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PARTE II
MORFOLOGIA DO SOLO
1. INTRODUÇÃO (Adaptado de Spiers, 1984) potencial de uso. Contudo, permitem-nos sempre separar no
campo diferentes unidades homogéneas, que poderão
Os diversos solos possuem propriedades mensuráveis ou posteriormente ser caracterizadas e classificadas mais
descritíveis, que nos possibilitam classificá-los, descrevê-los detalhadamente, tomando em conta também as análises de
avaliá-los para vários fins e cartografá-los. Diferenças entre solos laboratório efectuadas em amostras provenientes de perfis
podem ser locais ou regionais e são evidentes tanto no aspecto representativos de cada uma das unidades cartográficas.
que apresentam à superfície, como também em profundidade.
É óbvio que para uma descrição morfológica poder ser de
Solos diferentes são resultados de diferentes combinações alguma utilidade como transmissor de informação e como base
dos factores responsáveis pela sua formação e exibirão perfis para a avaliação do potencial de uso do solo, deve ser usada uma
próprios, caracterizados pelas propriedades dos seus horizontes terminologia clara e objectiva. Infelizmente há vários sistemas de
(Vide Parte V). Dessas propriedades, aquelas que são mais "normas de descrição", que usam terminologia similar, mas muitas
facilmente acessíveis e prontamente perceptíveis são as vezes com significado ligeiramente diferente, dando origem a
morfológicas, obtidas nas descrições morfológicas, efectuadas no bastante confusão. Por isto é importante que o pedólogo ao
campo, em um perfil de solo. descrever um perfil sempre anote o método usado, com o ano da
edição do manual; e siga rigorosamente o vocabulário
A descrição morfológica de um solo é a expressão da recomendado. Comentários devem ser anotados separadamente.
aparência deste solo, segundo as características macroscópicas O resultado pode ser um texto que para a maioria dos leigos seja
prontamente perceptíveis. A morfologia corresponde então à um tanto chato e de leitura difícil. Para o verdadeiro pedólogo seria
"anatomia do solo". Em seu conjunto, as características um prazer de reconstruir na sua imaginação o solo descrito e
morfológicas constituem a base para definir este corpo natural que poder apontar muitos aspectos de importância prática.
é o solo, e a definição se completará com as demais
determinações do laboratório. A terminologia no texto a seguir é baseada no método de
descrição internacionalmente mais aceite: Os "Guidelines for soil
A morfologia compreende somente propriedades profile description" da FAO (1977), que foi adaptado pelo INIA para
observadas directamente, que devem ser distinguidas de uso em Moçambique. Em 1990 os "guidelines" foram reeditados
propriedades inferidas ou deduzidas dos solos. Assim, uma sob o nome "Guidelines for soil description". Parte das
descrição morfológica constará apenas do relatório do aspecto ou modificações está sendo implementada pelo INIA.
forma do solo, como, por exemplo, a sua cor, estrutura,
consistência.
2. O PERFIL DO SOLO E SEUS HORIZONTES
A morfologia, além de sua importância para a caracterização
do solo, fornece muitos elementos para interpretações de 2.1 Nomenclatura e definições
importância agrícola, tais como: drenagem, permeabilidade,
compactação, susceptibilidade à erosão, possibilidade de uso de Solo é a colecção de corpos naturais que ocupam parte da
máquinas, etc. Para quem executa levantamentos de solos, a superfície terrestre e constituem o meio natural para
morfologia é de capital importância, pois permite rapidamente desenvolvimento das plantas terrestres. São dotados de atributos
identificar e cartografar solos de determinada região pela resultantes da diversidade de efeitos de aço integrada do clima e
aparência do seu perfil, com reduzida necessidade de dados de dos organismos, agindo sobre o material de origem, em
laboratório. determinadas condições de relevo durante certo período de tempo
(Soil Conservation Service, 1951).
