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INTERFACE DA ANTROPOLOGIA COM A

PSICOLOGIA
AULA 1
PRFA. DRA MARILU MARCIA CAMPELO
ANTROPOLOGIA PARA QUEM NÃO É
ANTROPOLOGO

Antropologia é o estudo do homem como ser biológico, social e cultural. Sendo


cada uma destas dimensões por si só muito ampla, o conhecimento antropológico
geralmente é organizado em áreas que indicam uma escolha prévia de certos
aspectos a serem privilegiados como a “Antropologia Física ou Biológica”
(aspectos genéticos e biológicos do homem), “Antropologia Social” (organização
social e política, parentesco, instituições sociais), “Antropologia Cultural” (sistemas
simbólicos, religião, comportamento) e “Arqueologia” (condições de existência dos
grupos humanos desaparecidos). Além disso podemos utilizar termos como
Antropologia, Etnologia e Etnografia para distinguir diferentes níveis de análise ou
tradições acadêmicas.
Para o antropólogo Claude Lévi-Strauss (1970:377) a etnografia corresponde “aos
primeiros estágios da pesquisa: observação e descrição, trabalho de campo”. A
etnologia, com relação à etnografia, seria “um primeiro passo em direção à síntese”
e a antropologia “uma segunda e última etapa da síntese, tomando por base as
conclusões da etnografia e da etnologia”.
Qualquer que seja a definição adotada é possível entender a antropologia como uma
forma de conhecimento sobre a diversidade cultural, isto é, a busca de respostas para
entendermos o que somos a partir do espelho fornecido pelo “Outro”; uma maneira de
se situar na fronteira de vários mundos sociais e culturais, abrindo janelas entre eles,
através das quais podemos alargar nossas possibilidades de sentir, agir e refletir
sobre o que, afinal de contas, nos torna seres singulares, humanos.
Refletir sobre o que no aproxima e o que nos diferencia.
Algumas informações básicas sobre os principais paradigmas e escolas de
pensamento antropológico.(inglesa, francesa e americana)
(fonte: https://antropologia.fflch.usp.br/antropologia) e Rafael Santos e François
Laplantine
Como se desenvolveu a antropologia

A Antropologia deu seus primeiros passos no inicio do século XIX como


ciência acadêmica e pesquisa planejada (Na história da antropologia, alguns
autores tendem a coloca-la desde a Antiguidade, mas não é esse o nosso
foco aqui) ao mesmo tempo que a Sociologia. Porém um foco as
diferenciava: o tipo de sociedade que ambas queriam explicar.
“O fato de ambas começarem no mesmo momento histórico e na mesma região do mundo não foi mera coincidência,
mas resultado de uma série de mudanças sociais, econômicas e políticas, ou, para falar como cientista social, de um
determinado contexto.” (SANTOS, 2005:19)  principal fator: desenvolvimento do
capitalismo
A antropologia tem suas origens históricas no processo de expansão do
capitalismo, através do colonialismo e do imperialismo das nações ricas
que estenderam seus dominios aos lugares mais remotos do mundo.  “...
dado importante que não nos deixa esquecer a relações de força e poder envolvendo paises centrais, como
Inglaterra, Alemanha e França, e paises e regiões subjugados direta ou indiretamente pelo sistema, como boa parte
das culturas africanas, asiáticas, indianas e lation-americanas.” (SANTOS, 2005:21)
Os primeiros antropologos, cientistas das sociedades exóticas, não coletavam
seus dados de modo direto. Eles se baseavam em informações (que podemos
chamar de terceira mão) enviadas por missionários, mercadores, militares e
funcionários coloniais.
Dois aspectos desta antropologia inicial deve ser destacado que são úteis para
compreender as notas ideias sobre sociedades que nós não conhecemos: a) a
forte influência de aspectos do positivismo, evolucionismo, e os determinismos
geográficos e biológicos que os primeiros pesquisadores tinham das “outras”
sociedades; b) e ausência do trabalho de campo, ou seja do pesquisador in loco
na cultura estudada, coletando dados e fazendo observação direta.
O Método Antropológico

A antropologia tem como objeto privilegiado de estudo costumes, crenças, hábitos,


universo psíquico, mitos, rituais, processo histórico, linguagem, leis, relações de
parentesco,dentre outros temas. Todos esses são aspectos subjetivos dos
diferentes povos do planeta.
O método antropológico consiste, basicamente, na prática da etnografia
(descrição do trabalho de campo) e etnologia (síntese dos conteúdos descritos em
campo). Deste modo, por meio da análise crítica, é possível interpretar os
fenômenos descritos.
Além disso, utiliza metodologias e conhecimentos comuns em pesquisas de
outras áreas do conhecimento, tal como linguística, arqueologia, história,
psicologia, dentre outras.
Os viajantes.
Formação de uma literatura “etnográfica” sobre a diversidade cultural

Período Séculos XVI-XIX

Relatos de viagens (Cartas, Diários, Relatórios etc.) feitos por


Características missionários, viajantes, comerciantes, exploradores, militares,
administradores coloniais etc.

