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SITUAÇÃO PROBLEMA O8
- Insuficiência cardíaca
DEFINIÇÃO
Clínica médica USP: Considera-se que a insuficiência cardíaca (IC) seja uma síndrome que torna o
coração incapaz de ofertar oxigênio em taxa adequada aos tecidos, ou o faz à custa de elevação da
sua pressão de enchimento (pré-carga). Devido à heterogeneidade e à complexidade da IC, não
existe uma definição amplamente difundida e aceita. Geralmente, a IC resulta de disfunção
estrutural ou funcional do coração, que compromete a sua capacidade de se encher de sangue ou de
ejetá-lo. Salienta-se a diferenciação entre “insuficiência miocárdica”, que ocorre quando a contração
miocárdica é comprometida, e a “insuficiência circulatória”, que se dá quando uma anormalidade de
algum componente da circulação é responsável pela manifestação da IC.
Diretriz: A insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome clínica complexa, na qual o coração é
incapaz de bombear sangue de forma a atender às necessidades metabólicas tissulares, ou pode
fazê-lo somente com elevadas pressões de enchimento. Tal síndrome pode ser causada por
alterações estruturais ou funcionais cardíacas e caracteriza-se por sinais e sintomas típicos, que
resultam da redução no débito cardíaco e/ou das elevadas pressões de enchimento no repouso ou
no esforço.
Implícito na definição de IC está o conceito de que a ela possa ser causada por anormalidade na
função sistólica, produzindo redução do volume sistólico (IC sistólica) ou anormalidade na função
diastólica, levando a defeito no enchimento ventricular (IC diastólica), que também determina
sintomas típicos de IC. No entanto, é importante salientar que, em muitos pacientes, coexistem as
disfunções sistólica e a diastólica. Assim, convencionou-se definir os pacientes com IC de acordo
com a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE).
FATORES DE RISCO
Incluem: (1) ingesta excessiva de Na, (2) não adesão às medicações para IC, (3) IAM (pode ser
silencioso), (4) exacerbação da hipertensão, (5) arritmias agudas, (6) infecções e/ou febre, (7)
embolia pulmonar, (8) anemia, (9) tireotoxicose, (10) gravidez, (11) miocardite aguda ou
endocardite infecciosa e (12) certos fármacos (p. ex., AINEs, verapamil).
EPIDEMIOLOGIA
Diretriz: A despeito de avanços na terapêutica da IC, a síndrome mantém-se como patologia grave,
afetando, no mundo, mais de 23 milhões de pessoas. A sobrevida após 5 anos de diagnóstico pode
ser de apenas 35%, com prevalência que aumenta conforme a faixa etária (aproximadamente de 1%
em indivíduos com idade entre 55 e 64 anos, chegando a 17,4% naqueles com idade maior ou igual
a 85 anos). Dados recentes distinguem a mortalidade tardia (1 ano) entre portadores de IC crônica,
de acordo com a classificação por fração de ejeção, atingindo maior taxa para portadores da ICFEr
(8,8%), seguida da ICFEi (7,6%) e da ICFEp (6,3%). De acordo com publicações internacionais, o
perfil clínico da IC crônica envolve indivíduos idosos portadores de etiologias diversas, sendo a
isquêmica a mais prevalente, com alta frequência de comorbidades associadas.
Na América Latina, com suas peculiaridades sociais, econômicas e culturais, um perfil clínico
distinto é encontrado. Baixo investimento na saúde, inadequado acesso ao atendimento e
acompanhamento insuficiente nos serviços em nível primário ou terciário são potenciais fatores de
risco, e, consequentemente, inúmeros processos fisiopatológicos favorecem o desenvolvimento da
IC. Em nosso país, dados do registro BREATHE (Brazilian Registry of Acute Heart Failure)
mostraram como principal causa de re-hospitalizações a má aderência à terapêutica básica para IC,
além de elevada taxa de mortalidade intra-hospitalar, posicionando o Brasil como uma das mais
elevadas taxas no mundo ocidental. Nosso país ainda apresenta controle inadequado de hipertensão
arterial e diabetes, e a persistência de doenças negligenciadas está entre causas frequentes da IC. A
doença reumática e a doença de chagas (DC), embora menos relevantes do que no passado,
continuam presentes, gerando quadros graves. Esta última esteve relacionada ao atendimento
ambulatorial de até 21% de portadores de IC.
Clínica médica USP: A IC é a manifestação inicial ou final de muitas patologias. Pode ser
secundária a: 1) doenças cardiovasculares como hipertensão arterial, aterosclerose (com suas várias
manifestações, como infarto do miocárdio, cardiomiopatia isquêmica etc.), doenças das válvulas
cardíacas ou doença congênita etc.; 2) cardiomiopatias primárias (de origem genética, mista ou
adquirida) ou secundárias; 3) pericardiopatias; e 4) endocardiopatias. As etiologias mais frequentes
da IC sistólica são cardiomiopatia dilatada idiopática, isquêmica (aterosclerose coronariana),
doença de Chagas, hipertensão arterial, valvar, alcoólica, miocardite de origem indeterminada e
periparto. A IC com fração de ejeção preservada mais frequente está geralmente associada à
disfunção diastólica, que, por sua vez, está relacionada à idade avançada, sexo feminino, obesidade,
diabetes mellitus, doença coronariana, doença renal e estenose aórtica.
Harrison: Como mostra a Tabela abaixo, qualquer condição que leve a alterações na estrutura ou
função do ventrículo esquerdo (VE) pode predispor o paciente a desenvolver IC. Ainda que a
etiologia da IC nos pacientes com FE preservada seja diferente daquela encontrada nos casos com
diminuição da FE, há considerável sobreposição de etiologias para essas duas condições.
- Nos países industrializados, a doença arterial coronariana (DAC) tornou-se a principal causa em
homens e mulheres, sendo responsável por 60 a 75% dos casos de IC.
A DAC e a hipertensão arterial interagem para aumentar o risco de IC, assim como o diabetes
melito.
- Em 20 a 30% dos casos de IC com redução da FE, a etiologia exata não é conhecida. Quando a
causa é desconhecida, os pacientes são referidos como portadores de miocardiopatia dilatada,
não isquêmica ou idiopática.
- Infecção viral prévia e exposição a toxinas (álcool ou quimioterápicos) também podem levar à
miocardiopatia dilatada. Além disso, está se tornando cada vez mais evidente que muitos casos
de miocardiopatia dilatada são secundários a problemas genéticos específicos, em particular
aqueles no citoesqueleto. A maioria das formas de miocardiopatia dilatada familiar é herdada de
forma autossômica dominante. Até o momento, foram identificadas mutações nos genes que
codificam proteínas do ci-toesqueleto (desmina, miosina cardíaca, vinculina) e proteínas da
membrana nuclear (laminina). A miocardiopatia dilatada também está associada às distrofias
musculares de Duchenne, de Becker e da cintura pélvica.
- As condições que levam a aumento do débito cardíaco (p. ex., fístula arteriovenosa, anemia)
raramente são responsáveis pelo desenvolvimento de IC em um coração normal. Entretanto, na
presença de cardiopatia estrutural subjacente, tais condições podem desencadear IC franca.
CONSIDERAÇÕES GLOBAIS
A cardiopatia reumática continua sendo uma das principais causas da IC na África e na Ásia,
especialmente entre os jovens. A hipertensão arterial é uma causa importante de IC nas populações
africanas e nos negros norte-americanos. A doença de Chagas ainda é uma causa considerável de IC
na América do Sul. Não é surpreendente que a anemia seja um fator concomitante frequente na IC
em muitos países em desenvolvimento. À medida que tais nações se desenvolvem, a epidemiologia
da doença vai se tornando semelhante à observada na Europa Ocidental e na América do Norte,
com a DAC surgindo como causa isolada mais comum de IC. Ainda que a contribuição do diabetes
melito não esteja bem compreendida, sabe-se que essa doença acelera o processo de aterosclerose e
com frequência está associada à hipertensão arterial.
CLASSIFICAÇÃO
Clínica médica USP: Com o objetivo de uma melhor estratégia no seu diagnóstico etiológico e
tratamento, a IC pode ser classificada de várias formas. Essa classificação pode ser de acordo com a
condição clínica, hemodinâmica, funcional ou a etiologia.
1 Duração: IC aguda, quando inferior, e crônica quando superior a 6 meses. Utiliza-se o termo “de
novo” quando do seu aparecimento. Quanto maior a duração, mais completa pode ser a ativação
neuro-hormonal e o remodelamento, com manifestações mais típicas de retenção hídrica.
Inversamente, após um infarto agudo do miocárdio, pode não haver as manifestações crônicas. A
aplicação típica dessa classificação é no raciocínio diagnóstico da miocardite.
5 Classe funcional: correntemente utilizada na prática clínica, a classificação proposta pela New
York Heart Association (NYHA) avalia a limitação de esforço em pacientes com IC. É útil na prática
diária por ser de fácil aplicação e apresentar valor prognóstico (Tabela IV).
6 Estágios: mais recentemente, foi proposto um novo sistema de estadiamento baseado na evolução
e na progressão da IC. Essa forma de categorização reflete o modelo fisiopatológico da IC, que
considera essa síndrome como a via final comum a diferentes doenças cardíacas em indivíduos com
fatores de risco. Essa representação da IC cardíaca com caráter contínuo possui implicações
preventivas, prognósticas e também terapêuticas (Figura 2).
Diretriz: A IC pode ser determinada de acordo com a fração de ejeção (preservada, intermediária e
reduzida), a gravidade dos sintomas (classificação funcional da New York Heart Association −
NYHA) e o tempo e progressão da doença (diferentes estágios).
A classificação funcional de acordo com a NYHA continua sendo a classificação usada para
descrever e classificar a gravidade dos sintomas. Esta classificação se baseia no grau de tolerância
ao exercício e varia desde a ausência de sintomas até a presença de sintomas mesmo em repouso.
Ela permite avaliar o paciente clinicamente, auxilia no manejo terapêutico e tem relação com o
prognóstico. Pacientes em classe funcional da NYHA III a IV apresentam condições clínicas
progressivamente piores, internações hospitalares mais frequentes e maior risco de mortalidade. Por
outro lado, embora pacientes em NYHA II apresentem sintomas mais estáveis e internações menos
frequentes, o processo da doença nem sempre é estável, e estes pacientes podem apresentar morte
súbita sem piora dos sintomas. Tal risco pode ser reduzido pela otimização terapêutica, de modo
que o tratamento clínico deve ser otimizado da mesma forma que em pacientes com sintomas mais
graves.
PROGNÓSTICO
A despeito dos avanços recentes na avaliação e no controle da IC, o surgimento de sintomas ainda
determina prognóstico reservado. Estudos baseados na comunidade indicam que 30 a 40% dos
pacientes morrem 1 ano após o diagnóstico, e 60 a 70%, no prazo de 5 anos, principalmente pela
piora da IC ou por um evento súbito (provavelmente devido a uma arritmia ventricular). Conquanto
seja difícil estabelecer um prognóstico individual, os pacientes com sintomas em repouso (classe IV
da New York Heart Association [NYHA]) apresentam taxa de mortalidade anual de 30 a 70%,
enquanto aqueles com sintomas surgidos durante atividades moderadas (classe II da NYHA) têm
taxa de mortalidade anual de 5 a 10%. Assim, o estado funcional é um preditor importante da
evolução do paciente.
PATOGÊNESE
A Figura abaixo apresenta um modelo conceitual geral para explicar o desenvolvimento e a
evolução da ICFER. A IC é um distúrbio progressivo iniciado quando um evento-índice lesa o
músculo cardíaco, resultando em perda dos miócitos cardíacos funcionantes ou, alternativamente,
em diminuição da capacidade do miocárdio de gerar força, impedindo, assim, que o coração se
contraia normalmente.
- esse evento-índice pode ter instalação súbita, como no caso de IAM;
- início gradual ou insidioso, como nos casos de sobrecarga hemodinâmica de pressão ou de
volume;
FIGURA: Patogênese da insuficiência cardíaca com redução da fração de ejeção. A insuficiência cardíaca se inicia quando
um evento- índice produz o declínio inicial na capacidade de bombear do coração. Após esse declínio inicial na capacidade
de bombeamento, diversos mecanismos compensatórios são ativados, como o sistema nervoso adrenérgico, o sistema
renina-angiotensina-aldosterona e o sistema das citocinas. Em curto prazo, esses sistemas são capazes de restaurar a
função cardiovascular para o limite da homeostase normal, fazendo o paciente se manter assintomático. Entretanto, com o
passar do tempo, a ativação mantida de tais sistemas causa dano secundário no órgão- alvo dentro do ventrículo, com
agravamento do remodelamento ventricular e subsequente descompensação cardíaca.
Mesmo não tendo sido estabelecidas as razões precisas para explicar por que é possível que
pacientes com disfunção de VE se mantenham assintomáticos, uma explicação razoável é o grande
número de mecanismos compensatórios ativados na presença de lesão cardíaca e/ou de disfunção
do VE, permitindo aos pacientes manter e modular a função do VE por meses ou anos. Os
mecanismos compensatórios descritos até o momento incluem
FIGURA: Ativação dos sistemas neuro-hormonais na insuficiência cardíaca (IC). A diminuição do débito cardíaco nos
pacientes com IC produz uma “descarga” dos barorreceptores de alta pressão (círculos) localizados no ventrículo
esquerdo, seio carotídeo e arco aórtico. Essa descarga dos barorreceptores periféricos leva à perda do tônus
parassimpático inibitório para o sistema nervoso central (SNC), resultando em aumento generalizado no tônus simpático
eferente e em liberação não osmótica de arginina-vasopressina (AVP) pela hipófise. A AVP (ou hormônio antidiurético
[ADH]) é um vasoconstritor potente que aumenta a permeabilidade dos ductos coletores renais, levando à reabsorção de
água. Esses sinais aferentes ao SNC também ativam vias eferentes do sistema nervoso simpático que inervam o coração, os
rins, a vasculatura periférica e os músculos esqueléticos.
