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ARTIGO REGULAR
Marino Pérez-Álvarez1
AbstratoA virada da investigação qualitativa sugere uma concepção mais aberta e plural da
psicologia do que apenas a ciência da mente e do comportamento, como é mais comumente
definida. A ligação histórica, ontológica e epistemológica desta concepção de psicologia ao
método positivista das ciências naturais pode ter esgotado as suas possibilidades e, depois de
ter contribuído para o seu prestígio como ciência, tornou-se agora um obstáculo. Propõe-se que
a psicologia seja reconcebida como uma ciência do sujeito e do comportamento no quadro de
uma ciência hermenêutica contextual, social e do comportamento humano. Assim, sem rejeitar
a investigação quantitativa, a psicologia recupera territórios deixados de lado como a
introspecção e a autoconsciência pré-reflexiva, e reconecta-se com tradições marginalizadas da
corrente principal. A partir desta perspectiva, a psicologia também poderá recuperar a sua
credibilidade como ciência humana, tendo em conta o cepticismo actual.
Um certo espírito dos tempos parece exigir uma revisão da psicologia como ciência da mente e
do comportamento como definição mais estabelecida (American Psychological Association 2016
; Gerrig2014; Schacter et al.2015; Stanovich2012). Dois movimentos importantes surgiram de
forma independente, um no coração da própria Associação Americana de Psicologia, com a
Divisão 5 recentemente renomeada como Métodos Quantitativos e Qualitativos, incluindo a
Sociedade para Investigação Qualitativa em Psicologia e o Journal of Qualitative Psychology
(Gergen et al.2015) e o outro na tradição europeia comO Manifesto de Yokohamapor uma
Psicologia como Ciência do HumanoSer (Valsiner et al. 2016). Ambos assumem uma virada
pluralista aberta em direção à Psique comoBcomplexo, subjetivo, significativo e misterioso
(Valsiner et al.2016, pág. v) e como Gergen et al. dizer,Bnão
* Marino Pérez-Álvarez
marino@uniovi.es
1
Universidade de Oviedo, Oviedo, Espanha
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a prática da investigação está excluída a priori; múltiplos objetivos de investigação tornam-se plausíveis e
múltiplos caminhos podem reivindicar uma legitimidade situada (Gergen et al.2015, pág. 2).
O problema com a concepção padrão da psicologia como uma ciência do
comportamento e dos processos mentais é que ela acabou estabelecendo uma ontologia
e um raciocínio dualísticos na ciência psicológica com feedback do método científico
natural positivista (Packer2011; Slife et al.2012). O problema com o dualismo, como
poderia ser antecipado, é a sua doutrina das duas substâncias,res cogitans/res extensa (
mental/físico), referindo-se, no entanto, a umpluralista,não monistauniverso, (James1909/
1977), conforme argumentado neste artigo. Essetradicionala ontologia dualista se baseia
e ao mesmo tempo recebe feedback de uma epistemologia em si dualista na forma da
naturalmétodo científico (hoje em crise) com suas novas dualidades sujeito/objeto, teoria/
método e fato/valor, conforme discutido mais adiante.
Esta concepção tem obviamente a sua história erazão de ser.Não é em vão que a
fundação da psicologia como disciplina científica no final do século XIX deriva da
psicologia filosófica estudada segundo o método positivista das ciências naturais em
conformidade com o espírito da época (Danziger1990; Hatfield2002). Como diz
Hatfield,BA nova ciência que se consolidou e se desenvolveu no final do século XIX e
início do século XX foi uma transformação da velha ciência (ou da velha 'filosofia
natural')̂ (Hatfield2002, pág. 212). O mais conhecido,sineteos movimentos científicos
da psicologia do século XX, como o behaviorismo e o cognitivismo, no fundo da sua
concepção atual, seguem esta linha.
