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Aula 02

Direito
Processual Penal - 2022 (Pós-Edital)

Autor:
Leonardo Ribas Tavares, Equipe
Materiais Carreiras Jurídicas

20 de Janeiro de 2022

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Sumário
Ação Penal .......................................................................................................................................................... 7

1 - Distinções prévias ...................................................................................................................................... 7

2 - Conceito..................................................................................................................................................... 8

2.1 - Teorias da ação ......................................................................................................................................................... 9

2.2 - Conceito no processo penal ................................................................................................................................... 12

3 - Natureza jurídica das normas sobre ação penal ..................................................................................... 15

4 - Características do direito de ação penal ................................................................................................. 18

Doutrina Complementar................................................................................................................................................. 21

Condições da ação penal.................................................................................................................................. 24

1 - Condições genéricas da ação penal ........................................................................................................ 31

1.1 - Pela teoria geral do processo ................................................................................................................................. 31

1.2 - Justa causa .............................................................................................................................................................. 47

1.3 - Como categorias próprias do processo penal ........................................................................................................ 53

2 - Condições específicas da ação penal ...................................................................................................... 55

Doutrina Complementar................................................................................................................................................. 63

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................... 69

Classificação das ações penais ......................................................................................................................... 70

1 - Classificação das ações penais de acordo com o processo penal ........................................................... 72

Doutrina Complementar................................................................................................................................................. 75

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................... 77

Princípios da ação penal................................................................................................................................... 78

1 - Princípio da obrigatoriedade da ação penal pública .............................................................................. 78

2 - Princípio da oportunidade da ação penal de iniciativa privada ............................................................. 81

3- Princípio da indisponibilidade da ação penal pública .............................................................................. 82

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4 - Princípio da disponibilidade da ação penal de iniciativa privada ........................................................... 83

5 - Princípio da (in)divisibilidade da ação penal pública .............................................................................. 83

6 - Princípio da indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada ........................................................... 85

7 - Princípio da intranscendência ................................................................................................................. 86

8 - Princípio da oficialidade .......................................................................................................................... 87

9 - Princípio da autoritariedade ................................................................................................................... 88

10 - Princípio da oficiosidade ....................................................................................................................... 88

Doutrina Complementar................................................................................................................................................. 89

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................... 94

Ação penal pública incondicionada.................................................................................................................. 97

Doutrina Complementar................................................................................................................................................. 99

Ação penal pública condicionada................................................................................................................... 100

1 - Representação....................................................................................................................................... 101

1.1 - Forma e natureza jurídica ..................................................................................................................................... 101

1.2 - Destinatário da representação ............................................................................................................................. 105

1.3 Titularidade ou legitimidade para o oferecimento................................................................................................. 106

1.4 - Prazo da representação ........................................................................................................................................ 109

1.5 - Retratação da representação ............................................................................................................................... 111

1.6 - Extensão e eficácia ............................................................................................................................................... 112

1.7 - Retratação da representação na Lei Maria da Penha .......................................................................................... 113

2 - Requisição ............................................................................................................................................. 114

2.1 - Doutrina Complementar....................................................................................................................................... 115

2.2 - Jurisprudência pertinente .................................................................................................................................... 120

Ação penal privada ......................................................................................................................................... 122

1 - Ação penal exclusivamente privada...................................................................................................... 125

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2 - Ação penal privada personalíssima ...................................................................................................... 125

3 - Ação penal privada subsidiária da pública ........................................................................................... 125

3.1 - Atuação do Ministério Público ............................................................................................................................. 127

4 - Extinção da punibilidade e ação penal de iniciativa privada ................................................................ 128

4.1 - Decadência ........................................................................................................................................................... 128

4.2 - Perempção............................................................................................................................................................ 131

4.3 - Renúncia ............................................................................................................................................................... 133

4.4 - Perdão do ofendido .............................................................................................................................................. 134

4.5 - Doutrina Complementar....................................................................................................................................... 136

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 141

Ação penal popular ........................................................................................................................................ 142

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 144

Ação penal adesiva......................................................................................................................................... 146

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 146

Ação de prevenção penal ............................................................................................................................... 147

Ação penal secundária ................................................................................................................................... 147

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 147

Ação penal nas várias espécies de crimes ..................................................................................................... 148

1 - Ação penal nos crimes contra a dignidade sexual ................................................................................ 148

1.1 - Direito intertemporal ........................................................................................................................................... 151

2 - Ação penal nos crimes contra a honra de servidor público .................................................................. 152

3 - Ação penal nos crimes de lesão corporal leve e culposa com violência doméstica .............................. 153

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 155

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 155

Peça acusatória .............................................................................................................................................. 158

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1 - Denúncia e queixa-crime ....................................................................................................................... 158

2 - Requisitos da peça acusatória .............................................................................................................. 158

2.1 - Exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias ........................................................................... 159

2.2 - Qualificação do acusado ....................................................................................................................................... 162

2.3 - Classificação do crime .......................................................................................................................................... 162

2.4 - Rol de testemunhas .............................................................................................................................................. 163

2.5 - Endereçamento da peça acusatória ..................................................................................................................... 163

2.6 - Redação na língua oficial ...................................................................................................................................... 163

2.7 - Subscrição do Ministério Público ou do advogado do querelante ....................................................................... 164

2.8 - Procuração da queixa-crime e custas processuais ............................................................................................... 164

3 - Prazo para oferecimento da peça acusatória ....................................................................................... 166

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 168

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 173

Questões diversas .......................................................................................................................................... 177

1 - Denúncia genérica e crimes societários ................................................................................................ 177

2 - Cumulação de imputações .................................................................................................................... 178

3 - Imputação implícita .............................................................................................................................. 178

4 - Imputação alternativa........................................................................................................................... 180

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 181

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 184

Aditamento à denúncia .................................................................................................................................. 187

1 - Aditamento próprio e impróprio ........................................................................................................... 189

2 - Aditamento espontâneo ou provocado ................................................................................................ 191

3 - Recebimento do aditamento ................................................................................................................. 193

4 - Interrupção da prescrição ..................................................................................................................... 193

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5 - Recurso cabível no indeferimento ......................................................................................................... 194

6 - Aditamento da queixa-crime................................................................................................................. 195

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 199

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 203

Ação civil ex delicto ........................................................................................................................................ 203

1 - Definição e sistemas.............................................................................................................................. 203

2 - Prejudicialidade - suspensão da ação civil ............................................................................................ 209

3 - Legitimidade .......................................................................................................................................... 211

4 - Eficácia preclusiva e força vinculatória ................................................................................................. 218

4.1 - Em caso de condenação ....................................................................................................................................... 219

4.2 - Em caso de absolvição .......................................................................................................................................... 233

Doutrina Complementar............................................................................................................................................... 243

Jurisprudência pertinente............................................................................................................................................. 248

Resumo........................................................................................................................................................... 249

1 - Ação penal ............................................................................................................................................. 250

2 - Condições da ação penal ....................................................................................................................... 250

3 - Classificação das ações penais .............................................................................................................. 251

4 - Princípios da ação penal ....................................................................................................................... 252

5 - Ação penal pública incondicionada....................................................................................................... 252

6 - Ação penal pública condicionada.......................................................................................................... 253

7 - Ação Penal Privada ............................................................................................................................... 254

8 - Ação penal popular ............................................................................................................................... 255

9 - Ação penal adesiva ............................................................................................................................... 255

10 - Ação de prevenção penal .................................................................................................................... 256

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11 - Ação penal secundária ........................................................................................................................ 256

12 - Ação penal nas várias espécies de crimes........................................................................................... 256

13 - Peça acusatória ................................................................................................................................... 256

14 - Questões diversas ............................................................................................................................... 257

15 - Aditamento à denúncia ....................................................................................................................... 257

16 - Ação Civil ex delicto ............................................................................................................................. 259

Referências Bibliográficas .............................................................................................................................. 261

Questões com Comentários ........................................................................................................................... 265

Magistratura ................................................................................................................................................................. 265

Promotor ...................................................................................................................................................................... 276

Defensor ....................................................................................................................................................................... 286

Delegado ....................................................................................................................................................................... 291

Lista de Questões ........................................................................................................................................... 297

Magistratura ................................................................................................................................................................. 297

Promotor ...................................................................................................................................................................... 309

Defensor ....................................................................................................................................................................... 318

Delegado ....................................................................................................................................................................... 323

Gabarito.......................................................................................................................................................... 329

Magistratura ................................................................................................................................................................. 329

Promotor ...................................................................................................................................................................... 330

Defensor ....................................................................................................................................................................... 330

Delegado ....................................................................................................................................................................... 330

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AÇÃO PENAL

1 - DISTINÇÕES PRÉVIAS
Antes de falarmos de ação penal, convém trazer algumas concepções prévias, de forma breve, em relação a
institutos entrelaçados no processo penal. Pois bem.

Relação processual penal: “compreende o direito de ação do autor, o direito de defesa do réu e o poder do
Estado de se impor a ambos” (Tornaghi, 1987).

Jurisdição: CHIOVENDA define como “função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da
lei, por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros
órgãos públicos, já no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la praticamente efetiva” (Tornaghi,
1987). “Como poder jurídico, a jurisdição é manifestação da soberania do Estado e tem por contraposto o
status subjetionis do indivíduo”.

Corolário da organização jurídica das sociedades, aparece o poder do Estado de se reservar a


solução dos conflitos juridicamente relevantes. Sem ele, a ordem jurídica não poderia subsistir.
E o Estado não alcançaria prescindir dele sem se negar a si mesmo. Estado sem poder de resolver
conflitos de interesses e de normas não preencheria a própria finalidade. Mas, além de
necessária à conservação e aperfeiçoamento do Estado. A jurisdição, enquanto jurisdição penal,
encontra ainda outro motivo para se reservar ao Estado; é o de que o delito produz sempre, em
qualquer caso, um dano mediato ou imediato, a todos os consócios da comunhão civil que,
dessarte, são parte no conflito (Tornaghi, 1987).

Jorge De Figueiredo Dias:

O princípio do monopólio estatal da função jurisdicional constitui hoje um alicerce inatacável de


todas as sociedades; o que não significa, no entanto, total exclusão da autodefesa, mas
reconhecimento da sua admissibilidade só em casos muito excepcionais, rigorosamente
delimitados pela lei e subordinados à ideia da impossibilidade de recorrer em tempo útil aos
meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática do direito (Dias, 1974).

Punibilidade: na visão de HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, seria a consequência jurídica correspondente à prática do
crime.

Crime é ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Como regra geral, em consequência,
pratica crime, e deve sofrer a consequência jurídica correspondente, quem transgride a norma
que lhe impõe proibição ou mandado, atuando ou omitindo-se de forma ilícita e reprovável. Há,
todavia, casos em que a punibilidade depende de condições objetivas exteriores à conduta
(condições objetivas de punibilidade) e casos em que ela se exclui tendo em vista condições
pessoais do agente ou seu comportamento posterior (escusas absolutórias). Atende-se, em tais
casos, à ocorrência de elementos ou circunstâncias exteriores ao fato que, por motivos de política
criminal, condicionam sua ilicitude penal ou sua punição (Fragoso, 1993).

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“É a possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável (autor, coautor ou partícipe)
pela infração penal. Não é seu elemento, razão pela qual o crime e a contravenção permanecem íntegros
com a superveniência da causa extintiva da punibilidade. Desaparece do mundo jurídico somente o poder
punitivo estatal [...]” (Masson, 2014).

Segundo De Plácido e Silva:

Formado de punir, no concerto jurídico, assim se diz o direito de punir, isto é, o direito de aplicar
a pena ao caso em espécie, inclusive o de impor o cumprimento de que é imposta pela
condenação. Nesta razão, não ocorre a punibilidade quando não se mostra punível o ato
praticado, ou a pena que lhe era imposta foi afastada. Assim, a punibilidade encerra sentido mais
amplo que sanção penal, que se mostra a regra, onde se impõe a pena, pois que significa o direito
de aplicar a pena e de exigir a efetividade dela ou o respectivo cumprimento. A punibilidade vai
da efetividade da sanção penal à punição ou cumprimento da pena (Silva, 2005).

Pretensão punitiva: segundo GUSTAVO HENRIQUE BADARÓ, seria o “poder do Estado de exigir de quem comete
um delito a submissão à sanção penal”.

Através da pretensão punitiva o Estado-Administração procura tornar efetivo o ius puniendi, com
o exigir do autor do crime, que está obrigado a sujeitar-se à sanção penal, o cumprimento dessa
obrigação, que consiste em sofrer o delinquente as consequências do crime e se concretiza no
dever de abster-se ele de qualquer resistência contra os órgãos estatais a que cumpre executar
a pena. Porém, tal pretensão não poderá ser voluntariamente resolvida sem um processo, não
podendo o Estado impor a sanção penal, nem o infrator submeter-se à pena. Assim sendo, tal
pretensão já nasce insatisfeita. (Correlação entre acusação e sentença. 2ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. P. 68) (Lima, 2018).

2 - CONCEITO
Começamos aqui, neste ponto, tentando trazer a definição do que seja ação penal e direito de ação penal.
Se, no Direito, normalmente já é difícil e controverso conceituar e atribuir natureza jurídica aos mais diversos
institutos – aqui a dificuldade atravessa gerações. Já era assim ao tempo de JOSÉ FREDERICO MARQUES:

Dizia SABATINI que a ação penal, pelas dificuldades e controvérsias que sugere, é tema
verdadeiramente escabroso. E JOÃO MENDES JÚNIOR, tratando do problema da ação, teve de
adentrar-se, como anotou COUTURE, nos domínios transcendentes da metafísica escolástica, tal a
relevância e complexidade da matéria (Marques, 1997).

De qualquer modo, vamos aqui fazê-lo compreender o direito de ação penal de uma forma mais simples e
objetiva, observada a doutrina mais ortodoxa e dominante. Por essa forma de pensar, concluímos que a
definição de ação que temos lá da teoria geral do processo é, basicamente, a mesma aqui na área penal. Ao
largo das controvérsias, como já dizia TORNAGHI, referindo-se à ação, “uma coisa é certa: o conceito é o
mesmo tanto no cível quanto no crime” (Tornaghi, 1977).

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E para ilustrar a concepção cível sobre o direito de ação, trazemos a lição de ninguém menos do que LUIZ
GUILHERME MARINONI, para quem o direito de ação “pode ser utilizado conforme as necessidades funcionais
dos direitos fundamentais”, em outras palavras, “os direitos fundamentais materiais dependem, em termos
de efetividade, do direito de ação”. Nessa condição “o direito de ação é um direito fundamental processual,
e não um direito fundamental material, como são os direitos de liberdade, à educação e ao meio ambiente.
Portanto, ele pode ser dito o mais fundamental de todos os direitos, já que imprescindível à efetiva
concreção de todos eles”. Para o mestre, “a ação é a contrapartida natural da proibição da tutela privada,
ou seja, é o instrumento de que o particular passou a fazer uso diante da eliminação da ‘justiça de mão
própria’”.

O direito de ação aparece exatamente no momento em que o Estado proíbe a tutela privada ou
o uso da força privada para a realização e a proteção dos direitos. A partir daí o Estado assume o
monopólio da solução dos conflitos e da tutela dos direitos e, por consequência lógica, dá ao
privado o direito de acudir a ele. Esse último direito, antes denominado de direito de agir e agora
chamado de direito de ação, é a contrapartida da proibição da realização privada dos direitos e,
portanto, é devido ao cidadão como um direito à proteção de todos e quaisquer direitos. Ou seja,
é um direito fundamental não apenas à tutela dos direitos fundamentais, mas sim à proteção de
todos os direitos [...] (Marinoni, 2006).

2.1 - Teorias da ação

Muitas teorias, ao longo da história, tentaram definir um conceito de ação. A maior parte delas já foi
descartada, tendo apenas valor histórico. Para maior clareza no tema, importante que pontuemos algumas,
as mais importantes.

a) Teoria imanentista – a ação seria imanente (no sentido de inerente, inseparável) ao direito material; uma
coisa estaria umbilicalmente relacionada à outra; sem direito material, fulminado estaria o próprio direito
de ação.

SAVIGNY consolidou a teoria imanentista (teoria civilista ou concepção clássica) em 1840. Foi a
primeira teoria, no direito moderno, que tentou estabelecer o conceito de ação processual.
Defendia a ideia de que para cada direito material era imanente uma ação, em analogia à
concepção original dos romanos (legis actionis). O direito material era indissociável, não
autônomo, ao direito de movimentar a jurisdição. A ação e o direito subjetivo material
constituíam uma só coisa, eram sinônimos, quer dizer, não há ação sem direito e não há direito
sem ação. Partia do conceito de ação dado pelo jurista romano Celso: Nihilaliud est actioquamius
quod sibidebeatur, indiciumpersequendi (A ação nada mais é do que o direito de perseguir em
juízo o que nos é devido). WINDSCHEID demonstrou que essa actio não correspondia à ação
processual moderna. O conceito seria mais adequado à pretensão de tutela jurídica estatal.
Existiam quatro condições da ação: existência do direito, qualidade de parte, capacidade
processual e interesse. Chegou a ser adotada por GARSONNET, MATTIROLO, JOÃO MONTEIRO, JOÃO
MENDES JÚNIOR, CLÓVIS BEVILÁQUA e CÂMARA LEAL.

Na crítica mais central, essa teoria não consegue explicar, por exemplo, as ações que são propostas e, ao
final, são improcedentes. Ora, se são improcedentes é porque o direito material não existia – não existindo
este, como a ação pôde ser exercida?

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A famosa polêmica entre WINDSCHEID e MUTHER levou à conclusão de que o direito de ação era outro,
diferenciado do direito material, teria autonomia – seriam realidades distintas.

Por volta de 1850, houve disputa entre os juristas alemães WINDSCHEID e MÜTHER no sentido de
conceber, ou não, a ação como direito autônomo, distinto do direito material. BERNHARD
WINDSCHEID publicou, em 1856, obra intitulada A ação do direito civil romano do ponto de vista
do direito atual, em que demonstra que o conceito romano de actio não coincidia em absoluto
com o conceito de ação (Klage) daquele direito germânico. THEODOR MÜTHER, em 1857, publica
Sobre a teoria da actio romana, do moderno direito de queixa, da litiscontestação e da sucessão
singular nas obrigações, em revide a WINDSCHEID. Ele procurou demonstrar que havia uma perfeita
coincidência entre a actio romana e a Klage germânica. No mesmo ano, WINDSCHEID respondeu a
MÜTHER na obra intitulada A actio réplica ao Dr. THEODOR MÜTHER, acolhendo muitas das
ponderações de seu opositor.

Duas correntes doutrinárias surgiram a partir daí, ambas baseadas na autonomia.

b) Teoria da ação como direito autônomo e concreto – a ação estaria condicionada à existência do direito
material; a ação seria um direito subjetivo, público e autônomo a uma decisão favorável.

WACH (1860) acresceu à disputa a ideia de direito a uma sentença favorável: tem direito de ação
quem tem razão, ou seja, direito de ação só existe se reconhecido concretamente em juízo.
Nascia a teoria concreta da ação. Fundava-se a ideia de direito autônomo e público da ação. WACH
dizia que ação é um direito público contra o Estado que deve garantir os direitos do autor contra
o réu. Seguiram WACH, MÜTHER e HELLWIG. Alguns autores inserem CHIOVENDA, pois seu conceito
de ação é idêntico ao de WACH, qual seja, ação é poder atribuído ao titular do direito subjetivo
material. Esse titular invoca a proteção do Estado para tornar efetivo seu direito contra o
obrigado. CHIOVENDA, assim como WACH, também tentou demonstrar a autonomia do direito de
ação ao subordinar o direito de ação à existência de um direito para o autor. A existência do
direito é pressuposto da ação. Devem concorrer, ainda, duas condições: legitimidade e interesse,
sendo que o julgamento das condições da ação é o julgamento do mérito. A concepção é
duramente criticada por não explicar o direito de ação declaratória negativa que visa reconhecer
a inexistência de uma relação jurídica, esvaziando o conceito concreto de ação. OSKAR VON BÜLOW
(1868) concebeu o processo como relação jurídica. Quanto à ação, posicionou-se como
concretista, seguindo, pois, as teorias de MÜTHER e WACH. Doutrinava que a ação é o direito a
uma sentença justa, mas só ocorre após a demanda. Anterior ao juízo, não existe.

c) Teoria da ação como direito autônomo e abstrato – a ação estaria completamente desvinculada do direito
material, configurada como o direito abstrato de buscar a tutela jurisdicional, não dependendo, por
conseguinte, da existência do direito material.

Coube a DEGENKOLB, na Alemanha, e PLÓSZ, na Hungria, em 1877, desenvolver a teoria da ação


como direito público, eminentemente autônomo e abstrato. Conceberam, assim, a ação como
direito incondicionado de movimentar a jurisdição, pouco importando o reconhecimento do
direito material alegado. Essa teoria, abstrata da ação, define a ação como direito autônomo

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completamente desvinculado de qualquer direito subjetivo material. O direito à ação é abstrato


porque outorgado pela ordem jurídica a quem invoca proteção jurisdicional. Ação é, assim,
direito geral e abstrato a uma sentença favorável ou desfavorável. A partir de 1877, desvincula-
se o direito de ação do direito subjetivo invocado e da análise de ser o direito material favorável
ou não. Diferencia-se, de uma vez por todas, direito material de direito processual. A existência
do direito material torna-se irrelevante para o direito de ação. Seguiram a concepção CARNELUTTI,
COUTURE, ALFREDO ROCCO, ZANZUCCHI dentre outros. KÖHLER dizia que acionar é um direito individual
decorrente da personalidade. Essa tese não vingou, por se adequar mais à Psicologia do que ao
Direito, apesar de GOLDSCHMIDT ter suavizado a crítica ao referir-se ao conceito de ação como
direito da personalidade. CHIOVENDA, em 1903, profere na Universidade de Bolonha conferência
intitulada A ação no sistema dos direitos, concebendo a ação como "o poder de criar a condição
para a atuação da vontade da lei". Integra, assim, a ação na categoria dos chamados direitos
potestativos (poderes de produzir efeitos jurídicos determinados). Para CHIOVENDA, a ação é um
poder puramente ideal, quer dizer, o poder de produzir determinados efeitos jurídicos (atuação
da lei), mas ação é direito autônomo.
Essa teoria da ação como direito potestativo é inserida no grupo da concepção concreta, pois a
ação, para CHIOVENDA, não pressupõe necessariamente um direito subjetivo, mas só existe direito
de ação quando a sentença é favorável ao autor. Ação é direito potestativo, de poder jurídico
(kannRechte), a quem tem razão contra quem não a tem. Não se propõe contra o Estado, mas
contra o adversário, porque o Estado é que tem interesse da escolha da razão; por isso provê
juízes. A vitória na demanda seria uma condição da ação sendo ele o primeiro processualista a
formular a teoria das condições da ação. Conceitua-as como condições necessárias para se obter
um pronunciamento favorável. Para CHIOVENDA, as condições da ação são questões de mérito, por
isso é considerado adepto à concepção concreta do direito de ação, que seria autônoma, mas
que estaria sempre voltada à realização efetiva do direito substantivo da parte. De forma que
não faz uma separação nítida entre as condições da ação e o mérito. Diz ele que os pressupostos
processuais são "condições para a obtenção de um pronunciamento qualquer, favorável ou
desfavorável, sobre a demanda". Já as condições da ação seriam "condições de uma decisão
favorável ao autor". Para CHIOVENDA, pois, a falta de condição da ação leva à rejeição do pedido
do autor produzindo sempre coisa julgada, como decisão de mérito. É dizer: o julgamento das
condições da ação é o julgamento do mérito. As condições da ação são condições de mérito.
Seguiram CHIOVENDA, WEISMANN, REDENTI, ELIÉZER ROSA, CELSO AGRÍCOLA BARBI. CALAMANDREI também
seguiu CHIOVENDA. Para ele, a ação era direito subjetivo autônomo (existia por si mesmo). Daí
dizer que havia um direito processual e outro material. CARNELUTTI definiu a ação como "o direito
subjetivo processual das partes". Também dizia que o interesse individual do autor é diferente
do interesse da ação. Aquele pretende a solução favorável do litígio; esse, a composição do litígio.
CARNELUTTI é criticado por falar que a ação é contra o juiz, porque o juiz e o Estado não podem ser
separados. Já EDUARDO COUTURE, jurista uruguaio, definiu a ação como "o poder jurídico que tem
todo o sujeito de direito de recorrer aos órgãos jurisdicionais para reclamar deles a satisfação de
uma pretensão". Seguindo a linha do tempo, UGO ROCCO define ação como "o direito de pretender
a intervenção do Estado e a prestação da atividade jurisdicional, para a confirmação ou realização
coativa dos interesses (materiais ou processuais) protegidos em abstrato pelas normas de direito
subjetivo". ZANZUCCHI defende a teoria abstrata da ação, segundo a qual, além de ser um direito
autônomo frente ao direito material controvertido - conceitualmente -, independe a ação da
própria existência de tal direito subjetivo. Ele assume perante o problema das condições da ação
posição bem diferente da de CHIOVENDA. Seu entendimento é que as condições da ação, os

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pressupostos processuais e o mérito da causa são categorias distintas. As condições da ação são
"os requisitos do poder de agir" diante do caso concreto, a fim de alcançar o provimento final a
que tende a ação.

d) Teoria eclética – a ação existe ainda que o exercente não seja titular do direito material que afirma existir,
mas ele terá de cumprir as condições da ação para que haja o exame do mérito. O direito só existirá se o
autor preencher essas condições.

LIEBMAN lança bases para a teoria eclética da ação. Para o processualista, ação é direito de
provocar o exercício da função jurisdicional, direito subjetivo que consiste no poder de criar
situação a que o exercício desta função está condicionado. É dirigida contra o Estado, a fim de
que esse dê provimento jurisdicional. Para isso, a ação depende de requisitos constitutivos (as
condições da ação). "Só se estiverem presentes essas condições é que se pode considerar
existente a ação, surgindo para o juiz a necessidade de julgar o pedido, para acolhê-lo ou rejeitá-
lo". O direito de ação é um agir contra o Estado, em sua condição de titular do poder jurisdicional,
i.e., direito de ação é direito à jurisdição. Não há ação sem jurisdição e vice-versa. Nisso
concordam também os adeptos da teoria abstrata. Para ENRICO TULLIO LIEBMAN, só há jurisdição
quando ultrapassada a fase de averiguação prévia. Se há alguma condição prévia não presente
para que o juiz possa decidir sobre o mérito da causa, a decisão que encerra o processo não é
verdadeiramente jurisdicional e não haverá exercício de ação. O direito de ação é direito a
sentença de mérito favorável ou não ao autor, sendo necessário as condições da ação que se
apresentam como pré-requisitos à apreciação do mérito da causa. Na terceira edição de seu
manual, retirou a possibilidade jurídica do pedido dentre as condições da ação, subsumindo-a
ao interesse de agir. Paradoxalmente, o legislador brasileiro passou a adotar, naquele momento,
a primeira posição do professor italiano, pelo art. 267, VI, do CPC. Com LIEBMAN, deu-se sentido
próprio à expressão carência da ação, fazendo surgir a teoria do trinômio: pressupostos
processuais, condições da ação e mérito da causa. É a teoria mais aceita. FAZZALARI faz a revisão
do conceito de ação tomando como critério a legitimação para agir, que não pode ser atribuída
apenas ao autor, mas se estende a todos os sujeitos do processo, o que é perfeitamente lógico,
pois sem a legitimação para agir não se poderia compreender o fundamento jurídico de seus atos
(As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

A última corrente é majoritária e acolhida pelo Código de Processo Civil. Tem sido aprimorada por autores
que sustentam, basicamente, que as condições da ação são requisitos para o legítimo exercício do direito
que é assegurado na Constituição Federal. Por essa mais moderna concepção, a carência de ação está mais
para um abuso do direito de ação do que para a inexistência desse mesmo direito.

2.2 - Conceito no processo penal

O direito de ação se caracteriza numa prerrogativa subjetiva e abstrata de invocar a tutela jurisdicional.
Segundo a conclusão mais enxuta de HÉLIO TORNAGHI, na obra A relação processual penal, “a ação é o direito
subjetivo público que tem qualquer pessoa de exigir do Estado a prestação jurisdicional” (Tornaghi, 1987).
Nas diferentes palavras de vários mestres:

José Frederico Marques:

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A ação penal é o direito de agir exercido perante os juízes e tribunais da justiça criminal. [...] O
direito de agir, em seu aspecto geral, é o direito à jurisdição. [...] Se o Estado deve atribuir justiça
e tem para isso o aparelhamento judiciário adequado, aqueles que necessitem da atividade
jurisdicional, para a resolução de situações contenciosas, devem ter o direito de levar à
apreciação dos tribunais suas causas e litígios (JOSÉ ALBERTO DOS REIS). [...] A ação penal é o direito
de invocar-se o Poder Judiciário para aplicar o direito penal objetivo; e, como dela se serve o
Estado para tornar efetivo o seu ministério penal, a ação é também um momento da persecução
criminal [...]. É o direito que tem o Estado-Administração, em face do Estado-juiz, ao julgamento
sobre o mérito de uma pretensão punitiva regularmente deduzida na acusação (Marques, 1997).

HÉLIO TONAGHI, afastando a ideia – calcada na linguagem imperativa dos artigos 24 e 42 do CPP – de que a
ação penal seria um poder-dever, assevera:

Mas cumpre não esquecer que o titular da ação pública é o Estado; o Ministério Público é
apenas um órgão dele. O Estado tem, realmente, disponibilidade da ação. Isso fica manifesto ao
considerar-se que ele pode (por seus órgãos competentes) conceder anistia e, desse modo,
embora por via oblíqua, dispor do direito de ação. O dever de agir do Ministério Público existe
perante o Estado, de que ele é órgão. Enquanto o Estado não dispuser de seu direito, é claro que
o Ministério Público não tem como arrogar-se o poder de fazê-lo. Dizer que a ação pública não é
um direito, apenas porque o Ministério Público dela não pode abrir mão, é o mesmo que afirmar:
a propriedade privada, nos regimes capitalistas, não é um direito subjetivo porque dela não
podem dispor os prepostos, gerentes, administradores ou empregados do proprietário. [...]
mesmo no Direito italiano, o fato de o Ministério Público não poder motu proprio, arquivar o
inquérito, não significa que o Estado não possa dispor da ação penal (que lá é sempre pública).
O Estado, não o Ministério Público! O direito é daquele, não desse que é apenas seu órgão. Em
outras palavras: o Estado abre mão de seu direito por via de um órgão e o exerce por meio de
outro. Consequentemente, esse tem o dever de exercê-lo. Mas o fato de não lhe competir dispor
do direito não significa que ele inexista, ou que não possa ser objeto de renúncia por via de outro
órgão. [...] é insofismável que se trata de autêntico direito subjetivo. [...] No cível, como no
crime, a ação é direito a uma decisão judicial (Tornaghi, 1977).

MAGALHÃES NORONHA, referindo-se à ação penal:

[...] é o direito do Estado-Administração de pedir ao Estado-Juiz a aplicação da lei. Como escreve


CANUTO MENDES DE ALMEIDA: “O aparelho judiciário é, geralmente, inerte. Seu funcionamento
depende de solicitação exterior; a jurisdição só se move mediante esse impulso. Essa solicitação
ou impulso, que à lei incumbe determinar, é a ação: uma atividade de pessoas que querem ou
que devem garantir pela coação do poder público a efetividade de um direito e que, nos termos
legais, constitui condição do procedimento jurisdicional”. Conceituou-a JOÃO MENDES DE ALMEIDA
JÚNIOR como “o direito de invocar a jurisdição do juiz; é um atributo do autor; é direito de
requerer em juízo aquilo que é devido ao autor [...]”. Em síntese, a ação, de que se cogita, é o
direito de invocar-se o Poder Judiciário para aplicação do direito objetivo (Noronha, 1995).

Guilherme De Souza Nucci:

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É o direito do Estado-acusação ou do ofendido de ingressar em juízo, solicitando a prestação


jurisdicional, representada pela aplicação das normas de direito penal ao caso concreto. Por
meio da ação, tendo em vista a existência de uma infração penal precedente, o Estado consegue
realizar a sua pretensão de punir o infrator. Trata-se do “poder jurídico de promover a atuação
jurisdicional a fim de que o julgador se pronuncie acerca da punibilidade dos fatos que o titular
da demanda reputa constitutivos do delito”. Na ótica de ROGÉRIO LAURIA TUCCI, “a ação é a atuação
correspondente ao exercício de um direito abstrato (em linha de princípio, até porque, com ela,
se concretiza), autônomo, público, genérico e subjetivo, qual seja o direito à jurisdição”. Como
bem anota JOÃO MENDES DE ALMEIDA JÚNIOR, “a ação é sempre um movimento e todo o movimento
parte de um princípio e tende a um fim. Não há movimento infinito”.

RENATO BRASILEIRO chama a atenção para a distinção entre o direito de ação


com a ação, propriamente dita: “direito de ação é o direito de se exigir do
Estado o exercício da jurisdição. Ação, todavia, é o ato jurídico, ou mesmo a direito

iniciativa de se ir à justiça, em busca do direito, com efetiva prestação da


tutela jurisdicional, funcionando como a forma de se provocar o Estado a
prestar a tutela jurisdicional” (Lima, 2021). ação

PAULO RANGEL recorre à etimologia para a conceituação:


jurisdição

O vocábulo ação vem da expressão em latim actio, que significa agere,


que, como nos informa ENRIQUE VÉSCOVI, “no direito primitivo o autor
devia atuar, isto é, reproduzir mimicamente, perante o tribunal, o fato fundamental de sua
reclamação” (Teoría general del proceso. 2. ed. Bogotá: Temis, 1999. p. 64; tradução nossa).
Diante de todo o quadro acima exposto, podemos definir o direito de ação como sendo um
direito subjetivo de se invocar do Estado a prestação jurisdicional, pois, havendo o Estado
monopolizado a administração da Justiça, deve dar a cada um o que lhe é devido. [...] Na
medida em que o Estado proibiu o fazer justiça pelas próprias mãos (cf. art. 345 do CP),
assumindo, por inteiro, o monopólio da Justiça, mister se faz dar ao cidadão um instrumento para
que ele possa reclamar o que é seu. Este é o direito de ação (Rangel, 2018).

AURY LOPES JÚNIOR, assim define:

Concebemos a ‘ação’ como um poder político constitucional de acudir aos tribunais para
formular a pretensão acusatória. É um direito (potestativo) constitucionalmente assegurado de
invocar e postular a satisfação da pretensão acusatória. [...] Superadas as históricas polêmicas,
considera-se que ação é um direito público autônomo e abstrato. É autônomo e abstrato, pois
independe da relação jurídica de direito material. Por isso, a ação é um direito dos que têm razão
e também dos que não a têm. Haverá ação ainda que, ao final, o réu seja absolvido (abstração e
autonomia) (Júnior, 2021).

PACELLI e FISCHER bem arrematam:

Do ponto de vista processual, a ação é o ato de ir a juízo, submetendo ao Poder Judiciário uma
dada pretensão, qualquer que seja ela. Uma vez que a tarefa de dizer o direito é atribuída aos

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órgãos do Estado, integrantes do Poder Judiciário, que, para isso, exercem a chamada função
jurisdicional (de jurisdição), devem esses órgãos se manifestar sobre os pedidos a eles
apresentados pelos jurisdicionados. E de tal dever resulta uma obrigação, qual seja a de prestar
jurisdição, ou, da prestação jurisdicional. Note-se que a expressão “prestação” tem precisamente
a finalidade de revelar uma obrigação, de tal maneira que, com ela, se consiga chegar sem
maiores dificuldades à ideia de uma relação jurídica, na qual uma parte, o autor, pode exigir do
Estado (Poder Judiciário) um pronunciamento sobre determinada questão. Nessa ordem de
ideias, o autor exerceria um direito de ação em face do Estado, que, por sua vez, seria devedor
de uma prestação jurisdicional. Por seu turno, o réu de uma ação se encontraria em uma posição
de submissão (à ação), no sentido de que não lhe seria cabível recusar a ação contra si proposta.
Nesse aspecto, se, em relação ao Estado (Poder Judiciário), o autor da ação exerce direito,
exigindo-lhe a obrigação da jurisdição devida, já em relação ao réu, a natureza dessa ação
assemelha-se mais a um verdadeiro exercício de poder, ao qual este (réu) se acha submetido, já
que não se lhe faculta a opção de ser ou não acionado. No fim das contas, no que se refere ao
exame da questão sob a perspectiva da chamada Teoria Geral do Processo, adequada ao
processo civil mas não ao processo penal (exceção feita à ação penal privada), aquele que se julga
em condições de exigir de outra pessoa um comportamento, uma omissão, ou ainda uma
prestação de outra natureza, tem o direito de provocar a atuação do Poder Judiciário – direito
de ação – que, por seu turno, deve necessariamente se manifestar sobre a pretensão deduzida,
ainda que seja para repeli-la integralmente. Sob essa perspectiva, a ação é um direito subjetivo
público, exercido contra o Estado, abstrato, porque independe da procedência ou não da
pretensão. Esta é a concepção acolhida pela grande maioria da doutrina nacional (Pacelli, et al.,
2021).

Podemos encontrar a base normativa para o direito de ação na Constituição Federal, art. 5º:

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Compreenda-se, por essa norma, que todos nós temos o direito, quando nos sentirmos lesados e usurpados
em nossas prerrogativas e garantias, de levarmos ao Poder Judiciário essas questões para ‘apreciação’ (não
necessariamente, portanto, ‘procedência’). Nenhuma lei pode excluir esse nosso direito – princípio da
inafastabilidade da jurisdição ou cláusula de acesso à justiça.

3 - NATUREZA JURÍDICA DAS NORMAS SOBRE AÇÃO PENAL


Além dessa previsão constitucional, nossos códigos também têm disposições que disciplinam a ação penal.
O Código Penal faz isso nos artigos 100 a 106, ao passo que o Código de Processo Penal regulamenta o
instituto nos artigos 24 a 62. Interessante notar, portanto, que a ação está prevista em ambos os Códigos, o
que pode traduzir a seguinte dúvida: estamos diante de um instituto jurídico de direito processual
(adjetivo) ou material (substantivo)?

A dúvida é relevante, com respostas que geram consequências na interpretação das normas (como
sabemos). Na visão de FREDERICO MARQUES, a ação penal é “um instituto de processo, e não de direito material.
[...] se insere no processo e está subordinada à mesma regulamentação normativa que disciplina atos

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processuais, isto é, ao direito processual. O titular da ação tem por isso mesmo, um direito subjetivo de
caráter processual” (Marques, 1997).

No mesmo sentido caminha PAULO RANGEL:

Não temos dúvida em afirmar que a norma que trata e regula o direito de ação é norma
puramente processual. O direito é previsto em norma material (cf. art. 5º, XXXV, da Constituição
Federal), porém a disciplina e a regulamentação deste direito encontram-se no direito
processual. Hodiernamente, a autonomia do direito processual é plenamente reconhecida, pois
foi o tempo em que o direito processual era um complemento do direito material. O fato de a
ação estar prevista tanto no CP como no CPP (cf. arts. 100 do CP e 24 do CPP) não pode levar o
intérprete a pensar em uma natureza mista. Não. Pois, na medida em que demonstramos a
autonomia e a abstração do direito de agir, inclusive que este direito preexiste à prática do delito,
claro nos parece que a natureza da norma é, exclusivamente, processual. Aliás, já se disse,
alhures, que o caráter processual da norma “se infere não da sua localização – que constitui um
dado de identificação importante, mas, certamente, não vinculante –, e, sim, do objeto, do seu
conteúdo, da sua finalidade” (cf. TOURINHO FILHO. Processo penal. 18. ed. v. I, p. 299). A
identificação dessa natureza não é mero deleite doutrinário, pois, à medida que tratarmos da
representação na ação penal pública condicionada, teremos que enfrentar a retroatividade ou
não do art. 88 da Lei no 9.099/1995 [...]. Portanto, o “processo é uma garantia outorgada pela
Constituição da República à efetivação do direito (subjetivo material e público) à jurisdição, ou
seja, à tutela jurisdicional do Estado” que somente pode ser exercida através da ação, que, por
sua vez, independe da existência do direito material violado ou ameaçado de violação. Neste
caso, sua natureza processual é patente (TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual
penal: jurisdição, ação e processo penal – estudo sistemático. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 202).

MAGALHÃES NORONHA diz que “a ação, como direito, encontra sua sede própria no Código Penal; o de Processo
regula o exercício desse direito. Essa razão por que ambos os estatutos se ocupam da ação”.

TORNAGHI assim explica:

No que respeita à colocação das normas sobre ação penal, as legislações se dividem em dois
grupos: - o primeiro segue o modelo francês que trata do assunto exclusivamente na lei de
processo: a princípio no Code d’Instruction Criminelle, de 1808, e, atualmente, no Code de
Procédure Pénale, de 1957; - o segundo afasta-se desse modelo e contém regras sobre a ação
penal na lei substantiva e na processual. É o seguido no Brasil e entendo que o mais correto; -
ação é um direito objetivo como outro qualquer. Da mesma forma que o Código Civil disciplina o
nascimento, as transformações e a extinção dos direitos civis (p. ex., propriedade, crédito,
direitos sobre coisas alheias etc.), assim também cabe ao Código Penal regular o aparecimento,
as vicissitudes e a morte do direito de ação. É matéria de Direito substantivo a titularidade do
direito, sua constituição, seu perecimento; - ao contrário dos demais direitos, entretanto, o de
ação somente pode ser exercido em juízo, no processo. Consequentemente são de Direito
Processual as normas sobre o exercício do direito de ação; - observe-se que os códigos civis
contêm sempre inúmeros preceitos sobre o direito de ação, exatamente aqueles que respeitam

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à titularidade, à constituição, às transformações e à perda do direito subjetivo de ação (Tornaghi,


1977).

BRASILEIRO defende a natureza mista: “não obstante sua previsão no CPP,


como a ação penal tem estreita relação com o direito de punir do mista
Estado, não deixa de ter também caráter penal”. Referido autor ainda
exemplifica algumas consequências concretas da distinção, que
merecem transcrição:
AÇÃO

A constatação de sua natureza mista tem extrema importância


material processual
quando nos deparamos com as recentes leis que introduziram
modificações quanto às espécies de ação penal. Basta ver, nessa
linha, o exemplo da Lei nº 12.015/09, que transformou os crimes sexuais, pelo menos em regra,
em crimes de ação penal pública condicionada à representação (CP, art. 225, caput). Fosse o
direito de ação considerado de natureza estritamente processual, aplicar-se-ia o art. 2º do CPP,
com a regra do princípio da aplicação imediata. Porém, a partir do momento em que se
constatam os reflexos que o exercício do direito de ação produz em relação ao ius puniendi, não
se pode deixar de aplicar a regra da irretroatividade da lei mais gravosa, ou da retroatividade da
lei mais benéfica. Exemplificando, se determinado crime era de ação penal pública
incondicionada e passa a ser de ação penal de iniciativa privada, forçoso é concluir que se trata
de lex mitior. Afinal, a partir do momento em que determinado crime passa a ser de ação penal
de iniciativa privada, maior será a possibilidade de incidência de causas extintivas da
punibilidade, como a decadência, a renúncia, o perdão e a perempção. Por outro lado, se
determinado delito era de ação penal de iniciativa privada e uma lei nova o transforma em crime
de ação penal pública condicionada à representação – veja-se o exemplo da Lei nº 12.033/09,
que alterou a natureza da ação penal do crime de injúria racial, antes de ação penal de iniciativa
privada, hoje de ação penal pública condicionada à representação – cuida-se de evidente novatio
legis in pejus, não podendo retroagir. De fato, a partir do momento em que o crime passa a ser
de ação penal pública condicionada à representação, não serão mais cabíveis a renúncia, o
perdão e a perempção como causas extintivas da punibilidade, subsistindo apenas a
possibilidade de decadência do direito de representação. Evidente, portanto, tratar-se de lei
nova prejudicial ao acusado, logo, irretroativa (Lima, 2018).

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4 - CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE AÇÃO PENAL


A doutrina costuma trazer algumas características da ação penal ou do direito
de ação. Embora procuremos separar uma coisa de outra (ação e direito de público
ação), elas estão muito relacionadas. Vejamos:

direito de ação
subjetivo
a) Direito público: a atividade que se invoca com o seu exercício é pública
autônomo e
(jurisdição); mais que isso, o seu titular é o Estado e “mesmo nas hipóteses em abstrato
que o Estado transfere ao ofendido a possibilidade de ingressar em juízo (v.g.
em regra, nos crimes contra a honra), tal ação continua sendo um direito instrumental
público, razão pela qual se utilizada expressão ação penal de iniciativa privada
– vide exemplo do art. 100, §§ 2º e 3º, do Código Penal” (Lima, 2021). conexo
Lembremos, ainda, que é um “direito de agir exercido perante juízes e tribunais
da justiça criminal” (Marques, 1997), de maneira que, por todos ângulos que analisemos o instituto, sua
natureza pública é evidente.

b) Direito subjetivo: “o titular do direito de ação penal pode exigir do Estado-Juiz a prestação jurisdicional,
relacionada a um caso concreto” (Lima, 2021). “A ação é, pois, um direito subjetivo (posto que inerente a
cada indivíduo)” (Pacelli, et al., 2018).

c) Direito autônomo e abstrato: não se pode confundir com o direito material que se pretende
tutelar. Direito material é uma coisa e direito de ação é outra! Façamos uma indagação para
retratar mais concretamente a diferença: ação penal e pretensão punitiva/direito de punir
(jus puniendi) são a mesma coisa?

NÃO; “a ação penal não surge do crime e basta a suspeita de ter sido praticada uma infração
para que ela tenha cabimento. O que nasce do crime é a pretensão punitiva” (Tornaghi, 1977). Do crime não
nasce a ação penal. Esta, “como um dos momentos da persecução ao crime, precede ao delito, é a este
anterior. O que decorre do crime é a pretensão punitiva. O direito de agir para pôr em movimento os órgãos
de jurisdição penal, o Ministério Público o possui em abstrato, pela só razão de não ser auto-executável o
direito de punir” (Marques, 1997).

Enquanto no processo civil, a pretensão, traduzida no desejo de subordinação de um interesse


alheio ao próprio, diz respeito, em regra, a questões econômicas, patrimoniais, ou, de todo
modo, que permitam a individualização do interesse do autor (mesmo nas ações civis coletivas
e/ou difusas o interesse pode ser individualizado), no processo penal a pretensão, do ponto de
vista processual, isto é, da solução judicial requerida, é punitiva (Pacelli, et al., 2021).

BRASILEIRO destaca que “no processo penal costuma-se trabalhar com o que se convenciona chamar de
pretensão punitiva, que significa a pretensão de imposição da sanção penal ao autor do fato tido por
delituoso. Pretensão, por sua vez, deve ser compreendida como a exigência de subordinação do interesse
alheio ao próprio”.

PACELLI e FISCHER têm uma visão diferenciada sobre o ‘direito’ de punir, encarando-o, em verdade, como um
poder-dever:

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Jus puniendi? Vistas assim as coisas, não há como acolher secular doutrina no sentido da
existência de um jus puniendi, ou, no vernáculo, de um direito de punir. Ora, todo Estado
politicamente organizado reivindica a si o exercício de uma soberania legiferante, no sentido de
reservar-se competência e poderes para a regulamentação da vida social e coletiva. Dentro dessa
competência é que se encontraria também a competência legislativa penal, de alta
complexidade, porquanto submetida a princípios constitucionais específicos (vedação de
excesso, como proibição da insignificância ou da bagatela; legalidade, e, em consequência,
anterioridade da lei penal, legalidade estrita, não só como exigência de lei para a incriminação,
mas de lei com descrição taxativa da matéria proibida etc.). Então, o que se pode afirmar é a
existência de um poder de incriminação ou de criminalização de condutas, desde que destinada
à proteção contra graves violações aos direitos fundamentais (tutela da vida, da integridade física
e psíquica, das liberdades pessoais – sexual, de locomoção, de religião, de opinião, da fé pública,
da Administração Pública, do Erário etc.). Trata-se de poder, consectário da manifestação da
soberania estatal em relação à ordem jurídica1interna. No plano da ação penal, portanto, o seu
exercício implica atuação por dever de aplicação da lei penal e não por direito de punição
(Pacelli, et al., 2021).

De qualquer modo, não há se confundir o direito de ação com o direito material.

Do crime nasce a pretensão punitiva estatal (direito material), mas não o direito de ação (direito
processual), que preexiste à prática da infração penal, aliás, como demonstra o direito
constitucional (art. 5º, XXXV, CF). É justamente a pretensão (tender à atuação de um direito) de
punir do Estado que fará movimentar a ação penal (Nucci, 2018).

Como diz AURY LOPES JÚNIOR, “a ação é um direito dos que têm razão e também dos que não a têm. Haverá
ação ainda que, ao final, o réu seja absolvido” (Júnior, 2021).

JOSÉ FREDERICO MARQUES, didaticamente, assim consolida:

Não se confunde assim, a ação penal com o direito punitivo material do Estado, da mesma forma
que se apresentam distintos os direitos subjetivos privados e a ação civil. Depois que a doutrina
da ação, em consequência de laboriosas e fecundas especulações técnico-jurídicas, separou o
direito de agir do direito subjetivo material, aceito ficou que o jus actionis é autônomo e
independente. Quem propõe em juízo uma causa, onde é pleiteado o pagamento de uma dívida,
está exercendo o direito de ação; mas, se julgado improcedente o pedido, por inexistir o crédito
reclamado, houve o exercício do jus actionis, apesar de declarado inexistente o direito subjetivo
material consubstanciado no crédito litigioso. É o que também acontece no processo penal,
porque mesmo que proposta a ação penal, pode a sentença declarar que não houve crime; e
então, apesar de faltar o jus puniendi, nem por isso deixou de existir a ação penal, que foi
plenamente exercida. Infere-se dessas considerações que a ação, antes de mais nada, é um
direito abstrato que investe seu titular da faculdade de invocar o poder público, por meio de
seus órgãos judiciários, para aplicar a norma legal objetiva e solucionar um litígio de interesses
em conflito. Este é o primeiro aspecto do direito de ação, e que, como diz LIEBMAN, se projeta em
cheio no campo do Direito Constitucional, como um dos direitos fundamentais do indivíduo.
JELLINEK, por isso, conceituava a ação como um direito subjetivo público, emanado do status
civitatis, exercido contra o Estado para exigir deste uma prestação jurisdicional. O conceito de

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ação como direito abstrato de agir, depois de ter ganho os domínios do processo civil, é também
hoje o entendimento vitorioso no processo penal, abraçando-o, dentre outros, os nomes insignes
de ERNEST V. BELLING, F. GRISPIGNI, G. LEONE e ALCALÁ-ZAMORA (Marques, 1997).

Mais que pertinente, novamente, a lição de TORNAGHI, inclusive com gráfico de sua autoria:

Conclusão. Do ligeiro escorço apresentado, vê-se logo que a


ação está longe de ser mero aspecto do direito ou mesmo outro
direito decorrente da lesão do primeiro. Os exemplos da ação
declaratória e da ação em que o autor sucumbe por
improcedência do pedido estão a mostrar que pode haver ação
sem que haja qualquer direito ferido ou ignorado. Em outras
palavras: evidenciam a autonomia do direito de ação, sua
3
existência independente, per se. E, por outro lado, a evolução
sofrida pelo conceito, mercê da organização judiciária do
Estado, demonstra que a ação é movida pelo autor contra o Estado, que ela é o direito subjetivo
público de exigir do Estado que faça justiça, e, pois, não é relação entre autor e réu (a antiga
ação direta), mas, exclusivamente, relação entre autor e Estado. [...] Ao contrário, sendo o direito
de ação pertinente ao particular, sendo direito pré-processual, existe pelo simples fato de o
Estado proibir a justiça privada e de se impor o dever de justiça pública. Neste sentido é que se
deve realmente entender o caráter abstrato do direito de ação [...]. De tudo quanto foi dito se
infere: a ação é o direito subjetivo público que tem qualquer pessoa de exigir do Estado a
prestação jurisdicional. Essa definição convém a todos os tipos de ação. No arcabouço da relação
processual, a ação ocupa somente um dos lados: aquele que liga autor e Estado (juiz), por um
direito do primeiro e um dever do segundo. Paralelo a esse direito, mas em sentido oposto, figura
o poder jurisdicional do Estado, a que o autor está sujeito (status subiectionis). Mas a relação é
angular. O outro lado do ângulo é também formado por dois vetores paralelos e em sentido
oposto: o direito de defesa do réu e o poder jurisdicional do Estado sobre ele.

d) Direito instrumental: na medida em que a ação serve de meio para se alcançar uma finalidade – a
aplicação do direto material ao caso concreto (jurisdição).

A ação, disse-o LIEBMAN, é um direito ao meio, e não um direito ao fim. Se a ação penal fosse um
direito concreto à condenação, não haveria o jus actionis, se absolvido o réu [...]. A ação penal é
o instrumento de aplicação do direito penal objetivo, no tocante a uma situação concreta
consubstanciada na pretensão punitiva. A ação penal não é consequência dessa pretensão, e sim
o instrumento ou meio para que os órgãos jurisdicionais profiram uma decisão sobre a acusação
formulada em juízo (Marques, 1997).

e) Direito conexo: no sentido de estar relacionado a uma pretensão de direito material.

No campo da Justiça criminal, esse nexo se estabelece entra a ação penal e a pretensão punitiva,
sem embargo de não depender o direito de agir do direito de punir. [...] é “um direito subjetivo
instrumentalmente conexo a uma situação concreta”. O direito de agir está coordenado a uma

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pretensão punitiva, que, em juízo, é deduzida por meio da acusação, a qual se torna, assim, o
objeto da ação penal (Marques, 1997).

BRASILEIRO fala em direito determinado e direito específico em relação a essa última característica1.

Aliás, referido autor, com propriedade, destaca que a concepção clássica de CARNELUTTI quanto à lide (conflito
de interesses qualificado por uma pretensão resistida) deve ser evitada no processo penal.

Em primeiro lugar, porque não haveria um conflito de interesses, já que o interesse na


preservação da liberdade individual também é um interesse público, uma vez que interessa ao
Estado, na mesma medida, a condenação do culpado e a tutela da liberdade do inocente. No
processo penal, o Estado pretende apenas a correta aplicação da lei penal. Ademais, mesmo que
o imputado esteja de acordo com a imposição da pena, com o que não haveria qualquer
resistência de sua parte ao pedido condenatório,
2 ainda assim a defesa técnica será indispensável
no processo penal, valendo lembrar ser inviável a aplicação de pena sem a existência de processo
em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa (nulla poena sine judicio) (Lima,
2021).

Doutrina Complementar

GUSTAVO BADARÓ (Processo penal, 8ª ed., São Paulo – RT, 2020): O direito de ação previsto na
Constituição (art. 5.º, XXXV) não assegura apenas o mero direito de ingresso em juízo. Na
verdade, assegura o direito à efetiva e adequada tutela jurisdicional. O direito de ação não
corresponde somente ao ato inicial de demandar (ingresso em juízo), compreendendo também
o exercício de direitos, poderes e faculdades ao longo de todo o desenvolvimento do processo
(direito de ação analítico), para se obter um provimento de mérito (direito de ação liebmaniano),
conferindo uma adequada tutela jurisdicional (direito à tutela jurisdicional). As teorias sobre o
direito de ação podem ser agrupadas em três grandes classes: as teorias imanentistas do direito
de ação, as teorias (autonomistas) concretas do direito de ação e as teorias (também
autonomistas) abstratas do direito de ação, com destaque, nestas, para a teoria de LIEBMAN. Para
as teorias imanentistas, não há autonomia do direito de ação em relação ao direito subjetivo
material reclamado em juízo. [...] A principal crítica a tais teorias é que os processos com
sentenças de improcedência (o autor não tem o direito alegado) seriam processos sem ação!
Também na tutela meramente declaratória negativa, em que o autor pede que seja declarada a
inexistência de uma relação jurídica (por exemplo, declarar a nulidade de um contrato), a
procedência significa a inexistência do direito material, o que significaria que no caso também
não havia o direito de ação. [...] Para as teorias autonomistas, o direito de ação (processual) não
se confunde com o direito subjetivo (material) debatido no processo. Todavia, trata-se de teorias
concretas do direito de ação, dado que este somente existe se, no caso posto em julgamento

1
Talvez não sejam as melhores definições para as características. Para não haver confusão, melhor a didática de JOSÉ FREDERICO
MARQUES.

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concretamente também existir o direito material. [...] O máximo grau de separação entre o
direito de ação (processual) e o direito material é atingido pelas teorias abstratas do direito de
ação. O direito de ação não se confunde com direito subjetivo (material) debatido no processo.
A ação é um direito abstrato, posto que existe abstração feita da própria existência do direito
material debatido. Desenvolvidas na Alemanha por DEGENKOLB e na Hungria por PLÓSZ, as teorias
abstratas defendem que o direito de ação independe da efetiva existência do direito material
invocado. Há direito de ação mesmo que o processo tenha terminado com uma sentença de
improcedência (contrária ao direito do autor), ou com uma sentença injusta (concede direito a
quem realmente não o tem), ou, ainda, com uma sentença que não julgue o mérito (sentença
terminativa). Outra característica de tais teorias é que o direito de ação é movido contra o Estado,
pois ele tem o poder-dever de exercer a jurisdição. [...] A teoria de LIEBMAN não deixa de ser uma
teoria abstrata do direito de ação, posto que há o direito de ação, mesmo quando o provimento
jurisdicional não é favorável ao autor. O direito de ação não é o direito a uma sentença favorável,
mas o direito ao julgamento do mérito. Para LIEBMAN, o direito de ação é um direito público
7
subjetivo, instrumentalmente conexo a uma pretensão material. O direito de ação é o direito a
uma sentença de mérito, favorável ou desfavorável ao autor. A “conexão com a pretensão
material” é representada pelas condições da ação: possibilidade jurídica do pedido, legitimidade
de partes e interesse de agir. O direito de ação é abstrato, mas se liga ao direito material. Os
críticos da teoria de Liebman afirmam que ela não deixa de ser uma teoria concreta do direito de
ação, na medida em que a existência da ação depende de que haja as condições da ação, e,
portanto, elementos do direito material debatido. Com isso, estaria sujeita a todas as críticas
anteriormente formuladas. Todavia, as críticas não se sustentam. A teoria de LIEBMAN não deixa
de ser uma teoria abstrata da ação, posto que a existência do direito de ação independe da
existência do direito material debatido em juízo. No caso de uma sentença de mérito de
improcedência, terá existido o direito de ação, embora não haja o direito material. Tal postura é
incompatível com as teorias concretas, não permitindo a inclusão da teoria liebmaniana entre as
concretistas. Por outro lado, a principal vantagem de tal teoria foi ter buscado um ponto de
equilíbrio entre as teorias concretas e abstratas da ação: o direito de ação não é só o direito de
ingresso em juízo, mas também não é um direito que existe somente no caso de uma sentença
de procedência. O direito de ação está presente em qualquer sentença de mérito, favorável ou
desfavorável”.

WARLEY BELO (As Condições da Ação Penal e o Julgamento de Mérito Abusivo, artigo:
www.editoramagister.com/doutrina): “Ação é o bater à porta do Poder Judiciário. É o direito de
invocar, de pedir a tutela jurisdicional. O Estado chamou para si a tarefa de administrar a Justiça
através do Poder Judiciário ficando impossibilitados, os particulares, de auto-executarem seus
direitos, salvo os casos em que a lei permita a autodefesa. Dessa forma, da violação da norma
penal nasce a pretensão punitiva do Estado (ius puniendi), que se opõe à pretensão de liberdade
(ius libertatis) do possível infrator. A pretensão punitiva, por sua vez, só pode ser atendida
mediante a sentença judicial, que só é alcançável validamente por intermédio do processo (nulla
poena sine judicio). O processo é sempre indispensável; é dogma do Estado Democrático de
Direito. E o direito de pedir o provimento jurisdicional é a própria ação. O Estado, portanto, por
intermédio do órgão do MP ou de particular (ação penal condenatória de iniciativa privada),
exerce a ação a fim de ativar a jurisdição penal. Dessa forma, a ação provoca a jurisdição que se
exercita por meio do processo, importante alicerce do Estado Democrático de Direito. [...] Ação
vem de actio, do verbo latino agere, significando, processualmente, ação judicial. Na linguagem

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forense, empregou-se agere, no sentido de pleitear. É, pois, o direito de provocar o Poder


Judiciário a uma decisão sobre relação de direito. Diz-se da ação penal quando visa a aplicação
da lei penal, assim entendida em sua inteireza de imposição de pena ao delinquente, prova do
delito, acusação do autor de infração penal, busca pela verdade do fato considerado delituoso.
Ação é faculdade ou dever (no caso das ações penais públicas) e meio próprio que tem toda
pessoa capaz, com interesse e legitimidade de exercitar em juízo um direito subjetivo de que é
titular. É meio legal de reivindicar ou defender em juízo um direito subjetivo pretendido,
ameaçado ou violado ou simples interesse. É o direito de invocar o Poder Judiciário. Diz-se que
ela é pública, mesmo a ação penal condenatória de iniciativa privada, pois o que se faz valer é o
direito de punir do Estado (ius puniendi) e não o direito de ação (ius accusationis). Caracteriza-se
por ser indivisível, pois abrange todos os que participaram do delito, e indisponível, visto que o
órgão do MP não pode desistir da ação iniciada e as partes não podem transacionar sobre o
objeto do processo ou fixar e delimitar o objeto de acordo com seus interesses pessoais, como
ocorre no processo civil. A ação é dirigida apenas contra o Estado (tanto na esfera civil como na
2
penal), embora, uma vez apreciada pelo juiz, vá ter efeitos na esfera jurídica de outra pessoa: o
réu ou o executado. Nega-se, portanto, que ela seja exercida contra o adversário isoladamente,
contra esse e o Estado ao mesmo tempo, ou contra a pessoa física do juiz. Modernamente, há
uma tendência a considerar como ação penal uma série de pedidos feitos em juízo penal e que
não têm caráter condenatório, como a prisão preventiva, a homologação de sentença
estrangeira, a fiança, o habeas corpus, a revisão criminal etc. Por isso, utilizamos sempre a
expressão ação penal condenatória, porque existem ações penais não condenatórias”.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018): “Acerca da teoria que
logrou êxito em conceber a natureza jurídica do direito de ação penal, expõe o autor: “Por último,
foram Degenkolb e Plòsz que identificaram a verdadeira natureza da ação como a de um direito
abstrato, ou seja, um direito que serve de instrumento para se exigir do Estado a prestação
jurisdicional, independentemente da existência ou não do direito material que irá se discutir em
juízo. A ação é um direito autônomo. Não está ligado a outro, não decorre de outro e pode
conceber-se como abstração de qualquer outro. Para eles, a ação é a razão de ser do processo,
pouco importando que o autor tenha ou não tenha razão. Assim, à luz da teoria abstrata, o direito
de ação pertence mesmo àqueles que não possuem o direito material que irá se discutir em juízo.
Pois o réu pode obter a improcedência do pedido, mas não pode impedir o ingresso em juízo do
autor. O direito de ação existe por si só”. Sobre o conceito desse direito, sustenta: “(...) podemos
definir o direito de ação como sendo um direito subjetivo de se invocar do Estado a prestação
jurisdicional, pois, havendo o Estado monopolizado a administração da Justiça, deve dar a cada
um o que lhe é devido”.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018): “A ação é, pois, um
direito subjetivo (posto que inerente a cada indivíduo), autônomo (pois não se confunde com o
direito subjetivo material, que irá se deduzir em juízo), abstrato (pois independe de o autor ter
ou não razão ao final do processo), instrumental (serve de meio para se alcançar um fim que é o
acertamento do caso penal, através do processo) e público (porque se dirige contra o Estado e
em face do réu)”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “As
características atinentes ao direito de ação levam ao reconhecimento de que este é: a)

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autônomo: não se confunde com o direito material. Tem força e brilho próprio. O direito de ação
é preexistente à pretensão punitiva do Estado, que surge com a ocorrência da infração penal. b)
abstrato: independe do resultado do processo. Mesmo que a demanda seja julgada
improcedente, o direito de ação terá sido exercido. c) subjetivo: o titular do direito é especificado
na própria legislação, sendo como regra o Ministério Público (art. 257, inc. I do CPP) e
excepcionalmente a própria vítima ou seu representante legal. d) público: a atividade provocada
é de natureza pública, sendo a ação exercida contra o próprio Estado. e) instrumental: é o meio
para se alcançar a efetividade do direito material”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “Como principais
características do direito de ação, é possível apontar tratar-se de: (1) um direito público, visto
que a prestação jurisdicional perseguida é atividade de natureza pública, exercida pelo Poder
Judiciário, que é órgão público; (2) um direito subjetivo, pois qualquer pessoa pode formular sua
pretensão em juízo e reclamar do Estado a correspondente prestação jurisdicional; (3) um direito
f
autônomo, pois o direito de movimentar a máquina jurisdicional do Estado não se confunde com
o direito material cuja tutela o autor da ação busca alcançar; (4) um direito abstrato, na exata
medida em que preexiste à prática da infração e não guarda vinculação com o resultado do
processo (procedente ou não a ação; acolhida ou não a pretensão exposta em juízo, o direito de
ação foi exercitado) (...)”. [...] O autor, ainda, complementa: “Verificado o fato ensejador do
ajuizamento da ação, é possível falar, ainda, tratar-se de (1) um direito determinado, porquanto
indissociável de um caso concreto, e por isso (2) específico, delimitado pelo mesmo fato”.

AURY LOPES JR. (Direito processual penal, 18ª ed., São Paulo: Saraiva, 2021): “[...] toda ação
processual tem caráter público, porque se estabelece entre o particular e o Estado, para
realização do direito penal que é público. [...] Tal lição (autonomia e abstração) é perfeita para o
processo civil, mas precisa ser redefinida no processo penal. Isso porque, no processo penal, não
se admite a plena abstração, pois, para a acusação ser exercida e admitida, dando início ao
processo, é imprescindível que fique demonstrado o fumus commissi delicti. No processo penal,
há que se buscar o entreconceito, entre o abstrato e o concreto, na esteira de MIRANDA
COUTINHO e LIEBMAN, no sentido de que a ação é autônoma e abstrata, mas conexa
instrumentalmente ao caso penal, na medida em que desde o início, para que a acusação seja
admitida, deve o acusador demonstrar a verossimilhança do alegado, isto é, a fumaça de
materialidade e autoria (fumus commissi delicti). Assim, entendemos que a ação processual
penal é um direito potestativo de acusar, público, autônomo e abstrato, mas conexo
instrumentalmente ao caso penal”.

CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL


Como já se viu, o direito de ação não é um instituto exclusivo do processo penal. Foi a doutrina do processo
civil que elaborou o conceito de condições da ação. Conceito que, em muitas situações, vai revelar
impropriedades e inconsistências na seara criminal (e isso não é culpa do intérprete). Por isso mesmo, é
comum divergência doutrinária na caracterização dessas condições nas mais variadas hipóteses legais e na
casuística. Numa mesma situação concreta, por exemplo, há quem diga que uma acusação deve ser rejeitada
por falta de uma específica condição da ação, enquanto outros a encaixam em outra ou, até mesmo, a

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entendem como hipótese de mérito que deve ser analisada como motivo de absolvição sumária (art. 397 do
CPP) ou em sentença.

Os códigos são diversos e os processos civil e penal têm premissas diferenciadas; não é de estranhar essas
impropriedades e inconsistências.

O estudo das condições da ação penal, não obstante isso, revela importância. O próprio Código de Processo
Penal sempre fez referência a elas: primeiro no inciso III do art. 43 (estabelecia a rejeição da denúncia quando
for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal);
agora, com o advento da Lei 11.718/2008, no artigo 395:

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal;

Não podemos, portanto, nos eximir de enfrentar o assunto condições da ação.

Pois bem. “Para os que seguem a teoria do direito concreto da ação (WEISSMAN e CHIOVENDA) elas seriam
condições de existência do direito de ação. Para os que se filiam à corrente do direito abstrato de agir 2, elas
são condições do exercício regular do direito de ação” (Tornaghi, 1977). No mesmo sentido e, mais
recentemente, PAULO RANGEL:

[...] adotando a teoria do direito abstrato, estas condições são para o regular exercício do direito
de agir e não para a sua existência, pois, independentemente de estarem presentes, o direito de
ação existe. Ele lhes é anterior. Assim, a colocação correta é de que as condições não são da ação
e, sim, para o seu regular exercício, pois, independentemente de existirem (as condições), o
autor tem o direito de ação. Portanto, se nos filiarmos, conforme o fizemos, à teoria do direito
abstrato, diremos que as condições são para o regular exercício do direito de agir. Porém, se nos
filiarmos à teoria do direito concreto, elas serão condições de existência deste direito.
Entendemos que elas são condições para o regular exercício do direito de agir (Rangel, 2018).

Para LIEBMAN, que tanto influiu na formação dos processualistas brasileiros, “a ação é direito abstrato e contra
o Estado, ligado pela causa petendi a uma situação objetiva e declarada pelo autor”.

O exercício desse direito depende da ocorrência das condições da ação. É direito cívico, genérico,
de ir a juízo. É direito meramente instrumental. Para LIEBMAN, não é o fato de o autor ter razão
que lhe dá o direito de agir; a razão do autor apenas torna a ação fundada (em minha opinião
nem isso acontece: o que torna a ação fundada é a circunstância de a lei conceder a ação. O fato
de o autor ter razão torna o pedido fundado, procedente; não a ação) (Tornaghi, 1987).

2
Nosso CPP parece seguir essa linha ao referir “condição para o exercício da ação penal” no art. 395, II.

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Na lição de FREDERICO MARQUES:

O direito de ação, embora autônomo e abstrato, está conexo, instrumentalmente, a uma


pretensão, pelo que se liga a uma situação jurídica concreta sobre a qual deve incidir a prestação
jurisdicional invocada. Por esse motivo, o jus actionis subordina-se a condições que se
relacionam com a pretensão a ser julgada. Chamam-se condições da ação os elementos e
requisitos necessários para que o juiz decida do mérito da pretensão, aplicando o direito
objetivo a uma situação contenciosa. As condições da ação nada tem a ver com as condições de
decisão favorável ao autor; e também não se confundem com os denominados pressupostos
processuais. Antes de decidir do mérito, para julgar procedente ou improcedente a pretensão, o
juiz examina se o processo está regular e se estão atendidos os pressupostos da relação
processual. Em seguida passa a examinar, se regular o processo, as condições do direito de ação.
A falta de pressupostos processuais torna inadmissível o julgamento do mérito, o mesmo
sucedendo com a ausência de condições da ação. No primeiro caso, nula está a relação
processual, e no segundo é o autor carecedor do direito de ação. Admissível que seja o
julgamento de mérito, por existentes as condições da ação, nem por isso a pretensão necessita
ser julgada procedente. Uma vez que deve proferir decisão de meritis, o juiz passará a examinar
da espécie, a fim de aplicar a norma jurídica cabível, para resolver da procedência ou
improcedência do pedido do autor. Uma coisa, portanto, é o julgamento das condições da ação
(actionen esse fundatam) e outra a decisão do pedido (actionem esse probatam) (Marques,
1997).

GUILHERME DE SOUZA NUCCI afirma que condições da ação:

[...] são os requisitos exigidos pela lei para que o órgão acusatório, por meio da ação penal,
obtenha do Poder Judiciário uma análise da imputação formulada na denúncia ou na queixa,
proferindo decisão de mérito, acolhendo ou rechaçando a pretensão punitiva estatal. [...] O
conteúdo da denúncia ou queixa [...] é uma imputação, ou seja, a atribuição a alguém da prática
de um crime ou contravenção. Para que o juiz possa colher provas e decidir acerca da imputação
– se correta ou incorreta, verdadeira ou falsa – torna-se indispensável que analise, previamente,
os requisitos para o ajuizamento da ação penal” (Nucci, 2018).

TORNAGHI diz que “importa não confundir essas ‘condições’, que são os requisitos para o exercício regular,
legítimo, do direito de ação, com os pressupostos processuais, que dizem respeito ao processo e não à ação.
E muito menos com os fundamentos do Direito Substantivo (razões) em que o autor baseia seu pedido”
(Tornaghi, 1987).

O direito de invocar o Poder Judiciário exige a presença de condições, requisitos para a existência
não abusiva e de efetivo exercício da ação penal. "É como a situação de quem embarcasse em
trem, sem bilhete de passagem. Depois de algum percurso, verifica-se que ele não tem direito
ao transporte, nem meios de adquiri-lo. É posto para fora da composição. Não consegue a
finalidade com que entrou no carro". [...] o primeiro processualista a formular a teoria das
condições da ação foi CHIOVENDA. Conceituava-as como condições necessárias para se obter um
pronunciamento favorável. Para CHIOVENDA, as condições da ação são questões de mérito
(concepção concreta). Tal posicionamento é, coloquemos assim, vencido atualmente pela

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concepção abstrata. Tal constatação é de suma importância para diferenciarmos as


consequências, limites e fundamentos da carência da ação. Somente quando presentes as
condições da ação é que se pode dizer que existe ação tecnicamente regular, surgindo para o juiz
a obrigação de julgar o pedido procedente ou não. As condições da ação no processo penal são
três: possibilidade jurídica da acusação, interesse de agir e legitimação para agir (As condições
da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

BRASILEIRO bem lembra que o Código de Processo Civil “consagrou expressamente a concepção eclética sobre
o direito de ação, segundo a qual o direito de ação é o direito ao julgamento do mérito da causa – é
irrelevante se favorável ou desfavorável –, que fica condicionado ao preenchimento de certas condições,
aferíveis à luz da relação jurídica material deduzida em juízo. São as chamadas condições da ação,
desenvolvidas na obra do processualista italiano ENRICO TULLIO LIEBMAM”.

Pela teoria eclética a existência do direito de ação não depende da existência do direito substantivo, mas sim
do preenchimento de certos requisitos formais chamados de condições da ação. “Segundo essa concepção,
as condições da ação não se confundem com o mérito, ainda que sejam aferidas à luz da relação jurídica de
direito material discutida no processo, sendo analisadas preliminarmente e, quando ausentes, geram uma
sentença terminativa de carência de ação” (Lima, 2021), nos termos do Código de Processo Civil:

Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: [...]

VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

Em isso ocorrendo, não haverá coisa julgada material, o que permite que a demanda seja renovada, nos
termos da lei processual civil:

Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha
de novo a ação.

§ 1º No caso de extinção em razão de litispendência e nos casos dos incisos I, IV, VI e VII do art.
485, a propositura da nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem
resolução do mérito.

Por outro lado, quando presentes as condições da ação haverá julgamento do mérito, oportunidade em que
o juiz poderá acolher ou rejeitar o pedido do autor. Dentro dessa teoria eclética, as condições da ação
refletem matéria de ordem pública, por isso não precluem. A qualquer momento do processo, e com
qualquer grau de cognição, “o juiz deve extinguir o processo sem resolução de mérito por carência de ação
se entender ausente uma das condições da ação” (Lima, 2021), nos termos do art. 485 do CPC:

§ 3º O juiz conhecerá de ofício da matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer
tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.

Mais recentemente surgiu no processo civil a teoria da asserção (in status assertionis), também denominada
de teoria della prospettazione, segundo a qual “a presença das condições da ação deve ser analisada pelo
juiz com base nos elementos fornecidos pelo próprio autor em sua petição inicial, que devem ser tomados

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por verdadeiros, sem nenhum desenvolvimento cognitivo”. Assim deve ser feito inclusive para diferenciar
condições da ação de questões de mérito. “As condições da ação exercem, pois, uma clara função de filtro
processual” (Lima, 2021).

Veja-se, mais uma vez, a pertinente lição de WARLEY BELO:

A aferição das condições da ação deve ser feita antes do recebimento. Após o recebimento, não
é possível declarar o autor carecedor de ação. Poderá ocorrer, no caso, nulidade (art. 564, II, III,
a, do CPP) ou se chegar ao mérito (art. 386 do CPP). Na decisão preliminar de recebimento,
contrariando CHIOVENDA, não é possível fazer paralelos ao exame do mérito. A chamada teoria da
asserção relaciona as condições da ação com a profundidade da cognição. No exame preliminar
(quando do recebimento) não há uma análise aprofundada, mas tão-somente superficial, de
modo que as condições da ação resultam da simples alegação do autor (ut si vera sint exposita).
Todas as condições da ação devem, assim, ser averiguadas. Mas como? Como saber se há
possibilidade jurídica da acusação? Como saber da legitimação ad causam ou do interesse de
agir? Simplesmente observando o que afirmou o autor. O juiz deverá aceitar, provisoriamente,
as afirmações do autor. A cognição sumária, portanto, não deve se confundir com o exame do
mérito. Esse sim, necessariamente de cognição aprofundada no processo de conhecimento. Se,
prima facie, se observa a inviabilidade da pretensão do autor, não se tratará de julgamento de
mérito, mas da falta, v.g., de uma das condições da ação, tratar-se-á de carência. Se presentes
essas condições, nesse juízo de prelibação, só então estará autorizado, o juiz, a decidir o mérito,
ou seja, se o pedido é procedente ou improcedente. E se o juiz tiver dúvidas sobre uma das
condições? Simplesmente deverá receber a peça vestibular (in dubio pro societate). É que
qualquer necessidade de cognição não-sumária indica a exigência de instrução, e isso se traduz
em análise do mérito. Se há exigência de averiguação mais aprofundada é caso de recebimento.
Daí podemos concluir que as condições da ação sempre serão analisadas em tese. Ou seja, se há
possibilidade jurídica em tese, legitimação para agir em tese, interesse de agir em tese. Deve-se
analisar, sempre, a probabilidade positiva de veracidade das alegações do autor. Certo é que a
ausência de qualquer uma das condições induz à carência de ação, mas se averiguado no
recebimento. Após, só se poderá tratar de declaração de nulidade absoluta ou exame de mérito
abusivo (ou não, caso adentre no mérito observando a ausência referente à condição). Após o
recebimento, não há possibilidade de se considerar o autor carecedor da ação. Na primeira
oportunidade concedida ao réu após o recebimento, qual seja a defesa prévia, a inépcia da ação
deverá ser alegada pelo réu, pois o seu silêncio acarreta preclusão, evidenciado sua capacidade
de se defender. Nesse caso, há a possibilidade de se considerar inepta a ação penal após o
recebimento, mas somente até a primeira fala do réu. Após a apresentação da defesa prévia, não
existirá consequência jurídica, salvo se demonstrada a nulidade absoluta. Já com a carência da
ação é diferente. Uma vez recebida a ação penal, não há mais como considerar a carência,
tecnicamente. Nem se o réu a alegar na defesa prévia. Após o recebimento, o instituto carência
é impossível de ocorrer. A carência, tecnicamente, só pode existir até o recebimento da ação
penal. É dizer que, presente a carência da ação, deve, o juiz, obrigatoriamente, não receber a
ação penal. Se a receber, todavia, não poderá no curso do processo ou em sentença apontar a
sua existência sob essa alcunha, senão apontar nulidade ou enfrentar o mérito. E por que no
recebimento é que o juiz deverá declarar o autor carente? É porque é esse o momento
procedimental para se averiguar as condições da ação. A falta das condições da ação não impede
- de maneira absoluta - o julgamento do mérito, pois, como já dissemos, poderá haver uma ação

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penal abusiva (ou seja, sem alguma condição da ação), e nesse caso poderá haver o julgamento
do mérito - também abusivo (porque a ação não possuía uma das condições da ação). Não é
verdade que existe a possibilidade legal de revisão dos processos findos de sentença "contrária
ao texto expresso da lei"? Decorrência desses pensamentos é que a carência da ação nunca será,
tecnicamente, fundamento para a sentença. BUZAID põe as condições da ação como questões
preliminares. São preliminares ao exame do mérito, porque são condições da admissibilidade do
provimento sobre a demanda, ou seja, como condições essenciais para o exercício não abusivo
da função jurisdicional em face do caso concreto. Haverá, sim, exercício da ação. Poderá haver
julgamento, e de mérito, mas poderá ser abusivo se as condições não estiverem presentes. Essas
condições referem-se ao exercício regular (não à existência) da ação penal. Não se confundem
com os pressupostos processuais, que dizem conta - aqui, sim - da existência do processo e da
validade da relação processual. Por isso mesmo, ausente uma das condições da ação, é possível
ao autor (outrora carecedor) renovar o pedido. Portanto, os julgamentos sobre os pressupostos
processuais, sobre as condições da ação e sobre o pedido (mérito) não se confundem. O juiz, ao
==13272f==

receber a ação penal, deve observar, na ordem, os pressupostos processuais, após as condições
da ação, e, ao final, o mérito. Faltando os pressupostos processuais ou as condições da ação
penal ou havendo julgamento de mérito abusivo, estar-se-á contrariando a lei processual e a
Carta Magna. Haverá abuso e ilegalidade do poder-dever jurisdicional nessa persecutio criminis
(As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça acolheram a teoria da asserção, como se pode
ver dos seguintes acórdãos:

[...] 4. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. A legitimidade para a causa, segundo a teoria da


asserção adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro para a verificação das condições da ação,
é aferida conforme as afirmações feitas pelo autor na inicial. No caso, depreende-se do acórdão
que a ré foi indicada pelo autor para figurar no polo passivo da ação, em razão de ser considerada
devedora do crédito pleiteado nestes autos, do que resulta sua legitimidade passiva ad causam.
(ARE 713211 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 11/06/2013)

[...] 1. Em conformidade com o entendimento desta Corte Superior, segundo a teoria da


asserção, as condições da ação, entre elas a legitimidade passiva, devem ser aferidas a partir das
afirmações deduzidas na petição inicial. [...] (AgInt no AREsp 1710782/SP, Rel. Ministro RAUL
ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 08/03/2021, DJe 26/03/2021)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CAUSA DE PEDIR. [...] TEORIA DA ASSERÇÃO.
RECURSO DESPROVIDO. [...] 2. As condições da ação, incluídos o interesse de agir e a
possibilidade jurídica do pedido, são aferidas à luz das afirmações deduzidas pelo autor da
demanda na petição inicial, com a aplicação da denominada "Teoria da Asserção". 3. No caso
concreto, os pedidos formulados na petição inicial não revelam, a partir das alegações autorais e
em um exame puramente abstrato, falta de interesse de agir ou impossibilidade jurídica. (REsp
1314946/SP, Rel. Min. ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 09/08/2016)

Essa ideia erigida pela teoria da asserção não é completamente nova. Vejamos o que TORNAGHI ensinava, com
exemplo do processo penal, sobre ‘o exame das condições da ação pelo juiz’:

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Ao apreciar as condições da ação, o juiz deve partir da suposição de que o alegado pelo autor é
verdadeiro (ut si vera sint exposita). A questão que elas suscitam nada tem que ver com o mérito.
Assim, por exemplo, equivocar-se-ia quem pensasse que só é parte legítima quem tem o direito
que quer ver protegido. Parte legítima é aquela a quem a lei concede o direito de ação
pressupondo a veracidade dos fatos alegados. Quem se considera e se afirma difamado é parte
legítima para mover ação penal por difamação. Se realmente, em concreto, a difamação existiu
é matéria de mérito, diversa da referente à condição para ser autor em ação penal. A condição
da ação se relaciona com a premissa maior do silogismo judicial (todo aquele que se reputa
difamado é parte legítima para mover a ação penal); o mérito concerne à premissa menor (Tício
foi realmente difamado). Continuando no exemplo da legitimidade de parte: o juiz, para dizer se
as partes são legítimas, deve raciocinar assim: na hipótese de serem verdadeiros os fatos
alegados pelas partes, é a elas que a lei concede legitimidade para, respectivamente, propor ou
contestar a ação? Para decidir sobre as condições da ação, portanto, o juiz toma como ponto de
partida questões de Direito: suposta a veracidade dos fatos arguidos pelo autor, é a esse que a
lei dá ação? Tem ele interesse processual? Há possibilidade jurídica? Para dizer se a norma
invocada vigora ou não, se é excluída por outra, se os fatos narrados estão nela configurados, o
juiz não precisa da prova dos fatos. Exatamente o oposto, como se verá adiante, acontece na
apreciação do mérito, para a qual é necessário em primeiro lugar resolver a questão de fato,
questão de prova, para depois decidir a de Direito, a da aplicação da lei ao fato provado.
(Tornaghi, 1987).

RENATO BRASILEIRO é assertivo ao trazer situações e exemplos:

Se o juiz constatar a ausência de uma condição da ação mediante uma cognição sumária, deverá
extinguir o processo sem resolução do mérito por carência de ação (art. 485, VI, do novo CPC);
se houver necessidade de uma cognição mais aprofundada para a análise da presença das
condições da ação, a carência de ação passa a ser analisada como mérito, gerando uma sentença
de rejeição do pedido do autor (art. 487, I, do novo CPC), com formação de coisa julgada formal
e material. Num exemplo tradicionalmente citado pela doutrina processual penal, supondo que,
ao final do processo, reconheça o juiz que a denúncia fora oferecida em face de acusado
inocente, entende-se que, ao invés de reconhecer sua ilegitimidade passiva ad causam,
extinguindo o processo sem a apreciação do mérito, incumbe ao magistrado proferir sentença
absolutória, com enfrentamento do mérito, hipótese em que a decisão fará coisa julgada formal
e material. Outro exemplo interessante diz respeito à ausência de justa causa, pelo menos para
aqueles que a consideram como espécie de condição da ação penal. Verificada sua ausência por
ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, incumbe ao magistrado rejeitá-la, nos
termos do art. 395, III, do CPP, hipótese em que a decisão fará apenas coisa julgada formal. Logo,
surgindo novos elementos probatórios, nova peça acusatória poderá ser oferecida, enquanto não
extinta a punibilidade. Todavia, iniciado o processo, não se pode admitir que o próprio juiz que
recebeu a denúncia determine sua extinção sem apreciação do mérito por ausência de justa
causa. Nesse caso, ao final do processo, cabe ao juiz proferir sentença de mérito, absolvendo o
acusado com fundamento no art. 386, incisos I, II, IV, V, VI, ou VII, hipótese em que a decisão
estará protegida pelo manto da coisa julgada formal e material. Em sede processual penal, a
presença dessas condições da ação deve ser analisada por ocasião do juízo de admissibilidade da
peça acusatória. A denúncia ou queixa deve ser rejeitada pelo magistrado quando faltar condição
para o exercício da ação penal (CPP, art. 395, II). Se, no entanto, isso não ocorrer por ocasião do

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juízo de admissibilidade da peça acusatória, é perfeitamente possível o reconhecimento de


nulidade absoluta do processo, em qualquer instância, com fundamento no art. 564, inciso II, do
CPP — o dispositivo refere-se apenas à ilegitimidade de parte, mas, por analogia, também pode
ser aplicado às demais condições da ação penal. Há quem entenda que também seria possível a
extinção do processo sem julgamento do mérito, aplicando-se, por analogia, o disposto no art.
485, VI, do NCPC. (Lima, 2018).

Pois bem. No processo penal as condições da ação são divididas:

• condições genéricas - aquelas que deverão estar presentes em toda e qualquer ação penal;
• condições específicas/de procedibilidade3 – pontuais em relação a determinadas infrações penais,
considerando a natureza do crime ou a pessoa do acusado.

Quanto às condições genéricas da ação penal, grande parte da doutrina entende que são
aplicáveis ao processo penal as mesmas condições da ação tradicionalmente trabalhadas pelo
processo civil – à luz da sistemática do novo Código de Processo Civil, legitimidade e interesse de
agir –, sendo que há controvérsias quanto à verdadeira natureza jurídica da justa causa. Outra
corrente (minoritária) entende que, diante da necessidade de se respeitar as categorias jurídicas
próprias do processo penal, as condições genéricas da ação penal devem ser buscadas dentro
do próprio processo penal: prática de fato aparentemente criminoso, punibilidade concreta,
legitimidade de parte e justa causa (Lima, 2021).

Repare-se que a controvérsia se estabelece diante de lacuna legal. Nosso Código de Processo Penal, embora
fale em condições para o exercício da ação penal, não explicita quais são elas. Isso, aliado ao fato de não
termos uma ‘teoria geral do processo’ construída e pensada para a área criminal, leva à indefinição
doutrinária no tema.

1 - CONDIÇÕES GENÉRICAS DA AÇÃO PENAL

1.1 - Pela teoria geral do processo

Neste momento, o conhecimento da teoria geral do processo nos facilita muito a compreensão. Por essa
corrente (não há uniformidade no pensamento doutrinário, como já pontuamos), aqui no processo penal
teríamos, essencialmente, as mesmas condições da ação que estudamos no processo civil: a) possibilidade
jurídica do pedido; b) interesse de agir; d) legitimação para agir.

a) Possibilidade jurídica do pedido - está presente “quando a pretensão do autor refere-se à providência
admissível pelo direito objetivo”. Nas palavras de Galeno Lacerda, “só será titular do direito subjetivo público

3
O nome condição de procedibilidade parece ter sido cunhado por aqueles autores os quais sustentam que ela não faz parte do
tipo, não é elemento do crime, mas é exigida para que se possa mover a ação penal (Tornaghi, 1987).

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de ação se, em tese, o direito objetivo material admitir o pedido” (Marques, 1997). “A ação só existe [...] se
a lei previr, em tese, a providência que o autor pede, na hipótese. [...] não se trata de saber se, na hipótese,
o autor tem realmente o direito, o que é matéria de mérito a ser decidida na sentença, mas de saber se os
fatos que enuncia em seu pedido são típicos, isto é, adequados à descrição legal de um direito” (Tornaghi,
1977).

Um exemplo servirá para ilustrar: existe possibilidade jurídica de pedir ao Judiciário a resposta
de uma consulta em tese? NÃO, em matéria penal, civil, comercial processual: O Judiciário, aí,
não é órgão de consulta. Não haveria, por exemplo, a possibilidade jurídica de ação para pedir
ao tribunal que dissesse se o crime de extorsão (Código Penal, art. 158) é formal ou material. Já
o mesmo não ocorre no âmbito da Justiça Eleitoral, à qual a lei dá poderes para responder a
indagações em abstrato (Tornaghi, 1987)

A admissão ou (de uma forma mais abrangente) a não proibição da pretensão, verificáveis de uma forma
sumária e pelos fatos e razões expostos em tese, é que caracterizam essa condição para o exercício da ação
penal.

Haverá possibilidade de acusação se a causa de pedir se fundar em fato previsto como delito e o
pedido for previsto e não defeso em lei. No processo civil, diz-se que a pretensão sobre dívida de
jogo, v.g., é expressamente vedada, dizendo-se impossível juridicamente o pedido. Mas, o
pedido, tecnicamente, é possível, qual seja, condenação a pagamento de quantia certa. Assim, a
impossibilidade jurídica reside, precisamente, na causa de pedir e não no pedido em si. Faltando
a previsão legislativa sobre o pedido - ou a causa de pedir -, no processo civil, não é causa de
impossibilidade jurídica do pedido, pois o juiz decidirá mesmo assim. No processo penal, a ordem
jurídica deve prever a providência pretendida pelo interessado. A possibilidade jurídica da
acusação é uma questão de tipicidade a ser observada no recebimento. Se há previsão, a causa
de pedir - e não o pedido - é juridicamente perfeita e, atendendo-se às outras condições, é
possível que se alcance a decisão de mérito. O pedido seria juridicamente impossível se
pretendesse a prisão perpétua ou a pena de morte, por exemplo, já que vedadas pelo
ordenamento (As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

Evidentemente, essa condição da ação acaba se relacionando bastante com o direito material e, na seara
criminal, ao crime em tese cometido. Tanto que a doutrina mais ortodoxa (JOSÉ FREDERICO MARQUES, por
exemplo) já dava como exemplo de impossibilidade jurídica do pedido a situação de que o fato narrado
evidentemente não constitui crime (art. 397, III, CPP).

Se, no plano processual civil, a possibilidade jurídica é configurada negativamente, no âmbito


processual penal, sua conceituação é positiva, como previsão expressa do pedido condenatório
no ordenamento jurídico. A fim de se evitar persecuções levianas, infundadas, dando ensejo a
processos penais temerários, deve se analisar se a imputação formulada na peça acusatória leva
a alguma providência prevista no direito objetivo. Em observância ao princípio da legalidade (CF,
art. 50, XXXIV, c/c art. 1º do CP), atendendo, ademais, à função de garantia dos tipos penais, para
que o pedido seja juridicamente possível no processo penal, é imprescindível a existência de
norma jurídica definindo a conduta imputada ao acusado como infração penal, estabelecendo a
respectiva sanção. Como se vê, essa condição da ação guarda relação com a possibilidade de o

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juiz pronunciar, em tese, a decisão pleiteada pelo autor, consoante o que dispõe a ordem jurídica
de forma abstrata. De modo a não se confundir a análise dessa condição da ação com a do mérito,
a apreciação da possibilidade jurídica do pedido deve ser feita sobre a causa de pedir (causa
petendi), considerada em tese, desvinculada de qualquer prova porventura existente. Analisa-se
o fato tal qual narrado na inicial, sem se discutir se é ou não verdadeiro, a fim de se concluir se o
ordenamento material lhe comina, em abstrato, uma sanção (Lima, 2021).

TORNAGHI procurava distinguir:

Problema interessante é o da falta de tipicidade. É mérito? É condição da ação? Cumpre


distinguir a ausência de tipicidade em tese e a falta de tipicidade na hipótese. Assim, por
exemplo: o fato de não pagar dívida é atípico, em tese. Uma denúncia por inadimplemento dessa
obrigação seria absurda e o juiz deveria rejeitá-la, pela impossibilidade jurídica de processar
alguém criminalmente por não haver solvido o débito. Pense-se, entretanto, no caso de alguém
ser denunciado por furto. O juiz aceita a denúncia. Em meio ao processo o réu prova que a coisa
era sua e não alheia e que portanto aquele fato concreto não é típico. Daí advém a absolvição
com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal. No primeiro caso a questão não
era de mérito. Assim, por exemplo, não é questão de mérito e sim de possibilidade jurídica, a de
saber se pode ser movida ação penal por falta de pagamento. No segundo, a questão é de mérito.
É possível a ação penal se um fato se apresenta, prima facie, como crime de furto. Mas impede
a condenação a circunstância de o furto não estar caracterizado. A rejeição da denúncia na
primeira hipótese não é julgamento antecipado da lide (Tornaghi, 1987).

Os típicos exemplos dessa categoria são a cobrança de dívida de jogo ou o pedido de dissolução de vínculo
conjugal em algum país que não consagra essa possibilidade. Exemplos cíveis justamente em razão de a
categoria ter sido elaborada na respectiva área. Difícil lembrar de exemplos na área criminal que não estejam
muito ligados à tipicidade e à própria existência do crime, matérias de mérito.

São exemplos de impossibilidade jurídica do pedido tradicionalmente citados pela doutrina


processual penal, que autorizam a rejeição da peça acusatória com fundamento no art. 395, II,
do CPP, ou, se recebida, ensejarão o trancamento do processo por meio de habeas corpus: a)
oferecimento de denúncia e/ou queixa com a imputação de conduta atípica; b) peça acusatória
oferecida a despeito da presença de um fato impeditivo do exercício da ação (v.g., ausência de
decisão final do procedimento administrativo de lançamento nos crimes materiais contra a
ordem tributária); c) peça acusatória oferecida sem o implemento de condição específica da ação
penal (v.g., ausência da representação do ofendido); d) denúncia oferecida em face de menor de
18 (dezoito) anos, a ele imputando a prática de crime e, por isso, requerendo a imposição de
pena privativa de liberdade, contrariando, assim, o quanto disposto na Constituição Federal, que
prevê que são penalmente inimputáveis os menores de 18 (dezoito) anos (CF, art. 228) (Lima,
2021).

BRASILEIRO bem destaca que é impossível distinguir ou separar completamente essa condição da ação do
mérito da causa, fato que acabou justificando a exclusão dela pelo novo Código de Processo Civil e, por
consequência, do processo penal que, doravante, deverá trabalhar só com o interesse de agir e com a
legitimidade.

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Vejamos o que diz o novo Código de Processo Civil:

Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade.

Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar: [...]

XI - ausência de legitimidade ou de interesse processual;

Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:

VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

Na visão do autor:

Diante da inadequada transposição da possibilidade jurídica do pedido como condição da ação


para o processo penal, reputamos absolutamente válido e oportuno o afastamento dessa
condição pelo novo diploma processual civil. Doravante, à semelhança do novo CPC, a
impossibilidade jurídica do pedido também deverá ser enfrentada no âmbito processual penal
como decisão de mérito, e não de inadmissibilidade. No âmbito processual cível ou penal, é
impossível extremar a possibilidade jurídico do pedido do mérito da causa, fato que, por si só,
acabou justificando a exclusão dessa condição do processo penal, que, doravante, terá como
condições da ação penal tão somente a legitimidade e o interesse de agir. (Lima, 2021)

Com muito acerto, ainda acrescenta:

A transposição da possibilidade jurídica do pedido como condição da ação penal ignora,


por completo, uma premissa básica do processo penal, segundo a qual o pedido é de todo
irrelevante numa ação penal condenatória, já que o acusado defende-se dos fatos que
lhe são imputados, pouco importando o pedido formulado pelo acusador.
Exemplificando, ainda que conste da peça acusatória o pedido de imposição de uma pena
vedada pelo ordenamento jurídico, a exemplo da pena de morte para crime comum (CF,
art. 5º, XLVII, "a"), tal vício não terá o condão de ensejar rejeição da peça acusatória. Noutro giro,
ainda que o pedido de imposição de determinada sanção não corresponda efetivamente àquela
prevista na cominação legal pertinente ao fato imputado ao agente, nada impede o recebimento
da denúncia ou queixa e o regular processamento do feito, haja vista a possibilidade de
emendatio libelli por ocasião da sentença (CPP, art. 383). Na mesma linha, se uma denúncia pela
prática de crime doloso contra a vida for oferecida perante o Juiz Sumariante com pedido de
condenação, que, como é sabido, tem autorização apenas para pronunciá-lo, já que o juiz natural
para eventual decreto (condenatório ou absolutório) é o Conselho de Sentença do Tribunal do
Júri, também não há falar em rejeição da denúncia em virtude de suposta impossibilidade jurídica
do pedido. Cuida-se de mera irregularidade, incapaz de produzir qualquer vício, porquanto o
acusado defende-se da imputação que recai sobre sua pessoa, e não do pedido constante da
denúncia. Para além disso, sob a ótica da teoria eclética, para que se possa falar em
impossibilidade jurídica do pedido como condição da ação, sua ausência deveria dar ensejo a uma
sentença terminativa de carência de ação (art. 485, VI, do novo CPC), é dizer, sem a formação de
coisa julgada material. No entanto, se a possibilidade jurídica a ser investigada no processo penal

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diz respeito à causa de pedir, ou seja, à imputação de um fato típico, ilícito e culpável, fica difícil
sustentar que a análise desta condição da ação não esteja relacionada ao mérito, produzindo,
pois, coisa julgada formal e material. Basta pensar no exemplo da rejeição da denúncia em
virtude da atipicidade (formal ou material) da conduta imputada ao acusado. Ora, se um simples
arquivamento o inquérito policial com base na atipicidade funciona como decisão de mérito, com
a formação de coisa julgada formal e material, como negar semelhantes efeitos à decisão
proferida no limiar do processo, reconhecendo, por exemplo, a atipicidade material da conduta
em virtude do princípio da insignificância? Do ponto de vista da profundidade da cognição,
mesmo em se tratando de um exame superficial, o reconhecimento da atipicidade no início do
processo pode ser considerado um verdadeiro julgamento do mérito, por não haver controvérsia
fática. Portanto, se, por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, reconhecer o juiz
ser possível a aplicação do princípio da insignificância, com o consequente reconhecimento da
atipicidade material da conduta, não se trata de sentença de carência de ação em face da
impossibilidade jurídica do pedido, mas sim de verdadeira decisão de mérito, à semelhança da
absolvição sumária prevista no art. 397, III, do CPP, logo, acobertada pela coisa julgada formal e
material. Em síntese, se a atipicidade, descriminante, exculpante (salvo inimputabilidade), ou
causa extintiva da punibilidade estiverem cabalmente demonstradas no momento do juízo de
admissibilidade da peça acusatória, e desde que haja um juízo de certeza acerca de sua presença,
pouco importando se, para tanto, foi necessária uma cognição superficial (prima facie) ou
macroscópica, deve o juiz absolver sumariamente o acusado desde logo com fundamento no art.
397 do CPP. Se o novo Código de Processo Civil autoriza o reconhecimento liminar da
improcedência do pedido quando for dispensável a instrução probatória e se revelarem
presentes uma das hipóteses listadas nos incisos do art. 332, não há justificativa razoável para
não se aplicar idêntico raciocínio ao processo penal, autorizando, por conseguinte, a prolação
de um decreto liminar de absolvição sumária por ocasião do juízo de admissibilidade da peça
acusatória, independentemente da citação do acusado e apresentação da resposta à acusação.
Em todos esses casos, o que menos importa é o momento procedimental em que houver o
reconhecimento de uma das hipóteses do art. 397 do CPP. Como há efetiva análise do mérito em
todas elas, a decisão fará coisa julgada formal e material, nos mesmos moldes do que ocorre, por
exemplo, com o arquivamento do inquérito policial com base na atipicidade da conduta
delituosa. (Lima, 2021)

Repare que o ensinamento do referido doutrinador responde à seguinte questão: pode o juiz, quando
recebe a denúncia, verificando que o fato narrado não é crime, absolver sumariamente o denunciado?
Entende ele que SIM e que essa decisão faz coisa julgada material4.

Existe corrente divergente, como verificamos nas palavras de WARLEY BELO:

4
Uma decisão que rejeita denúncia, portanto sem processo ainda, implicando em absolvição e coisa julgada material... Estranho,
não? Ora, se os tribunais superiores (como vimos em outra aula) já reconhecem coisa julgada até no arquivamento de inquérito
policial, aqui, então, nada de anormal.

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O recebimento da denúncia (ou queixa) importa em cognição sumária; ou seja, o juiz não deve
aprofundar no exame do mérito, pois seria verdadeiramente um julgamento antecipado.
Todavia, caso o fato narrado evidentemente não constitua crime, i.e., a prima facie já se nota a
atipicidade, desnecessário o processo, e a peça inaugural não deverá ser recebida e nem haverá
julgamento do mérito. É somente no julgamento meritocrático que se analisarão os fatos
provados. No juízo de prelibação, o juiz deverá renunciar a esse exame detido. Se há
impossibilidade jurídica da acusação constatada no recebimento, o juiz deverá declarar o autor
carecedor da ação (art. 395 do CPP, modificado pela Lei 11.719/2008). É impensável que, por
exemplo, um cidadão seja denunciado por fato atípico, e o juiz julgue o mérito em pleno juízo
de prelibação, e, o pior, já se sabendo que, na hipótese, não poderia ter sido pedida a aplicação
da sanção penal (já que se trata de conduta atípica). Se o juiz, num momento de dúvida, recebe
a ação penal, que pede a condenação por fato atípico, temos aí uma nulidade. Se, persistindo o
processo, alcançar a sentença tratar-se-á de decisão de mérito (art. 386, III, do CPP). Ao juiz
cumpre indeferir a inicial por carência, se averiguada no recebimento. Deve declarar extinto o
processo sem julgamento de mérito, por nulo que é, se averiguada, a impossibilidade, entre o
recebimento e a sentença. Há, todavia, julgamento de mérito se averiguada na sentença. Uma
coisa é o julgamento das condições da ação (actionem esse fundatam) e outra a decisão do
pedido (actionem esse probatam). Por todos esses motivos, a inicial que é recebida, sendo a
acusação impossível juridicamente, está a contrariar a legislação constitucional e
infraconstitucional. Haverá flagrante abuso do poder-dever de acusar. O caminho do réu poderá
ser dois: impetrar habeas corpus para trancar a ação penal por nulidade ou aguardar a decisão
de mérito e pleitear absolvição com base no art. 386, III, do CPP.

b) Interesse de agir – existirá quando o autor depender da tutela jurisdicional para a providência que
pretende. “Para que haja interesse de agir, é necessário que o autor formule uma pretensão adequada, ou
seja, um pedido idôneo a provocar a atuação jurisdicional” (Marques, 1997). “A doutrina francesa sustenta
que há interesse onde há proveito; a italiana é mais exigente e só vê interesse onde existe necessidade de
recorrer ao judiciário. É matéria de fato que deve ser examinada em cada caso” (Tornaghi, 1977). “A ideia de
interesse de agir ou de interesse processual está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional que se
pretende obter com a movimentação do aparato judiciário” e há quem a considere no binômio composto
pela necessidade e adequação (Lima, 2021). “É o interesse-necessidade de se recorrer ao Judiciário, que no
processo penal é presumida, tendo em vista a impossibilidade de aplicar pena sem processo (nulla poena
sine iudicio)” (As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

O interesse de agir decorre sempre da necessidade de ir a juízo para obter algo que, de outra
maneira, não se poderia alcançar. Para isso o Estado assume o dever de prestar a jurisdição.
Alguns autores contestam que o interesse tenha de ser legítimo. Parece-me que eles incidem na
confusão entre o interesse de agir e o interesse em litígio. Constitui matéria irrelevante para o
assunto saber se o interesse em litígio é legítimo. Mas é importante verificar se o autor é movido
pelo ilegítimo interesse de usar o Poder Judiciário como instrumento de vingança, de arbítrio, de
fantasia, de extravagância. Os tribunais não se fizeram para servir ao capricho ou à vindita de
quem quer que seja. Também não é legítimo o interesse meramente científico, teórico: a justiça
não foi estabelecida para resolver dúvidas em tese. Muito menos é legítimo o interesse de quem
é movido pelo delírio persecutório. (Tornaghi, 1977)

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O interesse de agir é configurado na relação entre a situação antijurídica denunciada e a tutela jurisdicional
requerida.

Disto resulta que somente há interesse quando se pede uma providência jurisdicional adequada
à situação concreta a ser decidida. É preciso que se examine em que termos é formulada a
exigência que se contém na pretensão para que se verifique da existência do interesse de agir.
Donde a seguinte lição de LIEBMAN: ‘A existência do interesse de agir é assim uma condição do
exame do mérito, o qual seria evidenciadamente inútil se a providência pretendida fosse por si
mesma inadequada a proteger o interesse lesado ou ameaçado, ou então quando se demonstra
que a lesão ou ameaça que é denunciada, na realidade não existe ou não se verificou ainda. É
claro que reconhecer a subsistência do interesse de agir não significa, ainda, que o autor tenha
razão quanto ao mérito; isto tão-só quer dizer que pode tê-la e que sua pretensão se apresenta
digna de ser julgada’. (Marques, 1997)

WARLEY Belo pontua:

É perda de tempo o exame de mérito em pedidos que podem ser satisfeitos por outros modos
que não uma ação judiciária ou que não revelam nenhum prejuízo ou resistência do réu na
satisfação do direito que se lhe exige. Assim é no processo civil. No campo penal, é impensável
aplicar pena sem o devido processo legal. Demandas que invocam leis em tese, questões
acadêmicas, dentre outros exemplos, são questões que revelam a falta de interesse processual
de agir. Antes de saber quem tem razão, o juiz tem de verificar se a demanda se justifica,
independentemente do direito que as partes alegam ter, e se o tipo de processo pretendido é o
adequado para a situação concreta. Exsurgem do conceito os requisitos da necessidade,
utilidade (uso das vias) e adequação (ao procedimento em contraditório), a fim de se atingir o
interesse de agir. Para a maioria doutrinária, porém, quando observada pelo juiz, por exemplo,
uma causa de extinção da punibilidade, haverá carência da ação por falta de interesse de agir, se
observada no recebimento nos termos do art. 43, II, do CPP. Tal se impõe até mesmo em
obediência ao princípio da economia processual, pelo qual o processo deve ter o máximo de
efetividade com o mínimo de procedimento e gasto financeiro. Assim, se já se sabe da
impossibilidade de se aplicar pena a alguém pelo processo ser desnecessário ou inútil (interesse-
utilidade), não deverá nem ao menos ser recebido, tal é o caso da prescrição retroativa. Desse
modo, as causas extintivas da punibilidade (perempção, litispendência, coisa julgada, prescrição,
decadência, dentre outras) se ligam ao interesse de agir. Há carência da ação, mas por falta de
interesse, e não por impossibilidade jurídica da acusação. A extinção da punibilidade faz a causa
de pedir inútil e sem necessidade.

BRASILEIRO destaca o seguinte:

Segundo parte significativa da doutrina, o interesse de agir deve ser analisado sob três aspectos
distintos: a) necessidade de obtenção da tutela jurisdicional pleiteada: estará presente sempre
que o autor não puder obter o bem da vida pretendido sem a devida intervenção do Poder
Judiciário. Esse raciocínio só é correto para as situações em que se pretende exercitar, pelo
processo, direitos a uma prestação, pois há a possibilidade de cumprimento espontâneo da
prestação. Portanto, quando não houver meios para a satisfação voluntária, há necessidade de

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jurisdição. E é exatamente isso o que ocorre com a pretensão punitiva. No âmbito processual
penal, essa necessidade é implícita na ação penal condenatória, já que, em virtude do princípio
do nulla poena sine judicio, nenhuma sanção penal poderá ser aplicada sem o devido processo
legal, ainda que o acusado não tenha interesse em oferecer qualquer resistência. A ação penal
é, por conseguinte, uma ação necessária. Logo, o exame da necessidade para a verificação do
interesse de agir é dispensável, pois está in re ipsa. No âmbito processual penal, em face do
princípio nulla poena sine judicio, ter-se-á uma pretensão insatisfeita, vez que, para solucionar a
demanda penal, é sempre necessário o processo, pois o Estado não pode aplicar a norma penal
de imediato, mesmo que haja concordância de quem cometeu o delito. Para que as regras
punitivas atuem concretamente, torna-se imprescindível o processo, pois a pena não pode ser
imposta diretamente ao autor do crime, sem prévia apuração de sua responsabilidade. Afinal, o
jus puniendi é de coação indireta em face da exigência de que a pena só seja imposta após regular
processo. A ressalva à possibilidade de aplicação de pena sem processo no âmbito processual
penal fica por conta da transação penal no âmbito dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº
9.099/95, art. 76). Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos, deverá o titular da ação
penal formular proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou de multa. Nesse
caso, ainda não há processo. O ato compositivo ocorre por ocasião da audiência preliminar, logo,
antes do oferecimento da denúncia; b) adequação entre o pedido e a proteção jurisdicional que
se pretende obter: por adequação entende-se o ajustamento da providência judicial requerida à
solução do conflito subjacente ao pedido. Se essa adequação é assaz importante no processo
civil, é interessante perceber que, em uma ação penal condenatória, tal condição não ostenta
grande relevância, já que não há espécies distintas de ações penais condenatórias. De fato,
sempre que o órgão ministerial ou o querelante pleiteiam a aplicação do direito de punir, o fazem
por meio de uma ação penal condenatória. Em se tratando de ações penais não condenatórias,
todavia, é mais fácil visualizar a importância do interesse-adequação. Basta pensar no exemplo
de persecução penal em andamento por conduta manifestamente atípica à qual seja cominada
apenas pena de multa. Em tal hipótese, o habeas corpus não será instrumento adequado para se
buscar o trancamento do processo, já que o referido remédio constitucional está ligado à
proteção da liberdade de locomoção (CF, art. 5º, LXVII). Logo, como o não pagamento de multa
não mais autoriza sua conversão em pena privativa de liberdade (CP, art. 51, com redação
determinada pela Lei nº 9.268/96), o instrumento adequado será o mandado de segurança. A
propósito, diz a súmula no 693 do STF que "não cabe habeas corpus contra decisão condenatória
a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária
seja a única cominada". Na mesma linha, se, durante o trâmite de um habeas corpus, o juiz ou
tribunal verificar que já cessou a violência ou coação ilegal, julgará prejudicado o pedido, nos
termos do art. 659 do CPP. Em tal hipótese, a extinção do processo sem a apreciação do mérito
se dará pelo desaparecimento superveniente do interesse de agir, porquanto teria deixado de
existir ameaça à liberdade de locomoção; c) utilidade: consiste na eficácia da atividade
jurisdicional para satisfazer o interesse do autor. Só haverá utilidade se houver possibilidade de
realização do jus puniendi com eventual aplicação da sanção penal adequada (Lima, 2021).

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A justa causa já foi relacionada com essa condição da ação pela doutrina ortodoxa (Marques, 1997). Hoje
essa correlação não á apropriada, compreendendo-se a justa causa como o ‘suporte probatório mínimo’ que
toda ação penal deve ter5.

