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8 PERGUNTAS PARA ENTENDER O CONFLITO ENTRE

ISRAELENSES E PALESTINOS QUE JÁ DURA


SETE DÉCADAS
O conflito entre palestinos e israelenses, que se estende por pelo
menos sete décadas, atingiu uma tensão sem precedentes nos últimos anos.
O mais recente capítulo desta tensão começou em 7 de outubro,
quando militantes do Hamas lançaram mísseis e invadiram Israel.
As forças militares israelenses contra-atacaram e fizeram operações
na Faixa de Gaza. Até o momento, foram registrados centenas de mortos e
milhares de feridos de ambos os lados.
Além disso, civis e militares israelenses são mantidos como
reféns por integrantes do Hamas.
Essa é a mais recente escalada de um confronto longo e sangrento,
sem resolução próxima, que tem marcado o Oriente Médio há décadas.
1. Como começou o conflito?
A região da Palestina, entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo,
considerada sagrada para muçulmanos, judeus e católicos, pertencia
naqueles anos ao Império Otomano e era ocupada principalmente por
árabes e outras comunidades muçulmanas. Mas a forte imigração judaica,
encorajada pelas aspirações sionistas, começava a gerar resistência.
Após a desintegração do Império Otomano na Primeira Guerra
Mundial, o Reino Unido recebeu um mandato da Liga das Nações para
administrar o território da Palestina.
Mas, antes e durante a guerra, os britânicos fizeram várias promessas
aos árabes e judeus que mais tarde não foram cumpridas — porque o Reino
Unido já tinha dividido o Médio Oriente com a França, entre outras razões.
Isto causou um clima de tensão entre nacionalistas árabes e sionistas
que levou a confrontos entre grupos paramilitares judeus e gangues árabes.
Após a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto, a pressão para
estabelecer um Estado judeu aumentou. O plano original contemplava a
divisão do território controlado pela potência europeia entre judeus e
palestinos.
Após a fundação de Israel em 14 de maio de 1948, a tensão deixou de
ser uma questão local para se tornar uma questão regional.
No dia seguinte, o Egito, a Jordânia, a Síria e o Iraque invadiram o
território recém-criado. Foi a primeira guerra árabe-israelense, também
conhecida pelos judeus como guerra de independência ou de libertação.
Após o conflito, o território inicialmente planejado pelas Nações
Unidas para estabelecer um Estado Árabe foi reduzido pela metade.
Para os palestinos, começou a Nakba, a chamada “destruição” ou
“catástrofe”: o início da tragédia nacional. Cerca de 750 mil palestinos
fugiram para países vizinhos ou foram expulsos pelas tropas israelenses.
Em 1956, uma crise no Canal de Suez confrontaria o Estado de Israel
com o Egito. O problema não foi resolvido no campo de batalha, mas pela
pressão internacional sobre Israel, França e Inglaterra.
A luta teria uma conclusão em 1967, na Guerra dos Seis Dias. O que
aconteceu entre 5 e 10 de Junho teve consequências profundas e
duradouras.
Foi uma vitória esmagadora de Israel contra uma coligação árabe.
Israel capturou a Faixa de Gaza e a Península do Sinai do Egipto, a
Cisjordânia (incluindo Jerusalém Oriental) da Jordânia e as Colinas de Golã
da Síria. Meio milhão de palestinos viraram refugiados.
O último conflito árabe-israelense foi a Guerra do Yom Kippur, em
1973, que colocou o Egito e a Síria contra Israel e permitiu ao Cairo
recuperar o Sinai (entregue completamente por Israel em 1982). Gaza,
porém, seguiu sob controle israelense
Seis anos depois, o Egito tornou-se o primeiro país árabe a assinar a
paz com Israel, exemplo seguido apenas pela Jordânia anos depois.
2. Por que o Estado de Israel foi criado no Oriente Médio?
A tradição judaica indica que a área em que o Estado de Israel está
localizado é a Terra Prometida por Deus ao primeiro patriarca, Abraão, e
aos seus descendentes.
