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Rio de Janeiro
2016
AUTONOMIA COMO ELEMENTO DE ESPERANÇA E TRANSFORMAÇÃO SOCIAL:
CRENÇAS DE PROFESSORES SOBRE SEU PAPEL COMO EDUCADORES
Rio de Janeiro
2016
AUTONOMIA COMO ELEMENTO DE ESPERANÇA E TRANSFORMAÇÃO SOCIAL:
CRENÇAS DE PROFESSORES SOBRE SEU PAPEL COMO EDUCADORES
Examinada por:
______________________________________________________________
Presidente: Profa. Doutora Christine Siqueira Nicolaides
______________________________________________________________
Prof. Doutor Rogério Casanovas Tilio - UFRJ
______________________________________________________________
Profa. Doutora Walkyria Alydia Grahl Passos Magno e Silva - UFPA
______________________________________________________________
Profa. Doutora Ana Paula Marques Beato-Canato - UFRJ(1° suplente)
______________________________________________________________
Profa. Doutora Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold - UFRJ (2° suplente)
Rio de Janeiro
2016
DEDICATÓRIA
na importância da educação.
AGRADECIMENTOS
A minha família, por sempre estar ao meu lado, me apoiando em todos os momentos e
valorizando meus esforços.
Aos integrantes do grupo EASEL, por todo o aprendizado que construímos em conjunto.
A minha orientadora Christine Nicolaides, que me acolheu em seu grupo de pesquisa e com
isso me proporcionou um mundo de possibilidades e novos aprendizados. Agradeço-a por
sempre acreditar em nossas ideias e pesquisas.
(Mario Quintana)
CHAVES, Camila da Silva. Autonomia como elemento de esperança e transformação social:
crenças de professores sobre seu papel como educadores. Dissertação de Mestrado, Programa
Interdisciplinar de Pós-Graduação em Linguística Aplicada, Faculdade de Letras,
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2016.
RESUMO
ABSTRACT
The idea of autonomy is not restricted to the individual range. On the contrary, it also
embodies the sociocultural range, understanding education as “as act of intervention in the
world” (FREIRE, 1996, p.109). Under this perspective, the element hope is essential to stand
back from the “education as reproduction” and approach the idea of “education as
transformation” (VIEIRA, BARBOSA, PAIVA e FERNANDES, 2003, p. 219). Teacher’s
autonomy, therefore, can be understood as the process of development of individual as well
as social competences which will have as a continued objective the promotion of self-
determined, inquisitive, and consciously critical minds (theirs as well as their students’),
aiming for social transformations inside and outside of the school environment. Therefore, the
objective of this work was to analyze the beliefs of teachers in a public school in Rio de
Janeiro about their roles in their community of practice as self-determined, socially and
critically engaged members, through a view of education which understands it as a way of
developing emancipation and social transformation, aiming at comprehending how their
beliefs relate to the development of their autonomy. This is a qualitative research with an
interpretivist paradigm and using some ethnographic principles as data triangulation, emic
vision e reflexivity. The data observed was generated through interviews, observation of
teachers meeting and discussion session with the teachers, and revealed that teacher autonomy
can be an element of hope and social transformation. The teachers expresses an understanding
of their role as educators which makes reference to a proactive and responsible participation
that permits cooperation, interdependence and questioning, aiming at performing in a way to
transform society.
LA – Linguística Aplicada
AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. 6
LISTA DE QUADROS........................................................................................................... 11
2 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 18
4 METODOLOGIA................................................................................................................ 49
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este trabalho busca despertar algo que muitas vezes sentimos estar apagado quando se
fala de educação no Brasil: a esperança. Freire (1996) afirma que
Um dos piores males que o poder público vem fazendo a nós, no Brasil,
historicamente, desde que a sociedade brasileira foi criada, é o de fazer muitos de
nós correr o risco de, a custo de tanto descaso pela educação pública,
existencialmente cansados, cair no indiferentismo fatalistamente cínico que leva ao
cruzamento de braços. ‘Não há o que fazer’ é o discurso acomodado que não
podemos aceitar. (FREIRE, 1996, p. 67)
Portanto, a esperança em questão não tem relação alguma com o verbo esperar, pelo
contrário, tem muito mais a ver com fazer, sem se deixar acomodar com a realidade vigente.
Esta, então, é uma esperança baseada no material humano, no agir de professores que lidam
rotineiramente com as problemáticas da educação pública no Brasil.
Já ouvi pessoas dizerem que o professor da escola pública não faz nada, que o ensino é
péssimo e que ninguém se importa. Acontece que eu testemunhei algo diferente. Eu mesma
nunca trabalhei na escola pública, mas convivi desde pequena com minha mãe e minha tia,
que trabalharam neste ambiente durante toda sua vida profissional. Minha mãe é professora de
língua portuguesa e trabalha há 30 anos com ensino público. Minha tia também deu aula de
português, mas passou uma grande parte de sua carreira como coordenadora, diretora adjunta
e, por fim, diretora.
Em todos esses anos, vi minha mãe preparar suas aulas com todo cuidado e contar das
conversas que tinha com alguns alunos que não tinham com quem conversar ou a quem
recorrer. Até hoje, mesmo estando cansada, por muitas vezes frustrada, a vejo preparando
uma aula sobre figuras de linguagem utilizando letras de músicas atuais e depois contando
animada como a aula foi boa e como os alunos ficaram empolgados. Por todos esses anos, a vi
presentear alunos com livros que comprou do próprio bolso porque eles comentavam com ela
que gostariam de ler alguma obra e ela prontamente providenciava.
15
Por causa de minha mãe e minha tia, acabei convivendo com outros professores que
trabalharam com elas e também ouvi muitas histórias. Algumas tristes, outras encorajadoras.
Entretanto, mesmo diante do cansaço e da frustração, o sentimento de fazer alguma coisa por
seus alunos e de mudar algo prevaleceu. Mesmo com todas as limitações, a sensação de
incômodo com a situação acabava sendo uma demonstração de que nem tudo estava perdido.
Essas professoras não haviam desistido, elas persistiam.
É importante destacar que esta pesquisa não tem a intenção de mascarar a realidade do
ensino público, mostrando somente o lado positivo. Entretanto, tem como propósito
reconhecer que o lado positivo existe e que este tem como base o material humano presente
na escola.
Desta forma, este trabalho tem como foco a autonomia de professores, analisada
através de suas crenças. O interesse para desenvolver esta pesquisa surgiu, primeiramente, a
partir de meu ingresso na Faculdade de Letras da UFRJ, que me permitiu ter acesso ao grupo
de pesquisa do qual faço parte há seis anos. O grupo é intitulado de Estudos de Autonomia
Sociocultural em Ensinagem de Línguas (EASEL) e é orientado pela professora doutora
Christine Siqueira Nicolaides.
1
Szundy e Nicolaides (2013) explicam que o termo ensinagem tem sido utilizado “na intenção de substituir os
termos ensino e aprendizagem separadamente, não marcando assim sua dicotomia, mas sua íntima relação no
que diz respeito não só a sua concepção, mas também em termos de práxis pedagógica” (p.15).
2
Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e Cultural.
3
Congresso Brasileiro de Linguística Aplicada
16
Desta forma, com base nas leituras e reflexões proporcionadas pelo grupo de pesquisa,
comecei a me propor alguns questionamentos que acabaram por me guiar no desenvolvimento
desta pesquisa. Algumas destas perguntas foram:
4
Este trabalho deu origem a um artigo publicado nos anais eletrônicos do CBLA: O desenvolvimento da
autonomia sociocultural de aprendizes e sua interação na realização de tarefas em grupo (CHAVES, NERES e
MOREIRA, 2011).
Disponível em: <http://www.alab.org.br/images/stories/alab/CBLA/ANAIS/temas/06_02.pdf >
17
2 INTRODUÇÃO
Dickinson (1994) ressalta que a autonomia deve ser vista como “uma atitude diante da
aprendizagem e não como uma metodologia” (DICKINSON, 1994, p.2), descrevendo, então,
cinco habilidades essenciais para os aprendizes. Sendo estas: “identificar o que está sendo
ensinado, ou seja, estar consciente dos objetivos do professor” (p6); “determinar e
acompanhar seus próprios objetivos, juntamente com aqueles do professor, ou seja, eles são
capazes de formular seus próprios objetivos de aprendizagem” (p6); “selecionar e
implementar estratégias de aprendizagem adequadas” ( p7); “monitorar e avaliar seu próprio
uso de estratégias” (p7); e “monitorar sua própria aprendizagem” (p7).
5
http://www.sinonimos.com.br/autonomia/
19
As primeiras ideias sobre autonomia, portanto, voltavam-se para uma concepção mais
individual de aprendizado. Entretanto, definir autonomia é um trabalho complexo, já que esta
“tem uma variação de possíveis conotações, nem todas elas ligadas ao individualismo”
(OXFORD, 2011, p. 253). A autonomia, desta forma, possui diferentes facetas, que podem ser
exploradas e entendidas dependendo dos diferentes contextos. Raya, Lamb e Vieira (2007, p5)
sugerem que “em lugar de ficarmos restringidos por definições, devemos permanecer
sensíveis e abertos a circunstâncias e contextos particulares”. Desta maneira, em contextos
educacionais, o desenvolvimento da autonomia ultrapassa questões somente individuais,
preocupando-se também com as dimensões sociais. Portanto, a concepção de autonomia que
permeia este trabalho estende-se para além de uma perspectiva individual, do fazer por si
próprio, relacionando-se com uma abordagem sociocultural, entendendo que a autonomia
“envolve não só o indivíduo, mas todo o contexto socio-histórico” (NICOLAIDES e TÍLIO,
2011, p. 178).
Em vista disto, esta pesquisa tem como foco a autonomia de professores, observada a
partir de suas crenças a respeito de seu papel como educadores. Entende-se crenças como
formas de perceber o mundo, pensar e construir a realidade, podendo ser tanto individuais
como sociais. Estas são construídas a partir de processos interativos de interpretação e
ressignificação, constituindo-as como dinâmicas, contextuais e paradoxais. (BARCELOS,
2006).
O contexto escolhido é uma escola pública que atende a uma clientela de crianças que
em sua maioria vive em comunidades carentes, enfrentando problemas de saneamento,
violência, falta de assistência médica, além de negligência por parte dos responsáveis
(informação retirada do Projeto Político Pedagógico6 da escola). A escolha por um contexto
de escola pública mostrou-se mais adequada para os propósitos da pesquisa e mais
condizentes com as motivações que me levaram a desenvolver este trabalho.
6
Toda escola deve elaborar seu Projeto Político Pedagógico (PPP). Este é um documento, que reúne as propostas
de ação e as diretrizes pedagógicas da mesma.
21
Desta forma, com o intuito de responder a estar perguntas, esta dissertação está
organizada em seis capítulos: considerações iniciais, introdução, fundamentação teórica,
metodologia, análise de dados e considerações finais: autonomia e esperança.
O capítulo de análise de dados tem como objetivo apresentar os dados gerados durante
a pesquisa, tecendo diálogos com as teorias que a fundamentam. Este capítulo procura
responder as perguntas de pesquisa utilizando categorias de análise geradas com base na
observação dos dados.
