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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIDOM BOSCO

RAFAEL WILSON LARSEN ENDLICH

A NÃO RESPONSABILIZAÇÃO DO SÓCIO SEM PODER DE MANDO DENTRO


DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA

Curitiba
2024
2

RAFAEL WILSON LARSEN ENDLICH

A NÃO RESPONSABILIZAÇÃO DO SÓCIO SEM PODER DE MANDO DENTRO


DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA

Trabalho de conclusão de curso apresentado como


requisito parcial para a obtenção de grau de Bacharel
em Direito na Faculdade UniDom Bosco.

Professor Orientador: MARCO AURÉLIO SCHLICHTA

Curitiba
2024
3

Dedico este trabalho à minha família, cujo


amor e apoio incondicional foram
fundamentais em todos os momentos desta
jornada acadêmica. À minha mãe e
familiares por serem minha fonte de
inspiração e força; aos meus irmãos, pelo
incentivo constante e pelas palavras de
ânimo nos momentos mais desafiadores.
Este trabalho também é dedicado aos meus
colegas, cuja presença tornou esta
caminhada mais leve e memorável. A todos
vocês, meu mais profundo agradecimento.
4

AGRADECIMENTOS

Dedico este trabalho a todas as pessoas que, de alguma forma, contribuíram


para a realização deste sonho, à minha família, pelo amor incondicional, apoio
constante e sacrifícios que fizeram para que eu pudesse chegar até aqui. Aos meus
amigos, pela amizade verdadeira e pelas palavras de incentivo nos momentos de
dúvida. Aos meus professores, pela orientação, conhecimento transmitido e pela
confiança em meu potencial. A todas as pessoas que compartilharam comigo essa
jornada, este trabalho é dedicado a vocês. Que este seja apenas o início de uma
trajetória repleta de realizações.
5

“Pensar grande e pensar pequeno, gera o


mesmo trabalho.” (Evandro Guedes)
6

RESUMO

Este trabalho aborda a questão da responsabilidade dos sócios que não possuem poder de mando e
não tomam decisões de administração dentro das sociedades empresárias, focando nos casos onde
não deve haver sua responsabilização pelos danos causados e consequentemente constituição de
obrigações e débitos sociais. Este tema pertence ao campo do Direito Empresarial, mais
especificamente às relações societárias, abordando as questões onde verifica-se que uma sócio não
possui poder ou influência na tomada de decisões e não participa da gestão/administração da
atividade econômica, ocorrendo apenas sua configuração no quadro societário por mera
integralização de um capital social.

Palavras-chave: Responsabilidade, sócio administração, decisões, participação.

ABSTRAT

In hoc opere quaestionem sollicitudinis sociis alloquitur qui potestatem imperandi non habent nec
administrationem decisionum intra societates negotiationes faciunt, in causis in quibus non debent
respondere de damnis causatis et consequenter constitutio obligationum socialium et debitorum. Hic
locus pertinet ad campum Negotiationis Iuris, specialius ad relationes corporatas, quaestiones
admovendas, ubi apparet socium non habere vim vel potentiam in decernendo nec participare
administrationi/administrationis activitatis oeconomicae, sed eius configurationem. occurrentes in
corporatis structura per solam solutionem participes capitalis.

Keywords: Cura, particeps administrationis, decisionum, participationis.

Sumário
7

1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 8
2. DESENVOLVIMENTO.............................................................................................................................. 9
2.1 PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA...............................................................................................................9
2.2 AUTONOMIA PATRIMONIAL........................................................................................................................10
2.3 RESPONSABILIDADE LIMITADA.....................................................................................................................11
3. ADMINSTRAÇÃO DA SOCIEDADE.......................................................................................................... 12
4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA..............................................................................13
5. CONCLUSÃO........................................................................................................................................ 16
8

1. INTRODUÇÃO
9

2. DESENVOLVIMENTO

O Direito Empresarial, também conhecido como Direito Comercial,


desempenha um papel fundamental na regulação das atividades comerciais e
empresariais em qualquer sociedade.

