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EPILEPSIA

CRISE CONVULSIVA

A consciência é perdida quando a função de ambos os hemisférios cerebrais ou do sistema


reticular ativador do tronco cerebral está comprometida. A disfunção periódica dessas
regiões anatômicas leva a uma perda transitória e em geral recorrente da consciência.

Existem duas causas principais de perda episódica de consciência:

1. CONVULSÕES: as convulsões caracterizam-se por sinais e sintomas


neurológicos temporários, que resultam em atividade elétrica neuronal anormal,
paroxística e hipersincrônica no córtex cerebral.

2. SÍNCOPE: é a perda de consciência decorrente de uma redução do suprimento


sanguíneo dos hemisférios cerebrais ou do tronco cerebral. Isso pode ser
decorrente de hipoperfusão pancerebral, causada por reflexos vasovagais,
hipotensão ortostática, diminuição da ejeção cardíaca, ou de hipoperfusão
seletiva do tronco cerebral, que resulta de uma isquemia vertebrobasilar.

Uma convulsão é um distúrbio transitório da função cerebral causado por uma descarga
neuronal anormal.

Epilepsia, um grupo de distúrbios caracterizados por convulsões recorrentes, é uma


causa comum de perda de consciência episódica; a prevalência da epilepsia na população
geral é de cerca de 1%, e a probabilidade de se apresentar uma convulsão durante a vida é
de aproximadamente 10%.

CLASSIFICAÇÃO

As convulsões são classificadas da seguinte maneira:

• Convulsões generalizadas

1. Tônico-clônica

2. Ausência (pequeno mal)

3. Outros tipos (tônica, clônica, mioclônica, atônica)

• Crises parciais

1. Parcial simples

2. Parcial complexa (lobo temporal, psicomotora)

3. Crises parciais com generalização secundária

Convulsões Generalizadas

➢ Convulsões tônico-clônicas generalizadas


As convulsões tônico-clônicas generalizadas são ataques nos quais a consciência é
perdida, geralmente sem aura ou outro tipo de aviso. Quando ocorre um aviso, ele costuma
consistir em sintomas inespecíficos.

1. Fase tônica: As manifestações iniciais são a inconsciência e a contração


tônica de todos os músculos dos membros durante 10 a 30 segundos,
produzindo inicialmente uma flexão e depois uma extensão, em especial das
costas e do pescoço (Figura 12-2). A contração tônica dos músculos da respiração
pode produzir uma vocalização induzida pela expiração (um grito ou gemido) e
cianose, e a contração dos músculos mastigatórios pode causar um
traumatismo da língua. O paciente cai e pode se lesionar.

2. Fase clônica: A fase tônica é seguida por uma fase clônica (alternando
contração e relaxamento muscular), com movimentos simétricos dos membros,
que persistem por 30 a 60 segundos ou mais. O esforço ventilatório retorna
imediatamente após o cessamento da fase tônica, e a cianose desaparece.

A boca pode espumar com saliva. Com o passar do tempo, os abalos musculares
se tornam menos frequentes, até que todo o movimento cessa e os músculos se
tornam flácidos. O relaxamento esfincteriano ou a contração do músculo
detrusor pode produzir incontinência urinária.

3. Recuperação: Quando o paciente volta à consciência, existe confusão pós-


ictal e, frequentemente, cefaleia. A orientação plena costuma demorar 10 a 30
minutos, ou até mais em pacientes com estado de mal epiléptico (ver próxima
seção) ou distúrbios estruturais ou metabólicos preexistentes.

O exame físico durante o estado pós-ictal costuma ser normal na epilepsia


idiopática ou nas convulsões de origem metabólica, exceto as respostas
plantares, que podem ser transitoriamente extensoras (sinal de Babinski). As
pupilas sempre reagem à luz, mesmo quando o paciente está inconsciente.

4. Estado de mal epiléptico: O estado de mal epiléptico é definido arbitrariamente


como convulsões que continuam por mais de 30 minutos, sem cessar de forma
espontânea, ou que recorrem frequentemente, de modo que a consciência
plena não é restaurada entre os episódios sucessivos. O estado de mal epiléptico
é uma emergência médica, pois pode levar a dano cerebral permanente decorrente
de hiperpirexia, colapso circulatório ou lesão neuronal citotóxica, caso não seja
tratado.

