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Fundamentos de
microbiologia
Denise Diedrich
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
A fundamentação e o futuro de qualquer ciência estão alicerçados em suas realiza-
ções passadas. Mesmo que a microbiologia tenha raízes muito antigas, essa ciência
não se desenvolveu de forma organizada até o século XIX, quando as tecnologias
essenciais para seu desenvolvimento — como os microscópios e as técnicas de
cultura — precisaram ser descobertas. Nos últimos 150 anos ou mais, a ciência da
microbiologia demonstrou avanços sem precedentes e tem desenvolvido vários
campos novos na biologia e na medicina moderna.
Recentemente, a pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, ou Covid-19, levou
milhões de pessoas à morte em todo o mundo, além de gerar prejuízos econômicos
e sociais. Nesse sentido, a microbiologia e o estudo das doenças infecciosas se
tornam cada vez mais necessários. Além disso, a manipulação e o conhecimento
dos microrganismos pode trazer diversos avanços tecnológicos nas áreas indus-
triais e ambientais.
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Desenvolvimento da microbiologia
A microbiologia é uma ciência inteiramente voltada ao estudo dos microrga-
nismos —também denominados micróbios — e ao modo como eles funcionam.
Essa ciência busca compreender a diversidade dos microrganismos, buscando
entender por que e como surgiram. Além disso, a microbiologia trata da
ecologia e, dessa forma, estuda o local onde os microrganismos vivem, como
se associam e/ou cooperam entre si, com o ambiente e as demais espécies
(p. ex., animais e plantas) (MADIGAN et al., 2016; FADER; ENGELKIRK; DUBEN-
-ENGELKIRK, 2021).
A ciência da microbiologia busca, principalmente, estudar duas áreas
interconectadas: a natureza e o funcionamento dos microrganismos e a
aplicabilidade do conhecimento acerca da microbiologia para beneficiar a
humanidade e o meio ambiente. Assim, a microbiologia como uma ciência
biológica básica utiliza o estudo das células microbianas para compreender
os processos fundamentais da vida (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK,
2021; MADIGAN et al., 2016).
A denominação microbiologia, em si, traz muito significado, pois "micro"
significa “muito pequeno”, algo tão minúsculo que precisa ser visualizado com
um microscópio (instrumento óptico utilizado para observar objetos muito
pequenos) e "logia" significa "o estudo de". Com apenas raras exceções, os
micróbios individualizados só podem ser observados com o uso dos vários
tipos de microscópios. Além disso, eles são considerados onipresentes, ou
seja, podem ser encontrados em praticamente todos os lugares. As diversas
categorias de micróbios incluem vírus, bactérias, Archaea, protozoários e
determinados tipos de algas e fungos. Elas serão discutidas de modo deta-
lhado adiante no texto (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; MADIGAN
et al., 2016).
A primeira vez que alguém ouve falar de micróbios pode ser quando sua
mãe ou seu pai o adverte sobre a existência dos “germes”. Apesar de não ser
um termo científico, eles são os micróbios que causam doenças, os pais se
preocupam com a possibilidade de infecção por esses tipos de micróbios.
Os microrganismos causadores de doenças são tecnicamente conhecidos
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Além disso, os seres humanos estão sob ameaça de doenças que poderiam
emergir subitamente, como a gripe aviária ou suína, ou a febre hemorrágica
do Ebola, por exemplo, cujo surgimento está cada vez mais relacionado
às mudanças climáticas e ao desequilíbrio dos ecossistemas. Um exemplo
recente é a pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, que causou mais de
6,46 milhões de mortes ao redor do mundo até agosto de 2022, além de crise
econômica e social. Dessa forma, os microrganismos ainda representam gra-
ves ameaças à saúde humana em todas as partes do mundo, demonstrando
cada vez mais a importância dos estudos microbiológicos (ALAM; SULTANA,
2021; CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2022; WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2022).
Embora uma pequena parcela dos microrganismos seja patogênica, a
maior parte das espécies microbianas desempenha importante papel para a
vida humana e nos ecossistemas do planeta. Vários exemplos poderiam ser
citados, como os microrganismos envolvidos em ciclos elementares, como
os do carbono, do nitrogênio, do oxigênio, do enxofre e do fósforo. No ciclo
do nitrogênio, determinadas bactérias convertem o gás nitrogênio do ar em
amônia no solo. Em seguida, outras bactérias do solo convertem a amônia
em nitritos e nitratos. Outras bactérias ainda convertem o nitrogênio dos
nitratos em gás nitrogênio, completando, assim, o ciclo (FADER; ENGELKIRK;
DUBEN-ENGELKIRK, 2021; MADIGAN et al., 2016).
