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Título original: In duo praecepta caritatis et in decem legis praecepta: de dilectione Dei
Opuscula theologica
ISBN 978-65-992185-0-7
PARTE I
CAPÍTULO I
Tratado dos dois preceitos da caridade e dos dez mandamentos da lei de Deus
.......................................................................... 27
CAPÍTULO II
Do amor de Deus ...................................................................... 43
CAPÍTULO III
Do amor do próximo ................................................................. 51
PARTE II
CAPÍTULO IV
Do primeiro preceito da lei .......................................................... 63
CAPÍTULO V
Do segundo preceito da lei .......................................................... 73
CAPÍTULO VI
Do terceiro preceito da lei ........................................................... 83
CAPÍTULO VII
Do quarto preceito da lei ............................................................ 97
CAPÍTULO VIII
Do quinto preceito da lei ........................................................... 109 CAPÍTULO X
Do sétimo preceito da lei .......................................................... 133
CAPITULO IX
Do sexto preceito da lei ............................................................ 123
CAPÍTULO XI
Do oitavo preceito da lei ........................................................... 141
CAPÍTULO XII
Do nono preceito da lei ............................................................ 151 CAPÍTULO XIII
Do décimo preceito da lei.......................................................... 157
ANEXO I
CATEQUESE ........................................................................ 165
EXAME DE CONSCIÊNCIA ..................................................... 166 Para confissão
ATO DE CONTRIÇÃO............................................................ 172
ANEXO II
PINTURA .......................................................................... 173 A Confissão, 1838 de
Giuseppe Molteni
APRESENTAÇÃO
Pasme quem pensava que quando São Paulo na primeira carta aos
Coríntios disse que, mesmo que falasse as línguas dos homens e
dos anjos, que tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os
mistérios e toda a ciência, que tivesse toda a fé, que distribuísse
todos os seus bens em sustento dos pobres, e ainda que
entregasse o seu corpo para ser queimado, mas se não tivesse
caridade, nada seria e de nada valeria (cf. 13,1-4), pasme quem
pensava que ele estava se referindo a caridade como um
sentimento piedoso, ou que se referia a um amor natural, romântico
ou poético. Não. Ele se referia ao amor-graça, ao amor-dom, ao
amor-alma, ao amor-vida, ao amor-vivificante, a virtude sobrenatural
da caridade indelevelmente unida a graça santificante, selo de
Deus, ao Espírito Santo, Dom de Deus, a inabitação trinitária na
alma justificada, alma do justo, alma em graça de Deus. Ele se
referia àquele amor de Cristo quando disse: “Dou-vos um novo
mandamento: Amai
-vos uns aos outros. Como eu vos tenho amado, assim também vós
deveis amar-vos uns aos outros. Nisto todos conhecerão que sois
meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,34-35), ou
“Amai-vos uns aos outros, como eu vos amo” (Jo 15,12). Como
Cristo nos ama? Quem é o Amor de Cristo,Amor do Filho pelo Pai e
do Pai pelo Filho? Isso mesmo. É o Espírito Santo. Assim Cristo nos
ama, no Espírito Santo. Só se pode amar como o Pai, dando o Filho,
só se pode amar como o Filho, dando a vida, quem ama no Espírito
Santo, Espírito de Amor. Daí que São João afirma: “Aquele que não
ama não conhece a Deus, porque Deus é amor” (1Jo 4,8). E São
Paulo: “Vós, porém, não viveis segundo a carne, mas segundo o
Espírito, se realmente o espírito de Deus habita em vós. Se alguém
não possui o Espírito de Cristo, este não é dele.Ora, se Cristo está
em vós, o corpo, em verdade, está morto pelo pecado, mas o
Espírito vive pela justificação” (Rm 8,9-10).
A primeira delas diz que o amor se deve pôr mais nas obras que nas
palavras. De fato, a caridade não deve ser somente afetiva, mas
também efetiva. A Sagrada Escritura é cheia de exortações sobre
esta verdade, vejamos algumas delas:
• Mt 7,21: “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor,
13 Exercícios Espirituais, 230-231.
entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de
meu Pai que está nos céus”14.
Filho único”.
• 1Jo 4,10: “Nisto consiste o amor: não em termos nós ama
do a Deus, mas em ele nos ter amado e enviado seu Filho
para expiar nossos pecados”.
• 1Jo 4,19: “Amemos a Deus, porque Deus nos amou primeiro”.
Dizia São Bernardo: “Só com amor a criatura pode intercambiar o
amor de Deus por ela, ainda que de modo desproporcionado”. Amor
com amor se paga. Para Santo Tomás, a semelhança é a causa do
amor. Se aplicamos isso a nossa relação com Deus, a graça que
está em nós é que nos faz semelhantes a Ele. Portanto, a graça é
que nos faz capaz de amá-Lo. Quando o Senhor pediu tríplice
confissão de amor de Pedro, na verdade pedia que ele devolvesse o
que era seu, o amor.
Devemos erradicar em nós tudo aquilo que não é amor a Deus. Se
entre nós e Deus não tem amor, não é culpa de Deus, é culpa
nossa. O cristão sempre que se aproxima de Deus sente alegria e o
desejo de comunicá-la. Cristo não escondeu sua tristeza, mas
escondeu sua alegria, porque sua alegria é tão grande quanto Deus.
O Amor de Deus é contrário ao amor próprio. A caridade se antecipa
as necessidades do próximo e faz com que saiamos de nós
mesmos. Disse Cristo: “Eu estou no meio de vós, como aquele que
serve” (Lc 22,27). Nesse sentido, é extremamente estimulante o
texto de São Paulo aos Gálatas: “Aquele que recebe a catequese da
palavra, reparta de todos os seus bens com aquele que o instrui.
Não vos enganeis: de Deus não se zomba. O que o homem semeia,
isso mesmo colherá. Quem semeia na carne, da carne colherá a
corrupção; quem semeia no Espírito, do Espírito colherá a vida
eterna. Não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo
colheremos, se não relaxarmos. Por isso, enquanto temos tempo,
façamos o bem a todos os homens, mas particularmente aos irmãos
na fé” (6,6-10).