A adoção do método científico natural contribuiu para o prestígio da psicologia como
ciência. No entanto, a psicologia como ciência natural em prol do método científico
positivista, que embora até agora tenha representado um progresso, pode ter-se tornado
uma limitação, se não um obstáculo. Um obstáculo já é o duplo raciocínio implícito que
pode estar influenciando a pesquisa psicológica, por mais que ela se considere bem
fortalecida pelo método científico natural. Mas o método científico natural adotado pela
psicologia dominante (Toomela2007), longe de ser isento e em si uma garantia de uma
ciência melhor, estrutura a nossa forma de compreender e estudar assuntos psicológicos,
por exemplo, de uma forma mais analítica do que holística, mecanicista do que
contextual, causal do que mutualista, etc. .2012). O próprio método científico pode
constituir umaBobstaclê epistemológico no sentido do filósofo francês Gaston Bachelard,
como uma armadilha para o conhecimento e conceitos científicos armada por 'hábitos de
pensamento' (Bachelard1938/2002), neste caso derivado do ensino rotineiro da Bmétodô
comoBalgo em sî (Costa e Shimp2011; Machado e Silva2007).
Historicamente, o triunfante método científico positivista marginalizou toda uma rica
tradição holística que agora está sendo perdida (Diriwächter e Valsiner2008; Toomela
2007). Este ressurgimento da investigação qualitativa do ser humano como um todo não
responde a uma suposta lei psicanalítica deBretorno do reprimidô, mas à limitação do
próprio método científico. Rotular o método científico natural como fonte de dualismo
(em vez de superá-lo) não significa de forma alguma rejeitar o estatuto da psicologia
como ciência. Para começar, não existe ciência sem método. O que não existe éométodo
científico para fazer ciência (Chalmers2013).
A questão é se o método científico natural é o melhor para a psicologia. A
assunção da psicologia como uma ciência natural pode estar na base da sua crise de
credibilidade como ciência (Ferguson2015; Lilienfeld2012), bem como o problema da
globalizaçãoindígenapsicologia ocidental como universal (Christopher et al.2014;
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Mesmo quando uma dualidade não implica dualismo, no caso da mente e do comportamento
na definição da psicologia, ela implica o dualismo tradicional, não importa o quanto esteja
revestido de novos termos e metáforas. O dualismo cartesiano não encontra versão melhor do
que naBa visão da mente como um software rodando em um hardware físico (Everett2016, pág.
37). A definição de psicologia comoBestudo científico do comportamento dos indivíduos e seus
processos mentaiseŝ (American Psychological Association2016; Gerrig2014, pág. 2) significa
pelo menos uma dicotomia interior-exterior. Enquanto o comportamento se refere a atividades
factuais observáveis no mundo exterior, os processos mentais referem-se a atividades
cognitivas ou neurocognitivas que ocorrem no interior do sujeito, em sua mente, sistema
cognitivo ou cérebro (Schacter et al.2015; Westerman e Steen2007).
Pode-se dizer que os processos mentais associados aos processos neurais podem ser
observáveis dependendo da disponibilidade de tecnologias cada vez mais refinadas. Mas
isso apenas levantaria novas questões, a começar pelo problema da sua ligação, que
Descartes acreditava já ter resolvido com a glândula pineal. Transformar realidades
psicológicas em realidades físico-químicas também seria um problema de reducionismo
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Esta duplicação ou representação mental, por mais que seja concebida em termos já
familiares de processamento, computação, codificação, armazenamento, recuperação, é,
no entanto, uma versão da mente numa tradição que vai de Descartes a Kant. A mente
como construção de representações do mundo segundo a concepção de Kant tornou-se
senso comum e a visão dominante na psicologia acadêmica (Packer 2011, pág. 143). No
entanto, uma abordagem representacional não é inevitável. Uma longa tradição, desde
Vygotsky e a psicologia da Gestalt até a psicologia ecológica de Gibson, mostra toda uma
variedade de abordagens holísticas além da dicotomia interior-exterior (Westerman e
Steen2007). Nos próprios termos mentais ou cognitivos, alternativas não
representacionais podem ser encontradas em termos de cognição situada ou mente
estendida – incorporada e incorporada no mundo (Clark2008; Gallagher e Crisafi2009;
Rowland2010; Thompson2007).