A área foi invadida na Antiguidade por assírios, babilônios, persas,
macedônios e romanos. Roma foi o império que deu nome à região como
Palestina e que, sete décadas depois de Cristo, expulsou os judeus após
combater os movimentos nacionalistas que buscavam a independência.
Com a ascensão do Islã, no século 7 d.C., a Palestina foi ocupada
pelos árabes e depois conquistada pelos cruzados europeus. Em 1516, foi
estabelecida a dominação turca que duraria até a Primeira Guerra Mundial,
quando foi imposto o controle britânico.
O Comitê Especial das Nações Unidas sobre a Palestina (UNSCOP)
declarou em seu relatório à Assembleia Geral, em 3 de setembro de 1947,
que as razões para o estabelecimento de um estado judeu no Oriente Médio
centravam-se em "argumentos baseados em fontes bíblicas e históricas", na
Declaração de Balfour de 1917, na qual o governo britânico se declarou a
favor de uma "nação" para os judeus na Palestina, e no mandato britânico
sobre a Palestina.
Ali foram reconhecidas a ligação histórica do povo judeu com a
Palestina e as bases para a reconstituição do "Lar Nacional Judaico"
naquela região.
Com o Holocausto contra milhões de judeus na Europa antes e
durante a Segunda Guerra Mundial, cresceu a pressão internacional para o
reconhecimento de um Estado nacional judeu.
Incapaz de resolver a polarização entre o nacionalismo árabe e o
sionismo, o governo britânico levou a questão às Nações Unidas.
Em 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral aprovou um plano
para a divisão da Palestina, que recomendava a criação de um estado árabe
independente, de um estado judeu e de um regime especial para a cidade de
Jerusalém.
O plano foi aceito pelos israelenses, mas não pelos árabes, que o
consideraram uma perda de territórios. É por isso que ele nunca foi
implementado.
Um dia antes de expirar o mandato britânico da Palestina, em 14 de
maio de 1948, a Agência Judaica para Israel, representante dos Judeus
durante o mandato, declarou a independência do Estado de Israel.
No dia seguinte, Israel solicitou a adesão às Nações Unidas, status que
finalmente alcançou um ano depois.
3. Por que existem dois territórios palestinos?
Em seu relatório à Assembleia Geral em 1947, o Comitê Especial das
Nações Unidas sobre a Palestina (UNSCOP), recomendou que o Estado
Árabe incluísse "a Galiléia Ocidental, a região montanhosa de Samaria e
Judéia, com exclusão da cidade de Jerusalém, e a planície costeira de
Ishdud até a fronteira egípcia."
Mas a divisão do território foi definida pela Linha do Armistício de
1949, estabelecida após a criação de Israel e da primeira guerra árabe-
israelense.
Os dois territórios palestinos são a Cisjordânia (que inclui Jerusalém
Oriental) e a Faixa de Gaza, que estão separados por cerca de 45 km. Eles
possuem áreas de 5.970 km2 e 365 km2, respectivamente (veja no mapa a
seguir).
A

Cisjordânia fica entre Jerusalém, reivindicada como capital tanto por


palestinos como por israelenses, e a Jordânia, a leste, enquanto Gaza é uma
faixa de 41 km de comprimento e entre 6 e 12 km de largura.
Gaza tem uma fronteira de 51 km com Israel, 7 km com o Egito e 40
km de costa no Mar Mediterrâneo.
Originalmente ocupada por israelenses que ainda mantêm o controle
da fronteira sul, a Faixa de Gaza foi capturada por Israel na guerra de 1967
e só desocupada em 2005, embora mantenha até hoje um bloqueio aéreo,
marítimo e terrestre que restringe a circulação de mercadorias, serviços e
pessoas.
A Faixa de Gaza é atualmente controlada pelo Hamas, o principal
grupo islâmico palestino, que nunca reconheceu acordos assinados entre
outras facções palestinas e Israel.