AO LEITOR
Evangelium non erubesco
Bem sei que para ser cristão não basta conhecer e praticar a moral
do Evangelho, mas é preciso ainda acreditar nos dogmas e seguir o
culto da Religião divina. Estou mesmo intimamente convencido de
que os dogmas e o culto são, como se tem dito, os dois esteios
sólidos e necessários da moral, e que é sobretudo pela união de
seus dogmas com a sua moral, que o Cristianismo tem gerado todos
esses prodígios e maravilhas que assombram o universo. Mas, tal é
o mecanismo da Religião divina, que todas as suas partes se ligam
e se atraem irresistivelmente, e pode-se com segurança trabalhar no
aumento de uma sem que as outras sofram. Entretanto, a moral do
Decálogo e do Evangelho, parece-me em todo o caso o prelúdio
mais feliz para o ensino da fé católica, que não pode ter maiores
inimigos do que a perversidade do coração e o desregramento da
vida. Seria da minha parte temeridade se quisesse empreender o
elogio do autor que escolhi. Quem haverá que desconheça o grande
e venerável nome de Santo Tomás de Aquino? Qual o cristão que
não tenha alguma ideia desse gênio assombroso, que o testemunho
dos séculos tem imortalizado com epítetos de Anjo da escola e de
Doutor Angélico? Qual o homem de algumas letras que não tenha
hoje notícia do seu vasto saber, e erudição nas coisas divinas e
humanas, depois que o moderno apóstolo do catolicismo (o imortal
Ventura) se encarregou de desenvolver e vulgarizar as suas
doutrinas, armando-se delas, como de poderosa clava, para
esmagar o racionalismo europeu, restabelecer a verdadeira filosofia
e com ela os direitos da Revelação? Se alguém houver que não
esteja em alguma destas hipóteses, a este talvez poderá talvez
servir mais do que a ninguém o Tratado dos Dois Preceitos da
Caridade, e dos Dez Mandamentos da Lei, pequeno volume onde os
mais doutos e esclarecidos têm encontrado verdadeiro chefe de
obra, em tudo digno do insigne teólogo e profundo filósofo que
produziu as duas Sumas.
CAPÍTULO 1
TRATADOS DOS DOIS PRECEITOS DA CARIDADE
E DOS DEZ MANDAMENTOS DA LEI
1. Três coisas são necessárias ao homem para andar no caminho
da salvação: a ciência da fé, a ciência dos desejos, a ciência das
obras. Destas três ciências, a primeira nos é ensinada no símbolo
(que vulgarmente chamamos: Creio em Deus Pai), onde estão
formulados todos os dogmas da nossa Religião; a segunda, na
oração dominical (que é o Padre Nosso); a terceira, na lei. Vamos
ocupar-nos com a ciência das obras. Quatro leis presidem as
nossas ações: a primeira é a lei natural, que não é outra coisa
senão a consciência, luz intelectual posta por Deus em nossa alma,
e que nos mostra o que devemos fazer e o que devemos evitar. Esta
luz intelectual, esta lei natural, Deus fez dela presente ao homem
apenas criado. Entretanto, não faltam indivíduos que julgam escusar
suas culpas pretextando a ignorância de seus deveres; a esses é
que convém aplicar estas palavras do Rei profeta, Muitos dizem:
quem nos ensinará o que é bem?15 Como se não soubessem o que
devem fazer! Porém o Rei profeta lhes responde nestes termos:
Senhor, vós pusestes em nós a vossa luz. Isto é, essa luz intelectual
que nos esclarece sobre nossos deveres.
15 Sl 4,7.
Ninguém pode ignorar, por exemplo, que não deve fazer a outrem o
que não quereria que lhe fizessem; e os outros preceitos da lei
natural estão igualmente gravados na consciência de todos. Esta lei,
dizemos, foi dada ao homem no momento da criação; mas o
demônio submeteu a criatura de Deus a uma outra lei, a lei da
concupiscência. Enquanto o primeiro homem foi fiel ao seu Criador,
observando os preceitos divinos, a carne obedeceu também ao
espírito, e os sentidos permaneceram submissos à razão.
4. Mas, convém notar que entre a lei do temor e a lei do amor existe
tríplice diferença. A primeira é que a lei do temor nos impõe
obediência servil, ao passo que a lei do amor nos pede uma
submissão voluntária e livre. Aquele que obra pelo temor, obra como
escravo, mas aquele cujas ações não tem outro motivo senão o
amor, obra como homem livre e a sua obediência é toda filial. Onde
há o Espírito do Senhor, diz São Paulo, aí há liberdade19. Com
efeito, graças ao amor, o homem obedece a Deus como um filho a
seu Pai. A segunda diferença é que a lei do temor prometia os bens
temporais àqueles que observassem seus preceitos, ao pas
17 Eclo 1,16.
18 Hb 10,28.
30 1Jo 3,14.
31 Jo 14,23.
32 1Cor 13.
13. O amor divino produz ainda em nós uma paz perfeita. Quando o
coração do homem é animado por um amor terreno, acontece
muitas vezes que depois de ter possuído o objeto de seus desejos,
ainda se acha inquieto, e ainda deseja outra coisa; porque o
coração do ímpio é como um mar agitado, que não pode acalmar.44
Não há paz para os ímpios45, diz o Senhor. Mas não acontece assim
com o que é animado pelo amor divino. Quando se ama a Deus,
goza-se de perfeita paz. Senhor, exclama o Salmista, gozam muita
paz os que amam a tua lei, e não há para eles tropeço.46 E qual a
razão? Não é porque Deus só pode preencher a multidão de nossos
desejos? A imensidade de Deus não é maior do que o vácuo de
nosso coração, como diz o Apóstolo? Meu Deus, exclama Santo
42 Eclo 2,10.
43 1Jo 4,16.
44 Is 57,20.
45 Ibid.
46 Sl 118,165.
Agostinho Vós nos fizestes para vós, e nosso coração está inquieto
enquanto não descansa em vós47. Ó minha alma! exclama também
o Rei profeta, bendize ao Senhor que enche de bens o teu desejo48.
15. O amor divino não torna somente o homem livre, mas também o
faz filho de Deus. Sim, graças ao amor, obtemos o título de filhos de
Deus, e o somos verdadeiramente, segundo o que diz ainda São
João52 adquirimos assim direito à herança de nosso Pai celeste, e
esta herança é a vida eterna. O Espírito Santo, diz o grande
Apóstolo, dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de
Deus, e se somos filhos de Deus somos também seus herdeiros,
herdeiros verdadeiramente de Deus, e coerdeiros de Cristo.53 Os
justos, diz também Salomão, têm sido contados entre os filhos de
Deus.54
II DO AMOR DE DEUS
CAPÍTULO 2
DO AMOR DE DEUS
21. Quando os Doutores da lei mosaica perguntaram a Jesus qual
era o maior e o primeiro mandamento, ele lhes respondeu:Amarás o
Senhor, teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo
o teu entendimento; tal é o maior e o primeiro mandamento.68 É com
efeito este o mais importante, o mais sublime, o mais útil de todos
os mandamentos, e nele se contém todos os outros. Mas, quatro
condições são necessárias para o perfeito cumprimento deste
preceito.