A prescrição em perspectiva ou prescrição virtual, mais atualmente, está relacionada com essa condição da
ação (interesse de agir). Ela ocorre com a análise prospectiva da inutilidade do processo, considerando que,
numa determinada situação concreta, a eventual pena aplicada já estaria fulminada pela prescrição da
pretensão punitiva retroativa.

O exemplo e o detalhamento, no ponto, são trazidos por RENATO BRASILEIRO:

Imagine-se o seguinte exemplo: em data de 12 de maio de 2008, o Ministério Público tem vista
de autos de inquérito policial relativo a suposto crime de furto simples ocorrido em 25 de outubro
de 2005. À época do delito, o investigado era menor de 21 (vinte e um) anos, além de ser primário
e portador de bons antecedentes. Nesse caso concreto, ainda não houve prescrição da pretensão
punitiva abstrata. De fato, tal espécie de prescrição leva em consideração o máximo da pena
cominada ao delito — no exemplo, 4 (quatro) anos de reclusão; considerando que o lapso
prescricional seria de 8 (oito) anos, nos termos do art. 109, IV, do CP, contado pela metade — 4
(quatro) anos —, por se tratar de acusado menor de 21 (vinte e um) anos ao tempo do crime,
resta evidente que não transcorreu lapso temporal superior a 4 (quatro) anos entre a data do
crime — 25 de outubro de 2005 — e a data em que o Ministério Público teve vista dos autos (12
de maio de 2008). Porém, se ainda não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva abstrata, já
se pode visualizar, no caso concreto, a presença da prescrição em perspectiva. O delito de furto
simples tem pena de reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos; tendo em conta que o acusado é
primário, portador de bons antecedentes, mesmo antes de instaurado o processo penal, o
Promotor de Justiça já pode visualizar que, se acaso proferida sentença condenatória, a pena a
ser imposta ao acusado seria de 1 (um) ano. Pois bem, supondo-se que a pena imposta pelo juiz
fosse de 1 (um) ano, dar-se-ia a prescrição da pretensão punitiva retroativa em 04 (quatro anos),
prazo este que é contado pela metade, logo, em 02 (dois) anos, por se tratar de acusado menor
de 21 anos (CP, art. 115). Ora, entre a data do crime — 25 de outubro de 2005 —e a data em que
o Ministério Público teve vista dos autos — 12 de maio de 2008 —já transcorreu lapso temporal
superior a 02 (dois) anos. Portanto, o órgão ministerial já pode visualizar, antecipadamente, que
o processo está fadado à prescrição da pretensão punitiva retroativa, porquanto, mesmo que o
acusado seja condenado no futuro, haverá o reconhecimento da prescrição pretensão punitiva
retroativa. Em tal hipótese, o que deve fazer o Promotor de Justiça: oferecer denúncia ou
requerer o arquivamento do inquérito policial? Requerendo o arquivamento do inquérito, qual
deve ser o fundamento: extinção da punibilidade pelo advento da prescrição ou ausência de
interesse de agir? A nosso ver, com a quantidade avassaladora de processos criminais que lotam
os fóruns criminais, não faz sentido dar início a um processo penal fadado à prescrição. Em outras
palavras, qual seria a utilidade de um processo penal, com grande desperdício de atos

5
Falaremos da justa causa mais adiante.

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processuais, de tempo, de trabalho humano, etc., se, antecipadamente, já se pode antever que
não haverá resultado algum? Como já se pode visualizar que, fatalmente, a pena a ser aplicada
acarretaria a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva retroativa, e,
portanto, que a sentença penal condenatória seria ineficaz quanto aos seus efeitos penais e civis,
pensamos que não há qualquer utilidade em tal demanda. Não se trata de requerer o
arquivamento com base em causa extintiva da punibilidade, já que a prescrição em perspectiva
não tem amparo legal. Cuida-se sim, de requerer o arquivamento do inquérito policial com
fundamento na ausência de interesse de agir condição sine qua non para o regular exercício do
direito de ação. Afinal, qual a utilidade de se levar adiante um processo penal em que já se pode
visualizar, antecipadamente, a superveniência da prescrição? Se, porventura, o processo já
estiver em andamento, e a prescrição em perspectiva for visualizada, também não faz qualquer
sentido levar-se adiante o feito. Deve-se, pois, extinguir o processo sem a apreciação do mérito,
aplicando-se subsidiariamente o quanto disposto no art. 485, VI, do novo CPC, ou anular o
processo, com fundamento no art. 564, II, do CPP, aplicável por analogia já que ausente uma das
condições da ação — o interesse de agir. Apesar de o reconhecimento antecipado da prescrição
ser uma rotina no dia-a-dia de fóruns criminais, contando com o respaldo de respeitada parte da
doutrina processual penal, convém destacar que a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem
se posicionado contrariamente a ela, sob argumento de que referida espécie de prescrição não
tem amparo no ordenamento jurídico pátrio, além de contrariar o princípio da presunção de não
culpabilidade, já que parte do pressuposto de que o acusado será condenado ao final do
processo. Nessa esteira, em Questão de Ordem em Repercussão Geral em Recurso
Extraordinário, o Plenário do Supremo assim se manifestou quanto ao tema: “É inadmissível a
extinção da punibilidade em virtude de prescrição da pretensão punitiva com base em previsão
da pena que hipoteticamente seria aplicada, independentemente da existência ou sorte do
processo criminal”. Com entendimento semelhante ao do Supremo Tribunal Federal, vale a pena
prestar atenção ao enunciado da Súmula no 438 do STJ: "É inadmissível a extinção da
punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética,
independentemente da existência ou sorte do processo penal" Uma observação final deve ser
feita quanto à prescrição em perspectiva: com o advento da Lei nº 12.234/10, será cada vez
menos comum a sua aplicação. Explica-se: a Lei no 12.234/10 revogou o § 2º do art. 110 do
Código Penal, o qual previa que a prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em
julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regulava-se pela pena aplicada,
podendo ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou queixa. Além disso,
deu nova redação ao art. 110, § 1º, do CP, que passou a dispor: “A prescrição depois da sentença
condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso,
regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data
anterior à da denúncia ou queixa". Como se vê, apesar de o art. 1º da Lei no 12.234/10 dizer que
a mesma teve por objetivo excluir a prescrição retroativa, pôs-se fim apenas à prescrição da
pretensão punitiva retroativa entre a data do fato e a data do recebimento da peça acusatória.
Subsiste, todavia, a possibilidade de prescrição retroativa, levando-se em conta a pena aplicada,
porém apenas no tocante ao lapso temporal compreendido entre a data do recebimento da
denúncia ou queixa e a data da publicação de condenatória recorrível. Como, na grande maioria
dos casos, a prescrição antecipada levava e leva em consideração a virtual prescrição da
pretensão punitiva retroativa entre a data do fato delituoso e a data do recebimento da peça
acusatória, haja vista a lentidão na conclusão de inquéritos policiais, é evidente então que a Lei
nº 12.234/10 também produzirá reflexos no reconhecimento da prescrição em perspectiva, cuja

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incidência tende a ser cada vez mais incomum. De fato, em regra, ao receber os autos do
inquérito policial, levando em conta o lapso temporal entre a data do fato delituoso e a data de
eventual recebimento da peça acusatória, o Promotor de Justiça já se manifestava no sentido do
arquivamento dos autos com base na ausência de interesse de agir (prescrição em perspectiva).
Com o fim da possibilidade de se reconhecer a prescrição retroativa levando-se em conta termo
inicial ao do recebimento da denúncia ou queixa (CP, art. 110, § 1º, com redação dada pela Lei
nº 12.234/10), significa dizer que a referida lei também produzirá reflexos quanto ao
reconhecimento da prescrição antecipada. Porém, é bom que se advirta que, tratando-se de
novatio legis in pejus, já que extingue hipótese de prescrição da pretensão punitiva, é evidente
que a Lei nº 12.234/10 só se aplica aos crimes cometidos após a sua vigência (06 de maio de
2010). Portanto, aos crimes cometidos até o dia 5 de maio de 2010, ainda é possível o
reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva retroativa entre a data do fato delituoso e
a data do recebimento da peça acusatória, assim como eventual reconhecimento da prescrição
antecipada quanto a esse período. (Lima, 2021)

c) Legitimidade para agir – ou legitimatio ad causam “diz respeito à titularidade ativa e passiva da ação: é a
pertinência subjetiva da ação, como, com propriedade, ensina ALFREDO BUZAID”.

A ação somente pode ser proposta por aquele que é titular do interesse que se afirma prevalecer
na pretensão e contra aquele cujo direito de liberdade possa ser subordinado, no caso em foco,
ao interesse punitivo do Estado. Quando o autor não é titular da pretensão ajuizada, falta-lhe
legitimação para agir. É o que ocorreria se o Ministério Público propusesse a ação em crimes em
que esta é exclusivamente da iniciativa do ofendido. Falta legitimação passiva ad causam quando
sanção penal alguma pode ser imposta no delito que a acusação descreve, à pessoa a quem se
atribui a sua prática. É o que ocorre com os casos de imunidade parlamentar, e com os fatos
típicos praticados por menores de dezoito anos (Marques, 1997).

A legitimidade configura-se por uma “situação prevista em lei que permite a um determinado sujeito propor
a demanda judicial e a um determinado sujeito ocupar o polo passivo dessa mesma demanda” (Lima, 2021).

Há legitimidade de partes quando o autor afirma ser titular do direito subjetivo material
demandado (legitimidade ativa) e pede a tutela em face do titular da obrigação correspondente
àquele direito (legitimidade passiva). (Badaró, 2020)

Vejamos o que diz o Código de Processo Civil quanto a essa condição:

Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade.

No processo penal, os crimes de ação pública, que são a grande maioria, têm sua legitimidade resolvida pelo
disposto no art. 129 da Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

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Por outro lado, no que diz respeito às ações penais privadas, regra geral, o legitimado é a vítima ou seu
representante legal.

Daí a grande importância de se saber de determinado delito é de ação penal pública ou de ação
penal de iniciativa privada. Afinal, se o delito e de ação penal de iniciativa privada (v.g., em regra,
crime de calúnia), e o Ministério Público oferece denúncia em relação a ele, há de se reconhecer
a falta de legitimatio ad causam do órgão ministerial, com a consequente rejeição da peça
acusatória (CPP, art. 395, II). Caso o processo já esteja em andamento, a ilegitimidade ad causam
será causa de nulidade absoluta do processo, tal qual prevê o art. 564, II, do CPP. Por outro lado,
em se tratando de crime de ação penal pública (v.g., crime contra a honra praticado durante a
propaganda eleitoral, o qual é crime eleitoral e, portanto, de ação penal pública incondicionada),
não se pode admitir o oferecimento de queixa-crime pelo ofendido ou por seu representante
legal, salvo se caracterizada a inércia do órgão ministerial, hipótese em que a própria
Constituição Federal ressalva o cabimento da ação penal privada subsidiária da pública (art. 5º,
LIX). (Lima, 2021)

No polo passivo, a legitimidade se dá em relação ao provável autor do fato, observada a imputabilidade, nos
termos da Constituição Federal:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da
legislação especial.

Uma ação movida contra um adolescente, por exemplo, deveria ser rejeitada ou extinta por ilegitimidade de
parte. Outro exemplo se daria em caso de ação movida contra pessoa errada, que tenha o mesmo nome
(homônimo):

[...] AÇÃO PENAL - LEGITIMIDADE PASSIVA - IDENTIFICAÇÃO DATILOSCOPICA - IMPRESSÕES


DIGITAIS DISCREPANTES. Exsurgindo descompasso entre as impressões digitais constantes do
boletim de identificação criminal alusivo ao delito e as do acusado via denúncia, impõe-se a
conclusão sobre a ilegitimidade passiva, declarando-se nulo o processo a partir, inclusive, da
peça primeira, ou seja, da denúncia. (HC 72451, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Segunda
Turma, julgado em 27/02/1996, DJ 19-04-1996 PP-12213 EMENT VOL-01824-02 PP-00264)

BRASILEIRO, pontualmente, lembra sobre a questão que envolve a pessoa jurídica:

Quanto à legitimação da pessoa jurídica no processo penal, dúvidas não há quanto a sua
legitimação ativa. De fato, supondo-se que uma pessoa jurídica seja vítima de um crime de
difamação, o que é plenamente possível, já que referido ente é dotado de honra objetiva, sendo
possível a imputação de fato ofensivo a sua reputação, poderá figurar no polo ativo de queixa-
crime por ela proposta em face do suposto autor do delito. Em relação à legitimação passiva da
pessoa jurídica, tem-se admitido o oferecimento de denúncia em face da pessoa jurídica pela
prática de crimes ambientais, ainda que não haja a imputação simultânea à pessoa física que
atua em seu nome ou em seu benefício, já que os Tribunais Superiores abandonaram a aplicação
da teoria da dupla imputação. (Lima, 2021)

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Com efeito, a outrora adotada teoria da dupla imputação começou a ser superada a partir do julgamento
do RE 548.181/PR, pelo STF, em 06/08/2013:

EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE


PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À IDENTIFICAÇÃO E À
PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO ENCONTRA AMPARO NA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a
responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução
penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não
impõe a necessária dupla imputação. 2. As organizações corporativas complexas da atualidade
se caracterizam pela descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades, sendo
inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato ilícito a uma pessoa concreta. 3.
Condicionar a aplicação do art. 225, §3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a
pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do
constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de
evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização
dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico
ambiental. 4. A identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da
produção do fato ilícito tem relevância e deve ser buscada no caso concreto como forma de
esclarecer se esses indivíduos ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas
atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se deu no interesse ou em
benefício da entidade coletiva. Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado
delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa
jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras
oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal
modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual. 5. Recurso
Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte conhecida, provido. (RE 548181, Relator(a):
Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013)

A partir desse precedente, o STJ passou a adotar o mesmo entendimento, no sentido de que “é possível a
responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização
concomitante da pessoa física que agia em seu nome [...]. A personalidade fictícia atribuída à pessoa jurídica
não pode servir de artifício para a prática de condutas espúrias por parte das pessoas naturais responsáveis
pela sua condução” (RMS 39.173/BA, julgado em 06/08/2015).

[...] 2. Este Superior Tribunal, na linha do entendimento externado pelo Supremo Tribunal
Federal, passou a entender que, nos crimes societários, não é indispensável a aplicação da
teoria da dupla imputação ou imputação simultânea, podendo subsistir a ação penal proposta
contra a pessoa jurídica, mesmo se afastando a pessoa física do polo passivo da ação. [...] (AgRg
no RMS 48.851/PA, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 20/02/2018)

PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO. DESCRIÇÃO


PORMENORIZADA DA CONDUTA DOS GESTORES DA EMPRESA. PRESCINDIBILIDADE. ART. 54 DA
LEI N. 9.605/1998. CRIME FORMAL. POTENCIALIDADE EVIDENCIADA. LAUDO QUE ATESTA VÍCIOS
NA ESTRUTURA UTILIZADA PELA EMPRESA. RESPONSABILIDADE QUE NÃO SE AFASTA EM RAZÃO
DE CULPA OU DOLO DE TERCEIROS. [...] 2. Abandonada a teoria da dupla imputação necessária,

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eventual ausência de descrição pormenorizada da conduta dos gestores da empresa não


resulta no esvaziamento do elemento volitivo do tipo penal (culpa ou dolo) em relação à
pessoa jurídica. [...] (AgRg no RMS 48.085/PA, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA,
julgado em 05/11/2015, DJe 20/11/2015)

RENATO BRASILEIRO ainda relembra distinções importantes em relação a institutos que podem ser confundidos:

Legitimidade ad causam não se confunde com legitimatio ad processum, fenômeno relacionado


à capacidade de estar em juízo, tida como pressuposto processual de validade. Essa capacidade
processual refere-se à capacidade de exercer direitos e deveres processuais, ou seja, de praticar
validamente atos processuais. É o que ocorre com um ofendido menor de 18 (dezoito) anos, que
não tem capacidade processual para oferecer queixa-crime, razão pela qual sua incapacidade é
suprida por seu representante legal. Esse representante processual age em nome alheio na
defesa de interesse alheio, não sendo considerado parte no processo, mas mero sujeito que dá
à parte capacidade para que esteja em juízo. Capacidade processual, por sua vez, não se
confunde com capacidade postulatória, assim compreendida a aptidão para postular perante
órgãos do Poder Judiciário. Supondo, assim, o ofendido que não seja advogado inscrito nos
quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, o ajuizamento da queixa-crime deverá ser feito por
advogado com poderes especiais (CPP, art. 44). Como se vê, a incapacidade postulatória é suprida
por meio da representação voluntária necessária. Por fim, não se pode confundir o conceito de
legitimidade ad causam com o de capacidade de ser parte, pressuposto de existência de um
processo. A capacidade de ser parte deriva da personalidade, consistindo na capacidade de
adquirir direitos e contrair obrigações (CC, art. 1º). No âmbito processual penal, além de pessoas
físicas e jurídicas, é interessante perceber que alguns “entes” também são considerados como
pessoas formais. É o que ocorre, por exemplo, com as entidades e órgãos da administração
pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à
defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor, a quem o CDC
atribui legitimidade não só para figurar como assistente do Ministério Público, como também
para ajuizar queixa-crime subsidiária, se a denúncia não for oferecida no prazo legal (Lei nº
8.072/90, art. 82, III, c/c art. 80). (Lima, 2021)

Fala-se em legitimidade ordinária e extraordinária e essa classificação provém, essencialmente, do disposto,


hoje, no art. 18 do Código de Processo Civil:

Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo
ordenamento jurídico.

Regra geral, portanto, a parte só poderá pleitear em nome próprio direito que seja de sua titularidade ou
interesse que seja seu e a isso se dá o nome de legitimidade ordinária. É o que ocorre, por exemplo, quando
o Ministério Público intenta uma ação penal pública.

A exceção, que pode ocorrer, fica por conta de eventual autorização legal, conforme parte final do art. 18 do
Código de Processo Civil. Nesse sentido, havendo essa autorização do ordenamento jurídico, alguém pode
pleitear, em nome próprio, direito alheio – legitimidade extraordinária.

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“A doutrina costuma citar como exemplo a ação penal de iniciativa privada”. O Estado seria o titular do direito
de punir ou da pretensão punitiva e transferiria a legitimidade para a propositura da ação penal à vítima ou
ao seu representante legal; seria o ofendido agindo, em nome próprio, na defesa de um interesse alheio
(Lima, 2021).

No processo penal, há uma legitimação genérica do MP. Somente quando a lei expressamente
estabelece que a legitimação é do ofendido ou seu representante é que temos a legitimação
extraordinária. Sendo as ações penais classificadas de acordo com critério subjetivo
(diferentemente do processo civil, cujo critério é o objetivo), leva-se em consideração a
titularidade do direito de ação penal condenatória, que poderá ser de iniciativa pública ou de
iniciativa privada. Na primeira, o titular é o Estado; na segunda, o titular também é o Estado, mas
o exercício da ação é concedido ao ofendido ou ao seu representante (legitimação
extraordinária). Não pode o MP oferecer queixa em ação penal condenatória de iniciativa privada
(salvo exceções) e nem o particular denunciar, salvo no caso da ação penal de iniciativa privada
subsidiária da pública (art. 5º, LIX c/c art. 129, I, da CF/88) (As condições da ação penal e o
julgamento de mérito abusivo).

GUSTAVO BADARÓ tem um pensamento diferente em relação a isso:

A partir da transposição dos conceitos processuais civis para o campo penal, afirma-se que, no
caso de ação penal de iniciativa pública, o Ministério Público seria o legitimado ordinário; no caso
da ação penal privada, haveria uma hipótese de legitimação extraordinária, sendo o querelante
seu substituto processual, porque a legitimidade seria conferida a quem não é o titular do ius
puniendi. Discorda-se de tal posicionamento. No direito processual civil, a legitimação para a ação
é extraída da situação de direito material. Em regra, o titular do direito material terá legitimidade
para, em juízo, buscar tutela jurisdicional ao tal direito, lesado ou ameaçado. Em suma, o
conceito de legitimação ordinária decorre da análise da titularidade da relação material. A
pertinência subjetiva da ação é um reflexo da pertinência subjetiva do direito material. Tal
construção, contudo, não se adequa ao direito processual penal. O Ministério Público não é o
titular do direito de punir, que pertence ao Estado. Ao Ministério Público se confere, apenas,
a titularidade ou legitimidade para a propositura da ação penal. Tal poder, porém, decorre
simplesmente da lei, independentemente da titularidade do “direito material” debatido em
juízo, no caso, o “direito de punir”. Assim, somente no sentido de ser o titular da pretensão
processual posta em juízo é que se pode considerar o Ministério Público um “legitimado
ordinário”. Entretanto, nesse conceito, na ação penal de iniciativa privada, em que,
excepcionalmente, o poder de perseguir em juízo é conferido à vítima, ela também seria um
“legitimado ordinário”. E, diante de tal quadro, concluir-se-ia que, se ambos são legitimados
ordinários, não existiria situação de “legitimado extraordinário” ou substituto processual, pelo
que a distinção entre legitimação ordinária e extraordinária seria destituída de todo e qualquer
significado no processo penal (Badaró, 2020).

WARLEY BELO elucida sobre a legitimidade passiva, trazendo o seu posicionamento no que diz respeito à
análise de mérito e à formação da coisa julgada no processo penal:

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A legitimatio ad causam passiva refere-se ao acusado, ao réu, a quem se imputa o fato, que pode
até mesmo ser uma pessoa jurídica, conforme for o caso. Se a parte for ilegítima, diz o art. 395
do CPP (modificado pela Lei 11.719/2008), a denúncia ou queixa será rejeitada. Na prática, como
já dito, o juiz fará uma cognição sumária da legitimatio ad causam passiva, pois a grande questão
é saber se o imputado é ou não autor do fato delituoso. Se o indiciado não participou da infração,
não deve ser denunciado. Todavia, se a primeira dúvida persiste - "Será que o indiciado não
participou mesmo do crime?" -, ou seja, havendo maior probabilidade de que a peça acusatória
seja verídica, temos a legitimatio. Na doutrina e na jurisprudência temos exemplos de casos de
ilegitimatio passiva ad causam: a denúncia contra a testemunha ou contra o perito ou contra
suspeito que se identificou com cédula de identidade que não era sua (STF, HC 74.941-1/SP).
No caso, o juiz - consciencioso - deverá rejeitar a denúncia quanto a esses, pois numa cognição
sumária, percebe-se que eles não participaram do fato. E essa decisão de rejeição da denúncia
quanto à falta desta condição: é decisão de mérito? No processo civil, muitos entendem a decisão
da ilegitimidade ad causam como mérito. O juiz deverá, na decisão de prelibação do recebimento
e, evidente, antes de receber a peça introdutória, verificar a presença dos pressupostos
processuais e das condições da ação. Se o juiz verifica que o autor é carecedor da ação, não irá
receber a ação. Não deverá analisar o mérito, pois: a) o próprio ordenamento processual
determina a rejeição da denúncia quando "faltar pressuposto processual ou condição para o
exercício da ação penal" (art. 395, II, do CPP); e b) a teor do art. 564, II, do CPP, o processo será
passível de nulidade. Não se pode falar em lacuna no caso. Pode até parecer estranho, por
exemplo, que o órgão do MP denuncie equivocadamente o perito e que o juiz tenha que excluí-
lo antes do recebimento, mas a verdade é que o perito não poderá alcançar sentença de mérito
na oportunidade do recebimento, que não comporta cognição aprofundada. Teria de esperar, o
perito, até o final da sentença para alcançar o julgamento de mérito, tentar inovar no processo
penal, pedindo o julgamento antecipado da lide penal, ou impetrar HC, se o juiz,
equivocadamente, houvesse recebido a ação penal. Observe-se, novamente, a melhor
adequação abstrativista. Os defensores da teoria concreta certamente não concordarão com o
posicionamento. Todavia, é preciso lembrar que quando discordamos dos civilistas estamos com
olhos postos no processo penal. É claro que pela disposição do art. 267, VI, do CPC (1973) há a
consequência - lá - do julgamento do mérito. No processo penal, entretanto, não se pode dar
guarita à corrente que liga as condições da ação à situação de fato, que só pode ser afirmada e
comprovada no processo após a instrução e a avaliação das provas. O art. 395 do CPP desvincula
a legitimidade das partes do direito material. Por outra, antes do recebimento da denúncia ou
queixa não há processo e o juiz decide que, por falta da condição da ação, não poderá julgar o
mérito. Sentenças que julgam o mérito sobre o fundamento de que há carência da ação não
reflete técnica processual, pois o que existe é juízo de inadmissibilidade. A procedência ou não
do pedido só é possível se presentes todos os pressupostos processuais e condições da ação. A
carência, por sua vez, só existe, tecnicamente, até o recebimento. Claro que já nos
posicionamos pela teoria abstrata da ação e por isso seguimos esse entendimento. Na análise
das condições, tem-se cognição sumária, tanto que no art. 395 do CPP, diz-se que se rejeitará a
denúncia ou a queixa se ausente qualquer condição da ação. Já no mérito: cognição exauriente.
O problema é de intensidade, verticalidade, profundidade da cognição. Se ocorrer o
recebimento da denúncia nos casos de réu injustamente denunciado, só restará impetrar HC para
trancar a ação penal por nulidade (art. 564, II), segundo dispõe o CPP, ou aguardar sentença
onde, só aí, se alcançará o mérito. De qualquer maneira, é-nos evidente que o problema da
ilegitimatio ad causam passiva, como capaz de gerar a carência da ação, já estará superado para

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o juiz do processo de conhecimento, após o recebimento. Temos, pois, por impossível a


absolvição com julgamento do mérito (art. 386, IV, do CPP) no recebimento. Se falta um dos
pressupostos, inexiste processo. Não se impede a ação que pode ser proposta em outro
processo. Quando se fala em carência da ação, é porque falta uma das condições da ação. Se
averiguada no momento processual adequado (no recebimento), ocorrerá a carência; caso
contrário, poderá haver alegação e reconhecimento pelo juiz de nulidade ou a impetração de HC
para trancamento. De todas as maneiras, é certo que a falta de pressuposto ou condição
contraria o devido processo legal. Por isso mesmo, há abuso e ilegalidade do poder-dever de
acusar (As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

Devemos saber diferenciar a legitimação extraordinária (substituição processual) da sucessão processual:

Há sucessão processual quando um sujeito sucede outro no processo, assumindo a sua posição
processual. Há, portanto, uma troca de sujeitos no processo, uma mudança subjetiva da relação
jurídica processual. A propósito, consoante disposto no art. 31 do CPP, no caso de morte do
ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou
prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Por outro lado, na
legitimação extraordinária (substituição processual), não há troca de sujeitos. Na verdade, não
há qualquer alteração da relação processual, pois um sujeito tem o poder (legitimidade) de estar
legitimamente em um processo defendendo interesse de outrem (Lima, 2021).

Agora que se falou das três conhecidas condições da ação, aquelas que são aproveitadas da teoria geral do
processo, cumpre trazer a lição e o exemplo didático de TORNAGHI (em sua obra A Relação Processual Penal,
1987) para diferenciá-las, observando as fases da ação penal e consolidando o aprendizado:
• "quem se reputa ofendido na honra é parte legítima para mover a ação (CP, art. 145); tem
interesse processual em fazê-lo (não confundir com o interesse de fato), pois que sem o
propositur processo não há como obter a condenação do ofensor; e tem a possibilidade de fazê-lo,
a pois a punição do ofensor, que o ofendido pede na hipótese, está prevista na lei em tese;

• se o juiz atende à pretensão do ofendido condenando o ofensor no grau pretendido por


aquele, ele continua sendo parte legítima para responder a qualquer recurso interposto
sentença pelo segundo, mas desaparece o interesse de recorrer;

• se a lei considera irrecorrível (hipótese rara, sobretudo no processo penal dos países
civilizados) a sentença de primeiro grau, a parte que sucumbe, ainda que legítima e
recurso interessada na reforma da sentença, não tem possibilidade jurídica de consegui-la".

1.2 - Justa causa

Estudaremos aqui justa causa, mas é importante que inicialmente se diga que, para muitos, ela não é uma
condição da ação. Estamos, mais uma vez, diante de um instituto jurídico controvertido.

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O conceito da justa causa, assim como sua natureza jurídica, é tema polêmico na doutrina pátria,
mesmo quando se trata de averiguarmos no restrito estudo das condições da ação. Faria parte
do interesse de agir? Seria uma condição genérica da ação, um conjunto dessas condições ou
uma quarta e autônoma condição? Seria mérito ou um controle prévio da admissibilidade do
mérito? Etimologicamente, a palavra justa tem sua origem no latim, do adjetivo justus ou iustus.
Diz-se daquilo que é equitativo, daquilo que é legal. Já a palavra causa vem também do latim
causaae (ou com variações para caussa e kaussa) e é um vocábulo filosófico e científico obscuro.
No direito, esse vocábulo, possui inúmeros sentidos: motivo determinante, fim imediato, lide,
ação etc.

O Código de Processo Penal, embora tome a locução em várias oportunidades, acaba por não esclarecer
exatamente o seu sentido. Vejamos algumas passagens nas quais é referida como o ‘motivo fundado’ para
determinados atos ou abstenções:

Art. 277. O perito nomeado pela autoridade será obrigado a aceitar o encargo, sob pena de multa
de cem a quinhentos mil-réis, salvo escusa atendível.

Parágrafo único. Incorrerá na mesma multa o perito que, sem justa causa, provada
imediatamente:

Art. 278. No caso de não-comparecimento do perito, sem justa causa, a autoridade poderá
determinar a sua condução.

Art. 458. Se a testemunha, sem justa causa, deixar de comparecer, o juiz presidente, sem
prejuízo da ação penal pela desobediência, aplicar-lhe-á a multa prevista no § 2o do art. 436
deste Código.

Em outra passagem, o CPP faz referência à justa causa como tradutora da ilegalidade de uma coação para
efeito de viabilizar o hábeas corpus:

Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:

I - quando não houver justa causa;

Por fim, a justa causa como um dos motivos determinantes para a rejeição da acusação:

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Assim, como adverte WARLEY BELO, “há quem conceitue a justa causa como causa legal, motivo legal, segundo
os preceitos da lei, o motivo legítimo, o impedimento de evidente necessidade, o que está conforme a
Justiça, a razão, o motivo para processos ou proceder etc.”.

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O tema é muito bem explorado no artigo do referido autor, de maneira que merece transcrição com os
destaques apropriados:

Autores há, por outro lado, que identificam na justa causa uma quarta condição da ação penal.
É o caso de AFRÂNIO SILVA JARDIM, entendendo que às três condições clássicas da ação -
possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade ad causam - "acrescenta-se uma
quarta: a justa causa, ou seja, um suporte probatório mínimo em que se deve lastrear a acusação,
tendo em vista que a simples instauração do processo penal já atinge o chamado status dignitatis
do imputado. Tal lastro probatório nos é fornecido pelo inquérito policial ou pelas peças de
informação, que devem acompanhar a acusação penal (arts. 12, 39, § 5º, e 46, § 1º, do CPP).
Alguns autores identificam o conceito de justa causa com aquilo que é legal ou conforme ao
direito. Adotam, assim, um posicionamento mais amplo quanto ao conceito. É de se ver que tal
identificação não pode ser tida como equivocada. Explicita e individualiza a natureza do instituto
como um paladino, um fiscal, um equilíbrio entre os institutos processuais penais e a própria lei
penal e constitucional. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA conceitua o termo como "a causa
conforme o ordenamento jurídico, ou secundumius", ressaltando que é inviável definição
absoluta, mas possível um conceito-limite. Demonstrado, assim, o que temos apontado: o tema
é amplo, complexo e longe de ser pacificado. Todavia, como parece claro e inconteste, a acusação
não pode e não deve ser ilegal, abusiva, temerária ou leviana. Daí ter de vir lastreada em
elementos probatórios (fumus delicti).
Mas, isso, por si só, não erige, em absoluto, a justa causa a autônoma condição da ação. Tanto é
assim que, em uma análise mais criteriosa - e a crítica aqui é construtiva e científica, não
procurando desconsiderar os pensamentos destoantes -, o que se releva como quarta condição
da ação seria a soma da possibilidade jurídica da acusação e do interesse de agir. A justa causa
está em todas as condições da ação, e isso não a faz autônoma, senão mais vinculada. Por tudo
isso, ainda ficamos com JOSÉ BARCELOS DE SOUZA quando afirma que a justa causa não é e nem pode
ser erigida à quarta condição da ação. Faltando uma das condições para o exercício regular da
ação penal, falta a justa causa.
A justa causa expande-se em importância e realidade além das condições da ação a ponto de a
conceituarmos como um pré-requisito universal da persecutio criminis. É que o iuslibertatis é
valioso. Procedimentos fundados em devaneios ou em conjecturas abstratas, ilegalidades ou,
ainda, em insuficiência investigatória contrariam o ordenamento jurídico. A ação penal, v.g., só
pode e deve ser utilizada quando de sua real necessidade; caso contrário, afrontar-se-ia a CF e
de nada valeria consagrar princípios reitores que protegem a liberdade individual. A finalidade
da persecutio criminis deve ter uma justa causa provável, sempre, tanto no inquérito quanto no
processo, ou na medida cautelar ou execução. Portanto, a justa causa não se limita às condições
da ação.
A discussão se a justa causa estaria na possibilidade jurídica da acusação ou no interesse de agir
ou se seria condição autônoma já é ultrapassada. A jurisprudência, inclusive, já está em outras
discussões. Defende-se que a justa causa não se restringe mais ao interesse de agir ou à quarta
condição de ação. É pré-requisito universal da persecutio criminis. O primeiro direito do indivíduo
suspeito de crime é o direito de preservação de sua dignidade humana. Tanto a ação do Poder
Executivo quanto do Poder Judiciário é limitada pela lei, essa mesma lei que protege a dignidade
humana. Não se admite mais arbitrariedades - nem grandes, nem pequenas, nem sobre o manto
cego do tecnicismo jurídico de diferenciar processo de procedimento e nivelar a liberdade do
indivíduo por esse aspecto. Esse direito de preservação da dignidade humana protege

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substancialmente nós cidadãos contra investigações irregulares sobre nossas pessoas e


pertences.
O que estamos defendendo é que a linha que separa o que é considerado legal - à luz da
necessidade de investigar o crime em benefício da comunidade - do que é ilegal - à luz do direito
de preservação da dignidade humana - é demarcada pela justa causa. Sem a probabilidade de
que a causa seja justa, haverá espoliação do status dignitatis do acusado. É dizer que, sempre,
deve haver uma prisão necessária, um inquérito necessário, uma ação necessária, um processo
necessário, uma medida cautelar necessária, um libelo-crime necessário e uma execução
necessária, sendo certo que é a ação penal um grande filtro (a priori ou a posteriori) desses
eventos. Quando o Estado inicia a persecutio criminis, necessita, antes de mais nada, respeitar a
liberdade e a dignidade moral do acusado. Sob esse aspecto, uma série de transigências viáveis
foram sendo feitas através dos séculos, e hoje alcançam grandeza constitucional. Todavia, essas
garantias não impedem a atuação do poder-dever de punir. Não impedem, mas limitam e exigem
pré-requisitos.
Uma vez estabelecido que é provável que a causa seja justa, pelo conjunto de elementos
probatórios, as relações entre o acusado e o Estado alcançam o seu ponto crítico. É tão crítico
que não é possível um julgamento válido sem defesa em nosso sistema acusatório misto. A justa
causa está para a persecutio criminis assim como o processo penal está para o Estado
Democrático de Direito. Analogamente ao que disse GRISPIGNI quanto ao bem jurídico, dizemos
que a justa causa é a alma da persecutio criminis, o espírito de liberdade vivo no nosso Estado
Democrático de Direito. A justa causa está presente além das condições da ação. É o próprio
motivo para agir, seja em que quadrante do processo ou procedimento penal estejamos. É o
escudo contra qualquer tipo de abuso do poder-dever de acusar ou qualquer ilegalidade.

Como destacado pelo mesmo autor, o significado dessa expressão vai além das condições da ação e, nas
mais variadas situações do processo penal, é o fundamento maior para a prisão, para o inquérito policial,
para a medida cautelar e até mesmo para a execução penal. Quem já não ouviu falar de trancamento do
inquérito policial, por exemplo, por falta de justa causa?

Estamos diante de um tema próprio do processo penal, não há figura correlata no processo civil. Estamos à
frente de um ‘filtro’ de fundamento jurídico (ou de um escudo de proteção) que ganha corpo, dentro de uma
persecução penal concreta, por meio do conjunto probatório que lhe dá embasamento. E assim acontece no
processo penal justamente porque aqui o elemento probatório, fático, é o que legitima a atuação estatal.
Em outras palavras: se há um mínimo de provas, não é abusiva a atuação do Estado, seja na investigação seja
no processo; se não há esse suporte probatório mínimo (locução mais utilizada para definir o instituto), toda
e qualquer atuação do Estado é potencialmente arbitrária.

O fumus comissi delicti, a plausibilidade da imputação são institutos correlacionados com a justa causa.

WARLEY BELO assim expressa quanto à natureza jurídica – que entende bastante ampla – do instituto:

A natureza jurídica da justa causa, da mesma forma, estimula grande discussão, e pelos mesmos
motivos. Como se percebe, a expressão justa causa - ou falta de justa causa - é dotada de grande
amplitude. Seu conceito doutrinário flutua de acordo com a percepção de cada autor. As
variantes são muitas. Onde há acusação, em seu sentido mais lato, deve estar presente a justa

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causa como pré-requisito a uma acusação não abusiva. A cada prova produzida, a cada passo
procedimental, há de se justificar o porquê da constrição imposta à liberdade do acusado. Há a
necessidade de se prever um controle sobre a justa causa, pois abusos ou ilegalidades devem ser
evitados na imposição de qualquer tipo de restrição à liberdade do acusado, seja em sede de
inquérito policial ou de processo ou de execução.
A justa causa vem apresentada como uma ideia de garantia para a liberdade do cidadão e de
limitação da intervenção estatal. Não se trata de pontuarmos a legalidade estrita, pois essa já
existe nas letras da lei; trata-se de pontuarmos a eficácia legal, a existência prática e real de
proteção no mundo real, e não no mundo das ideias. A justa causa, como entendemos, é a
eficácia prática e amplificada do princípio da legalidade.
Quando dizemos que a justa causa se liga à legalidade e ao não-abuso do poder-dever de acusar,
temos um conceito tão amplo quanto os casos em que caibam HC. É um ponto de partida, mas
não definitivo, já que a enumeração do art. 648 do CPP não é exaustiva, e o conceito de justa
causa deve ser até mais amplo, pois se liga à própria concepção de dignidade do acusado. PONTES
DE MIRANDA, FREDERICO MARQUES e PIMENTA BUENO também dão ao tema a mais ampla extensão
conceitual. Se faltam, pois, pressuposto processual, condição da ação, se não há prova material
ou de autoria, se cabe HC, ou seja, se abarca o amplo e irrestrito conceito de ilegalidade ou abuso
de poder ou de direito - ou do poder-dever -, diz-se que há falta de justa causa para a prisão, ou
o inquérito, ou a ação etc. É nesse aspecto que, deveras, mais coadunam com o espírito da CF as
hipóteses ampliativas que surgem na jurisprudência e os cultuados juristas retro-mecionados (As
condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo).

BRASILEIRO bem resume as correntes que tratam da natureza jurídica da justa causa:

Não há consenso na doutrina acerca da natureza jurídica da justa causa. Vejamos as diversas
correntes acerca do assunto: a) justa causa como elemento integrante do interesse de agir:
doutrinadores como FREDERICO MARQUES, por exemplo, sustentam que a justa causa se identifica
com o fumus boni iuris, que caracteriza o legítimo interesse para a denúncia; b) justa causa como
condição da ação penal autônoma: ao lado das demais condições da ação (legitimidade e
interesse de agir) — lembre-se que a possibilidade jurídica do pedido perdeu esse status com a
vigência do novo CPC —, a justa causa funciona como verdadeira condição para o regular
exercício da ação penal condenatória. Nessa linha, como destaca AFRÂNIO SILVA JARDIM, “torna-se
necessário ao regular exercício da ação penal a demonstração, prima facie, de que a acusação
não é temerária ou leviana, por isso que lastreada em um mínimo de prova. Este suporte
probatório mínimo se relaciona com os indícios da autoria, existência material de uma conduta
típica e alguma prova de sua antijuridicidade e culpabilidade. Somente diante de todo este
conjunto probatório é que, a nosso ver, se coloca o princípio da obrigatoriedade da ação penal
pública”; c) justa causa como fenômeno distinto das condições da ação penal: como as
condições foram concebidas, inicialmente, com base nos três elementos da ação — partes
(legitimidade ad causam), pedido (possibilidade jurídica do pedido), e causa de pedir (interesse
de agir), revela-se inviável a transposição do conceito processual civilístico de condições da ação
para justificar a verdadeira natureza jurídica da justa causa. Esse entendimento ganhou força
com a reforma processual de 2008, já que, ao tratar das causas de rejeição da peça acusatória, o
art. 395 do CPP distingue as "condições da ação" da "justa causa", colocando-a em inciso diverso.
O inciso II do art. 395 do CPP aponta como causa de rejeição da peça acusatória a falta das
“condições para o exercício da ação penal". O inciso III do art. 395, por sua vez, dispõe que a

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denúncia ou queixa deve ser rejeitada quando faltar justa causa para o exercício da ação penal.
Colocada em inciso diverso, fica a impressão de que o CPP considera a justa causa fenômeno
distinto das condições da ação penal, que não se enquadraria nem no interesse de agir, nem
poderia ser considerada uma terceira condição da ação penal, ao lado da legitimidade e do
interesse de agir (Lima, 2021).

Independentemente da tese que adotemos, da ‘roupagem’ jurídica, uma coisa é certa: uma ação penal não
pode vingar sem que haja justa causa. É hipótese expressa de rejeição da acusação, nos exatos termos do
art. 395, III do Código de Processo Penal.

Note que, não obstante a relativa complexidade e divergência do tema, ele é objeto de cobrança nos
concursos públicos. Olha o que foi cobrado na prova dissertativa do Concurso de 2018 para a magistratura
paranaense:

Questão 7 - Diferencie as condições da ação penal sob a ótica da concepção eclética e


sob a teoria da asserção, considerando a justa causa como espécie de condição da ação,
discorrendo sobre os efeitos da absolvição sumária bem como da rejeição da peça
acusatória.

ESPELHO RESPOSTA - DIREITO PROCESSUAL PENAL

Concepção Eclética sobre o direito de ação: o Código de Processo Civil consagrou expressamente a
concepção eclética sobre o direito de ação, entendida como o direito ao julgamento do mérito da
causa, sendo irrelevante se favorável ou desfavorável, condicionando ao preenchimento de certas
condições aferíveis à luz da relação jurídica material deduzida em juízo, às quais ENRICO TULLIO LIEBMAN
chamou de condição da ação. Segundo esta teoria, o direito de ação não depende da existência do
direito material, mas do preenchimento de certos requisitos formais chamados de condições da ação,
que não se confundem com o mérito. Quando ausentes, geram uma sentença terminativa de carência
da ação (art. 485, VI, do novo CPC), sem a formação de coisa julgada material, o que em tese permite
que nova demanda seja renovada, em havendo correção do vício que deu ensejo à sentença sem
resolução do mérito (CPC, 486, § 1º). Tratando-se de matéria de ordem pública, não há preclusão,
concluindo os defensores desta teoria, que a qualquer momento do processo e com qualquer grau de
cognição o juiz deve extinguir o processo sem resolução de mérito por carência da ação, se entender
ausente uma das condições da ação.

Teoria da Asserção ou teoria da prospettazione: mais recentemente surge esta teoria, defendida por
ALEXANDRE FREITAS CÂMARA, segundo a qual a presença das condições da ação deve ser analisada pelo juiz
com base nos elementos fornecidos pelo próprio autor em sua inicial, os quais devem ser tomados
como verdadeiros, sem nenhum desenvolvimento cognitivo, ou seja, o exame deverá ser feito in statu
assertionis. Se o juiz constatar a ausência de uma condição da ação mediante cognição sumária, deve
extinguir o processo sem resolução do mérito por carência de ação (art. 485, VI do NCPC), quando
houver necessidade de cognição mais aprofundada para análise da presença das condições da ação, a
carência de ação passa a ser analisada como mérito, gerando uma sentença de rejeição do pedido do
autor com formação de coisa julgada formal e material.

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Justa causa para a ação penal: o artigo 395 do Código de Processo Penal prevê expressamente que a
denúncia ou queixa será rejeitada quando: “faltar justa causa para o exercício da ação penal” (inciso
III). Exige-se da acusação lastro probatório mínimo de existência material de um fato penalmente
punível e indícios suficientes de autoria para invocar a tutela jurisdicional, normalmente colhidos no
inquérito policial ou de outras peças de informação. Sob a ótica da concepção eclética, evidenciada
ausência de justa causa para ação penal, deverá o juiz rejeitá-la, fazendo a decisão apenas coisa julgada
formal. Iniciada a ação penal, por se tratar de matéria de ordem pública, não haverá preclusão e a
decisão não fará coisa julgada material. No âmbito do processo penal, sob a perspectiva da teoria da
asserção, ainda que se analise as condições da ação, com base no que foi narrado na denúncia ou
queixa, deverá o juiz aferir se há justa causa, apreciada em cognição superficial, evitando-se denúncia
ou queixa infundadas. Para os que consideram a justa causa como espécie de condição da ação penal,
verificando a sua ausência por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, deve o
magistrado rejeitá-la, nos termos do art. 395, III do Código de Processo Penal, fazendo a decisão apenas
coisa julgada formal. A ausência de justa causa após apresentação da resposta do acusado, mediante
cognição profunda, implicará na absolvição sumária com base no artigo 397, inciso III, do Código de
Processo Penal, com julgamento de mérito, fazendo coisa julgada formal e material.

A doutrina ainda faz alusão à justa causa duplicada. O termo teria origem no crime de lavagem, conforme
Lei 9.613/1998:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou


propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.

Aqui haveria a necessidade de lastro probatório tanto para a ocultação ou dissimulação dos capitais como
para a proveniência deles do crime. Mais especificamente, olha o que diz a Lei no art. 2º:

§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal


antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de
pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.

Exige a lei, portanto, “lastro probatório mínimo quanto à lavagem e quanto à infração precedente” (Lima,
2018). A doutrina chama isso de justa causa duplicada.

1.3 - Como categorias próprias do processo penal

Até agora vimos as condições genéricas da ação, considerando a teoria geral do processo civil. Todavia, parte
da doutrina compreende que o processo penal tem categorias próprias, diferentes daquelas que já
estudamos. Isso se deve às diferenças essenciais entre esses ramos do Direito, conforme já pontuamos.
Repare que a controvérsia, portanto, parte da essência, da concepção.

O ponto de partida, para aqueles que referem a condições da ação exclusivas do processo penal, também
aproveitando o art. 395, é o revogado art. 43 do Código de Processo Penal, que dizia:

Art. 43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

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I – o fato narrado evidentemente não constituir crime;

II – já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;

III – for manifesta a ilegitimidade de parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da
ação penal.

Assim, as condições da ação seriam: prática de fato aparentemente criminoso, punibilidade concreta,
legitimidade de parte e justa causa. Já falamos sobre as duas últimas, de maneira que agora vamos explicar
somente as duas primeiras.

a) prática de fato aparentemente criminoso: essa condição é especificamente trazida, a contrario sensu, do
antigo e revogado inciso I do art. 43 (que falava da rejeição da denúncia), disposição reproduzida
praticamente igual, hoje, no inciso III do art. 397 do CPP (que trata da absolvição sumária).

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...]

III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; [...]

É a “criminalidade aparente”, como diz BRASILEIRO:

Só se pode admitir o oferecimento de peça acusatória se a conduta delituosa atribuída ao


acusado for, em tese, típica, ilícita e culpável. Se da própria peça acusatória já se pode constatar
a ausência de um dos elementos do conceito analítico de crime – tipicidade, ilicitude e
culpabilidade –, independentemente de qualquer dilação probatória, não se pode admitir a
instauração de um processo penal contra alguém (Lima, 2018).

Mas se a hipótese é motivo de rejeição da acusação por falta de condição da ação (pelo artigo 395, II, CPP) e
também de absolvição sumária, nos termos do inciso III do art. 397 do CPP, como deve ser analisada? Em
outras palavras: verificando a excludente, de forma manifesta (em caso de dúvida deve se resolver pela
continuidade da ação), o juiz deve rejeitar a denúncia ou absolver sumariamente o réu?

A resposta vem nas palavras de AURY LOPES JR.:

Em suma, a questão deve ser analisada da seguinte forma: a) se a causa de exclusão da ilicitude
ou culpabilidade estiver demonstrada no momento em que é oferecida a denúncia ou queixa,
poderá o juiz rejeitá-la, com base no art. 395, II (falta uma condição da ação penal, qual seja, a
prática de um fato aparentemente criminoso); b) se o convencimento do juiz (sobre a existência
da causa e exclusão da ilicitude ou da culpabilidade) somente for atingido após a resposta do
acusado, já tendo sido a denúncia ou queixa recebida portanto, a decisão será de absolvição
sumária (art. 397) (Júnior, 2021).

b) Punibilidade concreta: essa apontada condição da ação (observada a corrente doutrinária que estamos
estudando) também estava no revogado artigo 43, II (antes transcrito), hoje substituído pelo art. 395 do CPP
(que trata da rejeição da denúncia). Assim, para que uma ação penal seja viável, a infração penal nela tratada

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tem de ser passível de punição (esse poder-dever do Estado deve estar presente); ou, em outras palavras,
não pode ter se operado uma causa de extinção da punibilidade.

Na esteira do art. 395, II do CPP, parte final, quando o juiz constatar a presença manifesta de alguma causa
de extinção da punibilidade, deverá ‘rejeitar’ a denúncia ou a queixa.

Ocorre, mais uma vez, que essa hipótese (de extinção da punibilidade), além de traduzir (por esta
compreensão doutrinária) uma condição da ação, também está prevista como motivo para absolvição
sumária:

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...]

IV - extinta a punibilidade do agente.

E aí, novamente a mesma indagação: o juiz deve rejeitar a acusação ou absolver sumariamente caso verifique
essa hipótese?

Deve o juiz (das garantias) rejeitar a denúncia ou queixa quando houver prova da extinção da
punibilidade. A decisão de absolvição sumária fica reservada aos casos em que essa prova
somente é produzida após o recebimento da denúncia (ou seja, após a resposta escrita do
acusado). Quando presente a causa de extinção da punibilidade, como a prescrição, decadência
e renúncia (nos casos de ação penal de iniciativa privada ou pública condicionada à
representação), a denúncia ou queixa deverá ser rejeitada ou o réu absolvido sumariamente,
conforme o momento em que seja reconhecida (Júnior, 2021).

RENATO BRASILEIRO traz um exemplo e manifesta sua opinião no sentido de que em ambas as situações haveria
formação de coisa julgada material.

Em outras palavras, se o magistrado formou sua convicção acerca da presença de uma causa
extintiva da punibilidade por ocasião do oferecimento da peça acusatória, verificando o juiz, por
exemplo, que o ofendido teria decaído do direito de queixa, já que a ofereceu nove meses após
saber quem seria o autor do crime, deve rejeitar a exordial acusatória, com fundamento no art.
395, inciso II, do CPP, hipótese em que referida decisão fará coisa julgada formal e material. Se,
no entanto, se convencer da presença de causa extintiva da punibilidade somente após o
recebimento da peça acusatória, a citação do acusado e a apresentação de sua resposta à
acusação, o caminho natural será a absolvição sumária, com base no art. 397, inciso IV, do CPP,
que também fará coisa julgada formal e material. (Lima, 2018).

2 - CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DA AÇÃO PENAL


Bom, até agora vimos, por uma e outra corrente doutrinária, as condições genéricas da ação penal;
passaremos a analisar as específicas. Em determinadas situações, a lei erige requisitos pontuais (que não
aplicam a todos os casos) que acabam por condicionar o exercício da respectiva ação penal – são as condições

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de procedibilidade. “Na verdade, se refletirmos bem, as condições específicas da ação penal não passam de
uma particular possibilidade jurídica do pedido” (Pacelli, 2018).

No processo penal, em determinadas situações, a lei exige o preenchimento de determinadas e


específicas condições para o exercício da ação penal. [...] A doutrina, de modo geral, considera
as condições de procedibilidade condições específicas da ação penal (porque somente exigíveis
para determinadas ações), enquanto as demais, comuns a qualquer ação (interesse, legitimidade
e possibilidade jurídica), seriam as condições genéricas da ação penal. Acompanhando a doutrina
de AFRÂNIO SILVA JARDIM (1999, p. 98), parece-nos que as chamadas condições de procedibilidade
da ação podem ser perfeitamente conduzidas à categoria da possibilidade jurídica do pedido,
e aí efetivamente como condições da ação. No ponto, vale a pena transcrever lição de HUMBERTO
THEODORO JÚNIOR, para quem “[...] o cotejo do pedido com o direito material só pode levar a uma
solução de mérito, ou seja, à sua improcedência, caso conflite com o ordenamento jurídico, ainda
que a pretensão, prima facie, se revele temerária ou absurda [...] impõe-se restringir a
possibilidade jurídica do pedido a seu aspecto processual, pois só assim estaremos diante de uma
verdadeira condição da ação, como requisito prévio de admissibilidade do exame da questão de
mérito. [...] Com efeito, o pedido que o autor formula ao propor a ação é dúplice: 1º, o pedido
imediato, contra o Estado, que se refere à tutela jurisdicional; e 2º, o pedido mediato, contra o
réu, que se refere à providência de direito material. A possibilidade jurídica, então, deve ser
localizada no pedido imediato, isto é, na permissão, ou não, do direito positivo a que se instaure
a relação processual em torno da pretensão do autor [...]” (Pacelli, 2018).

O raciocínio em relação ao reconhecimento da sua inexistência é o mesmo para as condições genéricas: dará
ensejo à rejeição da denúncia (art. 395, II); se reconhecida posteriormente, pode resultar em nulidade, nos
termos do art. 564, II do CPP (aplicado em analogia); e, ainda, extinção do processo, sem julgamento do
mérito, nos termos do art. 485, VI do Código de Processo Civil (por aplicação analógica).

Exemplos comuns que a doutrina traz: representação da vítima (nos crimes em que é exigida); requisição do
Ministro da Justiça (nos crimes em que é exigida); provas novas em relação à retomada de inquéritos já
arquivados, nos termos da Súmula 524 do STF6, e também em relação à impronúncia, conforme parágrafo
único do art. 414 do CPP.

Temos mais exemplos. Laudo pericial nos crimes contra a propriedade imaterial:

Art. 525. No caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa ou a denúncia não será recebida
se não for instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito.

Autorização da Câmara dos Deputados, nos termos da Constituição Federal:

6
Súmula 524: arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal
ser iniciada, sem novas provas.

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Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:

I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e
o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado;

Trânsito em julgado da sentença anulatória de casamento, para o crime de induzimento a erro essencial e
ocultação do impedimento, conforme previsto no Código Penal:

Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe
impedimento que não seja casamento anterior:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser
intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou
impedimento, anule o casamento.

Repare que toda vez que, de uma forma ou de outra, a Constituição ou as leis trouxerem condicionantes
para o exercício da ação penal, para o recebimento da acusação ou para a instauração do processo (de um
modo geral), poderemos estar diante de uma condição específica da ação penal – condição de
procedibilidade.

BRASILEIRO distingue de condição de prosseguibilidade:

Condição da ação (ou de procedibilidade) é uma condição que deve estar presente para
que o processo penal possa ter início. A título de exemplo, verificando-se a prática de
crime de lesão corporal leve ocorrido em data de 20 de janeiro de 2010, temos que a
representação é uma condição de procedibilidade, porquanto, sem o seu implemento, não será
possível o oferecimento de denúncia em face do suposto autor do delito, já que o art. 88 da Lei
nº 9.099/95 dispõe que o crime de lesão corporal leve depende de representação.

Condição de prosseguibilidade (ou condição superveniente da ação) é uma condição necessária


para o prosseguimento do processo. Em outras palavras, o processo já está em andamento e uma
condição deve ser implementada para que o processo possa seguir seu curso normal. Exemplo
interessante é aquele constante do art. 152, caput, do CPP. De acordo com tal dispositivo, se se
verificar que a doença mental do acusado sobreveio à infração, o processo permanecerá
suspenso até que o acusado se restabeleça. Como se percebe, a necessidade de o agente
recobrar sua higidez mental no caso de insanidade superveniente é uma condição de
prosseguibilidade do processo; sem o seu implemento, o processo fica paralisado, com a
prescrição correndo normalmente, o que é denominado pela doutrina de crise de instância (Lima,
2021).

Ou seja: a distinção entre uma e outra diz respeito ao fato da condicionante atuar em relação ao início ou à
continuidade/prosseguimento da ação penal – e o nome, nesse sentido, nos ajuda a fixar a distinção.

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Há diferença, também, em relação a escusa absolutória e condição objetiva de punibilidade, essas que
dizem respeito não ao processo, mas sim ao Direito Penal.

Heleno Cláudio Fragoso esclarece:

Crime é ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Como regra geral, em consequência,
pratica crime, e deve sofrer a consequência jurídica correspondente, quem transgride a norma
que lhe impõe proibição ou mandado, atuando ou omitindo-se de forma ilícita e reprovável. Há,
todavia, casos em que a punibilidade depende de condições objetivas exteriores à conduta
(condições objetivas de punibilidade) e casos em que ela se exclui tendo em vista condições
pessoais do agente ou seu comportamento posterior (escusas absolutórias). Atende-se, em tais
casos, à ocorrência de elementos ou circunstâncias exteriores ao fato que, por motivos de política
criminal, condicionam sua ilicitude penal ou sua punição (Fragoso, 1993).

A lei penal brasileira não tem disposição geral expressa em relação às condições objetivas de punibilidade.
São objetivas porquanto independem de culpa ou dolo e normalmente são determinadas por razões de
política criminal, “entendendo o legislador que sem elas não se justifica a punibilidade do fato, pela ausência
de dano efetivo ao interesse tutelado ou por outra razão de oportunidade ou conveniência”. É a
“circunstância de que depende a punibilidade”, “o antecedente indispensável para que ocorra a punibilidade
do fato”; “acontecimentos exteriores ao tipo, que a lei estabelece como indispensáveis à punibilidade do
fato”; “elementos suplementares ao tipo, mas não se incluem no mesmo, caracterizando-se precisamente
pela circunstância de serem exteriores” (Fragoso, 1993).

Já falamos, ao começo da aula, que punibilidade seria a consequência do crime. Por vezes, por mais que uma
conduta seja típica, a lei cria condições que impedem a sua punição. “São condições exigidas pelo legislador
para que o fato se torne punível e que estão fora do injusto penal”; traduzem um “acontecimento futuro e
incerto” e funcionam como “fatos externos ao tipo penal, que devem ocorrer para a formação de um injusto
culpável punível” (Lima, 2018).

Existe divergência na doutrina quanto à natureza jurídica:

Conforme LUIZ RÉGIS PRADO, a exata definição das condições objetivas de punibilidade é questão
tormentosa. Por um lado, parte da doutrina considera-as como acontecimentos futuros e
incertos, cuja realização é indispensável para a integração jurídica do delito. Admitindo-se a
punibilidade como elemento do conceito de crime, argumenta-se estar fora de dúvida não haver
delito enquanto não se verifique a ocorrência da condição. Faltaria, aqui, um elemento que, no
caso específico, é pressuposto para a existência de um requisito essencial do delito. De outra
parte, defende-se que as condições objetivas de punibilidade integram a noção de tipo penal em
sentido amplo, isto é, aquele que engloba não apenas os elementos que fundamentam
positivamente o injusto, mas também os que condicionam sua punibilidade. As condições
objetivas de punibilidade pertenceriam, pois, ao tipo penal porque condicionariam sua objetiva
relevância penal. Além disso, uma terceira posição, diversa das anteriores, entende que as
condições objetivas de punibilidade pressupõem um delito completo em todos os seus
elementos constitutivos, funcionando, portanto, como condicionantes da aplicação concreta da
pena. Segundo essa corrente de pensamento, tais condições não constituem requisitos do delito

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– como postulam aqueles para os quais a punibilidade é elemento do crime –, mas dizem respeito
à imposição da sanção penal, visto que o crime já estaria perfeito em todos os seus elementos
estruturais. Logo, a função dessas condições não seria certamente a de permitir a punibilidade
de um delito pelo seu concurso ao aperfeiçoamento do mesmo, mas sim a de, excepcionalmente,
suspender a punibilidade, submetendo-a à ocorrência de um evento ulterior e extrínseco de um
delito já perfeito (KALINCA DE CARLI. Condições objetivas e causas extintivas da punibilidade do
autor do delito, 2013)7.

Exemplo haveria nos crimes falimentares da Lei 11.101/2005:

Art. 180. A sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou concede a
recuperação extrajudicial de que trata o art. 163 desta Lei é condição objetiva de punibilidade
das infrações penais descritas nesta Lei.

As escusas absolutórias também são condições de punibilidade, “mas diferem radicalmente das que acima
analisamos, porque são condições negativas de punibilidade do crime. Subsiste aqui a ilicitude, ocorrendo
apenas causas pessoais de exclusão de pena. Não beneficiam aos coautores ou partícipes a que não se
refiram” (Fragoso, 1993). Perceba: o crime se configura por uma conduta típica, antijurídica e culpável, mas
o agente estará isento de pena.

Exemplos do Código Penal, em relação a crimes contra o patrimônio praticados sem violência:

Art. 181. É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.

Também em relação ao crime de favorecimento pessoal:

Art. 348. Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada
pena de reclusão:

Pena - detenção, de um a seis meses, e multa. [...]

§ 2º Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica


isento de pena.

7
http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,condicoes-objetivas-e-causas-extintivas-da-punibilidade-do-
autor-do-delito,45549.html

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“Em tais casos, o fato não perde o seu caráter delituoso, declarando-se, porém, a isenção de
pena por motivos de oportunidade ou política criminal” (Fragoso, 1993).

Em dada oportunidade (19/08/2013), numa rede social, assim se pronunciou GUILHERME NUCCI quanto à
diferença entre os institutos analisados:

As condições objetivas de punibilidade são as condições exteriores à conduta delituosa, não


abrangidas pelo elemento subjetivo, que, como regra, estão fora do tipo penal, tornando-se
condições para punir. São causas extrínsecas ao fato delituoso, não cobertas pelo dolo do agente.
Ex.: sentença declaratória de falência em relação a alguns casos de crimes falimentares (art. 180,
Lei 11.101/2005). As condições negativas de punibilidade são as escusas especiais e pessoais,
fundadas em razões de ordem utilitária ou sentimental, que não afetam o crime, mas somente a
punibilidade. Têm efeito idêntico ao das condições objetivas de punibilidade, mas natureza
jurídica diversa. Ex.: art. 181, I e II, ou art. 348, § 2º, do Código Penal (crimes contra o patrimônio
e favorecimento pessoal, respectivamente)8.

BRASILEIRO diz que há diferenças (Lima, 2018):

condições objetivas de punibilidade escusas absolutórias


Eventos futuros e incertos; Antecipam-se ao momento consumativo da
infração; excluem a imposição de pena desde o
começo;
Apresentam-se se modo positivo, ou seja, sua Formuladas de maneira negativa, representando
presença autoriza a punibilidade do crime; condições negativas de punibilidade;
Quando ausentes, impossibilitam a punição dos Não se comunicam com coautores e partícipes, são
coautores e partícipes. causas pessoas de isenção de pena.

Mais didático ainda é o gráfico comparativo trazido por NORBERTO AVENA:

8
https://www.facebook.com/guilhermenucci2/posts/226233440864068

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CONDIÇÕES ESPECIAIS DA
CONDIÇÕES GERAIS DA CONDIÇÕES OBJETIVAS DE
AÇÃO OU DE ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS
AÇÃO PUNIBILIDADE
PROCEDIBILIDADE

a)Possuem caráter geral e


devem estar presentes em
a) São específicas, sem a) Trata-se de causas
qualquer ação penal. a) Trata-se de
caráter geral, vinculando contempladas na parte
b) Consistem: o exercício da ação penal circunstâncias exteriores
Especial do CP, que fazem
em apenas alguns casos. ao crime, não integrantes
b.1) Possibilidade jurídica com que um fato típico e
do tipo e de
do pedido: viabilidade de b) Referem-se, antijurídico, apesar da
acontecimento futuro e
condenação, o que unicamente, à instauração culpabilidade do agente,
incerto, ou seja, o agente
implica tipicidade da do processo e não não conduza a aplicação
não sabe se acontecerá ou
conduta. envolvem diretamente da pena por motivos de
não esta condição à época
aspectos pertinentes ao política criminal.
b.2) Interesse de agir: do crime.
indícios de autoria e prova mérito. b) Exemplo: Furto
b) Exemplo típico
da existência do crime. c) Como exemplos destas praticado por
encontra-se no art. 180 da
condições, as hipóteses descendente contra
b.3) Legitimidade: Lei 11.101/2005 ao dispor
em que a lei exige a ascendente menor de 60
b.3.1) ativa: Ministério que a sentença que
representação do anos (art. 181, II c/c o art.
Público, na ação penal decreta a falência, é
ofendido ou a requisição 183, III, do CP), em que,
pública; e o ofendido, na condição objetiva de
do Ministro da Justiça pela condição do agente
ação penal privada. punibilidde das infrações
para que possa o (filho da vítima),
penais descritas naquela
b.3.2) passiva: indivíduo Ministério Público permanece isento de
lei.
maior de 18 anos. ingressar com ação. pena.

Existe discussão sobre o esgotamento da via administrativa e o que essa exigência configuraria (sua natureza
jurídica) em relação aos crimes tributários. A discussão entra muito no direito material, mas vale a pena, ao
menos, trazer a lição de PACELLI acerca do assunto:

Nas edições anteriores deste Curso, e em atenção à dimensão constitucional da questão,


deitamos falação acerca de uma suposta condição de procedibilidade em matéria de crimes
contra a ordem tributária (e previdenciária), apontada em alguns setores da doutrina e da
jurisprudência. Trata-se da exigência, ou não, do esgotamento da via administrativa para o início
da persecução penal, ou, de outro, se existiria ou não essa condição de procedibilidade. No
entanto, parece-nos desnecessário prosseguirmos no tema. É que a Suprema Corte já consolidou
seu entendimento sobre a matéria, entendendo existir, não uma condição de procedibilidade,
mas, mais que isso, uma condição objetiva de punibilidade. Uma condição de procedibilidade é
uma questão processual; a condição objetiva de punibilidade, ao contrário, diz respeito ao Direito
Penal. Por isso, deixamos apenas registrada a polêmica, atualmente encerrada com a Súmula
Vinculante 24, do STF: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art.
1º, I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.” A Suprema Corte, bem
se vê, ressalva a situação dos delitos formais, ou de mera conduta, tal a hipótese daqueles
elencados no art. 2º da mesma Lei nº 8.137/90, para os quais não existiria a necessidade de
esgotamento da via administrativa. Mas note-se que nem mesmo ali há convergência conceitual

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sobre a matéria. No HC nº 81.611-SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, fixou-se orientação no sentido
de se reconhecer uma condição objetiva de punibilidade – fora do tipo, pois – na apreciação da
questão (tributo devido ou não) pela Administração Fazendária.

Já no julgamento do HC nº 84.555-0/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, 14.9.2007, 2ª Turma, o que se


decidiu foi pela subordinação do Ministério Público aos órgãos fazendários, dado que “ser devido
ou não” o tributo seria um elemento normativo do tipo, de modo que a manifestação da Fazenda
não seria condição de punibilidade. A consequência de tal decisão é da maior gravidade:
entendeu-se que quando estiver presente a decadência do tributo (prazo de cinco anos) não
restará tipo penal algum!

E no Superior Tribunal de Justiça, então, sequer se adotou a distinção da citada Súmula


Vinculante de nº 24. Veja-se, por exemplo, decisão proferida pela 5ª Turma do STJ, HC nº 97.789-
SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 3.12.2009, na qual se vislumbra condição
objetiva de punibilidade também para crimes tributários formais. Com isso, de nada mais
adiantaria discutir a independência entre a instância administrativa, responsável pela
constituição do crédito tributário, e a judiciária. Parece desimportante, portanto, a titularidade
do parquet para a ação penal. Nos crimes tributários, ela dependerá do procedimento
administrativo.

Não aderimos a essa orientação: nos chamados crimes materiais, cuja consumação exige não só
resultado, mas a prática de ação fraudulenta (no tipo penal), nada poderia impedir o Ministério
Público de examinar a matéria, independentemente da posição da Receita Federal, sobretudo
porque, ainda que não devido o tributo, poder-se-ia encontrar crime remanescente – falsidade
material, por exemplo. Note-se que ali, hipóteses do art. 1º, I a IV, há a previsão de condutas
fraudulentas nos tipos penais. São estes os caminhos percorridos na discussão da matéria, ora
sob a perspectiva de suposta ausência de condição objetiva de punibilidade (condição ou
circunstância que se encontra fora do tipo penal), ora no campo da própria tipicidade (a
consumação dependeria de ser devido o tributo), ambos no âmbito do Direito Penal, e até
mesmo no campo processual, de suposta ausência de condição de procedibilidade para a ação
penal tendo por objeto crime contra a ordem tributária. A existência do tributo e do crime
dependeria, portanto, nessa linha de raciocínio, da manifestação final da Administração
Fazendária.

No julgamento do leading case da questão, HC nº 81.611/DF, no Supremo Tribunal Federal, em


que foi Relator o eminente Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Sua Excelência, cujo voto foi seguido pela
maioria – vencidos os Mins. JOAQUIM BARBOSA, CARLOS AYRES e a Min. ELLEN GRACIE –, acolheu a
ausência de justa causa para a ação, cuidando, porém, de sustar o curso do prazo prescricional,
enquanto não resolvida a matéria no âmbito fazendário. Em um ponto o ilustre e então Min.
PERTENCE tinha e tem razão: a possibilidade de extinção da punibilidade pelo pagamento do
tributo – e também pelo parcelamento, com o respectivo reconhecimento do débito – pode
funcionar como instrumento de inibição ao contribuinte, relativamente ao eventual
questionamento, administrativo e judicial, do débito. Quanto a isso, pode-se objetar, porém, que
a solução mais adequada não seria o reconhecimento da ausência de justa causa para a ação,
quando não resolvida definitivamente a matéria administrativa, mas, sim, a suspensão do
processo penal, se demonstrada a relevância da questão, a ser revelada, por exemplo, com a

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decisão judicial (cível) de suspensão da exigibilidade do tributo. Aplicar-se-ia, portanto, o


disposto no art. 93 do CPP, que cuida da chamada questão prejudicial heterogênea. Nesse caso,
a suspensão do processo teria prazo certo, no curso do qual não correria a prescrição (art. 116,
I, CP).

De todo modo, o aspecto mais problemático da questão se encontra na mencionada decisão da


2ª Turma do STF no HC nº 84.555-0-RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, no sentido de que a fluência do
prazo decadencial da constituição do crédito tributário implicaria a impossibilidade de realização
do tipo penal relativo à conduta tendente a suprimir ou reduzir tributo devido. No mesmo
sentido, STJ – HC nº 77.986-MS, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, julgado em 13.9.2007. Ora, na
hipótese de decadência tributária, quando a constituição do crédito tributário não se opera por
razões absolutamente independentes da existência ou não do crédito, e da existência ou não de
crime, não se pode recusar a intervenção penal, desde que ainda não prescrito o delito. Fazer
decorrer da decadência tributária, matéria de política fiscal, uma modalidade de causa extintiva
da punibilidade constitui indevida ingerência no âmbito da política criminal. Indevida e sem
previsão legal. Fazer o Ministério Público depender da presteza dos órgãos fazendários na
constituição do crédito não nos parece juridicamente justificado (Pacelli, 2018).

Doutrina Complementar

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018): “As condições para o
regular exercício do direito de agir estão intimamente ligadas ao caso penal deduzido em juízo
pelo autor, independentemente de haver ou não o direito que ele alega. Ou seja, não podemos
vincular estas condições ao direito material discutido. [...] As condições para o regular exercício
do direito de agir podem ser as que são exigidas, normalmente, para todo e qualquer tipo de
ação penal e que chamamos de genéricas (legitimidade, interesse, possibilidade jurídica e justa
causa) e as que somente em determinados casos são exigidas pela lei e que chamamos de
específicas (representação do ofendido na ação penal pública condicionada; laudo prévio na Lei
de entorpecentes; novas provas no caso do art. 409 do CPP, dentre outras)”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “A existência das
condições da ação deve ser analisada pelo juiz, portanto, já no momento em que proferir decisão
de recebimento ou rejeição da inicial acusatória, quando então declarará o autor carecedor do
direito de ação, caso ausente qualquer delas, mas, ainda que ultrapassado esse momento
sensível da instância penal, caberá a extinção do processo sob tal fundamento, a qualquer tempo,
inclusive em segundo grau de jurisdição. A ausência de qualquer das condições da ação torna a
imputação temerária e inviabiliza a marcha procedimental, de modo a determinar a extinção do
processo sem julgamento do mérito, daí afirmarmos que a presença de todas constitui condictio
sine qua non para o exercício do direito de ação”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019):
“Conquanto a expressão ‘condições da ação’ tenha enorme aceitação na doutrina do direito
processual como um todo, é certo que o direito de ação, em si, não é condicionado, conforme já
mencionado. Qualquer pessoa do povo, bem como os órgãos do Ministério Público, podem
livremente ajuizar ações perante o Poder Judiciário, após o que o órgão provocado estará
obrigado a conceder ao autor uma resposta, ainda que seja para negar seguimento à ação

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ajuizada. Por isso, ao contrário do que ensinava a doutrina tradicional, não é propriamente o
exercício do direito de ação que é condicionado, mas sim o direito de que o movimento
desencadeado pelo ajuizamento da ação se desenvolva, por meio do processo, em direção a um
julgamento de mérito. Nesse sentido, a definição de Liebman, segundo a qual as condições da
ação constituem as ‘condições essenciais para o exercício da função jurisdicional com referência
à situação concreta deduzida em juízo’”.

Condições genéricas da ação

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018), a respeito das
condições genéricas da ação, pontua: “Possibilidade jurídica do pedido. Se no processo civil o
conceito de possibilidade jurídica é negativo, isto é, ele será juridicamente admissível desde que,
analisado em tese, o ordenamento não o vede, no processo penal seu conceito é aferido
positivamente: a providência pedida ao Poder Judiciário só será viável se o ordenamento, em
abstrato, expressamente a admitir. Nesse passo, a denúncia deverá ser rejeitada quando o fato
narrado evidentemente não constituir crime. Essa hipótese poderá, após oferecida a defesa dos
arts. 396 e 396-A do CPP, dar causa à absolvição sumária do agente (CPP, art. 397, III). [...] Analisa-
se o fato tal como narrado na peça inicial, sem se perquirir se essa é ou não a verdadeira
realidade, a fim de se concluir se o ordenamento penal material comina-lhe, em abstrato, uma
sanção. [...] Interesse de agir. Desdobra-se no trinômio (i) necessidade e (ii) utilidade do uso das
vias jurisdicionais para a defesa do interesse material pretendido, e (iii) adequação à causa, do
procedimento e do provimento, de forma a possibilitar a atuação da vontade concreta da lei
segundo os parâmetros do devido processo legal. A necessidade é inerente ao processo penal,
tendo em vista a impossibilidade de se impor pena sem o devido processo legal. [...] A utilidade
traduz-se na eficácia da atividade jurisdicional para satisfazer o interesse do autor. Se, de plano,
for possível perceber a inutilidade da persecução penal aos fins a que se presta, dir-se-á que
inexiste interesse de agir. [...] É o caso, e. g., de se oferecer denúncia quando, pela análise da
pena possível de ser imposta ao final, se eventualmente comprovada a culpabilidade do réu, já
se pode antever a ocorrência da prescrição retroativa. [...] Por fim, a adequação reside no
processo penal condenatório e no pedido de aplicação de sanção penal. Legitimação para agir.
[...] Cuida-se, aqui, da legitimidade ad causam, que é a legitimação para ocupar tanto o polo ativo
da relação jurídica processual, o que é feito pelo Ministério Público, na ação penal pública, e pelo
ofendido, na ação penal privada (CPP, arts. 24, 29 e 30), quanto o polo passivo, pelo provável
autor do fato, e da legitimidade ad processum, que é a capacidade para estar no polo ativo, em
nome próprio, e na defesa de interesse próprio (CPP, arts. 33 e 34)”.

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010),
concebendo as condições genéricas como sendo a legitimidade e o interesse de agir, assevera:
“A) Legitimatio ad causam. [...] Ela é, como diz Buzaid, a pertinência subjetiva da ação. Somente
o titular do interesse em lide é que pode promovê-la. Assim, como na lide penal, informada da
pretensão punitiva e do direito de liberdade, o Estado tem sempre interesse, visto que titular do
direito de punir e, de consequência, da pretensão punitiva, segue-se que, no campo repressivo,
é ele, por meio do seu órgão competente, que é o Ministério Público, sempre par te legítima para
agir, para promover a ação penal. [...] Somente as partes que têm interesse no conflito é que são
legítimas: a que pode promover a ação e aquela em relação a quem esta deve ser proposta. Daí
as duas legitimações: legitimação ativa (paia promovê-la) e legitimação passiva (em relação a

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quem deve ser proposta). Somente quem tem legitimação ativa é que pode iniciar a ação penal,
e, por outro lado, esta deve ser promovida em relação àquele que tem legitimação passiva, vale
dizer, em relação ao genuíno autor da infração. [...] B) Interesse de agir. [...] Em face do princípio
do nulla poena sine judice, não se concebe a aplicação da pena senão por meio do Juiz. Logo, não
podendo o Estado conseguir aquele ‘interesse substancial ou primário’ que descansa na
repressão à infração, com a inflição da pena, senão por meio do Juiz, o interesse de agir estará
implícito em toda acusação, em toda e qualquer ação penal. Todavia e a despeito desse raciocínio
lógico, quem quer que se detenha na análise do CPP chegará à conclusão inarredável de que o
legitimo interesse, embora implícito em toda acusação, exige um plus. Quando se conceitua o
interesse de agir como necessidade de se valer do órgão jurisdicional sob pena de se sofrer um
prejuízo, está claro que se supõe existente um estado de fato antijurídico, porque, se não houver
tal situação de fato contrária ao direito, ninguém pode exercitar o direito de ação, que, como
vimos, é instrumentalmente conexo a um caso concreto. Só existe o direito de ação como
realidade processual quando há um interesse emergente de um estado de fato contrário ao
direito e interesse que se possa fazer valer por meio da via jurisdicional”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016), sobre a
‘justa causa’ como eventual quarta condição genérica da ação penal, sustenta: “Justa causa: a
ação só pode ser validamente exercida se a parte autora lastrear a inicial com um mínimo
probatório que indique os indícios de autoria, da materialidade delitiva, e da constatação da
ocorrência de infração penal em tese (art. 395, III, CPP). É o fumus commissi delicti (fumaça da
prática do delito) para o exercício da ação penal. Como a instauração do processo já atenta contra
o status dignitatis do demandado, não se pode permitir que a ação seja uma aventura
irresponsável, lançando-se no polo passivo, sem nenhum critério, qualquer pessoa. [...] A justa
causa, todavia, não é pacificamente aceita como quarta condição da ação. Alguns a integram ao
interesse de agir, ou mesmo como requisito ao desenvolvimento do procedimento, ‘e não à
propositura da demanda’”.

AURY LOPES JR. (Direito processual penal, 18ª ed., São Paulo: Saraiva, 2021), sustentando visão
contrária e minoritária, critica a migração de conceitos provenientes do processo civil para o
processo penal: “Quanto às condições da ação, a doutrina costuma dividi-las em: legitimidade,
interesse e possibilidade jurídica do pedido. O problema está em que, na tentativa de adequar
ao processo penal, é feita uma verdadeira ginástica de conceitos, estendendo-os para além de
seus limites semânticos. O resultado é uma desnaturação completa, que violenta a matriz
conceitual, sem dar uma resposta adequada ao processo penal. Vejamos por que: a)
Legitimidade: esse é um conceito que pode ser aproveitado, pois se trata de exigir uma
vinculação subjetiva, pertinência subjetiva, para o exercício da ação processual penal. [...] b)
Interesse: para ser aplicado no processo penal, o interesse precisa ser completamente
desnaturado na sua matriz conceitual. Lá no processo civil, é visto como utilidade e necessidade
do provimento. Trata-se de interesse processual de obtenção do que se pleiteia para satisfação
do interesse material. CRÍTICA: Pensamos que se trata de categoria do processo civil que resulta
inaplicável ao processo penal. Isso porque o processo penal vem marcado pelo princípio da
necessidade, algo que o processo civil não exige e, portanto, desconhece. Se o interesse,
civilisticamente pensado, corresponde à tradicional noção de utilidade e necessidade do
provimento, não há nenhuma possibilidade de correspondência no processo penal. O princípio
da necessidade impõe, para chegar-se à pena, o processo como caminho necessário e

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imprescindível, até porque o Direito Penal somente se realiza no processo penal. [...] c)
Possibilidade Jurídica do Pedido: quanto à possibilidade jurídica do pedido, cumpre, inicialmente,
destacar que o próprio LIEBMAN, na terceira edição do Manuale di diritto processuale civile,
aglutina possibilidade jurídica do pedido com o interesse de agir, reconhecendo a fragilidade da
separação. [...] Superada essa advertência inicial, o pedido da ação penal, no processo penal de
conhecimento, será sempre de condenação, exigindo um tratamento completamente diverso
daquele dado pelo processo civil, pois não possui a mesma complexidade. Logo, não satisfaz o
conceito civilista de que o pedido deve estar autorizado pelo ordenamento, até porque, no
processo penal, não se pede usucapião do Pão de Açúcar... (típico exemplo dos manuais de
processo civil). [...] CRÍTICA: Na verdade, o que se verifica é uma indevida expansão dos conceitos
do processo civil para (ilusoriamente) atender à especificidade do processo penal”. [...] Diante
das duras críticas que tece a respeito dessa intervenção conceitual do processo civil no processo
penal, o autor sugere: “Agora, diante da necessidade de respeitarem-se as categorias jurídicas
próprias do processo penal, devemos buscar as condições da ação dentro do próprio Processo
Penal, a partir da análise das causas de rejeição da acusação. Assim, do revogado art. 43 e do
atual art. 395, sustentamos que são condições da ação penal: prática de fato aparentemente
criminoso – fumus commissi delicti; punibilidade concreta; legitimidade de parte; justa causa”.

Condições específicas da ação

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “Também
chamadas de condições de procedibilidade, são condições exigidas pela lei para o exercício da
ação penal em determinados casos. Entre as principais, a doutrina destaca: a) representação do
ofendido ou de seu representante; b) requisição do Ministro da Justiça; c) ingresso do agente em
território nacional, em crimes praticados fora do território nacional (extraterritorialidade da lei
penal). Diante do rol, vê-se logo que essas condições nem sempre devem ser satisfeitas para que
se afigure admissível o ajuizamento da ação penal. De fato, a representação do ofendido ou de
seu representante, ou a requisição do Ministro da Justiça, apenas condicionam o exercício da
ação penal naqueles casos em que a própria lei determina que o exercício da ação penal fica
obstado sem sua ocorrência. Se nada for dito a respeito, assume-se que não existe o
condicionamento. [...] Diante da inexistência, no caso concreto, de qualquer das condições da
ação penal, o juiz deverá decretar a carência da ação, anulando o processo ‘ab initio’,
extinguindo-o sem proceder ao julgamento do mérito, que, no processo penal, é a pretensão
punitiva do Estado. O exame acerca do atendimento, em cada caso concreto, dessas condições
pode ser realizado a qualquer momento durante o processo. Caso seja verificada a ausência de
condição da ação no momento do oferecimento da exordial acusatória, deve o magistrado
rejeitá-la com fulcro no art. 395, II, do CPP. Não obstante esse controle prévio acerca das
condições da ação, caso o processo continue indevidamente, a qualquer tempo poderá ser
decretada a nulificação do feito, com base no art. 564, II, do CPP”.

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010): “Ao
lado dessas condições genéricas, sempre exigidas, a lei penal ou processual penal, em
determinadas hipóteses, faz subordinar o exercício da ação penal a outras condições. Até há
pouco tempo, estas eram denominadas ‘condições de procedibilidade’ ou de perseguibilidade.
Com essa denominação, procurava-se extremá-las das condições genéricas. Hoje, contudo, a
melhor doutrina considera tanto aquelas quanto estas simplesmente condições para o exercício

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da ação penal”. A respeito da diferença entre as condições genéricas e específicas, assevera:


“Para distingui-las, consideramos aquelas exigidas sempre condições genéricas, e as exigidas num
ou noutro caso, condições específicas. Específicas, repita-se, porque a lei as exige em alguns
casos. Uma vez exigida pela lei, sua ausência torna inadmissível o jus actionis”. Pontualmente
sobre as condições específicas, o autor elenca uma miríade de exemplos: “Sem a pretensão de
querer indicar todas, procuramos mostrar as mais comuns: a) A representação, exigida para
algumas infrações penais, conforme tivemos oportunidade de ver. b) A requisição do Ministro da
Justiça. c) A entrada do agente no território nacional. Nos crimes cometidos fora do território
nacional, de que tratam as letras a e b do inc. II do art. 7º do CP, bem como na hipótese do § 3°
do art. 7º do mesmo estatuto, a aplicação da lei penal brasileira fica condicionada à ‘entrada do
agente no território nacional’. Logo, tal condição é de procedibilidade. [...] d) O trânsito em
julgado da sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento (cf. CP, art. 236,
parágrafo único). e) A autorização da Assembleia Legislativa, pelo voto de 2/3 dos seus membros,
para ser instaurado processo contra Governador de Estado, seja nos crimes comuns, seja nos de
responsabilidade (art. 49 da Constituição paulista, entre outras). f) A autorização da Câmara dos
Deputados para poder ser instaurado processo, por crime comum ou de responsabilidade
praticado pelo Presidente, Vice-Presidente da República e Ministros de Estado (CF, art. 51, I). g)
As novas provas a que se refere o parágrafo único do art. 414 do CPP. h) O exame pericial de que
trata o art. 525 do CPP. i) A prova nova exigida pelo parágrafo único do art. 414 do CPP. j) A
conclusão do procedimento administrativo para apuração de débito tributário nos crimes contra
a ordem tributária etc.”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016), agrupando
as diversas condições específicas (lato sensu) em diferentes categorias, sustenta: “As condições
específicas da ação penal – entendidas como as que precisam ser providas para, a par das
condições gerais da ação penal, autorizar o desencadeamento da ação penal – podem ser assim
agrupadas: e.1) condições de procedibilidade (requisição do Ministro da Justiça ou representação
da vítima, a exemplo do que ocorre nos crimes de ação penal pública condicionada: lesão
corporal leve – art. 129, caput, do CP); e.2) condições específicas constitucionais (admissão da
acusação pela Câmara dos Deputados para o início de processo contra o Presidente e o Vice-
Presidente da República, bem como contra os Ministros do Estado, a teor dos artigos 51, I, e 86,
caput, CF); e.3) condições específicas legais (juntada de laudo pericial nos casos de crime contra
a propriedade imaterial que deixe vestígios, em compasso com o art. 525, do CPP; trânsito em
julgado da sentença cível nos autos da ação anulatória de casamento, quando se tratar de crime
do art. 236, do CP – crime de induzimento a erro essencial e de ocultação de impedimento –, de
acordo com o parágrafo único do mesmo artigo); e.4) condições específicas jurisprudenciais
(surgimento de novas provas, nas hipóteses de impronúncia do acusado por suposto delito
doloso contra a vida de competência do júri ou de arquivamento do inquérito policial por
insuficiência de provas – Súmula 524, STF; o lançamento definitivo do tributo, para a tipicidade
dos crimes tributários previstos no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/1990, exigindo-se o prévio
exaurimento das vias administrativas para que a ação penal possa ser proposta, diante do que
dispõe a Súmula Vinculante nº 24, do STF, evitando-se que a demanda penal se torne forma de
cobrança tributária)”.

Condições da ação e condições de prosseguibilidade

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HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “A lei prevê
ainda, em alguns casos, que a ação só pode prosseguir se satisfeita uma condição exigida depois
de seu início. É o que ocorre com os crimes contra a honra. Nesses crimes, oferecida a queixa-
crime, o Juiz, antes de recebe-la, promoverá entre as partes (querelante e querelado), depois de
ouvi-las em separado, desde que ache provável a reconciliação, o entendimento entre eles, a sua
presença. Se houve a reconciliação, a queixa será arquivada depois de assinado pelo querelante
o termo de desistência. A ação só prosseguirá se resultar infrutífera a reconciliação. Logo, essa
audiência chamada de reconciliação, prevista no art. 520 do CPP, é exemplo de condição de
prosseguibilidade”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016):
“Condições de prosseguibilidade: esta seria uma condição para a continuidade da ação já
deflagrada. Ex: nos crimes inafiançáveis de competência do Júri, após a pronúncia, o processo só
prosseguia após a intimação pessoal do réu daquela decisão. Enquanto isto não ocorria, o feito
ficava paralisado. Era a crise de instância, pela pendência de um ato processual sem o qual o
processo não podia prosseguir. Com a nova previsão do art. 420, parágrafo único do CPP,
imprimida pela Lei nº 11.689/2008, se o pronunciado solto não for encontrado, será intimado
por edital, ilidindo-se assim a paralisação do procedimento. Pode-se cogitar, entretanto, como
condição de prosseguibilidade, a necessidade do agente recobrar a higidez mental nas hipóteses
de insanidade superveniente, pois, enquanto isso não ocorre, o processo fica paralisado, e a
prescrição corre normalmente. É mais um caso de crise de instância (art. 152, caput, CPP)”.

Condições da ação, condições objetivas de punibilidade e escusas absolutórias

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016):
“Condições objetivas de punibilidade: são condições necessárias para o exercício do jus puniendi,
aferidas em momento subsequente à instauração do processo. No caso, nada impede que a ação
penal seja exercida validamente, diante da presença das condições gerais e específicas para seu
ajuizamento. Há óbice, contudo, à prolação de sentença condenatória, enquanto não preenchido
o pressuposto punitivo, sendo autêntica questão prejudicial para o julgamento do mérito da
demanda penal. É o que ocorre com as hipóteses: de ingresso no País, do autor de crime
praticado no estrangeiro (diante da dicção do art. 7º, §§ 2º, “a” e “b”, e 3º, do CP); e de sentença
que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou extrajudicial, nas infrações
falimentares, nos termos do previsto no art. 180, da Lei de Falência e Recuperação Judicial”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012), diferenciando
as figuras das condições de procedibilidade e punibilidade, pontua: “As condições de
procedibilidade distinguem-se das condições de punibilidade. Estas referem-se ao mérito e
extinguem a pretensão punitiva, ainda que posteriores ao início da ação penal, porque quebram
a relação natural existente entre a prática de uma infração penal e a imposição da pena. Todavia,
se o fato extintivo da punibilidade (CP, art. 107) ocorre antes da instauração da ação penal, ele
se torna uma condição negativa de procedibilidade, de modo que a própria ação penal fica
proibida. O entendimento desta situação é importante para a compreensão das duas figuras que
nesse momento se confundem quanto às consequências. A condição de procedibilidade, positiva
ou negativa, impede sempre e a qualquer tempo o exercício da ação penal, que não pode ser
proposta ou admitida. As condições de punibilidade, também positivas ou negativas, podem

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aparecer após o exercício válido da ação penal, e, se reconhecidas, provocarão uma sentença de
mérito, mas se essas causas surgirem anteriormente à ação também proíbem esta última devido
à correlação necessária entre ação, processo penal e sanção penal. Assim, condições extintivas
da punibilidade anteriores à ação penal tornam-se condições negativas de procedibilidade”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019) muito bem
sintetiza as diferenças entre as condições da ação, de punibilidade e as escusas absolutórias:
“Não há confundir as condições, genéricas ou específicas, da ação com as chamadas condições
objetivas de punibilidade. Os institutos não têm qualquer relação, a despeito de a nomenclatura
ser semelhante. As condições da ação constituem fatos relacionados ao direito processual e que
são necessários para que o exercício da ação penal possa originar validamente um processo
penal. Já as condições objetivas da punibilidade são institutos contidos no plano do direito
material. São fatos, externos ao tipo penal, que devem ocorrer para que a prática do tipo penal
constitua fato punível. Constitui condição objetiva de punibilidade, por exemplo, a ocorrência de
prejuízo no caso de crime de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia.
Também é necessário se estabelecer uma distinção entre as condições da ação e as escusas
absolutórias, que atingem diretamente o direito de punir do Estado, fazendo com que a pena
deixe de ser imposta por circunstâncias pessoais do agente. Como exemplos de escusas
absolutórias temos a imunidade parlamentar (prevista no art. 53 da Constituição Federal) e
aquelas previstas nos arts. 181 e 348, § 2º, do Código Penal”.

Jurisprudência pertinente

Súmula Vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I
a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
Súmula 438, STJ: É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com
fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

Supremo Tribunal Federal

[...] AÇÃO PENAL - LEGITIMIDADE PASSIVA - IDENTIFICAÇÃO DATILOSCOPICA - IMPRESSÕES


DIGITAIS DISCREPANTES. Exsurgindo descompasso entre as impressões digitais constantes do
boletim de identificação criminal alusivo ao delito e as do acusado via denúncia, impõe-se a
conclusão sobre a ilegitimidade passiva, declarando-se nulo o processo a partir, inclusive, da peça
primeira, ou seja, da denúncia. (HC 72451, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma,
julgado em 27/02/1996)

Esta Corte, em sede de repercussão geral, fixou entendimento de ser inviável o reconhecimento
da prescrição em perspectiva (virtual, antecipada) – RE 602.527 QO-RG, CEZAR PELUSO, DJe
18.12.2009. [...] (HC 125777, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em
21/06/2016)

Superior Tribunal de Justiça

É assente na jurisprudência desta Corte que o crime de descaminho é de natureza formal, sendo
prescindível, portanto, a conclusão do processo administrativo-fiscal para a sua caracterização.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 69


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Não há como aplicar o mesmo entendimento jurisprudencial aos crimes descritos nos arts. 334
do Código Penal e 1º da Lei n. 8.137/1990, visto que possuem objetividade distinta. [...] (AgRg no
REsp 1488692/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 03/08/2017,
DJe 16/08/2017)

A assinatura do termo de ajustamento de conduta, firmado entre o Ministério Público estadual


e o suposto autor de crime ambiental, não impede a instauração da ação penal, pois não elide a
tipicidade penal. Ademais, há independência entre as esferas administrativa, cível e penal. [...]
(REsp 1154405/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
18/05/2017, DJe 25/05/2017)

CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS


Existem duas formas de classificar as ações penais:
uma delas tomando por base a teoria do processo condenatória
civil; outra, inerente ao processo penal, considerando
a legitimação ativa. Pela primeira, as ações seriam de Conhecimento constitutiva
conhecimento, cautelar e de execução.

A ação de conhecimento busca uma decisão sobre Teoria geral Execução declaratória
alguma situação jurídica disciplinada no Direito Penal,
e se subdivide em condenatória, constitutiva e
declaratória; a primeira é a que deduz em juízo a Cautelar*
pretensão punitiva, por meio da denúncia ou da
queixa, imputando-se ao acusado uma conduta típica, ilícita e culpável, visando uma sentença que torne
concreta a sanção que a lei prevê em abstrato; a segunda visa criar, modificar ou extinguir uma situação
jurídica (por exemplo, revisão criminal, pedido de homologação de sentença penal estrangeira e hábeas
corpus para anular determinado processo por ausência de citação); a terceira pretende a declaração da
existência ou não de uma relação jurídica (hábeas corpus buscando a declaração da extinção da punibilidade,
nos termos do artigo 648, VII do CPP).

Não temos no processo penal uma ação cautelar estruturada e sistematizada; não se enxerga autonomia e
disciplina própria de um processo cautelar (como havia no processo civil). Quando muito, podemos falar em
medidas cautelares que tutelam situações pontuais e específicas, em variados temas do processo penal. A
lei prevê, como faz no artigo 319 do Código de Processo Penal, diversas medidas cautelares, mas elas estão
espalhadas e sem sistematização. São exemplos de medidas cautelares a prisão preventiva, a busca e
apreensão, a fiança, o monitoramento eletrônico, dentre outras (Lima, 2021).

Temos processo de execução na área criminal - a pena deve ser executada -, só que ele é diferente em relação
ao que conhecemos do processo civil. Na área criminal a execução não se submete ao princípio da demanda,
o início não depende da iniciativa da parte. A expedição da guia é suficiente para isso. Vejamos a Lei de
Execução Penal:

Art. 105. Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu
estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução.

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Art. 171. Transitada em julgado a sentença que aplicar medida de segurança, será ordenada a
expedição de guia para a execução.

A execução das penas restritivas de direitos pode ser iniciada mediante requerimento do Ministério Público,
mas a lei também prevê que o juiz pode dar início a sua execução de ofício.

Art. 147. Transitada em julgado a sentença que aplicou a pena restritiva de direitos, o Juiz da
execução, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, promoverá a execução, podendo,
para tanto, requisitar, quando necessário, a colaboração de entidades públicas ou solicitá-la a
particulares.

Temos, ainda, a execução da pena de multa. No ponto, inicialmente o STJ entendeu que a legitimidade para
execução seria da Fazenda Pública, editando a Súmula 521:

A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória
é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. [SUPERADA]

Posteriormente, na ADI 3150 (Informativo 927), julgada em dezembro de 2018, o Plenário do STF, por
maioria, assentou “a legitimidade do Ministério Público (MP) para propor a cobrança de multa decorrente
de sentença penal condenatória transitada em julgado, com a possibilidade subsidiária de cobrança pela
Fazenda Pública (Informativo 848)”:

O colegiado assentou que a Lei 9.268/1996, ao considerar a multa penal como dívida de valor,
não retirou dela o caráter de sanção criminal que lhe é inerente, por força do art. 5º, XLVI, c, da
Constituição Federal (CF) (2). Como consequência, a legitimação prioritária para a execução da
multa penal é do MP, perante a vara de execuções penais. Entretanto, caso o titular da ação
penal, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de noventa dias, o
juiz da execução criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública
(federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria vara de execução
fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/1980. [...] A natureza de sanção penal dessa espécie
de multa é prevista na própria CF, razão pela qual o legislador ordinário não poderia retirar-lhe
essa qualidade. Diante de tal constatação, não há como retirar do MP a competência para a
execução da multa penal, considerado o teor do art. 129 da CF (3), segundo o qual é função
institucional do MP promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei. Promover a
ação penal significa conduzi-la ao longo do processo de conhecimento e de execução, ou seja,
buscar a condenação e, uma vez obtida esta, executá-la. Caso contrário, haveria uma interrupção
na função do titular da ação penal. Ademais, o art. 164 da Lei de Execução Penal (LEP) (4) é
expresso ao reconhecer essa competência do MP. Esse dispositivo não foi revogado
expressamente pela Lei 9.268/1996 (ADI 3150/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12 e
13.12.2018).

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1 - CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS DE ACORDO COM O PROCESSO


PENAL

No âmbito do processo penal, a doutrina costuma classificar a ação penal a partir da legitimação ativa,
tomando em conta a natureza do crime praticado. Duas grandes espécies se colocam num primeiro
momento: a ação penal pública e a ação penal privada.

A primeira subdivide-se em condicionada e incondicionada, muito embora haja segmento


doutrinário que refira, ainda, uma terceira modalidade de ação pública rotulada de ação penal
pública subsidiária da pública; já a segunda subdivide-se em privada exclusiva, privada subsidiária
da pública e privada personalíssima. Sem embargo dessa divisão clássica, um terceiro gênero
ainda precisa ser mencionado, consistente na chamada ação penal popular, de
constitucionalidade bastante questionável, sendo refutada pela maioria dos autores (Avena,
2020).

Veja-se o quadro elaborado por NORBERTO AVENA:

Incondicionada
À representação do
ofendido
Condicionada
À requisição do Ministro
Pública da Justiça

Esta modalidade de ação


penal é referida apenas
Subsidiária
por parcela doutrinária,
da Pública
não integrando a divisão
clássica da ação penal
Exclusiva
Ação Penal
Personalíssi
Privada
ma

Subsidiária
da Pública
Embora prevista no art. 14 da Lei
1.079/1950, possui constitucionalidade
Popular
questionável, sendo refutada pela maioria
doutrinária.
• Ação penal pública - gênero utilizado para designar a ação penal intentada pelo Ministério Público.
Se subdivide:

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 72


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• incondicionada - quando a atuação do Ministério Público não depende de nenhuma condição; é a


regra no processo penal brasileiro;
• condicionada - nos casos em que a atuação do Ministério Público é dependente de uma condição
normativa; é exceção e só vai existir diante de previsão expressa;
• subsidiária da pública - essa classificação não é pacífica na doutrina e, a grosso modo, representa
situações em que um órgão do Ministério Público atua diante da omissão de outro. Para os adeptos
dessa orientação, a referida modalidade de ação penal encontra-se prevista nas seguintes situações:

1) De acordo com o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei 201/1967, que dispõe sobre crimes de
responsabilidade de prefeitos e vereadores, “se as providências para a abertura do inquérito
policial ou instauração da ação penal não forem atendidas pela autoridade policial ou pelo
Ministério Público estadual, poderão ser requeridas ao Procurador-Geral da República”. Para
grande parte da doutrina, esse dispositivo não foi recepcionado pela Constituição Federal, quer
porque desloca para Justiça Federal competência que não está prevista no art. 109 da
Constituição Federal, quer porque atenta contra a autonomia dos Ministérios Públicos dos
Estados, ou o oferecimento e ação penal privada subsidiária da pública, nos termos do art. 29 do
CPP;

2) Outra espécie de ação penal pública estaria prevista no art. 357, §§ 3º e 4º, do Código Eleitoral.
De acordo com o art. 357, § 3º do Código Eleitoral, “se o órgão do Ministério Público não oferecer
a denúncia no prazo legal, representará contra ela a autoridade judiciária, sem prejuízo da
apuração da responsabilidade penal”. Por sua vez, dispõe o art. 357, § 4º, do referido Códex que
“ocorrendo a hipótese prevista no parágrafo anterior o juiz solicitará ao Procurador Regional a
designação de outro promotor, que, no mesmo prazo, oferecerá a denúncia”. Como o Ministério
Público dos Estados atua por delegação nos crimes eleitorais, permanecendo o Promotor
eleitoral inerte, é possível que o Procurador Geral Eleitoral designe outro órgão do MP para
oferecer denúncia.

3) Uma última subespécie de ação penal pública subsidiária da pública pode se dar nos casos de
incidente de deslocamento de competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal (IDC).
Referida medida, [...] foi inserida na Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 45/04
[...], estando o deslocamento da competência subordinado à presença de dois requisitos: 1)
crime com grave violação aos direitos humanos; 2) risco de descumprimento de obrigações
decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, em
virtude da inércia do Estado-membro em proceder à persecução penal. Como o IDC importa em
deslocamento da competência da Justiça Estadual, onde atua o Ministério Público dos Estados,
para a Justiça Federal, onde funciona o Ministério Público Federal, tem-se aí mais uma espécie
de ação penal pública subsidiária da pública (Lima, 2021).

• Ação penal privada – aquela cuja iniciativa foi outorgada ao particular, considerando a existência de
interesse ou direito muito próprio da vítima; o desencadeamento do processo vai depender e passar,
necessariamente, pela vontade da vítima ou de seu representante. São exceção, e a escolha dos
crimes de iniciativa privada observa critérios de política criminal, tendo em conta,
preponderantemente, os bens jurídicos atingidos pelo delito e os interesses do ofendido. Se
subdividem, conforme segue.

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• Ação penal privada exclusiva - o desencadeamento do processo depende da própria iniciativa da


vítima ou de seu representante legal. Não há inicial legitimidade para o Estado atuar.

É que, em tais hipóteses, a vítima, já afetada pela prática do crime, pode sentir-se ainda mais
prejudicada em razão do constrangimento natural causado pela natureza da infração e pela
exposição da sua intimidade provocada pela amplitude dos debates que ocorrem na esfera
judicial. A ação penal privada exclusiva é intentada mediante queixa-crime, a qual poderá ser
proposta pelo ofendido (se maior de 18 anos e capaz); por seu representante legal (se o ofendido
for menor de 18 anos ou incapaz), pelo seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, no caso
de morte ou de declaração judicial de ausência (art. 31 do CPP).

• Ação penal privada personalíssima - a titularidade compete única e exclusivamente ao próprio


ofendido; não é cabível a sucessão processual; o representante legal da vítima não poderá atuar.

E se ocorrer o falecimento do ofendido? Neste caso, nada poderá ser feito, devendo ser extinta a
punibilidade do ofensor. E se o ofendido for incapaz (v.g., por enfermidade mental)? Do mesmo
modo, a queixa não poderá ser exercida, tendo em vista sua incapacidade de estar em juízo e a
impossibilidade de ser representado no polo ativo da ação penal por representante legal ou
curador nomeado pelo juiz. Logo, nesta situação, resta aguardar a cessação da incapacidade.
Havendo este restabelecimento, poderá o ofendido, então, ajuizar a queixa-crime, salientando-
se que, no período em que permaneceu incapaz, o prazo decadencial permaneceu suspenso. Na
atualidade, em vista da revogação do crime de adultério (que também ensejava esta forma de
ação penal), a única hipótese de crime de ação penal privada personalíssima refere-se ao
induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, tipificado no art. 236 do Código
Penal. Basta ver que o parágrafo único desse dispositivo dispõe que “a ação penal depende de
queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado
a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento”. E como fica a situação
do contraente, por exemplo, com 17 anos de idade, que tenha sido enganado pelo outro cônjuge
de forma a configurar a figura típica em exame? Não se duvida de que o casamento importa em
emancipação, conforme reza o art. 5.º, parágrafo único, II, do Código Civil. Não obstante esta
circunstância, é certo que a emancipação derivada do casamento subsiste tão somente para os
fins civis e não para os fins do direito processual penal. Nesta órbita, o casamento não supre a
incapacidade, continuando a vedação do emancipado para prática de atos processuais penais
que exigem a idade de 18 anos como, por exemplo, para promover a ação penal. Assim, no caso
do art. 236 do Código Penal, se o contraente enganado possuir idade inferior a 18 anos, a queixa-
crime não poderá ser proposta por ele, pois não tem capacidade processual (ou seja, legitimidade
para praticar atos válidos no processo), tampouco poderá ele ser representado por outrem em
face da natureza personalíssima da ação penal privada neste caso. Deverá, então, aguardar os 18
anos de idade, para somente após ajuizar a ação. Até lá, evidentemente, não correrá o prazo
decadencial de seis meses (art. 38 do CPP) (Avena, 2020).

• Ação penal privada subsidiária da pública ou ação penal acidentalmente privada - "corresponde a
uma ação penal privada ajuizada em relação a crime de ação pública, justificando-se quando,
esgotado o prazo do Ministério Público, este não ofereceu a competente denúncia. O início do
processo criminal, neste caso, ocorrerá mediante a dedução da queixa-crime subsidiária". Eis a
previsão constitucional, no art. 5º:

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LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo
legal;

Doutrina Complementar

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010):
“Alguns autores, decerto pela influência que sofreram dos processualistas civis, procuraram e
procuram adaptar ao Processo Penal a moderna classificação das ações do Processo Civil,
classificação esta que se baseia na tutela jurisdicional invocada. [...] A ação se diz de
conhecimento porque obriga o Juiz ao exame da lide ‘para o fim de descobrir e formular a regra
jurídica concreta que deve regular o caso’, como bem diz Liebman (cf. Processo de execução, 2.
ed., Saraiva, 1963, p, 32). Tomando conhecimento da pretensão deduzida e da resposta do réu,
colhe as provas, analisa-as, interpreta a norma, desenvolvendo, assim, intensa atividade para
poder aplicar a lei àquele caso concreto. [...] Essa ação de conhecimento pode ser condenatória,
constitutiva ou declaratória. Diz-se condenatória quando visa a uma sentença de condenação.
Nesses casos, o Juiz declara a existência da relação jurídico-material e, ao mesmo tempo, impõe
a sanctio juris ao transgressor da norma. [...] Constitutiva é aquela destinada a criar, extinguir ou
modificai uma situação jurídica. [...] Finalmente, declaratórias, também denominadas
meramente declaratórias, que visam apenas à declaração da existência ou inexistência de uma
relação jurídica. Já se disse que a tarefa do Juiz, antes de mais nada, é necessariamente
declaratória. Mas, nas denominadas ações declaratórias, objetiva-se tão só uma providência
jurisdicional meramente declaratória, Quando o pedido visa à declaração da existência da relação
jurídica, a ação se diz declaratória positiva; quando objetiva a declaração da inexistência da
relação jurídica, é denominada declaratória negativa. [...] Ação cautelar. A decisão, no processo
de conhecimento, é, muitas vezes, demorada, e tal demora pode carretar prejuízos à parte.
Assim, para assegurar os efeitos de uma providência principal, a parte pode solicitar, por meio
da ação cautelar, medidas urgentes e provisórias. [...] Ação executiva. Quando o Juiz, na ação de
conhecimento de tipo condenatório, declara o direito em favor do autor e impõe a sanctio juris
ao réu, se este não atender ao preceito sancionador contido na sentença condenatória, restar á
ao vencedor, para tornar efetiva a sanctio juris, promover ‘ação executiva’, em que se realizam
atos executórios visando satisfazer o direito do exequente, já proclamado na sentença final da
ação de conhecimento”. [...] Após esse panorama, o autor questiona acerca da possibilidade de
agregar-se esse tipo de classificação ao processo penal (o que é questão polêmica), citando vários
doutrinadores, dentre os quais será transcrito trecho de Frederico Marques, que bem ilustra, por
meio de exemplos, como essas diversas espécies de ações estariam incorporadas ao processo
penal: “Isto posto, pergunta-se: Tal classificação — feita em razão da tutela jurisdicional invocada
— pode ser adaptada ao Processo Penal? Frederico Marques, que tem sido, entre nós, o defensor
da adaptação dessa classificação ao Processo Penal, dá como exemplo de ação declaratória o
pedido de habeas corpus com fundamento no art. 648, VII. Como exemplos de ação constitutiva,
a revisão criminal, o pedido de homologação de sentença penal estrangeira e o pedido de
extradição passiva; como ação cautelar, o habeas corpus com fundamento no art. 648, V, e as
medidas a que se referem os arts. 311 a 316 do CPP. Quanto às ações executivas, diz ele, o único
caso é o do art. 688, I, do CPP, que equivale, afirmamos agora, ao art. 164 da Lei de Execução
Penal, que trata da ação de execução da pena de multa. Aceitando essa classificação, teremos a
ação penal no sentido restrito, compreendendo aquela disciplinada nos arts. 100 a 106 do CP,

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que seria a ação penal condenatória, e a ação penal em sentido amplo, abrangendo todas as
modalidades de ação penal, desde a condenatória até a executória”.

