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 Valentim Fernandes „de Morávia“ / „Alemão“

 Personalidade versátil e multifacetada


 Conhecido só pelo nome português
➢ Impressor / editor
➢ Escudeiro da Rainha D. Leonor
➢ Intérprete (dos viajantes e mercadores alemães)
➢ Corretor e tabelião (dos mercadores alemães)
➢ Colecionador de textos e documentos referentes
à expansão portuguesa
➢ Intermediário entre Portugal e a Alemanha
(através da sua correspondência)
 Valentim Fernandes „de Morávia“ – datas biográficas:
➢ Oriundo de uma família alemã da província da
Morávia (hoje República Checa); nasce nos anos 50
ou no início dos anos 60 do século XV
➢ Viveu em Nuremberga, onde provavelmente
aprendeu a arte da impressão, e em Augsburgo,
como se presume pelos seus contactos com eruditos
dessas cidades e mercadores das companhias dos
Fugger, Welser, etc.
➢ Passou por Sevilla (por volta de 1493/94)
➢ Aparece como intérprete do médico alemão
Hieronymus Münzer na corte de D. João II em
1494/95
➢ Morre em Portugal entre a segunda metade de 1518
e a primeira metade de 1519
• Valentim Fernandes, impressor / editor:

➢ Textos em latim, português, castelhano


➢ Textos religiosos e profanos, p. ex.:
✓Vita Christi (1495, com Nicolau de Saxónia)
✓História do muy nobre Vespasiano (1496)
✓Gramática Pastrane (1497)
✓Marco Paulo (1502)
✓O auto dos apóstolos (1505)
✓Ordenações Manuelinas (1512/13)
✓Reportório dos Tempos (1518)
Códice Valentim Fernandes
 Original encontra-se na Biblioteca Estadual da Baviera em
Munique (Codex hispanicus 27)
 Coletânea de textos em português e latim, reunidos e redigidos
por V. Fernandes entre 1505-1510:
➢ Textos sobre a África:
❖ Relato sobre Ceuta e o norte de África
❖ Relato sobre as ilhas do Atlântico até S. Tomé e Príncipe
❖ Resumo da Crónica da Guiné de Gomes Eanes de Zurara
❖ Memórias do navegador Diogo Gomes, redigidas pelo alemão
Martin Behaim em latim (De prima inuentione Guinee, De insulis
primo inuentis in mari oceano…)
❖ Este livro é de rotear da Galiza até S. Jorge da Mina
➢ Textos sobre a Ásia:
❖ Relato da viagem de D. Francisco de Almeida (1505-1506),
escrito pelo escrivão da feitoria/de bordo, o alemão Hans
Mayr
❖ Descrição da Índia e das Ilhas Maldivas
➢ Rascunhos de mapas desenhados por V. Fernandes
Conteúdo do Livro de Marco Paulo (Lisboa, 1502)
 Epístola-dedicatória ao rei D. Manuel, por Valentim Fernandes.

 Introdução, por Valentim Fernandes, seguida de «certos capítulos das


províncias do título real de vossa Senhoria» (Etiópia; Arábia; Índia).

 Tradução do Prólogo da versão latina de Il Milione, de Frei Pipino da


Bologna (1320), de latim para português.

 Texto de Il Milione, traduzido da versão latina de Frei Pipino da Bologna


(1320) para português.

 Proémio ao Livro de Nicolau Véneto, por Valentim Fernandes

 Tradução do Prólogo de Poggio Bracciolini ao Livro de Nicolau Véneto, de


latim para português, por Valentim Fernandes.

 Texto do Livro de Nicolau Véneto, redigido por Poggio a partir das


informações dadas por Niccolò dei Conti (que visitou as Índias c. 1421-
1422) e inserido pelo autor no tratado De varietate fortunae (pronto em 1448).
Foi publicado autonomamente em 1492, como India recognita.

 Tradução da carta de Jerónimo de Santo Estêvão (1499).


Circunstâncias históricas em que surge a edição
do Livro de Marco Paulo (Lisboa, 1502)
 Em 1498 Vasco da Gama chega à Índia.
 Em 1500 Pedro Álvares Cabral descobre o Brasil.

 Com estes acontecimentos, a expansão portuguesa alarga-


se a 2 novos continentes, depois de ter completado o
reconhecimento de toda a costa africana.
 As notícias, mais ou menos exatas, mais ou menos
fantasiosas, sobre os novos territórios , os novos povos e
os novos mercados espalham-se rapidamente.
 As informações que chegam a Lisboa são ainda confusas,
ou contraditórias, o que gera um clima de instabilidade e
incerteza à volta do rumo a dar à expansão ultramarina
João de Barros, Ásia (Década 1ª, Livro VI)
 «fizerã todas estas cousas muyta duuida no parecer de pessõas notãuees
deste reyno, se seria proueitóso a elle huma cõquista tã remóta e de tãtos
perigos [...] Porque nestas primeiras viágens nã mostrou o negócio tãto de
sy como cõ a vinda delles: posto que a sua informaçã ajnda foi muy cõfusa,
pera o que nas seguintes armádas se soube da grãdeza daquella cõquista.»

