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CAPÍTULO 14
ATRESIA DE VIA BILIAR COMO CAUSA DE
COLESTASE NEONATAL: UMA REVISÃO DE
LITERATURA
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vias biliares, levando à fibrose e obliteração das Esta entidade pode se manifestar em duas
mesmas, com o desenvolvimento de cirrose formas clínicas (Tabela 14.1): 1) do tipo em-
biliar. É a causa mais comum de colestase brionário ou fetal e 2) do tipo perinatal; a última
crônica em lactentes e crianças, sendo, por- forma foi responsável por 65% de todos os ca-
tanto, a indicação mais frequente de transplante sos em uma série. Em ambos os subtipos parece
hepático nessa faixa etária. (BALISTRERI et ser o resultado do processo inflamatório em
al., 1996) curso que produz esclerose completa ou parcial
dos ductos biliares. (SCHWEIZER, 1986;
DESMENT, 1992).
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diagnóstico dessa afecção quando ocorre dimi- - ALT) e das canaliculares (gama glutamiltrans-
nuição de seus níveis em duas dosagens suces- ferase - GGT e fosfatase alcalina - FA), as duas
sivas. (ROQUETE, 2000) Além disso, há últimas mais frequentemente elevadas que as
elevação das enzimas tissulares (aspartato ami- demais. (QUEIROZ, 2017)
notransferase - AST e alanina aminotransferase
Doenças intra-
Doenças extra-hepáticas
hepáticas
Peso de nascimento (média) 2680g 3230g
Início da acolia fecal (dias) 30 16
Frequência de fezes coradas (10 dias
79% 26%
de observação)
Fígado grande e de consistência
53% 87%
aumentada
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Pode ser utilizada para excluir o diagnóstico de hipertensão portal e cirrose biliar secundária,
AB por permitir a visualização do trato biliar. que constituem um quadro de colestase crônica
(QUEIROZ, 2017) (CARVALHO, et al., 2007).
Outros métodos auxiliares, porém pouco No que se relaciona à portoenterostomia, é
utilizados, são: a tubagem duodenal, cuja nega- possível que ocorra colangite bacteriana ascen-
tividade para bile sugere processo obstrutivo; a dente, sendo esta a complicação precoce mais
cintilografia hepatobiliar e colangiopancreato- frequente. Esse quadro ocorre em 40 a 60% das
grafia retrógrada endoscópica, que tem um crianças operadas, sendo mais comumente ob-
valor limitado para o diagnóstico de colestase servada nos pacientes que apresentam
neonatal. (QUEIROZ, 2017) drenagem biliar satisfatória, no primeiro ano
pós-operatório (CARVALHO, et al., 2007). Os
Tratamento principais agentes etiológicos são a Escherichia
O tratamento cirúrgico é indicado nas coli, Enterobacter cloacae, Klebsiella
causas extra-hepáticas de colestase, como cisto pneumoniae, Pseudomonas aeruginosa,
de colédoco e atresia das vias biliares, sendo a Acinetobacter baumanni e Salmonella typhi.
portoenterostomia ou cirurgia de Kasai o proce- Assim, a criança poderá apresentar um quadro
dimento terapêutico proposto (CARVALHO, et com febre, irritabilidade, diminuição do apetite,
al., 2007). vômitos, aumento da icterícia, colúria e acolia
Nesse procedimento cirúrgico, a drenagem fecal, ou então, apresentar, apenas, início súbito
biliar é estabelecida por anastomose delicada de icterícia ou acolia fecal, sem outros sinais ou
entre o porta hepatis (hilo hepático) e um seg- sintomas (CARVALHO, et al., 2007).
mento intestinal em Y de Roux, sem tensão em Diante disso, é essencial que durante o pri-
suas linhas de sutura (CARVALHO, et al., meiro ano pós-operatório, quadros caracteriza-
2007). dos por febre, alterações das enzimas hepáticas
Alguns pontos são fundamentais para o e/ou redução da pigmentação das fezes sejam
sucesso do procedimento e, por consequência, tratados como colangite (CARVALHO, et al.,
para a recuperação adequada, como: idade do 2007).
paciente no momento da cirurgia; extensão da Apesar dos grandes avanços da hepatologia
fibrose hepática; grau de lesão intra-hepática do pediátrica, apenas 11% dos pacientes submeti-
ducto biliar; número de episódios de colangite dos a portoenterostomia mostram sinais míni-
ascendente; experiência do cirurgião; local de mos de doença hepática crônica e, portanto, são
obstrução do ducto biliar; e o tipo de atresia considerados com chance de cura somente com
(embrionária ou fetal). (SOKOL, et al., 2003). a cirurgia de Kasai. (HADZIC, et al., 2003).
Além disso, algumas complicações pós- Entre 70 a 80% das crianças precisarão ainda de
operatórias podem influenciar na evolução da transplante hepático em suas primeiras 2 déca-
criança (CARVALHO, et al., 2007). das de vida. Atualmente, a sobrevivência a
Inicialmente, a criança pode apresentar as longo prazo de receptores de transplantes
complicações decorrentes da própria doença, corresponde a 80 a 90%, resultado de melhorias
como esteatorreia, desnutrição, deficiência das nas técnicas operatórias e nas terapias imunos-
vitaminas lipossolúveis, atraso no desenvolvi- supressoras (SOKOL, et al., 2003).
mento neuropsicomotor, icterícia, prurido,
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