GUILHERME MADEIRA DEZEM (Curso de Processo, São Paulo: RT, 2020). “A primeira classificação,
defendida por José Frederico Marques,1 vê a tutela que o autor pretende para a classificação da
ação penal. É uma classificação muito similar à classificação das ações cíveis, daí porque temos:
a) Ação penal de conhecimento, que possui três subdivisões: a1 – declaratória; a2 constitutiva;
a3 – condenatória. b) Ação penal cautelar; c) Ação penal executiva. Já a segunda classificação é
a classificação tradicional e usual na doutrina. Refere-se à legitimidade ativa para a propositura
da ação, e a necessidade ou não do preenchimento de algum requisito específico. Por esta
classificação, temos: a) Ação penal de iniciativa pública, que possui duas subdivisões: a1 – ação
penal de iniciativa pública incondicionada; a2 – ação penal de iniciativa pública condicionada. b)
Ação penal de iniciativa privada, que possui três subdivisões: b1 – ação penal de iniciativa privada
propriamente dita; b2 – ação penal de iniciativa privada personalíssima; b3 – ação penal de
iniciativa privada subsidiária da pública)”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012): “Quanto à
natureza do provimento pretendido, a ação penal pode ser declaratória, constitutiva e
condenatória. Será declaratória, positiva ou negativa, se o pedido limitar-se à definição de uma
situação jurídica vinculada ao direito penal, eliminando a incerteza que possa existir sobre ela,
como por exemplo um habeas corpus para declarar a extinção da punibilidade de um fato em
face da ameaça de em relação a ele instaurar-se procedimento penal. Será constitutiva se a
pretensão for a de alterar situações jurídicas, como, por exemplo, um habeas corpus para o
trancamento de ação penal condenatória ou uma revisão criminal para desfazer sentença de
condenação. Será condenatória se o pedido for de aplicação de sanção, pena ou medida de
segurança. Há ações originalmente civis que, por questionarem decisões do processo penal,
tornam-se penais porque seu reflexo será naquele processo, como, por exemplo, o mandado de
segurança contra atos do juiz penal ou os embargos de terceiro contra a decisão que determinou
o sequestro (CPP, art. 129). Entendo não ser cabível, no processo penal, a distinção entre ações
de conhecimento, execução e cautelares, porque a única existente é a de conhecimento. A
execução penal não é ação, porque não há pedido de tutela jurisdicional específica. Trata-se de
um procedimento complementar à sentença com incidentes próprios. A execução se realiza por
força da própria sentença, que já tem carga executiva. Executa-se por ordem do juiz, per officium
iudicis, independentemente da instauração de nova relação processual. A situação assemelha-se
à execução imprópria do processo civil, das chamadas sentenças de força. Também inexiste ação
ou processo cautelar. Há decisões ou medidas cautelares, como a prisão preventiva, o sequestro
e outras, mas sem que se promova uma ação ou se instaure um processo cautelar diferente da
ação ou do processo de conhecimento. As providências cautelares são determinadas como
incidentes do processo de conhecimento. Não se deve confundir, contudo, a função acautelatória
de certas ações de conhecimento que são definitivas, como o habeas corpus preventivo. Essa
finalidade acautelatória, de prevenir litígios, é uma das características ou aspectos da jurisdição,
mas o pedido e consequentemente o provimento são definitivos”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “A par da tradicional
classificação das ações em geral, levando-se em conta a natureza do provimento jurisdicional
invocado (de conhecimento, cautelar e de execução), no processo penal é corrente a divisão

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subjetiva das ações, isto é, em função da qualidade do sujeito que detém a sua titularidade.
Segundo esse critério, as ações penais serão públicas ou privadas, conforme sejam promovidas
pelo Ministério Público ou pela vítima e seu representante legal, respectivamente. É o que diz o
art. 100, caput, do Código Penal: A ação penal é pública, salvo quando a lei, expressamente, a
declara privativa do ofendido’. Dentro dos casos de ação penal pública (exclusiva do Ministério
Público), ainda há outra subdivisão, em ação penal pública incondicionada e condicionada. No
primeiro caso, o Ministério Público promoverá a ação independentemente da vontade ou
interferência de quem quer que seja, bastando, para tanto, que concorram as condições da ação
e os pressupostos processuais. No segundo, a sua atividade fica condicionada também à
manifestação de vontade do ofendido ou do seu representante legal. [...] Há outros que, por sua
vez, atingem imediata e profundamente o interesse do sujeito passivo da infração. Na maioria
desses casos, pela própria natureza do crime, a instrução probatória fica, quase que por inteiro,
na dependência do concurso do ofendido. Em face disso, o Estado lhe confere o próprio direito
de ação, conquanto mantenha para si o direito de punir, a fim de evitar que a intimidade,
devassada pela infração, venha a sê-lo novamente (e muitas vezes com maior intensidade, dada
a amplitude do debate judicial) pelo processo. São os casos de ação penal privada”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019) aponta
para o que considera como impropriedade na nomenclatura das ações, dentro de sua
classificação subjetiva: “Conquanto o uso corrente tenha consagrado essa terminologia, tem-se
que as expressões ‘ação penal pública’ e ‘ação penal privada’ não coadunam de forma precisa
com os conceitos que representam. Com efeito, conforme se viu anteriormente, a ação penal é
sempre um direito público. Não é, dessa forma, de todo correto afirmar a existência de uma ação
penal privada. Privada não é a ação, mas sim a qualificação do sujeito que irá exercê-la. A ação,
seja enquanto direito, seja enquanto poder, é pública mesmo quando exercida por um acusador
que não atue em nome do Estado. Dessarte, onde a lei fizer referência à ação penal pública e à
ação penal privada, deve-se compreender que as expressões mais adequadas para designá-las
seriam ‘ação penal de iniciativa pública’ e ‘ação penal de iniciativa privada’. De fato, entre um e
outro tipo de ação não há diferenças essenciais. O que varia é tão somente o sujeito legitimado
para a propositura da ação: no caso da ação penal pública, somente o Ministério Público poderá
ajuizá-la. Por outro lado, a ação penal privada é aquela ajuizada por um sujeito privado.” Em
seguida, o autor dispõe sobre a classificação das ações em relação à titularidade do direito de
ação: “Feita a ressalva — e admitindo o uso corrente da nomenclatura que resulta na distinção
entre ação penal pública e privada —, é de destacar também que cada um desses gêneros
contém espécies. A ação penal pública pode ser incondicionada ou condicionada, enquanto a
ação penal privada poderá ser principal (ou exclusiva), subsidiária da ação penal pública ou
personalíssima”.

Jurisprudência pertinente

Superior Tribunal de Justiça

[...] a peça acusatória apenas delimita a qual espécie de ação penal responde o paciente, valendo-
se de uma das classificações existentes na doutrina, que comumente subdivide as ações penais
de conhecimento em declaratórias, constitutivas e condenatórias. [...] Não obstante essas
ponderações, não há constrangimento na utilização da nomenclatura 'ação penal condenatória'.

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Isso porque essa é a classificação dada à ação penal instaurada pelo Estado contra o acusado. [...]
(HC 88.448/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe
02/08/2010)

PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL


As ações penais têm os seus contornos delineados e suas bases definidas por uma miríade de diferentes
princípios. Esses mandamentos nucleares variam de acordo com a classificação das ações em públicas ou de
iniciativa privada. Vejamos, então, esses princípios.

1 - PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA


Como a própria nomenclatura já manifesta, a atuação do Ministério Público nas ações penais públicas, das
quais é o titular, é obrigatória. Perceba o que dispõe o art. 24 do Código de Processo Penal:

Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público,
mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação
do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

Perceba que o dispositivo legal prescreve um verdadeiro comando: ‘será promovida’; a atuação não é
faculdade conferida ao parquet. Isso significa que, apurados elementos de informação suficientes que deem
conta da existência de um fato típico, ilícito e culpável, e presentes as condições da ação, o Ministério Público
deve oferecer a competente denúncia (Lima, 2018). Não se trata de uma livre escolha, portanto.

A contrario sensu, estando o membro do Ministério Público convicto da ausência de um dos substratos do
crime ou das condições da ação penal, poderá (deverá, em respeito à boa prática) promover o arquivamento
do inquérito e deixar de oferecer a denúncia, invocando as razões que o conduziram a tal atitude. Isso se
constata da leitura do art. 28 do CPP (com a redação anterior ao Pacote Anticrime):

Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o


arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de
considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de
informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do
Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então
estará o juiz obrigado a atender.

Além disso, note que o mesmo artigo ainda se apresenta como mecanismo de controle do referido princípio,
como bem lembra MARCÃO: “Note-se que em sede de art. 28 do CPP incide fenômeno estranho, em que o
juiz de direito passa a funcionar como fiscal do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, tarefa
que segue complementada pela atuação específica do Procurador-Geral de Justiça” (Marcão, 2017).

É certo que a redação do art. 28 do CPP foi alterada pela Lei 13.964/2019. Diante do novo texto o juiz perderia
essa função atípica de ‘fiscal’ da obrigatoriedade. Em caso de arquivamento, o juiz não mais atuaria, ficando
uma instância revisional do MP encarregada da homologação. Todavia, essa nova redação está com a

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vigência e eficácia suspensas pelo STF (ADIs 6.298, 6.299, 6300 e 6.305), não se sabe até quando. Então,
atualmente, para efeito de arquivamento, observa-se a redação antiga do art. 28, aqui transcrita.

Importante registrar que o princípio da obrigatoriedade nas ações penais públicas não é absoluto, havendo
previsão de sua mitigação (ou mera contemporização, para alguns), na própria Constituição Federal, em
relação aos crimes de menor potencial ofensivo e outras situações na persecução penal.

Atualmente, o princípio sofreu inegável mitigação com a regra do art. 98, I, da Constituição da
República, que possibilita a transação penal entre Ministério Público e autor do fato, nas
infrações penais de menor potencial ofensivo (...). [...] A possibilidade de transação (proposta de
aplicação de pena não privativa de liberdade) está regulamentada pelo art. 76 da Lei n. 9.099/95,
substituindo, nestas infrações penais, o princípio da obrigatoriedade pelo da discricionariedade
regrada (o Ministério Público passa a ter liberdade para dispor da ação penal, embora esta
liberdade não seja absoluta, mas limitada às hipóteses legais) (Capez, 2018).

No mesmo sentido, PAULO RANGEL:

Porém, diante das chamadas infrações penais de menor potencial ofensivo (cf. art. 61 da Lei do
JECRIM), o princípio tem atenuado este caráter e passa a ter um valor relativo, pois, para nós, ele
foi mitigado. O legislador da Lei nº 9.099/1995, ao estabelecer a transação penal (cf. art. 76),
permitiu ao Ministério Público deixar de propor ação penal, mesmo que o fato seja típico, ilícito
e culpável, e presentes todas as condições para o regular exercício da ação penal pública. Nesse
caso, deve sim, o Ministério Público oferecer proposta de transação penal, desde que ausente
qualquer condição negativa do § 2º do art. 76 da mencionada lei (Pacelli, et al., 2018).

Nas lições de BRASILEIRO, todavia, para além da transação penal, há outras hipóteses de exceção ao princípio
da obrigatoriedade. Vale a transcrição:

b) termo de ajustamento de conduta: [...] Para além disso, não se pode perder de vista que o
cumprimento das penas restritivas de direitos a que estão submetidas as pessoas jurídicas
(interdição temporária de direitos, suspensão parcial ou total de atividades e prestação
pecuniária – Lei nº 9.605/98, art. 8º) pode ser obtido por meio do termo de ajustamento de
conduta, sem a necessidade de se iniciar um processo penal, com todos os custos dele
decorrentes, seja para o acusado, que se livraria das cerimônias degradantes do processo penal,
seja para o próprio Ministério Público, que passaria a se preocupar com os delitos mais graves.
Portanto, lavrado um termo de ajustamento de conduta, e desde que o acordo esteja sendo
cumprido, o oferecimento de denúncia em razão de ilícito ambiental praticado perde
completamente o sentido e, em especial, a utilidade, condição da ação penal sem a qual não é
possível a deflagração da persecutio criminis in judicio. Logo, pelo menos enquanto houver o
cumprimento do quanto acordado no termo de ajustamento de conduta, o Ministério Público
está impedido de oferecer denúncia. [...]

c) parcelamento do débito tributário: o parcelamento do débito tributário também figura como


exceção ao princípio da obrigatoriedade, já que a sua formalização antes do recebimento da
denúncia é causa de suspensão da pretensão punitiva, impedindo, pois, o oferecimento da peça
acusatória pelo Ministério Público (Lei nº 9.430/96, art. 83, § 2º).

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d) acordo de leniência: também conhecido como acordo de brandura ou doçura, este acordo é
uma espécie de colaboração premiada prevista na Lei que dispõe sobre o Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência. [...] Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei nº 8.137/90
e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei
nº 8.666/93 e os tipificados no art. 288 do Código Penal, a celebração de acordo de leniência
determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia
com relação ao agente beneficiário da leniência. Ademais, cumprido o acordo de leniência pelo
agente, extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes acima referidos;

e) colaboração premiada na nova Lei das Organizações Criminosas: consoante disposto no art.
4º, § 4º, da Lei nº 12.850/13, se da colaboração do agente resultar um ou mais dos seguintes
resultados – identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das
infrações penais por eles praticadas, a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas
da organização criminosa, a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da
organização criminosa, a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações
penais praticadas pela organização criminosa ou a localização de eventual vítima com sua
integridade física preservada –, o Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se
preenchidos dois requisitos concomitantemente: I – o colaborador não for o líder da organização
criminosa; II – o colaborador for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo;

f) acordo de não persecução penal: o tema foi objeto de análise no título referente à investigação
preliminar [...] (Lima, 2021).

As exceções ao princípio em testilha não constituem matéria pacífica. NESTOR TÁVORA, por exemplo, discorda
do supracitado autor em relação ao termo de ajuste de conduta como exceção ao princípio da
obrigatoriedade, afirmando que esse instrumento não afetaria a atuação do parquet na esfera criminal:

Entendemos que o termo de ajustamento de conduta em procedimento civil para apuração de


infração ambiental não impede a atuação do Ministério Público na esfera criminal pelo crime
ambiental residual ou subjacente. RENATO BRASILEIRO DE LIMA pondera que o ajuste de conduta teria
o condão de evitar que o acusado se submetesse a cerimônias degradantes (status-degradation
ceremony: procedimentos ritualizados que ofendem o status dignitatis do agente, despojando-o
de sua identidade ao ser condenado, e recebendo outra, degradada), restando impedido o
Ministério Público de ofertar denúncia enquanto pender o cumprimento do ajuste. No entanto,
não há previsão legal para autorizar a mitigação à obrigatoriedade. Ao contrário, o princípio da
proteção máxima ao meio ambiente permite concluir que a providência civil, fixada no termo de
ajuste de conduta, só impede a propositura de ação civil pública, não sendo capaz de paralisar a
jurisdição criminal.

O mesmo autor, ainda, discorda de compor a transação penal dos juizados especiais uma verdadeira exceção
à obrigatoriedade, porquanto esse instituto constituiria, em verdade, uma espécie anômala de ‘ação penal’
dotada de obrigatoriedade própria, guardadas as suas peculiaridades. Veja o que afirma TÁVORA:

Como se depreende, a transação penal não é propriamente exceção ao princípio da


obrigatoriedade da ação penal, como sustenta parte da doutrina. A transação penal é ação penal

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pública não convencional tendente a propor a aplicação imediata de pena restritiva de direito,
seguindo um “devido processo legal” abreviado. Convencional é a denúncia, petição inicial da
ação penal pública. Daí que se o Ministério Público estiver diante dos pressupostos para o
oferecimento da transação penal, nos termos do art. 76, da Lei nº 9.099/1995, estará compelido
a propor essa espécie de “ação penal” (transação penal), incidindo o princípio da obrigatoriedade
(Távora, 2017).

Fato é que o princípio da obrigatoriedade está longe de ser absoluto, havendo mitigações, contemporizações
e exceções a esse mandamento espalhados pelo ordenamento jurídico. Esses mecanismos legais de controle
tendem a evitar a instauração desenfreada de processos penais, mormente em casos nos quais tal
deflagração demonstre-se inoportuna e até mesmo desaconselhável quando analisada conjuntamente aos
objetivos e balizas do direito processual penal.

2 - PRINCÍPIO DA OPORTUNIDADE DA AÇÃO PENAL DE INICIATIVA


PRIVADA

Se a ação penal pública é regida pela obrigatoriedade, tendo em vista o compromisso assumido pelo Estado
de monopolizar a atividade jurisdicional e a prestação da justiça, evitando-se a o exercício da autotutela; nas
ações penais de iniciativa privada a deflagração do processo depende exclusivamente da vontade,
conveniência e oportunidade do ofendido ou de seus representantes.

Assim, a existência ou não de uma ação penal de iniciativa privada fica vinculada a um juízo de valoração
interno do ofendido (ou representantes legais), que é livre para ponderar acerca da conveniência de sujeitar
tanto o autor da infração quanto a si mesmo às consequências, incômodos e desgostos próprios de uma
demanda penal.

Nas palavras de RANGEL: “[...] a de iniciativa privada dá a faculdade ao ofendido para verificar se vale a pena
o escândalo do processo para a punição do criminoso, ou se é melhor a impunidade em vez da publicidade
de um fato que diz mais respeito à vida íntima do ofendido” (Pacelli, et al., 2018).

Acaso decida por não exercer o direito de ação, a vítima pode quedar-se inerte e deixar transcorrer in albis
o prazo decadencial de seis meses para o oferecimento da queixa-crime ou mesmo renunciar a esse direito
expressa ou tacitamente, conforme artigos 49 e 50 do CPP (Távora, 2017).

Esses conceitos serão estudados mais adiante; mas servem para demonstrar, desde já, de que modo o
princípio da oportunidade pode se manifestar no processo penal. De qualquer sorte, segue a transcrição dos
citados artigos, bem como do art. 38 – que dispõe sobre o referido prazo decadencial – para conferir maior
familiarização com a matéria:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

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Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a
todos se estenderá.

Art. 50. A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu
representante legal ou procurador com poderes especiais.

3- PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA


Pelo princípio da indisponibilidade da ação penal pública, uma vez exercido o direito de ação, não pode dela
o Ministério Público dispor, por força da clara e simples previsão do art. 42 do CPP:

Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal.

Por mais que detenha a titularidade das ações penais públicas, o processo penal deflagrado não está ao
alvedrio do parquet, o qual, além de não poder desistir da ação, também não tem legitimidade para transigir
quanto ao seu objeto. Justamente nesse sentido, a lição de MOUGENOT BONFIM:

Com efeito, o órgão do parquet, ao ajuizar a ação e conduzir a acusação, não age em interesse
próprio. Representa o Estado, titular do direito defendido, que em última análise pertence à
sociedade como um todo. Assim, não tem o Ministério Público poder para transigir, abrindo mão
de interesse que não lhe pertence (Bonfim, 2019).

Convém notar que, naturalmente, essas regras comportam mitigações, e, novamente, as peculiaridades dos
crimes de menor potencial ofensivo nos juizados especiais criminais as representam (transação, suspensão
condicional do processo). A esse respeito, AVENA:

Diz-se “como regra” porque, assim como ocorre no tocante ao princípio da obrigatoriedade da
ação penal pública, também o princípio da indisponibilidade, excepcionalmente, pode ser
flexibilizado. Como exemplo, a proposta de suspensão condicional do processo, viabilizada ao
Ministério Público por ocasião do oferecimento da denúncia, quando presentes as condições do
art. 89 da L. 9.099/1995. Ainda, a possibilidade de transação penal entre o Ministério Público e o
acusado quando, por força de emendatio libelli ou de mutatio libelli, sobrevier, nos
procedimentos de competência do juiz singular ou do Tribunal do Júri, desclassificação para
infração penal de competência dos Juizados Especiais Criminais (arts. 383, 384, 411, § 3º e 418,
observados os termos da Súmula 337 do STJ, aplicável, por analogia, à transação penal). Sinale-
se, também, a viabilidade, defendida por alguns segmentos dos Ministérios Públicos Estaduais,
do acordo de não continuidade da ação penal, que, por analogia ao acordo de não persecução
penal (cabível na fase pré-processual, consoante disciplina do art. 28-A do CPP), seria facultado
ao promotor de justiça após ter sido ajuizado o processo criminal. Quanto a esta última hipótese,
deve-se ressaltar que se trata de possibilidade que, à época do fechamento da presente edição
deste livro, era acenada por parcela inexpressiva dos Ministérios Públicos dos Estados, razão pela
qual se orienta ao Leitor acompanhar a evolução da matéria, muito especialmente em nível de
legislação institucional em cada Unidade Federativa (Avena, 2020).

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4 - PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE DA AÇÃO PENAL DE INICIATIVA


PRIVADA

Ao contrário das ações penais públicas – indisponíveis, como vimos – ao ofendido (ou seus representantes
legais), nas ações penais de iniciativa privada, é conferida a faculdade de prosseguir ou não até o final do
processo após deflagrada a ação; ou seja, dela pode dispor a qualquer momento.

Nessa esteira, assevera TOURINHO FILHO:

O direito de ação, nesses casos, é exclusivo do particular, isto é, do ofendido. Poderá exercê-lo,
se quiser. [...] E, mesmo que venha a promover a ação penal, poderá a todo instante dispor do
conteúdo material do processo (lide), quer perdoando o ofensor, quer abandonando a causa,
dando lugar à perempção. Perdão e perempção, nos crimes de exclusiva ação penal privada, são,
também, causas de extinção da punibilidade (Filho, 2011).

Percebe-se, então, que o perdão e a perempção constituem maneiras pelas quais o ofendido, não mais
verificando conveniência na continuidade do processo penal após ter exercido o seu direito de ação, pode
dar fim a ele antes do seu natural desfecho (trânsito em julgado da sentença ou acórdão). Essas causas de
extinção da punibilidade serão estudadas em tópico próprio, mais adiante.

RENATO BRASILEIRO concebe, ainda, uma outra hipótese de disponibilidade da ação penal: a conciliação no
procedimento dos crimes contra a honra de competência do juiz singular. Nas palavras do autor:

[...] grande parte dos crimes contra a honra é tida como infração de menor potencial ofensivo, e,
portanto, da competência do Juizado Especial Criminal, já que a pena máxima privativa de
liberdade não é superior a 2 (dois) anos. É o que ocorre, por exemplo, com os crimes de calúnia,
difamação e injúria, previstos nos arts. 138, 139 e 140 do Código Penal, respectivamente. [...]
logo, da competência do juiz singular, o procedimento a ser observado é aquele compreendido
entre os arts. 519 e 523 do CPP. Ali está previsto que, antes de receber a queixa, o juiz oferecerá
às partes oportunidade para se reconciliarem, fazendo-as comparecer em juízo e ouvindo-as,
separadamente, sem a presença dos seus advogados, não se lavrando termo. Se, depois de ouvir
o querelante e o querelado, o juiz achar provável a reconciliação, promoverá entendimento entre
eles, na sua presença. No caso de reconciliação, depois de assinado pelo querelante o termo da
desistência, a queixa será arquivada (CPP, art. 522) (Lima, 2021).

5 - PRINCÍPIO DA (IN)DIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA


A (in)divisibilidade da ação penal pública não é tema pacífico na doutrina. Uma parcela sustenta que,
havendo elementos probatórios suficientes a respeito dos participantes do fato delituoso, deve a ação penal
ser proposta contra todos; ou seja, a ação penal pública seria indivisível. Já a outra parte da doutrina afirma
que o parquet poderia denunciar apenas alguns dos envolvidos, enquanto busca amealhar elementos
suficientes para denunciar os demais, em momento posterior; a ação seria, portanto, divisível.

TOURINHO FILHO, adepto da visão da indivisibilidade da ação penal pública, sustenta:

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Se A, B e C praticam um crime de ação pública, o órgão do Ministério Público é obrigado a


oferecer denúncia contra todos os partícipes do crime, salvo se em relação a algum deles houver
empecilho à propositura da ação penal, como, por exemplo, extinção da punibilidade pela morte,
impossibilidade absoluta de se conseguir, ao menos, seus sinais característicos Caso contrário, a
denúncia será oferecida contra todos. Aliás, vigorando no Direito pátrio o princípio da legalidade,
quanto aos crimes de ação pública, seria superfluidade salientar o legislador que a denúncia
contra um dos autores do crime obrigaria ao processo de todos (Filho, 2011).

Compartilhando dessa visão, leciona BRASILEIRO:

Afinal, se vigora, quanto à ação penal pública, o princípio da obrigatoriedade, não se pode admitir
que o Parquet tenha qualquer margem de discricionariedade quanto aos acusados que figurarão
no polo passivo da demanda. Se há elementos de informação em face de duas ou mais pessoas,
o Ministério Público se vê obrigado a oferecer denúncia contra todos eles (Lima, 2021).

Do lado contrário, adepto da visão da divisibilidade da ação penal pública, NORBERTO AVENA afirma:

Havendo mais de um suposto autor do crime, nada impede que venha o Ministério Público a
ajuizar a ação penal apenas em relação a um ou alguns deles, relegando a propositura quanto
aos demais para momento posterior. Esse procedimento pode justificar-se tanto na necessidade
de serem buscados maiores elementos para amparar o processo penal em relação aos
investigados que não constaram no polo passivo da inicial, como em questão de estratégia
processual. Esta opção do promotor de justiça em não ajuizar, de plano, a ação penal contra
todos os envolvidos, fazendo-o apenas em relação a um ou alguns deles, não acarreta qualquer
tipo de preclusão quanto aos demais, mesmo porque são consolidadas, na doutrina e na
jurisprudência, tanto a possibilidade de aditamento da denúncia a qualquer tempo (desde que
antes da prescrição do crime, obviamente) para inclusão de coautor ou partícipe que não tenha
integrado o polo passivo da relação processual, como a viabilidade de propositura de nova ação
penal contra o corresponsável não incluído em processo já sentenciado. De qualquer modo,
havendo vários indiciados no inquérito e nem todos sendo denunciados, esse procedimento deve
ser justificado pelo promotor no momento do oferecimento da denúncia (Avena, 2020).

Também pela divisibilidade, a lição de GRECO FILHO:

Divisibilidade. No caso de ação pública, o processo pode sempre ser desmembrado, tendo em
vista a conveniência da instrução criminal, sem que, com isso, haja qualquer interferência na
situação penal de cada um dos agentes. É certo que o princípio da necessidade impõe sempre a
ação penal contra todos os autores da infração, mas havendo denúncia contra um apenas não
significa que haja renúncia contra o outro, ou que essa omissão possa interferir na situação penal
do primeiro. Havendo omissão, enquanto não extinta a punibilidade, pode ser suprida pela
adequada denúncia (Filho, 2012).

Se há divergências consideráveis na doutrina a respeito do tema, na jurisprudência dos


tribunais superiores isso se trata de matéria pacífica; tanto para o STF quanto para o STJ a
ação penal pública é divisível. Para visualizar o pronunciamento dos referidos tribunais sobre
o assunto, remetemos o aluno ao item ‘jurisprudência pertinente’ deste tópico.

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6 - PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL DE INICIATIVA


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Conquanto haja discussões a respeito da indivisibilidade ou não das ações penais públicas, nas ações penais
de iniciativa privada não há quaisquer dúvidas: trata-se de ação indivisível. Isso decorre de expressa previsão
legal, conforme art. 48 do Código de Processo Penal:

Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o
Ministério Público velará pela sua indivisibilidade.

Segundo TOURINHO FILHO: “O que se não concebe, sob pena de serem desvirtuados aqueles motivos de política
criminal que determinaram a adoção da ação penal privada, é poder o ofendido processar somente um dos
culpados”.

E continua o autor:

Tão importante é esse princípio que, se o ofendido renunciar ao direito de queixa, isto é, se
abdicar do direito de promover a ação penal quanto a um dos culpados, a todos se estenderá sua
abdicação, conforme dispõe o art. 49 do CPP. Por outro lado, se o ofendido perdoar um dos
culpados, a punibilidade será declarada extinta em relação a todos os corréus, salvo quanto
àquele que recusar o perdão, segundo dispõe o art. 51 do CPP, e, nessa hipótese, o processo terá
andamento em relação ao querelado recusante (Filho, 2011).

Convém registrar que o âmbito de atuação do Ministério Público, ao ‘velar pela indivisibilidade’ da ação penal
de iniciativa privada, é motivo de divergência doutrinária. A celeuma reside na possibilidade ou não de
intervenção direta do parquet na peça acusatória, aditando a queixa para incluir os réus faltantes, e se isso
poderia constituir temerária intromissão no direito de ação do particular ofendido.

A respeito dessa discussão, MOUGENOT BONFIM resume as divergências, elencando três diferentes visões
adotadas sobre o tema. O trecho é bem elucidativo e vale a transcrição integral:

Desrespeitado o princípio da indivisibilidade, deve o Ministério Público, como fiscal da lei, agir
para que sejam processados todos os infratores. A doutrina e a jurisprudência divergem, nesse
ponto, acerca da possibilidade de que o Ministério Público venha a aditar a queixa para incluir os
autores indevidamente excluídos da lide. Sobre essa questão, existem três posições:

a) Para alguns, o membro do parquet, cumprindo ex officio seu dever de agir como fiscal da lei,
deverá aditar a peça acusatória, de forma a incluir os agentes que haviam sido omitidos.

b) Para outros, o aditamento da queixa por parte do Ministério Público representaria usurpação
ao direito de ação, que, no caso específico da ação penal privada, cabe exclusivamente ao
particular. Dessa forma, seria vedado ao órgão do parquet aditar a queixa para nela incluir outros
coautores ou partícipes. Para os adeptos desse entendimento, portanto, a omissão do autor da
ação em incluir esses coautores ou partícipes deverá ser interpretada como o exercício de
renúncia em relação a eles. Ocorre, entretanto, que, por força do mencionado art. 49 do Código

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de Processo Penal, a renúncia exercida em face de uns necessariamente aproveita aos demais,
de modo que a hipótese redundaria na renúncia do querelante com relação a todos os coautores
ou partícipes, equivalendo, em seus efeitos, à renúncia à ação penal como um todo.

c) Finalmente, uma terceira corrente, posicionando-se entre as duas anteriores, defende que,
muito embora seja vedado ao membro do parquet substituir-se ao ofendido para incluir os outros
autores, existe a possibilidade de que o representante do Ministério Público, ao deparar-se com
a situação de que um ou mais agentes tenham sido omitidos pelo querelante, suscite a ocorrência
da omissão, de modo a abrir a oportunidade para que o querelante proceda, desejando, ao seu
aditamento. Somente a recusa do querelante em proceder, por conta própria, ao aditamento da
queixa consubstanciar-se-ia em renúncia ao direito de queixa, nos termos do art. 49 do Código
de Processo Penal. (Bonfim, 2013)

São incomuns precedentes dos tribunais superiores sobre o assunto; todavia, confira-se um julgado do STJ
que adotou a segunda posição, mas de maneira mitigada, admitindo o aditamento da queixa-crime pelo
próprio MP, desde que não o faça para incluir agentes no polo passivo ou para inovar quanto aos fatos
narrados:

Nos termos do artigo 45 do CPP, a queixa poderá ser aditada pelo Ministério Público, ainda que
se trate de ação penal privativa do ofendido, desde que não proceda à inclusão de coautor ou
partícipe, tampouco inove quanto aos fatos descritos, hipóteses, por sua vez, inocorrentes na
espécie (STJ, HC 85.039/SP, rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 05.03.2009).

O seguinte trecho do voto vencedor ilustra a atuação ministerial chancelada pela Corte Superior: “Calha
acentuar que, na hipótese dos autos, o aditamento à queixa promovido pelo Ministério Público se prestou
apenas a melhor esclarecer as circunstâncias em que ocorreram o fato criminoso, limitando-se, destarte, aos
fatos e querelados já apontados, originalmente, na queixa”.

7 - PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA
No âmbito do Direito Penal, o art. 5º, XLV da CF estabelece o mandamento da responsabilidade pessoal ou
pessoalidade da pena:

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano
e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra
eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

O princípio da intranscendência no processo penal é simples decorrência lógica dessa regra material e
preceitua que a ação penal não pode recair sobre pessoas alheias ao fato criminoso, mas apenas sobre o seu
autor, coautor e partícipes.

Nesse sentido, leciona AURY LOPES JR., de maneira simples e objetiva:

A regra não possui maior relevância processual, pois a situação vem circunscrita, previamente,
pelo Direito Penal. A acusação está limitada, na sua abrangência subjetiva, aos limites impostos

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pelo Direito Penal no que se refere à autoria, coautoria e participação. Não havendo o vínculo
concursal, não há que se falar em transcendência da pena ou da acusação. Assim, a acusação
somente pode recair sobre autor, coautor ou partícipe do delito (Júnior, 2021).

Outrossim, AVENA bem sintetiza o tema: “a ação penal será ajuizada contra o responsável pela autoria ou
participação no fato típico, não se incluindo corresponsáveis civis cuja ação do ponto de vista penal foi
irrelevante” (Avena, 2020).

Importante frisar que esse princípio se aplica tanto às ações penais públicas quanto às de iniciativa privada.

8 - PRINCÍPIO DA OFICIALIDADE
A ação penal pública apenas pode ser deflagrada por órgão oficial do Estado; e essa incumbência recai sobre
o Ministério Público. Trata-se, inclusive, de função institucional do parquet positivada no art. 129, I da CF:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

Em verdade, como bem anota PACELLI, tal princípio constitui mera derivação do princípio da obrigatoriedade:

Ora, se há obrigatoriedade da ação, somente o Estado pode responder por ela. Pensamos ser
inimaginável uma ordem jurídica que obrigue o particular a promover a ação penal contra quem
quer que seja. E se o Estado é o responsável, nada mais óbvio que a função ser destinada aos
seus órgãos (art. 129, CF) (Pacelli, 2018).

Como mitigação desse princípio, AVENA aponta a figura da ‘ação penal privada subsidiária da pública’:
“Excetua-se este princípio, contudo, na faculdade conferida ao ofendido pelo art. 29 do CPP e pelo art. 5. º,
LIX, da CF no sentido de ajuizar a ação penal privada subsidiária da pública, quando inerte o Ministério
Público em oferecer denúncia no prazo legal” (Avena, 2020).

Ou seja, por mais que a titularidade da ação penal pública seja do Ministério Público, e por mais que a
deflagração dessa ação seja de sua competência privativa, a própria Constituição Federal, no seu art. 5º, LIX,
previu importante hipótese de exceção ao princípio em comento. Veja-se o que o artigo dispõe:

LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo
legal;

A ação penal subsidiária da pública conta com várias peculiaridades e detalhes; será melhor analisada em
momento oportuno desta aula.

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9 - PRINCÍPIO DA AUTORITARIEDADE
Esse simples princípio estabelece que os órgãos de persecução penal são caracterizados como autoridades
públicas.

Para PACELLI, trata-se, em verdade, de regra atinente à própria oficialidade e de mero aspecto do princípio da
obrigatoriedade:

No campo da oficialidade, mencionam-se, ainda, as regras da autoritariedade e da oficiosidade,


a primeira dizendo respeito ao exercício das funções persecutórias por autoridades estatais e
a segunda explicitando o dever de procedimento ex officio das apontadas autoridades. Como se
percebe, todas essas regras encontram sua raiz comum no princípio da obrigatoriedade da ação
penal pública, sendo, na realidade, meras derivações ou aspectos do mesmo conceito (Pacelli,
2018).

Por derradeiro, sustenta MUCCIO:

Por este princípio, corolário do princípio da oficialidade, acolhido e citado por parte da doutrina,
os encarregados da persecução penal, seja na sua primeira fase (persecutio criminis), seja na
segunda fase (persecutio criminis in judicio), são autoridades públicas. O delegado de polícia
(autoridade policial), a quem se deferiu à persecutio criminis, como o Ministério Público, a quem
se conferiu a persecutio criminis in judicio, ou seja, no processo, em juízo, constitui uma
autoridade pública (sic) (Muccio, 2000).

10 - PRINCÍPIO DA OFICIOSIDADE
Em se tratando de crimes de ação penal pública incondicionada, a persecução penal deve desenvolver-se ex
officio pelos órgãos dotados dessa incumbência; ou seja, devem esses órgãos agir independentemente de
provocação.

Esse princípio é mitigado nos casos das ações penais públicas condicionadas, nas quais tanto a autoridade
policial quanto o Ministério Público dependem da prévia representação por parte do ofendido ou de
requisição do Ministro da Justiça para agir.

Decorre essa visão de expressa previsão legal, conforme o já citado art. 24 do CPP:

Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público,
mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação
do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

Portanto, nessas espécies de ação, caso não seja implementada a condição específica (representação do
ofendido ou requisição do Ministro da Justiça), não há se falar em instauração de inquérito policial tampouco
em oferecimento da denúncia ou consequente deflagração da ação penal.

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Doutrina Complementar

Obrigatoriedade da ação penal pública.

NORBERTO AVENA (Processo Penal, 12ª edição, Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020),
a respeito da relação entre o princípio da obrigatoriedade e a amplitude da análise, pelo
Ministério Público, dos elementos do crime para oferecimento ou não da denúncia, assevera: “A
presença de causa excludente de ilicitude no agir do indiciado pode justificar o não ajuizamento
da ação penal pública? As excludentes de ilicitude ou de antijuridicidade são as previstas no art.
23 do Código Penal, quais sejam: legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do
dever legal e exercício regular de direito. Em tese, aspectos relativos à ilicitude ou não da conduta
do agente são irrelevantes no momento do ajuizamento da denúncia. A consideração a ser
realizada pelo Ministério Público deve respeitar, unicamente, à existência de indícios de autoria
e prova da materialidade de uma infração penal (fato típico), descabendo adentrar nas órbitas
da ilicitude. No entanto, parte da doutrina aceita a possibilidade de não ajuizamento da ação
penal pública em situações nas quais a presença de excludentes da ilicitude seja absolutamente
irrefutável, vale dizer, totalmente estreme de dúvidas. Isto se justifica em questões de economia
processual e também para não submeter ao constrangimento de responder a um processo
criminal a pessoa que, embora tenha praticado conduta típica, agiu evidentemente ao amparo
de uma das causas excludentes de ilicitude previstas em lei. [...] E quando presente causa
excludente de culpabilidade? A culpabilidade envolve fatores de três ordens: potencial
consciência da ilicitude, exigibilidade de conduta diversa e imputabilidade. Logo, excluem a
culpabilidade as seguintes causas: 1) Erro de proibição inevitável (art. 21, caput, 1.ª parte, do CP).
Atuando como hipótese de isenção de pena, esse erro exclui culpabilidade ao elidir a potencial
consciência da ilicitude do fato. Diversamente, o erro de proibição evitável apenas reduz a
culpabilidade e, consequentemente, a pena do agente (art. 21, caput, 2.ª parte, do CP). 2) Coação
moral irresistível e estrita obediência à ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico
(art. 22 do CP). Essas situações afastam a inexigibilidade de conduta diversa, sendo punido
apenas o autor da coação ou da ordem. Veja-se que a coação física irresistível, por refletir na
vontade do agente, incide na tipicidade da conduta e não na culpabilidade. 3) Doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto ou retardado totalmente incapacitantes (art. 26, caput, do
CP), idade inferior a 18 anos (art. 27 do CP) e embriaguez completa proveniente de caso fortuito
ou força maior (art. 28, § 1.º, do CP). Exclui-se, em todos estes casos, a imputabilidade. Observe-
se que a doença mental ou desenvolvimento mental incompleto parcialmente incapacitantes
(art. 26, parágrafo único, do CP), assim como a embriaguez proveniente de caso fortuito ou força
maior incompleta (art. 28, § 2.º, do CP) apenas reduzem a culpabilidade e não a excluem,
acarretando, em consequência, a redução de pena. Pois bem, tocante à possibilidade de
ajuizamento da ação penal pública quando presentes essas causas, é preciso distinguir: a) Jamais
será lícito ao Ministério Público deixar de oferecer denúncia contra o agente ao fundamento da
sua inimputabilidade por doença mental ao tempo do fato (art. 26, caput, do CP), pois, embora
se trate esta de uma excludente da culpabilidade, e, desse modo, imponha a absolvição (art. 386,
VI, 2.ª parte, do CPP), permite a lei a imposição de medida de segurança (art. 386, parágrafo
único, III, do CPP). Assim, mesmo sendo o autor do fato absolutamente incapaz à época da
infração penal, é juridicamente viável a dedução de ação penal contra ele. Não poderá o
promotor, reitere-se, pedir a sua condenação, pois, sendo inimputável, é isento de pena. Todavia,
deverá requerer na denúncia seja ele absolvido com aplicação de medida de segurança. b) Em se

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tratando de inimputabilidade decorrente de menoridade penal (art. 27 do CP), não há de se


cogitar dedução de ação penal, a qual resta inviabilizada pela manifesta ilegitimidade ad causam
passiva do autor do ato infracional (v. item 5.2.1 – c). c) Quanto às outras dirimentes (erro de
proibição inevitável, coação moral irresistível, obediência hierárquica à ordem não
manifestamente ilegal e embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior), tal
como ocorre em relação às excludentes de ilicitude, cremos que tão somente a absoluta certeza
quanto à sua existência, e ainda assim em caráter excepcional, poderá justificar o não
ajuizamento da ação penal pelo Ministério Público e o consequente pedido de arquivamento do
inquérito policial. Atente-se que esta possibilidade de não oferecimento de denúncia por razões
relacionadas à culpabilidade apenas poderá ocorrer quando presentes de forma inequívoca
causas que excluam a culpabilidade, mas não em vista de hipóteses que, simplesmente, reduzam
a culpabilidade (v.g., o erro de proibição evitável previsto no art. 21, caput, 2.ª parte, do CP, e a
semi-imputabilidade consagrada no art. 26, parágrafo único, do CP), já que estas últimas não
impedem a condenação, apenas importando em redução da pena imposta”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012): “A relação entre
a infração penal e a propositura da ação penal é uma relação de obrigatoriedade e não de
eventualidade. Isto não quer dizer, porém, que o Ministério Público não tenha que examinar a
existência de dados probatórios sobre os elementos da infração. Para oferecer denúncia é
preciso que existam elementos probatórios sobre todos os aspectos da infração, sob pena de
inexistir justa causa. No passado, entendia-se que haveria justa causa na simples imputação de
fato típico. Hoje, contudo, reconhece-se que, para haver justa causa, exige-se um juízo de
probabilidade da ocorrência da infração penal quanto a todos os seus elementos, inclusive a
antijuridicidade e a culpabilidade. Para a instauração do inquérito bastou um juízo de pos-
sibilidade. Para a ação exige-se a probabilidade, porque a ação penal já é um constrangimento
que depende de base para submeter qualquer pessoa. Se estiver, por exemplo, cabalmente
demonstrada a inexistência de dolo ou culpa, ou a ocorrência de excludente, não pode o
promotor denunciar. Deve pedir o arquivamento. Na dúvida, porém, deve o promotor denunciar
em virtude do princípio da necessidade e da defesa da sociedade”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “Assim,
tem-se entendido que, para o início da ação penal pública, basta a presença de indícios
suficientes de autoria e prova da materialidade delitiva. Portanto, o Ministério Público não
deverá sequer adentrar o mérito da existência de causas excludentes de ilicitude ou de
culpabilidade. Todavia, em situações específicas em que se afigure inequívoca e evidente a
presença das referidas causas excludentes, entende-se ser possível que o Ministério Público
deixe de ingressar com a ação penal, propondo o arquivamento do inquérito policial”.

Oportunidade da ação penal de iniciativa privada.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “O ofendido tem a
faculdade de propor ou não a ação de acordo com a sua conveniência, ao contrário da ação penal
pública, informada que é pelo princípio da legalidade, segundo o qual não é dado ao seu titular,
quando da sua propositura, ponderar qualquer critério de oportunidade e conveniência. Diante
disto, se a autoridade policial se deparar com uma situação de flagrante delito de ação privada,
ela só poderá prender o agente se houver expressa autorização do particular (CPP, art. 5º, § 5º)”.

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Indisponibilidade da ação penal pública.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016) trata de
algumas questões adjacentes, mas interessantes, dentro do princípio: “Não pode o órgão
ministerial, sequer, desistir do recurso interposto (art. 576, CPP), afinal, a fase recursal é um
desdobramento do direito de ação. Perceba que o MP não é obrigado a recorrer. Contudo, se o
fizer, não poderá desistir do recurso manejado. Esse princípio tem lugar também na ação penal
privada subsidiária da pública na hipótese de abandono da causa pelo querelante, fato que
enseja a tomada da ação pelo Ministério Público com parte autora principal. Cumpre ainda
observar que o MP não é um colecionador de condenações, assumindo o relevante papel de
guardião da sociedade e fiscal da justa aplicação da lei. Apesar de não poder dispor da ação, pode
validamente, em sede de alegações finais, pleitear a absolvição do réu, impetrar habeas corpus
em favor deste, e até recorrer para beneficiá-lo”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “O jus puniendi
pertence ao Estado, que em seu aparelhamento outorga ao Ministério Público o jus persequendi
in judicio, mas não o total e desregrado assenhoramento da ação penal. Na irretocável expressão
de Vicente de Azevedo, o Ministério Público não é o proprietário da ação penal. A necessidade
de solução de litígios e pacificação social, finalidades mediata e imediata do processo penal,
reclama a instauração de processo sempre que presente justa causa para tanto, daí não se
admitirem certas liberalidades ao órgão público incumbido de postular em juízo a prestação
jurisdicional nas ações penais públicas”.

Disponibilidade da ação penal de iniciativa privada.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018): “Uma vez decidido pelo
ofendido propor a ação penal de iniciativa privada (conveniência ou oportunidade), poderá ele a
todo tempo dispor do conteúdo material do processo, desistindo do seu prosseguimento. Esse
princípio é contrário ao da indisponibilidade da ação penal pública. Assim, o fato de ter iniciado
a ação penal, porque lhe era conveniente e oportuno, não significa que, durante o curso desta
ação, o ofendido não possa dela desistir. Pode. Pois, a qualquer tempo, ser-lhe-á lícito conceder
ao réu (querelado) o perdão ou abandonar o processo, perimindo a ação”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012) trata de ponto
interessante, que é a impossibilidade de o querelante transigir quanto ao objeto da lide penal:
“Significa que o querelante pode renunciar, desistir, quer da ação, quer do recurso. Não pode,
porém, transigir, porque a transação envolveria o próprio jus puniendi, que não é seu, mas do
Estado. Aliás o querelante é substituto processual do Estado, porque age em nome próprio sobre
direito de terceiro. O querelante tem disponibilidade sobre a ação, não sobre o direito de punir.
É certo que a disponibilidade sobre a ação pode levar à não punição, mas se o legislador deu ao
crime a ação penal privada, optou conscientemente pela possibilidade de não punir, a critério da
iniciativa do ofendido. Não há, porém, possibilidade de se transacionar sobre o conteúdo da
punição”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “O particular é o
exclusivo titular dessa ação, porque o Estado assim o desejou, e, por isso, é-lhe dada a

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prerrogativa de exercê-la ou não, conforme suas conveniências. Mesmo o fazendo, ainda lhe é
possível dispor do conteúdo do processo (a relação jurídica material) até o trânsito em julgado
da sentença condenatória, por meio do perdão ou da perempção (CPP, arts. 51 e 60,
respectivamente)”.

(In)divisibilidade da ação penal pública.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “A ação penal pública
deve abranger todos aqueles que cometeram a infração. A regra é desdobramento do princípio
da legalidade: se o Ministério Público está obrigado a propor a ação penal pública, é óbvio que
não poderá escolher, dentre os indiciados, quais serão processados, pois isso implicaria
necessariamente a adoção do princípio da oportunidade em relação ao perdoado”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “Há
discordância acerca da aplicabilidade, no caso de ação penal pública, do princípio da
indivisibilidade da ação penal, insculpido no art. 48 do Código de Processo Penal. Tourinho Filho
defende a indivisibilidade da ação penal pública, o que equivaleria a dizer que a ação penal
obrigatoriamente deverá ser ajuizada contra todos os autores da infração penal, havendo
exceção somente nos casos de separação do processo. Em posicionamento contrário, a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece expressamente (RSTJ, 23/145) a
divisibilidade da ação penal pública, tendo decidido no sentido de que ‘o fato de o Ministério
Público deixar de oferecer denúncia contra quem não reconheceu a existência de indícios de
autoria na prática do delito não ofende o princípio da indivisibilidade da ação penal, pois o
princípio do art. 48 do Código de Processo Penal não compreende a ação penal pública, que, não
obstante, é inderrogável’. [...] Dessa forma, especialmente em casos complexos em que estejam
envolvidos diversos investigados, o Ministério Público poderá oferecer denúncia em face
daqueles acerca dos quais houver reunido indícios suficientes de autoria. Com a continuidade
das investigações, poderá, mais tarde, aditar posteriormente a denúncia para a inclusão de
corréu(s), ou mesmo propor, separadamente, nova ação penal contra os indivíduos cuja autoria
somente venha a ser suficientemente esclarecida em ocasião posterior. O que não pode ocorrer,
evidentemente, é o Ministério Público, de forma discricionária, deixar de oferecer denúncia em
face de um ou outro suspeito contra o qual militem provas significativas”.

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “Na ação
penal pública, não há disposição legal direta assegurando-lhe a indivisibilidade. Ela, no entanto,
decorre da adoção do princípio da legalidade ou obrigatoriedade. Por força desse princípio, não
pode o órgão do Ministério Público deixar de promover a ação penal contra todos os autores do
fato (nec delict maneant impunita). O autor da ação penal não pode excluir, sem motivo legal,
qualquer partícipe ou autor do fato. A ação penal pública é, pois, indivisível. Dessa forma, se o
delito foi praticado por João e José, ambos devem ser processados. Se cinco são os autores do
fato, contra os cinco deve a ação penal ser iniciada. Não tem o Ministério Público poder
discricionário para escolher, entre os autores, aqueles contra quem promoverá o processo e os
que ficarão dele excluídos”.

Indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada.

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FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “O ofendido pode
escolher entre propor ou não a ação. Não pode, porém, optar dentre os ofensores qual irá
processar. Ou processa todos, ou não processa nenhum. O Ministério Público não pode aditar a
queixa para nela incluir os outros ofensores, porque estaria invadindo a legitimação do ofendido.
No caso, a queixa deve ser rejeitada em face da ocorrência da renúncia tácita no tocante aos não
incluídos, pois esta causa extintiva da punibilidade se comunica aos querelados (CPP, art. 49).
Convém notar que, na hipótese de não ser conhecida a identidade do coautor ou partícipe do
crime de ação penal privada, não será possível, evidentemente, a sua inclusão na queixa. Nesse
caso, não se trata de renúncia tácita, com a consequente extinção da punibilidade de todos os
demandados, porque a omissão não decorreu da vontade do querelante”.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018), a respeito da atuação do
Ministério Público ao velar pela indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada, assevera:
“Entendemos que a lei legitima o Ministério Público a propor a ação penal pública, que é a regra;
porém, excepcionalmente, permite ao ofendido substituí-lo, processualmente, diante de
determinados crimes que dizem mais respeito ao particular do que ao Estado, sem descuidar que
esta legitimidade não é para ser usada como instrumento de vingança e sim de justiça. Assim, no
momento em que a queixa-crime for oferecida, e no curso da instrução, se descobrirem novos
elementos de culpabilidade de outros indivíduos, deve o Ministério Público aditar (acrescentar)
a queixa para incluí-los, pois, do contrário, não haveria a indivisibilidade necessária da ação penal
que é exigida por lei. Entretanto, se o ofendido deixou de oferecer a queixa em relação a um dos
indivíduos, de forma expressa ou praticando um ato incompatível com o desejo de instaurar a
ação, ocorre a renúncia expressa ou tácita, respectivamente e, consequentemente, dar-se-á a
extinção da punibilidade. [...] Não se diga que o aditamento pelo Ministério Público seria uma
intervenção do mesmo na esfera de disponibilidade do ofendido. Não. Pois o ofendido, se quiser
dispor do conteúdo da ação, poderá fazê-lo através do instituto do perdão, mesmo com o
aditamento do MP, pois o que não se admite é a divisibilidade da ação penal que quis o legislador
fosse indivisível”.

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “O titular da
ação penal privada, o ofendido ou seu representante legal (querelante), não pode escolher, seja
por qual razão for, contra quem oferecerá a queixa-crime. Ou inicia a ação, o processo, contra
todos os autores do fato (querelados), ou simplesmente não promove a ação. Com isso, proíbe-
se a vingança privada. Ao órgão do Ministério Público compete o aditamento da queixa para
incluir o querelado excluído, e, no prazo de 03 (três) dias (art. 46, § 2º, do CPP). O perdão na ação
penal privada, causa extintiva da punibilidade do querelado, pode excepcionar o princípio da
indivisibilidade. Nos termos do art. 51 do CPP, o perdão concedido a um dos querelados
aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação ao que o recusar”.

Intranscendência.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “A ação penal só
pode ser proposta contra a pessoa a quem se imputa a prática do delito. Salienta-se esse princípio
em virtude do fato de que há sistemas em que a satisfação do dano ex delicto faz parte da pena,
devendo, por isso, ser pleiteada pelo órgão da acusação em face do responsável civil. A ação
engloba, assim, além do provável sujeito ativo da infração, também o responsável pela

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indenização. Não é o sistema adotado no Brasil, como se vê. Entre nós vigora a intranscendência
da ação penal, seja pública ou privada”.

Oficialidade.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012): “A oficialidade
tem dois aspectos. Significa que a ação pública é de iniciativa de um órgão público, o Ministério
Público, e, também, que ela se desenvolve por impulso oficial. As partes não precisam requerer
a prática de atos processuais, que serão determinados de ofício pelo juiz. Recebida a denúncia,
independentemente de pedido, o juiz designa interrogatório, mandando citar o réu etc.”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “A instauração do
processo e a prestação jurisdicional ocorrem no âmbito do Poder Judiciário, que para tanto
x’dispõe de seus órgãos Constitucionalmente delineados (CF, art. 92). Como se vê, a persecução
penal em sentido amplo – da investigação ao término da prestação jurisdicional – é monopólio
do Estado, que desenvolve todas as atividades correspondentes por meio de seus órgãos
Constitucionalmente dispostos. Os órgãos incumbidos da persecução penal são oficiais, daí a
ação penal encontrar-se envolvida pelo princípio da oficialidade”.

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “De fato,
quem promove a ação penal pública incondicionada é o órgão do Ministério Público. Esse órgão
pertence ao Estado-Administração. É, portanto, um órgão estatal. É público, oficial, porque
pertence ao Estado, tanto que não age em nome próprio, e sim em nome daquele. [...] Como o
Estado não pode estar em juízo pessoalmente, foi instituído o Ministério Público, que, em seu
nome, deduz sua pretensão punitiva por meio da ação penal, instrumento que viabiliza a atuação
do Direito Penal objetivo”.

Oficiosidade.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “Na ação penal pública
incondicionada, os órgãos incumbidos da persecução devem agir de ofício – ex officio –, pois não
dependem de provocação de quem quer que seja. De ver, entretanto, que o sistema acusatório
adotado e regras expressas impedem que o juiz proceda de ofício em determinadas situações,
mesmo diante de ação penal pública incondicionada. É o que ocorre, por exemplo, com a
impossibilidade de decretação de prisão preventiva ou imposição de medida cautelar restritiva
ex officio na fase de investigação, a teor do disposto nos arts. 282, § 2º, e 311, do CPP”.

Jurisprudência pertinente

Supremo Tribunal Federal

Princípio da divisibilidade da ação penal pública incondicionada. Não obrigatoriedade da


denúncia contra todos os infratores em idêntico tempo e ato processual. [...] (RHC 126423 AgR,
Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 07/10/2016)

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O Supremo Tribunal Federal possui clara orientação no sentido de que a regra da


indivisibilidade da ação penal tem campo de incidência específico à ação penal privada (art. 48
do Código de Processo Penal). Precedentes. [...] (Inq 3979, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda
Turma, julgado em 27/09/2016)

A indisponibilidade da ação penal pública não proíbe que o Ministério Público possa opinar
pela absolvição do réu, mas exclui a vinculação do juízo à manifestação do Parquet, tendo em
vista a vedação inscrita nos artigos 42 e 576 do Código de Processo Penal, que impedem o
Ministério Público de desistir da ação penal ou do recurso que haja interposto. [...] (AP 921,
Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 20/06/2017)

Tratando-se de ação penal privada, o oferecimento de queixa-crime somente contra um ou


alguns dos supostos autores ou partícipes da prática delituosa, com exclusão dos demais
envolvidos, configura clara hipótese de violação ao princípio da indivisibilidade (CPP, art. 48),
implicando, por isso mesmo, renúncia tácita ao direito de querela (CPP, art. 49), cuja eficácia
extintiva da punibilidade estende-se a todos quantos alegadamente hajam intervindo no
cometimento da infração penal (CP, art. 107, V, c/c o art. 104). Doutrina. Precedentes. (Inq 2139
AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 13/09/2006)

Superior Tribunal de Justiça

A litispendência guarda relação com a ideia de que ninguém pode ser processado quando está
pendente de julgamento um litígio com as mesmas partes (eadem personae), sobre os mesmos
fatos (eadem res), e com a mesma pretensão (eadem petendi), que é expressa por antiga
máxima latina, o ne bis in idem (HC 229.650/SP, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA
TURMA, julgado em 8/3/2016)

Doutrina e jurisprudência não admitem o chamado "arquivamento implícito" em sede de ação


penal pública incondicionada, porquanto não vigora para o Ministério Público o princípio da
indivisibilidade, não sendo o Parquet obrigado a denunciar todos os investigados em uma só
oportunidade. [...] (RHC 87.894/RN, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 03/10/2017, DJe 09/10/2017)

Não há inépcia da denúncia por uma eventual separação da acusação, assim como violação ao
princípio da indivisibilidade da ação penal, porquanto na ação penal pública incondicionada é
permitido, a qualquer tempo, o aditamento ou até o posterior oferecimento de outra denúncia
pelo Parquet (precedentes). [...] (RHC 46.296/BA, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, 6ª T, julgado
em 16/03/2017)

O princípio da indivisibilidade da ação penal privada não se aplica à ação penal pública
incondicionada, pois nesta é permitido, a qualquer tempo, o aditamento ou até o posterior
oferecimento de outra denúncia pelo Parquet (precedentes). Assim, o não oferecimento
imediato da exordial acusatória em relação aos demais investigados não implica em renúncia
tácita ao direito de ação, como ocorre na ação penal privada, não gerando, dessa forma,
nulidade a ser reclamada. [...] (AgRg no Ag 1433513/RN, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA
TURMA, julgado em 15/12/2016)

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O acórdão recorrido encontra-se no mesmo sentido da jurisprudência desta Corte Superior de


Justiça e do Supremo Tribunal Federal de que o princípio da indivisibilidade não se aplica à ação
penal pública, podendo o Ministério Público, como 'dominus litis', aditar a denúncia, até a
sentença final, para inclusão de novos réus, ou ainda oferecer nova denúncia, a qualquer
tempo (STF, HC 71.538/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 15/03/1996). [...] (AgRg no
AREsp 1019674/BA, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em
02/02/2017, DJe 10/02/2017)

Não vigora o princípio da indivisibilidade na ação penal pública. O Parquet é livre para formar
sua convicção incluindo na increpação as pessoas que entenda terem praticados ilícitos penais,
ou seja, mediante a constatação de indícios de autoria e materialidade, não se podendo falar
em arquivamento implícito em relação a quem não foi denunciado. [...] (RHC 34.233/SP, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/05/2014, DJe
14/05/2014)

[...] DUPLA IMPUTAÇÃO. DENÚNCIAS OFERECIDAS CONTRA O PACIENTE. OBJETOS DISTINTOS.


AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. INEXISTÊNCIA DE IMPUTAÇÃO NA PRIMEIRA DENÚNCIA.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. ORDEM DENEGADA. [...] A titularidade
conferida constitucionalmente ao Ministério Público permite a promoção da persecução penal,
atendidos os ditames da ampla defesa, do contraditório, do due process of law e da celeridade
na prestação jurisdicional, da melhor forma a deslindar o processo, como nos casos complexos,
marcados pela prática de diversos crimes, em tese, em apuração. [...] O ordenamento
processual possibilita ao Ministério Público cindir as imputações em diversas denúncias na
tutela do bem jurídico. [...] "Em se evidenciando que as imputações deduzidas nas denúncias
oferecidas referem-se a fatos distintos, inexiste violação do princípio ne bis in idem, e, por
conseguinte, constrangimento ilegal qualquer a ser sanado" (HC 27.142/RS). [...] (HC 91.403/RJ,
Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2010, DJe
02/08/2010)

[...] VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. PROIBIÇÃO DO NE BIS IN IDEM. PACIENTE CONDENADO


DUAS VEZES PELOS MESMOS FATOS. FLAGRANTE ILEGALIDADE. [...] Não obstante as nuances
constantes dos decretos condenatórios relativamente aos bens subtraídos pelo paciente, é
evidente que as condenações incidiram sobre o mesmo fato criminoso, implicando em
indevido bis in idem em desfavor do paciente. [...] Malgrado o roubo cometido contra a vítima
Paulo José de Oliveira, gerente do estabelecimento bancário, não tenha sido apreciado na
primeira ação, vindo à tona apenas no segundo processo, ele também se encontra sob o âmbito
de incidência do princípio ne bis in idem, porque fora praticado no mesmo contexto fático da
primeira ação, podendo ser levado ao conhecimento do juízo de origem já naquela
oportunidade, o que não ocorreu. [...] Não há se falar em arquivamento implícito, rechaçado
pela doutrina e pela jurisprudência pátria, porque não se cuida, in casu, de fatos diversos, mas
sim de um mesmo fato com desdobramentos diversos e apreciáveis ao tempo da instauração da
primeira ação penal. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para anular a
ação penal n. 04504661-2, que tramitou perante o d. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da
Comarca de Belo Horizonte/MG, por violação ao princípio ne bis in idem. (HC 285.589/MG, Rel.
Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 17/09/2015)

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AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA


Essa modalidade de ação penal é pública porque quem pode intentá-la é somente o Estado, através do
Ministério Público, não havendo inicial possibilidade de o particular promovê-la.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

É incondicionada porquanto não está sujeita a requisito especial algum, que não aqueles genéricos de toda
e qualquer ação penal.

Observado o sistema acusatório concebido pela Constituição Federal, estabeleceu-se o Ministério Público
como dominus litis, que, na maioria dos casos (sempre que a ação for incondicionada), pode instaurar o
processo independentemente da vontade de quem quer que seja, aliás, até mesmo contra a vontade da
vítima.

Esse tipo de ação penal constitui a regra no nosso sistema. Veja-se o Código Penal:

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido.

§ 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de
representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.

Sendo assim, sempre que a lei silenciar, quando a norma nada trouxer sobre exigência de condição específica
ou, enfim, qualquer disposição contrária (e normalmente isso é feito na parte final de cada capítulo do
Código Penal), a ação será pública e incondicionada – procedendo-se, portanto, pelo Ministério Público,
mediante denúncia e sem que dependa da vontade de outrem.

Assim, para que se possa saber a espécie de ação penal referente a determinado delito, deve-se
analisar se o Código Penal ou se a lei especial dispõe em sentido contrário, seja no próprio artigo
onde o delito está tipificado, seja nas disposições finais do capítulo ou do título onde o crime
estiver inserido. Quando o delito depende de representação, portanto, hipótese de crime de
ação penal pública condicionada à representação, costuma-se usar a expressão "somente se
procede mediante representação"; se o delito depende de requisição, logo, crime de ação pública
condicionada à requisição do Ministro da Justiça, utiliza-se a expressão "procede-se mediante
requisição do Ministro da Justiça"; por fim, quando se trata de crime de ação penal de iniciativa
privada usa-se a expressão "somente se procede mediante queixa".

Estando presentes as condições da ação e havendo justa causa, o Ministério Público pode oferecer denúncia
e prescinde da atuação de qualquer cidadão.

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Na medida em que a Constituição Federal, no artigo 129, inciso I, estabelece competência privativa do
Ministério Público para a propositura da ação penal pública, conclui a doutrina que qualquer dispositivo legal
que permita a outro agente, como o delegado de polícia ou o juiz, por exemplo, a instauração de um
processo, não foi recepcionado pela Constituição Federal.

Veja-se que não foi recepcionado pela Constituição Federal o denominado procedimento
judicialiforme, previsto no art. 26 do CPP, no qual se permitia que a ação penal pública nas
contravenções penais fosse iniciada por auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria
expedida pelo juiz ou pela autoridade policial (Avena, 2020).

Ação penal pública não está sujeita a representação; com isso, o único prazo que sobre ela incide, para efeito
de fulminá-la, é o da prescrição, em relação à pretensão punitiva. O prazo de denúncia (que é outra coisa) é
impróprio e não implica em preclusão. Vejamos lição de NORBERTO AVENA nesse ponto:

Quanto ao prazo para o oferecimento da denúncia, estabelece o art. 46 do CPP que é de cinco
dias, quando se tratar de indiciado preso, e de quinze dias, quando estiver em liberdade,
contados, em qualquer caso, da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do
inquérito policial ou das peças de informação. Ressalvam-se determinadas exceções previstas em
leis ou procedimentos especiais contemplando prazos diferenciados. É o caso, por exemplo, dos
crimes eleitorais, em que o prazo para oferecimento da denúncia é de dez dias (art. 357 do
Código Eleitoral); dos crimes contra a economia popular, cujo prazo é de dois dias (art. 10, § 2.º,
da Lei 1.521/1951); dos crimes de abuso de autoridade, em que a denúncia deve ser proposta
em quarenta e oito horas (art. 13 da Lei 4.898/1965); e dos crimes relacionados a drogas, em que
este prazo é de dez dias (art. 54 da Lei 11.343/2006). Mas, atenção: a despeito dessas disciplinas,
pode ocorrer que o descumprimento do prazo legal para o oferecimento da denúncia não se
revele desarrazoado, justificando-se, por exemplo, na complexidade do caso ou das provas
produzidas. Nestes casos, ainda que esteja preso o indiciado, a delonga no ajuizamento da ação
penal, desde que não excessiva, não implica, necessariamente, a conclusão de constrangimento
ilegal passível de enfrentamento por meio de habeas corpus, devendo ser ponderada, no caso
concreto, sob o princípio da razoabilidade. Há divergências quanto ao efetivo dies a quo dos
prazos mencionados. Indaga-se, enfim: Ao dispor o art. 46 do CPP que o prazo para oferecimento
da denúncia conta-se da data em que o Ministério Público receber os autos do inquérito policial,
referido dispositivo está determinando a inclusão do dia da vista efetiva do inquérito, ou, ao
contrário, ordenando que o prazo tenha início no primeiro dia útil seguinte ao da referida vista?
A solução desta questão passa, necessariamente, pela definição da natureza processual ou
material dos prazos estabelecidos em lei para o oferecimento da exordial. Veja-se que os prazos
processuais contam-se na forma prevista no art. 798, § 1º, do CPP, excluindo-se o dia do começo,
incluindo-se, porém, o do vencimento. Além disso, não se iniciam e não se finalizam em dias não
úteis, o que acarreta a prorrogação do dies a quo e do dies ad quem para o primeiro dia útil
seguinte na hipótese, por exemplo, de recaírem em final de semana ou feriado. Por essa linha de
raciocínio, aportassem os autos do inquérito policial junto ao Ministério Público no dia 1.º (sexta-
feira) e se encontrando preso o indiciado, o prazo para oferecimento da denúncia iniciar-se-ia no
dia 4 (segunda-feira), encerrando-se no dia 8 (sexta-feira). Por outro lado, os prazos materiais
têm a sua forma de contagem regrada pelo art. 10 do CP, incluindo-se o dia do começo,
independentemente de tal data recair ou não em dia útil, pois essa modalidade de prazo não
está sujeita a interrupção ou suspensão. Assim, chegando os autos do inquérito na promotoria

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de justiça no dia 1.º (sexta-feira) e estando o réu preso, teríamos como dies a quo o próprio dia
1.º e, como dies ad quem, o dia 5 (terça-feira). Embora não possamos ignorar a circunstância de
que a última posição (natureza material) possibilita a contagem do prazo de forma mais benéfica
para o investigado, aderimos à primeira corrente, qual seja, a de que a natureza desses prazos é
processual, devendo ser contados com exclusão do dia do começo, mesmo porque esta é a regra
estipulada pelo art. 798, § 1.º, do CPP para contagem dos prazos previstos no Código de Processo
Penal. Perceba-se, finalmente, que o prazo para oferecimento da denúncia é impróprio, o que
significa que seu escoamento não acarreta preclusão. Logo, ainda que esgotado o prazo legal do
Ministério Público, se a vítima ou quem tenha qualidade para representá-la não ajuizar a ação
penal privada subsidiária da pública nos termos do art. 29 do CPP, poderá a denúncia ser
apresentada pelo Promotor em qualquer tempo, desde que antes da extinção da punibilidade
pela prescrição ou outra causa (Avena, 2020).

Doutrina Complementar

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2020): “No
silêncio da lei, a ação penal pública será incondicionada. Vale dizer, a regra em nosso direito é
que a ação penal pública não dependa da manifestação de terceiros. A exigência de prévia
manifestação, portanto, somente existirá se for expressamente prevista em lei, por meio de
expressões como ‘somente se procede mediante representação’, ou ‘somente se procede
mediante requisição do Ministro da Justiça’. Se a lei nada prevê, o Ministério Público,
convencendo-se da prática de crime, ajuizará a ação ex officio, oferecendo a denúncia”.

GUILHERME MADEIRA DEZEM (Curso de Processo, São Paulo: RT, 2020). “Ela é a regra no sistema
processual penal brasileiro. Vale dizer, quando não houver indicação na legislação de
determinação em contrário, a ação penal será pública incondicionada. Normalmente, estas
disposições em contrário estão dispostas na parte final de cada capítulo do Código Penal. Assim
no caso dos crimes contra o patrimônio, há disposições especiais com relação à ação penal no
Capítulo VIII, art. 182. Também é necessário observar que em algumas vezes o entendimento da
jurisprudência acaba por fixar o tipo de ação penal, como é o caso da Súmula 714 do STF. Por
fim, é importante notar que, sempre que o crime for praticado em detrimento de patrimônio ou
interesse da União, Estado ou Município, a ação penal será pública incondicionada (art. 24, § 2º,
do CPP). Este artigo não menciona o Distrito Federal, pois à época de sua elaboração, ele não
existia, mas deve a ele ser estendida também esta regra. Ao final deste capítulo, serão tratadas
algumas ações penais em espécie e sua legitimidade ativa”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017) assevera que:
“Observada a indiscutível relevância dos bens jurídicos tutelados e o correspondente interesse
do Estado em solucionar os litígios e promover a paz social que se espera advenha da regulação
e efetivação desse complexo sistema de distribuição de Justiça, na generalidade dos casos os
crimes são de ação penal pública incondicionada. [...] Não foram recepcionados pela vigente
Constituição Federal os arts. 26 e 531 (redação original, antes da Lei n. 11.719/2008) do CPP, que
autorizavam, nas contravenções penais, o início da ação penal pública pelo auto de prisão em
flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial. Não subsiste
no ordenamento, portanto, o procedimento judicialiforme que autorizava a ação penal ex officio
e tornava concorrente a titularidade da ação penal nas infrações indicadas”. Ainda, o autor expõe

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sobre uma situação atípica em relação ao crime contra a honra de funcionário público em razão
de seu ofício: “Apesar da existência de expressa disposição de lei em sentido contrário (CP, art.
145, parágrafo único), na hipótese de crime contra a honra praticado contra funcionário público
em razão de suas funções (propter officium), para o qual a ação penal é pública condicionada à
representação do ofendido, a Súmula 714 do STF admite legitimação concorrente e permite ao
ofendido o ajuizamento de ação penal privada, independentemente do escoamento do prazo
outorgado ao Ministério Público”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “A ação
penal pública incondicionada é aquela titularizada pelo Ministério Público e que prescinde de
manifestação de vontade da vítima ou de terceiros para ser exercida. Ela constitui a regra em
nosso ordenamento e será a ação cabível quando do silêncio da lei acerca da ação penal cabível.
A parte inicial do caput do art. 24 do CPP assevera que ‘nos crimes de ação pública, esta será
promovida por denúncia do Ministério Público...’, ao passo que o § 2º, do mesmo artigo, reza
que ‘seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União,
Estado e Município, a ação penal será pública’. A Constituição tem no Ministério Público o órgão
acusador oficial do Estado e, na esmagadora maioria das infrações, atuará o promotor
incondicionalmente, ex officio, sem a necessidade de autorização ou manifestação de vontade
de quem quer que seja. Portanto, o chamado processo judicialiforme, encampado pelos artigos
26 e 531 do CPP, prevendo a possibilidade de, em algumas infrações, o início da ação ocorrer
através do auto de prisão em flagrante ou por portaria emanada da autoridade policial ou
judiciária, encontra-se revogado pelo inciso I, do art. 129 da CF, afinal, a titularidade da ação
penal pública foi conferida ao Ministério Público pela Carta de 1988, sendo impensável o
exercício da ação por iniciativa do delegado ou do magistrado. Com o advento da Lei nº
11.719/08, o art. 531 ganhou nova redação, sendo sepultado expressamente o antigo instituto.
A seu turno, assevera-se no art. 257, inc. I, que cabe ao MP a promoção privativa da ação pública.
Nada mais se fez do que adequar o código aos ditames constitucionais”.

AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA


É pública porque a titularidade é exclusiva do Ministério Público; condicionada porquanto, diferentemente
da modalidade anterior, está sujeita a condição específica – acaba por depender da manifestação de outrem
exigida expressamente na norma: representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça. Código
Penal, art. 100:

§ 1º A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de
representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 100


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Lembre que essas condições se aproveitam inclusive para o inquérito policial, que não vai poder ser
instaurado e desenvolvido sem elas, conforme art. 5º, § 4º do CPP9.

1 - REPRESENTAÇÃO
TORNAGHI assim define: "representação é o ato pelo qual o ofendido manifesta a vontade de não se opor ao
procedimento".

Andou mal a lei ao usar a palavra representação para significar o consentimento do ofendido ou
de quem lhe supra a incapacidade. A mesma palavra é usada em outro sentido dentro do Código.
Os italianos usam o termo querella e os franceses plainte. Poderíamos ter empregado
autorização, permissão, consentimento, anuência, admissão, licença ou qualquer outra palavra
melhor (Tornaghi, 1977).

Em relação à representação vigora o princípio da oportunidade e conveniência. O ofendido ou seu


representante podem optar por iniciar ou não a ação penal.

Apesar disso, doutrina e jurisprudência entendem que, pelo menos em regra, não é possível a
ocorrência de renúncia à representação, já que o artigo 104 do Código Penal refere-se apenas à
renúncia do direito de queixa. Logo, não é cabível a renúncia do direito de representação, sob
pena de se acrescentar uma hipótese de extinção da punibilidade sem previsão legal. A exceção
a essa regra fica por conta da Lei dos Juizados que prevê que, tratando-se de ação penal pública
condicionada à representação, a homologação do acordo de composição dos danos civis acarreta
a renúncia ao direito de representação (Lei nº 9099/95, art. 74, parágrafo único) (Lima, 2021).

Razões de ‘política criminal’ que justificam a existência dessa condição específica - a representação. As
agruras do processo, da produção da prova, em determinadas situações, podem representar danos
equivalentes aos da conduta criminosa. Por outro lado, existem crimes que atingem mais o interesse
particular do que propriamente o interesse do Estado. A repressão passa a não ser tão importante. Nessas
condições, por razoabilidade, nosso ordenamento jurídico permitiu à vítima se opor à persecução penal. Em
outras palavras: deixou para a vítima a definição sobre a existência ou não da persecução penal.

1.1 - Forma e natureza jurídica

Assim estabelece o Código de Processo Penal:

9
Falamos disso quando tratamos sobre o início do inquérito policial.

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Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público,
mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação
do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

Em sentido oposto ao da norma, portanto, podemos pensar que a ação penal não ocorrerá sem o
implemento dessa condição específica ou condição de procedibilidade.

Eventual denúncia do Ministério Público sem o preenchimento dessa condição específica da ação seria
rejeitada, nos termos do artigo 395, inciso II do Código de Processo Penal.

RENATO BRASILEIRO sustenta que a necessidade superveniente da representação no trâmite do processo, por
alteração Legislativa, a transformaria em condição de prosseguibilidade. Na visão do autor, isso teria
acontecido em relação aos crimes de lesão corporal leve e lesão corporal culposa que estavam em
andamento quando a Lei dos Juizados Especiais Criminais (nº 9.099) entrou em vigor, em 1995, nos termos
do artigo 91.

Aliás, a compreensão de que se trata de condição de ‘procedibilidade’ foi mais recentemente reforçada pelos
tribunais superiores, em relação ao crime de estelionato (art. 171 do CP), que passou a ser processado por
ação pública condicionada (§ 5º) com o advento do Pacote Anticrime. Nesse sentido o Informativo 691 (HC
610.201/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por maioria, julgado em 24/03/2021):

Destaque - A exigência de representação da vítima no crime de estelionato não retroage aos


processos cuja denúncia já foi oferecida.

Informações do Inteiro Teor - A controvérsia aborda a retroatividade ou não da Lei n. 13.964/19,


também conhecida por Pacote Anticrime, no que toca ao seu aspecto alterador da natureza
jurídica da ação penal no delito de estelionato (art. 171 do Código Penal). A ação que era pública
incondicionada, como cediço, passou a exigir a representação da vítima, como condição de
procedibilidade, tornando-se, assim, ação pública condicionada à representação.

A celeuma então se instalou em relação àquelas ações penais já instauradas: seria a norma
retroativa? A representação da vítima seria também condição de prosseguibilidade? Ou em
outros termos, a vítima, quando já instaurada a ação penal, precisa comparecer em juízo para
apresentar a sua representação?

A retroatividade da norma que previu a ação penal pública condicionada, como regra, no crime
de estelionato, é desaconselhada por, ao menos, duas ordens de motivos.

A primeira é de caráter processual e constitucional, pois o papel dos Tribunais Superiores, na


estrutura do Judiciário brasileiro é o de estabelecer diretrizes aos demais Órgãos jurisdicionais.
Nesse sentido, verifica-se que o STF, por ambas as turmas, já se manifestou no sentido da
irretroatividade da lei que instituiu a condição de procedibilidade no delito previsto no art. 171
do CP.

Em relação ao aspecto material, tem-se que a irretroatividade do art. 171, § 5º, do CP, decorre
da própria mens legis, pois, mesmo podendo, o legislador previu apenas a condição de

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procedibilidade, nada dispondo sobre a condição de prosseguibilidade. Ademais, necessário


ainda registrar a importância de se resguardar a segurança jurídica e o ato jurídico perfeito (art.
25 do CPP), quando já oferecida a denúncia.

Oportuno assinalar, ainda, que prevalece, tanto neste STJ quanto no STF, o entendimento no
sentido de que “a representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, não exige
maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de que a vítima tem
interesse na persecução penal. Dessa forma, não há necessidade da existência nos autos de peça
processual com esse título, sendo suficiente que a vítima ou seu representante legal leve o fato
ao conhecimento das autoridades”. (AgRg no HC 435.751/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta
Turma, DJe 04/09/2018).

No contexto do último parágrafo do Informativo, atualmente, então, é corrente o entendimento de que a


representação não exige forma específica ou disciplinada em lei. Essa manifestação de vontade do ofendido
pode ganhar, dentro dos procedimentos, as mais variadas roupagens. Isso acontece justamente porque a
exigência é estabelecida em favor e não contra os interesses da vítima. CPP:

Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com
poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério
Público, ou à autoridade policial.

§ 1º A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada


do ofendido, de seu representante legal ou procurador, será reduzida a termo, perante o juiz ou
autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida.

§ 2º A representação conterá todas as informações que possam servir à apuração do fato e da


autoria.

§ 3º Oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial procederá a inquérito,


ou, não sendo competente, remetê-lo-á à autoridade que o for.

§ 4º A representação, quando feita ao juiz ou perante este reduzida a termo, será remetida à
autoridade policial para que esta proceda a inquérito.

§ 5º O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem


oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a
denúncia no prazo de quinze dias.

“Embora longa a disposição do artigo, é de curto alcance o seu conteúdo. Não ultrapassa o estabelecimento
de regras, óbvias, sobre a forma da representação, cuja essência, como vimos, tem natureza de autorização.
E por isso, exatamente porque se trata de simples autorização, não poderiam ser exigidas formalidades que
exorbitem a necessidade de sua constatação” (Pacelli, et al., 2013).

Daí por que: (a) pode ser feita pessoalmente ou por procuração, com poderes especiais, é claro,
já que se trata de mandato especificamente outorgado; (b) pode ser apresentada a quaisquer
dos poderes públicos envolvidos na persecução penal (juiz, membro do Ministério Público ou

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autoridade policial), oralmente ou por escrito; quando feita oralmente, a autoridade pública que
a presenciou fará a sua redução a termo; (c) embora a lei se refira à autenticação da assinatura
na declaração prestada por escrito, pensamos desnecessária a medida, se e quando se puder
constatar, por quaisquer meios, a idoneidade do escrito, relativamente à sua autoria. A
importância da observação que ora se faz diz respeito à hipótese de risco de decadência, se não
apreciada a representação feita por escrito, sem a autenticação da assinatura. Deve-se, portanto,
presumir a validade da manifestação da vontade, ainda que, posteriormente, se chegue à
conclusão diversa. Do mesmo modo, a exigência atinente aos esclarecimentos e informações
acerca dos fatos não pode ser rigorosa. O que há de se exigir é a especificação do fato, ainda
que indisponíveis elementos relativos à autoria. Delimitado o fato, deve a autoridade policial
envidar esforços no seu esclarecimento, avançando sobre todas as circunstâncias e elementares
que o constituam ou o circundem, ainda que inicialmente não vislumbradas pelo representante.
Se o representante dispuser também de elementos comprobatórios do fato, e que se mostrem
suficientes também ao esclarecimento da autoria, nada impede a formação do convencimento
do Ministério Público, independentemente da instauração de inquérito policial. Como já vimos,
o inquérito não é indispensável à propositura da ação penal, destinando-se, precipuamente, à
formação da opinio delicto, qualquer que seja a sua modalidade (ação pública ou privada) e seu
autor (Ministério Público ou querelante) (Pacelli, et al., 2021).

A exigência quanto à forma é praticamente nenhuma, senão aquela ligada à segurança jurídica sobre aquilo
e por quem se manifestou, no sentido de se afastar eventual dúvida. Havendo segurança na interpretação e
sobre a origem, as mais variadas formas de representação são admitidas pela vítima ou seu representante.

Sem embargo do que dispõe o art. 39, caput e parágrafos, do CPP, tem-se entendido que a
representação, confeccionada sob a forma de petição escrita ou feita oralmente, com redução a
termo perante a autoridade policial, não exige forma específica, bastando que contenha a
narrativa, ainda que sucinta, do fato a ser apurado e que traduza a inequívoca vontade da vítima
ou de seu representante em ver responsabilizado criminalmente o autor do fato. A
representação da vítima ou de seu representante legal pode constituir-se em registro de
ocorrência policial? Embora a questão não seja pacífica, entendemos que nada impede esteja a
representação incorporada à comunicação de ocorrência policial, desde que dela se possa extrair
a vontade efetiva na apuração da infração penal. “A representação nos crimes de ação penal
pública condicionada prescinde de qualquer formalidade, sendo necessária apenas a vontade
inequívoca da vítima ou de seu representante legal, mesmo que realizada na fase policial” (HC
46.455/RJ). Evidentemente, em casos tais, não bastará o simples relato da vítima quanto ao
crime, impondo-se que contenha o registro de ocorrência, expressamente, a manifestação de
vontade de que a investigação seja realizada, apurando-se a responsabilidade penal do infrator
(Avena, 2020).

E o que ocorre se o juiz recebeu a denúncia em crime de ação penal pública condicionada sem a
representação?

Considere-se, porém, a hipótese de que tenha o magistrado, por lapso, recebido a denúncia em
crime de ação penal pública condicionada, sem representação ou com representação subscrita
por quem não seja o ofendido e nem seu representante legal. Haverá, nesta hipótese, nulidade

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insanável dos atos praticados? Haverá nulidade, sem dúvida, mas não necessariamente
insanável, tudo dependendo das peculiaridades do caso concreto. Assim:

• Se oferecida ou regularizada a representação ainda dentro do prazo decadencial de seis meses,


cujo dies a quo se iniciou com o conhecimento acerca da autoria do fato praticado, é plenamente
possível o prosseguimento do processo com o aproveitamento dos atos já realizados.

• Se a ação penal iniciou-se sem representação ou com representação ilegítima, sendo a falha
suprida apenas após o decurso do prazo legal, neste caso, é impossível ter-se como sanado o
processo, impondo-se a extinção da punibilidade e o consequente arquivamento do processo a
teor do art. 107, IV, do CP (decadência).

Este entendimento, que vem sendo adotado pela maioria da jurisprudência, decorre da exegese
do art. 568 do CPP, ao dispor que “a nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá
ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais”. Enfim, a expressão “a todo
tempo sanada” mencionada no art. 568 do CPP deve ser limitada, no caso da representação, ao
prazo máximo de seis meses previsto em lei para o seu exercício. Neste sentido, foi o
entendimento do STJ, quando, analisando tema análogo, decidiu que “o vício da representação
processual do querelante é sanável, desde que dentro do prazo decadencial” (Avena, 2020).

1.2 - Destinatário da representação

Mais uma vez, por objetividade e clareza, o artigo 39 do CPP:

Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com
poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério
Público, ou à autoridade policial.

A lei legitimou os três principais atores de uma persecução penal como destinatários da representação,
manifestação que, nos termos do § 2º do art. 39, conterá todas as informações que possam servir à apuração
do fato e da autoria.

Nos termos do art. 39 do CPP, a representação poderá ser dirigida ao juiz, ao Ministério Público
e à autoridade policial, indistintamente. Se realizada por escrito, deverá estar com a firma
reconhecida. Feita oralmente ou apresentada por escrito sem reconhecimento de firma, deverá
ser reduzida a termo perante a autoridade a que destinada. Sendo oferecida à autoridade
policial, será a representação a peça inicial do inquérito, dispensando portaria de instauração
(art. 5º, § 4º, do CPP). Formalizada perante o Ministério Público, poderá este, desde logo,
oferecer denúncia se estiver acompanhada dos elementos necessários ao ajuizamento da ação
penal (art. 39, § 5º, do CPP) ou, então, requisitar a instauração de inquérito policial por meio de
ofício acompanhado de cópia da representação que lhe foi dirigida. Deduzida perante o juiz,
incumbirá a este encaminhá-la à autoridade policial ou ao Ministério Público para as providências
legais (Avena, 2020).

A Lei dos Juizados Especiais (nº 9.099/1995) prevê uma oportunidade judicial para oferecimento da
representação na audiência preliminar:

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Art. 75. Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a
oportunidade de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo.

Parágrafo único. O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica


decadência do direito, que poderá ser exercido no prazo previsto em lei.

Importante pontuar que a representação tem um prazo (6 meses, art. 38 do CPP), mas não necessariamente
uma oportunidade – prova disso é que diz o parágrafo único do artigo transcrito. Desde que dentro do prazo
decadencial, ela pode ser oferecida a qualquer momento. Nesse sentido, cumpre observar que caso a
audiência preliminar se realize depois de escoado o prazo decadencial, o procedimento poderá ter
continuidade caso ela já tenha sido apresentada anteriormente, por exemplo, quando se lavrou o termo
circunstanciado. Aliás, isso é mais recomendável.

1.3 Titularidade ou legitimidade para o oferecimento

Tudo que aqui for estudado se aplica ao oferecimento da queixa – o regime jurídico da titularidade, como
bem aponta BRASILEIRO. Mais uma vez a lei, com destaques diferentes, porque é de lá que extraímos todas as
conclusões jurídicas:

Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com
poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério
Público, ou à autoridade policial.

§ 1º A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada


do ofendido, de seu representante legal ou procurador, será reduzida a termo, perante o juiz ou
autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida.

Não se exige, perceba, que o procurador tenha capacidade postulatória ou que seja advogado. Todavia, a
procuração deve conter poderes especiais.

São titulares do direito de representação:

a) ofendido maior e capaz – se a vítima for maior de 18 anos e mentalmente capaz, somente ela poderá
exercer a representação. Tem “legitimidade exclusiva” ou “capacidade processual autônoma”. A capacidade
é avaliada nos termos do art. 5º do Código Civil:

Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática
de todos os atos da vida civil.

Diante dessa norma civil, ao completar 18 anos a vítima é completamente capaz, “não havendo a
possibilidade de o direito de representação ou de queixa ser exercido por seu ascendente, já que este não é
mais seu representante legal. Conclui-se, então, que os arts. 34 e 50, parágrafo único, ambos do CPP, e
igualmente a súmula 594 do STF, estão tacitamente revogados, não tendo mais qualquer aplicação prática”
(Lima, 2021).

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b) Representante legal do ofendido menor ou incapaz – quando a vítima for menor de 18 anos ou portadora
de deficiência mental, a representação passará a ser do seu representante legal, independentemente da
vontade daquela. “Devido ao informalismo que impera em sede de representação, a jurisprudência entende
que qualquer pessoa que, de alguma forma, seja responsável pelo menor, poderá oferecer representação,
tais como avós, irmãos, pessoa de quem dependa economicamente, etc.” (Lima, 2021).

Pode ocorrer que o incapaz não possua representante legal ou que haja conflito de interesses entre um e
outro. Nesse caso, assim disciplina o CPP:

Art. 33. Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado
mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o
direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a
requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal.

O curador poderá ser qualquer pessoa, advogado ou não, desde que maior de 18 anos. Daí a indagação:
nomeado o curador, ele está obrigado a oferecer a representação?

Há duas posições: uma, espelhando a maioria doutrinária e à qual nos filiamos, no sentido de
que a nomeação de curador não impõe a este a obrigação de oferecer representação contra o
autor do crime, incumbindo-lhe analisar a conveniência deste procedimento segundo os
interesses do incapaz (art. 33 do CPP, por analogia); outra, entendendo em sentido oposto, vale
dizer, no sentido da obrigatoriedade de o curador nomeado representar em prol da vítima, já
que está agindo como substituto processual, ou seja, defendendo interesse alheio em nome
próprio (Avena, 2020).

NORBERTO AVENA ainda levanta outra questão interessante:

E se mais de um entre os legitimados do art. 24, § 1.º, comparecer para representar? Neste
caso, terão preferência os primeiros em prol dos demais, na ordem enumerada em lei. Se um dos
primeiros representar, nada haverá aos demais a fazer, a menos que haja a retratação da
representação por parte de quem a fez. Em caso de discordância entre os legitimados – um
querendo representar e o outro não –, deve prevalecer a vontade daquele que deseja
representar.

c) Pessoa jurídica – nos termos do art. 37 do Código de Processo Penal:

Art. 37. As fundações, associações ou sociedades legalmente constituídas poderão exercer a


ação penal, devendo ser representadas por quem os respectivos contratos ou estatutos
designarem ou, no silêncio destes, pelos seus diretores ou sócios-gerentes.

“É o caso, por exemplo, da pessoa jurídica que venha a sofrer furto de coisa comum, previsto no art. 156 do
CP, cuja ação penal é pública condicionada” (Avena, 2020).

BRASILEIRO ainda traz duas situações peculiares: 1ª) ofendido maior de 16 e menor de 18 anos casado:

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Segundo o artigo 1.517 do Código Civil, após os 16 anos os menores podem se casar com
autorização dos pais ou responsáveis legais, vindo a adquirir a capacidade civil plena. A despeito
da aquisição da capacidade civil plena, entende-se que ainda não é dotado de capacidade para
oferecer representação ou queixa. Como ele não pode exercer seu direito pessoalmente, não
possuindo representante legal por conta da emancipação, há duas possibilidades: 1) nomeação
de curador especial, nos termos do artigo 33 do CPP; 2) aguarda-se que atinja a idade de 18
(dezoito) anos, quando, então, poderá exercer seu direito de queixa ou de representação. Nesse
caso, não há falar em decadência, porquanto o prazo decadencial não flui para aquele que não
pode exercer seu direito por conta da incapacidade. Esse mesmo raciocínio é aplicável às demais
hipóteses de emancipação (Lima, 2021).

2ª) morte da vítima: especial hipótese de legitimação anômala, sendo que o direito de oferecer queixa ou
representação ou de prosseguir na ação penal de iniciativa privada passará aos indicados, conforme art. 24,
§ 1º e art. 31 do CPP.

§ 1º No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito
de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o
direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente
ou irmão.

Existe aí uma preferência de acordo com a ordem estipulada na lei, com a prevalência da vontade daquele
que deseja dar início ou continuar com a persecução criminal.

E o companheiro, deve ser inserido nesse rol por forma do disposto no art. 226, § 3º da Constituição
Federal?10

Grande parte da doutrina insere no rol dos sucessores o companheiro. [...] A nosso ver, não se
pode incluir o companheiro nesse rol, sob pena de indevida analogia in malam partem. A inclusão
do companheiro ou da companheira nesse rol de sucessores produz reflexos no direito de punir
do Estado, já que, quanto menos sucessores existirem, maior é a possibilidade de que o não
exercício do direito de representação ou de queixa no prazo legal acarrete a extinção da
punibilidade pela decadência. Portanto, cuidando-se de regra de direito material, não se pode
querer incluir o companheiro, sob pena de indevida analogia in malam partem, malferindo o
princípio da legalidade (CF, art. 5º, XXXIX) (Lima, 2021).

Não obstante o posicionamento dessa doutrina minoritária, é fato que o STF já consignou que não deve
existir hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as formas de constituição do núcleo doméstico

10
Constituição Federal, art. 226, § 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher
como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

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(casamento ou união estável); que nesse ponto não pode haver desequiparação ou discriminação (RE 646721
– Tema 498), inclusive que se aplicam à união estável entre pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e as
mesmas consequências da união estável heteroafetiva. Nessa perspectiva é que assim definiu o STJ
(Informativo 654):

QUEIXA-CRIME. ACUSAÇÃO CONTRA DESEMBARGADORA DO TJRJ. PRERROGATIVA DE


FORO NO STJ. CRIME DE CALÚNIA CONTRA PESSOA MORTA. QUEIXA PARCIALMENTE
RECEBIDA. [...] 2. Por se tratar de crime de calúnia contra pessoa morta (art. 138, § 2º, do
Código Penal), os Querelantes - mãe, pai, irmã e companheira em união estável da vítima
falecida - são partes legítimas para ajuizar a ação penal privada, nos termos do art. 24, §
1º, do Código de Processo Penal [...]. 3. A companheira, em união estável reconhecida,
goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal, podendo figurar como legítima
representante da falecida. Vale ressaltar que a interpretação extensiva da norma processual
penal tem autorização expressa no art. 3º do CPP ("A lei processual penal admitirá interpretação
extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito"). (APn
912/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/08/2019)

1.4 - Prazo da representação

A regra está no art. 38 do Código de Processo Penal:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar
o prazo para o oferecimento da denúncia.

“Trata-se prazo de natureza material, fatal e improrrogável, a ser contado nos termos do artigo 10 do CP”
(Lima, 2021):

Art. 10 - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos
pelo calendário comum.

Contagem do prazo: Embora se trate de prazo formalmente processual, é de se ver que tem ele
consequência no âmbito da punibilidade, como sói ocorrer em relação a determinados ônus e
faculdades processuais (perempção, renúncia, perdão, por exemplo). [...]. Assim, e tendo em
vista as consequências da contagem do prazo decadencial no que toca à extinção da punibilidade
com base nela (art. 107, IV, Código Penal), deve-se aplicar a norma contida no art. 10 do Código
Penal [...] (Pacelli, et al., 2021).

Exemplo: um crime de ameaça cometido contra uma pessoa capaz com 18 anos completos (ou mais) em
data de 26 de março de 2010. A representação deve ser oferecida até o dia 25 de setembro de 2010, às
23h59min, sob pena de decadência e consequente extinção da punibilidade, nos termos do artigo 107, inciso
IV, segunda figura, do Código Penal. Não deve haver suspensões nem interrupções, também não se
admitindo prorrogação do prazo, mesmo que expirado num domingo ou feriado (Lima, 2021).

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Em regra, o decurso do prazo decadencial só começa a fluir a partir do conhecimento da autoria.


E isso por uma razão muito óbvia: só se pode falar em decadência de um direito que pode ser
exercido. Se o ofendido não sabe quem é o autor do delito, não pode exercer seu direito. Mas
como se comprova que o titular do direito de representação ou de queixa-crime só tomou
conhecimento da autoria nesta ou naquela data? A nosso ver, a fim de se evitar o
reconhecimento da decadência, caso a queixa ou representação sejam apresentadas após o
decurso do prazo de 6 (seis) meses da data do crime, recai sobre o autor da representação ou da
queixa-crime o ônus de comprovar que só tomou conhecimento da autoria do delito em
momento posterior, e em lapso temporal inferior a 6 (seis) meses, contados da queixa ou da
representação, para trás. Muito se discute acerca da decadência do direito de queixa ou de
representação nas hipóteses de inércia do representante legal do menor de 18 (dezoito) anos,
mentalmente enfermo ou retardado mental. Parte da doutrina entende que, tratando-se de
incapaz, o prazo decadencial de 6 (seis) meses não flui para ele enquanto não cessar a
incapacidade, já que não se pode falar em decadência de um direito que não pode ser exercido.
Logo, ainda que o representante legal, tendo tomado conhecimento da autoria do fato delituoso,
não ofereça representação (ou queixa), subsiste para o menor o direito de oferecê-la, a partir do
momento em que atingir 18 (dezoito) anos, logicamente desde que não extinta a punibilidade
por outra causa, como, por exemplo, a prescrição. Com a devida vênia, pensamos que o prazo
decadencial é um só. O representante legal exerce na plenitude o direito de queixa ou de
representação, como já se podia inferir do revogado art. 50, parágrafo único, do CPP, quando,
implicitamente e a contrario sensu, permitia concluir que a renúncia do representante legal da
pessoa com menos de 18 (dezoito) anos de idade privaria esta do direito de queixa. Logo, o
decurso do prazo decadencial para o representante legal também afetaria o direito do menor,
do mentalmente enfermo ou do retardado mental. De todo modo, esse raciocínio só é válido se
o representante legal tiver conhecimento acerca da autoria do crime (Lima, 2021).

Sustenta BRASILEIRO que de qualquer forma o prazo decadencial deve ser uno, mesmo nos casos de sucessão
processual (CPP, art. 31), aquilo que contou para um desconta do prazo do outro (vítima e representante),
sempre observando que o início do prazo só acontece com o conhecimento da autoria.

Vale a referência, também, à contagem do prazo nos crimes continuados, permanentes e habituais, segundo
a visão de renomados doutrinadores:

[...] o prazo decadencial nos crimes continuados e nos crimes permanentes, isto é, naquelas
hipóteses em que a ação delituosa se prolonga no tempo, segue a regra geral, ou seja, começa a
correr da data em que conhecida a autoria, renovando-se (a contagem) com a renovação da
conduta delituosa, enquanto for a mesma – e também conhecida – a autoria. Esse entendimento,
registre-se, alinha-se com aquele emanado da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal, cujos
termos são os seguintes: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência” (Pacelli,
et al., 2021).

Sendo hipótese de crime continuado, o prazo decadencial de seis meses deve ser contado
individualmente, vale dizer, na medida em que o ofendido vai tomando ciência da autoria em
relação a cada um dos delitos cometidos.

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Já em se tratando de crime permanente, há duas orientações: uma, no sentido de que o prazo


decadencial seja computado na forma estabelecida no art. 38 do CPP, ou seja, da data em que a
vítima souber quem é o autor do crime; e outra, compreendendo que o prazo decadencial deve
fluir do dia em que cessar a permanência, por interpretação extensiva do art. 111, III, do CP
(dispositivo que estabelece o cômputo do prazo prescricional nessa ordem de crime).

Por fim, no caso de crime habitual, predomina o entendimento de que o lapso é computado,
igualmente, com a ciência da autoria do crime pela vítima ou demais legitimados. Lembre-se de
que nos crimes habituais cada conduta isoladamente considerada é irrelevante penalmente,
apenas havendo repercussão criminal quando a reprovabilidade decorre da reiteração de uma
série de condutas indicativas de estilo ou hábito de vida do indivíduo (Avena, 2020).

1.5 - Retratação da representação

A questão é disciplinada (de forma idêntica no que se refere ao conteúdo) tanto pelo Código Penal quanto
pelo Código de Processo Penal, respectivamente:

CP. Art. 102 - A representação será irretratável depois de oferecida a denúncia.

CPP. Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

Retratar significa reavaliar, voltar atrás no exercício de um direito. Ou seja, uma vez autorizada
a investigação, o ofendido pode, posteriormente, melhor analisar o caso e reavaliar, retirando a
autorização inicialmente concedida. É, assim, uma revogação da representação anteriormente
ofertada. Ao assim fazê-lo, é retirado o consentimento anteriormente dado e o Estado deixa de
ter a autorização para continuar as investigações. (Antonio Magalhães Gomes Filho, 2018)

É a lei concedendo oportunidade de ‘arrependimento’ para o titular do direito de representação (em ação
penal pública condicionada) que, num primeiro momento quis ver o autor do fato processado e
responsabilizado e, depois, por alguma razão, mudou de ideia. A consequência da retratação normalmente
será a extinção da punibilidade (principalmente se o prazo decadencial de 6 meses já se escoou).

Mas existe um limite para que isso aconteça, dentro das várias etapas da persecução penal: a apresentação
da denúncia. E repare bem para não confundir: é do ‘oferecimento’ e não do ‘recebimento’ da denúncia que
estamos tratando; é da apresentação da peça acusatória e não do momento em que o juiz decide sobre o
recebimento dela.

Sabemos que o processo penal nasce com o recebimento da denúncia (aliás, é daí que se interrompe a
prescrição, nos termos do art. 117, I do Código Penal) e se completa com a citação (art. 363 do CPP). Ok, mas
só poderá haver retratação da representação até antes do ‘oferecimento’ da denúncia. “Logo, oferecida a
denúncia, o ofendido ou seu representante legal já não podem mais se retratar sob a alegação de que o juiz
ainda não teria recebido a peça acusatória” (Lima, 2021).

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Questão debatida na doutrina é quanto à possibilidade de retratação da retratação. É possível que isso
ocorra?

Considere-se, pois, que, uma vez oferecida a representação pela vítima, esta, antes do
oferecimento da denúncia, venha a se retratar. Posteriormente, ainda dentro do prazo
decadencial, volta atrás e retrata-se da retratação antes apresentada, desejando ver processado
o autor do crime. Tal atitude é válida? Parte considerável da doutrina, à qual nos filiamos,
entende possível que isto ocorra, desde que não fique evidenciada a ocorrência de má-fé da
vítima (v.g., pretensão de extorquir o autor do delito, usando, para tanto, a possibilidade de
retratar-se e depois voltar atrás neste seu ato) e que ainda não se tenha escoado o prazo de seis
meses contados da ciência do autor do fato. Neste sentido, GUILHERME DE SOUZA NUCCI e JULIO
FABBRINI MIRABETE. Outros, porém, consideram que a retratação da representação importa em
renúncia ao direito de ação, acarretando a extinção da punibilidade, não sendo possível ao
ofendido voltar atrás (Avena, 2020).

1.6 - Extensão e eficácia

Segundo sustenta a doutrina majoritária, a representação se dá em relação ao fato criminoso e não em


relação aos seus autores. Em razão do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, não há como se
fracionar subjetivamente a representação nos casos de concurso de agentes; quando a vítima representa em
relação a um, a medida se estende em relação aos demais, autorizando o Ministério Público a denunciar
todos os envolvidos.

Claro, denunciar se houver justa causa, nada impedindo o arquivamento do inquérito policial em relação a
uns e a denúncia em relação a outros por motivo diverso dessa condição de procedibilidade (representação).
Existe, também, como aconteceria em outros casos (e segundo doutrina majoritária), a possibilidade de
aditamento da denúncia.

Sinale-se, contudo, a existência de posição minoritária no sentido de que não haveria


possibilidade de o Ministério Público aditar a denúncia para incluir pessoa distinta daquelas
visadas na peça representatória. Pode o Ministério Público denunciar apenas alguns dos
indivíduos nominados na representação? Sim, assiste esta possibilidade ao parquet. Nada
impede que compreenda o promotor de justiça que existem indícios de autoria apenas em
relação a alguns dos representados, ajuizando em relação a eles a ação penal e postulando o
arquivamento da representação ou do inquérito relativamente aos demais. Observe-se que não
se está, aqui, aventando a possibilidade de arquivamento implícito em relação aos indivíduos
que, nominados na representação ou investigados no inquérito, não tenham integrado o polo
passivo da denúncia, o que ocorreria se o Ministério Público oferecesse denúncia contra um ou
alguns indiciados e simplesmente silenciasse quanto aos demais. Esta prática não encontra
amparo em lei. Assim, cogitando não ser o caso de acionar a todos os representados ou
indiciados, incumbirá ao Ministério Público promover quanto a estes, fundamentadamente,
perante o juízo, o respectivo arquivamento com vistas à devida homologação (Avena, 2020).

A vítima não pode escolher a quem o Ministério Público vai processar; o que ela pode é definir qual caso,
qual fato criminoso será passível de processo pelo Estado, através do Ministério Público. Veja-se o exemplo
de RENATO BRASILEIRO:

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Portanto, se, num crime contra a honra praticado contra funcionário público no exercício de suas
funções, limitar-se ofendido a oferecer representação no sentido de que o autor do delito seja
processado apenas em relação a um delito (v.g. injúria), poderá o Ministério Público denunciar
todos os envolvidos na prática do referido delito. Todavia, não poderá o órgão ministerial, em
ação pública condicionada à representação, extrapolar os limites materiais previamente traçados
na representação, procedendo a uma ampliação objetiva indevida para oferecer denúncia, por
exemplo, pela prática de calúnia, difamação e injúria. Se assim o fizer, deverá o magistrado
rejeitar a peça acusatória em relação aos crimes de calúnia e difamação, ex vi do artigo 395, inciso
II, do CPP, haja vista a ausência de uma condição específica da ação penal em relação a tais
delitos: a representação” (Lima, 2021).

1.7 - Retratação da representação na Lei Maria da Penha

Conforme destaca BRASILEIRO, o legislador não foi feliz na expressão utilizada no art. 16 da Lei 11.340/2006, a
Lei Maria da Penha:

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

“Retratar-se significa voltar atrás, arrepender-se; pressupõe o prévio exercício de um direito. Não se
confunde, portanto, com a renúncia, quando alguém abre mão de um direito que ainda não fora exercido”.

Normalmente, crimes dessa natureza e de ação penal pública condicionada, nos termos da lei, devem ter a
representação reduzida a termo logo no registro da ocorrência:

Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da
ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem
prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:

I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se


apresentada;

Sendo assim, quando o caso chega na Justiça, ordinariamente já vem acompanhado da representação da
vítima. Na oportunidade da audiência prevista no art. 16 da Lei 11.340/2006 o direito da vítima já foi
exercido, de maneira que não é tecnicamente correto falar em renúncia. Voltando atrás a vítima – o que só
poderá fazer em audiência perante o juiz – o que faria seria uma retratação.

Detalhe: a retratação, como vimos, só pode ocorrer, na generalidade dos casos, até o
oferecimento da denúncia; no caso de crimes de violência doméstica, isso pode acontecer
até depois, desde que perante o juiz, em audiência, antes do recebimento da peça
acusatória.

A audiência a que se refere o dispositivo NÃO é de designação obrigatória e não deve ser
indistintamente marcada como uma fase necessária de confirmação das representações já apresentadas;

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não é condição de recebimento da denúncia e não pode ser determinada pelo juiz como forma de
constranger a vítima a ratificar sua manifestação de vontade já externada.

Na verdade, sua realização só deve ser determinada pela autoridade judiciária nos casos de crime
de ação penal pública condicionada à representação (v.g., ameaça, [...] etc), e desde que tenha
havido prévia manifestação da parte ofendida antes do recebimento da denúncia, a demonstrar
sua intenção de retratar-se da representação oferecida para o para o ajuizamento da ação penal
contra o autor da violência doméstica, cabendo ao magistrado verificar a espontaneidade e a
liberdade na prática de tal ato. logo, caso não tenha havido qualquer manifestação da vítima
quanto ao seu interesse em se retratar, não há qualquer nulidade decorrente da não realização
da referida audiência, já que a lei não exige a realização ex officio de uma audiência para
ratificação da representação anteriormente oferecida (Lima, 2021).

Detalhe importante para evitar confusão: os crimes de lesões corporais leves e lesões culposas praticados
em violência doméstica são de ação incondicionada (ADI 4424/DF). A razão disso é simples: aplicação literal
do disposto no art. 41 da Lei 11.340/2006. É o art. 88 da Lei 9.099/1995 que estabelece a necessidade de
representação; essa disposição não se aplica aos casos de violência doméstica.

Todavia, persistem alguns crimes de violência doméstica que ainda dependem de representação, como é o
caso de ameaça (art. 147, CP). Isso porque a exigência dessa condição de procedibilidade não está na Lei
9.099/1995, mas sim no Código Penal (que não é afastado pela Lei Maria da Penha).

2 - REQUISIÇÃO
Inicialmente, pontue-se o mesmo: estamos diante de uma condição de procedibilidade; condição sine qua
non para a instauração de inquérito policial e para o oferecimento de denúncia. Razões de política criminal
ditaram sua exigência: “evitar o strepitus judicii ou strepitus processus, quer no sentido de se evitar que o
processo penal cause maiores prejuízos que o próprio delito, quer no sentido de se evitar inconvenientes
políticos ou diplomáticos para o Brasil” (Lima, 2021). Vigora o princípio da oportunidade e conveniência
diante dessa faculdade do Ministro da Justiça.

Os exemplos são escassos no nosso processo penal. Um deles é o de crimes contra a honra contra o
Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro, nos termos do Código Penal:

Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes
é cometido:

I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;

Art. 145 – [...] Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso
do inciso I do caput do art. 141 deste Código, [...]

Outra hipótese, lembrada por BRASILEIRO, é o de crime cometido contra brasileiro fora do Brasil (Código Penal,
art. 7º, § 3º, ‘b’).

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A requisição do Ministro da Justiça é dirigida ao chefe do Ministério Público: Procurador-Geral de Justiça ou


Procurador-Geral da República, com as informações necessárias para apuração do fato. O parquet, diante da
sua independência funcional, não está obrigado a oferecer a denúncia; formará sua opinio delicti, como
normalmente o faz.

Não existe prazo decadencial (como na representação); a lei não fala nada sobre isso, de maneira que o único
prazo que pode fulminar com a pretensão punitiva é o da prescrição ou outra hipótese de extinção da
punibilidade.

E quanto à retração, cabe em relação à requisição já apresentada pelo Ministro da Justiça? Temos
controvérsia doutrinária neste ponto, com a prevalência da opinião favorável, como se pode ver:

No tocante à possibilidade de retratação da requisição, há controvérsias. Há doutrinadores, como


TOURINHO FILHO, que entendem que, diante do silêncio do artigo 25 do CPP, que faz menção
apenas à retratação da representação, esse silêncio eloquente deve ser compreendido no
sentido de se considerar a retratação irrevogável, irretratável. A despeito dessa orientação,
prevalece o entendimento doutrinário de que, nos mesmos moldes da representação, também
é cabível a retratação da requisição do Ministro da Justiça, enquanto não oferecida a denúncia
(Lima, 2021).
Há dúvidas quanto a poder ou não o Ministro da Justiça retratar-se da requisição que tenha
realizado, posicionando-se alguns no sentido da impossibilidade dessa retratação, já que, em
primeiro lugar, trata-se de ato administrativo oriundo do governo mediante atitude do Ministro
da Justiça, revestindo-se, pois, de seriedade; e, em segundo, inexiste previsão legal de que possa
ser reconsiderado. Particularmente, não pensamos assim, acreditando que, exatamente por
cuidar a requisição de um ato administrativo, é que deve admitir retratação eficaz, desde que
realizada esta reconsideração antes do ajuizamento da ação penal (após o ajuizamento é
indisponível a ação penal pública). Justificamos esse ponto de vista na simples razão de que atos
administrativos, modo geral, podem ser revistos, inclusive de ofício, por quem os editou (Avena,
2020).

2.1 - Doutrina Complementar

Ação penal pública condicionada

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018) elenca os crimes cujas
ações penais públicas dependem de representação: “Crime de lesão corporal leve (CP, art. 129,
caput, c/c o art. 88 da Lei n. 9.099/95, exceto para os casos de violência contra a mulher – Lei n.
11.340/2006); crime de lesão corporal culposa (CP, art. 129, § 6º, c/c art. 88 da Lei n. 9.099/95;
sobre o delito de lesão corporal culposa no trânsito, vide art. 291, § 1º, do CTB); perigo de
contágio venéreo (CP, art. 130, § 2º); crime contra a honra de funcionário público, em razão de
suas funções (art. 141, II, c/c o art. 145, parágrafo único); ameaça (art. 147, parágrafo único);
violação de correspondência (art. 151, § 4º), correspondência comercial (art. 152, parágrafo
único); furto de coisa comum (art. 156, § 1º); tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel
ou utilizar-se de transporte sem ter recursos para o pagamento (art. 176, parágrafo único)”.

