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Brasília-DF.
Elaboração
Produção
APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7
UNIDADE I
A MÚSICA MODERNA (1894-1938)......................................................................................................... 9
CAPÍTULO 1
A CENA MUSICAL MODERNA.................................................................................................... 9
CAPÍTULO 2
PRINCIPAIS COMPOSITORES MODERNOS................................................................................. 15
CAPÍTULO 3
REPERTÓRIO SELECIONADO/ MÚSICA MODERNA..................................................................... 27
UNIDADE II
A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)............................................................................................. 42
CAPÍTULO 1
CENA MUSICAL NO PÓS-GUERRA............................................................................................ 42
CAPÍTULO 2
PRINCIPAIS COMPOSITORES DO PÓS-GUERRA......................................................................... 49
CAPÍTULO 3
REPERTÓRIO SELECIONADO/ MÚSICA NO PÓS-GUERRA........................................................... 58
UNIDADE III
CONTEMPORANEIDADE (1967-2019).................................................................................................... 70
CAPÍTULO 1
CENA MUSICAL CONTEMPORÂNEA......................................................................................... 70
CAPÍTULO 2
PRINCIPAIS COMPOSITORES CONTEMPORÂNEOS.................................................................... 79
CAPÍTULO 3
REPERTÓRIO SELECIONADO/ MÚSICA CONTEMPORÂNEA ...................................... 84
REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 92
Apresentação
Caro aluno
Conselho Editorial
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Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.
Atenção
5
Saiba mais
Sintetizando
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Introdução
Acontecimentos marcantes, ocorridos na segunda metade do séc. XIX e na virada do
XIX para o XX, deflagraram, na humanidade, o surgimento de uma nova percepção
de mundo. Em 1859, Darwin publicou “A Origem das Espécies”, propondo a teoria
evolucionista de seleção natural, que afrontava dogmas ainda em voga; 1867 foi o ano
de lançamento de “O Capital”, livro em que Marx fundamentava sua teoria de que a
história é uma luta de classes; em 1872, Nietszche confrontava a tradição filosófica
com “A Origem da Tragédia”; na virada do século, em 1900, Freud publicou “A
Interpretação dos Sonhos”, abalando a própria noção de identidade por meio de uma
nova ciência, a Psicanálise; e não tardaria para que Einstein demolisse as fundações
da Física com sua Teoria da Relatividade, em 1905.
A possibilidade da reprodutibilidade técnica por meio de gravações, por sua vez, alçou a
outro patamar um campo musical ainda pouco explorado economicamente, o da música
popular, afastando-o da associação com o folclore e viabilizando o surgimento de obras
singulares e, muitas vezes, complexas, por meio de estilos como o Jazz, o Rock e a MPB.
Esta apostila tratará das diversas correntes estéticas surgidas a partir das
experiências fascinantes realizadas pelos músicos dos séculos XX e XXI, que, ao
mesmo tempo em que refletiram as transformações da sociedade, ajudaram a
moldar a sensibilidade do homem contemporâneo.
Embora o enfoque aqui seja a música erudita contemporânea, a partir de certo ponto
será necessário abordar outros universos musicais. Isso porque, devido aos cada vez
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mais recorrentes cruzamentos ocorridos entre as vertentes eruditas e populares – e
que têm provocado reavaliações no próprio conceito de música “erudita”, ou “clássica”,
ou “de concerto”, ou “séria” de “alto repertório” etc. –, certos trabalhos produzidos
nas diversas áreas, do Jazz ao Rock, do Pop à Música Popular Brasileira, que tragam
similaridades estéticas e técnicas com as obras significativas dos séculos XX e XXI, serão
também comentados. Assim, a Unidade III, especialmente, confrontará a intersecção
dos gêneros e estilos, incorporando compositores e obras expressivas.
Objetivos
»» Identificar e contextualizar as correntes estéticas musicais mais
significativas dos séculos XX e XXI.
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A MÚSICA MODERNA UNIDADE I
(1894-1938)
CAPÍTULO 1
A Cena Musical Moderna
As obras de Mahler e Strauss são consideradas, hoje, como uma “ponte” entre a música
Romântica e a Moderna, por alcançarem as fronteiras da atonalidade. No caso do
primeiro, resultado de profunda busca interior, e, no caso do segundo, devido à extrema
criatividade e pesquisa.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Fonte: https://www.rawpixel.com/image/547294/monet-water-lilies-painting
Impressionismo
Termo proposto pela crítica francesa, de forma negativa, para classificar a estética de
um grupo de pintores da segunda metade do séc. XIX (como Édouard Manet, Claude
Monet e August Renoir), cujas obras buscavam captar a fugacidade da luz sobre o
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
objeto. O resultado desse processo eram quadros que necessitavam de uma distância
conveniente para serem apreciados, parecendo borrados e imprecisos quando vistos de
perto. Afrontando a crítica, os artistas incorporaram a denominação.
Para o compositor e regente francês Pierre Boulez, a música moderna se inicia com
uma peça de Claude Debussy: Prélude à L’après-midi d’un faune. Por esse motivo,
optamos por delimitar o primeiro capítulo dessa apostila a partir do ano de lançamento
da obra, 1894.
Modalismo
A música erudita ocidental estabelecida entre os séc. XVII e início do séc. XX baseava-
se na redução do número de modos disponíveis a dois, o maior e o menor, contrastando
com a música anterior a esse período, que contava com os diversos modos eclesiásticos.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
motivo, por Bartók e pelo o inglês Peter Maxwell Davies, entre outros. Bartók
também fez uso de um modo que descobriu na música romena, que consistia numa
metade inferior lídia e uma superior mixolídia (GRIFFITHS, 1995, p.141), ou seja:
dó-ré-mi-fá sustenido-sol-lá-si bemol-dó.
Atonalidade
O termo refere-se às peças musicais composta por autores como Stravinsky, Ives e
o russo Alexander Scriabin que apresentam características pós-tonais, nas quais as
polarizações típicas do sistema tornam-se imprecisas. No entanto sua aplicação mais
comum refere-se às composições de Schoenberg e seus discípulos criadas anteriormente
ao desenvolvimento do sistema dodecafônico.
Música Dodecafônica
Arnold Schoenberg desenvolveu os princípios da música dodecafônica durante a
década de 1920. Buscava, dessa forma, apresentar uma alternativa ao já desgastado
sistema tonal.
Para isso, considerou as doze notas do sistema tonal, destituindo-as das antigas
funções tonais e valorizando os intervalos resultantes entre elas. Propôs, então,
uma organização democrática, criando as partituras a partir de uma série que
deveria conter todas as notas da escala cromática sem que um único som fosse
repetido, ressaltando assim as particularidades intervalares.
A série dodecafônica aparece não apenas em sua forma original, mas através de três
desdobramentos: inversão (notas descendentes tornam-se ascendentes e vice-versa),
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Outro elemento que ganhou importância foi a textura, o que pode ser observado
em composições de Debussy como La Mer, obra na qual esse parâmetro parece
orientar todo o desenvolvimento musical. Na segunda metade do século XX, a maior
exploração dos parâmetros musicais continuaria vigente, como, por exemplo, no caso
da investigação da dinâmica realizada pelo norte-americano Morton Feldman por meio
de suas delicadas peças, às vezes no limite mínimo da audibilidade.
Neoclassicismo
Num movimento inverso, alguns compositores voltaram-se para preceitos do séc. XVIII
ou anteriores, porém, por meio de perspectivas modernas e muitas vezes irônicas. A
primeira obra relevante apontada como neoclássica é Pulcinella, de Stravinsky, obra
para três cantores e orquestra de câmara baseada em árias e peças instrumentais
atribuídas ao compositor do período barroco Giovanni Battista Pergolesi, e realizada
sob encomenda, para os Balés Russos. Já Villa-Lobos referenciou-se em Johann
Sebastian Bach para compor as Bachianas Brasileiras. Ravel, Prokofiev e o francês
Francis Poulenc são exemplos de outros autores atraídos pelo neoclassicismo.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Além disso, a ampla presença de pausas, como ocorre em diversas obras de Webern,
fragmentaram de tal forma as melodias que muitas delas passaram a não mais serem
reconhecidas como tal, originando a chamada “textura pontilhista”. José Miguel Wisnik
relaciona o grande índice de ruído e silêncio presente na música de compositores como
Stravinski, Schoenberg e Varèse a uma resposta, no campo artístico, à eclosão da
Primeira Guerra Mundial:
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Boccioni-The_Noise_of_the_Street_detail.jpg
1 O Futurismo foi um movimento artístico italiano idealizado pelo poeta e jornalista Filippo Tommaso Marinetti, que propunha
uma estética agressiva e atualizada com o novo século. O autor chegou a afirmar que “um carro a motor roncando... é mais belo
que a Vitória da Samocrácia”. Os preceitos do movimento podem ser observados na pintura e escultura de Balla, Boccioni e
Severini, e na música de Russolo.
