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ARTES VISUAIS, HISTÓRIA E

SOCIEDADE
AULA 6

Profª Danielly Sandy


CONVERSA INICIAL

A presente aula traz um texto intitulado Arte Contemporânea e trata sobre


diferentes tópicos desta produção recente do campo das artes visuais. O recorte
busca tratar primeiramente sobre a complexidade do contemporâneo, para, em
seguida, tratar sobre performance, happening, arte conceitual, escultura
contemporânea, intervenções urbanas e sobre a relação entre arte e tecnologia.
Tudo isso nos permite melhor compreender a dinâmica da contemporaneidade
no que se refere à criação e produção na arte.
Assim, o objetivo desta aula é proporcionar ao leitor as ferramentas
necessárias para adentrar o amplo e instigante universo da arte contemporânea.
Para tanto, seguimos a seguinte sequência nos assuntos:

• A complexidade do contemporâneo;
• Performance;
• Arte conceitual;
• A escultura contemporânea e as intervenções urbanas;
• Arte e tecnologia.

A arte contemporânea, ou arte pós-moderna, tem início após a Segunda


Grande Guerra Mundial. Trata-se de uma tendência estética do momento atual
com elementos característicos de nossa sociedade, que vão desde os materiais
empregados até as temáticas, reflexões e críticas propostas pelos artistas por
meio das diferentes linguagens. A arte contemporânea também propõe
investigações e descobertas por parte do artista, que passa a ser um
pesquisador, experimentador e crítico.
A arte contemporânea pode ser chamada de arte pós-moderna no sentido
de romper com aspectos modernistas e ultrapassá-los no que se refere ao fazer
artístico, muitas vezes substituindo a ideia, a proposta e o conceito. Com isso,
torna-se um campo ainda mais fértil para a subjetividade e experimentações, em
muitos casos, tanto por parte do artista como também do público. Além disso, a
arte contemporânea possui grande envolvimento com o desenvolvimento
tecnológico e suas reverberações nas sociedades. São tantas as possibilidades
na arte contemporânea que podemos considerar que “o jovem artista de hoje já
não precisa mais dizer “sou um pintor” ou “um poeta” ou “um dançarino”. Ele é
simplesmente um “artista”” (Kaprow, 1958, citado por Dempsey, 2003).

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Além do que tratamos nesse texto sobre alguns dos tópicos da arte
contemporânea, devemos lembrar, ainda, das instalações, considerando que
essas não apenas podem ser intervenções realizadas diretamente no espaço
urbano e em outros espaços alternativos, mas também dentro dos museus e
galerias. As instalações tanto podem ser obras específicas como também a
própria exposição, o que permite tanto ao artista como ao curador inúmeras
possibilidades de criação e proposição de interatividade ao público.
Isso ocorre porque a maioria das instalações proporciona experiências
únicas e sinestésicas envolvendo outros sentidos além da visão. As instalações
na realidade brincam com o espaço, permitindo ao público vivenciar a obra e, ao
mesmo tempo, evocar as suas memórias e experiências anteriores para serem
correlacionadas com o que está sendo apresentado no presente. Não há como
não se envolver com a obra.
As instalações como uma forma de linguagem das artes visuais têm início
com a exposição “Primeiros documentos do surrealismo”, realizada no ano de
1942, na cidade de Nova York, para a qual o artista dadaísta Marcel Duchamp
foi convidado para ser o curador. Não obstante, Duchamp deu asas à sua
imaginação para criar a sua obra por meio da exposição proposta pelos artistas
surrealistas. Destacamos que Duchamp não estava expondo nenhuma obra
nessa mostra, mas, ao realizar a curadoria, criou a sua obra intitulada “Milhas de
barbante”.
A obra em questão foi produzida por Duchamp quando este espalhou
barbantes pelo espaço expositivo e entre as obras, amarrando fios pelos
expositores e nos locais em que se encontravam os quadros pendurados, o que
dificultou a passagem dos visitantes da mostra e também a visibilidade das
pinturas. Como se não bastasse, ele ainda convidou um grupo de meninos para
jogar bola entre os fios na abertura da exposição, promovendo constrangimento
entre os artistas e visitantes, pois claramente o jogo oferecia riscos às obras
expostas (O’Doherty, 2002).
Nada mais justo que os artistas surrealistas se sentissem um tanto quanto
incomodados com essa atitude do curador, considerando ainda que a exposição
“Primeiros documentos do surrealismo” foi a segunda exposição para a qual ele
foi convidado para ser curador. A primeira exposição para a qual Duchamp foi
convidado como curadoria foi realizada em 1938, na cidade de Paris, sendo
intitulada “Exposição Internacional do Surrealismo” e contando com a