22
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Esta pesquisa situa-se no campo da Linguística Aplicada, doravante LA, buscando dar
voz aos professores e evidenciar sua interação e participação no contexto social no qual
atuam. Para isto, o foco será em suas crenças e como estas se relacionam com o
desenvolvimento de sua autonomia.
A autonomia, por sua vez, é entendida como um construto que integra dimensões
individuais, sociais e políticas. O desenvolvimento da autonomia de professores, portanto, é
um processo contínuo que foca na promoção de capacidades que visem tanto a independência
como a interdependência, estimulando reflexões críticas sobre a educação. Esta por sua vez,
tendo o objetivo de promover a liberdade e a transformação social (RAYA, LAMB e
VIEIRA, 2007).
Portanto, este capítulo tem como objetivo principal situar teoricamente a pesquisa no
âmbito da LA, e, em seguida, explorar os conceitos de crenças e autonomia, propondo um
diálogo entre os mesmos. Para atingir tal objetivo, primeiramente, farei um breve panorama
do que se entende por LA contemporânea, estabelecendo sua relação com este trabalho, para
em seguida, explorar os conceitos de crenças e autonomia que perpassam a pesquisa.
No início dos estudos em Linguística Aplicada, esta surge como “uma disciplina
voltada para os estudos sobre ensino de línguas estrangeiras” (PAIVA, SILVA e GOMES,
2009, p.25). Nesta perspectiva, “as teorias linguísticas forneceriam a solução para os
24
[...] não tem como objeto a aplicação de teorias que partem de outras áreas como a
própria linguística, educação, psicologia, sociologia ou antropologia, constituindo
uma área autônoma que estabelece diálogos interdisciplinares com estas outras áreas
em processo de compreensão e transformação de contextos situados de usos da
linguagem. (SZUNDY & NICOLAIDES, 2013, p.15)
A pesquisa em LA no Brasil cada vez mais transita por outros contextos que não a sala
de aula de línguas, estimulando o diálogo com outras áreas de conhecimento. Assim, “a
questão da pesquisa, em uma variedade de contextos de usos da linguagem, passou a ser
iluminada e construída interdisciplinarmente. Tal perspectiva tem levado à compreensão da
LA não como conhecimento disciplinar, mas como indisciplinar” (MOITA LOPES, 1998;
apud MOITA LOPES, 2006, p.19), já que não está vinculada diretamente a uma ‘disciplina-
mãe’, como a Linguística, permitindo-se estar na fronteira e caminhando por diferentes áreas
das ciências sociais e humanas.
Este movimento de diálogo com diferentes teorias do campo das ciências sociais e
humanidades, Moita Lopes (2006, p.14) chama de LA mestiça, que tem como objetivo “criar
inteligibilidade sobre problemas sociais em que a linguagem tem um papel central”. Desta
maneira, mostra-se importante levar em conta as mudanças e características sociais, culturais
e históricas dos contextos de pesquisa e dos participantes envolvidos.
Fabrício (2006, p.48) destaca que a LA passa por “um momento de revisão de suas
bases epistemológicas” em que é importante a compreensão dos seguintes elementos.
Estas observações são cruciais para refletir sobre uma nova agenda de pesquisa em LA
que considere os contextos de uso da linguagem, admita a impossibilidade da neutralidade,
entenda que significados fixos não existem, especialmente no mundo globalizado. Fabrício
(2006) traz um esboço do que significa a globalização.
Está em operação um campo de forças plurais que entrelaça uma série de novos
significados, modos de produção de sentido, práticas, técnicas, instituições,
procedimentos de subjetivação e relações discursivas, tornando problemática a
adoção de pontos de vista e explicações causais simplistas a respeito de fenômenos
sociais. (FABRÍCIO, 2006 , p.47)
Os pressupostos teóricos desta pesquisa passeiam por teorias dos campos das ciências
humanas e sociais, buscando uma relação dialógica entre essas ideias, com o objetivo de
proporcionar visibilidade para contextos do mundo em que vivemos, através do entendimento
da linguagem como prática social.
bem como dos membros da comunidade escolar, colocando em foco a fala dos professores,
evidenciando seus sentimentos, crenças, convicções e frustrações, bem como suas atitudes e
ações.
Para isto, na próxima seção o conceito de crenças será explorado, visando uma melhor
compreensão de sua relação com as atitudes e autonomia dos professores.
Pajares (1992) lista alguns conceitos associados à ideia de crenças citados na literatura
de psicologia educacional sobre o assunto, indicando a complexidade na definição de tal
termo.
Assim, a percepção de crenças está ligada aos valores, concepções, ideias, pontos de
vista, maneiras de entender a vida social, que fazem parte da nossa compreensão do mundo,
influenciando também a maneira como agimos nele.
28
Barcelos (2006, p. 25) aponta essa relação complexa entre contexto, crenças e ações,
mencionando três maneiras de se perceber as relações entre crenças e ações descritas por
Richardson (1996):
A primeira seria uma relação de causa e efeito, em que crenças influenciam ações. A
segunda seria uma relação interativa em que as crenças e ações se influenciam
mutuamente. E a terceira seria dentro da tradição hermenêutica que sugere “uma
relação complexa entre as crenças de professores e suas ações” (RICHARDSON,
1996, p.104; apud BARCELOS, 2006, p.25)
interativa traz um movimento de troca, no qual as crenças influenciam as ações, assim como
as experiências e reflexões sobre ações podem transformar as crenças de alguma maneira A
relação hermenêutica aponta para duas possibilidades: a de as crenças não terem
correspondência com as ações; e a influência do contexto sobre as crenças.
Barcelos (2006, p.32) acredita que “a compreensão mais aprofundada das crenças fica
difícil sem a análise das ações dentro de um contexto, principalmente tendo em vista a
complexidade das crenças e a força dos fatores contextuais”. Medrado (2009, p.94-95)
também destaca a importância de olharmos “para o contexto social e histórico no qual os
professores estão inseridos, tentando observar como esse contexto define/ influencia a
representação que eles têm de si mesmos e dos lugares que ocupam, com base nas escolhas
que fazem discursivamente”. Desta maneira, para entender as crenças e atitudes de
professores no ambiente escolar, é preciso entender, analisar e observar este contexto do
ponto de vista sócio-histórico-cultural.
Com base em uma breve revisão de estudos na área da psicologia, Barcelos (2013)
aponta que a relação complexa entre emoções e crenças que podem ter repercussões na
construção das identidades. A autora destaca que
Desta forma, as identidades, por sua vez, também encontram relação com os conceitos
de crenças e emoções. Barcelos (2013) revela características semelhantes nas definições
destas três concepções:
abordagem busca “entender a crença como um fenômeno construído nas relações de natureza
dinâmica que acontecem em um determinado contexto de um meio maior”.
A análise das crenças dos professores sobre seu papel na comunidade de prática
escolar precisa levar em conta a realidade em que lecionam, suas identidades, suas emoções e
suas histórias de vida, para estabelecer relações com o desenvolvimento da autonomia desses
professores. Nicolaides (2010) destaca a importância de levar em conta a abordagem
contextual ao estudo de crenças, explicando que nesta perspectiva,
3.3 AUTONOMIA
Nas redes sociais, a propaganda foi comparada a música e clipe de ‘Another Brick in
the Wall’(ANEXOS 2, 3, 4) da banda Pink Floid. No clipe desta música, os alunos aparecem
sentados em carteiras escolares, enfileirados em uma esteira industrial, e adentram uma
máquina que os deixa sem rosto, ou seja, os uniformiza em uma máscara única. A música fala
sobre o caráter uniformizador que a educação pode ter.
Em sua obra Pedagogia da Autonomia (1996), Paulo Freire não define diretamente
autonomia, mas traz conceitos importantes que ajudam a construir uma ideia de autonomia,
sua importância na vida escolar, e como docentes e discentes têm papel fundamental no
desenvolvimento da mesma. O autor afirma, por exemplo, que “não há docência sem
discência” (FREIRE, 1996, p. 21), ou seja, “quem forma se forma e re-forma ao formar e
9
Nota de repúdio disponível em: http://www.adufrj.org.br/index.php/noticias-destaque/2035-faculdade-de-
educa%C3%A7%C3%A3o-repudia-propaganda-de-mau-gosto-da-prefeitura.html
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quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (p.23). Esta é uma visão que rejeita o
entendimento da educação como transmissão de conhecimento, assumindo que a docência e a
discência “não se resumem à condição de objeto, um do outro” (p.23). Portanto, aprender e
ensinar são processos imbricados, podendo ser chamados então de um só processo, o de
“ensinagem”.
A partir destas ideias expostas por Paulo Freire (1996), podemos perceber que a
autonomia não se restringe ao plano individual, nem ao autodidatismo, mas se estende para o
plano sociocultural, abrangendo tanto docentes como discentes e destacando uma visão de
educação como “um ato de intervenção no mundo” (FREIRE, 1996, p.109).
autonomia como “a situação na qual o aprendiz é totalmente responsável por todas as decisões
relativas ao seu aprendizado e a implantação dessas decisões”. Little (1999), por sua vez,
entende que a autonomia se desenvolve quando o indivíduo aceita a responsabilidade por seu
próprio aprendizado. Estas definições têm grande correlação com a ideia de independência do
aprendiz, ou seja, sua capacidade de fazer escolhas e controlar seu próprio aprendizado, de
modo a aprender sozinho. Estas concepções, entretanto, deixam de lado possíveis implicações
socioculturais que permeiam o desenvolvimento da autonomia.
Nicolaides (2003), por sua vez, acrescenta um viés social à definição de autonomia,
destacando a importância tanto da independência, mas também da autonomia do aprendiz em
sua atuação ativa em contextos sociais. A autora entende que ser autônomo significa:
[...] saber definir metas; entender seu papel de aprendiz como responsável pelo
processo de busca e apreensão do conhecimento; estar apto a definir formas de
buscar seu conhecimento desenvolvendo habilidades e técnicas para trabalhar de
forma independente e em outros contextos diferentes do acadêmico; ser capaz de
detectar suas dificuldades e procurar soluções para serem implementadas tendo
maior controle sobre sua aprendizagem; conseguir avaliar-se não só no final, mas
durante o processo de aprendizagem; desenvolver a capacidade de exercer
autonomia como aprendizes nas oportunidades oferecidas pelo contexto de forma
responsável e assim, tomar consciência de seu papel modificador do meio social no
qual está inserido. (NICOLAIDES, 2003, p. 91-92)
Benson (1997), por sua vez, também destaca três ângulos de visão da autonomia de
aprendizes. O autor sugere um modelo separado em três versões: técnica, psicológica e
10
Comunidades de prática, segundo Wenger (1998), estão em todos os lugares e participamos de inúmeras delas
ao mesmo tempo. Os membros destas (chamados de practicioners) são naturalmente conectados pelo que fazem
juntos, compartilhando rotinas, vocabulário, estilos e etc. Wenger (2015) define comunidade como “um grupo de
pessoas que compartilham uma preocupação ou uma paixão a respeito de algo que fazem, e aprendem a fazê-lo
melhor a medida que interagem regularmente” (p.1). Uma comunidade de prática, portanto, possui uma
identidade definida por interesses que levam os envolvidos a aprenderem uns com os outros.