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CAPÍTULO 2
Principais Compositores Modernos
Compositor alemão. Em 1878 teve uma partitura sua apresentada publicamente pela
primeira vez, gerando a expectativa de que seria o sucessor espiritual de Brahms. Porém,
em meados da década de 1880 mudou completamente de rumo, passando a admirar
e se deixar influenciar pelas obras mais ousadas do húngaro Franz Liszt e do alemão
Richard Wagner. Compôs obras sinfônicas, óperas e inúmeras canções.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Música de Mobiliário, peças instrumentais feitas para serem ignoradas devido à sua
função de compor a decoração da casa, e que foram apontadas como precursoras do
minimalismo; e Socrate, um canto de meia hora influenciado pelo cantochão e sem
nenhum acompanhamento instrumental.
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Vassily_kandinsky,_improvvisazione_XIV,_1910.JPG
3 Kandinsky tornou-se amigo de Schoenberg, que também pintava, e na correspondência de ambos se observa o ímpeto de se
superar técnica e tradição.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Após os primeiros estudos e composições em Viena, onde nasceu, compôs sua primeira
obra significativa em 1899, o sexteto de cordas Verklärte Nacht, combinando harmonia
wagneriana e desenvolvimento brahmsiano. Nas obras seguintes, harmonias não
resolvidas e elaboradas polifonias foram utilizadas para transmitir estados emocionais
profundos, como nas Gurrelieder, de 1900 e no poema sinfônico Pelleas und Melisande,
de1903. Após uma fase em que investiu no gradativo abandono das regiões tonais,
chocou o establishment com aquela que seria sua obra mais célebre, Pierrot Lunaire,
já marcadamente atonal. Ensinando em Viena, desenvolveu os princípios do sistema
dodecafônico e lançou em 1923 as primeiras peças seriais, dedicando-se a essa técnica
pelos próximos anos. Em 1933 começou a compor sua ópera Moses und Aron e mudou-
se ao final desse ano para os EUA, onde permaneceu até o resto de sua vida, compondo
e ensinando na UCLA.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Também era atraído por esquemas secretos, como palíndromos (sua ópera Lulu é
dividida em duas partes simétricas, cuja segunda é um palíndromo exato da primeira)
e proporções aritmétricas, e, no entanto, o alto nível de elaboração jamais interferiu na
dramaticidade de suas obras.
Desde que começou as primeiras obras atonais, na década de 1900, estas foram ficando
cada vez menores, ao ponto de a última das 3 Pequenas Peças para Violoncelo e Piano
consistir em apenas 20 notas. Entre 1915 e 1926 encontrou no gênero canção um veículo
para suas ideias. Ao adotar o sistema dodecafônico, em 1924, descobriu a aptidão da
técnica para o cânone rigoroso e a variação simetricamente padronizada, investindo
doravante nesse estilo. A partir daí e ao contrário de Schoenberg, aplicou o sistema
dodecafônico em tudo que compôs, de peças instrumentais a canções e cantatas. O
autor organizou de forma mais compacta as relações de alturas estabelecidas pelo
sistema dodecafônico, chegando a séries de apenas 3 ou 4 notas.
Acolhido por artistas da geração seguinte, como Boulez, Stockhausen e Berio, que
admiravam a organização extrema de suas composições, influenciou na criação do
serialismo integral desenvolvido por eles. Por outro lado, o efeito textural resultante da
recorrência de notas curtas e pausas em muitas de suas peças foi denominado “textura
pontilhista”, influenciando no surgimento da chamada “música textural”. Sua morte,
em 1945, atingido por engano pelo tiro de um soldado americano que ainda não tinha
sido informado sobre o término da guerra, simboliza também o final da primeira fase do
experimentalismo musical no séc. XX, que foi seguida por uma ampliação dos conceitos
originais lançados pelos primeiros compositores modernos.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Após compor as primeiras obras, uma das quais dedicada a Korsakov – a Sinfonia nº1,
de 1907 –, Stravinsky recebeu uma encomenda do empresário Sergei Diaghilev para
compor uma partitura para os Balés Russos. Diaghilev iniciou suas atividades em 1908
impactando a estética teatral, trabalhando em Paris, no ano seguinte, já na direção dos
Balés Russos. Dessa forma, em 1910, estreava O Pássaro de Fogo, primeira de uma
série de composições do músico para esse grupo de dança – a segunda obra, Petruchka,
apresentada em 1911, é considerada sua primeira obra realmente original.
Mas foi sua terceira colaboração com Diaghilev a que maior impacto causou, dividindo
o público entre aplausos e vaias, causando brigas durante o espetáculo, e, com o passar
do tempo, tornando-se uma das obras mais emblemáticas de todo o século XX. Trata-
se de A Sagração da Primavera, estreada em 1913. O caráter primitivo e violento da
obra inaugurava um novo capítulo na história da música, imbuindo a cultura erudita
de uma renovação vital e necessária. Trazendo o ritmo para o primeiro plano, o autor
desarticulou toda uma estética sonora até então baseada na organização das alturas
musicais. Até o fim da primeira grande guerra Stravinsky manteve laços com as
fontes russas, encantando as plateias européias por meio de um apelo exótico. Após
essa fase, voltou-se para a tradição musical ocidental, sendo considerado o primeiro
compositor neoclássico. Em sua última fase, já radicado nos Estados Unidos, acolheu,
surpreendentemente, o serialismo de Schoenberg. Sua versatilidade musical e obra
dividida em fases contrastantes lhe rendeu comparações com o pintor Pablo Picasso,
outro pesquisador inconformado.
Fonte: https://www.wikiart.org/es/juan-gris/retrato-de-pablo-picasso-1912
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
A partir de 1933, depois de longo período ausente de sua terra natal, voltou algumas
vezes à União Soviética, estabelecendo residência definitiva em 1936. Lá, encontrou
uma política oficial que exigia dos artistas maior comunicação com o público.
Por esse motivo, considera-se que a obra mais relevante de Shostakovich deve
ser desemaranhada daquela que criou como compositor “oficial” que produzia
propaganda política sob ordens, obrigado a utilizar uma linguagem acessível para
maior aproximação com as massas. Entre as obras importantes, compôs 15 sinfonias
que se destacam pela qualidade e pela quantidade, num período em que o gênero já
não possuía o mesmo apelo que no século anterior.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Dessa forma, percebeu que poderia redefinir a tonalidade por meio dos modos e
desenvolver formas eficientes a partir da variação constante de pequenos motivos.
Notou também que os ritmos poderiam ser mais bem explorados, além dos binários e
ternários. Impressionado com A Sagração da Primavera, de Stravinsky, criou uma de
suas partituras mais exuberantes, O Mandarim Maravilhoso, com ritmos impetuosos
e grande colorido orquestral. Uma de suas últimas obras, Concerto para Orquestra, é
hoje amplamente executada.
O autor, que começou a tocar órgão numa igreja batista aos 14 anos e a criar peças
musicais por volta dos 20, não seguiu carreira musical, tornando-se corretor de seguros
e compondo esporadicamente e em isolamento, antes de praticamente abandonar
a música na década de 1920. A despeito do pouco tempo dedicado, sua obra é
surpreendentemente extensa.
Além disso, não teve nenhuma peça publicada antes de 1920, quase nenhuma de
suas peças foi ouvida antes de 1930, e muitas das mais importantes só foram tocadas
após sua morte. Porém, graças à publicação por Cowell de movimentos orquestrais
e canções e aos concertos públicos com suas obras por Slonimsky e Webern, sua
música chamou a atenção.
