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Flavell
O Período Sensorio-Motor:
Desenvolvimento Geral
Este Capítulo, ao lado dos trés capítulos seguintes, tem por objetivo ofere
cer uma descrição do desenvolvimento intelectual, desde o nascimento até a ma
turidade. ^Este Capítulo apresentaas características gerais e fundamentais do pri-
pieiro período mais importanteToperíodo sensóriomiotof-, que abrangemos dois
primeiros anos de vida.fO Capítulo 4 começa pelaanãlise de algumas evoluções
sensório-motoras mais especializadas — o desenvolvimento da imitação, do brin
quedo, da noção de objeto, etc. — e termina com uma descrição do pensamento
pré-operacional. O Capítulo 5 abrange a construção das operações concretas nos
anos intermediários de infância. E, finalmente, o Capítulo 6 é dedicado (em par
te) à descrição das operações formais da adolescência.
Os quatro capítulos não abrangem com a mesma amplitude os respectivos
períodos de desenvolvimento a que se referem. Piaget realizou uma quantidade
muito menor de trabalhos experimentais com crianças até os dois anos de
idade, do que com os demais grupos etários. Assim sendo, torna-se perfeitamente
compreensível a tentativa de apresentar a teoria e a pesquisa referente à criança
pequena em um capítulo e meio, embora isto seja completamente impossível em
relação aos períodos posteriores. Por isso, os Capítulos 5 e 6 e a parte final do
Capítulo 4 descrevem principalmente as características do sistema geral das estru
turas de pensamento - os aspectos mais teóricos do pensamento da criança e do
adolescente —, e os dados experimentais são apresentados ocasionalmente, a títu
lo de ilustração. Grande parte dos dados experimentais relativos a estes períodos
encontra-se na Parte II.
Como roteiro para a leitura deste capítulo e dos três seguintes, parece útil
apresentar, cm linhas gerais, a taxonomia piagetiana dos períodos de desenvolvi
mento, resumindo cm apenas uma ou duas sentenças os aspectos importantes de
cada um deles. De acordo com as preferências mais recentes de Piaget (1955d, p.
85
36 nota IX o termo período i usado para designar as principais épocas do desen
voNimento e o tcmio estágio designa subdivisões menores dentro dos períodos
quando necessário, são usados também os termos subperíodo e subestágio.1
O período da inteligência sensôrio-motora (0 a 2 anos). Durante este impor-
tante período inicial, a criança se desenvolve de um nível neonatal, reflexo de
completa mdiferenciação entre o eu c o mundo para uma organização relativa
mente coerente de ações sensório-motoras diante do ambiente imediato. Esta or
ganização. no entanto, é inteiramente “prática”, pois abrange ajustamentos per-
ceptivos c motores simples às coisas e não manipulações simbólicas delas. Há seis
estágios principais neste período, alguns das quais se subdividem em subestágios.
O período de preparação e de organização das operações concretas (2 a 11
anos). Este período tem início com as primeiras simbolizações rudimentares que
aparecem no final do período sensório-motor e termina com o início do pensa
mento formal, durante os primeiros anos da adolescência. Há dois subperíodos
importantes. O primeiro, das representações pré-operacionais (2 a 7 anos), refe
re-se ao termo preparação usado no título. Trata-se daquele período, na infância
inicial, no qual a criança realiza suas primeiras tentativas relativamente desorgani
zadas e hesitantes de enfrentar um mundo novo e estranho de símbolos. Às ve
zes, Piaget distingue três estágios neste primeiro subperíodo: (1) primórdios do
pensamento representativo (2 a 4 anos); (2) representações ou intuições simples
(4 a 5¥i anos); (3) representações ou intuições articuladas (5 a 7 anos). 0 tra
balho desta fase preparatória frutifica no subperíodo seguinte, das operações con
cretas (7 a 11 anos). Nele, a organização conceituai do ambiente circundante tor-
na-se lentamente estável e coerente, dada a formação de uma série de estruturas
cognitivas chamadas agrupamentos. Particularmente neste subperíodo, a criança
começa a parecer racional e bem organizada em suas adaptações; parece possuir
um quadro de referências conceituai razoavelmente estável e regular que aplica
sistematicamente ao mundo de objetos que a rodeia.
O período das operações formais (11 a 15 anos). Durante este período
ocorre uma reorganização nova e definitiva, com novas estruturas isomórficas aos
grupos e aos reticulados da álgebra. Em resumo, o adolescente é capaz de lidar
eficientemente não só com a realidade que o cerca (como o faz a criança
subperíodo precedente), mas também com um mundo de pura possibilidade,
mundo das afirmações abstratas e proposicionais, o mundo do “como se •
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tipo de cognição, do qual Piaget encontra provas entre os adolescentes que estu
da, caracteriza o pensamento adulto no sentido de que é através destas estruturas
que o adulto funciona quando está em sua melhor forma cognitiva, isto é, quan
do pensa de modo lógico e abstrato.
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cmos há vantagens no método de observação longitudinal, embora se limite a
uma amostra de tres sujeitos.
Piaget discrimina seis estágios principais em toda a sequência de desenvolvi
mento do período sensório-motor (1952c). No estágio 1 (0 a 1 més) a criança
é capaz do muito pouco, além dos reflexos com os quais nasceu. No estágio 2 (1 a 4
meses) as várias atividades reflexas começaram a passar por modificações isoladas
decorrentes da experiência c a se coordenarem mutuamente de várias maneiras
complexas. No estágio 3 (4 a 8 meses) a criança começa a realizar ações mais defini-
damente orientadas para os objetos e eventos externos além do próprio corpo. Em
suas tentativas de reproduzir repetidas vezes os efeitos ambientais conseguidos ini-
culmente através de ações casuais, o bebê demonstra uma espécie de prenúncio de
intencionalidade ou de direção para um alvo. No estágio 4 (8 a 12 meses) nota-se
daramente a presença da intencionalidade que se manifesta nas primeiras seqüên-
cias de ação meios-fim ou instrumentais. Enquanto neste estágio a criança se limi
ta a empregar apenas padrões de comportamento familiares ou habituais como
meios para enfrentar situações novas, no estágio seguinte (estágio 5: 12 a 18 me
ses) ela tenta encontrar novos meios e parece procurar, pela primeira vez, a novi
dade com um fim em si. Finalmente, no estágio 6(18 meses em diante) a crian
ça começa a fazer representações internas, simbólicas dos problemas sensório-mo-
tores, a inventar soluções através de comportamentos implícitos de ensaio-e-eno,
em lugar de emitir comportamentos explícitos deste mesmo tipo. Com 0 advento
destas primeiras representações elementares, a criança transpõe os limites entre 0
período sensório-motor e o pensamento pré-operacional.