28. Não basta porém que a intenção seja boa para que a ação
também o seja. É necessário que essa boa intenção seja
acompanhada de vontade reta; e é o que nos quer dar a entender o
Evangelho quando nos manda que amemos a Deus de toda a nossa
alma, pois a alma é a vontade. Muitas vezes obra o homem com
boa intenção, mas sem mérito, porque, além dessa boa intenção
não tem uma vontade reta. Por exemplo, furtar para nutrir um pobre
que morre de fome é obrar com boa intenção, mas a bondade da
intenção não escusa o mal que se comete por falta de retidão na
vontade. São criminosos, diz São Paulo, os que querem fazer o mal
para que venha o bem.85 A retidão da vontade é unida à bondade
da intenção quando a vontade humana está também de acordo com
a vontade divina; e é o que pedimos todos os dias pedindo a nosso
Pai celeste; seja feita a vossa vontade assim na terra como no Céu.
É esse mesmo acordo que exprime o Rei profeta quando diz:
Senhor, quero fazer a tua santa vontade.86 Eis aí pois porque o
Evangelho nos ordena que amemos também a Deus de toda a
nossa alma, pois a alma, repito, é muitas vezes tomada na Sagrada
Escritura pela vontade; a desobediência, diz o Senhor, desagrada a
minha alma, isto é, está em desacordo com minha vontade.87
81 Sl 61,9.
82 Mt 22, 37; Lc 10, 27; Mc 12,30.
83 Lc 11,34.
30. Mas não basta amar a Deus de todo o nosso coração; de toda a
nossa alma, de todo o nosso entendimento; devemos também amá-
lo de todo o nosso poder, de todas as nossas forças: Senhor, diz o
Rei profeta, é ao teu serviço que quero consagrar a minha força.91
Homens há que consagram sua força ao pecado, que não revelam
seu poder senão no vício; É a estes que se dirigem estas palavras
ameaçadoras de Isaías: Desgraçados de vós que só tendes força
para vos entregardes à devassidão, e coragem para vos
embriagardes.92 Outros há que desenvolvem em detrimento de seu
próximo o poder que deveriam empregar servindo seus interesses:
Arrancai à morte aquele que vai perecer93, diz Salomão. É assim
que convém mostrar-se forte e poderoso. Devemos portanto para
cumprir plenamente o preceito do amor divino, dar a Deus, nosso
coração, nossa alma, nosso entendimento, nossa força, isto é, ter a
Deus por alvo de nossa intenção, de nossa vontade, de nossos
pensamentos e de nossos esforços.
89 Is 1,16.
90 Pr 3,5.
91 Sl 58,10.
92 Is 5,22.
93 Pr 24,11.
CAPÍTULO 3
DO AMOR DO PRÓXIMO
31. Quando os doutores da lei perguntaram a Jesus Cristo qual era
o maior mandamento, duas respostas deu Ele a esta única
pergunta. Primeira: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu
coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento, e de todas
as tuas forças e desta primeira parte do preceito já temos tratado.
Amarás, acrescentou Ele, o teu próximo como a ti mesmo. Ora,
convém observar que o cumprimento desta segunda parte do
preceito encerra o cumprimento de todos os deveres do homem
para com o homem: no amor, diz o Apóstolo, está todo o
cumprimento da lei.94 Quatro motivos nos convidam ao amor do
próximo.
32. O primeiro é o amor divino: Mente aquele que disser que ama a
Deus detestando seu próximo.95 Não é porventura mentir o avançar
que se ama alguém detestando seus filhos e sua família? Ora, todos
os fiéis são filhos de Deus, e não formam mais que uma só família
de que Deus é o pai. Vós sois, diz São Paulo, o corpo e os membros
de Jesus Cristo96. Por consequência, aquele que aborrece seu
irmão, não pode amar a Deus, que é nosso pai comum.
que Jesus Cristo nos deu antes de deixar a terra, Ele principalmente
recomendou à nossa obediência o amor do próximo, dizendo aos
seus discípulos; Eis aqui o preceito que eu vos dou: amai-vos uns
aos outros como eu vos amei.97 Não se pode portanto cumprir a
vontade de Deus detestando o próximo, e o testemunho o mais
assinalado à lei divina é o amor que temos aos nossos irmãos. Por
isso Nosso Senhor mesmo disse: Nisto conhecerão todos que sois
meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.98 Ele não disse:
reconhecer-vos-ão pelo poder que vos foi dado de ressuscitar os
mortos, ou por algum outro sinal estrondoso, mas pelo amor que
tiverdes uns aos outros. São João apreciava devidamente toda a
importância do preceito de seu Divino Mestre; e por isso dizia:
Passamos da morte à vida; e porquê? Porque amamos os nossos
irmãos. Aquele que não ama permanece na morte.99
45. É um dever para todos não só desejar a ruína dos maus, mas
também concorrer para ela, por amor do interesse geral. De certo
não é pecado dar a morte aqueles que a mereceram por seus
crimes. Os príncipes, diz São Paulo, são os ministros de Deus, e
não é debalde que trazem a espada da justiça.121 Os que velam na
manutenção das leis, não violam o preceito da caridade ferindo o
criminoso; se o punem, é umas vezes para castigá-lo, outras vezes
para garantir a segurança pública, que é mais preciosa que a vida
de um homem. Entretanto não se estaria isento de pecado punindo
o criminoso só com a intenção de lhe fazer mal, se a esta intenção
se não reunir a de servir seus verdadeiros interesses, isto é, de
infligir-lhe um castigo salutar, e procurar-lhe a vida eterna.
49. O segundo motivo que nos induz a amar os que nos fazem mal
é o triunfo das paixões nobres sobre as paixões ruins. O desejo da
superioridade em todas as coisas é inato no homem. É mister pois,
ou que, a força de bondade, obriguemos o que nos ofende a amar-
nos e, então, somos vencedores: ou que nos deixemos arrastar ao
ódio por uma influência estranha, e então somos vencidos. Não
consintais que o mal triunfe de vós, diz São Paulo, mas triunfai do
mal pelo bem.125
50. O terceiro motivo que nos induz a amar os que nos fazem mal, é
o nosso próprio interesse. Nós os forçamos assim a tornar
-se nossos amigos. Se vosso inimigo tiver fome, diz ainda São
Paulo, dai-lhe de comer; se tiver sede dai-lhe de beber; assim
obrando amontoareis brasas vivas sobre sua cabeça.126 Não há
maior provocação ao amor, diz Santo Agostinho, do que amar
primeiro. Ninguém tem o coração tão duro que não pague ao menos
em compensação o amor que se lhe testemunha. Um amigo fiel é o
mais precioso de todos os tesouros127, segundo Salomão. E quando
o Senhor vê marchar um homem no bom caminho, muda o coração
de seus inimigos,128 diz ainda o Sábio coroado.