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acentuando a crítica social presente nas montagens. Entre elas, destacam-se a Ópera
dos Três Vinténs e Ascenção e Queda da Cidade de Mahagonny.
Quando os nazistas tomaram o poder em 1933, fugiu para Paris, e, em 1935 radicou-se
nos Estados Unidos, onde trabalhou como compositor de musicais para a Broadway.
Compositor brasileiro. Seu pai, músico amador, tocava violoncelo, fagote e clarinete, e
lhe ensinava violoncelo, mas faleceu muito cedo, quando Heitor contava apenas com 11
anos. Sem a oportunidade de uma educação musical sistemática devido às dificuldades
financeiras (esta só viria a ocorrer mais tarde, e por breve período), o rapaz envolveu-se
com diversos gêneros de música, dos mais populares a requintadas peças camerísticas,
o que contribuiu para a originalidade de sua escrita.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
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CAPÍTULO 3
Repertório Selecionado/ Música
Moderna
Apesar de menos complexa que as outras sinfonias do autor, a “Titã” expõe seu espírito
angustiado, que frequentemente buscava nas memórias de sua infância as melodias
e ritmos – no terceiro movimento da sinfonia, por exemplo, há a alusão à melodia de
“Bruder Martin”, na verdade o “Frère Jacques” dos franceses. Porém, a alegre melodia é
transfigurada para o tom menor e acrescida de dissonâncias, resultando numa dolorosa
paródia.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:The_Kiss#/media/File:El_beso(Gustav_Klimt).jpg
A peça é apontada pela crítica como a primeira grande obra de Debussy. Baseada em
poema de Stéphane Mallarmé (1842-1898), é uma das mais sensuais obras do autor,
ilustrando os desejos de um fauno ao calor da tarde.
Sua introdução com uma sinuosa melodia cromática e descendente, realizada pela
flauta, inaugurou a música moderna. E a delicada orquestração subsequente, que
envolve trompete e harpa e busca evocar o clima tranquilo da tarde, já traz a marca de
uma sutil instabilidade, característica do autor nas próximas obras de Debussy.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Um marco na literatura do piano solo, pela maneira como o autor aborda a articulação
do instrumento. Ravel é apontado pela crítica como o último grande “clássico”, e,
embora na maioria de suas composições o autor priorizasse frases delineadas com
precisão, algumas de suas obras podem ser associadas ao Impressionismo pela
dissolução da linha melódica observada na escrita deste estilo.
É o caso dessa obra, que, embora não abandone o campo da tonalidade, possui uma
harmonia expandida, com o emprego pouco usual do acorde de sétima. Segundo
Ross (2007, p.99), em diversas peças para piano da primeira década do novo século
“Ravel realizou uma espécie de revolução de veludo, renovando a linguagem musical
sem perturbar a paz”, caso de Jeux d’eau, em que “a melodia e o acompanhamento se
desmaterializam em respingos e meneios que imitam o movimento da água de uma
fonte”.
Baseada em texto de Oscar Wilde, essa ópera é ainda hoje considerada revolucionária.
No texto, a princesa Salomé, não correspondida em seu amor por João Batista, pede a
cabeça do profeta ao seu padrasto, Herodes. Seduzindo o padrasto, que a desejava, com
uma dança de sete véus, a princesa recebe a cabeça de João Batista em uma bandeja de
prata, e a beija. Herodes, horrorizado, ordena que Salomé seja morta.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
no texto, pricipalmente na rapsódia dividida em três episódios Dança dos Sete Véus,
um dos raros momentos da ópera que podem ser vistos de forma isolada.
A obra foi chamada por Debussy de “três esboços sinfônicos”, e seu encanto provém
da maneira peculiar com que o autor trata a orquestração. O próprio desenvolvimento
textural da obra sugere o movimento do mar.
O tempo musical é extremamente fluido, traço que se tornou comum em muitas das
obras de Debussy. Já a harmonia considera os acordes por sua sonoridade única,
desprezando os encadeamentos ou qualquer tipo de direcionamento – procedimento
que se tornou uma dos características mais marcantes do compositor.
Composta a partir de versos do poeta belga Albert Giraud (em tradução alemã de Otto
Erich Hartleben) e sob encomenda para a atriz e cantora Albertine Zehme, foi dividida
em três partes de sete recitações cada uma, e tornou-se a obra mais popular do autor.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Diversas técnicas de composição são utilizadas, dos cânones e fugas dos antigos
mestres flamengos à livre associação de ideias. Em algumas das recitações, pequenas
células geradoras de três ou quatro notas engendram todo o discurso, o que alguns
consideram uma antecipação do sistema dodecafônico.
Fonte: http://www.essential-humanities.net/western-art/painting/modern/
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Mas talvez a maior contribuição da obra tenha sido delegar ao ritmo a função de
elemento organizador do discurso, contrariando quase toda a música composta
anteriormente, que relegava a esse parâmetro musical o papel de suporte para as
melodias e harmonias.
Sagração foi a terceira escrita sob encomenda para os Balés Russos, companhia de
danças capitaneada pelo empresário russo Sergei Diaghilev (1872-1929). As outras
foram O Pássaro de Fogo e Petruchka. Diaghilev foi um dos principais incentivadores
da música nova, encomendando, para integrar seus inovadores espetáculos, diversas
obras para compositores como Debussy (Jeux), Ravel (Daphnis et Chloé) e Richard
Strauss (Josephslegende).
Webern compôs seu ciclo orquestral Seis Peças Op. 6 em 1909 (a peça só foi
apresentada ao público em 1913), ainda sob o impacto da morte da mãe anos antes,
em 1906. Nessa delicada obra, cuja orquestração sutil atenua a aridez do atonalismo,
o compositor expõe as etapas de sua experiência pessoal. Pressentimento, choque e
lembrança se sucedem, e a imagem de uma procissão funerária é evocada pelo arranjo
com ênfase nos instrumentos de sopro: trompas, trompetes, trombones são tocados
com grande intensidade e no limite do ruído, e o solo agudo de um clarinete em mi
bemol é percebido como um lamento, para ser respondido pela flauta em região grave
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
A partitura de balé foi encomendada pela atriz e dançarina Pastora Imperio em 1915,
e composta inicialmente para o conjunto de câmara que estava disponível para o
espetáculo, sendo no ano seguinte rearranjada para orquestra sinfônica, forma como
se tornou conhecida tanto nos palcos de dança como nas salas de concerto. A obra está
entre as mais exuberantes do artistas e apresenta grande riqueza de timbres, que inclui,
além da orquestra, piano e voz feminina.
O enredo diz respeito ao amor de Candelas por Carmelo, relação prejudicada pela
interferência do fantasma do antigo amor da cigana, que a persegue e atormenta com
seu ciúme. Carmelo concebe um estratagema para que o fantasma se apaixone por
outra moça, Lucía, o que, de fato, ocorre, fazendo com que o casal seja deixado em paz.
Contendo várias seções distintas, a partitura inclui a Dança Ritual do Fogo, uma das
mais célebres páginas do compositor. Com uma impressionante economia de meios,
De Falla criou uma peça cujo espírito representa fidedignamente à cultura cigana.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Muitas das obras consequentes de Stravinsky seguiram esse padrão. Entre as obras
neoclássicas, destacam-se o Octeto, de 1923, composto para flauta, clarinete, dois
fagotes, dois trompetes e dois trombones, e o Concerto para Violino e Orquestra em Ré
Maior, de 1931, em que o autor levou o virtuosismo instrumental a um de seus grandes
momentos, resgatando a escrita barroca e levando o pastiche às últimas consequências
(seu movimento final é um tango). Porém, o espírito inconformista de Stravinsky não o
deixaria se acomodar em um só estilo, e o compositor ainda se interessaria por diversas
vertentes, do jazz à música serial.
Ainda na juventude, Prokofiev deixou a Rússia por muitos anos, pois a Revolução
deixava poucas condições para que o compositor investisse em sua carreira. Após
alguns concertos em Tókio e Yokohama, alcançou grande sucesso nos Estados Unidos e
em Paris, países onde obras como O Amor Por Três Laranjas, O Bufão e o Concerto nº
3 Para Piano e Orquestra foram consideradas obras originais. Amor por Três Laranjas
é uma ópera baseada na peça fantástica de Gozzi. Estreou em Chicago obtendo êxito
retumbante, que seria repetido em várias partes do mundo. A partitura pertence àquele
considerado o segundo período criativo do compositor.
