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“ Instrumentos de detecção de
doenças vasculares periféricas
em idosos assistidos pela
atenção primária

Ana Paula Pillatt


UNIJUÍ

Fernanda Dallazen Sartori


UNIJUÍ

Evelise Moraes Berlezi


UNIJUÍ

10.37885/201102308
RESUMO

A atenção primária à saúde é o atendimento inicial, cujo principal objetivo é a preven-


ção de doenças, o tratamento de agravos simples e o direcionamento de casos graves
para outros níveis de complexidade. Assim, cabe à atenção primária o dever de atender
e resolver grande parte dos problemas de saúde da população, além de organizar o
fluxo de serviços na rede de saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020). A ampliação da
rede de atenção primária, por meio das equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF),
juntamente com o aumento da população idosa, tornam imperativos o reconhecimento
da condição de envelhecimento da população e de seus fatores associados para uma
efetiva promoção de saúde (MAIA et al. 2020). A partir do aumento expressivo de idosos,
profundas mudanças epidemiológicos implicam em novos desafios para os sistemas
de saúde e, é preciso minimizar as consequências do processo de envelhecimento,
buscando manter os idosos independentes funcionalmente, pelo maior período possível
(CANÊDO et al. 2018). Considerando-se que o envelhecimento individual não é causa
de declínio funcional por si só, mas representa o principal fator de risco para o acúmulo
de condições crônicas de saúde, que tendem a diminuir a funcionalidade e a qualidade
de vida, além de gerar mais custos para o sistema de saúde (MORAES, 2017). Desta
forma, investir em ações em nível da atenção primária em saúde, como o rastreamento
de condições predisponentes as doenças cardiovasculares, permitiria identificar condi-
ções passíveis de serem tratadas com menor custo-benefício; na perspectiva de evitar
desfechos indesejáveis como instalação de incapacidades ou morte precoce. Assim, o
objetivo deste capítulo é discutir sobre as doenças vasculares periféricas e instrumentos
de rastreamento que podem ser adotados pela atenção primária em saúde.

Palavras- chave: Assistência Integral à Saúde, Saúde do Idoso, Doenças Vasculares


Periféricas, Atenção Primária à Saúde
INTRODUÇÃO

A atenção primária à saúde é o atendimento inicial, cujo principal objetivo é a preven-


ção de doenças, o tratamento de agravos simples e o direcionamento de casos graves para
outros níveis de complexidade. Assim, cabe à atenção primária o dever de atender e resolver
grande parte dos problemas de saúde da população, além de organizar o fluxo de serviços
na rede de saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020).
A ampliação da rede de atenção primária, por meio das equipes da Estratégia Saúde
da Família (ESF), juntamente com o aumento da população idosa, tornam imperativos o
reconhecimento da condição de envelhecimento da população e de seus fatores associados
para uma efetiva promoção de saúde (MAIA et al. 2020). A partir do aumento expressivo
de idosos, profundas mudanças epidemiológicos implicam em novos desafios para os sis-
temas de saúde e, é preciso minimizar as consequências do processo de envelhecimento,
buscando manter os idosos independentes funcionalmente, pelo maior período possível
(CANÊDO et al. 2018).
Considerando-se que o envelhecimento individual não é causa de declínio funcional
por si só, mas representa o principal fator de risco para o acúmulo de condições crônicas
de saúde, que tendem a diminuir a funcionalidade e a qualidade de vida, além de gerar
mais custos para o sistema de saúde (MORAES, 2017). Desta forma, investir em ações em
nível da atenção primária em saúde, como o rastreamento de condições predisponentes as
doenças cardiovasculares, permitiria identificar condições passíveis de serem tratadas com
menor custo-benefício; na perspectiva de evitar desfechos indesejáveis como instalação
de incapacidades ou morte precoce. Assim, o objetivo deste capítulo é discutir sobre as
doenças vasculares periféricas e instrumentos de rastreamento que podem ser adotados
pela atenção primária em saúde.

