de polícia preventivo. Falar de normas e atos
normativos de caráter genérico, impessoal ou abstrato é falar de poder de polícia em atuação preventiva.
Da mesma forma, quando se tem, por exemplo, a expedição de alvarás, que têm por conteúdo uma
licença, a qual, por sua vez, é um ato administrativo vinculado e tem um caráter de definitividade como,
por exemplo, a licença para dirigir ou construir, e que também pode ter, como conteúdo uma autorização,
que é um ato administrativo precário e discricionário, como a autorização para se fazer uma festa em uma
praça pública. Toda vez que a Administração Pública para estabelecer estas normas abstratas e genéricas
que irão, de alguma maneira, limitar o exercício dos direitos individuais, se teria a atuação preventiva do
poder de polícia.
A atuação repressiva, por sua vez, já seria composta pelos atos de fiscalização e também a
imposição de penalidades ou sanções administrativas. Então, quando a polícia administrativa, de
alguma maneira, faz a fiscalização e há a imposição de penalidades, estamos diante da atuação repressiva
do poder de polícia.
Deve ficar muito claro também que, quando se estiver falando de atuação da polícia
administrativa, estaremos no âmbito do ilícito administrativo. Se o ilícito começa a caminhar para a
seara penal quem atuará será a polícia judiciária e não a administrativa. Trataremos melhor desta
distinção em um tópico abaixo. É bem claro que se trata aqui de Direito Administrativo; logo, se fala em
um poder de polícia que está, na verdade, se dispondo a restringir e limitar os direitos de liberdade e
propriedade em prol de um interesse público, mas é uma atuação que se limita ao âmbito do ilícito
administrativo.

220
3.1.4.4 Ciclo de Polícia
O exercício do poder de polícia obedece a uma sequência de atos, que podem também ser
chamados de fases. Todavia, nem sempre são observadas todas as fases. São quatro fases, mas pode ser
que, em uma hipótese específica, só haja uma ou duas. Dependerá do caso concreto.
A primeira fase seria a das chamadas ordens de polícia ou legislação. São as normas que
propriamente vão estabelecer os limites, que efetivamente irão restringir e limitar os direitos individuais.
Essas normas podem ser constitucionais, legais ou regulamentares. De alguma maneira elas irão efetuar
alguma restrição ao direito dos indivíduos.

Ex.: A lei 6.153/12 do Estado do Rio de Janeiro dispõe sobre a proibição de venda, oferta, fornecimento,
entrega e permissão de consumo de bebida alcoólica aos menores de 18 anos, no âmbito do Estado do Rio
de Janeiro. Tal lei restringe não só a liberdade individual dos menores, que não poderão ingerir bebida
alcoólica, mas também é um instrumento de sujeição dos empresários e comerciantes que, de alguma
forma, hão de tomar medidas para que a lei seja cumprida. É um exemplo de como se pode ter uma ordem
de polícia. Tem-se uma lei que, de algum modo, irá limitar a atuação dos particulares.

A segunda fase da sequência que o poder de polícia costuma obedecer na prática é conhecida
como consentimento de polícia. Isso permitirá ao particular exercer uma atividade que, de alguma
maneira é controlada pela Administração. Por exemplo, tem-se uma atividade cujo exercício pode ser
proibido pela Administração e, por isso, o particular se dirige a ela e, caso queira, pode a mesma levantar
aquela proibição. Então, a Administração pode permitir que o particular exerça um direito que, de alguma
maneira, é limitado por ela.
Quem levanta esta proibição, através de um ato de consentimento é a Administração Pública por
intermédio, por exemplo, de uma licença ou de uma autorização.

Ex.: um particular pode requerer uma autorização para fazer um show em uma determinada rua e, nesses
casos, a autorização é um ato discricionário da Administração Pública, pois ela pode ou não conceder tal
liberalidade ao sujeito, dependendo da conveniência e oportunidade. Caso a Prefeitura julgue conveniente
e oportuna a realização do show, emitirá uma autorização para tal, sendo esta a materialização do ato de
consetimento.

Os atos de consentimento irão referir-se a alguma atividade controlada pela Administração Pública
e, por intermédio de tais atos, pode ela levantar uma proibição, de modo que o particular possa exercer a
atividade que antes era proibida ou controlada.
A terceira fase é a fiscalização. Ela será sempre instrumental. É um instrumento para se alcançar
uma finalidade pública. Fiscaliza-se justamente o cumprimento das ordens de polícia, das normas como
um todo, que irão restringir e/ou limitar os direitos individuais, controlando-as, assim como os atos de
consentimento.

221
É uma fiscalização do
cumprimento de normas. Tem-
se a polícia administrativa que
fará o controle se as normas
estão sendo cumpridas – se os
menores estão ingerindo ou não
bebida ou se os ambulantes
estão nas calçadas vendendo
produtos. As vezes é difícil
delimitar o âmbito, pois há um
momento em que a sanção
administrativa pode também
ingressar na seara penal. Então,
é uma linha bastante tênue.
Por fim, a última fase do ciclo de poder de polícia são as sanções. Trata-se de sanções
administrativas e não de sanções penais.

Ex.: um indivíduo tem um estabelecimento e está vendendo produtos com o prazo de validade vencido. A
vigilância sanitária faz a fiscalização e assim atua no exercício do poder de polícia. Quando ela apreende
e destrói os alimentos que estão fora dos prazos de validade haveria a chamada sanção administrativa e,
com isso, se encerra o ciclo de polícia.

Quando falamos em sanção administrativa, falamos em um ato punitivo que o ordenamento


jurídico, de alguma maneira, estabelece para o cometimento de uma determinada infração administrativa,
no intuito de puni-la. Quando esta sanção resultar do exercício do poder de polícia, aí ela será exatamente
uma sanção de polícia.
A sanção de polícia tem que observar os princípios do contraditório e ampla defesa, além do
devido processo legal. É importante e necessária a concepção de que a sanção de polícia tem sempre que
observar o princípio da legalidade. A instituição de uma sanção tem que ser sempre por intermédio da lei.
E quais são as sanções de
polícia?
A primeira delas é a multa.
É a sanção mais comum. Só é
possível sua cobrança quando a
mesma ocorre em dois momentos.
Primeiro a pessoa tem que ser
autuada, notificada e aí, nessa
notificação constararão exatamente

222
as características da infração – que horas, o sujeito avançou o sinal ou qual a infração específica que ele
praticou. E depois, em um segundo momento, é que se tem a sanção, a aplicação da multa.
Pode-se pensar também na interdição de um estabelecimento que esteja vendendo comida fora do
prazo de validade ou na apreensão e/ou inutilização de bens privados caso eles estejam em
desconformidade com alguma regra ou ordem de polícia. Podemos ter também o embargo de uma obra
ou a cassação de uma licença ou autorização. Todos são exemplos de sanções de polícia, que devem
obedecer ao princípio da legalidade.
Então, temos as ordens de polícia ou legislação, os atos de consentimento ou consentimento de
polícia, a fiscalização e, por último, as sanções. Nem sempre teremos todas as fases presentes, haverá
casos em que conseguiremos visualizar apenas duas ou três.

223
3.1.4.5 Limites
Apesar de o poder de polícia ser uma prerrogativa de direito público, ele não é ilimitado. Então,
ele terá que observar alguns limites. Alguns desses limites estão no próprio artigo 5º da Constituição. O
exercício do poder de polícia estará ligado à restrição a algum direito fundamental, seja liberdade,
propriedade, em prol do interesse público. Contudo, ainda assim, tem que se pensar nas garantias dos
direitos fundamentais esculpidas no artigo supracitado, que, de alguma maneira, servirão como uma
espécie de limitação ao exercício do poder de polícia. Além dos direitos fundamentais é possível pensar
no próprio interesse social, na própria sociedade como limites ao exercício do poder de polícia.
Dois outros vetores que podem servir de limitação ao poder de polícia são os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade. O poder de polícia significa limitação e restrição a direitos individuais.
Entretanto, esta restrição só pode se dar no limite do que for indispensável ao atendimento do interesse
público. Há um limite ao seu exercício.

Ex.: Ambulantes vendendo produtos falsificados em pleno centro de São Paulo e, aí, vem a polícia e se
utiliza de armas letais para reprimi-los. A repressão por armas letais não se dá dentro do limite do
razoável e proporcional, pois isso o extrapola. Não é necessário, pelo menos a princípio, reprimir um
ambulante com uma arma letal. Seria um caso em que se está restringindo um direito, mais além do que
seria indispensável e aí se ultrapassa a fronteira do que seria razoável. Logo, podem-se reprimir os
direitos individuais, mas dentro, obviamente, de uma razoabilidade.

A imposição de sanções também precisa observar uma limitação. Como vimos, uma das
características do poder de polícia é a auto-executoriedade de seus atos e esta não seria um sinônimo de
punição sumária, pois a regra é que tem que se oferecer a oportunidade do contraditório e da ampla defesa
ao particular. Em regra, deve haver um processo administrativo para que ele possa se defender. Contudo,
obviamente, existem exceções. No caso de urgência e flagrância do delito não se tem como oferecer
contraditório e ampla defesa, sendo, portanto, uma exceção. Mas a regra é que haja a oportunidade de
defesa ao particular. Sendo assim, mesmo a aplicação das sanções é algo que se dá dentro de certos
limites. O poder de polícia não é absoluto, pois encontra limites, especialmente na razoabilidade e na
proporcionalidade.

3.1.4.6 Polícia Administrativa X Polícia Judiciária


Colocamos esta diferenciação em um tópico à parte, pois é muito comum fazermos confusão com
estes conceitos. Ainda que se tenha a mesma nomenclatura “polícia”, são coisas bem distintas.
A Polícia Administrativa é a que vai tratar do interesse público em geral. Ela se espalha por
todos os órgãos da Administração Pública. Ela incidirá sobre bens, atividades, direitos, se propagando por
todo o Poder Público. Podemos citar como exemplos de expressões do exercício da Polícia
Administrativa, as atividades de fiscalização em comércios, sobre a condição dos alimentos, e
eventualmente a apreensão de alimentos estragados, concessão de licenças, autorizações, etc.

224
Esta Polícia Administrativa terá como principal função impedir a prática de ilícitos
administrativos, a ocorrência de atividades antissociais, protegendo o interesse público, em geral.
Predominantemente, a Polícia Administrativa possui um caráter preventivo. Mas, como já vimos, essa
classificação não é absoluta. É possível pensarmos na Polícia Administrativa também com caráter
repressivo.
Já a Polícia Judiciária, em regra, é exercida pela Polícia Civil e pela Polícia Federal. É esta a
responsável por reprimir os crimes. Além disso, também temos a Polícia Militar, que servirá como polícia
ostensiva, zelando pela manutenção da ordem pública.
Quando se fala em Polícia Judiciária, quando se fala em polícia ostensiva de manutenção da
ordem pública, estamos tratando dos órgãos elencados no artigo 144 da Constituição. Vejamos:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos
seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

A atividades de Polícia Judiciária e a Polícia Ostensiva de manutenção da ordem pública, em


regra, só podem ser exercidas pelas entidades supracitadas. A função dessas polícias seria justamente a
prevenção e a repressão de crimes. A Polícia Judiciária, especificamente, vai atuar investigando os crimes
e preparando a jurisdição penal, como diz o art. 4º do Código de Processo Penal:

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas
respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.
Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades
administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

Importante notar que a Polícia Judiciária irá incidir sobre a pessoa do infrator, e não sobre o bem,
sobre a atividade. Irá ser investigada a pessoa que eventualmente cometeu o crime, visando à imposição
de uma pena restritiva de liberdade. Enquanto a Polícia Administrativa incide sobre bens, sobre
atividades, tendo um caráter predominantemente preventivo. E deve-se entender que enquanto a Polícia
Administrativa está sob a orientação das normas administrativas, a Polícia Judiciária e a Polícia de
manutenção da ordem pública estão sob a alçada da legislação penal e processual penal.
E ainda que a classificação não seja absoluta, podemos entender que a Polícia Judiciária e a
Polícia de manutenção da ordem pública possuem um caráter mais repressivo que preventivo, ainda que
consigamos vislumbrar casos em que elas também vão atuar preventivamente.
Indo mais além, é possível verificar o mesmo órgão exercendo os dois tipos de atividades.

225
Ex.: A Polícia Federal quando emite passaportes está no exercício
de Polícia Administrativa. Já quando ela instaura inquéritos
policiais para averiguar o eventual cometimento de crimes, ela está
agindo como Polícia Judiciária.

Ex.: Operação Lei Seca. Ainda que quem esteja lá fiscalizando na blitz seja a Polícia Civil (Polícia
Judiciária), a Polícia Militar (Polícia de manutenção da ordem pública) ou o DETRAN (Polícia
Administrativa), teremos um exemplo de exercício do poder de polícia administrativo. Qualquer das
polícias acima poderia estar exercendo as duas funções (uma função administrativa e uma função própria
da Polícia Judiciária ou própria da polícia de manutenção da ordem pública). A Lei Seca é um exemplo de
poder de polícia, quando se restringe, de alguma maneira, a possibilidade do consumo de álcool em
detrimento de uma coletividade,
mexe-se exatamente no
conceito do poder de polícia
(que é a restrição da liberdade e
da propriedade em prol do
interesse público). Então, pode
haver um órgão exercendo
várias funções: um mesmo
órgão que exerce a Polícia
Administrativa pode estar, em
outro momento, exercendo a
Polícia Judiciária ou a polícia
de manutenção da ordem pública, etc.

Legal, mas, e onde entra a Marinha nisso tudo?


Bem, vimos no item 2.3 da nossa disciplina que uma das atribuições das Forças Militares é atuar
como Polícia Judiciária Militar (PJM), conforme o artigo 7º do Código de Processo Penal Militar
(CPPM). Então, sempre que algum titular de OM da MB mandar instaurar um procedimento de IPM para
apurar o eventual cometimento de um crime militar, ele estará atuando como Polícia Judiciária. Por outro
lado, por exemplo, sempre que alguma autoridade lavrar um Auto de Infração, decorrente da infringência
à legislação afeta à segurança da navegação e salvaguarda da vida humana no mar ou em águas interiores,
ela estará atuando como Polícia Administrativa.

226
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma pausa para verificar o que você já prendeu até aqui. Responda às questões
abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O fundamento do poder de polícia será sempre o interesse público.

2) ( ) A Administração Pública necessita de autorização judicial para executar qualquer ato de polícia.

3) ( ) A atuação do poder de polícia será sempre preventiva.

4) ( ) A Polícia Administrativa é a responsável por reprimir os crimes.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) A fase do ciclo de polícia em que a Administração Pública verifica se está havendo o adequado
cumprimento das ordens de polícia pelo particular é:

(A) ordem de polícia.

(B) consentimento de polícia.

(C) fiscalização.

(D) sanção de polícia.

(E) coerção de polícia.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 E
5 C

227
RECADO FINAL:

Na aula de hoje, trabalhamos um conceito muito caro aos servidores público em geral, sejam eles
civis ou militares. Conceituamos o Poder de Polícia, bem como citamos suas principais características e
seus limites de atuação.
Além disso, falamos sobre o ciclo de polícia, assunto bastante importante deste tema.
Por fim, dirimimos as confusões feitas entre as polícias administrativas, as polícias judiciárias e as
polícias ostensivas de manutenção da ordem pública.
Agora que já estudamos estes conceitos gerais de Direito Administrativo, já podemos avançar a
temas mais relacionados à atividade militar propriamente dita.
Aproveite agora para relembrar todos os conceitos explorados nestas duas primeiras aulas, porque
eles nos ajudarão, e muito, no desenrolar deste módulo.
Dito isto...
Até a próxima aula!

228
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Nas duas últimas aulas trouxemos alguns conceitos do Direito Administrativo. Apresentamos um
breve histórico, conceituamos o Direito Administrativo, trouxemos os principais princípios aplicados a
este ramo do Direito e abordamos as principais nuances relacionadas ao exercício do poder de polícia
administrativa.
Nesta aula, trataremos sobre uma das subdivisões do ramo do Direito Administrativo, que é o
Direito Administrativo Disciplinar. Tema bastante complexo e com algumas questões bastante
controversas, as quais teceremos alguns comentários.
Prepare-se que lá vamos nós!!!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Direito Administrativo Disciplinar;
- Conceituar ilícito administrativo disciplinar;
- Citar os princípios aplicados aos processos disciplinares;
- Explicar a relação entre o Direito Administrativo Disciplinar e o Direito Penal; e
- Descrever o Direito Administrativo Disciplinar Militar.

INTRODUÇÃO:
O Direito Administrativo Disciplinar é uma subdivisão do Direito Administrativo, voltado às
questões disciplinares. Decorre diretamente do Poder Disciplinar, que é a faculdade de a Administração
Pública punir internamente as infrações funcionais dos servidores.
O poder de punir do Estado na esfera administrativa bebe na mesma fonte do Direito Penal, por
isso, estão intimamente relacionados. Ambos os ramos do direito provém de uma só origem, que é o texto
constitucional, portanto, não se podem negar ao polo passivo do direito sancionador administrativo os
direitos e garantias fundamentais esculpidos na nossa Constituição.
Todavia, o poder disciplinar da Administração não deve ser confundido com o poder punitivo do
Estado, realizado por meio da Justiça Penal. O disciplinar é interno à Administração, enquanto que o
penal visa proteger os valores e bens mais importantes do grupo social em questão.
Nesta aula trataremos em minúcias o conceito e os princípios aplicados no Direito Administrativo
Disciplinar, bem como analisaremos sua relação com o Direito Penal.
Vamos nessa!?

229
3.2 DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR
3.2.1 Conceito
O Direito Administrativo Disciplinar é um ramo do Direito Público que decorre da própria
atividade da Administração Pública, que precisará disciplinar o comportamento de seus agentes, a fim de
permitir a regularidade de sua estrutura, de modo a possibilitar a prestação dos diversos serviços públicos
que lhe são atribuídos. Assim, o processo administrativo disciplinar é o instrumento hábil previsto para o
exercício comedido do poder disciplinar da Administração Pública, podendo resultar ao término em
alguma penalidade administrativa.
O processo administrativo disciplinar tem como objetivo específico esclarecer a verdade dos fatos
constantes da representação ou denúncia associadas, direta ou indiretamente, a exercício do cargo, sem a
preocupação de incriminar ou exculpar indevidamente o servidor.
Nas palavras de Teixeira (2010):

Direito Administrativo Disciplinar, como ramo do Direito Público, decorre da competência de a


administração pública impor modelos de comportamento a seus agentes, com o fim de manter a
regularidade, em sua estrutura interna, na execução e prestação dos serviços públicos. Nesse
objetivo, o processo administrativo disciplinar é o instrumento legalmente previsto para o
exercício controlado deste poder, podendo, ao final, redundar em sanção administrativa. A sanção
legalmente prevista funciona para prevenir ostensivamente a ocorrência do ilícito e, acaso
configurada, para reprimir a conduta irregular. Ou seja, o objetivo da sede administrativa
disciplinar é manter e retomar o regular e eficiente funcionamento da administração pública
federal.

Nota-se que a finalidade do direito administrativo disciplinar está respaldada no interesse e na


necessidade de aprimoramento progressivo do serviço público.
A função administrativa, dentre as relevantes missões estatais, demonstra-se pela dinâmica de
atos, praticados de acordo com a ordem normativa, no escopo de legar o bem-estar geral da coletividade.

3.2.2 Ilícito Administrativo Disciplinar


O ilícito administrativo disciplinar é toda conduta do servidor que, no âmbito de suas atribuições
ou a pretexto de exercê-las, contraria dispositivo estatutário. Em se tratando dos empregados públicos,
consiste em conduta que contraria a legislação trabalhista ou os normativos internos da estatal, em
especial o seu regime disciplinar.
Os ilícitos administrativos de servidores públicos englobam inobservância de deveres funcionais
do artigo 116, afrontas às proibições do artigo 117 e cometimento de condutas do artigo 132, todos da Lei
nº 8.112/1990, apuráveis conforme o rito previsto naquele Estatuto. Dessa forma, têm como polo passivo
a pessoa legalmente investida em cargo público, seja de provimento efetivo, seja de provimento
comissionado.
No caso de empregados públicos, os ilícitos administrativos englobam a inobservância de deveres
funcionais previstos na legislação trabalhista e nas normas internas das empresas estatais.
230
No âmbito militar, os deveres militares constam no artigo 31 do Estatuto dos Militares. Além
disso, devem ser observados os valores militares contidos no artigo 27 e os preceitos de ética militar
contidos no artigo 28, ambos do Estatuto dos Militares. Todos estes conceitos serão mais aprofundados na
nossa próxima aula.
Não obstante, cada Força terá o seu Regulamento Disciplinar. Na Marinha do Brasil (MB),
teremos o Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM) que também apresentará uma série de
obrigações e deveres pertinentes a vida militar naval.
A autoridade administrativa não podem perder de vista como pressuposto fático indissociável,
também no labor administrativo, a falibilidade humana.
Ensejando erros de fato ou de direito, várias podem ser as causas colhidas na experiência cotidiana
das organizações: desatenção, precipitação, pressa, cansaço, falta de concentração, atividades repetitivas,
dentre outras. Até mesmo a simples iniciativa no desempenho de tarefas novas já podem acarretar erros
não pretendidos, pois só não erra quem nada faz.
O Direito Administrativo Disciplinar não tem por fim a produção de uma caça às bruxas. A falha
escusável não pode ser inibida pela punição disciplinar, pois inerente à condição humana, sendo assim,
não estará o jus puniendi cumprindo seu papel precípuo de prevenção de novas práticas.
O erro administrativo escusável pode ser definido como uma conduta em desconformidade com a
norma, cuja repressão disciplinar não se mostre condizente com o principio da razoabilidade.
São três os requisitos cumulativos para que sobreviesse o erro administrativo escusável:

- atitude culposa;
- eventualidade; e
- ofensividade mínima.

Claro que quando trazidos para o âmbito militar, temos que fazer as devidas adaptações.
Obviamente que também existem erros administrativos cometidos na caserna. Todavia, quando
considerarmos a ofensividade, sempre deveremos contemplar os princípios da hierarquia e da disciplina.
Às vezes um erro que parece inofensivo se cometido por um servidor civil, pode se configurar em uma
verdadeira afronta aos princípios basilares castrenses.

3.2.3 Princípios
Os princípios mais importantes aplicados aos processos disciplinares são: Princípio do Devido
Processo Legal, Princípio da Ampla Defesa e Princípio do Contraditório.

231
Também se aplicam em todo o processo administrativo
disciplinar os cinco princípios jurídicos reitores da
Administração Pública, de sede constitucional: legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Ademais, há outros princípios aceitos pela doutrina como
também balizadores da conduta da comissão e das autoridades
instauradora e julgadora em sede disciplinar como, por exemplo:
Princípio da Verdade Material, Princípio da Autoexecutoriedade,
Princípio da Presunção de Veracidade.
As sanções disciplinares, bem como os princípios
constitucionais que gerem sua aplicação, têm incidência no caso
concreto por meio do procedimento administrativo disciplinar, o
qual se apresenta como importante marco na evolução do Direito
Administrativo Disciplinar, anteriormente marcado pelo arbítrio
da autoridade administrativa, configurado, dentre outros, no
instituto da verdade sabida.
Partindo do pressuposto de que ao instaurar o processo ocorreram ao menos indícios de falta
disciplinar enxergado por alguma autoridade com poder disciplinar, não pode o julgador se contentar
apenas com uma fagulha indiciária, o qual pode conduzir a erros de julgamento.
Não deve o julgador fazer da apuração mera formalidade, pois caracterizaria forte pré-julgamento
baseado em mera presunção. Descabido, portanto, impor determinada conclusão à vista apenas de
suspeitas não comprovadas.
Não pode ser este o intento do processo administrativo disciplinar. A manifestação do julgador
deve estar confirmada pelas provas dos autos de maneira insofismável. Não se pode julgar por presunção
ou mera suspeita. Somente a prova tem o condão de afastar o erro de julgamento, o que acarretaria impor
ao servidor penalidade injusta e afastada da verdade real.
Também chamado de princípio da verdade material, a verdade real indica que se deve buscar, na
medida do possível, o que realmente teria acontecido, não se contentando apenas com aquela versão dos
fatos levada ao processo pelos envolvidos. Não se admite, deste modo, a “verdade sabida” no processo
administrativo disciplinar.
Nesta conjuntura, importa destacar que, a pretexto de garantir o direito dos cidadãos e o bom
funcionamento do serviço público, não pode o Estado, valendo-se do procedimento administrativo
disciplinar, infringir garantias asseguradas aos servidores acusados. Além disso, no contexto de um
Estado Democrático de Direito, o bom emprego de sanções aos servidores deve ser norteada por limites,
fixados, sobretudo, na Constituição.
Desta forma, o processo disciplinar, configura-se, também, como uma garantia do acusado.

232
Como veremos ao decorrer desta Unidade de Ensino, todos estes princípios se aplicarão em maior
ou menor intensidade nos procedimentos administrativos disciplinares militares, sempre com foco na
percepção dos princípios basilares das Forças Armadas: hierarquia e disciplina.

3.2.4 Direito Administrativo Disciplinar e o Direito Penal


O Direito é uno e indivisível. A separação que é feita em
diversos ramos serve apenas para fins didáticos e acadêmicos. Mas,
o Direito deve ser entendido como um complexo de relações
jurídica que dão fim a todo um ordenamento indivisível com o
objetivo de regular as relações existentes em uma dada sociedade.
Desta forma, quando falamos no relacionamento entre o
Direito Administrativo Disciplinar e os demais ramos do Direito,
estamos trazendo apenas como funcionam as relações internas entre
estes ramos, visto que todos fazem parte de um mesmo corpo, o
Direito.
Carvalho (2008) sintetiza estas relações da seguinte forma:

(...) guarda relações com o direito civil (noções de domicílio, de pessoa


jurídica), constitucional (princípios e garantias constitucionais incidem diretamente no processo
administrativo disciplinar, como do juiz natural, da irretroatividade da norma penal, da
inadmissibilidade de provas ilícitas, do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal,
da legalidade, moralidade, eficiência, publicidade, etc), penal (conceito de crime contra a
Administração Pública como falta disciplinar passível de pena demissória, contagem da prescrição
das faltas administrativas pelos prazos prescricionais do Código Penal - art. 142, Lei federal n.
8.112/1990, idéias de excludentes de ilicitude e de culpabilidade, inimputabilidade,
etc), processual civil e penal (procedimentos em audiências e para coleta de provas,
etc), comercial (conceitos de comércio e gerência, de atividade comercial incompatível com a
função pública, para fins de demissão do agente transgressor), dentre outros tantos exemplos.

Entretanto, é nítido pela leitura da bibliografia disponível, que a maior aproximação se dá


sobremaneira com o Direito Penal, enquanto ramos do direito público de caráter punitivo.
E isso decorre porque em sua essência não há qualquer diferença entre o ilícito penal o ilícito
administrativo e até mesmo o ilícito civil. Oliveira (2005) nos explica que: “ilícito é o comportamento
contrário àquele estabelecido pela norma jurídica, que é pressuposto da sanção. É a conduta contrária à
devida. É o antijurídico. Neste sentido, ilicitude e antijuridicidade são sinônimos e confundem-se num
mesmo conceito, de unívoco conteúdo”. Neste sentido, Bruno (1978) assevera que:

233
Antes de tudo o problema fora mal formulado: o que se buscava era inexistente, não há diferença
em substância entre ilícito penal e ilícito civil. O que os distingue é antes questão de grau que de
essência. Todo ilícito é uma contradição à lei, uma rebelião contra a norma, expressa na ofensa ou
ameaça a um bem ou interesse por esta tutelado. A importância social atribuída a esse bem ou
interesse jurídico é, em grande parte, o que determina a natureza da sanção – civil ou penal. É uma
questão de hierarquia de valores. Ao legislador é que cabe, tomando em consideração condições
do momento, fixar que espécie de bens jurídicos devem ser elevados à tutela penal, e, portanto, a
que determinados fatos se atribuirá o caráter de crime. Mas afinal a pena é um recurso extremo de
que se vale o legislador quando de outro modo não lhe seria possível assegurar a manutenção da
ordem jurídica. A sua oportunidade é marcada pela insuficiência da sanção civil.

Na verdade, a única diferença que pode ser reconhecida entre as espécies de ilicitude é de grau
reprovabilidade: está na maior ou menor gravidade ou imoralidade de uma em relação a outra. O grau de
reprovação de um ilícito será graduado pelo legislador no momento de sua tipificação.
O ordenamento jurídico também visa à proteção de alguns bens jurídicos. Normalmente, a
violação aos bens jurídicos mais caros à sociedade corresponderá uma sanção na esfera penal, que vai agir
na liberdade do infrator. Assim, as ilicitudes mais graves serão classificadas no ordenamento jurídico
como ilícitos penais, cabendo uma punição em âmbito penal. Logo, temos que as infrações civis e
administrativas seriam relacionadas a infrações que o nosso legislador considerou como mais brandas aos
preceitos básicos de nossa sociedade.

3.2.5 Direito Administrativo Disciplinar Militar


Segundo Assis (2008), o Direito Administrativo Disciplinar Militar “é a manifestação do Estado
na delimitação de conduta dos integrantes das instituições militares, visando uma melhor prestação de
serviço na consecução das missões constitucionalmente fixadas para as Forças Armadas e Auxiliares”.
Podemos dizer que o Direito Administrativo Disciplinar Militar tem como escopo os atos
funcionais praticados pelos militares no exercício de suas atividades e está atrelado aos Regulamentos
Disciplinares das Instituições Militares, seguindo não só os princípios e regras gerais da Constituição da
República e do Direito Administrativo, mas também do Direito Penal Militar e Processual Penal Militar.
Logo, o Direito Administrativo Disciplinar Militar nada mais é que um desdobramento do Direito
Administrativo Disciplinar voltado às atividades da caserna, já com a observância de suas peculiaridades.
Veremos sua aplicação em diversos procedimentos disciplinares realizados nas Forças Armadas. Ao
longo desta Unidade de Ensino veremos alguns deles: Conselho de Disciplina; Conselho de Justificação e
o Processo Administrativo Sumário, consubstanciado na Audiência do Comandante para apuração e
punição de contravenções disciplinares corriqueiras.

234
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma pausa para verificar o que você já prendeu até aqui. Responda às questões
abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O ilícito administrativo disciplinar é toda conduta do servidor que contrarie dispositivo penal.

2) ( ) A autoridade administrativa julgadora deve aplicar sanções administrativas apenas com base
na verdade sabida.

3) ( ) O Direito Administrativo Disciplinar não guarda relação com qualquer outro ramo do Direito.

4) ( ) O Direito Administrativo Disciplinar Militar se trata de um desdobramento do Direito


Administrativo Disciplinar, porém voltado às atividades militares.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) São requisitos para configuração do erro administrativo escusável:

(A) atitude culposa, eventualidade e ofensividade mínima.

(B) atitude culposa, eventualidade e inofensividade.

(C) atitude dolosa, eventualidade e ofensividade mínima.

(D) atitude culposa, habitualidade e ofensividade mínima.

(E) atitude dolosa, habitualidade e inofensividade.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 E
4 C
5 A

235
RECADO FINAL:

Na aula de hoje, falamos sobre o Direito Administrativo Disciplinar. Vimos que não se trata de um
ramo autônomo do Direito, mas que está inserido no Direito Administrativo, estando relacionado às
questões disciplinares dos servidores.
Ao longo desta Unidade de Ensino, trataremos bastante sobre este subramo do Direito,
principalmente quando falarmos no Conselho de Disciplina, no Conselho de Justificação e na Audiência
disciplinar do Comandante.
Porém, primeiro precisaremos relembrar alguns conceitos que já podem ter caído um pouco no
esquecimento. Então, antes de efetivamente entrarmos nestes tópicos, nas próximas aulas iremos
relembrar alguns conceitos contidos no Estatuto dos Militares e no Regulamento Disciplinar para a
Marinha (RDM).
Dito isto...
Até a próxima aula!

236
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Nesta aula falaremos acerca do Estatuto dos Militares. Impressionante perceber como muitas
vezes passamos a carreira inteira sem ter dado uma olhadinha sequer nesta lei, que na verdade é o
documento fundamental, onde estão alicerçadas as bases da vida militar.
O que? Você se encontra nesta situação?
Não tem problema, porque hoje vamos dar fim a este problema. Vamos trazer o conceito e
falaremos sobre os deveres e obrigações militares, bem como traremos os principais direitos e
prerrogativas inerentes à carreira. Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar o Estatuto dos Militares;
- Citar os valores militares;
- Descrever a ética militar;
- Citar os deveres militares;
- Citar os direitos militares; e
- Citar as prerrogativas militares.

INTRODUÇÃO:
É interessante como muitas vezes nós não conheçamos os nossos direitos e deveres. E isso não se
aplica apenas ao âmbito civil, mas aqui dentro da caserna também. Os deveres nem tanto, pois sempre
somos cobrados a realizar alguma coisa, mas os direitos...
Sempre caímos naquela armadilha do "depois eu leio", "estou sem tempo agora", "tenho outras
prioridades", "antes devo fazer isso ou aquilo"... não é mesmo!?
Pois hoje, este nosso problema vai acabar. Vamos tirar um tempinho de nossas árduas rotinas, para
conhecer um pouquinho mais sobre a nossa lei, a lei que rege a vida dos militares que é o Estatuto dos
Militares. Falaremos de valores militares, dos nossos deveres, mas também dos direitos e das
prerrogativas que temos, enquanto militares.
Então, vamos que vamos!

3.3 ESTATUTO DOS MILITARES


3.3.1 Conceito
O Estatuto dos Militares é a lei que vai regular a situação, obrigações, deveres, direitos e
prerrogativas dos membros das Forças Armadas.
No artigo 2º do Estatuto dos Militares, a lei traz a sua definição para Forças Armadas, em
consonância com o disposto no artigo 142 da Constituição da República. Vejamos:

237
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são
instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina,
sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia
dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

Art. 2º As Forças Armadas, essenciais à execução da política de segurança nacional, são


constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, e destinam-se a defender a Pátria e a
garantir os poderes constituídos, a lei e a ordem. São instituições nacionais, permanentes e
regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do
Presidente da República e dentro dos limites da lei.

De ambos, podemos tirar que as Forças


Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e
pela Aeronáutica, são instituições nacionais
regulares e permanentes, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema
do Presidente da República, que se destinam , à
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa
de qualquer destes, da lei e da ordem. Perceba o
enfoque e a importância dados a hierarquia e
disciplina em ambos os dispositivos legais. O artigo
14 do Estatuto dos Militares nos dará o conceito
legal dessas expressões:

Art. 14. A hierarquia e a disciplina são a base institucional das Forças Armadas. A autoridade
e a responsabilidade crescem com o grau hierárquico.
§ 1º A hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da
estrutura das Forças Armadas. A ordenação se faz por postos ou graduações; dentro de um mesmo
posto ou graduação se faz pela antigüidade no posto ou na graduação. O respeito à hierarquia é
consubstanciado no espírito de acatamento à seqüência de autoridade.
§ 2º Disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos,
normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento
regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de
cada um dos componentes desse organismo.
§ 3º A disciplina e o respeito à hierarquia devem ser mantidos em todas as circunstâncias da
vida entre militares da ativa, da reserva remunerada e reformados.

Ainda, nas palavras de Silva (2000):

Não se confundem, como se vê, hierarquia e disciplina, mas são termos correlatos, no
sentido de que a disciplina pressupõe relação hierárquica. Somente se é obrigado a obedecer,
juridicamente falando, a quem tem poder hierárquico. Onde há hierarquia com superposição de
vontade, há, correlativamente, uma relação de sujeição objetiva, que se traduz na disciplina, isto é,
no rigoroso acatamento pelos elementos dos graus inferiores da pirâmide hierárquica, às ordens,

238
normativas ou individuais, emanadas dos órgãos superiores. A disciplina é, assim, um corolário de
toda organização hierárquica. Essa relação fundamenta a aplicação de penalidades que ficam
imunes ao habeas corpus, nos termos do art. 142, § 2º, que declara não caber aquele remédio
constitucional em relação a punições disciplinares militares.

Conforme o artigo 3º, §1° do Estatuto dos Militares, os militares se encontram em uma das
seguintes situações:

- Na ativa:

- Carreira;
- Serviço Militar Inicial (SMI);
- Componente da reserva (convocados, reincluídos...);
- Alunos dos cursos de formação; e
- Todo cidadão mobilizado, em tempo de guerra.

- Na inatividade:

- Reserva remunerada;
- Reformados; e
- Tarefa por Tempo Certo (TTC).

3.3.2 Obrigações Militares


No campo moral, as pessoas possuem diversas obrigações, que surgem em decorrência da cultura,
dos costumes e da própria convivência social. Já para o Direito, a obrigação surgirá em decorrência de lei
ou de um negócio jurídico.
O Estatuto dos Militares destina um capítulo inteiro às obrigações militares.

3.3.2.1 Valor Militar


A consciência coletiva de uma sociedade é
a responsável pela formação dos valores morais
que passam a exercer pressão sobre os indivíduos
nos momentos de suas escolhas. Essa consciência
coletiva diz respeito aos valores do grupo a que
uma pessoa pertence, sendo transmitida entre as
gerações pela educação e conformando-se em
fator fundamental para a vida social. A

239
consciência coletiva pode, portanto, ser variável e determinante da intensidade da coesão do grupo.
Os militares formam uma sociedade em particular, onde existe uma consciência coletiva, em que
certos valores são compartilhados. Nesse grupo social sempre se espera uma padronização dos
comportamentos de cada indivíduo segundo o significado atribuído a cada um dos valores militares.
O artigo 27 do Estatuto dos Militares traz as manifestações dos valores militares:

Art. 27. São manifestações essenciais do valor militar:


I - o patriotismo, traduzido pela vontade inabalável de cumprir o dever militar e pelo solene
juramento de fidelidade à Pátria até com o sacrifício da própria vida;
II - o civismo e o culto das tradições históricas;
III - a fé na missão elevada das Forças Armadas;
IV - o espírito de corpo, orgulho do militar pela organização onde serve;
V - o amor à profissão das armas e o entusiasmo com que é exercida; e
VI - o aprimoramento técnico-profissional.

3.3.2.2 Ética Militar


O termo ética deriva do grego ethos (caráter, modo de ser de uma pessoa).
E, já podemos começar com uma pergunta, aparentemente muito simples, o que é ética?

Ética é um conjunto de valores morais e princípios que norteiam a conduta humana na sociedade.
A ética serve para que haja um equilíbrio e bom funcionamento social, possibilitando que ninguém saia
prejudicado. Neste sentido, a ética, embora não possa ser confundida com as leis, está relacionada com o
sentimento de justiça social.

240
A ética é construída por uma sociedade com base nos valores históricos e culturais. Do ponto de
vista da Filosofia, a Ética é uma ciência que estuda os valores e princípios morais de uma sociedade e
seus grupos.
Assim, a norma ética de conduta são as normas culturais. Ela visa especificar os comportamentos
dos indivíduos componentes de uma sociedade, e, por conseguinte, demonstrar o que é permitido,
proibido e obrigatório. As normas éticas possuem características comuns e várias espécies.
A ética militar vai compreender o sentimento de dever, a honra pessoal, o pundonor militar e o
decoro de classe. O Estatuto dos Militares, em seu artigo 28, estabelece formalmente os preceitos de ética
militar que devem ser observados pelos integrantes das Forças Armadas:

Art. 28. O sentimento do dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um
dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, com a
observância dos seguintes preceitos de ética militar:
I - amar a verdade e a responsabilidade como fundamento de dignidade pessoal;
II - exercer, com autoridade, eficiência e probidade, as funções que lhe couberem em
decorrência do cargo;
III - respeitar a dignidade da pessoa humana;
IV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das
autoridades competentes;
V - ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados;
VI - zelar pelo preparo próprio, moral, intelectual e físico e, também, pelo dos subordinados,
tendo em vista o cumprimento da missão comum;
VII - empregar todas as suas energias em benefício do serviço;
VIII - praticar a camaradagem e desenvolver, permanentemente, o espírito de cooperação;
IX - ser discreto em suas atitudes, maneiras e em sua linguagem escrita e falada;
X - abster-se de tratar, fora do âmbito apropriado, de matéria sigilosa de qualquer natureza;
XI - acatar as autoridades civis;
XII - cumprir seus deveres de cidadão;
XIII - proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular;
XIV - observar as normas da boa educação;
XV - garantir assistência moral e material ao seu lar e conduzir-se como chefe de família
modelar;
XVI - conduzir-se, mesmo fora do serviço ou quando já na inatividade, de modo que não
sejam prejudicados os princípios da disciplina, do respeito e do decoro militar;
XVII - abster-se de fazer uso do posto ou da graduação para obter facilidades pessoais de
qualquer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros;
XVIII - abster-se, na inatividade, do uso das designações hierárquicas:
a) em atividades político-partidárias;
b) em atividades comerciais;
c) em atividades industriais;
d) para discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou
militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnica, se devidamente autorizado; e

241
e) no exercício de cargo ou função de natureza civil, mesmo que seja da Administração
Pública; e
XIX - zelar pelo bom nome das Forças Armadas e de cada um de seus integrantes,
obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos da ética militar.

3.3.3 Deveres Militares


Deveres são as atividades, atos e circunstâncias que envolvem uma
determinada obrigação legal, moral ou ética. Normalmente estão relacionados a
determinadas atitudes que todos os indivíduos estão obrigados a cumprir, de
modo a assegurar aos demais a paz social.
Os deveres são um dos pontos mais importantes de todos os sistemas
jurídicos, uma vez que permite o alcance de sociedades mais equilibradas.
Devido às várias peculiaridades inerentes a vida militar, a legislação irá
impor a esta classe de servidores, diversos deveres que não terão um
correspondente em outros ramos de atividades. Todo este conjunto de obrigações
e deveres é que torna a carreira militar tão singular.
Por isso que todos os cidadãos que ingressam em uma das Forças devem
prestar o compromisso de honra, sob a forma de juramento à Bandeira, no qual
afirmará a sua aceitação consciente das obrigações e dos deveres militares e
manifestará a sua firme disposição de bem cumpri-los (artigos 32 e 33 do Estatuto
dos Militares).
Mas, quais são estes deveres?
O artigo 31 do Estatuto dos Militares elenca os deveres militares
essenciais, conforme abaixo:

Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como
morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente:
I - a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser
defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida;
II - o culto aos Símbolos Nacionais;
III - a probidade e a lealdade em todas as circunstâncias;
IV - a disciplina e o respeito à hierarquia;
V - o rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens; e
VI - a obrigação de tratar o subordinado dignamente e com urbanidade.

A violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime, contravenção ou


transgressão disciplinar (artigo 42 do Estatuto dos Militares). O Código Penal Militar (CPM) relaciona e
classifica os crimes militares, em tempo de paz e em tempo de guerra, e dispõe sobre a aplicação aos
militares das penas correspondentes aos crimes por eles cometidos (artigo 46 do Estatuto dos Militares).

242
Por outro lado, os regulamentos disciplinares das Forças Armadas especificarão e classificarão as
contravenções ou transgressões disciplinares e estabelecerão as normas relativas à amplitude e aplicação
das penas disciplinares, à classificação do comportamento militar e à interposição de recursos contra as
penas disciplinares. No âmbito da Marinha do Brasil (MB), o Regulamento Disciplinar para a Marinha
(RDM), matéria da nossa próxima aula, cumprirá com este papel.

3.3.4 Direitos
O artigo 50 do Estatuto dos Militares elenca uma série de direitos, os quais trabalharemos apenas
os principais.
Logo o primeiro trata da
garantia do oficial a sua patente em
toda a sua plenitude, com as
vantagens, prerrogativas e deveres a
ela inerentes. A patente é o título
que cada oficial carrega dentro das
Forças Armadas e exterioriza o seu
posto, que é o grau hierárquico do
oficial, conferido por ato do
Presidente da República ou do
Comandante de cada Força e
confirmado em Carta Patente. Já
falamos acerca dos deveres e no
próximo tópico, trataremos sobre as
prerrogativas.
Além disso, dentro das condições ou limitações impostas na legislação e regulamentação
específicas, todo militar tem direito:

- a estabilidade, quando praça com 10 ou mais anos de tempo de efetivo serviço;


- o uso das designações hierárquicas;
- a ocupação de cargo correspondente ao posto ou à graduação;
- a percepção de remuneração;
- a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes;
- o funeral para si e seus dependentes;
- a alimentação;
- fardamento, constituindo-se no conjunto de uniformes, roupa branca e roupa de cama, fornecido ao
militar na ativa de graduação inferior a terceiro-sargento e, em casos especiais, a outros militares;
- a moradia para o militar em atividade;

243
- a constituição de pensão militar;
- a promoção;
- a transferência a pedido para a reserva remunerada;
- as férias, os afastamentos temporários do serviço e as licenças;
- a demissão e o licenciamento voluntários;
- o porte de arma quando oficial em serviço ativo ou em inatividade, salvo caso de inatividade por
alienação mental ou condenação por crimes contra a segurança do Estado ou por atividades que
desaconselhem aquele porte;
- o porte de arma, pelas praças, com as restrições impostas pela respectiva Força Armada; e
- outros direitos previstos em leis específicas.

Em relação aos dependentes, a lei também elenca que é considerado dependente do militar:

- a esposa;
- o filho menor de 21 anos ou inválido ou interdito;
- a filha solteira, desde que não receba remuneração;
- o filho estudante, menor de 24 anos, desde que não receba remuneração;
- a mãe viúva, desde que não receba remuneração;
- o enteado, o filho adotivo e o tutelado, nas mesmas condições dos filhos;
- a viúva do militar, enquanto permanecer neste estado, e os demais dependentes mencionados nos itens
anteriores, desde que vivam sob a responsabilidade da viúva;
- a ex-esposa com direito à pensão alimentícia estabelecida por sentença transitada em julgado, enquanto
não contrair novo matrimônio.

São, ainda, considerados dependentes do militar, desde que vivam sob sua dependência
econômica, sob o mesmo teto, e quando expressamente declarados na organização militar competente:

- a filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde
que não recebam remuneração;
- a mãe solteira, a madrasta viúva, a sogra viúva ou solteira, bem como separadas judicialmente ou
divorciadas, desde que, em qualquer dessas situações, não recebam remuneração;
- os avós e os pais, quando inválidos ou interditos, e respectivos cônjuges, estes desde que não recebam
remuneração;
- o pai maior de 60 anos e seu respectivo cônjuge, desde que ambos não recebam remuneração;
- o irmão, o cunhado e o sobrinho, quando menores ou inválidos ou interditos, sem outro arrimo;
- a irmã, a cunhada e a sobrinha, solteiras, viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não
recebam remuneração;

244
- o neto, órfão, menor inválido ou interdito;
- a pessoa que viva, no mínimo há 5 anos, sob a sua exclusiva dependência econômica, comprovada
mediante justificação judicial;
- a companheira, desde que viva em sua companhia há mais de 5 anos, comprovada por justificação
judicial; e
- o menor que esteja sob sua guarda, sustento e responsabilidade, mediante autorização judicial.