A estimulação simpática dos rins leva à liberação de renina, produzindo aumento nos níveis
circulantes de angiotensina II e aldosterona. A ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona
promove retenção de água e sal e leva à vasoconstrição da vasculatura periférica, hipertrofia dos
miócitos, morte celular de miócitos e fibrose miocárdica. Embora os mecanismos neuro-hormonais
facilitem a adaptação em curto prazo por meio da manutenção da pressão arterial, esses mesmos
mecanismos neuro-hormonais resultam em alterações nos órgãos-alvo, no coração e na circulação,
bem como em retenção excessiva de água e sal nos casos avançados de IC.
MECANISMOS BÁSICOS DA IC
• Insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida
O remodelamento do VE ocorre em resposta a uma série de eventos complexos nos níveis celular e
molecular. Tais alterações consistem em:
(3) perda progressiva de miócitos em razão de necrose, apoptose e morte celular autofágica;
Os estímulos biológicos para essas alterações profundas são estiramento mecânico dos miócitos,
neuro-hormônios circulantes (p. ex., norepinefrina, angiotensina II), citocinas inflamatórias (p. ex.,
fator de necrose tumoral [TNF, de tumor necrosis factor]), outros peptídeos e fatores de crescimento
(p. ex., endotelina), bem como espécies reativas do oxigênio (p. ex., superóxido). Acredita-se que a
sobre-expressão mantida dessas moléculas biologicamente ativas contribua para a progressão da IC
em razão dos seus efeitos deletérios sobre o coração e a circulação. De fato, essa percepção embasa
o raciocínio clínico que justifica o uso de agentes farmacológicos antagonistas desses sistemas (p.
ex., inibidores da enzima conversora de angiotensina, inibidores do receptor de angiotensina-
neprilisina [IRANs] e β-bloqueadores) no tratamento dos pacientes com IC.
Para compreender como as alterações que ocorrem no miócito cardíaco insuficiente contribuem
para a depressão da função sistólica do VE na IC, é instrutivo revisar primeiro a biologia da célula
muscular cardíaca. A ativação neuro-hormonal mantida e a sobrecarga mecânica resultam em
alterações transcricionais e pós- transcricionais nos genes e nas proteínas que regulam o
acoplamento excitação-contração e a interação das pontes cruzadas.
(2) aumento do estresse oxidativo com ativação resultante das famílias de genes sensíveis à geração
dos radicais livres (p. ex., TNF e interleucina 1β); e
(3) expressão sustentada da ativação por estiramento das vias de sinalização hipertrófica.
Sintomas
Em pacientes com insuficiência cardíaca, os achados de história e exame físico são de grande valor
por fornecerem, além do diagnóstico da síndrome, informações sobre a etiologia e o prognóstico.
Entretanto, as manifestações não são específicas, podendo ser encontradas isoladamente ou em
conjunto em outras doenças e situações, como doença de Parkinson, sequela de acidente vascular
cerebral e etc.
Ainda que a fadiga tradicionalmente seja atribuída ao baixo débito cardíaco da IC, é provável que
anormalidades musculares esqueléticas e outras comorbidades não cardíacas (p. ex., anemia)
contribuam para esse sintoma. Nos primeiros estágios da IC, a dispneia é observada apenas durante
o exercício; entretanto, à medida que a doença evolui, esse sintoma passa a ser provocado por
atividades cada vez menores até, por fim, ocorrer inclusive durante o repouso. A dispneia da IC
provavelmente é multifatorial. O mecanismo mais importante é a congestão pulmonar com acúmulo
de líquido no interstício ou dentro dos alvéolos, o que ativa os receptores J justacapilares,
estimulando a respiração rápida e superficial característica da dispneia cardíaca. Outros fatores
podem contribuir para a dispneia aos esforços, incluindo redução na complacência pulmonar,
aumento da resistência nas vias aéreas, fadiga dos músculos ventilatórios e/ou do diafragma e
anemia. A dispneia pode tornar-se menos frequente com o surgimento de insuficiência ventricular
direita (VD) e de insuficiência tricúspide.
Ortopneia A ortopneia, definida como dispneia que ocorre em posição deitada, em geral é uma
manifestação mais tardia de IC em comparação com a dispneia aos esforços. Ela é causada pela
redistribuição de volume da circulação esplâncnica e dos membros inferiores para a circulação
central quando o paciente permanece deitado, com o consequente aumento da pressão capilar
pulmonar. A tosse noturna é uma manifestação comum desse processo, sendo um sintoma muitas
vezes negligenciado da IC. A ortopneia costuma ser aliviada quando o paciente senta ou quando
dorme recostado sobre muitos travesseiros. Ainda que seja um sintoma relativamente específico da
IC, também pode ocorrer em pacientes com obesidade abdominal ou com ascite e naqueles com
doença pulmonar cuja mecânica favoreça a postura ereta.
Dispneia paroxística noturna (DPN) Essa expressão refere-se a episódios agudos de dispneia e tosse
que costumam ocorrer à noite e despertam o paciente, em geral 1 a 3 horas após deitar. A DPN pode
se manifestar na forma de tosse ou de sibilos, possivelmente em razão de aumento da pressão nas
artérias brônquicas, levando à compressão das vias aéreas junto com edema intersticial pulmonar, o
que produz aumento da resistência nas vias aéreas. Enquanto a ortopneia pode ser aliviada com o
paciente sentado ereto na lateral da cama com as pernas pendentes, nos casos de DPN, a tosse e os
sibilos se mantêm mesmo com os pacientes em posição ereta. A asma cardíaca está relacionada com
a DPN, é caracterizada por sibilos secundários ao broncospasmo e deve ser diferenciada da asma
primária, bem como das causas pulmonares para os sibilos.
Edema agudo de pulmão Caracteriza-se pelo início rápido de dispneia em repouso, taquipneia,
taquicardia e hipoxemia grave. A ausculta pode detectar estertores e sibilos devido a
extravasamento alveolar e compressão das vias aéreas por envolvimento peribrônquico. A liberação
de catecolaminas endógenas costuma causar hipertensão
Exame físico
Um exame físico cuidadoso está sempre indicado na avaliação de pacientes com IC de modo a
determinar a causa da IC, bem como definir a gravidade da síndrome. Os achados incluem
manifestações próprias da doença cardíaca no coração e outras manifestações sistêmicas
secundárias à IC ou à doença de base. Salienta-se o desvio do ictus cordis para baixo e para a
esquerda, a presença de sopros, elevação de pressão venosa jugular (especialmente se for superior a
4 cm do ângulo esternal), edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, refluxo
hepatojugular, estertores pulmonares, derrame pleural, ascite, taquicardia, galope de terceira ou
quarta bulhas, pulso alternante, tempo de enchimento capilar lentificado, taquipnéia e cianose. A
persistência de terceira bulha e de pressão venosa central elevada em pacientes tratados com
insuficiência cardíaca confere pior prognóstico .
Estado geral e sinais vitais Na IC leve a moderada, o paciente não aparenta dor em repouso, exceto
quando estiver deitado em posição supina por alguns minutos. Nos casos mais graves de IC, o
paciente senta-se ereto, pode apresentar dificuldade respiratória e, talvez, impossibilidade de
terminar uma frase por estar ofegante. A pressão arterial sistólica pode estar normal ou elevada na
IC inicial, mas geralmente encontra-se reduzida nos casos avançados com disfunção grave de VE. A
pressão de pulso pode mostrar-se reduzida, refletindo redução do volume de ejeção sistólico. A
taquicardia sinusal é um sinal inespecífico causado por aumento da atividade adrenérgica. A
vasoconstrição periférica, que leva ao esfriamento das extremidades e cianose dos lábios e leitos
ungueais, também é causada por atividade adrenérgica excessiva.
Veias jugulares O exame das veias jugulares permite estimar o valor da pressão atrial direita. A
pressão venosa jugular é mais bem avaliada com o paciente deitado, com a cabeça inclinada a 45°.
A pressão venosa jugular deve ser quantificada em centímetros de água (normal ≤ 8 cm),
estimando-se a altura da coluna de sangue venoso acima do ângulo do esterno e adicionando 5 cm.
Nos estágios iniciais da IC, a pressão venosa pode estar normal em repouso, mas elevar acima do
normal com a pressão manual mantida (por aproximadamente 15 segundos) sobre o abdome
(refluxo abdominojugular positivo). A presença de onda v gigante indica insuficiência tricúspide.
Abdome e membros A hepatomegalia é um sinal importante nos pacientes com IC. Quando
presente, o fígado aumentado costuma ser doloroso, podendo pulsar durante a sístole nos casos em
que haja insuficiência tricúspide. A ascite, um sinal tardio, ocorre como consequência de aumento
da pressão nas veias hepáticas e nas veias que drenam o peritônio. A icterícia, também um achado
tardio, é causada por disfunção hepática secundária à congestão do fígado e à hipoxemia
hepatocelular, estando associada a aumento das bilirrubinas direta e indireta.
O edema periférico é uma das principais manifestações da IC, porém constitui um sinal inespecífico
e em geral está ausente nos pacientes tratados adequadamente com diuréticos. O edema periférico
costuma ser simétrico e postural, ocorrendo predominantemente nos tornozelos e na região pré-
tibial nos pacientes capazes de deambular. Nos pacientes restritos ao leito, o edema pode ser
observado nas regiões sacral (edema pré-sacral) e escrotal. O edema de longa duração pode estar
associado à pele endurecida e pigmentada.
Caquexia cardíaca Nos casos de IC crônica grave, pode haver perda evidente de peso e caquexia.
Embora o mecanismo da caquexia não seja completamente compreendido, é provável que seja
multifatorial. Quando presente, a caquexia implica prognóstico reservado.
DIAGNÓSTICO
Exames laboratoriais de rotina Nos casos de início recente e naqueles com descompensação aguda
de quadro crônico, devem ser realizados hemograma completo, perfil dos eletrólitos, dosagens de
ureia sanguínea, da creatinina sérica e das enzimas hepáticas, bem como análise de urina. Alguns
pacientes devem ser investigados para detecção de diabetes melito (glicemia em jejum ou teste de
tolerância à glicose), dislipidemia (perfil lipídico em jejum) e disfunção tireoidiana (nível do
hormônio estimulante da tireoide [TSH]).
Radiografias de tórax A radiografia do tórax fornece informações úteis acerca das dimensões e da
forma do coração, assim como sobre o estado da vasculatura pulmonar, podendo, ainda, identificar
causas não cardíacas para os sintomas do paciente. Embora os pacientes com IC aguda apresentem
evidências de hipertensão pulmonar, de edema intersticial e/ou de edema pulmonar, a maior parte
dos pacientes com IC crônica não apresenta quaisquer desses sinais radiográficos. A ausência de tais
achados nos pacientes com IC crônica reflete o aumento da capacidade dos linfáticos de remover o
líquido intersticial e/ou o pulmonar.
Avaliação da função do VE A imagem cardíaca não invasiva é essencial para diagnóstico, avaliação e
condução dos casos de IC. O exame mais útil é o ecocardiograma bidimensional (2D) com Doppler,
capaz de fornecer uma avaliação semiquantitativa das dimensões e função do VE, assim como sobre
a presença ou ausência de anormalidades valvares e/ou na mobilidade da parede (indicativas de
IAM prévio). A presença de dilatação atrial esquerda e hipertrofia de VE, junto com alterações no
enchimento diastólico do VE identificadas por ondas de pulso e Doppler tecidual, são úteis para
avaliar os casos de ICFEP. O ecocardiograma 2D com Doppler também é inestimável na investigação
das dimensões do VD e das pressões pulmonares, parâmetros fundamentais à avaliação e ao
tratamento do cor pulmonale (ver adiante). A imagem por ressonância magnética (RM) também
fornece uma análise abrangente da anatomia e da função cardíacas, sendo atualmente considerado
o padrão-ouro para a avaliação da massa e do volume do VE. A RM também vem se tornando uma
modalidade de imagem útil e precisa para a avaliação de pacientes com IC, tanto em termos de
investigação da estrutura do VE quanto para a determinação das causas da IC (p. ex., amiloidose,
miocardiopatia isquêmica, hemocromatose).
O indicador mais utilizado da função de VE é a FE (volume de ejeção sistólico dividido pelo volume
diastólico final). Como a FE é fácil de medir com exames não invasivos e fácil de conceituar, ela se
tornou muito popular na clínica diária. Infelizmente, a FE apresenta uma série de limitações para
ser considerada um indicador confiável para avaliar a contratilidade, uma vez que é influenciada
por alterações na pós-carga e/ou na pré-carga. De qualquer forma, com as exceções indicadas
anteriormente, quando a FE é normal (≥ 50%), a função sistólica em geral está preservada, e,
quando a FE está significativamente reduzida (< 30 a 40%), a contratilidade está reduzida. A
imagem da velocidade de esforço miocárdico usando o rastreamento de pontos mostrou acrescentar
valor incremental às medidas regulares da FEVE e ter valor prognóstico.
Biomarcadores Os níveis circulantes dos peptídeos natriuréticos são ferramentas adjuntas úteis e
importantes no diagnóstico dos pacientes com IC. Tanto o peptídeo natriurético do tipo B (BNP)
como o fragmento N-terminal do precursor do peptídeo natriurético cerebral (NT-pro-BNP),
liberados do coração insuficiente, são marcadores relativamente sensíveis para a presença de IC
com redução da FE; ainda que em menor grau, também se encontram elevados nos pacientes que
têm ICFER (insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida). Nos pacientes ambulatoriais com
dispneia, a dosagem de BNP e de NT-pro-BNP é útil para corroborar a decisão clínica acerca do
diagnóstico de IC, especialmente em quadro de incerteza clínica. Além disso, a dosagem de BNP ou
de NT-pro-BNP é útil para definir o prognóstico ou a gravidade da doença em caso de IC crônica e
pode ser útil para chegar na dose ideal da terapia medicamentosa em pacientes euvolêmicos
clinicamente selecionados. No entanto, é importante ressaltar que os níveis dos peptídeos
natriuréticos aumentam com a idade e com a disfunção renal, são mais elevados nas mulheres e
podem estar aumentados em IC de qualquer etiologia. Os níveis de BNP podem aumentar em
pacientes em uso de IRANs. Os níveis podem estar falsamente baixos em pacientes obesos. Outros
biomarcadores mais recentes, como ST-2 solúvel e galectina-3, podem ser usados para definir o
prognóstico de pacientes com IC.