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
pela violência e pelo ritmo como princípio gerador, mas sua orquestração de Bartók é
mais despojada e seca.
A partir dessa perspectiva, é possível observar em suas peças o uso de cromatismos não
apenas de maneira funcional, ou seja, como alteração de sustenido ou bemol apenas
para destacar a “nota-mãe” diatônica, mas como graus independentes da escala. Sua
preferência pelo intervalo de quarta, tanto melódico como harmônico, provém da
música folclórica magiar. Eclético, no entanto, Bartók não dispensa os progressos
harmônicos feitos pela música ocidental.
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Em muitos momentos, a densidade dos acordes é tamanha que estes passam a ser
percebidos como ruídos. Há uma tendência a atribuir aos instrumentos uma função
percussiva, pela repetição de notas em ritmos variados. Mammì analisa trechos da obra:
Peça orquestral composta a pedido da bailarina Ida Rubinstein para ser dançada
com outra obra do compositor, La Valse, o Bolero se tornou uma das peças mais
emblemáticas e populares de Ravel. Para compô-la, o compositor partiu de um
obsessivo tema, por meio do qual explorou os timbres da orquestra, levando a
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A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
Uma das obras que consolidou essa transformação do compositor foi A Ópera dos
Três Vinténs, inspirada em uma ópera-balada do séc. XVIII de John Gay, a Ópera do
Mendigo. Brecht tinha uma fascinação especial pelos fora da lei e desajustados socias,
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
A peça contém a mais popular das parcerias Weill-Brecht, a canção “Die Moritat vom
Mackie Messer”, mais conhecida como “Mack, a Faca”. Trata-se de um catálogo de
homicídios, descrevendo um protagonista que não apenas mata por dinheiro, mas que
sente prazer nisso. A melodia criada por Weill é simples e circular, detendo-se várias
vezes num acorde de tríade com sexta acrescentada, recurso comum no jazz e também
utilizado por Debussy pelo potencial ambíguo que remete à tonalidade menor.
Devido ao arranjo criado para a banda de sete músicos (que deveriam tocar nada
menos que 23 instrumentos), que prioriza instrumentos graves, o acorde em suspenso
estabelece um clima misterioso. Assim, o ambiente da peça se alterna entre sombrio e
eufórico, o melancólico e o sarcástico, sempre um tom acima e remetendo vagamente
ao expressionismo musical.
Esta obra de Varèse foi composta para uma orquestra de percussão de 13 músicos,
sendo a primeira dedicada exclusivamente a essa família de instrumentos – apenas
antecipada por Les Choëphores, de Darius Milhaud, e Les Noces, de Stravinsky, obras
com passagens que enfatizavam a percussão. Varése utilizou instrumentos sem altura
definida até quase o final da peça, quando o piano, o glockenspiel e os sinos tubulares
intervêm.
A obra é uma síntese das peças Espírito da Terra e Caixa de Pandora, de Wedekind,
nas quais a cantora Lulu, que se torna prostituta após frequentar a alta sociedade,
encontra a morte pelas mãos de Jack, o Estripador. Lulu reúne as contradições da
cultura centro-europeia às vésperas da ascenção de Hitler, alternando-se entre hiper-
romantismo e vanguarda, a empatia e a brutalidade. O autor compôs grande parte da
peça e apresentou-a como suíte em 1934, mas a finalização da obra foi interrompida
38
A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
por ocasião de sua morte, em 1935, faltando ainda concluir boa parte da orquestração
do terceiro ato. Como a sua viúva havia proibido que a obra fosse concluída, durante
muito tempo esta foi apresentada como uma ópera em dois atos. Após a morte de Helen
Berg e pelo fato das intenções do compositor serem muito claras, foi possível o término
da partitura pelo compositor austríaco Friedrich Cerha, e a obra estreou completa em
1979. Berg, embora dedicado ao dodecafonismo, fazia deste um uso peculiar, tendo
confessado a Adorno, em carta, que o sistema de Schoenberg lhe interessava pela
possibilidade de gerar novos tipos de tonalidade, e muitas das séries escolhidas pelo
compositor dão margem a alusões tonais e a fragmentos de músicas do passado – o
Concerto para Violino, por exemplo, apresenta as primeiras notas de um coral de Bach.
Ross analisa trecos de Lulu:
The Unanswered Question foi originalmente composta por Ives em 1906 e revisada
entre 1930-1935, quando ganhou a partitura definitiva. A peça busca expressar o
questionamento sobre o sentido da vida através de uma orquestração estereofônica, em
que as cordas, fora do palco, se contrapõem a um lamentoso trompete, e este, por sua
vez, dialoga com quatro frenéticas flautas. A densidade da massa sonora é um elemento
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UNIDADE I │ A MÚSICA MODERNA (1894-1938)
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Symbolist_paintings#/media/File:A_New_Generation_1892_Jan_Toorop.jpg
Gershwin almejava escrever uma grande ópera lírica há tempos, quando, em outubro
de 1926, se deparou com a leitura de um conto que estava sendo bastante comentado
em Nova York. Tratava-se de Porgy, história do mendigo aleijado Porgy e sua paixão
por uma bela mulher, Bess – esta, por sua vez, envolvida com um violento estivador.
Animado com a possibilidade de haver encontrado o libreto para sua composição,
Gershwin entrou em contato com o autor do texto, DuBoise Heyward, e aventou a
possibilidade de se tornarem parceiros. Quatro anos mais tarde, o Metropolitan Opera
de Nova York lhe encomendou uma ópera, e o compositor se lembrou do conto de
Heyward, animado em criar uma ópera americana que não fosse uma imitação das
óperas francesas, italianas ou alemãs, como ocorria até então.
40
A MÚSICA MODERNA (1894-1938) │ UNIDADE I
nome Porgy and Bess foi sugerido por empresários, o que alinhou a obra à tradição de
outros títulos de ópera, como Tristão e Isolda e Sansão de Dalila. A estreia, embora
prevista para o palco do Metropolitan Opera de Nova York, teve que ser alterada para
o Colonial Theatre, em Boston, devido à decisão de Gershwin em escalar um elenco
composto apenas de artistas afroamericanos, pois o teatro de Nova York, nessa época,
não aceitava a presença de negros.
A peça foi um enorme sucesso, aplaudida em pé por quinze minutos, e, além das
inúmeras montagens operísticas, tornou-se parte do cancioneiro popular norte-
americano, recebendo versões cantadas e instrumentais, de intérpretes como Louis
Armstrong e Ella Fitzgerald e músicos de jazz como Miles Davis.
O balé Billy the Kid está entre as primeiras composições de Copland, mas já apresenta
o estilo americano que o consagrou. Trata-se de uma homenagem a William Bonney,
fora da lei que, segundo relatos, roubava dos ricos, era amigo dos pobres, encantava as
damas e matou 21 homens (ROSS, 2007, p.296). Por meio de artifícios como a citação de
músicas de caubói como “Great Granddad”, “Whoopee ti yi yo, git along little dogies” e
“The Old Chisholm Treil”, o autor evoca a atmosfera dos Estados Unidos de um período
pré-capitalista (Copland havia se envolvido com o ativismo de esquerda e tinha críticas
ao modelo econômico).
41
A MÚSICA NO PÓS- UNIDADE II
GUERRA (1939-1966)
CAPÍTULO 1
Cena Musical no Pós-Guerra
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/Piet_Mondrian#/media/File:Composition-with-red-yellow-and-blue.jpg
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
Destino de grande parte dos artistas europeus, os Estados Unidos começaram a se firmar
como uma grande potência musical, acolhendo autores como Stravinsky e Schoenberg,
que compuseram novas obras em solo americano – no caso de Stravinsky, algumas
delas, como Ebony Concerto, inspiradas no jazz. Além disso, após a consolidação de
um estilo americano na primeira metade do século XX por autores como Gershwin,
Thomson, Harris e Copland (este ainda bastante jovem), um novo grupo de artistas
norte-americanos levaria as propostas estéticas de uma música genuinamente
americana adiante, entre eles, o próprio Copland, aprimorando seu estilo, Walter
Piston, Lou Harrison e Roger Sessions.
