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TEORIA E HISTÓRIA DA ARQUITETURA E DO URBANISMO I

ASSER – Rio Claro

Aula 01
A formação da cidade industrial

Professores – Monica C.B.Frandi Ferreira e Renata Segalla


SICA, Paolo. Historia del urbanismo – El siglo XIX (vol.1º). Madrid: Instituto de Estudios de Administración Local, 1981.
BENEVOLO, Leonardo. As origens da urbanística moderna. Lisboa: Editorial Presença, 1963.
CHOAY, Françoise. O urbanismo: utopias e realidades, uma antologia. São Paulo: Perspectiva, 2007.
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A FORMAÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL

MUDANÇAS PRODUZIDAS PELA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL


NOS NÚCLEOS URBANOS NO SÉCULO XIX

O aparecimento e a importância desse fenômeno seguem a ordem e o nível de industrialização dos países:
Grã-Bretanha aparece nos recenseamentos desde 1801, França e Alemanha a partir de 1830.

1. AUMENTO DA POPULAÇÃO:

Diminuição da taxa de mortalidade e o consequente aumento da porcentagem da população jovem:

* melhorias na alimentação (carne fresca, verduras, trigo), no asseio pessoal (maior consumo de sabão e de
roupa branca de algodão) e nas habitações (substituição da madeira pelo tijolo para as paredes, do colmo
pela ardósia e pedra para os telhados, e diminuição das atividades industriais no interior da moradia);

* progressos da medicina e da cirurgia e aumento dos hospitais, com reflexos positivos na saúde pública em
geral (ROSEN, G. História da Saúde Pública);

* localização mais racional dos depósitos de lixo e dos cemitérios e melhoramentos dos aquedutos e esgotos
nas cidades.
O crescimento total da população inglesa entre 1750-1900
e a relação entre população urbana (hachura) e população rural (em branco)
População de Londres:
1801: 864.845 habitantes - 1841: 2.235.000 (Benevolo) ou 1.873.676 (Choay) - 1891: 4.232.118 hab.
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MUDANÇAS PRODUZIDAS PELA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL


NOS NÚCLEOS URBANOS NO SÉCULO XIX

2. REVOLUÇÃO AGRÍCOLA: o processo de fechamento dos campos, ou “enclosure”.

* O antigo sistema de parcelamento das terras comuns (common fields) ao redor das aldeias, sobretudo
inglesas, em nome da racionalização da produção agrícola (melhor aproveitamento do solo e aumento da
produtividade), foi rompido legalmente (na Grã-Bretanha, pelo Ato de 1801).

* Os cultivadores diretos, tornaram-se rendeiros ou assalariados, onde os baixos salários asseguravam aos
trabalhadores somente mínimo vital, excluindo qualquer melhoria da sua condição.

* Esse desequilíbrio da organização tradicional, determina a expulsão das formas originárias de emprego e
subsistência, e essa população marginal, que encontrava nos commons fields seu próprio engajamento
social e produtivo, passa a migrar para os núcleos urbanos, em busca do trabalho na indústria nascente.
A aldeia de Balscott (Oxfordshire, Grã-Bretanha), em 1768, com os common fields (terrenos comunais)
explorados em regime de concessão de pequenos lotes e a posterior concentração de parcelas
subsequênte ao processo de fechamento dos campos ou enclousure.
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2. REVOLUÇÃO AGRÍCOLA X REVOLUÇÃO INDUSTRIAL:


* A alternativa nos núcleos urbanos era o trabalho industrial, sobretudo o têxtil, que aos poucos
abandonava a antiga organização familiar (operações de fiação, tecelagem e tintura realizadas pela
mesma família, no interior do domicílio), rural e dispersa, para concentrar-se nas grandes oficinas.

* Essas organizações produtivas passaram a localizar-se nos antigos núcleos com características urbanas
(ocupando instalações provisórias) e nos locais onde pudesse dispor de força motriz (cursos d’água e
minas de carvão). Famílias dispersas em unidades isoladas no campo transferem-se para os bairros
compactos, improvisados ou construídos nas proximidades das oficinas.

* A evolução dos processos produtivos possibilita o aumento da produção, sobretudo de lã e de algodão:


do tear manual (jenny e fly shuttle), ao mecânico (water frame) e à máquina à vapor (patenteada por Watt,
em 1769). “O vapor funcionava mais eficientemente em grandes unidades concentradas (...). Uma dúzia
de tais fábricas, com todos os instrumentos e serviços acesso’rios, já representava o núcleo de uma
cidade de proporções consideráveis”. (L.Munford)
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Evolução do processo produtivo na indústria têxtil (1) jenny, (2) fly shuttle, (3) water frame e (4) tear hidráulico
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MUDANÇAS PRODUZIDAS PELA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

NOS NÚCLEOS URBANOS NO SÉCULO XIX

3. RENOVAÇÃO NAS REDES DE COMUNICAÇÃO: fruto das exigências do comércio, especialmente


para o transporte de mercadorias.

