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I M P L I C A Ç Õ E S PA R A O

BRASIL
O ano de 2024 começa com um sentimento de otimismo no Brasil. O segundo
ano do mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá ser mais
desafiador que o primeiro, conforme o arrefecimento da economia pesa
sobre o seu governo e a meta de zerar o déficit fiscal se prova uma tarefa
árdua. No entanto, essas perspectivas não são suficientes para abater o
otimismo dos mercados locais. A bolsa de valores atinge novas máximas, o
dólar se afasta da marca dos cinco reais e as emissões de títulos mostram
crescimento constante.

Chame isso de sensação de retorno à normalidade após anos de crises. Ao mesmo tempo,
há o reconhecimento de que Brasília ainda é capaz de implementar reformas estruturais
importantes, como a fiscal, apesar da crescente polarização política e das disputas contínuas
entre os três poderes.

O relatório Top Risks 2024 da Eurasia Group destaca riscos e oportunidades significativos que
acreditamos que afetarão a maior economia da América Latina. A boa notícia é que o Brasil
está relativamente bem-posicionado para enfrentar dois dos três maiores riscos geopolíticos
esperados: o Oriente Médio à beira do precipício (risco nº 2) e a Ucrânia Particionada (risco nº
3). Ser um produtor de alimentos e energia permite ao país colher benefícios econômicos dos
deslocamentos provocados por qualquer desses riscos; mas o Brasil também pode, de forma
mais ampla, lucrar com o reposicionamento de investimentos em um mundo geopoliticamente
controverso. A má notícia é que o Top Risks deste ano aponta riscos políticos internos latentes
que poderão começar a manifestar-se em 2024 (riscos nº 1 e nº 4), assim como alguns ventos
contrários importantes na economia global que poderão minar o crescimento doméstico (riscos
nº 6 e nº8).

Aqui estão algumas das principais conclusões do relatório Top Risks 2024 da Eurasia Group
para o Brasil. A lista completa dos dez principais riscos globais pode ser acessada no relatório
completo, aqui.

• Primeiro, as boas notícias para o Brasil. Num mundo G-Zero, os riscos geopolíticos
permanecerão estruturalmente elevados em 2024. Isso será evidente com a turbulência
em curso no Oriente Médio, o conflito na Ucrânia e o eixo dos chamados estados párias
(risco nº 5). O Brasil e alguns outros líderes do Sul Global têm a ganhar em termos relativos
com o deslocamento dos fluxos de investimento impulsionado por empresas e investidores
em busca de proteção. Ser produtor de alimentos e energia e ter fontes de energia de
baixo carbono ajuda o Brasil nesse contexto. Não por acaso a UE esteve interessada, no
ano passado, em assinar um acordo de livre comércio com Mercosul—embora o pacto não
tenha sido ratificado. Os formuladores de políticas da UE—assim como o setor privado
da Europa—consideram o acordo vital, dadas as necessidades energéticas e de segurança
alimentar do continente.

• A competição para produzir minerais críticos para a economia verde e digital (risco nº 7)
é uma clara oportunidade para o Brasil—ainda que possa ser desperdiçada, a depender de
preocupações regulatórias ou ambientais. À medida em que governos em todo o mundo
adotam medidas protecionistas para garantir o controle sobre insumos críticos para a
produção de baterias e semicondutores, o Brasil poderá atrair interesse para algumas de
suas reservas, muitas ainda inexploradas. O país possui, por exemplo, o terceiro maior
depósito de grafite do mundo—item crítico para a produção de veículos elétricos. A ameaça
chinesa de controlar as exportações já levou empresas a acelerar investimentos em minas
na Bahia. O Brasil também tem reservas substanciais de níquel, fosfato e terras raras.

• Por último, embora guerras no Oriente Médio (risco nº 2) e na Ucrânia (risco nº 3) possam
prejudicar a economia global ao provocarem aumento de preços de alimentos e energia,
o Brasil, como fornecedor de ambos, sofre relativamente muito menos. Petróleo mais
caro em 2024 resultará em preços internos de combustíveis mais elevados, mas ao mesmo
tempo em receitas maiores advindas da produção da commodity. A maior vulnerabilidade
macroeconômica do Brasil são suas contas fiscais—mas uma alta nas receitas, tal como a vista
após a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, aliviaria essa preocupação. Essas guerras, no
entanto, poderão fazer com que o Brasil tenha mais dificuldade de assumir seu papel como
líder diplomático enquanto anfitrião do G20 este ano—especialmente conforme os conflitos
jogam, cada vez mais, os EUA (e, em menor grau, a Europa) contra os países do Sul Global.