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participação de mais de 60 artistas de diferentes países e cerca de 300 obras
expostas. Já nessa mostra, Duchamp pendurou sacos de carvão no texto,
propondo mais uma possibilidade para o espaço expositivo (O’Doherty, 2002).
Contudo, evidenciamos que muitas das ideias propostas por Marcel
Duchamp ainda influenciam os artistas contemporâneos nas diferentes
linguagens das artes visuais. O caráter ousado no que se refere à proposição de
críticas, reflexões e questionamentos é outro item indispensável à arte
contemporânea que se embasa teoricamente em conceitos que poderão
subjetivamente sustentá-la. Assim, o que poderia ser considerado belo já não
importa mais porque a intenção da arte contemporânea vai além da fruição,
contemplação e deleite, pois se trata de uma arte que instiga e intui o pensar.

TEMA 1 – A COMPLEXIDADE DO CONTEMPORÂNEO

Também chamada pejorativamente como “arte vide bula”, a arte na


contemporaneidade se tornou ainda mais complexa em sua base e
compreensão. A subjetividade, frente às inúmeras possibilidades de criação por
meio das diferentes linguagens, permite que artistas contemporâneos brinquem
com os sentidos humanos. E não apenas a multiplicidade de linguagens, mas
também de materiais e técnicas, convencionais ou não, incluindo matéria viva,
reflete a liberdade que a arte assumiu desde o século XX. De acordo com
Cocchiaralle:

A arte contemporânea esparramou-se para além do campo


especializado, construído pelo modernismo, e passou a buscar uma
interface com quase todas as outras artes e, mais, com a própria vida,
tornando-se uma coisa espraiada e contaminada por temas que não
são da própria arte. (Cocchiaralle, 2006, p. 16)

Entre as características principais da arte contemporânea, evidentemente


destacamos a liberdade de expressão, pois, comparados a outros séculos, os
séculos XX e XXI permitem aos artistas aberturas em diferentes campos. Além
disso, a arte contemporânea trabalha com a fusão de diferentes estilos e técnicas
permitindo que uma mesma obra possa ser composta por pintura, escultura,
vídeo arte e tudo o mais que o arista queira inserir no espaço expositivo como
sua obra. Isso evidencia o caráter híbrido da arte contemporânea, o qual
multiplica ainda mais as possibilidades de criação para os artistas que também
contam com oportunidades de intervenção e apropriação de outras obras já
existentes e de outros artistas.

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Obviamente, as críticas e questionamentos sociais sobre a própria arte e
seus desdobramentos na sociedade são outra característica forte da arte
contemporânea, que instiga para que o observador possa ir além do que está
vendo ou sentindo com base em experiências sinestésicas. Isso porque a arte
visual já não permanece somente no campo da visão, passando a permitir a
expressão do artista pelo tato, pela audição, pelo olfato e pelo paladar.

Figura 1 – Instalação O corpo me segue, de Ernesto Neto, no Museu


Guggenheim, em Bilbao

Créditos: Watch The World/Shutterstock.

Assim, é fácil encontrarmos exposições diversas com propostas


interativas em que o público pode ser convidado a participar da obra, interagir,
aprender e até mesmo a recriá-la. Dessa forma, temos o conceito de obra aberta,
que, quando empregado pelo artista, tal como o título já diz, realmente deixa a
sua obra aberta para que possa passar por interferências e intervenções de
quem quer que tenha interesse em recriar algo com base nela.

