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Autor:
Michael Procopio
06 de Fevereiro de 2022
Sumário
DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO II ................................................................................................. 1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................................................... 3
DO DANO ...................................................................................................................................... 3
1 - DANO .............................................................................................................................................. 4
2 - INTRODUÇÃO OU ABANDONO DE ANIMAIS EM PROPRIEDADE ALHEIA ........................................................... 7
3 - DANO EM COISA DE VALOR ARTÍSTICO, ARQUEOLÓGICO OU HISTÓRICO ....................................................... 8
4 - ALTERAÇÃO DE LOCAL ESPECIALMENTE PROTEGIDO ................................................................................ 10
DA APROPRIAÇÃO INDÉBITA ............................................................................................................. 11
1 - APROPRIAÇÃO INDÉBITA .................................................................................................................... 11
2 - APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA ............................................................................................. 14
3 - APROPRIAÇÃO DE COISA HAVIDA POR ERRO, CASO FORTUITO OU FORÇA DA NATUREZA ................................ 23
4 - APROPRIAÇÃO DE TESOURO ............................................................................................................... 23
5 - APROPRIAÇÃO DE COISA ACHADA ........................................................................................................ 24
6 - FORMA PRIVILEGIADA PARA OS CRIMES DO CAPÍTULO V – DA APROPRIAÇÃO INDÉBITA ................................. 25
DO ESTELIONATO E OUTRAS FRAUDES ................................................................................................. 25
1 - ESTELIONATO .................................................................................................................................. 26
2 - DISPOSIÇÃO DE COISA ALHEIA COMO PRÓPRIA....................................................................................... 29
3 - ALIENAÇÃO OU ONERAÇÃO FRAUDULENTA DE COISA PRÓPRIA .................................................................. 29
4 - DEFRAUDAÇÃO DE PENHOR ................................................................................................................ 30
5 - FRAUDE NA ENTREGA DE COISA .......................................................................................................... 30
6 - FRAUDE PARA RECEBIMENTO DE INDENIZAÇÃO OU VALOR DE SEGURO........................................................ 31
7 - FRAUDE NO PAGAMENTO POR MEIO DE CHEQUE ..................................................................................... 32
Da Apropriação Do Estelionato e
Do Dano
Indébita Outras Fraudes
Ao final da aula, finalizaremos o tema dos crimes contra o patrimônio, valendo relembrar que as disposições
gerais se aplicam aos delitos vistos na aula passada, observados os requisitos de cada uma de suas regras.
Nosso estudo, como sempre, deve ser aprofundado, para que a prova nos pareça leve. Desejo um estudo
agradável e produtivo, esperando sinceramente que o conteúdo esteja exposto de forma didática.
DO DANO
O Capítulo IV do Título II do Código Penal se denomina “Do Dano”. Prevê alguns crimes patrimoniais de
dano, ou seja, aqueles que se configuram com a ocorrência de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma
penal.
Referida classificação se opõe aos chamados crimes de perigo, que se configuram com a mera exposição do
bem jurídico a risco, não sendo necessária a sua efetiva lesão.
1 - DANO
O crime de dano está previsto no artigo 163 do Código Penal:
Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - Se o crime é cometido:
I - com violência à pessoa ou grave ameaça;
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave
III - III - contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia,
fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de
serviços públicos;
IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
Cuida-se de crime comum, não se exigindo nenhuma qualidade específica do sujeito ativo. Tutela-se o
patrimônio, público ou privado, tanto no âmbito da propriedade quanto da posse.
São núcleos do tipo: “destruir” (demolir, desmanchar, devastar); “inutilizar” (tornar inútil, quebrar, avariar)
ou “deteriorar” (estragar, danificar, arruinar, corromper). O objeto material é coisa alheia, razão pela qual
a destruição, inutilização ou deterioração de coisa própria não configura o crime do artigo 163 do Código
Penal, sendo sua punição possível apenas se for meio para a prática de outro delito, como fraude contra
seguro.
A pichação com tintas e similares é considerada deterioração, mas está prevista na Lei dos Crimes
Ambientais, especificamente em seu art. 65, voltada à edificação e monumentos urbanos. Diante disso, só
se aplica o crime de dano do art. 163, do Código Penal, às pichações de imóveis rurais.
É crime de ação múltipla, razão pela qual a prática de apenas uma das condutas representadas pelos verbos
acima estudados é suficiente para a configuração do delito. De igual modo, a prática de todos eles, no
mesmo contexto, configurará crime único.
Tratando-se de crime plurissubsistente, é possível a punição do conatus.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente de destruir,
inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Não há previsão de punição da modalidade culposa.
Existe controvérsia sobre a exigência de elemento subjetivo especial do tipo, consistente
no animus nocendi. Isto é, a vontade específica do agente de prejudicar, de causar o dano.
O STF decidiu, por seu Pleno, que o elemento subjetivo especial é imprescindível para a
configuração do crime de dano, em julgado não muito recente:
“1. A materialidade do crime de dano contra o patrimônio público está demonstrada pela prova
documental. 2. Falta de prova que demonstre ter sido o réu o responsável pelo dano causado e de
comprovação da presença do elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de causar prejuízo.”
(AP 427/SP, Rel. Min. Carmen Lúcia, Tribunal Pleno, Julgamento: 04/11/2010).1
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, possui entendimento consolidado de que referida conduta
praticada pelo preso não configura o crime, dada a ausência de animus nocendi. Isto porque o indivíduo
encarcerado, ao deteriorar as grades da cela, por exemplo, busca evadir do local, sem o intuito específico
de causar dano ao patrimônio público:
“(...) 1 - Consoante jurisprudência desta Corte, para a configuração do crime de dano previsto no art.
163 do Código Penal, mostra-se imprescindível a presença do elemento subjetivo específico, qual seja,
o animus nocendi, que consiste na vontade deliberada de causar prejuízo ao patrimônio alheio. 2 - "A
destruição de patrimônio público (buraco na cela) pelo preso que busca fugir do estabelecimento no
qual encontra-se encarcerado não configura o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo único,
inciso III do CP), porque ausente o dolo específico (animus nocendi), sendo, pois, atípica a conduta"
(...)” (AgRg no HC 409417/SC, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, DJe 06/11/2017).
“Nos termos da jurisprudência desta Corte, para que se possa falar em crime de dano qualificado
contra patrimônio da União, Estado ou Município, mister se faz a comprovação do elemento subjetivo
do delito, qual seja, o animus nocendi, caracterizado pela vontade de causar prejuízo ao erário.
Nesse passo, a destruição, deterioração ou inutilização das paredes ou grades de cela pelo detento,
com vistas à fuga de estabelecimento prisional, ou, ainda, da viatura na qual o flagranteado foi
conduzido à delegacia de polícia, demonstra tão somente o seu intuito de recuperar a sua liberdade,
sem que reste evidenciado o necessário dolo específico de causar dano ao patrimônio público. (STJ, HC
503.970/SC, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 04/06/2019)
➢ Dano qualificado
O crime de dano possui a modalidade qualificada, em que a pena passa a ser de detenção, de seis meses a
três anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Deste modo, configurada a violência, como a
lesão corporal de natureza grave, incidirá o sistema de cúmulo material de penas.
1
Por ter sido decisão do Plenário, ainda que de 2010, parece ter mais relevância do que precedente de 1996, da Segunda Turma,
citado por alguns autores como posição acolhida pelo STF: “O crime de dano exige, para a sua configuração, apenas o dolo
genérico” (STF, HC 73189/MS, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, Julgamento: 23/02/1996). Essa posição, de Turma e mais antiga,
é apontada por: MASSON, Cleber. Direito penal: parte especial (arts. 121 a 212) – vol. 2. 12. ed. São Paulo: MÉTODO, 2019, p.
465. CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte especial (arts. 121 ao 361). 12. ed. Salvador: JusPODIVM, 2020, p.
361.
Tanto a violência à pessoa quanto a grave ameaça precisam ser meios para a prática do crime de dano ou
utilizados para possibilitar a prática do dano. Senão, não é o caso de dano qualificado por violência à pessoa
ou grave ameaça, mas de concurso entre o crime respectivo e o delito de dano na modalidade simples.
São absorvidos por tal modalidade de dano o crime de ameaça e a contravenção penal de vias
de fato. Quanto às lesões corporais, parte da doutrina entende que há concurso material dos
delitos2, o que parece ser equivocado. Cezar Roberto Bitencourt entende que deve ser adotado
o sistema do cúmulo material, mas isso não significa que o concurso é material. O concurso
pode, segundo o autor, ser material ou formal impróprio, pois ambos determinam a soma das
penas3.
II. com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave
A substância inflamável ou explosiva possui maior potencial danoso, além de possuir o potencial de causar
perigo a várias pessoas. Por isso, o dano praticado com o emprego de substância inflamável ou explosiva é
qualificado. O emprego de tais substâncias significa sua utilização para a prática do crime, ou seja, como
meio para a conduta delitiva.
2
MASSON, Cléber. Ob. Cit., 2019, p. 463.
3
BITENCOURT, Cezar Roberto. Parte Especial: crimes contra o patrimônio até crimes contra o sentimento religioso e o respeito
aos mortos. Coleção Tratado de direito penal volume 3. 16 ed. São Paulo: Saraiva Educação: 2020, p. 242-243.
4
CUNHA, Rogério Sanches. Ob. Cit., 2020, p. 364-365.
O motivo egoístico que qualifica o dano é a motivação ligada a um sentimento pessoal do agente, ligado a
algum interesse seu, seja econômico ou moral. É o caso de quem danifica o comércio que fica perto do seu,
querendo torná-lo menos atrativo para os clientes pelos quais disputam.
O prejuízo considerável para a vítima é a consequência do delito que o torna qualificado. Como já é
circunstância que qualifica o crime, tal circunstância não pode ser valorada também na primeira fase da
dosimetria, sob pena de bis in idem. O prejuízo deve ser analisado em relação a cada vítima, de acordo com
o caso concreto e as condições socioeconômicas do sujeito passivo.
➢ Ação Penal
O artigo 167 do Código Penal trata sobre a ação penal no caso de crime de dano, nos seguintes termos:
Ação penal
Art. 167 - Nos casos do art. 163, do inciso IV do seu parágrafo e do art. 164, somente se procede
mediante queixa.
A ação penal, portanto, será privada nos casos do art. 163, caput, e do inciso IV do seu parágrafo. Ou seja,
somente se procede mediante queixa no caso de dano simples e de dano qualificado por motivo egoístico
ou com prejuízo considerável para a vítima. Nos demais casos, a ação penal é pública incondicionada.
5
BITENCOURT, Cezar Roberto.Ob. Cit., 2020, p. 254.
6
MASSON, Cléber. Código Penal Comentado. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020, p. 853.
Cuida-se de crime comum, por não se exigir nenhuma qualidade específica do sujeito ativo. O crime é
material, exigindo que a introdução ou o abandono dos animais na propriedade alheia acarrete prejuízo
para outrem para que haja a sua consumação.
Em razão da necessidade do efetivo prejuízo para a configuração do delito, a doutrina aponta não ser
possível a punição da forma tentada. Isto porque, ou há prejuízo e o crime ocorreu, ou não há prejuízo e o
tipo penal não restou configurado.
O crime é de ação múltipla, ou seja, cuida-se de tipo penal misto alternativo. Isto significa que basta uma
das ações nucleares (introduzir ou deixar) para que a conduta se amolde ao tipo penal, sendo que a execução
das duas ações nucleares, no mesmo contexto, configura um único delito.
➢ Ação Penal
O artigo 167 do Código Penal dispõe sobre a ação penal no caso de crime de introdução ou abandono de
animais em propriedade alheia:
Ação penal
Art. 167 - Nos casos do art. 163, do inciso IV do seu parágrafo e do art. 164, somente se procede
mediante queixa.
Deste modo, a ação penal será privada.
II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei,
ato administrativo ou decisão judicial:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da
multa.
Nota-se que a redação do tipo penal do artigo 62 da Lei 9.605/98 é mais abrangente que o do artigo 165 do
Código Penal. Sendo posterior, revogou-o de forma total, ou seja, houve ab-rogação. Assim, passaremos a
analisar o tipo penal atualmente em vigor.
As ações nucleares são “destruir” (demolir, extinguir, reduzir a nada), “inutilizar” (tornar inútil, danificar,
comprometer o uso de) e “deteriorar” (estragar, danificar, tornar pior). O tipo penal é misto alternativo, ou
seja, basta a prática de uma das ações nucleares para a sua configuração, sendo que a prática de mais de
uma das condutas representadas pelos verbos, no mesmo contexto, configura apenas um delito.
A pena, que é mais grave do que a prevista no Código Penal, passou a ser de um a três anos e multa. Há
previsão da modalidade culposa, quando a pena passa a ser de seis meses a um ano de detenção, além da
multa. Vale lembrar que, por ser mais gravosa, a Lei 9.605/98 só pode ser aplicável aos casos ocorridos após
o início da sua vigência (o que só se registra para fins doutrinários, já que a modificação ocorreu há anos).
O objeto material do delito pode ser bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão
judicial; assim como arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar
protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial.
Vale destacar que o tombamento é apenas uma das formas de se proteger o bem de forma especial, de
modo que a previsão do artigo 165 do Código Penal se encontra totalmente abordada no artigo 62 da Lei
9.605/98.
O bem pode ser protegido especialmente por meio de lei, de ato administrativo ou decisão
judicial, o que abrange o tombamento, o inventário e o registro, por exemplo. Também são
protegidos os arquivos, registros, museus, bibliotecas, pinacotecas, instalações científicas ou
algo similar. Esta última expressão permite a interpretação analógica, que deve tomar como
parâmetro os itens anteriormente citados.
O crime é comum, não exigindo qualquer condição ou qualidade especial do agente para a sua
prática. É material, pois o seu resultado (destruição, inutilização ou deterioração) é necessário para a sua
consumação.
Pode ser doloso ou culposo. É crime de forma livre, podendo ser praticado de qualquer modo que acarrete
a destruição, inutilização ou deterioração dos bens citados no tipo penal.
É plurissubsistente, razão pela qual se admite a punição do conatus, ou seja, da forma tentada. É
instantâneo, de modo que se consuma de uma só vez, sem prolongamento temporal.
Nos termos do que dispõe o artigo 26 da Lei 9.605/98, a ação penal é pública incondicionada:
Art. 26. Nas infrações penais previstas nesta Lei, a ação penal é pública incondicionada.
As demais questões, como a possibilidade de transação e suas peculiaridades, devem ser tratadas no estudo
do Direito Penal Especial (Legislação Penal Extravagante).
DA APROPRIAÇÃO INDÉBITA
O Capítulo V do Título II da Parte Especial do Código Penal é intitulado “Da Apropriação Indébita”,
abrangendo os crimes de apropriação indébita; apropriação indébita previdenciária; apropriação de coisa
havida por erro, caso fortuito ou força da natureza; apropriação de tesouro e apropriação de coisa achada.
1 - APROPRIAÇÃO INDÉBITA
O delito de apropriação indébita está previsto no artigo 168 do Código Penal, que possui o seguinte
conteúdo:
Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Aumento de pena
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa:
I - em depósito necessário;
II - na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário
judicial;
III - em razão de ofício, emprego ou profissão.
Segundo pontua o Professor Cezar Bitencourt7, a primeira diferenciação entre a apropriação indébita e o
furto foi realizada no Código Francês de 1791, que influenciou outros países europeus.
Protegem-se a propriedade e os direitos reais de garantia. Não se exige confiança ou fidúcia entre o sujeito
ativo e o passivo, sendo suficiente que haja posse justa ou mera detenção do agente sobre a coisa.
A ação nuclear é apropriar-se (apoderar-se, assenhorear-se, arrogar-se a posse) de coisa alheia móvel. Exige-
se a anterior posse ou detenção lícita da coisa, em nome alheio, ou seja, o agente deve ter, anteriormente
à conduta típica, a posse justa ou a detenção lícita da coisa, sem que tenha a disponibilidade jurídica sobre
ela.
Deste modo, a consumação do delito se dá com a inversão do título da posse, isto é, o agente deixa de
possuir em nome alheio (alieno domine) para possuir como dono (causa dominii). Portanto, é um elemento
subjetivo, que deve ser demonstrado por um ato exterior, algo que transcenda o simples elemento anímico,
a mera vontade do agente.
A inversão do título ou da natureza da posse pode se consubstanciar na recusa em devolvê-la, quando o
agente demonstra que a tomou para si, ou em algum ato de disponibilidade, em razão de só o proprietário
poder dispor da coisa.
7
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. Cit., p. 235.
Ainda que haja divergências, parece prevalecer o entendimento segundo o qual é possível a tentativa de
apropriação indébita, apesar de ser difícil sua configuração.
A apropriação indébita é crime doloso, exigindo o animus rem sibi habendi, ou seja, o intuito de tomar a
coisa para si. O atraso ou a demora na devolução da coisa não significam, por si sós, a configuração do delito,
sendo imprescindível que demonstre a intenção do agente de modificar a natureza da posse, passando a
possuir a coisa como dono.
A doutrina majoritária classifica o crime em estudo como comum. Há, entretanto, entendimento minoritário
de que a infração penal de apropriação indébita é própria, por envolver a necessidade de anterior posse
justa ou detenção lícita da coisa.
É crime material, pois exige que a coisa passe a ser possuída pelo agente a título de proprietário, o que
acarreta o resultado naturalístico de lesão ao patrimônio da vítima.
Vale ressaltar que o STJ já aceitou a configuração do crime de apropriação indébita em caso de bem fungível:
(...) 1. Este Tribunal Superior já reconheceu a possibilidade de ocorrência do delito de apropriação
indébita quando se trata de bem fungível. 2. É também entendimento deste Sodalício que o
ressarcimento do prejuízo decorrente do desvio do bem depositado - inocorrente no caso - não
descaracteriza o delito. (...)” (STJ, AgRg no AREsp 528420/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma,
DJe 02/03/2018).
➢ Modalidades majoradas
O Código Penal prevê o aumento de um terço na pena do crime de apropriação indébita nos seguintes casos:
I. em depósito necessário
O Código Civil faz distinção entre o depósito necessário e o voluntário. Além disso, subdivide o necessário
em legal e miserável:
Art. 647. É depósito necessário:
I - o que se faz em desempenho de obrigação legal;
II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou
o saque.
O parágrafo único do artigo 649 traz, ainda, as hipóteses equiparadas ao depósito:
Parágrafo único. Os hospedeiros responderão como depositários, assim como pelos furtos e roubos
que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas nos seus estabelecimentos.
O artigo 647 traz as hipóteses de depósito necessário para o Direito Civil. O inciso I representa o chamado
depósito legal, enquanto o inciso II cuida do depósito miserável, as duas modalidades do depósito necessário
em referido ramo do Direito.
Para o Direito Penal, com base nos ensinamentos de Nelson Hungria, grande parte da doutrina aponta que
somente o depósito miserável corresponde ao exigido pela modalidade qualificada da apropriação indébita
tratada no inciso I do artigo 168 do Código Penal. Não inclui o depósito legal, que seria o gênero do depósito
judicial8. É a posição de Cezar Bitencourt9.
Por isso, apenas as hipóteses do artigo 647, inciso I, do Código Civil (depósito miserável) se amoldam ao
artigo 168, § 1º, inciso I, do Código Penal. O depósito judicial, conforme veremos, se enquadra na hipótese
do artigo 168, § 1º, inciso II, do Código Penal. A apropriação no caso de depósito legal, por parte de
funcionário público, pode configurar peculato. Para Hungria, o depósito por equiparação, do artigo 649,
deveria configurar a modalidade majorada em razão do exercício de ofício, emprego ou profissão10.