Na história da ciência do solo, podemos distinguir um período
em que a descrição morfológica do solo era considerada a Da aço combinada dos factores de formação do solo,
maneira mais importante da sua caracterização. Com o determinando os processos pedogenéticos - adições, perdas,
melhoramento de acesso às análises fisico-químicas, e sobretudo transformações, transportes selectivos (Simonson, 1959) - que se
o avanço da informática nas ciências agrárias, a morfologia perdeu operam no material de origem, resultam secções mais ou menos
grande parte do seu brilho, devido à dificuldade de exprimi-la paralelas à superfície do terreno e que se sucedem verticalmente
numericamente. Actualmente este brilho está a renovar-se com a compondo os solos. São secções interrelacionadas, guardando
introdução de programas de computador mais "inteligentes", e com entre si vínculos concernentes a sua natureza, em consequência
a percepção de que o melhor lugar para analisar o solo é no do processamento da formação dos solos. Essas secções,
campo, como corpo tridimensional, e não através de frascos denominadas horizontes, diferenciam-se umas das outras pela
separados com terra moída. organização, pelos constituintes ou pelo comportamento. Quando
No entanto, as propriedades morfológicas por si só geralmente são os atributos possuídos são bem manifestos através da morfologia,
insuficientes para que se possa classificar os solos e avaliar o seu torna-se relativamente fácil a identificação e delimitação dos
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horizontes de um solo. Porém, quando o solo é pouco diversificado seus horizontes e/ou camadas. É discriminado dos demais
verticalmente, a expressão dos horizontes é pouco distinta, sendo segundo a sequência e a natureza de seus horizontes: sua
por vezes bastante difícil detectar-lhes os limites. constituição qualitativa e quantitativa, conformação própria,
Uma secção paralela à superfície, que é pouco ou nada organização dos constituintes e manifestação de atributos
diferenciado pelos processos pedogenéticos é denominada decorrentes.
camada (p.e. a rocha mãe; uma camada de material orgânico
acumulado na superfície; sedimentos estratificados). Em exame de campo, os horizontes são identificados pela
constatação de atributos morfológicos (prontamente perceptíveis),
À secção vertical, através do solo, englobando a sucessão de tais como: estrutura, textura, cor, consistência e cerosidade. Nem
horizontes ou camadas, acrescidas do material mineral sempre a verificação desses atributos é suficiente para identificar
subjacente, pouco ou nada transformado pelos processos os horizontes: tornam-se necessárias, então, informações
pedogenéticos e o manto superficial de resíduos orgânicos, dá-se adicionais quanto a atributos físicos e/ou químicos e/ou
o nome de perfil do solo (Ing: soil profile). mineralógicos, mediante análises de laboratório em amostras
adequadamente colectadas.
2.2 O perfil do solo A denominação dos horizontes e camadas é feita por símbolos
representados por letras e números. Esses símbolos
Não obstante o perfil seja concebido como um plano ortogonal convencionalmente informam a relação genética existente entre
à superfície do terreno, na prática, ao examiná-lo e descrevê-lo, horizontes no conjunto do perfil. São o resultado das
são consideradas características que só podem ser detectadas e interpretações feitas pelo operador durante a descrição do perfil,
identificadas se o material constitutivo do solo for inspeccionado tendo por base as constatações morfológicas e inferências delas
em três dimensões, ou seja, se em vez de se examinar decorrentes, acrescidas, quando necessário, de dados de
simplesmente a face exposta naquele plano, o exame interiorizar- laboratório.
se, atingindo pelo menos alguns decímetros a dentro. O objecto de
atenção usualmente consiste numa secção com aquela espessura A notação aplicada aos horizontes, na sua identificação
por um a dois metros de largura e que se aprofunda desde a durante o exame e descrição do perfil do solo, é o registro da
superfície do terreno até, quando possível e necessário, a zona de interpretação feita pelo operador. Tais denominações constituem
material saprolítico ou o próprio substrato rochoso consolidado. expressão do julgamento concernente ao todo das transformações
ocorridas, causadas por processos pedogenéticos, gerando os
A rigor, o exame, a descrição e a tomada de amostras para horizontes como presentemente são, em distinção comparativa
análises dizem respeito a um volume de solo, compreendendo o com a natureza presumível do que existiu anteriormente - material
que se manifeste de atributos na face exposta e o contido na de origem - às custas do qual veio a se formar cada horizonte.
matéria intraface. Nesse contexto foi formulado o conceito de
pedon, referente à parcela tridimensional abrangendo a inteireza As designações dos horizontes e camadas do solo passaram
dos horizontes, perfazendo volume mínimo que possibilite por modificações em tempos recentes, visando sanar deficiências
expressar a variabilidade de atributos no sentido lateral de cada que vieram se comprovando através dos muitos anos de uso das
horizonte em si, bem como a variabilidade sequencial dos normas preconizadas no "Soil Survey Manual" (Soil Conservation
horizontes que compõem o perfil considerado. Service, 1951).