A criação de uma sociedade empresarial ocorre quando um grupo de pessoas


decide iniciar um negócio juntas. Essa vontade entre as partes envolvidas é
chamada de animus societatis, é o termo jurídico que se refere à intenção das partes
em celebrar um contrato de sociedade, seja para formar uma pessoa jurídica, seja
para iniciar uma cooperação ou empreendimento conjunto com o objetivo de
alcançar um fim comum através da criação da sociedade.

Essa intenção é fundamental para a validade e existência do contrato de


sociedade. Ela implica que as partes estão conscientes de que estão entrando em
um acordo que estabelece obrigações, direitos e responsabilidades mútuas, visando
alcançar um objetivo em comum, como a condução de um negócio ou projeto
conjunto.

O animus societatis é um elemento essencial na formação de uma sociedade,


pois demonstra a vontade das partes de agirem em conjunto, compartilhando
recursos, responsabilidades e riscos para atingir um objetivo comum. Sem essa
intenção mútua, o contrato de sociedade pode ser considerado inválido ou
inexistente, uma vez que a formação de uma sociedade requer o consentimento livre
e consciente de todas as partes envolvidas

Ocorre que no nosso ordenamento jurídico, para realizar esse


empreendimento de forma eficiente e legal, é necessário criar uma entidade jurídica
para gerenciar o negócio.

As pessoas envolvidas na criação dessa sociedade com o objetivo de


explorar uma atividade empresarial deverão, cada um contribuir com capital
individual, sejam eles em espécie ou em bens, para a criação do empreendimento,
elaborando um contrato de sociedade, que estabelece os termos e condições da
parceria, incluindo a divisão de responsabilidades, a distribuição de lucros e as
regras para tomada de decisões.
10

Ao celebrar esse contrato de sociedade e registrar a empresa conforme as


leis aplicáveis, como por exemplo, constituindo uma Sociedade Limitada (Ltda), eles
estão criando uma pessoa jurídica.

O ordenamento atribui capacidade à pessoa humana, reconhece também


capacidade a esses organismos criados pela vontade de duas ou mais
pessoas, buscando a consecução de um fim, por meio da criação da pessoa
jurídica. Essa entidade nasce da celebração de um pacto denominado
contrato de sociedade1

Sua importância reside na criação e manutenção de um ambiente jurídico


sólido e previsível, essencial para promover o desenvolvimento econômico e garantir
a ordem nas relações comerciais.

No cerne do Direito Empresarial está o conceito de sociedade empresarial,


uma estrutura legal que permite que indivíduos ou entidades se unam para a
realização de uma atividade comercial com objetivos lucrativos.

2.1 Personalidade Jurídica Própria

A personalidade jurídica própria da sociedade é uma característica


fundamental que distingue a sociedade empresária como uma entidade legal
separada e independente de seus sócios ou acionistas. Essa personalidade jurídica
confere a esta sociedade uma série de direitos e obrigações, permitindo-lhe atuar
como sujeito de direitos e deveres no contexto jurídico.

The first and most importante contributio of corporate law, as of other formo f
organizational law, is to permit a firm to servthis coordinating role by
operating as a single contracting party that is distinct from the various
individuals who own or manage the firm2
Tradução livre: A primeira e mais importante contribuição do direito
societário, assim como de outras formas de direito organizacional, é permitir
que uma sociedade exerça esse papel coordenador operando como uma
única parte contratante distinta dos vários indivíduos que possuem ou
gerenciam a sociedade empresarial.

1
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito empresarial. 12. ed. Barueri/SP, Atlas, 2024;
2
RINGER, Wolf-Georg. The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and Functional Approach.
Oxford University Press, 2017
11

Uma das principais vantagens da personalidade jurídica é a separação


patrimonial entre a sociedade e seus sócios. Isso significa que os ativos e passivos
desta sociedade não se confundem com os bens pessoais dos sócios. Como
resultado, os sócios geralmente não são responsáveis pelas dívidas e obrigações
contraídas para além do capital que investiram, protegendo assim seus patrimônios
pessoais em caso de falência ou insolvência da sociedade empresarial que
integram.