Deste modo, o termo depósito necessário, previsto na causa de aumento de pena do inciso I, deve ser
entendido como aquele decorrente de efetiva necessidade, não se estendendo às hipóteses de depósito
legal. Somente o depósito miserável, decorrente de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o
naufrágio ou o saque, serve para a configuração da majorante. O desvalor maior reside na situação de
vulnerabilidade da vítima.
Noronha, em sentido contrário, apresenta a posição de que o dispositivo abrange todas as modalidades de
depósito legal11.
8
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, vol. VII. 2 ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1958, p. 147-148.
9
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. Cit., 2020, p. 275-276. No mesmo sentido: GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 11 ed.
Niterói: Impetus, 2017, p. 927-928.
10
HUNGRIA, Nelson. Ob. Cit., 1958, p. 148-149.
11
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal, vol. 2. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 355. No mesmo sentido, defendendo
ser o depósito necessário o miserável e o legal (ressalvando o do funcionário público): PRADO, Luiz Régis. Curso de direito penal
brasileiro: parte geral e parte especial. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 657-658.
o mesmo encargo, mas em caso de incapacidade, seja por ser o indivíduo que tem a vida gerenciada um
ébrio habitual, viciado em tóxico ou alguém que, por causa transitória ou permanente, não puder exprimir
sua vontade. Está sujeito, ainda, à curatela o pródigo, nos termos do artigo 1.767 do Código Civil.
Síndico era a antiga denominação do administrador judicial, aquele que gerencia e representa a massa falida
em caso de falência.
Liquidatário é o que procede à chamada liquidação judicial, tratada nos termos dos artigos 1.102 a 1.112 do
Código Civil. São sinônimos os termos liquidante e liquidatário. Rogério Greco, entretanto, entende que a
figura foi extinta e não há mais esta função no ordenamento jurídico brasileiro.
Inventariante é o responsável pelo encargo de administrar o espólio até a efetiva partilha dos bens entre os
sucessores, herdeiros e legatários.
Testamenteiro é aquele que cumpre as disposições de última vontade de outrem, ou seja, que procede ao
cumprimento do disposto em determinado testamento.
Por fim, depositário judicial é a pessoa que recebe o encargo, perante o Poder Judiciário, de realizar a
guarda de bens e valores. Vale recordar, como dito acima, que o depósito necessário miserável é tratado
pelo inciso I do § 1º do artigo 168. Ademais, se o depósito judicial for encargo atribuído a um funcionário
público, no exercício de suas funções ou em razão delas, o delito será de peculato.
12
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit., 2020, p. 286-287.
13
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit., 2020, p. 288.
para se configurar o delito de apropriação indébita previdenciária. (...)” (STJ, EREsp 1207466/ES, Rel.
Min. Gurgel de Faria, Terceira Seção, DJe 06/11/2014).
Apesar de o tema já estar consolidado, cumpre verificar em um acórdão mais recente que referido
entendimento vem sendo aplicado pela Corte, além de consignar que o tipo é omissivo próprio:
“(...) I - "É assente o entendimento já consolidado nesta Corte que "o tipo penal do artigo 168-A do
Código Penal constitui crime omissivo próprio, que se consuma com o não recolhimento da
contribuição previdenciária dentro do prazo e das formas legais, inexigindo a demonstração do dolo
específico" (...)” (STJ, AgRg no REsp 1799126/RN, Rel. Min. Félix Fischer, Quinta Turma, DJe
11/06/2016).
O STJ possui precedentes no sentido de que o crime é formal14. Entretanto, após adotar a posição do STF,
vem entendendo que o crime é material, exigindo a constituição definitiva do débito tributário para a sua
configuração:
“(...) 1. Este Superior Tribunal de Justiça, adotando entendimento firmado pelo Supremo Tribunal
Federal na Súmula Vinculante n.º 24, entende que o crime tipificado no art. 168-A, do Código Penal
possui natureza material e, dessa forma, consuma-se a partir da conclusão definitiva do procedimento
administrativo de constituição do crédito tributário, sendo, portanto, este o momento a ser
considerado para fins de contagem inicial do prazo da prescrição da pretensão punitiva estatal.
Precedentes. (...)” (STJ, REsp 1734799/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 31/08/2018).
“(...) O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que os crimes de sonegação e
apropriação indébita previdenciárias, a exemplo dos delitos previstos no art. 1º da Lei 8.137/1990,
são materiais, não se configurando enquanto não lançado definitivamente o crédito, o que também
impede o início da contagem do prazo prescricional.” (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1806096, Rel. Min.
Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 08/10/2019).
É importante a leitura da Súmula Vinculante 24 que, apesar de não mencionar o delito em estudo, foi citada
no julgado acima colacionado:
Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei
8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo.
Quanto à continuidade delitiva, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça não admite o seu
reconhecimento entre o crime de apropriação indébita previdenciária e o de sonegação de contribuição
previdenciária. O motivo, já estudado, é a exigência de os delitos sejam da mesma espécie para que se
reconheça o crime continuado:
“(...) Os delitos de apropriação indébita previdenciária e de sonegação de contribuição previdenciária,
previstos, respectivamente, nos arts. 168-A e 337-A do CP, embora sejam do mesmo gênero, são de
espécies diversas; obstando a benesse da continuidade delitiva (...)” (STJ AgRg no REsp 1868826/CE,
Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 09/02/2021, DJe 17/02/2021)
➢ Formas equiparadas
14
STJ, EREsp 1207466/ES, Rel. Min. Gurgel de Faria, Terceira Seção, DJe 06/11/2014.
O § 1º do artigo 168 prevê formas equiparadas. Seriam hipóteses, de acordo com a doutrina, em que o
contribuinte seria o próprio empresário ou sociedade empresária. São as condutas de deixar de:
I. recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que
tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público
Deixar de recolher a contribuição consiste na conduta de, após descontada a contribuição do pagamento
efetuado ou sua arrecadação, não haja o seu efetivo pagamento. Conduta nitidamente omissiva. Note que
o objeto material não está estritamente vinculado à contribuição previdenciária, podendo ser qualquer
importância destinada à previdência social.
II. recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou
custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços
Também é conduta equiparada a de deixar de recolher contribuições devidas à previdência social, as quais
tenham integrado as despesas contábeis ou custos referentes à venda de produtos ou à prestação de
serviços. Pressupõe-se que o agente tenha recebido o valor, por eles integrarem os custos, de modo que
depois não o recolhe, o que se amolda ao tipo penal. É um crime omissivo próprio ou puro.
III. pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social
Configura-se o delito, em sua forma equiparada, a conduta de deixar de pagar benefício devido a segurado,
após os valores terem sido recebidos pela empresa, em virtude de reembolso do Regime Geral de
Previdência Social. Como as demais condutas, cuida-se de crime omissivo próprio.
O parágrafo terceiro do artigo 168-A do Código Penal prevê hipótese de perdão judicial ou de substituição
da pena privativa de liberdade pela de multa:
§ 3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário
e de bons antecedentes, desde que:
I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou
II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido
pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas
execuções fiscais.
§ 4o A faculdade prevista no § 3o deste artigo não se aplica aos casos de parcelamento de contribuições
cujo valor, inclusive dos acessórios, seja superior àquele estabelecido, administrativamente, como
sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.
Exige-se que o agente seja primário e de bons antecedentes, devendo, ainda, preencher um dos requisitos,
de forma alternativa:
• Efetuar o pagamento da contribuição social previdenciária e acessórios (incluídos os juros) após o
início da execução fiscal e antes de oferecida a denúncia; ou
• Que o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido,
pela Previdência Social, como mínimo para o ajuizamento das execuções fiscais. Com a unificação da
Receita Federal e a criação da chamada “Super Receita”, a cobrança das execuções ficais passou para
a Receita Federal, sendo que sua cobrança em juízo é atribuição da Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional. Atualmente, o limite mínimo para o ajuizamento das execuções fiscais relacionadas à
dívida ativa do INSS é de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Entretanto, o parágrafo quarto, incluído recentemente pela Lei n. 13.606/2018, passou a vedar a aplicação
do parágrafo terceiro aos casos de parcelamento de contribuições cujo valor seja superior ao estabelecido,
administrativamente, como mínimo para o ajuizamento das execuções fiscais. Vale repisar que o patamar
mínimo é de R$ 10.000,00.
Importante saber a redação do parágrafo quarto, por se tratar de modificação recente e que pode ser
cobrado em provas, especialmente por meio questões objetivas.
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada
com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais,
inclusive acessórios.
Portanto, pela Lei 10.684/03, não há limite temporal para a suspensão da punibilidade pelo parcelamento
do débito tributário, nem mesmo para a extinção da punibilidade em caso de pagamento integral dos
débitos tributários.
O que se pode questionar, a partir de então, é se o parágrafo quarto do artigo 168-A possuirá alguma
influência na questão do parcelamento, devendo-se aguardar o posicionamento dos Tribunais Superiores.
De início, parece não haver influência, dada a especialidade das disposições da Lei 10.684/03 em relação ao
perdão judicial e à substituição da pena privativa de liberdade por multa, tratados no Código Penal.
Além disso, o artigo 83 da Lei 9.430/96 também trata do tema. Apesar de ser mais antiga, os parágrafos
primeiro ao quinto foram incluídos pela Lei 12.382/2011,
1 a qual também renumerou o parágrafo sexto, o
que torna o dispositivo mais recente do que o da Lei 10.684/03:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos
nos arts. 1º e 2 da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social,
previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal),
será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa,
sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.
§ 1º Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para fins
penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou jurídica
do parcelamento.
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o
período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes
estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes
do recebimento da denúncia criminal.
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa
jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos,
inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
§ 5º O disposto nos §§ 1o a 4o não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento.
§ 6º As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-
se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a
denúncia pelo juiz.
O caput do artigo 34 da Lei 9.249/95, a que o parágrafo sexto do artigo 83 da Lei 12.382/2011 faz referência,
tem o seguinte conteúdo:
Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990,
e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou
contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.
Portanto, a Lei 9.430/96 possui dispositivos de teor semelhante aos da Lei 10.684/03, mas faz referência ao
artigo 34, caput, da Lei 12.382/2011, a qual determina a extinção da punibilidade no caso de pagamento
antes do recebimento da denúncia.
Ademais, os artigos 67 a 69 da Lei n. 11.941/2009 passaram a tratar do tema:
Art. 67. Na hipótese de parcelamento do crédito tributário antes do oferecimento da denúncia, essa
somente poderá ser aceita na superveniência de inadimplemento da obrigação objeto da denúncia.
Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da
Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal, limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de
concessão de parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os arts.
1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
Parágrafo único. A prescrição criminal não 3corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva.
Art. 69. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
Parágrafo único. Na hipótese de pagamento efetuado pela pessoa física prevista no § 15 do art. 1º
desta Lei, a extinção da punibilidade ocorrerá com o pagamento integral dos valores correspondentes
à ação penal.
Uma questão interessante extraída da Lei 11.941/2009, já verificada nas leis acima mencionadas, é a
exigência de que o débito pago tenha sido objeto de concessão de parcelamento. Referida exigência passou
a levantar a discussão sobre a necessidade ou não de consolidação do parcelamento para que a punibilidade
fique suspensa. Ou seja, se basta que o agente ou a pessoa jurídica relacionada ao débito tributário efetue
o parcelamento, com o pagamento das guias disponíveis, ou se é necessário que o Fisco aprove e consolide
o parcelamento requerido pelo devedor.
Pois bem, além de leis extravagantes, de Direito Tributário, tratando do tema, há os dispositivos já estudados
do Código Penal.
✓ Como lidar com essa miscelânea legislativa?
Vejamos como a jurisprudência tem tratado o parcelamento e pagamento das contribuições em relação a
eventual efeito de suspensão e extinção da pretensão punitiva.
O Superior Tribunal de Justiça tem considerado que a quitação do débito referente ao crédito tributário
extingue a punibilidade, nos termos da Lei 10.684/03:
“(...) 3. Consoante dispõe o art. 9º, § 2º, da Lei n. 10.684/03, nos crimes contra a ordem tributária e
de apropriação indébita previdenciária, extingue-se a punibilidade do agente que efetua o
pagamento integral do débito em questão. (...)” (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 320281/SE, Rel. Min.
Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, DJe 16/09/2016).
“(...) 1. O pagamento integral do débito previdenciário extingue a punibilidade do acusado, sendo que
a adesão ao programa de parcelamento suspende o andamento do prazo prescricional até sua
revogação ou a posterior extinção da punibilidade, em razão do pagamento integral. (...)” (STJ, AgRg
no AREsp 774580/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, 6ª Turma, DJe 04/04/2018).
“Não há como se interpretar o referido dispositivo legal de outro modo, senão considerando que o
parcelamento do tributo concedido pela Fazenda Pública, a qualquer tempo, até mesmo após o
advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de suspensão da ação penal
e do prazo prescricional.” (STJ, HC 402978/SC, Rel. Min Jorge Mussi, Sexta Turma, DJe 06/11/2017)
O Supremo Tribunal Federal possui precedente no mesmo sentido, entendendo ser cabível a extinção da
punibilidade no caso de pagamento integral do débito tributário, referente à contribuição previdenciária,
também com base na Lei 10.684/03:
“1. Tratando-se de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, § 1º, I, CP), o pagamento integral
do débito tributário, ainda que após o trânsito em julgado da condenação, é causa de extinção da
punibilidade do agente, nos termos do art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03. Precedentes. (...)” (STF, RHC
128245/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, Julgamento: 23/08/2016).
Ademais, o STJ tem entendido que não basta a 2adesão ao parcelamento do débito tributário, mas é
imprescindível que haja a consolidação do parcelamento pela Administração:
“(...) 2. Quanto ao mérito recursal, nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, o
simples requerimento de adesão do contribuinte ao programa de parcelamento não implica
imediata suspensão da pretensão punitiva estatal, pois, conforme a dicção do art. 68 da Lei n.
11.941/2009, tal benefício está adstrito aos débitos quanto aos quais a Fazenda Pública houver
efetivamente concedido o parcelamento e que tenham relação com a ação penal em curso. No caso,
conforme reconhecido no acórdão proferido no julgamento da impetração, os débitos encontravam-
se aguardando consolidação do parcelamento quanto ao quantum debeatur e ao valor das parcelas,
o que revela ser prematura a suspensão da persecução penal. (...)” (STJ, AgInt no RHC 61543/SP, Rel.
Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 30/05/2018).
O STF e o STJ têm admitido a extinção da punibilidade pelo pagamento integral do débito,
consistente no valor das contribuições previdenciárias (e acessórios, como juros), mesmo após o
trânsito em julgado. Por outro lado, o parcelamento implica a suspensão da pretensão punitiva,
sendo necessário que haja a consolidação do parcelamento pela Administração (não basta o
requerimento).
Portaria nº 4.943, de 4 de janeiro de 1999, já alterada, promoveu a atualização do valor mínimo para a
execução fiscal da dívida ativa do INSS, fixando-o em R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Com a Portaria nº 75 de 2012 do Ministério da Fazenda, o valor foi recalculado para o patamar de
R$20.000,00 (vinte mil reais), sendo, portanto, o quantum mínimo necessário para o ajuizamento da
execução fiscal. Mesmo com esse novo valor, o Superior Tribunal de Justiça adotava o limite para a aplicação
do princípio da insignificância, para o crime de apropriação indébita previdenciária, em R$ 10.000,00, nos
termos da Lei 10.522/200215.
O STF, independentemente do valor do débito, vinha julgando no sentido de inaplicabilidade do Princípio
da Insignificância para os casos de apropriação indébita previdenciária. Há diversos precedentes da Corte
Suprema em que se nega a aplicação da bagatela, em razão do entendimento de que a reprovabilidade da
conduta não é mínima, mas alta:
“(...) Deveras, o bem jurídico tutelado pelo 7 delito de apropriação indébita previdenciária é a
"subsistência financeira à Previdência Social" (...). Consectariamente, não há como afirmar-se que a
reprovabilidade da conduta atribuída ao paciente é de grau reduzido, porquanto narra a denúncia
que este teria descontado contribuições dos empregados e não repassado os valores aos cofres do
INSS, em prejuízo à arrecadação já deficitária da Previdência Social, configurando nítida lesão a bem
jurídico supraindividual (...)” (STF, HC 1022550/PR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, Julgamento:
20/09/2011).
“(...) Aplicação do princípio da insignificância. Impossibilidade. Elevado grau de reprovabilidade da
conduta. Precedentes. (...)” (RHC 132706 AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma,
Julgamento em 21/06/2016).
Recentemente, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça modificou seu entendimento para declarar
inadmissível o reconhecimento do princípio da insignificância ao crime de sonegação de contribuição
previdenciária:
(...) A Terceira Seção desta Corte Superior concluiu que não é possível a aplicação do princípio da
insignificância aos crimes de apropriação indébita previdenciária e de sonegação de contribuição
previdenciária, independentemente do valor do ilícito, pois esses tipos penais protegem a própria
subsistência da Previdência Social, de modo que é elevado o grau de reprovabilidade da conduta do
agente que atenta contra este bem jurídico supraindividual. (...) (STJ, AgRg no REsp 1783334/PB, Rel.
Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 02/12/2019).
“(...)Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, não é possível a aplicação do
princípio da insignificância ao crime de apropriação indébita previdenciária, independentemente do
valor apropriado, dado o elevado grau de reprovabilidade da conduta do agente que atenta contra a
subsistência da Previdência Social. (...)” (STJ, AgRg no REsp 1862853/MG, Rel. Min. Rogério Schietti
Cruz, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe 12/11/2020)
15
STJ, AgRg no REsp 1609757/SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, DJe 08/03/2018.
Portanto, STF e STJ atualmente não têm admitido a aplicação do princípio da insignificância
ao crime de apropriação indébita previdenciária. Houve uma modificação do entendimento
do STJ, que tinha o entendimento de ser possível o reconhecimento da atipicidade material
tanto do crime de apropriação indébita previdenciária quanto do delito de sonegação de
contribuição previdenciária.
O artigo 169 do Código Penal trata de diversos delitos, tratado da apropriação de coisa havida por erro, caso
2
fortuito ou força da natureza em seu caput. Além disso, o parágrafo único prevê formas equiparadas, cada
qual com seu nomen iuris, ou seja, com denominação diversa. Estudaremos cada um separadamente, a
começar com o do caput:
Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da
natureza:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
O crime de apropriação de coisa havia por erro, caso fortuito ou força da natureza possui como núcleo do
tipo o verbo “apropriar-se” (apoderar-se, assenhorear-se, arrogar-se a posse de), sendo o objeto material a
coisa alheia, que tenha chegado ao seu poder por erro, caso fortuito ou força maior.
Erro é a falsa percepção da realidade.
Caso fortuito é o acaso, evento imprevisto.
Força da natureza é um evento físico natural.
É o caso de envio pelos Correios, sendo que o carteiro entrega por erro em apartamento diverso. Também
pode ocorrer de uma enchente levar os bens de um vizinho para a propriedade do outro. Ou, ainda, se o
gado consegue derrubar uma cerca e adentra no imóvel adjacente, de propriedade de outrem.
Tutelam-se o patrimônio e a posse legítima. O crime é comum, por não exigir nenhuma qualidade específica
do sujeito ativo. É material, pois exige a ocorrência do resultado naturalístico para sua consumação.
É de forma livre, instantâneo e plurissubsistente, admitindo, portanto, a modalidade tentada.
4 - APROPRIAÇÃO DE TESOURO
O artigo 169 prevê no seu parágrafo único, inciso I, a forma equiparada que se denomina apropriação de
tesouro:
Parágrafo único - Na mesma pena incorre:
Apropriação de tesouro
I - quem acha tesouro em prédio alheio e se apropria, no todo ou em parte, da quota a que tem direito
o proprietário do prédio;
A conduta envolve o “achar” (encontrar, deparar, topar) tesouro em prédio alheio e o subsequente
“apropriar-se” (apoderar-se, assenhorear-se, arrogar-se a posse de), seja no todo ou em parte, da cota a
que tem direito o proprietário do prédio em que estava tal tesouro.