Antes de retomar estes seis estágios em detalhes, é necessário apresentar
uma série de esclarecimentos e explicações. Alguns dos esclarecimentos já sao co
nneddos. Primeiro, cada estágio é definido de acordo com os comportamento
mais adiantados que abrange; indubitavelmente, a persistência de comportamen
evolutivamente anteriores é a regra e não a exceção. Em muitos casos,
te, a forma anterior se integra diretamente à sua sucessora, embora estas
antenores possam simplesmente persistir como são; por exemplo, a crianç
dois anos apresenta comportamentos primitivos de sucção quando rece e çs:
madeira, apesar de sua capacidade evidente para adaptações maiores e me
s dc comPorta
De modo geral, deve ser enfatizado o fato de que os padr t linear
mento que caracterizam os diferentes estágios não se sucedem de moS se-
<os que pertencem a um dado estágio desapareceríam quando n0 vertí"
gumtes) mas, como as camadas de uma pirâmide (apoiada na ^aS^creScenDd°s
<*)> de modo que os padrões de comportamento mais simples sao ^id^ P*
íos antigos completando-os, corrigindo-os ou combinando-se com
329),
1 . de obserV11',á0
1 m fn ie^un<^° ’u8ar. basta examinar rapidamente os protoo:0,0SÍfi^^
U .ern seu* **vro* »obre o período sensório-motor, para qoc melhor
hèn/t ° K ,nten,aJo’ de idade atribuídos aos cstiígios são, n sentar c«X
h.^te»e», média, muito gro,seiras; por exemplo, Lucionne pode ap^
portamentos equivalentes ao estágio 5 cerca de um més antes que seus irmãos ou
vice-versa. Assim sendo, torna-se claro que um estágio não pode ser nada além de
uma espécie de abstração retirada de uma continuidade cinemática. Estes esclare
cimentos são leitos pelo próprio Piaget (ibid.) e convém enfatizá-los, mesmo sob o
risco de repetição excessiva, para que fique excluída a possibilidade de qualquer
mal-entendido.
O domínio do comportamento sensório-motor se presta especialmente a
uma explicação referente a problemas de exposição, dos quais o leitor precisa
estar ciente. Ao resumir a obra de Piaget é impossível evitar reorganizações, mu
danças de ênfase e outros desvios do original; isto ocorre devido às idiossincrasias
de expressão e de ênfase que caracterizam Piaget, ao período no qual o trabalho
toi realizado ou escrito, ao público a que se dirige, etc. No caso específico do
desenvolvimento sensório-motor, há dois temas aos quais Piaget dedica muita
atenção mas que, neste sumário, serão menos valorizados. Um deles se refere às
suas longas discussões teóricas sobre as vicissitudes complexas das funções inva-
riantes de organização, a assimilação e a acomodação, quando se trata de explicai
o comportamento presente em cada estágio. O outro diz respeito às repetidas
comparações entre sua própria explicação teórica do desenvolvimento, expressa
em termos das invariantes funcionais, e as explicações alternativas que o associa-
cionismo, a teoria da Gestalt e outras posições teóricas ofereceríam para os mes
mos fenômenos. Estes dois temas foram discutidos em linhas gerais no Capítulo 2.
89
das invariantes funcionais - a organização, a assimilação e a acomodação ue
sistirão como constantes funcionais durante todo o desenvolvimento. ***’
90
Estágio 2: As Primeiras Adaptações Adquiridas e
a Reação Circular Primária (1—4 meses)
Pode-se dizer que este estágio tem início quando os reflexos do rece'm-nas-
cido começam a mudar, e alteram sua forma em função da experiência. É o pe
ríodo no qual realmente começam a surgir os primeiros hábitos simples, as aquisi
ções sensório-motoras mais elementares:
91
AS INVAKJANTES FUNCIONAIS E A REAÇÃO CIRCULAR PRIMÁRIA
2 ue Q empíe'
gou raTntó?Predt0U eSte conceito de j- M. Baldwin (Baldwin, 1925, 9Jentro
orientação teó**3 L" explicar a seleção e a retenção dos hábitos de e t ’ cjaimente jp
nificado h-' qUe$e darwiniana- Embora Piaget não tenha alterado su min
sxar ™ u,üsouo'
crtâpos posteriores Este termo se refere a uma série de repetições de uma res-
pcists sensõrio-motora (ou a uma destas repetições). A resposta inicial da série é
tcnprr nova para a criança, pois seus resultados específicos não foram antecipa-
dos nào foram “planejados" antes da emissão da resposta. O componente im
portante desta reação do qual deriva o termo circular - está naquilo que acon-
taoc depois que a resposta, nova c inicial, foi emitida. Dada a existência da assi-
rrulaç*0 reprodutiva ou funcional, inerente à atividade inteligente, a criança tende
i repetir muito c muitas vezes esta adaptação nova e casual. Através destas repeti-
çVs i resposta rs va se consolida num esquema novo e firmemente estabelecido.
Assim, a sequência consiste, em primeiro lugar, em deparar-se casualmente com
um c.vpenência nova, em conseqüéncia de algum ato e, em segundo lugar, em
tentar recapturar esta experiência, realizando os movimentos originais repetidas
vezes, numa espécie de ciclo rítmico.3
A importância da reação circular está no fato de que ela é um mecanismo
sensóno-motor por excelência que permite adaptações novas e, obviamente, as
adaptações novas são o cerne do desenvolvimento intelectual em qualquer estágio.