➢ Crises de ausência (pequeno mal)

Estas crises são geneticamente transmitidas, em geral começam na infância e raramente


persistem na adolescência.

Os genes ligados à epilepsia tipo ausência incluem o canal de cálcio CACNA1H, o canal de
cloreto CLCN2 e as subunidades de receptor GABA GAGRB2.

As crises se caracterizam por perda de consciência breve (por 5 a 10 segundos), sem perda
do tônus postural.

Manifestações motoras sutis, como piscamento ocular ou leve rotação da cabeça, são
comuns. Movimentos automáticos mais complexos (automatismos) são incomuns. A
orientação plena ocorre imediatamente após a crise cessar.

Podem ocorrer até várias centenas de crises ao dia, levando a um comprometimento do


desempenho escolar e das interações sociais, de modo que as crianças podem ser
consideradas erroneamente como deficientes mentais, antes que o diagnóstico de
pequeno mal seja feito.

As crises são caracteristicamente induzidas pela hiperventilação. O EEG mostra um


padrão característico de três ponta-onda por segundo durante as crises.

Na maioria dos pacientes com inteligência normal e atividade no EEG de fundo normal, as
crises de ausência ocorrem somente na infância; em outros casos, no entanto, as crises
continuam na vida adulta, isoladamente ou em associação com outros tipos de crises.

➢ Outros tipos de crises generalizadas

Estes incluem as crises tônicas (que não são seguidas por uma fase clônica), as crises
clônicas (que não são precedidas por uma fase tônica) e as crises mioclônicas.

1. Crises tônicas se caracterizam por contração muscular contínua, que pode


levar à fixação dos membros e da musculatura axial em flexão ou extensão, e são
uma causa de crises de queda (ou drop attacks); o cessamento dos movimentos
respiratórios que acompanha a crise leva à cianose. A consciência é perdida, mas
nessas crises não existe a fase clônica.

2. Crises clônicas se caracterizam por movimentos clônicos repetitivos,


acompanhados por perda da consciência. Não existe o componente tônico inicial.

3. Crises mioclônicas são caracterizadas por contrações súbitas, rápidas,


semelhantes a um choque, que podem estar localizadas em alguns músculos de
uma ou mais extremidades, podendo apresentar uma distribuição mais
generalizada.

Uma epilepsia mioclônica juvenil é a causa mais comum, geralmente iniciando na


adolescência. No entanto, nem todos os abalos mioclônicos têm uma base
epiléptica. Existe uma história familiar de crises em um terço dos pacientes com
crises mioclônicas. O distúrbio é geneticamente heterogêneo, com ligação em
famílias diferentes para genes de uma proteína de ligação de cálcio EF-hand
(EFHC1), proteína contendo domínio bromo (BRD2), ou canal de cálcio (CACNB4),
canal de cloreto (CLCN2), ou subunidade receptor GABA (GABRA1).

4. Crises atônicas resultam da perda do tônus postural, algumas vezes após um


abalo mioclônico, levando a queda ou ataque de queda. Essas crises são mais
comuns em distúrbios do desenvolvimento como a síndrome de Lennox-Gastaut,
que, em alguns casos, resulta de mutações afetando o gene mitogênio ativado
proteína-quinase 10 (MAPK10).

Crises Parciais

➢ Crises parciais simples

Crises parciais simples começam com fenômenos motores, sensoriais ou autônomos,


dependendo da região cortical afetada. Por exemplo, movimentos clônicos de um único
grupo muscular na face, em um membro ou da faringe podem ocorrer e podem ser
autolimitados; podem ser recorrentes ou contínuos, ou podem se disseminar para
envolver regiões contíguas do córtex motor (marcha jacksoniana).

Os sintomas autônomos podem consistir de palidez, ruborização, sudorese, piloereção,


dilatação pupilar, vômito, borborismos ou sialorreia. Os sintomas psíquicos incluem
distorções da memória (p. ex., déjà vu, a sensação de que uma nova experiência é familiar),
processos de pensamento forçados ou processos de pensamento elaborados, déficits
cognitivos, distúrbios afetivos (p. ex., medo, depressão, um sentimento inadequado de
prazer), alucinações ou ilusões.

Durante crises parciais complexas, a consciência é preservada, a menos e até que a


descarga convulsiva se dissemine para outras áreas cerebrais, produzindo crises tônico-
clônicas (generalização secundária). A aura é a porção da convulsão que precede a perda
de consciência e que o paciente retém na memória. Algumas vezes, a aura é a única
manifestação da descarga epiléptica.