Já na Europa, no início dos anos 1950, um grupo de jovens músicos ampliou os preceitos
da escola dodecafônica, chegando ao chamado serialismo integral, ou seja, um tipo de
técnica composicional que buscava organizar todos os parâmetros musicais possíveis
de acordo com as regras da composição dodecafônica. Entre esses compositores
podemos destacar Pierre Boulez, Luciano Berio, Luigi Nono, Bruno Maderna, Karlheinz
Stockhausen e Henri Pousseur, ou seja, alguns dos principais nomes da música de alto
repertório na segunda metade do séc. XX.
Boulez, por exemplo, dividiu o tempo dedicado à composição musical com sua
atividade como regente de obras seminais da música contemporânea de autores
como Debussy, Schoenberg, Stravinsky, Webern e Bartók, e, a partir dos anos 1970,
envolvido na criação e direção do estúdio de música computadorizada denominado
Institut de Recherche et de Coordination Acoustique/Musique, em Paris.
Stockhausen, por sua vez, voltou-se para a música eletrônica, compondo as primeiras
obras dedicadas exclusivamente ao sintetizador. Buscando humanizar a audição
excessivamente árida das apresentações eletrônicas, passou a incluir executantes
43
UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
humanos nesse tipo de performance. Alé disso, o autor foi influenciado pela filosofia
oriental, passando a considerar a execução musical de forma holística, na qual o
compositor, o executante e o público interagem e são igualmente afetados.
Serialismo Integral
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
Música Concreta
Elaborada por Pierre Schaeffer em 1948, a música concreta foi inicialmente criada
em disco e, em breve, em fita magnética, por meio de técnicas simples de edição,
inversão e mudança de velocidade feitas sobre gravações de instrumentos e vozes,
além de outros sons captados por gravação, como sons da natureza ou locomotivas.
Alguns teóricos inicialmente utilizavam o termo em oposição a Música Eletrônica.
Porém, desde que as técnicas foram combinadas em obras como Poème Électronique,
de Edgar Varèse, e Cântico dos Adolescentes, de Stockhausen, foi abolida a distinção,
acolhendo-se “Música Eletrônica” de forma generalizada e relegando a denominação
“Música Concreta” de forma histórica, remetendo às peças criadas por Schaeffer e
seus colaboradores em Paris, nas décadas de 1940 e 1950.
Música Eletrônica
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Música Eletroacústica
Música Aleatória
Charles Ives foi quem lançou as bases: algumas de suas partituras incluem
alternativas, exortações à liberdade e notações irrealizáveis que convidam o
intérprete a encontrar uma solução.
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
Música Estocástica
Colagem
O termo provém das artes visuais, em que significa a reunião de materiais heterogêneos
na composição de um quadro, como na obra de Picasso quando este utiliza-se de recortes
de jornal aplicados à tela. Em música, é aplicado quando há reunião de fragmentos
sonoros discordantes, muitas vezes provenientes de outras músicas. Algumas obras de
Ives, por exemplo, incluem colagens de marchas, danças, canções, etc. Porém, a técnica
foi mais explorada após a Segunda Guerra Mundial, pelos processos realizados em fita
magnética ou com o uso de sintetizadores e computadores. Um exemplo já clássico do
processo de colagem é o Poème Électronique, de Varèse.
Música Textural
O termo foi cunhado para denominar a música na qual o enfoque na textura parece
ser a característica predominante, subvertendo-se melodia e ritmo em prol de massas
sonoras definidas pela sua densidade. Embora grande parte da música eletrônica
produzida nos anos 1950 e 1960 se encaixe na descrição, o termo é mais habitualmente
usado para classificar obras orquestrais como Atmosphères, de Ligeti, além de grande
parte das peças de Xenakis e Penderecki.
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
No caso do Free Jazz, surgido nos anos 1960 e capitaneado pelo saxofonista Ornette
Coleman, a improvisação – um dos principais pilares do gênero jazz – foi ampliada,
chegando, em muitos momentos, à improvisação livre, desconectada de temas musicais
prévios, o que sugere uma aproximação com os processos aleatórios de Cage e seus
discípulos.
Além disso, o estilo trazia outras novidades, como: o ingresso numa tonalidade
expandida, que no início suscitou a impressão de atonalidade; uma nova concepção
rítmica caracterizada pela dissolução do metro, do beat e da simetria; adesão às
culturas musicais diversas, como as da Índia, África, Japão e países árabes; ênfase
no parâmetro da intensidade, explorando-o além do que já ocorrera no próprio jazz
realizado anteriormente; expansão do som musical para o âmbito do ruído (BERENDT
& HUESMANN, 2014, p.46).
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CAPÍTULO 2
Principais Compositores do Pós-Guerra
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Criou a primeira obra-prima da nova música, Le Marteau Sans Maître, entre 1953 e
1955, na qual, mais uma vez, recorria aos versos de Char, porém dessa vez utilizando-os
de forma mais fragmentada.
Nos anos 1960 e início dos 1970 colocou em segundo plano a composição, para se
dedicar à regência, principalmente nos concertos no Domaine Musical, que fundara em
Paris em 1954 com o objetivo de difundir a nova música e reavaliar obras antigas.
Nessa época, iniciou seus estudos com Messiaen e conheceu Boulez, trabalhando
no estúdio de Shaeffer e também compondo Kontrapunkte e a primeira das
Klavierstücke. Foi convidado a codirigir o novo estúdio de música da Westdeustscher
Rundfunk, onde compôs em sintetizador de som uma das primeiras obras totalmente
eletrônicas, 2 Studien. Assim como Boulez, também se tornou professor em
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
A partir das obras Gruppen, Cântico dos Adolescentes e Klavierstük XI, o autor
incorporou diversas técnicas de composição, preocupando-se mais com o conceito
da composição do que com a realização detalhada – seu contato com os processos
aleatórios contribuíram para esse caminho. Por exemplo, em obras da década de 1960,
como Plus-Minus, Prozession e Spiral não há incidências sonoras predeterminadas,
apenas notações para padrões de mudança.
Aus Den Sieben Tagen traz apenas palavras como estímulo à música intuitiva. Essas
proposta foi estimulada pela atividade de Stockhausen com seu próprio conjunto
realizando música eletrônica ao vivo, fase inaugurada com a peça Mikrophonie I.
Atuou a partir de então com enfoque na música eletrônica e suas interações com
orquestra e vozes.
Também conseguiu a edificação de prédios especiais para sua música, como na Exposição
de Osaka, em 1970, e desde Momente, apresentada em 1972, a maioria de suas obras
foi concebida como eventos de grande duração, ocorrendo em certas ocasiões, durante
uma noite inteira. Alguns de seus filhos se tornaram executantes de sua obra.
Fonte: https://www.wikiart.org/en/jackson-pollock/number-8-detail
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Trata-se de um piano contendo entre suas cordas vários objetos, com o objetivo de
que esses interfiram no som, resultando numa orquestra de percussão para espaços
limitados. Durante a década de 1940, muitas obras foram compostas para piano
preparado, como as Sonatas e os Interlúdios, e algumas dessas peças foram utilizadas
pela companhia de balé de seu colaborador, o coreógrafo Merce Cunnigham.
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Suas últimas peças foram criadas ainda nos anos 1950, entre elas Étude Aux
Allures, de 1958, e Étude Aux Objets Sons Animés, de 1959, passando a se dedicar
ao ensino e à atividade filosófica.
Em 1944, de volta à Inglaterra, iniciou sua ópera Peter Grimes, revelando ao mundo
um talento incomum para criar óperas, sendo comparado a Purcell por estabelecer
a atmosfera dramática por meio de interlúdios orquestrais e pela habilidade de criar
personagens marcantes. Tinha preferência pela ópera de câmara, com orquestra de cerca
de doze instrumentos e poucos cantores, estabelecendo uma sensação de intimidade
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
rara no gênero. Seu temperamento musical mudou pouco desde o início da carreira,
mas o compositor explorou o sistema dodecafônico em The Turn Of The Screw. Em seu
último e reverenciado trabalho, Quarteto nº 3, recuperou a escrita orquestral em larga
escala. Os críticos observam que Britten buscou conciliar o passado inglês de Purcell
com o presente europeu de Stravinsky e Bartók.