O principal sentido da obra de arte é, pois, a sua capacidade de intervir


no processo histórico da sociedade e da própria arte e, ao mesmo
tempo, ser por ele determinado, explicitando, assim, a dialética de sua
relação com o mundo. (Fusari; Ferraz, 1993, p. 105)

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Figura 2 – Exposição na Galeria Nacional de Singapura, 2017, da artista Yayoi
Kusama

Créditos: KeongDaGreat/Shutterstock.

Outro fator importante a ser elencado é o reconhecimento e uso do


efêmero, ou seja, de materiais não considerados nobres no campo das artes
visuais e passíveis de rápida degradação, como materiais orgânicos diversos e
outros. Além disso, na contemporaneidade temos a valorização da ideia e
conceito em detrimento do objeto em si, que poderá ser substituído por outro
similar em qualquer momento a depender da obra e proposta do artista.
Por fim, destacamos a ampliação das dimensões e possibilidades de uma
obra, como as instalações e a apresentação da arte em espaços alternativos
como a rua, e não somente nos museus e galerias. Na atualidade, há inúmeros
artistas contemporâneos que podem ser destacados, cada qual com sua
proposta, trazendo novidades e proposições diversas para o mundo da arte.

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Figura 3 – Arco do Triunfo empacotado, em Paris, proposta contemporânea do
artista Christo

Créditos: Petr Kovalenkov/Shutterstock.

TEMA 2 – PERFORMANCES

A performance tem origem na década de 1950 e trata-se de uma


linguagem bastante usada pelos artistas contemporâneos. A performance possui
estreita ligação com o teatro e a body art (arte do corpo), a qual tem origem no
final da década de 1960. E, com base no olhar de Glusberg (1987, p. 103),
compreendemos que

a performance não é um jogo e sim uma máquina simbólica, que na


sua multiplicação artística aponta os caminhos do desenvolvimento
corporal, utilizando os recursos mais cotidianos com os fins mais
inéditos.

Os observadores da body art são passíveis a todo o tipo de emoção,


considerando o caráter múltiplo dessa linguagem que promove o voyeurismo,
evocando diferentes reações emocionais. Da mesma forma, a performance
trabalha diretamente com o corpo do artista, mas vai além do voyeurismo, pois
permite ao público a sua participação a depender da proposta.
Assim, observamos nessa linguagem artística o corpo em atuação, com
uma proposta baseada em algum conceito ou algo que o artista queira comunicar
ou mesmo investigar por meio de sua experiência performática. “A performance
é primariamente comunicação corporal; a comunicação verbal ocupa um papel
secundário nessa expressão de arte” (Glusberg, 1987, p. 117).

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O artista performático faz uso de seu próprio corpo para apresentar a sua
performance, podendo incluir ou não outros elementos e sujeitos.

O performer vai conceituar, criar e apresentar sua performance, à


semelhança da criação plástica. Seria uma exposição de sua ‘pintura
viva’, que utiliza também os recursos da dimensionalidade e da
temporalidade. (Cohen, 1989, p. 138)

De acordo com Dempsey:

A performance, fosse ela denominada ações, arte viva ou arte direta,


permitiu aos artistas romper as fronteiras entre a mídia e as disciplinas,
e entre a vida. A performance como um modo de expressão continuou
a ganhar ímpeto durante o final da década de 60 e nos anos 70,
assumindo com frequência a forma de body art. Desde então, além de
explorar questões relevantes para o universo da arte, os artistas
performáticos vêm criando uma obra que se referencia a questões
sociológicas mais amplas de nossa época. (Dempsey, 2003, p. 222-
223)