DOENÇAS VASCULARES PERIFÉRICAS:

Doença Arterial Periférica e Insuficiência Venosa Crônica

Entre as DCNT, destacam-se as doenças cardiovasculares (DCV), que estão entre as


predominantes causas de mortalidade no mundo, representando cerca de 31% de todas as
mortes (OMS, 2017), no qual constituem um conjunto de doenças do coração e dos vasos
sanguíneos que incluem: Doença Arterial Periférica (DAP) e Insuficiência Venosa Crônica
(IVC), as quais são consideradas Doenças Vasculares Periféricas (DVP).
A DAP é um processo patológico gradual, sintomático ou assintomático, caracterizada
pela redução do fluxo sanguíneo causada, na maioria dos casos, por aterosclerose, a qual

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é denominada por ateroma, ou placas ateroscleróticas, que se projetam e obstruem a luz
vascular, que leva ao desenvolvimento de estenoses e oclusões em artérias maiores da
circulação dos membros inferiores (SBACV, 2015a). Aponta-se uma prevalência que varia
entre os 3-10% na população em geral e aumenta gradativamente em indivíduos com idade
superior a 70 anos, chegando a 15-20% (FERNANDES, 2017).
A Doença Arterial Obstrutiva periférica (DAOP) é uma doença decorrente do acúmulo de
gordura na parede vascular, ocasionando a formação de placas ateroscleróticas que podem
provocar obstruções no sistema arterial, que transporta o sangue para os órgãos vitais do
corpo. Os vasos mais afetados são a aorta, os vasos viscerais e as artérias dos membros
inferiores e está associada a alto risco de morbimortalidade cardiovascular (SBACV, 2015a).
A principal causa da DAOP é a aterosclerose, através do acúmulo de placas de ateroma,
as quais são formadas por lipídios, proteínas, cálcio e células da inflamação, na parede das
artérias e desta forma, acarretam estreitamentos e obstruções que desencadeiam processos
isquêmicos localizados ou sistêmicos (LEIBSON et al, 2004). A aterosclerose é caracteri-
zada por ser uma doença sistêmica e multifatorial que afeta a luz do vaso com intensidade
variável. A formação da placa aterosclerótica inicia-se em resposta à uma injúria ao endotélio
vascular, a camada única e mais interna que recobre a luz do vaso. Esse processo inicia-se
na infância e agrava com o avanço da idade e exposição à fatores de risco, acarretando em
incapacidade física, perda da independência e autonomia e reduzindo a capacidade funcional
do indivíduo, afetando assim a qualidade de vida (FALUDI et al, 2017).
A maioria dos indivíduos acometidos pela doença são assintomáticos, o que pode levar
a um diagnóstico tardio, impossibilitando o início do tratamento precocemente, e piorando
o prognóstico da doença (ZANDER et al, 2002). Os sintomas mais comuns de DAOP são
a ausência de pulsos distais e dor nos membros superiores ou inferiores, que pode ocorrer
após atividade física ou mesmo em repouso, claudicação intermitente e lesão cutânea ou
não (MAFFEI, 2016). A claudicação intermitente, é a manifestação mais frequente, que é
caracterizada por dor e desconforto muscular nos membros inferiores durante o exercício e
alivia durante o repouso, devido a diminuição do aporte do fluxo sanguíneo para o membro
afetado (SBACV, 2015a).
Já, a IVC pode ser definida como um conjunto de alterações que ocorrem na pele
e no tecido subcutâneo, principalmente nos membros inferiores, decorrentes de uma hi-
pertensão venosa de longa duração, causada pela insuficiência valvular e/ou obstrução
venosa (MAFFEI, 2002) e caracteriza-se por um conjunto de manifestações clínicas como
a incapacidade em manter o equilíbrio entre o fluxo sanguíneo e seu retorno nos membros
inferiores. Causadas principalmente, por obstrução mecânica ao fluxo venoso e refluxo do
sangue venoso através de válvulas incompetentes do sistema venoso periférico superficial