Fonte: https://search.creativecommons.org/photos/db7f4c59-b3a5-403d-8b69-d2b8918cf979
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
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CAPÍTULO 3
Repertório Selecionado/ Música no Pós-
Guerra
Após diversos trabalhos oficiais, como o balé épico Romeu e Julieta, Prokofiev
interessou-se pela trilha de cinema, encontrando no cineasta Sergei Eisenstein o
colaborador ideal. O músico foi convidado a escrever a partitura para o filme Alexandre
Nevsky, de Eisenstein, que contaria a história do príncipe que conteve os Cavaleiros
Teutônicos no gelo do lago Peipus, no século XIII.
Devido aos recursos ainda incipientes no cinema, várias dificuldades tiveram que ser
superadas, mas os autores tiveram grande sucesso: a cena da batalha sobre o gelo só
foi filmada quando a música estava esboçada, mas, no resultado final, som e imagem
adequaram-se integralmente. Em alguns casos, Eisenstein queria movimentação
rítmica nas cenas, e Prokofiev tamborilava os dedos marcando as sequências para
depois escrever os trechos – Eisenstein só finalizava a montagem após a música estar
pronta, usando-a para estabelecer o ritmo. Percebe-se na obra que a linguagem tonal de
Prokofiev atingiu, por essa época, grande sofisticação, com dissonâncias bem escolhidas
e certo acabamento ácido, evitando o sentimentalismo.
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
O Quarteto para o Fim dos Tempos possui oito movimentos baseados na imagética
do Apocalipse: 1 - Liturgia de cristal: processo rítmico abstrato; 2 - Vocalise, para
o anjo que anuncia o fim dos tempos:canção de êxtase; 3 - Abismo dos pássaros:
solo de clarineta; 4 - Interlúdio: animada dança sem piano; 5 - Louvor à eternidade
de Jesus: adágio para violoncelo e piano; 6 - Dança das Fúrias: a maior parte para
quarteto em forte uníssono; 7 - Feixes de arco-íris, para o anjo que anuncia o fim
dos tempos: trecho de desenvolvimento; 8 - Louvor à imortalidade de Jesus: adágio
para violino e piano. No cabeçalho da partitura, o autor escreveu um texto que
remete ao Livro da Revelação: “Em homenagem ao Anjo do Apocalipse, que ergue
suas mãos ao céu dizendo: ‘Não haverá mais tempo’”.
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Assim como em toda a obra de Bartók, em maior ou menor grau, elementos como o
modalismo, a orquestração seca e angulosa e a violência rítmica estão presentes em seu
Concerto para Orquestra, porém resultam atenuados em comparação com a maioria
de sua obra. Exilado na América após abandonar a Hungria devido à guerra, Bartók
compôs a obra em condições precárias, sem perspectivas de trabalho e acometido de
leucemia, que o mataria no ano seguinte à estreia da peça. Dessa forma, é impressionante
que o compositor tenha composto uma obra de colorido orquestral tão intenso.
Britten acabara de obter sucesso com a ópera Peter Grimes, quando foi convidado,
juntamente com o violinista Yehudi Menuhin, para uma incursão pela Alemanha
derrotada. Nessa viagem, os músicos visitaram um campo de concentração, o de Bergen-
Belsen, apresentando-se para os ex-prisioneiros. O cenário de desolação foi tão forte
para o compositor que este decidiu compor uma peça para exteriorizar suas emoções.
Decidiu musicar o ciclo de Sonetos Sagrados do poeta jacobita inglês John Donne, que
trazia versos como “Malhai meu coração, malhai, Trindade Santa” e “Orgulhosa não
sejas, morte” – Ross (2007, p.365) observa que, quando o cantor declama as palavras
“E a morte não será nada” numa escala ascendente, deve permanecer por nove longos
compassos na palavra “morte”, “para afinal trovejar, sobre uma cadência de tônicas e
dominantes em conflito: ‘Sim, morte, morrerás’”.
A técnica de “preparar” o piano foi introduzida por John Cage nas peças de 1940 Second
Construction e Bacchanale. Consiste em inserir diversos tipos de objetos entre as
cordas do piano, como parafusos, pedaços de cartolina, materiais de vedação de portas
e janelas, etc. Durante a década, o autor aprimorou o procedimento, e suas Sonatas
e Interlúdios para Piano Preparado trazem indicações precisas sobre quais tipos de
material e onde devem ser colocados em cada uma das 45 pequenas peças.
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
No Estudo nº 33, por exemplo, os intervalos são sobrepostos de acordo com uma
relação matemática. Já o Estudo nº 37 tem doze linhas melódicas individuais e
de métricas e andamento diferentes. A energia hipercinética situa as peças de
Nancarrow adiante das principais tendências do modernismo pós-guerra. Porém,
o autor só saiu do relativo anonimato na década de 1980, quando, então, foi
proclamado como um dos mais importantes compositores do século XX, sendo,
inclusive, elogiado por Ligeti.
Fonte: https://www.wikiart.org/en/m-c-escher/relativity-lattice
Em 1948 Schaeffer criou seus cinco Estudos de Ruídos, peças que consistiam na
gravação de chiados, apitos e bufos de seis locomotivas na estação de trem de
Batignolles, utilizando discos fonográficos. Em breve percebeu que a gravação
em fita magnética, aperfeiçoada durante a guerra, poderia lhe oferecer melhores
condições artísticas, pois o autor poderia recorrer a colagens de sons se cortasse,
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
Uma das obras mais originais e excêntricas de Cage é 4’33’. Trata-se de uma peça
para piano inteiramente silenciosa, na qual o pianista aciona um cronômetro e
espera, sentado ao instrumento, por exatamente 4’33’’, movendo as mãos acima do
teclado, porém, sem tocá-lo, realizando três intervalos para sugerir três andamentos
diferentes. Na estreia da peça, em 1952, o público sentiu-se ultrajado, achando que
Cage o ironizava, o que, até certo ponto, também era verdade. Mas a finalidade era
mais filosófica. O autor pretendia que as pessoas questionassem a razão de estarem ali,
e, acima de tudo, refletissem sobre o valor do silêncio – que, em última medida, não
existe para o ser humano, pois mesmo numa câmara à prova de som este ouvirá dois
sons: seu próprio batimento cardíaco e o som agudo do sistema nervoso. Dessa forma, a
“música” também funciona como moldura para os ruídos percebidos durante os 4’33’’,
que, a cada realização da peça, serão diferentes.
Durante a década de 1940, a situação dos compositores na Rússia era crítica. Suas
obras eram supervisionadas e estes deviam cumprir um modelo que atendesse às
especificações do Estado quanto à simplicidade, de maneira que as peças fossem
facilmente compreendidas pelo povo. Os críticos percebem que, nessa época,
Shostakovich simplificou tanto suas peças que deixou de ser ele mesmo, manifestando
sua própria personalidade apenas em obras de menor alcance, como quartetos de
cordas. A reunião de sua persona dividida ocorreu apenas depois da morte de Stálin,
na Sinfonia nº 10, composta meses após a morte do ditador. Nela, percebe-se a intensa
recorrência do tema autorreferente D S C H (Dmitri SCHostakowitch, transliteração
de seu nome para o alemão), além de passagens eufóricas, vistas pelos musicólogos
como uma celebração histérica e exaurida. Segundo eles, a persistência mecânica de
certos temas reflete uma marionete que, no entanto, sobrevive, e goza de uma espécie
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Nos anos 1950, aprimorou seus métodos, chegando à, denominada por ele, “Música
Estocástica”, referenciando-se no ramo da matemática que estuda a atividade aleatória
ou irregular das partículas. Porém, o autor não se encaixava na descrição de “músico
de laboratório”, preocupando-se com a forma com que a plateia reagiria a suas peças,
buscando atrair sua atenção por meio do impacto. Nesse sentido, alcançou êxito com a
obra Metastasis. Ross analisa brevemente essa peça:
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
Gesang der Jünglinge, ou Cântico dos Adolescentes, é uma das mais emblemáticas e
originais obras já compostas para instrumentos eletrônicos. Trata-se da manipulação
sintética da voz de um menino coralista entoando o cântico católico “Louvação ao
Senhor”.