No estado pós-ictal, um déficit neurológico focal como uma hemiparesia (paralisia de


Todd) pode persistir por 30 minutos a 36 horas, indicando uma lesão cerebral focal
subjacente.

➢ Crises parciais complexas

As crises parciais complexas, antigamente denominadas crises do lobo temporal ou


psicomotoras, são crises parciais nas quais a consciência, a responsividade ou a
memória estão comprometidas.

A descarga convulsiva geralmente se origina no lobo temporal ou no lobo frontal medial,


mas pode se originar em qualquer lugar. Os sintomas assumem muitas formas, mas
geralmente são estereotipados para o paciente individual.
Os episódios podem começar com uma aura. Sensações epigástricas são as
manifestações de aura mais comuns, mas também podem ocorrer sintomas afetivos
(medo), psíquicos (déjà vu) e sensoriais (alucinações olfatórias).
A consciência está comprometida. As crises costumam persistir por 1 a 3 minutos. As
manifestações motoras das crises parciais complexas são caracterizadas por atividade
motora involuntária coordenada, denominada automatismo, que toma a forma de
movimentos orobucolinguais em cerca de 75% dos pacientes, e outros movimentos
faciais, cervicais ou manuais em cerca de 50% dos casos.

Sentar ou ficar em pé, mexer em objetos e realizar movimentos bilaterais dos membros são
ações menos comuns. Pode ocorrer uma generalização secundária.

DIAGNÓSTICO

O EEG pode ser um teste confirmatório útil na distinção entre crise epiléptica e outras
causas de perda da consciência (Figura 12-4). No entanto, um EEG normal ou anormal
inespecífico nunca exclui o diagnóstico de epilepsia. Características do EEG
específicas e que sugerem epilepsia incluem espículas anormais, descargas
poliespiculares e complexos ponta-onda.

Crises com um início claramente focal, ou aquelas que iniciam após os 25 anos, requerem
avaliação imediata para se excluir a presença de uma lesão cerebral estrutural.

A ressonância magnética (RM) é essencial para esse propósito (um exame de tomografia
computadorizada [TC] não é adequado). Se não for encontrada uma causa, a decisão de
iniciar com tratamento anticonvulsivante crônico deve ter como base a probabilidade
de recorrência. Após uma convulsão tônico-clônica generalizada isolada, a recorrência
esperada em 3 a 4 anos é de 30 a 70% nos pacientes adultos não tratados.

REF

GREENBERG, D. Neurologia clínica. 8. ed. – Dados eletrônicos. Porto Alegre: AMGH, 2014.
Objetivo. Crises epilépticas

Epilepsia é definida como “um distúrbio cerebral caracterizado pela predisposição


persistente do cérebro para gerar crises epilépticas e pelas consequências
neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais desta condição”.

Crises epilépticas são manifestações epilépticas (excessivas e/ou hipersíncronas),


usualmente autolimitadas de neurônios cerebrais.

Quando um paciente apresenta crises epilépticas, o médico segue alguns passos críticos
para realizar o diagnóstico. Antes de tentar classificar o tipo de crise, o médico deve
determinar se o evento paroxístico é realmente uma crise epiléptica uma vez que múltiplos
diagnósticos diferenciais são possíveis. Estes incluem síncopes convulsivas, parassonias,
transtornos de movimento e outros eventos não-epilépticos. Esta etapa diagnóstica já
deve ter sido estabelecida quando se inicia a classificação da epilepsia de um
determinado paciente.

Em termos da classificação da epilepsia, o clínico começa com a classificação dos tipos


de crises.

Em alguns locais, a classificação de acordo com os tipos de crises pode ser o nível máximo
possível para diagnóstico por não haver acesso a estudos eletroencefalográficos, de vídeo-
EEG e imagem.

CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE CRISES EPILÉPTICAS – 2017.


A figura 1 retrata a classificação básica das crises epilépticas e a figura 2 a classificação
expandida. As duas representam a mesma classificação, com a supressão das
subcategorias para formar a versão básica. O uso de uma ou outra depende do nível de
detalhes desejado. Variações sobre o tema de crises epilépticas individuais podem ser
acrescidas para tipos de crises focais de
acordo com o grau de percepção

ESTRUTURA DA CLASSIFICAÇÃO

O esquema da classificação é colunar, mas não hierárquico (significando que níveis


podem ser ignorados), portanto as setas foram intencionalmente omitidas.

