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DA ENERGIA

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VERDE
O TRIUNFO
ALBERTO KUBA,
FUTURO CEO, E
HARRY SCHMELZER JR.,
CEO DA WEG

NENHUM PAÍS
ESTÁ TÃO PREPARADO
QUANTO O BRASIL
PARA LIDERAR A
REVOLUÇÃO ENERGÉTICA
GLOBAL. PIONEIRA
EM ELETRIFICAÇÃO
DE BAIXO CARBONO,
A WEG INICIA EM 2024
A FASE MAIS AMBICIOSA
DE SUA HISTÓRIA
+A PRIMEIRA ENTREVISTA
DO NOVO CEO, ALBERTO KUBA

COM CONTEÚDO

ESG: O ENORME POTENCIAL DAS FONTES RENOVÁVEIS NO BRASIL


MUNDO: OS PRÓXIMOS PASSOS DAS RELAÇÕES ENTRE CHINA E TAIWAN
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Distribuição 100% gratuita - Clube de Revistas Duas Rodas: aromistas criam os sabores
de vários produtos que comemos

54
6 DA EXAME

8 FALE CONOSCO

12 PRIMEIRO LUGAR
As estratégias das PMEs Sodiê Doces,
Zerezes, Biti9, Kinsol, Cresci e Perdi
e QI Tech para crescer em 2024

18 VISÃO GLOBAL
A eleição em Taiwan aumenta o risco
de escalada em uma das questões
geopolíticas mais complexas atualmente

28 ENTREVISTA 54 NEGÓCIOS
Benjamin Gedan, da Universidade A catarinense Duas Rodas virou uma
Johns Hopkins, afirma que a crise entre empresa de 1,6 bilhão de reais e agora
Guiana e Venezuela ainda traz riscos investe em uma expansão global

34 CAPA 62 MARKETING
Pioneira em eletrificação de baixo Ao descobrir os efeitos nocivos do álcool,
carbono, a WEG começa em 2024 a geração Z passou a preferir bebidas que
a fase mais ambiciosa de sua história vão bem na balada, mas não embriagam

48 ESG 66 MUNDO
Na corrida contra as mudanças Os planos da indústria automobilística
climáticas os países querem triplicar os dos Estados Unidos derrapam nos desafios
investimentos em energias renováveis dos motores movidos a energia limpa

Harry Schmelzer Jr.


e Alberto Kuba: sucessão
de CEO na WEG

SUMÁRI
68O 34
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95
FOTOS: LEANDRO FONSECA
Carla Assumpção, da Swarovski (à dir.):
para ela a ioga virou um estilo de vida

72 TECNOLOGIA CASUAL
Durante anos a Apple pareceu alheia à
tensão entre a China e os Estados Unidos. 95 MEU ESTILO
Ao que tudo indica, o período de paz acabou Carla Assumpção, diretora-geral
da Swarovski para Brasil, Chile e
76 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL Argentina: ioga é um estilo de vida
Serviços de criação de imagens como
Midjourney e Dall-E estão ampliando o 98 AVENTURA
horizonte de designers ao redor do mundo A Montblanc lança modelo feito
para condições extremas durante
80 CONSUMO maratona na Antártida
O comércio tradicional investe em
tecnologias como robôs e sensores 100 VINHOS
para reconquistar os consumidores Susana Balbo trabalhou na Catena
Zapata, fundou a própria vinícola e
é uma das autoridades no assunto
84 EXAME AGRO
A produção de etanol de milho no Brasil
deve triplicar nos próximos anos e agregar 102 TÊNIS
valor ao grão e ao agronegócio nacional Com jogadores de alto nível e uma
vista de tirar o fôlego, o Rio Open
88 OPINIÃO completa dez anos de idade
As metas para 2024, segundo Felipe
Miranda: compre boas empresas, não 104 CULTURA
pague caro por elas e não faça muita coisa Pobres Criaturas, com Emma
Stone, estreia nos cinemas do país
90 OPINIÃO com grandes prêmios no currículo
Paulo Camargo, CEO da Espaçolaser:
líderes autênticos têm coragem de se expor 106 SANTÉ
e aliam efetividade com afetividade Em 2024, o mercado espera a
normalização do consumo de
92 CLUBE CMO brancos, rosés e bebidas sem álcool
Cristina Duclos, do Sicredi: a meta
da companhia é alcançar a marca
REVISTA MENSAL
de 10 milhões de associados até 2025 ANO 58 | NO 1 | EDIÇÃO 1259
JANEIRO DE 2024
FOTO/CAPA: LEANDRO FONSECA
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da EXAME
Fábrica da WEG:
investimento
crescente em energia
solar e eólica e
em tecnologia para
veículos elétricos

gia de baixo carbono. São


necessárias, em suma, mais

LEANDRO FONSECA
empresas como a WEG, fa-
bricante de motores elétri-
cos que ilustra a capa desta
edição, em reportagem do
diretor de redação Lucas
Amorim e do editor de foto-
Por mais protagonistas globais grafia Leandro Fonseca. Eles
mostram um momento de-
cisivo para a companhia, de
Precisamos de mais empresas disputando a liderança sucessão na liderança e de
global em energia limpa, como faz a WEG ampliação em investimentos
em energia eólica e solar, em
armazenamento, em veículos
De 30 em 30 dias os jornalistas da EXAME de. Reportagem coordenada elétricos. É uma dessas histó-
têm o desafio de captar o espírito do tempo pelo editor Rodrigo Caetano rias que mostram o tamanho
na edição mensal da mais tradicional e in- mostra que, de 2015 para cá, do potencial brasileiro.
fluente revista de economia e negócios do o volume de investimen- O mundo observa aten-
Brasil. As reportagens que estampam nos- tos em fontes renováveis de tamente o avanço do Brasil
sas páginas impressas e nossa edição digi- energia passou de 1 trilhão nas fontes renováveis. Afi-
tal são o resultado de uma seleção intensa para 1,7 trilhão de dólares. No nal, apesar dos trilhões in-
de conteúdo. Todos os meses, produzimos, mesmo intervalo de tempo, vestidos nos últimos anos,
editamos e publicamos milhares de conteú- os investimentos em fontes há um crescente consenso
dos sobre os assuntos mais relevantes para tradicionais recuaram de de que as metas de redução
uma audiência que chega a 15 milhões de 1,3 trilhão para 1 trilhão de do aquecimento global não
pessoas. Desta ampla e relevante gama de dólares. É um caminho sem serão alcançadas. O plane-
informações, o que vale a pena selecionar volta, que tem no Brasil um ta, como mostra o cientista
para cristalizar numa edição mensal? De protagonista global por uma climático Paulo Artaxo, pode
tudo o que acontece em um ano de guerras, combinação de condições aquecer até 3 graus Celsius
recorde de eleições e de desastres naturais, naturais, investimentos e com as emissões nos níveis
o que é essencialmente relevante não só ambição. atuais. Precisamos que enti-
para as próximas horas, mas para os próxi- Para destravar esse poten- dades, governos e empresas
mos meses? cial, por sua vez, o país terá façam ainda mais. A EXAME
São perguntas que norteiam as reuniões de intensificar a dobradinha seguirá contando em suas
de nossos editores. Esta edição de fins de entre setor público e inicia- páginas as histórias mais
janeiro está ancorada numa pauta que, sob tiva privada. Precisaremos relevantes para o futuro, es-
qualquer ponto de vista, é essencial para de mais negócios disputando senciais para entender um
2024 e para além: o triunfo da energia ver- a liderança global em ener- mundo em ebulição.

6 exame.com
Distribuição 100% gratuita - Clube de Revistas Contorno de Serra Mestre
Álvaro – BR-101 – ES

DO GOVERNO FEDERAL
É O BRASIL NO RUMO CERTO

O Novo PAC é o maior programa


de investimentos do país.
São investimentos em infraestrutura em todos os estados
do Brasil para acelerar o crescimento econômico e a inclusão
social, promover moradia digna e saúde, gerar empregos
e renda e impulsionar o crescimento sustentável do nosso
país, melhorando a vida de cada brasileiro.

O NOVO PAC É O NOSSO PAC:


DA G E R AÇÃO D E E M P R EG O.
DA T R A N S I ÇÃO EC O LÓ G I CA .
D O C R E S C I M E N TO EC O N Ô M I C O.

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da EXAME, sugestões e críticas a reportagens.
Deixe também sua mensagem no Facebook,
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Capa: presente e futuro da JBS.


Em pé, Wesley Batista, Joesley
Batista e Gilberto Tomazoni.

GERMANO LÜDERS
Sentados, José Batista Sobrinho
(fundador), Brenda Mello,
Lorenzzo Neves Rodrigues e
Evelyn Machado (ex-aluna e
alunos do Instituto J&F)

AS NOVAS AMBIÇÕES OS CARROS VOADORES


DA JBS FINALMENTE VOARÃO exame@exame.com
Vejo potencial para que, no futuro, Acredito que pode chegar ao
a JBS se transforme em uma rede Brasil a partir de 2030. Falta linkedin.com/company/
supermercadista, revendendo consolidar os carros elétricos, exame-com
quase exclusivamente seus uma vez que nem postos de
próprios produtos. abastecimento de energia
@exame
Miguel Goulão existem.
Via LinkedIn Vagner Santiago
Via LinkedIn facebook.com/exame

UM CONVITE PARA SAIR


DO PILOTO AUTOMÁTICO Questiono um pouco a
Que história inspiradora, viabilidade desse tipo de
parabéns pela trajetória! iniciativa, pelas questões O QUE ACHOU
Bruna Godoy energéticas. Acho pouco DA NOVA EXAME?
provável que esse serviço seja RESPONDA À PESQUISA
Via Instagram
ampliado a toda a população. E NOS CONTE

Alan Carassini de Barros


Que mulher! Resultado Via LinkedIn
de muito trabalho e estudo.
Diogo Monteiro
Via Instagram

8 exame.com
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Excelência.
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o sucesso.
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Alex Atala
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PECIAL PME
ES ⚫
⚫ E
E

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PM

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ESPECIA

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N AS S
PEQUE É DIA
POR MARCOS BONFIM E M

PME ⚫
EMPR
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ES
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PE
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IA L P
EC
los produzidos por mês, depois de ⚫ ESP ME
PORTFÓLIO
receber investimentos de 20 mi­
lhões de reais em uma nova fábri­ Diferentes caminhos vão guiar
Para além ca. A expectativa é de que avance as rotas para o crescimento
d o s n e g ó c i o s e m 2 0 2 4, a n o
ainda mais e represente 25% do
do pão de ló faturamento total neste ano. Mas
recepcionado com altas cargas
de otimismo. Mudanças de
a cereja do bolo para a Sodiê em r o t a s , a m p l i a ç ã o d e p o r tf ó l i o e
A paulista Sodiê Doces 2024 é outra: uma marca própria
entrada em novos setores estão
n a s e st raté g ia s d a s e m p re s a s
cresce anualmente de chocolates premium. Os pro­ q u e a p a re c e m n a s p róx i m a s
dutos serão vendidos inicialmen­ páginas. Muitas delas estiveram
vendendo bem mais no Ranking EXAME Negócios em
do que bolo te nas lojas da boleria e, no futu­ E x p a n s ã o 2 0 2 3. O u s e ja , vê m
ro, em operações próprias. “Essa construindo reputação em seus
DANIEL GIUSSANI respectivos mercados.
é nossa aposta para o ano”, diz
Cleusa. Prevista para o segundo
Uma porção de novas lojas, uma trimestre, a unidade deverá con­ A Sodiê possui atualmen­
pitada de diversificação de port- tribuir para uma nova expansão te 372 lojas abertas no Brasil
fólio e uma dose de gestão. Esses na casa dos dois dígitos da Sodiê, e duas unidades na cidade de
são os ingredientes que fazem chegando a 715 milhões de reais. Orlando, nos Estados Unidos
crescer a receita da paulista Sodiê Os novos sabores, recheios e — onde há estudos para a aber­
Doces, uma das maiores fran- opções para deixar as celebrações tura de mais operações. Em seu
quias de bolos artesanais do país. mais fartas são combinados ao cardápio, há mais de 100 varie­
Criada pela empresária Cleusa reforço nas estratégias para atrair dades de sabores de bolos. Mas
Maria da Silva, a rede fechou 2023 franqueados. A Sodiê incorporou na receita vai bem mais do que
faturando 640 milhões de reais, operações mais enxutas em seu isso: a capacidade de seguir
15% mais do que em 2022. “Desde modelo de negócios, unidades que criando produtos e aumentan­
2020, estamos numa toada boa de requerem investimentos meno­ do a receita, mesmo 27 anos
crescimento, ritmo que queremos res. “Hoje já é possível abrir uma após a sua fundação.
repetir em 2024”, afirma a fun­ loja pequena por 90.000 reais”,
dadora da rede, que foi boia­fria afirma a empresária. Muito des­
e empregada doméstica antes de sa movimentação começou nos
abrir a primeira unidade da mar­ últimos dois anos. Em 2022, Cleu­ APETITE PARA CRESCER
ca, em 1997. “Para isso, só fazendo sa chamou para a operação um A Sodiê vem abrindo lojas ano
um bom trabalho diário e inovan­ gestor de mercado, Fabio Araujo, após ano, mesmo durante
do bastante.” executivo com mais de 20 anos o período da pandemia
A inovação é mesmo um dos em multinacionais como Unilever
principais motivos para o cres­ e Nestlé. Na cabeça, a proposta de Número de lojas
372
cimento da companhia nos últi­ pensar numa forma de crescer
mos anos. Conhecida pelos bolos com sustentabilidade, sem gran­ 342
330
à base de pão de ló, a Sodiê co­ des alavancagens. “A empresa não 316
locou novos produtos à mesa, de abre mão de ter uma gestão ino­ 314
versões sem açúcar a salgados. A vadora, que sempre está à frente
produção de salgadinhos cres­ das tendências de mercado, como 2019 2020 2021 2022 2023
ceu 350% em 2023, passando de foi o caso da diversificação dos
56.000 quilos para 250.000 qui­ modelos de lojas para franquias.” Fonte: empresa.

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LEANDRO FONSECA

Cleusa Maria da Silva, da Sodiê: gestão profissional ajudou na receita da rede

janeiro de 2024 13
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PRIMEIRO LUGAR
Luiz Rocha,
Hugo Galindo e
Rodrigo Latini,
da Zerezes: “Há
muito mercado
para ganharmos
ainda”

DIVULGAÇÃO
NOVOS MERCADOS

de 5 milhões a 30 milhões de reais do VISÃO DE SUCESSO


Um olho na Ranking EXAME Negócios em Expan­ O faturamento da Zerezes
moda, outro são 2023. “Queremos que as pessoas cresceu mais de sete vezes
vejam os óculos menos como uma tec­ em cinco anos
na loja nologia assistiva e mais como um tênis
Faturamento
moderno, que podem trocar conforme (em milhões de reais) 55
A carioca Zerezes a ocasião”, diz o CEO Rodrigo Latini.
cresce anualmente O que ajuda a explicar o crescimen­ 35
acima de 50%, abrindo to? Duas estratégias, principalmente. 20
unidades físicas e A primeira é a abertura de novas lojas 10
físicas, um instrumento importante 7
lançando modelos
para um setor em que os clientes que­
DANIEL GIUSSANI rem provar antes de comprar. Além 2019 2020 2021 2022 2023
de operações em praças já existen­
Fonte: Empresa.
tes, como Rio de Janeiro e São Paulo,
a empresa entrou em Porto Alegre e
A meta da marca de ótica carioca em Belo Horizonte e concluiu o ano neste ano, cinco já no primeiro
Zerezes é clara: fazer dos ócu­ com 14 operações. A segunda é a apre­ semestre, inclusive em shop­
los de grau um artigo de moda, sentação de novos modelos, iniciativa ping centers, um canal em que
como roupas e tênis. Criada em que reforça a teoria dos fundadores da a empresa pretende estar mais
2012 por então estudantes de Zerezes de que os óculos estão virando, ativa. Novos modelos também
design na Pontifícia Universi­ cada vez mais, objetos de moda. deverão chegar ao mercado,
dade Católica do Rio de Janeiro “É legal observar que tivemos um como parte dos projetos para
(PUC Rio), a empresa encerrou crescimento sustentável em todas as alavancar as vendas. No ano
2023 faturando 55 milhões de lojas”, afirma Daniel Dränger, CMO da passado, foram mais de 90.000
reais, um crescimento de 57% Zerezes. “E, mesmo num cenário de­ óculos. “Considerando que 20%
em relação a 2022 — só em no­ safiador para o varejo, nós crescemos da população usa óculos, há
vembro, na Black Friday, vendeu também no e­commerce e em novas li­ muito mercado para ganharmos
6 milhões de reais. No ano ante­ nhas, como infantil e de verão.” O obje­ ainda”, diz Dränger. A meta está
rior, já tinha avançado 71% e fi­ tivo é seguir nessa toada em 2024. Dez traçada, agora é trabalhar com
cou na 17a colocação na categoria novas unidades deverão ser abertas os olhos para o futuro.

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OPORTUNIDADES A automação de tarefas repeti- sim como os demais planos ofere­


tivas nas empresas dos clientes cidos pela empresa.
garantiu à paulistana Biti9 uma A penetração no agro contribuiu
O agro no alvo receita de 4,2 milhões de reais para que a empresa faturasse 8,5
em 2022 — 422% acima de 2021. milhões de reais em 2023. Pouco
A empresa de automação Foi no segundo semestre daque­ mais de um ano depois do início da
Biti9 investiu no le ano que a empresa percebeu estratégia, 25,49% de seus clientes
agronegócio para crescer que poderia explorar outros são do setor. “Nós percebemos que o
e faturou 8,5 milhões de setores para escalar o negócio. mercado estava passando por mui­
reais em 2023. Em 2024, Olhou para o PIB brasileiro e tas fusões e aquisições. Isso fez com
vai dobrar a aposta no percebeu que não tinha nenhum que as empresas inchassem e per­
cliente do agronegócio. Criada dessem celeridade”, afirma Martin
setor e na IA generativa em 2015 como uma consultoria Luther Candido e Silva, cofundador
de tecnologia, a Biti9 prosperou e CEO da Biti9. Para entrar no setor,
MARCOS BOMFIM
nos setores industriais e de ser­ a empresa investiu em uma nova
viços. No portfólio estão clientes vertical, de integração, que olha
Martin Luther Candido como a seguradora Porto, a rede para os sistemas usados pelas com­
e Silva: a análise
macroeconômica abriu
de shopping centers Iguatemi e panhias e estrutura como conectar
novas oportunidades a cervejaria Petrópolis. Entrou os ponteiros e gerar ganho de efici­
de negócio nessas empresas com robôs de ência em curto espaço de tempo.
automação capazes de gerir pro­ A demanda do setor veio tam­
cessos burocráticos. Na lista de bém em forma de projetos de inte­
atividades estão validações de ligência artificial generativa. Como
notas fiscais e, ainda, a gestão muitos produtores trabalham com
da contratação de profissionais. safras sazonais e têm alto fluxo de
Uma vez cadastrados os novos contratações e desligamentos, a
funcionários, os robôs solicitam automação de leitura de documen­
os benefícios como VR e VA, as­ tos foi uma das atividades mais
solicitadas. “A chancela de final de
execução é sempre do humano,
mas o robô faz 80% do processo”,
afirma Candido. Neste ano, a visão
macroeconômica da Biti9 está de
olho em outra tendência, a reto­
mada do mercado de seguridade,
já conhecido da empresa. Juntos,
agro e seguros devem impulsionar
a receita a 15,3 milhões de reais.

ORIGEM DO DINHEIRO
A Biti9 introduziu novas frentes de atuação e começa
a perceber o impacto das fontes de receita
Verticais de negócios (em %)
Cross-sell (novo Consultoria
pacote para e integração
clientes da base) de sistemas
10,7 14,2

Inteligência 60,7
artificial Automação
14,2 de processos
LEANDRO FONSECA

Fonte: Biti9

janeiro de 2024 15
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PRIMEIRO LUGAR Os próximos dois anos devem re- O período mais desafiador ao
presentar uma guinada para a longo dos últimos meses fez o
Kinsol, um negócio que cresceu negócio avançar nos planos de
com a compra de equipamentos mobilidade elétrica, até como
para a geração de energia solar, forma de agregar novas receitas a
como placas, inversores e baterias, e seus 350 franqueados atualmen­
a revenda numa rede de lojas fran- te. “Eu falo que é das dificuldades
queadas. A empresa de Uberaba, que nós tiramos as oportunida­
NOVOS NEGÓCIOS
em Minas Gerais, prevê que a mo- des”, afirma Mauricio Crivelin,
bilidade elétrica vai superar a divi- CEO da Kinsol. A empresa tinha
são de energia solar já neste ano e uma atuação tímida no setor,
A vez da acelerar a sua expansão. Em 2023, a basicamente com estações de
Kinsol faturou 31 milhões de reais, recarga de conveniência, aquelas
mobilidade queda de 47% em relação aos nú­ vistas em shoppings e supermer­
elétrica meros obtidos um ano antes, quan­
do aproveitou o boom de energia
cados. “Em 2022, nós vendíamos
seis por mês. Hoje, vendemos
Passada a “corrida do solar para obter uma receita de 59 isso por dia. Melhorou muito, até
milhões de reais. O resultado de mesmo pela queda do preço dos
ouro” no mercado de 2022, com crescimento de 1.297% carros elétricos.” Atualmente, são
energia solar, a Kinsol quer na comparação com 2021, levou a cerca de 300 postos da Kinsol
avançar no mercado de mineira à primeira posição na cate­ pelo país, muitos deles contrata­
recarga de carros elétricos goria de 30 milhões a 150 milhões dos por montadoras como Volvo
de reais do Ranking EXAME Negó­ e Stellantis.
MARCOS BONFIM cios em Expansão 2023. O grande plano, porém, é a ins­
talação de 1.000 eletropostos de
recarga ultrarrápidos na cidade
Mauricio e na região metropolitana de São
Crivelin, da Paulo, estado que concentra o
Kinsol: “Vamos
investir 150 mercado de carros elétricos, até
milhões de 2025. O modelo permite a recar­
reais para
instalar 1.000 ga total de um carro no interva­
eletropostos lo entre 20 e 40 minutos — o de
ultrarrápidos
de recarga conveniências leva em torno de
de veículos 6 a 10 horas. Para fazer o projeto
elétricos”
andar, a empresa tem um plano
de investimentos de 150 milhões
de reais. A movimentação, pelos
cálculos da companhia, vai con­
tribuir para um faturamento de
102 milhões de reais em 2024,
alta de 229% sobre 2023 — 60
milhões de reais já viriam da
frente de mobilidade.

EVOLUÇÃO DAS RECEITAS


A expansão de serviços de
mobilidade elétrica deve acelerar
o crescimento da empresa
mineira nos próximos anos
Faturamento
(em milhões de reais)

2022 59
2023 31
2024 102(1)
LEANDRO FONSECA

2025 148(1)
(1) Projeção. Fonte: Kinsol.

16 exame.com
Distribuição 100% gratuita - Clube de Revistas Sócios da Cresci e Perdi e fundadores do Enjoei:
“Vamos dominar uma parcela maior do mercado”

LIVROS

A corrida por
uma marca

DIVULGAÇÃO
Pedro Mac Dowell,
fundador e CEO da QI Tech,
recomenda a biografia GESTÃO
do cofundador da Nike
LAYANE SERRANO
Exemplo dentro de casa
“E se houvesse um jeito de ter Na Cresci e Perdi, os sócios operam lojas próprias e
tanto prazer no trabalho a ponto transmitem as estratégias aos franqueados pelas redes sociais
de ele se tornar, essencialmente,
um esporte?” Essa foi uma das ISABELA ROVAROTO
provocações de Phil Knight, criador
da Nike, em seu livro A Marca da Mais do que fundadores do brechó ver na rede”, diz Alves. No começo
Vitória: A Autobiografia do Criador infantil Cresci e Perdi, os primos de dezembro, por exemplo, os dois
da Nike. Apaixonado por esportes, paulistas Elaine e Saulo Alves são estimularam uma campanha mais
Phil era um bom corredor, mas donos de duas unidades da franquia. agressiva aos franqueados como uma
não o suficiente para seguir com A dupla usa a própria experiência na forma de “prevenção”. Janeiro, conhe­
a vida como atleta profissional. gestão das lojas para criar conteú- cido como o mês das contas e tribu­
Foi correndo por hobby em Oregon, dos e transmitir as estratégias para tos, é tradicionalmente mais fraco em
nos Estados Unidos, que teve a rede de franqueados. Até aqui, um vendas. “A mesma coisa com a coleção
uma ideia maluca: “Deixar uma caminho que tem dado certo. Com de inverno. Em janeiro, já mostramos
marca no mundo”. mais de 430 lojas, a empresa regis­ como estamos organizando e revi­
A partir daí, tudo é história trou uma receita de 729 milhões de sando o estoque”, afirma.
e, desde 1960, o empresário reais em 2023 com a venda de rou­ A empresa espera escalar o cresci­
inspira outros empreendedores pas, itens de enxoval, carrinhos e mento em 2024 também pela siner­
pela sua coragem de ir além do acessórios negociados a preços até gia com o novo sócio, o Enjoei, plata­
estabelecido. “Phil Knight mostra 70% mais baratos do que em lojas forma de brechó online que adquiriu
a importância de ter uma visão convencionais. “Temos um perfil no uma fatia de 25% do negócio no fi­
clara e uma vontade de crescer, Instagram fechado com os franquea­ nal de 2023. “Nada muda no dia a dia
mesmo que isso signifique ir dos no qual mostramos como esta­ das lojas. Com o Enjoei, vamos domi­
contra caminhos convencionais mos operando nossas lojas na prá­ nar uma parcela maior do mercado,
e enfrentar a descrença e a tica”, afirma Saulo Alves, fundador e além de trocar experiências. Vamos
resistência de outras pessoas”, diz COO da Cresci e Perdi. ter acesso a mais ferramentas de
Pedro Mac Dowell, CEO da A interação virtual diária com tecnologia e dividir a nossa expertise
QI Tech, fintech que recebeu o os franqueados garantiu a expan­ com a gestão de lojas físicas.” No ano,
maior aporte de 2023 do país, no são sustentável da rede nos últimos a ambição é superar 900 milhões de
valor de 1 bilhão de reais. anos, mesmo na pandemia, quando reais em receita.
as unidades não podiam abrir, mas
seguiram funcionando com catálogo
A Marca da Vitória: A Autobiografia Quer ser informado sobre
do Criador da Nike, de Phil Knight digital. “Criamos uma relação de con­ as inscrições para o
Editora Sextante | Páginas: 384 fiança com os franqueados e somos Ranking EXAME Negócios
59,90 reais | E-book: 39,99 reais exemplo da postura que queremos em Expansão 2024?

janeiro de 2024 17
visão global
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POR RAFAEL BALAGO

Coreia
Pequim do Norte
Wuhan
Coreia
do Sul

C H I N A Xangai
(maior porto
chinês) Japão
Paquistão
Shenzen
(2o porto
chinês)
Índia Guangzhou TA I W A N
Hong
Kong

CONFLITO ENVOLVERIA
VÁRIOS PAÍSES DA REGIÃO
Taiwan tem apoio dos Estados
Unidos, que tem bases na
região e alianças militares
com países vizinhos da China
Integra a aliança militar Quad
Tem bases militares dos EUA
Singapura

Quem apoia quem


C H I N A
Aliados dos EUA
Taiwan
100 km de
Austrália distância no
Japão trecho mais
Índia estreito Taipé
Coreia do Sul Keelung
Singapura (2o maior porto)
T A I W A N

Aliados da China Kaohsiung


Coreia do Norte (maior porto
de Taiwan)
Paquistão Austrália

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GEOPOLÍTICA

Estreitando a tensão
Eleição em Taiwan aumenta o risco de escalada em uma
das questões geopolíticas mais complexas da atualidade

