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UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA

Instituto de Ciências Humanas


Curso de Psicologia

ANÁLISE DO FILME ‘’ONDE VIVEM OS MONSTROS’’


SOB A ÓTICA WINNICOTTIANA.

Giovana Quadros Silva – RA: F065HC-4


Gisele Landgraf Piva – RA: T859948
Vanessa Pedroso Gelfuso Lapenta – RA: T86453-4

Campos Vargas – Ribeirão Preto


Novembro de 2021
UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA
Instituto de Ciências Humanas
Curso de Psicologia

ANÁLISE DO FILME ‘’ONDE VIVEM OS MONSTROS’’


SOB A ÓTICA WINNICOTTIANA.

Giovana Quadros Silva – RA: F065HC-4


Gisele Landgraf Piva – RA: T859948
Vanessa Pedroso Gelfuso Lapenta – RA: T86453-4

Trabalho apresentado à disciplina de APS


– Atividades Práticas Supervisionadas, sob
a orientação da Prof.ª Maria Ângela Nunes.

Campos Vargas – Ribeirão Preto


Novembro de 2021
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 4
2. DESENVOLVIMENTO DO FILME: ONDE VIVEM OS MONSTROS..............5
3. TEORIA WINNICOTIANA DO PROCESSO MATURACIONAL E
FENÔMENO TRANSICIONAL............................................................................8

4. ANÁLISE WINNICOTTIANA DO FILME.......................................................13

5. CONCLUSÃO................................................................................................16

REFERÊNCIAS.................................................................................................17
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1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho envolve fazer uma análise crítica do Filme


Onde Vivem os Monstros sob a perspectiva do pediatra e psicanalista Donald
Woods Winnicott, onde serão apresentados conceitos teóricos de sua teoria em
trechos do filme que esses conceitos podem ser ilustrados.
O filme Onde Vivem os Monstros, retrata uma pequena parte da história
de vida do menino Max, que tem aproximadamente 8/9 anos de idade. Max é
um garoto que exerce de forma intensa a sua criatividade, imaginação e
fantasia. No enredo ele aparece morando com a sua mãe e sua irmã.
É possível pensar que ele esteja passando por um momento difícil de
mudanças em sua vida. Logo nas primeiras cenas, vemos sua irmã falando ao
telefone com uma amiga e dizendo que final de semana irá passar com o seu
pai, aqui podemos inferir que seus pais estão divorciados.
Max não aparece com muitos amigos, vemos que ele costuma brincar
sozinho, ou costumava brincar na companhia de sua irmã, que agora está mais
crescida, portanto, possui outros interesses com as pessoas de sua idade.
Sua mãe é uma mulher de aproximadamente 35/40 anos que é muito
envolvida com seu trabalho, percebemos isso quando ela fala ao telefone
pedindo um prazo maior para entregar um relatório, como se tivesse muito
serviço para fazer. Apesar disso, trata o Max com atenção – mesmo que do
ponto de vista do menino ela esteja ausente – nas condições que pode e tem
para oferecer.
Ao longo do filme, vamos analisar a partir da perspectiva de Max,
compreendendo a forma como ele se sentiu em alguns momentos
considerados difíceis e intensos, mas sobretudo, o que ele fez com todos essas
emoções, pensamentos e sentimentos, e de forma ele pode se confortar e
achar uma maneira de diminuir toda ansiedade que ele estava passando.
Para esta análise, usaremos os conceitos winnicottianos de fenômeno
transicional e o processo maturacional, que envolve noções do
desenvolvimento emocional inicial como por exemplo: integração,
personalização e realização, além de outras concepções que surgem a partir
destas.
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2. DESENVOLVIMENTO DO FILME: ONDE VIVEM OS MONSTROS