Alguns micróbios vivem no trato intestinal de animais, onde ajudam na
digestão do alimento e, em alguns casos, produzem substâncias valiosas
para o hospedeiro animal. Por exemplo, a bactéria E. coli, que vive no trato
intestinal humano, produz as vitaminas K e B1, que são absorvidas e utilizadas
pelo corpo. Outro exemplo é o dos micróbios essenciais em várias indústrias
de alimentos e bebidas, enquanto outros são utilizados na produção de
determinadas enzimas e substâncias químicas (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-
-ENGELKIRK, 2021; MADIGAN et al., 2016).
As bactérias e os protozoários foram os primeiros micróbios a serem ob-
servados pelos seres humanos, e foram necessários cerca de 200 anos para
estabelecer uma conexão entre os microrganismos e as doenças infecciosas.
Entre os acontecimentos mais significativos nos primórdios da história da
microbiologia, destacam-se o desenvolvimento dos microscópios, os métodos
de coloração das bactérias, as técnicas que possibilitaram a cultura (cresci-
mento) dos microrganismos em laboratório e as etapas que provaram que
micróbios específicos eram responsáveis por doenças infecciosas específicas.
No decorrer dos últimos 400 anos, muitos indivíduos contribuíram para o
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Além disso, Kock descobriu a bactéria que causa tuberculose (M. tuber-
culosis) e a que provoca cólera (Vibrio cholerae). O trabalho de Koch com a
tuberculina (uma proteína derivada da M. tuberculosis) levou, finalmente, ao
desenvolvimento de um teste cutâneo valioso no diagnóstico da tuberculose
(FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; RIEDEL et al., 2022; TORTORA;
FUNKE; CASE, 2012).
Células
Células eucarióticas
procarióticas
(Continuação)
Células
Células eucarióticas
procarióticas
Vírus
As partículas virais completas, denominadas vírions, são muito pequenas e
de estrutura simples. A maioria dos vírus varia, quanto a seu tamanho, de 10
a 300 nm de diâmetro, porém alguns, como o vírus Ebola, pode alcançar até
1 μm de comprimento. Os menores vírus têm aproximadamente o tamanho
da grande molécula de hemoglobina de um eritrócito; por isso, os cientistas
eram incapazes de visualizá-los até a invenção do microscópio eletrônico,
na década de 1930 (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; RIEDEL et al.,
2022; TORTORA; FUNKE; CASE, 2012).
São reconhecidas cinco propriedades específicas dos vírus, que os dis-
tinguem das células vivas (BLACK; BLACK, 2021; FADER; ENGELKIRK; DUBEN-
-ENGELKIRK, 2021).
Bactérias
O domínio Archaea contém organismos que são amplamente divididos em
três categorias fenotípicas, ou seja, com base em suas características físicas:
bactérias gram-negativas e com parede celular, bactérias grampositivas e
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com parede celular e bactérias que carecem de parede celular. Muitas carac-
terísticas das bactérias são examinadas para fornecer dados utilizados na
identificação e classificação. Elas incluem o formato e o arranjo morfológico
das células, as reações de coloração, a motilidade, a morfologia das colônias,
as necessidades atmosféricas, as exigências nutricionais, as atividades bio-
químicas e metabólicas, as enzimas específicas produzidas pelo organismo,
a patogenicidade (capacidade de causar doença) e a constituição genética
(FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; LEVINSON et al., 2022).
Com o uso do microscópio óptico composto, é fácil observar o tamanho, o
formato e o arranjo morfológico de várias bactérias. Elas variam enormemente
quanto ao tamanho e, em geral, consistem em esferas que medem cerca de
0,2 μm de diâmetro até espiraladas de 10 μm de comprimento e, inclusive,
filamentosas ainda mais longas. São observadas três formas básicas de
bactérias: redondas ou esféricas (os cocos), retangulares ou em forma de
bastonete (os bacilos) e curvas e espiraladas (algumas vezes designadas
como espirilos), conforme a Figura 5 (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK,
2021; MADIGAN et al., 2016).
Fungos
Os fungos constituem um grupo diverso, e seu estudo é denominado mico-
logia. Os fungos são encontrados em quase todas as partes na Terra, alguns
(saprófitas) vivem na matéria orgânica, na água e no solo, enquanto outros
(parasitas) vivem na superfície e no interior de animais e plantas. Algumas
espécies são prejudiciais, causando doenças ou prejuízos econômicos pela
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Algas
As algas são organismos eucarióticos fotossintéticos que, juntamente com os
protozoários, são classificados como pertencentes ao reino Protista. Todas as
células das algas são constituídas de citoplasma, parede celular (geralmente),
membrana celular, núcleo, plastídeos, ribossomos, mitocôndrias e corpúscu-
los de Golgi. Além disso, algumas células de algas apresentam uma película
(membrana celular mais espessa), um estigma (organela que é um sensor de
luz, também conhecida como ocelo) e flagelos. Embora não sejam plantas e
careçam de raízes verdadeiras, caules e folhas, as algas assemelham-se mais
a vegetais do que aos protozoários (FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK,
2021; MADIGAN et al., 2016).