A interação entre teoria e experimento é complicada. Não é que as teorias surjam primeiro e
depois os experimentalistas as confirmem, ou que os experimentalistas façam descobertas que
são depois explicadas pelas teorias. A teoria e a experiência muitas vezes acontecem ao mesmo
tempo, influenciando-se fortemente uma à outra. (Weinberg1995, pág. 11).
Nas ciências comportamentais, o método é carregado de teoria, mesmo que apenas para assumir que os
fenômenos psicológicos são de uma certa maneira e podem ser estudados com um determinado método
(Bishop2007, pág. 50).
Na verdade,Bmétodo científico^ não existe realmente como algo em si,universal.
O que existe é oBdiscurso do método científico^. O discurso do método científico foi
estabelecido para servir a dois propósitos: Marcar os limites entre
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Não existe situação inexistencial; uma situação em que uma pessoa participa sempre
possui qualidades existenciais. Há sempre uma dimensão central de importância; hánão
existe uma situação neutra indiferente aos valores da vida de uma pessoa. (Pedersen e
Bang2016, pág. 473, destaque no original).
Não temos um método científico fixo para nos unirmos e defendermos. Lembro-me de
ter conversado, anos atrás, com uma professora do ensino médio que explicou com
orgulho que em suas aulas eles tentavam deixar de ensinar apenas fatos científicos e, em
vez disso, dar aos alunos uma ideia do que era o método científico. Respondi que não
tinha ideia do que era o método científico e achava que ela deveria ensinar fatos
científicos aos alunos. […]Penso que não adianta nada os cientistas fingirem que temos
uma ideia claraa prioriidéia do método científico. (Weinberg1995, pág. 8, 10).
Como espero que este livro mostre, a ciência raramente procede da maneira lógica e direta
imaginada por quem está de fora. Em vez disso, os seus passos em frente (e por vezes para
trás) são frequentemente acontecimentos muito humanos nos quais personalidades e tradições
culturais1 desempenham papéis importantes. […]Acredito que ainda persista uma ignorância
geral sobre como a ciência é “feita”. Isso não quer dizer que toda ciência seja feita da maneira
descrita aqui. Isto está longe de ser o caso, pois os estilos de investigação científica variam
quase tanto como as personalidades humanas. Por outro lado, não acredito que a forma como
o ADN surgiu constitua uma estranha excepção a um mundo científico complicado pelos
impulsos contraditórios da ambição e do sentido de jogo limpo. (Watson1968, Prefácio).
Nunca enfrentei um problema que fosse mais do que o eterno problema de encontrar
ordem. Nunca ataquei um problema construindo uma hipótese. Nunca deduzi teoremas
ou os submeti à verificação experimental. Até onde posso ver, eu não tinha nenhum
modelo preconcebido de comportamento – certamente não era fisiológico ou mentalista
e, acredito, não era conceitual. (Skinner1956, pág. 227).
Uma estrutura ontológica para a psicologia como uma ciência radicalmente humana
Seguindo este argumento, certa metafísica implícita que consiste numa ontologia
dualística com feedback do método científico natural estaria na base do dualismo
persistente em psicologia. Entende-se que a identificação da psicologia como ciência
natural se deveu provavelmente mais ao seu prestígio do que à sua própria complexidade
implícita no seu estudo. É hora de reconceber a psicologia como uma ciência humana
(social, cultural, comportamental), sem umaBcomplexô. Para isso, deveria ser levantada
uma questão ontológica relativa ao lugar da psicologia numa ontologia pluralista, e não
dualista ou monista.
(matemática, teoremas, teorias, geometria). Nem todos estão relacionados com todos os
outros, nem alguns se reduzem a outros. Uma dor de dente é tão real quanto a máquina
de escrever que existe (Skinner1945). A distância entre dois corpos não é em si corpórea.