A personificação das sociedades é a chave do sucesso da atividade


empresarial e, consequentemente, dotada de fundamental valor para o
ordenamento jurídico. O interesse colimado com a personificação –
progresso e desenvolvimento econômico – só cederá espaço quando a
finalidade social do direito e não simplesmente o interesse do credor for
lesado3

Conferindo à sociedade a capacidade de realizar uma série de atos jurídicos


em seu próprio nome. Sendo assim, esta sociedade pode celebrar contratos, adquirir
bens, contratar funcionários, processar e ser processada em juízo, entre outras
atividades comerciais, sem a necessidade de intervenção direta de cada sócio.

A sociedade é uma pessoa e, nessa condição, é absolutamente distinta das


pessoas de seus sócios.4

Essa capacidade de agir como uma entidade legal e independente, permite


que esta exerça suas atividades empresariais de forma contínua e estável, mesmo
diante de mudanças na composição societária ou de gestão. A sociedade
empresária pode continuar suas operações normalmente.

No entanto, é importante destacar que a personalidade jurídica não isenta a


sociedade de responsabilidades legais e obrigações. A sociedade empresária deve
cumprir todas as leis e regulamentações aplicáveis ao seu setor de atuação e é
passível de responsabilização civil e criminal por atos ilícitos praticados em seu
nome.

2.2 Autonomia Patrimonial

A Autonomia Patrimonial é uma característica fundamental no direito


empresarial que conforme exposto anteriormente se refere à separação do

3
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito empresarial. 11. ed.– Barueri/SP: Atlas, 2023;
4
MAMEDE, Gladston. Direito societário. 14. ed. – Barueri/SP: Atlas, 2022;
12

patrimônio individual dos sócios que integram a sociedade empresária. Essa


característica estabelece que a sociedade, ao adquirir personalidade jurídica própria,
possui um patrimônio distinto e independente do patrimônio de seus sócios ou
acionistas. Essa separação patrimonial é um dos pilares das sociedades
empresariais e tem implicações importantes para a responsabilidade dos sócios e
para a segurança jurídica das relações comerciais.

Ainda, essa característica implica que os sócios não têm direito direto sobre
os ativos da sociedade empresária. Embora sejam proprietários das quotas partes
desta sociedade, esses ativos são considerados parte do patrimônio ativo da
sociedade empresária e não podem ser utilizados pelos sócios para satisfazer suas
dívidas pessoais. Essa separação de patrimônios proporciona segurança jurídica
aos investidores e incentiva o empreendedorismo e o investimento em novos
negócios.

Juridicamente, a Autonomia Patrimonial é reconhecida como um direito da


sociedade empresária, garantido pela legislação e pela jurisprudência. Ela implica
que os credores desta sociedade só podem buscar a satisfação de suas dívidas ou
obrigações no patrimônio pertencente a sociedade empresária, e não nos bens
pessoais dos sócios ou acionistas. Isso significa que, em caso de falência,
insolvência ou liquidação da sociedade, os credores só podem executar os bens que
pertencem à esta, não podendo atingir o patrimônio pessoal dos sócios em regra.

Além da capacidade de direito, a pessoa jurídica passa a ter patrimônio


autônomo ao dos sócios que a integram. As obrigações sociais serão
satisfeitas com os bens pertencentes à sociedade e, apenas
subsidiariamente, a depender da responsabilidade dos sócios, os credores
sociais poderão voltar-se contra os bens particulares dos sócios5

No entanto, é importante ressaltar que a Autonomia Patrimonial não é


absoluta e pode ser relativizada em determinadas situações. Por exemplo, em casos
de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, os
tribunais podem desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade empresária e
responsabilizar os sócios ou administradores pelos atos praticados em nome da
sociedade. Esse fenômeno é conhecido como desconsideração da personalidade

5
SACRAMONE, Marcelo Barbosa, Manual de direito empresarial, p. 69 / Marcelo Barbosa Sacramone. 4. ed.,
São Paulo : SaraivaJur, 2023;
13

jurídica e ocorre quando há violação do princípio da separação patrimonial de forma


a prejudicar terceiros.

