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FEVEREIRO 2017 | hbrbr.com.

br OPERAÇÕES 66 OPERAÇÕES 76

Seja excelente Estratégias


no atendimento energéticas para
ao cliente executivos do
Matthew Dixon et al.
C-level
CORPO & ALMA 90 Andrew Winston,
George Favaloro e Tim Healy
Jerry Seinfeld, o
comediante que
se reinventa

Editores

COM ER
C O QUE A P&G, LEGO E INTUIT SABEM SOBRE
VENCER A CONCORRÊNCIA. PÁGINA 35
FEVEREIRO 2017

FOCO 36 ESTRATÉGIA 50 CONSUMIDORES

35
A FIDELIDADE DO CLIENTE ESTÁ “O HÁBITO CRIA A CONEXÃO”
VANTAGEM SUPERESTIMADA
Melhor focar no hábito. Uma teoria sobre
Uma conversa com Jørgen Vig Knudstorp,
CEO e presidente do Grupo LEGO.
CUMULATIVA a vantagem acumulativa. A.G. Lafley e
Roger L. Martin
David Champion
52 PSICOLOGIA
44 ESTRATÉGIA COMO O HÁBITO VENCE A NOVIDADE
CONTRAPONTO: VELHOS HÁBITOS SÃO Evidências neurológicas do “calor
aconchegante da familiaridade”.
DUROS DE MORRER, MAS MORREM Scott Berinato
O modelo de assinatura da Dollar Shave
Club é um exemplo surpreendente. 54 EMPREENDEDORISMO
Rita Gunther McGrath
“UM PRODUTO QUE PERMITE ÀS
PESSOAS MANTER SEUS HÁBITOS” CAPA: THAWAT TANHA/123RF; BRUCE PETERSON
Uma conversa com Scott Cook, presidente
e cofundador da Intuit. David Champion

FIQUE CONECTADO CONOSCO


HBRBRASIL www.hbrbr.com.br
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4 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


FEVEREIRO 2017

ARTIGOS
ESTRATÉGIA SOCIAL OPERAÇÕES OPERAÇÕES
A contribuição da estratégia social Seja excelente no atendimento ao Estratégias energéticas
para a vantagem competitiva consumidor para executivos do C-level
Cada vez mais, executivos e empresas O consumidor quer resultados — A energia não é mais simplesmente
são desafiados a beneficiar a sociedade não necessariamente simpatia. um custo a ser administrado.
e a proteger o meio ambiente atuando Matthew Dixon Lara Ponomareff, Andrew Winston, George Favaloro
local ou internacionalmente. Scott Turner e Rick DeLisi e Tim Healy
Alexander Zimmermann, Gilbert Probst,
Carolin Hermann e Paul Ferreira
66 76
58
ENIS AKSOY/GETTY IMAGES

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 5 


FEVEREIRO 2017

RADAR 17 MARKETING
O poder de uma
avaliação positiva
COMO EU FIZ
O CEO da T-Mobile explica
Novas ideias e Forçar os consumidores a refletir
pesquisas em andamento sobre boas experiências estimula como conquistar uma fatia
as vendas. de mercado provocando
ofensivamente os
concorrentes
26 DEFENDA SEU ESTUDO O provedor de wireless
O sucesso depende dos genes quis tornar todo o
Nova pesquisa revela que pessoas segmento melhor para
com certas variantes genéticas os consumidores de
têm emprego de prestígio, ganham uma vez por todas.
salário alto e acumulam mais bens. John Legere

28
DE CORPO E ALMA
JERRY SEINFELD
90

MATT MCCLAIN/GETTY IMAGES E REYNOLDS

SEÇÕES 10 Carta ao leitor


11 Colaboradores
86 Resumo da edição

6 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


SEU REFÚGIO
CONECTE-SE COM O QUE
REALMENTE IMPORTA, A VIDA.

O LUGAR MAIS DESEJADO DO RIO PARA RELAXAR


E APRECIAR UM BOM MOMENTO.

HOTÉIS | TRENS | CRUZEIROS FLUVIAIS | JORNADAS | B E L M O N D.CO M


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Publieditorial

Combinação de dados com


análise acelera resultados
e engorda lucros
'L¼FLOPHQWHXPDHPSUHVDFRQVHJXLULDsobreviver olhando só
SDUDRSDVVDGR0DVHQWmRQmRVHQGRSRVVtYHOSUHYHURIXWXUR
FRPRID]HPDVHPSUHVDVGHVXFHVVR"&RPQRYDVHSRGHURVDV
IHUUDPHQWDVGHDQiOLVHGHGDGRVPXLWDVGHODVHVWmRFRQVHJXLQGR
FKHJDUFDGDYH]PDLVSHUWRGHSHUFHEHURTXHHVWiSRUYLU1DHUDGR
°ELJGDWD±WUDQVIRUPDPGDGRVEUXWRVHPSUHYLV}HVFRPDOWRJUDXGH
DFXLGDGHHGHVVHPRGRHQJRUGDPVXDVUHFHLWDVHOXFURV

MODELOS ANALÍTICOS de alta precisão, capazes de 8EQFqQ JSM S GEWS HI YQ ZEVINMWXE HI TSVXI QqHMS
antecipar padrões e tendências de grande impacto, como HI IUYMTEQIRXSW HI PE^IV I VSYTEW IWTSVXMZEW %PXEQIRXI
necessidades e demandas futuras dos consumidores de HITIRHIRXI HI YQ KVYTS HI GPMIRXIW ½qMW I HE WE^SREPMHEHI
determinado produto, já fazem parte do dia-a-dia de seu modelo de negócio estava prestes a se exaurir.
muitas organizações. Portais de e-commerce oferecem Quando decidiu aumentar o ticket QqHMS HI GSQTVEW S
produtos de acordo com preferências percebidas a TVSTVMIXjVMS TIVGIFIY UYI RnS XMRLE E QIRSV MHIME HIUYEP
partir dos movimentos dos internautas com seus mouses. seria a resposta dos seus clientes. Por onde começar? Que
Agências de viagens reprogramam roteiros de acordo com TVSHYXSW SJIVIGIV# )Q UYI GPMIRXIW JSGEV# % WEuHE WYVKMY
fatores climáticos ou eventos como crises políticas ou a partir de uma análise dos dados do ponto de venda da
erupções vulcânicas. Bancos previnem fraudes a partir de PSNE I HS TIV½P HSW GPMIRXIW  GSQTVEHSVIW VIKYPEVIW HI
algoritmos sobre padrões de comportamento suspeitos. E produtos de valor mais baixo, os compradores ocasionais
EWWMQ TSV HMERXI IQ YQE MR½RMHEHI HI GEWSW UYI XEQFqQ de produtos mais caros, compras únicas, compradores de
combinam dados com análises de alto impacto. ±PMUYMHEpnS² I EWWMQ TSV HMERXI )WWI QIVKYPLS TIVQMXMY
Foi o caso de YQ JEFVMGERXI HI jPGSSP KPSFEP UYI IWXEZE novos insights TEVE S ZEVINMWXE GSRWIKYMV MHIRXM½GEV I
GSQ HM½GYPHEHI IQ HI½RMV YQE VSXE HI PSRKS TVE^S QEMW VEWXVIEV WIYW GPMIRXIW QEMW ½qMW JSVQYPEV GEQTERLEW I
precisa das vendas de suas várias linhas de produtos ao programar promoções, oferecendo diferentes valores para
redor do mundo. A partir de dados sobre efeitos dos consumidores menos comprometidos para aumentar as
fatores econômicos globais, preços e eventos de marketing ZIRHEW I GSRWXVYMV VIPEp~IW HI ½HIPMHEHI
HSW GSRGSVVIRXIW YQE IUYMTI HI EREPMWXEW IWTIGMEPM^EHSW Outro processo permitiu a um banco gerenciar o uso
produziu uma ampla gama de previsão para 29 mercados dos caixas eletrônicos em diferentes circunstâncias e,então,
globais, incorporando marketing, preço e fatores planejar e otimizar a programação de remessa e entrega de
KISIGSR|QMGSW% TVIGMWnS QqHME HEW TVIZMW~IW EYQIRXSY HMRLIMVS 4EVE FERGSW HI ZEVINS q GVYGMEP KEVERXMV UYIWIYW
IQ  % SVKERM^EpnS XEQFqQ JSM GETE^ HI ERXIZIV SW IJIMXSW GEM\EW IPIXV|RMGSW IWXINEQ EHIUYEHEQIRXI EFEWXIGMHSW
HEW EPXIVEp~IW HI TVIpS I HEW EXMZMHEHIW HI QEVOIXMRK%PqQ GSQ HMRLIMVS (MRLIMVS IQ I\GIWWS ½GE TEVEHS WIQ
disso, os efeitos das mudanças das condições econômicas VIXSVRS TEVE S FERGS JEPXE HI HMRLIMVS WMKRM½GE WIQTVI
em vendas futuras começaram a poder ser simulados. assumir o risco de perder clientes aborrecidos por não

8
GSRWIKYMVIQ JE^IV WEUYIW UYI XIRHIQ E TVSGYVEV E 4SHIWIVUYIREverdade, a organização tenha pessoas
QjUYMREHSGSRGSVVIRXISRHIIPIWTSHIQWIVEXVEuHSW e hardware, mas os problemas a solucionar sejam mais
TSV IQTVqWXMQSW I SJIVXEW HI SYXVSW WIVZMpSW 2IWXI GSQTPI\SW I QEMW HMJuGIMW UYI E WYE GETEGMHEHI HI
GEWS JSM YWEHS YQ TVSNIXS HI±TVIZMWnS I SXMQM^EpnS² solucioná-los. Podem ser problemas novos ou emergentes
HITSMW EHETXEHS E SYXVEW SVKERM^Ep~IW UYI ETPMGEVEQ IUYITVIGMWEQWIVVIWSPZMHSWQYMXSVETMHEQIRXI
uma abordagem semelhante para a otimização de suas 3XIQTSXEQFqQTSHIWIVGVYGMEP5YEPUYIVTVSNIXS
próprias atividades de logísticas e cadeia de fornecimento, HI8-PIQFVE1EMEPIZEXIQTSTEVEGSR½KYVEVIENYWXEVSW
levando os itens certos ao lugar certo e na hora certa ambientes de hardware e software. Pode haver necessidade
para atender a demanda. de recrutar pessoal ou as pessoas envolvidas podem ter
Desafios como esses demandam QEMW UYI S outras responsabilidades diárias.
TVSGIWWEQIRXS EYXSQjXMGS HI KVERHIW UYERXMHEHIW HI
dados, segundo Bruno Maia, head HE%QqVMGE 0EXMRE HI
Cloud Analytics do SAS, líder global em softwares e serviços Os projetos levam em média de 6 a 12 meses
de business analytics e a maior empresa independente do para gerar valor. Nesse tempo, os problemas
segmento. Exigem análise especializada e personalizada. podem ter mudado ou a oportunidade de negócios
diminuído. O Results as a Service do SAS supera
O software, explica, age rapidamente e sem demandar
vários desses obstáculos e pode gerar valor
alto grau de intervenção humana. Pode ser usado em comercial em poucas semanas. Tem o resultado
diversas situações semelhantes. Uma vez ativados, os pronto para gerar ROI, sem burocracia e sem
algoritmos assumem o controle e comandam as ações. necessidade de licenciamento do software ou
Mas muitos casos exigem vasta matriz de experiência em contratação da mão de obra qualificada. Basta
diferentes setores. o RAAS (Results as a Service) para ter acesso
Por falta de capacidade de implementar as soluções ao know-how da líder global em analytics, e com
IHEVSTEWWSEPqQQIWQSIUYMTEHEWGSQJIVVEQIRXEW implementação ultra veloz.
O SAS é líder de mercado em Analytics. Por meio
tão poderosas de processamento de dados, muitas
de soluções analíticas inovadoras, voltadas para a
organizações deixam de tirar o melhor proveito dos inteligência do negócio e gerenciamento de dados,
softwares e alcançar os melhores resultados. Isso, diz Maia, a companhia ajuda seus clientes em 140 países a
TSVZjVMEWVE^~IW9QEHEWQEMWJVIUYIRXIWqEIWGEWWI^ tomarem decisões de forma rápida e assertiva.
das habilidades corretas. Analistas estão se tornando Softwares de alto desempenho para a análise
YQ VIGYVWS GEHE ZI^ QEMW IWGEWWS ª QIHMHE UYI EW de grande quantidade de dados para a solução de
SVKERM^Ep~IWTIVGIFIQSWFIRIJuGMSWUYIEERjPMWITSHI problemas complexos em curto espaço de tempo
fornecer, a demanda pelos analistas aumenta. Diversas começaram a ser desenvolvidos em 1976 pelo SAS.
Desde então, mais de 70 mil empresas, governos e
TIWUYMWEWVIGIRXIWHIWXEGEQHq½GMXHIEREPMWXEWIQXSHS
instituições acadêmicas já instalaram softwares SAS.
o mundo. Nos últimos anos, o SAS começou a se envolver
3YXVE HM½GYPHEHI q UYI a organização pode ter falta diretamente na aplicação dos processos de análise a
HI SYXVSW VIGYVWSW RIGIWWjVMSW 4SHI LEZIV HM½GYPHEHIW casos concretos – o SAS Results as a Service.
com a central de dados ou hardware EHIUYEHS GSQ No Brasil desde 1996, a subsidiária brasileira
conhecimento de TI ou disponibilidade para administrar conta com mais de 200 clientes, escritórios em São
os ambientes necessários de hardware; com software Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF), cerca
necessário para gerenciar dados, executar análises e utilizar de 180 colaboradores e atua em diferentes setores
como finanças, telecomunicações, varejo, energia,
os resultados; com habilidades certas em termos de dados
governo, manufatura e educação.
para gerenciar os dados necessários; ou com os dados
externos necessários para fornecer o melhor resultado.

Saiba mais em: SAS.com/br/raas

9 
CARTA AO LEITOR
RENOVAÇÃO Você provavelmente notou que a revista que está
em suas mãos é diferente da HBR Brasil à qual está

CONSTANTE
acostumado. Nossa equipe de design, liderada
pelo diretor de criatividade James de Vries, fez um
excelente trabalho ao introduzir mais requinte e
energia em nossas páginas.
O que não mudou foi nossa profundidade
e rigor, que você verá plenamente exibidos no
menu de artigos. O principal artigo do bloco Foco
apresenta uma nova teoria da estratégia: enquanto
alguns acadêmicos sustentam que o mercado atual
em rápida mudança torna qualquer vantagem
competitiva insustentável, o ex-CEO da Procter &
Gamble A. G. Lafley e o professor da Rotman Roger
Martin argumentam que desempenho sustentado
é, sim, possível. Alcançar o que eles chamam de
vantagem cumulativa não significa fidelizar o
cliente, e sim incutir-lhe hábitos.
Esta edição marca o início do nosso novo
esquema de publicações impressas: dez por ano.
Com esta reformulação introduzimos duas edições
digitais (janeiro e julho), o que nos permitirá
produzir mais conteúdo geral — incluindo recursos
digitais e ferramentas valiosas para ajudá-lo a
aplicar as ideias apresentadas na revista e no
Adi Ignatius com o diretor de arte Matthew Guemple
website HBRBR.com.br.
Estamos orgulhosos da nova experiência da
HBR Brasil. Queremos saber sua opinião.

CHRISTOPHER CHURCHILL

ADI IGNATIUS, EDITOR CHEFE

10 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


COLABORADORES

A teoria central do Foco As imagens atrevidas que


desta edição teve sua ilustram o artigo sobre
origem no trabalho de A. as características de um
G. Lafley para revitalizar Rita Gunther McGrath, que excelente representante de
o centro da cidade de também colabora no Foco, serviço ao cliente são de
Cincinnati. O ex-CEO e é fascinada pelas mudanças autoria do finlandês Rami
presidente da P&G percebeu no estudo de estratégia. Niemi, que vive na região
que as cidades precisam “Quando comecei a lecionar, rural da Suécia. “Pego ideias
oferecer experiências só se falava em vantagem da TV e de revistas, ou
atraentes que possam se competitiva sustentável”, diz apenas olhando ao redor”,
transformar em hábitos. ela. “Como criar barreiras? diz ele. “Acima de tudo,
Quanto mais as pessoas Como combater substitutos. uso a imaginação, pois
vão a um lugar, mais se Mas contavam-se nos no interior não há muita
acostumam a ir, e o mais dedos os interessados em gente para observar.” Mas
provável é que voltem. inovação. É bom ver a área ele sabe a impressão que
Chamou a atenção de Lafley conciliando a necessidade quer passar: “Quero que o
que o processo tem um de estabelecer uma forte leitor, só de olhar para um
análogo nos negócios — posição de mercado com a personagem que desenhei,
uma ideia que ele explora de se reinventar.” pense: ‘Conheço esse tipo
com Roger Martin. de cara, ele é realmente
irritante’ — ou legal, ou
divertido. Seria ótimo.”

34 ESTRATÉGIA 42 ESTRATÉGIA 66 CONSUMIDOR


A fidelidade do cliente Mudar hábitos é difícil, Serviço ao cliente
é superestimada mas não impossível espetacular

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 11 


Apresenta

Tudo ou nada
$LQÀXrQFLDGLJLWDOQRDPELHQWHGHLPSRVWRVH[LJHXPDPXGDQoD
GUiVWLFDHPRSHUDo}HVWULEXWiULDVGDVHPSUHVDVHPWRGRRPXQGR
Houve uma época em que a digitalização do universo de está se sujeitando não só a multas e punições cada
impostos era estável e previsível. Reportes eram realizados vez mais severas, mas também a ver suas operações
com base em planilhas exaustivamente preenchidas e a serem ultrapassadas até o ponto de se tornarem
análise de todos esses dados era feita de forma individual, completamente obsoletas.
prejudicando a capacidade de cruzamento de informações
]YÕk[YdarY…ƒg\]ajj]_mdYja\Y\]k& Para Roberta Ezar, sócia de Tax Technology da EY, essa
dura e veloz realidade se mostra ainda mais complexa
em um mundo de negócios marcado por acordos de livre
Essa época acabou. E faz tempo.
comércio e por cadeias de suprimentos multinacionais:
Hoje, o nível de maturidade de órgãos reguladores somado
à ilimitada capacidade de armazenamento, processamento “As adaptações e mudanças em reportes e obrigações
e análise de dados oferecida pelo universo digital dá a Õk[Yak\][Y\YhYŠkY^]lYelg\YYeYd`YljaZmljaY]$hgj
oportunidade não só de uma determinação rápida de falhas consequência, toda a operação de uma empresa, exigindo
[geglYeZ†e\]a\]flaÕ[Y…ƒg]hj]]f[`ae]flgYmlgela[g um grau de conhecimento e uma versatilidade cada vez
de dados pessoais e corporativos. maiores dos responsáveis pela área de Impostos”, diz.

A empresa que não estiver preparada para lidar com <aYfl]\]me[]fjaglƒg\]kYÕY\gj$bfƒg`gmljY


YY\YhlY…ƒgl][fgd_a[Y\]kmYkj]khgfkYZada\Y\]kÕk[Yak escolha que não seja a de colocar em prática um profundo
eSUHFLVRYHUD
WUDQVIRUPDomRGLJLWDO
WULEXWiULDFRPRXP
WRGR&RUULJLUIDOKDV
LVRODGDPHQWHSRGH
VLJQL¿FDUJDVWRV
H[FHVVLYRVVHP
UHVXOWDGRVUHDLV
Roberta Ezar
Sócia de Tax Technology da EY

processo de mudança, adaptando suas práticas às novas


demandas e, também, utilizando esse novo ambiente
a seu favor.

Isso porque à medida que cresce o número e o grau de


]pa_ˆf[aY\YkgZja_Y…“]kÕk[Yak$lYeZ†ekƒg\]k]fngdna\Yk
novas ferramentas e abordagens capazes de auxiliar de
^gjeY]Õ[a]fl]fYa\]flaÕ[Y…ƒg\]h]f\ˆf[aYk]^Yd`Yk$
no preenchimento de reportes, na organização de dados
e na análise, tanto de operações internas, quanto das que
envolvem terceiros.

“Uma estratégia de transformação digital em impostos


deve considerar os pilares: Digital Tax Administration,
Digital Tax Effectiveness, Tax Technology e Tax Big Data.
O objetivo é acompanhar o impacto das transformações Acesse ey.com.br
de impostos no negócio, mas também monitorar as
afgnY…“]k\a_alYakÊ$YÕjeY=rYj&
EDITOR-CHEFE CONSELHO EDITORIAL
Adi Ignatius Elaine Saad
EDITORA José Guimarães Monforte
Amy Bernstein José Luiz Bichuetti
PUBLISHER Murilo Portugal
Joshua Macht Pedro Parente
DIRETOR-GERAL
Edward Crowley PUBLISHER
EDITORA EXECUTIVA Roberto Müller Filho
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DIRETORA DE ARTE EDITORA-CHEFE
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JORNALISTA RESPONSÁVEL
Volume 95, Número 02, Fevereiro 2017 Roberto Müller Filho
FEVEREIRO 2017

Radar
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COMBe PeRDeR V eNdAs
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N Te N S O C o R D iA L !
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MAIS UMA DIFERENÇA DE GÊNERO:
HOMENS E MULHERES TÊM MOTIVAÇÕES
BEM DIFERENTES PARA ENTRAR NA
ÁREA DE VENDAS.
O PODER DA PESQUISA POSITIVA
O processo de feedback dos clientes pode ser uma
ferramenta valiosa para inspirar lealdade e aumentar
as vendas.
Veja também: por que o lobby nem sempre significa
influência, o sucesso dos empresários estrangeiros
e a magia da palavra crowdsourced.
COMO EU FIZ
Aumentar participação de mercado atacando rivais:
a visão do CEO da T-Mobile.

ILUSTRAÇÕES DE KENNETH ANDERSSON


RADAR

PONSáVE LSUCeS
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A G A
RADá V eL
AR T a V eN dA s
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TIC A IL
EM Pá

16 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


INDUZIR CLIENTES A REFLETIR SOBRE BOAS
EXPERIÊNCIAS AUMENTA AS VENDAS.

O PODER DA
os pesquisadores chamam de “solicitações positivas
abertas” parece ser uma maneira fácil e de baixo custo

PESQUISA
de aumentar a satisfação e os gastos. “As pessoas fi-
cam mais felizes quando focam no lado positivo, mas
as empresas raramente lhes dão essa oportunidade”,

POSITIVA
diz Bone.
Em um dos estudos, realizado em uma rede nacio-
nal de varejo, clientes solicitados a fazer um elogio no
início de uma pesquisa de satisfação realizaram 9%
mais transações e gastaram 8% a mais com a empre-
sa no ano seguinte que clientes que fizeram a mesma
pesquisa sem o pedido de elogio. Um estudo em uma
empresa de software B2B descobriu que usuários de
uma versão de teste de um software aos quais se soli-
citou, logo no início, que descrevessem seus recur-
sos favoritos gastaram 32% a mais com os produtos
da empresa no ano seguinte quando comparados
aos que passaram pelo mesmo teste sem que lhes
fosse feita tal solicitação.
maioria das empresas faz pesquisa Em ambos os estudos, clientes levados a elogiar
com clientes para medir-lhes a satis- também pontuaram mais alto em medidas tradicio-
fação, identificar possibilidades de nais de satisfação. E ser solicitado a dar feedback po-
melhoria ou simplesmente permitir sitivo aumentou os gastos, mesmo entre clientes que
que os descontentes desabafem. A relataram ter tido experiências ruins. “Solicitações
abordagem parte de uma mentalida- positivas abertas podem ajudar os clientes a reformu-
de pessimista e focada em problemas. lar experiências não ideais”, escrevem os autores.
“Os clientes foram condicionados a Os pesquisadores oferecem várias explicações pos-
sempre procurar o que está errado”, síveis para esses resultados. Graças à maleabilidade da
diz Sterling Bone, professor associa- memória, conhecida por psicólogos, pedir aos clientes
do de marketing da Huntsman School que relatem episódios positivos pode fortalecer a me-
of Business, no estado de Utah. Na mória dessas experiências e torná-las mais acessíveis
verdade, a grande maioria das pes- no futuro, aguçando a percepção geral dos clientes so-
quisas sobre atendimento ao cliente bre elas. Outro efeito psicológico que pode estar em
trata da “recuperação de serviços” — jogo é a dissonância cognitiva, ou o desconforto que as
que fazer quando um cliente se pessoas sentem quando mantêm crenças contraditó-
queixa. Durante um curso de estu- rias. Ela faz com que seja mais difícil aos clientes cri-
dos bíblicos, quase uma década ticar uma marca depois de ter expressado admiração.
atrás, Bone refletiu sobre o poder da gratidão e come- “Elogiamos o que gostamos, e gostamos do que elogia-
çou a se perguntar o que aconteceria se se esse senti- mos”, diz Hilary Hendricks, MBA da Brigham Young
mento fosse mencionado em pesquisas com clientes. University, que colaborou na pesquisa.
E se em vez de as empresas perguntarem a eles o que Essa manipulação é ética? Os pesquisadores reco-
deu errado perguntassem o que deu certo? nhecem que essa dúvida deve ser investigada, mas
Desde então Bone e colegas fazem pesquisas pa- oferecem vários argumentos favoráveis. Primeiro,
ra explorar essa ideia. Eles publicaram sete estudos dizem, pesquisas anteriores mostram que os clientes
que argumentam que as empresas devem olhar para raramente percebem a manipulação. “Então, é pro-
o processo de feedback do cliente não só como uma vável que eles percebam solicitações gerenciais como
oportunidade de ouvir, mas de também, sutilmente, genuínas, ou até lisonjeiras”, escrevem. Bone acres-
influenciar-lhe a percepção. Descobriram que come- centa que o trabalho psicológico sobre os efeitos salu-
çar um pedido de feedback solicitando um elogio (por tares de expressar gratidão sugere que ser solicitado
exemplo, “O que foi bom em sua visita?”) aumenta- a elogiar pode aumentar a sensação de bem-estar dos
va consistentemente os níveis de satisfação relata- clientes. Os pesquisadores argumentam também que
dos, a possibilidade de uma nova compra, a quanti- as empresas devem ver a técnica não tanto como um
dade de dinheiro que gastariam e até mesmo a leal- meio de manipular percepções, mas como uma forma
dade do cliente. Começar uma pesquisa com o que de construir relacionamentos.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 17 


RADAR

“PRIMEIRO, VOCÊ PRECISA SER ATRAENTE”


Burke Powers dirigiu o programa de voz do cliente da JetBlue
de 2009 a 2011 (agora ele lidera a área de people analytics
na PayPal). Durante esse tempo, ele usou insights da ciência
comportamental para influenciar o comportamento dos
clientes. Ele conversou recentemente com a HBR sobre essa
experiência. Seguem trechos editados.
Como a JetBlue descobriu básica é que há realidade e há
que a forma como pedia percepção. Você pode mudar,
feedback alterava a percepção temporariamente, a percepção,
dos clientes? Quando entrei mas a pessoa sempre volta para
para a JetBlue, o CEO acabara a realidade. Esses truques não
de renunciar. Estávamos focados funcionam se o serviço ao cliente
em reconstruir a confiança do é consistentemente ruim. Não
consumidor. A ideia de “induzir” se pode supor que, mudando o
respostas acabara de se tornar o fraseado de um formulário de
padrão. Ficamos curiosos sobre feedback, as pessoas passarão
como influenciar percepções e a gostar de você. Primeiro, você
comportamentos e sobre como precisa ser atraente.
poderíamos usar nosso programa
de voz do cliente para fazer isso. Como é possível identificar
Na pós-graduação, soube do o que está errado e como
trabalho de Kristen DeTienne sobre melhorar, focando clientes no
pesquisa e percepção dos clientes. lado positivo? Em um programa
Por tentativa e erro, descobrimos maduro de voz do cliente, você
que era eficaz convidá-los a não deve confiar em formulários
compartilhar experiências de feedback para saber o que está
positivas, e não apenas queixas. errado. Insights sobre o que pode
ser melhorado devem vir de uma
Houve alguma preocupação série de outras medidas, incluindo
de que os clientes se pesquisas cientificamente rigorosas,
sentissem manipulados? análise de dados e escuta social.
Discutimos muito isso. Há vários Solicitações de feedback não se
truques psicológicos aos quais destinam a induzir determinados
as empresas podem recorrer sentimentos do cliente — elas
para alterar a percepção do devem fazer com que ele saiba que
cliente, mas se não forem está sendo ouvido, ou então devem
usados corretamente destruirão induzi-lo a lembrar os aspectos
a confiança. Uma boa regra positivos do atendimento. ■

Os pesquisadores citam várias empresas que já so- Mayne argumenta, também, que as empresas po-
licitam elogios como parte dos programas de voz do dem usar respostas positivas para melhorar a qua-
cliente. A Subway colocou sinais perto de seus caixas lidade deslocando o foco de “minas terrestres” (as
com as frases: “Como está seu sanduíche? Na medi- queixas inevitáveis) para “minas de ouro” (áreas
da! Perfeito! Ótimo! Diga-me, quero saber!”. Uma rede onde a marca vai bem). No entanto, adverte Kristen
hospitalar de origem religiosa pede aos pacientes que DeTienne, professora da Marriott School of Manage-
respondam à pergunta “De que forma você foi aben- ment da Brigham Young University e coautora de al-
çoado por um funcionário do hospital?”. A página de guns dos sete estudos, é preciso mais pesquisa para
contato da JetBlue leva os clientes ao link “compar- saber se, em experiências de serviço extremamente
tilhe um elogio”. Para Lonnie Mayne, presidente da ruim (como erros médicos), altamente sensível ou ra-
InMoment — empresa de insights do cliente que se ramente agradável, o pedido de elogio pode sair pela
apoia em grande parte nessa pesquisa —, os que ado- culatra e enfurecer os clientes. “Perguntar quais ele-
tam essa tática percebem que ela cria um ciclo virtuo- mentos de um serviço de funeral nos ‘encantou’ pode
so de apreciação mútua entre clientes e funcionários. não ser uma boa ideia”, diz ela.
“Clientes não são inimigos”, diz ele. “Mas, se você DeTienne alerta que insistir demais por feedback
abordar apenas as críticas, é isso que seus funcioná- positivo é “forçar a barra”. Ela cita uma equipe da
rios vão ouvir e levar para o próximo atendimento.” Delta Air Lines com sede em Ontário que distribuiu

FOTOGRAFIA DE CHAD KIRKLAND


18 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017
cartões aos passageiros com a frase
LOBBY
O VERDADEIRO JOGO DE PODER
“Lutamos com afinco pelo 5 — pe-
dindo, essencialmente, a nota má-
xima 5, em pesquisas de satisfação

EM WASHINGTON
do cliente. E sugerir a resposta po-
de ser particularmente preocupan-
te no contexto de saúde porque,
frequentemente, a percepção que
os pacientes têm dos serviços con-
tribui para determinar o valor do EM CAPITOL HILL, dinheiro significa influência? Segundo um novo estudo, a
financiamento federal. Segundo resposta é não. Pesquisadores entrevistaram funcionários do Congresso,
DeTienne, as melhores empresas do Executivo e do setor privado sobre a reputação de empresas e setores
alertam os funcionários que tenta- para calcular o “índice de pontuação de marca” de cada setor. Empresas
tivas de direcionar a resposta dos
que gastam muito, como as de petróleo e gás, tiveram pontuação baixa,
clientes são motivos de demissão
imediata. enquanto empresas de tecnologia ficaram no topo. O que separa os
De fato, os autores afirmam melhores dos demais? Os pesquisadores identificaram cinco fatores:
que a maior preocupação sobre visibilidade organizacional, conhecimento da área, engajamento externo,
sua pesquisa é que alguns geren- posicionamento de políticas e cidadania corporativa.
tes tentem usá-la para inflar os
índices de satisfação do cliente ALTO
— uma métrica que muitas vezes
ajuda a estabelecer salários com
base no mérito. Em seus estudos, TECNOLOGIA
pedir um elogio levantou o Net
Promoter Scores (uma métrica co- US$ 250 BI
RECEITA
mum de fidelidade) em até 15% e MÉDIA
ANUAL
aumentou as intenções de compra
Índice de pontuação de marca

em até 25%. Se pesquisas inteiras


fossem reformuladas para focar COMIDA & TELECOM
SEGURO BEBIDA SERVIÇOS PÚBLICOS
em experiências positivas, muitas
empresas interpretariam errone-
amente um aumento pequeno e o EMPRESAS AÉREAS
manipulariam como uma melho- FARMACÊUTICO
ra real no serviço. Os pesquisado-
res recomendam que as empresas SEGUROS DE SAÚDE
continuem aplicando suas pesqui-
GÁS & PETRÓLEO
sas originais a um grupo-controle BANCOS
de clientes para que as tendências
genuínas do serviço não sejam
camufladas.
Finalmente, os pesquisadores
observam que, para uma melhoria
sustentada, os benefícios obtidos
BAIXO
com a solicitação de elogios de-
US$ 0 US$ 2 US$ 4 US$ 6 US$ 8 US$ 10 US$ 12
vem ser acompanhados de sólidos
Despesa anual com lobby (US$ milhões)
fundamentos de serviço. “Na nos-
sa opinião, isso não funciona para FONTE NATIONAL JOURNAL RESEARCH
uma empresa mal dirigida”, diz
DeTienne. “Não vai, por si só, res-

,
gatar um negócio do fracasso.” PROPORÇÃO DE ADULTOS NOS ESTADOS
HBR Reprint F1701A–P
UNIDOS QUE OBTIVERAM RENDA DA
SOBRE O ESTUDO  ECONOMIA DE PLATAFORMAS ONLINE,
“Mere measurement ‘plus’: how
solicitation of open-ended positive INCLUINDO EMPRESAS COMO UBER E
feedback influences customer purchase
behavior”, de Sterling A. Bone et al.
AIRBNB.
“PAYCHECKS, PAYDAYS, AND THE ONLINE
(Journal of Marketing Research, 2016) PLATFORM ECONOMY,” DE JPMORGAN CHASE

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 19


14
RADAR
IMPOSTO MÍNIMO SOBRE
ALIMENTOS PREJUDICIAIS À
SAÚDE NECESSÁRIO PARA
GÊNERO CENTAVOS
MUDAR PADRÕES DE CONSUMO
“WILL A FAT TAX WORK?” DE ROMANA KHAN,

ELE VENDE, ELA VENDE


KANISHKA MISRA E VISHAL SINGH

GLOBALIZAÇÃO
Milhões de pessoas trabalham em vendas nos Estados Unidos. Como seria de
esperar, as motivações que as levaram a seguir essa carreira são muito variadas. POR QUE, REALMENTE, AS EMPRESAS
Mas uma pesquisa com mais de mil profissionais de vendas revela uma clara
diferença de gênero. As mulheres, mais que os homens, geralmente chegam à
MUDAM P&D PARA O EXTERIOR
profissão por acaso, enquanto os homens, mais que as mulheres, são atraídos NÃO É À TOA QUE AS MULTINACIONAIS
pela autonomia da área e pelas recompensas financeiras. ■
investem pesado para abrir centros de
P&D na Índia e em outros países em
A RAZÃO FUNDAMENTAL PELA QUAL ESTOU EM VENDAS desenvolvimento: muitos desses países
têm graduados em ciência, tecnologia,
MULHERES HOMENS engenharia e matemática qualificados
e que trabalharão por muito menos que
cientistas nos Estados Unidos. Mas novas
pesquisas sugerem que essa não é a maior
motivação: as empresas fazem isso,
principalmente, por causa do benefício
fiscal obtido com a transferência dos lucros
Quero controlar meu próprio destino. por meio de inovação para jurisdições
estrangeiras. Foram analisadas patentes e
dados financeiros de mais de 200 empresas
entre 1993 e 2006. Descobriu-se que as
empresas economizaram 20 vezes mais
pelo deslocamento de impostos que pelo
deslocamento do trabalho. Descobriu-
Quanto mais trabalho mais ganho. se também que as empresas estão mais
propensas a deslocar receitas relacionadas
a suas patentes mais valiosas e que o
deslocamento de impostos é menos
comum em países com baixo IP (índice de
proteção) — isso reforça a ideia de que P&D
estrangeira tem mais a ver com impostos
que com mão de obra.
“Tais análises fornecem informações
Combina com minha personalidade. úteis para os formuladores de políticas
públicas e pesquisadores interessados em
compreender a crescente participação
estrangeira nos lucros em todo o mundo”,
escrevem os autores. Isso é especialmente
verdade numa época em que autoridades
de muitos países se esforçam para conter
transferências de lucros. ■
Aconteceu naturalmente.
SOBRE O ESTUDO “R&D and the rising foreign
profitability of U.S. multinational corporations”, de Lisa
FONTE “THE SIMILARITIES AND DIFFERENCES BETWEEN MEN AND WOMEN IN SALES,” DE STEVE W. MARTIN De Simone, Jing Huang e Linda Krull (versão preliminar).