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Representação

GUILHERME MADEIRA (Curso de processo penal, São Paulo: RT, 2020). “A representação (também
conhecida como delatio criminis postulatória) consiste, na feliz expressão de Mirabete, em
pedido-autorização pelo qual o ofendido ou seu representante legal, ao mesmo tempo em que
requer a investigação e a ação penal, a autoriza. In verbis: “(...) espécie de pedido-autorização
em que a vítima, seu representante legal ou curador nomeado para a função, expressam o desejo
de que a ação seja instaurada, autorizando a persecução penal”. A doutrina majoritária afirma
que a natureza jurídica da representação é a de condição de procedibilidade. Entendemos que
se trata de questão ligada ao interesse de agir. A representação é necessária tanto para o
inquérito policial quanto para a ação penal. Não pode haver inquérito policial ou ação penal na
falta de representação. É importante notar que não são necessárias duas representações. Basta
que seja feita uma para que se alcance o intento desejado pelo legislador. Feita a representação
no inquérito policial, não é a vítima chamada para nova representação durante o processo. No
Juizado Especial Criminal há peculiaridade a ser observada: a representação pode ser oferecida
na audiência preliminar, nos termos do art. 75 da Lei 9.099/1995. No caso de concurso de
agentes, a representação não precisa ser oferecida em face de todos os que cometeram o crime.
Mesmo que no curso da investigação sejam descobertos outros autores do delito, não há
necessidade de renovação da representação em face destes novos autores descobertos, desde
que o crime seja o mesmo. A isso se dá o nome de eficácia objetiva da representação, ou seja,
ela abrange fatos e não pessoas. Assim, feito o “pedido/autorização”, a persecução penal pode
ser iniciada em face de quem quer que seja (neste sentido, a posição do STF, STJ, de Guilherme
Nucci, Mirabete e Tourinho). [...] O art. 39 do CPP estabelece que a representação poderá ser
feita pessoalmente ou por procurador com poderes especiais e ela deve conter todas as
informações que possam servir à apuração da autoria e do fato criminoso. Contudo, não se retire
das disposições do art. 39 que a representação exija maiores formalidades. Basta que da
manifestação do ofendido permita-se depreender a vontade de representar. Esta é a posição do
STJ: “2. Prevalece no STJ e no STF que a representação, nos crimes de ação penal pública
condicionada, não exige maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de
que a vítima tem interesse na persecução penal. Dessa forma, não há necessidade de que exista
nos autos peça processual com esse título, sendo suficiente que a vítima ou seu representante
legal leve aos conhecimentos das autoridades o ocorrido (HC 385.345/SC, de minha relatoria, DJe
5/4/2017)” (STJ, AgRg no AREsp 1478850/SC, 5T, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe
05.08.19). [...] A representação não vincula o órgão do Ministério Público. Com isso se quer dizer
que o promotor de justiça poderá requerer o arquivamento dos autos de inquérito policial se
entender que não há elementos suficientes para o oferecimento da denúncia. Também significa
dizer que o promotor não está vinculado à eventual tipificação apresentada pelo ofendido ou por
seu representante legal. Vale dizer, da mesma forma que o promotor não está vinculado à
tipificação apresentada pela autoridade policial, também não está à representação do ofendido,
podendo oferecer denúncia pelo crime que entender mais adequado. Neste sentido, já se
manifestou o STF: “O Ministério Público, nas ações penais públicas condicionadas, não está
vinculado à qualificação jurídica dos fatos constantes da representação ou da requisição de que
lhe haja sido dirigida. A vinculação do Ministério Público à definição jurídica que o representante
ou requisitante tenha dado aos fatos é nenhuma. A formação da opinio delicti compete,
exclusivamente, ao Ministério Público, em cujas funções institucionais se insere, por consciente
opção do legislador constituinte, o próprio monopólio da ação penal pública (CF/1988, art. 129,

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I). Dessa posição de autonomia jurídica do Ministério Público, resulta a possibilidade, plena, de,
até mesmo, não oferecer a própria denúncia.” (HC 68.242, rel. Min. Celso de Mello, DJ
15.03.1991)”.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017), sobre a natureza
jurídica da representação, afirma: “A representação é instituto de natureza processual que
exterioriza manifestação positiva de vontade que pode ser feita pelo ofendido ou outro
legitimado com vistas à instauração de inquérito pela autoridade policial e oferecimento de
denúncia pelo representante do Ministério Público, constituindo verdadeira delatio criminis
postulatória”. A respeito da forma pela qual deve revestir-se a representação, assevera: “Nada
obstante o disposto no art. 39 do CPP, que reclama certo formalismo, doutrina e jurisprudência
pacificaram o entendimento no sentido de que não há forma rígida para a representação, que
pode ser formulada por meio de singela manifestação de vontade, mas é certo que, na medida
do possível, deverá vir acompanhada de todas as informações que possam servir à apuração do
fato e de sua autoria, dispensada a correta capitulação jurídica do delito”. Em relação ao prazo
da representação: “Salvo disposição em contrário, o ofendido decairá do direito de
representação se não o exercer dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que vier a
saber quem é o autor do delito (CPP, art. 38; CP, art. 103). Importante destacar que o prazo não
flui a partir da data do delito, mas da data em que o ofendido tomar conhecimento de quem fora
seu autor, e nem sempre tais datas coincidem. [...] Se o ofendido for menor de dezoito anos,
teremos situação excepcional em que serão dois os prazos: um para seu representante legal e
outro para o ofendido. Para o representante legal, o prazo fluirá conforme a regra geral: a partir
da data em que tomou conhecimento de quem foi o autor do delito. Para o ofendido menor:
fluirá a partir da data em que completar dezoito anos, visto que antes disso não poderá, por
iniciativa sua, formular representação”. Concernente aos destinatários da representação: “(...)
resta acrescentar que a representação poderá ser endereçada ao juiz, ao órgão do Ministério
Público ou ao delegado de polícia, embora na prática seja mais comum e também mais célere
endereçá-la diretamente ao último, pois, se o fato depender de esclarecimentos, o juiz ou o
membro do Ministério Público que tenha recebido a representação deverá encaminhá-la à
autoridade policial, mediante ofício, requisitando a instauração de procedimento investigatório
para a completa apuração dos fatos (CPP, art. 39, § § 3º, 4º e 5º)”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016), a respeito
da retratação da representação e a chamada ‘retratação da retratação’, assevera: “(...) enquanto
não oferecida a denúncia, a vítima pode retratar-se da representação, inibindo o início do
processo. Como a representação está adstrita à conveniência do ofendido, uma vez apresentada,
é possível que ele se arrependa, volte atrás. Só é possível até a apresentação da inicial acusatória
na secretaria da vara criminal ou na distribuição, pois após este ato, a representação é
irretratável (art. 25 do CPP c/c art. 102 do CP). Para a doutrina majoritária, a vítima pode retratar-
se e reapresentar a representação quantas vezes entender conveniente. Tal significa que pode
retratar-se da representação e, em se arrependendo, reapresentá-la, respeitando apenas o
marco do oferecimento da denúncia e o prazo decadencial dos seis meses, pois, uma vez
oferecida a peça acusatória, a representação passa a ser irretratável. Assim, num pequeno jogo
de palavras, com a vênia do leitor, concluímos que cabe retratação da retratação da
representação, ou seja, a vítima que representa e se retrata, pode novamente representar”.

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FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010), em
posição minoritária, afirma acerca do instituto da ‘retratação da retratação’: “Havendo
retratação da representação, poderá o Promotor de Justiça requerer o arquivamento dos autos
do inquérito policial ou das peças de informação? A retratação, na hipótese, assemelha-se, em
tudo e por tudo, à renúncia, e, assim, devem os autos ser arquivados, em face da ausência de
representação, condição a que se subordina, às vezes, o jus accusationis. Permitir a retratação
da retratação é entregar ao ofendido arma poderosa para fins de vingança ou outros
inconfessáveis”. [...] Data venia, pensamos que a retratação da representação, embora não
elencada entre as causas extintivas da punibilidade, apresenta idêntica consequência.. Sabemos
que o art. 107 do CP não esgota todas as causas extintivas ao jus puniendi. A morte do cônjuge
inocente não constitui causa extintiva da punibilidade no crime de adultério? Assim também a
retratação da representação não deixa de ser causa extintiva ao jus puniendi, equivalente que é
à renúncia”.

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000), em relação
à eficácia objetiva da representação, sustenta: “Feita a representação, o ofendido ou seu
representante legal anui à persecução penal. [...] Autorizou os órgãos incumbidos da persecução
a agirem para apurar o fato e a autoria. Por isso, ainda que não conste da representação um ou
alguns dos autores ou partícipes do crime, ela alcançará a todos, pouco importando qual tenha
sido o motivo da exclusão. [...] O Estado não deixou a critério do ofendido o processo contra este
ou aquele autor, e, sim, o julgamento da conveniência e oportunidade do processo”.

Requisição do Ministro da Justiça.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019):
“Requisição é a autorização, fundamentada em razões políticas, para que o Ministério Público
promova a ação penal pública. A requisição é prevista como condicionante para o exercício da
ação penal em certos crimes de cunho eminentemente político (crimes contra a honra praticados
contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro, por exemplo), motivo
pelo qual se justifica que a persecução penal fique condicionada ao prudente arbítrio do Ministro
da Justiça, que julgará a conveniência e oportunidade de que seja ajuizada ação penal para cada
caso que se lhe apresente. Não obstante o termo requisição signifique ordem, esta não vincula o
órgão do Ministério Público, sendo mera autorização para que o Parquet promova a ação penal.
A requisição, como a representação, não exige forma especial. Deve, entretanto, conter, quando
possível, informações acerca do fato e sua autoria. Diferentemente da representação, o exercício
da requisição não está sujeito à decadência. Poderá ser exercida a qualquer tempo, enquanto
não surgir causa extintiva da punibilidade (prescrição da pretensão punitiva, por exemplo).
Quanto à possibilidade de retratação da requisição, a doutrina divide-se em duas correntes. Há
os que defendem a possibilidade de retratação, aplicando-se por analogia, nesse caso, os
dispositivos referentes à retratação da representação. Outros, ao contrário, entendem que a
retratação não é possível, por inexistir expressa disposição legal acerca da possibilidade de
retratação da requisição, não havendo, no caso, possibilidade de analogia com os dispositivos
legais referentes à representação em face da diferença essencial entre esta e a requisição, ato
político de autoridade do Estado que é o Ministro da Justiça”.

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GUILHERME MADEIRA (Curso de processo penal, São Paulo: RT, 2020). “A requisição tem por
natureza jurídica, segundo a posição majoritária, a de condição de procedibilidade. São aqui as
mesmas discussões apresentadas quando da representação, para as quais se remete o leitor. O
legitimado ativo para a requisição é o Ministro da Justiça, e tem por destinatários os mesmos da
representação. É certo que o CPP não prevê os destinatários da requisição de maneira expressa,
no entanto, admite-se que estes são os destinatários por força da analogia do art. 39 do CPP, que
cuida da representação. No mesmo sentido, não prevê expressamente o Código de Processo
Penal forma para a requisição. Daí porque se aplica por força de analogia o art. 39, § 2º, do CPP,
também para a requisição. A requisição do Ministro da Justiça não possui o prazo decadencial de
seis meses, estando sujeita tão somente ao prazo prescricional. Aqui, não se trata de aplicar por
interpretação extensiva o prazo da representação, pois o Código de Processo Penal e o Código
Penal são claros: somente caberá o prazo decadencial onde houver expressa previsão legal. Não
há previsão expressa sobre a possibilidade de retratação da requisição do Ministro da Justiça, daí
porque a doutrina diverge. Assim, temos as seguintes posições: a) Irretratável: Mirabete, José
Frederico Marques, Helio Tornaghi, Tourinho Filho, Rogério Lauria Tucci e Gustavo Badaró; b)
Retratável: Carlos Frederico Coelho Nogueira, Bento de Faria, Damásio de Jesus e Guilherme
Nucci. De nossa parte, entendemos que a requisição é retratável. Ora, percebe-se claramente o
tratamento lacônico que o legislador deu para a requisição e este tratamento lacônico foi
justamente no sentido de que fossem aplicadas para a requisição as mesmas disposições da
representação. Daí porque o primeiro argumento a favor da possibilidade da retratação é a
aplicação por analogia das disposições relativas à representação, no caso específico, o art. 25 do
CPP. Mas há segundo argumento de ordem política. Ora, não há sentido em se alijar o mais alto
mandatário da nação da possibilidade de retratação. Embora o legitimado ativo seja o Ministro
da Justiça, ele o faz por determinação do Presidente da República. Tanto a representação quanto
a requisição são baseadas em juízos de conveniência e de oportunidade, tanto do ofendido
quanto do Ministro da Justiça. Não há diferenciação ontológica entre ambos a justificar
tratamento diferenciado pelo legislador e pela doutrina. Por fim, da mesma forma que a
representação, também a requisição do Ministro da Justiça não vincula o promotor. Ou seja, este
pode propor arquivamento ou denunciar por crime diverso do eventualmente capitulado na
requisição. A confusão que se faz aqui decorre do termo “requisição”. Nesse contexto, ele não
tem o mesmo sentido de ordem. As palavras em direito não têm, necessariamente, o mesmo
sentido que o sentido do léxico. Daí porque, neste caso, requisição não tem sentido de ordem,
mas sim de pedido-autorização”.

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010) elenca
os crimes que necessitam do implemento dessa condição específica para deflagração da ação
penal: “A requisição, na espécie, é um ato político, porque ‘há certos crimes em que a
conveniência da persecução penal está subordinada a essa conveniência política’. São raras as
hipóteses em que a lei subordina a persecução àquele ato político: a) Nos crimes cometidos por
estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (CP, art. 7º, § 3º, b). b) Nos crimes contra a honra
cometidos contra Chefe de Governo estrangeiro (CP, art. 141, I, c/c o parágrafo único do art. 145).
[...] c) Nos crimes de injúria praticados contra o Presidente da República (cf. art. 141, I, c/c o
parágrafo único do art. 145 do CP e art. 26 da Lei de Segurança Nacional). Nos crimes de calúnia
e difamação contra o Presidente da República, se presentes as condições expostas nos arts. 1º e
2º da Lei de Segurança Nacional, a ação penal independerá de requisição ministerial. Será pública
incondicionada, e a competência é da Justiça Federal. Entretanto, se não atingirem a segurança

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interna ou externa do País, serão crimes comuns, cuja ação penal fica subordinada à requisição
ministerial. Na Lei de Imprensa havia outras hipóteses que admitiam a ação penal condicionada
à requisição do Ministro da Justiça, mas como o referido diploma foi revogado pelo STF na sessão
plenária de 30-4-2009, ao julgar procedente a ADPF 130-7, deixamos de fazer-lhe referência”.
Ainda, o autor registra a razão de existência dessa condição: “Com esse poder de julgar da
conveniência quanto à propositura da ação penal, o governo, representado pelo Ministro da
Justiça, evita, quando convém, ‘a repercussão pouco favorável que poderiam ter certos
episódios’. Assim, a requisição nada mais é senão mera autorização para proceder, permissão
para ser instaurado o processo, manifestação de vontade que tende a provocar a atividade
processual. Ela é, por assim dizer, a representação política”. Por fim, aduz acerca do conteúdo
necessário da requisição: “Qual o conteúdo da requisição? O CPP silenciou a respeito. É natural,
entretanto, deva indicar a qualidade da vítima, a qualificação, se possível, do autor da infração
penal e a exposição do fato. Se se tratar de crime praticado fora do Brasil por estrangeiro contra
brasileiro, a requisição deverá, também, referir-se a tais circunstâncias. Se, com a requisição,
forem fornecidos elementos que possibilitem a propositura da ação penal, esta será promovida”.

2.2 - Jurisprudência pertinente

Súmula 234, STJ: A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta
o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Supremo Tribunal Federal

Nos crimes de ação penal pública condicionada, como a ameaça, descabe impor forma especial
relativamente à representação. A postura da vítima, a evidenciar a vontade de ver processado
o agente, serve à atuação do Ministério Público. [...] (Inq 3714, Relator(a): Min. MARCO
AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 15/09/2015)

A representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, é ato que dispensa maiores
formalidades, bastando a inequívoca manifestação de vontade da vítima, ou de quem tenha
qualidade para representá-la, no sentido de ver apurados os fatos acoimados de criminosos.
[...] (Inq 3438, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 11/11/2014)

Nos crimes de ação penal pública condicionada, a decadência do direito à representação conta-
se da data em que a vítima tomou conhecimento dos fatos ou de quem é o autor do crime.
Hipótese em que, à míngua de elementos probatórios que a infirme, deve ser tida por verídica a
afirmação da vítima de que somente tomou conhecimento dos fatos decorridos alguns meses.
[...] (Inq 3672, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 14/10/2014)

[...] OFENSAS RECÍPROCAS. REPROVABILIDADE DA CONDUTA DO OFENDIDO. RETORSÃO


IMEDIATA. PERDÃO JUDICIAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 1. A representação do ofendido é
ato que dispensa maiores formalidades, bastando a inequívoca manifestação de vontade da
vítima, ou de quem tenha qualidade para representá-la, no sentido de ver apurados os fatos
acoimados de criminosos (INQ 3438, de minha relatoria, Primeira Turma, DJe 10/2/2015).
Preliminar de ofensa ao art. 44 do CPP rejeitada. [...] Ofensor e ofendido, ao projetarem
deliberadamente ofensas recíprocas - incitando um ao outro -, devem suportar as aleivosias

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em relação de vice e versa. Hipótese de perdão judicial, nos termos do artigo 140, § 1º, do CP.
Extinção da punibilidade declarada com fundamento no artigo 109, IX, do CP. (AP 926,
Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/09/2016)

Superior Tribunal de Justiça

Admite-se a reconsideração da retratação da representação, desde que observado o prazo


decadencial de 6 meses previsto no art. 38, caput, do Código de Processo Penal - CPP. [...] (AgRg
nos EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp 493.015/MG, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA
TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016)

[...] Poderá o ofendido se retratar da representação, ou melhor, se arrepender de ter


representado em desfavor do ofensor até o momento antes de ser oferecida pelo Ministério
Público a denúncia, que é o início da ação penal. [...] A doutrina e a jurisprudência admitem a
retração de retratação dentro do prazo decadencial. Em outros termos, a decisão de
arquivamento não implica extinção da punibilidade do autor da conduta delitiva, inclusive não
faz coisa julgada material, podendo o órgão ministerial, diante da reconsideração da vítima,
antes do termo final do prazo decadencial, requerer o desarquivamento. [...] (AgRg no REsp
1131357/DF, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 05/11/2013, DJe
28/11/2013)

É pacífica a jurisprudência desta Corte, nos termos dos arts. 25 do Código de Processo Penal e
102 do Código Penal, de que a representação será irretratável depois de oferecida a denúncia.
[...] (AgRg no AREsp 66.021/PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado
em 06/09/2016)

REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. AÇÃO PÚBLICA CONDICIONADA. INCLUSÃO DE OUTROS


ENVOLVIDOS QUE NÃO CONTAVAM NA REPRESENTAÇÃO. POSSIBILIDADE. PERSECUÇÃO
PENAL CONTRA TODOS OS POSSÍVEIS AUTORES DO FATO. LEGALIDADE. EFICÁCIA OBJETIVA DA
REPRESENTAÇÃO. DECADÊNCIA PARA REPRESENTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. [...] A questão
controvertida cinge-se a saber se, em decorrência da eficácia objetiva da representação, é
possível, na denúncia, o envolvimento de outro agente que não tenha sido apontado desde o
início na representação do ofendido. [...] Por eficácia objetiva da representação, entende-se o
seguinte: se oferecida a representação contra um dos partícipes ou coautores do crime, o
representante do Ministério Público deve oferecer a denúncia contra todos aqueles que
praticaram o delito. [...] A eficácia objetiva da representação, interligada ao princípio da
indivisibilidade que vige na ação penal pública, confere ao MP a possibilidade de atuar
prontamente contra todos os envolvidos, ainda que a representação não tenha abrangido
todos os autores da infração. Logo, admissível o aditamento à denúncia pelo Parquet para fins
de inclusão de corréu não constante da representação do ofendido. [...] Incabível a incidência
da decadência semestral para representação criminal em desfavor do recorrente, sobretudo
porque há que se considerar o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, que vincula e
legitima a atuação do Ministério Público a fim de que, havendo notícia do crime, apure os fatos
e promova a ação penal contra todos os envolvidos no fato delituoso. [...] (AgRg no REsp
1558569/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe
01/12/2016)

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Conforme a dicção do art. 16 da Lei n. 11.340/2006, "nas ações penais públicas condicionadas
à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação
perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do
recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público". [...] (RHC 65.558/BA, Rel. Ministro
RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 23/11/2016)

A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, nos crimes de
ação penal pública condicionada a representação submetidos à Lei Maria da Penha, a audiência
prevista no artigo 16 da Lei nº 11.340/06 visa confirmar a retratação, não a representação, e
por isso não é obrigatória, nem deve ser designada de ofício pelo magistrado, somente sendo
exigível quando a vítima demonstrar, por qualquer meio, que pretende desistir do
prosseguimento do feito. [...] (AgRg no REsp 1596737/SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS
MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 24/05/2016)

A representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, prescinde de formalidade,


sendo suficiente a demonstração inequívoca do interesse da vítima ou de seu representante
na persecução criminal. [...] (AgRg no REsp 1588248/CE, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, SEXTA
TURMA, julgado em 24/10/2017)

AÇÃO PENAL PRIVADA


Casos há em que a própria lei confere a titularidade do direito de ação penal ao ofendido ou seu
representante legal. São as chamadas ações penais de iniciativa privada e a referida titularidade decorre de
expressa previsão legal, conforme art. 30 do CPP:

Art. 30. Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação
privada.

Tomem-se, por exemplo, os crimes contra a honra elencados nos artigos 138, 139 e 140 do CP, em seu
Capítulo V (calúnia, difamação e injúria, respectivamente). O próprio Código, em seu artigo 145, estabelece
expressamente a natureza privada das ações referentes a esses crimes – ressalvando-se a figura da ‘injúria
real’ ao final do dispositivo:

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.

De qualquer forma, a regra permanece e convém lembrá-la: quando a lei se quedar silente, a ação penal será
pública incondicionada. Em se tratando de ação penal pública condicionada, a lei expressará a necessidade
de implemento de condição específica necessária à sua deflagração. Por fim, quando a ação for de iniciativa
privada, a lei expressamente a declarará, fazendo menção expressa (em boa parte, se não em todos os casos)
ao fato de que se procederá ‘mediante queixa’ ou construções sintáticas semelhantes.

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‘Queixa’ – palavra-chave para verificação da natureza privada da ação de determinado crime – é


simplificação do termo queixa-crime, que nada mais é do que a peça inaugural desse tipo de ação; guardadas
as devidas proporções, é como fosse a ‘denúncia’ nas ações penais de iniciativa privada11.

Note-se, todavia, que o Estado continua como titular do direito de punir (sempre o será); mas, por razões de
política criminal, outorga o direito de ação ao particular (Capez, 2018).

RENATO BRASILEIRO aponta as razões para a existência dessa vinculação da ação a uma atitude direta do
ofendido:

Os fundamentos que levam o legislador a dispor que determinado delito depende de queixa-
crime do ofendido ou de seu representante legal são: a) há certos crimes que afetam
imediatamente o interesse da vítima e mediatamente o interesse geral; b) a depender do caso
concreto, é possível que o escândalo causado pela instauração do processo criminal cause
maiores danos à vítima que a própria impunidade do criminoso – é o que se chama de escândalo
do processo (strepitus judicii); c) geralmente, em tais crimes, a produção da prova depende quase
que exclusivamente da colaboração do ofendido, daí por que o Estado, apesar de continuar
sendo o detentor do jus puniendi, concede ao ofendido ou ao seu representante legal a
titularidade da ação penal (Lima, 2021).

Por mais que a titularidade recaia, a princípio, na vítima ou em seus representantes legais, podem ocorrer
situações peculiares que demandem análise específica; como, por exemplo, nos casos de morte/ausência,
menoridade relativa e absoluta do ofendido. O legislador, já prevendo essas hipóteses, estabeleceu algumas
regras para tutelar, de maneira satisfatória, os interesses da vítima, conforme artigos 31, 33 e 34 do CPP:

Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o
direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente
ou irmão.

Art. 33. Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado
mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o
direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a
requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal.

Art. 34. Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de
queixa poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal.

Sobre isso, explica TÁVORA:

11
Tanto a queixa-crime quanto a denúncia serão pormenorizadas em pontos específicos.

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O exercício do direito de ação cabe ao ofendido ou ao seu representante legal (art. 30, CPP). No
caso de morte ou declaração de ausência da vítima, o direito de ação transfere-se ao cônjuge
(incluída a companheira), ascendentes, descendentes e irmãos, nesta ordem preferencial (art.
31, CPP). Tudo o mais quanto tratamos da legitimidade para representar, aqui tem aplicação,
assim, a figura do curador para o incapaz é tratada no art. 33 do CPP, além da possibilidade da
pessoa jurídica ter legitimidade ativa para a propositura da ação penal privada, como destacamos
pela leitura do art. 37 do mesmo código. Já quanto àqueles que têm entre 18 e 21 anos, por
serem absolutamente capazes, o direito de ação é cabível apenas a eles, não havendo que se
cogitar da presença do representante legal, afinal, como já frisado, são absolutamente capazes.
Por isso, o art. 34 do CPP encontra-se tacitamente derrogado, quando trata da figura do
representante legal a referidas pessoas, além da perda de eficácia da súmula nº 594 do STF
(Távora, 2017).

Outrossim, especificamente em relação à figura do ofendido menor de 18 anos, CAPEZ leciona:

Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver
representante legal, ou seus interesses colidirem com os deste último, o direito de queixa poderá
ser exercido por curador especial, nomeado para o ato (art. 33 do CPP). [...] Convém observar
que, para o menor de 18, não se inicia o prazo decadencial a partir do conhecimento da autoria,
mas da data em que completar a maioridade, pois não tem sentido começar a fluir prazo para o
exercício de um direito que ainda não pode ser exercido. Haverá, nessa hipótese, dois prazos
decadenciais: um para o ofendido, a partir dos 18 anos, e outro para o representante legal, a
contar do conhecimento da autoria, nos termos da Súmula 594 do STF (Capez, 2018).

Perceba-se que conceitos atinentes à ‘representação’ nas ações penais públicas condicionadas aproveitam
às de iniciativa privada; e um deles é a questão da decadência (aqui, do próprio direito de ação; nas públicas
condicionadas, da representação). Desta forma, como aponta o autor, somente se iniciará o prazo
decadencial (que é de seis meses) ao menor de 18 anos a partir do momento em que atingir a maioridade.
Aos demais, permanece a regra geral estampada no art. 38 do CPP:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do


mesmo prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31.

Convém notar, ademais, que o oferecimento de queixa-crime é atividade dependente de capacidade


postulatória, não podendo o querelante, caso não a detenha, apresentá-la como lhe aprouver. Tanto é que
o CPP, em seu artigo 32, inclusive prevê possibilidade de nomeação de advogado dativo, pelo juiz, para
exteriorizar, de forma técnica, a pretensão do ofendido quando este não tiver condições de constituir
defensor particular:

Art. 32. Nos crimes de ação privada, o juiz, a requerimento da parte que comprovar a sua
pobreza, nomeará advogado para promover a ação penal.

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Por fim, as ações penais de iniciativa privada podem ser subdivididas em:

a. exclusivamente privada;
b. personalíssima; e
c. subsidiária da pública.

1 - AÇÃO PENAL EXCLUSIVAMENTE PRIVADA


Essa espécie refere-se à ação penal de iniciativa privada propriamente dita, seguindo as diretrizes elencadas
logo acima, sem nenhum detalhe adicional. Dispensa, portanto, maiores comentários.

É a regra quando a lei for silente quanto ao seu aspecto personalíssimo ou sobre o condicionamento à inércia
do Ministério Público (Bonfim, 2013).

2 - AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA


Nas ações personalíssimas, a sua titularidade, como a própria denominação já explicita, recai apenas e tão
somente sobre a pessoa do ofendido, não se admitindo a sua transferência a representantes ou quaisquer
outras pessoas, nem mesmo em se tratando de morte ou declaração de ausência do ofendido ou, ainda,
situações congêneres.

Trata-se, atualmente, de hipótese rara no Direito brasileiro (apenas 1 (uma) hipótese) como aponta AURY
LOPES JR.:

Atualmente, com a revogação do delito de adultério (art. 240 do CP) pela Lei n. 11.106/ 2005,
persiste em nosso ordenamento apenas um delito de iniciativa personalíssima: o crime de
induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, previsto no art. 236 do CP. Nesse
crime, exige o parágrafo único do art. 236 que a ação penal somente poderá ser ajuizada pelo
contraente enganado. Significa que não se opera a sucessão prevista no art. 31 do CPP e, por
consequência, com a morte do ofendido, extinguem-se a punibilidade e a ação penal (Júnior,
2021).

3 - AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA


A ação penal privada subsidiária da pública constitui direito fundamental constitucionalmente garantido ao
ofendido quando constatada a inércia do Ministério Público na deflagração da ação penal pública, da qual é
titular. Veja-se o art. 5º, LIX da CF:

LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo
legal;

No mesmo sentido, o art. 100, § 3º do Código Penal:

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§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério
Público não oferece denúncia no prazo legal.

Ou seja, decorrido o prazo legal para o Ministério Público, quedando-se, este, inerte, surge para o ofendido
a possibilidade de, independentemente da atuação do parquet nesse momento, dar início à ação que seria
pública. Passará a ser denominada ação privada subsidiária da pública quando intentada pelo particular. É
clara exceção ao princípio da oficialidade no processo penal.

O Código de Processo Penal confere diretrizes e contornos mais práticos à referida ação em seu art. 29:

Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

Para que se possa constatar em que caso haverá tal inércia do parquet, é de bom alvitre relembrar os prazos
relacionados ao oferecimento da denúncia nas ações penais, conforme art. 46 do CPP:

Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da
data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se
o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade
policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber
novamente os autos.

Atenção: inércia significa inatividade, estagnação, ausência de reação. Portanto, o juízo de sua verificação
não se pode dar tão somente em relação ao oferecimento da denúncia como se permitem interpretar os
artigos supracitados; até porque o oferecimento da exordial acusatória, como já vimos, é apenas uma das
providências possíveis de serem tomadas pelo Ministério Público ao receber os autos de inquérito policial,
por exemplo. Nessa esteira, bem lembra AURY LOPES JR.:

Por inércia do MP compreende-se o fato de ele não acusar, nem pedir diligências e tampouco o
arquivamento. Caso tenha pedido diligências ou o arquivamento, mesmo que a vítima não
concorde, não há que se falar em inércia e, portanto, inviável a ação penal de iniciativa privada
subsidiária da pública (Júnior, 2021).

Importante registrar que as ações penais privadas subsidiárias da pública também se sujeitam ao instituto
da decadência, embora com algumas peculiaridades. A primeira delas refere-se ao seu termo inicial, e isso é
expressamente previsto na parte final do art. 38 citado há pouco. Relembre:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

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Desta forma, o prazo decadencial iniciará no 6º dia (caso o réu esteja preso) ou 16º dia (caso esteja solto),
sem que o Ministério Público tenha tomado qualquer atitude.

Ainda sobre a decadência, RENATO BRASILEIRO frisa outros detalhes:

Além disso, como essa ação penal, em sua essência, é de natureza pública, a decadência do
direito de ação penal privada subsidiária da pública não irá produzir a extinção da punibilidade,
sendo, por isso, chamada de decadência imprópria. Portanto, ainda que tenha havido a
decadência do direito de queixa subsidiária, o Ministério Público continua podendo propor a ação
penal pública em relação ao referido fato delituoso, logicamente desde que não tenha se
operado a prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade (Lima, 2021).

3.1 - Atuação do Ministério Público

Intentada a ação penal privada subsidiária da pública, ao Ministério Público é conferido amplo grau de
intervenção nos seus termos, como já percebido do supracitado art. 29 do CPP.

A respeito das medidas possíveis de serem adotadas pelo parquet, MOUGENOT BONFIM pormenoriza:

O mencionado art. 29 determina a obrigatória intervenção do órgão do parquet, no processo que


se originar do ajuizamento de ação privada subsidiária para: a) aditar a queixa, suprindo qualquer
omissão da peça acusatória, seja para incluir outros autores da infração, seja para adicionar
novos elementos ou circunstâncias olvidados pelo querelante; b) repudiar a queixa oferecida, se
reconhecê-la inepta, oferecendo nesse caso denúncia substitutiva; c) intervir em todos os termos
do processo, sob pena de nulidade (art. 564, III, d, do Código de Processo Penal). A nulidade
resultante da não intervenção do Ministério Público, nesses casos, constituirá nulidade relativa,
sanável e arguível apenas em caso de prejuízo (art. 563 do Código de Processo Penal); d) fornecer
elementos de prova, participando ativamente da instrução, comparecendo a audiências e
requerendo a produção das provas que julgar relevantes; e) interpor recurso; f) retomar a ação
como parte principal, a qualquer tempo, no caso de negligência do querelante na condução do
processo. A existência desse dever torna inexistente nos casos de ação penal privada subsidiária
o fenômeno da perempção. Nas hipóteses de o querelante abandonar a ação ou mesmo perdoar
o réu, caberá ao Ministério Público assumir a posição de parte do processo, passando a conduzir
a acusação (Bonfim, 2013).

O Ministério Público, portanto, segundo TÁVORA, “figura como interveniente adesivo obrigatório ou parte
adjunta, atuando em todos os termos do processo, sob pena de nulidade (art. 564, III, d, CPP), tendo amplos
poderes” (Távora, 2017).

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4 - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE E AÇÃO PENAL DE INICIATIVA


PRIVADA

Conforme determinados incisos do art. 107 do Código Penal, há causas de extinção da punibilidade
especialmente voltadas às ações de iniciativa privada, como a decadência, perempção, renúncia e perdão.
Vejamos, então, cada uma delas.

4.1 - Decadência

Por ‘decadência’ entende-se a perda de um direito pelo seu não uso dentro do prazo legal; no caso deste
tópico, estamos tratando da perda do direito de ação, com a consequente declaração de extinção da
punibilidade, ex vi do art. 107, IV do CP.

Já se comentou acerca desse instituto e suas várias minúcias quando da exposição acerca das ações penais
privadas e suas espécies; serão apenas repisados e sintetizados alguns detalhes, portanto.

Abrangendo tanto o direito de representação nas ações penais públicas condicionadas quanto o direito de
queixa nas ações penais privadas, a decadência está prevista no art. 38 do CPP e 103 do CP:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

Art. 103 - Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de
representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a
saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se
esgota o prazo para oferecimento da denúncia

Por expressa previsão legal, o prazo decadencial é, via de regra, de 6 (seis) meses, contados do dia em que
se teve conhecimento da autoria do crime nas ações penais públicas condicionadas e ações penais de
iniciativa privada exclusiva e personalíssima; ou do dia do esgotamento do prazo de oferecimento da
denúncia nos casos de ação penal privada subsidiária da pública.

Vale lembrar que, nos casos envolvendo ofendidos menores de 18 anos, o prazo decadencial para estes
apenas passará a contar a partir do momento em que for atingida a maioridade (e desde que se saiba a
autoria); afinal, só se pode falar em decadência de direito que pôde ser exercido, conforme já se aduziu. A
jurisprudência dos tribunais superiores confere uma interpretação diferenciada à Súmula 594 do STF, para
reconhecer à vítima, quando atinge 18 anos, a possibilidade de apresentar representação ou queixa,
independentemente de qual foi o comportamento do seu representante antes disso.

Para uma explicação mais detalhada, neste ponto, confira-se:

Direito de queixa/representação pelo representante legal e posterior maioridade do ofendido.


Prazos distintos. A questão que se coloca é se há um único direito para o representante legal e

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para o menor de 18 anos ou se são prazos distintos. Em outras palavras, se o representante legal
não exercitar o direito de queixa e de representação no prazo decadencial, o que ocorre quando
o ofendido alcançar a maioridade? Ou a situação inversa: o direito de queixa ou representação
for exercitado pelo representante legal, dentro do prazo decadencial, seria possível ao menor se
retratar ao alcançar a maioridade? O STF editou há tempos a Súmula 594, com o seguinte teor:
‘Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo
ofendido ou por seu representante legal’. Referida Súmula foi editada sob o entendimento de
que, ‘no sistema do Código de Processo Penal, há autonomia do direito de queixa ou de
representação, que pode ser exercido pelo ofendido ou por seu representante legal’ (STF, RE
81.796, rel. Min. Xavier de Albuquerque, Segunda Turma, julgado em 01.09.1975). Da análise dos
precedentes que levaram à edição da Súmula 594, verifica-se que todos os precedentes diziam
respeito à situação prevista no art. 34, ou seja, quando houvesse menor entre 18 e 21 anos
(concorrência entre direitos). Nessas situações, o STF asseverou que o prazo de cada um (menor
e representante) seria autônomo e independente, correndo dois fluxos diversos, com termos
iniciais distintos. Embora referida súmula fosse criticada por parte da doutrina, a jurisprudência
do STF acabou estendendo a interpretação prevista na Súmula – criada para situações de
concorrência entre o representante legal e o ofendido entre 18 e 21 anos – para os casos de
menores de 18 anos de idade. Assim, o STF passou a entender que o CPP diferencia entre o
titular do direito e o seu exercício, de sorte que o ofendido menor de 18 anos somente passa a
ter o prazo decadencial iniciado a partir da data em que complete a maioridade, pois antes,
embora tivesse o direito, não poderia exercê-lo pessoalmente. Ademais, segundo o STF, o
ofendido menor poderá exercer autonomamente seu direito ao completar 18 anos de idade,
caso seu representante legal não tenha exercido o direito ou ainda que este tenha
expressamente renunciado a tanto. São dois direitos absolutamente distintos e independentes,
portanto: (i) do menor de 18 anos – que poderá exercê-lo normalmente após completar a
maioridade – e (ii) do representante legal, inclusive com prazos e termos iniciais distintos para
seu exercício. O não exercício do direito ou, inclusive, sua renúncia pelo representante legal
não prejudica o direito do ofendido menor de 18 anos. O raciocínio é que, se o menor não pode
exercer seu direito, não pode correr contra ele o prazo decadencial. Assim, uma coisa é a
titularidade do direito, outra a possibilidade de seu exercício (que somente ocorre após os 18
anos). Portanto, no caso de menores de 18 anos, mesmo em caso de renúncia pelo representante
legal, o ofendido, ao completar a maioridade penal, poderá propor a queixa. Por exemplo, se a
menor foi vítima de um crime de ação privada aos 15 anos, mesmo que seus genitores tenham
conhecimento e deixem escoar o prazo para oferecer queixa ou, ainda, renunciem ao direito de
queixa, o ofendido poderá propor a queixa ao completar 18 anos, data em que se iniciará a
fluência do prazo decadencial de seis meses, se já conhecida a autoria. No mesmo sentido, o STJ
decidiu que é possível ao ofendido menor exercer o direito de queixa ao atingir a maioridade.
Portanto, o STF e o STJ entendem que há dois prazos completamente autônomos: o do menor
e o de seus representantes. São prazos autônomos, estanques e absolutamente independentes
e inclusive com termos iniciais e regras de contagem diferentes. Enquanto o do representante
legal começa a fluir realmente quando conhece a autoria delitiva, extinguindo-se em seis meses
a partir de então, o prazo do menor de 18 anos somente começa a fluir quando, além de conhecer
a autoria delitiva, completa 18 anos. E, ademais, o prazo do menor é completamente
independente do prazo do representante legal, não havendo qualquer influência. Há uma
duplicidade de prazos para o oferecimento do direito de queixa ou de representação, com
titularidades distintas e com formas de contagem e marcos iniciais diversos. Como são dois

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poderes distintos, as intercorrências de um não prejudicam ou interferem no direito do outro.


São prazos não vinculados um ao outro, sendo certo que um não contamina o outro. Assim,
enquanto menor o ofendido, o representante legal pode renunciar ao direito de queixa. No
entanto, essa renúncia não levará à extinção da punibilidade e não produzirá efeitos em relação
ao direito do menor, cujo direito de propor a queixa-crime é autônomo e independente e
somente começará a fluir após completar 18 anos. Na prática, portanto, a renúncia do
representante legal do menor não produz a extinção da punibilidade (apenas terá efeitos
processuais, impedindo que o representante legal proponha a queixa-crime), sendo uma espécie
de decadência anômala – por atingir apenas o direito de ação, mas não o direito material.
Somente se o ofendido, após os 18 anos, renunciar, é que haverá a extinção da punibilidade. Ou
seja, mesmo que o representante legal tenha renunciado, quando o menor completar 18 anos,
poderá propor a queixa-crime no prazo decadencial, de maneira autônoma. Em resumo,
portanto, o menor de 18 anos terá assegurado o direito de exercer a queixa assim que
completar a maioridade, independentemente de qual foi o comportamento de seu
representante legal. Com a maioridade do ofendido se inicia o seu prazo para oferecer queixa-
crime e para representar. De qualquer sorte, é importante destacar que, em qualquer caso, o
lapso prescricional correrá, a partir da consumação do fato delitivo, como regra, e
independentemente das regras de decadência. Assim, embora seja raro, é possível que o prazo
prescricional ocorra antes do decadencial. Por exemplo, se a vítima tiver um ano de idade quando
da prática do crime, se chegar aos 18 anos e o crime estiver prescrito, não há que se falar em
exercício do direito de representação ou queixa. (Filho, et al., 2018)

Excepcionalmente, conforme pondera MOUGENOT BONFIM, há situações em que a lei prevê características
específicas à decadência:

Há, ainda, casos especiais, para os quais a lei fixa prazos diversos: a) crime contra o casamento,
consistente no induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento: o prazo será de 6
meses, porém seu termo a quo será a data em que transitar em julgado a sentença que, por
motivo de erro ou impedimento, anular o casamento (art. 236, parágrafo único, do Código Penal);
b) crimes contra a propriedade imaterial sujeitos a ação privada exclusiva: o prazo será de 30
dias, contados da homologação do laudo (art. 529, caput, do Código de Processo Penal).

Quanto à última situação retratada, estabeleceu o STJ (Informativo 692) que “o prazo do art. 529 do Código
de Processo Penal não afasta a decadência pelo não exercício do direito de queixa em seis meses, contados
da ciência da autoria do crime”.

Informações do Inteiro Teor - Discute-se se o prazo decadencial previsto no art. 529 do CPP - 30
dias após homologação do laudo pericial - consubstancia norma especial, apta a afastar a
incidência do art. 38 do mesmo código (decadência em 6 meses contados da ciência da autoria
do crime).

Tal exegese, no entanto, não deve prevalecer. A interpretação sistemática das normas aponta no
sentido da possibilidade de conformação dos prazos previstos nos referidos dispositivos do
Código de Processo Penal.

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Assim, em se tratando de crimes contra a propriedade imaterial que deixem vestígio, a ciência
da autoria do fato delituoso dá ensejo ao início do prazo decadencial de 6 meses, sendo tal
prazo reduzido para 30 dias se homologado laudo pericial nesse ínterim.

A adoção de interpretação distinta, de modo a afastar o prazo previsto no art. 38 do CPP em prol
daquele preconizado no art. 529 do CPP, afigura-se desarrazoada, pois implicaria sujeitar à
vontade de querelante o início do prazo decadencial.

De fato, consoante ressaltado pelo Tribunal de origem, o querelante, a qualquer tempo, mesmo
que passados anos após ter tomado ciência dos fatos e de sua autoria, poderia pleitear a
produção do laudo pericial, vindo a se reabrir, a partir da data da ciência da homologação deste
elemento probatório, o prazo para oferecimento de queixa-crime.

Desse modo, o que se verifica é que a exegese defendida vulnera a própria natureza jurídica do
instituto (decadência), cujo escopo é punir a inércia do querelante. (REsp 1.762.142/MG, Rel.
Min. Sebastião Reis Junior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 13/04/2021)

Ainda, o referido autor, com muita propriedade, assevera acerca da forma de contagem nas diferentes
espécies de crime:

Finalmente, há que se destacar a forma de contagem do prazo em alguns casos específicos: a) no


crime continuado, o prazo será apreciado em relação a cada delito, de forma individualizada; b)
no crime habitual, o prazo será computado a partir do último ato praticado conhecido pelo
ofendido; c) no crime permanente, conta-se o prazo a partir da ciência, por parte da vítima, de
quem seja o seu autor, e a partir da data dos fatos posteriores a essa ciência, se persistirem os
efeitos da infração (Bonfim, 2013).

Ao demais, conforme salienta RENATO BRASILEIRO, diferentemente do prazo prescricional, a decadência


constitui prazo fatal – não se interrompe nem se suspende:

Ao contrário do que ocorre com a prescrição, cujo prazo está sujeito a interrupções ou
suspensões, o prazo decadencial é fatal e improrrogável, logo, não se suspende e não se
interrompe. Também não admite prorrogações. Por isso, expirando-se num domingo ou feriado,
não pode ser prorrogado, como se dá com os prazos processuais (Lima, 2021).

4.2 - Perempção

Perempção é uma causa extintiva de punibilidade (art. 107, IV do CP) que se perfaz com a constatação de
desídia do querelante nas ações penais de iniciativa privada.

Nas lições de MOUGENOT:

A perempção compreende, na verdade, duas espécies distintas de fatos. Compreende aquelas


hipóteses em que a ação penal é abandonada pelo seu autor, que simplesmente deixa de prover-
lhe movimento, deixando-a extinguir por inércia, e também aquelas em que desaparece o autor
da ação sem que alguém lhe suceda (Bonfim, 2013).

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O art. 60 do CPP, em seus incisos I a IV, prevê as hipóteses de perempção:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a
ação penal:

I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30


dias seguidos;

II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo,


para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem
couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36;

III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do
processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações
finais;

IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.

Algumas breves observações acerca dos aludidos incisos.

Inc. I: a perempção, aqui, apresenta-se como consequência do abandono da ação. Não podem o Poder
Judiciário e o querelado ficarem à mercê da vontade do querelante. Se este não provê a movimentação do
processo, deve haver sua extinção (Bonfim, 2013).

Inc. II: para BRASILEIRO, em relação à situação apresentada neste inciso, não haveria necessidade de se intimar
todos os sucessores para darem continuidade à ação:

(...) se comparecer mais de uma pessoa com direito de queixa, terá preferência o cônjuge, e, em
seguida, os ascendentes, descendente e irmãos, podendo, no entanto, qualquer deles prosseguir
na ação, caso o querelante desista da instância ou a abandone, nos termos do art. 60, II, c/c art.
36, ambos do CPP. A nosso ver, não há necessidade de intimação de cada um dos sucessores, já
que o referido prazo começa a fluir imediatamente após a morte do querelante ou do
reconhecimento de sua incapacidade. Ademais, seria inviável querer se instaurar um processo
sucessório no âmbito criminal, a fim de se localizar eventuais cônjuges, ascendentes,
descendentes e irmãos do falecido (Lima, 2021).

Inc. III: a extinção da punibilidade pela perempção em relação aos fatos previstos neste inciso é questão
divergente na doutrina, e MOUGENOT, como de costume, muito bem sintetiza a celeuma:

a) A doutrina diverge quanto à hipótese do não comparecimento do querelante à audiência de


conciliação prevista no art. 520 do Código de Processo Penal (ato que faz parte do procedimento
adotado no processamento de crimes contra a honra). Há aqueles que reconhecem na ausência
do querelado a esse ato processual uma causa que enseja perempção, pois essa audiência seria
um ato relativo ao processo, configurando verdadeira condição de procedibilidade da ação.
Defendendo posição oposta, argumentam outros doutrinadores que a mencionada audiência,
uma vez que ocorre em momento anterior à própria propositura da ação penal, não constitui um

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ato processual, de modo que não haveria como admitir que o não comparecimento do
querelante ensejaria a perempção, instituto que só existe em atos de natureza processual. Antes
de haver processo, portanto, não haveria como existir perempção. (STJ, HC 9843-MT, 6ª T., Rel.
FERNANDO GONÇALVES, DJ, 17.4.2000; STF, HC 81.264-3, 2ª T., Rel. Maurício Corrêa, DJ, 27.2.2004).
b) Quanto à segunda hipótese prevista no inciso III — o caso de ausência de pedido expresso de
condenação nas alegações finais —, alguns autores defendem uma interpretação menos presa
à literalidade do texto, afirmando que, naqueles casos em que do teor das alegações finais se
possa denotar a inequívoca vontade do querelante no sentido de que seja o querelado
condenado, não deve o juiz reconhecer a ocorrência de perempção, ainda que não haja expresso
pedido nesse sentido. Trata-se, aqui, de corrente doutrinária que homenageia o princípio
segundo o qual os atos jurídicos devem ser interpretados à luz da intenção de seu praticante,
relevando, quando o caso requerer, a estrita formalidade da lei. Outros autores, entretanto,
preferem prestigiar a literal disposição legal, entendendo haver exigência no sentido de que o
pedido de condenação deva vir claramente enunciado, não sendo suficiente o simples pedido de
fiat iustitia para suprir-lhe a ausência (Bonfim, 2019).

Inc. IV: extinta a pessoa jurídica querelante, sem sucessores, não há qualquer razão ou interesse na
continuidade de uma ação penal de iniciativa privada.

4.3 - Renúncia

A renúncia ao direito de queixa refere-se à possibilidade conferida ao ofendido de abdica do referido direito
antecipadamente, ensejando-se a declaração da extinção de punibilidade do ofensor com fundamento no
art. 107, V do CP.

Veja o que dispõe o art. 49 do CPP acerca da renúncia:

Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a
todos se estenderá.

Percebe-se deste dispositivo a incidência do princípio da indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada,
de que já tratamos. Ora, se é indivisível essa ação por força de expressa previsão legal (art. 48 do CPP), no
momento em que o ofendido decide pela não persecução penal em relação a um dos agentes, abrirá mão
do seu direito aos demais. Imperioso registrar que só há falar em renúncia nas ações penais de iniciativa
privada exclusiva e personalíssima; trata-se de instituto incompatível com a subsidiária da pública.

Essa renúncia pode ser expressa (explícita) ou tácita (implícita). A esse respeito, as disposições do art. 50 do
CPP e 104, parágrafo único do Código Penal:

Art. 50. A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu
representante legal ou procurador com poderes especiais.

Art. 104 - O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente.

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Parágrafo único - Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com
a vontade de exercê-lo; não a implica, todavia, o fato de receber o ofendido a indenização do
dano causado pelo crime.

Expressa será a renúncia quando o ofendido a manifestar por meio de declaração própria (ou por seu
representante legal/procurador com poderes especiais), por escrito, e subscrevendo-a, conferindo-lhe
autenticidade.

Em relação à renúncia tácita, esta pode ser dar por diversas maneiras, cuja constatação fica a cargo da lógica
e interpretação, porquanto o legislador infraconstitucional não se pôs a descrevê-las antecipadamente.
Nesse sentido, NORBERTO AVENA elenca uma série de atitudes do ofendido que fazem presumir ter abdicado
do seu direito de queixa:

É, por outro lado, tácita quando o ofendido: • Deixa escoar o prazo decadencial sem ajuizar a
queixa-crime; • Sendo instado a aditar a inicial para a inclusão de coautores ou partícipes,
mantém-se inerte; • Realizar a composição dos danos cíveis da infração penal com o autor do
fato no âmbito dos juizados especiais criminais mediante acordo judicialmente homologado (art.
74, parágrafo único, da Lei 9.099/ 1995); • Promover atos, fatos e circunstâncias que revelem a
ausência de seu interesse em promover a responsabilização penal do ofensor, v.g., convidando-
o para ser padrinho de batismo de seu filho. Nesse último exemplo, se, apesar do convite
realizado, vier o ofendido a ingressar com ação penal, poderá o querelado, nos termos do art. 57
do CPP, utilizar de todo o meio de prova admitido para comprovar a ocorrência de anterior
renúncia tácita à ação penal e, assim, buscar a extinção da punibilidade (art. 107, V, do CP)
(Avena, 2020).

4.4 - Perdão do ofendido

Se a renúncia é a abdicação do direito de queixa antes (evidentemente) do início da ação penal de iniciativa
privada, o perdão consiste na desistência, por parte do ofendido, da continuidade do processo, efetivamente
perdoando o ofensor. É o que dispõe o art. 105 do Código Penal:

Art. 105 - O perdão do ofendido, nos crimes em que somente se procede mediante queixa, obsta
ao prosseguimento da ação.

Não se deve confundir os institutos. A renúncia é manifestação do princípio da oportunidade da ação penal
de iniciativa privada; o perdão é manifestação do princípio da sua disponibilidade.

Trata-se de causa extintiva da punibilidade prevista no art. 107, V do Código Penal:

V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;

No citado artigo, aliás, reside a grande diferença entre os institutos da renúncia e do perdão (além do
momento em que são manifestados): é a necessidade de aceitação do perdão por parte do ofensor para que
opere os seus efeitos.

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O perdão também pode se dar de maneira expressa ou tácita, dentro ou fora do processo. Veja o que dispõe
o art. 106 do Código Penal:

Art. 106 - O perdão, no processo ou fora dele, expresso ou tácito:

I - se concedido a qualquer dos querelados, a todos aproveita;

II - se concedido por um dos ofendidos, não prejudica o direito dos outros;

III - se o querelado o recusa, não produz efeito.

§ 1º - Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir
na ação.

§ 2º - Não é admissível o perdão depois que passa em julgado a sentença condenatória.

Tratando sobre as mesmas questões, os artigos 51, 56 e 59 do CPP:

Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia,
efeito em relação ao que o recusar.

Art. 56. Aplicar-se-á ao perdão extraprocessual expresso o disposto no art. 50.

Art. 59. A aceitação do perdão fora do processo constará de declaração assinada pelo querelado,
por seu representante legal ou procurador com poderes especiais.

Por força do princípio da indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada, o perdão de um querelado afeta
todos os demais; isso é consequência e adequação lógica ao fato de, em momento processual anterior, a
renúncia do direito de queixa em relação a um ofensor estender-se necessariamente a todos.

Excetua-se a essa situação o caso em que o ofensor recusar o perdão, ocasião em que, excepcionalmente,
não se terá uma ação penal de iniciativa privada em relação a todos os ofensores.

Sobre o perdão expresso e tácito, seguindo a mesma sorte da renúncia, AVENA aduz:

O perdão pode ser expresso ou tácito. Será expresso quando constar de declaração nos autos ou
termo assinados pelo ofendido ou por procurador com poderes especiais. Será tácito quando
atos patrocinados pelo querelante forem incompatíveis com o desejo de prosseguir na ação
penal, como a hipótese mencionada por NUCCI de retornar o querelante a conviver intimamente
com o querelado. Observe-se que, assim como a renúncia tácita, também o perdão tácito pode
exigir do querelado a produção de provas para torná-lo inequívoco, conforme autorizado pelo
art. 57 do CPP (Avena, 2020).

O momento processual para exteriorização do perdão, a contrario sensu do § 2º do referido artigo, é até
antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.

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Em relação à legitimidade atinente ao perdão, considerando que os artigos 52 e 54 foram tacitamente


revogados pelo Código Civil, assim dispõem os artigos 53 e 55 do CPP, que são claros e objetivos:

Art. 53. Se o querelado for mentalmente enfermo ou retardado mental e não tiver representante
legal, ou colidirem os interesses deste com os do querelado, a aceitação do perdão caberá ao
curador que o juiz lhe nomear.

Art. 55. O perdão poderá ser aceito por procurador com poderes especiais.

Por fim, ofertado o perdão, o querelado será intimado para, em três dias, manifestar ou não seu aceite,
conforme art. 58 do CPP:

Art. 58. Concedido o perdão, mediante declaração expressa nos autos, o querelado será
intimado a dizer, dentro de três dias, se o aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cientificado de
que o seu silêncio importará aceitação.

4.5 - Doutrina Complementar

Ação penal de iniciativa privada.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “Em certas
ocasiões, entretanto, a própria lei reserva o exercício da ação penal a um particular. São aqueles
casos em que, por determinação legal, a ação penal será de iniciativa privada (ou,
abreviadamente, os casos de ação penal privada). Conforme já se disse, ao transferir para o
ofendido o exercício da ação penal (jus accusationis), o Estado continua a deter, com
exclusividade, o direito de punir (jus puniendi). O particular, ajuizando e conduzindo a ação penal,
na verdade, defende não apenas seu próprio interesse em ver punido o suposto autor de uma
conduta criminal que se perpetra contra ele, mas também, e principalmente, o interesse social
em que sejam perseguidos e devidamente punidos aqueles que infringem a lei penal. Nesse
ponto, a denominação consagrada do instituto — ação penal privada — pode induzir a erro. A
ação penal, seja a de iniciativa pública, seja a de iniciativa privada, é sempre direito público, uma
vez que exercido perante um poder público. Além disso, não obstante seja iniciada e conduzida
por um particular, tem por conteúdo uma pretensão cuja titularidade é, também, pública.
Dessarte, o caráter privado da assim denominada ação penal privada restringe-se tão somente
ao sujeito que detém a titularidade da ação”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018) elenca os crimes
passíveis de ação penal de iniciativa privada previstos no Código Penal: “(i) Calúnia, difamação e
injúria (arts. 138, 139 e 140, caput), salvo as restrições do art. 145; (ii) Alteração de limites,
usurpação de águas e esbulho possessório, quando não houver violência e a propriedade for
privada (art. 161, § 1º, I e II); (iii) Dano, mesmo quando cometido por motivo egoístico ou com
prejuízo considerável para a vítima (art. 163, caput, parágrafo único, IV); (iv) Introdução ou
abandono de animais em propriedade alheia (art. 164 c/c o art. 167); (v) Fraude à execução (art.
179 e parágrafo único); (vi) Violação de direito autoral, usurpação de nome ou pseudônimo
alheio, salvo quando praticados em prejuízo de entidades de direito (arts. 184 a 186); (vii)
Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento para fins matrimoniais (art. 236 e seu

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parágrafo); e (viii) Exercício arbitrário das próprias razões, desde que praticado sem violência
(art. 345, parágrafo único)”.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018): “A iniciativa deste direito
de agir é que em alguns casos excepcionais é dada ao particular. Portanto, a ação penal é pública,
porém iniciada pelo particular. O Estado entrega ao particular o direito de perseguir em juízo
aquilo que lhe é devido (jus accusationis), porém o direito de punir (jus puniendi) pertence-lhe
exclusivamente. [...] Portanto, o ofendido na ação penal de iniciativa privada tem a natureza
jurídica de um verdadeiro substituto processual, pois está legitimado para litigar em juízo, em
nome próprio, como autor, na defesa de direito alheio, qual seja: o interesse que tem o Estado
de ver reintegrada a ordem jurídica que foi violada com a prática da infração penal. O ofendido
é legitimado extraordinariamente para agir, posto que o legitimado ordinário é o Estado-
administração”.

GUILHERME MADEIRA (Curso de processo penal, São Paulo: RT, 2020). “Como regra, o prazo para o
oferecimento da queixa-crime é de seis meses, a contar do conhecimento da autoria (arts. 38 do
CPP e 103 do CP). Este prazo, por ser decadencial, liga-se diretamente à punibilidade e, portanto,
é um prazo de direito penal material. Desta forma, na sua contagem, inclui-se o dia de início e
exclui-se o dia do final. Assim, caso tome conhecimento do prazo no dia 29.07, o último dia do
prazo será 28.01. Há, contudo, cinco exceções a este prazo: a) Crimes contra a propriedade
imaterial – o prazo é de trinta dias para o oferecimento da queixa-crime a contar da homologação
do laudo pericial pelo juiz (art. 529 do CPP); b) Ocultação ou impedimento para casamento – no
caso do crime do art. 236 do CP, o prazo é de seis meses a contar do trânsito em julgado da
sentença que anular o casamento; c) Ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública – o
prazo é de seis meses, a contar do dia seguinte ao término do prazo para o Ministério Público; d)
Ação penal privada para os sucessores – quando o ofendido morre antes do término do prazo
decadencial, surge para os sucessores o prazo de seis meses para o oferecimento da queixa-
crime, a contar da morte do ofendido, desde que não tenha havido decadência para o ofendido.
É também a posição de Pedro Henrique Demercian, Jorge Assaf Maluly e Carlos Frederico Coelho
Nogueira. Neste caso é importante notar que há outras posições que merecem conhecimento.
Mirabete entende que o prazo é de seis meses e o termo inicial será a data em que os sucessores
tomarem conhecimento da autoria, desde que não tenha se escoado o prazo antes da morte do
ofendido. Já Tourinho Filho separa a situação em três possibilidades: a) se o ofendido já sabia
quem era o autor do crime e não promoveu a ação penal vindo a morrer depois, estará extinta a
punibilidade; b) se sabia quem era o autor mas não promoveu a ação penal por não ter
capacidade para tanto, o prazo é de seis meses contados da data em que qualquer pessoa do art.
31 do CPP tomar ciência da autoria; e c) se não havia escoado o prazo de seis meses quando
morreu o ofendido e este já tinha conhecimento da autoria, o prazo será de seis meses a contar
da data em que qualquer dos sucessores vier a saber quem é o autor do crime. Não há posição
pacífica na jurisprudência dos tribunais superiores. Assim, podemos organizar da seguinte forma
as posições: a) se quando da morte já tinha decorrido seis meses do conhecimento da autoria
por parte do ofendido, nada pode ser feito pois já houve decadência (os autores acima citados
todos concordam com isso); b) se não houve o transcurso do prazo decadencial, há duas
posições: b1) Pedro Demercian, Jorge Maluly, Carlos Frederico Coelho Nogueira: seis meses a
contar do óbito do ofendido; b2) Tourinho Filho e Mirabete: seis meses a contar do
conhecimento da autoria. Neste caso o prazo é contado da ciência por parte de cada sucessor e

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afeta a todos indistintamente; c) Vítima menor de 18 anos, e o representante legal não exerceu
o direito de queixa-crime – seis meses, a contar do dia em que completa 18 anos. Neste último
caso, contudo, é preciso explicação mais detalhada. Há, em verdade, duas posições sobre este
tema. A posição majoritária é a que consta da letra “e”: o ofendido menor de 18 anos terá o prazo
de seis meses para oferecer queixa-crime, se seu representante legal não o fez antes dos 18 anos
do ofendido. São defensores desta posição majoritária: Guilherme Nucci e Mirabete. Mas há
posição minoritária neste tema. Para esta posição, minoritária, somente poderá ser exercido o
direito de queixa pelo ofendido se não houve decadência para o representante legal. Neste caso,
o ofendido terá o direito de queixa-crime pelo tempo restante do prazo que teria seu
representante legal. É defensor desta posição minoritária: Tourinho Filho”.

Espécies de ação penal de iniciativa privada.

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018) assevera em relação à
ação penal de iniciativa privada personalíssima: “Ocorrendo o crime de induzimento a erro
essencial e ocultação de impedimento, somente o contraente enganado poderá propor a ação
penal e, uma vez proposta, se vier a falecer no curso da ação, haverá a extinção da punibilidade,
pois nesse caso não há sucessão processual. Portanto, o direito de ação é personalíssimo e
intransmissível. Se o contraente enganado tem 17 anos no crime de induzimento a erro essencial
e ocultação de impedimento (no caso da mulher, que com essa idade pode casar com o
consentimento dos pais, cf. art. 1.517 e seguintes do Código Civil), a ação penal não poderá ser
proposta, pois não tem ele (cônjuge) capacidade processual, ou seja, legitimidade para praticar
atos válidos no processo, não obstante ser parte legítima para propor ação. Nesse caso, deverá
aguardar completar 18 anos para propor a ação”. Acerca do instituto da emancipação pelo
casamento e sua relação com o Direito Penal, aduz: “A emancipação ocorrida como decorrência
do casamento (cf. art. 5o, parágrafo único, II, do Código Civil – Lei no 10.406/2002) é meramente
para os efeitos civis, não, porém, para fins de Direito Penal. O casamento não supre a
incapacidade para a prática de atos processuais penais que exigem a idade de 18 anos, como por
exemplo, para promover ação penal, pois, nesse aspecto, não há intromissão do direito civil no
direito processual penal. Até porque, se o cônjuge promover uma ação penal imputando fato de
que sabe o réu inocente não irá responder pelo crime de denunciação caluniosa”.

AURY LOPES JR. (Direito processual penal, 15ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018), a respeito da ação
penal privada subsidiária da pública, pontua: “Importante destacar que é uma legitimidade
extraordinária, nascida da inércia do MP, mas que não transforma a ação em privada. Ela segue
sendo de iniciativa pública, regida pelas regras anteriormente expostas, de obrigatoriedade,
indisponibilidade, indivisibilidade e intranscendência. Assim, não há que se falar em disposição,
perdão ou perempção. Contudo, em tese, pode o ofendido renunciar ao seu direito de oferecer
a queixa subsidiária, mas isso em nada afetará o direito de o Ministério Público oferecer a
denúncia a qualquer tempo (desde que antes de extinta a punibilidade, por óbvio). [...] Daí por
que, para além das possibilidades de aditar, repudiar e oferecer a denúncia, poderá o MP intervir
em todos os termos do processo (devendo ser intimado dos atos, portanto), bem como retomar
a qualquer tempo como parte principal. Nesse caso, o ofendido poderá permanecer no processo,
mas como assistente da acusação (devendo habilitar-se para tanto, nos termos dos arts. 268 e s.
do CPP). Quanto à discussão acerca da expressão no caso de negligência do querelante, retomar
a ação como parte principal, contida na última parte do art. 29, pensamos que ela deve ser (re)

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lida a partir da legitimidade constitucional do MP. Havendo negligência do querelante (o que


poderia conduzir a uma perempção, sem, contudo, produção dos efeitos), diante da regra da
obrigatoriedade (já descumprida pela inércia inicial do MP), deverá o promotor retomar a ação.
Não há possibilidade de perempção de ação pública. Nesse caso, existe um dever legal de agir.
Contudo, não é apenas em caso de negligência que o MP pode retomar a ação, pois, sendo ele o
titular constitucional (art. 129, I, da Constituição), poderá fazê-lo a qualquer tempo (e não apenas
em caso de negligência)”.

Causas de extinção da punibilidade nas ações penais de iniciativa privada.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016), sobre as
causas extintivas da punibilidade nas ações penais de iniciativa privada, trata sobre alguns
detalhes: “A decadência: [...] Como já ressaltado, a pendência de inquérito policial inconcluso
apurando infração de caráter privado não possibilita a dilação do prazo para a vítima ofertar a
ação. Para não decair do direito, restaria ao querelante propor a demanda criminal, sem o
inquérito, requerendo ao magistrado, na inicial, que os autos sejam apensos ao processo, assim
que o inquérito for concluído. O ajuizamento da queixa-crime, mesmo perante juízo relativa ou
absolutamente incompetente, obsta o decurso do prazo decadencial, eis que existente ação
processual, vale dizer: a partir da propositura da queixa, há de fato exercício do jus puniendi pelo
particular e instauração de processo (pedido condenatório e jurisdição). O recebimento posterior
da queixa-crime pelo juízo competente não causa prejuízo ao direito punitivo estatal. O que
importa é que o ajuizamento da demanda tenha se dado dentro do prazo de seis meses previsto
em lei. No entanto, a inexistência de procuração com poderes especiais ou a apresentação de
procuração com a cláusula geral (para o foro geral ou ad juditia) enseja o reconhecimento da
decadência se escoado o prazo em momento ulterior, não podendo ser suprida posteriormente,
haja vista que o advogado pleiteia em juízo fazendo prova do mandato e, inexistindo poderes
específicos, devem ser reputados inexistentes os atos por aquele praticado em nome do
outorgante”. [...] Renúncia: [...] Por consectário lógico, a renúncia é ato voluntário (sem coação
sobre a pessoa do ofendido ou do seu representante legal), unilateral (não há necessidade de
aceitação pelo suposto sujeito ativo da infração), pré-processual (extraprocessual) e irretratável,
já que em razão dela o direito de ação não mais poderá ser exercido, tendo por consequência a
extinção da punibilidade (art. 107, V, CP). [...] Perdão da vítima: é uma espécie de benevolência.
Qualquer motivo pode levar a vítima a não mais desejar prosseguir com a ação, perdoando o réu.
O perdão tem por consequência a extinção da punibilidade (art. 107, V, CP). Contudo, precisa ser
aceito pelo imputado, senão não operará efeitos (ato bilateral). Uma vez oferecido o perdão
mediante declaração nos autos, o demandado será intimado para dizer se concorda, dentro de
três dias. Se nada disser, o silêncio implica acatamento (aceitação tácita). A bilateralidade do
perdão se justifica pela possibilidade do réu desejar provar a sua inocência, objetivando que o
processo evolua, para sagrar-se absolvido (já que a aceitação do perdão apenas extingue a
punibilidade). Eventualmente, pode até mesmo processar o querelante por denunciação
caluniosa (art. 339, CP). Já a aceitação do perdão fora do processo (perdão extrajudicial), constará
de declaração assinada pelo querelado ou por procurador com poderes especiais, que, por sua
vez, não precisa ser advogado (art. 59, CPP). Neste caso, não é necessária a ratificação do perdão
em juízo. [...] Perempção: esta revela a desídia do querelante que já exerceu o direito de ação,
sendo uma sanção processual ocasionada pela inércia na condução da ação privada, desaguando
na extinção da punibilidade (art. 107, IV, CP). [...] (...) Os atrasos justificados não devem implicar

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perempção. Já se ocorrerem diversas paralisações, porém nenhuma isoladamente dando


margem ao preenchimento dos 30 dias, é incabível o somatório para o reconhecimento da
sanção. [...] (...) Não mais podendo dar continuidade ao feito, devem substituir o querelante as
pessoas indicadas no art. 31 do CPP, é dizer, o rol preferencial composto do cônjuge (incluída a
companheira), ascendentes, descendentes e irmãos. Não é necessária a intimação pessoal dos
sucessores para seguirem no processo. Portanto, o prazo se inicia da morte ou do
reconhecimento da incapacidade do querelante. [...] (...) Quanto ao pedido de condenação nas
alegações finais, exige-se bastante cautela para o reconhecimento da perempção nestes casos.
Se da narrativa feita em alegações deduzir-se o desejo de condenação, não se deve reconhecer
a perempção. Já se esta intenção não puder ser extraída, seja pela displicência na construção da
peça, seja porque o querelante não mais deseja ver o réu condenado, a perempção é de rigor. Já
se o querelante requer expressamente a absolvição do réu em alegações finais, não restará ao
magistrado outra alternativa que não o reconhecimento da perempção. E se o querelante for
omisso na apresentação das alegações finais? Se esta omissão ocasionar a paralisação do
processo por 30 dias seguidos, deve ser reconhecida a perempção com base no inciso I do art. 60
do CPP. [...] (...) Extinta a pessoa jurídica e não se habilitando nenhum sucessor interessado a
prosseguir no feito, resta o reconhecimento da extinção da punibilidade pela perempção”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012): “A decadência
é a extinção do direito de queixa em virtude do decurso do prazo de 6 meses contados da data
em que o ofendido tem conhecimento de quem seja o autor da infração, ou, no caso da ação
penal privada subsidiária, da data em que termina o prazo do Ministério Público. A decadência
do direito de queixa, no caso da ação penal exclusivamente privada, extingue a punibilidade. A
renúncia é a manifestação de vontade do ofendido de não promover a ação penal. Ela é
incondicionada e não depende do consentimento do autor da infração. Havendo em relação a
um, estende-se aos demais. [...] A perempção, disciplinada no art. 60 do Código de Processo
Penal, é a extinção da ação penal exclusivamente privada em virtude dos fatos ali relacionados,
com a consequente extinção da punibilidade. Nas diversas legislações há muitas espécies de
perempção, em situações muito diferentes, de modo que o único traço comum a todas é o de
que se trata de uma figura que provoca a extinção do direito de ação com a consequente extinção
do processo, se já instaurado. Cabe à lei processual definir os casos em que ocorre esse
fenômeno, tanto que são diferentes os casos de perempção do processo penal do caso previsto
no processo civil. [...] A perempção (art. 61), como as demais causas extintivas da punibilidade, é
decretada de ofício pelo juiz e independentemente de intimação do querelante. Todavia, é de
boa cautela que o juiz, especialmente no caso de abandono ou de não comparecimento do
querelante, mande intimá-lo ou investigue a causa do abandono ou do não comparecimento
antes de decretar a extinção, porque a decisão precipitada poderá deixar de considerar algum
fato que caracterize justa causa, com a consequente possibilidade de recurso e reforma da
decisão. O juiz poderá, também, no caso de pedido do réu, adotar o procedimento do parágrafo
único do mesmo art. 61, ou seja, autuar o pedido em apenso e facultar a produção de prova.
Finalmente, nos crimes de ação penal exclusivamente privada, pode ocorrer o perdão, que é a
manifestação de vontade de não se aplicar a pena, a despeito da ocorrência do fato. O perdão,
exatamente porque envolve o reconhecimento do fato, para produzir a extinção da punibilidade,
deve ser aceito, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais. Dado a um querelado,
aos outros aproveita, mas não produzirá efeito contra aquele que recusar. É certo que, havendo
recusa, o querelante poderá desistir da ação ou abandoná-la, provocando a perempção. Mas

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nesse caso o resultado é diferente, porque a extinção da punibilidade ocorrerá sem o


reconhecimento do fato”.

Jurisprudência pertinente

Súmula 594/STF: Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo
ofendido ou por seu representante legal.

Supremo Tribunal Federal

Os arts. 38 do CPP e 103 do CPP preveem, como marco inicial do prazo de decadência de 6 (seis)
meses para o exercício da ação penal privada, o dia em que o ofendido vier “[...] a saber quem
é o autor do crime”. Insusceptível, pela natureza decadencial do prazo, a incidência de causas
suspensivas e interruptivas de seu fluxo. [...] (Pet 6594 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER,
Primeira Turma, julgado em 22/09/2017)

Para o recebimento de queixa-crime é necessário que as alegações estejam minimamente


embasadas em provas ou, ao menos, em indícios de efetiva ocorrência dos fatos. Posição
doutrinária e jurisprudencial majoritária. Não basta que a queixa-crime se limite a narrar fatos
e circunstâncias criminosas que são atribuídas pela querelante ao querelado, sob o risco de se
admitir a instauração de ação penal temerária, em desrespeito às regras do indiciamento e ao
princípio da presunção de inocência. Queixa-crime rejeitada. (Inq 2033, Relator(a): Min.
NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, julgado em 16/06/2004)

Superior Tribunal de Justiça

[...] QUEIXA OFERECIDA DENTRO DO PRAZO MAS PERANTE JUÍZO INCOMPETENTE 'RATIONE
LOCI'. IRRELEVANTE TAL CIRCUNSTÂNCIA PARA O EFEITO DE CONTAGEM DO PRAZO
DECADENCIAL. O QUE IMPORTA E A DATA DO INÍCIO DA AÇÃO PENAL, OU SEJA DO
OFERECIMENTO DA QUEIXA-CRIME EM JUÍZO E NÃO A DO SEU RECEBIMENTO. [...] (RHC 63665,
Relator(a): Min. DJACI FALCÃO, Segunda Turma, julgado em 01/04/1986)

O perdão do ofendido, seja ele expresso ou tácito, só é causa de extinção da punibilidade nos
crimes que se apuram exclusivamente por ação penal privada. (Precedente). [...] (HC
44.280/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ
13/02/2006, p. 836)

O não exercício do direito de queixa no prazo de seis meses, a contar do conhecimento da


autoria pelo ofendido, enseja a extinção da punibilidade. [...] (RHC 78.111/PB, Rel. Ministro
JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 01/02/2017)

O entendimento firmado nos Tribunais Superiores é no sentido de que o princípio da


indivisibilidade da ação penal possui aplicação apenas nas ações penais privadas, de natureza
disponível e facultativa, mas não nas ações penais públicas. Precedentes. [...] (HC 237.344/MT,
Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 27/09/2016, DJe 10/10/2016)

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[...] AÇÃO PENAL PRIVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA


CAUSALIDADE. ART. 3º DO CPP. I - "Consoante a jurisprudência sedimentada do STJ, o princípio
geral da sucumbência é aplicável no âmbito do processo penal quando se tratar de ação penal
privada" (AgRg no REsp n. 1.206.311/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi). II - Tal
entendimento, que decorre da aplicação do disposto no art. 3º do CPP, restritivamente às ações
penais privadas, deve observar o princípio da causalidade, não se limitando a condenação de
honorários aos casos em que haja sentença de mérito, pois utilizado subsidiariamente o CPC,
devem ser aplicados também seus princípios norteadores. Embargos de divergência desprovidos.
(EREsp 1218726/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe
01/07/2016)

[...] AÇÃO PENAL PRIVADA. INÉPCIA DA QUEIXA-CRIME. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA


INDIVISIBILIDADE. ART. 49 DO CPP. RECURSO DESPROVIDO. [...] Se a queixa, fundada em
elementos suficientes, permite a adequação típica, ela não é inepta e nem peca pela falta de
justa causa (precedentes). [...] Na hipótese, também não se vislumbra a alegada violação ao
princípio da indivisibilidade da ação penal privada, porquanto a despeito das alegações do
recorrente de que o querelante deixou de observar o referido princípio, da análise acurada da
exordial acusatória conclui-se que em momento algum o querelante renunciou, nem ao menos
tacitamente, ao jus accusationis. [...] "O reconhecimento da renúncia tácita ao direito de queixa
exige a demonstração de que a não inclusão de determinados autores ou partícipes na queixa-
crime se deu de forma deliberada pelo querelante" (v.g.: HC 186.405/RJ, Quinta Turma, Rel.
Min. Jorge Mussi, DJe de 11/12/2014). [...] (RHC 55.142/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 21/05/2015)

AÇÃO PENAL POPULAR


Nas ditas ações penais populares a titularidade para a sua deflagração seria conferida a qualquer pessoa do
povo; isso fora dos casos referentes às ações penais de iniciativa privada e o elevado grau de individualidade
que lhes é inerente.

Trata-se de espécie de ação deveras rara. Como assevera MUCCIO: “(...) quando prevista e adotada, e o é em
algumas legislações, sofre a ação penal popular severo regramento. Mesmo assim, por não ter se mostrado
útil, em muito dos países em que foi adotada, foi abolida de vez” (Muccio, 2000).

Discute-se sobre a efetiva existência, no Direito brasileiro, de ações penais populares. De certo modo, os
institutos que, a princípio e pela doutrina, mais se aproximariam desse conceito são o habeas corpus e a
possibilidade de denúncia por crimes de responsabilidade nos termos das disposições da Lei 1.079/1950.

O habeas corpus é um dos chamados ‘remédios constitucionais’ e está previsto no art. 5º, LXVIII da CF:

LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;

A respeito da legitimidade para sua impetração, dispõe o art. 654 do CPP:

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Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de
outrem, bem como pelo Ministério Público.

Por sua vez, a denúncia a que faz menção a Lei 1.079/1950 refere-se a uma iniciativa possibilitada a qualquer
do povo, perante as Casas do Congresso Nacional, para encetar perquirição de crime de responsabilidade
praticado por determinados agentes. BRASILEIRO bem sintetiza as suas peculiaridades:

[...] faculdade de qualquer cidadão oferecer denúncia, por crime de responsabilidade, contra
determinados agentes políticos, perante a Câmara dos Deputados (Presidente da República e
Ministro de Estado), o Senado Federal (Ministros do Supremo Tribunal Federal e Procurador-
geral da República) ou a Assembleia Legislativa (Governador de Estado), conforme arts. 14, 41, e
75 da Lei 1.079/50, respectivamente (Lima, 2021).

Para TÁVORA, “A única ação penal popular em vigor, porém sem natureza condenatória, é o habeas corpus,
em razão da ampla legitimidade para propositura (art. 5º, inciso LXVIII, CF)” (Távora, 2017).

Entretanto, BRASILEIRO não concebe nenhum dos institutos referidos como sendo hipóteses de ação penal
popular:

Porém, as duas hipóteses não podem ser consideradas espécies de ação penal condenatória
popular, pelo menos se se compreender ação penal condenatória popular como o direito de
qualquer pessoa do povo promover uma ação penal visando à condenação do suposto autor da
infração penal, tal qual ocorre no âmbito do processo civil com a ação popular. No caso do habeas
corpus, não se trata de uma ação penal condenatória, mas sim de uma ação de natureza
constitucional, vocacionada à tutela da liberdade de locomoção. No caso da denúncia oferecida
por qualquer cidadão em relação à prática de crimes de responsabilidade, a palavra denúncia é
usada no sentido de notitia criminis, e não com o significado de peça inaugural da ação penal
pública. Ademais, os crimes de responsabilidade aí referidos não são crimes propriamente ditos,
mas sim infrações político-administrativas (Lima, 2021).

PACELLI também não reconhece como ação penal popular as hipóteses de denúncia previstas na Lei
1.079/1950:

[...] o que se estará exercitando é a chamada jurisdição política – ainda quando a competência
para o julgamento seja atribuída a órgãos do Judiciário –, responsável pelo processo e julgamento
de infrações políticas, isto é, infrações praticadas por agentes políticos do Poder Público, no
exercício de cargos e funções públicas. Tais infrações, embora historicamente tratadas por crimes
de responsabilidade, não constituem, a rigor, infrações penais, abarcadas pelo Direito Penal. [...]
Os crimes de responsabilidade, quando não tipificados também como crimes comuns, não têm a
dimensão coletiva e difusa própria dos interesses do Direito Penal, no que se refere aos bens
selecionados para a necessária tutela.

E arremata:

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Assim, os crimes de responsabilidade têm muito de responsabilidade (política) e nada de crime.


Com isso, não se podem incluir as ações instauradas para as respectivas apurações entre as ações
penais propriamente ditas, tratando-se, na verdade, de procedimentos realizados no âmbito da
jurisdição política (Pacelli, 2018).

TOURINHO FILHO, por outro lado, concebe a referida denúncia como efetivo caso de ação penal popular. O
autor muito bem representa a visão contrária, valendo transcrever algumas de suas razões:

Há entendimento de que nos crimes de responsabilidade previstos na Lei n. 1.079/50, não há


ação penal. Já fizemos observação a respeito. O fato de o julgamento ficar afeto a órgão político,
como é a Câmara Alta, e quase sempre por razões políticas, a nosso aviso, não desnatura o
caráter da ação. Ela continua sendo penal. [...] Se na Lei n. 1.079/50 há numerosas condutas
definidas como crimes, punidas com a perda do cargo e inabilitação para o exercício de qualquer
função pública, por óbvio estamos face a face com figuras delituais penais. O fato de a sanção
não ser privativa de liberdade não retira daquelas condutas o caráter de crime. Quando da
elaboração da Lei dos Crimes de Responsabilidade, o legislador, na individualização da pena
cominada a esses crimes, deu plena autonomia à pena acessória, erigindo-a à categoria de pena
principal. E isso não lhe era defeso, visto que o legislador tinha e tem inteira liberdade,
respeitados princípios e regras constitucionais, de cominar a determinadas infrações a sanção
que melhor lhe parecer, observado o princípio da proporcionalidade. Nesse caso de crimes de
responsabilidade, a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outro cargo
público pareceram-lhe satisfatórias. A circunstância de os crimes de responsabilidade, nesses
casos, implicarem sanção administrativa não retira da ação o caráter penal (Filho, 2011).

Trata-se, portanto, de tema polêmico. Ficam registradas, de todo modo, ambas as visões relacionadas à
matéria.

Doutrina Complementar

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “No Brasil,
contudo, a ação penal popular é contemplada, e de forma excepcional, pela Lei nº 1.079/1950.
Essa lei define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo e julgamento.
Permite que qualquer cidadão, ut civis, ofereça denúncia, por crime de responsabilidade, contra
Ministro do Supremo Tribunal Federal e contra o Procurador-Geral da República. Neste caso,
recebida a denúncia, que é apresentada ao Senado, o cidadão denunciante, tendo capacidade
postulatória, acompanha todo o desenrolar do processo, como acusador. Não tendo capacidade
postulatória, compete-lhe contratar um advogado para representá-lo. O mesmo sucede em
relação ao Presidente da República e Ministros de Estados nos crimes conexos aos daquele. A
denúncia, neste caso, é apresentada à Câmara dos Deputados. [...] No habeas corpus temos o
que se denomina de ação penal popular constitucional, porque tem natureza de ação penal e a
ordem pode ser impetrada por qualquer pessoa em seu favor ou de outrem, bem como pelo
Ministério Público. [...] Essa ação, no entanto, tutela o direito da liberdade. Na ação penal
propriamente dita, objetiva-se a inflição de pena privativa de liberdade cominada ao delito
cometido”.

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GUILHERME MADEIRA (Curso de processo penal, São Paulo: RT, 2020). “Segunda questão diz respeito
à chamada ação penal popular. Trata-se de ação penal em que a legitimidade é amplamente
conferida a qualquer pessoa. Ou seja, qualquer um poderia promover essa ação. Utilizando a
classificação de José Frederico Marques,3 não há dúvidas de que, no Brasil, existe a ação penal
popular de conhecimento, declaratória ou constitutiva. Trata-se do habeas corpus, cuja
legitimidade é ampla para impetração, ou seja, qualquer pessoa pode impetrá-lo em favor de
quem quer que seja. Mais tormentosa é a questão envolvendo a chamada ação penal popular de
natureza condenatória, ou seja, ação penal que visa à imposição de sanção de natureza penal e
que poderia ser ajuizada por qualquer pessoa. Na história do direito brasileiro, já tivemos esta
modalidade de ação prevista no art. 157 da Constituição de 1824: ‘Por suborno, peita, peculato
e concussão haverá contra elles [Juízes de Direito e Oficiais de Justiça] acção popular, que poderá
ser intentada dentro de anno, e dia pelo proprio queixoso, ou por qualquer do Povo, guardada a
ordem do Processo estabelecida na Lei’. Atualmente, porém, não há nenhuma disposição similar
em nossa Constituição Federal. Contudo, a dúvida persiste, por força da Lei 1.079, de 10.04.1950
(Define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento). Esta dúvida
decorre por força de três artigos dispostos na lei, a saber: a) ‘Art. 14. É permitido a qualquer
cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado, por crime de
responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados.’ b) ‘Art. 41. É permitido a todo cidadão
denunciar perante o Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador
Geral da República, pêlos crimes de responsabilidade que cometerem (artigos 39 e 40).’ c) Art.
75. ‘É permitido a todo cidadão denunciar o Governador perante a Assembleia Legislativa, por
crime de responsabilidade.’ Ao usar a expressão ‘denunciar’, a lei acabou por criar celeuma na
doutrina. De um lado, há os que defendem que se trata de verdadeira ação penal popular (Hélio
Tornaghi, Tourinho Filho, Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio
Scarance Fernandes). De outro lado, há os que negam que se trate de ação penal popular
condenatória (Eugenio Pacelli de Oliveira, Guilherme Nucci e Rogério Lauria Tucci)”.

VICENTE GRECO FILHO (Manual de processo penal, 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012): “A ação penal
popular propriamente dita, ou seja, a possibilidade de qualquer pessoa promover a ação penal
foi repelida pelo texto da Constituição, em termos gerais, de modo que não é o caso de
aprofundar a polêmica sobre sua conveniência. A doutrina, porém, citava dois casos de ação
penal popular no direito brasileiro: a faculdade de qualquer cidadão oferecer denúncia perante
a Câmara dos Deputados ou perante o Senado Federal por crime de responsabilidade de agentes
políticos e a faculdade de qualquer credor, na falência, promover a ação penal por crime
falimentar no caso de inércia do Ministério Público (parágrafo único do art. 184). No primeiro
caso, justifica-se a legitimação em virtude do julgamento político especial por órgão legislativo,
como uma manifestação da cidadania. No segundo, os credores podem, por extensão, ser
reconhecidos como ofendidos ou prejudicados, não se caracterizando, portanto, a chamada
‘ação de qualquer do povo’. A disciplina vigente adaptou a Lei Falimentar à Constituição (art. 5º,
LIX), admitindo a ação penal de iniciativa privada em caráter subsidiário somente no caso de
inércia do Ministério Público e não como antes previsto e já entendido revogado pela
Constituição de que poderia ocorrer a ação penal subsidiária ainda que o Ministério Público
tivesse requerido o apensamento dos então existentes autos do inquérito judicial falimentar, o
que equivalia ao pedido de arquivamento”.

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AÇÃO PENAL ADESIVA


Trata-se de instituto próprio do Direito alemão. Refere-se à constância concomitante do Ministério Público
e do ofendido no polo ativo de uma ação penal, figurando o ofendido como interveniente adesivo.

Sempre citado quando se trata do presente tema, TOURINHO FILHO assevera que, em verdade, a figura da ‘ação
penal adesiva’ representaria a busca pela satisfação do dano ex delicto no próprio juízo penal, e não uma
espécie autônoma de ação:

Se o Ministério Público promove a ação penal e fica à frente do processo, e o acusador particular
(Nebenkläger) passa a funcionar como simples interveniente adesivo facultativo, não se pode
dizer que a Nebenklage seja, propriamente, modalidade de ação penal. Desse modo, se lhe falta
autonomia, não se pode falar em “ação penal adesiva”, como pretende GIOVANNI LEONE (‘Linee
generale di una reforma dei processo penale’, in Rivista Italiana di Diritto Penale, 1948, p. 236).
Entretanto, existe na Alemanha a ação penal adesiva, que não é propriamente penal. O adjetivo
“penal” advém da circunstância de ser ela proposta no juízo penal. Seu objetivo, contudo, reside
na satisfação do dano ex delicto no juízo criminal, como ocorre na França, na Espanha, entre
outros países europeus. [...] Não se pode dizer, pois, que a Nebenklage seja, propriamente, uma
ação penal.

Ademais, no Direito brasileiro, a possibilidade de o ofendido ingressar como assistente do Ministério Público
dentro do processo penal (art. 268 do CPP) constitui ‘intervenção adesiva facultativa’, mas não uma ação
penal autônoma (Filho, 2011).

Doutrina Complementar

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “Também
chamada de intervenção adesiva facultativa, é a possibilidade de militarem no polo ativo, em
conjunto, o Ministério Público e o querelante, nos casos onde houver hipótese de conexão ou
continência entre crimes de ação penal de iniciativa pública e de ação penal de iniciativa privada.
Trata-se de caso similar ao do litisconsórcio do direito processual civil, interessando destacar que,
no âmbito do processo penal, ao invés de uma petição única (litisconsórcio originário), a regra é
que haja a propositura de denúncia pelo Parquet e a de queixa pela vítima do delito conexo,
surgindo assim um litisconsórcio (impróprio) em momento ulterior, qual seja, o da reunião das
demandas”.

HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “Há
legislações que preveem os três tipos de ação penal: ação penal pública incondicionada; ação
penal pública condicionada; ação penal privada. Nesta última, embora seja o ofendido o seu
titular, confere-se legitimidade também ao Ministério Público para promovê-la. Nesse caso,
fazendo-o, o ofendido pode se habilitar, intervindo no processo como assistente. Esse tipo de
ação existe na Alemanha. [...] Entre nós, não se confere iniciativa ao Ministério Público por crime
de ação penal privada. Na ação penal privada a titularidade pertence, com exclusividade, ao
ofendido ou seu representante legal (CPP, art. 30)”.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 146


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AÇÃO DE PREVENÇÃO PENAL


Por ‘ação de prevenção penal’ entende-se a ação penal intentada com o propósito exclusivo de aplicação de
medida de segurança aos inimputáveis descritos nos art. 26 do CP. Refere-se, portanto, aos indivíduos
portadores de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto. Veja o que dispõe o artigo:

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

TOURINHO FILHO, inclusive, segmenta as ações penais condenatórias nesse sentido: “Assim, a ação penal
condenatória se bifurca: a ação penal propriamente dita, tendo por finalidade a aplicação da pena, e a ação
de prevenção penal, visando à imposição de medida de segurança” (Filho, 2011).

Para MUCCIO, todavia, tal ação não constituiria, por si só, uma espécie de ação penal:

Temos que, na verdade, a medida de segurança surge como consequência da procedência da


ação penal de conhecimento, que, visando a um provimento condenatório, na sentença, o Juiz
não aplica pena privativa de liberdade, porque o réu se encontra na situação do art. 26 do CP,
vale dizer, é inimputável; sujeita-se, tão somente, à medida de segurança. Não é, pois,
propriamente um tipo ou modalidade de ação penal (Muccio, 2000).

AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA


A ‘ação penal secundária’ diz respeito às situações em que a lei prevê uma modalidade de ação penal para
um determinado crime, como regra, ao mesmo tempo em que estabelece modalidade diversa acaso
verificada a presença de circunstâncias excepcionais.

RENATO BRASILEIRO exemplifica a referida situação com o caso dos crimes contra a honra e a injúria racial:

É o que acontece, por exemplo, com os crimes contra a honra, em que, em regra, a ação penal é
de iniciativa privada (CP, art. 145, caput). No entanto, se cometido o crime contra a honra de
injúria racial (CP, art. 140, § 3º), a ação penal será pública condicionada à representação (CP, art.
145, parágrafo único, in fine, com redação determinada pela Lei nº 12.033/09) (Lima, 2021).

Doutrina Complementar

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “Quando
as circunstâncias aplicadas ao caso fazem variar a modalidade de ação a ser intentada, como no
exemplo típico dos crimes contra a honra, temos o que a doutrina chama de ação penal
secundária. Haverá, nesses casos, o que se convencionou chamar de “legitimação secundária”. É
o que acontece, por exemplo, com a calúnia contra o Presidente da República. É que, de regra,
os crimes contra a honra são de ação privada. Todavia, tratando-se do Presidente,

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secundariamente, a ação passa a ser pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça


(art. 145, parágrafo único, CP)”.

AÇÃO PENAL NAS VÁRIAS ESPÉCIES DE CRIMES

1 - AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL


A ação penal nos crimes contra a dignidade sexual sofreu significativas alterações nos últimos anos. Primeiro
com o advento da Lei 12.015/2009, a qual deu nova redação a determinados dispositivos do Código Penal.
Antes dessa Lei, a titularidade da ação penal nos outrora chamados ‘crimes contra os costumes’ era da
própria vítima; ou seja, tratava-se de ação penal de iniciativa privada. Existiam, todavia, exceções a essa
regra, que são bem delineadas por TOURINHO FILHO:

Antes da vigência da Lei n. 12.015/2009, os crimes contra a liberdade sexual eram de ação penal
privada, exceto nas seguintes hipóteses: a) se a vítima ou seus pais não podiam prover às
despesas do processo, sem privar-se dos recursos indispensáveis à manutenção própria ou da
família; b) se o crime fosse cometido com abuso do pátrio poder, ou na qualidade de padrasto,
tutor ou curador; c) se da violência empregada resultasse lesão corporal grave ou morte (Filho,
2011).

Com a alteração ocasionada pela referida Lei, passou o art. 225 do Código Penal (que trata sobre a
titularidade do direito de ação), na sua redação antiga e revogada, a constar:

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal
pública condicionada à representação. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a


vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.

No Capítulo I estão contidos os denominados ‘crimes contra a liberdade sexual’, compreendendo os crimes
de estupro (art. 213) – incluindo-se o resultado de lesão corporal grave e morte –; violação sexual mediante
fraude (art. 215), importunação sexual (art. 215-A) e assédio sexual (art. 216-A).

Por sua vez, no Capítulo II estão os ‘crimes sexuais contra vulnerável’, que compreendem os crimes de
estupro de vulnerável (art. 217-A) – incluindo-se o resultado de lesão corporal e morte –; corrupção de
menores (art. 218); satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente (art. 218-A),
favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de
vulnerável (art. 218-B) e divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de
sexo ou de pornografia (art. 218-C).

Nesses crimes, portanto, segundo o disposto na antiga redação do art. 225 do Código Penal, a ação penal
era pública condicionada à representação; a não ser que se tratasse de vítima menor de 18 anos ou
vulnerável, momento em que passaria a ser incondicionada.

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Perceba a aparente contradição que surgia da antiga redação do art. 225: ao dizer que nos crimes definidos
nos Capítulos I e II procedia-se mediante ação penal pública condicionada, o caput contrariava a disposição
do parágrafo único, uma vez que todos os crimes previstos no Capítulo II envolviam, necessariamente,
menores de 18 anos ou vulneráveis, o que ensejaria a presença da figura da ação incondicionada.

Para RANGEL, as disposições do caput do artigo revogado referiam-se, apenas, aos crimes definidos no
Capítulo I:

Pensamos que o que se quis dizer (aqui o terreno é movediço: adivinhar o que o legislador quis
dizer) no caput do art. 225, é que nos crimes definidos no Capítulo I (apenas o Capítulo I) a ação
penal será pública condicionada à representação, e no parágrafo único do mesmo artigo, será
pública incondicionada quando a vítima for pessoa menor de 18 anos ou pessoa vulnerável.

Ainda, para o referido autor, os crimes de estupro com resultado lesão grave ou morte também deveriam
entrar na regra do parágrafo único; ou seja, deveriam se procedidos mediante ação penal pública
incondicionada:

E mais: temos que aplicar os princípios da razoabilidade; da conformação do legislador ordinário


à Constituição da República; da proibição do retrocesso social e o da interpretação conforme a
Constituição, para entendermos que em se tratando de estupro com resultado lesão grave ou
morte, ou ainda, se a vítima é menor de 18 e maior de 14 anos, a ação penal será PÚBLICA
INCONDICIONADA. Não é crível nem razoável que o legislador tenha adotado uma política de
repressão a esses crimes e tornado a ação penal pública condicionada à representação. Até
mesmo pelo absurdo de se ter a morte da vítima no crime de estupro e não haver quem,
legitimamente, possa representar para punir o autor do fato. O crime, sendo a vítima maior e
capaz, ficaria impune. Com certeza, por mais confuso que esteja o Congresso Nacional com seus
sucessivos escândalos, não foi isso que se quis fazer (Pacelli, et al., 2018).

BRASILEIRO também concebia uma visão constitucional da situação dos crimes sexuais envolvendo menores
de 18 anos e vulneráveis:

Essa antinomia deve ser resolvida em conformidade com a Constituição Federal, que prevê um
tratamento diferenciado para crianças, adolescentes e pessoas portadoras de deficiência física e
mental, assegurando-lhes a mais ampla proteção, que é a aquela dada pela ação penal pública
incondicionada. Em síntese, pode-se dizer que, diante das alterações produzidas pela Lei nº
12.015/09, a ação penal em crimes sexuais, pelo menos em regra, será pública condicionada à
representação. Se a vítima for menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável, a ação penal
será pública incondicionada.

Em relação às figuras do estupro com resultado lesão corporal grave e morte, ponderava:

Superada esta questão, é interessante notar que a Lei nº 12.015/09 nada dispôs quanto à espécie
de ação penal nas hipóteses de estupro qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte
(art. 213, §§ 1º e 2º), do que se poderia concluir que tal delito estaria sujeito à nova regra geral

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em sede de ação penal nos crimes sexuais: pública condicionada à representação. Não obstante
o silêncio da lei, não se pode admitir que tal delito dependa de representação. A uma, porque
condicionar o exercício da ação penal em relação a crime de tal gravidade importa em clara
violação ao princípio da proporcionalidade, conferindo proteção deficiente à sociedade. A duas,
porque haveria clara violação ao princípio da dignidade da pessoa humana, permitindo-se que
crime do qual resultou a morte de uma pessoa fique submetido à manifestação da vontade de
seus sucessores em dar início à persecução criminal (Lima, 2018).

Verificam-se, portanto, as inconsistências da antiga previsão legal acerca do tema; se por um lado a alteração
do Código Penal (nesse tema, pela Lei 12.015/2009) teve por fim retirar da esfera de disponibilidade do
particular a titularidade da ação referente a crimes tão graves quanto os contra a dignidade sexual,
conferindo um maior grau de tutela e de proteção por parte do Estado, por outro quedou-se inconsistente
em vários outros aspectos, como os indicados pelos autores supracitados.

Essas inconsistências foram superadas, recentemente, com o advento da Lei 13.718/2018 que,
mais uma vez, alterou (dentre outros) o art. 225 do Código Penal; o parágrafo único foi revogado
e o caput passou a ter a seguinte redação:

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação
penal pública incondicionada. (Redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018)

Ou seja: agora e atualmente, todos os delitos antes indicados – contra a liberdade sexual e crimes sexuais
contra vulnerável (constantes dos Capítulos I e II) – serão processados mediante ação penal pública
incondicionada12. Veja a evolução legislativa em relação aos crimes sexuais: antes de ação penal privada
(regra geral), hoje são de ação pública incondicionada.

•ação penal privada


•procede mediante queixa Lei 12.015/2009
•ação pública
incondiciona
•ação pública da
condicionada
•vontade da
•dependente de vítima
representação irrelevante Lei 13.718/2018
Código Penal

12
Detalhe: bastava revogar o art. 225 do Código Penal (sem necessidade de alteração da sua redação); afinal, a regra, como
sabemos, é que os crimes sejam de ação penal pública incondicionada (art. 100, caput e § 1º do CP e art. 24 do CPP). Talvez uma
precaução do legislador, diante da tradição em relação a esses crimes que normalmente foram dependentes da vontade da vítima
(e agora não mais).

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Repare que antes era necessária a anuência da vítima (regra geral) para que a ação penal fosse levada a cabo
(queixa ou representação) – hoje, não mais.

Embora encerre alguns debates acerca da espécie de ação nesses delitos, a alteração pode ser objeto de
críticas, na medida em que – por mais que amplie a tutela estatal em relação a esses crimes – acaba por
desconsiderar completamente a vontade da vítima em infrações penais que são bastante delicadas e
peculiares, que tocam à intimidade das pessoas e que podem implicar em strepitus judicii (ruído do
julgamento/constrangimento causado pela exposição no processo). Igualam-se todas as formas em que os
crimes sexuais podem ser praticados e retira-se da vítima qualquer poder da sua vontade.

Optou-se por não manter regras que dificultassem o ajuizamento da ação penal, a exemplo do que já ocorreu
com as ações que envolvem violência doméstica.

1.1 - Direito intertemporal

O direito intertemporal já foi discutido quando da edição da Lei 12.015/2009; interessava a forma de
aplicabilidade das novas disposições legais aos processos, seja retroativamente, seja em relação aos
processos em andamento quando da sua entrada em vigor.

A esse respeito bem lecionava TÁVORA:

Há quem entenda que é de seis meses a partir da notificação do juízo, o prazo para oferecer
representação nos processos em andamento nas hipóteses de crimes ocorridos antes da vigência
da nova lei e que eram, na origem, delitos de ação penal pública incondicionada. Isso porque a
norma utilizada seria o art. 38, do Código de Processo Penal, que prevê expressamente o prazo
decadencial da representação para que possa ser deflagrada a ação penal. Como se trata de
norma geral, em relação ao art. 91, da Lei nº 9.099/1995 – que preconiza o prazo de 30 dias a
partir da notificação para a apresentação de representação nos casos do processo em
andamento –, no caso dos processos em andamento que exijam representação, deve-se intimar
o ofendido para ofertá-la, só decaindo desse direito após o decurso do lapso de seis meses.

Especificamente sobre sua visão em relação ao tema, o autor pontuava:

Entendemos que a norma tem natureza híbrida, sendo “norma processual com conteúdo
material ou norma mista”. Logo, será aplicada apenas para os crimes ocorridos após a sua
entrada em vigor, retroagindo, todavia, nos pontos em que for benéfica. Por essa razão, nas
hipóteses em que a ação cabível era pública incondicionada e passa a ser condicionada à
representação, deve haver notificação do ofendido ou do seu representante legal, nos processos
já existentes, para que represente, se desejar. Não o fazendo, decairá do direito, operando-se a
extinção da punibilidade. E qual o prazo que terá para representar? Por analogia ao art. 91 da Lei
nº 9.099/1995, 30 dias, contados da respectiva notificação (Távora, 2017).

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Desta forma, nos casos em que a ação penal era pública incondicionada anteriormente à Lei 12.015/2009
(com resultado lesão grave ou morte; com abuso do poder familiar, das relações de tutela ou curatela) e que,
após a entrada em vigor dessa lei, passaram a ser condicionadas à representação (crimes definidos no atual
Capítulo I, transcritos acima), dever-se-ia notificar o ofendido para que provesse a representação, se
intentasse a continuidade do processo. Poderia retroagir, porquanto constituiria norma de natureza híbrida
mais benéfica ao acusado.

RENATO BRASILEIRO entendia não ser possível utilizar o prazo previsto na Lei 9.099/1995, por analogia, para
delimitar o espaço de tempo para o oferecimento da representação:

Diante do silêncio da Lei nº 12.015/09, não se pode usar, por analogia, o art. 91 da Lei nº
9.099/95. Referida lei só poderia ser usada, subsidiariamente, se o Código Penal e o Código de
Processo Penal nada dispusessem acerca do assunto. Ora, como o Código Penal (art. 103) e o
Código de Processo Penal (art. 38) contêm dispositivos expressos acerca do prazo decadencial da
representação – 6 (seis) meses – pensamos que este é o prazo que deve ser utilizado
subsidiariamente, cujo termo inicial será o momento em que o ofendido ou seu representante
legal forem intimados para oferecê-la (Lima, 2018).

Agora, com o advento da Lei 13.718/2018, o direito intertemporal volta a ter alguma relevância. Diante da
premissa de que seja uma norma híbrida ou de conteúdo misto (natureza processual e material), na medida
em que tem influência no campo penal (elimina causa extintiva da punibilidade – decadência – e suprime
condição específica da punibilidade), sendo mais severa para o acusado, não deverá retroagir✔, sendo
aplicável somente aos crimes posteriores a 25/9/2018 (data da publicação da Lei).

2 - AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A HONRA DE SERVIDOR


PÚBLICO

Como já visto, as ações penais referentes aos crimes contra a honra, em regra, são de iniciativa privada; ou
seja, procedem-se mediante o oferecimento de queixa-crime pelo ofendido ou representantes.

Contudo, a ação penal referente a crimes contra a honra de funcionário público, em razão de suas funções
(propter officium), sujeita-se a uma peculiaridade estabelecida pelo próprio Código Penal, em seu art. 145,
parágrafo único. Veja o que o dispositivo prevê:

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.

Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do


caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do
mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art. 140 deste Código.

Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes
é cometido:

II - contra funcionário público, em razão de suas funções;

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Como se percebe, o Código Penal expressamente dispõe que, nesses casos, a ação será procedida mediante
representação do ofendido.

Tratando expressamente sobre a titularidade da ação penal nos crimes contra a honra de funcionário público
propter officium, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 714, não mais pairando quaisquer dúvidas
sobre quem seria o real legitimado para intentá-la. Dispõe o enunciado:

Súmula 714: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público,


condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de
servidor público em razão do exercício de suas funções.

Trata-se, portanto, de legitimidade concorrente; cabendo ao funcionário público ofendido optar entre
representar (dando ensejo a eventual ação penal pública condicionada) ou, ao sabor da sua conveniência,
contratar advogado particular para patrocinar a ação, que será de iniciativa privada (Távora, 2017).

Referido autor trata, ainda, sobre a curiosa hipótese de, em tendo o funcionário público ofendido optado
por oferecer representação, o Ministério Público resolver não oferecer da denúncia:

Questão interessante seria a hipótese do funcionário público representar e o órgão ministerial,


ao invés de ofertar a denúncia, promover o arquivamento. Seria possível ao funcionário contratar
advogado para promoção da ação privada? Ao nosso sentir, uma vez oferecida a representação,
ocorre a preclusão da segunda via da persecutio criminis, de modo que não poderá mais o
funcionário público oferecer a queixa-crime correspondente. Com base nesse entendimento,
albergado pelo STF, parte da doutrina defende que a legitimação, nesses casos, é denominada
de “legitimação alternativa” e não concorrente, justamente porque, uma vez feita a opção pela
representação ou queixa, esgota-se a possibilidade de valer-se daquela remanescente (Távora,
2017).

No mesmo sentido, MOUGENOT BONFIM:

Não obstante, o STF entendeu que, se o funcionário optar pela representação, restará preclusa
a oportunidade de oferecer a queixa-crime, haja vista que, nesta hipótese, estaria o Parquet
definitivamente investido para a causa (STF, Inq. 1.939/BA, Rel. Sepúlveda Pertence, Pleno, j.
3.3.2004) (Bonfim, 2013).

3 - AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE LESÃO CORPORAL LEVE E CULPOSA


COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Com o advento da Lei 11.340/2006 (popularmente conhecida como ‘Lei Maria da Penha’), o quantum de
pena abstratamente previsto para os crimes de lesão corporal no contexto de ambiente doméstico (art. 129,
§ 9º do CP) sofreu significativa alteração. Veja-se a redação original do referido dispositivo, e, em seguida, a
atual redação:

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§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro,


ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano.

§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro,


ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos

Desta forma, em razão de a pena máxima aplicável superar o limite de 2 (anos), afastou-se essa modalidade
de lesão corporal da competência dos juizados especiais criminais, porquanto não se considera mais um
crime de ‘menor potencial ofensivo’ nos termos do art. 61 da Lei 9.099/1995. A pena máxima supera dois
anos.

Todavia, questionou-se no momento se, mesmo após o advento da Lei 11.340/2006, continuaria o art. 88 da
Lei 9.099/95 a reger a presente situação. Esse artigo prevê:

Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de
representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

A bem da verdade, esse questionamento não se sustentava, haja vista que a própria Lei 11.340/2006, em
seu art. 41, afasta, sem ressalvas, a aplicação da Lei dos Juizados Especiais:

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Nesse mesmo sentido, bem sintetiza BRASILEIRO:

Lado outro, o art. 41 da Lei nº 11.340/06 dispõe que, aos crimes praticados com violência
doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei
nº 9.099/95. Ora, se a Lei dos Juizados não é aplicável às situações de violência doméstica e
familiar contra a mulher, e se é a Lei nº 9.099/95 que dispõe que o crime de lesão corporal leve
e de lesão corporal culposa é de ação penal pública condicionada à representação (art. 88),
conclui-se que, se acaso praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a
mulher, tais delitos seriam de ação penal pública incondicionada (Lima, 2021).

Nas lições de CAPEZ, o STF, ao julgar determinada Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, entendeu,
encaminhando essa discussão para o seu fim, pela desnecessidade de representação nos casos de lesão
corporal leve em contexto doméstico:

O STF pacificou a questão ao julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade (ADIn


4.424) ajuizada pelo procurador-geral da República, no sentido de que, nos crimes de lesão

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corporal leve, o Ministério Público agora pode propor ação penal pública sem necessidade de
representação da vítima (Capez, 2018).

De qualquer sorte, o Superior Tribunal de Justiça conferiu desfecho à celeuma, sumulando a presente
questão. É o enunciado nº 542, que dispõe:

Súmula 542/STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a
mulher é pública incondicionada.

Doutrina Complementar

EUGENIO PACELLI e DOUGLAS FISCHER. (Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência
(p. 958). 12ª edição, Atlas, 2020): As Leis nºs 12.015/2009 e 13.718/2018 fizeram desaparecer,
ainda que tardiamente, a iniciativa privada para os crimes contra a dignidade sexual (antigos
delitos contra o costume). As ações, então, passam a ser, como regra, públicas incondicionadas.
Então, se ao tempo da Lei nº 12.015/09 já havia sido proposta a ação penal pelo particular, não
incidiria a nova regra, por simples razão: a ação é o ingresso em juízo. Eventuais modificações na
natureza da ação jamais poderiam atingir a ação já proposta. E vamos além. Como a modificação
da natureza da ação implica a alteração do prazo de extinção da punibilidade, parece-nos
irrecusável a irretroatividade da norma (art. 225, com redação dada pela Lei nº 11.719/08) aos
fatos anteriores à sua vigência, se e desde que operada a decadência da ação, devendo
reconhecer-se a extinção da punibilidade. Havendo prazo ainda em curso, a ação penal deverá
ser intentada pelo particular (ofendido). Nessa situação específica, pensamos que poderá ele
(ofendido) representar ao Ministério Público, para fins de ajuizamento da ação penal pública,
desde que tal ocorra no prazo decadencial restante”.

Ação penal nos crimes contra a honra de funcionário público

AURY LOPES JR. (Direito processual penal, 18ª ed., São Paulo: Saraiva, 2021): “Então, nesses delitos
a ação poderá ser de iniciativa privada ou pública condicionada à representação do ofendido.
Contudo, há que se ter muito cuidado, pois eleita uma via está fechada a porta para a outra. No
caso em tela, além da preclusão de uma via quando eleita outra (logo, ou o ofendido representa
e com isso a ação será pública e a cargo do MP, ou assume integralmente o polo ativo, através
do oferecimento de queixa), aponta o STF para o descabimento de ação penal privada subsidiária
quando o MP pede diligências à polícia (no caso, abertura de inquérito), na mesma linha do que
afirmamos anteriormente. Por fim, repetindo lição anterior, se o ofendido optar por fazer a
representação, poderá ele se retratar? Com certeza. Insere-se na regra geral do art. 25. Logo, se
representou, pode se retratar (desde que antes de oferecida a denúncia). Se optou pela queixa,
tanto poderá renunciar – se ainda não a exerceu – como poderá ofertar o perdão ou mesmo
desistir e dar lugar à perempção (se já exerceu a queixa)”.

Jurisprudência pertinente

Súmula 542, STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 155


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Súmula 608, STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. [*]

Súmula 609, STF: É pública incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal.

Súmula 714, STF: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério


público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra
de servidor público em razão do exercício de suas funções.