A tensão geopolítica entre Pequim e Taiwan tudo como está. O KMT, maior partido da
é uma das mais complexas do mundo hoje. oposição, defende a retomada das conver-
Há o risco de que um erro de cálculo ou um sas com Pequim para reduzir as tensões.
movimento mais brusco de uma das par- “Pequim vê Lai como um dos políticos
tes gere um conflito indireto entre Estados mais pró-independência do PDP. Isso torna
Unidos e China, as duas maiores potências muito improvável que o Partido Comunista
deste início de século 21. A dificuldade já Chinês se engaje em algum diálogo oficial
começa com as palavras: Taiwan tem um com ele”, diz Grant Wyeth, editor da pla-
governo autônomo, faz eleições próprias e taforma AP4D (sigla em inglês para Ásia-
conta com representações diplomáticas no -Pacífico, Desenvolvimento, Diplomacia e
exterior, mas não é oficialmente um país. Contenção) e que acompanhou as eleições
Para a China continental, a ilha de Taiwan em Taiwan presencialmente. “As suspeitas
é uma província rebelde, que é parte do ter- sobre Lai farão com que Pequim exerça o
ritório chinês e deve ser reincorporada, mas máximo de pressão possível sobre Taiwan.”
em data indefinida. Do outro lado, a 100 Para ele, um dos sinais disso foi o gesto de
quilômetros de distância da costa chinesa, Nauru, um pequeno país insular na Ocea-
Taiwan vive de forma separada em relação à nia, de retirar seu reconhecimento diplo-
China continental há mais de 70 anos. Mas mático de Taiwan. Desde 2016, quando o
não há planos imediatos de formalizar uma PDP chegou ao poder, dez países tiveram
independência, pois o custo disso seria uma gesto similar. “Ir atrás dos aliados de Taiwan
guerra, como Pequim deixa claro. Assim, os é um modo de causar dano sem uma inva-
dois lados vão empurrando a questão para são. Isso pode ser suficiente para Pequim”,
a frente — deixando os analistas de riscos afirma Wyeth. Outros analistas também
geopolíticos de cabelo em pé. consideram que a China deve seguir com
Em janeiro, esse enredo teve um novo gestos para ampliar a pressão e que uma
capítulo, com as eleições presidenciais em invasão de fato parece distante. Mauricio
Taiwan. No dia 13, os moradores da ilha ele- Moura, professor na Universidade George
geram como presidente Lai Ching-te, de 64 Washington que viajou a Taiwan, disse que
anos. Político de carreira, ele foi deputado, a maior preocupação por lá é que a China
prefeito de Tainan, premiê e vice-presi- busque dificultar a circulação de navios na
dente da atual mandatária, Tsai Ing-wen. região, o que levaria a um estrangulamento
Assim, o Partido Democrático Progressista no comércio marítimo. “Na opinião pública
(PDP) continuará no poder por mais quatro de Taiwan, há a percepção de que não ha-
anos. A vitória de Lai não era o que Pequim verá uma invasão, independentemente do
queria. O atual governo taiwanês mantém cenário”, diz. “Quando estive lá, recebi no
uma política de distanciamento em relação celular um alerta de exercício militar da
ao continente e, no passado, Lai disse ser China, mas notei que a população da ilha é
um trabalhador pela independência. Ele acostumada com essas ações.”
amenizou o discurso na campanha, mas a Sem um ataque militar físico, se mate-
posição do PDP é considerar que a ilha já rializa outra ameaça: ataques virtuais que
é independente e que, assim, basta deixar colocam em risco sistemas críticos da ilha

janeiro de 2024 19
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visão global AS DEFESAS DE CADA LADO
A China tem capacidade militar muito maior, mas Taiwan tem apoio dos
Estados Unidos, a maior potência militar global, e de outros países da região

Militares ativos(1) Reservistas(1) Aviões de combate(1) Orçamento de defesa(1)


(em milhões) (em milhões) (em milhares) (em bilhões de dólares)

China 230
2,0 0,5 2,921
continental

Taiwan 0,16 1,6 474 19

Estados
1,3 0,8 3,757 858
Unidos

Japão 0,2 0,05 587 51,4

Coreia
0,5 3,1 617 44,8
do Sul

Austrália 0,05 0,2 124 38,3

Coreia sem
0,5 3 810
do Norte informações

(1) Dados de 2023 (exceto China, cujos dados são de 2022, último disponível).
Fonte: International Institute for Strategic Studies e Time.

e podem espalhar campanhas de desinformação e eleição. No entanto, esse conteúdo teve pouco en-
fake news. Em uma amostra do que pode ocorrer gajamento orgânico. Ou seja, as pessoas comuns
no festival de eleições deste ano, quando haverá compartilharam pouco as postagens”, disse Ken-
disputas em mais de 70 nações, houve uma en- ton Thibaut, associada sênior do Laboratório de
xurrada de vídeos criados com auxílio de inteli- Pesquisa Digital Forense do think tank america-
gência artificial que buscavam expor supostos no Atlantic Council.
fatos negativos do passado dos candidatos. Entre O impasse na relação entre os dois lados do es-
elas, a mensagem frequente de que uma vitória treito vem desde 1949. Naquele ano, a Revolução
de Lai significaria dar um passo em direção à Comunista chefiada por Mao Tsé-Tung tomou
guerra. “A ideia era tentar enfraquecer a votação o poder na China e expulsou o governo anterior,
no PDP, partido do governo, já que, se ele perdesse que fugiu para Taiwan e, de lá, buscou manter sua
algo em torno de 10% dos votos, poderia perder a legitimidade. Até hoje, o nome oficial do governo

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ANNABELLE CHIH/GETTY IMAGES


décadas seguintes, em um movimento que ajudou
a levar o país asiático ao posto de segunda maior
economia global. Taiwan também se beneficiou
do movimento do Ocidente de migrar fábricas e
Lai Ching-te: novo se tornou um grande produtor do item mais im-
presidente de Taiwan portante dos aparelhos eletrônicos: o microchip,
defendeu a independência
no passado e gera usado em celulares, computadores, automóveis
desconfiança em Pequim e em quase todos os dispositivos que processam
informações. Atualmente, a ilha fabrica metade
da demanda mundial de chips e é a sede da maior
empresa do setor, a TSMC.
No entanto, mesmo depois de restabelecer os
laços com Pequim, os Estados Unidos não aban-
donaram Taiwan. O governo americano tem um
de Taiwan é República da China, enquanto o go- acordo com a ilha, pelo qual promete ajudar na
verno de Pequim se tornou República Popular da defesa militar em caso de invasão, embora não se
China. Nas primeiras décadas após a revolução, comprometa a enviar soldados em caso de confli-
muitos países seguiram reconhecendo o governo to. Isso ajuda a dissuadir a China de tentar uma
em Taiwan como sendo a China de fato, mas isso invasão de fato, sob o risco de desencadear uma
foi mudando aos poucos. Em 1978, os Estados Uni- guerra global. A disposição bélica de Pequim, no
dos retomaram as relações com o governo comu- entanto, ganhou força na última década, depois
nista, após uma costura habilidosa da diplomacia que Xi Jinping assumiu o comando do país. Pre-
americana, chefiada na época por Henry Kissinger, sidente da China desde 2013, Xi acentuou o dis-
morto em novembro de 2023. A mudança deu iní- curso de “uma só China”: a defesa de que todos os
cio a uma forte aliança comercial: empresas ame- territórios do país devem se aproximar das polí-
ricanas passaram a fabricar de tudo na China nas ticas do governo central, o que na prática signifi-

janeiro de 2024 21
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visão global

COSTFOTO/NURPHOTO/GETTY IMAGES
Porto de Taicang, na China: pressão chinesa contra exportações de Taiwan preocupa moradores da ilha

ca calar dissidências. O exemplo mais claro disso membros em caso de agressão, mas busca passar
ocorreu em Hong Kong: a região, que viveu mais um sinal claro de integração entre forças milita-
de um século sob controle britânico, foi devolvi- res, que poderão reagir em conjunto em caso de
da à China em 1997. Um acordo determinava que avanço chinês.
Hong Kong manteria características diferencia- Depois da votação em Taiwan, o próximo gran-
das, como eleições livres, liberdade de imprensa e de passo esperado é o discurso de posse de Lai, em
livre mercado. Era o modelo “um país, dois siste- 20 de maio. Em sua fala, ele deve indicar se haverá
mas”, que ruiu em 2019. Após uma onda de fortes ou não uma mudança substancial de tom em rela-
protestos contra as medidas de Pequim, o gover- ção ao continente. Contudo, o partido de Lai não
no chinês mudou as regras, puniu duramente os terá maioria no Congresso, o que o impedirá de
líderes das manifestações e reduziu muito o po- fazer movimentos amplos sem apoio. “A política
der da oposição na região. Depois do que ocorreu externa de Lai deverá ser muito consistente com
em 2019, cresceu a expectativa de que a China a dos últimos oito anos. Desde 2016, a linha mes-
apertaria o cerco sobre Taiwan. Em meio a isso, tra tem sido a New Southbound Policy, uma bus-
houve um reforço do grupo Quad, um fórum de ca de laços mais fortes com o Sudeste Asiático, o
defesa militar que une Estados Unidos, Austrália, Sul da Ásia, a Austrália e a Nova Zelândia. Taiwan
Índia e Japão. O grupo foi criado em 2007, mas tem visto isso não só como algo recompensador
teve sua primeira reunião de chefes de gover- na economia, mas como um modo de criar con-
no em 2021. O Quad não é uma aliança tão for- tenções por meio de parcerias internacionais for-
te como a Organização do Tratado do Atlântico tes”, aponta Wyeth, da AP4D. Na campanha, Lai
Norte (Otan), que garante proteção mútua a seus também buscou falar muito de temas domésti-

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MIKE KAI CHEN/BLOOMBERG/GETTY IMAGES


TSMC: a maior fabricante global de chips é de Taiwan, o que aumenta sua importância estratégica

PRODUÇÃO EM TAIWAN cos, de olho no eleitorado mais jovem, que já não


Itens mais exportados, em bilhões de dólares(1) se importa tanto com a questão externa. Shelley
Rigger, professora de política do Leste Asiático
na universidade americana Brown, mostra que
Peças para
equipamentos pesquisas revelam que um terço da população de
de escritório Taiwan diz se identificar com a origem chinesa,
22,1 mas que dois terços se veem como taiwaneses
— número muito maior do que há 30 anos, por
Chips e
circuitos exemplo. Essa parcela da população defende a in-
integrados dependência, mas não vê problema em manter as
Computadores coisas como estão. “Eles dizem: ‘Eu nasci e cresci
175
12,4 aqui. Não faz sentido falar de mim como chinês se
sou de Taiwan. A China é outra coisa. Mas o que
importa é que possamos nos governar, ter liber-
LCDs dade no dia a dia. Podemos viver com a situação
Mídias para 9 atual. Taiwan está indo bem”, afirma Rigger.
gravação de som Resta ver se Pequim continuará disposta a
10,5 manter as coisas como estão, um cenário em
que duas versões da China conseguiram prospe-
rar, cada uma à sua maneira. Para o mundo, esse
(1) Dados de 2021. Fonte: Observatório da Complexidade Econômica. status quo importa, e muito.

janeiro de 2024 23
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visão global
em um sinal de como o avanço dessa cate-
MOBILIDADE
goria ainda gera pouco interesse. De acordo
com dados do IBGE, de 2022, o Brasil tem 25,7
Motos na frente milhões de motos e 60,4 milhões de carros.
“A mobilidade elétrica no Brasil sobre duas
A frota elétrica de motos e triciclos sai na frente
rodas ainda não cresceu, mas tem uma opor-
na transição energética em nível global, mas não no Brasil
tunidade interessante por causa da demanda
por motos de baixa cilindrada. A moto é mui-
O avanço dos carros elétricos faz um alerta. “Há um risco cres- to usada para trabalhos por aplicativo”, diz
domina o noticiário dos últimos cente de que a transição não seja Ricardo Bastos, presidente da ABVE.
anos, mas outra categoria de igualitária e que muitas econo- Para 2024, o mercado brasileiro terá duas
veículos, a de duas rodas, é que mias percam os benefícios de grandes mudanças: a volta do imposto de im-
vem fazendo uma ultrapassa- uma melhor qualidade do ar e portação, desde 1o de janeiro, e o início do pro-
gem silenciosa: para cada auto- de novos investimentos”, aponta grama Mover Auto. Com a nova taxa, um mo-
móvel elétrico de passeio fabri- o estudo Electric Vehicle Outlook. delo Volvo EX30, por exemplo, passou a custar
cado no mundo, há mais de dez No Brasil, a venda de carros elé- 229.950 reais, 10.000 reais a mais. Apesar do
motos elétricas. tricos é mais lenta, mas atingiu encarecimento, a ABVE espera que as vendas
Segundo dados da Bloomberg- recorde em 2023, com quase subam 60% em 2024, para 150.000 unidades.
NEF, a frota global de veículos 94.000 emplacamentos, alta de Já o Mover Auto, sancionado pelo presidente
elétricos de duas e três rodas, ex- 91% sobre o ano anterior, segun- Lula em dezembro, trará mudanças nos in-
cluindo bicicletas, já supera 280 do dados da Associação Brasi- centivos fiscais, para estimular a produção
milhões de veículos, enquanto leira do Veículo Elétrico (ABVE). nacional. Montadoras chinesas como BYD e
os carros de passageiros somam Entre os pesados, a venda de ca- GWM anunciaram fábricas no Brasil e a ex-
quase 30 milhões. A frota de elé- minhões novos caiu de 667 uni- pectativa é que os primeiros elétricos feitos
tricos pesados, como ônibus e dades em 2022 para 242 no ano aqui sejam lançados a partir de 2025. Atual-
caminhões, soma 1,5 milhão. A passado. Já os ônibus foram de mente, o país só produz híbridos, da Toyota
maioria dos veículos, em todas nove para 65 no mesmo período. e Caoa Chery. Fora do Brasil, o avanço será
as categorias, está na China. O A ABVE não tem dados atualiza- mais forte, especialmente na China e Europa.
relatório da Bloomberg, porém, dos do mercado de duas rodas, Com isso, as vendas globais de elétricos de-
vem atingir 26,6 milhões em 2026, ante 6,6
milhões em 2021, projeta a BloombergNEF. A
aceleração silenciosa dos elétricos ainda tem
CORRIDA ELÉTRICA muita estrada pela frente.
Veículos de duas rodas têm vendas muito maiores
do que carros de passeio, ônibus e caminhões

Motos Carros Vans e


e triciclos Ônibus de passeio caminhões
Mas os Estados Unidos e a Europa devem
% das concentrar o crescimento da frota elétrica global
vendas 49% 38% 14% 3% nas próximas décadas. Países em
em 2023 desenvolvimento ficarão em segundo plano
Veículos vendidos por ano (em milhões)
80 Resto do mundo
A China tem a maior frota em todos os segmentos
Veículos vendidos por ano (em milhões) 70 Sudeste Asiático
China Europa Estados Unidos Outras regiões 60 Austrália
Coreia do Sul
Motos e triciclos 50
(exclui bicicletas) Carros de passeio Ônibus, vans e caminhões Índia
40
400 80 7 Japão
30 Canadá
300 60 5
200 40 20 Estados Unidos
3
100 20 10 Europa
0 0 0 0 China
2015 2020 2025 2015 2020 2025 2015 2020 2025 2020 2040(1)

(1) Previsão. Fontes: BNEF, BNE.


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Acesse e ouça o
Donald Trump: ex-presidente teve 51% dos votos
republicanos em Iowa e começou bem na disputa

podcast Eleições
nos EUA — O Caminho
da Casa Branca

ELEIÇÕES

O longo caminho
para a Casa
Branca

BRANDON BELL/GETTY IMAGES


Corrida eleitoral dos Estados
Unidos começa com Trump
demonstrando força, mas o
ex-presidente terá muitos
desafios na disputa com Biden

A jornada eleitoral dos Es- contra ele, por motivos como Em janeiro, estreou o podcast “Eleições nos EUA -
tados Unidos começou para fraude fiscal e desvio de docu- O Caminho para a Casa Branca”, que acompanha-
valer em janeiro, com o cau- mentos. Uma condenação no rá as votações das primárias e os principais mo-
cus republicano de Iowa. Foi meio da corrida eleitoral levaria mentos da campanha ao longo do ano. Ele pode
a primeira etapa de um longo a um cenário incerto. “A decisão ser acessado no Spotify e no YouTube — e no QR
caminho, que passará por pri- final sobre a candidatura ficará Code acima. Há também um canal no WhatsApp,
márias em mais 49 estados, com os delegados do Partido com todas as notícias da cobertura. No aplicativo,
convenções partidárias e de- Republicano, que sempre tive- procure por “Eleições EUA 2024 | EXAME”.
bates, até o dia da votação, em ram a palavra final para apontar
5 de novembro. o candidato. Por convenção, eles
Os números da primeira seguem os resultados da vota- CALENDÁRIO DAS ELEIÇÕES NOS EUA
votação mostram que o ex- ção nas primárias, mas não são
-presidente Donald Trump obrigados a fazer isso”, explica 3.fev Primárias democratas na Carolina do Sul
segue muito competitivo: ele Mauricio Moura, professor da
6 e 8.fev Primárias em Nevada
teve 51% dos votos em Iowa, Universidade George Washing-
30 pontos à frente do segun- ton e sócio do fundo Zaftra, da
24.fev Primárias republicanas na Carolina do Sul
do colocado, Ron DeSantis. Gauss Capital.
No entanto, Trump ainda tem Do lado democrata, o atual 5.mar Super Terça, com votações em 16 estados
muitos desafios: o eleitorado presidente Joe Biden deve ter
de outros estados tem perfil um caminho tranquilo para 12.mar Quatro primárias, incluindo Geórgia
menos conservador do que o obter a nomeação do partido.
de Iowa e, fora das urnas, ele Ele tem apenas dois competi- 19.mar Cinco primárias, incluindo Flórida
enfrenta dezenas de processos. dores nas primárias, Mariane
O ex-presidente foi barrado Williamson e Dean Philips, que Junho Fim das primárias
nas primárias de dois estados, possuem menos de 10% dos
15.jul Convenção republicana, em Milwaukee
Maine e Colorado, por sua par- votos, somados, nas pesquisas,
ticipação na invasão do Con- segundo dados do site FiveThir- 19.ago Convenção democrata, em Chicago
gresso, em 6 de janeiro de 2021. tyEight. O atual presidente, no
A validade do veto, nos dois entanto, tem como adversárias 16.set 1o debate presidencial
casos, será decidida pela Su- a baixa aprovação, na casa dos
prema Corte. Naquele dia, seus 40%, e a inflação que vem em 1.out 2o debate
apoiadores tentaram impedir queda, mas continua acima de
9.out 3o e último debate
a confirmação do resultado 3%, nível alto para o país.
das eleições de 2020, perdidas A EXAME realiza uma cober- 5.nov Dia da eleição
por Trump. Além disso, há ou- tura ampla das eleições ameri-
tros quatro grandes processos canas, em várias plataformas. 20.jan.25 Posse

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APRESENTADO POR ALLP FIT PRODUZIDO POR EXAME SOLUTIONS

A REINVENÇÃO DO
MUNDO FITNESS
Com o inovador conceito
Top to All, a rede de academias
Allp Fit planeja grande expansão
da franquia, chegando a 100
unidades em apenas 18 meses

CRIADA COM O CONCEITO PROPRIETÁRIO TOP TO ALL


(“O MELHOR PARA TODOS”), a Allp Fit inaugura um no-
vo modelo de academia: mais completa, com infraestru-
tura de alto padrão e foco em desempenho, mas com pre-
ços reduzidos ou tão competitivos quanto os praticados
por redes low cost, que ficaram conhecidas apenas pelo
baixo custo.
Muito além dos treinos convencionais, a rede oferece
uma experiência 360 graus de saúde e bem-estar, com uma
série de recursos para enriquecer a jornada do aluno. Isso
inclui, por exemplo, treinos personalizados, equipamentos
de ponta, ambiente sofisticado, coach de performance, ava-
liações físicas e nutricionais e diferenciais como espaço
kids, sala vip com coworking, área de alongamento, aulas
guiadas para alívio de dores (Calm Space), sauna, cadeiras
de massagem, pré-treino e pós-treino diários, bronzeamen-
to e hidromassagem, entre outros diferenciais.

BEM-ESTAR PARA TODOS

DIVULGAÇÃO
Com opções de planos que vão do econômico ao premium
(os preços variam de 89,90 a 189,90 reais), a rede de aca-
demias criada pelo empresário mineiro Anderson Franco Anderson Franco, fundador da Allp Fit:
pretende ser a mais completa, inclusiva e competitiva do bem-estar para alunos e oportunidade a investidores
país. “Nos últimos anos acompanhamos a popularização
e o maior interesse do brasileiro por saúde, beleza e bem-
-estar, o que criou um mercado consumidor gigantesco e expandir o portfólio. A taxa de franquia é de 100.000 reais,
ávido por novidades”, diz Franco. Ao mesmo tempo, diz com um breakeven em 1.500 alunos, retorno do investi-
ele, o segmento sofreu uma depreciação em termos de mento estimado entre 24 e 36 meses e margem de lucro
reputação e qualidade. “Enxergamos, então, uma lacuna em torno dos 30%. A franquia também oferece aportes de
para inserir um melhor negócio para toda a cadeia fitness.” obras imediatos e em intervalos de 30 e 60 dias, com a
A inovação da Allp Fit não se limita às academias físicas. obra pronta dentro de 90 dias, um período de carência na
A rede lançou recentemente o Allp Home, um aplicativo locação por outros 90, além de suporte técnico ao fran-
de saúde e rotina com assinaturas a partir de apenas 0,99 queado em todos os estágios do projeto.
centavos. Por meio dele, leva o conceito Top to All a qual- Só no ano passado, com 100 milhões de reais em inves-
quer lugar do mundo através de uma série de conteúdos timento, a rede somou 20 unidades em funcionamento,
que vão de treinos em casa a orientações nutricionais, de 16 em implantação, mais de 50 praças reservadas e 60.000
acordo com o objetivo do aluno. alunos atendidos, encerrando 2023 com faturamento de
40 milhões de reais, e expectativa de atingir 220 milhões
OPORTUNIDADE PARA de reais em 2024. Neste ano, com um investimento cinco
FRANQUEADORES E INVESTIDORES vezes maior e o negócio consolidado, a expectativa é che-
A Allp Fit é, ainda, uma oportunidade para quem quer gar a 100 unidades. Para mais informações sobre fran-
empreender no segmento e para investidores que buscam quia e investimento, acesse allpfit.com.br
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ENTREVISTA

Benjamin Gedan

Américas na berlinda
O ano de 2024 começa agitado no conti­ RAFAEL BALAGO Quais as perspectivas
nente americano. Ao norte, as eleições ame­ para o continente em 2024?
ricanas tiveram seu início, com a disputa Este pode ser um ano signi­
das primárias, e Donald Trump, um dos ficativo para a América La­
favoritos na disputa, voltou a dizer que, se tina e o Caribe. O México, a
eleito, colocará força máxima nos esforços bem a Venezuela: foi diretor segunda maior economia
para conter a imigração vinda pela frontei­ de América do Sul no Conse­ da região, realiza sua elei­
ra sul. Enquanto os países do continente lho de Segurança Nacional ção presidencial em junho.
se preparam para lidar com os efeitos da da Casa Branca, durante o O Peru está no meio de uma
possível troca de presidente na Casa Branca, governo de Barack Obama. crise política prolongada que
precisam enfrentar também questões mais Atualmente, Gedan é dire­ pode explodir a qualquer
urgentes: o governo de Javier Milei adotou tor do programa de Améri­ momento. O novo presidente
medidas duras contra a inflação na Argenti­ ca Latina do Wilson Center, do Equador herdou um país
na, tentando agir rápido logo depois de to­ com sede em Washington, e sobrecarregado pelo crime
mar posse, e os países da região, incluindo professor na Universidade organizado. Tensões entre o
o Brasil, agem para manter a crise entre a Johns Hopkins. Em conversa presidente de Honduras e o
Venezuela e a Guiana sob controle. com a EXAME, ele detalhou Congresso controlado pela
“Governos autoritários impopulares são os principais desafios do oposição aumentaram os
imprevisíveis e podem ser tentados a bus­ continente em 2024 e anali­ temores de uma crise cons­
car apoio por meio de aventuras militares sou como o Brasil pode ga­ titucional. A migração está
nacionalistas”, diz Benjamin Gedan, sobre nhar protagonismo global piorando; no ano passado,
a disputa entre os dois países. Ele conhece ao chefiar o G20. meio milhão de migrantes

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DIVULGAÇÃO

Ex-diretor do Conselho de Segurança Nacional dos EUA para a América


do Sul e professor na Universidade Johns Hopkins, Benjamin Gedan
adverte que a crise entre a Venezuela e a Guiana ainda traz riscos
e que o Equador precisa de ajuda externa para conter facções

janeiro de 2024 29
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ENTREVISTA

Crise no Equador:
soldado revista
pedestre em Quito;
governo colocou as
Forças Armadas para
combater facções
criminosas

viajaram pela selva mortal


no Darién Gap do Panamá.
Mas também há tendências
positivas para observar nes-
te ano. O governo dos EUA
cada vez mais vê a região
como um parceiro comer-
cial estratégico, inclusive
para indústrias de chips de
computador e de disposi-
tivos médicos, e para insu-
mos para veículos elétricos,
como lítio e cobre. As em-
presas dos EUA estão levan-
do a sério a ideia de near-
shoring. A América Latina
também pode desempenhar
um papel importante nes-
te ano no enfrentamento
da segurança alimentar e
energética global, dadas as
enormes oportunidades na
Argentina, no Brasil e em
outros lugares para produzir
energia renovável e hidrogê-
nio verde e para aumentar a
produção de alimentos após
uma recente seca.

Em 2024, os EUA terão


eleições presidenciais. Isso
pode levar os EUA a prestar
ainda menos atenção à
América Latina neste ano?
A eleição de novembro pode
FRANKLIN JACOME/AGENCIA PRESS SOUTH/GETTY IMAGES

alterar significativamente a
política dos EUA em relação
à América Latina. Os pilares
da estratégia do presidente
Joe Biden na região incluem
a defesa da democracia e
dos direitos humanos, a luta
contra a corrupção e a ação
climática. Nenhum desses
tópicos estaria na agenda

30 exame.com
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“O Equador parece tentado a adotar


linha dura, como encarceramento em massa.
Isso não resolverá o problema
com o crime organizado”

regional dos EUA caso o ex­ têm um papel a desempenhar. Os


­presidente Donald Trump Estados Unidos podem dissuadir a
retornasse à Casa Branca. Venezuela ao sugerirem que forne-
Os Estados Unidos também ceriam assistência militar à Guiana
prestariam menos atenção à em caso de guerra e com ameaças de
região caso o ex­presidente reinstaurar sanções econômicas. Por
retornasse ao poder. Trump sua parte, o Brasil pode continuar a
visitou a América Latina promover negociações diretas entre
apenas uma vez durante Caracas e Georgetown. A crise me-
seus quatro anos de manda­ rece mais atenção. Como vimos na
to, para uma cúpula do G20 Argentina em 1982, governos autori­
em Buenos Aires, e foi o pri­ tários impopulares são imprevisíveis
meiro presidente dos EUA a e podem ser tentados a buscar apoio
não comparecer à Cúpula por intermédio de aventuras milita­
das Américas. Dito isso, há res nacionalistas.
elementos da política dos
EUA na região que desfru­ No Equador, houve uma nova onda
tam apoio bipartidário, in­ de violência nas ruas em janeiro,
cluindo a competição com após a fuga de um líder de facção,
a China e o reconhecimento e o governo declarou estado de
da importância dos minerais emergência. Como o país pode
críticos da América Latina superar esta crise?
para a transição energética O Equador tem necessidade urgen­
dos Estados Unidos. te de apoio internacional. Os equa­
torianos estão assustados, o que é
Como vê o futuro da crise compreensível, e seu governo tem
Venezuela-Guiana? Como os pouca experiência para combater o
EUA e o Brasil podem ajudar crime organizado, e poucos recur­
a acalmar a situação e evitar sos para isso. Sem apoio maior dos
uma guerra? Estados Unidos, do Brasil e de outros
Nem os Estados Unidos nem pesos­pesados da região, esses gru­
o Brasil estão em boa posi­ pos criminosos só vão se tornar mais
ção para gerenciar essa peri­ fortes e violentos, e apertar a pressão
gosa disputa. O Brasil é visto sobre as instituições da Justiça cri­
como simpático ao regime minal. Isso é especialmente verdade
venezuelano, especialmen­ em relação às ações de investigação
te após o caloroso encontro para combater lavagem de dinheiro
de Lula com Nicolás Madu­ e mapear redes criminosas. Neste
ro, em maio, em Brasília. O momento, o Equador parece tentado
oposto vale para os Esta­ a adotar táticas linha­dura, como en­
dos Unidos, especialmente carceramentos em massa e uma cam­
após os exercícios militares panha militar contra chefes do crime.
conjuntos na Guiana em Isso não resolverá o problema e pode
dezembro. Dito isso, ambos levar a abusos de direitos humanos.

janeiro de 2024 31
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ENTREVISTA

Como vê a atuação da
China no continente, em um
contexto em que o país tem
tido solavancos na economia?
Este é um momento interes-
sante para a China nas Amé-
ricas. Após décadas de influ-
ência crescendo rapidamente,
a China tem reduzido muito
seus investimentos na região.
Sua economia mais lenta vai
reduzir a demanda por ali-
mentos, minerais e energia
exportados pela América do
Sul. Pequim, no entanto, vai
continuar com importância
enorme, especialmente em in-
dústrias estratégicas, incluin-
do telecomunicações e a mine-
ração de metais para baterias.
Dito isso, para muitos países a
China é agora mais conhecida
como um cobrador de dívidas
do que como uma fonte de
capital novo. Conforme a re-
gião continua a se recuperar
da devastação da pandemia,
a China não será o motor de
crescimento e uma fonte sem
fim de financiamento de infra­
estrutura que foi um dia.