Entre as características da performance, destacamos o seu caráter


híbrido por poder envolver diversas outras linguagens e formas de expressão.
Além disso, é caraterístico de algumas performances o registro fotográfico, que
permite ao artista expor as imagens em outros momentos.
Além da performance, temos, ainda, o happening, o qual é realizado de
forma mais espontânea e improvisada que a performance, a qual necessita, de
certa forma, de um planejamento para ser executada. O happening trabalha
diretamente com a imprevisibilidade, podendo ser realizado frente ao público e
inclusive convidando o público para participar ativamente. E, ainda, essa
linguagem não é realizada muitas vezes, pois depende do timing exato percebido
pelo artista. “Os Happenings intervinham como um meio-termo prudente entre o
teatro de vanguarda e a colagem” (O´Doherty, 2002, p. 48).
Uma artista contemporânea que tem se destacado sobretudo por meio da
linguagem performática é a sérvia Marina Abramovic, jocosamente considerada
como a avó da performance. Sua obra performática tem início a partir da década
de 1970 e investiga os limites do corpo, as relações entre o artista e o público,
bem como as possibilidades da mente humana.

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Figura 4 – Registro fotográfico de performance da artista Marina Abramovic

Créditos: bibiphoto/Shutterstock.

TEMA 3 – A ARTE CONCEITUAL

A arte conceitual tem origem a partir da década de 1960 e se embasa no


conceito para se valer como arte, podendo fazer uso de qualquer linguagem,
material e técnica, efêmera ou não, desde que tenha uma base conceitual sólida.
Assim, a arte conceitual se faz por meio da ideia, do pensamento proposto pelo
artista, que, mediante isso, pode fazer ou não uso do efêmero a considerar que
a sua ideia se sobrepõe a qualquer material empregado para a criação de sua
obra. Com isso, é pretendido que a inteligência se sobreponha ao belo com essa
proposta contemporânea, dando valor à arte como forma de se fazer pensar.
Conforme aponta Dempsey sobre a arte conceitual:

A arte conceitual surgiu como categoria ou movimento no final da


década de 60 e no início da década seguinte. Também costuma ser
designada como arte da ideia ou arte da informação e seu preceito
básico é o de que as ideias ou conceitos constituem a verdadeira obra
[...]. Em um exemplo mais extremado, a arte conceitual renuncia
completamente ao objeto físico, usando mensagens verbais ou
escritas para transmitir ideias. (Dempsey, 2003, p. 240)

Mas também há obras conceituais que fazem uso de materiais nobres e


de um resultado estético primoroso para se consolidarem, tais como a obra do
artista inglês Damien Hirst, intitulada For the Love of God, feita por meio de
platina, diamantes e dentes humanos. Por meio dessa obra, Hirst pretende trazer
à tona reflexões acerca da morte, do luto e de seus desdobramentos, evocando
a famosa frase bastante aplicada pelos artistas barrocos em suas obras no
século XVI e XVII: Memento mori (morrerás um dia).

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Obviamente, há obras cujo conceito está mais evidente para a sua
existência do que a própria matéria do suporte que a permite existir. Vale
destacar que toda a arte contemporânea é, de certa forma, conceitual em suas
distintas e múltiplas linguagens. Uma obra conceitual bastante intrigante é a obra
Merda d’artista, de 1961, proposta pelo artista italiano Piero Manzoni, o qual
enlatou mecanicamente seus próprios excrementos para vender as latas ao
preço da cotação diária do ouro. As latas ainda foram exportadas para diferentes
países, e, por isso, podem apresentar rótulos em diferentes idiomas. O intuito de
Manzoni era promover uma crítica tanto à arte conceitual como também à
sociedade de consumo.

Figura 5 – Latas de Merda de Artista em edição limitada, obra de Piero Manzoni

Créditos: Dave Smith/Shutterstock.

Outro artista contemporâneo em cuja produção artística, ideias e


conceitos propostos podemos nos aprofundar mais é o chinês Ai Weiwei. Suas
obras vão desde instalações e intervenções a objetos diversos, mas sempre com
profundo e forte apelo crítico e conceitual. Suas críticas políticas ao sistema
governamental totalitário da China já lhe renderam grandes problemas que
acabaram se tornando sua inspiração para a produção de mais obras. Isso
mostra o quanto a arte e ideias de um artista bem informado pode realmente
incomodar aqueles que se apresentam frente ao poder.
No ano de 2013, Ai Weiwei expôs na Tate Gallery, em Londres, a sua obra
“Sunflower Seeds” (sementes de girassol) com cerca de 100 milhões de
pequenas peças de porcelana pintadas a mão. Inicialmente, o público podia
andar sobre as sementes, tocá-las, pegá-las e pular sobre elas. Porém, essa
possibilidade de interação foi fechada ao público devido aos riscos à saúde
em decorrência do pó que o atrito entre as peças poderia oferecer.