A Cisjordânia, pelo contrário, é governada pela Autoridade Nacional
Palestina, o governo reconhecido internacionalmente, cuja principal facção,
a Fatah, não é islâmica, mas, sim, secular.
4. Os palestinos e os israelenses nunca assinaram a paz?
Após a criação do Estado de Israel e o deslocamento de milhares de
pessoas que perderam as próprias casas, o movimento nacionalista palestino
começou a reagrupar-se na Cisjordânia e em Gaza, controladas
respectivamente por Jordânia e Egito, e em campos de refugiados criados
em outros Estados árabes.
Pouco antes da guerra de 1967, organizações palestinas como a Fatah
— liderada por Yasser Arafat — formaram a Organização para a Libertação
da Palestina (OLP) e lançaram operações contra Israel, primeiro a partir da
Jordânia e depois do Líbano.
Mas estes ataques também incluíram alvos israelenses em território
europeu, como aviões, embaixadas ou atletas.
Depois de anos de ataques palestinos e assassinatos seletivos pelas
forças de segurança israelenses, a OLP e Israel assinaram os acordos de paz
de Oslo em 1993, nos quais a organização palestina renunciava à “violência
e ao terrorismo” e reconhecia a “lei” de Israel “para existir em paz e
segurança".
A organização islâmica palestina Hamas nunca aceitou esse
reconhecimento.
Na sequência dos acordos assinados em Oslo, foi criada a Autoridade
Nacional Palestina, que representa os palestinos nos fóruns internacionais.
O presidente da autoridade é eleito por voto direto e ele, por sua vez,
escolhe um primeiro-ministro e os membros do gabinete. As autoridades
civis e de segurança controlam as áreas urbanas (Área A de acordo com
Oslo), enquanto apenas os representantes civis – e não de segurança –
controlam as áreas rurais (Área B).
Jerusalém Oriental, considerada a capital histórica dos palestinos, não
está incluída neste acordo.
Jerusalém é um dos pontos mais conflituosos entre as partes
envolvidas.
5. Quais são os principais pontos de conflito entre palestinos e
israelenses?
O atraso no estabelecimento de um Estado Palestino independente, a
construção de colônias israelenses na Cisjordânia e a barreira de segurança
em torno desse território — condenada pelo Tribunal Internacional de
Justiça em Haia — complicaram o processo de paz.
Mas estes não são os únicos obstáculos, como ficou claro pelo
fracasso das últimas negociações de paz entre os dois grupos em Camp
David, nos Estados Unidos, em 2000.
À época, o então presidente americano Bill Clinton não conseguiu
estabelecer um acordo entre Arafat e o primeiro-ministro israelense, Ehud
Barak.
As diferenças que parecem inconciliáveis são:
Jerusalém: Israel reivindica a soberania sobre a cidade (sagrada para
judeus, muçulmanos e cristãos) e afirma que é a sua capital depois de tomar
a parte oriental em 1967. Isto não é reconhecido internacionalmente. Os
palestinos querem que Jerusalém Oriental seja a capital deles.
Fronteiras e terreno: os palestinos exigem que o futuro Estado esteja
em conformidade com as fronteiras anteriores a 4 de Junho de 1967, antes
do início da Guerra dos Seis Dias. Israel rejeita a proposta.
Assentamentos: as colônias, ilegais de acordo com o Direito
Internacional, foram construídas pelo governo israelense nos territórios
ocupados por Israel após a guerra de 1967. Na Cisjordânia e em Jerusalém
Oriental, há mais de meio milhão de colonos judeus.
Refugiados palestinos: quantos refugiados existem depende de quem
está fazendo essa conta. A OLP diz que há 10,6 milhões, dos quais quase
metade estão registrados nas Nações Unidas. Os palestinos sustentam que
os refugiados têm o direito de regressar ao que hoje é considerado como
território de Israel. Israel, na contramão, diz que abrir as portas destruiria a
identidade do Estado judeu.