A classificação de crises epilépticas começa com a determinação se as manifestações


iniciais das crises são focais ou generalizadas. O início pode ser não observado ou ser
obscuro; nesses casos a crise epiléptica é de início desconhecido. As palavras “focal “e
“generalizado” no início do nome da crise significam crise de início focal ou generalizado.

Para crises focais, o grau de percepção opcionalmente pode ser incluído no tipo de crise.
Percepção é apenas uma característica potencialmente importante da crise, mas a
percepção tem importância prática suficiente para justificar seu uso como classificador
de crise. Percepção preservada significa que a pessoa está consciente de si e do ambiente
durante uma crise, mesmo que imóvel.

• Uma crise focal perceptiva (com ou sem outros classificadores


subsequentes), corresponde ao prévio termo “crise parcial simples”. Uma
crise com percepção comprometida (com ou sem outros classificadores)
corresponde ao termo prévio “crise parcial complexa”. Percepção
comprometida durante qualquer parte da crise torna a crise focal
disperceptiva.
• Além disso, crises focais também são subagrupadas naquelas com sintomas
e sinais motores e não motores no início da crise. Se ambos, sinais motores
e não motores, estão presentes no início da crise, os sinais motores irão
geralmente dominar, a menos que sintomas e sinais não motores (em geral
sensoriais) sejam proeminentes.
• Crises focais perceptivas ou disperceptivas opcionalmente podem ser
também caracterizadas por um dos sintomas listados de início motor ou
não motor, refletindo o primeiro sinal ou sintoma mais proeminente da crise
epiléptica, por exemplo, crise focal disperceptiva com automatismos.

Crises epilépticas devem ser classificadas pela característica de início motor ou não motor
proeminente mais precoce, exceto na crise focal com parada comportamental na qual a
interrupção de atividade é a característica dominante durante toda a crise, e qualquer
comprometimento significante da percepção durante o curso da crise leva a crise focal a
ser classificada como tendo percepção comprometida.

A classificação de acordo com o início da crise tem uma base anatômica, enquanto a
classificação pelo nível de percepção tem uma base comportamental, justificada pela
importância prática do comprometimento da percepção. Ambos os métodos de
classificação são disponíveis e podem ser usados concomitantemente. Breve parada
comportamental no início de uma crise frequentemente é imperceptível, e assim não deve
ser usada como classificador a menos que seja a característica dominante durante toda a
crise.

O critério de classificação (anatômico) mais precoce não será necessariamente a


característica comportamental mais significante da crise. Por exemplo, uma crise pode
começar com medo e progredir para atividade focal clônica vigorosa resultando em queda.
Essa crise ainda seria uma crise focal emocional (com ou sem alteração de percepção),
mas uma descrição das características subsequentes sob a forma de um texto livre
poderia ser muito útil.

O denominação crise focal pode omitir a menção de percepção quando a percepção não
for aplicável ou for desconhecida; dessa forma, a crise deverá ser classificada diretamente
pelas características de início motor ou início não motor. Os termos início motor e início
não motor também podem ser omitidos quando um termo subsequente gera um nome de
crise inequívoco.

A classificação de uma crise individual pode parar a qualquer nível: uma crise de “início
focal” ou “início generalizado”, sem outras elaborações, ou uma “crise focal sensorial”,
“crise focal motora”, “crise focal tônica” ou “crise focal com automatismos”, e assim por
diante. Descritores adicionais são incentivados, e seu uso dependerá da experiência e
objetivos da pessoa que classifica a crise. Os termos início focal e início generalizado são
para fins de agrupamento. Nenhuma dedução deve ser feita de que cada tipo de crise
exista em ambos os grupos; a inclusão de crises de ausência na categoria de início
generalizado que não implica na existência de crises de “ausências focais”.

