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TECNOLOGISTA MICROSCOPIA ELETRÔNICA – CETENE

MÓDULO 2

2.1 FORMAÇÃO DE IMAGENS


A microscopia eletrônica de varredura e microanálise destacam-se pela capacidade de captar e medir
várias radiações resultantes das interações elétron-amostra. Essas interações revelam detalhes cruciais da
amostra, como composição, topografia, potencial eletrostático e campo magnético local. Compreender os
fenômenos físicos dessas interações é essencial para extrair informações valiosas das radiações, seja na forma
de imagem ou na microanálise. Este capítulo aborda noções básicas dessas complexas interações, fornecendo
as informações essenciais para interpretar as imagens do MEV. Apesar do controle rigoroso dos parâmetros
do feixe eletrônico antes de atingir a amostra, é fundamental compreender que, após a penetração dos elétrons,
o processo de espalhamento determina as informações obtidas, destacando a importância de conhecer o
volume da amostra envolvido nessas interações.

2.2 INTERAÇÕES ELÉTRONS-AMOSTRA


O elétron do feixe eletrônico interage com os átomos da amostra, sofrendo modificações na velocidade
devido ao potencial atômico e nuclear. Essa variação pode ser apenas na direção ou incluir mudanças no
módulo. Interações elásticas afetam a trajetória do elétron sem alterar sua energia cinética, enquanto interações
inelásticas envolvem transferência de energia do elétron primário para os átomos da amostra.
Se o elétron atinge o núcleo do átomo, o potencial columbiano do núcleo carregado positivamente
influencia sua velocidade. Esse processo é conhecido como espalhamento Rutherford, e o desvio do elétron
da trajetória inicial pode ser precisamente calculado. A força de Coulomb atua sobre o elétron ao se aproximar
do núcleo, sendo diretamente proporcional à carga do núcleo (número atômico Z). O movimento do núcleo é
pouco afetado pelo movimento do elétron devido à sua grande massa, aproximadamente 1830 vezes a massa
do elétron. Nessa interação, há conservação de momento e energia, caracterizando-a como elástica.
Para uma interpretação precisa, é crucial considerar a presença dos elétrons do próprio átomo. Quando
o elétron do feixe penetra no átomo, interage com os elétrons ao redor, resultando principalmente em
espalhamento inelástico e transferência de energia para o átomo. Essas interações podem liberar ou excitar
elétrons das camadas do átomo, especialmente os das camadas externas, que requerem pouca energia para
serem removidos. Esses elétrons podem se mover pelo material e também passar por interações inelásticas.
Além disso, o átomo excitado, após perder um elétron, pode capturar elétrons na amostra, provenientes de
outras excitações ou do aterramento. Esses elétrons são pouco energéticos, e apenas aqueles muito próximos
à superfície e com energia suficiente para ultrapassar a barreira superficial conseguem escapar do material.
A profundidade de penetração dos elétrons é influenciada pela composição do material, afetando o
espalhamento elástico e inelástico. O espalhamento inelástico é mais notável em materiais de alto número
atômico (Z), resultando em menor profundidade de penetração em comparação com materiais de baixo Z. A
simulação de Monte-Carlo, com modelos de probabilidade para espalhamentos, calcula os ângulos e
transferências de energia, proporcionando uma boa aproximação do volume de interações. A influência do
valor de Z é evidente, como no caso de uma energia de 20 KeV, onde a profundidade de penetração é 3 µm
para o carbono e 0,7 µm para a prata.
A energia inicial do feixe de elétrons primários ganha mais relevância com o aumento total da energia
do feixe. Compreender a região de interação é crucial ao lidar com materiais não homogêneos, como camadas,
filmes finos e inclusões em metais. A estrutura interna do material molda o volume de interação, especialmente
em materiais cristalinos, onde os elétrons seguem canais preferenciais, aumentando a profundidade de
penetração se alinhados com a direção dos elétrons primários.