Não há como fazer geometria sem desenhar linhas, mas por exemplo, a estrutura do
poliedro não é reduzida ou deduzida das linhas desenhadas. Embora toda realidade tenha
um aspecto ou momento físico (odanificadodente no caso do dentedor, linhas retas
formando um poliedro bidimensionalpercebido,porém, como um cubo tridimensional), a
matéria não deve ser confundida com a corporeidade física.BA matériâ aqui tem um
sentido semelhante arealseja físico, experiencial ou conceitual. Mas sem algum tipo de
materialidade física também nada existiria, por isso o materialismo é privilegiado como
doutrina filosófica em vez de, por exemplo, idealismo, espiritualismo ou mero
pragmatismo. A primazia do materialismo físico pode ser aceita sem ser a palavra final.
Dado o lugar da psicologia (M2) no meio e em relação a outras realidades (M1, M3) de
acordo com a ontologia de três gêneros seguida, vale mencionar uma tripla
dimensionalidade dos fenômenos psicológicos. É importante fazer isso para
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reconhecer que nem tudo é psicológico (o que seria uma espécie de reducionismo), nem o que
é precisamente psicológico está separado do físico (M1) ou institucional (M3). Isso se refere a
como os fenômenos psicológicos participam de forma mais ou menos visível ou relevante em
aspectos não psicológicos (M1e M3). Várias trilogias sugerem esta tripla dimensionalidade à sua
maneira. Eles são encontrados em Ortega y Gasset comovitalidade, alma e espírito (Ortega e
Gasset1924/1966), em Merleau-Ponty comoordem física, vital (virtual) e humana (Merleau-Ponty
1942/1963; Thompson2007, pág. 74), em Binswanger comoum bem (Bao redor do mundo ),
eigenwelt (Bpróprio mundô) emeio-dia (Bcom mundô) (Binswanger1958; Sullivan2015, pp.
28-31) e em Strasser comobios, pathoselogotipos (Strass1977).
Freud e Skinner tambémdelesversão. Em Freud seria a trilogiaid, ego, superego.
Skinner, que se refere a Freud a esse respeito, enfatiza que,BO comportamento humano é
o produto conjunto de 1) as contingências de sobrevivência responsáveis pela seleção
natural da espécie e 2) as contingências de reforço responsáveis pelos repertórios
adquiridos por seus membros, incluindo 3) as contingências especiais mantidas por um
ambiente social evoluídô ( Skinner1981, pág. 502).
Vale ressaltar a recente recuperação desta trilogia em seus termos clássicoscorpo, alma e
espírito (Weger e Wagemann2015b), ao longo de uma linha semelhante à de Ortega y Gasset (
1924/1966). Escusado será dizer que as noções de alma e espírito estão longe de qualquer
conotação cartesiana ou espiritualista. Pelo contrário, concordam bem com a concepção aqui
discutida, mesmo quando não pensada dentro das coordenadas do materialismo filosófico. No
que nos diz respeito, a concepção de Ortega y Gasset será retomada no que diz respeito aos
aspectos ontológicos que queremos mostrar.
Ortega y Gasset propôs fazer umBtectônica de uma pessoaŝ descrevendo sua topografia em
termos devitalidade, alma,eespírito.Vitalidade refere-se a issoBporção de nossa psique que vive
infundida no corpo,̂ aBintrabodŷ ou corpo vivido, com sua força vital e razões latentes muitas
vezes obscuras. A alma refere-se aoBregião de sentimentos e emoções, desejos, impulsos e
apetites.̂ O espírito é compreensão e vontade,Boperação racionalŝ obedecendoBnormas e
requisitos objetivos.̂
Essa tectônica da psique humana é importante por três razões. Em primeiro lugar, porque
enfatiza a dupla raiz corporal-vital (bios) e objetivo-conceitual (logos) da psique (pathos). Em
segundo lugar, permite ir além da dicotomia interior-exterior e do seu dualismo implícito, ao
conceber os acontecimentos privados como processos aninhados que constituem uma parte
constituinte da nossa actividade.emo mundo. As cognições não seriam uma realidade separada,
mas processos parciais que se articulam com outras partes do que uma pessoa está fazendo e
com aspectos da situação presente (Westerman e Steen2007). Em terceiro lugar, fornece uma
estrutura da pessoa sobre a qual transcende o reducionismo psicológico. Não considerar uma
ontologia pluralista (trigenérica) levaria facilmente ao psicologismo reducionista, e mais
frequente hoje, ao cerebrocentrismo, como se tudo surgisse de baixo para cima numa suposta
(inexplicável) complexidade neural crescente.
