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a reconstrução dos movimentos do autor estudado, situando cada uma de suas ideias em
relação àquelas que a antecedem e a sucedem no interior do texto onde se encontram,
mediante o que adquirem o seu sentido; bem como, posteriormente, em relação ao
sistema de pensamento do autor, no interior da sua obra.
É no contexto de uma crítica dirigida às formas pelas quais se faz a pesquisa histórica
acerca do sistema de pensamento de um filósofo que Victor Goldschmidt (1949/1970),
em Tempo histórico e tempo lógico na interpretação dos sistemas filosóficos,
a necessidade de se compreender o fenômeno de superestimação sexual, segundo
o pensamento de Freud, mediante as articulações de uma estrutura global, de que recebe
sua plena significação.
É certo que uma tal atitude, própria a quem não quer julgar um autor, mas compreendê-
lo, exige um esforço penetrante de inteligência, uma rigorosa disciplina intelectual, a
ausência de todo preconceito e dogmatismo. Exige que o intérprete se faça discípulo –
ainda que provisoriamente – e discípulo fiel. O que é lamentável, entretanto, é que sob a
influência de certo relativismo em moda, mal compreendido aliás, se veja recusar por
alguns a própria possibilidade teórica dessa objetividade desejável para todo historiador.
Lançando mão de argumentos capciosos ou sofísticos, um historicismo superficial
torna-se apenas cômodo pretexto para dogmatismos fáceis e intolerantes: “refuta-se”,
“julga-se”, critica-se um autor e sua doutrina, sem ter-se levado a cabo a exigência de
compreensão objetiva, e postulando-se paradoxalmente o caráter irrealizável da
pretensão a uma tal compreensão.
O primeiro método, que se pode chamar dogmático, aceita, sob ressalva, a pretensão dos
dogmas a serem verdadeiros, e não separa a léxis (A. Lalande) da crença; o segundo,
que se pode chamar genético, considera os dogmas como efeitos, sintomas, de que o
historiador deverá escrever a etiologia (fatos econômicos e políticos, constituição
fisiológica do autor, suas leituras, sua biografia, sua biografia intelectual ou espiritual
etc.).
Não é senão em aparência que o outro método, o genético, escapa a esse perigo. Ele
busca descrever a etiologia (fatos econômicos, sociais e políticos, constituição
psicofisiológica do autor, sua formação etc.) dos dógmata considerados, então, como
meros efeitos desses fatores. É lícito, sem dúvida, e cientificamente interessante, estudar
um autor do ponto de vista sociológico, psicológico ou psicanalítico. Nada haveria a
dizer contra tal empreendimento se não fora sua frequente tentação de “esquecer” a
pretensão das doutrinas à verdade, de desprezar a especificidade propriamente
filosófica, e de reduzir a filosofia à condição de mero resultado, geneticamente
reconstituível a partir de elementos
infraestruturas conhecidos.
dão um pensamento desenvolvido, onde as “teses” não valem por causa de seu
conteúdo material, mas pretendem-se verdadeiras em razão dos movimentos e processos
de investigação de que resultaram.
A pesquisa, em matéria de filosofia, não procede somente da verdade [crença], mas faz
corpo com ela. Assim, para compreender uma doutrina, não é suficiente não separar a
léxis [a forma discursiva] da crença, a regra [preconizada pelo método], de sua prática; é
preciso, após o autor, refazer os movimentos concretos, aplicando as regras [do método
utilizado pelo autor em questão] e chegando a resultados que, não por causa de seu
conteúdo material, mas em razão desses movimentos, se pretendem verdadeiros. Ora,
esses movimentos se nos apresentam na obra escrita. (Goldschmidt, 1949/1970, p. 142,
grifos do autor).
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Mi «retorno a Freud» significa simplemente que los lectores se preocupen por saber qué es lo que
Freud quiere decir, y la primera condición para ello es que lo lean con seriedad. Y no basta, porque
como una buena parte de la educación secundaria y superior consiste em impedir que la gente sepa leer,
es necesario todo un proceso educativo que permita aprender a leer de nuevo un texto. […] no basta con
hablar de método experimental para saberlo practicar. Sentado esto, saber leer un texto y comprender lo
que quiere decir, dar-se cuenta de que “modo” está escrito (en sentido musical), en que registro, implica
muchas otras cosas, y sobre todo, penetrar en la lógica interna del texto en cuestión. […] La mejor
manera de practicar la crítica sobre textos metodológicos o sistemáticos es la de aplicar al texto en
cuestión el método crítico que él mismo preconiza. Así, al aplicar la crítica freudiana a los textos de
Freud, se llegan a descubrir muchas cosas.
Citamos, algumas linhas atrás, uma frase do autor sôbre a
necessidade de compreender-se a religião, em Platão, na sua inserção
natural no contexto filosófico, isto é, no seu caráter de
momento interno a ser apreendido segundo as articulações de
uma estrutura global, de que recebe sua plena significação. Estas
considerações permitem-nos abordar ràpidamente um tema
o do
método em história da filosofia.