Testes de esforço Testes feitos em esteira ou bicicleta ergométrica não são recomendados
rotineiramente aos pacientes com IC, mas podem ser úteis na avaliação da necessidade de
transplante cardíaco em pacientes com IC avançada. Níveis de consumo máximo de oxigênio (VO2)
< 14 mL/kg/min estão associados a um prognóstico relativamente reservado. Os pacientes com VO2
< 14 mL/kg/min têm apresentado melhor sobrevida quando submetidos a transplante do que
quando tratados clinicamente.
Além disso, ainda são utilizados 2 critérios diagnósticos de IC: de Framingham e Boston (CM USP).
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
A IC deve ser distinguida de (1) condições nas quais se observa congestão circulatória secundária à
retenção anormal de água e sais, mas sem distúrbios na estrutura ou função cardíacas (p. ex.,
insuficiência renal), e (2) causas não cardíacas de edema pulmonar (p. ex., síndrome da angústia
respiratória aguda). Na maioria dos pacientes que se apresentam com os sinais e sintomas clássicos
de IC, o diagnóstico é relativamente claro. Entretanto, mesmo clínicos experientes podem ter
dificuldade de diferenciar as dispneias de origem cardíaca das de origem pulmonar. Nesse sentido,
exames não invasivos de imagem cardíaca, biomarcadores, testes para a avaliação da função
pulmonar e radiografia de tórax podem ser úteis. Em tal cenário, níveis muito baixos de BNP ou de
NT-pro-BNP podem ser úteis para excluir uma causa cardíaca para a dispneia. O edema de tornozelo
pode surgir secundário à insuficiência venosa, obesidade, doença renal ou efeitos da gravidade.
Quando a IC se desenvolve em pacientes com FE preservada, pode ser difícil determinar o papel
relativo da IC na gênese da dispneia que esteja ocorrendo em pacientes com doença pulmonar
crônica e/ou obesidade.
TRATAMENTO
O primeiro modelo a descrever os fenômenos existentes na IC tomava por base a existência de re-
tenção hidrossalina secundária à hipoperfusão renal (modelo cardiorrenal), sendo a terapêutica
baseada na administração de diuréticos e restrição hídrica. Em um segundo momento, observou-se
que havia, asso- ciada à diminuição do débito cardíaco, a elevação da pré e pós-carga (refletida pelo
aumento do retorno venoso e da resistência vascular periférica, respectiva- mente), o que motivou a
utilização de vasodilatadores e inotrópicos (modelo hemodinâmico). Entretanto, ambas as
estratégias pouco acrescentaram para evitar a progressão da IC, tendo papel na IC descompensa-
da. Nas últimas décadas, houve uma revolução no entendimento da síndrome, sendo observado o
papel fundamental da ativação neuro-hormonal na sua progressão, permitindo o desenvolvimento
de terapêutica medicamentosa mais eficiente a longo prazo com efeitos sobre a mortalidade
(modelo neuro-hormonal). O tratamento da IC sistólica é o que apresenta maior evidência na
literatura.
Por se tratar de doença crônica de alta prevalência, com repercussão intensa sobre a qualidade de
vida, alta morbidade, mortalidade e custo elevado para os sistemas de saúde (principalmente pelas
freqüentes hospitalizações por descompensação), o tratamento da insuficiência cardíaca deve ser
intensivo e incluir informações detalhadas ao paciente sobre a necessidade da adesão à terapêutica
com a modificação do estilo de vida e uso correto das medicações.
Tratamento não-farmacológico
Dieta: para pacientes com insuficiência cardíaca, re- comenda-se restrição hídrica e salina,
dependendo do sódio plasmático. Em relação ao sal, não existe definição do grau de restrição, que
está intimamente relacionado ao grau de descompensação (dieta de aproximadamente 3 a 4 g/dia
de cloreto de sódio para pacientes com insuficiência cardíaca leve a moderada e 2 g para IC grave);
também é variável o grau de restrição hídrica, orientando-se o paciente na prática clínica conforme
a gravidade da IC (600 a 1.000 mL/dia para pacientes mais graves). Uma vez que o álcool deprime
a contratilidade miocárdica, sua utilização deve ser evitada .
Vacinação: nos pacientes com insuficiência cardíaca, recomenda-se a profilaxia contra influenza
(anualmente) e pneumococo (reforço após os 65 anos) .
Clínicas de IC: grande parte das causas de descompensação de pacientes com IC são passíveis de
prevenção. As clínicas de IC são unidades especializadas no seu tratamento e constituídas por
cardiologista, enfermeiro especializado em IC, equipe multidisplinar (nutrição, psicologia, fisiologia
do exercício, psicologia e assistência social). Têm por objetivo o seguimento intensivo do paciente
mediante orientação continuada sobre a própria doença e a importância do tratamento, além de
permitir contato facilitado do paciente com os integrantes da equipe, valorizando os primeiros
sintomas de descompensação. Estudos têm demonstrado melhora pronunciada da adesão ao
tratamento, melhora da qualidade de vida e diminuição no número de internações e, possivelmente,
redução de mortalidade com essa forma de seguimento . O estudo prospectivo randomizado de
monitoração – REMADHE – utilizando educação repetida e monitoração em nosso meio reduziu
internações ou óbitos com aumento da qualidade de vida e adesão .
Nas duas últimas décadas, ocorreu uma revolução no tratamento da insuficiência cardíaca crônica
sistólica com o surgimento de drogas com atuação sobre os eixos neuro-hormonais, incluindo os
inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA), betabloqueadores (BB), bloqueadores dos
receptores AT-I da angiotensina II (BRA) e antagonistas dos receptores da aldosterona, que
promoveram considerável redução da morbidade e mortalidade da insuficiência cardíaca.
b) Tiazídicos: inibem o transporte de sódio e cloro para o intracelular no túbulo contornado distal.
Demonstram potência inferior, início de ação mais tardio e meia-vida mais prolongada quando
comparados aos diuréticos de alça. Não devem ser utilizados nas situações de descompensação
aguda. Apresentam efeito reduzido nos pacientes com taxa de filtração glomerular diminuída. Em
pacientes com insuficiência cardíaca avançada, uso de altas doses de diurético de alça e baixa
resposta diurética, a associação de um tiazídico mostra- se geralmente efetiva. Os efeitos colaterais
dos tiazídicos são principalmente eletrolíticos (hipocalemia, hipomagnesemia, hipercalcemia) e
metabólicos (hiperuricemia, hipertrigliceridemia, hiperglicemia e hipercolesterolemia), sendo estes
reduzidos com a utilização de doses mais baixas.
c) Poupadores de potássio: a amilorida e o triantereno inibem diretamente a secreção de potássio
no túbulo distal; já a espironolactona é um antagonista da aldosterona. Apresentam baixo poder
diurético, início de ação tardio e duração de ação mais prolongada. São geralmente utilizados em
associação com outros diuréticos. O efeito colateral mais freqüente é a hipercalemia, principalmente
em pacientes com alteração da função renal e na associação com IECA e/ou BRA. A ginecomastia é
relativamente freqüente com a espironolactona.
Betabloqueadores (Tabela IX): seus efeitos benéficos em pacientes com IC confirmam a hipótese da
influência adrenérgica na progressão da insuficiência cardíaca. O tratamento com betabloqueadores
resulta em melhora da função ventricular e dos sintomas, redução das hospitalizações, revertendo o
remodelamento miocárdico e diminuindo a mortalidade . Os betabloqueadores constituem uma
classe heterogênea de medicamentos por causa das inúmeras particularidades (seletividade do
bloqueio – relação beta-1/2, atuação sobre os receptores alfa-1, atividade simpaticomimética
intrínseca – ASI, farmacocinética, farmacodinâmica, efeitos pleotrópicos, possíveis efeitos diferentes
em raças distintas) e, por esse motivo, não se pode considerar que exista um efeito de classe. O
estudo BEST, que utilizou o bucindolol (agente não-seletivo, com discreto efeito alfa-1 bloqueador,
sem ASI), foi suspenso precoce- mente por ausência de benefício, revelando ainda aumento de
mortalidade no subgrupo de negros, ratificando a hipótese da heterogeneidade dos
betabloqueadores para o tratamento da IC. Existem 4 betabloqueadores disponíveis para o
tratamento da IC com efetividade comprovada: succinato de metoprolol, bisoprolol, carvedilol e
nebivolol.
a) Succinato de metoprolol: apresenta seletividade para o bloqueio do receptor beta-1, sem ASI. O
succinato de metoprolol apresenta liberação prolongada com posologia de uma tomada diária e
dose alvo de 200 mg/dia. Seu benefício na IC ficou estabelecido no estudo MERIT-HF . Pela
seletividade beta-1 e ausência de efeito alfabloqueador, o metoprolol pode ser interessante nos
pacientes com antecedente de broncoespasmo e níveis pressóricos mais reduzidos.
b) Bisoprolol: também apresenta alta seletividade para o bloqueio do receptor beta-1, sem ASI; sua
dose alvo é de 10 mg, podendo ser utilizado 1 vez/dia. Benefício na IC estabelecido no estudo
CIBISII .
Bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRA): são drogas com perfil terapêutico muito
semelhante aos IECA. Seu mecanismo de ação está relacionado ao antagonismo dos receptores AT1
da angiotensina II, sem atividade sobre a produção de bradicinina. Apesar de menor número de
trabalhos em relação aos IECA, os BRA demonstram resultados semelhantes para a redução de
morbidade e mortalidade na insuficiência cardíaca, sendo opção interessante para os pacientes que
não toleram IECA (principalmente devido à tosse). À semelhança dos IECA, o benefício está na
utilização das maiores doses (Tabela XI). Apresentam efeitos colaterais semelhantes aos IECA de
piora da função renal e hipercalemia; também são contra-indicados na gestação. Em pacientes que
já recebem IECA e betabloqueador, a associação de
candesartam (estudo CHARM) foi capaz de melhorar
sintomas e reduzir internações, sem efeito sobre a
mortalidade. Metanálise (incluindo os estudos Val-Heft e
CHARM) demonstrou que, em pacientes que não podem
receber betabloqueador, a associação é segura e eficaz
(redução de hospitalizações), entretanto, não houve
benefício da associação nos pacientes em uso de betabloqueador.
Dispositivos de assistência ventricular: estão indicados como ponte para transplante (em
pacientes em que o suporte medicamentoso, incluindo drogas vasoativas, não é suficiente para
manutenção do estado circulatório), ponte para recuperação do miocárdio (p. ex., miocardites,
periparto) ou terapia de destino (insuficiência cardíaca terminal sem perspectiva de outro
tratamento). Os dispositivos incluem o balão intra-aórtico (BIA) e os ventrículos artificiais. As
contra-indicações ao BIA são insuficiência valvar aórtica, dissecção aórtica e ausência de perspectiva
de outro tratamento definitivo (transplante ou ventrículo artificial). Os ventrículos artificiais podem
ser implantados por mais tempo quando comparados ao BIA e suas complicações estão relacionadas
principalmente a fenômenos trom- bo-hemorrágicos e infecção.
Transplante cardíaco: é a única forma de trata- mento cirúrgico capaz de aumentar a sobrevida de
pacientes com insuficiência cardíaca avançada ou choque cardiogênico, sendo a sobrevida média de
pacientes submetidos a transplante cardíaco superior a 9 anos. Suas indicações incluem: CF III e IV
refratárias, com tratamento medicamentoso otimizado, VO2 < 10 mL/kg/min, na ausência de
contra-indicações (hipertensão pulmonar, idade acima de 65 anos, insuficiência renal, diabetes com
lesão de órgão-alvo, entre outras). Suas limitações estão relacionadas principalmente à falta de
doadores. Após o transplante, as complicações mais freqüentes são rejeição aguda, infecção, doença
vascular do enxerto e neoplasias.
Tratamento da IC crônica com fração de ejeção preservada
Tratamento da IC descompensada
As descompensações da IC são muito freqüentes, sendo responsáveis pela maior parte dos recursos
gastos com IC. Na abordagem do paciente que chega à unida- de de emergência com
descompensação, alguns aspectos importantes incluem as causas de descompensação, função
ventricular e forma de apresentação.
A diferenciação entre disfunção sistólica e diastólica pode ser difícil inicialmente, entretanto, sua
busca mediante exames complementares é essencial, uma vez que também pode implicar
abordagens terapêuticas distintas (é pouco provável a necessidade de inotrópico na disfunção
diastólica).
Vasodilatadores: têm atuação sobre a pré e a pós- carga do coração, exigindo menor consumo
metabólico miocárdico que os inotrópicos, o que acarreta situação fisiopatológica mais favorável. Os
principais agentes são:
INTRODUÇÃO
Nas últimas duas décadas, a Fibrilação Atrial (FA) tornou-se um importante problema de saúde
pública, com grande consumo de recursos em saúde. Apresenta importante repercussão na
qualidade de vida, em especial devido a suas consequências clínicas, fenômenos tromboembólicos e
alterações cognitivas. Nos Estados Unidos, estima-se que sua prevalência será de 15,9 milhões em
2050, com metade desses pacientes apresentando idade superior a 80 anos.
Dessa forma, é crucial uma visão epidemiológica e social clara do impacto dessa arritmia, com o
objetivo de uso adequado de recursos em saúde e planejamento estratégico de políticas em saúde. A
FA é a arritmia sustentada mais frequente na prática clínica, e sua prevalência na população geral
foi estimada entre 0,5 e 1%. Estudos mais recentes, entretanto, demonstram que a prevalência é
quase o dobro da observada na década passada, variando de 1,9%, na Itália, a 2,9%, na Suécia.
Além do envelhecimento populacional, outros potenciais fatores podem ser levantados para explicar
o incremento na prevalência de FA. Um deles é a maior habilidade de tratamento de doenças
cardíacas crônicas, contribuindo para um número maior de indivíduos suscetíveis a FA. A melhoria
nos recursos de investigação, com o uso de ferramentas para monitorização prolongada na prática
clínica, também pode ser levantada como um fator contribuinte ao aumento da prevalência, uma
vez que pacientes portadores de FA sintomática podem ter a sua arritmia documentada. A
prevalência também sofre influência do sexo. A razão homem-mulher observada na FA é de
aproximadamente 1.2:1. Apesar da maior predisposição no sexo masculino, as mulheres
representam maior massa de pacientes com FA, devido à sua maior sobrevida. Além disso, é
conhecida a maior susceptibilidade a fenômenos tromboembólicos e a mortalidade observada no
sexo feminino.