Outro direito conferido aos militares é o gozo de férias regulamentares. As férias são afastamentos
totais do serviço, anual e obrigatoriamente concedidos aos militares para descanso, a partir do último mês
do ano a que se referem e durante todo o ano seguinte.
Compete aos Comandantes de Força regulamentar a concessão de férias, a qual não poderá ser
prejudicada pelo gozo anterior de licença para tratamento de saúde, nem por punição anterior decorrente
de contravenção ou transgressão disciplinar, ou pelo estado de guerra, ou para que sejam cumpridos atos
em serviço, bem como não anula o direito àquela licença.
Somente em casos de interesse da segurança nacional, de manutenção da ordem, de extrema
necessidade do serviço, de transferência para a inatividade, ou para cumprimento de punição decorrente
de contravenção ou de transgressão disciplinar de natureza grave e em caso de baixa a hospital, os
militares terão interrompido ou deixarão de gozar na época prevista o período de férias a que tiverem
direito, registrando-se o fato em seus assentamentos.
Além das férias, os militares têm direito, ainda, aos seguintes períodos de afastamento total do
serviço, obedecidas às disposições legais e regulamentares, por motivo de:

- núpcias: 8 dias;
- luto: 8 dias;
- instalação: até 10 dias; e
- trânsito: até 30 dias.

As férias e os demais afastamentos supramencionados são concedidos com a remuneração prevista


na legislação específica e computados como tempo de efetivo serviço para todos os efeitos legais.
Além destes afastamento, os militares também possuem direito ao gozo de determinadas licenças.
A licença é a autorização para afastamento total do serviço, em caráter temporário, concedida ao militar,
obedecidas às disposições legais e regulamentares. A licença pode ser:

- para tratar de interesse particular;


- para tratamento de saúde de pessoa da família;
- para tratamento de saúde própria; e
- para acompanhar cônjuge ou companheiro(a).

245
A remuneração do militar licenciado é regulada em legislação específica.
A concessão da licença também será regulada pelo Comandante da Força.
A licença para tratar de interesse particular é a autorização para o afastamento total do serviço,
concedida ao militar, com mais de 10 anos de efetivo serviço, que a requeira com aquela finalidade.
Esta licença será sempre concedida com prejuízo da remuneração e da contagem de tempo de
efetivo serviço, exceto, quanto a este último, para fins de indicação para a quota compulsória.
A licença para acompanhar cônjuge ou companheiro(a) é a autorização para o afastamento
total do serviço, concedida a militar com mais de 10 anos de efetivo serviço que a requeira para
acompanhar cônjuge ou companheiro(a) que, sendo servidor público da União ou militar das Forças
Armadas, for, de ofício, exercer atividade em órgão público federal situado em outro ponto do território
nacional ou no exterior, diverso da localização da organização militar do requerente.
Esta licença será concedida sempre com prejuízo da remuneração e da contagem de tempo de
efetivo serviço, exceto, quanto a este último, para fins de indicação para a quota compulsória.
O prazo-limite para esta licença será de 36 meses, podendo ser concedido de forma contínua ou
fracionada.
Para a concessão da licença para acompanhar companheiro(a), há necessidade de que seja
reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, de acordo com a
legislação específica.
Esta licença não será concedida quando o militar acompanhante puder ser passado à disposição ou
à situação de adido ou ser classificado/lotado em organização militar das Forças Armadas para o
desempenho de funções compatíveis com o seu nível hierárquico, a qual será efetivada sem ônus para a
União e sempre com a aquiescência das Forças Armadas envolvidas.
As licenças poderão ser interrompidas a pedido ou nas condições abaixo.
A interrupção da licença especial, da licença para tratar de interesse particular e da licença para
acompanhar cônjuge ou companheiro(a) poderá ocorrer:

- em caso de mobilização e estado de guerra;


- em caso de decretação de estado de emergência ou de estado de sítio;
- para cumprimento de sentença que importe em restrição da liberdade individual;
- para cumprimento de punição disciplinar, conforme regulamentação de cada Força; e
- em caso de denúncia ou de pronúncia em processo criminal ou indiciação em inquérito militar, a juízo
da autoridade que efetivou a denúncia, a pronúncia ou a indiciação.

3.3.5 Prerrogativas
Prerrogativa é a vantagem de algumas pessoas por pertencerem a determinado grupo, que as
diferenciam dos demais. É o direito próprio de um determinado ofício, cargo ou profissão. É sinônimo de
privilégio.

246
O artigo 73 do Estatuto dos Militares dispõe sobre as prerrogativas dos militares, as quais serão
constituídas pelas honras, dignidades e distinções, conforme abaixo:

Art. 73. As prerrogativas dos militares são constituídas pelas honras, dignidades e distinções
devidas aos graus hierárquicos e cargos.
Parágrafo único. São prerrogativas dos militares:
a) uso de títulos, uniformes, distintivos, insígnias e emblemas militares das Forças Armadas,
correspondentes ao posto ou graduação, Corpo, Quadro, Arma, Serviço ou Cargo;
b) honras, tratamento e sinais de respeito que lhes sejam assegurados em leis e regulamentos;
c) cumprimento de pena de prisão ou detenção somente em organização militar da respectiva
Força cujo comandante, chefe ou diretor tenha precedência hierárquica sobre o preso ou, na
impossibilidade de cumprir esta disposição, em organização militar de outra Força cujo
comandante, chefe ou diretor tenha a necessária precedência; e
d) julgamento em foro especial, nos crimes militares.

Além disso, o militar só poderá ser preso por autoridade policial


em caso de flagrante delito ou por ordem judicial, ficando a autoridade
obrigada a entregá-lo imediatamente à autoridade militar mais próxima,
só podendo retê-lo, na delegacia ou posto policial, durante o tempo
necessário à lavratura do flagrante (artigo 74 do Estatuto dos Militares).
Os militares da ativa, no exercício de funções militares, são
dispensados do serviço na instituição do Júri e do serviço na Justiça
Eleitoral (artigo 75 do Estatuto dos Militares).
Por fim, os uniformes das Forças Armadas, com seus distintivos,
insígnias e emblemas, são privativos dos militares e simbolizam a
autoridade militar, com as prerrogativas que lhe são inerentes,
constituindo crime o desrespeito aos uniformes, distintivos, insígnias e
emblemas militares, bem como seu uso por quem a eles não tiver direito
(artigo 76 do Estatuto dos Militares).

247
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer uma parada, a fim de verificar o aprendizado alcançado nesta aula. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) As Forças Armadas são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa
da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

2) ( ) A ética militar vai compreender o sentimento de dever, a honra pessoal, o pundonor militar e o
decoro de classe.

3) ( ) A violação das obrigações ou dos deveres militares sempre constituirá crime.

4) ( ) A licença para acompanhar cônjuge ou companheiro(a) será concedida sempre com prejuízo
da remuneração e da contagem de tempo de efetivo serviço, tendo como prazo-limite 2 anos,
podendo ser concedido de forma contínua ou fracionada.

5) ( ) Os militares da ativa, no exercício de funções militares, são dispensados do serviço na instituição


do Júri e do serviço na Justiça Eleitoral.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

6) São manifestações essenciais do valor militar, EXCETO:

(A) o espírito de luta e aguerrido.

(B) o civismo e o culto das tradições históricas.

(C) a fé na missão elevada das Forças Armadas.

(D) o amor à profissão das armas e o entusiasmo com que é exercida.

(E) o aprimoramento técnico-profissional.

248
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 E
4 E
5 C
6 A

RECADO FINAL:

Nesta aula, pudemos revisar conceitos muito importante à nossa carreira militar, contidos no
Estatuto dos Militares. Citamos os valores militares, falamos sobre ética militar, trouxemos os direitos e
deveres dos militares e ainda mencionamos as prerrogativas militares.
Na próxima aula, continuaremos a tratar de assuntos específicos da vida militar, e mais ainda do
militar naval, abordaremos o Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM).
Dito isto...
Até a próxima aula!

249
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Nesta aula falaremos sobre o Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM), que ao lado do
Estatuto dos Militares, visto na aula anterior, são os documentos fundamentais, onde estão alicerçadas as
bases da vida militar naval.
Aproveite esta oportunidade para rever alguns conceitos que já podem ter ficado um pouco para
trás ao longo dos anos.
Vamos que vamos!

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar o Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM);
- Descrever a contravenção disciplinar;
- Citar as penas disciplinares; e
- Descrever os recursos.

INTRODUÇÃO:
O estudo das questões afetas à vida da caserna ainda se apresenta cercado de algumas dúvidas, o
que permite grandes controvérsias, em especial no que diz respeito à natureza jurídica da punição
disciplinar aplicada pela prática de transgressões disciplinares.
As particularidades do Direito Militar apontam nítidos pontos de encontro entre as esferas
disciplinar e penal, as quais se diferenciam apenas pelo grau de ilicitude. No Regulamento Disciplinar
para a Marinha (RDM), temos que ambos, o crime militar e a contravenção disciplinar, se constituem em
violação do dever militar, sendo o primeiro mais grave e o segundo mais simples.
Enfrentaremos alguns destes temas nesta aula.
Então, vamos trabalhar!

3.4 REGULAMENTO DISCIPLINAR PARA A MARINHA (RDM)


3.4.1 Conceito
O Regulamento Disciplinar
para a Marinha (RDM) tem por
propósito a especificação e a
classificação das contravenções
disciplinares e o estabelecimento
das normas relativas à amplitude e à
aplicação das penas disciplinares,
à classificação do comportamento

250
militar e à interposição de recursos contra as penas disciplinares.
Então, diferentemente do que vimos na última aula, o RDM não se aplica a todas as Forças
Armadas, mas tão somente a Marinha do Brasil (MB). As prescrições do RDM se aplicam aos militares
da Marinha da ativa, da reserva remunerada e aos reformados. Cada Força terá o seu próprio regulamento.
Outro ponto interessante é que o RDM se refere apenas a contravenções disciplinares. Então,
quando estivermos diante de um eventual cometimento de crime, o RDM não será o documento hábil a
nos orientar.
Apesar do conceito legal de hierarquia e disciplina contidos no artigo 14 do Estatuto dos Militares,
que vimos na última aula, o RDM achou por bem, em seus artigos 2º e 3º, complementar e adaptar estas
definições especificamente ao cotidiano da MB:

Art . 2º - Disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos,


normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento
regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de
cada um dos componentes desse organismo.
Parágrafo único - A disciplina militar manifesta-se basicamente pela:
- obediência pronta às ordens do superior;
- utilização total das energias em prol do serviço;
- correção de atitudes; e
- cooperação espontânea em benefício da disciplina coletiva e da eficiência da instituição.
Art . 3º - Hierarquia Militar é a ordenação da autoridade em níveis diferentes, dentro da estrutura
militar. A ordenação se faz por postos ou graduações; dentro de um mesmo posto ou graduação, se
faz pela antiguidade no posto ou na graduação.
Parágrafo único - O respeito à hierarquia é consubstanciado no espírito de acatamento à seqüência
de autoridade.

Perceba que os conceitos supracitados são muito parecidos com o que já vimos na nossa última
aula sobre Estatuto dos Militares.

3.4.2 Contravenções Disciplinares


Contravenção Disciplinar é toda ação ou omissão contrária às obrigações ou aos deveres militares
estatuídos nas leis, nos regulamentos, nas normas e nas disposições em vigor que fundamentam a
Organização Militar, desde que não incidindo no que é capitulado pelo Código Penal Militar como crime.
Lembrando que a violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime, contravenção
ou transgressão disciplinar (artigo 42 do Estatuto dos Militares). Contravenção ou transgressão disciplinar
são expressões sinônimas. E qual a diferença entre o crime e a contravenção disciplinar?
Crime é uma ação ou omissão que, a juízo do legislador, contrasta violentamente com valores ou
interesses da sociedade e que seja proibida sob ameaça de pena. Muito abstrato? Afinal de contas como
vou saber o que é crime ou contravenção disciplinar? O crime é algo que uma determinada sociedade
considera muito grave, seria uma ofensa mais grave aos preceitos preservados por esta sociedade. E como
eu vou saber isso? Muito simples. A lei vai me dizer o que é crime. Onde? Normalmente, o Código Penal
251
(CP) e o Código Penal Militar (CPM) vão nos dizer quais serão os crimes comuns e os crimes militares.
Mas, em Direito Penal, temos algumas leis chamadas extravagantes, que são um conjunto de leis relativas
a matérias penais que já foram compiladas nos Códigos supracitados, que entram em vigor com um
caráter suplementar. Resumindo, são leis penais fora dos Códigos Penais.

Ex.: Lei de Crimes Hediondos, Lei Maria da Penha, Lei de Drogas, Crimes Ambientais, Estatuto do
Desarmamento e etc.

Concluindo, o que a lei nos disser que é crime, será crime. O que restar poderá ser enquadrado
como contravenção disciplinar.
O tão famigerado artigo 7º do RDM nos trará as hipóteses de contravenções disciplinares. Não
iremos reproduzi-lo aqui, pois ficaria demasiado extenso expor as 84 situações previstas. Mas,
gostaríamos de reproduzir apenas o parágrafo único deste artigo 7º.

Art . 7º - São contravenções disciplinares:


Parágrafo único - São também consideradas contravenções disciplinares todas as omissões do
dever militar não especificadas no presente artigo, desde que não qualificadas como crimes nas leis
penais militares, cometidas contra preceitos de subordinação e regras de serviço estabelecidos nos
diversos regulamentos militares e determinações das autoridades superiores competentes.

Note que temos aqui uma norma de caráter geral e bastante abrangente, praticamente reproduzida
por todos os Regulamentos Disciplinares militares e que por sua proposital imprecisão e flexibilidade,
permite uma grande margem de discricionariedade para se apreciar o comportamento de um subordinado,
a fim de otimizar a conveniência e a oportunidade da aplicação de uma eventual sanção administrativa.
Realmente por este parágrafo único muita coisa pode ser enquadrada como contravenção disciplinar.
As contravenções disciplinares são classificadas em graves e leves, conforme o dano que
causarem à disciplina ou ao serviço, em virtude da sua natureza intrínseca, ou das consequências que
delas advierem, ou puderem advir, pelas circunstâncias em que forem cometidas.
O artigo 10 do RDM nos traz a situações agravantes da contravenção disciplinar:

- acúmulo de contravenções simultâneas e correlatas;


- reincidência;
- conluio de duas ou mais pessoas;
- premeditação;
- ter sido praticada com ofensa à honra e ao pundonor militar;
- ter sido praticada durante o serviço ordinário ou com prejuízo do serviço;
- ter sido cometida estando em risco a segurança da Organização Militar;
- maus antecedentes militares;
- ter o contraventor abusado da sua autoridade hierárquica ou funcional; e
- ter cometido a falta em presença de subordinado.

252
Por sua vez, o artigo 11 do RDM nos apresenta as situações atenuantes da contravenção
disciplinar:

- bons antecedentes militares;


- idade menor de 18 anos;
- tempo de serviço militar menor de seis meses;
- prestação anterior de serviços relevantes já reconhecidos;
- tratamento em serviço ordinário com rigor não autorizado pelos regulamentos militares; e
- provocação.

Temos ainda algumas situações que serão consideradas justificativas ou dirimentes da


contravenção disciplinar, expostas no artigo 12 do RDM:

- ignorância plenamente comprovada da ordem transgredida;


- força maior ou caso fortuito plenamente comprovado;
- evitar mal maior ou dano ao serviço ou à ordem pública;
- ordem de superior hierárquico; e
- legítima defesa, própria ou de outrem.

Todas estas contravenções disciplinares vistas acima serão punidas com penas disciplinares, as
quais começaremos a ver agora.

3.4.3 Penas Disciplinares


O artigo 14 do RDM elenca as penas disciplinares aplicadas no âmbito da MB:

Art . 14 - As penas disciplinares são as seguintes:


a) para Oficiais da ativa:
1. repreensão;
2. prisão simples, até 10 dias; e
3. prisão rigorosa, até 10 dias.
b) para Oficiais da reserva que exerçam funções de atividade:
1. repreensão;
2. prisão simples, até 10 dias;
3. prisão rigorosa, até 10 dias; e
4. dispensa das funções de atividade.
c) para os Oficiais da reserva remunerada não compreendidos na alínea anterior e os reformados:
1. repreensão
2. prisão simples, até 10 dias; e
3. prisão rigorosa, até 10 dias.
d) para Suboficiais:

253
1. repreensão;
2. prisão simples, até 10 dias;
3. prisão rigorosa, até 10 dias; e
4. exclusão do serviço ativo, a bem da disciplina.
e) para Sargentos:
1. repreensão;
2. impedimento, até 30 dias;
3. prisão simples, até 10 dias;
4. prisão rigorosa, até 10 dias; e
5. licenciamento ou exclusão do serviço ativo, a bem da disciplina.
f) para Cabos, Marinheiros e Soldados:
1. repreensão;
2. impedimento, até 30 dias;
3. serviço extraordinário, até 10 dias;
4. prisão simples, até 10 dias;
5. prisão rigorosa, até 10 dias; e
6. licenciamento ou exclusão do serviço ativo, a bem da disciplina.
Parágrafo único - Às Praças da reserva ou reformados aplicam-se as mesmas penas estabelecidas
neste artigo, de acordo com a respectiva graduação.

Note que as penas disciplinares


não se aplicam apenas aos militares da
ativa, mas também aos da reserva, e até
mesmo reformados.
Existe ainda a figura da
admoestação, quando o superior mostra ao
subalterno a irregularidade praticada no
serviço ou chama sua atenção. Seria uma
espécie de "puxão de orelha". Esta
admoestação não é considerada como
pena.
Por uma única contravenção não pode ser aplicada mais de uma punição (artigo 17 do RDM).
Entretanto, quando o contraventor houver cometido contravenções simultâneas mas não correlatas, ser-
lhe-ão impostas penas separadamente (artigo 29 do RDM).
A punição disciplinar não exime o apenado de ressarcir eventuais prejuízos financeiros que a sua
conduta tenha trazido.

3.4.3.1 Competência
Pela leitura do artigo 19 do RDM, podemos inferir que qualquer Titular de OM possui
competência para impor penas disciplinares aos seus comandados ou aos que servem sob sua direção ou

254
ordem. Além disso, o Presidente da República e o Comandante da Marinha possuem competência para
imposição de penas disciplinares a todos os militares da MB.
Os Almirantes poderão delegar esta competência, no todo ou em parte, a Oficiais subordinados.
A pena de licenciamento e exclusão do serviço ativo da Marinha será imposta pelo Comandante da
Marinha ou por autoridade que dele tenha recebido delegação de competência.
A pena de licenciamento do serviço ativo da Marinha ex officio, a bem da disciplina, será aplicada
às Praças prestando serviço militar inicial pelo Comandante de Distrito Naval ou de Comando Naval onde
ocorreu a incorporação, de acordo com o Regulamento da Lei do Serviço Militar.
Os Comandantes dos Distritos Navais ou de Comando Naval têm competência, ainda, para aplicar
punição aos militares da reserva remunerada ou reformados que residem ou exercem atividades na área de
jurisdição do respectivo Comando, respeitada a precedência hierárquica.

3.4.3.2 Cumprimento
A repreensão consistirá na declaração formal de que o contraventor é assim punido por haver
cometido determinada contravenção, podendo ser aplicada em particular ou não (artigo 21 do RDM).
A pena de impedimento obriga o contraventor a permanecer na Organização Militar (OM), sem
prejuízo de qualquer serviço que lhe competir (artigo 22 do RDM).
A pena de serviço extraordinário consistirá no desempenho pelo contraventor de qualquer serviço
interno, inclusive faina, em dias e horas em que não lhe competir esse serviço (artigo 23 do RDM).
A pena de prisão simples consiste no recolhimento (artigo 24 do RDM):

- do Oficial, Suboficial ou Sargento na OM ou outro local determinado, sem prejuízo do serviço interno
que lhe couber; e
- da Praça, à sua coberta na OM ou outro local determinado, sem prejuízo dos serviços internos que lhe
couberem, salvo os de responsabilidade e confiança.

A pena de prisão rigorosa consiste no recolhimento (artigo 25 do RDM):

- do Oficial, Suboficial ou Sargento aos recintos que na OM forem destinados ao uso do seu círculo; e
- da Praça, à prisão fechada.

Quando na OM não houver lugar ou recinto apropriado ao cumprimento da prisão rigorosa com a
necessária segurança ou em boas condições de higiene, o Comandante ou autoridade equivalente
solicitará que esse cumprimento seja feito em outra OM em que isto seja possível.
A critério da autoridade que as impôs, as penas de prisão simples e prisão rigorosa poderão ser
cumpridas pelas Praças, computando-se 2 dias de impedimento para cada dia de prisão simples e 3 dias de
impedimento para cada dia de prisão rigorosa.

255
3.4.3.3 Imposição
Para a imposição de penas disciplinares deverão ser observados os princípios constitucionais de
contraditório e ampla defesa. Logo, nenhuma pena será imposta sem ser ouvido o contraventor e serem
devidamente apurados os fatos.
Quando houver necessidade de maiores esclarecimentos sobre a contravenção, a autoridade
mandará proceder à Sindicância ou, se houver indício de crime, ao IPM, de acordo com as normas e
prazos legais.
A autoridade julgará com imparcialidade e isenção de ânimo a gravidade da contravenção, sem
condescendência ou rigor excessivo, levando em conta as circunstâncias justificativas ou atenuantes, em
face das disposições do RDM e tendo sempre em vista os acontecimentos e a situação pessoal do
contraventor.

3.4.4 Recursos
Em linhas gerais, àquele a quem for imposta pena disciplinar será facultado solicitar
reconsideração da punição à autoridade que a aplicou, devendo esta apreciar e decidir sobre a mesma
dentro de 8 dias úteis, contados do recebimento do pedido (artigo 45 do RDM).
Então, este primeiro recurso, Pedido de Reconsideração é direcionado a mesma autoridade que
impôs a pena disciplinar.
Por outro lado, não obtendo êxito, este militar ainda poderá, verbalmente ou por escrito, por via
hierárquica e em termos respeitosos, recorrer à autoridade superior à que a impôs, pedindo sua anulação
ou modificação, com prévia licença desta primeira autoridade julgadora. Este segundo recurso também
terá prazo de 8 dias úteis, devendo ser devidamente informado pela autoridade que tiver imposto a pena.
Se o recurso for julgado inteiramente procedente, a punição será anulada e cancelado tudo quanto
a ela se referir; se apenas em parte, será modificada a pena (artigo 49 do RDM).

256
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer uma parada, a fim de verificar o aprendizado alcançado nesta aula. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O RDM se aplica somente aos militares da Marinha da ativa.

2) ( ) Contravenção Disciplinar é toda ação ou omissão contrária às obrigações ou aos deveres militares,
mesmo que seja considerado como crime pelo Código Penal Militar (CPM).

3) ( ) Por uma única contravenção disciplinar não pode ser aplicada mais de uma punição.

4) ( ) Àquele a quem for imposta pena disciplinar será facultado solicitar reconsideração da punição
à autoridade que a aplicou, devendo esta apreciar e decidir sobre a mesma dentro de 8 dias úteis,
contados do recebimento do pedido.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) São penas disciplinares aplicadas a Sargentos, EXCETO:

(A) repreensão.

(B) impedimento, até 10 dias.

(C) prisão simples, até 10 dias.

(D) prisão rigorosa, até 10 dias.

(E) licenciamento ou exclusão do serviço ativo, a bem da disciplina.

257
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 C
4 C
5 B

RECADO FINAL:

Nesta aula, pudemos revisar mais alguns conceitos muito importante à nossa carreira militar naval,
contidos no Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM). Descrevemos o que é uma contravenção
disciplinar e a diferenciamos do crime. Ainda citamos as penas disciplinares e explicamos os recursos,
citando os prazos aplicáveis. Alguns destes últimos conceitos ainda serão mais aprofundados na última
aula desta Unidade de Ensino, quando falaremos sobre algumas questões disciplinares e especificamente
acerca da audiência do Comandante perante os princípios de ampla defesa e do contraditório.
Nem preciso falar que o que vimos aqui hoje será muito importante para estas próximas aulas.
Dito isto...
Até a próxima aula!

258
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Agora que já falamos sobre o Estatuto dos Militares e do Regulamento Disciplinar para a Marinha
(RDM), podemos avançar para alguns procedimentos de grande relevância no âmbito militar.
Nesta aula, falaremos de um processo administrativo disciplinar específico da caserna, que é o
Conselho de Disciplina.
Vamos nessa!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as Autoridades Nomeantes;
- Conceituar Conselho de Disciplina;
- Citar as hipóteses de submissão a Conselho;
- Citar os direitos do acusado;
- Citar a composição do Conselho de Disciplina;
- Descrever a Portaria de Afastamento das Funções;
- Citar os prazos; e
- Descrever o Libelo Acusatório.

INTRODUÇÃO:
Quando um empresário possui um mau funcionário, o que ele faz? Provavelmente demite, né. Mal
ou bem, esta sistemática de contratações e demissões funciona na iniciativa privada. Mas, e no setor
público, como funciona?
Huummm...
Bom, no setor público não é bem assim. Nem de um lado, nem de outro. Na Administração
Pública, "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público
de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na
forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração", conforme artigo 37, II da Constituição. Logo, para o exercício de cargo efetivo,
a pessoa deverá ser previamente selecionada através de um concurso público.
Ok, entendi. E a demissão, como funciona?
Bem, o servidor ao garantir a estabilidade, somente poderá ser demitido através de um Processo
Administrativo com direito a contraditório e ampla defesa.
Nesta aula, nós começaremos a ver os procedimentos relativos ao Conselho de Disciplina, que
nada mais é que um processo administrativo disciplinar efetuado em âmbito militar, destinado,
principalmente, a julgar a capacidade das praças com estabilidade para a permanência na ativa.

259
3.5 CONSELHO DE DISCIPLINA
3.5.1 - Autoridades Nomeantes
A nomeação de Conselho de Disciplina (CD), por deliberação própria ou por ordem superior, é da
competência:

- do Oficial-General em cargo de Comando ou correspondente, posicionado na linha de subordinação


direta do Guarda-Marinha ou Suboficial da ativa, a ser julgado;
- do Comandante do Distrito (DN) a que estiver vinculada a praça da reserva remunerada ou reformada, a
ser julgada; ou
- do Comandante ou autoridade com atribuições equivalentes estabelecidas no regimento interno da OM
respectiva, no caso das demais praças com estabilidade assegurada.

3.5.2 Conceito
Trata-se de um processo disciplinar de caráter administrativo, independente de ação penal,
podendo, entretanto, tornar-se peça a ser utilizada na instrução de processo criminal na Justiça Militar,
caso as acusações provadas e consideradas procedentes constituam ilícito penal militar. O CD é previsto
no Decreto nº 71.500/1972, sendo aplicadas, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo
Penal Militar (CPPM).
O CD é destinado a julgar a capacidade dos Guardas-Marinha e das praças com estabilidade
assegurada para a permanência na ativa, como também das praças reformadas ou na reserva remunerada,
presumivelmente incapazes de permanecerem na situação de inatividade em que se encontram, criando-
lhes, ao mesmo tempo, condições para se defenderem.

3.5.3 Submissão a Conselho


O artigo 2° do Decreto nº 71.500/1972 enumera as hipóteses de submissão a Conselho de
Disciplina. Vejamos:

Art . 2º É submetida a Conselho de Disciplina, " ex officio ", a praça referida no artigo 1º e seu
parágrafo único.
I - acusada oficialmente ou por qualquer meio lícito de comunicação social de ter:
a) procedido incorretamente no desempenho do cargo;
b) tido conduta irregular; ou
c) praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou decoro da classe;
II - afastado do cargo, na forma do Estatuto dos Militares, por se tornar incompatível com o
mesmo ou demonstrar incapacidade no exercício de funções militares a ele inerentes, salvo se o
afastamento é decorrência de fatos que motivem sua submissão a processo;
III - condenado por crime de natureza dolosa, não previsto na legislação especial concernente à
segurança do Estado, em tribunal civil ou militar, a pena restritiva de liberdade individual até 2
(dois) anos, tão logo transite em julgado a sentença; ou

260
IV - pertencente a partido político ou associação, suspensos ou dissolvidos por força de disposição
legal ou decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou perigosas à segurança
nacional.
Parágrafo único. É considerada entre os outros, para os efeitos deste decreto, pertencente a partido
ou associação a que se refere este artigo a praça das Forças Armadas que, ostensiva ou
clandestinamente:
a) estiver inscrita como seu membro;
b) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício;
c) realizar propaganda de suas doutrinas; ou
d) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo inequívoco ou doloso, em suas atividades.

Em relação ao inciso I, o item 4.4.1 da DGPM-315 nos explica um pouco melhor sobre o
entendimento de cada alínea:

- Procedido incorretamente no desempenho de cargo:


Considera-se que a praça tenha procedido incorretamente no desempenho de cargo quando a sua
atuação funcional tenha tido relação de causa e efeito, por ação ou omissão, com contravenção
disciplinar considerada grave ou com ilícito penal, a ponto de torná-la incompatível com o exercício do
cargo.

- Tido conduta irregular:


Considera-se conduta irregular, o fato de a praça ter sido punida com, no mínimo, 30 dias de
prisão rigorosa no espaço de 12 meses consecutivos, ou, no mesmo período, houver perdido 90 pontos
no comportamento, em razão de punições disciplinares ou conversão de pontos perdidos em razão de
condenação criminal transitada em julgado, a ponto de abalar fortemente a confiança de seus superiores
hierárquicos.

- Praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe:
Considera-se ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe a não
observância dos preceitos da ética militar, preconizados sobretudo no artigo 28 do Estatuto dos Militares
(EM), conforme verificado no item 3.3 deste capítulo.

Um militar é considerado acusado oficialmente a partir da aceitação, pela autoridade que nomeará
o Conselho, de uma Parte Acusatória, formulada por oficial, o acusador, que tenha tido conhecimento,
por qualquer meio lícito de comunicação social, de fato(s) que abale(m), fortemente, a reputação do
mesmo no meio naval ou na sociedade em geral.
Considera-se meio lícito de comunicação social: os assentamentos dos militares, peças de
inquéritos e processos, depoimentos datados, assinados e testemunhados, relatos de ocorrência datados e
assinados, todas as formas de correspondência administrativa oficial, divulgações na imprensa e cartas

261
datadas e assinadas, após a verificação da existência e do paradeiro do remetente, desde que autorizada a
divulgação do seu conteúdo pelo destinatário e remetente, conforme o caso.

3.5.4 Direitos do Acusado


Ao acusado é assegurada ampla defesa, podendo requerer a produção, perante o Conselho, de
todas as provas permitidas no CPPM, além de poder examinar ou retirar cópias dos documentos
componentes dos autos, findos ou em andamento, em meio físico ou digital.
O Conselho poderá ser acompanhado por advogado, legalmente habilitado junto à Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), contratado pelo acusado, quando este o desejar. O advogado deverá ser
notificado, por meio oficial, com antecedência de pelo menos 3 (três) dias úteis, de todas as sessões do
Conselho. Caso o acusado deseje um defensor, mas não haja quem indicar, caberá a ele a solicitação à
Defensoria Pública da União da designação de Defensor Público para acompanhar e efetivar a sua defesa.
No caso de o acusado constituir advogado, deverá ser anexada a procuração aos autos.
Ocorrendo a revelia, caberá à autoridade nomeante a designação de um Oficial, bacharel em
Direito sempre que possível, para a defesa, mediante Portaria.
Em qualquer caso, a não indicação de advogado ou de Defensor Público não impedirá a
instauração do Conselho, vide Súmula Vinculante nº 5 do STF, a qual diz que: "A falta de defesa técnica
por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição"; e não ofenderá os
princípios do contraditório e da ampla defesa, desde que o acusado, de forma voluntária e formal, por
meio de declaração, dispense tal prerrogativa.

3.5.5 Composição do Conselho de Disciplina


O Conselho é nomeado mediante expedição de Portaria de Nomeação, sendo composto de três
oficiais de Marinha, da ativa, sendo o Presidente, no mínimo, um Capitão-Tenente, o que lhe segue
em antiguidade, o Inquiridor e Relator, e o mais moderno, o Escrivão.
A distribuição da Portaria de Nomeação será feita da seguinte maneira: o original, com anexos,
para o Presidente, e as cópias, sem anexos, para os demais membros, ao acusado, à autoridade superior
que tenha ordenado a nomeação (se for o caso), à DPMM ou o CPesFN (se o acusado pertencer ao CFN),
à DEnsM (se o acusado for Guarda-Marinha), ao Comando do DN da área e ao CIM.
Imediatamente após a assinatura da Portaria, a autoridade nomeante informará, por mensagem, à
DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso, a nomeação do Conselho.
Não podem fazer parte do Conselho:

- o oficial que formulou a acusação;


- oficiais que tenham entre si, com o acusador ou com o acusado parentesco consanguíneo ou afim, na
linha reta ou até o 4° grau de consanguinidade colateral ou de natureza civil;
- oficiais que tenham particular interesse nas decisões do Conselho; e

262
- oficiais que não tenham asseguradas suas permanências definitivas no Serviço Ativo da Marinha
(SAM).

3.5.6 Portaria de Afastamento das Funções


A praça da ativa ou da reserva remunerada designada para o serviço ativo será afastada do
exercício de suas funções ao ser submetida a CD.
O afastamento será determinado pela primeira autoridade da cadeia de comando do acusado
(comandante ou autoridade equivalente).
A distribuição da Portaria de Afastamento das Funções será feita da seguinte maneira: o original,
com o “ciente”, datado e assinado pelo acusado, para o Presidente, e as cópias para o acusado, o DPMM
ou o CPesFN, conforme o caso, e o setor responsável pela redistribuição de pessoal correspondente.
A Portaria de Afastamento das Funções deverá ser transcrita nos assentamentos do acusado,
ficando o mesmo privado do exercício de qualquer função militar, até a solução expedida pela Autoridade
Nomeante. A reassunção das funções deverá ser efetivada por meio de Portaria, da mesma autoridade que
determinou o afastamento, que deverá ser transcrita no assentamento do militar.
Os autos do CD serão classificados como INFORMAÇÃO PESSOAL, nos termos do artigo 4º, IV
da Lei nº 12.527/2011, regulamentada pelo Decreto nº 7.724/2012. A Autoridade Nomeante poderá
atribuir grau de sigilo superior, observadas as normas para salvaguarda de assuntos sigilosos.

3.5.7 Prazos
O Conselho deverá ser instaurado tão logo
as autoridades que tiverem competência para
instaurá-lo venham a tomar conhecimento de fato
que enseje a sua abertura, de modo a evitar que
não haja prejuízo à hierarquia e à disciplina, bem
como a eventual prescrição dos fatos.
Se o CD tiver como causa o fato de o
militar ter sido punido com mais de trinta dias de
prisão rigorosa no espaço de doze meses
consecutivos e se ainda estiver cumprindo tal
pena, o Conselho só poderá ser aberto após o cumprimento da pena e decorrido o prazo de 8 dias úteis de
que dispõe o militar para recorrer à Autoridade que a aplicar, nos termos do artigo 46, § 1º, do Decreto nº
88.545/1983 (RDM).
Vejamos os demais prazos envolvidos no Conselho de Disciplina:

263
Prazo Fundamento
pelo menos 7 dias corridos após a primeira
Qualificação e Interrogatório Artigo 402 do CPPM
sessão (Libelo Acusatório)
até 5 dias corridos após a audiência de Artigo 9º do Decreto
Defesa Prévia
qualificação e interrogatório do acusado 71.500/1972
Oitiva das Testemunhas Notificação com antecedência mínima de 3 dias Artigo 421 do CPPM
até 8 dias corridos após a última sessão que
Vistas aos Autos anteceder à elaboração do Relatório, para a Artigo 428 do CPPM
elaboração das alegações finais de defesa
até 8 dias corridos após a última sessão que
Alegações Finais de Defesa anteceder à elaboração do Relatório, para a Artigo 428 do CPPM
elaboração das alegações finais de defesa
Conclusão 30 dias, a contar da data de nomeação 4.15.7 da DGPM-315
20 dias após recebidos os autos pela
Solução 4.15.8 da DGPM-315
Autoridade Nomeante
Recursos 10 dias após a entrega do Relatório 4.15.9 da DGPM-315
Prorrogação 20 dias 4.16.2 da DGPM-315

A solicitação da prorrogação do prazo deverá ser feita pelo Presidente à Autoridade Nomeante,
por ofício ou mensagem, em que serão explanados os motivos da necessidade de prorrogação e o número
de dias necessários para a conclusão dos trabalhos.
Em caso de necessidade, por motivo de saúde que impeça o acusado de participar das sessões do
Conselho, este poderá ser suspenso até seu restabelecimento, mediante prévia autorização da
DPMM/CPesFN, com prazo que lhe restava no momento da suspensão, adotando-se providências citadas
no inciso 4.36.1 da DGPM-315.

3.5.8 Libelo Acusatório


O Libelo Acusatório deve descrever, com minúcias, o tempo, o lugar e a exposição do fato ou
descrição dos atos que ao acusado são imputados, contendo a acusação de forma clara, objetiva e calcada
em provas legalmente admitidas, além do enquadramento deste nas hipóteses previstas no Decreto n°
71.500/1972, fazendo-se, sempre que possível, correlação com os preceitos descritos nos artigos 27 a 31
do Estatuto dos Militares.
O Libelo Acusatório deverá conter, obrigatoriamente, o rol de testemunhas de acusação que os
membros do Conselho julgarem necessárias para o esclarecimento dos fatos.

264
3.5.9 Inspeção de Saúde
Recebidas as Portarias de Nomeação e, se for o caso, de Afastamento das Funções, o Presidente
apresentará o acusado à Junta de Saúde competente, mediante ofício, para que seja submetido à inspeção
de saúde para fim de Justiça e Disciplina, somente na hipótese de o acusado estar com sua inspeção de
saúde regular vencida.
A mensagem da Junta de Saúde, julgando o acusado apto a responder a Conselho, não supre a
necessidade do TIS ser juntado aos autos, antes da feitura do “Relatório”.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos novamente fazer uma pequena pausa para revisar o que você aprendeu nesta aula.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Conselho de Disciplina poderá ser nomeado a pedido da praça, quando este desejar se justificar,
para esclarecimento dos fatos.

265
2) ( ) Considera-se que a praça tenha procedido incorretamente no desempenho de cargo quando houver
perdido 90 pontos no comportamento, em razão de punições disciplinares ou conversão de pontos
perdidos em razão de condenação criminal transitada em julgado.

3) ( ) O Libelo Acusatório deverá conter, obrigatoriamente, o rol de testemunhas de acusação que os


membros do Conselho julgarem necessárias para o esclarecimento dos fatos.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Para fins de Conselho de Disciplina, NÃO é considerado como pertencente a partido político ou
associação a Praça das Forças Armadas que, ostensiva ou clandestinamente:

(A) estiver inscrita como seu membro.

(B) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício.

(C) realizar propaganda de suas doutrinas.

(D) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo inequívoco ou doloso, em suas atividades.

(E) candidatar-se a qualquer cargo público eletivo.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 C
4 E

RECADO FINAL:

Nesta aula, começamos a ver os dispositivos relativos ao Conselho de Disciplina.


Trouxemos alguns conceitos iniciais, mas que serão de suma importância para o entendimento da
próxima aula, quando fecharemos este assunto.
Então, procure dar uma boa revisada nesta aula antes de avançar à próxima.
Dito isto...
Até a próxima aula!

266
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na nossa última aula, iniciamos o assunto Conselho de Disciplina. Tratamos das questões mais
introdutórias, tais como: a competência da Autoridade Nomeante; conceituamos o Conselho de
Disciplina; bem como trouxemos as hipóteses de submissão a Conselho; citamos os direitos do acusado;
citamos a composição do Conselho; abordamos os prazos envolvidos no procedimento e descrevemos o
que é o Libelo Acusatório.
Nesta aula, encerraremos estudo sobre este procedimento, abordando uma série de novos
conceitos.
Então, partiu trabalhar!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever como se iniciam os trabalhos do Conselho;
- Descrever a Oitiva;
- Citar as hipóteses de defesa por escrito;
- Explicar como funciona o exame dos autos do Conselho;
- Descrever o procedimento quando o acusado é inativo;
- Descrever o procedimento de apuração de insanidade mental e incapacidade de discernimento;
- Descrever o procedimento quando há a deserção do acusado;
- Descrever o procedimento quando há conduta inconveniente do acusado;
- Citar as possíveis substituições no decorrer do procedimento;
- Descrever o Relatório;
- Descrever a Solução;
- Descrever como é feita a remessa dos autos;
- Conceituar Despacho Final;
- Conceituar Decisão Final; e
- Descrever os recursos cabíveis.

INTRODUÇÃO:
Beleza, já sabemos dar o start no Conselho de Disciplina. Mas, e se o acusado for inativo, o que
eu faço? E se ele à época do ocorrido não estava em pleno gozo de suas faculdades mentais? O que
acontece se ele desertar no meio do procedimento? E se ao longo do procedimento, o acusado se portar de
forma inconveniente prejudicando o bom andamento dos trabalhos?
Nossa, quanta coisa hein...rs
Calma, calma, respira fundo. Vamos manter a nossa pressão arterial em 12 por 8.
Não se preocupe que na aula de hoje dissecaremos todos estes assuntos e muito mais...

267
3.5 CONSELHO DE DISCIPLINA
3.5.10 – Início dos Trabalhos
3.5.10.1 – Convocação

A partir da data do início da contagem de prazos, prevista na Portaria de Nomeação, o Presidente


emitirá o Despacho, convocando os demais membros e o acusado, designando o dia e a hora para a 1ª
sessão, no local determinado na Portaria; informará ao acusado de que poderá comparecer com o seu
advogado ou Oficial-Defensor, designará a data para a 2ª sessão, pelo menos 7 dias corridos após a 1ª
sessão (ocasião em que foi entregue o Libelo Acusatório ao acusado), quando será realizada a
qualificação e interrogatório do acusado.
Ao fim da 1ª Sessão, o Escrivão lavrará a Ata, na qual serão consignados todos os acontecimentos
ocorridos durante a sessão.

3.5.10.2 - Compromisso
Reunido o Conselho, presente o acusado, o Presidente prestará em voz alta, de pé, descoberto, o
seguinte compromisso: “Prometo apreciar com imparcial atenção os fatos que me forem submetidos
e julgá-los de acordo com a Lei e a prova dos autos”.
Esse compromisso será também
prestado pelos demais membros sob a
forma: “Assim o prometo”. A seguir, o
Presidente mandará proceder à leitura e à
Autuação de todos os documentos que
constituíram o ato de nomeação (Portaria de
Nomeação, com anexos, e Portaria de
Afastamento das Funções) e o Libelo
Acusatório; em seguida, fará a entrega ao
acusado de cópia do Libelo Acusatório e do
ofício de apresentação à Junta de Saúde (se ainda não tiver sido entregue e se for o caso); a seguir, serão
juntados ao processo todos os documentos oferecidos pelo acusado.

268
3.5.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos
Nessa fase, inicia-se a participação ativa do Escrivão com a lavratura do Termo de Autuação, que
será a folha n° 1 dos autos do processo; a seguir, juntará os documentos autuados, nada escrevendo entre
eles e o Termo de Autuação; imediatamente após, emitirá o Termo de Certidão, no qual certificará que
cumpriu o Despacho exarado na Portaria de Nomeação; logo após, emitirá o Termo de Juntada, dispondo,
imediatamente após, todos os documentos a serem juntados, quais sejam: a cópia do ofício de
apresentação à Junta de Saúde; o Termo de Inspeção de Saúde (TIS), se recebido; documentos
apresentados pelo acusado; a cópia dos assentamentos, ofícios de intimação, etc.

3.5.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes


De posse dos autos, o Presidente despachará ordenando que o Escrivão tome certas providências e
designará dia e hora para a próxima sessão, caso já não o tenha feito durante a 1ª sessão. Tendo exarado
despacho, restituirá os autos ao Escrivão.
O Escrivão emitirá o Termo de Recebimento, cumprirá as ordens e emitirá o Termo de Certidão;
fará a juntada das cópias dos documentos que houver expedido e dos originais que tenha recebido e, se
necessário, restituirá os autos ao Presidente; cumprirá as novas ordens e aguardará a próxima sessão.
Nas demais sessões, embora não ocorram os eventos do compromisso dos membros do Conselho,
o comportamento e o procedimento dos presentes serão semelhantes ao da 1ª sessão, culminando com a
ata e as demais providências pertinentes.

3.5.10.5 - Apresentação das Testemunhas


O acusado poderá apresentar, no máximo, três testemunhas ou até o número de testemunhas
arroladas no Libelo Acusatório, caso estas sejam em número superior a três. Se o acusado não tiver
testemunhas para indicar ou as apresentar em número inferior às do Libelo Acusatório, deverá firmar
expressa Declaração nesse sentido, que será juntada aos autos.

3.5.11 Oitiva
Serão ouvidas, em primeiro lugar, as testemunhas arroladas no Libelo Acusatório e, a critério do
Presidente, as referidas por estas em seus depoimentos. Logo após, serão ouvidas as testemunhas
indicadas pelo acusado, que deverão ser apresentadas no dia e hora designados pelo Presidente.
A testemunha não poderá eximir-se da
obrigação de depor, salvo por motivo de força
maior, devidamente justificado (artigo 354 do
CPPM). O comparecimento de militar ou
servidor civil será requisitado ao respectivo
Comandante pelo Presidente (artigo 349 do
CPPM).

269
A requisição poderá ser feita por meio de notificação extra-judicial quando houver dificuldade ou
recusa do militar em receber a notificação.
As testemunhas serão inquiridas, cada uma de per si, de modo que uma não possa ouvir o
depoimento da outra (artigo 353 do CPPM).
O Presidente não permitirá que a testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando
inseparáveis da narrativa do fato (artigo 357 do CPPM).
O acusado assistirá e assinará, juntamente com advogado (se houver) ou defensor, os depoimentos
de todas as testemunhas, podendo, inclusive, apresentar quesitos ao Presidente, para serem respondidos
após as perguntas formuladas pelo Inquiridor e Relator. As perguntas solicitadas pela defesa não poderão
ser recusadas, salvo se ofensivas, impertinentes ou sem relação com o fato descrito no Libelo Acusatório,
ou, ainda, importarem repetição de outra pergunta já respondida (artigos 418 e 419 do CPPM).
Se o Presidente verificar que a presença do acusado, pela sua atitude, poderá influir no ânimo da
testemunha, de modo que prejudique a veracidade do depoimento, fará retirá-lo, prosseguindo na
inquirição, na presença do seu advogado, se houver, ou defensor do acusado, dando a estes a
oportunidade de formular quesitos. Nesse caso, deverão constar da ata da sessão a ocorrência e os
motivos que a determinaram (artigo 358 do CPPM).
A testemunha que residir em área de outro DN poderá ser inquirida pela autoridade militar do
lugar de sua residência, sendo expedida, para esse fim, Carta Precatória, com prazo razoável para
devolução, após ouvido o acusado, o qual poderá formular quesitos. Caso o acusado, ou sua defesa, não
deseje formular os quesitos, deverá firmar expressa Declaração, que será juntada aos autos (artigo 359 do
CPPM).
A acareação é admitida, e reduzida a termo, sempre que houver divergência em declarações sobre
fatos ou circunstâncias relevantes, entre testemunhas ou entre o acusado e testemunhas (artigo 365 do
CPPM). O Inquiridor e o Relator explicarão aos acareados quais os pontos em que divergem e, em
seguida, os reinquirirão, cada um de per si e em presença do outro (artigo 366 do CPPM).

3.5.12 Defesa por Escrito


O acusado, ou seu defensor, tem o direito de apresentar defesa por escrito nos autos em duas
oportunidades:

- defesa prévia, no prazo de até 5 dias após o Auto de Qualificação e de Interrogatório; e


- alegações finais, no prazo de 8 dias corridos após a última sessão que anteceder à elaboração do
Relatório, conforme o inciso 4.15.6 da DGPM-315, não dando margem à prorrogação do processo.

O defensor deverá pautar a defesa por escrito no Libelo Acusatório, nos depoimentos e nos
documentos juntados ao processo, de modo a evitar alusões a fatos irrelevantes e estranhos ao acusado e à
matéria julgada.