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ou profundo, acometendo os membros inferiores (EKLÖF et al, 2009). Decorre da incom-
petência valvular, podendo ser associada ou não a uma obstrução do fluxo sanguíneo, de
forma predominante em membros inferiores (DIAS et al, 2014); sua no mundo é de 1,5% da
população geral e até 5% da população idosa (CHI; RAFFETTO, 2015).
A insuficiência das válvulas das veias profundas causa hipertensão venosa, a qual está
relacionada com o comprometimento da musculatura da panturrilha levando a uma desordem
na circulação venosa (AQUINO et al, 2016). A hipertensão venosa é a principal causa de
IVC, ocorre devido a uma pressão venosa aumentada nas vênulas dos capilares, impedin-
do o fluxo sanguíneo. Sendo baixo o fluxo dentro dos capilares desencadeia o acúmulo de
leucócitos, esses por sua vez liberam enzimas proteolíticas e radicais livres de oxigênio, que
comprometem as membranas basais capilares, as proteínas plasmáticas vazam fibrinogênio
para os tecidos circundantes formando uma braçadeira de fibrina. Em decorrência do acúmulo
fibrina intersticial e do edema ocorre uma redução do aporte de oxigênio aos tecidos, cau-
sando hipóxia local, inflamação, além de ocasionar o surgimento de úlceras (SBACV, 2015b).
Isto ocorre em virtude das veias superficiais normais que se dilatam ao ponto que as
abas finas das válvulas venosas não conseguem fazer contato com o lúmen do vaso, sendo
incapazes de bombear o sangue de volta ao coração, devido a insuficiência da rede valvular
estar “falhada”, decorrente desta falha o sangue flui para trás, com isso acumula sangue
nesses vasos sanguíneos (geralmente nas pernas), fazendo com que as veias se dilatam
ao longo do tempo, formando por fim, as veias varicosas (ROBERT, 2017).
A IVC inicialmente ocorre com aparecimento de varizes, com disfunção na parede
venosa, causando a insuficiência das válvulas pela dilatação. Com o acúmulo de sangue
formado, é gerado uma pressão hidrostática progressivamente maior no interstício que passa
a causar redução no fluxo na microcirculação com consequente diminuição de oxigenação
e trocas metabólicas, que com ou sem a participação de veias perfurantes insuficientes
termina por transmitir-se aos capilares sanguíneos (SBACV, 2015b).
As principais características de IVC incluem o eczema de estase com ressecamento,
descamação, adelgaçamento e coceira na pele, sinais evidentes da alteração inflamatória
local. Quando ocorre a destruição da pele e há solução de continuidade com os tecidos mais
profundos, a denominada “úlcera de estase” ou “úlcera varicosa” é gerada. A condição é
acompanhada de sinais e sintomas como, formigamento, dor, queimação, câimbras mus-
culares, edema, latejamento, coceira cutâneo, pernas inquietas e fadiga (SBACV, 2015b).
Além disso a IVC, causa impacto negativo na qualidade de vida dos indivíduos, provocando
dor, impossibilidade de realizar suas atividades de vida diária (AVD’s), e redução na mobi-
lidade (LOPES et al, 2013).

Envelhecimento Humano: Desafios Contemporâneos - Volume 2 211


Instrumentos de avaliação

A Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular (SBACV, 2015a e 2015b)


apresenta em suas diretrizes para DAOP e IVC as recomendações de métodos diagnósticos;
e, proposição de instrumentos que auxiliam na classificação de risco, severidade da doença;
e também de qualidade de vida. Estes instrumentos podem ser aplicados na população e
risco para DVP; e com isso, a equipe de saúde tem insumo para o planejamento das medidas
de saúde e de fluxograma para encaminhamentos aos serviços de referência.
Com relação aos instrumentos aplicados a condições de insuficiência venosa crônica
uma das indicações é a classificação e graduação da doença venosa dos membros inferio-
res (CEAP – classificação clínica (C), etiológica (E), anatômica (A) e patológica (P)). Esta
classificação foi proposta e realizada no fórum Americano de Doenças Venosas preparado
por um “Comitê AD HOC”. É também organizada em termos decrescentes de gravidade da
doença (EKLOF et al., 2004).
Criada em 1994, (PORTER; MONETA, 1995) e revisado em 2004 (EKLOF et al., 2004)
(Quadro 1), a classificação de CEAP surgiu devido a necessidade de criar um sistema capaz
de conduzir a um diagnóstico e classificação precisos e adequados na prática clínica, que
constitua a base para a escolha da estratégia terapêutica mais apropriada. Com a revisão
do CEAP, uma forma mais complexa e avançada foi desenvolvida adicionando ao primeiro
a classificação anatômica dividida em 18 segmentos venosos, clareando a localização dos
processos patológicos subjacentes (MEDEIROS; MANSILHA, 2012).

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Quadro 1. Classificação de CEAP revisado

Classificação Clínica

Co Sem sinais visíveis ou palpáveis de doença venosa crônica


C1 Telangiectasias ou veias reticulares
C2 Varizes (mais de 3mm de diâmetro)
C3 Edema
C4a Pigmentação ou eczema
C4b Lipodermatosclerose ou atrofia branca
C5 Úlcera venosa cicatrizada
C6 Úlcera venosa ativa
Classificação Anatômica
As Veias superficiais
Ap Veias perfurantes
Ad Veias profundas
An Local venoso não identificado
Classificação Patofisiológica – CEAP básico

Pr Refluxo
Po Obstrução
Pr,o Refluxo e obstrução
Pn Patofisiologia não identificada
Classificação Patofisiológica – CEAP avançado
Telangiectasias ou veias reticulares
Grande veia safena acima do joelho
Veias
Grande veia safena abaixo do joelho
Superficiais
Pequena veia safena
Veias não safenas
Veia cava inferior
Veia ilíaca comum
Veia ilíaca externa
Veias pélvicas: gonadais, do ligamento largo, outras
Veias
Profundas Veia femoral comum
Veia poplítea
Veias crurais: tibial anterior, tibial posterior, peroniais

Veias musculares: gastrocnêmias, soleais, outras

Veias Coxa
Perfurantes Perna
Fonte: Adaptado de Eklof B., et al. (2004).