Falando sobre a Argentina,


como avalia as primeiras
ações de Javier Milei? Ele
será capaz de avançar com
suas ambiciosas reformas?
Javier Milei não está perdendo
tempo. Durante a campanha
e em seu discurso de posse,
ele deixou claro que a maior
esperança da Argentina para
escapar de sua crônica misé­
ria econômica seria através de
cortes orçamentários rápidos
e dramáticos e reformas estru­
turais. Em seus primeiros dias
no cargo, ele desvalorizou o
peso em mais de 50%, fechou
“A crise entre a Venezuela e a Guiana
ministérios, cortou subsídios merece mais atenção. Governos autoritários
para eletricidade e transporte impopulares são imprevisíveis”
público e reduziu o apoio aos
governos provinciais. Em uma

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Nicolás Maduro: ce uma oportunidade signifi-


presidente da
Venezuela quer cativa para liderança global. As
anexar mais da metade tentativas do Brasil de resolver
da Guiana e divulgou
mapas que já incluem a guerra na Ucrânia, acabar
a região de Essequibo com os combates entre Israel
e Hamas, desvalorizar o dólar
no comércio internacional e
tornar-se membro permanen-
te do Conselho de Segurança
uma greve nacional planejada e da ONU tiveram pouco pro-
uma decisão de um juiz federal gresso. Seus investimentos di-
suspendendo várias reformas. plomáticos no Brics renderam
Enquanto isso, a Argentina está pouco em termos de influência
em risco de hiperinflação. Isso global. Por outro lado, o G20
tudo para dizer que Milei pode oferece uma plataforma séria
rapidamente perder o controle, para Lula canalizar suas ambi­
a menos que ele reverta a situa­ ções na política externa. O G20
ção nos próximos meses. é muito mais representativo
do que o G7, especialmente
No México, haverá eleições agora que inclui a União Afri­
presidenciais em junho. Qual é cana, mas ainda é um espaço
sua expectativa para o pleito? mais fácil para construir con­
No momento, as eleições me­ senso do que a ONU. As mais
xicanas não parecem altamen­ de 100 reuniões do G20 que
te competitivas, mas as políti­ o Brasil planeja sediar neste
cas de um segundo governo do ano oferecem uma chance de
partido Morena [Movimento abordar uma série de questões,
de Regeneração Nacional] são incluindo desenvolvimento
menos previsíveis. Apesar de a sustentável, fome, pobreza e
candidata do partido, Claudia conservação.
Sheinbaum, ser uma protegida
do presidente Andrés Manuel A presidência da Índia
López Obrador, ela pode ser no G20 pode trazer algumas
MARIELA LOPEZ/ANADOLU/GETTY IMAGES

tentada a considerar estraté­ lições para o Brasil?


gias que permitiriam ao Méxi­ O primeiro­ministro Narendra
co aproveitar mais vantagens Modi aproveitou ao máximo a
das oportunidades extraordi­ presidência da Índia no G20, e
nárias do movimento de near­ muitas das questões que ele
shoring. Isso exigiria, entre colocou na agenda, incluindo a
outras reformas, uma abertura transformação digital, são alta­
bem maior a projetos de ener­ mente relevantes para o Brasil e
gia limpa, que as companhias o restante da região. Dado o in­
multinacionais cada vez mais teresse da Índia na continuida­
insistem em usar em suas fá­ de no G20 e a crescente atenção
bricas modernas. dela para a América Latina — o
sessão de emergência neste Ministro das Relações Exterio­
verão, legisladores argenti­ O Brasil assumiu a res, Subrahmanyam Jaishankar,
nos debaterão centenas de Presidência do G20 em visitou a Guiana, o Panamá, a
propostas de reforma. Milei dezembro. Quais ações o país Colômbia e a República Domi­
ainda desfruta de considerá­ poderia liderar agora e quais nicana no ano passado —, há
vel apoio público, mas ainda resultados poderia alcançar? uma grande oportunidade para
é cedo. Sua “terapia de choque” O G20 é um bloco poderoso, e Nova Déli e Brasília trabalha­
já provocou protestos públicos, a Presidência do Brasil ofere­ rem juntas no G20.

janeiro de 2024 33
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CAPA

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O
T R I U N F O
D A
E N E R G I A
V E R D E
Nenhum país está tão
preparado quanto o Brasil
para liderar a revolução
energética global. Pioneira
em eletrificação de baixo
carbono, a WEG começa
em 2024 a fase mais
ambiciosa de sua história

LUCAS AMORIM

FOTO
LEANDRO FONSECA

Fábrica da WEG em Jaraguá


do Sul (SC): 15.000
funcionários em terreno
que lembra uma cidade

janeiro de 2024 35
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CAPA

EM UMA QUINTA-FEIRA QUENTE em Jaraguá do Sul, Santa Catarina. Schmelzer e Kuba re­
DE INÍCIO DE JANEIRO, os en- presentam o presente e o futuro de uma das mais bem­
genheiros eletricistas Harry ­sucedidas empresas brasileiras das últimas décadas. Fun­
Schmelzer Jr. e Alberto Yoshi- dada em 1961 pelos amigos Werner Voigt, Eggon João da
kazu Kuba interromperam Silva e Geraldo Werninghaus, com o capital equivalente a
temporariamente suas férias e três Fuscas, a WEG se consolidou ao longo de 60 anos como
colocaram camisa e paletó para uma das maiores empresas de tecnologia industrial do pla-
uma foto histórica. Durante al- neta. Tem 38.000 funcionários, 52 fábricas em 15 países e
guns minutos, posaram para o clientes em mais de 130, com metade de seu faturamento
editor de fotografia da EXAME, anual de 30 bilhões de reais vindo de fora do Brasil. Se em
Leandro Fonseca, na sede da seus primeiros dias a WEG fabricava 12 motores elétricos
fabricante de motores WEG, por mês, hoje produz 60.000 por dia. A empresa não che-

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FOTOS: LEANDRO FONSECA


Robô em fábrica da
WEG: conexão 5G e uso
intensivo de automação
ao redor do mundo

garia aonde chegou tratando cultura e a estratégia da ges-


com desinteresse eventos im- tão Schmelzer, que, por sua vez,
portantes como a sucessão em manteve o legado de Décio da
sua liderança. Por isso a foto da Silva, presidente da WEG en-
capa desta edição é tão relevan- tre 1989 e 2007. Décio, por sua
te: após 43 anos de empresa e vez, é filho do fundador Eggon
16 anos como CEO, Schmelzer João da Silva, e sucessor da cul-
vai passar o bastão a Kuba, com tura de trabalho desenhada
21 anos de casa. Ambos come- nos primórdios da companhia.
çaram suas carreiras na WEG, Parte essencial dessa cultura
e dentro da empresa chegaram passa pela formação interna
ao topo do mercado corporati- de profissionais. Todos os líde-
vo. Schmelzer entrega uma em- res da empresa têm planos de
presa com as finanças em dia e sucessão com dois ou três can-
tida como um case mundial de didatos sempre em preparação
sucesso na indústria; Kuba tem para assumir cargos futuros. “A
o desafio de consolidá-la como diferença da WEG para nossos
protagonista da corrida global concorrentes é que temos um
Harry Schmelzer Jr., por energia sustentável. time com muito conhecimento
CEO da WEG: 43 anos
de empresa e 16 na Para chegar lá, não espere do negócio”, diz Kuba (leia a en-
liderança executiva estripulias. O plano de Kuba, trevista completa na página 46).
em linhas gerais, é manter a “Passamos por muitas áreas da

TODOS OS LÍDERES DA COMPANHIA, A COMEÇAR


PELO CEO, TÊM PLANOS DE SUCESSÃO COM DOIS
OU TRÊS CANDIDATOS SEMPRE EM PREPARAÇÃO
PARA ASSUMIR CARGOS FUTUROS
janeiro de 2024 37
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CAPA

os poucos casos em que a WEG


decide não fazer algo dentro de
casa, o próprio Schmelzer se trai
em frases como “não fazemos,
por exemplo, estamparia... espe-
re: isso nós fazemos, sim”. Du-
empresa ao longo dos anos, o que cria um sen- rante a pandemia de covid-19, a
so de pertencer, de trabalhar para criar valor. Ao WEG conseguiu montar em 30
trazer gente de fora não se constrói vínculo.” A dias uma fábrica para produzir
mesma estratégia de formação de liderança foi 1.000 respiradores elétricos.
levada para os 15 países em que a companhia Na mesma época, sua unidade
tem fábricas. Na base, todos os anos 800 jovens de tintas industriais passou a
aprendizes entram na WEG, com formação téc- fabricar também álcool em gel
nica que pouco a pouco os leva a assumir maio- em questão de dias. Ao todo, a
res responsabilidades. empresa fabrica 1.500 linhas
A empresa tem 4.600 engenheiros em seus de produtos, que se dividem
quadros e um histórico de promoção de técnicos em quatro negócios principais:
para funções de liderança. À medida que novas motores comerciais e para ele-
tecnologias e novos países ganham espaço den- trodomésticos, equipamentos
tro dos negócios, especialistas crescem junto. No industriais, equipamentos para
momento, por exemplo, um grupo de cinco en- energia e tintas e vernizes. Re-
genheiros está estudando células de baterias de centemente, começou a inves-
pequenas dimensões para vislumbrar possibilida- tir em novos negócios, como
des de produtos para a WEG. “Somos industriais, energia eólica e painéis solares,
temos uma cultura de querer fazer, de dominar armazenamento de energia, sis-
a tecnologia”, diz Schmelzer. “Desde os primeiros temas de tração para veículos
anos tivemos como foco a internacionalização, o elétricos, soluções para casas in-
que nos forçou a ser competitivos para atender teligentes. Todos tendo a ener-
mercados mais exigentes.” É uma combinação gia como espinha dorsal, mas
que remonta à cultura empresarial alemã, base num número de frentes cada
da imigração na região onde a empresa foi cria- vez maior. “Para assumir a pre-
da e de grande influência em sua concepção. “Na sidência estou em um processo
Alemanha não se tolera defeito”, diz Schmelzer. de transição, olhando cada pro-
O país segue como motor industrial da Europa, duto, cada negócio, e eu mesmo
e tem suas fábricas conectadas às comunidades estou impressionado com a va-
como um diferencial competitivo para o futuro. riedade”, diz Kuba. “A WEG está
É uma visão de sociedade que, de certa forma, se transformando num ecossis-
foi explicada por um diálogo estabelecido dez tema de soluções completas em
anos atrás entre a então chanceler alemã Angela energia e eletrificação limpas,
Merkel e seu colega britânico David Cameron. Ca- com produtos para clientes cor-
meron, às vésperas do referendo que tirou o Rei- porativos, mas também para o
no Unido da União Europeia, questionou Merkel consumidor final.”
sobre qual era a receita do sucesso econômico Parte dessa variedade pode
alemão no longo prazo. Ouviu como resposta algo ser vista na sede da companhia,
como “nós ainda fabricamos coisas”. em Jaraguá do Sul, uma cida-
Num mundo que nas últimas duas décadas de industrial no Vale do Itajaí,
mergulhou de cabeça na terceirização, a WEG em Santa Catarina, onde estão
se manteve como uma potência industrial que também as sedes de empre-
fabrica boa parte dos componentes utilizados. A sas como a malharia Malwee e
companhia orgulha-se de nunca ter fechado uma a Duas Rodas, de aromas (leia
fábrica. “Ao longo de nossa história, fomos domi- a reportagem na página 54).
nando tecnologias importantes para entrar em A WEG é tão relevante para a
novos negócios”, diz Schmelzer. Ao tentar explicar economia local que o comércio
costuma aceitar compras com
pagamento programado para as
datas de distribuição de bônus
da empresa, em março e agosto.
No centro da cidade, a empresa
mantém um museu que conta

38 exame.com
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UMA
MULTINACIONAL
52 4.600 QUINZE FÁBRICAS ENGENHEIROS PA ÍS E S

BRASILEIRA 1.500 38.000 135 LINHAS DE


PA ÍS E S
COMPRAM
A WEG tem 62 anos de PRODUTOS FUNCIONÁRIOS PRODUTOS
história e 52 fábricas em
15 países, com 50% da
receita obtida fora do Brasil
Alemanha
4
Índia
2
DEZENOVE
MILHÕES DE
Fábricas no mundo Áustria MOTORES
1 PRODUZIDOS
POR ANO

Espanha
1
Estados
Unidos China
6 Portugal
2 4
México Itália
3 1
Colômbia
2 Turquia
1

Brasil
17

Argélia África do Sul


Argentina 1
3 4

ÁREAS DE NEGÓCIO NOVOS NEGÓCIOS

Receita total: Energia • Começa a fabricar


30 BILHÕES DE RE AIS, EM 2022 neste ano os maiores
eólica aerogeradores do Brasil
Tintas e Tintas e
vernizes vernizes Armazenamento • Sistemas para
4% 1% de energia armazenar energia limpa
Motores em instalações comerciais
comerciais e para e industriais
Motores eletrodomésticos
comerciais e para 5%
eletrodomésticos Veículos • Sistemas de tração para
MERCADO MERCADO caminhões, ônibus e trens
3% INTERNO elétricos
EXTERNO • Centrais de
50% Equipamentos 50% carregamento para carros
Equipamentos para energia e veículos elétricos
industriais 12%
16% Sistemas • Solução para casas
Equipamentos inteligentes e fábricas inteligentes,
Equipamentos
para energia integrando máquinas
industriais
27% e equipamentos
32%
Fonte: empresa.

janeiro de 2024 39
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CAPA

CONSISTÊNCIA
A WEG é referência em previsibilidade de resultados:
expande faturamento e lucro trimestre após trimestre

Receita líquida trimestral (em bilhões de reais)

TRIM. A TRIM. 10

8
8

sua história e explica didatica-


mente suas tecnologias. Uma 4
visita guiada revela que, nos
primeiros anos do negócio, a 1,7
2
esposa de um dos fundadores
se surpreendeu com o tama-
nho do terreno adquirido para a 0
primeira fábrica: “Vocês preten-
dem fazer uma fábrica ou uma 3o trim. 2013 3o trim. 2023
cidade?”. Sessenta anos depois,
a “cidade” da WEG em Jaraguá
emprega 15.000 pessoas, em fá-
bricas que fazem de tomadas e
interruptores a gigantescos ae-
rogeradores para energia eólica.
Em algumas alas e em alguns Cinco anos atrás, a receita passou para 3,2
laboratórios, conectados com bilhões; e o lucro, para 400 milhões. No fim
tecnologia 5G, robôs carregam de 2023, a primeira linha do balanço já apon-
equipamentos para cima e para tou 8 bilhões; e a última, 1,3 bilhão de reais
baixo, e servem também de tes- a cada três meses. É um exemplo acabado da
te prático para novos negócios “Marcha das 20 milhas”, estratégia de gestão
em que a companhia possa vir a e crescimento apresentada ao mundo pelo
apostar. “Dizemos que tudo que consultor Jim Collins, que mostra empresas
dá choque é uma oportunidade capazes de avançar em quaisquer condições
de negócio”, diz João Paulo da de mercado, sem exagerar o ritmo nos dias
Silva, diretor industrial da WEG. de sol, nem se deter nos de chuva. “Todos
“Num mundo que se eletrifica os investimentos que fazemos são miran-
cada vez mais, as possibilida- do o longo prazo. Temos anos e décadas de
des se multiplicam. Produzimos melhoria diária”, diz Kuba. “Nosso zelo pelo
energia, mas não vendemos capital é muito grande, basta ver o nível de
energia. Vendemos a máquina, retorno que entregamos.”
não o sorvete.” Nos últimos dez anos, a WEG passou de
Seguindo essa analogia, a 19a empresa com maior valor de mercado na
variedade de sabores cresce- bolsa brasileira para posições entre o quinto
rá como nunca nos próximos e o oitavo lugar, junto com gigantes como
anos, que devem testar uma das Petrobras, Itaú, Vale e Ambev. Atualmente,
fortalezas da WEG: a consistên- vale cerca de 150 bilhões de reais. Faz parte
cia. Uma análise dos resultados de sua cultura de gestão distribuir a riqueza
trimestrais feita pelo consultor
Einar Riveiro mostra a solidez
da empresa em equilibrar cres-
cimento no faturamento e no
lucro. Dez anos atrás, a empre-
DIVULGAÇÃO

sa faturava cerca de 1,8 bilhão Fábrica da WEG na Índia:


expansão de projetos de
de reais por trimestre, com lu- aerogeradores abre novas
cro na casa dos 200 milhões. frentes de crescimento

40 exame.com
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entre seus mais de 400.000 investi-
dores, com mais de 1,8 bilhão de re-
ais pagos em dividendos tanto em
2021 quanto em 2022. “A WEG é uma
Lucro líquido trimestral (em bilhão de reais) empresa única no Brasil. Consegue
crescer em dois dígitos a receita,
1,5 avançar ainda mais no lucro, e ainda
1,3
dividir os ganhos”, diz Oscar Mal-
1,2 vessi, professor de finanças da FGV-
-Eaesp e autor do livro Como Criar
Valor na Sua Empresa. A distribuição
0,9 de resultado entre os herdeiros dos
fundadores, ao longo das décadas,
fez da WEG a empresa brasileira
0,6 com mais bilionários no ranking da
revista Forbes: são 29, segundo esti-
0,3 mativas divulgadas no ano passado.
A companhia ainda investe 50% de
seus resultados em novas fábricas,
0 novos projetos, novos produtos; cer-
ca de metade da receita vem de lan-
3o trim. 2013 3o trim. 2023 çamentos feitos nos últimos cinco
Fonte: Einar Riveiro.

janeiro de 2024 41
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CAPA

anos. Relatório recente do ban-


co Itaú levantou preocupação
quanto aos resultados de curto
prazo da WEG, sobretudo na
margem, apertada por aumento
de custo de matéria-prima, mas
manteve a confiança no longo
prazo. Em um evento do banco
Bradesco BBI no ano passado,
Florian Bartunek, um dos mais
respeitados gestores de investi­
mento do país, resumiu a previ­
sibilidade de resultados da em­
presa. “Não sei como a bolsa vai
estar em dois anos, mas é fácil
saber como a WEG vai estar. O
balanço da WEG é melhor que o
do Brasil. A WEG não é o Brasil,
infelizmente.”
O futuro da WEG e o do Bra­
sil, por sua vez, estão intrin­
sicamente ligados. Num mo­
mento em que se prepara para
receber a COP30, a conferência
global do clima, em 2025, o Bra-
sil trabalha para se consolidar
como potência energética ver-
de no mundo. E poucas empre-
sas brasileiras estão tão bem
posicionadas quanto a WEG
para assumir uma liderança
GERMANO LÜDERS

global na transição para uma


economia de baixo carbono.
Segundo as Nações Unidas, os

AS MAIORES
DA BOLSA A consistência de
600

500
1a Petrobras
506

resultados nos últimos


400 2a Vale
dez anos fez a WEG
312
entrar no grupo das
maiores empresas 300 3a Itaú
listadas do Brasil 302
200 4a Ambev
Posição na B3 por 213
valor de mercado 8a WEG
100
(em bilhões de reais) 146

0
Fonte: Einar Riveiro. 2014 2016 2018 2020 2022 2024

42 exame.com
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Operação da são chave”, diz Jefferson de
Petrobras: a WEG
entrou no grupo das
Oliveira Gomes, diretor de tec-
maiores empresas nologia e inovação da Confe-
abertas do Brasil, deração Nacional da Indústria.
liderado pela
petroleira estatal “O desafio, como país, é não só
aproveitar o potencial exporta­
dor de empresas como a WEG,
como também usar suas inova­
ções para turbinar a eficiência
e a produtividade de nosso par­
que industrial interno.”
Assim como o Brasil, a WEG
se beneficia agora de investi­
mentos que começaram déca­
das atrás, como a pesquisa com
açúcar e álcool, uma solução
que a própria empresa está ex­
portando para países como o
Vietnã. A companhia também
tem soluções para gerador de
energia eólica, energia solar,
equipamentos para usinas hi­
drelétricas, para uso de bagaço
de cana na geração de energia.
“O Brasil está adiantado, e po­
demos usar nossas soluções e
escalar para o mundo. Na Índia,
por exemplo, vamos começar
com aerogeradores, um mer­
cado que vemos com muito po­
tencial para os próximos anos”,
diz Kuba. Por outro lado, a WEG
investiu 600 milhões de reais
numa fábrica de motores para
ônibus e caminhões elétricos,
na sua sede, em Santa Catari-
na. Também fabrica produtos
investimentos globais em energias renováveis devem para trens elétricos. Motores
triplicar nos próximos sete anos em relação aos 115 bi- de automóveis não estão nos
lhões de dólares investidos de 2015 a 2022. Na última planos, mas a companhia já
janela, o Brasil recebeu 11% dos investimentos, e sobra tem uma linha robusta de car-
otimismo sobre uma ampliação dessa fatia nos próxi- regadores para carros elétricos
mos anos, como mostra reportagem na página 48. “O que permitem reserva de vaga,
mundo vai precisar de mais energia, mais água e mais monitoramento da recarga e do
alimentos, e nenhum país conseguirá fazer tudo isso, pagamento, em parceria com
com energia limpa e soluções em larga escala, como o montadoras como GM, Volvo e
Brasil. Temos uma chance de nos posicionarmos como GWM. Um dos negócios mais
uma cadeia de valor imbatível. E empresas como a WEG promissores é o de hidrogênio

A WEG INVESTE 50% DE SEUS RESULTADOS EM


NOVAS FÁBRICAS, NOVOS PROJETOS, NOVOS
PRODUTOS; CERCA DE METADE DA RECEITA VEM DE
LANÇAMENTOS FEITOS NOS ÚLTIMOS CINCO ANOS
janeiro de 2024 43
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CAPA

Aerogeradores: os
investimentos
globais em energias
renováveis devem
triplicar em sete
anos, para mais
de 300 bilhões
de dólares

verde, combustível gerado a


partir de fontes renováveis. A
empresa já participa de alguns
dos maiores projetos de hidro-
gênio verde do mundo. Forne-
ceu, por exemplo, motores para
a maior fábrica de hidrogênio
liquefeito do planeta, na Coreia
do Sul. Também está envolvida
em projetos nos Estados Uni-
dos, no Canadá, na França e na
Suécia, que já garantiram cerca
de 15 milhões de dólares de fa-
turamento em 2023. Mas o país
com maior potencial dessa tec-
nologia é o Brasil, sobretudo o
Nordeste. O hidrogênio verde,
na visão da WEG, é um cami-
nho para o país exportar ener-
gia limpa para o mundo, numa
visão de negócios e de desen-
volvimento de país que podem
se complementar.
O desafio é equilibrar os in-
vestimentos em novas tecno-
COSTFOTO/NURPHOTO/GETTY IMAGES

logias com a ampliação de re-


ceita em negócios maduros. A
WEG, como destaca Malvessi,
da FGV-Eaesp, é referência em
transformar investimentos em
geração de valor para o acionis-
ta. Faz isso, como explica Kuba,

A WEG JÁ FATUROU 15 MILHÕES DE DÓLARES EM


2023 COM PROJETOS DE HIDROGÊNIO VERDE,
E APOSTA NA TECNOLOGIA COMO GRANDE
FONTE DE RESULTADOS NO FUTURO
44 exame.com
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ao seguir apostando também em negócios de mão dupla que deve seguir
tradicionais, com mercados amplos, e es- norteando o crescimento da
senciais na transição para uma economia WEG. “Vamos seguir crescendo
de baixo carbono. O exemplo mais recente de forma consistente em negó-
foi a compra dos negócios de motores elé- cios maduros. São essas frentes
tricos industriais e geradores da america- que vão nos permitir apostar
na Regal Rexnord, num valor de 400 mi- no que é novo e que vão per-
lhões de dólares. A transação, que ainda mitir crescimentos de mais de
depende de aprovações em alguns órgãos um dígito”, diz Kuba. “Ener-
concorrenciais, adicionará ao portfólio da gia solar, por exemplo, era um
WEG dez fábricas em sete países, além de negócio pequeno, e virou um
2.800 funcionários. É uma aquisição que mercado de bilhões.” O novo
aproxima a WEG ainda mais da suíça ABB, CEO assume no início de abril.
líder mundial em motores elétricos, e que À sua frente, uma leva inédita
dá acesso a novos mercados. “A Rexnord de possibilidades bilionárias —
é líder em negócios como alternadores a e o desafio de ampliar uma se-
diesel. Pode não parecer baixo carbono, quência de bons resultados que
mas é essencial em países como a Áfri- se estende por seis décadas.
ca do Sul, em que a energia cai 20 vezes
por dia”, diz Kuba. “Estamos partindo de
soluções como essa para construir redes
integradas, com geração cada vez mais
limpa, armazenamento eficiente, estabi-
lidade nas entregas.” O negócio de bate-
rias, integrado a projetos de geração cada
Carros elétricos
vez mais limpa, é uma das grandes apos- na China: a WEG tem
tas para a companhia nos próximos anos. parceria para estação
de carregamento com
Equilibrar curto e longo prazo, projetos um grupo crescente
maduros e projetos inovadores, é uma via de montadoras

VCG/GETTY IMAGES

janeiro de 2024 45
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CAPA

DE ESTAGIÁRIO
A CEO
Em sua primeira entrevista,
Alberto Kuba, novo CEO da
WEG, fala da cultura única da
companhia e de sua visão de
longo prazo para os negócios

LUCAS AMORIM

Sai um executivo com mais de comercial a diretor


40 anos de casa, entra outro superintendente. Quando voltei
com 20 anos de empresa. ao Brasil, fiquei à frente da
A sucessão da WEG, em que divisão de motores. No ano
Harry Schmelzer dá lugar passado fui aos Estados
a Alberto Kuba, numa troca Unidos para completar um gap
marcada para o fim de março, de experiência, para conhecer
é um símbolo da cultura da o mercado, as pessoas. Era
companhia. Com mais de parte do processo, mesmo
30.000 funcionários no mundo, que eu não soubesse.
a WEG forma seus líderes
dentro de casa, seja no Brasil, E quando você soube
seja na China. O novo CEO que seria o novo CEO?
assume em abril com o desafio Fiquei sabendo no dia anterior
de ampliar a relevância da ao anúncio público. O Décio
empresa em negócios como [da Silva, presidente do
carros elétricos, sem deixar conselho de administração]
de crescer em mercados me procurou na semana,
tradicionais. dizendo que eu era um dos
finalistas do plano de
Como foi o processo de sucessão. Conversamos muito
sucessão do atual CEO, sobre a missão do cargo e a
Harry Schmelzer? visão de futuro da empresa.
Na WEG, nossa cultura não é Com o Harry [Schmelzer, CEO]
de dizer quem será o sucessor também conversei sobre o
de quem. Você vai tendo sinais senso de responsabilidade,
de preparo. Todos os líderes a importância de crescer e
sempre têm de apontar dois construir valor. Isso foi numa
ou três executivos como terça-feira [5 de dezembro
futuros sucessores. Um de 2023]. Na quinta, me
indicador de que eu estava perguntaram: “Você quer?
cotado para uma sucessão foi Se sente preparado?”.
LEANDRO FONSECA

meu retorno ao Brasil, depois O anúncio para a WEG veio


de ficar de 2010 a 2019 na com o fato relevante na sexta
China, onde fui de diretor [dia 8 de dezembro de 2023].

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Alberto Kuba e global por fontes limpas.


Harry Schmelzer Jr.:
o sucessor ficou
A WEG tem hoje gerador
sabendo que seria de eólica, temos estrutura
o escolhido um dia de energia solar, estamos
antes do anúncio
ao mercado também na geração com
bagaço há muitos anos.