DEFINIÇÃO
A atividade elétrica de um ritmo cardíaco normal (ritmo sinusal) “surge” no Nódulo Sinusal (NSA),
um condensado de células especializadas localizado próximo ao óstio da cava superior. Estas células
possuem a importante propriedade do “automatismo”, ou seja, a capacidade de se despolarizar
espontaneamente com uma determinada “frequência de disparos”.
O estímulo elétrico proveniente do nódulo sinusal se propaga para o miocárdio atrial ao mesmo
tempo em que, através de feixes internodais, alcança o Nódulo Atrioventricular (AV), próximo ao
anel tricúspide, na parte baixa do septo interatrial.
A ativação elétrica do miocárdio ventricular inscreve-se no ECG como o complexo QRS. Por serem
altamente especializadas, a condução pelas fibras de Purkinje é muito rápida, determinando um
QRS “estreito”. Nesse momento, todo o miocárdio ventricular está despolarizado, refratário a novos
estímulos. O período refratário termina quando os miócitos se repolarizam, evento marcado pela
onda T. O intervalo desde o início do QRS até o final da onda T (intervalo QT) corresponde ao
Período Refratário Efetivo (PRE) dos miócitos ventriculares.
A Frequência Cardíaca (FC) pode ser determinada no ECG medindo-se a distância entre os
complexos QRS. Dividimos 1.500 por esta distância, em milímetros; ou usamos uma “regra prática”,
considerando a distância em centímetros: 0,5 cm (FC = 300 bpm); 1 cm (FC = 150 bpm); 1,5 cm
(FC = 100 bpm); 2 cm (FC = 75 bpm); 2,5 cm (FC = 60 bpm); 3 cm (FC = 50 bpm).
Fique ligado:
Dentre eles, destacam-se a presença de Apneia Obstrutiva do Sono (AOS), obesidade,uso de bebidas
alcoólicas, exercício físico, história familiar e fatores genéticos,mas, na prática clínica, a influência
da obesidade e da AOS parece impactar significativamente na abordagem terapêutica dos pacientes
portadores de FA. A AOS é caracterizada pela obstrução, completa ou parcial, recorrente das vias
aérea superiores durante o sono, resultando em períodos de apneia, dessaturação de
oxiemoglobina, e em despertares noturnos frequentes. Os mecanismos relacionados a anormalidade
do sono e o dano cardiovascular possivelmente são inúmeros. No entanto, três fatores principais
merecem destaque: hipóxia intermitente, despertares frequentes e alterações na pressão
intratorácica. Essas alterações acabam por desencadear hiperatividade do sistema nervoso
simpático, disfunção endotelial e inflamação,culminando com o aparecimento de várias
comorbidades cardiovasculares − dentre elas, a FA.
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA
A classificação mais utilizada na prática clínica refere-se a forma de apresentação da FA. Define-se
“fibrilação atrial paroxística” aquela que é revertida espontaneamente ou com intervenção médica
em até 7 dias de seu início. Episódios com duração superior a 7 dias têm o nome de “fibrilação
atrial persistente”. Alguns estudos utilizam a terminologia de “fibrilação atrial persistente de
longa duração” para designar os casos com duração superior a 1 ano. Finalmente, o termo
“fibrilação atrial permanente” é utilizado nos casos em que as tentativas de reversão ao ritmo
sinusal não serão mais instituídas. “Fibrilação atrial não valvar” é definida por FA na ausência de
estenose mitral reumática, válvula mecânica ou biológica ou plastia mitral prévia.
MECANISMO ELETROFISIOLÓGICO
Quando os miócitos atriais estão “doentes”, importantes alterações de suas propriedades
eletrofisiológicas podem ocorrer, predispondo à formação de “novos caminhos” elétricos através do
miocárdio atrial. Nessas condições, um estímulo proveniente de uma extrassístole atrial pode se
fragmentar, fazendo surgir múltiplos pequenos circuitos de reentrada (movimentos circulares). Estes
circuitos aparecem e desaparecem em momentos diferentes e em diversas partes do miocárdio
atrial, que por isso perde a sua contração rítmica. Visualmente o átrio apresenta movimentos
fibrilatórios anárquicos, cerca de 400-600 por minuto (frequência das ondas f). Mesmo quando a FA
começa em um dos átrios, acaba passando para o outro através de fibras interatriais acompanhando
o seio coronariano venoso.
Se todos os estímulos elétricos atriais passassem para os ventrículos, a frequência cardíaca seria
400-600 bpm, degenerando-se para uma fibrilação ventricular. Felizmente existe o nódulo AV, que
“filtra” boa parte dos estímulos atriais, “deixando passar” geralmente entre 90-170 por minuto.
EPIDEMIOLOGIA E ETIOLOGIA
Trata-se da taquiarritmia crônica mais comum, com uma prevalência de 1-2% na população,
aumentando progressivamente com a idade, atingindo 3-9% dos idosos (> 65 anos). É
discretamente mais prevalente nos homens.
PRINCIPAIS CAUSAS
Em nosso meio,dois grupos de cardiopatia predominam como causa de FA: (1) hipertensiva e (2)
reumática.
- Dupla lesão mitral + insuficiência tricúspide = 70%; - Dupla lesão mitral = 52%;
- Estenose mitral pura = 29%;
- Insuficiência mitral pura = 17%;
- Estenose aórtica (sem disfunção de VE) = 1%.
O infarto agudo do miocárdio pode cursar com FA em 6-10% dos casos. Presumivelmente, a
isquemia atrial e o estiramento atrial, decorrentes da disfunção de VE, são os fatores patogênicos. A
doença coronariana crônica sem disfunção de VE, infarto ou hipertensão arterial não é
propriamente uma causa de FA.
A cardiomiopatia dilatada (qualquer causa) cursa com FA em 15-20% dos casos, enquanto a
cardiomiopatia hipertrófica, em 10-30%. Outras cardiopatias associadas à FA são a Comunicação
Interatrial (CIA) e a anomalia de Ebstein. O hipertireoidismo é encontrado como causa de 5-6% dos
casos de FA de início recente.
O hipertireoideo com mais de 30 anos tem uma chance de 20% de desenvolver FA. O mecanismo
parece ser o aumento do tônus adrenérgico sobre o miocárdio atrial.
Outras Causas:
Pacientes com miocardite, pericardite, embolia pulmonar, DPOC descompensada e apneia obstrutiva
do sono também têm incidência aumentada de fibrilação atrial. A libação alcoólica pode levar a
surtos autolimitados de FA paroxística em pacientes com corações normais (“Holiday Heart
Syndrome”), bem como o uso de anfetamínicos, cocaína ou L-tiroxina (em fórmulas para
emagrecer). Outras drogas que podem causar FA são a teofilina e o digital (intoxicação digitálica).
Os distúrbios eletrolíticos (hipocalemia, hipomagnesemia) e gasométricos (acidose, hipoxemia)
podem precipitar FA, principalmente nos pacientes com cardiopatia estrutural prévia.
A doença do nódulo sinusal, uma doença degenerativa da terceira idade, pode se apresentar com
episódios de FA, seguidos de pausa sinusal (Síndrome Bradi-Taqui). O mesmo processo patológico
que degenera o tecido sinusal também pode comprometer o miocárdio atrial, propiciando
taquiarritmias (FA, flutter, taquicardia atrial).
A fibrilação atrial se associa muito ao flutter atrial, já que são duas arritmias que compartilham das
mesmas causas e fatores precipitantes. Uma pode se converter na outra, eventualmente no mesmo
traçado do ECG (“fibrilo-flutter”). Cerca de 20% dos pacientes com Taquicardia Supraventricular
Paroxística (TSVP) e 20-35% daqueles com a síndrome de Wolff-Parkinson- -White desenvolvem FA
(adiante).
QUADRO CLÍNICO
A fibrilação atrial, ao mesmo tempo em que é um marcador de gravidade na cardiopatia, pode
contribuir para a piora hemodinâmica, precipitando sintomas do tipo palpitações, dispneia,
desconforto torácico, tonteira, sudorese fria, urgência urinária. Uma parcela significativa de
casos, entretanto, revela-se assintomática. A arritmia acaba sendo suspeitada apenas pelo exame
físico e confirmada pelo ECG.
Obs.: Os pacientes que mais se prejudicam com a instalação da FA são aqueles com estenose mitral,
estenose aórtica, cardiomiopatia hipertrófica e portadores de insuficiência cardíaca – neles, a FA
pode precipitar até um edema agudo de pulmão e/ou hipotensão arterial grave. Nos coronariopatas,
a FA pode causar angina instável.
O exame físico do paciente é marcado por um ritmo cardíaco irregularmente irregular e perda
da onda A no pulso venoso. Só para lembrar: quem tem FA não pode ter B4, já que esta bulha
acessória depende da contração atrial. Eventualmente, na FA, a frequência cardíaca contada no
precórdio é maior do que a contada pelo pulso radial (dissociação pulso-precórdio). A explicação
para este último achado é a seguinte: como o tempo de enchimento diastólico é variável e às vezes
muito curto, o ventrículo pode “bater” ainda vazio, sem produzir débito sistólico perceptível. Isso
faz com que o batimento percebido no precórdio não se acompanhe de uma onda de pulso
periférico.
TROMBOEMBOLISMO
Uma das principais preocupações em pacientes com FA. Como os átrios perdem sua contração
rítmica, o sangue sofre estase no interior dessas câmaras, predispondo à formação de trombos
murais (aderidos à parede atrial). O local preferido para a formação desses trombos é o apêndice
atrial esquerdo (antiga “auriculeta”). Um fragmento do trombo (ou ele inteiro) pode se deslocar e
caminhar pela circulação, até ocluir um vaso arterial. O SNC é o local mais frequentemente
acometido, determinando o AVE isquêmico embólico. Outros eventos tromboembólicos também
podem ocorrer, tais como o infarto enteromesentérico (abdome agudo) e a isquemia aguda do
membro inferior por embolia femoral.
A fibrilação atrial é a causa mais comum de AVE isquêmico cardioembólico que, por sua vez, é o
tipo responsável por 1/3 de todos os AVEs. Pacientes com fibrilação atrial têm uma chance bem
maior de evoluir com eventos tromboembólicos, quantificada em torno de 5% ao ano e 28%
durante toda a vida. Estudos de autópsia demonstraram que microêmbolos no SNC são encontrados
em 40-70% dos casos – muitos deles certamente passaram clinicamente despercebidos. O AVE
isquêmico pode ser a primeira manifestação de uma fibrilação atrial. Às vezes, o paciente sequer
havia procurado o médico antes do AVE, pois sua FA era assintomática.
INFLUÊNCIA NA MORTALIDADE
A fibrilação atrial é um fator de risco independente para morte em indivíduos acima de 60 anos e
em pacientes cardiopatas. A presença da arritmia praticamente dobra o risco. Em pacientes com
IAM, foi comprovado que a ocorrência de FA triplica a mortalidade, pelo menos no primeiro ano de
acompanhamento, provavelmente pelo fato de a FA ocorrer em pacientes com maior disfunção de
VE. O prognóstico do AVE isquêmico é pior na presença da FA: a mortalidade em 30 dias é de 25%
versus 14% no AVE isquêmico sem FA. Além disso, a sequela neurológica é mais grave, já que o
infarto cerebral costuma ser maior com o AVE cardioembólico.
TIPOS CLÍNICOS
Classificamos três tipos de FA:
TRATAMENTO
(1) FA “recém-diagnosticada” (paciente “instável” ou “estável”)
(2) FA “refratária”.
Paciente Instável:
Em arritmologia, o termo “instabilidade” significa choque circulatório, congestão pulmonar e/ou
isquemia miocárdica. Se a FA se apresentar com algum critério de “instabilidade”, a conduta é a
cardioversão elétrica imediata! A cardioversão elétrica é a maneira mais rápida de se restaurar o
ritmo sinusal em qualquer taquiarritmia.
Como o paciente “instável” tem risco iminente de óbito, é preciso “estabilizá-lo” (revertendo a
arritmia) o quanto antes... Para o procedimento de cardioversão elétrica temos que prover sedação e
analgesia.
Diversos esquemas podem ser empregados, sendo o mais comum a combinação de drogas com
meia- vida curta, como propofol ou midazolam (sedativos- -hipnóticos) + fentanil (analgésico). O
paciente deve estar com suporte de O2, além de acesso venoso periférico e monitorização contínua
do eletrocardiograma e dos sinais vitais (OVM = Oxigênio, Veia e Monitor), ficando o material de
reanimação prontamente disponível. O choque inicial com o desfibrilador monofásico deve ter carga
entre 100-200 J, e deve ser sincronizado com a onda R do complexo QRS. Se o ritmo sinusal não for
reestabelecido, pode-se repetir o choque com uma carga maior, de 360 J. Se ainda assim a
cardioversão não for bem- -sucedida, pode-se ministrar o antiarrítmico ibutilida (1 mg IV em
10min) seguido de nova tentativa de cardioversão. Com os modernos desfibriladores bifásicos, a
carga do choque sincronizado deve variar entre 120-200 J. Na FA “instável” a conduta é a
cardioversão elétrica imediata, sem anticoagulação prévia.
Paciente Estável
Na ausência de critérios de instabilidade não há urgência em restaurar o ritmo sinusal, logo, NÃO é
preciso realizar uma cardioversão elétrica imediata.
Nesta situação – que, diga-se de passagem, é a forma mais comum de apresentação da FA – dá
tempo para avaliarmos cada caso individualmente, a fim de selecionar a melhor estratégia.
Existem duas opções:
(1) “controle do ritmo”, onde se tenta a cardioversão ELETIVA;
(2) “controle da resposta ventricular”, onde deixamos o paciente em ritmo de FA e utilizamos
drogas inibidoras do nódulo AV, com o intuito de diminuir a frequência cardíaca.