Tesouro é um conjunto de coisas valiosas ou preciosas, como moedas de ouro, que podem estar enterradas
ou apenas ocultas. O encontro deve ser causal, situação em que deverá ser dividido igualmente entre o
proprietário do terreno e aquele que o encontrar.
O Código Civil trata do tema do achado de tesouro em seus artigos 1.264 a 1.266, com as seguintes
disposições:
Art. 1.264. O depósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória, será dividido
por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro casualmente.
Art. 1.265. O tesouro pertencerá por inteiro ao proprietário do prédio, se for achado por ele, ou em
f
pesquisa que ordenou, ou por terceiro não autorizado.
Art. 1.266. Achando-se em terreno aforado, o tesouro será dividido por igual entre o descobridor e o
enfiteuta, ou será deste por inteiro quando ele mesmo seja o descobridor.
O crime é comum, instantâneo, material, de forma livre e plurissubsistente.
A exemplo dos demais crimes previstos no artigo 169, é classificado como comum, material, instantâneo e
de forma livre. Entretanto, ainda que haja doutrinadores entendendo possível sua tentativa, apesar de difícil
configuração, a parte omissiva da conduta não se mostra compatível com a tentativa.
1 - ESTELIONATO
O estelionato está previsto no caput do artigo 171 do Código Penal:
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo
alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme
o disposto no art. 155, § 2º.
As formas equiparadas, por possuírem denominações próprias dadas pela própria lei, serão estudadas
separadamente.
O estelionato consiste na conduta de “obter” (vir a ter, conseguir, receber), para si ou para outrem,
vantagem ilícita, em prejuízo alheio. É necessário, então, que haja o seguinte binômio:
A prática da conduta se dá por meio de fraude, ou, como diz a lei, por meio de indução ou manutenção de
alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento. É crime de ação austuciosa.
O termo estelionato vem do direito romano, da época em que os pretores (juízes)
definiam os crimes. Deriva do delito de stellionatus, proveniente da palavra stellio, que
significa camaleão16.
Artifício é a astúcia ou dissimulação utilizada para que alguém interprete os fatos de
forma errada. Ardil é a sagacidade, o estratagema, a armação ou cilada. Qualquer outro
meio fraudulento representa a cláusula de interpretação extensiva, que deve ser feita
com base nos exemplos de artifício e ardil.
O crime é comum, não se exigindo nenhuma qualidade específica do sujeito ativo para a sua configuração.
O sujeito passivo deve certo e determinável, com capacidade de discernimento para que posse der mantida
ou induzida a erro, ou seja, ser vítima da fraude perpetrada pelo agente. Vale mencionar, entretanto, que
pode haver dois sujeitos passivos diversos, uma que é enganada e outra que sofre o efetivo prejuízo 17.
A doutrina aponta haver a chamada dupla relação de causa de efeito: de início, o agente emprega o artifício,
o ardil ou outro meio fraudulento para que o sujeito passivo seja induzido a erro ou mantido em erro; na
sequência, em virtude do erro, há a obtenção de vantagem ilícita pelo agente e o consequente prejuízo para
a vítima.
16
BRANDÃO, Cláudio. Tipicidade Penal. 2 ed. Coimbra: Almedina, 2020, p. 27-28.
17
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. Cit., 2020, p. 304.
Há divergência sobre a necessidade de a vantagem ilícita obtida pelo agente ser econômica ou não. Alguns,
como Heleno Fragoso, argumentam que a vantagem deve ser econômica, mormente porque se trata de um
dos crimes contra o patrimônio. Há a posição, entretanto, de que o fato de ser um crime contra o patrimônio
significa que este é o bem jurídico tutelado pela norma, não sendo necessário que o benefício auferido pelo
agente seja econômico. É a posição de Cezar Bitencourt.
Não é habitual o tema ser enfrentado diretamente pelo STJ, o que ocorreu em um precedente não tão
recente:
“(...) 6. O prejuízo alheio, necessário à configuração do crime tipificado no art. 171 do Diploma
Penalista, deve ser patrimonial e avaliado concretamente, o que no caso não ocorreu. (...)” (STJ, REsp
1164698/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 18/06/2012).
Cuida-se de crime material, pois exige resultado naturalístico para a sua consumação. Exige-se o duplo
resultado, consistente na vantagem ilícita e no prejuízo alheio. É crime de forma livre.
A doutrina majoritária entende que a torpeza bilateral não afasta a configuração do crime de estelionato,
por não haver compensação de culpas no Direito Penal.
É doloso, sendo seu elemento subjetivo o dolo, consistente na vontade livre e consciente de manter ou
induzir alguém em erro, por meio de fraude, para obtenção de vantagem ilícita, causando prejuízo a outrem.
É plurissubsistente, razão pela qual admite a forma tentada.
O estelionato pode ser cometido mediante falsificação de cheque, sendo que a Súmula 48 do STJ dispõe
sobre a competência em tal caso:
Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato
cometido mediante falsificação de cheque.
O STJ já diferenciou o crime de furto mediante fraude, no caso de “gato” na rede elétrica, e da adulteração
do medidor de energia, em prestação lícita do serviço, que configura estelionato:
(...) Extrai-se dos autos que fraude empregada pelos agravantes - uso de material transparente nas
fases "a" e "b" do medidor - reduzia a quantidade de energia registrada no relógio e, por consequência,
a de consumo, gerando a obtenção de vantagem ilícita. (...) O caso dos autos revela não se tratar da
figura do "gato" de energia elétrica, em que há subtração e inversão da posse do bem. Trata-se de
prestação de serviço lícito, regular, com contraprestação pecuniária, em que a medição da energia
elétrica é alterada, como forma de burla ao sistema de controle de consumo, - fraude -, por
induzimento ao erro da companhia de eletricidade, que mais se adequa à figura descrita no art. 171,
do Código Penal - CP (estelionato). (STJ, AREsp 1418119/DF, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK,
QUINTA TURMA, julgado em 07/05/2019, DJe 13/05/2019)
Também importante destacar a diferenciação desse crime e o de furto mediante fraude, no caso de
clonagem de cartões:
“Mostra-se devida a condenação do recorrente pelo delito de furto, e não pelo de estelionato, quando
verificado que o acusado se valeu de fraude - clonagem de cartões - para burlar o sistema de proteção
e vigilância do Banco, com o objetivo de retirar indevidamente valores pertencentes aos titulares das
contas bancárias." (STJ, AgRg no AREsp 1172397/RN, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA,
QUINTA TURMA, julgado em 06/02/2018, DJe 19/02/2018)
Apesar de se tratar de matéria processual, cumpre lembrar que o estelionato pode ser cometido mediante
falsificação de cheque, sendo que a Súmula 48 do STJ dispõe sobre a competência em tal caso:
Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato
cometido mediante falsificação de cheque.
➢ Estelionato privilegiado
O parágrafo primeiro do artigo 171 determina a aplicação do disposto no parágrafo segundo do artigo 155,
ambos do Código Penal:
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de
reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.
São aplicáveis, mais uma vez, as observações feitas a respeito do furto privilegiado, com as devidas
alterações para as especificidades do crime de estelionato. Faz-se remissão ao estudo realizado para se
evitar repetição desnecessária.
Já o parágrafo 2º-B, também inserido pela Lei 14.155/ 2021, traz uma causa de aumento de pena de um a
dois terços. A fração deve ser escolhida pelo critério da relevância do resultado gravoso, como já previsto
pela lei. Essa forma majorada incide, sobre a forma qualificada do § 2º-A, se o crime for praticado mediante
a utilização de servidor mantido fora do território nacional. Nesse caso, há maior gravidade pela dificuldade
de repressão a um delito praticado a partir de um servidor, de um equipamento de informática central,
localizado fora do território brasileiro.
presente no delito já analisado). São núcleos do tipo: “vender”, “permutar”, “dar em pagamento” ou “dar
em garantia”. Cuida-se de tipo penal misto alternativo.
O objeto material, entretanto, é a coisa própria, mas da qual o agente não possui a
disponibilidade e, mesmo assim, procede a sua alienação ou oneração fraudulenta. Pode ser a
coisa própria objeto do crime aquela que seja inalienável, que esteja gravada de ônus (como
hipoteca), que seja litigiosa, bem como imóvel que já tenha prometido vender a terceiro,
mediante pagamento em prestações.
De toda forma, é imprescindível que o sujeito ativo tenha silenciado sobre tais circunstâncias, sendo este
o elemento sobre o qual recai a fraude, que provoca ou mantém a falsa percepção da realidade pela vítima.
É o crime comum, não se exigindo nenhuma qualidade específica do sujeito ativo para sua configuração. A
tentativa (conatus) é possível, razão pela qual o crime é plurissubsistente. É material e doloso.
4 - DEFRAUDAÇÃO DE PENHOR
O delito de defraudação de penhor está tipificado no artigo 171, § 2º, inciso III do Código Penal:
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Defraudação de penhor
III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia
pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;
O núcleo do tipo é “defraudar” (fraudar, ludibriar, usurpar, espoliar) a coisa dada em garantia pignoratícia,
da qual o agente tem a posse. O crime é de forma livre, sendo que a defraudação pode ocorrer por meio de
alienação não consentida ou por outro modo.
A defraudação de penhor ocorre com a perda do direito real de garantia pelo credor, podendo ocorrer por
meio de alienação, como visto, da coisa empenhada. Sujeito ativo é o devedor pignoratício, enquanto o
sujeito passivo é o credor pignoratício.
É crime doloso, plurissubsistente e material.
A conduta é “defraudar” (fraudar, adulterar, ludibriar, alterar) substância, qualidade ou quantidade da coisa
que deve entregar a alguém.
O dever de entregar a alguém pode decorrer de um negócio jurídico, de determinação legal ou judicial. A
substância da coisa diz respeito a sua constituição, sua essência; a qualidade se refere à espécie; e, por fim,
a quantidade diz respeito à massa, ao tamanho ou ao número.
Parte da doutrina entende tratar-se de crime é comum, não se exigindo qualidade específica do sujeito ativo.
Cleber Masson, defende, todavia, que o delito de fraude na entrega de coisa só pode ser cometido pela
pessoa que está obrigada a entregar o bem, portanto, seria um crime próprio18.
É necessário que haja a fraude para a configuração do delito, que é material, plurissubsistente e doloso.
18
MASSON, Cleber. Ob. Cit., 2020. p. 885.
danificar o bem material por circunstâncias alheias à sua vontade, estará caracterizada a tentativa,
não havendo que se falar em crime impossível quando impedido pela atuação policial. Precedentes.
(...)” (STJ, AgRg no AREsp 780326/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 05/04/2017).
O crime é classificado como próprio por parte da doutrina, por exigir que o sujeito ativo seja o dono da coisa
ou o indivíduo que sofre as lesões ou o agravamento das consequências da lesão ou doença.
“(...) Não configura crime de estelionato a emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos, ou
a frustração do respectivo pagamento, se a cártula consubstancia pagamento de dívida
preexistente. (...)” (STJ, RHC 19314/CE, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 09/05/2012)
A confirmar a necessidade de fraude para a configuração do delito, há o enunciado número 246 da Súmula
do Supremo Tribunal Federal:
Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos.
A Suprema Corte também aprovou a Súmula 554, de antes da Reforma da Parte Geral (quando ainda não
havia o instituto do arrependimento posterior). Ainda assim, tem aplicado seu entendimento até hoje:
O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não
obsta ao prosseguimento da ação penal.
A contrario sensu, o enunciado demonstra que, se o agente pagar o cheque emitido sem provisão de fundos
até o recebimento da denúncia, não há justa causa para a ação penal. Cuida-se de uma causa de extinção
da punibilidade de construção pretoriana, ou seja, advinda da jurisprudência.
Parte da doutrina entende que só pode ser autor o emitente do cheque, enquanto outra parte entende que
o endossante também pode cometer o delito.
Os crimes de estelionato e as figuras equiparadas, todos previstos no artigo 171 do Código Penal, possuem
regras sobre causas de aumento, formas equiparadas e ação penal nos parágrafos terceiro a quinto.
➢ Ação penal
A Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, introduziu o parágrafo quinto ao artigo 171 do Código Penal. Traz
o dispositivo hipóteses em que a ação penal passa a ser pública incondicionada:
§ 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:
I - a Administração Pública, direta ou indireta;
II - criança ou adolescente;
III - pessoa com deficiência mental; ou
IV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.
Portanto, a regra é a ação penal pública condicionada à representação. A ação penal passa a ser
incondicionada se o delito for praticado contra a Administração Pública, direta ou indireta; contra criança
ou adolescente; contra pessoa com deficiência mental; contra maior de 70 (setenta) anos de idade ou contra
incapaz. O estelionato contra incapaz é possível, por exemplo, se entendermos, como Cezar Bitencourt 19,
de que o crime pode ter dois sujeitos passivos: o que leva o prejuízo e o que é enganado.
Sobre o direito intertemporal, a regra, como toda que diz respeito à titularidade da ação penal, tem
natureza híbrida. Isto porque, quanto menos condicionada é a propositura da ação (ação penal pública
incondicionada, submetida ao princípio da obrigatoriedade, por exemplo), mais fácil é o exercício do poder
punitivo estatal. Quando se cria condicionante, como no caso (exigência de representação do ofendido, em
19
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit., 2020, p. 304.
regra), o poder punitivo encontra maior dificuldade para seu exercício). Por isso, ainda que a ação penal seja
matéria processual penal, também tem relevância para o direito material, daí sua natureza híbrida.
Por isso, a norma mais benéfica se aplica de imediato. A dúvida que surge é quanto à ação penal já iniciada:
• Ato jurídico perfeito, não havendo que se falar em exigência de representação;
• Exigência imediata de representação;
• Utilização do artigo 91 da Lei n. 9.099/95 como analogia (intimação para oferecimento de
representação no prazo de 30 dias, no caso de ação em andamento).
Após precedente da Quinta Turma em que o STJ adotou a tese do ato jurídico perfeito20, a Terceira Seção
da Corte pacificou o entendimento de que a nova regra não retroage:
“(...) 1. A retroatividade da norma que previu a ação penal pública condicionada, como regra, no crime
de estelionato, é desaconselhada por, ao menos, duas ordens de motivos.
2. A primeira é de caráter processual e constitucional, pois o papel dos Tribunais Superiores, na
estrutura do Judiciário brasileiro é o de estabelecer diretrizes aos demais Órgãos jurisdicionais. Nesse
sentido, verifica-se que o STF, por ambas as turmas, já se manifestou no sentido da irretroatividade da
lei que instituiu a condição de procedibilidade no delito previsto no art. 171 do CP.
3. Em relação ao aspecto material, tem-se que a irretroatividade do art. 171, §5º, do CP, decorre da
própria mens legis, pois, mesmo podendo, o legislador previu apenas a condição de procedibilidade,
nada dispondo sobre a condição de prosseguibilidade. Ademais, necessário ainda registrar a
importância de se resguardar a segurança jurídica e o ato jurídico perfeito (art. 25 do CPP), quando já
oferecida a denúncia. (...)”
(HC 610.201/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2021, DJe
08/04/2021)
No mesmo sentido, há precedente da Primeira Turma do STF:
“(...) 2.Em face da natureza mista (penal/processual) da norma prevista no §5º do artigo 171 do Código
Penal, sua aplicação retroativa será obrigatória em todas as hipóteses onde ainda não tiver sido
oferecida a denúncia pelo Ministério Público, independentemente do momento da prática da infração
penal, nos termos do artigo 2º, do Código de Processo Penal, por tratar-se de verdadeira “condição de
procedibilidade da ação penal”. 3.Inaplicável a retroatividade do §5º do artigo 171 do Código Penal,
às hipóteses onde o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da Lei
13.964/19; uma vez que, naquele momento a norma processual em vigor definia a ação para o delito
de estelionato como pública incondicionada, não exigindo qualquer condição de procedibilidade para
a instauração da persecução penal em juízo. (...)”
(HC 187341, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 13/10/2020, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-263 DIVULG 03-11-2020 PUBLIC 04-11-2020)
Entretanto, recentemente, a Segunda Turma decidiu de forma diversa, abrindo a divergência, ao julgar o HC
180421:
A Turma, por maioria, negou provimento ao agravo regimental, mas concedeu o habeas corpus, de
ofício, e trancou a ação penal, com a aplicação retroativa, até o trânsito em julgado, do disposto no
20
STJ, HC 573093/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 18/06/2020.
art. 171, § 5º, do CP, com a alteração introduzida pela Lei n. 13.964/2019, nos termos do voto do
Relator, vencido, em parte, o Ministro Ricardo Lewandowski, que dava provimento ao recurso para
conceder a ordem e trancar a ação penal. Presidência do Ministro Gilmar Mendes. 2ª Turma,
22.6.2021.
9 - DUPLICATA SIMULADA
O delito de duplicata simulada está previsto no artigo 172 do Código Penal, de seguinte teor:
Art. 172 - Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em
quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado.
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrerá aquele que falsificar ou adulterar a escrituração do Livro
de Registro de Duplicatas.
A conduta incriminar é “emitir”, ou seja, colocar em circulação ou lançar fatura, duplicata ou nota de venda
de forma simulada. Isto é, o documento deve não corresponder à quantidade ou qualidade da mercadoria
vendida ou ao serviço prestado.
O parágrafo único prevê a forma equiparada de “falsificar” (desvirtuar, alterar os dados) ou “adulterar”
(modificar, corromper) a escrituração do Livro de Registro das Duplicatas.
A doutrina diverge sobre o crime ser comum21 ou próprio22. É, ainda, doloso, formal, comissivo e
plurissubsistente, ou seja, admite a forma tentada.
Uma controvérsia que surge é a configuração ou não do crime no caso de a duplicata ser
emitida sem que haja venda de mercadoria ou serviço prestado. Configura-se o delito?
A polêmica surge porque o tipo penal fala em venda feita de forma diversa daquela descrita na
duplicata ou prestação de serviço que não corresponda ao constante do referido título de
crédito. Entretanto, a lei não fala sobre o caso de não haver prestação de serviço algum ou de
não se ter efetivado venda alguma.
Malgrado seja polêmica a questão, no âmbito jurisprudencial, o STJ possui precedente em que reconhece
possível a existência do crime no caso de não haver a prestação de serviço ou a venda de mercadoria:
“(...) 1. O delito relativo à duplicata simulada consiste na emissão de fatura, duplicata ou nota de venda
que não corresponda à mercadoria efetivamente vendida ou ao serviço prestado, ou seja, o documento
pode se referir tanto a um negócio inexistente, como ao que tenha sido realizado de forma diversa
da descrita pelo emissor. (...)” (STJ, AgRg no REsp 1482745/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma,
DJe 28/05/2018).
10 - ABUSO DE INCAPAZES
O crime de abuso de incapazes está tipificado no artigo 173 do Código Penal:
Art. 173 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor,
ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível
de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, o que leva à conclusão de se tratar de crime comum. O sujeito
passivo deve ser o menor, o alienado ou o débil mental, ou seja, aquele que possui alguma deficiência ou
doença de ordem mental.
Bento de Faria defende que se inclui como sujeito passivo tanto o menor emancipado quanto o não
emancipado. Magalhães Noronha, por sua vez, entende que o termo menor deve ser interpretado conforme
a denominação do dispositivo, que diz sobre abuso de incapazes. Logo, o menor emancipado não pode ser
vítima do delito.
A conduta nuclear é “abusar” (usar de maneira inadequada, tirar vantagem de). O abuso pode ser efetuado
em proveito próprio ou alheio, recaindo sobre:
• a necessidade, paixão ou inexperiência da vítima menor de 18 anos;
• da alienação da vítima;
21
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit., 2020, p. 304. PRADO, Luiz Regis. Ob. Cit., 2020, p. 701. Parece defender a mesma posição:
NORONHA, Edgard Magalhães. Ob. Cit., 1976, p. 446-448.