35
política. A versão técnica busca inspiração no positivismo e está relacionada com aprender
uma língua fora do contexto de sala de aula. O aprendiz se depara com situações em que tem
que tomar responsabilidade por seu próprio aprendizado e “o principal objetivo é equipar o
aprendiz com habilidades e técnicas que lhes permitam lidar com situações que possam
surgir” (BENSON, 1997, p. 18). A versão psicológica tem como base o construtivismo e o
desenvolvimento da autonomia é visto como uma transformação interna do indivíduo, uma
capacidade, um construto de atitudes e habilidades. A versão política tem relação com a teoria
crítica e diz respeito ao controle sobre o processo e conteúdo do aprendizado. O aprendiz deve
ser capaz de “controlar tanto seu aprendizado individual e como o contexto institucional no
qual este se insere” (BENSON, 1997, p 18).
Oxford (2003) apresenta uma crítica ao modelo proposto por Benson, fazendo as
seguintes observações: o modelo valoriza excessivamente a versão política, não contempla a
perspectiva sociocultural, concentra estratégias de aprendizado apenas na versão técnica e não
mostra construtos importantes para cada versão, como contexto, agência, motivação e
estratégias de aprendizagem.
Para a autora, contexto refere-se a “toda situação, pano de fundo, cenário ou ambiente”
(OXFORD, 2003, p.80) relevantes para a aprendizagem. Desta forma, o contexto pode ser a
situação física, o ambiente de maneira geral, o conjunto de ideologias que permeiam uma
determinada interação, o cenário sociocultural ou as comunidades de prática. A agência, por
sua vez, significa “a qualidade de ser uma força ativa para produzir um efeito” (OXFORD,
2003, p.80), podendo referir-se a características psicológicas do indivíduo, a autorregulação,
participação ativa ou controle sobre uma situação. A motivação é “a condição de ser movido
para a ação ou o desejo interno de produzir uma ação” (OXFORD, 2003, p.80), tendo relação
com vontade ou desejo de autorregulação, de fazer parte de uma comunidade, ou de ter voz
própria, podendo ser influenciada por fatores situacionais e apresentando também graus de
intensidade. As estratégias referem-se ao plano que se faz para atingir um objetivo, podendo
ser ferramentas, atributos psicológicos, estratégias cognitivas e metacognitivas. Estas podem
ser aprendidas na interação e têm potencial para obter acesso a estruturas de poder e
alternativas culturais (OXFORD, 2003).
11
Oxford (2003) entende que a auto-regulação (self-regulation) acontece quando um par mais experiente
funciona como andaime para dar assistência a um par menos experiente, tendo como objetivo a agência do
último, ou seja, sua atuação de forma intencionalmente independente.
37
A versão sociocultural II não tem a autonomia como objetivo principal, mas sim a
participação – inicialmente periférica e depois mais completa – na comunidade de prática.
Baseada nos trabalhos de Rogoff e Lave (1984), Lave e Wenger (1991) e Wenger (1998),
também considera a mediação no processo de aprendizado. Porém, nesta perspectiva o
indivíduo não é tão importante quanto a comunidade de prática. O foco, portanto, é no
contexto, nas relações que acontecem nesta comunidade e no ambiente cultural e social.
Desta forma, nas duas seções a seguir, o conceito de autonomia de professores será
discutido, partindo de algumas visões sobre o assunto para um estudo mais aprofundado sobre
o conceito de autonomia adotado neste trabalho.
38
Benson (2008) acredita que os professores enxergam sua própria autonomia como
uma sugestão para a tomada de controle por parte do aprendiz. O autor argumenta sobre
diferentes perspectivas que aprendizes e professores têm sobre autonomia. Estas diferenças
resultariam das estruturas de poder que permeiam as relações entre esses indivíduos. O autor
acredita que
Desta forma, Benson (2008) descreve uma autonomia de professores com o objetivo
exclusivo de promover a tomada de controle por parte do aluno, restringindo-a ações como
organização curricular e da sala de aula dentro dos paradigmas institucionais. Esta visão não
contempla a autonomia docente de maneira completa e acaba por excluir outras facetas
importantes, como a interação e cooperação entre professores, a possibilidade de
autorregulação e o cultivo de um olhar mais crítico e contextualizado sobre a realidade
sociocultural que envolve a vida escolar.
Shaw (2008, p.187) apresenta algumas questões sobre a relação entre autonomia de
alunos e professores: “é possível que não haja relação nenhuma entre estes dois construtos?”;
“é possível que o excesso de estresse para realizar a autonomia do aluno possa ser prejudicial
para a autonomia do professor?”; “é possível que professores trabalhando independentemente
um dos outros sejam realmente autônomos?”. Shaw sugere que não há necessariamente uma
conexão entre autonomia de alunos e autonomia de professores, podendo haver ou não,
dependendo do contexto. O autor acredita que a autonomia do professor pode ser prejudicada
pela crença da necessidade da autonomia do aprendiz, que nem sempre tem conexão com as
necessidades dos mesmos. Ele entende que o diálogo é necessário “com professores como
companheiros críticos, motivados a questionar as suposições uns dos outros e explorar novos
caminhos para questionamentos” (SHAW, 2008, p.200). Neste processo, os professores
seriam capazes de compartilhar compreensões e buscar a melhor adaptação para seus cursos e
programas (SHAW, 2008).
A autonomia de professores, sob esta visão, está voltada para questões como a
promoção de uma prática mais crítica e ao mesmo tempo coletiva, valorizando o trabalho em
grupo e o estímulo à autonomia do aprendiz. Desta forma, o desenvolvimento profissional
tem reflexos nas ações práticas.
Baseando-se nos trabalhos de McGrath (2000) e Smith (2000), Smith (2003) destaca
algumas dimensões da autonomia do professor relacionadas com a ação e o desenvolvimento
profissionais, como é possível observar no quadro explicativo abaixo.
Vieira et. al. ainda (2008, p.219) definem a autonomia do professor como “disposição
e habilidade para administrar obstáculos dentro da visão de educação como forma de
liberação e empoderamento”. As autoras acreditam que o elemento esperança é essencial para
se afastar da “educação como reprodução” e se aproximar dessa ideia de “educação como
transformação”. Transformar, então, torna-se um ato ideológico, que também exige
compreender o fato de que somos “limitados pelas forças históricas e culturais que agem
sobre nossa personalidade pessoal e profissional” (VIEIRA et.al. 2008, p.218). No que diz
respeito à formação de professores, a compreensão dessa dimensão socio-histórica, aliada a
elementos como experimentação, regulação e negociação, são apontados pelas autoras como
fatores essenciais para o desenvolvimento de uma pedagogia para a autonomia.
Raya, Lamb e Vieira (2007, p.4) acreditam que uma das razões para desenvolver uma
pedagogia para a autonomia está na “nossa disposição e necessidade humanas de nos
tornarmos indivíduos autodeterminados e participantes ativos nas comunidades sociais”. Os
autores afirmam que
uma pedagogia para a autonomia implica que professores se tornem agentes de
mudança, pelo que uma das principais razões para promover prende-se com o
fato de favorecer também a emancipação do professor. Embora este aspecto de
uma pedagogia para a autonomia tenha sido frequentemente ignorado ou entendido
como um efeito secundário, entendemos que o desenvolvimento da autonomia
dos alunos está ligado ao desenvolvimento da reflexividade dos professores e
pode promover a sua disposição e capacidade para desafiarem o status quo e
lutarem por melhores condições educacionais e sociais. (RAYA, LAMB e
VIEIRA, 2007, p.4)12
12
Grifo meu em negrito.
43
Desta forma, a proposta de uma pedagogia para a autonomia busca enquadrar três
domínios: o contexto, o aluno e o professor (RAYA, LAMB e VIEIRA, 2007). A partir desta
proposta, Raya, Lamb e Vieira (2007) propõem uma definição comum para autonomia do
aluno e do professor, pretendendo “enfatizar a sua natureza semelhante, bem como a sua
interdependência em contextos escolares” (RAYA, LAMB e VIEIRA, 2007, p.2). Afirmam
ainda que “a adopção de uma definição independente do sujeito visa alargar o seu âmbito e
sublinhar o seu potencial transdisciplinar” (RAYA, LAMB e VIEIRA, 2007, p.2). Deste
modo, a definição proposta pelos autores, e que servirá como base para esta pesquisa, entende
a autonomia como “competência para se desenvolver como participante autodeterminado,
socialmente responsável e criticamente consciente em (e para além de) ambientes educativos,
por referência a uma visão da educação como espaço de emancipação (inter) pessoal e
transformação social” (RAYA, LAMB e VIEIRA, 2007, p.2). Esta definição de autonomia
não está voltada somente para a questão do aprendizado e do aprendiz, mas também para a
importância de questões sociais, culturais e históricas que envolvem tanto alunos como
professores. Ademais, destaca a importância de uma visão de autonomia voltada para a
transformação e para uma emancipação que se expanda para além do ambiente escolar.
13
Grifo meu.
44
aos indivíduos exercer o direito de desenvolver a sua autonomia e, por conseguinte, promover
a aprendizagem ao longo da vida, tanto dentro como fora das instituições educativas” (RAYA,
LAMB e VIEIRA, 2007, p. 3).
A autonomia proposta guia-se por uma visão da educação como espaço de
emancipação (inter)pessoal e transformação social, compreendendo que
Através desta perspectiva de autonomia, Raya, Lamb e Vieira (2007, p.44) pretendem
situar a “autonomia profissional numa perspectiva social e política mais ampla”, promovendo
a interligação entre a autonomia do professor e do aluno. Compreende-se, portanto, que
a autonomia do professor (tal como a autonomia do aluno) pode ser vista como
uma competência relacional onde a autodeterminação é simultaneamente
constrangida e potenciada pela responsabilidade social, o que significa que o seu
crescimento assenta na interdependência entre o Eu e o Outro. Evolui através do
diálogo, direto ou mediado, com vozes significativas na comunidade educacional, da
negociação e do compromisso, da sensibilidade moral em relação a situações
problemáticas, da abertura à diversidade e à consciência crítica dos contextos, da
participação na tomada de decisões e da voz. Tudo isto está ao serviço da
emancipação (inter)pessoal e da transformação social. (RAYA, LAMB e
VIEIRA, 2007, p.46)14
14
Grifo meu.
46
principais de uma competência profissional que tem a função de facilitar a autonomia tanto de
professores como de seus alunos. Estas dimensões estão envoltas em observações baseadas na
autorreflexão sobre valores, crenças e disposições, assim como a autorreflexão sobre como
colocar esses elementos em prática e também a autorreflexão sobre ações profissionais e
agência.