• As más notícias vêm de diversas frentes. Notadamente, as eleições nos EUA (risco nº 1) e a
inteligência artificial não governada (risco nº 4) são lembretes claros de questões internas
problemáticas que, em sua maior parte, estiveram adormecidas em 2023. Assim como
os EUA, o Brasil é um país profundamente dividido e polarizado, no qual a confiança na
imprensa, na justiça e nos líderes políticos é estruturalmente baixa. Quase um terço do
eleitorado acredita que o ex-presidente Jair Bolsonaro venceu as eleições presidenciais de
2022, e cerca de 40% dizem que votariam nele novamente. No ano passado, o crescimento
econômico acima do esperado e o recuo nos preços dos alimentos mantiveram a aprovação
de Lula acima dos 50%—e a oposição bolsonarista afastada. Mas a provável queda nos
números do presidente em 2024 em meio a um crescimento mais fraco pode estimular a
oposição—o que, por sua vez, levaria Lula a pressionar mais a situação fiscal de seu governo.

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Ainda que isso não vá prejudicar a direção geral da gestão econômica ou a estabilidade
política, políticas mais polarizadas poderão ressurgir, com ferramentas melhoradas para
a desinformação e um governo mais fraco—um aviso de que o ambiente politicamente
carregado de 2022 deverá regressar nas eleições de 2026.

• O Brasil também deve se preparar para a potencial eleição de Donald Trump para a
presidência dos Estados Unidos em janeiro próximo. Se isso acontecer, as relações entre
os dois países devem esfriar e se tornar significativamente mais voláteis. Nesse cenário, as
empresas brasileiras poderão sofrer com a imposição de novas tarifas e políticas comerciais
ainda mais agressivas que no primeiro mandato de Trump. A cooperação ambiental, por
sua vez, incluindo fundos para o combate ao desmatamento e outros investimentos verdes,
enfrentará mais dificuldades.

• Ao mesmo tempo, a inteligência artificial (risco nº 4) cativa usuários e preocupa autoridades


no Brasil e ao redor do mundo. A proximidade das eleições municipais, marcadas para
outubro, instigaram o interesse do congresso em regulamentar ferramentas de IA para
restringir o uso de táticas de desinformação pelas campanhas. No entanto, como mostra
o Top Risks, esses esforços regulatórios devem ser infrutíferos, dada a velocidade com que
novas ferramentas são desenvolvidas. As inovações esperadas para 2024, possivelmente
envolvendo linguagem não-escrita e algoritmos mais personalizados, farão com que os
chatbots atuais pareçam obsoletos. Apesar dos riscos, a IA pode aumentar a produtividade
de toda a economia, conforme empresas, trabalhadores e estudantes aprendem a usar os
robôs como copilotos (embora o Brasil esteja entre os últimos países do G20 em termos de
políticas e investimentos relacionados ao tema). Neste contexto, há um perigo importante
de que uma regulamentação precipitada e mal elaborada possa travar prematuramente o
uso dessas ferramentas no país, prejudicando a competitividade de suas empresas.

• Os riscos econômicos (nºs 6 e 8) têm implicações diretas para o Brasil, especialmente os


relacionados à China, maior parceira comercial do país. O menor crescimento econômico
chinês prejudica o dinamismo brasileiro, reduzindo o crescimento e a arrecadação. A
forte centralização política nas mãos do Presidente Xi Jinping reduz as chances de que
a China passe por uma crise aguda em 2024, mas aprofunda as distorções estruturais no
longo prazo. Essa situação reforça a importância do Brasil abrir novos mercados para
seus produtos, não só na Ásia como em outros continentes. O acordo UE-Mercosul poderá
avançar, embora uma ratificação seja improvável em 2024, e novas negociações para mais
comércio e investimento deverão estar nos planos brasileiros.

• Por último, o papel dos BRICS em 2024 é notável—não como um risco, mas como uma
distração. Diferenças internas entre China, Índia, Brasil e outros países impedem o grupo
de servir de modo eficiente como contraponto ao poder do G7 e outras instituições lideradas
pelos EUA e Europa. Além disso, o envolvimento do Brasil nos BRICS não é um sinal de que
a diplomacia do país esteja mais inclinada a favor da China que aos EUA.

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