Descrições das terras (Fauna, Flora, Topografia) e dos povos


Temas e Conceitos “descobertos” (Hábitos e Crenças).Primeiros relatos sobre a
Alteridade

Pero Vaz Caminha (“Carta do Descobrimento do Brasil” - séc. XVI).


Alguns  Hans Staden (“Duas Viagens ao Brasil” - séc. XVI).
Representantes Jean de Léry (“Viagem a Terra do Brasil” - séc. XVI).
e obras de referência Jean Baptiste Debret (“Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil” - séc.
XIX).
Evolucionismo
Escola/paradigma Evolucionismo social

Período Século XIX

Sistematização do conhecimento acumulado sobre os


Características “povos primitivos”. Predomínio do trabalho de
gabinete.

Unidade psíquica do homem.Evolução das


sociedades das mais “primitivas” para as mais
“civilizadas”. Busca das origens (Perspectiva
Temas e Conceitos
diacrônica). Estudos de Parentesco /Religião
/Organização Social.Substituição conceito de raça pelo
de cultura.

Maine (“Ancient Law” - 1861).


Alguns  Herbert Spencer (“Princípios de Biologia” - 1864).
Representantes E. Tylor (“A Cultura Primitiva” - 1871).
e obras de referência L. Morgan (“A Sociedade Antiga” - 1877).
James Frazer (“O Ramo de Ouro” - 1890)
Escola Sociológica Francesa
Escola/paradigma Escola Sociológica Francesa
Período Século XIX

Definição dos fenômenos sociais como objetos de


Características investigação socio-antropológica.
Definição das regras do método sociológico.

Representações coletivas.Solidariedade orgânica e mecânica.


Formas primitivas de classificação (totemismo) e teoria do
Temas e Conceitos conhecimento. Busca pelo Fato Social Total (biológico +
psicológico + sociológico). A troca e a reciprocidade como
fundamento da vida social (dar, receber, retribuir).

Émile Durkheim:“Regras do método sociológico”- 1895;


“Algumas formas primitivas de classificação” - c/ Marcel
Mauss - 1901; “As formas elementares da vida religiosa” -
Alguns 
1912.
Representantes
Marcel Mauss:“Esboço de uma teoria geral da magia” - c/
e obras de referência
Henri Hubert - 1902-1903; “Ensaio sobre a dádiva” - 1923
-1924; “Uma categoria do espírito humano: a noção de
pessoa, a noção de eu”- 1938).
Funcionalismo
Escola/paradigma Funcionalismo
Período Século XX - anos 20

Modelo de etnografia clássica (Monografia). Ênfase no


trabalho de campo (Observação participante).
Características
Sistematização do conhecimento acumulado sobre uma
cultura.

Cultura como totalidade.Interesse pelas Instituições e


Temas e Conceitos suas Funções para a manutenção da totalidade cultural.
Ênfase na Sincronia x Diacronia.

Bronislaw Malinowski (“Argonautas do Pacífico Ocidental”


-1922).
Radcliffe Brown (“Estrutura e função na sociedade
primitiva” - 1952-; e “Sistemas Políticos Africanos de
Parentesco e Casamento”, org. c/ Daryll Forde - 1950).
Evans-Pritchard (“Bruxaria, oráculos e magia entre os
Alguns 
Azande” - 1937; “Os Nuer” - 1940).
Representantes
Raymond Firth (“Nós, os Tikopia” - 1936; “Elementos de
e obras de referência
organização social - 1951).
Max Glukman (“Ordem e rebelião na África tribal”- 1963).
Victor Turner (“Ruptura e continuidade em uma sociedade
africana”-1957; “O processo ritual”- 1969).
Edmund Leach - (“Sistemas políticos da Alta Birmânia” -
1954).
Culturalismo Norte-Americano
Escola/paradigma Culturalismo Norte-Americano

Período Séc. XX - anos 30

Método comparativo. Busca de leis no


Características desenvolvimento das culturas. Relação
entre cultura e personalidade.

Ênfase na construção e identificação de


Temas e Conceitos padrões culturais (“patterns of culture”)
ou estilos de cultura (“ethos”).

Franz Boas (“Os objetivos da etnologia”


- 1888; “Raça, Língua e Cultura” - 1940).
Alguns  Margaret Mead (“Sexo e temperamento
Representantes em três sociedades primitivas” - 1935).
e obras de referência Ruth Benedict (“Padrões de cultura” -
1934; “O Crisântemo e a espada” -
1946).
Estruturalismo
Escola/paradigma Estruturalismo

Período Século XX - anos 40

Busca das regras estruturantes das


culturas presentes na mente humana.
Características Teoria do parentesco/Lógica do
mito/Classificação primitiva. Distinção
Natureza x Cultura.

Princípios de organização da mente


Temas e Conceitos humana: pares de oposição e códigos
binários. Reciprocidade.