Para melhor compreender do que se tratam essas dimensões, segue um quadro
explicativo e resumido, com base nas ideias de Raya, Lamb e Vieira
(2007), apresentando as principais intenções e reflexões sugeridas em cada uma destas. Estas
dimensões também serão utilizadas na análise, assim como os elementos da autonomia do
professor mencionados anteriormente.
aprendizagem (expectativas,
necessidades e interesses individuais)
com a natureza social e interativa da
cultura de aula e da escola” (p.48)
fomentação da autoestima dos alunos;
promoção de envolvimento dos alunos
no processo de experimentação,
Centralização do ensino na formulação de estratégias e tomada de
aprendizagem responsabilidades que envolvem a
aprendizagem (p.48-49).
compartilhamento de “teorias, práticas e
preocupações com membros da
comunidade profissional”, convidando
Interação na comunidade profissional colegas de trabalho, membros da equipe
escolar e alunos para buscar melhorias e
trabalhar em conjunto;
colocar questões para debate e
participar ativamente das
“problemáticas da escola e da educação
em geral” (p.49)
Quadro 3: Dimensões reflexivas sobre as competências profissionais do professor, voltadas para o
desenvolvimento da autonomia. (RAYA, LAMB e VIEIRA, 2007)
uma sociedade melhor e mais justa (NICOLAIDES, 2010). Ou seja, um olhar mais atento para
o contexto social pode permitir uma participação mais ativa, responsável e crítica dos
membros da comunidade escolar, tendo como objetivo mudanças sociais significativas.
A autonomia de professores, portanto, pode ser compreendida como um processo de
desenvolvimento de competências tanto individuais quanto sociais que terão como objetivo
contínuo a promoção de mentes autodeterminadas, questionadoras e criticamente conscientes
- tanto as suas como a de seus aprendizes -, visando transformações sociais dentro e fora do
ambiente escolar.
Portanto, para melhor compreender o desenvolvimento da autonomia dos professores
no ambiente escolar é importante buscar um entendimento sobre suas crenças como
educadores. Desta forma, este trabalho tem como objetivo principal analisar as crenças de
professores de uma escola pública sobre seu papel de educadores em sua comunidade de
prática como membros autodeterminados, engajados socialmente e críticos, através de uma
visão da educação como meio de desenvolver emancipação e transformação social, buscando
compreender como estas crenças se relacionam com o desenvolvimento de sua autonomia.
Esta análise se dará a partir de dados gerados através de anotações em diário de pesquisa,
entrevistas individuais, observação de conselho de classe e sessão de discussão entre os
professores, como será observado no capítulo seguinte dedicado à metodologia.
49
4 METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada em uma escola municipal na Zona Norte15 da cidade do Rio de
Janeiro que abriga desde a educação infantil até o sexto ano do ensino fundamental. É
importante ressaltar que a última série faz parte do projeto “sexto ano experimental”, no qual
as aulas de Português, Matemática, Ciências, História e Geografia são ministradas por PII
(professores de primeiro a quinto anos, formados em pedagogia ou com formação em ensino
médio Normal), enquanto as aulas de inglês, educação física e artes são ministradas por PI
(professores licenciados nas respectivas áreas).
A escola define em seu PPP o objetivo de “construir uma educação que atenda às
necessidades dos alunos, valorizando todos os envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem, democratizando o saber, despertando o prazer de aprender, de ler e de
pesquisar”. Dentro deste objetivo, um dos princípios destacados é a construção do indivíduo
“que respeite a individualidade, seja autônomo, capaz de invenção e progresso, digno e
solidário e consciente de seu contexto histórico”.
que trabalham em um sistema frequentemente criticado pela opinião pública e que sofre com
diversas dificuldades, dentre elas a carência de recursos das próprias escolas, mas também a
carência enfrentada pelos aprendizes que as frequentam.
É relevante, portanto, dar voz a esses professores e evidenciar a realidade escolar que
pode (e vai) além dos fatores negativos, como precariedade do ambiente físico da escola,
problemas médicos dos alunos que interferem em seu desempenho escolar, falta de suporte
dos órgãos governamentais, dentre outros. Ao colocar em evidência as crenças dos
professores, é possível perceber uma energia direcionada para a superação destas dificuldades,
proveniente de uma conscientização e aproximação com a realidade que vivenciam
rotineiramente.
Esta pesquisa, por adotar o princípio etnográfico da visão êmica, valoriza a visão dos
participantes, bem como suas crenças, identidades e emoções. Portanto, com o objetivo de
destacar estes elementos, a próxima seção é dedicada à descrição dos professores participantes
desta pesquisa.
4.3 PARTICIPANTES
doando o uniforme e o encorajando a continuar as aulas. HUGO disse que naquele momento
pensou: “quando eu crescer quero ser igual a esse cara, ajudar as pessoas” (dados da
entrevista realizada em 28 de maio de 2014). Ele explica que gosta muito da profissão e que a
entende como sua verdadeira vocação, mesmo com todas as dificuldades da carreira.
RÔMULO tem 29 anos e leciona a disciplina de língua inglesa há mais de dez anos.
Ele relatou que iniciou na profissão trabalhando de forma voluntária em uma ONG e
posteriormente em cursos particulares, iniciando no ensino público há cerca de cinco anos.
Rômulo explicou que uma de suas frustrações é a falta de interesse dos alunos e que já pensou
algumas vezes em mudar de carreira.
TÂNIA tem 56 anos e trabalha como professora há 30 anos, sendo 12 destes na escola
pesquisada. Ela relatou que sempre quis ser professora desde jovem e, por isso fez curso
normal. No momento ela trabalha com turmas de alfabetização e realfabetização17 e ressalta a
importância de estimular a autoestima de seus aprendizes.
SANDRA tem 38 anos e está na carreira de magistério há 19 anos, desde que terminou
seu curso normal, sendo dois anos na escola atual. Recentemente se formou em língua
portuguesa, mas afirma que sua maior motivação é trabalhar com turmas de alfabetização.
Recentemente ela sofreu algumas decepções com a profissão por ter recebido ameaças de
alunos e mães de alunos.
CRISTINA tem 49 anos e diz ter escolhido essa profissão por querer ajudar a quem
teve uma origem como a dela. Filha de mãe semianalfabeta e pai analfabeto, ela teve que se
esforçar muito e pedir ajuda de vizinhos com seus estudos. CRISTINA trabalha por cerca de
20 anos como professora.
17
O projeto de realfabetização faz parte do Projeto de Reforço Escolar na Prefeitura do Rio de Janeiro e tem
como objetivo a realfabetização de alunos que mesmo tendo avançado nos anos escolares, são analfabetos
funcionais.
56
MARIA tem 48 anos, trabalha há 30 anos em escolas públicas. Ela diz que nunca se
imaginou em outra profissão e acredita que mesmo diante de todas as dificuldades que
enfrentam, a maioria dos professores se dedica e tenta fazer o seu melhor.
Os dados da presente pesquisa foram gerados durante o ano de 2014, tendo início no
dia 28 de maio de 2014 e se estendendo até 18 de dezembro de 2014. Primeiramente, foi
pedida a autorização da diretora da escola, que conversou com os professores, caso
desejassem se voluntariar para participar da pesquisa. Sete professores decidiram contribuir
com as entrevistas e com a sessão de discussões, enquanto o restante dos professores não se
opôs à minha presença e à gravação em áudio dos conselhos de classe. Os professores
participantes assinaram um consentimento autorizando a utilização dos dados de pesquisa
(ANEXO 6).
A geração de dados foi dividida em três etapas, sendo estas:
Estas etapas foram levadas em concomitância com meu diário de pesquisa que
continha anotações, observações e reflexões sobre todo o processo de pesquisa.
4.4.1 ENTREVISTAS
Durante estas reuniões, foi possível observar como os professores exercem sua
autonomia tanto de forma autodeterminada como na interação com a comunidade de prática e
com os membros da mesma. Ficaram evidentes nestas observações, as vozes e as
possibilidades e constrangimentos em relação a seu empoderamento como professores.
No dia 18 de dezembro de 2014, foi feita uma sessão de discussão com os professores,
com o objetivo de entender melhor suas crenças sobre seu papel no ambiente escolar. Esta
discussão foi gravada em áudio e transcrita posteriormente, e girou em torno das seguintes
palavras: professor, escola e aluno. As palavras foram apresentadas e eles tiveram que discutir
entre si o que estas significavam para eles, assim como que ideias vinham as suas mentes ao
pensarem nessas palavras.
59
Durante a sessão, interferi eventualmente para fazer algumas poucas perguntas ou para
apresentar a palavra seguinte a ser discutida. Na grande maioria do tempo, os professores
conversaram entre si, explicitando suas crenças a respeito das questões que envolvem as três
palavras discutidas.
Este instrumento de pesquisa enquadra-se no pressuposto etnográfico da visão êmica,
buscando valorizar a voz dos participantes. Portanto, a sessão de discussão foi útil para
explorar o entendimento dos professores sobre seu papel na comunidade de prática escolar,
afinal, ao exporem suas opiniões e pensamentos sobre as palavras professor, escola e aluno,
deixaram aflorar suas crenças e emoções, que nos permitem entender melhor sua relação com
o atual cenário educacional e com o seu papel como educadores.
O diário de pesquisa foi mantido desde o início da mesma, como objetivo de anotar
minhas impressões sobre todo o processo. Nele foram registradas minhas impressões sobre a
escola, os professores e os acontecimentos com os quais me deparei no decorrer da pesquisa,
além de minhas reflexões sobre os rumos da pesquisa.
A utilização deste instrumento permitiu desenvolver a reflexividade, entendendo que a
bagagem cultural da pesquisadora que interfere em sua forma de enxergar o mundo ao redor.
Portanto, o diário de pesquisa foi utilizado tanto para registrar minhas impressões, mas
também como fonte de reflexão sobre minhas ideias e sobre todo o processo de pesquisa.
Nesta seção, serão definidas as categorias de análise, que têm como base,
primeiramente, os dados gerados durante a pesquisa, ou seja, as crenças e atitudes de
professores que surgiram no decorrer da investigação. Em concomitância, consideram-se
também os seguintes elementos: a definição de autonomia e as dimensões reflexivas –
direcionadas ao professor - de competência profissional visando a autonomia, ambas
apresentadas por Raya, Vieira e Lamb (2007). Por esta razão, estão intimamente conectadas
com as perguntas e objetivos de pesquisa.
A definição proposta pelos autores engloba uma autonomia que tem como objetivo
promover a emancipação (inter)pessoal e a transformação social dentro e fora do ambiente
60
4.5.1 ADAPTAÇÃO
4.5.3 COOPERAÇÃO
4.5.4 TRANSFORMAÇÃO
Desta forma, este capítulo teve como objetivo descrever os percursos metodológicos
desta pesquisa. Na primeira seção, foram delimitados os objetivos, natureza e perguntas de
pesquisa. Em seguida, na segunda seção, foi feita a descrição do contexto. A terceira seção foi
dedicada a caracterização dos participantes, contando um pouco de sua trajetória. Os
procedimentos e os instrumentos utilizados para a geração de dados foram detalhados na
quarta seção. Na última seção, foram especificadas as categorias de análise e como elas se
relacionam com as perguntas de pesquisa. Estes procedimentos e percursos serviram de guia
para o próximo capítulo, que é dedicado à análise de dados.