Supremo Tribunal Federal

Ação penal: crime contra a honra do servidor público, propter officium: legitimação
concorrente do MP, mediante representação do ofendido, ou deste, mediante queixa: se, no
entanto, opta o ofendido pela representação ao MP, fica-lhe preclusa a ação penal privada:
electa una via... II. Ação penal privada subsidiária: descabimento se, oferecida a representação
pelo ofendido, o MP não se mantém inerte, mas requer diligências que reputa necessárias. [...]
(Inq 1939, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 03/03/2004)

[...] Atos praticados antes da vigência da Lei n. 12.015/2009. Atentado violento ao pudor. Ação
penal pública condicionada à representação, nos termos da norma anterior do art. 225, § 1º, I,
c/c § 2º, do Código Penal. [...] A condição da miserabilidade da vítima não exige demonstração
formal, podendo ser constatada por outros elementos, como se tem na espécie, diante do grau
de instrução e da profissão da mãe da vítima. [...] Representação. Dispensa de formalidade.
Genitora da vítima que compareceu à autoridade policial para dar notícia do delito. [...] (RHC
116171, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 03/09/2013)

Nos crimes contra os costumes, caracterizada a pobreza da vítima, a ação penal passa a ser
pública condicionada, sendo o Ministério Público legitimado para sua propositura. [...] (HC
92932, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 07/03/2013)

O art. 225 do Código Penal, na sua redação original, previa que em crimes como o dos presentes
autos somente se procedia mediante queixa, salvo se a vítima fosse pobre ou tivesse ocorrido
abuso do pátrio-poder. O dispositivo vigeu por décadas sem que fosse pronunciada a sua
inconstitucionalidade ou não recepção. [...] A Lei nº 12.015, de 07.08.2009, modificou o
tratamento da matéria, passando a prever ação pública incondicionada no caso de violência
sexual contra menor. [...] Na situação concreta aqui versada, o Poder Judiciário considerou, por
decisão transitada em julgado, descabido o oferecimento de queixa-crime pelo pai da vítima,
entendendo tratar-se de crime de ação penal pública. Se o STF vier a considerar, no presente
habeas corpus, que não é admissível a ação penal pública, a consequência seria a total
desproteção da menor e a impunidade do crime. [...] À vista da excepcionalidade do caso
concreto, o art. 227 da CF/88 paralisa a incidência do art. 225 do Código Penal, na redação
originária, e legitima a propositura da ação penal pública. Aplicação do princípio da proibição
de proteção deficiente. Precedente. [...] (HC 123971, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI,
Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 25/02/2016)

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Denúncia que imputa ao acusado a prática do crime de lesão corporal em ambiente doméstico
– CP, art. 129, § 9º. [...] Irrelevância da retratação da ofendida. Crime de ação penal pública
incondicionada, que independe de representação da ofendida (ADIn 4.424). [...] A persecução
penal em relação aos delitos de lesão corporal leve e culposa praticados em ambientes
domésticos contra a mulher dá-se por intermédio de ação penal pública, conforme decidiu esta
Corte no julgamento da ADIn 4.424, o que torna sem valia a retratação da vítima, que, in casu,
deve ser considerada apenas com valor probatório. [...] (Inq 3556, Relator(a): Min. LUIZ FUX,
Primeira Turma, julgado em 16/09/2014)

Superior Tribunal de Justiça

A legitimidade ativa ad causam é concorrente entre o ofendido e o Ministério Público,


mediante representação do ofendido, para ações penais por crime contra a honra de servidor
público em razão do exercício de suas funções. Súmula 714, do e. STF. [...] (APn 755/DF, Rel.
Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/09/2015, DJe 21/09/2015)

PETIÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM. RECURSOS REPETITIVOS. TEMA N. 177. CRIME DE LESÕES


CORPORAIS COMETIDOS CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR. NATUREZA
DA AÇÃO PENAL. REVISÃO DO ENTENDIMENTO DAS TERCEIRA SEÇÃO DO STJ. ADEQUAÇÃO AO
JULGAMENTO DA ADI N. 4.424/DF PELO STF E À SÚMULA N. 542 DO STJ. AÇÃO PÚBLICA
INCONDICIONADA. [...] (Pet 11.805/DF, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 10/05/2017)

[...] VIAS DE FATO EM AMBIENTE DOMÉSTICO. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. [...]
Nas contravenções penais de vias de fato, praticadas no âmbito das relações domésticas e
familiares, a ação penal é pública incondicionada, nos termos do art. 17 da Lei de
Contravenções Penais, que não foi alterado pela Lei n. 9.099/1995, nem pela Lei n.
11.340/2006. Precedentes. [...] (AgRg no AREsp 1036763/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA
PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/04/2017)

Na espécie, em que se apura a prática de lesões corporais, ainda que a ofendida tenha se
retratado da representação anteriormente ofertada contra o paciente, tal fato é irrelevante
para a persecução criminal, cuja deflagração independe da sua manifestação de vontade. [...]
(HC 357.885/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 23/08/2016, DJe
31/08/2016)

Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, sem violência real ou grave ameaça,
cometidos antes da entrada em vigor da Lei n.12.015/2009, eram processados mediante ação
penal pública condicionada à representação, no prazo decadencial de 6 meses, a contar do
conhecimento do autor do fato (para representante legal) ou da maioridade (para a vítima),
cuja manifestação dispensava rigor formal, bastando demonstração inequívoca do interesse
na persecução penal. [...] Antes da modificação no Título VI da Parte Especial do Código Penal,
que tratava dos "crimes contra os costumes", introduzida pela Lei n. 12.015/2009, o
representante legal ou a vítima possuíam o direito de, dentro do prazo decadencial de 6 meses
e antes do oferecimento da denúncia, reconsiderar a manifestação, seja pela persecução penal
ou, ao contrário, pela inércia da justiça pública, sem que houvesse afronta ao princípio da

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segurança jurídica ou aos institutos do direito penal que ainda reforçam o devido processo
legal, como a preclusão e a coisa julgada. [...] No caso, é idônea e legal a retratação da
representação e posterior reconsideração da renúncia ao direito anteriormente exercido,
dentro do prazo decadencial de 6 meses, permitindo-se a persecutio criminis. [...] (RHC
51.849/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe
15/12/2017)

Conforme a jurisprudência pacífica deste Superior Tribunal de Justiça, os crimes de estupro e


de atentado violento ao pudor praticados contra vítimas pobres antes da Lei n. 12.015/2009
devem ser processados mediante ação penal pública condicionada à representação, sendo
despiciendas maiores formalidades para a comprovação da hipossuficiência do ofendido. [...]
(RHC 59.822/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe
15/12/2017)

PEÇA ACUSATÓRIA

1 - DENÚNCIA E QUEIXA-CRIME
A peça inicial acusatória visa levar ao conhecimento do Poder Judiciário (especificamente, os juízos criminais)
a existência de determinado fato tido como criminoso, a fim de que se deflagre o processo penal e, ao seu
final, seja o réu julgado na forma da lei.

Nas palavras de CAPEZ, que muito bem conceitua o termo:

Peça acusatória iniciadora da ação penal, consistente em uma exposição por escrito de fatos que
constituem, em tese, ilícito penal, com a manifestação expressa da vontade de que se aplique a
lei penal a quem é presumivelmente seu autor e a indicação das provas em que se alicerça a
pretensão punitiva (Capez, 2018).

Compreende tanto a denúncia quanto a queixa-crime, a depender da titularidade do direito de ação sobre
determinado fato delituoso. Nos crimes de ação penal pública incondicionada e condicionada, a peça
acusatória é a denúncia, oferecida pelo Ministério Público; nos de ação penal de iniciativa privada – incluindo
a subsidiária da pública –, é a queixa-crime, promovida pelo ofendido ou pelos seus representantes legais,
por meio de advogado.

2 - REQUISITOS DA PEÇA ACUSATÓRIA


A denúncia ou a queixa deve cumprir alguns requisitos legais para que seja apta a produzir os seus efeitos.
Tais requisitos constam do art. 41 do CPP:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo,
a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

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Aliás, note que a regulamentação existente sobre a acusação inicial em nosso processo penal é basicamente
essa. Não teremos nenhum artigo de lei mais elaborado que traga, de forma expressa, outros requisitos da
peça acusatória.

Indo além, RENATO MARCÃO assevera que o referido artigo constitui rol meramente exemplificativo, não
taxativo, e elenca requisitos adicionais para a peça acusatória:

Outros requisitos: (1) endereçamento ao juízo competente; (2) precisa ser escrita na língua oficial
(português); (3) pedido de condenação; (4) indicação do local e data de sua elaboração; (5)
identificação do nome e cargo ou profissão daquele que a subscreve (Promotor de Justiça,
Procurador da República ou advogado), e (6) assinatura do profissional identificado (Marcão,
2017).

Para BRASILEIRO, nem todos os requisitos possuem o mesmo grau de importância:

Alguns requisitos são de observância obrigatória. É o que ocorre, por exemplo, com a exposição
do fato criminoso, a individualização do acusado e a redação da peça em português. Eventual
vício quanto a um desses elementos enseja o reconhecimento da inépcia formal da peça
acusatória. Outros requisitos, todavia, como o rol de testemunhas, a classificação do crime, a
assinatura do promotor ou do advogado, o endereçamento e as razões de convicção, não se
revestem de tamanha importância (Lima, 2021).

Vejamos cada um dos requisitos.

2.1 - Exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias

A peça acusatória deve descrever detalhadamente o fato tido como criminoso, não podendo consistir em
meras ilações ou imputações vagas e abstratas, devendo ater-se aos fatos perceptíveis no plano da realidade.
Isso é o que há de mais importante numa acusação.

AVENA muito bem dimensiona esse requisito, não se olvidando da forte relação que a peça acusatória
mantém com demais envolvidos no processo, mormente a defesa e o juiz:

[...] trata-se de elemento essencial da peça acusatória, pois é do fato descrito que o réu se
defende e será em relação ao fato descrito que deverá estar relacionada a sentença a ser
proferida. Como circunstâncias obrigatórias, reputa-se quando o fato foi praticado, onde ocorreu,
quem o praticou, o motivo que o ensejou (se conhecido), os meios utilizados, o modo como foi
cometido o delito, o malefício causado e, por fim, a explicação quanto ao contexto no qual
perpetrado (Avena, 2020).

Há se lembrar que o acusado se defenderá dos fatos a ele imputados na peça acusatória (princípio da
consubstanciação). Como se defender satisfatoriamente da acusação de algo tão grave quanto um crime
sem se ter total ciência do que lhe está sendo imputado? Como já visto, o contraditório e a ampla defesa são
mandamentos constitucionais inafastáveis e balizam todo o processo penal; portanto, a exordial acusatória
deve conter todas as informações necessárias para que esses direitos possam ser efetivamente exercidos.

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Tome-se por exemplo a hipótese de uma denúncia oferecida contra um indivíduo pela suposta prática do
crime de roubo. Seria completamente imponderável e inadmissível uma denúncia que se limitasse a imputar
referido crime ao réu porque este teria “subtraído coisa alheia móvel, para si, mediante grave ameaça”. Ora,
não se sabe o local e o tempo dos fatos; qual a coisa subtraída; quem é a vítima; em que teria consistido a
grave ameaça; como teriam decorrido os fatos etc. Tratar-se-ia de denúncia grosseiramente inepta nesse
exemplo pitoresco, visto que não se pôs a promover a adequação dos fatos ao tipo legal, impedindo qualquer
vislumbre de defesa.

Basta nos imaginarmos como réus para compreendermos o real problema de denúncias vagas e imprecisas.
Em relação a o quê nos defenderemos exatamente?

Imperioso assentar, todavia, que nem todos esses elementos fáticos são essenciais para a validade da
exordial acusatória. GRECO FILHO sustenta a divisão dos aludidos elementos em elementares e identificadores.
Em relação aos dados ‘elementares’, cuja ausência da respectiva descrição enseja a inépcia da peça
acusatória, assevera:

Os elementares são os dados de fato que correspondem aos elementos do tipo penal. A descrição
dessas circunstâncias deve ser feita com dados fáticos da realidade, não bastando a repetição da
descrição típica. Esta serve de modelo, que deve ser preenchido com os elementos do fato
concreto. Assim, por exemplo, na denúncia por estelionato não basta referir que houve um meio
fraudulento; há necessidade de descrevê-lo. Não basta afirmar que houve prejuízo; deve ser
indicado em que consistiu e sua quantificação.

Por outro lado, os dados ‘identificadores’, segundo o autor, não seguem a mesma sorte dos ‘elementares’,
e sua ausência, a princípio, não deve acarretar a inépcia da denúncia13:

As circunstâncias identificadoras são as demais circunstâncias de fato que individualizam a


infração com relação a outras infrações da mesma natureza. São as circunstâncias de tempo e
lugar. O defeito, ou a dúvida, quanto a circunstâncias individualizadoras, se não for de molde a
tornar impossível a identificação da infração, não conduz à inépcia da denúncia, mas, ao
contrário, facilita a defesa, porque pode dar azo à negativa da autoria mediante, por exemplo, a
alegação de um álibi. A deficiência nas circunstâncias individualizadoras não pode, contudo, ser
tão grande a ponto de impedir totalmente a identificação da infração (Filho, 2012).

Questão interessante surge quando se coteja o presente requisito com os casos envolvendo concurso de
agentes. Se por um lado é claro que a inicial acusatória deve especificar a conduta de cada um dos autores,
coautores e partícipes pelas razões já expendidas acima, por outro existem situações excepcionais em que

13
O autor refere-se à denúncia em seu texto; todavia, quando trata sobre a queixa-crime, expressamente afirma que ela se
submete aos mesmos requisitos da denúncia. Servem as lições para ambas as modalidades de peças acusatórias, portanto.

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tal tarefa pode mostrar-se inviável diante das circunstâncias do caso (como o demasiado número de agentes
envolvidos em determinado fato). Nesse sentido, a lição de CAPEZ:

Todavia, essa providência nem sempre é possível, o que tem levado os tribunais a admitir a
narração genérica da conduta dos coautores e dos partícipes, devendo o autor apenas deixar
bem clara a existência das elementares do concurso de agentes (CP, art. 29). No caso dos crimes
de autoria coletiva, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que, quando a acusação não
tem elementos para especificar a conduta de cada coautor e partícipe, a fim de não inviabilizar a
persecução penal, é possível fazer uma narração genérica do fato, sem descrever a conduta de
cada um, uma vez que a inaugural poderá ser emendada até a sentença condenatória.

Não obstante, adverte o autor:

Convém frisar, no entanto, que a peça acusatória não pode, a pretexto de ser genérica, omitir os
mais elementares requisitos que demonstrem estar presentes as indispensáveis condições para
a causa petendi. A atenuação do rigorismo do art. 41 do Código Penal não implica admitir-se
denúncia que nem de longe demonstre a ação ou omissão praticada pelos agentes, o nexo de
causalidade com o resultado danoso ou qualquer elemento indiciário de culpabilidade (Capez,
2018).

Ainda, tem-se a figura da imputação alternativa. Consistiria em imputar-se a determinado sujeito práticas
alternadas a fim de que, ao final do processo, acaso não se configure a condenação por um dos crimes, seja
condenado pelo outro.

Para NUCCI, a denúncia ou queixa-crime alternativa não deve ser admitida no Direito brasileiro, haja vista os
seus efeitos deletérios ao exercício da defesa do acusado, devendo referida peça acusatória ser rejeitada:

O ideal, caso o órgão acusatório esteja em dúvida quanto a determinado fato ou quanto à
classificação que mereça, deve fazer sua opção antes do oferecimento, mas jamais apresentar
ao juiz duas versões contra o mesmo réu, deixando que uma delas prevaleça ao final. Tal medida
impossibilita a ideal e ampla defesa pelo acusado, que seria obrigado a apresentar argumentos
em vários sentidos, sem saber, afinal, contra qual conduta efetivamente se volta o Estado-
acusação. Exemplo: se, descrita uma situação fática qualquer, justificadora de um homicídio,
houver dúvida se constitui motivo fútil ou torpe, é preciso que o promotor opte entre um ou
outro, indicando-o na denúncia. Não tem sentido, entretanto, denunciar o réu por homicídio
cometido por motivo fútil ou torpe. Por força dessa dubiedade a defesa fica prejudicada,
especialmente a autodefesa. Assim ocorrendo, configura-se a inépcia da inicial, devendo ser
rejeitada (art. 395, I, CPP) Fonte bibliográfica inválida especificada..

Para GRECO FILHO, todavia, “Desde que não haja incompatibilidade lógica, pode haver imputação alternativa
ou subsidiária, a fim de que o acusado se defenda de mais de um fato, ainda que alternativa ou
subsidiariamente” (Filho, 2012).

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2.2 - Qualificação do acusado

Deve a peça acusatória individualizar o sujeito ao qual se imputa a prática de crime, identificando-o pelo seu
nome (prenome, sobrenome e cognome), alcunha (se houver), idade, filiação, estado civil, número de
identidade (RG) e cadastro de pessoa física (CPF) e demais dados pessoais a que se tenha acesso.

Trata-se de medida imprescindível, porquanto deve a responsabilidade penal ser delimitada, prestigiando-
se o princípio da intranscendência (Marcão, 2017).

Importante registrar que, na impossibilidade de se qualificar de maneira satisfatória o acusado pelos


elementos supracitados, o próprio artigo 41 do CPP permite que a peça acusatória contenha outros
“esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo” como satisfação deste requisito. Nesse sentido, as lições
de MUCCIO:

Desconhecido o nome do autor da infração penal, ou outros dados que de regra servem para
qualificá-lo, não será empecilho a que contra ele se instaure o processo. Se for possível obter
outros esclarecimentos que levem à sua identificação, a denúncia contra ele pode ser oferecida,
dando-se início à ação penal. O que a lei processual penal exige é que a ação penal seja iniciada
contra a pessoa certa. Assim se há nas peças informativas, dados objetivos, capazes de individuar
no futuro a pessoa infratora, válido será o processo contra ela iniciado (Muccio, 2000).

2.3 - Classificação do crime

Também deverá constar da peça acusatória a indicação do dispositivo legal a que se amolda a prática tida
como criminosa. Essa é a classificação, definição ou capitulação jurídica do crime.

Esse requisito não se reveste do mesmo grau de imprescindibilidade dos elementos tratados acima. A
classificação legal concedida ao fato criminoso por ocasião do oferecimento da denúncia ou queixa, embora
deva constar, é modificável no curso do processo penal. Eventual erro nessa classificação pode ser corrigido
a qualquer hora por meio de aditamento (art. 569 do CPP) ou pelo próprio juiz por ocasião da sentença (art.
383 do CPP), e não acarreta nulidades à peça acusatória (Avena, 2020).

Ainda, o autor arremata: “Lembre-se de que ‘o acusado defende-se dos fatos narrados na peça inicial, e não
da capitulação dela’” (Avena, 2020).

No mesmo sentido leciona RENATO BRASILEIRO: “Não se trata, todavia, de requisito obrigatório, pois prevalece
o entendimento de que, no processo penal, o acusado defende-se dos fatos que lhe são imputados, pouco
importando a classificação que lhes seja atribuída” (Lima, 2021).

Essa classificação passa a ter maior importância no caso de equívoco que eventualmente implique em
cerceamento de algum direito subjetivo do acusado ou no afastamento de algum benefício processual, caso
em que mereceria o reparo do órgão acusatório, inclusive por provocação judicial.

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2.4 - Rol de testemunhas

Como se depreende da parte final do art. 41 do CPP, o rol de testemunhas não constitui requisito essencial
à denúncia ou queixa; em verdade, será apresentado apenas quando o titular da ação assim julgar
necessário, como, por exemplo, em casos nos quais haja insuficiência probatória (ou mesmo inexistência) de
documentos, perícias e afins.

A depender do tipo de ação penal, o número máximo de testemunhas arroláveis modifica-se. BRASILEIRO bem
resume o panorama:

a) procedimento comum ordinário: 8 (oito) testemunhas (CPP, art. 401, caput); b) procedimento
comum sumário: 5 (cinco) testemunhas (CPP, art. 532); c) procedimento sumaríssimo (Lei nº
9.099/95): 3 (três) testemunhas; d) primeira fase do procedimento do júri: 8 (oito) testemunhas
(CPP, art. 406, § 3º); e) segunda fase do procedimento do júri: 5 (cinco) testemunhas (CPP, art.
422); f) procedimento da Lei de drogas: 5 (cinco) testemunhas (Lei nº 11.343/06, art. 54, inciso
III); g) procedimento ordinário do CPPM: 6 (seis) testemunhas (CPPM, art. 77, alínea “h”) (Lima,
2021).

Impende ressaltar que, conforme artigos 209, § 2º e 401, § 1º, ambos do CPP, não são contabilizadas para
esse limite máximo as testemunhas que nada souberem em relação à causa e as que não prestarem o
compromisso legal – estas são as informantes.

Ademais, em se tratando de pluralidade de fatos e/ou acusados, o número máximo de testemunhas sofre
alteração, a fim de se adequar à extensão da matéria a ser discutida. Nesse sentido, o magistério de
BRASILEIRO:

Há certa controvérsia na doutrina e na jurisprudência acerca desse número quando o processo


versa sobre mais de um delito ou quando há mais de um corréu. Prevalece o entendimento de
que, para a acusação, o número é estabelecido de acordo com a quantidade de fatos imputados,
independentemente do número de acusados. Para a defesa, toma-se em conta não apenas o
número de fatos, como também o número de acusados (Lima, 2021).

2.5 - Endereçamento da peça acusatória

Assim como toda petição, a peça acusatória deve ser endereçada para o juízo competente, a fim de que se
possa estabelecer a devida relação processual, observando-se o juiz natural.

Não se trata, todavia, de requisito essencial; mesmo porque não é requisito expresso no art. 41 do CPP.

2.6 - Redação na língua oficial

A denúncia ou a queixa deve ser redigida na língua oficial do Brasil: o português. O velho e bom vernáculo.

Sobre a língua a ser utilizada nas atividades forenses já dispõe o art. 192 do CPC/15:

Art. 192. Em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso da língua portuguesa.

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Referido dispositivo é completamente aplicável ao processo penal, por força do art. 3º do CPP, não havendo
qualquer incompatibilidade entre as regras atinentes aos sistemas processuais:

Art. 3º A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como
o suplemento dos princípios gerais de direito.

A esse propósito, MARCÃO bem pondera: “A petição grafada em idioma não oficial impede a ampla defesa e
o contraditório, e ninguém está obrigado a conhecer outros idiomas” (Marcão, 2017).

2.7 - Subscrição do Ministério Público ou do advogado do querelante

Deverá a denúncia conter a assinatura do membro do Ministério Público responsável pela sua confecção; de
igual forma, deverá a queixa-crime ser subscrita pelo advogado do querelante.

A depender do caso, eventual equívoco em relação a esse requisito pode ou não acarretar consequência
para a efetividade da peça acusatória. AVENA bem reúne a visão dos tribunais a esse respeito:

Não obstante a orientação tradicionalmente agasalhada pelos tribunais seja a de que a ausência
de subscrição na denúncia conduz à inexistência da peça, o STJ, já há algum tempo, vem se
pronunciando no sentido de que “a falta de assinatura do Promotor de Justiça na denúncia, mas
não havendo dúvida quanto à autenticidade da peça acusatória, constitui mera irregularidade,
não acarretando, portanto, a sua nulidade”. O mesmo raciocínio não é, contudo, aplicado à
queixa-crime, relativamente à qual se compreende que a ausência de subscrição pelo advogado
constitui óbice ao regular andamento da ação penal (Avena, 2017).

Em igual sentido, GRECO FILHO:

Sobre a falta de assinatura do promotor, argumenta-se que, no caso, a denúncia seria inexistente.
Essa afirmação, contudo, não é correta. Inexistência ocorreria se a denúncia não fosse elaborada
por promotor. Se o foi, e esta questão é matéria de prova, a denúncia existe e seu defeito é de
autenticação, que evidentemente pode ser suprido. A correção deve ser feita por petição do
promotor em exercício no momento da correção, o qual deverá declarar assinada, autenticada e
ratificada a peça inicial (Filho, 2012).

2.8 - Procuração da queixa-crime e custas processuais

Especificamente em relação à queixa, o próprio Código de Processo Penal estabelece requisitos adicionais
quanto à procuração do advogado do querelante. Veja o que dispõe o art. 44:

Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do
instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando
tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo
criminal.

Dessa forma, percebe-se que a simples procuração com cláusula ad judicia (para o foro em geral) não é o
suficiente para o oferecimento da queixa-crime.

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Importante ressaltar que, malgrado o referido artigo faça menção ao ‘nome do querelante’, a doutrina é
pacífica no sentido de que o termo querelante constitui erro material/terminológico na lei. Em verdade, deve
constar da procuração o nome do querelado. A finalidade de necessitar a procuração conter o nome do
querelado e a descrição do fato criminoso a ele imputado é a possibilidade de fixar eventual responsabilidade
pelo crime de denunciação caluniosa (Lima, 2021).

Eventuais irregularidades na procuração podem ser sanadas pela assinatura conjunta do querelante ao final
da queixa-crime; na falta dessa assinatura, as irregularidades ensejam a rejeição da peça acusatória (Avena,
2017).

Ao demais, ainda em relação às omissões, TÁVORA resume a visão dos tribunais superiores sobre o tema:

Eventuais defeitos da procuração estarão supridos se o querelante assinar a inicial acusatória


juntamente com o advogado, sendo desnecessário o reconhecimento de sua firma para o ato.
Em que pese nosso entendimento de que os vícios da procuração devam ser sanados até o prazo
decadencial, os tribunais superiores têm declarado que as omissões formais da procuração
podem ser sanadas a qualquer tempo, mesmo após superado este prazo. [...] O STF, contudo,
tem entendido que os defeitos podem ser sanados até a sentença. Vale acentuar que o defeito
de procuração, referido nos julgados da Suprema Corte, consiste na omissão do fato criminoso
naquele instrumento de mandato, requisito necessário à propositura da ação penal privada
(Távora, 2017).

Não obstante o apontamento do referido autor, o Superior Tribunal de Justiça, mais recentemente, reafirma
a necessidade de observância do prazo decadencial para eventuais regularizações, como podemos observar
dos seguintes julgados da 5ª e 6ª Turmas:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIMES CONTRA A HONRA. CALÚNIA E INJÚRIA.


NULIDADE DA PROCURAÇÃO OFERTADA PELA QUERELANTE. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO DOS
FATOS CRIMINOSOS. INSTRUMENTO DE MANDATO EM DESCONFORMIDADE COM O ARTIGO 44
DA LEI PENAL ADJETIVA. AUSÊNCIA DE NARRATIVA DOS FATOS ATRIBUÍDOS AO QUERELADO.
MÁCULA CARACTERIZADA. REGULARIZAÇÃO EFETUADA APÓS O PRAZO DECADENCIAL. AÇÃO
PENAL. JUSTA CAUSA. AUSÊNCIA. REVALORAÇÃO DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE. 1. Não se
desconhece a existência de precedentes desta Corte Superior de Justiça no sentido de que a
exigência contida no artigo 44 do Código de Processo Penal, consistente na menção do fato
criminoso no aludido documento, é cumprida com a indicação do dispositivo de lei no qual o
querelado é dado como incurso. 2. Para que reste atendido o comando contido no art. 44 do CPP,
é indispensável que a procuração contenha uma descrição, ainda que sucinta, dos fatos a serem
abordados na queixa-crime. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. 3. No caso dos autos, a
procuração ofertada pela querelante não contém a descrição, ainda que sucinta, dos fatos a
serem apurados com o oferecimento de queixa-crime, não estando atendida a exigência contida
no artigo 44 da Lei Penal Adjetiva. 4. Eventual defeito na representação processual da
querelante só pode ser sanado dentro do prazo decadencial previsto no art. 38 do CPP. [...]
(AgRg no REsp 1673988/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, 5ª TURMA, julgado em 22/05/2018)

[...] 2. "Preceitua o art. 568 do CPP que a nulidade por ilegitimidade do representante da parte
poderá ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais, respeitando-se,

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contudo, o prazo decadencial de 6 meses previsto no art. 38 do CPP" (AgRg no REsp n.


1544882/DF, relator Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 28/6/2016, DJe
1º/8/2016) . 3. Agravo regimental improvido. (EDcl no REsp 1753716/SP, Rel. Ministro ANTONIO
SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/12/2018)

Não custa lembrar que, caso o próprio ofendido possua capacidade postulatória, nada impede que ofereça,
por si mesmo, a queixa-crime.

Pertinente às custas processuais nas ações penais de iniciativa privada, prevê o Código de Processo Penal,
em seu art. 806, a necessidade de recolhimento das custas para que sejam realizados os atos e diligências
processuais, ressalvados os casos envolvendo pessoas pobres na acepção da lei:

Art. 806. Salvo o caso do art. 32, nas ações intentadas mediante queixa, nenhum ato ou diligência
se realizará, sem que seja depositada em cartório a importância das custas.

§ 1º Igualmente, nenhum ato requerido no interesse da defesa será realizado, sem o prévio
pagamento das custas, salvo se o acusado for pobre.

§ 2º A falta do pagamento das custas, nos prazos fixados em lei, ou marcados pelo juiz, importará
renúncia à diligência requerida ou deserção do recurso interposto.

§ 3º A falta de qualquer prova ou diligência que deixe de realizar-se em virtude do não-


pagamento de custas não implicará a nulidade do processo, se a prova de pobreza do acusado
só posteriormente foi feita.

3 - PRAZO PARA OFERECIMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA


Como regra geral, o Ministério Público deve oferecer a denúncia no prazo de 5 dias, contados do
recebimento dos autos de inquérito, se o réu estiver preso; ou de 15 dias se estiver em liberdade. É o que
dispõe o art. 46 do CPP:

Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado
da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias,
se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à
autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público
receber novamente os autos.

Diz-se ‘regra geral’ pois, a depender do crime tratado, a legislação penal especial pode fixar prazo diverso
para o oferecimento da denúncia. TÁVORA bem colaciona esses casos nas ações penais públicas:

a) 10 dias, para crime eleitoral (art. 357, Código Eleitoral). b) 10 dias, para crimes de imprensa
(art. 40, § 1º, Lei nº 5.250/1967). Com a não recepção da Lei nº 5.250/67 pela CF (ADPF nº 130-
7), os crimes praticados pela imprensa passam a estar regidos pelo CP, e o prazo da denúncia
segue a regra geral do CPP (art. 46). c) 10 dias, para tráfico de drogas (art. 54, III, Lei nº

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11.343/2006). d) 48 horas, para crime de abuso de autoridade (art. 13, Lei nº 4.898/1965)14. e) 2
dias, para crimes contra a economia popular (art. 10, § 2º, Lei nº 1.521/1951). A nova Lei de
Falências (Lei nº 11.101/2005), em seu art. 187, § 1º, prevê que “o prazo para oferecimento da
denúncia regula-se pelo art. 46 do Código de Processo Penal, salvo se o Ministério Público,
estando o réu solto ou afiançado, decidir aguardar a apresentação da exposição circunstanciada
de que trata o art. 186 desta Lei, devendo, em seguida, oferecer a denúncia em 15 (quinze) dias”
(Távora, 2017).

Referente à contagem do prazo, note-se que o próprio artigo 46 supracitado estabelece uma forma
específica para o seu início: o dia do recebimento dos autos de inquérito policial. Trata-se de detalhe
interessante (e gerador de polêmicas), haja vista que foge à regra da contagem de prazos processuais
expressa no art. 798, § 1º do CPP – pela qual se exclui o dia do começo:

Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se
interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

§ 1º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.

Em se tratando de acusado em liberdade, não há maiores discussões; até porque o prazo de 15 dias para o
oferecimento da denúncia é tido como impróprio, de modo que o seu não cumprimento gera, no máximo, o
direito (potestativo) de o ofendido valer-se da ação penal privada subsidiária da pública. É claro, o verdadeiro
limite para o oferecimento da denúncia nesses casos é o eventual advento da prescrição, que fulmina por
completo qualquer pretensão punitiva.

Por outro lado, nos casos de acusados presos, até mesmo pelo exíguo prazo para oferecimento da denúncia
(cujo descumprimento pode configurar constrangimento ilegal com o consequente relaxamento da prisão),
a discussão ganha outro relevo. A esse respeito, o magistério de NUCCI, trazendo à baila, também, a visão de
outros doutrinadores sobre o assunto:

É certo que os cinco dias para oferecer denúncia constituem prazo processual, mas de caráter
especial, não somente por lidar com a liberdade de alguém, como também porque há regra
específica no referido art. 46, caput. Concordamos com aqueles que dizem ser lógico computar-
se, como primeiro dia do prazo, aquele em que foi aberta vista ao promotor. Nessa ótica,
TOURINHO FILHO (Código de Processo Penal comentado, v. 1, p. 125); ESPÍNOLA FILHO,
invocando a regra específica do art. 800, § 2º, do CPP (Código de Processo Penal brasileiro
anotado, v. 1, p. 439). Contrariamente, está a posição de MIRABETE, alegando que o dia do
recebimento dos autos é o termo inicial dos cinco dias, que necessitam ser computados na forma

14
A nova Lei de Abuso de Autoridade (nº 13.869/2019) não prevê prazo específico. Aplica-se, então, a regra geral do CPP.

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do art. 798, § 1º, do Código de Processo Penal (Código de Processo Penal interpretado, p. 111)
Fonte bibliográfica inválida especificada..

Pelo mesmo caminho as lições de TÁVORA: “A data do termo de vista pessoal do MP fixa o marco inicial, já
contado como primeiro dia para a oferta da denúncia. Afinal, a regra em comento é especial em relação ao
art. 798, § 1º, do CPP”. O autor, ainda, complementa e arremata: “Já se existirem vários denunciados em
situação diversa, uns presos e outros não, o prazo deve ser contado como se todos estivessem presos”
(Távora, 2017).

Pois bem. No que tange ao prazo para oferecimento da queixa-crime, imperioso relembrar o art. 38 do CPP
que, como regra geral, concebe o prazo decadencial de 6 meses contados do dia em que se toma
conhecimento da autoria do crime para o oferecimento da peça acusatória:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar
o prazo para o oferecimento da denúncia.

Por tratar-se de prazo decadencial, ostenta natureza penal; portanto, sua contagem se dá de acordo com as
disposições do art. 10 do CP:

Art. 10. O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos
pelo calendário comum.

As demais peculiaridades desse prazo decadencial já foram tratadas por ocasião do título sobre ‘decadência’,
ao qual remetemos o aluno para relembrar esses detalhes.

Doutrina Complementar

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “A ação
penal é promovida por meio do oferecimento de uma petição inicial, que, despachada pelo juiz,
dá início ao processo penal. Nos casos em que o órgão do Ministério Público apresenta a peça
acusatória, esta recebe o nome de ‘denúncia’. Quando couber ao ofendido ou a seu
representante legal dar início à persecutio criminis in iudicio, deverão fazê-lo por meio do
oferecimento de ‘queixa-crime’, nome dado à peça acusatória nas ações penais privadas
(exclusivas ou subsidiárias)”.

Requisitos da peça acusatória.

Exposição dos fatos com todas as suas circunstâncias.

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “Inicialmente, é
necessário que a denúncia ou queixa contenha a indicação clara e precisa do local, dia e hora em
que os fatos se deram, bem como da conduta típica praticada. É imprescindível que transcreva o
tipo penal a que se refere e indique as elementares do tipo em que incidiu o apontado autor do

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delito. [...] Nos crimes culposos, deve indicar qual a modalidade de culpa com que agiu o autor
do delito: se negligência, imprudência ou imperícia. Mas não basta indicar a modalidade de culpa;
deve também explicar em que consistiu uma ou outra (exemplo de narrativa em caso de
imprudência: desrespeitou sinal de parada obrigatória e a preferência do veículo em que
trafegava a vítima, e assim deu causa ao acidente). [...] Com efeito, é na petição inicial que são
fixados os limites e, portanto, a intensidade e alcance da acusação, daí a necessidade de ser ela
precisa a fim de proporcionar ao juiz condições de avaliar se há justa causa, e ao apontado autor
do delito, todos os elementos de que necessita para sua ampla defesa”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “São
indispensáveis os elementos essenciais da imputação contida na peça acusatória: a descrição
pormenorizada do fato criminoso, evitando-se imputação de fato atípico ou que cause prejuízo
à ampla defesa. A falta de elementos essenciais enseja nulidade absoluta. Por sua vez, os
elementos acidentais circundam o fato delituoso, oferecendo-lhe os contornos distintivos, a
exemplo do horário que foi cometido o delito. São aptos a causar nulidade relativa, dependendo
de demonstração do prejuízo à defesa. A inicial deve conter, desse modo: (1) descrição de uma
conduta fática; (2) a imputação, que é atribuição da autoria de uma conduta humana; e (3) a
qualificação jurídico-criminal da narrativa, isto é, o enquadramento da conduta na lei penal. O
MP ou querelante necessita fazer a classificação provisória do delito (tipo fundamental) e de suas
qualificadoras (tipo derivado). É desnecessário imputar agravantes na denúncia ou na queixa, eis
que se trata, em boa medida, de matéria preponderantemente de direito (reincidência,
qualidade de ascendente da vítima, etc.) e, ademais, o art. 385, do CPP, autoriza ao juiz
reconhecer agravantes mesmo nas hipóteses de ausência de pedido condenatório, nas ações
penais públicas”.

Classificação do crime

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “Se, em
consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão
condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95), o juiz procederá de acordo com o disposto
nessa lei (CPP, art. 383, § 1º). A Lei n. 11.719/2008 apenas tornou expressa a orientação
sedimentada na Súmula 337 do STJ: ‘É cabível a suspensão condicional do processo na
desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva’. ‘Tratando-se de
infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos’ (CPP, art. 383, §
2º)”.

GUSTAVO BADARÓ (Processo Penal, São Paulo: RT. 2020). “A denúncia deverá trazer a qualificação
penal do fato. Não basta a menção do nome do delito, sendo necessária a indicação do tipo penal,
inclusive com suas formas qualificadas, se for o caso. Se houver causas de aumento de pena,
também deverão estar identificadas e mencionadas na denúncia. O mesmo deverá ocorrer no
caso de concurso material ou formal, bem como no crime continuado. No caso de norma penal
em branco, a denúncia deverá indicar, além do tipo penal incompleto, a norma integradora ou
complementar, fazendo menção ao artigo de lei integrador, sob pena de inépcia da denúncia.
Predomina o entendimento de que o juiz, ao receber a denúncia, não pode alterar a qualificação
jurídica dada ao fato, o que somente pode ser feito no momento da sentença, como faculta o
art. 383 do CPP. Realmente, em regra, a sentença é o momento oportuno para tal correção.

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Consequentemente, entende-se que a errônea qualificação jurídica dos fatos na denúncia (por
exemplo, narra latrocínio, mas qualifica os fatos no art. 121 do CP) não autoriza a sua rejeição,
posto que o acusado se defende dos fatos que lhe são imputados, e não da qualificação jurídica
dada aos mesmos. Não concordamos com tal posição. A qualificação jurídica dada na denúncia
tem repercussões jurídicas importantíssimas durante o processo. Por exemplo, definirá a
competência (inclusive constitucional, como no caso de crimes dolosos contra a vida), poderá
levar à adoção de procedimento especial (como o procedimento do júri), poderá implicar
vedação de decretação de prisão preventiva, entre outras. Assim, o juiz poderá rejeitar a
denúncia no todo ou em parte, por falta de justa causa, em razão de inadequação da qualificação
jurídica, toda vez que esta se mostrar incorreta, mormente nos casos de excesso de acusação
(por exemplo, inclusão de uma qualificadora indevida no homicídio ou oferecer denúncia por
tráfico de drogas, no caso de simples usuário).

Rol de testemunhas

NORBERTO AVENA (Processo Penal, 12ª edição, Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020):
“O rol de testemunhas, assim como a classificação do crime, é elemento acidental, cuja ausência
não importa qualquer vício, até porque há delitos cuja prova é eminentemente documental.
Evidentemente, a ausência do rol acarreta a preclusão, não podendo ser suprida posteriormente
pelo Ministério Público, salvo nos casos de substituição de testemunha não localizada ou na
hipótese de testemunha cujo nome surgiu apenas na instrução processual, caso em que o
promotor poderá requerer ao juízo a sua inquirição. A despeito de limitar-se o art. 41 do CPP a
referir-se a “rol de testemunhas”, é importante dizer que, na verdade, com a inicial já deve o
Ministério Público indicar todas as provas que pretende produzir, já que se trata do momento
correto para tanto. Ora, a prova testemunhal é apenas uma entre as muitas outras previstas na
legislação, constituindo impropriedade do Código de Processo Penal a menção exclusiva a esse
tipo de prova”.

GUSTAVO BADARÓ (Processo Penal, São Paulo: RT. 2020): “O rol de testemunhas é facultativo.
Embora o momento procedimental para requerer a oitiva de testemunha seja no oferecimento
da denúncia ou queixa, a ausência do rol não torna a peça acusatória inepta. Haverá apenas a
preclusão do direito de produzir a prova testemunhal acusatória. Mesmo assim, nada impede
que a acusação, em momento posterior, demonstre ao juiz a necessidade de oitiva de uma
testemunha, e o magistrado, valendo-se dos poderes que lhe confere o art. 209 do CPP,
determine sua oitiva. Também será possível requerer a oitiva de testemunha na fase do art. 402
do CPP, desde que a conveniência e necessidade de tal prova surjam no curso da instrução (por
exemplo, seu nome ser mencionado em um documento juntado aos autos durante a instrução).

Endereçamento da peça acusatória

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017): “Ao iniciar a petição
inicial, é preciso que se faça o correto endereçamento, ao juiz ou tribunal competente, conforme
regras de fixação de competência (...). O endereçamento equivocado, entretanto, não impede o
recebimento da petição, cumprindo se faça posterior remessa ao juízo competente”.

Redação oficial

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HIDEJALMA MUCCIO (Curso de processo penal, vol. 1, 1ª ed., São Paulo: EDIPRO, 2000): “Embora
não haja nenhuma norma direta e expressa que diga que a inicial (denúncia) deva ser escrita em
vernáculo, essa obrigatoriedade decorre do nosso ordenamento jurídico-processual penal, que
através de várias disposições legais determina que os atos processuais sejam praticados em
português, que é a língua pátria. Nesse sentido os arts. 193, 223, 236 e 784, § 1º, todos do Código
de Processo Penal. Inadmite-se, pois, a denúncia escrita em língua estrangeira (espanhol, inglês,
italiano, alemão, etc.)”.

Subscrição do Ministério Público ou do advogado do querelante

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “A inicial
deve conter o nome e a assinatura do órgão acusador. A ausência de assinatura pode levar à
própria inexistência do ato, não sendo possível identificar, nem em tese, o autor. Caso contrário,
revelando-se ocasional esquecimento, mas certificando-se a real autoria, passa a mera
irregularidade. Assim se manifestam Ada Pellegrini Grinover, Antônio Scarance Fernandes e
Antônio Magalhães Gomes Filho, informando que ‘denúncia ou queixa não assinada pode
significar inexistência. Não, contudo, se facilmente identificável quem a elaborou; assim, se o
promotor, apesar de não ter subscrito a peça acusatória, lançou cota nos autos, assinando-a e
nela fazendo constar que está oferecendo denúncia, não há razão plausível para, em excessivo
apego ao formalismo, anular o processo’.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “a falta de assinatura
não invalida a peça, se não houver dúvidas quanto à sua autenticidade”.

Procuração da queixa-crime e custas processuais

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “O art. 44
do Código de Processo Penal, no entanto, exige que a queixa seja proposta por procurador com
poderes especiais, devendo constar do instrumento do mandato o nome do querelado e a
menção do fato criminoso. Na rejeição da queixa pela falta desses requisitos, a ação pode ser
renovada, desde que o prazo decadencial não tenha decorrido. Tem ainda a jurisprudência
entendido que tais requisitos são dispensáveis na procuração desde que a queixa seja assinada
também pelo querelante (RJDTACrim, 2/139). Ademais, eventual falha na procuração não é
questão pertinente à legitimidade de parte, mas sim à representação, razão pela qual possibilita
ao julgador aplicar o disposto no art. 568 do CPP (‘poderá a todo tempo ser sanada’), inclusive se
superado o prazo decadencial (STJ, HC 12815-SP, 5ª T., Rel. Felix Fischer, j. 2.10.2001, DJ,
19.11.2001)”.

NORBERTO AVENA (Processo Penal, 12ª edição, São Paulo: Método, 2020). “Embora a procuração
assim elaborada constitua-se verdadeira condição de procedibilidade da ação penal privada,
aceita-se, na hipótese de não serem observados os pressupostos do citado art. 44, que seja
suprida a nulidade mediante a aposição da assinatura do querelante juntamente com a de seu
advogado na queixa-crime ou juntada posterior de instrumento procuratório adequado. Nesses
casos, para que o vício convalide, será necessário que este suprimento ocorra ainda dentro do
prazo decadencial de seis meses contados da ciência do fato ou de sua autoria pelo querelante
(e não do ajuizamento da ação penal privada), não dispensando a observância desse prazo a regra

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do art. 568 do CPP, ao referir que “a nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá
ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais”. Isso porque a expressão “a
todo tempo”, em que pese haver divergências, deve ser considerada dentro dos limites
temporais estabelecidos pela lei para a prática dos atos processuais, o que, no caso da queixa, é
de seis meses. Nesse sentido, pronunciou-se o STJ, referindo que “o instrumento de mandato
com poderes especiais conferido a procurador legalmente habilitado, para a propositura de
queixa nos crimes contra a honra, que não contém a menção ao fato delituoso, constitui omissão
que obsta o regular prosseguimento da ação penal, se não for sanada dentro do prazo
decadencial”.

Prazo para oferecimento da peça acusatória

RENATO MARCÃO (Curso de processo penal, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017), a respeito do prazo
para oferecimento da denúncia, sustenta: “Caso o Ministério Público requeira diligências (CPP,
art. 16), o prazo de 15 (quinze) dias será restituído integralmente e voltará a correr na data em
que referido órgão receber novamente os autos. Quando o Ministério Público dispensar o
inquérito policial, por já dispor de elementos suficientes para formar sua convicção, o prazo para
o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações
ou a representação (CPP, art. 46, § 1º). [...] Decorrido o prazo que a lei defere ao Promotor de
Justiça, em caso de absoluta inércia, poderá o particular ofendido ingressar com ação penal
privada subsidiária da pública (CF, art. 5º, LIX; CPP, art. 29; CP, art. 100, § 3º). [...] No caso de
atraso injustificado, o representante do Ministério Público poderá sofrer sanção administrativa,
em procedimento levado a efeito pela Corregedoria do Parquet. Dispõe a respeito, por exemplo,
o § 3º do art. 357 do Código Eleitoral que “Se o órgão do Ministério Público não oferecer a
denúncia no prazo legal representará contra ele a autoridade judiciária, sem prejuízo da
apuração da responsabilidade penal”. Em relação ao prazo para oferecimento da queixa-crime,
afirma: “No caso de morte do ofendido, a ação penal privada poderá ser ajuizada pelo cônjuge,
ascendente, descendente ou irmão, no prazo de seis meses, contado da data em que um dos
sucessores tomou conhecimento de quem foi o autor do delito, conforme decorre do disposto
no parágrafo único do art. 38 do CPP. Nessa hipótese, se qualquer dos sucessores legitimados
deixar transcorrer o prazo sem o ajuizamento da queixa, deverá ser julgada extinta a
punibilidade, visto não ser concebível a infinita multiplicidade de prazos. Não haverá, portanto,
um prazo para cada sucessor legitimado. [...] Trata-se de prazo fatal. Iniciada a contagem, fluirá
até que seja interrompido com a apresentação da queixa-crime em juízo, ou até a extinção da
punibilidade em relação ao autor do delito. Na contagem do prazo decadencial, segue-se a regra
do art. 10 do CP, segundo o qual deve ser computado o dia do começo e excluído o dia final”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018), sobre os prazos para
oferecimento da denúncia previstos no CPP e em procedimentos específicos, assevera: “Em
regra, quinze dias, se o indiciado estiver solto, e cinco dias, se estiver preso. Será de dez dias, no
caso de crime eleitoral, dois dias para crime contra a economia popular, quarenta e oito horas
para abuso de autoridade, e dez dias para crime previsto na Lei de Drogas (cf. art. 54 da Lei n.
11.343/2006). Ressalve-se que esse prazo para oferecimento da denúncia não se aplica à infração
prevista no art. 28 da lei, pois, nessa hipótese, o agente será processado e julgado na forma dos
arts. 60 e seguintes da Lei n. 9.099/95, que dispõem sobre os Juizados Especiais Criminais, salvo
se houver concurso com os crimes nos arts. 33 a 37 (cf. art. 48, § 1º)”. Referente ao prazo para

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oferecimento da queixa-crime, pontua: “Seis meses, contados do dia em que o ofendido vier a
saber quem é o autor do crime. Trata-se de prazo de direito material (decadencial), computando-
se o dia do começo, excluindo-se o dia do final, e não se admite prorrogação”.

Jurisprudência pertinente

Supremo Tribunal Federal

[...] QUEIXA-CRIME. CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. IMPUTAÇÃO QUE NÃO INDIVIDUALIZA AS


CONDUTAS DOS QUERELADOS. ACUSAÇÃO QUE SE BASEIA NA QUALIDADE DE SÓCIOS
PROPRIETÁRIOS DE EMPRESA DE RADIODIFUSÃO SONORA. NÃO PREENCHIMENTO DOS
REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. REJEIÇÃO DA
QUEIXA-CRIME QUANTO A DOIS QUERELADOS. [...] A mera posição hierárquica dos acusados na
titularidade da empresa de comunicação, sem a descrição da ação e sem elementos que
evidenciem a vontade e consciência de praticar o crime imputado, inviabiliza o prosseguimento
da ação penal, por manifesta ausência de justa causa. Precedente: AP 905-QO, Relator: Min.
Roberto Barroso, Primeira Turma, Julgada em 23/02/2016, DJe de 21/03/2016. [...] Da análise da
inicial acusatória, percebe-se que o Querelante não individualizou, minimamente, as condutas
dos Querelados [...], imputando, aos mesmos, fatos tidos por criminosos, em razão da mera
condição de sócios proprietários da Rádio [...], veículo de comunicação social por meio do qual o
radialista [...] teria proferido as supostas ofensas à honra do peticionário [...]. [...] Assim, não há
nada nos autos que permita atribuir de modo fundamentado a autoria das supostas agressões
verbais, alegadamente caluniosas, difamatórias e injuriosas, aos querelados. Em verdade, não há
elementos que permitam sequer a imputação de responsabilidade a título de participação, em
qualquer de suas modalidades: instigação, auxílio ou ajuste. A presunção de responsabilidade na
seara penal colide com princípios e garantias fundamentais, consoante orientação
jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal [...]. (Pet 5660, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira
Turma, julgado em 14/03/2017)

[...] RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À


IDENTIFICAÇÃO E À PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO ENCONTRA
AMPARO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. [...] O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não
condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea
persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma
constitucional não impõe a necessária dupla imputação. [...] (RE 548181, Relator(a): Min. ROSA
WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013)

A instauração da ação penal requer, para sua configuração legítima, que a peça acusatória
preencha os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal. [...] A denúncia que deixa de
estabelecer a necessária vinculação da conduta individual de cada agente aos eventos
delituosos qualifica-se como denúncia inepta (HC 88.875, Rel. Min. Celso de Mello, DJE
09/03/2012). [...] A responsabilidade penal é sempre subjetiva, por isso que é absolutamente
inadmissível a atribuição, em sede penal, de responsabilidade objetiva pela prática criminosa,
consistente na atribuição de um resultado danoso a um indivíduo, unicamente em razão do
cargo por ele exercido. [...] A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sedimentou a
compreensão de que “A circunstância objetiva de alguém ser meramente sócio ou de exercer

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cargo de direção ou de administração em sociedade empresária não se revela suficiente, só por


si, para autorizar qualquer presunção de culpa [...]. Prevalece, sempre, em sede criminal, como
princípio dominante do sistema normativo, o dogma da responsabilidade com culpa (“nullum
crimen sine culpa”), absolutamente incompatível com a velha concepção medieval do “versari
in re illicita”, banida do domínio do direito penal da culpa” (HC 88.875, Segunda Turma, Rel.
Min. Celso de Mello, unânime, j. 07/12/2010, DJE 09/03/2012, Public. 12/03/2012). [...] (AP 953,
Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 06/09/2016)

Não é inepta a denúncia que especifica as condutas, expondo de forma pormenorizada o fato
criminoso e preenche os requisitos do art. 41 do CPP. [...] Alegações de inépcia da denúncia por
falta de justa causa e de atipicidade da conduta, assim como a análise dos demais pedidos
absolutórios, dependeriam da verificação da ocorrência ou não da versão apresentada na peça
acusatória, o que demanda o revolvimento de fatos e provas, inviável em habeas corpus.
Precedentes. [...] (HC 123745 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em
04/11/2014)

A denúncia – não importando se sucinta ou não – que contém todos os elementos essenciais e
necessários à adequada descrição da figura típica do delito (“essentialia delicti”) e que atende,
por isso mesmo, às exigências impostas pelo art. 41 do CPP qualifica-se como peça acusatória
processualmente apta e juridicamente idônea, não incidindo, por tal razão, no vício da inépcia.
Doutrina. Precedentes. [...] (RHC 118636 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma,
julgado em 26/08/2014)

É apta a denúncia que bem individualiza a conduta do réu, expondo de forma pormenorizada
o fato criminoso, preenchendo, assim, os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.
Basta que, da leitura da peça acusatória, possam-se vislumbrar todos os elementos
indispensáveis à existência de crime em tese, com autoria definida, de modo a permitir o pleno
exercício do contraditório e da ampla defesa. Precedentes. [...] (AP 465, Relator(a): Min.
CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 24/04/2014)

[...] As agravantes, ao contrário das qualificadoras, sequer precisam constar da denúncia para
serem reconhecidas pelo Juiz. É suficiente, para que incidam no cálculo da pena, a existência
nos autos de elementos que as identifiquem. [...] (HC 93211, Relator(a): Min. EROS GRAU, 2ª T,
julgado em 12/02/2008)

Superior Tribunal de Justiça

[...] AÇÃO PENAL PRIVADA. VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO. PROCURAÇÃO ORIGINARIAMENTE


OUTORGADA COM PODERES DA CLÁUSULA AD JUDICIA ET EXTRA. SUBSTABELECIMENTO COM
RESERVA DE DIREITOS. INCLUSÃO DE PODERES ESPECIAIS QUE NÃO CONSTAVAM NO
INSTRUMENTO DE MANDATO ORIGINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. LIMITES OBJETIVOS.
REQUISITOS DO ART. 44 DO CPP NÃO PREENCHIDOS. [...] Para a validade da ação penal nos
crimes de ação penal privada, é necessário que o instrumento de mandato seja conferido com
poderes especiais expressos, além de fazer menção ao fato criminoso, nos termos do art. 44
do Código de Processo Penal. [...] O substabelecimento, enquanto meio de transferência de
poderes anteriormente concedidos em procuração, deve obedecer integralmente ao que consta

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do instrumento do mandato, porquanto é dele totalmente dependente. Ainda que neste


instrumento esteja inserida a cláusula ad judicia, há limites objetivos que devem ser observados
quando da transmissão desses poderes, visto que o substabelecente lida com direitos de
terceiros, e não próprios. [...] Na espécie, como a procuração firmada pela querelante somente
conferiu aos advogados os poderes da cláusula ad judicia et extra, apenas estes foram objeto
de transferência aos substabelecidos, razão pela qual deve ser tida por inexistente a inclusão
de poderes especiais para a propositura de ação penal privada, uma vez que eles não
constavam do mandato originário. [...] Nula é a queixa-crime, por vício de representação, se a
procuração outorgada para a sua propositura não atende às exigências do art. 44 do Código de
Processo Penal. [...] (RHC 33.790/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/
Acórdão Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 27/06/2014, DJe
05/08/2014)

[...] PEREMPÇÃO. INOCORRÊNCIA. MANDATO. FATO CRIMINOSO. MENÇÃO. DENÚNCIA. INÉPCIA.


AUSÊNCIA. A perempção somente tem lugar após o recebimento da queixa-crime. A menção do
fato criminoso no instrumento de mandato, exigida pelo art. 44 do Código de Processo Penal
(CPP), cumpre-se pela indicação do artigo de lei no qual se baseia a queixa-crime ou pela
referência à denominação jurídica do crime. A queixa-crime que atribui a prática de delitos
contra a honra aos querelados, de maneira conjunta, e expõe o fato criminoso e suas
circunstâncias, a qualificação dos acusados, a classificação do crime e o rol das testemunhas
atende os requisitos do art. 41 do estatuto Processual Penal. Recurso Especial a que se nega
provimento. (REsp 663.934/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em
09/02/2006, DJ 27/03/2006, p. 367)

A procuração outorgada pelo querelante ao seu advogado para fins de ingresso com queixa-
crime não requer a descrição pormenorizada do fato criminoso. [...] (Rcl 5.478/DF, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/09/2011, DJe 13/03/2012)

[...] A despeito da Lei nº 9.099/95 ser pautada por critérios da oralidade, simplicidade e
informalidade, a inicial acusatória (denúncia ou queixa-crime), mesmo nas infrações de menor
potencial ofensivo, deve vir acompanhada com o mínimo embasamento probatório, ou seja,
com lastro probatório mínimo apto a demonstrar, ainda que de modo indiciário, a efetiva
realização do ilícito penal. [...] (RHC 61.822/DF, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,
julgado em 17/12/2015, DJe 25/02/2016)

Se o querelante se limita a transcrever algumas frases escritas pelo segundo querelado, em sua
"linha do tempo" da rede social facebook, sem mais esclarecimentos, impedindo uma análise
do elemento subjetivo da conduta, a peça inaugural falece de um maior delineamento do fato
criminoso e suas circunstâncias, sendo inepta. [...] Na peça acusatória por crimes contra a
honra, exige-se demonstração mínima do intento positivo e deliberado de lesar a honra alheia.
Trata-se do animus injuriandi vel diffamandi. [...] Exordial acusatória não instruída com
nenhum elemento de prova capaz de embasar minimamente os fatos ali narrados, revelando-
se temerária a instauração de ação penal para se verificar, somente em juízo, a idoneidade das
imputações feitas ao primeiro querelado. [...] (APn 724/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES,
CORTE ESPECIAL, julgado em 20/08/2014, DJe 27/08/2014)

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[...] DESPACHO QUE DETERMINA A INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA APRESENTAÇÃO


DAS PROVAS QUE PRETENDIA PRODUZIR EM JUÍZO. NULIDADE. AUSÊNCIA. DEVER DE
COOPERAÇÃO. DECISÃO QUE ADMITE ROL DE TESTEMUNHAS APRESENTADO
EXTEMPORANEAMENTE. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. [...] A intimação do
Ministério Público para que este indique as provas que pretende produzir em Juízo e a juntada
do rol de testemunhas pela acusação, após a apresentação da denúncia mas antes da formação
da relação processual, não enseja nenhum prejuízo à defesa que tem amplas possibilidades de
contraditar os elementos probatórios até então requeridos. [...] (RHC 37.587/SC, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 23/02/2016)

Em sentido diverso, precedente da 6ª Turma:

[...] DENÚNCIA. OFERECIMENTO. AUSÊNCIA DE ROL DE TESTEMUNHAS. RETORNO DOS AUTOS


AO PARQUET PARA CORREÇÃO. ILEGALIDADE. RECONHECIMENTO. RECURSO PROVIDO. O
processo revela-se como encadeamento de atos procedimentais teleologicamente encadeados,
voltados para a obtenção do equacionamento de uma relação jurídica. A bem da técnica, as
diversas fases do rito são suplantadas por meio da preclusão. Na espécie, o Ministério Público,
após o oferecimento da denúncia, recebeu do magistrado, indevidamente, uma segunda
chance para a apresentação do rol de testemunhas que, inadvertidamente, não constou da
petição inicial. Não prospera o argumento de que não se deveria reconhecer a nulidade
porquanto "as provas são destinadas ao juiz", que sempre as poderia produzir de ofício. Trata-
se de compreensão que deve ser revista. O juiz cumpre papel fundamental na cristalização das
garantias constitucionais. Logo, ele deve ser o principal patrocinador do devido processo legal,
e, nunca, arvorar-se na condição altiva de sumo destinatário da prova, como se não houvesse
algo muito maior do que ele, a Justiça, à qual deve prestar, sempre e sempre, reverência.
Cumpre ao julgador não olvidar que a prova tem como desaguadouro o processo, como
dinâmica e rica relação jurídica, aparelhada não apenas pelo juiz de primeiro grau, mas,
também, pelas partes principais (autor e réu), contingente (assistente de acusação) e tribunais,
de segundo grau e de cúpula, responsáveis pela garantia do duplo grau de jurisdição e pela
unidade do direito federal e constitucional. Não foi ao que se assistiu na situação sob lentes. O
magistrado torceu o procedimento, em franca e indevida camaradagem com o órgão acusador,
e, assim comportando-se, tingiu de ilegalidade a ação penal. Na espécie, ao juiz não era dado
fazer vistas grossas para a preclusão. E, como a sua iniciativa probatória ocorre apenas de
maneira subsidiária (HC 202.928/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 08/09/2014), não
poderia, no exercício da faculdade, supletiva, prevista no artigo 209 do Código de Processo
Penal, inaugurar e produzir toda a prova acusatória em juízo. [...] Recurso ordinário provido
para decretar a nulidade da ação penal a partir da decisão de 27/05/2011, que permitiu ao
Ministério Público Federal agregar o rol de testemunhas à denúncia, devendo o processo seguir
com a incoativa tal qual originalmente proposta. (RHC 45.921/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA
DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 29/05/2015)

É afastada a inépcia quando a denúncia preencher os requisitos do art. 41 do CPP, com a


descrição dos fatos e classificação do crime, de forma suficiente para dar início à persecução
penal na via judicial, bem como para o pleno exercício da ampla defesa, o que ocorreu na

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espécie. [...] (HC 389.013/PE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em
05/12/2017, DJe 12/12/2017)

A exposição do fato criminoso com todas suas circunstâncias tem o objetivo de atender à
necessidade de permitir, desde logo, o exercício da ampla defesa pelo denunciado, pois é na
delimitação temática da peça acusatória em que se irá fixar o conteúdo da questão penal. [...]
Ocorre a inépcia da denúncia ou queixa quando sua deficiência resultar em prejuízo ao
exercício da ampla defesa do acusado, ante a falta de descrição do fato criminoso, da ausência
de imputação de fatos determinados ou da circunstância de da exposição não resultar
logicamente a conclusão. [...] A rejeição da denúncia por inépcia em relação a um acusado não
impede o oferecimento de nova denúncia, caso sanadas as irregularidades, nem seu exame
pelo juiz natural dos demais acusados, fixado pelo desmembramento do processo. [...] (APn
810/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 20/11/2017, DJe
28/11/2017)

QUESTÕES DIVERSAS
RENATO BRASILEIRO, em sua obra, traz algumas questões pontuais sobre a denúncia/acusação que serão aqui
abordadas.

1 - DENÚNCIA GENÉRICA E CRIMES SOCIETÁRIOS


Nos crimes praticados em concurso de pessoas, existe necessidade de individualizar o quanto mais possível
a conduta de cada agente, evitando-se acusações genéricas “ou afirmações como, por exemplo, que os dois
acusados, de comum acordo, praticaram o crime”.

A descrição individualizada deve ser feita o quanto possível; existem situações em que isso é inviável, como,
por exemplo, numa situação de roubo em que vários agentes estejam encapuzados, ou em “crimes
multitudinários, assim compreendidos aqueles cometidos por influência de uma multidão em tumulto (v.g.
saque de caminhão de cerveja tombado em rodovia)”.

No que diz respeito aos chamados “crimes societários (ou de gabinete), assim entendidos aqueles praticados
por sócios, mandatários, administradores ou responsáveis por uma pessoa jurídica”, a jurisprudência –
outrora não tão exigente, admitindo a denúncia com narração genérica da participação de cada envolvido,
com apuração posterior na instrução, desde que viabilizasse ampla defesa –, mais recentemente, se inclina
em sentido contrário.

Tribunais superiores não têm admitido denúncia genérica e sustentam que a peça acusatória “deve
estabelecer o vínculo do administrador ao ato ilícito que lhe está sendo imputado. É necessário que descreva,
de forma direta e objetiva, a ação ou omissão do acusado”.

Do contrário, ofende os requisitos do artigo 41 do CPP, os Tratados Internacionais sobre o


assunto, além dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. O princípio da
responsabilidade penal adotado pelo sistema jurídico brasileiro é o pessoal (subjetivo). Portanto,

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a autorização pretoriana de denúncia genérica para os crimes de autoria coletiva não pode servir
de escudo retórico para a não descrição mínima da participação de cada agente na conduta
delitiva. Uma coisa é a desnecessidade de pormenorizar. Outra é a ausência absoluta de vínculo
do fato descrito com a pessoa do denunciado. Portanto, reputa-se inepta a denúncia que, ao
imputar a sócio a prática dos crimes contra a ordem tributária, limita-se a transcrever trechos
dos referidos tipos penais e a mencionar a condição do denunciado de administrador da
sociedade empresária que, em tese, teria suprimido tributos, sem descrever qual conduta ilícita
supostamente cometida pelo acusado haveria contribuído para a consecução do resultado
danoso. O simples fato de o acusado ser sócio e administrador da empresa constante da denúncia
não pode levar a crer, necessariamente, que ele tivesse participação nos fatos delituosos, a ponto
de se ter dispensado ao menos uma sinalização de sua conduta, ainda que breve, sob pena de
restar configurada a repudiada responsabilidade criminal objetiva. Não se pode admitir que a
narrativa criminosa seja resumida à simples condição de acionista, sócio, ou representante legal
de uma pessoa jurídica ligada a eventual prática criminosa. Vale dizer, admitir a chamada
denúncia genérica nos crimes societários e de autoria coletiva não implica aceitar que a acusação
deixe de correlacionar, com o mínimo de concretude, os fatos considerados delituosos com a
atividade do acusado. Não se deve admitir que o processo penal se inicie com uma imputação
que não pode ser rebatida pelo acusado, em face da indeterminação dos fatos que lhe foram
atribuídos, o que, a toda evidência, contraria as bases do sistema acusatório, de cunho
constitucional, mormente a garantia insculpida no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal
(Lima, 2021).

2 - CUMULAÇÃO DE IMPUTAÇÕES
Esse fenômeno, normalmente estudado com a conexão e a continência (simultaneus processos), ocorre
quando as acusações (denúncia ou queixa) contêm mais de uma imputação. É objetiva quando se narram
dois ou mais crimes; é subjetiva quando existe pluralidade de acusados.

Situação bastante comum, plenamente admitida pela doutrina e jurisprudência, pode ocorrer desde o início
do processo, com o oferecimento da denúncia, como também pode ser superveniente, diante da reunião de
processos (pela conexão ou continência) ou do aditamento da denúncia (CPP, art. 569) (Lima, 2021).

3 - IMPUTAÇÃO IMPLÍCITA
A análise dessa questão parte do art. 41 do CPP:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo,
a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

De acordo, portanto, com a norma, a acusação (seja denúncia ou queixa) deve ser ‘exposta’ com todas as
suas circunstâncias; em outras palavras, não pode ser implícita. É ela que inicialmente estabelece todos os
contornos e limites pelos quais deve se desenvolver a instrução e dentro dos quais a sentença não pode sair
(princípio da correlação/congruência). Nesses termos, é em relação aos fatos nela expressamente contidos

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que o acusado se defende, de maneira que acusações implícitas poderiam malferir o contraditório ou a ampla
defesa. Pensemos assim: como o réu poderia contraditar os fatos se eles não estão expressos na acusação?
Por essa forma de pensar, que tanto doutrina quanto jurisprudência caminham no sentido de dizer inviável
imputações implícitas.

Embora o CPP não tenha descido a minúcias quanto aos requisitos de validade de uma peça
acusatória, o sistema processual penal, ou, mais especificadamente, o devido processo legal,
penal, não pode prescindir do atendimento de algumas exigências, inevitáveis por força da
aplicação de alguns princípios. Veja-se, por exemplo, que a exposição do fato criminoso, com
todas as suas circunstâncias, tem por objetivo a satisfação do princípio da ampla defesa. A
preocupação é com a descrição completa do fato, com a inclusão de todas as elementares do
tipo, bem como de suas circunstâncias. É exatamente a descrição completa da imputação penal
que permitirá o mais amplo exercício da defesa, a partir do conhecimento, particularmente pela
defesa técnica – advogado regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil
– das possíveis consequências criminais resultantes do eventual acolhimento da peça acusatória.
Nesse passo, a descrição fiel dos fatos, tal como os entende terem ocorrido o órgão da acusação
(querelante ou Ministério Público), é de suma importância. Muito mais importante, aliás, que a
correta classificação ou tipificação deles, também exigida pelo dispositivo em comento. E assim
é porque o juiz não se encontra vinculado ou subordinado ao juízo de valor emitido pela acusação
na tipificação do fato. Pode ele, à evidência, discordar da classificação dada na denúncia ou na
queixa (Pacelli, et al., 2021).

Falaremos mais disso oportunamente, mas lembre-se que no processo penal vige o princípio da
consubstanciação, de maneira que o réu se defende dos fatos a ele imputados e não da classificação ou
definição jurídica. Daí a importância de uma narrativa fática circunstanciada e expressa; esse será o ‘norte’,
o ponto de referência a ser observado pelo acusado em sua defesa.

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. CORRUPÇÃO ATIVA.


FALSIFICAÇÃO. QUADRILHA. DENÚNCIA. INÉPCIA FORMAL. NARRATIVA DOS FATOS. CARÁTER
LACÔNICO. AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO. RECONHECIMENTO. 1. A perfeita descrição do
comportamento irrogado na denúncia é pressuposto para o exercício da ampla defesa. Do
contrário, a peça lacônica causa perplexidade, prejudicando tanto o posicionamento pessoal
do réu em juízo como a atuação do defensor técnico. In casu, a inserção do paciente no universo
acusatório sem se lhe atribuir, de modo claro, qual teria sido sua contribuição efetiva para a
prática dos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção ativa, falsificação e quadrilha tinge de
ilegal a persecução penal. Tendo a denúncia listados vinte e dois documentos falsificados e a
imputação restrita a doze, tem-se prejuízo para a defesa dada a ausência de individualização do
objeto da imputação. 2. Ordem concedida para anular a ação penal em relação ao paciente, sem
prejuízo de oferecimento de nova denúncia, com a devida explicitação de seu comportamento
tido como delitivo. (HC 76.098/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 26/04/2010)

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4 - IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA
BRASILEIRO faz remissão ao pensamento de AFRÂNIO SILVA JARDIM para definir: “diz-se alternativa a imputação
quando a peça acusatória vestibular atribui ao réu mais de uma conduta penalmente relevante, asseverando
que apenas uma delas efetivamente terá sido praticada pelo imputado, embora todas se apresentem como
prováveis, em face da prova do inquérito. Desta forma, fica expresso, na denúncia ou queixa, que a pretensão
punitiva se lastreia nesta ou naquela ação narrada”.

A título de exemplo, suponha-se que determinado indivíduo tenha sido flagrado na cidade de
Santos/SP na posse de veículo automotor que fora furtado há alguns dias em São Paulo.
Encerradas as investigações policiais, não havendo qualquer outra diligência a ser requisitada
pelo dominus litis, suponha-se que persista dúvida razoável sobre qual conduta fora realmente
praticada pelo investigado: furto ou receptação. Diante da dúvida acerca de qual delito o agente
teria realmente praticado, a denúncia seria oferecida pelo Promotor de Justiça imputando a ele
a prática do furto ou de receptação dolosa. Em tal hipótese, o reconhecimento, por parte do
magistrado, de uma das condutas descritas na peça acusatória importará, obrigatoriamente, na
rejeição da outra conduta (Lima, 2021).

Ainda na visão de AFRÂNIO, a imputação alternativa poderia ser objetiva ampla ou objetiva restrita, conforme
se referisse à ação principal ou a uma circunstância qualificadora.

De seu turno, a imputação alternativa subjetiva, diz respeito ao sujeito passivo da imputação,
subdivide-se em: a) simples: a alternatividade decorre de dúvida sobre a autoria do crime, como
ocorre nos exemplos em que os investigados se acusam reciprocamente, sendo contraditórios os
elementos de informação colhidos no inquérito (v.g., briga em bares); b) complexa: é aquela que
abrange não só o autor do delito como também a própria infração penal. Suponha-se, por
exemplo, situação em que um particular seja preso em flagrante pela suposta prática do crime
de corrupção ativa (CP, art. 333), porém persista dúvida quanto à eventual solicitação indevida
do funcionário público, o que caracterizaria o crime de corrupção passiva de sua parte (CP, art.
317). Em tal hipótese, segundo aqueles que admitem imputação alternativa, seria viável que se
imputasse alternativamente ao particular o crime de corrupção ativa e ao funcionário público o
crime de corrupção passiva (Lima, 2021).

Conclui BRASILEIRO que, a despeito da construção doutrinária sobre a imputação alternativa, a maior parte
da doutrina “se posiciona contrariamente a ela, já que, ainda quando houver compatibilidade entre os fatos
imputados, seu oferecimento quase sempre acarreta dificuldades ao exercício do direito de defesa. Uma
imputação penal alternativa, além de constituir transgressão do dever jurídico que se impõe ao Estado de
expor o fato criminoso com todas as suas circunstâncias, qualifica-se como causa de nulidade absoluta por
inviabilizar o exercício da ampla defesa”.

A conclusão do autor tem respaldo, inclusive, na disposição do § 4º do art. 384 do CPP, que não admitiria
nem mesmo a imputação alternativa superveniente, decorrente do aditamento da denúncia:

§ 4º Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5
(cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.

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Doutrina Complementar

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010): “Nos
crimes de autoria coletiva é muito comum o Promotor de Justiça não especificar, na peça
acusatória, o modo de participação de cada um, preferindo uma maneira mais cômoda, com a
expressão ‘atuando de comum acordo e identidade de propósito’. Algumas decisões, inclusive
do STF, têm aceito denúncias assim nos crimes societários, sem que haja a individualização da
conduta dos sócios. A propósito, RSTJ, 65/157, 68/91; RT, 713/402,719/514. Mas, na advertência
de Manoel Pedro Pimentel, ‘se a responsabilidade penal é subjetiva, não pode recair
indistintamente sobre todos os diretores, mas apenas sobre os que tiveram participação efetiva
no fato delituoso’. [...] (Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, Revista dos Tribunais, 1987,
p. 173). E, se assim é, a denúncia deve descrever a participação de cada um dos sócios ou
diretores. Dispõe o art. 41 do CPP que a denúncia deve conter a exposição do fato criminoso
‘com todas as suas circunstâncias’. Esse imperativo se vincula, por um lado, ao fato de que no
Processo Penal a acusação corresponde ao pedido do Processo Civil de conhecimento. [...] Essa
exigência de descrição circunstanciada, contida no art. 41 do CPP, torna-se mais essencial se a
acusação é dirigida a diversas pessoas ou, melhor dizendo, quando convivem, na denúncia, várias
acusações, e muito especialmente se essas pessoas são reunidas pela circunstância de exercerem
cargos de direção ou serem sócias de uma empresa, sob pena de estarmos face a face com uma
espécie de denúncia vazia, empregada essa expressão em todo o seu sentido semântico,
gramatical. A propósito: ‘...sem a descrição de condutas especificas que vinculem cada diretor ao
evento criminoso, não é possível viabilizar a denúncia. Esta, pelas consequências graves que
acarreta, não pode ser produto de ficção literária. Não pode deixar de descrever o porquê da
inclusão de cada acusado como autor, coautor ou partícipe do crime’ (STJ, RHC 4.214-1, ReL Min
Assis Toledo, DJU, 27-3-1995, EJSTJ, /12/281). [...] Na verdade, a prática de incluir todos os sócios
ou diretores de uma empresa em acusação criminal relacionada ao desempenho dessa empresa
é mais que uma ilegalidade: é um equívoco que desserve a própria Justiça Criminal, e é equívoco
de muitas faces”.

GUSTAVO BADARÓ (Processo Penal, São Paulo: RT. 2020). “Nos crimes societários tem-se admitido
que a denúncia não individualize a conduta de cada um dos envolvidos, ficando tal tarefa
reservada à sentença, conforme as provas que forem produzidas na instrução processual. Tal
posicionamento não é correta por confundir a finalidade da imputação penal e a da instrução.
Na denúncia deve haver um conteúdo narrativo, com a atribuição concreta de um fato para
delimitar o objeto do processo, e, consequentemente, a defesa do acusado. A partir dessa
narrativa, a atividade instrutória tem por escopo verificar, a partir dos meios de prova
produzidos, se os fatos imputados são verdadeiros ou não. Prova-se ou não, o que foi imputado.
Ao se admitir que, nos crimes societários, a denúncia não precisa trazer a narrativa completa da
conduta de cada um dos coautores ou partícipe, pois isto poderá ser suprido na instrução, está
se considerando, erroneamente, que prova pode suprir ausência de narração. A prova se destina
a demonstra se uma afirmação fática corresponde ou não a realidade. A prova pressupõe a
narrativa, não podendo, jamais, ser seu sucedâneo”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016): “Questão
interessante diz respeito à chamada denúncia genérica. Havendo concurso de infratores, deve
ser destacada a quota de participação de cada um na infração penal. O grau de contribuição e

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como ela se deu são essenciais para se precisar o que está sendo imputado ao réu, e em que
circunstâncias, garantindo-se o exercício da ampla defesa. O STF, todavia, já se manifestou no
sentido de que nos crimes de autoria coletiva, notadamente nos societários e multitudinários
(sob influência de multidão), seria possível a imputação genérica, sem especificar exatamente a
conduta de cada agente para o deslinde da infração penal, se até aquele momento não se
conseguiu apurar tais circunstâncias. A expectativa é que durante a instrução processual tais
elementos possam ser colhidos, de sorte a não se inviabilizar o processamento de todos os
infratores, principalmente em circunstâncias complexas onde não fica claro, com os elementos
colhidos no inquérito, o nível de envolvimento de cada criminoso. A nosso sentir, denúncia
genérica afronta o princípio constitucional da ampla defesa, afinal, a falta de especificação dos
fatos é de prejuízo evidente à atuação defensiva, pois o réu se defende dos fatos, e se estes não
estiverem especificados, a insegurança quanto ao posicionamento frente ao processo é gritante.
A questão está longe de ser pacífica, havendo posições divergentes dentro do STF e do STJ apesar
de sensivelmente ter prevalecido a admissibilidade da denúncia genérica”.

EUGENIO PACELLI & DOUGLAS FISCHER (Comentários ao código de processo penal e sua jurisprudência,
13ª ed., São Paulo: Atlas, 2021). “Denúncia genérica e denúncia geral: Temos sustentado em
doutrina (PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2021, item 5.10.2)
a necessidade de se fazer uma distinção entre dois modelos diferentes de exposição dos fatos
criminosos. Em um deles, a denúncia ou queixa imputa a todos os réus, sem divergência quanto
aos respectivos comportamentos, a realização dos mesmos atos. Em tais situações, e ainda que,
no plano lógico, se possa supor a impossibilidade fática da realização das mesmas ações por
todos os denunciados ou querelados, não se pode falar em inépcia da peça acusatória, na medida
em que o suposto equívoco na acusação não teria prejudicado a articulação da defesa, já que
todos estariam habilitados a compreender a imputação e, assim, a se defender dela. Nessa
hipótese, o que poderá ocorrer é a absolvição de alguns réus e a eventual condenação de outros,
se comprovado que não realizaram eles os mesmos atos. Assim, em um crime de homicídio, por
exemplo, se a peça de acusação não diferenciar o comportamento do partícipe, em quaisquer de
suas modalidades (que pode ser por determinação, por instigação e por quaisquer das demais
classificações doutrinárias), deverá ele ser absolvido, precisamente por não ter realizado os atos
de execução do crime. Deveria a denúncia ou queixa esclarecer que a atuação do partícipe seria
outra. Denominamos semelhante modelo de denúncia ou queixa de denúncia (ou queixa) geral,
caracterizada pela centralização dos fatos em todos os réus. Outra solução se deve dar à
acusação genérica, por meio da qual, dada à pluralidade e/ou complexidade dos atos imputados,
não se possa atribuir com clareza a individualização dos comportamentos dos réus,
comprometendo-se, por isso mesmo, a amplitude da defesa. Se a peça acusatória, cuidando, por
exemplo, de crimes financeiros, não distingue, dentre vários comportamentos, quais seriam os
atos imputados como de gestão, bem como não identifica quais seriam, especificamente, os
responsáveis por eles, não só a instrução criminal terá significativos obstáculos, como também a
própria defesa de cada acusado, se e na medida em que cada um deles exerça funções diferentes
na cadeia de condutas e na organização do empreendimento delituoso. De maneira geral, tais
problemas ocorrem nas hipóteses de pluralidade de ações e de réus, bem como naquelas em que
a imputação recai sobre tipos penais de conduta complexa, seja no que se refere à distribuição
de atuações no fato criminoso, seja no que diz com a estrutura organizacional dos envolvidos e
responsabilizados”.

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Imputação alternativa.

FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (Processo penal, vol. 1, 32ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010):
“Tem-se admitido, também, a denúncia alternativa. Assim, quando o Promotor de Justiça, em
face das provas colhidas no inquérito, tem dúvida, entre duas condutas, sobre qual deva ser
imputada, diz-se, pode ele atribuir ambas ao réu. Por exemplo, na dúvida quanto a ter havido
receptação dolosa ou culposa. Há, por outro lado, entendimento contrário. As Mesas de Processo
Penal, realizadas na Faculdade do Largo de São Francisco, sob a coordenação da Profª Ada
Pellegrini Grinover e integradas por Professores, Juizes e membros do Ministério Público,
deixaram assentado na Súmula 1 que ‘a acusação deve ser determinada, pois a proposta a ser
demonstrada há de ser concreta Não se deve admitir denúncia alternativa, principalmente
quando haja incompatibilidade lógica entre os fatos imputados’”.

GUSTAVO BADARÓ (Processo Penal, São Paulo: RT. 2020). “Considera-se alternativa a denúncia em
que há a imputação de mais de um crime ao acusado, para que este venha a ser condenado
apenas por um deles. Em outras palavras, sem saber efetivamente qual o crime praticado pelo
investigado, mas estando convicto de que ele cometeu algum delito, o Ministério Público o
denuncia pela prática de um ou outro delito (por exemplo, furto ou receptação), para que ao
final o acusado seja condenado por apenas um desses crimes, de acordo com o que ficar provado
na instrução criminal. A possibilidade de oferecimento de denúncia alternativa deve ser rejeitada
na medida em que, além de dificultar sobremaneira a defesa, representa uma clara hipótese de
falta de justa causa para a ação penal. Se, para o oferecimento é necessário, além dos indícios de
autoria, que haja prova da materialidade delitiva, entendida essa expressão como certeza da
ocorrência de um crime, não há como existir, simultaneamente, justa causa em relação a dois
delitos excludente entre si. Na medida em que aumentam os elementos que apontam para a
ocorrência de um dos crimes (por exemplo, o furto), na mesma medida e intensidade, diminuem
os elementos que indicam a ocorrência do outro delito, alternativamente imputado (por
exemplo, a receptação). Ou se tem certeza de um, ou do outro. Nunca, porém, dos dois
simultaneamente. E, sem justa causa, a hipótese não deve ser o oferecimento de uma denúncia
alternativa, mas o aprofundamento das investigações preliminares para que se obtenham
elementos de informação que seguramente indiquem qual o crime efetivamente ocorrido”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018), acerca da discussão
doutrinária sobre a possibilidade ou não de admissão da denominada denúncia alternativa,
pondera: “Discute-se na doutrina a possibilidade de ser oferecida denúncia alternativa, que é
aquela que atribui ao réu mais de uma conduta penalmente relevante de forma alternada, de
modo que, se uma delas não ficar comprovada, o réu poderá ser condenado subsidiariamente
pela outra. [...] Desse modo, o acolhimento de uma imputação implicará a rejeição da outra e
vice-versa, abrindo-se um rol de alternativas para o magistrado, com a observação de que a coisa
julgada se estenderá sobre todos os delitos imputados alternativamente, sendo impossível novo
processo pelo delito no qual operou-se a absolvição. Há duas posições a respeito: (i) Para
Grinover, Scarance e Magalhães, a denúncia alternativa não pode ser aceita, pois torna a
acusação incerta, dificultando muito, e às vezes até inviabilizando, o exercício da defesa. Nesse
mesmo sentido posicionam-se a Súmula 1 das Mesas de Processo Penal da USP e a jurisprudência
mais recente (RT, 610/429). (ii) Em sentido contrário, Afrânio Silva Jardim e STJ, 5ª T., REsp
399.858/SP, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 25-2-2003, DJ, 24 mar. 2003”. Sobre a opinião

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própria do autor sobre o tema, assevera: “(...) correta a primeira posição, pois para que se realize
a ampla defesa não se concebe uma pluralidade de acusações alternativas, alternativas,
impossibilitando o réu de saber do que está sendo acusado”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “A
denúncia (ou queixa) alternativa consubstancia-se na peça acusatória em que se atribui mais de
uma conduta criminosa provável ao mesmo agente, mas apenas uma delas foi efetivamente
realizada, como, por exemplo, a denúncia que imputa ao acusado o delito de furto ou de
receptação, em virtude do quadro probatório não se apresentar claro quanto à configuração de
um ou de outro delito. Essa medida, segundo a corrente a que nos filiamos, atinge
diametralmente o princípio da ampla defesa, obrigando o acusado a apresentar argumentos
defensivos em vários sentidos, sem saber, no entanto, efetivamente contra qual conduta será
ele perseguido penalmente. [...] Contudo, força é convir que, em situações excepcionais que não
importem “incompatibilidade lógica” entre as condutas imputadas alternativamente, o rigor do
posicionamento deve ser atenuado em face da impossibilidade de uma imputação estrita e
precisa. Outros autores entendem contrariamente ao exposto, admitindo que a imputação
alternativa, não vedada pelo Código de Processo Penal, torna apenas mais complexa a defesa do
acusado, não a suprimindo. Ademais, segundo essa vertente doutrinária, os fatos imputados ao
réu são certos e determinados, o que possibilita o exercício da ampla defesa e, sobretudo, atende
ao princípio da correlação. É pacífica, porém, a impossibilidade de condenação alternativa”.

Jurisprudência pertinente

Supremo Tribunal Federal

[...] Inépcia da denúncia. Admissibilidade. Imputação derivada da mera condição de o paciente


ser diretor-presidente das empresas. Ausência de descrição mínima dos fatos. Denúncia que
individualizou as condutas de corréus. Possibilidade de diferenciação de responsabilidades dos
dirigentes da pessoa jurídica. Teoria do domínio do fato. Invocação na denúncia.
Admissibilidade. Exigência, contudo, da descrição de indícios convergentes no sentido de que
o paciente não somente teria conhecimento da prática do crime como também teria dirigido
finalisticamente a atividade dos demais agentes. [...] Não se olvida que, conforme tem decidido
o Supremo Tribunal Federal, “não [é] inepta a denúncia que contém descrição mínima dos fatos
imputados aos acusados, principalmente considerando tratar-se de crime imputado a
administradores de sociedade, não exigindo a doutrina ou a jurisprudência descrição
pormenorizada da conduta de proprietário e administrador da empresa, devendo a
responsabilidade individual de cada um deles ser apurada no curso da instrução criminal” (HC
nº 101.286/MG, Primeira Turma, de minha relatoria, DJe de 25/8/11). [...] Todavia, a
inexigibilidade de individualização, na denúncia, das condutas dos dirigentes da pessoa jurídica
pressupõe a indiferenciação das responsabilidades, no estatuto, dos membros do conselho de
administração ou dos diretores da companhia, ou, se tratando de sociedade por quotas de
responsabilidade limitada, de seus sócios ou gerentes. Precedentes. [...] Quando for viável a
diferenciação de responsabilidades, a denúncia não poderá lastrear a imputação
genericamente na condição de dirigente ou sócio da empresa. [...] Na espécie, a denúncia, ao
atribuir fatos específicos ao diretor financeiro das empresas e a seu subordinado, individualizou
condutas, razão por que não poderia se limitar a imputar o concurso do seu diretor-presidente

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para o crime de evasão de divisas em razão tão somente de seu suposto poder de mando e
decisão, sem indicar qual teria sido sua contribuição concreta para tanto. [...] A teoria do domínio
do fato poderia validamente lastrear a imputação contra o paciente, desde que a denúncia
apontasse indícios convergentes no sentido de que ele não somente teve conhecimento da
prática do crime de evasão de divisas como também dirigiu finalisticamente a atividade dos
demais acusados. [...] Não basta invocar que o paciente se encontrava numa posição
hierarquicamente superior para se presumir que tenha ele dominado toda a realização
delituosa, com plenos poderes para decidir sobre a prática do crime de evasão de divisas, sua
interrupção e suas circunstâncias, máxime considerando-se que a estrutura das empresas da
qual era diretor-presidente contava com uma diretoria financeira no âmbito da qual se
realizaram as operações ora incriminadas. [...] Exigível, portanto, que a denúncia descrevesse
atos concretamente imputáveis ao paciente, constitutivos da plataforma indiciária mínima
reveladora de sua contribuição dolosa para o crime. [...] A denúncia contra o paciente,
essencialmente, se lastreia na assertiva de que “não [seria] crível que lhe passassem
despercebidas negociações tão vultosas [aproximadamente cinco milhões de dólares], que
montavam a cerca de 1% de todo o capital social do grupo”. [...] Nesse ponto, a insuficiência
narrativa da denúncia é manifesta, por se amparar numa mera conjectura, numa criação mental
da acusação, o que não se admite. Precedente. [...] A deficiência na narrativa da denúncia, no
que tange ao paciente, inviabilizou a compreensão da acusação e, consequentemente, o
escorreito exercício da ampla defesa. [...] (HC 127397, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda
Turma, julgado em 06/12/2016)

Este Supremo Tribunal Federal sufraga o entendimento no sentido de que nos crimes
societários, é prescindível que conste da denúncia a descrição minuciosa de cada acusado,
mostrando-se consentâneo com os postulados do contraditório e da ampla defesa que se
exponha o vínculo dos acusados com a sociedade comercial e que se narre as condutas
delituosas de forma a possibilitar o exercício do direito de defesa. [...] (HC 149328 AgR,
Relator(a): Min. LUIZ FUX, 1ª Turma, j. em 01/12/2017)

Superior Tribunal de Justiça

[...] HOMICÍDIO CULPOSO E LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO. ARTS. 302 E
303 DO CTB. INÉPCIA DA DENÚNCIA. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO DA CONDUTA
QUE OCASIONOU O RESULTADO. 1. A denúncia é inepta, pois não descreveu qual a conduta
praticada pelo paciente, que decorreria de negligência, imprudência ou perícia, a qual teria
ocasionado a produção do resultado naturalístico. 2. O fato de o paciente ter perdido o
"controle da direção" e ter, em consequência, invadido a contramão, não é típico. A tipicidade,
se houvesse, estaria na causa da perda do controle do veículo. Essa, entretanto, não é
mencionada na peça acusatória. [...] (HC 188.023/ES, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR,
SEXTA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe 26/03/2012)

Somente é apta a iniciar a ação penal a denúncia que, atenta aos requisitos previstos no art.
41 do Código de Processo Penal, descreve os fatos criminosos atribuídos à denunciada com
todas as suas circunstâncias relevantes, de modo a permitir à imputada compreender os
termos da acusação e dela defender-se, sob o contraditório judicial. [...] Na hipótese dos autos,
a denúncia, de forma genérica, atribuiu à recorrente a prática do delito de falsidade ideológica,

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sem, no entanto, descrever em qual documento foi inserida declaração falsa ou o dolo
específico de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. [...] Sem a descrição, na
peça inicial, de elementos do tipo, a denúncia é formalmente inepta, por impossibilitar a
desembaraçada reação defensiva à acusação apresentada. [...] Na verdade, o que a denúncia
descreve é o uso de documento com prazo de validade vencida, o que é atípico. [...] (RHC
68.894/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 05/12/2017)

Em tema de idoneidade formal da imputação, há de seguir-se o disposto no art. 41 do CPP e,


em relação a crime de autoria coletiva ou societário, esta Corte Superior aceita por válida a
exordial que, apesar de não pormenorizar a conduta dos acusados, demonstra nexo entre suas
ações ou omissões relevantes e o evento criminoso, a fim de estabelecer a plausibilidade da
imputação e possibilitar a ampla defesa. [...] É sempre necessário correlacionar o crime com as
atividades dos acusados integrantes de pessoa jurídica - ainda que em decorrência de poderes
de gerência ou de administração, melhor delimitados no decorrer da instrução criminal -, pois
o mero exercício do cargo de diretor não constitui, por si só, fato ilícito, sob pena de admitir
odiosa responsabilidade penal objetiva. [...] Na espécie, a denúncia é inepta quanto aos
pacientes porque lhes atribui o crime de associação criminosa pela mera detenção de cargos
de diretoria em uma seguradora que possui escritórios em várias unidades federativas, sem
especificar eventuais atividades de gerência ou de administração que teriam sido exercidas
pelos réus em relação ao fato criminoso ou, mesmo, qual omissão denotaria a mencionada
anuência com o esquema fraudulento. [...] (HC 283.610/ES, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 19/12/2017)

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ tem mitigado a exigência de descrição


minuciosa da ação de cada agente nos crimes de autoria coletiva, desde que a denúncia não
seja demasiadamente genérica. Precedentes. [...] (RHC 90.428/PB, Rel. Ministro JOEL ILAN
PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 01/02/2018)

Embora seja prescindível, nos crimes de autoria coletiva, a descrição minuciosa e


individualizada da conduta de cada acusado, não se pode conceber que o órgão acusatório
deixe de estabelecer qualquer vínculo entre o denunciado e a empreitada criminosa a ele
imputada. [...] A ausência absoluta de elementos individualizados que apontem a relação entre
os fatos delituosos e a autoria ofende o princípio constitucional da ampla defesa, tornando,
assim, inepta a denúncia. [...] (PExtDe no HC 214.861/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA
TURMA, julgado em 19/04/2012, DJe 30/04/2012)

[...] CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. [...] INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE


INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. [...]
No caso, a imputação fática encontra-se insuficientemente delineada na denúncia, visto que
não é possível identificar, nos termos do que dispõe o artigo 41 do Código de Processo Penal,
qual a responsabilidade do paciente no fato, vale dizer, qual a conduta ilícita supostamente
por ele praticada que teria contribuído para a consecução do resultado danoso. [...] O simples
fato de o acusado ser sócio e administrador da empresa constante da denúncia não pode levar
a crer, necessariamente, que ele tivesse participação nos fatos delituosos, a ponto de se ter
dispensado ao menos uma sinalização de sua conduta, ainda que breve, sob pena de restar
configurada a repudiada responsabilidade criminal objetiva. [...] Não se pode admitir que a

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narrativa criminosa seja resumida à simples condição de acionista, sócio, ou representante


legal de uma pessoa jurídica ligada a eventual prática criminosa. Vale dizer, admitir a chamada
denúncia genérica nos crimes societários e de autoria coletiva não implica aceitar que a
acusação deixe de correlacionar, com o mínimo de concretude, os fatos considerados
delituosos com a atividade do acusado. [...] (HC 224.728/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 27/06/2014)

[...] CRIME AMBIENTAL. ART. 60 DA LEI N. 9.605/1998. NORMA PENAL EM BRANCO. ACUSAÇÃO
QUE NÃO INDICA A LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR ALEGADAMENTE DESCUMPRIDA. INÉPCIA
DE DENÚNCIA. [...] O art. 60 da Lei n. 9.605/1998 é norma penal incriminadora em branco, visto
que a configuração de seu preceito primário pressupõe o descumprimento de outro ato
normativo (complementar) que regulamente as atividades potencialmente poluentes a que tal
dispositivo se refere. [...] Na espécie, a denúncia não atende o disposto no art. 41 do Código de
Processo Penal, pois não descreve, por completo, a conduta delitiva, já que apenas afirma
genericamente que houve o funcionamento de atividade potencialmente poluidora sem
autorização, qual seja, a queimada de plantio de cana-de-açúcar, deixando de mencionar a
legislação complementar a que se refere a aludida obrigação de natureza administrativa e
ambiental, o que, quando menos, dificulta a compreensão da acusação e, por conseguinte, o
exercício do direito de defesa. [...] (RHC 64.430/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA
TURMA, j. em 19/11/2015)

ADITAMENTO À DENÚNCIA
Segundo o dicionário AURÉLIO, aditar significa acrescentar, ajuntar-se. É palavra derivada do latim additu,
particípio passado de addere, consistindo no ato de “acrescentar, adir, adicionar, juntar algo que falta a
alguma coisa” (Pacelli, et al., 2018).

No que concerne ao processo penal, em relação à denúncia (ou queixa), aditar significa acrescentar algo à
imputação, algo que pode ser relativo aos fatos e/ou a pessoas.

A possibilidade de aditamento da peça acusatória deriva da premissa de que o réu se defende dos fatos que
lhe são imputados e não da capitulação dada a eles. Deste modo, a acusação deve ser específica, garantindo-
lhe os elementos necessários para exercer a sua defesa (de forma ampla).

O fundamento do aditamento no processo penal é a necessidade que se tem de se fazer uma


imputação clara e precisa ao acusado, possibilitando-lhe o exercício pleno e amplo de defesa,
porém sem descuidar, também, da necessidade de se proteger a sociedade, pois, na medida em
que o fato não está bem individualizado, ou todos os sujeitos não estão na relação processual,
há, ainda, uma dívida do acusado ou autor do fato para com seus pares (Rangel, 2018).

Além disso, durante a instrução podem surgir elementos que demonstrem a ocorrência de outros crimes e,
também, da participação de outros agentes. Esses elementos devem ser integrados na peça inicial,
compondo-a, a fim de que tudo o que efetivamente ocorreu – ou pelo menos o mais próximo -, esteja
previsto na exordial. Isso é importante inclusive para efeito de formação da coisa julgada.

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A denúncia nada mais é do que a peça que retrata, através da exposição do Ministério Público, o que de fato
ocorreu e qual a participação do(s) denunciado(s), de acordo com os elementos colhidos no inquérito policial.
Mesmo com as diligências investigativas da fase de inquérito, existem informações e detalhes que podem
ser revelados apenas na fase judicial, quando da instrução probatória. Aliás, lembremos que a investigação
não tem por fim elucidar o fato por completo; apenas naquilo que for suficiente para embasar a acusação.
Não se poderia admitir que, uma vez oferecida da denúncia, esta não pudesse ser modificada. Estar-se-ia,
em alguns casos, prejudicando o próprio réu e, em outros, a sociedade.

Havendo, na denúncia dada, omissão do nome de mais alguém, que se ache implicado no crime,
ou de fato criminoso, atribuído ao indiciado, que não tenha sido mencionado nela, far-se-á um
aditamento à denúncia, para que se inclua o indicado omitido ou para que se complete e efetive
a narração do que se olvidou na primitiva ou denúncia original. É, assim, consoante expressa o
próprio substantivo, o acréscimo do nome omitido ou do fato não mencionado anteriormente
na denúncia dada. O aditamento somente é permitido, nos crimes ou delitos, em que há
pronúncia, antes desta. E nos crimes ou delitos, em que ela não ocorre, antes do julgamento. O
aditamento da denúncia exige que sejam ouvidas novamente as testemunhas arroladas, que já
tenham prestado seus depoimentos, sobre os novos fatos arguidos ou sobre a inclusão do novo
culpado, sob pena de nulidade do processo, avocada pelos réus, em face do justo motivo de
cerceamento de defesa, que decorre desta omissão (Silva, 2005).

Não há se olvidar o princípio da busca da verdade que rege a atividade jurisdicional dentro do processo penal.
A dificuldade de se chegar à verdade dos fatos é evidente, entretanto, dentro das provas que se produziram
e de tudo o que se revelou, cabe ao Ministério Público trazer na inaugural a versão mais completa e real
possível.

Além disso, o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública – já explanado -, impede o Ministério
Público de se omitir quando do conhecimento dos crimes e, via de regra, também de detalhes destes.

Por fim, a sentença deve ser correlata à acusação (princípio da correlação entre acusação e sentença), de
modo que não poderá o magistrado condenar o réu pela prática de fatos que não tiverem sido objeto da
denúncia. Eis, patente, a necessidade do aditamento.

A regra da correlação entre o fato imputado e o fato constante na sentença implica que o objeto
do processo permaneça inalterado, durante todo o desenvolvimento do iter procedimental. Não
pode haver alteração do objeto do processo, considerado em seus momentos extremos. Desde
o momento inicial, com a acusação, até seu término, com a sentença, o objeto do processo não
pode, em regra, sofrer alterações. O objeto do processo, veiculado já no momento inicial, com a
acusação, deve estar presente de forma inalterada na sentença. Porém, se no curso do processo
a instrução revelar a existência de fatos diversos, que alterem o objeto do processo, para que
tais fatos possam ser considerados pelo juiz, é necessário respeitar determinadas regras que
visam a evitar surpresas para a defesa, assegurar o respeito ao princípio do contraditório e, até
mesmo, evitar que o juiz venha a julgar, quebrando o princípio da inércia da jurisdição. Isso não
quer dizer que todo o objeto do processo deve permanecer imutável. Identificado o objeto do
processo como o objeto da imputação, não significa que todo o fato imputado deva permanecer
inalterado, ou que o juiz não possa sentenciar, ainda que considerando algo diverso do que foi
imputado. A questão é saber em que medida é possível alterar o objeto do processo, sem que tal

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mudança viole o contraditório. É possível admitir mudanças no objeto do processo, sem que isso
represente uma quebra da regra da correlação entre acusação e sentença, desde que a variação
se verifique em um aspecto não relevante do fato imputado. E é o perímetro dentro do qual se
desenvolveu o contraditório que determinará a relevância ou irrelevância de tal alteração
(Badaró, 2020).

O aditamento é classificado pela doutrina em próprio, impróprio, espontâneo ou provocado, conforme se


detalhará a seguir.
Real = fatos
Próprio
Pessoal = sujeitos

Retificação

Ratificação
Aditamento Impróprio
Suprimento

Esclarecimento

Espontâneo
Quanto à
oportunidade
Provocado

1 - ADITAMENTO PRÓPRIO E IMPRÓPRIO


O aditamento próprio é aquele em que, efetivamente, se acrescentam elementos novos à denúncia.
Elementos estes que não estavam presentes quando do oferecimento da peça.

O artigo 569 do CPP assim prevê:

Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das
contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a
todo o tempo, antes da sentença final.

Diz-se que o aditamento próprio é real (objetivo) quando o acréscimo se referir aos fatos, ou seja, quando
acrescentar um novo crime, alguma qualificadora, causa de aumento ou agravante. Por sua vez, chama-se
de pessoal (subjetivo) quando se trata da inclusão de um novo denunciado, seja na condição de coautor ou
partícipe.

RENATO BRASILEIRO DE LIMA assim classifica o aditamento próprio:

No aditamento próprio, ocorre o acréscimo de fatos não contidos, inicialmente, na peça


acusatória, ou de sujeitos que, apesar de terem concorrido para a prática delituosa, não foram

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incluídos no polo passivo da denúncia ou queixa, já que, quando de seu oferecimento, não havia
elementos de informação quanto ao seu envolvimento. Diante do princípio da obrigatoriedade
da ação penal pública, e seu consectário lógico da indisponibilidade (CPP, art. 42), o aditamento
só pode ser feito para fim de acrescer imputação ou alguém ao polo passivo da demanda, não
sendo possível, pois, que seja utilizado para retirar imputação ou corréu do polo passivo. O
aditamento próprio subdivide-se em: a) próprio real: quando disser respeito a fatos delituosos,
aí incluídos novos fatos delituosos, qualificadoras ou causas de aumento de pena. Este, por sua
vez, comporta as subespécies real material e real legal: a.1) aditamento próprio real material: é
aquele que acrescenta fato à denúncia, qualificando ou agravando o já imputado, com a adição
de circunstância não contida na inicial, ou mesmo fato novo que importa imputação de outro ou
mais de um crime; a.2) aditamento próprio real legal: é o que se refere ao acréscimo de
dispositivos legais, penais ou processuais (substantivo ou adjetivo), alterando, assim, a
classificação ou o rito processual, mas sem inovar no fato narrado. b) próprio pessoal: quando
disser respeito à inclusão de coautores ou partícipes (Lima, 2021).

O exemplo a seguir, também citado pelo autor acima mencionado, demonstra as espécies faladas.

Exemplificando, suponha-se que o Ministério Público ofereça denúncia em face de Tício pela
suposta prática de crime de furto. No curso do processo penal, surgem elementos probatórios
quanto ao envolvimento de Mévio na receptação da coisa alheia móvel. Nessa hipótese, pode o
Promotor aditar a peça acusatória para incluir Mévio, imputando-lhe o delito de receptação, o
que caracterizaria hipótese de aditamento próprio real, porquanto houve o acréscimo de outro
fato delituoso (no caso, receptação), e próprio pessoal, já que houve a inclusão de outro acusado
no polo passivo da demanda (Lima, 2021).

Segundo bem delimita PAULO RANGEL, o aditamento é impróprio quando não se acrescenta nada novo, mas
se busca a correção de alguma falha da denúncia ou a ratificação de atos, a última como no caso de
declaração de incompetência (art. 108, § 1º, CPP).

A segunda hipótese (aditamento impróprio) ocorre quando, embora não se acrescente um fato
novo ou um sujeito, tenta-se corrigir alguma falha na denúncia, como, por exemplo, a
qualificação completa do acusado, esclarecendo seus dados ou suprindo elementos
circunstanciais da denúncia, como o dia preciso do fato ou, ainda, retificando dados inerentes ao
lugar da consumação do delito, sem que, nesse caso, altere a competência do foro. Há casos em
que se declara a incompetência do juízo e os atos praticados pelo juiz incompetente e pelo
promotor de justiça sem atribuição devem ser ratificados perante o juiz e o promotor natural da
causa. Nessa hipótese, surge o aditamento impróprio de ratificação (Rangel, 2018).

XXV Concurso para Ministério Público/RJ (2002). O Procurador da República responsável por processo
envolvendo tráfico de entorpecentes, verificando, já em fase de vista de designação para audiência de
instrução e julgamento, que não se tratava de tráfico internacional, opinou pela incompetência do
Juízo. Vindo o feito para a Justiça Estadual, o Juiz, após designar data para audiência de instrução e
julgamento, com base no art. 567 do CPP, deu vista ao órgão do Ministério Público. Qual deve ser a
manifestação do Promotor?

Resposta.

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Trata-se de aditamento impróprio de retificação em face da incompetência absoluta do juízo. Nesse


caso, o Promotor de Justiça deve fazer um aditamento impróprio de retificação para adequar a petição
inicial penal ao novo trâmite processual. Os fatos narrados originariamente não expressam a verdade,
qual seja: não se trata de mercancia internacional e sim estadual, razão pela qual deve ser retificada
(corrigida) pelo Promotor de Justiça. Nesse aditamento não há acréscimo de fatos, propriamente dito,
mas apenas correção da narrativa fática feita anteriormente. Há um entendimento doutrinário no
sentido de que deve ser oferecida nova denúncia pelo Promotor de Justiça, por se tratar de
incompetência absoluta, estando completamente viciada a que foi oferecida pelo Procurador da
República e também, consequentemente, a decisão judicial que a recebeu, pois a Constituição Federal,
ao adotar os princípios do Promotor e do Juiz natural (art. 5º, LIII), não permite a aplicação do art. 567
do CPP aos casos de competência absoluta e sim somente relativa (ratione loci). Nesse caso, sendo
nulo ou inexistente, juridicamente, o processo ab initio, deve ser feita nova denúncia e repetidos todos
os atos processuais. Tal entendimento sustenta que o art. 567 do CPP somente será aplicado aos casos
de competência ratione loci ou de outras formas de competência definidas ou fixadas por lei
infraconstitucional e não quando se tratar de competência constitucional. Nossa posição: a primeira.
A Constituição da República (art. 5º, LIII) não distinguiu entre competência relativa ou absoluta quando
adotou o princípio do Promotor e do Juiz natural, não sendo lícito ao intérprete distinguir. Desta forma,
o aditamento impróprio de retificação, com renovação dos atos processuais, é medida que se ajusta
ao caso concreto. (Rangel, 2018)

2 - ADITAMENTO ESPONTÂNEO OU PROVOCADO


De acordo com a oportunidade ou, como chamam alguns autores, a voluntariedade, o aditamento pode ser
espontâneo ou provocado.

O princípio da obrigatoriedade (art. 28, CPP) ‘exige’ do Ministério Público a iniciativa em promover o
aditamento da denúncia quando conhecidos novos elementos que deveriam tê-la integrado, mas, pela
extemporaneidade da descoberta, não fizeram parte da acusação. É nesse sentido que a doutrina classifica
o aditamento como espontâneo pois, diante da obrigatoriedade, não há necessidade de provocação do juiz,
a iniciativa de aditar deve partir do Ministério Público.

O artigo 384 do CPP, antes das mudanças da Lei nº 11.719/2008, previa que o juiz baixaria o processo para
o Ministério Público aditar a denúncia, em uma espécie de ‘provocação’ ao órgão acusatório; entretanto,
após a alteração da referida lei, a nova redação do 384 afastou essa ‘atribuição’ do juiz, prevendo que:

Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato,
em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal
não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de
5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública,
reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

O princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, impulsionando o aditamento à denúncia,


faz com que a regra seja o aditamento espontâneo e a exceção FOSSE o provocado. A reforma
processual penal feita pela Lei no 11.719/2008 retirou do art. 384 a expressão o juiz baixará o
processo, a fim de que o Ministério Público possa aditar a denúncia. O legislador, ciente da

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estrutura acusatória do processo penal, não mais faz com que o juiz provoque o MP ao
aditamento. O próprio órgão do MP, em nome do princípio da obrigatoriedade, adita, se
entender que deve, a denúncia (Rangel, 2018).

Por sua vez, o aditamento provocado se personifica no ato do juiz que, verificando a necessidade de se
acrescentar algo na denúncia – sem que o Ministério Público tenha tomado a iniciativa –, o ‘provoca’ a fazê-
lo. Encontra-se disciplinado, dentre outros, no § 1º do artigo 384 do CPP (mutatio libelli), quando o juiz, na
função de ‘fiscal’ do princípio da obrigatoriedade, constatando que não houve o aditamento espontâneo,
aplica a disposição do artigo 28 do CPP, fazendo remessa dos autos ao Procurador-Geral a fim de que, se for
o caso, se promova o aditamento.

Vislumbra-se, ainda, esta espécie de aditamento em outros dispositivos do CPP, como no art. 417 que prevê:

Art. 417. Se houver indícios de autoria ou de participação de outras pessoas não incluídas na
acusação, o juiz, ao pronunciar ou impronunciar o acusado, determinará o retorno dos autos ao
Ministério Público, por 15 (quinze) dias, aplicável, no que couber, o art. 80 deste Código.

Ainda, com relação ao entendimento de parte da doutrina, assim expõe RENATO BRASILEIRO:

Há quem entenda que o art. 419 do CPP também contempla hipótese de aditamento provocado,
porém de natureza imprópria. De acordo com tal dispositivo, que se refere à desclassificação na
primeira fase do procedimento escalonado do júri, quando o juiz se convencer, em discordância
com a acusação, da existência de crime não doloso contra a vida, e não for competente para o
julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. Segundo POLLASTRI a aplicação desse dispositivo
importará verdadeira provocação indireta por parte do juiz, através de decisão desclassificatória
em processos que foram originalmente de competência do Tribunal do Júri. Segundo o autor,
‘não podem, tanto o juiz que operou a desclassificação, quanto o juiz que se tornou competente,
classificar o novo delito a ser imputado, senão em tese ou genericamente na decisão
desclassificatória, devendo ser, assim, oferecido aditamento pelo parquet, que importará
verdadeira retificação, aduzindo novos fatos ou modificando o especial fim de agir, sendo que,
em regra, será imputado delito menos grave em vista da desclassificação operada’ (Lima, 2021).