20 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


Gustavo Morita

O design como caminho


para a inovação
NA SEGUNDA QUINZENA de janeiro, a uma temperatura organizacional conservadora e problemas regulatórios.
que na melhor das hipóteses rondou o zero grau, os cerca O diretor geral do Istituto Europeo di Design – IED
de 3 mil participantes do Fórum Econômico Mundial Brasil, Victor Falasca Megido, vai além e alerta que esses
de Davos, Suíça, ouviram maravilhados a previsão de cobiçados ganhos não serão capturados sem a ajuda do
que a revolução da digitalização pode proporcionar um design.
ganho de US$ 100 trilhões na próxima década para a Megido explica que a combinação do uso de
indústria e a sociedade. A avaliação é um dos primeiros [LJUVSVNPHZ JVTV H PU[LSPNvUJPH HY[PÄJPHS H H\[VTHsqV L H
resultados da Iniciativa de Transformação Digital lançada PU[LYUL[ KHZ JVPZHZ Z} ZLYm LÄJPLU[L ZL OV\]LY WYVÄZZPVUHPZ
em 2015 pelos organizadores do Fórum em parceria com X\L ZHPIHT \ZHY LZZHZ MLYYHTLU[HZ ,ZZLZ WYVÄZZPVUHPZ
a Accenture com o objetivo de dimensionar o impacto indica, são os designers que, com a abordagem do
das novas tecnologias no planeta. design thinking, sabem combinar essas tecnologias
Esse primeiro relatório divulgado observa que há de modo sustentável e de forma a gerar valor para a
alguns fatores que inibem as transformações. Um deles ZVJPLKHKL JVTV \T [VKV 5H KLÄUPsqV KH (JJLU[\YL
é o dilema do inovador, que receia a canibalização design thinking é um processo de resolver problemas
dos atuais modelos de negócio. Outros são a baixa L PKLU[PÄJHY VWVY[\UPKHKLZ WHYH PUV]HY JLU[YHKV UV
adesão à tecnologia em algumas organizações, a cultura ser humano. O método pode ser usado para resolver

21 
problemas, endereçando as necessidades pessoais,
possibilidades técnicas e demandas dos negócios.
As empresas já descobriram suas vantagens.
Atualmente, cerca de 60% dos alunos do curso de pós-
graduação em design estratégico do IED São Paulo são
engenheiros e administradores que querem usá-lo como
ferramenta para seus negócios. Os 150 professores
As empresas têm que inovar,
da casa, mentores e consultores, não só dão aula na trabalhar de olho no futuro,
graduação, pós-graduação e extensão, mas também
apoiam as consultorias prestadas pela instituição para na sustentabilidade, na nova
as grandes e médias empresas, organizações e governos,
com projetos desenvolvidos em 12 estados brasileiros.
economia e nos serviços.
O mais recente passo da faculdade foi o lançamento O design é capaz de propiciar
do IED Lab, laboratório de design e inovação que, na
KLÄUPsqV KL 4LNPKV t \T ¸LZWHsV KL [YHUZMVYTHsqV toda essa transformação
constante, local de oxigenação de seres humanos
por meio do design thinking, para gerar inovações. É
uma junção de espaços físicos e virtuais para jovens,
LTWYLZmYPVZ WYVÄZZPVUHPZ X\L WVKLYqV WHY[PJPWHY KL
cursos, vivências, workshops e desenvolver projetos
com a gente”. As empresas interessadas podem trazer
seus projetos e submetê-los ao laboratório, onde serão
desenvolvidos por professores e alunos. A exigência é
que a empresa também participe. “É preciso engajamento
e envolvimento para haver transformação”, explica
Megido. Além disso, o modelo de negócio tem que estar distinto, da arquitetura, da engenharia e do artesanato, e
coerente e alinhado com as questões da sustentabilidade, MVPZLJVUZVSPKHUKVJVTV\THWYVÄZZqVUV]HHVSVUNV
novas tecnologias, serviços e gestão. desse período. Faz parte dessa história o surgimento de
Na avaliação de Megido, o laboratório dá novo importantes escolas como o Istituto Europeo di Design
ZPNUPÄJHKV HV WYVW}ZP[V KL \TH MHJ\SKHKL KL KLZPNU (IED), na Itália, em 1966. As agências vão surgindo e
no Brasil, uma vez que fomentar o olhar diferente ganhando importância nas décadas seguintes e, mais
para a disciplina abre espaço para os jovens que estão ou menos simultaneamente, começou a tomar forma
WYVJ\YHUKV UV]HZ WYVÄZZLZ ¸i \T [Z\UHTP X\L ]HP o design thinking. Até então, o foco do design era uma
chegar: ou você surfa ou vai se afogar. Acabou a era coisa bem diferente, voltada para o mercado da época,
KHZIVUPÄJHsLZKL]VS\TLZKHZYLZLY]HZ[tJUPJHZ9;Z da indústria de produtos de massa.
KVZ WYVÄZZPVUHPZ H\[UVTVZ KVZ MLLZ KL HNvUJPHZ KV
pedágio”, diz. O que aconteceu então?
O próximo passo é mais ousado ainda. O IED quer O mercado mudou. Com novas tecnologias, é mais
ser espaço também para o empreendedorismo. Megido virtual, intangível. Para sobreviver, as empresas têm que
calcula que se cada um dos mil alunos que passam inovar, trabalhar de olho no futuro, na sustentabilidade,
pelo instituto todo ano tiver uma ideia, são mil ideias na nova economia e nos serviços. E o design é capaz de
potencialmente inovadoras. Se 20% delas forem propiciar toda essa transformação. Desde o início do
realmente transformadoras, já há um volume crítico novo milênio, o design passou a viver uma nova fase,
para levar adiante um projeto consistente com apoio ao que começou no plano teórico, mas agora começa a
empreendedorismo por meio da incubação das propostas entrar na aplicação prática. O design está hoje atrelado
junto com outras empresas. a todas essas temáticas. Não é mais só questão de marca
A seguir, a entrevista com Megido. e de engenharia. Design é um jeito de pensar diferente.
O design gera projetos transformadores para que isso
Como o design se transformou em uma ferramenta do possa ocorrer, idealizando coisas de uma forma nova e
mundo dos negócios? diferente. O design apresenta uma revolução. É disso que
O design nasceu no século 20 como um híbrido, porém tratamos no livro “A Revolução do Design – Conexões

22
para o Século XXI” (Editora Gente/IED Brasil), que Mas passa por uma revisão completa da educação e do
acabamos de lançar. relacionamento entre empresa e cliente. O que está em
jogo não é mais a relação entre uma empresa e um cliente
Qual foi essa revolução? e sim entre parceiros de vida, que buscam ambos saírem
A revolução do design signiÄJH WYVQL[HY JVPZHZ WHYH HZ enriquecidos desse relacionamento. E, para que haja
pessoas levando em conta quatro pilares: sustentabilidade, LUYPX\LJPTLU[VWYLJPZHTL_PZ[PYWYVW}ZP[VLZPNUPÄJHKV
inovação tecnológica, serviços e nova economia. A
sustentabilidade, por sua vez, tem sete pilares: clima, É um caminho sem volta?
água, direitos, produção, biodiversidade, agropecuária Não dá mais para continuar replicando as métricas e
e emprego, na formulação do Conselho Empresarial metodologias do século passado, que funcionaram em
Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). uma época da guerra fria, dos blocos políticos e
As novas tecnologias que estão redesenhando nossa econômicos. O mundo está mais complexo. O ser humano
]PKH [HTItT ZqV ZL[L! PU[LSPNvUJPH HY[PÄJPHS VIQL[VZ mudou de tal forma que não quer o relacionamento que
autônomos, big data, impressão 3D, internet das coisas, tinha antes. A pauta hoje é outra. As empresas estão
robótica e mídia social, conforme estabelece o relatório procurando o design thinking porque é uma abordagem
Digital Transformation Initiative, recém divulgado que as ajuda a projetar seus propósitos, com respeito
pelo World Economic Forum. Os serviços passam a e empatia, com o olhar para sustentabilidade que
predominar e já representam 80% do Produto Interno a sociedade exige, e para os serviços que as pessoas
Bruto (PIB) dos países desenvolvidos, e cerca de 60% no demandam. A economia pede projetistas, planejadores,
caso do o Brasil. A nova economia visa o bem-estar, além pensadores que tenham essa capacidade e essa
da riqueza. São essas as premissas do design inovador, ÅL_PIPSPKHKLKLSPKHYJVTLZZHKPUoTPJHKVZLYO\THUV
que também impactam os negócios. É uma junção de em uma ponta e com a tecnologia na outra. Por outro
inovações dos últimos anos que, pela primeira na história, SHKV LZZL WYVÄZZPVUHS [LT X\L ZHILY JVSHIVYHY JVT V
torna o homem livre de ter que produzir coisas. Ele pode arquiteto, o geneticista, com o engenheiro. O designer
planejar, mas não precisa mais produzir. t \T WYVÄZZPVUHS OxIYPKV JHWHJP[HKV WHYH [YHIHSOHY
e dialogar com todas essas frentes, do antropólogo e
Como o design thinking entra nessa equação? sociólogo ao geneticista e engenheiro. É grande aliado
O design thinking é contemporâneo do desenvolvimento das empresas porque o que mais agrega é um novo olhar.
das inovações, como as que resultaram na inteligência O designer chega como oxigênio para propiciar essa
HY[PÄJPHS L UH JPILYUt[PJH :qV PUV]HsLZ KVZ ‚S[PTVZ transformação e tirar a inovação do discurso.
50 anos, que estão agora se integrando com resultados
explosivos. Por exemplo, o carro autônomo do futuro As empresas estão conscientes dessas mudanças?
[YHIHSOHJVTPU[LSPNvUJPHHY[PÄJPHSIPNKH[HPU[LYUL[KHZ As empresas sempre querem vender mais. Depois de
JVPZHZLYVI}[PJHHStTKLJVUÄN\YHY\TUV]VZLY]PsV terem atuado com propaganda e técnicas voltadas para
mais que um produto. E também não é mais o vilão porque o aumento das vendas, começam a entender que todos
é uma ideia sustentável, respeita o clima, é mais acessível vendem as mesmas coisas. É só ir um supermercado e olhar
e vai gerar bem-estar. É o designer que está projetando as prateleiras. Saturou. As empresas então descobriram
tudo isso. É o ser humano que usa de suas capacidades que precisam trabalhar com propósito, se relacionar com
PU[LSLJ[\HPZ¶ÅL_PIPSPKHKLZVS\sqVKLWYVISLTHZVSOHY os seres humanos que compram seus produtos e que são
L[UVNYmÄJV LTWH[PH [YHIHSOV LT LX\PWL ¶ KL TVKV movidos por paixões, medos e desejos; e que têm de
criativo. O design thinking usa a antropologia para tratar essas pessoas de uma forma mais sincera e honesta
entender o homem e se conectar com o contexto. Ser KVX\LÄaLYHTH[tOVQL,UÄTWHZZHYHYLZWLP[HYVZLY
criativo é resolver os problemas do homem e do planeta humano. As pessoas querem respeito; se consideram
com empatia e respeito para proporcionar felicidades. O parceiras das empresas e estão dispostas a se conectar
design se preocupa em realmente proporcionar felicidade com elas desde reconheçam propósito em seus produtos,
e bem-estar. Não vende felicidade como o marketing, serviços e atitudes. Caso contrário, vão se desconectar
sem se importar se realmente vai gerar felicidade. Será com apenas um clique.
possível uma revolução que quebre muralhas, mude
modelos, mas com empatia e bom humor, respeitando Todas as empresas pensam assim?
a cultura e os valores humanos? Com a revolução do É a primeira vez na história dos últimos 50 anos que as
design, que é uma revolução da empatia, isso é possível. empresas estão sensibilizadas para o tema. Atualmente,

23 
indústrias, organizações, entidades e até governos a ter uma utilidade extraordinária e rende muito dinheiro
querem ouvir a respeito do design thinking. Toda a para seu fabricante até hoje. As empresas têm que achar
pressão da sociedade pela sustentabilidade joga a favor; um jeito de fomentar a criatividade. Curiosidade só não
e o mercado também, por causa do protagonismo dos basta; é preciso coragem.
serviços. A virtualização torna tudo serviço hoje. Design
é serviço. Mas há um paradoxo. As empresas pedem Quais são as consequências?
criatividade das pessoas, mas castram a criatividade. Muitas empresas estão falindo porque não estão abertas
O modelo educacional faz o mesmo com escolas com a essas transformações e estão vendo seus mercados
currículos do século 19. Persiste o consenso de que serem seriamente ameaçados. Há vários exemplos
tudo que não é relacionado à produção e à riqueza é recentes. A Ryanair surgiu oferecendo serviço a baixo
vagabundice, é arte. Naturalmente, há resistências. No preço, se conectou diretamente com clientes, digitalizou
entanto, a criatividade nunca foi tão necessária. Não há tudo, possibilitando que todos os procedimentos sejam
mais gestão que não seja criativa. Não há inovação sem feitos on-line, passou a usar hubs secundários, um
criatividade. O design veio devolver a criatividade ao único modelo de avião, sem lugar marcado. Essas
mundo dos negócios. mudanças permitiram o acesso de um turista que viajava
apenas de trem ou ônibus porque o avião era caro. As
O que acontece? grandes companhias aéreas acabaram perdendo um
O dilema da empresa para inovar é mudar o modelo mercado que poderiam ter. Transformações semelhantes
atual para sobreviver no futuro. Tem que mudar a cultura aconteceram com o Uber no serviço de transporte; com
organizacional, o mindset; e, muitas vezes, a tecnologia. a Airbnb no ramo hoteleiro; e com a Alibaba e a Amazon
A empresa precisa ter coragem de canibalizar recursos nas vendas de varejo. A empresa precisa assumir que
hoje para gerar vida empresarial e receita amanhã. viverá transformações constantes. A sociedade também
Liderança não é mais mandar, é inspirar. As escolas não precisa entender que viverá crises constantes. As pessoas
ensinam que não é apenas o lucro que importa, mas passarão a mudar de emprego quatro, oito, muitas vezes
também o impacto socioambiental. É uma mudança HVSVUNVKLZ\H]PKH"LKLWYVÄZZqV[YvZX\H[YV]LaLZ
de paradigma. Nem todos executivos estão dispostos Para quem nasceu no século passado é difícil passar
a sair da zona de conforto hoje para ganhar amanhã. por essas mutações, mas quem nasce no século atual
Em muitos casos, a resistência começa na cúpula, vai viver isso naturalmente. As empresas precisam se
entre as primeiras três linhas hierárquicas. É o caso organizar para captar esses talentos. Não há talento que
KV WYVÄZZPVUHS KL THYRL[PUN V\ KH HKTPUPZ[YHsqV X\L queira trabalhar em uma empresa que coloca a mesa de
WYLMLYL YLJLILY HZ WLZX\PZHZ WYVU[HZ L UqV LZ[m H ÄT WPUN\LWVUN\LLKLWLIVSPTHWLUHZWHYHÄUNPYX\LLZ[m
de falar com as pessoas, de pôr a mão na massa. Se aberta à criatividade.
não há essa disponibilidade, vai continuar replicando as
coisas de sempre, aprendidas nos manuais tradicionais. Quais são as barreiras?
Acaba criando um castelo inacessível, se esconde no 6 WYPTLPYV NYHUKL KLZHÄV nas empresas é a cultura
micromanagement para evitar o enfrentamento. Ignora organizacional. A empresa quer adotar o design thinking,
que o contato com o ser humano é muito importante. mas não pretende mudar nada do que faz. Não tem
coragem para se transformar por causa das pessoas.
A preocupação das empresas, então, nem sempre é Geralmente a direção não quer sair da zona de conforto,
genuína? da rotina, de tudo que aprendeu a vida toda. Há resistência
Muitas vezes, para indicar que querem construir a mudar o modelo de negócio mesmo que haja pressão
um ambiente que estimula a brincadeira, o jogo e a do mercado. Mas quem não mudar não vai sobreviver.
criatividade, as empresas e as escolas instalam mesas É preciso adaptar o modelo de negócio para aplicar as
de pingue-pongue e pebolim. Mas nem sempre isso novas tecnologias, olhar a sustentabilidade, oferecer não
ZPNUPÄJHWLYTP[PY\TVSOHYKPMLYLU[LZVIYLHZJVPZHZKH apenas produtos, mas serviços e experiências. Quem
vida. O Google realmente inovou nesse ponto liberando não mudar, não vai participar da economia do século 21.
10% do tempo dos colaboradores para pensarem coisas
aleatórias, fora de um contexto utilitário. No meio desses Em que estágio as empresas brasileiras estão nessa
pensamentos laterais surgiram boas ideias. O Post it é um revolução?
case clássico de uma ideia que nasceu desatrelada de O IED tem clientes entre empresas KV ZL[VY ÄUHUJLPYV
uma necessidade fundamental do momento, que passou da área automobilística, da indústria têxtil e do

24
varejo, além de entidades setoriais e alguns governos as empresas abram espaço para os jovens, que estão
estaduais e municipais com os quais trabalhamos WYVJ\YHUKVUV]HZWYVÄZZLZWHYH[YHUZMVYTHYHZVJPLKHKL
capacitação em design thinking e desenvolvimento É preciso abraçar essa transformação de forma sincera
de clusters, para ajudá-los a ter outro olhar sobre seus e sem medo. Não há fuga para essa mudança. É um
negócios e atividades. O IED faz isso com cursos in tsunami que vai chegar: ou você surfa ou vai se afogar.
company, workshop para desenvolver a gestão criativa, (JHIV\HLYHKHZIVUPÄJHsLZKL]VS\TLZKHZYLZLY]HZ
e laboratórios de design thinking, em que são usadas [tJUPJHZ9;ZKVZWYVÄZZPVUHPZH\[UVTVZKVZMLLZKL
ferramentas de solução de problemas para levar as agências, do pedágio.
empresas à transformação do mindset. O interesse pode
ser aferido pelo sucesso da pós em design estratégico Qual é o próximo passo?
entre administradores de empresas e engenheiros, que Com o IED Lab, o IED quer ser espaço não só de ensino
compõem cerca de 60% das turmas. Eles querem tornar e educação, mas também de empreendedorismo. Nossos
o design ferramenta estratégica para seus negócios. Os dois grandes ativos são os 1 mil alunos que passam por
150 professores da casa, mentores e consultores, não só ano pela unidade de São Paulo e os 150 professores
dão aula na graduação, pós-graduação e extensão, mas especialistas em todas as áreas de design. Temos um
também apoiam as consultorias prestadas há 12 anos ambiente propício para a inovação porque existem seres
para grandes e médias organizações. E agora lançamos humanos que aqui buscam formação e aprimoramento
o IED Lab. para gerar projetos; temos professores e mentores aliados
dessa transformação; e um ambiente que fomenta o olhar
Como funciona o laboratório? brincalhão, da empatia, quebra barreiras e as divisões de
O IED Lab é nossa revolução, espaço de transformação departamentos. Se cada aluno tiver uma ideia, são mil
constante, local de oxigenação de seres humanos ideias de designers. Se 20% delas forem transformadoras,
por meio do design thinking para gerar inovações. É já temos um ecossistema de inovação bastante
uma junção de espaços físicos e virtuais para jovens, interessante, cujo empreendedorismo podemos apoiar,
LTWYLZmYPVZ WYVÄZZPVUHPZ X\L WVKLYqV WHY[PJPWHY KL incubando as iniciativas junto com outras empresas.
cursos, vivências, workshops e desenvolver projetos Queremos gerar projetos transformadores que saem do
com a gente. As empresas interessadas podem trazer seus papel e são concretizados. São projetos que respeitam
projetos e submetê-los ao laboratório, com a participação as premissas da sustentabilidade e potencializam a
de professores e alunos, desde que possam trabalhar inovação e o uso de novas tecnologias, sob a lógica de
junto. É preciso engajamento e envolvimento para serviços para a nova economia. O Lab está sendo criado
haver transformação. O projeto proposto tem que estar para colocar isso tudo junto, de modo que os projetos já
coerente e alinhado com as questões da sustentabilidade, nasçam com essas características integradas. Somente
novas tecnologias, serviços e nova economia, que são as com um laboratório desse tipo, aberto à experimentação,
demandas da sociedade. pode-se integrar todas as teorias. No laboratório, o
HS\UV YL‚UL [\KV PZZV L HPUKH SPKH JVT VZ KLZHÄVZ
Como essa atividade é aderente aos propósitos da reais do mundo dos negócios, como prazo de entrega
faculdade? L HWYLZLU[HsqV H \T JSPLU[L YLHS ,ZZL KLZHÄV SL]H H
Nessa transformação, passamos a questionar o propósito faculdade do IED para a vanguarda, capitalizando o que
de uma faculdade de design no Brasil. Concluímos que sabemos fazer melhor. Nosso propósito é fomentar um
devemos fomentar a cultura do design de modo que espaço de ensino, projeto e consultoria e transformar a
o potencial e impacto dos projetos seja percebido; e sociedade por meio do design.

ied.edu.br

25 
RADAR

DEFENDA SEU ESTUDO


combinação da natureza com a criação.
Mas estamos apenas começando a
entender como essa interação funciona.

Você não sugere, portanto, testar as


Quando Daniel Belsky, professor da Faculdade de pessoas quando nascem, ou ainda no
Medicina da Duke University, e seus colegas fizeram útero, para ver quem tem aptidão para,
digamos, conseguir um Ph.D. ou se
cruzamento de dados de um estudo longitudinal com tornar um executivo eficaz?
918 pessoas de Dunedin, Nova Zelândia, descobriram Não. Ainda estamos muito longe de
ser capazes de estimar com precisão
uma conexão entre a presença de genes específicos e o potencial humano com um teste
a obtenção de melhores resultados socioeconômicos. genético — e, mesmo se pudéssemos, há
muitas razões para não se considerar isso
A conclusão:

O SUCESSO É MOLDADO
uma boa ideia. Para desenvolver nosso
modelo preditivo, começamos com os
resultados de coletas de dados de dezenas
de milhares de genomas humanos.

PELOS GENES
Identificamos variantes de genes ligados
a resultados acadêmicos específicos e
avaliamos essas relações. Usamos as
informações para criar um algoritmo
que calcula a chamada “pontuação
poligênica”, que indica quantas variantes
cada pessoa tem. Quando analisamos os

PROFESSOR BELSKY,
dados do estudo de Dunedin, descobrimos
que os participantes com pontuação
poligênica mais elevada eram ligeiramente

DEFENDA SEU ESTUDO


mais bem-sucedidos que aqueles com
pontuação mais baixa, mas o efeito era
muito pequeno — apenas 1% a 4% da
variância.
Esses resultados são médias. Algumas
pessoas com pontuação poligênica baixa
eram muito bem-sucedidas, e algumas
com pontuação alta não. Existem muitos
outros testes não genéticos aplicáveis a
crianças e adultos que, mais que o genoma,
permitem boa leitura sobre a capacidade
de realização deles.

BELSKY: O DNA não determina nosso mais prestigiosos, ganharam salários Se outros métodos presumivelmente
destino, mas pode dizer algo sobre mais altos, relacionaram-se com mais baratos funcionam melhor,
que tipo de pessoa nos tornamos e o pessoas mais bem-sucedidas, por que estudar genes nesse
que realizamos. Quando estudamos tiveram maior capacidade contexto?
esse conjunto de dados de um grupo de mobilidade social e Queremos entender como
de indivíduos nascido em uma única geográfica, administraram a genética molda nossa
DESCOBERTA
cidade e depois pesquisado em seu dinheiro com mais vida e o que faz com
intervalos regulares ao longo de suas eficiência e acumularam PESSOAS que algumas pessoas
quatro primeiras décadas de vida, mais ativos. Tudo isso COM CERTOS sejam bem-sucedidas
descobrimos que aqueles com certas sugere que nossos MARCADORES e outras não. A
variantes genéticas — que, em outros genes podem afetar vantagem de olhar para
GENÉTICOS
estudos, já haviam sido relacionadas nosso futuro. Mas o DNA é que ele está
ao bom desempenho educacional — também sabemos que GANHAVAM MAIS. definido no nascimento
atingiram marcos de desenvolvimento o desenvolvimento e é fixo ao longo da vida,
mais cedo quando crianças e se tornaram humano decorre de uma por isso fornece uma base
adolescentes mais ambiciosos. Então, interação complexa entre os para pesquisas. Em última
quando adultos, avançaram mais nos genes que herdamos e o ambiente análise, esperamos fornecer
estudos, ocuparam postos de trabalho que encontramos. Somos o resultado da insights úteis para os formuladores de

26 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


políticas públicas que os ajude a planejar Parece que estamos na fronteira de e profissionais. Esses traços permitiram
intervenções que melhorem a mobilidade um novo campo de pesquisa sobre que crianças com alta pontuação
social. genes e socioeconomia. O que mais poligênica tivessem sucesso não apenas
está sendo estudado? na escola, mas também em muitas outras
Que tipo de intervenção? Este novo campo — chamado áreas. De fato, as diferenças na formação
Por exemplo, descobrimos em nosso sociogenômica — está avançando explicaram, aproximadamente, apenas
estudo que crianças com em várias direções. Grandes metade do sucesso de longo prazo que
pontuação poligênica maior consórcios, como o Consórcio encontramos. E embora a pontuação
começaram a dominar a da Associação Genética poligênica das crianças nascidas em
linguagem mais cedo; DESCOBERTA de Ciências Sociais, famílias com melhores condições tenda
elas aprenderam a CRIANÇAS COM liderado por Dan a ser ligeiramente maior, as pontuações
falar mais cedo e a Benjamin, da University mais altas indicaram o sucesso,
ler mais cedo e mais PONTUAÇÃO MAIOR of Southern California, independentemente das condições
rápido que seus pares. DOMINARAM O e Philipp Koellinger, em que a criança cresceu.
Talvez intervenções IDIOMA MAIS da Vrije University, em
que aumentem todas as CEDO. Amsterdã, e projetos Acho que isso ainda causa certa
habilidades linguísticas como o Sociogenoma, dúvida. Você não se preocupa
das crianças mais novas liderados por Melinda com um futuro como o que mostra
possam ajudar mais pessoas a Mills, da Oxford University, o filme Gattaca, no qual as pessoas
seguir trajetórias bem-sucedidas. estão investigando as influências com “bons” genes são mais favore-
No futuro, conjuntos de dados genéticas das decisões de risco, cidas do que aquelas com genes
maiores podem nos ajudar a entender empreendedorismo, comportamento “ruins”?
por que algumas crianças, mesmo reprodutivo e muito mais. Outra grande Como disse, dado o fraco poder preditivo
com baixas pontuações poligênicas, área de investigação é como os genes de nossos modelos, Gattaca não é possível
conseguem ser bem-sucedidas, ou por moldam nossas relações sociais. Meu hoje. Mas acho que a hora de conversar
que algumas crianças com pontuações colega Ben Domingue, de Stanford, o é, sim, agora. Concordo que a ideia
mais altas têm dificuldades. Esses economista Jason Fletcher e os sociólogos de usar genética como um mecanismo
casos “excepcionais” podem fornecer Dalton Conley e Jason Boardman vêm de classificação é assustadora. Portanto,
pistas sobre como mudar o ambiente investigando conjuntamente se amigos e é importante discutir os possíveis usos
das crianças para melhorar seus cônjuges tendem a ser mais semelhantes desse tipo de pesquisa — e o que deve
resultados. geneticamente entre si e por quê. E há ser evitado. Mas devemos reconhecer
mais cientistas sociais entrando nessa área que já fazemos muita classificação
De onde viriam esses conjuntos todos os dias. hoje. Usamos todo tipo de rótulo
de dados maiores? para escolher vencedores e
O Reino Unido desenvolveu um biobanco Você disse que os genes perdedores, antes mesmo
nacional que agora inclui dados genéticos, que analisou já haviam que as pessoas tenham
além de volumosas informações de uma chance de realmente
meio milhão de pessoas. Nos Estados
sido relacionados
com as realizações
DESCOBERTA mostrar quem são.
Unidos, a Iniciativa de Medicina de acadêmicas, que estão, OS MARCADORES As escolas usam testes
Precisão do presidente Obama visa naturalmente, ligadas INDICARAM de aptidão para
desenvolver um recurso semelhante. ao QI e ao status SUCESSO EM colocar as crianças
Mas esses grandes projetos de dados socioeconômico. em programas para
não podem substituir completamente Será que realmente
QUALQUER “dotados e talentosos”.
os estudos de coorte, como esse no precisamos de AMBIENTE. Problemas iniciais com
qual focamos nossa pesquisa. Para pesquisas científicas atenção ou controle
começar, eles não podem obter o mesmo para nos dizer que pessoas comportamental podem
nível de detalhe, especialmente sobre inteligentes e ricas avançam direcionar as crianças para
o início da vida. Por outro lado, os mais nos estudos e, portanto, o lado oposto. Talvez o genoma
participantes se autosselecionam, então têm mais sucesso como adultos? possa nos ajudar a entender quando
eles não representam necessariamente Acho que uma contribuição importante essas regras sociais não funcionam,
a população total. Essa questão de do nosso trabalho é demonstrar que quando estamos limitando o potencial
representatividade é importante. Por a genética descoberta originalmente humano, e quem nós deixamos para
exemplo, uma grande questão sobre em estudos de escolaridade não se trás injustamente.
nossas descobertas é se elas poderão relaciona especificamente com educação.
ser generalizadas para além das Em vez disso, ela se relaciona com Então, como estão seus genes?
populações de origem europeia. uma série de características pessoais — O acompanhamento está sendo feito.
Talvez elas não possam ser aplicadas a incluindo o QI, mas também habilidades
pessoas com diferentes origens étnicas, não cognitivas, como autocontrole e Entrevistado por Alison Beard
ou que vivem em outras partes do mundo. capacidade de ter boas relações pessoais HBR Reprint F1702B–P