Permitam-me duas citações de Ortega y Gasset sobre a interação dessas três dimensões, como
todas elas são íntimas, mas a mais pessoal é a experiencial (alma, pathos). As outras duas dimensões
podem tornar-se impessoais, quer porque são actividades objectivas que todos nós faríamos da
mesma forma, porque fazem parte de uma normatividade partilhada (espírito, logos), ou então porB
caindo em processos corporais genéricos (vitalidade, bios).
Penso na medida em que permito que as leis da lógica se cumpram em mim e moldo a
atividade da minha inteligência ao ser das coisas. Portanto, o pensamento puro está em
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Nosso corpo, diz Ortega y Gasset, também não vive de si mesmo e de si mesmo. Espécie e
herança são poderes extraindividuais que atuam no corpo de cada indivíduo. Assim, a vitalidade
individual ainda seria participante de uma torrente de energia supraindividual,Bvitalidade
cosmiĉ ao extremo para que não faltassem circunstâncias em que o corpo, por assim dizer,
predomine sobre a individualidade. A esse respeito, Ortega y Gasset cita situações de máxima
exaltação corporal, como a embriaguez, o orgasmo e as danças orgíacas, como Btrazendo
consigo a dissolução da consciência individual e uma deliciosa aniquilação na unidade cósmica.̂
O riso e o choro poderiam ser incluídos aqui como limites do comportamento humano onde o
próprio corpo parece assumir o controle e responder por um, de acordo com o estudo de
antropólogos alemães e filósofo Helmuth Plessner (1970).
A excentricidade humana essencial – tomar sempre posição sobre si mesmo sem coincidir
totalmente consigo mesmo – é igualmente enfatizada pela antropologia adualista de Plessner
(Plessner1970).
Com base numa ontologia pluralista, não dualística ou monística, mas de três géneros de
realidade (físico-corporal, subjetivo-comportamental, objetivo-supraindividual), uma
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Nesta apreciação crítica, o problema não está na psicologia comoCiência,mas que tipo de
psicologia científicaé.O problema estaria na tentativa da psicologia de ser uma ciência natural
em vez de uma ciência humana, cultural, social ou comportamental. O problema também não é
a dualidade. Um duplo aspecto subjetivo-interativo é imposto aonaturezados fenômenos
psicológicos como experiências e modos de agir. O problema estaria em seu delineamento em
termos mentais internos e comportamentais externos, mais costurados do que entrelaçados. A
este respeito, propõe-se o novo quadro bem conhecido de sujeito e comportamento, em vez de
mente e comportamento, como a dualidade que melhor capta o lugar e o papel da psicologia
no todo de uma sociedade.Buniverso pluralista.
A relação entre alguém e o mundo não é primariamente uma relação de sujeito para objeto ou
o inverso, mas uma relação mutuamente constitutiva expressa como ser-no-mundo.
Pertencer ao mundo desta forma significa que a nossa forma essencial de nos
relacionarmos com as coisas não é puramente sensorial e reflexiva, nem cognitiva
ou intelectual, mas antes corporal e prática, articulada por umaBintencionalidade
motora. ^ Este ambiente-intencionalidade motora corporal constitui o que Merleau-
Ponty chama de Barco intencional que subentende a nossa relação com o mundo
integrando sensibilidade e motilidade, percepção e ação (Merleau-Ponty1945/1962,
pág. 136). O arco intencional e o estar-no-mundo não são exatamente subjetivos ou
objetivos, nem mentais ou físicos. São estruturas existenciais anteriores e mais
básicas que essas abstrações (Thompson2005, pág. 410). Nessa perspectiva, a mente
deixa de ser algo interior e é concebida como uma relação, e o mundo deixa de ser
algo exterior e é concebido como meio.