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Figura 6 – Obra Sementes de girassol, de Ai Weiwei na Tate Gallery, em
Londres, fechada ao público devido aos riscos que poderia trazer à saúde. Trata-
se de 100 milhões de pequenas peças de porcelana pintadas a mão

Créditos: Nando Machado/Shutterstock.

TEMA 4 – A ESCULTURA CONTEMPORÂNEA E AS INTERVENÇÕES


URBANAS

A escultura contemporânea é livre em todos os sentidos, desde a técnica


aos materiais e dimensões escolhidos pelo artista. Essas esculturas podem se
transformar em elementos do espaço urbano, fazendo desse um espaço
expográfico no qual o transeunte se torna observador do mundo e das obras que
o rodeiam. Assim, muitas esculturas contemporâneas podem ir além dos
espaços institucionalizados como museus e galerias, estando expostas também
nos espaços alternativos, como ruas e centros urbanos.
Assim, a escultura contemporânea também pode ser uma obra
arquitetônica a depender da proposta do arquiteto, que pode compreender o seu
projeto como uma obra de arte. Com isso, percebemos o quanto essa linguagem
da arte contemporânea funciona como uma forma de intervenção. Em muitos
locais, a escultura contemporânea se apresenta como elemento de contraste,
propondo uma ideia ou crítica, além de seu resultado e qualidade estética.
Dentre as mais famosas esculturas contemporâneas, podemos citar as
extravagantes obras do artista norte-americano Jeff Koons. Suas esculturas
gigantes são produzidas por meio da técnica de topiaria, o que parece bastante
inusitado, ao mesmo tempo em que mostra a pluralidade de técnicas, as quais
podem ser utilizadas pelos artistas contemporâneos.

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O topiaria é uma técnica milenar de jardinagem que permite a modelagem
de plantas e arbustos. A obra Puppy, de Koons, feita por meio da técnica de
topiaria e medindo cerca de 16 metros de altura, apresenta a forma de um
cachorro. Para essa obra, o artista produziu uma estrutura de ferro que pudesse
ser revestida por flores e plantas naturais, sendo estas trocadas sempre que
necessário.

Figura 7 – Escultura de flores Puppy em frente ao Museu Guggenheim de


Bilbaona, Espanha

Créditos: BearFotos/Shutterstock.

Outro exemplo do qual podemos lembrar ao citarmos as esculturas


contemporâneas é o artista Rom Mueck, com suas obras hiper-realistas e de
tamanhos não convencionais. Rom Mueck cresceu em meio à produção de
marionetes e outros brinquedos, aprendendo desde cedo as técnicas de
fabricação de bonecos para futuramente trabalhar com a produção de cenários.
Mas foi a partir da década de 1990 que ingressou no mundo da arte com suas
esculturas que propõem diferentes leituras, e, ao mesmo tempo, despertam
distintas emoções em quem as observa, tanto pelo impacto do tamanho como
pela similaridade com o real.

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Figura 8 – Escultura hiper-realista Menino, de Ron Mueck

Créditos: Lisaveya/Shutterstock.