As algas variam, quanto ao tamanho, desde organismos microscópicos
minúsculos e unicelulares (p. ex., diatomáceas, dinoflagelados e desmídias)
até grandes algas marinhas multicelulares e semelhantes a plantas. Dessa
forma, nem todas são microrganismos, podendo formar colônias ou fila-
mentos, e podem ser encontradas na água doce e na salgada, em solos ou
rochas úmidas. As algas produzem a sua energia por fotossíntese, utilizando
energia solar, dióxido de carbono, água e nutrientes inorgânicos do solo para
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Protozoários
Os protozoários são organismos eucarióticos que, juntamente com as al-
gas, são classificados como protistas, uma decisão não unânime entre os
taxonomistas. O estudo dos protozoários é denominado protozoologia.
Os protozoários são, em sua maioria, unicelulares, e o seu tamanho varia
de 3 a 2.000 μm. A maior parte é de organismos de vida livre, encontrados
no solo e na água. As células dos protozoários são mais semelhantes às de
animais do que às de vegetais, mas todas têm uma variedade de estruturas
e organelas eucarióticas, incluindo membranas celulares, núcleo, retículo
endoplasmático, mitocôndrias, corpúsculos de Golgi, lisossomos, centrí-
olos e vacúolos digestivos. Além disso, alguns protozoários apresentam
películas, citóstomas, vacúolos contráteis, pseudópodes, cílios e flagelos
(FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; RIEDEL et al., 2022; TORTORA;
FUNKE; CASE, 2012).
Os protozoários são desprovidos de clorofila e, portanto, são incapazes
de produzir o próprio alimento pela fotossíntese. Alguns ingerem algas intei-
ras, leveduras, bactérias e protozoários menores como fonte de nutrientes,
enquanto outros vivem em matéria orgânica morta e em decomposição. O
ciclo de vida típico de um protozoário consiste no estágio trofozoíta no qual
é móvel, se alimenta e se divide, enquanto o cisto é o estágio de sobrevi-
vência imóvel e dormente. Alguns protozoários são parasitas, degradando e
absorvendo os nutrientes do corpo do hospedeiro onde vivem. Muitos deles
são patógenos, como os que causam a malária e a giardíase, por exemplo.
Outros protozoários coexistem com o animal hospedeiro em um tipo de re-
lação simbiótica mutualística — em que ambos os organismos se beneficiam
(FADER; ENGELKIRK; DUBEN-ENGELKIRK, 2021; RIEDEL et al., 2022; TORTORA;
FUNKE; CASE, 2012).
A microbiologia, portanto, é uma ciência indispensável para o desenvolvi-
mento humano, a prevenção e o tratamento de doenças e desenvolvimento
econômico. Ao longo da história, essa ciência se provou essencial ao aumento
da expectativa e da qualidade de vida do ser humano. A curiosidade e a ge-
nialidade de diversos cientistas propiciaram descobertas que, acumuladas,
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Referências
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outbreak: A review of existing literature. Environmental Challenges, v. 5, p. 1-8, 2021.
BLACK, J. G.; BLACK, L. J. Microbiologia: fundamentos e perspectivas. 10. ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2021.
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2022. Disponível em: https://covid.cdc.gov/covid-data-tracker/#global-counts-rates.
Acesso em: 4 set. 2022.
FADER, R.; ENGELKIRK, P.; DUBEN-ENGELKIRK, J. Burton: microbiologia para as ciências
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LEVINSON, W. et al. Microbiologia médica e imunologia: um manual clínico para doenças
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MADIGAN, M. T. et al. Microbiologia de Brock. 14. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016.
RIEDEL, S. et al. Microbiologia médica de Jawetz, Melnick & Adelberg. 28. ed. Porto
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TORTORA, G. J.; FUNKE, B. R.; CASE, C. L. Microbiologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Coronavirus (COVID-19) dashboard. Geneva: WHO,
2022. Disponível em: https://covid19.who.int/. Acesso em: 4 set. 2022.
Leituras recomendadas
FEIJÓ, R. B.; SÁFADI, M. A. Imunizações: três séculos de uma história de sucessos e
constantes desafios. Jornal de Pediatria, v. 82, n. 3 suppl., p. s1-s3, 2006. Disponível
em: https://doi.org/10.1590/S0021-75572006000400001. Acesso em: 4 set. 2022.
UJVARI, S. C. A história e suas epidemias: a convivência do homem com os microrganismos.
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