22
GRECO, Rogério. Ob. cit., 2017, p. 989. MASSON, Cleber. Ob. Cit., 2020, p. 553.
11 - INDUZIMENTO À ESPECULAÇÃO
O artigo 174 do Código Penal está previsto no induzimento à especulação:
Art. 174 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade
mental de outrem, induzindo-o à prática de jogo ou aposta, ou à especulação com títulos ou
mercadorias, sabendo ou devendo saber que a operação é ruinosa:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
O sujeito ativo é qualquer pessoa, razão pela qual o crime é classificado como comum. Sujeito passivo, por
sua vez, deve ser alguém menor ou que seja inexperiente, simples ou ingênuo.
A conduta nuclear é “abusar” (usar de maneira inadequada, tirar vantagem de). O abuso pode ser efetuado
em proveito próprio ou alheio, recaindo sobre a inexperiência, a simplicidade ou inferioridade mental da
vítima.
O sujeito passivo deve, ainda, ser compelido à prática do jogo ou da aposta ou à especulação com títulos ou
mercadorias.
Exige-se que o agente saiba ou deva saber que a conduta é ruinosa. O crime é doloso, formal, de forma livre
e plurissubsistente.
12 - FRAUDE NO COMÉRCIO
O delito de fraude no comércio está previsto no artigo 175 do Código Penal:
Art. 175 - Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor:
I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;
II - entregando uma mercadoria por outra:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
§ 1º - Alterar em obra que lhe é encomendada a qualidade ou o peso de metal ou substituir, no mesmo
caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor; vender pedra falsa por verdadeira;
vender, como precioso, metal de ou outra qualidade:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
➢ Forma qualificada
O parágrafo primeiro do artigo 175 prevê a forma qualificada do delito, sendo que a sua pena passa a ser de
detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
O núcleo do tipo é “alterar” (modificar, causar alteração, mudar); “substituir” (colocar no lugar de outra
coisa, trocar) ou “vender” (efetuar a alienação mediante pagamento de preço).
As condutas são de alterar, em obra que lhe é encomendada, a qualidade ou o peso de metal ou substituir,
no mesmo caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor. Além disso, incrimina-se o ato de
vender pedra falsa por verdadeira ou de vender, como precioso, metal de outra qualidade.
➢ Forma privilegiada
Aplica-se à fraude no comércio a hipótese de privilégio prevista no artigo 155, § 2º, do Código Penal. Faz-se
remissão sobre o estudo do furto privilegiado, para não se incorrer em repetição não necessária.
13 - OUTRAS FRAUDES
O artigo 176 prevê o tipo penal referente a outras fraudes:
Art. 176 - Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem
dispor de recursos para efetuar o pagamento:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação, e o juiz pode, conforme as
circunstâncias, deixar de aplicar a pena.
O tipo penal tem como núcleos do tipo “tomar” refeição, “alojar-se” em hotel ou “utilizar-se” de meio de
transporte. Refeição inclui bebidas e hotel abrange também pensões e albergues, segundo a doutrina.
Em todos os casos, exige-se que o agente não disponha de recursos para efetuar o pagamento. Por isso,
alguns autores entendem que no caso do pendura, por exemplo, em que os alunos de Direito que se recusam
a pagar pela refeição, em virtude do tradicional “trote”, não cometem crime se possuírem os recursos. Isto
porque o tipo penal exige que o agente não possua o valor necessário para efetuar o pagamento.
A ação penal é pública condicionada à representação e há possibilidade de aplicação do perdão judicial.
Neste caso, não se preveem os requisitos para a incidência de referida causa de extinção da punibilidade,
sendo que cabe ao juiz analisar caso a caso.
O crime é de dano e material, exigindo o efetivo prejuízo da vítima para a sua configuração. É comum, doloso
e plurissubsistente.
Cuida-se de delito subsidiário, sendo que só se configura se não se configurar o crime contra
a economia popular. Há delitos do artigo 3º, incisos VII a X, da Lei 1.521/51, a Lei de
Economia Popular, que são próximos dos delitos tratados no artigo 177 do Código Penal,
devendo se analisar os casos com base na subsidiariedade expressa do crime em estudo.
O parágrafo primeiro traz formas equiparadas, sendo que são crimes próprios, que exigem
qualidade específica do sujeito ativo. Em todos se protege o patrimônio societário.
O parágrafo segundo prevê o chamado crime de acionista ou de negociação de voto, que pune a conduta
do acionista que negocia o voto nas deliberações de assembleia geral, exigindo-se o elemento subjetivo
especial do tipo consistente no fim de obter vantagem para si ou para outrem. O voto é trocado por
determinado interesse do sujeito ativo. Neste caso, a pena é mais leve, consistente em detenção, de seis
meses a dois anos, e multa.
16 - FRAUDE À EXECUÇÃO
O artigo 179 do Código Penal estipula o crime de fraude à execução:
Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando
dívidas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.
A fraude à execução tem como núcleo do tipo o verbo “fraudar” (adulterar, ludibriar, alterar), sendo que a
fraude deve ocorrer de uma das seguintes maneiras:
• Alienando bens;
• Desviando bens;
• Destruindo bens ou
• Simulando dívidas.
Cuida-se de crime material, pois se exige a efetiva fraude à execução, por meio da alienação, desvio ou
destruição de bens ou simulação de dívidas. Se ele continuar solvente, sem prejudicar a execução, não se
consuma o delito.
O crime é próprio. É plurissubsistente, admitindo a tentativa. Além disso, é doloso, exigindo a vontade livre
e consciente de fraudar a execução, sendo apontado pela doutrina, ainda, o elemento subjetivo especial
consistente na finalidade de prejudicar os credores. É crime de dano e não transeunte.
A ação penal é privada exclusiva.
DA RECEPTAÇÃO
O Capítulo VII do Título II da Parte Especial do Código Penal se denomina “Da Receptação”. Nele, estão
inseridos os crimes de receptação e de receptação de animal.
1 - RECEPTAÇÃO
O crime de receptação está previsto no artigo 180 do Código Penal:
Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que
sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Receptação Qualificada
§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar,
vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de
atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
§ 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de
comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência.
§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou
pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.
§ 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que
proveio a coisa.
§ 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as
circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155.
§ 6o Tratando-se de bens do patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de
autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa
concessionária de serviços públicos, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo.
Os núcleos do tipo são adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio,
coisa que sabe ser produto de crime. Trata-se de crime material e plurissubsistente, sendo possível a
tentativa.
O crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, menos o coautor ou partícipe do crime
antecedente. Isto porque, como prevalece na doutrina, a venda posterior por quem cometeu o crime
patrimonial seria pós fato impunível, incidindo o princípio da consunção.
Também se configura o crime com a ação de influir para que terceiro, de boa-fé, adquira, receba ou oculte
coisa que sabe ser produto de crime. A coisa somente pode ser bem móvel, apesar de a lei não o exigir
expressamente. Neste caso, é indispensável que terceiro esteja de boa-fé, do contrário também responderá
como receptador. Noronha denomina o agente, neste caso, de “mediador criminoso”. A maioria da doutrina
entende que o crime se consuma apenas com a conduta de influir, independentemente de o terceiro praticar
ou não a conduta.
Adquirir, receber, transportar, conduzir ou Influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira,
ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa receba ou oculte.
que sabe ser produto de crime.
Em ambos os casos, o agente deve saber da origem ilícita do bem. De igual modo, a lei diz que a coisa deve
ser produto de crime, o que exclui a coisa que advenha da prática de contravenção penal.
Dentre as hipóteses de receptação própria, o tipo é misto alternativo. Entretanto, Cezar Bittencourt23 e
Rogério Greco alertam que, no caso de o agente cometer a receptação própria e a imprópria, o tipo é misto
cumulativo, havendo a configuração de mais de um delito, em concurso.
Admite-se a receptação em cadeia, desde que o agente saiba da origem ilícita. É o caso de quem compra o
carro de um intermediário, sabendo que este vende os produtos dos roubos praticados por outro sujeito,
dos quais os compra a preço bem mais baixo.
Verifica-se que o crime de receptação pressupõe um crime anterior, razão pela qual é denominado de crime
acessório. Sendo crime acessório, é necessário que se demonstre a ocorrência de crime anterior, sendo
desnecessária, conduta, a condenação dos agentes envolvidos (podem, inclusive, ser desconhecidos ou
terem morrido). Ademais, vale recordar não ser possível a imputação de receptação caso o agente seja
autor, coautor ou partícipe do crime anterior. Neste caso, ele responde pelo delito principal, e não pela
receptação.
✓ Cabe receptação de bens imóveis?
Há recente acórdão do STJ, sinalizando o entendimento dos Tribunais Superiores:
“O Supremo Tribunal Federal, em julgado da Relatoria do Ministro Moreira Alves, já decidiu que, em
face da legislação penal brasileira, só as coisas móveis ou mobilizadas podem ser objeto de
receptação. Interpretação do art. 180 do Código Penal. Assim, não é crime, no direito pátrio, o adquirir
imóvel que esteja registrado em nome de terceiro, que não é o verdadeiro proprietário (...)” (STJ, HC
545395/RO, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 13/03/2020).
➢ Forma Qualificada
O parágrafo primeiro prevê a forma qualificada da receptação, cuja pena é a de reclusão, de 3 a 8 anos, e
multa. Damásio de Jesus, entretanto, aponta que se trata de figura autônoma, já que o legislador
acrescentou figuras diferentes daquelas previstas no caput.
Cuida-se de tipo penal misto alternativo, cujos núcleos do tipo são adquirir, receber, transportar, conduzir,
ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma
utilizar coisa que deve saber ser produto de crime. Exige-se que a conduta seja realizada em proveito próprio
ou alheio.
Como especializante, exige-se que a conduta do agente seja realizada no exercício de atividade comercial
ou industrial. O parágrafo segundo determina que a atividade comercial, para efeito da forma qualificada
da receptação, deve ser entendida como qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o
exercido em residência. Para alguns, essa seria uma outra modalidade do delito, a equiparada. Incluem-se
no caso as garagens clandestinas de desmonte ou desmanche de automóvel, exatamente a atividade que o
legislador mais desejou punir severamente.
Nesta modalidade, há falta de cuidado do agente quanto à origem da coisa a ser adquirida, recebida,
transportada, conduzida, ocultada, tida em depósito, desmontada, montada, remontada, vendida, exposta
23
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit., 2020, p. 393.
à venda ou utilizada de qualquer forma. O agente deveria saber que o produto advém do crime, razão pela
qual se classifica o elemento subjetivo como dolo eventual. Este é o entendimento da doutrina majoritária.
A doutrina majoritária entende que o termo “deve saber” traduz-se por dolo eventual, sendo que, inclusive,
Alberto Silva Franco e Damásio de Jesus defendem que não é possível uma pena mais grave do que o caput,
já que referida modalidade abrange o dolo eventual, enquanto a forma do caput diz respeito ao dolo direito
(ou seja, maior culpabilidade do agente).
Deste modo, surgiu a corrente que defende não ser possível a pena mais grave para a
modalidade do parágrafo primeiro, razão pela qual se deveria aplicar a pena do caput também
no caso da conduta se amoldar ao parágrafo primeiro. O STJ, entretanto, entende que a pena
mais rigorosa se liga ao fato de o crime qualificado envolver o exercício de atividade
comercial ou industrial, não havendo que se falar em aplicação da pena do caput se
configurada a figura do parágrafo primeiro:
“(...) 1. Embora seja certo que o delito do § 1º do art. 180 do Código Penal traga como elemento
constitutivo do tipo o dolo eventual, a pena mais severa cominada à forma qualificada da receptação
tem sua razão de ser na maior gravidade e reprovabilidade da conduta praticada no exercício da
atividade comercial ou industrial, cuja lesão exponencial resvala num número indeterminado de
consumidores. (...) 4. Ordem denegada. (HC 189.297/BA, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA
TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 29/06/2012).
“(...) 2. Segundo entendimento desta Corte, a pena a ser aplicada ao crime de receptação qualificada
não pode manter o quantum previsto no artigo 180, caput, do Código Penal, ou seja, o mesmo
patamar do preceito secundário da receptação simples. (Embargos de Divergência 879.539/SP).
Resssalva do entendimento da Relatora. (...)” (STJ, HC 388640/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta
Turma, DJe 22/06/2017).
Por fim, parte da doutrina defende que se deve dar interpretação extensiva à expressão “deve saber”,
compreendendo ali também a situação do agente que “sabe” que a coisa é produto do crime. Ou seja,
abrangeria também o dolo direto como elemento subjetivo. É a posição de Rogério Greco24.
Nesta modalidade, o crime é próprio, doloso, material, de dano e plurissubsistente, admitindo, portanto, a
forma tentada.
➢ Forma Culposa
O legislador trouxe uma forma diferente de narrar a modalidade culposa da receptação: “Adquirir ou
receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem
a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso”. A pena é de detenção, de um mês a um ano, ou
multa, ou ambas as penas.
Neste caso, portanto, a lei se utiliza de um tipo fechado, não usando o tipo aberto, como é praxe no Código.
Seria o tipo aberto se a lei previsse: “Se a receptação é culposa. Pena – detenção, de um mês a um ano, ou
multa, ou ambas as penas”.
São indícios que o agente atuou com culpa (em sentido estrito) ao receber ou adquirir a coisa:
24
GRECO, Rogério. Ob. cit., 2017, p. 1038-1039.
➢ Perdão judicial
No caso do parágrafo terceiro, se o agente for primário, o juiz pode deixar de aplicar a pena. Trata-se de
extinção da punibilidade por perdão judicial, prevista no parágrafo quinto do artigo 180 do Código Penal.
Vale lembrar que, neste caso, não subsiste nenhum efeito condenatório, nos termos da Súmula 18 do STJ.
➢ Forma privilegiada
No caso de receptação dolosa, aplicam-se as mesmas disposições do artigo 155, § 2º, do Código Penal, que
prevê o chamado furto privilegiado. Para evitar repetições, faz-se remissão ao estudo realizado quando da
análise do furto, com as devidas adaptações para a receptação.
➢ Forma majorada
Se a conduta recair sobre bens do patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de
autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de
serviços públicos, há a majorante, que determina que a pena do caput seja aplicada em dobro. A atual
redação foi dada pela Lei nº 13.531, de 2017, que veio corrigir lacuna, como a ausência do Distrito Federal
na causa de aumento de pena, o que não se justificava em virtude da majorante no caso do patrimônio dos
demais entes federativos.
➢ Efeito da condenação
A Lei 13.804, de 10 de janeiro de 2019, alterou a Lei 9.503/97, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), para
incluir novos efeitos da condenação com relação aos crimes de receptação, contrabando e descaminho.
Referido efeito está previsto no artigo 278-A do CTB, nos seguintes termos:
Art. 278-A. O condutor que se utilize de veículo para a prática do crime de receptação, descaminho,
contrabando, previstos nos arts. 180, 334 e 334-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal), condenado por um desses crimes em decisão judicial transitada em julgado, terá
cassado seu documento de habilitação ou será proibido de obter a habilitação para dirigir veículo
automotor pelo prazo de 5 (cinco) anos.
§ 1º O condutor condenado poderá requerer sua reabilitação, submetendo-se a todos os exames
necessários à habilitação, na forma deste Código.
§ 2º No caso do condutor preso em flagrante na prática dos crimes de que trata o caput deste artigo,
poderá o juiz, em qualquer fase da investigação ou da ação penal, se houver necessidade para a
garantia da ordem pública, como medida cautelar, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público
ou ainda mediante representação da autoridade policial, decretar, em decisão motivada, a suspensão
da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, ou a proibição de sua obtenção.
Entendo que houve omissão indevida da lei em relação ao artigo 180-A do CP, que cuida da receptação de
animal, analisado na sequência. Cumpre acompanhar como a jurisprudência tratará do tema. De todo modo,
parece não haver possibilidade de incluir o artigo 180-A ao lado do artigo 180, no rol de crimes que
possibilitam a medida, sob pena de violação da legalidade, por analogia in malam partem.
2 - RECEPTAÇÃO DE ANIMAL
O crime de receptação de animal, que é especial em relação à receptação do artigo 180 do Código Penal,
localiza-se no artigo 180-A do Código Penal, inserido pela Lei 13.330/2016:
Art. 180-A. Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito ou vender, com a
finalidade de produção ou de comercialização, semovente domesticável de produção, ainda que
abatido ou dividido em partes, que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Todos os núcleos do tipo foram estudados na forma comum do crime de receptação. O elemento
especializante é o objeto material, que é o semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou
dividido em partes. Exige-se que o agente deva saber ser produto do crime.
A pena deste crime é de reclusão, de 2 a 5 anos, e multa. Semovente é o bem que se locomove por si só, o
animal. O tipo menciona semovente domesticável de produção, o que inclui ovelhas ou bois, por exemplo.
A expressão deve saber indica, para a maioria da doutrina, o dolo eventual. Entretanto, alguns
doutrinadores, como Rogério Greco, defendem que também se deve incluir o dolo direto, em interpretação
extensiva do tipo penal.
Cuida-se de delito comum, por não exigir nenhuma qualidade específica do sujeito ativo. O crime é doloso,
exigindo-se a finalidade específica de produção ou comercialização. É plurissubsistente, possibilitando a
tentativa, exceto na forma de “ocultar”, em que é considerado omissivo. É tipo misto alternativo.
QUESTÕES COMENTADAS
Comentários
A alternativa A está correta. Cuida-se de crime doloso, exigindo-se a vontade livre e consciente de não
repassar à previdência social as contribuições recolhias dos contribuintes, no prazo e forma legal e
convencional. Independe se o agente tem a intenção de ter o valor recolhido para si, ou seja, dispensa o
dolo específico do rem sibi habendi. Portanto, o dolo exigido é o genérico.
A alternativa B está incorreta. O bem jurídico tutelado é o patrimônio de todos os cidadãos que integram o
sistema previdenciário.
A alternativa C está incorreta. Na realidade, admite-se caracterizada a inexigibilidade de conduta diversa
com a demonstração de que o repasse das contribuições previdenciárias traria dificuldades para a empresa.
Vejamos o entendimento do STJ:
AGRAVO REGIMENTAL. CRÉDITO TRIBUTÁRIO CONSTITUÍDO. VIABILIDADE DA PERSECUÇÃO PENAL.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS DA EMPRESA. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. A existência de crédito tributário constituído, que é inclusive objeto de execução fiscal, viabiliza a
persecução penal, conforme entendimento desta Corte.
2. Para que fique caracterizada a causa supralegal de exclusão da culpabilidade relativa à
inexigibilidade de conduta diversa, é necessário que a defesa comprove, por força do disposto no
art. 156 do Código de Processo Penal, que a omissão no recolhimento das contribuições devidas ao
INSS decorreu de dificuldades financeiras da empresa, o que, no caso, não ocorreu.
(...)
(AgRg no REsp 1264697/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
17/12/2015, DJe 02/02/2016)
A alternativa D está incorreta. A ação nuclear é “deixar de repassar”, ou seja, trata-se de crime omissivo,
pois se configura quando o indivíduo não repassa as contribuições.
A alternativa E está incorreta. O crime é formal, ou seja, não se exige resultado naturalístico para a sua
consumação.
d) não tem qualquer repercussão na esfera penal por ter o delito em questão natureza previdenciária
e expressa previsão legal neste sentido.
e) somente pode ser considerado como arrependimento posterior.
Comentários
Não se extingue a punibilidade do crime de estelionato previdenciário pela devolução à Previdência Social,
antes do recebimento da denúncia, da vantagem percebida ilicitamente. É este o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ART. 171, § 3º, DO CP.