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 27 


COMO EU FIZ

John Legere

CEO DA T-MOBILE FALA


SOBRE DIFAMAÇÃO DA
CONCORRÊNCIA PARA
GANHAR MERCADO
FOTOS DE ANDY REYNOLDS
28 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017
m 2011, depois de dez anos como CEO da o moral dos funcionários estivesse baixo, a cultura geral
Global Crossing, vendi a empresa e aban- estava preservada e tinha enorme potencial. A idade mé-
donei o emprego. Pela primeira vez na dia dos funcionários de campo era 27 anos, e eles procu-
vida eu não precisava trabalhar em tem- ravam alguém para energizá-los. Na verdade, tudo que
po integral, e acabei me divorciando no queriam era um líder que pudesse lhes garantir que tudo
mesmo mês. Foi uma fase bem diferen- daria certo, canalizando sua energia na direção correta.
te. Passei algum tempo de papo para o ar, Percebi também que a T-Mobile estava sendo admi-
lendo O poder do agora, de Eckhart Tolle. nistrada como organização paramilitar, com excessivo
Logo percebi que ficar parado não era pa- controle exercido pelo departamento jurídico e pelo RH.
ra mim. Quando um headhunter me encaminhou para Quis fazer uma reunião de funcionários no primeiro dia,
uma entrevista para o cargo mais alto da T-Mobile, che- mas me disseram que eu só podia falar com funcioná-
quei algumas informações e decidi marcar a reunião. rios de nível sênior. Insisti que a reunião fosse transmi-
Na época, a T-Mobile era uma empresa de capital tida para toda a base de funcionários para permitir que
fechado, detida e controlada pela Deutsche Telekom todos pudessem fazer perguntas. Excesso de hierarquia
(DT). A AT&T tentou adquiri-la, mas o negócio não não é bom! No segundo dia, conheci um funcionário que
vingou devido à oposição do Departamento de Justiça era veterano da guerra do Afeganistão. Haviam-lhe dito
e da Comissão Federal de Comunicação. Os funcioná- que não era permitido colocar uma foto do pelotão so-
rios da DT e da T-Mobile ficaram sem rumo. Durante a bre sua mesa porque isso poderia aborrecer as pessoas
reunião inicial, tentei encorajar o CEO da DT: disse-lhe que eram contra a guerra. Tirei uma foto do soldado sen-
que a situação não era tão ruim quanto ele pensava — tado diante da minha mesa com a foto do pelotão sobre
uma dinâmica incomum em entrevistas de emprego, ela. Disse-lhe que, caso alguém o questionasse sobre a
mas não para aquele CEO em particular, uma pessoa foto novamente, que viesse até mim. Realmente, a bu-
aberta e interessada em ideias e possibilidades de to- rocracia corporativa gasta muito tempo e acaba com o
dos os tipos. Do meu ponto de vista, a T-Mobile tinha moral. Mas não comigo por perto! No terceiro dia, apren-
ótima consciência de marca, e estava claro quais eram di que a T-Mobile não permitia que os funcionários ti-
as medidas necessárias para mudar a situação. Eu dis- vessem tatuagens ou piercings faciais. Informei que mi-
se que havia seis ou sete coisas estratégicas óbvias pa- nha filha mais velha tinha a língua perfurada, e a mais
ra fazer e que a T-Mobile fracassaria se continuasse no nova seis tatuagens, e era perturbador saber que não se-
mesmo caminho. Se ele queria mudar as coisas, preci- riam contratadas em empresa gerida por mim. A política
saria de muito esforço — e isso incluía atacar agressi- foi alterada imediatamente. Quando discordo de algo,
vamente os líderes do setor — a Verizon e a AT&T. pergunto o motivo, e quando ouço a resposta, pergun-
Na maioria das grandes empresas, os CEOs são ex- to novamente. É uma técnica de liderança que pode ser
cessivamente diplomáticos: nunca dizem nada negativo aprendida com crianças de 5 anos.
sobre ninguém em público, e muitos evitam até mencio- Mas a coisa mais importante que percebi valia pa-
nar o nome de um concorrente. Essa é a abordagem da ra o setor de wireless em geral, não era específica da
velha escola. Eu sou diferente. Cresci praticando corri- T-Mobile: as pessoas o odiavam. Tenho uma linha
da, e me dou bem em competições — é parte de quem especial para ouvir instantaneamente chamadas de
sou. Gosto de ganhar, mas gosto ainda mais de fazer o atendimento ao cliente. Ninguém sabe. Uso-a todos
oponente perder. Não é só papo furado, tenho larga ex- os dias. Especialmente no início, ela me deu ótimos
periência em estratégias de negócio. Passo a maior par- insights sobre problemas dos clientes. Por exemplo,
te do tempo pensando sobre os rumos da empresa nos eles odiavam estar presos a contratos. Odiavam ser
próximos anos e convencendo os funcionários a chegar extorquidos por taxas extras referentes a coisas que
lá. Especialmente em um mercado saturado — no qual não entendiam ou não conseguiam controlar direito,
muitos dos ganhos de fatia do mercado só são possíveis como dados e roaming. Devido às formas iniciais de
à custa do concorrente — tento descobrir e explorar as marketing do setor, as pessoas pensavam que telefo-
fraquezas dos rivais. As atitudes públicas mudaram no nes celulares eram gratuitos, quando, em essência, os
que diz respeito à retórica e franqueza que esperamos fabricantes se escondiam atrás das operadoras fazen-
dos líderes — felizmente ficaram mais parecidas com do com que os provedores de serviços wireless cobras-
a minha abordagem. Veja a campanha presidencial de sem mais em taxas mensais para que seus telefones de
2016, ou como pessoas como Mark Cuban e Elon Musk US$ 700 parecessem baratos. Ficou claro que a melhor
se comunicam. Foi-se o tempo — e já foi tarde — em que maneira de ter sucesso nesse setor era fazer as coisas
todas as declarações dos CEOs precisavam ser verifica- de forma totalmente diferente das operadoras existen-
das pela equipe jurídica. As pessoas querem líderes au- tes — ou seja, fazer exatamente o oposto. Esse foi o iní-
tênticos, não frases enlatadas cheias de juridiquês. cio da estratégia que chamamos de “não operadora”.

PERGUNTE POR QUE OUTRA VEZ VOCIFERANDO


Em setembro de 2012, no meu primeiro dia na T-Mobi- Primeiro, porém, enfrentei os problemas óbvios que ha-
le, logo percebi várias coisas. A primeira foi que, embora via apresentado ao CEO da DT na entrevista de emprego.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 29 


RADAR COMO EU FIZ

DIA DOS RESULTADOS


O CEO da T-Mobile, John Legere (à
esquerda, com seu telefone) e sua equipe
de liderança observam a reação das
redes sociais ao seu anúncio positivo do
terceiro trimestre, em 24 de outubro de
2016, na sede da empresa em Bellevue,
Washington. (Os sapatos no canto inferior
direito pertencem a Callie Field, SVP de
atendimento ao cliente da T-Mobile.)
Legere publica comentários e dispara selfies
conforme as reações aparecem. “As mídia
sociais se tornaram parte fundamental da
minha estratégia de liderança”, diz ele.
“Quando um analista diz algo sobre nossas
ações, ou um concorrente faz um anúncio,
geralmente fico sabendo pelo Twitter.”

30 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


A T-Mobile não estava vendendo o iPhone, então fomos
à Apple e fizemos um acordo. Historicamente, a cober-
T-MOBILE: FATOS E NÚMEROS
tura da T-Mobile era terrível, então começamos a com- FUNDAÇÃO 1999
SEDE BELLEVUE, WASHINGTON
prar todas as bandas wireless que podíamos. Compra- Nº DE CLIENTES 69,4 MILHÕES NO FIM DO TERCEIRO TRIMESTRE DE 2016
mos também um concorrente menor, a MetroPCS, para RECEITAS (EM US$ BILHÕES)
criar o líder de mercado em pré-pagos, um segmento em
LUCRO OPERACIONAL US$ 32,1
rápido crescimento. A T-Mobile havia sido prejudicada
quando era subsidiária de uma empresa alemã. A com-
pra da MetroPCS possibilitou a abertura de capital por
meio de um IPO reverso e do uso do capital para con-
US$ 20,6
tinuar investindo na infraestrutura. Não havia nada de
particularmente brilhante nessas medidas — qualquer
analista de Wall Street teria sugerido as mesmas coisas.
Mas colocamos de imediato o plano em ação.
Com essas peças no lugar, e com a melhora da rede
mês a mês, precisávamos relançar a marca. Em janeiro de
2013 fomos ao Consumer Electronics Show em Las Vegas
e demos uma entrevista coletiva. Depois de uma pergun- US$ 2,1
ta, comecei um discurso colérico. Disse que se um marcia-
no viesse à Terra e tentasse entender como o setor de wire-
less trabalha não acreditaria e voltaria para o seu planeta.
As transportadoras prendiam os clientes por meio de lon- –US$ 4,3
gos contratos e ofereciam péssimo tratamento. Suas re- 2011 2012 2013 2014 2015
des eram terríveis. “Os anúncios da Match.com são mais
honestos que os mapas de cobertura da AT&T”, eu disse.
FONTE T-MOBILE
Meus comentários eram espontâneos, mas verdadeiros. O
vídeo online viralizou, demonstrando toda a hostilidade
reprimida do consumidor em relação ao setor. ESCOLHENDO O VILÃO
Falar da boca para fora, porém, não é o suficiente — À medida que mudamos a empresa e reconstruímos
é preciso fazer o trabalho necessário para apoiar as afir- nossa rede, começamos a anunciar, com alarde, o con-
mações. Por isso, lancei um desafio para minha equi- traste com nossos rivais. Toda boa narrativa tem um vi-
pe de liderança, e juntos começamos a fazer mudanças lão, e logo escolhemos o nosso: a AT&T. A AT&T tinha
dramáticas — e finalmente bem-sucedidas — na nossa direitos exclusivos para novos lançamentos de iPho-
estratégia de produtos. Queríamos transformar o setor ne, e as pessoas achavam que a empresa havia se apro-
para melhor e para sempre e em benefício de todos os veitado disso nos preços e no atendimento ao clien-
consumidores. Nós nos livramos dos contratos de longo te. Pesquisas mostravam que a AT&T era odiada — os
prazo e os substituímos por um modelo de preços trans- pontos negativos da empresa ultrapassavam os limites.
parente. Facilitamos a atualização do smartphone e eli- Sempre que falava com um grupo bastava perguntar:
minamos as cobranças de roaming global, o que muitas “Quantos de vocês têm a AT&T como provedor? E quan-
vezes resultava em contas gigantescas para os clientes tos de vocês a odeiam?” — e todos levantavam a mão.
de nossos concorrentes. Oferecemos o pagamento das Outro fator nos levou a escolher essa abordagem
taxas de rescisão antecipada dos concorrentes a todos agressiva: precisávamos ser notados. A AT&T e a Veri-
que quisessem migrar para a T-Mobile. Facilitamos a li- zon gastavam US$ 5 bilhões por ano em anúncios e não
gação gratuita por wi-fi. Como o streaming de vídeo se conseguíamos igualar isso. No início, tínhamos cerca
tornou popular, criamos o Binge On, que permite assis- de 10% do mercado wireless, e cada uma delas tinha
tir a vídeos no YouTube e acessar a Netflix sem gastar o quase 40%. Acreditávamos que venceríamos se con-
pacote de dados. Com o tempo, os rivais tentaram nos seguíssemos arrastá-los para o conflito.
copiar, especialmente eliminando contratos restritivos Começamos com anúncios focados nas nossas ino-
e de longo prazo. Felizmente a tentativa deles de emu- vações. Atacamos os concorrentes diretamente. Certa
lar nossa estratégia não operadora não deu certo. vez, enviamos uma pessoa com um telefone da AT&T
Acima de tudo, continuamos investindo em nossa para a Europa, onde ela recebeu enormes encargos de
rede. Partimos para a ação em vez de ficar no discur- roaming; destacamos o valor ridículo da conta e a com-
so vazio. Quando estou no bar, uma das minhas diver- paramos com nosso plano de roaming internacional grá-
sões favoritas é desafiar estranhos para um teste de tis. No Super Bowl de 2015, fizemos um anúncio em que
velocidade: definimos os navegadores de nossos celu- Kim Kardashian explicava como o plano da T-Mobile de
lares para um site que mede a velocidade de download manter dados não utilizados permitiria que as pessoas
e verificamos quem é o mais rápido. Meu telefone da visualizassem mais selfies. Em outro, Sarah Silverman e
T-Mobile quase sempre ganha. Chelsea Handler corriam cada uma em volta de sua casa

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 31 


RADAR COMO EU FIZ

Legere e sua equipe


executiva conversam
exibindo a capacidade para chamadas wi-fi. No Super
Bowl de 2016, atacamos a Verizon, que vinha anuncian- Começamos a alardear o
com os funcionários
sobre os resultados
do terceiro trimestre.
do falsamente que sua rede era mais rápida. No anún-
cio, Steve Harvey — que recentemente havia declarado
o nome errado da vencedora do concurso Miss Universo
contraste com nossos rivais.
— zombava da Verizon por deturpar seu desempenho.
“A Verizon errou!”, dizia ele. “Sim! Não fui eu!” Che-
Toda boa narrativa tem um
gamos a lançar anúncios publicados nas redes sociais
para solicitar a opinião dos consumidores.
vilão, e logo escolhemos o
Seja nos anúncios, nas mídias sociais ou em mi-
nhas declarações públicas, há alguns limites que não
nosso: a AT&T.
ultrapasso. Ao contrário de alguns candidatos presi-
denciais, não debocho da família das pessoas. E quan-
do outra operadora tem problemas técnicos, como World of Warcraft. Chegue até o nível 90”. De repen-
queda da rede, não faço piada, pois sei como isso é te, muitos gamers e aficionados de tecnologia passa-
um transtorno para muitos. Também refreamos os co- ram a me seguir. Hoje tenho mais de três milhões de se-
mentários negativos sobre a Sprint, que já foi um con- guidores, e como muitos deles são famosos (incluindo
corrente à altura, mas hoje está tão por baixo que não a Oprah), consigo enorme alcance através de retweets.
me sinto confortável em agredi-la. Fizemos uma análise disso, e não é incomum que meus
tuítes tenham 150 milhões de reações. Isso não é um
AO ALCANCE DE UM TWEET jogo. É uma forma de dirigir os negócios.
Um pouco por acaso, a mídia social se tornou uma parte Gasto muito tempo tuitando no telefone ou no ta-
fundamental da minha estratégia de liderança. Eu janta- blet. Moro sozinho — não tenho nem cachorro — e, fo-
va com minha filha, que achou que seria divertido abrir ra correr e passar tempo com minhas filhas, trabalho o
uma conta de Twitter para mim, e entreguei-lhe meu tempo todo. Muito do que faço online é ouvir clientes,
smartphone. Minutos depois de abri-la, a segurança cor- e mídias sociais são perfeitas para isso, pois não há fil-
porativa da T-Mobile ligou para informar que alguém es- tro. Se alguém se queixa da T-Mobile, mando-lhe um
tava usando meus dados no Twitter. Assegurei à pessoa tweet com meu endereço de email e certifico-me que
que era eu. Nossos advogados disseram que tuitar era o assunto será encaminhado internamente. Quando
uma péssima ideia, mas ignorei-os. Uma das primeiras participo de reuniões na sede, sei o que está aconte-
interações que tive no Twitter foi com alguém que bus- cendo lá fora, porque as pessoas estão constantemen-
cava aconselhamento sobre como construir uma car- te me “tuitando”. Se um analista diz algo sobre nosso
reira bem-sucedida. Perguntei à minha filha mais ve- estoque, ou um concorrente faz uma declaração, fre-
lha, que é uma grande videogamer, o que ela achava que quentemente fico sabendo pelo Twitter, às vezes até
seria útil. Acabei respondendo simplesmente: “Jogue antes de ser informado pela minha equipe.

32 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


Uma amostra dos Alguns dos meus tweets são dirigidos a concorren-
tweets de Legere após a John Legere @johnLegere • 24/10/16 tes. Quando o CEO da Verizon admitiu em uma confe-
divulgação de resultados Obrigado por me receber @LizClaman & rência de investidores que a propaganda do novo servi-
@foxBusiness! E obrigado @ATT, como sempre,
ço de vídeo da empresa foi enganosa, postei um link pa-
por nos encaminhar clientes!
ra a notícia com o seguinte tweet: “Meu Deus, Verizon,
você está deixando as coisas muito fáceis”, seguido por
“Se na Verizon ‘expectativas realistas’ = gastar bilhões
para construir um serviço que ninguém quer/usa, então
#AcertouNaMosca! ”. Minha presença em redes sociais
reforça nossa estratégia de anúncios. Às vezes, fazemos
um anúncio teste provocando a AT&T, mas o impacto
pelo Twitter é tão grande que acaba sendo desneces-
sário fazer uma versão impressa ou para transmissão.
John Legere, CEO da T-Mobile, se manifesta sobre
o acordo de fusão da AT&T com a Time Warner.
foxbusiness.com NÚMERO 1 EM SERVIÇO
Passo um bom tempo em nossos call centers, locais que
os antigos CEOs da T-Mobile raramente visitavam. Lá
John Legere @johnLegere • 24/10/16 os funcionários têm o trabalho mais difícil do planeta, e
[emoticon] De repente, as operadoras parecem tenho tremendo respeito por eles. Eles são, realmente,
acreditar que isso é um ambiente competitivo... meus favoritos, e adoram quando vou atrás da AT&T e
#newsflash – $TMUS É O AMBIENTE COMPETITIVO! da Verizon. Temos um inimigo comum, e quando bri-
gamos juntos, isso os deixa orgulhosos. Eles são inacre-
ditavelmente empenhados em explicar às pessoas por
John Legere @johnLegere • 24/10/16
que somos melhores que nossos concorrentes, e ver o
Compartilhar o sucesso da $TMUS com nossos
funcionários é a melhor parte do meu dia! Obrigado por CEO declarando abertamente isso ajuda a energizá-los.
tudo que vocês fazem! #WeWantStop O entusiasmo da equipe de atendimento ao cliente é vi-
sível, e é a razão pela qual somos avaliados frequente-
mente como número 1 em atendimento ao cliente de
wireless pela JD Power & Associates.
Quando pessoas fora do setor finalmente começa-
ram a notar minhas provocações contra os concorren-
tes, o que chamou a atenção delas foi o desempenho
da empresa. Adicionamos clientes por mais de três
anos consecutivos, passando de 33 milhões, quando
comecei, para mais de 69 milhões no terceiro trimes-
tre de 2016. O mais impressionante é que a T-Mobile
John Legere @johnLegere • 24/10/16 capturou todo o crescimento da indústria de clientes
O que as operadoras estão fazendo depois de saber dos de telefones pós-pagos — os clientes de wireless mais
lucros da $TMUS no terceiro trimestre 2016??? valiosos desde 2013. Fizemos isso enquanto diminuía-
mos nossa taxa de desistência do pós-pago de 2,5% no
Chorando? 13% último bimestre de 2012 para 1,3% no primeiro bimes-
Decidindo o que copiar 25% tre de 2016. A AT&T e a Verizon só levaram a T-Mobi-
le a sério quando era tarde demais — agradeço a elas.
Distraindo-se 6% À medida que crescemos, talvez precisemos en-
contrar novos vilões para atacar — o que não será difí-
Todas as opções 56%
cil. Às vezes, a melhor maneira de motivar as pessoas é
criar a ideia de uma força maligna. Na Global Crossing,
2.136 votos • resultados finais
por exemplo, o inimigo era a falência. Em outros luga-
res, pode ser a burocracia ou algum outro problema
John Legere @johnLegere • 24/10/16 interno. Neste momento, o setor de wireless começa a
Precisa de uma tradução para os resultados da $TMUS? competir mais diretamente com as empresas de cabo,
Aqui vai: por isso são abundantes as opções para um bandido no
futuro. Talvez as empresas de cabo?
Estamos apenas começando a mudar a forma como
o setor de wireless funciona. Ainda faremos muito
#TMUSEmojiresultados mais para resolver os problemas do cliente. Nossos
concorrentes sempre facilitam a nossa tarefa.
HBR Reprint R1701A–P Para pedidos, página 14

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 33 


FEVEREIRO 2017

Foco
VANTAGEM CUMULATIVA
Os profissionais de marketing gastam muito
tempo — e dinheiro — tentando agradar os
consumidores com produtos cada vez mais
atraentes. Acontece que seus clientes tomam
a maioria das decisões de compra quase
automaticamente. Eles procuram o que
é mais familiar e fácil de comparar.
O Foco desta edição
explora a ideia e a ciência
subjacentes a esse
tipo de decisão, oferece
contrapontos e inclui
conversas com o CEO
da LEGO e com o
presidente da Intuit.
A FIDELIDADE DO CLIENTE ESTÁ SUPERESTIMADA
O que as pessoas realmente querem é evitar fazer escolhas.
CONTRAPONTO: VELHOS HÁBITOS SÃO DUROS DE MORRER, MAS MORREM
O modelo de assinatura da Dollar Shave Club
é um exemplo surpreendente.
“O HÁBITO CRIA A CONEXÃO”
Tornar sua marca uma proposição de valor
cria uma poderosa vantagem competitiva.
UM PRODUTO QUE PERMITE ÀS PESSOAS MANTER SEUS HÁBITOS”
O Quicken, por exemplo, foi projetado para se
parecer com um talão de cheque.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 35 


FOCO VANTAGEM CUMULATIVA

36 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


A FIDELIDADE
DO CLIENTE ESTÁ
SUPERESTIMADA
MELHOR FOCAR NO HÁBITO.
UMA TEORIA SOBRE A
VANTAGEM CUMULATIVA
A.G. LAFLEY E
ROGER L. MARTIN
FOTOGRAFIA POR BRUCE PETERSON
FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 37 
FOCO VANTAGEM CUMULATIVA

Q
Quase no fim do ano passado, o aplicativo
de compartilhamento de fotos da Facebook,
o Instagram, líder da categoria, substituiu
uma reação dessas por renovar ou relançar
sua marca. O lançamento da Diet Pepsi sem
aspartame pela PepsiCo foi — como o de-
sastre da infame New Coke — uma tentativa
fracassada de reinvenção que resultou em
sérias perdas de receita e precisou ser rever-
tida. No entanto, a questão que importa é:
por que empresas com bom desempenho se
deixam constantemente apanhar na arma-
dilha de uma renovação radical da marca?
Seria possível entender a tentação de adotar
essa estratégia diante de um desastre, mas a
Instagram, a PesiCo e a Coke estavam longe
da beira do abismo. (É importante observar
que a Snapchat, cuja fatia de mercado com-
posta de usuários jovens é hoje particular-
mente robusta, vem mantendo, zelosamen-
te, seu famoso ícone do fantasminha. A tí-
tulo de esclarecimento: A. G. Lafley é mem-
bro do conselho da Snap Inc.)
Acreditamos que a resposta está nas raí-
zes de algumas interpretações errôneas so-
seu ícone original — uma retrocâmera à bre a natureza da vantagem competitiva.
qual mais de 400 milhões de usuários do Boa parte do novo pensamento estratégi-
aplicativo estavam totalmente habituados co defende que o passo rápido da mudança
— por um design plano, modernista, que, nos negócios modernos (talvez em nenhum
como explicou o chefe de design, “sugere lugar, de forma mais óbvia que no mundo
uma câmera”. Numa época em que a Insta- dos aplicativos) significa que nenhuma van-
gram via seu crescimento ameaçado pela ri- tagem competitiva é sustentável, por isso as
val Snapchat, ela justificou a troca: “Aparen- empresas precisam atualizar continuamen-
temente o ícone já não refletia a comunida- te seus modelos de negócio, estratégias e
de, por isso pensamos em melhorá-lo”. formas de comunicação para responder em
A avaliação da Ad Week, a bíblia do setor tempo real à explosão de opções com que
de marketing, foi clara em sua manchete: os consumidores, cada vez mais sofistica-
“O novo logo da Instagram é uma caricatu- dos, deparam. Para manter seus clientes —
ra. Podemos voltar ao que era? Por favor?”. Já e atrair novos — você precisa permanecer
os designers da revista GQ assim se manifes- relevante e na crista da onda. Assim sendo,
taram no artigo “O logo que ninguém queria a Instagram fez exatamente o que dela se
acaba de chegar à Instagram”: “A Instagram esperava: mudou proativamente.
O QUE É UM ÍCONE? passou ANOS criando uma propriedade visual Certamente essa é uma ideia crítica, mas
O ícone da Instagram à direita foi da marca com seu logo, instruindo os usuá- muitas evidências a contradizem. Veja o ca-
hostilizado pela comunidade online, rios como utilizá-lo, e agora, em vez de enfa- so da Southwest Airlines, da Vanguard e da
que já estava acostumada com o da tizar isso, está deixando tudo ir pelo ralo”. IKEA, mencionadas no artigo clássico de 1996
esquerda. A Instagram mudou o ícone
por acreditar, equivocadamente, que Ainda é muito cedo para dizer se a mu- da HBR “O que é estratégia? ”, de Michael Por-
a imagem de uma câmera tradicional dança de design terá de fato consequências ter: são exemplos de vantagem competitiva
não era relevante para os usuários comerciais para a Instagram, mas não é a de longa persistência. Duas décadas depois
que nunca tiveram uma. primeira vez que uma empresa experimenta essas empresas ainda estão no topo de sua

38 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


respectiva indústria, seguindo estratégias e consumidores-alvo e elaboram atividades
conceitos de marca absolutamente imutáveis. para satisfazê-los da melhor forma possível.
E embora as gigantes Google, Facebook ou A meta é fazer com que os clientes repitam
Amazon possam tropeçar e ser esmagadas por suas compras, ajustando as proposições de
alguma empresa emergente e pretensiosa, a valor da empresa com as próprias necessi-
posição competitiva de cada uma certamente dades. Ao afastar a concorrência por meio
não é passageira. Mais perto de casa (um dos de especificidades e personalização sempre
autores deste artigo pertence à família P&G), em evolução, a empresa pode atingir uma
soaria muito estranho aos gestores das mar- vantagem competitiva sustentável.
cas Tide (sabão em pó) ou Head & Shoulders Uma suposição implícita nessa defini-
(xampu) dos últimos 50 anos ouvir que su- ção é que os clientes estão tomando deci-
as vantagens de meio século não são ou não sões deliberadas, talvez até racionais. Seus
eram sustentáveis. (Sem dúvida nenhuma, motivos para comprar produtos e serviços
os gestores do sabonete Dove e da maionese podem ser emocionais, mas sempre resul-
Hellmann´s, que estão entre os produtos da tam de uma lógica relativamente conscien-
Unilever preferidos pelos consumidores há te. Portanto, uma boa estratégia identifica e
tantos anos, sentiriam o mesmo.) responde a essa lógica.
No artigo, aproveitamos para incluir Mas a ideia de que decisões de compra
uma pesquisa comportamental recente para surgem de escolhas conscientes contraria
apresentar a teoria sobre o que torna a van- muitas pesquisas da psicologia comporta-
tagem competitiva duradoura. Ela explica mental. O cérebro, por sua vez, não é uma
tanto as condutas erradas como a da Insta- máquina completamente analítica. Ele re-
gram, como histórias de sucesso como a do cebe informação ruidosa e incompleta do
Tide. Defendemos que o desempenho é sus- mundo exterior e, rapidamente, baseado
tentado, não por oferecer aos consumidores em experiências anteriores, insere as pe-
a escolha perfeita, mas por lhes oferecer a ças que estão faltando. A intuição — pensa-
escolha mais fácil. Por isso, mesmo que te- mento, opiniões e preferências que rápida IDEIA EM RESUMO
nha sido uma proposição de valor a primei- e irrefletidamente nos vêm à mente sem ser
ra coisa que os atraiu, não é necessariamen- suficientemente fortes para provocar uma O PROBLEMA
te o que os obriga a continuar. ação — é produto desse processo. No entan- Muitas inovações de
Por esta visão, manter os clientes fideli- to, não é só o que é preenchido que determi- produtos fracassam logo
no lançamento, apesar
zados não é uma questão de adaptar-se con- na nossos julgamentos intuitivos. Eles são
dos tremendos esforços
tinuamente às mudanças necessárias para fortemente influenciados pela velocidade para torná-los atraentes,
permanecer com o melhor ajuste racional e facilidade do próprio processo de preen- relevantes e atualizados.
ou emocional. Trata-se de ajudar o consu- chimento, um fenômeno que os psicólo-
midor a não precisar fazer mais uma esco- gos chamam de fluência de processamento. POR QUE ACONTECE
lha. Para isso é preciso criar o que chama- Quando dizemos que tomamos uma deci- Os consumidores não
mos de vantagem cumulativa. são porque ela “simplesmente parece boa”, querem gastar a energia
mental necessária para
Vamos começar explorando como o processamento que levou a ela foi fluente. escolher entre produtos.
o nosso cérebro se comporta quando A própria fluência do processamento
compramos. é produto de experiências repetidas, e ela A SOLUÇÃO
aumenta continuamente com o número de
vezes que vivemos determinada experiên- Para reforçar os hábitos dos
CRIATURAS DO HÁBITO cia. Uma exposição anterior a um objeto consumidores, as inovações
deveriam representar
O senso comum sobre vantagem com- melhora a capacidade de perceber e identi- a evolução da marca, e
petitiva é que empresas bem-sucedi- ficar aquele objeto. À medida que um objeto não o rompimento com o
das assumem uma posição, miram nos é apresentado repetidamente, os neurônios passado.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 39 


FOCO VANTAGEM CUMULATIVA

CADA VEZ QUE


VOCÊ ESCOLHE
que codificam as características UM PRODUTO, SUA pequenas conseguem sobreviver
não essenciais para o reconheci-
mento do objeto amortecem suas VANTAGEM SOBRE nesse ambiente, ver quadro “O lado
positivo perverso da deslealdade
respostas, e a rede neural torna-
-se mais seletiva e eficiente na OS QUE VOCÊ do consumidor”.)

identificação do objeto. Em outras


palavras, estímulos repetidos têm
NÃO ESCOLHEU É UM COMPLEMENTO PARA A ESCOLHA
limiares mais baixos de identificação
perceptual, requerem menos aten-
ACUMULADA. Não estamos afirmando que a escolha
do cliente nunca é consciente, ou que
ção para ser percebidos e são citados ou a qualidade de uma proposição de valor
lidos com mais rapidez e precisão. Além é irrelevante. Ao contrário: em primeiro lu-
disso, os consumidores tendem a preferi-los gar, as pessoas precisam ter motivos para
a novos estímulos. comparar. E, às vezes, uma nova tecnologia
Em resumo, pesquisas sobre o funciona- ou uma nova norma reguladora permite que
mento do cérebro humano sugerem que a a empresa reduza radicalmente o preço do
mente adora a automatização mais que qual- o Facebook como sua homepage, todos os produto ou que ofereça novos elementos ou
quer outra coisa — certamente mais que se itens da página se tornarão familiares, e o uma solução completamente nova para as
envolver em considerações conscientes. Dada impacto será tão grande quanto estar diante necessidades do consumidor de forma que
uma opção, sua preferência é fazer a mesma de uma gôndola repleta de Tide. isso demande deliberação da parte dele.
coisa repetidamente. Se a mente desenvolve Comprar a marca mais fácil e mais famo- Portanto, opções firmes sobre onde jogar
ao longo do tempo a percepção de que o Tide sa cria um ciclo no qual a liderança compar- e como ganhar ainda são essenciais para a
limpa melhor as roupas, e se o produto está tilhada aumenta continuamente ao longo estratégia. Sem uma proposição de valor su-
disponível e acessível nas prateleiras do su- do tempo. Cada vez que você seleciona e perior às das outras empresas que estão ten-
permercado e nas páginas da web, a coisa mais usa um dado produto ou serviço, as vanta- tando atrair os mesmos clientes, nenhuma
fácil de fazer é comprá-lo uma vez mais. gens sobre os produtos ou serviços que você empresa terá o que oferecer.
Um motivo decisivo para escolher o pro- não escolheu são acumuladas. Mas, se a empresa quiser ampliar essa
duto líder no mercado, portanto, é o sim- O crescimento da vantagem cumula- vantagem competitiva inicial, terá de inves-
ples fato de esse ato ser a coisa mais fácil tiva — ausência de mudanças que forçam tir para transformar sua proposição em há-
do mundo: em qualquer canal de distribui- reavaliações conscientes — é praticamente bito em vez de opção. Portanto, é possível
ção que você comprar, ele será o produto de inexorável. Há 30 anos, a marca Tide man- definir formalmente a vantagem cumulativa
maior destaque. No supermercado, no ata- tinha uma pequena liderança de 33% sobre como a camada que a empresa deposita so-
cado ou na drogaria, ele será predominante 28% do Surf da Unilever no lucrativo mer- bre a vantagem competitiva inicial que tor-
nas prateleiras. Além disso, é bem provável cado de detergentes de lavar roupa nos Es- na seu produto ou serviço uma escolha cada
que você não só já o comprou como também tados Unidos. Lenta mas decisivamente os vez mais instintivamente agradável para o
o retirou exatamente da mesma prateleira. consumidores criaram hábitos que coloca- consumidor.
Ou seja, repetir uma ação é o que há de mais ram o Tide muito à frente do Surf. Ano após As organizações que não criam vanta-
fácil. Não só isso: toda vez que você compra ano o diferencial do hábito aumentava e gem cumulativa provavelmente serão su-
outra unidade da mesma marca isso tor- o gap da participação do mercado crescia. plantadas por concorrentes bem-sucedidos
na o processo ainda mais fácil — e a mente Em 2008, a Univeler abandonou o negó- nesse quesito. Um bom exemplo é a Myspa-
agradece. cio e vendeu suas marcas para o que era, na ce, cujo fracasso é frequentemente citado
Por outro lado, cada vez é um pou- época, uma empresa de capital privado que como prova de que a vantagem competitiva
co mais difícil comprar produtos que você fabricava detergente. Atualmente o Tide é é inerentemente insustentável. Nossa inter-
não escolhe, e o gap continua aumentan- o líder absoluto no mercado de detergentes pretação é um pouco diferente.
do — enquanto, obviamente, o produto es- de lavar roupa nos Estados Unidos com sua Lançada em agosto de 2003, a Myspace
colhido preencher suas expectativas. Essa fatia de mais de 40%. Seu maior competi- tornou-se o site de rede social número 1 dos
lógica funciona muito bem tanto na antiga dor tem uma participação de menos de 10%. Estados Unidos em dois anos, e em 2006
economia como na nova. Se você escolher (Para uma discussão sobre como as marcas superou a Google para se tornar o site mais