Seja como for, o PRIMEIRO PASSO perante uma FA “estável” (até quando se planeja a cardioversão
eletiva) consiste no controle da frequência cardíaca, o que é conseguido, como já dissemos, com
drogas inibidoras do nódulo AV. A diminuição da FC pode melhorar os sintomas da arritmia (ex.:
palpitações, fadiga), e mesmo no paciente assintomático ela evita o surgimento de
taquicardiomiopatia. A meta é uma FC < 110 bpm em repouso.
Três grupos de inibidores do nódulo AV podem ser utilizados: (1) betabloqueadores; (2)
antagonistas de canais de cálcio não diidropiridínicos; e (3) digitálicos.
Os betabloqueadores são preferidos nos pacientes coronariopatas e hipertireoideos.
Os antagonistas do cálcio são preferidos nos pacientes com pneumopatia obstrutiva crônica e nos
asmáticos.
A digoxina pode ser associada na insuficiência cardíaca grave.
O diltiazem pode ser usado com cuidado nos casos de ICC leve a moderada, mas o verapamil não.
Se o controle da frequência cardíaca não for possível com apenas uma droga, podem-se associar
dois medicamentos de classes diferentes.
Associações bastante utilizadas são:
(1) digoxina + betabloqueador; (2) digoxina + diltiazem.
Obs.: Quando o paciente é portador de estenose mitral moderada a grave (ou prótese valvar), ele
automaticamente é considerado de “Alto Risco Cardioembólico” na vigência de FA, devendo,
portanto, ser antigoagulado. Isso é o que se chama de FA “valvar” e neste caso não é preciso calcular
nenhum escore. A estratificação formal do risco cardioembólico pelo CHA2 DS2 -VASC é indicada
apenas para portadores de FA “não valvar”.
Outro conceito importantíssimo: se o risco cardioembólico for alto (FA “valvar”, CHA2 DS2 -VASC ≥
2), a anticoagulação está indicada PARA O RESTO DA VIDA DO PACIENTE, mesmo que ele retorne
ao ritmo sinusal!
Já foi demonstrado que é frequente a ocorrência de episódios autolimitados de FA, de duração
variável, em todo paciente que possui história prévia dessa arritmia. Na vigência de “alto risco
cardioembólico” a chance de formação de trombos durante esses episódios é significativa! Assim, o
paciente pode “entrar e sair” do ritmo de FA de forma totalmente assintomática, fazendo um
acidente cardioembólico a qualquer momento. A literatura confirma que, em pacientes com história
de FA e alto risco cardioembólico, a não anticoagulação aumenta a chance de AVE em longo prazo,
ao passo que a anticoagulação a diminui. No paciente sem fatores de risco cardioembólico a
anticoagulação permanente não é necessária, pois, mesmo que ele “entre e saia” do ritmo de FA, o
risco de AVE não é suficientemente alto para suplantar os riscos da anticoagulação.
Recomenda-se que o risco de acidente hemorrágico induzido por anticoagulantes também seja
levado em conta na decisão de prescrever ou não esses medicamentos. O escore HAS-BLED nos
auxilia nesse sentido (Tabela 3). Na prática ele tem sido aplicado a todos os anticoagulantes, apesar
de validado somente em relação ao uso de warfarina. Uma pontuação > 3 indica elevado risco de
sangramento. Contudo, NÃO se contraindica a anticoagulação só por causa disso. Na realidade, na
presença de “alto risco”, o que se deve fazer é avaliar individualmente a viabilidade da
anticoagulação, isto é, verificar se é possível modificar fatores ou comportamentos de risco, bem
como se existem condições psicossociais para uma correta adesão ao tratamento.
O último guideline europeu de FA, por exemplo, já coloca os novos anticoagulantes orais como
drogas de primeira escolha, deixando a tradicional warfarina em segundo lugar.
Pacientes que usam warfarina há muito tempo e mantêm anticoagulação satisfatória, com INR
dentro da faixa terapêutica e poucos efeitos colaterais, NÃO DEVEM trocar este medicamento pelos
novos anticoagulantes! Por outro lado, se a anticoagulação com warfarina for difícil e problemática
(INR lábil, paraefeitos significativos e recorrentes), a troca por um dos novos anticoagulantes é
recomendada. Esta é feita da seguinte forma: suspende-se a warfarina e, quando o INR cair abaixo
de 2, o novo anticoagulante oral poderá ser introduzido.
Obs.: Na FA “estável” não é preciso realizar uma cardioversão elétrica imediata. O paciente deve ter
a frequência cardíaca controlada com inibidores do nódulo AV, e deve pesquisar fatores
desencadeantes potencialmente reversíveis. Após analisar cada caso individualmente, decidiremos
entre:
O risco cardioembólico sempre deve ser avaliado, e quando alto indica anticoagulação definitiva,
independente da estratégia selecionada para tratar a arritmia.
Dois grandes estudos (AFFIRM e RACE) compararam prospectivamente essas condutas, e seus
resultados foram semelhantes:
(1) a estratégia de “controle da frequência cardíaca” NÃO se associa a um maior número de AVE ou
óbito, desde que o paciente receba anticoagulação conforme o risco cardioembólico;
(2) a estratégia de “controle do ritmo” não aumenta a tolerância ao exercício nem melhora a
qualidade de vida do paciente;
(3) é mais fácil controlar a frequência do que o ritmo (mesmo que a cardioversão seja bem-sucedida
e o paciente utilize antiarrítmicos profiláticos, a maioria evolui com recidiva da FA e por isso acaba
internando no hospital com mais frequência!).
(1) primeiro episódio de FA, principalmente se associado a algum fator desencadeante reversível;
(2) persistência dos sintomas após controle da frequência cardíaca (ex.: palpitações, fadiga).
Existem ainda os pacientes em que a frequência cardíaca “alvo” não consegue ser atingida (ex.:
refratariedade ou contraindicação aos inibidores do nódulo AV). Nestes, a melhor opção para evitar
o surgimento de taquicardiomiopatia é a cardioversão, uma vez que a taquicardia desaparece com a
restauração do ritmo sinusal.
Quando se opta pelo “controle do ritmo”, nos deparamos com um sério problema: se a FA tiver >
48h de duração, o risco de acidente cardioembólico após retorno do ritmo sinusal é grande (6% em
média). Lembre-se que quanto maior a duração da FA, maior a chance de formação de trombos no
apêndice atrial esquerdo! Com o retorno do ritmo sinusal (e da contração do átrio) o trombo pode
se desprender e ganhar a circulação sistêmica.
Então, como cardioverter com segurança uma FA com > 48h ou duração desconhecida? Antes de
tudo, devemos realizar um ecocardiograma transesofágico (que é mais sensível do que o
transtorácico para a detecção de trombos no apêndice atrial esquerdo). Na ausência de trombos, o
paciente pode ser cardiovertido logo em seguida. Na presença de trombo, o paciente deve ser
anticoagulado por 3-4 semanas antes da cardioversão (período suficiente para que o trombo seja
desfeito). Se não for possível realizar um eco transesofágico, a conduta é assumir que existe trombo,
anticoagulando por 3-4 semanas antes de cardioverter.
É importante compreender que a anticoagulação não “dissolve” diretamente o trombo. Ela apenas
bloqueia a cascata da coagulação, criando um desequilíbrio no sistema hemostático do paciente que
favorece o predomínio da fibrinólise endógena. Assim, com a anticoagulação, é o próprio organismo
que vai “podando” o trombo até seu desaparecimento!
Após a cardioversão de uma FA com > 48h ou duração desconhecida, o paciente deve permanecer
anticoagulado. Se o risco cardioembólico for BAIXO, a anticoagulação poderá ser suspensa após
quatro semanas. Se o risco for ALTO, ela deverá ser mantida indefinidamente, mesmo que o coração
volte a bater em ritmo sinusal (já explicamos o porquê disso).
A razão para manter a anticoagulação por quatro semanas no paciente de baixo risco é a seguinte:
após 48h em ritmo de FA, se houver cardioversão o miocárdio atrial estará “atordoado” (stunning
myocardium), o que significa que ele não recupera de imediato sua contração efetiva. Assim,
formam-se bolsões de estase sanguínea atrial – com alto risco de formação de trombos – os quais
perduram até a melhora do “atordoamento” (que dura em média quatro semanas). Mesmo tendo
baixo risco cardioembólico o paciente deve ser “protegido” pela anticoagulação durante esse
período.
Se pudermos garantir que o início da FA foi há menos de 48h, a cardioversão pode ser realizada
imediatamente, sendo a anticoagulação iniciada ou não conforme a estratificação individual do
risco cardioembólico do paciente. Vale dizer que quase sempre a anticoagulação definitiva será
indicada, pois a maioria dos pacientes com FA contabiliza dois ou mais pontos no escore CHA2 DS2
-VASC, ou então possui uma FA “valvar”. O paciente que classicamente não precisa ser
anticoagulado numa FA < 48h de duração é o portador de FA “isolada” (Lone Atrial Fibrillation).
Trata-se de pessoas jovens (< 65 anos), homens ou mulheres, que não apresentam cardiopatia
estrutural, doença aterosclerótica, HAS, DM ou história de AVE/AIT, e que geralmente foram
expostas a algum fator desencadeante reversível (álcool, medicamentos, pós-operatório). Mais de
2/3 dos surtos de FA isolada se resolvem espontaneamente nas primeiras 24h (cenário comum:
enquanto iniciamos um inibidor de nódulo AV e preparamos o paciente para a cardioversão, a
arritmia desaparece por conta própria).
A cardioversão eletiva pode ser química (farmacológica), elétrica ou uma combinação de ambas (se
ministrarmos previamente drogas antiarrítmicas, elas aumentam a probabilidade de sucesso da
cardioversão elétrica). Antes de proceder à cardioversão, no entanto, não podemos nos esquecer de
avaliar o risco cardioembólico. A cardioversão elétrica eletiva é mais eficaz do que a cardioversão
química eletiva (taxa de sucesso de 60-70% versus 30-60%).
Logo, daqui para frente, falaremos apenas sobre a técnica de cardioversão farmacológica.
▪ Cardioversão Farmacológica
Diversas drogas antiarrítmicas são eficazes em cardioverter a FA. As mais empregadas na prática
atual são: ibutilida, amiodarona, dofetilida, propafenona, flecainida e sotalol. Com exceção da
ibutilida, que só existe em formulação intravenosa, as demais também podem ser usadas na
profilaxia das recidivas (uso oral crônico). Existe ainda um antiarrítmico que não é empregado na
cardioversão (por possuir baixa eficácia), mas que pode ser usado na profilaxia: a dronedarona, um
análogo da amiodarona desprovido de iodo em sua molécula (e que por isso acarreta menos efeitos
colaterais do que a amiodarona).
Uma grande metanálise revelou que a chance de sucesso da cardioversão química é semelhante para
todas as drogas citadas, com exceção da amiodarona, que é um pouco menos eficaz. A droga mais
fácil de usar é a ibutilida, cuja posologia já citamos: 1 mg IV em 10min, podendo repetir uma vez se
necessário. Por este motivo, alguns autores colocam a ibutilida como droga de primeira escolha. Em
nosso meio, infelizmente, a ibutilida é pouco disponível, sendo a droga mais comumente empregada
a amiodarona. Na Tabela 6 descrevemos duas formas de cardioverter o paciente com amiodarona.
• A dofetilida (125-500 mcg 12/12h VO) e o sotalol (80-160 mg 12/12h VO) podem ser
usados na vigência de cardiopatia estrutural, porém, obrigatoriamente devem ser iniciados
no hospital (com o paciente monitorizado), uma vez que podem desencadear um episódio
de torsades des pointes (TV polimórfica com QT longo) logo após o início do uso. A
propafenona (150-300 mg 8/8h VO) e a flecainida (50-150 mg 12/12h VO) possuem
aplicação um pouco mais restrita, pelo fato de NÃO poderem ser ministradas a portadores
de cardiopatia estrutural (ex.: doença coronariana, disfunção sistólica, HVE importante). No
entanto, ambas podem ser usadas ambulatorialmente para terminar um episódio de FA
paroxística no paciente não cardiopata, sem que ele precise ir ao hospital. Esta é a famosa
estratégia “pill in the pocket”: alguns portadores de FA recorrente são capazes de reconhecer
o início da arritmia devido ao surgimento de sintomas, podendo ser orientados e se
automedicar imediatamente com essas drogas! Se realizada de maneira precoce, o pill in the
pocket é altamente eficaz. Vale mencionar que, 30 minutos antes de tomar flecainida ou
propafenona, é preciso utilizar um inibidor do nódulo AV, como um betabloqueador ou um
antagonista do cálcio. O motivo é que se a FA for convertida em flutter atrial, evita-se um
potencial aumento na frequência cardíaca.
Após a cardioversão, menos de 50% dos pacientes conseguem se manter em ritmo sinusal com o uso
crônico de um antiarrítmico. Como já dissemos, as drogas que podem ser usadas com este intuito
pela via oral são: amiodarona, dronedarona, sotalol, propafenona, flecainida e dofetilida. Sempre
que possível, a droga de escolha será a AMIODARONA. Apesar de menos eficaz na cardioversão, seu
efeito preventivo é superior ao das outras drogas. A dronedarona é uma opção menos eficaz que a
amiodarona, mas acarreta bem menos paraefeitos. Sotalol, propafenona, flecainida e dofetilida
apresentam o mesmo problema em relação ao tratamento prolongado: RISCO DE “PRÓ-ARRITMIA”,
isto é, tais drogas alteram as propriedades eletrofisiológicas do coração de modo que aumentam a
chance de surgirem outras arritmias, inclusive ritmos de “morte súbita”, como o já citado torsades
des pointes.
▪ Efeitos colaterais da amiodarona: Quando ministrada pela via intravenosa de forma aguda, a
amiodarona pode causar hipotensão arterial em cerca de 25% dos pacientes. Os outros paraefeitos
clássicos são notados com o uso oral prolongado, após recebimento de uma dose cumulativa
grande. Os principais são: (1) disfunção tireoideana, tanto HIPO quanto HIPERtireoidismo; (2)
toxicidade pulmonar (geralmente pneumonite intersticial crônica, que pode evoluir com fibrose e
pneumopatia restritiva); (3) microdepósitos corneanos (fotofobia, visão turva, percepção de “halos
luminosos”); (4) fotossensibilidade e hipocromia da pele; (5) elevação assintomática das
aminotransferases (até 25% logo após início do uso), que raramente (< 3%) evolui para hepatite
medicamentosa.