4.1 Intervenções urbanas

A arte contemporânea trabalha muito com a intervenção, promovendo a


interferência visual, inclusive como forma de linguagem artística. Atualmente, a
intervenção pode ser realizada em praticamente tudo, tanto em um objeto
qualquer como em uma edificação, outra obra de arte e mais. Já na obra
intitulada L.H.O.O.Q., de Marcel Duchamp, 1919, cuja leitura da sigla remete à
frase em francês "Elle a chaud au cul" (Ela tem o rabo quente), podemos
identificar uma reprodução da imagem da obra da Mona Lisa, de autoria de
Leonardo da Vinci, como referência visual, mas com um bigode desenhado pelo
artista dadaísta. Trata-se de uma intervenção de Duchamp na imagem em
questão, provocando questionamentos sobre o que ela representa visualmente
e no mundo da arte.
De forma geral, as intervenções na arte surgem a partir da década de
1970, visando aos espaços expositivos não convencionais, ou seja, extramuros
dos museus, galerias, centros culturais e qualquer outro espaço
institucionalizado para a prática da realização de mostras expositivas. As
intervenções visam, além do mais, à transformação da vida cotidiana e vêm
ganhando cada vez mais espaço no cenário urbano por meio de manifestações,
como street art em geral, como o grafite, as colegas e o lambe-lambe, as
instalações de objetos, a apresentação de performances em determinado
cenário para contextualizar ou intervir de alguma forma, e a realização de
happenings.

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Dentre os inúmeros exemplos de instalações artísticas, podemos
evidenciar a obra do artista Ai WeiWei, exposta no ano de 2016, na Konzerthaus,
na cidade de Berlim, na Alemanha. Para a concretização dessa obra, Ai Weiwei
expôs cerca de 14 mil coletes salva-vidas encontrados por ele na Ilha de Lesbos,
na Grécia. A intenção era mostrar a trágica situação da crise de 2015 dos
refugiados que tentavam escapar pelo Mar Mediterrâneo, considerando, ainda,
que somente a Alemanha estimou que cerca de 800 mil pessoas tenham
solicitado asilo nesse período.

Figura 9 – Instalação na cidade de Berlim. Obra política mostrando a crise dos


refugiados por Ai Weiwei

Créditos: 360b/Shutterstock.

Dentre as mais famosas intervenções artísticas do mundo está a “Cow


Parade” (Parada da Vaca), com a intenção de democratizar a arte, permitindo e
estabelecendo um diálogo entre a arte contemporânea e o espaço urbano.
Assim, as reproduções em fibra de vidro da escultura de uma vaca, de autoria
do artista suíço Pascal Knapp, puderam ser espalhadas por diferentes cidades
do mundo todo, sendo pintadas por artistas locais. Com isso, apesar de
observarmos a mesma reprodução escultórica, nos deparamos com diferentes
resoluções pictóricas no mundo todo.

Figura 10 – Cow Parade em Atenas, na Grécia

Créditos: Theastock/Shutterstock.

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Outra linguagem urbana de destaque que tem se difundido muito desde a
década de 1970 é o grafite. O grafite hoje permite que as paredes e muros das
cidades se tornem arte por meio de imagens e letras específicas. Trata-se de
uma arte produzida tanto em locais públicos como privados e de acesso ao
coletivo. Entretanto, com origem em Nova York, inicialmente o grafite tratava
mais de uma forma de expressão urbana por meio da qual adultos e crianças se
manifestavam, passando a se desenvolver em termos de técnicas e pictóricos
até os dias atuais.
O grafite não surgiu isoladamente como tentativa de manifestação
artística, mas sim como uma forma de expressão do movimento cultural norte-
americano hip hop, com origem na década de 1960, o qual buscava dar voz aos
membros das periferias. Não obstante, o hip hop é um movimento cultural das
ruas por meio do qual os integrantes buscavam apresentar suas reações frente
aos problemas de desigualdade social e violência urbana com as classes sociais
marginalizadas. Com isso, o hip hop se difundiu na música, na moda, na dança,
bem como nas artes visuais, seguindo o que é chamado de freestyle, ou estilo
livre.

Figura 11 – 'CCTV‘, grafite em Londres, de Banksy

Créditos: Jeremy Reddington/Shutterstock.

Vale destacar que a inscrição de informações, expressões ou críticas


como forma de manifestação urbana vem desde o Império Romano. Um exemplo
são as inscrições nas ruínas de Pompeia, por meio das quais hoje se estuda o
latim vulgar. Tais inscrições mostram desde o descontentamento social e político
por parte da população da época até expressões sentimentais e declarações
amorosas.