270
No caso do acusado não desejar apresentar defesa, deverá firmar expressa Declaração. Nessa
hipótese, o oficial-defensor, se houver, deverá, necessariamente, apresentar a defesa por escrito.

3.5.13 Exame dos Autos


É facultado ao acusado, ou a seu defensor, a partir da data do recebimento da cópia do Libelo
Acusatório, o exame dos autos, sempre no local de funcionamento do Conselho.
Após a última sessão do Conselho, antes da elaboração do Relatório, será aberta vista aos autos ao
acusado e à defesa, no local de funcionamento do Conselho, para apresentação das alegações finais,
devendo ser recolhida correspondente Declaração.
Recomenda-se que, a cada sessão realizada, se solicitado, seja fornecida ao acusado, ou a seu
defensor, cópia de todos os documentos e depoimentos gerados, sendo registrada em ata a entrega.
O presidente do Conselho só poderá limitar o acesso do advogado a elementos de prova
relacionados a diligências em andamento e ainda não cumpridas, ou seja, que ainda não foram juntados
aos autos, desde que tal acesso comprometa a eficiência, a eficácia ou a finalidade das diligências.

3.5.14 Acusado Inativo


No caso de o acusado ser inativo, a Autoridade Nomeante deverá envidar esforços para a sua
localização, inclusive junto às OM pagadoras do mesmo. Caso ele ainda não tenha sido localizado, o
Presidente ordenará, no Despacho, que o mesmo seja intimado, se possível, por meio de Edital, a ser
publicado por três dias em jornal de grande circulação na cidade do domicílio do acusado.
Caso esta medida não surta efeito, o inativo será julgado à revelia. Ocorrendo a revelia, caberá à
Autoridade Nomeante a designação de um Oficial, bacharel em Direito sempre que possível, para a
defesa, mediante Portaria (item 4.6.4 da DGPM-315).
Apresentando-se o revel antes de elaborado o Relatório, será o mesmo qualificado e interrogado e,
se necessário, acareado com os depoentes ouvidos em sua ausência, não tendo, entretanto, direito a
solicitar a repetição de qualquer ato ocorrido anteriormente (artigo 411, parágrafo único e artigo 413 do
CPPM).

3.5.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento


Quando, em virtude do comportamento do acusado, ou do Termo de Inspeção de Saúde (TIS),
houver dúvida a respeito de sua sanidade mental ou da sua capacidade de discernimento, será ele
submetido à perícia médica, ordenada pelo Presidente, ou a pedido da defesa ou do cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão, em qualquer fase do processo (artigo 156, §§ 1° e 2° do CPPM). Durante o período
de realização da perícia deverão ser adotadas as seguintes providências:

271
- suspender, por meio de despacho, os trabalhos do Conselho até o recebimento do Laudo Pericial;
- suspender o prazo de conclusão do Conselho (nesta ocasião, não serão contados os dias em que o
Conselho esteve suspenso, sendo retomado assim que o Laudo for juntado aos autos);
- ao ser juntado aos autos do Conselho o Laudo Pericial, proferir despacho retomando os trabalhos e a
contagem do prazo restante;
- durante o período em que o acusado estiver sendo submetido ao Exame, mantê-lo vinculado a sua OM
de origem, se for o caso, afastado das funções; e
- transmitir mensagem à Autoridade Nomeante, à DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso, participando
todo o ocorrido.

O Presidente apresentará o acusado ao Diretor do hospital da área ou à autoridade que suas vezes
fizer, mediante ofício e solicitará que sejam designados dois peritos para procederem ao exame de
sanidade mental. Nessa oportunidade, serão remetidos, anexos, os documentos que originaram o
Conselho, e outros considerados elucidativos, e formulados, no mínimo, os seguintes quesitos:

- se o acusado sofre de doença mental, de desenvolvimento mental incompleto ou retardado;


- se, no momento da(s) ação(ões) ou omissão(ões), o acusado se achava em algum dos estados referidos
no quesito anterior;
- se, em virtude das circunstâncias referidas nos quesitos antecedentes, possuía o acusado capacidade de
entender o caráter ilícito, irregular do fato, da falta cometida, etc. ou de proceder de acordo com esse
entendimento;
- se a doença ou deficiência mental do acusado, não lhe suprimindo, diminui-lhe, consideravelmente, a
capacidade de entendimento (da ilicitude, irregularidade, gravidade) do fato ou a de autodeterminação,
quando o praticou (artigo 159 do CPPM); e
- se, em virtude do exame realizado, o acusado encontra-se passível de submissão à Junta de Saúde, a fim
de se avaliar sua possível reforma nos termos do inciso V do artigo 108 do Estatuto dos Militares.

No caso de embriaguez fortuita ou habitual, formular-se-ão quesitos congêneres, pertinentes ao


caso (artigo 159, parágrafo único do CPPM).
Recebido o laudo, o Presidente nele despachará, ordenando a sua juntada ao processo.
Se os peritos concluírem que o acusado estava sem capacidade de discernimento no momento da
ação ou omissão ou que a doença encontrada tenha, de alguma maneira, interferido com a capacidade de
julgar o acerto de seus próprios atos, e se os membros, por unanimidade ou maioria, concordarem com os
peritos, será, imediatamente, feito o Relatório, consignando a evidência, e remetido o processo à
Autoridade Nomeante.
Caso os membros não concordem, por maioria ou unanimidade, com os peritos, solicitarão à
mesma autoridade que indique novos peritos para procederem à segunda e última perícia.

272
Tendo o exame de sanidade mental concluído pela inimputabilidade do acusado e por sua
incapacidade para permanecer no Serviço Ativo da Marinha (SAM), deverá a Autoridade Nomeante
propor na Solução a reforma do militar por motivo de saúde.
Em caso de falecimento do acusado, a certidão de óbito deverá ser juntada ao processo e,
imediatamente após, encerrado o mesmo, com a elaboração de um Relatório, no qual conste que a
punibilidade foi extinta pela morte (artigo 123, I do Código Penal Militar).

3.5.16 Deserção do Acusado


Em caso de deserção do acusado durante o processo, deverá ser juntada aos autos cópia do Termo
de Deserção, tendo o Conselho prosseguimento à revelia, acompanhado pelo defensor designado,
devendo a deserção ser consignada no Relatório e em ata.
Caso se apresente voluntariamente, ou seja capturado, antes da redação do Relatório, o processo
continuará com a sua presença, podendo ser, inclusive, reinquirido ou acareado com os depoentes ouvidos
em sua ausência, não tendo, entretanto, direito a solicitar a repetição de qualquer ato ocorrido
anteriormente.

3.5.17 Conduta Inconveniente do Acusado


Se o acusado, durante uma sessão, se portar de modo inconveniente, será advertido pelo Presidente
e, se persistir, poderá ser retirado da sessão, que prosseguirá sem a sua presença, estando presente, porém,
o advogado ou o defensor do acusado, devendo o fato ser consignado em ata.
No caso de desacato a um dos membros, o Presidente determinará a lavratura de Auto de Prisão
em Flagrante, que será remetido à Autoridade Judiciária Militar competente, devendo o fato ser
consignado em ata e no Relatório, além da cópia do Auto ser juntada ao processo (artigo 389, parágrafo
único do CPPM).

3.5.18 Substituições
Por absoluta necessidade de serviço ou por motivo de saúde, qualquer
membro do Conselho poderá ser substituído mediante Portaria da Autoridade
Nomeante, na qual será consignado o motivo da substituição.
O novo membro prestará o compromisso preconizado no item 4.22 da
DGPM-315, que será registrado em ata.
Em caso da substituição da Autoridade Nomeante, a nova autoridade deverá consignar, em sua
Solução, se for competente para exará-la, que o Conselho foi nomeado pelo seu antecessor.
Por absoluta necessidade de serviço ou por motivo de saúde, devidamente comprovados, o Oficial-
Defensor poderá solicitar sua substituição ao Presidente.

273
Nesse caso, o acusado, se tiver se apresentado, deverá ser informado, em tempo hábil, para indicar
ou solicitar à Autoridade Nomeante outro oficial para acompanhar a sua defesa, devendo a substituição
ser consignada em ata e no Relatório.

3.5.19 Relatório
Realizadas todas as diligências, o Conselho passará a
deliberar sobre o Relatório a ser redigido.
O Relatório constará de uma parte expositiva e de outra
conclusiva. Na primeira, deverão ser mencionados: os fatos que
deram origem à nomeação (Libelo Acusatório); a graduação e o
nome do acusado; o enquadramento; o teor dos depoimentos; os
laudos e demais documentos elucidativos; as evidências ou não
de culpabilidade do acusado; a argumentação apresentada pela
defesa e os incidentes ocorridos durante o processo. Na segunda
parte, o Conselho deve decidir, por unanimidade ou maioria:

- se o acusado é ou não culpado da acusação que lhe foi feita; ou


- se o acusado está ou não incapaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na
inatividade, no caso do inciso III do artigo 2º do Decreto nº 71.500/1972.

No caso da deliberação ter sido por maioria de votos, deverá constar a expressão “VOTO
VENCIDO" ao lado da assinatura do membro que discordou dos demais.
O voto vencido, no todo ou em parte, será justificado pelo membro, imediatamente após a sua
assinatura em Termo Circunstanciado.
Após as assinaturas dos membros, será entregue uma cópia do Relatório ao acusado e ao defensor
ou, no caso de revelia, somente ao defensor, mediante Declaração nos autos.
Após a Declaração mencionada no artigo anterior, o Escrivão emitirá o Termo de Conclusão e
entregará os autos ao Presidente.
De posse dos autos, o Presidente emitirá despacho ordenando a remessa dos mesmos à autoridade
nomeante, restituindo, em seguida, os autos ao Escrivão.
O Escrivão emitirá, então, o Termo de Recebimento e, a seguir, o Termo de Encerramento e
Remessa. Os autos do Conselho serão remetidos à Autoridade Nomeante, por meio de ofício.

3.5.20 Solução
Recebidos os autos, a Autoridade Nomeante, dentro do prazo de 20
dias, aceitando ou não seu julgamento e, neste último caso, justificando os
motivos do seu despacho, proporá como Solução:

274
- o arquivamento do processo, se julgar a praça capaz de permanecer na ativa ou na inatividade;
- a aplicação de pena disciplinar, se considerar transgressão disciplinar a razão pela qual a praça foi
julgada culpada, discriminando o enquadramento no RDM e a falta cometida;
- a remessa do processo ao Juiz-Auditor competente, se considerar crime a razão pela qual a praça foi
julgada culpada; ou
- a reforma ou a exclusão a bem da disciplina, se considerar que:
- a razão pela qual a praça foi julgada culpada está prevista nos incisos I, II ou IV, do artigo 2° do
Decreto n° 71.500/1972;
- a praça foi julgada incapaz de permanecer na ativa ou na inatividade pelo crime previsto no
inciso III do artigo 2° do mesmo Decreto; ou
- a reforma por motivo de Saúde, se o acusado tiver sido julgado inimputável pelo exame de sanidade
mental.

Na ausência da Autoridade Nomeante, o substituto eventual remeterá o processo à autoridade


imediatamente superior, que emitirá, nesse caso, a Solução.

3.5.21 Remessa
Após fazer entrega da
cópia da Solução ao acusado, a
Autoridade Nomeante remeterá
o original à DPMM ou ao
CPesFN, juntamente com os
autos e o Recurso (se houver),
por ofício, para que se dê a
Decisão Final ou Despacho
Final.
Os autos originais do Conselho serão encaminhados à DPMM ou ao CPesFN, os quais após
análise, serão restituídos para que permaneçam arquivados na OM de origem e sejam recolhidos a
DPHDM, após cumprida a fase corrente constante na Tabela de Temporalidade e Destinação de
Documentos (TTDD), conforme previsto na SGM-105.

3.5.22 Decisão e Recursos


Despacho Final é a decisão exarada pelo DPMM ou o CPesFN, no caso de arquivamento ou
reforma por motivo de saúde.
Decisão Final é aquela proferida pelo DPMM ou CPesFN nos casos de aplicação de pena
disciplinar, crime, reforma ou exclusão a bem da disciplina. No caso de aplicação de pena disciplinar,

275
serão os autos encaminhados ao Titular da OM em que serve o militar para que seja procedida a audiência
disciplinar, na forma prevista no RDM e, posteriormente, restituídos os autos à DPMM ou ao CPesFN
para arquivamento.
O acusado, ou no caso de revelia, seu defensor, poderá interpor recurso do Relatório e da Solução
da Autoridade Nomeante.
O prazo para interposição de
recurso é de 10 dias, contados da data
em que o acusado tenha recebido a
cópia do Relatório ou da Solução, ou da
publicação desta em Ordem de Serviço
(OS). No primeiro caso, o recurso
deverá ser dirigido à Autoridade
Nomeante e, no segundo, ao DPMM ou
ao CPesFN.
Caso a praça interponha recurso da Solução e o processo já tenha sido remetido à DPMM ou ao
CPesFN, o fato deverá ser participado àquela OM, por mensagem, e o recurso enviado imediatamente
após.
Uma vez encerrado, os autos do Conselho de Disciplina serão enviados à DPMM ou ao CPesFN,
conforme o caso, para que se dê a Decisão Final ou Despacho Final.
A Decisão Final, ou o Despacho Final, será baseado em análises prévias, realizadas pela
Assessoria Jurídica da DPMM ou do CPesFN, no prazo máximo de 30 dias, observando, quando for o
caso, o disposto no artigo 106, VI e no artigo 125, III, ambos do Estatuto dos Militares.

276
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma breve pausa para verificar o nosso aprendizado sobre o Conselho de Disciplina.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A testemunha não poderá eximir-se da obrigação de depor, salvo por motivo de força maior,
devidamente justificado.

2) ( ) É facultado ao acusado, ou a seu defensor, a partir da data do recebimento da cópia do Libelo


Acusatório, o exame dos autos, sempre no local de funcionamento do Conselho.

3) ( ) Decisão Final é a decisão exarada pelo DPMM ou o CPesFN, no caso de arquivamento ou reforma
por motivo de saúde.

4) ( ) As deliberações do Conselho de Disciplina sempre se darão por unanimidade, não havendo a


possibilidade da existência de um voto vencido.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Recebidos os autos, a Autoridade Nomeante NÃO poderá propor como Solução:

(A) o arquivamento do processo, se julgar a praça capaz de permanecer na ativa ou na inatividade.

(B) a aplicação de pena disciplinar, se considerar transgressão disciplinar a razão pela qual a praça foi
julgada culpada.

(C) a remessa do processo ao Juiz-Auditor competente, se considerar crime a razão pela qual a praça foi
julgada culpada.

(D) a remessa do à Advocacia Geral da União (AGU), se considerar que a razão pela qual a praça foi
julgada culpada tiver acarretado prejuízos ao erário..

(E) a reforma por motivo de saúde, se o acusado tiver sido julgado inimputável pelo exame de sanidade
mental.

277
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 E
4 E
5 D

RECADO FINAL:

Nesta aula, concluímos o assunto Conselho de Disciplina e já estamos aptos a passar ao nosso
próximo assunto, Conselho de Justificação. Veremos que se trata de um procedimento bastante
semelhante, mas que possui as suas peculiaridades.
O que aprendemos nestas duas últimas aulas nos ajudarão, e muito, no estudo desse nosso
próximo tópico.
Tente tirar um tempinho para reler estas últimas aulas antes de avançar à seguinte.
Dito isto...
Até a próxima aula!

278
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Já falamos sobre o Conselho de Disciplina, processo administrativo disciplinar que avaliava a
capacidade de a praça permanecer na ativa ou na situação de inatividade, quando da reserva ou
reformado.
Nesta aula traremos o Conselho de Justificação, um procedimento muito parecido, porém
destinado aos oficiais. Apesar das semelhanças, devemos nos ater às sutis diferenças existentes entre
ambos os procedimentos.
Então, partiu feroz!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as Autoridades Nomeantes;
- Conceituar Conselho de Justificação;
- Citar as hipóteses de submissão a Conselho;
- Citar os direitos do justificante;
- Citar a composição do Conselho de Justificação;
- Descrever a Portaria de Afastamento das Funções;
- Citar os prazos; e
- Descrever o Libelo Acusatório.

INTRODUÇÃO:
O Conselho de Justificação tem origem europeia. Juristas de renome consideram, no entanto, que
o modelo brasileiro difere de outros existentes no Direito comparado, por sua índole liberal e
privilegiadora da defesa. Aponta-se como referência inicial a um conselho de guerra, com caráter
justificativo e julgador, regra constante da Ordenança francesa de 25 de março de 1765, que dispunha
sobre a conduta de oficiais que obrigatoriamente deveriam ser submetidos a esse julgamento. Tal norma
constou também das Ordenanças de 1776 e de 1º de janeiro de 1876. A medida aparece no Código de
Justiça Militar para o Exército de Mar da França, promulgado em 1851, o qual estabelecia a convocação
de conselhos de guerra para a justificação de oficiais (GOMES CARNEIRO, 1942).
Após diversos avanços realizados ao longo da História, atualmente, a matéria está regida pela Lei
nº 5.836, de 5 de dezembro de 1972.
Hoje, nós começaremos a estudar este importante procedimento específico da caserna.
Vamos lá!?

279
3.6 CONSELHO DE JUTIFICAÇÃO
3.6.1 Autoridades Nomeantes
A nomeação de Conselho de Justificação (CJ) é da competência do:

- Comandante da Marinha (CM); e


- Comandante do Teatro de Operações ou de Zona de Defesa ou dos mais altos Comandantes das
Forças Armadas isoladas, para os oficiais sob o seu comando e no caso de fatos ocorridos na área de sua
jurisdição, quando em campanha no País ou no exterior.

3.6.2 Conceito
O Conselho de Justificação é um processo administrativo de caráter disciplinar, independente
de ação penal, podendo, entretanto, tornar-se peça a ser utilizada na instrução de processos criminais na
Justiça Militar, caso as acusações provadas e consideradas procedentes constituam ilícito penal militar.
Está previsto na Lei 5.836/1972, sendo aplicadas, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo
Penal Militar (CPPM).
Destina-se a julgar, por meio de processo especial, a capacidade do oficial das Forças Armadas
para permanecer na ativa, como também a do oficial da Reserva Remunerada ou Reformado,
presumivelmente incapaz de permanecer na situação de inatividade em que se encontra, criando-lhes, ao
mesmo tempo, condições para se justificar. O Conselho de Justificação poderá ser nomeado a pedido do
oficial, nos termos do artigo 2° da Lei n° 5.836/1972, quando este se achar enquadrado e, assim, desejar
se justificar, para esclarecimento dos fatos.

3.6.3 Submissão a Conselho


O artigo 2° da Lei nº 5.836/1972 enumera as hipóteses de submissão a Conselho de Justificação.
Vejamos:

Art. 2º É submetido a Conselho de Justificação, a pedido ou "ex officio" o oficial das forças
armadas:
I - acusado oficialmente ou por qualquer meio lícito de comunicação social de ter:
a) procedido incorretamente no desempenho do cargo;
b) tido conduta irregular; ou
c) praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe;
II - considerado não habilitado para o acesso, em caráter provisório, no momento em que venha a
ser objeto de apreciação para ingresso em Quadro de Acesso ou Lista de Escolha;
III - afastado do cargo, na forma do Estatuto dos Militares por se tornar incompatível com o
mesmo ou demonstrar incapacidade no exercício de funções militares a ele inerentes, salvo se o
afastamento é decorrência de fatos que motivem sua submissão a processo;
IV - condenado por crime de natureza dolosa, não previsto na legislação especial concernente a
segurança do Estado, em Tribunal civil ou militar, a pena restrita de liberdade individual até 2
(dois) anos, tão logo transite em julgado a sentença; ou

280
V - pertencente a partido político ou associação, suspensos ou dissolvidos por força de disposição
legal ou decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou perigosas à segurança
nacional.
Parágrafo único. É considerado, entre outros, para os efeitos desta Lei, pertencente a partido ou
associação a que se refere este artigo o oficial das Forças Armadas que, ostensiva ou
clandestinamente:
a) estiver inscrito como seu membro;
b) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício;
c) realizar propaganda de suas doutrinas; ou
d) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo inequívoco ou doloso, em suas atividades.

Em relação ao inciso I, o item 5.4.1 da DGPM-315 nos explica um pouco melhor sobre o
entendimento de cada alínea:

- Procedido incorretamente no desempenho de cargo:


Considera-se que o oficial tenha procedido incorretamente no desempenho do cargo quando a sua
atuação funcional tenha tido relação de causa e efeito, por ação ou omissão, com contravenção
disciplinar considerada grave ou com ilícito penal, a ponto de torná-lo incompatível com o exercício de
cargo.

- Tido conduta irregular:


Considera-se conduta irregular, o fato de o oficial ter sido punido com, no mínimo, 30 dias de
prisão rigorosa no espaço de 12 meses consecutivos, por faltas consideradas graves a ponto de abalar
fortemente a confiança de seus superiores hierárquicos.

- Praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe:
Considera-se ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe a não
observância dos preceitos da ética militar, preconizados sobretudo no artigo 28 do Estatuto dos Militares
(EM), conforme verificado no item 3.3 deste capítulo.

Condenado por crime de natureza dolosa, não previsto na legislação especial concernente a
segurança do Estado, em tribunal civil ou militar, à pena restritiva de liberdade individual até dois anos,
tão logo transite em julgado a sentença.
Pertencente, ostensiva ou clandestinamente, a partido político ou associação, suspensos ou
dissolvidos por força de disposição legal ou decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou
perigosas à segurança nacional. Não se considera para efeito deste inciso a filiação em partidos políticos
ou associações, regularmente constituídas, em que pese a vedação constitucional estatuída nos incisos IV
e V do artigo 142 da Constituição Federal.

281
Afastado do cargo, na forma do EM, por se tornar incompatível com o mesmo ou demonstrar
incapacidade no exercício de funções militares a ele inerentes, salvo se o afastamento é decorrência de
fatos que motivem sua submissão a processo.
Como já foi dito, o oficial poderá requerer a nomeação de Conselho para se justificar de acusações
que lhe sejam feitas. O requerimento será dirigido ao CM, obedecendo-se à cadeia de Comando.
Um oficial é considerado acusado oficialmente a partir da aceitação, por parte da Autoridade
competente para a nomeação de CJ, de uma Parte Acusatória, formulada por oficial mais antigo que o
justificante, o acusador, que tenha tido conhecimento de pelo menos uma das hipóteses elencadas acima,
por qualquer meio lícito de comunicação social.
Considera-se meio lícito de comunicação social: os assentamentos dos militares e as Folhas de
Avaliação de Oficial (FAO), as peças de inquéritos e processos, os depoimentos datados, assinados e
testemunhados, os relatos de ocorrência datados e assinados, todas as formas de correspondência
administrativa oficial, divulgações na imprensa e cartas datadas e assinadas, após a verificação da
existência e do paradeiro do remetente, desde que autorizada a divulgação do seu conteúdo pelo
destinatário e remetente, conforme o caso.
As autoridades competentes podem, com base nos antecedentes do oficial a ser julgado e na
natureza ou falta de consistência dos fatos arguidos, indeferir o pedido de nomeação de CJ, o qual,
devidamente fundamentado, deverá ser publicado oficialmente e transcrito nos assentamentos do oficial,
se este for da ativa.

3.6.4 Direitos do Justificante


Ao justificante é assegurada ampla defesa, podendo requerer a produção, perante o Conselho, de
todas as provas permitidas no CPPM, além de poder examinar ou retirar cópias dos documentos
componentes dos autos findos ou em andamento, em meio físico ou digital.
O Conselho poderá ser acompanhado por advogado, legalmente habilitado junto à Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), contratado pelo acusado, quando este o desejar, devendo a procuração ser
anexada aos autos.
O advogado deverá ser notificado, por meio oficial, com antecedência de pelo menos 3 (três)
dias úteis, de todas as sessões do Conselho. Caso o justificante deseje um defensor, mas não haja quem
indicar, caberá a ele a solicitação à Defensoria Pública da União da designação de Defensor Público para
acompanhar e efetivar a sua defesa.
Ocorrendo a revelia, caberá a autoridade nomeante a designação de um oficial, bacharel em
Direito sempre que possível, para defesa, mediante Portaria. Em qualquer hipótese, caso não seja
indicado advogado ou defensor, o Conselho poderá ser instaurado, vide Súmula Vinculante nº 5 do STF, a
qual diz que: "A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende
a Constituição". Logo, não existe a obrigatoriedade de que o Conselho seja acompanhado por um
advogado, mas deve ser permitido, se assim o justificante desejar para auxílio em sua defesa.

282
3.6.5 Composição do Conselho de Justificação
O Conselho é nomeado mediante expedição de Portaria de Nomeação, sendo composto por três
oficiais de Marinha, da ativa, de posto superior ao do justificante, sendo o Presidente, no mínimo, um
Oficial Superior, o que lhe segue em antiguidade, o Inquiridor e Relator, e o mais moderno, Escrivão.
A distribuição da “Portaria de Nomeação” será feita da seguinte maneira: o original, com anexos,
para o Presidente, e as cópias, sem anexos, para os demais membros, ao justificante, à DPMM ou ao
CPesFN (se o justificante pertencer ao CFN), ao Comando do Distrito Naval (DN) da área e ao CIM.
Imediatamente após a assinatura da Portaria, a Autoridade Nomeante informará, por mensagem, à
DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso, a nomeação do Conselho.
Quando o justificante for Oficial-General, cujo posto não permita a nomeação de membros do
Conselho com posto superior, estes serão nomeados dentre os oficiais daquele posto, da ativa ou na
inatividade, mais antigos que o justificante.
Quando o justificante for oficial da reserva remunerada ou reformado, um dos membros do
Conselho poderá ser da reserva remunerada.
Não podem fazer parte do Conselho:

- o oficial que formulou a acusação;


- oficiais que tenham entre si, com o acusador ou com o justificante parentesco consanguíneo ou afim, na
linha reta ou até o 4° grau de consanguinidade colateral ou de natureza civil;
- oficiais subalternos;
- oficiais que tenham particular interesse nas decisões do Conselho; e
- oficiais que não tenham assegurada sua permanência definitiva no Serviço Ativo da Marinha (SAM).

3.6.6 Portaria de Afastamento das Funções


O oficial da ativa ou da reserva designado para o serviço ativo, ao ser submetido a CJ será
afastado do exercício de suas funções:

- automaticamente, caso tenha sido enquadrado nos incisos IV ou V do artigo 2° da Lei n° 5.836/1972; e
- a critério do CM, caso tenha sido enquadrado no inciso I do artigo 2° da mesma Lei.

O afastamento do exercício das funções será determinado pelo CM, mediante expedição de
Portaria, cujo original será remetido ao Presidente.
A distribuição da Portaria de Afastamento das Funções será feita da seguinte maneira: o original,
com o “ciente”, datado e assinado pelo justificante, para o Presidente, e as cópias para o justificante, à
DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso, e o setor responsável pela redistribuição de pessoal
correspondente.

283
Esta Portaria deverá ser transcrita nos assentamentos do justificante, ficando o mesmo privado do
exercício de qualquer função militar, até a conclusão do Relatório elaborado pelo Conselho.
Será confeccionada Portaria de reassunção das funções, se for o caso, após Despacho da
Autoridade Nomeante, que igualmente deverá ser transcrita nos assentamentos do militar.

3.6.7 Prazos
O Conselho deverá ser instaurado
tão logo as autoridades que tiverem
competência para instaurá-lo venham a
tomar conhecimento de fato que enseje a
sua abertura, de modo a evitar que haja
prejuízo à hierarquia e à disciplina, bem
como a eventual prescrição dos fatos.
Se o Conselho tiver como causa o fato de o oficial ter sido punido com mais de trinta dias de
prisão rigorosa no espaço de doze meses consecutivos e se ainda estiver cumprindo tal pena, o Conselho
só poderá ser aberto após o cumprimento da pena e decorrido o prazo de oito dias úteis de que dispõe o
militar para recorrer à Autoridade que a aplicar, nos termos do artigo 46, §1º, do RDM.
Vejamos os demais prazos envolvidos no Conselho de Justificação:

Prazo Fundamento
pelo menos 7 dias corridos após a primeira
Qualificação e Interrogatório Artigo 402 do CPPM
sessão (Libelo Acusatório)
até 5 dias corridos após a audiência de Artigo 9º da Lei nº
Defesa Prévia
qualificação e interrogatório do acusado 5.836/1972
Oitiva das Testemunhas Notificação com antecedência mínima de 3 dias Artigo 421 do CPPM
até 8 dias corridos após a última sessão que
Vistas aos Autos anteceder à elaboração do Relatório, para a Artigo 428 do CPPM
elaboração das alegações finais de defesa
até 8 dias corridos após a última sessão que
Alegações Finais de Defesa anteceder à elaboração do Relatório, para a Artigo 428 do CPPM
elaboração das alegações finais de defesa
Conclusão 30 dias, a contar da data de nomeação 5.17.7 da DGPM-315
20 dias após recebidos os autos pela
Solução 5.17.8 da DGPM-315
Autoridade Nomeante
Recursos 10 dias após a entrega do Relatório 5.17.9 da DGPM-315
Prorrogação 20 dias 5.18.2 da DGPM-315

284
A solicitação da prorrogação do prazo deverá ser feita pelo Presidente à Autoridade Nomeante,
por ofício ou mensagem, onde serão explanados os motivos da necessidade de prorrogação e o número de
dias necessários para a conclusão dos trabalhos.
Em caso de necessidade, por motivo de saúde que impeça o acusado de participar das sessões do
Conselho, este poderá ser suspenso até seu restabelecimento, mediante prévia autorização da
DPMM/CPesFN, com o prazo que lhe restava no momento da suspensão, adotando-se as providências
citadas no inciso 5.38.1 da DGPM-315.

3.6.8 Libelo Acusatório


O Libelo Acusatório deve descrever, com minúcias, o tempo, o lugar e a exposição do fato ou
descrição dos atos que ao justificante são imputados, contendo a acusação de forma clara, objetiva e
calcada em provas legalmente admitidas, além do enquadramento deste nas hipóteses previstas no artigo
2° da Lei n° 5.836/1972, fazendo-se, sempre que possível, correlação com os preceitos descritos nos
artigos 27 a 31 do Estatuto dos Militares.
O Libelo Acusatório deverá conter, obrigatoriamente, o rol de testemunhas de acusação que os
membros do Conselho julgarem necessárias para o esclarecimento dos fatos.

3.6.9 Inspeção de Saúde


Recebidas a Portaria de Nomeação e, se for o caso, de Afastamento das Funções, o Presidente
apresentará o justificante à Junta de Saúde competente, mediante ofício, para que seja submetido à
inspeção de saúde para fim de Justiça e Disciplina, somente na hipótese do justificante estar com sua
inspeção de saúde regular vencida.
A mensagem da Junta de Saúde, julgando o justificante apto a responder a Conselho, não supre a
necessidade de o Termo de Inspeção de Saúde (TIS) ser juntado aos autos, antes da feitura do Relatório.

285
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já aprendeu
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A nomeação de Conselho de Justificação é da competência do Oficial-General em cargo de


Comando ou correspondente, posicionado na linha de subordinação direta do oficial.

2) ( ) Considera-se conduta irregular, o fato de o oficial ter sido punido com pelo menos 30 dias de
prisão rigorosa no espaço de 12 meses consecutivos, por faltas consideradas graves a ponto de abalar
fortemente a confiança de seus superiores hierárquicos.

3) ( ) A não indicação de advogado ou de Defensor Público impedirá a instauração do Conselho.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) NÃO podem fazer parte do Conselho de Justificação:

(A) o oficial que formulou a acusação.

(B) oficiais da reserva remunerada.

(C) oficiais subalternos.

(D) oficiais que tenham particular interesse nas decisões do Conselho.

(E) oficiais que não tenham assegurada sua permanência definitiva no Serviço Ativo da Marinha.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 E
4 B

286
RECADO FINAL:

Nesta aula, começamos a ver os dispositivos relativos ao Conselho de Justificação, procedimento


muito próximo ao Conselho de Disciplina, mas que guarda as suas peculiaridades.
Trouxemos alguns conceitos iniciais, mas que serão de suma importância para o entendimento da
próxima aula, quando pretendemos fechar este assunto e avançar ao nosso último tópico desta Unidade de
Ensino, Direito Administrativo Disciplinar Militar.
Dê uma boa revisada nesta aula antes de avançar à próxima.
Dito isto...
Até a próxima aula!

287
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Na nossa última aula, iniciamos o assunto Conselho de Justificação. Tratamos das questões mais
introdutórias, tais como: a competência da Autoridade Nomeante; conceituamos o Conselho de
Justificação; bem como trouxemos as hipóteses de submissão a Conselho; citamos os direitos do
justificante; citamos a composição do Conselho; abordamos os prazos envolvidos no procedimento e
descrevemos o que é o Libelo Acusatório.
Nesta aula, encerraremos estudo sobre este procedimento, abordando uma série de novos
conceitos.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever como se iniciam os trabalhos do Conselho;
- Descrever a Oitiva;
- Citar as hipóteses de defesa por escrito;
- Explicar como funciona o exame dos autos do Conselho;
- Descrever os procedimentos quando o justificante é inativo;
- Descrever o procedimento de apuração de insanidade mental e incapacidade de discernimento;
- Descrever o procedimento quando há a deserção do justificante;
- Descrever o procedimento quando há conduta inconveniente do justificante;
- Citar as possíveis substituições no decorrer do procedimento;
- Descrever o Relatório;
- Descrever como é feita a remessa dos autos; e
- Descrever a decisão.

INTRODUÇÃO:
Legal, já conseguimos dar o start no Conselho de Justificação. Mas, e se o justificante for inativo,
o que faremos? E se ele à época do ocorrido não estava em pleno gozo de suas faculdades mentais? O que
acontece se ele desertar no meio do procedimento? E se ao longo do procedimento, o justificante se portar
de forma inconveniente prejudicando o bom andamento dos trabalhos?
Nossa, novamente quanta coisa hein...rs
Calma, calma, respira fundo. Recupera o fôlego.
Não se preocupe que na aula de hoje enfrentaremos todos estes assuntos e muito mais...
Peço que você preste bastante atenção a esta aula, pois veremos que alguns dos procedimentos são
um pouco diferentes dos que já vimos quando estudamos o Conselho de Disciplina.
Vamos nessa!?

288
3.6 CONSELHO DE JUTIFICAÇÃO
3.6.10 Início dos Trabalhos
3.6.10.1 – Convocação

A partir da data do início da contagem de prazos, prevista na Portaria de Nomeação, o Presidente


emitirá o Despacho, convocando os demais membros e o justificante, designando o dia e a hora para a 1ª
sessão, no local determinado na Portaria; informará ao justificante de que poderá comparecer com o seu
advogado ou Oficial-Defensor, e determinará que sejam juntados aos autos os documentos relativos à
inspeção determinada, designará a data para a 2ª sessão, pelo menos 7 dias corridos após a 1ª sessão
(ocasião em que foi entregue o Libelo Acusatório ao justificante), quando serão realizados a qualificação
e o interrogatório do justificante.
Ao fim da 1ª Sessão, o Escrivão lavrará a Ata, na qual serão consignados todos os acontecimentos
ocorridos durante a sessão.

3.6.10.2 - Compromisso
Reunido o Conselho, presente o justificante, o Presidente prestará em voz alta, de pé, descoberto,
o seguinte compromisso: “Prometo apreciar com imparcial atenção os fatos que me forem
submetidos e julgá-los de acordo com a Lei e a prova dos autos”.
Esse compromisso será também prestado pelos demais
membros, sob a forma: “Assim o prometo”. A seguir, o
Presidente mandará proceder à leitura e à Autuação de todos
os documentos que constituíram o ato de nomeação (Portaria
de Nomeação, com anexos, e Portaria de Afastamento das
Funções) e o Libelo Acusatório; em seguida, fará a entrega ao
justificante de cópia do Libelo Acusatório e do ofício de
apresentação à Junta de Saúde (se ainda não tiver sido
entregue e se for o caso); a seguir, serão juntados ao processo
todos os documentos oferecidos pelo justificante.

289
3.6.10.3 - Autuação e Juntada de Documentos
Nessa fase, inicia-se a participação ativa do Escrivão com a lavratura do Termo de Autuação, que
será a folha n° 1 dos autos do processo; a seguir, juntará os documentos autuados, nada escrevendo entre
eles e o Termo de Autuação; imediatamente após, emitirá o Termo de Certidão, no qual certificará que
cumpriu o Despacho exarado na Portaria de Nomeação; logo após emitirá o Termo de Juntada, dispondo,
imediatamente após, todos os documentos a serem juntados, quais sejam: a cópia do ofício de
apresentação à Junta de Saúde; o TIS, se recebido; documentos apresentados pelo justificante; a cópia dos
assentamentos; e, se for o caso, das FAO, ofícios de intimação etc.

3.6.10.4 - Preparativos para as Sessões Subsequentes


De posse dos autos, o Presidente despachará ordenando que o Escrivão tome certas providências e
designará dia e hora para a próxima sessão, caso já não o tenha feito durante a 1ª sessão. Tendo exarado
despacho, restituirá os autos ao Escrivão.
O Escrivão emitirá o Termo de Recebimento, cumprirá as ordens e emitirá o Termo de Certidão;
fará a juntada das cópias dos documentos que houver expedido e dos originais que tenha recebido e, se
necessário, restituirá os autos ao Presidente; cumprirá as novas ordens e aguardará a próxima sessão.
Nas demais sessões, embora não ocorram os eventos do compromisso dos membros, o
comportamento e o procedimento dos presentes serão semelhantes ao da 1ª sessão, culminando com a ata
e as demais providências descritas neste capítulo.

3.6.10.5 - Apresentação das Testemunhas


O justificante poderá apresentar, no máximo, três testemunhas ou até o número de testemunhas
arroladas no Libelo Acusatório, caso estas sejam em número superior a três. Se o justificante não tiver
testemunhas para indicar ou as apresentar em número inferior às do Libelo Acusatório, deverá firmar
expressa Declaração nesse sentido, que será juntada aos autos.

3.6.11 Oitiva
Serão ouvidas, em primeiro lugar, as testemunhas arroladas no Libelo Acusatório e, a critério do
Presidente, as referidas por estas em seus depoimentos. Logo após, serão ouvidas as testemunhas
indicadas pelo justificante, que deverão ser apresentadas no dia e hora designados pelo Presidente.
A testemunha não poderá eximir-se da
obrigação de depor, salvo por motivo de força
maior, devidamente justificado (artigo 354 do
CPPM). O comparecimento de militar ou
servidor civil será requisitado ao respectivo
Comandante pelo Presidente (artigo 349 do
CPPM).

290
A requisição poderá ser feita por meio de notificação extra-judicial quando houver dificuldade ou
recusa do militar em receber a notificação.
As testemunhas serão inquiridas, cada uma de per si, de modo que uma não possa ouvir o
depoimento da outra (artigo 353 do CPPM).
O Presidente não permitirá que a testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando
inseparáveis da narrativa do fato (artigo 357 do CPPM).
O justificante assistirá e assinará, juntamente com advogado (se houver) ou defensor do
justificante, os depoimentos de todas as testemunhas, podendo, inclusive, apresentar quesitos ao
Presidente, para serem respondidos após as perguntas formuladas pelo Inquiridor e Relator. As perguntas
solicitadas pela defesa não poderão ser recusadas, salvo se ofensivas, ou impertinentes, ou sem relação
com o fato descrito no Libelo Acusatório, ou, ainda, importarem repetição de outra pergunta já
respondida (artigos 418 e 419 do CPPM).
Se o Presidente verificar que a presença do justificante, pela sua atitude, poderá influir no ânimo
da testemunha, de modo que prejudique a veracidade do depoimento, fará retirá-lo, prosseguindo na
inquirição, na presença do seu advogado, se houver, ou defensor do justificante, dando a estes a
oportunidade de formular quesitos. Nesse caso, deverão constar da ata da sessão a ocorrência e os
motivos que a determinaram (artigo 358 do CPPM).
A testemunha que residir em área de outro DN poderá ser inquirida pela autoridade militar do
lugar de sua residência, sendo expedida para esse fim, Carta Precatória, com prazo razoável para
devolução, após ouvido o justificante, o qual poderá formular quesitos. Caso o justificante, ou sua defesa,
não deseje formular os quesitos, deverá firmar expressa Declaração, que será juntada aos autos (artigo
359 do CPPM).
A acareação é admitida, e reduzida a termo, sempre que houver divergência em declarações sobre
fatos ou circunstâncias relevantes, entre testemunhas ou entre o justificante e testemunhas (artigo 365 do
CPPM). O Inquiridor e Relator explicarão aos acareados quais os pontos em que divergem e, em seguida,
os reinquirirão, a cada um de per si e em presença do outro (artigo 366 do CPPM).

3.6.12 Defesa por Escrito


O justificante, ou seu defensor, tem o direito de apresentar defesa por escrito nos autos em duas
oportunidades:

- defesa prévia, no prazo de até 5 dias após o Auto de Qualificação e de Interrogatório; e


- alegações finais, no prazo de 8 dias corridos após a última sessão que anteceder à elaboração do
Relatório, conforme o inciso 5.17.2 da DGPM-315, não dando margem à prorrogação do processo.

291
O defensor deverá pautar a defesa por escrito no Libelo Acusatório, nos depoimentos e nos
documentos juntados ao processo, de modo a evitar alusões a fatos irrelevantes e estranhos ao justificante
e à matéria julgada.
No caso do justificante não desejar apresentar defesa, deverá firmar expressa Declaração. Nessa
hipótese, o oficial-defensor, se houver, deverá, necessariamente, apresentar a defesa por escrito.

3.6.13 Exame dos Autos


É facultado ao justificante, ou a seu defensor, a partir da data do recebimento da cópia do Libelo
Acusatório, o exame dos autos, sempre no local de funcionamento do Conselho.
Após a última sessão do Conselho, antes da elaboração do Relatório, será aberta vista aos autos ao
justificante e à defesa, no local de funcionamento do Conselho, para apresentação das alegações finais,
devendo ser recolhida correspondente Declaração.
Recomenda-se que, a cada sessão realizada, se solicitado, seja fornecida ao justificante, ou a seu
defensor, cópia de todos os documentos e dispositivos gerados, sendo registrada em ata a entrega.
O presidente do Conselho só poderá limitar o acesso do advogado a elementos de prova
relacionados a diligências em andamento e ainda não cumpridas, ou seja, que ainda não foram juntados
aos autos, desde que tal acesso comprometa a eficiência, a eficácia ou a finalidade das diligências.

3.6.14 Justificante Inativo


No caso de o justificante ser inativo, a Autoridade Nomeante deverá envidar esforços para a sua
localização, inclusive junto às OM pagadoras do mesmo. Caso ele ainda não tenha sido localizado, o
Presidente ordenará, no Despacho, que o mesmo seja intimado, se possível, por meio de Edital, a ser
publicado por três dias em jornal de grande circulação na cidade do domicílio do justificante.
Caso esta medida não surta efeito, o inativo será julgado à revelia. Ocorrendo a revelia, caberá à
Autoridade Nomeante a designação de um Oficial, bacharel em Direito sempre que possível, para a
defesa, mediante Portaria (item 5.8.2 da DGPM-315).
Apresentando-se o revel antes de elaborado o Relatório, será o mesmo qualificado e interrogado e,
se necessário, acareado com os depoentes ouvidos em sua ausência, não tendo, entretanto, direito a
solicitar a repetição de qualquer ato ocorrido anteriormente (artigo 411, parágrafo único e artigo 413 do
CPPM).

3.6.15 Insanidade Mental e Incapacidade de Discernimento


Quando, em virtude do comportamento do justificante, ou do Termo de Inspeção de Saúde (TIS),
houver dúvida a respeito de sua sanidade mental ou da sua capacidade de discernimento, será ele
submetido à perícia médica, ordenada pelo Presidente, ou a pedido da defesa ou do cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão, em qualquer fase do processo (artigo 156, §§ 1° e 2°, do CPPM). Durante o
período de realização da perícia deverão ser adotadas as seguintes providências:

292
- suspender, por meio de despacho, os trabalhos do Conselho até o recebimento do Laudo Pericial;
- suspender o prazo de conclusão do Conselho (nesta ocasião, não serão contados os dias em que o
Conselho esteve suspenso, sendo retomado assim que o Laudo for juntado aos autos);
- ao ser juntado aos autos do Conselho o Laudo Pericial, proferir despacho retomando os trabalhos e a
contagem do prazo restante;
- durante o período em que o justificante esteja sendo submetido ao Exame, mantê-lo vinculado a sua OM
de origem, afastado das funções; e
- transmitir mensagem à Autoridade Nomeante, à DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso, participando
todo o ocorrido.

O Presidente apresentará o justificante ao Diretor do hospital da área ou à autoridade que suas


vezes fizer, mediante ofício e solicitará que sejam designados dois peritos para procederem ao exame de
sanidade mental. Nessa oportunidade, serão remetidos, anexos, os documentos que originaram o
Conselho, e outros considerados elucidativos, e formulados, no mínimo, os seguintes quesitos:

- se o justificante sofre de doença mental, de desenvolvimento mental incompleto ou retardado;


- se, no momento da(s) ação(ões) ou omissão(ões), o justificante se achava em algum dos estados
referidos no quesito anterior;
- se, em virtude das circunstâncias referidas nos quesitos antecedentes, possuía o justificante capacidade
de entender o caráter ilícito, irregular do fato, da falta cometida etc, ou de proceder de acordo com esse
entendimento;
- se a doença ou deficiência mental do justificante, não lhe suprimindo, diminui-lhe, consideravelmente, a
capacidade de entendimento (da ilicitude, irregularidade, gravidade) do fato ou a de autodeterminação,
quando o praticou (artigo 159 do CPPM); e
- se, em virtude do exame realizado, o justificante encontra-se passível de submissão à Junta de Saúde, a
fim de se avaliar sua possível reforma nos termos do inciso V do artigo 108 do Estatuto dos Militares.

No caso de embriaguez fortuita ou habitual, formular-se-ão quesitos congêneres, pertinentes ao


caso (artigo 159, parágrafo único do CPPM).
Recebido o laudo, o Presidente nele despachará, ordenando a sua juntada ao processo.
Se os peritos concluírem que o justificante estava sem capacidade de discernimento no momento
da ação ou omissão ou que a doença encontrada tenha, de alguma maneira, interferido com a capacidade
de julgar o acerto de seus próprios atos, e se os membros do Conselho, por unanimidade ou maioria,
concordarem com os peritos, será, imediatamente, feito o Relatório, consignando a evidência, e remetido
o processo à Autoridade Nomeante.

293
Caso os membros não concordem, por maioria ou unanimidade, com os peritos, solicitarão à
mesma autoridade que indique novos peritos para procederem à segunda e última perícia.
Tendo o exame de sanidade mental concluído pela inimputabilidade do justificante e por sua
incapacidade para permanecer no Serviço Ativo da Marinha (SAM), deverá o Conselho elaborar o
Relatório, propondo a Autoridade Nomeante a reforma do militar por motivo de saúde.
Em caso de falecimento do justificante, a certidão de óbito deverá ser juntada ao processo e,
imediatamente após, encerrado o mesmo, com a elaboração de um Relatório, no qual conste que a
punibilidade foi extinta pela morte (artigo 123, I, do Código Penal Militar).