Durante os anos 1950, Messiaen derivou muitas de suas linhas instrumentais das
melodias dos cantos de pássaros, procedimento que marcou sua música até o final.
Iniciou nesse caminho com Réveil Des Oiseaux, ou Despertar dos Pássaros, para piano
e orquestra, apresentado em 1953.
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
Talvez a mais ambiciosa obra referenciada no canto dos pássaros seja Catalogue
D’oiseaux, ou Catálogo dos Pássaros, um ciclo de treze peças para piano, cada uma delas
referenciando-se no canto de um pássaro francês em seu habitat, durando, no total,
cerca de seis horas. Mais especificamente, a obra foi composta a partir das impressões
de Messiaen das diversas paisagens cênicas da França, ilustradas pelos pássaros que as
habitam.
Nessa obra, a confiança no canto dos pássaros fez com que Messiaen restaurasse a
primazia da linha melódica. A partir de então, o autor não precisava mais escolher entre
seus diversos estilos, que abarcavam, até esse momento, o sensualismo de trabalhos
anteriores aos anos 1950 e a dureza da fase pós-Segunda Guerra.
Parece-me que Ornette, na maioria das vezes, quando toca uma canção,
detém-se sobre uma tonalidade de modo apenas aproximativo, intuitivo.
Ele a utiliza como ponto de partida para sua própria melodia. Com
isso, não quero dizer que sua música possa se fixar numa determinada
tonalidade. Digo que as melodias e os acordes de suas composições
possuem, no lugar de um tom específico, uma sonoridade geral, que
Ornette usa como fundamento. Essa aplicação realmente o libera, como
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
The Shape Of Jazz To Come, segundo LP de Coleman, traz sua mais famosa
composição, “Lonely Woman”. O disco é um bom exemplo do estilo melódico
pleno de arestas do autor, representando aqui o universo do Free Jazz – cuja
pesquisa, naturalmente, demanda maior atenção do que é possível disponibilizar
nesta apostila. No registro em disco pode-se observar como a ação performática do
saxofonista tem uma ligação direta com o desenvolvimento do material sonoro.
Young conta que em sua infância, vivida numa pequena comunidade em Idaho, se
encantava com os acordes microtonais das linhas de transmissão de energia, os ruídos
das perfuratrizes, o apito de trens distantes, os zumbidos dos gafanhotos, o assobio do
vento sobre o lago Utah. Segundo ele, essas manifestações sonoras refletiam-se numa
sensação de reverência, de que as coisas podiam durar muito tempo, o que apenas se
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UNIDADE II │ A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966)
intensificou quando o artista mudou-se para Los Angeles com a família, já que sempre
havia tempo na Califórnia.
Para que o autor transportasse essa sensação para sua música ainda demoraria um
tempo. Inicialmente, dedicou-se ao Bebop e à música dodecafônica. Percebeu que
poderia diminuir o andamento nos eventos dodecafônicos, transformando cada nota
em uma nota muito longa. Assim, os sons se moviam tão lentamente que não se podia
identificar o movimento dodecafônico da melodia, e nem mesmo a identidade dos
próprios sons no contexto geral. Seu Trio para Cordas, após intervalos que duravam
de um a dois minutos antes de se moverem, termina com um dó e um sol no violoncelo
que soam por vários minutos, enquanto decresce o volume. Para alguns, essa cintilante
quinta aberta apontou o caminho da tonalidade minimalista.
O autor criou Composition 1961 numa época em que se voltava para a arte conceitual,
influenciado por Cage, criando trabalhos que envolviam móveis arrastados pelo chão,
latas de lixo lançadas escada abaixo e fogueiras queimando no palco. Composition
1961 se inicia com as quintas abertas com as quais o Trio Para Cordas terminava, e
a partitura consiste nas notas si e fá sustenido, com a seguinte instrução: “Manter
por um bom tempo”.
Folk Songs foi composta para mezzo-soprano e sete instrumentos, e cantada pela
primeira vez por sua esposa e parceira musical, Cathy Berberian. Nessa peça, Berio
promoveu a desconstrução de arranjos de canções tradicionais da França, Itália,
Azerbaijão, Armênia e Estados Unidos.
A obra pode ser classificada como uma colagem, processo pelo qual o artista incutia em
sua obra citações e pastiches, com alto teor de ironia. Dessa forma, a música clássica
tonal podia se encontrar com elementos como ruídos abruptos, o que sinalizava um
retorno à realidade contemporânea. Muitos vêem esse tipo de procedimento como uma
nostalgia do antigo mundo tonal, por meio do qual os compositores contemporâneos
podiam recrutar elementos antigos sem ameaçar o status de artistas transgressores.
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A MÚSICA NO PÓS-GUERRA (1939-1966) │ UNIDADE II
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CONTEMPORANEIDADE UNIDADE III
(1967-2019)
CAPÍTULO 1
Cena Musical Contemporânea
Além disso, Ross (2007, p.539-540) observa que a música clássica atinge, hoje, um
público muito maior que em qualquer época da história, com novas plateias que se
materializaram no leste da Ásia e na América do Sul, por exemplo, e que boa parte do
repertório inclui a música do século XX, tendo entre as peças mais adoradas a Sagração
da Primavera, de Stravinsky e o Concerto para Orquestra, de Bartók.
Walter Benjamin (1987) foi um dos autores que dedicou estudos à questão das novas
tecnologias surgidas na virada do século XIX, em especial ao tema da reprodutibilidade
técnica, percebendo nas técnicas industriais uma mudança de paradigma em relação às
técnicas artesanais. Vale a pena nos debruçarmos sobre o assunto para compreendermos
a trajetória da enorme difusão musical durante o século XX e suas consequências na
contemporaneidade.
Segundo Benjamin, ainda que a obra de arte sempre tenha sido suscetível de
reprodução, como no caso dos discípulos que copiam as obras dos mestres a título de
70
CONTEMPORANEIDADE (1967-2019)│ UNIDADE III
exercício ou dos falsários que as copiam visando proveito material, seu processo de
replicação técnica (iniciado com a xilogravura na Idade Média, seguido da estampa
em chapa de cobre e água forte e chegando à litografia no início do século XIX)
permitiu colocar no mercado produções em massa.
Porém o salto decisivo foi dado com a invenção da fotografia, pois, além de esta
proporcionar a difusão das imagens em grande velocidade pela facilidade de produção,
pela primeira vez “a mão foi liberada das responsabilidades artísticas mais importantes,
que agora cabiam unicamente ao olho” (BENJAMIN, 1987, p.167).
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Fonte http://www.ebc.com.br/cultura/2016/01/conheca-5-pintores-da-arte-moderna-e-contemporanea
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Em O autor como produtor, Benjamin defende, ainda, que o objeto artístico deve se
situar nos “contextos sociais vivos”, ou seja, que a técnica deve ser compatível com o
período histórico, permitindo que a arte se situe dentro das relações de produção de
sua época. Seu argumento é o de que “temos que repensar a ideia de formas ou gêneros
literários em função dos fatos técnicos de nossa situação atual, se quisermos alcançar as
formas de expressão adequadas às energias literárias de nosso tempo”. O autor ressalta
que “nem sempre houve romances no passado, e eles não precisarão existir sempre”,
defendendo o jornalismo como meio técnico ideal para a difusão de uma nova literatura,
ajustada com o contexto político vigente e em que a distinção convencional entre o
autor e o público desapareça, já que o leitor está sempre pronto a escrever, descrever
e prescrever (BENJAMIN, 1987, p.124). No caso da música, tanto melhor seria uma
reprodução quanto mais se aproximasse da qualidade de uma apresentação ao vivo.
No final da década de 1940, já em plena fase elétrica, o advento do sistema de gravação
em alta-fidelidade, ou hy-fi, aproximou-se do som realista, “para unir-se à imagem da
televisão como parte da recuperação da experiência tátil” (VALENTE, 2003, p.73).
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mas desse mundo poroso que vigora, num equilíbrio muito instável e
precário, fora e dentro da indústria do entretenimento (WISNIK, 2004,
p.321).
