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A Biologia do movimento dentário induzido

O ortodontista deve conhecer a biologia do seu campo de atuação, ou seja, o


movimento dentário induzido. Só assim será possível saber a influência de fatores
externos, sistêmicos, os limites e as variávies impostas às movimentações dentárias.

O movimento induzido representa um movimento desencadeado por outros estímulos


externos aos dentes e ossos, normalmente mecânicos, advindos de forças liberadas
geralmente por dispositivos adaptados aos dentes. Esses dispositivos permitem o
controle pleno da movimentação dentária e tem o objetivo de correção dos problemas
estéticos e funcionais dentário e facial.

As forças mecânicas aplicadas aos dentes não são usadas para produzir movimento
mecânico e sim para obter um estímulo biológico capaz de promover reações teciduais
desejáveis, modificando a posição dentária de forma estável e duradoura.
A movimentação dentária é um processo biológico múltiplo caracterizado por reações
sequenciais do ligamento periodontal em resposta às forças biomecânicas, que
induzem alteração em duas regiões do tecido periodontal (o lado de tensão e o lado
de pressão), quebrando a TENSIGRIDADE ( situação de equilíbrio ou estabilidade de
uma estrutura) tecidual e celular. Basicamente, as modificações teciduais induzidas
estão relacionadas à remodelação tecidual por ativação da reabsorção óssea alveolar
no lado de pressão, e consequentemente aposição óssea no lado de tensão. Essa ação
mecânica transformada em evento biológico é definida como
MECANOTRANSDUÇÃO.
PERIODONTO DE SUSTENTAÇÃO

O periodonto compreende os seguintes tecidos: gengiva, ligamento periodontal,


cemento radicular e osso alveolar. Vamos relembrar algumas estruturas?

1. Ligamento periodontal: lâmina fina de tecido conjuntivo que liga o dente ao osso
adjacente. Tem em média 0,25 mm de espessura e está em volta de toda raiz. É
composto de fibras colágenas e oxitalâmicas, que resistem às forças de tensão e
pressão durante a função normal. Os fibroblastos são as células mais abundantes.

2. Cemento: tecido mineralizado avascular que recobre totalmente a raiz do dente.


Está localizado entre a dentina e o ligamento periodontal. Sua composição é
semelhante ao osso, composto por 50% de hidroxiapatita e 50% de proteínas.

Importante: a maioria das reabsorções radiculares externas apresenta, como


fenômeno inicial, a destruição ampla dos cementoblastos, desnudando a superfície
mineralizada de cemento e expondo às ações reabsortivas. Os cementoblastos
protegem a superfície radicular porque não possuem receptores para os mediadores
que participam da remodelação óssea.

Fig. 1 Periodonto de sustentação


O MOVIMENTO DENTÁRIO INDUZIDO

São forças mecânicas exercidas sobre os dentes que são transmitidas aos tecidos de suporte
e, se de magnitude adequadas, propiciam a atividade remodeladora responsável pelo
movimento dentário.

O movimento dentário inicia quando um agente físico, químico ou biológico atua


sobre as células que por sua vez produzem substâncias afim de anular tal ação.
Desta forma, ocorre a quebra da homeostasia (equilíbrio celular fisiológico). As três
causas mais comum de quebra da homeostasia são: redução de oxigênio,
superestimulação e deformação celular. Com a quebra da homeostasia, as células
liberam mediadores, pequenas proteínas denominadas citocinas e fatores de
crescimento que são mensagens bioquímicas que se ligarão a receptores de
membranas das células agredidas e nos tecidos vizinhos, com objetivo de
restabelecer a normalidade.

Pra exemplificarmos a ação da força ortodôntica sobre os dentes e o periodonto,


podemos seguir a sequência:

1. FORÇA ORTODÔNTICA
2. QUEBRA DA TENSIGRIDADE
3. REAÇÃO BIOLÓGICA
4. PROCESSO INFLAMATÓRIO
5. REABSORÇÃO E APOSIÇÃO OSSEA
6. MOVIMENTAÇÃO DENTÁRIA
O lado de pressão no movimento dentário

A aplicação da forca sobre a coroa gera a compressão dos vasos do ligamento


periodontal e consequente hipóxia (falta de oxigênio). Isso gera um estresse
funcional metabólico e mecânico nas células do ligamento periodontal
(fibroblastos, osteoblastos, cementoblastos, clastos, células endoteliais e filetes
neurais), mediadores celulares são produzidos com o objetivo de reestabelecer
a normalidade por meio da remodelação óssea.