Piaget descreve três tipos de reação circular: a primária, a secundária e a
icrciária. As diferenças entre elas referem-se tanto àquilo que a resposta inicial
atinge como à natureza de suas repetições. As reações circulares primárias são
escontradas no estágio 2 — na realidade, praticamente o definem (1952c, p. 49);
a reações circulares secundárias e terciárias aparecem nos estágios 3 e 5, respecti-
*-mente. Embora a diferença vá se tornar mais clara quando discutirmos o estágio
podemos antecipar que as reações circulares primárias diferem das secundárias,
fl ^dida em que estão mais centradas no corpo da criança do que dirigidas para
ora, para a manipulação de objetos circundantes. Esta distinção certamente não
’ imutável, sendo mais fácil intuí-la quando se compara exemplos concretos dos
tipos de reações circulares. Piaget apresenta numerosos exemplos de reação
-Lilar primária; talvez apenas um deles seja suficiente como ilustração:
94
na posição dc rcccbcr alimentos (nos braços da mãe, ou na cama, etc.), as mãos
deixam dc ter interesse, c tirada da boca c torna-se evidente que a criança não
procura mais nada além do seio, isto c, o contato com o alimento... Durante o
segundo mes, a coordenação entre a posição e a busca do seio já passou por um
progresso considerável. No final do mês, Laurent só tenta mamar quando está
no colo da mãe c não mais quando está na mesa onde é trocado (ibid., p. 58).
95
temente social, é a princípio uma simples reação (de prazer) a ob e
e seria o equivalente sensório-motor do reconhecimento de °S
71-2). Um °bÍet0 ('*#.,
Tal como no estágio reflexo, a criança ainda não percebe os obi
objetos, quando realiza as reações circulares primárias visuais. Como C°m°
a construção de um mundo cognitivo de objetos estáveis e externos”1 ISSemos’
coisas sejam assimiladas não a um único esquema, mas a uma rede^?^ “
intercoordenados: esquema$
Para que uma imagem sensorial se constitua num objeto externo não é sufi
ciente que ela seja reconhecida quando aparece. Qualquer estado subjetivo pode
ser reconhecido, embora nao se encontre ligado à ação de objetos que indLn-
em do ego. O recem-nascido que mama reconhece o mamilo através da combi
nação dos reflexos de sugar e de deglutir, sem transformar o mamilo num obje
to. Do mesmo modo, uma criança de um mês é capaz de reconhecer algumas
imagens visuais, sem entretanto realmente exteriorizá-las. Qual é a condição ne
cessária a solidificação destas imagens? Parece-nos essencial que os esquemas
visuais se coordenem com outros esquemas de assimilação como os de preensão,
au içao ou sucção. Em outras palavras, devem estar organizados num universo.
sya inclusão numa totalidade que lhes confere um início de objetividade
(ibid.y pp. 74-5).
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determinados sons. Mais tarde, demonstra, de maneira mais ou menos consistente
prazer diante de certos sons e desprazer diante de outros (assimilação de reco^ :
amento) e. em geral revela um interesse genuíno por uma vaidade cada Vez
maior de ruídos (assnnilaçao generalizadora).
É nesse estágio que se dá o esperado início de coordenação entre a visão e
a audiçlo e entre a audição e a vocalização. Segundo Piaget, estas coordenações
não são simples associações, mas assimilações recíprocas entre os esquemas (ver
Capítulo 2). Tomemos como exemplo o caso da visão e da audição. Poder-se-ia
concluir que quando a criança vira a cabeça em resposta a um som, ela está ten
tando ver o objeto que produziu o som. Entretanto, Piaget duvida que este seja o
caso durante os primeiros meses e sugere, em lugar desta interpretação, que a
ativação de um esquema (audição) simplesmente excita os outros (no caso, a vi
são). Segundo Piaget, embora pareça que a criança está tentando ver o que ouve
ela está, na realidade, apenas tentanto olhar enquanto ouve (ibid., p. 86). E, reci
procamente, ele acredita que a ativação do esquema de olhar sensibiliza a criança
para ouvir. O que ocorre, portanto, não é uma simples associação entre a visão e
o som, mas uma assimilação recíproca entre os esquemas. Isto é, a criança tenta
assimilar atividades auditivas ao esquema de olhar e imagens visuais ao esquema
de ouvir; segundo as palavras de Piaget, a criança tenta ouvir o objeto que vé e
ver o som que o objeto produz (ibid., p. 87).
0 mesmo se dá em relação à vocalização e à audição, talvez de maneira
ainda mais clara. Sem dúvida a criança assimila os sons que ela própria produz ao
esquema de ouvir; estes sons estimulam a atividade de ouvir e são, em parte, con
trolados por ela. O inverso também é verdadeiro. Os bebes revelam uma espécie
de imitação primitiva ou de fenômeno de contágio no qual sons externos tendem
a estanular a vocalização, especialmente quando o som e a vocalização são seme
lhantes. Deste modo, como no caso da visão e da audição, a criança assimila os
SOns que ouve aos esquemas de vocalização, ao mesmo tempo que assimila a vo-
calização à audição.
Preensão. A área de evolução mais complexa durante o estágio 2 é, sem
'dda, a do comportamento de agarrar ou da preensão. O conceito de assimi-
recíproca que acabamos de descrever assume uma importância particular
contexto; Piaget o utiliza para organizar e esclarecer conceitualmente esta
*ea difícil e intrincada. O desenvolvimento da preensão contém cinco subes-
Os primeiros abrangem a atividade manual per se\ os últimos referem-se às
Jfdenações entre esta atividade e os esquemas de sugar e de olhar.
Embora tenhamos a intenção de adiar qualquer avaliação positiva ou nega-
n a da produção piagetiana para os últimos capítulos, é difícil deixar de fazer,
ponto, alguns comentários sobre sua descrição do desenvolvimento da
^r^/)sío. a leitura cuidadosa deste material dá a impressão de que nele Piaget
As ° r^^mo de sua capacidade num campo em que trabalha com perfeição.
rnc .. * ^rvaÇôes empíricas são especialmente penetrantes e criativas — criativas na
sad da Crn qUe Procuro“ c encontrou fenômenos sutis que a maioria dos pesqui-
nao teria procurado c, conseqüentcrnente, não teria encontrado. Seu qu
97
1 referências tóorico é parcialmente responsável pelo fato dele saber o que
procurar e ccomo encontrar; q no
conc eitodadepreensão
caso ele parece
assimilação, mais útil
que parece tãoe adequado
impreciso
do que cm ,.bstrato torna-se surpreendentemente útil na ordenação
qUa"Ó° Z-** que de^oulta «d. - U!t. Jie.
e no esclarec Dito isto> paSsemos aos detalhes.
de observações 1 eSL . é d atividade reflexa impulsiva e pertence, portan-
° T i Xeafic^nte, o recém-nascido exrbe um reflexo de fechara
98
cnançâ não tenta pegar o que ve (isto é, manipular as imagens visuais); na realida-
de ainda não consegue sequer manter as mãos no campo visual para continuar
exanunando-as. Assim, a relação olho-mão é mais atrasada quando comparada
com a relação boca-mão. Embora não exista nenhuma explicação lógica para esta
décalagc (ibid.. p. 99), ela continua a existir no terceiro subestágio.