Para PAULO RANGEL, por sua vez, o aditamento provocado teria sido revogado do CPP, não mais existindo no
art. 417 (reforma da Lei nº 11.689/2008) e nem no art. 384 (reforma da Lei nº 11.719/2008), sendo, inclusive,
inconstitucional. Eis, nesse sentido, o que pensa referido autor:

Destarte, o aditamento provocado foi revogado do CPP: não mais existe no art. 417 (com a
reforma da Lei no 11.689/2008) e nem no art. 384 (com a reforma da Lei no 11.719/2008).
Sempre entendemos, em edições anteriores, que diante do sistema acusatório, que tem como
um dos seus objetivos manter a imparcialidade do órgão jurisdicional, não devia mais o juiz
provocar o Ministério Público para aditar a denúncia, mantendo assim sua postura de sujeito
processual imparcial. O Promotor de Justiça, em face do princípio da obrigatoriedade da ação
penal pública, é quem tem o dever de aditar a denúncia independentemente de manifestação
judicial. Portanto, o aditamento quanto à oportunidade, que chamamos de provocado, nunca
encontrou amparo frente à Constituição da República sendo, consequentemente,
inconstitucional. Para aqueles que não conseguem olhar ‘o processo penal como um direito

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constitucional aplicado’ (JORGE FIGUEIREDO DIAS) fica agora o texto da lei, de forma clara, que não
autoriza mais o juiz a proceder dessa forma. É bem verdade que vozes autorizadas vão dizer que
o aditamento provocado ainda persiste porque no art. 384, § 1º, se diz que, ‘não procedendo o
órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código’. Ora, por que o
legislador mandaria o juiz aplicar o art. 28 do CPP, se o órgão do MP não proceder ao aditamento?
A resposta açodada levaria o intérprete a pensar que o juiz mandou aditar e, como o MP não o
fez, aplicou o art. 28. Nada mais equivocado. A providência do § 1º do art. 384 é para quando o
MP, indicando os fundamentos jurídicos de seu pronunciamento processual (art. 43, III, da Lei no
8.625/1993) de não aditar a denúncia, sofrer o controle sobre o princípio da obrigatoriedade da
ação penal pública pelo juiz, isto é, assim como quando não oferece denúncia, arquivando o
inquérito policial, o juiz aplica o art. 28, também o fará quando não aditar, espontaneamente, a
denúncia, pois deverá fundamentar seu despacho, permitindo ao juiz concordar ou não com os
fundamentos. Portanto, não há mais o aditamento provocado, nem o § 1º do art. 384 pode dar
margem a esse entendimento. [...] O certo é que o Ministério Público, verificando a necessidade
de adequar a denúncia à realidade fática ocorrida, adite-a para incluir um fato novo ou um
sujeito, sem provocação do juiz, pois, pela obrigatoriedade da ação penal pública, assim deve
agir. Destarte, o aditamento provocado, que achávamos que era exceção, passa a não ter amparo
não só frente à Constituição, que é a principal fonte de nossa interpretação, porque adota o
sistema acusatório, mas também de acordo com o novo texto do art. 384 do CPP. Os juízes terão
que se manter em sua imparcialidade e deixar com que o MP exerça seu mister, nos limites do
art. 129, I, da CR (Rangel, 2018).

3 - RECEBIMENTO DO ADITAMENTO
Com o oferecimento do aditamento há nova análise pelo juiz acerca das condições da ação, justa causa,
competência, rito. Além disso, abre-se nova oportunidade para oferecimento de defesa prévia e indicação
de testemunhas, com realização de novo interrogatório, oportunizando o contraditório e garantindo a ampla
defesa. Perceba que é praticamente um procedimento que se repete ou se inicia, de maneira que, por vezes,
pode implicar em obstáculo ao rápido desfecho do processo.

4 - INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
O inciso I do artigo 117 do CP prevê que a decisão que recebe a denúncia é causa interruptiva da prescrição.
Com relação ao aditamento, surge a seguinte indagação: a decisão que recebe o aditamento interrompe a
prescrição?

Há consenso de que se o aditamento for próprio real a decisão que o recebe interrompe a prescrição,
porquanto, ao trazer fatos novos, assume a característica de ‘nova denúncia’, subjugando-se à intenção da
norma contida no inciso I do art. 117 já mencionado.

O mesmo não ocorre quando se tratar de aditamento próprio pessoal, porquanto o que ‘prescreve’ são os
fatos e não os sujeitos; deste modo, havendo a inclusão de coautor ou partícipe, sem que se existam fatos
novos, não há se falar em nova interrupção da prescrição.

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Todavia, na hipótese de aditamento próprio real, em que novo fato delituoso é incluído na
demanda, a interrupção da prescrição quanto a esse delito dar-se-á na data em que o aditamento
for recebido pela autoridade judiciária competente. Com efeito, se ao Ministério Público se
reserva a possibilidade de oferecer denúncia por este fato novo, e esta, uma vez recebida,
interromperia a prescrição, idêntico raciocínio há de ser aplicado ao recebimento do aditamento,
o qual também terá o condão de interromper a prescrição. De acordo com o STJ ‘não há que se
falar em prescrição da pretensão punitiva se não decorreu o lapso de tempo necessário entre a
data do proferimento da sentença e a data do aditamento da denúncia, que trouxe fatos novos
resultando em modificação na capitulação do delito imputado, inclusive com mudança no rito
procedimental, e determinou a inclusão de corréus’. Na hipótese de inclusão de coautor ou
partícipe (aditamento próprio pessoal), não há falar em interrupção da prescrição. Isso porque a
prescrição refere-se ao fato delituoso praticado pelo agente, e não ao agente que o praticou. Na
verdade, por força do próprio Código Penal, a interrupção da prescrição por ocasião do
recebimento da peça acusatória já produz efeitos relativamente a todos os autores do crime (CP,
art. 117, § 1º) (Lima, 2021).

5 - RECURSO CABÍVEL NO INDEFERIMENTO


Com relação ao recurso cabível em caso de decisão que indefere o aditamento, a doutrina é dividida. Alguns
autores entendem que caberia apelação, enquanto outros apontam o recurso em sentido estrito como a
modalidade correspondente.

Observe-se o entendimento de PAULO RANGEL, apontando a apelação como o recurso indicado:

Feito o aditamento à denúncia pelo Ministério Público, para incluir sujeito excluído ou fato novo,
pode ser que o juiz entenda infundado tal acréscimo e queira rejeitá-lo. Neste caso, entendemos
que o recurso cabível é apelação, pois o rol elencado no art. 581 do CPP é taxativo e não comporta
interpretação analógica nem extensiva. Assim, tendo o legislador estabelecido a apelação
supletiva ou subsidiária, o recurso cabível seria aquele previsto no art. 593, II, do CPP, pois claro
está que, quando não for cabível o recurso em sentido estrito e a decisão for interlocutória,
caberá a apelação. Ademais, se possível fosse a ampliação do rol do art. 581 do CPP, não haveria
necessidade do legislador estabelecer 24 hipóteses nos respectivos incisos (Pacelli, et al., 2018).

Em outro sentido, porém, é o entendimento de AURY LOPES JR.:

Por fim, quanto ao recurso que pode surgir dessas decisões relacionadas ao aditamento,
pensamos que: *não cabe recurso contra a decisão que recebe o aditamento, pois, como ocorre
na denúncia, a única via possível seria a do habeas corpus (que não é recurso); *se rejeitado o
aditamento, nos casos do art. 395, aplicado por analogia, caberá o recurso em sentido estrito.

Tanto o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 435256/CE, quanto o STF, no julgamento do RE
104659/PR, externaram posição que consagra o cabimento do recurso em sentido estrito, nos seguintes
termos:

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PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. ADITAMENTO À DENÚNCIA. REJEIÇÃO. RECURSO


EM SENTIDO ESTRITO. É cabível o recurso stricto sensu da decisão que indefere o aditamento
da denúncia. Inteligência do art. 581, I, CPP. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, Respe
435256/CE, 15/04/2003).

AÇÃO PENAL. ADITAMENTO A DENÚNCIA. REJEIÇÃO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CÓDIGO


DE PROCESSO PENAL, ART. 581, I. DO DESPACHO QUE REJEITA ADITAMENTO A DENÚNCIA CABE
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INTELIGÊNCIA DO ART. 581, I, DO CPP. NATUREZA DO
ADITAMENTO A DENÚNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO. (RE 104659,
Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Primeira Turma, julgado em 20/09/1985)

Crê-se, pelo entendimento externado pelos tribunais superiores e pela natureza do aditamento, que o
recurso mais apropriado, efetivamente, seja o recurso em sentido estrito.

Abaixo, questão do XII Concurso para o Ministério Público do Rio de Janeiro, trazida na obra já citada de
PAULO RANGEL, demonstrando a forma como o questionamento já foi colocado em pergunta discursiva. A
resposta da questão, trazida pelo autor, não será apresentada por ser divergente daquela predominante nos
tribunais superiores, conforme dito.

Fernando responde a uma ação penal por violação ao art. 155 do Código Penal, tendo o fato ocorrido
no dia 20.8.90, no Rio de Janeiro. Concluída a fase probatória, o Ministério Público requer o aditamento
da denúncia, por entender que a prova colhida, sob a vigilância do contraditório, evidencia a prática
do crime previsto no art. 157 do Código Penal, não descrito explícita ou implicitamente na denúncia.
O juiz, apreciando o requerimento da Promotoria de Justiça, indefere o aditamento pretendido,
alegando: a) que o art. 384, parágrafo único, do Código de Processo Penal, concedeu apenas ao juiz a
iniciativa daquela providência, antes da prolação da sentença; b) que, segundo pensa, a infração
praticada pelo imputado seria, em tese, do art. 155 do Código Penal. Pergunta-se: ciente da decisão,
como deve proceder o Ministério Público?

6 - ADITAMENTO DA QUEIXA-CRIME
Cabe, neste momento, trazer mais uma vez a disposição do artigo 569 do CPP:

Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das
contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a
todo o tempo, antes da sentença final.

Há se distinguir o ‘tipo’ de aditamento para se esclarecer sobre a possibilidade ou não de ser oferecido em
caso de queixa-crime, nesse sentido delimita BRASILEIRO:

Regra geral, eventuais omissões da queixa poderão ser supridas a todo tempo, desde que antes
da sentença, tal qual determina o art. 569 do CPP. Limita-se o referido dispositivo ao suprimento
de falhas quanto à correta descrição do fato ou da tipificação legal (aditamento impróprio), que
não conduzam a uma inovação na acusação. Esse aditamento impróprio da queixa-crime poderá
ser feito tanto pelo Ministério Público quanto pelo querelante. Raciocínio diferente será aplicável

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às hipóteses de aditamento próprio. De fato, quanto à possibilidade de aditamento para incluir


novos fatos delituosos, coautores e partícipes (aditamento próprio), há de se diferenciar aquele
feito pelo Ministério Público daquele feito pelo próprio querelante (Lima, 2021).

Vê-se que não há controvérsias quando se fala em aditamento impróprio, no qual se incluem apenas
elementos que não representem uma ‘inovação’ na acusação.

Entretanto, quando se fala em aditamento próprio, quando surge a necessidade de se acrescentarem


coautores, partícipes ou novos fatos, a questão deve ser desmembrada em relação ao Ministério Público
e/ou ao querelante.

O art. 45 do CPP estabelece que:

Art. 45. A queixa, ainda quando a ação penal for privativa do ofendido, poderá ser aditada pelo
Ministério Público, a quem caberá intervir em todos os termos subsequentes do processo.

A possibilidade de o Ministério Público aditar a queixa, porém, não é tão ampla quanto parece da leitura do
dispositivo. Há se fazer uma separação entre os tipos de ação penal privada.

Nesse sentido, BRASILEIRO delimita a questão:

Nas hipóteses de ação penal exclusivamente privada e privada personalíssima, como o


Ministério Público não é dotado de legitimatio ad causam, não tem legitimidade para incluir
coautores, partícipes e outros fatos delituosos de ação penal de iniciativa privada, podendo
aditar a queixa-crime apenas para incluir circunstâncias de tempo, de lugar, modus operandi, etc.
Admite-se, portanto, apenas o aditamento impróprio, cujo prazo é de 3 (três) dias, nos termos
do art. 46, § 2º, do CPP.

Na ação penal privada subsidiária da pública, como a ação penal, em sua origem, é de natureza
pública, conclui-se que o Ministério Público tem ampla legitimidade para proceder ao
aditamento, seja para incluir novos fatos delituosos, coautores e partícipes (aditamento próprio),
seja para acrescentar elementos acidentais como dados relativos ao local e ao momento em que
o crime foi praticado (CPP, art. 29), ou seja, aditamento impróprio. O próprio art. 384, caput, do
CPP, ao se referir à mutatio libelli, também admite o aditamento pelo Ministério Público na
hipótese de ação penal privada subsidiária da pública, ao dispor que o Parquet deverá aditar a
denúncia ou queixa, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação
pública Ora, somente pode haver queixa em ação penal pública quando caracterizada a inércia
do órgão do Ministério Público, ou seja, nos casos de ação penal privada subsidiária da pública
(Lima, 2021).

Ainda com relação ao aditamento da queixa-crime, assim se manifestam alguns autores.

AURY LOPES JR.:

O aditamento próprio real, para inclusão de fato novo, não pode ocorrer por absoluta ausência
de previsão legal. O aditamento na ação pública existe, essencialmente, para assegurar a eficácia

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do princípio da obrigatoriedade. Mas a ação penal de iniciativa privada é regida pelos princípios
da oportunidade e da conveniência, não havendo qualquer tipo de obrigação de acusar. Assim,
se o autor souber de fato novo no curso do processo, cuja ação penal seja igualmente de iniciativa
privada, deverá ajuizar nova queixa-crime em relação a esse fato (observado o prazo decadencial
nos termos do art. 38 do CPP), pagando as custas e instruindo com procuração que contenha os
poderes especiais exigidos pelo art. 44. Quanto ao aditamento próprio subjetivo, para inclusão
de coautor ou partícipe, deve-se ter muito cuidado com a incidência do princípio da
indivisibilidade (art. 48). Se havia elementos indicando a presença de coautores ou partícipes e
eles não foram incluídos na queixa, não há que se falar em aditamento, mas sim em extinção da
punibilidade para todos, diante da renúncia tácita (art. 49). Mas, quando não existirem
elementos probatórios prévios ao oferecimento da queixa, e somente no curso da instrução o
querelante tomar conhecimento dos demais autores ou partícipes, o caminho a ser tomado não
é o aditamento. Ele deverá formular nova queixa (sob pena de violar a indivisibilidade, arts. 48 e
49), pagando custas processuais e juntando procuração com poderes especiais (art. 44) dentro
do prazo de 6 meses (contados do dia em que vier a saber quem são os coautores do fato, art.
38). Essa nova queixa pode, por força da conexão ou continência (conforme o caso), ser reunida
com o processo que já está tramitando, para julgamento simultâneo. Essa reunião é feita
posteriormente. Pensamos que não é caso de simples aditamento diante da necessidade do
pagamento das custas, juntada de procuração e eventual possibilidade de conciliação (conforme
o rito) ou mesmo transação penal ou suspensão condicional, nos termos da Lei n. 9.099. Ademais,
como não há a incidência do princípio da obrigatoriedade, como se procederia no processo que
está em curso? Teria de ficar suspenso pelo prazo de 6 meses (prazo decadencial de que dispõe
a vítima para proceder contra o agressor) até que fosse feito ou não o aditamento? Pensamos
que não é esse o caminho. O processo originário continua e, se for oferecida a nova queixa antes
de proferida a sentença, reúnem-se os processos. Mas e se o querelante não oferecer essa nova
queixa, ocorre uma renúncia tácita? Sim, ocorre uma renúncia tácita. Nesse caso, a qualquer
momento deve ser extinta a punibilidade no processo originário, nos termos do art. 49 do CPP.
O único aditamento cabível na ação penal de iniciativa privada seria o impróprio. É a esse que
se refere o art. 45 do CPP, pois constitui uma flagrante ilegitimidade de parte permitir que o
MP adite a queixa para incluir fatos e/ ou pessoas. O aditamento impróprio nada mais é do que
uma mera correção material na descrição dos fatos, como datas, lugares, circunstâncias etc. Não
existe inclusão de fato novo, coautor ou partícipe. Mas, entre as falhas na queixa-crime (desde
que não conduzam à inépcia), está a falta de procuração com os poderes especiais ou que
contenha a menção ao fato criminoso (art. 44), conforme explicamos anteriormente. Nesse caso,
se a queixa foi recebida (pois deveria ter sido rejeitada), o suprimento dessa exigência deve ser
feito antes da sentença ser prolatada e, ainda, antes de decorrido o prazo decadencial de 6 meses
(contados da data do fato, art. 38 do CPP). Trata-se de grave defeito que compromete a validade
da queixa e da decisão que a recebeu, devendo ser sanada dentro do prazo decadencial de 6
meses, pois esse prazo somente é considerado cumprido quando a queixa é regular e válida
(Júnior, 2021).

Renato Marcão:

É discutida a possibilidade de aditamento da queixa pelo particular, especialmente para incluir


corréu, pois há quem entenda impossível tal proceder em razão da decadência que se opera por
força do disposto no art. 38 do CPP. Com efeito, se o corresponsável pelo delito já era conhecido

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ao tempo em que ofertada a queixa, a renúncia em relação a ele ou o simples escoamento do


prazo decadencial têm repercussões que já foram analisadas no capítulo anterior. Quer nos
parecer, entretanto, que, se as informações dando conta do envolvimento do corresponsável
pelo delito surgirem no curso da instrução processual, o aditamento se revelará cabível por força
do disposto no art. 569 (Marcão, 2017).

Fernando Capez:

O Ministério Público pode aditar a queixa para nela incluir circunstâncias que possam influir na
caracterização do crime e na sua classificação, ou ainda na fixação da pena (dia, hora, local,
meios, modos, motivos, dados pessoais do querelado etc.) (CPP, art. 45). Não poderá, entretanto,
aditar a queixa para imputar aos querelados novos crimes, ou para nela incluir outros ofensores,
além dos já existentes, pois desse modo estaria invadindo a legitimidade do ofendido, que optou
por não processar os demais. Nesse caso, opera-se a renúncia tácita do direito de queixa, com a
extinção da punibilidade dos que não foram processados (CP, art. 107, V, primeira parte), que se
estende a todos os querelados, por força do princípio da indivisibilidade da ação penal (não quis
processar um, não pode processar ninguém) (CPP, art. 49), desde que a exclusão de um ou de
alguns dos ofensores tenha sido feita injustificadamente. Na hipótese de não ser conhecida a
identidade do coautor ou partícipe do crime de ação penal privada, não será possível,
evidentemente, a sua inclusão na queixa. Nesse caso não se trata de renúncia tácita, com a
consequente extinção da punibilidade de todos os demandados, porque a omissão não decorreu
da vontade do querelante. Tão logo se obtenham os dados identificadores necessários, o
ofendido deverá promover o aditamento ou, então, conforme a fase do processo, apresentar
outra queixa contra o indigitado, sob pena de, agora sim, incorrer em renúncia tácita extensiva a
todos. Omitindo-se, se o processo estiver em andamento, o juiz ou tribunal imediatamente
julgará extinta a punibilidade dos querelados, nos termos do art. 107, V, primeira parte, do CP
(CPP, art. 61, caput); se já tiver havido condenação transitada em julgado, os prejudicados
poderão ingressar com revisão criminal, nos termos do art. 621, III, parte final, do CPP, porque
se a lei admite a rescisão parcial do julgado ante circunstância que autorize a diminuição da pena,
por óbvio também admitirá a sua extinção, quando tal circunstância beneficiar o condenado de
forma mais ampla, admitindo-se interpretação extensiva em matéria processual (CPP, art. 3º).
Seria clara afronta ao princípio da indivisibilidade perpetuar-se a punição de alguns querelados,
ficando outros excluídos por omissão voluntária do titular do direito de ação. O prazo para
aditamento da queixa pelo Ministério Público é de três dias, a contar do recebimento dos autos
pelo órgão ministerial. Aditando ou não a queixa, o MP deverá intervir em todos os termos do
processo, sob pena de nulidade (CPP, arts. 46, § 2º, e 564, III, d, segunda parte). Tratando-se de
ação penal privada subsidiária da pública, o Ministério Público poderá, além de aditar a queixa,
repudiá-la, oferecendo denúncia substitutiva (CPP, art. 29).

Em suma, observando a doutrina e a jurisprudência, podemos elencar as


seguintes atribuições e incumbências do Ministério Público no âmbito das ações
penais privadas:

1) Ação penal exclusivamente privada:

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✓ a atuação, como custos legis, é deveras restrita e se limita, basicamente, a velar pela sua
indivisibilidade;
✓ a doutrina se posiciona pela inadequação de que o próprio MP adite queixa-crime, não obstante o
permissivo legal constante do art. 45 do CPP, cabendo-lhe, no máximo, manifestar-se para que o
querelante promova as devidas adições e correções na peça acusatória;
✓ parte minoritária sustenta ser possível que o MP adite a queixa-crime, inclusive para adição de novos
agentes no polo passivo;
✓ há precedente do STJ em um meio-termo, reconhecendo o poder de aditamento pelo MP, desde que
em caráter complementar, sem incluir novos agentes nem inovar nos fatos descritos;
✓ segundo a doutrina, também não poderá o MP recorrer de sentença absolutória quando não o fizer
o querelante.

2) Ação penal privada subsidiária da pública:

✓ a atuação do MP se dá na forma de parte adjunta, litisconsorte necessário ou assistente litisconsorcial


(há divergência na doutrina – como sinalizam BADARÓ et al.) e é ampla, cabendo-lhe:
✓ aditar a queixa-crime subsidiária para a inclusão de fatos ou agentes;
✓ repudiar a queixa considerada imprestável (quando não suficiente o aditamento) e oferecer denúncia
substitutiva;
✓ intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova e interpor recursos, sob pena
de nulidade (relativa);
✓ retomar a ação como parte principal, em caso de negligência, desídia ou abandono do querelante.

Doutrina Complementar

PAULO RANGEL (Direito processual penal, 26ª ed., São Paulo: Atlas, 2018) sobre os fundamentos e
princípios que regem o aditamento: “O fundamento do aditamento no processo penal é a
necessidade que se tem de se fazer uma imputação clara e precisa ao acusado, possibilitando-
lhe o exercício pleno e amplo de defesa, porém sem descuidar, também, da necessidade de se
proteger a sociedade, pois, na medida em que o fato não está bem individualizado, ou todos os
sujeitos não estão na relação processual, há, ainda, uma dívida do acusado ou autor do fato para
com seu pares. [...] Nesse sentido, em nome da verdade processual dos fatos e a fim de
estabelecer a perfeita correlação entre acusação e sentença, o Ministério Público oferece um
acréscimo à denúncia que poderá ser subjetivo (sujeitos) ou objetivo (fatos). Ora, claro nos
parece, diante da afirmativa acima, que os princípios que impulsionam a ação do Ministério
Público no aditamento à denúncia são os da obrigatoriedade da ação penal pública e da verdade
processual, pois somente haverá exercício regular da pretensão acusatória estatal se o
verdadeiro fato for imputado ao réu ou se todos os réus responderem pelo fato que praticaram
em litisconsórcio passivo necessário. [...] O aditamento visa evitar julgamento ultra petita, citra
petita e extra petita. É sabido que o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia e não da
capitulação dada aos fatos, motivo pelo qual, feito o aditamento, acrescentando fato novo,
dever-se-á dar a ele oportunidade de defesa em respeito ao princípio constitucional do
contraditório e da ampla defesa”. A respeito do seu conceito, assevera: “Aditar, no sentido
etimológico da palavra, deriva do latim additu, particípio passado de addere, que significa
acrescentar, adir, adicionar, juntar algo que falta a alguma coisa. Sob o ponto de vista técnico
jurídico, aditar é acrescentar ou complementar a denúncia com fatos, sujeitos ou elementos

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novos que não constavam, inicialmente, da mesma.” No tocante aos tipos de aditamento,
especificamente quanto ao seu objeto, aduz: “A doutrina estabelece dois tipos de aditamento à
peça exordial: o próprio e o impróprio. Na primeira hipótese (próprio), há o acréscimo verdadeiro
de fatos não contidos inicialmente na peça inaugural, ou de sujeitos, que, embora coautores ou
partícipes da empreitada criminosa, não figuram na denúncia, nem havia provas (informações),
no inquérito policial, de seu concurso. Assim, diante de novas provas, haverá o acrescentamento
dos fatos ou dos sujeitos. O aditamento próprio, portanto, divide-se em: real (fatos) e pessoal
(sujeitos). [...] A segunda hipótese (aditamento impróprio) ocorre quando, embora não se
acrescente um fato novo ou um sujeito, tenta-se corrigir alguma falha na denúncia, como, por
exemplo, a qualificação completa do acusado, esclarecendo seus dados ou suprindo elementos
circunstanciais da denúncia, como o dia preciso do fato ou, ainda, retificando dados inerentes ao
lugar da consumação do delito, sem que, nesse caso, altere a competência do foro. Há casos em
que se declara a incompetência do juízo e os atos praticados pelo juiz incompetente e pelo
promotor de justiça sem atribuição devem ser ratificados perante o juiz e o promotor natural da
causa. Nessa hipótese, surge o aditamento impróprio de ratificação”. Sobre o tipo de aditamento
relacionado à sua oportunidade, dispõe: “O princípio da obrigatoriedade da ação penal pública,
impulsionando o aditamento à denúncia, faz com que a regra seja o aditamento espontâneo e a
exceção FOSSE o provocado. A reforma processual penal feita pela Lei no 11.719/2008 retirou do
art. 384 a expressão o juiz baixará o processo, a fim de que o Ministério Público possa aditar a
denúncia. O legislador, ciente da estrutura acusatória do processo penal, não mais faz com que
o juiz provoque o MP ao aditamento. O próprio órgão do MP, em nome do princípio da
obrigatoriedade, adita, se entender que deve, à denúncia. [...] Portanto, o aditamento quanto à
oportunidade, que chamamos de provocado, nunca encontrou amparo frente à Constituição da
República sendo, consequentemente, inconstitucional. Para aqueles que não conseguem olhar
‘o processo penal como um direito constitucional aplicado’ (JORGE FIGUEIREDO DIAS) fica agora
o texto da lei, de forma clara, que não autoriza mais o juiz a proceder dessa forma”. No que tange
à possibilidade de interrupção do prazo prescricional pelo recebimento do aditamento, sustenta:
“Entendemos que, se o aditamento for de fato novo, portanto, próprio real, haverá a interrupção
da prescrição, pois, não obstante o art. 117, I, referir-se ao recebimento da denúncia, não temos
dúvidas de que o aditamento de fato novo à denúncia compreende, na realidade, nova denúncia.
Ora, se o Ministério Público pode oferecer denúncia por este fato novo, e esta, uma vez recebida,
interromperia a prescrição, por que o aditamento à denúncia, sendo recebido, também não traria
o mesmo resultado? [...] Importante ressaltar que não admitimos a interrupção da prescrição
quando se tratar de inclusão de corréu ou partícipe (aditamento próprio pessoal), pois a
prescrição, regulada no art. 109 do CP, é do fato praticado pelo agente e não do agente que
pratica o fato. O que prescreve é o fato e não o agente”.

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018), sobre a constatação
de eventuais omissões na denúncia já oferecida, aduz: “O artigo em tela [art. 569 do CPP] confere
ao Ministério Público, além da prerrogativa de retificar dados acidentais da denúncia, o direito
de aditá-la a qualquer momento, até a sentença, para incluir no processo novos acusados, ou
para imputar aos existentes novos delitos. Em qualquer caso, providências deverão ser tomadas
para assegurar a observância de todas as garantias do devido processo legal, tais como nova
citação, reabertura da instrução, quando esta já estiver concluída, ou mesmo abertura de vista à
parte para manifestar-se a respeito de algum documento que se tenha juntado”. Em relação às
omissões constantes da queixa-crime, assevera: “As falhas e as omissões da queixa no tocante a

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formalidades secundárias também poderão ser sanadas a qualquer tempo, até a sentença. Há,
todavia, entendimentos contrários, segundo os quais tais irregularidades só podem ser
retificadas enquanto não fluir o prazo decadencial”.

GUILHERME MADEIRA (Curso de processo penal, São Paulo: RT, 2020). “O aditamento próprio ocorre
nas hipóteses em que há o acréscimo de fatos ou pessoas que não constavam originariamente
na acusação. Quando são acrescidos fatos, teremos o aditamento próprio real, quando se trata
de inclusão de pessoas, teremos hipótese de aditamento próprio pessoal. No caso do aditamento
impróprio, não há propriamente a inclusão de fato novo ou de pessoas novas, mas busca-se sanar
alguma falha. Vale aqui a citação na íntegra de Paulo Rangel: “A segunda hipótese (aditamento
impróprio) ocorre quando, embora não se acrescente um fato novo ou um sujeito, tenta-se
corrigir alguma falha na denúncia, como, por exemplo, a qualificação completa do acusado,
esclarecendo seus dados, ou suprindo elementos circunstanciais da denúncia, como o dia preciso
do fato ou, ainda, retificando dados inerentes ao lugar da consumação do delito, sem que, nesse
caso, altere a competência do foro”. O aditamento impróprio por ratificação ocorrerá nas
hipóteses em que houver alteração na competência do juízo e, no novo juízo, o promotor deverá
ratificar a denúncia anteriormente oferecida. O aditamento próprio tem grande relevância
prática do ponto de vista da lógica processual: a inclusão de outros fatos ou de pessoas realmente
altera o próprio objeto do processo (a imputação nele contida). Já o aditamento impróprio não
pode ser considerado verdadeiro aditamento, pois não há alteração do objeto do processo.
Quanto à voluntariedade do aditamento, poderá ser ele espontâneo ou provocado. Será
espontâneo quando partir da própria acusação, sem provocação do juiz. O aditamento
espontâneo pode ser feito até a prolação da sentença, nos termos do art. 569 do CPP. Já o
aditamento provocado ocorre nas hipóteses de mutatio libelli, previstas no art. 384, do CPP e
também haverá aditamento provocado na hipótese do art. 417 do CPP. Trata-se de aditamento
que tem início com a atuação do juiz e de constitucionalidade questionável. Remetemos o leitor
para os comentários sobre a mutatio libelli quando do estudo da sentença. Quanto à interrupção
da prescrição, é importante notar que não ocorrerá no aditamento impróprio, existindo apenas
no aditamento próprio real. Vale dizer, na data em que o magistrado receber o aditamento
próprio real será interrompida a prescrição. Nesse sentido o STJ: “1. O aditamento da denúncia
sem inovação da acusação não interrompe o prazo prescricional. 2. Houve início da persecução
penal, para apurar crime de sonegação fiscal, com lastro em lançamento que, posteriormente,
foi anulado por iniciativa do contribuinte, por vício formal. Havia denúncia recebida, em um
primeiro momento, mas desapareceu sua justa causa, uma vez que o fato tornou-se atípico, sem
que se pudesse exigir do Estado o exercício do poder-dever de punir. 3. Com a constituição
definitiva do crédito tributário, o Ministério Público modificou a exordial acusatória. O
aditamento interrompe a prescrição, pois trouxe alteração substancial ao processo. A peça
narrou crime antes inexistente, cuja condição objetiva do tipo ficou caracterizada somente com
o trânsito em julgado na esfera administrativa. 4. O instituto da prescrição está estreitamente
relacionado à inércia do Estado. Antes da emenda à denúncia, não havia possibilidade de
exercitar a pretensão punitiva, razão pela qual é incabível reconhecer eventual inatividade estatal
a fim de declarar a extinção da punibilidade do réu. (STJ, AgRg no HC 462206/SP, 6T, Rel. Min.
Rogério Schietti Cruz, DJe 06.06.19)”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019): “O
aditamento nada mais é do que o complemento da peça inicial acusatória, que tem por finalidade

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a correção de erros materiais, a mudança da acusação (em virtude da prova produzida no curso
do processo) ou a inclusão de corréu. A primeira hipótese de aditamento consta no art. 569 do
CPP, segundo o qual as omissões da denúncia ou queixa-crime podem a qualquer tempo, antes
da sentença, ser sanadas. Contudo, não é toda e qualquer omissão que pode ser suprida pelo
aditamento, como erroneamente se pode concluir da leitura do dispositivo. O acusado se
defende dos fatos a ele imputados, que devem estar devidamente narrados, com todas as suas
circunstâncias, na exordial (art. 41 do CPP). Por conta disso somente as omissões ou erros
materiais, que não obstem o exercício da ampla defesa, podem ser corrigidos por meio do
aditamento. Se o vício for insanável, a hipótese será de nulidade absoluta, insuscetível de
convalidação. Também pode ocorrer o aditamento em caso de mutatio libelli, prevista no art.
384, caput, do CPP. Durante a instrução criminal, com a produção da prova, podem surgir fatos
novos, que impliquem a necessidade de mudança da acusação. [...] Finalmente, o aditamento
pode ser usado para a inclusão de corréu. Nesse caso, em atendimento ao devido processo legal,
deve haver citação e as demais providências previstas no procedimento cabível em relação ao
acusado que passará a integrar a relação jurídica processual. [...] Da decisão que rejeita o
aditamento caberá recurso em sentido estrito, com base no art. 581, I, do CPP, embora alguns
autores entendam ser cabível apelação, com fulcro no art. 593, II, do CPP. De qualquer forma, o
recurso deverá ser recebido e processado, em razão do princípio da fungibilidade, positivado no
art. 579 do CPP. Caso o juiz baixe os autos ao Ministério Público para aditamento e este não
concorde, deve haver aplicação analógica do art. 28 do CPP, com a remessa dos autos ao
Procurador-Geral de Justiça (esfera estadual) ou à Câmara de Coordenação e Revisão (esfera
federal)”.

NESTOR TÁVORA (Curso de direito processual penal, 11ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016), sobre os
tipos de aditamento, expõe: “Pode o aditamento ser próprio ou impróprio. O aditamento próprio
se biparte em real e pessoal: o aditamento próprio real se apresenta como: (1) aditamento
próprio real material (quando incluir fato delituoso, elementar ou circunstância nova, inovando
na descrição da imputação); (2) aditamento próprio real legal (sem inovar propriamente a
descrição narrativa do fato, acresce dispositivos legais e processuais a partir de interpretação
que enseja a alteração do procedimento e/ou da competência para processamento e julgamento
do processo). O aditamento próprio pessoal é o que resulta na inclusão de coautores e partícipes.
Por seu turno, o aditamento impróprio consiste nas correções de falhas, esclarecimentos que
não inovam o fato imputado, ou mesmo em retificação simples ou ratificação da denúncia. Já
quanto ao aspecto volitivo do ato, o aditamento será espontâneo ou provocado. Espontâneo:
quando realizado pelo Ministério Público, sem a atuação do juiz na função anômala de fiscal do
princípio da obrigatoriedade da ação penal, postura essa mais apropriada ao sistema de cariz
acusatório. Provocado: quando a iniciativa do Ministério Público tiver decorrido do exercício
judicial daquela função de controle, hipótese em que o juiz insta o Parquet sempre que este não
faz o aditamento espontaneamente (art. 384, § 1º, CPP). [...] É possível a formulação de
aditamento que suplante, integralmente, os termos da inicial acusatória. Para tanto, todavia,
devem ser atendidos, rigorosamente, os ditames do contraditório e da ampla defesa. Pensamos,
inclusive, que este é o sentido que se depreende do art. 384, § 4º, do CPP, quando preconiza que,
uma vez aditada a inicial, o juiz ficará adstrito aos termos do aditamento. No ponto, a
impossibilidade do magistrado volver a instrução probatória àquela narrativa da denúncia
originária decorre de substituição integral da petição inicial”.

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Jurisprudência pertinente

Superior Tribunal de Justiça

Havendo alteração da situação fática descrita na inicial acusatória, o Ministério Público deverá
proceder ao aditamento da denúncia, conforme preceitua o artigo 384 do CPP. [...] (AgRg no
REsp 1628367/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
09/03/2017)

É entendimento desta Corte que a abertura de prazo para aditamento da denúncia não implica
ofensa ao princípio da imparcialidade, uma vez que ao Juízo compete prover a regularidade do
processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos. [...] (HC 374.589/DF, Rel. Ministro
NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 21/02/2017, DJe 23/03/2017)

O aditamento da denúncia não torna nula a primeira exordial acusatória apresentada, razão
pela qual mantém-se a interrupção do prazo prescricional decorrente do seu recebimento (art.
117, I do CPB). [...] (HC 188.471/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA
TURMA, julgado em 31/05/2011)

AÇÃO CIVIL EX DELICTO

1 - DEFINIÇÃO E SISTEMAS
É a ação que se exerce, na esfera cível, em decorrência de um crime. “Trata-se da ação ajuizada pelo
ofendido, na esfera cível, para obter indenização pelo dano causado pela infração penal, quando existente”
(Nucci, 2018).

A legislação criminal cuida, com particular zelo, embora não com a amplitude merecida, do
ressarcimento da vítima, buscando incentivá-lo, sempre que possível. O Código Penal estabelece
como efeito da condenação a obrigação de reparar o dano (art. 91, I). Firma, ainda, uma causa
de diminuição de pena, caso a gente repare o dano ou restitua a coisa ao ofendido (art. 16).
Estabelece como atenuante genérica a reparação do dano (art. 65, III, b). Incentiva-a para a
substituição das condições genéricas da suspensão condicional da pena por condições específicas
(art. 78, § 2º). Fixa como condição para concessão do livramento condicional a reparação do
dano, salvo impossibilidade efetiva de fazê-lo (art. 83, IV). Enaltece-a, como condição para a
reabilitação (art. 94, III). Permite a extinção da punibilidade no caso de peculato culposo cujo
dano é devidamente ressarcido (art. 312, § 3º). E não olvidemos o conteúdo da Súmula 554 do
Supremo Tribunal Federal, ainda em vigor, que estabelece o seguinte: “O pagamento de cheque
emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento
da ação penal”, significando que, antes da propositura, o pagamento retira a justa causa para
ação penal (Nucci, 2018).

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O nome do instituto – ação civil ex delicto – surge da ideia de que existem “ações que nascem do crime e
que seriam a ação penal, para a inflição de pena e a ação civil, para restituição, ressarcimento e reparação”.
TORNAGUI15 critica essa concepção:

É falso que qualquer dessas duas ações nasça do crime. O que, realmente, o crime produz é a
obrigação de reparar o dano e a sujeição do réu à pena. [...] A ação independe do crime. [...] A
ação civil não decorre sequer da obrigação, não é um aspecto dela, e nem mesmo um direito que
a protege, que lhe acede ou dela provém. É direito autônomo, que pode existir ainda quando
nenhuma obrigação haja surgido. Uma coisa, pois, é o problema das relações entre a
responsabilidade civil e a penal, e outra, o da sede em que deve correr a ação civil (Tornaghi,
1977).

BADARÓ também critica essa ideia, esclarecendo que o CPP


pretensão
“disciplina a relação entre a ação civil ex delicto e a ação penal.
punitiva
Embora o título sugira o regramento de uma ‘ação’, na verdade, o
mesmo fato
Código de Processo Penal trata dos efeitos civis da sentença penal.
pretensão
A lei processual penal não regulamenta a ação a ser proposta no reparatória
juízo cível, tendo por causa de pedir o fato criminoso” (Badaró,
2017).

Grosso modo, quando estudamos esse instituto estamos analisando situações em que um mesmo fato gera
repercussões na esfera criminal e, também, na esfera cível.

Com fundamento em um mesmo fato, que se afirma delituoso, cuja prática se imputa à
determinada pessoa, podem ser exercidas duas pretensões distintas: a chamada pretensão
punitiva, ou seja, a pretensão à imposição de pena cominada em lei, e a pretensão à reparação
do dano que o suposto delito haja causado. Há, pois, uma pluri-incidência normativa sobre um
fato unitário (Badaró, 2020).

No que diz respeito ao bem jurídico protegido pela norma penal incriminadora, a lesão causada
pelo crime tanto pode atingir, diretamente, a coletividade do corpo social sem a completa
particularização ou personificação da vítima, tal como ocorre com o tráfico de drogas, por
exemplo, como pode também afetar mais intensamente o patrimônio (moral e econômico) de
determinada pessoa. Na segunda hipótese, tais condutas darão ensejo a intervenções judiciais
distintas da resposta penal, diante da diversidade e pluralidade de graus de ilicitude que as
acompanham. Nessas situações, quando a repercussão da infração houver de atingir também o
campo da responsabilidade civil, terá lugar a chamada ação civil ex delicto, que outra coisa não
é senão o procedimento judicial voltado à recomposição do dano civil causado pelo crime
(Pacelli, 2018).

15
Com propriedade e observado o que já estudamos sobre o direito de ação.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 204


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Como se percebe, há uma relação natural e evidente entre a prática de uma infração penal e o
possível prejuízo patrimonial que dela pode resultar ao ofendido, facultando-lhe o direito à
reparação. Não por outro motivo, ao tratar dos efeitos automáticos da condenação, o próprio
Código Penal estabelece que um deles é o de tornar certa a obrigação de indenizar o dano
causado pelo crime (art. 91, I) (Lima, 2021).

3Ao longo da história, a doutrina tentou agrupar várias legislações, em linhas


gerais, para definir sistemas em relação ao tema, procurando definir a respeito confusão
do processo em que corre a ação civil. Como destaca TORNAGHI, é comum

sistemas
solidariedade
classificar as ordenações dos vários Estados em quatro grandes esquemas:
livre escolha
a) Confusão – uma ação única, uma “mesma ação visa à imposição da pena e à
reparação (lato sensu)” (Tornaghi, 1977). Acumulam-se duas obrigações ou independênci
pretensões na mesma ação. Foi seguido pelas primitivas legislações. a

Antes de o estado chamar a si a solução dos conflitos, o ofendido buscava a reparação (lato sensu)
do dano e a punição por meio da ação direta sobre o ofensor. Quando surgiu a jurisdição, assumiu
ela esse mesmo papel: conceder justiça punindo e fazendo reparar o dano. O ofendido não
precisava pedir ao estado, em duas ações diversas, duas prestações diferentes. Uma única ação,
civil e penal ao mesmo tempo; um direito amplo de pedir ao órgão jurisdicional a reparação por
inteiro do malefício causado pelo crime, quer ao interesse geral, quer ao particular (Tornaghi,
1977).

Na verdade, o que havia era simplesmente a busca da punição do ofensor e a indenização de


natureza civil não era vista exatamente como uma forma de reparação, possuindo na verdade
natureza penal (Dezem, 2020).

b) Solidariedade – “há duas ações diferentes, uma penal, outra civil, mas no mesmo processo, e diante do
mesmo juiz, o criminal” (Tornaghi, 1977).

Fala-se na existência de cumulação obrigatória de ações que correm perante o juízo penal. É
importante notar a diferença entre o sistema da solidariedade e da confusão: no sistema da
solidariedade as duas pretensões são exercidas dentro do mesmo processo, enquanto no sistema
da confusão não se fala propriamente em pretensões distintas, mas em verdade a pretensão
indenizatória faz parte da persecução penal (Dezem, 2020).

c) Livre escolha – “neste é facultativo cumular as ações no processo penal ou fazê-las correr nas sedes civil
e penal, respectivamente. [...] Aqui, sim, é permitido acumular as duas ações no processo penal. É uma
acumulação facultativa” (Tornaghi, 1977). “De todo modo, a critério do interessado, admite-se a cumulação
das duas pretensões no processo penal, daí por que se fala em cumulação facultativa, e não obrigatória,
como se dá no sistema da solidariedade” (Lima, 2021).

De acordo com o sistema da livre escolha, se a parte quiser promover a ação de satisfação do
dano na esfera civil, poderá fazê-lo, mas, neste caso, em face da influência que a sentença penal
exerce sobre a civil, deverá o juiz cível paralisar o andamento da ação até o julgamento definitivo

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 205


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da ação penal, para evitar decisões irreconciliáveis. Por outro lado, é possível cumular as duas
ações no processo penal. Trata-se, portanto, de cumulação facultativa (Badaró, 2020).

d) Independência – “duas ações podem ser propostas de maneira independente, uma no juízo cível, outra
no âmbito penal. Isso porque, enquanto a ação civil versa sobre questão de direito privado, de natureza
patrimonial, a outra versa sobre o interesse do Estado em sujeitar o suposto autor de uma infração penal ao
cumprimento da pena cominada em lei” (Lima, 2017). É o sistema “seguido pelo Direito alemão, pelo inglês,
pelo norte-americano e pelo holandês” (Tornaghi, 1977).

[...] o sistema da independência é aquele em que as duas ações devem ser propostas de maneira
independente, uma no juízo penal, outra no cível. A justificativa seriam as diferenças das duas
ações, uma que versa sobre direito público, de natureza não patrimonial, e outra, tendo por
objeto questão de direito privado, de natureza patrimonial, o que desaconselharia que
corressem juntas (Badaró, 2020).

E no Brasil, qual o sistema adotado? A teor do art. 935 do Código Civil, primeira parte, podemos concluir
que adotamos o sistema da independência:

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais
sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal.

Todavia, essa independência não é absoluta e se encontra, na atualidade (principalmente depois da reforma
de 2008), bastante mitigada, por diversas disposições legais que serão paulatinamente analisadas. O fato é
que, hoje, a responsabilidade ou a ação civil tem vários ‘pontos de contato’ ou de necessária convergência
com a ação penal – a própria segunda parte do art. 935 é um desses pontos normativos de contato.

A lei brasileira adotou o sistema da independência. Apenas concedeu ao juiz do cível a faculdade
de suspender o curso da ação civil até o julgamento definitivo da criminal (Tornaghi, 1977).

No Brasil, adota-se o sistema da independência relativa ou mitigada, em razão da existência de


uma subordinação temática de uma instância a outra, especificamente em relação a
determinadas questões [...] (Pacelli, 2018).

Continua a vigorar, pois, o sistema da separação das instâncias, vez que é possível a propositura
de uma ação civil pela vítima, com o objetivo de obter a reparação do dano causado pelo delito
- ação civil ex delicto –, paralelamente à ação penal, proposta, em regra, pelo Ministério Público
(Lima, 2021).

Privilegia o nosso sistema a separação da jurisdição, fazendo com que a ação penal destine-se à
condenação do agente pela prática da infração penal e a ação civil tenha por finalidade a
reparação do dano, quando houver (Nucci, 2018).

A regra, portanto, é a independência das instâncias: a justiça penal pode decidir de um jeito e a justiça cível
de outro, inclusive considerando as diferenças e as peculiaridades de um ramo e outro. Entretanto, em

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diversas situações, com relação ao mesmo fato apurado em instâncias diversas, a decisão penal acaba de
algum modo interferindo, vinculando o resultado da ação cível, mitigando-se a regra ou a separação.

A jurisprudência também reconhece essa independência:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL (CPC/73). AGRAVO DE


INSTRUMENTO EM AÇÃO DE EXECUÇÃO. I - PRELIMINAR. ALEGAÇÃO DE FATO NOVO. ART. 1.525
DO CC/1916. INDEPENDÊNCIA EXISTENTE ENTRE AS ESFERAS CIVIL E PENAL. POSSIBILIDADE DE
FIXAÇÃO DE RESPONSABILIDADE NO ÂMBITO CÍVEL, O QUE SOMENTE PODE SER ELIDIDO SE A
AÇÃO PENAL AFASTAR A OCORRÊNCIA DO FATO OU A NEGATIVA DA AUTORIA [...].. (AgInt no
AREsp 686.810/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 3ª T, julgado em 27/04/2017)

Há muito tempo EDUARDO ESPÍNOLA já proclamava que “a regra é a da independência”. Porém, “bem se
compreende que, sendo o mesmo o ato ilícito, um choque entre as decisões proferidas pelo juízo cível e pelo
juízo criminal, apreciando esse mesmo fato, seria um rude golpe para dignidade do direito, um verdadeiro
abalo para a segurança da Justiça, com funestas consequências sociais” (Filho, 1980). Daí a razão de a lei ter
procurado equacionar esse possível problema com disposições legais que vão buscar, numa visão ampla,
evitar decisões conflitantes.

Podemos também concluir que, em determinadas situações, existe prevalência da decisão


criminal em relação à decisão cível – e não o contrário. Por que é assim? Por que a decisão
criminal vincula o cível e não o contrário?

Essencialmente porque o interesse estatal está muito mais presente no processo penal se
comparado ao processo civil. A amplitude probatória no primeiro é muito maior, e, dentro de
uma concepção ortodoxa (em boa medida ultrapassada), o segundo contentar-se ia com a verdade formal,
ao passo que o segundo buscaria a verdade material.

Na grande maioria dos processos, quem vai promover a ação penal será o próprio Estado, mediante o
Ministério Público, e não um particular preocupado (em tese) em demonstrar tão-somente a sua versão dos
fatos. Regra geral, as restrições de prova do processo civil não se aplicam ao processo penal (art. 155, CPP).
A livre convicção e a impossibilidade de o juiz conformar-se com a postura da defesa para tomar sua decisão
(os ônus processuais têm menor importância) também são fatores de relevo para a prevalência da decisão
criminal. A revelia no processo penal, lembre-se, não implica em presunção de veracidade dos fatos
alegados; mais que isso, a dúvida tem um papel diferenciado no processo penal, não é interpretada contra
o réu e não implica em decisões que geram reflexos extrapenais. Ou seja, são várias as razões – que dizem
respeito à própria essência do processo penal – que justificam a prevalência da decisão criminal em
determinadas situações.

Várias razões aconselham que, em caso de correrem as duas ações no mesmo processo, este seja
o penal. A ação penal tem por objeto uma pretensão pública e o processo penal é
particularmente enredado e complexo. Só o juiz penal, afeito a lidar com ele, está aparelhado
para levá-lo a bom termo. Além disto, a intervenção do Estado por seu órgão específico,
Ministério Público, é muito mais compatível com o processo penal do que com o processo civil,
embora possa conceber-se neste, nos casos em que o Estado tem interesse, v.g., em questões de
família, nos processos de falência etc (Tornaghi, 1977).

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 207


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O estudo da ação civil ex delicto envolve uma análise interdisciplinar16. “O Código Penal, no Capítulo VI do
Título V trata dos efeitos da condenação (arts. 91 e s.). O Código de Processo Penal dedica o Título IV à ação
civil (arts. 63 e s.). Em sede civil, o Código de Processo Civil prevê que a sentença penal condenatória
transitada em julgado é título executivo judicial (art. 515, caput, VI). Também o Código Civil regula a matéria,
ao tratar dos atos ilícitos (arts. 186 e ss.) e das obrigações de indenizar (arts. 927 e s.)” (Badaró, 2020).

Dentro desse complexo de normas, que vamos analisar na sequência,


é importante destacar o seguinte: a ação civil ex delicto pode se
ação civil ‘ex delicto’

de execução constituir como uma ação de conhecimento ou pode se constituir


como uma ação de execução, amparada em um título executivo
(art. 63) criminal e judicial. Ambas são ações civis decorrentes do delito, uma
de conhecimento desenvolvida por processo cognitivo, outra por processo executivo.
(art. 64) A ação civil ex delicto se dará em processo executivo nos termos do
art. 63 do CPP, baseada numa sentença condenatória definitiva que
tornou certa a obrigação de reparar o dano (Código Penal, art. 91, I):

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no


juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus
herdeiros.

Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser


efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo
da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido.

Por outro lado, a ação civil ex delicto se dará em processo de conhecimento, daí sem condenação definitiva
que tenha traduzido um título executivo, nos termos do art. 64 do CPP:

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá
ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil.

BRASILEIRO defende que só se poderia “falar em ação civil ex delicto na hipótese prevista no art. 64 do CPP”.
A primeira, do art. 63, seria ‘ação de execução ex delicto’ 17.

No que se refere ao objeto da ação civil ex delicto, frequentemente a doutrina tenta, sem muita utilidade
prática, distinguir restituição, ressarcimento, reparação e indenização como as diversas modalidades de
recomposição civil do dano causado pela infração penal. Nesse particular, por todas, a lição de PACELLI:

16
Razão pela qual é ‘prato cheio’ para os concursos públicos.

17
Pensamos que não há necessidade de mudar a nomenclatura; basta lembrar que uma ação de natureza civil pode ser de processo
de conhecimento ou de processo de execução, aliás, diante do sincretismo, menos ainda a distinção é relevante.

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O objeto, ou conteúdo, da ação civil, que vem a ser precisamente a apontada recomposição
patrimonial ou pecuniária decorrente da ilicitude também civil, pode se identificar em um pedido
de simples restituição do bem subtraído ou apropriado indevidamente, ou, quando maior o
dano, de ressarcimento, em que se buscará satisfazer, além do dano emergente, também aquilo
que o ofendido deixou de receber com a fruição do bem (lucros cessantes). Como se percebe,
em ambas as modalidades de recomposição citadas, o dano causado é de natureza econômica.
Quando, porém, o dano causado pela infração penal atingir o patrimônio moral do ofendido, isto
é, aqueles valores atinentes à dignidade, à individualidade e à personalidade da vítima,
expressões culturais da própria comunidade social, dar-se-á a reparação civil do ilícito, tal como
ocorre, por exemplo, nas chamadas ações de danos morais, seja em proveito do próprio
ofendido, quando o dano é dirigido diretamente a ele, seja em favor de terceiros (filhos, cônjuge
e sucessores), na hipótese de morte daquele. Ainda segundo a doutrina, o vocábulo indenização
se prestaria a definir a modalidade de recomposição patrimonial do dano causado por ato lícito
do Estado (desapropriações etc.).

Entretanto, embora toda a classificação construída com rigor conceitual seja indispensável à
elaboração científica, o fato é que a legislação brasileira, incluindo a própria Constituição, não
obedece às definições anteriormente apontadas, tratando por indenização qualquer pedido de
natureza ressarcitória ou reparatória (ver, por exemplo, art. 5º, V, CF, e art. 68, CPP). A atual
legislação civil codificada (Código Civil) bem demonstra a concreta inutilidade das apontadas
classificações, no ponto em que, no primeiro capítulo do Título IX, sobre a responsabilidade civil,
dispõe acerca da obrigação de indenizar, referindo-se a quaisquer de suas modalidades. Note-se,
também, que o pedido de restituição de bem, subtraído ou apropriado indevidamente, embora
cabível no juízo cível, pode ser aviado na instância criminal por meio de simples incidente de
restituição de coisas apreendidas, conforme previsto nos arts. 118 e seguintes do CPP, na
hipótese, evidentemente, de já ter sido apreendido o bem objeto do ilícito penal e de inexistência
de dúvida em relação à sua propriedade (art. 120, § 4º, CPP) (Pacelli, 2018).

2 - PREJUDICIALIDADE - SUSPENSÃO DA AÇÃO CIVIL


No caso de um processo de conhecimento, na esfera cível, o parágrafo único do art. 64, dentro da perspectiva
de evitar decisões conflitantes e insegurança jurídica, prevê a possibilidade de ele ser suspenso até o
julgamento definitivo da ação penal:

Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até
o julgamento definitivo daquela.

A suspensão da ação civil e não da ação penal se dá em razão daquela prevalência da decisão criminal
que, em determinadas situações, vai vincular a decisão cível.

Como convém a um ordenamento jurídico que pretende una a jurisdição, isto é, preocupado com
a uniformidade das soluções judiciais para casos idênticos, sobretudo quando a hipótese for de
um único e mesmo caso, submetido a competências distintas (juízo criminal e juízo cível), prevê
o parágrafo único do art. 64 do CPP que “intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá
suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela”. A ratio essendi do apontado

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dispositivo legal pode ser facilmente identificada. Tratando-se de julgamento de um mesmo fato
e da mesma causa de pedir, a busca de uma única solução para ambas as instâncias deve passar
necessariamente pelo modelo processual para o qual sejam previstas menores restrições à prova
e em que o grau de certeza a ser obtido na reconstrução dos fatos seja elaborado a partir de
provas materialmente comprovadas. Por isso, o caminho a ser escolhido deve ser o do processo
penal. Com efeito, uma vez admitida a hipótese de subordinação de uma instância a outra, ainda
que apenas no tocante a determinadas questões, a relação de dependência há de ser do juízo
cível para o juízo criminal. É que neste a verdade processual é obtida a partir de critérios mais
rigorosos, não se admitindo como suficiente à comprovação de uma alegação, por exemplo, a
simples ausência de impugnação tempestiva a ela, tal como ocorre no processo civil (art. 341,
CPC/2015). Assim, nos termos do art. 64, parágrafo único, do CPP, uma vez proposta a ação no
juízo criminal, o juiz do cível poderá suspender o curso desta até a solução final da ação penal
(Pacelli, 2018).

Primeiro: note que a norma fala em intentada a ação penal; ou seja, só se cogita da suspensão da ação civil
quando na persecução penal já existe processo, denúncia oferecida. Em fase de inquérito policial não teria
cabimento a suspensão. Nesse sentido, JOSÉ FREDERICO MARQUES, citado por MADEIRA:

Enquanto não se instaurar a relação processual penal, com a apresentação da denúncia ou


queixa, não cabe ao juiz da ação civil suspender esta –, uma vez que a suspensão, como ensina
MANGIN, não é senão “la conséquence de l’existence simultanée de deux actions fondées sur les
mêmes faits”. Disso se infere que a simples existência de inquérito policial não autoriza a
suspensão da ação civil, porquanto a investigação não é fase da relação processual” (Dezem,
2020).

Segundo: prevalece o entendimento de que se trata de uma faculdade do magistrado; ou seja, a suspensão
não é obrigatória ou imperativo de lei – é discricionária.

[...] o vocábulo poderá, constante do citado art. 64, parágrafo único, do CPP, confere verdadeiro
poder discricionário ao juiz do cível, acerca da conveniência da suspensão do processo naquela
instância. Embora alguns autores entendam que esse termo (poderá) contemplaria verdadeiro
dever, entendemos que a hipótese é mesmo de discricionariedade. Isso porque, somente a partir
do exame do estágio de desenvolvimento procedimental de um e outro processo (a ação cível e
a penal) é que se poderá avaliar a conveniência de se suspender o processo no cível. Assim,
quando já estiver encerrada a instrução na ação civil, não haverá, segundo nos parece, qualquer
razão para a suspensão do processo se, por exemplo, estiver ainda no início o procedimento
criminal. A questão da suspensão, até porque a própria lei prevê prazo limitado (art. 313,
CPC/2015), deve, pois, situar-se no âmbito da discricionariedade, e não da obrigatoriedade.
Entretanto, se estiverem ambas as ações em fases procedimentais igualmente desenvolvidas, ou
ainda quando a ação cível estiver mais adiantada, mas não concluída a sua fase instrutória, a
suspensão do processo civil se revelará extremamente oportuna e conveniente, na medida em
que determinadas questões, quando resolvidas no juízo criminal, subordinam o conteúdo da
decisão a ser proferida no cível. Por isso, e, sobretudo, em atenção ao amplo espaço probatório
destinado ao processo penal, em tais situações, a suspensão do feito poderá evitar o ajuizamento
posterior de ações rescisórias (quando cabíveis, nos termos do art. 966, CPC/2015), se inviável o

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reconhecimento dos efeitos da decisão criminal na via recursal cível, ou seja, após o trânsito em
julgado da sentença civil (Pacelli, 2018).

Terceiro: qual o tempo que a ação civil pode ficar suspensa? Duas correntes:

1ª) um ano, no máximo, segundo pensamento majoritário e nos termos do Código de Processo Civil:

Art. 313. Suspende-se o processo: [...]

V - quando a sentença de mérito:

a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de


relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente;

§ 4º O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso
V [...].

Esse é o pensamento de PACELLI, MADEIRA e BADARÓ, por exemplo:

O prazo limite definido pela legislação processual civil (art. 265, § 5º, do CPC) nunca poderá
exceder ao período de 1 (um) ano, sendo certo que, findo esse prazo, o processo tomará seu
curso normal. (STJ, AgRg no REsp 1.398.658/SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe
12.08.2015) (Badaró, 2020).

2ª) até o julgamento definitivo da ação penal, nos termos do parágrafo único do art. 64 do CPP, que fala isso
expressamente.

Até mesmo porque dificilmente um processo criminal chegará a termo antes do decurso do prazo
de um ano. Logo, se o juiz cível vislumbrar a possibilidade de a absolvição criminal vir a produzir
reflexos no âmbito cível, deve determinar o sobrestamento do seu processo até que haja o
trânsito em julgado da sentença criminal (Lima, 2021).

Quarto: corre prescrição enquanto a ação civil estiver suspensa? NÃO, segundo o que estabelece o art. 200
do Código Civil:

Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá
a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

O STJ chancelou esse entendimento e falaremos mais disso na sequência.

3 - LEGITIMIDADE
Cumpre analisar, neste ponto, quem pode e contra quem se pode intentar a ação civil ex delicto.

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Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no


juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus
herdeiros.

Tratando do polo ativo da demanda, perceba que além da vítima, do seu representante legal, também os
herdeiros estão legalmente legitimados a promover a execução.

Tanto a execução da sentença penal condenatória passada em julgado quanto o ajuizamento da


ação de conhecimento no juízo cível poderão ser propostos pelo ofendido ou seu representante
legal, no caso de incapacidade (menoridade, alienação mental etc.). Tratando-se de pretensão
de natureza civil, com repercussões de índole patrimonial, tem-se que a legitimação para a ação,
na falta do ofendido, ou de seu representante legal, é atribuída aos seus herdeiros, consoante
o disposto no art. 63, caput, do CPP, não se limitando ao rol de pessoas elencadas no art. 31 do
mesmo Código (Pacelli, 2018).

Questão interessante tratada pela doutrina, é quanto à legitimidade do Ministério Público, conforme
estabelece o art. 68 do CPP:

Art. 68. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1º e 2º), a execução
da sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento,
pelo Ministério Público.

Pertinente a explicação de PACELLI e AVENA:

Com o advento da Constituição de 1988 e com a previsão da instituição da Defensoria Pública


como órgão essencial à função jurisdicional do Estado, incumbida da orientação jurídica e da
defesa, em todos os graus, dos necessitados (art. 134, CF), a razão de ser da legitimação do
Ministério Público (pobreza do titular da ação civil) evidentemente deixou de existir. E assim nos
parece, até mesmo por incompatibilidade da atuação privada do parquet com o novo regramento
constitucional reservado àquela instituição, incumbida, a partir de 1988, da defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais, de dimensão coletiva e difusa, e
individuais indisponíveis (art. 127, CF). Embora não se possa deixar de incluir a pobreza entre os
interesses sociais, sobretudo diante da sua gigantesca abrangência no país, o fato é que a
intervenção do Ministério Público, sobretudo no campo da iniciativa processual – mas também
como custos legis –, somente se legitima a partir de uma contextualização coletiva ou difusa dos
interesses individuais, não sendo permitida no âmbito da tutela exclusivamente particular, como
ocorre na hipótese do art. 68 do CPP.
Entendendo-se de modo diferente, não se justificaria o afastamento do Ministério Público da
ação penal privativa do ofendido, na hipótese de insuficiência de recursos deste para o patrocínio
da persecução penal, conforme se observa no art. 32 do CPP, que determina ao juiz a nomeação
de um advogado para a ação privada quando a vítima for pobre. Curiosamente, somente após
quase dez anos de vigência do novo texto constitucional é que a doutrina, de modo geral, passou
a apontar a revogação do mencionado art. 68 do CPP, posição esta que vai, pouco a pouco,
solidificando-se.

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Solução das mais interessantes veio do Supremo Tribunal Federal, que, vem sustentando a tese
de uma inconstitucionalidade progressiva, preconizada, sobretudo, pelo eminente Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE. Sustenta Sua Excelência que, diante da ausência de positivação normativa do
art. 134 da CF, isto é, diante da omissão de diversos Estados, e também da União, no encargo
constitucional de instituir e organizar as respectivas Defensorias Públicas, o art. 68 do CPP
manteria a sua vigência até o funcionamento regular dos apontados órgãos de defesa jurídica
dos necessitados. Do ponto de vista rigorosamente jurídico, a solução não convence, até porque
o que seria progressivo seria a revogação, e não a inconstitucionalidade, dado que a norma
constitucional é posterior à legal. E também porque toda norma constitucional ostenta eficácia
jurídica, consoante se nota na lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA, em obra clássica: “Todas elas irradiam
efeitos jurídicos, importando sempre numa inovação a ordem jurídica preexistente à entrada em
vigor da constituição a que aderem e na ordenação da nova ordem constitucional” (1968, p. 75).
Como se percebe, porém, a solução da Suprema Corte busca, na verdade e unicamente, a
acomodação dos diversos interesses em disputa, revelando-se de ordem eminentemente política
– função, aliás, à qual ela não pode, em certa medida, jamais renunciar. Compreende-se, pois, a
solução, por assim dizer temporária, sem deixarmos de observar as suas inúmeras limitações, no
plano da hermenêutica e da aplicação do Direito.
Trata-se, na verdade, de hipótese em que a jurisprudência pátria tem reconhecido a chamada
inconstitucionalidade progressiva ou temporária, cuja incidência se manifesta sobre aspectos
materiais da norma jurídica e em hipóteses nas quais o poder público se mantém inerte em
adaptar as leis aos objetivos que, com o passar do tempo, vão se extraindo da ordem
constitucional vigente. Por que, afinal de contas, na hipótese do art. 68 do CPP, em relação à
ação civil, atribuiu o legislador de 1941 a legitimidade ministerial para intentar a demanda?
Evidentemente, para que não restasse impedida a vítima pobre de buscar a reparação cível a que
faz jus em razão do crime contra ela perpetrado. Não obstante, com o advento da Constituição
Federal de 1988 e a atribuição que essa Carta conferiu à Defensoria Pública para atendimento
dos necessitados, a conclusão que se extrai é a de que o art. 68 do CPP torna-se progressivamente
inconstitucional à medida que forem sendo preenchidos os cargos de defensor público em cada
região do País. Afinal, o dispositivo do CPP confere ao parquet função que agora incumbe à
Defensoria.
vítima
Ou seja: quanto ao polo ativo, estão legalmente habilitados a
POLO ATIVO

representante
vítima, seus representantes, seus herdeiros e, s
excepcionalmente, até o Ministério Público/Defensoria
Pública. herdeiros
Ministério Defensoria
No que se refere ao polo passivo, assim disciplina o Código de Público Pública
Processo Penal:

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá
ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil.

Duas possíveis ações podem se apresentar: a execução da sentença condenatória transitada em julgado, ou
uma ação de conhecimento proposta para reparar o dano.

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Se for uma execução, nos termos do art. 63 do CPP, somente pode figurar como legitimado passivo “aquele
que figurou como acusado no processo penal. Esse dever de indenizar também pode ser exercido contra os
herdeiros do acusado condenado por sentença irrecorrível, desde que observados os limites do patrimônio
transferido” (Lima, 2021).

BRASILEIRO dá um exemplo:

O motorista de uma empresa provoca um acidente de trânsito, causando a morte de uma pessoa
a título culposo. O Ministério Público oferece denúncia apenas em face do referido o motorista,
deixando de incluir o proprietário da empresa no polo passivo da demanda, porquanto não
demonstrada, de sua parte, qualquer imprudência, negligência ou imperícia. Caso o motorista
seja condenado, a execução da sentença condenatória com trânsito em julgado somente poderá
ser promovida contra ele, jamais contra o proprietário da empresa.

“Na hipótese de execução de sentença penal condenatória, o título executório é, obviamente, dirigido
apenas contra o condenado. Daí por que não poderá ser oposto a qualquer outra pessoa” (Pacelli, 2018).
Isso se dá em respeito aos limites subjetivos da coisa julgada.

E se houver revisão criminal da condenação? Vejamos a opinião (distinta na situação de já se ter concluído
a execução cível) de dois autores:

Na hipótese de condenado por sentença transitada em julgado lograr êxito em ulterior revisão
criminal, quer para fins de absolvição, quer para o reconhecimento da nulidade do processo,
haverá a consequente rescisão do título executivo judicial anteriormente obtido pela vítima (art.
515, VI, do novo CPC). Nesse caso, se o cumprimento da sentença ainda não se tiver iniciado, a
execução não poderá ser deflagrada, haja vista a ausência de título executivo (art. 783 do novo
CPC). Caso o cumprimento da sentença já esteja em andamento, também não será possível sua
continuação, tese esta que poderá ser arguida em impugnação ou mediante a chamada exceção
de pré-executividade. Por fim, caso a sentença já tenha sido cumprida, deve ser feito pedido de
indenização contra o Estado, pedido este que pode ser formulado no bojo da própria revisão
criminal, ex vi do artigo 630, caput, do CPP (Lima, 2021).

Eventualmente, pode ocorrer que a decisão do Tribunal competente, desconstituindo a sentença


penal condenatória, tenha ocorrido após o ingresso da ação de execução ex delicto deduzida com
base no art. 63 da Lei Adjetiva. Em tal hipótese, será necessário distinguir duas situações:
Primeira, a execução ainda está em curso no âmbito cível: nesta situação, o feito executivo
deverá ser extinto em face do desaparecimento do título executivo consubstanciado na sentença
penal condenatória. Segunda, já foi concluída a execução: restará ao executado que já pagou o
valor exigido, recobrar o montante por ação de repetição de indébito, em que se admitirá ao
primitivo credor demonstrar que, não obstante a eliminação do título penal, a indenização era
devida, eis que presente algum dos pressupostos (ilícito civil) que ensejam responsabilidade civil
para manter as consequências da execução havida (Avena, 2020).

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Outra situação se verifica, em caso de ação de conhecimento, nos termos do art. 64 do CPP. Nessa hipótese
o legitimado passivo poderá ser não só o autor do crime, como também o responsável civil. O Código Civil
define:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;

II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do


trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro,


mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente


quantia.

Ou seja: mesmo que as pessoas enumeradas não sejam autoras ou partícipes do crime, poderão
eventualmente ser responsabilizadas pelos danos dele decorrentes. Se a vítima ou qualquer outro legitimado
pretender isso, deverá intentar ação de conhecimento na esfera cível.

Repare na distinção das situações:

✓ legitimidade passiva na execução - bem mais restrita e que considera quem foi réu e condenado no
processo, contra quem se formou o título executivo;
✓ legitimidade em eventual ação de conhecimento - pode ser ampla, incluindo não só o autor da
conduta, mas também aqueles responsáveis (inclusive objetivamente falando), de acordo com a lei
cível, por eventual reparação.

Entende a doutrina majoritária, portanto, que os efeitos da coisa julgada não podem prejudicar ‘terceiros’
que não interviram no feito criminal, sob pena de violação do contraditório e da ampla defesa. “Como a
autoridade da coisa julgada atinge apenas quem foi parte no processo, é de todo evidente que o terceiro
que não pôde fazer parte valer suas alegações, não produziu provas nem influenciou diretamente o
provimento final, não pode ser atingido pela res iudicata” (Lima, 2021).

Situação do corresponsável civil ou do corréu não condenado: não há qualquer reflexo da


sentença penal condenatória como fator vinculante da obrigação de indenizar sobre quem,
embora corresponsável civil, não tenha sido réu no processo criminal e nem sobre aquele que,
mesmo integrando o polo passivo da relação processual penal, tenha sido absolvido. Destarte, a
sentença condenatória transita em julgado apenas se constitui em título executivo em relação
ao réu condenado.
Exemplo: determinada pessoa entrega a terceiro, que sabe possuir habilitação, a direção do
veículo automotor de sua propriedade. Este, na condução do automóvel, vem a provocar
acidente de trânsito, causando vítima fatal. Por não ter obrado com imprudência ou negligência,

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o proprietário do veículo sequer é denunciado pelo Ministério Público, que ajuíza ação penal
unicamente em relação ao condutor. Sendo este condenado definitivamente, apenas contra ele
poderá ser ajuizada a execução da sentença penal condenatória e não contra o proprietário do
carro (que nesta condição, em tese, revela-se corresponsável civil), em relação ao qual o
reconhecimento da obrigação de indenizar dependerá de ação própria na esfera cível.

Utilizando o mesmo exemplo, antes referido, do motorista de uma empresa que provoca um
acidente de trânsito com morte a título culposo, assim esclarece BRASILEIRO:

É bem verdade que o proprietário da empresa pode até ser responsabilizado no âmbito
cível, seja com fundamento em sua culpa in eligendo, seja com base em eventual
responsabilidade objetiva do empregador, porém, para tanto, será necessário o
ajuizamento de ação autônoma na seara cível. Nesta ação, o empregador poderá voltar a discutir
tudo o que restou decidido na sentença penal, inclusive quanto à existência do crime e à própria
autoria delitiva, que, no primeiro processo, geraram o dever de reparar o dano.

Entendimento diferente tem EUGÊNIO PACELLI, para quem a matéria de defesa, nos casos de já haver
condenação contra o agente direto causador do crime e do dano, será unicamente “aquela atinente à
existência, ou não, de relação jurídica (contratual ou legal) entre ele e o agente do crime. A questão relativa
à existência e à autoria do fato estará fora de seu alcance, desde que passada em julgado a sentença
condenatória”.

O Direito brasileiro atribui não só ao autor do ato ilícito a responsabilidade civil pelos danos
causados ao titular do patrimônio – material ou moral – atingido. Prevê também que
determinadas pessoas, em razão de parentesco ou do mau desempenho de atividade laborativa,
respondam pelo risco assumido com a escolha de mandatário, empregado ou prestador de
serviços (art. 932, III, CC), bem como do exercício do poder familiar (arts. 1.630 e seguintes, CC),
ou da assistência devida aos descendentes, tutelados e curatelados, nos termos do art. 932, I e
II, do CC. É o que ocorre também em relação ao ilícito penal, estabelecendo o Código Civil
inúmeras hipóteses de responsabilidade civil em razão da prática de infração delituosa, conforme
previsto nos dispositivos alinhados a partir do art. 927 da aludida legislação codificada. No
mesmo diapasão, o art. 64 do CPP estabelece que a ação para ressarcimento do dano poderá ser
proposta no juízo cível contra o autor do crime e, se for o caso, contra o responsável civil.
A questão que oferece maior complexidade em relação ao tema diz respeito à extensão da
subordinação temática existente entre a instância cível e criminal – isto é, à eficácia preclusiva
das decisões condenatórias ou absolutórias do juízo penal – também ao responsável civil, não
integrante da relação processual penal. Saliente-se, desde logo, que a dificuldade somente terá
lugar quando se tratar de ação de conhecimento proposta contra o autor do fato e o responsável
civil. Na hipótese de execução de sentença penal condenatória, o título executório é,
obviamente, dirigido apenas contra o condenado. Daí por que não poderá ser oposto a qualquer
outra pessoa.
Já em relação à ação de conhecimento, parte da doutrina sustenta a impossibilidade de extensão
de efeitos erga omnes da decisão criminal condenatória para atingir a pessoa do responsável
civil, ao fundamento de violação ao contraditório e à amplitude da defesa deste, que estaria,

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assim, impedido de discutir a existência do fato e a sua autoria, com inegável diminuição prévia
de suas chances de êxito na demanda civil. A argumentação, sobretudo pela qualidade
intelectual de seus defensores, realmente impressiona. Mas, com o devido respeito, não nos
convence.
Em primeiro lugar, porque o nosso ordenamento jurídico não autoriza qualquer modalidade de
intervenção de terceiros no processo penal, a não ser a assistência, reservada exclusivamente ao
ofendido – e demais legitimados, no caso de sua incapacidade, ausência ou morte – no interesse
da acusação. E assim é porque o conteúdo do processo penal, no que respeita unicamente à
imposição de sanção penal, não evidencia qualquer interesse jurídico para o responsável civil,
dado que, vedada também a formação de litisconsórcio passivo, a pena não passará da pessoa
do acusado, e somente dele (art. 5º, XLV, CF).
Em segundo lugar, porque o exame e a apreciação das questões ligadas à autoria e à
materialidade do delito não se inserem no campo da fundamentação de semelhante modalidade
de responsabilidade civil. Esta se localiza no âmbito das relações juridicamente relevantes
existentes entre o agente do crime e o responsável civil. O alto grau de desenvolvimento
tecnológico nas atividades produtivas, bem como a crescente e a desordenada disputa pelo
mercado consumidor, talvez constituam a base estrutural da elaboração de uma teoria da
responsabilidade civil centrada no risco, e não mais na culpa. Atento a essa evolução, o novo
Código Civil cuidou de referir-se a ela de modo expresso, no texto do art. 927, cujo parágrafo
único tem a seguinte redação: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
Como se observa, por força do disposto expressamente no art. 933 do Código Civil, em que se
estabelece a responsabilidade objetiva – independentemente de culpa – do empregador e do
comitente, por ato ilícito praticado por seus empregados, serviçais e prepostos, a matéria de
defesa reservada ao terceiro, responsável civil, na hipótese de já haver decisão condenatória
em face do agente do delito (reconhecendo, portanto, a existência do fato e a autoria, nos
termos do art. 935, CC), será unicamente aquela atinente à existência, ou não, de relação
jurídica (contratual ou legal) entre ele e o agente do crime. A questão relativa à existência e à
autoria do fato estará fora de seu alcance, desde que passada em julgado a sentença
condenatória.
Entretanto, se a ação de responsabilidade civil for intentada antes da ação penal, ou seja, sem
que haja condenação penal já passada em julgado, pensamos que o terceiro, responsável civil,
não estaria impedido de discutir, no juízo cível, toda a matéria relativa ao fato e à autoria, diante
de sua posição litisconsorcial e diante da ausência, ainda, de subordinação temática à instância
penal. Embora a responsabilidade do terceiro situe-se no vínculo contratual ou legal, o fato é que
ela somente existirá se pressuposta a responsabilização do autor do fato, seu empregado,
preposto ou serviçal. Por isso, acreditamos que o horizonte da discussão judicial cível pode ser
ampliado também em relação a ele, quando estiverem em disputa apenas os interesses privados
decorrentes da recomposição civil do dano causado pelo crime.
Em outras palavras: quando se tratar de ação civil reparatória proposta contra o autor do fato e
o seu responsável civil e, inexistindo ação penal em curso (ou, se arquivado o inquérito ou
absolvido o réu por ausência de provas etc.), ou, se em curso, ainda não sentenciada, com decisão
passada em julgado, admite-se que o terceiro (responsável civil) possa impugnar a própria
existência do fato e sua autoria. Isso, no âmbito, é claro, do processo civil. Tal ocorre menos em
razão de possível violação à ampla defesa – que também será exercitada – que em razão do

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litisconsórcio formado entre ambos (responsável civil e autor do fato), cuja consequência, por
força de lei, estenderá aos dois os efeitos da sentença.
No juízo criminal, porém, as questões relativas à autoria e à materialidade evidenciam interesses
de natureza pública, na medida em que, uma vez capitulada a conduta como delituosa, a
intervenção estatal deve caracterizar-se como ultima ratio. Daí por que, acrescida da necessidade
de se preservar a unidade da jurisdição, não poderão mais ser discutidas, quando estiverem
passadas em julgado.
Por fim, é de se lembrar, mais, de que a impossibilidade de reabertura da discussão acerca da
autoria e da materialidade pode também ser explicada como restrição à prova no juízo cível,
conforme anota TOURINHO FILHO (1992, v. II, p. 22). Com efeito, como se sabe, na instância cível,
existem restrições à prova de natureza até mesmo substancial, como ocorre com a certeza obtida
a partir da simples ausência de impugnação do fato articulado na inicial (art. 341, CPC/2015),
com a vedação do testemunho de menores de 16 anos (art. 447, § 1º, III, CPC/2015), e até mesmo
com os efeitos da confissão (art. 389 e seguintes, CPC/2015). A impossibilidade de reabrir a
discussão de tais questões seria, então, mais uma das já existentes restrições à prova.

MADEIRA destaca o pensamento similar de outro autor sobre o mesmo tema:

TOURINHO FILHO entende que “se o patrão, ante uma ação, com fulcro no art. 932, III, do CC/2002,
pudesse discutir sobre o fato e a autoria, sob o fundamento de não ter sido parte na relação
jurídico-processual penal, a balbúrdia seria inominável, uma vez que, por via oblíqua, poderia o
juízo cível afrontar o decidido no juízo penal. Haveria, inegavelmente, uma revisão criminal sui
generis, na 1ª instância, e, o que é pior, no juízo cível” (Dezem, 2020).

4 - EFICÁCIA PRECLUSIVA E FORÇA VINCULATÓRIA


Analisaremos neste ponto sobre os efeitos da decisão criminal em relação à reparação e ao próprio processo
civil, de acordo com a variedade de situações possíveis e conforme as normas que disciplinam essa questão.

Poderíamos fazer isso analisando as situações


decisão
individualmente, como preferem alguns autores.
criminal
Todavia, vamos usar um caminho diferente para facilitar
o seu aprendizado e, principalmente, a assimilação do de mérito
categórica
conteúdo. Difícil recordar de uma por uma das variadas
definitiva
situações possíveis. O processo penal comporta muitas força
decisões. Assim, assimilaremos primeiro a regra geral, vinculatória
para depois verificarmos as variadas situações. coisa julgada
cível
E qual é a regra geral?

A regra geral é que sempre que a decisão criminal for de materialidad


e
mérito, categórica e definitiva sobre a existência do fato
(materialidade) e sobre a autoria, ela terá força autoria
vinculatória no cível, com formação de coisa julgada.

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Essa regra geral é retirada da interpretação conjunta de vários artigos de lei, principalmente dos artigos 935
do Código Civil e 66 do Código de Processo Penal:

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais
sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal.

Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta
quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

Quando o art. 935 do CC fala em decididas compreenda-se como decisão de mérito (com análise de provas)
e transitada em julgado; quando o art. 66 fala em categoricamente, compreenda-se como isenta de dúvida,
com nível de certeza na decisão.

Por outro lado, caso a decisão criminal não preencha essas condições não terá eficácia preclusiva, nem
vinculará a esfera cível – até porque, antes de mais nada, as instâncias são independentes.

4.1 - Em caso de condenação

Na lição de TORNAGUI a sentença penal que é condenatória com relação ao crime, é, ao mesmo tempo,
declaratória (e somente isso) da obrigação de ressarcir e reparar o dano patrimonial. Dizia o mestre que o
fato constitutivo da obrigação é o próprio fato ilícito e não a condenação criminal em si. Esta apenas torna
indiscutível, provada, evidenciada, irretorquível a obrigação de indenizar o dano resultante do crime. Mais
que isso, essa certeza, essa indiscutibilidade somente pode existir quando a sentença passa em julgado. A
sentença traz a certeza sobre duas obrigações: a penal, de sujeitar-se às penas e medidas de segurança, e a
civil, de restituir, ressarcir e reparar (Tornaghi, 1977). Nesses termos, assim estabelece o nosso Código Penal:

Art. 91 - São efeitos da condenação:

I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

É como se a norma dissesse: a obrigação de indenizar já existe desde o começo, com dano decorrente do
crime; a condenação criminal (é um dos seus efeitos) apenas vai tornar indiscutível essa obrigação.

Duas situações, portanto, podem apresentar-se e o Código de Processo Penal bem as distingue:
1ª) houve condenação – nada mais há que discutir no juízo cível, pois o fato ilícito penal é, a
fortiori, ilícito civil, a autoria obriga à reparação [...] e a culpa criminal envolve a civil; isto é: pode
conceber-se culpa civil onde não há culpa criminal [...] e nos de culpa contratual, mas não o
reverso; [...] O crime, portanto, desde que cause dano, é suficiente, mas não é necessário, para
que haja obrigação civil (Tornaghi, 1977).

Temos nessa disposição legal, de forma imperativa, um efeito extrapenal obrigatório ou genérico da
condenação. Efeito que não depende de expressa declaração judicial e que é próprio de toda e qualquer
sentença condenatória. Desde que tenha havido dano decorrente do crime e tanto que a decisão transite
em julgado, haverá por imposta legalmente (declarada pela lei) a obrigação de repará-lo.

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Independentemente da disposição do art. 91, I do Código Penal, de acordo com a ‘regra geral’ que
estabelecemos antes, podemos concluir que a decisão condenatória criminal vincula a ação cível. Basta
lembrar que uma sentença criminal só pode ser prolatada quando, acima de dúvida razoável (in dubio pro
reo), se reconhece a materialidade e a autoria. O juízo é de mérito, categórico e baseado na convicção.

A decisão criminal condenatória, perceba, será sempre categórica e de mérito;


necessariamente o juiz terá de verificar se o crime/fato existiu e se o réu foi o seu autor
(materialidade e autoria); ninguém pode ser condenado dentro de um espectro de
dúvida, afinal, se isso acontecer, o caminho é a absolvição (in dubio pro reo). Quando
ela transitar em julgado, tornar-se-á definitiva (a questão estará ‘decidida’) e, assim (de
acordo com a regra geral estabelecida) fará coisa julgada, vinculando a esfera cível.

Conforme já antecipado, o sistema processual brasileiro, no que respeita à vinculação de


instâncias em relação a um único fato, adota o modelo da independência relativa ou mitigada.
Embora não se renuncie ao ideal da jurisdição una, porque manifestação do mesmo Poder
Público, não são todas as decisões proferidas em uma instância que impedirão solução diversa
em outra, adotando o legislador os critérios da eficiência ou suficiência probatória e da extensão
material do julgado para a determinação da subordinação temática. Assim, nos termos do art.
935 do CC, uma vez comprovada no juízo criminal a existência do fato, bem como a sua autoria,
tais questões não poderão ser mais discutidas na instância cível. Trata-se, pois, de decisão com
eficácia preclusiva subordinante, na medida em que impede a reabertura da discussão em
qualquer outro processo ou juízo, em homenagem à unidade da jurisdição.

É de se registrar, todavia, que a matéria vedada à discussão na instância cível limita-se


exclusivamente à existência do fato e à respectiva autoria. Assim, parece-nos perfeitamente
possível a alegação, no cível, da concorrência de culpa no evento danoso, ainda que tal questão
não tenha sido abordada no juízo criminal, ou, se abordada, não tenha se mostrado suficiente
para afastar a responsabilidade penal. Embora possa parecer absurda a possibilidade de um
ilícito penal que não seja também um ilícito civil – o contrário nem sempre é verdadeiro, como
se sabe –, o fato é que, em tal situação, é a própria lei (art. 935, CC) que faz a restrição específica
aos efeitos preclusivos da decisão criminal.

A hipótese antes aventada, a nosso aviso, não se enquadra nas exigências da coisa julgada (arts.
502 e 503, CPC/2015), até porque pode não existir sequer identidade de partes na ação penal e
na civil. O que não nos parece sujeito a novas indagações no cível diz respeito ao elemento
subjetivo da ação delituosa, isto é, a decisão acerca do dolo ou culpa imputados ao autor,
sobretudo por se tratar de matéria indissociável da decisão relativa à própria autoria (Pacelli,
2018).

Assim é que, havendo sentença condenatória, ela constituirá, quando transitar em julgado, um título
executivo judicial, nos termos do Código de Processo Civil:

Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos
previstos neste Título: [...]

VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado;

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Título executivo que poderá ser executado no juízo cível, como qualquer outro. Vejamos o que diz o CPP:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no


juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus
herdeiros.

Perceba que não obstante a sentença seja criminal, ela deverá ser executada na instância civil. Aliás, de longa
data e de um modo geral, nosso ordenamento jurídico sempre atribui à esfera cível a reparação dos danos,
seja em processo de conhecimento seja em execução – por mais que o título ou a decisão exequenda
provenha do crime. Nesses termos o Código de Processo Civil:

Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: [...]

III - o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, [...]

TORNAGUI já explicitou até sobre a natureza das normas do CPP que tratam da ação civil:

Bem examinadas, as normas contidas no Código de Processo Penal sobre a epígrafe “Da ação
civil” são de Direito substantivo, dizem respeito às obrigações decorrentes de fato ilícito, ao
direito de ação, à força vinculatória da sentença, ou melhor, da coisa julgada. Não existe ação
civil no juízo criminal, nem em confusão nem em solidariedade com a ação penal e não se
permite sequer a livre escolha. Em outras palavras: não há comistão nem acumulação,
obrigatória ou facultativa. Quem quiser mover ação civil terá de fazê-lo na sede civil. A lei
brasileira adotou o sistema da Independência. Apenas concedeu ao juiz do cível a faculdade
(compare com outras legislações apontadas neste estudo nas quais o juiz tem o dever) de
suspender o curso da ação civil até o julgamento definitivo da criminal (Tornaghi, 1977).

BRASILEIRO ainda destaca:

[...] a execução e/ou liquidação devem ser processadas no âmbito cível, conclusão que pode ser
extraída a partir da própria localização topográfica do artigo 63 do CPP, inserido no título “Da
ação civil”. Nosso sistema processual penal sempre se orientou no sentido de que a condenação
proferida no juízo criminal vale como título judicial a ser executado na seara cível (CPP, art. 63,
c/c art. 515, VI, do novo CPC). Na mesma linha o artigo 630, § 1º, do CPP, que cuida da revisão
criminal, dispõe que, reconhecido o direito à indenização do autor, a liquidação deve se dar no
juízo cível. Até mesmo a Lei dos Juizados Especiais Criminais destaca que a composição dos danos
civis, uma vez homologada em juízo, tem eficácia de título judicial, ser executado no juízo cível
competente (Lei nº 9.099/95, art. 74, caput) (Lima, 2017).

A pretensão de reparação civil de fato criminoso prescreverá em 3 anos, nos termos do Código Civil:

Art. 206. Prescreve: [...] § 3º Em três anos: [...]

V - a pretensão de reparação civil;

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Conforme art. 200 do Código Civil, e desde que haja relação de prejudicialidade, com a instauração de
inquérito policial ou processo, esse prazo só começa a correr do trânsito em julgado da condenação criminal:

Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá
a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

Nesse sentido é a atual jurisprudência:

[...] 2."Desde que haja a efetiva instauração do inquérito penal ou da ação penal, o lesado pode
optar por ajuizar a ação reparatória cível antecipadamente, ante o princípio da independência
das instâncias (art. 935 do CC/2002), ou por aguardar a resolução da questão no âmbito criminal,
hipótese em que o início do prazo prescricional é postergado, nos termos do art. 200 do
CC/2002" (REsp 1631870/SE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe
24/10/2017). [...] (AgInt no REsp 1481096/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 27/02/2018)

CIVIL E PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INJÚRIA RELIGIOSA E RACIAL.
AÇÃO PENAL. CAUSA IMPEDITIVA DA PRESCRIÇÃO. ART. 200 DO CC/2002. OCORRÊNCIA. [...] 2. O
propósito recursal consiste em determinar a legalidade na decretação da prescrição da pretensão
de reparação dos danos morais suportados pelas recorrentes, considerando que o mesmo evento
danoso pode ser compreendido como um fato típico e, portanto, crime, o que interromperia o
prazo prescricional, nos termos do disposto no art. 200 do CC/2002. 3. O comando do art. 200
do CC/02 incide quando houver relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal, isto
é, quando a conduta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal, sendo
fundamental a existência de ação penal em curso ou ao menos inquérito policial em trâmite.
4. Não é possível afastar a aplicação do art. 200 do CC/2002 em hipóteses que envolvam, além
do pedido de indenização, discussões relacionadas à existência de responsabilidade solidária
entre o autor da ofensa e aquele que consta no polo passivo da controvérsia, em razão da relação
de preposto. [...] (REsp 1704525/AP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, 3ª T., j. em 12/12/2017)

Essa relação de prejudicialidade é verificada à luz do art. 935 do Código Civil, considerando a relação de
subordinação necessária, a relação de dependência entre o resultado da ação no juízo criminal e a pretensão
de indenização, tanto que o STJ já afastou a suspensão da prescrição em situação em que isso não se
verificou:

[...] IV - No tocante à prescrição, o acórdão recorrido encontra-se em perfeita sintonia com a


orientação desta Corte, que é firme no sentido de que a incidência do art. 200 do Código Civil
pressupõe a existência de relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal. V - Isto é, a
prescrição da pretensão indenizatória não corre quando a conduta ilícita supostamente
perpetrada pela parte ré se originar de fato que, necessariamente, deva ser apurado no juízo
criminal, sendo fundamental, para tanto, a existência de ação penal em curso ou ao menos
inquérito policial em trâmite. Precedentes: AgRg no AREsp 631.181/SP, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/11/2015, DJe 07/12/2015; AgRg nos EDcl
no REsp 1.521.359/AM, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado
em 27/10/2015, DJe 03/11/2015; REsp 1135988/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 08/10/2013, DJe 17/10/2013; AgRg no REsp 1.121.295/RJ, Rel.

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Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 24/6/2014, DJe 1º/8/2014. VI - No caso
dos autos, o Tribunal de origem consignou que não existe relação de dependência no resultado
da ação no juízo criminal e a pretensão de indenização, uma vez que o caráter indenizatório
está baseado na responsabilidade civil do Estado e a ação penal visa a punição dos autores do
delito. VII - Desse modo, diante da inexistência, no caso, de relação de subordinação necessária
entre o fato objeto de apuração penal e o desenvolvimento regular da ação cível, não há como
prosperar o pleito recursal. [...] (AgInt no AREsp 971.779/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO,
SEGUNDA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 18/12/2017)

Também já se decidiu que “o termo a quo da prescrição da ação indenizatória, nos casos em que não chegou
a ser ajuizada ação penal, é a data do arquivamento do inquérito policial”18.

Assim é que, havendo decisão transitada em julgado, o acusado condenado estará obrigado à reparação dos
danos, não podendo se esquivar dessa obrigação declarada e imposta, por imperativo de lei, na esfera
criminal. Uma questão que gera alguma divergência, com relação a isso, é quanto à decisão do tribunal do
júri; se ela pode ou não ser considerada um título executivo capaz de facultar a execução prevista no art. 63
do CPP. A explicação vem de NORBERTO AVENA:

Uma primeira posição, majoritária e à qual nos filiamos, entende que as condenações levadas a
efeito pelo júri popular, uma vez definitivas, constituem-se título executivo judicial, eis que não
ressalvadas nos arts. 91, I, do CP; 63 do CPP e 515, VI, do CPC/2015. Outra corrente inclina-se em
sentido diverso, compreendendo no sentido da inviabilidade de se considerar a condenação
emanada do tribunal do júri como título executivo, tendo em vista que os jurados não
fundamentam seu veredicto, decidindo por íntima convicção e, muitas vezes, até mesmo contra
a prova integrante dos autos (Avena, 2020).

Quantificação do valor a ser indenizado

Nosso sistema, até a reforma do CPP, operada em 2008, era assim: a sentença condenatória tornava certa a
obrigação de reparar o dano; resolvia, em sentido positivo a questão sobre o an debeatur, deixando sempre
para a sede civil, mediante liquidação, a outra questão acerca do quantum debeatur (Tornaghi, 1977).

Na regulamentação anterior à vigência da Lei 11.719/2008, a sentença penal condenatória


caracterizava-se como um título executivo judicial ilíquido, razão pela qual não viabilizava o
ajuizamento imediato de ação executória na esfera cível. Impunha-se, então, que, previamente
a essa execução, o ofendido apurasse o valor efetivo do dano a ser reparado por meio de
requerimento, no juízo cível, da liquidação por artigos prevista no art. 475-E do CPC/1973 (no
CPC/2015, a nomenclatura liquidação por artigos foi suprimida, dando lugar à chamada
liquidação pelo procedimento comum, prevista no art. 509, II, do novo diploma). Em outras
palavras, antes de intentar a ação executória, obrigatoriamente deveria o credor (ofendido,

18
(AgInt no REsp 1692705/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/12/2017, DJe 14/12/2017).

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representante legal ou herdeiros) alegar e comprovar, na esfera civil, o quantum do dano civil.
Somente depois disso é que, valendo-se do disposto no art. 63 do CPP e no art. 515, VI, do
CPC/2015, poderia ajuizar a demanda executória visando constranger o réu condenado
criminalmente por sentença definitiva ao ressarcimento do prejuízo causado pela prática do fato
criminoso (Avena, 2020).

O procedimento de liquidação, quando houver necessidade, é aquele previsto no Código de Processo Civil:

Art. 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua
liquidação, a requerimento do credor ou do devedor: [...]

II - pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo. [...]

§ 4º Na liquidação é vedado discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.

O procedimento de liquidação não pode ser palco para discutir novamente o mérito da causa, aquilo que a
sentença condenatória já consolidou, em especial sobre a existência do fato e sua autoria (art. 935 do Código
Civil). Mas é possível a produção de provas sobre o valor do dano existente.

A liquidação por artigos estabelecida no revogado art. 475-E do CPC/1973 corresponde à


liquidação pelo procedimento comum prevista no art. 509, II, do CPC/2015 e tem lugar na
mesma hipótese, vale dizer, quando houver necessidade de alegar e provar, no juízo cível, fato
novo. Como referem JAQUELINE MIELKE SILVA e JOSÉ TADEU NEVES XAVIER (Curso de processo civil, Rio
de Janeiro: Forense, 2008, p. 36), como a sentença penal condenatória não possui liquidez, “para
que a execução seja viável, é necessária a fixação do valor do dano, que deve ser apurado por
meio da liquidação por artigos, já que não há como serem provados os danos na esfera do
processo penal. Embora se trate de fato qualificado como ‘velho’, não há como ser comprovado
na esfera penal” (Avena, 2020).

Hoje, o caminho para aquele que suportou o dano criminoso foi, em algumas situações, abreviado. Olha o
que diz o art. 387 do CPP, que trata da sentença condenatória:

Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: [...]

IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os
prejuízos sofridos pelo ofendido;

Quer dizer: o próprio juiz criminal, ao sentenciar, poderá fixar um valor mínimo, quantia que será líquida,
para efeito de reparação de danos – o que dispensa o procedimento de liquidação, podendo o credor
ingressar diretamente com um procedimento de execução em relação a esse quantum já estipulado.
Perceba, também por essa norma, a mitigação da independência das instâncias.

Essa inovação, como dito, abrevia o caminho da vítima em algumas situações, no que se refere ao valor
mínimo para a reparação dos danos. Todavia, o quantum fixado na sentença criminal não é definitivo, na
medida em que as portas do cível estão abertas para o ofendido que deseja uma reparação maior ou integral.
Vejamos o que diz o art. 63 do CPP sobre isso:

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Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser


efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo
da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido.

Se a vítima ou seus representantes quiserem uma reparação maior, poderão ingressar com o procedimento
de liquidação para essa finalidade. Vejam-se exemplos:

A título de ilustração, considere-se que, em condenação definitiva, tenha o juiz criminal


arbitrado, como indenização mínima à vítima, o valor de R$ 15.000,00 a ser pago pelo réu
condenado. Nesse contexto, poderá o ofendido ajuizar, desde logo, no juízo cível, a ação de
execução ex delicto em relação ao montante fixado na sentença criminal e, simultaneamente,
deduzir, também no juízo cível, a liquidação da sentença penal condenatória para quantificar o
prejuízo efetivamente sofrido com a prática criminosa. Imaginando-se que, em decisão da
liquidação cível, o prejuízo total seja calculado em R$ 40.000,00, poderá o ofendido, agora, exigir
a diferença entre o valor apurado na sentença penal como indenização mínima (já objeto de
execução) e o valor total do que foi apurado em liquidação civil. Nesse caso, a nova execução
será movida em relação aos R$ 25.000,00 remanescentes. Evidentemente, nada impede que a
vítima, em vez de executar imediatamente o valor arbitrado na condenação, opte por liquidar a
sentença penal na esfera cível e, após, ingressar com uma só execução em relação ao valor total
do prejuízo (Avena, 2020).

A título de exemplo, suponha-se que, em sentença condenatória referente à prática de homicídio


culposo, tenha juiz fixado o montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) como indenização
mínima em favor dos sucessores do ofendido. Com o trânsito em julgado desta decisão, os
interessados poderão promover, de imediato, no âmbito cível, a execução deste valor, sem a
necessidade de anterior procedimento de liquidação. Concomitantemente, caso os sucessores
entendam que este quantum ficará aquém do prejuízo efetivamente causado, poderão
promover, também no juízo cível, liquidação por artigos da sentença condenatória transitada em
julgado. Supondo que o prejuízo total apurado na liquidação cível irrecorrível seja de R$
80.000,00 (oitenta mil reais), poderão os sucessores ingressar com nova ação de execução ex
delicto, limitada, todavia, à diferença entre o valor fixado na sentença condenatória irrecorrível
a título de indenização mínima e o quantum total apurado na liquidação civil, exemplo do que
prevê o Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97, art. 297, § 3º) e o Código Penal (art. 45, § 1º).
Logo, restará aos sucessores a execução da quantia restante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Como se percebe, o mesmo título executivo judicial representado pela sentença condenatória
com trânsito em julgado poderá dar ensejo, simultaneamente, à execução de valor líquido e
outro ilíquido, devendo apenas esta última passar por prévia liquidação (Lima, 2021).

Não obstante a aparente simplicidade na conjugação dos artigos de lei, algumas questões ainda são bastante
controversas e geram debate na doutrina e na jurisprudência.

1ª) Qual a natureza do dano que, por força do art. 387, IV do CPP, estará sujeito à fixação de indenização
mínima na sentença penal condenatória?

Ao dispor que na sentença condenatória o juiz fixará o valor mínimo para reparação dos danos
causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, o art. 387, IV, do CPP

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não restringiu essa indenização tão somente aos danos patrimoniais, referindo-se, ao contrário
e genericamente, à “reparação dos danos”. Nesse contexto, não vemos razão para excluir do
juízo penal a possibilidade de arbitrar valor destinado à reparação, também, de danos de ordem
moral eventualmente causados pela infração penal. Afinal, não há dúvidas de que o legislador,
permitindo ao juiz criminal, por ocasião da sentença condenatória, estabelecer indenização
mínima devida à vítima, objetivou possibilitar a esta ter satisfeito o prejuízo que lhe foi causado
pela prática criminosa com maior prontidão, sem a necessidade de aguardar as delongas de uma
fase liquidatória prévia ao ajuizamento da ação executória. Tal arbitramento, então, apenas visa
a antecipar, em parâmetros mínimos, o valor que, em liquidação de sentença, seria apurado no
juízo cível. E, no juízo cível, pela exegese do art. 186 do Código Civil, fica evidente que tanto o
dano moral quanto o patrimonial sujeitam-se à reparação. Por isso, parece-nos que a indenização
arbitrada na sentença criminal poderá sim abarcar essas duas ordens de prejuízos – moral e
patrimonial. E, no tocante à quantificação, na decisão condenatória, do valor mínimo devido a
título de dano moral, entende-se que deve ser realizada a partir de um critério de razoabilidade,
detectável com base nas circunstâncias do caso concreto. Por fim, não se alegue a possibilidade
de serem conflitantes a sentença penal condenatória que fixar a indenização mínima a título de
dano moral e a decisão eventualmente proferida em futuro processo cível de indenização,
porque, de acordo com o art. 91, I, do Código Penal, a decisão penal condenatória faz coisa
julgada na esfera cível quanto à obrigação de indenizar. Logo, se, no âmbito penal, for
estabelecida indenização mínima em decisão transitada em julgado, isso não poderá, mais tarde,
ser questionado na órbita civil. Em outras palavras, estará vinculado o juízo cível ao dano
reconhecido em sede de condenação criminal, cabendo-lhe, então, no máximo, considerar
suficiente o valor imposto ao acusado no juízo penal, mas não isentá-lo de tal obrigação ou
quantificar o dano em montante inferior ao que foi decidido na esfera criminal (Avena, 2020).

Esse mesmo entendimento, sobre a possibilidade de fixar danos morais, é defendido, dentre outros, por
RENATO BRASILEIRO, GUILHERME MADEIRA e GUILHERME DE SOUZA NUCCI, este que é mais radical em relação à
amplitude dessa reparação e até critica a norma:

Outro ponto que reputamos fraco é a previsão de fixação de valor mínimo para a reparação dos
danos, permitindo que o interessado possa ingressar na esfera cível a fim de apurar o prejuízo
efetivamente sofrido. O correto seria o estabelecimento de um valor real, debatido no processo
criminal, a fim de não sobrecarregar a esfera cível com nova discussão a respeito do mesmo
tema. Ademais, se o ofendido conseguir um valor mínimo qualquer, sem atingir o efetivamente
devido, poderá sentir-se duplamente enganado. O Judiciário fixa-lhe um valor pífio, que não o
deixa satisfeito, embora se sinta desmotivado para, novamente, demandar no cível outros
valores. Não se deve implementar uma modificação pela metade. O ideal é que a reparação civil
possa ser apurada no processo criminal de maneira ampla, sem abertura para, depois, renovar-
se o debate no cível. Por isso, pode envolver o dano moral, eventualmente, advindo pela prática
do delito. Pensamos deverem os juízes criminais, se instados pela vítima a promover a discussão
da indenização civil, buscar atingir o valor real – e não somente o mínimo – deixando consignado,
em suas sentenças, tal situação. Com isto, pode-se argumentar ter-se formado coisa julgada
material, vedando-se o acesso à órbita civil, evitando-se a sobrecarga inútil de serviço (Nucci,
2018).

A jurisprudência mais recente do STJ caminha nesse sentido, pacificando o tema:

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. VIOLAÇÃO DO ART.


387, IV, DO CPP. REPARAÇÃO CIVIL. PEDIDO EXPRESSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NECESSIDADE.
ACÓRDÃO RECORRIDO EM DESACORDO COM O ENTENDIMENTO DOMINANTE DO STJ. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "Nos termos do entendimento desta Corte Superior a reparação
civil dos danos sofridos pela vítima do fato criminoso, prevista no art. 387, IV, do Código de
Processo Penal, inclui também os danos de natureza moral, e para que haja a fixação na
sentença do valor mínimo devido a título de indenização, é necessário pedido expresso, sob pena
de afronta à ampla defesa" (AgRg no AREsp n. 720.055/RJ, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 26/6/2018, DJe 2/8/2018). 2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1615913/RS, Rel. Min. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, 6ª T., j. em 19/05/2020)

2ª) A fixação do valor de indenização exige provocação do lesado ou pode ser realizada ex officio pelo juiz?

Temos dois posicionamentos diferentes.

Há os que entendem, como RENATO BRASILEIRO e NORBERTO AVENA, que o juiz pode fixar de ofício, como parte
integrante (um tópico obrigatório) e um efeito automático da sentença condenatória, como já ocorria com
o art. 91, I do Código Penal.

Não obstante seja essa a tendência da jurisprudência atual (proibição ao arbitramento da


indenização ex officio pelo juiz), sempre comungamos da orientação oposta, isto é, de que pode
sim o juiz, ex officio, fixar a indenização mínima a que alude o art. 387, IV, do CPP. Tal raciocínio
decorre, sobretudo, dos termos peremptórios incorporados a esse artigo, dispondo que, ao
proferir sentença condenatória, o juiz fixará valor mínimo para reparação dos danos causados
pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Como se vê, o texto legal não
refere que o juiz poderá fixar tal quantitativo, tampouco condiciona a que haja um pedido a
respeito.

Há os que, de forma majoritária, sustentam que o juiz, para fixar, depende de pedido:

[...] para aqueles que entendem que não é efeito automático da sentença, há necessidade de
observância do contraditório, vale dizer a parte não pode ser surpreendida por uma decisão
sobre a qual não teve ela a oportunidade de questionar e por isso haveria necessidade de pedido.
O nosso entendimento caminha no sentido de que deveria haver pedido sobre esta pretensão,
ou seja, sobre a questão da indenização para que pudesse o acusado exercer o contraditório
(Dezem, 2020).

[...] não tendo havido requerimento expresso, inexistiria discussão nos autos em relação ao valor,
motivo pelo qual seria incabível a fixação de um montante qualquer, que não foi objeto de debate
entre as partes interessadas. [...] O dever de reparar o dano, em virtude do crime, é consagrado
pelo artigo 91, I, do CP; porém, o montante da indenização sempre foi discutido sob o crivo do
contraditório, permitindo-se a ampla defesa. Se o juiz da condenação, sem prévio debate das
partes, simplesmente fixar um valor qualquer, ter-se-á rompido o tradicional e indeclinável
devido processo legal (Nucci, 2018).

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De todo modo, AVENA registra ter prevalecido esse segundo entendimento nos tribunais superiores:

Não obstante esta nossa compreensão, é certo que a jurisprudência nacional, muito
especialmente a dos Tribunais Superiores, sedimentou entendimento oposto, compreendendo
que o arbitramento, na sentença condenatória, de valor mínimo para reparação dos danos
causados à vítima pela prática da infração penal pressupõe requerimento expresso na denúncia
ou na queixa, independentemente da natureza do dano a ser indenizado, vale dizer, material ou
moral. E mais: de acordo com essa linha de pensamento, é necessária, também, a especificação
da respectiva quantia, a fim de que estas questões - a ocorrência do dano e sua mensuração -
possam ser objeto de contraditório e instrução probatória no curso do processo criminal.
Atenção: a despeito deste entendimento, o STJ em sede de recurso repetitivo (Tema Repetitivo
983, firmado no julgamento do REsp 1675874/MS, em 28.02.2018), firmou tese no sentido de
que, relativamente à fixação do dano moral nos casos de violência doméstica ou familiar contra
a mulher, embora persista a necessidade de requerimento expresso da indenização mínima, não
é imprescindível a especificação do respectivo valor, tampouco sendo necessária instrução
probatória a respeito. Na oportunidade, entendeu a Terceira Seção da Corte que “justifica a não
exigência de produção de prova dos danos morais sofridos com a violência doméstica a
necessidade de melhor concretizar, com o suporte processual já existente, o atendimento
integral à mulher em situação de violência doméstica, de sorte a reduzir sua revitimização e as
possibilidades de violência institucional, consubstanciadas em sucessivas oitivas e pleitos perante
juízos diversos”. Reitera-se que esta tese incide apenas em relação ao estabelecimento da
indenização mínima por danos morais, pois, conforme excerto do julgamento “por óbvio, os
danos materiais dependem de comprovação do prejuízo, como sói ocorrer em ações de natureza
similar”, sendo necessária, então, quanto a estes, a prévia estipulação do valor desejado (Avena,
2020).

Dentro desse contexto, também se discute o seguinte: 3ª) o pedido deve ser feito pela vítima (ou seu
representante) ou o Ministério Público teria legitimidade para isso?

Considerando que, ao ofendido, mais do que a qualquer outro sujeito processual, releva ter
ressarcidos os prejuízos materiais ou morais sofridos em consequência da prática criminosa,
reputamos que a ele, ao seu representante legal ou, em caso de morte ou ausência, ao seu
cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, por meio de advogado, incumbe postular ao juízo
que estabeleça na sentença condenatória a indenização mínima referida no art. 387, IV, do CPP.
Sem embargo desta conclusão, igual faculdade deve ser conferida ao Ministério Público,
legitimidade esta que se sustenta, inclusive, em analogia aos dispositivos incorporados ao Código
de Processo Penal que permitem ao parquet alcançar ao lesado a reparação dos danos causados
pela prática criminosa (p. ex. os arts. 68 e 142 do CPP) (Avena, 2017).

De todo modo, parece-nos somente o ofendido poderia solicitar a indenização [...] o pedido não
poderia vir expresso na denúncia, oferecida pelo Ministério Público, pois inexiste legitimidade
para o parquet se manifestar em nome da vítima com fundamento em interesse puramente civil,
como é a indenização pleiteada (Nucci, 2018).

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A jurisprudência do STJ começou a se consolidar, não faz muito, mediante tese firmada em repetitivo afetado
na sessão do dia 11/10/2017 (Terceira Seção). Até a questão sobre a necessidade ou não de especificar e
provar o valor foi definida, inclusive de forma diversa de como o mesmo Tribunal já tinha decidido.

Tese firmada nº 983: Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é
possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da
acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução
probatória (Recurso Especial n. 1.675.874/MS afetado, em substituição ao REsp n. 1.683.324/DF, para
julgamento sob o rito dos repetitivos, em conjunto com o REsp n. 1.643.051/MS).

Algumas informações adicionais e passagens do voto vista do Ministro FELIX FISCHER:

"[...] a simples relevância de haver pedido expresso na denúncia, a fim de garantir o exercício
do contraditório e da ampla defesa, ao meu ver, é bastante para que o Juiz sentenciante, a
partir dos elementos de prova que o levaram à condenação, fixe o valor mínimo a título de
reparação dos danos morais causados pela infração perpetrada, não sendo exigível produção de
prova específica para aferição da profundidade e/ou extensão do dano. O merecimento à
indenização é ínsito à própria condição de vítima de violência doméstica e familiar. O dano, pois,
é 'in re ipsa'". [...] "A reforma do processo penal, ao prever a regra do art. 387, inc. IV, do Código
de Processo Penal, autorizando o juiz a fixar valor mínimo da indenização dos danos decorrentes
da infração penal, teve, dentre outros objetivos, remodelar o papel da vítima no processo. O
lesado passou a ter seus interesses (patrimoniais e extrapatrimoniais) tutelados, ainda que de
modo parcial e acessório. Essa tendência de 'reposicionamento' da vítima se reflete na
preocupação do sistema penal também com a responsabilidade civil [...]. E tal caminho vem
sendo reiteradamente acolhido por esta Corte Superior, ao admitir, tanto a fixação de danos
morais na sentença penal condenatória, como a dispensa da exigência de quantificação do
montante pretendido por ocasião do pedido, até mesmo para se evitar o desvirtuamento da
finalidade precípua da ação penal, que diz respeito a elucidação da infração penal propriamente
dita.