No início do filme percebemos que Max, um garoto entre 8/10 anos de


idade, não está muito bem, pois, vestindo uma fantasia de lobo, com um garfo
na mão, grita e agarra de forma violenta seu cachorro.
Logo em seguida, aparece o menino brincando sozinho na neve,
construindo um forte, ficou tão animado que correu para chamar sua irmã mais
velha para ela ver, porém, ela está falando ao telefone e ignora o seu
chamado, dizendo ‘’vá brincar com seus amigos’’. Max aparenta ter ficado
enraivecido ao ouvir esta frase, então pega um galho com um saco plástico e
começa a chutar e gritar com a cerca, como se estes fossem pessoas.
Depois disso resolve atacar os amigos da irmã com bolas de neve,
também de forma agressiva, mas quando percebe que são mais fortes do que
ele, chora.
Enfurecido, vai até o quarto da irmã e molha tudo, pula em sua cama e
quebra um presente que havia feito para ela. Após passar a fúria, fica triste e
pensativo, vai para seu quarto, olha para maquetes feitas de papelão e
gravetos e depois para um globo terrestre com a seguinte dedicatória: “Para
Max o dono do mundo, amor Papai”.
Sua mãe chega do trabalho e vai para o quarto do filho, ao chegar lá,
encontra o menino deitado, quieto, apenas brincando com um barquinho de
papel sob as cobertas. Arrependido, ele mostra para a mãe o que ele fez com o
quarto da irmã. A mãe, demonstra surpresa, mas não briga com ele, apenas
faz ele limpar a bagunça que fez, e ela o ajuda na limpeza.
Percebemos uma mãe muito paciente que tenta dar conta de tudo,
trabalho, casa, filhos, sempre calma e amorosa apesar de sobrecarregada.
Percebemos também que o pai, embora não more mais com eles, ainda
mantém contato com os filhos, pois no início do filme, ao telefone, a irmã de
Max afirma que no final de semana irão para a casa do pai. Também
observamos que o pai dava presentes e dizia de seu amor para o filho.
Na cena da escola, vemos que Max brinca normalmente com os amigos
na hora do intervalo, eles jogam bola, se agarram, dão risadas, Max age de
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forma normal na escola, não demonstrando a agressividade que demonstra em


casa.
Quando o professor explica sobe a morte do sol o menino demonstra
preocupação, fica pensativo e depois, no carro, lembra-se das palavras do
professor e olha para a mãe e para a irmã.
Com essa cena percebemos que o menino sente medo do que está por
vir, do crescimento, das coisas que ainda não sabe como lidar e, acima de tudo
de perder as pessoas que ama como a mãe e a irmã. Também o fato de já ter
“perdido” o pai, que não mora mais com eles.
Determinada noite, brincando sozinho, usando apenas seus bichinhos
de pelúcia como companhia, Max decide chamar a mãe para lhe fazer
companhia, ela responde que está ocupada, o menino olha sua fantasia de
lobo pendurada na cama, decide vesti-la e vai ao encontro da mãe.
Quando percebe que ela está trocando carícias com o novo namorado o
menino fica muito enciumado, começa a arrastar os móveis, questionar as
coisas, reclamar, gritar, até que sobe na bancada e em posição de comando,
como se fosse mesmo o “rei do mundo” fala para a mãe: “Mulher, comida! Eu
vou comer você!”
Repreendendo o menino, a mãe diz que ele não irá jantar, o menino
então se revolta e começa a gritar, a mãe tenta segurá-lo e leva uma mordida,
ela fica muito nervosa, o garoto percebendo o que fez, chora e diz que não era
culpa dele, em seguida sai correndo de casa em direção a uma floresta.
A partir desse momento, Max chega perto de um rio e vê um barco de
verdade, é possível ver que ele fecha os olhos logo após, como se estivesse se
concentrando em algum pensamento ou imaginação. Reparamos que as cenas
ficam diferentes, saindo da realidade para um outro mundo, possivelmente
mundo criado pelo próprio imaginário e criatividade do menino.
Max veleja um tempo em um mar agitado e chega à uma ilha. Lá ele
encontra seres bem diferentes do mundo real. São como bichos grandes,
peludos, de início, uma aparência assustadora, porém logo que o menino os
observa vemos que esses seres são simpáticos e vivem como uma família.
Os bichos, que são como monstros, percebem a presença de alguém
diferente, e encontra o garoto Max os observando. Carol, se aproxima do
menino e os dois possuem uma identificação, isso porque Carol também
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aparenta ter uma personalidade intensa. Os monstros então se juntam para se