40 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


O LADO POSITIVO PERVERSO
DA DESLEALDADE DO
CONSUMIDOR
Se os consumidores são escravos
do hábito, é difícil entender
que sejam “fiéis”, ou seja, que
se prendam a uma marca na
visitado de qualquer categoria no país. En- suposição de que ela satisfaz De tempos em tempos a Facebook intro-
tretanto, apenas dois anos depois, ela foi suas necessidades racionais duzia mudanças no design para alavancar
suplantada pela Facebook, que a destruiu sua funcionalidade, e sofria severas críticas.
competitivamente — até chegar a ser ven-
e emocionais. Na verdade, os
Porém os novos serviços não puseram em
dida em 2011 por US$ 35 milhões, uma fra-
consumidores são muito mais risco a comodidade e o hábito adquirido, e
ção irrisória dos U$ 580 milhões que a News volúveis que muitos profissionais ela até permitia que as mudanças fossem
Corp havia pago por ela em 2005. de marketing imaginam: não opcionais em seus estágios iniciais. Até o
Por que a Myspace não deu certo? Nossa raro marcas que supostamente nome da empresa evoca um objeto familiar,
resposta é que ela nem tentou atingir a van- dependem de consumidores fiéis o álbum de formatura da faculdade — já a
tagem cumulativa. Para começar, permitia atingem os mais baixos níveis de Myspace nunca propiciou nenhuma refe-
aos usuários criar páginas web que expres- rência familiar ao usuário.
savam seu próprio estilo pessoal, por isso
fidelidade.
Em resumo: baseando-se na familiarida-
A Colgate e a Crest, por exemplo,
as páginas individuais pareciam muito di- de, a Facebook usou a vantagem cumulativa
são marcas de dentifrício líderes no
ferentes para os visitantes. Ela também in- para se tornar o site de redes sociais mais vi-
cluiu anúncios grosseiros e indecorosos que
mercado americano: juntas detêm 75% ciante do mundo. Isso torna ainda mais in-
irritaram as agências reguladoras. Quando a da preferência. Os consumidores das compreensível a decisão de sua subsidiária
News Corp comprou a Myspace, aumentou duas marcas são fiéis 50% do tempo (a Instagram de mudar seu ícone.
o número de anúncios, entulhando ainda marca preferida responde por 50% de
mais o site. Para atrair mais usuários, a Mys- sua compra anual do produto). O creme
pace introduziu o que a Bloomberg Busines- dental Tom’s, cuja fábrica se localiza no AS IMPOSIÇÕES DA VANTAGEM CUMULATIVA
sweek se referiu como “um número espan- Maine, é uma marca que domina um nicho O caso da Myspace e da Facebook é o exem-
toso de elementos: ferramentas de comuni- “produto natural” de 1% do mercado. plo perfeito de que a vantagem sustentável
cação com troca instantânea de mensagens, Acredita-se que ele tenha um séquito de é tanto possível como garantida. Como en-
um programa de anúncios classificados, consumidores fanáticos. Seria esperado tão o próximo concorrente poderá melhorar
um programa de reprodução de vídeo, um que esse 1% fosse formado principalmente e ampliar sua abordagem competitiva cons-
programa de reprodução de música, uma por compradores constantes. Mas, na truindo uma camada protetora de vanta-
máquina virtual de caraoquê, uma platafor- verdade, os consumidores da Tom’s são gem cumulativa? Aqui estão quatro regras
ma de publicidade com autoatendimento, fiéis somente 25% do tempo — metade do básicas:
ferramentas de edição de perfil, sistemas de tempo das grandes marcas. 1. Torne-se popular logo no início. Essa
segurança, filtros de privacidade, lista de li- Então, por que marcas periféricas ideia está longe de ser nova — ela está im-
vros, e assim por diante”. Por isso, em vez como a Tom’s sobrevivem? A resposta, plícita em muitos dos melhores e mais an-
de tornar o site uma escolha cada vez mais talvez perversa, é que com os índices tigos trabalhos sobre estratégia, e podemos
agradável e instintiva, a Myspace deixou notá-la no pensamento de Bruce Hender-
de fidelidade de 50% das grandes
seus usuários desnorteados.. son, fundador do Boston Consulting Group
marcas, apenas consumidores suficientes
Compare esse quadro com a Facebook, (BCG). O foco específico de Henderson esta-
comprarão uma vez ou outra as marcas
que vem construindo vantagem cumulati- va no impacto positivo do output cumulati-
va. Inicialmente, ela dispunha de alguns as-
pequenas para mantê-las no negócio. As vo nos custos — a hoje famosa curva expe-
pectos atraentes, que faltavam à Myspace, o marcas pequenas não conseguem vencer a rimental que sugere que, à medida que au-
que a tornou uma boa proposição de valor, barreira dos hábitos arraigados, e embora menta a experiência de uma companhia em
mas o mais importante para seu sucesso foi marcas completamente novas entrem no produzir um produto, a gestão de custos se
a consistência de seu visual e da percepção mercado e se tornem líderes, é altamente torna mais eficiente. Ele argumentava que
que incutiu nos usuários. A Facebook não se improvável que uma pequena marca as empresas deviam praticar uma política
parece com nada nem com ninguém. Quan- periférica assuma com sucesso a posição de preços agressiva logo no início — “antes
do ela expandiu o acesso para dispositivos de um líder consolidado. da curva da experiência”, no seu linguajar
móveis, certificou-se de que a experiência — e assim conquistar uma cota de mercado
dos usuários fosse tão satisfatória quanto o suficiente para permitir que as companhias
era com computadores. tivessem custos mais baixos, cotas relativas

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 41 


FOCO VANTAGEM CUMULATIVA

mais altas e maior lucratividade. As impli- auferiu lucros espetaculares graças à sua de a BlackBerry ter sido derrubada pelos
cações eram claras: a vantagem precoce no atenção constante para com o design forma- smartphones munidos de aplicativos e tela
mercado é importante — e muito. dor de hábito — na verdade, mais do que há- sensível ao toque, um grupo restrito de con-
Há muito tempo os profissionais de bito: para bilhões de usuários checar atuali- sumidores — que se recusou enfaticamente
marketing já sabem da importância de ven- zações tornou-se uma verdadeira compul- a abandonar o dispositivo — implorou, com
cer logo no início. Lançada especificamente são. É claro que a empresa se beneficia com sucesso, que a administração da empresa o
para atender ao mercado de máquinas de la- os efeitos cada vez maiores da rede. Mas a ressuscitasse com o mesmo aspecto dos dis-
var automáticas em rápido crescimento, a verdadeira vantagem reside no fato de que positivos da geração anterior. O aparelho re-
Tide é uma das marcas de maior repercus- abandonar o Facebook significa eliminar cebeu o nome consolador de Classic.
são, mais bem-sucedidas e lucrativas da um hábito poderoso. Como Art Markman, psicólogo da Uni-
P&G. Quando foi apresentada, em 1946, Pioneira dos smartphones, a BlackBerry versity of Texas, demonstrou, no design
ela imediatamente mereceu a maior carga é talvez o melhor exemplo de empresa que criador de hábito certas regras precisam ser
publicitária da categoria. A P&G também conscientemente criou o design destinado à respeitadas. Para começar, é imprescindível
garantiu que nenhuma máquina de lavar compulsão. Seu fundador, Mike Lazaridis, manter consistentes os elementos do design
fosse vendida nos Estados Unidos sem es- inventou o dispositivo que explicitamente do produto que podem ser vistos de longe
tar acompanhada de uma caixa grátis de torna viciante toda uma sequência padroni- para que os compradores possam visuali-
Tide para criar o hábito no consumidor. zada de ações e percepções: senti-lo vibrar zá-lo com rapidez. Cores e formas diferen-
A Tide ganhou de imediato o concurso de no bolso, deslizar o aparelho para fora, che- tes, como o laranja do Tide e o logo do Dori-
popularidade logo no início e nunca mais car mensagens e digitar com os polegares o tos, são excelentes exemplos.
olhou para trás. teclado em miniatura. Ele foi bem-sucedi- E você deve buscar meios para fazer com
Amostras grátis de um novo produto do: o dispositivo recebeu o apelido de Cra- que os produtos se ajustem aos ambien-
sempre foram uma tática popular dos pro- ckBerry, numa clara alusão ao crack. O há- tes pessoais para estimular o uso. Quando a
fissionais de marketing. Precificação agres- bito se tornou tão forte que mesmo depois P&G apresentou o Febreze, os consumido-
siva, a tática destacada por Henderson, é res gostaram da forma como ele funcionava,
igualmente popular. A Samsung surgiu co- mas não o usavam com muita frequência.
mo líder mundial na participação de merca- Como se observou posteriormente, parte
do no setor de smartphones equipados com do problema foi o recipiente moldado como
a plataforma Android, fornecida gratuita- uma garrafa de limpa-vidros, o que sinaliza-
mente mediante contrato de prestação de va que o produto deveria ser guardado sob
serviços. Para os negócios na internet, A BLACKBERRY É a pia. O recipiente foi finalmente redese-
grátis é a tática central para criar hábi-
tos. Praticamente todas as histórias TALVEZ O MELHOR nhado para ser guardado em local mais
visível, e as vendas dispararam.
de sucesso de larga escala da inter-
net — eBay, Google, Twitter, Ins- EXEMPLO DE UMA Infelizmente as frequentes mu-
danças de design acabam destruin-
tagram, Uber, Airbnb — fornecem
serviços gratuitos para que o nú-
EMPRESA QUE, do hábitos em vez de reforçá-los.
Procure mudanças que fortaleçam
mero de usuários aumente e seus
hábitos sejam fortalecidos. Por is-
CONSCIENTEMENTE, os hábitos e estimulem a recom-
pra. O Amazon Dash Button é um
so, provedores ou agências de pu- CRIOU UM DESIGN ótimo exemplo: ao criar uma for-
blicidade se dispõem, de bom gra-
do, a pagar pelo acesso a eles. DESTINADO A GERAR ma simples de as pessoas reorga-
nizarem os produtos que utilizam
2. Crie design para o hábito. Co-
mo vimos, o melhor resultado se dá COMPULSÃO. com frequência, a Amazon as ajuda a
formar hábitos e os preserva num ca-
quando a escolha do produto se torna nal de distribuição particular.
uma resposta automática do consumidor. 3. Inove dentro da marca. Como já
Então crie o design para isso — não deixe o observamos, as empresas se envolvem em
resultado totalmente ao acaso. A Facebook iniciativas para “relançar”, “reembalar” ou

42 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


“recriar plataformas” com certo risco: esses reforçaram, em vez de diminuir, a vantagem no modo raciocínio lento. Eles são recom-
esforços podem resultar em mudanças de cumulativa da marca. Todos os novos pro- pensados pela fama graças ao brilhantismo
hábitos dos consumidores. Obviamente as dutos preservaram o visual da embalagem com que combinam e destacam os vários
empresas precisam manter seus produtos tradicional do Tide — a cor laranja brilhante benefícios de novos produtos e serviços. É
atualizados, mas mudanças na tecnologia e o logo na forma de alvo. Nas poucas vezes verdade que inúmeros anúncios brilhantes
ou em outros aspectos devem ser introdu- na história do Tide em que esse visual foi al- e inesquecíveis levam os consumidores a
zidas, idealmente, de forma que permita terado — como a introdução da embalagem mudar seus hábitos. Se a mente consciente
que qualquer nova versão de um produto ou azul do Tide Coldwater —, os efeitos sobre do raciocínio lento decidir prestar atenção,
serviço mantenha a vantagem cumulativa os consumidores foram bastante negativos, o resultado será “Uau, isso é impressionan-
do antigo. e a mudança foi prontamente revertida. te. Mal posso esperar”.
Às vezes até os mais bem-sucedidos cap- É óbvio que em muitos casos a mudan- Mas, se os espectadores não estivessem
tadores de vantagem cumulativa esquecem ça é necessária para manter a relevância e prestando atenção (como ocorre na maioria
essa regra. A P&G, por exemplo, que au- a vantagem. Nessas situações, as empresas dos casos), a comunicação engenhosa po-
mentou a vantagem cumulativa do Tide por inteligentes conseguem ajudar os consumi- de sair pela culatra. Pense na propaganda
mais de 70 anos por meio de grandes mu- dores na transição do hábito antigo para o do Samsung Galaxy S5 veiculada há alguns
danças, precisou aprender algumas lições novo. A Netflix começou como serviço de anos. Ela começava mostrando vinhetas
dolorosas ao longo do caminho. Indiscuti- entrega de DVDs pelo correio. Provavelmen- sucessivas de smartphones de aparência ge-
velmente, a maior inovação de detergente te estaria hoje fora do mercado se tivesse nérica que eram incapazes de (a) resistir à
de roupa depois do Tide foram os detergen- tentado maximizar sua permanência recu- água, (b) impedir que uma criança aciden-
tes líquidos. A primeira resposta da P&G foi sando-se a mudar. Em vez disso se reinven- talmente enviasse uma mensagem cons-
lançar uma nova marca chamada Era, em tou, com sucesso, no serviço de streming trangedora, (c) permitir troca fácil de bate-
1975. Sem nenhuma vantagem cumulativa de vídeo. ria. Depois, triunfalmente, mostrava como
por trás, o Era não conseguiu se firmar como Embora a nova Netflix comercialize uma o Samsung S5, que se parecia muito com os
marca apesar da crescente tendência dos plataforma totalmente diferente de entrete- três telefones anteriores, tinha superado as
consumidores de substituir o detergente em nimento digital, envolvendo um novo mix três deficiências. Se espectadores conscien-
pó pelo líquido. de atividades, ela encontrou caminhos para tes de raciocínio lento tivessem assistido a
Reconhecendo a forte conexão dos con- ajudar seus clientes, acentuando o que não todo o comercial poderiam se convencer de
sumidores com o Tide e sua poderosa van- precisava ser mudado. Ela mantém o mes- que o S5 era diferente e superior aos outros
tagem cumulativa, a P&G decidiu lançar o mo visual e percepção e é ainda um serviço aparelhos. Mas existia a probabilidade de
Liquid Tide, em 1984, numa embalagem já de assinatura pelo qual as pessoas acessam espectadores de raciocínio rápido incons-
conhecida e com força de marca. Ele veio a lançamentos e atrações sem sair de casa. cientemente associar o S5 às três deficiên-
se tornar o detergente líquido dominante, Assim, os clientes lidam com os aspectos cias. Ao tomarem a decisão de compra, as
em que pese sua entrada tardia no merca- necessários da mudança e ao mesmo tem- pessoas precisam estar influenciadas por
do. Depois dessa experiência, a P&G teve o po mantêm o hábito o mais possível. Para os um apelo inconsciente: “Não compre aquele
cuidado de garantir que as inovações adi- consumidores, “melhorado” é muito mais que não é à prova d’água, que envia mensa-
cionais fossem consistentes com a marca apreciado e menos assustador que “no- gens ardilosas e cuja bateria é difícil de tro-
Tide. Quando seus pesquisadores descobri- vo”; no entanto, para os gestores de marca e car”. Na verdade, esse comercial pode até
ram como incorporar um alvejante ao deter- agências de publicidade soa como “incrivel- induzi-las a comprar um produto da concor-
gente, o produto levou o nome de Tide Plus mente novo”. rência — como o iPhone 7 —, cuja mensa-
Bleach. A tecnologia inovadora de limpeza 4. Seja simples na comunicação. Um gem sobre ser à prova d’água é mais simples
a frio estava presente no Tide Coldwater, e a dos pais da ciência comportamental, Da- de captar.
revolucionária forma de sachês três em um niel Kahneman classificava as tomadas de Lembre-se: a mente é preguiçosa. Ela não
foi lançada como Tide Pods. A marca não decisão inconscientes movidas pelo hábi- quer redobrar a atenção absorvendo uma
poderia ter sido mais simples ou mais cla- to como “raciocínio rápido”, e as tomadas mensagem com alto nível de complexidade.
ra: este é o seu querido Tide para água fria, de decisão conscientes como “raciocínio Mostrar simplesmente a resistência à água
com alvejante, em forma de sachê. Essas lento”. Aparentemente os profissionais de do modelo Samsung S5 — ou, melhor ainda,
inovações com toda a carga de comodidade marketing e os publicitários vivem em geral mostrar um consumidor comprando um S5 e

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 43


FOCO VELHOS HÁBITOS SÃO DUROS DE MORRER, MAS MORREM

CONTRAPONTO

VELHOS HÁBITOS
o vendedor garantindo que ele é 100% à pro-
va d’água — teria sido muito mais eficiente.
Teria passado às pessoas de raciocínio rápi-
SÃO DUROS DE
MORRER, MAS
do a mensagem do que pretende que elas fa-
çam: ir a uma loja e comprar o Samsung S5.
Porém nenhum desses comerciais ganharia

MORREM
um prêmio dos profissionais de marketing
focados na astúcia da versão publicitária.

A MORTE DA vantagem competitiva susten-


tável é exagero. A vantagem competitiva
está tão sustentável quanto sempre esteve.
A diferença hoje é que num mundo de possi-
RITA GUNTHER MCGRATH
bilidades infinitas de comunicação e inova-
ção, muitos estrategistas parecem conven-
cidos de que a sustentabilidade só é viável
quando a proposição de valor da empresa
é o que move o consumidor ao tomar a de-
cisão de compra. Eles esqueceram ou nunca
entenderam a prevalência do inconsciente
nas tomadas de decisão. Para as pessoas
de raciocínio rápido, produtos e serviços
mais fáceis de acessar que reforçam hábitos
agradáveis de compra superarão com o pas-
sar do tempo as alternativas inovadoras que e
são mais difíceis de encontrar e requere em
formação de novos hábitos.
air
Portanto, tenha cuidado para não ca
na armadilha de atualizar constanteme ente
sua marca e proposição de valor. Quallquer
empresa, seja grande empresa e bem m con-
solidada, seja um nicho de mercado ou uma
novata, pode manter sua vantagem inicial
com uma excelente proposição de v valor se
entender e seguir as quatro regras da
d vanta-
gem cumulativa.
HBR Reprint R1701B–P Para pedidos, página 14

A. G. LAFLEY, CEO recentemente aposentado da


Procter & Gamble, é membro do conselho da
Snap Inc.. ROGER L. MARTIN é ex-reitor da Rotman School
of Management da Universidade de Toronto. Eles
são coautores de Playing to win: how strategyy really
works (Harvard Business Review Press, 2013). O
artigo foi inspirado na pesquisa de Craig B. Wynett,
diretor de ciência comportamental da Procter &
Gamble.

44 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


RITA GUNTHER MCGRATH, professora de administração da Columbia Business
School, é especialista mundialmente reconhecida em estratégia e
crescimento, com ênfase em empreendedorismo corporativo.

u adoro a ideia de que as ou telecomunicações. Seus ambientes não — como outros elementos do ambiente —
decisões de compra dos são estáveis — as empresas podem ser abala- mudam. E quando novas tecnologias viabi-
consumidores estão mais das por empresas novatas em ascensão, co- lizam novos modelos de negócio, os hábitos
intimamente relacionadas mo mostrou Clayton Christensen, e também podem mudar muito rápido.
a hábitos e facilidades que à por concorrentes que usam um modelo de Pense nas forças poderosas liberadas de
fidelidade — ela encerra um negócios diferente ou chegam de um setor 2004 a 2007 pelo surgimento e expansão de
insight da ciência comporta- adjacente. E forças competitivas persistentes quatro empresas separadas, mas relaciona-
mental indispensável ao estudo das decisões podem ser destruídas do dia para a noite por das. Em 2004, a Facebook foi fundada. Em
do consumidor. E como Lafley e Martin suge- uma empresa que digitalizou seu negócio físi- 2005, a YouTube. Em 2006, a Amazon lançou
rem, ela tem grandes implicações sobre co- co (hello, Enciclopédia Britânica) ou transfor- a Amazon Web Services (AWS). Em 2007, os
mo os produtos são desenvolvidos e as mar- mou seu produto num serviço (por exemplo, sistemas operacionais iPhone da Apple e
cas administradas. Concordo plenamente a Zipcar, Airbnb e Uber). A Apple e a Google, Android da Google foram lançados. Como
com os autores que o inconsciente dos con- não necessariamente, pretenderam abalar as aponta Ben Thompson, analista de tecnolo-
sumidores controla os processos de tomada câmeras fotográficas compactas, nem falar gia, a AWS facilitou e barateou o processo de
de decisão — e acredito que muitas empresas nos dispositivos GPS, comerciais de TV ou o abrir empresas online. A YouTube facilitou e
podem se beneficiar por tornar suas escolhas Wheather Channel; não obstante, acabaram barateou o upload de vídeos. E eu acrescen-
de rotina mais fáceis, mais rápidas e mais fazendo exatamente isso (ver quadro “Funcio- taria que a frenética popularidade dos telefo-
convenientes. Essa é uma razão pela qual o na até parar: a natureza mutante da vantagem nes celulares permitiu que tudo isso estives-
modelo de assinatura se tornou tão popular competitiva”). se ao alcance das pessoas comuns. Atual-
em tantos setores — ele elimina a necessida- mente, uma pessoa com uma ideia na cabeça
de dos consumidores de, conscientemente, e com conhecimentos de programação pode
decidir sobre as compras de rotina e oferece PONTOS DE INFLEXÃO ESTRATÉGICOS rivalizar com os gigantes globais em dias ou
aos fornecedores um convidativo lucro re- Durante algum tempo, meu argumento foi semanas, e não em meses ou anos — e prati-
corrente sem nenhum esforço. que precisamos de uma nova forma de pensar camente sem nenhum capital.
A teoria da vantagem cumulativa faz mui- sobre estratégia em ambientes onde as barrei-
to sentido no que Martin Reeves e seus cole- ras tradicionais a vencer estão ruindo, ou nos
gas do BCG chamam de dispositivo estratégi- quais as tecnologias emergentes enfraquecem GILLETTE VERSUS DOLAR SHAVE
co clássico — segundo o qual as fronteiras de as restrições. O termo cunhado por Andy Gro- E foi exatamente isso o que aconteceu com o
cada indústria estão claramente definidas, ve, ponto de inflexão, traduz perfeitamente es- lançamento, em 2013, da DollarShave Club.
a base da competição é estável, o ambien- sa situação. Um ponto de inflexão estratégico, com. A promessa da marca foi simples: óti-
te não sofre grandes abalos e a forte posição segundo ele, é “o momento na vida de um ne- mos barbeadores com poucos acessórios
competitiva, uma vez criada, pode ser man- gócio em que o básico está prestes a mudar”. supérfluos, a um baixo custo de assinatura,
tida. Como o BCG mostrou, a empresa de Para as ferramentas estratégicas tradicionais entregues em sua casa automaticamente.
confeitos Mars desfrutou de longos ciclos de é difícil lidar com os pontos de inflexão por- Você não só economizava dinheiro, mas não
vida de produtos: Snickers e M&M (introdu- que, de início, eles geralmente não parecem precisava ir até uma loja ou correr o risco de
zidos no mercado em 1930 e 1941, respecti- importantes. Os irmãos Wright provaram que não encontrar o produto. Isso tudo era mais
vamente) estão entre os confeitos de maiores era possível voar com segurança em 1903, mas atraente porque o hábito de comprar já tinha
vendas no mundo atual. A Procter & Gamble ninguém os levou a sério até 1908. Mesmo sido rompido: barbeadores de lâmina são
tem um background igualmente sólido com o com o lançamento, em 1914, do primeiro voo caros e fáceis de roubar, por isso era comum
Tide, a Unilever com o Dove e a PepsiCo com comercial, poucos perceberam que os aviões trancá-los com chave nas lojas. Atualmente,
o suco de laranja Tropicana. poderiam acabar com indústrias tão variadas embora a Dollar Shave Club tenha 8% de par-
Mas, para um número cada vez maior de como ferrovias, navios a vapor e entrega de ticipação de um mercado de US$ 3 bilhões de
empresas, essas condições não se aplicam. Os mercadorias. lâminas e barbeadores nos Estados Unidos,
limites de suas indústrias não estão claramen- Os hábitos dos consumidores podem ser a característica muito mais importante é sua
te definidos — na verdade, eles estão com- auxiliares poderosos para manter uma van- “participação nos cartuchos”. De acordo com
pletamente borrados. Basta perguntar a qual- tagem competitiva, como mostram Lafley e fontes recentes, está em espantosos 15% de
quer profissional de varejo, entretenimento Martin com muita propriedade. Mas hábitos todos os cartuchos de lâminas vendidos.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 45


FOCO VELHOS HÁBITOS SÃO DUROS DE MORRER, MAS MORREM

FUNCIONA ATÉ PARAR


A NATUREZA MUTANTE DA VANTAGEM COMPETITIVA
Qualquer teoria que tente explicar relações de causa e efeito funciona
dentro de um conjunto de restrições. Uma teoria que funcione
maravilhosamente sob um conjunto pode desabar sob outro.
Ao longo dos anos, testemunhamos mudanças sistemáticas na forma
Em 2010, a Gillette possuía 70% do mer- como as empresas criam uma posição estrategicamente valiosa, muitas
cado global de barbeadores, sem contar as
legiões de consumidores fiéis que lealmente
vezes reforçada pelas restrições dos sistemas dentro dos quais funcionam.
continuavam comprando em grandes quanti- No início da década de 1900, por exemplo, empresas que atingiram
dades, a preços mais altos, enquanto uma no- economias em variedade e volume por meio de produção em massa eram
va geração de produtos era lançada. A Procter dominantes, e assim permaneceram até o período pós-Segunda Guerra.
& Gamble havia adquirido a marca em 2005
por US$ 57 bilhões. Era um negócio de alta
Na verdade, a lista da Fortune 500, de 1970, revela o predomínio de
qualidade, com uma clássica alta participação enormes atores industriais sediados nos Estados Unidos, como General
de mercado — e de seus registros históricos, Motors, General Electric, Exxon Mobil e Union Carbide.
presume-se que tanto a Gillette como a P&G Com o advento das comunicações e da tecnologia computacional, a
foram competentes o bastante para fazer os
vantagem estratégica passou a mirar empresas que alavancavam a tecnologia
consumidores comprar habitualmente. Por-
tanto, eles tinham uma forte vantagem cumu- de informação para fornecer serviços, além de produtos; e modelos que
lativa. Mas isso não foi suficiente, pois o negó- impunham um valor sobre a utilização da informação, que era adicionado às
cio atingira seu ponto de inflexão. funções e características do produto. Embora os gigantes da indústria tenham
Em julho de 2016, a Unilever concordou permanecido estáveis por muito tempo, empresas como Walmart, AIG, Enron
em comprar a Dollar Shave Club por cerca
de US$ 1 bilhão, à vista. Os empreendedores
e Citigroup figuraram ao lado deles na edição da Fortune 500 de 1995.
fundadores estão felizes. Os investidores es- A dinâmica da vantagem competitiva mudou mais uma vez. Hoje as
tão felizes. Os clientes estão obviamente fe- empresas auferem vantagens por meio de acesso a ativos, e não pela
lizes. Os operadores do mercado? Nem tan- posse deles. Além disso, emergiu uma nova categoria de empresas — as de
to. De acordo com o Wall Streee Journal, a
participação de mercado da P&G de lâminas
“plataforma” — como Google, Apple e Facebook, e é o tamanho de sua base
e barbeadores masculinos caiu para 59% em de clientes que cria um círculo virtuoso de reforço. Muitas vezes chamada
2015. Uma das formas de contra-atacar foi de “efeitos de rede”, essa dinâmica revela que quanto mais clientes uma
lançar a Gillette Shave Club. Ao perceber os empresa tem, mais valiosa ela é para cada novo cliente. Nesses casos, ser
efeitos potencialmente destruidores de há-
bitos do modelo de assinatura, a P&G agora
um dos primeiros a se articular pode resultar em vantagens expressivas.
oferece assinaturas e entrega de outros pro- O problema é que todas as teorias têm suas limitações. Tentar aplicá-las
dutos — incluindo o caro Tide Pods. fora dessas condições pode ser desastroso.
Há 20 anos seria inconcebível pensar
que uma mensagem de marketing pudesse
atingir 20 milhões de pessoas em questão
de semanas sem investimentos volumosos podem ser tomadas de surpresa. O que me uma oportunidade de atingir um segmento
em comerciais de televisão e outras mídias. faz pensar numa questão difícil: como os de mercado que, embora estivesse crescen-
Mas a Dollar Shave Club conseguiu isso gra- executivos conseguem equilibrar o tremen- do, não era bem atendido pelo formato de
ças a um divertido vídeo de lançamento, à do poder da vantagem cumulativa e do há- então. O segmento era formado por consu-
divulgação em canais de mídias sociais, e a bito, geralmente associado à marca, com a midores preocupados com valor/preço, mas
um grupo de embaixadores entusiastas da necessidade de revitalizar sua abordagem? que ao mesmo tempo apreciavam o bom de-
marca que saíram em campo para promover Uma tática prática é alavancar as habi- sign e consideravam as compras uma expe-
seus produtos — de graça. lidades ou competências centrais da orga- riência agradável. Para proteger a marca da
nização num novo formato. A Target ser- então loja de departamentos dominante, foi
ve como exemplo. As raízes da empresa criada uma marca separada para o novo em-
PROMOVA O QUE É FAMILIAR PARA O encontram-se numa loja de departamen- preendimento. Seu logo icônico no formato
CLIENTE ATÉ QUANDO VOCÊ INOVA tos tradicional, a Dayton’s, que se tornou de um alvo foi concebido para representar
O ponto essencial de tudo isso é que até a Dayton Hudson e finalmente a Marshall a noção de atingir o alvo da conveniência,
mesmo empresas de renome como a P&G Field’s. Em 1960, sua liderança percebeu preço e experiência do cliente.