 «E ajnda a muytos, vendo sómente na cárta de marear hũa tã grãde cósta


de térra pintáda, e tãtas vóltas de rumos que parecia rodearem as nóssas
náos duas vezes o mũdo sabido, por entrar no caminho doutro nóuo que
queriamos descobrir: fazia nélles esta pintura hũa tã espãtósa jmaginaçã,
que lhe asombráua o juizo. E se esta pintura fazia nojo á vista, ao módo que
faz ver sóbre os hombros de Hercules o mundo que lhe os poétas posséram,
que quásy a nóssa natureza se móue cõ affectos a se condoer dos hõbros
daquella jmagem: como se nã cõdoeria hũ prudente hómem em sua
consideraçã, ver este reyno (de que elle éra membro) tomar sobre os hõbros
de sua obrigaçã hũ mundo, nã pintádo, mas verdadeiro, que ás vezes o
podia acuruar cõ o grã peso da terra, do mar, do vento, e ardor do sól que
em sy continha: e o que éra muyto mais gráue e pesádo que estes elementos,
a variedáde de tantas gentes como nelle habitáuã.»
Objetivo (declarado) de Valentim Fernandes
«E me moueo de tralladar e ajuntar ho presente liuro [de
nicolao veneto] ao de Marco paulo. ho seruiço que nysso espero
de fazer a vossa Serenissima magestade, em auisar e amoestar
os vossos subditos de cousas perijgosas que em as Indias ha. e
onde onde ha christaãos e onde mouros ou ydolatras, e dos
grandes proueitos e riquezas .s. Pedras preçiosas e espeçias
aromaticas, ouro e prata. onde e em que lugar cada huũ naçe,
pera reçeberem alguũ refrigerio e consolaçom aquelles que
vossa reall Senhoria manada em busca dellas por tam longo e
trabalhoso caminho. E ajinda porque este liuro falla mais
particularmente de algũas çidades de India a nos outros ja
descobertas, como som as de Calicud e Cochym etc. E mais por
dar testimunho ao liuro de Marco paulo, que andou em as
partes orientaes no tempo do papa Gregorio ho .x. E foy ho seu
caminho contra a parte do norte pera as terras do gram Cham.»
Prohemio ao Liuro de Nycolao Veneto. In Marco Paulo. Lisboa: 1502, f. 78, v.
Começase a epistola sobre a tralladaçam do liuro de Marco paulo.
Feita por Valentym fernandez escudeyro da exçellentissima
Raynha Dona Lyanor. Enderençada ao Serenissimo e Inuictissimo
Rey e Senhor Dom Ema-nuel o primeiro. Rey de Portugal e dos
Alguarues. da-quem e alem mar em Africa. Senhor de Guynee. E da
conquista da naueguaçom e comercio de Ethiopia. Ara-bia. Pérsia, e
da India.