* incômodas estradas de freguesias foram substituídas por novas estradas terrestres;

* construção de canais navegáveis, com custos de transporte mais reduzidos do que os terrestres. Na
primeira fase da industrialização, onde as condições geográficas permitissem, desenvolveram-se, de
forma complementar com as redes viárias terrestres, um sistema de transportes fluvial, seja
aproveitando os rios navegáveis, prevendo sua regularização e acondicionamento, ou fazendo surgir
uma série de canais que muitas vezes se integram a geografia natural dos cursos d’água ou executando
obras de grande categoria técnica e construtiva.
Os canais fluviais abertos entre 1800 e 1850 e a rede de canais da área dos Midlands, Inglaterra.
A rede de canais fluviais e de rios navegáveis (pontilhados) e a rede ferroviária (linha cheia) na França (1850)
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MUDANÇAS PRODUZIDAS PELA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
3. RENOVAÇÃO NAS REDES DE COMUNICAÇÃO:
* ferrovias, com possibilidade de difusão e expansão superior a rede fluvial.
Na Grã-Bretanha, a primeira linha foi aberta entre as cidades de Liverpool e Manchester (1830). Trinta anos
depois (1860) o conjunto da rede européia alcançaria 100.000 quilômetros, para chegar em 1910 com
1.100.000 quilômetros.
“Em todos os paises, dos mais avançados aos mais atrasados, a construção da rede ferroviária representou
sempre um dos acontecimentos mais incisivos sobre os elementos territoriais e urbanos”.
O crescimento da rede ferroviária entre 1840-1850 e entre 1850-1900, na Grã-Bretanha
O crescimento da rede
ferroviária entre 1840-
1848, na França.

“Se a fábrica movida a


vapor, a produzir para
o mercado mundial, foi
o primeiro fator com
tendência para
aumentar a área de
congestionamento
urbano, o novo sistema
de transportes
ferroviários, a partir de
1830, estimulou-o
largamente”.
(L.Munford)
A FORMAÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL
Contraponto à cidade antiga, que mudava
MUDANÇAS PRODUZIDAS PELA
lentamente, podendo considerar-se
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
NOS NÚCLEOS URBANOS NO SÉCULO XIX imutável por tempo indefinido, como pode
ser observado nas gravuras de Pugin,
4. CRESCIMENTO DOS NÚCLEOS URBANOS:
vista de uma cidade católica em 1440 e em 1840.

“É em função da nova rede de


transportes e do movimento
comercial sempre em
expansão que convém
interpretar o crescimento
sem precedentes de algumas
cidades, para onde
convergiam as vias
comerciais e onde se
concentravam as alavancas
de comando, financeiras e
administrativas, da nova
economia”.
As dimensões dos maiores centros urbanos europeus em 1800 e 1890 (Weber).
Diagrama de crescimento de algumas cidades norteamericanas (Gottmann).
Dispersão territorial

Diagrama do
crescimento de
Londres,
entre 1784 e 1939.

Aglomeração
parisiense
no início do século XX
Número de cidades com mais
de cem mil habitantes:
(1800-1895)

Inglaterra: 2 para 30
Alemanha: 2 para 28
França: 3 para 12.

Crescimento de Londres: a
situação em 1746 e 1825, com
as primeiras proliferações
suburbanas.
Crescimento
metropolitano de
Londres: a
situação em 1845,
em 1860, em 1880
e em 1900.

“Entre 1820 e
1900, a destruição
e desordem dentro
das grandes
cidades é
semelhante àquela
de um campo de
batalha,
proporcional à
própria extensão
de seu
equipamento e ao
poder das forças
empregadas”
(L.Munford)
“Esse conjunto de transformações originou a mudança de domicílio e de modo de vida da maior parte da
população inglesa, e modificou a utilização do solo e a própria paisagem. É totalmente nova a natureza
dos fenômenos – a multidão dos habitantes, o número de novas casas, a capacidade das novas zonas
industriais e comerciais, os quilômetros de novas estradas e canais, o número de veículos que circulam
nas estradas da cidade – e a velocidade das transformações não tem precedentes: cidades que nascem e
duplicam numa geração, iniciativas especulativas que se concretizam prontamente em estabelecimentos,
estradas, canais e minas abertas em poucos anos em paisagem agreste, altos fornos e chaminés
apontadas para o céu ao lado das torres das catedrais” (Benevolo)
“Os principais elementos do novo complexo urbano foram a fábrica, a estrada de ferro e o cortiço. Em si
mesmos, constituíam a cidade industrial (...). A fábrica passou a ser o núcleo do novo organismo urbano.
Todos os demais detalhes da vida ficaram subordinados a ela”. (Munford).
As fábricas situavam-se nos melhores sítios, habitualmente próximos aos rios e linhas ferroviárias que corriam paralelas
aos rios. Nenhuma autoridade se fazia sentir no sentido de concentrar as fábricas num determinado lugar, separando-as
das habitações.
Os locais destinados à moradia estavam muitas vezes situados dentro dos espaços que sobravam entre
fábricas, galpões e pátios ferroviários. “dia após dia, o mau cheiro dos dejetos, o negro vômito das
chaminés e o ruído nas máquinas martelantes ou rechinantes, acompanhavam a rotina doméstica”
(Munford).

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