PRESCRIÇÃO ANTECIPADA. SÚMULA N. 438 DO STJ. DEVOLUÇÃO DA VANTAGEM INDEVIDA ANTES DO
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. APLICAÇÃO DO ART. 16 DO CP. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em
pena hipotética (Súmula n. 438 do STJ).
2. Umz vez tipificada a conduta da agente como estelionato, na sua forma qualificada, a circunstância
de ter ocorrido devolução à previdência social, antes do recebimento da denúncia, da vantagem
percebida ilicitamente, não ilide a validade da persecução penal, podendo a iniciativa, eventuamente,
caracterizar arrependimento posterior, previsto no art. 16 do CP.
(...)
(REsp 1380672/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/03/2015, DJe
06/04/2015)
Correta a alternativa E, portanto.
b) pratica o crime de apropriação indébita o agente que, mediante alienação não consentida pelo
credor, defrauda a garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado.
c) pratica o crime de furto de coisa comum o sócio que, para si ou para outrem, subtrai a coisa comum,
a quem legitimamente a detém, ainda que se trate de coisa fungível e cujo valor não excede a quota
a que tem direito.
d) a prática do crime em razão de emprego constitui causa de aumento da pena na apropriação
indébita e no estelionato.
e) o delito de duplicata simulada apenas se configura quando o agente emite título que não
corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade.
Comentários:
A alternativa A está correta. A ação penal é privada exclusiva.
A alternativa B está incorreta. A assertiva indica a conduta típica do crime de defraudação de penhor,
tipificado no artigo 171, § 2º, inciso III do Código Penal:
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Defraudação de penhor
III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia
pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;
A alternativa C está incorreta. pratica o crime de furto de coisa comum o sócio que, para si ou para outrem,
subtrai a coisa comum, a quem legitimamente a detém, ainda que se trate de coisa fungível e cujo valor não
excede a quota a que tem direito.
A alternativa D está incorreta. A tal respeito o parágrafo segundo do artigo 156 prevê não ser punível a
subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente. Isto porque
não haveria nenhum prejuízo ao condômino, ao coerdeiro ou ao sócio.
A alternativa E está incorreta. A conduta incriminada é “emitir”, ou seja, colocar em circulação ou lançar
fatura, duplicata ou nota de venda de forma simulada. Isto é, o documento deve não corresponder à
quantidade ou qualidade da mercadoria vendida ou ao serviço prestado.
Comentários:
O estelionato consiste na conduta de “obter” (vir a ter, conseguir, receber), para si ou para outrem,
vantagem ilícita, em prejuízo alheio. A prática da conduta se dá por meio de fraude, ou, como diz a lei, por
meio de indução ou manutenção de alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio
fraudulento. De acordo com o teor do enunciado da Súmula nº 17 do Superior Tribunal de Justiça, o
estelionato absorve a falsidade este quando se exaure na prática delitiva do crime de estelionato:
Súmula 17
Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, e por este absorvido.
Logo, a alternativa B está correta.
Art. 170 - Nos crimes previstos neste Capítulo, aplica-se o disposto no art. 155, § 2º.
A alternativa E está incorreta. A receptação privilegiada encontra previsão no § 5º do art. 180 do Código
Penal:
Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que
sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as
circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155.
a) No crime de furto de uso, se a coisa infungível é subtraída para fim de uso momentâneo, e, a seguir,
vem a ser imediatamente restituída ou reposta no lugar onde se achava, responderá o agente por
pena de detenção de até seis meses e pagamento de trinta dias-multa.
b) Se o agente consuma o homicídio, mas não obtém êxito na subtração de bens da vítima por
circunstâncias alheias à sua vontade, responderá por crime de homicídio qualificado consumado.
c) O delito de dano, previsto pelo art. 163 do Código Penal, prevê as modalidades dolosa e culposa.
d) O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.
e) De acordo com o art. 168, § 1º, do Código Penal, são causas exclusivas de aumento da pena ao
delito de apropriação indébita quem receber a coisa em depósito necessário ou em razão de ofício,
emprego ou profissão.
Comentários
A alternativa A está incorreta. Como foi visto na última aula, O elemento subjetivo do furto é o dolo. É
necessário o desejo de apropriação definitiva, devido ao tipo penal exigir que a vontade livre e consciente
de subtração seja para si ou para outrem. Em razão da exigência de referido elemento subjetivo especial do
tipo, não é punível o chamado furto de uso
A alternativa B está incorreta. Quanto à consumação do latrocínio, prevalece o entendimento que, sendo a
morte tentada, o latrocínio será tentado, haja ou não a efetiva subtração. Se a morte se consumar, o
latrocínio será consumado, sendo também indiferente a subtração da coisa.
A alternativa C está incorreta. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e
consciente de destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Não há previsão de punição da modalidade
culposa.
A alternativa D está correta. O intuito da conduta criminosa deve ser o de obter para si ou para outrem
indevida vantagem econômica, sendo que a efetiva obtenção da vantagem não é necessária para a
configuração do delito em sua forma consumada. O crime, portanto, é formal.
A alternativa E está incorreta. De acordo com o art. 168, § 1º, do Código Penal, são causas exclusivas de
aumento da pena ao delito de apropriação indébita:
• Quando o agente recebeu a coisa em depósito necessário;
• Quando o agente recebeu a coisa na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante,
testamenteiro ou depositário judicial;
• Quando o agente recebeu a coisa em razão de ofício, emprego ou profissão.
II. No sistema legal brasileiro o latrocínio contempla crime complexo, qualificado pelo resultado,
formado pela soma dos delitos de roubo e homicídio, doloso ou culposo.
III. O perdão judicial previsto no § 5° do artigo 180 do Código Penal constitui benefício incompatível
com a modalidade dolosa do crime de receptação.
IV. O agente que tenta adentrar em estabelecimento ainda que com o intuito de subtrair coisa alheia
móvel, mas, por circunstâncias alheias à sua vontade, não efetiva a empreitada criminosa, comete o
crime de dano, desde que esse seja mais grave do que o furto tentado.
É correto o que se afirma APENAS em
a) I, II e III.
b) I e IV.
c) II e III.
d) I, III e IV.
e) II, III e IV.
Comentários:
O item I está correto. O crime de extorsão se consuma quando o agente constrange alguém, mediante
violência ou grave ameaça, com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a
fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa. O crime, portanto, é formal. Neste sentido, a
Súmula 96 do STJ:
O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.
O item II está correto. O resultado morte que qualifica o roubo pode ser na forma dolosa ou na culposa. A
violência deve ser dolosa, e se dessa violência produz um resultado mesmo que culposo, caracterizado está
o latrocínio.
O item III está correto. No caso do parágrafo terceiro, se o agente for primário, o juiz pode deixar de aplicar
a pena. Trata-se de extinção da punibilidade por perdão judicial, prevista no parágrafo quinto do artigo 180
do Código Penal. Apenas há a previsão de receptação culposa no parágrafo terceiro. Vejamos:
§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou
pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.
O item IV está incorreto. O fato narrado na alternativa configura-se furto qualificado tentado.
Portanto, a alternativa A é o gabarito.
b) o pagamento do cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, obsta
o prosseguimento da ação penal.
c) configura-se o crime de estelionato na modalidade de emissão de cheque sem fundos ainda que
não demonstrada fraude.
d) a utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado não configura, nem mesmo em tese, o crime
de estelionato.
e) quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido.
Comentários
A alternativa A está incorreta. O enunciado da Súmula nº 24 do STJ dispõe:
Aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da previdência
social, a qualificadora do § 3º, do art. 171 do Código Penal.
A alternativa B está incorreta. O enunciado da Súmula nº 554 do STF dispõe:
O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta
ao prosseguimento da ação penal.
A alternativa C está incorreta. A Súmula nº 246 do STF determina:
Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos.
A alternativa D está incorreta. A Súmula nº 73 do STJ determina que, nestes casos, se configura o crime de
estelionato:
A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da
competência da justiça estadual.
A alternativa E está correta. É o teor da Súmula nº 17 do Superior Tribunal de Justiça:
Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, e por este absorvido.
O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao
prosseguimento da ação penal.
A alternativa B: errada. No caso de dívida preexistente, o crime não se configura, nos termos do seguinte
julgado do Superior Tribunal de Justiça:
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. FRAUDE NO PAGAMENTO POR MEIO DE
CHEQUE. INSUFICIÊNCIA DE FUNDOS. DÍVIDA PREEXISTENTE. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE.
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. 1. Não configura crime de estelionato a emissão de cheque sem
suficiente provisão de fundos, ou a frustração do respectivo pagamento, se a cártula consubstancia
pagamento de dívida preexistente. 2. Inocorrente, em casos tais, a lesão fraudulenta ao patrimônio da
vítima decorrente da emissão do título de crédito. 3. Recurso a que se dá provimento.” (STJ, RHC
19314/CE, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 09/05/2012).
A alternativa C: correta. Com efeito, não é necessário que haja a efetiva obtenção da indenização ou valor
do segundo para a consumação do delito, a qual, se ocorrer, consistirá em mero exaurimento do crime. O
crime, portanto, é formal.
A alternativa D: errada. Não há exclusão das entidades autárquicas da Previdência Social da norma
mencionada.
JJ se apropriou de coisa alheia móvel que tinha posse ou detenção porque era responsável pelo caixa em
seu emprego, por isso cometeu o delito de apropriação indébita com majoração da pena por tê-lo cometido
em razão de ofício, emprego ou profissão (art. 168, III do CP).
A impropriedade técnica da questão está em considerar aumento de pena sinônimo de qualificadora.
Como sabemos, a qualificadora altera os limites mínimo e máximo da pena aplicável ao crime, enquanto na
majorante (analisada na terceira fase da dosimetria da pena) é possível passar o limite da pena máxima
cominada ao delito (acréscimo em frações).
De todo modo, a troca do termos é frequente, sendo considerada correta a alternativa que indicou a
apropriação indébita com a majorante do emprego.
Gabarito, alternativa D.
causa de aumento de pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do CP. (...)” (STJ, HC 416745/PR,
Rel. Min. Félix Fischer, Quinta Turma, Dje 01/02/2018).
O item IV está correto. A Suprema Corte também aprovou a Súmula 554, de antes da Reforma da Parte Geral
(quando ainda não havia o instituto do arrependimento posterior). Ainda assim, tem aplicado seu
entendimento até hoje:
O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta
ao prosseguimento da ação penal.
A contrario sensu, o enunciado demonstra que, se o agente pagar o cheque emitido sem provisão de fundos
até o recebimento da denúncia, não há justa causa para a ação penal. Cuida-se de uma causa de extinção
da punibilidade de construção pretoriana, ou seja, advinda da jurisprudência.
Desta forma, a alternativa C está correta.
Comentários:
A alternativa A está incorreta. Exige-se a anterior posse ou detenção lícita da coisa, em nome alheio, ou
seja, o agente deve ter, anteriormente à conduta típica, a posse justa ou a detenção lícita da coisa, sem que
tenha a disponibilidade jurídica da coisa.
A alternativa B está correta. O estelionato consiste em crime material, pois exige resultado naturalístico
para a sua consumação. Exige-se o duplo resultado, consistente na vantagem ilícita e no prejuízo alheio.
A alternativa C está incorreta. A alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria ocorre quando o sujeito
ativo vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou
litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre
qualquer dessas circunstâncias. Assim, ao se silenciar, o sujeito ativo utiliza-se de fraude, provocando ou
mantendo a falsa percepção da realidade pela vítima.
A alternativa D está incorreta. A questão erra ao afirmar que há esbulho possessório quando o ingresso é
realizado em concurso com duas pessoas, pois, são necessárias mais de duas pessoas conforme o art. 161,
inciso II, do Código Penal.
A alternativa E está incorreta. O objeto material desse crime é a coisa perdida, assim entendida aquela que
se extraviou de seu proprietário ou possuidor em local público ou aberto ao público, pois apenas nesses
casos o objeto encontra-se fora da esfera de vigilância do dono.
• em depósito necessário;
• na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário
judicial;
• em razão de ofício, emprego ou profissão.
Q23. FUNDATEC/PC-RS/Delegado/2018
Em relação aos crimes contra o patrimônio, assinale a alternativa correta, de acordo com
entendimento majoritário na doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores.
a) Tadeuzinho, menor, subtraiu uma bicicleta de alto valor comercial. Após pinta-la, vendeu-a para
Espertinhus, contando a respeito da origem ilícita do objeto. Nessa hipótese, não está configurada a
receptação, porque o tipo penal exige que a coisa adquirida seja produto de crime anterior e não de
ato infracional, como é o caso.
b) Astolfo, proprietário de um açougue clandestino, adquiriu, para vender em seu estabelecimento
comercial, diversos bois abatidos, que deveria saber serem produto de subtração. Carneiro Ticiani,
agropecuarista, nesta condição, adquiriu uma carga de gado nelore, que deveria saber ser produto de
furto. Este responderá pelo crime de receptação de animal semovente de produção, com pena de
reclusão de 02 a 05 anos e multa. Aquele responderá pelo crime de receptação qualificada, com pena
de reclusão de 03 a 08 anos e multa.
c) Ligeirinhus subtraiu a bolsa de Maria Sussa, enquanto ela dormia, em um ônibus interurbano. Assim
agindo, praticou o crime de roubo mediante violência imprópria, porque se aproveitou de situação na
qual a vítima não possuía qualquer capacidade de resistência.
d) Folgadus, imputável, subtraiu o talão de cheques de seu pai, 59 anos, preencheu uma cártula,
assinou-a e efetuou vultosas compras em estabelecimento comercial. Folgadus não responde, em
tese, por nenhum crime, em função da regra de imunidade absoluta, prevista no artigo 181 do Código
Penal.
e) Santina, 60 anos, conheceu Larapius pela internet, passando a manter com ele relacionamento
amoroso. Alegando dificuldades financeiras, Larapius pediu que Santina depositasse para ele elevada
quantia em dinheiro, para que pudesse ir até ela. Após o depósito, o perfil da rede social foi desativado
e Santina descobriu que tinha sido vítima de um scam A conduta de Larapius se amolda ao crime de
estelionato majorado, por ter sido praticado contra idosa.
Comentários.
A alternativa A está incorreta, pois grande parte da doutrina entende que a receptação não exige ação
punível, o que abrangeria o ato infracional. A matéria é divergente, sendo que a maioria da doutrina entende
que o artigo 171, § 4º, permite a configuração se o ilícito anterior for ato infracional (§ 4º – A receptação é
punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa).
A alternativa B também está incorreta, pois ambos os casos envolvem a receptação de animal, prevista no
artigo 180-A do CP, norma especial que prevalece em relação à receptação do artigo 180. Assim, para ambos
a pena será de 2 a 5 anos de reclusão e multa.
A alternativa C está incorreta uma vez que descreve a prática de um crime de furto. O roubo impróprio
ocorre quando o agente subtrai a coisa alheia móvel, depois de ele ter, por qualquer meio, reduzido a vítima
à impossibilidade de resistência.
A alternativa D seria incorreta. Entretanto, entendo que está correta. Incide no caso a chamada escusa
absolutória, causa pessoal de isenção de pena, prevista no artigo 181, I, do CP. Já foi cobrada questão
semelhante no concurso de Juiz Substituto do TJPA (2009, FGV, questão 31, sendo considerada correta a
alternativa E):
Há meses José Pereira vinha insistindo com seu pai para que lhe comprasse roupas novas de grifes da
moda. Seu pai, Manoel Pereira, negava todos esses pedidos sob o argumento de que as roupas
pretendidas por José eram muito mais caras do que outras equivalentes. Manoel dizia que, se José
desejasse roupas caras, criasse vergonha na cara e conseguisse um emprego, pois já tinha quase trinta
anos de idade e ainda dependia economicamente de seus pais. Indignado com a insensibilidade de
seu pai, José arranca uma folha do talão de cheques de seu pai, falsifica a assinatura deste e saca todo
o dinheiro que havia na conta – o salário do mês inteiro –, utilizando-o para adquirir as roupas
desejadas. Assinale a alternativa que indique a pena a que, por esse ato, José está sujeito.
a) Detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, pois praticou o crime de exercício arbitrário das
próprias razões.
b) Reclusão, de um a cinco anos, e multa, pois praticou o crime de falsificação de documento
particular.
c) Reclusão de um a três anos, e multa, pois praticou o crime de falsidade ideológica em documento
particular.
d) Reclusão, de um a cinco anos, e multa, pois praticou o crime de estelionato.
e) Não está sujeito a pena alguma.
A alternativa E estaria correta, pois se pode considerar que o sujeito usou o perfil como meio de enganar a
idosa. Entretanto, há casos em que a jurisprudência vem entendendo que a disposição de bens pela pessoa
durante o relacionamento amoroso, com a notícia dos fatos após o término da relação, não demonstra a
ocorrência de estelionato. Vejamos um caso julgado pelo TJRS:
“ESTELIONATO. AUSÊNCIA DE INDUZIMENTO EM ERRO. DELITO NÃO CARACTERIZADO. ABSOLVIÇÃO.
A característica primordial do estelionato é o engodo usado, para induzir ou manter a vítima, ou o
recebedor, em erro, obtendo-se, assim, a vantagem patrimonial. Sem este induzimento ou
manutenção não há o crime. Foi o que ocorreu no caso em tela. Como retrata a prova, não houve
qualquer ação de induzimento ou manutenção da pessoa que recebeu os cheques. Nem mesmo
vantagem patrimonial. O que aconteceu, e a prova bem afirma isto, foi que o apelante e a pretensa
vítima tinham um relacionamento amoroso. Durante este tempo, o recorrente dava-lhe cheques, para
pagar as suas despesas. Terminado o relacionamento, o acusado tentou reavê-los, não conseguindo.
E, desta forma, sustou seus pagamentos. Ora, se alguém tentou ser esperto, eu penso que foi a
pretensa ofendida, pois, como ela mesmo declarou, “tentou compensar os cheques depois do término
do namoro¿. Ou seja, sem qualquer motivo para tê-los em tese (o relacionamento amoroso que o
precedia terminara), quis aproveitar a oportunidade de, estando com os cheques em mãos, depositá-
los em seu favor. DECISÃO: Apelação defensiva provida. Unânime. (Apelação Crime Nº 70031917040,
Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em
29/10/2009)”.
Quanto a essa questão, entendo ser cabível recurso, em relação às divergências quanto à alternativa A
(apesar de pedir entendimento majoritário, a divergência parece ser considerável) e quanto à alternativa E
(apesar de o enunciado trazer elementos do estelionato amoroso, não considerado crime pela
jurisprudência, poderia ser o caso de verdadeiro crime, caso se considere que não havia relacionamento
amoroso algum).
Comentários:
Como Maria não informou ao INSS o óbito de sua genitora e continuou a utilizar o cartão de benefício de
titularidade da falecida, ela praticou estelionato de natureza previdenciária, em continuidade delitiva,
conforme o entendimento do STJ (AgRg no REsp 1745532/BA, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO,
SEXTA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe 09/11/2018). Portanto, assertiva está errada.
Comentários:
João, em razão do crime ter sido cometido contra o seu próprio pai, estará isento de pena, conforme prevê
o art. 181, inciso II do Código Penal. Vejamos:
Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.
Não há incidência da escusa absolutória em relação ao estranho que participa do crime (por exemplo, quem
auxilia o cônjuge a furtar o outro, não sendo seu familiar). Desta forma, a escusa absolutória não se estende
à Maria.
Logo, a alternativa D está correta.
cheque emitido sem provisão de fundos, antes do recebimento da denúncia obsta o prosseguimento da
ação penal.
Comentários:
Alternativa A está incorreta porque é isento de pena o agente que comete apropriação indébita contra seu
ascendente, por inteligência do art. 181, II, do Código Penal:
Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
(...)