Durante o terceiro subestágio, tém lugar duas novas conquistas importan
tes. Primeiro, dá-se a assimilação recíproca dos esquemas de preensão e de suc
ção. A criança não só leva à boca aquilo que pega, como também segura qualquer
coisa que seja colocada em sua boca. Obviamente, esta coordenação entre esque
mas leva a criança a um degrau intelectual mais próximo do mundo de objetos
(ibid.. p. 101). Sob os auspícios das reações circulares primárias de pegar, a crian
ça adquire a capacidade de reconhecer vários objetos de um ponto de vista tá-
til-motor. No entanto, este reconhecimento é apenas o germe de um conceito dos
objetos como objetos — como coisas externas que são diferentes das próprias
ações. Porém o progresso mais importante no sentido da objetividade é consegui
do quando a criança se toma capaz de inserir os objetos em dois esquemas ao
mesmo tempo - neste subestágio, os de preensão e sucção (ibid.. p. 101).
Em segundo lugar, verifica-se um progresso nas coordenações entre a preen
são e a visão sem todavia haver uma assimilação recíproca definida entre ambas.
A criança ainda não segura os objetos quando os vé, mas é capaz de duas realiza
ções que indicam um avanço em relação ao subestágio anterior. Em primeiro lu-
8a1» o simples olhar para a mão, muitas vezes, parece levar a um aumento da
atividade desta; trata-se de um tipo de controle visual primitivo do comportamen-
to manual. Em segundo lugar, a criança desenvolve a capacidade de manter a mão
a vista, assim que ela entra (casualmente) no campo visual. Apresentamos a seguir
Urn exemplo deste fenômeno.
neste estágio * d*0 Contro‘e v*sua^ da atividade das mãos, embora rudimentar
deira preensão lmPortante na medida em que leva muito em breve a uma verda-
Ça aPrenda * Onentada pela visão. Para que isto ocorra, é necessário que a crian-
dade motora transformar as imagens visuais através de sua própria ativi-
ria-se reaJmcj ma vez adquirida esta noção, a assimilação entre os esquemas tor-
recíproca e não mais um direcional:
99
J
tátcis tenham servido como alimentos para os esquemas manuais as
convertem cm material para os exercícios manuais. Neste sentido ™agen”e i
visuais podem ser consideradas “assimiladas" à atividade sensóridmStUnagens
braços c das nwos (ibid., pp. 107-08). ,Ora d<»
í
No quarto subestágio, a relação entre a visão e a preensão progride ainda
mais, porém novamente com evidentes limitações. A criança é capaz, pela primei
ra vez, de pegar deliberadamente um objeto que vê. Mas isto pode ocorrer somen
te quando o objeto e a mão que o pega são percebidos no mesmo campo visual
100
tos O^nação sua mctno
que coloco85cm No mao que Jacqucline
dia.está fora do leva paravisual
campo do, olho,
diante(lápis, Eia
etc.) obje
rcaçao <5 nova c nao apareceu no, dias anteriores (ibid., p. H6).
101
consistem na repetição de adaptações casuais, isto é, adaptações claramente ’
antecipadas pela criança. Porém, existe uma diferença fundamental. Dito da ma
neira a mais simples possível, no estágio 2 a criança dedica-se principalmente às
atividades de seu próprio corpo suga pelo prazer de sugar, pega pelo prazer de
pegar, etc. , intcressando-se rclativamente pouco pelos efeitos destas atividades
sobre o ambiente. Por sua vez, a criança do terceiro estágio está muito mais inte
ressada pelas consequências ambientais de suas ações; a reação circular secundária
consiste exatamente em tentativas de manter, através da repetição, uma mudança
ambiental interessante que sua própria ação produziu acidentalmente. Assim, no
estágio 2, a criança simplesmente pega, toca, olha, ouve, etc.; no estágio 3, ela
balança, joga, esfrega e bate os objetos com grande interesse pelas imagens e sons
que estas açòes produzem nos objetos. Obviamente, às vezes é difícil distinguir entre
as reações primárias e secundárias, especialmente no início do estágio 3, como ocor
re com todas as diferenciações evolutivas, ela se torna mais clara quanto maior
for a diferença de idade entre as crianças tomadas como modelos. De modo geral,
pode-se dizer que a reação circular primária é mais autocêntrica, mais centrada
em seu próprio funcionamento, enquanto que a reação circular secundária é mais
alocéntrica, mais orientada para fora, além dos limites do eu.
Não é difícil perceber como o desenvolvimento da atividade manual visual
mente orientada, realização máxima do estágio 2, permite a transição gradual das
reações primárias para as reações secundárias. Esta atividade mais do que todas as
outras, possibilita alterações genuínas no ambiente, que são essenciais à reação
circular secundária. Durante suas reações manuais primárias cotidianas de pegar,
bater, puxar, etc., a criança inevitavelmente nota que o chocalho que pega, pro
duz um som especial, que o boneco que ela golpeia, balança, etc. A assimilaçao
reprodutiva garante que a criança tentará conservar a nova aquisição, repetindo os
atos de pegar e de golpear muitas e muitas vezes. Os esquemas primários foram
construídos exatamente desta maneira. Portanto, é assim que as reações circulares
secundárias nascem de um contexto de reações primárias e é assim que tem inicio
a primeira exploração real do mundo exterior.
Piaget oferece inúmeros exemplos de reações circulares secundárias que
servou em seus próprios filhos. Há vários tipos diferentes de reações secundárias,
a maioria das quais abrange atividade manual (puxar, bater, balançar, esfrega ,
etc.), e algumas que incluem movimentos gerais do corpo, especialmente esperne
e agitá-lo violentamente. A seguinte observação ilustra a evolução gradual de
reação secundária manual:
102
esses movimentos, o objeto c casuahncnte friccionado contra o vime do cesto:
Laurent então agita vigorosamente os braços, evidentemente tentando repro
duzir o som que ouviu, sem perceber a necessidade do contato entre a espátula
e o vime c, consequentemente, só o consegue por acaso.
