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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

VINÍCIUS GANDOLFI DE MORAIS

O IMPACTO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPITALISTA


NA FORMAÇÃO E INDIVIDUALIDADE DO SUJEITO
COMO ATOR POLÍTICO

CURITIBA
2022
ARTIGO SOBRE UNIDADE II: SOCIOLOGIA DA POLÍTICA EM MARX E ENGELS
1. O IMPACTO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO CAPITALISTA NA FORMAÇÃO E
INDIVIDUALIDADE DO SUJEITO COMO ATOR POLÍTICO

O presente artigo possuí a finalidade de apresentar os impactos e efeitos que o


sistema socioeconômico atualmente vigente na maior parte do mundo, o capitalismo, produz
na mentalidade do sujeito como cidadão, o inibindo de uma individualidade e uma
percepção de si mesmo frente à sociedade. Tal prática acaba intencionalmente
influenciando na formação desse sujeito como ator político e em sua tomada de decisões.
Para se construir tal pensamento, serão utilizadas as confluências políticas descritas
por Karl Marx e Friedrich Engels em seus manuscritos originais que revelam uma ideologia
política que até hoje impera nas diversas camadas sociais e suas ramificações na estrutura
social como um todo. Outros autores foram consultados para análises mais situacionais,
mas que agregam ao discurso aqui construído.
A importância de se discutir essa perca da individualidade e autonomia política do
ser perante o capital se deve pelas seguintes razões: a busca pela liberdade de escolha e
de reflexão do ser, a autonomia na eleição de seus representantes políticos e a necessidade
de independência do cidadão para a evolução da própria sociedade ao qual está inserido.
Para se traçar esses tópicos, em um primeiro momento, identificaremos os principais
pontos-chave do debate, através da literatura marxiana e marxista, enquanto em um
segundo momento, uniremos esses diferentes fatores para alimentar a discussão e por fim,
delinear as consequências e possíveis soluções.
Enquanto estudava os campos da economia política em uma busca para
compreender a filosofia do direito hegeliana, suas relações jurídicas e a formação do
Estado, Marx se defrontou com um resultado geral, ao qual passou a utilizar como guia, que
representava um princípio muito importante na atuação política daquela sociedade:
[...] na produção social da própria existência, os homens entram em
relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas
relações de produção correspondem a um grau determinado de
desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas
relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base
real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual
correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de
produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e
intelectual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; ao
contrário, é o seu ser social que determina sua consciência. (MARX, 1859,
p. 47)

Através dessa ótica, Marx está defendendo uma ideia de que naquela dada
sociedade inglesa no ápice de sua revolução industrial, os indivíduos são conectados por
meio de uma cadeia de relações sociais meramente formadas e já pré-determinadas pelos
meios de produção aos quais se faz necessário o sistema capitalista progredir, e o próprio
sistema só avançaria a partir da troca dessas relações.
Dessa forma, é construída a base econômica, a qual os valores éticos e morais, e
consequentemente todo o fazer jurídico e político, é condicionado a ser direcionado, ficando,
direta ou indiretamente, refém dessas relações arbitrárias que o ser acaba formando com o
social. Como finaliza Marx, a própria consciência do indivíduo é suplantada pelo
materialismo dessas relações, onde toda a sua vida e as suas formas de expressão, sejam
elas culturais, artísticas, intelectuais e, nesse caso principalmente, políticas, são
determinadas pela força dos modos de produção atuando no cerne do ser social.
Em seguida, podemos atrelar essa perca da subjetividade humana a outro conceito
que Marx atenua em seus escritos: a reificação. Como ele diz:
No capital-lucro, ou melhor capital-juros, terra-renda fundiária, trabalho-
salários, nesta Trindade econômica como conexão dos componentes de
valor e riqueza além e acima de suas fontes, completam a mistificação do
modo de produção capitalista, a reificação das relações sociais, a
incomensurável junção das relações de produção material com sua
determinação histórico-social [...] (MARX, 1969b, p. 838)

Nesse sentido, o autor frisa a forma de como a lógica trabalhista do capital induz à
alienação do indivíduo, com sua subjetividade sendo moldada pelo homem-economicus, isto
é, o ser humano que só conhece os valores da troca assimétrica, do ganho, da
produtividade (ROLO, 2012). Com esse mesmo espectro, ao revisitar os estudos da dialética
marxista, Georg Lukács é outro que atribuí a reificação como um sintoma dos modos de
organização do trabalho no capitalismo moderno:
Se perseguirmos o caminho desenvolvido pelo processo de trabalho
desde o artesanato, passando pela cooperação e pela manufatura, até a
indústria mecânica, descobriremos uma racionalização continuamente
crescente, uma eliminação cada vez maior das propriedades qualitativas
humanas e individuais do trabalhador. […] Com a moderna análise
“psicológica” do processo de trabalho (sistema de Taylor), essa
mecanização racional penetra até a “alma” do trabalhador. (LUKÁCS, 2003,
p. 201)