46 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


COMO OS EXECUTIVOS
CONSEGUEM EQUILIBRAR
O TREMENDO PODER DA
Em meados da década de 1970, as lojas da
VANTAGEM CUMULATIVA
Target tinham superado as vendas das lojas
de departamentos da empreda. Em 2000, a
COM A NECESSIDADE
Dayton Hudson passou a se chamar Target pa-
ra refletir a realidade de seu novo negócio cen-
tral. Em 2004, a empresa vendeu sua marca
DE REVITALIZAR SUAS
de loja de departamentos, completando uma
transformação extraordinária no varejo.
Outra transformação fascinante, que ala-
ABORDAGENS?
vancou as habilidades centrais de uma em-
presa-mãe, foi a incansável digitalização per- o desempenho possa ser medido de várias MAS VOLTEMOS AO insight realmente impor-
seguida pela Schibsted, empresa norueguesa formas, essa me parece ser uma daquelas tante que destaca o argumento de Lafley e
de mídia jornalística. Ao contrário de muitas que testam a ideia de vantagem sustentável Martin: a maior parte do tempo, nenhum
outras empresas jornalísticas, a Schibsted viu consistentemente.) A primeira conclusão é de nós tem consciência das verdadeiras
a invasão dos anúncios classificados digitais óbvia: é difícil obter crescimento contínuo e motivações subjacentes às nossas escolhas.
como uma oportunidade, e não como uma sustentável de lucros, principalmente num Quanto melhor os estrategistas e profissio-
ameaça ao seu negócio. A partir do fim da dé- período que abrangeu a grande recessão de nais de marketing entenderem essas moti-
cada de 1990, seus líderes, agressivamente, 2008. A segunda, no entanto, é que algumas vações, maior será a probabilidade de incu-
cortejaram os anunciantes de classificados pa- empresas mantêm esse crescimento por pe- tirem hábitos nos consumidores — e, igual-
ra serem listados em seus ativos digitais. Isso ríodos relativamente longos. Descobri que mente importante, maior a probabilidade de
se transformou numa cruzada. Como obser- elas equilibram elementos de estabilidade perceberem que esses hábitos podem mu-
vou Sverre Munck, então vice-presidente de (cultura, relacionamentos, liderança e até es- dar. Aqui a teoria de Clayton Christensen
estratégia editorial internacional, “a internet tratégia) com elementos de dinamismo (mo- sobre ”tarefas a ser realizadas” vem bem
foi feita para os classificados e os classifica- bilização rápida de recursos, experimentos a calhar. Ele se celebrizou por dizer
dos foram feitos para a internet”. Empresa de mercado e mobilidade das pessoas). que quando compramos produtos estamos
de mídia tradicional, a Schibsted foi capaz de Conversei recentemente com Malcolm na verdade contratando-os para nos pres-
desenvolver laços profundos com seus anun- Frank, executivo sênior da Cognizant, que tar um serviço. E os “serviços” embutidos
ciantes com um modelo que promoveu eco- aparece na minha lista original e em outra são extremamente estáveis. Pense no caso
nomias de escala e atividades de comunica- que atualizei no fim de 2015 (para a qual utili- das comunicações: de sinais de fumaça
ção e editorial por suas marcas de mídia. Isso zei um critério modificado: se uma empresa aos correios, do telégrafo e do telefone às
foi suplementado por um significativo com- estava acima do limiar em qualquer um dos tecnologias de comunicação atuais, nosso
prometimento em trazer habilidades tecno- dez anos anteriores, ela era incluída na lista, serviço básico — enviar mensagens a ou-
lógicas para o centro do negócio de mídia, que totalizava então 5.300 empresas). Frank tros seres humanos — não mudou. Mas a
pondo um fim a um cabo de guerra entre os me contou que sua organização vive e respira forma como esse serviço é prestado mudou
processos editoriais convencionais e a lógica a ideia de que em muitos casos a vantagem radicalmente. Se as empresas permane-
da transformação digital. competitiva não vai durar. “Para nós, o que cem focadas no próprio serviço — e não nas
era o teto há cinco anos será o piso daqui a especificidades de como ele é prestado no
cinco anos”, disse ele. A Cognizant é discipli- momento —, elas são capazes de inventar
O EQUILÍBRIO ENTRE ESTABILIDADE E DINAMISMO nada em suas operações em curso com baixo uma forma melhor antes que a concorrên-
Em 2012 escrevi um artigo para a HBR inti- desempenho ou baixo crescimento. Mas ela cia o faça.
tulado “How the growth outliers do it” (*). é extremamente estável. Francisco D’Souza Esse é um ponto que muitos líderes de
A pesquisa, que que se estendeu de 2000 a é CEO desde 2007, e a última inclusão na empresas ignoram. Os consumidores po-
2009, mostrou que das 2.347 empresas de equipe de liderança foi em 2005. A cultura da dem facilmente “contratar” outra solução
capital aberto com capitalização de mercado Cognizant reflete o que seus líderes chamam que preste um serviço melhor — exata-
de mais de US$ 1 bilhão estudadas somen- de “um conjunto sólido de valores cultu- mente como um grande número deles está
te dez deram certo, isto é, aumentaram seu rais”, como fica demonstrado em seus regis- fazendo atualmente com os barbeadores
rendimento líquido em 5% ou mais em ca- tros documentais, declarações públicas e es- comprados por assinatura.
da um dos dez anos do trabalho. (Embora tratégias de comercialização. HBR Reprint R1701B–P Para pedidos, página 14

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 47 


FOCO VANTAGEM CUMULATIVA
DAVID CHAMPION é editor
sênior da HBR

NA PRÁTICA
UMA CONVERSA COM JØRGEN VIG KNUDSTORP,
CEO E PRESIDENTE DO GRUPO LEGO
DAVID CHAMPION
HBR: Você acredita que a fidelidade dos construímos a conexão. As pessoas desen- recente da Nasa sugere que quando as pes-
consumidores da LEGO é consequência volvem hábitos fazendo as mesmas coisas soas chegam aos 25 anos, preservaram somen-
do hábito? repetidamente. E os hábitos se transformam te cerca de 5% da capacidade de pensamento
Knudstorp: Acredito que é mais que hábito. em valores. Quando ensinamos nossos fi- criativo que tinham aos cinco anos. Isso signifi-
Quando me tornei CEO, há 13 anos, o grupo lhos a escovar os dentes todas as noites an- ca que são facilmente sobrecarregadas.
LEGO estava em crise. Eu recebia cartas que tes de ir para a cama, no início essa é apenas Vou ilustrar como nós administramos is-
imploravam: “Por favor, não morra. O mun- uma ação obrigatória para eles. Depois, com so. Temos uma linha de produtos chamada
do seria um lugar mais pobre sem a LEGO”. o tempo, eles se sentem desconfortáveis se LEGO Creator 3 em 1 — kits. Cada um contém
Se os clientes têm conexão emocional com vão dormir sem escovar os dentes. Por fim instruções para montar três modelos em um
sua marca, eles se esforçam para obter o pro- eles começam a sentir que escovar os den- kit. Na verdade, você pode montar muito
duto, e a meu ver suas escolhas são cons- tes é a coisa certa a fazer. Se você tornar sua mais modelos com um único kit. Há 12 anos
cientes. As pessoas não fazem fila durante marca um valor — uma parte da identidade teríamos oferecido 12 sugestões. Mas tanta
dias para comprar um iPhone 7 só porque es- de alguém —, terá uma vantagem competi- variedade afugenta as pessoas. Por isso sim-
sa é uma escolha automática. tiva realmente poderosa. Mas tudo começa plificamos, deixando apenas três. É preciso
É evidente que nem todos os produtos po- quando se faz da marca um hábito. também tornar as rotinas mais divertidas,
dem esperar que ocorra essa conexão emocio- porque é brincando que as crianças apren-
nal com o consumidor. Linhas aéreas e hotéis Como isso funciona no grupo LEGO? dem e se habituam a novas rotinas.
têm programas de fidelidade para nos forçar Você precisa oferecer às pessoas rotinas sim-
a usar com exclusividade seus serviços justa- ples que elas possam praticar para se habituar A novidade — por ser a próxima coisa legal
mente porque não sentimos a conexão emo- a montar os blocos. À medida que as monta- — é importante no negócio de brinquedos.
cional que nos faria escolhê-los. É difícil en- gens se tornam mais complicadas, começam a Mas hábito tem a ver com previsibilidade.
contrar pessoas que se imaginam “asseclas da desenvolver seus próprios hábitos e técnicas. Como você equilibra os dois aspectos?
Holiday Inn”. Mas, se você comercializa um Mas elas estarão abertas a mudar essas rotinas Você está totalmente certo ao afirmar que a
produto como o Tide, certamente precisa ape- se alguém lhes mostrar uma forma mais sim- novidade é importante para as crianças, e é
lar para a mente inconsciente do consumidor, ples, mais original. Centenas de convenções por isso que 60% dos conjuntos LEGO que co-
já que a decisão sobre que detergente comprar anuais da LEGO pelo mundo afora mostram locamos no mercado todos os anos são sem-
costuma ser inconsciente. novas formas de usar os elementos existen- pre novos. Mas isso não significa substituir o
Mas um produto como o nosso, que en- tes sobre as quais nós, como empresa, nunca fator familiaridade, porque o System of Play da
volve jogos, crianças e aprendizagem, po- tínhamos pensado. Vá até o YouTube e veja LEGO é uma plataforma — talvez o único brin-
de ser mais que apenas uma opção segura as coisas extraordinárias que as pessoas mon- quedo no mundo que oferece uma plataforma
e fácil. Pode ser uma declaração consciente tam. Eu estou sentado aqui com uma estrutu- para brincar. Cada novo conjunto não só con-
de valores ou identidade. Nenhuma crian- ra de cerca de 20 blocos para criar milhões de tém 12 novos modelos possíveis como pode
ça anda por aí declarando-se correligionária estruturas diferentes. Construir é realmente ser combinado com os conjuntos que você já
da LEGO, é claro — criança quer é brincar —, uma necessidade básica — todos nós quere- tem, e assim pode aumentar o número total de
mas ela vai crescer e talvez se torne adepta mos fazer coisas que sejam nossas — e ofere- potenciais estruturas em ordens de grandeza.
da LEGO quando tiver seus próprios filhos. É cemos uma plataforma para isso. Isso contém um tremendo efeito da rede. Se
muito mais fácil persuadir os pais a adquirir o uma criança já tem um conjunto LEGO, ter ou-
hábito da LEGO que as crianças. E esse é um O que é preciso fazer para iniciar o processo? tro produto LEGO é mais valioso que apenas o
motivo para trabalharmos mais em merca- É questão de manter o básico o mais simples e ato incremental da compra — a criança amplia
dos emergentes, onde estamos falando prin- fácil possível para se acostumar. Um neuro- exponencialmente sua plataforma para brin-
cipalmente de usuários de primeira geração. cientista recentemente me disse que nosso cé- car. Isso é contagioso: quanto mais crianças
rebro tem o equivalente a 20 megabytes de me- adquirem o hábito LEGO, mais as outras crian-
O hábito tem alguma influência nessa mória RAM — suficientes para processar ape- ças também o farão, e elas poderão misturar e
conexão emocional? nas quatro fotos de um smartphone. E ela piora combinar suas coleções LEGO.
De forma alguma. Hábito é como à medida que envelhecemos: uma pesquisa HBR Reprint R1701B–P Para pedidos, página 14

50 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


“O HÁBITO
CRIA A
CONEXÃO.”
FOTOGRAFIA POR LASSE BECH MARTINUSSEN
FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 51 
FOCO “O HÁBITO CRIA A CONEXÃO”

A CIÊNCIA
COMO O
HÁBITO VENCE
A NOVIDADE
OS PROFISSIONAIS DE MARKETING
GASTAM TEMPO E DINHEIRO TENTANDO
TORNAR OS PRODUTOS ATRAENTES PARA
QUE SEJAM ESCOLHIDOS. MAS E SE A
NOVIDADE PRODUZIR O EFEITO OPOSTO?
SCOTT BERINATO
pesquisadores chamavam esse
Por serem criaturas de hábitos, fenômeno de “calor aconchegante
as pessoas são cegas para a da familiaridade”. Atualmente há
evidências neurológicas de que ele
novidade. existe. Tide é um exemplo clássico de
Nosso cérebro utiliza heurística e um produto que reconhecemos sem
experiência para decidir o que um objeto muito esforço. A pesquisa mostra que
é, deixando muitas vezes passar aspectos respondemos à posição, cor, forma e
inesperados ou novos de uma cena. Segundo orientação espacial dos produtos (nessa
o neurocientista Moshe Bar, o cérebro ordem) nas prateleiras das lojas. Num
está continuamente ocupado gerando processo conhecido como pré-ativação
previsões que aproximam o futuro relevante. perceptual, o cérebro se baseia nessas
“Acreditamos que, quando olhamos para pistas. Com o passar do tempo ele precisa
um objeto, o cérebro pergunta: o que é isso? de menos informação e utiliza menos energia
Mas o que ele realmente pergunta é: com para reconhecer um objeto familiar que para
que isso se parece?” Esse rápido processo de identificar um objeto novo.
previsão é o equivalente mental do antigo jogo Aparentemente esse é um segredo muito
“Qual é a música?”. Quanto mais você tivesse bem guardado, porque os profissionais de
ouvido a música, menos notas precisaria para marketing investem tempo e dinheiro criando
reconhecê-la. Quanto menos energia for usada novidades. Mas uma nova embalagem para
para reconhecer alguma coisa, melhor. O um produto tradicional pode não ter o efeito
objetivo do profissional de marketing é fazer esperado. A mudança destinada a revitalizar
o consumidor comprar aquela marca com ou energizar uma linha de produtos pode, na
apenas uma nota. Mudar constantemente a verdade, fazer os consumidores ignorarem o
melodia e a letra não vai ajudar. novo design enquanto buscam por aquilo que
O lado oposto de nossa cegueira para a estão acostumados a ver por força do hábito.
novidade é que quanto mais consistente um Num teste desse tipo de cegueira, solicitou-se a
objeto permanece, menos esforço o cérebro gestores de produto que localizassem um novo
precisa fazer para identificá-lo (e escolhê-lo). design de sua própria marca numa prateleira, e
Há muito tempo, por volta de 1910, os não foi fácil para eles fazerem isso. 

52 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


SCOTT BERINATO é editor
sênior da HBR.

O PODER DA MEMÓRIA IMPLÍCITA


Uma vez que as imagens foram absorvidas, a intensidade com que
ficam impressas em nós é extraordinária. Num estudo, David Mitchell,
da Kennesaw State University, mostrou aos participantes imagens
similares a A (abaixo), várias vezes, pré-ativando sua memória
implícita. Mais tarde mostrou-lhes fragmentos (similares a B) das
imagens que tinham visto originalmente, juntamente com “novos
fragmentos” de imagens que ainda não tinham visto. Houve entre
os participantes uma probabilidade maior de reconhecer imagens
já vistas do que de reconhecer as novas. Mas o mais curioso é que
Mitchell fez seu follow-up 17 anos depois da pré-ativação. Alguns já
nem se lembravam de que tinham participado do estudo. Mesmo anos
depois, as pessoas são capazes de identificar coisas que viram antes
com mais facilidade que coisas que nunca viram ou viram apenas
ocasionalmente — o que poderia servir de alerta para os profissionais
de marketing que valorizam mais a novidade que o hábito. ■

A B

HBR Reprint R1701B–P Para pedidos, página 14


FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 53 
FOCO “UM PRODUTO QUE PERMITE ÀS PESSOAS MANTER SEUS HÁBITOS”

NA PRÁTICA

“UM PRODUTO
QUE PERMITE
ÀS PESSOAS
MANTER SEUS
HÁBITOS”
UMA CONVERSA COM SCOTT COOK,
PRESIDENTE E COFUNDADOR DA
INTUIT DAVID CHAMPION
54 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017
DAVID CHAMPION é editor
sênior da HBR.

totalidade, projetados para contadores, e os usuários


HBR: Que influência os hábitos do consumidor
tinham de falar a linguagem deles. Mas, de dez peque-
têm no sucesso de sua empresa?
nas empresas, nove não tinham contador no staff — os
Cook: Nós realmente prestávamos muita atenção na
livros eram escriturados por leigos que provavelmen-
forma como as pessoas lidavam com suas finanças
te não sabiam diferenciar um débito de um crédito e
pessoais antes de criar nosso primeiro produto — e
não queriam aprender. Descobrimos isso observando
conseguimos que a interface do usuário imitasse essas
os usuários do Quicken e decidimos projetar o primei-
rotinas. O Quicken foi projetado para se parecer com
ro produto para contabilidade sem contabilidade. Ele
um talão de cheques. E não se tratava somente de apa-
levou o nome de QuickBooks. Embora o lançamento
rência — a interface funcionava como um lançamento
não tenha sido um sucesso, tornamo-nos líderes do
de cheques. Você coloca a próxima transação na parte
mercado em dois meses, porque o produto tinha sido
inferior, por exemplo, exatamente como você faz num
desenhado para trabalhar com os hábitos das pessoas.
talão. Ninguém mais tinha oferecido uma interface
Agora que um grande número de pequenas empresas
tão familiar como essa.
utiliza o QuickBooks, seus auditores se acostumaram
Nós acompanhamos as rotinas das pessoas en-
a usá-lo e estão aconselhando novos clientes a usá-lo
quanto criávamos a funcionalidade do produto. Em
também, o que produz um efeito bola de neve. Tudo
1984 as contas eram pagas com cheque. Então quise-
isso foi colocado num produto que permite que
mos garantir que o Quicken fosse capaz de imprimir
as pessoas mantenham seus hábitos.
cheques facilmente em impressora. Isso parece óbvio
hoje, mas naquela época as pessoas usavam as antigas
Mas você não acha que os hábitos mudam
impressoras de jato de tinta da Epson, o que torna-
rapidamente no espaço digital?
va especialmente difícil o processo de alinhar a pilha
Sim. As pessoas se ajustarão a uma mudança radical se
de cheques para imprimir exatamente nas linhas dos
ela lhes oferecer um hábito de algum outro contexto que
cheques. Na verdade, inventamos e patenteamos uma
esteja relacionado — principalmente no espaço digital.
técnica de alinhamento que permitia que as impresso-
Agora estamos tentando tornar vários hábitos —
ras imprimissem corretamente. Aparentemente nin-
que são realmente apenas uma forma de simplificar a
guém mais teve essa ideia.
vida — redundantes. Considere um profissional autô-
nomo típico, como um motorista da Uber. Autônomos
O que fez você apostar tão pesado nas rotinas
precisam manter um registro cuidadoso de seus gastos
do consumidor?
para poder calcular os impostos. Mas é um sofrimento
Foi a Apple. Eu pedi a um funcionário da empresa
organizar e categorizar todos os recibos e listar as leitu-
que me mostrasse o Lisa, e vi que a interface de seu
ras de controle de quilometragem e do odômetro para
desktop se parecia muito com os artefatos físicos de
cada corrida. Muitos autônomos não fazem isso e per-
escritório com os quais as pessoas trabalhavam — ar-
dem dinheiro em deduções fiscais. Por isso lançamos
quivos, e assim por diante. Eu me lembro de sair da
um serviço chamado QuickBooks Self-Employed, que
sede da Apple e dirigir até o restaurante mais próximo
contabiliza operações com cartões de crédito e taxas
para sentar e tomar nota do que eu tinha observado de
bancárias e automaticamente categoriza as despesas
tão poderoso no design.
de acordo com o código de categoria do comerciante.
Mais tarde, no lançamento do Mac, tive um impac-
Ele também lista automaticamente todos os períodos
to quando ouvi Steve Jobs dizer que o que ele preten-
em que você esteve dirigindo, então basta juntar todas
dia era tornar seu computador tão simples de operar
as corridas. Na hora de calcular os impostos, todas as
quanto um telefone. Pense nisso por um minuto. Era
informações são transmitidas diretamente ao prepara-
fácil usar um telefone naquela época? Você precisa-
dor de impostos ou ao software de impostos.
va memorizar sete — ou dez — dígitos numéricos. Se
você discasse o número errado, o sistema cobrava, o
Se você está formando o hábito para torná-lo
que era muito caro em chamadas de longa distância, e
redundante, de onde virá sua próxima vantagem?
depois você tinha de recomeçar do zero. Se a linha es-
Agora, é uma questão de efeito de rede, que é a razão
tivesse ocupada, a resposta era um desagradável bip,
de estarmos trabalhando para alavancar a comunida-
bip, bip. A interface dos telefones era horrorosa. En-
de de usuários. Com o TurboTax, por exemplo, esta-
tão, por que Jobs — um aforismo para design elegan-
mos conseguindo que os consumidores respondam
te — disse que queria tornar o Mac tão simples de usar
perguntas sobre impostos. Criamos a maior e melhor
quanto um telefone?
fonte de respostas sobre impostos — se você entrar no
Google e digitar uma pergunta sobre imposto, o pri-
Porque todos estavam acostumados a ele.
meiro link que aparece geralmente é a nossa resposta.
Certo. Por causa do hábito. As pessoas estavam acos-
Isso está promovendo um novo hábito da era digital:
tumadas a digitar essas séries de sete ou dez dígitos.
participar de comunidades online. Mas não teríamos
criado a comunidade se, primeiro, não tivéssemos tra-
Mas os hábitos de quem você quer captar?
balhado com as rotinas das pessoas.
Quando lançamos o QuickBooks, para pequenas em-
presas, os softwares de contabilidade eram, na sua HBR Reprint R1701B–P Para pedidos, página 14

FOTOGRAFIA DE JEFF SINGER


FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 55 
FEVEREIRO 2017

Artigos

A CONTRIBUIÇÃO DA ESTRATÉGIA SOCIAL PARA A VANTAGEM COMPETITIVA


Cada vez mais, executivos e empresas são desafiados a
beneficiar a sociedade e a proteger o meio ambiente
atuando local ou internacionalmente.
UM EMPURRÃOZINHO PARA AJUDAR O ATENDIMENTO AO CLIENTE
Consumidores querem resultados — não simpatia.
ESTRATÉGIAS ENERGÉTICAS PARA EXECUTIVOS DO C-LEVEL
A energia não é mais simplesmente um custo
a ser administrado.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 57 


58 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017
A CONTRIBUIÇÃO DA
ESTRATÉGIA SOCIAL PARA
A VANTAGEM COMPETITIVA
ALEXANDER ZIMMERMANN, GILBERT PROBST,
CAROLIN HERMANN E PAUL FERREIRA

CADA VEZ MAIS, EXECUTIVOS


E EMPRESAS SÃO DESAFIADOS
A BENEFICIAR A SOCIEDADE
E A PROTEGER O MEIO
AMBIENTE ATUANDO LOCAL
OU INTERNACIONALMENTE.

ILUSTRAÇÃO DE ENIS AKSOY/GETTY IMAGES


FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 59 
A CONTRIBUIÇÃO DA ESTRATÉGIA SOCIAL PARA A VANTAGEM COMPETITIVA

No entanto, costuma ser mais fácil falar que fazer. valor compartilhado, Michael E.Porter e Mark R. Kra-
Se antes bastava divulgar as atividades filantrópicas mer (HBRBR, janeiro de 2011) defendem, por exemplo,
e criar a área de responsabilidade social, hoje as ne- que melhorar as condições sociais e ambientais ao lon-
cessidades sociais e ambientais devem ser percebidas go de toda a cadeia de suprimentos pode garantir, no
como uma oportunidade de mudança, proatividade e longo prazo, a disponibilidade dos inputs necessários.
assunção de risco. É a isso que chamamos “estratégia Outros argumentam que as necessidades sociais e am-
responsável”. Em primeiro lugar, contribuir estrategi- bientais podem ser uma fonte de inovação. Como res-
camente para a sociedade ou para o meio ambiente re- posta, as empresas devem desenvolver novos produ-
quer “pensamento fora da caixa” e habilidade de per- tos ou modelos de negócio. Podemos então resumir
ceber as demandas de diversos stakeholders. Interna- que a estratégia responsável pode levar a dois tipos di-
mente, respostas a essas necessidades dificilmente ferentes de iniciativa:
surgirão dentro das tradicionais estruturas de silos. É a) a otimização dos produtos e processos de uma
preciso pensar em soluções integradas que cruzem as empresa para aprimorar sua tripla linha final de resul-
fronteiras internas da empresa. tados no balancete (isto é, pessoas, planeta e lucros)
A estratégia responsável permite às empresas ver b) a renovação de produtos ou modelos de negócio
a esfera socioambiental como um indutor de mudan- para satisfazer necessidades socioambientais e desen-
ça para seu negócio. Outra característica está relacio- volver novas oportunidades de crescimento.
nada à proatividade da empresa em atender às neces- Como consequência, no Relatório de Pesquisa e Es-
sidades sociais e ambientais. Estratégia responsável tudo Executivo Global de Sustentabilidade & Inovação
significa que essas necessidades são percebidas como de 2012, a Sloan Management Review e o Boston Consul-
uma oportunidade de diferenciação, cabendo à pró- ting Group descobriram que iniciativas estratégicas res-
pria empresa tentar conduzir as questões mais pro- ponsáveis “se enquadram num amplo espectro — des-
missoras em vez de seguir outros atores do setor. E tão de fazer as coisas de forma diferente (isto é, otimização)
importante quanto tudo isso, a estratégia responsável até fazer coisas completamente diferentes (isto é, reno-
cria um alto nível de incerteza. Essa incerteza é parti- vação) ”. No entanto, muitas pesquisas focam nas van-
cularmente maior quando a esfera social e a ambiental tagens das iniciativas da otimização ou da renovação,
se tornam mais complexas que os mercados tradicio- mas não comparam nem destacam seus efeitos. Por is-
nais. Em outras palavras, estratégia responsável sig- so ainda sabemos muito pouco sobre se as iniciativas de
nifica que as empresas estão dispostas a assumir um otimização e renovação são o que há de mais adequa-
risco empresarial significativo. do para conferir vantagem competitiva a uma empresa.
idade crescente de pesquisas e de exem- Essa questão é vital para as pequenas e médias em-
bem-sucedidos mostra que atender às presas (PMEs), que costumam estar profundamente
sociais e ambientais pode ser vantajo- entrosadas nas comunidades vizinhas, mas, com fre-
ócios. Tendo em mente a noção de criar quência, enfrentam mercados altamente competiti-
vos. Por isso, enquanto houver uma forte pressão para
adotar uma estratégia responsável, as PMEs só terão
condições de adotá-la no longo prazo se isso contribuir
para sua vantagem competitiva. A questão tem impli-

ESTRATÉGIA
cações importantes também para as grandes multina-
cionais, que precisam enfrentar vários stakeholders
sensíveis à pegada social e ambiental da empresa. En-

ONSÁVEL
quanto isso, acionistas e mercados financeiros conti-
nuam céticos quanto a atribuir valor às iniciativas so-
cialmente responsáveis. Na pesquisa com CEOs reali-

EMPRESAS
zada pela Accenture em 2013, os respondentes consi-
deraram a falta de vínculo entre essas iniciativas e o
valor do negócio como um dos três principais obstá-

CIOAMBIENTAL
culos à implementação de uma abordagem estratégica
integrada das questões sociais, ambientais e de gover-
nança corporativa.
Para saber mais sobre se, e por meio de que inicia-

COMO UM INDUTOR DE
tivas, a estratégia responsável contribui para a vanta-
gem competitiva da empresa, realizamos um projeto
de pesquisa em várias etapas e com várias metodolo-

MUDANÇA PARA SEU NEGÓCIO.


gias no Center for Organizational Excellence das uni-
versidades de Genebra e de São Galo, na Suíça. Nos-
so propósito era responder a duas questões. Primeiro,
realizamos um estudo quantitativo para medir como

60 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


a estratégia responsável, a otimização resultante e as Para explicar melhor como a estratégia responsável
iniciativas de renovação contribuem para a vantagem resulta em desempenho acima da média, fizemos uma
competitiva. Depois, estudamos dados qualitativos segunda rodada de análises mais exploratórias. Agru-
de corporações internacionais para identificar práti- pamos as empresas de nossa amostra de acordo com
cas concretas de estratégia responsável. seu nível de otimização e renovação, o que resultou
numa matriz 2x2. Para cada quadrante da matriz, cal-
MEDINDO O EFEITO DA ESTRATÉGIA culamos a média do bom e do mau desempenho eco-
RESPONSÁVEL NO DESEMPENHO nômico de empresas com alto nível de estratégia res-
Inicialmente, coletamos dados de 88 CEOs de PMEs ponsável em relação àquelas com baixo nível de estra-
da indústria manufatureira alemã em 2014. Indaga- tégia (ver quadro abaixo). Em média, as empresas com
mos sobre: alto nível de estratégia responsável tinham desem-
a) grau de estratégia responsável (em termos de penho 7,75% superior às demais, o que está de acor-
mudança, proatividade e capacidade de assumir do com nossa análise estatística. E em conformidade
riscos); com nossos resultados estatísticos, as empresas que
b) iniciativas estratégicas (em termos de otimiza- adotaram simultaneamente forte otimização e inicia-
ção e renovação de produtos e modelos de negócio); e tivas de renovação mostraram o mais alto desempe-
c) desempenho econômico no curto, médio e lon- nho acima da média.
go prazos (em termos de produtividade, lucrativida- As empresas com alto nível de estratégia responsável
de, crescimento de vendas e desempenho geral em tiveram desempenho, em média, 11% melhor (quadrante
relação à concorrência). Todas essas questões foram superior direito). Curiosamente, essas empresas que im-
respondidas baseadas numa escala Likert de sete pon- plementaram sua estratégia responsável principalmente
tos. Em um terço das empresas, obtivemos respostas por meio da otimização (quadrante superior esquerdo) ou
de um segundo respondente para validar a confiabili- por renovação (quadrante inferior direito) apresentaram
dade de nossos dados. diferença de desempenho médio muito pequena ou até EM RESUMO
A análise desses dados permitiu que obtivéssemos negativa em comparação com as demais.
vários insights. E o mais importante: as análises esta- O PROBLEMA
tísticas mostraram que a estratégia responsável tem COMO A ESTRATÉGIA RESPONSÁVEL OPERA NA PRÁTICA? Há uma forte pressão para
que empresas adotem
um efeito significativamente positivo no desempenho Baseados nesses insights, queríamos entender melhor
estratégias responsáveis
econômico. Além disso, esse efeito é completamente como a implementação da estratégia responsável por nos campos social e
mediado pela combinação de otimização e iniciativas meio da otimização e/ou de iniciativas de renovação ope- ambiental. No entanto,
de renovação. Em outras palavras, a estratégia respon- ra na prática e como afeta a vantagem competitiva. Nos- tais estratégias muitas
sável contribui para a vantagem competitiva, mas so- so objetivo era também obter insights qualitativos mais vezes não parecem gerar
mente se for implementada pela otimização e pela re- profundos em corporações líderes que tinham se des- retorno comercial direto.
novação de produtos ou modelos de negócio. tacado por adotar estratégias responsáveis. Partindo de
POR QUE ACONTECE
nossos resultados quantitativos, se- Segundo o estudo realizado,
lecionamos empresas de cada qua- as estratégias responsáveis
drante da matriz. Então conversa- são mais efetivas
MODELO PARA TESTE mos longamente com vários toma-
dores de decisão dessas empresas
quando implementadas
indiretamente no
Porcentual médio do bom/mau desempenho de empresas com alto
funcionamento da
versus baixo nível de estratégia responsável (baseado numa pesquisa para entender por que a estratégia empresa — ou seja, sem
de 2014 com 88 pequenas e médias empresas) responsável compensava em alguns ter ligação imediata ao
casos, mas em outros não. O insight modelo de negócios. Elas
mais importante é que as empresas funcionam melhor como
ALTA

mais bem-sucedidas criavam efei- forma de influência sobre


os principais alvos da
tos sinergéticos entre a otimização
– 1,5% + 11% e a renovação, o que consequente-
mente sobrecarregava os custos re-
organização (clientes,
acionistas e stakeholders).
OTIMIZAÇÃO

lacionados à estratégia responsável. A SOLUÇÃO


Em primeiro lugar, as empresas Inserir estratégias
que incorporam a responsabilida- responsáveis nos processos
de produção da empresa,
de social e ambiental em sua estra-
+5% + 1%
conciliando mudanças de
tégia, mas não a implementam nos menor escala (otimização)
negócios por meio de forte otimiza- a inovações estruturais
ção ou esforços de renovação, têm, (renovação). Ao fazer
BAIXA

em média, desempenho superior ao isso, a empresa deve ser


ágil, produzir relatórios
de suas congêneres. Embora isso se- constantes e lidar
ja contraintuitivo de início, é um si- diretamente com
BAIXA RENOVAÇÃO ALTA nal de que a estratégia responsável seus clientes.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 61


A CONTRIBUIÇÃO DA ESTRATÉGIA SOCIAL PARA A VANTAGEM COMPETITIVA

tem, em si, um efeito positivo. Isso pode ser explicado em toda a cadeia de suprimentos. Principalmente as
pelo fato de que as empresas que incorporam as necessi- empresas grandes, de capital aberto, praticamente não
dades sociais e ambientais em sua estratégia de negócios têm escolha senão se engajar na otimização, uma vez
enviam uma poderosa mensagem aos seus stakeholders, que elas são cada vez mais forçadas a relatar explicita-
antes mesmo que eles tomem medidas concretas. Estes mente seus esforços nesse sentido, o que constitui um
podem, então, contribuir, direta ou indiretamente, pa- critério-chave em muitos rankings de responsabilidade
ra a vantagem competitiva. Encontramos várias referên- corporativa. No entanto, esses esforços de otimização
cias a esses efeitos em nossas entrevistas. não raro implicam custos consideráveis. As empresas
A estratégia responsável pode, por exemplo, au- precisam estar dispostas a aceitar preços mais altos, su-
mentar a motivação dos funcionários, oferecendo um primentos limitados e competição acirrada.
propósito maior para seu trabalho. Os gestores perce- Um exemplo típico é o óleo de palma (denomina-
beram que isso tornou os funcionários mais envolvidos ção genéricas de vários óleos vegetais, entre eles o
e eficientes. Um segundo grupo de stakeholders muito dendê), ingrediente essencial em vários produtos de
aberto às empresas com estratégia responsável são os consumo que, no entanto, tem sido objeto de debates
governos e as agências reguladoras. Ao incluírem as ne- públicos que acompanham os relatos de devastação
cessidades socioambientais em sua estratégia, algumas de florestas e destruição ambiental massiva. Muitas
empresas se tornaram parceiros decisivos de governos empresas responsáveis reagiram e procuraram novas
ao promover mudança social e ambiental. Isso lhes deu fontes mais sustentáveis de óleo de palma. Foi criada
a vantagem de ser as primeiras a chegar e a atingir o uma mesa-redonda sobre óleo de palma sustentável
mercado no prazo mais curto possível. E, igualmente (RSPO, na sigla em inglês) para certificar o óleo cru de
importante, os clientes se tornaram cada vez mais sen- grãos de palma (CPKO, na sigla em inglês). Apesar da
síveis às empresas com estratégia responsável. Embo- acentuada queda no preço desse produto desde 2011,
ra eles não estejam necessariamente dispostos a pagar os incentivos para a produção de óleos certificados tri-
preços mais altos, a percepção pública de uma empresa plicaram, chegando a US$ 21,08 por tonelada em 2013.
ainda pode influenciar substancialmente as decisões de As empresas que quiserem comercializar esse ingre-
compra em algumas indústrias. diente de forma sustentável terão então de arcar com
os custos crescentes.
A BRITISH PETROLEUM Esse insight está alinhado com nossos resultados
Apesar dos efeitos, o bom desempenho de empresas anteriores com as PMEs. Se a estratégia responsável só
com estratégia responsável no quadrante inferior es- leva as empresas a otimizar seus negócios centrais, ela
querdo de nossa matriz pode ainda ser atribuído ao fa- aparentemente faz mais que neutralizar o efeito nor-
to de que elas evitam os altos custos e riscos associa- malmente positivo. Isso não quer dizer em absoluto
dos a abordagens mais dinâmicas. No entanto, é im- que as empresas devam reprimir essas atividades, vi-
portante observar que essa abordagem passiva, mui- tais para garantir a viabilidade de longo prazo de seus
tas vezes, não se sustenta no longo prazo. Um ótimo negócios, proteger nosso ambiente natural e melhorar
exemplo disso é a British Petroleum, que desde mui- o padrão de vida da população. No entanto, vale lem-
to cedo se tornou uma constante precursora de ques- brar que focar somente na otimização responsável po-
tões públicas no que diz respeito a visão e estratégia de produzir um efeito médio neutro ou até ligeiramen-
responsável. No entanto, dado o custo considerável te negativo no desempenho e, portanto, não é muito
da pressão da indústria, a empresa lutou para imple- adequado para promover a vantagem competitiva.
mentar definitivamente suas altas ambições no negó-
cio central. Isso resultou numa série de problemas, co- RENOVAÇÃO
mo os acidentes com a refinaria do Texas ou num oleo- Uma segunda possibilidade para implementar estra-
duto no Alasca, que, na verdade, não teve um impacto tégias responsáveis é renovar as atividades centrais
assim tão forte graças à percepção positiva que seus do negócio e se envolver em novos produtos ou mo-
stakeholders tinham da BP. Por outro lado, o acidente delos de negócio. Nos últimos anos, o empreendedo-
da Deep Water Horizon, em 2010, foi severamente cri- rismo social floresceu. Enquanto os primeiros a chegar
ticado pela opinião pública — a BP chegou a enfrentar foram principalmente pequenas start-ups, um núme-
novas críticas por não agir de acordo com o que prega- ro crescente de grandes empresas se engajou recente-
va. No entanto, embora abordagens passivas compen- mente em novos negócios com um objetivo social e/ou
sem no curto prazo, podem não ser sustentáveis. E aí é ambiental explícito. Grandes corporações farmacêuti-
preciso usar abordagens mais dinâmicas. cas que individual ou coletivamente desenvolvem me-
dicamentos para doenças tropicais negligenciadas são
OTIMIZAÇÃO um excelente exemplo. A demanda por esses tratamen-
Utilizar abordagem mais dinâmica consiste em imple- tos é enorme, uma vez que uma em cada sete pessoas
mentar uma estratégia responsável otimizando as ativi- no mundo sofre de, pelo menos, uma doença tropical
dades centrais do negócio. A forma mais comum de fa- negligenciada, e 2,5 bilhões estão em risco. No entan-
zer isso é encorajar a sustentabilidade social e ambiental to, embora elas correspondam a 11,4% do total da carga