3.6.16 Deserção do Justificante


Em caso de deserção do justificante durante o processo, deverá ser juntada aos autos cópia do
Termo de Deserção, tendo o Conselho prosseguimento à revelia, acompanhado pelo defensor designado,
devendo a deserção ser consignada no Relatório e em ata.
Caso se apresente voluntariamente, ou seja capturado, antes da redação do Relatório, o processo
continuará com a sua presença, podendo ser, inclusive, reinquirido ou acareado com os depoentes ouvidos
em sua ausência, não tendo, entretanto, direito a solicitar a repetição de qualquer ato ocorrido
anteriormente.

3.6.17 Conduta Inconveniente do Justificante


Se o justificante, durante uma sessão, se portar de modo inconveniente, será advertido pelo
Presidente e, se persistir, poderá ser retirado da sessão, que prosseguirá sem a sua presença, estando
presente, porém, o advogado ou o defensor do justificante, devendo o fato ser consignado em ata.
No caso de desacato a um dos membros, o Presidente determinará a lavratura de Auto de Prisão
em Flagrante, que será remetido à Autoridade Judiciária Militar competente, devendo o fato ser
consignado em ata e no Relatório, além da cópia do Auto ser juntada ao processo (artigo 389, parágrafo
único do CPPM).

3.6.18 Substituições
Por absoluta necessidade de serviço ou por motivo de saúde, qualquer
membro do Conselho poderá ser substituído mediante Portaria da Autoridade
Nomeante, na qual será consignado o motivo da substituição.
O novo membro prestará o compromisso preconizado no artigo 5.24 da
DGPM-315, que será registrado em ata.
Em caso da substituição da Autoridade Nomeante, a nova autoridade deverá consignar, em sua
Solução, se for competente para exará-la, que o Conselho foi nomeado pelo seu antecessor.
Por absoluta necessidade de serviço ou por motivo de saúde, devidamente comprovados, o Oficial-
Defensor poderá solicitar sua substituição ao Presidente.

294
Nesse caso, o justificante, se tiver se apresentado, deverá ser informado, em tempo hábil, para
indicar ou solicitar à autoridade nomeante outro oficial para acompanhar a sua defesa, devendo a
substituição ser consignada em ata e no Relatório.

3.6.19 Relatório e Remessa


Realizadas todas as diligências, o Conselho passará a
deliberar sobre o Relatório a ser redigido.
O Relatório constará de uma parte expositiva e de outra
conclusiva. Na primeira, deverão ser mencionados: os fatos que
deram origem à nomeação (Libelo Acusatório); o posto e o nome
do justificante; o enquadramento; o teor dos depoimentos; os
laudos e demais documentos elucidativos; as evidências ou não de
culpabilidade do justificante; a argumentação apresentada pela
defesa e os incidentes ocorridos durante o processo. Na segunda
parte, o Conselho deve decidir, por unanimidade ou maioria:

- se o justificante é ou não culpado da acusação que lhe foi imputada;


- se o justificante está ou não sem habilitação para acesso, em caráter definitivo, no caso do inciso II do
artigo 2° da Lei n° 5.836/1972; e
- se o justificante está, ou não, incapaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na
inatividade, no caso do inciso IV do artigo 2° da mesma Lei, levado-se em consideração os preceitos de
aplicação da pena previstos no Código Penal Militar (CPM).

No caso da deliberação ter sido por maioria de votos, deverá constar a expressão “VOTO
VENCIDO” ao lado da assinatura do membro que discordou dos demais.
O voto vencido, no todo ou em parte, será justificado pelo membro, imediatamente após a sua
assinatura em Termo Circunstanciado.
Após as assinaturas dos membros, será entregue uma cópia do Relatório ao justificante e ao
defensor ou, no caso de revelia, somente ao defensor, mediante Declaração nos autos.
Após a Declaração mencionada no artigo anterior, o Escrivão emitirá o Termo de Conclusão e
entregará os autos ao Presidente.
De posse dos autos, o Presidente emitirá despacho ordenando a remessa dos mesmos à Autoridade
Nomeante, restituindo, em seguida, os autos ao Escrivão.
O Escrivão emitirá, então, o Termo de Recebimento e, a seguir, o Termo de Encerramento e
Remessa.
O Presidente entregará cópia do Relatório ao Justificante, com posterior remessa dos autos,
mediante ofício, juntamente com o Recurso (se houver), obedecendo aos seguintes critérios:

295
- ao CM, via DPMM ou CPesFN, quando se tratar do caso previsto no item. 5.1, alínea a da DGPM-315;
- ao CM, via Autoridade Nomeante, no caso do item 5.1, alínea b da DGPM-315; e
- Os autos do Conselho deverão ser digitalizados no formato “PDF” e encadernados, enviando ainda, por
mídia, os arquivos editáveis (.doc ou .odt) de todos os documentos produzidos.

3.6.20 Decisão
Uma vez encerrado, os autos do Conselho de
Justificação serão enviados à Autoridade Nomeante,
para o Despacho, que é a decisão exarada no
Conselho de Justificação pelo CM.
O encaminhamento dos autos do Conselho
para Despacho será baseado em análise prévia,
realizada pela Assessoria Jurídica da DPMM ou do
CPesFN, no prazo máximo de 30 dias.
Os autos do processo serão apreciados, no prazo de 20 dias após o recebimento, pelo CM, que se
pronunciará sobre a aceitação ou não do julgamento realizado e determinará ações previstas nos incisos
do artigo 13 da Lei n° 5.836/1972.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma breve pausa para verificar o nosso aprendizado sobre o Conselho de Justificação.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O justificante poderá apresentar, no máximo, três testemunhas ou até o número de testemunhas


arroladas no Libelo Acusatório, caso estas sejam em número superior a três.

2) ( ) Em hipótese alguma, as perguntas solicitadas pela defesa na oitiva poderão ser recusadas.

3) ( ) Caso o justificante inativo não seja localizado, o Presidente ordenará a suspensão, por meio de
despacho, dos trabalhos do Conselho até que ele seja localizado.

4) ( ) Em caso de falecimento do justificante, a certidão de óbito deverá ser juntada ao processo, que será
imediatamente encerrado, com a elaboração de um Relatório, no qual conste que a punibilidade foi extinta
pela morte.

296
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Quando houver dúvida a respeito da sanidade mental ou da capacidade de discernimento do


justificante, ele será submetido à perícia médica. Durante o período de realização da perícia deverão ser
adotadas algumas providências, EXCETO:

(A) suspender, por meio de despacho, os trabalhos do Conselho até o recebimento do Laudo Pericial.

(B) suspender o prazo de conclusão do Conselho.

(C) mantê-lo vinculado a sua OM de origem, afastado das funções.

(D) proceder à detenção do justificante até que se constate que ele não traz perigo à instrução do processo.

(E) transmitir mensagem à Autoridade Nomeante, à DPMM ou ao CPesFN, conforme o caso,


participando todo o ocorrido.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 E
4 C
5 D

RECADO FINAL:

Nesta aula, fechamos o assunto Conselho de Justificação e já estamos prontos a passar ao nosso
próximo e último assunto desta Unidade de Ensino, Audiência do Comandante, assunto bem mais
corriqueiro a bordo.
Porém, veremos que existem certas questões, nem sempre muito bem abordadas, e que podem nos
trazer algumas complicações.
Mas, isso fica para a aula seguinte...
Dito isto...
Até a próxima aula!

297
DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR MILITAR

Olá, Aluno(a)!
Finalmente, chegamos à última aula da terceira unidade de ensino. Durante as nossas aula
anteriores, trouxemos vários conceitos do Direito Administrativo aplicados à caserna. Abordamos alguns
conceitos introdutórios e importantes do Direito Administrativo, explicamos o Direito Administrativo
Disciplinar Militar, apresentado alguns procedimentos como o Conselho de Disciplina e o Conselho de
Justificação; também tivemos a oportunidade de relembrar alguns dispositivos do Estatuto dos Militares e
do Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM).
Por fim, falaremos agora sobre algo muito corriqueiro a bordo, que a Audiência disciplinar
realizada pelo Comandante.
Vamos relembrar o conceito de contravenção disciplinar, a competência para imposição de penas
disciplinares, bem como citaremos alguns dos princípios aplicáveis a este procedimento sumário.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever a Contravenção Disciplinar;
- Citar a competência para imposição de penas disciplinares;
- Citar os princípios aplicáveis; e
- Descrever a audiência do comandante.

INTRODUÇÃO:
O procedimento administrativo disciplinar militar possui uma regulação maior na nossa
Constituição através dos dispositivos que tratam do processo administrativo geral, resguardando direitos e
garantias fundamentais como as do devido processo legal, contraditório, ampla defesa, legalidade,
presunção de inocência e direito ao silêncio, acompanhados de um amplo e sólido conjunto de valores e
peculiaridades, tais como a hierarquia e disciplina. O processo administrativo disciplinar militar vai
aparecer de forma mais detalhada no Estatuto dos Militares (Lei 6.880/80) e no Regulamento Disciplinar
para a Marinha (RDM).
A Audiência disciplinar realizada pelo Comandante nada mais é que a expressão de um
procedimento administrativo disciplinar militar, porém realizado de forma sumária.
Nesta aula, abordaremos este tema, inclusive enfrentando algumas situações um pouco polêmicas
sobre estes procedimentos.
Agora, vamos à luta!!!

298
3.7 AUDIÊNCIA DO COMANDANTE
3.7.1 Contravenção Disciplinar
Este é um tema que já abordamos no item 3.4.2 desta Unidade de Ensino. Entretanto, vamos
relembrar aqui alguns conceitos.
Primeiramente, vimos que a violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime,
contravenção ou transgressão disciplinar (artigo 42 do Estatuto dos Militares), sendo que contravenção ou
transgressão disciplinar são expressões sinônimas.
O militar no cumprimento de suas funções deve observar dois preceitos fundamentais: hierarquia
e disciplina. A inobservância destes preceitos poderá configurar a prática de faltas administrativas. Após
um regular processo administrativo, onde devem ser assegurados a ampla defesa e o contraditório, o
militar poderá ser punido, inclusive com o cerceamento da liberdade, a qual chamaremos de prisão
administrativa.
Desta forma, a Contravenção Disciplinar será toda ação ou omissão contrária às obrigações ou aos
deveres militares estatuídos nas leis, nos regulamentos, nas normas e nas disposições em vigor que
fundamentam a Organização Militar, desde que não incidindo no que é prescrito pelo Código Penal
Militar como crime.
Ao cometimento de uma transgressão, corresponderá a imposição de uma sanção. Aqui na
caserna, a prática de contravenções disciplinares será sancionada com a cominação de uma das penas
disciplinares previstas no artigo 14 do RDM.
Entretanto, temos que observar que a sanção não será simplesmente aplicada do nada. Teremos
todo um procedimento, em que será garantido ao contraventor o contraditório e a ampla defesa, como
veremos mais adiante. Mesmo na caserna, faz-se necessária a instauração de um procedimento
disciplinar, ainda que de forma abreviada para a sanção do infrator.

3.7.2 Competência
Vamos relembrar também as competências para imposição das penas disciplinares (item 3.4.3.1
desta Unidade de Ensino).
Pela leitura do artigo 19 do Regulamento Disciplinar para a Marinha (RDM), podemos inferir que
qualquer Titular de OM possui competência para impor penas disciplinares aos seus comandados ou aos
que servem sob sua direção ou ordem. Além disso, o Presidente da República e o Comandante da
Marinha possuem competência para imposição de penas disciplinares a todos os militares da MB.
Os Almirantes poderão delegar esta competência, no todo ou em parte, a Oficiais subordinados.
A pena de licenciamento e exclusão do serviço ativo da Marinha será imposta pelo Comandante da
Marinha ou por autoridade que dele tenha recebido delegação de competência.
A pena de licenciamento do serviço ativo da Marinha ex officio, a bem da disciplina, será aplicada
às Praças prestando serviço militar inicial pelo Comandante de Distrito Naval ou de Comando Naval onde
ocorreu a incorporação, de acordo com o Regulamento da Lei do Serviço Militar.

299
Os Comandantes dos Distritos Navais ou de Comando Naval têm competência, ainda, para aplicar
punição aos militares da reserva remunerada ou reformados que residem ou exercem atividades na área de
jurisdição do respectivo Comando, respeitada a precedência hierárquica.
Após relembrarmos todos estes conceitos, nesta aula iremos nos ater mais as audiências
promovidas pelos Titulares de OM.

3.7.3 Princípios Aplicáveis


Quando tratamos desta sistemática de um superior fazer uma Parte de Ocorrência a um
subordinado, o qual terá um determinado prazo para realização de sua defesa prévia, sendo
posteriormente julgado por um outra autoridade militar, normalmente um Titular de OM, temos a
expressão de um processo administrativo disciplinar militar.
Os servidores públicos civis são regulados pela Lei 8.112/90, que em seu artigo 148 define o que é
um processo disciplinar: "O processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de
servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as
atribuições do cargo em que se encontre investido".
Guardadas as devidas peculiaridades, é mais ou menos isso que se verifica também em âmbito
militar e que percebemos na audiência disciplinar realizada pelo Titular da OM. Este procedimento,
mesmo que sumário, deverá observar alguns princípios e regras para que tenha validade, conforme
estudaremos mais abaixo.
Claro que se deve ressaltar que não se pode estudar o processo administrativo disciplinar militar
afastando, por mais breve que se possa imaginar, os sustentáculos das Forças Armadas, hierarquia e
disciplina. Assim, a análise de qualquer princípio aplicável a esta espécie de processo administrativo não
deve ser desvinculada daqueles que são fundantes.
Por outro lado, a rigidez da disciplina militar e sua estrutura fundamentalmente hierarquizada
enseja particularidades. No entanto, essas especificidades não devem ser utilizadas como mecanismo para
realização de arbitrariedades. Existem alguns princípios que teremos que verificar, a fim de atestar a
legitimidade do processo administrativo disciplinar militar.

3.7.3.1 Devido Processo Legal


Trata-se de um princípio anglo-saxão, observado pela primeira vez na Magna Carta (1215) e há
muito incorporado em diversos ordenamentos jurídicos. Sua principal expressão na nossa Constituição se
encontra no artigo 5º, LIV, o qual assevera que: "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem
o devido processo legal".
Apesar de o dispositivo mencionar especificamente privação de liberdade e bens, na verdade este
princípio irá se propagar a todo o nosso ordenamento jurídico, inclusive aqui na caserna.
Sobre este tema, afirma HEUSELER (2007) que:

300
No que pertine ao processo disciplinar, os princípios da legalidade e do devido processo legal
desdobram-se em diversas garantias para os administrados, no nosso caso, aos militares: em
primeiro lugar, é vedado à Administração Pública criar infrações ou sanções; em segundo lugar,
impõe que a lei contenha um mínimo de densidade normativa, que permita aos indivíduos saberem
com segurança qual a conduta proibida e a respectiva sanção (tipicidade, conforme defendemos
anteriormente); por fim, exige que a lei criadora do ilícito e da sanção seja anterior ao fato
(irretroatividade).

Consoante este princípio, nenhuma decisão gravosa a um determinado sujeito poderá ser imposta
sem que, antes, tenha sido submetido a um processo cujo procedimento esteja previamente previsto em
lei, ou seja, impõe-se o cumprimento dos ritos legalmente previstos para a aplicação da penalidade.
Logo, podemos perceber que a pena disciplinar somente será válida se estiver formalmente
prevista em leis ou regulamentos prévios, que descrevam a conduta ilícita, bem como a sanção. Além
disso, ela deverá percorrer todo o devido processo legal, inclusive com o direito ao contraditório e ampla
defesa, que veremos mais a frente.

3.7.3.2 Discricionariedade
Trata-se de um tema bastante complexo.
O fundamento da discricionariedade é a impossibilidade do legislador não conseguir, diante dos
fatos, catalogar todas as situações. Há uma impossibilidade material e fática de o legislador conseguir
catalogar e prever todos os atos administrativos que podem ser praticados. A lei não consegue traçar de
maneira rígida todos os comportamentos que a Administração Pública tem que ter.
Em virtude desta dificuldade do legislador, lança-se mão de algumas formulações mais genéricas,
abstratas ou fluidas e, justamente, desses conceitos jurídicos indeterminados mais abertos para que o
próprio administrador, diante da hipótese e da singularidade da mesma, possa ele fazer aquela valoração.
Então, o próprio ordenamento jurídico irá conferir ao administrador público essa margem de liberdade
que será preenchida com seu juízo pessoal.

301
Perceba que, de forma alguma, estamos falando em ausência de lei, uma vez que a
discricionariedade deve estar parametrizada por ela. Desta feita, a lei faz remanescer essa margem de
liberdade, de espaço de atuação para o administrador público para que ele possa, diante das
circunstâncias, valorar e praticar o ato administrativo que mais atenda ao interesse público. Logo, é a
própria lei, que dá esse espaço em virtude da incapacidade de o legislador conseguir catalogar o mundo
fático, ou seja, todas as possibilidades de agir do administrador público.
Assim, a discricionariedade se traduz no poder conferido à Administração Pública para agir
livremente dentro de determinados parâmetros, ou seja, sem estar diretamente vinculada a uma
determinada conduta, desde que aja dentro dos limites legais e em defesa da ordem pública. Tal poder
consubstancia a posição de supremacia da Administração Pública sobre o particular.
O poder discricionário é o que permite ao Administrador Público diante de uma determinada
situação poder escolher uma dentre várias decisões igualmente válidas possíveis.
Nas palavras de HEUSELER (2007):

Assim, a discricionariedade deve ser entendida como uma limitação imposta pela lei, ou seja,
diante do caso concreto, a Administração poderá optar em adotar uma das opções previstas na lei à
resolução daquele caso. Especificamente no processo disciplinar, a discricionariedade tem
efetividade basicamente na especificação da pena disciplinar a ser aplicada ao servidor, levando-se
em consideração a natureza e a gravidade da infração ocorrida. Vê-se, portanto, que, embora possa
a Administração escolher a pena a ser aplicada, ainda assim está vinculada ao caso concreto, de
forma que a sanção não seja desproporcional em relação ao fato ocorrido.

Um ponto importantíssimo a ser dito é que discricionariedade é totalmente diferente de


arbitrariedade. O conceito de discricionariedade administrativa é sempre balizada pela lei. Se ela estiver
fora da lei, não é discricionariedade, mas sim arbitrariedade. São coisas totalmente diferentes.

3.7.3.3 Razoabilidade e Proporcionalidade


Apesar de não serem exatamente a mesma coisa, normalmente sempre vemos um princípio
acompanhado do outro, e assim faremos o nosso estudo aqui.
Estes são considerados dois dos princípios mais importantes no Direito. É um princípio
informador de diversas disciplinas jurídicas. Alguns chegam a chamá-los de princípio dos princípios.
A razoabilidade remonta à origem do próprio homem. Aristóteles foi um dos primeiros filósofos
que tratou da noção de proporcionalidade e razoabilidade. Dizia ele que o justo é o proporcional e está
ligado a essa ideia do meio termo. Então, vê-se uma referência a razoabilidade e proporcionalidade desde
muito tempo, é algo muito antigo.
Ele está previsto implicitamente na CRFB/88. Sendo assim, não existe propriamente um
dispositivo constitucional que trate do princípio da razoabilidade. Contudo, está ele expresso no artigo 2º
da Lei nº 9.784/99, a lei que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública
Federal.

302
Quando nos referimos à razoabilidade e proporcionalidade, também nos referimos a uma tríade:
meio, resultado e fim. Deve haver razoabilidade e proporcionalidade dos meios utilizados e para os fins
almejados. Estes princípios se dividem em subprincípios: adequação; necessidade e proporcionalidade em
sentido estrito.

- Adequação: é uma relação de aptidão da medida para alcançar um determinado resultado. Sendo assim,
deve-se perguntar se a medida é idônea, apta a determinado fim. Eis a pergunta relacionada ao
subprincípio da adequação. Este subprincípio é uma espécie de primeiro estágio, primeiro passo de
aferição da razoabilidade de uma medida. Assim, verifica-se se a medida é ou não adequada.

- Necessidade: está diretamente ligada à "proibição do excesso". Se existem duas medidas possíveis a
escolhida deve ser a mais suave, a mais branda, a que signifique um bônus maior do que um ônus. Seri o
"dos males o menor". Então, dentre as soluções consideradas adequadas, deve-se impor a menor restrição
possível ao direito fundamental.

- Proporcionalidade em sentido estrito: aqui devemos ponderar a solução que apresente um bônus maior
que o ônus. Vamos ter que ponderar entre os prejuízos e os benefícios em se adotar ou não uma medida.

É importante ter em mente que os três subprincípios se comunicam. A análise não é totalmente
estanque. A interpretação e a compreensão fazem parte de um processo único. Igualmente, também se
deve atentar ao fato de que a ponderação não se restringe à terceira hipótese, pois o juízo de ponderação
se dá em todas as três etapas.
Especificamente em relação ao processo disciplinar militar, HEUSELER (2007) assevera:

Especificamente no que tange ao processo disciplinar militar, deve-se ter em mente que a
imposição de eventual punição ao militar deve ser feita observando-se, necessariamente, a
natureza da infração e o quantum de sua gravidade, sopesando esses dois extremos, de modo que a
decisão da autoridade esteja proporcional à falta cometida e que seja razoável a imposição de
eventual sanção, evitando, assim, que ocorra uma inadequação entre os meios e os fins,
contrariando, por derradeiro, o previsto no inciso VI do artigo 2º da Lei nº 9.784, de 1999.

3.7.3.4 Motivação
É o ponto chave do controle de qualquer ato administrativo.
O princípio da motivação surge como mais um instrumento de garantia da Administração e dos
administrados quanto ao atendimento do interesse público, revestindo-se, de certo modo, em uma forma
de publicidade da vontade da Administração estampada nos seus atos. Portanto, a razão e os fundamentos
de qualquer decisão administrativa que implique restrições a direitos dos cidadãos devem
obrigatoriamente ser explicitados.

303
Uma distinção rápida entre motivo e motivação: motivo é a situação de fato, de direito, que vai
ensejar, motivar a prática do ato pela Administração Pública. Portanto, tem-se o motivo de fato, uma
situação de fato, de direito, que motivará a manifestação da Administração Pública. Motivação é a
divulgação desses motivos, tornar público para todos a justificativa do pronunciamento tomado pela
Administração.
A maior parte da doutrina entende que o motivo sempre será obrigatório, visto que é um dos
requisitos do ato administrativo, porém a motivação não. A doutrina entende que a motivação nem
sempre é obrigatória, que só se pode falar em motivação obrigatória se a lei expressamente determinar a
obrigatoriedade.
Vejamos o que nos diz o artigo 50 da lei 9.784/99:

Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos
fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;
IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;
V - decidam recursos administrativos;
VI - decorram de reexame de ofício;
VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos,
propostas e relatórios oficiais;
VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de
concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que,
neste caso, serão parte integrante do ato.
§ 2o Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que
reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos
interessados.
§ 3o A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da
respectiva ata ou de termo escrito.

Nesses atos listados a motivação é obrigatória. Da leitura do referido artigo, podemos inferir que
atos administrativos que imponham ou agravem sanções deverão ser motivados, de forma clara, explícita
e incongruente; com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos. Mesmo na caserna, com todas as
suas peculiaridades, deve-se observar este princípio.

3.7.3.5 Contraditório e Ampla Defesa


São verdadeiros pilares do devido processo legal, facultando ao acusado, durante todo o processo,
a efetiva participação na apuração, possibilitando-lhe a utilização de todos os meios de defesa admitidos
pelo ordenamento jurídico.

304
A nossa Constituição trata dos princípios do contraditório e ampla defesa no artigo 5º, LV, o qual
afirma que: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
Novamente, temos a apresentação de dois princípios que sempre são mencionados lado a lado.
Perceba que a nossa Constituição assegurou expressamente estas garantias a qualquer tipo de acusado,
seja em processo judicial ou administrativo.
O contraditório é a oportunidade de o cidadão ser ouvido e poder apresentar a sua versão dos fatos
que lhe são apresentados pela Administração Pública, contrapondo-se e defendendo-se dos fatos que lhe
são imputados. A ampla defesa, por sua vez, constitui garantia constitucional que assegura ao acusado
condições para que traga ao processo todos os elementos necessários ao esclarecimento da verdade,
facultando-lhe ainda o direito de se omitir ou se calar. O contraditório é a própria exteriorização da ampla
defesa. A ampla defesa abre espaço para que o militar exerça, sem qualquer restrição, seu direito de
proteção.
Garantir a aplicação destes princípios nos processos da caserna não é uma generosidade, nobreza
da autoridade competente para punir, mas um interesse público. O direito de se defender é essencial a
todos os envolvidos em qualquer processo.
Os princípios do contraditório e da ampla defesa são aplicáveis em qualquer tipo de procedimento
que envolva o poder punitivo. Não se concebe mais hoje, qualquer espécie de pena em que não se
garantam mais os direitos dos envolvidos.
Neste sentido, o artigo 26 do RDM é bastante cristalino: "Nenhuma pena será imposta sem ser
ouvido o contraventor e serem devidamente apurados os fatos".
Perceba que os princípios do contraditório e ampla defesa não inibem em nada a percepção dos
princípios da hierarquia e disciplina. Mesmo observando estas peculiaridade inerentes à caserna, deve-se
assegurar o pleno exercício do contraditório e ampla defesa, pois além de refletirem o interesse público,
encontram-se intimamente ligados à concepção de justiça, conceito fundamental ao bom e regular
exercício da liderança militar.

3.7.4 A Audiência
Primeiramente, temos que verificar que o Estatuto dos Militares é de 1980, enquanto o RDM é de
1983. Já a nossa Constituição, data de 1988. Ou seja, o Estatuto dos Militares foi promulgado sob a égide
de uma outra Constituição. Por sua vez, o RDM busca seu fundamento justamente no Estatuto dos
Militares. Logo, eventualmente, é possível que encontremos alguns dispositivos contidos em ambos que
não foram recepcionados pela atual Constituição. O problema é que isso nem sempre é expresso ou
declarado e, diante de um caso real, teremos que verificar se ambas as normas estão de acordo com os
princípios e regras trazidas pela atual Constituição.

305
A audiência disciplinar realizada pelo
Titular da OM é o ponto auge do processo
administrativo disciplinar militar sumário. Ela
sempre deverá se pautar no estrito cumprimento dos
parâmetros constitucionais e legais.
Em um primeiro momento, algum superior
hierárquico ao visualizar um eventual cometimento
de contravenção disciplinar fará a correspondente
Parte de Ocorrência, em que narrará a sua visão
acerca da falta cometida. Já em um segundo
momento, ao militar imputada a falta, será dada a ciência da referida Parte de Ocorrência, sendo-lhe
facultado um prazo para que faça a sua defesa prévia por escrito. Posteriormente, todos estes documentos
serão levados à audiência com o Titular da OM para que julgue o caso. Momento no qual será facultado
novamente ao acusado a possibilidade de se defender, desta vez de forma oral.
A punição administrativa por transgressão disciplinar militar se configura como um ato
discricionário administrativo, decorrente do poder disciplinar e como tal necessita observar os requisitos
legais que permeiam os atos da Administração Pública, condições necessárias à validade de qualquer ato
administrativo.
A efetividade da justiça não significa impunidade, nem a quebra de princípios basilares da vida
castrense, mas a aplicabilidade das penas não podem ser utilizadas como mecanismo saneador da vontade
de punir da autoridade competente, devendo respeitar preceitos constitucionais e administrativos,
evitando assim atuações arbitrárias, abusos de poder e cerceamento de direitos. Sempre deverão ser
observados os princípios e regras que vão balizar a atuação da autoridade competente a punir. Todo
cidadão, inclusive os militares, são dotados de direitos e garantias fundamentais que devem ser
respeitados em sua plenitude, a fim de que consigamos atingir uma maior justiça social.
A autoridade competente sempre deverá julgar com imparcialidade e isenção de ânimo a
gravidade da contravenção, sem condescendência ou rigor excessivo, levando em conta as circunstâncias
justificativas ou atenuantes.

306
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer uma última parada nesta Unidade de Ensino, para testarmos o aprendizado
alcançado nesta aula. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A discricionariedade possibilita que o administrador público aja livremente sem observância de


qualquer parâmetro.

2) ( ) A imposição de penas disciplinares militares não precisa ser motivada.

3) ( ) Nenhuma pena disciplinar será imposta sem ser ouvido o contraventor e serem devidamente
apurados os fatos.

4) ( ) A autoridade competente sempre deverá julgar com imparcialidade e isenção de ânimo a gravidade
da contravenção, sem condescendência ou rigor excessivo, levando em conta as circunstâncias
justificativas ou atenuantes.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Podemos dividir os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade em subprincípios, que são:

(A) adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

(B) adequação, necessidade e equilíbrio.

(C) conformidade, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

(D) adequação, conveniência e proporcionalidade em sentido estrito.

(E) conformidade, conveniência e equilíbrio.

307
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 C
4 C
5 A

RECADO FINAL:

Nesta aula, estudamos sobre a Audiência disciplinar realizada pelo Comandante da OM e citamos
alguns princípios aplicáveis a esta situação e assim finalizamos esta Unidade de Ensino.
Espero que você tenha gostado e aproveitado bastante a oportunidade de aprender um pouquinho
mais sobre o Direito Administrativo Disciplinar Militar. Além dos procedimentos de hoje, falamos
também sobre o Conselho de Disciplina e o Conselho de Justificação, além de fazer uma grande revisão
acerca do Estatuto dos Militares e do Regulamento Disciplinar para a aMarinha (RDM).
Na próxima aula já avançaremos a um outro ramo do Direito muito interessante e muito
importante à nossa atividade militar naval, porém ainda pouco conhecido, que é o Direito Internacional
dos Conflitos Armados (DICA).
Dito isto...
Até a próxima aula!

308
REFERÊNCIAS:

ASSIS, Jorge César de. Curso de direito disciplinar militar: da simples transgressão ao processo
administrativo. Curitiba: Juruá, 2008.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal: Centro Gráfico, 1988.

________. Decreto nº 71.500, de 5 de dezembro de 1972. Dispõe sobre o Conselho de Disciplina.


Brasília, DF.

________. Decreto nº 7.724, de 16 de maio de 2012. Regulamenta a Lei no 12.527, de 18 de novembro de


2011, que dispõe sobre o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do caput do art. 5o, no inciso II
do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da Constituição. Brasília, DF.

________. Decreto nº 88.545, de 26 de julho de 1983. Regulamento Disciplinar para a Marinha.


Brasília, DF.

________. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar. Brasília, DF.

________. Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969. Código de Processo Penal Militar. Brasília,
DF.

________. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal.

________. Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965. Regula a ação popular.

________. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional.

________. Lei nº 5.836, de 5 de dezembro de 1972. Dispõe sobre o Conselho de Justificação. Brasília,
DF.

________. Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980. Estatuto dos Militares. Brasília, DF.

________. Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores
públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Brasília, DF.

_________. Lei 9.784, de 29 de janeiro de 19999. Regula o processo administrativo no âmbito da


Administração Pública Federal. Brasília, DF.

________. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Lei de Acesso à Informação. Brasília, DF.

________. Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha. DGPM-315. Normas sobre Justiça e Disciplina na


MB. 3ª Rev. 2018.

309
________. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante nº 5. Brasília, DF.

BRUNO, Aníbal. Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. Manual de Processo Administrativo Disciplinar e


Sindicância. São Paulo: Fortium, 2008.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. – 31. ed. rev., atual. e ampl.
– São Paulo: Atlas, 2017.

GOMES CARNEIRO, Márcio Tibúrcio. “O Direito Penal Militar nos Congressos Jurídicos
Brasileiros”, in “Arquivo de Direito Militar”, Ano I, nº 2, Set/Dez de 1942, Imprensa Nacional, Rio, p.
384.

HEUSELER, Elbert da Cruz. Processo Administrativo Disciplinar Militar à Luz dos Princípios
Constitucionais e da Lei nº 9.784 de 1999. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2007.

OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Infrações e Sanções Administrativas. 2.ed. São Paulo: RT, 2005.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

TEIXEIRA, Marcos Salles. Anotações sobre Processo Administrativo Disciplinar. Brasília: CGU,
2010.

310
TEMA: DIREITO
4.0 DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)
4.1 CONVERGÊNCIA ENTRE O DIDH E O DIH
4.1.1 Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH).
4.1.2 Direito Internacional Humanitário (DIH).
4.1.3 A Interação entre o DIDH e o DIH.
4.1.4 Aplicação do DIDH e DIH no Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos.
4.1.5 Desafios da interação do DIDH e do DIH.
4.1.5.1 Alguns problemas da aplicação dos Direitos Humanos em conflitos armados.
4.1.5.2 A interrelação entre o DIDH o DIH.
4.2 DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)
4.2.1 Conceito.
4.2.2 A evolução histórica do DICA.
4.2.3 Regras fundamentais do DICA.
4.2.4 Princípios fundamentais do DICA.
4.3 PRINCIPAIS TRATADOS DE DICA
4.3.1 Direito de Genebra.
4.3.2 Artigo 3º Comum.
4.3.3 Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra.
4.3.4 Direito de Haia.
4.4 PROTEÇÃO DO DICA
4.4.1 Civis.
4.4.2 Conduta com prisioneiro de guerra, feridos, enfermos e náufragos.
4.4.2.1 Prisioneiros de guerra.
4.4.2.2 Enfermos detidos.
4.4.2.3 Náufragos.
4.4.3 Conduta com Pessoal de Saúde e Capelães.
4.4.4 Espiões e Mercenários.
4.4.5 Procedimentos com unidades sanitárias e meios de transporte sanitário.
4.4.6 Pessoal sanitário e religioso.
4.4.7 Bens Culturais.
4.4.8 Localidades e Zonas sob Proteção Especial.
4.4.9 Principais símbolos e distintivos.
4.5 CONFLITO ARMADO INTERNACIONAL (CAI)
4.5.1 Natureza do conflito.
4.5.2 Os sujeitos ativos e passivos.
4.5.3 Aplicação em razão do tempo.
311
4.5.4 Aplicação em razão do lugar.
4.5.5 Estados Neutros.
4.6 CONFLITO ARMADO NÃO INTERNACIONAL (CANI)
4.6.1 Natureza do conflito.
4.6.2 Os sujeitos ativos e passivos.
4.6.3 Aplicação em razão do tempo.
4.6.4 Aplicação em razão do lugar.
4.7 GUERRA NO MAR
4.7.1 Passagem Inocente.
4.7.2 Imunidades.
4.7.3 Bloqueio e Zonas de Exclusão.
4.8 GUERRA NO AR
4.9 ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS
4.9.1 Tribunal Penal Internacional (TPI).
4.9.2 Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).
4.9.2.1 História.
4.9.2.2 Funções.
4.9.2.3 Princípios Fundamentais.
4.9.2.4 Orgãos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.

312
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Seja bem-vindo ao último capítulo do nosso curso, Direito Internacional dos Conflitos
Armados (DICA).
Ao longo do curso tivemos algumas breves noções gerais sobre Direito Constitucional, Direito
Penal Militar, Direito Processual Penal Militar e Direito Administrativo, tendo sempre como foco a
atuação das Forças Armadas, em especial da Marinha do Brasil (MB).
Neste último tópico, veremos um outro ramo do Direito muito interessante e também
intimamente relacionado à atuação das Forças Armadas em sua atividade fim, a guerra! Enquanto os
demais ramos estarão mais preocupados em regular atividades dentro do território nacional, o DICA
terá um enfoque mais voltado aos conflitos internacionais. Você perceberá que nós veremos um novo
ramo do Direito, completamente distinto aos demais.
As aulas deste capítulo foram compiladas e adaptadas, mediante autorização, a partir do
material utilizado pela Escola Superior de Guerra (ESG), em sua plataforma EAD do Curso de Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA). Estas regras constituem um resumo das disposições
essenciais do Direito Internacional Humanitário. Nossas aulas terão como função facilitar a difusão do
Direito Internacional Humanitário no âmbito da MB.
Inicialmente conversaremos a respeito da relação entre o Direito Internacional dos Direitos
Humanos e o Direito Internacional Humanitário.

Objetivos da Aprendizagem:
- Diferenciar o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e o Direito Internacional
Humanitário (DIH); e
- Descrever a interação entre o DIDH e o DIH.

INTRODUÇÃO:
Nesta aula veremos a interação entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos
(DIDH) e o Direito Internacional Humanitário (DIH). Porém, para se verificar a convergência de
ambos será necessário, em um primeiro momento, distinguir esses dois ramos do Direito
Internacional, apresentando suas especificidades e os princípios que integram seus corpus iuris.
Dessa forma, os primeiros tópicos deste breve estudo discutirão os elementos essenciais do
DIDH e do DIH. A seguir, analizaremos de forma genérica as convergências entre os citados
ramos, enfatizando o nível mínimo de humanidade destes e o desenvolvimento da claúsula
Martens, que permite a aplicação subsidiária dos Direitos Humanos no Direito Humanitário.

313
4.0 DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)
O DICA faz parte do Direito Internacional, o qual rege as relações entre Estados, sendo
constituído por acordos internacionais concluídos entre Estados – geralmente designados por
tratados ou convenções – assim como pelos princípios gerais e costumes que os Estados aceitam
como obrigações legais.
As origens do DICA podem ser encontradas nos códigos e regras de religiões e nas
culturas do mundo inteiro. O desenvolvimento moderno do Direito teve início na década de 1860;
desde essa altura, os Estados acordaram uma série de normas práticas, baseadas na dura
experiência da guerra moderna, que refletem em um delicado equilíbrio entre as preocupações
humanitárias e as necessidades militares dos Estados. Com o crescimento da comunidade
internacional, aumentou igualmente o número de Estados em todo o mundo que contribuem para
o desenvolvimento do DICA, que hoje pode ser considerado como um sistema de Direito
verdadeiramente universal.

4.1 CONVERGÊNCIA ENTRE O DIDH E O DIH


4.1.1 Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH)
O Direito Internacional dos Direitos Humanos tem o escopo de proteger os indivíduos
contra violações cometidas pelo Estado ou por particulares com a conivência ou inatividade deste,
sendo formada uma relação jurídica entre o indivíduo e o Estado; ou entre o indivíduo e outro
particular, nos casos de omissão do Estado.
O modelo de proteção dos Direitos
Humanos é baseado em atividades de
garantia da lei (law enforcement), capazes de
serem utilizadas tanto em tempo de paz,
quanto em tempo de guerra. Assim,
independentemente da qualificação da
situação do Estado como comum ou de
conflito armado, a aplicação desse modelo
pressupõe uma base segura por parte do
governo em relação ao seu território, dentro do qual ele deve exercer controle efetivo e assegurar
a ordem e o cumprimento das normas estabelecidas.
Dessa forma, apesar de as normas de Direitos Humanos serem aplicáveis em todas as
circunstâncias, elas podem, contudo, sofrer revogações de alguns de seus preceitos, de acordo
com as cláusulas de suspensão de garantias dos tratados internacionais.
Em casos excepcionais, alguns direitos humanos podem ser revogados, sendo que é nesse
campo de atuação que se encontra explicitamente a interrelação entre o Direito Internacional dos
Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário.
314
Diversos tratados internacionais abrangem tal possibilidade de suspensão de direitos.
Como exemplos, podemos citar o artigo 4 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos,
no sistema ONU, e o artigo 15º da Convenção Europeia de Direitos Humanos, no Sistema
Europeu de Proteção aos Direitos Humanos.

ARTIGO 4
1. Quando situações excepcionais ameacem a existência da nação e sejam proclamadas
oficialmente, os Estados Partes do presente Pacto podem adotar, na estrita medida exigida
pela situação, medidas que suspendam as obrigações decorrentes do presente Pacto, desde
que tais medidas não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhes sejam
impostas pelo Direito Internacional e não acarretem discriminação alguma apenas por
motivo de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social.
2. A disposição precedente não autoriza qualquer suspensão dos artigos 6, 7, 8
(parágrafos 1 e 2) 11, 15, 16, e 18.
3. Os Estados Partes do presente Pacto que fizerem uso do direito de suspensão devem
comunicar imediatamente aos outros Estados Partes do presente Pacto, por intermédio do
Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, as disposições que tenham
suspendido, bem como os motivos de tal suspensão. Os Estados partes deverão fazer uma
nova comunicação, igualmente por intermédio do Secretário-Geral da Organização das
Nações Unidas, na data em que terminar tal suspensão.

ARTIGO 15°
Derrogação em caso de estado de necessidade
1. Em caso de guerra ou de outro perigo público que ameace a vida da nação, qualquer
Alta Parte Contratante pode tomar providências que derroguem as obrigações previstas na
presente Convenção, na estrita medida em que o exigir a situação, e em que tais
providências não estejam em contradição com as outras obrigações decorrentes do direito
internacional.
2. A disposição precedente não autoriza nenhuma derrogação ao artigo 2°, salvo quanto ao
caso de morte resultante de actos lícitos de guerra, nem aos artigos 3°, 4° (parágrafo 1) e
7°.
3. Qualquer Alta Parte Contratante que exercer este direito de derrogação manterá
completamente informado o Secretário Geral do Conselho da Europa das providências
tomadas e dos motivos que as provocaram. Deverá igualmente informar o Secretário -
Geral do Conselho da Europa da data em que essas disposições tiverem deixado de estar
em vigor e da data em que as da Convenção voltarem a ter plena aplicação.

No âmbito do Sistema Interamericano, marco teórico da presente pesquisa, é o artigo 27 da


Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) que estabelece as regras para a
suspensão de garantias para os Estados-membros.

315
Artigo 27. Suspensão de garantias
1. Em caso de guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace
a independência ou segurança do Estado Parte, este poderá adotar disposições que, na
medida e pelo tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as
obrigações contraídas em virtude desta Convenção, desde que tais disposições não sejam
incompatíveis com as demais obrigações que lhe impõe o Direito Internacional e não
encerrem discriminação alguma fundada em motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião
ou origem social.
2. A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos
determinados seguintes artigos: 3 (Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica);
4 (Direito à vida); 5 (Direito à integridade pessoal); 6 (Proibição da escravidão e servidão);
9 (Princípio da legalidade e da retroatividade); 12 (Liberdade de consciência e de religião);
17 (Proteção da família); 18 (Direito ao nome); 19 (Direitos da criança); 20 (Direito à
nacionalidade) e 23 (Direitos políticos), nem das garantias indispensáveis para a proteção
de tais direitos.
3. Todo Estado Parte que fizer uso do direito de suspensão deverá informar
imediatamente os outros Estados Partes na presente Convenção, por intermédio do
Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos, das disposições cuja aplicação
haja suspendido, dos motivos determinantes da suspensão e da data em que haja dado por
terminada tal suspensão.

Considerando-se que o artigo 27.1 da CADH contempla a suspensão de certos direitos em


caso de guerra, perigo público e outras emergências que ameacem a independência ou segurança
do Estado, e dado que as limitações em qualquer dessas hipóteses devem estar ajustadas à
exigência da situação específica, pode-se concluir que alguns tipos de suspensão de garantias que
poderiam ser permitidas em um caso, por outro lado, poderiam não o ser em um caso diferente.
Portanto, a licitude das medidas adotadas para enfrentar situações excepcionais em um Estado
depende do caráter, da intensidade, da profundidade e do contexto particular da emergência, bem
como da proporcionalidade e razoabilidade que possuam as medidas adotadas.
A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) já enfatizou que o
Estado está obrigado a determinar as razões e os motivos que levaram as autoridades internas a
declarar o estado de emergência, que deve exercer o adequado e efetivo controle dessa situação,
além de garantir que a suspensão declarada se encontre na medida e no tempo estritamente
limitados à exigência do caso.
No mesmo sentido, a Corte Europeia de Direitos Humanos estabelece como requisitos para
a declaração do estado de emergência três critérios:

- a existência de uma situação excepcional de crise ou emergência;


- que essa situação afete toda a população; e
- que constitua uma ameaça à vida organizadada sociedade.

316
Os Estados, portanto, não possuem uma discricionariedade ilimitada no momento da
declaração da suspensão de garantias. Consequentemente, corresponde aos órgãos de supervisão
dos tratados internacionais, de acordo com as suas respectivas competências, exercer o controle
da declaração do estado de emergência de forma subsidiária e complementar, analisando a
conformidade ou não dos atos estatais com o estabelecido no dispositivo que autoriza a suspensão
de garantias, assim como com os outros artigos do texto convencional.
Destarte, a suspensão de garantias não deve exceder a medida do estritamente necessário,
sendo ilegal toda a atuação dos poderes públicos que ultrapasse os limites que devem estar
assinalados na disposição que decreta o estado de exceção.

4.1.2 Direito Internacional Humanitário (DIH)


O Direito Internacional Humanitário (DIH) tem a finalidade de reger as normas referentes
à condução das hostilidades e as normas de proteção e distinção entre combatentes e civis em
casos de conflito armado. A relação jurídica que esse ramo do Direito abrange é entre as partes
que estão em conflito armado, sejam elas Estados, grupos insurgentes ou outros grupos armados
organizados. Suas normas não podem ser revogadas, por serem o nível mínimo de humanidade a
deve ser respeitado em casos de conflito.

A definição da existência de um conflito armado é objetiva, com base na natureza e na


gravidade das hostilidades em curso, independentemente da
motivação ou propósito do conflito ou da qualificação das partes a
ele pertencentes. O modelo de proteção ao indivíduo do DIH se
aplica exclusivamente na condução das hostilidades em conflitos
armados, baseando-se na premissa de que, em dito estágio, é

317
muito tarde para prevenir o uso de violência armada entre as várias partes do conflito. Seu
objetivo é restringir o uso de violência pelos beligerantes, por meio do balanceamento das
necessidades militares e dos imperativos humanitários.
O DIH é aplicado em casos de conflitos armados, que devem ser entendidos como uma
situação que gera o recurso à força armada por:

- Estados entre si;


- Estados e grupos armados organizados; ou
- Grupos armados organizados entre si dentro de um Estado.

Os conflitos armados podem, por


sua vez, ter caráter internacional ou não
internacional; sendo que a respeito de
cada âmbito de aplicação incidem normas
específicas. No que tange aos conflitos
armados internacionais, são aplicadas as
disposições das Convenções de Genebra
de 1949.
Os conflitos armados não internacionais, por sua vez, apesar de não estarem
expressamente definidos no artigo 3 comum às Convenções de Genebra, são interpretados pela
doutrina como abrangidos pelo referido artigo e pelas normas costumeiras pertinentes; sendo que
devem ser entendidos da forma mais extensiva possível, de modo a abarcar, inclusive, aqueles
conflitos abertos e de pouca intensidade entre as forças armadas ou grupos relativamente
organizados, que ocorrem dentro do território de um Estado em particular. A existência de um
conflito prolongado, com uso de táticas e armamentos militares e de intensidade grave são fatores
que caracterizariam, por exemplo, uma situação de conflito armado não internacional, sendo que
eles devem ser diferenciados das situações de distúrbios e tensões internas, que se caracterizam
por serem atos isolados e esporádicos, que não são abarcados pelo DIH, mas sim pelos Direitos
Humanos.
Estes tipos de conflitos variam enormemente. Compreendem as guerras civis tradicionais,
conflitos armados internos que se propagaram a outros Estados ou conflitos internos nos quais
intervêm terceiros Estados ou uma força multinacional junto aos governos. O artigo 3º comum
estipula normas fundamentais que são irrevogáveis. É como uma mini convenção dentro das
quatro Convenções de Genebra com as suas normas essenciais condensadas, tornando-as
aplicáveis aos conflitos de natureza não internacional:

318
- Determina o tratamento humano para todos os indivíduos em poder do inimigo, sem nenhuma
distinção adversa. Proíbe especialmente os assassinatos; mutilações; torturas; tratamento cruéis,
humilhantes e degradantes; tomada de reféns e julgamentos parciais;
- Determina que os feridos, enfermos e náufragos sejam recolhidos e tratados;
- Outorga ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) o direito de oferecer seus serviços
às partes em conflito;
- Insta as partes em conflito para pôr em vigor, mediante os chamados acordos especiais, a
totalidade ou as partes das Convenções de Genebra; e
- Reconhece que a aplicação dessas disposições não afetam o estatuto jurídico das partes em
conflito.