2.3 ORIGEM DOS SINAIS


Como foi discutido na seção anterior, o elétron perde energia no seu caminho através do material. Esta
energia é então liberada da amostra de diferentes formas, dependendo do tipo de interação entre o elétron
primário e os átomos da amostra.
Devido a interações elásticas e inelásticas, o elétron pode se tornar um elétron retroespalhado (ERE)
com energia máxima igual à do elétron primário. Ocorre ionização, produzindo elétrons secundários em todo
o volume de interação, com energia média de 2 a 5 eV. Esses elétrons secundários têm origem em regiões de
pouca profundidade, cerca de 1 nm para metais e 10 nm para o carbono. Os elétrons retroespalhados, mesmo
em regiões mais profundas, têm energia suficiente para gerar elétrons secundários ao retornar para a superfície,
inclusive fora do volume de interação do elétron primário, como ao atingir a parede da câmara da amostra.
A ionização do átomo pelo elétron primário resulta na formação de um elétron Auger, que pode transferir
o excesso de energia para outro elétron, gerando um elétron com energia característica do material, com
máximo de cerca de 2 keV. Os elétrons secundários têm energia inferior a 50 eV, enquanto os elétrons
retroespalhados têm energia superior. O pico elevado próximo aos elétrons primários é devido ao
espalhamento Rutherford, aumentando com o aumento do número atômico Z. Assim, os elétrons
retroespalhados refletem o valor médio de Z do material, sendo crucial para o contraste nas imagens de elétrons
retroespalhados (ERE).
O átomo preenche vacâncias em camadas capturando elétrons de maior energia, emitindo raios-X
característicos. Essa energia é única para cada átomo, seguindo as leis da mecânica quântica. Os raios-X
produzidos pelos elétrons primários podem remover elétrons de camadas internas de outros átomos, causando
fluorescência. Durante seu percurso, os quanta de raios-X podem ser capturados por outros átomos, gerando
raios-X adicionais, geralmente com menor energia. Isso é conhecido como fluorescência, afetando a posição
e a quantidade de raios-X emitidos.
Se um elétron do feixe primário interage com o núcleo, de maneira que o mesmo é retroespalhado, existe
uma força intensa movendo o elétron (partícula carregada). Como resultado desta interação uma onda
eletromagnética é originada durante esta desaceleração. O resultado é a geração de raio-X com energia ou
comprimento de onda variando de 0 até o valor da radiação característica. Como resultado da emissão de raios-
X existem sempre cargas se movendo e esta radiação de desaceleração (Bremsstrahlung) é conhecida como
raios-X contínuos.
A energia do feixe de elétrons pode ser liberada da amostra como luz (fótons) por meio de
catodoluminescência, originando-se em transições eletrônicas de baixa energia. Isso ocorre em transições da
banda de condução para a banda de valência ou na desexcitação de átomos ou moléculas. A capacidade de um
material emitir luz após bombardeio eletrônico depende de sua estrutura e transparência ao comprimento de
onda. Materiais como minerais e semicondutores apresentam boa luminescência, sendo a intensidade
dependente do tipo e concentração dos dopantes.
Se as amostras forem muito finas, os elétrons serão capazes de atravessar o material, emergindo com
energia inferior e com um leve desvio em relação a direção do feixe incidente (difração). Esses elétrons que
emergem da amostra com trajetória dependente da difração sofrida e com energia que traz informações da
amostra, são analisados pela Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET).
No caso da Microscopia Eletrônica de Varredura as amostras são espessas o suficiente para se assumir
que o feixe eletrônico é totalmente desacelerado na amostra. A quantidade de elétrons secundários que deixam
a amostra iES está relacionado com o número total de elétrons que chegam na amostra (elétrons primários
iEP) pelo coeficiente de emissão de emissão de elétrons secundários δ. O carregamento da amostra é
compensado pelo aterramento da amostra. Esta corrente de compensação é chamada de corrente da amostra
(CA).