Neste texto, a orientação seguida é a das normas publicadas pelo
O exame de perfis é realizado em exposições de barrancos ou Instituto de Investigação Agrária (INIA, 1985) que se coadunam
em trincheiras, suficientemente profundos para permitir uma visão com os critérios das designações preconizadas pela FAO (1977) e
abrangente. Para aproveitamento das exposições em cortes de com as normas atuais do serviço de conservação do solo dos
estradas torna-se necessário avivar a face dos taludes, removendo Estados Unidos da América (Soil Conservation Service, 1981).
alguns decímetros da superfície exposta. Em vista de estar sujeita
à contaminação com poeira, lavagem pela chuva, escorrimento de Os horizontes e camadas principais (Ing: master horizons) do
material, secagem e humedecimento e à acção de animais e solo são simbolizados pelas seguintes letras maiúsculas: O, H, A,
plantas, a face do talude pode apresentar modificações sensíveis E, B, C e R. Três são sempre denotativas de horizontes: A, E e B;
em muitos atributos e, assim, interferir na verificação dos atributos R é sempre indicativa de camada; enquanto O e H podem ser de
que individualizam os horizontes e, consequentemente, na denotação variável. Na descrição de perfis, normalmente
identificação do solo. adicionam-se, a essas letra, outras, minúsculas, e números
arábicos que completam a designação dada pelas letras
Em trabalhos de levantamento de solos, quando não haja maiúsculas aos horizontes principais. A seguir vem uma descrição
exposição de barrancos e torna-se impraticável a abertura de dos conceitos de cada horizonte principal. Para as definições
trincheira, é comum o uso de sondagens. Naturalmente, o recurso oficiais refere-se para INIA (1985). Alguns exemplos de
das sondagens não permite um exame circunstanciado, só representações gráficas de perfis com seus horizontes estão na
realizável mediante a inspecção dos horizontes in situ. Figura II-1.
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Sólum: designação referente ao conjunto dos horizontes A e B de um perfil de solo.
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Figura II-2. (A) Esquema demonstrativo das componentes das cores; (B) os matizes que compõem o espectro e
que aparecem nos cartões Munsell. Fonte: Kiehl (1979).
4. A TEXTURA DO SOLO
(tradução adaptada de Van den Berg, 1986)
4.1 Nomenclatura
A textura do solo, ou distribuição das partículas por tamanhos,
refere-se a ocorrência relativa das várias classes de tamanho dos
graus minerais individuais do solo. A textura refere
especificamente para as proporções de argila (Ing: clay), limo (Br:
silte; Ing: silt) e areia (Ing: sand) na fracção de terra fina (Ing: fine
earth fraction), i.e. a fracção de partículas com diâmetro menor que
2 mm.
Figura II-4 Triângulos texturais: (a) classes de textura; (b) subclasses de areia;
(c) classes gerais de textura, conforme FAO 1994; INIA/UEM, 1995
Constituintes do solo como (oxi)(-hidr)óxidos de ferro e de 5.2.2 Grau, classe e tipo de estrutura
alumínio, carbonatos e gesso podem, mesmo em pequenas A estrutura do solo pode ser descrita de acordo com seu grau,
concentrações agir como agentes cimentantes, o que pode causar classe e tipo, de acordo com as definições do Manual para a
uma textura aparentemente mais grosseira do que a textura descrição do Solo (INIA/UEM, 1995; pág. 43-46). Por exemplo, um
determinada no laboratório. Se seus teores forem elevados, estes horizonte de solo pode ser descrito como tendo uma estrutura forte
constituintes podem dominar as propriedades do solo, como é o média anisoforme subangular. Isto significa que o tipo de estrutura
caso da plintita (com muito ferro), bancos de conchas (carbonatos é anisoforme subangular; o tamanho dos agregados (classe) é
de cálcio) e horizontes petrogípsicos ou petrocálcicos. médio; e o grau de desenvolvimento é forte. Modelos de tipos de
estrutura estão apresentados na Figura II-5.