alimentar do menino, mas este consegue se salvar dizendo que eles não
podem o comer, pois ele é um rei. Inicialmente, os monstros não acreditam,
mas depois, passa a tratá-lo como o rei deles.
A partir desse trecho, Max constrói uma relação de amizade e
cumplicidade com os monstros. Principalmente com o monstro Carol e sua
outra amiga, DW. Carol e DW possuíam uma amizade forte, mas DW estava se
organizando para ir embora da ilha, com a troca de olhares entre Carol e Dw,
observamos que o monstro Carol estava com uma expressão triste, como se
quisesse se desapegar dessa amizade.
Mais pra frente, entendemos que DW pensava em ir embora porque
tinha feito amizade com dois animais e Carol não compreendia que essa
amizade repentina. Em diversas cenas, percebemos o quanto esses dois
amigos incomodam o monstro Carol.
Em uma conversa com Max, DW explica que não vê problema em ter os
dois amigos e continuar sendo amiga dos outros monstros da ilha. Uma
amizade, não anula a outra, diz ela. O menino ouve atentamente.
Ao longo das próximas cenas, é possível notar que o enredo se passa
por esse conflito entre Carol e DW, e que o menino Max, está intermediando
essa relação. Ora conversando e escutando DW, ora dialogando e
aconselhando Carol.
Judith, outra monstra da ilha, percebendo o vínculo que Max estava
construindo com DW, questiona o menino dizendo ‘’Todos os reis tem seus
preferidos, quem é o seu preferido da Ilha?’’. Max diz que gosta de todos
igualmente, porém Judith retoma a conversa ‘’Isso não é possível, sempre há
um preferido’’.
Em uma conversa com Carol, o garoto tenta confortá-lo, dizendo que
quando ele se sente mal, tem uma coisa que ele faz que o ajuda a melhorar.
Mais tarde, Max propõe uma brincadeira com os monstros: guerra de bola de
barro. A brincadeira, se parece muito com o começo do filme em que ele brinca
de jogar bolas de neve nos amigos de sua irmã. No começo parece divertida,
mas com o passar do tempo, notamos que se torna agressiva e que acaba
machucando outros monstros.
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Essa situação ocasiona um abalo nos monstros, que começa a


questionar se o menino é realmente o rei. Alguns aparentam serem mais
sábios e assumem que desde o início já sabiam que Max não era rei, mas sim
uma pessoa comum. O único que demonstra grande resistência para essa
informação é o Carol, que fica decepcionado quando o próprio menino diz ser
apenas o ‘’Max’’ e que ele não é rei de verdade.
Carol apresenta um comportamento que se aproxima muito do que o
garoto fez ao bagunçar o quarto de sua irmã. Uma agressividade que não é
controlável, o deixa cego para objetos importantes, destrói qualquer coisa que
estiver a sua frente, e só depois percebe as consequências de seus atos.
Max presencia essa situação, fica assustado com o comportamento de
Carol, e conversando com outros monstros, toma a decisão de que está na
hora dele voltar para a casa. Tenta uma última conversa com Carol, mas não
demonstra grande interesse.
No momento de sua despedida, todos os monstros estão presentes.
Quando o menino sobe no barco para ir para casa, vê, de longe, o Carol
correndo, desesperadamente, chorando, e até uivando. Essa cena remete aos
choros do Max no começo do filme, as lágrimas, os soluços, a expressão de
tristeza no rosto.
Após essa cena, em que ele se despede e volta no barco, notamos que
o garoto está diferente. Expressa um sorriso no rosto - apesar do momento
difícil da despedida – como se tudo aquilo que viveu tivesse sido importante
para ele. Sentimos que o menino sai daquela experiência mais maduro,
compreensível diante das relações humanas, e principalmente, das relações
com as pessoas importantes para ele.
Max volta para a sua casa, e é recebido com um abraço bem intenso da
sua mãe, os dois trocam olhares como se naquele silêncio, muitas coisas
tivessem sido ditas.

3. TEORIA WINNICOTIANA DO PROCESSO MATURACIONAL E


FENÔMENO TRANSICIONAL

Para a análise do filme ‘’Onde Vivem os Monstros’’ utilizaremos a


perspectiva psicanalítica de Donald Woods Winnicott. Este formulou a sua
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teoria focado no desenvolvimento emocional do bebê, que teria como momento


principal o período que vai do nascimento até os 5/6 meses de vida. Entretanto,
isso não significa que tem o seu término neste período, ao contrário, esses
processos farão parte da construção da maturidade do sujeito, dessa forma,
estarão presentes durante toda a existência.
Winnicott, não desconsidera as conquistas físicas do bebê, isso fica
evidenciado quando cita o marco fundamental da habilidade do bebê em pegar
um objeto e levá-lo à boca. Se trata de um progresso físico, porém isso só foi
possível também devido ao desenvolvimento emocional, a esse respeito o
autor coloca:
Não há um paralelo exato entre a habilidade e o desejo,
e sabemos que muitos progressos físicos – tal como a
capacidade de andar – podem ser tolhidos até que o
desenvolvimento emocional libere a conquista física. Seja qual
for o aspecto físico da questão, há sempre o lado emocional.
(WINNICOTT, 1945, p. 221)