51. O quarto motivo que nos induz a amar os que nos fazem mal é
que, graças a este esforço generoso de virtude, nossas orações são
mais agradáveis a Deus. Ainda que Moisés e Samuel se
apresentassem perante mim, diz o Senhor, eu não perdoaria a este
povo.129 Se Deus, observa São Gregório, cita de preferência Moisés
e Samuel, e se por isso mesmo exprime o poder que eles têm sobre
Ele, é porque Moisés e Samuel tinham amado seus inimigos, e
tinham orado por eles. Jesus Cristo também orou pelos seus
carrascos.130 E as orações do bem-aventurado Santo Estêvão em
favor dos que o apedrejavam, foram de uma utilidade muito grande
à Igreja, obtendo a conversão de São Paulo.
125 Rm 12,21.
126 Rm 12,20. Aqui São Paulo repete os ensinamentos do livro dos Provérbios (Pr 25, 21).
127 Eclo 6,14.
128 Pr 16,7.
52. O quinto e último motivo que nos induz a amar os que nos fazem
mal, é o desejo de sair do pecado, desejo que deve ser o mais
poderoso de todos em nosso coração. Algumas vezes acontece-nos
pecar e não procurar a Deus, então Deus nos chama a si fazendo
-nos sentir rudemente a necessidade de seu apoio. Cobrirei vosso
caminho de espinhos131, nos diz Ele pela boca do profeta Oséias.
Foi assim que feriu a Paulo com a cegueira no caminho de
Damasco, a fim de o chamar a si. Senhor, exclama o Salmista,
andei errante como ovelha que se desgarrou, vinde procurar vosso
servo.132 Deus vem em nosso socorro, se perdoamos a nossos
inimigos, se os conduzimos ao bem pela indulgência e bondade.
Deus, diz-se na Escritura, usará para vós da mesma medida de que
usares para os outros. Perdoai e sereis perdoados.133 Bem-
aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão
misericórdia.134 Ora, não há maior testemunho de misericórdia, do
que perdoar aos que nos fazem mal.
129 Jr 15,1.
130 Lc 23,34.
131 Os 2,8.
132 118,176.
133 Lc 6,38.
134 Luc 6,36.
CAPÍTULO 4
DO PRIMEIRO PRECEITO DA LEI
53. Não terás deuses estranhos.135 Como já dissemos, a lei de
Cristo é uma lei de amor, toda ela descansa sobre a caridade. Os
deveres da caridade são formulados em dois preceitos, um dos
quais é relativo ao amor de Deus, e o outro relativo ao amor do
próximo. Já falamos destes dois preceitos. Agora convém saber que
a lei dada a Moisés no monte Sinai, continha dez preceitos gravados
sobre duas tábuas de pedra. Três eram gravados sobre a primeira
tábua, e se referem ao amor de Deus; sete eram gravados sobre a
segunda, e se referem ao amor do próximo. Assim, toda a lei moral
descansa sobre dois preceitos fundamentais.
63. A terceira razão que nos leva a não adorar, senão a Deus, é a
obrigação em que estamos de permanecermos fiéis a nossas
promessas. Nós renunciamos a Satanás e prometemos o nosso
coração a Deus só. Esta obrigação é sagrada, e seria um crime
violá-la. Se o que infringia a lei de Moisés, era punido com a morte
em presença de duas ou três testemunhas, que suplício não
merecerá o que tiver calcado aos pés a lei do Filho de Deus, o que
tiver em conta de profano o sangue da nova aliança, sangue
precioso derramado sobre a terra para purificar o mundo, o que tiver
ultrajado o Espírito Santo, dispensador das graças do Altíssimo?
157A mulher que, em vida de seu esposo, passa para os braços de
65. Enfim, a quinta razão que nos convida a não adorar, senão o
verdadeiro Deus, é a imensidade da recompensa que reserva a
seus servos. Em nenhuma lei se prometem prêmios tais como na lei
de Jesus Cristo. Os maometanos esperam rios de leite e de mel, os
judeus a terra prometida, mas os Cristãos esperam a glória dos
Anjos. Eles serão, disse Jesus Cristo, semelhantes aos Anjos de
Deus no Céu.164 Eis aí porque Pedro dizia a seu Divino Mestre:
Senhor, para quem havemos nós de ir? Tu tens palavras da vida
eterna.165
161 Rm 6,19.
162 Sb 5,7.
163 Jr 9,4.
164 Mt 22,30.
165 Jo 6,68.
CAPÍTULO 5
DO SEGUNDO PRECEITO DA LEI
66. Não pronunciarás em vão o nome do Senhor teu Deus.166 Tal é
o segundo preceito da lei moral.Assim como não há mais que um só
Deus, a quem devemos adorar, assim também, não há mais que um
só Deus a quem devemos respeitar sobre todas as coisas, e
primeiramente quanto ao seu nome.
por estas duas simples palavras – sim e não. Notai bem que sucede
com o juramento como com a medicina; É um recurso de que só se
deve lançar mão nos casos de necessidade. Eis aí porque Jesus
Cristo nos diz: Tudo que disserdes de mais, além do sim e do não
procede do mal.173 Eis aí porque o Eclesiástico nos diz também:
Não se acostume vossa boca ao juramento, porque é este um
hábito mui perigoso. Não esteja pois sempre o nome de Deus e de
seus Santos na vossa boca, porque é isto uma profanação que não
ficará impune.174
CAPÍTULO VI
DO TERCEIRO PRECEITO DA LEI
77. Lembra-te de santificar o dia de sábado.195Tal é o terceiro
preceito da lei moral, e com razão é ele o terceiro. Primeiramente
devemos honrar a Deus do íntimo do coração, e é o que se nos
ordena neste preceito: Não terás deuses estranhos. Em segundo
lugar devemos honrá-lo pela palavra, e é o que se nos ordena neste
preceito: Não pronunciarás em vão o nome do Senhor teu Deus. Em
terceiro lugar devemos honrá-lo pelas obras, e é o que se nos
ordena neste preceito: Santificai o dia de sábado. Deus quis que
houvesse um dia especialmente consagrado ao seu culto, e o quis
por cinco razões principais.