Quando a primazia de um versus outro sintoma ou sinal chave é incerto, a crise epiléptica
pode ser classificada no nível acima do termo questionável, com uso de descritores
adicionais da semiologia da crise relevantes para a crise individual. Quaisquer sinais ou
sintomas de crises, termos descritores sugeridos no Manual de Instrução que acompanha
este texto ou descrições em texto livre podem ser opcionalmente anexadas às descrições
do tipo de crise, sem alterar contudo o tipo de crise.
O tipo de crise “focal evoluindo para tônico-clônica bilateral” é um tipo especial de
crise, que corresponde ao termo de 1981 “crise parcial com generalização secundária”.
Início focal evoluindo para tônico-clônica bilateral reflete um padrão de propagação da
crise, mais do que um tipo unitário de crise epiléptica, mas é uma apresentação tão
comum e importante que a categorização separada foi continuada. O termo “evoluindo
para tônico-clônica bilateral” em vez de “secundariamente generalizada” foi usado para
distinguir uma crise de início focal da crise de início generalizado. O termo “bilateral” é
usado para padrões de propagação e “generalizado” para crises epilépticas que envolvem
circuitos bilaterais desde o início.

A atividade ictal se propaga através de circuitos cerebrais, às vezes promovendo incerteza


sobre se um evento é uma crise unitária ou múltiplas crises começando de diferentes
circuitos (“multifocal”). Uma crise unifocal pode apresentar-se com múltiplas
manifestações clínicas como resultado da propagação. O clínico deverá determinar (pela
observação da evolução contínua ou apresentação estereotipada de crise para crise) se
um evento é crise única ou uma série de diferentes crises.

Quando uma crise focal única se apresenta com uma sequência de sinais e sintomas,
então a crise epiléptica é nomeada pelo sinal ou sintoma inicial mais proeminente,
refletindo a prática clínica usual de identificar o foco de início da crise ou rede envolvida.
Por exemplo, uma crise começando com súbita incapacidade de compreender linguagem
seguida por comprometimento da percepção e abalos clônicos no braço esquerdo poderia
ser classificada como uma “crise focal disperceptiva (início não motor) cognitiva”
(progredindo para abalos clônicos no braço esquerdo). Os termos entre parênteses são
opcionais. O tipo de crise formal nesse exemplo é determinado pelo início não motor
cognitivo e presença de comprometimento da percepção durante qualquer ponto da crise.

Crises generalizadas são divididas em crises motoras e não motoras (ausências).


Outras subdivisões são semelhantes àquelas da classificação de 1981, com a adição das
crises mioclono-atônicas, comuns na epilepsia com crises mioclono-atônicas (síndrome
de Doose), crises mioclono-tônico-clônicas, comuns na epilepsia mioclônica juvenil,
ausências mioclônicas e crises de ausência com mioclonias palpebrais vistas na síndrome
descrita por Jeavons e outros.

Manifestações generalizadas das crises podem ser assimétricas, tornando difícil a


distinção de crises de início focal. A palavra “ausência” tem um significado comum, mas
um olhar vago ou ausente não é sinônimo de crise de ausência, pois interrupção da
atividade também ocorre em outros tipos de crises. A classificação de 2017 permite anexar
um número limitado de qualificadores às crises de início desconhecido, a fim de melhor
caracterizar a crise.

Crises de início desconhecido podem ser referidas pela simples palavra “não
classificadas” ou com características adicionais, incluindo motoras, não motoras, tônico-
clônicas, espasmos epilépticos e parada comportamental. Um tipo de crise de início
desconhecido pode posteriormente ser classificada tanto como de início focal quanto de
início generalizado, mas qualquer comportamento associado (por exemplo, tônico-
clônico) a uma crise previamente “não classificada” pode ainda ser aplicado. A esse
respeito, o termo “início desconhecido” é um termo substituto – não da característica da
crise, mas do desconhecimento.
Regras para Classificação de crises

1. Início: decida se a crise tem início focal ou generalizado, utilizando um intervalo de


confiança de 80%. Caso contrário, o início é desconhecido.

2. Percepção: para crises focais, decida entre classificar a crise de acordo com o grau de
alteração da percepção ou omita este item da classificação. Crises focais perceptivas
correspondem as antigas crises parciais simples e crises focais com alteração da
percepção correspondem a crises parciais complexas.

3. Alteração da percepção em qualquer momento durante a crise: uma crise focal é


uma crise focal com alteração da percepção caso a percepção esteja alterada em
qualquer momento durante a crise.

4. Início como determinante: classifique a crise focal de acordo com o primeiro sinal e
sintoma proeminente. Não considere a parada comportamental transitória.

5. Parada comportamental: uma crise focal com parada comportamental deverá assim
ser classificada quando a parada comportamental é a característica mais proeminente de
toda crise.