Diversos standards de proteção estão abrangidos no modelo do DIH, sendo eles variáveis
de acordo com o status do indivíduo envolvido nas hostilidades. Assim, não apenas os membros
da força armada inimiga podem ser objeto de ataque, mas também os civis que tomam parte
diretamente nas hostilidades, pelo período que durar a sua participação. A distinção entre
combatentes e não combatentes tem implicações fundamentais.
Cabe ressaltar que, de acordo com a regra
de imunidade do artigo 13 do Protocolo II das
Convenções de Genebra, as partes têm a
obrigação geral de proteger a população civil
contra os perigos procedentes das operações
militares, sendo que, consequentemente, essa
população não pode ser objeto de ataques
militares e não pode ser alvo de atos de ameaça
de violência que tenham como objetivo aterrorizá-la. Independentemente da situação jurídica de
normalidade ou anormalidade política, a população civil vítima de um conflito armado deve ser
protegida pelo Estado.

4.1.3 A interação entre o DIDH e o DIH


O DIH tem status de lei especial, uma vez que abrange especificamente os casos de
conflito armado. Apesar de elaborado para tutelar essa específica qualificação jurídica, tem-se que
em muitos casos suas regras tratam do mesmo bem jurídico que as regras de Direitos Humanos.
Contudo, as normas desenvolvidas no período de paz não podem ser aplicadas
indiscriminadamente aos conflitos armados, mas inseridas na estrutura do DIH de maneira
sensível.
A esse respeito, a Corte Internacional de Justiça estabeleceu no caso da Legality of the
Threat or Use of Nuclear Weapons que para a análise da natureza do direito inderrogável à vida
319
deveriam ser levadas em consideração as regras do DIH como lex specialis, a fim de se
determinar o que seria considerado como privação arbitrária à vida no contexto de um conflito
armado. Embora esse raciocínio funcione completamente para se interpretar o direito à vida, o
mesmo não ocorre para outros bens jurídicos protegidos, como, por exemplo, o direito ao acesso à
justiça.
Em algumas áreas coincidentes do DIDH e DIH, as normas de direitos humanos são mais
precisas do que as de direito internacional humanitário. Por exemplo, no caso das garantias
judiciais, que possuem grande desenvolvimento normativo e jurisprudencial em matéria de DIDH
e bastante incipiente em DIH, tem-se que a norma do artigo 3.1.d comum das Convenções de
Genebra diz que: "As condenações proferidas e as execuções efectuadas sem prévio julgamento,
realizado por um tribunal regularmente constituído, que ofereça todas as garantias judiciais
reconhecidas como indispensáveis pelos povos civilizados". Perceba que a norma é bastante
imprecisa e demasiadamente abrangente, o que necessitaria a utilização complementar dos
Direitos Humanos para desenvolver seu conteúdo.
Assim, em uma hipótese como essa é necessário que além dos elementos complementares
à Convenção de Genebra, contidos nos protocolos adicionais I e II e no direito costumeiro,
integrem-se à fórmula apresentada na Convenção de Genebra as normas de Direitos Humanos,
uma vez que elas apresentam uma evolução patente na caracterização das garantias judiciais e
meios de acesso à justiça.
No que tange à convergência dos DH e DIH, é notável que no caso Music et alli o Tribunal
Penal Internacional ad hoc para a ex-Ioguslávia tenha ponderado que tanto o Direito Internacional
dos Conflitos Armados, quanto o Direito Internacional dos Direitos Humanos tomam como ponto
de partida sua preocupação comum em salvaguardar a dignidade da pessoa humana, o que forma a
base dos seus princípios mínimos de humanidade.
Assim, o princípio da humanidade pode ser entendido de dois modos diversos: de um lado,
pode ser concebido como um princípio subjacente à proibição do tratamento desumano,
estabelecido pelo artigo 3 comum às Convenções de Genebra; e por outro lado pode ser invocado
como referência à humanidade como um todo, em relação às matérias de interesse comum, geral e
direto desta.
A inclusão no preâmbulo da Convenção de Haia de 1899 de uma disposição, tributo a um
delegado russo na Convenção, conhecida como cláusula Martens, é outra eloquente expressão da
convergência entre esses ramos do Direito Internacional.
Reconhecendo-se que não seria possível solucionar todos os problemas que poderiam ser
levantados na análise da Convenção de Haia, as partes contratantes estabeleceram que não era a
sua intenção que os casos não previstos, na ausência de um mandamento escrito, fossem deixados
ao julgamento arbitrário dos comandantes militares.
Dessa forma, estabeleceu-se que nos casos de falta de normativa dirigente, os civis e os
320
combatentes deveriam permanecer sob a proteção e a regra dos princípios do direito das nações,
como um resultado dos usos estabelecidos pelos povos civilizados, das leis de humanidade, e os
ditames da consciência pública.
Assim, independentemente do que os Estados acordem, a condução da guerra será sempre
governada pelos princípios existentes de direito internacional, entre os quais se destaca o Direito
Internacional dos Direitos Humanos. Sua importância ainda é visível, por sua incorporação nas
disposições relativas à denúncia das quatro Convenções de Genebra sobre Direito Internacional
Humanitário e do Protocolo Adicional I.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já
aprendeu até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas
ou erradas.

1) ( ) Os Direitos Humanos não podem ser revogados, por serem o nível mínimo de humanidade
que deve ser respeitado.

2) ( ) A definição da existência de um conflito armado é subjetiva, dependendo da natureza e


gravidade das hostilidades, e ainda da motivação ou propósito do conflito.

3) ( ) O objetivo do DIH é restringir o uso de violência pelos beligerantes, por meio do


balanceamento das necessidades militares e dos imperativos humanitários.

321
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Sobre o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), podemos afirmar que

(A) só se aplica em tempos de paz.

(B) tem o escopo de proteger os indivíduos contra violações cometidas pelo Estado ou por
particulares com a conivência ou inatividade deste.

(C) a relação jurídica que esse ramo do Direito abrange é entre as partes que estão em conflito armado,
sejam elas Estados, grupos insurgentes ou outros grupos armados organizados.

(D) suas normas não podem ser revogadas, por serem o nível mínimo de humanidade a deve ser
respeitado em casos de conflito.

(E) se aplica em todas as circunstâncias, sem a possibilidade de qualquer de acordo com as


cláusulas de suspensão de garantias dos tratados internacionais.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 E
3 C
4 B

RECADO FINAL:

Nesta primeira aula de Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA), procuramos
diferenciar bem o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e o Direito Internacional
Humanitário (DIH), que é algo que sempre causa muitas dúvidas, principalmente pelos nomes
parecidos. Descrever também como que ocorre a interação entre eles. A aplicação de um, não exclui
necessariamente a do outro.
Na próxima aula, complementaremos esta ideia, abordando a aplicação de ambos no
âmbito do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos.
Dito isto...
Até a próxima aula!

322
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Na nossa primeira aula deste capítulo, trouxemos alguns conceitos iniciais e fizemos a
diferenciação do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e do Direito Internacional
Humanitário (DIH), bem com dscrevemos como que ambos interagem entre si.
Nesta aula, iremos finalizar este tema, trazendo alguns desafios existentes nesta interação e
vamos ver como se inserem no âmbito do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos.
Então, mãos à obra!

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever a aplicação do DIDH e DIH no Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos
Humanos; e
- Citar os desafios da interação do DIDH e do DIH.

INTRODUÇÃO:
Nesta aula, analizaremos os desdobramentos jurisprudenciais do Sistema Interamericano
de Direitos Humanos, comparando as conclusões da Comissão e da Corte Interamericanas de
Direitos Humanos na matéria, bem como faremos uma análise da possibilidade de aplicação
subsidiária do Direito Humanitário pelos Direitos Humanos por autorização do artigo 29 da
Convenção Americana.
Por fim, discutiremos as vantagens e as desvantagens da aplicação do Direito Internacional
dos Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário.

4.1 CONVERGÊNCIA ENTRE O DIDH E O DIH


4.1.4 Aplicação do DIDH e DIH no Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos
Como avaliar a integração do Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e do
Direito Internacional Humanitário (DIH) no momento da aplicação e efetivação de seus
postulados?
É notável que o DIH não possua um tribunal permanente que analise as violações desse
Direito pelas partes contratantes de seus tratados, sendo que a falta de mecanismos para sua
implementação é um dos maiores problemas para a efetivação desse ramo do Direito
Internacional.
Desse modo, a literatura jurídica aponta que a proteção dos Direitos Humanos não apenas
compartilha uma filosofia comum com o DIH, mas que também pode ser utilizada para
compensar seus déficits. Com isso, há certo apoio do uso de mecanismos de implementação de

323
Direitos Humanos, a fim de assegurar o cumprimento do DIH e realizar um apelo aos Estados
para a implementação das suas obrigações.
A primeira evidência da convergência entre o DIDH e o DIH no Sistema Interamericano
de Proteção aos Direitos Humanos é encontrada no artigo 29 da Convenção Americana (CADH),
o qual estabelece as normas de interpretação dessa convenção:

Artigo 29. Normas de interpretação


Nenhuma disposição desta Convenção pode ser interpretada no sentido de:
a. permitir a qualquer dos Estados Partes, grupo ou pessoa, suprimir o gozo e exercício
dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do
que a nela prevista;
b. limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser
reconhecidos de acordo com as leis de qualquer dos Estados Partes ou de acordo com
outra convenção em que seja parte um dos referidos Estados;
c. excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem
da forma democrática representativa de governo; e
d. excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos
Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza.

Assim, no que diz respeito à interpretação e aplicação das disposições da Convenção


Americana, os órgãos do Sistema Interamericano devem atuar de forma a garantir sua proteção de
maneira extensiva, por meio da análise de outros tratados internacionais para uma melhor
delimitação da matéria em voga.
Nesse sentido, em diversas
oportunidades, a Corte Interamericana
ressaltou o fato de os tratados de direitos
humanos deverem ser considerados
instrumentos vivos, cuja interpretação
deve acompanhar a evolução dos tempos e
as condições de vida atuais, seguindo a
linha jurisprudencial da Corte Européia de
Direitos Humanos. Essa interpretação
evolutiva dos tratados internacionais de
direitos humanos é coincidente com as
regras gerais de interpretação consagradas
no artigo 29 da CADH, assim como com
as regras de interpretação da Convenção
de Viena sobre o Direito dos Tratados.

324
Nessa linha de raciocínio, a Corte
Interamericana reconhece que é devido ao Tribunal
Internacional, no momento de julgar um caso, não
apenas levar em conta os acordos e instrumentos
formalmente relacionados com o tratado que lhe
estipula a competência, mas, também, o sistema
dentro do qual esse tratado se insere.
Contudo, ressalta-se que é apenas permitido
julgar as violações de instrumentos que confiram à
Corte competência para tanto. Assim estabeleceu a
Corte Interamericana no caso Bámaca Velásquez Vs.
Guatemala, no sentido de que apesar de a Corte não poder declarar que um Estado é
internacionalmente responsável pela violação de tratados internacionais que não lhe atribuam
competência, é possível para tal órgão observar que certos atos ou omissões que violam os
direitos humanos de acordo com os tratados que lhe compete aplicar infringem também outros
instrumentos internacionais de proteção à pessoa humana.
Portanto, a limitação da atribuição de competência não impede que a Corte Interamericana
invoque elementos ou referências de Direito Internacional geral quando resulte procedente fazê-lo
para interpretar ou integrar as normas convencionais que lhe admitem competência, tomando em
conta as características dos fatos alegados e o texto e sentido das normas imediatamente
aplicáveis. Dessa forma, não se faz uma aplicação direta de outros instrumentos para resolver
sobre violações e direitos e deveres estabelecidos nesses, mas se recorre a eles como elementos de
interpretação, apreciação ou juízo para uma melhor inteligência e imediata aplicação dos
instrumentos que explicitamente lhe confere competência.
No que tange especificamente à aplicação do DIH pelo Sistema Interamericano,
divergências quanto à possibilidade de análise direta ou suplementar das convenções humanitárias
surgiram nos primeiros casos analisados nos seus órgãos. O posicionamento discordante entre a
Comissão e a Corte Interamericanas no momento do surgimento de casos que envolviam o DIH
não permanece mais. Contudo, as duas teorias de atribuição de competência da CADH merecem
destaque, assim como seus desdobramentos.
A posição da Comissão Interamericana é ambiciosa no que tange à aplicação do DIH, uma
vez que ela o aplica, em um primeiro momento, diretamente às violações de tal sistema de
direitos. A Comissão estipula que ignorar o conteúdo e o alcance de certas obrigações
internacionais do Estado e renunciar à tarefa de harmonizá-las com a competência dos órgãos do
sistema interamericano em um contexto integral implicaria trair o bem jurídico ético promovido
pelo artigo 29, qual seja, a melhor e progressiva aplicação da CADH.
Entre os argumentos utilizados pela Comissão para a aplicação direta do DIH nos casos
325
submetidos a sua apreciação, destacam-se:

- a incorporação das normas de tratados na legislação dos Estados;


- o princípio da aplicação da norma mais favorável de acordo com o artigo 29.b da CADH; e
- a relação entre a cláusula de suspensão de garantias e o DIH.

4.1.5 Desafios da interação do DIDH e do DIH


4.1.5.1 Alguns problemas da aplicação dos Direitos Humanos em conflitos armados
Em situações de conflito interno, o DIDH e o DIH se convergem de maneira mais precisa,
reforçando-se reciprocamente. Um dos maiores problemas que surgem nesse aspecto é o caso de
uma hipotética violação do direito à vida inserida em uma situação de conflito. A Comissão e a
Corte têm competência para analisar tal alegação.
Contudo, como o direito à vida supostamente violado está inserido em um contexto de
conflito armado, a análise da violação levando em consideração apenas o disposto na Convenção
poderia se mostrar ineficaz; uma vez que a CADH não contém disposições que definam ou
distingam civis, combatentes e outros objetivos militares, tampouco que especifiquem quando um
civil pode ser alvo de um ataque legítimo ou quando as baixas civis são uma consequência
legítima das operações militares.
Assim, de forma a cumprir com o objeto e fim da Convenção Americana, dever-se-iam
aplicar as regras pertinentes do DIH como fontes de interpretação autorizada para resolver
situações de violações de direitos humanos em conflitos armados. Esse tipo de aplicação das
normas de Direito Humanitário como lex especialis é necessário, pois em casos específicos
apenas pela aplicação das normas de Direitos Humanos não seria possível avaliar-se
adequadamente a observância dos padrões internacionais de proteção ao indivíduo.
Outra questão sobre a convergência desses direitos diz respeito à aplicação do princípio da
proporcionalidade. Sob uma perspectiva negativista acerca da aplicação das normas do DIH por
órgãos de Direitos Humanos, tem-se que os membros das forças armadas poderiam não estar
aptos a identificar previamente qual o critério de interpretação, ao qual eles estarão sujeitos: se o
tradicional do Direito Internacional dos Conflitos Armados ou o extensivo do Direito
Internacional dos Direitos Humanos.

326
Ex.: uma interpretação estrita de proporcionalidade aplicada ao ataque de um alvo militar que
cause danos a civis, típica dos DH, poderia se tornar impossível de ser aplicada em uma situação
de conflito. Tal fato poderia causar uma incongruência, no sentido de que, por exemplo, um piloto
de avião que efetuasse um bombardeio aéreo não pudesse ser punido pelo DIH porque os danos
causados aos civis que estivessem perto dos alvos militares fossem necessários e proporcionais ao
objetivo; enquanto que o Estado poderia ser condenado por uma ótica de Direitos Humanos pelos
mesmos danos causados aos civis.

Outra hipótese sobre a aplicação da proporcionalidade diz respeito ao caso de forças


estatais realizarem um ataque letal a um grupo inimigo no contexto de conflito armado não
internacional. De acordo com as normas do DIH, esta ação seria completamente possível, desde
que efetuada contra combatentes ou contra um alvo militar autorizado. Por outro lado, de acordo
com os Direitos Humanos, os agentes estatais deveriam anteriormente tentar capturar os
combatentes, por ser uma forma menos gravosa, e, portanto, mais proporcional de ganhar
vantagem militar e derrotar o inimigo, o que pode demonstrar ser insustentável em uma situação-
limite de conflito.

4.1.5.2 A interrelação entre o DIDH o DIH


A importância da utilização de fontes subsidiárias de interpretação, entre elas o DIH, é
ressaltada pelo fato de que o resultado obtido em um mesmo caso não seria satisfatoriamente
atingido pela utilização isolada dos instrumentos de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Apesar das divergências da aplicação do artigo 29 da Convenção Americana entre a Comissão e a
Corte Interamericanas, aparentemente os resultados obtidos atingem o mesmo objetivo, ou seja:
declarando ou não diretamente violações diversas daquelas da Convenção Americana, pode-se
utilizar desses outros instrumentos para analisar os direitos e garantias da CADH, o que gera a
possibilidade de um maior esclarecimento sobre os bens protegidos e acompanhamento da
tendência de desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
No que tange a aplicação do DIH pelos órgãos de Direitos Humanos, apesar de ser
extremamente favorável por solucionar o vácuo da inexistência de órgãos jurisdicionais
permanentes de DIH, é necessário realizar alguns apontamentos no sentido de garantir que sua
aplicação seja satisfatória. Em um primeiro momento, cabe aos órgãos de Direitos Humanos
realizarem cursos de aperfeiçoamento e contratação de especialistas em DIH em seu quadro de
funcionários, a fim de evitar a má aplicação desse ramo do direito.
Em um segundo momento, a inaplicabilidade das sanções por violações de DIH para os
atores não estatais parece ser um empecilho para uma análise neutra do conflito. Contudo, cabe
destacar que os atores nãoestatais são igualmente obrigados a cumprir as normas do DIH em
conflitos armados e que, mesmo não podendo efetuar sanções, os órgãos de DH podem emitir

327
declarações sobre as atividades desses grupos, o que contribui de forma indireta para o respeito
destes pelo DIH.
A aplicação do DIH por órgãos de proteção aos Direitos Humanos não está sendo realizada
apenas pelo Sistema Interamericano. Existem diversas decisões do Comitê de Direitos Humanos e
da Corte Europeia de Direitos Humanos na matéria, o que ressalta que o processo de convergência
entre esses ramos do direito internacional é contínuo e está presente não só nos sistemas regionais,
mas também no sistema universal de proteção do indivíduo.
Uma vez que o sistema tradicional de monitoramento do DIH é particularmente fraco, a
atuação de outros órgãos permite a efetivação e controle das normas e proteção das pessoas
envolvidas em uma situação de conflito, preenchendo a lacuna da tutela jurisdicional do DIH e, ao
mesmo tempo, não violando o consentimento estatal ao não aplicar diretamente as disposições de
tal ramo do Direito Internacional.
Apesar das diferenças intrínsecas desses ramos do direito, o DIDH e o DIH apresentam
uma inegável convergência das suas normas. O presente modelo baseado na complementaridade
desses sistemas é preferente àquele no qual, na existência de um conflito armado, a aplicação do
DIH precluiria a aplicação de qualquer outro ramo do direito, por razão de seu status de lex
specialis. A complementaridade existente é o meio mais eficaz de proteção legal em todas as
circunstâncias, levando-se em consideração que em qualquer momento elementos relevantes de
pelo menos um ramo ou vários ramos do direito continuará a ser aplicável.
Em resumo, podemos dizer que o conceito de Direitos Humanos refere-se à tutela dos
direitos fundamentais dos indivíduos perante o Estado (relação Estado-indivíduo), tais como o
direito à vida, à liberdade e aos direitos sociais, políticos, culturais e econômicos, que, no
conjunto, limitam a possibilidade de arbitrariedade ou a exacerbação do conceito de soberania do
Estado perante aos seus cidadãos. Já o conceito de DIH (relação entre Estados) aplica-se somente
por ocasião de um conflito armado. Contudo, o fundamento de ambos é o mesmo: o respeito à
integridade física e moral da pessoa.

328
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer mais uma pausa nos nossos estudos para testar os seus conhecimentos.
Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas
ou erradas.

1) ( ) Nenhuma disposição da Convenção Americana dos Direitos Humanos pode ser interpretada
no sentido de excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem
da forma democrática representativa de governo.

2) ( ) Atualmente o DIDH e o DIH apresentam uma convergência das suas normas, baseado em
um modelo de complementaridade desses sistemas.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) O sistema internacional de proteção dos direitos humanos pode apresentar diferentes âmbitos de
aplicação, daí poder se falar de sistemas global e regional. O instrumento de maior importância no
sistema interamericano é a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), a qual estabelece:

(A) um catálogo de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, garantindo-lhes a plena
realização.

(B) que os direitos essenciais do homem derivam do fato de ele ser nacional de um determinado
Estado e, por isso, merecem proteção apenas no âmbito interno de cada país.

(C) que os países que ainda não aboliram a pena de morte somente poderão impô-la aos delitos mais
graves, tais como os crimes políticos e em cumprimento de sentença final de tribunal competente.

(D) que ela não pode ser interpretada no sentido de limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou
liberdade que possam ser reconhecidos de acordo com as leis de qualquer dos Estados Partes.

(E) que a confissão do acusado é válida, ainda que obtida mediante coação de qualquer natureza.

329
GABARITO:

QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 D

RECADO FINAL:
Nesta aula, finalizamos o nosso estudo inicial sobre a diferenciação e as formas de interação
entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e o Direito Internacional Humanitário
(DIH).
A partir da próxima aula, iremos um pouco mais a fundo no Direito Internacional dos Conflitos
Armados (DICA), trabalharemos o conceito, as regras e os princípios norteadores deste ramo do
Direito.
Aproveite este momento para revisar estas duas primeiras aulas.
Não deixe a matéria acumular!
Dito isto...
Até a próxima aula!

330
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Vamos continuar o estudo do Direito Internacional dos Conflitos Armados.
Nas últimas aulas, diferenciamos o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e o
Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA), além de ver suas formas de interação. A partir desta
aula vamos um pouco mais a fundo no conceito do DICA, veremos sua evolução histórica,
identificaremos suas regras e princípios fundamentais.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Conceituar Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA);
- Descrever a evolução histórica do DICA;
- Citar as regras fundamentais do DICA; e
- Citar os princípios fundamentais do DICA.

INTRODUÇÃO:
Por um acaso, alguma vez você já ouviu alguém falando que "vale tudo no amor e na guerra"?
Bom, não temos a menor pretensão de tentar entender ou entrar em minúcias quanto a primeira
parte da afirmativa, mas vale tudo na guerra?
Com certeza, a guerra faz parte da natureza humana. Mas, não evoluímos nada ao longo dos
tempos? Será que a guerra ainda continua a ser aquela terra de ninguém, fadada a mais pura barbárie?
Guerreamos hoje da mesma forma que guerreávamos há 500 ou 5.000 anos atrás?
Nem seria possível né, tamanha a evolução tecnológica, que, obviamente, também chegou à
indústria bélica.
Bom, estes e outros questionamentos começarão a ser respondidos a partir de agora.

4.2 DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)


4.2.1 Conceito
O Direito Internacional Humanitário (DIH) é um conjunto de normas que, procura limitar os
efeitos de conflitos armados. Protege as pessoas que não participam ou que deixaram de participar
nas hostilidades, e restringe os meios e métodos de combate. O DIH é também designado por Direito
da Guerra e por Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA), sendo um ramo do Direito
Internacional Público constituído por todas as normas convencionais ou de origem consuetudinária
(baseadas nos costumes), destinadas especificamente a regulamentar os problemas que surgem em
períodos de conflitos armados.

331
Segundo Swinarski (1996):

O Direito Internacional Humanitário é o conjunto de normas internacionais, de origem


convencional ou consuetudinária, especificamente destinado a ser aplicado nos conflitos
armados, internacionais ou não-internacionais, e que limita, por razões humanitárias, o direito
das Partes em conflito de escolher livremente os métodos e os meios utilizados na guerra, ou
que protege as pessoas e os bens afetados, ou que possam ser afetados pelo conflito.

O DICA representa o estabelecimento de normas que limitam a condução das hostilidades, no


que se refere aos indivíduos envolvidos nos conflitos.
Em linhas gerais, o DICA tem como propósito submeter as situações de extrema violência,
inerentes aos conflitos armados, ao domínio de um conjunto de normas com fulcro humanitário.
Desta forma, é comum se indicar como funções do DICA:

- proteger quem não toma parte ou deixou de tomar parte do conflito; e


- permitir que a missão possa ser cumprida com mais eficiência e eficácia, sem destruição e baixas
desnecessárias.

Portanto, conforme aponta o Manual de DICA do Ministério da Defesa, pode-se afirmar que,
na atualidade, o DICA representa um conjunto de normas de proteção dos indivíduos e bens nos
conflitos armados, além de disciplinar o comportamento dos Estados em tais conflitos, no tocante
aos métodos e aos meios permitidos pelo Direito, na condução das hostilidades. (MD, 2011).

4.2.2 A evolução histórica do DICA


Nas suas origens, a guerra se caracterizava pela ausência de qualquer regra para além da lei
do mais forte. As populações vencidas eram massacradas e, na melhor das hipóteses, reduzidas à
332
escravatura.
Mas o progresso das ideias, a necessidade de os beligerantes preservarem o seu potencial
humano, o medo de represálias e a tomada de consciência do carácter irracional, inútil e
economicamente prejudicial das destruições e massacres totais, levaram os homens a considerar de
modo diferente os vencidos. Assim, começaram a se levantar vozes de moderação, tolerância e
humanidade.
Como exemplo podemos citar as leis de Manou (na Índia) que proíbem a utilização de flechas
envenenadas, exigem que o vencedor poupe os feridos, bem como aqueles que se rendem e que
respeite as leis das nações conquistadas.
Na China, um pensador do século IV AC, Se-Ma, condena as destruições inúteis e recomenda
que não sejam atacadas as pessoas que não possam se defender, e que os feridos sejam tratados.
Os Incas tinham uma conduta paternal relativamente aos povos vencidos, especialmente se
estes fossem estrangeiros, tentando uma reconciliação.
A Europa e a zona do Mediterrâneo se beneficiaram da influência dos ensinamentos do
Cristianismo e do Islã. Mesmo se em certas ocasiões a Igreja Católica parece esquecer os pedidos de
não recurso à violência, o que é certo é que ela permanece fiel à vontade de assegurar uma certa
humanização das guerras. Santo Agostinho escreveu: "Se o inimigo que combate deve morrer, que tal
seja por necessidade, e não por tua vontade....O vencido ou o capturado têm direito à compaixão".
No século X, em vários Concílios foram proclamados a inviolabilidade das igrejas, dos
mosteiros, dos pobres, dos mercadores, dos peregrinos, dos agricultores, bem como dos seus bens.
Estes princípios constituem as regras da Paz de Deus, cuja violação é sancionada pela excomunhão.
O Islã condena igualmente o crime, as mutilações, a tortura e protege os anciãos, mulheres,
crianças, mosteiros muçulmanos e os seus bens dos efeitos da guerra.
Enfim em 1762, Jean Jacques Rousseau escreveu no Contrato Social que a guerra não
consiste numa relação de homem para homem, mas sim de Estado para Estado, na qual os indivíduos
só acidentalmente são inimigos. Segundo este autor, o fim da guerra transforma os antigos inimigos
novamente em simples homens, o que implica o respeito pelos soldados feridos e por aqueles que
estejam em poder do inimigo.
No entanto, o acontecimento que irá levar à criação de um corpo de normas escritas relativas
à proteção das vítimas da guerra, que constituirá a contribuição efetiva para o desenvolvimento deste
ramo do direito, só terá lugar em meados do século XIX.
A partir do trabalho de Henry Dunant, intitulado “Lembranças de Solferino” (1862), ficou
estabelecido que a guerra só deveria permitir, no tocante ao ser humano, comportamentos
compatíveis com a própria dignidade, especialmente quando este não tem participação ativa nos
conflitos, ou seja, não é considerado combatente.

333
Cabe salientar que ao longo da história da humanidade foram celebrados vários tratados de
paz, acordos internacionais de capitulação, rendições e tratados de armistício. Porém, quando se
tentou disciplinar a proteção das vítimas dos conflitos armados, surgiu a primeira codificação
internacional que estabeleceu normas para a proteção dos feridos e doentes nos campos de batalha,
ou seja, a Convenção de Genebra, realizada em 1864.
Então, O Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA) surgiu em 1864, ano de
celebração da primeira Convenção de Genebra (Suíça). Entretanto, desde a antiguidade, já havia
regras sobre os métodos e meios para a condução das hostilidades, inclusive, algumas relativas à
proteção de determinadas categorias de vítimas dos conflitos armados, por meio de práticas nascidas
em combates e legitimadas pelo uso e costumes, as quais foram convertidas em normas
consuetudinárias relativas à condução da guerra.
Cronologicamente, temos o seguinte:

1859 - Henry Dunant, cidadão suiço de 31 anos, chega a Solferino no


dia 24 de Junho (uma cidade do Norte de Itália) com vista a conseguir
obter ajuda de Napoleão III para uns investimentos que efetuara na
Argélia. Nesse preciso dia desenrolava-se uma batalha entre os exércitos
Austríaco e Francês. Dunant fica horrorizado com a falta de serviços
médicos adequados que assegurassem o tratamento das vítimas e
improvisa, ele mesmo, um apoio aos feridos da batalha.

334
1862 - De volta a Genebra, Henry Dunant passa a escrito as recordações da experiência que viveu,
editando um livro com o título "Uma Recordação de Solferino", que se tornou um sucesso imediato.
Nesta obra, Dunant faz duas sugestões: por um lado propõe a criação de sociedades de ajuda a todos os
feridos sem distinção quanto à nacionalidade e, por outro lado, a adoção de uma Convenção que
assegurasse a proteção dos soldados feridos e do pessoal médico no campo de batalha.

1863 - O Comitê Internacional de Socorro aos Militares Feridos em Tempo de Guerra é criado, sendo os
membros fundadores, para além do próprio Dunant, Gustave Moynier, Guillaume-Henri Dufour, Louis
Appia, Theodore Maunoir. Em agosto deste mesmo ano o Comitê decide organizar uma Conferência
Internacional em Genebra com a participação de representantes governamentais. A conferência revela-se
um sucesso, tendo 62 delegados representando 16 Estados, adotando-se as resoluções que estão na base
do Movimento da Cruz Vermelha.

1864 - Primeira Convenção de Genebra. Esta Convenção é ratificada, entre 1864 e 1907 por 57 Estados -
um recorde na época.

1868 - Declaração de São Petersburgo - o primeiro instrumento internacional que regula os métodos e
meios de combate. A Declaração, considerada como enunciando o direito consuetudinário existente,
proíbe o ataque a não combatentes, a utilização de armas que agravem inutilmente o sofrimento dos
feridos ou que tornem a sua morte inevitável e o emprego de projéteis com menos de 400g contendo uma
carga explosiva ou substâncias incendiárias.

1899 - Convenções e Declarações de Haia. Entre aquelas que não serão revistas em 1907 podemos citar a
Declaração que proíbe por um lado a utilização de gás asfixiante e por outro a utilização de balas "dum-
dum".

1906 - Convenção de Genebra sobre os feridos e doentes nos exércitos.

1907 - 13 Convenções de Haia relativas, entre outros, às leis e costumes da guerra, aos direitos e deveres
das potências neutras em caso de guerra terrestre, ao regime dos navios de comércio no início das
hostilidades, à transformação dos navios de comércio em navios de guerra, à colocação de minas
submarinas automáticas de contato, ao bombardeamento por forças navais em tempo de guerra, à
adaptação dos princípios da Convenção de Genebra à guerra marítima e à proibição de lançar projéteis e
explosivos a partir de balões.

1923 - Regras de Haia sobre a guerra aérea (que nunca se tornaram) numa Convenção.

335
1925 - Protocolo de Genebra de 17 de Junho relativo à proibição de utilizar gazes asfixiantes, tóxicos ou
similares na guerra.

1929 - Duas Convenções de Genebra: (I) sobre os feridos e doentes em campanha e (II) sobre os
prisioneiros de guerra.

1949 - Quatro Convenções de Genebra:

- Convenção para melhorar a situação dos feridos e doentes das Forças Armadas em campanha
(Convenção I);
- Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos, doentes e náufragos das Forças
Armadas no mar (Convenção II);
- Convenção de Genebra relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra (Convenção III); e
- Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra (Convenção IV).

1954 - Convenção e Protocolo de Haia para a proteção de bens culturais em caso de conflito armado.

1977 - Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949:

- Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 relativo à proteção das vítimas
dos conflitos armados internacionais (Protocolo I); e
- Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 relativo à proteção das vítimas
dos conflitos armados não internacionais (Protocolo II).

1981 - Convenção das Nações Unidas sobre a proibição ou a limitação da utilização de certas armas
clássicas que podem ser consideradas como produzindo efeitos traumáticos excessivos ou como atingindo
sem discriminação. Esta Convenção era composta de 3 Protocolos anexos.

Em 1996 reuniu-se a Conferência para Exame da Convenção que aprovou alterações ao


Protocolo II relativo a minas, armadilhas e outros dispositivos e um Protocolo IV relativo às armas
que provocam a cegueira.
Nesse contexto, o DICA representa o estabelecimento de normas que têm por finalidade
limitar a condução das hostilidades, no que se refere aos indivíduos envolvidos nos conflitos.

4.2.3 Regras fundamentais do DICA


As regras no DICA podem ser fundamentalmente de três tipos.
O primeiro tipo é constituído pelo chamado Direito de Genebra, isto é, pelas quatro

336
Convenções de Genebra de 1949 para a proteção das vítimas de guerra e dos seus dois Protocolos
Adicionais de 1977. Estes seis instrumentos jurídicos perfazem cerca de 600 artigos codificando as
normas de proteção da pessoa humana em caso de conflito armado. Estes textos de Genebra foram
elaborados com o único objetivo de proteção das vítimas de guerra: tanto os militares fora de
combate, bem como as pessoas que não participem nas operações militares.
O segundo tipo de regras é chamado o Direito de Haia, constituído pelo direito da guerra
propriamente dito, ou seja, pelos princípios que regem a conduta das operações militares, direitos e
deveres dos militares participantes na conduta das operações militares, e limita os meios de ferir o
inimigo. Estas regras têm em vista a necessidade de ter em conta necessidades militares das partes
em conflito, nunca esquecendo, porém, os princípios de humanidade. O Direito de Haia encontra a
maior parte das suas regras nas Convenções de Haia de 1899 (revistas em 1907), mas igualmente em
algumas regras do Protocolo I Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949.
O terceiro tipo de regras (ditas de Nova Iorque) prende-se com a proteção dos direitos
humanos em período de conflito armado. São chamadas regras de Nova Iorque por terem na sua base
a atividade desenvolvida pelas Nações Unidas no âmbito do Direito Humanitário. Com efeito, é
importante referir que em 1968 a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Resolução 2.444
(XXIII) com o título "Respeito dos Direitos Humanos em período de conflito armado", o que
constitui um marco, verdadeiro sinal da mudança de atitude desta organização no que diz respeito ao
Direito Humanitário.
Se, desde 1945 a ONU não se ocupou deste ramo do direito com a justificação de que tal
indiciaria uma falta de confiança na própria organização enquanto garante da paz, o ano de 1968
pode ser considerado como o do nascimento deste novo foco de interesse. As Nações Unidas têm
desde então vindo ainda a mostrar um grande interesse em tratar questões como as relativas às
guerras de libertação nacional, e à interdição ou limitação da utilização de certas armas clássicas.
Estas regras fundamentais do DICA podem ser resumidas nas seguintes:

1 - As pessoas postas fora de combate e aquelas que não participam diretamente nas hostilidades têm
o direito ao respeito das suas vidas e da sua integridade física e moral. Estas pessoa devem ser, em
todas as circunstâncias, protegidas e tratadas com humanidade, sem qualquer distinção de carácter
desfavorável.

2 - É proibido matar ou ferir um adversário que se renda ou que se encontre fora de combate.

3 - Os feridos e doentes devem ser recolhidos e tratados pela parte no conflito que os tem em seu
poder. A proteção cobre igualmente o pessoal sanitário, os estabelecimentos, os meios de transporte
e material sanitário. O emblema da cruz vermelha ou do crescente vermelho constitui o sinal dessa
proteção, devendo por isso ser respeitado.

337
4 - Os combatentes capturados e os civis que se encontrem sob a autoridade da parte adversa têm
direito ao respeito da sua vida, da sua dignidade, dos seus direitos pessoais e das suas convicções.
Devem ser protegidos de todo o ato de violência e de represálias. Terão o direito a trocar notícias
com as suas famílias e a receber socorros.

5 - Todas as pessoas beneficiarão das garantias judiciárias fundamentais. Ninguém será tido como
responsável de um ato que não cometeu. Ninguém será submetido à tortura física ou mental, nem a
penas corporais ou a tratamentos cruéis e degradantes.

6 - As partes num conflito e os membros das suas forças armadas não possuem um direito ilimitado
na escolha dos métodos e meios de guerra susceptíveis de causar perdas inúteis ou sofrimentos
excessivos.

7 - As partes num conflito devem fazer sempre a distinção entre a população civil e os combatentes,
de forma a poupar a população e os bens civis. Nem a população civil, enquanto tal, nem as pessoas
civis devem ser objeto de ataques. Os ataques devem ser exclusivamente dirigidos contra objetivos
militares.

4.2.4 Princípios fundamentais do DICA


Conforme já mencionado, a finalidade do DICA consiste em limitar, na medida do possível,
as calamidades da guerra, por meio da conciliação das necessidades militares, determinadas pela
situação tática e o cumprimento da missão, de acordo com as exigências impostas pelos princípios de
caráter humanitário, conforme exposto a seguir.

- Distinção: distinguir os combatentes e não combatentes. Os não combatentes são protegidos contra
os ataques. Também, distinguir bens de caráter civil e objetivos militares. Os bens de caráter civil
não devem ser objetos de ataques ou represálias.
Tal princípio rege, portanto, a escolha de objetivos durante a ação militar e sua estrita
observância tem como decorrência evitar a condução de ataques indiscriminados que são proibidos,
entendidos como tais aqueles que não se dirijam contra um objetivo militar determinado, ou que,
devido aos métodos e meios empregados, podem atingir indistintamente objetivos militares e bens de
caráter civil, ou civis.
Em decorrência deste princípio, não é mais aceitável a condução de bombardeiros aéreos de
altitude, nem o emprego de armas incendiárias, sobre áreas que mesclem objetivos militares, bens de
caráter civil e população civil.
Exclui-se dos ataques tidos como indiscriminados aqueles que venham a causar

338
acidentalmente perdas de vidas humanas ou ferimentos na população civil e/ou danos nos bens de
caráter civil, que não sejam excessivos em relação à vantagem militar concreta e direta esperada.
Tais perdas constituem uma ocorrência normal, na condução de ataques sobre objetivos militares,
em área de concentração urbana.
Na guerra marítima, que tem na identificação do alvo um dos seus maiores problemas, a
aplicação deste princípio tende a ser mais difícil.

- Limitação: o direito das partes beligerantes na escolha dos meios para causar danos ao inimigo não
é ilimitado, sendo imperiosa a exclusão de meios e métodos que levem ao sofrimento desnecessário
ou danos extensos e a danos supérfluos.

- Proporcionalidade: a utilização dos meios e métodos de guerra deve ser proporcional à vantagem
militar concreta e direta. Nenhum alvo, mesmo que militar, deve ser atacado se os prejuízos e
sofrimento forem maiores que os ganhos militares que se espera da ação.

- Necessidade militar: em todo conflito armado, o uso da força deve corresponder à vantagem
militar que se pretende obter. As necessidades militares não justificam condutas desumanas,
tampouco atividades que sejam proibidas pelo DICA.
Portanto, levando-se em conta as necessidades inerentes para se obter a rendição do inimigo,
um Comandante, baseado neste princípio, poderá flexibilizar, em casos excepcionais, as normas
estabelecidas no DICA, a fim de poder cumprir a sua missão, desde que as atitudes tomadas não
sejam de caráter desumano.
Assim, caso necessidades militares imperiosas o exigirem, o princípio autoriza o emprego de
medidas excepcionais, não consubstanciando, contudo, uma escusa a um comportamento cruel ou a
prática de alguma atividade proibida.

- Humanidade: o princípio da humanidade proíbe que se provoque sofrimento às pessoas e


destruição de propriedades, se tais atos não forem necessários para obrigar o inimigo a se render. Por
isso, são proibidos ataques exclusivamente contra civis, o que não impede que, ocasionalmente,
algumas vítimas civis sofram danos; mas todas as precauções devem ser tomadas para mitigá-los.
(MD, 2011).

339
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma pausa para revisar os conteúdos aprendidos na aula de hoje. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O DICA representa o estabelecimento de normas que limitam a condução das hostilidades.

2) ( ) O DICA surgiu em 1862, a partir da obra de Henry Dunant, intitulada “Lembranças de


Solferino”.

3) ( ) Em um conflito armado, é proibido matar ou ferir um adversário que se renda ou que se


encontre fora de combate.

4) ( ) O princípio da humanidade impede que haja ataques com vítimas civis.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Em relação ao DICA, podemos afirmar que:

(A) se restringe à proteção das populações civis na hipótese de conflitos armados, excluindo-se os
militares postos fora de combate.

(B) consiste em limitar, na medida do possível, as calamidades da guerra, por meio da conciliação
das necessidades militares, determinadas pela situação tática e o cumprimento da missão.

(C) as partes num conflito e os membros das suas Forças Armadas possuem um direito ilimitado na
escolha dos métodos e meios de guerra, de acordo com a necessidade militar existente.

(D) é possível se utilizar de medidas excepcionais, como tortura mental e penas corporais, desde que a
vantagem militar concreta almejada seja superior aos prejuízos acarretados.

(E) é permitido bombardeiros aéreos de altitude, bem como o emprego de armas incendiárias, sobre
áreas que contenham objetivos militares, independentemente de haver ou não bens e população civis.

340
GABARITO:

QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 E
5 B

RECADO FINAL:
Agora sim, nós começamos para valer.
Nesta aula, efetivamente iniciamos o aprofundamento propriamente dos conceitos do Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA).
Tratamos um pouquinho sobre a história deste ramo do direito e, principalmente, trouxemos suas
regras e princípios fundamentais.
Nem preciso falar que estes conhecimentos serão de suma importância para o bom desenrolar do
restante do nosso curso. Então, estude bastante estes tópicos!
Dito isto...
Até a próxima aula!

341
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Vamos prosseguir os nossos estudos do Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA).
Na última aula, começamos efetivamente a ver os conceitos, regras e princípios do DICA.
Nesta aula, veremos o arcabouço jurídico que permite a existência do DICA, enquanto ramo
autônomo do Direito Internacional Público (DIP), abordando as principais Convenções Internacionais que
o fundamentam.
Vamos que vamos!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar os principais tratados de DICA;
- Descrever o Direito de Genebra;
- Enunciar o artigo 3º comum às Convenções de Genebra;
- Descrever os Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra;
- Descrever o Direito de Haia; e
- Descrever o Direito de Nova York ou Direito Misto.

INTRODUÇÃO:
Das fontes emanam as normas jurídicas que dispõem sobre os direitos e deveres dos sujeitos.
No Direito Internacional, podemos elencar como sendo fontes: as convenções internacionais, o
costume internacional, os princípios gerais de direito e, como meio auxiliar, sendo consideradas fontes
secundárias ou acessórias, as decisões judiciais e a doutrina dos mais qualificados publicistas
internacionais. Além das fontes contidas no rol estatutário, as decisões das organizações internacionais e
os atos unilaterais dos Estados também são admitidas como fontes do Direito Internacional.
Nesta aula, veremos os principais tratados de DICA.
Partiu!?

4.3 PRINCIPAIS TRATADOS DE DICA


Ao longo da história, podemos observar
que vários tratados e convenções foram criados,
a fim de assegurar o respeito aos seres humanos
diretamente envolvidos ou não nos conflitos
armados. A seguir, faremos uma descrição
cronológica desses tratados, detendo-nos apenas
aos principais.

342
1864 Convenção de Genebra (melhoria das condições dos feridos na guerra terrestre)
1899 e 1907 Convenções de Haia
1925 Protocolo de Genebra (gases e armas químicas)
1936 Protocolo de Londres (Regras para a Guerra Submarina)
1949 Convenções I, II, III e IV de Genebra
1954 Convenção de Haia (proteção aos bens culturais)
1971 Convenção das Nações Unidas sobre armas químicas e bacteriológicas
1976 Convenção das Nações Unidas sobre modificação do meio ambiente (ENMOD)
1977 Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 1949
Convenção das Nações Unidas sobre certas armas convencionais e seus Protocolos I a III
1980
(fragmentos, minas, armadilhase armas incendiárias)
1989 Convenção das Nações Unidas sobre emprego dos mercenários
1994 Convenção das Nações Unidas sobre a segurança do pessoal da ONU e pessoas associadas
1995 Protocolo IV à Convenção das Nações Unidas de 1980 (armas ofuscantes à laser)
1997 Tratado de Ottawa (minas terrestres antipessoal)
2005 Protocolo III Adicional às Convenções de Genebra de 1949

Conforme apontado pelo CICV (ROVER, 2005), o Direito Internacional dos Conflitos
Armados é dividido em duas categorias: o Direito de Genebra e o Direito de Haia. Veremos a partir
de agora as suas principais características.

4.3.1 Direito de Genebra


O Direito de Genebra trata da proteção das vítimas de guerra, podendo ser estas militares ou
civis, estando em terra ou no mar, desde que não estejam participando das hostilidades ou se
encontrem em situações específicas, em que não possam mais participar das hostilidades, tais como:
feridos, doentes, náufragos e prisioneiros de guerra.
O objetivo do Direito de Genebra é salvaguardar as vítimas de situações de conflitos
armados:

- membros das Forças Armadas fora de combate;


- feridos;
- doentes;
- náufragos;
- prisioneiros de guerra;
- população civil; e
- todas as pessoas que não participem ou tenham deixado de participar das hostilidades.
343
As quatro convenções de Genebra, datadas de 12 de agosto de 1949, formam o conjunto de
normas que estabelecem os procedimentos para essa proteção. Estas normas são reconhecidas
universalmente e contam, atualmente, com 188 Estados Partes.
Após o estabelecimento das convenções, houve a necessidade de complementação das
normas, o que foi materializado por meio da adoção de dois Protocolos Adicionais, datados de 10 de
junho de 1977. O primeiro protocolo se refere aos conflitos armados internacionais enquanto o
segundo aos conflitos armados não internacionais. Até a data de 31 de março de 1997, tais
protocolos haviam sido ratificados por 147 e 139 Estados, respectivamente.
Conheceremos agora as principais características das quatro convenções.
A I Convenção de Genebra protege os soldados feridos e enfermos durante a guerra
terrestre.
Essa convenção constitui-se de 64 artigos que estabelecem a proteção para os enfermos e
feridos, bem como para o pessoal sanitário e religioso e os transportes e unidades sanitárias.
Além disso, a Convenção reconhece também os símbolos e distintivos que identificam as
pessoas e os bens protegidos, que veremos mais adiante. Ela contém dois anexos com uma minuta de
acordo relativa às zonas sanitárias e um modelo de cartão de identidade específico para o pessoal
sanitário e religioso.
A II Convenção de Genebra protege os militares feridos, enfermos e náufragos durante a
guerra marítima.
Essa convenção substituiu a convenção de Haia de 1907 com as devidas adaptações à guerra
naval. Ela possui 63 artigos aplicáveis de modo específico à guerra naval incluindo, por exemplo, a
proteção aos navios hospitais. Contém, também, um anexo com um modelo de cartão de identidade
para o pessoal sanitário e religioso.
A III Convenção de Genebra aplica-se especificamente aos prisioneiros de guerra.
Essa convenção substituiu a convenção relativa aos prisioneiros de guerra de 1929. Ela
contém 143 artigos. Foram ampliadas as categorias de pessoas com direito ao estatuto de prisioneiro
de guerra, de acordo com as Convenções I e II.
Ainda foram definidas as condições e os locais de cativeiro com maior precisão,
especialmente com relação ao trabalho dos prisioneiros de guerra, seus recursos financeiros, a ajuda
que recebem e os processos judiciais contra eles.
Essa Convenção determina o princípio de que os prisioneiros de guerra devam ser soltos e
repatriados sem demora após cessarem as hostilidades ativas. Ela possui cinco anexos com diversos
modelos de regulamentos e de cartões de identidade, entre outros.
A IV Convenção de Genebra estabelece a proteção aos civis, inclusive em território
ocupado.
Essa convenção possui 159 artigos e contém uma breve seção sobre a proteção geral das
populações contra certas consequências da guerra. A maior parte da convenção trata do estatuto e

344
tratamento das pessoas protegidas, fazendo a distinção entre a situação dos estrangeiros no território
de uma das Partes em conflito e dos civis em território ocupado.
Ela ainda estabelece as obrigações da potência ocupante em relação à população civil e
contém disposições pormenorizadas sobre o socorro humanitário às populações em território
ocupado. Além disso, apresenta um regime especial para o tratamento dos civis internados.
Essa Convenção possui três anexos com modelos de acordo para zonas sanitárias e de
segurança, de regulamentos sobre o socorro humanitário e cartões de identidade.