5. A ESTRUTURA DO SOLO
5.2.3 Agregados simples e compostos
5.1 Definições É bastante comum que num horizonte de solo ocorra mais que
uma estrutura. Em alguns casos as duas estruturas podem ocorrer
Segundo a Soil Conservation Service da USDA (1981) a lado a lado, por exemplo anisoforme subangular e granular num
estrutura do solo refere a “organização natural das partículas de horizonte A. Em outros casos pode haver um horizonte de
solo em unidades, que são separadas por superfícies de fraqueza, transição cuja parte superior é caracterizada por uma estrutura
que persistem por mais que um ciclo de molhamento e secagem diferente da parte inferior, p. e. anisoforme angular e prismática.
em situ. Uma unidade estrutural individual chama-se agregado Uma terceira forma são os agregados compostos (Ing: compound).
(Ing: agregate ou ped). Um agregado composto pode ser subdividido em agregados
Os agregados distinguem-se dos (1) torrões (Ing: clods), cuja simples de acordo com as superfícies de fraqueza naturais. Em
formação é causada por perturbações, como aração, que moldam alguns casos os agregados compostos podem ser subdivididos em
o solo em corpos transientes; (2) fragmentos (Ing: fragments) de agregados que por sua vez também são compostos. Um agregado
solo que são formados por fendilhamento ou quebras do solo, e não composto (i.e. agregado simples; Ing: simple ped) não pode
que não reaparecem no mesmo lugar sob secagem; e (3) ser subdividido em elementos menores ao longo de superfícies de
concreções (Ing: concretions) ou nódulos (Ing: nodules), que fraqueza naturais. Na prática isto significa que obtém-se pedaços
estão relacionados com concentrações locais de substâncias que com faces diferentes das faces dos agregados originais, i.e.
cimentam as partículas formando unidades discretas dentro do formam-se torrões. As faces destes pedaços têm cor diferente,
solo. tem menos lustrosidade e são mais ásperos.
Figura II-5 Tipos de estrutura de solo. (A) granular ou grumoso; (B) anisoforme subangular e anisoforme angular; (C)
prismático; (D) colunar; (E) laminar.
Poros intersticiais: (Ing: interstitial- or textural voids): Poros controlados pelo arranjo das partículas do solo. Podem ser subdivididos
em poros intersticiais simples, p.e. entre os grãos de areia, e poros intersticiais compostos, entre agregados que não se
amoldam. Estes poros são predominantemente irregulares e interligados, e não podem ser quantificados no campo.
Vesículas (Ing: vesicles): Poros descontínuos de foram esférica ou elíptica (câmaras) de origem sedimentar ou formados por ar
comprimido, por exemplo, bolinhas de ar em crostas superficiais, formadas depois de chuva torrencial. Estes poros são
relativamente pouco importantes em conexão com o crescimento de plantas.
Ing: vughs (sem termo equivalente em Português): Poros predominantemente irregulares equidimensionais de origem faunal, ou
resultando de aração ou perturbação de outros poros. Podem ser descontínuos ou interligados; e podem ser quantificados em
casos específicos.
Canais (Ing: channels): Poros elongados de origem faunal ou vegetal. Na maioria dos casos têm forma tubular e são contínuos, com
diâmetro variando fortemente. Quando maior que alguns centímetros (p.e. escavações de camundongos) podem ser descritos
mais adequadamente sob o capítulo "actividade biológica".
Planos (Ing: planes): A maioria dos planos são vazios entre os agregados, relacionados com superfícies de agregados que se
amoldam ou fendilhas. Os planos são muitas vezes não persistentes e podem variar em tamanho, forma e quantidade em
dependência das condições de humidade do solo. Os planos podem ser registados pela descrição da sua largura e abundância.
aumento pronunciado da velocidade de decomposição matéria nutrientes absorvidos pela cultura. É um fenómeno muito comum
orgânica por microorganismos e processos químicos. A matéria em regiões de transição de agricultura familiar para agricultura
orgânica tem um papel importante como agente aglutinante de privada, e quando o aumento da densidade populacional força os
partículas (vide Capítulo 5 desta Parte); e a diminuição do teor de agricultores a manter pousios cada vez menores ou cultivar áreas
matéria orgânica no solo torna a sua estrutura menos estável. Os menos aptas para a agricultura. Uma outra situação é em regiões
agregados menos estáveis são facilmente destruídos pelo impacto socialmente desestabilisadas (p.e. devido à guerra) com imigração
directo das gotas de chuva (splash). Isto torna o solo mais de agricultores sem experiência nos solos da região (por exemplo,
vulnerável à erosão hídrica ou eólica. Subsequentemente haverá parte das zonas verdes de Maputo).
uma diminuição da actividade biológica, devido às variações
extremas de temperatura e humidade e os teores mais baixos de A intensidade excessiva de pecuária causa problemas
matéria orgânica. semelhantes à combinação da intensidade excessiva de cultivo (se
os produtos da pecuária forem tirados da área) e a mecanização.