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.
Logo, Mévio não receberá punição.
b) Tício, comerciante, tendo adquirido carne a preço muito inferior ao valor de mercado, pratica o crime de
receptação qualificada, na modalidade culposa.
A conduta de Tício, acaso criminosa, se amolda ao artigo 180, § 3º, do CP:
§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço,
ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.
Não se trata da forma qualificada, prevista no § 2º, mas sim da modalidade culposa. Sendo assim, é incorreta
a alternativa B.
c) Caio, visando processar Tícia, pelo crime de furto de coisa comum, deverá fazê-lo mediante queixa. Está
incorreta a alternativa C, porque o delito de furto de coisa comum somente se procederá mediante
representação, nos termos do artigo 156, § 1º, do CP:
§ 1º - Somente se procede mediante representação.
Por isso, é incorreto afirmar que é exigida queixa para seu processamento.
d) Mévia, tendo exigido de Semprônia, como garantia de dívida, que falsificasse a assinatura do fiador no
contrato de mútuo, pratica o crime de extorsão direta.
A conduta se amolda ao crime de extorsão indireta, previsto no artigo 160 do CP:
Extorsão indireta
Art. 160 - Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento
que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Logo, é incorreta a alternativa D.
e) Cipião, tendo quebrado a janela da Prefeitura de Buritizal, intencionalmente, pratica o crime de dano
qualificado.
Está correta a alternativa E.
O crime de dano, neste caso, será qualificado porque fora praticado contra o patrimônio do Município. É o
que prevê o art. 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal:
Dano qualificado
Parágrafo único - Se o crime é cometido:
(...)
III - contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia,
fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de
serviços públicos.
LISTA DE QUESTÕES
c) O delito de dano, previsto pelo art. 163 do Código Penal, prevê as modalidades dolosa e culposa.
d) O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.
e) De acordo com o art. 168, § 1º, do Código Penal, são causas exclusivas de aumento da pena ao
delito de apropriação indébita quem receber a coisa em depósito necessário ou em razão de ofício,
emprego ou profissão.
JJ, frentista de um posto de gasolina e responsável pelo recebimento de valores que recebia dos
clientes, pretendendo ter uma noite especial com sua namorada em um motel de luxo, resolve pegar
do caixa pelo qual é o responsável há mais de 5 (cinco) anos, a quantia de R$ 1.200,00 em dinheiro.
Para encobrir seu ato, emite e firma três notas fiscais falsas para pagamentos posteriores, em nome
de clientes.
Nessa situação hipotética, conforme legislação aplicável ao caso, o frentista pratica crime de
a) estelionato.
b) furto qualificado mediante fraude.
c) furto qualificado pelo abuso de confiança.
d) apropriação indébita qualificada em razão do emprego.
c) III e IV.
d) I, II e IV.
e) II, III e IV.
c) Lesão corporal.
d) Roubo
e) Dano qualificado e lesão corporal.
Q23. FUNDATEC/PC-RS/Delegado/2018
Em relação aos crimes contra o patrimônio, assinale a alternativa correta, de acordo com
entendimento majoritário na doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores.
a) Tadeuzinho, menor, subtraiu uma bicicleta de alto valor comercial. Após pinta-la, vendeu-a para
Espertinhus, contando a respeito da origem ilícita do objeto. Nessa hipótese, não está configurada a
receptação, porque o tipo penal exige que a coisa adquirida seja produto de crime anterior e não de
ato infracional, como é o caso.
b) Astolfo, proprietário de um açougue clandestino, adquiriu, para vender em seu estabelecimento
comercial, diversos bois abatidos, que deveria saber serem produto de subtração. Carneiro Ticiani,
agropecuarista, nesta condição, adquiriu uma carga de gado nelore, que deveria saber ser produto de
furto. Este responderá pelo crime de receptação de animal semovente de produção, com pena de
reclusão de 02 a 05 anos e multa. Aquele responderá pelo crime de receptação qualificada, com pena
de reclusão de 03 a 08 anos e multa.
c) Ligeirinhus subtraiu a bolsa de Maria Sussa, enquanto ela dormia, em um ônibus interurbano. Assim
agindo, praticou o crime de roubo mediante violência imprópria, porque se aproveitou de situação na
qual a vítima não possuía qualquer capacidade de resistência.
d) Folgadus, imputável, subtraiu o talão de cheques de seu pai, 59 anos, preencheu uma cártula,
assinou-a e efetuou vultosas compras em estabelecimento comercial. Folgadus não responde, em
tese, por nenhum crime, em função da regra de imunidade absoluta, prevista no artigo 181 do Código
Penal.
e) Santina, 60 anos, conheceu Larapius pela internet, passando a manter com ele relacionamento
amoroso. Alegando dificuldades financeiras, Larapius pediu que Santina depositasse para ele elevada
quantia em dinheiro, para que pudesse ir até ela. Após o depósito, o perfil da rede social foi desativado
e Santina descobriu que tinha sido vítima de um scam A conduta de Larapius se amolda ao crime de
estelionato majorado, por ter sido praticado contra idosa.
Caio entrega a Tício, seu amigo e funcionário do Detran, uma quantia em dinheiro para que este último
pague uma multa naquele órgão público. Tício, no entanto, apropria-se do dinheiro. Nesse caso, Tício
deverá ser responsabilizado pelo crime de:
a) apropriação indébita
b) peculato furto
c) peculato apropriação
d) peculato mediante o erro de outrem
a) Helen cometeu apropriação indébita culposa e Sérgio praticou apropriação indébita de coisa
havida por erro:
b) Sérgio praticou estelionato e Helen cometeu apropriação indébita culposa
c) Sérgio praticou furto qualificado pela fraude e Helen não cometeu crime (fato atípico);
d) Helen não cometeu crime (fato atípico) e Sérgio cometeu apropriação indébita de coisa
havida por erro;
e) Sérgio cometeu estelionato e Helen não cometeu crime (fato atípico).
GABARITO
Q1. A Q14. C Q27. B
Q2. A Q15. D Q28. ERRADA
Q3. E Q16. B Q29. A
Q4. C Q17. C Q30. B
Q5. A Q18. C Q31. CERTA
Q6. B Q19. B Q32. E
Q7. B Q20. E Q33. E
Q8. A Q21. B
Q9. D Q22. C
Q10. A Q23. E
Q11. E Q24. E
Q12. B Q25. ERRADA
Q13. D Q26. D
QUESTÃO DISSERTATIVA
Q1. MPE-MG/MPE-MG/Promotor de Justiça/2009
O que significa torpeza bilateral no crime de estelionato, e qual a sua repercussão prática?
Comentários:
A torpeza bilateral ocorre quando a vítima também age de má-fé no caso concreto, ou seja, se vale da
situação para tentar obter lucro ilícito. O entendimento majoritário é que a má-fé da vítima não afasta
o crime de estelionato. O Superior Tribunal de Justiça possui antigo precedente no sentido de que a
torpeza bilateral não impede a configuração da conduta ilícita da vítima:
ESTELIONATO. NÃO IMPEDE A SUA CONFIGURAÇÃO A CONDUTA ILICITA OU IMORAL DA VÍTIMA
(TORPEZA BILATERAL). EMISSAO DE CHEQUE, SEM FUNDOS, EM PAGAMENTO DE DIVIDA DE
JOGO PODE CONSTITUIR CRIME DE ESTELIONATO. O ARTIGO 1477 DO CÓDIGO CIVIL, EMBORA
DISPONHA QUE AS DIVIDAS DE JOGO NÃO OBRIGAM A PAGAMENTO, TODAVIA ACRESCENTA:
"MAS NÃO SE PODERA RECOBRAR A QUANTIA QUE VOLUNTARIAMENTE SE PAGOU". ASSIM,
EMBORA O CHEQUE SEJA DADO PROSOLVENDO E NÃO PRO SOLUTO, FORÇA, FORÇA E
RECONHECER QUE, SE O RÉU TIVESSE PROVISAO DE FUNDOS, O CHEQUE TERIA SIDO RECEBIDO
E O RÉU NÃO TERIA AÇÃO PARA RECOBRAR A RESPECTIVA IMPORTANCIA. LOGO, NÃO HÁ NEGAR
QUE, NA ESPÉCIE, A EMISSAO DO CHEQUE SEM FUNDOS IMPORTOU PARA A VÍTIMA UM DANO
PATRIMONIAL.
(RHC 33015, Relator(a): Min. LUIZ GALLOTTI, Tribunal Pleno, julgado em 28/04/1954, DJ 08-07-
1954 PP-07988 EMENT VOL-00176-01 PP-00313 ADJ 04-07-1955 PP-02219)
Ademais, a doutrina majoritária entende que a má-fé da vítima não impede a configuração do delito.
Desta forma, como implicação prática, o agente poderá ser responsabilizado criminalmente pelo
crime de estelionato, ainda que a vítima tenha agido de má-fé.
Art. 167 do Código Penal dispõe sobre a ação penal no caso de crime de introdução ou abandono
de animais em propriedade alheia
Ação penal
Art. 167 - Nos casos do art. 163, do inciso IV do seu parágrafo e do art. 164, somente se procede
mediante queixa.
Art. 165 do Código Penal: crime de dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico
Art. 165 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em
virtude de valor artístico, arqueológico ou histórico:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Art. 2º do parágrafo primeiro da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro: revogação tácita
Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou
revogue.
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela
incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
Art. 62 da Lei 9.605/98: o artigo passou a regular a matéria inteiramente com a revogação tácita
do art. 165 do Código Penal
Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:
I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;
II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por
lei, ato administrativo ou decisão judicial:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem
prejuízo da multa.
Art. 26 da Lei 9.605/98: a ação penal é pública incondicionada
Art. 26. Nas infrações penais previstas nesta Lei, a ação penal é pública incondicionada.
Art. 166 do Código Penal: crime de alteração de local especialmente protegido
Art. 166 - Alterar, sem licença da autoridade competente, o aspecto de local especialmente
protegido por lei:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Art. 63 da Lei 9.605/98: caso de revogação tácita. A matéria tratada o art. 166 do Código Penal
passou a ser inteiramente regulada pelo artigo 63
Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei,
ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico,
artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem
autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
a intervenção mínima do Poder Público." (HC nº 84.412-0/SP, STF, Ministro CELSO DE MELLO,
DJU 19.11.2004)
3. Malgrado o valor irrisório do bem e a primariedade da paciente, inviabiliza-se o
reconhecimento do crime bagatelar, porquanto o crime de apropriação indébita é majorada por
ter sido cometida em razão do ofício, emprego ou profissão, circunstância concreta
desabonadora, nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior, suficiente para impedir a
aplicação do referido brocardo, pois fomenta exponencialmente a prática de outros crimes.
4. Habeas corpus não conhecido.
(HC 351.173/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2016, DJe
20/09/2016)
Art. 168-A do Código Penal: delito de apropriação indébita previdenciária
Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes,
no prazo e forma legal ou convencional:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de:
I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que
tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do
público;
II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis
ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social.
HC 122766 AgRg/STF: o Supremo Tribunal Federal fixou o entendimento sobre ser prescindível, ou
seja, desnecessário o elemento subjetivo especial do tipo
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DA
DECISÃO AGRAVADA. PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE E INEXIGIBILIDADE DE
CONDUTA DIVERSA. PRESCRIÇÃO: IMPROCEDÊNCIA MANIFESTA. PRECEDENTES. DECISÃO
AGRAVADA MANTIDA. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Os Agravantes têm o dever
de impugnar, de forma específica, todos os fundamentos da decisão agravada, sob pena de não
provimento do agravo regimental. 2. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no
sentido de que para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária não é
necessário um fim específico, ou seja, o animus rem sibi habendi, bastando para nesta incidir a
vontade livre e consciente de não recolher as importâncias descontadas dos salários dos
empregados da empresa pela qual responde o agente. 3. As pretensões de exclusão da
culpabilidade pela inexigibilidade de conduta diversa e de substituição da pena privativa de
liberdade por restritivas de direito são questões controversas e somente podem ser analisadas e
decididas nas instâncias ordinárias, próprias para a verificação das alegações dos Agravantes,
pois demandam exame acurado do acervo probatório, o que não é admitido não via estreita do
habeas corpus. Precedentes. 4. Ao se aplicarem as causas de interrupção previstas no art. 117
do Código Penal, fixadas pelas instâncias antecedentes para o fim de cálculo de eventual
prescrição, não se comprova a extinção da punibilidade dos Agravantes. 5. Agravo Regimental
não provido.
(HC 122766 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 28/10/2014,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-223 DIVULG 12-11-2014 PUBLIC 13-11-2014)
EREsp 1207466/STJ: entendimento de que é desnecessário o dolo específico para se configurar o
delito de apropriação indébita previdenciária.
PENAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CARACTERIZAÇÃO DO DELITO DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA - ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. TIPICIDADE. DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS REM
SIBI HABENDI). COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE.
I - Observa-se que a infração penal tipificada no art. 168-A do Código Penal constitui-se em delito
omissivo próprio. O núcleo do tipo é o verbo deixar, que se perfaz com a simples conduta
negativa do sujeito, caracterizando-se com o não fazer o que a lei determina, sendo
desnecessária, para a configuração do crime, a comprovação do fim específico de apropriar-se
dos valores destinados à Previdência Social consistente no animus rem sibi habendi.
II - Não se deve emprestar maior relevo à nomenclatura utilizada pelo legislador na edição da
Lei nº 9.983/2000, para definir o crime - apropriação indébita previdenciária -, de modo a se
considerar como elemento do tipo o dolo específico, a vontade livre e consciente do sujeito de se
apropriar dos valores relativos às contribuições, a exemplo do que ocorre no crime de
apropriação indébita. Ao contrário deste, que é crime de resultado, a apropriação indébita
previdenciária é crime formal; a intenção específica ou vontade de se beneficiar com a ausência
do recolhimento nada tem a ver com a consumação do fato que ocorre no momento que ele
deixa de recolher as contribuições no prazo legal.
III- A Terceira Seção, no julgamento do EREsp 1296631/RN, Relatora Ministra LAURITA VAZ,
TERCEIRA SEÇÃO, DJe 17/09/2013, pacificou o entendimento da desnecessidade do dolo
específico para se configurar o delito de apropriação indébita previdenciária.
IV - Embargos acolhidos.
(EREsp 1207466/ES, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/10/2014,
DJe 06/11/2014)
Art. 168-A, parágrafo segundo do Código Penal: causa de extinção da punibilidade
§ 2o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o
pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à
previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
Art. 168-A, parágrafo terceiro do Código Penal: hipótese de perdão judicial ou de substituição da
pena privativa de liberdade pela de multa
§ 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for
primário e de bons antecedentes, desde que:
I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento
da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou
II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele
estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o
ajuizamento de suas execuções fiscais.
§ 4o A faculdade prevista no § 3o deste artigo não se aplica aos casos de parcelamento de
contribuições cujo valor, inclusive dos acessórios, seja superior àquele estabelecido,
administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.
Art 9º da Lei 10.684/03: não há limite temporal para a suspensão da punibilidade pelo
parcelamento do débito tributário, nem mesmo para a extinção da punibilidade em caso de
pagamento integral dos débitos tributários.
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e
2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica
relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.
Art. 83 da Lei 9.430/96: também trata do perdão judicial e da substituição da pena privativa de
liberdade por multa
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária
previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a
Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão
final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.
§ 1º Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para
fins penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou
jurídica do parcelamento.
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante
o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos
crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido
formalizado antes do recebimento da denúncia criminal.
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa
jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de
tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
§ 5º O disposto nos §§ 1o a 4o não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento.
§ 6º As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995,
aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não
recebida a denúncia pelo juiz.
Art. 34, caput da Lei 9.249/95: extinção da punibilidade dos crimes tributários
Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de
1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do
tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.
Arts. 67 a 69 da Lei n. 11.941/2009: extinção da punibilidade no caso de pagamento dos débitos
Art. 67. Na hipótese de parcelamento do crédito tributário antes do oferecimento da denúncia,
essa somente poderá ser aceita na superveniência de inadimplemento da obrigação objeto da
denúncia.
Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e
2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido
objeto de concessão de parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que
tratam os arts. 1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
Parágrafo único. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva.
Art. 69. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de
parcelamento.
Parágrafo único. Na hipótese de pagamento efetuado pela pessoa física prevista no § 15 do art.
1o desta Lei, a extinção da punibilidade ocorrerá com o pagamento integral dos valores
correspondentes à ação penal.
EDcl no AgRg no AREsp 320281/STJ: o Superior Tribunal de Justiça tem considerado que a quitação
do débito referente ao crédito tributário extingue a punibilidade, nos termos da Lei 10.684/03.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. REITERAÇÃO DAS RAZÕES DE MÉRITO.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. PAGAMENTO
INTEGRAL DO DÉBITO. ART. 9º, §2º, DA LEI N. 10.684/03. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
1. Os embargos de declaração, no processo penal, são oponíveis com fundamento na existência
de ambiguidade, obscuridade, contradição e/ou omissão no decisum embargado, e, por isso, não
constituem instrumento adequado para demonstração de inconformismos da parte com o
resultado do julgado e/ou para formulação de pretensões de modificações do entendimento
aplicado, salvo quando, excepcionalmente, cabíveis os efeitos infringentes.
2. A mera reiteração ou reprise das razões do mérito dos recursos predecessores revela o
propósito do embargante de reversão do julgado por via oblíqua e enseja a rejeição do recurso.
3. Consoante dispõe o art. 9º, § 2º, da Lei n. 10.684/03, nos crimes contra a ordem tributária e
de apropriação indébita previdenciária, extingue-se a punibilidade do agente que efetua o
pagamento integral do débito em questão.
4. Embargos de declaração rejeitados. De ofício, por intermédio de habeas corpus, foi declarada
extinta a punibilidade do embargante em face do pagamento integral do débito previdenciário
objeto do presente processo.
(EDcl no AgRg no AREsp 320.281/SE, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA
TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016)
RHC 128245/STF: o Supremo Tribunal Federal possui precedente entendendo ser cabível a extinção
da punibilidade no caso de pagamento integral do débito tributário, referente à contribuição
previdenciária, também com base na Lei 10.684/03.
EMENTA Recurso ordinário em habeas corpus. Apropriação indébita previdenciária (art. 168-A,
§ 1º, I, CP). Condenação. Trânsito em julgado. Pagamento do débito tributário. Extinção da
punibilidade do agente. Admissibilidade. Inteligência do art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03.
Precedentes. Ausência de comprovação cabal do pagamento. Recurso parcialmente provido
para, afastado o óbice referente ao momento do pagamento, determinar ao juízo das execuções
criminais que declare extinta a punibilidade do agente, caso venha a ser demonstrada, por
certidão ou ofício do INSS, a quitação do débito. 1. Tratando-se de apropriação indébita
previdenciária (art. 168-A, § 1º, I, CP), o pagamento integral do débito tributário, ainda que após
o trânsito em julgado da condenação, é causa de extinção da punibilidade do agente, nos termos
do art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03. Precedentes. 2. Na espécie, os documentos apresentados
pelo recorrente ao juízo da execução criminal não permitem aferir, com a necessária segurança,
se houve ou não quitação integral do débito. 3. Nesse diapasão, não há como, desde logo, se
conceder o writ para extinguir sua punibilidade. 4. De toda sorte, afastado o óbice referente ao
momento do pagamento, cumprirá ao juízo das execuções criminais declarar extinta a
punibilidade do agente, caso demonstrada a quitação do débito, por certidão ou ofício do INSS.
5. Recurso parcialmente provido.
(RHC 128245, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 23/08/2016,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-225 DIVULG 20-10-2016 PUBLIC 21-10-2016)
AgInt no RHC 61543/STJ: o STJ tem entendido que não basta a adesão ao parcelamento do débito
tributário, mas é imprescindível que haja a consolidação do parcelamento pela Administração:
PROCESSO PENAL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. OFENSA
AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE NÃO EVIDENCIADA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ADESÃO À PROGRAMA DE
PARCELAMENTO DO DÉBITO. SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL. NECESSIDADE DE CONSOLIDAÇÃO.