79. Em segundo lugar, Deus pôs este preceito para ensinar aos
homens a crer no Redentor. A corrupção não atingiu o corpo de
Jesus Cristo; Ele mesmo disse pela boca do profeta: Minha carne
descansará na esperança da vida, e Deus não permitirá à corrupção
aproximar-se de meu corpo sagrado.199 Quis Deus tanto porque se
santificasse o dia de sábado, a fim de que o descanso dos homens
nesse dia solene fosse símbolo do descanso da carne do
197 Gl 6,12ss.
198 Rm 6,1ss.
199 Sl 15,9s.
81. Em quarto lugar, Deus pôs este preceito para entreter nos
homens o amor divino. O corpo que se corrompe, faz pesada a
alma.204 E por isso tem o homem necessidade de fazer muitos
esforços para erguer-se debaixo do peso que o oprime, para não
estar sempre curvado sobre a terra. Convém, pois, que haja época
determinada em que ele possa desprender-se do seio da terra, e
arrojar-se ao mundo espiritual. Para alguns esta época não é fixada,
antes volta a cada instante. Bendirei ao Senhor em todo o tempo,
diz o Salmista, e o seu louvor estará continuamente em minha
boca.205 Orai sem interrupção,206 dizSão Paulo aos fiéis. Para essas
almas escolhidas a vida inteira é um sábado continuo. Para outros,
esta época volta com pequenos intervalos de tempo: Senhor, diz
ainda o Salmista, eu cantei os vossos louvores sete vezes por
dia.207 Enfim, para as almas ordinárias volta esta época uma vez
por semana, e o dia em que elas devem ocupar-se exclusivamente
das coisas do Céu, foi determinado com receio de que, entregues a
sua própria discrição, não perdessem inteiramente o amor divino. Se
chamares o sábado delicado, diz Isaías, tu te deleitarás no
Senhor.208 Então, diz Jó, abundarás em delícias no Todo-Poderoso,
levantarás teu rosto para Deus.209 Com efeito não foi este dia
destinado para frívolos divertimentos, mas para a súplica e o serviço
divino. Por isso diz Santo Agostinho, que será pecado menor lavrar
a terra em tal dia, do que entregar-se a regozijos mundanos.
204 Sb 9,15.
205 Sl 33,2.
206 1Ts 5,17.
207 Sl 118,164.
208 Is 58,13.
91. Mas antes que a alma possa chegar a esse grau último de
descanso, é mister que ela passe por três outros graus sucessivos
de repouso. Primeiramente é mister que esteja ao abrigo das
agitações que nascem do pecado: O coração do ímpio é como um
mar agitado, que nada pode acalmar.239 Depois deve pôr-se fora do
alcance das paixões carnais, porque a carne conspira contra o
espírito, do mesmo modo que o espírito conspira contra a carne.
Enfim deve abandonar toda a ocupação mundana. Marta, Marta tu
andas muito inquieta, e te embaraças cuidando em muitas coisas;
entretanto uma só coisa é necessária.240 É depois de ter passado,
digo, por estes três graus sucessivos de repouso, que a alma chega
ao mais alto grau de sossego e descanso no seio de Deus. Se
chamares o sábado delicado, então te deleitarás no Senhor,241 diz o
profeta. É para chegarem a esse termo que os santos tudo
abandonaram sobre a terra. O descanso é a pérola inestimável de
que fala o Evangelho, e que aquele que a encontra, compra mesmo
à custa de todos os seus bens. O descanso é a vida eterna, é a
eterna felicidade. Assim possamos nós obtê-la! Assim possa cada
um de nós repetir, falando da celestial Jerusalém, estas palavras do
Rei profeta: Este é o meu descanso para sempre: aqui habitarei
porque o escolhi.242
233 Sl 118,11.
234 Sl 118,105.
235 Sl 104,1.
236 Sl 33,9.
237 Sl 30,3.
238 Sb 8,16.
239 Is 57,20.
240 Lc 10,41s.
241 Is 58,13.
242 Sl 131,14.
CAPÍTULO 7
DO QUARTO PRECEITO DA LEI DE DEUS
92. Honrarás a teu pai e a tua mãe. A perfeição do homem consiste
no amor de Deus e do próximo. Ao amor de Deus se referem os três
preceitos gravados sobre a primeira tábua que Deus deu a Moisés;
ao amor do próximo se referem os outros sete preceitos gravados
sobre a segunda tábua da lei, mas como diz São João: nós
devemos amar não de palavra, nem de língua, mas por obra e em
verdade.243 O homem, cujo coração é penetrado de um amor
verdadeiro, deve evitar o mal, e fazer o bem; e é por isso que os
preceitos da lei moral ora são negativos e proíbem o mal, ora
positivos e ordenam o bem. Está sempre em nosso poder evitar o
mal, mas não está sempre em nosso poder fazer o bem; e é o que
fez dizer Santo Agostinho que nós somos obrigados a amar a todos
os homens, mas não somos obrigados a beneficiar a todos, mas
somente aos que nos são conjuntos, por quanto aquele que não
cuida dos seus, principalmente dos domésticos, é infiel e não
cristão.244 Ora, entre todos os viventes os que nos são mais
intimamente ligados são nosso pai e nossa mãe; e por isso diz
Santo Ambrósio que em primeiro lugar devemos amar a Deus, em
segundo a nosso pai e a nossa mãe. E é o que diz o preceito divino,
quando nos manda honrá-los.
243 1Jo 3,18. 244 1Tm 5,8.
95. Para confusão e vergonha dos maus filhos basta que olhem
para a piedade filial da cegonha. Quando a velhice, diz Cassiodoro,
enfraquecendo as asas de seus progenitores, torna-os incapazes
para procurarem por si mesmos o alimento, a ternura da ave supre
seu vigor extinto: ela aquece com suas penas seus membros
entorpecidos, traz-lhes os alimentos que achou, reanima suas forças
abatidas, e por um piedoso reconhecimento presta sendo moça, aos
que lhe deram a vida, os cuidados que deles recebera em seus dias
de fraqueza. Enfim, já que nossos Pais foram nossos primeiros
mestres, nós devemos obedecer-lhes: Filhos, diz o Apóstolo,
obedecei a vossos pais,254 exceto no que é contrário à Religião;
porquanto segundo se exprime São Jerônimo, é o único caso em
que a desobediência é um dever e a revolta uma piedade. Aquele
que não abandona a seu pai e a sua mãe para me seguir, diz Cristo,
não pode ser meu discípulo.255Acaso não é teu Pai aquele que te
protege, que te fez e te criou?256
250 Sb 4,6.
251 Eclo 3,9s.
252 Eclo 3,13.
253 Eclo 3,14ss.
96. Honra a teu pai e a tua mãe. Entre todos os preceitos, só a este
ajuntou o Legislador a promessa de uma recompensa e esta
recompensa é a de longa vida sobre a terra. A razão disto é que Ele
não queria deixar acreditar que o respeito filial fosse uma virtude
sem mérito, porque é uma virtude natural. Mas convém saber que
há cinco coisas desejáveis, que são prometidas aos que honrarem
seus pais.
102. Honra a teu pai, etc. Convém notar que o nome de pai não se
aplica somente àquele que nos deu a vida, mas a toda a pessoa que
merece nosso respeito e nossa veneração por qualquer título que
seja. Assim chamamos pais aos Apóstolos e outros santos
personagens, que são para nós modelos de doutrina e de fé.