A intencionalidade operante é inerente ao comportamento. Refere-se a uma noção de
comportamento que envolve conhecimento implícito e compreensão do mundo, não uma mera
ação comportamental, mas um comportamento significativo (Yela1987). O comportamento
incorpora tanto a subjetividade corporal quanto a objetividade normativa, de acordo com a
ontologia tridimensional mencionada acima (Ortega y Gasset1924/1966; Weger e Wagemann
2015b). É um sentido de comportamento que capta a estrutura única da nossa articulação
corporal, afetiva e cognitiva com o mundo (Jacobs et al.2014, pág. 90). Esta noção de
comportamento (Verhaltung)é encontrado em HeideggerSer e Tempo com referência aBknow-
hoŵ relacionado com situações concretas. Em inglês é traduzido comoBformas de
comportamento/comportamento,̂Bmaneiras pelas quais o Dasein se comportâ (Jacobs et al.
2014, pág. 108, nota 1) ouBcomportamentô (Sembera2007, pág. 233). Esta noção de
comportamento é a mesma desenvolvida por Merleau-Ponty em seu livro Merleau-Ponty1942
trabalho intitulado em francêsA estrutura do comportamento,traduzido para o inglês comoA
Estrutura do Comportamento (Merleau-Ponty1942/1963).BStructurê aqui significa a forma
gestalt ou unidade de sentido (Thompson2007, pág. 67). Tal como a ponte descrita pedra a
pedra ou pelo arco que forma, o comportamento não define umas pedras ou outras (B
comportamentoŝ ,Bcogniçãoŝ ), mas o arco que eles formam.
Agora, além de Gibson, as affordances não se limitam ao seu papel funcional, mas também
podem ter um valor estético. De acordo com Jaan Valsiner:
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Nessa linha, a noção de affordance pode ser estendida paraBfornecimento de padrão socialŝ
relacionado a práticas coletivas e em forma de gerúndio, indicativo do processo dinâmico de
transações pessoa-ambiente. A disponibilização de padrões refere-se ao ponto em que uma
pessoa conhece e lida com a sociedade através de uma grande variação de padrões, que
orientam as práticas coletivas, bem como a construção de sentido e o desenvolvimento de uma
pessoa (Pedersen e Bang2016, pág. 474). A disponibilização de padrões leva ao processo de
subjetivação.
Conclusões e Discussão
Foi demonstrado que a psicologia, como ciência da mente e do comportamento, sofre de uma
ontologia dualística que consiste na distinção entre duas substâncias, uma mental, interna,
inobservável, e a outra comportamental, externa, observável (Schacter et al.2015;
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Westerman e Steen2007; Yela1987). Acredita-se que esse dualismo tenha sido superado
com a adoção do método científico oriundo das ciências naturais. No entanto, o próprio
método científico abriga uma metafísica dualista implícita que contribui para esse
dualismo (Packer2011; Slife et al.2012). A distinção entre dois planos de ordem
epistemológica, um hipotético-dedutivo e outro empírico-observacional, juntamente com
as dicotomias sujeito/objecto, teoria/prática e valor/facto, acaba por retroalimentar o
dualismo que supostamente superou (Bishop2007; Yela1987).
Este artigo propõe uma ontologia pluralista alternativa com implicações
epistemológicas para o status científico da psicologia. A partir destas duas conclusões,
discute uma série de pontos quentes da psicologia relativos à sua particularidade
científica, ao seu papel mediador em relação às outras ciências e a outras, bem como à
capacidade de integração da proposta.
tendência do momento. Contudo, não entra em colapso, não importa quantos reducionismos se
fechem em torno dele. Mas também não acaba por se impor e definir o seu papel mediador
entre realidades e tipos de ciência. O facto de não ruir apesar de tudo fala mais de uma
presença firme como entidade ontológica do que de uma mera subsistência por inércia ou
interesses. Contudo, a sua concepção como uma ciência supostamente natural da mente e do
comportamento, ou quando aplicável, como uma neurociência cognitiva com o seu dualismo-
monismo, não ajuda a definir a sua posição e papel no mapa de uma pluralidade ontológica e
epistemológica.