Como a visão de futuro


da WEG equilibra negócios
Qual é a importância de formar estáveis com frentes
internamente a liderança? promissoras?
A diferença da WEG para Nos diferenciamos sendo
nossos concorrentes é fortes em mercados maduros,
que temos um time muito como motores, em que
completo. Sabemos o que estamos perto de ser o
estamos fazendo, de A a Z. número 1 no mundo, muito
Entrei como estagiário, em próximos da ABB. Você precisa
2001. Passei na fábrica, de crescimento em mercados
na qualidade, na engenharia, maduros para poder investir
em programação, também em mercados novos.
no financeiro, marketing, Mas o novo é que vai puxar
automação. Com isso você crescimentos maiores, de
cria um senso de pertencer, mais de um dígito. Energia
de construir valor, de ensinar solar era um nicho e virou
o outro. Ao trazer gente um negócio de bilhões.
de fora não se constrói vínculo Em mobilidade elétrica, por
com a empresa. Levamos isso exemplo, focamos soluções
para o mundo todo. Quando urbanas, como ônibus
começamos a operação e caminhões de lixo, que
na China, em 2004, trouxemos na China já são elétricos.
um executivo de fora. Em automóveis, nosso negócio
Não funcionou. Só começou a é de carregador, não vamos
funcionar quando mandamos fazer motores pequenos para
a equipe do Brasil para lá carros elétricos. Também
e aí começamos a criar uma vendemos placas solares
cultura local. Hoje já existem e soluções para uma casa
dois diretores chineses, inteligente, com tudo
que também começaram integrado.
lá de baixo. Temos um plano
de sucessão em todos Analistas mostram otimismo
os outros países. com o longo prazo, mas
preocupação com o curto
O Brasil é um país bem prazo da WEG. Como equilibrar
posicionado no mercado global essas duas frentes?
de energia limpa. Isso dá uma Todos os investimentos que
vantagem competitiva à WEG? fazemos são mirando o longo
O Brasil é de fato o país mais prazo. O curto prazo é muito
competitivo nesse sentido. volátil, mas as bases que
Se o mundo será net zero, plantamos são sustentáveis.
a energia limpa precisará se São anos e décadas de
viabilizar cada vez mais. Nós melhoria diária. Nosso foco
temos, por exemplo, operação no longo prazo faz com
na Alemanha, e em 2023 a que cuidemos muito do
preocupação era se teríamos investimento. O nosso zelo
energia para rodar a fábrica pelo capital é muito grande,
porque a matriz dependia da basta ver o nível de retorno
Rússia. Vemos uma pressão que entregamos.

janeiro de 2024 47
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ESG

Sprint
f inal

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A corrida contra as mudanças


climáticas chega à reta final, e os países
querem triplicar os investimentos em
energias renováveis. Nesse esforço
trilionário, o Brasil tem tudo para
receber parte considerável dos recursos
— principalmente se fizer a lição de casa

R O D R I G O C A E TA N O

LEANDRO FONSECA

Energia em Dubai: realizada nos Emirados Árabes Unidos, a COP28 produziu o primeiro
documento climático que menciona a eliminação gradual dos combustíveis fósseis

janeiro de 2024 49
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ESG

EM 2015, O MUNDO INVESTIU 1,3


TRILHÃO DE DÓLARES EM ENERGIA Helena Matza,
fóssil e pouco mais de 1 trilhão diplomata dos EUA:
o governo americano
de dólares em fontes renováveis, quer trabalhar com o
de acordo com dados da Agência governo brasileiro
Internacional de Energia (IEA). para construir um
ambiente propício
Naquele ano, em dezembro, ao fi- à chegada de
nal da 21a Conferência das Partes investimentos
privados em energia
da Convenção-Quadro das Na- limpa no país
ções Unidas sobre as Alterações
Climáticas, a COP21, os quase 200
países-membros assinaram um
compromisso para conter as emis-
sões de gases de efeito estufa e
combater o aquecimento global,
que ficou mundialmente conheci-
do como Acordo de Paris, em alu-
são ao local de realização da COP.
Nunca mais os investimentos em
energia fóssil superaram os inves-
timentos em energia renovável.
Desde o Acordo de Paris, o mun-
do passou pelo Brexit, na Europa;
pela eleição de Donald Trump, nos
Estados Unidos; Jair Bolsonaro
assumiu o comando da maior de-
mocracia latino-americana e prio-
rizou uma agenda de desmonte
de estruturas ambientais; houve
uma pandemia, que bagunçou a
FOTOS: LEANDRO FONSECA

economia e a logística mundiais; e


o russo Vladimir Putin, contraria-
do em seus interesses, lançou uma
ofensiva contra a Ucrânia, levando
os europeus a reviverem o medo
da guerra após quase 80 anos. Em
todos esses episódios, a transição
energética foi colocada em dúvi- de castelos de areia nas praias artificiais de (2020-2021), nunca são meno-
da, e a pergunta “seria o fim dos Balneário Camboriú: o ritmo é insuficiente res do que 1 trilhão de dólares.
esforços para conter as mudanças para fazer o mundo cumprir as metas es- A esperança de um sprint final
climáticas?” se fez presente em tabelecidas no Acordo de Paris. “O que está nessa maratona que possa al-
cada ano de campanha por uma acontecendo é muito simples do ponto de terar o resultado, agora, recai
economia de baixo carbono. Nada vista científico”, explica o cientista climá- sobre um novo acordo firmado
disso, no entanto, abalou a onda tico Paulo Artaxo, um dos mais citados pelo em uma COP, desta vez na 28a
de renovação energética. No ano mundo. “Não é mais possível estabilizar a edição da conferência, realizada
passado, o volume de investimen- temperatura em 2 graus Celsius; com as em Dubai, nos Emirados Árabes
tos foi de 1,7 trilhão de dólares em emissões que temos hoje, o planeta vai se Unidos. O documento final da
renováveis, ante pouco mais de 1 aquecer entre 2,5 e 3 graus; e, para a maior COP28 traz, pela primeira vez
trilhão de dólares em fósseis, tam- parte dos países do Acordo de Paris, a meta em quase três décadas, menção
bém de acordo com a IEA. de ser ‘net zero’ não é alcançável.” aos combustíveis fósseis — e
Os cães ladram, e a caravana Na corrida pela descarbonização global, a não são elogiosas. Os países-
passa, diria o colunista social cada volta a equipe renovável tira um pou- -membros concordaram em
Ibrahim Sued. Mas há um pe- quinho da diferença da equipe fóssil, porém estabelecer um plano faseado
queno detalhe nesse frenesi de a distância segue enorme e o desempenho de saída dos combustíveis fós-
transição para uma economia do oponente, ainda que não evolua, perma- seis, além de triplicar o volume
sem petróleo que faz todo esse nece praticamente estável. Os investimen- de geração de energia renovável
comprometimento financeiro tos em petróleo, carvão e derivados, exceto até o final desta década. O acor-
parecer uma enorme construção pelos dois anos mais agudos da pandemia do foi considerado histórico.

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INVESTIMENTOS RECORDES
A COP do fim
do petróleo: Há poucas dúvidas sobre a che-
a presença de gada de um tsunami de investi-
lobistas da
indústria do
mentos em renováveis. A proje-
petróleo foi ção da IEA é que, nos próximos
recorde em Dubai, cinco anos, se instale mais ca-
mesmo assim os
países chegaram pacidade de geração limpa do
a um acordo que a soma de todos os anos
para acelerar a
descarbonização desde a construção da primeira
geradora comercial de energia
renovável, há mais de 100 anos.
Antes mesmo da conclusão da
COP28, a agência já previa um
acréscimo de 2,5 vezes na capa-
cidade global, pouco abaixo da
meta estabelecida em Dubai.
Duas fontes, especificamente,
dominarão 95% desse volu-
me: solar e eólica. Neste ano,
as duas já devem ultrapassar
a hidrelétrica globalmente (no
Brasil, ainda não). Em 2025, o
carvão perderá, depois de mais
de um século, o posto de maior
fonte de energia global para as
renováveis. As usinas solares e
eólicas superarão as nucleares
em entrega no ano seguinte, e,

A evolução As previsões são de crescimento acelerado das energias limpas até


2028, com destaque para as fontes solar e eólica, porém ainda
aquém da meta de triplicar a geração até o final desta década
das renováveis Adições de capacidade (em GWh)
Hidrelétrica Fotovoltaica Eólica Projeção

Histórico Cenário-padrão Cenário acelerado


1.000 100%
221
800 80%
167 672
600 60%
536 123
108
400 405 40%
375
74
200 20%
228
17 24 24 34
0 32 0
2018 2019 2020 2021 2022 2023 2024 2025 2026 2027 2028 2023 2024 2025 2026 2027 2028
Fonte: Agência Internacional de Energia.

janeiro de 2024 51
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em 2028, 42% de toda eletricidade


no mundo virá de fontes limpas,
de acordo com as estimativas da
Agência Internacional de Energia.
Em termos de investimentos, os
cálculos variam muito. Há alguns
anos que diferentes previsões es-
tabelecem uma necessidade anu-
al de investimentos para fazer a
transição energética num inter-
valo entre 1 trilhão e 7 trilhões de
dólares anuais. De concreto, com
base nos dados do ano passado e
nos cenários mais realistas, pode-
-se esperar um patamar mínimo
de 2 trilhões de dólares para os
GETTY IMAGES

próximos anos, sendo o Brasil o


destino de uma décima parte dis-
so. O governo brasileiro espera

um volume considerável de inves-


timentos, e tem recebido sinais Pecém: porto cearense
de que é para ficar otimista. Mas recebeu um aporte do
negociar a entrada de tamanho Porto de Rotterdam, na
Holanda, cujo plano é
volume de dinheiro é uma tarefa transformar o Ceará em
cheia de riscos, e os perigos, como um polo de exportação
de hidrogênio verde
se sabe, moram nos detalhes.
“A maioria dos países assinou

VALTER CAMPANATO/AGÊNCIA BRASIL.


um compromisso de descarbo-
nização, e ninguém faz uma coi-
sa dessas com a intenção de não de infraestrutura brasileiro, com grande
cumprir”, disse à EXAME, durante enfoque em energia. “O Brasil tem gran-
a COP28, Roberto Azevêdo, ex-di- des vantagens competitivas em se tratan-
retor-geral da Organização Mun- do de energia renovável”, disse Matza.
dial do Comércio, que esteve em Essas vantagens são de ordem natural,
Dubai representando a Abag, as- pelo país concentrar algumas das me-

sociação ligada ao agronegócio. “O lhores áreas de vento e de sol do planeta


problema é que não há um modelo para a produção de energia limpa; e de Elmano de Freitas,
ou uma entidade capaz de organi- ordem econômica. A diplomata ameri- governador do Ceará:
“Pelos estudos a que tive
zar esses esforços, então cada país cana ressalta que, embora a exportação acesso, nosso hidrogênio
faz do seu jeito. Isso gera o risco de energia seja um negócio interessan- verde será produzido a um
custo equivalente a 30%
de transformar algo positivo para tíssimo do ponto de vista do investidor, do produzido lá fora”
o planeta e para a economia em a capacidade interna de absorver parte
motivo para o estabelecimento de relevante da produção é um aspecto
barreiras comerciais, que às vezes central na definição do volume de recur-
são necessárias; e às vezes, não.” sos que serão alocados em cada região. riscos. Nesse sentido, a participa-
Nessa geopolítica da transição, os Nesse ponto, o país tem a seu favor a ção governamental se dará em
grupos de afinidades vão sendo for- indústria siderúrgica e a mineradora. Se três elementos da equação: juros
mados, e o Brasil, por uma série de o mundo quiser realmente cumprir as subsidiados, capital a fundo per-
motivos, é um jogador cobiçado. Em metas do Acordo de Paris, ou pelo me- dido e políticas públicas. Os dois
meados de janeiro, Helaina Matza, nos chegar perto delas, terá de atacar os primeiros atuam diretamente
coordenadora especial do progra- maiores poluidores, ou seja, a chamada no apetite de risco do investidor,
ma de parcerias em infraestrutura “velha economia”. e buscam potencializar os apor-
dos Estados Unidos (PGI), esteve no No plano americano também está con- tes. O terceiro visa direcionar
Brasil para uma série de encontros templada a evolução social das regiões esforços regulatórios e aplicar
com empresas, investidores e go- investidas. Matza ressalta que o modelo recursos públicos para infraes-
verno — além de uma conversa com a ser construído envolve as lideranças dos truturas de base, cuja ausência
a EXAME. Sua missão é preparar o dois países e tem por objetivo facilitar o pode até não inviabilizar o su-
cenário para a entrada de dinheiro investimento privado, o que significa, cesso comercial do empreendi-
privado, majoritariamente, no setor numa generalização grosseira, reduzir mento, mas limita o benefício

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O hidrogênio verde, no caso,

GETTY IMAGES/IMAGE SOURCE


é uma espécie de novo petróleo
produzido a partir da quebra
das moléculas da água com o
uso de energia limpa. As pro-
priedades do hidrogênio como
combustível são conhecidas há
muito tempo, porém sua pro-
dução exige uma quantidade
descomunal de eletricidade, o
que até pouco tempo atrás só
era viável com o uso de fontes
não renováveis. O barateamen-
to da geração limpa, em espe-
cial a eólica, tornou possível
a produção em escala de uma
versão carbono neutro do com-
bustível, hoje a maior aposta
para substituir o petróleo em
indústrias poluentes, como as
de transporte pesado, minera-
ção, siderurgia etc. Elmano de
Freitas se gaba de ter, em seu
litoral, “talvez a melhor condi-
ção para produção de energia
← de vento do mundo”. “Pelos es-
Recursos tudos a que tive acesso, o nosso
naturais: turbinas
eólicas no Ceará hidrogênio verde será produ-
tiram proveito zido a um custo equivalente
da condição
excepcional de a 30% do que é produzido lá
vento no estado, fora”, disse Freitas à EXAME.
que antes era
considerada um Esse potencial chamou a
entrave para o atenção de europeus, que já
desenvolvimento
se estabeleceram no estado. O
Porto de Rotterdam, na Holan-
da, comprou uma participação
econômico e social disponibili- tre estados. Em se tratando de energias re- relevante no Porto de Pecém,
zado à população. Basicamente, nováveis, o maior potencial de geração está com o intuito de fazer dois
é garantir que os projetos consi- concentrado em áreas mais pobres, como no hubs para hidrogênio verde,
derem o impacto nas comunida- Ceará. O estado vive, atualmente, uma euforia um de exportação, em terras
des locais e promovam o desen- pela expectativa da chegada de bilhões em in- brasileiras, e outro de impor-
volvimento sustentável. vestimentos, graças a características naturais tação, em terras holandesas. A
Para algumas regiões bra- que sempre foram um entrave para o desen- ambição é ter o maior polo de
sileiras, esse posicionamento volvimento: o excesso de vento, que prejudi- combustível limpo da Europa,
é música para os ouvidos. Em ca a pesca, e o excesso de sol, que inviabiliza a e abastecer todo o continente.
especial, o Nordeste. Há uma agricultura. Elmano de Freitas, governador do Segundo o governo cearense, já
oportunidade, nessa transição Ceará, esteve na COP28 para vender o projeto foram comprometidos, por di-
energética, para o país corrigir de um polo de produção de hidrogênio verde, versas empresas, 17 bilhões de
injustiças históricas e reduzir em fase avançada de implementação no Porto dólares em projetos no porto. O
gaps de desenvolvimento en- de Pecém. tsunami está chegando.

Parceiro
Realização Institucional Patrocínio

janeiro de 2024 53
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NEGÓCIOS

Iselde Kelbert, aromista sênior, e Ana Cláudia Tezza, aromista trainee:


na Duas Rodas, gerações de aromistas criam os sabores de vários produtos que comemos

Os aromistas
estão chegando
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Fundada há nove décadas, a catarinense


Duas Rodas virou uma empresa de 1,6
bilhão de reais criando sabores a partir de
frutas brasileiras. Agora, investe em uma
expansão global para atender um mundo
sedento por alimentos saudáveis

DANIEL GIUSSANI, DE JARAGUÁ DO SUL (SC)


FOTOS: LEANDRO FONSECA

U
ma mesa repleta de quitutes como geleias
e salgadinhos, além de energéticos e outras
bebidas, preenche uma das salas mais im-
portantes do laboratório da indústria de in-
gredientes Duas Rodas. Localizada no meio
de um naco de Mata Atlântica em pleno centro de Jara-
guá do Sul, cidade catarinense de 200.000 habitantes, a
Duas Rodas é um dos exemplos mais completos de uma
empresa brasileira que construiu uma reputação global
numa atividade de nicho — e de altíssimo valor. O ne­
gócio dela usa processos químicos para transformar es­
sências da natureza em pós e líquidos com sabor. Tudo
isso para servir de matéria­prima a alimentos industria­
lizados. Na sala das guloseimas, funcionários da Duas Ro­
das costumam receber clientes para degustarem sabores
recém­criados. Sentada numa das cadeiras está a técnica
de alimentos Iselde Kelbert. Com a mesma naturalidade
com que respira, ela pega um dos copinhos de plástico à
sua frente, cheira o produto e, na hora, decifra os ingre­
dientes presentes. “Aqui tem uma nota mais cítrica, uma
essência de pêssego, um composto mais adocicado”, diz
ela, emendando a conversa ao falar de compostos quí­
micos aromáticos também adicionados à composição do
produto, como aldeídos, ésteres e álcoois. Há 40 anos Kel­
bert é aromista da Duas Rodas. A função dela é identificar
as mais de 3.000 matérias-primas no portfólio da empre-
sa. Tudo isso porque é também atribuição dela combinar
uma essência com outra até formar um novo sabor.
Não é uma tarefa fácil. Um aroma de manga, por exem-
plo, é definido pela composição de mais de 250 substân-
cias, como óleos essenciais, vindos da própria destilação
a vapor da fruta — o que é feito antes, por outros profis-
sionais —, e químicos aromáticos, normalmente em pó.
O aromista identifica a substância e a solicita por meio

janeiro de 2024 55
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NEGÓCIOS

de uma biblioteca de matérias-


-primas, gerenciada também ali
no laboratório. Como gerente de
desenvolvimento de aromas, Kel-
bert comanda uma equipe de dez
profissionais. Com um quê de al-
quimia, eles passam o dia de jaleco
branco adicionando químicos e
extratos naturais, pesando insu-
mos, fazendo anotações e criando
fórmulas para serem utilizadas
em larga escala nas fábricas da
empresa. E, depois, nos processos
industriais dos clientes. Em regra,
a função da Duas Rodas é criar um
gosto incrível para o produto do
cliente, numa composição man-
tida sob sigilo absoluto, digno da
fórmula da Coca-Cola. A equipe
de Kelbert tem um conhecimento
apuradíssimo. Para ter uma ideia,
o programa de trainee de aromis-
tas dura quatro anos. O profissio-
nal só deixa de ser júnior após dez
anos na função. Além de muita
leitura de manuais de química, o
trabalho exige provações elevadas.
Para preservar a papila gustativa e
o olfato, o consumo de alimentos
condimentados deve ser evitado;
cigarro, nem pensar. “Ficamos tão
sensíveis ao gosto que, num su-
permercado, compramos as comi-
das e involuntariamente descobri-
mos os compostos que estão ali”,
diz Kelbert. Embaixo da sala dos
Rosemeri Francener, diretora de negócios internacionais,
aromistas, um espaço reproduz as e Leonardo Fausto Zipf, CEO da Duas Rodas: a meta é que 45%
linhas de produção dos clientes. do faturamento seja conquistado com vendas no exterior
Tem de tudo por ali: uma máquina
de refrigerantes, outra de pão, de
bolos e de sorvetes. “A ideia é saber
se os aromas criados aqui terão sa Kerry Group, cujo faturamen- isso abriu espaço para foodtechs
uma boa reação quando assados to está na casa dos 10 bilhões de ganharem mercado em cima de
ou fritos”, diz Kelbert. dólares, além das suíças Givau- gigantes com produtos novos e
Ao longo de nove décadas, a dan (receita anual de 8,2 bilhões ingredientes inovadores. Muitos
Duas Rodas virou a maior fábrica de dólares, dos quais 54% vêm deles dependentes das essências
de ingredientes da América Lati- de aromas e sabores) e Firme- fabricadas pela Duas Rodas. “Fica-
na. A julgar pelo ritmo de expan- nich (4,9 bilhões de dólares). mos colados no cliente para criar
são dos últimos anos, a empresa Por trás do crescimento ex- produtos que eles nem sabem que
pode entrar na liga das maiores do pressivo da Duas Rodas estão precisam, mas ficam interessados
mundo. De 2019 para cá, o fatura- mudanças profundas nos hábi- em comprar quando degustam”,
mento praticamente dobrou. No tos alimentares. A preocupação diz Leonardo Fausto Zipf, CEO da
ano passado, foi de 1,6 bilhão de com saúde e bem-estar virou do empresa e membro da terceira
reais. Entre os concorrentes glo- avesso a dieta de muita gente, geração da família proprietária.
bais da Duas Rodas está a irlande- sobretudo na geração Z. Tudo O nome dos clientes também

56 exame.com
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Crescimento escritórios comerciais na China e


que dá gosto nos Estados Unidos.
A ambição global da Duas Rodas
A Duas Rodas bateu o primeiro ganhou um impulso relevante no
bilhão de faturamento e continua começo de janeiro com a aquisi-
crescendo numa média ção da Tropextrakt, uma empresa
de 16% ao ano de Frankfurt, na Alemanha, dedi-
cada à importação e distribuição
Faturamento de extratos botânicos e insumos
(em milhão de reais) naturais de frutas tropicais. Com a
compra, o foco é ampliar o inves-
1.500 1.600 timento em alimentos funcionais,
1.200
874 1.000 ou “superalimentos”, nome dado
àqueles com alguma promessa de
2019 2020 2021 2022 2023 bem-estar para o corpo. “A Europa
é o berço do desenvolvimento dos
produtos saudáveis que depois vão
para o mundo inteiro e são consu-
matérias-primas midos em escala nos Estados Uni-

4.500 são usadas para


criar os produtos
dos”, diz Rosemeri Francener, di-
retora de negócios internacionais
da Duas Rodas. “Com a compra,
itens vamos desenvolver e pesquisar
3.000 no portfólio produtos na Europa, além de ficar
mais próximos de nossos clientes

10.000 clientes e das tendências de alimentação


funcional.” Fundada em 2002, a
alemã tem cerca de 1.000 clientes.
No portfólio estão nomes presen-
tes na casa de muita gente, como a
Para onde os produtos vão fabricante de cereais Dr. Oetker e a
farmacêutica Bayer.
Outros 0,56% A pegada da Tropextrakt é ofe-
Europa recer aos clientes a chance de
11,37% utilizar ingredientes considera-
América
do Norte dos exóticos por terem produção
Ásia
é segredo absoluto por ali. As 18% 48,91% centralizada numa região do glo-
próprias empresas alimentícias bo. Na lista estão o açaí do Brasil,
ou de bebidas evitam associar- América Fonte: o coco das Filipinas e o goji da
do Sul empresa.
-se publicamente à Duas Rodas 21,15% China. Além de importar insu-
com medo de os concorrentes mos para alimentos e bebidas, a
descobrirem de onde vêm os empresa alemã opera um labo-
sabores dos produtos — o ati- ratório de testes de ingredientes
vo mais estratégico de seus nos moldes do mantido pela Duas
negócios. Atualmente, além de costuma misturar cheiros de todo Rodas. Com a aquisição, o espaço
aromas, os aromistas da Duas tipo. Para evitar contaminação vai virar um centro de inovação
Rodas produzem extratos bo- cruzada, a produção é organizada e tecnologia para a indústria de
tânicos, recheios, condimentos, de modo que os sabores de cheiro suplementos alimentares e de
aditivos e insumos para sorve- neutro, como a baunilha, sejam superalimentos. A aposta é cres-
terias e confeitarias. A produção fabricados no início da semana. cer num dos nichos mais pro-
é feita na sede, em Jaraguá do Os mais fortes, como o chocola- missores da indústria global de
Sul, ou em fábricas nos estados te, saem na sexta-feira — dia em alimentos. Em 2022, o mercado
de São Paulo e Sergipe, além de que a reportagem da EXAME es- de ingredientes para bebidas e
unidades no Chile, na Colômbia teve no local. A produção é vendi- alimentos funcionais movimen-
e no México. O ar nas fábricas da para 39 países com a ajuda de tou 109 bilhões de dólares. Até

janeiro de 2024 57
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NEGÓCIOS

2030, o número deve crescer 53%, ensinando pessoas de fora do trataram de usar a mesma ima-
segundo a consultoria Precedence país a usar esses ingredientes.” gem para representar o negócio
Statistics. A aquisição também vai Com a aquisição da Tropex- recém-criado. “Mesmo chamada
permitir à Duas Rodas exportar trakt, de certa forma a Duas de Indústrias Reunidas Jaraguá do
para 21 novos países, hoje aten- Rodas retorna às origens. O ne- Sul, os clientes insistiam em pedir
didos somente pela Tropextrakt. gócio começou em 1925, quando os produtos ‘daquela empresa de
Em quatro anos, a meta é chegar dois alemães chegaram à região duas rodas’”, diz Zipf. A mudança
a 25% do faturamento da Duas de Jaraguá do Sul, cidade que, de nome veio em 1992 e ainda gera
Rodas com exportações — atual- assim como Blumenau, Pome- conversas entre os clientes. “Todo
mente a fatia é de 18%. No longo rode e Joinville, nasceu a partir mundo pergunta isso. É uma boa
prazo, o “sonho grande”é ter pra- de uma colônia de imigrantes maneira de apresentar a empresa”,
ticamente metade das receitas da Alemanha. O químico-far- diz ele. O storytelling é relevante
vindas de fora do Brasil. Para isso, macêutico Rudolph Hufenüssler para a Duas Rodas porque, apesar
a aposta é continuar com aquisi- e sua mulher, a física Hildegard de bilionária e quase centenária, a
ções lá fora. “Sabe aquele jogo de Hufenüssler, embarcaram num empresa acaba ficando à sombra
War, em que você vai conquistan- navio rumo ao Brasil com um dos clientes, normalmente gran-
do territórios no mapa-múndi? pequeno destilador de essências. des indústrias alimentícias cujas
Queremos ir conquistando espa- O objetivo era extrair óleos es- marcas costumam estar na ponta
ços assim com a Duas Rodas”, diz senciais de frutas brasileiras. Os da língua dos consumidores.
Zipf. “A ideia é levar toda a riqueza dois vinham de Mainz, cidade Nesse tempo todo, a fórmula
da biodiversidade brasileira para no sudoeste da Alemanha, cujo para crescer foi manter a agili-
o mundo, preservando as regiões brasão são duas rodas com uma dade nas tomadas de decisão, so-
onde os frutos são produzidos e cruz no meio. Ao desembarcar, bretudo em momentos críticos.

2001
De volta às origens 1948
Inauguração do
A trajetória de um casal Criação da marca centro tecnológico
alemão que encontrou nos Selecta, que simboliza e administrativo
sabores do Brasil a o início da produção de da empresa em
receita para o sucesso emulsificantes na WE ART/DIVULGAÇÃO Jaraguá do Sul, que
empresa. Hoje, a marca funciona até hoje
representa o braço de
insumos para sorvete
2003
1925
Abertura de fábrica
Vindos de Mainz, em Estância,
na Alemanha, 1965 em Sergipe
o químico- 1935
farmacêutico Durante as décadas de
Rudolph Começa a exportação para o Uruguai, 1960 e 1970, a companhia
2008
Hufenüssler e a primeiro país a receber os produtos atua vendendo produtos
da empresa fora do Brasil Instalação de
física Hildegard diretamente para fábrica na Colômbia
Hufenüssler o consumidor final
instalam a fábrica 2013
de extratos e
essências 1992 Inauguração de
naturais em unidade no México
A empresa passa a se
Jaraguá do Sul chamar Duas Rodas,
2015
DUAS RODAS/DIVULGAÇÃO

marca pela qual os


produtos já eram A Duas Rodas compra
conhecidos fábrica de ingredientes em
São Bernardo do Campo,
1997 em São Paulo, e passa a
trabalhar com aromas e
Companhia inaugura desidratados voltados
Hildegard e Rudolph Hufenüssler, fundadores fábrica no Chile para a nutrição animal
da Duas Rodas: alemães vieram para o Brasil
explorar frutas tropicais

58 exame.com
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Fábrica de aromas da Duas Rodas, em Jaraguá do Sul (SC): a produção


varia conforme o dia da semana, do item mais neutro ao mais forte

2019
Abertura de
escritório O último deles foi a pandemia. -prima para a cadeia de aromas”,
comercial
na China Um dos principais sintomas da diz Maria Eugenia Proença Salda-
infecção por covid-19 é a perda nha, diretora-executiva da Abifra,
do olfato e do paladar, dois sen- a associação brasileira de ingre-
tidos vitais para o trabalho do dientes, fragrâncias e aromas. “E
2020 aromista. Na fase mais aguda a Duas Rodas sabe mapear isso e
A empresa bate o primeiro bilhão da crise sanitária, quando ain- desenvolver tecnologias.” Entre as
em faturamento e expande a da não havia vacinas, a Duas criações da empresa reconhecidas
fabricação de insumos para Rodas montou esquemas para pelo mercado como inovadoras
sorvete minimizar o contato dos aro- estão extratos naturais de frutas
mistas com o restante dos 1.700 brasileiras, como a acerola. Nos
2021 funcionários. “Tivemos de ter últimos anos, o olhar redobra-
Abertura de escritório resiliência para encarar aquele do ao bioma brasileiro acelerou
comercial nos Estados Unidos momento”, diz Zipf. o ritmo de novos produtos. Hoje,
Olhando para o futuro, o fato 23% do faturamento da Duas Ro-
de a Duas Rodas ter nascido no das vem de produtos criados nos
2024 Brasil pode dar uma vantagem últimos três anos. A guinada da
competitiva à empresa diante empresa tem sido acompanhada
Aquisição de operação na Alemanha.
das concorrentes estrangeiras. de perto pelos gigantes do setor,
Com isso, a Duas Rodas volta à sua
origem, com negócio no país de “O Brasil é um grande celeiro, todos de alguma maneira também
origem de seus fundadores tem muita fonte de matéria- apostando as fichas em extratos

janeiro de 2024 59
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NEGÓCIOS

Mercado com
apetite por mais
Com foco em bem-estar e
saudabilidade, setor tem crescido
anualmente — e quer mais
Variação do crescimento
do faturamento no setor
(em relação ao ano anterior)
+19%
+7%
+26%
2019 2020 2021 2022

Tamanho do mercado de sabores


(flavours) no mundo
(em bilhões de dólares)
Projeção 25
17

2022 2024 2032

Tamanho do mercado de
ingredientes para alimentos
funcionais no mundo
(em bilhões de dólares)

Projeção 167,5
103,4

Fábrica de insumos para sorvete em Jaraguá do Sul (SC): torre de controle


2021 2024 2030 envia dados para tablets de funcionários que acompanham a produção

Fontes: Abifra e Precedence Statistics.

naturais capazes de servir de cionais era fazer as pessoas supe- inteligência artificial. Nos últimos
ingredientes aos alimentos rarem um sabor por vezes insatis- meses, ela criou uma plataforma
funcionais. Em 2020, a Givau­ fatório em nome da saúde. “Houve para captar dados sobre consumo
dan comprou 40% da francesa uma mudança forte na pandemia, de alimentos ao redor do mundo.
Naturex, fabricante de extratos quando as pessoas valorizaram O motivo: descobrir os ingredien-
botânicos para aromas e uma demais a própria imunidade”, diz tes em alta e, assim, ajustar o tra-
concorrente direta da Tropex­ Ary Bucione, CEO da NutriConnec- balho de criação de sabores — e
trakt, por 522 milhões de euros. tion, consultoria do mercado de o da produção em massa de aro-
O plano de crescimento da Gi- alimentação saudável. “A indústria mas. “Ela analisa até se vai chover,
vaudan é dobrar de tamanho entrou de cabeça na tendência, porque isso interfere no consumo
até 2030, basicamente com in- com o desenvolvimento de produ- de sorvete”, diz Lucimar Coelho,
gredientes para uma alimenta- tos saudáveis e também gostosos.” diretor de operações industriais
ção saudável. Firmenich e Kerry Com concorrentes adotando da Duas Rodas. “Isso interfere no
Group têm metas semelhantes. uma estratégia mais ou menos consumo dos nossos ingredien-
Até pouco tempo atrás, o desafio parecida, o contra-ataque da Duas tes.” A inteligência artificial tam-
do mercado dos alimentos fun- Rodas envolve investimentos em bém alimenta o centro de controle

60 exame.com
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da linha de produção. A estrutu- maiores padrões de qualidade”, diz
ra, com várias telas interligadas, Saldanha, da Abifra. “Se está sen-
lembra a torre de controle de um do usado, é porque é seguro, mas
aeroporto. As imagens mostram o setor tem o desafio de comuni-
cada ponto da linha de produção car isso para os consumidores.” As
e da logística dos produtos até leis de outros países sobre o que é
os clientes. A tecnologia destaca permitido ou não num alimento
pontos de melhoria nos proces- também podem azedar a ambição
sos e, desde a adoção, já permitiu global da Duas Rodas. As defini-
reduzir em 10% os estoques ar­ ções de aromas naturais variam
mazenados nas fábricas — uma entre os Estados Unidos e a União
economia de 20 milhões de reais. Europeia conforme a produção do
Além disso, ajustes no modo de ingrediente. A vanilla, utilizada na
produção elevaram a capacidade baunilha, é considerada natural
de algumas fábricas em 30%. na União Europeia com qualquer
É da mistura de inovação com tipo de fermentação. Nos Estados
uma arte quase milenar de extra- Unidos, só é considerada natural
ção de aromas que o crescimento ao ser fermentada com ácido fe-
da Duas Rodas vem se desenvol- rúlico. A adequação às regras pode
vendo. No meio do caminho há levar um tempo. A solução é ir tri-
desafios. A guinada a um mundo lhando o crescimento com paci-
com apetite pelos alimentos fun- ência, assiduidade e perseverança,
cionais traz consigo a perda de características que o cantor Jorge
valor dos ingredientes sintéticos. Ben Jor listou para descrever os al-
Muita gente os associa às fórmu- quimistas, aqueles que trabalham
las de guloseimas e de alimentos sob leis herméticas de trituração,
de baixo valor nutricional. A Duas fixação, destilação e a coagulação.
Rodas trabalha com muitos aro- Mas bem que ele poderia estar fa-
mas sintéticos. O desafio, aqui, é lando, também, dos aromistas. E,
desmistificar a ideia de que eles considerando o plano de expan-
são menos seguros do que os na- são da Duas Rodas, dá para dizer:
turais. “A regulação do tema é rígi- os aromistas estão chegando — e
da ao redor do mundo e busca os querem conquistar o mundo.