Podeis, diz São Paulo aos Coríntios, ter mil pedagogos, que vos
ensinem a doutrina de Cristo, mas não tendes muitos pais
espirituais; pois só eu vos gerei em Jesus Cristo pelo Evangelho.266
Louvemos, diz o Eclesiástico, aos varões gloriosos de outro tempo,
que também são vossos pais.267 Sim, louvemos esses homens
ilustres, e seja nossa veneração comprovada não por vãs palavras,
mas pela imitação de sua vida. Ora, se quisermos imitar
verdadeiramente a vida dos grandes personagens que admiramos,
é necessário que as suas virtudes revivam em nós: Lembrai-vos diz
São Paulo, lembrai-vos dos vossos prelados que vos ensinam a
palavra de Deus, e cuja fé haveis de imitar.268 Os prelados merecem
igualmente o nome de pais, e também tem direito ao respeito e à
veneração, pois são os ministros de Deus. Não disse Jesus Cristo a
seus Apóstolos: Quem vos ouve, ouve-me a mim, e quem vos
despreza, me despreza?269 Devemos portanto honrar aos prelados,
e ser-lhes submissos; e pagar-lhes o dízimo. Obedecei aos vossos
superiores, diz o Apóstolo, e sede-lhes sujeitos.270 Honra o Senhor
com a tua fazenda, diz Salomão, e dá-lhe das primícias de todos os
teus frutos.271 Os reis e os príncipes também merecem o nome de
pais e na Escritura Santa vemos que este nome lhes era outrora
concedido. É o título mais glorioso que se lhes pode dar, e serve de
os advertir que se acham colocados sobre o trono para velarem na
felicidade dos povos, e que devem considerar seus súditos como
seus filhos. Tal é o dever dos reis para com os povos; e o dos povos
para com os reis é ter-lhe respeito filial, e testemunhar-lhes esse
respeito por uma inteira submissão.Todo o homem, diz o Apóstolo,
seja sujeito às potestades que o governam.272 Ora, essa submissão
não deve vir somente do temor, mas também do amor; ela é
recomendada não só pela razão, mas ainda pela consciência. Com
efeito, segundo o Apóstolo, todo o poder vem de Deus, e por
consequência devemos render homenagem a quem é de direito.273
Meu filho, diz Salomão, teme a Deus, e ao rei.274 Nossos
benfeitores são também nossos pais: Sê piedoso para com os
órfãos como pai,275 diz o Eclesiástico. Com efeito a beneficência é
um atributo da paternidade: Não te esqueças nunca, diz ainda o
Eclesiástico, da graça que te fez o que ficou por teu fiador.276 O
esquecimento dos serviços recebidos é ingratidão odiosa, por isso
lemos no livro da Sabedoria que a esperança do ingrato se derreterá
como o gelo do inverno, e se perderá como uma água inútil.277
Finalmente, o título de pai é ainda devido ao velho. Pergunta a teu
pai, diz a Escritura Santa, e ele te informará; pergunta aos teus
maiores, e eles te dirão.278 Levanta-te diante dos que tem a cabeça
cheia de fios brancos, e honra a pessoa do velho.279 No meio dos
magnatas não te iguales com eles, e onde estão os velhos não fales
muito.280 Ouvi em silêncio e a proporção da tua modéstia ser-te-á
conciliada a boa graça.281 Assim pois, o preceito que nos dá o
Senhor de honrarmos a nossos pais, aplica-se igualmente aos
velhos, aos nossos benfeitores, aos nossos chefes tanto espirituais
como temporais, porque todos estes representam de certo modo
nosso Pai que está no Céu, e desprezá-los é desprezar a Deus.
264 Eclo 3,13.18.
265 Eclo 3,11.
266 1Cor 4,15.
268 Hb 13,7.
269 Lc 10,16.
270 Hb 13,7.
271 Pr 3,9.
272 Rm 13,1.
273 Rm 13,7.
274 Pr 24,21.
275 Eclo 4,10.
276 Eclo 29,20.
277 Sb 16,29.
278 Dt 32,7.
279 Lv 19,32.
280 Eclo 32,13.
CAPÍTULO 8
DO QUINTO PRECEITO DA LEI
103. Não matarás. A lei divina ordenando-nos que amemos a Deus
e a nosso próximo, manda-nos não só que façamos o bem, mas
ainda que evitemos o mal. Ora, o maior mal que podemos fazer a
nosso próximo é tirar-lhe a vida. Não matarás, tal é o preceito que
proíbe o homicídio. Este preceito porém tem dado lugar a três
interpretações igualmente falsas.
109. Mata-se concorrendo para o homicídio: Filho meu não vás com
ele, guarda-te de andar pelas suas veredas. Porque seus pés
correm para o mal, e se dão pressa a derramar o sangue. 294
113. Dissemos que o homem deve primeiro que tudo ter cuidado em
não encolerizar-se sem reflexão. Em segundo lugar, ele deve
acautelar-se para não conservar longo ressentimento: Se vos
irardes, diz o salmista, seja sem pecar.307 Não se ponha o sol sobre
a vossa ira,308 acrescenta o Apóstolo. E por que razão? Nosso
Senhor nos explica no Evangelho, Concerta-te sem demora com o
teu adversário, enquanto estás posto a caminho com ele; para que
não suceda, que ele te entregue ao Juiz, e que o Juiz te entregue ao
seu ministro; e sejas mandado para a cadeia. Em verdade te digo,
que não sairás de lá enquanto não pagares o último centavo.309
115. Em quarto lugar, deve o homem acautelar-se para que a sua ira
não se manifeste por palavras amargas e violentas: O fátuo, diz o
autor dos Provérbios, mostra logo a sua ira;313 e pode mostrá-la de
dois modos por injúrias, e por uma linguagem cheia de orgulho e
arrogância. Quanto ao primeiro, diz Nosso Senhor: O que tratar seu
irmão de tolo será réu do fogo do inferno. Quanto ao segundo diz
Ele: O que disser a seu irmão: racá, será réu no conselho.314A
resposta branda, diz o autor dos provérbios, quebra a ira; a palavra
dura suscita o furor.315
116. Em quinto lugar, o homem deve acautelar-se para que sua ira
não se manifeste por ações. Todas as nossas obras devem ser
inspiradas pela justiça e pela misericórdia; ora, a ira acaba com a
misericórdia e com a justiça. A ira do homem, segundo expressão
de São Thiago, não realiza as obras de Deus.316Ainda que um ho
310 1Jo 3,15.