Tal discussão, indiscutivelmente, termina por levar à transformação social proposta


por Marx e como essa reificação do ser humano é um grande empecilho na construção de
uma sociedade mais justa e igualitária, visto que o pensamento do indivíduo é moldado
pelas objetividades socioeconômicas e não por suas visões críticas e particulares.
E preciso, ao contrário, explicar essa consciência pelas contradições da vida
material, pelo conflito que existe entre as forças produtivas sociais e as relações de
produção. Uma sociedade jamais desaparece antes que estejam desenvolvidas todas
as forças produtivas que possa conter, e as relações de produção novas e superiores
não tomam jamais seu lugar antes que as condições materiais de existência dessas
relações tenham sido incubadas no próprio seio da velha sociedade. (MARX, 1844, p.
48)
Tendo isso em mente, nesse segundo momento, com o levantamento bibliográfico
feito, podemos juntar as peças formuladas pelos intelectuais para fomentar a discussão
proposta.
Com Marx revelando a face do capitalismo que aliena, coisifica e manipula o cidadão
a seguir uma corrente econômica que o objetifica, é fácil desnudar que esses demais
desdobramentos também impliquem na formação dele como ator político na hora de tomar
decisões, apoiar projetos políticos, escolha de partidos, votação de representantes e demais
ações políticas intrínsecas a qualquer democracia contemporânea.
Em um cenário capitalista, a atuação política está sujeita a ser condicionada e regida
por meros convencionalismos sociais, sem a aplicação prática e racional da consciência
individual do cidadão. Isso dificulta, atrapalha e não dignifica um ambiente social saudável
ou mesmo a própria democracia em si, se tornando apenas um emaranhado de roteiros e
panfletaríssimo já previamente estabelecidos pela indústria.
Dito isso, podemos destacar que a discussão aqui levantada trata de importantes
questões a serem debatidas no âmbito social. De uma maneira geral, as relações sociais
capitalistas coisificam o ser humano em seu senso crítico e sua opinião política se torna fácil
de ser manipulada e administrada por terceiros. A falta da subjetividade impera em um
cenário caótico de despolitização, ilusão convincente da realidade e falta de livre arbítrio em
decisões de cunho político.
Para Marx, seus ideais de transformação social estão inerentemente ligados à
solução desse problema, onde o autor utiliza a própria lógica capitalista para contradizê-la:
Se o dinheiro é o vínculo que me liga à vida humana, vinculando a
sociedade a mim, conectando-me com a natureza e o homem, não é o
dinheiro o laço de todos os laços? Não pode dissolver e ligar todos os
laços? Não é, portanto, também o agente universal da separação? (MARX,
1844, p. 31)

Já para Antonio Gramsci é um dos autores que acredita que deve haver um
momento de grande ênfase em que os alienados socialmente pela superestrutura em
questão, tomem consciência de sua vida política manipulada, como define ele ao chamar
esse evento de catarse:
Pode-se empregar a expressão ―catarse‖ para indicar a passagem do
momento meramente econômico (ou egoístico-passional) ao momento
ético-político, isto é, a elaboração superior da estrutura em superestrutura
na consciência dos homens. Isso significa, também, a passagem do objetivo
ao subjetivo e da necessidade à liberdade. (GRAMSCI, 2007, vol. 1, p. 314-
315).
Por sua vez, Lukács também crê em uma desalienação por meio de ações
revolucionárias, mas no sentido de os alienados compreenderem a dimensão e a totalidade
histórica que permitiu que chegassem aonde estão:
Justamente porque é impossível para o proletariado libertar-se
como classe sem suprimir a sociedade de classes em geral, sua
consciência, que é a última consciência de classe na história da
humanidade, deve coincidir, de um lado, com o desvendamento da essência
da sociedade e, de outro, tornar-se uma unidade cada vez mais íntima da
teoria e da práxis.(LUKÁCS, 2012, p. 174)

Assim sendo, se faz mister uma revisão acerca de como o debate político, a
divulgação dos agentes políticos e outras atividades inerentes entre as relações de poder
são representadas na atualidade. Para que uma sociedade possa continuar a crescer e
evoluir para o bem de seus cidadãos, assim como as instituições possam melhor administrar
seus papéis socialmente, a autonomia do ser deve ser amplamente valorizada para gerar
um ambiente não só mais singular e crítico, como também mais preocupado em libertar
seus indivíduos das amarras do sistema dominante.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MARX, Karl. Contribuição para a Crítica da Economia Política, ed.


2. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2008.

MARX, Karl. Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844. São


Paulo: Boitempo Editorial, 2004.

ROLO, Márcio. Ocupando os latifúndios do saber: subsídios para o


ensino da ciência na perspectiva politécnica da educação. Rio de
Janeiro, 2012.

LUKÁCS, Georg. História e consciência de classe: Estudos sobre a


dialética marxista, São Paulo. Editora Martins Fontes, 2018.

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