62 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


global de doenças, somente 1,3% das drogas aprovadas imobiliária chinesa Vanke é um exemplo de uma gran-
entre 1975 e 2004 foi desenvolvido para esses tipos de de corporação que abraça simultaneamente as ativi-
doença. As empresas farmacêuticas abriram suas bi- dades de otimização e renovação, e no mesmo negó-
bliotecas corporativas especializadas aos pesquisado- cio. Com base em sua estratégia responsável, que o
res de organizações não governamentais e as ajudaram presidente Wang Shi continuamente enfatiza, a em-
a desenvolver tratamentos para resolver essa questão presa começou produzindo habitações pré-fabrica-
urgente. Financiadas por doações públicas e privadas, das, uma técnica até então completamente desconhe-
essas ONGs produzem e distribuem os medicamentos. cida no setor de construção civil da China. Enquanto o
tempo médio de vida de construções tradicionais era
INOVAÇÕES RESPONSÁVEIS de somente 25 anos, os prédios pré-fabricados dura-
Embora essas inovações responsáveis sejam da mais vam mais de 75 anos, o que contribui fortemente para
alta importância e devessem ser fortemente encora- resolver o déficit habitacional na China, principalmen-
jadas, nossos dados quantitativos e qualitativos suge- te nas grandes cidades.
rem que elas podem não ser eficazes em produzir um Além disso, ao produzir e montar os elementos da
desempenho econômico elevado significativo. Uma construção fora da obra, a Vanke consome 20% menos
razão para isso é que o público, em geral, não aprova energia, 63% menos água e 87% menos madeira por
os altos lucros auferidos por empresas que carregam metro quadrado de construção. O impacto ambiental
bandeiras sociais ou ambientais. Grandes empresas global é enorme, uma vez que a China concentra pra-
farmacêuticas, por exemplo, poderiam ser alvo de pe- ticamente metade de todos os novos projetos de cons-
sadas críticas se vendessem medicamentos para do- trução civil no mundo. A Vanke está seriamente em-
enças negligenciadas a um preço competitivo de mer- penhada em aumentar sua cota de pré-fabricados pa-
cado nos países em desenvolvimento, que são os mais ra 80% em 2016, economizando aproximadamente 3
afetados, e ganhassem deles uma receita similar à que mil hectares de florestas e 120 mil toneladas de emis-
ganham com outros tipos de tratamento em países do sões de carbono por ano. Essas sinergias criadas entre
Primeiro Mundo. É por isso que, nesse aspecto, as ati- a otimização e a renovação contribuíram muito para o
vidades de grandes multinacionais geralmente têm crescimento lucrativo da Vanke. Ao ampliar seu por-
caráter mais filantrópico. A boa notícia é que a percep- tfólio de produtos pré-fabricados, ela pôde otimizar as
ção positiva resultante entre os stakeholders pode aju- atividades de seus negócios e economizar recursos ex-
dar a compensar os volumosos investimentos neces- pressivos, o que de outra maneira não teria
sários para desenvolver e concretizar essas atividades. sível. Essas vantagens permitem que o preço
Um gestor comentou que os funcionários envolvi- pré-fabricadas da Vanke seja substancialment
dos nesses projetos estavam extremamente entusias- to que o de seus competidores no mercado tra
mados com o trabalho por eles desenvolvido. Eles não
só se tornaram embaixadores ainda mais fortes de su-
as empresas, mas também estavam dispostos a dedicar

A PERCEPÇÃO
a esses projetos parte de seu tempo livre, e ajudaram a
reduzir os custos. Os governos valorizam essas campa-
nhas. Para oferecer alguma compensação econômica, a

PÚBLICA DE
agência de alimentos e medicamentos dos Estados Uni-
dos, a FDA, concede o chamado título de ensaio priori-
tário (PRV, na sigla em inglês). Esses títulos podem ser

UMA EMPRESA
usados para qualquer tratamento médico desenvolvido
por alguma empresa e, em média, reduzem o processo
de aprovação do medicamento em cerca de seis meses.
Pesquisadores da Duke University calcularam que, pa-

AINDA PODE INF


ra um medicamento com alta comercialização, o PVR
pode chegar a mais de US$ 300 milhões. Esses insights
— mais uma vez alinhados com os resultados de nos-

SUBSTANCIALMENTE AS
sa pesquisa — indicam que as atividades de renovação
responsável podem acabar produzindo um efeito mé-
dio ligeiramente positivo no desempenho.

OTIMIZAÇÃO E RENOVAÇÃO
A terceira abordagem (de acordo com nossos dados
DECISÕES DE COMPRA EM
ALGUMAS INDÚSTRIAS.
quantitativos) que mais promove o desempenho para
implementar a estratégia responsável é adotar as ativi-
dades de renovação e otimização simultaneamente. E
essa opção não se restringe às PMEs. A incorporadora

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 63


A CONTRIBUIÇÃO DA ESTRATÉGIA SOCIAL PARA A VANTAGEM COMPETITIVA

A receita para o sucesso pode ser reduzida a um negócios. A mesma lógica está por trás da estratégia
slogan que a empresa alemã de artigos de consumo “Fator 3” da Henkel. Em seu esforço para triplicar a efi-
Henkel criou para orientar sua estratégia de sustenta- ciência na utilização de recursos, a Henkel deixou cla-
bilidade: “Tenha mais com menos”. A Henkel espera ro para todos os funcionários que essa meta não po-
que por volta de 2030 seus produtos sejam três vezes deria ser atingida apenas com a otimização. Com essa
mais eficientes em recursos do que hoje. A empresa meta ambiciosa, a empresa pretende encontrar uma
percebeu que esse objetivo ambicioso só pode ser atin- solução para um dos grandes desafios de sustenta-
gido aumentando o output e ao mesmo tempo redu- bilidade desatrelando o crescimento do consumo de
zindo o input. Ela espera que cada novo produto seu recursos.
combine melhorias inovadoras em sua funcionalida- 2) Meça o valor e a pegada. O histórico de sucesso
de, saúde e segurança dos consumidores e uma contri- da Henkel se baseia principalmente nos relatórios for-
buição para o avanço social com uma pegada ambien- mais tanto do valor que cada produto cria, como dos
tal reduzida. A Henkel Sustainability#Master® avalia recursos que ele consome. Essa é uma ferramenta po-
o aumento de valor e a redução na pegada ambiental derosa para orientar os esforços de todos os funcioná-
em todos os estágios do ciclo de vida dos produtos — rios da empresa na busca de sinergias entre otimiza-
da matéria-prima e produção até a utilização e descar- ção e renovação. A mesma lógica se aplica ao eROISM
te. Essa abordagem parece compensadora. A Henkel da Ecolab, segundo a qual medição é um componente
anunciou que em 2014 conseguiu aumentar sua efi- crítico para promover resultados exponenciais: “Co-
ciência operacional, vendas e expectativas apesar das meçamos com o que é mais importante para nossos
dificuldades do mercado. Sua estratégia reflete perfei- clientes — desempenho — e associamos os resulta-
tamente o reforço mútuo das atividades de renovação, dos do desempenho às métricas ambientais e sociais
que agrega valor para os consumidores e a sociedade, e economias de custo para demonstrar os benefícios
e de otimização, que economiza recursos. nas três linhas finais do balancete”.
A Ecolab é outro exemplo interessante de uma em- 3) Trabalhe com seus clientes. A razão do sucesso
presa inteligente que já reconheceu o potencial de da Ecolab não é só sua capacidade de inovação, mas
criação de valor sinergético. A empresa líder global em também sua habilidade de trabalhar em íntimo con-
água, higiene e tecnologia de energia e serviços, sedia- tato com os clientes para melhorar a equação de
da em Minnesota EUA), enfatiza que se a melhoria do input-output. Como comenta seu CEO, “por estarmos
desempenho, a eficiência operacional e o impacto de tão próximos de nossos clientes, e com um profundo
sustentabilidade caminharem juntos poderão criar conhecimento de suas operações, conseguimos ob-
vantagens exponenciais (chamadas pela empresa de ter insights construtivos para nossas pesquisas e pa-
“eROISM”). Cada nova solução tecnológica que a Eco- ra o desenvolvimento do trabalho”. A Henkel também
lab desenvolve para seus clientes é quantificada se- ensina seus clientes a utilizar melhor e com mais efi-
gundo essas três dimensões. Ao inventar, por exem- ciência seus produtos. Isso é de vital importância,
plo, uma nova tecnologia de resfriamento de água pa- uma vez que 90% de sua pegada ambiental é gerada
ra uma refinaria do Texas, a Ecolab permitiu que seu pelo consumidor, e geralmente basta que ele reduza a
cliente mantivesse e até melhorasse o tempo de suas temperatura da água de lavagem em 10 graus centígra-
operações e produção. E essa nova tecnologia econo- dos para economizar 40% de energia.
miza quase 4 bilhões de litros de água e US$ 4 milhões
anualmente. Graças à sua capacidade de combinar no- ESTAMOS FIRMEMENTE CONVENCIDOS que, no longo
vas tecnologias inovadoras e soluções com melhor de- prazo, somente a estratégia responsável trará pros-
sempenho, a Ecolab tem sido enormemente beneficia- peridade para as empresas e a sociedade. Quaisquer
da e vem conseguindo reduzir substancialmente seus esforços — lucrativos ou não — que envidarem serão
recursos e custos. De 2011 a 2013, ela dobrou suas ven- importantes blocos de construção dessa iniciativa.
das e sua receita líquida, superando o índice da S&P Esperamos que este estudo encoraje e oriente os to-
500 em cerca de 60%. madores de decisão não só a acreditar na estratégia
Resumindo, nossos dados quantitativos e casos responsável e incentivá-la como também a imple-
qualitativos mostram que a estratégia responsável con- mentá-la em suas empresas, para que ela promova o
tribui, sim, para a vantagem competitiva, mas somente sucesso de longo prazo num ambiente de negócios
se ela for implementada segundo a combinação de re- cada mais competitivo.
novação com otimização. Para conciliarem os dois as- HBR Reprint R1701C–P Para pedidos, página 14
pectos, as empresas devem seguir três preceitos:
1) Procure dar saltos quânticos. A Vanke jamais te- ALEXANDER ZIMMERMANN é professor do centro de excelência
ria obtido crescimento tão expressivo nos lucros e re- organizacional da University of St. Gallen. GILBERT PROBST
dução tão significativa na utilização de recursos se ti- é professor honorário e diretor do centro de pesquisa da
University of Geneva. CAROLIN HERMANN é doutouranda na
vesse otimizado suas atividades de construção tradi- University of St. Gallen. PAUL FERREIRA é professor do centro de
cional gradativamente. Isso só foi possível graças à liderança e inovação do Insper e pesquisador permanente do
introdução de formas completamente novas de fazer centro de excelência organizacional da University of St. Gallen.

64 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


ZINHO
O

66 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


Consumidores querem
resultados — não simpatia.
Matthew Dixon, Lara Ponomareff,
Scott Turner e Rick DeLisi

REGR
AS
ILUSTRAÇÃO DE RAMI NIEMI
UM EMPURRÃOZINHO PARA AJUDAR O ATENDIMENTO AO CLIENTE

ense na última vez que pegou um voo. Na hora de fazer o


check-in, você usou a opção de autoatendimento (por
exemplo, site da companhia aérea, aplicativo ou quiosque
do aeroporto) para despachar as malas, escolher o lugar
e imprimir o cartão de embarque? Ou preferiu esperar na
fila do aeroporto para falar com um funcionário? Se você é
como a maioria, escolheu a primeira opção. Nossos dados
mostram preferência esmagadora por essa alternativa:
em todos os setores, 81% dos clientes tentam cuidar de seus
assuntos por conta própria antes de interagir com uma pessoa.
O autoatendimento oferece às empresas uma opor- E mais: gente despreparada atendendo clientes ir-
tunidade tentadora para reduzir gastos, muitas ve- ritados sai caro. O custo da chamada saltou de US$ 7
zes de forma drástica. O custo da transação “faça vo- em 2009 para quase US$ 10 em média cinco anos de-
cê mesmo” é medido em centavos. Já para as empre- pois (ver quadro “Altos custos e demissões”). O treina-
sas B2C e para as B2B a mesma operação via telefone, mento inadequado impulsiona a rotatividade dos fun-
email ou webchat sai, respectivamente, por US$ 7 e cionários, o que é agravado por um tenso mercado de
US$ 13 por pessoa. O investimento corporativo em tec- trabalho — os atritos entre atendentes e consumidores
nologias de autoatendimento tem sido extremamente subiram de 19% durante a recessão de 2008 para 24%
eficaz na remoção dos problemas de baixa complexi- hoje. Maior rotatividade não só aumenta os custos de
dade próprios do atendimento ao vivo. E a maioria das recrutamento e treinamento como também obriga a
empresas que estudamos relata significativa redução empresa a pagar mais para manter essa mão de obra,
dos atendimentos desse tipo nos últimos anos. isto é, para que experiências e conhecimentos valiosos
Tudo isso cria um novo desafio: à medida que os permaneçam na empresa e não fujam mercado afora.
clientes lidam com problemas simples por conta pró- Em um mundo de autosserviço, esses talentosos
pria, para os atendentes de atendimento ao cliente, atendentes são mais importantes do que nunca. E nos
também chamados genericamente de atendentes, so- dias de hoje que tipo de pessoa está mais bem prepa-
bram as tarefas mais difíceis — os problemas que os rada para tratar com clientes? E como as organizações
clientes não conseguem resolver sozinhos. E os aten- podem atrair e reter as mais eficazes? Foi o que nos
dentes têm dificuldade para resolver esses problemas propusemos descobrir.
complexos. Um chefe da área de atendimento de um
grande varejista admitiu: “Nosso pessoal, lamentavel- SETE TIPOS DE ATENDENTE
mente, está mal preparado para lidar com os clientes Para determinar o perfil ideal, empreendemos um estu-
EM RESUMO de hoje e seus problemas. Nem parece que trabalha- do global e transversal com 1.440 desses profissionais.
mos num call center, mas numa fábrica de tristeza”. Descobrimos que todos podem ser enquadrados em
O DESAFIO Além disso, enquanto focam novas tecnologias de um dos sete perfis que derivamos dos dados: benfeito-
A qualidade dos serviços
ao cliente está caindo. autoatendimento, muitas empresas deixam de inves- res, concorrentes, controladores, empáticos, dedicados,
Isso ocorre porque os tir nos talentos da área de atendimento ao cliente pro- inovadores e firmes (ver quadro “Os sete tipos de atenden-
atendentes de hoje não são priamente dita. Ainda contratam, treinam, desenvol- te”). Nossa equipe entrevistou dezenas de candidatos pa-
selecionados e treinados vem e gerenciam seus atendentes da mesma forma de ra entender melhor o trabalho dos diferentes tipos. En-
para lidar com problemas sempre. A experiência de autoatendimento melhorou trevistou também supervisores de call centers para saber
cada vez mais complexos.
muito nos últimos anos, mas a interação entre aten- que tipo de atendente preferem contratar e gerenciar.
A SOLUÇÃO dente e consumidor pouco mudou em décadas, o que Por boa margem os gestores optaram pelo perfil em-
Os gestores devem criou uma lacuna entre as expectativas dos clientes e a pático: 42%. Não é de surpreender que em nossa pesqui-
abandonar a preferência experiência real. Relatos de atendimento inadequado sa os empáticos constituíssem 32% da categoria. Nas en-
por atendentes cuidadosos provocam indignação na mídia social e viralizam ape- trevistas, os gestores descreveram o atendente ideal co-
e solícitos e recrutar sar dos melhores esforços das empresas para remediar mo “orientado para o serviço”, “bom ouvinte e comuni-
e desenvolver pessoas
assertivas que assumam o esse quadro. Não surpreende que a satisfação do clien- cador” e “empenhado em ajudar o cliente”. O cargo não
controle e resolvam de fato te venha declinando constantemente em todos os se- é fácil. “Os clientes de hoje são incrivelmente impacien-
os problemas dos clientes. tores há anos. tes. Assim que perguntamos em que podemos servi-los,

68 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


eles nos maltratam. Sentem-se frustrados com o núme-
ro de vezes que tiveram de resolver algo por conta pró-
pria, com a quantidade de informações conflitantes na
internet e com a ideia de ter de conversar com um aten- APENAS RESOLVA OS PROBLEMAS DOS CLIENTES
dente. Eles não telefonam porque querem, mas porque Dados da CEB de mais de 100 mil clientes de todo o mundo mostram que as interações
não têm escolha”, diz o vice-presidente da área de aten- com os atendentes de serviço têm probabilidade quatro vezes maior de levar à falta
dimento de uma grande operadora de TV a cabo. de fidelidade do cliente do que à fidelidade. Assim, como já discutimos, as empresas
Quão bem os empáticos atuam? Coletamos dados devem se concentrar em poupar os clientes em vez de tentar encorajá-los a procurar
de atendentes com métricas-chave usadas para a ges- o setor de atendimento. Confira algumas sugestões:
tão de desempenho em prestadoras de serviços. Ali- Melhore as ferramentas de autoatendimento. Os clientes não precisam
nhados com nossa própria pesquisa sobre o que favo- de ajuda ao vivo se os canais de autoatendimento são simples e intuitivos.
rece a fidelidade de clientes no ambiente de serviço, Isso não significa volumosos investimentos em novas tecnologias. Uma grande
concentramo-nos na capacidade desses profissionais administradora de cartão de crédito, por exemplo, criou uma ferramenta interativa
de facilitar as interações (ver quadro “Apenas resolva os que os clientes visualizam logo que acessam o site de suporte. A ferramenta faz
problemas dos clientes” ao lado). Consideramos tam- duas perguntas sobre o motivo da consulta e, em seguida, direciona-os para o
bém indicadores de qualidade como níveis de satisfa- canal apropriado. A abordagem ajudou a cortar as interações via email (um canal
ção do cliente, além de medidas de produtividade co- particularmente de alto custo e baixa satisfação) em um terço.
mo tempo médio de interação. Evite chamadas repetidas. Não se preocupe demais em resolver os problemas
Nossos resultados se afastaram consideravelmente do cliente em um único telefonema ou troca de emails, mas procure se concentrar
do que os gestores esperam: os empáticos não são os que em evitar uma próxima reclamação. Os clientes geralmente voltam a contatar a
necessariamente executam melhor suas tarefas, mas sim empresa quando a correção do problema original cria uma nova preocupação.
os controladores. Estes superam todos os outros tipos Portanto, seja proativo: ajude com o pedido que aparecer, mas também resolva
em diversas medidas de qualidade e desempenho — no- situações que possam gerar outras chamadas. Um de nossos clientes, um provedor
tavelmente por aliviar a carga dos ombros do cliente. No de serviços públicos, informa ao consumidor como a empresa está lidando com o
entanto, os gestores de serviço em geral apreciam menos problema por meio da atualização de um status — uma estratégia que evita que o
esse perfil: apenas 2% disseram que os controladores se- cliente ligue repetidas vezes para verificar o progresso da ordem de serviço.
riam sua primeira opção na hora de contratar. Use técnicas de “engenharia de experiência”. Outra estratégia eficaz é
Por que os controladores se saem melhor que os a formação de atendentes de linha de frente para moldar as percepções das
seus pares dos outros perfis? Nossas entrevistas estru- pessoas sobre a experiência de atendimento. Por exemplo, ensinar a equipe a usar
turadas revelam que eles trabalham rápido, propõem uma linguagem que influencie as reações dos clientes a soluções propostas e a
soluções simples e se sentem à vontade demonstran- respostas decepcionantes. Uma operadora de TV a cabo oferecia aos assinantes
do experiência e personalidade. Eles se descrevem co- uma janela de serviços de reparo de oito horas para o dia seguinte, o que os
mo indivíduos que “assumem o controle” e se empe- deixava bem insatisfeitos. Hoje, ela propõe uma alternativa: uma janela de duas
nham em construir e seguir um plano em vez de “ir horas em três dias úteis. Em vista dessa extensão, a grande maioria dos clientes
com a maré”, mesmo em situações sociais. Tomam aceita de bom grado a janela de oito horas.
decisões com confiança, sobretudo quando ninguém
está no comando. Além disso, expressam sua opinião.
“Gosto de assumir o controle da situação e orientar as
pessoas”, revela um atendente com esse perfil. orientação clara em vez de muitas opções. Por exemplo,
As situações enfrentadas por esses profissionais no 84% dos consumidores da CEB preferem que seu proble-
exercício de seu ofício são cada vez mais complexas. ma seja resolvido diretamente a ser encaminhados para
E os controladores, muitas vezes, são os que mais aju- diversos canais de autoatendimento (email, bate-papo,
dam a solucionar problemas. Não só identificam pro- serviço de mídia social, etc.). Em nossa prática de ven-
ativamente os aborrecimentos do interlocutor como das, descobrimos que oferecer orientação prescritiva aos
também levam em conta a personalidade deste e o clientes, isto é, tudo o que simplifica grandes decisões de
contexto do telefonema a fim de personalizar a solu- compra, está associado com menor arrependimento por
ção e apresentá-la de forma eficaz. Pessoas com esse parte deles. E em nossa prática de marketing, chegamos
perfil perguntam menos o que os clientes gostariam de à conclusão de que as marcas constantes no quartil supe-
fazer e do que lhes dizem o que deve ser feito — o ob- rior do “índice de simplicidade de decisão” são 85% mais
jetivo é chegar sempre à resolução mais rápida e fácil. prováveis de ser compradas pelos consumidores do que
O tom da conversa é humano e sem roteiros: a ideia é as que constam no quartil inferior.
evitar linguagem genérica e listas de verificação pres- Gestores que desejam a abordagem controladora
critas, principalmente quando está claro que os clien- enfrentam três importantes desafios: contratar mais
tes já investiram tempo significativo tentando resolver pessoas com esse perfil; ensinar aos atendentes dos
um problema por conta própria. demais tipos as habilidades necessárias para criar pa-
Inconscientemente ou não, os controladores ofe- ra os clientes uma experiência com essa característi-
recem aos clientes saturados de informação aqui- ca; e reconstruir o clima da empresa de serviços para
lo que querem escutar (de acordo com as pesquisas): incentivar e recompensar a conduta do controlador.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 69 


UM EMPURRÃOZINHO PARA AJUDAR O ATENDIMENTO AO CLIENTE

OS SETE TIPOS DE ATENDENTE


Um estudo global e transversal com 1.440 atendentes revelou diferenças na personalidade e na abordagem
do trabalho. Os empáticos eram de longe o tipo mais comum, mas os controladores ficavam em primeiro
lugar no quesito “tornar as interações simples e eficientes”.
CONTROLADOR FIRME BENFEITOR EMPÁTICO DEDICADO INOVADOR
franco e opinativo; gosta sereno e otimista; comprometido com as gosta de resolver os segue regras e identifica formas de
de demonstrar sua não leva conversas pessoas; envolve outros problemas dos outros; procedimentos; gosta melhorar processos e
experiência e direcionar difíceis para o nas tomadas de decisão; procura compreender de trabalhar com procedimentos; gera
a interação com o cliente lado pessoal oferece descontos e comportamentos e números; é persistente novas ideias e cria
reembolsos prontamente motivos; escuta e orientado por prazos opções
com empatia

CLASSIFICAÇÃO: #1 CLASSIFICAÇÃO: #2 CLASSIFICAÇÃO: #3 CLASSIFICAÇÃO: #4 CLASSIFICAÇÃO: #5 CLASSIFICAÇÃO: #6


PROPORÇÃO: 15% PROPORÇÃO: 12% PROPORÇÃO: 11% PROPORÇÃO: 32% PROPORÇÃO: 20% PROPORÇÃO: 9%

regra 1
regra 2

FONTE CEB 2015 FRONTLINE WORKFORCE FIT E ENGAGEMENT SURVEY

70 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


CONTRATAÇÃO DE CONTROLADORES
Em nossa amostra, os controladores representavam
ALTOS CUSTOS E DEMISSÕES
A complexidade desse tipo de chamada vem
apenas 15% dos atendentes. Considerando a escassez aumentando e, paralelamente, seu custo unitário:
dessa mão de obra e seu desempenho superior, você 38% de 2009 para cá.
pode chegar à conclusão de que seria mais difícil atrair CUSTO POR CHAMADA
Média de demissão, US$
essas pessoas ou mais caro contratá-las do que outras.
COMPETIDOR Para verificar isso, estudamos 1.022 candidatos a em- $10
concentra-se em
ganhar, superar prego. Depois de classificá-los de acordo com um dos
9
colegas e mudar as sete tipos mencionados, testamos o interesse de cada
opiniões dos outros grupo por funções de atendimento ao cliente. Observa- 8
mos que é alta a probabilidade de os controladores acei-
7
tarem um trabalho que pague menos que US$ 35 mil por
ano (a média dos funcionários de call center); são me-
CLASSIFICAÇÃO: #7 6
nos propensos a obter diploma universitário; e mais
PROPORÇÃO: 1% propensos a pedir emprego em área de atendimento. 5
2009 2010 2011 2012 2013 2014
Isso não significa que contratar controladores é fá-
cil. Há diversos obstáculos no caminho. Primeiro, as
mensagens usadas pelas empresas para aproximar Muitos atendentes não estão preparados para lidar
candidatos para serviços de atendimento costumam com chamadas complicadas de clientes; temos
mais repelir do que atrair pessoas com esse perfil. Nos- observado pedidos de demissão em massa.
sa equipe auditou os postos de trabalho de dezenas de TAXA DE ROTATIVIDADE DE FUNCIONÁRIOS
Média de demissão
empresas da Fortune 500 e descobriu que as empresas
usavam mensagens enganosas para descrever o perfil 25%
desejado, como veremos a seguir.
Essas empresas tendem a procurar candidatos com
“habilidades comprovadas de atendimento ao cliente”,
o que limita os postulantes aos que já têm experiência 20
(de acordo com os nossos dados, é pouco provável que
sejam controladores). E a proposta de valor do emprego
que oferecem é bastante genérica: praticamente todos
os anúncios revisados prometiam “oportunidades de- 15 2014
2009 2010 2011 2012 2013
safiadoras de carreira” e uma “cultura que recompensa
o desempenho”. Além disso, anúncios desse tipo refor- FONTE CEB
çam velhos estereótipos: “pessoas capazes de cumprir
padrões de qualidade e produtividade”, de manejar múl-
tiplos sistemas, aplicações, processos administrativos e
ferramentas operacionais”; e “trabalhar em turno de oi-
to horas”. Infelizmente, tudo isso é exatamente o oposto o cliente” e “resolverão os problemas deles do início
do que os controladores procuram. Em nossas entrevis- ao fim”. As listas de trabalho incluem frases retiradas
tas, eles indicaram uma clara preferência pela flexibilida- dos supervisores da Macquarie, que descrevem seus
de para expressar sua personalidade e tratar as questões melhores funcionários como “solucionadores de pro-
que consideram pertinentes. Um anúncio honesto que blemas”, com capacidade única de “pensar e agir rapi-
descreva um serviço mecânico de chão de fábrica diz damente” e “proativos e à vontade para tomar inicia-
que a empresa busca funcionários que seguem regras e tivas”. Por fim, enfatizam os benefícios que os profis-
procedimentos. Um anúncio condizente com a função sionais de alto desempenho declaradamente mais va-
de atendente de perfil controlador declara que a empresa lorizam, como os melhores programas de treinamento
espera do candidato capacidade e iniciativa para exercer para novos contratados, certificação do setor e oportu-
seu próprio julgamento e oferecer um serviço superior nidade de trabalhar em ambiente dinâmico.
ao cliente — isso é decisivo para controladores. Depois que a organização aprender a atrair candida-
Os anúncios de emprego redigidos pelas empresas tos-alvo, deve se tornar mais agressiva para garantir bons
podem influenciar fortemente o tipo de candidato que ajustes. Como a Macquarie, a outsourcer canadense Blue
atraem. A Macquarie Telecom, na Austrália, analisou Ocean usa linguagem projetada para atrair controladores
seus atendentes de alto desempenho para descobrir o de diversas origens profissionais e pessoais e não apenas
que os estimulava em relação ao trabalho e, em segui- pessoas com experiência em call center: “Se você se des-
da, criou um anúncio destinado a chamar a atenção taca na hora de resolver quebra-cabeças lógicos e pesa-
para essas características. A empresa promete que os delos logísticos como a organização de torneios espor-
atendentes “serão o principal ponto de contato com tivos ou de viagens longas com vários veículos, então

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 71 


UM EMPURRÃOZINHO PARA AJUDAR O ATENDIMENTO AO CLIENTE

CORRIGINDO O PROBLEMA — E UM POUCO MAIS


Mais do que seus colegas dos outros perfis, os controladores assumem a responsabilidade,
dirigem a interação com o cliente e resolvem os problemas com eficiência.
ATIVIDADE O QUE A MAIORIA FAZ O QUE OS CONTROLADORES FAZEM
Envolver o TRATA CADA CLIENTE DE FORMA CONSISTENTE, PERSONALIZAM A INTERAÇÃO DE ACORDO COM A PERSONALIDADE
cliente SEGUINDO UM ROTEIRO PADRÃO. E CONTEXTO DE CADA CLIENTE.
“Primeiro, eu gostaria de agradecer por ser um cliente “Vejo que você ligou três vezes recentemente. Vamos corrigir esse
leal. Agora, em que posso servi-lo?” problema para você.”