63
5 ANÁLISE DE DADOS
Este capítulo tem como objetivo apresentar e analisar os dados, de maneira a dialogar
com as teorias que fundamentam esta pesquisa e entender como as crenças de professores
sobre seu papel no ambiente escolar se relaciona com a autonomia dos mesmos. Essa relação
será analisada de acordo com as crenças e ações (BARCELOS, 2006) apresentadas nos dados,
tendo como fundamento, a definição de autonomia proposta por Raya, Lamb e Vieira (2007) e
as reflexões propostas pelos mesmos autores aos professores com vistas à promoção de uma
pedagogia para a autonomia. A intenção é observar como as crenças dos professores se
relacionam com os seguintes elementos provenientes destas teorias: participação
autodeterminada, participação socialmente responsável e participação criticamente consciente,
assim como, construção de uma visão crítica da educação, gestão de constrangimentos locais
para a criação de espaços de manobra, centralização do ensino na aprendizagem e interação na
comunidade profissional. Todos estes elementos estão permeados por uma visão de educação
promotora da autonomia dos participantes da comunidade em questão, que tem como
propósito a emancipação (inter) pessoal e a transformação social, alcançando horizontes para
além do ambiente escolar.
A partir dos dados gerados, quatro categorias foram geradas, as quais relacionam-se
com as crenças e atitudes autônomas dos professores observadas durante a pesquisa. Estas
são: adaptação, empatia, cooperação e transformação. Cada uma das categorias está conectada
a um ou mais dos elementos supracitados, como será possível observar na análise dos dados
nas sessões deste capítulo.
5.1 ADAPTAÇÃO
Os dados destacados nesta sessão têm como objetivo evidenciar as crenças e atitudes
de professores que se relacionam com uma autonomia voltada para a adaptação consciente
perante a realidade encontrada na comunidade de prática observada. Freire (1996, p.19)
afirma que “como consciência presente no mundo não posso escapar à responsabilidade ética
do meu mover-me no mundo”. Deste modo, os dados aqui observados destacam um
64
movimento consciente, entendendo que professores podem ser agentes de mudança (RAYA,
LAMB e VIEIRA, 2007, p.6).
RÔMULO: Então, o material deles é bom. Nosso material é feito pela Cultura18, a mesma
empresa que faz o livro da Cultura faz o livro da Prefeitura. É ótimo, só que não condiz com
a realidade dos alunos. Você chega num quinto ano, a maioria, 80% dela já sabe o que é
beijar na boca e além, você vai ficar falando pra ela do coelhinho da Alice que tá atrasado?,
Que o sol está feliz?, não condiz, entendeu?
RÔMULO: Sinceramente, eu não penso assim, eu tenho que dar o cronograma que lá em
cima quer. Eu tenho que dar o que vai servir pro meu aluno. Eu já fui aluno um dia, então
assim, de que adianta o carinha, ele já vem pra escola ‘p’ da vida porque tem que vir pra
escola, que a maioria é assim, eu tento aproximá-lo pra que ele não crie um problema maior
na sala de aula, pra não atrapalhar tanto o colega do lado.
18
Cultura Inglesa, curso de idiomas.
65
RÔMULO: Às vezes eu pego o material do curso, trago. Porque ‘ah, a gente não sabe falar’,
mas uma coisa ou outra, pra falar é fácil, por exemplo, eles adoram quando começa a falar
nomes de fruta ou de comida. Então, eu procuro incentivar eles a falarem.
TÂNIA: A criança, quando ela passa da idade de ser alfabetizada, ela se torna uma criança
muito desinteressada. Então você realmente tem que arrumar outras maneiras de poder
chamar atenção, diferente daqueles cinco anos que ele já viu, entendeu? Quer dizer, então o
livro didático ele não funciona. A apostila ela já vem prontinha e coisa e tal. Só que você tem
66
que dar outros exercícios por fora né. Exercícios de alfabetização mesmo. ‘Olha aqui cara, b
com a é bá, l com a é lá’, bem método tradicional mesmo, pra que ele possa entender a
sequência e possa ler. Não adianta você vir com sonzinho, método fônico, a coisa da
abelhinha. Não adianta. A historinha do A. O A foi dar a mão ao I, e coisa e tal. Não adianta.
RÔMULO: Nos projetos eles não tem livros. Eu acho injusto, no caso o Realfa, eles são
semialfabetizados. Pô, vou trazer um livro pra eles, de primeiro ano, segundo ano, o cara vai
tacar o livro na minha cabeça. Então não, prefiro eu montar o material com eles. Uso
quadro, trago uma folha, ‘vambora, atividade’, trago wordsearch que eles amam.
pode atingir em sala de aula. Por este motivo, ela apoia uma abordagem baseada em um
diagnóstico sobre possibilidades do aprendiz, como podemos observar no excerto 6.
SANDRA: No início do ano a gente faz o diagnóstico, e aí a gente vê o que o aluno sabe e o
que ele não sabe. Então eu não posso pegar e trabalhar os objetivos que a prefeitura
estabelece se o aluno, por exemplo, ele não sabe ler. Eles cobram a leitura, interpretação e o
aluno não sabe ler, ainda não identifica o alfabeto.
MARIA: Eles precisam que você pare, que você converse, que você discipline mais do que
você ensina. Então a minha estratégia toda é baseada naquilo que eu conheço deles, que eu
aprendi a conhecer. Então é o tempo.
MARIA entende que conhecer os alunos, conversar, gerenciar, são atitudes necessárias
para desenvolver seu planejamento. Freire (1996, p. 45) acredita que “pormenores assim da
cotidianidade do professor, portanto igualmente do aluno, a que sempre pouca ou nenhuma
atenção se dá, têm na verdade um peso significativo na avaliação da experiência docente”. O
desenvolvimento de sua relação com os alunos ao longo do tempo parece permitir que
MARIA adote estratégias para suas turmas e, assim, crie espaços de manobra em sala de aula.
Ao final das entrevistas individuais, percebi uma unidade no discurso dos professores.
Todos afirmaram ter liberdade e ao mesmo tempo apoio da equipe, algo que disseram nem
sempre encontrar em outros ambientes de trabalho. Esta homogeneidade de opiniões me
chamou a atenção e fiz a seguinte anotação em meu diário de pesquisa.
68
O engraçado é que os professores tiveram um discurso parecido, o que demonstra uma certa
“unidade” dentro do ambiente escolar. Todos disseram, por exemplo, que tinham liberdade
para planejar suas aulas e adaptar seus materiais, coisa que em outras escolas eles nem
sempre encontram.
O professor HUGO fala um pouco sobre essa liberdade e sobre o apoio que recebe da
equipe, transpassando uma percepção positiva sobre seus colegas de trabalho, o que acaba por
tornar seu trabalho mais produtivo, como se pode observar no excerto a seguir.
HUGO deixa claro que a escola apoia os professores na execução de suas ideias. Da
mesma forma, os professores também se apoiam uns aos outros. MARIA também relata uma
experiência parecida, comparando-a com a vivência que teve em outras escolas nas quais
trabalhou, como podemos observar no excerto 10.
MARIA: Eu trabalhei em vários lugares e tem lugares que só Jesus. É, porque é aquela
coisa, às vezes a pessoa acha que todo mundo tem que ter o mesmo resultado e não dá.
Então a escola parece que quer colocar todo mundo numa caixinha. E cara, com tua turma
não vai dar, nunca vai dar. Aqui na escola tem dois sexto anos experimentais. A minha turma
anda completamente diferente da turma da tarde. Eu vejo, eu percebo pela maneira como a
professora, com os trabalhos que ela às vezes deixa colado. A minha turma anda totalmente
diferente da dela, entendeu? Então, não dá. Eu, assim, graças a Deus a gente aqui tem a
liberdade, mas não é toda escola não, não é mesmo.
Nicolaides e Tílio (2011) enfatizam a importância dessa autonomia voltada para uma
perspectiva sociocultural, “partindo do pressuposto de que o indivíduo faz parte de um
contexto sócio-histórico e, como tal, é responsável por seus atos e pelas consequências daí
originadas, além de exercer um papel de modificador no e do meio social no qual está
inserido” (p.179). Nestes dados, podemos perceber que os professores têm noção da realidade
e não a negam, pelo contrário, tentam usar suas estratégias para modificar aquilo que está
engessado.
Nesta categoria, portanto, foi possível perceber a autonomia dos professores associada
à capacidade de adaptação. Os professores demonstraram exercer uma participação
autodeterminada, associada à construção crítica de uma visão crítica da educação, já que
demonstram agir de forma responsável, exercendo sua capacidade de autorregulação e
autodireção. Estas características de sua autonomia ficam evidentes em suas iniciativas para
agir de forma a contestar cronogramas, materiais e estruturas predeterminadas.
Por fim, a participação socialmente responsável fica evidente na relação das crenças
dos professores com o elemento social da autonomia, destacando componentes como respeito
pelos outros e cooperação, evidenciados em seu cuidado em respeitar as necessidades de seus
alunos e na preocupação da escola em criar um ambiente no qual os professores possam agir
de maneira mais livre e ao mesmo tempo integrada.
Isto posto, nesta categoria, foi possível observar a autonomia dos professores
participantes através de suas crenças na necessidade de exercer seu papel na escola de forma
consciente, evitando que compartimentalizações impostas pelo sistema escolar que
sobreponham as necessidades do contexto social no qual se inserem. Ademais, esse processo
autônomo é favorecido pela equipe e diretoria da escola, que além de proporcionar liberdade
para que exerçam seu papel como educadores, os apoia e encoraja a desenvolver suas ideias.
Esta categoria de análise tem como objetivo destacar as crenças dos professores
participantes que se relacionem com uma autonomia voltada para o desenvolvimento da
consciência social e, ao mesmo tempo da empatia, no exercício de seu papel de educadores.
Os dados analisados nesta categoria, portanto, têm forte relação com o respeito pelos
aprendizes. Freire (1996) destaca a importância do respeito pelo educando, de despir-se da
arrogância e buscar agir com humildade. Ele afirma que “assim como não posso ser professor
sem me achar capacitado para ensinar certo e bem os conteúdos de minha disciplina não
posso, por outro lado, reduzir minha prática docente ao puro ensino daqueles conteúdos”
(FREIRE, 1996, p.103). O autor ainda salienta que “o que importa na formação docente, não é
a repetição mecânica do gesto, este ou aquele, mas a compreensão do valor dos sentimentos,
das emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela segurança, do medo que, ao ser
‘educado’, vai gerando a coragem” (FREIRE, 1996, p.45).
71
Assim sendo, esta sessão, traz observações sobre dados que evidenciam crenças e
atitudes direcionadas para a autonomia de professores relacionadas ao respeito pelo próximo,
favorecendo a autoestima de seus aprendizes. Os elementos de autonomia presentes nesta
categoria são: participação socialmente responsável e a centralização do ensino na
aprendizagem.
No decorrer da pesquisa, foi possível perceber a preocupação dos professores com o
lado humano e afetivo de seu trabalho. No excerto seguinte, HUGO conta durante a entrevista
como auxiliou um aluno que havia se machucado, mas que não recebia ajuda com os
curativos em casa.
HUGO: a linha de pipa enrolou no tornozelo dele, ele levou 35 pontos, aí tava tudo
inflamado. Os dias que eu estava na escola, eu limpava, trazia água oxigenada, eu limpava
e fazia curativo. Mas lá em casa, não faziam. E ele numa boa. Fui fazendo, fazendo, depois
secou. Ele tirou os pontos. Ele chegou e ‘po, aí tio, aí’. Ele mostrou eu falei, tênis maneiro. Aí
ele, ‘po, tio, não é o tênis não, aquele machucado que o senhor fez curativo, aí tô bonzinho’.