4.3.2 Artigo 3º Comum


Há um artigo comum às quatro Convenções de Genebra, que merece destaque especial, pois,
pela primeira vez abrange as situações de conflitos armados não internacionais. Esses tipos de
conflitos variam muito e compreendem as guerras civis tradicionais, conflitos armados internos que
se propagaram a outros Estados ou conflitos internos nos quais intervêm terceiros Estados ou uma
força multinacional junto aos governos.
Cabe salientar que o artigo 3º comum estabelece normas fundamentais que são irrevogáveis.
Para esclarecer com maior precisão, podemos dizer que o artigo 3º comum é como se fosse
uma espécie de “miniconvenção” dentro das quatro Convenções de Genebra, com as suas normas
essenciais condensadas, aplicáveis aos conflitos de natureza não internacional.
Vejamos a seguir as suas principais disposições:

Artigo 3º
No caso de conflito armado sem caráter internacional e que surja no território de uma das
Altas Partes Contratantes, cada uma das Partes em luta será obrigada a aplicar pelo menos, as
seguintes disposições:
1) As pessoas que não participem diretamente das hostilidades, inclusive os membros de
fôrças armadas que tiverem deposto as armas e as pessoas que tiverem ficado fora de combate
por enfermidade, ferimento, detenção, ou por qualquer outra causa, serão, em qualquer
circunstância, tratadas com humanidade sem distinção alguma de caráter desfavorável
baseada em raça, côr, religião ou crença, sexo, nascimento, ou fortuna, ou qualquer outro
critério análogo.
Para esse fim estão e ficam proibidos, em qualquer momento e lugar, com respeito às pessoas
mencionadas acima:
a) os atentados à vida e à integridade corporal, notadamente o homicídio sob qualquer de suas
formas, as mutilações, os tratamentos cruéis, as torturas e suplícios;
b) a detenção de reféns;
c) os atentados à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e
degradantes;
d) as condenações pronunciadas e as execuções efetuadas e sem julgamento prévio proferido
por tribunal regularmente constituído, que conceda garantias judiciárias reconhecidas como
indispensáveis pelos povos civilizados.

345
2) Os feridos e enfermos serão recolhidos e tratados.
Um organismos humanitário imparcial, tal como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha,
poderá oferecer os seus serviços às Partes em luta.
As partes em luta esforçar-se-ão, por outro lado, para pôr em vigor, por meio de acordos
especiais, o todo ou partes das demais disposições da presente Convenção.
A aplicação das disposições precedentes não terá efeito sôbre o estatuto jurídico das Partes em
luta.

Considerando que a maioria dos conflitos armados atuais é de caráter não internacional, a
aplicação do artigo 3º comum é da maior importância, sendo necessária sua completa aplicação.

4.3.3 Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra


Em 1977, foram assinados dois protocolos adicionais às Convenções de Genebra. Tais protocolos
foram destinados a suplementar as Convenções pela proteção de civis em tempo de guerra e a estender os
critérios da aplicação do DICA para abranger novos tipos de conflitos. No Brasi, esses Protocolos (I e II)
foram promulgados pelo Decreto nº 849, de 25 de junho de 1993.
O 1º Protocolo, aplicável a conflitos armados internacionais (incluindo guerras de libertação
nacional), assegura a proteção de civis contra os efeitos das hostilidades, particularmente, bombardeios.
As Convenções se limitavam apenas à proteção contra o abuso de autoridade.
Como consequência, diversas normas relativas ao comportamento de combatentes e à conduta de
hostilidades foram retiradas das Convenções de Haia, conforme veremos posteriormente.
É importante destacar que as necessidades da população civil devem ser supridas pelas Partes em
conflito. Na impossibilidade de fazê-lo, devem permitir a entrada, sem obstáculos, de todo o auxilio
necessário para a sobrevivência da população. Tal regra se aplica a todas as circunstâncias, mesmo para o
benefício de uma população inimiga ou da população de um território ocupado.
Além disso, de acordo com o 1º Protocolo, o pessoal médico civil, transporte e hospitais gozam da
mesma proteção já concedida pelas Convenções ao pessoal médico militar e suas instalações.
Outra mudança importante é o fato de o status de prisioneiro de guerra ser concedido a categorias
de combatentes que não haviam sido incluídas anteriormente, tais como combatentes irregulares, desde
que esses obedeçam a certas normas, como, por exemplo, o respeito pelas leis e costumes de guerra,
carreguem suas armas abertamente, etc.
O 2º Protocolo suplementa o artigo 3º, comum a todas as Convenções, com normas mais
detalhadas e aplicáveis em situações que não são abrangidas pelo 1º Protocolo, ou seja, conflitos
armados não internacionais de certa magnitude.
De grande relevância são as garantias fundamentais da proteção a todas as pessoas que não estão
participando, ou tenham deixado de participar nas hostilidades, incluindo o princípio geral da
obrigatoriedade de proteção à população civil e às normas relativas aos feridos, doentes, náufragos e às
instalações e ao pessoal médico.

346
Essas disposições, simplificadas e adaptadas ao contexto específico dos conflitos armados não
internacionais, baseiam-se naquelas contidas no 1º Protocolo.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), por ocasião da Conferência Diplomática de
1974, não incluiu em suas propostas a proibição ou a limitação de armas específicas, pois percebeu que
tal assunto era demasiadamente delicado em decorrência de suas implicações políticas e militares.
Entretanto, alguns governos solicitaram aos participantes da reunião que considerassem as proibições e as
restrições. Sendo assim, o Comitê organizou uma conferência com Especialistas de Governo, realizada
em 1974 em Lucerna e em 1976 em Lugano. Apesar de a Conferência Diplomática de 1974 não ter
chegado à conclusão alguma, recomendou que fosse convocada outra para tratar do assunto.
Em 1979 e 1980, foi adotada a Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Emprego de Certas
Armas Convencionais que Possam ser Consideradas como Excessivamente Nocivas ou Ter Efeitos
Indiscriminados. Apesar de seu âmbito ser reconsiderado restrito, a Convenção foi um sucesso. Ela
estabeleceu o embasamento jurídico para futuras limitações e proibições ao emprego de armas
desenvolvidas no futuro, que causem ferimentos supérfluos ou sofrimento desnecessário, sendo
considerada o alicerce para protocolos adicionais tratando de outras armas específicas.
Os dispositivos básicos estão contidos em quatro Protocolos anexos, dos quais pelo menos dois
devem ser ratificados por um Estado, antes que esse possa se tornar parte da Convenção.
O 1º Protocolo proíbe o emprego de qualquer arma cujo efeito primário seja ferir com fragmentos
que não possam ser detectados no corpo humano com raios X. Tal proibição está diretamente relacionada
à invenção indigna de bombas de fragmentação, feitas de pedaços de plástico ou vidro.
O 2º Protocolo proíbe o emprego de minas, armadilhas e outros artifícios contra a população civil
ou seu emprego de uma forma indiscriminada que cause ferimentos acidentais a civis, que seja excessivo
em relação à vantagem militar concreta e direta almejada. Este protocolo se refere, especificamente, a
minas colocadas fora de zonas militares. Proíbe, também, a colocação de armadilhas em objetos
aparentemente inofensivos, incluídos nessa lista os brinquedos infantis.
O 3º Protocolo restringe o emprego de armas incendiárias. De acordo com a legislação brasileira,
Decreto nº 2.739, de 20 de agosto de 1998, a proibição de seu emprego contra civis em todas as
circunstâncias foi confirmada e estendida para incluir até mesmo objetivos militares localizados dentro de
concentrações de civis e em florestas e outros tipos de coberturas vegetais, exceto quando tais elementos
naturais estiverem sendo usados para esconder combatentes ou alvos militares.
O 4º Protocolo sobre Armas de Laser “Cegantes”, adotado em 13 de outubro de 1995, na
Conferência de Revisão, proíbe o emprego e transferência (tanto para Estados quanto para entidades não
Estatais) “(...) de armas de laser especificamente projetadas, como única ou uma de suas funções de
combate, para causar cegueira permanente à vista não ampliada isto é, a olho nu ou a olhos providos de
dispositivos corretores da vista”.

347
4.3.4 Direito de Haia
Relembrando, o DICA é dividido em duas categorias: o Direito de Genebra e o Direito de Haia.
Para reforçarmos a distinção entre essas duas categorias, devemos observar, uma vez mais, suas
principais características.
O Direito de Genebra trata da proteção das vítimas de guerra, sejam elas militares ou civis, no
mar ou em terra. Protege todas as pessoas fora de combate, isto é, que não participam ou não estão mais
participando das hostilidades: os feridos, os doentes, os náufragos e os prisioneiros de guerra.
Já o Direito de Haia regulamenta os métodos e os meios de combate, concentrando-se na
condução das operações militares. Portanto, o Direito de Haia é de interesse fundamental ao comandante
militar em terra, mar e ar.
Apesar de aparentemente estático, o Direito de Genebra evoluiu ao longo dos tempos, porém,
permaneceu inalterado desde 1907. Assim sendo, as normas estabelecidas pelas Convenções de Haia
foram incluídas no esboço dos Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 1949, para evitar que
se tornassem obsoletas.
No entanto, há um terceiro tipo de direito, o chamado Direito Misto, que contém disposições que
tratam tanto da proteção das vítimas de guerra quanto de conceitos operacionais. Tal fusão dos dois tipos
de direito é reconhecida principalmente nos dois Protocolos Adicionais, adotados em 1977.
As Convenções de Haia foram estabelecidas por duas Conferências Internacionais de Paz,
ocorridas em Haia, em 1899 e 1907. A primeira Conferência adotou seis convenções e declarações e a
segunda, adotou 14, estando todas encaixadas em três categorias (ROVER, 2005):

- A primeira categoria inclui as convenções que objetivam evitar a guerra, tanto quanto possível, ou pelo
menos estabelecendo condições rigorosas a serem cumpridas antes do início das hostilidades;
- A segunda categoria inclui convenções específicas das vítimas de guerra; e
- A terceira categoria compreende as convenções estabelecendo algumas normas elementares à conduta
de guerra.

4.3.5 Direito de Nova York ou Direito Misto


Entende-se por “Direito de Nova York” o conjunto de normas originadas no âmbito da
Organização das Nações Unidas (ONU). Em 1968, por ocasião do Ano Internacional dos Direitos do
Homem, a ONU convocou a Conferência Internacional dos Direitos do Homem, que marcaria o vigésimo
aniversário da Declaração dos Direitos do Homem de 1948. No final da reunião, realizada no Irã, adotou-
se a resolução XXIII que, entre outras solicitações, pedia que todos os signatários auxiliassem para que,
em todos os conflitos armados, tanto a população civil como os soldados fossem protegidos pelos
princípios do DICA.
As inovações tecnológicas e a complexidade dos conflitos armados contemporâneos, associadas às
exigências da comunidade internacional de limitar o desenvolvimento dos meios de destruição, têm

348
contribuído para aproximar as duas vertentes do DICA – o Direito de Haia e o Direito de Genebra. O
primeiro, no que se refere à proibição e limitação do uso de determinados métodos e meios de combate
nas hostilidades e o segundo, como sistema para salvaguardar e proteger as vítimas de situações de
conflitos armados.
A vinculação do DICA às novas propostas de instrumentos, que têm caráter de
complementaridade na limitação dos meios e proteção da pessoa humana, e a contribuição da ONU aos
últimos instrumentos de limitação de uso das armas, justificam uma nova corrente denominada Direito de
Nova York ou Direito Misto, por contemplar aspectos das vertentes clássicas de Haia e de Genebra.
Para exemplificar, pode-se comparar os instrumentos relativos aos gases asfixiantes, como o
Protocolo de Genebra de 1925, sobre a proibição do uso na guerra de gases asfixiantes, tóxicos ou
similares e de meios bacteriológicos, e a Convenção de 1972 sobre a proibição do desenvolvimento,
produção e estocagem de armas bacteriológicas (biológicas) e tóxicas e sobre a sua destruição. No
primeiro instrumento, contempla-se o uso, mas não se proíbe o manejo, enquanto o segundo proíbe
formalmente a existência. No que se refere às armas, verifica-se a tendência em limitar, controlar e
determinar a produção, a estocagem, o deslocamento e destruição das armas.
O Direito de Nova York caracteriza-se por instrumentos que abarcam aspectos de Haia e Genebra
em forma de complementaridade e especificação desses aspectos, constituindo-se em um sistema com
legislação completa aplicável às situações de conflito armado.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos uma pausa para revisar os conteúdos aprendidos na aula de hoje. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Direito de Genebra trata da proteção das vítimas de guerra, desde que não estejam
participando das hostilidades ou não possam mais participar das hostilidades.

2) ( ) O artigo 3º comum às quatro Convenções de Genebra se aplica exclusivamente a situações de


conflitos armados internacionais.

3) ( ) O Direito de Haia regulamenta os métodos e os meios de combate, concentrando-se na


condução das operações militares.

4) ( ) O Direito de Nova York é o conjunto de normas originadas no âmbito da ONU, com instrumentos
que abarcam aspectos de Haia e Genebra.

349
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) O Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA):

(A) possui o artigo 3º comum às quatro Convenções de Genebra, abrangendo todas as situações de
conflitos armados internacionais.

(B) proíbe o emprego de qualquer arma cujo efeito primário seja ferir com fragmentos que não possam
ser detectados no corpo humano com raios X.

(C) é aplicável em casos de tensões e perturbações internas, tais como motins, atos de violência isolados e
esporádicos e outros atos análogos.

(D) proíbe, em conflitos armados não internacionais, execuções sumárias de pessoas que não participarem
diretamente das hostilidades, não se aplicando, assim, aos combatentes, ainda que tenham deposto as
armas ou sido postos fora de combate.

(E) e o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) são ramos complementares do Direito
Internacional, possuindo incidência em circunstâncias opostas, sendo o primeiro a normativa aplicável
durante conflitos armados e o segundo o conjunto de normas aplicável em tempos de paz.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 C
5 B

RECADO FINAL:
Até agora, você já identificou a diferença entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos
(relação Estado-indivíduo) e o Direito Internacional dos Conflitos Armados (relação entre Estados).
Além disso, conheceu os cinco princípios que tem por finalidade limitar, na medida do possível, as
calamidades da guerra: distinção, limitação, proporcionalidade, necessidade militar e humanidade.
Por fim, nesta aula você identificou os principais tratados do DICA, destacando-se as Convenções
de Genebra e seus protocolos adicionais.
Na próxima aula continuaremos avançando ainda mais nos meandros do DICA.
Dito isto...
Até a próxima aula!
350
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Nas últimas aulas, vimos os conceitos, regras e princípios do DICA e falamos das principais
convenções que fundamentam esta matéria.
A partir da aula de hoje, trataremos da proteção dada pelo DICA às pessoas e a alguns bens.
Vamos à batalha!

Objetivos da Aprendizagem:
- Identificar as categorias de pessoas e objetos;
- Descrever a conduta com prisioneiro de guerra, feridos, enfermos e náufragos; e
- Descrever a conduta com Pessoal de Saúde e Capelães.

INTRODUÇÃO:
O Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA) protege uma ampla variedade de
pessoas e objetos durante os conflitos armados.
O DICA é um conjunto de normas que procura limitar os efeitos de conflitos armados. Uma
parte considerável do DICA se encontra nas quatro Convenções de Genebra de 1949 e nos
Protocolos Adicionais de 1977, as quais protegem doentes, feridos e náufragos que não participam
das hostilidades, prisioneiros de guerra e outros detidos, assim como civis que não estejam
participando de forma direta dos conflitos (equipe médica e religiosa, profissionais humanitários e
membros de equipes de defesa civil) e também objetos civis.
A proteção das pessoas e dos bens é a essência dos princípios básicos já estudados.
Nesta aula, começaremos a estudar um pouco melhor quem são estas pessoas.

4.4 PROTEÇÃO DO DICA


4.4.1 Civis
O I Protocolo às Convenções de Genebra (1949), relativo à Proteção das Vítimas dos
Conflitos Armados Internacionais, define como pessoa civil “qualquer pessoa que não pertença a
uma das categorias de pessoas a que se refere o Artigo 4 letra A, alíneas 1, 2, 3 e 6, da Terceira
Convenção, e o Artigo 43 do presente Protocolo. Em caso de dúvida a respeito da condição de uma
pessoa, ela será considerada como civil”.
Se houver dúvidas quanto ao enquadramento em uma das categorias enumeradas no artigo 4º,
da III Convenção de Genebra, de pessoas que tiverem cometido um ato beligerante e caírem em
poder do inimigo, tais pessoas se beneficiarão da proteção deste Convênio, aguardando que um
tribunal competente determine seu estatuto.

351
Artigo 4.º
A. São prisioneiros de guerra, no sentido da presente Convenção, as pessoas que, pertencendo
a uma das categorias seguintes, tenham caído em poder do inimigo:
1) Os membros das forças armadas de uma Parte no conflito, assim como os membros das
milícias e dos corpos de voluntários que façam parte destas forças armadas;
2) Os membros das outras milícias e dos outros corpos de voluntários, incluindo os dos outros
corpos de voluntários, incluindo os dos movimentos de resistência organizados, pertencentes a
uma Parte no conflito operando fora ou no interior do seu próprio território, mesmo se este
território estiver ocupado, desde que estas milícias ou corpos voluntários, incluindo os dos
movimentos de resistência organizados, satisfaçam as seguintes condições:
a) Ter à sua frente uma pessoa responsável pelos seus subordinados;
b) Ter um sinal distinto fixo que se reconheça à distância;
c) Usarem as armas à vista;
d) Respeitarem, nas suas operações, as leis e usos de guerra.
3) Os membros das forças armadas regulares que obedeçam a um Governo ou a uma
autoridade não reconhecida pela Potência detentora;
4) As pessoas que acompanham as forças armadas sem fazerem parte delas, tais como os
membros civis das tripulações dos aviões militares, correspondentes de guerra, fornecedores,
membros das unidades de trabalho ou dos serviços encarregados do bem-estar das forças
armadas, desde que tenham recebido autorização das forças armadas que acompanham, as
quais lhes deverão fornecer um bilhete de identidade semelhante ao modelo anexo;
5) Membros das tripulações, incluindo os comandantes, pilotos e praticantes da marinha
mercante e as tripulações da aviação civil das Partes no conflito que não beneficiem de um
tratamento mais favorável em virtude de outras disposições do direito internacional;
6) A população de um território não ocupado que, à aproximação do inimigo, pegue
espontaneamente em armas, para combater as tropas de invasão, sem ter tido tempo de se
organizar em força armada regular, desde que transporte as armas à vista e respeite as leis e
costumes da guerra.
B. Beneficiarão também do tratamento reservado pela presente Convenção aos prisioneiros de
guerra:
1) As pessoas que pertençam ou tenham pertencido às forças armadas do país ocupado se, em
virtude disto, a Potência ocupante, mesmo que as tenha inicialmente libertado enquanto as
hostilidades prosseguem fora do território por ela ocupado, julgar necessário proceder ao seu
internamento, em especial depois de uma tentativa não coroada de êxito daquelas pessoas para
se juntarem às forças armadas a que pertenciam e que continuam a combater, ou quando não
obedeçam a uma imitação que lhes tenha sido feita com o fim de internamento;
2) As pessoas pertencendo a uma das categorias enumeradas neste artigo que as Potências
neutras ou não beligerantes tenham recebido no seu território e que tenham de internar em
virtude do direito internacional, sem prejuízo de qualquer tratamento mais favorável que estas
Potências julgarem preferível dar-lhes, e com execução das disposições dos artigos 8.º, 10.º,
15.º, 30.º, 5.º parágrafo, 58.º a 67.º, inclusive, 92.º, 126.º e, quando existam relações
diplomáticas entre as Partes no conflito e a Potência neutra ou não beligerante interessada, das
disposições que dizem respeito à Potência protectora. Quando estas relações diplomáticas
existem, as Partes no conflito de quem dependem estas pessoas serão autorizadas a exercer a
respeito delas as funções atribuídas às Potências protectoras pela presente Convenção sem

352
prejuízo das que estas Partes exercem normalmente em virtude dos usos e tratados
diplomáticos e consulares.
C. Este artigo não afecta o estatuto do pessoal médico e religioso tal como está previsto no
artigo 33.º desta Convenção.

Estatuto do combatente e do prisioneiro de guerra


Artigo 43.º
Forças armadas
1 - As forças armadas de uma Parte num conflito compõem-se de todas as forças, grupos e
unidades armadas e organizadas, colocadas sob um comando responsável pela conduta dos
seus subordinados perante aquela Parte, mesmo que aquela seja representada por um governo
ou uma autoridade não reconhecidos pela Parte adversa. Essas forças armadas devem ser
submetidas a um regime de disciplina interna que assegure nomeadamente o respeito pelas
regras do direito internacional aplicável nos conflitos armados.
2 - Os membros das forças armadas de uma Parte num conflito (que não o pessoal sanitário e
religioso citado no artigo 33.º da Convenção III) são combatentes, isto é, têm o direito de
participar diretamente nas hostilidades.
3 - A parte num conflito que incorpore, nas suas forças armadas, uma organização paramilitar
ou um serviço armado encarregado de fazer respeitar a ordem, deve notificar esse fato às
outras Partes no conflito.

Todas essas pessoas elencadas no artigo 4º da III Convenção de Genebra têm o direito de
gozar o status de prisioneiro de guerra quando capturados.
A IV Convenção de Genebra destina-se à proteção dos civis em tempo de guerra. A
população civil, assim como todo indivíduo civil, não pode ser objeto de ataque, de ameaças ou de
atos de aterrorização intencionais. A população civil consiste de todas as pessoas que não sirvam às
forças armadas, às milícias ou às forças paramilitares e que não estejam tomando parte diretamente
nas hostilidades. Mulheres e crianças têm direito a respeito e proteção especiais. Diferentemente do
pessoal militar (exceção feita àqueles que gozam do status de proteção especial, tais como pessoal
médico, doentes e feridos), que está sempre sujeito a ataque, estando de serviço ou de licença, os
civis, como uma categoria de pessoas protegidas, não podem ser objeto de ataque.
Como decorrência desse status, os civis, de um modo geral, não podem legalmente se engajar
em hostilidades. A exceção a essa regra ocorre quando os habitantes de um território não ocupado,
ao se aproximar o inimigo, e não havendo tempo hábil para se organizarem como forças regulares,
tomam, espontaneamente, as armas para combater as tropas invasoras. Nesse caso serão
considerados como combatentes, caso empunhem claramente armas e respeitem as leis da guerra.
Os civis que tenham participação direta nas hostilidades, portando armas ou tentando matar,
ferir ou capturar pessoal inimigo, ou mesmo destruir propriedade inimiga, perdem suas imunidades e
podem ser atacados. A participação direta de civis também pode incluir aqueles que estejam
servindo de guarda, agentes de inteligência ou vigias a serviço de forças militares, devendo ser
avaliada caso a caso. O pessoal combatente, presente na cena de ação, deve fazer uma avaliação

353
criteriosa se um civil, em particular, está ou não sujeito a ataque deliberado, baseado no seu
comportamento, localização, vestimentas e outras informações disponíveis no momento. O art. 50 do
Protocolo I às Convenções de Genebra estabelece que, em caso de dúvida, a pessoa será considerada
civil e, portanto, pertencente à categoria de pessoas protegidas.
Agora, convido você a assistir à reportagem abaixo do Jornal Nacional, apresentada em
30/07/2014, que aborda o tema acima mencionado. Clique no link abaixo e aproveite para refletir um
pouco mais sobre o conteúdo estudado.

http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/07/jornal-nacional-visita-hospital-em-israel-com-
pacientes-de-gaza.html

4.4.2 Conduta com prisioneiro de guerra, feridos, enfermos e náufragos


Conforme o artigo 13 da II Convenção de Genebra de 1949, os integrantes das Forças
Armadas e as demais pessoas, mencionadas a seguir, que forem feridos ou ficarem enfermos deverão
ser respeitados e protegidos em todas as circunstâncias.

Artigo 13.
A presente Convenção aplicar-se-á aos náufragos, feridos e doentes no mar, pertencentes às
categorias seguintes:
1) Os membros das forças armadas de uma Parte no conflito, bem como os membros das
milícias e dos corpos de voluntários que façam parte dessas forças armadas;
2) Os membros das outras milícias e dos outros corpos de voluntários, incluindo os dos
movimentos de resistência organizados, que pertençam a uma Parte no conflito e atuem fora
do seu próprio território, mesmo que este território esteja ocupado, contanto que essas milícias
ou corpos de voluntários, incluindo esses movimentos de resistências organizados, satisfaçam
às seguintes condições:
a) Serem comandados por uma pessoa responsável pelos seus subordinados,
b) Possuírem um sinal distintivo fixo e susceptível de ser reconhecido a distância;
c) Transportarem as armas à vista;
d) Observarem, nas suas operações, as leis e usos da guerra;
3) Os membros das forças armadas regulares que se mantenham fiéis a um governo ou a uma
autoridade não reconhecida pela Potência detentora;
4) As pessoas que acompanham as forças armadas sem delas fazerem diretamente parte, tais
como os membros civis de tripulação de aviões militares, correspondentes de guerra,
fornecedores, membros de unidades de trabalho ou de serviços encarregados do bem-estar dos
militares, com a condição de, para tal, estarem autorizados pelas forças armadas que
acompanham;
5) Os membros das tripulações, incluindo os comandantes, pilotos e praticantes, da marinha
mercante e as tripulações da aviação civil das Partes no conflito que não beneficiem de um
tratamento mais favorável em virtude de outras disposições de direito internacional;
6) A população de um território não ocupado que, quando da aproximação do inimigo, pegue
espontaneamente em armas para combater as tropas invasoras sem ter tido tempo de se

354
organizar em forças armadas regulares, desde que traga as armas à vista e respeite as leis e
costumes da guerra.

Eles serão tratados e cuidados com humanidade pelo adversário, quando os detiver, sem
qualquer distinção. Em outras palavras, em se tratando de guerra, eles não deverão ser assassinados,
exterminados, nem submetidos a torturas ou a qualquer tipo de experiência ou risco biológico.
Ainda, de acordo com o artigo 15 da I Convenção de Genebra de 1949, em qualquer
momento, as partes em luta adotarão as medidas necessárias para recolher os feridos e os doentes,
protegê-los contra o saque e os maus-tratos e proporcionar-lhes os cuidados necessários, assim como
procurar os mortos e impedir que sejam despojados.

Artigo 15.º
Em qualquer ocasião, e principalmente depois de um empenhamento, as Partes no conflito
adotarão sem demora todas as medidas possíveis para procurar e recolher os feridos e os
doentes, protegê-los contra a pilhagem e maus tratos e assegurar-lhes os socorros necessários,
assim como para procurar os mortos e impedir que eles sejam despojados.
Sempre que as circunstâncias o permitam, serão concluídos um armistício, uma interrupção de
fogo ou acordos locais para permitir o levantamento, a troca e os transportes de feridos
abandonados no campo de batalha.
Também poderão ser concluídos acordos locais entre as Partes no conflito para a evacuação
ou troca dos feridos e doentes de uma zona sitiada ou cercada e para a passagem do pessoal
do serviço de saúde e religioso e material sanitário destinado a esta zona.

No I Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 1949, seção I, título II, constam


todos os significados e designações a respeito da terminologia empregada.

4.4.2.1 Prisioneiros de guerra


São prisioneiros de guerra as pessoas pertencentes às
categorias mencionadas no artigo 4º, da III Convenção de
Genebra de 1949; bem como àquelas citadas no artigo 43 do
I Protocolo às Convenções (as mesmas mencionadas
anteriormente, nos itens 1 a 6 - feridos, enfermos e
náufragos), que tenham caído em poder do inimigo.
Os combatentes deixam de estar sujeitos a ataque
quando, individualmente, abaixarem suas armas com o
intuito de se render, quando não tiverem mais capacidade de
resistência ou, ainda, quando a unidade em que estejam
servindo ou embarcados tenha se rendido ou tenha sido
capturada. Entretanto, o DICA não define precisamente o
momento em que a rendição se torna efetiva, ou como ela
pode ser estabelecida em termos práticos.
355
A rendição envolve uma oferta pela parte que se rende (uma unidade ou um combatente
individual) e a aceitação por parte do oponente. Esse último não pode, quando comunicado, recusar
uma oferta de rendição, mas essa comunicação deve ser feita em um momento que permita seu
recebimento e a subsequente adoção de medidas apropriadas. Uma tentativa de se render no meio de
uma batalha duramente travada não é fácil de ser comunicada ou recebida. Nessas circunstâncias, o
assunto requer racionalidade.
Note um ponto muito importante e atual a respeito dos combatentes e prisioneiros de Guerra.
Para que a proteção da população civil contra os efeitos das hostilidades seja reforçada, os
combatentes devem se distinguir da população civil quando tomarem parte em um ataque ou em uma
operação militar preparatória para um ataque.
No entanto, levando em conta que há situações nos conflitos armados em que, devido à
natureza das hostilidades, um combatente armado não pode se distinguir da população civil, ele
conservará o estatuto de combatente desde que, em tais situações, use as suas armas abertamente:

- Durante cada ação militar; e


- Enquanto estiver à vista do adversário.

Os atos que satisfazem as condições previstas pelo presente parágrafo não são considerados
como perfídia, nos termos do artigo 37, parágrafo 1, alínea c.

Artigo 37.º
Proibição da perfídia
1 - É proibido matar, ferir ou capturar um adversário recorrendo à perfídia. Constituem
perfídia os atos que apelem, com intenção de enganar, à boa fé de um adversário para lhe
fazer crer que tem o direito de receber ou a obrigação de assegurar a proteção prevista pelas
regras do direito internacional aplicável nos conflitos armados. São exemplo de perfídia os
atos seguintes:
a) Simular a intenção de negociar a coberto da bandeira parlamentar, ou simular a rendição;
b) Simular uma incapacidade causada por ferimentos ou doença;
c) Simular ter estatuto de civil ou de não combatente;
d) Simular ter um estatuto protegido utilizando sinais, emblemas ou uniformes das Nações
Unidas, Estados neutros ou de outros Estados não Partes no conflito.
2 - As astúcias de guerra não são proibidas. Constituem astúcias de guerra os atos que têm por
fim induzir um adversário em erro ou fazer-lhe cometer imprudências, mas que não violem
nenhuma regra do direito internacional aplicável aos conflitos armados e que, não apelando à
boa fé do adversário no respeitante à proteção prevista por aquele direito, não são perfídias.
Os atos seguintes são exemplos de astúcias de guerra: uso de camuflagem, engodos,
operações simuladas e falsas informações.

356
Há que se diferenciar a perfídia das
astúcias de guerra. Como visto acima, a
perfídia são atos que apelam, com
intenção de enganar, à boa fé de um
adversário para lhe fazer crer que tem o
direito de receber ou a obrigação de
assegurar a proteção prevista pelas regras
do direito internacional aplicável nos
conflitos armados, enquanto as astúcias de
guerra os atos que têm por fim induzir um
adversário em erro ou fazer-lhe cometer
imprudências, mas que não violem
nenhuma regra do direito internacional
aplicável aos conflitos armados e que, não
apelando à boa fé do adversário no tocante à proteção prevista por aquele direito. Diferentemente da
perfídia, as astúcias de guerra não são proibidas.
O inimigo que detém os prisioneiros de guerra deve tratá-los com humanidade e todo o ato ou
omissão, que tenha como consequência a morte ou que ponha em perigo a saúde de um prisioneiro
em seu poder, vai de encontro às Convenções firmadas em Genebra (1942) e é proibido. O artigo 12º
da III Convenção de Genebra trata sobre a proteção geral aos prisioneiros de guerra:

Protecção geral aos prisioneiros de guerra


Artigo 12.º
Os prisioneiros de guerra ficam em poder da Potência inimiga, e não dos indivíduos ou corpos
de tropas que os capturam. Independentemente das responsabilidades individuais que possam
existir, a Potência detentora é responsável pelo tratamento que lhes é aplicado. Os prisioneiros
de guerra não podem ser transferidos pela Potência detentora senão para uma Potência que
seja parte na presente Convenção e depois de a Potência está disposta e em condições de
aplicar a Convenção.
Quando os prisioneiros são transferidos nestas condições, a responsabilidade pela aplicação
da Convenção é da Potência que aceitou recebê-los, durante o tempo em que eles lhe
estiverem confiados.
No entanto, se esta Potência faltar às suas obrigações no cumprimento das disposições da
Convenção sobre qualquer ponto importante da Convenção que transferiu os prisioneiros de
guerra deve, tomar medidas eficazes para remediar a situação ou pedir que lhe sejam
restituídos os prisioneiros de guerra. Tais pedidos deverão ser satisfeitos.

Os combatentes que tenham se rendido ou caído em mãos inimigas têm direito ao status de
prisioneiro de guerra e, como tal, devem ser tratados com humanidade e protegidos contra violência,
intimidação, insulto e curiosidade pública.

357
4.4.2.2 Enfermos detidos
Entende-se por feridos e enfermos as pessoas, sejam militares ou civis, que devido a um
traumatismo, ou uma enfermidade e outros distúrbios ou incapacidades de ordem física ou mental tenham
necessidade de assistência ou cuidados médicos, e que se abstenham de todo ato de hostilidade. Esses
termos são também aplicados às parturientes, aos recém-nascidos e a outras pessoas que possam estar
necessitadas de assistência ou cuidados médicos imediatos, como os inválidos e as mulheres grávidas, e
que se abstenham de todo ato de hostilidade.
Vejamos o que nos diz o artigo 76 da IV Convenção de Genebra (1949):

Artigo 76.º
As pessoas protegidas acusadas de delitos serão detidas no país ocupado e, se forem
condenadas, deverão cumprir aí a sua pena. Serão separadas, se possível, dos outros
presos e submetidas a um regime alimentar e higiênico adequado para as manter em
bom estado de saúde que corresponda pelo menos ao regime dos estabelecimentos
penitenciários do país ocupado.
Receberão os cuidados médicos exigidos pelo seu estado de saúde.
Serão igualmente autorizadas a receber a assistência espiritual que possam solicitar.
As mulheres serão alojadas em locais separados e colocadas sob a vigilância imediata
de mulheres.
Ter-se-á em consideração o tratamento especial previsto para os menores.
As pessoas protegidas detidas terão o direito de receber a visita dos delegados da
Potência protetora e da Comissão Internacional da Cruz Vermelha, em conformidade
com as disposições do artigo 143.º.
Por outro lado, as pessoas protegidas terão o direito de receber pelo menos uma
encomenda de socorro por mês.

Perceba que o artigo 76 da IV Convenção de Genebra (1949) traz que os detidos deverão
receber cuidados médicos e assistência espiritual e ainda que “As mulheres serão alojadas em locais
separados e colocadas sob a vigilância imediata de mulheres”, além de tratamento especial aos
menores de idade.

4.4.2.3 Náufragos
Entende-se por náufragos as pessoas, sejam militares ou
civis, que se encontrem em situação de perigo no mar ou em
outras águas em consequência de um infortúnio que as afete ou
que afete a nave ou aeronave que as transportava, e que se
abstenham de todo ato de hostilidade. Essas pessoas, sempre que
prossigam abstendo-se de todo ato de hostilidade, continuarão
consideradas como náufragos durante seu salvamento, até que
adquiram outra condição em conformidade com as Convenções

358
ou Protocolos.
Da mesma forma que os feridos e enfermos em campanha, os náufragos serão recolhidos e
tratados e, caso caiam em poder do inimigo, serão tratados como prisioneiros de guerra. Vejamos o
nos fala o artigo 18 da II Convenção de Genebra:

Artigo 18
Após cada combate, as Partes no conflito tomarão, sem demora, todas as medidas possíveis
para procurar e recolher os náufragos, os feridos e os doentes, protegê-los contra a pilhagem e
os maus tratos e assegurar-lhes os cuidados necessários, assim como para procurar os mortos
e impedir que eles sejam despojados.
Sempre que as circunstâncias o permitam, as Partes no conflito concluirão acordos locais para
a evacuação por mar dos feridos e doentes de uma zona sitiada ou cercada e para a passagem
de pessoal do serviço de saúde e religioso e de material sanitário destinado a esta zona.

A Potência que detiver os prisioneiros de guerra deverá tomar todas as medidas de higiene
necessárias para assegurar a limpeza e a salubridade dos campos. Providenciar a separação deles em
relação aos demais presos, em outras instalações, e encorajar as atividades educativas, recreativas e
desportivas.
Cabe ressaltar que náufragos não incluem pessoal combatente engajado em ataques anfíbios,
submarinos ou aerotransportado que estejam se dirigindo para terra, a menos que estejam claramente
em perigo e necessitem de assistência. Nesse último caso, eles podem ser qualificados como
náufragos somente se cessarem todas as atividades de combate e se o inimigo tiver oportunidade de
reconhecer suas condições de perigo. Combatentes náufragos, caindo em mãos inimigas, tornam-se
prisioneiros de guerra.
Por fim, complementando o que já dissemos, todos os feridos, enfermos e náufragos, qualquer
que seja a Parte a que pertençam, deverão ser respeitados e protegidos, sendo em todas as
circunstâncias humanamente tratados e recebendo, na medida do possível e no mais curto prazo, os
cuidados médicos exigidos por seu estado. Não se deve fazer entre eles qualquer distinção que não
seja baseada em critérios médicos.

4.4.3 Conduta com Pessoal de Saúde e Capelães


O pessoal dos serviços de saúde, que inclui médicos, dentistas, técnicos de saúde, enfermeiros
e pessoal de serviço médico, tem status de protegido especial, quando engajado exclusivamente em
serviços médicos, não devendo ser atacado. A posse de pequenas armas para proteção própria, dos
doentes e feridos e contra saqueadores e outros indivíduos que violem DICA, não desqualifica o
pessoal médico do status de protegido. O pessoal médico não pode usar tais armas contra forças
inimigas que estejam agindo em conformidade com o DICA.

359
Os capelães agregados às Forças Armadas têm direito ao respeito a sua condição e à proteção.
Os capelães e o pessoal médico devem exibir os respectivos símbolos de identificação, quando
desempenhando suas respectivas atividades médicas e religiosas. Todo pessoal dos serviços de saúde
e religioso que caia em mãos inimigas não se torna prisioneiro de guerra, a menos que sua retenção
pelo inimigo seja necessária para prover apoio médico ou religioso a prisioneiros de guerra. Nesse
caso, apesar de continuar não sendo considerado prisioneiro de guerra, o pessoal dos serviços de
saúde e religioso se beneficiará de todas as vantagens e da proteção da III Convenção de Genebra,
assim como de todas as facilidades necessárias para proporcionar assistência médica e religiosa aos
prisioneiros de guerra. Ressalta-se que, durante as hostilidades, as Partes em conflito deverão
entender-se sobre a eventual substituição do pessoal retido e fixarão suas modalidades nos termos do
artigo 33 da III Convenção de Genebra.

Artigo 33.º
O pessoal do serviço de saúde e os capelães enquanto em poder da Potência detentora com o
fim de darem assistência aos prisioneiros de guerra não serão considerados como prisioneiros
de guerra. No entanto, beneficiarão, pelo menos, de todas as vantagens e da protecção da
presente Convenção, assim como de todas as facilidades necessárias que lhes permitam levar
os seus cuidados médicos e o seu auxílio religioso aos prisioneiros de guerra.
Continuarão a exercer, dentro das leis e regulamentos militares da Potência detentora, sob a
autoridade dos seus serviços competentes e de acordo com a sua consciência profissional, as
suas funções médicas ou espirituais em benefício dos prisioneiros de guerra pertencentes de
preferência às forças armadas a que pertenciam.
Beneficiarão também para o exército da sua missão médica ou espiritual, das facilidades
seguintes:
a) Serão autorizados a visitar periodicamente os prisioneiros de guerra que estejam em
destacamentos de trabalho ou em hospitais situados fora do campo. A autoridade detentora
porá à sua disposição, para este efeito, os meios de transporte necessários;
b) Em cada campo, o médico militar de posto mais elevado ou o mais antigo no mesmo posto
será responsável junto das autoridades militares do campo por tudo que diz respeito à
actividade do pessoal do serviço de saúde retido.
Para este efeito, as Partes no conflito entender-se-ão desde o início das hostilidades sobre a
correspondência dos postos do seu pessoal do serviço de saúde, incluindo o das sociedades
citadas no artigo 26.º da Convenção de Genebra para melhorar as condições dos feridos e dos
doentes das forças armadas em campanha de 12 de Agosto de 1949. O oficial médico mais
graduado assim como os capelães terão o direito de tratar com as autoridades competentes do
campo todos os assuntos relativos ao seu serviço. Estar dar-lhe-ão todas as facilidades
necessárias para a correspondência relativa a estes assuntos;
c) Ainda que submetido à disciplina interna do campo no qual se encontre, o pessoal retido
não poderá ser adstrito a nenhum trabalho estranho à sua missão médica ou religiosa.
No decurso das hostilidades as Partes no conflito entender-se-ão relativamente à substituição
eventual do pessoal retido e fixarão as modalidades.
Nenhuma das disposições precedentes dispensa a Potência detentora das obrigações que lhe
competem para com os prisioneiros de guerra nos domínios sanitários e espirituais.

360
4.4.4 Espiões e Mercenários
O membro das Forças Armadas, que cair em poder do
inimigo em atividades de espionagem não terá direito ao
estatuto de prisioneiro de guerra e poderá ser tratado como
espião, estando sujeito à pena prevista no ordenamento
jurídico do Estado captor.
O membro das Forças Armadas, que recolha ou
procure recolher informações em território controlado por
uma Parte adversa não será considerado como espião se, ao
fazê-lo, envergar o uniforme das Forças Armadas a qual
pertença.
O membro das Forças Armadas que residir em território ocupado pelo inimigo e que
recolha ou procure recolher informações de interesse militar nesse território, não será considerado
como espião, a menos que, ao fazê-lo, proceda sob pretextos falaciosos ou de maneira
deliberadamente clandestina. Além disso, esse residente não perderá o seu direito ao estatuto de
prisioneiro de guerra e não poderá ser tratado como espião, salvo se for capturado executando
atividades de espionagem.
O membro das Forças Armadas que não for residente em território ocupado pelo inimigo e
que se dedicou a atividades de espionagem nesse território não perderá o seu direito ao estatuto de
prisioneiro de guerra e não poderá ser tratado como espião, salvo no caso de ser capturado antes de
se juntar às Forças Armadas a que pertence.
O termo mercenário designa todo aquele que tomar parte nas hostilidades essencialmente com
o objetivo de obter uma vantagem
pessoal e a quem foi efetivamente
prometido, por uma Parte no conflito ou
em seu nome, uma remuneração
material claramente superior à que foi
prometida ou paga aos combatentes
com um posto e função análogos nas
Forças Armadas dessa Parte. Um
mercenário não terá direito ao estatuto
de combatente ou de prisioneiro de guerra.

361
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Paremos agora para realizar mais uma verificação de aprendizagem sobre o conteúdo
ministrado nesta aula. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) A perfídia se caracteriza por serem atos que têm por fim induzir um adversário em erro, mas
que não violam nenhuma regra do DICA, portanto não sendo proibidas.

2) ( ) Uso de camuflagem, engodos, operações simuladas e falsas informações são exemplos de


astúcias de guerra.

3) ( ) Náufragos são quaisquer combatentes que se encontram em situação de perigo no mar em


consequência de um infortúnio que os afete ou ao navio que os transportava.

4) ( ) Espiões e mercenários capturado terão o mesmo direito ao estatuto do prisioneiro de guerra.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) O seguinte pessoal tem o direito de gozar o status de prisioneiro de guerra quando capturado, EXCETO

(A) quaisquer movimentos de resistência organizados.

(B) membros das Forças Armadas regulares a serviço de uma autoridade que não seja reconhecida pela
potência detentora.

(C) membros das Forças Armadas de uma Parte em conflito.

(D) a população de um território não ocupado que, à aproximação do inimigo, pegar espontaneamente em
armas para combater as tropas invasoras, sem ter tempo de organizar-se em forças armadas regulares,
desde que traga as armas à vista e respeite a lei e os costumes da guerra.

(E) membros de corpos de voluntários pertencentes às Forças Armadas de uma Parte em conflito.

362
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 E
4 E
5 A

RECADO FINAL:
Nesta aula, começamos a ver a proteção dada pelo DICA a diversas pessoas, tais como:
prisioneiros de guerra, feridos, enfermos, náufragos, pessoal de saúde e capelães.
Na próxima aula, ainda continuaremos nesta temática, porém com o foco mais voltado para os
bens e locais que serão objetos da proteção do DICA.
Dito isto...
Até a próxima aula!

363
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Vamos continuar os nossos estudos sobre o Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA).
Na última aula, falamos sobre a proteção dada pelo DICA a algumas pessoas.
Nesta aula, continuaremos falando sobre esta proteção especial do DICA, porém com foco mais
em bens e localidades.
Bons estudos!

Objetivos da aprendizagem:
- Citar os Procedimentos com unidades sanitárias e meios de transporte sanitário;
- Descrever a conduta com o pessoal sanitário e religioso;
- Descrever as localidades e zonas sob proteção especial; e
- Identificar os principais símbolos e distintivos.

4.4 PROTEÇÃO DO DICA


4.4.5 Procedimentos com unidades sanitárias e meios de transporte sanitário
Unidades sanitárias são os estabelecimentos e outras formações, militares ou civis,
organizados com finalidades sanitárias, a saber: a busca, o recolhimento, o transporte, o diagnóstico
ou tratamento (incluídos os primeiros socorros) dos feridos, enfermos e náufragos, assim como a
prevenção de enfermidades. A expressão compreende, entre outros, os hospitais e outras unidades
similares, os centros de transfusão de sangue, os centros e institutos de medicina preventiva e os
depósitos de material sanitários, assim como os paióis de material sanitário e de produtos
farmacêuticos dessas unidades. As unidades sanitárias podem ser fixas ou móveis, permanentes ou
temporárias.

O transporte sanitário é aquele efetuado por terra, por água ou por ar dos feridos, enfermos e
náufragos, do pessoal sanitário ou religioso ou do equipamento e material sanitários protegidos pelas
Convenções e Protocolos.