AGRAVO DESPROVIDO. 1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido
de que não ofende o princípio da colegialidade a decisão proferida pelo relator que nega
seguimento ao writ quando o decisum impugnado está em consonância com súmula ou com
jurisprudência dominante desta Corte ou do Supremo Tribunal Federal.
2. Quanto ao mérito recursal, nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, o
simples requerimento de adesão do contribuinte ao programa de parcelamento não implica
imediata suspensão da pretensão punitiva estatal, pois, conforme a dicção do art. 68 da Lei n.
11.941/2009, tal benefício está adstrito aos débitos quanto aos quais a Fazenda Pública houver
efetivamente concedido o parcelamento e que tenham relação com a ação penal em curso. No
caso, conforme reconhecido no acórdão proferido no julgamento da impetração, os débitos
encontravam-se aguardando consolidação do parcelamento quanto ao quantum debeatur e ao
valor das parcelas, o que revela ser prematura a suspensão da persecução penal. 3. Agravo
desprovido.
(AgInt no RHC 61.543/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em
22/05/2018, DJe 30/05/2018)
Art. 1º da Lei 9.441/97: prevê a extinção de todo e qualquer crédito do INSS, oriundo de
contribuições sociais ou do descumprimento de obrigações acessórias
Art. 1º Fica extinto todo e qualquer crédito do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS oriundo
de contribuições sociais por ele arrecadadas ou decorrente do descumprimento de obrigações
acessórias, cujo valor:
I - total das inscrições em Dívida Ativa, efetuadas até 30 de novembro de 1996, relativamente a
um mesmo devedor, seja igual ou inferior a R$1.000,00 (mil reais);
II - por lançamento feito até 30 de novembro de 1996, decorrente de notificação ou de auto-de-
infração não inscrito em Dívida Ativa, seja igual ou inferior a R$500,00 (quinhentos reais).
Parágrafo único. Os valores previstos neste artigo referem-se ao montante dos créditos
atualizados em 1º de dezembro de 1996, inclusive com todos os acréscimo legais incidentes.
Portaria nº 4.943, de 4 de janeiro de 1999: já alterada, promoveu a atualização do valor mínimo
para a execução fiscal da dívida ativa do INSS, fixando-o em R$ 10.000,00 (dez mil reais)
Art. 4º Autorizar: (Nova redação dada pela Portaria MPS nº 296, de 08/08/2007 - DOU DE
09/08/2007)
I - o não ajuizamento das execuções fiscais de dívida ativa do INSS de valor até R$ 10.000,00 (dez
mil reais), considerada por devedor, exceto quando, em face da mesma pessoa, existirem outras
dívidas que, somadas, superem esse montante; e (Incluído dada pela Portaria MPS nº 296, de
08/08/2007 - DOU DE 09/08/2007)
II - o pedido de arquivamento, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador
Federal, dos autos das execuções fiscais de débitos inscritos como dívida ativa do INSS de valor
consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
AgRg no AREsp 627904/STJ: o Superior Tribunal de Justiça fixou o limite para a aplicação do
princípio da insignificância, para o crime de apropriação indébita previdenciária, em R$ 10.000,00
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DO DÉBITO.
JUROS E MULTAS. EXCLUSÃO. IMPROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte pacificou-se no sentido da possibilidade de aplicação do princípio
da insignificância aos delitos de apropriação indébita previdenciária, nos casos em que o valor
do débito com a Previdência Social não ultrapassar o montante de R$ 10.000,00, descontados
os juros e as multas. Precedentes.
2. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 627.904/CE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em
17/10/2017, DJe 23/10/2017)
(AgRg no AREsp 1172428/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em
12/06/2018, DJe 20/06/2018)
Art. 169, caput do Código Penal: crime de apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou
força da natureza
Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força
da natureza:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Art. 169, parágrafo único, inciso I, do Código Penal: forma equiparada que se denomina apropriação
de tesouro
Parágrafo único - Na mesma pena incorre:
Apropriação de tesouro
I - quem acha tesouro em prédio alheio e se apropria, no todo ou em parte, da quota a que tem
direito o proprietário do prédio;
Arts. 1.264 a 1.266 do Código Civil: achado de tesouro
Art. 1.264. O depósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória, será
dividido por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro casualmente.
Art. 1.265. O tesouro pertencerá por inteiro ao proprietário do prédio, se for achado por ele, ou
em pesquisa que ordenou, ou por terceiro não autorizado.
Art. 1.266. Achando-se em terreno aforado, o tesouro será dividido por igual entre o descobridor
e o enfiteuta, ou será deste por inteiro quando ele mesmo seja o descobridor.
Art. 169, inciso II, parágrafo único do Código Penal: apropriação de coisa achada
Parágrafo único - Na mesma pena incorre:
Apropriação de coisa achada
II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de
restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro no
prazo de quinze dias.
Art. 170 do Código Penal: forma privilegiada para os crimes tratados no Capítulo V dos Crimes
Patrimoniais
Art. 170 - Nos crimes previstos neste Capítulo, aplica-se o disposto no art. 155, § 2º.
Art. 170, § 2º do Código Penal: determina-se a aplicação do disposto no parágrafo segundo do
artigo 155, dispositivo que trata do furto privilegiado
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a
pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena
de multa.
Art. 171 do Código Penal: estelionato
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou
mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena
conforme o disposto no art. 155, § 2º.
Súmula 48 do STJ: competência em caso de estelionato cometido mediante falsificação de cheque
Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de
estelionato cometido mediante falsificação de cheque.
Art. 155, parágrafo segundo do Código Penal: o parágrafo primeiro do artigo 171 determina a
aplicação do disposto no parágrafo segundo do artigo 155 ao crime de estelionato
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a
pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena
de multa.
Art. 171, § 2º, I, do Código Penal: crime de disposição de coisa alheia como própria
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:
Disposição de coisa alheia como própria
I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria;
Art. 171, § 2º, inciso II, do Código Penal: alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria
II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus
ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações,
silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;
Art. 171, § 2º, inciso III do Código Penal: delito de defraudação de penhor
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Defraudação de penhor
III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia
pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;
Art. 171, § 2º, inciso IV: crime de fraude na entrega de coisa
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Fraude na entrega de coisa
IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém;
Art. 171, § 2º, inciso V: delito de fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro
V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou
agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de
seguro;
Art. 171, § 2º, VI, do Código Penal: forma equiparada ao estelionato com a denominação de fraude
no pagamento por meio de cheque
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: (...)
Fraude no pagamento por meio de cheque
VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o
pagamento.
Súmula nº 246 do Supremo Tribunal Federal: há a necessidade de fraude para a configuração do
delito de fraude no pagamento por meio de cheque
Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos.
Súmula nº 554 STF: se o agente pagar o cheque emitido sem provisão de fundos até o recebimento
da denúncia, não há justa causa para a ação penal
O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não
obsta ao prosseguimento da ação penal.
Art. 171 do Código Penal, §§ 3º e 4º do Código Penal: formas majoradas e figuras equiparadas
Formas majoradas
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de
direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.
Estelionato contra idoso
§ 4o Aplica-se a pena em dobro se o crime for cometido contra idoso.
Art. 171 do Código Penal, § 5º do Código Penal: ação penal
§ 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:
I - a Administração Pública, direta ou indireta;
II - criança ou adolescente;
III - pessoa com deficiência mental; ou
IV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz
Súmula 24 do STJ: o STJ considera que a forma majorada do parágrafo terceiro se configura quando
a vítima for o INSS
Aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da previdência
social, a qualificadora do § 3º, do Art. 171 do Código Penal.
Art. 172 do Código Penal: delito de duplicata simulada
Art. 173 do Código Penal: abuso de incapazes
II - o diretor, o gerente ou o fiscal que promove, por qualquer artifício, falsa cotação das ações
ou de outros títulos da sociedade;
III - o diretor ou o gerente que toma empréstimo à sociedade ou usa, em proveito próprio ou de
terceiro, dos bens ou haveres sociais, sem prévia autorização da assembléia geral;
IV - o diretor ou o gerente que compra ou vende, por conta da sociedade, ações por ela emitidas,
salvo quando a lei o permite;
V - o diretor ou o gerente que, como garantia de crédito social, aceita em penhor ou em caução
ações da própria sociedade;
VI - o diretor ou o gerente que, na falta de balanço, em desacordo com este, ou mediante balanço
falso, distribui lucros ou dividendos fictícios;
VII - o diretor, o gerente ou o fiscal que, por interposta pessoa, ou conluiado com acionista,
consegue a aprovação de conta ou parecer;
VIII - o liquidante, nos casos dos ns. I, II, III, IV, V e VII;
IX - o representante da sociedade anônima estrangeira, autorizada a funcionar no País, que
pratica os atos mencionados nos ns. I e II, ou dá falsa informação ao Governo.
§ 2º - Incorre na pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, o acionista que, a fim de
obter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembléia geral.
Art. 178 do Código Penal: delito de emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant
Art. 178 - Emitir conhecimento de depósito ou warrant, em desacordo com disposição legal:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Art. 179 do Código Penal: crime de fraude à execução
Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou
simulando dívidas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.
Art. 180 do Código Penal: crime de receptação
Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa
que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou
oculte:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Qualificada
§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar,
remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio,
no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
RESUMO
Para finalizar o estudo da matéria, passamos ao tradicional resumo de fim de aula, que pode ser usado,
inclusive, para as revisões.
1. Dano
O crime de dano está previsto no artigo 163 do Código Penal. Cuida-se de crime comum, não se
exigindo nenhuma qualidade específica do sujeito ativo. Tutela-se o patrimônio, público ou privado,
tanto no âmbito da propriedade quanto da posse. São núcleos do tipo: “destruir”, “inutilizar” ou
“deteriorar”. O objeto material é coisa alheia, razão pela qual a destruição, inutilização ou
deterioração de coisa própria não configura o crime do artigo 163 do Código Penal. É crime de ação
múltipla. Tratando-se de crime plurissubsistente, é possível a punição do conatus. O elemento
subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente de destruir, inutilizar ou
deteriorar coisa alheia. Não há previsão de punição da modalidade culposa. Existe controvérsia sobre
a exigência de elemento subjetivo especial do tipo, consistente no animus nocendi. Isto é, a vontade
específica de prejudicar, de causar o dano. O STF já decidiu que o preso, ao danificar a cela para a sua
fuga, pratica o crime do artigo 163, na sua forma qualificada. O Superior Tribunal de Justiça, por sua
vez, possui entendimento de que referida conduta praticada pelo preso não configura o crime, dada
a ausência de animus nocendi.
Dano qualificado: o crime de dano possui a modalidade qualificada, em que a pena passa a
ser de detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
Deste modo, configurada violência, como a lesão corporal de natureza grave, haverá concurso
material de penas.
I - com violência à pessoa ou grave ameaça
A violência deve ser cometida contra a pessoa para qualificar o crime, não se configurando
a qualificadora com a violência praticada contra a coisa. A violência não precisa ser
empregada contra o proprietário ou o possuidor, podendo ser contra o detentor, por
exemplo. A grave ameaça também qualifica o delito de dano. Tanto a violência à pessoa
quanto a grave ameaça precisam ser meios para a prática do crime de dano ou utilizados
para possibilitar a prática do dano. Se não, não é o caso de dano qualificado por violência
à pessoa ou grave ameaça. São absorvidos por tal modalidade de dano o crime de ameaça
e a contravenção penal de vias de fato. Quanto às lesões corporais, parte da doutrina
entende que há concurso material dos delitos. Cezar Roberto Bitencourt entende que
deve ser adotado o sistema do cúmulo material, mas isso não significa que o concurso é
material. O concurso pode, segundo o autor, ser material ou formal impróprio, pois ambos
determinam a soma das penas.
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime
mais grave
• Ação Penal
O artigo 167 do Código Penal trata sobre a ação penal no caso de crime de dano. A ação penal será
privada nos casos do art. 163, caput, e do inciso IV do seu parágrafo. Ou seja, somente se procede
mediante queixa no caso de dano simples e de dano qualificado por motivo egoístico ou com prejuízo
considerável para a vítima. Nos demais casos, a ação penal é pública incondicionada.
do efetivo prejuízo para a configuração do delito, a doutrina aponta não ser possível a punição da
forma tentada. Isto porque, ou há prejuízo e o crime ocorreu, ou não há prejuízo e o tipo penal não
restou configurado. O crime é de ação múltipla, ou seja, cuida-se de tipo penal misto alternativo.
• Ação Penal
O artigo 167 do Código Penal dispõe sobre a ação penal no caso de crime de introdução ou abandono
de animais em propriedade alheia. Deste modo, a ação penal será privada.
aos crimes cometidos após o início de sua vigência. O crime é doloso. É comum. Possui forma livre.
Conforme prevê o artigo 26 da Lei 9.605/98, a ação penal é pública incondicionada.
2. Apropriação Indébita
O delito de apropriação indébita está previsto no artigo 168 do Código Penal. Protegem-se a
propriedade e os direitos reais de garantia. Não se exige confiança ou fidúcia entre o sujeito ativo e o
passivo, sendo suficiente que haja posse justa ou mera detenção do agente sobre a coisa. A ação
nuclear é apropriar-se de coisa alheia móvel. Exige-se a anterior posse ou detenção lícita da coisa, em
nome alheio, ou seja, o agente deve ter, anteriormente à conduta típica, a posse justa ou a detenção
lícita da coisa, sem que tenha a disponibilidade jurídica da coisa Deste modo, a consumação do delito
se dá com a inversão do título da posse, isto é, o agente deixa de possuir em nome alheio (alieno
domine) para possuir como dono (causa dominii). Portanto, é um elemento subjetivo, que deve ser
demonstrado por um ato exterior, algo que transcenda o simples elemento anímico, a mera vontade
do agente. A inversão do título ou da natureza da posse pode se consubstanciar na recusa em devolvê-
la, quando o agente demonstra que a tomou para si, ou em algum ato de disponibilidade, em razão
de só o proprietário poder dispor da coisa. Ainda que haja divergências, parece prevalecer o
entendimento segundo o qual é possível a tentativa de apropriação indébita, apesar de ser difícil sua
configuração. A apropriação indébita é crime doloso, exigindo o animus rem sibi habendi. O atraso ou
a demora na devolução da coisa não significam, por si sós, a configuração do delito, sendo
imprescindível que demonstre a intenção do agente de modificar a natureza da posse, passando a
possuir a coisa como dono. A doutrina majoritária classifica o crime em estudo como comum. Há,
entretanto, entendimento minoritário de que a infração penal de apropriação indébita é própria, por
envolver a necessidade de anterior posse justa ou detenção lícita da coisa. É crime material, pois exige
que a coisa passe a ser possuída pelo agente a título de proprietário, o que acarreta o resultado
naturalístico de lesão ao patrimônio da vítima.
Modalidades majoradas
O Código Penal prevê o aumento de um terço na pena do crime de apropriação indébita nos
seguintes casos:
I - em depósito necessário
O Código Civil faz distinção entre o depósito necessário e o voluntário. Além disso,
subdivide o necessário em legal e miserável. O parágrafo único do artigo 649 traz, ainda,
as hipóteses equiparadas ao depósito: O artigo 647 traz as hipóteses de depósito
necessário para o Direito Civil. O inciso I representa o chamado depósito legal, enquanto
o inciso II cuida do depósito miserável, as duas modalidades do depósito necessário em
referido ramo do Direito. Para o Direito Penal, com base nos ensinamentos de Nelson
Hungria, grande parte da doutrina aponta que somente o depósito miserável corresponde
ao exigido pela modalidade qualificada da apropriação indébita tratada no inciso I do
artigo 168 do Código Penal. É a posição de Rogério Greco e do Cezar Bitencourt. Deste
modo, apenas as hipóteses do artigo 647, inciso I, do Código Civil se amoldam ao artigo
168, § 1º, inciso I, do Código Penal. O depósito judicial, conforme veremos, se enquadra
na hipótese do artigo 168, § 1º, inciso II, do Código Penal. O depósito legal do funcionário
público pode configurar peculato. Deste modo, o termo depósito necessário, previsto na
causa de aumento de pena do inciso I, deve ser entendido como aquele decorrente de
efetiva necessidade, não se estendendo às hipóteses de depósito legal. Somente o
depósito miserável, decorrente de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o
naufrágio ou o saque, serve para a configuração da majorante. O desvalor maior reside na
situação de vulnerabilidade da vítima.
II - na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou
depositário judicial
O desvalor maior desta hipótese reside em função exercida pelo sujeito ativo, motivo pelo
qual se espera maior confiabilidade e honradez em seu comportamento. São funções
enumeradas em rol taxativo, isto é, não admitem a inclusão de outras não mencionadas,
sob pena de se aceitar analogia in malam partem, o que já vimos não ser possível. Tutor é
aquele que exerce o encargo de gerir a vida pessoal e patrimonial de outro indivíduo,
menor de idade, na ausência dos pais ou em caso de eles serem destituídos do poder
familiar. Curador é o que exerce o mesmo encargo, mas em caso de incapacidade, seja por
ser o indivíduo que tem a vida gerenciada um ébrio habitual, viciado em tóxico ou alguém
que, por causa transitória ou permanente, não puder exprimir sua vontade. Síndico era a
antiga denominação do administrador judicial, aquele que gerencia e representa a massa
falida em caso de falência. Liquidatário é o que procede à chamada liquidação judicial,
tratada nos termos dos artigos 1.102 a 1.112 do Código Civil. São sinônimos os termos
liquidante e liquidatário. Rogério Greco, entretanto, entende que a figura foi extinta e não
há mais esta função no ordenamento jurídico brasileiro. Inventariante é o responsável
pelo encargo de administrar o espólio até a efetiva partilha dos bens entre os sucessores,
herdeiros e legatários. Testamenteiro é aquele que cumpre as disposições de última
vontade de outrem, ou seja, que procede ao cumprimento do disposto em determinado
testamento. Por fim, depositário judicial é a pessoa que recebe o encargo, perante o Poder
Judiciário, de realizar a guarda de bens e valores. Vale recordar, como dito acima, que o
depósito necessário miserável é tratado pelo inciso I do § 1º do artigo 168. Ademais, se o
depósito judicial for encargo atribuído a um funcionário público, no exercício de suas
funções ou em razão delas, o delito será de peculato.
III - em razão de ofício, emprego ou profissão
Esta modalidade de apropriação indébita majorada também possui maior gravidade pela
função exercida pelo agente, em razão da qual se espera um comportamento mais
adequado e responsável. Ofício é geralmente conceituado pela doutrina como a profissão
em que se utiliza a habilidade manual, como a de carpinteiro ou de artesão. Emprego é a
relação de trabalho em que há habitualidade, pessoalidade, prestado por pessoa física,
com vínculo de subordinação. A profissão é gênero, envolvendo a prestação de serviços
de forma remunerada. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a modalidade
majorada do inciso III do § 1º impede a configuração do crime bagatelar, afastando a
aplicação do princípio da insignificância.
O delito de apropriação indébita previdenciária está previsto no artigo 168-A do Código Penal. A ação
nuclear é “deixar de repassar”, ou seja, trata-se de crime omissivo, pois se configura quando o
indivíduo não repassa. Anteriormente, as contribuições devem ter sido recolhidas dos contribuintes,
o que é um pressuposto para a conduta típica do agente. Cuida-se de crime doloso. O repasse, para a
configuração do delito, deve não ter sido feito na forma e no prazo legal ou convencional. Como os
prazos estão previstos em lei, é necessária uma complementação normativa, o que leva à conclusão
de se tratar de norma penal em branco. Os prazos e a forma estão previstos na Lei 8.212/91. Por se
tratar de crime omissivo próprio, ou seja, delito que já prevê um não fazer como seu tipo penal, não
se admite a tentativa.