Vimos oje cousas marauilhosas. Luce .v. capitulo. E quaaes som estas
cousas marauilhosas Rey Illustrissimo que vimos oje e cada dia as
vemos. Em verdade nom podem ser outras maiores que as cousas
nouas e marauilhas das terras e gente noua e das suas cousas. E que
cousas mais marauilhosas Rey strennuissimo. que vermos os vossos
catholicos regnos. que antre os outros dos christaãos eram quasi hũs
dos pequenos, e alongados dos outros, em os vltimos fyms do
mundo, assy que apenas os regnos alonguados delles tinham noticia.
E agora som feitos tam grandes, que nom soomente ho vosso
senhorio se estende em Europa e Africa, mas ajnda ja vosso nome
grande sooa em Asya atee as postumeiras partes da India, assy como
em as innumerauees prouincias de Ethiopia. da qual a mayor parte he
do vosso senhorio, das prouincias da qual trazem ho mais fyno ouro
que ha no mundo, e em tanta auondança que sobrepojaes a todollos
outros reys. E onde em outro tempo os vossos regnos nom forom
sabidos, ja som conhecidos e soados per todo ho mundo, e dysso se
temem os mouros, se espantam os Indianos, e todo ho vniuerso
mundo se marauilha.
E que cousas mais marauilhosas. que mudar ho nome do famosíssimo
ryo Nylo em Teyjo. por onde a mais das riquezas das Indias soyam
vijr ao Cayro. e Alexandria, e dalli aas terras dos christaãos. Em
verdade estas som cousas marauilhosas que veemos. as pedras
preciosas e as especias aromáticas vijr a mercar nos vossos regnos.
aquelles que vendendoas a todo ho mundo fartauam. O que cousa
tam marauilhosa. que ho vosso muy nobre porto de Lyxboa he ja
feyto porto da India. ho qual nom soo sobrepoja todollos portos da
nossa Europa, mas ajnda os de Africa e Asya. Ca a elle nom soomente
vem os Alarues. os Lybicos. os Mauritanos. e Ethiopes com ho seu
prezado ouro. mas os de Arábia felix e petree. os da muy nobre
prouincia de Persya. a elle ja de todallas Indias começam de vijr. e
nom menos de todallas ylhas do mar Indico. O nobre porto de
Lyxboa. que cousas tam grandes e tam marauilhosas Deos quis
mostrar em ty. Tu em verdade podes ja ser chamado porto de
Colchud. porto de Tauriz. porto de Mecha, de Gyda. e Adem. porto
de Alexandria. Baruti e Veneza. A ty nom soomente os da costa do
mar de leuante e poente, mas aa tua muy nobre cidade vem a buscar
os do sertaão. de terras muy alongadas .s. de Alemanha a alta. do
regno de Vngria. Bohemia Polónia Rossya Tartaria. O que cousa tam
marauilhosa que vymos oje. de como el Rey dom Joham o segundo,
de gloriosa memoria vosso antecessor com todas suas forças
trabalhou pera emtrar em esta terra de promissam a vos e aos vossos
sucçessores prometida. E lhe aconteçeo como a Moyses. que tantos
annos tinha trabalhado pera entrar em a terra da promissam. e em
fim do monte de Nebo olhou pera ella e a vyo. Assy aconteçeo ao
dito Rey dom Joham que do cabo de Boõa esperança oulhou pera
esta outra. O que cabo tam nobre, o que renome de esperança, posto
nom per humano entendimento, mas per diuina prouidençia.
profetizando Bertolomeo diaz. da vossa magnifica senhoria, que traz
esperança por diuisa. de ser digno como Josué de entrar em aquelle
mundo nouo. que bem podemos chamar a terra da promissam. E que
proueyto trouue este tam nobre cabo de Bõa esperança. Certamente
muy marauilhoso. s. ho achamento daquella terra de promissam.
onde ha crauo. canella. gingiure. noz nozcada. maces, pymenta preta,
branca, e longa, galangua. reubarbo. cardamomo. cassiafistola.
agarico. turbith. noz de India, balsamo, almisquere. ambra liquida,
do estoraque tres maneyras. benjoy. almeçega. oppopomaco.
galbano. camffora. bdelij. serapino. ençenso. e myrrha. Dally ho ligno
aloé. ebano, brasil, sandalo branco, vermelho e citrino, mirabolano.
jndio. belerico. etc. Alli ha aljoffar. perlas, diamantes, rubijs.
esmeraldas, amatistas. topasias. jaçintas. çaffíras. turquesas, etc. Alli
ha alifantes acostumados e brancos, vnicornios. papagaios brancos
vermelhos e de muytas coores. O que cousas tam marauilhosas. Ha
hy per ventura outra riqueza no mundo. Certo nom. saluo ouro. ho
qual como disse que vos trazem das vossas Ethiopias em tanta
auondança que sobrepojaaes todollos reys do mundo. O que cousa
tam marauilhosa. acharem christaãos no outro mundo. Os quaaes
com tanta alegria preguntauam pellas nossas terras, como os nossos
pellas suas. Onde fica agora o sapientissimo rey Salomom com sua
prudencia e potencia, que nom pode cheguar des o Mar roxo da ylha
Asiunguber onde fazia sua armada atee Orphir. sem ajuda dei rey
Iran rey de Damasco, ho qual vossa muy jnclita magestade. nom
digo do Mar roxo. se nom aquém tres mill legoas e mais. des ho
vosso mar Athlantico que se começa em Cepta chegou alem do Mar
roxo e Syno persico ate o Syno colchico. que som acerca de quatro
mill legoas sem fauor nem ajuda de nenhuũ outro rey saluo do
Emanuel eterno Deos. cujo lugar vossa potentissima senhoria possuy
em a terra. Onde fica Alexandre magno com o seu capitam
Onesecrito. Onde os virtuosos Romãos com o seu mandado que
fizerom que nenhuũ passasse as colunas de Ercules. pera que nom
fossem priuados do titulo da sua monarchia. Passou vossa senhoria
nom digo soomente toda a linea equinocçial. mas ajnda aos vltimos
fims de ocçidente e começo de oriente ate as terras do gram Cham
onde ja começa de soar vosso poderoso nome. onde jazem as muy
nobres prouincias Tenduch. Mangy. Tanguth. etc. o principio das
quaaes segundo o meu pequeno saber achou o muy honrrado
fidalguo Gaspar corte real. E assy acreçenta vossa senhoria a ffe
christaã per todas as partes do mundo ho que nom sento de nenhuũ
outro rey christaão. pouorando ajnda as ylhas despouoadas. onde o
nome do alto Deos he honrrado louuado bento e exalçado, o qual
rogo que pella sua santissima piedade me lejxe chegar ao tempo que
possa veer a vossa poderosa senhoria acreçentada com titulo
imperial de toda a monarchia. Amen.

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