Com isso, percebemos que Winnicott considera o desenvolvimento


emocional como extremamente importante na vida do bebê, bem como o seu
processo de amadurecimento, que para ele, significa: saúde mental.
Segundo o psicanalista, quando o bebê atinge esse estágio, um longo
caminho já foi percorrido em termos de desenvolvimento primitivo. Mas, o que
ocorre com o bebê até que ele atinja essa etapa? É através desse
questionamento inicial que Winnicott começará a conceituar sua teoria.
Para ele, há um estado primário chamado de não-integração-primária, o
que significa que no início da vida, não somos seres individualizados, inteiros,
integrados, esse estágio de integração se dará a partir de dois conjuntos de
experiência: a forma como o bebê é cuidado pelo ambiente – mais
especificamente pela mãe – e as experiências instintivas que tendem a
aglutinar a personalidade. (WINNICOTT, 1945, p. 224)
Para esse segundo conceito, deu-lhe o nome de personalização, que é o
momento em que o bebê começa a se sentir dentro do próprio corpo. Apesar
de parecer óbvio, segundo o autor, não o é, e não se dá de forma inata ou
automática. (WINNICOTT, 1945, p. 224)
Esse processo de integração e personalização ocorre de forma
concomitante. Outro ponto importante de sua teoria é que cada um possui uma
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tendência inata ao desenvolvimento (considerando que são seres saudáveis do


posto de vista físico, isto é, não são portadores de alguma deficiência motora
ou síndrome), porém, a maturidade emocional só ocorrerá quando o ambiente
for facilitador e prover condições necessárias para que este tenha aparatos
para enfrentar os próximos estágios de maturidade. (WINNICOTT, 1962, p. 62,
63)
Para progredir em sua teoria, é necessário apresentar as características
do bebê primitivo e como este atingirá aos outros níveis de desenvolvimento.
Como citado anteriormente, o bebê nasce de forma não-integrada, ou seja, ele
não possui aparatos suficientes para sobreviver ao ambiente de forma
individualizada. Nesse estágio, Winnicott fala sobre a dependência absoluta,
isto é, o bebê possui uma dependência extrema do ambiente, de seu cuidador.
Na dependência extrema o bebê depende da disponibilidade total de sua
mãe, e é essencial que esta esteja totalmente voltada para as necessidades do
bebê, agindo de forma suficientemente boa para que este consiga progredir de
forma saudável. O relacionamento do bebê com o seio materno é considerado
uma experiência essencial que será - por sorte - o estabelecimento do primeiro
vínculo do bebê com um objeto externo. (WINNICOTT, 1945, p. 227)
O bebê está faminto e está pronto para alucinar algo que pode ser
atacado, nesse mesmo instante, se considerarmos uma mãe suficientemente
boa, irá corresponder as necessidades do bebê e oferecerá para ele o seu
seio. Esse movimento da mãe, provoca no bebê ao que Winnicott chamou de:
momento de ilusão. (WINNICOTT, 1945, p. 227)
Esse momento de ilusão será importante pois, para o bebê, ele é
onipotente, deseja ou alucina um objeto e ele aparece, como se ele fosse o
verdadeiro criador desse objeto, de forma que nessa fase, ele ainda não
consegue separar o mundo externo de seu mundo interno.
Concomitantemente o bebê está superando o processo de dependência
absoluta e passando para a dependência relativa, momento no qual ocorrem as
falhas do ambiente, ocasionando nele, traumas. Nesta fase, há um ‘’indivíduo’’
para se traumatizar, se considerarmos que ele já é um ser em integração.
(WINNICOTT, 1962, p. 64)
Ao decorrer do tempo e a partir das falhas ambientais, que podem ser
descritas como a ausência da mãe em alguns momentos, o bebê passará por
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uma desilusão, e começará a se dar conta gradualmente de um mundo externo


que existe independente dele. E essa é outra etapa do desenvolvimento ao
qual ele alcança e é chamado de realização.
Não podemos deixar de mencionar aqui, um conceito importante que
dará suporte para que o bebê supere a ausência/separação da mãe: objetos
transicionais e fenômeno transicional. Esse espaço onde o bebê está
experimentando as suas áreas internas e reconhecendo uma outra realidade, é
chamado pelo autor de: área intermediária da experiência. Em suas palavras:

Introduzi as expressões ‘’objeto transicional’’ e ‘’fenômeno


transicional’’ para designar a área intermediária da experiência,
entre o polegar e o ursinho, entre o erotismo oral e a
verdadeira relação objetal, entre a atividade da criatividade
primária e a projeção do que já teria sido introjetado, entre a
não consciência primária da dívida e o reconhecimento da
dívida. (WINNICOTT, 1951, p. 317)

O objeto transicional é representado como as primeiras possessões do


não-eu. É através desse objeto – que pode ser um paninho, um ursinho – que a
criança será capaz de suportar tamanha angústia e ansiedade desse momento
de separação. Referente aos fenômenos transicionais ele diz:

Pode acontecer, também, que tudo isto (se estivermos


estudando uma determinada criança) emerja algo ou algum
fenômeno – talvez uma bolinha de lã ou a ponta de um
cobertor ou edredom, uma palavra ou melodia, ou um
maneirismo, que se tornam vitalmente importantes para a
criança, que os usa quando vai dormir e que funcionam como
uma defesa contra a ansiedade, especialmente a ansiedade
depressiva. (WINNICOTT, 1951, p. 319)

Dito isso, o fenômeno transicional é de extrema importância nessa fase,


pois, faz parte do processo evolutivo, é uma etapa do desenvolvimento. A
transição da ilusão para a desilusão, bem como da dependência relativa para a
independência será um momento intenso, e para que consiga suportá-lo, faz-se
necessário a utilização de um objeto transicional ou fenômeno transicional.
Além disso, Winnicott conclui:

O objeto transicional e os fenômenos transicionais dão a


partida a cada ser humano, através daquilo que será sempre
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importante para ele, ou seja, uma região neutra de experiência


que não será questionada. (WINNICOTT, 1951, p. 328)

Em outras palavras, não é possível especificar qual objeto será utilizado


como objeto transicional, e muito menos quais serão os fenômenos
transicionais que a criança usará, isto porque é próprio e singular de cada um,
desde que seja importante para ela.
Dando sequência ao processo de realização, ele explica que consiste no
bebê ser capaz de localizar no tempo e espaço, em outras palavras, o bebê
tomará consciência de que a coisa ou fenômeno em questão não é produzido
por sua imaginação. (WINNICOTT, 1945, p. 223)
No decorrer da passagem da dependência absoluta para a dependência
relativa, o bebê começará a passar por mesclas de dependência-
independência. No rumo à independência, presumimos que o bebê já possui
um ambiente internalizado, ou seja, ele já consegue identificar o outro além
dele, e mais, sabe delimitar o seu mundo interno do externo. (WINNICOTT,
1962, p. 64)
Importante ressaltar que apesar desses processos acontecerem em seu
auge no início do desenvolvimento primitivo do bebê, ele não finalizará nesta
etapa, pois o desenvolvimento do sujeito nunca será acabado, podendo até
regredir para alguns desses estágios em algum momento difícil da vida,
Winnicott diz:
[...] a análise desses relacionamentos primitivos só pode ser
realizada enquanto uma extensão da análise da depressão.
Esses relacionamentos primitivos, quando aparecem em
adultos e crianças, podem representar uma fuga às
dificuldades trazidas pelos estágios seguintes, de acordo com o
conceito clássico de regressão. (WINNICOTT, 1945, p. 220)

Sendo assim, retornaremos a esses estágios ao enfrentarmos uma nova


situação, um momento intenso de mudança que exija de nós maturidade para
superar. O autor usará o conceito de desintegração para explicar esse
momento em que haverá uma quebra da integração e que poderá nos abalar
de forma a envolver também nossa personalidade, ocorrendo dessa forma a
despersonalização. (WINNICOTT, 1945, p. 225)
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4. ANÁLISE WINNICOTIANA DO FILME