A aração na lavoura causa um aumento da superfície do solo Neste caso é o pisoteio do gado que pode causar a degradação
exposto à atmosfera pela destruição mecânica de agregados e a física. Em pastagens demasiadamente grandes o gado costuma
formação de uma superfície "rugosa". Isto favorece a oxidação da andar sempre nos mesmos caminhos, iniciando sulcos de erosão.
matéria orgânica e por consequência, a diminuição da estabilidade Este problema é especialmente grave em regiões semi-áridas, em
estrutural, o que pode dar origem ao esboroamento (Ing: slaking) que normalmente pode haver forragem suficiente, porém nos anos
dos agregados, i.e. a destruição ou desintegração de agregados mais secos o gado consome praticamente toda vegetação,
do solo nos seus constituintes originais, comumente observado em deixando o solo descoberto e susceptível à erosão das primeiras
solos recentemente arados e sujeitos ao impacto das chuvas. chuvas torrenciais.
Durante este processo as partículas de limo, argila, areia e matéria
orgânica ficam sorteadas pela água e formam uma crosta 6.5.2 Morfologia de estruturas deterioradas
adensada na superfície do solo. A combinação dos processos acima mencionados resulta na
formação duma crosta de grãos simples, maciça ou estratificada
O uso de máquinas pesadas favorece a compactação na superfície do solo; e/ou dum imperme de lavoura com estrutura
mecânica. Por exemplo, um tractor num solo cultivado exerce laminar ou anisoforme angular no limite inferior do horizonte Ap.
pressão mecânica sob as rodas, devido ao peso da máquina,
vibração do motor e deslizamentos pelo movimento das rodas. A A formação duma crosta externa (como resultado de slaking),
compactação é pior quando as actividades são exercidas sob é geralmente mais pronunciada em solos com elevado teor de limo
condições desfavoráveis (excesso de humidade no solo). A ou areia fina e relativamente pouca argila (p.e. franco siltoso, areia
regeneração da estrutura pela actividade biológica é limitada, entre franca fina) bem como em solos com elevado teor de sódio
outras razões devido à falta de alimentos adequados para os trocável. As crostas superficiais são caracterizadas pela presença
animais em condições de lavoura. de vesículas, relacionados com confinamento de gases, numa
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estrutura adensada. As crostas podem ocorrer nas áreas baixas
entre os torrões de terra, ou cobrir toda a superfície. 6.5.4 Efeitos práticos da degradação do solo
Crostas superficiais e impermes induzidos são prejudiciais,
Em solos com teor de argila mais elevada, os agregados são pois impedem o transporte vertical de água e ar pelo solo,
melhor desenvolvidos. No entanto, desagregação em profundidade implicando aumento do risco de ocorrência de excesso de água no
ou "micro-erosão" (transporte por fendilhas de material da solo superficial, além de impor uma restrição ao desenvolvimento
superfície do solo para camada inferior) podem resultar na radicular. Isto não só afecta o crescimento das plantas, como
formação duma camada adensada sob a profundidade de lavoura: também dificulta as operações de maneio, e torna o solo mais
imperme induzido ou imperme de lavoura (Br: pã induzido ou pã sensível à compactação.
de arado; Ing: plough pan). Em solos de textura média estas
camadas consistem de agregados laminares adensados, com A deterioração estrutural torna o solo mais sensível à erosão,
poucos poros visíveis. Nos solos argilosos costumam ter estrutura por duas razões: (1) partículas dos agregados inestáveis ou das
anisoforme angular, devido ao fendilhamento como consequência crostas superficiais podem ser facilmente deslocados por impacto
do encolhimento ao secar. Em solos de textura arenosa este de gotas de chuva, como explicado acima e (2) as camadas
imperme se manifesta como uma camada muito adensada sem adensadas na superfície têm baixa capacidade de infiltração, e
estrutura. Impermes induzidos têm 5 a 10 cm de espessura, mas a consequentemente haverá maior escoamento superficial de água.