Aos 0;4 (3), as reações são as mesmas, mas Laurent olha para o objeto
quando este é casualmente friccionado contra o vime do cesto. O mesmo ainda
ocorre aos 0:4 (5), embora haja um leve progresso no sentido de sistematização.
Finalmente, aos 0;4 (6), o movimento torna-se intencional: assim que a
criança tem o objeto na mão, fricciona-o regularmente contra o vime. Posterior
mente, faz o mesmo com bonecas, chocalhos (ver Observação 102), etc. (ibid.,
pp. 168-69).
Observação 95 - Lucienne, aos 0;4 (27), está em seu cesto de vime. Suspen
do uma boneca acima de seus pés, o que imediatamente mobiliza o esquema de
espernear (veja as observações precedentes). Seus pés alcançam a boneca em
cheio e lhe imprimem um movimento violento que Lucienne observa encantada.
Em seguida, ela olha para seu pé que está imóvel e recomeça em seguida. Não
há controle visual do pé, pois os movimentos são os mesmos quando Lucienne
apenas olha para a boneca ou quando a coloco sobre a sua cabeça. Por outro
lado, o controle tátil do pé é visível: depois dos primeiros chutes, Lucienne faz
movimentos lentos com o pé, como se quisesse pegar e explorar. Por exemplo,
quando ela tenta chutar a boneca e não acerta o alvo, ela reinicia lentamente
até conseguir (sem ver os pés). Do mesmo modo, cubro seu rosto ou a distraio
por alguns momentos; mesmo assim, ela continua a golpear a boneca e a con
trolar seus movimentos (ibid., p. 159).
Observação 106 - Na tarde dos 0;3 (13), Laurent, por acaso, golpeia a cor
rente enquanto chupa os dedos (Obs. 98): segura-a e lentamente a desloca en-
Quanto observa os chocalhos. Começa então a balançá-la levemente, o que pro-
duz um movimento leve dos chocalhos pendentes e um som ainda mais leve
( entro deles. Laurent, então, aumenta clara e gradualmente seus movimentos:
aK'ta a corrente cada vez com mais força e ri ruidosamente diante do resultado
1 - Ao observar a expressão da criança é impossível não achar que esta
gradação é intencional.
Aos 0,4 (21), quando golpeia com a mão os brinquedos pendurados na co-
Ção d° CeSt° 103), ele gradua visivelmente seus movimentos em fun-
° resultado: a princípio, golpeia levemente e depois continua cada vez
m rnaís f°rça, etc. (ibid., p. 185).
103
U „.1undSo secundárias de nota
ponto dignopara « refere intelectual,
a atividade à impottãncia
naoexUaotdiato
só neste estágio,
reações circulare . *Viagct afirma que os adultos, quando se defrontam com
mas durante tocatém nenhuma informação, recorrem a reações cir-
um aparelho sobre q puxam aquilo> repetindo apenas aqueies atos
cularcs secundárias. 1 são interessantes por algum motivo. Entretanto,
cujas consequências i p * a e 0 aduito neste sentido. Primeiro, para a
há duas diferenças ensecundárias constituem o máximo de suas capaci-
criança do n’ào XO,K com a maioria dos adultos! Segundo, as r»
^do^to são mais | '
pura e deliberadamente exploratórias e experimentais,
Desde o início, ele tenta sistematicamente fazer novas adaptações; isto não acon-
tece com a criança neste estágio, como veremos quando discutirmos o problema
da intencionalidade.
Transcrevemos a gUlr
• Uma amostra destas observações:
presos a um lustrp^UC*enneT>e[ce*)e a certa distância dois papagaios de
e,a agita definida e ™ VeZeS' estiveiem em seu cest° d^*
Este só pOtje Ptdamente as pernas sem tentar agir sobre eles
(19), basta oue L Uni. 03X0 reconhecimento motor. Assim tambcni.
to de agitá-las com VCJa.SUas bonecas à distância para que esboce uni
104
Se a interpretação destas observações estiver correta, tudo indica que en-
-ontramos os precursores do reconhecimento contemplativo puro, não contami
nados pela antecipação. Assim, ao contrário da criança que franze a boca quando
vê a maniadeira, neste caso, o comportamento de reconhecimento parece não ser
unia simples antecipação de uma ação que a criança pretende realizar em bre-
ve - Lucienne não parece realmente interessada em balançar a boneca neste mo
mento. Ao contrário, parece estar indicando, através da única maneira que lhe é
possível no nível em que se encontra, que conhece o significado do aconteci
mento em questão. Neste contexto, é interessante pensar na relevância destas
observações para a teoria do significado de Osgood, na qual as respostas significa
tivas são consideradas frações reduzidas e implícitas das respostas totais e explíci
tas emitidas originalmente em relação ao objeto-sinal (Osgood, Suei e Tannen-
baum, 1957).
Piaget afirma que quanto mais velha a criança, mais ativamente ela procura
se acomodar às novidades trazidas pelos objetos novos ou desconhecidos. Por
exemplo, mostraremos que a criança no quinto estágio do desenvolvimento sensó
rio-motor reage a novas situações com um programa decididamente ativo e versa
tü de experimentação. Modifica os esquemas comuns de todas as maneiras possí
veis, observando intencionalmente como o estímulo novo responde às suas várias
ações. As crianças muito pequenas, por sua vez, tendem a desconsiderar os aspec
tos novos dos objetos desconhecidos, simplesmente assimilando-os aos esquemas
habituais, ou seja, tratando-os, na medida do possível, como se tivessem todas as
Pr°priedades do objeto familiar que lhes seja mais semelhante. Segundo palavras
do Práprio Piaget: “é interessante que quanto mais nova a criança, menos as novi
dades lhe Parecem novas” (ibid., p. 196).