Fazer gestão CUMPRIR PASSOS E CHECKLISTS IDENTIFICAM O QUE O CLIENTE JÁ FEZ POR CONTA PRÓPRIA
da crise PREDETERMINADOS. E PASSAM PARA A FASE SEGUINTE.
“Primeiro, precisamos instalar a versão mais recente “O.k., se você pôs em prática todas as alternativas de solução
do software.” propostas no site, então já instalou o software mais recente.
Vamos tentar outra coisa.”
Propor DÃO AOS CLIENTES OPÇÕES DE RESOLUÇÃO PRESCREVEM A RESOLUÇÃO MAIS FÁCIL E RÁPIDA
soluções “Você pode nos enviar seu dispositivo para este “Vejo que o seu dispositivo não está disponível na loja mais próxima.
endereço. Ou pode trazê-lo para uma de nossas Recomendo que nos envie o antigo para que receba outro o quanto
lojas e fazer uma troca.” antes.”
Resolver RESOLVEM APENAS O PROBLEMA QUE ORIGINOU ANTECIPA E RESOLVE OUTROS POSSÍVEIS PROBLEMAS
problemas A CHAMADA “Clientes em sua situação muitas vezes acabam enfrentando um
“Resolvi o seu problema a contento?” problema relacionado. Deixe-me falar sobre isso agora para que
você não precise ligar mais tarde.”

apostamos que você tem o que é preciso”. A empresa as quais trabalhamos usam essa lente nas entrevistas
usa linguagem flexível — “Este trabalho não é para quem prévias e nos testes de avaliação, o que simplifica so-
tem coração fraco” — e é clara quanto às dificuldades en- bremaneira a seleção de candidatos.
frentadas pelos atendentes: “Nem sempre você saberá a
resposta certa, mas você é o tipo de pessoa que está sem- ENSINE A MENTALIDADE DO CONTROLADOR
pre pronto para o desafio. Você vai confiar em seus recur- Até mesmo uma abordagem de contratação sólida e
sos e pesquisar rapidamente uma resposta — e às vezes readequada para atrair e identificar controladores po-
tudo o que você vai precisar é o Google”. Definir clara- de deixar as empresas com um número significativo
mente as expectativas não só desestimula os candidatos de atendentes da linha de frente de outros perfis. As-
menos preparados (que são mais propensos a ir embora sim, além de aprimorar o processo de contratação, as
já nos primeiros dias depois do treinamento), como si- empresas precisam considerar novas abordagens pa-
naliza que a organização tem padrões exigentes, o que ra o desenvolvimento de talentos e gerenciamento de
contradiz a suposição de que qualquer um pode fazer desempenho para, assim, ajudar outros perfis a agir
o trabalho. A Blue Ocean também procura combater mais como controladores.
estereótipos negativos relativos ao cargo, divulgando Empresas que se comprometeram a transmitir ha-
vídeos em mídias sociais para questionar percepções bilidades de controlador excluíram do treinamento o
comuns equivocadas e apresentar as oportunidades do conhecimento do produto, os processos repetitivos de
call center da empresa de uma perspectiva favorável. atendimento telefônico e os procedimentos para usar
Mensagens elaboradas de forma cuidadosa podem sistemas e ferramentas. Em vez disso, ensinaram os
atrair controladores, mas não garantem passagem se- atendentes a aplicar técnicas de escuta e ofereceram
gura pelo processo de contratação. Como discutimos, um método que replica os instintos do controlador:
muitos gestores de atendimento ao cliente têm for- ajuda a entender rapidamente o que o cliente preci-
te preferência pelos empáticos e fortes preconceitos sa e mostra como oferecer a melhor resolução perso-
contra os controladores. Criamos um guia de entre- nalizada. No entanto, nuances de habilidades de con-
vista para ajudar a superar a situação. Sugerimos per- trolador não se aprende em sala de aula. As empresas
guntas que facilitam a tarefa de identificar controlado- que têm como objetivo desenvolver essas habilidades
res e destacamos as respostas indesejadas. Por exem- apostam em treinamento liderado pelo gerente, no lo-
plo: “Poderia relatar uma situação em que percebeu cal de trabalho, o que permitirá aos atendentes o do-
que um processo que deveria seguir determinado ru- mínio da função com o passar do tempo.
mo não fazia sentido? Que você fez?”. Ou “Fale sobre Infelizmente, a maioria dos gestores da linha de
um momento em que você precisava de alguém pa- frente confunde treinamento com gestão de desem-
ra fazer algo imediatamente, mas sabia que essa pes- penho. Numa organização típica de serviço, a maio-
soa era passiva. Que você fez?”. Muitas empresas com ria dos treinamentos é um exercício teórico, feito em

72 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


partes, no esquema checklist, geralmente uma vez por Os efeitos da interação com o cliente do banco me-
semana ou duas vezes por mês. Nessas sessões se faz a lhoraram bastante graças a essa mudança. A aborda-
revisão de conversas telefônicas gravadas para que os gem favoreceu tanto o aumento de 5% no número de
atendentes tentem recordar e explicar os detalhes. O clientes que pagavam suas dívidas durante as ligações
foco é o que deu errado e não o motivo do erro. Assim, quanto o aumento de 30% no compromisso para com
esses encontros podem ser percebidos como punitivos os planos de pagamento. O novo enquadramento tam-
em vez de construtivos. bém ajudou a reduzir os pedidos de revisão dos aten-
Embora esse tipo de treinamento seja comum, em dentes em relação às pontuações do controle de qua-
um estudo com mais de 300 gestores de atendimento lidade. Anteriormente, o banco recebia uma média de
ao cliente descobrimos que alguns adotavam treina- 20 a 30 pedidos mensais — um número que desde en-
mento integrado e mais efetivo — interações em tem- tão caiu para menos de cinco por mês. “Você quer es-
po real, isto é, durante o fluxo de trabalho diário regu- pecialistas nas habilidades que interessam — e não es-
lar. Observamos grandes diferenças entre os dois estilos pecialistas em seguir orientações de rotina. Nossa equi-
de treinamento. As equipes que na maioria das vezes pe sente que as algemas foram removidas”, diz um dos
tiveram treinamento variado e integrado apresentaram gestores de controle de qualidade da organização.
desempenho 12% superior em relação à média das mé- Além de abordar a gestão de desempenho de for-
tricas de qualidade e produtividade relatadas pela em- ma diferente, as empresas precisam ter outros meios
presa. Outro dado importante: quando os gestores se para solicitar feedback dos atendentes e envolvê-los
concentravam no treinamento programado, o desem- na criação de uma melhor experiência do cliente. A
penho das equipes era 5% menor do que a média. Fidelity Investments criou uma plataforma de discus-
são online para que os atendentes possam encaminhar
CONSTRUA UMA EMPRESA DE SERVIÇOS ideias de melhoria para a alta administração e buscar
QUE APRECIE O CONTROLADOR conselhos de colegas sobre como abordar os proble-
Os controladores valorizam a autonomia para resolver mas dos clientes. O fórum é moderado por atendentes
problemas de uma maneira que não requer a obediên- veteranos que atuam como canais entre seus colegas
cia estrita a um protocolo rígido. Eles dão importância e a gestão: eles levam as melhores ideias para a equi-
também à liberdade de “tratar os problemas com políti- pe de liderança e informam as respostas aos colegas.
cas e procedimentos”— e querem fazer parte de organi- No primeiro ano do fórum, os atendentes postaram
zações empenhadas na melhoria contínua e dispostas a mais de três mil comentários, dos quais 350 foram
dar voz aos atendentes envolvidos no processo. considerados pela gerência como dignos de maior ava-
Criar esse clima — em que os atendentes estão au- liação. Por exemplo, eles identificaram um problema
torizados a julgar e identificar oportunidades de apri- de limite de tempo no site que incomodava os clien-
moramento — exige novas maneiras de gerenciar o de- tes, o que resultava em mais chamadas — um obstácu-
sempenho individual e o comprometimento da equipe. lo rapidamente transposto assim que veio à tona. Mais
Primeiro, da perspectiva de gestão de desempenho, as de cem ideias de melhoria foram aprovadas pela alta
empresas devem repensar a abordagem “checklist” de administração, o que redundou em economia de mais
garantia de qualidade. O método tradicional de contro- de US$ 4 milhões.
le de qualidade — que exige que os atendentes atentem
para processos predefinidos e para interações com rotei- QUANDO COMPARTILHAMOS NOSSA pesquisa com os ges-
ro (“Diga o nome do cliente três vezes”; “Desculpe-se por tores, percebemos que muitos fogem da ideia de uma
qualquer dificuldade que o cliente possa ter”; “Agradeça organização de serviços cheia de controladores, sem
sempre pela fidelidade do cliente” e assim por diante) — falar do temor que têm de que pessoas com esse per-
anda na contramão da abordagem do controlador. fil interajam com os clientes mais frustrados. Muitos
Um grande banco substituiu seu checklist de contro- gestores nos dizem que os controladores “não se en-
le de qualidade por um “quadro flexível de competên- caixariam bem na cultura” nem têm a necessária em-
cia”. Em vez de avaliar os atendentes em relação à ca- patia para ter sucesso. Mas nossas entrevistas revelam
pacidade de manter um roteiro, o banco analisa com- que indivíduos com esse perfil são, de fato, bem em-
petências essenciais, como negociação e construção de páticos. E podem, sim, compreender as necessidades
relacionamento. O modelo não lhes ensina o que de- e frustrações dos clientes. Mas respondem de forma
vem dizer, mas descreve comportamentos em um es- distinta. Reconhecem que depois de fracassarem no
pectro de desempenho de “novato” para “especialista”. serviço online, os clientes não querem pedidos de des-
Por exemplo, o novato pode “falar sobre o cliente”, en- culpas — mas sim soluções.
quanto o atendente mais avançado “usaria tom asserti- HBR Reprint R1701D–P Para pedidos, página 14
vo e colaborativo”. Ao articular as características de al-
to desempenho em cada competência em vez de ditar MATTHEW DIXON, LARA PONOMAREFF, SCOTT TURNER e RICK DELISI
trabalham no call center da CEB e na área de experiên-
um roteiro preciso, o banco permite que os atendentes cia do cliente. Dixon é líder do grupo, Ponomareff é líder da
exerçam o seu próprio julgamento em cada interação prática, Turner é diretor de pesquisa e DeLisi é o principal
com o cliente — e sejam assim avaliados pelos gestores. conselheiro executivo.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 73 


outros milhões tiveram mudança na dinâmica

Os novos melhora no padrão


de vida. A despeito
dessas conquistas, a
econômica global
exige dos CEOs um
bom entendimento e

desafios globalização e as novas


tecnologias passaram
a ser questionadas.
rápida adaptação.
Recentemente, a PwC

dos CEOs
divulgou a 20th Global
Para essa parcela da
CEO Survey, com
sociedade, a tecnologia
entrevistas com cerca
e a globalização
de 1.400 CEOs de
são responsáveis
79 países. As respostas
pela eliminação de
mostram que os líderes
milhares de postos de
globais têm consciência
Nos últimos 20 anos, a e viram seus mercados trabalho, entre outros
da mudança do cenário:
globalização e os avanços se expandirem efeitos negativos. Os
58% dizem que a adoção
tecnológicos provocaram enormemente. Os ganhos movimentos de oposição
de políticas nacionalistas
uma grande revolução. beneficiaram também as reverberaram nos
em alguns países tornou
As empresas registraram pessoas: milhões saíram líderes políticos e estão
a competição mais difícil
aumento da produtividade da linha de pobreza e influenciando as políticas
e 69% afirmam que
de vários países. Essa
5
ficou ainda mais difícil Outras pesquisas da PwC inteligência emocional. Cinco questões
manter a confiança dos revelam que a busca Três quartos dos CEOS
stakeholders na era digital pelo lucro financeiro afirmam que a falta de relevantes:
(em que as informações não deve ser o único talentos pode impactar o
circulam com grande objetivo das companhias crescimento das empresas
velocidade e podem – elas precisam em 2017. 1. Como fazer sua
vazar rapidamente). abraçar valores como empresa crescer
O terceiro desafio é num cenário de
Considerando que a diversidade, inclusão e
defender os benefícios da economia global com
economia se baseia sustentabilidade para
globalização. Para cerca baixo crescimento
na compra e venda de serem bem sucedidas.
de 45% dos respondentes e aumento de
produtos e serviços, a
Um segundo ponto a ser da 20th Global CEO divergências?
revolução tecnológica
enfrentado é conciliar o Survey, a globalização
não vai retroceder e a
trabalho humano com as não conseguiu diminuir 2. Como as empresas
confiança é um atributo e governos podem
novas tecnologias. Com a desigualdade entre
indispensável para trabalhar em
o avanço da impressão ricos e pobres. Uma das
qualquer empresa que conjunto para ampliar
3D, da internet das coisas soluções apontadas por
queira ser bem sucedida, os benefícios da
e o uso de robôs não só eles para avançar neste
os líderes empresariais globalização e das
na produção de bens, sentido é aumentar a
têm diante de si um novas tecnologias?
mas no setor de serviços, colaboração com os
imenso desafio.
os conflitos tendem a se governos. Uma área 3. Sua empresa está
Um primeiro desafio é agravar. Outra sondagem promissora é a educação. buscando talentos
recuperar a confiança. feita pela PwC com O trabalho conjunto de com capacidade de
Na era digital em que 5.000 pessoas de 22 empresas e governos liderança, criatividade
vivemos, a transparência é países revelou que 79% em prol da qualificação e adaptabilidade,
um requisito fundamental deles acreditam que a de trabalhadores pode capacidades
para o cumprimento tecnologia vai provocar produzir resultados fundamentais para a
desse objetivo. Os líderes redução nos postos de significativos. E a inovação e construção
empresariais precisam trabalho nos próximos tecnologia pode ser uma das marcas?
entender as implicações cinco anos. aliada (por exemplo, os
éticas de suas decisões. cursos online). 4. O que sua empresa
A despeito disso, a está fazendo para
Nada passa despercebido.
contribuição humana no Como se vê, vivemos uma medir e aumentar
Um desvio pode significar
trabalho é imprescindível era de divergências que a confiança na sua
uma crise de reputação.
– e deverá ser por muito demanda um novo estilo marca, de modo a
A 20th Global CEO
tempo. Pouco mais da de liderança, capaz de ganhar vantagem
Survey mostra que
metade (52%) dos CEOs gerenciar as crescentes competitiva?
92% dos entrevistados
entrevistados planejam ansiedades. Os vencedores
concordam que, hoje, é
contratar. E as qualidades serão os que conseguirem 5. Sua empresa
muito importante que o redesenhou
que eles buscam na força entender os diversos
propósito das empresas processos para que os
de trabalho ainda não anseios e conciliá-los para
esteja refletido em profissionais possam
podem ser copiadas pelas o progresso sustentável
seus valores, culturas trabalhar usando
máquinas: criatividade e inclusivo.
e comportamentos. novas tecnologias,
e inovação; liderança e
somando as forças?

PwC Brasil @PwCBrasil @PwCBrasil

PwC Brasil PwC Brasil PwC Brasil

© 2017 PricewaterhouseCoopers Brasil Ltda. Todos os direitos reservados. Neste documento, “PwC” refere-se à PricewaterhouseCoopers Brasil Ltda., firma membro do network da
PricewaterhouseCoopers, ou conforme o contexto sugerir, ao próprio network. Cada firma membro da rede PwC constitui uma pessoa jurídica separada e independente. Para mais detalhes
acerca do network PwC, acesse: www.pwc.com/structure
AS GRANDES EMPRESAS GASTAM
DE FORMA DIRETA, ANO APÓS ANO,
BILHÕES DE DÓLARES EM ENERGIA —
E MILHÕES DE FORMA INDIRETA EM REDES
DE SUPRIMENTOS, OUTSOURCING E LOGÍSTICA.
NO ENTANTO, FORA DOS SETORES DE
CONSUMO ENERGÉTICO MAIS INTENSO,
76 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017
ESTRATÉGIAS
ENERGÉTICAS
PARA
EXECUTIVOS
DO C-LEVEL
ANDREW WINSTON,
GEORGE FAVALORO
E TIM HEALY

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 77


ESTRATÉGIAS ENERGÉTICAS PARA EXECUTIVOS DO C-LEVEL

para a maioria das empresas a energia é apenas mais incluindo desenvolvimento de uma estratégia formal,
um custo a ser administrado. Esse é um erro estratégi- aplicação de tecnologia de ponta e alavancagem de
co que deixa passar valiosas oportunidades de reduzir sistemas avançados de financiamento. Classificamos
o risco, aprimorar a resiliência e criar novo valor. as empresas em líderes, intermediárias e atrasadas e
Atualmente a energia é item prioritário na agenda analisamos até que ponto sua “maturidade energéti-
corporativa devido a questões ambientais, sociais e ca” criou valor para os negócios. Pautados nessa pes-
de negócios que incluem: mudanças climáticas e re- quisa e em décadas de experiência em consultoria e
gulamentação global de emissões de carbono; maior gestão de energia, desenvolvemos uma nova estrutu-
pressão sobre recursos naturais; expectativas crescen- ra para utilizar a estratégia de energia para criar valor
tes sobre o desempenho ambiental corporativo; ino- para as empresas.
vações em tecnologias de energia e modelos de negó- Neste artigo, apresentamos os principais passos pa-
cios; e redução drástica dos preços das energias reno- ra criar vantagem competitiva aplicando as melhores
váveis. Essas megatendências mudam o modo de ope- práticas emergentes.
ração dos negócios e predispõem as empresas a novos
riscos e novos caminhos para criar valor.
Na visão estratégica clássica de Michael Porter, as MUDANDO DE PERSPECTIVA
empresas criam vantagem competitiva mantendo os Antes de entrar no assunto, vamos analisar como uma
custos baixos ou diferenciando-se. As escolhas que a empresa líder, a Microsoft, aborda a estratégia ener-
empresa faz sobre suas fontes e consumo de energia gética. Como a maioria das empresas, a Microsoft há
podem influenciar profundamente sua estrutura de muito tempo considera a energia uma commodity oni-
custos. E a forma como administra o impacto ambien- presente: aperte um interruptor e as luzes — e os cen-
tal e o climático de seu consumo de energia — princi- tros de dados — se acenderão. Mas com o desenvol-
palmente as emissões de carbono — é um diferencial vimento da computação em nuvem e com a volatili-
cada vez mais valorizado pelos consumidores, inves- dade histórica dos preços da energia, essa commodity
tidores e clientes corporativos. tornou-se um grande e imprevisível input operacional
Para entender como o mundo corporativo es- e de despesas para as gigantes de TI. Além disso, em-
tá abordando a estratégia energética, fizemos uma presas do setor de informação, comunicações e tecno-
pesquisa com executivos de 145 empresas, com fa- logia (ICT, na sigla em inglês) encontram-se atualmen-
turamento igual ou superior a US$1 bilhão, de diver- te entre os maiores consumidores de energia do mun-
sos ramos e regiões. A pesquisa analisou o desempe- do, o que aumenta a preocupação com as emissões de
nho das empresas em 15 ações relacionadas à energia, carbono. Grandes organizações não governamentais,
como a Greenpeace, começaram a atacar os “dados
sujos”, criticando o desempenho ambiental dos líde-
res da computação em nuvem. Todas essas pressões,
juntamente com novas oportunidades de energia lim-

ENTE pa, colocaram a Microsoft na vanguarda das estraté-


gias energéticas.

D
Em 2011, Rob Bernard, executivo ambiental e de

R ESI sustentabilidade do alto escalão da empresa, solicitou


que a equipe de avaliação de risco analisasse o nível

E O P A
de exposição da empresa. A equipe concluiu rapida-
mente que regulamentações de emissões de carbo-
no e a disponibilidade e flutuação dos custos de ener-

CFO G OR
seriam fontes significativas de risco. Em resposta,
icrosoft formou uma equipe sênior centralizada
ra resolver questões estratégicas de energia em as-

“ STÃO A NTE NOSS


O nsão nos últimos tempos e desenvolver um plano
rangente para mitigar o risco. A equipe, formada por
14 especialistas em mercados de eletricidade, energia

E RIAME OS EM ICO.” renovável, armazenamento em baterias e geração lo-


cal (ou “distribuição de energia”), foi encarregada de
desenvolver e executar a estratégia energética da em-

SE VOLVID ERGÉT
presa. “A energia passou a ser um problema dos exe-
cutivos do C-level”, observa Bernard. “O CFO e o pre-
sidente agora estão seriamente envolvidos em nosso

EN ANO EN
plano energético.”
Ao perseguir suas metas energéticas, a Microsoft
aumentou a participação de combustíveis renováveis

PL
em seu mix de energia e melhorou sua eficiência ener- de operações, instalações, finanças, jurídico, compras,
gética. Agora, ela cobra das unidades de negócio uma sustentabilidade e até de outras áreas. A equipe da
taxa pelas emissões de carbono, reinvestindo os fun- Microsoft, que inclui membros das áreas de meio am-
dos em seus programas de energia. Recentemente biente e sustentabilidade, jurídica, financeira e opera-
ela anunciou que, para 2018, seu plano é alimentar ções de centro de dados, está subordinada ao vice-pre-
seus centros de dados com 50% de energia eólica, so- sidente de infraestrutura e operações e ao vice-presi-
lar e hidrelétrica; e, a partir da próxima década, che- dente de tecnologia e engajamento cívico. Na EMC,
gar aos 60%. empresa de serviço de dados que hoje é uma divisão
Para todas as empresas de ICT, administrar bem a da Dell, uipe de energia se reporta ao CFO.
energia tornou-se, no mínimo, a bola da vez, e cons-

2
titui um diferencial competitivo. Empresas de ou-
tros setores em que a energia e as emissões são críti- INTEGRE A ENERGIA À VISÃO E
cas estão seguindo caminho similar. A agricultura, OPERAÇÕES DA EMPRESA
por exemplo, produz até 35% das emissões de carbo- A primeira tarefa da equipe é avaliar os im-
no mundiais. Por entender as implicações estratégicas pactos internos e externos da empresa. Algu-
desse percentual, muitas empresas da indústria ali- mas das perguntas a serem respondidas são:
mentícia estabeleceram metas agressivas para reduzir qual o consumo de energia de nossa empresa
o consumo de energia e as emissões de carbono em e qual o custo? Qual o impacto desse gasto nos princi-
suas cadeias de valor. A Kellogg’s, por exemplo, redu- pais indicadores financeiros, como o custo das merca-
ziu o uso absoluto de energia em 8% e planeja cortar dorias vendidas? Estamos capitalizando oportunida-
as próprias emissões e de seus fornecedores em 65% e des de usar recursos renováveis? Qual é a nossa pega-
50%, respectivamente, até 2050. da de carbono? E de nossos fornecedores? Como isso
Embora empresas líderes de vários segmentos es- se alinha com as expectativas dos clientes, investido-
tejam desenvolvendo estratégias energéticas, não es- res e funcionários e qual é nossa posição em relação
tão seguindo nenhum manual. Na verdade, existem aos nossos concorrentes?
alguns programas bem estruturados para a gestão da As respostas sinalizam oportunidades e falhas de
energia, mas eles não estão integrados na estratégia desempenho. Uma empresa varejista de grande porte,
geral, nem estão explicitamente direcionados para sa- por exemplo, pode medir seu consumo de energia por
tisfazer as implicações estratégicas das megatendên- metro quadrado de loja e calcular o potencial de eco-
cias globais. Os cinco passos que recomendamos para nomia de custos ao resolver as falhas. A empresa tam- EM RESUMO
criar uma estratégia energética sólida não são revolu- bém pode avaliar sua taxa anual de redução de ener-
cionários. O que é revolucionário é aplicá-los sistema- gia. Grandes lojas de varejo com programas energéti- O PROBLEMA
ticam para o uso de energia das empresas. cos consistentes estão obtendo reduções anuais sus- Megatendências
ambientais, sociais e de
tentáveis de 2,5% a 3,5%. Nas centenas de milhões de negócios levaram a energia

1
dólares gastos em energia, essas reduções represen- até a agenda corporativa.
COMECE ENVOLVENDO UM tam uma economia significativa no lucro líquido da Mas muitas empresas ainda
EXECUTIVO DO C-LEVEL empresa. E cálculos similares para a intensidade de abordam o tema apenas
como um custo a ser
É difícil implementar uma estratégia de ener- carbono poderiam realçar a exposição às oscilações de
gerenciado.
gia sem o envolvimento explícito do CEO e de preço do combustível e sinalizar o sucesso da empresa
uma clara estrutura de governança. As empre- em adotar formas renováveis de energia. A SOLUÇÃO
sas classificadas como atrasadas em nosso estu- Uma vez que os impactos energéticos da empre- As empresas precisam de
do indicaram a falta dessa estrutura como o maior obs- sa sejam claramente entendidos, a equipe pode de- uma estratégia coesa de
táculo. O envolvimento do CEO normalmente come- senvolver um plano de ação com foco em várias áreas energia que reduza o risco,
ça com um comprometimento — inicialmente, den- mais amplas, começando por recomendar que o CEO melhore a resiliência e crie
novo valor.
tro da empresa — para tornar a estratégia energética defina as metas específicas de energia e emissões. Me-
essencial para a missão e competitividade da empre- tas agressivas podem refletir o grau e o ritmo da re- PRINCIPAIS PASSOS
sa. O CEO deve sinalizar a importância desse compro- dução das emissões. Tais metas, segundo os cientis- As empresas devem criar
metimento indicando um executivo sênior para ser- tas, são necessárias para mitigar as mudanças climáti- uma delegação sob o
vir como paladino e orientador. Em empresas onde as cas. Aproximadamente 200 das maiores empresas do comando de um executivo
operações e pegadas energéticas são críticas, como no mundo concordam em estabelecer essas metas basea- do C-level, integrar metas
de energia à visão e às
caso de produtores industriais e de petroquímicos, o das na ciência e mais de 80 assinaram a iniciativa glo- operações, rastrear o
COO pode desempenhar esse papel. Em empresas on- bal RE100, pela qual se comprometem a chegar a 100% progresso, buscar novas
de as fontes de energia e de financiamento são ques- de energia renovável. Um número cada vez maior de tecnologias e envolver os
tões centrais (setores de ICT e varejista), o CFO pode empresas está exigindo que também suas redes de su- stakeholders. Esses passos
ser a pessoa certa. primentos cumpram metas baseadas na ciência. Esta- não são revolucionários —
o que é revolucionário é
Esse executivo monta uma equipe transfuncional belecer metas publicamente não só sinaliza o compro- aplicá-los sistematicamente
para desenvolver a estratégia energética da empresa misso da empresa com os stakeholders externos, mas ao uso de energia da
e liderar a execução. A equipe deve incluir executivos também ajuda a alinhar vários grupos funcionais em organização.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 79


ESTRATÉGIAS ENERGÉTICAS PARA EXECUTIVOS DO C-LEVEL

toda a organização, promover a responsabilidade e tida praticam taxas mais baixas em períodos fora do
inspirar os funcionários. pico. Os gestores que trabalham do lado da demanda
Uma vez definidas as metas, a equipe precisa criar reformulam o consumo para evitar períodos de pico e
incentivos para mobilizar toda a organização a tornar até cobram das usinas de energia um pagamento pela
a energia uma prioridade operacional. A General Mo- resposta à demanda ao reduzir o consumo nos perío-
tors (GM), por exemplo, que atualmente gasta mais de dos de pico. As empresas estão tentando reduzir a de-
US$ 1,2 bilhão em energia, entranhou a eficiência ener- manda em períodos de pico de consumo usando ener-
gética em seu padrão global e nos planos de negócio gia armazenada previamente. A vinícola Kendall-Jack-
das fábricas. Os planos, que estão intimamente rela- son utiliza baterias do programa piloto da Tesla/Ener-
cionados à remuneração dos gestores da fábrica, in- NOC para armazenar energia de seus painéis solares.
cluem não só as métricas operacionais como os volu- Isso reduziu a conta de energia elétrica da vinícola em
mes de produção esperados, mas também os princi- aproximadamente 40% em 2016 — o que resultou na
pais indicadores de desempenho ambientais e energé- economia de US$ 2 milhões e no aumento de resiliên-
ticos, como a energia consumida em cada veículo pro- cia dian e potenciais apagões.
duzido. Se as metas de energia não são cumpridas, os

3
gestores precisam explicar os motivos para a lideran-
ça global. Como observa Mari Kay Scott, diretora de MONITORE A ENERGIA EM
compliance ambiental e sustentabilidade da GM, “para TODOS OS NÍVEIS
nós a eficiência de energia é uma prioridade na fábrica Saber que sua empresa desconhece quanto
da mesma forma como são a segurança, a qualidade, o consome de energia, tanto nas unidades e ati-
custo e a receptividade”. vidades em separado como na organização co-
Além disso, a equipe deve aconselhar como inte- mo um todo, é um duro golpe para os execu-
grar os custos de energia às prioridades e aos proces- tivos do C-level. A energia está entre as áreas de maior
sos estratégicos. Os gestores de instalações e opera- custo para as empresas — no mesmo patamar de custo
ções devem incluir a energia nos custos decorrentes com pessoal, produtos, instalações e equipamento —,
de seu potencial de recuperação e no planejamen- mas é a única que não é monitorada e controlada com
to de continuidade de negócios. E a equipe de finan- rigor. Na verdade, não raro é a área mais precariamen-
ças precisa priorizar a redução de energia e de emis- te monitorada da estrutura de custos. A maioria das
sões de carbono no processo de alocação de capital. A empresas não dispõe de bons sistemas para avaliar ra-
Johnson & Johnson e a GM reservam um capital adi- pidamente os dados sobre energia nem mecanismos
cional anualmente para projetos de eficiência e re- que informem a necessidade de intervenção imedia-
dução de emissões de carbono — respectivamente ta. Quando a Cisco, líder de TI, instalou 1.500 sensores
US$ 40 milhões e US$ 20 milhões. de energia numa de suas unidades da Ásia, em 2015,
Finalmente, a equipe de energia pode aju- pôde medir o consumo total de energia da fábrica pe-
dar a conectar duas operações que geral- la primeira vez, e imediatamente descobriu formas de
mente são distintas: prospecção de recur- reduzi-lo em 30%. Seu vice-presidente de suprimen-
e gestão de uso. Normal- tos, John Kern, diz: “Sempre administramos os custos
arte dos gestores da orga- cuidadosamente, mas não estávamos realmente me-
comprar energia pelo pre- dindo a energia — não sabíamos quanto gastávamos”.
xo possível e desenvolver Essa é uma falha comum entre os fabricantes, mas é
ento e uma estratégia de perturbadora porque, como observou Kern, a energia
tra parte dos gestores, no é normalmente o maior custo variável das fábricas.
o, trabalha para reduzir o Monitorar e analisar o uso da energia revela ques-
umo e melhorar a eficiên- tões operacionais que afetam custos, desempenho e
. Coordenar essas metas qualidade. Os dados da “assinatura da energia” po-
ode representar economia dem indicar que uma parte do equipamento, como
ou ganhos e redução de um sistema de aquecimento, ventilação e ar-condi-
risco. Por exemplo, ges- cionado (HVAC, na sigla em inglês), ou uma máquina
tores de compras deci- injetora de moldagem, está trabalhando fora de sua
dem contratar ener- faixa ideal de funcionamento. A Blommer Chocolate,
gia com custos mais grande processadora de cacau, utiliza análise estatís-
altos durante os tica para prever a energia necessária para torrar cada
períodos de pi- quilograma do produto. Quando o consumo real foge
co de deman- da previsão, os gestores sabem que algo vai mal. Um
da da malha produtor de material de construção monitora os cus-
energética tos de energia de cada linha de produto (cerca de 30
e em con- mil unidades de manutenção de estoque) e usa esses
trapar- dados para ajustar os preços e garantir a lucratividade.

80 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


Comparar o uso de energia em locais ou fábricas
similares pode revelar oportunidades de eficiência.
Uma empresa de entretenimento, por exemplo, uti-
liza uma planilha de pontuação trimestral de energia Ç
para comparar suas propriedades. Os locais com pon- O custo da energia renovável despencou nas últimas décadas. A queda
tuação menor podem aprender com os do topo da lista
acentuada significa que o preço da energia obtida de projetos renováveis
a melhorar o desempenho. Da mesma forma, uma ca-
deia de cinemas trabalhou com o fornecedor de apa-
que atualmente estão aparecendo online geralmente é inferior ao custo
relhos de ar-condicionado Ingersoll Rand para coletar dos combustíveis fósseis — e inferior ao preço que as empresas pagam
dados de energia e depois aplicar métodos analíticos pela energia no varejo.
preditivos aos dados sobre uso passado e atual. Dessa FAIXA DE CUSTOS EM CENTAVOS DE DÓLAR POR QUILOWATT-HORA
forma ela otimizou o funcionamento do HVAC em ca-
25¢
da sala de exibição de acordo com os horários das ses-
sões e as vendas de ingressos. A refinaria de petróleo
Valero, usando medidores de energia de baixo custo
e software de inteligência em energia para coletar da- 20
dos em tempo real, conseguiu economizar US$ 120 mi-
lhões em energia no primeiro ano.
EÓLICA SOLAR COMBUSTÍVEIS
É fundamental conhecer detalhadamente o consu- FÓSSEIS
15
mo de energia no âmbito geral da empresa. Essa infor-
mação ajuda a prever como a volatilidade dos preços FAIXA DE
ESCALA PREÇO DA
e a disponibilidade de energia afetarão todas as opera- ÃO ENERGIA
XA
ções, lucros e fluxos de caixa. 10 NO
VAREJO
Numa visão ainda mais aprofundada, as empresas (2015)
precisam analisar completamente suas cadeias de va- ATURAL
lor em relação ao risco e às oportunidades. Na maioria 5
das empresas muitos impactos de energia e de emis-
sões estão fora de seu controle direto, pois se encon-
tram nos fornecedores ou nos consumidores. Os maio-
res riscos operacionais decorrentes da volatilidade e 0
2 ’12 ’13 ’14 ’15 2 ’12 ’13 ’14 ’15
de futuras regulamentações podem, na verdade, es-
tar na extremidade superior da cadeia de produção. FONTE LAZARD, AGÊNCIA DE INFORMAÇÃO DA ENERGIA DOS ESTADOS UNIDOS. OBSERVE QUE AS FAIXAS DE
ENERGIA EÓLICA, SOLAR E DE COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS REPRESENTAM CUSTOS DE ELETRICIDADE NIVELADOS NÃO
Muitas empresas líderes exigem que os fornecedores SUBSIDIADOS (CUSTO POR QUILOWATT-HORA DE CONSTRUÇÃO E OPERAÇÃO DA USINA GERADORA DE ENERGIA
ELÉTRICA MAIS OS SERVIÇOS DURANTE TODA A VIDA ÚTIL DA USINA). OS PREÇOS DE VAREJO SE REFEREM À
mais importantes na linha de produção forneçam, no FAIXA DE PREÇO DA ENERGIA GERADA PELA MALHA ENERGÉTICA PARA CONSUMO COMERCIAL E INDUSTRIAL.
mínimo, dados sobre seu consumo de energia e emis-
sões de carbono. Mas os fornecedores, como a maioria
das empresas, não dispõem de bons mecanismos para
monitorar o uso da energia e, quando controlam, ge- A maior parte da nova energia elétrica gerada nos Estados Unidos provém de
ralmente usam processos manuais, lentos e trabalho- fontes renováveis.
CAPACIDADE TOTAL DE NOVA ENERGIA GERADA
sos. Algumas empresas, como a Walmart, oferecem
100%
aos fornecedores ferramentas para ajudá-los a redu- CARVÃO
zir as emissões de carbono e o consumo de energia.
As primeiras cadeias de suprimentos a automatizar COMBUSTÍVEIS
FÓSSEIS
e aperfeiçoar essa contabilidade terá a vantagem de 75 27%
controlar custos e reduzir riscos.
As empresas devem analisar suas cadeias de valor GÁS RENOVÁVEIS
NATURAL 73%
na extremidade inferior da cadeia de produção para
entender como seus clientes utilizam a energia. Em al- 50
guns setores, as pegadas de energia e de carbono das
empresas são grandes pontos de diferencial competi- OUTRAS
tivo. A Ingersoll Rand aprimora continuamente a efi-
ciência de energia de suas bombas, compressores e 25 OUTRAS
tecnologia de refrigeração. Ela adicionou controles RENOVÁVEIS
inteligentes que analisam como o equipamento está
EÓLICA
operando e otimizam automaticamente a eficiência.
SOLAR
A Boeing promoveu parcerias com clientes para ga- 0
2010 2011 2012 2013 2014 2015
rantir que suas turbinas funcionassem corretamente
FONTES COMISSÃO FEDERAL DE REGULAMENTAÇÃO DE ENERGIA; ASSOCIAÇÃO
com biocombustíveis que emitem zero carbono, uma DAS INDÚSTRIAS DE ENERGIA SOLAR; PESQUISA DA GTM

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 81


SABE
EMPR R QUE S
DESC ESA UA
GAST ONHEC
0,05 desde 2009. Novos projetos solares em áreas en-
solaradas como o Meio Leste e vizinhanças do Méxi-
co estão atingindo um preço inferior a US$ 0,03 por
quilowatt-hora.