6. Motor/não-motor: as crises focais com ou sem alteração da percepção podem ser


adicionalmente sub-classificadas de acordo com as características motoras e não
motoras. Alternativamente, as crises focais podem ser classificadas de acordo com as
características motoras e não motoras, sem especificar a alteração da perceptividade (Ex:
crise focal tônica).

7. Termos opcionais: termos como motoras e não motoras podem ser omitidos quando o
tipo de crise é evidente (Ex. crise focal clônica).

8. Descritores adicionais: após classificar as crises de acordo com as manifestações


iniciais, deve-se encorajar a adição de descritores de outros sinais e sintomas, quer sejam
os descritores sugeridos ou um texto livre. Estes não alteram o tipo de crise. Exemplo:
crises focais emocionais com atividade tônica em braço direito e hiperventilação.

9. Bilateral versus generalizado: utilize o termo “bilateral” para crises tônicoclônicas que
se propagam para ambos os hemisférios e “generalizadas” para crises que aparentemente
originam-se simultaneamente em ambos os hemisférios.

10. Ausência atípica: a ausência é atípica se tem um início e final graduais, mudanças
marcadas no tônus ou EEG com descargas de ponta-onda lenta com frequência inferior a
3 por segundo.

11. Clônico versus mioclônico: clônico refere-se a abalos rítmicos sustentados e


mioclônico a abalos irregulares, não sustentados.

12. Mioclonia palpebral: ausência com mioclonias palpebrais refere-se a abalos das
pálpebras com desvio dos olhos para cima durante uma crise de ausência

TIPOS DE EPILEPSIA

O segundo nível é o dos Tipos de Epilepsia que assume que o paciente tem o diagnóstico
de epilepsia baseado na definição de 2014 31.
O nível Tipo de Epilepsia inclui uma nova categoria de “Epilepsia com Crises Focais e
Generalizadas Combinadas” além dos grupos bem estabelecidos de Epilepsias Focais e
Epilepsias Generalizadas. Ele também inclui uma categoria Desconhecida.

Vários tipos de epilepsias incluem múltiplos tipos de crises epilépticas.

Para o diagnóstico de Epilepsia Generalizada, o paciente deve apresentar atividade de


complexos de espícula-onda generalizados no EEG. Indivíduos com epilepsias
generalizadas podem apresentar um conjunto de diferentes tipos de crises que
incluem crises de ausência, mioclônicas, atônicas, tônicas e tônico-clônicas. O
diagnóstico de Epilepsia Generalizada é feito com base nos dados clínicos, corroborados
pelo achado de descargas interictais típicas no EEG.

Deve-se ter cuidado frente a um paciente com crises tônico-clônicas generalizadas e um


EEG normal. Neste caso, outras evidências devem estar presentes para que seja feito o
diagnóstico de epilepsia generalizada, tais como abalos mioclônicos ou uma história
familiar relevante.

Epilepsias Focais incluem distúrbios unifocais e multifocais bem como crises envolvendo
um hemisfério. Uma variedade de tipos de crises epilépticas pode ser encontrada
incluindo crises focais perceptivas, crises focais disperceptivas ou com
comprometimento da percepção, crises focais motoras e não motoras e crises focais
evoluindo para crises tônico-clônicas bilaterais. O EEG interictal tipicamente mostra
descargas epileptiformes focais, mas o diagnóstico deve ser feito com bases clínicas,
corroborado pelos achados de EEG.

O novo grupo de Epilepsias com Crises Focais e Generalizadas Combinadas existe, já


que existem pacientes que apresentam tanto crises focais como generalizadas. O
diagnóstico de ambos os tipos de crises é feito com bases clínicas, corroborado pelas
descargas no EEG. Registros ictais são úteis mas não essenciais. O EEG interictal pode
mostrar tanto espícula-onda generalizada como descargas epileptiformes focais, mas
atividade epileptiforme não é exigida para o diagnóstico. Exemplos comuns nos quais
ambos os tipos de crises estão presentes são as síndromes de Dravet e de Lennox-
Gastaut.

O tipo de epilepsia também pode ser o nível final de diagnóstico alcançável, quando o
clínico não consegue fazer o diagnóstico de uma síndrome epiléptica.