Claude Lévi-Strauss:“As estruturas


elementares do parentesco” - 1949.
“Tristes Trópicos”- 1955.
Alguns 
“Pensamento selvagem” - 1962.
Representantes
“Antropologia estrutural” - 1958
e obras de referência
“Antropologia estrutural dois” - 1973
“O cru e o cozido” - 1964
“O homem nu” - 1971
Antropologia Interpretativa
Escola/paradigma Antropologia Interpretativa

Período Século XX - anos 60

Cultura como hierarquia de significados


Busca da “descrição densa”.
Características
Interpretação x Leis. 
Inspiração Hermenêutica.

Interpretação antropológica: Leitura da


Temas e Conceitos leitura que os “nativos” fazem de sua
própria cultura.

Alguns  Clifford Geertz:


Representantes “A interpretação das culturas” - 1973.
e obras de referência “Saber local” - 1983.
Antropologia Pós-moderna ou Crítica
Escola/paradigma Antropologia Pós-Moderna ou Crítica

Período Século XX - nos 80

Preocupação com os recursos


retóricos presentes no modelo
textual das etnografias clássicas e
contemporâneas. Politização da
Características
relação observador-observado na
pesquisa antropológica. Critica dos
paradigmas teóricos e da “autoridade
etnográfica” do antropólogo.

Cultura como processo polissêmico.


Etnografia como representação
polifônica da polissemia cultural.
Temas e Conceitos
Antropologia como
experimentação/arte da crítica
cultural.

James Clifford e Georges Marcus


(“Writing culture - The poetics and
politics of ethnography” - 1986).
George Marcus e Michel Fischer
(“Anthropoly as cultural critique” -
Alguns 
1986).
Representantes
Richard Price (“First time” - 1983).
e obras de referência
Michel Taussig (“Xamanismo,
colonialismo e o homem selvagem”-
1987).
James Clifford (“The predicament of
culture” - 1988).
Perspectivas pos-colonial e decolonial na
antropologia

Os estudos pós-coloniais são uma perspectiva crítica oriunda dos estudos


culturais e literários dos anos 1970 no mundo anglo-saxão, questionando o
ocidentalcentrismo na construção do Outro e seus múltiplos efeitos na realidade
de países ex-colônias.
Os(as) autores(as) dessa escola de pensamento analisam os efeitos dessas
construções (orientalismo, islamofobia, por exemplo), enquanto diferenciações
culturais que serviram e servem aos interesses coloniais ainda hoje, porém de
forma ressignificada e mais sútil, a exemplo do racismo.
Nos diferentes continentes (África, Ásia e América Latina) a perspectiva adquiriu
especificidades próprias.
A principal defesa dessa vertente consiste em um olhar não eurocêntrico e
pluriversal da modernidade, relacionando-a com a colonialidade como o seu lado
oculto e mais escuro (MIGNOLO, 2017.a)
Nessa perspectiva, a modernidade passa a ser pensada a partir de suas margens
e não de maneira universal, como se propunha em sua versão europeia. O início
da modernidade é ressituado temporalmente para o ano de 1492, ano da chegada
de Colombo às Américas, e não no marco da Revolução Industrial e Francesa,
visto como marcos desse processo segundo a literatura histórica clássica. Esse
processo de expansão do capitalismo e da modernidade resultou na invasão das
Américas e de muitas violências com os seus povos, suas culturas e seus saberes,
o que tem afetado suas diferentes ancestralidades e expressões até hoje.
A colonialidade representa a continuidade de formas de
exploração/dominação/conflito, que mesmo após cessado o domínio político dos
países centrais se perpetuaram através de sua reprodução na dimensão cultural.
A teoria pós-colonial é um conjunto de estudos provenientes do mundo europeu anglo
-saxão, que funda-se com a tríade francesa Memmi, Césaire e Fannon (BALLESTRIN,
2013), além de autores bem referenciado tais como o palestino Edward Said (1935
-2003), crítico literário e ativista social e político, autor dos clássicos “Orientalismo”
(1978) e “Cultura e Imperialismo” (1995); a indiana Gayatri C. Spivak2 , autora do
“Pode o subalterno falar?” (1993); e o britânico-jamaicano Stuart Hall3 , teórico
cultural e sociólogo, autor de “A identidade na Pós-modernidade” (1992). Como
importante nome da perspectiva pós-colonial também vale a pena fazer referência à
obra “O local da cultura'' (1994) do indobritânico Homi K. Bhabha.
Já o pensamento decolonial é um pensamento que tem sua origem fora do
mundo acadêmico, o mesmo diz respeito a toda experiência que se contrapôs à
experiência colonial desde seu começo. De acordo com o grupo
modernidade/colonialidade, mais especificamente segundo Mignolo (2007), a
perspectiva pós-colonial inverte o nosso olhar a colocar o Sul por exemplo como
referência para o Norte, mas o pensamento decolonial busca mudar os termos e
pensar para além de Sul e Norte (que são formas de ver eurocêntricas).
São relevantes as reflexões teóricas desenvolvidas pelo projeto
modernidade/colonialidade em torno do tema da colonialidade do poder, do ser,
do saber na qual reside o foco de algumas pesquisa atuais e que posteriormente
apoiou a leitura e as análises das monografias encontradas.

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