311 Pr 15,18.
312 Gn 49,7.
313 Pr 12,16.
314 Mt 5,22.
315 Pr 15,1.
316 Tg 1,20.
CAPITULO 9
DO SEXTO PRECEITO DA LEI
117. Não cometerás adultério,319 etc. Depois de ter proibido o
homicídio, o legislador supremo nos proíbe o adultério, e
consequentemente, pois que o homem e a mulher, graças ao
casamento, tornam-se um só e mesmo corpo: Serão dois, diz o
Senhor, em uma só carne.320 Por conseguinte, depois do assassino
que ataca o próximo em sua pessoa e vida, o inimigo mais perigoso
para o homem é o libertino que o ataca na pessoa e na hora
daquela que é sua metade. O adultério é igualmente proibido ao
marido e à mulher. Entretanto, convém considerá-lo primeiramente
em relação à mulher, porque esse crime parece maior quando é ela
que o comete. A esposa adúltera comete três pecados gravíssimos,
que são indicados nestes termos:Toda a mulher que deixa seu
marido, torna-se primeiramente desobediente à lei do Altíssimo; em
segundo lugar peca contra seu marido; enfim viola a castidade
conjugal.321
122. Primeira razão.A mulher tem sobre ele os mesmos direitos que
ele sobre a mulher. O marido, diz São Paulo, não tem poder sobre o
seu corpo, mas tem-no a mulher.326Assim como esposos, o homem
e a mulher acham-se em mútua dependência um do outro, e os
deveres do casamento são os mesmos para ambos. Para significar
essa dependência mútua dos esposos, é que Deus formou a mulher
de uma das costelas do homem, e não de outra qualquer parte do
corpo humano. O casamento nunca foi o que deve ser senão depois
da promulgação da lei cristã. Entre os judeus era permitido a um
homem ter muitas mulheres, mas não o era a uma mulher ter muitos
maridos. Não havia portanto igualdade de direitos e de deveres
entre o esposo e a esposa.
CAPÍTULO 10
DO SÉTIMO PRECEITO DA LEI
132. Não furtarás.340 O legislador supremo nos impôs sobre todas
as coisas a lei de não ofendermos ao nosso próximo. Ele nos proibiu
primeiramente que o atacássemos em sua pessoa, Não matarás, tal
é o primeiro artigo da lei. Proibiu-nos depois que o atacássemos na
pessoa que mais de perto lhe toca, e que é a sua metade: Não
cometerás adultério.Tal é o segundo artigo da lei. Depois nos proibiu
que o atacássemos em seus bens: Não furtarás, tal é o terceiro
artigo da lei. Digamos que este último artigo diz respeito a todo o
modo injusto de aquisição. Há muitas maneiras de furtar.
138. Não furtarás, etc. Este preceito, como dissemos, proíbe toda a
espécie de aquisição injusta; e muitas razões nos induzem a
observá-la.
CAPÍTULO 11
DO OITAVO PRECEITO DA LEI
143. Não dirás falso testemunho contra teu próximo.365 Até aqui
proibiu-nos que ofendêssemos nosso próximo por ações; agora
proíbe-nos que o ofendamos por palavras. Tal é o sentido deste
preceito: Não dirás falso testemunho contra teu próximo. A violação
dele pode ter lagar ou em juízo, ou no comércio ordinário da vida.
144. Em juízo pode este preceito ser violado de três maneiras, visto
que pode sê-lo por três pessoas; a saber, o acusador, a testemunha,
e o juiz. É violado pelo acusador quando a acusação intentada
perante os tribunais é falsa; Não serás delator de crimes, nem
mexeriqueiro entre o povo.366 Mas, note-se que assim como se não
deve acusar falsamente o próximo, assim também não se deve calar
a verdade a seu respeito: Se teu irmão pecar contra ti, vai, e corrige-
o,367 diz-se no Evangelho. É violado o preceito pela testemunha,
quando o depoimento dado em apoio da acusação ou da defesa,
não exprime a verdade: A testemunha falsa não ficará impune,368
diz o autor dos Provérbios. E com efeito, é este um crime que
encerra em si todos os outros de que precedentemente temos
falado, por quanto, os que o cometem, merecem umas vezes o
nome de homicidas, outras vezes o de ladrões, etc. Eles devem
sofrer a pena a que os condena a lei mosaica: Quando depois de
exatíssima averiguação tiveram conhecido que a testemunha falsa
se arrojou a dizer uma mentira contra seu irmão, tratá-lo-ão como
ele tinha intento de tratar a seu irmão. Não terás misericórdia com
ele: vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé
por pé.369 O homem que diz falso testemunho contra teu próximo, é
um dardo, é uma espada, é uma flecha penetrante,370 diz o autor
dos Provérbios. O preceito é violado pelo juiz, quando a sentença
que ele pronuncia não é justa; Não julgarás injustamente, diz-se no
Levítico, não tenhas respeito à pessoa do pobre, nem atendas a
casa do poderoso. Julga teu próximo segundo a justiça.371
365 Ex 20,16.
366 Lv 19,16.
367 Mt 18,15.
368 Pr 19,9.
147. É um pecado mortal mentir nas coisas que são de fé, e é o que
sucede aos prelados, aos pregadores, e aos mestres que não
ensinam a verdade que tem por missão ensinar. Semelhante
mentira é a mais grave de todas. Tereis entre vós, diz o Apóstolo
São Pedro, mestres mentirosos, que introduziram na Igreja
doutrinas funestas, e criminosas heresias.393 Certos homens que
têm missão de ensinar a verdade ensinam algumas vezes a mentira
a fim de parecerem doutos.A eles é que se dirigem estas palavras
de Isaías: De quem fizestes vós escárnio? Contra quem abristes a
boca, e deitastes a língua fora? Por ventura não sois vós uns filhos
malvados, uma geração maldita?394 Mente-se também alguma vez
para ofender ao próximo. Não mintais uns aos outros,395 recomenda
o Apóstolo. E estas duas espécies de mentira também são pecados
mortais.
389 Ef 4,25.
390 Eclo 34,4.
391 Sb 1,11.
392 Sl 5,7.
393 2Pd 2,1.