Quer dizer, é uma coisa que o cara lembrou, marcou ele.
A atitude de HUGO marcou o aluno, fazendo com que ele se sentisse valorizado. Ele
busca o professor para mostrar como melhorou, demonstrando sua compreensão da
importância que o professor teve naquele momento. HUGO manifesta uma atitude
socialmente responsável ao demonstrar respeito e consideração por seu aprendiz. Este pode
ser um fator de motivação para este menino, podendo incentivá-lo a estar no ambiente da
escola.
A professora TÂNIA também busca valorizar seus alunos através do estímulo de sua
autoestima. No excerto a seguir, ela comenta sobre os apelidos negativos que os alunos nas
turmas de realfabetização recebem e como essa desvalorização pode afetar seu
desenvolvimento. A professora acredita que o tratamento que dá aos alunos os motiva a
aprender e a sair de casa para estar na escola.
72
TÂNIA: Muitos não querem, mas a maioria quer. Porque eles são grandes, entendeu? Até
que esse ano não, mas eu já tive turma de REALFA que os alunos falavam: ih, ah lá a
turma dos burros. Entendeu? Quer dizer, então acaba tendo aquele rótulo que acaba
realmente prejudicando a autoestima deles. Então, um dos objetivos também desse projeto é
você trabalhar a autoestima. Então, quando vem com um perfume, eu ‘meu deus que perfume
cheiroso’. As vezes é um perfume horroroso. hhh. ‘ah, você comprou esse perfume aonde?,
‘nossa que batom lindo’, sabe? Eu procuro valorizar tudo, por que? A pessoa que ela tem a
autoestima valorizada, ela tem vontade de aprender. Ela tem vontade de sair.
Neste trecho, TÂNIA manifesta um pouco do seu entendimento sobre seu papel como
professora, concebendo que sua função não se limita a passar conteúdos. Ela entende que a
valorização da autoestima de aprendizes que se encontram em uma situação de desvalorização
– perante os colegas, por exemplo - é essencial para que tenham vontade de aprender, e assim
modificar a situação em que se encontram.
DIRETORA: Eu vou dar o cachorro quente. Meu último ano, eu dou todo ano, mas então eu
vou encerrar esse ano também dando. Então eu vou dar o cachorro quente esse ano. O
Gustavo já prometeu o refrigerante do cachorro quente, já vai ser dado. Do cachorro quente
não, do bolo. Com o cachorro quente eu vou tentar ver se tem suco suficiente pras meninas
fazerem suco.
HUGO: 30 garrafas?
73
DIRETORA: 30 garrafas. Aí só pro bolo, porque a gente acha que não dá pras duas coisas,
porque é o dia inteiro. São os dois turnos. Eu acredito que o suco dê pros dois turnos. Então,
não vai ter o show de talentos porque lá eles vão ficar na quadra, são duas horas cada turma.
Vai ter o pula-pula e o brinquedão, que é escorrega. E aí enquanto um grupo fica, o outro
come cachorro quente e a gente troca. A gente vai tentar ver, se o dinheiro der, é, o picolé vai
ser nesse dia, não?
DIRETORA: (...) alugar o algodão doce pro dia mesmo da festa sexta-feira que enquanto
eles estiverem na quadra eles vão comendo algodão doce. E também não sei se o dinheiro vai
dar tá gente. É 180? As 4 horas? Eu acho que é 180, à vontade por 4 horas.
RITA: eu acho melhor o algodão doce. Se fosse optar por causa de problema financeiro, eu
acho melhor o algodão doce.
COORDENADORA: perái, vamos por partes. Você doaria pra sua turma?
DIRETORA: Obaaa!
O excerto 13, portanto, revela tanto a dimensão individual como social da autonomia,
já que os professores agem de forma autodeterminada, tomando atitudes de forma
74
Pude observar neste COC a vontade dos professores de fazer o bem por essas crianças. A
iniciativa de alguns de doar do próprio bolso para a festa da criança mostra, pra mim, uma
vontade de fazer algo, de mover algo. Será que isto teria a ver com uma autonomia voltada
para o social, uma autonomia que visa modificar algo ao seu redor? O que move esses
professores?
Este comentário que anotei em meu diário de pesquisa e que se encontra transcrito no
excerto 14 decorreu de minha surpresa eu ver que os professores decidem usar seu próprio
dinheiro para contribuir com a festa das crianças. Então, respondendo às perguntas do trecho
14, acredito que a autonomia está presente nesta atitude dos professores, que ao moverem
esforços para promover uma festa legal para os alunos, demonstram que se importam. Os
alunos provavelmente nunca saberão de onde veio o dinheiro para a festa, mas somente o fato
de esta existir é significativo.
Quando decidem doar de seu próprio bolso para promover uma festa para seus alunos,
estão demonstrando o valor que dedicam aos mesmos, realçando um elemento importante, a
afetividade, como reforça a professora TÂNIA ao relatar o significado que a palavra professor
tem para ela, como podemos observar no excerto a seguir.
Neste excerto, que foi retirado da seção de discussão com os professores, TÂNIA
enfatiza ainda mais sua crença na relevância de desenvolver a consciência social e a empatia
75
no exercício de sua profissão. Ela acredita que estabelecer vínculos é essencial para ‘chegar a
algum lugar’, ou seja, para atingir seus objetivos como educadora.
Os dados observados nesta seção destacam crenças que revelam dois principais
elementos da autonomia: participação socialmente responsável e a centralização do ensino na
aprendizagem. A primeira está presente nas crenças dos professores na importância do
desenvolvimento de um relacionamento respeitoso, que valoriza a voz e a identidade dos
alunos. A segunda se destaca pela crença na importância do desenvolvimento da autoestima
dos aprendizes.
Ao mesmo tempo, em segundo plano, esta categoria revela em seus dados, de maneira
sutil, alguns elementos que poderiam ser associados com uma participação criticamente
consciente e uma visão crítica da educação por parte dos professores, já que se relaciona com
questões morais importantes como a dignidade e integridade de seus aprendizes, além de suas
crenças sugerirem a compreensão de seu papel como agentes de mudança. Entretanto, a
empatia e consciência social, evidenciadas nos dados desta categoria, não deixam claro este
viés crítico através das crenças dos professores.
5.3 COOPERAÇÃO
Retomo, assim, a fala de Shaw (2008), que acredita na importância do diálogo entre os
professores, capazes de questionar uns aos outros e buscar novos questionamentos de maneira
crítica. Portanto, esta categoria tem relação com participação autodeterminada, participação
76
TÂNIA: Geralmente quando a gente divide a série, a gente sempre troca. Tem uma menina,
que é a SANDRA, que trabalha na última sala, ela trabalha com alfabetização também. Tô
sempre lá na porta dela pedindo sugestão, sabe. Porque eu acho, que a alfabetização é
troca. O que deu certo pra mim, o que não deu certo pra mim, de repente dá certo com o
colega. E o que não deu certo com a colega, de repente, entendeu? Então eu sou assim, eu tô
sempre procurando, eu tô sempre enchendo saco, eu tô sempre querendo. Por quê? Eles
precisam de novidade. Se eu chegar aqui e falar: ‘vamos pegar o caderno de língua
portuguesa, a bola é bonita’, eu não vou conseguir nada. Porque eles são extremamente
agitados, eles são extremamente curiosos, porque eles querem sair dessa maldição.
Neste excerto 17, TÂNIA comenta mais uma vez sobre suas turmas de realfabetização.
Sua crença no valor da cooperação e da interação com seus colegas fica evidente, já que ela
busca trocar informações quando o que ela sabe ou conhece não é suficiente para solucionar
os desafios que enfrenta em sua sala de aula. Ela demonstra acreditar que a cooperação em
seu ambiente de trabalho pode lhe trazer novas ideias e perspectivas que irão beneficiar seus
alunos a superar ‘a maldição’ a qual estão presos. No excerto a seguir, TÂNIA fala
77
novamente sobre a importância de pedir auxílio, relatando a dificuldade que ela teve para
trabalhar com uma turma há dois anos.
TÂNIA: Eu trabalho com uma turma a tarde, que já tem, há dois anos atrás, eu não estava
conseguindo trabalhar com eles com alfabetização. Olha que eu sou macaca velha nisso. Eu
realmente, eu pedi um socorro. Por que? Porque tem horas também que por mais que você
saiba, por mais que você veja, a tua cota de criatividade também se esgota. Você tá
entendendo? Também se esgota. Aí eu pedi socorro.
Neste trecho, a professora expressa a crença de que nem todas as soluções são
responsabilidade exclusiva do professor como indivíduo, mas que essa atribuição pode ser
compartilhada. Ela demonstra humildade ao procurar ajuda e entender que não é possível reter
todas as informações e soluções. Reforça também a importância da cooperação na resolução
de problemas e dificuldades com as quais os professores se deparam em sua rotina.
Ao ser questionada sobre sua liberdade para preparar suas aulas, TÂNIA ressalta
peculiaridades da convivência profissional e do ambiente de trabalho. Ela admite a existência
de desafios, mas destaca a importância de cultivar um ambiente de trabalho harmonioso. Suas
palavras - no excerto a seguir - deixam evidente que o ambiente existente na escola facilita
essa interação, como já havia sido discutido na categoria adaptação.
TÂNIA: Mas eu tenho, tenho sim, liberdade pra reclamar, tenho liberdade pra conversar,
elogiar, tenho liberdade pra pedir desculpa, porque depois que você começa a trabalhar
muito tempo num lugar, você acaba tornando aquelas pessoas, assim como se fossem pessoas
da tua família. Então tem horas que a gente se estressa sim, tem horas que a gente dá risada
sim. Mas o ambiente de trabalho é assim mesmo. Porque afinal das contas, a gente passa a
maior parte do dia aqui. 7h15 a gente chega aqui e eu chego em casa 6 horas. Então, se a
gente não procurar aqui fazer um ambiente legal de trabalho, como é que vai ser. Porque
eu acho que trabalho é meio de vida, não é meio de morte.
Nesta passagem, TÂNIA ressalta mais uma vez a liberdade que tem dentro do
ambiente escolar, podendo trocar ideias, reclamar e compartilhar dilemas com os seus colegas
de trabalho. Ela comenta sobre as peculiaridades das relações profissionais, que possuem
78
tanto pontos positivos como negativos, ressaltando também a importância de cultivar um bom
ambiente de trabalho.
O professor HUGO, durante o conselho de classe do dia 11de junho de 2014, enquanto
descrevia o trabalho que vinha desenvolvendo com suas turmas, agradeceu a professora
TÂNIA por sua preocupação com seus alunos, neste caso, mais especificamente, com a turma
de realfabetização. Vejamos o excerto a seguir.
HUGO: Se puder fazer uma ressalva aí sobre as turmas da professora TÂNIA. Uma
excelente professora né. Está sempre preocupada com o desempenho da turma, às vezes
inverte até o horário de prova, pra fazer o melhor pro aluno. Se eles fizerem educação física
e voltar, vai prejudicar o rendimento. Tem toda essa preocupação com os alunos, quer dizer,
tá usando de estratégias, o máximo possível, para recuperar essas turmas.