0 comportamento da criança no estágio 3 encontra-se no extremo inferior
e°ntínuo: diante de situações novas, ela se contenta em aplicar os esquemas
visuais:
Aos 0;4 (8), coloco um grande macaco deuma en’
membros e o rabo móveis, assim como a ca eça demonstra assombro e
tidade absolutamente nova para ele. Realmen e, aplica ao macaco alguns
mesmo um certo temor. Mas se acalma rapi amen t 0 corpO, bate
dos esquemas que ele usa para balançar objetos Pen 0 resultado obtido
com as mãos, etc., graduando seus esforços e acor verificar se ele repete
(•••). Aos 0,6 (7) apresento-lhe vários objetos novos P associadas a0 objeto
as tentativas de exploração especial que pareceram alimento para
anterior. Isto não ocorre; a criança utiliza o o jc o $ e cabeça móvel e
seus esquemas habituais. Assim, um pingüiin t Pes uoipeia, depois o esfre-
observado durante pouco tempo, a principio. UI° cò,n quc pegou o
8* na lateral do cesto, etc., sem levar em conta a COIU
objeto. Várias bugigangas recebem o mesmo t^ento. ele P
das mãos e as golpeia com a outra (ibid., pp- l
105
Trata-sc nitidamente de um comportamento de generaliza '
que acontecimentos novos são incorporados a esquemas antigos rnedida em
neralização sem uma real discriminação, sem muita diferencia Uma ge‘
que decorra da acomodação precisa a aspectos novos. °s es<Juenras
No estágio 3 encontramos também uma espécie de generaliza '
renciação mais exótica do que a que citamos acima. A propósito o^ dife’
vo, neste caso, não é um objeto novo que a criança manipula diretam™10
um acontecimento que ela assiste à distância. O que aconterp n»,. "e’ mas
enança põe em açao uma ou mais de suas reações circulares secundárias
parece uma tentativa de preservar o espetáculo através da ação à distância Este
comportamento difere da reação de reconhecimento motor descrita anteriormen
te, pois agora a criança parece estar fazendo uma tentativa completa e ativa de
reconstituição do acontecimento, em lugar de simplesmente tomar conhecimento
dele através de movimentos reduzidos. Estes procedimentos são claramente irra
cionais apenas do ponto de vista de um observador familiarizado com a textura
causai do ambiente; para a criança, eles simplesmente constituem uma generali
zação inteiramente natural a partir de experiências anteriores de reação circular
secundária. Apresentamos, a seguir, alguns exemplos:
Aos 0;7 (7), ele (Laurent) olha para uma caixa de metal, colocada numa
almofada que está a sua frente, muito distante para ser alcançada. Tamborilo no
objeto por um momento, num ritmo que o faz rir, e a seguir apresento-lhe mi
nha mão (de frente, a uma distância de 2 cm dele). Ele a olha, apenas por um
momento, e volta-se novamente para a caixa; então, agita os braços enquanto a
olha fixamente (depois lança-se para a frente, golpeia as cobertas,
beça, etc., ou seja, se vale de todos os “procedimentos de que dispõe), vi
temente, ele espera que o fenômeno se repita. A mesma reação e o sen' ,
0;7 (12), 0;7 (13), 0;7 (22), 0;7 (29) e 0;8 (1), numa variedade de cir
cias (veja Observação 115). a princíp*0
Portanto, parece evidente que o movimento de agitar os raç
inserido num esquema circular de conjunto, foi retirado dc seui quaiquer
ser usado, cada vez mais, como um “procedimento para pr
espetáculo interessante (ibid., p. 201). chegou
Observação 118 - Finalmente, vamos mencionar como ^enteSe pesde
lizar os movimentos da cabeça como “procedimentos e r coni ape*
Laurent é capaz de imitar um deslocamento lateral da 03.e uando se
nas 0'3 (23), surpreendo-o movendo a cabeça desta rnan^^n^r.|jie um mo^
ta com um chocalho dependurado, como se quisesse impr
to real (ver Vol. II, Observação 88). UIT1a
Aos 03 (29) balança a cabeça quando paro de ba.^crrOinpo um ^°v
semanas seguintes, reage da mesma maneira assim que
to que ele observava. ar a continuar a
Aos 0;7 (1) ele faz este movimento para me *centlV reaçâo na
dedo médio contra o polegar. Aos 0,7 (5) tem a mvs ^oS 0;7 a
um jornal que desdobrei e que deixei imóvel diante e njo unl
cabeça, agita os braços ou joga o corpo para a fren
qual eu havia batido ritmadamente. ra fazer
Até cerca de 0;8, ele continua usar este esquema( p-
acontecimento interessante, seja ele um movimento etc ) 1
importa sua direção ou até mesmo um som (um mur
106
O PROBLEMA DA INTENCIONALIDADE
a^aPtaçj0 (j d ' Um at0 *ntenc*onal 4 aquele que consiste muito mais numa
erada a unia situação nova do que numa repetição simples e cega
107
dc esquemas habituais. Considerando os três critérios simultaneamente-
qücncia de comportamento é tanto mais intencional quanto mais se d • Jma " se-
objetos, quanto mais atos instrumentais intervenientes ou “meios” 8 para
abrange e
quanto mais for claramcntc uma adaptação progressista, que busca a
novidade e
não uma repetição retrógrada do velho.
De acordo com estes critérios, os comportamentos encontrados
no estágio
3 podem ser considerados semi-intencionais. Em primeiro lugar, eles tém em*co
i co-
mum com os comportamentos mais definidamente intencionais dos estágios pos
tenores a propriedade de estarem orientados para o mundo exterior. É preciso
lembrar que as reações circulares secundárias são definidas como ações destinadas
a manter um acontecimento sensorial interessante que acaba de ser produzi
do — pela ação da criança (reações secundárias “puras”) ou de outra pessoa (os
"procedimentos para prolongar espetáculos interessantes”). Além disso, é mais
justificável considerar estes atos como verdadeiros meios para produzir um acon
tecimento sensorial do que assim considerar as reações primárias mais autocén-
tncas.
No entanto, a intencionalidade no estágio 3 possui algumas limitações bem
definidas. A mais importante delas refere-se à maneira pela qual a intencionali
dade se apresenta. Nos estágios posteriores, a criança inicia uma seqüéncia de
comportamento com um objetivo a ser atingido e passa a procurar os meios apro
priados para atingi-lo. Nestes estágios, a intencionalidade está presente desde o
início, e a seqüéncia como um todo é muito mais uma adaptação nova (já que
os meios não são imediatamente dados e precisam ser descobertos) do que uma
repetição automática. No caso da reação circular secundária, de outro lado, o
acontecimento sensorial interessante torna-se um objetivo somente depois que os
meios forem postos em ação. Em outras palavras, os aspectos intencionais sao
post hoc\ não estando presentes inicialmente, eles passam a existir apenas depois
que o objetivo foi descoberto, ou seja, na repetição e não na ação original- 0
fato das reações secundárias, como as primárias, serem fundamentalmente orienta
das para a repetição e não centradas em adaptações novas, constitui uma segun
limitação à sua intencionalidade. Assim, o que Piaget vé no estágio 3 é uma for
ma de transição altamente interessante entre a não-intencionalidade e a intencio
nalídade. Esta, surgindo no estágio 3 somente depois da repetição de uma sequ
da ativa, eventualmente começará a surgir antes da seqüéncia, orientando n
ações desde o seu início. Os primeiros exemplos indiscutíveis de intenção, em
forma mais pura, ocorrem no estágio que passamos a apresentar.