394 Is 57,4.
395 Cl 3,9.
148. A mentira tem o caráter de pecado venial quando não tem por
fim ensinar o erro e ofender ao próximo. Este gênero de pecado
pode ser cometido de muitas maneiras. Mente-se algumas vezes
por excesso de humildade, e principalmente na confissão. A este
respeito, observa Santo Agostinho que se o homem deve guardar
-se de calar o que fez, deve igualmente guardar-se de dizer o que
não fez. A caso necessita Deus de vossas mentiras?396 Diz Jó. Há
pessoas, diz o Eclesiástico, que se humilham maliciosamente, e o
seu interior está cheio de dolo; e há justos que se submetem
excessivamente com uma profunda humilhação.397 Pode-se mentir
por uma falsa vergonha, e é o que acontece, quando, depois de ter-
se avançado alguma falsidade, adverte-se no erro, e tem-se
vergonha de o retratar. Não contradigas de modo algum a palavra
da verdade, diz o Eclesiástico, e confunde-te da mentira em que
tenhas cabido por ignorância.398 Pode-se mentir por interesse
pessoal; é o que acontece quando se recorre à mentira para obter o
que se deseja, ou para evitar o que se teme. Pusemos nossa
esperança na mentira, e lhe pedimos a nossa salvação399, diz o
profeta Isaías. Aquele que funda sua segurança na mentira, nutre-se
do vento,400 diz o autor dos Provérbios. Pode-se mentir em
vantagem de um terceiro, e é o que acontece quando se recorre à
mentira para livrar alguém da morte, de um perigo, de uma
desgraça. E ainda disto devemos nos guardar, segundo Santo
Agostinho. Não faças acepção de pessoas contra a tua salvação,
nem te deixes levar para a mentira à custa de tua alma.401 Enfim,
pode-se mentir por brincadeira; mas convém abster-se de
semelhante divertimento, porque o hábito de mentir brincando, pode
conduzir a mentiras sérias, e fazer cair em pecado mortal. O feitiço
das inépcias escurece o bem.402
396 Jó 13,7.
397 Eclo 19,23s.
398 Eclo 4,30.
399 Is 28,15.
400 Pr 11,29.
401 Eclo 4,24s.
402 Sb 4,12.
XII DO NONO PRECEITO DA LEI
CAPÍTULO 12
DO NONO PRECEITO DA LEI
149. Não cobiçarás as coisas do teu próximo.403 Há esta diferença
entre a lei divina e a lei humana, que a lei humana julga somente as
ações e as palavras, e a lei divina julga de mais os pensamentos, a
razão disto é que o homem só considera as aparências exteriores,
ao passo que Deus vê ao mesmo tempo o que está fora de nós e o
que se passa no íntimo de nossa alma. Deus de meu coração,404
diz o Salmista. O homem, diz o livro de Samuel, vê o que está
patente, mas o Senhor olha para o coração.405Temos falado até
aqui dos preceitos relativos às ações e palavras; resta-nos por tanto
falar dos que são relativos aos pensamentos. Aos olhos de Deus a
intenção é reputada como fato, e eis aí porque nos proíbe que
cobicemos as coisas alheias, depois de nos ter proibido que as
tiremos, e isto por muitas razões.
150. Primeira razão. A cobiça não conhece limites, seus desejos são
infinitos. Ora, todo o homem sábio deve saber moderar-se e conter-
se a propósito, ou antes ninguém deve internar-se em um caminho
sem fim e sem saída. O avarento, diz o Eclesiastes, nunca, jamais
se fartará de dinheiro.406 Ai de vós, diz também o profeta Isaías, que
ajuntais casa a casa, e ides acrescentando campo a capo.407 E
porque são infinitos os desejos dos homens? Porque seu coração é
destinado a receber a Deus. Senhor, diz Santo Agostinho, vós nos
fizestes para vós, e nosso coração é inquieto, enquanto não
descansa em vós.408 Por consequência tudo que não é Deus, é mui
pouca coisa para preencher a imensidade de nosso coração; só Ele
é o que enche de bens o nosso desejo,409 segundo a expressão do
Salmista.
403 Ex 20,17.
404 Sl 72,26.
405 1Sm 16,7.
406 Ecl 5,9.
151. Segunda razão.A cobiça priva-nos da felicidade, tirando-nos o
sossego. As pessoas cobiçosas são sempre atormentadas pela
ambição de adquirir o que não tem e pelo temor de perder o que
tem. A fartura do rico é a mesma que não o deixa dormir,410 diz o
Eclesiastes. Onde está o teu tesouro, aí está também o teu
coração,411 diz-se no Evangelho. E por isso comparou Jesus Cristo
aos espinhos os cuidados que nascem das riquezas, como diz São
Gregório.
CAPÍTULO 13
DO DÉCIMO PRECEITO DA LEI
156. Não desejarás a mulher do teu próximo.418 São João nos diz
que todos os bens deste mundo não são mais do que objetos de
concupiscência para a carne, objetos de cobiça para os olhos, e
objetos de ambição para o espírito.419Assim, todos os objetos dos
nossos desejos estão compreendidos nestas três divisões. Duas
sortes de desejos são proibidos por este preceito; Não desejarás a
casa de teu próximo; a saber o desejo das riquezas e o desejo das
honras; o desejo de possuir a casa do próximo compreende ao
mesmo tempo estes dois desejos, estas duas paixões: a cobiça e a
ambição. A glória e a riqueza habitam em sua casa,420 diz o
Salmista. Assim a ideia da casa encerra na Escritura Santa a ideia
de riquezas e de honras, e o que deseja a casa de seu próximo é ao
mesmo tempo cúpido e ambicioso. Depois de ter proibido a cobiça e
a ambição, o Legislador supremo nos proíbe a concupiscência
carnal. Tal é o sentido deste preceito: Não desejarás a mulher de teu
próximo. Mas depois da culpa de Adão nenhum mortal está ao
abrigo da concupiscência. Só o nosso divino Salvador e a gloriosa
Virgem sua Mãe conservaram uma pureza sem mancha. A
concupiscência algumas vezes é acompanhada de um pecado
venial, outras vezes de um pecado mortal. É acompanhada de
pecado mortal quando domina o homem. Não reine o pecado em
vosso corpo mortal,421 diz o Apóstolo; e não diz – não exista o
pecado em vós; porquanto ele mesmo acrescenta. Sei que o bem
não habita em mim, isto é, em minha carne.422
418 Ex 20,17.
419 1Jo 2,16.
420 Sl 111,3.
da Igreja?
• Li, assisti ou escutei materiais que colocam em risco minha fé (tais
como livros, revistas, vídeos ou músicas contrários à religião)?
os Santos?
• Queixei-me contra Deus (por algum problema ou dificul
dade)?
• Amaldiçoei-me a mim próprio, ou a outra pessoa ou coisa
(rogar praga)?
• Deixei de cumprir uma promessa feita a Deus?
3º MANDAMENTO
GUARDAR DOMINGOS E FESTAS
NÃO MATARÁS
• Tenho inimizade, ódio ou raiva de alguém?
• Desejei o mal para alguém? Foi um mal grave?
• Procurei vingar-me de alguém?
• Briguei com alguém?
• Feri ou matei alguém?
• Tentei, fiz, ajudei ou aconselhei um aborto?
• Levei alguém ao pecado (induzindo-o ao pecado com palavras, ou
tentando-o em seu modo de vestir ou agir)? Que pecado foi?
2º PASSO – CONFISSÃO
Diante do sacerdote diga:
Padre, minha última confissão foi... (dizer quanto tempo faz desde
a última confissão)
E meus pecados foram... (dizer os pecados que lembrou no
exame)
3º PASSO – PENITÊNCIA
Terminada a confissão, só faltará cumprir a penitência imposta pelo
sacerdote. Aconselha-se que ela seja cumprida logo após a
confissão.
172
A CONFISSÃO, 1838 DE
GIUSEPPE MOLTENI