364
Já por meio de transporte sanitário se
entende como sendo todo meio de transporte
militar ou civil permanente ou temporário,
destinado exclusivamente ao transporte sanitário,
sob a direção de uma autoridade competente de
uma Parte em conflito.
A proteção devida aos estabelecimentos
mencionados cessa quando eles são empregados
como meio para cometer atos contra o inimigo,
fora de objetivos humanitários. Vejamos o que nos diz a I Convenção de Genebra em seus artigos 19
e 21, sobre as unidades e estabelecimentos sanitários:

Das Unidades e dos Estabelecimentos Sanitários


Artigo 19
Os estabelecimentos fixos e as unidades sanitárias móveis do Serviço de Saúde não
poderão, em nenhuma circunstância, ser objeto de ataques, mas deverão ser respeitados
e protegidos pelas Partes em luta. Se caírem nas mãos da Parte contrária, poderão
continuar a funcionar enquanto a Potência captora não houver assegurado os cuidados
necessários aos feridos e enfermos que se acharem nesses estabelecimentos e unidades.
As autoridades competentes envidarão esforços no sentido de que os estabelecimentos
e as unidades sanitárias aqui mencionados sejam, na medida do possível, localizados de
maneira que ataques eventuais contra objetivos militares não constituam perigo para
êles.

Artigo 21
A proteção devida aos estabelecimentos fixos e as unidades sanitárias móveis o Serviço
de Saúde só deverá cessar se forem usados para cometer atos nocivos ao inimigo
incompatíveis com os seus deveres humanitários. Todavia, a proteção só cessará após
intimação que estabeleça, em todos os casos apropriados, um prazo razoável e depois
que tal intimação tiver sido desrespeitada.

Interessante verificar que o artigo 22 da I Convenção de Genebra nos traz algumas hipóteses
que não serão consideradas como de natureza a privar uma unidade ou um estabelecimento sanitário
da proteção assegurada acima:

- pessoal da unidade ou do estabelecimento estar armado e fazer uso de suas armas em defesa
própria ou na defesa dos feridos e enfermos;
- na falta de enfermeiros armados, estar a unidade ou estabelecimento guardado por um piquete,
sentinelas ou uma escolta;
- se acharem na unidade ou no estabelecimento armas portáteis e munições recolhidas nos feridos e
enfermos, e que não tenham sido ainda entregues ao serviço competente;
- se acharem na unidade ou estabelecimento, sem que façam parte integrante dos mesmos, pessoal e
365
material do serviço veterinário; e
- se estender a civis feridos ou enfermos a atividade humanitária das unidades e estabelecimentos
sanitários ou de seu pessoal.

Convido você agora a assistir ao vídeo “Panorama: o CICV em ação no mundo”, por meio do
link abaixo, que apresenta muitos dos conceitos estudados até agora:

https://www.youtube.com/watch?v=i8YfWsmfNwU

Passemos agora ao que nos diz o artigo 35º da I Convenção de Genebra e ao artigo 22º da II
Convenção de Genebra:

Artigo 35.º
Os transportes de feridos e doentes ou de material sanitário serão respeitados e protegidos do
mesmo modo que as formações sanitárias móveis.
Quando estes transportes ou veículos caiam em poder da Parte adversa, serão submetidos às
leis da guerra, com a condição de a Parte no conflito que os tenha capturado se encarregar, em
qualquer caso, dos feridos e doentes que eles transportam.
O pessoal civil e todos os meios de transporte provenientes da requisição serão submetidos às
regras gerais do direito das gentes.

Dos navios-hospitais
Artigo 22.º
Os navios-hospitais militares, isto é, os navios construídos ou adaptados pelas Potências
especial e unicamente no intuito de prestarem assistência aos feridos, doentes e náufragos, de
os tratarem e de os transportarem, não poderão, em circunstância alguma, ser atacados nem
apresados, e serão sempre respeitados e protegidos, contanto que os respectivos nomes e
características tenham sido comunicados às Partes no conflito dez dias antes da sua utilização.
As características que devem figurar na notificação compreenderão a tonelagem bruta
registrada, o comprimento da popa à proa e o número de mastros e de chaminés.

Os navios de guerra podem exercer


um direito de fiscalização e de visita sobre
os navios-hospitais beligerantes ou neutros
a fim de verificar a utilização que lhes é
dada.
No tocante às aeronaves sanitárias,
o artigo 39º da II Convenção de Genebra
dispõe o seguinte:

366
Artigo 39.º
As aeronaves sanitárias, isto é, as aeronaves exclusivamente utilizadas para a
evacuação dos feridos, doentes e náufragos, assim como para o transporte do pessoal e
do material sanitários, não serão objeto de ataques, mas sim respeitadas pelas Partes no
conflito durante os vôos que efetuarem a altitudes, a horas e por itinerários
especificamente combinados entre todas as Partes no conflito interessadas.
As referidas aeronaves apresentarão ostensivamente o sinal distintivo previsto no artigo
41.º, ao lado das cores nacionais, nas faces inferior, superior e laterais.
Serão dotadas de qualquer outra sinalização ou meio de reconhecimento, fixados por
acordo entre as Partes no conflito, quer no início, quer no decurso das hostilidades.
Salvo acordo em contrário, será proibido sobrevoar o território inimigo ou por este
ocupado.
As aeronaves sanitárias deverão obedecer a qualquer intimação para aterrar ou amarar.
Em caso de aterragem ou de amaragem que assim lhes sejam impostas, a aeronave,
com os seus ocupantes, poderá continuar o seu vôo após eventual inspeção.
Em caso de aterragem ou de amaragem fortuitas em território inimigo ou ocupado pelo
inimigo, os feridos, doentes e náufragos, assim como a tripulação da aeronave, serão
prisioneiros de guerra. O pessoal do serviço de saúde será tratado em conformidade
com os artigos 36.º e 37.º

As aeronaves sanitárias estão proibidas de sobrevoar o território inimigo ou o território


ocupado pelo inimigo, salvo se houver qualquer acordo entre as partes beligerantes. Elas deverão
obedecer a qualquer ordem de pouso para serem inspecionadas. Em caso de uma aterrisagem de
emergência em território inimigo, todos serão considerados prisioneiros de guerra (tripulação,
enfermos, etc.), exceto o pessoal sanitário, que será tratado conforme veremos abaixo no próximo
item.
Notificando às Potências Neutras sobre o sobrevoo em seu espaço aéreo, as aeronaves
sanitárias poderão cumprir o seu plano de voo conforme divulgado (de acordo com a citação acima),
para evitar qualquer tipo de ataque; contudo, deverão obedecer a todo tipo de intimação ou de
restrição, caso aconteçam.
Agora, assista à reportagem sobre um avião sírio forçado a pousar pela Força Aérea Turca:

https://www.youtube.com/watch?v=niUHLtQ019A

4.4.6 Pessoal sanitário e religioso


Responsáveis por prestar conforto espiritual e apoio médico e sanitário àqueles que sofrem os
horrores de uma guerra, os capelães (religiosos) e os médicos possuem condições especiais de
tratamento nos conflitos armados. Desde que não participem diretamente das hostilidades, não serão
considerados prisioneiros de guerra, caso sejam presos; no entanto, poderão se beneficiar das
disposições da Convenção, no que diz respeito ao tratamento que lhes é dado. Entretanto, perderão a
sua proteção se, fora da sua função humanitária, cometerem atos que prejudiquem o adversário.

367
Devem receber permissão do inimigo para prover os cuidados específicos aos feridos, aos
doentes e aos náufragos, a unidades sanitárias situadas dentro e fora do campo, mantendo sempre o
princípio da neutralidade, e identificar-se.
São comparados ao pessoal mencionado aqueles pertencentes ao Comitê Internacional da
Cruz Vermelha (CICV) e os militares que receberem instrução especial para serem, devido a
premência da situação, empregados como enfermeiros auxiliares; assim como, o pessoal das demais
sociedades de socorros voluntários, devidamente reconhecidas e autorizadas por seus governos, que
seja empregado nas mesmas funções que as do pessoal citado, contanto que seja submetido às leis e
regulamentos militares.

4.4.7 Bens Culturais


Bens culturais são bens móveis ou
imóveis que têm grande importância para o
patrimônio cultural dos povos, qualquer que
seja a sua origem ou o seu detentor. São os
monumentos históricos, os sítios arqueológicos,
as obras de arte, os manuscritos, livros e
importantes coleções científicas e outros objetos
de grande interesse histórico.
Devem ser protegidos os edifícios, cujo objetivo principal e efetivo seja conservar ou expor
bens culturais definidos no parágrafo anterior, tais como museus, grandes bibliotecas, depósitos de
arquivos, assim como os refúgios destinados a proteger esses bens em caso específico de conflito
armado.
É importante frisar o que consta no artigo 52º do I Protocolo às Convenções de Genebra:

Artigo 52.º
proteção geral dos bens de caráter civil
1 - Os bens de caráter civil não devem ser objeto de ataques ou de represálias. São bens de caráter
civil todos os bens que não são objetivos militares nos termos do n.º 2.
2 - Os ataques devem ser estritamente limitados aos objetivos militares. No que respeita aos bens,
os objetivos militares são limitados aos que, pela sua natureza, localização, destino ou utilização
contribuam efetivamente para a ação militar e cuja destruição total ou parcial, captura ou
neutralização ofereça, na ocorrência, uma vantagem militar precisa.
3 - Em caso de dúvida, um bem que é normalmente afeto ao uso civil, tal como um local de culto,
uma casa, outro tipo de habitação ou uma escola, presume-se não ser utilizado com o propósito de
trazer uma contribuição efetiva à ação militar.

Perceba que em caso de dúvida a respeito de um bem que normalmente se presta a fins civis,
tal como uma escola, uma moradia ou um lugar de culto, estar sendo utilizado para contribuir
eficazmente para ação militar, será presumido que não está sendo utilizado com tal propósito.

368
Quanto aos bens culturais, em caso de conflito armado e de outros instrumentos
internacionais aplicáveis, é proibido:

- cometer qualquer ato de hostilidade contra monumentos históricos, obras de arte ou lugares de
culto que constituam o patrimônio cultural ou espiritual dos povos;
- utilizar esses bens para apoio do esforço militar; e
- fazer desses bens objeto de represália.

Para fixar os conhecimentos, assista aos vídeos abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=LKDIIPfMM0w
https://www.youtube.com/watch?v=uoi0Hm0IjM4

O quadro resumo a seguir facilita o estudo e a pesquisa do tema.

Convenção de Haia de 1954 Proteção dos Bens Culturais em caso de Conflito Armado.
Protocolos Adicionais I e II às Proteção geral contra os efeitos das hostilidades.
Convençõesde Genebra de 1949
Convenção da UNESCO Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural de 1972.
Registro Internacional do bem Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
cultural Cultura (UNESCO).

4.4.8 Localidades e Zonas sob Proteção Especial


Uma das limitações em um conflito armado é a proibição de operações militares em locais
especialmente protegidos, como já observamos em relação às unidades sanitárias fixas ou móveis
especialmente protegidas, onde o pessoal sanitário cuida dos feridos e doentes.
Nas localidades não defendidas, ou aqueles locais habitados nas proximidades da frente de
combate, existem condições: uma delas é a evacuação de todos os combatentes e do material militar
para que não seja realizada qualquer atividade de apoio a operações militares; além, é claro, de não
ser cometido qualquer ato hostil contra o adversário. Após as tratativas, a outra parte beligerante
deve conceder, ou não, o tratamento de localidade não defendida.
O artigo 14º da IV Convenção de Genebra, que trata das zonas e das localidades sanitárias e
de segurança, as quais constituem zonas de refúgio criadas também por meio de um acordo entre as
partes, que podem estar afastadas ou próximas da frente de combate, e seu reconhecimento e
estabelecimento podem ser facilitados pela Potência protetora e pelo CICV:

369
Artigo 14.º
Desde o tempo de paz, as Partes contratantes e, depois do início das hostilidades, as Partes no
conflito, poderão estabelecer no seu próprio território e, se houver necessidade, nos territórios
ocupados, zonas e localidades sanitárias e de segurança organizadas de modo a proteger dos
efeitos da guerra os feridos e os doentes, os enfermos, os velhos, as crianças com menos de 15
anos, as mulheres grávidas e as mães de crianças com menos de 7 anos.
Desde o início de um conflito e no decorrer das hostilidades, as Partes interessadas poderão
concluir entre si acordos para o reconhecimento das zonas e localidades que tiverem estabelecido.
Poderão para este efeito pôr em execução as disposições previstas no projeto de acordo apenso à
presente Convenção, introduzindo as alterações que eventualmente considerem necessárias.
As Potências protetoras e a Comissão Internacional da Cruz Vermelha são convidadas a prestar os
seus bons ofícios para facilitar o estabelecimento e o reconhecimento destas zonas e localidades
sanitárias e de segurança.

Segundo as Convenções de Genebra, o tratamento de prisioneiros de guerra, civis internados


e habitantes de territórios ocupados devem ser amparados por um Estado neutro conhecido como
“Potência Protetora”. Em face à dificuldade de se encontrar um Estado considerado verdadeiramente
neutro pelos beligerantes, organizações humanitárias internacionais, tal como o Comitê Internacional
da Cruz Vermelha (CICV), têm sido autorizadas pelos envolvidos a conduzir pelo menos parte das
funções atribuídas à “Potência Protetora”.
Ao contrário do que acontece com as zonas sanitárias e de segurança, que tem caráter
permanente, as zonas neutras são criadas provisoriamente em regiões onde são desenvolvidos
combates e podem acolher também a população civil.
Quanto às zonas desmilitarizadas, igualmente criadas por meio de acordos concluídos em
tempo de paz ou após o início das hostilidades, é proibido às Partes em conflito estender suas
operações militares às zonas a que tem conferido, por acordo, o estatuto de zona desmilitarizada, se
essa extensão for contrária às disposições de tal acordo.
As limitações se ligam ao fato de que toda a atividade relacionada com o esforço militar deve
cessar e, naturalmente, serão desprovidas de efeito se os bens ou zonas protegidas forem empregados
ou utilizados para cometer atos de hostilidade ao inimigo.

4.4.9 Principais símbolos e distintivos


Com o objetivo de identificar as pessoas e os bens protegidos, foram criados alguns símbolos e
distintivos a fim de garantir a proteção de civis, dos prisioneiros de guerra, dos enfermos e dos bens
culturais, conforme a tabela de símbolos e distintivos a seguir. Tais símbolos deverão ser respeitados
pelos beligerantes.

370
“Cruz Vermelha” - Serviço sanitário
militar e civil / Pessoal religioso
militar e civil

Defesa Civil

Bens culturais (proteção especial)

PG
Campo de prisioneiros de guerra
PW

IC Campo de civis internados

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já
aprendeu até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O transporte sanitário é aquele efetuado por terra, por água ou por ar dos feridos, enfermos e
náufragos, do pessoal sanitário ou religioso ou do equipamento e material sanitários.

2) ( ) Em caso de conflito armado, é proibido cometer qualquer ato de hostilidade contra


monumentos históricos, obras de arte ou lugares de culto que constituam o patrimônio cultural ou
espiritual dos povos.

371
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

3) Acerca dos procedimentos com as unidades sanitárias e meios de transporte sanitário, podemos afirmar
que:

(A) os navios de guerra podem exercer um direito de fiscalização e de visita sobre os navios-
hospitais beligerantes ou neutros a fim de verificar a utilização que lhes é dada.

(B) meio de transporte sanitário é todo meio de transporte militar permanente, destinado, dentre
outras funções, ao transporte sanitário, sob a direção de uma autoridade competente de uma Parte em
conflito.

(C) as aeronaves sanitárias estão dispensadas de obedecer a qualquer intimação para aterrar ou amarar.

(D) A proteção devida aos estabelecimentos fixos e as unidades sanitárias móveis do Serviço de Saúde é
plena, sendo devida ainda que sejam usados para cometer atos nocivos ao inimigo.

(E) não é permitido a uma unidade ou um estabelecimento sanitário possuir pessoal armado, mesmo
que faça uso de suas armas somente em defesa própria ou na defesa dos feridos e enfermos.

GABARITO:

QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 C
3 A

RECADO FINAL:
Vimos até aqui que o Direito Internacional Humanitário aborda as regras aplicáveis aos
conflitos armados, internacionais ou não, que visam restringir as ações dos combatentes, por meio da
limitação dos métodos e meios de guerra, e proteger os direitos dos não combatentes, sejam eles
civis ou militares, que caírem em poder do adversário.
Nos conflitos armados tudo diz respeito aos dois principais atores: o combatente e o civil, ou
a população civil, podendo uma mesma pessoa assumir os dois papéis, conforme a situação.
Dito isto...
Até a próxima aula!

372
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Na última aula, concluímos as pessoas, bens e locais que terão a proteção do DICA.
Nesta aula, começaremos a falar sobre os conflitos armados, mais precisamente, os conflitos
armados internacionais. E percebam que não estamos utilizando a expressão “guerra”. Por que?
Este é exatamente um dos pontos que veremos na aula de hoje.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever o Conflito Armado Internacional;
- Citar a natureza do conflito;
- Citar os sujeitos ativo e passivo do conflito;
- Explicar a aplicação em razão do tempo;
- Aplicação em razão do lugar; e
- Descrever Estado Neutro.

INTRODUÇÃO:

Antes de definir ambas as situações, algumas palavras devem ser ditas sobre a noção de “conflito
armado” que tem substituído, desde 1949, a noção tradicional de “guerra”.
Depois da Segunda Guerra Mundial, raramente Estados declaram guerra de maneira formal, haja
vista as consequências jurídicas do ato. Desta forma, o termo “conflito armado” ganhou ênfase.
A substituição da palavra ‘guerra’ pela expressão mais genérica ‘conflito armado’ foi intencional.
Podem ser levantadas inúmeras questões sobre a definição legal de ‘guerra’. Um Estado poderia simular
que, ao cometer um ato hostil contra outro Estado, não está realizando uma guerra, mas sim agindo em
legítima defesa.
A expressão ‘conflito armado’ faz com que esse argumento seja menos fácil de ser defendido.
Qualquer diferença que surja entre dois Estados e que leve à intervenção das forças armadas é um conflito
armado, mesmo que uma das Partes negue a existência do estado de guerra.

4.5 CONFLITO ARMADO INTERNACIONAL (CAI)


O DICA relacionado a conflitos armados internacionais é aplicável “em todos os casos de guerra
declarada ou outro conflito armado qualquer que venha a surgir entre duas ou mais das Altas Partes
Contratantes das Convenções de Genebra, mesmo que o estado de guerra não seja reconhecido por uma
delas”, na forma do contido no Artigo 2º Comum às quatro Convenções de Genebra.
O mesmo conjunto de dispositivos legais também se aplica a todos os casos de ocupação parcial
ou total do território de uma Alta Parte Contratante, mesmo que a ocupação não tenha encontrado
373
resistência armada.
De acordo com a doutrina tradicional, a noção de conflito armado internacional era, portanto,
limitada a disputas armadas entre Estados.
Durante a Conferência Diplomática que levou à adoção dos Protocolos Adicionais de 1977, esse
conceito foi questionado e ficou finalmente reconhecido que as “guerras de libertação nacional” também
deveriam ser consideradas conflitos armados internacionais, como está bem descrito no artigo 1º do I
Protocolo Adicional.

Artigo 1.º

Princípios gerais e âmbitos de aplicação


1 - As Altas Partes Contratantes comprometem-se a respeitar e a fazer respeitar o presente
Protocolo em todas as circunstâncias.
2 - Nos casos não previstos pelo presente Protocolo ou por outros acordos internacionais, as
pessoas civis e os combatentes ficarão sob a proteção e autoridade dos princípios do direito
internacional, tal como resulta do costume estabelecido, dos princípios humanitários e das
exigências da consciência pública.
3 - O presente Protocolo, que completa as Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 para a
proteção das vítimas de guerra, aplica-se nas situações previstas pelo artigo 2.· comum a estas
Convenções.
4 - Nas situações mencionadas no número precedente estão incluídos os conflitos armados em que
os povos lutam contra a dominação colonial e a ocupação estrangeira e contra os regimes racistas
no exercício do direito dos povos à autodeterminação, consagrado na Carta das Nações Unidas e
na Declaração Relativa aos Princípios do Direito Internacional Respeitante às Relações Amigáveis
e à Cooperação entre os Estados nos termos da Carta das Nações Unidas

Existem mais de 30 instrumentos internacionais em vigor que abordam o Direito Internacional


aplicável a conflitos armados internacionais.
São aplicáveis as quatro Convenções de Genebra de 1949, relativas à proteção das pessoas que
não participam (ou não participam mais) das hostilidades (tais como feridos, doentes, náufragos,
prisioneiros de guerra, mortos, civis e aqueles que cuidam das vítimas do conflito armado).
A Quarta Convenção de Genebra também se aplica a todos os casos de ocupação parcial ou total
do território de uma Alta Parte Contratante, mesmo se a ocupação não enfrentar resistência armada.
O I Protocolo Adicional, de 1977, que complementa as Convenções de Genebra de 1949, é
aplicado aos conflitos armados internacionais, em situações de ocupação (artigo 1.3 do I Protocolo), e em
conflitos armados “em que os povos lutam contra a dominação colonial, contra a ocupação estrangeira e
contra os regimes racistas, no exercício do direito dos povos à autodeterminação, consagrado na Carta das
Nações Unidas (artigo 1.4 do I Protocolo).
O artigo 1º do Protocolo Adicional I submete essa qualificação a condições muito restritas.

374
4.5.1 Natureza do conflito
Tanto o artigo 2º comum das quatro Convenções de Genebra, como o artigo 1º do Protocolo
Adicional I estabelecem os três pressupostos dos conflitos armados internacionais.
Embora em 1949, os Estados somente se encontravam dispostos a incluir em tal concepção o
enfrentamento entre Estados, em 1977 a irrupção da vontade da vida independente de um grande número
de Estados descolonizados determinou que também a luta dos povos por sua autodeterminação também
fosse considerada como um conflito armado internacional.
O que ocorre em um processo de descolonização é certamente o confronto entre as duas nações
distintas dentro das quais a estatalidade de uma impede esse caráter na outra.
Um fator que influenciou fortemente esta inclusão tem a ver com o princípio da autodeterminação
dos povos, que já tinha sido expressado em 1960, na Assembleia Geral da ONU, com a "Declaração sobre
a concessão de independência aos países e povos coloniais".
Convém salientar que o verdadeiro critério identificador dos conflitos armados internacionais é a
qualificação dos sujeitos que se enfrentam. Isso deve ser levado em conta mais do que o âmbito territorial
ou a prolongação do conflito no tempo.
Desta forma, em conformidade com o DICA, são três as situações em que deve ser aplicado o
regime jurídico de Conflito Armado Internacional:

- No confronto entre dois ou mais Estados (seja quando há declaração de guerra ou mesmo quando não é
reconhecida).
- Nos casos de ocupação parcial ou total do território de uma das Altas Partes Contratantes, ainda que não
haja resistência militar.
- Na luta de um povo contra a dominação colonial, ocupação estrangeira ou regimes racistas, no exercício
do direito à AUTODETERMINAÇÃO.

4.5.2 Os sujeitos ativos e passivos


Normas de conflitos armados internacionais são destinadas basicamente aos Estados ou
Movimentos de Libertação Nacional (MLN), no âmbito de um conflito contra uma dominação colonial,
racista ou estrangeira.
Nesse sentido, os Estados são os principais destinatários das disposições do DICA. Eles são
vinculados por elas e incorrerem em responsabilidade internacional por seu descumprimento.
Já os Movimentos de Libertação Nacional que exercem o direito à autodeterminação, mesmo que
eles não tenham assinado estas disposições também devem observância ao DICA, na medida em que o
âmbito subjetivo das normas os envolve diretamente.
No entanto, merece ser sempre lembrado que no âmbito de um conflito armado internacional
também poderá ocorrer a presença das instituições internacionais, realizando MISSÕES DE
INTERPOSIÇÃO (como, por exemplo, as forças de paz das Nações Unidas) ou trabalho de assistência

375
humanitária (como, por exemplo, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha). É necessário, especialmente
no primeiro caso, que essas organizações também estejam comprometidas com as regras do DICA.
A este respeito, a ONU firmou um compromisso, por meio de Boletim do Secretário Geral,
segundo o qual os contingentes dos capacetes azuis e a própria organização, em última análise, são
obrigados a respeitar as regras do DICA, no contexto dos conflitos em que atuem.
Finalmente, quaisquer indivíduos devem também cumprir com as disposições do DICA. Nessa
medida, o seu descumprimento não só cria responsabilidade para o Estado a qual pertencem, como
também para eles mesmos, individualmente considerados, por meio de um sistema punitivo.
Em suma, todos aqueles que podem participar de um conflito armado internacional se encontram
obrigados a cumprir as normas humanitárias.
Cabe citar um aspecto particular deste tipo de conflito, que é a presença das potências protetoras
com a finalidade de auxiliar as partes no cumprimento de suas obrigações.
Potência protetora é aquele Estado neutro no conflito, responsável pela salvaguarda dos interesses
das partes beligerantes no país inimigo e, em particular, de velar pela aplicação das Convenções.
Essa possibilidade tem longa data no DICA, remetendo-se ao século XVI, contudo foi somente no
século XX que adquiriu grande importância.
Em 1949, o instituto das potências protetoras foi previsto em todas as Convenções de Genebra,
com algumas peculiaridades, inclusive instituindo um procedimento para a sua substituição para quando
sua designação não seja possível.
Um exemplo de seu uso foi em 1982, durante o conflito entre o Reino Unido e Argentina, no
Atlântico Sul. A Argentina designou o Brasil para representar os seus interesses junto ao Reino Unido, e o
Reino Unido designou a Suíça para atuar como seu representante junto à Argentina.
Também há a possibilidade de se nomear um substituto às potências protetoras, que pode ser o
CICV, desde que ratifique todas as garantias de imparcialidade e eficácia.
Do ponto de vista passivo, são sujeitos beneficiários das regras de DICA tanto as pessoas que não
participam diretamente das hostilidades, como as que participam e devem ser preservadas de danos ou
sofrimentos desnecessários.
O significado de pessoas não envolvidas diretamente nas hostilidades inclui: civis, membros das
Forças Armadas que tenham deposto suas armas e pessoas colocadas fora de combate por doença,
ferimento, detenção ou qualquer outra causa.
Além disso, o DICA também fornece proteção aos próprios contendores. Neste caso, trata-se de
conciliar a necessidade militar com o princípio da humanidade, como, por exemplo, a proibição de danos
desnecessários ao adversário, ou seja, o dano que ultrapassa a necessidade militar, como o uso de armas
laser, entre outras.
Em termos de responsabilidade pelo cumprimento destas disposições, corresponde ao Estado a
obrigação de garantir a observância das normas.
Como exemplo, no caso de ocupação é a potência ocupante que deverá restabelecer e garantir a

376
ordem pública e a segurança no território ocupado sob a sua autoridade. Caberá aos comandantes
militares no terreno a prevenção e repressão aos atos que vão contra os direitos das pessoas que estão sob
o seu controle ou submetidas a sua autoridade.

4.5.3 Aplicação em razão do tempo


Para estudar esse critério, cabe uma remissão ao processo judicial contra Dusko TADIC, relativo à
violação de normas do DICA durante o conflito na ex-Iugoslávia, que definiu bases para o Direito Penal
Internacional.
No caso TADIC, o julgamento pelo Tribunal Penal para a ex-Iugoslávia, em 1997, observou que o
alcance geográfico e temporal de um conflito armado se estende para além do tempo e lugar exatos das
hostilidades. Esta afirmação é importante, tomando-se em conta que as regras existentes não prevêem
nada específico sobre o assunto.
Este precedente deu ensejo à possibilidade jurídica de que ocorrendo situações de guerra
envolvendo conflitos armados que não estejam regulamentadas pelas Convenções e Tratados de Direito
Internacional Humanitário, sejam punidos, tendo com base principiológica a “Cláusula Martens”, a qual
estabelece um caráter universal nas condutas de guerra que ofendem os princípios de Direito
Internacional, usos e costumes das nações civilizadas, leis da humanidade e as exigências da consciência
pública pelo bem comum.
Dessa perspectiva temporal e compreendendo que o conflito armado implica necessariamente
violência armada, a aplicação do DICA começa com o início das hostilidades (e não com a ameaça de
fazê-lo) e termina após a cessação das hostilidades, quando são concluídas as operações militares, ou a
ocupação beligerante, se existir.
Ainda há uma aplicação extensiva no tempo, que impede de deixar desprotegidas as pessoas
envolvidas em um conflito armado, mesmo quando este, em termos gerais, pode estar terminado. Este
tema é bem relevante! Foi o caso dos prisioneiros do conflito entre Irã e Iraque (ocorrido entre 1980-
1988) que levaram mais de dez anos para serem repatriados.
Na verdade, desde o início daquele conflito, o CICV supervisionou a repatriação de mais de
97.000 prisioneiros de guerra em ambos os lados e continuou esse trabalho por meio do diálogo com
esses Estados, lembrando-lhes de suas obrigações.
Outra situação ocorreu no âmbito do conflito no Saara Ocidental, da Frente Polisário e as
autoridades marroquinas, que durou 14 anos (entre 1975-1989), no qual existiram prisioneiros de guerra
que somente foram repatriados em 2005, após mais de 15 anos em cativeiro.

4.5.4 Aplicação em razão do lugar


Na verdade, não se encontra nenhuma disposição específica do DICA, em termos de aplicação no
âmbito espacial.
Portanto, mais uma vez, o entendimento firmado pelo Tribunal Penal para a antiga ex-Iugoslávia

377
merece ser destacado e tem efeitos na medida em que se entende que o âmbito de aplicação espacial da
norma depende mais do seu próprio conteúdo. Ou seja, a sua aplicação do DICA pode ser conectada
diretamente ao restrito espaço geográfico em que são desenvolvidas as hostilidades (por exemplo,
disposições específicas sobre a condução das operações na zona de combate), mas também pode se referir
a todo o território da parte em conflito (como o regime dos prisioneiros, onde quer que eles se encontrem,
ou a população civil em poder do inimigo, na zona do interior).
Em qualquer caso, na ocorrência de um conflito armado internacional, a aplicação do DICA se
estende, por definição, a todo o território dos Estados em conflito.

4.5.5 Estados Neutros


O Direito da Neutralidade regulamenta as relações jurídicas entre os Estados beligerantes e
aqueles que não participam de tais hostilidades, chamados de Estados neutros. O Direito da Neutralidade
serve para delimitar a guerra, restringir sua condução nos diferentes espaços geográficos (mar, terra e ar),
e reduzir o impacto do conflito sobre o comércio internacional.
Desenvolvido em uma época em que os Estados costumeiramente emitiam declarações de guerra
antes de se engajarem em hostilidades, o Direito da Neutralidade, corresponde a uma situação jurídica de
Direito Internacional.
O costume internacional faculta a todos os Estados a opção de evitar tomar parte em conflito
armado por meio de declaração de neutralidade ou pela assunção da condição de neutralidade. O DICA
impõe deveres e confere direitos aos Estados neutros e aos beligerantes. O principal direito do Estado
neutro é o da inviolabilidade; seus principais deveres são a abstenção e a imparcialidade.
Por outro lado, o dever do beligerante é o de respeitar o Estado neutro, e é seu direito, insistir na
observância da abstenção e da imparcialidade por parte desse Estado. A condição de neutralidade, uma
vez estabelecida, permanece em vigor, a menos que o Estado neutro abandone sua postura e venha a
participar do conflito.
A neutralidade é a característica de um Estado que, formalmente, não seja Parte em determinado
conflito armado. Tal Estado é denominado “Estado Neutro”. O Direito da Neutralidade está disciplinado
nas Convenções de Genebra de 1949, nas Convenções de Haia e nos Protocolos Adicionais às
Convenções de Genebra de 1977. O estatuto legal de um Estado Neutro não requer uma declaração
formal pelo próprio país nem por outros Estados ou Partes, sejam elas ou não Partes beligerantes.
Os países neutros devem:

- assegurar o respeito pela sua neutralidade;


- tratar os Estados beligerantes de maneira igual; e
- opor-se, se for necessário, pelo uso da força, a qualquer violação da sua neutralidade.

Os países neutros podem tomar as seguintes medidas, desde que sejam aplicadas de modo

378
imparcial e notificadas às Partes beligerantes opostas:

- proibir a exportação ou trânsito de material militar a favor de uma Parte beligerante;


- proibir ou restringir o uso de telecomunicações pelas Partes beligerantes; e
- regulamentar o acesso ao território neutro. Estas medidas deverão aplicar-se de modo imparcial e serem
notificadas às Partes beligerantes opostas.

Perceba que a Lei da Neutralidade não proíbe Estados neutros de comerciar com Estados
beligerantes. Contudo, um governo neutro não pode fornecer suprimentos e materiais bélicos para um
beligerante sem que viole seus deveres de imparcialidade, correndo o risco de perder sua condição de
neutralidade.
O território nacional dos Estados Neutros é inviolável, e compreende:

- o território nacional;
- as águas territoriais; e
- o espaço aéreo nacional.

Os Estados Neutros podem autorizar, temporariamente, a passagem através de seu território de


feridos e doentes beligerantes. Para tanto, serão tomadas as medidas necessárias de segurança e controle.
A mera passagem de um navio de guerra das Partes beligerantes por águas territoriais de um país
neutro não afetará a neutralidade deste último. Essa passagem compreenderá as paradas habituais da
navegação e as provocadas por alguma emergência que afete a segurança do navio.
Os navios de guerra de uma das Partes beligerantes poderão ser admitidos num porto neutro para
reparações, abastecimento de víveres ou de combustível. A permanência do navio no porto não deverá
exceder 24 horas, exceto no caso de ter sofrido danos ou no caso de mau tempo.
A menos que o Estado neutro tenha adotado leis ou regulamentos em contrário, não mais do que
três navios de guerra de qualquer Estado beligerante podem estar presentes em porto ou baías neutros em
um mesmo instante. Quando navios de guerra de Estados beligerantes que se opõem estão presentes no
mesmo porto ou baías neutros, deve ser estabelecido um intervalo não inferior a 24 horas entre a partida
dos navios inimigos. A ordem de partida é determinada pela ordem de chegada, a não ser que uma
extensão da estadia seja concedida.
A neutralidade se estende ao espaço aéreo sobrejacente ao território, águas interiores, ao mar
territorial e águas arquipelágicas de um Estado neutro. Os aviões das Partes beligerantes respeitarão as
restrições impostas pelo Estado Neutro para uso do seu espaço aéreo e deverão também obedecer a
qualquer ordem para aterrar.
Os aviões militares de uma Parte beligerante poderão ser autorizados a aterrar em território neutro
em caso de impossibilidade de prosseguimento do voo.

379
VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos aquela pausa agora para testar o seu aprendizado na aula de hoje. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) Mesmo nos casos de ocupação parcial ou total do território em que não haja resistência militar,
será adotado o regime jurídico de Conflito Armado Internacional.

2) ( ) O descumprimento das disposições do DICA cria a responsabilidade para o Estado, mas também
para as pessoas envolvidas, individualmente consideradas, por meio de um sistema punitivo.

3) ( ) O alcance geográfico e temporal de um conflito armado internacional se estende para além do


tempo e lugar exatos das hostilidades.

4) ( ) A aplicação do DICA se estende a todo o Teatro de Operações.

5) ( ) A passagem de um navio de guerra de uma das Partes beligerantes por águas territoriais de um país
neutro compromete a sua neutralidade.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

6) Sobre o Direito da Neutralidade, podemos afirmar que:

(A) a passagem de um navio de guerra das Partes beligerantes por águas territoriais de um país neutro afeta sua
neutralidade.

(B) a Lei da Neutralidade proíbe os Estados neutros de comerciar com Estados beligerantes.

(C) a neutralidade não se estende ao espaço aéreo sobrejacente ao território.

(D) o território nacional dos Estados Neutros é inviolável.


(E) os navios de guerra de uma das Partes beligerantes não poderão ser admitidos num porto neutro.

380
GABARITO:
QUESTÃ RESPOSTA
O
1 C
2 C
3 C
4 E
5 E
6 D

RECADO FINAL:

Nesta aula, descrevemos o Conflito Armado Internacional (CAI), falamos da natureza do conflito,
com os sujeitos ativo e passivo, bem como a sua aplicação em razão do tempo e do lugar. Descrevemos
também as disposições que regem o Estado Neutro.
Na próxima aula, estudaremos os âmbitos de aplicação do DICA em conflitos armados não
internacionais (CANI).
Dito isto...
Até a próxima aula!

381
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Em nossa última aula, falamos bastante sobre os conflitos armados internacionais. Mas, nem só
desses conflitos vive o Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA). Será que todos os conflitos
armados são gerados por dois Estados?
De certo que não!
Mas, como ficam aqueles conflitos internos? As tão famigeradas guerras civis. A propósito, será
este o termo mais apropriado para chamar estes conflitos?
Estas e outras perguntas começarão a serem respondidas nesta aula.
Vamos lá!?

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever o Conflito Armado Não Internacional;
- Citar a natureza do conflito;
- Citar os sujeitos ativo e passivo do conflito;
- Explicar a aplicação em razão do tempo; e
- Aplicação em razão do lugar.

4.8 CONFLITO ARMADO NÃO INTERNACIONAL (CANI)


Com relação aos conflitos armados não internacionais (CANI) – também chamados de conflitos
armados internos, ou conflitos armados sem caráter internacional ou, ainda, utilizando outra terminologia
obsoleta, guerras civis – tradicionalmente, estes eram considerados questões internas dos Estados e, com
isso, os dispositivos de Direito Internacional não eram aplicados. Essa visão foi radicalmente modificada
com a adoção do Artigo 3º comum às quatro Convenções de Genebra de 1949.
Com a adoção desse dispositivo, pela primeira vez, a comunidade de Estados concordou com um
conjunto mínimo de garantias a serem respeitadas durante conflitos armados não internacionais.
Apesar de sua extrema relevância, o Artigo 3º não oferece uma clara definição do que é conflito
armado não internacional, pois o artigo prevê que é aplicável “no caso de conflito armado que não
apresente um caráter internacional e que ocorra no território de uma das Altas Potências contratantes”.
Durante a Conferência Diplomática que levou à adoção dos Protocolos Adicionais de 1977,
registrou-se a necessidade de uma definição mais abrangente para a noção de conflito armado não
internacional, o que foi reafirmado no Artigo 2º do Protocolo Adicional II.
De acordo com este dispositivo legal, o Protocolo II é aplicado “a todos os conflitos armados que
não estão cobertos pelo Artigo 1º do Protocolo I, e que se desenvolvam em território de uma Alta Parte
Contratante, entre as suas forças armadas e forças armadas dissidentes ou grupos armados organizados
que, sob a chefia de um comando responsável, exerçam sobre uma parte do seu território um controle tal,
que lhes permita levar a cabo operações militares contínuas e organizadas, e aplicar o presente

382
Protocolo”.
Essa definição restritiva se aplica apenas às situações cobertas pelo Protocolo Adicional II. A
definição não é aplicável às situações cobertas pelo Artigo 3º comum às quatro Convenções de Genebra,
que possui um alcance mais abrangente.
Na prática, há, portanto, situações de conflitos armados não internacionais, nas quais somente o
Artigo 3º se aplica, já que o nível de organização e atuação dos dissidentes é insuficiente para a aplicação
do Protocolo II.
O Artigo 3º comum às Convenções de Genebra de 1949 é a norma mais básica aplicável aos
conflitos armados não internacionais. Na essência, é um resumo dos mais importantes preceitos com
aplicação em todos os conflitos armados.
Sempre que um grupo armado tenha atingido um grau mínimo de controle sobre um território,
além dos outros instrumentos já mencionados, aplica-se o Protocolo II adicional às Convenções de
Genebra, que desenvolve e complementa o Artigo 3º Comum. O Protocolo Adicional II contém, em
particular:

- uma lista abrangente dos direitos e proteções básicos;


- normas precisas com relação às pessoas cuja liberdade foi restringida;
- normas relativas ao processo e punição de infrações criminais ligadas a conflitos armados internos,
incluindo uma convocação para uma ampla anistia quando terminam as hostilidades;
- normas mais detalhadas sobre os feridos, doentes e náufragos, e as unidades de transporte e pessoal
médico; e
- normas mais precisas sobre a proteção da população civil, incluindo a proibição do deslocamento
forçado de civis, a não ser que a segurança dos civis envolvidos determinem esse deslocamento, ou que
razões militares imperiosas o exijam.

Essas obrigações positivadas são complementadas pelo direito consuetudinário, que provém de
uma prática geral costumeira aceita como direito. O direito interno e o Direito Internacional dos Direitos
Humanos, se necessário com revogações, aplicam-se aos conflitos armados não internacionais (para as
pessoas presas ou detidas, por exemplo).
As revogações dos direitos humanos devem ser compatíveis com as obrigações do Estado em
questão e devem estar de acordo com o Direito Internacional dos Conflitos Armados.
Um conflito armado interno pode envolver as Forças Armadas de um ou vários Estados
estrangeiros. Esses Estados podem intervir, seja enviando suas próprias forças ao conflito ou exercendo o
controle total sobre as forças locais.
Contudo, não é suficiente observar que um conflito armado tem intervenções estrangeiras para
determinar qual direito se aplica. Precisam ser consideradas as relações entre o governo local, os
insurgentes e o Estado estrangeiro que intervém. Por exemplo:

383
1) A relação entre o governo local e os insurgentes é regida pelo Direito Internacional aplicável aos
conflitos armados não internacionais.
2) A relação entre os insurgentes e um Estado estrangeiro que intervém em favor do governo local
também é regida pelo Direito Internacional aplicável aos conflitos armados não internacionais.
3) Agora, a relação entre o governo local e um Estado estrangeiro que intervém em favor dos insurgentes
é regida pelo Direito Internacional aplicável aos conflitos armados internacionais.

Cabe reforçar que o DICA não é aplicável a situações de violência e tensões internas. Este ponto
está claro no artigo 1º, item 2 do Protocolo Adicional II, segundo o qual: “O Protocolo não se aplica a
situações de tensão e de perturbação internas, tais como motins, atos de violência isolados e esporádicos
e outros atos análogos, que não são considerados como conflitos armados”.
Merece ser ressaltado que o artigo 3º comum às Convenções de Genebra faz menção à
participação “direta” ou “ativa” nas hostilidades e essa noção é encontrada em muitas normas do Direito
Internacional dos Conflitos Armados, e tem sido objeto de diversas interpretações.
A participação direta de civis nas hostilidades implica a perda de imunidade de ataque durante a
vigência desta participação e também pode sujeitá-los, em caso de captura, a processo judicial de acordo
com a legislação interna do Estado detentor.
Apesar das sérias consequências de ordem jurídica, nem as Convenções de Genebra nem seus
Protocolos Adicionais incluem uma definição do que significa “participar ativamente das hostilidades” e
como esta conduta deve ser diferenciada de uma participação “indireta”.
Uma dificuldade adicional diz respeito à precisão da duração da participação direta e sobre quando
começam os preparativos concretos para um ataque ou quando termina o combate.
Os conflitos contemporâneos provocam mais desafios em termos de definição e implementação da
noção de “participação direta nas hostilidades”.
O uso de uma tecnologia
sofisticada de emprego bélico
(incluindo o aproveitamento e o
ataque a redes de computadores –
cyberataques), a transferência de
funções tradicionalmente militares
para contratistas e empresas
privadas e a “luta contra o
terrorismo”, entre outros fatores,
mostram a crescente fusão entre as
atividades civis e militares, o que
torna mais difícil determinar quem está “participando diretamente das hostilidades” e quais as medidas
que deveriam ser tomadas para proteger aqueles que não estão participando diretamente.

384
4.6.1 Natureza do conflito
O conflito armado não internacional (CANI) é regulamentado expressamente pelo Artigo 3º
comum às Convenções de Genebra e pelo Protocolo Adicional II, de acordo com a intensidade do
conflito. No entanto, nenhuma dessas disposições normativas propõe a definição do que seja um CANI.
Na verdade, o artigo 3º comum se limita a estabelecer obrigações que as partes devem seguir em
caso de conflito armado sem caráter internacional. O texto do Artigo 3º comum não contém uma
definição de conflito armado não internacional. Não obstante, limita-se a apontar a existência do conflito
como uma exigência para a autoaplicação.
Isso pode ser entendido como uma opção intencional de redação que facilitou a regulamentação
sobre conflitos armados internos, que se encontravam tradicionalmente tratados como assunto ligado
unicamente à soberania dos Estados.

Já o Protocolo Adicional II, mais precisamente, estabeleceu em seu artigo 1º as condições para sua
aplicação. Ou seja, uma lista de requisitos que caracterizam um conflito armado não internacional de
maior intensidade.

385
Em qualquer caso, a existência de um conflito armado não internacional vai depender da presença
de uma série de elementos, dado que é uma situação de fato e não somente uma qualificação jurídica.
Não obstante, Estados são relutantes em reconhecer a existência de um conflito armado não
internacional, por uma série de razões, como o receio da interferência externa, o evidenciamento de
fraqueza da sua própria administração civil e militar e o suposto protagonismo endêmico dos movimentos
internos, rebeliões e insurgências. Além disso, o próprio questionamento da autoridade estatal significa
por si uma repulsa, pois certamente implica uma "impotência momentânea” do Estado em manter a ordem
interna.
Na ausência de uma definição normativa, tanto a doutrina e a jurisprudência trataram de construir
uma definição com base nos elementos que configuram um conflito armado não internacional. É assim
que a doutrina tem apontado entre as características desse tipo de conflito:

- as partes no conflito não são Estados;


- os confrontos armados são realizados no território de um Estado;
- as hostilidades notórias devem ter um mínimo de organização; e
- e os confrontos armados devem ter certa intensidade.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos em seu relatório nº 55/97 apontou que:

O conceito de conflito interno exige, em princípio, que existam grupos armados que são
capazes de combater, e que de fato o façam, e de participar em outras ações militares
recíprocas, e que de fato também o façam.
O Artigo 3º comum claramente faz referência a este ponto, mas na realidade não define
conflito armado nãointernacional. No entanto, em geral se entende que o Artigo 3º comum
se aplica a confrontos armados notórios e de baixa intensidade entre as forças armadas ou
grupos relativamente organizados, que ocorrem dentro do território de um Estado
particular.

Em relação a este caso, referente ao episódio do ataque ao quartel de La Tablada, na Argentina,


em 1989, deve-se levar em conta que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos qualificou como
conflito armado não internacional o confronto entre as Forças Armadas argentinas e grupos de civis que
haviam pegado em armas (e assim adotaram o papel dos contendores e, portanto, tinham se convertido em
objetivos militares legítimos) em um lapso de aproximadamente trinta horas, entre 23 e 24 de janeiro de
1989.

4.6.2 Os sujeitos ativos e passivos


As obrigações impostas pelo DICA em conflitos armados internos, e em particular o artigo 3º
comum, destinam-se a cada uma das partes conflitantes e não exclusivamente ao Estado, como
eventualmente poderia ser no caso dos Direitos Humanos.