Exemplos incluem os seguintes casos:

1. A situação comum de uma criança ou um adulto com uma epilepsia de lobo


temporal não lesional que tem Epilepsia Focal de etiologia desconhecida; uma
criança de 5 anos que apresenta crises tônico-clônicas generalizadas e atividade
de espícula-onda generalizada no EEG que não pode ter sua epilepsia classificada
em uma etiologia conhecida mas tem claramente o diagnóstico de uma Epilepsia
Generalizada;
2. O cenário menos frequente de uma mulher de 20 anos que tem simultaneamente
crises focais disperceptivas e crises de ausência com descargas focais e de
espícula-onda generalizada no EEG e RM normal, que teria assim o diagnóstico de
Epilepsia Focal e Generalizada Combinadas.
O termo “Desconhecido” é usado para denotar a situação na qual sabe-se que o paciente
tem epilepsia mas o clínico é incapaz de determinar se o tipo de epilepsia é Focal ou
Generalizado porque há pouca informação disponível. Isto pode ocorrer por várias
razões. Pode não haver acesso ao EEG ou os estudos de EEG são não informativos, por
exemplo, normais. Se o(s) tipo(s) de crise(s) são desconhecidos, então o tipo de
epilepsia também será desconhecido por razões similares, embora os dois possam não
ser sempre concordantes. Por exemplo, o paciente pode ter tido crises tônico-clônicas
simétricas sem características focais e registros EEG normais. Assim, o início das crises é
desconhecido e a pessoa tem um tipo de epilepsia desconhecido.

SÍNDROME EPILÉPTICA

O terceiro nível é o diagnóstico de uma Síndrome Epiléptica.

Uma síndrome epiléptica se refere a um conjunto de características incluindo tipos de


crises, EEG e características de imagem, que tendem a ocorrer juntas. Frequentemente
tem características dependentes da idade tais como idade de início e remissão (quando
aplicável), desencadeadores de crises, variação diurna e algumas vezes prognóstico.

Ela também pode ter comorbidades distintas tais como disfunção intelectual e
psiquiátrica e características eletroencefalográficas e em estudos de neuroimagem. Ela
pode ter implicações etiológicas, prognósticas e terapêuticas. É importante notar que uma
síndrome epiléptica não tem correlação um a um com o diagnóstico etiológico e tem um
propósito diferente, como o de orientar o manejo clinico.

Há várias síndromes bem reconhecidas como epilepsia ausência da infância, síndromes


de West e de Dravet, embora deva ser assinalado que nunca houve uma classificação
formal das síndromes epilépticas pela ILAE. Um website educacional da ILAE
recentemente desenvolvido, epilepsydiagnosis.org, fornece uma fonte excelente para a
compreensão dos parâmetros para diagnóstico, revisão de vídeos de tipos de crises e
características EEG de várias síndromes estabelecidas, e tem sido recomendado como
instrumento de ensinamento.

CRISES FRONTAIS
PRÉ- FRONTAL

Crises que se originam na região pré-central (área motora primária) como crises focais
com movimentos clônicos contralaterais à ZE. Uma de suas características é a progressão
lenta de uma parte do corpo a outro segmento adjacente, a denominada “marcha
jacksoniana”. A parte do corpo afetada durante a crise indica a região do córtex motor que
tem representação somatotópica, permitindo distinguir as crises originadas na região
dorsal daquelas da região pré-central medial.

PRÉ-MOTORA

São caracterizadas por sinais posturais tônicos, com predomínio proximal, em geral
bilaterais e assimétricos. Os membros superiores são frequentemente envolvidos, sendo
observada a clássica “postura de esgrimista” ou uma variedade de posturas tônicas. Há
versão (desvio) da cabeça e dos olhos (pelo envolvimento da área frontal dos olhos). O
desvio pode ser ipsilateral ou contralateral à ZE.
A interrupção da linguagem, ou vocalização (característica da palilalia), também pode
ocorrer quando há envolvimento da área de linguagem opercular. Se a descarga se propaga
à área opercular e à região central baixa, podem se observar contrações clônicas faciais e
salivação. Ulteriormente podem ocorrer movimentos complexos dos quatro membros.
Sensações subjetivas ou auras são pouco frequentes nesse tipo de crises, mas alguns
pacientes descrevem sintomas sensoriais, como sensação de sentir-se enfermo, de
opressão ou formigamento, podendo ser generalizados ou localizados.

CRISES PRÉ-FRONTAIS

A semiologia das crises pré-frontais é variável e ainda necessita de caracterização


completa. É possível distinguir as crises originadas em nível dorsal das originadas em nível
ventral.