A fala de HUGO no excerto 20, ao elogiar o trabalho feito pela professora TÂNIA,
corrobora com o que a mesma havia dito no excerto 19, destacando mais uma vez a relevância
da cooperação no ambiente escolar. Ao reconhecer o valor do trabalho TÂNIA, HUGO
demonstra entender o valor de uma autonomia voltada para o social, com foco na
colaboração.
RITA: E na realidade, essa questão da grade, eu acho legal, mas pros professores tipo eu, a
gente que entra pra cobrir a grade, não é muito legal, porque enquanto eles estão na grade lá
embaixo, eles estão juntos. Mas inglês, artes, educação física e sala de leitura, a gente não
tem um momento junto. Meu centro de estudos é segunda-feira, sozinha. Porque terça-feira,
todas estão na grade, aí elas estão lá embaixo, elas podem conversar entre elas. E a
prefeitura simplesmente acabou com a reunião geral, por conta da grade, mas a gente não
tem um momento junto. E isso eu acho um entrave.
79
MARIA: Antigamente tinha o horário, era o planejamento, mas a gente parava toda a escola,
os alunos iam embora e toda escola se reunia. Mas é aquela coisa, o governo foi e cortou. Aí
veio a lei de 1/3 de planejamento, com isso, eles tiveram que fazer isso de qualquer maneira,
botar a toque de caixa. Só que ao mesmo tempo que isso é bom, porque eu tenho um dia que
eu posso planejar. Só que ao mesmo tempo é ruim. Se eu quiser falar com outro professor
sobre a minha turma, eu não posso porque ele está ocupado com a turma, entendeu? Eu
costumo conversar, a gente troca ideias, mas não dá muito pra você, você não tem muito
tempo. O que você faz é trabalhinho de corredor. Você conversa ‘ah, como é que tá a
turma”, ‘comigo tá assim’, ‘comigo tá assim’, e acabou, coisa de 15 minutos, no máximo 20.
MARIA comenta que é bom ter um tempo só para planejamento, mas que sente falta
de interagir com os outros professores e conversar sobre as turmas. A troca de ideias ocorre
geralmente de forma rápida, que ela demonstra considerar insuficiente. Suas crenças neste
excerto evidenciam ao mesmo tempo a concordância com a possibilidade de um horário para
planejamento de aulas, mas também um incômodo com a falta de oportunidade dentro da
grade escolar de trocar ideias com outros professores.
5.4 TRANSFORMAÇÃO
Neste excerto 23, HUGO afirma gostar de sua profissão, mas revela a intenção de se
aposentar por causa dos desafios que vem enfrentando com relação à disciplina dos
aprendizes. Entretanto, HUGO deixa claro que, no ambiente de trabalho em questão, ele ainda
se sente motivado a trabalhar, já que percebe que seu trabalho tem retorno. É interessante
observar que HUGO valoriza a possibilidade de aproximação que tem com os alunos no
81
ambiente escolar. Ele afirma que na escola ainda tem abertura com os alunos tanto para
repreender como para compartilhar afeto. Desta forma, HUGO expressa a crença de que seu
papel como professor vai além de passar conteúdos, reconhecendo a importância das relações
humanas que constrói com seus aprendizes. Esta crença já estava evidente no excerto 11,
quando contou como o simples gesto de fazer um curativo no aluno pode ser significativo.
MARIA: Na realidade, a gente faz aquilo que a gente pode. Lógico, a gente vem trabalhar
muitas vezes insatisfeito com o salário, mas quando a gente tá aqui, você vai cruzar o braço
e não fazer nada?
MARIA: Eu faço meu trabalho, eu faço aquilo que eu gosto, posso não ser assim a
maravilha, a coca cola hhh, mas uma Pepsi hhh. Porque assim gente, quando a gente tá
disposto a trabalhar, a gente faz o melhor possível. E eu sempre falo pra eles, eu não saio da
minha casa na hora que eu saio, não me despenco de onde eu moro, pra vir pra cá pra não
fazer nada. Então eu trabalho sim, procuro trazer novidades, vou lá, cutuco lá na internet,
uso Datashow, uso Educopédia, trago atividades. Tô fazendo a minha parte. Só que tem
horas que a minha parte só não dá, não faz o efeito que eu gostaria que fizesse.
MARIA deixa clara sua frustração quando afirma que nem tudo sai do jeito que ela
gostaria, mas acredita fazer o melhor que pode, buscando diferentes alternativas. Ela acredita
fazer o melhor possível e demonstra não se acomodar. Ao dizer para os alunos que ela não
está ali para não fazer nada, ela reafirma sua vontade de exercer seu trabalho.
SANDRA: eu antigamente achava que fosse uma profissão que as pessoas respeitavam
muito, mas ultimamente tenho estado muito decepcionada (...)mais decepcionante porque
você procura fazer seu trabalho direito. Você tem todo cuidado com o aluno, você gosta do
aluno.(...) eu passo a noite às vezes fazendo atividade e procurando atividade pra aluno. E
na outra escola eu também fazia isso, eu gosto de fazer meu trabalho direito. Então a gente
às vezes deixa de visitar parente, deixa de fazer um monte de coisas pra trabalhar e a gente
recebe esse tipo de coisa e a gente fica muito decepcionada.
SANDRA se sente magoada por se dedicar tanto e não receber o retorno do seu
trabalho. Sua motivação parece estar abalada por não receber o respeito que merece. Ela diz
que gosta dos alunos e tem todo cuidado com eles, e que por isso se decepcionou muito com
as ameaças que sofreu recentemente. É possível perceber que mesmo com todos os
desapontamentos, sua dedicação profissional está presente em sua fala, quando afirma que
gosta de fazer seu trabalho direito.
CRISTINA sente que sua história de vida e suas experiências serviram de motivação
para escolher o trabalho de professora. As dificuldades que viveu a estimularam a querer
83
modificar a realidade ao seu redor. Sua fala expressa a crença em sua profissão como
instrumento de transformação social.
RITA: Olha só gente, antes do salão do livro, eu fui a (...) pra pedir ao pessoal que me desse
sugestão de livros. Obrigada Sandrinha, que me deu uma pequena lista, 40 livros. hhh
MARIA: Nossa!
TÂNIA: Caraca!
RITA: Compramos uma porção, (...) Infelizmente a prefeitura só dá 600tinhos. Nós que no
final botamos dinheiro e fiquei quase chorosa porque tinha um livro que falava sobre (...) e
não pude comprar.
TÂNIA: Poxa, aqui na escola a gente tem um grupo antigo, problemático, sabe, é difícil
você trabalhar. Você manda relatório pra CRE, esperando que você tenha uma resposta.
Não é pra você descansar não, até uma orientação pra você trabalhar com a criança.
Porque é muito chato você trabalhar com a criança, pô, você vê que a criança não tá
rendendo. Aquele cara, ele vem pra escola, você não tem o que fazer com ele, sabe, porque
você não é preparada pra isso. Realmente, você pode até dar um exercício de coordenação
motora e coisa e tal mas você sabe que o cara não precisa só daquilo. O cara precisa de
mais, e você não tem de onde buscar, porque você escreve 500 relatórios. Por exemplo, a
Luana20. A Luana era uma aluna que tinha aqui desde os 5 anos estava na escola. A Luana
saiu da escola com 12 anos, todos os anos a gente mandava relatório pra CRE. Sabe quantas
vezes em 7 anos ela foi atendida? Nenhuma vez. Saiu da escola, caiu na rua, foi morar com
um cara, e ficou viciada, e foi morar num sei aonde. Acabou. Perdeu-se a Luana. Agora ela
deve tá com uns 15, 16 anos.
HUGO: (...) Eu pegava ela ajoelhada, rezando, aí eu olhei assim ‘tá rezando porquê
Luana?’ “Ah, pra pedir uma saia ao Papai Noel e uma sandália”. Pra tu ver, a garota
pedindo ao Papai Noel, ajoelhada, uma saia e uma sandália. [Professor fala com lágrimas
nos olhos].
TÂNIA: E a família dela era horrorosa, a irmã era cracuda. O filho tá até aqui na escola.
MARIA: Gente, eu tive aquele aluno autista, esse ano. Quantas visitas ele teve da CRE.
Zero. Nenhuma.
TÂNIA: Ninguém vem. E quando vem é ‘ah, a gente não pode fazer nada’.
Neste excerto da discussão, a professora TÂNIA reclama que tem lidado com um
grupo antigo de alunos problemáticos e que, mesmo com o envio de relatórios, nenhuma
sugestão é apresentada. Ela deixa bem claro que não quer descansar, mas sim poder fazer
alguma coisa por aquela criança, demonstrando sua insatisfação com o quanto os órgãos
governamentais deixam a desejar.
TÂNIA e HUGO dão um exemplo desta situação, contando a história da aluna Luana.
Desde criança ela estudou naquela escola e os professores desconfiavam que ela tinha algum
tipo de problema mental, mas esta não recebeu o auxílio que necessitava e hoje vive de
maneira desestruturada devido ao consumo de drogas. O professor HUGO se emociona ao
contar sobre um episódio em que encontrou esta mesma aluna rezando para o Papai Noel por
uma saia e uma sandália, demonstrando seu pesar por toda essa situação de descaso.
No excerto 29, portanto, os professores deixam bem clara sua indignação. Entretanto,
eles ainda parecem expressar em suas crenças a consciência das possibilidades do exercício de
seu papel como professores. Eles acreditam que não podem perder a motivação e a esperança,
já que sem os professores, estas crianças não teriam ninguém lutando por eles.
86
SANDRA: é que ano passado fizeram a mesma coisa. Ano passado fizeram essa auditoria. Aí
eu pedi sugestões (...). E ninguém resolveu (...).
DIRETORA: Quantas vezes eu já encaminhei casos seríssimos e não deu em nada (...)
Nenhuma resposta.
DIRETORA: A parte da gente, todos os anos é feita. E esse ano, você bateu quantos
relatórios?
mães porque. Essas que tem laudo elas conversaram. Não vou dizer pra vocês que elas vão
fazer alguma coisa não. Porque eu acho que aquilo ali é pra inglês ver, pra gente não dizer
que a gente vive reclamando que elas não estão dando atenção à escola. E a escola tá se
fudendo com elas porque elas vêm aqui toda semana, porque nossa escola tá uma bosta.
Desculpa tá gente, mas na visão dela está. E aí, como a gente falou com elas que desde o
início do ano a gente mandou 20 relatórios e ninguém tinha olhado nada, elas mandaram
essas mulheres aqui. Não vão fazer nada com aqueles que não têm laudo não tá.
DIRETORA: não fizeram, elas estão acompanhando a Joana desde ano passado, indo na
casa, mas elas vão falar pra gente que não tem jeito. Quer dizer, não há uma pressão, ‘ah,
vou botar no conselho tutelar se você não levar no médico’. (...) Agora, ao mesmo tempo,
aqueles 15 que não tem laudo, que aí elas iam pegar as 15 mães, conversar sobre a
importância de levar no médico, que na escola detectou que eles têm problema, aquela mãe
que todo dia a gente pede laudo e nunca traz. Sabe quantas vieram das 15? Quatro.