2.4 IMAGEM POR ELÉTRONS SECUNDÁRIOS

Elétrons secundários (ES) são ejetados de átomos da amostra devido a interações inelásticas com
elétrons pouco energéticos da banda de condução em metais ou de valência em semicondutores e isolantes.
Considera-se que elétrons emitidos com energia inferior a 50 eV são elétrons secundários. Embora haja
elétrons retroespalhados nesta faixa, sua contribuição é insignificante e pode ser efetivamente ignorada. Entre
os sinais utilizados na análise de amostras por MEV, os elétrons secundários são os mais comuns, e esta seção
discutirá suas principais características.

2.4.1 Dependência dos ES com a composição da amostra

O coeficiente de emissão dos elétrons secundários (δ) é praticamente constante em relação ao Z dos
elementos, mas aumenta com a redução da energia do feixe incidente, como visto no caso de Al e Au. Esse
comportamento se deve ao fato de que os elétrons secundários escapam da amostra de uma região muito
superficial, da ordem de nm. Quando a energia do feixe de elétrons primários é reduzida para cerca de 3 keV,
a penetração é mínima, resultando em uma produção significativamente maior de elétrons secundários em
uma região superficial.
Os elétrons secundários (eS) têm baixa profundidade de escape devido à sua baixa energia. São
produzidos ao longo do caminho do elétron primário (eP) na amostra, mas apenas os próximos à superfície
têm energia suficiente para escapar. Aqueles gerados mais internamente, devido ao espalhamento inelástico,
perdem muita energia durante o percurso. Quando esses elétrons secundários atingem a superfície, precisam
ter energia para superar a barreira de potencial superficial, o que requer alguns elétron-volts. A forte atenuação
devido ao espalhamento inelástico resulta em uma probabilidade de escape exponencialmente decrescente
com a profundidade.
As interações elétron-amostra geram elétrons secundários em todo o volume de interação, mas apenas
os próximos à superfície escapam da amostra e contribuem para o sinal. Essa profundidade é de
aproximadamente 1 nm para metais e 10 nm para isolantes. O coeficiente de emissão é menor para os metais
devido às interações inelásticas com elétrons da camada de condução, que são abundantes, diminuindo o livre
caminho médio. Nos isolantes, a quantidade desses elétrons é reduzida, resultando em um aumento do livre
caminho médio.
A probabilidade de escape dos elétrons secundários (eS) diminui consideravelmente com a
profundidade, sendo cerca de 1/100 da do elétrons retroespalhados para um feixe incidente com energia de 10
a 30 keV. Apesar disso, os eS são formados em todo o volume de interação do feixe eletrônico com a amostra.
No entanto, apenas os eS gerados em distâncias que permitam o escape fornecerão informações para o
microscopista. Esses elétrons secundários são originados pelos elétrons do feixe primário enquanto penetram
na amostra, bem como pelos elétrons retroespalhados ao deixarem a amostra.
Os elétrons secundários podem ser classificados em dois tipos:

• ESI: gerados quando o elétron primário (ep) interage em uma região menor que 5λ, sendo de alta
resolução.
• ESII: gerados pelo espalhamento do ep na amostra, resultando em colisões inelásticas. Quando o
elétron retroespalhado se aproxima da superfície a uma distância de 5λ, os elétrons secundários gerados
escapam da amostra como ESII. Esses são de baixa resolução e trazem informações do elétron retroespalhado.

Quando o feixe de elétrons é de baixa energia (< 5 keV), a quantidade de elétrons primários (eP)
atingindo a amostra e os elétrons retroespalhados de regiões mais profundas diminui. No entanto, os elétrons
secundários que escapam da amostra permanecem independentes da energia dos elétrons primários. A redução
da energia do feixe primário resulta em um aumento do coeficiente de emissão dos elétrons, indicando uma
maior fração de energia consumida do feixe na produção dos elétrons secundários que escapam da amostra.