2.3 Responsabilidade Limitada

Em muitas formas de composição de sociedades empresárias, como nas


sociedades limitadas e sociedades anônimas, a responsabilidade dos sócios ou
acionistas é limitada ao seu montante de capital investido. Isso significa que os
sócios ou acionistas não são pessoalmente responsáveis pelas dívidas e obrigações
da sociedade que integram o quadro societário para além do capital que investiram.

É um aspecto fundamental do direito empresarial, que determina quem deve


arcar com as dívidas e obrigações de uma sociedade. Compreender as diferentes
formas de responsabilidade patrimonial e adotar medidas para proteger o patrimônio
pessoal são aspectos essenciais para os empresários e investidores

Em que pese os sócios estejam protegidos pela separação patrimonial


proporcionada pela personalidade jurídica, existem em nosso ordenamento jurídico
hipóteses para a descaracterização da personalidade jurídica e assim possibilitando
o alcance de ao patrimônio individual de cada sócio.

3. ADMINSTRAÇÃO DA SOCIEDADE

A administração da sociedade é uma das áreas mais importantes no


funcionamento e exploração de uma atividade empresarial. Ela envolve a gestão e a
tomada de decisões estratégicas que impactam diretamente o desempenho e o
sucesso do negócio.

Os administradores das sociedades empresárias têm diversas competências


e responsabilidades, que podem variar de acordo com a estrutura organizacional e
as disposições do contrato social ou estatuto social.

O contrato social (ou, nas sociedades estatutárias, o estatuto social) atribui


competência e poder a seres humanos determinados para que ajam em
nome da pessoa jurídica, vinculando seu patrimônio. Não é – e não pode
ser – uma atribuição genérica: é preciso identificar e qualificar qual ser
humano administram e representam a pessoa jurídica. Sempre que esses
seres humanos ajam em nome da pessoa jurídica (não como eles próprios,
mas como ela), nos limites dessa atribuição de competência e poder,
expressando sua condição de representante, o ato não se compreenderá
14

como tendo sido juridicamente praticado por ele, pessoa natural, mas pela
sociedade representada.6

Os administradores deverão representar a sociedade perante terceiros,


administrar seus recursos e bens, de forma diligente e prudente, tomar decisões que
visem seu interesse social, prestar contas aos sócios ou acionistas, cumprir as leis e
regulamentações aplicáveis.

O comportamento do sócio administrador agindo em benefício próprio nos


remete a uma série de preceitos legais e responsabilidades inerentes a essa função.
Segundo o artigo 1.011 do Código Civil, é dever do administrador exercer suas
funções com probidade, agindo de maneira honesta e diligente, como se os
negócios da sociedade fossem seus. Esta obrigação reflete a responsabilidade e a
confiança depositadas no administrador para gerir os interesses da sociedade
empresária da qual fazem parte.

No entanto, quando o sócio administrador age de forma dolosa, culposa ou


em abuso de direito, viola esse dever e comete um ato ilícito, sujeitando-se à sua
responsabilização. Tanto a sociedade quanto terceiros prejudicados pelos atos do
administrador têm o direito de serem indenizados pelas perdas e danos causados,
conforme os artigos 186, 187 e 927 do Código Civil.

A responsabilidade do administrador não se limita apenas aos atos dolosos,


mas também se estende aos atos culposos, ou seja, aqueles praticados com
negligência ou imprudência.

Além disso, quando o administrador pratica atos em seu interesse pessoal e


em detrimento da sociedade, como a apropriação de créditos ou bens sociais sem o
consentimento dos sócios, ele também é responsável por restituir ou indenizar a
sociedade pelos prejuízos causados. O mesmo se aplica aos lucros obtidos
indevidamente em decorrência desses atos, conforme os artigos 1.017 e 670 do
Código Civil.