Através dos conceitos de fenômeno transicional e processo maturacional


da teoria de Winnicott descritas acima, nos propomos a analisar o filme Onde
Vivem os Monstros, e relacionar os conceitos psicanalíticos com a vivência em
que o personagem principal Max está experenciando.
Consideramos que Max é uma criança saudável, sadia, sem nenhuma
deficiência aparente, que gosta de brincar, utiliza seus brinquedos para
estimular a sua imaginação, usufrui da sua enorme criatividade para criar
espaços no mundo real em que possa brincar, para Winnicott, Max se constitui
de forma integrada, inteira, onde seu processo de integração e personalização
estão bem desenvolvidos.
Além disso, ele consegue se localizar no tempo e no espaço de forma a
compreender o mundo externo, a realidade, sabe separar o seu eu de outras
pessoas, como exemplo de sua mãe, sua irmã e outras pessoas que ele
aparece brincando ao longo do filme.
Dessa forma, demonstra que teve aparatos suficientemente bons do
ambiente, e mais especificamente de sua mãe, que deu suporte para que ele
se desenvolvesse de maneira saudável a sua maturidade e seu lado
emocional.
Winnicott fala a respeito de alguns processos de desintegração que
poderão acarretar também a despersonalização, desse ponto, diz que algo
provocará uma quebra de sua integração e personalização, o que fará com que
o sujeito tenha que encontrar aparatos para enfrentar as dificuldades ao longo
da vida e continuar dessa maneira, progredindo de maneira saudável.
Podemos inferir que o processo de separação dos pais, a nova relação
amorosa que a mãe está construindo e também a falta que está sentindo da
presença da irmã, é esse momento difícil, que provocou essa desintegração na
vida do Max. Assim, ele está encontrando maneiras para lidar com essa
situação.
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Seu comportamento agressivo, violento, destrutivo, imaturo é a primeira