▪ Inibidores da ECA na FA: vários estudos têm mostrado que os IECA reduzem a recidiva de FA em
pacientes com disfunção de VE. A provável explicação deriva do efeito benéfico dessas drogas no
sentido de evitar ou reduzir o remodelamento cardíaco.
▪ Estatinas na FA: alguns estudos também demonstraram benefício das estatinas na manutenção
do ritmo sinusal em pacientes com FA. Provavelmente, o mecanismo de prevenção acontece pelo
controle da doença coronariana, além de efeitos anti-inflamatórios, antioxidantes e antiarrítmicos
diretos nos canais iônicos.
FA “Refratária”:
A mesma degeneração senil que pode atingir o nódulo sinusal, determinando bradicardia e pausas
sinusais (doença do nódulo sinusal), pode também afetar o miocárdio atrial, provocando
taquiarritmias atriais paroxísticas, como a FA, o flutter e a taquicardia atrial (síndrome Bradi-
Taqui). É importante frisar que esta associação não é rara e exige certos cuidados por parte do
médico. Se o paciente apresentar, entre os episódios de FA, bradicardia sinusal importante ou
períodos de pausa sinusal (com ou sem síncope), o diagnóstico de uma DNS é bastante provável.
Frequentemente, as pausas vêm após um surto de taquiarritmia atrial – o “bombardeio” do nódulo
sinusal piora ainda mais a sua função. A conduta ideal é o implante de um MP definitivo DDDR
(dupla câmara), antes de instituir terapia antiarrítmica ou cardioverter eletricamente o paciente. Os
antiarrítmicos (especial mente a amiodarona) pioram a função do nódulo sinusal. O MP DDDR
reduz comprovadamente a recidiva de FA nestes pacientes (ao contrário dos MP de câmara única).
▪ Doença do Nódulo AV
Idosos e cardiopatas podem apresentar FA associada à disfunção do nódulo AV. Neste caso, o ECG
mostrará uma FA com baixa resposta ventricular (< 80 bpm), na ausência de inibidores do nódulo
AV. O que fazer? Em geral, apenas anticoagulação crônica. Os antiarrítmicos devem ser evitados ou
administrados com muito cuidado. Se a doença AV for grave e a resposta ventricular for abaixo de
40 bpm, está indicado o implante de um MP definitivo (VVIR).
▪ Diagnósticos Diferenciais
◦ Flutter Atrial
(1) Frequência atrial acima de 250 bpm (geralmente 300 bpm), observada pela frequência das
ondas F;
(2) Ausência de uma linha isoelétrica entre estas ondas atriais (ondas F), o que pode dar um
aspecto “em dente de serra”;
(3) A frequência cardíaca costuma ser de 150 bpm (metade da frequência atrial, pois a condução AV
quase sempre é 2:1);
(4) QRS estreito (idêntico ao QRS do ritmo sinusal), a não ser em caso de bloqueio de ramo
associado.
A fibrilação atrial se associa muito ao flutter atrial, já que são duas arritmias que compartilham das
mesmas causas e fatores precipitantes. Uma pode se converter na outra, eventualmente no mesmo
traçado do ECG (“fibrilo-flutter”).
◦ Taquicardia Sinusal
◦ Bradicardia Sinusal
◦ Arritmia Sinusal
◦ Extrassístole Atrial
◦ Extrassístole Ventricular
◦ Taquiventricular
TRANSMISSÃO
➔ Transmissão vetorial
A infecção por T. cruzi é primariamente uma zoonose transmitida para uma variedade de mamíferos
selvagens e domésticos por insetos triatomíneos sugadores de sangue. Algumas vezes há
sobreposição de ciclos vetoriais silváticos, peridomiciliares e intradomiciliares. Sobre uma ampla
região geográfica nas Américas (do norte da Argentina até o sul dos Estados Unidos), a maioria das
infecções em humanos é intradomiciliar, surgindo a partir de uma picada de triatomíneo durante
uma noite de sono. As fezes liberadas pelos triatomíneos durante o repasto sanguíneo contêm a
forma metacíclica infecciosa do T. cruzi que penetra no corpo humano através de rupturas da pele,
mucosas ou conjuntivas. Apesar de recentes pesquisas laboratoriais demonstrando o potencial para
a transmissão por percevejos, não há evidências de que os percevejos realmente transmitam o T.
cruzi para seres humanos.
Outros modos de transmissão podem causar infecção em regiões endêmicas e não endêmicas. O T.
cruzi pode ser transmitido de forma congênita da mãe para o recém-nascido, por transfusão de
hemoderivados, por transplante de órgãos e tecidos ou por ingestão de alimentos ou bebidas
contaminados. A infecção congênita ocorre em 1 a 10% dos recém-nascidos de mães infectadas. O
risco de infecção por hemoderivados contaminados é baixo (1,7% em geral, 13% para receptores de
plaquetas e perto de 0 para receptores de hemácias e plasma). A transmissão por transplante de
órgãos e tecidos afeta principalmente receptores de coração, fígado e rins. A transmissão oral é cada
vez mais relatada após a ingestão de alimentos (frutos silvestres) ou bebidas (suco de frutas ou de
cana de açúcar) contaminados, causando, algumas vezes, surtos.
EPIDEMIOLOGIA
Estima-se que 5,7 milhões de pessoas estejam infectadas por T. cruzi, incluindo > 1 milhão de
pessoas com miocardiopatia crônica. Porém, a verdadeira carga global da doença de Chagas não é
conhecida. O maior número de pessoas infectadas mora na Argentina, Brasil e México; a
prevalência é maior na Bolívia (6,1%), Argentina (3,6%) e Paraguai (2,1%). Em regiões altamente
endêmicas desses países, a prevalência pode ser de mais de 40%. Anteriormente restrita a
populações rurais pobres, a distribuição dos casos – e, de certa forma, a transmissão do T. cruzi – se
estendeu progressivamente para cidades no contexto da rápida urbanização e migração rural. Uma
história recente de migração de uma área rural é o principal fator de risco em ambientes urbanos.
Em geral, a prevalência e a incidência da doença de Chagas diminuiu marcadamente nas últimas
décadas devido a melhoras nas condições de moradia e socioeconômicas, além das intervenções em
saúde pública, incluindo as iniciativas para o controle regional de vetores, a implementação de
rastreamento sistemático de derivados de sangue e a melhora na detecção da transmissão
congênita. Vários países foram declarados livres da transmissão domiciliar como resultado de
campanhas sustentadas de aplicação de inseticidas residuais. Este progresso é ameaçado pela
adaptação do vetor ao ambiente periurbano, seu ressurgimento em áreas onde a aplicação foi
suspensa, o desenvolvimento de resistência aos inseticidas piretroides e a persistência da
transmissão peridomiciliar. Um número crescente de surtos localizados está sendo relatado em
regiões anteriormente estáveis, com a Bacia Amazônica particularmente sob risco.
A distribuição da doença de Chagas aumentou recentemente para países não endêmicos no contexto
do aumento das viagens globais, com casos relatados mais frequentemente na América do Norte,
Europa Ocidental, Austrália e Japão. Os Estados Unidos abrigam até 300 mil casos, principalmente
entre imigrantes da América Central. Além disso, as infecções esporádicas transmitidas por vetores
ocorrem nos estados do sul dos Estados Unidos. A Europa Ocidental tem 68 mil a 123 mil casos, e o
Japão e a Austrália relatam alguns milhares de casos. Apesar da implementação de rastreamento em
bancos de sangue e de alguns programas médicos dedicados, apenas uma pequena proporção de
casos foram identificados e adequadamente manejados até o momento. Um baixo nível de
conscientização entre os profissionais de saúde e as dificuldades experimentadas por alguns grupos
no acesso aos cuidados parecem ser os principais fatores envolvidos. As comunidades de imigrantes
sob risco estão frequentemente sujeitas a fatores que as tornam social, legal e economicamente
vulneráveis. Além disso, a percepção cultural da doença de Chagas como uma doença ligada à
pobreza pode criar um estigma social que complica seu manejo em nível de comunidade. Em
contraste com os imigrantes, os turistas internacionais que visitam países endêmicos têm risco
muito baixo de infecção, seja por picada de reduvídeos ou por outras vias, sendo raros os relatos de
doença de Chagas em viajantes.
PATOLOGIA
Várias cepas de T. cruzi foram identificadas. Essas cepas têm ciclos de transmissão e distribuição
geográfica parcialmente sobrepostos, mas não há evidência definitiva apoiando uma associação de
determinadas cepas com manifestações clínicas específicas ou com variação na gravidade da
doença. A raridade do envolvimento do trato digestivo ao norte da Bacia Amazônica sugere que
fatores específicos do parasita e do hospedeiro possam influenciar a evolução da doença. A
patogênese da doença de Chagas resulta de interações complexas entre o patógeno e a resposta
imunológica do hospedeiro. Muitas questões acerca da importância relativa dessas interações,
incluindo o papel de mecanismos autoimunes, ainda não foram respondidas.
O T. cruzi parece ter um efeito tóxico direto sobre as células ganglionares autonômicas intramurais
do trato digestivo. Com o tempo, a perda de células neurais afeta o tônus muscular, levando a
distúrbios da motilidade e, por fim, à dilatação do órgão (síndrome de megavísceras). O esôfago e o
cólon são primariamente afetados, mas as lesões podem ocorrer ao longo de todo o trato digestivo.
O relaxamento inadequado do esfincter esofágico inferior causa sintomas de acalásia, enquanto o
dano ao cólon acaba simulando a doença de Hirschsprung, com constipação grave e risco de vólvulo
e dilatação tóxica.
Os fatores que reduzem a resposta imune celular, como a infecção pelo HIV, as terapias
imunossupressivas pós-transplantes ou as doenças malignas hematológicas, podem aumentar a
replicação intracelular de amastigotas, com aumento da parasitemia (reativação). As lesões ocorrem
predominantemente no sistema nervoso central (SNC), no coração e na pele. Entre os pacientes
com HIV, o risco de reativação é de cerca de 20% na ausência de terapias antirretrovirais, ocorrendo
quando a contagem de células T CD4+ cai abaixo de 100/μL. A reativação clinicamente manifesta
do T. cruzi é uma infecção oportunista definidora de Aids.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
As manifestações clínicas da infecção por T. cruzi variam muito entre as pessoas. A evolução da
infecção é dividida em duas fases que estão associadas a diferentes características clínicas, durações
e prognósticos.
A fase aguda permanece indetectada e não diagnosticada na maioria das pessoas. Embora 5 a 10%
dessas infecções iniciais melhorem espontaneamente sem tratamento, o T. cruzi persiste pela vida
toda na grande maioria das pessoas (fase crônica); 60 a 70% dessas pessoas nunca desenvolvem
lesão tecidual aparente (forma indeterminada), mas os restantes 30-40% progridem para lesão de
órgãos de intensidade variável ao longo de décadas (forma determinada). Essas complicações
crônicas incluem distúrbios cardíacos (20-30%), digestivos (5-20%) ou mistos (5-10%). Não há
preditor de evolução para as manifestações clínicas durante a fase crônica.
Em pacientes com miocardiopatia, os bloqueios de ramo costumam ser o primeiro sinal e podem
não causar sintomas durante anos até que ocorra doença mais grave do sistema de condução,
arritmias e disfunção ventricular esquerda. A lesão cardíaca avançada tem prognóstico pior que
outras miocardiopatias – notavelmente, a cardiopatia isquêmica.
ABORDAGEM AO PACIENTE
Mais de 90% das infecções não são diagnosticadas, e os casos são frequentemente identificados em
estágios tardios após o desenvolvimento de complicações crônicas. A grande maioria das pessoas
infectadas por T. cruzi é assintomática (i.e., na forma indeterminada da fase crônica). Uma
conscientização sobre a possibilidade da doença de Chagas é importante para os médicos
generalistas e para médicos de várias especialidades, incluindo gastrenterologistas, cardiologistas,
neurologistas, obstetras, pediatras e infectologistas. Fora de regiões endêmicas, o rastreamento para
a doença de Chagas deve ser proposto quando qualquer latinoamericano tem sinais e sintomas
sugestivos, incluindo anormalidades no ECG ou risco aumentado de
(1) infecção por T. cruzi (doença de Chagas na mãe ou em outro familiar; origem em país ou região
altamente endêmicos; história de transfusão de sangue sem rastreamento na América Latina);
(2) transmissão para outros (p. ex., via gestação ou doação de sangue ou tecidos); ou
DIAGNÓSTICO E ESTADIAMENTO
Confirmação do diagnóstico
O diagnóstico de infecção congênita se baseia no exame de sangue do cordão e/ou periférico por
microscopia ou PCR durante os primeiros dias ou semanas de vida. Um teste conduzido após 4
semanas de idade é mais acurado: a PCR anterior a isso pode ser falsamente positiva,
provavelmente devido à passagem de fragmentos do DNA de T. cruzi da mãe para o bebê. Se os
resultados forem negativos, os testes sorológicos devem ser realizados com 9 meses de idade, após a
eliminação dos anticorpos maternos. Durante a fase crônica, a sensibilidade limitada da PCR
(50-80%) restringe a sua utilidade para diagnóstico primário; porém, a PCR pode documentar a
falha terapêutica se gerar resultados positivos após se completar o tratamento.
Estadiamento da doença
Após a confirmação da infecção por T. cruzi, o médico deve avaliar a presença de complicações e
fatores concomitantes que possam influenciar a evolução da doença. A avaliação inicial inclui:
- dependendo dos achados, a avaliação pode ser suplementada por ressonância magnética (RM) ou
estudo eletrofisiológico.
Devem ser investigadas comorbidades, incluindo outros fatores de risco cardiovasculares, condições
imunossupressivas e outras infecções crônicas (p. ex., Strongyloides stercoralis ou HIV).