Alemanha

Estados Unidos
China
Gostinho brasileiro
pelo mundo México

A Duas Rodas já exporta para


40 países; com a aquisição de Colômbia
empresa na Alemanha, BRASIL
chegará a mais lugares Sergipe
São Paulo
Para onde exporta Santa Catarina
Aonde vai chegar Chile
Fábrica
Escritório

janeiro de 2024 61
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BLOOMBERG BUSINESSWEEK
MARKETING

A GERAÇÃO Z QUESTIONA TUDO, INCLUSIVE OS EFEITOS NOCIVOS DO ÁLCOOL. AO DESCOBRI-LOS, ELA PREFERE AS

62
Bebida sim,
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COM CONTEÚDO

BEBIDAS QUE VÃO BEM NA BALADA, MAS NÃO EMBRIAGAM DASHA AFANASIEVA, DA BLOOMBERG BUSINESSWEEK

ressaca não janeiro de 2024 63


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MARKETING

EM
30% ao ano nos próximos anos, ante 6% das bebidas con-
vencionais, de acordo com a empresa de pesquisa de mer-
cado Euromonitor. Portanto, não é surpresa que a categoria
esteja atraindo o interesse de empresas multinacionais de
bebidas alcoólicas, como a Diageo e a Pernod Ricard.
Sejam grandes, sejam pequenas, todas essas empresas
buscam clientes mais jovens. Entre aqueles de 18 a 26 anos
UM LABORATÓRIO A CERCA nos Estados Unidos e no Japão, mais de metade afirmou não
DE 1 HORA DE CARRO a no- ter consumido álcool nos seis meses anteriores, de acordo
roeste de Londres, o químico com o instituto de pesquisa IWSR. Num estudo separado da
Matthew Coulshed derrama Gallup Poll, 62% dos adultos americanos com menos de 35
um líquido cor de vinho forte anos disseram que bebem, ante 72% dez anos atrás.
em um grande jarro plásti- “A rápida mudança está sendo impulsionada por uma ge-
co. Frascos com minibotões ração que realmente questiona tudo”, afirma David Orren,
de rosa, manjericão santo e CEO da Gaba Labs, cujo produto, Sentia, está disponível em
outras ervas ficam na ban- duas variedades, vermelha e preta, em 15 países. “Eles leem
cada, prontos para ser pro- tudo, verificam tudo e querem saber tudo o que contém.”
cessados. Ele está mexendo Como diz Orren, o Sentia não é o carro-chefe da Gaba
nos ingredientes do Sentia, Lab. Seu cofundador, o cientista David Nutt, passou déca-
uma bebida destilada à base das desenvolvendo um substituto do álcool totalmente
de plantas e sem álcool, que sintético chamado Alcarelle, que é ainda mais eficaz na
promete proporcionar “aque- criação de um burburinho agradável sem nenhuma des-
la sensação de dois drinques”, vantagens. Seu objetivo final é vender o composto a outros
melhorando o humor de uma fabricantes de bebidas alcoólicas. Mas antes que isso acon-
pessoa e tornando-a extro- teça, eles precisam arrecadar aproximadamente 15 milhões
vertida e falante, sem as desa- de libras (19 milhões de dólares) para submeter o Alcarelle
gradáveis espirais de ansieda- ao processo de aprovação da FDA americana.
de, dores de cabeça e náuseas A formulação do Alcarelle está envolta em segredo, mas
que a bebida alcoólica pode os ingredientes ativos do Sentia estão listados no frasco e
trazer. Além disso, contém incluem extratos botânicos, como magnólia e tília, muitos
apenas nove calorias por por- dos quais já são conhecidos por terem propriedades rela-
ção, bem como vitaminas.
A Gaba Labs é uma entre
várias startups que surgiram UM DÁ MAIS SEDE QUE O OUTRO
em resposta a uma maior Expansão anual das vendas dos mercados de bebidas
conscientização sobre os da- destiladas nos Estados Unidos (em %)
nos que o consumo de álcool
representa: os jovens preocu- 100%
pados com a saúde estão be-
bendo menos do que os mil-
lennials ou os baby boomers
quando tinham a mesma 50%
idade. Com um valor de ven- Destilados
sem álcool
das global inferior a 1 bilhão
de dólares, as bebidas sem
Destilados
álcool representam apenas 0%
uma fatia do mercado de be-
bidas alcoólicas, avaliado em
650 bilhões de dólares, mas 2019 2020 2021 2022 2023 2024(1) 2025(1)
estão em franca expansão.
Elas deverão crescer cerca de (1) Previsão. Fonte: Euromonitor.

64 exame.com
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xantes. A Leilo, uma startup


Tradução de Anna Maria Dalle Luche
de Nova York, usa extrato de
uma planta conhecida como
kava, usada há centenas de
anos no Pacífico Sul por suas
propriedades psicoativas,
para preparar coquetéis não
alcoólicos prontos para beber
nos sabores pina colada, amo-
ra-preta, laranja, entre outros.
Os adaptógenos — nome
dado às ervas que podem ali-
viar o estresse ou a ansiedade
— ainda representam uma
pequena parcela do merca-
do de bebidas não alcoóli-
cas. E eles não estão isentos
de controvérsia. O Kratom,
derivado de uma planta en-
contrada no Sudeste Asiático

DIVULGAÇÃO
que produz um leve efeito
estimulante, causou preocu-
pações sobre suas proprieda-
des viciantes; alguns estados Sentia, da Gaba Labs: bebida sem álcool que
promete “aquela sensação de dois drinques”
americanos estão tentando
regulamentá-lo.
A Diageo, a Pernod Ricard
e outras empresas têm até
agora evitado substâncias garrafa de 700 mililitros de seu gim sem álcool nos
psicoativas não alcoólicas, Estados Unidos, o que equivale a cerca de 13 dólares a
apostando em especiarias e mais do que uma garrafa de Tanqueray, que também
plantas que dão sabor. A Dia- inclui impostos sobre o álcool.
geo, que fabrica versões não O cofundador da Lyre’s, Carl Hartmann, diz que 90%
alcoólicas do gim Gordon’s, de seus clientes desejam moderar o álcool ou as calorias,
comprou em 2019 uma par- em vez de eliminá-los completamente. Por exemplo,
ticipação majoritária na 100 mililitros de seu gim fake tem apenas dez calorias,
Seedlip, uma marca de bebi- em comparação com cerca de 200 do produto normal.
das não alcoólicas que fazia Os medicamentos para perda de peso, Ozempic e
parte de seu programa acele- Wegovy, representam um desafio para os fabricantes
rador, a Distill Ventures. de bebidas não alcoólicas, pois parecem aliviar a atra-
Dados compilados pela ção de substâncias viciantes, incluindo o álcool. As em-
Euromonitor mostram que presas focadas no mercado americano estão em maior
o preço médio por litro de risco, segundo uma pesquisa da Morgan Stanley, que
bebidas não alcoólicas, de prevê queda de 2% no consumo até 2035.
38 dólares, excede agora o Mas, de acordo com Hartmann, a rotulagem de calo-
das opções alcoólicas — su- rias já está conscientizando e afastando os consumido-
gerindo que podem ser mais res. (Na Europa, alguns produtores começaram volunta-
lucrativas para as empresas. riamente a imprimir essa informação nos rótulos, mas
A Lyre’s, empresa britânica os reguladores poderão em breve tornar esse passo obri-
de quatro anos e meio, cobra gatório.) Hartmann diz: “Não creio que as pessoas tives-
cerca de 35 dólares por uma sem qualquer noção sobre as calorias vazias do álcool”.

janeiro de 2024 65
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A FREADA
KEITH NAUGHTON, DA BLOOMBERG BUSINESSWEEK

DOS VEÍCULOS
ATÉ POUCO TEMPO ATRÁS, A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA DOS ESTADOS
UNIDOS PREVIA UM FUTURO 100% SEM COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS. OS DESAFIOS
DOS MOTORES MOVIDOS A ENERGIA LIMPA FIZERAM OS PLANOS DERRAPAR

ELÉTRICOS
QUANDO O ANTIGO HYUNDAI
DE DEBBIE METTENLEITER
precisou ser substituído depois de ro-
dar 320.000 quilômetros, ela decidiu
embarcar no movimento dos veículos
elétricos (VEs). Afinal, os Teslas pare-
ciam estar em todos os semáforos de Foi quando ela desistiu da reserva
San Diego, onde ela mora. Até a filha do Tesla e, em vez disso, comprou um
dela tem um. Então ela fez um depó- SUV Hyundai Kona 2022, com um mo-
sito de reserva de 250 dólares para tor tradicional de combustão interna.
um Tesla Model Y. “Eu queria um veículo em que pu-
Depois, ela começou a conversar desse simplesmente entrar e fazer
com amigos sobre suas experiências uma viagem sem precisar me preo-
com veículos elétricos e a dificuldade cupar com abastecimento”, diz ela.
que tinham para acessar confiáveis “Simplesmente não estou pronta
estações de carregamento. Ela tam- para encarar as dificuldades de recar-
bém não gostou do banco de trás do ga desses veículos.”
Model Y da filha para passear com o Há um ano, os VEs agitaram o mun-
neto. “Eu batia a cabeça todas as ve- do automobilístico, e parecia que um
zes”, diz Debbie, de 67 anos, assisten- futuro totalmente elétrico estava
te executiva aposentada. próximo. Mas os compradores de au-
tomóveis de hoje estão repensando
esses veículos, provocando um curto-
-circuito no crescimento das vendas e
COM CONTEÚDO fazendo com que os modelos plug-in
se acumulem nos pátios das conces-
sionárias. Os fabricantes de automó-
veis, que nesta década estão investin-

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PATRICK PLEUL/POOL/AFP/GETTY IMAGES

Model Y, da Tesla: clientes incomodados


com o acesso escasso a estações de recarga

janeiro de 2024 67
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do mais de 100 bilhões de dólares no veículos elétricos, e executivos e polí-


desenvolvimento de veículos elétricos, ticos do setor automotivo estão ansio-
agora estão reduzindo preços, produ- sos para recuperar o atraso para que o
ção e previsões de lucro para os novos país não perca a corrida da tecnologia
veículos verdes. O estoque de mode- de transporte. Mas a maioria dos con-
los movidos a bateria nos pátios das sumidores americanos não concorda.
concessionárias mais que dobrou no Os VEs continuam muito caros, com
ano passado, atingindo um recorde de preço médio de 60.544 dólares — cer-
fornecimento de 114 dias no início de ca de 13.000 dólares mais do que um
dezembro, em comparação com 71 dias carro movido a gasolina, de acordo
da indústria automobilística em geral, com a empresa especializada em pes-
de acordo com a empresa de pesquisas quisas automotivas Edmunds. Esse
Cox Automotive. prêmio tornou-se ainda mais doloro-
A situação piorou tanto que um so à medida que as taxas de juro dos
grupo nacional de quase 4.000 reven- empréstimos para a aquisição de au-
dedoras de automóveis que se autode- tomóveis dispararam. Além do custo,
Elon Musk: a
nomina “A Voz do Cliente VE” escreveu muitos consumidores consideram os política de
ao presidente Joe Biden em novembro, VEs demasiadamente arriscados se fi- baixar preços
pedindo-lhe que “pisasse no freio nas carem sem bateria e sem nenhum car- dos veículos da
Tesla acirrou a
irrealistas legislações governamen- regador à vista — uma preocupação concorrência
tais” para veículos elétricos, que sua conhecida na indústria de VE como
administração deseja que representem “ansiedade de autonomia”.
mais da metade de todas as vendas de O crescimento anual das vendas de
automóveis nos Estados Unidos até veículos elétricos nos Estados Unidos
2030, ante cerca de 7% em 2023. atingiu 60% em 2022, mas aumentou
Em vez disso, compradores de auto- apenas 47% em 2023 e deverá subir
móveis estão migrando para os híbri- apenas 11% neste ano, de acordo com
dos — veículos movidos a gasolina e uma previsão do UBS Group. A Ford
eletricidade que existem há um quar- cortou pela metade seus planos de
to de século —, que as concessionárias produção em 2024 de sua picape plug-
têm dificuldade de manter em esto- -in F-150 Lightning, seu VE exclusivo.
que. A Toyota Motor, a Ford Motor e A General Motors também está atra-
outras estão aumentando a produção sando a produção de veículos elétri-
de híbridos para atender a demanda. cos muito aguardados, como o SUV
Enquanto isso, os veículos tradicionais Chevy Equinox e a picape Silverado.
com motor a combustão continuam Elon Musk repetidamente reduziu o
gerando grandes negócios, represen- preço dos modelos Tesla em 2023. Isso
tando mais de oito de cada dez vendas desencadeou o que o CEO da Ford,
de automóveis nos Estados Unidos. Jim Farley, chamou de “guerra de pre-
Os Estados Unidos ficaram atrás ços” de VE, o que levou sua empresa
da Europa e da China na adoção de e outras a também reduzirem o que

PÁTIOS CHEIOS DE 120


CARROS ELÉTRICOS
Duração estimada dos
estoques de veículos nas 90
concessionárias americanas
à espera de interessados
(em dias) 60
Total de veículos
Veículos elétricos
30
Fonte: Cox Automotive. Os números excluem Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out
os carros das montadoras Tesla e Rivian,
cujas vendas são apenas por lojas próprias. 2022 2023

68 exame.com
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estavam cobrando. Os movimentos de Musk quiriam um carro extra para a família porque
diminuíram, mas não impediram perdas de queriam a tecnologia mais recente. Agora que
participação de mercado que exerceram um os primeiros adotantes estão saciados, os com-
significativo impacto nas margens de lucro. pradores convencionais que dependem de seus
“Tudo mudou muito rapidamente”, diz carros como veículo diário consideram os VEs
Mickey Anderson, um revendedor de automó- “mais caros e menos úteis”, afirma Anderson.
veis que viu longas listas de espera por veículos “Precisamos de uma rede de carregamento
elétricos evaporarem enquanto modelos mo- mais confiável”, diz Anderson, observando que
vidos a bateria se acumulavam em suas con- há apenas uma estação de carregamento no
cessionárias em Oklahoma, Kansas e Colorado. trajeto de 320 quilômetros que ele faz sema-
O que mudou, dizem os executivos e ana- nalmente entre seus escritórios em Omaha e
listas do setor, é que a corrida inicial de com- Kansas City. “As pessoas precisam ter confian-
pradores consistia em motoristas ricos que ad- ça de que podem levar seus filhos à consulta

ORDAN VONDERHAAR/BLOOMBERG/GETTY IMAGES

janeiro de 2024 69
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médica, que podem chegar ao traba- que, na verdade, não existe uma “de-
lho na hora certa e que podem usar manda intrínseca” de VEs, devido ao
esse veículo nas férias.” seu alto preço e às limitações de car-
Não é apenas a rede de carregamen- regamento. “Pouquíssimas pessoas
to que não é confiável. Os VEs tiveram querem gastar 55.000 dólares para ter
80% mais problemas do que os carros motivos de preocupação.”
com tradicionais motores a combus- Certamente, o fundo do poço não é o
tão interna, de acordo com a última abandono do mercado de VEs. As ven-
pesquisa da revista Consumer Reports. das de veículos movidos a bateria ain-
Os proprietários de veículos elétricos da crescerão a um ritmo mais rápido
relataram mais problemas com a bate- do que o mercado automobilístico glo-
ria e sua capacidade de recarregar. bal neste ano, preveem fabricantes de
“Isso não tem nada a ver com os automóveis e analistas independen-
carregadores em campo. Trata-se es- tes. Mas o otimismo inebriante sobre
pecificamente de um problema com um VE em cada garagem esbarrou no
o veículo que não aceitava o carrega- pragmatismo dos principais compra-
mento”, diz Jake Fisher, diretor sênior dores. Até que vejam preços mais bai-
de testes automotivos da Consumer xos e mais carregadores em seu trajeto
Reports. “É como se você não conse- diário — duas questões para as quais
guisse colocar gasolina no carro. Isso a indústria automotiva e o governo
é um problema, um grande problema.” dos Estados Unidos estão dedican-
Isso ajuda a explicar por que mais do bilhões de dólares para melhorar
da metade dos compradores de auto- —, continuarão com os seus veículos

75%
DESINTERESSE
PELOS ELÉTRICOS
Fatia de consumidores 50%
americanos que disseram não
ter interesse em carros
movidos a eletricidade 25%

Fonte: estudo de experiência de


novos veículos da Strategic Vision.
0%
John Farley,
2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023 CEO da Ford:
combustão interna
continua gerando
grandes negócios,
representando
mais de oito de
cada dez vendas de
automóveis nos EUA
móveis americanos dizem agora que tradicionais e os postos de abasteci-
não estão interessados em veículos mento conhecidos.
elétricos, ante apenas 42% que des- “Sei que há um posto de gasolina a
cartaram modelos movidos a bateria cada poucos quilômetros”, diz Debbie,
Tradução de
em 2022, de acordo com um estudo proprietária do Hyundai Kona, “e, para Anna Maria
com 250.000 compradores de auto- mim, isso nunca será um problema”. Dalle Luche
móveis nos Estados Unidos feito pela Os VEs também acabaram na mira
empresa de pesquisa da indústria au- das guerras culturais, outro obstácu-
tomotiva Strategic Vision. lo para quem busca um automóvel.
“Nos últimos meses, tem havido Os carros plug-in são fundamentais
uma forte resistência, com mais pes- para os planos de Biden para comba-
soas dizendo que não têm absoluta- ter as alterações climáticas. Sua em-
mente nenhum interesse em comprar blemática Lei de Redução da Inflação
um VE”, diz Alexander Edwards, presi- oferece uma série de créditos fiscais
dente da Strategic Vision. Ele afirma ao consumo e bilhões de dólares em

70 exame.com
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PETER FOLEY/BLOOMBERG/GETTY IMAGES


incentivos à produção para estimular a pro- “Os estados azuis [democráticos] dizem que
cura pelos VEs. A Agência de Proteção Am- os VEs são excelentes e que precisamos ado-
biental de Biden propôs restrições às emis- tá-los o mais rapidamente possível, por mo-
sões de gases de efeito estufa que exigiriam tivos climáticos”, disse Bill Ford, presidente
que dois terços dos novos veículos de passa- executivo da Ford e bisneto do fundador Hen-
geiros fossem totalmente elétricos até 2032. ry Ford, numa entrevista em outubro ao New
Mas, enquanto Biden hesita em se manter na York Times. “Alguns dos estados vermelhos
Casa Branca, o ex-presidente Donald Trump [republicanos] dizem que isso é igual à vaci-
chama o plano de Biden de “uma ridícula far- na e que está sendo enfiado goela abaixo pelo
sa sobre carros totalmente elétricos” e ressal- governo, e não queremos isso. Nunca pensei
ta que os VEs matarão empregos e tirarão as que veria o dia em que nossos produtos se-
montadoras americanas do mercado. riam tão fortemente politizados, mas são.”

janeiro de 2024 71
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TECNOLOGIA

CHRISTINA LEE/BLOOMBERG BUSINESSWEEK

72 exame.com
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Por muito tempo, a empresa liderada por
Tim Cook pareceu alheia à tensão entre
os Estados Unidos, onde foi fundada, e a China,
onde está boa parte de seus fornecedores —
e um número crescente de consumidores.
Ao que tudo indica, o período de paz acabou
AA
NENHUMA EMPRESA AMERICANA DE TECNOLOGIA
APOSTOU TÃO FORTEMENTE como a Apple na interdepen-
dência econômica entre China e Estados Unidos. A Apple precisa de
trabalhadores chineses para fabricar seus iPhones e de consumi-
PPL
dores chineses para comprá-los. Isso parece tornar a deterioração
da relação entre as duas superpotências globais particularmente
perigosa para a empresa e para o seu CEO, Tim Cook, responsável
pela decisão da Apple de terceirizar a produção para a China muito
antes de assumir de Steve Jobs a posição de topo em 2011.
Mas, até recentemente, a guerra comercial entre EUA e China,
que começou durante a Presidência de Donald Trump e se inten-
EN

sificou durante a gestão de Joe Biden, pouco conseguiu desacele-


rar a empresa. Claro, Biden lançou uma campanha agressiva para
impedir a China de desenvolver semicondutores avançados e cha-
mou o presidente chinês Xi Jinping de “ditador”, e Xi prosseguiu
com uma estratégia para limitar a de-
pendência da China da tecnologia fa-
bricada no Ocidente — mas nada dis-
AL

MAX CHAFKIN, so parecia importar. A Apple registrou


DA BLOOMBERG cerca de 73 bilhões de dólares em re-
BUSINESSWEEK ceitas na região que chama de Grande
China — que inclui suas operações em
Taiwan e Hong Kong — em 2023, aci-
ma dos 32 bilhões de dólares em 2014.
INH

Os negócios desaceleraram na China


em 2023, mas não tão rapidamen-
te como em outros lugares. Cerca de
19% da receita da Apple veio do país
no ano fiscal encerrado em setembro,
um pouco acima de 2022.
AC

Embora a empresa tenha flutuado


acima do tumulto geopolítico, a Apple
entra em 2024 correndo o risco de ser
arrastada para ele. Isso seria um mau
presságio para outras empresas ame-
ricanas que enfrentam uma crescente
pressão de Pequim, sob a forma de
RUZ

regulamentações e de concorrência
revigorada de empresas nacionais
que os decisores políticos chineses há
muito procuram impulsionar.
Em setembro, agências governa-
mentais chinesas em algumas cida-
des disseram aos funcionários que
não podiam mais levar seus telefo-
ADA

nes Apple para o trabalho, como par-


te de um plano maior para manter
o iPhone fora dos escritórios esta-
COM CONTEÚDO tais. Em dezembro, várias empresas
apoiadas pelo Estado e departamen-
tos governamentais, em pelo menos
oito províncias, tinham instruído

janeiro de 2024 73
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TECNOLOGIA

seus funcionários a utilizarem aparelhos fabricados por


marcas locais, um grande avanço na campanha, infor-
mou a Bloomberg News. As autoridades chinesas respon-
A FATIA DE
deram ao relatório inicial sobre as novas restrições obser-
vando que o país não proibiu os telefones fabricados pela MERCADO
Apple ou outras empresas estrangeiras, mas também se
referiram indiretamente a “incidentes de segurança rela- DA HUAWEI
tivos aos telefones da Apple”.
A Casa Branca descreveu as restrições de setembro como
“retaliação agressiva e inadequada”. Cook pareceu minimi-
NA CHINA
zar o relatório em uma entrevista à CBS News, observando
que não viu nenhuma mudança oficial na política. CRESCEU
Os usuários chineses de smartphones poderiam ter ig-
norado a proibição se não fosse por um segundo fator:
os avanços tecnológicos das empresas chinesas. A China
DE 11%
vem tentando expulsar a Apple do mercado doméstico de
smartphones há mais de uma década, geralmente sem su-
PARA 24%
cesso, diz James Lewis, ex-diplomata dos Estados Unidos
que hoje é vice-presidente sênior do Centro de Estudos Es- DESDE 2022
tratégicos e Internacionais. “O que mudou é que existem
alguns telefones chineses muito bons”, diz ele.
Em agosto, a Huawei Technologies anunciou um apa-
relho que é comparável a um iPhone 15 Pro Max topo de
linha. O novo dispositivo, o Mate 60 Pro, representa um re-
torno para a Huawei, que ultrapassou brevemente a Apple
nas vendas de smartphones em 2019, antes de ser excluída
do mercado de telefones de última geração. Trump insti-
tuiu controles de exportação em 2020, proibindo a Huawei
de adquirir chips avançados de fornecedores globais, in-
cluindo a Taiwan Semiconductor Manufacturing (TSMC),
líder do setor. Essas restrições fizeram com que a Huawei
ficasse sem chips de última geração e sua participação no
mercado despencasse em 2021 e 2022.
O Mate 60 Pro não usa chip TSMC. Ao contrário, funcio-
na com um fabricado pela Semiconductor Manufacturing
International Corp. (SMIC), empresa apoiada pelo Estado
com sede em Xangai. Em 2020, os melhores chips da SMIC
baseavam-se em um processo de 14 nanômetros — o que os tornava anos atrasados
em relação aos mais modernos. (Em chips, uma medição mais baixa significa um
processador mais rápido e eficiente; os telefones Apple mais poderosos usam chips
de 3 nanômetros.) Agora a SMIC é capaz de fabricar chips usando um processo de 7
nanômetros, uma tecnologia quase de última geração que a coloca um pouco mais
próxima da paridade com os processos usados pela Apple.
A participação de mercado da Huawei no segmento de telefones topo de linha
já disparou, de 11% em 2022 para 24% durante o terceiro trimestre de 2023,
segundo a empresa de pesquisas IDC. O sucesso do novo telefone levou a IDC
a reduzir sua previsão para as vendas da Apple na China em 2024, diz Nabila
Popal, diretora de pesquisa da empresa. “O sucesso da Huawei tem um impacto
mais significativo no crescimento da Apple na China”, diz ela.
A Apple ainda tem uma enorme base de fãs na China, e em dezembro
havia longas filas na loja principal da empresa em Pequim, enquanto os
compradores esperavam para adquirir seus novos iPhones. A Apple tem
procurado reiterar seu compromisso com o país, salientando que sua ca-
deia de abastecimento emprega cerca de 5 milhões de pessoas na China.
Durante uma visita a Pequim em março, Cook fez um discurso elogiando
a relação “simbiótica” da Apple com a China.
Tradução de
Anna Maria
Nos bastidores, porém, Cook parece estar tentando se proteger em meio
Dalle Luche à retórica cada vez mais hostil entre China e Estados Unidos e às preo-

74 exame.com
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LEANDRO FONSECA

Tim Cook, CEO da Apple:


liderança em meio a
escrutínio crescente
do governo chinês

dindo ou planejando novas fábricas


na Índia, onde a Apple também está
ansiosa para vender mais aparelhos.
A diversificação da cadeia de abas-
tecimento parece, pelo menos em
parte, uma sensata tentativa de re-
duzir a exposição da Apple a adversas
reações geopolíticas. Mas pode pro-
vocar o efeito oposto. A Apple é um
importante empregador na China, e
a repressão do governo aos iPhones
pode ser vista como um alerta sobre a
transferência de empregos para fora
do país. Em novembro, a principal
executiva da Apple na China, Isabel
Ge Mahe, ofereceu o que parecia ser
uma resposta: uma rara entrevista à
mídia estatal em que elogiou os fa-
bricantes chineses por desempenha-
rem um papel crítico na cadeia de
abastecimento da empresa.
VCG/GETTY IMAGES

Se sua entrevista foi concebida


para acalmar as tensões, pode não ter
sido suficiente. Novas restrições às
empresas apoiadas pelo Estado surgi-
Fábrica da Apple na China: concorrência
acirrada de celulares locais
ram no mês seguinte, ameaçando iso-
lar a Apple de cerca de 80 milhões de
pessoas que trabalham em empresas
pertencentes ao governo — no mo­
mento em que os concorrentes chi­
neses oferecem alternativas cada vez
cupações acerca dos perigos de concentração da cadeia de abaste- mais confiáveis ao mesmo grupo. “Os
cimento levantadas pelas restrições da covid-19, bem como pelos telefones da Apple ainda são os me-
violentos protestos em uma fábrica de iPhone no final de 2022. A lhores do mercado”, diz Lewis. “Mas
Apple intensificou seus esforços para transferir parte da produção todos os anos a margem aperta.”
para a Índia e o Sudeste Asiático. Fornecedores como o Grupo Fox- — Com Yuan Gao, Jane Lanhee Lee e
conn Technology, de Taiwan, e o Grupo Tata, da Índia, estão expan- Debby Wu.

janeiro de 2024 75
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INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

A viagem de ácido da IA
OS SERVIÇOS DE CRIAÇÃO DE IMAGENS ALIMENTADOS POR INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, COMO MIDJOURNEY E DALL-E,
ESTÃO AMPLIANDO O HORIZONTE DE DESIGNERS AO REDOR DO MUNDO — E PRODUZINDO RESULTADOS SURREAIS

COM CONTEÚDO

76 exame.com
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AUSTIN CARR, DA
BLOOMBERG BUSINESSWEEK
O DESIGNER COLIN DUNN GOSTA QUANDO SERVIÇOS DE
CRIAÇÃO DE IMAGENS ALIMENTADOS por inteligência ar-
tificial, como Midjourney e Dall­E, da OpenAI, parecem
estragar tudo e produzir algo aleatório, ao responderem A startup de Dunn, a Visual Electric, desenvolveu
a um pedido de imagem de um grupo de pessoas ca­ uma nova interface de rede para aproveitar esse pro­
minhando juntas com a representação de uma única cesso. Os geradores de texto para imagem geralmente
figura afastada para longe. Isso faz Dunn se lembrar de exibem imagens únicas em uma janela de bate­papo,
experimentar com um colega de trabalho uma porção mas, no aplicativo de Dunn, as saídas são salvas em
de ideias estranhas antes de encontrar a certa. linhas e organizadas ao lado ou abaixo daquela que es­
tão modificando, criando uma galeria de miniaturas.
O resultado é uma colagem de rascunhos que permite
aos usuários explorarem várias ideias criativas com
base em como a IA interpretou suas sucessivas solici­
tações, para melhor ou para pior.
O objetivo do fluxo de trabalho é inspirar uma “ex-
ploração ampla e confusa”, diz Dunn, ex-designer do
Dropbox e do Facebook, cuja startup com sede em
Sausalito, Califórnia, é apoiada pela Sequoia Capital.