386
Ou seja, o grupo armado
(mesmo em sua luta com outros
grupos e não apenas contra o
Estado) encontra-se obrigado a
cumprir essas normas. Portanto, a
sua observância é totalmente
exigível.
Agora, nas regras que
regulam o conflito armado não
internacional encontramos alusão
à expressão “participação direta
nas hostilidades”, seja pelas Forças Armadas do Estado, ou pelas forças armadas dissidentes ou qualquer
outro grupo armado.
Esta participação direta nas hostilidades está referida aos atos destinados a causar dano real e
material ao inimigo, e implica nexo direto de causa e efeito entre a atividade exercida e as ações
desferidas contra o inimigo, no momento e no local onde essa atividade é exercida.
Assim, por exemplo, quando os civis portam armas ou outros meios para cometer atos de violência
contra os beligerantes ou materiais das forças inimigas, entende-se que participam diretamente das
hostilidades.
No entanto, se eles fornecem alimentos e abrigo para aqueles que lutam e são solidários com eles,
em geral não parece motivo suficiente para negar a proteção, especialmente porque isto ocorre sob grave
ameaça. Não se trata como participação direta nas hostilidades.
Enfim, como se pode concluir, o leque de possibilidades no que se refere à interpretação do que é
a participação direta nas hostilidades é extremamente amplo.
Cabe ainda ressaltar que as regras devem ser seguidas por todas as partes envolvidas no conflito
armado não internacional. As vítimas do conflito devem ser protegidas seja pelas Formas Armadas
estatais ou pelos grupos armados.
Nos conflitos da Somália, Bósnia-Herzegovina, Libéria, Cambodja, Angola, Ruanda, entre outros,
o Conselho de Segurança da ONU, quando se dirigia aos contendores, alcançava diretamente todas as
forças, movimentos de libertação e a todas as facções, ou seja, a todas as partes, para, por exemplo,
facilitarem o deslocamento da assistência humanitária às vítimas.
As violações do DICA podem ser cometidas por qualquer pessoa (ou grupo de pessoas), ou seja,
os eventuais autores de infrações não precisam reunir alguma condição especial, uma vez que o cerne da
questão é proibir atos atentatórios aos princípios essenciais da humanidade. Desta forma, podem ser
considerados infratores tanto aqueles que enfrentam o Estado como os que agem em nome dele, como os
militares.

387
O Tribunal Penal para Ruanda compreendeu que parte da população civil ou pessoas que não
participam diretamente das hostilidades também podem cometer violações do Direito Internacional dos
Conflitos Armados (Ministério Público vs. Akayesu, caso n.° ICTR-96-4-T, acórdão de 2 de setembro de
1998, parágrafos 630-634, em que há condenação de uma pessoa que não tormava parte das Forças
Armadas ruandesas por violações do artigo 3º comum e o Protocolo Adicional II).
Convém assinalar que não existe no âmbito dos conflitos armados não internacionais regras para a
utilização da expressão “combatente”, que deve se referir àqueles que tomam parte nas hostilidades.
O direito de combater não se aplica, de nenhuma forma, aos rebeldes ou insurgentes que se
levantam em armas contra um governo, no interior do território de um Estado, porque eles serão
considerados, em princípio, como criminosos e podem, portanto, ser julgados como tais, segundo os
ditames do direito interno. Não é reconhecido no âmbito de um conflito armado não internacional
qualquer imunidade jurídica especial ou o estatuto de prisioneiro de guerra para aqueles que são presos
durante o confronto.
Em relação aos sujeitos passivos destas violações, não estamos propriamente diante do que se
denomina estatuto de pessoas protegidas, como se aplica nos casos de conflitos armados internacionais.
No caso de conflitos armados não internacionais, seguindo as disposições do artigo 3º comum, a
referência protetiva geral que se faz é a todas as pessoa que “não participam diretamente das
hostilidades”.

4.6.3 Aplicação em razão do tempo


Quanto ao âmbito temporal, deve ser ressaltado que estas regras se aplicam desde a abertura ou o
início das hostilidades e terminam com a cessação das hostilidades e até que seja restaurada a paz. No
entanto, sua aplicação se manterá, ainda que o conflito haja terminado, se existirem vítimas detidas por
razões relacionadas com o conflito.
Assim, o âmbito temporal destas regras claramente excede o tempo das hostilidades propriamente
ditas. Sua aplicação cessa, no território das Partes no conflito, no fim geral das operações militares e, no
caso dos territórios ocupados, no fim da ocupação, salvo nos dois casos, para as categorias de pessoas
cuja libertação definitiva, repatriamento ou estabelecimento tenham lugar posteriormente. Estas pessoas
continuam a beneficiar das disposições pertinentes das Convenções e do presente Protocolo até à sua
libertação definitiva, repatriamento ou estabelecimento.

4.6.4 Aplicação em razão do lugar


Não se encontram disposições específicas relativas ao âmbito de aplicação espacial do DICA. No
entanto, a jurisprudência do Tribunal Penal para a antiga Iugoslávia assinalou que aplicação espacial da
norma depende do conteúdo da própria norma, ou seja, que a sua aplicação pode ser conectada
diretamente ao espaço geográfico em que são desenvolvidas as hostilidades (por exemplo, disposições
sobre a condução das hostilidades), mas também pode se referir a todo o território da parte em conflito

388
(como o regulamento da população civil nas mãos do inimigo).
Por fim, cabe mencionar que se a situação equivale a um CANI, aplicam-se disposições
normativas nacionais e também o Direito Internacional dos Conflitos Armados. Não existe, portanto,
substituição da lei nacional pelo DICA, mas sim uma aplicação simultânea, o que significa o
reconhecimento expresso por todos os Estados de que a autoridade estatal, para restaurar a lei e a ordem,
tem um limite. Os Estados não são livres para tratar seus cidadãos de qualquer maneira durante um
período de CANI nem podem dispor de meios ilimitados para sufocar uma rebelião.
Em síntese, no âmbito de um CANI, segue-se aplicando o direito interno, mas também as regras
do DICA. Estas, como vimos, apontam os limites do confronto (ou seja, as condutas não permitidas nem
mesmo no contexto de um conflito).
Elas não são destinadas a legitimar o grupo que se levanta em armas nem a restringir o poder
punitivo do Estado, que tem o dever fundamental de preservar a ordem pública e a unidade nacional.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos fazer agora uma pequena pausa nos nossos estudos para verificar o que você já aprendeu
até aqui. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O DICA é aplicável a situações de violência e tensões internas.

2) ( ) Em um conflito armado não internacional, as partes no conflito não são Estados.

3) ( ) Aplica-se, sem qualquer restrição, o direito de combater aos rebeldes ou insurgentes que se
levantam em armas contra um governo, no interior do território de um Estado.

389
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

4) Em relação às pessoas sujeitas aos dispositivos relativos aos conflitos armados não internacionais,
podemos afirmar que:

(A) é reconhecida a aplicação do estatuto de prisioneiro de guerra para aqueles que são presos durante o
confronto.

(B) podem ser considerados infratores tanto aqueles que enfrentam o Estado como os que agem em nome
dele, como os militares.

(C) o direito de combater se aplica aos rebeldes ou insurgentes que se levantam em armas contra um
governo, no interior do território de um Estado.

(D) se utiliza a expressão “combatente” para se referir àqueles que tomam parte nas hostilidades.

(E) as obrigações impostas se destinam exclusivamente ao Estado em conflito e não aos grupos armados.

GABARITO:

QUESTÃO RESPOSTA
1 E
2 C
3 E
4 B

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na aula anterior, vimos as disposições que regem os conflitos armados internacionais. Já nesta
aula, expusemos os dispositivos referentes aos conflitos armados não internacionais, abordando as
diferenças e peculiaridades inerentes a cada caso.
Na próxima aula, trataremos de algumas nuances do desenvolvimento dos conflitos em âmbito
marítimo e aéreo. Nossa matéria já começa a se encaminhar para o fim...
Dito isto...
Até a próxima aula!

390
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Continuemos a nossa epopeia através dos meândros do DICA.
Nas últimas aulas, falamos dos conflitos armados, tanto internacionais, quanto os não
internacionais. Nesta aula, nós trataremos de algumas peculiaridades do desenvolvimento destes conflitos
em âmbito marítimo e aéreo.
Partiu feroz!

Objetivos da Aprendizagem:
- Citar as Zonas de Guerra Naval;
- Conceituar Passagem Inocente;
- Citar as imunidades referentes à guerra no mar;
- Conceituar bloqueio;
- Conceituar Zonas de Exclusão; e
- Descrever a Guerra no Ar.

INTRODUÇÃO:
O DICA determina que somente objetivos de importância militar devem ser atacados, e ainda
permite a concentração de meios necessários para destruir esses objetivos. Ao mesmo tempo, prevê que a
destruição desnecessária deve ser evitada, na medida do possível, e deve ser consistente com o
cumprimento da missão e a segurança da força envolvida, devendo ser evitado o sofrimento humano
desnecessário.

E é sob esta ótica que hoje analisaremos algumas peculiaridades da guerra no mar e no ar.

4.7 GUERRA NO MAR


São consideradas Zonas de Guerra Naval:

- as águas interiores, águas territoriais, Zona


Econômica Exclusiva (ZEE) e plataforma continental
dos Estados beligerantes;
- o alto mar; e
- a ZEE e a plataforma continental, excluindo-se o
mar territorial, dos Estados neutros, respeitados os
direitos de exploração dos recursos econômicos em
tais áreas devidos a estes Estados.

391
É proibido às Forças beligerantes operarem no mar territorial ou do espaço aéreo dos Estados
neutros.

4.7.1 Passagem Inocente


É permitido o direito de passagem inocente dos beligerantes.
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) estabelece o significado
de passagem inocente, aplicável à navegação pelo mar territorial quando executada com o propósito
de:

- atravessar esse mar sem penetrar nas águas interiores ou fazer escala em um ancoradouro ou
instalação portuária situada fora das águas interiores; ou
- dirigir-se para as águas interiores, ou delas sair, ou fazer escala num desses ancoradouros ou
instalações portuárias.

A passagem deverá ser contínua e rápida. Ela compreende, ainda, o parar e o fundear, mas
apenas na medida em que estes constituam incidentes comuns de navegação ou tenham sido
impostos por motivo de força maior ou dificuldade grave, ou tenham por fim prestar auxílio a
pessoas, navios ou aeronaves em perigo ou em dificuldade grave.
A passagem será inocente na medida em que não seja prejudicial à paz, à ordem e à
segurança do Estado costeiro.

4.7.2 Imunidades
Embarcações que gozam de imunidade contra ataques:

- navios-hospital;
- embarcações costeiras de salvamento e outros meios de transporte sanitário;
- navios que possuam salvo-conduto em virtude de acordo entre as partes beligerantes, como navios
para o transporte de prisioneiros de guerra e os que cumpram missões humanitárias;
- navios empregados no transporte de bens culturais sob proteção especial;
- navios de passageiros, quando transportando somente passageiros civis;
- navios destinados a missões religiosas, filantrópicas ou científicas de caráter não militar;
- pequenos barcos pesqueiros;
- embarcações empregadas no combate à poluição marinha;
- navios que hajam se rendido; e
- balsas e botes salva-vidas.

392
Navios mercantes inimigos só poderão ser atacados se forem classificados como objetivo
militar.

4.7.3 Bloqueio e Zonas de Exclusão


Bloqueio é uma operação beligerante que tem por finalidade evitar que navios e aeronaves de
todos os Estados, inimigos e neutros, entrem ou saiam de específicos portos, aeroportos e áreas
costeiras pertencentes, ocupadas, ou sob controle de um Estado inimigo.
As regras tradicionais de bloqueio são, em sua maior parte, originadas do costume, tendo sua
forma definitiva derivada da prática exercida pelas potências marítimas do século XIX. As regras
refletem um balanço entre o direito do beligerante, que exerce o efetivo domínio do mar de fechar
portos e linhas de comunicação marítimas do inimigo ao comércio internacional, e o direito dos
Estados neutros em conduzirem o comércio neutro com a menor interferência possível de forças
beligerantes.
O direito ao bloqueio é, portanto, baseado em um sistema de controle projetado para limitar a
interferência com o comércio neutro. Tradicionalmente, isso era cumprido com o estabelecimento de
um “cordão” formado por navios de guerra de superfície posicionados nas vizinhanças da área
bloqueada.
O propósito de um beligerante em estabelecer um bloqueio é negar ao inimigo o uso de
navios e aeronaves, inimigos e neutros, assim como de transportar pessoal e material para o território
inimigo. Enquanto o direito beligerante de visita e inspeção visa a interditar o fluxo de contrabando,
o direito beligerante do bloqueio tem como propósito impedir que navios e aeronaves,
independentemente de suas cargas, cruzem um cordão, estabelecido e tornado público, que separa o
inimigo de águas ou espaço aéreo internacionais. Será estabelecido seguindo os critérios abaixo
relacionados:

- ser declarado pelo governo de uma nação envolvida em conflito armado internacional;
- serem notificadas todas as nações afetadas pela sua imposição. É também costumeira a notificação
da autoridade local da área bloqueada;
- uma vez que a informação do estabelecimento do bloqueio é um elemento essencial para o seu
exercício, os navios neutros e as aeronaves na iminência de descumpri-lo devem ser
obrigatoriamente notificados, e de forma efetiva;
- ser efetivo, mantido continuamente por forças de superfície, aéreas ou de submarinos, ou outros
meios, como os de minagem;
- ser imparcial, aplicável a todos os meios, de todas as nações. A discriminação em favor ou contra
os navios de nações em particular, incluindo os próprios ou de uma nação aliada, tornam o bloqueio
legalmente inválido; e
- não se deve bloquear o acesso ou a partida de portos ou costas de Estados neutros.

393
Os navios que tentarem violar um bloqueio, independente da carga que transportem, poderão
ser tomados como presas ou até mesmo atacados, caso ofereçam manifesta resistência à captura. A
passagem de navio ou aeronave através do bloqueio, sem autorização especial de entrada ou saída,
concedida pelo beligerante responsável pelo bloqueio é denominado furo de bloqueio.
Zonas de Exclusão são áreas marítimas notificadas internacionalmente pelas partes
beligerantes com o objetivo de conter a área geográfica do conflito, ou para manter o tráfego
mercante neutro a uma distância segura das áreas de hostilidades, efetivas ou potenciais.
O controle beligerante de uma área de operações navais é distinto da prática beligerante
conduzida durante as I e II Guerras Mundiais, de estabelecer largas faixas oceânicas como “zonas de
exclusão” e “zonas de guerra”, nas quais o tráfego mercante neutro era simplesmente barrado ou
colocado sob risco.
As zonas de guerra ou de exclusão estabelecidas pelos beligerantes de ambos os lados eram
baseadas no direito da represália contra alegados comportamentos ilegais do inimigo, e eram usadas
para justificar a captura, a destruição ou o exercício do controle sobre os navios mercantes neutros,
ações essas consideradas contrárias às regras da guerra naval.
No pós-guerra, zonas de guerra ou de exclusão estabelecidas por beligerantes no contexto de
guerra limitada, têm sido justificadas, pelo menos em parte, como medidas razoáveis, embora
coercitivas, para conter a área geográfica do conflito ou para manter o tráfego mercante neutro a uma
distância segura das áreas de hostilidades, efetivas ou potenciais.
Na medida em que tais zonas de guerra ou de exclusão sirvam para alertar navios mercantes e
aeronaves neutras para se afastarem das atividades beligerantes e assim reduzirem a exposição a
danos colaterais e incidentes, e desde que não interfiram com o legítimo comércio neutro, elas serão
indubitavelmente consideradas legais.
Contudo, o estabelecimento de tais zonas não dispensa o beligerante que as criou da
obrigação, de acordo com a lei do direito humanitário internacional, de se abster de atacar navios e
aeronaves que não constituam alvos legítimos. Em tal situação, uma plataforma protegida não perde
essa proteção por cruzar uma linha imaginária traçada no oceano por um beligerante.

4.8 GUERRA NO AR
O DICA aborda a guerra aérea quanto às hostilidades aéreas, incluindo as operações ar-solo,
tanto no Teatro de Operações (TO) terrestre como no marítimo.
Os bombardeios aéreos serão considerados legais se os alvos forem considerados objetivos
militares e se os ataques, caso produzam danos colaterais, estejam de acordo com os limites
aceitáveis dos princípios que norteiam o DICA.

394
O termo “bombardeio” se refere aos
bombardeios navais e aéreos de alvos inimigos em
terra, com armamento convencional lançados por
navios e aeronaves, aí incluídos canhões, foguetes,
mísseis e bombas.
O bombardeio de portos, cidades, habitações
ou edifícios é proibido. No entanto, um objetivo
militar existente em uma cidade, vila ou vilarejo
pode ser bombardeado, com o mínimo de perdas de vidas humanas e recursos materiais. As baixas
acidentais de civis ou o dano colateral a bens civis não devem ser excessivos, à luz da vantagem
militar a ser auferida pelo ataque.
O bombardeio com propósito exclusivo de aterrorizar a população civil é proibido.
Podemos definir dano colateral como sendo o dano ou a perda causada de maneira fortuita
durante um ataque, apesar de todas as precauções tomadas para evitar perdas de vidas humanas na
população civil, ferimentos nos civis ou danos em bens de caráter civil.
Diferentemente do dano colateral, o dano adicional diz respeito aos danos e perdas (bens e
pessoal) ocorridos no interior de uma área sob responsabilidade e controle da força adversa,
decorrentes dos efeitos de um ataque que deixou de atingir, de forma não intencional, o alvo
planejado.
Uma cidade ou vila localizada atrás das linhas inimigas não é, por definição, considerada
desprovida de defesa e nem cidade aberta. Alvos militares nesses locais podem ser destruídos por
bombardeio. No entanto, beligerantes são proibidos de bombardear cidades ou vilas desprovidas de
defesa e que estejam abertas à entrada das próprias forças ou forças aliadas. Uma zona que, por
comum acordo, seja considerada desmilitarizada também não pode ser bombardeada.
Estabelecimentos, unidades, veículos e equipamentos médicos não podem ser
deliberadamente bombardeados.
Os beligerantes devem procurar estabelecer suas instalações médicas afastadas de alvos
considerados militares, de modo que, na medida do possível, fiquem fora de perigo quando alvos
militares em suas vizinhanças forem atacados.
As instalações médicas poderão ser atacadas se forem utilizadas com fins militares
inconsistentes com a sua missão humanitária, e se desconsiderarem os alertas para o fato de que seu
uso continuado, para estes fins, implica a perda do status de proteção especial.
O símbolo médico e outros símbolos de proteção, como por exemplo, a Cruz Vermelha ou o
Crescente Vermelho, devem ser claramente indicados nos estabelecimentos e unidades médicas, de
modo a identificá-los como objetos sujeitos à proteção. Qualquer objeto reconhecido como
instalação médica não deve ser atacado, independentemente de apresentar, ou não, o símbolo
protetor.

395
Ao serem estabelecidas zonas hospitalares e zonas neutras, mediante acordo entre
beligerantes, elas ficam imunes a bombardeios, de acordo com os termos contidos no acordo.
Edificações dedicadas às atividades de caridade, religiosas e artísticas; monumentos
históricos; e outras instalações utilizadas para fins religiosos, culturais e de caridade não devem ser
bombardeados, desde que não sejam utilizados para fins militares. É responsabilidade dos habitantes
locais marcarem tais edificações e monumentos com o emblema distintivo da Convenção.
Represas, diques, açudes, usinas nucleares e outras instalações que, uma vez rompidas ou
destruídas, liberariam as águas retidas ou outras forças capazes de colocar em perigo a população
civil, não devem ser bombardeadas se o potencial para causar danos a não combatentes for excessivo
em relação à vantagem militar a ser obtida com o bombardeio. De maneira oposta, instalações com
tais características, que sejam utilizadas por beligerantes para proteger ou apoiar atividades militares,
não gozam de proteção semelhante.
Quando a situação militar permitir, os comandantes devem envidar esforços no sentido de
alertar à população civil, localizada nas proximidades do objetivo militar designado, da ocorrência
do bombardeio.
O alerta pode ser genérico, de modo que os meios empregados no bombardeio não sejam
colocados em perigo, ou não comprometa o sucesso da missão.
O Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra é o primeiro tratado que contém uma
série de previsões que tem a intenção de regular a conduta do bombardeiro aéreo. Muitas de suas
previsões codificam o Direito Internacional costumeiro preexistente. Por essa razão, os Estados são
obrigados a obedecer estas disposições, caso tenham ou não ratificado o referido Protocolo.
A guerra aérea deve se conduzir e se executar por intermédio do emprego de meios e métodos
específicos, na medida adequada e efetiva para atingir o objetivo militar, contribuindo para a licitude
das ações planejadas.
Durante um conflito armado, na área
geral do ambiente da guerra aérea, as partes
ficam encarregadas das operações aéreas no
seu espaço aéreo e no espaço aéreo
internacional. Considera-se que as operações
aéreas no espaço aéreo internacional deverão
ser conduzidas respeitando o direito daqueles
que não são partes no conflito.
O regulamento da guerra aérea aplicar-se-á a todas as aeronaves, mais leves ou mais pesadas
que o ar, sem distinguir se podem ou não flutuar na água.
As partes de um conflito deverão, por uma notificação apropriada, estabelecer áreas das
operações aéreas onde poderão ser realizadas as atividades de combate. Todos os aviões que
entrarem em tais zonas, incluindo aeronaves de Estados neutros, estarão sujeitos a danos por causa

396
das hostilidades.
Todas as aeronaves militares usadas em um conflito armado deverão ser marcadas com seu
emblema nacional, indicando que são aeronaves militares e, portanto, alvos legítimos.
Os ocupantes das aeronaves propriamente identificadas como militares serão considerados
combatentes.
As aeronaves civis e aeronaves do Estado, com marcas distintas das aeronaves militares, não
serão consideradas militares e, portanto, não serão engajadas nas hostilidades.
As ações aéreas hostis procurarão exclusivamente uma vantagem militar e, o mais
rapidamente possível, alcançar a submissão total ou parcial do adversário.
Uma aeronave militar inimiga poderá ser atacada, destruída ou capturada em qualquer espaço
aéreo que não seja neutro. No caso de captura, a propriedade da aeronave passará ao governo que a
capturou, podendo ser operada pelo mesmo, desde que as marcas do inimigo sejam retiradas.
Aeronaves neutras ou não militares que voem na jurisdição de uma Parte em conflito, após
serem devidamente advertidas, submeter-se-ão às instruções emanadas do órgão controlador do
espaço aéreo ou da aeronave militar interceptadora, sob pena de serem submetidas a disparo.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Vamos dar uma paradinha para revisar os conteúdos aprendidos na aula de hoje. Responda às
questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) É proibido às Forças beligerantes operarem no mar territorial ou do espaço aéreo dos Estados
neutros.

2) ( ) A passagem inocente compreende em todos os casos o parar e o fundear em territórios de


Estados neutros.

3) ( ) Bloqueio é o exercício de um certo grau de controle sobre determinada área, com o propósito
de impedir o trânsito ou o movimento de navios.

4) ( ) Os bombardeios aéreos são considerados legais se os alvos forem considerados objetivos


militares e os danos colaterais produzidos estejam de acordo com os limites aceitáveis do DICA.

397
II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) Sobre a Guerra no mar, podemos afirmar que:

(A) o bloqueio pode ser parcial, sendo aplicável apenas às nações inimigas.

(B) é permitido às Forças beligerantes operarem no mar territorial ou no espaço aéreo dos Estados
neutros.

(C) gozam de imunidade os navios de passageiros, mesmo que transportando combatentes.

(D) a plataforma continental dos Estados beligerantes é considerada uma Zona de Guerra Naval.

(E) é lícito o bloqueio ao acesso ou à partida de portos ou costas de Estados neutros.

GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 C

RECADO FINAL:
Nesta aula trouxemos diversos conceitos relacionados à guerra no mar, tais como: as Zonas de
Guerra Naval; o direito de passagem inocente; as imunidades aplicadas; o conceito de bloqueio e de zonas
de exclusão. Falamos ainda um pouco sobre a guerra desenvolvida em ambiente aéreo.
A próxima, será a nossa última aula do curso. Nela, falaremos sobre a atuação de algumas
Organizações Internacionais, com foco principalmente no Tribunal Internacional Penal (TPI) e no Comitê
Internacional da Cruz Vermelha (CICV).
Dito isto...
Até a próxima aula!

398
DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS (DICA)

Olá, Aluno (a)!


Vamos finalizar o nosso estudo do Direito Internacional dos Conflitos Armados.
Nas últimas aulas, falamos bastante sobre a atuação de algumas Organizações Internacionais.
Nesta última aula, vamos abordar a forma de atuação de algumas delas, mais precisamente, do
Tribunal Internacional Penal (TPI) e do do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

Objetivos da Aprendizagem:
- Descrever o Tribunal Internacional Penal (TPI);
- Descrever a história do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV);
- Citar as funções do CICV;
- Citar os princípios fundamentais do CICV; e
- Citar os órgãos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.

INTRODUÇÃO:
A partir da segunda metade do século passado, o Direito Internacional passou a vivenciar uma
nova era, com o surgimento de novas personalidades jurídicas, além dos Estados, a atuar em seu âmbito:
as Organizações Internacionais. A sociedade internacional organizada passou a criar entes com as mais
variadas formas de organização e de função, formados pela congregação de Estados-parte, e lhes conferiu
personalidade jurídica própria, permitindo-lhes desde a sua concepção celebrar tratados e ser titular de
direitos e deveres perante Estados soberanos.
Nesta aula, falaremos um pouquinho sobre algumas destas organizações.

4.9 ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


4.9.1 Tribunal Penal Internacional (TPI)
Embora o Direito Internacional Público (DIP) permita a realização de julgamentos de
militares pertencentes às forças inimigas enquanto as hostilidades estão em curso, os Estados
raramente recorrem a tal expediente. Tais julgamentos normalmente provocam ações indesejáveis
por parte do inimigo e dificultam as medidas de caráter humanitário eventualmente aplicadas aos
seus nacionais.
A doutrina contemporânea reconhece que o julgamento pelas práticas de crimes de guerra e
as consequentes sanções devem se realizar após o término do conflito, e de preferência por um
tribunal neutro.

399
Criado a partir da reunião de plenipotenciários que
aprovaram o Estatuto de Roma, o Tribunal Penal
internacional (TPI) é um tribunal independente, de caráter
permanente, de abrangência universal, vinculado ao sistema
das Nações Unidas e que possui como principal característica
o princípio da complementaridade. Ou seja, o Tribunal age de
forma complementar às decisões dos tribunais dos Estados-
Partes, caso o julgamento destes tenha sido realizado de
maneira parcial ou inidônea. Foi estabelecido em 2002 em Haia, Holanda, local da sua sede atual,
conforme estabelece o artigo 3º do Estatuto de Roma.
O Brasil ratificou o Estatuto de Roma, ato que foi promulgado por meio do Decreto nº 4.388,
de 25 de setembro de 2002, sujeitando-se aos ditames legais nele estabelecidos. Em sendo assim,
formalizou-se o reconhecimento do Brasil em face da competência do TPI, em consequência da
introdução da Emenda Constitucional nº 45, em 8 de dezembro de 2004. Por conseguinte, a
Constituição brasileira está em acordo com o ordenamento jurídico internacional de amparo aos
direitos humanos.
Diferentemente da Corte Internacional de Justiça, que examina litígios entre estados, o
Tribunal Penal Internacional julga apenas indivíduos. A existência do Tribunal contribui para
prevenir a ocorrência de violações dos direitos humanos e do direito internacional humanitário, além
de coibir ameaças contra a paz e a segurança internacionais.
O Estatuto do TPI prevê o julgamento de pessoas envolvidas em crimes:

- de genocídio;
- contra a humanidade;
- de guerra; e
- de agressão.

Crime de genocídio é qualquer ato cometido com a intenção de destruir, no todo ou em parte,
uma nação, etnia, raça ou grupo religioso, tais como:

- matar membros de grupo ou etnia;


- causar prejuízos à saúde física ou mental dos membros de grupo ou etnia;
- afligir deliberadamente as condições de vida de grupo ou etnia, de modo premeditado, visando a
causar a sua destruição total ou parcial;
- impor medidas tendentes a evitar nascimentos dentro do grupo; e
- realizar transferência forçada de pessoas, principalmente crianças, de um grupo ou etnia para outro.

400
São considerados crimes contra a humanidade os atentados contra bens jurídicos individuais
fundamentais, tais como a vida, a integridade física, a saúde e a liberdade, cometidos tanto em tempo
de paz como de guerra, como parte de um ataque generalizado ou sistemático, realizado com a
participação ou tolerância do poder político.
Nesse contexto, são crimes contra a humanidade:

- assassinato;
- extermínio;
- escravidão;
- deportação (entre fronteiras nacionais) e o deslocamento forçado de população (dentro de um país);
- detenção arbitrária;
- tortura;
- estupro;
- prostituição forçada e outras formas de abuso sexual;
- perseguição por motivos políticos, raciais ou religiosos;
- desaparecimento forçado de pessoas; e
- outros atos desumanos realizados em massa.

São consideradas crimes de guerra as ações e/ou omissões proibidas pelas normas do DICA,
segundo os correspondentes acordos internacionais e os princípios e regras reconhecidos pelos
respectivos Estados-Partes.
O Tribunal Penal Internacional tem competência para julgar as pessoas que cometam ou
ordenem o cometimento de atos contra as pessoas ou bens, protegidos pelas disposições dos
Convênios de Genebra de 1949 e seus Protocolos, ou que violem as leis e costumes da guerra, como
por exemplo:

- homicídio doloso;
- tortura ou atos inumanos, incluindo os experimentos biológicos;
- atos intencionais que causem grande padecimento ou graves danos à integridade física ou à saúde;
- destruição ou apropriação de bens não justificados por necessidades militares e levadas a cabo em
grande escala e de forma ilícita e arbitrária;
- coação de prisioneiros de guerra ou de civil a prestar serviços às forças armadas de potência
inimiga;
- privação deliberada a um prisioneiro de guerra ou a um civil de seu direito a julgamento justo, com
as devidas garantias;
- deportação, translado ou reclusão ilícita de um civil;

401
- tomadas de civil como refém;
- emprego de armas tóxicas ou de outras armas que ocasionem sofrimentos desnecessários;
- destruição arbitrária de cidades, povos ou aldeias, ou a sua devastação não justificada por
necessidades militares; e
- apropriação ou destruição de bens, reconhecidos como patrimônio cultural da humanidade,
protegidos pela Convenção para Proteção de Bens Culturais de Haia, de 1954.

4.9.2 Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV)


4.9.2.1 História
Antes de iniciar, convido você a assistir ao extrato do filme produzido pelo Comitê Internacional
da Cruz Vermelha (CICV), através do link abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=v7UxTgMwR4w

Após essa breve ilustração histórica, apresentada pelo filme do CICV, podemos discorrer um
pouco mais sobre o contexto de sua criação.
Na sequência da Batalha de Solferino, Henry Dunant é testemunha da falta de tratamento
dado às pessoas feridas e mortas como consequência da guerra. Henry Dunant atribui a falta de
eficácia das operações de salvamento pelos serviços sanitários do exército à falta de sinalização com
um emblema uniforme.
Desta forma, a Conferência Internacional que decorre em 1863 em Genebra adota a cruz
vermelha sobre um fundo branco como sinal distintivo das sociedades de socorro aos militares
feridos (as futuras Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho).
Um ano mais tarde, em 1864, a Primeira Convenção de Genebra é adotada, consagrando a
cruz vermelha sobre fundo branco como sinal distintivo dos serviços de saúde dos exércitos.

O artigo 38º da I Convenção de Genebra de 1949 consagra a cruz vermelha sobre fundo
branco como emblema e sinal distintivo do serviço de saúde dos exércitos. São igualmente
reconhecidos, para os países que empregam como sinal distintivo o crescente vermelho ou o leão e o
sol vermelhos em fundo branco.

402
Do sinal distintivo
Artigo 38.º
Em homenagem à Suíça, o sinal heráldico da cruz vermelha em fundo branco, formado pela
inversão das cores federais, é mantido como emblema e sinal distintivo do serviço de saúde
dos exércitos.
Contudo, para os países que empregam já como sinal distintivo, em vez da cruz vermelha, o
crescente vermelho ou o leão e o sol vermelhos em fundo branco, estes emblemas são
igualmente reconhecidos nos termos da presente Convenção.

Desde 1980 que nenhum Estado utiliza o símbolo do leão e sol vermelhos sobre fundo
branco.

Em tempo de conflito o emblema constitui a manifestação visível da proteção concedida pelas


Convenções de Genebra. O emblema pretende assinalar aos combatentes que certas pessoas (voluntários
das Sociedades Nacionais, pessoal sanitário, delegados do CICV), as unidades sanitárias (hospitais,
postos de socorro) ou certos meios de transporte (por terra, água ou ar) estão protegidos pelas Convenções
de Genebra e pelos seus Protocolos Adicionais.
Quando o emblema é utilizado a título protetor, ele deve provocar nos combatentes um reflexo de
abstenção e de respeito.
Cada Estado Parte nas Convenções de Genebra tem a obrigação de tomar medidas para evitar e
reprimir a utilização abusiva do emblema. Os Estados Partes nas Convenções de Genebra devem,
nomeadamente, promulgar uma lei sobre a proteção dos emblemas da cruz vermelha e do crescente
vermelho.
Constitui um uso abusivo do emblema toda a utilização não autorizada expressamente pelas
Convenções de Genebra e respectivos Protocolos Adicionais. Constituem exemplos deste abuso as
imitações, as usurpações e a perfídia (tema abordado no item 4.4 desta unidade de ensino).
As imitações consistem na utilização de um símbolo que corra o risco de causar uma confusão
com o emblema da cruz vermelha e do crescente vermelho. As usurpações do emblema da cruz vermelha
ou do crescente vermelho ocorrem quando este é utilizado por entidades ou pessoas às quais não é
conferido esse direito (por exemplo, empresas comerciais, simples particulares, organizações não
governamentais, farmácias, entre outros) ou por pessoas que têm o direito de utilizar o emblema, mas que
o fazem em atividades não conformes com os princípios fundamentais do Movimento.
403
Por fim, estamos face a uma situação de perfídia (ou de abuso grave) quando se utiliza o emblema
em tempo de conflito armado para proteger combatentes armados ou material de guerra. Este abuso grave
constitui, de acordo com as Convenções de Genebra, um crime de guerra.

4.9.2.2 Funções
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha
(CICV) é uma instituição privada apolítica,
humanitária neutra, imparcial e independente. Visa à
proteção e assistência às vítimas de conflitos internos
ou internacionais e das suas consequências mais
diretas.
Criado em 1863, ele é o orgão fundador do
Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho. O CICV. Está investido de um
mandato único no que diz respeito o acompanhamento
do tratamento dos prisioneiros de guerra, dispondo
igualmente de um direito de iniciativa humanitária
reconhecido pela comunidade internacional.
As funções do CICV são as seguintes:

- Manter e difundir os princípios fundamentais do Movimento.


- Reconhecer toda Sociedade Nacional recentemente criada ou reconstituída que esteja em
conformidade com as condições de reconhecimento impostas pelos Estatutos do Movimento e de
notificar esse reconhecimento às outras Sociedades Nacionais.
- Assumir as tarefas que lhe são reconhecidas pelas Convenções de Genebra. Trabalhar com vista à
aplicação fiel do Direito Internacional Humanitário aplicável em tempo de conflito armado e receber
todas as queixas referentes a alegadas violações desse direito.
- Esforçar-se sempre por assegurar a proteção e assistência às vítimas militares e civis de conflitos
armados e de distúrbios internos.
- Assegurar o funcionamento da Agência Internacional de Pesquisas prevista pelas Convenções de
Genebra.
- Contribuir para a formação e preparação de pessoal e de material sanitários, em colaboração com
as Sociedades Nacionais, os serviços de saúde militares e civis e outras autoridades competentes.
- Trabalhar com vista à difusão e à compreensão do Direito Internacional Humanitário aplicável nos
conflitos armados e à preparação dos seus eventuais desenvolvimentos.
- Assumir os mandatos que lhe são confiados pela Conferência Internacional da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho.

404
4.9.2.3 Princípios Fundamentais
Os princípios fundamentais foram proclamados pela XXª Conferência Internacional da Cruz
Vermelha, Viena, em 1965. A versão revista do texto consta dos Estatutos do Movimento
Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, adotados pela XXVª Conferência
Internacional da Cruz Vermelha, Genebra, em 1986 e são os seguintes:

Humanidade - O Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho nascido da


preocupação de prestar auxílio sem discriminação aos feridos, dentro dos campos de batalha,
esforçam-se por prevenir e aliviar, em todas as circunstâncias, o sofrimento humano, tendo em vista
a proteção da vida e saúde, bem como a promoção do respeito pela pessoa humana. Favorece a
compreensão mútua, a amizade, a cooperação e uma paz duradoura entre todos os povos.

Imparcialidade - O Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho não faz


qualquer distinção quanto à nacionalidade, raça, religião, condição social ou filiação política. O
Movimento se empenha unicamente em socorrer todos os indivíduos na medida do seu sofrimento e
da urgência das necessidades.

Neutralidade - A fim de guardar a confiança de todos, o Movimento abstem-se de tomar parte nas
hostilidades e em controversas de ordem política, racial, religiosa ou ideológica.

Independência - O Movimento é independente. As Sociedades Nacionais, auxiliares dos poderes


públicos no desempenho das suas atividades humanitárias, e submetidas às leis que regem o seu país
respectivo, devem guardar uma autonomia que lhes permita agir sempre de acordo com os princípios
do Movimento.

Voluntariado - O Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho é uma


instituição de socorro voluntária e desinteressada.

Unidade - Só pode existir uma única Sociedade Nacional da Cruz Vermelha ou do Crescente
Vermelho em cada país. Ela deve estar aberta a todos e estender a sua ação humanitária por todo o
território nacional.

Universalidade - O Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho é uma


instituição universal, no seio do qual todas as Sociedades têm direitos iguais e o dever de ajuda
mútua.

405
4.9.2.4 Orgãos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho

- As Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho:


Existem hoje mais de 160 Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho
no mundo inteiro. As Sociedades Nacionais agem enquanto auxiliares das autoridades do seu próprio
país e fornecem uma vasta gama de serviços, que vão desde os socorros em caso de catástrofe aos
cursos de socorrismo, passando pela assistência médica e social.
Em tempo de guerra, as Sociedades Nacionais ajudam os serviços sanitários do Exército. Elas
devem ser previamente reconhecidas pelo CICV, com base numa série de condições de
reconhecimento (artigo 4º dos Estatutos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho), para poderem fazer parte do Movimento. Podem seguidamente tornar-se
membros da Federação Internacional.

- A Federação das Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho:


Nos termos do Estatuto da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho, esta instituição tem as seguintes funções:

- Agir na qualidade de orgão permanente de ligação, de coordenação e de estudo entre as Sociedades


Nacionais e de lhe conceder a assistência que elas possam requerer.
- Encorajar e favorecer em cada país a criação e o desenvolvimento de uma Sociedade Nacional
independente e devidamente reconhecida.
- Prestar socorro por todos os meios ao seu alcance a todas as vítimas de desastres.
- Ajudar as Sociedades Nacionais na preparação dos socorros antes das catástrofes, na organização
das suas ações de socorro e durante as últimas.
- Organizar, coordenar e dirigir as ações internacionais de socorro em conformidade com os
"Princípios e Regras que regem as ações de socorro da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho em
caso de desastre "adotadas pela Conferência Internacional.
- Encorajar e coordenar a participação das Sociedades Nacionais nas atividades que visam à
salvaguarda da saúde da população e a promoção da ação social em cooperação com as autoridades
nacionais competentes.
- Encorajar e coordenar entre Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha as trocas de ideia com vista a
inculcar os ideais humanitários nas crianças e nos jovens, bem como para desenvolver as relações de
amizade entre os jovens de todo o mundo.
- Ajudar as Sociedades Nacionais a recrutar membros no conjunto da população e a inculcar-lhes os
princípios fundamentais e os ideais do Movimento.
- Levar socorro às vítimas de conflitos armados em conformidade com os acordos concluídos com o
CICV.
406
- Ajudar o CICV na promoção e desenvolvimento do Direito Internacional Humanitário e colaborar
com ele na difusão deste ramo do direito e dos princípios fundamentais junto das Sociedades
Nacionais.
- Representar oficialmente as Sociedades membros no plano internacional, nomeadamente para tratar
de todas as questões relacionadas com as decisões e recomendações adotadas pela Assembleia Geral
da Federação e ser guardiã da sua integridade e protetora dos seus interesses.
- Exercer os mandatos que lhe forem confiados pela Conferência Internacional. O Secretariado da
Federação, em Genebra, conta com mais de 245 funcionários de cerca de 30 nacionalidades
diferentes.

- A Conferência Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho:


A Conferência Internacional é a mais alta autoridade deliberatória do Movimento.
É composta por delegações das Sociedades Nacionais, do Comitê Internacional, da Federação
e dos Estados Partes às Convenções de Genebra. Juntos examinam questões humanitárias de
interesse comum e todas as outras questões relacionadas, tomando igualmente decisões a este
respeito. As delegações têm direitos iguais, dispondo cada de uma voz.

- O Conselho dos Delegados do Movimento:


O Conselho dos Delegados é constituído pela Assembleia dos Representantes do CICV, da
Federação Internacional e pelas Sociedades Nacionais.
Reúne-se de a cada dois anos e é frequentemente solicitado a pronunciar-se sobre questões de
doutrina ou sobre matérias de interesse comum a todas as componentes do Movimento. Prepara
igualmente o desenrolar da Conferência Internacional e propõe candidatos para um certo número de
lugares desta (presidente, vice-presidente, secretário-geral, presidentes e vice-presidentes das
Comissões, bem como os seus relatores em sessão plenária).

- A Comissão Permanente da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho:


A Comissão Permanente é a mandatária da Conferência Internacional entre duas
Conferências para exercer, designadamente, as seguintes atribuições:

- Assegurar a preparação da próxima Conferência Internacional.


- Estatuir entre duas Conferências Internacionais, e sob reserva de uma decisão definitiva da
Conferência, sobre diferendos decorrentes de questões de interpretação dos Estatutos e Regulamento
do Movimento Internacional, bem como sobre qualquer questão que lhe for submetida pelo Comité
Internacional ou pela Federação relativa a eventuais diferendos.
- Assegurar a preparação do próximo Conselho.

407
- Atribuição da Medalha Henry-Dunant.
- Criação, por consenso, de todo orgão ad hoc necessário.

VAMOS TESTAR OS SEUS CONHECIMENTOS!

Façamos a nossa última pausa de verificação parcial para repassar alguns dos conceitos vistos
nesta última aula. Responda às questões abaixo.

I - Coloque “C” ou “E” nos parênteses à esquerda, conforme as afirmativas sejam consideradas certas ou
erradas.

1) ( ) O Tribunal Penal internacional (TPI) é um tribunal independente, de caráter permanente, de


abrangência universal, possuindo como principal característica o princípio da complementaridade.

2) ( ) O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) é uma instituição humanitária de caráter


público.

3) ( ) Só pode existir uma única Sociedade Nacional da Cruz Vermelha ou do Crescente Vermelho
em cada país.

4) ( ) A Conferência Internacional é a mais alta autoridade deliberatória do Movimento


Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.

II - Assinale a alternativa que apresenta a única resposta correta.

5) O Tribunal Penal Internacional (TPI) tem competência para julgar:

(A) a tortura, o racismo, o terrorismo e os crimes contra a humanidade.

(B) a tortura coletiva, o extermínio em massa, o tráfico de pessoas e os crimes de guerra.

(C) os crimes de guerra, os crimes contra a humanidade, o terrorismo e os crimes hediondos.

(D) o genocídio, os crimes contra a humanidade, a tortura e o tráfico internacional de entorpecentes.

(E) o genocídio, os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra e os crimes de agressão.

408
GABARITO:
QUESTÃO RESPOSTA
1 C
2 E
3 C
4 C
5 E

RECADO FINAL:

Ao finalizar o estudo dessa disciplina, temos a certeza de que, nesta modalidade de ensino a
distância, você alcançou os objetivos propostos. Este estudo objetivou a sua preparação para o
exercício de funções de assessoramento que envolvam questões relativas às leis dos conflitos
armados, tanto no âmbito da Marinha do Brasil e das demais Forças Armadas, como também nos
demais Órgãos governamentais de interesse da Defesa Nacional.

Foi uma grande satisfação tê-lo conosco ao longo de todos os módulos do curso. Esperamos
que você tenha gostado e aproveitado bastante para aprender um pouquinho mais sobre alguns
tópicos especiais de Direito que influenciam, e muito, a nossa vida militar naval.
Com os desejos de continuado sucesso na carreira, agradecemos pela atenção e
permanecemos sempre a postos para quaisquer dúvidas ou curiosidades que possam surgir acerca da
nossa disciplina.
Dito isto...

409
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BRANT, Leonardo N.; SOARES, Larissa C. A inter-relação entre o Direito Internacional dos
Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário na Perspectiva Universal e
Interamericana. Anuário de Derecho Constitucional Latinoamericano. Montevideo, 2010.

BRASIL. Decreto nº 42.121, de 21 de agosto de 1957. Promulga as convenções concluídas em


Genebra a 12 de agosto de 1949, destinadas a proteger vítimas da guerra.

_____. Decreto n° 44.851, de 11 de novembro de 1958. Promulga a Convenção e Protocolo para a


proteção de bens culturais em caso de conflito armado. Haia, 1954.

_____. Decreto nº 849, de 25 de junho de 1993. Promulga os Protocolos I e II de 1977 adicionais às


Convenções de Genebra de 1949, adotados em 10 de junho de 1977 pela Conferência Diplomática sobre a
Reafirmação e o Desenvolvimento do Direito Internacional Humanitário aplicável aos Conflitos
Armados. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1993.

_____. Decreto nº 2.739, de 20 de agosto de 1998. Promulga a Convenção sobre Proibições ou


Restrições ao Emprego de Certas Armas Convencionais, que Podem Ser Consideradas como
Excessivamente Lesivas ou Geradoras de Efeitos Indiscriminados, conhecida como Convenção sobre
Certas Armas Convencionais, adotada em Genebra, em 10 de outubro de 1980.

______. Decreto nº 3.437, de 25 de abril de 2000. Promulga o Protocolo IV sobre Armas Cegantes a
Laser, adicional à Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Emprego de Certas Armas
Convencionais que podem ser Consideradas Excessivamente Lesivas ou Geradoras de Efeitos
Indiscriminados.

______. Decreto nº 5.760, de 24 de abril de 2006. Promulga o Segundo Protocolo relativo à Convenção
da Haia de 1954 para a Proteção de Bens Culturais em Caso de Conflito Armado, celebrado na Haia, em
26 de março de 1999.

______. Estado-Maior da Armada. EMA-135 - Manual de Direito Internacional Aplicado às


Operações Navais. 2ª Rev. Brasília, 2017.

_____. Portaria Normativa nº 1.069/MD, de 5 de maio de 2011. Aprova o Manual de Emprego do


Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA) nas Forças Armadas - MD34- M-03 – 1ª
Edição/2011. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 2011.

JARDIM, Tarciso Dal Maso. Direito Internacional dos Conflitos Armados (Tomo I e Tomo II). Porto
Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editora, 2006.

410
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Cumprimento das Regras do Direito Humanitário
Internacional pelas Forças da ONU em situação de conflito. 1999. Boletim do Secretário Geral da ONU
(ST/SGB/1999/13) de 6 agosto de 1999. Nova Iorque, 1999.

ROVER, Cees de. Para servir e proteger. Direitos humanos e Direito Internacional Humanitário para
forças policiais e de segurança: manual para instrutores. Tradução Sílvia e Ernani S. Pilla. 4ª edição.
Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Brasília –DF, 2005.

SALMÓN, Elizabeth. Introducción al Derecho Internacional Humanitário. Instituto de Democracia y


Derechos Humanos – Pontifícia Universidad del Perú. Lima, 2004.

SWINARSKI, Chritopher. Introdução ao Direito Internacional Humanitário. Brasília, D.F: CICV,


1996.

411

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