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VALENTE, C. M. W. Existência e Essência Da Norma Jurídica. Revista de Estudos Jurídicos UNESP, v. 8, P. 135-140, 1999
VALENTE, C. M. W. Existência e Essência Da Norma Jurídica. Revista de Estudos Jurídicos UNESP, v. 8, P. 135-140, 1999
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REVISTA
DE
ESTUDUS
JURÍDICOS
UNESP
ISSN 1414-3097
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sua entrada no ordenamento jurídico abstrato (vigência); e o mesma no ordenamento jurídicos. Neste sentido, a própria
momento de sua aplicação, via interpretação, ao caso concreto.
existencia da norma pressupöe um mínimo de sua essência
No primeiro momento, a norma ainda não existe, ela caracterizada, justamente, pela inserção no ordenamento jurídico de
está sendo elaborada teleologicamente e portanto essenciaimente. sua carga valorativa e de sua posição dentro de uma hierarquia.
Pode-se dizer que a essência da norma, no primeiro momento, está
A essência da norma é a sua eficacia, ou seja, "é o fato
sendo elaborada antes mesmo de sua própria existência, que se
real de ela ser efetivamente aplicada e observada ..." (Kelsenf. A
caracteriza apenas com a sua inserção no mundo lógico-jurídico.
existência da* norma encontra o seu correlato na vigência.
No segundo momento, a norma existe de maneira estática, porém
Nas teorias que admitern a interpretação contralegem, o
não se equipara ao nada (ao qual a existência humana se compara)
terceiro momento adquire ainda maior relevância na determinação
na medida em que vem carregada de um conteúdo axiológico que
da essência da norma.
lhe é imanente e que produz efeitos no mundo do ser, através do
Voltando às perguntas que deram origem a este ensaio:
receio que as pessoas têm do poder coercitivo do Estado. Este
pode a existência da norma, de algum modo, preceder à sua
conteúdo axiológico é o conteúdo que foi elaborado no primeiro essência?
momento. No terceiro momento, a norma. é aplicada ao caso
A resposta é negativa. A norma em sua origem é fruto
concreto. Tal aplicação exige o elemento volitivo e a ação, fator
de um ato humano, portanto volitivo e teleológicog Desta maneira,
mais importante para se determinar a essência dentro da teoria
a essência normativa já vem indicada (não determinada) dentro do
existencialista. Este elemento volitivo pode se dar no sentido de
seu próprio conteúdo axiológico. Apenas se ignoramos este
reafirmar o conteúdo axiologico normativo, expandi-lo ou até l
conteúdo e consideramos a norma somente sob urn ângulo lógico-
contraria-lo (segundo algumas teorias)5 _ Desta maneira, a essência racional é que poderíamos dar uma resposta afirmativa à questão,
da norma jurídica é formada em duas etapas distintas: inicialmente,
porém tal consideração implica necessariamente na morte da lei.,
quando da sua elabpração e, posteriormente, quando da sua
pois esta é eminentemente um juízo de valor e, como tal, humano.
aplicação ao caso concreto.
A única maneira de se aproximar a teoria das normas a uma
A existência normativa é representada pelo segundo
filosofia existencialista, sem desnaturar o caráter da norma
momento, é uma existência intermedia que se dá entre uma
enquanto ato volitivo, seria através da admissão da interpretação
indicação inicial da essência (elaboração da lei) e uma
contralegem. Tal ìnterpretação significa urna forte concentração da
determinação final da essência. E necessário aqui deixar bem claro
essência no terceiro momento: 0 momento da aplicação e
que, segundo Kelsen, toda norma vigente é dotada de um mínimo
interpretação das normas. A conseqüência principal disto é que o
de eficacia que se origina justamente do fato da prépiia inserção da
primeiro momento decresceria em impoitância em relação ao
n
terceiro, que praticamente monopolizaria a fabrìcação da essência
normativa, porém a essência inicial mínima jamais iria sucumbir.
Lrnnrwnon E A(:Ão NA TEORIA POLÍTICA DE
Isto posto, pode-se concluir que a existëncia da lei já
HANNAH ARENDT
vem dotada de um elemento essencial que é justamente o seu
caráter axiológico, formado no momento da deliberação legislativa Eduardo Carlos Bianca Bittar*
e herdado das circunstancias do mundo da vida no qual os Samuel Rodrigues Barbosa*
legisladores se inserem. Tal elemento pode ser parcialmente
SU1l/LÁRIO: 1. A proposta de Hannah /lrendr. 2. A
modificado ou, mais precisamente, orientado na medida em que são ¿iberdade do exterior e a liberdade do interior. 3. Por uma
adotadosdiferentes criterios para a interpretação e aplicação da lei antología da liberdade. Bibliografia
que, como atos humanos que são, somam à existência da norma,
outra carga valorativa, determinando uma nova interpretação do 1. A proposta de Hannah Arendt
mundo da vida, através ,da vontade humana, no modo da eficacia A liberdade é um fenômeno perceptivel na vida
normativa (essência). ' comum: nos diretivos de conduta, na fabricação, na obediência e
A essência final da norma é formada então pela relacão recusa à ordem. A legìslação e a arte política com suas justificaçöes
dialética resultante destes dois momentos distintos da intervenção parecem depender da existêncía da liberdade.'
do mundo da vida - através da vontade humana - nc processo j,
Mas, essa base comum, de ceita intuição e evidência,
legislativo; compreendendo este como o caminho percorrido pela l
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A,
apreensível pela experiència do comum dos homens, em nada
lei do seu nascedouro nas casas legislativas até a sua aplicação ao 1 assegura uma delimitação mais precisa da noção da liberdade,
fato concreto pelo judiciário. ›
sempre de dificil delimitação. Assim, a tematização fimdamentada
e justificada de sua existencia esbarra em varias dificuldades, a
Referências bibliográficas despeito de sua aparente evidencia.
i
ANDRADE, Christiano Jose de. O problema dos métodos da 1
I
A fortuna da discussöes históricas em torno do
interpretação juridica. São Paulo: Revista dos Tribunais, problema robustecem ainda mais as dúvidas, o que aguça certo
1992. ceticismo para sua demonstração. Talvez, desde já, deva-se admitir í
1
KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. 3.ed. São Paulo: Martins |
seja a liberdade mais um termo metafisico, destes que 'não
Fontes, 1991. resistiriam a uma terapia mais acurada da linguagem - devendo a
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. l7.ed. São Paulo: Saraiva, análise ser abandonada sem arrependimento. Mas, uma suspenção 4
1996. de juízo sobre esse termo mysthicus significaría rejeitar
SARTRE, Jean Paul. O ser e o nada. São Paulo: Vozes, 1997. apressadamente um terreno que assegura a própria tematização do
direito e, em termos mais arnplos, de qualquer ação social. Dai a
1
necessidade de encaminhamento da discussão para um campo I
sólido. Ha, pois, fartas razöes para tentar redefinir a noção da
liberdade.
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” Doutorandos da Faculdade de Direito da USP - Universidade de São Paulo.
1 Cfr. Entre o passado e o futuro, 1972, p.189.
140 Revista de Estudos Jurídicos UNESP, Franca, 11(8): 135-140, 1999
Revista de Estudos Jurídicos UNESP, Franca, 4(8): 141-148, 1999 141