PATRICK KYLE/BLOOMBERG BUSINESSWEEK

janeiro de 2024 77
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INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Sua empresa está menos focada em alcançar o resultado


esperado com o menor número de cliques possível do que
em deixar a IA correr solta de maneiras surpreendentes.
Existem ferramentas para reescrever automaticamente
prompts com descrições mais incomuns, alterar a estética
com humor e ajustar a liberalidade com que o computa-
dor interpretará suas palavras.
Em outras palavras, parte do objetivo da Visual Elec-
tric é encorajar “alucinações”, o termo pseudocientífico
para sistemas de IA que se envolvem em seus próprios
dados de treinamento e inventam coisas. Os engenhei­
ros têm tentado impedir que os chatbots tenham aluci­
nações muito antes do lançamento público do ChatGPT, extremo” sobre seus produtos de IA voltados para o consu-
no final de 2022, mas o chatbot e outros semelhantes midor. “O grande problema deles é: ‘E se eu lançar essa coisa
ainda tendem a misturar “fatos” fabricados em respostas e ela vomitar bobagens? Isso pode prejudicar nossa marca,
às perguntas dos usuários. Por exemplo, quando ques- nossas ações e ser muito ruim para o mundo’”, explica.
tionado sobre a inflação num segmento do programa 60 Devido à complexidade da moderna IA, os especialistas
Minutes, o Bard, do Google, inventou uma série de livros não têm certeza se esse problema poderá ser totalmente
de economia que pareciam reais, repletos de resumos resolvido. Então, novamente, talvez nem todos os proble-
falsos. Depois de integrar a tecnologia OpenAI, o Bing mas precisem ser corrigidos. “Às vezes as alucinações são
se envolveu em algumas desastradas trocas nas quais características reais; isso se chama criatividade e às vezes
ameaçou chantagear e professou amor aos primeiros re- é um bug”, disse recentemente o CEO da Microsoft, Sa-
visores. A natureza realista e imprevisível dessas respos- tya Nadella, quando questionado sobre as consequências
tas deu a impressão não apenas de que os robôs tinham dessa falha. “Estamos todos tentando melhorar a forma
ideias próprias, mas de que já as estavam perdendo. como poderemos aperfeiçoar isso.”
Se as pessoas vão confiar em grandes modelos de lin- No próximo ano, um número crescente de desenvolve-
guagem como aquele que alimenta o ChatGPT para pes- dores pretende aproveitar a magia desses erros e fanta-
quisas online, redação de ensaios ou outras aplicações, sias. Dunn compara isso às maneiras, às vezes, arriscadas
essas alucinações são um potencial obstáculo. Enquanto como alguns seres humanos têm procurado usar produ-
o público enlouquecia com a IA em 2023, a torturada re- tos químicos para explorar seus impulsos artísticos. “Uma
lação da tecnologia com os fatos inspirou inúmeras pro-
clamações de que confabular com computadores poderia
ameaçar a própria ideia da verdade.
A tendência de um sistema de IA de ter alucinações
tornou-se uma referência de desempenho. A Galileo, uma
empresa que ajuda clientes corporativos a ajustar seus
aplicativos generativos de IA, introduziu um Índice de
Alucinação, que classifica a correção dos sistemas de IA de
empresas como Hugging Face, Meta Platforms e OpenAI.
O CEO da Galileo, Vikram Chatterji, afirma que as empre-
sas em setores que vão desde finanças até cuidados com a
saúde estão particularmente interessadas em ter “controle

78 exame.com
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viagem de LSD é uma metáfora muito adequada”, brinca
ele. “Se o modelo fizer exatamente o que você pediu, en­
tão não é realmente um parceiro criativo.”
Anastase Germanidis, diretor de tecnologia do unicórnio
de texto para vídeo Runway AI, diz que é necessário algum
grau de “fundamentação” — um clipe solicitando um gato
precisa apresentar um gato, não um cachorro —, mas que
sua equipe não quer sufocar resultados fantásticos. Para
solicitações mais curtas, Germanidis diz que a Runway às
vezes preenche as lacunas, “dando mais liberdade ao mode­
lo para imaginar os atributos que estão faltando ou que o
usuário não fornece especificamente”.
Ele também descobriu que profissionais criativos estão Outros desenvolvedores estão tentando limitar seus sis­
brincando com o programa, fornecendo instruções com­ temas de IA com o que equivale à microdosagem. A Inworld
plexas para suscitar visões surreais. O diretor Paul Trillo, AI, que ajuda desenvolvedores de videogames a construir
por exemplo, criou um curta­metragem aclamado na personagens de computador interativos, desenvolveu um
Runway que se inclinava para os efeitos mais psicodélicos recurso de “quarta parede” para restringir os modos como
do motor, com cenas de metrô afundando e traços faciais os personagens reagem a um jogador humano. Esses perso­
se movendo como massa de modelar. As falhas foram o que nagens de IA são alimentados com traços de personalidade,
o tornou tão fascinante. Em entrevista à New Yorker, que emoções, memórias e ambições, que podem levar a com­
descreveu o filme, intitulado Obrigado Por Não Responder, portamentos intrigantes e únicos. Mas Kylan Gibbs, cofun­
como “parte Edward Hopper e parte David Lynch”, Trillo dador e chefe de produto, diz que, se eles saírem muito do
disse que a IA fez escolhas cinematográficas que ele não roteiro, isso pode arruinar a imersão. Um bot em um jogo
teria feito e que “parecia ser capaz de voar em um sonho”. Star Wars deveria ser capaz de inventar uma história pes­
soal sobre seu planeta natal, mas não negar erroneamente
que Darth Vader é o pai de Luke Skywalker. “Há um equilí­
brio entre as alucinações que estão expandindo o mundo e
as que estão destruindo o mundo”, diz Gibbs.
Não obstante, ele observa que alguns desenvolvedores es­
tão desativando o recurso da quarta parede, especialmen­
te em jogos menores do tipo Dungeons & Dragons, onde o
universo não é ditado por décadas de cânone narrativo. Ele
também viu criadores de jogos desmarcarem o cenário no
processo de produção e usarem alucinações para inventar
novas histórias e missões paralelas. “Você tem um redator
que diz: ‘Tenho uma ideia aproximada para este mundo.
Vou apenas criar os personagens, começar a conversar com
eles e ver o que acontece’”, diz Gibbs.
Assim, não é tanto que a tolerância à alucinação esteja
mudando, e sim a sua definição. Os tipos criativos falam
sobre isso mais no sentido antropomórfico do que como
uma máquina que fabrica falsidades. Soluços durante
o processamento de uma música ou uma campanha de
marketing gerada por máquina podem ser exatamente o
que o usuário estava procurando.
Dunn, da Visual Electric, se depara com isso com fre­
quência ao gerar gráficos de IA. Com instruções cada vez
mais longas, o computador eventualmente se desvia de
suas intenções. “A primeira reação é pensar: ‘Isso é terrí­
vel, isso é a coisa errada’”, afirma Dunn. Mas, então, de­
pois de olhar para o gráfico por alguns minutos, muitas
vezes percebe­se que o computador está certo.

Tradução de
Anna Maria
Dalle Luche

janeiro de 2024 79
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CONSUMO

Edição 2024 da feira da


NRF, em Nova York: mais
de 40.000 visitantes
e 1.000 expositores

O CONTRA-ATAQUE

DO VAREJO FÍSICO
Abalado pela pandemia e pelo avanço digital,
o comércio tradicional investe em tecnologias como robôs
e sensores para reconquistar os consumidores

LEO BRANCO, DE NOVA YORK (ESTADOS UNIDOS)

Num ponto comercial em uma das esquinas mais Até recentemente, a tecnologia estava restrita a
valorizadas da 5a Avenida, a principal via de comér- gigantes como a Uniqlo e a Amazon. Em 2018, a va-
cio de Nova York, a loja da varejista japonesa Uniqlo rejista americana ganhou as manchetes do mundo
é, talvez, um dos exemplos mais emblemáticos de ao lançar a Go, uma loja na qual os clientes pagam
como o comércio de rua está investindo pesado em pelas compras sem tirar a carteira do bolso, graças a
tecnologia. Por ali, não há mais humanos com a fun- um sistema semelhante ao da Uniqlo. Na ocasião, o
ção de caixa. Os funcionários andam pelos quatro gigante fundado por Jeff Bezos falava em abrir 3.000
andares da loja dando as boas-vindas a quem está lojas no formato até 2021. A prática, porém, foi bem
passando, como é o costume no Japão, além de tirar diferente do planejado. Atualmente, são 43 lojas no
uma ou outra dúvida. Os clientes pagam sozinhos formato nos Estados Unidos e no Reino Unido. Em
pelas suas compras. Para isso, colocam roupas em março passado, a companhia cortou oito unidades
grandes caixas forradas com sensores de RFID, uma em meio a uma onda de demissões e medidas para
tecnologia para transmissão de dados via radiofre- cortes de custos. Enquanto isso, a tecnologia de self-
quência, além de câmeras para reconhecer o tama- -checkout foi ganhando espaço entre concorrentes,
nho e o peso dos produtos colocados ali. Um visor como as americanas Walmart e Kroger, que passa-
exibe o nome e o preço de tudo dentro da caixa. Se ram a adotar a tecnologia em algumas lojas.
o cliente tira algo, o visor automaticamente muda o Ao que tudo indica, o papo da automação nas
valor da compra. Basta o cliente colocar o cartão de compras deixará de ser só de executivos das grandes
crédito na maquininha e — voilà! — a compra está varejistas, para o bem de pequenos lojistas em busca
feita. Esse tipo de autoatendimento é chamado no de maneiras de competir com as grandes e também
jargão do varejo de self-checkout. O sistema adotado para o de consumidores. A tecnologia foi o destaque
pela Uniqlo virou o paradigma de ótima experiência da feira anual da NRF, a associação americana das
para o consumidor na boca do caixa — quem gosta varejistas, realizada em janeiro, em Nova York. Em
de ficar escaneando códigos de barras até descobrir três dias, 40.000 pessoas circularam pelos 310.000
o preço de um produto? metros quadrados do Javits Center, centro de con-

80 exame.com
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LEO BRANCO

venções às margens do Rio Hudson. É quase 20% ção, por exemplo, seis em cada dez executivos que-
acima da edição do ano passado, que já tinha batido rem implantar a tecnologia de RFID para ganhar
recorde de público. Além disso, 10% dos visitantes tempo na expedição de mercadorias que entram e
eram brasileiros. O país mandou a segunda maior saem de seus armazéns em algum momento nos
delegação, só atrás da americana. No meio da turma próximos quatro anos. É um aumento de 21 pontos
havia executivos de varejistas nacionais, como Pão percentuais em relação a uma pesquisa similar fei-
de Açúcar e Mercado Livre, e também muitos em- ta pela Zebra em 2022. Esta disposição deve elevar
preendedores. Entidades como o Sebrae montaram as vendas desse tipo de tecnologia no mundo para
missões com empresários de diversas regiões. 18,9 bilhões de dólares, alta de 67% sobre 2022. O
Há indícios de que uma revolução tecnológica número de sensores de RFID como os instalados na
está por vir no varejo tradicional. É o que mostra máquina de self-checkout da Uniqlo deve beirar 49
um estudo com 1.400 executivos do varejo condu- bilhões em 2031, quase o triplo do número mais re-
zido pela americana Zebra Technologies, uma das cente, de 2021: 18 bilhões.
principais fabricantes de tecnologias para o varejo, Grande parte das tecnologias de automação de
como sensores de RFID, câmeras e celulares capa- vendas à disposição na NRF está longe de ser uma
zes de reconhecer produtos dentro de um centro novidade. Os sensores de radiofrequência, por
de distribuição. A pesquisa realizada no fim de 2023 exemplo, remontam ao sistema de identificação
constatou que 73% dos entrevistados pretendem de aeronaves adotado pelas forças militares ame-
acelerar o cronograma de investimentos em tecno- ricanas e alemãs na Segunda Guerra Mundial. As
logia nos próximos anos. Em centros de distribui- câmeras de altíssima resolução em 3D, usadas para

janeiro de 2024 81
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CONSUMO

reconhecer objetos, como as mercadorias numa ba-


lança de caixa, já fazem parte do dia a dia de seto-
res como o de segurança pública. Os experimentos
com self-checkout começaram em 1986, numa loja
do supermercado Kroger em Atlanta, nos Estados
Unidos. Na época, o sistema era equivalente ao de
quiosques de autoatendimento comuns em super-
mercados no Brasil hoje em dia, no qual o cliente
ainda precisa escanear as compras.
Tudo isso na balança, por que o tema virou um
oba-oba entre os frequentadores da NRF em 2024?
Há três razões principais. A primeira está na respos-
ta do setor ao baque sofrido na pandemia. O abre e
fecha do comércio de rua levou muita gente para o
e-commerce. Pessoas de todas as idades, inclusive
idosos, ficaram acostumadas com inovações como
vídeos em 3D para checar o tamanho de um calçado
à venda na internet, por exemplo. Agora, com o fim
da pandemia e um cliente muito mais à vontade com
a tecnologia na hora de comprar, o varejo físico está
investindo como nunca em aparatos para melhorar
a experiência do cliente que está de novo circulando
por aí. Ou, então, para elevar a eficiência de proces-
sos, como a gestão de estoque, de modo a recuperar
margens operacionais em meio à concorrência acir-
radíssima entre tantos canais. Conceito de “Modern Store” da Zebra
Technologies: self-checkout para as massas
A segunda parte da explicação está na queda dra-
mática dos preços de algumas das tecnologias ado-
tadas pelo varejo. O valor do sensor de RFID instala-
do numa etiqueta da Uniqlo, por exemplo, caiu 80%

FOTOS: LEO BRANCO


na década passada, de acordo com estudo da consul-
toria McKinsey. Hoje, é possível encontrar uma tag
por 4 centavos de dólar. “No passado, o custo da tag
era tão grande que tornava inviável adotar a tecno-
logia em mercadorias de pouco valor”, diz Alessan-
dro Matos, gerente-geral para a América Latina da
Zebra. “Hoje em dia, o custo deixou de ser um em-
pecilho.” Fundada em 1969, nos arredores de Chica-
go, a Zebra aposta pesado no varejo tendo em men-
te crescer entre os negócios de pequeno porte. Na
NRF, a empresa de faturamento anual de 5 bilhões
de dólares levou o conceito de “Modern Store”, com
um self-checkout semelhante ao da Uniqlo, além de
aparelhos para leitura dos códigos de RFID, como
um celular adaptado que pode ser usado como um
dispositivo para processar a compra dos clientes ou
checar inventários num estoque. “É possível montar
uma loja inteligente com investimentos na casa dos
milhares de reais”, diz Vanderlei Ferreira, gerente da
empresa no Brasil. Por fim, as redes sociais trouxe-
ram muita gente nova para o varejo — vide a mul-
tiplicação de lojas online populares no TikTok. Essa
turma não apenas trabalha com clientes já dispostos
a comprar com toda essa parafernália como tam-
bém precisa deles para resolver problemas — erros
de expedição ou fraudes em centros de distribuição Robô da Apptronik, de
Austin (Texas): substituto de
—, ou ainda para fazer a gestão de estoque quando humanos em funções incômodas,
há pedidos de devolução de mercadorias. como carregar caixas pesadas

82 exame.com
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COM TECNOLOGIA,
O VAREJO DE RUA FLORESCE
Depois de bombar na pandemia, o
comércio eletrônico deve crescer num
ritmo mais módico nos próximos anos
8,1
As vendas no varejo 6,9
pelo mundo (em 5,2
trilhões de dólares)
Fatia das vendas do 22% 24%
comércio eletrônico 19%
(em %)
2021 2024(1) 2026(1)

foi o tamanho da queda no

80% preço das tags de RFID no


mundo na década passada.
Hoje, é possível encontrar
tags por 4 centavos de dólar

Ao mesmo tempo, puxado pela queda nos preços de


tecnologias como sensores de radiofrequência (RFID),
o varejo tradicional deve investir pesado em inovação
para conquistar os consumidores

Vendas de sensores Sensores


RFID no varejo instalados
(em bilhões de dólares) (em bilhões de unidades)
Vitrine de realidade 11,3 18,9(1) 18 49(1)
aumentada da startup
Zero10, do Chipre:
o cliente pode provar
a roupa, mesmo sem
o item em estoque

2022 2028 2021 2031

(1) Projeção. Fontes: Global RFID in Retail Market [2023-2030]


Research Reports World, Insider Intelligence/eMarketer,
McKinsey e Transparency Market Research.

Daqui para a frente, a concorrência entre provedo- em 2016, o Astro serve para desempenhar funções
res de tecnologias tende a colocar o tema ainda mais pouco confortáveis aos humanos num centro de
na ordem do dia de tomadores de decisão do varejo. distribuição, como carregar caixas muito pesadas
Entre as 1.000 empresas com algum estande na NRF ou subir escadas sucessivas vezes. Algumas tecno-
de 2024 estavam muitas startups dispostas a forçar logias ainda estão na fase de protótipo, com uma
mudanças ainda mais radicais no comércio. Um pa- vitrine capaz de mostrar em tamanho real uma
vilhão inteiro do Javits Center foi dedicado a elas. Ali, pessoa a milhares de quilômetros dali. A ideia é o
era possível encontrar soluções como uma vitrine cliente tirar dúvidas mais rápido do que por tele-
digital criada pela empresa cipriota Zero10. Fundada fone ou e-mail. É provável que algumas inovações
em 2020, ela usa realidade aumentada para captu- caiam em desuso com o tempo, mas uma coisa é
rar a fisionomia do cliente e, numa tela em tama- unânime entre quem circulou pela NRF deste ano:
nho real, reproduz a imagem do cliente sobreposta a a experiência de compra está passando por uma re-
qualquer peça de vestuário. É uma mão na roda para volução profunda e ainda sem data para acabar.
uma loja com pouco estoque. Ao lado dela estava
um robô humanoide chamado Astro. Desenvolvido O jornalista viajou a
pela Apptronik, startup criada em Austin, no Texas, convite da Zebra Technologies

janeiro de 2024 83
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EXAME AGRO
POR MARIANA GRILLI

BIOCOMBUSTÍVEIS

Da espiga
ao combustível
A produção de etanol de milho no
Brasil deve triplicar nos próximos
anos e agregar valor ao grão
e ao agronegócio nacional

Muito se fala da soja, cuja trajetória produ-


tiva espetacular das últimas décadas posi-
cionou o Brasil no mapa das exportações
mundiais. Mas outro grão teve um cres-
MAILSON PIGNATA/GETTY IMAGES

cimento extraordinário. De 1983 a 2023, a


produção de milho cresceu quase seis vezes
e se consolidou como coadjuvante de luxo
do agronegócio nacional. E a cultura vive
um novo momento, com a explosão do eta-
nol de milho, cuja oferta deve triplicar até

O milho no Brasil
A produção no país ganhou ritmo principalmente depois da liberação de sementes transgênicas
Produção Área plantada
(em mil t) (em mil ha)
2008: uso de cultivares 2015: início 24
140.000
transgênicas de milho liberado da produção
120.000 para comercialização no Brasil em Goiás 20
100.000 16
80.000
12
60.000
8
40.000
20.000 4

0 0
1983/84 1987/88 1991/92 1995/96 1999/2000 2003/04 2007/08 2011/12 2015/16 2019/20 2023/24

Década de 1980: criação do 2012: primeira produção de etanol 2017: inauguração da primeira usina
primeiro milho transgênico de milho no país, em Mato Grosso 100% exclusiva a etanol de milho

84 exame.com
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Da espiga
ao etanol
Produção brasileira
de etanol de milho
(em mil m 3) 6.000

Etanol total
Projeção 4.432

791,4
37
0
2012/13 2018/19 2022/23

Fonte: Unica.
2023/24 2030/31

grão — operação full. Há, ainda, a possibili-


dade de uma usina ter ambas as operações,
simultânea e paralelamente — flex-full.
Os dados da União Nacional de Etanol de
Milho (Unem) revelam que a produção está
estimada em mais de 6 milhões de metros
cúbicos para a safra 2023/24. Na tempora-
da 2013/14, esse dado foi de 37.000 metros
cúbicos. Evandro Gussi, presidente da União
da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioener-
gia (Unica), destaca que a quantidade atual
— de 4,1 milhões de metros cúbicos — re-
Lavoura de milho: a Conab estima que a colheita chegue presenta 20% do etanol total produzido no
a 117,6 milhões de toneladas na safra 2023/24
país. O restante vem da cana-de-açúcar. “En-
tendemos que até 2030 o etanol de milho
2030. Trata-se de um fenôme- Agricultura e Pecuária (Mapa) dobrará essa participação. Vamos falar de 12
no paralelo ao crescimento do mostram que o Brasil possui milhões de metros cúbicos”, ele projeta.
biodiesel e dos painéis solares, atualmente 24 usinas dedicadas A efervescência das novas plantas de eta-
que vem na esteira da agenda ao etanol do grão — 22 delas no nol de milho tem vários motivos. Segundo
de energia limpa e biocombus- Centro-Oeste. Há quem dedique Vinicius Damazio, especialista de mercado de
tíveis. Uma junção de fatores, as usinas de etanol de cana tam- etanol na Argus, “o etanol de cana está menos
do campo ao mercado externo, bém para a produção de etanol competitivo do que o de milho”, e uma das
vem contribuindo para que o de milho — operação chamada razões é que a cana-de-açúcar está em um
biocombustível tenha ficado flex. Em outros casos, as usinas momento de teto produtivo. “A cana está se
mais atrativo nas últimas déca- nascem 100% voltadas para o movimentando para buscar novos mercados,
das, dando sinais de um futuro além de o etanol de segunda geração, para o
promissor — e lucrativo. mercado externo, ser superpremiado. Nisso,
Em 2012, a Usimat foi a pri- A UNICA PROJETA vemos o etanol de cana deslocado para o ex-
meira empresa a processar eta- terior, enquanto o milho aumenta a compe-
nol de milho por aqui. Daí, en-
tão, a escalada começou. Dados
da Agência Nacional do Petró-
12 milhões
DE M³ DE ETANOL
titividade no mercado interno”, diz.
Além disso, pontua, o milho pode ser ar-
mazenado e processado posteriormente. Já
leo, Gás Natural e Biocombus- DE MILHO ATÉ 2030/31 a cana, uma vez colhida, não pode ficar ar-
tíveis (ANP) e do Ministério da mazenada. Nesse calendário, as usinas pre-

janeiro de 2024 85
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Exame agro
cisam moer a cana entre abril e novembro. Inpasa, produtor de etanol de segunda safra, deverá fortale-
De dezembro a março, sem a cana, que já foi milho e alimentação animal cer, ainda, o braço varejista da
moída, o volume de etanol cai e aumenta o com atuação no Centro-Oeste e 3tentos. No estado, há 12 usinas
risco de elevação no preço. O milho preen- no Paraguai. A companhia anun- de etanol de milho, concentradas
che justamente essa lacuna da entressafra. ciou no ano passado o aporte de no centro e no oeste. “A localiza-
Para fins de regulação de preço e flexibilida- 2,5 bilhões de reais na constru- ção da nova usina no extremo
de entre oferta e demanda, o cereal se mos- ção de uma planta de produção leste do estado deverá amenizar
tra mais vantajoso. “Se tem etanol de milho do etanol no Maranhão. Tam- a pressão competitiva com as
correndo o ano todo, você acaba quebrando bém a 3tentos, empresa com 12 usinas de etanol de milho já
essas noções que estão enraizadas na tra- capital aberto focada em grãos existentes”, afirmaram os analis-
ding brasileira. A competição no mercado e insumos agrícolas, anunciou tas do BTG, que no ano passado
interno de etanol está cada vez mais acirra- neste mês que investirá 1 bilhão publicaram um relatório mos-
da”, afirma o especialista da Argus. de reais até 2030 para entrar na trando que o milho destronaria a
atividade do etanol de milho, cana na produção de etanol.
com uma usina em Mato Grosso. De olho na proporção que o
CONSTRUÇÕES EM CAMPO Nas contas do BTG Pactual etanol de cereais pode tomar, a
Os números oficiais da ANP e do Mapa não (do mesmo grupo de controle da Be8, líder em vendas de biodie-
dão a real dimensão da velocidade que o EXAME), o custo de construção sel no Brasil e integrante da hol-
segmento de etanol do cereal ganha no de 3,2 reais por litro implícito ding ECB, quer se dedicar a essa
campo. Mas as instituições não levam em no investimento da 3Tentos em produção no Rio Grande do Sul.
consideração outros cultivos, além de cana Porto Alegre do Norte, em Mato O estado importa todo o etanol
e milho, para produção do etanol. Uma Grosso, é mais baixo do que o que utiliza, principalmente de
pesquisa realizada pela Argus constatou 15 que a São Martinho gastou re- São Paulo. O CEO Erasmo Carlos
novas plantas de etanol que usaram outras centemente em sua unidade de Battistella quer mudar essa rea-
matérias-primas que não a cana-de-açúcar processamento de milho, apesar lidade. “A unidade que estamos
ao longo de 2023. Vinicius Damazio diz que de compartilhar infraestrutura desenhando é uma unidade flex
o retorno sobre investimento nos projetos com a produção de uma usina para cereais. Nós acreditamos
de milho está mais rápido do que o da cana, de cana-de-açúcar. Para o ban- que, pelas características regio-
exatamente por causa dessa disponibilidade co, o beneficiamento do milho nais, a tendência é usar mais tri-
ao longo do ano, em diferentes safras. originado em Mato Grosso, onde go e triticale do que milho. Mes-
Ainda não constam na lista dos órgãos mais da metade das áreas culti- mo assim, o estado é um grande
federais investimentos como o do Grupo vadas com soja já cultiva milho produtor e consumidor de mi-
lho, e a unidade vai processá-lo
também”, diz. O aporte anuncia-

usinas de etanol do é de 556 milhões de reais no


município de Passo Fundo.