Nesse sentido, a psicologia foi concebida com base em umaBtectônica da pessoâ com
sua tridimensionalidade ontológica (Ortega y Gasset1924/1966). De acordo com a tripla
dimensão ontológica, a coparticipação do comportamento humano é concebida na
configuração das próprias realidades biofísicas e culturais e de suas relações. Nesse
sentido, as atividades psicológicas como ações humanas construtivas e transformadoras
no mundo, e a psicologia como ciência entre outras ciências teriam um papel mediador,
não redutível a elas, mas também não as reduzindo. Este papel mediador, construtivo e
transformador, da psicologia pressupõe uma noção de comportamento como relação
constitutiva do sujeito com o mundo diferente da noção de comportamento como se
fosse um instrumento da mente, bem como uma noção de umincorporado, incorporado e
promulgadosujeito, prático-manipulativo, diferente da mente interior ou, neste caso, do
cérebro como processador de informações (Jacobs et al. 2014; Merleau-Ponty1942/1963;
Thompson2007).
De acordo com esta ênfase no sujeito e no comportamento, o papel construtivo e
transformador da ação humana seria melhor compreendido (do que em termos de mente e
comportamento de acordo com os problemas mencionados), não apenas noBsemiosfera
(sociedade, cultura, instituições, normas, modos de vida), mas naBbiosfera (habitats, nichos) e
até mesmo naBgeosfera ^ (Antropoceno). Nem a cultura é por si só um agente transformador,
mas o faz através das ações humanas, nem se pode dizer hoje que os genes são os principais
agentes da evolução, mas sim o comportamento dos organismos. O comportamento dos
organismos, com a sua construção potencialmente selectiva de nichos e modos de vida, pode
alterar o próprio genoma e acabar por ter um papel mediador na evolução (Laland e Brown
2006). Nesse sentido, a psicologia se tornaria uma ciência mediadora entre comportamentos (B
semiosfera) e natural (Bbiosfera) ciências.
Da mesma forma, a psicologia também teria um papel mediador nas ciências
comportamentais. Assim, por exemplo, como reconhecem os economistas, a psicologiaBfatorŝ
(atitudes, medos, otimismo) seria o verdadeiroBactorŝ da mudança económica (inflação,
deflação, bolhas). Pegarexuberância irracional,por exemplo, de acordo com Robert Shiller:
A exuberância irracional é a base psicológica de uma bolha especulativa. Defino uma bolha
especulativa como uma situação em que notícias de aumentos de preços estimulam o
entusiasmo dos investidores, que se espalha por contágio psicológico de pessoa para pessoa,
amplificando no processo histórias que podem justificar os aumentos de preços e atraindo uma
classe cada vez maior de investidores. que, apesar das dúvidas sobre o valor real de um
investimento, são atraídos para ele em parte pela inveja do sucesso dos outros e em parte pelo
entusiasmo do jogador. (Shiller2015, pág. 2).
Além disso, em vez de ficar cega pelas suas neuroimagens, a psicologia lança luz sobre
a neurociência. Afinal, a psicologia teria que vir antes e depois da neurociência
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estudos: antes definindo os fenômenos a serem estudados no ou pelo cérebro e depois dando
sentido a eles, porque o sentido não é encontrado ou deduzido pelo cérebro. O BA piscadela
mencionada poderia ser um ponto de partida para o estudo de sua neurofisiologia (se não
houvesse a piscadela como fenômeno de interesse, ninguém o estudaria no cérebro), mas os
correlatos envolvidos não são a piscadela. Seu sentido ainda está na relação distal com os
fenômenos interpessoais, e não na relação proximal neural adjacente.
questão de pesquisa, sem pensar muito se esta era uma abordagem qualitativa ou
quantitativa (Brinkmann2015, pág. 171). Como continua Brinkmann, talvez o futuro
seja o da investigação pós-qualitativa.