TRATAMENTO Doença de Chagas (tripanossomíase americana)
TRATAMENTO ETIOLÓGICO
Apenas dois fármacos, benznidazol e nifurtimox , têm eficácia demonstrada contra a infecção por T.
cruzi quando administrados por ≥ 30 dias. Embora esses fármacos sejam usados desde o início da
década de 1970, ainda há muitas dúvidas sobre seu modo de ação e eficácia nos diferentes estágios
da infecção.
O objetivo do tratamento depende do estágio clínico; os objetivos gerais são a cura dos pacientes
com infecção recente ou reativação, a redução da morbidade e a prevenção da transmissão em
estágios tardios. O tratamento é mais efetivo durante a fase aguda (incluindo a congênita) e a fase
crônica inicial (i.e., em pacientes < 18 anos de idade), com taxa de cura de 60 a 100%. A eficácia
do tratamento durante a forma indeterminada da fase crônica em pacientes > 18 anos de idade não
é conhecida; porém, o tratamento pode proteger contra o desenvolvimento de lesão cardíaca mais
tarde na vida e reduzir muito o risco de transmissão vertical quando administrado antes da
concepção. Em adultos com miocardiopatia crônica, o benznidazol não tem impacto sobre a
progressão da doença e o risco de morte.
Nem o benznidazol nem o nifurtimox são efetivos contra as complicações digestivas. O tratamento
está contraindicado durante a gestação e na insuficiência renal e hepática avançadas. Os regimes
preferidos e a tolerância aos fármacos variam conforme a idade. Os eventos adversos são mais
frequentes em adultos, os quais apresentam, dessa forma, risco aumentado de suspensão prematura
do tratamento. Como o benznidazol parece ser mais bem tolerado que o nifurtimox em adultos, ele
é recomendado como fármaco de primeira linha nessa faixa etária. Há necessidade de
monitoramento cuidadoso (p. ex., semanal) clínico e laboratorial durante o tratamento. Embora o
tratamento costume ser prescrito por 60 dias, a duração ideal ainda é discutida, com interesse
crescente nos tratamentos mais breves.
O tratamento deve ser oferecido a crianças, mulheres em idade fértil, pacientes na fase aguda e
pacientes com reativação. Considerando-se as incertezas sobre o impacto do tratamento, a decisão
de tratar os pacientes > 18 anos com a forma indeterminada da fase crônica deve ser tomada
individualmente após uma discussão dos prós e contras com o paciente. Um teste de gravidez
negativo é mandatório antes de começar o tratamento, pois não foi comprovado que os fármacos
recomendados sejam seguros na gestação.
A eficácia do tratamento de segunda linha (p. ex., nifurtimox após falha do benznidazol) ainda não
foi avaliada. A eficácia limitada dos esquemas atuais e a compreensão de que os parasitas vivos
desencadeiam processos imunopatológicos aumentou o interesse em novas abordagens terapêuticas.
Isso inclui a adição de intervenções imunomoduladoras ao tratamento antiparasitário e o uso de
combinações de fármacos antiparasitários.
ACOMPANHAMENTO CLÍNICO
A definição do cuidado ideal após o tratamento é muito difícil, sendo um tópico crucial das
pesquisas. Embora a busca de biomarcadores (incluindo através da proteômica) para a identificação
de indicadores precoces de resposta terapêutica seja promissora, o acompanhamento sorológico
ainda é a base do monitoramento pós-tratamento na fase aguda. Na fase crônica, não há exame com
valor comprovado para a documentação de resposta. O tempo necessário para negativar a sorologia
após o tratamento depende, de fato, da duração da infecção. O intervalo é curto (geralmente
meses) quando a infecção é tratada durante a fase aguda (incluindo a congênita). Em contraste, há
necessidade de décadas nos adultos infectados durante a infância. Um resultado positivo em uma
PCR pós-tratamento indica falha terapêutica, mas um resultado negativo não pode ser interpretado
devido à baixa sensibilidade da PCR durante a fase crônica. A condição dos pacientes com
resultados negativos na PCR, mas com sorologia persistentemente positiva é, assim, incerta, mas
esses pacientes devem ser considerados como potencialmente infectantes enquanto os testes
sorológicos continuarem a gerar resultados positivos. Todos os pacientes, tratados ou não, devem
ser regularmente monitorados. A avaliação anual básica inclui anamnese para detecção de novos
sintomas, exame clínico e ECG de 12 derivações.
PREVENÇÃO
Na ausência de uma vacina, há necessidade de medidas preventivas – primárias (prevenção da
transmissão do T. cruzi), secundárias (evitação de complicações) e terciárias (redução de morbidade
e mortalidade). O rastreamento de doações de sangue está sendo progressivamente implementado
em regiões endêmicas e em países para onde estão imigrando grupos de alto risco, e o rastreamento
deve ser estendido para a doação de órgãos. Quando sustentado por períodos prolongados, o
controle do vetor é uma estratégia efetiva e custo-efetiva para reduzir a transmissão intradomiciliar.
As telas mosquiteiras impregnadas com inseticidas (como usadas na malária) oferecem proteção
individual contra picadas de reduvídeos. O rastreamento de mulheres imigrantes latinoamericanas
em idade fértil e gestantes tem sido altamente custo-efetivo na Espanha, embora o custo por caso
detectado varie conforme a prevalência da infecção na população-alvo. A identificação precoce de
casos por rastreamento passivo e ativo da população de risco, junto com a provisão de tratamento,
pode reduzir o risco de complicações e de transmissão secundária, particularmente a transmissão
congênita. Por fim, a identificação e o tratamento de complicações cardíacas e a prevenção de
eventos cardioembólicos em estágio inicial influenciam de forma positiva a evolução da doença.
CONSIDERAÇÕES GLOBAIS
Com a sua expansão geográfica, a doença de Chagas se tornou uma questão de saúde global,
afetando de maneira predominante as pessoas vulneráveis nos quatro continentes. Ainda assim,
como em outras doenças tropicais negligenciadas, o progresso contra a doença de Chagas é limitado
pela falta de pesquisas e desenvolvimentos, além da ausência de comprometimento financeiro e
político. Por exemplo, a produção e o registro de fármacos existentes e o acesso a eles ainda é
problemático em muitos países, inclusive os Estados Unidos. A pesquisa e o desenvolvimento de
novos fármacos são complicados pela falta de incentivos financeiros. É provável que o futuro da
doença de Chagas seja influenciado por fenômenos globais. É provável que mudanças climáticas,
envelhecimento da população, aumento das prevalências de comorbidades não transmissíveis (p.
ex., diabetes, hipertensão) em países de renda baixa e média, além do uso crescente de fármacos
imunossupressores, tenham impacto na epidemiologia, evolução clínica e carga da doença de
Chagas. Para lidar com esses desafios, as intervenções clínicas, de saúde pública e políticas devem
ser aumentadas e melhoradas em regiões com prevalência elevada ou oculta (p. ex., região do
Chaco na Argentina, Bolívia e Paraguai, e no México, Europa Ocidental e Estados Unidos,
respectivamente)
DADOS EPIDEMIOLÓGICOS
O edema agudo de pulmão é a apresentação clínica inicial de cerca de 13,2% dos pacientes
hospitalizados por IC, segundo recente registro europeu, sem diferença de prevalência em relação à
fração de ejeção, mas está associado à maior mortalidade em ICFEr e maior duração da
hospitalização. A crise hipertensiva, a insuficiência mitral aguda (disfunção do músculo papilar
secundária à doença isquêmica ou ruptura espontânea) e a síndrome coronariana aguda são os
fatores causais mais comuns de edema agudo de pulmão cardiogênico. A apresentação clínica, com
hipotensão arterial e sinais de baixo débito cardíaco, é menos frequente e, em geral, observada em
pacientes com IC crônica agudizada.
CLASSIFICAÇÃO
Os pacientes com edema agudo de pulmão apresentam dois modelos distintos de distribuição
volêmica:
- IC aguda nova: congestão pulmonar sem hipervolemia periférica (IC de novo). Neste modelo
hemodinâmico, o tratamento tem como objetivo redistribuir o volume da circulação pulmonar
para a circulação periférica. Esta melhora da distribuição de volume é feita por ação de
vasodilatadores (nitroglicerina e, especialmente, o nitroprussiato de sódio), com uso judicioso de
diuréticos e suporte ventilatório com pressão positiva não invasiva de baixa pressão, para reduzir
o trabalho respiratório e a hipoxemia, que podem reduzir as taxas de intubação e de mortalidade.
O uso de ventilação não invasiva é recomendado em pacientes com congestão pulmonar
associada a desconforto respiratório e/ou hipoxemia (frequência respiratória > 25 incursões/
minuto e SatO2 < 90%). É recomendável terse cautela com pacientes hipotensos (pressão
positiva pode reduzir a pressão arterial) e em pacientes após IAM, os quais podem ter pior
evolução. Os opioides aliviam ansiedade e dispneia, mas o uso rotineiro não é recomendado,
devido a riscos de efeitos adversos, como náusea, hipotensão, bradicardia e depressão
respiratória, além de controvérsias a respeito de maior risco de mortalidade com seu uso.
Fisiologicamente, o edema pulmonar não cardiogênico caracteriza-se por shunt intrapulmonar com
hipoxemia e redução da complacência pulmonar, levando à redução da capacidade residual
funcional. Ao exame patológico, são observadas membranas hialinas nos alvéolos e pode ser
observada inflamação com fibrose pulmonar subsequente. Clinicamente, o quadro varia de dispneia
branda à insuficiência respiratória. A ausculta dos pulmões pode ser relativamente normal, apesar
de as radiografias de tórax mostrarem infiltrados alveolares difusos. A TC mostra que a distribuição
do edema alveolar é mais heterogênea que se pensava. Embora alguns autores entendam que as
pressões intracardíacas normais façam parte da definição do edema pulmonar não cardiogênico, a
patologia do processo é muito diferente, e alguns pacientes podem ter simultaneamente edema
pulmonar cardiogênico e não cardiogênico. É conveniente classificar as causas do edema pulmonar
não cardiogênico com base na hipótese de que a lesão pulmonar provavelmente resulte de fatores
diretos, indiretos ou vasculares pulmonares. As lesões diretas são mediadas pelas vias respiratórias
(p. ex., aspiração) ou são secundárias a um traumatismo pulmonar fechado. As lesões indiretas são
atribuídas aos mediadores que chegam aos pulmões pela corrente sanguínea. A terceira categoria
inclui os distúrbios que podem resultar de alterações agudas das pressões vasculares pulmonares,
possivelmente em consequência da atividade autonômica súbita (nos casos de edema pulmonar
neurogênico ou secundário às altitudes elevadas) ou de oscilações repentinas da pressão pleural e
de lesões transitórias dos capilares pulmonares (no caso de edema pulmonar de reexpansão).
DIFERENCIAÇÃO ENTRE EDEMAS PULMONARES CARDIOGÊNCIO E NÃO
CARDIOGÊNICO
A história é essencial para avaliar a existência de uma doença cardíaca subjacente e também para
detectar um dos distúrbios associados ao edema pulmonar não cardiogênico. O exame físico dos
pacientes com edema pulmonar cardiogênico caracteriza-se por evidências de elevação das pressões
intracardíacas (galope por B3, elevação do pulso venoso jugular, edema periférico) e estertores e/ou
sibilos à ausculta torácica. Por outro lado, no exame físico dos pacientes com edema pulmonar não
cardiogênico predominam as alterações secundárias ao distúrbio desencadeante, embora os achados
pulmonares possam ser relativamente normais nos estágios iniciais. No edema pulmonar
cardiogênico, as radiografias de tórax geralmente mostram aumento da silhueta cardíaca,
redistribuição vascular, espessamento intersticial e infiltrados alveolares peri-hilares; os derrames
pleurais são comuns. No edema pulmonar não cardiogênico, o coração tem dimensões normais, os
infiltrados pulmonares estão distribuídos mais uniformemente pelos pulmões e os derrames pleurais
não são comuns. Por fim, a hipoxemia associada ao edema pulmonar cardiogênico é atribuída
principalmente à desproporção entre V/Q e melhora com a administração de oxigênio suplementar.
Por outro lado, a hipoxemia do edema pulmonar não cardiogênico é causada principalmente pelo
shunt intrapulmonar e geralmente persiste apesar da inalação de concentrações altas de oxigênio.
APRESENTAÇÃO CLÍNICA
Edema pulmonar é o acúmulo de líquido excessivo no compartimento extravascular dos pulmões,
sobretudo no interstício e nos espaços alveolares. Esse acúmulo pode ocorrer lentamente – como em
um paciente com insuficiência renal oculta – ou de maneira emergencial – como na insuficiência
ventricular esquerda depois de um infarto agudo do miocárdio. O edema pulmonar se apresenta
mais comumente com dispneia. Dispneia é a respiração percebida por um paciente como
desconfortável ou provocadora de ansiedade e desproporcional ao nível de atividade. A dispneia por
edema pulmonar pode estar presente somente com o exercício, ou o paciente pode experimentar
dispneia em repouso. Em casos graves, o edema pulmonar pode ser acompanhado por líquido de
edema no escarro e pode causar insuficiência respiratória aguda.
FISIOPATOLOGIA
Todos os vasos sanguíneos vazam; em condições normais, líquido se move entre vasos sanguíneos e
nos espaços em volta deles, enquanto o fluxo de proteínas é mínimo. No ser humano adulto, os
capilares pulmonares constituem o principal local de fluxo de líquido a partir da vasculatura
pulmonar. A equação de Starling descreve o movimento de líquido entre os capilares pulmonares e
o compartimento extravascular pulmonar. O fluxo de líquido através de uma membrana
semipermeável está relacionado com a permeabilidade inerente da membrana ao líquido e a
macromoléculas, bem como dos gradientes de pressão hidrostática e coloidoncótica através da
membrana.