108
usoagora
evidentes noque
totalidades que asão inquestionavelmente
criança intencionais
faz dos signos oti sinais Za 7^ P^0’
mentos iminentes. Finalmente, suas reações a obietos nnv P anteciPar acontecí-
conhecidos passam por uma mudança sutil e importante ° COmpletamente des'
109
minha mão como que para removê-la ou abaixá-la; deixo-o
a caixa. - Recomeço a impedir sua passagem, mas’ usando * 'le pegi
almofada suficientemente flexível, para conservar as marcas dos1 anlepwo Un>»
ça. Laurent tenta alcançar a caixa e, aborrecido com o obstáculo*"' 05 Cr“n’
te o golpeia c o abaixa ate que o caminho fique desimpedido
110
É muito provável que surja a seguinte objeção: as coordenações íntersenso-
riais peculiares a algumas reações circulares primárias nos põem desde muito
cedo diante de scriaçõcs do mesmo tipo. Quando a criança pega um objeto
para sugá-lo» olhá-lo, etc., tudo indica que diferencia meios e fins e, conseqüen-
temente, estabelece um objetivo. Porém, na falta de um obstáculo que atraia a
atenção da criança, nada justifica atribuir tais diferenciações à consciência do
sujeito. Pegar para sugar constitui um ato isolado no qual os meios e os fins se
confundem, sendo este ato isolado formado pela assimilação recíproca imediata
dos esquemas presentes. Portanto, é o observador e não o sujeito quem estabe
lece distinções no caso desses esquemas. A diferenciação entre meios e fins sur
ge somente quando a criança tenta estabelecer relações entre os objetos - em
outras palavras, surge a aquisição de consciência que caracteriza a intenção e
que é mobilizada quando ocorrem obstáculos externos (ibid., pp. 226-27).
111
to começa a levantar da cadeira c a criança, antecipando sua partida '
chora. A criança vê a mãe pôr o chapéu c, como este gesto foi seguido'™^^’
da mãe no passado, ela também chora. Portanto, as reações antecipatóriasV31^
de sinais evoluem como os demais padrões sensório-motores: a princípio os
tos não se diferenciam do próprio comportamento da criança e apenas gradual
mente são reconhecidos como independentes de seu comportamento A partir do
que dissemos, não é de surpreender que Piaget considere desnecessário inferir°
neste período inicial, processos de imaginação ou processos simbólicos complexos
como mediadores do comportamento diante de sinais:
Quando Jacqueline espera ver uma pessoa assim que uma porta se abre ou
suco de frutas numa colher que foi retirada de um determinado recipiente, não
é necessário, para que haja compreensão dos sinais e, conseqüentemente, pre
visão, que ela seja capaz de imaginar estes objetos quando estão ausentes. É
suficiente que o sinal mobilize uma determinada atitude de expectativa e um
certo esquema de reconhecimento de pessoas ou de alimentos (ibid., p. 25 2).
112
se adaptar, c não unia substância ilimitadamentc flexível ou um simples alimen
to paia sua própria atividade, l inalmentc, os esquemas habituais são aplicados a
esta realidade. Mas quando tenta sucessivamcntc aplicar cada um dos esquemas,
a criança deste estagio da mais a impressão de estar fazendo um experimento
do que de estar generalizando seus padrões de comportamento: ela tenta “com
preender" (ibid., pp. 258-59).
Observação 136 — Aos 0;8 (16), Jacqueline pega um maço de ciganos que
não conhece e que lhe apresento. A princípio, ela o examina muito atentamen
te, vira-o e o segura com ambas as mãos, produzindo o som apff (uma espécie
de assobio que ela comumente faz na presença de pessoas). Depois, o esfrega no
vime do berço (movimento habitual de sua mão direita, Observação 104), de
pois se projeta para a frente enquanto o observa (Observação 115), depois agita
o maço acima dela e finalmente o coloca na boca (ibid., p, 253).
113
A REAÇÃO CIRCULAR TERCIÃRIA
114
diferenciação considerável entre a assimilação e a acomodação. A partir da exis
tência de um hiato quase imperceptível entre elas, no estágio 2, as duas invarian-
tes funcionais atingem agora um estado adiantado de individualidade e de com-
plementação. A verdadeira exploração de um objeto novo requer que a função
acomodativa sc separe da ação assimil ativa original, para colocar-se a serviço da
estrutura do objeto e, assim, modificar o esquema para o próximo encontro. É
exatamente isto que acontece no estágio 5. Neste sentido, a busca da novidade
significa o afastamento de uma orientação autocêntrica para a ação e a aproxima
ção a uma orientação alocêntrica em relação ao objeto. A criança capaz de reação
terciária, como mostraremos com mais detalhes posteriormente, encontra-se num
estágio avançado de desenvolvimento do conceito de objeto. Ela distingue clara e
nitidamente a ação do objeto, e dirige vigorosamente seus esforços, no sentido de
acomodar a primeira ao segundo. Por este motivo, Piaget refere-se ao estágio 5
como “o estágio dedicado principalmente à elaboração do ‘objeto’” (ibid., p.
264).
Não é preciso dizer que a passagem da reação secundária para a terciária é
totalmente contínua e imperceptível, e tem todas as características das formas de
transição. As respostas aos objetos novos que ocorrem no estágio 4 são típicas.