Griffiths (1995, p.249) ressalta o fato de que a história normalmente só pode ser
identificada anos após sua ocorrência. De fato, torna-se bastante arriscado realizar
afirmações acerca da música no presente.
Pós-Modernismo
O termo, incorporado à crítica de arte, teria surgido em algum momento da década de
1960, associado à arte conceitual (COELHO, 1986, p.128-129), trazendo como pedra
de toque a ideia de que a arte deveria ser um processo com ênfase no mental, e não no
material.
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Minimalismo
Se a expressão originou-se para descrever criações em que o material musical
é mínimo – como as peças de poucas e longas notas de La Monte Young, e, no
extremo, a música silenciosa 4’33’’, de Cage –, consolidou-se ao ser aplicada
a composições nas quais a repetição de figuras, em geral curtas, predomina,
ou seja, a obra de autores como Reich, Riley, Glass, etc. Além de La Monte
Young, são apontados como precursores do minimalismo o irreverente Erik
Satie, em particular sua série Música de Mobiliário (peças orquestrais de poucos
compassos musicais que deveriam ser repetidos infinitamente, de maneira a
compor o mobiliário de um cômodo da casa), e Cage.
Nos anos 1960, Glass e Reich acrescentaram uma noção de processo, ou de mudança
gradual efetuada no desenvolvimento de texturas repetitivas. Se no início as obras
minimalistas impressionavam mais pela beleza de sua simplicidade, provaram-se
capazes de elaboração, como nas óperas de Glass ou peças posteriores de Reich. Ganhou
adeptos nos EUA e Europa, influenciando compositores como Ligeti, que já haviam
chegado ao material repetitivo independentemente, além de invadir o mundo pop por
meio da música eletrônica feita para dançar.
Segundo Ross (2007, p.544), “se a música clássica chinesa conseguir assimilar a nova
música do século XXI, o centro de gravidade pode mudar de forma permanente para o
oriente”. Exemplo disso é a importância mundial adquirida por compositores como o
japonês Toru Takemitsu.
Nova Complexidade
O movimento conhecido como “Nova Complexidade” surgiu pela proposta de Brian
Ferneyhough, inglês radicado nos Estados Unidos, de testar os limites extremos do
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Como, por mais que os intérpretes sejam habilidosos, não é possível executar a obra de
maneira precisa, a obra se torna um tipo de improvisação planejada, próxima do Free
Jazz ou de um rock delirante, muito mais que da tradição clássica.
Espectralismo
Após o minimalismo romper com vários tabus musicais modernistas por meio da
insistência de pulsos estáveis e consonâncias, coube ao espectralismo representar
o retorno à natureza. Trata-se de uma corrente musical iniciada nos anos 1970 por
três compositores, Tristan Murail, Gérard Grisey e Hughes Dufourt, que utilizaram
programas de computador avançados para analisar os espectros de som superpostos
que acompanham qualquer tom ressonante, concebendo um novo tipo de música a
partir dos complexos padrões encontrados (ROSS, 2007, p.551).
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faixa “Revolution 9” é uma colagem com fitas de gravação, na qual podem ser ouvidos
os acordes finais da Sétima Sinfonia, de Sibelius.
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CAPÍTULO 2
Principais Compositores
Contemporâneos
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Formou seu conjunto para realizar suas peças, que trazia uma energia compatível a um
grupo de rock, apresentando-se em galerias de arte, apartamentos do Upper East Side,
parques e clubes noturnos, entre eles o famoso Max’s Kansas City. Com suas óperas
chegou a um nível de reconhecimento popular que nenhum compositor moderno já havia
alcançado desde Stravinsky. Ampliou ainda mais o alcance de sua arte compondo trilha
para cinema e contribuindo com músicos populares, como no caso dos brasileiros do
grupo UAKTI. Como Reich, é considerado um dos nomes importantes do Minimalismo.
Nessa época, apresentou Lo Fi, que previa um conjunto aleatório de discos velhos e
riscados de 78 rpm sendo tocados por mais de uma hora em um equipamento de áudio
antiquado. Depois disso, começou a achar a estética de Cage limitadora, encontrando
uma saída no Minimalismo.
Tornou-se uma celebridade por volta de 1971, quando tocava teclados e criava efeitos
sonoros para a banda de rock-art Roxy Music. Incluiu no segundo álbum do Roxy Music,
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For Your Pleasure, efeitos de fase apreendidos da obra de Reich, marcando uma das
primeiras invasões do minimalismo na linguagem do pop. Saiu do grupo para seguir
carreira solo e consolidou-se como produtor musical de estrelas como David Bowie.
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Quando o selo alemão ECM começou a lançar suas obras nos anos 1980, milhões de
cópias foram vendidas, de maneira incomum para a música erudita contemporânea,
alçando o compositor à condição de pop star. A crítica musical explica isso pelo fato de
as puras e espirituais composições de Pärt oferecerem um oásis aos ouvidos já saturados
do novo milênio.
Também compôs peças para fita magnética e trilha de cinema. Algumas de suas trilhas
acompanharam obras-primas do cinema japonês, como Dodeskaden, de Kurosawa, com
música baseada em temas populares japoneses, e A Mulher de Areia, de Teshigahara,
em que utiliza ruídos e glissandos arrepiantes, típicos de Xenakis. Na época de sua
prematura morte, Takemitsu já havia criado um estilo de estrutura precisa, rico em
timbres, beirando o tonal e profundamente misterioso.
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CAPÍTULO 3
Repertório Selecionado/ Música
Contemporânea
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A força da peça não reside apenas nos padrões polirrítmicos, mas na intensidade
adquirida pela voz, amplificando a emoção do pastor e intensificando o momento
indefinidamente. Mais tarde, Reich aproveitou a técnica de vozes defasadas sobrepostas
na criação de uma série de peças instrumentais, iniciada com Piano Phase e Violin
Phase, ambas de 1967.
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identificar e acolher cada vez mais nuances particulares a cada faixa”. Algumas
faixas do disco apresentavam semelhanças com os experimentos de Darmstadt,
como o tema “A Day In The Life”, com sequências de som ad libitum e camadas
texturais se sobrepondo.
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da Sonata para Piano Opus 81, de Beethoven, e termina com um Lamento, uma
paisagem devastada, simbolizando o século que matou a maior parte de sua família
e sua fé na humanidade.
Mas a harmonia não fica tão triste quanto poderia: “No final, três notas brilham na noite:
um sol grave na trompa; um dó agudo no violino; e um lá que soa frágil na tessitura
média do piano” (ROSS, 2007, p.558). As notas são as mesmas que reaparecem na
ordem inversa em um quarteto de cordas final de Beethoven, em fá maior, no qual o
mestre anexou as palavras “É necessário”.
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Referências
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1982.
MAMMÌ, Lorenzo. A fugitiva: ensaios sobre música. São Paulo: Companhia das
Letras, 2017.
ROSS, Alex. O resto é ruído: escutando o século XX. Trad. CARINA, Claudio. São
Paulo: Companhia das Letras, 2007.
WISNIK, José Miguel. O som e o sentido: uma outra história das músicas. São Paulo:
Companhia das Letras, 1989.
Sites pesquisados
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Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Boccioni-The_
Noise_of_the_Street_detail.jpg. Acesso em: 04 jul. 2019.
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REFERÊNCIAS
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Encyclopedia. Disponível em: https://www.wikiart.org/en/m-c-escher/relativity-
lattice Acesso em: 04 jul. 2019.
KLIMT, Gustav. O Beijo (1908). Fonte: Wikimedia Commons. Disponível em: https://
commons.wikimedia.org/wiki/Category:The_Kiss#/media/File:El_beso(Gustav_
Klimt).jpg. Acesso em: 04 jul. 2019.
MONET, Claude. Lírios D’água (1906). Fonte: Rawpixel Public Domain. Disponível
em: https://www.rawpixel.com/image/547294/monet-water-lilies-painting. Acesso
em: 09 jul. 2019.
TOOROP, Jan. Uma Nova Geração (1892). Fonte: Wikimedia Commons. Disponível
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File:A_New_Generation_1892_Jan_Toorop.jpg. Acesso em: 04 jul. 2019.
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