De acordo com as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia


Vascular (SBACV), apesar da classificação da CEAP ser a mais reconhecidamente e difun-
dida, a mesma apresenta algumas limitações nas quais podemos citar a não adequação
da sua utilização como marcador de evolução dos tratamentos. Desta forma, existem ou-
tros sistemas de classificação como o Venous Clinical Severity Score (VCSS) (VASQUEZ;
MUNSCHAUER, 2008), usado frequentemente na prática clínica, fornece uma medida mais
próxima da severidade da doença e seu impacto nas atividades de rotina e representando

Envelhecimento Humano: Desafios Contemporâneos - Volume 2 213


uma ferramenta útil para avaliar alterações após procedimentos para o tratamento e acom-
panhamento dos doentes (VASQUEZ et al., 2010).
Este instrumento, Escore de Gravidade Clínica Venosa (VCSS) (Quadro 2) foi desen-
volvido no ano de 2000 com o objetivo de melhorar a avaliação padronizada de resultados
de doenças venosas com elementos graduáveis que
​​ poderiam mudar em resposta ao trata-
mento e complementar o sistema de classificação de CEAP (RUTHERFORD et al., 2000).
No ano de 2010, o VCSS foi revisado devido a identificação de algumas inconsistên-
cias que possivelmente limitavam a utilização geral, tendo em vista como falha principal do
escore de risco o idioma, pela ambiguidade nos descritores clínicos. A revisão do VCSS foi
realizada, com foco na atualização da terminologia, simplificando a aplicação e eliminando
ambiguidades (VASQUEZ et al., 2010).
O VCSS, validado em 2011 por Passman et al., (2011), com outras ferramentas de
avaliação de gravidade venosa o instrumento apresenta a análise os parâmetros clínicos
fornecidos pelos pacientes, os quais são: dor, varizes, edema venoso, pigmentação da pele,
inflamação, endurecimento, número de úlceras ativas, duração da ulceração ativa, tamanho
da úlcera e uso de terapia compressiva, onde a pontuação encontra-se entre zero a três
dentro de dez parâmetros avaliados. O sistema de pontuação inicial foi encontrado para ter
alta reprodutibilidade inter e intraobservador e ser responsivo a mudanças na gravidade da
doença (MEISSNER; NATIELLO; NICHOLLS, 2002).

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Quadro 2. Classificação de VCSS revisada.
Leve Moderado Severo
Parâmetro Ausente (0)
(1) (2) (3)

Sintomas diários, interferindo Sintomas diários limitando


Dor ou outro desconforto
Não Ocasional mas não impedindo as atividades a maioria das atividades
ligado a doença venosa
rotineiras. rotineiras.

Poucas dispersas,
Veias varicosas Não inclui a coroa Limitadas a panturrilha ou coxa Envolvendo panturrilha e coxa
flebectásica

Limitado ao pé e Acima do tornozelo mas abaixo


Edema de origem venosa Não Até o joelho ou acima
tornozelo do joelho

Limitada a área Difusa e até o terço inferior da Distribuição ampla (acima do


Hiperpigmentação Não
perimaleolar perna terço inferior da perna)

Limitada a área Difusa e até o terço inferior da Distribuição ampla (acima do


Inflamação Não
perimaleolar perna terço inferior da perna)
Limitada a área
Endurecimento Não Até o terço inferior da perna Acima do terço distal da perna
perimaleolar
Número de úlceras abertas Não 1 2 3
> 3 meses mas
Duração da úlcera Não <3 meses >1 ano
< 1 ano
Tamanho da úlcera Não <2cm 2 a 6 cm > 6cm
Terapia de compressão Não Uso Uso na maioria Uso diário
Fonte: Adaptado de Projeto Diretrizes SBACV, (2015b).

