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Razão louca versus Razão sábia

O século XVIII entronizou a Razão que tinha como parceira a Ilustração. O Iluminismo que
suplantara as trevas da Idade Média já trouxera para a história humana a esperança de que a Ciência
esmagaria todas as formas de superstição. A crença no ideal científico alimentara a grande
revolução de 1917, na Rússia, cuja visão utópica era a abolição de todas as classes com a realização
do comunismo. O clima de otimismo que se seguiu à segunda guerra mundial alimentou a literatura,
a cinematografia e a música que apontavam para um novo homem. Essa nova humanidade
liquidaria a exploração do trabalho (Marx) e o esmagamento dos preconceitos de raça, de gênero ou
sexo (Freud).
Essa movimentação gigantesca do espírito humano em busca da realização da Razão (Hegel)
veio abaixo, como um castelo de cartas, com o fim da União Soviética. O capitalismo não deu um
só tiro para executar essa façanha e os EUA assumiram a condição de donos do mundo. O ocidente
em decadência dominado pelo irracionalismo agora vê surgir a China como grande potência
mundial. A ética protestante que tinha sido o grande sustentáculo da Ilustração na cultura capitalista
e nutrira o saber e o poder ocidentais, desapareceu. Esse nutriente foi substituído por uma
banalização do protestantismo, cuja visão se limita a uma prosperidade baseada no fetichismo do
dinheiro. O catolicismo, por seu turno, abandonou sua inserção popular, afastando-se da teologia da
libertação. O irracionalismo na sua forma política de extrema direita tematiza o ódio à diferença
como seu combustível.
A nova versão do nazifascismo veste-se com as mesmas roupas do seu antecessor, ou seja,
negros, indígenas e população LGBTQI+ devem ser anuladas ou exterminadas. As debilitadas
estruturas democráticas ocidentais diante dos fracassos econômicos e sociais apresentam a
meritocracia como substituto para a democracia. A ONU enfraquecida não impede as guerras por
procuração que o império em declínio (EUA) promove (Ucrania, Faixa de Gaza e Iêmen). A
filosofia atônita volta à Platão com sua metáfora da caverna para dizer que o homem que vem à luz
do sol fica escandalizado com a loucura do próprio homem (Alain Badiou).
Nesse contexto, líderes transloucados mobilizam o inconsciente de grupos paranoicos que
veem no “inimigo” um perseguidor a destruir. Dessa forma, tudo o que era conceitualmente sólido
se dissolve no ar, criando um ambiente sociocultural, cujo lema é o gozo desatinado. As
mercadorias fetichizadas transformam também o homem em mercadoria através de processos
disciplinares em que saber e poder se entrelaçam (Foucault). Essa frivolidade geral dispensa o
pensamento crítico que é substituído pelo ato, enquanto o comportamento se torna pura estética do
corpo na cirurgia plástica indiscriminada. Diante desse pequeno esboço da sociocultura humana no
mundo é preciso apontar para a destruição ecocida que está levando o planeta a terríveis mudanças
climáticas. A desobediência às determinações dos encontros das COPs evidencia a tendência ao
desrespeito das regras, pois na Groelândia o revestimento de gelo que cobre a gigantesca ilha já está
reduzido em mais de um terço. A Razão louca triunfará?
Construir uma nova razão exige esforço prático e conceitual de intelectuais orgânicos e
lideranças políticas consagradas. Lula é atualmente o líder mais reconhecido desta nova
racionalidade. O contencioso com Israel não é questão numérica, mas do fato objetivamente
constatado de que a empreitada colonizadora israelense já matou mais de 70 mil palestino, sendo a
esmagadora maioria de mulheres e crianças. Assim, para maior precisão nocional pode se dizer que
o exército israelense promove um genocídio na Faixa de Gaza.
O pensamento sábio está na grandeza política internacionalmente reconhecida de Luiz
Inácio Lula da Silva.
Valton de Miranda Leitão – Psiquiatra e Psicanalista. Doutor Honoris Causa pela UFC

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