maneira que ele está utilizando para enfrentar essa gama de sentimentos,
podemos pensar em: solidão, ciúmes, separação, medo, vulnerabilidade e etc.
Mas, percebe que suas atitudes não estão mudando essa realidade.
Aqui, também é possível verificar um retrocesso para o momento de
ilusão, que ocorre nos primeiros meses da vida do bebê, em que a criança
acha que tem a condição de onipotência, e que ela tem poderes para criar algo
para a sua vontade ou alucinação.
Outro ponto a ressaltar é que quando Max percebe que perdeu o
controle do objeto, no caso, sua mãe, ele foge, não dando conta de lidar com
as dificuldades que estão surgindo. Nesse momento do filme, Max se imagina
em uma ilha, onde se relaciona com diversos monstros e cria um vínculo
especial com Carol e DW.
Analisando com atenção o enredo da ilha, vemos que a criatividade de
Max se aproxima muito de sua realidade, já que, o monstro Carol está
passando por um conflito de amizade com DW. Carol tem uma personalidade
forte e costuma destruir as coisas quando as situações saem de seu controle, o
que gera muita identificação com o menino Max e seus comportamentos.
DW está criando laços de amizade com outros dois bichos, mas Carol,
apesar de ser amigo dela, parece não aceitar essa nova relação, e decide se
afastar. Em alguns momentos do filme, observamos que os comportamentos
de Carol em relação a DW, se dão da mesma forma que Max se relaciona com
sua mãe e irmã.
Max se coloca como rei para os monstros dentro da ilha, e age como tal,
dizendo que afastará toda a tristeza daquele ambiente, para ele tudo era
motivo de festejar. Além disso, Max propunha algumas brincadeiras agressivas
entre os monstros. A forma como ele se descreve como rei, aquele que é todo
poderoso e que tem super poderes únicos no universo todo, também remete ao
momento de ilusão em que Winnicott descreve como sendo importante para o
desenvolvimento maturacional do bebê.
Segundo o autor, esse momento de ilusão será importante para que se
tenha a desilusão, ou seja, o encontro com a realidade, o discernimento entre o
que é imaginário e o que é real.
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O menino Max age como mediador da amizade entre Carol e DW. Ele
compreende a forma como Carol está se sentindo, mas ao mesmo tempo, tem
um diálogo importantíssimo com DW, que ensina para ele que apesar dela ter
duas amizades novas, isso não implicaria em uma não-amizade com o pessoal
da ilha, como se uma coisa não anulasse a outra.
Quando os monstros se dão conta de que Max não é rei, não tem super
poderes mágicos e especiais, é como se o menino se deparasse com a
realidade, a de que ele é somente Max, uma criança comum.
Outro ponto a se destacar é em relação a fantasia de lobo usada pelo
garoto. Pudemos observar que Max possui um apego, um vínculo muito forte
com a fantasia, de forma que, nos momentos difíceis como na discussão com a
mãe, faz questão de coloca-la como se ganhasse força com ela. Além disso,
em todo o momento de “aventuras na ilha dos monstros” o menino usa a
fantasia, nos trazendo a impressão de ser algo muito importante para ele, algo
que oferece proteção diante dos conflitos, talvez uma forma de fugir de sua
realidade e encarar uma outra personalidade.
Max demonstra ser, desde o início do filme, uma criança muito criativa e
que usa essa criatividade para imaginar histórias, construir espaços de
imaginação. A parte em que Max vai para a ilha e passa por todas essas
situações, se demonstra como muito importante para o seu amadurecimento,
funcionou como um suporte, para que ele pudesse novamente, delimitar os
espaços internos e externos a ele, processo esse conhecido como fenômeno
transicional.
O fenômeno transicional funciona como aparato para que diminuía as
ansiedades e angustias, e dessa forma, Max conseguiu sair daquela
experiência de forma mais compreensiva e apesar de ter sido algo criado por
ele mesmo, ele pode se colocar naquela situação e aprender novas habilidades
e capacidades maturacionais.
É possível observar que Max vai embora da ilha muito diferente de como
quando ele chegou no local. Ele se despede de todos de forma mais integrada,
entendendo quem ele é e sobretudo, decide, por vontade própria, voltar para a
casa, ou seja, sair daquele mundo que não é o mundo real.
Assim, teoria de Winnicott nos alerta para a importância dos primeiros
meses da vida humana, onde os cuidados da mãe devem ser suficientemente
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bons sob pena de trazer sérios prejuízos à criança. Contudo, mesmo que esses
processos ocorram de forma satisfatória, mais tarde, ao longo de nossas vidas,
basta estarmos diante de situações novas e difíceis de lidar, para revisitarmos
nossa primeira infância onde, mais uma vez, buscaremos recursos para
superar os desafios.
5. CONCLUSÃO

Através desta análise podemos compreender melhor a complexa teoria


do desenvolvimento humano proposta por Winnicott.
Apesar de ser uma obra de ficção, o filme conseguiu trazer com riqueza
de detalhes as dificuldades enfrentadas por uma criança no decorrer de seu
desenvolvimento e também os recursos utilizados para reorganizar sua
estrutura mental.
Max se sentia sozinho. A irmã adolescente já não brincava mais com
ele, o pai, após o divórcio, estava morando em outra casa e a mãe, embora
amorosa e atenta as suas necessidades estava sobrecarregada de trabalho.
Para agravar a situação, Max se viu “trocado” pelo novo namorado da mãe.
O nível de ansiedade do garoto era tão alto que não conseguia controlar
sua agressividade, seu sofrimento psíquico era enorme.
Porém, os bons cuidados de sua mãe, desde seu nascimento, que
possibilitaram um desenvolvimento saudável, capacitaram o menino a buscar o
recurso do fenômeno transicional, conectando-se com toda sua criatividade
para reestabelecer o equilíbrio entre sua realidade interna e o mundo real.
Nessa elaboração com monstros imaginários representativos de
sentimentos e situações de seu dia a dia, Max deu vazão a sua criatividade o
que auxiliou para que esse voltasse ao seu estágio integrado de sua
personalidade, além disso, retornasse para a realidade e o mundo real.
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REFERÊNCIAS

ONDE VIVEM OS MONSTROS, Direção de Spike Jonze. Estados Unidos:


Warner Bros Pictures, 2009.

WINNICOTT, Donald Woods. Da Pediatria à Psicanálise: obras escolhidas.


Rio de Janeiro: Imago Editora, 2000. Cap. 12 e 18, 1945/1951

WINNICOTT, Donald Woods. O Ambiente e os Processos de Maturação:


estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre:
Artmed, 1983. Cap. 5, 1962

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