O extravasamento de líquido dos capilares para os espaços intersticiais circundantes é limitado por
junções estreitas entre as células endoteliais capilares pulmonares. Em geral, os espaços alveolares
pulmonares são protegidos de líquido extravascular no espaço intersticial por três mecanismos: (i)
uma barreira de células epiteliais alveolares que é quase impermeável à passagem de proteínas, (ii)
linfáticos pericapilares que normalmente retiram o líquido antes que ele se acumule suficien-
temente para suplantar a barreira epitelial alveolar, e (iii) transporte ativo de sódio a partir do
alvéolo, que regula a quantidade de líquido no espaço alveolar. Em condições normais:
3. O efeito das forças hidrostáticas é maior que o das forças coloidoncóticas, e assim há uma
tendência de movimento do líquido para fora dos capilares e para dentro dos espaços
intersticiais.
4. O líquido no espaço intersticial pulmonar é removido por linfáticos pericapilares que não
entram na parede alveolar e são chamados de “justa-alveolares”. O interstício pericapilar é
contíguo ao interstício perivascular e peribrônquico. A pressão intersticial nessas áreas mais
centrais é negativa em relação ao interstício pericapilar, de modo que o líquido se desloca
centralmente para longe dos espaços aéreos. Com efeito, o interstício perivascular e
peribrônquico age como um reservatório de drenagem para líquido, e pode acomodar
aproximadamente 500 mL com um aumento irrisório da pressão hidrostática intersticial. Como
esse líquido é pobre em proteína em relação ao sangue, forças osmóticas favorecem reabsorção
do interstício para dentro dos vasos sanguíneos adjacentes a estas áreas centrais. Esse é o
principal local de reabsorção de líquido a partir do interstício perivascular e peribrônquico. O
líquido de edema pode se deslocar mais para dentro do mediastino, onde é captado por
linfáticos mediastínicos. O interstício perivascular e peribrônquico também é contíguo aos septos
interlobulares e à pleura visceral. Em alguns pacientes, uma quantidade significativa de líquido
transita para fora através da pleura visceral para dentro do espaço pleural, onde há uma
capacidade alta de reabsorção através de poros na pleura parietal para dentro dos linfáticos
pleurais parietais.
A velocidade de reabsorção de líquido pelo sistema linfático geralmente é suficiente para prevenir
acúmulo de líquido no interstício e nos espaços alveolares. O edema pulmonar ocorre quando o
líquido sai do espaço vascular pulmonar, excede a capacidade para retirada de líquido e se
acumula nos espaços extravasculares do pulmão. Em algum nível crítico indefinido, depois que o
interstício perivascular e peribrônquico estiver cheio, o aumento da pressão hidrostática intersticial
causa a entrada de líquido de edema no espaço alveolar.
A via para dentro do espaço alveolar permanece desconhecida, mas acredita-se que ocorra por
volume de fluxo. O edema pulmonar pode acontecer em numerosas condições diferentes:
4. A drenagem linfática está prejudicada. Esta forma de edema pulmonar é rara, mas pode ser
vista com obstrução física do sistema linfático por neoplasia maligna (linfoma) ou infecção
(histoplasmose, tuberculose), por obliteração de vasos linfáticos devida à radioterapia para
câncer de mama ou de pulmão ou por causas idiopáticas (síndrome da unha amarela).
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Tanto o edema pulmonar cardiogênico quanto o não cardiogênico resultam do aumento de água
extravascular no pulmão, e ambos podem causar insuficiência respiratória. Levando em conta as
diferenças em fisiopatologia, não é surpreendente que as manifestações clínicas sejam muito
diferentes nas duas síndromes.
Os sinais clínicos começam com o acúmulo de líquido intersticial. O exame do coração pode revelar
uma terceira bulha cardíaca, mas há uma escassez de achados pulmonares no edema puramente
intersticial. Com frequência, o achado mais precoce é uma radiografia de tórax mostrando um
aumento de calibre dos vasos do lobo superior (“redistribuição vascular pulmonar”) e acúmulo de
líquido nos espaços perivasculares e peribrônquicos (“cuffing”). Ela também pode mostrar linhas B
de Kerley, que representam líquido nos septos interlobulares. A complacência pulmonar cai, e o
paciente começa a respirar de maneira mais rápida e superficial para se adaptar ao aumento do
trabalho elástico da respiração. Quando começa a inundação alveolar, há diminuições adicionais do
volume do pulmão e da complacência pulmonar. Com alguns alvéolos cheios de líquido, há um
aumento da fração do pulmão que é perfundida, mas mal ventilada. Esse desvio para razões V/Q
baixas causa um aumento na ΔPO2 A-a, se não hipoxemia franca. Suplementação de oxigênio
corrige a hipoxemia. A PaCO2 é normal ou baixa, refletindo no impulso aumentado para respirar. O
paciente pode ficar sudorético e cianótico. O escarro pode mostrar líquido de edema, que é róseo
por hemorragia capilar pelas altas pressões venosas pulmonares. A ausculta revela estertores crepi-
tantes inspiratórios sobretudo nas bases, onde a pressão hidrostática é maior, mas, potencialmente,
disseminados por ambos os pulmões. Roncos e sibilos (“asma cardíaca”) podem ocorrer. A
radiografia mostra opacidades peri-hilares em vidro fosco bilaterais, representando áreas de edema
intersticial e alveolar.
Embora o mecanismo de lesão varie, o dano de células endoteliais capilares e células epiteliais
alveolares é comum à SARA, independentemente da causa. Após a agressão inicial (p. ex., um
episódio de bacteriemia de alto grau), geralmente há um período de estabilidade, refletindo o
tempo que leva para que mediadores pró-inflamatórios liberados de células inflamatórias
estimuladas causem dano. A lesão de células endoteliais e epiteliais causa permeabilidade vascular
aumentada e produção e atividade reduzidas de surfactante. Essas anormalidades levam a edema
pulmonar intersticial e alveolar, colapso alveolar, aumento significativo das forças de superfície,
complacência pulmonar marcantemente reduzida e hipoxemia. Pelas primeiras 24 a 48 horas após a
agressão, o paciente pode experimentar trabalho de respiração aumentado, manifestado por
dispneia e taquipneia, mas sem anormalidades na radiografia de tórax. Nesta fase inicial, a ΔPO2 A-
a aumentada reflete edema alveolar com desequilíbrio V/Q desviado para razões V/Q baixas, que
podem ser corrigidas por aumento da FiO2 e da ventilação-minuto. O quadro clínico pode melhorar,
ou pode haver uma queda maior de complacência e ruptura de capilares pulmonares, levando a
áreas de shunt verdadeiro e hipoxemia refratária. A combinação de trabalho de respiração
aumentado e hipoxemia progressiva muitas vezes requer ventilação mecânica. Como o processo
subjacente é heterogêneo, com pulmão de aspecto normal adjacente a pulmão atelectásico ou
consolidado, os pacientes em ventilação com volumes correntes típicos podem distender
excessivamente alvéolos normais, reduzir o fluxo sanguíneo para áreas de ventilação adequada e
precipitar lesão pulmonar adicional (“volutrauma”).
A hipoxemia pode ser profunda, posteriormente seguida por hipercapnia, devido à crescente
ventilação de espaço morto. Radiograficamente, pode haver opacidades alveolares esparsas ou
“branqueamento” dos pulmões, representando enchimento alveolar confluente difuso.
Patologicamente, é observado dano alveolar difuso (DAD), caracterizado por células inflamatórias e
formação de membranas hialinas. A mortalidade é de 30 a 40%. A maioria dos pacientes morre por
alguma complicação de sua doença de apresentação, e não pela hipoxemia refratária. Daqueles que
sobrevivem, a maioria recobrará função pulmonar quase normal, mas sua recuperação pode ser
prolongada por 6 a 12 meses. Um número significativo desenvolverá nova doença reativa das vias
aéreas ou fibrose pulmonar.
CAUSAS
Manifestação aguda e potencialmente fatal de edema dos alvéolos pulmonares em razão de um ou
mais dos seguintes:
O diagnóstico do edema agudo pulmonar é clínico. O paciente apresenta-se agitado, com sudorese
fria, taquicárdico, taquidispneico e com tosse com expectoração rósea ou espumosa. Na evolução
(ou se chegar tardiamente a unidade de emergência) poderá estar sonolento, cianótico com
bradipneia, havendo risco elevado de parada cardiorrespiratória. A pressão arterial (PA), em geral,
está elevada, pela resposta adrenérgica aumentada e, principalmente, quando for crise hipertensiva
a causa do edema agudo pulmonar. A ausculta cardíaca poderá evidenciar a presença de sopro em
portadores de valvopatia ou se houver complicação mecânica (insuficiência mitral e comunicação
interventricular entre outras) no infarto agudo do miocárdio (IAM). Arritmias, como a fibrilação
atrial, pode ser o fator precipitante do edema pulmonar agudo em portador de insuficiência
coronariana, ventricular esquerda ou de valvopatia, como a estenose mitral. Na ausculta pulmonar,
pode se notar a presença de estertores crepitantes e subcrepitantes ou mesmo sibilos, desde a base
até o ápice pulmonar. Os portadores de edema agudo pulmonar devido a infarto agudo poderão
apresentar dor torácica.
Os exames complementares são úteis na definição da causa do edema pulmonar. A elevação súbita
da PA sistêmica, isquemia miocárdica, interrupção de medicamentos em portador de insuficiência
cardíaca ou ainda o uso abusivo de líquidos são causa comuns de edema pulmonar. Pacientes
diabéticos, hipertensos, com insuficiência coronariana ou disfunção de ventrículo esquerdo (VE),
apresentam maior predisposição. Na sala de emergência da Unidade de Primeiro Atendimento
(UPA), solicitamos:
- Sódio, potássio, ureia, creatinina, glicemia, hemograma. Além desses: mioglobina, CK-MB,
troponina na suspeita de isquemia miocárdica. Em alguns casos, D-dímero (diagnóstico
diferencial com tromboembolismo pulmonar) e peptídeo natriurético cerebral (BNP), para
diagnóstico diferencial com doenças pulmonares (BNP < 100 pg/mL), sobretudo doença
pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). A gasometria arterial poderá ser útil, pois, tipicamente,
mostra hipoxemia com hipocapnia, no início do edema agudo pulmonar. Havendo progressão, a
hipoxemia estará associada à hipercapnia, que também pode ocorrer em portadores de DPOC;
- A coronariografia é restrita para os pacientes nos quais a causa do edema agudo pulmonar foi
IAM. Em pacientes instáveis, a entubação orotraqueal poderá ser necessária antes da realização
da coronariografia;
- Tomografia de tórax: limitada a pacientes com suspeita de afecções na aorta (como dissecção de
aorta) ou pulmonar (tromboembolismo pulmonar, DPOC, ou pneumonia). Se houver suspeita de
tromboembolismo pulmonar, um protocolo específico é realizado para identificação de áreas de
interrupção do fluxo arterial pulmonar ou de infarto pulmonar.
TRATAMENTO:
O tratamento do edema pulmonar depende da etiologia específica. Como um distúrbio de natureza
aguda e potencialmente fatal, algumas medidas devem ser implementadas imediatamente para
manter a circulação, a troca gasosa e a mecânica pulmonar. Ao mesmo tempo, é necessário corrigir
as condições que frequentemente complicam o edema pulmonar, como infecção, acidemia, anemia e
insuficiência renal aguda.
c) Terapia renal substitutiva: A terapia renal substitutiva deve ser considerada para os pacientes
com edema pulmonar com sobrecarga de volume refratária, acidose metabólica (pH < 7,15 a
7,25), hipoxemia e/ou hiperpotassemia persistente. Para pacientes hipotensos ou que
necessitam de suporte inotrópico, a terapia renal substitutiva contínua costuma ser mais bem
tolerada do que a hemodiálise intermitente.
d) Inibidores da ECA: Os IECAs reduzem a pós-carga e a pré- carga e estão recomendados aos
pacientes hipertensos. O tratamento pode ser iniciado com doses baixas de um agente de ação
curta, seguidas do aumento progressivo das doses orais. No IAM com insuficiência cardíaca, os
IECAs reduzem as taxas de mortalidade em curto e longo prazos.
i) Balão intra-aórtico: O BIA pode ser útil em raras situações de insuficiência mitral aguda por
endocardite infecciosa, mas não é geralmente usado no edema pulmonar com choque
cardiogênico.
3. SITUAÇÕES ESPECIAIS:
b) Síndromes Coronarianas Agudas: O IAMEST complicado por edema pulmonar está associado a
taxas de mortalidade hospitalar entre 20 e 40%. Depois da estabilização imediata, o fluxo
arterial coronariano deve ser rapidamente restabelecido. A ICP primária precoce é o método de
escolha; de modo alternativo, um agente fibrinolítico deve ser administrado. A
angiocoronariografia e a revascularização coronariana precoces por ICP ou CRM também estão
indicadas aos pacientes com síndrome coronariana aguda sem elevação de ST.
c) Oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO): Para pacientes com edema pulmonar não
cardiogênico agudo grave com potencial para causa rapidamente reversível, a ECMO pode ser
considerada como medida de suporte temporário em pacientes altamente selecionados para
obter trocas gasosas adequadas com taxas atuais de sobrevida até a alta hospitalar de 50 a 60%.
Geralmente a ECMO venovenosa é usada nessas situações. A ECMO pode funcionar como uma
ponte para o transplante ou outras intervenções.
d) Tipos incomuns de edema: Algumas etiologias específicas do edema pulmonar podem exigir
tratamentos especiais. O edema pulmonar por reexpansão pode ocorrer após remoção de ar ou
líquido pleurais de longa duração. Esses pacientes podem apresentar hipotensão ou oligúria com
edema pulmonar resultante dos desvios rápidos de líquido para dentro dos pulmões. Os
diuréticos e a redução da pré-carga estão contraindicados e a reposição do volume intravascular
muitas vezes é necessária enquanto se fornece suporte à troca gasosa e à oxigenação.
O edema pulmonar das altitudes elevadas geralmente pode ser evitado pelo uso de dexametasona,
bloqueadores dos canais de cálcio ou agonistas β2-adrenérgicos inalatórios de ação prolongada. O
tratamento inclui a descida a uma altitude mais baixa, repouso no leito, oxigênio e (se possível)
inalação de óxido nítrico; o nifedipino também pode ser eficaz.
Nos casos de edema pulmonar resultante da obstrução das vias aéreas superiores, a identificação da
causa da obstrução é fundamental, porque o tratamento consiste em aliviar ou fazer um desvio da
obstrução.