Repare: são cinco (5) as conclusões que poderíamos retirar da tese firmada:

1) o valor mínimo para reparação comporta os danos morais;


2) a fixação desse valor mínimo depende de pedido expresso;
3) esse pedido pode ser feito pela vítima ou pelo Ministério Público;
4) não é necessário especificar a quantia;
5) não há necessidade de instrução probatória.

Não obstante, o próprio STJ, mais recentemente, por ambas as Turmas, não tem seguido a linha traçada pela
tese firmada:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM


TRIBUTÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ART. 387, IV, DO CPP. EXISTÊNCIA DE
PEDIDO EXPRESSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE INSTRUÇÃO ESPECÍFICA NO
CURSO DO PROCESSO. INOBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO
CONTRADITÓRIO. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A fixação de valor mínimo para

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reparação dos danos materiais causados pela infração exige, além de pedido expresso na inicial,
a indicação de valor e instrução probatória específica. Precedentes. 2. Agravo regimental
improvido. (AgRg no REsp 1856026/SC, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, 6ª T., julgado em 16/06/2020)

[...] 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que "a fixação de valor
mínimo para reparação dos danos materiais causados pela infração exige, além de pedido
expresso na inicial, a indicação de valor e instrução probatória específica, de modo a possibilitar
ao réu o direito de defesa com a comprovação de inexistência de prejuízo a ser reparado ou a
indicação de quantum diverso" (AgRg no REsp 1.724.625/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS,
QUINTA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe de 28/06/2018.) 2. No caso em comento, há
pedido expresso na denúncia, mas não houve instrução probatória específica sobre o quantum
apontado como devido. [...] (AgRg no REsp 1844856/SC, Rel. Min. JORGE MUSSI, 5ª T., julgado
em 05/05/2020)

Então, na forma mais atualizada de compreender a questão pela jurisprudência do STJ, pelo menos em casos
outros (que não os de violência doméstica) e com relação a danos materiais, teríamos o seguinte:

1) o valor mínimo para reparação comporta os danos morais;


2) a fixação desse valor mínimo depende de pedido expresso;
3) esse pedido pode ser feito pela vítima ou pelo Ministério Público;
4) não é necessário especificar a quantia;
5) não há necessidade de instrução probatória.

3ª) A norma do art. 387, IV do CPP é de natureza processual ou mista? Lembre que isso tem relevância para
definir sobre a aplicação nos processos em curso.

Não há dúvida de que temos aqui um conteúdo material, mas não de direito penal e sim de
direito civil. Vale dizer: o legislador reconheceu o dever do juiz de fixar valor mínimo da
indenização e esta indenização é de natureza civil, afastando-se, portanto do antigo sistema da
confusão. Ao se fazer esta distinção entendemos, portanto que esta norma embora possua
conteúdo civil ela é regida pelo disposto no art. 2º do CPP, ou seja, possui sua eficácia imediata.
No âmbito do STJ prevaleceu tratar-se de regra de direito material que só pode ser aplicada
aos crimes cometidos após sua vigência: “2. No caso, o disposto no art. 387, IV, do Código de
Processo Penal (norma de direito material mais rigorosa ao réu), que cuida da reparação civil dos
danos sofridos pelo ofendido, foi aplicado a delito praticado antes da entrada em vigor da Lei n.
11.719/2008” (STJ, AgIn no HC 331.162/PE, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe 25.04.16) (Dezem,
2020).

Além dessas três questões mais relevantes, trazemos aqui na obra, na busca da completude, mais algumas
indagações tratadas por NORBERTO AVENA:

Como será feita a prova do dano no juízo criminal e a quantificação do valor mínimo devido a
título de indenização? Para que alguém seja responsabilizado pela reparação de danos, é
necessário nexo de causalidade entre a ação ou omissão do agente e o prejuízo sofrido pela
vítima. Esta, a propósito, é a exegese clara do art. 186 do Código Civil. Neste contexto, para que
possa o juiz concretizar na sentença condenatória o disposto no art. 387, IV, do CPP,

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imprescindivelmente, deverão estar presentes nos autos provas que lhe permitam aferir a
existência de um prejuízo sofrido pela vítima e a relação desse prejuízo com a conduta objeto da
condenação penal. Realizado o pedido de indenização pelo MP ou pelo ofendido, a eles caberá
trazer os elementos que permitam ao juiz quantificar o mínimo da indenização devida. Tratando-
se, porém, de dano moral decorrente de crime praticado com violência doméstica ou familiar
contra a mulher, faculta-se ao juiz, ex officio, de acordo com seu prudente arbítrio, “decidir sobre
um montante que, relacionado à dor, ao sofrimento, à humilhação da vítima, de difícil
mensuração, deriva da própria prática criminosa experimentada” (STJ, Tema Repetitivo 983, REsp
1675874/MS, j. 28.02.2018).

É possível ao próprio réu condenado ajuizar liquidação cível da sentença penal transitada em
julgado com o objetivo de reduzir o montante da indenização nela fixada? Pensamos que é
possível essa discussão em sede liquidatória, sem que isso importe em qualquer ofensa à coisa
julgada ditada pela condenação criminal definitiva. Isso porque não parece correto que o juízo
penal vincule a decisão do juízo civil, desrespeitando o sistema da separação sempre adotado
pelo nosso ordenamento jurídico, o qual estabelece a autonomia das decisões penais e civis, bem
como as regras de competência, do livre convencimento e do devido processo legal.

É possível ao réu, após o trânsito em julgado de sentença condenatória, propor revisão criminal
em relação à parte da sentença que, ao condená-lo, fixou valor a título de indenização mínima
à vítima? Como já dissemos, essa fixação faz parte da sentença condenatória. Logo, não há como
negar a possibilidade de revisão criminal em casos tais. Considere-se, por exemplo, que após o
trânsito em julgado da condenação, obtenha o réu a prova de que o prejuízo que teria sofrido a
vítima, móvel da indenização fixada na condenação criminal, não apresenta nexo de causalidade
com a conduta pelo qual restou ele condenado. Nesse caso, perfeitamente viável a
desconstituição da decisão judicial na parte em que fixada a indenização contemplada no art.
387, IV, fundamentando-se, nesse caso, a ação revisional no art. 621, III, do CPP, aplicável à
hipótese por interpretação extensiva (art. 3.º do CPP).

Qual a solução a ser conferida no caso de a vítima, ou quem de direito, já ter interposto a ação
civil reparatória no juízo cível (art. 64 do CPP) antes da fixação do valor mínimo de reparação
no âmbito penal? Não vemos aí qualquer impasse. Se por ocasião da sentença condenatória, já
houver decisão definitiva proferida no juízo cível, estabelecendo no âmbito de ação ordinária de
indenização o quantum devido pelo autor do crime à vítima, restará prejudicada a aplicação, no
juízo penal, do art. 387, IV, do CPP. Entretanto, se naquela sede (civil) ainda não houver decisão
definitiva, a superveniência do trânsito em julgado da sentença penal condenatória não obstará,
necessariamente, o prosseguimento da demanda cível, o que pode se justificar, por exemplo, na
hipótese de o seu autor (a vítima do crime), na inicial, ter postulado a condenação do réu ao
pagamento de quantia certa, superior à fixada na condenação penal a título de valor
indenizatório mínimo. Agora, se a inicial da ação cível limitou-se a pleitear a condenação do réu
ao pagamento de indenização, relegando para uma fase liquidatória posterior a quantificação do
dano a ser reparado, nesse caso, efetivamente, não haverá a menor razão para o prosseguimento
da demanda cível, que poderá ser extinta ou prosseguir apenas em relação a eventuais
corresponsáveis civis que não tenham sido condenados criminalmente. Isso porque, por meio da
sentença penal, logrou o ofendido alcançar, em relação ao condenado, o título executivo judicial
que estava buscando obter na esfera civil.

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A regra do art. 387, IV, possui aplicação em sede de sentença proferida no Tribunal do Júri a
partir do veredicto condenatório determinado pelo Conselho de Sentença? Não vemos
qualquer óbice. Nem mesmo o argumento acerca da dificuldade de mensuração do valor a ser
arbitrado parece constituir entrave intransponível, pois a indenização mínima, aqui, poderá
respeitar, por exemplo, ao ressarcimento de despesas hospitalares causadas à vítima em razão
do atentado a sua vida. Observe-se, ademais, que, segundo o art. 492 do CPP, a sentença
proferida pelo juiz-presidente no âmbito do Tribunal do Júri quando condenado o réu pelos
jurados, além dos requisitos específicos que a peculiarizam, observará as demais disposições do
art. 387 deste Código, o que, evidentemente, inclui o inciso IV desse artigo.

A regra do art. 387, IV, possui aplicação na hipótese de sentença condenatória por crime sem
vítima certa e determinada? Exemplificamos: imagine-se a hipótese de indivíduo condenado por
crime de tráfico de drogas. Poderia, nesse caso, o Juiz, valendo-se do art. 387, IV, do CPP, fixar
valor mínimo devido a título de indenização para o Estado? Muitos consideram que isso não é
possível. Alegam, para tanto, que a aplicação do mencionado art. 387, IV, exige que haja, nos
autos, provas que permitam ao Magistrado aferir a existência de um prejuízo concreto sofrido
pela vítima e a relação desse prejuízo com a conduta objeto da condenação penal. Sob tal viés,
em casos como o de tráfico de drogas, no qual figura como vítima a coletividade, não havendo,
portanto, ofendido certo e determinado, a impossibilidade de quantificação do prejuízo sofrido
inviabilizaria a aplicação da precitada disciplina legal. Não concordamos, pois, primeiramente, o
art. 387, IV, do Código de Processo Penal não vincula o estabelecimento da indenização a que se
refere à existência de um prejuízo patrimonial matematicamente quantificável sofrido por
ofendido certo e determinado. E, como segundo fundamento, invoca-se uma questão de
coerência jurídica e, até mesmo, de proporcionalidade. Afinal, mais uma vez trazendo a hipótese
de condenação do agente por tráfico de drogas, não seria juridicamente coerente, nem mesmo
proporcional, reputar indenizável a prática de crimes que vitimam pessoa certa e determinada
(crimes que, muitas vezes, geram prejuízos de pequena monta) e ignorar o elevado dano social
causado pelo traficante que persegue, com sua conduta, o lucro fácil em detrimento da saúde da
coletividade (Avena, 2020).

Para consolidar, um esquema do mesmo autor:

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Sentença penal condenatória transitada em julgado com fixação de valor


mínimo a título de indenização ao lesado (art. 387, IV, do CPP)

Providências facultadas ao
ofendido:

Ajuizar imediatamente ação de execução ex Desprezar o valor mínimo arbitrado pelo


delicto pelo valor mínimo apurado na juiz na sentença penal condenatória e
sentença condenatória. proceder à liquidação desta decisão no
juízo cível.

Simultaneamente a essa providência,


liquidar a sentença penal condenatória no Uma vez apurado o valor do
juízo cível e, após quantificado o valor do prejuízo efetivamente sofrido,
dano efetivamente sofrido, ingressar com ajuizar, então, na esfera cível, uma
nova ação de execução ex delicto tendo só ação de execução ex delicto,
como objeto a diferença entre o quantum fundada, igualmente, no art. 63 do
final apurado na liquidação civil e o valor CPP, porém tendo como objeto o
inicialmente fixado na condenação penal valor total do prejuízo apurado na
(art, 63, parágrafo único, do CPP) liquidação.

4.2 - Em caso de absolvição

Trataremos, agora, sobre a sentença absolutória e suas repercussões na ação civil ex delicto.

Depois de tanta informação, convém relembrar a regra geral: sempre que a decisão criminal for de mérito,
categórica e definitiva sobre a existência do fato (materialidade) e sobre a autoria, ela terá força
vinculatória no cível, com formação de coisa julgada.

Pois bem, é assim também com relação à sentença absolutória, que é uma decisão de mérito e pode ser
definitiva se transitada em julgado. Sempre que ela não for categórica, sempre que traduzir dúvida, não fará
coisa julgada, permitindo a rediscussão cível. Vejamos novamente o que diz o CPP e o Código Civil, de onde
extraímos a regra geral:

Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta
quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

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Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais
sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal.

O art. 386 do Código de Processo Penal estabelece várias hipóteses de absolvição. A vinculação ou não da
sentença vai depender da hipótese erigida para absolvição. As situações que representarem dúvida não
vincularão a esfera cível; ao contrário, as situações que constituírem uma decisão categórica farão coisa
julgada.

Vamos trazer o art. 386, paulatinamente, conforme as hipóteses tratadas:

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato; [...]

IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; [...]

Essas são situações aplicadas numa pequena minoria dos casos, onde a decisão de mérito, em relação à
materialidade e autoria, é tomada em juízo de certeza (categórica, portanto), baseada em provas que
traduziram a convicção judicial. Na primeira o juiz entendeu que foi comprovado que o fato não existiu; na
segunda, que foi comprovado que o acusado não concorreu para a infração penal. Nessas hipóteses, o juiz
do cível jamais poderá dizer diferente em relação à existência do fato ou sua autoria.

Nestas duas situações, igualmente, a absolvição criminal faz coisa julgada no cível e impede a
dedução de ação de indenização contra o ofensor absolvido em processo criminal. Isso ocorre
pela mesma razão já vista anteriormente e que justifica a vinculação entre a sentença
condenatória criminal e a obrigação de indenizar, qual seja, a segunda parte do art. 935 do Código
Civil, prevendo que, embora, como regra geral, a responsabilidade civil seja independente da
criminal, “não se poderá mais questionar sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu
autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal” (Avena, 2020).

Diferente dos incisos II e V do art. 386 do CPP.

II - não haver prova da existência do fato; [...]

V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; [...]

Ambos, tratando da existência do fato e da autoria, começam falando em não haver prova e não existir prova,
respectivamente. Embora de mérito, são exemplos de decisões ‘não categóricas’, proferidas em juízo de
dúvida razoável e com base no in dubio pro reo. Por essas premissas, não farão coisa julgada nem vincularão
o processo civil – este que pode, diante da sua autonomia, produzir provas mais contundentes e eficazes,
afastando-se eventual dúvida anteriormente existente no processo penal.

Cabe ressaltar que muito diferente é a hipótese em que o Magistrado absolve o réu, aduzindo
que não há provas de que o fato existiu (art. 386, II, do CPP) ou de que não há provas de que ele
concorreu para a infração penal (art. 386, V, do CPP). Nestes casos, as questões atinentes à

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materialidade e autoria não estão efetivamente “decididas” no âmbito criminal e,


consequentemente, não elidem a potencial ação ordinária na esfera cível (Avena, 2020).

O mesmo se diga (não faz coisa julgada) em relação ao inc. VII do art. 386 do CPP:

VII – não existir prova suficiente para a condenação.

É hipótese residual de absolvição, não havendo outra mais específica. Traz a dúvida em seu mais alto grau e,
por isso mesmo, não é categórica. Não se cogita de força vinculativa.

Vejamos outra situação do art. 386 do CPP:

III - não constituir o fato infração penal;

O inciso III está se referindo à atipicidade da conduta imputada ao agente, seja no plano formal, seja no plano
material – e não vai ter força vinculatória no cível. Até porque, é possível que um mesmo fato não constitua
um ilícito penal e constitua um ilícito civil. Vejamos o que diz, em outro ponto, o CPP:

Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil: [...]

III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.

Desta forma a sentença absolutória que entende que o fato não constitui crime (art. 67, III, c.c.
art. 386, III) não produz efeitos. Imagine-se o caso de um comentário ofensivo é possível que esta
pessoa que produziu o comentário ofensivo seja processada criminalmente e absolvida por
atipicidade da conduta e ao mesmo tempo seja condenada no juízo cível como tendo produzido
um ato ilícito. Isso porque o ilícito penal e o ilícito civil não necessariamente são coincidentes. O
ilícito civil é estabelecido no art. 186 do CC/2002: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito”. Diante da disposição do Código Civil fica claro que um fato pode ser
um ilícito civil, mas não ser ilícito penal daí o código acertadamente estabelecer que não produz
qualquer efeito a sentença que reconhece que o fato é atípico. Assim, absolvido na esfera penal
por atipicidade da conduta, isso não impedirá a propositura de ação de indenização por danos
morais por exemplo (Dezem, 2020).

Parte da doutrina ressalva, todavia, a hipótese de crime culposo: considerando que a culpa se
exterioriza por meio da imprudência, negligência ou imperícia, se acaso o indivíduo for absolvido
no processo criminal sob o fundamento de ter sido comprovada a ausência de quaisquer das
modalidades da culpa, esta absolvição deve refletir no âmbito cível. Soaria contraditório que o
juiz criminal reconhecesse a ausência de imprudência, negligência ou imperícia, e o juiz cível,
posteriormente, atestasse sua presença (Lima, 2021).

VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22,
23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua
existência;

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Essa hipótese do art. 386 tem relação com o art. 65 do CPP e com o art. 188 do Código Civil:

Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em
estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no
exercício regular de direito.

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo


iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o
tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção
do perigo.

Nessa situação, o acusado absolvido por sentença criminal transitada em julgado, por qualquer dessas
excludentes de ilicitude, não poderá, em princípio, ser responsabilizado na instância cível. Os atos não são
ilícitos penais e nem ilícitos civis.

Dentro daquela regra geral, caso a sentença absolutória seja proferida em juízo de certeza com relação ao
reconhecimento da excludente, sendo a decisão categórica, terá força vinculatória.

O Código Civil estabelece duas exceções; duas hipóteses nas quais, mesmo absolvido sob a égide de
excludentes, poderá o ofendido ser demandado na órbita cível:

1ª) Legítima defesa em que, por erro na execução, atinge-se terceiro inocente. Considere-se a
hipótese de que o agente, ao defender-se de agressão injusta, atual ou iminente, por acidente
ou erro na execução, atinja a pessoa de um terceiro completamente inocente, vale dizer, não
envolvido na relação que motivou a reação legítima. Ainda que venha o autor da repulsa a ser
absolvido sob a égide da legítima defesa, nem por isso estará isento da obrigação de indenizar
os danos pessoais e patrimoniais que tiver causado à vítima lesada pelo erro na realização do
gesto defensivo. Poderá, então, responder civilmente a ação de indenização, restando-lhe
ingressar, posteriormente, com a via regressiva cabível contra o indivíduo que lhe motivou a justa
reação, nos termos do art. 930, parágrafo único, do Código Civil.
2ª) Estado de necessidade agressivo. Por estado de necessidade compreende-se a situação de
perigo atual, não provocado voluntariamente pelo agente, em que este lesa bem de outrem a
fim de não sacrificar direito próprio ou alheio cujo sacrifício não lhe poderia ser razoavelmente
exigido. Quanto a quem sofre a ofensa em face do agir necessário do réu, classifica-se o estado
de necessidade em duas formas:
– Estado de necessidade defensivo: ocorre quando o agente, ao praticar o ato necessário descrito
no tipo penal, sacrifica bem jurídico pertencente à própria pessoa que gerou a situação de perigo.
Exemplo: para evitar uma inundação, o agente desvia o curso de um riacho (crime ambiental) em
direção à propriedade do indivíduo que causou o rompimento de um dique.

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– Estado de necessidade agressivo: verifica-se quando a prática do ato necessário importa em


sacrifício de bem jurídico de terceiro inocente. Exemplo: visando a fugir de um desafeto que o
perseguia, o agente invade domicílio alheio, causando danos materiais para nele ingressar.
Embora ambas as modalidades do estado de necessidade excluam a ilicitude da conduta
praticada e conduzam à absolvição do agente, no primeiro caso (estado de necessidade
defensivo), na medida em que o bem jurídico lesionado pertence ao próprio causador do perigo,
a sentença absolutória criminal obsta ao ofendido promover a responsabilização civil do autor
do fato típico. Assim, no exemplo anterior, não seria facultado ao proprietário da área inundada
pelo desvio do curso d’água pretender ressarcir-se dos prejuízos patrimoniais que tenha sofrido,
já que ele foi quem deu causa à situação de perigo (inundação) ao provocar o rompimento de
um dique de contenção. Opostamente, tratando-se da segunda hipótese (estado de necessidade
agressivo), o ofendido poderá acionar civilmente o causador do dano, restando a este,
unicamente, promover ação de regresso contra quem provocou a situação de perigo. Destarte,
no exemplo alhures, poderia o proprietário da casa invadida ressarcir-se dos prejuízos materiais
que lhe foram causados pelo agente invasor, cabendo a este último, então, ingressar com a ação
regressiva cabível contra o indivíduo que o perseguia. Essa distinção dos reflexos civis que
decorrem da sentença penal absolutória, conforme se reconheça no agir do réu um estado de
necessidade defensivo ou um estado de necessidade agressivo, decorre da regra do art. 929 do
Código Civil, estabelecendo que se a pessoa lesada não for culpada do perigo, terá o direito de
buscar indenização pelo prejuízo que sofreu, bem como do que dispõe o art. 930 desse mesmo
diploma, ao preceituar que, se o perigo ocorreu por culpa de terceiro, contra este terá o autor
do dano ação de regresso para reaver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

Eis o art. 930 do Código Civil:

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este
terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano

No mesmo sentido, a lição de MADEIRA:

Ocorre que estas causas de exclusão da antijuridicidade podem atuar de maneira defensiva ou
agressiva. Quando atuarem de maneira defensiva então o art. 66 tem plena eficácia. A pessoa
que mata outra em legítima defesa não poderá ser processada na esfera civil pelos sucessores
da vítima. No entanto como é sabido pela doutrina penal é possível que essas causas de exclusão
da antijuridicidade atinjam terceira pessoa. Nesta situação a causa excludente é agressiva, pois
atinge bem de terceiro que não é obrigado a suportar o dano provocado pela pessoa e desta
forma é possível o ajuizamento de ação civil indenizatória. Imagine-se que alguém em estado de
necessidade tenha que sacrificar um bem de terceiro para se salvar. Nesta situação este terceiro
poderá processar aquele que sacrificou o seu bem, pois não é obrigado a suportar o dano causado
a si. Então quando se tratar de causa excludente da antijuridicidade defensiva haverá a
produção de efeitos civis nos termos do art. 66. Quando se tratar de causa excludente da
antijuridicidade agressiva não haverá a produção de eficácia civil da sentença penal podendo
haver a promoção da ação civil indenizatória.

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Situação diferente é das excludentes de culpabilidade: “eventual absolvição do acusado com


base no reconhecimento categórico de causa exculpante (v.g. erro de proibição, coação moral
irresistível, obediência hierárquica, inexigibilidade de conduta diversa, embriaguez completa
proveniente de caso fortuito ou força maior) não faz coisa julgada no âmbito cível” (Lima, 2021).

Quanto à sentença absolutória imprópria [...] algumas observações são importantes.


Entende-se que a sentença absolutória imprópria é aquela que aplica a medida de
segurança nos termos do art. 26, caput, do CP não é capaz de produzir qualquer eficácia civil.
Não serve ela como título executivo, pois não é sentença condenatória e também ao mesmo
tempo não impede a propositura de ação civil nos termos do art. 932 do CC/2002 (Dezem, 2020).

Sentença absolutória imprópria: é aquela que, considerando a total inimputabilidade do agente


ao tempo da infração penal, absolve-o com a imposição de medida de segurança (art. 386, VI, 2.ª
parte e parágrafo único, III, do CPP c/c o art. 97 do CP). Importante observar que apesar de impor
medida de segurança ao acusado, esta espécie de sentença não possui natureza condenatória,
razão pela qual lhe são estranhos e, portanto, inaplicáveis, os efeitos, penais ou extrapenais,
atinentes à condenação, previstos nos arts. 91 e 92 do Código Penal, no art. 15, III, da
Constituição Federal e em dispositivos de leis especiais (Avena, 2020).

Ainda com relação às excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, sempre que a decisão for baseada na
regra probatória do in dubio pro reo, portanto não categórica, não terá ela o condão de impedir que o
acusado seja acionado civilmente (Lima, 2021).

E quando se tratar de absolvição criminal fundamentada na ocorrência de descriminantes putativas?

Chamam-se de descriminantes putativas (legítima defesa putativa, estado de necessidade


putativo, exercício regular de direito putativo e estrito cumprimento do dever legal putativo) as
condutas praticadas pelo agente que, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias,
julgando estar albergado por uma excludente de ilicitude, comete um ato ilícito. Trata-se, enfim,
de estados imaginários decorrentes de equivocada apreciação dos fatos. No caso da legítima
defesa putativa, por exemplo, o erro de fato incide sobre a existência da situação de legítima
defesa, que, em verdade, não está presente. O mesmo ocorre no estado de necessidade putativo,
em que não estão presentes os seus pressupostos, embora o autor tenha acreditado, por erro,
na sua efetiva ocorrência. Exemplo: Supondo o agente que está na iminência de ser alvejado por
um desafeto, desfere-lhe, com uso de uma faca, um golpe letal. Posteriormente, é constatado
que referido desafeto encontrava-se desarmado. Neste caso, agiu o ofensor em legítima defesa
putativa.

Como as descriminantes putativas, ao contrário dos estados reais, não implicam exclusão da
ilicitude da conduta, afastando, isto sim, a sua tipicidade (Teoria Limitada da Culpabilidade), há
controvérsias quanto aos reflexos cíveis que decorrem do seu reconhecimento. Indaga-se, em
síntese, se, uma vez absolvido o réu ao fundamento de legítima defesa putativa, poderá o
ofendido buscar do agente a reparação dos danos que lhe foram causados. Há duas posições:

Primeira: A conduta amparada pelas descriminantes putativas decorre, necessariamente, de


negligência na apreciação dos fatos, razão pela qual não exclui a responsabilidade civil pelos

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danos causados ao ofendido, em respeito, inclusive, ao disposto no art. 186 do Código Civil. De
acordo com esta ótica, tais descriminantes não se incluem no alcance do art. 65 do Código de
Processo Penal, aplicando-se, em consequência, a regra da independência da responsabilidade
criminal em relação à civil. Adotando esta posição, decidiu o STJ no julgamento do Recurso
Especial n.º 513.891/RJ que “a legítima defesa putativa supõe negligência na apreciação dos fatos
e por isso não exclui a responsabilidade civil pelos danos que dela decorram”.

Segunda: O reconhecimento das causas putativas não pressupõe, obrigatoriamente, negligência


do agente na apreciação dos fatos. Logo, é preciso diferenciar: Não ocorrendo agir negligente, as
descriminantes putativas equiparam-se às causas que excluem a ilicitude da conduta (legítima
defesa real, estado de necessidade real, estrito cumprimento do dever legal real e exercício
regular de direito real), afastando a obrigação de indenizar com base no art. 65 do CPP. Agora,
se, ao contrário, evidenciar-se o agir negligente do autor do fato, neste caso a absolvição criminal
sob o fundamento daquelas descriminantes não impede o ofendido de buscar o ressarcimento
do dano que lhe foi causado. Aderindo a esta linha de pensamento, HUMBERTO TEODORO JÚNIOR
ensina que “a legítima defesa putativa se equipara à real, para efeito de excluir a ilicitude da
reação. O direito penal isenta de pena tanto o autor da legítima defesa real como o da legítima
defesa putativa. Mas, segundo certa doutrina, para o agente ficar isento do dever de indenizar é
preciso que não tenha incorrido culposamente na suposição errônea da agressão, que de fato
inexistiu” (in: Comentários ao Novo Código Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. III, t. II,
p. 138) (Avena, 2020).

O arquivamento do inquérito policial tem reflexos sobre a obrigação de indenizar? NÃO. Vejamos regra
expressa nesse sentido, lembrando que a decisão de arquivamento não constitui, estritamente, uma decisão
de mérito categórica e não é, necessariamente, definitiva19.

Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:

I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;

No que se refere à extinção da punibilidade, assim consigna a lei:

Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil: [...]

II - a decisão que julgar extinta a punibilidade;

Um esquema para consolidarmos o que vimos até agora:

19
Falamos sobre essa decisão na aula passada.

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Sentença penal
absolutória
definitiva

Regra geral: independência


entre o crime e o cível

Não impedem a ação Exceções à


de indenização civil independência entre o
crime e o cível

Extinção da Arquivamento
punilibidade (art, 67, de inquérito Excludentes de Prova de que o fato
II, do CPP) policial (art. 67, ilicitude (art. 65 inexistiu/réu não
I, do CPP) do CPP) concorreu (art. 935
do CPP)
Absolvições em geral,
não abrangidas pelos Exceções
arts. 65 do CPP e 935
do CC
Estado de Erro na execução na
Descriminantes Falta de necessidade legítima defesa (art.
putativas (não provas para agressivo (arts. 930, parágrafo único,
excluem a condenação 929 e 930 do CC) do CC)
ilicitude)

Falta de prova da Falta de prova de


existência do fato envolvimento do
réu

Todavia, há se distinguir algumas situações, pela lição de NORBERTO AVENA20:

Extinção da punibilidade pela anistia, graça e indulto: a anistia é medida que se


fundamenta no interesse coletivo, normalmente motivada por questões de ordem
política e que se aplica, principalmente, aos crimes políticos, militares e eleitorais, embora
nada impeça se refira a qualquer outra infração penal. É concedida por lei emanada do
Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República. Quanto ao seu alcance, caberá
ao Poder Judiciário defini-la a partir da interpretação da lei que a concede. É causa que extingue
a punibilidade (art. 107, II, do CP), sendo que a sua concessão pode ocorrer antes da sentença ou
até mesmo depois da condenação transitada em julgado. Relativamente a seus reflexos sobre os
efeitos da decisão condenatória, a anistia extingue todos os efeitos penais decorrentes da prática
do crime, seja o efeito principal ou os efeitos secundários, mas não produz qualquer repercussão
sobre os efeitos extrapenais. Assim, concedida após a condenação definitiva, não impede seja a
sentença criminal normalmente executada no juízo cível para efeitos de reparação dos danos
provocados à vítima, conforme autorizam os arts. 91, I, do CP; 63 do CPP e art. 515, VI, do

20
Autor do esquema desta página.

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CPC/2015. Em sentido oposto, NUCCI, entendendo que o reconhecimento da anistia “faz com que
desapareça o título executivo judicial”. Já quanto à graça e ao indulto, constituem-se em outras
formas de indulgência do poder público, também importando em extinção da punibilidade (art.
107, II, do CP). Ambos apenas podem ser concedidos pelo Presidente da República, embora possa
ele delegar essa atribuição ao Ministro de Estado ou a outras autoridades, nos termos do art. 84,
XII e parágrafo único, da Constituição Federal. Em tese, tanto a graça como o indulto apenas
podem ser concedidos após condenação transitada em julgado. Observe-se que bastante
semelhantes estes benefícios, diferenciando-se apenas no fato de que “a graça é em regra
individual e solicitada, enquanto o indulto é coletivo e espontâneo”. No que concerne aos efeitos
da condenação, a graça e o indulto apenas atingem o efeito penal principal (pena), subsistindo
todos os efeitos penais secundários, bem como os efeitos extrapenais. Destarte, não impedem a
execução da sentença condenatória definitiva no juízo cível. Neste sentido, a propósito, a Súmula
631 do STJ, editada em 24.04.2019: “O indulto extingue os efeitos primários da condenação
(pretensão executória), mas não atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais”.

Extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória: considere-se que


determinado réu seja condenado, transitando em julgado a sentença para a acusação.
Certificado este trânsito pelo escrivão, retornam os autos ao juiz que, então, verificando a
impossibilidade de aumento da reprimenda em grau recursal dada à ausência de recurso do
Ministério Público, procede à extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória.
A extinção da punibilidade, no caso, prejudicará o efeito principal da sentença. No entanto,
subsistem todos os secundários.

Extinção da punibilidade pela morte do agente: o reflexo da extinção da punibilidade pela morte
do agente em relação aos efeitos da condenação dependerá da época em que ocorrer o
falecimento em face do momento do trânsito em julgado da decisão. Assim, falecendo o acusado
antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, restarão prejudicados todos os efeitos
que dela poderiam advir, quer os penais, quer os extrapenais, pois tais efeitos apenas se operam
após alcançar a decisão o caráter de imutável. Se, por outro lado, a morte sobrevier ao trânsito
em julgado da condenação, o entendimento majoritário é o de que ficarão extintos tão somente
os efeitos penais e não os extrapenais. No campo indenizatório, por exemplo, nada impedirá seja
executada no juízo cível a sentença penal contra o espólio do condenado ou contra os herdeiros,
limitada, neste último caso, a responsabilidade civil às forças da herança. Defendendo posição
oposta, ou seja, a de que necessário o ajuizamento de ação cognitiva contra os herdeiros do réu
falecido após o trânsito em julgado da condenação, está FERNANDO CAPEZ, aduzindo que “mesmo
em se tratando de herdeiros, os quais não respondem além das forças da herança (ultra vires
hereditaris), não se pode simplesmente liquidar o valor devido e executá-lo”. Considera esse
autor, portanto, que, nesta hipótese, deverá ser proposta ação de conhecimento pela vítima para
ver-se ressarcida dos prejuízos patrimoniais que tenha sofrido.

Perdão judicial: trata-se de causa extintiva da punibilidade prevista no art. 107, IX, do CP, que
faculta ao juiz deixar de aplicar a pena em hipóteses expressamente previstas em lei e diante de
circunstâncias excepcionais. É o que ocorre, por exemplo, no caso de homicídio culposo,
estabelecendo o art. 121, § 5.º, do CP que o juiz poderá deixar de aplicar a pena na hipótese de
as consequências do crime (v.g., morte de um parente) terem afetado o autor da infração de
forma tão grave que se torne desnecessária a sanção penal. Observe-se que o perdão judicial

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ocorre por ocasião da sentença condenatória. Enfim, o juiz profere a sentença condenatória,
mas, ao final, concede-lhe o perdão, deixando de aplicar a pena e julgando, em consequência,
extinta a punibilidade. Há divergências quanto à natureza jurídica da decisão concessiva do
perdão judicial. Alguns entendem que o perdão não afasta o caráter condenatório da sentença
em que inserido, de forma que, ressalvado o efeito penal principal (pena), todos os demais
persistem, tanto os penais secundários (salvo reincidência) como os extrapenais; outros,
opostamente, aduzem que “tal decisão é declaratória, não produzindo qualquer efeito, penal ou
extrapenal”. Esta última posição é a agasalhada pelo STJ, conforme se constata dos termos da
Súmula 18 daquele Pretório, dispondo que “a sentença concessiva do perdão judicial é
declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.

“Abolitio criminis”: trata-se de instituto em que uma lei nova passa a considerar lícito um fato
anteriormente tratado como criminoso. Na medida em que descriminaliza fato até então
considerado uma infração penal, gera a exclusão da tipicidade. Evidentemente, ocorrente esta
situação, apagam-se todos os efeitos penais da sentença condenatória transitada em julgado, o
que se justifica, inclusive, no art. 2.º do Código Penal, ao regrar que “ninguém será punido por
fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos
penais da sentença condenatória”. Diverge, entretanto, a doutrina, quanto à persistência dos
efeitos extrapenais. Alguns, como NUCCI, entendem que a abolitio “faz com que desapareça o
título executivo judicial, seja antes da decisão condenatória, seja depois”. Outros, ao contrário,
espelhando a maioria doutrinária, consideram que a sentença penal condenatória transitada em
julgado, ainda que atingida por lei abolicionista, pode ser executada no cível, o que faz
depreender permanecerem os seus efeitos extrapenais. Concordamos plenamente com este
último entendimento, até porque o fato de uma ação ser ou não descrita como ilícito penal, em
nada reflete em ser ou não, esta mesma conduta, considerada como um ilícito civil.

Extinção da punibilidade pela prescrição retroativa: A prescrição retroativa, na esteira de


consolidado entendimento, é forma de prescrição da pretensão punitiva e não da pretensão
executória. Logo, seu reconhecimento afasta todos os efeitos penais e extrapenais próprios da
sentença condenatória (Avena, 2020).

Quanto à sentença absolutória no tribunal do júri, assim pondera ROBERTO BRASILEIRO, dentro daquela regra
que inicialmente pontuamos:

Diante do sigilo das votações e da adoção do sistema da íntima convicção inerente ao Tribunal
do Júri, afigura-se impossível precisar o exato motivo que deu ensejo à decisão dos jurados. Logo,
é de se concluir que eventual sentença absolutória não deve fazer coisa julgada no cível. Aliás,
ainda que o acusado seja absolvido em virtude dos quesitos pertinentes à materialidade e
autoria, tal decisum não deve repercutir no cível, porquanto não se pode estabelecer com
exatidão se a decisão dos jurados se baseou na dúvida (in dubio pro reo), situação em que não
faria coisa julgada no cível, ou em um juízo de certeza acerca da inexistência do crime ou de
negativa de autoria. Destarte, diante da dúvida, já que impossível definir o grau de convicção que
levou os jurados a absolver o acusado, o ideal é concluir que uma sentença absolutória no júri
não fará coisa julgada no Cível não permitindo, aplicação do artigo 935 do Código Civil (Lima,
2021).

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Trazemos agora, para consolidarmos os pontos principais, tabela elaborada por NORBERTO AVENA, em relação
a algumas intercorrências (Avena, 2017):

EFEITOS PENAIS PRINCIPAL E


OCORRÊNCIA EFEITOS EXTRAPENAIS GENÉRICOS E ESPECÍFICOS
SECUNDÁRIOS
Extingue o efeito principal e Persistem os efeitos extrapenais, inclusive
Anistia
os efeitos secundários. quanto à obrigação de indenizar.
Extingue o efeito principal,
Persistem os efeitos extrapenais, inclusive
Graça e indulto mas subsistem os efeitos
quanto à obrigação de indenizar.
secundários.
Extingue o efeito principal,
Prescrição da pena in Persistem os efeitos extrapenais, inclusive
mas subsistem os efeitos
concreto quanto à obrigação de indenizar.
secundários.
Extingue todos os efeitos extrapenais,
Morte do agente antes do Extingue o efeito principal e
devendo a vítima buscar no cível a
trânsito em julgado os efeitos secundários.
reparação de seu prejuízo.
Morte do agente depois do Extingue o efeito principal e Persistem os efeitos extrapenais, inclusive
trânsito em julgado os efeitos secundários. quanto à obrigação de indenizar.
Para o STF, extingue o efeito Na visão do STF, persistem os efeitos
principal e não os extrapenais, valendo a decisão, inclusive,
secundários; para o STJ, como título executivo cível.
Perdão Judicial
extingue todos os efeitos Para o STJ, não remanescem quaisquer
penais, principal e efeitos da sentença condenatória, a teor da
secundários. Súmula 18 daquele Tribunal.
Há duas posições, alguns entendendo que
restam atingidos os efeitos extrapenais e,
Extingue os efeitos penais, outros, em sentido contrário,
Abolitio criminis
principal e secundários. posicionando-se pela persistência destes
efeitos, inclusive quanto à obrigação de
indenizar (maioria).
Extingue os efeitos penais, Extingue os efeitos extrapenais, inclusive a
Prescrição retroativa
principal e secundários. obrigação de indenizar.

Doutrina Complementar

FERNANDO CAPEZ (Curso de processo penal, 24ª ed., São Paulo: Saraiva, 2018): “Daí se pode afirmar
que, conquanto independentes as responsabilidades civil e criminal (CC, art. 935), quando do
ilícito penal resultarem prejuízos de ordem material ou moral para a vítima, seus herdeiros ou
dependentes ou para terceiros, estará caracterizado o dever de indenizar. [...] Assim, se a
instância penal reconheceu a existência de um ato ilícito, não há mais necessidade, tampouco
interesse jurídico, de rediscutir essa questão na esfera civil. Se o fato constitui infração penal, por
óbvio caracteriza ilícito civil, dado que este último configura grau menor de violação da ordem
jurídica. Só restará saber se houve dano e qual o seu valor. [...] A lei autoriza o juiz fixar, na
sentença condenatória, independentemente do pedido das partes, um valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido

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(CPP, art. 387, IV), e o art. 63, parágrafo único, passou a permitir a execução desse valor sem
prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. Com isso, pode-se afirmar
que ela se tornou em parte líquida, o que possibilitou a sua execução no juízo cível, com a
dispensa da liquidação para o arbitramento do valor do débito”. Sobre as hipóteses verificadas
no caso concreto que ensejam a constituição de coisa julgada no juízo cível criminal, pondera o
autor: “Faz coisa julgada no juízo cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado
em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no
exercício regular de direito (cf. art. 65 do CPP). Esses atos são penal e civilmente lícitos
(respectivamente, arts. 23 do CP e 188, I, primeira parte, e II, CC). Há duas exceções a essa regra:
(i) no estado de necessidade agressivo, onde o agente sacrifica bem de terceiro inocente, este
pode acioná-lo civilmente, restando ao causador do dano a ação regressiva contra quem
provocou a situação de perigo (cf. arts. 929 e 930, caput, do CC); (ii) na hipótese de legítima
defesa, onde, por erro na execução, vem a ser atingido terceiro inocente, este terá direito à
indenização contra quem o atingiu, ainda que este último estivesse em situação de legítima
defesa, restando-lhe apenas a ação regressiva contra seu agressor (cf. parágrafo único do art.
930 do CC). [...] No caso de absolvição imprópria, que é aquela decisão que reconhece a prática
do ilícito penal, mas impõe medida de segurança, em face da inimputabilidade do agente, não se
forma o título executivo, pois a lei só fala em condenação transitada em julgado (CPP, art. 63:
‘Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo
cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros’).
[...] Também fará coisa julgada no cível a absolvição fundada nas seguintes hipóteses: (i) estar
provada a inexistência do fato (art. 386, I); (ii) estar provado que o réu não concorreu para a
infração penal (art. 386, IV); (iii) existirem circunstâncias que excluam o crime. Note-se que, com
a reforma processual penal, será possível o juiz absolver o réu quando presentes circunstâncias
que excluam o crime, ou quando haja fundada dúvida sobre sua existência. No entanto, somente
a primeira hipótese fará coisa julgada no cível, isto é, a certeza da existência da causa excludente
da ilicitude. De outro lado, não impedem a propositura da ação civil reparatória o despacho de
arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação, a decisão que julgar extinta a
punibilidade, nem a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime
(CPP, art. 67). Também não impede o aforamento da mencionada ação a sentença que absolver
o réu com fundamento nas seguintes fórmulas, ambas do Código de Processo Penal (CPP, art.
386): (i) não haver prova da existência do fato (art. 386, II); (ii) não existir prova de ter o réu
concorrido para a infração penal (art. 386, V); (iii) existirem circunstâncias que isentem o réu de
pena (art. 386, VI); (iv) não existir prova suficiente para condenação (art. 386, VII)”. A respeito do
juízo para execução cível da sentença penal condenatória, aduz: “A execução fundada em
sentença penal condenatória processar-se-á perante o juízo cível competente. No juízo cível,
embora a ação se funde em direito pessoal, o foro territorialmente competente não é o do
domicílio do réu. O autor, nesse caso, tem o privilégio de escolher um dos foros especiais,
previstos no art. 53, V, do CPC, que assim dispõe: ‘É competente o foro de domicílio do autor ou
do local do fato, para a ação de reparação de dano sofrido em razão de delito ou acidente de
veículos, inclusive aeronaves’. O autor pode, portanto, fazer uso do privilégio de escolher o foro
de seu domicílio ou o foro do local em que ocorreu a infração penal”. Ainda, sobre o prazo
prescricional da referida ação, afirma: “Finalmente, dispõe o Código Civil, em seu art. 200, que o
prazo prescricional para a actio civilis ex delicto não começa a correr enquanto não transitar em
julgado a sentença penal condenatória. De acordo com o que dispõe o art. 206, § 3º, V, tal prazo

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será de três anos apenas e não começa a correr enquanto o titular do direito de ação não
completa 16 anos e se torna, pelo menos, relativamente incapaz”.

EDILSON MOUGENOT BONFIM (Curso de processo penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2019), referente
aos ‘sistemas de reparação’ existentes, sustenta: “No sistema brasileiro, os pedidos de reparação
civil e de condenação penal devem ser veiculados em ações diversas. Em outros sistemas
jurídicos, entretanto, por vezes se admite a cumulação dos pedidos em uma única ação. Com
base na possibilidade ou não de a vítima cumular à pretensão punitiva (de natureza penal) a
pretensão reparatória (de cunho civil) em um único processo, a doutrina enumera os seguintes
sistemas de reparação do dano oriundo de infração penal: a) Sistema da livre escolha. Por esse
sistema, cabe ao ofendido escolher se deseja ou não cumular as duas pretensões no processo
penal. Poderá, portanto, deduzir a pretensão da reparação do dano tanto em sede penal quanto
em sede civil. b) Sistema da confusão. Nesse sistema, os pedidos são necessariamente cumulados
em uma única ação, que terá, portanto, natureza dúplice (penal e civil). Caberá ao juízo que a
decidir, se condenatória, proceder tanto à dosimetria da sanção penal quanto à quantificação da
reparação civil. c) Sistema da solidariedade. Nesse sistema, embora haja duas ações, uma penal
e outra civil, são elas julgadas conjuntamente no mesmo processo, de modo a ser proferida
apenas uma sentença. d) Sistema da separação ou da independência. É o sistema adotado no
Brasil. Nele se dividem os juízos penal e civil, sendo que as ações deverão ser propostas
separadamente perante os respectivos juízos competentes. Caberá, entretanto, ao juízo criminal,
além de decidir a lide penal, acolhendo ou não a pretensão punitiva, fixar, em caso de
condenação, um valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração penal,
considerando os prejuízos do ofendido”. A respeito dos efeitos da sentença penal condenatória
no plano cível, pondera: “O art. 91, I, do Código Penal determina que um dos efeitos da
condenação penal é tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Dessa
forma, não obstante a responsabilidade penal ser independente da responsabilidade civil, o
sistema brasileiro acaba por conferir à sentença condenatória penal transitada em julgado a
natureza de título executivo judicial (art. 475-N, II, do Código de Processo Civil, cf. Lei n.
11.232/2005 e art. 63 do Código de Processo Penal), consubstanciando entre nós o sistema da
independência mitigada entre as esferas cível e penal. Há que ter certa cautela, entretanto, ao
interpretar a disposição genérica da lei processual penal. Isso porque nem sempre a prática de
conduta criminosa ensejará direito de indenização a algum particular, seja pela circunstância de
que o ilícito penal pode não constituir ilícito civil, seja porque a prática do crime não tenha
atingido negativamente o patrimônio jurídico de ninguém. Nessa hipótese, é evidente que o
reconhecimento da materialidade e da autoria delitivas não poderá redundar na constituição de
título executivo cível. A título de exemplo, se alguém pratica ato obsceno, poderá ser processado
e condenado criminalmente, sem que com esse ato tenha causado prejuízo a outrem, e, nesse
caso, por óbvio, a sentença condenatória não constituirá título executivo perante o juízo cível. É
que nem sempre haverá coincidência entre os bens tutelados pelo direito penal e o direito civil,
embora no mais das vezes a coincidência seja a regra, e não a exceção. [...] No que diz respeito
especificamente ao direito processual, é possível reconhecer certa tendência do legislador a dar
prevalência às decisões proferidas pelo juízo penal. Com efeito, o art. 63, caput, do Código de
Processo Penal faculta à vítima a possibilidade de aguardar o trânsito em julgado da sentença
condenatória, para só posteriormente promover a execução civil dessa sentença, que, como se
viu, constituirá título executivo perante o juízo cível. Essa possibilidade é reforçada por
disposição da lei cível, já que o art. 200 do Código Civil veda a prescrição da pretensão cível, de 3

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anos, nos termos do art. 206, § 3º, V do Código Civil, que decorrer de fato que deva ser apurado
no juízo criminal enquanto não for proferida pelo juízo penal a respectiva sentença definitiva.
Isso porque, como já se disse ao abordar os princípios aplicáveis ao processo penal, o juízo penal,
via de regra, deve ser muito mais rigoroso na apreciação da prova acerca da existência dos fatos
e de sua autoria. O maior rigor se justifica em face da importância da pretensão veiculada na
ação penal, que, embora lance efeitos sobre a esfera cível do réu, diz respeito, em último plano,
à sua liberdade de ir e vir. A condenação penal é a mais séria restrição jurídica que se pode impor
legalmente a alguém, e é apenas por esse motivo que imperam, no processo penal, diversas
regras que desequilibram o processo em favor do réu (consubstanciadas sob o princípio do favor
rei). [...] Com base nessa relação de prejudicialidade da decisão do juízo penal em relação à
decisão do juízo cível é que parte da doutrina entende que a determinação no sentido de que
seja suspenso o curso do processo civil na pendência de processo penal acerca do mesmo fato
não constitui mera faculdade do juízo civil, mas sim sua obrigação. Tal dever decorreria, dessa
forma, da determinação do art. 265, IV, a, do Código de Processo Civil, no sentido de que é
obrigatória a suspensão do processo na circunstância em que o juízo do mérito no cível dependa
de ‘julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica,
que constitua o objeto principal de outro processo pendente’, e, nesse sentido, ‘a suspensão
requerida em razão da dependência de julgamento de questão prejudicial ou de realização de
ato em outro processo (art. 265, IV) não pode ultrapassar o período máximo de um ano de
duração, cabendo ao juiz, de ofício, determinar seu prosseguimento após vencido tal lapso (art.
265, § 5º)’. [...] Importante salientar que a morte do agente antes do trânsito em julgado e a
sentença absolutória imprópria — por não ser decisão condenatória propriamente dita — não
possuem efeitos extrapenais, inexistindo o dever de indenizar. Quanto à abolitio criminis, há
divergência doutrinária acerca da persistência dos efeitos extrapenais. Já em relação à morte do
agente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e as decisões que extinguem
a punibilidade com base na anistia, graça, indulto e prescrição, persistem os efeitos extrapenais
e, como regra, o dever de indenizar”. Tocante aos efeitos da sentença penal não condenatória
no plano cível, assevera o autor: “A absolvição criminal fundada na circunstância de estar
provada a inexistência do fato (art. 386, I, do CPP) ou de estar provado não ter o réu concorrido
para a infração penal (art. 386, IV, do CPP) fazem coisa julgada no cível, impedindo a ação de
indenização contra o ofensor absolvido em processo criminal. [...] Já no caso de legítima defesa
putativa entende a jurisprudência que a absolvição não desincumbe o réu da indenização como
na legítima defesa real. A doutrina, apoiando essa interpretação, compreende que o dever de
indenizar provém da culpa, e, no caso da legítima defesa, temos que quem age com culpa é a
própria vítima, é dela a origem do ato que causa dano, o que supre a responsabilidade do réu.
Ocorre, então, que na legítima defesa putativa subsiste a responsabilidade de indenizar do autor
do dano, a menos que demonstre que a vítima agiu culposamente, de forma a provocar, no
agente, a repulsa ao que justificadamente acreditava tratar-se de agressão. A legítima defesa
putativa exclui a culpa mas não a antijuridicidade do ato. Trata-se de erro de fato, não se
aplicando o art. 65 do CPP. Não se pune penalmente o ato ilícito apenas por ele não ser, pelas
circunstâncias, reprovável”. Por fim, em relação à figura do ‘perdão judicial’ e o dever de
indenizar, sustenta: “O perdão judicial é causa extintiva da punibilidade (art. 107, IX, do Código
Penal), que permite ao juiz deixar de aplicar a pena quando as consequências da infração penal
atingem o próprio agente de forma tão grave que a sanção se torna desnecessária. Deve estar
expressamente previsto em lei. [...] O perdão judicial é concedido na sentença, após a apuração
do fato, mediante o devido processo legal. Com efeito, se o agente não atuou com culpa, deve

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ser absolvido, pois o fato é atípico. Questão divergente na doutrina é a natureza da sentença
concessiva do perdão judicial. Três são as principais correntes: i) absolutória: defende-se ser
impossível condenação sem imposição de pena. Ao conceder o perdão judicial, absolve-se o réu;
ii) declaratória da extinção da punibilidade: o perdão judicial está no rol do art. 107 do Código
Penal. A sentença tem a natureza do instituto, declarando, portanto, a extinção da punibilidade.
Nesse sentido, a Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça: ‘A sentença concessiva do perdão
judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito
condenatório’; iii) condenatória: só é possível perdoar quem é culpado. Por isso, condena-se o
agente, excluindo-o da sanção penal por merecer a aplicação do instituto. Para essa corrente, a
qual nos filiamos, os efeitos secundários da condenação persistem. É o entendimento do
Supremo Tribunal Federal. Assim, para aqueles que atribuem natureza condenatória à sentença
que concede o perdão judicial, poderá ela, uma vez transitada em julgado, servir de título
executivo apto a embasar a pretensão reparatória da vítima”.

AURY LOPES JR. (Direito processual penal, 18ª ed., São Paulo: Saraiva, 2021) critica a cumulação da
pretensão indenizatória e acusatória no processo penal: “Como explicamos anteriormente, de
forma híbrida, o legislador brasileiro permite cumular, frente ao juiz criminal, uma pretensão
acusatória e outra indenizatória. Condenando o réu, deverá o juiz fixar um valor mínimo para fins
de reparação dos danos causados pela infração, sendo que essa reparação feita na esfera penal
não impede que a vítima busque, na esfera cível, um montante maior, posto que o fixado na
sentença penal é considerado o ‘valor mínimo’ da indenização. [...] Essa cumulação é uma
deformação do processo penal, que passa a ser também um instrumento de tutela de interesses
privados. Não está justificada pela economia processual e causa uma confusão lógica grave,
tendo em vista a natureza completamente distinta das pretensões (indenizatória e acusatória).
Representa uma completa violação dos princípios básicos do processo penal e, por consequência,
de toda e qualquer lógica jurídica que pretenda orientar o raciocínio e a atividade judiciária nessa
matéria. Desvirtua o processo penal para buscar a satisfação de uma pretensão que é
completamente alheia a sua função, estrutura e princípios informadores. Como exemplo dessa
errônea privatização do processo penal, o próprio Direito Penal nos oferece as absurdas
‘condenações penais disfarçadas de absolvição de fato’. Ocorrem quando alguém é condenado
a uma insignificante pena de multa (responsabilidade penal) quando o que se pretende, na
realidade, é uma substancial indenização na esfera cível (responsabilidade civil), utilizando a
sentença penal condenatória como título executivo judicial. Para amparar esse tipo de direito,
existem vias próprias e para isso está o processo civil. Cada coisa no seu devido lugar”. O autor
também elenca alguns elementos a serem observados para a fixação do valor mínimo de
reparação: “Mas voltando ao art. 387 do CPP, para que o juiz penal possa fixar um valor mínimo
para reparação dos danos na sentença, é fundamental que: 1. exista um pedido expresso na
inicial acusatória de condenação do réu ao pagamento de um valor mínimo para reparação dos
danos causados, sob pena de flagrante violação do princípio da correlação; 2. portanto, não
poderá o juiz fixar um valor indenizatório se não houve pedido, sob pena de nulidade por
incongruência da sentença; 3. a questão da reparação dos danos deve ser submetida ao
contraditório e assegurada a ampla defesa do réu; 4. somente é cabível tal condenação em
relação aos fatos ocorridos após a vigência da Lei n. 11.719/ 2008, sob pena de ilegal atribuição
de efeito retroativo a uma lei penal mais grave (como explicado anteriormente, ao tratarmos da
Lei Processual Penal no Tempo)”.

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GUSTAVO BADARÓ (Processo penal, São Paulo: RT, 2020). “O Código de Processo Penal disciplina a
relação entre a ação civil ex delicto e a ação penal. Embora o título sugira o regramento de uma
‘ação’, na verdade, o Código de Processo Penal trata dos efeitos civis da sentença penal. A lei
processual penal não regulamenta a ação a ser proposta no juízo cível, tendo por causa de pedir
o fato criminoso. A análise da denominada ação civil ex delicto envolve um estudo
interdisciplinar. O Código Penal, no Capítulo VI do Título V, trata dos efeitos da condenação (arts.
91 e s.). O Código de Processo Penal dedica o Título IV à ação civil (arts. 63 e s.). Em sede civil, o
Código de Processo Civil prevê que a sentença penal condenatória transitada em julgado é título
executivo judicial (art. 515, caput, VI). Também o Código Civil regula a matéria, ao tratar dos atos
ilícitos (arts. 186 e ss.) e das obrigações de indenizar (arts. 927 e s.). [...] A expressão ‘reparação
do dano’ será empregada em sentido amplo. Doutrinariamente, distinguem-se as várias
modalidades de satisfação do dano. A restituição da própria coisa é a forma mais singela de
satisfação do dano. Nos casos em que a afetação do bem jurídico consiste na privação de um
objeto, como no furto, no roubo, ou na apropriação indébita, a primeira forma de restaurar a
situação do lesado está em lhe repor nas mãos a res furtiva. Já o ressarcimento é o mais completo
pagamento dos danos patrimoniais resultantes do crime. Abrange, portanto, o dano emergente
e o lucro cessante, o principal e os acréscimos que lhe adviriam com o tempo e com o emprego
da coisa. Por outro lado, quando se trata de dano não patrimonial, isto é, de dano moral, fala-se
em reparação. Finalmente, há quem afirme que a indenização é a compensação do ato lícito
praticado pelo Estado, lesivo ao particular. Não é possível concordar com tal ponto de vista. Se o
ato do Estado era lícito, não é passível de indenização. O art. 5.º, LXXV, da CR assegura a
indenização pelo erro judiciário, sendo possível cumular com o pedido de revisão criminal um
pedido indenizatório (CPP, art. 630). Sem dúvida, a hipótese é de indenização, mas não por ato
lícito, e sim por ato ilícito. Sendo dado provimento à revisão, há o reconhecimento de que houve
erro e, no processo originário, condenou-se um inocente, o que é ilícito, isto é, contrário a lei. O
Código de Processo Penal prevê, expressamente, a restituição (arts. 119 e ss.). Também faz
referência ao ressarcimento (art. 64), à reparação (art. 63 e art. 387, caput, IV) e à indenização
(art. 630, caput) sem, contudo, se preocupar em empregar tais palavras tecnicamente”.

Jurisprudência pertinente

Superior Tribunal de Justiça

O STJ pacificou entendimento no sentido de que a absolvição na esfera criminal, por ausência
de prova nos autos relativa ao fato de ter o acusado concorrido para a infração penal, não tem
o condão de excluir a condenação administrativa. [...] (REsp 1028436/SP, Rel. Ministro ADILSON
VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em
15/09/2011, DJe 17/11/2011)

Consoante a jurisprudência desta Corte Superior, a absolvição no juízo criminal, diante da


relativa independência entre as instâncias cível e criminal, apenas vincula o juízo cível quando
restar reconhecida a inexistência do fato ou atestar não ter sido o demandado seu autor. [...]
(AgRg no AREsp 377.855/CE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 20/03/2014)

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A legítima defesa putativa supõe negligência na apreciação dos fatos, e por isso não exclui a
responsabilidade civil pelos danos que dela decorram. [...] (REsp 513.891/RJ, Rel. Ministro ARI
PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/03/2007, DJ 16/04/2007, p. 181)

A executoriedade da sentença penal condenatória (CPP, art. 63) ou seu aproveitamento em


ação civil ex delicto (CPP, art. 64; CPC, arts. 110 e 265, IV) depende da definitividade da
condenação, ou seja, da formação da coisa julgada criminal, até mesmo pela máxima
constitucional de que ninguém poderá ser considerado culpado antes do trânsito em julgado
de sentença penal condenatória (CF, art. 5º, LVII). [...] Afastado o obrigatório aproveitamento
da sentença penal condenatória que não transitou em julgado, deve o juízo cível, no âmbito de
sua livre convicção, pautar-se nos elementos de prova apresentados no âmbito de todo o
processo, inclusive em eventual prova emprestada do processo criminal do qual tenha
participado o réu (garantia do contraditório), a fim de aferir a responsabilidade da parte ré pela
reparação do dano. [...] (REsp 678.143/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA,
julgado em 22/05/2012, DJe 30/04/2013)

Este Superior Tribunal de Justiça pacificou sua jurisprudência no sentido de que basta que haja
pedido expresso e formal na inicial acusatória para que seja determinada a reparação dos
danos causados à vítima, de modo a viabilizar o devido contraditório, não se exigindo, para
tanto, indicação de valores na denúncia, já que cabe ao magistrado fixar um valor mínimo. [...]
O dano moral ex delicto ocorre in re ipsa, ou seja, exsurge da própria conduta típica que já foi
devidamente apurada na instrução penal, não havendo necessidade de instrução específica
para apuração de valores, mormente porque se trata de um valor mínimo de indenização,
fixado nos termos do disposto no artigo 387, IV, do Código de Processo Penal. [...] (AgInt no
REsp 1694713/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
10/10/2017, DJe 16/10/2017)

Para que haja a fixação na sentença do valor mínimo devido a título de indenização civil pelos
danos causados à vítima, é necessário pedido expresso, sob pena de afronta à ampla defesa.
[...] (AgRg no REsp 1675965/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,
julgado em 26/09/2017)

Considerando que a norma não limitou e nem regulamentou como será quantificado o valor
mínimo para a indenização e considerando que a legislação penal sempre priorizou o
ressarcimento da vítima em relação aos prejuízos sofridos, o juiz que se sentir apto, diante de
um caso concreto, a quantificar, ao menos o mínimo, o valor do dano moral sofrido pela vítima,
não poderá ser impedido de fazê-lo. [...] Ao fixar o valor de indenização previsto no artigo 387,
IV, do CPP, o juiz deverá fundamentar minimamente a opção, indicando o quantum que refere-
se ao dano moral. [...] (REsp 1585684/DF, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 24/08/2016)

RESUMO
Relação processual penal: “compreende o direito de ação do autor, o direito de defesa do réu e o poder do
Estado de se impor a ambos”.

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Jurisdição: manifestação de soberania e monopólio do Estado, que traduz a função de aplicar a lei ao caso
concreto.
Punibilidade: consequência jurídica correspondente à prática do crime. É a possibilidade jurídica de o Estado
impor uma sanção penal ao responsável pelo crime.
Pretensão punitiva: poder do Estado de exigir de quem comete um delito a submissão à sanção penal.

1 - AÇÃO PENAL
Identidade de conceitos com a área cível.
mista
É o direito de se invocar a prestação
direito jurisdicional.
Base normativa constitucional: art. 5º, XXXV
ação - a lei não excluirá da apreciação do Poder AÇÃO
Judiciário lesão ou ameaça a direito.
jurisdição Existem regras sobre a ação tanto no Código material processual
Penal quando no CPP. Doutrina diverge
sobre a natureza jurídica das normas que
regulam a ação:
Características
Ação penal não é o mesmo que direito de punir ou pretensão punitiva.
público
A ação penal não surge do crime, como ocorre com a pretensão punitiva.
direito de ação

subjetivo
Para alguns, o ‘direito’ de punir está mais para um poder-dever.
autônomo e
abstrato O direito material não se confunde com o direito de ação, este essencialmente
instrumental, quando muito conexo com o direito penal objetivo.
instrumental

conexo 2 - CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL


CPP, art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: II - faltar pressuposto processual ou condição
para o exercício da ação penal;
‘Teoria do direito abstrato’. As condições – que são requisitos para que o juiz analise o mérito – se relacionam
com a pretensão a ser julgada, mas não tem relação direta com a procedência.
Processo penal: condições genéricas e condições específicas (de procedibilidade).
Condições genéricas: a) possibilidade jurídica do pedido; b) interesse de agir; c) legitimidade para agir; d)
justa causa. Como categorias próprias do processo penal: a) prática de fato aparentemente criminoso; b)
punibilidade concreta.
Condições específicas (“condições de procedibilidade”): Em determinadas situações, a lei erige requisitos
pontuais (que não se aplicam a todos os casos) que acabam por condicionar o exercício da respectiva ação
penal – são as condições de procedibilidade: Ex.: a) representação da vítima; b) requisição do Ministro da

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Justiça; c) provas novas; d) laudo pericial; e) autorização da Câmara dos Deputados; f) trânsito em julgado
da sentença anulatória de casamento.
Escusas absolutórias: As escusas absolutórias também são condições de punibilidade, “mas diferem
radicalmente das que acima analisamos, porque são condições negativas de punibilidade do crime. Perceba:
o crime se configura por uma conduta típica, antijurídica e culpável, mas o agente estará isento de pena. Ex.:
art. 181 e art. 348, ambos do Código Penal.

CONDIÇÕES ESPECIAIS DA
CONDIÇÕES GERAIS DA CONDIÇÕES OBJETIVAS DE
AÇÃO OU DE ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS
AÇÃO PUNIBILIDADE
PROCEDIBILIDADE

a)Possuem caráter geral e


devem estar presentes
em qualquer ação penal. a) São específicas, sem
caráter geral, vinculando o a) Trata-se de causas
b) Consistem: a) Trata-se de contempladas na parte
exercício da ação penal
b.1) Possibilidade jurídica em apenas alguns casos. circunstâncias exteriores ao Especial do CP, que fazem
do pedido: viabilidade de crime, não integrantes do com que um fato típico e
condenação, o que b) Referem-se, tipo e de acontecimento antijurídico, apesar da
implica tipicidade da unicamente, à instauração futuro e incerto, ou seja, o culpabilidade do agente,
conduta. do processo e não agente não sabe se não conduza a aplicação
envolvem diretamente acontecerá ou não esta da pena por motivos de
b.2) Interesse de agir: aspectos pertinentes ao condição à época do crime. política criminal.
indícios de autoria e mérito.
prova da existência do b) Exemplo típico encontra- b) Exemplo: Furto
crime. c) Como exemplos destas se no art. 180 da Lei praticado por descendente
condições, as hipóteses 11.101/2005 ao dispor que contra ascendente menor
b.3) Legitimidade: em que a lei exige a a sentença que decreta a de 60 anos (art. 181, II c/c
b.3.1) ativa: Ministério representação do falência, é condição o art. 183, III, do CP), em
Público, na ação penal ofendido ou a requisição objetiva de punibilidde das que, pela condição do
pública; e o ofendido, na do Ministro da Justiça infrações penais descritas agente (filho da vítima),
ação penal privada. para que possa o naquela lei. permanece isento de
Ministério Público pena.
b.3.2) passiva: indivíduo ingressar com ação.
maior de 18 anos.

3 - CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS


De acordo com o processo penal: a) ação penal pública (condicionada ou incondicionada); b) ação penal
privada (exclusiva, personalíssima ou subsidiária da pública); c) ação popular.

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Incondicion
ada À representação do
Condicionad ofendido
a À requisição do Ministro da
Pública Justiça

Esta modalidade de ação


penal é referida apenas
Subsidiária
por parcela doutrinária,
da Pública
não integrando a divisão
clássica da ação penal
Exclusiva
Ação Penal
Personalíssi
Privada
ma

Subsidiária
da Pública

Embora prevista no art. 14 da Lei 1.079/1950,


Popular possui constitucionalidade questionável, sendo
refutada pela maioria doutrinária.

4 - PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL


a) Princípio da obrigatoriedade da ação penal pública; b) da oportunidade da ação penal de iniciativa privada;
c) da indisponibilidade da ação penal pública; d) da disponibilidade da ação penal privada; e) da
(in)divisibilidade da ação penal pública; f) da indivisibilidade da ação penal privada; g) da instranscedência;
g) da oficialidade; h) da autoritariedade; e, i) da oficiosidade.

5 - AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA


É ‘incondicionada’ porquanto não está sujeita a requisito especial algum, que não aqueles genéricos de toda
e qualquer ação penal. É a regra em nosso sistema.
CF - art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal
pública, na forma da lei;
CP - art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. § 1º
- A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação
do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.

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6 - AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA


É ‘condicionada’ porquanto, diferentemente da modalidade anterior, está sujeita a condição específica –
acaba por depender da manifestação de outrem exigida expressamente na norma: representação do
ofendido ou requisição do Ministro da Justiça.
CP. Art. 100: § 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige,
de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.
Representação: princípio da oportunidade e conveniência; o ofendido (ou seu representante) pode optar
por iniciar ou não a ação penal.
CPP. Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas
dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou
de quem tiver qualidade para representá-lo.
CPP. Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes
especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade
policial.
§ 1º A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada do ofendido,
de seu representante legal ou procurador, será reduzida a termo, perante o juiz ou autoridade policial,
presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida.
§ 2º A representação conterá todas as informações que possam servir à apuração do fato e da autoria.
§ 3º Oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial procederá a inquérito, ou, não
sendo competente, remetê-lo-á à autoridade que o for.
§ 4º A representação, quando feita ao juiz ou perante este reduzida a termo, será remetida à autoridade
policial para que esta proceda a inquérito.
§ 5º O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos
elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze
dias.
Titularidade ou legitimidade para o oferecimento: a) ofendido maior e capaz; b) representante legal do
ofendido menor ou incapaz; c) curador (art. 33 do CPP); d) pessoa jurídica (art. 37 do CPP). Segundo parte
da doutrina, ainda: a) ofendido maior de 16 e menor de 18 anos, casado; e, b) morte da vítima/ofendido (art.
24, § 1º e art. 31, ambos do CPP).
Prazo: CPP. Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier
a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento
da denúncia.
Retratação: a representação será irretratável depois de oferecida a denúncia (art. 102 do CP e art. 25 do
CPP).
Extensão e eficácia: a representação se dá em relação ao fato criminoso em não em relação aos seus autores;
em razão do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, não há como se fracionar subjetivamente a
representação nos casos de concurso de agentes; quando a vítima representa em relação a um, a medida se
estende em relação aos demais, autorizando o Ministério Público a denunciar todos os envolvidos.

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Requisição: Vigora o princípio da oportunidade e conveniência diante dessa faculdade do Ministro da Justiça.
Ex. de casos de necessidade de requisição: CP. Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se
de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de
governo estrangeiro; Art. 145 – [...] Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça,
no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, [...]; e, de crime cometido contra brasileiro fora do Brasil
(Código Penal, art. 7º, § 3º, ‘b’).

7 - AÇÃO PENAL PRIVADA


Quando a ação for de iniciativa privada, a lei expressamente a declarará, fazendo menção expressa (em boa
parte, se não em todos os casos) ao fato de que se procederá ‘mediante queixa’ ou construções sintáticas
semelhantes.

CPP. Art. 30. Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação
privada. Ex.: crimes contra a honra (calúnia – art. 138, difamação – art. 139, e injúria - art. 140,
todos do CP). Código Penal. Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede
mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.

CPP. Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial,
o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente
ou irmão.

Art. 33. Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado
mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o
direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a
requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal.

Art. 34. Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de
queixa poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal.

Ação penal exclusivamente privada: essa espécie refere-se à ação penal de iniciativa privada propriamente
dita, seguindo as diretrizes legais (acima).
Ação penal privada personalíssima: hipótese única no Direito Brasileiro, sendo o crime de induzimento a erro
essencial e ocultação de impedimento, previsto no art. 236 do Código Penal. Nesse caso, a titularidade recai
unicamente na pessoa do ofendido.
Ação penal privada subsidiária da pública: decorrido o prazo legal para o Ministério Público, quedando-se,
este, inerte, surge para o ofendido a possibilidade de, independentemente da atuação do parquet nesse
momento, dar início à ação que seria pública.
Previsão legal: CF. Art. 5º, LIX: será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for
intentada no prazo legal;

CP. Art. 100, §3º: A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o
Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.

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CPP. Art. 29: Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

CPP. Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias,
contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e
de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito
à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público
receber novamente os autos.

CPP. Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no
direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado
do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se
esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

Extinção da punibilidade e ação penal de iniciativa privada

Art. 107, IV, Código Penal: a) decadência – remete-se ao art. 38 do CPP, citado no tópico acima e
ao art. 103 do CP; b) perempção (art. 60, inc. I a IV, CPP); c) renúncia (art. 107, V, Código Penal,
art. 49 e 50 do CPP e art. 104, parágrafo único, do CP); d) perdão do ofendido (art. 107, V, art.
105, art. 106, todos do CP – art.51, art. 56 e art. 59, todos do CPP).

8 - AÇÃO PENAL POPULAR


Os institutos que, a princípio e pela doutrina, mais se aproximariam desse conceito são o habeas corpus
(unânime) e a possibilidade de denúncia por crimes de responsabilidade nos termos das disposições da Lei
1.079/1950 (posição minoritária).
Constituição Federal. Art. 5º, LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
CPP. Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem
como pelo Ministério Público.

9 - AÇÃO PENAL ADESIVA


Atuação concomitante do Ministério Público e do ofendido no polo ativo da ação penal, sendo o ofendido
interveniente adesivo. Para a doutrina, a figura da ‘ação penal adesiva’ representaria a busca pela satisfação
do dano ex delicto no próprio juízo penal, e não uma espécie autônoma de ação.

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10 - AÇÃO DE PREVENÇÃO PENAL


Ação penal intentada com o propósito exclusivo de aplicação de medida de segurança aos inimputáveis
descritos nos art. 26 do CP. Refere-se, portanto, aos indivíduos portadores de doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto.

11 - AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA


Ocorre quando a lei estabelece uma modalidade de ação penal para apuração de determinado crime e,
secundariamente, estabelece modalidade diversa acaso verificada a presença de circunstâncias
excepcionais. Ex.: crime contra a dignidade sexual, antes da alteração da Lei 13.718/2018, era, em regra, de
ação penal pública condicionada à representação (isso mudou, fique atento); todavia, sendo caso de vítima
vulnerável ou menor de 18 anos de idade, a ação penal tornava-se pública incondicionada (art. 225, caput e
parágrafo único do Código Penal).

12 - AÇÃO PENAL NAS VÁRIAS ESPÉCIES DE CRIMES


Nos crimes contra a dignidade sexual: art. 225 do CP. De regra, observada a alteração da Lei 13.718/2018, a
ação penal será pública incondicionada.
Nos crimes contra a honra de funcionário público: Art. 141 e 145 do CP. Súmula 714 do STF: é concorrente a
legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à representação do
ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.
Nos crimes de lesão corporal leve e lesão corporal culposa com violência doméstica e familiar contra a
mulher: súmula 542 do STJ - a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

13 - PEÇA ACUSATÓRIA
Nos crimes de ação penal pública incondicionada e condicionada, a peça acusatória é a denúncia, oferecida
pelo Ministério Público; nos de ação penal de iniciativa privada – incluindo a subsidiária da pública –, é a
queixa-crime, promovida pelo ofendido ou representantes legais, através de advogado.
Requisitos da peça acusatória: a) exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias; b)
qualificação do acusado; c) classificação do crime; d) rol de testemunhas; e) endereçamento da peça
acusatória; f) redação na língua oficial; g) subscrição do Ministério Público ou do advogado do querelante;
h) procuração da queixa-crime e custas processuais.
Prazo para oferecimento da denúncia: Como regra geral, o Ministério Público deve oferecer a denúncia no
prazo de 5 dias, contados do recebimento dos autos de inquérito, se o réu estiver preso; ou de 15 dias se
estiver em liberdade (art. 46 do CPP). Legislações esparsas fixam prazos diversos específicos a alguns crimes.
Ex.:10 dias, para crime eleitoral (art. 357, Código Eleitoral).

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Contagem do prazo: o próprio artigo 46 supracitado estabelece uma forma específica para o seu início: o dia
do recebimento dos autos de inquérito policial. Trata-se de detalhe interessante (e gerador de polêmicas),
haja vista que foge à regra da contagem de prazos processuais expressa no art. 798, § 1º do CPP – pela qual
se exclui o dia do começo: Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios,
não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado. § 1º Não se computará no prazo o dia do começo,
incluindo-se, porém, o do vencimento.
Prazo para oferecimento da queixa-crime: art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu
representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de
seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em
que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. Por tratar-se de prazo decadencial, ostenta
natureza penal; portanto, sua contagem se dá de acordo com as disposições do art. 10 do CP: Art. 10 - O dia
do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.

14 - QUESTÕES DIVERSAS
Denúncia genérica e crimes societários: tribunais superiores não têm admitido denúncia genérica e
sustentam que a peça acusatória “deve estabelecer o vínculo do administrador ao ato ilícito que lhe está
sendo imputado. É necessário que descreva, de forma direta e objetiva, a ação ou omissão do acusado”.
Cumulação de imputações: ocorre quando as acusações (denúncia ou queixa) contêm mais de uma
imputação; é objetiva quando se narram dois ou mais crimes; é subjetiva quando existe pluralidade de
acusados.
Imputação implícita: De acordo com o art. 41 do CPP, a acusação (seja denúncia ou queixa) deve ser ‘exposta’
com todas as suas circunstâncias; em outras palavras, não pode ser implícita. É ela que inicialmente
estabelece todos os contornos e limites pelos quais deve se desenvolver a instrução e dentro dos quais a
sentença não pode sair (princípio da correlação/congruência).
Imputação alternativa: quando na denúncia ou queixa, havendo dúvidas acerca da extensão da conduta
praticada pelo agente, atribuem-se a ele as duas prováveis, para, no decorrer da instrução, definir-se por
uma ou outra; a doutrina se manifesta contrária ao instituto, “já que, ainda quando houver compatibilidade
entre os fatos imputados, seu oferecimento quase sempre acarreta dificuldades ao exercício do direito de
defesa. Uma imputação penal alternativa, além de constituir transgressão do dever jurídico que se impõe ao
Estado de expor o fato criminoso com todas as suas circunstâncias, qualifica-se como causa de nulidade
absoluta por inviabilizar o exercício da ampla defesa” (Lima, 2018). Vedada, inclusive, a imputação subjetiva
superveniente (§ 4º do art. 384 do CPP).

15 - ADITAMENTO À DENÚNCIA
Em relação à denúncia (ou queixa), aditar significa acrescentar algo à imputação, algo que pode ser relativo
aos fatos e/ou a pessoas.
CPP. Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contravenções
penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da
sentença final.

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Real = fatos
Próprio
Pessoal = sujeitos

Retificação

Ratificação
Aditamento Impróprio
Suprimento

Esclarecimento

Espontâneo
Quanto à oportunidade
Provocado

Aditamento próprio: é aquele onde, efetivamente, se acrescentam elementos novos à denúncia; aditamento
próprio objetivo ou real – quando o acréscimo se referir aos fatos; aditamento próprio subjetivo ou pessoal
– quando se trata da inclusão de um novo denunciado, seja na condição de coautor ou partícipe.

Aditamento impróprio: quando não se acrescenta nada novo, mas se busca a correção de alguma falha da
denúncia ou a ratificação de atos, a última como no caso de declaração de incompetência (art. 108, § 1º,
CPP).

Aditamento espontâneo: o princípio da obrigatoriedade (art. 28, CPP) ‘exige’ do Ministério Público a iniciativa
em promover o aditamento da denúncia quando conhecidos novos elementos que deveriam tê-la integrado,
mas, pela extemporaneidade da descoberta, não fizeram parte da acusação. É nesse sentido que a doutrina
classifica o aditamento como espontâneo pois, diante da obrigatoriedade, não há necessidade de
provocação do juiz, a iniciativa de aditar deve partir do Ministério Público.

Aditamento provocado: o aditamento provocado se personifica no ato do juiz que, verificando a necessidade
de se acrescentar algo na denúncia – sem que o Ministério Público tenha tomado a iniciativa –, o ‘provoca’
a fazê-lo; encontra-se disciplinado, dentre outros, no § 1º do artigo 384 do CPP (mutatio libelli) e no art. 417
do mesmo diploma.

Recebimento do aditamento: nova análise acerca das condições da ação e abertura de nova oportunidade
de oferecimento de defesa e indicação de testemunhas, novo interrogatório – oportunizando o contraditório
e garantindo a ampla defesa.

Interrupção da prescrição: em se tratando de aditamento próprio real (objetivo) a decisão que o recebe
interrompe a prescrição, pois, ao trazer fatos novos, se perfaz em ‘nova denúncia’, subjugando-se à intenção
da norma do inciso I do art. 117 do Código Penal.

Recurso cabível no indeferimento: parte da doutrina entende que caberia apelação, mas a maioria, seguida
pelo entendimento dos Tribunais Superiores, aponta o recurso em sentido estrito, como o recurso cabível
em caso de indeferimento do aditamento.

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Aditamento da queixa-crime: há se distinguir o ‘tipo’ de aditamento para se esclarecer sobre a possibilidade


ou não de ser oferecido em caso de queixa-crime; cabe, sem maiores discussões, o aditamento impróprio;
no que se refere ao aditamento próprio, entretanto, difere-se no que se refere ao Ministério Público ou ao
querelante.

16 - AÇÃO CIVIL EX DELICTO


É ação que se exerce na esfera cível, mas em decorrência de um crime. O ofendido busca, através dela, ser
indenizado em razão dos danos sofridos em decorrência da infração penal. Trata-se de situação em que um
mesmo fato gera repercussões na esfera criminal e também na esfera cível.
CPP. Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a
existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo
criminal.
No Brasil, adota-se a teoria da independência (a justiça penal pode decidir de um jeito e a justiça cível de
outro) conforme norma acima citada, entretanto, tal independência não é absoluta.
Prejudicialidade: No caso de um processo de conhecimento, na esfera cível, o parágrafo único do art. 64,
dentro da perspectiva de evitar decisões conflitantes e insegurança jurídica, prevê a possibilidade de ele ser
suspenso até o julgamento definitivo da ação penal. A suspensão não é obrigatória, mas sim discricionária.
Quanto ao tempo de suspensão, duas correntes: primeira, majoritária, um ano (art. 313, inciso V, a e § 4º,
Código de Processo Civil); segunda corrente, até o julgamento definitivo da ação penal (parágrafo único do
art. 64 do CPP). Segundo entendimento do STJ, e diante de previsão expressa do art. 200 do CC, não corre a
prescrição enquanto a ação estiver suspensa.
Legitimidade: CPP. Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a
execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus
herdeiros.
No polo ativo são legitimados o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. O art. 68 do CPP, traz
a legitimidade supletiva (excepcional) do Ministério Público, quando o titular da reparação for pobre (art. 32,
§§ 1º e 2º).
No polo passivo encontra-se o ofensor (autor do crime) e, se for o caso, seu representante civil (art. 64, CPP).
Duas possíveis ações podem se apresentar: a execução da sentença condenatória transitada em julgado, ou
uma ação de conhecimento proposta para reparar o dano. Se for uma execução, nos termos do art. 63 do
CPP, somente pode figurar como legitimado passivo aquele que figurou como acusado no processo penal.
Em caso de ação de conhecimento, nos termos do art. 64 do CPP, o legitimado passivo poderá ser não só o
autor do crime, como também o responsável civil (art. 932 do CC).
Eficácia preclusiva e força vinculatória: A regra geral é que sempre que a decisão criminal for de mérito,
categórica e definitiva sobre a existência do fato (materialidade) e sobre a autoria, ela terá força vinculatória
no cível, com formação de coisa julgada.
CC. Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a
existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo
criminal.

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CPP. Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando
não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.
Quando o art. 935 do CC fala em decididas compreenda-se como decisão de mérito (com análise de provas)
e transitada em julgado; quando o art. 66 fala em categoricamente, compreenda-se como isenta de dúvida,
com nível de certeza na decisão.
Em caso de condenação: a sentença traz a certeza sobre duas obrigações: a penal, de sujeitar-se às penas e
medidas de segurança, e a civil, de restituir, ressarcir e reparar.
Quantificação do valor da reparação: CPP. Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: [...] IV - fixará
valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo
ofendido. O quantum fixado na sentença criminal não é definitivo, na medida em que as portas do cível estão
abertas para o ofendido que deseja uma reparação maior ou integral. CPP. Art. 63. Parágrafo único.
Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos
do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano
efetivamente sofrido. Se a vítima ou seus representantes quiserem uma reparação maior, poderão ingressar
com o procedimento de liquidação para essa finalidade (art. 509 do CPC).
Em caso de absolvição: tem-se por regra geral que, sempre que a decisão criminal for de mérito, categórica
e definitiva sobre a existência do fato (materialidade) e sobre a autoria, ela terá força vinculatória no cível,
com formação de coisa julgada. Pois bem, é assim também com relação à sentença absolutória, que é uma
decisão de mérito e pode ser definitiva se transitada em julgado. Sempre que ela não for categórica, sempre
que traduzir dúvida, não fará coisa julgada, permitindo a rediscussão cível. O art. 386 do CPP estabelece
várias hipóteses de absolvição. A vinculação ou não da sentença vai depender da hipótese erigida para
absolvição. As situações que representarem dúvida não vincularão a esfera cível; ao contrário, as situações
que constituírem uma decisão categórica farão coisa julgada.

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Sentença penal absolutória


definitiva

Regra geral:
independência entre o
crime e o cível

Não impedem a ação Exceções à


de indenização civil independência entre
o crime e o cível
Extinção da Arquivamento de
punilibidade (art, inquérito policial (art. Excludentes de Prova de que o fato
67, II, do CPP) 67, I, do CPP) ilicitude (art. 65 inexistiu/réu não
do CPP) concorreu (art. 935
do CPP)
Absolvições em geral, não
abrangidas pelos arts. 65
do CPP e 935 do CC Exceções

Descriminantes Estado de
Falta de provas para Erro na execução na
putativas (não necessidade
condenação legítima defesa (art.
excluem a agressivo (arts. 929
ilicitude) 930, parágrafo único,
e 930 do CC) do CC)
Falta de prova Falta de prova de
da existência do envolvimento do
fato réu

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1973.

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As condições da ação penal e o julgamento de mérito abusivo. Belo, Warley. Porto Alegre : Lex Editora, Lex
Magister.

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Badaró, Gustavo. 2017. Processo penal. 5ª. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2017.

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Pinheiro, Rui. 1976. A constituição e o processo penal. 1. São Paulo : Coimbra, 1976.

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Prado, Luiz Regis. 2009. Direito Processual Penal. São Paulo : RT, 2009.

Rangel, Paulo. 2017. Direito processual penal. 25. São Paulo : Atlas, 2017.

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Reis, Alexandre Cebrian Araújo. 2012. Direito processual penal esquematizado. 1. São Paulo : Saraiva, 2012.

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Távora, Nestor. 2017. Curso de direito processual penal. 12. Salvador : JusPodvim, 2017.

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Wambier, Luiz Rodrigues. 2010. Curso avançado de processo civil. 11. São Paulo : RT, 2010.

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QUESTÕES COM COMENTÁRIOS


Magistratura

1. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2017) A legitimidade para a propositura de ação penal por crime
contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções é:
a) exclusiva do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido;
b) concorrente do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do
ofendido;
c) concorrente do ofendido, mediante representação, e do Ministério Público, mediante ação pública
incondicionada;
d) exclusiva do ofendido, mediante queixa.

Comentários:

A alternativa B é a única correta. O teor da Súmula 714 do Supremo Tribunal Federal


responde o questionamento: é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante
queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação
penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.

2. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2015) Conforme o artigo 41, do Código de Processo Penal, “A
denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação
do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando
necessário, o rol das testemunhas”. Portanto, a peça acusatória:
a) precisa apresentar algumas das condutas alegadamente praticadas pelo agente;
b) deve descrever os fatos ilícitos, ainda que não em sua totalidade;
c) pode conter elementos que sejam prescindíveis, mas relevantes para a imputação;
d) necessita trazer a descrição do comportamento delituoso de forma escorreita.

Comentários:

A assertiva A está errada. O exercício do contraditório e da ampla defesa toma por base os fatos narrados
na inicial. A denúncia, portanto, deve apontar todas as condutas atribuídas ao agente e não apenas algumas,
sob pena de comprometimento do exercício da defesa.

A alternativa B está incorreta. Os fatos ilícitos devem ser descritos por completo. O art. 41 do Código de
Processo Penal é claro ao afirmar que a denúncia deve expor o fato criminoso com todas as suas
circunstâncias.

A alternativa C também está incorreta. Se algum fato é relevante para a imputação ele deve constar na
denúncia e, portanto, não é dispensável.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 265


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A assertiva D está correta. A inicial acusatória deve descrever o comportamento atribuído ao acusado de
forma escorreita, sem defeito. Não há como pensar diferente, na medida em que a peça acusatória delimita
o objeto do processo.

3. (FCC – Juiz Substituto – TJ/PE – 2013) Nos crimes de ação penal de iniciativa privada,
a) o perdão do ofendido somente é cabível antes do exercício do direito de ação
b) o perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação
ao que o recusar;
c) a renúncia ao exercício do direito de queixa se estenderá a todos os querelantes;
d) a renúncia é ato unilateral, voluntário e necessariamente expresso;
e) a perempção pode ocorrer no curso do inquérito policial.

Comentários:

A alternativa A está errada. O perdão ocorre após o exercício do direito de ação. Essa, inclusive, é uma das
diferenças entre perdão e renúncia.

A assertiva B está correta. O perdão oferecido a um dos querelados aproveita aos demais. Essa é uma das
representações do princípio da indivisibilidade da ação penal privada. O perdão, contudo, é ato bilateral.
Exige-se, portanto, aceitação por parte do “perdoado”; inexistindo, o feito prossegue em relação àquele que
o recusar. O art. 51 do CPP esclarece:

Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza,
todavia, efeito em relação ao que o recusar.

A alternativa C está incorreta. Ofendido algum poderá renunciar a direito que não lhe pertence.
Aparentemente, a assertiva procurou induzir o candidato a erro modificando a essência do art. 49 do Código
de Processo Penal. Perceba-se:

Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a
todos se estenderá.

A assertiva D está errada. Ao contrário do que a alternativa dispõe, a renúncia pode ser tácita. O art. 57 do
Código de Processo Penal permite essa conclusão. Note-se:

Art. 57. A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova.

A alternativa E está incorreta. A perempção é causa extintiva da punibilidade e se opera apenas no âmbito
da ação penal. Não se admite a figura da perempção na fase de inquérito. A redação do art. 60 do Código de
Processo Penal conduz a essa conclusão:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a
ação penal [...]

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tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal.

4. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/PR– 2016 - 2ª fase)


Diferencie as condições da ação penal sob a ótica da concepção eclética e sob a teoria da asserção,
considerando a justa causa como espécie de condição da ação, discorrendo sobre os efeitos da absolvição
sumária bem como da rejeição da peça acusatória.

Comentários:

Concepção Eclética sobre o direito de ação: o Código de Processo Civil consagrou


expressamente a concepção eclética sobre o direito de ação, entendida como o direito
ao julgamento do mérito da causa, sendo irrelevante se favorável ou desfavorável,
condicionando ao preenchimento de certas condições aferíveis à luz da relação jurídica
material deduzida em juízo, às quais Enrico Tullio Liebman chamou de condição da ação.
Segundo esta teoria, o direito de ação não depende da existência do direito material, mas do preenchimento
de certos requisitos formais chamados de condições da ação, que não se confundem com o mérito.

Quando ausentes, geram uma sentença terminativa de carência da ação (art. 485, VI, do novo CPC), sem a
formação de coisa julgada material, o que em tese permite que nova demanda seja renovada, em havendo
correção do vício que deu ensejo à sentença sem resolução do mérito (CPC, 486, § 1º). Tratando-se de
matéria de ordem pública, não há preclusão, concluindo os defensores desta teoria, que a qualquer
momento do processo e com qualquer grau de cognição o juiz deve extinguir o processo sem resolução de
mérito por carência da ação, se entender ausente uma das condições da ação.

Teoria da Asserção ou teoria da prospettazione: mais recentemente surge esta teoria, defendida por
Alexandre Freitas Câmara, segundo a qual a presença das condições da ação deve ser analisada pelo juiz com
base nos elementos fornecidos pelo próprio autor em sua inicial, os quais devem ser tomados como
verdadeiros, sem nenhum desenvolvimento cognitivo, ou seja, o exame deverá ser feito in statu assertionis.

Se o juiz constatar a ausência de uma condição da ação mediante cognição sumária, deve extinguir o
processo sem resolução do mérito por carência de ação (art. 485, VI do NCPC), quando houver necessidade
de cognição mais aprofundada para análise da presença das condições da ação, a carência de ação passa a
ser analisada como mérito, gerando uma sentença de rejeição do pedido do autor com formação de coisa
julgada formal e material.

Justa causa para a ação penal: o artigo 395 do Código de Processo Penal prevê expressamente que a denúncia
ou queixa será rejeitada quando: “faltar justa causa para o exercício da ação penal” (inciso III). Exige-se da
acusação lastro probatório mínimo de existência material de um fato penalmente punível e indícios
suficientes de autoria para invocar a tutela jurisdicional, normalmente colhidos no inquérito policial ou de
outras peças de informação.

Sob a ótica da concepção eclética, evidenciada ausência de justa causa para ação penal, deverá o juiz rejeitá-
la, fazendo a decisão apenas coisa julgada formal. Iniciada a ação penal, por se tratar de matéria de ordem
pública, não haverá preclusão e a decisão não fará coisa julgada material.

No âmbito do processo penal, sob a perspectiva da teoria da asserção, ainda que se analise as condições da

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ação, com base no que foi narrado na denúncia ou queixa, deverá o juiz aferir se há justa causa, apreciada
em cognição superficial, evitando-se denúncia ou queixa infundadas.

Para os que consideram a justa causa como espécie de condição da ação penal, verificando a sua ausência
por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, deve o magistrado rejeitá-la, nos termos do art.
395, III do Código de Processo Penal, fazendo a decisão apenas coisa julgada formal.

A ausência de justa causa após apresentação da resposta do acusado, mediante cognição profunda, implicará
na absolvição sumária com base no artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal, com julgamento de
mérito, fazendo coisa julgada formal e material.

5. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2017) No procedimento comum, após o oferecimento da


resposta pelo acusado, o juiz deverá absolvê-lo sumariamente quando:
a) faltar justa causa para o exercício da ação penal ou verificar a existência manifesta de qualquer causa
excludente da culpabilidade;
b) verificar a existência manifesta de qualquer causa excludente da ilicitude do fato ou que o fato narrado
evidentemente não constitui crime;
c) a denúncia ou a queixa for manifestamente inepta ou não se convencer da existência de indícios suficientes
de autoria ou de participação;
d) faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal ou verificar que extinta a
punibilidade do agente.

Comentários:

A alternativa A está incorreta. Segundo o art. 395, inciso III do Código de Processo Penal, a ausência de justa
causa é hipótese de rejeição da denúncia e não de absolvição sumária.

Entretanto, há quem defenda que o reconhecimento da ausência de justa causa após o recebimento da
denúncia (e, portanto, na fase do art. 397, CPP) tem força de absolvição sumária, fazendo coisa julgada
material.

Ainda que se adotasse o posicionamento supramencionado, a assertiva continuaria errada; isso porque, ao
contrário do que ela sugere, nem todas as causas extintivas da culpabilidade conduzem à absolvição sumária.
Existe ressalva expressa quanto à inimputabilidade no texto legal (art. 397, II, CPP).

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: [...] III - faltar justa causa para o exercício
da ação penal.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] II - a existência manifesta de
causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

A alternativa B está correta. As duas hipóteses constantes na assertiva são causas de absolvição sumária
(art. 397, II e III CPP).

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Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa
excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade
do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou
IV - extinta a punibilidade do agente.

A assertiva C está errada. A inépcia da inicial é causa de rejeição e não de absolvição sumária (art. 395, I,
CPP). Além disso, a outra hipótese constante na assertiva é causa de impronúncia (nos casos de crimes de
competência do Tribunal do Júri - art. 414, CPP).

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta.

Art. 414. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes


de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. [...]

A alternativa D também está errada. Embora a extinção de punibilidade seja causa de absolvição sumária,
a ausência de pressuposto processual ou condição para exercício da ação não passa de hipótese de rejeição
da peça acusatória (art. 395, II e art. 397, IV, CPP).

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: [...]II - faltar pressuposto processual ou
condição para o exercício da ação penal [...]

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] IV - extinta a punibilidade do
agente.

6. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/AM – 2016) Em se tratando de procedimento comum ordinário, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar que:
a) a punibilidade está extinta em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em perspectiva;
b) o fato foi cometido em situação de manifesta inexigibilidade de conduta diversa;
c) estão ausentes indícios mínimos de autoria e materialidade do fato supostamente praticado;
d) o acusado é portador de doença mental, atestada por laudo médico oficial, e inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato;
e) o fato foi cometido em estrita obediência a ordem manifestamente ilegal.

Comentários:

A alternativa A está errada. A prescrição da pretensão punitiva em perspectiva (com


fundamento na pena hipotética) não tem o condão de extinguir a punibilidade do agente e,
consequentemente, de gerar absolvição sumária. Sobre o tema, confira-se o teor da Súmula 438
do STJ: é inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com
fundamento na pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

A alternativa B está correta. Inexigibilidade de conduta diversa é causa que afasta a culpabilidade e, segundo

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o art. 397, inciso II do Código de Processo Penal, dá causa à absolvição sumária.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] II - a existência manifesta de causa
excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade. [...]

A alternativa C está errada. A ausência de suporte probatório mínimo é causa de rejeição da denúncia (art.
395, III, CPP) e não está dentre as hipóteses de absolvição sumária previstas no art. 397 do Código de
Processo Penal.

A assertiva D está incorreta. A inimputabilidade não viabiliza a absolvição sumária por expressa vedação
legal (art. 397, II, CPP).

A assertiva E também está errada. Obediência à ordem manifestamente ilegal não é causa excludente de
culpabilidade e, consequentemente, não conduz à absolvição sumária. A exigibilidade de conduta diversa (e
a culpabilidade) somente estaria afastada se a ordem obedecida fosse não manifestamente ilegal.

7. (TRF3 – Juiz Federal – TRF3 – 2016 – ADAPTADA) Pensando na hipótese de, após a apresentação de
resposta à acusação, o magistrado se convencer da falta de justa causa para a ação penal, assinale qual
hipótese é verdadeira à luz da jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça:
a) O magistrado terá que deixar a ação correr, pois não lhe compete conceder habeas corpus contra si
próprio;
b) O magistrado deverá absolver sumariamente o acusado, sem especificar nenhum inciso do artigo 397 do
Código de Processo Penal;
c) O magistrado poderá rejeitar a denúncia, dado que o primeiro recebimento, conforme parte da doutrina,
ocorre a título precário;
d) O magistrado deverá enviar os autos ao titular da ação, para que diga se concorda em retirar a denúncia.

Comentários:

Com exceção da alternativa C, todas as assertivas estão erradas. O Superior Tribunal de Justiça já se
manifestou a respeito da matéria. Segundo a orientação do Tribunal, em casos semelhantes o magistrado
pode exercer juízo de reconsideração sobre a decisão que recebeu a inicial para o efeito de rejeitar a peça
acusatória.

[...] O recebimento da denúncia não impede que, após o oferecimento da resposta do acusado
(arts. 396 e 396-A do Código de Processo Penal), o Juízo reconsidere a decisão prolatada e, se for
o caso, impeça o prosseguimento da ação penal. [...] (AgRg no REsp 1.218.030/PR, Quinta Turma,
Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 10/4/2014).

OBS. Há doutrina e jurisprudência em sentido contrário; entretanto, o entendimento acima é aquele que
parece prevalecer.

8. (VUNESP – Juiz Substituto – TJM/SP – 2016 – ADAPTADA)

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O vício quanto à regularidade da procuração na ação penal privada pode ser emendado (capacidade
postulatória), mesmo após o transcurso do prazo decadencial (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. Vícios relacionados à regularidade da procuração devem ser sanados dentro do
prazo decadencial. Nesse sentido:

[...] 2. No caso dos autos, a procuração sequer contém a indicação do dispositivo penal em que
foi dada como incursa a recorrente, de modo que o reconhecimento da irregularidade é medida
que se impõe. [...] 3. Sendo de ação penal privada a actio penalis na espécie, operou- se a
decadência do direito do ofendido a oferecer queixa-crime, em conformidade com o disposto no
art. 38 do Código de Processo Penal, pois a irregularidade não foi sanada no prazo de seis
meses.[...] (RHC 44.287/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
11/11/2014, DJe 01/12/2014)

9. (TRF4 – Juiz Federal – TRF4 – 2016 – ADAPTADA)


Prevalece no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que o princípio
da indivisibilidade da ação penal também se aplica às ações penais públicas (C/E)

Comentários:

A alternativa está errada. Segundo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, o princípio
da indivisibilidade não se aplica às ações penais públicas. Perceba-se:

Em sede de ação penal pública vigora o princípio da divisibilidade, sendo admissível que o
processo seja desmembrado em tantos quantos forem os réus(AgRg no REsp 1465912/RS, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe
19/02/2018)

Princípio da indivisibilidade da ação penal, ademais, que não se aplica à ação penal pública.
Precedentes. (AP 560, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 25/08/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 10-09-2015 PUBLIC 11-09-2015)

10. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/AM – 2016 – ADAPTADA)


Carla fez um seguro de vida que previa o pagamento de vultosa indenização a seu marido, José, caso ela
viesse a falecer. O contrato previa que o beneficiário não teria direito à indenização se causasse a morte da
segurada. Alguns meses depois, Carla foi encontrada morta, tendo o perito oficial que assinou o laudo
cadavérico concluído que a causa provável fora envenenamento. Em que pese o delegado não ter indiciado
José, o MP concluiu que havia indícios de autoria, razão pela qual ele foi denunciado por homicídio doloso.
O juiz recebeu a denúncia e determinou a citação do réu. José negou a autoria do delito, tendo solicitado a
admissão de assistente técnico e apresentado defesa em que requereu sua absolvição sumária. O parecer
do assistente técnico foi no sentido de que a morte de Carla tivera causas naturais. Pergunta-se: Caso o juiz
absolva José por estar provado não ser ele autor do fato, essa decisão não impedirá que os genitores de Carla
ingressem com ação civil indenizatória e obtenham o reconhecimento de sua responsabilidade civil. (C/E)

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Comentários:

A assertiva está incorreta. A sentença absolutória que reconhece que o acusado não foi autor do fato faz
coisa julgada no cível e impede o ajuizamento de ação civil indenizatória. Sobre o tema:

O Código de Processo Penal, em seu art. 386, com a redação determinada pela Lei n.
11.690/2008, prevê sete hipóteses de absolvição. Os incisos II, V e VII tratam de hipóteses de
falta de provas. Dão ensejo ao ajuizamento, na esfera cível, de ação de reparação de dano. Não
possibilitam a ação de regresso ao trabalho do funcionário público. O inciso I (inexistência do
fato) possui importante repercussão na esfera cível, na medida em que impossibilita o
ajuizamento de ação civil ex delicto para reparação do dano (CPP, art. 66). A mesma repercussão
possui o inciso IV (estar provado que o réu não concorreu para a infração penal), introduzido pela
Lei n. 11.690/2008 (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19ª ed. Saraiva. São Paulo. 2012.
P. 537)

11. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/RJ – 2016) A, casada com B, durante uma discussão de casal, levou
um soco, sendo ameaçada de morte. Diante dos gritos e ameaças, os vizinhos acionaram a Polícia que, ao
chegar ao local, conduziu todos à Delegacia. A, inicialmente, prestou depoimento na Delegacia e
manifestou o desejo de que o marido fosse processado criminalmente pelos crimes de lesão corporal leve
e ameaça. Entretanto, encerradas as investigações policiais e remetidos os autos ao Fórum, em sede de
audiência preliminar, A informou o Juízo que havia se reconciliado com B, não desejando que o marido
fosse processado por ambos os crimes. Diante da nova manifestação de vontade de A, é correto afirmar
que o procedimento:
a) deverá ser arquivado, vez que a ação penal, seja para o crime de ameaça, seja para o de lesão corporal de
natureza leve, é condicionada à representação da vítima, e a retratação de A obsta o prosseguimento do
feito;
b) terá seguimento quanto ao crime de lesão corporal, visto que a ação penal é pública incondicionada, por
ter se dado em âmbito doméstico. Já quanto ao crime de ameaça, a retratação de A obsta o prosseguimento,
visto que a ação penal continua condicionada à representação, ainda que praticada em âmbito doméstico;
c) terá seguimento, tanto para o crime de ameaça quanto para o crime de lesão corporal, pois em se tratando
de crimes ocorridos no âmbito doméstico, a ação penal é pública incondicionada, pouco importando a
retratação de A;
d) terá seguimento, tanto para o crime de ameaça quanto para o crime de lesão corporal. Todavia, é possível
ao órgão de acusação, desde logo, ofertar a transação penal;
e) será arquivado quanto ao crime de ameaça, já que a ação é condicionada à representação da vítima.
Quanto ao crime de lesão corporal, ocorrida em âmbito doméstico, o procedimento terá seguimento, por
tratar-se de ação penal pública incondicionada. Todavia, é possível ao órgão de acusação, desde logo, ofertar
a transação penal.

Comentários:

A alternativa B é a única correta. Noticia-se a ocorrência dos crimes de lesão corporal leve e
ameaça. O caso retratado no enunciado deve ser avaliado à luz da Lei Maria da Penha (Lei
11.340/2006). Há se ter em mente que a ação penal no crime de lesão corporal resultante de

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violência doméstica contra a mulher é incondicionada (Súmula 542, STJ). O crime de ameaça, por sua vez, se
procede mediante ação penal pública condicionada à representação (art. 147, parágrafo único do Código
Penal). Com base nesses esclarecimentos, pode-se concluir que a retratação da representação – que
respeitou o art. 16 da Lei nº 11.340/2006 – somente gerará efeitos quanto ao delito de ameaça (obstando o
prosseguimento da demanda quanto a essa infração), mas não impedirá a continuidade em relação à lesão
corporal leve que, por sua vez, não comporta transação penal (Súmula 536, STJ).

Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na


hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de
causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único -
Somente se procede mediante representação.

Lei 11.340/2006 - Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida
de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência
especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o
Ministério Público.

12. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/DFT – 2015 – ADAPTADA)


Situação hipotética: Marta, de dezenove anos de idade, foi vítima de assédio sexual praticado pelo gerente
da empresa em que trabalha. Assertiva: Nessa situação, a ação penal se processará mediante queixa-crime.
(C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. Segundo o art. 216-A c/c art. 225 do Código Penal, a infração em questão se
processará mediante ação penal pública incondicionada (alteração operada pela Lei nº 13.718/2018). A
assertiva estaria errada mesmo antes da alteração de 2018, porquanto, na época, tratava-se de ação penal
pública condicionada a representação e não de ação privada conforme proposto no enunciado. Perceba-se:

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual,
prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao
exercício de emprego, cargo ou função [...]

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal
pública incondicionada. (Redação dada pela Lei nº 13.718/2018)

13. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/DFT – 2015 – ADAPTADA)


Situação hipotética: Breno foi vítima de injúria racial cuja autoria foi imputada a Rômulo. Assertiva: Nessa
situação, a ação penal será pública incondicionada. (C/E)

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Comentários:

A assertiva está incorreta. O crime de injúria racial se processa mediante ação penal pública condicionada à
representação. O art. 145 do Código Penal é claro a esse respeito.

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: [...] § 3o Se a injúria consiste
na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa
idosa ou portadora de deficiência. [...]

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-
se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste
Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como
no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

14. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/MS – 2015) XISTO, querelante em ação penal privada, ao término
da instrução e representado por advogado constituído, requereu a absolvição de CRISTÓVÃO, querelado.
Deve o juiz
a) determinar a extração de peças processuais e o encaminhamento à autoridade policial, para apuração da
prática, pelo querelante, de denunciação caluniosa;
b) designar audiência para tentativa de conciliação das partes, em homenagem ao princípio da intervenção
mínima;
c) considerar perempta a ação penal, porque o querelante deixou de formular pedido de condenação nas
alegações finais;
d) encaminhar os autos em vista ao Ministério Público, titular da ação penal, para manifestação de interesse
na produção de outras provas;
e) absolver CRISTÓVÃO, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Comentários:

A alternativa A está errada. O simples pedido de absolvição do querelado não sugere a ocorrência de
denunciação caluniosa. Não há motivo, portanto, para determinar a extração de cópia do feito para apuração
de tal infração.

A assertiva B está errada. A legislação não prevê hipótese de designação de audiência de conciliação nos
casos em que, após a instrução, em sede de memoriais, o querelante requeira a absolvição do querelado.

A alternativa C está correta. Objetivamente, o querelante deixou de requerer a condenação do querelado,


situação que se enquadra como hipótese de perempção (art. 60, III, CPP).

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a
ação penal: [...] III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a
qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais;

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A assertiva D está incorreta. A ação penal privada é regida pelo princípio da disponibilidade. Nos casos em
que o ofendido manifeste desinteresse na continuidade do processo ou na condenação do querelado, não
cabe ao parquet assumir o polo ativo da demanda; consequentemente, não terá razão para se manifestar
quanto à existência ou não de interesse na produção de outras provas (afinal, o reconhecimento da
perempção, causa extintiva da punibilidade, é iminente).

A alternativa E está errada. O enunciado não indica absolutamente nada a respeito da suficiência ou não
das provas colhidas ao longo da ação penal. Consequentemente, não há razão sequer para aventar a
possibilidade de absolvição com base no artigo 386, inciso VII do Código de Processo Penal.

15. (FCC – Juiz Substituto – TJ/AP- 2014 – ADAPTADA)


No que toca aos procedimentos, o Código de Processo Penal estabelece que: as disposições atinentes à
rejeição da denúncia ou queixa, apresentação de resposta à acusação e absolvição sumária aplicam-se a
todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados pelo Código de Processo Penal.
(C/E)

Comentários:

A assertiva está correta. Existe previsão legal expressa nesse sentido (art. 394, § 4º, CPP):

Art. 394. O procedimento será comum ou especial. [...]§ 4o As disposições dos arts. 395 a 398
deste Código aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não
regulados neste Código.

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar
pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para
o exercício da ação penal.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa
excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade
do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; IV
- extinta a punibilidade do agente.

16. (FUNDEP – Juiz Substituto – TJ/MG – 2014) Assinale a alternativa INCORRETA:


a) na ação penal privada subsidiária da pública, o Promotor de Justiça pode repudiar a queixa e oferecer
denúncia substitutiva, quando a queixa apresentada for inepta;
b) tanto a renúncia ao exercício do direito de queixa como o perdão do ofendido em relação a um dos autores
do crime, a todos se estenderá, extinguindo-se a punibilidade;
c) a renúncia, nas ações penais privadas, pode ser tácita e admite, para tanto, todos os meios de prova,
conforme previsto no Código de Processo Penal;
d) tratando-se de ação penal privada personalíssima, a morte da vítima extingue a punibilidade.

Comentários:

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A assertiva A está correta. O Promotor de Justiça tem a prerrogativa de repudiar a queixa apresentada pelo
ofendido e oferecer denúncia substitutiva nos casos de ação penal privada subsidiária. A esse respeito:

Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

A alternativa B está incorreta e deveria ter sido assinalada. O simples perdão do ofendido não conduz à
extinção da punibilidade. É imprescindível que haja aceitação do perdão por parte do querelado. Note-se:

Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza,
todavia, efeito em relação ao que o recusar.

A alternativa C está certa. A renúncia nas ações penais privadas pode ser tácita e admite todos os meios de
prova. Note-se:

Art. 57. A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova.

A alternativa D também está correta. A morte da vítima extingue a punibilidade do agente nos casos de
ação penal privada personalíssima. Não há nesses casos a sucessão processual prevista no art. 31 do Código
de Processo Penal. Perceba-se:

Se, em regra, a morte do autor do delito é causa extintiva da punibilidade, tal qual o prevê o art. 107,
I, do CP, nas hipóteses de ação penal privada personalíssima, a morte da vítima também irá produzir a
extinção da punibilidade. Isso porque, como não é cabível a sucessão processual, com a transmissão
do direito de queixa-crime aos sucessores, se o ofendido vier a óbito, ter-se-á que reconhecer a
extinção da punibilidade, quer pela decadência, se a ação penal ainda não tiver sido exercida, quer pela
perempção, se o processo já estiver em andamento, já que a ninguém é dado promover a ação ou
prosseguir no processo que estava em curso. (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal.
Volume Único. 5ª ed. Jus Podivm. Salvador. 2017. P. 261)

Promotor

17. (MPE/SC – Promotor de Justiça – MPE/SC – 2016)


Nos termos do Código de Processo Penal, nos casos em que somente se procede mediante queixa,
considerar-se-á perempta a ação penal: quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o
andamento do processo durante sessenta dias seguidos; quando o querelante deixar de comparecer, sem
motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais; quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar
sucessor. (C/E)

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Comentários:

A assertiva está incorreta. A questão exige a literalidade da lei. Ao contrário do que consta na
assertiva, a perempção será reconhecida quando o querelante deixar de promover o
andamento do processo durante trinta (30) dias seguidos, e não sessenta (60) como consta no
enunciado. Note-se:

Art. 60, CPP. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á
perempta a ação penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o
andamento do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou
sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do
prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto
no art. 36; III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer
ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas
alegações finais; IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar
sucessor

18. (MPE/RS– Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Demétrio foi vítima de ameaça. O prazo para
representação finda em 15 de janeiro, em plenas férias forenses. Neste caso, o prazo:
a) é interrompido até o final das férias;
b) é suspendido até o final das férias;
c) é prorrogado por questão de força maior;
d) não é interrompido;
e) é prorrogado automaticamente sob pena de violar o princípio constitucional de pleno acesso à justiça.