É importante ressaltar que, em situações de conflito de interesses entre o


administrador e a sociedade, como previsto no artigo 1.013, § 2º, do Código Civil, a

6
MAMEDE, Gladston. Direito societário. 14. ed. – Barueri/SP: Atlas, 2022;
15

responsabilidade do administrador também está configurada. Em tais casos, ele


deve agir com imparcialidade e priorizar os interesses da sociedade.

4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica é um instituto


jurídico de suma importância no direito empresarial, que visa proteger credores e
terceiros prejudicados por práticas abusivas ou fraudulentas por parte das
sociedades empresárias. Essa ferramenta permite que a pessoa jurídica seja
desconsiderada e os sócios/administradores sejam responsabilizados pessoalmente
pelas obrigações da sociedade em determinadas circunstâncias.

Acerca da desconsideração da personalidade jurídica, nosso ordenamento


consagra duas teorias básicas para a responsabilização dos sócios: teoria
maior e teoria menor. A primeira aplica-se ao caso de desvirtuamento da
personalidade jurídica, ao passo que a segunda se caracteriza pelo simples
inadimplemento das obrigações da sociedade. A teoria maior, por sua vez,
subdivide-se em subjetiva e objetiva. Pela primeira formulação, a
desconsideração requer o elemento fraude, enquanto que, pela segunda,
basta que se demonstre a confusão patrimonial. A legislação civil adotou a
teoria maior, nas suas duas vertentes, conforme dispõe o artigo 50, do
Código Civil (com a redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)7

Sobre a a teoria menor, o Ministro Villas Bôas Cueva esclareceu que a teoria
menor de desconsideração da personalidade jurídica, ao contrário da teoria maior,
não demanda evidências de fraude ou abuso de direito, nem necessita da
confirmação de confusão patrimonial. Basta que o consumidor evidencie o estado de
insolvência do fornecedor ou que a personalidade jurídica represente um obstáculo
ao ressarcimento dos prejuízos.

A teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica é um princípio


jurídico que permite aos tribunais ignorarem a separação entre a pessoa jurídica
(sociedade empresária) e seus sócios ou acionistas em determinadas situações
específicas. Ao aplicar essa teoria, os tribunais podem responsabilizar
individualmente os sócios ou acionistas por atos praticados em nome da empresa,
mesmo que estes estejam protegidos pela separação patrimonial proporcionada pela
personalidade jurídica.

7
NEVES, Esdras. Acórdão 1353814, 07089375420218070000, Relator: Sexta Turma Cível, data de
julgamento: 7/7/2021, publicado no DJE: 19/7/2021.
16

A teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica é


frequentemente aplicada em casos de abuso, fraude, má administração ou violação
da lei por parte da sociedade ou de seus sócios. Se esta sociedade empresária for
utilizada como instrumento para a prática de atos ilícitos ou para fraudar credores,
os tribunais podem desconsiderar a separação entre a pessoa jurídica e seus
membros e responsabilizar diretamente os sócios ou acionistas pelos danos
causados.

A aplicação da teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica é


uma questão complexa e sujeita a análise detalhada das circunstâncias específicas
de cada caso. Os tribunais devem levar em consideração uma série de fatores,
como a gravidade da conduta ilícita, o grau de participação dos sócios ou acionistas
nos atos questionados, o impacto sobre terceiros e a necessidade de proteger os
interesses públicos.

Uma questão-chave na aplicação da teoria maior é o equilíbrio entre a


proteção dos credores e a preservação da autonomia e da segurança jurídica.
Embora seja importante garantir que os credores não sejam prejudicados por
abusos perpetrados pelos sócios ou administradores, também é fundamental
proteger a estabilidade e a confiança no ambiente empresarial, incentivando
investimentos e empreendedorismo.