Além disso, mesmo as reações terciárias geralmente surgem qum contexto de rea
ções secundárias. A criança comumente inicia uma certa seqüência, realizando re
petições quase exatas do tipo das reações secundárias e daí passa para as varia
ções do tipo das reações terciárias. Apresentamos a seguir alguns exemplos de
reações circulares terciárias; os que correspondem a Laurent ilustram a transição a
partir de formas mais primitivas:
7/5
quedf. Às vezes estende o braço verticalmente, outras vezes o mantém em
ção oblíqua, diante ou atrás dos olhos, etc. Quando o objeto cai numa no<°'1
nova (por exemplo, sobre seu travesseiro), ele o deixa cair duas ou três vezes °
mesmo lugar, como sc estudasse a relação espacial e a seguir modifica a situa
çãó. Num determinado momento, o objeto cai perto de sua boca desta vp7 ~
o suga (embora este objeto habitualmente tenha esta finalidade), mas o deixa
cair três vezes mais enquanto faz o gesto de abrir a boca (ibid., pp. 268-69)
Observação 146 - Aos 1;2 (8), Jacqueline tem na mão um objeto que lhe é
novo; uma caixa redonda e baixa que ela gira, agita, esfrega contra o berço, etc.
Ela a deixa cair e tenta pegá-la novamente. Porém, consegue apenas tocá-la com
o dedo indicador, sem pegá-la. Mesmo assim, ela tenta e pressiona a borda. A
caixa balança e torna a cair. Jacqueline, muito interessada neste resultado ca
sual, imediatamente se detém em sua observação.... Até aqui temos um exem
plo de tentativa de assimilação semelhante às Observações 136 e 137 e de des
coberta casual de um resultado novo, mas esta descoberta, em vez de produzir
uma simples reação circular, continua sob a forma de “experimentos para ver”.
Realmente, Jacqueline imediatamente põe a caixa no chão e a empurra para
o ponto mais distante possível (é digno de nota que a caixa é empurrada para
longe, para que ocorram as mesmas condições da primeira tentativa, como se
esta condição fosse necessária para obter o resultado). Em seguida, Jacqueline
põe o dedo na caixa e a pressiona. Porém, como ela coloca o dedo no centro
da caixa, ela simplesmente a desloca e a faz deslizar, em vez de virá-la. Ela se
diverte com este jogo e se dedica a ele durante vários minutos (o repete após
intervalos, etc.). Então, mudando o ponto de contato, ela finalmente volta a pôr
o dedo na borda da caixa e consegue virá-la. Repete esta ação, muitas vezes,
variando as condições, mas conservando sua descoberta: agora ela pressiona so
mente a borda da caixa! (ibid., p. 272).
116
De modo semelhante, ela aprende que um objeto que está atado a um barbante,
pode ser conseguido puxando-se apenas o barbante. Ela novamente inventa os
meios de aproximar um objeto através de manipulações criteriosas de um bastão.
Existem também esquemas inteiramente diferentes. A criança descobre que é ne
cessário inclinar objetos compridos para fazê-los passar através das barras do cer
cado. Ela aprende a colocar objetos apenas cm recipientes suficientemente gran
des, como também a lazer uma corrente de relógio ou outros objetos finos e
flexíveis passar por uma abertura estreita, e assim por diante. 0 primeiro padrão,
de puxar o suporte é suficiente como exemplo. A citação que se segue é interes
sante como amostra do Piaget experimentador-observador, que varia as condições
experimentais, que tenta afastar hipóteses alternativas, etc.:
117
dem. Portanto, a situação é nova c o problema consiste em descobrir meios
apropriados. Mas, inversamente aos padrões de comportamento mencionados
(Observações 120-130), a criança não se vale mais de nenhum método conheci
do. Portanto, é preciso inovar. É então que intervém um padrão de comporta
mento análogo às reações circulares terciárias, isto é, um “experimento para
ver": os tateamentos. A única diferença está no fato de que agora o tateamento
é orientado em função de um objetivo, ou seja, do problema apresentado (da
necessidade que antecede a ação), em lugar de ocorrer simplesmente “para ver”
(ibi<L, p. 288).
Observação 181 - Aos 1 í (23), Lucienne brinca, pela primeira vez, com um
carrinho de boneca cuja alça é da altura de seu rosto. Ela o empurra pelo tape
te. Quando chega na parede, ela o puxa, andando para trás. Como esta posição í
não lhe é conveniente, ela pára e sem hesitar passa para o outro lado e continua
a empurrar o carrinho. Assim, ela descobriu este procedimento em uma unica
tentativa, talvez por analogia com outras situações, mas sem treinamento, apren
dizagem ou obra do acaso.
Nesta mesma área de invenções, isto é, no âmbito das representações cine
máticas, é preciso mencionar o seguinte fato. Aos 1 ;10 (27), Lucienne ten
ajoclhar-sc num banquinho, mas ao encostar-se nele o empurra para mais l°n^
Então ela se levanta, pega o banquinho e o coloca de encontro a um 50
Quando o sente bem firme, abaixa-se c ajoelha sem dificuldade.
118
Observação 181 repetida Do mesmo modo, Jacqueline, com lí (9), se
aproxima dc uma porta fechada - com um punhado de grama em cada mão.
Ela estende a mao direita para o trinco, mas percebe que não pode virá-lo sem
deixar cair a grgina. Poc a grama no chão, abre a porta, pega a grama novamen-
te e entra. Porem, no momento em que deseja sair da sala, as coisas se compli
cam 1 oe a grama no chao e pega na maçaneta. Mas percebe que se puxar a
porta cm sua direção, vai simultaneamente espalhar a grama que colocou entre
a porta e o batente. Então pega a grama e a coloca fora da área de movimento
da porta (ibid., pp. 338-39).
119
culos presenciados, mas também evocá-los e reproduzi-los à vontade. Ao abrir a
boca, Luciennc expressa e até mesmo reflete seu desejo de aumentar a abertura
da caixa. Este esquema de imitação, com o qual está familiarizada, constitui
para ela o meio dc elaborar a situação. Sem dúvida, ele está associadc a um
elemento dc causalidade ou de eficiência mágico-fenomenística. Assim como
freqüentemente ela usa a imitação para agir sobre as pessoas e levá-las a repro
duzir movimentos interessantes, é provável que o ato de abrir a boca diante da
abertura que deseja aumentar, signifique a presença de alguma idéia subjacente
de eficiência.
Logo após esta fase de reflexão plástica, Lucienne põe o dedo na abertura
sem hesitar, mas em lugar de tentar, como antes, alcançar a corrente com o
dedo, puxa a caixa de modo a aumentar a abertura! Consegue e pega a corrente
(ibid., pp. 337-38).
120
que a invenção parece vir do nada. O ato que aparece subitamente resulta de
uma assimilação recíproca anterior, c não manifesta suas vicissitudes diante de
todos (ibid., p. 347).
121