No estudo multicêntrica de Marston et al., (2013), o VCSS revisado demonstrou ser


um instrumento confiável e reprodutível para documentação da gravidade dos sintomas em
pacientes com IVC e os mesmos concluíram que este instrumento de rastreamento deve ser
um sistema de pontuação útil que possa ser usado para documentar a gravidade da doença
na prática clínica e na pesquisa estudos de pacientes com DCV.
Para o rastreamento de DAOP há sinais característicos que podem sinalizar a necessi-
dade de investigação de doença vascular, como a claudicação intermitente que ocorre devido
a redução do aporte sanguíneo para os membros inferiores durante o exercício e caracteri-
za-se por dor ou desconforto durante a caminhada que desaparece após o repouso (SBACV,
2015a). Cabe destacar que cerca de 50% dos pacientes com DAOP apresentam outros
sintomas e não a claudicação, e 40% não apresentam sintomas nas pernas (FIRNHABER;
POWELL, 2019), o que demonstra a necessidade da realização de um bom exame físico
para detecção de sinais e sintomas que possam sugerir a doença.
No exame físico é recomendado que se observe a presença de claudicação intermitente
e que se realize, tanto em pacientes sintomáticos quanto em assintomáticos a ausculta das
artérias femorais e a palpação dos pulsos femoral comum, poplítea, tibial anterior e tibial
posterior. Em pacientes sintomáticos recomenda-se ainda que se verifique a coloração, tem-
peratura, integridade da pele do pé e a presença de ulcerações, que se realize a palpação

Envelhecimento Humano: Desafios Contemporâneos - Volume 2 215


abdominal e ausculta em diferentes níveis, incluindo os flancos, a região periumbilical e as
regiões ilíacas (SBACV, 2015a).
Outros achados comuns durante o exame físico dos membros inferiores incluem rarefa-
ção dos pelos, pele brilhante, atrofia muscular, e as ulcerações arteriais são caracterizadas
por lesões bem demarcadas e perfuradas (FIRNHABER; POWEL, 2019). Nos pacientes
que apresentam sintomas, a presença de pele fria ou de pelo menos um sopro e qualquer
anormalidade palpável no pulso pode ser indicativo de DAOP (SBACV, 2015a).
O exame físico não é suficiente para indicar e/ou descartar a presença de DAOP.
Existem atualmente diversos protocolos e/ou testes para este fim, dentre eles: o índice tor-
nozelo-braquial (ITB), o índice hálux-braquial (IHB) e o teste de esteira.
O ITB é considerado uma ferramenta de triagem primária, sendo calculado pela di-
visão da maior pressão sistólica nas artérias do tornozelo pela pressão sistólica da artéria
braquial, aferido com o indivíduo em decúbito dorsal, utilizando um esfigmomanômetro e um
aparelho portátil de ultrassom de ondas contínua (SBACV, 2015a). Os valores de referência
são entre 1,0 a 1,4 considerados normais, 0,9 - 0,99 limítrofes e menor que 0,9 indicam a
presença de doença obstrutiva; enquanto valores maiores que 1,4 indicam provável calcifi-
cação (ROOKE et al., 2011).
Pacientes que apresentam calcificação vascular, decorrentes de Diabetes Mellitus ou
de Insuficiência Renal, podem apresentar aferições falsamente elevadas das pressões sis-
tólicas, e nestes casos o IHB fornece valores mais acurados (SBACV, 2015a). Os valores de
referência utilizados são maiores que 0,7 considerado normal, entre 0,4 e 0,7 considerado
anormal, e menor que 0,4 considerado grave (FOLEY, ARMSTRONG; WALDO, 2016).
O teste de esteira é utilizado para avaliar a magnitude da limitação funcional devido a
claudicação (ROOKE et al., 2013). Conforme a SBACV (2015a), recomenda-se utilizar um
protocolo de exercício padronizado com carga fixa ou progressiva. Para a estratificação de
risco, recomenda-se a Classificação de Fontaine (FONTAINE; KIM; KIENY; 1954), a qual
divide os pacientes com DAOP em quatro estágios, conforme quadro abaixo.

Quadro 3. Classificação de Fontaine.


Classificação de Fontaine
ESTÁGIO I Assintomáticos
ESTÁGIO II A Claudicação intermitente limitante
ESTÁGIO II B Claudicação intermitente incapacitante
ESTÁGIO III Dor isquêmica em repouso
ESTÁGIO IV Lesões tróficas
Fonte: Adaptado de SBACV (2015a).

Recomenda-se que a atenção primária faça o acompanhamento com os indivíduos de


menor risco, assim como ações de educação em saúde que possam prevenir a evolução da

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doença. Enquanto que, aqueles indivíduos com riscos elevados devem ser encaminhados
para os serviços especializados, através do sistema de referência e contrarreferência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do contexto apresentado, salienta-se a necessidade de ações de saúde na


atenção primária com o intuito de rastreamento e acompanhamento de usuários com DCV.
Cabe a equipe de referência, a estratificação de risco destes pacientes e a organização de
uma linha de cuidado que tenha como objetivos o acompanhamento dos casos de menor
risco e o encaminhamento de casos com maior risco para o atendimento especializado.

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