6. A Palestina é um país?
As Nações Unidas reconheceram a Palestina como um “Estado
observador não membro” no final de 2012. Com isso, ela deixou de ser uma
“entidade observadora”.
A mudança permitiu que os palestinos participassem dos debates da
Assembleia Geral e aumentassem as possibilidades de adesão às agências
da ONU e a outros órgãos.
Mas a votação não criou o Estado palestino de fato. Um ano antes, os
palestinos tentaram, mas não obtiveram apoio suficiente no Conselho de
Segurança.
Mais de 70% dos membros da Assembleia Geral da ONU (138 de
193) reconhecem a Palestina como um Estado.
7. Por que os EUA são o principal aliado de Israel? Quem apoia os
palestinos?
Em primeiro lugar, é preciso considerar a existência de um lobby pró-
Israel significativo e poderoso nos Estados Unidos. Isso leva ao fato de a
opinião pública ser geralmente favorável à posição israelense. Com isso, é
virtualmente impossível que um presidente americano retire o apoio a
Israel.
Além disso, ambas as nações são aliadas no campo militar: Israel é
um dos maiores beneficiários da ajuda americana e a maior parte dela vem
na forma de subsídios para a compra de armas.
Contudo, em Dezembro de 2016, durante o governo do presidente
Barack Obama, foi dado um passo atípico na política dos EUA em relação a
Israel: o país não vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU
que condenava a política de colônias israelenses.
Mas a chegada de Donald Trump à Casa Branca deu um novo impulso
à relação entre os Estados Unidos e Israel, que se refletiu na transferência
da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém.
Com isso, os Estados Unidos foram o primeiro país do mundo a
reconhecer aquela cidade como a capital de Israel.
Nos últimos meses de presidência, Trump conseguiu que quatro
países árabes ricos normalizassem as relações com Israel.
O atual presidente americano, Joe Biden, assumiu o poder com a
intenção de fugir do arriscado conflito Israel-Palestina, além de vê-lo como
um problema que requer grande capital político.
A administração Biden continua a apoiar o reconhecimento de Israel,
mas adotou uma diplomacia mais cautelosa.
Os palestinos não têm o apoio aberto de nenhuma potência.
Na região, o Egito deixou de apoiar o Hamas após a deposição da
Irmandade Muçulmana — historicamente associada ao grupo palestino.
A Síria, o Irã e o grupo libanês Hezbollah são os principais apoiadores
da Palestina.
A causa palestina tem muitos simpatizantes ao redor do mundo, mas
até o momento isso não se traduziu em avanços concretos.
8. O que precisa acontecer para uma paz duradoura entre Israel e
Palestina?
Por um lado, os israelenses precisariam apoiar um Estado soberano
para os palestinos que incluísse o Hamas, acabando com o bloqueio em
Gaza e as restrições de movimento na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental.
Por outro, os grupos palestinos deveriam renunciar à violência e
reconhecer o Estado de Israel.
Outro ponto de acordo razoável precisaria envolver as fronteiras, as
colônias israelenses e a volta de refugiados palestinos.
Porém, desde 1948 (o ano da criação do Estado de Israel,) muitas
coisas mudaram, principalmente a configuração dos territórios disputados
após as guerras entre árabes e israelenses.
Para Israel, estes são fatos consumados. O palestinos não concordam e
insistem que as fronteiras devem ser as que existiam antes da guerra de
1967.
Além disso, enquanto no campo de batalha as coisas ficam cada vez
mais incontroláveis na Faixa de Gaza, há uma espécie de guerra silenciosa
na Cisjordânia com a construção contínua de colônias israelenses, o que
reduz o território palestino nas áreas autônomas.
Mas talvez a questão mais complicada devido ao simbolismo seja
Jerusalém, a capital de palestinos e israelenses.
Tanto a Autoridade Nacional Palestina, que governa a Cisjordânia,
como o grupo Hamas, em Gaza, reivindicam a parte oriental como a capital,
apesar de Israel a ter ocupado em 1967.
Um acordo definitivo nunca será possível sem resolver este ponto
sensível.

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