Diante da força aplicada a matriz extracelular sofre alteração bioquímica e


organizacional dos seus componentes formando áreas hialinas. A extensão da
área de hialinização depende da intensidade e distribuição da força. Quando a
hialinização ocorre, as células clásticas iniciam a reabsorção óssea na superfície
cortical periférica às áreas hialinas e nos espaços medulares adjacentes, alívio
do estresse mecânico e descompressão do ligamento periodontal.

 A reabsorção óssea constitui a forma do organismo adaptar-se,


aliviando a força sobre o ligamento periodontal, devolvendo-lhe a
tensigridade.

O lado de tensão no movimento dentário

No lado de tensão, a força promove a distensão do ligamento periodontal. As


fibras colágenas são estiradas e os vasos sanguíneos parcialmente colabados.
O estresse celular, a hipóxia e a inflamação são menores nessa região.
 As fibras periodontais são rearranjadas em 28 dias, sendo que as
fibras gengivais permanecem deslocadas e estiradas mesmo após
um período de 230 dias, sendo responsáveis pelas recidivas nos
movimentos de giroversão. Os pequenos aumentos na quantidade
de mediadores químicos são estimulados para aposição óssea neste
local.
 Se a força for excessiva, podem ser observadas áreas de reabsorção
óssea e até dentária até no lado de tensão pois nessas condições
ocorre rompimento das fibras do ligamento periodontal e aumento
excessivo dos mediadores químicos nas áreas de tensão e também
pressão.
 Na biologia óssea, as reações frente a forças de baixa intensidade e
longa duração, o estresse celular moderado e a chance de ocorrer
fenômenos reabsorvitivos é pequena. O contrário ocorre com forças
intensas.

Fig. 2 Movimentação dentária


REABSORÇÃO RADICULAR NO MOVIMENTO DENTÁRIO

A reabsorção radicular consequentes ao movimento ortodôntico e é encontrada


com bastante frequência quando analisada microscopicamente os tecidos
dentários. Porém, cerca de 10% são visíveis radiograficamente.

O excesso de força gera compressão dos vasos sanguíneos do ligamento


periodontal e ausência de oxigênio no local, provocando a morte dos
cementoblastos que revestem a superfície radicular. Assim, a superfície radicular
fica desnuda e expostas às células cláticas que respondem aos mediadores da
reabsorção. A exposição direta do tecido cementário e dentinário expõe a raiz às
ações reabsorvitivas das células clásticas.

A morfologia da raiz é um fator de previsibilidade de reabsorção dentária. A


concentração de forca recai mais no terço apical da raiz. As raízes de formato
triangular tendem a concentrar mais forças em menor área apical em comparação
com as raízes de formato romboidal e retangular, portanto são mais susceptíveis à
reabsorção.

Apesar de demorar em média três semanas para reabsorção radicular


evidenciar-se radiograficamente, a reabsorção dental inflamatória pode
iniciar apenas em algumas horas. Uma vez eliminada a causa, o reparo
acontece em alguns dias. Haverá repovoamento da camada
cementoblastica da próprio ligamento e pela proliferação de
cementoblastos vizinhos.
Fig. 3 Radiografias periapicais dos dentes anteriores

Fig. 4 Classificação de graus de reabsorção segundo Levander, Malmegreen e Eliasson


Teste seu conhecimento

1. Quais são as células protetoras contra as reabsorções


radiculares?
2. O que é estresse celular?
3. Por que e quando uma agressão desencadeia uma
inflamação?
4. Explique como a movimentação dentária acontece no
contexto do estresse celular e inflamação
5. Por que os movimentos de giroversão apresenta tendência a
recidiva?
6. O que acontece no lado de pressão e no lado de tensão
quando o dente está diante de um movimento dentário
induzido?
7. O que é área de hialinização?
8. Como as reabsorções radiculares acontecem? O que
podemos fazer para evita-las?
9. O que é tensigridade?
10. O que devemos fazer diante de uma reabsorção radicular?

* Essa apostila foi idealizada e resumida a partir de informações contidas no PROGRAMA DE


ATUALIZAÇÃO EM ORTODONTIA (PRO-ODONTO)/SESCAD, Ciclo 1 Módulo 1 . Os autores desse
capítulo são: Milton Santamaria Jr, Maria Fernanda Martins Ortiz, Ana Carolina C. Fracalossi,
Vanessa da Rocha Bernadini, Alberto Consolaro. Algumas fotos ilustrativas foram retiradas da
internet.

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