Formas equiparadas
O § 1º do artigo 168 prevê formas equiparadas. Seriam hipóteses, se acordo com a doutrina, em
que o contribuinte seria o próprio empresário ou sociedade empresária, as de deixar de:
I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência
social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou
arrecadada do público
Deixar de recolher a contribuição consiste na conduta de, após descontada a contribuição
do pagamento efetuado ou sua arrecadação, não haja o seu efetivo pagamento.
II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas
contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços
Também é conduta equiparada a de deixar de recolher contribuições devidas à
previdência social, as quais tenha integrado as despesas contábeis ou custos referentes à
venda de produtos ou à prestação de serviços. Pressupõe-se que o agente tenha recebido
o valor, por eles integrarem os custos, e depois não os recolha.
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem
sido reembolsados à empresa pela previdência social
Configura-se o delito, em sua forma equiparada, a conduta de deixar de pagar benefício
devido a segurado, após os valores terem sido recebidos pela empresa, em virtude de
reembolso do Regime Geral de Previdência Social.
O parágrafo segundo do artigo 168-A prevê uma causa de extinção da punibilidade. Prevê-se que, caso
o agente espontaneamente declare, confesse e efetue o pagamento das contribuições, importâncias
ou valores, termos em que se incluem juros e correção monetária, além de prestar as informações
devidas à Previdência Social, na forma definida em lei ou regulamento, sua punibilidade deve ser
extinta. O termo final para referido benefício é o início da ação fiscal, e não da ação penal. Deve-se
enfatizar este ponto para que não haja confusão: o prazo máximo para que o agente proceda à
confissão, ao pagamento e ao fornecimento de informações é a propositura da ação fiscal, que, de
regra, constitui-se da execução fiscal.
➢ Perdão judicial ou substituição da pena por multa
O parágrafo terceiro do artigo 168-A do Código Penal prevê hipótese de perdão judicial ou de
substituição da pena privativa de liberdade pela de multa. Exige-se que o agente seja primário e de
bons antecedentes, devendo, ainda, preencher um dos requisitos, de forma alternativa:
• Efetuar o pagamento da contribuição social previdenciária e acessórios (incluídos os juros)
após o início da execução fiscal e antes de oferecida a denúncia; ou
• Que o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele
estabelecido, pela Previdência Social, como mínimo para o ajuizamento das execuções fiscais.
Com a unificação da Receita Federal e a criação da chamada “Super Receita”, a cobrança das
execuções ficais passou para a Receita Federal, sendo que sua cobrança em juízo é atribuição
da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Atualmente, o limite mínimo para o ajuizamento
das execuções fiscais relacionadas à dívida ativa do INSS é de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Entretanto, o parágrafo quarto, incluído recentemente pela Lei n. 13.606/2018, passou a vedar
a aplicação do parágrafo terceiro aos casos de parcelamento de contribuições cujo valor seja
superior ao estabelecido, administrativamente, como mínimo para o ajuizamento das
execuções fiscais. Vale repisar que o patamar mínimo é de R$ 10.000,00.
O artigo 169 do Código Penal trata de diversos delitos, tratado da apropriação de coisa havida por
erro, caso fortuito ou força da natureza em seu caput. Além disso, o parágrafo único prevê formas
equiparadas, cada qual com seu nomen iuris, ou seja, com denominação diversa. Estudaremos cada
um separadamente, a começar com o do caput. O crime de apropriação de coisa havia por erro, caso
fortuito ou força da natureza possui como núcleo do tipo o verbo “apropriar-se”, sendo o objeto
material a coisa alheia, que tenha chegado ao seu poder por erro, caso fortuito ou força maior.
Tutelam-se o patrimônio e a posse legítima. O crime é comum. É material. É de forma livre,
instantâneo e plurissubsistente, admitindo, portanto, a modalidade tentada.
➢ Apropriação de Tesouro
O artigo 169 prevê no seu parágrafo único, inciso I, a forma equiparada que se denomina apropriação
de tesouro. A conduta envolve o “achar” tesouro em prédio alheio e o subsequente “apropriar-se”,
seja no todo ou em parte, da cota a que tem direito o proprietário do prédio em que estava tal tesouro.
Tesouro é um conjunto de coisas valiosas ou preciosas, como moedas de ouro, que podem estar
enterradas ou apenas ocultas. O encontro deve ser causal, situação em que deverá ser dividido
igualmente entre o proprietário do terreno e aquele que o encontrar. O Código Civil trata do tema do
achado de tesouro em seus artigos 1.264 a 1.266. O crime é comum, instantâneo, material, de forma
livre e plurissubsistente.
trata do furto privilegiado. Deste modo, cabem aqui as observações feitas a respeito do furto
privilegiado, mutatis mutandis, isto é, com as devidas alterações em relação aos crimes ora estudados.
Fazemos remissão ao estudo já feito para evitar repetição desnecessária.
3. Estelionato
O estelionato está previsto no caput do artigo 171 do Código Penal. As formas equiparadas, por
possuírem denominações próprias dadas pela própria lei, serão estudadas separadamente. O
estelionato consiste na conduta de “obter” (vir a ter, conseguir, receber), para si ou para outrem,
vantagem ilícita, em prejuízo alheio. A prática da conduta se dá por meio de fraude, ou, como diz a
lei, por meio de indução ou manutenção de alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer
outro meio fraudulento. Artifício é a astúcia ou dissimulação utilizada para que alguém interprete os
fatos de forma errada. Ardil é a sagacidade, o estratagema, a armação ou cilada. Qualquer outro meio
fraudulento representa a cláusula de interpretação extensiva, que deve ser feita com base nos
exemplos de artifício e ardil. O crime é comum. Entretanto, o sujeito passivo deve ter capacidade de
discernimento para que posse der mantida ou induzida a erro, ou seja, ser vítima da fraude perpetrada
pelo agente. A doutrina aponta haver a chamada dupla relação de causa de efeito: de início, o agente
emprega o artifício, o ardil ou outro meio fraudulento para que o sujeito passivo seja induzido a erro
ou mantido em erro; na sequência, em virtude do erro, há a obtenção de vantagem ilícita pelo agente
e o consequente prejuízo para a vítima. Há divergência sobre a necessidade de a vantagem ilícita
obtida pelo agente ser econômica ou não. Alguns, como Heleno Fragoso, argumentam que a
vantagem deve ser econômica, mormente porque se trata de um dos crimes contra o patrimônio. Há
a posição, entretanto, de que o fato de ser um crime contra o patrimônio significa que este é o bem
jurídico tutelado pela norma, não sendo necessário que o benefício auferido pelo agente seja
econômico. É a posição de Cezar Bitencourt. Cuida-se de crime material. Exige-se o duplo resultado,
consistente na vantagem ilícita e no prejuízo alheio. É crime de forma livre. É doloso. É
plurissubsistente, razão pela qual admite a forma tentada. O estelionato pode ser cometido mediante
falsificação de cheque, sendo que a Súmula 48 do STJ dispõe sobre a competência em tal caso é do
juízo do local da obtenção da vantagem ilícita.
Estelionato privilegiado
O parágrafo primeiro do artigo 171 determina a aplicação do disposto no parágrafo segundo do artigo
155, ambos do Código Penal. São aplicáveis, mais uma vez as observações feitas a respeito do furto
privilegiado, com as devidas alterações para as especificidades do crime de estelionato. Faz-se
remissão ao estudo realizado para se evitar repetição desnecessária.
pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio
de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
Já o parágrafo 2º-B, também inserido pela Lei 14.155/ 2021, traz uma causa de aumento de pena de
um a dois terços. A fração deve ser escolhida pelo critério da relevância do resultado gravoso, como
já previsto pela lei. Essa forma majorada incide, sobre a forma qualificada do § 2º-A, se o crime for
praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional. Nesse caso, há maior
gravidade pela dificuldade de repressão a um delito praticado a partir de um servidor, de um
equipamento de informática central, localizado fora do território brasileiro.
➢ Defraudação de Penhor
O delito de defraudação de penhor está tipificado no artigo 171, § 2º, inciso III do Código Penal. O
núcleo do tipo é “defraudar” (fraudar, ludibriar, usurpar, espoliar) da coisa dada em garantia
pignoratícia, da qual o agente tem a posse. O crime é de forma livre, sendo que a defraudação pode
ocorrer por meio de alienação não consentida ou por outro modo. A defraudação de penhor ocorre
com a perda do direito real de garantia pelo credor, podendo ocorrer por meio de alienação, como
visto, da coisa empenhada. Sujeito ativo é o devedor pignoratício, enquanto o sujeito passivo é o
credor pignoratício. É crime doloso, plurissubsistente e material.
fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal. A contrario
sensu, o enunciado demonstra que, se o agente pagar o cheque emitido sem provisão de fundos até
o recebimento da denúncia, não há justa causa para a ação penal. Cuida-se de uma causa de extinção
da punibilidade de construção pretoriana, ou seja, advinda da jurisprudência.
➢ Duplicata Simulada
O delito de duplicata simulada está previsto no artigo 172 do Código Penal. A conduta incriminar é
“emitir”, ou seja, colocar em circulação ou lançar fatura, duplicata ou nota de venda de forma
simulada. Isto é, o documento deve não corresponder à quantidade ou qualidade da mercadoria
vendida ou ao serviço prestado. O parágrafo único prevê a forma equiparada de “falsificar”
(desvirtuar, alterar os dados) ou “adulterar” (modificar, corromper) a escrituração do Livro de Registro
das Duplicatas. O crime é doloso, formal, comissivo e plurissubsistente, ou seja, admite a forma
tentada. Há divergência sobre ser comum ou próprio.
➢ Abuso de incapazes
O crime de abuso de incapazes está tipificado no artigo 173 do Código Penal. O sujeito ativo pode ser
qualquer pessoa. O sujeito passivo deve ser o menor, o alienado ou o débil mental, ou seja, aquele
que possui alguma deficiência ou doença de ordem mental. A conduta nuclear é “abusar” (usar de
maneira inadequada, tirar vantagem de). O abuso pode ser efetuado em proveito próprio ou alheio,
recaindo sobre a necessidade, paixão ou inexperiência da vítima. O crime é formal, doloso e
plurissubsistente, admitindo o conatus.
➢ Induzimento à Especulação
O artigo 174 do Código Penal está previsto no induzimento à especulação. O sujeito ativo é qualquer
pessoa. Sujeito passivo, por sua vez, deve ser alguém menor ou que seja inexperiente, simples ou
ingênuo. A conduta nuclear é “abusar” (usar de maneira inadequada, tirar vantagem de). O abuso
pode ser efetuado em proveito próprio ou alheio, recaindo sobre a inexperiência ou inferioridade
mental da vítima. O sujeito passivo deve, ainda, ser compelido à prática do jogo ou da aposta ou à
especulação com títulos ou mercadorias. Exige-se que o agente saiba ou deva saber que a conduta é
ruinosa. O crime é doloso, formal, de forma livre e plurissubsistente.
➢ Fraude no Comércio
O delito de fraude no comércio está previsto no artigo 175 do Código Penal. O núcleo do tipo é
“enganar” (induzir em erro, mentir, iludir) o adquirente ou consumidor, no exercício de atividade
comercial. O engano pode ocorrer de dois modos, sendo, portanto, crime de forma vinculada:
vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria que seja falsificada ou que esteja deteriorada;
ou entregando uma mercadoria por outra. Alguns doutrinadores entendem que houve revogação em
razão do artigo 7º, IV, da Lei 8.137/90, complementado pelo artigo 18, § 6º, do Código de Defesa do
Consumidor. Entretanto, entende-se que não houve a regulamentação total da matéria, sendo que o
conflito aparente de normas deve ser analisado caso a caso. O crime é doloso e plurissubsistente.
Forma qualificada
O parágrafo primeiro do artigo 175 prevê a forma qualificada do delito, sendo que a sua pena
passa a ser de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. O núcleo do tipo é “alterar”
(modificar, causar alteração, mudar); “substituir” (colocar no lugar de outra coisa, trocar) ou
“vender” (efetuar a alienação mediante pagamento de preço). As condutas são de alterar, em
obra que lhe é encomendada, a qualidade ou o peso de metal ou substituir, no mesmo caso,
pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor. Além disso, incrimina-se o ato de vender
pedra falsa por verdadeira ou de vender, como precioso, metal de outra qualidade.
Forma privilegiada
Aplica-se à fraude no comércio a hipótese de privilégio prevista no artigo 155, § 2º, do Código
Penal. Faz-se remissão sobre o estudo do furto privilegiado, para não se incorrer em repetição
não necessária.
➢ Outras Fraudes
O artigo 176 prevê o tipo penal referente a outras fraudes. O tipo penal tem como núcleos do tipo
“tomar” refeição, “alojar-se” em hotel ou “utilizar-se” de meio de transporte. Refeição inclui bebidas
e hotel abrange também pensões e albergues, segundo a doutrina. Em todos os casos, exige-se que o
agente não disponha de recursos para efetuar o pagamento. Isto porque o tipo penal exige que o
agente não possua o valor necessário para efetuar o pagamento. A ação penal é privada e
há possibilidade de aplicação do perdão judicial. Neste caso, não se preveem os requisitos para a
incidência de referida causa de extinção da punibilidade, sendo que cabe ao juiz analisar caso a caso.
O crime é de dano e material, exigindo o efetivo prejuízo da vítima para a sua configuração. É comum,
doloso e plurissubsistente.
➢ Fraude à Execução
O artigo 179 do Código Penal estipula o crime de fraude à execução. A fraude à execução tem como
núcleo do tipo o verbo “fraudar” (adulterar, ludibriar, alterar), sendo que a fraude deve ocorrer de
uma das seguintes maneiras: alienando bens; desviando bens; destruindo bens ou simulando dívidas.
Cuida-se de crime material, pois se exige a efetiva fraude à execução, por meio da alienação, desvio
ou destruição de bens ou simulação de dívidas. Se ele continuar solvente, sem prejudicar a execução,
não se consuma o delito. O crime é comum, não exigindo nenhuma qualidade específica do sujeito
ativo. É plurissubsistente, admitindo a tentativa. Além disso, é doloso, exigindo a vontade livre e
consciente de fraudar a execução, sendo apontado pela doutrina, ainda, o elemento subjetivo especial
consistente na finalidade de prejudicar os credores. A ação penal é privada exclusiva.
4. Receptação
O crime de receptação está previsto no artigo 180 do Código Penal. Os núcleos do tipo são adquirir,
receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto
de crime. Portanto, o crime de receptação pressupõe um crime anterior, razão pela qual é
denominado de crime acessório. Também se configura o crime com a ação de influir para que terceiro,
de boa-fé, adquira, receba ou oculte coisa que sabe ser produto de crime. A coisa somente pode ser
bem móvel, apesar de a lei não o exigir expressamente.
Forma Qualificada
O parágrafo primeiro prevê a forma qualificada da receptação, cuja pena passa a ser de reclusão,
de 3 a 8 anos, e multa. Cuida-se de tipo penal misto alternativo, cujos núcleos do tipo são
adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar,
remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar coisa que deve saber ser produto
de crime. Exige-se que a conduta seja realizada em proveito próprio ou alheio. Referida
modalidade prevê o dolo eventual como elemento subjetivo (deve saber), sendo que parte da
doutrina entende que aí se deve incluir também o dolo direto. Como especializante, exige-se
que a conduta do agente seja realizada no exercício de atividade comercial ou industrial, sendo
este o elemento que justifica a pena maior. O parágrafo segundo determina que a atividade
comercial, para efeito da forma qualificada da receptação, deve ser entendida como qualquer
forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. Incluem-se no
caso as garagens clandestinas de desmonte.
Forma Culposa
Forma prevista no parágrafo terceiro, configura-se se o agente adquirir ou receber coisa que,
por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a
oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso. O tipo penal é fechado, sendo que se
diferencia da maioria dos crimes culposos, descritos no Código Penal por tipos abertos. O tipo
penal prevê algumas circunstâncias que se traduzem em indícios de que a coisa é produto de
crime.
Perdão judicial
No caso do parágrafo terceiro, se o agente for primário, o juiz pode deixar de aplicar a pena.
Trata-se de extinção da punibilidade por perdão judicial, prevista no parágrafo quinto do artigo
180 do Código Penal.
Forma privilegiada
No caso de receptação doloso, aplica-se as mesmas disposições do artigo 155, § 2º, do Código
Penal, que prevê o chamado furto privilegiado. Para evitar repetições, faz-se remissão ao estudo
realizado quando da análise do furto, com as devidas adaptações para a receptação.
Forma majorada
Se a conduta recair sobre bens do patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de
Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista
ou empresa concessionária de serviços públicos, há a majorante, que determina que a pena do
caput seja aplicada em dobro. A atual redação foi dada pela Lei nº 13.531, de 2017, que veio
corrigir lacuna, como a ausência do Distrito Federal na causa de aumento de pena, o que não se
justificava em virtude da majorante no caso do patrimônio dos demais entes federativos.
➢ Receptação de animal
O crime de receptação de animal, que é especial em relação à receptação do artigo 180 do Código
Penal, localiza-se no artigo 180-A do Código Penal, inserido pela Lei 13.330/2016. Todos os núcleos
do tipo foram estudados na forma comum do crime de receptação. O especializante é o objeto
material, que é semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes. Exige-
se que o agente deva saber ser produto do crime. A pena deste crime é de reclusão, de 2 a 5 anos, e
multa. Semovente é o bem que se locomove por si só, o animal. O tipo menciona semovente
domesticável de produção, que podem ser ovelhas ou bois, por exemplo. O crime é doloso, exigindo-
se a finalidade de produção ou comercialização. É plurissubsistente, possibilitando a tentativa, exceto
na forma de “ocultar”, em que é considerado omissivo.
enquanto a causa de extinção da punibilidade põe fim ao direito de punir em razão de um fator
superveniente. Além disso, em determinadas hipóteses de crimes contra o patrimônio, a ação penal
é condicionada à representação, como prevê o art. 182. No caso de a vítima ser o cônjuge desquitado
ou judicialmente separado ou irmão (não existe mais a diferenciação entre legítimo e ilegítimo)
somente se procede mediante queixa. Além disso, a ação penal também é privada nos casos de crimes
patrimoniais cometidos em prejuízo de tio ou sobrinho, mas neste caso exige-se a coabitação. A
incidência de ambos os artigos acima estudados, o 182 e o 183, é limitada pelo artigo 183 do Código
Penal, que exclui de sua incidência determinados casos. Não há incidência da escusa absolutória nem
se exige representação do ofendido, ainda que preenchidos os requisitos dos artigos 182 e 183, nas
seguintes situações:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este é o fim de mais uma aula nossa. Finalizamos o estudo dos crimes contra o patrimônio, delitos
que, infelizmente, são muito comuns na nossa realidade, ainda triste, do nosso país.
O estudo desses crimes foi dividido em duas aulas, em razão da extensão da matéria. Deve-se ter em
mente, contudo, que os crimes contra o patrimônio abrangem os vistos nessa aula e na aula anterior,
que devem ser estudas em conjunto (as imunidades absolutas, por exemplo, aplicam-se aos crimes
contra o patrimônio em geral, estudados em ambas as aulas).
Quaisquer sugestões são bem-vindas e, apesar de elaborada com muito rigor, toda aula pode ser
aperfeiçoada a partir de contribuições. O contato pode ser feito pelo fórum, por e-mail ou pelo
Instagram.
Até a próxima aula. Forte abraço e meus desejos de sempre de sucesso!
Michael Procopio.
procopioavelar@gmail.com
professor.procopio