É UM A EM EN E QUAN
Como ocorre com todas as formas de energia, os
incentivos do governo tornam a economia de mer-
cado mais atraente. Mas, mesmo sem ajuda, o custo

PARA DURO G ERGIA TO


da tecnologia limpa está caindo muito rápido. O cus-
to total de desenvolver energia solar e eólica foi redu-
zido em 74% e 55%, respectivamente, em cinco anos
(ver quadro “Paridade de preço de combustíveis reno-

O EXE OLPE váveis e fósseis”). O custo de lâmpadas LED diminuiu


impressionantes 94% em menos que uma década.
O custo da tecnologia de armazenamento — bate-

CUTIV rias que eliminam os últimos grandes desafios da


energia renovável, a intermitência — também está
caindo rapidamente.

O. Esses preços mais baixos, decorrentes de investi-


mentos globais massivos e rápidos avanços tecnológi-
cos, estão produzindo mudanças previsíveis no mer-
cado: desde 2012 mais da metade da energia introdu-
zida atualmente na malha elétrica global é produto de
fontes renováveis. Em 2015, grandes empresas com-
praram diretamente 3,4 gigawatts de energia limpa, o
que representa cerca de 20% do mercado total de re-
nováveis (usinas e residências compraram o restante).
De acordo com uma pesquisa da PwC, 85% das empre-
tecnologia que muitas empresas aéreas estão adotan- sas que já compraram energia limpa estão dispostas a
do. E a maioria das grandes empresas de tecnologia e comprar mais nos próximos 18 meses.
de veículos estabeleceu metas agressivas de eficiência Ao mesmo tempo que as corporações apostam em
energética para seus produtos. Essas inovações redu- formas renováveis de energia — principalmente eólica
zem custos e diferenciam produtos, promovendo as e solar — para a maior parte de sua tecnologia limpa,
vendas e elização dos clientes. elas testam várias tecnologias alternativas. Algumas
empresas estão captando o calor dissipado pela gera-

4
ção de eletricidade para usá-lo em aquecimento e re-
MUDE PARA RENOVÁVEIS E OUTRAS frigeração. Outras, como a GM e a Diageo, que produz
TECNOLOGIAS AVANÇADAS DE ENERGIA bebidas destiladas, estão coletando e queimando me-
O mercado para a tecnologia de energia lim- tano de aterros sanitários — uma fonte de gás natural
pa está mudando rapidamente e as empresas considerada neutra em termos de emissão de carbono.
precisam entender tanto essas tecnologias A Walmart, que utiliza células combustíveis para for-
como as opções de financiamento disponí- necer energia para mais de 50 lojas, instalou mais de
veis. Empresas que não incorporam agressivamente mil empilhadeiras alimentadas a hidrogênio em seus
os combustíveis renováveis e outras novas tecnologias centros de distribuição. A Home Depot, recentemente,
de energia em suas estratégias gerais de energia estão aumentou para 200 o número de lojas que utilizam cé-
deixando passar benefícios importantes e expondo-se lulas combustíveis e armazenamento de energia. Em-
a uma série de riscos. presas aéreas do mundo todo estão usando combustí-
O cenário da energia atual se caracteriza pelo au- veis alternativos de várias fontes — resíduo sólido, re-
mento drástico de fornecimento e pela queda vertigi- finarias de petróleo, gás residual de siderúrgicas e até
nosa nos custos de uma série de tecnologias de ener- tabaco. Empresas com grandes frotas de veículos, co-
gias alternativas, incluindo turbinas eólicas, células mo USPS, FedEx e UPS, estão testando veículos movi-
fotovoltaicas, biocombustíveis, células de combustí- dos a combustível alternativo que variam de veículos
vel, baterias avançadas, iluminação a LED e medido- elétricos e híbridos a caminhões movidos a propano,
res avançados. Os projetos mais recentes de energia gás natural ou biometano. Os veículos a combustível
renovável estão precificando a energia abaixo do cus- alternativo da UPS já percorreram mais de 1,5 bilhão
to de qualquer fonte de energia. Em 2015, o preço mé- de quilômetros entregando encomendas.
dio da eletricidade para novos contratos de longo pra- Opções de financiamento. As tecnologias de
zo de projetos de energia eólica nos Estados Unidos energia limpa podem estar proliferando e seus pre-
foi de US$ 0,02 por quilowatt-hora, diminuindo US$ ços caindo, mas nem sempre é fácil para as empresas

82 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


aproveitá-las adequadamente. Para isso é preciso ter
uma compreensão sofisticada das implicações finan-
ceiras e do risco de várias opções de compra. O siste-
COMO SE FAZ UM LÍDER EM ENERGIA?
ma de financiamento de energia renovável mais usa-
Para avaliar sua maturidade nas técnicas e estratégias em
do é o acordo de compra de energia (PPA, na sigla em energia, pense nas seguintes perguntas. Respostas “não” indicam
inglês). A versão mais simples é um compromisso de oportunidade de capitalizar benefícios significativos financeiros e
dez a 20 anos de comprar energia limpa a um preço operacionais e reduzir riscos.
predeterminado, geralmente de uma fazenda eólica
ou solar. Os gestores financeiros e de operações po-
dem não querer assinar contratos de longo prazo, ape- SOFISTICAÇÃO NA GESTÃO DA ENERGIA
sar dos preços atraentes. E como todas as salvaguar- A gestão da energia está impregnada no tecido da minha empresa?
das, os PPAs são um jogo: os preços da energia são ex-
O nível de desempenho dos negócios de minha empresa aumenta quando a
tremamente voláteis e nem mesmo contratos de ener-
inteligência é usada para a gestão da energia (dados e métodos analíticos)?
gias renováveis assinados a um preço preestabelecido,
abaixo dos custos atuais, têm garantias. Nós capitalizamos em tecnologia e mercados de energia (como seleção de
Mas empresas inteligentes entendem o valor dos fornecedores e de sistemas de financiamento)?
PPAs como uma salvaguarda contra a volatilidade de Divulgamos nossos esforços relacionados à energia (aos funcionários, clientes e
preços — e como fonte de vantagem competitiva. Jigar outros stakeholders) e comemoramos o sucesso?
Shah, um dos pais do modelo PPA, mostra as oportu-
nidades deixadas sobre a mesa. “Combustíveis reno-
váveis e outras tecnologias limpas estão entre as áreas
OBSTÁCULOS PARA MELHORAR A GESTÃO DA ENERGIA
da economia que mais rápido crescem. Os CFOs geral- Minha empresa tem recursos internos e expertise suficientes?
mente conhecem pouco sobre os principais sistemas Os tomadores de decisão entendem as vantagens de uma gestão em energia
de financiamento.” mais eficiente?
Outros benefícios. Os combustíveis renováveis e, A energia é uma prioridade estratégica?
de forma geral, as tecnologias de novas energias forne-
cem uma série de vantagens além da garantia de pre-
Temos uma área central de gestão de energia?
ço. Primeiro, podem ajudar as empresas a se posicio-
nar previamente e de forma vantajosa em futuras re- BENEFÍCIOS RESULTANTES
gulamentações. Cerca de 40% das emissões de gases Nossa estratégia em energia oferece valor financeiro direto (criando eficiências
do mundo já estão sob alguma forma de precificação e reduzindo custos e melhorando a produtividade do capital)?
de carbono, e com os acordos do clima de Paris que en-
Reduz o risco (como compliance e relatórios de risco)?
traram em vigor no fim de 2016, as probabilidades de
uma regulamentação mais ampla das emissões de car- Melhora nossa marca (externamente com os parceiros, investidores e clientes,
bono — independentemente da participação dos Esta- e internamente com os funcionários)?
dos Unidos — são altas. Os governos do mundo todo Melhora nosso desempenho operacional geral?
também estão estabelecendo padrões agressivos de
Reduz nossos impactos ambientais negativos (como as emissões de gases
eficiência de energia.
do efeito estufa)?
Todas as políticas que taxam o carbono tornam os
combustíveis fósseis mais caros que a energia limpa
(por meio de um esquema de comercialização que li-
mita a energia total baseada em carbono ou impondo
um imposto direto). Essas políticas afetam mais umas
empresas que outras. A Apple e a IKEA, por exemplo,
já possuem contratos de compra para energia renová-
vel suficiente para suprir mais de dois terços de sua
demanda — afastando-as substancialmente da amea- aumentando, e marca e produtos limpos podem efe-
ça das regulamentações de carbono. tivamente envolver todos os tipos de stakeholders, co-
Outro beneficio das tecnologias limpas é a capaci- mo disc mos a seguir.
dade de reduzir o risco de descontinuidade operacio-

5
nal. Walmart, Morgan Stanley e Kendall-Jackson uti-
lizam a energia distribuída localmente (células com- ENVOLVA OS STAKEHOLDERS
bustíveis, ou uma combinação de painéis solares e tec- MAIS IMPORTANTES
nologia de armazenamento) para manter as operações As empresas podem se esmerar em aspectos
quando a rede de distribuição sofre pane. operacionais de estratégia energética: aumen-
Finalmente, o compromisso com a energia lim- tar a eficiência, diversificar fontes de energia,
pa beneficia a marca e gera diferencial competiti- reduzir emissões e assim por diante. Mas es-
vo. A pressão social para reduzir as emissões está ses efeitos não conseguem ir muito longe sem uma

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 83


ESTRATÉGIAS ENERGÉTICAS PARA EXECUTIVOS DO C-LEVEL

estratégia coerente de comunicação com os stakehol- precisam colaborar com os governos na construção de
ders. As empresas precisam não só se envolver com os uma malha mais inteligente e melhorar a transmissão
governos para influenciar as regulamentações ener- para viabilizar grandes projetos de energia renovável e
géticas e ambientais que afetam seus negócios, como de desenvolvimento de infraestrutura que apoiem lo-
também informar aos clientes, comunidades, investi- gística mais limpa e eficiência energética.
dores e funcionários suas estratégias de energia. Essa A dimensão do desafio é substancial. Algumas ins-
estratégia de comunicação deve ser moldada de acor- talações e estados continuam lutando para manter o
do com os interesses de stakeholder. status quo e têm resistido em fornecer os tipos de ener-
O mercado de energia limpa evolui rapidamente. gia e serviços que as empresas líderes do mercado de-
As empresas não precisam mais comprar energia de mandam. Estas devem utilizar sua influência para pro-
uma usina local regulamentada e podem, cada vez mover regulamentações favoráveis às suas estratégias
mais, negociar com os fornecedores de energia, até de energia e garantir acesso a novas tecnologias e fi-
instigá-los uns contra os outros para obter melho- nanciamentos — e estar dispostas a transferir seus ne-
res preços. Vários elementos ajudam-nas a gerenciar gócios para outro lugar, se necessário.
seus custos: precificação dinâmica, novos sistemas de No ano passado, a gigante dos cassinos de Las Ve-
financiamento como os PPAs e incentivos como cré- gas, a MGM Resorts International, pagou uma multa
ditos fiscais para aumentar a eficiência e investimen- de US$ 86 milhões ao romper o contrato que manti-
tos em energias renováveis. As empresas podem usar nha com a distribuidora de energia local, a Nevada Po-
redes inteligentes de energia, armazenamento em wer, para poder vender uma imagem mais verde para
baterias e tecnologias de geração local para otimizar o mercado de pacotes turísticos. Numa carta enviada
a quantidade de eletricidade a ser comprada da rede à comissão estadual de fornecimento de energia a em-
de distribuição — e quando. Mas a capacidade das em- presa explicou: “É nosso objetivo diminuir o impac-
presas de capitalizar benefícios desses avanços é au- to ambiental da MGM reduzindo o uso de energia e
mentada e acelerada por políticas governamentais, desenvolver agressivamente fontes de energia reno-
incluindo a regulamentação que promove a ener- vável. Nossa necessidade é reforçada pela crescente
gia renovável e a eficiência energética. Por isso, elas demanda do cliente por ambientes sustentáveis”.
têm uma participação efetiva, quer gostem ou não, na A Facebook trabalhou de perto com as empresas dis-
criação um sistema regulador dinâmico e orientado tribuidoras para atingir suas metas e ao mesmo tempo
para o futuro. tornar público o fato de que o acesso à energia reno-
Boa parte da ação se desenvolve no cenário local vável é importante quando se decide o local onde ins-
e regional. Por mais de um século, monopólios natu- talar um novo centro de dados.
rais forneceram energia, principalmente nos Esta- Conecte-se com clientes, sociedade, investido-
dos Unidos. No entanto, usinas geradoras, co- res e parceiros. A atitude da MGM de abandonar a
missões de agências públicas e a própria matriz distribuidora sinalizou claramente seu comprometi-
energética continuarão a ser essenciais para mento com as preocupações ambientais dos clientes
as operações das empresas, mesmo com o e da sociedade local. Todas as empresas deveriam di-
da geração distribuída. Por vulgar agressivamente suas estratégias de energia e de
ptar valor sobre o uso de tec- clima para esses grupos. Demonstrar boa gestão am-
pas, as empresas precisam biental não só protege a licença de funcionamento da
políticas que encorajem a empresa como também promove as vendas para clien-
mação do sistema energé- tes que procuram administrar seus próprios impactos
ra incluir a geração distri- ambientais. Veja o caso da Iron Mountain, empresa de
. Um grupo de grandes em- armazenamento de documentos e dados de US$ 3,4
sas com operações signifi- bilhões que utiliza energia limpa para criar um pro-
tivas em Ohio — incluindo duto inovador: os clientes dos centros de dados têm a
a Campbell Soup, Owens opção de comprar serviços de hospedagem de baixo
Corning, Jones Land La- carbono ou sem carbono (alimentados a energia eóli-
Salle, Nestlé e Whirpool ca) a um preço atraente de longo prazo, o que lhes per-
— convocou recente- mite capturar valor tanto na estabilidade de preço co-
mente os legislado- mo nos benefícios climáticos.
res do estado pa- A comunicação externa também deve ser talhada
ra restabelecer os para atender investidores e parceiros do negócio. His-
drões de eficiên- toricamente, a comunidade de analistas não se pre-
cia de energia e ocupava com as ações sociais e ambientais das em-
de energia re- presas, mas isso começou a mudar. Num relatório de
novável. As analistas do setor de artigos de vestuário, por exem-
empresas plo, a Morgan Stanley aumentou as metas de cota-
também ção das ações da Nike, Hanesbrands e VF porque elas

84 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


superaram suas concorrentes com uma estratégia de obstáculos reais e hipotéticos. Por não dispor de da-
sustentabilidade melhor e mais eficiente, incluindo dos confiáveis, é um grande desafio para a maioria das
políticas para assuntos energéticos. A comunicação empresas referenciar e administrar a energia estrate-
com os parceiros e investidores é particularmente im- gicamente em toda a organização. E sem um poder
portante quando a energia e o carbono são questões que centralize estratégia de energia é difícil capitali-
relevantes relacionadas aos custos, riscos, resiliência e zar oportunidades.
desempenho da empresa ou aos clientes. A Alcoa, por Mas as ferramentas para medir e gerenciar a ener-
exemplo, conversa proativamente com os investido- gia e as emissões de carbono já estão disponíveis: hoje
res sobre como ela cria os produtos dos clientes — car- está mais fácil coletar dados. E como mostramos aqui,
ros, aviões e prédios — com mais eficiência energética. surgiram modelos robustos de governança e práticas
Numa recente reunião trimestral com investidores, o de gestão que permitem que as empresas detectem
CEO da Walmart relatou que os esforços de sustenta- e consertem suas falhas (ver quadro “Como se faz um
bilidade da empresa, incluindo os compromissos com líder em energia?”).
a energia limpa, foram decisivos para a confiança na O maior obstáculo continua sendo a percepção de
marca e, portanto, para o valor do negócio. que a energia é apenas um custo a ser administrado ou
Engaje os funcionários. Engajar os funcionários que administrá-la estrategicamente implica um cus-
em estratégias de energia traz benefícios tangíveis e to extremamente alto. Esperamos que o artigo tenha
intangíveis. Primeiro, é difícil executar completamen- dissuadido as pessoas da primeira ideia. Com relação
te a estratégia sem que eles estejam envolvidos em à segunda: executivos de pequenas empresas muitas
iniciativas de eficiência. A famosa “caça ao tesouro” vezes se queixam de que participar de uma econo-
da GE convida os funcionários a participar de análises mia de energia limpa é um luxo reservado às empre-
estruturadas das fábricas para desencavar a energia e sas grandes e ricas. “Obviamente a Apple, Microsoft
outros desperdícios de recursos e recomendar ações ou Walmart podem fazê-lo”, costumam dizer, “mas
para melhorar a eficiência. A empresa organizou mais não temos esse cacife todo”. Mas possuir capital não
de 300 caçadas em suas instalações, economizando foi a principal razão para essas empresas perseguirem a
US$ 150 milhões. Nos últimos dez anos, a GE apresen- eficiência de energia e investirem em combustíveis
tou o processo de caça ao tesouro a mais de seis mil renováveis, pois ambos, na verdade, permitiram
empresas de clientes e parceiros. As empresas deve- que elas economizassem. Em vez disso, essas em-
riam incrementar o engajamento dos funcionários nas presas são bem-sucedidas porque têm grande me-
estratégias de energia premiando sua participação em tas, comprometimento do alto escalão, equipes em-
atividades de eficiência como caças ao tesouro, parti- poderadas e uma clara governança de estratégias
lhando energia e dados de retorno de investimentos direcionadas para a energia; acima de tudo, elas tor-
internamente para estimular uma competição amis- naram a energia limpa uma parte fundamental de sua
tosa e fornecendo ensino e treinamento em energia. história corporativa.
Segundo, conversar com os funcionários sobre as As iniciativas de energia, como as de qualquer tipo
estratégias de energia da empresa promove o com- de negócio, requerem investimento — se não for de di-
prometimento. Esse item é difícil medir, obviamente, nheiro, será de tempo e foco organizacional. Mas nos-
mas todos sabem que os valores organizacionais são sa experiência mostra que todas as recomendações
importantes para os empregados, principalmente os que expusemos aqui estão ao alcance da maioria das
millennials, que constituirão metade da força de tra- empresas e que os benefícios substanciais que propor-
balho global por volta de 2020. Um estudo da Morgan cionam podem vir mais rápido que se espera.
Stanley de 2015 mostrou que os millennials têm enor-
me tendência de trabalhar em (e comprar de) empre- OS PROPULSORES DA vantagem competitiva estão sem-
sas que partilham seus valores e administram bem as pre evoluindo. Até há pouco tempo a “qualidade” era
questões ambientais e sociais. Ao entender isso, Brad uma ideia periférica, e TI apenas um centro de despe-
Smith, presidente da Microsoft, é franco sobre as es- sas. Atualmente a qualidade é a bola da vez, e a fluên-
tratégias de energia da empresa. Uma das formas de cia de grandes dados é fator crítico para a missão da
comunicação é por meio de um blog da empresa. Re- empresa. A energia está seguindo uma trajetória simi-
centemente ele expôs a estratégia de energia renová- lar. O que antes estava profundamente escondido na
vel para seus centros de dados descrevendo metas área de compras está em ascensão para assumir seu
agressivas “que podemos usar para nos manter res- lugar entre as alavancas mais importantes do sucesso
ponsáveis”. É esse tipo de linguagem que os funcioná- dos negócios.
rios querem ouvir de seus líderes. HBR Reprint R1701E–P Para pedidos, página 14

O QUE O IMPEDE? ANDREW WINSTON é fundador da Winston Eco-Strategies,


autor de The big pivot e coautor de Green to gold.
Se há tanto valor a ser liberado e protegido com GEORGE FAVALORO é diretor-geral de práticas de soluções de
uma estratégia de energia, por que outras empresas negócios sustentáveis da PwC. TIM HEALY é presidente e CEO da
não criam a sua estratégia? Nossa pesquisa revelou EnerNOC, provedor de software para inteligência em energia.

FEVEREIRO 2017 HARVARD BUSINESS REVIEW 85 


RESUMO DA EDIÇÃO FEVEREIRO 2017

FOCO
VANTAGEM CUMULATIVA
Nesta edição analisamos
o que realmente motiva
os consumidores a
escolher um produto em
detrimento de outro: é
o hábito — e não, como
muitos pressupõem, a
atração ou a fidelidade.
pág. 35

Por que as empresas, rotineiramente, gostaram do produto, mas não


sucumbem à sedução da reformulação o usavam com muita frequência.
da marca? A resposta, afirmam A. Verificou-se posteriormente que era
G. Lafley e Roger L. Martin, autores por causa da embalagem, que parecia
de “A fidelidade do cliente está uma garrafa de limpa-vidros; por isso
superestimada”, tem suas raízes em os consumidores a guardavam sob a
sérias interpretações equivocadas sobre pia. Quando a empresa redesenhou
a natureza da vantagem competitiva a garrafa para que os consumidores
— ou seja, que as empresas precisam pudessem guardá-la em local visível,
atualizar continuamente seus modelos eles passaram a usar o produto com
de negócio, estratégias e formas de mais frequência.
comunicação para responder à explosão Inove dentro da marca. Esforços
de opções que consumidores, cada vez para “relançar” marcas podem levar as
mais sofisticados, encontram pela frente. pessoas a romper hábitos. Mudanças
A pesquisa sugere que o que torna a nas características do produto devem
vantagem competitiva verdadeiramente ser introduzidas de forma a reter
sustentável é ajudar os consumidores a vantagem cumulativa. Para os
a não precisar fazer escolhas. Eles consumidores, “melhorado” é muito
escolhem o produto líder do mercado mais agradável que “novo”.
principalmente porque essa é a forma Mantenha a comunicação simples.
mais fácil. E cada vez que eles o fazem, Um comercial brilhante pode ganhar
sua vantagem sobre a dos produtos prêmios, mas se a mensagem é
ou serviços não escolhidos aumenta, complexa o tiro pode sair pela culatra.
criando o que os autores chamam de
vantagem cumulativa. Contraponto
Lafley e Martin oferecem um tutorial Rita Gunther Mc Grath contesta essa
para criar vantagem cumulativa. ideia. Em “Os velhos hábitos são duros
Torne-se popular logo no início. de matar, mas morrem”, ela defende
Voltando a 1946, a Procter & Gamble que, embora a teoria da vantagem
fornecia uma caixa de Tide com cada cumulativa possa fazer sentido em
máquina de lavar vendida nos Estados organizações previsíveis, essa condição
Unidos. não se aplica em muitas empresas.
VOCÊ PODE ADQUIRIR OS ARTIGOS DO FOCO DESTA EDIÇÃO Crie design para o hábito. Quando a Hábitos, bem como outros elementos
EM UM ÚNICO REPRINT. HBR Reprint R1701B–P P&G lançou o Febreze, os consumidores do ambiente, podem mudar.

86 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


Veja como o modelo de assinatura
da Dollar Shave CLub arrebatou a fatia
de mercado da Gillette. Os executivos,
afirma McGrath, precisam equilibrar o
poder da vantagem cumulativa com a
necessidade de atualizar sua abordagem.
Uma tática é alavancar as habilidades ou
competências centrais da organização,
mas num novo formato — como fez a
Dayton Hudson, quando se tornou a
Target. Quanto melhor os executivos
entendem as motivações das escolhas
inconscientes, maior é a probabilidade
de desenvolverem determinados
hábitos entre seus consumidores —
e, igualmente importante, maior a
probabilidade de perceberem como
esses hábitos podem mudar.

Estratégias de duas empresas


Como a teoria da vantagem cumulativa
pode ser aplicada a outras empresas
além da Procter & Gamble? Jørgen Vig
Knudstorp, CEO do grupo LEGO, criou
a vantagem cumulativa de sua empresa
aproveitando a conexão emocional
que muitas pessoas têm com seus
blocos coloridos. “Se você puder fazer
de sua marca um valor — uma parte
da identidade de alguém —, terá uma
vantagem competitiva realmente
poderosa”, comenta. “Mas tudo começa
quando se faz da marca um hábito.”

Scott Cook, presidente da Intuit,


atribui boa parte do sucesso de sua
empresa a uma decisão antiga de criar
o Quicken, o software de finanças
pessoais da Intuit, que se parece e
funciona como um talão de cheques.
Como Cook observa, o Quicken é
“o produto que permite às
pessoas manter seus hábitos”.
RESUMO DA EDIÇÃO

ARTIGOS COMO EU FIZ


BRASIL OPERAÇÕES OPERAÇÕES CULTURA ORGANIZACIONAL
A CONTRIBUIÇÃO DA SEJA EXCELENTE NO ESTRATÉGIA O CEO DA T-MOBILE EXPLICA COMO
ESTRATÉGIA SOCIAL ATENDIMENTO AO ENERGÉTICA PARA CAPTAR PARTICIPAÇÃO DE MERCADO
PARA A VANTAGEM CONSUMIDOR O C-LEVEL John Legere | pág. 28

COMPETITIVA Matthew Dixon, Lara


Ponomareff, Scott Turner
Andrew Winston, George
Favaloro e Tim Healy |
Alexander Zimmermann, e Rick DeLisi | pág. 66 pág. 76
Gilbert Probst, Carolin Hermann
e Paul Ferreira | pág. 58

Cada vez mais, Por que os consumidores Grandes empresas gastam Quando ingressou na T-Mobile, em setembro de 2013, escreve
executivos e empresas estão cada vez mais de forma direta bilhões de o autor, o dado mais importante que ele logo identificou não
são desafiados a insatisfeitos com a qualidade dólares em energia todos era específico da T-Mobile, mas da indústria de wireless em
beneficiar a sociedade da assistência que recebem os anos — e milhões de geral: as pessoas a odiavam. Ele percebeu que a melhor forma
e a proteger o meio dos serviços de atendimento forma indireta em custos de ser bem-sucedido nesse setor era ter um comportamento o
ambiente atuando local ao consumidor? As da rede de suprimentos, mais diferente possível das empresas existentes.
ou internacionalmente. No pesquisas e entrevistas dos outsourcing e logística. No A T-Mobile abandonou os contratos de longo prazo e
entanto, costuma ser mais autores com pessoal de entanto, fora dos setores os substituiu por modelos com precificação transparente,
fácil falar que fazer. centros de atendimento no de consumo energético facilitou a atualização para um novo smartphone, e eliminou
Se antes bastava mundo todo sugerem que as mais intenso, a maioria taxas de roaming global. Legere também começou criticando
divulgar as atividades empresas não contratam as das empresas aborda a as concorrentes Verizon e AT&T Wireless, que ele chamou de
filantrópicas e criar a área pessoas certas para atuar energia simplesmente “burros e mais burros” em comentários na imprensa e no
de responsabilidade social, como atendentes da linha como mais um custo a ser Twitter.
hoje as necessidades de frente, nem as equipam administrado. Esse é um Resultado: os assinantes da T-Mobile, que eram 33 milhões
sociais e ambientais devem para lidar com os complexos erro estratégico que ignora quando Legere foi admitido, no fim do terceiro trimestre de
ser percebidas como uma desafios inerentes ao cargo. enormes oportunidades de 2016 eram 69 milhões.
oportunidade de mudança, Segundo os autores, reduzir o risco, aprimorar a HBR Reprint R1701A–P
proatividade e assunção existem sete tipos de resiliência e criar novo valor.
de risco. É a isso que atendente. Os “enfáticos” Atualmente a energia
chamamos “estratégia apoiadores constituem está em ascensão na
responsável”. Em o maior grupo, e são os agenda corporativa por
primeiro lugar, contribuir preferidos dos gestores. abranger tendências
estrategicamente para Mas os “controladores” ambientais, sociais e
a sociedade ou para o cuidadores, que representam de negócios, incluir
meio ambiente requer somente 15% dos mudanças climáticas e
“pensamento fora da caixa” atendentes, são na verdade regulamentação global
e habilidade de perceber melhores na hora de resolver de emissões de carbono,
as demandas de diversos os problemas dos clientes. aumentar pressões sobre os
stakeholders. Para ampliarem seus recursos naturais, aumentar
Internamente, respostas números, as empresas as expectativas sobre o
a essas necessidades precisam atualizar sua desempenho ambiental
dificilmente surgirão forma de contratação — corporativo, inovações
dentro das tradicionais procurando aprimorar em tecnologias de energia
estruturas de silos. os anúncios de oferta e modelos de negócios,
HBR Reprint R1701C–P de emprego e selecionar e reduzir drasticamente
candidatos de formas os preços das energias
diferentes. Devem também renováveis.
renovar suas práticas de Para responder a essas
treinamento, usando novos mudanças, as empresas
processos e coaching sobre precisam desenvolver
o trabalho para ajudar todas uma estratégia energética
as categorias de atendente robusta.
a aprender a agir mais como HBR Reprint R1701E–P
controladores. Outro passo
fundamental é desenvolver
uma cultura que valorize e
premie o comportamento
controlador.
HBR Reprint R1701D–P

88 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


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Mais sobre Seinfeld em HBR.ORG.

CORPOEALMA Depois de anos como comediante, Jerry Seinfeld conquistou a TV nos

JERRY SEINFELD anos 1990 com seu sitcom homônimo. Duas décadas depois, ele está
novamente atraindo elogios e telespectadores, desta vez com seu
inventivo programa de entrevistas online Comedians in cars getting

COMEDIANTE coffee — e ao mesmo tempo uma nova geração descobre Seinfeld


por streaming. Entrevistado por Daniel McGinn

HBR: Como surgiu o Comedians in cars getting coffee?


SEINFELD: É muito importante saber do que você não gosta. Uma
“O SUCESSO DO SHOW SE DEVE AO FATO DE EU TER grande parte da inovação começa com a pergunta: “Sabe do que estou

MICROGERIDO TUDO — CADA PALAVRA, CADA realmente enjoado?”. Para mim, eram os talk shows nos quais toca uma
música, alguém entra em cena e anda até uma mesa, cumprimenta o
LINHA, CADA TOMADA, CADA EDIÇÃO, CADA anfitrião, e senta: “Como vai? Você está ótimo!”. “Do que realmente

ESCOLHA DE ATOR. ESSE É O MEU JEITO.” estou enjoado?” é aí que começa a inovação.

Quanto da popularidade contínua de Seinfeld vem de ter desistido


quando estava no topo da audiência?
Eu adoraria saber a resposta. Minha teoria é que o equilíbrio é a chave
de tudo. Se você está fazendo um programa de TV e ele fica muito
popular, haverá um momento em que você terá de parar ou ele perde
a magia. Não vou me comparar, de forma alguma, com os Beatles, mas
eles terminaram depois de nove anos, quando eu era criança, e acho
que esse número de um só dígito significava alguma coisa. Dez
temporadas parecia muito mais do que nove. Decidi que a nona
temporada seria a última para que o público sentisse que assistia a
uma performance que terminaria no auge.

Foi difícil descobrir como seria sua carreira pós-Seinfeld?


Nunca achei que precisava fazer algo diferente. Fui um comediante bem-
sucedido por muitos anos antes de começar esse programa. Eu sabia que
essa ia ser a minha vida. O show aconteceu, e foi um total desvio. Fui do
anonimato à maior aventura possível no entretenimento, e sentindo ainda
que havia certa relevância cultural. As pessoas começaram a usar palavras
que inventamos, como “regifting” e “shrinkage”. Mas sempre me vi como
comediante de stand-up, nada além disso. Teria sido um erro construir
uma enorme empresa de mídia para fazer filmes e programas de TV.

Pode-se ensinar alguém a ser engraçado?


Não. Você pode ensinar aspectos da profissão de comediante, mas
você não pode ensinar ninguém a ser engraçado. Eu só percebi como
isso é genético quando vi minha filha — mal podia acreditar como
era engraçada. Eu não a ensinei a ser assim, e sei que meu pai era
engraçado, então agora vejo que há um enorme componente genético.
A pessoa nasce assim.

Quão efetivo é o humor como ferramenta de liderança?


Ser engraçado é uma das maiores armas que uma pessoa pode ter
na sociedade. Pode até competir com ser muito bonito.

Como um performer dos palcos, como melhorar?


ANDREW HETHERINGTON/REDUX

Você precisa saber como motivar a si próprio para ser seguro e corajoso
quando está criando material novo, e, também, para ser um crítico
severo e dizer “Isso é bom, mas não é bom o suficiente — elimine”.
Não acho uma boa ser crítico a ponto de ficar deprimido, mas chego
perto. Gerir isso é a parte mais difícil da profissão. Na maioria das vezes,
quando os comediantes deixam o palco e você pergunta como foi, eles
dizem “Eu me odeio”.
HBR Reprint R1701F–P Para pedidos, página 14

90 HARVARD BUSINESS REVIEW FEVEREIRO 2017


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