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Em meio a muitas polêmicas, a linguagem do grafite é defendida por
muitos como arte urbana, porém, é também atacada por alguns que a
consideram pichação, ou seja, uma forma de vandalismo e depredação do
patrimônio público ou privado. Assim, para que uma obra de grafite possa ser
realizada, é necessário que artista e proprietário, ou responsável pelo local,
estejam em comum acordo. Dentre os principais grafiteiros, podemos destacar
Jean-Michel Basquiat (1960-1988), Keith Haring (1958-1990), Alex Vallauri
(1949-1987), Banksy, Aryz, Chris Ellis (Daze), Os gêmeos (Irmãos Pandolfo),
Eduardo Kobra, Frank Shepard Fairey e outros.

Figura 12 – Retrato do arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer em grafite na Avenida


Paulista, em São Paulo, por Eduardo Kobra

Créditos: MAR Photography/Shutterstock.

TEMA 5 – ARTE E TECNOLOGIA

Conforme mencionado anteriormente, a arte contemporânea permitiu que


os artistas trabalhassem com múltiplas técnicas e linguagens. Além disso, com
os avanços tecnológicos, a arte passou a contar também com mais
possibilidades. Tal relação mostra o quanto a arte está relacionada à sociedade
e aos desdobramentos de seu tempo, não podendo se desligar da realidade e
de acontecimentos diversos.
Isso deu origem a mais linguagens e formas de expressão, além da
ampliação no que se refere ao hibridismo. Para Machado (2007, p. 24):

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As técnicas, os artifícios, os dispositivos de que se utiliza o artista para
conceber, construir e exibir seus trabalhos não são apenas ferramentas
inertes, nem mediações inocentes, indiferentes aos resultados, que se
poderiam substituir por quaisquer outras. Eles estão carregados de
conceitos, eles têm uma história, eles derivam de condições produtivas
bastante específicas. A artemídia, como qualquer arte fortemente
determinada pela mediação técnica, coloca o artista diante do desafio
permanente de, ao mesmo tempo em que se abre às formas de
produzir do presente, contrapor-se também ao determinismo
tecnológico, recusar o projeto industrial já embutido nas máquinas e
aparelhos, evitando assim que sua obra resulte simplesmente num
endosso dos objetivos de produtividade da sociedade tecnológica.
(Machado, 2007, p. 24)

Conforme as evoluções tecnológicas, as linguagens artísticas se ampliam


ao mesmo tempo em que não estão limitadas ao uso dos equipamentos
tecnológicos, pois também contam com os conceitos e outras possibilidades que
a tecnologia é capaz de oferecer. Das artes diretamente relacionadas à
tecnologia, podemos evidenciar as principais:

• Videoarte: tem início na década de 1960 e usa a tecnologia e o vídeo


como suporte para a criação;
• Web art ou internet art: realiza-se por meio da interatividade na web,
sendo uma produção artística realizada entre usuários da internet;
• Arte multimídia: congrega múltiplas mídias para a produção de uma obra;
• Computer art: trata-se de uma produção por meio da aplicação de
técnicas computacionais no âmbito da arte e estética;
• Virtual art: produzida a partir da década de 1980, envolve jogos de vídeo
game, filmes e animações, trabalhando com a realidade virtual,
aumentada e mista;
• Video mapping: projeção em grandes dimensões e em superfícies
irregulares diversas, como edifícios e construções nos espaços urbanos;
• Arte digital: produzida por meio de técnicas gráficas computacionais;
• Arte holográfica: projeção de imagens artísticas em formato holográfico.

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Figura 13 – Festival das luzes de Berlim, projeção de vídeo mapping na Catedral
de Berlim

Créditos: Peeradontax/Shutterstock.

Sobre a videoarte, essa linguagem tem início na década de 1960, a partir


da qual o vídeo se torna elemento fundamental, promovendo a interação entre a
imagem e o observador da obra. A intenção dos primeiros artistas da videoarte
era se contrapor à mídia televisiva com suas práticas comerciais e
massificadoras.
Com isso, identificamos uma forte crítica à televisão e a tudo que pudesse
estar relacionado a ela.