compactação causada pela vibração e pressão pode continuar até Com a perda do solo e água também perde-se nutrientes e
mais baixo. Isto reflecte-se pelo aumento de microporos e a matéria orgânica do horizonte A. O horizonte E ou B ficará à
diminuição de poros grosseiros. superfície do solo. Estes horizontes geralmente têm propriedades
físicas e químicas menos favoráveis (especialmente o E) para o
6.5.3 Características do solo que promovem a deterioração crescimento das plantas do que o horizonte A.
estrutural
Deve-se ressaltar que as características do solo que Em solos com características físicas e/ou químicas
promovem a deterioração estrutural não estão exclusivamente degradadas, fica mais difícil obter uma cobertura vegetal completa
relacionadas com a textura do solo, como pode ter sido sugerido do que em solos com suas características originais preservadas.
nos exemplos acima. Entre as características do solo que agravam Por isto, uma maior parte do solo fica exposta à atmosfera durante
a deterioração estrutural destacam-se: mais tempo, tornando-lhe mais vulnerável aos processos de
deterioração estrutural.
• Elevado teor de limo ou areia fina
• Teor de matéria orgânica muito baixo ou muito elevado O acima exposto deixa claro que, os processos de
• Ausência de carbonato de cálcio deterioração estrutural formam um espiral vicioso, o que os torna
• Baixo teor de alumínio e ferro ainda mais perigosos.
• Sodicidade/alcalinidade
• Excesso de humidade 6.5.5 Melhoramento de estruturas deterioradas
O limo e a areia fina são as fracções do solo que são (1) Para melhorar a estrutura de camadas deterioradas ou
fracamente coesivas, devido à sua baixa superfície específica e adensadas naturalmente, deve-se promover a formação dum
baixa densidade de cargas (em comparação com a argila) e (2) "sistema permanente de poros heterogéneos e contínuos". Alguns
facilmente transportáveis por serem de tamanho reduzido (em exemplos para fazer isto são:
comparação com a areia média e grossa). • Arar para soltar uma superfície adensada e compactada
• Fazer uma aração profunda para misturar camadas com
A matéria orgânica, o carbonato de cálcio e óxidos de ferro e características favoráveis e desfavoráveis (p.e. areia pobre
alumínio têm a capacidade de estabelecer ligações fortes entre as em matéria orgânica com areia húmida, para aumentar a
partículas do solo, formando desta maneira agregados estáveis. profundidade potencial de enraizamento).
No entanto, solos com matéria orgânica muito elevada são muito • Fazer uma aração profunda para soltar o subsolo de textura
untuosos (Ing: smearing) e esponjosos, o que pode facilitar a arenosa com arranjo adensado de partículas.
vedação dos poros, e compactação por máquinas ou gado. • Quebrar/Misturar camadas que actuam como barreiras
mecânicas para o desenvolvimento radicular e transporte de
A razão porque solos alcalinos (pH>8.5) ou sódicos (Na+ água e ar.
trocável maior que 15% são inestáveis será explicada na Parte III
(Química do Solo). Se estas operações forem executadas sob condições
desfavoráveis (demasiadamente molhado) ou se forem
Solos com excesso de humidade, especialmente com elevado executadas em solos que não são aptos para tal, o resultado (no
teor de argila e/ou matéria orgânica, são facilmente deformáveis. A médio ou longo prazo) será deterioração estrutural em vez de
plasticidade e pegajosidade de solos molhados (Vide Capítulo 7: melhoramento.
Consistência do Solo) causam untadura (smearing) quando
trabalhados, ou pisoteados. 6.5.6 Prevenção da deterioração estrutural
Para prevenir a deterioração estrutural deve-se:
• estimular a actividade biológica pelo suprimento de matéria
orgânica ao solo (p.e. "mulching", adubação com estrume,
rotação com pousio, evitar retirar todos os órgãos da planta
APONTAMENTOS DE CIÊNCIA DO SOLO
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sem deixar nada para ser incorporada na terra (p.e. batata A terminologia para a descrição da consistência do solo no campo
doce); (INIA/UEM, 1995) inclui termos diferentes para os três estágios de
• aplicar gesso aos solos com elevado Na+ trocável (Vide humidade: molhado, húmido e seco.