CRISES PRÉ-FRONTAIS DORSOLATERAIS

Frequentemente há desvio tônico ocular que antecede o desvio da cabeça, acompanhado


de automatismos gestuais dirigidos para onde ocorre o desvio dos olhos. Esses
movimentos podem parecer propositais, quando, por exemplo, o paciente parece buscar
algo no campo visual para onde dirige o desvio dos olhos.

São observados também movimentos distais da mão e palmear, que parecem


compulsivos, denominados “atitudes forçadas” ou condutas pseudocompulsivas. Podem
ser associados a posturas tônicas ou distônicas assimétricas dos membros superiores ou
inferiores. Podem ocorrer automatismos não verbais, como vocalização ou ecolalia, ou
verbais, como palilalias, uso de jargão, canto (especialmente no hemisfério direito).

Alucinações visuais foram também descritas nas crises dessa região que, em geral,
caracterizam-se por visão difusa ou borrada e, mais raramente, alucinações reais. Ainda
pode haver “pensamento forçado”, que consiste em pensamento recorrente intrusivo ou
sob a forma de impulso de realizar uma determinada ação, como abrir os olhos ou apanhar
um objeto.

CRISES PRÉ-FRONTAIS MESIOVENTRAIS

Conduta motora hipercinética, movimentos proximais, comportamento complexo, com


atividade gesticular aparentemente proposital, como pontapés ou murros, movimentos de
pedalar ou parecendo que o paciente está tentando escapar são episódios
frequentemente violentos denominados “crises hipermotoras”.

Algumas crises se iniciam com reação dramática de medo, acompanhada de expressão de


terror, emissão de gritos e agitação. Essa conduta de medo é diferente da observada nas
epilepsias temporais nas quais a sensação de medo é subjetiva. A observação de sinais
autonômicos como midríase, taquicardia e enrubescimento facial, bem como
relaxamento do esfíncter urinário, é comum.

CRISES TEMPORAIS

Os sintomas mais frequentemente observados são sensação epigástrica ascendente,


autonômicos e psíquicos. Algumas crises usualmente começam com ruptura de contato,
automatismos oromastigatórios (sucção, mastigação) e posturas distônicas assimétricas.
Frequentemente, há desorientação e amnésia do episódio no período pós-ictal. Tais crises
podem ser precedidas por uma aura típica, referida como “sensação retroesternal
ascendente” até a faringe. Este tipo de aura pode também ser observada quando há
comprometimento insular.

Quando há comprometimento da amígdala e do giro para-hipocampal, ocorrem


sentimentos de despersonalização, medo e pânico. A aura pode se apresentar de forma
isolada ou transformar-se em crise parcial complexa após 5 a 30 segundos. Em caso de
progressão, há ausência de resposta ao meio, olhar fixo, condutas automáticas (simples
ou complexas), como mastigação, movimentos da língua e outros mais complexos, como
esfregar as mãos, manusear as roupas, despir-se, caminhar, roçar o nariz com a mão
ipsilateral à ZE etc.

CRISES DO LOBO OCCIPITAL

Os sintomas fundamentais das crises occipitais são visuais e oculomotores. Os sintomas


visuais incluem alucinações visuais elementares e complexas, cegueira, ilusões visuais e
palinopsia. Os sintomas oculomotores incluem desvio tônico dos olhos, desvio
oculoclônico, nistagmo e piscamento repetitivo ou clonias palpebrais. Vômito ictal e
cefaleia ictal ou pós-ictal são frequentemente associados a crises occipitais.

CRISES DO LOBO PARIETAL

• Fenômenos positivos

Consistem em parestesias ou sensação de eletricidade restritas a um membro ou com


marcha “jacksoniana”. Em geral, esses fenômenos sensitivos envolvem as áreas de maior
representação cortical (mão, face ou braço). Sugerem ainda ZE parietal, o desejo de mover
uma parte do corpo ou sensação de que está sendo movida; rigidez ou resfriamento da
língua e alucinações gustativas que constituem sinais do envolvimento do opérculo
parietal, bem como rotação do corpo (crises giratórias).

• Fenômenos negativos

Enfraquecimento, sensação de ausência de parte do corpo (asomatognosia), intensa


vertigem ou desorientação espacial podem ser indicativos de crises do lobo parietal
inferior. Crises do lobo parietal dominante resultam em vários distúrbios de linguagem de
recepção ou condução.

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