Não porque os psicólogos parem de fazer entrevistas, trabalho de campo ou outros tipos de
trabalho qualitativo (espero certamente que não!), mas porque param de definir os seus
esforços de investigação em termos de um método (Brinkmann2015, pág. 171; ver também
Lilienfeld et al.2015).
Então estaria no mesmo nível das ciências naturais, que não têm as disputas
típicas sobre o método científico como a psicologia tem tido até agora. Como diz
Michael Mascolo,
Um debate sobre se uma determinada disciplina é ou não uma ciência parece ser mais
uma batalha sobre estatuto e prestígio do que sobre a identificação de caminhos
alternativos para o conhecimento fiável. Uma questão melhor poderia ser, dado o seu
objecto, como podemos estudar os processos psicológicos de forma sistemática, fiável e
útil? Se tais condições pudessem ser satisfeitas, a questão de saber se as práticas
disciplinares são científicas ou não seria irrelevante. (Mascolo2016, pág. 553).
Existe ordem e variação. Quer dizer que se quisermos estudar essa ordem, devemos examinar o
que as pessoas reais realmente fazem em tempo real e em vários tempos e lugares. Sob tais
condições de avaliação, a complexidade da ordem psicológica e da variação torna-se mais clara
e os traços tornam-se menos semelhantes a traços. (Mascolo2016, pág. 550).
caráter do ser humano, suscetível a uma diversidade de modos de ser dependendo de modos
de vida historicamente dados e socialmente organizados. O problema deve-se, na verdade, à
atitude científica dominante na psicologia como uma ciência supostamente natural, que
descreve como funciona a mente de um sujeito universal. Os psicólogos teriam que reconhecer
Bque toda psicologia, incluindo a psicologia dos EUA, é inevitavelmente indígena; isto é, está
incorporado e é um produto da cultura circundante e das condições sociais locais.̂ (Christopher
et al.2014, pág. 648). Segundo Valsiner,
A restauração do foco nos processos subjetivos de cultura dos seres humanos em seus
atos intencionais de viver suas vidas é a contribuição que a globalização pode trazer para
a Psicologia.̂ (Valisner2013, pág. 257).
Por uma Ciência da Psicologia mais IntegrativaA psicologia como ciência do sujeito e do
comportamento permite ainda a integração de outras abordagens da psicologia:
comportamental (contextualismo funcional, behaviorismo radical), cognitiva (mente
incorporada, incorporada, promulgada, amalgamada), ecológico-cultural (recursos,
padrões de concessão, semiótica) , fenomenológico-existencial (ser-no-mundo,
hermenêutica, perspectiva em primeira pessoa); humanista-experiencial (focalização,
centrada na pessoa), psicanalítica (contextualismo fenomenológico, nova introspecção),
em busca de umaqualitativopsicologia como ciência do ser humanopsique (Gergen et al.
2015; Valsiner et al. 2016). Os próprios mundos subjetivos das pessoas foram distanciados
da ciência, levando, no nosso século XXI, a apelos renovados porBtrazendo o subjetivo
para dentro da ciência da psicologia (Valisner2013, pág. 257).
Aprovação éticaEste artigo não contém estudos com participantes humanos ou animais realizados por
qualquer um dos autores.
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Marino Pérez-Álvarezé Professor de Psicologia Clínica na Universidade de Oviedo. Seus tópicos de pesquisa
incluem o desenvolvimento de uma abordagem contextual da psicologia como ciência comportamental e a
reconceitualização fenomenológico-existencial da psicopatologia. Os seus trabalhos caracterizam-se pela
abordagem de questões psicológicas na intersecção das ciências naturais, das ciências sociais e das
humanidades. É autor de mais de cem artigos em revistas especializadas, além de numerosos capítulos de
livros e livros. Entre os livros mais recentes (em espanhol) estão O Mito do Cérebro Criativo: Corpo,
Comportamento e Cultura, As Raízes da Psicopatologia Moderna: Melancolia e Esquizofrenia, Terapias de
Terceira Geração como Terapias Contextuais e Retornando ao Normal: invenção do TDAH e da bipolaridade
infantil. transtorno (como coautor).