Parte III, Capítulo 5.2.2);
• minimizar o período que os solos estão descobertos; Geralmente não é necessário descrever a consistência do solo
• minimizar as práticas de maneio do solo; sob todas estas três condições padronizadas. A consistência
• promover a remoção de excessos de água por sistemas de húmida é geralmente mais importante, pois é o estado mais
drenagem; comum de muitos solos. A consistência do solo seco é geralmente
• adoptar práticas para evitar erosão como plantar em útil, mas não é relevante em solos que nunca estão secos. A
contornos, culturas consociadas, terraceamento. mesma coisa se aplica para a consistência do solo molhado. Um
7. A CONSISTÊNCIA DO SOLO problema prático para a determinação da consistência no campo,
é que é bastante difícil de secar uma amostra no campo. Também
7.1 Conceitos e definições é difícil obter no campo uma amostra húmida a partir duma
amostra seca.
A consistência do solo refere à resistência do material do solo
para deformações ou ruptura. A consistência depende do grau e O grau da cimentação não depende do teor de humidade no
tipo de coesão (entre materiais similares) e adesão (entre solo.
materiais diferentes), do solo e das condições de humidade.
Descreve-se a consistência do solo seco e húmido, bem como
A consistência do solo é uma função da superfície específica e o grau de cimentação, em termos duma característica que pode-se
da quantidade e da força dos contactos por unidade de área de chamar resistência à ruptura (Ing: soil strength), ou seja, a força
superfície. Portanto, varia com o tamanho, a forma, a natureza e o ou pressão mínima necessária para quebrar o material. A
arranjo das partículas do solo e da natureza dos "filmes" de resistência à ruptura é descrita em termos de solto, friável, firme
humidade em volta destas partículas. para material húmido; solto, brando, duro para material seco; e não
cimentado, cimentado para material cimentado. No caso de
A água exibe coesão, como indicado por sua tensão material cimentado também descreve-se a continuidade e a
superficial. As moléculas de água, sendo dipolares, também são estrutura do material, bem como a natureza do agente que causa
absorvidas e se orientam em partículas de solo com cargas a cimentação.
eletroestatícas negativas ou positivas. Sob secagem, partículas
vizinhas se atraem, e o solo desenvolve maior coesão e força A consistência de material molhado é descrita em termos da
mecânica, o que resulta em encolhimento. pegajosidade (Ing: stickiness): a qualidade de adesão do material
do solo a outros objectos; e a plasticidade (Ing: plasticity): a
A adição de água tem um efeito oposto à secagem, por habilidade do material de solo de mudar continuamente de forma
aumentar a largura de filmes de água em volta das partículas do sob a influência de uma pressão aplicada e de conservar a forma
solo. Quantidades adicionais de água tornam o solo plástico, e impressa após a cessão desta pressão. A pegajosidade e a
mesmo perder a sua coesão, aproximando um fluido. Portanto, plasticidade do solo dependem do grau de destruição da estrutura,
sob teores diferentes de água, o solo apresenta consistências bem como da humidade. A determinação destas características
diferentes. deve ser feita sob condições padronizadas, numa amostra de solo
Em solos cimentados, também outras forças que as adesões cuja estrutura é completamente destruída, e que contém água
entre as partículas do solo estão envolvidas. suficiente para expressar o máximo de pegajosidade e
Segundo o "Soil Survey Manual (Manual de Levantamento de plasticidade. Desta maneira possibilita-se a comparação entre
Solos, Soil Conservation Service, 1981) "Material de solo é graus de pegajosidade e plasticidade de solos diferentes.
considerado cimentado se um agregado não se desintegra depois
de uma hora de imersão em água". Se o agregado se desintegra, As classes e definições dos vários tipos de consistência estão
o material não é considerado de cimentado. Agentes cimentantes nas páginas 47-49 do Manual de Descrição do Solo (INIA/UEM,
podem ser: calcário, gesso, ferro e sílica. 1995). Os termos para a descrição da cimentação e compacidade
estão nas páginas 52 e 53 do mesmo manual.
O termo compacto refere para material com uma consistência
húmida que é firme a extremamente firme, e um arranjo cerrado
das partículas. Material compacto não se desintegra depois de 7.3 A importância da consistência e cimentação do material do
uma hora de imersão em água. Compacidade é um termo solo
genérico que pode referir a material compactado, resultante da
acção externa (p.e. máquinas pesadas) ou material adensado, que 7.3.1 Importância pedológica
resulta de processos naturais, pedogenéticos (p.e. iluviação de A consistência do solo não depende apenas da textura e da
argila de horizonte A ou E para horizontes Bt, Vide Parte V) ou humidade do solo, mas também da mineralogia da argila, dos
geogenéticos (p.e. sedimentação cerrado). cations trocáveis e do teor de matéria orgânica. Portanto, é uma
característica do solo bastante complexa. Isto é ilustrado na
Tabela II-1, que compara a consistência dum Ferralsolo argiloso
7.2 Descrição da consistência e cimentação do solo com a dum Vertissolo argiloso. A mineralogia do Ferralsolo é
dominada pela caulinita e por oxi-hidróxidos de ferro e alumínio. Os
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Vertissolos são ricos em smectitas (Vide Parte VI, Classificação do 8.1 Tipos de películas e sua origem
Solo).