Entendeu? E não vai acontecer nada. Então, mudou sim, como a TÂNIA falou. Mudou. Que
antigamente, mesmo pobre, as mães acompanhavam. Eles não estão nem aí gente, o
camarada, você vê claramente que seu filho tem problema. O Alex não dorme, quebra tudo
dentro de casa, tá nesse nível. Quebrando geladeira a noite porque não dorme. Ele tá até
aprendendo, mas ele está louco. Ela ontem, depois que a gente pela trigésima vez deu o
relatório pra ela, ‘ não, eu conversei com a menina, vou levar ele no médico porque ele
precisa de remédio’. ‘Claro que ele precisa de remédio, senão daqui a pouco ele tá te
matando’. Porque ele já bate nela. Mas eles não estão nem aí. Então a TÂNIA falou, muita
coisa mudou. Mudou. Mas eu acho assim, infelizmente somos nós. A gente já está cansada,
a gente já tá de saco cheio, a gente não aguenta mais. Todo dia é dar murro em ponto de
faca, e a coisa não mudar, mas se a gente não fizer.
DIRETORA: Ninguém, não vai ter ninguém por essas crianças, só a gente.
No excerto 31, mais uma vez, professores e direção da escola reclamam da falta de
acompanhamento dos alunos. Podemos perceber então que este é um assunto recorrente na
rotina da escola. A diretora deixa claro em sua fala que a Secretaria Municipal de
88
No fim do excerto, ambas reforçam mais uma vez a crença de que precisam continuar
a agir em prol destes alunos porque não existe outra alternativa para os mesmos. Ou seja,
precisam “continuar dando murro em ponta de faca”, como TÂNIA comenta.
RITA: Eu vou falar uma coisa, a gente fala assim ‘ah, não vou ligar não, ah, deixa pra lá’. A
nossa cabeça às vezes é assim, ‘ah, não quer aprender não aprende’. Mas é horrível você
chegar numa turma, e você ver o quanto eles não sabem nada. É angustiante. Angustiante
você pedir um verbo e o aluno falar ‘arame’ pra você. É angustiante isso gente, é
angustiante. E você pensa assim, ‘cara, esse cara vai pra frente’. A criatura pegar uma
tabuada, no projeto Mais Educação. Você fala assim, ‘tá, você pode olhar a tabuada’. Aí ela
vai olhar. Aí você fala assim ‘quatro menos um’, e ela vai olhar na tabuada quanto é quatro
menos um. Uma criança grande gente. Então, se perdeu de uma tal forma, que falam ‘ah
não tem jeito’. Tem jeito sim, mas é com muito ó [sinal com a mão, limpando suor da testa,
indicando trabalho].
Assim como a diretora já havia afirmado no excerto 31, RITA sustenta, no excerto 32,
a crença da possibilidade de ação, compreendendo que suas atitudes têm relevância e podem
89
transformar a situação problemática com a qual convivem. Deste modo, algumas das falas
destacadas nos excertos 29, 31 e 32 indicam que, mesmo com todas as limitações, a equipe da
escola demonstra ter esperança, buscando motivação para agir dentro de suas possibilidades,
mesmo diante de uma situação de negligência por parte dos órgãos públicos.
Esta preocupação por parte dos membros desta instituição escolar remete também à
dimensão social da autonomia e, portanto, à participação socialmente responsável. As
crenças dos professores evidenciadas nos dados demonstram o respeito que têm por seus
aprendizes. Ao mesmo tempo, fazem valer suas vozes, valorizando a interação na comunidade
profissional, ao colocar questões em debate e participar ativamente em discussões que
envolvem assuntos problemáticos com relação ao funcionamento das estruturas educacionais.
Retomo, portanto, a primeira citação deste trabalho, escrita por Freire (1996), na qual
ele afirma que o pior mal que o poder público vem infligindo à sociedade brasileira é que,
diante de tanto descaso em relação à educação, as pessoas reproduzam e acreditem no
discurso de que não há o que fazer. Através das crenças evidenciadas nas falas dos
90
professores participantes, é possível perceber que estes não se deixam “cair no indiferentismo
fatalistamente cínico que leva ao cruzamento de braços” (FREIRE, 1996, p.67). Pelo
contrário, reconhecem as dificuldades que enfrentam todos os dias e escolhem continuar
“dando murro em ponta de faca”, como externou TÂNIA no excerto 31.
No primeiro dia em que estive na escola, a primeira imagem que avistei foi a de uma
obra inacabada, abandonada pela Prefeitura do Rio de Janeiro. A sala dos professores,
recepção e diretoria estavam interditadas e a equipe estava ocupando duas salas de aula
provisoriamente. Neste mesmo dia, enquanto esperava para fazer as entrevistas na sala dos
professores, uma fechadura da porta de uma das salas de aula caiu fazendo um grande
barulho. Alguns fios pendiam do teto e o auditório estava sem uso por falta de cadeiras e
aparelhagem.
Entretanto, outra imagem também marcou este primeiro dia. Assim que os alunos iam
chegando, eram recepcionados com muito carinho e atenção. À medida que ia conversando
com os professores e os entrevistando, comecei a perceber em suas falas um conflito de
sentimentos. Por um lado, a indignação e frustração, e de outro a consciência de seu trabalho e
a vontade de promover mudanças.
Este capítulo tem como objetivo fazer uma retrospectiva reflexiva a respeito do
trabalho e das impressões trazidas pelos dados gerados na pesquisa, procurando retomar um
diálogo com os objetivos e perguntas de pesquisa.
Esta pesquisa teve como objetivo analisar quais são as crenças de professores de uma
escola pública da cidade do Rio de Janeiro sobre seu papel de educadores em sua comunidade
de prática como membros autodeterminados, engajados socialmente e críticos, através de uma
visão da educação como meio de desenvolver emancipação e transformação social, buscando
compreender como estas crenças se relacionam com o desenvolvimento de sua autonomia.
Para atender a este objetivo, as seguintes perguntas de pesquisa serviram de guia para
as reflexões levantadas durante este trabalho:
92
Desta forma, as categorias de análise tiveram como objetivo ressaltar alguns pontos
dessas teorias expostas nos dois parágrafos anteriores. Sendo estes: participação
autodeterminada, participação socialmente responsável, participação criticamente
consciente, construção de uma visão crítica da educação, gestão de constrangimentos locais
93
A construção de uma visão crítica da educação aparece nos dados das categorias
adaptação e transformação. Este aspecto fica evidente no posicionamento consciente dos
professores sobre seu papel de modificadores sociais, bem como na iniciativa de tornar seus
cronogramas e materiais mais condizentes com a realidade e as necessidades de seus alunos.
profissão, trazendo impactos positivos na vida de seus alunos, muitas vezes através de
pequenos gestos. “Às vezes mal se imagina o que pode passar a representar na vida de um
aluno um simples gesto do professor. O que pode um gesto aparentemente insignificante valer
como força formadora ou como contribuição à do educando por si mesmo” (FREIRE, 1996,
p.42).
Observando dos dados gerados na pesquisa, acredito que existe uma forte vontade de
mover algo, gerada pela inquietação destes professores. Os obstáculos os incomodam, mas os
motivam a fazer o que está dentro de seu alcance, algumas vezes contribuindo com seu
próprio dinheiro, algo que foge de suas obrigações. Por outro lado, a vontade de transformar
acaba sendo eventualmente tolhida por uma série de obstáculos que impossibilitam mudanças
mais profundas, restringindo a realização de seus objetivos como educadores. Este conflito de
elementos favoráveis e desfavoráveis pode beneficiar ou prejudicar a autonomia dos
professores.
Outro ponto que pode ser favorável à autonomia destes professores é a sua consciência
a respeito de seu papel como educadores, permitindo que possam adaptar com seus conteúdos
e materiais de forma a lidar melhor com a realidade social em questão, favorecendo seus
aprendizes e um aprendizado mais significativo.
96
Outros fatores a destacar são as condições de vida dos alunos e a falta de suporte dos
órgãos governamentais. Além de alunos com dificuldades financeiras e problemas familiares,
os professores relataram com tristeza- e em alguns momentos lágrimas - que recebem um
número considerável de alunos com algum tipo de deficiência física ou mental e que estes não
recebem o atendimento médico e o apoio pedagógico necessários.
21
Grifo meu.
97
Deste modo, mesmo pequenas ações, gestos que circulem no meio educacional podem
fazer a diferença e trazer resultados positivos e possibilitadores de transformações sociais.
Acreditar nas possibilidades é uma expressão de autonomia, esperança e transformação social.
Assim, mesmo que as atitudes e crenças dos professores participantes analisadas neste
trabalho não pareçam ser grandiosas, ou seja, mesmo que não tenham uma evidência ou
reconhecimento devidos, são significativas para a realidade social na qual atuam. É possível
perceber que mesmo diante dos constrangimentos que relataram, estes professores acreditam
em possibilidades.
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2007)
ANEXOS
104
ANEXO 1:
105
Link: http://www.vagalume.com.br/pink-floyd/another-brick-in-the-wall.html#ixzz3ah8kzIc0
107
Pt.3
Link: http://www.vagalume.com.br/pink-floyd/another-brick-in-the-wall-
traducao.html#ixzz3yZEXLW3K
109
Link: http://www.adufrj.org.br/index.php/noticias-destaque/2035-faculdade-de-
educa%C3%A7%C3%A3o-repudia-propaganda-de-mau-gosto-da-prefeitura.html
Acesso : 20/05/2015
“A Faculdade de Educação da UFRJ (FE-UFRJ) vem por meio desta manifestar o seu repúdio
à imagem utilizada na propaganda da SME, veiculada na página 05 do jornal O Globo, em 07
de dezembro de 2014. A FE-UFRJ compreende a pertinência de informar à população sobre a
criação de uma fábrica de construção de módulos, com a previsão de construção de 136
unidades de ensino climatizadas, e parabeniza a SME por toda iniciativa que objetive
aperfeiçoar o sistema de ensino público do município. A FE-UFRJ compreende, contudo, que
a imagem de alunos na esteira da linha de montagem de uma fábrica, associando o trabalho da
SME à ideia de fabricação de seres humanos como peças industrializadas produzidas em
série, contraria frontalmente uma concepção pedagógica responsável e republicana. A
formação a cargo da Educação Pública deve, em acordo com a legislação e as orientações
emanadas do Poder Público, priorizar a oportunidade de crescimento pessoal e coletivo, dos
educandos e educandas, através de valores como solidariedade e respeito à diversidade, e o
desenvolvimento de um espírito questionador e investigativo próprio ás bases das tradições
científicas e artísticas que compõem as práticas curriculares escolares.”
111
Faculdade de Letras
CONSENTIMENTO
Através deste documento, solicita-se sua participação num projeto de pesquisa que
prevê geração de dados através de gravações de entrevistas, reuniões e aulas em áudio e
vídeo, da observação de aulas e do registro de notas de campo. Os dados gerados serão
analisados no desenvolvimento de pesquisa qualitativa vinculada à Faculdade de Letras e ao
Programa Interdisciplinar de Linguística Aplicada, ambos da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Este documento garante que as identidades dos participantes da pesquisa serão
mantidas em anonimato. Indique, para cada item abaixo, o seu consentimento de uso dos
dados gerados utilizando sua rubrica. Os dados permitidos serão utilizados somente conforme
a permissão abaixo.
112
Atenciosamente,
Orientadora
Data: ____________________________________________________