2.4.2 Resolução espacial


Na microscopia eletrônica de varredura, a imagem de maior resolução é fornecida pelos elétrons
secundários devido à sua origem superficial no volume de interação. A resolução é maior para sinais
provenientes da região mais superficial da amostra, onde a seção transversal se aproxima do diâmetro do feixe.
Assim, reduzir o diâmetro do feixe eletrônico resulta em uma melhor resolução dos sinais de elétrons
secundários (maiores aumentos), considerando que outros fatores, como a relação sinal/ruído, não sejam
problemas.
Conforme mencionado anteriormente, para obter um feixe de elétrons com mínimo diâmetro e brilho na
microscopia eletrônica de varredura (MEV), é necessário uma elevada voltagem de aceleração do feixe
primário. No entanto, o processo de detecção dos elétrons secundários também captura elétrons
retroespalhados, afetando a resolução espacial, especialmente em voltagens mais altas. Reduzir a voltagem do
feixe para cerca de 20-25 kV pode ser benéfico, diminuindo o volume de interação e melhorando a resolução.

2.4.3 Detectores de eletróns secundários e retroespalhados


Uma fração pequena de elétrons retroespalhados atinge o detector, sendo acelerada por uma voltagem
de +10 kV em direção ao cintilador. Este potencial elevado permite que os elétrons tenham energia suficiente
para gerar fótons de luz ao atingir o cintilador. Os fótons são conduzidos a uma fotomultiplicadora por meio
de um guia de luz, onde são transformados em um sinal elétrico. Uma janela ótica na parede da câmara de
amostras permite a captura da luz pela fotomultiplicadora localizada fora da câmara, evitando a necessidade
de vácuo no microscópio e liberando espaço na câmara para manipulação da amostra e outros detectores. A
amplificação do sinal (ES) ocorre até 10^8 vezes, proporcionando uma alta amplificação com pouco ruído,
contanto que o cintilador seja eficiente.
A polarização da grade à frente do detector varia de +300 volts, onde os elétrons secundários (ES) são
coletados, até aproximadamente -200 volts, onde os ES são totalmente repelidos. No entanto, ao utilizar o
detector para elétrons retroespalhados (ERE) com polarização negativa, apenas os ERE emitidos com alta
energia podem ser captados, pois esse potencial não afeta significativamente sua trajetória. No entanto, essa
configuração não proporciona uma imagem de ERE com bom contraste devido ao sinal fraco recebido. Isso
está relacionado à trajetória dos ERE e à posição do detector, geralmente localizado lateralmente à câmara, a
cerca de 90 graus em relação ao feixe de elétrons primários (EP). O sinal de ERE está sempre presente,
independentemente da polarização da grade, mas sua detecção é prejudicada pela grande quantidade de
elétrons secundários quando a grade está positivamente polarizada. O detector de elétrons secundários (ES) é
eficiente e não obstrutivo, sendo a imagem de ES a mais comumente utilizada na microscopia eletrônica de
varredura devido à sua facilidade de interpretação.

2.5 IMAGEM POR ELÉTRONS RETROESPALHADOS


O sinal de elétrons retroespalhados (ERE) resulta de colisões elásticas e inelásticas, e é crucial para
imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV). Os ERE têm energia entre 50 eV e a do elétron
primário, sendo os de alta energia os principais contribuintes para o sinal de ERE, resultantes de colisões
elásticas na camada superficial. Captar apenas ERE de alta energia limita as informações de profundidade na
imagem em comparação com a penetração total do feixe. Já os ERE de baixa energia, provenientes de
interações mais internas, têm um diâmetro maior no volume de interação, resultando em menor resolução de
imagem em comparação com elétrons secundários (ES). Além dos parâmetros do microscópio, a resolução
depende do material da amostra, sendo maior para materiais com maior número atômico (Z).
Existem também detectores de estado sólido (para ERE) que dispensam o uso da grade coletora, pois
esses elétrons são de alta energia. Esses detectores consistem em uma junção P-N posicionada entre a lente
final e a amostra, otimizando a eficiência da coleta de elétrons retroespalhados. Ao penetrar no detector, esses
elétrons geram pares elétron-buraco, produzindo um fluxo de corrente que é amplificado e processado para
gerar a imagem.

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