Ao permitir que os tribunais ignorem a separação entre a pessoa jurídica e


seus membros em certas circunstâncias, essa teoria busca assegurar que os
responsáveis por atos ilícitos ou abusivos sejam responsabilizados de forma
adequada e proporcional, protegendo assim os interesses legítimos de todas as
partes envolvidas.

Para a análise inicial do preenchimento dos pressupostos legais específicos


para a desconsideração da personalidade jurídica almejada e a instauração
do incidente, embora devam ser consideradas as variáveis insculpidas no
art. 50 do Código Civil (teoria maior), com as alterações promovidas pela Lei
nº 13.784/2019 ("Lei da Liberdade Econômica"), é suficiente a plausibilidade
da argumentação tendente a demonstrar o desvio de finalidade ou confusão
patrimonial e não é devida a incursão meritória e aprofundada acerca da
definitiva configuração do abuso da personalidade jurídica.8

8
DA SILVA, Lucimeire Maria. Acórdão 1820955, 07348523720238070000, Relatora, 5ª Turma Cível,
data de julgamento: 22/2/2024, publicado no DJE: 8/3/2024.
17

A implicação dos atos descritos anteriormente, nos quais o sócio


administrador age em benefício próprio em detrimento da sociedade, pode resultar
na aplicação do artigo 50 do Código Civil (desconsideração da personalidade
jurídica). Isso significa que, se houver abuso da personalidade jurídica, desvio de
finalidade ou confusão patrimonial, os sócios ou administradores poderão ser
responsabilizados pessoalmente pelas dívidas e obrigações da sociedade.

Essa responsabilidade pessoal pode incluir a obrigação de indenizar a


sociedade ou terceiros prejudicados pelos atos ilícitos praticados, bem como a
possibilidade de execução dos bens pessoais dos sócios que deu causa ao dano
para satisfazer as dívidas contraídas pela sociedade.

Portanto, os atos do sócio administrador em benefício próprio, em violação


aos deveres legais e éticos, podem ter sérias consequências, incluindo a
responsabilização pessoal e a perda de proteção oferecida pela personalidade
jurídica. É essencial que os sócios administradores ajam em conformidade com a lei,
visando sempre o interesse da sociedade e evitando práticas que possam
comprometer sua integridade e reputação.

A redação revogada do artigo 50 do Código Civil admitia que os efeitos de


determinadas obrigações da pessoa jurídica poderiam atingir seus sócios e
administradores. A primeira e sensível alteração legislativa, proveniente da
lei 13.487, de 20.09.2019, se relaciona à qualificação que a nova redação
exige desses "sócios e administradores" para que a eles toque a
desconsideração. Segundo a lei atual, apenas poderão sofrer os efeitos da
desconsideração os sócios e os administradores que, direta ou
indiretamente, tenham sido beneficiados pelo abuso. A mudança não é sutil,
guardando enorme impacto prático. A partir de seu advento, o interessado
em envolver o sócio ou administrador deverá demonstrar que esse gozou de
algum proveito com o uso indevido da pessoa jurídica. Com isso, procura-se
encerrar a situação injusta de um sócio minoritário, sem qualquer
participação na vida da sociedade, ficar vinculado a ter seus bens
comprometidos por uma ação de abuso dos majoritários, sobre a qual ele
não teve qualquer ingerência e, muito menos, colheu proveito, mesmo
indireto. A lei pretende apurar os responsáveis e beneficiados com o
abuso9.
9
NEVES, José Roberto de Castro, A Desconsideração da Personalidade Jurídica - O Avesso do
Avesso. In: Lei de Liberdade Econômica e seus impactos no Direito Brasileiro - 1ª ed., São Paulo:
18

A nova redação, em última análise, convida o intérprete a apreciar a


existência de um nexo causal entre o abuso (decorrente da confusão
patrimonial ou pelo desvio de finalidade) e o benefício, mesmo o indireto,
dos sócios ou administradores10

5. CONCLUSÃO

Thomson Reuters Brasil, 2020. p. 458;


10
Ibidem, p.460;

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