Os primeiros videoartistas fundiram as teorias da comunicação global


com elementos da cultura popular para realizar vídeos, instalações que
usavam um canal ou multicanais, produções com transmissões de
satélites internacionais e esculturas multimonitoradas. (Dempsey,
2003, p. 258).

Para além dessas críticas, a vídeo arte ainda propunha uma forte reflexão
acerca das imagens, seu uso e também sobre a história da arte.
Um dos principais artistas da videoarte é o artista sul-coreano Nam June
Paik (1932-2006), o qual, “em particular, submeteu a televisão a seu espírito
irreverente, declarando: ‘Torno a tecnologia como ridícula’” (Dempsey, 2003, p.
258). No ano de 1963, Paik criou uma obra com 13 aparelhos de TV objetivando
propor uma análise por meio das possíveis distorções imagéticas. A intenção era
fazer uso dos defeitos e problemas de transmissão para a realização de sua obra
e também de uma performance.

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Figura 14 – Instalação para TV, obra do videoartista sul-coreano Nam June Paik

Créditos: Gina Smith/Shutterstock.

NA PRÁTICA

Tendo como base o que aprendemos nesta aula:

• Realize uma visita a um museu ou galeria de arte contemporânea, mas


também pode ser uma visita virtual;
• Escolha um artista contemporâneo que apresente uma produção visual
que mais desperte o seu interesse;
• Faça uma pesquisa sobre a produção visual desse artista buscando
aprender ao máximo sobre sua poética;
• Selecione uma obra desse artista e escreva um texto crítico destacando
os principais elementos visuais;
• Procure outras referências, ou seja, autores que já trataram sobre a obra
desse artista ou de artistas que trabalham com a mesma poética ou
resultado estético;
• Após escrever o seu texto, verifique a possibilidade de publicá-lo em um
evento científico de artes visuais.

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FINALIZANDO

Nesta aula, começamos aprendendo sobre a complexidade do


contemporâneo e, consequentemente, da arte contemporânea com suas
características principais e seus questionamentos críticos e reflexivos sobre
tantas questões da sociedade. Em seguida, aprendemos sobre o que são
performances com sua influência do teatro, seus desdobramentos, como o
happening, e suas características principais, como a imprevisibilidade.
Seguimos para a arte conceitual, compreendendo o início na década de
1960, a qual abre mão de elementos materiais usados como suporte para a
criação e produção das obras visuais, dando maior ênfase a ideias obra e
conceitos obra. Com isso, verificamos sobre todo um universo que se abre, pois,
assim, a arte passa a questionar a sua própria produção, resultando em
questionamentos que tratam sobre a liberdade de uma obra para ser efêmera.
Na sequência, passamos para a escultura contemporânea e suas tantas
possibilidades, incluindo o espaço vazio, além das intervenções urbanas e suas
múltiplas possibilidades.
Por fim, tratamos sobre arte e tecnologia, incluindo artistas que trabalham
com diferentes mídias em suas propostas visuais, como videoarte, vídeo
mapping etc.

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REFERÊNCIAS

ARGAN, G. C. Arte moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

COCCHIARALLE, F. Quem tem medo da Arte Contemporânea. Recife:


Massangana, 2006.

COHEN, R. Performance como Linguagem. São Paulo: Perspectiva, 1989.

DEMPSEY, A. Estilos, escolas e movimentos. São Paulo: Cosac e Naify, 2003.

FUSARI, M. F. R.; FERRAZ, M. H. C. T. Arte na Educação Escolar. São Paulo:


Cortez, 1993.

GLUSBERG, J. A Arte da Performance. São Paulo: Perspectiva, 1987.

MACHADO, A. Arte e mídia: aproximações e distinções. v. 2, n. 4. Rio de


Janeiro: Zahar, 2007.

O’DOHERTY, B. No interior do cubo branco: a ideologia do espaço da arte.


São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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