de milho No BRASIL 22 Usinas SEGUNDA SAFRA PARA


TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
Dados da ANP e do DAS 24 EM FUNCIONAMENTO Segundo a Agência Internacio-
Mapa mostram que ESTÃO LOCALIZADAS NO nal de Energia, o uso da bioener-
o Brasil possui CENTRO-OESTE gia terá de triplicar no planeta
atualmente 24 usinas
até 2030. O Brasil tem a capaci-
dedicadas ao etanol
6 TO dade de estar à frente da pauta
de milho, sendo 22
no Centro-Oeste. 1 por causa da extensão de terras
Hoje, outras dez MT agricultáveis, e esse é o ponto de
estão em construção 14 convergência entre agricultura e
GO 7 transição energética.
O plano do governo para re-
Usinas em operação MS cuperar pastagens estima trans-
(em unidades) 1
1 SP 1 formar cerca de 40 milhões de
Usinas em construção 1 hectares de áreas de baixa pro-
(em unidades) 1 PR dutividade em talhões de alto
Região Centro-Oeste rendimento — e o milho pode
RS ser um caminho. Renata Miran-
Fonte: ANP. da, secretária de Inovação e De-
1

86 exame.com
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os Estados Unidos sendo o maior produtor


de etanol de milho do mundo, cujo consu-
mo é o dobro do tamanho do Brasil, o mer-
cado nacional tem vantagens competitivas
— mas é preciso mostrá-las. O processo de
fabricação estadunidense conta com o uso
do vapor de gás natural, ou seja, emitindo
ainda gases poluentes. No Brasil, o Ministé-
rio de Minas e Energia esclarece que as usi-
nas utilizam fontes renováveis de energia,
como a biomassa do eucalipto, o que reduz
a pegada de carbono e faz parte do previsto
no Plano Combustível do Futuro. “A conso-
lidação do milho como matéria-prima vem
ao encontro dos desafios enfrentados pelo
setor de transportes, em seus diferentes
segmentos: rodoviário, aéreo e marítimo”,
diz o MME em nota. Daí surge, por exem-
plo, o potencial para atender à demanda de
combustível sustentável de aviação, cha-
mado de SAF.
A sustentabilidade pode ser o trunfo bra-
sileiro, inclusive pela ótica da maior partici-
pação dos setores envolvidos no Renovabio,
em busca dos créditos de descarbonização.
Ainda assim, as fontes ouvidas pela EXAME
reforçaram a necessidade de maior rastrea-
bilidade da espiga ao combustível, inclusive
para atender à demanda da Comissão Euro-
peia por zero desmatamento.
Outra crítica de países desenvolvidos
ganha corpo na discussão de comida ver-
sus combustível ( food X fuel, em inglês).
Na Europa, onde há limitação de área agri-
DIVULGAÇÃO

cultável, a competição para que o milho


seja dedicado a uma ou outra finalidade
preocupa as distintas cadeias produtivas.
No Brasil, não há esse risco — e deve ter
milho para todo mundo.
Evandro Gussi,
Mesmo o atual momento, com previsão
senvolvimento Sustentável do presidente da Unica: de quebra de safra para o milho, não deve
Mapa, diz que a pasta “tem visto “O etanol é bioenergia afetar o crescimento do etanol. No levanta-
tropical produzida com
esse aumento da importância sustentabilidade” mento de janeiro da Companhia Nacional
do milho dentro da matriz de de Abastecimento (Conab), a colheita para
etanol no Brasil”, o que deriva 2023/24 está estimada em 117,6 milhões de
de um amplo portfólio maior de neticamente modificadas, mais toneladas, redução de 10,9% em relação à
cultivares de milho, principal- resistentes a pragas e doenças. temporada anterior. Para Evandro Gussi,
mente para a segunda safra. Naquele ano, a produção era de da Unica, os investimentos são feitos pen-
Até o início dos anos 2000, o 58 milhões de toneladas. Na sa- sando no longo prazo, avaliando a série his-
Brasil não tinha tradição como fra encerrada em 2023, o país tórica de alta produção. “O etanol de milho
exportador de milho. Em 2008, colheu 131 milhões de toneladas não pressiona o desmatamento e não tem
uma mudança importante acon- — aumento de 124%. concorrência com os alimentos. Por isso di-
teceu: o uso de cultivares trans- A mudança de paradigma do zemos que é bioenergia tropical produzida
gênicas de milho foi liberado milho no campo, 15 anos atrás, com sustentabilidade”, afirma.
para comercialização no Brasil. agora permite ao setor vislum- Da espiga ao combustível, é mais uma
Isso significou, na época, a per- brar outros horizontes, fazendo etapa de valor econômico e sustentável ao
missão de adquirir sementes ge- inveja ao norte global. Mesmo agronegócio brasileiro.

janeiro de 2024 87
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OPINIÃO

A autocrítica é virtude rara na Faria Lima. Caminhando


por lá, só vejo CEOs de sucesso, empreendedores disrup-
tivos e investidores acima da média, num desafio lógico
à própria definição de média. Aplicação prática do efeito
Dunning­Kruger. “Unskilled and unaware of it”. Há um viés
cognitivo clássico em pessoas de limitada competência em
superestimar a própria capacidade. Atribuir­se aptidões
maiores do que se tem de fato é o caminho para o exces­
so de concentração e a alavancagem, cujas consequências
financeiras costumam ser desastrosas. Reconhecer as pró­
prias limitações dá o poder de permanecer no jogo, estimu­
la a paciência e permite colher os ganhos da diversificação.
É claro, no entanto, que a diferença entre o remédio e o
veneno é a dose. O excesso de autocrítica pode também ser
paralisante. Precisamos ser críticos sobre nossa autocrítica.
Se não formos capazes também de reconhecer nossas vir­
LEANDRO FONSECA

tudes e os poucos momentos em que temos alta convicção,


quando surgem as raras oportunidades de ir na jugular, per­
deremos boas chances.
Depois de severo exame e autorreflexão, descobri um ta-
FELIPE MIRANDA
lento: sou um sucesso em reconhecer rapidamente o próprio
Economista formado pela USP
e mestre em finanças pela FGV, fracasso. Estamos em janeiro e já posso sacramentar a com-
fundou a Empiricus Research pleta falência em relação às metas do ano. Estou 3 quilos e
em 2009, onde atua como
estrategista-chefe e CEO vários litros etílicos acima do objetivo. Ah, preciso ser justo.
Há uma coisa acima das projeções: a calvície. Impiedosa.
Vira o ano e é sempre a mesma coisa. Você quer estar
mais magro, mais forte, mais rico, mais eficiente, mais
saudável. Quer ficar mais perto dos amigos e da família.
Promete ser melhor ouvinte, ficar menos no celular e vi-
ver mais a imanência, aquela enorme dificuldade em estar
presente em cada um dos momentos. Chega o Carnaval
e você se parece com um barril, está atolado com coisas
atrasadas do trabalho, pensa a todo momento em como
seria se não tivesse aquele chefe medíocre, continua che-
cando o celular a cada 5 minutos, vê seu filho uma vez por
semana, visita seus pais a cada bimestre.
Será que somos muito indisciplinados por natureza? Ou
será que nos impomos metas excessivamente ambiciosas?
Ao melhor estilo Riobaldo, “eu quase que nada não sei, mas
desconfio de muita coisa.” Acho que é a versão sertaneja para
o clássico de Bertrand Russell: “As pessoas inteligentes estão
SE PUDESSE SUGERIR METAS cheias de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certe-
zas”. Se pudéssemos esboçar metas mais críveis e factíveis,
EFICIENTES PARA 2024, EU possivelmente as coisas fossem mais fáceis. Ao mesmo tem-
PRESCREVERIA: COMPRE BOAS po, se tratássemos o que nos é verdadeiramente caro como
prioridade, chegaríamos lá, ou pelo menos perto de lá.
EMPRESAS, NÃO PAGUE CARO POR Algumas coisas na vida não deveriam ser tão difíceis. Se
ELAS E NÃO FAÇA MUITA COISA você quer conviver mais com seu filho, marque o horário

Metas para 202488 exame.com


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para seus encontros e obedeça à agenda com disciplina re- nanceiro muito mais favorável. Juros em queda costumam
ligiosa. Se pretende mesmo emagrecer, você no fundo sabe ser ótimos indicadores antecedentes de um ciclo de alta das
o que precisa fazer. Pergunte se você realmente precisa ações. Some a isso um nível de preços ainda convidativo para
levar seu celular para aquela reunião — Simon Sinek tem nossa bolsa, cerca de um desvio-padrão abaixo de sua média
uma alegoria bem interessante: no meio de uma palestra, histórica pelas métricas mais clássicas de apreçamento.
ele pede um celular a alguém na plateia, segura o aparelho Em paralelo, o Brasil volta a ser estratégico. Num ano
na mão e então pergunta se as pessoas em volta ainda es- marcado por riscos geopolíticos importantes, enquanto o
tão se sentindo prestigiadas pelo palestrante. No momento xerife do mundo (Estados Unidos) se vê assolado por uma
em que você coloca o celular na mão, mesmo que não faça divisão interna sem precedentes às vésperas de uma eleição
nada com ele, demonstra aos demais falta de foco. presidencial, somos um país neutro e um dos poucos capa-
Em investimentos, também funciona assim. Procuramos zes de conversar com os dois lados da segunda guerra fria.
atalhos, estratégias mirabolantes, a dica esperta. Como Temos todo tipo de commodity. Estamos entre os maiores
tudo na vida, não rola. Simplesmente porque não há ata- produtores de grãos, minério de ferro e petróleo do mundo.
lhos, em nada. “Entre pela porta estreita.” É bíblico. A nar- Há um play global sendo montado de mercados emergen-
rativa da dica esperta é uma porta ampla e um caminho tes ex-China — e, se um tantinho do fluxo estrangeiro que
que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. ia para a Ásia vier para cá, nos lembraremos de que a porta
Se pudesse sugerir metas críveis, factíveis e eficientes desse grande teatro chamado B3 é bastante pequena. Temos
para 2024, eu prescreveria: compre boas empresas, não uma posição de contas externas privilegiada, com superávit
pague caro por elas e não faça muita coisa. Aliás, temos da balança comercial flertando com 100 bilhões de dólares.
uma ótima notícia aqui: há vasta evidência empírica de Se comprarmos o kit Brasil e simplesmente esperarmos, há
que mudanças de posição são destruidores de valor para o chances bem razoáveis de termos um grande ano.
investidor. Na média, quanto menos coisas você faz, mais Vejo dois fatores de risco principais para a tese. O pri-
dinheiro você ganha. Veja que maravilha: você não precisa meiro se liga ao problema histórico clássico brasileiro,
se esforçar para comer menos, entrar numa academia rigo- ainda não resolvido: nossa trajetória fiscal, que inclusive
rosa ou cortar o álcool. Você evolui ao fazer menos coisas. se deteriorou bastante em 2023. O segundo já foi citado
Muitas pessoas se esquecem de que, em ciclos favoráveis acima: um recrudescimento das tensões geopolíticas,
de mercado, a estratégia buy and hold (“compre e segure”) mais especificamente uma eventual partição da Ucrânia
oferece os maiores ganhos por causa do hold (o tempo que que revisitasse as fronteiras europeias, um espraiamento
você segura, mais do que a compra em si). Depois de um pe- da guerra no Oriente Médio e uma eleição colérica nos Es-
ríodo de forte alta das taxas de juro em âmbito global, que tados Unidos. Como defesa à minha própria tese, portanto,
castigaram os ativos de risco, o ano de 2024 deve ser mar- teria como hedge uma posição comprada de ouro em dólar
cado por uma inflexão de política monetária nos países de- e outra num combo de empresas de petróleo. Entre pecar
senvolvidos. Da mesma maneira que sofremos com os juros pelo excesso de confiança ou de autocrítica, sugeriria o se-
subindo, agora devemos ter um ambiente econômico e fi- gundo caminho. Ainda que isso esteja caindo em desuso.

Vejo dois fatores de risco para um ano


em que o Brasil volta a ser estratégico:
nossa trajetória fiscal e um
recrudescimento das tensões geopolíticas LUMEZIA/GETTY IMAGES

janeiro de 2024 89
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OPINIÃO

Pense num cara que era incapaz de pronunciar as palavras


“eu te amo” até para a mulher que é o amor da sua vida, que
não conseguia manifestar ternura nem diante dos pais e ir-
mãos, a quem também ama... Esse cara era eu. A dificuldade
do ser humano de demonstrar afeto e expressar sentimentos,
como dizer “eu te amo” às pessoas amadas, ou chorar para
extravasar emoções, deriva de bloqueios, traumas e outras
experiências que podem gerar conflitos nos relacionamentos,
problemas de estresse e transtornos diversos tanto na família
quanto no ambiente de trabalho.
Faço essa confissão porque se trata de um fato importante
na minha jornada de liderança. Alguém que não tem capaci-
dade de ser autêntico (eu amava, só não sabia dizer) e de ser
afetuoso na vida pessoal reproduz esse comportamento na
atividade profissional. Eu lidava com minha equipe focado
em eficiência, eficácia, efetividade, mas afetividade era algo
que eu ignorava. Mas quem semeia vento colhe tempestade,
GABRIEL REIS

e senti a verdade dessa profecia bíblica na primeira avaliação


360 graus a que fui submetido na empresa em que estava
trabalhando. Eu não me via como o melhor líder do mundo,
PAULO CAMARGO
mas o resultado da avaliação foi um soco no estômago: arro-
CEO da Espaçolaser e
ex-CEO do McDonald’s no Brasil gante, inseguro, fechado, pouco flexível.
e da Iron Mountain na Espanha Encarei aquela avaliação como uma oportunidade para fazer
do limão uma limonada. Entendi a necessidade de distinção
entre ter um cargo de chefia e ser uma liderança, que atua com
base em diálogo, respeito mútuo e cooperação. A partir dali de-
cidi enfrentar os desafios para me tornar um líder com autenti-
cidade. Uma das características importantes do líder autêntico
é reconhecer falhas e admitir fragilidades. As pessoas precisam
conhecer você, precisam ver que você também tem vulnerabili-
dades, virtudes e defeitos. A liderança autêntica poderia ser re-
presentada numa fórmula de 4 Cs: (mostrar) credibilidade, (ge-
rar) confiança, (praticar) comunicação, (estabelecer) conexões.
Comecei a investir nas características de liderança que eu
mirava. Melhorei o suficiente para avançar positivamente nas
novas avaliações pelas quais passei. Mas ainda não estava satis-
feito com o nível de conexões criadas com a equipe. Faltavam-
-me características como as do meu pai, meu primeiro exem-
plo de liderança. Além de profissional de ética irrepreensível
na gestão de sua assistência técnica de aparelhos eletrônicos,
LÍDERES AUTÊNTICOS ALIAM o “seu” Pedro tratava as pessoas com muito carinho e empatia.
Qualidades indispensáveis para eu atingir meu objetivo.
EFETIVIDADE E AFETIVIDADE. ESTÃO O que parecia uma barreira intransponível começou a mudar
MAIS INTERESSADOS EM CAPACITAR com o nascimento do meu primeiro filho, o João Pedro. Decidi
AS PESSOAS DO QUE EM PODER que eu poderia ser tão carinhoso quanto o seu avô, e manifestar
meus sentimentos sem a preocupação de que isso poderia apa-
E PRESTÍGIO PARA SI PRÓPRIOS rentar fraqueza. Assim, certa noite, levantei-me da cama, quase

Efetividade vs. afetividade


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como se estivesse fazendo algo proibido, e na pontinha dos existirá se houver autenticidade nessas relações. Ter auten­
dedos dos pés — para não acordar minha esposa — cheguei ao ticidade é se expor, ter coragem de mostrar vulnerabilida­
berço dele e sussurrei: “JP, eu te amo! Eu te amo, meu filho!”. des, mostrar suas imperfeições. Isso não é fácil, mas é o que
Rompido esse bloqueio, comecei a dizer “eu te amo” para gera confiança e cria conexões sólidas.
minha mulher e me tornei um cara que não tem mais difi- Quando fui CEO do McDonald’s, muitas pessoas me per­
culdade para expressar sentimentos, declarar amor ou cho- guntavam como era liderar 60.000 colaboradores. Minha
rar na frente de todo mundo, como aconteceu num evento resposta era sempre a mesma: “Quando eu lidero, eu falo
quando fui CEO da Iron Mountain, na Espanha. Era um en- com um deles de cada vez, e me esqueço dos outros 59.999”.
contro em que familiares de colaboradores que estavam em O principal papel do líder é o desenvolvimento de novas li-
outro país enviavam vídeos gravados, e a gente surpreendia deranças. É pura ciência, pura matemática. E, quando você
os colaboradores com os depoimentos. Mas, de repente, o cria isso como cultura, transforma numa matriz com pro-
surpreendido fui eu. Apareceu na tela um vídeo da minha gressão geométrica. Imagine que você tenha um grupo de
família, que estava no Brasil. Minha mãe, pela primeira sete subordinados e os transforme em novos líderes. Cada
vez na vida, dizia “eu te amo, meu filho, a gente tem muito um deles pode criar mais sete, e assim sucessivamente.
orgulho de você. Saiba que a tua mãe te ama muito”. Des- Essa força será importante e fará a diferença na medida
penquei no choro por uns 15 minutos, sendo abraçado pela em que estejam todos na trilha da liderança autêntica. Em
diretora de gente, a Fanny Delgado. seu livro Authentic Leadership, Bill George — que tive a sor-
O líder autêntico tem coragem de se expor, não teme que te de ter como professor — diz que, depois de anos estudan-
saibam das suas fraquezas, é transparente, expressa senti­ do líderes e seus traços, acredita que a liderança começa e
mentos e emoções de forma genuína, escuta, dialoga, pro­ termina com autenticidade e considera que isso não é o que
fessa empatia. Sendo assim, o líder constrói um ambiente de diz a maior parte da literatura sobre liderança, nem o que
trabalho saudável, estimula o desenvolvimento individual, ensinam os especialistas. Segundo ele, “líderes autênticos
consolida relacionamentos, estabelece as melhores referên­ desejam genuinamente servir os outros através da sua lide-
cias, compartilha aspirações e se torna fonte de inspiração. rança. Eles estão mais interessados em capacitar as pessoas
Pesquisas demonstram que equipes que melhor perfor­ que lideram para fazer a diferença do que em poder, dinhei-
mam não são as que supostamente têm os melhores talen­ ro ou prestígio para si próprios”.
tos, os mais capacitados ou as pessoas geniais. Os melhores Eu ainda recebo mensagens de pessoas que eu liderei e
resultados são proporcionados por equipes que melhor se que pude ajudar quando trabalhávamos juntos. Eles que-
relacionam, melhor se conectam, nas quais impera a con­ rem que eu veja quão longe eles chegaram, e me agrade-
fiança. As pessoas não se conectam com cargos, seja CEO, cem por algum ensinamento, alguma conversa, algum
diretor, gerente, coordenador, seja supervisor. Elas se co­ encorajamento que dei enquanto trabalhávamos juntos.
nectam com o ser humano designado para o cargo. Essa Foram experiências em que efetividade e afetividade ca-
conexão vem por um processo de confiança. E confiança só minharam juntas. Isso é autenticidade.

O líder autêntico tem coragem de se expor,


não teme que saibam das suas fraquezas,
é transparente, expressa sentimentos e
emoções de forma genuína ISTOCK/GETTY IMAGES

janeiro de 2024 91
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CLUBE CMO

O Sicredi, sistema cooperativo de crédito, tem uma


meta: alcançar a marca de 10 milhões de associados
até 2025. Atualmente, são 7,5 milhões distribuídos
em mais de 2.600 agências físicas no país. A estra­
tégia, que culminou na maior campanha publicitá­
ria da história da companhia em 2023, vem acom-
panhada de um novo posicionamento, com foco na
ampliação do conhecimento e da consideração da
marca em todo o Brasil.
Há quase um ano à frente da nova diretoria de
marketing e experiência, Cristina Duclos enxerga o
Sicredi como uma lovebrand no futuro. “Há um po-
tencial enorme, não só de crescimento e de presen-
ça como também de retorno para a sociedade. Isso
é o que uma marca amada faz pelas pessoas”, diz a
executiva, que revela os planos da companhia para
2024. Acompanhe a entrevista.
MARCOS SUGUIO

Você atuou em empresas como Dr.consulta,


Electrolux, Vivo e Claro/BCP. Qual é o principal
desafio ao assumir uma nova área no Sicredi?
CRISTINA DUCLOS Cheguei há quase um ano com objetivos bem claros.
Diretora-executiva
de marketing e experiência Um deles, talvez o mais importante, era fortalecer
do Sicredi a marca nacionalmente. Nos últimos três anos, o
Sicredi dobrou de tamanho. Temos a robustez de
uma empresa tradicional, mas que cresce como uma
startup. Queremos chegar a 10 milhões de associa­
dos em 2025, mas nossa situação de marca se difere
no Brasil. Operamos melhor em cidades menores e
temos uma concentração de conhecimento grande
no Sul, que é a nossa origem, por isso a necessidade
de expansão. Sempre investimos bastante em mar-
keting, mas era algo pulverizado nas cooperativas.
Não havia essa espinha dorsal nacional, que foi o que
fizemos no ano passado ao lançar a primeira grande
campanha com o novo posicionamento. Agora, se-
guimos para uma segunda fase desse movimento.
SICREDI AVANÇA NOS PLANOS DE
E qual é o balanço da campanha e desse primeiro
AMPLIAÇÃO DA MARCA E APOSTA ano como diretora de marketing e experiência?
EM NOVAS AGÊNCIAS, EXPERIÊNCIA, Desde que cheguei, revisamos missão, visão, va-
lores e posicionamento. Nas pesquisas, o Sicredi já
RELACIONAMENTO E AUTOMAÇÃO era reconhecido pela excelência em relacionamen-
PARA SE DESTACAR NO MERCADO to. Sempre destacamos a importância de conhecer
profundamente o nosso associado e buscamos uma
JULIANA PIO presença forte no que chamamos de “físital” [união

10 milhões de associados
92 exame.com
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dos canais físicos e digitais]. Mas precisávamos ex- estamos conhecendo mais profundamente
por isso ao mercado. Foi então que lançamos, em nossos clientes, para oferecer produtos e servi-
outubro, a primeira grande campanha. Fomos a to- ços adequados a cada perfil. Já mapeamos cerca
das as emissoras e fizemos ações de conteúdo com de 200 hábitos de consumo, para cada vez mais
mais de 60 influenciadores. Contratamos dois em- trabalharmos com a hiperpersonalização. O
baixadores, os cantores Leo Santana e Ana Castela, mercado é muito dinâmico e há muitos concor­
e fizemos uma paródia da canção do Tim Maia para rentes. A nossa diferenciação vai se dar justa­
lançar o posicionamento: “Não é só dinheiro, é ter mente pela forma como nos relacionamos, seja
com quem contar”. Foi sucesso. Movemos o pon- pelo lado humano, seja pela inteligência em
teiro de conhecimento e consideração em pouco oferecer o produto certo ao cliente certo.
tempo, com um aumento de 150% no número de
associados na jornada digital no último trimestre, A marca é patrocinadora de vários eventos,
comparando com o mesmo período de 2022. muitos esportivos, como a Copa do Brasil. Qual
é a relevância desse tipo de investimento?
Quais são os planos do Sicredi para 2024? Além da Copa do Brasil, patrocinamos os
A gente acredita que uma marca se fortalece por campeonatos Mato­Grossense, Amapaense,
meio de relacionamento. Estamos trabalhando na Rondoniense, Acriano, Amazonense, Gaúcho,
melhoria da experiência para os mais de 40.000 Carioca, Paulista e Copa do Nordeste. Temos
colaboradores e associados. Buscamos excelên­ bastante vínculo com o futebol, até porque
cia no atendimento em todos os canais físicos e somos uma marca brasileira, e o futebol é pai­
digitais. Atualmente, o nosso NPS [net promoter xão nacional. Mas atuamos em outras frentes
score — índice que mede a satisfação do cliente] é também, como feiras no interior e eventos li­
superior a 75%. Ao contrário dos bancos, que es- gados ao agronegócio e ao empreendedorismo.
tão fechando agências, neste ano vamos abrir uma Acreditamos que a presença e a experiência do
unidade a cada dois dias no Brasil. Hoje, há 200 nosso associado, ou do potencial associado,
municípios nos quais a agência do Sicredi é a úni­ fisicamente por meio de um evento ajuda na
ca instituição financeira do local. Queremos estar formação e na lembrança de uma marca.
onde, como e quando o associado quiser, de uma
maneira próxima e humana.
Temos ainda a meta de ampliação do conheci-
mento e da consideração de marca em todo o Bra-
sil, para conquistar novos associados. Buscamos a
principalidade, a fidelização do cliente e a geração
de novos negócios. As cooperativas continuarão com
um trabalho local forte, que é, inclusive, o nosso di-
ferencial. O que estamos fazendo agora é orquestrar
isso ao plano de expansão nacional. Seguiremos
também com a estratégia de lançamento de novos
produtos e serviços, até mesmo para a pessoa jurídi-
ca. Teremos parcerias com consórcios, seguradoras,
Mastercard e Visa, com lançamentos de cartões. As
pessoas ouvirão falar bastante do Sicredi em 2024. O Clube CMO é uma iniciativa da
EXAME em parceria com a agência
Como o Sicredi pretende se diferenciar dos Zmes, com apoio da Associação
concorrentes? Há inovações previstas?
Brasileira de Anunciantes (ABA).
O diferencial está na experiência e no relaciona-
mento com o associado. Estamos trabalhando Trata-se de um espaço seguro de
bastante com o uso da inteligência artificial para troca de conhecimento entre os
aprimorar isso. A grande aposta deste ano é a auto- líderes de marketing dos maiores
mação de serviços, quer dizer, cada vez mais o as- anunciantes do país, em eventos
sociado poder se autosservir. Não significa que não de relacionamento, encontros de
terá atendimento humano quando for preciso, mas
oferecemos também a possibilidade da tecnologia,
learning e viagens de experiências.
um avatar apelidado de Theo. Em 2023, ele recebeu
60% do total de chamadas, o que representa mais de Quer saber mais?
4 milhões de atendimentos. A IA está melhorando a HTTPS://LPS.EXAME.COM/
capacidade de automação para gerar eficiência sem LPL-CLUBE-CMO-202305
que a gente se distancie do associado, inclusive nes-
te momento de expansão. Por meio da IA, também

janeiro de 2024 93
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Quem é você quando


larga a caneta,
sai do zoom,
fecha o notebook?

Quem é você no
seu lado Casual?

SIGA @CASUALEXAME
E DESCUBRA.
Distribuição 100% gratuita - Clube de Revistas AVENTURA
→ O relógio
Montblanc
para condições
extremas

ENOLOGIA
→ A madame
vinho e o
monsieur
terroir

CARLA ASSUMPÇÃO

VIGOR E FLEXIBILIDADE
LEANDRO FONSECA
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CASUAL

A
ntes de 2020, ter prática aconteceu quando trouxe boas noções de ioga. Sou
uma varanda em ela morava na Califórnia. muito disciplinada com tudo
casa significava um “Ao longo dos anos a ioga se isso porque sem a ioga eu não
espaço para desfru- tornou muito mais do que seguro todo o resto.”
tar encontros com um hobby. Quando conhe- Um dos desejos de Assump-
amigos ou para apreciar a vista. ci a linha ashtanga, há dez ção é passar uma temporada
Após o ultrapassado confinamen- anos, comecei a entender em um ashram na cidade de
to, o ambiente ganhou outras fun- o lado prático do exercício. Mysore, no sul da Índia, para
ções, como trabalhar, relaxar e até Com os asanas [ posturas] ter a experiência de prática com
fazer atividades físicas. Durante a comecei a entender um pou- outras pessoas em níveis com-
pandemia, Carla Assumpção, dire- co mais da profundidade e o plementares. “Ainda não fui ao
tora-geral da Swarovski para Brasil, que significa a ioga. A partir berço do ashtanga por questões
Chile e Argentina, usou a espaçosa daí, a prática deixou de ser de agenda”, diz.
varanda de seu quarto para traba- um hobby e passou a ser um
lhar. Hoje, pratica ioga diariamen- estilo de vida e a base fun-
te no espaço. Há mais de 25 anos damental para muitas fren-
Assumpção é adepta da atividade tes da minha vida.”