Comentários:

A alternativa D é a única correta. O prazo para exercício do direito de representação é decadencial, de


natureza penal. Esse prazo não se interrompe, não se suspende, tampouco se prorroga.

19. (MPE/RS – Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Eurípedes foi preso preventivamente por
homicídio qualificado. Com o inquérito findo em mãos, o Ministério Público levou 15 dias para oferecer a
denúncia. Encerrada a instrução em prazo razoável, nas alegações orais, a defesa sustentou, em
preliminar, que a denúncia não poderia ter sido recebida, uma vez que ofertada fora do prazo do art. 46
do CPP. Nessa situação, o Magistrado deve:
a) reconhecer a prefacial e anular a peça inaugural;
b) afastar a prefacial, por ser mera irregularidade;
c) proceder, por analogia, na forma do art. 28 do CPP, para que o Procurador-Geral de Justiça tome as
providências legais;
d) reconhecer a prefacial e, através de habeas corpus de ofício, determinar a liberdade do réu;
e) reconhecer a prefacial e impor ao Ministério Público a perda de 10 dias de vencimentos.

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Comentários:

A assertiva B é a única correta. O prazo para oferecimento da denúncia é impróprio. A superação desse
prazo previsto em lei (desde que considerável) pode até culminar no relaxamento da prisão cautelar, mas
não dá ensejo à declaração de nulidade. Aliás, a jurisprudência consolidada reconhece a ocorrência de mera
irregularidade em casos parecidos ao retratado no enunciado. Perceba-se:

[...] 3. O oferecimento de denúncia fora do prazo legal não apresenta nulidade que afete a
validade do processo penal, apenas, mera irregularidade, porquanto inexiste prejuízo para o réu,
e a inércia do órgão persecutório, a não ser que dela decorra prescrição, não pode implicar
impunidade.[...] (REsp 1115275/PR, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 04/11/2011)

20. (MPE/RS – Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Tarquínio, servente de pedreiro, analfabeto, era
casado, e ainda assim, contraiu novo matrimônio em 21/03/2002. O fato só veio à tona em 25/03/2014.
Aberto inquérito policial de ofício no mesmo dia, por ter a autoridade policial tomado ciência do evento
por meio de extensa notícia jornalística, foi concluído rapidamente, e o Ministério Público, frente às
irretorquíveis provas documentais coletadas nos registros públicos do duplo casamento, deve, consoante
a jurisprudência majoritária,
a) esperar pela representação da última vítima;
b) propor o arquivamento pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva;
c) propor o arquivamento por medida de política criminal face o decurso do tempo;
d) propor o arquivamento porque o indiciado incorreu em erro sobre a ilicitude do fato
e) denunciá-lo pelo crime de bigamia;

Comentários:

A alternativa A está errada. O comportamento do agente se amolda ao tipo penal de bigamia (art. 235, CP).
Essa infração se procede mediante ação penal pública incondicionada, porque a lei nada dispõe em sentido
contrário.

Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena - reclusão, de dois a seis anos.

A alternativa B também está errada. De acordo com o art. 111, inciso IV do Código Penal, a prescrição nesse
caso começou a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: [...] IV -
nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em
que o fato se tornou conhecido

A alternativa C está incorreta. Não há se falar em arquivamento em face do decurso do tempo. Tão logo a
autoridade policial tomou conhecimento do fato, instaurou inquérito policial. O procedimento tramitou
rapidamente e chegou ao Promotor de Justiça. Não houve, portanto, constrangimento algum que
recomendasse o arquivamento do feito por afronta à duração razoável do processo.

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A assertiva D está errada. O desconhecimento da lei é inescusável. Além disso, não há absolutamente nada
no enunciado que indique a ocorrência de erro de proibição. É bem possível que mesmo sendo pessoa
humilde, Tarquínio tivesse conhecimento de que contrair novo casamento sendo casado configura crime. O
requerimento de arquivamento nessas circunstâncias seria imprudente.

A assertiva E está correta. O crime de bigamia, como já esclarecido, é de ação penal pública incondicionada.
Presentes elementos de informação suficientes, deve o Ministério Público oferecer denúncia.

21. (FUNDEP – Promotor de Justiça – MPE/MG – 2014) Segundo os Tribunais Superiores e posição
doutrinária dominante, uma denúncia, sabidamente autêntica, que não contém a assinatura do Promotor
de Justiça, é:
a) absolutamente nula;
b) formalmente correta;
c) inexistente;
d) meramente irregular.

Comentários:

A assertiva D é a única correta. O enunciado é claro ao exigir do candidato conhecimento a respeito do


entendimento jurisprudencial e doutrinário majoritário. Prevalece que se a peça inicial for sabidamente
autêntica, a ausência de assinatura não passa de mera irregularidade. Sobre o tema:

[...] este Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que a falta de assinatura da
denúncia configura mera irregularidade, uma vez que, após o seu oferecimento, o órgão
ministerial se manifestará nos autos, o que supre a ausência de tal formalidade, que, por
conseguinte, não acarreta quaisquer prejuízos à defesa. Doutrina. Precedentes. [...] (HC
357.036/MT, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 18/10/2016, DJe
25/10/2016)

22. (MPE/PR – Promotor de Justiça – MPE/MA – 2014) Sobre denúncia e queixa, é incorreto afirmar:
a) o rol de testemunhas não é indispensável;
b) a apuração prévia do crime por meio de inquérito policial não é obrigatória;
c) devem conter a narrativa do fato criminoso e a respectiva classificação jurídica;
d) o recebimento das duas iniciais acusatórias sempre interrompe o prazo prescricional;
e) consideradas as duas ações penais, a decadência obsta apenas o ajuizamento da queixa.

Comentários:

A alternativa A está correta. O rol de testemunhas é dispensável. É possível que inexistam testemunhas
relevantes para o esclarecimento dos fatos e que a infração demande apenas a produção de prova
documental e pericial, por exemplo.

A alternativa B também está certa. O inquérito é procedimento administrativo dispensável. Nada impede

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que elementos de informação suficientes ao oferecimento da denúncia ou da queixa-crime sejam colhidos


de outras formas.

A assertiva C está certa. A narrativa do fato criminoso e a classificação jurídica da imputação são requisitos
da peça inicial. O art. 41 do Código de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a
classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

A assertiva D também está correta. O recebimento de denúncia ou de queixa-crime interrompe o curso do


prazo prescricional. O art. 117, inciso I do Código Penal não dá margem para dúvidas:

Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa


[...]

A assertiva E está incorreta e deveria ter sido assinalada. A decadência não obsta apenas o ajuizamento de
queixa-crime, mas também a própria denúncia nos casos de ação penal pública condicionada à
representação.

23. (MPE/PR – Promotor de Justiça – MPE/PR – 2013) Sobre a ação ex delicto é correto afirmar:
a) O fato imputado na esfera criminal, mesmo após sentença condenatória irrecorrível, pode ser declarado
inexistente na ação de reparação de danos no juízo cível;
b) O arquivamento do inquérito policial, pelo reconhecimento de quaisquer das causas extintivas da
punibilidade, obsta a respectiva ação cível de reparação;
c) Se ação de reparação de danos está em fase de citação e a ação penal na ocasião da sentença, tal situação
vincula o juízo cível a suspender o curso da ação reparatória;
d) A sentença absolutória que reconhece o estado de necessidade, sem atribuir culpa a terceiro ou ao dono
da coisa, não impede a ação cível deste;
e) Conforme súmula do STF, o Ministério Público pode propor, sem qualquer restrição, ação ex delicto em
favor do titular do direito à reparação do dano que é pobre.

Comentários:

A alternativa A está incorreta. A sentença condenatória irrecorrível faz coisa julgada no cível, de
modo que reconhecida a existência do fato (pressuposto para a condenação) no âmbito penal, a
matéria não poderá ser rediscutida em eventual ação de reparação de danos. A esse respeito,
confira-se o entendimento da doutrina:

Assim, se a instância penal reconheceu a existência de um ato ilícito, não há mais necessidade,
tampouco interesse jurídico, de rediscutir essa questão na esfera civil. Se o fato constitui infração
penal, por óbvio caracteriza ilícito civil, dado que este último configura grau menor de violação da
ordem jurídica. Só restará saber se houve dano e qual o seu valor. Vê-se, portanto, que a condenação
penal imutável faz coisa julgada também no cível, para efeito de reparação do dano ex delicto,

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impedindo que o autor do fato renove nessa instância a discussão do que foi decidido no crime. (CAPEZ,
Fernando. Curso de Processo Penal. Saraiva. São Paulo. 19ª ed. 2012. P. 212).

A alternativa B também está errada. O arquivamento do inquérito em caso de reconhecimento de causa


extintiva de punibilidade não impede o ajuizamento da ação civil ex delicto. Sobre o tema:

De outro lado, não impedem a propositura da ação civil reparatória o despacho de arquivamento do
inquérito policial ou das peças de informação, a decisão que julgar extinta a punibilidade, nem a
sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime [...] (CAPEZ, Fernando. Curso
de Processo Penal. Saraiva. São Paulo. 19ª ed. 2012. P. 212).

A assertiva C está incorreta. Na hipótese constante no enunciado, caberá ao juiz do processo cível decidir se
suspende ou não a ação reparatória. Não há vinculação. Ele não é obrigado a suspender. O art. 64 do Código
de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá
ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil.
Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até
o julgamento definitivo daquela.

A alternativa D está correta. A sentença penal absolutória que reconhece a ocorrência de estado de
necessidade faz coisa julgada no cível. Se a decisão não atribuir a culpa a terceiro ou ao dono da coisa, o
proprietário do bem jurídico atingido poderá ajuizar ação cível para reparação do dano diretamente contra
o causador. Nesse caso, o indivíduo que agiu acobertado pela causa excludente de ilicitude poderá ajuizar
ação regressiva. Sobre o tema, confira-se o que dispõem os arts. 188, 929 e 930 do Código Civil:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular
de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa,
a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo
somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os
limites do indispensável para a remoção do perigo.

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem
culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este
terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano
(art. 188, inciso I).

A assertiva E está incorreta. Não há súmula do Supremo Tribunal Federal conferindo ao Ministério Público
legitimidade irrestrita para o ajuizamento de ação civil ex delicto em favor de pessoa pobre. Pelo contrário,
o STF reconheceu a inconstitucionalidade progressiva do art. 68 do CPP para o efeito de atribuir legitimidade
ao parquet somente enquanto não tiver sido instalada Defensoria Pública no local. Sobre a matéria:

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LEGITIMIDADE - AÇÃO "EX DELICTO" - MINISTÉRIO PÚBLICO - DEFENSORIA PÚBLICA - ARTIGO 68


DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CARTA DA REPÚBLICA DE 1988. A teor do disposto no artigo
134 da Constituição Federal, cabe à Defensoria Pública, instituição essencial à função jurisdicional
do Estado, a orientação e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º,
LXXIV, da Carta, estando restrita a atuação do Ministério Público, no campo dos interesses sociais
e individuais, àqueles indisponíveis (parte final do artigo 127 da Constituição Federal).
INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA - VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE DIREITO
ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - ASSISTÊNCIA JURÍDICA E JUDICIÁRIA DOS
NECESSITADOS - SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao
Estado, no que assegurado constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo
exercício. Enquanto não criada por lei, organizada - e, portanto, preenchidos os cargos próprios,
na unidade da Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de
Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele
prevista. Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do
Estado, em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam
demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio
sustento. (RE 135328, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/1994,
DJ 20-04-2001 PP-00137 EMENT VOL-02027-06 PP-01164 RTJ VOL-00177-02 PP-00879)

24. (MPE/SP – Promotor de Justiça – MPE/SP – 2015) Assinale a alternativa correta:


a) A vítima poderá, em hipótese específica, provocar a prestação da tutela jurisdicional, mesmo em crime de
ação pública. Neste caso, o Promotor de Justiça atuará como interveniente obrigatório subsidiário;
b) A requisição do Ministro da Justiça é, por definição, uma ordem legal e, portanto, impõe o oferecimento
da denúncia e o início da ação penal nos delitos a ela condicionados;
c) O princípio da indivisibilidade da ação privada não comporta exceções;
d) O crime de lesões corporais dolosas de natureza leve, quando envolver violência doméstica contra mulher,
é de ação pública condicionada à representação;
e) O fenômeno da assistência no processo penal pode se verificar nas ações penais públicas e privadas, nos
termos do artigo 268 do Código de Processo Penal.

Comentários:

A alternativa A está correta. Em caso de inércia do Ministério Pública, o ofendido poderá provocar a
prestação da tutela jurisdicional. Trata-se da ação penal privada subsidiária da pública. Para
parte da doutrina, o Promotor de Justiça, nesses casos, figurará como um interveniente
adesivo obrigatório ou assistente litisconsorcial. A banca empregou expressão diversa no
caso (interveniente obrigatório subsidiário) o que, em princípio, não a tornou incorreta.
Confiram-se os dispositivos legais pertinentes sobre o tema:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [....]LIX - será admitida
ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal.

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Art. 100, CP - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido. [...]§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o
Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.

Art. 29, CPP. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada
no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

A alternativa B está incorreta. A expressão requisição do Ministro da Justiça deve ser interpretada como
mero requerimento e não como uma ordem. Caberá ao Ministério Público, a par dos elementos de
informação, formar juízo de convencimento sobre a pretensa infração e externar a opinio delicti.

A alternativa C também está errada. É possível afirmar que o princípio da indivisibilidade da ação penal
privada comporta exceções. Perceba-se. Caso um dos coautores faleça, o ofendido, por razões óbvias, não
ficará obrigado a demandar contra ele. O mesmo se diga em relação a coautores não identificados.

A assertiva D está incorreta, porque contraria entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça.
Note-se:

Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

A alternativa E está incorreta. Por expressa previsão legal, a assistência somente é possível em casos de ação
penal pública. Confira-se:

Art. 268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério
Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas
no Art. 31.

25. (UFMT– Promotor de Justiça – MP/MT – 2014) Em matéria de Ação Penal, é INCORRETO afirmar:
a) O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
N.º 130/DF, julgou pela recepção do art. 44, § 2.º, da Lei N.º 5.250/1967, asseverando que, contra a decisão
de rejeição da denúncia por crime de imprensa, é previsto o recurso de apelação;
b) Ação de prevenção penal é aquela deflagrada com a finalidade de aplicar exclusivamente ao acusado
inimputável, na forma do art. 26 do Código Penal, medida de segurança, na chamada sentença absolutória
imprópria;
c) Ação penal adesiva é a possibilidade de figurar no polo ativo o Ministério Público e o querelante, nas
hipóteses em que houver conexão e continência entre crimes de ação penal pública e ação penal privada;
d) Os crimes de injúria qualificada ou injúria real serão objeto de ação penal pública condicionada à
representação do ofendido;
e) A Súmula N.º 714 do STF afirma que haverá legitimidade concorrente nos crimes contra a honra de
funcionário público praticados no exercício de suas funções (propter officium), podendo o próprio

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funcionário público ingressar com a ação penal privada, sem prejuízo da legitimidade conferida ao Ministério
Público para oferecer a denúncia condicionada à representação do ofendido.

Comentários:

A alternativa A está incorreta e, portanto, deveria ter sido assinalada. Ao contrário do que consta na
assertiva, o STF declarou não recepcionada a Lei nº 5250/1967 (Lei de Imprensa). Veja-se:

Total procedência da ADPF, para o efeito de declarar como não recepcionado pela Constituição
de 1988 todo o conjunto de dispositivos da Lei federal nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967. (ADPF
130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/2009, DJe-208 DIVULG
05-11-2009 PUBLIC 06-11-2009 EMENT VOL-02381-01 PP-00001 RTJ VOL-00213-01 PP-00020)

A alternativa B está correta. Ação de prevenção penal é a demanda que tem por objetivo aplicar
exclusivamente ao indivíduo inimputável medida de segurança. A esse respeito:

Ação de prevenção penal é aquela ajuizada com o objetivo de se aplicar ao inimputável do art. 26,
caput, do CP, exclusivamente, medida de segurança (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo
Penal. 4ª ed. Jus Podivm. Salvador/BA. 2016. P. 380).

A assertiva C também está correta. Ação penal adesiva é, basicamente, a possibilidade de Ministério Público
e querelante figurarem no polo ativo de uma demanda nas hipóteses de conexão/continência entre infrações
de ação penal pública e privada. Sobre o tema:

No ordenamento jurídico alemão, é possível que o Ministério Público ingresse com ação penal
pública mesmo em relação aos crimes sujeitos à ação penal privada, desde que divise um
interesse público. Se isso ocorrer, o ofendido (ou outro legitimado) poderá constituir-se em parte
acessória, acusador subsidiário ou acusador acessório, equivalente ao instituto brasileiro do
assistente do Ministério Público, como se fosse uma ação penal acessória ou uma ação penal
adesiva. (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4ª ed. Jus Podivm. Salvador/BA.
2016. P. 379).

Não obstante controversa, a alternativa D foi considerada correta pela banca. As infrações previstas nos
§§ 2º e 3º do art. 140 do Código Penal podem ser consideradas injúrias qualificadas (possuem preceito
secundário próprio). A doutrina, contudo, diverge a respeito da modalidade de ação penal em relação ao
crime de injúria real (art. 140, § 2º, CP). Confiram-se os esclarecedores apontamentos da doutrina sobre o
tema:

De acordo com o texto legal, a ação penal será pública incondicionada qualquer
que seja a lesão corporal: leve, grave ou gravíssima. No entanto, há posições
doutrinárias sustentando que, em face do art. 88 da Lei 9.099/1995, a lesão
corporal leve passou a ser crime de ação penal pública condicionada à
representação. Consequentemente, se da violência empregada como meio de
execução advém lesão leve, a ação penal na injúria real será pública
condicionada, subsistindo a ação penal pública incondicionada somente para as hipóteses em
que resultar lesão grave ou gravíssima. Mas há também quem entenda que, por se tratar a injúria

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 284


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real de crime complexo, integrado por um misto de injúria e lesão corporal, a ação penal continua
pública incondicionada, qualquer que seja a natureza da lesão corporal. Isso porque a lesão
corporal perde sua autonomia, não sendo alcançada peia exigência de representação prevista no
art. 88 da Lei 9.099/1995 A injúria real praticada com emprego de vias de fato é crime de ação
penal privada. Como não há ressalva expressa, segue a regra geral prevista na primeira parte do
caput do art. 145 do Código Penal. (MASSSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. Volume 2.
3ª ed. Método. São Paulo. 2011. P. 207/8)

No que diz respeito à injúria racial (art. 140, § 3º, CP), a lei é clara ao estabelecer o processamento
por intermédio de ação penal condicionada à representação (art. 145, CP).

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-
se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste
Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como
no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

A alternativa E também está correta. Prevalece o entendimento de que, em se tratando de crimes contra a
honra praticados contra funcionário público no exercício de suas funções, há legitimidade concorrente entre
Ministério Público e ofendido para ajuizamento de ação penal. A Súmula 714 do STF viabiliza essa conclusão:
é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à
representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do
exercício de suas funções.

26. (FCC – Promotor de Justiça – MP/PA – 2014) Antônio, de 25 anos, está sendo processado pelo delito
de furto praticado contra João, seu irmão gêmeo. Diante disso,
a) mesmo depois de oferecida a denúncia, se a pedido de João, o Ministério Público pode desistir da ação;
b) o número máximo de testemunhas a serem arroladas na denúncia é 5;
c) o Ministério Público não pode oferecer denúncia sem representação de João;
d) o número máximo de testemunhas a serem arroladas na queixa é 5;
e) ao fim, o juiz pode isentar Antonio de pena.

Comentários:

A assertiva A está errada. O crime de furto, em regra, é de ação penal pública incondicionada.
Existem situações excepcionais, contudo, em que a ação estará condicionada à representação
do ofendido (art. 182, CP). O caso noticiado no enunciado é uma delas. Havendo representação
por parte do ofendido e oferecimento de denúncia, o Ministério Público não poderá desistir da
ação (art. 42, CPP), ainda que a pedido do ofendido. Eventual retratação da representação, para
vincular o Ministério Público, deve preceder a peça acusatória.

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é
cometido em prejuízo. I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão,
legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

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Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal.

As alternativas B e D também estão erradas. No procedimento ordinário, poderão ser arroladas até oito
testemunhas. Há expressa previsão legal nesse sentido (art. 401, CPP).

Art. 401. Na instrução poderão ser inquiridas até 8 (oito) testemunhas arroladas pela acusação
e 8 (oito) pela defesa.

A alternativa C está correta. Na hipótese do enunciado, a ação penal é condicionada à representação do


ofendido. Sem ela o Ministério Público não poderá oferecer denúncia. Falta condição da ação. Sobre o tema:

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é
cometido em prejuízo. I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão,
legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

A assertiva E está incorreta. Não há previsão legal que viabilize a isenção da pena. Repare-se que a situação
fática não se enquadra em nenhuma das hipóteses do art. 181 do Código Penal.

Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo.
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II - de ascendente ou descendente, seja o
parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.

Defensor

27. (FCC – Defensor Público – DPE/AP– 2018) Em caso de ação penal de iniciativa pública condicionada:
a) a ausência de representação impede o início do processo, mas permite a instauração de inquérito policial
desde que mediante requisição judicial;
b) o direito de representação deve ser exercido dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier
a saber quem é o autor do crime;
c) o direito de representação é do ofendido, salvo nos crimes patrimoniais, que passa também ao cônjuge;
d) o direito de representação deve ser exercido pela FUNAI, quando o ofendido é indígena;
e) a representação será retratável até a publicação da sentença.

Comentários:

A assertiva A está errada. Nos casos de ação penal pública condicionada, a ausência de representação
impede não só o início do processo como também a instauração de inquérito policial, ainda que haja eventual
requisição judicial. Sobre o tema, confira-se o teor dos arts. 5º, § 4º e 24, caput do Código de Processo Penal:

Art. 5o. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: [...] § 4o O inquérito, nos
crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

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Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público,
mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação
do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

A alternativa B está correta. O art. 38 do Código de Processo Penal prevê o prazo decadencial de seis (6)
meses para o exercício do direito de representação e esclarece que o marco inicial da contagem é a data em
que o ofendido, ou seu representante legal, toma conhecimento sobre quem foi o autor do crime. Note-se:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

A assertiva C está incorreta. O direito de representação, mesmo nos casos de crimes patrimoniais, continua
pertencendo ao ofendido. Essa conclusão pode ser extraída dos arts. 24 e 39 do Código de Processo Penal.
O supracitado direito somente passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão em caso de morte do
ofendido (ou quando declarado ausente por decisão judicial). A esse respeito, veja-se o § 1º do art. 24 do
CPP:

Art. 24, § 1º. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o
direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

A alternativa D também está errada. A lei não garantiu à FUNAI o direito de representação nesses casos e,
como se sabe, as atribuições da administração pública estão sujeitas ao princípio da legalidade.

A assertiva E está incorreta, porque, de acordo com o art. 25 do Código de Processo Penal, a representação
é irretratável após o oferecimento da denúncia.

Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

OBS. Nos casos abrangidos pela Lei 11.340/2006 (Maria da Penha), a ofendida poderá se retratar até o
recebimento da inicial (art. 16).

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

28. (VUNESP – Defensor Público – DPE/RO – 2017) Assinale o crime que se processa mediante ação
penal pública incondicionada:
a) Furto de coisa comum (CP, art. 156);
b) Violação do segredo profissional (CP, art. 154);
c) Perigo de contágio venéreo (CP, art. 130);
d) Ameaça (CP, art. 147);
e) Violação de domicílio (CP, art. 150).

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Comentários:

Apenas a assertiva E está correta. Quando a lei nada dispuser em sentido contrário, a infração será apurada
mediante ação penal pública incondicionada. Essa é a síntese, na essência, do art. 100, §§ 1º e 2º do Código
Penal:

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido. § 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei
o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. § 2º - A ação de
iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para
representá-lo.

Dentre os delitos listados nas alternativas, apenas o crime de violação de domicílio independe de
representação ou queixa-crime. Perceba-se:

Art. 156, CP - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem
legitimamente a detém, a coisa comum [...] § 1º - Somente se procede mediante representação.

Art. 154, CP - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função,
ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem [...] Parágrafo único
- Somente se procede mediante representação.

Art. 130, CP - Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio
de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado [...] § 2º - Somente se
procede mediante representação.

Art. 147, CP - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico,
de causar-lhe mal injusto e grave [...] Parágrafo único - Somente se procede mediante
representação.

29. (UFMT– Defensor Público – DPE/MT– 2016) São princípios que regem a ação penal privada:
a) obrigatoriedade e intranscendência;
b) indivisibilidade e obrigatoriedade;
c) oportunidade e indisponibilidade;
d) instranscendência e indisponibilidade;
e) disponibilidade e indivisibilidade.

Comentários:

A assertiva E é a única correta. Os princípios da oportunidade, disponibilidade e indivisibilidade regem a


ação penal privada. Os princípios da obrigatoriedade, indisponibilidade e divisibilidade, por outro lado,
orientam a ação penal pública. São comuns às duas formas de ação penal os princípios da intranscendência,
da inércia judicial (ou demanda) e do ne bis in idem.

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30. (CESPE – Defensor Público – DPE/DF – 2013)


Com relação à ação penal privada, à queixa-crime e à ação civil, julgue os itens que se seguem. Conforme
jurisprudência do STJ, nos casos de ação penal privada, não incide o ônus da sucumbência por aplicação
analógica do CPC. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. O enunciado exige que o candidato conheça o entendimento do Superior Tribunal
de Justiça a respeito do tema. No âmbito do referido Tribunal, prevalece a orientação de que são cabíveis
honorários de sucumbência em ações penais privadas, por aplicação analógica do Código de Processo Civil.
Note-se:

PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL


PRIVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ART. 3º
DO CPP. I - "Consoante a jurisprudência sedimentada do STJ, o princípio geral da sucumbência é
aplicável no âmbito do processo penal quando se tratar de ação penal privada" (AgRg no REsp n.
1.206.311/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi). II - Tal entendimento, que decorre da
aplicação do disposto no art. 3º do CPP, restritivamente às ações penais privadas, deve observar
o princípio da causalidade, não se limitando a condenação de honorários aos casos em que haja
sentença de mérito, pois utilizado subsidiariamente o CPC, devem ser aplicados também seus
princípios norteadores. Embargos de divergência desprovidos. (EREsp 1218726/RJ, Rel. Ministro
FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 01/07/2016)

31. (CESPE– Defensor Público – DPE/PE – 2015)


Acerca de aspectos diversos do processo penal brasileiro, o próximo item apresenta uma situação hipotética,
seguida de uma assertiva a ser julgada. Gabriela está sendo processada porque, segundo a denúncia, teria
praticado delito de roubo. Há prova segura nos autos para se afirmar que a ré era imputável no momento
do delito. No entanto, após o recebimento da denúncia, mas antes da resposta à acusação, sobreveio à ré,
no cárcere, doença mental comprovada em incidente de insanidade mental, procedimento que suspendeu
o curso do processo. Após a homologação das conclusões dos peritos no incidente de insanidade mental, o
juiz competente determinou que o processo retomasse seu curso. Em seguida, a DP apresentou resposta à
acusação e o magistrado absolveu sumariamente a ré, impondo-lhe medida de segurança, uma vez que a
doença mental que a tornou inimputável era a única tese da defesa. Nessa situação, à luz do CPP, agiu
acertadamente o magistrado ao determinar o prosseguimento do processo e, ao final, decretar a absolvição
imprópria da acusada nos termos do pedido da defesa. (C/E)

Comentários:

A alternativa está errada. De início, lembre-se que a inimputabilidade não dá ensejo à absolvição sumária
por expressa previsão legal (art. 397, II, CPP). Além disso, há se levar em consideração o fato de que a doença
mental sobreveio à infração penal. A solução para o impasse seria a suspensão do processo até que a acusada
recuperasse a sanidade (art. 152, CPP) e não a absolvição sumária (art. 397, CPP) ou mesmo a imprópria (art.
386, VI, CPP).

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Art. 149. Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de
ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente,
descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal [...] § 2º
O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando suspenso o processo,
se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que possam ser prejudicadas pelo
adiamento [...]

Art. 152. Se se verificar que a doença mental sobreveio à infração o processo continuará
suspenso até que o acusado se restabeleça, observado o § 2o do art. 149.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça
[...] VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22,
23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua
existência.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] II - a existência manifesta de causa
excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade [...]

32. (CESPE – Defensor Público – DPE/PE – 2015)


Acerca de aspectos diversos do processo penal brasileiro, o próximo item apresenta uma situação hipotética,
seguida de uma assertiva a ser julgada. Ana, conduzindo veículo automotor em via pública, colidiu com o
veículo de Elza, que conduzia regularmente seu automóvel. Elza sofreu lesões leves em seus braços e pernas,
comprovadas por exame pericial. Ana trafegava à velocidade de 85 km/h, quando o máximo permitido para
a via era de 40 km/h. Na delegacia de polícia, Elza fez constar na ocorrência policial que não desejava
representar criminalmente contra Ana. Ficou demonstrado ainda, durante o inquérito policial, que Ana não
conduzia o veículo sob efeito de álcool e também não participava de corrida não autorizada pela autoridade
competente. Ana foi denunciada pelo MP pelo delito de lesão corporal culposa (art. 303 do CTB).
Argumentou o representante do parquet que o delito era de ação penal pública incondicionada, haja vista
que Ana trafegava a uma velocidade superior ao dobro da permitida para a via. Nessa situação, agiu
acertadamente o MP ao oferecer denúncia contra Ana com respaldo no CTB. (C/E)

Comentários:

A assertiva está errada. No caso constante no enunciado, a ação penal é condicionada à representação do
ofendido. Isso em face do que dispõe o art. 291 da Lei nº 9.503/98 c/c art. 88 da Lei nº 9.099/95. Elza
manifestou desinteresse em representar contra Ana, logo não agiu acertadamente o Ministério Público ao
oferecer denúncia. Note-se que o fato de Ana ter conduzido o veículo em velocidade superior ao dobro à
permitida para a via não torna o crime processável mediante ação penal pública incondicionada por ausência
de previsão legal nesse sentido.

Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código,
aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se este Capítulo não
dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que couber.
§ 1o Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa o disposto nos arts. 74, 76 e 88 da
Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, exceto se o agente estiver: I - sob a influência de álcool

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ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; II - participando, em via


pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou demonstração de
perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente; III -
transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinqüenta
quilômetros por hora). § 2o Nas hipóteses previstas no § 1o deste artigo, deverá ser instaurado
inquérito policial para a investigação da infração penal.

Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de
representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Delegado

33. (FUNCAB – Delegado de Polícia – PC/RJ – 2012) O senhor Rui dos Santos, após ser vítima do delito
de roubo perpetrado por Nei da Silva, preso em flagrante delito, ao tomar conhecimento de que o
Promotor de Justiça havia perdido o prazo de cinco dias (art. 46, do CPP) para oferecer denúncia, resolve
intentar ação privada subsidiária da pública, por meio de queixa-crime. Decorridos alguns dias,
incomodado pelo trabalho e pelo desgaste emocional, o querelante resolve desistir da ação. Esta medida
acarretará:
a) a decadência do direito de ação;
b) a perempção da ação;
c) a extinção da punibilidade;
d) a renúncia tácita do querelante;
e) a retomada da titularidade da ação pelo Ministério Público, que já atuava como assistente litisconsorcial.

Comentários:

A alternativa A está errada. Não há se falar em decadência, porque o direito de ação foi exercido no prazo.
Sobre o tema, confira-se:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no
direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses,
contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do
dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

As assertivas B e C também estão erradas. A situação prevista no enunciado não se enquadra


em nenhuma das hipóteses de perempção, tampouco de extinção da punibilidade previstas no art. 60 do
Código de Processo Penal e no art. 107 do Código Penal:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação
penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante
30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não
comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer
das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar
de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou

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deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante
pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III -
pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição,
decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes
de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; [...] IX - pelo perdão
judicial, nos casos previstos em lei.

A alternativa D está incorreta. Não cabe renúncia em crimes de ação penal pública incondicionada (mesmo
nos casos em que o particular tenha se valido da faculdade do art. 100, §4º do Código Penal) como é a
hipótese do enunciado. Além do mais, a renúncia, nos casos em que é admitida, apenas pode ser exercida
antes do oferecimento da peça acusatória.

A assertiva E está correta. Nos casos de ação penal privada subsidiária da pública em que o querelante não
mais tenha a intenção de prosseguir como autor, o Ministério Público retomará a ação na qualidade de parte
principal. O art. 29 do Código de Processo Penal é esclarecedor a esse respeito:

Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo .

34. (MS Concursos – Delegado de Polícia – PC/PA – 2012)


Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar
liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo
de 10 (dez) dias. Após recebida a resposta, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar
I - extinta a punibilidade do agente; II - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; III -
que o fato narrado evidentemente não constitui crime; IV - a existência manifesta de causa excludente da
culpabilidade do agente. Diante dessas informações, assinale a alternativa correta:
a) somente as assertivas I e III estão incorretas;
b) somente as assertivas II e III estão incorretas;
c) somente a assertiva IV está incorreta;
d) somente a assertiva I está incorreta;
e) Todas as assertivas estão incorretas.

Comentários:

A assertiva C é a única certa. As causas listadas nos itens I, II e III são, efetivamente, hipóteses de absolvição
sumária (art. 397, CPP). O item IV, contudo, ao não ressalvar o caso de inimputabilidade, como faz o inciso II
do art. 397 do Código de Processo Penal, está incorreto.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá
absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] II - a existência manifesta de causa excludente

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da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

35. (FAPEMS – Delegado de Polícia – PC/MS – 2017) De acordo com as disposições legais sobre ação
penal, assinale a alternativa correta:
a) na ação penal pública condicionada, nada obsta que a retratação da representação seja realizada no
inquérito policial, todavia essa manifestação não vincula o Ministério Público em virtude do princípio da
indisponibilidade;
b) a espécie de ação penal nos casos de estupro é sempre pública incondicionada em virtude da gravidade
do delito. Dessa forma, a investigação criminal pode ser iniciada sem representação da vítima por meio de
portaria ou, se for o caso, auto de prisão em flagrante;
c) a perempção, uma das causas extintivas da punibilidade, pode ser reconhecida em qualquer momento
processual, porém sanada a omissão do querelante, é possível a renovação da ação penal privada;
d) nos crimes de ação penal de iniciativa privada, o legislador exige para a instauração de inquérito policial
requerimento de quem tenha qualidade para ajuizá-la e apresentação de queixa-crime do ofendido ou de
seu representante legal;
e) o perdão do ofendido, ato bilateral que exige aceitação, pode ser exercido tanto na fase inquisitorial como
na judicial. Uma vez oferecido ainda no inquérito policial, cabe ao Delegado de Polícia proceder à
homologação e encaminhar ao juiz competente.

Comentários:

A assertiva A está incorreta. Ao questionar sobre a retratação ocorrida no inquérito, a alternativa sugere
não ter havido oferecimento da peça acusatória; como se sabe, a retratação à representação anterior ao
oferecimento da denúncia vincula o Ministério Público.

A alternativa B está, atualmente, e em sua essência, correta. Essa questão data do ano de 2017, e, à época,
esta alternativa estava errada, uma vez que o estupro constituía crime de ação penal pública condicionada
à representação. Entretanto, com o advento da Lei 13.718/2018, que, dentre outras alterações, conferiu
nova redação ao art. 225 do CP, o crime de estupro (assim como todos os crimes contra a liberdade sexual)
passou a ser processado mediante ação penal incondicionada. Embora não seja possível afirmar, como o faz
a alternativa, que isso decorra simplesmente da gravidade do delito, mas sim da nova redação conferida ao
art. 225 do CP, fato é que a investigação criminal poderá ser iniciada sem representação da vítima - seja
mediante portaria, seja em virtude da prisão em flagrante.

A assertiva C está errada. A perempção é causa extintiva da punibilidade (art. 107, IV, CP) que, se
reconhecida, faz coisa julgada material, impedindo a repropositura da ação penal privada.

Art. 107. Extingue-se a punibilidade [...] IV - pela prescrição, decadência ou perempção; [...]

A alternativa D foi considerada correta pela banca. A redação não é das melhores. Conhecendo o teor do
art. 5º, § 5º e do art. 30 do Código de Processo Penal, o candidato seria levado a assinalá-la. Perceba-se:

Art. 5o [...] § 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito
a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 293


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Art. 30. Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação privada.

A assertiva E também está incorreta. O perdão não pode ser exercido na fase inquisitorial. Essa causa
extintiva da punibilidade pressupõe a existência de uma ação penal.

36. (FUNCAB – Delegado de Polícia – PC/PA – 2016) Sobre ação penal é correto afirmar que:
a) a ação penal privada, em certos casos é personalíssima, só podendo o delegado de polícia instaurar
inquérito, exclusivamente, no caso de requerimento do próprio ofendido;
b) na ação penal subsidiária da pública, quando o querelado deixa de comparecer aos atos do processo,
ocorre a perempção;
c) quanto ao exercício, classifica-se em pública incondicionada, condicionada a representação do ofendido
ou a resolução do Ministério da Justiça;
d) na ação penal privada o querelante tem legitimidade ordinária;
e) a ação penal pública rege-se pelos princípios da obrigatoriedade e disponibilidade, enquanto a privada
rege-se pela oportunidade e indivisibilidade.

Comentários:

A alternativa A está correta. Nas ações penais privadas personalíssimas (hipótese do art. 236,
CP), apenas o próprio ofendido poderá requerer a instauração de inquérito; se a vítima vier a
falecer, os legitimados constantes do art. 31 do Código de Processo Penal não poderão fazê-
lo.

Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe
impedimento que não seja casamento anterior: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. Parágrafo
único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão
depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o
casamento.

Ora, se a própria ação penal exige que a queixa-crime seja oferecida diretamente pelo contraente enganado,
não se pode admitir a instauração de inquérito por outro meio que não por requerimento do próprio
ofendido.

A alternativa B está incorreta. Não existe nenhum caso em que a inércia/não comparecimento do querelado
dê ensejo ao reconhecimento da perempção. O art. 60 do Código de Processo Penal é claro quanto às
hipóteses.

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação
penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante
30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não
comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer
das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar
de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou
deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante

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pessoa jurídica, está se extinguir sem deixar sucessor.

A assertiva C está errada. A ação penal pública classifica-se em incondicionada, condicionada à


representação do ofendido ou à requisição (e não resolução) do Ministro (e não Ministério) da Justiça.

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. §
1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de
representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. [...]

A alternativa D está incorreta. Na ação penal privada o querelante tem legitimidade extraordinária. O Estado
é o titular exclusivo do direito de punir. Em alguns casos, contudo, transfere a legitimidade para propositura
da ação ao ofendido ou seu representante. Nesses casos, o particular age em nome próprio, mas na defesa
de interesse alheio (do Estado).

A assertiva E está errada. A disponibilidade é princípio que rege a ação penal privada (e não pública).

37. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/PE – 2016) Acerca da ação penal, suas características, espécies e
condições, assinale a opção correta:
a) a perempção incide tanto na ação penal privada exclusiva quanto na ação penal privada subsidiária da
ação penal pública;
b) os prazos prescricionais e decadenciais incidem de igual forma tanto na ação penal pública condicionada
à representação do ofendido quanto na ação penal pública condicionada à representação do ministro da
Justiça;
c) de regra, não há necessidade de a queixa-crime ser proposta por advogado dotado de poderes específicos
para tal fim, em homenagem ao princípio do devido processo legal;
d) tanto na ação pública condicionada à representação quanto na ação penal privada, se o ofendido tiver
menos de vinte e um anos de idade e mais de dezoito anos de idade, o direito de queixa ou de representação
poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal;
e) é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do MP, condicionada à representação do
ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.

Comentários:

A alternativa A está errada. A perempção não incide nos casos de ação penal privada subsidiária da pública.
A leitura do caput do art. 60 do Código de Processo Penal permite essa conclusão. Segundo o referido
dispositivo, ocorrerá perempção apenas nos casos que se procedem somente mediante queixa, o que não é
o caso das hipóteses tuteladas pela ação penal privada subsidiária da pública.

A alternativa B está incorreta. A lei nada dispôs a respeito do prazo decadencial quanto aos crimes
processáveis por ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça. Nesses casos, diante
da omissão, não há se falar em prazo decadencial.

A assertiva C também está errada. A lei exige poderes específicos para propositura de queixa-crime. O art.

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44 do Código de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do
instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais
esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal.

A alternativa D está incorreta. O advento da maioridade do ofendido retira de seu (até então) representante
legal o direito de queixa e de representação. Nesse ponto, consigne-se que o art. 34 do Código de Processo
Penal (abaixo transcrito) foi tacitamente revogado com o advento do Código Civil (art. 5º, CC).

Art. 34. Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de queixa
poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal.

A alternativa E está correta, porque retrata o entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal (714):
é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à
representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do
exercício de suas funções.

38. (UEG – Delegado de Polícia – PC/GO – 2013) É princípio aplicável à ação penal de iniciativa privada:
a) divisibilidade;
b) indisponibilidade;
c) oportunidade;
d) transcendência.

Comentários:

A alternativa C é a única correta. A divisibilidade e indisponibilidade são princípios que regem a ação penal
pública; a transcendência, por sua vez, não se aplica nem a uma nem a outra.

39. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/AL – 2012)


O instituto da perempção não se aplica nas ações penais de iniciativa pública incondicionada ou condicionada
à representação do ofendido, sendo aplicável somente às ações penais de iniciativa privada. (C/E)

Comentários:

A assertiva está correta. A perempção se aplica apenas nas hipóteses de ação penal de iniciativa privada
(com exceção da subsidiária da pública), restando afastada nos demais casos.

40. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/ES – 2011)


Rose recebeu sentença penal condenatória transitada em julgado pela prática do crime de roubo qualificado
pelo uso de arma de fogo. Nessa situação, considerando que Lina tenha sido a única vítima do delito, a
correspondente ação civil ex delicto somente poderá ser promovida pela ofendida. (C/E)

Comentários:

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A assertiva está incorreta. O emprego de arma de fogo no roubo é causa de aumento de pena e não
qualificadora. Além disso, é possível o ajuizamento de ação civil ex delicto pelos legitimados do art. 63 do
Código de Processo Penal e, ainda, pelo próprio Ministério Público, caso a vítima seja pobre e no local a
Defensoria Pública não tenha se instalado.

Art. 68. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1o e 2o), a execução da
sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento, pelo
Ministério Público.

LISTA DE QUESTÕES
Magistratura

1. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2017) A legitimidade para a propositura de ação penal por crime
contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções é:
a) exclusiva do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido;
b) concorrente do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do
ofendido;
c) concorrente do ofendido, mediante representação, e do Ministério Público, mediante ação pública
incondicionada;
d) exclusiva do ofendido, mediante queixa.

Comentários:

A alternativa B é a única correta. O teor da Súmula 714 do Supremo Tribunal Federal


responde o questionamento: é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante
queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação
penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.

2. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2015) Conforme o artigo 41, do Código de Processo Penal, “A
denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação
do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando
necessário, o rol das testemunhas”. Portanto, a peça acusatória:
a) precisa apresentar algumas das condutas alegadamente praticadas pelo agente;
b) deve descrever os fatos ilícitos, ainda que não em sua totalidade;
c) pode conter elementos que sejam prescindíveis, mas relevantes para a imputação;
d) necessita trazer a descrição do comportamento delituoso de forma escorreita.

Comentários:

A assertiva A está errada. O exercício do contraditório e da ampla defesa toma por base os fatos narrados

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na inicial. A denúncia, portanto, deve apontar todas as condutas atribuídas ao agente e não apenas algumas,
sob pena de comprometimento do exercício da defesa.

A alternativa B está incorreta. Os fatos ilícitos devem ser descritos por completo. O art. 41 do Código de
Processo Penal é claro ao afirmar que a denúncia deve expor o fato criminoso com todas as suas
circunstâncias.

A alternativa C também está incorreta. Se algum fato é relevante para a imputação ele deve constar na
denúncia e, portanto, não é dispensável.

A assertiva D está correta. A inicial acusatória deve descrever o comportamento atribuído ao acusado de
forma escorreita, sem defeito. Não há como pensar diferente, na medida em que a peça acusatória delimita
o objeto do processo.

3. (FCC – Juiz Substituto – TJ/PE – 2013) Nos crimes de ação penal de iniciativa privada,
a) o perdão do ofendido somente é cabível antes do exercício do direito de ação
b) o perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação
ao que o recusar;
c) a renúncia ao exercício do direito de queixa se estenderá a todos os querelantes;
d) a renúncia é ato unilateral, voluntário e necessariamente expresso;
e) a perempção pode ocorrer no curso do inquérito policial.

Comentários:

A alternativa A está errada. O perdão ocorre após o exercício do direito de ação. Essa, inclusive, é uma das
diferenças entre perdão e renúncia.

A assertiva B está correta. O perdão oferecido a um dos querelados aproveita aos demais. Essa é uma das
representações do princípio da indivisibilidade da ação penal privada. O perdão, contudo, é ato bilateral.
Exige-se, portanto, aceitação por parte do “perdoado”; inexistindo, o feito prossegue em relação àquele que
o recusar. O art. 51 do CPP esclarece:

Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza,
todavia, efeito em relação ao que o recusar.

A alternativa C está incorreta. Ofendido algum poderá renunciar a direito que não lhe pertence.
Aparentemente, a assertiva procurou induzir o candidato a erro modificando a essência do art. 49 do Código
de Processo Penal. Perceba-se:

Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a
todos se estenderá.

A assertiva D está errada. Ao contrário do que a alternativa dispõe, a renúncia pode ser tácita. O art. 57 do
Código de Processo Penal permite essa conclusão. Note-se:

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 298


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Art. 57. A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova.

A alternativa E está incorreta. A perempção é causa extintiva da punibilidade e se opera apenas no âmbito
da ação penal. Não se admite a figura da perempção na fase de inquérito. A redação do art. 60 do Código de
Processo Penal conduz a essa conclusão:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a
ação penal [...]

tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal.

4. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/PR– 2016 - 2ª fase)


Diferencie as condições da ação penal sob a ótica da concepção eclética e sob a teoria da asserção,
considerando a justa causa como espécie de condição da ação, discorrendo sobre os efeitos da absolvição
sumária bem como da rejeição da peça acusatória.

Comentários:

Concepção Eclética sobre o direito de ação: o Código de Processo Civil consagrou


expressamente a concepção eclética sobre o direito de ação, entendida como o direito
ao julgamento do mérito da causa, sendo irrelevante se favorável ou desfavorável,
condicionando ao preenchimento de certas condições aferíveis à luz da relação jurídica
material deduzida em juízo, às quais Enrico Tullio Liebman chamou de condição da ação.
Segundo esta teoria, o direito de ação não depende da existência do direito material, mas do preenchimento
de certos requisitos formais chamados de condições da ação, que não se confundem com o mérito.

Quando ausentes, geram uma sentença terminativa de carência da ação (art. 485, VI, do novo CPC), sem a
formação de coisa julgada material, o que em tese permite que nova demanda seja renovada, em havendo
correção do vício que deu ensejo à sentença sem resolução do mérito (CPC, 486, § 1º). Tratando-se de
matéria de ordem pública, não há preclusão, concluindo os defensores desta teoria, que a qualquer
momento do processo e com qualquer grau de cognição o juiz deve extinguir o processo sem resolução de
mérito por carência da ação, se entender ausente uma das condições da ação.

Teoria da Asserção ou teoria da prospettazione: mais recentemente surge esta teoria, defendida por
Alexandre Freitas Câmara, segundo a qual a presença das condições da ação deve ser analisada pelo juiz com
base nos elementos fornecidos pelo próprio autor em sua inicial, os quais devem ser tomados como
verdadeiros, sem nenhum desenvolvimento cognitivo, ou seja, o exame deverá ser feito in statu assertionis.

Se o juiz constatar a ausência de uma condição da ação mediante cognição sumária, deve extinguir o
processo sem resolução do mérito por carência de ação (art. 485, VI do NCPC), quando houver necessidade
de cognição mais aprofundada para análise da presença das condições da ação, a carência de ação passa a
ser analisada como mérito, gerando uma sentença de rejeição do pedido do autor com formação de coisa
julgada formal e material.

Justa causa para a ação penal: o artigo 395 do Código de Processo Penal prevê expressamente que a denúncia
ou queixa será rejeitada quando: “faltar justa causa para o exercício da ação penal” (inciso III). Exige-se da

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acusação lastro probatório mínimo de existência material de um fato penalmente punível e indícios
suficientes de autoria para invocar a tutela jurisdicional, normalmente colhidos no inquérito policial ou de
outras peças de informação.

Sob a ótica da concepção eclética, evidenciada ausência de justa causa para ação penal, deverá o juiz rejeitá-
la, fazendo a decisão apenas coisa julgada formal. Iniciada a ação penal, por se tratar de matéria de ordem
pública, não haverá preclusão e a decisão não fará coisa julgada material.

No âmbito do processo penal, sob a perspectiva da teoria da asserção, ainda que se analise as condições da
ação, com base no que foi narrado na denúncia ou queixa, deverá o juiz aferir se há justa causa, apreciada
em cognição superficial, evitando-se denúncia ou queixa infundadas.

Para os que consideram a justa causa como espécie de condição da ação penal, verificando a sua ausência
por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, deve o magistrado rejeitá-la, nos termos do art.
395, III do Código de Processo Penal, fazendo a decisão apenas coisa julgada formal.

A ausência de justa causa após apresentação da resposta do acusado, mediante cognição profunda, implicará
na absolvição sumária com base no artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal, com julgamento de
mérito, fazendo coisa julgada formal e material.

5. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/SP – 2017) No procedimento comum, após o oferecimento da


resposta pelo acusado, o juiz deverá absolvê-lo sumariamente quando:
a) faltar justa causa para o exercício da ação penal ou verificar a existência manifesta de qualquer causa
excludente da culpabilidade;
b) verificar a existência manifesta de qualquer causa excludente da ilicitude do fato ou que o fato narrado
evidentemente não constitui crime;
c) a denúncia ou a queixa for manifestamente inepta ou não se convencer da existência de indícios suficientes
de autoria ou de participação;
d) faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal ou verificar que extinta a
punibilidade do agente.

Comentários:

A alternativa A está incorreta. Segundo o art. 395, inciso III do Código de Processo Penal, a ausência de justa
causa é hipótese de rejeição da denúncia e não de absolvição sumária.

Entretanto, há quem defenda que o reconhecimento da ausência de justa causa após o recebimento da
denúncia (e, portanto, na fase do art. 397, CPP) tem força de absolvição sumária, fazendo coisa julgada
material.

Ainda que se adotasse o posicionamento supramencionado, a assertiva continuaria errada; isso porque, ao
contrário do que ela sugere, nem todas as causas extintivas da culpabilidade conduzem à absolvição sumária.
Existe ressalva expressa quanto à inimputabilidade no texto legal (art. 397, II, CPP).

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Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: [...] III - faltar justa causa para o exercício
da ação penal.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] II - a existência manifesta de
causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

A alternativa B está correta. As duas hipóteses constantes na assertiva são causas de absolvição sumária
(art. 397, II e III CPP).

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa
excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade
do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou
IV - extinta a punibilidade do agente.

A assertiva C está errada. A inépcia da inicial é causa de rejeição e não de absolvição sumária (art. 395, I,
CPP). Além disso, a outra hipótese constante na assertiva é causa de impronúncia (nos casos de crimes de
competência do Tribunal do Júri - art. 414, CPP).

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta.

Art. 414. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes


de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. [...]

A alternativa D também está errada. Embora a extinção de punibilidade seja causa de absolvição sumária,
a ausência de pressuposto processual ou condição para exercício da ação não passa de hipótese de rejeição
da peça acusatória (art. 395, II e art. 397, IV, CPP).

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: [...]II - faltar pressuposto processual ou
condição para o exercício da ação penal [...]

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] IV - extinta a punibilidade do
agente.

6. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/AM – 2016) Em se tratando de procedimento comum ordinário, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar que:
a) a punibilidade está extinta em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em perspectiva;
b) o fato foi cometido em situação de manifesta inexigibilidade de conduta diversa;
c) estão ausentes indícios mínimos de autoria e materialidade do fato supostamente praticado;
d) o acusado é portador de doença mental, atestada por laudo médico oficial, e inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato;
e) o fato foi cometido em estrita obediência a ordem manifestamente ilegal.

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Comentários:

A alternativa A está errada. A prescrição da pretensão punitiva em perspectiva (com


fundamento na pena hipotética) não tem o condão de extinguir a punibilidade do agente e,
consequentemente, de gerar absolvição sumária. Sobre o tema, confira-se o teor da Súmula 438
do STJ: é inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com
fundamento na pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

A alternativa B está correta. Inexigibilidade de conduta diversa é causa que afasta a culpabilidade e, segundo
o art. 397, inciso II do Código de Processo Penal, dá causa à absolvição sumária.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] II - a existência manifesta de causa
excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade. [...]

A alternativa C está errada. A ausência de suporte probatório mínimo é causa de rejeição da denúncia (art.
395, III, CPP) e não está dentre as hipóteses de absolvição sumária previstas no art. 397 do Código de
Processo Penal.

A assertiva D está incorreta. A inimputabilidade não viabiliza a absolvição sumária por expressa vedação
legal (art. 397, II, CPP).

A assertiva E também está errada. Obediência à ordem manifestamente ilegal não é causa excludente de
culpabilidade e, consequentemente, não conduz à absolvição sumária. A exigibilidade de conduta diversa (e
a culpabilidade) somente estaria afastada se a ordem obedecida fosse não manifestamente ilegal.

7. (TRF3 – Juiz Federal – TRF3 – 2016 – ADAPTADA) Pensando na hipótese de, após a apresentação de
resposta à acusação, o magistrado se convencer da falta de justa causa para a ação penal, assinale qual
hipótese é verdadeira à luz da jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça:
a) O magistrado terá que deixar a ação correr, pois não lhe compete conceder habeas corpus contra si
próprio;
b) O magistrado deverá absolver sumariamente o acusado, sem especificar nenhum inciso do artigo 397 do
Código de Processo Penal;
c) O magistrado poderá rejeitar a denúncia, dado que o primeiro recebimento, conforme parte da doutrina,
ocorre a título precário;
d) O magistrado deverá enviar os autos ao titular da ação, para que diga se concorda em retirar a denúncia.

Comentários:

Com exceção da alternativa C, todas as assertivas estão erradas. O Superior Tribunal de Justiça já se
manifestou a respeito da matéria. Segundo a orientação do Tribunal, em casos semelhantes o magistrado
pode exercer juízo de reconsideração sobre a decisão que recebeu a inicial para o efeito de rejeitar a peça
acusatória.

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[...] O recebimento da denúncia não impede que, após o oferecimento da resposta do acusado
(arts. 396 e 396-A do Código de Processo Penal), o Juízo reconsidere a decisão prolatada e, se for
o caso, impeça o prosseguimento da ação penal. [...] (AgRg no REsp 1.218.030/PR, Quinta Turma,
Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 10/4/2014).

OBS. Há doutrina e jurisprudência em sentido contrário; entretanto, o entendimento acima é aquele que
parece prevalecer.

8. (VUNESP – Juiz Substituto – TJM/SP – 2016 – ADAPTADA)


O vício quanto à regularidade da procuração na ação penal privada pode ser emendado (capacidade
postulatória), mesmo após o transcurso do prazo decadencial (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. Vícios relacionados à regularidade da procuração devem ser sanados dentro do
prazo decadencial. Nesse sentido:

[...] 2. No caso dos autos, a procuração sequer contém a indicação do dispositivo penal em que
foi dada como incursa a recorrente, de modo que o reconhecimento da irregularidade é medida
que se impõe. [...] 3. Sendo de ação penal privada a actio penalis na espécie, operou- se a
decadência do direito do ofendido a oferecer queixa-crime, em conformidade com o disposto no
art. 38 do Código de Processo Penal, pois a irregularidade não foi sanada no prazo de seis
meses.[...] (RHC 44.287/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
11/11/2014, DJe 01/12/2014)

9. (TRF4 – Juiz Federal – TRF4 – 2016 – ADAPTADA)


Prevalece no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que o princípio
da indivisibilidade da ação penal também se aplica às ações penais públicas (C/E)

Comentários:

A alternativa está errada. Segundo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, o princípio
da indivisibilidade não se aplica às ações penais públicas. Perceba-se:

Em sede de ação penal pública vigora o princípio da divisibilidade, sendo admissível que o
processo seja desmembrado em tantos quantos forem os réus(AgRg no REsp 1465912/RS, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe
19/02/2018)

Princípio da indivisibilidade da ação penal, ademais, que não se aplica à ação penal pública.
Precedentes. (AP 560, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 25/08/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 10-09-2015 PUBLIC 11-09-2015)

10. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/AM – 2016 – ADAPTADA)

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 303


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Carla fez um seguro de vida que previa o pagamento de vultosa indenização a seu marido, José, caso ela
viesse a falecer. O contrato previa que o beneficiário não teria direito à indenização se causasse a morte da
segurada. Alguns meses depois, Carla foi encontrada morta, tendo o perito oficial que assinou o laudo
cadavérico concluído que a causa provável fora envenenamento. Em que pese o delegado não ter indiciado
José, o MP concluiu que havia indícios de autoria, razão pela qual ele foi denunciado por homicídio doloso.
O juiz recebeu a denúncia e determinou a citação do réu. José negou a autoria do delito, tendo solicitado a
admissão de assistente técnico e apresentado defesa em que requereu sua absolvição sumária. O parecer
do assistente técnico foi no sentido de que a morte de Carla tivera causas naturais. Pergunta-se: Caso o juiz
absolva José por estar provado não ser ele autor do fato, essa decisão não impedirá que os genitores de Carla
ingressem com ação civil indenizatória e obtenham o reconhecimento de sua responsabilidade civil. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. A sentença absolutória que reconhece que o acusado não foi autor do fato faz
coisa julgada no cível e impede o ajuizamento de ação civil indenizatória. Sobre o tema:

O Código de Processo Penal, em seu art. 386, com a redação determinada pela Lei n.
11.690/2008, prevê sete hipóteses de absolvição. Os incisos II, V e VII tratam de hipóteses de
falta de provas. Dão ensejo ao ajuizamento, na esfera cível, de ação de reparação de dano. Não
possibilitam a ação de regresso ao trabalho do funcionário público. O inciso I (inexistência do
fato) possui importante repercussão na esfera cível, na medida em que impossibilita o
ajuizamento de ação civil ex delicto para reparação do dano (CPP, art. 66). A mesma repercussão
possui o inciso IV (estar provado que o réu não concorreu para a infração penal), introduzido pela
Lei n. 11.690/2008 (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19ª ed. Saraiva. São Paulo. 2012.
P. 537)

11. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/RJ – 2016) A, casada com B, durante uma discussão de casal, levou
um soco, sendo ameaçada de morte. Diante dos gritos e ameaças, os vizinhos acionaram a Polícia que, ao
chegar ao local, conduziu todos à Delegacia. A, inicialmente, prestou depoimento na Delegacia e
manifestou o desejo de que o marido fosse processado criminalmente pelos crimes de lesão corporal leve
e ameaça. Entretanto, encerradas as investigações policiais e remetidos os autos ao Fórum, em sede de
audiência preliminar, A informou o Juízo que havia se reconciliado com B, não desejando que o marido
fosse processado por ambos os crimes. Diante da nova manifestação de vontade de A, é correto afirmar
que o procedimento:
a) deverá ser arquivado, vez que a ação penal, seja para o crime de ameaça, seja para o de lesão corporal de
natureza leve, é condicionada à representação da vítima, e a retratação de A obsta o prosseguimento do
feito;
b) terá seguimento quanto ao crime de lesão corporal, visto que a ação penal é pública incondicionada, por
ter se dado em âmbito doméstico. Já quanto ao crime de ameaça, a retratação de A obsta o prosseguimento,
visto que a ação penal continua condicionada à representação, ainda que praticada em âmbito doméstico;
c) terá seguimento, tanto para o crime de ameaça quanto para o crime de lesão corporal, pois em se tratando
de crimes ocorridos no âmbito doméstico, a ação penal é pública incondicionada, pouco importando a
retratação de A;

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 304


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d) terá seguimento, tanto para o crime de ameaça quanto para o crime de lesão corporal. Todavia, é possível
ao órgão de acusação, desde logo, ofertar a transação penal;
e) será arquivado quanto ao crime de ameaça, já que a ação é condicionada à representação da vítima.
Quanto ao crime de lesão corporal, ocorrida em âmbito doméstico, o procedimento terá seguimento, por
tratar-se de ação penal pública incondicionada. Todavia, é possível ao órgão de acusação, desde logo, ofertar
a transação penal.

Comentários:

A alternativa B é a única correta. Noticia-se a ocorrência dos crimes de lesão corporal leve e
ameaça. O caso retratado no enunciado deve ser avaliado à luz da Lei Maria da Penha (Lei
11.340/2006). Há se ter em mente que a ação penal no crime de lesão corporal resultante de
violência doméstica contra a mulher é incondicionada (Súmula 542, STJ). O crime de ameaça,
por sua vez, se procede mediante ação penal pública condicionada à representação (art. 147, parágrafo único
do Código Penal). Com base nesses esclarecimentos, pode-se concluir que a retratação da representação –
que respeitou o art. 16 da Lei nº 11.340/2006 – somente gerará efeitos quanto ao delito de ameaça
(obstando o prosseguimento da demanda quanto a essa infração), mas não impedirá a continuidade em
relação à lesão corporal leve que, por sua vez, não comporta transação penal (Súmula 536, STJ).

Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na


hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de
causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único -
Somente se procede mediante representação.

Lei 11.340/2006 - Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida
de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência
especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o
Ministério Público.

12. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/DFT – 2015 – ADAPTADA)


Situação hipotética: Marta, de dezenove anos de idade, foi vítima de assédio sexual praticado pelo gerente
da empresa em que trabalha. Assertiva: Nessa situação, a ação penal se processará mediante queixa-crime.
(C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. Segundo o art. 216-A c/c art. 225 do Código Penal, a infração em questão se
processará mediante ação penal pública incondicionada (alteração operada pela Lei nº 13.718/2018). A
assertiva estaria errada mesmo antes da alteração de 2018, porquanto, na época, tratava-se de ação penal
pública condicionada a representação e não de ação privada conforme proposto no enunciado. Perceba-se:

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 305


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Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual,
prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao
exercício de emprego, cargo ou função [...]

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal
pública incondicionada. (Redação dada pela Lei nº 13.718/2018)

13. (CESPE – Juiz Substituto – TJ/DFT – 2015 – ADAPTADA)


Situação hipotética: Breno foi vítima de injúria racial cuja autoria foi imputada a Rômulo. Assertiva: Nessa
situação, a ação penal será pública incondicionada. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. O crime de injúria racial se processa mediante ação penal pública condicionada à
representação. O art. 145 do Código Penal é claro a esse respeito.

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: [...] § 3o Se a injúria consiste
na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa
idosa ou portadora de deficiência. [...]

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-
se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste
Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como
no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

14. (VUNESP – Juiz Substituto – TJ/MS – 2015) XISTO, querelante em ação penal privada, ao término
da instrução e representado por advogado constituído, requereu a absolvição de CRISTÓVÃO, querelado.
Deve o juiz
a) determinar a extração de peças processuais e o encaminhamento à autoridade policial, para apuração da
prática, pelo querelante, de denunciação caluniosa;
b) designar audiência para tentativa de conciliação das partes, em homenagem ao princípio da intervenção
mínima;
c) considerar perempta a ação penal, porque o querelante deixou de formular pedido de condenação nas
alegações finais;
d) encaminhar os autos em vista ao Ministério Público, titular da ação penal, para manifestação de interesse
na produção de outras provas;
e) absolver CRISTÓVÃO, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Comentários:

A alternativa A está errada. O simples pedido de absolvição do querelado não sugere a ocorrência de
denunciação caluniosa. Não há motivo, portanto, para determinar a extração de cópia do feito para apuração
de tal infração.

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 306


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A assertiva B está errada. A legislação não prevê hipótese de designação de audiência de conciliação nos
casos em que, após a instrução, em sede de memoriais, o querelante requeira a absolvição do querelado.

A alternativa C está correta. Objetivamente, o querelante deixou de requerer a condenação do querelado,


situação que se enquadra como hipótese de perempção (art. 60, III, CPP).

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a
ação penal: [...] III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a
qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais;

A assertiva D está incorreta. A ação penal privada é regida pelo princípio da disponibilidade. Nos casos em
que o ofendido manifeste desinteresse na continuidade do processo ou na condenação do querelado, não
cabe ao parquet assumir o polo ativo da demanda; consequentemente, não terá razão para se manifestar
quanto à existência ou não de interesse na produção de outras provas (afinal, o reconhecimento da
perempção, causa extintiva da punibilidade, é iminente).

A alternativa E está errada. O enunciado não indica absolutamente nada a respeito da suficiência ou não
das provas colhidas ao longo da ação penal. Consequentemente, não há razão sequer para aventar a
possibilidade de absolvição com base no artigo 386, inciso VII do Código de Processo Penal.

15. (FCC – Juiz Substituto – TJ/AP- 2014 – ADAPTADA)


No que toca aos procedimentos, o Código de Processo Penal estabelece que: as disposições atinentes à
rejeição da denúncia ou queixa, apresentação de resposta à acusação e absolvição sumária aplicam-se a
todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados pelo Código de Processo Penal.
(C/E)

Comentários:

A assertiva está correta. Existe previsão legal expressa nesse sentido (art. 394, § 4º, CPP):

Art. 394. O procedimento será comum ou especial. [...]§ 4o As disposições dos arts. 395 a 398
deste Código aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não
regulados neste Código.

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar
pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para
o exercício da ação penal.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa
excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade
do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; IV
- extinta a punibilidade do agente.

16. (FUNDEP – Juiz Substituto – TJ/MG – 2014) Assinale a alternativa INCORRETA:

Direito Processual Penal - 2022 (Pós-Edital) 307


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a) na ação penal privada subsidiária da pública, o Promotor de Justiça pode repudiar a queixa e oferecer
denúncia substitutiva, quando a queixa apresentada for inepta;
b) tanto a renúncia ao exercício do direito de queixa como o perdão do ofendido em relação a um dos autores
do crime, a todos se estenderá, extinguindo-se a punibilidade;
c) a renúncia, nas ações penais privadas, pode ser tácita e admite, para tanto, todos os meios de prova,
conforme previsto no Código de Processo Penal;
d) tratando-se de ação penal privada personalíssima, a morte da vítima extingue a punibilidade.

Comentários:

A assertiva A está correta. O Promotor de Justiça tem a prerrogativa de repudiar a queixa apresentada pelo
ofendido e oferecer denúncia substitutiva nos casos de ação penal privada subsidiária. A esse respeito:

Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

A alternativa B está incorreta e deveria ter sido assinalada. O simples perdão do ofendido não conduz à
extinção da punibilidade. É imprescindível que haja aceitação do perdão por parte do querelado. Note-se:

Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza,
todavia, efeito em relação ao que o recusar.

A alternativa C está certa. A renúncia nas ações penais privadas pode ser tácita e admite todos os meios de
prova. Note-se:

Art. 57. A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova.

A alternativa D também está correta. A morte da vítima extingue a punibilidade do agente nos casos de
ação penal privada personalíssima. Não há nesses casos a sucessão processual prevista no art. 31 do Código
de Processo Penal. Perceba-se:

Se, em regra, a morte do autor do delito é causa extintiva da punibilidade, tal qual o prevê o art. 107,
I, do CP, nas hipóteses de ação penal privada personalíssima, a morte da vítima também irá produzir a
extinção da punibilidade. Isso porque, como não é cabível a sucessão processual, com a transmissão
do direito de queixa-crime aos sucessores, se o ofendido vier a óbito, ter-se-á que reconhecer a
extinção da punibilidade, quer pela decadência, se a ação penal ainda não tiver sido exercida, quer pela
perempção, se o processo já estiver em andamento, já que a ninguém é dado promover a ação ou
prosseguir no processo que estava em curso. (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal.
Volume Único. 5ª ed. Jus Podivm. Salvador. 2017. P. 261)

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Promotor

17. (MPE/SC – Promotor de Justiça – MPE/SC – 2016)


Nos termos do Código de Processo Penal, nos casos em que somente se procede mediante queixa,
considerar-se-á perempta a ação penal: quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o
andamento do processo durante sessenta dias seguidos; quando o querelante deixar de comparecer, sem
motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais; quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar
sucessor. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. A questão exige a literalidade da lei. Ao contrário do que consta na
assertiva, a perempção será reconhecida quando o querelante deixar de promover o
andamento do processo durante trinta (30) dias seguidos, e não sessenta (60) como consta no
enunciado. Note-se:

Art. 60, CPP. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á
perempta a ação penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento
do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua
incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60
(sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36;
III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do
processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações
finais; IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor

18. (MPE/RS– Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Demétrio foi vítima de ameaça. O prazo para
representação finda em 15 de janeiro, em plenas férias forenses. Neste caso, o prazo:
a) é interrompido até o final das férias;
b) é suspendido até o final das férias;
c) é prorrogado por questão de força maior;
d) não é interrompido;
e) é prorrogado automaticamente sob pena de violar o princípio constitucional de pleno acesso à justiça.

Comentários:

A alternativa D é a única correta. O prazo para exercício do direito de representação é decadencial, de


natureza penal. Esse prazo não se interrompe, não se suspende, tampouco se prorroga.

19. (MPE/RS – Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Eurípedes foi preso preventivamente por
homicídio qualificado. Com o inquérito findo em mãos, o Ministério Público levou 15 dias para oferecer a
denúncia. Encerrada a instrução em prazo razoável, nas alegações orais, a defesa sustentou, em
preliminar, que a denúncia não poderia ter sido recebida, uma vez que ofertada fora do prazo do art. 46
do CPP. Nessa situação, o Magistrado deve:

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a) reconhecer a prefacial e anular a peça inaugural;


b) afastar a prefacial, por ser mera irregularidade;
c) proceder, por analogia, na forma do art. 28 do CPP, para que o Procurador-Geral de Justiça tome as
providências legais;
d) reconhecer a prefacial e, através de habeas corpus de ofício, determinar a liberdade do réu;
e) reconhecer a prefacial e impor ao Ministério Público a perda de 10 dias de vencimentos.

Comentários:

A assertiva B é a única correta. O prazo para oferecimento da denúncia é impróprio. A superação desse
prazo previsto em lei (desde que considerável) pode até culminar no relaxamento da prisão cautelar, mas
não dá ensejo à declaração de nulidade. Aliás, a jurisprudência consolidada reconhece a ocorrência de mera
irregularidade em casos parecidos ao retratado no enunciado. Perceba-se:

[...] 3. O oferecimento de denúncia fora do prazo legal não apresenta nulidade que afete a
validade do processo penal, apenas, mera irregularidade, porquanto inexiste prejuízo para o réu,
e a inércia do órgão persecutório, a não ser que dela decorra prescrição, não pode implicar
impunidade.[...] (REsp 1115275/PR, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 04/11/2011)

20. (MPE/RS – Promotor de Justiça – MPE/RS– 2014) Tarquínio, servente de pedreiro, analfabeto, era
casado, e ainda assim, contraiu novo matrimônio em 21/03/2002. O fato só veio à tona em 25/03/2014.
Aberto inquérito policial de ofício no mesmo dia, por ter a autoridade policial tomado ciência do evento
por meio de extensa notícia jornalística, foi concluído rapidamente, e o Ministério Público, frente às
irretorquíveis provas documentais coletadas nos registros públicos do duplo casamento, deve, consoante
a jurisprudência majoritária,
a) esperar pela representação da última vítima;
b) propor o arquivamento pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva;
c) propor o arquivamento por medida de política criminal face o decurso do tempo;
d) propor o arquivamento porque o indiciado incorreu em erro sobre a ilicitude do fato
e) denunciá-lo pelo crime de bigamia;

Comentários:

A alternativa A está errada. O comportamento do agente se amolda ao tipo penal de bigamia (art. 235, CP).
Essa infração se procede mediante ação penal pública incondicionada, porque a lei nada dispõe em sentido
contrário.

Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena - reclusão, de dois a seis anos.

A alternativa B também está errada. De acordo com o art. 111, inciso IV do Código Penal, a prescrição nesse
caso começou a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

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Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: [...] IV -
nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em
que o fato se tornou conhecido

A alternativa C está incorreta. Não há se falar em arquivamento em face do decurso do tempo. Tão logo a
autoridade policial tomou conhecimento do fato, instaurou inquérito policial. O procedimento tramitou
rapidamente e chegou ao Promotor de Justiça. Não houve, portanto, constrangimento algum que
recomendasse o arquivamento do feito por afronta à duração razoável do processo.

A assertiva D está errada. O desconhecimento da lei é inescusável. Além disso, não há absolutamente nada
no enunciado que indique a ocorrência de erro de proibição. É bem possível que mesmo sendo pessoa
humilde, Tarquínio tivesse conhecimento de que contrair novo casamento sendo casado configura crime. O
requerimento de arquivamento nessas circunstâncias seria imprudente.

A assertiva E está correta. O crime de bigamia, como já esclarecido, é de ação penal pública incondicionada.
Presentes elementos de informação suficientes, deve o Ministério Público oferecer denúncia.

21. (FUNDEP – Promotor de Justiça – MPE/MG – 2014) Segundo os Tribunais Superiores e posição
doutrinária dominante, uma denúncia, sabidamente autêntica, que não contém a assinatura do Promotor
de Justiça, é:
a) absolutamente nula;
b) formalmente correta;
c) inexistente;
d) meramente irregular.

Comentários:

A assertiva D é a única correta. O enunciado é claro ao exigir do candidato conhecimento a respeito do


entendimento jurisprudencial e doutrinário majoritário. Prevalece que se a peça inicial for sabidamente
autêntica, a ausência de assinatura não passa de mera irregularidade. Sobre o tema:

[...] este Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que a falta de assinatura da
denúncia configura mera irregularidade, uma vez que, após o seu oferecimento, o órgão
ministerial se manifestará nos autos, o que supre a ausência de tal formalidade, que, por
conseguinte, não acarreta quaisquer prejuízos à defesa. Doutrina. Precedentes. [...] (HC
357.036/MT, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 18/10/2016, DJe
25/10/2016)

22. (MPE/PR – Promotor de Justiça – MPE/MA – 2014) Sobre denúncia e queixa, é incorreto afirmar:
a) o rol de testemunhas não é indispensável;
b) a apuração prévia do crime por meio de inquérito policial não é obrigatória;
c) devem conter a narrativa do fato criminoso e a respectiva classificação jurídica;
d) o recebimento das duas iniciais acusatórias sempre interrompe o prazo prescricional;

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e) consideradas as duas ações penais, a decadência obsta apenas o ajuizamento da queixa.

Comentários:

A alternativa A está correta. O rol de testemunhas é dispensável. É possível que inexistam testemunhas
relevantes para o esclarecimento dos fatos e que a infração demande apenas a produção de prova
documental e pericial, por exemplo.

A alternativa B também está certa. O inquérito é procedimento administrativo dispensável. Nada impede
que elementos de informação suficientes ao oferecimento da denúncia ou da queixa-crime sejam colhidos
de outras formas.

A assertiva C está certa. A narrativa do fato criminoso e a classificação jurídica da imputação são requisitos
da peça inicial. O art. 41 do Código de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a
classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

A assertiva D também está correta. O recebimento de denúncia ou de queixa-crime interrompe o curso do


prazo prescricional. O art. 117, inciso I do Código Penal não dá margem para dúvidas:

Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa


[...]

A assertiva E está incorreta e deveria ter sido assinalada. A decadência não obsta apenas o ajuizamento de
queixa-crime, mas também a própria denúncia nos casos de ação penal pública condicionada à
representação.

23. (MPE/PR – Promotor de Justiça – MPE/PR – 2013) Sobre a ação ex delicto é correto afirmar:
a) O fato imputado na esfera criminal, mesmo após sentença condenatória irrecorrível, pode ser declarado
inexistente na ação de reparação de danos no juízo cível;
b) O arquivamento do inquérito policial, pelo reconhecimento de quaisquer das causas extintivas da
punibilidade, obsta a respectiva ação cível de reparação;
c) Se ação de reparação de danos está em fase de citação e a ação penal na ocasião da sentença, tal situação
vincula o juízo cível a suspender o curso da ação reparatória;
d) A sentença absolutória que reconhece o estado de necessidade, sem atribuir culpa a terceiro ou ao dono
da coisa, não impede a ação cível deste;

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e) Conforme súmula do STF, o Ministério Público pode propor, sem qualquer restrição, ação ex delicto em
favor do titular do direito à reparação do dano que é pobre.

Comentários:

A alternativa A está incorreta. A sentença condenatória irrecorrível faz coisa julgada no cível, de
modo que reconhecida a existência do fato (pressuposto para a condenação) no âmbito penal, a
matéria não poderá ser rediscutida em eventual ação de reparação de danos. A esse respeito,
confira-se o entendimento da doutrina:

Assim, se a instância penal reconheceu a existência de um ato ilícito, não há mais necessidade,
tampouco interesse jurídico, de rediscutir essa questão na esfera civil. Se o fato constitui infração
penal, por óbvio caracteriza ilícito civil, dado que este último configura grau menor de violação da
ordem jurídica. Só restará saber se houve dano e qual o seu valor. Vê-se, portanto, que a condenação
penal imutável faz coisa julgada também no cível, para efeito de reparação do dano ex delicto,
impedindo que o autor do fato renove nessa instância a discussão do que foi decidido no crime. (CAPEZ,
Fernando. Curso de Processo Penal. Saraiva. São Paulo. 19ª ed. 2012. P. 212).

A alternativa B também está errada. O arquivamento do inquérito em caso de reconhecimento de causa


extintiva de punibilidade não impede o ajuizamento da ação civil ex delicto. Sobre o tema:

De outro lado, não impedem a propositura da ação civil reparatória o despacho de arquivamento do
inquérito policial ou das peças de informação, a decisão que julgar extinta a punibilidade, nem a
sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime [...] (CAPEZ, Fernando. Curso
de Processo Penal. Saraiva. São Paulo. 19ª ed. 2012. P. 212).

A assertiva C está incorreta. Na hipótese constante no enunciado, caberá ao juiz do processo cível decidir se
suspende ou não a ação reparatória. Não há vinculação. Ele não é obrigado a suspender. O art. 64 do Código
de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá
ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil.
Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até
o julgamento definitivo daquela.

A alternativa D está correta. A sentença penal absolutória que reconhece a ocorrência de estado de
necessidade faz coisa julgada no cível. Se a decisão não atribuir a culpa a terceiro ou ao dono da coisa, o
proprietário do bem jurídico atingido poderá ajuizar ação cível para reparação do dano diretamente contra
o causador. Nesse caso, o indivíduo que agiu acobertado pela causa excludente de ilicitude poderá ajuizar
ação regressiva. Sobre o tema, confira-se o que dispõem os arts. 188, 929 e 930 do Código Civil:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular
de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa,
a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo
somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os
limites do indispensável para a remoção do perigo.

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Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem
culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este
terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano
(art. 188, inciso I).

A assertiva E está incorreta. Não há súmula do Supremo Tribunal Federal conferindo ao Ministério Público
legitimidade irrestrita para o ajuizamento de ação civil ex delicto em favor de pessoa pobre. Pelo contrário,
o STF reconheceu a inconstitucionalidade progressiva do art. 68 do CPP para o efeito de atribuir legitimidade
ao parquet somente enquanto não tiver sido instalada Defensoria Pública no local. Sobre a matéria:

LEGITIMIDADE - AÇÃO "EX DELICTO" - MINISTÉRIO PÚBLICO - DEFENSORIA PÚBLICA - ARTIGO 68


DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CARTA DA REPÚBLICA DE 1988. A teor do disposto no artigo
134 da Constituição Federal, cabe à Defensoria Pública, instituição essencial à função jurisdicional
do Estado, a orientação e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º,
LXXIV, da Carta, estando restrita a atuação do Ministério Público, no campo dos interesses sociais
e individuais, àqueles indisponíveis (parte final do artigo 127 da Constituição Federal).
INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA - VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE DIREITO
ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - ASSISTÊNCIA JURÍDICA E JUDICIÁRIA DOS
NECESSITADOS - SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao
Estado, no que assegurado constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo
exercício. Enquanto não criada por lei, organizada - e, portanto, preenchidos os cargos próprios,
na unidade da Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de
Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele
prevista. Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do
Estado, em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam
demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio
sustento. (RE 135328, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/1994,
DJ 20-04-2001 PP-00137 EMENT VOL-02027-06 PP-01164 RTJ VOL-00177-02 PP-00879)

24. (MPE/SP – Promotor de Justiça – MPE/SP – 2015) Assinale a alternativa correta:


a) A vítima poderá, em hipótese específica, provocar a prestação da tutela jurisdicional, mesmo em crime de
ação pública. Neste caso, o Promotor de Justiça atuará como interveniente obrigatório subsidiário;
b) A requisição do Ministro da Justiça é, por definição, uma ordem legal e, portanto, impõe o oferecimento
da denúncia e o início da ação penal nos delitos a ela condicionados;
c) O princípio da indivisibilidade da ação privada não comporta exceções;
d) O crime de lesões corporais dolosas de natureza leve, quando envolver violência doméstica contra mulher,
é de ação pública condicionada à representação;
e) O fenômeno da assistência no processo penal pode se verificar nas ações penais públicas e privadas, nos
termos do artigo 268 do Código de Processo Penal.

Comentários:

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A alternativa A está correta. Em caso de inércia do Ministério Pública, o ofendido poderá provocar a
prestação da tutela jurisdicional. Trata-se da ação penal privada subsidiária da pública. Para
parte da doutrina, o Promotor de Justiça, nesses casos, figurará como um interveniente
adesivo obrigatório ou assistente litisconsorcial. A banca empregou expressão diversa no
caso (interveniente obrigatório subsidiário) o que, em princípio, não a tornou incorreta.
Confiram-se os dispositivos legais pertinentes sobre o tema:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [....]LIX - será admitida
ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal.

Art. 100, CP - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido. [...]§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o
Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.

Art. 29, CPP. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada
no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia
substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor
recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte
principal.

A alternativa B está incorreta. A expressão requisição do Ministro da Justiça deve ser interpretada como
mero requerimento e não como uma ordem. Caberá ao Ministério Público, a par dos elementos de
informação, formar juízo de convencimento sobre a pretensa infração e externar a opinio delicti.

A alternativa C também está errada. É possível afirmar que o princípio da indivisibilidade da ação penal
privada comporta exceções. Perceba-se. Caso um dos coautores faleça, o ofendido, por razões óbvias, não
ficará obrigado a demandar contra ele. O mesmo se diga em relação a coautores não identificados.

A assertiva D está incorreta, porque contraria entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça.
Note-se:

Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência
doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

A alternativa E está incorreta. Por expressa previsão legal, a assistência somente é possível em casos de ação
penal pública. Confira-se:

Art. 268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério
Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas
no Art. 31.

25. (UFMT– Promotor de Justiça – MP/MT – 2014) Em matéria de Ação Penal, é INCORRETO afirmar:

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a) O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)


N.º 130/DF, julgou pela recepção do art. 44, § 2.º, da Lei N.º 5.250/1967, asseverando que, contra a decisão
de rejeição da denúncia por crime de imprensa, é previsto o recurso de apelação;
b) Ação de prevenção penal é aquela deflagrada com a finalidade de aplicar exclusivamente ao acusado
inimputável, na forma do art. 26 do Código Penal, medida de segurança, na chamada sentença absolutória
imprópria;
c) Ação penal adesiva é a possibilidade de figurar no polo ativo o Ministério Público e o querelante, nas
hipóteses em que houver conexão e continência entre crimes de ação penal pública e ação penal privada;
d) Os crimes de injúria qualificada ou injúria real serão objeto de ação penal pública condicionada à
representação do ofendido;
e) A Súmula N.º 714 do STF afirma que haverá legitimidade concorrente nos crimes contra a honra de
funcionário público praticados no exercício de suas funções (propter officium), podendo o próprio
funcionário público ingressar com a ação penal privada, sem prejuízo da legitimidade conferida ao Ministério
Público para oferecer a denúncia condicionada à representação do ofendido.

Comentários:

A alternativa A está incorreta e, portanto, deveria ter sido assinalada. Ao contrário do que consta na
assertiva, o STF declarou não recepcionada a Lei nº 5250/1967 (Lei de Imprensa). Veja-se:

Total procedência da ADPF, para o efeito de declarar como não recepcionado pela Constituição
de 1988 todo o conjunto de dispositivos da Lei federal nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967. (ADPF
130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/2009, DJe-208 DIVULG
05-11-2009 PUBLIC 06-11-2009 EMENT VOL-02381-01 PP-00001 RTJ VOL-00213-01 PP-00020)

A alternativa B está correta. Ação de prevenção penal é a demanda que tem por objetivo aplicar
exclusivamente ao indivíduo inimputável medida de segurança. A esse respeito:

Ação de prevenção penal é aquela ajuizada com o objetivo de se aplicar ao inimputável do art. 26,
caput, do CP, exclusivamente, medida de segurança (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo
Penal. 4ª ed. Jus Podivm. Salvador/BA. 2016. P. 380).

A assertiva C também está correta. Ação penal adesiva é, basicamente, a possibilidade de Ministério Público
e querelante figurarem no polo ativo de uma demanda nas hipóteses de conexão/continência entre infrações
de ação penal pública e privada. Sobre o tema:

No ordenamento jurídico alemão, é possível que o Ministério Público ingresse com ação penal
pública mesmo em relação aos crimes sujeitos à ação penal privada, desde que divise um
interesse público. Se isso ocorrer, o ofendido (ou outro legitimado) poderá constituir-se em parte
acessória, acusador subsidiário ou acusador acessório, equivalente ao instituto brasileiro do
assistente do Ministério Público, como se fosse uma ação penal acessória ou uma ação penal
adesiva. (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4ª ed. Jus Podivm. Salvador/BA.
2016. P. 379).

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Não obstante controversa, a alternativa D foi considerada correta pela banca. As infrações previstas nos
§§ 2º e 3º do art. 140 do Código Penal podem ser consideradas injúrias qualificadas (possuem preceito
secundário próprio). A doutrina, contudo, diverge a respeito da modalidade de ação penal em relação ao
crime de injúria real (art. 140, § 2º, CP). Confiram-se os esclarecedores apontamentos da doutrina sobre o
tema:

De acordo com o texto legal, a ação penal será pública incondicionada qualquer
que seja a lesão corporal: leve, grave ou gravíssima. No entanto, há posições
doutrinárias sustentando que, em face do art. 88 da Lei 9.099/1995, a lesão
corporal leve passou a ser crime de ação penal pública condicionada à
representação. Consequentemente, se da violência empregada como meio de
execução advém lesão leve, a ação penal na injúria real será pública
condicionada, subsistindo a ação penal pública incondicionada somente para as hipóteses em
que resultar lesão grave ou gravíssima. Mas há também quem entenda que, por se tratar a injúria
real de crime complexo, integrado por um misto de injúria e lesão corporal, a ação penal continua
pública incondicionada, qualquer que seja a natureza da lesão corporal. Isso porque a lesão
corporal perde sua autonomia, não sendo alcançada peia exigência de representação prevista no
art. 88 da Lei 9.099/1995 A injúria real praticada com emprego de vias de fato é crime de ação
penal privada. Como não há ressalva expressa, segue a regra geral prevista na primeira parte do
caput do art. 145 do Código Penal. (MASSSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. Volume 2.
3ª ed. Método. São Paulo. 2011. P. 207/8)

No que diz respeito à injúria racial (art. 140, § 3º, CP), a lei é clara ao estabelecer o processamento
por intermédio de ação penal condicionada à representação (art. 145, CP).

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-
se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste
Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como
no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

A alternativa E também está correta. Prevalece o entendimento de que, em se tratando de crimes contra a
honra praticados contra funcionário público no exercício de suas funções, há legitimidade concorrente entre
Ministério Público e ofendido para ajuizamento de ação penal. A Súmula 714 do STF viabiliza essa conclusão:
é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à
representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do
exercício de suas funções.

26. (FCC – Promotor de Justiça – MP/PA – 2014) Antônio, de 25 anos, está sendo processado pelo delito
de furto praticado contra João, seu irmão gêmeo. Diante disso,
a) mesmo depois de oferecida a denúncia, se a pedido de João, o Ministério Público pode desistir da ação;
b) o número máximo de testemunhas a serem arroladas na denúncia é 5;
c) o Ministério Público não pode oferecer denúncia sem representação de João;
d) o número máximo de testemunhas a serem arroladas na queixa é 5;

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e) ao fim, o juiz pode isentar Antonio de pena.

Comentários:

A assertiva A está errada. O crime de furto, em regra, é de ação penal pública incondicionada.
Existem situações excepcionais, contudo, em que a ação estará condicionada à representação
do ofendido (art. 182, CP). O caso noticiado no enunciado é uma delas. Havendo representação
por parte do ofendido e oferecimento de denúncia, o Ministério Público não poderá desistir da
ação (art. 42, CPP), ainda que a pedido do ofendido. Eventual retratação da representação, para
vincular o Ministério Público, deve preceder a peça acusatória.

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é
cometido em prejuízo. I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão,
legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal.

As alternativas B e D também estão erradas. No procedimento ordinário, poderão ser arroladas até oito
testemunhas. Há expressa previsão legal nesse sentido (art. 401, CPP).

Art. 401. Na instrução poderão ser inquiridas até 8 (oito) testemunhas arroladas pela acusação
e 8 (oito) pela defesa.

A alternativa C está correta. Na hipótese do enunciado, a ação penal é condicionada à representação do


ofendido. Sem ela o Ministério Público não poderá oferecer denúncia. Falta condição da ação. Sobre o tema:

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é
cometido em prejuízo. I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão,
legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

A assertiva E está incorreta. Não há previsão legal que viabilize a isenção da pena. Repare-se que a situação
fática não se enquadra em nenhuma das hipóteses do art. 181 do Código Penal.

Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo.
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II - de ascendente ou descendente, seja o
parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.

Defensor

27. (FCC – Defensor Público – DPE/AP– 2018) Em caso de ação penal de iniciativa pública condicionada:
a) a ausência de representação impede o início do processo, mas permite a instauração de inquérito policial
desde que mediante requisição judicial;
b) o direito de representação deve ser exercido dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier
a saber quem é o autor do crime;

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c) o direito de representação é do ofendido, salvo nos crimes patrimoniais, que passa também ao cônjuge;
d) o direito de representação deve ser exercido pela FUNAI, quando o ofendido é indígena;
e) a representação será retratável até a publicação da sentença.

Comentários:

A assertiva A está errada. Nos casos de ação penal pública condicionada, a ausência de representação
impede não só o início do processo como também a instauração de inquérito policial, ainda que haja eventual
requisição judicial. Sobre o tema, confira-se o teor dos arts. 5º, § 4º e 24, caput do Código de Processo Penal:

Art. 5o. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: [...] § 4o O inquérito, nos
crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público,
mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação
do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

A alternativa B está correta. O art. 38 do Código de Processo Penal prevê o prazo decadencial de seis (6)
meses para o exercício do direito de representação e esclarece que o marco inicial da contagem é a data em
que o ofendido, ou seu representante legal, toma conhecimento sobre quem foi o autor do crime. Note-se:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito
de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia
em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o
prazo para o oferecimento da denúncia.

A assertiva C está incorreta. O direito de representação, mesmo nos casos de crimes patrimoniais, continua
pertencendo ao ofendido. Essa conclusão pode ser extraída dos arts. 24 e 39 do Código de Processo Penal.
O supracitado direito somente passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão em caso de morte do
ofendido (ou quando declarado ausente por decisão judicial). A esse respeito, veja-se o § 1º do art. 24 do
CPP:

Art. 24, § 1º. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o
direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

A alternativa D também está errada. A lei não garantiu à FUNAI o direito de representação nesses casos e,
como se sabe, as atribuições da administração pública estão sujeitas ao princípio da legalidade.

A assertiva E está incorreta, porque, de acordo com o art. 25 do Código de Processo Penal, a representação
é irretratável após o oferecimento da denúncia.

Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

OBS. Nos casos abrangidos pela Lei 11.340/2006 (Maria da Penha), a ofendida poderá se retratar até o
recebimento da inicial (art. 16).

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Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

28. (VUNESP – Defensor Público – DPE/RO – 2017) Assinale o crime que se processa mediante ação
penal pública incondicionada:
a) Furto de coisa comum (CP, art. 156);
b) Violação do segredo profissional (CP, art. 154);
c) Perigo de contágio venéreo (CP, art. 130);
d) Ameaça (CP, art. 147);
e) Violação de domicílio (CP, art. 150).

Comentários:

Apenas a assertiva E está correta. Quando a lei nada dispuser em sentido contrário, a infração será apurada
mediante ação penal pública incondicionada. Essa é a síntese, na essência, do art. 100, §§ 1º e 2º do Código
Penal:

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido. § 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei
o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. § 2º - A ação de
iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para
representá-lo.

Dentre os delitos listados nas alternativas, apenas o crime de violação de domicílio independe de
representação ou queixa-crime. Perceba-se:

Art. 156, CP - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem
legitimamente a detém, a coisa comum [...] § 1º - Somente se procede mediante representação.

Art. 154, CP - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função,
ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem [...] Parágrafo único
- Somente se procede mediante representação.

Art. 130, CP - Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio
de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado [...] § 2º - Somente se
procede mediante representação.

Art. 147, CP - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico,
de causar-lhe mal injusto e grave [...] Parágrafo único - Somente se procede mediante
representação.

29. (UFMT– Defensor Público – DPE/MT– 2016) São princípios que regem a ação penal privada:
a) obrigatoriedade e intranscendência;

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b) indivisibilidade e obrigatoriedade;
c) oportunidade e indisponibilidade;
d) instranscendência e indisponibilidade;
e) disponibilidade e indivisibilidade.

Comentários:

A assertiva E é a única correta. Os princípios da oportunidade, disponibilidade e indivisibilidade regem a


ação penal privada. Os princípios da obrigatoriedade, indisponibilidade e divisibilidade, por outro lado,
orientam a ação penal pública. São comuns às duas formas de ação penal os princípios da intranscendência,
da inércia judicial (ou demanda) e do ne bis in idem.

30. (CESPE – Defensor Público – DPE/DF – 2013)


Com relação à ação penal privada, à queixa-crime e à ação civil, julgue os itens que se seguem. Conforme
jurisprudência do STJ, nos casos de ação penal privada, não incide o ônus da sucumbência por aplicação
analógica do CPC. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. O enunciado exige que o candidato conheça o entendimento do Superior Tribunal
de Justiça a respeito do tema. No âmbito do referido Tribunal, prevalece a orientação de que são cabíveis
honorários de sucumbência em ações penais privadas, por aplicação analógica do Código de Processo Civil.
Note-se:

PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL


PRIVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ART. 3º
DO CPP. I - "Consoante a jurisprudência sedimentada do STJ, o princípio geral da sucumbência é
aplicável no âmbito do processo penal quando se tratar de ação penal privada" (AgRg no REsp n.
1.206.311/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi). II - Tal entendimento, que decorre da
aplicação do disposto no art. 3º do CPP, restritivamente às ações penais privadas, deve observar
o princípio da causalidade, não se limitando a condenação de honorários aos casos em que haja
sentença de mérito, pois utilizado subsidiariamente o CPC, devem ser aplicados também seus
princípios norteadores. Embargos de divergência desprovidos. (EREsp 1218726/RJ, Rel. Ministro
FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 01/07/2016)

31. (CESPE– Defensor Público – DPE/PE – 2015)


Acerca de aspectos diversos do processo penal brasileiro, o próximo item apresenta uma situação hipotética,
seguida de uma assertiva a ser julgada. Gabriela está sendo processada porque, segundo a denúncia, teria
praticado delito de roubo. Há prova segura nos autos para se afirmar que a ré era imputável no momento
do delito. No entanto, após o recebimento da denúncia, mas antes da resposta à acusação, sobreveio à ré,
no cárcere, doença mental comprovada em incidente de insanidade mental, procedimento que suspendeu
o curso do processo. Após a homologação das conclusões dos peritos no incidente de insanidade mental, o
juiz competente determinou que o processo retomasse seu curso. Em seguida, a DP apresentou resposta à
acusação e o magistrado absolveu sumariamente a ré, impondo-lhe medida de segurança, uma vez que a

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doença mental que a tornou inimputável era a única tese da defesa. Nessa situação, à luz do CPP, agiu
acertadamente o magistrado ao determinar o prosseguimento do processo e, ao final, decretar a absolvição
imprópria da acusada nos termos do pedido da defesa. (C/E)

Comentários:

A alternativa está errada. De início, lembre-se que a inimputabilidade não dá ensejo à absolvição sumária
por expressa previsão legal (art. 397, II, CPP). Além disso, há se levar em consideração o fato de que a doença
mental sobreveio à infração penal. A solução para o impasse seria a suspensão do processo até que a acusada
recuperasse a sanidade (art. 152, CPP) e não a absolvição sumária (art. 397, CPP) ou mesmo a imprópria (art.
386, VI, CPP).

Art. 149. Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de
ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente,
descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal [...] § 2º
O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando suspenso o processo,
se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que possam ser prejudicadas pelo
adiamento [...]

Art. 152. Se se verificar que a doença mental sobreveio à infração o processo continuará
suspenso até que o acusado se restabeleça, observado o § 2o do art. 149.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça
[...] VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22,
23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua
existência.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar [...] II - a existência manifesta de causa
excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade [...]

32. (CESPE – Defensor Público – DPE/PE – 2015)


Acerca de aspectos diversos do processo penal brasileiro, o próximo item apresenta uma situação hipotética,
seguida de uma assertiva a ser julgada. Ana, conduzindo veículo automotor em via pública, colidiu com o
veículo de Elza, que conduzia regularmente seu automóvel. Elza sofreu lesões leves em seus braços e pernas,
comprovadas por exame pericial. Ana trafegava à velocidade de 85 km/h, quando o máximo permitido para
a via era de 40 km/h. Na delegacia de polícia, Elza fez constar na ocorrência policial que não desejava
representar criminalmente contra Ana. Ficou demonstrado ainda, durante o inquérito policial, que Ana não
conduzia o veículo sob efeito de álcool e também não participava de corrida não autorizada pela autoridade
competente. Ana foi denunciada pelo MP pelo delito de lesão corporal culposa (art. 303 do CTB).
Argumentou o representante do parquet que o delito era de ação penal pública incondicionada, haja vista
que Ana trafegava a uma velocidade superior ao dobro da permitida para a via. Nessa situação, agiu
acertadamente o MP ao oferecer denúncia contra Ana com respaldo no CTB. (C/E)

Comentários:

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A assertiva está errada. No caso constante no enunciado, a ação penal é condicionada à representação do
ofendido. Isso em face do que dispõe o art. 291 da Lei nº 9.503/98 c/c art. 88 da Lei nº 9.099/95. Elza
manifestou desinteresse em representar contra Ana, logo não agiu acertadamente o Ministério Público ao
oferecer denúncia. Note-se que o fato de Ana ter conduzido o veículo em velocidade superior ao dobro à
permitida para a via não torna o crime processável mediante ação penal pública incondicionada por ausência
de previsão legal nesse sentido.

Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código,
aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se este Capítulo não
dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que couber.
§ 1o Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa o disposto nos arts. 74, 76 e 88 da
Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, exceto se o agente estiver: I - sob a influência de álcool
ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; II - participando, em via
pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou demonstração de
perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente; III -
transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinqüenta
quilômetros por hora). § 2o Nas hipóteses previstas no § 1o deste artigo, deverá ser instaurado
inquérito policial para a investigação da infração penal.

Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de
representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Delegado

33. (FUNCAB – Delegado de Polícia – PC/RJ – 2012) O senhor Rui dos Santos, após ser vítima do delito
de roubo perpetrado por Nei da Silva, preso em flagrante delito, ao tomar conhecimento de que o
Promotor de Justiça havia perdido o prazo de cinco dias (art. 46, do CPP) para oferecer denúncia, resolve
intentar ação privada subsidiária da pública, por meio de queixa-crime. Decorridos alguns dias,
incomodado pelo trabalho e pelo desgaste emocional, o querelante resolve desistir da ação. Esta medida
acarretará:
a) a decadência do direito de ação;
b) a perempção da ação;
c) a extinção da punibilidade;
d) a renúncia tácita do querelante;
e) a retomada da titularidade da ação pelo Ministério Público, que já atuava como assistente litisconsorcial.

Comentários:

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A alternativa A está errada. Não há se falar em decadência, porque o direito de ação foi exercido no prazo.
Sobre o tema, confira-se:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no
direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses,
contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do
dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

As assertivas B e C também estão erradas. A situação prevista no enunciado não se enquadra


em nenhuma das hipóteses de perempção, tampouco de extinção da punibilidade previstas no art. 60 do
Código de Processo Penal e no art. 107 do Código Penal:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação
penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante
30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não
comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer
das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar
de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou
deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante
pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III -
pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição,
decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes
de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; [...] IX - pelo perdão
judicial, nos casos previstos em lei.

A alternativa D está incorreta. Não cabe renúncia em crimes de ação penal pública incondicionada (mesmo
nos casos em que o particular tenha se valido da faculdade do art. 100, §4º do Código Penal) como é a
hipótese do enunciado. Além do mais, a renúncia, nos casos em que é admitida, apenas pode ser exercida
antes do oferecimento da peça acusatória.

A assertiva E está correta. Nos casos de ação penal privada subsidiária da pública em que o querelante não
mais tenha a intenção de prosseguir como autor, o Ministério Público retomará a ação na qualidade de parte
principal. O art. 29 do Código de Processo Penal é esclarecedor a esse respeito:

Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal,
cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos
os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo .

34. (MS Concursos – Delegado de Polícia – PC/PA – 2012)


Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar
liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo
de 10 (dez) dias. Após recebida a resposta, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar
I - extinta a punibilidade do agente; II - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; III -

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que o fato narrado evidentemente não constitui crime; IV - a existência manifesta de causa excludente da
culpabilidade do agente. Diante dessas informações, assinale a alternativa correta:
a) somente as assertivas I e III estão incorretas;
b) somente as assertivas II e III estão incorretas;
c) somente a assertiva IV está incorreta;
d) somente a assertiva I está incorreta;
e) Todas as assertivas estão incorretas.

Comentários:

A assertiva C é a única certa. As causas listadas nos itens I, II e III são, efetivamente, hipóteses de absolvição
sumária (art. 397, CPP). O item IV, contudo, ao não ressalvar o caso de inimputabilidade, como faz o inciso II
do art. 397 do Código de Processo Penal, está incorreto.

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá
absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] II - a existência manifesta de causa excludente
da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

35. (FAPEMS – Delegado de Polícia – PC/MS – 2017) De acordo com as disposições legais sobre ação
penal, assinale a alternativa correta:
a) na ação penal pública condicionada, nada obsta que a retratação da representação seja realizada no
inquérito policial, todavia essa manifestação não vincula o Ministério Público em virtude do princípio da
indisponibilidade;
b) a espécie de ação penal nos casos de estupro é sempre pública incondicionada em virtude da gravidade
do delito. Dessa forma, a investigação criminal pode ser iniciada sem representação da vítima por meio de
portaria ou, se for o caso, auto de prisão em flagrante;
c) a perempção, uma das causas extintivas da punibilidade, pode ser reconhecida em qualquer momento
processual, porém sanada a omissão do querelante, é possível a renovação da ação penal privada;
d) nos crimes de ação penal de iniciativa privada, o legislador exige para a instauração de inquérito policial
requerimento de quem tenha qualidade para ajuizá-la e apresentação de queixa-crime do ofendido ou de
seu representante legal;
e) o perdão do ofendido, ato bilateral que exige aceitação, pode ser exercido tanto na fase inquisitorial como
na judicial. Uma vez oferecido ainda no inquérito policial, cabe ao Delegado de Polícia proceder à
homologação e encaminhar ao juiz competente.

Comentários:

A assertiva A está incorreta. Ao questionar sobre a retratação ocorrida no inquérito, a alternativa sugere
não ter havido oferecimento da peça acusatória; como se sabe, a retratação à representação anterior ao
oferecimento da denúncia vincula o Ministério Público.

A alternativa B está, atualmente, e em sua essência, correta. Essa questão data do ano de 2017, e, à época,

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esta alternativa estava errada, uma vez que o estupro constituía crime de ação penal pública condicionada
à representação. Entretanto, com o advento da Lei 13.718/2018, que, dentre outras alterações, conferiu
nova redação ao art. 225 do CP, o crime de estupro (assim como todos os crimes contra a liberdade sexual)
passou a ser processado mediante ação penal incondicionada. Embora não seja possível afirmar, como o faz
a alternativa, que isso decorra simplesmente da gravidade do delito, mas sim da nova redação conferida ao
art. 225 do CP, fato é que a investigação criminal poderá ser iniciada sem representação da vítima - seja
mediante portaria, seja em virtude da prisão em flagrante.

A assertiva C está errada. A perempção é causa extintiva da punibilidade (art. 107, IV, CP) que, se
reconhecida, faz coisa julgada material, impedindo a repropositura da ação penal privada.

Art. 107. Extingue-se a punibilidade [...] IV - pela prescrição, decadência ou perempção; [...]

A alternativa D foi considerada correta pela banca. A redação não é das melhores. Conhecendo o teor do
art. 5º, § 5º e do art. 30 do Código de Processo Penal, o candidato seria levado a assinalá-la. Perceba-se:

Art. 5o [...] § 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito
a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la.

Art. 30. Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação privada.

A assertiva E também está incorreta. O perdão não pode ser exercido na fase inquisitorial. Essa causa
extintiva da punibilidade pressupõe a existência de uma ação penal.

36. (FUNCAB – Delegado de Polícia – PC/PA – 2016) Sobre ação penal é correto afirmar que:
a) a ação penal privada, em certos casos é personalíssima, só podendo o delegado de polícia instaurar
inquérito, exclusivamente, no caso de requerimento do próprio ofendido;
b) na ação penal subsidiária da pública, quando o querelado deixa de comparecer aos atos do processo,
ocorre a perempção;
c) quanto ao exercício, classifica-se em pública incondicionada, condicionada a representação do ofendido
ou a resolução do Ministério da Justiça;
d) na ação penal privada o querelante tem legitimidade ordinária;
e) a ação penal pública rege-se pelos princípios da obrigatoriedade e disponibilidade, enquanto a privada
rege-se pela oportunidade e indivisibilidade.

Comentários:

A alternativa A está correta. Nas ações penais privadas personalíssimas (hipótese do art. 236,
CP), apenas o próprio ofendido poderá requerer a instauração de inquérito; se a vítima vier a
falecer, os legitimados constantes do art. 31 do Código de Processo Penal não poderão fazê-
lo.

Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe
impedimento que não seja casamento anterior: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. Parágrafo

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único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão
depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o
casamento.

Ora, se a própria ação penal exige que a queixa-crime seja oferecida diretamente pelo contraente enganado,
não se pode admitir a instauração de inquérito por outro meio que não por requerimento do próprio
ofendido.

A alternativa B está incorreta. Não existe nenhum caso em que a inércia/não comparecimento do querelado
dê ensejo ao reconhecimento da perempção. O art. 60 do Código de Processo Penal é claro quanto às
hipóteses.

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação
penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante
30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não
comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer
das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar
de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou
deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante
pessoa jurídica, está se extinguir sem deixar sucessor.

A assertiva C está errada. A ação penal pública classifica-se em incondicionada, condicionada à


representação do ofendido ou à requisição (e não resolução) do Ministro (e não Ministério) da Justiça.

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. §
1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de
representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. [...]

A alternativa D está incorreta. Na ação penal privada o querelante tem legitimidade extraordinária. O Estado
é o titular exclusivo do direito de punir. Em alguns casos, contudo, transfere a legitimidade para propositura
da ação ao ofendido ou seu representante. Nesses casos, o particular age em nome próprio, mas na defesa
de interesse alheio (do Estado).

A assertiva E está errada. A disponibilidade é princípio que rege a ação penal privada (e não pública).

37. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/PE – 2016) Acerca da ação penal, suas características, espécies e
condições, assinale a opção correta:
a) a perempção incide tanto na ação penal privada exclusiva quanto na ação penal privada subsidiária da
ação penal pública;
b) os prazos prescricionais e decadenciais incidem de igual forma tanto na ação penal pública condicionada
à representação do ofendido quanto na ação penal pública condicionada à representação do ministro da
Justiça;
c) de regra, não há necessidade de a queixa-crime ser proposta por advogado dotado de poderes específicos
para tal fim, em homenagem ao princípio do devido processo legal;

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d) tanto na ação pública condicionada à representação quanto na ação penal privada, se o ofendido tiver
menos de vinte e um anos de idade e mais de dezoito anos de idade, o direito de queixa ou de representação
poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal;
e) é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do MP, condicionada à representação do
ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.

Comentários:

A alternativa A está errada. A perempção não incide nos casos de ação penal privada subsidiária da pública.
A leitura do caput do art. 60 do Código de Processo Penal permite essa conclusão. Segundo o referido
dispositivo, ocorrerá perempção apenas nos casos que se procedem somente mediante queixa, o que não é
o caso das hipóteses tuteladas pela ação penal privada subsidiária da pública.

A alternativa B está incorreta. A lei nada dispôs a respeito do prazo decadencial quanto aos crimes
processáveis por ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça. Nesses casos, diante
da omissão, não há se falar em prazo decadencial.

A assertiva C também está errada. A lei exige poderes específicos para propositura de queixa-crime. O art.
44 do Código de Processo Penal é claro a esse respeito:

Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do
instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais
esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal.

A alternativa D está incorreta. O advento da maioridade do ofendido retira de seu (até então) representante
legal o direito de queixa e de representação. Nesse ponto, consigne-se que o art. 34 do Código de Processo
Penal (abaixo transcrito) foi tacitamente revogado com o advento do Código Civil (art. 5º, CC).

Art. 34. Se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o direito de queixa
poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal.

A alternativa E está correta, porque retrata o entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal (714):
é concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à
representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do
exercício de suas funções.

38. (UEG – Delegado de Polícia – PC/GO – 2013) É princípio aplicável à ação penal de iniciativa privada:
a) divisibilidade;
b) indisponibilidade;
c) oportunidade;
d) transcendência.

Comentários:

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A alternativa C é a única correta. A divisibilidade e indisponibilidade são princípios que regem a ação penal
pública; a transcendência, por sua vez, não se aplica nem a uma nem a outra.

39. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/AL – 2012)


O instituto da perempção não se aplica nas ações penais de iniciativa pública incondicionada ou condicionada
à representação do ofendido, sendo aplicável somente às ações penais de iniciativa privada. (C/E)

Comentários:

A assertiva está correta. A perempção se aplica apenas nas hipóteses de ação penal de iniciativa privada
(com exceção da subsidiária da pública), restando afastada nos demais casos.

40. (CESPE – Delegado de Polícia – PC/ES – 2011)


Rose recebeu sentença penal condenatória transitada em julgado pela prática do crime de roubo qualificado
pelo uso de arma de fogo. Nessa situação, considerando que Lina tenha sido a única vítima do delito, a
correspondente ação civil ex delicto somente poderá ser promovida pela ofendida. (C/E)

Comentários:

A assertiva está incorreta. O emprego de arma de fogo no roubo é causa de aumento de pena e não
qualificadora. Além disso, é possível o ajuizamento de ação civil ex delicto pelos legitimados do art. 63 do
Código de Processo Penal e, ainda, pelo próprio Ministério Público, caso a vítima seja pobre e no local a
Defensoria Pública não tenha se instalado.

Art. 68. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1o e 2o), a execução da
sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento, pelo
Ministério Público.

GABARITO
Magistratura

1. B
2. D
3. B
4. DISCURSIVA
5. B
6. B
7. C
8. INCORRETA
9. INCORRETA
10. INCORRETA
11. B
12. INCORRETA

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13. INCORRETA
14. C
15. CORRETA
16. A

Promotor

17. INCORRETA
18. D
19. B
20. E
21. D
22. E
23. D
24. A
25. A
26. C

Defensor

27. B
28. E
29. E
30. INCORRETA
31. INCORRETA
32. INCORRETA

Delegado

33. E
34. C
35. D
36. A
37. E
38. C
39. CORRETA
40. INCORRETA

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