Existem vários tipos de películas de natureza diferente: de
7.3.2 Importância para o maneio do solo argila, de compressão, de sesquióxidos, de matéria orgânica.
A consistência do solo também é de grande importância Alguns solos, classificados como Nitissolos (vide Parte VI:
prática, em relação ao uso do solo, tanto para fins agrícolas, como classificação) apresentam uma lustrosidade cuja formação ainda
para obras de engenharia. As consistências no estado seco e não está bem esclarecida. No Brasil, onde estes solos são muito
húmido determinam, juntos com outros factores, as possibilidades comuns, indica-se este tipo de lustrosidade por cerosidade.
de trabalhar o solo, p.e. a facilidade de preparação do solo para a
sementeira, uma actividade que deve-se evitar em solo molhado. No campo é importante discriminar aquilo que é realmente
A presença de material de solo cimentado, a uma profundidade observado daquilo que é interferido. Pode-se referir para a
rasa, é uma limitação séria neste respeito. As consistências natureza de películas em termos como "provavelmente de argila",
húmida e molhada também são importantes para determinar a ou "possivelmente de matéria orgânica e óxidos de ferro".
transitabilidade do solo e o risco de compactação do solo pelas
máquinas agrícolas e pelo gado, actividades que muitas vezes não 8.1.1 Películas de argila
podem ser evitadas quando o solo estiver molhado. A consistência As películas de argila são revestimentos que podem ser
do solo também está correlacionada com o enraizamento dos facilmente distinguidos quando são mais escuros ou avermelhados
horizontes. do que os interiores dos elementos estruturais. Critérios para sua
8. PELÍCULAS identificação no campo são (1) espessura real; (2) uma transição
abrupta entre a película e o interior do agregado, como pode ser
Muitas vezes, as faces dos agregados, os poros ou os grãos visto numa secção transversal numa superfície quebrada. Uma
de areia apresentam revestimentos de materiais como p.e. argila, lente de bolsa de 10x de aumento pode ajudar na identificação.
matéria orgânica, ou óxidos de ferro. Uma descrição detalhada Sob o microscópio as películas de argila podem ser facilmente
destas chamadas películas (Ing: cutans) não é possível sem vê- reconhecidas como lâminas de placas de argila orientada
los sob o microscópio, e faz parte da micromorfologia do solo. No paralelamente à superfície da face do agregado ou como lâminas
entanto, as películas podem frequentemente ser reconhecidas no concêntricas em volta dos poros cilíndricos.
campo, pelo olho nu, ou por uma lente de aumento de 10x.
Geralmente a observação no campo por si só é suficiente para Películas de argila são principalmente compostas por
identificar a natureza exacta duma película. partículas de argila que foram lavadas (eluviação) pela água
descendente, do solo superficial e depositadas (iluviação) nas
A presença de películas pode providenciar uma indicação faces dos poros e agregados no subsolo (Vide Parte V, Capítulo
importante dos processos que estão, ou estiveram actuando no 3.1). Na classificação dos solos, a presença de películas de argila
solo. Alguns critérios importantes para a designação de horizontes é um critério importante para diagnosticar a presença dum
e para a classificação do solo também referem para a presença de horizonte B árgico (Vide Parte VI).
certos tipos de películas. 8.1.2 Películas de compressão
Películas de compressão (Ing: stress cutans), ou faces de
A classificação e descrição de películas segundo as normas compressão (Ing: pressure faces) são facilmente confundidas com
do Manual para a Descrição do Solo (INIA/UEM, 1995; página 50 e películas de argila na examinação no campo. Se a superfície do
51) foram adoptadas da FAO (1990). agregado for lisa e a película não tiver espessura, quando
Tabela II-1 Comparação de consistência de um Ferralsolo argiloso e um Vertissolo argiloso duma região subtropical
(fonte: Brasil, 1973)