LEANDRO FONSECA
de origem indiana. Cinco vezes por O início da prática, no en-
semana, a executiva se encontra tanto, surgiu para comple-
virtualmente às 6 horas da manhã mentar a corrida. “Achava
com a professora em Brasília. “To- que eu precisava de algo que
dos os sábados vou a um estúdio também fosse mais voltado
para fazer as minhas correções. para a elasticidade”, diz. “A
Quando minha professora está em ioga que pratico é muito vi-
São Paulo, nos encontramos para gorosa e exige muito cuidado
as aulas presenciais”, diz. para não se machucar.”
A experiência de Assumpção A cultura indiana, como
com a ioga já aconteceu em dife- os princípios da ayurveda,
rentes vertentes e em aulas pre- também foram incluídos na
senciais e virtuais, no Brasil e nos rotina de Assumpção. “Im-
Estados Unidos. A introdução à plemento aprendizagens
no meu dia a dia. Não sou
especialista em nada, mas
sou persistente em muita
CAPA coisa no que diz respeito a
isso. Aplico a ayurveda nas
Mais do que um massagens e no cuidado na
hobby, a ioga alimentação, não somen-
te pela questão física em si
virou um estilo mas pela cura através do ali-
de vida para Carla mento. Quando você começa
Assumpção, diretora- a entender que o alimento
pode ser a cura, o remédio
geral da Swarovski e a salvação, percebe que é
para Brasil, Chile um recurso muito acessível.
e Argentina A ioga me trouxe um pouco
mais de conhecimento da
JÚLIA STORCH ayurveda, e a ayurveda me

Inspira,
96 exame.com
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O tempo de carreira de No início de dezembro a mar- e um espaço onde os clientes podem
Assumpção na Swarovski se as- ca de cristais inaugurou sua personalizar suas compras.
semelha ao período de prática maior loja na Quinta Avenida, Atualmente são 6.600 pontos de
de ioga. Ainda que hoje esteja à em Nova York. Projetada pela venda no mundo, dos quais 2.300
frente da marca de cristais em diretora criativa Giovanna En- são lojas próprias, em mais de 150
três países, a executiva conta que gelbert, a loja também é uma ga- países. No Brasil são 121 pontos de
já desejou ser professora de ioga. leria, com dois andares divididos venda. Desde o ano passado, a em-
“Mas foi pura epifania da minha em 1.300 metros quadrados. No presa adotou um novo layout nas
parte”, diz. Há mais de 20 anos na primeiro andar, há um espaço lojas, com mais cores, uma mesa de
empresa, Assumpção fez parte de butique branco dedicado aos degustação com diversos colares,
diversos momentos da joalheria. diamantes criados pela marca, pulseiras, anéis e brincos à mostra
“Quando comecei, achavam que um lounge onde são servidas be- e às mãos dos clientes, que podem
era uma marca de vodca”, brinca. bidas nas peças Rosenthal China tocar e provar os produtos. O logo
também foi alterado. O cisne, sím-
bolo icônico da marca, girou 180
graus da esquerda para a direita,
mirando o futuro.
O design dos produtos também
foi ajustado com a entrada de Engel-
bert como diretora criativa em 2020.
“Foram inseridos novos códigos de
cristais mais opulentos, maiores
e com mais cores, que podem ser
associados ao comportamento de
moda”, diz Assumpção. No final do
ano passado chegou ao país a cole-
ção colaborativa feita com a Skims,
marca de roupas e lingeries de Kim
Kardashian. Joias corporais, roupas
íntimas, bodies, vestidos, saias e
macacões foram adornados com os
cristais austríacos. Assumpção veste
a coleção já esgotada no Brasil nas
fotos que ilustram esta reportagem.
Da varanda de casa às lojas que
comanda no cone sul, a executiva vê
na ioga uma forma de enfrentar os
desafios do trabalho. “A ioga ensina
que você não vai só para a frente,
você às vezes vai para trás, como é a
vida. Eu bebo muito da fonte da ioga
em todos os aspectos, desde a disci-
plina e a rotina, que insiro natural-
mente no meu dia a dia na empresa.
Quando me sinto muito desafiada
na companhia, aplico esse meu es-
tado consciente de olhar de forma
positiva para os desafios”, afirma.

Carla Assumpção na varanda de


sua casa: ”A ioga ensina que
você não vai só para a frente,
vai para trás, como é a vida” expira janeiro de 2024 97
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CASUAL

AVENTURA

DESAFIO GLACIAL
A Montblanc lança modelo feito para condições extremas durante
maratona na Antártida, a 30 graus negativos
JÚLIA STORCH
RODOLFO SOTO/DIVULGAÇÃO

Competidores da maratona nas Montanhas Ellsworth: preparação, concentração e sorte em condições inóspitas

P
ara correr uma maratona são necessá- sado, 52 homens e 14 mulheres partiram para o sopé
rios poucos acessórios além de um bom das Montanhas Ellsworth para completar a 18a Mara-
par de tênis, roupas confortáveis e pre- tona do Gelo da Antártida, a dezenas de graus negati-
paro físico. Mas algumas maratonas são vos e com ventos cortantes. Para esse tipo de corrida,
mais árduas do que outras, como o de- em local tão inóspito, são necessários acessórios mais
safio proposto pela Montblanc para testar seu novo re- adequados para atravessar a linha de chegada.
lógio Montblanc 1858 Geosphere 0 Oxygen South Pole Entre os competidores estavam Laurent Lecamp,
Exploration Limited Edition 1990. Em dezembro pas- diretor-geral da divisão de relógios da Montblanc, e

98 exame.com
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o embaixador da marca, ou mark maker, Si- crível chegar lá e ver com os próprios olhos o que
mon Messner. Lecamp é um corredor expe- significa estar ao ar livre a 30 graus negativos”,
riente em trilhas e maratonas. “Preparação diz Simon. “Uma vez ele me disse que eu poderia
é 50% do trabalho. Sorte e concentração herdar muitas coisas: roupas, histórias, conheci-
são a outra metade necessária para finalizar mento, livros, mas não poderia herdar experiên-
a corrida”, diz Lecamp. cias. E nesse sentido cada geração tem de sair e
Ainda que esta tenha sido a primeira ma- conquistar as suas próprias experiências.”
ratona de Simon, o italiano possuía uma van- O relógio faz parte da coleção 0 Oxygen. Para
tagem, visto que a prática no montanhismo resistir às condições climáticas, a caixa das pe-
o tornava familiarizado com as condições cli- ças é preenchida com nitrogênio. A falta de oxi-
máticas extremas e o terreno árido que a du- gênio não apenas elimina o embaçamento, que
pla encontraria. Sua participação também foi pode ocorrer com mudanças drásticas de tem-
simbólica, já que seu pai, peratura em altitude, mas também evita a oxi-
Reinhold Messner, fez dação. O relógio também vem com duas pulsei-
história em 1990. Naque- ras, de tecido e de titânio. O preço da peça para
le ano, ele e o explorador o mercado brasileiro é de 51.600 reais.
Arved Fuchs foram os pri- Para enfrentar as condições climáticas extre-
meiros homens a cruzar a mas, a recomendação de Lecamp é usar a pulseira
Antártida a pé, sem apoio de titânio. “Decidimos juntos usar a pulseira de
animal ou motorizado, titânio por uma razão. A qualidade da pulseira
cobrindo uma distância têxtil pode diminuir se estiver ventando, choven-
de 2.800 quilômetros e do ou nevando ao mesmo tempo. Mesmo com
subindo, gradualmente, muito frio e muito vento, a pulseira de titânio não
mais de 3.000 metros se move. Além disso, ela foi adaptada ao nosso ta-
em 96 dias. Ao mesmo manho, então, quando corro, o relógio continua
tempo, eles puxavam um ajustado na mesma posição”, diz.
trenó com peso superior Correndo juntos, com Laurent ditando o rit-
a 100 quilos e tinham mo, a dupla cruzou a linha de chegada de mãos
poucos instrumentos de dadas, com o relógio no pulso, em 4 horas e 29
navegação, como uma segundos, conquistando o sétimo lugar. E mais
bússola, para guiá-los. uma história para contar.
Simon nasceu no ano em
que Reinhold completou
tal empreitada. Essa his- O Montblanc 1858 Geosphere 0 Oxygen South Pole Exploration:
tória serviu de inspiração caixa com nitrogênio e edição limitada a 1.990 peças
para o desenvolvimento
do novo relógio.
O ano de 1990 tam-
bém representa a quan-
tidade de peças disponí-
veis da coleção limitada.
O relógio é alimentado
pelo calibre MB 29.25
da manufatura da mai-
son, que apresenta uma
complicação de hora
mundial e uma reserva
de marcha de 42 horas.
O mostrador exibe os
Hemisférios Norte e Sul com dois globos
tridimensionais que giram no sentido anti-
-horário. Uma gravação especial em 3D da
Aurora Austral adorna o fundo da caixa.
“Passei a entender o que meu pai fez
quando comecei a escalar sozinho. Antes dis-
DIVULGAÇÃO

so era muito difícil ter essa compreensão. E


o mesmo acontece na Antártida agora. É in-

janeiro de 2024 99
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CASUAL

BEBIDAS

A DAMA ao amadurecimento mais rápido


da uva. Isso nos levou a fazer um

DO VINHO…
manejo diferente para alargar o
ciclo de desenvolvimento da fruta.
Estamos trabalhando com pro-
dutores na Europa que estudam
mudanças genéticas nas videiras
Susana Balbo trabalhou na Catena Zapata, para enfrentar o calor, e isso é uma
fundou sua própria vinícola e é uma das vantagem competitiva.
maiores autoridades no assunto Há alguma região que você vê
como oportunidade na produção
GILSON GARRETT JR. de vinhos com essas mudanças?
O aquecimento climático está
permitindo à Europa produzir

“F
vinhos mais parecidos com os
azer vinho é relativamente simples. Só os primeiros 200 produzidos na Argentina, no Chi-
anos são difíceis.” A afirmação pronunciada pela baro- le e no Brasil, com um paladar de
nesa Philippine de Rothschild resume bem a complexi- mais frutas. E isso educa o consu-
dade de produzir bons rótulos. Solo, clima e intervenção midor a provar mais rótulos feitos
do enólogo são algumas das variáveis nesse processo e no Novo Mundo. Essas alterações
bem conhecidas por Susana Balbo, a primeira mulher enóloga formada estão permitindo, ainda, vinhos
na Argentina e que há mais de 40 anos se dedica à produção da bebida. mais redondos e palatáveis, com-
Ela trabalhou na célebre Bodega Catena Zapata, e em 1999 fundou uma petindo com regiões de prestígio,
vinícola que leva o seu nome, a primeira construída por uma mulher. No como a Borgonha, na França.
Brasil, seus vinhos chegam pela importadora Cantu.

Como está o mercado do vinho para as mulheres? Susana Balbo: primeira mulher
enóloga formada na Argentina
Tive desafios enormes quando comecei. Precisei
trabalhar muito para mostrar que era capaz, e isso
não foi fácil. Ainda não vejo muitas mulheres den-
tro da carreira e menos ainda donas que funda-
ram a própria vinícola. Acredito que as mulheres
têm uma sensibilidade maior na produção dos vi-
nhos e conseguem entregar bebidas com sabores
mais expressivos.

Por que os brasileiros gostam


tanto de vinho argentino?
Os brasileiros se sentem em casa aqui, o que faz com
que a visita aos vinhedos argentinos seja uma expe-
riência emocionalmente marcante. Acredito que nós
pensamos muito no mercado do Brasil, que gosta de
muita madeira. Os vinhos argentinos também com-
binam bastante com a comida brasileira. Uma críti-
ca que faço aos vinhos chilenos é que eles são mais
voltados para o mercado dos Estados Unidos.

Muitos produtores têm antecipado


JOEL KWIECINSKI/DIVULGAÇÃO

a colheita das uvas em quase um mês por causa


das mudanças climáticas. Como isso tem
afetado a produção da vinícola?
Mendoza tem clima de deserto, com influência tan-
to do Pacífico quanto do Atlântico. Na última vindi-
ma tivemos um calor mais persistente, o que levou

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Pedro Parra: consultor da vinícola italiana Argiano de vem da terra, sempre da localida-
de, nunca do homem.

Como definir um bom terroir?


Um bom terroir é uma interpreta-
ção boa do solo. Existem fatores em
comum que determinam um bom
terroir: pedras, drenagem, porosida-
de, espaço para raízes, espaço para a
água, com clima nem muito chuvoso
nem muito ensolarado. Esse é o se-
gredo dos grandes terroirs.

O vinho chileno tem


esse som especial?
O vinho chileno, como o Malbec ar-
gentino, canta bem, mas não canta
especial. A pergunta que se precisa
fazer é por quê. Encontrar um ter-
roir que saiba cantar é um processo
DIVULGAÇÃO

longo, precisa de tempo. Tanto Chile


quanto Argentina são países jovens
fazendo vinho. Ambos estão no ca-
minho de encontrar a sua música.

...E O
Há muitos produtores que estão bem
perto de encontrar esse algo espe-
cial. Eles estão no mesmo estágio de

SENHOR
outras regiões dos Estados Unidos,
como Napa Valley, Oregon e Sonoma.

TERROIR
Nesse grupo também está o Brasil,
em especial com os espumantes?
Sim, claro. É como um Messi ou um
Pelé: é raro, mas é possível de encon-
trar. A Europa já encontrou com o
O chileno Pedro Parra é especialista nessa tempo, o resto está procurando. Todos
palavra não tão fácil de explicar, mas os grandes vinhos do mundo, cerca
fundamental para a produção de vinhos de 95%, vêm da Europa. Nós aqui na
América do Sul precisamos de tempo.
A França levou 200 anos para encon-
GILSON GARRETT JR. trar. Acredito que com a tecnologia
esse tempo pode ser menor.

O
chileno Pedro Parra é conhecido no meio como As mudanças climáticas
“senhor terroir”, reconhecido por ser o maior es- estão afetando produtores
pecialista nessa palavra não tão fácil de explicar, tradicionais, como a França.
mas tão importante na hora de produzir gran- É uma oportunidade para o Brasil?
des bebidas. Ele é consultor de dezenas de viní- É uma oportunidade para novos ter-
colas do mundo, incluindo a italiana Argiano, que elaborou o roirs, que antes, por causa do clima,
Brunello Di Montalcino 2018, eleito o melhor vinho do mundo talvez não pudessem produzir bons
em 2023 pela prestigiada revista americana Wine Spectator. vinhos. É um novo jogo, uma trans-
formação importante da qual muitas
O que é terroir e por que é tão importante? pessoas não estão conscientes. Ou-
Os vinhos são como música: muitas pessoas cantam bem, mas tras já estão muito conscientes, como
os grandes cantores têm algo a mais. Esse algo a mais do cantor na Califórnia, nos Estados Unidos, e
vem do treinamento, da voz, do tom, da genética. Um cantor é estão investimento muito. Produ-
grande quando gera um som pessoal. Um terroir é grande quan- tores da Borgonha, na França, estão
do gera uma assinatura, uma tipicidade pessoal. E essa tipicida- indo produzir vinho lá.

janeiro de 2024 101


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TÊNIS

O REDENTOR NA
ARQUIBANCADA
Com jogadores de primeiro nível, alta quanto um Masters 1000 ou um Grand
Slam, mas é maior que um ATP 250. Existe
organização impecável e uma um número limitado de torneios ao longo
vista de tirar o fôlego, o Rio Open do ano, definido pela Associação de Tenis-
completa dez anos de idade tas Profissionais. Um novo campeonato só
pode ser realizado no lugar de algum outro.
IVAN PADILLA O Rio Open só existe porque os organiza-
dores do então ATP 500 de Memphis, nos
Estados Unidos, desistiram naquele mo-
mento de realizar o torneio. Houve então
um leilão. Quem levou foi a empresa brasi-

D
e um lado, o Pão de Açúcar. Do leira IMX, que mais tarde virou IMM. Uma
outro, o Corcovado. Na frente, a
Lagoa Rodrigo de Freitas. Com
todo o respeito às cidades do
circuito internacional de tênis,
mas poucos torneios têm uma vista tão bonita
quanto o Rio Open, realizado no Jockey Club,
na Gávea. Com jogadores de primeiro nível,
organização impecável e um cenário de tirar
o fôlego, o campeonato carioca categoria ATP
500 está completando dez anos. A comemora-
ção será à altura de seu breve, porém estrelado,
histórico. Nesta edição, que acontece de 17 a 25
de fevereiro, está confirmada a presença do es-
panhol Carlos Alcaraz, atual número 2 do mun-
do, e do veterano suíço Stanislas Wawrinka,
vencedor de três Grand Slam.
A primeira edição do torneio teve início no
dia 15 de fevereiro de 2014. Foi um começo ar-
rasador. O campeão daquela edição foi o espa-
nhol Rafael Nadal, então número 1 do mundo,
que venceu o ucraniano Alexandr Dolgopolov
na final. A lista de tenistas de primeiro escalão
que passaram pelas quadras do Jockey inclui
os espanhóis David Ferrer, Fernando Verdasco
e Tommy Robredo, os franceses Gael Monfils e
Jo-Wilfried Tsonga, o austríaco Dominic Thiem,
o japonês Kei Nishikori, os croatas Marin Cilic e
Borna Coric, os italianos Fabio Fognini, Lorenzo
CARLO WREDE/DIVULGAÇÃO

Musetti e Matteo Berrettini, o canadense Felix


Auger-Aliassime, o argentino Diego Schwartz-
man e o atual campeão, Cameron Norrie.
O ATP 500 é uma categoria intermediária. Não
distribui tantos pontos nem tem premiação tão

102 exame.com
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exigência era que as quadras fossem ☉ de suvenires e gastronomia, conta Luiz
de saibro. O Rio Open hoje faz parte de Procópio Carvalho, diretor do Rio Open.
um pequeno circuito na terra verme- AGITO NA CIDADE “Estamos sempre vendo o que funciona
lha, que inclui os ATP 250 de Córdoba O torneio ganha aqui e em outros circuitos”, diz o executi-
e Buenos Aires, na Argentina, e de San- visibilidade internacional vo, que também é diretor dos torneios ATP
tiago, no Chile, todos em fevereiro. e incentiva o turismo 250 de Chengdu e Shenzen, na China, de
“Foi um início muito desafiador”, no Rio de Janeiro Hong Kong e do Queen’s, na Inglaterra. Um
lembra Márcia Casz, diretora-geral do aprendizado nesses anos foi aumentar a
Rio Open. “Estávamos vendendo um → 600.000 torcedores cobertura da área de ativações, uma prote-
sonho, algo que ainda não existia. Mas já passaram pelas ção para os visitantes contra o sol forte e as
o momento para o país era muito favo- arquibancadas chuvas implacáveis do verão.
rável, os olhos estavam todos voltados Carvalho também é encarregado de des-
para cá.” Naquele ano o país sediou a → 140 PAÍSES exibiram cobrir talentos e negociar a presença de jo-
até hoje o torneio
Copa do Mundo de futebol. Dois anos gadores de ponta no Rio de Janeiro. Quatro
pela televisão, em
depois o Rio de Janeiro recebeu os Jo- mais de 3.000 horas anos atrás, o espanhol Carlos Alcaraz, então
gos Olímpicos. A primeira empresa de transmissão um iniciante desconhecido, recebeu um
a acreditar no projeto foi a Claro, que convite para disputar o torneio. Foi no Rio
hoje dá nome ao torneio. A Rolex, pa- → A edição de 2023 que ele ganhou seu primeiro jogo como pro-
trocinadora dos maiores torneios de tê- movimentou 150 fissional. Por contrato, ele vem participando
nis do mundo, foi outra marca presen- MILHÕES DE DÓLARES do evento de lá para cá. O mesmo aconteceu
te desde o início. “Só existe uma chance na economia do estado com o norueguês Casper Ruud, que chegou
do Rio de Janeiro,
de causar uma boa primeira impressão. a ser número 2 e é o atual número 11 do
com 5.000 empregos
E nós conseguimos”, diz Casz. diretos ou indiretos mundo. Na edição de 2017, também como
Uma inspiração para o Rio Open jovem convidado, ele chegou às semifinais.
foi Roland Garros, com seus charmo- “Olhamos os atletas não só pelo ranking,
sos bulevares arborizados com tendas Fonte: IMM, Deloitte Brasil. mas com um olhar de produto”, conta Car-
valho. “Procuramos jogadores com carisma,
que se conectem com os torcedores, cau-
Quadra central do Rio
sem frisson na arquibancada.” Uma aposta
Open, no Jockey Club: para este ano é o jovem francês Arthur Fills,
belezas naturais número 35 do mundo. Uma disputa entre
Fills e Alcaraz seria a final dos sonhos para
os organizadores neste ano de celebração?
“Talvez entre Alcaraz e João Fonseca, um
Rafael Nadal: campeão
da primeira edição juvenil muito promissor. Meu sonho é que
da competição um dia um brasileiro seja campeão do Rio
Open”, afirma Casz.
DIVULGAÇÃO

janeiro de 2024 103


Distribuição 100% gratuita - Clube de Revistas CASUAL

Emma Stone:
protagonista em
mistura de drama
de época com
ficção científica

ruptela de “God” (Deus), tam-


bém foi vítima de experiências.
ATSUSHI NISHIJIMA/SEARCHLIGHT PICTURES/DIVULGAÇÃO

Sob a proteção do pai e cien-


tista, a jovem deseja descobrir o
mundo e os prazeres disponí-
veis e os indisponíveis para
uma mulher do século 19. As-
sim, a fuga para vários conti-
nentes com o advogado Duncan
Wedderburn (Mark Ruffalo) pa-
rece ser uma boa alternativa de
escape dos preconceitos de sua
época. As cores também acom-
panham as mudanças de cená-
rio e de experiências conquista-
das, da branca e preta Londres
FILME
às cores vívidas inseridas nas
viagens. “Eu quis fazer a Bella

A criatura com porque me pareceu uma aceita-


ção do que é ser mulher, do que

nome de princesa
é ser livre para sentir medo e ter
coragem”, disse Stone.
Além do extenso trabalho de
maquiagem para as transfor-
Meio humana, meio criatura. Em Pobres Criaturas, a personagem mações físicas, como o rosto
de Emma Stone deseja descobrir o mundo e os prazeres costurado do quase irreconhecí-
vel Dafoe, o figurino é um des-
disponíveis e os indisponíveis para uma mulher do século 19 taque no longa. “A única infor-
mação era que Lanthimos não
JÚLIA STORCH queria que as roupas lembras-
sem um drama de época ou um
filme de ficção científica”, disse
Em esquenta para o Oscar, Po- época A Favorita (2018), a dupla a designer de figurinos Holly
bres Criaturas estreia nos cine- conquistou dez indicações ao Waddington ao The New York
mas brasileiros com grandes Oscar e sete vitórias no Bafta. Times, que desenvolveu peças
prêmios no currículo, como o Novamente a produção se pas- extravagantes que mesclam
Leão de Ouro no Festival Inter- sa no passado, em 1880, baseada ambos os gêneros fictícios.
nacional de Cinema de Veneza no livro de Alasdair Gray. Bella
e no Globo de Ouro como Me- Baxter, a protagonista com no-
lhor Filme (Musical ou Comé- me de princesa da Disney, é uma
dia) e Melhor Interpretação Fe- pobre criatura. A jovem é mais POBRES CRIATURAS
minina, com a protagonista e um dos experimentos do bri- 1O DE FEVEREIRO
produtora Emma Stone. Esta lhante e pouco ortodoxo cientis- NOS CINEMAS
não é a primeira colaboração ta dr. Godwin Baxter (Willem COM EMMA STONE, MARK
de sucesso entre a atriz ameri- Dafoe), que ressuscita Bella ao RUFFALO, WILLEM DAFOE
cana e o diretor grego Yorgos inserir o cérebro de um feto no E RAMY YOUSSEF
Lanthimos. Com o filme de cadáver da jovem. Godwin, cor-

104 exame.com
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EXPOSIÇÃO
A panorâmica
da “não artista”

A programação da
Pinacoteca de São Paulo
começa o ano com a
exposição panorâmica
de Lygia Clark. A partir
ESPECULAÇÕES
de março na Pina Luz,
CINEMATOGRÁFICAS,
a mostra percorre os QUENTIN TARANTINO
diferentes momentos
ROMULO FIALDINI

EDITORA INTRÍNSECA
da carreira de Clark

DIVULGAÇÃO
89,90 REAIS
e apresenta o legado
da mineira que se
autointitulava
“não artista”
e que transformou
as possibilidades LIVRO que estava vendo filmes
LYGIA CLARK
de produção e que os outros pais não dei-
EDIFÍCIO PINA LUZ,
PRAÇA DA LUZ, 2
experimentação VIOLÊNCIA xavam os filhos assistirem,
DE 2 DE MARÇO
artísticas no Brasil e SEXY questionei minha mãe. Ela
no mundo. Além desta disse: ‘Quentin, eu me
A 4 DE AGOSTO
mostra, estão marcadas Tarantino discorre preocupo mais com você
CURADORIA: ANA MARIA
MAIA, POLLYANA QUINTELLA outras 13 exposições na assistindo ao noticiário. Um
E JOCHEN VOLZ Pina Luz, Pina Estação sobre filmes e filme não vai fazer mal al-
e Pina Contemporânea. diretores que gum’”, diz.
Outros diretores tam-
influenciaram sua bém são mencionados na
forma de fazer filmes publicação, como o espa-
nhol Pedro Almodóvar, que
LIVRO é citado por Tarantino co-
Resgate da Cães de Aluguel, Pulp Fic- mo um exemplo de incon-
memória tion, Kill Bill, Era Uma Vez formismo e inspiração para
Em... Hollywood são algu- a violência cinematográfica
Escritos deixados por mas produções do diretor tão marcante em sua pró-
Carolina Maria de Jesus Quentin Tarantino. Porém, pria obra. “Os filmes dos
ainda permanecem longe para além do cinema, o meus sonhos sempre
dos olhos do público 47 americano acaba de publi- incluíam uma reação cômi-
anos após a morte da car um livro sobre nada ca a alguma coisa desagra-
escritora. No entanto, menos do que filmes. Em dável. Algo parecido com a
uma iniciativa pretende Especulações Cinematográ- conexão que os filmes de
publicar alguns de seus ficas, Tarantino comparti- Almodóvar fazem entre o
textos, como O Escravo, lha sua visão sobre os fil- desagradável e o sensual.
escrito na década de mes americanos aos quais Sentado num cinema de
DIVULGAÇÃO

1950 e agora publicado assistiu pela primeira vez arte em Beverly Hills, vendo
pela Companhia das na juventude, nos anos as imagens coloridamente
Letras. Os protagonistas 1970. Além de analisar dire- vívidas e provocativamente
do romance são ções, produções e atuações, empolgantes captadas em
os primos Rosa e o autor reflete sobre outros 35 milímetros e projetadas
Renato, que, embora caminhos possíveis para os numa parede enorme, que
apaixonados, acabam O ESCRAVO, filmes e sobre sua formação provavam ser possível ha-
CAROLINA MARIA DE JESUS
seguindo caminhos cinematográfica, iniciada ver algo sexy na violência,
COMPANHIA DAS LETRAS
distintos, sobretudo por aos 7 anos, quando sua mãe eu me convenci de que
pressão da família 64,90 REAIS o levava para ver filmes existia lugar para mim e
abastada do rapaz. destinados a adultos. “A cer- meus devaneios violentos
ta altura, quando percebi na cinemateca moderna.”

janeiro de 2024 105


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SANTÉ

O mercado de vinhos tem experimentado um


dinamismo crescente nos últimos anos. No
período da pandemia de covid-19, o consumo
da bebida acelerou, o que reconfigurou signi-
ficativamente as vendas entre os diferentes
canais. Já o pós-pandemia trouxe uma retra-
ção, interpretada como uma normalização do
consumo, com maior presença em bares e res-
taurantes, uma diminuição nas vendas online e
uma redução nos volumes de importação. Para
o ano de 2024, alguns fenômenos devem mar-
car o cenário vinícola no Brasil.
O primeiro deles é a comercialização de vi-
nhos premium e superpremium, resilientes em
períodos de crise e crescentes em momentos de
prosperidade econômica, uma expectativa para
este ano. Nos vinhos de baixo custo, em 2023 vi-
mos uma redução nas vendas e na importação
(impactando especialmente vinhos chilenos). Em
2024, a redução das taxas de juro, o aumento do
consumo e a aceleração do varejo devem impul-
sionar esses vinhos, com recuperação de market
share e maior espaço na cesta de compras.
Tendência global impulsionada por millen-
nials e pela geração Z, a busca por produtos
com menor teor alcoólico ou completamente
desalcoolizados deve crescer no mercado brasi-
leiro em 2024, com vinícolas apostando no de-
senvolvimento de produtos nessas linhas. Ou-
tra tendência é o interesse dos consumidores
por vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais.
Embora com menor velocidade no Brasil, deve-
mos ver um aumento global na oferta dessas
categorias neste ano.
Brancos, rosés e espumantes continuarão a
ganhar mais espaço no consumo dos brasileiros,
CATARINA BESSELL

mesmo que ainda haja uma supremacia dos tin-


tos. O crescimento desses estilos de vinhos no
Brasil reflete muito o amadurecimento do mer-
cado e a compatibilidade dos vinhos mais leves
com o clima quente e a gastronomia local.
Do lado das importadoras, o crescimento ex-
As expectativas para 2024 ponencial no consumo de vinhos durante a pan-
demia resultou em uma explosão no número de
O mercado espera a normalização do consumo novas empresas. Diante de uma competição
acirrada e um mercado ainda retraído, muitos
de vinho, a venda de mais brancos e rosés players pequenos tendem a abandonar o merca-
e a busca por bebidas sem álcool do, enquanto empresas mais profissionalizadas,
com maior capacidade de distribuição e inves-
timento, devem ganhar espaço e market share.
O ano de 2024 trará desafios significativos
para o mercado de vinhos, marcado por uma
carga tributária elevada e forte concorrência de
outras categorias, principalmente de cervejas
INO
R A M A R T INS/E V

e de destilados. No entanto, será, sem dúvida,


um ano repleto de grandes oportunidades para
ARI GORENSTEIN
aqueles que estiverem atentos às tendências, às
SSA

Co-CEO do Víssimo
expectativas dos consumidores e às mudanças
JU

Group e co-founder
da Evino de comportamento.

106 exame.com
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