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Unidade Didáctica 2:

Rastreio de Infecções Oportunistas em


Pacientes HIV+: Principais Testes Disponíveis
Objectivos de Aprendizagem

No final desta unidade os participantes devem ser capazes de:


• Listar os principais testes diagnósticos disponíveis para a avaliação de pacientes
HIV+ com doença avançada.
• Explicar o mecanismo pelo qual estes testes permitem identificar algumas das
principais doenças oportunistas.
• Descrever a sensibilidade e especificidade dos testes.
• Listar as indicações dos novos testes disponíveis.
• Interpretar os resultados dos testes.
Testes importantes para usar na avaliação do paciente com doença
avançada

• CD4
• Xpert MTB/RIF
• TB-LAM
• CrAg
• RPR (ou VDRL)
• Exame pélvico e VIA (mulheres HIV+ em geral e com HIV avançado em particular, pela elevada
prevalência de Cancro de colo uterino).
• Testes/provas não específicas mas que apoiam no diagnóstico diferencial.
o FASH (avaliação ecográfica focada nos achados de TB disseminada).
o Retinoscopia (fundoscopia).
CD4
Contagem de CD4

• Os CD4 são uma parte dos linfócitos T.


• Em pacientes com HIV e sem TARV a contagem de CD4 tende a diminuir com o
decorrer do tempo e a progressão da doença
• A contagem de CD4 determina o risco para desenvolver algumas condições
oportunistas e outras doenças.
• A maioria das condições oportunistas se apresentam com contagens de CD4
baixas (<200 cels/mm3).
• Outras doenças frequentemente ligadas à infecção por HIV não tem uma
relação tão clara com a contagem de CD4.
Contagem de CD4 e Doenças Oportunistas

Adaptado de: Disease Control Priorities Project, capítulo 18, 2ª edição, 2006
Em que pacientes devemos monitorar CD4?

Apesar da CV ser o teste de escolha para a monitoria dos pacientes com HIV, a
contagem de CD4 deve continuar a ser feita em todos os seguintes casos:
1. Pacientes novos inícios de seguimento/TARV.
2. Pacientes que retornam aos cuidados após abandono/perda de seguimento.
3. Pacientes em seguimento e com qualquer sinal sugestivo de progressão da doença
(nova condição de estadio 3 ou 4 ou recaída).
4. Pacientes em seguimento e sem supressão viral (CV detectável de forma
persistente).
5. Mulheres grávidas HIV+, (independente de qualquer outra circunstância), na altura
da confirmação da gravidez
6. Pacientes que iniciam TARV com contagem de CD4 baixa*, até apresentar
supressão viral e aumento da contagem de CD4 (anualmente).
Novos testes rápidos para CD4

• Teste rápido semiquantitativo para


estimação de CD4 no sangue.
• POC (sem necessidade de
aparelhos de laboratório).
• Resultados:
• ≤200 cels/ml
• >200 cels/ml
Tipo de Amostra: Capilar ou Venosa (EDTA)

OU

Capilar Venosa (EDTA)

Adicionar 30 µL da amostra no
poço A
Incubações e adicções de tampão

Espere 3 MIN Espere 17 MIN Espere 20 MIN

90° 90° 3 Gotas


1 Gota

Interprete os
resultados nos
Adicione 1 gota de Adicione 3 gotas de seguintes
diluente ao Poço A diluente ao Poço B
5 minutos
Interpretação dos Resultados

A linha do resultado do teste (T) tem maior intensidade que a linha de referência (200)
A contagem de CD4 do paciente está acima de 200 células / µL

C = Linha de Controlo

200 = Linha de Referência


Linha de teste (T) T = Linha de Teste
MAIS ESCURA do que
a linha de referência
(200)
Interpretação de Resultados
A liha do resultado do teste (T) não aparece ou tem igual ou menor intensidade que a
linha de referência (200)
A contagem de CD4 do paciente está abaixo de 200 células / µL

Linha de teste (T) Linha de teste (T) MAIS


TESTE (T) linha
INTENSIDADE IGUAL LEVE do que a linha de
AUSENTE
que linha de referência referência (200)
Interpretação de Resultados
O resultado do teste é INVÁLIDO

FALTA Linha de FALTA Linha de

Referência (200) Controlo (C)

Repita o Teste
Testes para Diagnóstico de TB
Diagnóstico Laboratorial de TB em Pacientes HIV+

Xpert MTB/RIF TB LAM


Point of caB LAM
Xpert é o teste de escolha para o diagnóstico de TB

• É um teste molecular automatizado que detecta a presença de material genético


do bacilo da TB.
• Tem maior sensibilidade e especificidade comparativamente à microscopia, ao
algoritmo da OMS para detecção de TB pulmonar com baciloscopia negativa e,
provavelmente à radiografia de tórax.
• Permite a detecção de resistência a rifampicina no momento do diagnóstico de
tuberculose.
• Pode ser utilizado em amostras diferentes de escarro para a detecção de
tuberculose.
GeneXpert: Sensibilidade

• Metanálise de 21 estudos com 8.880 pacientes 1.


• Sensibilidade da baciloscopia: 65% (IC 57-72%)
• Sensibilidade do GeneXpert 88% (IC 84-92%)

• Isto é, o teste GeneXpert aumenta a capacidade de detecção de TB em 23% (IC 15-32%)


• Estudo multicêntrico2 publicado em 2014, que incluiu pacientes da África do Sul,
Zimbabwe, Zâmbia e Tanzânia,
• Sensibilidade global da microscopia foi de 50% (em relação à cultura),
• Sensibilidade do GeneXpert foi de 83,3%.

Importante!
• A sensibilidade aumenta para 90.2% com 3 amostras testadas.
• Devemos insistir com a colheita de amostras para tentar confirmar o diagnóstico.
Para quais amostras está validado o teste Xpert MTB/RIF?

• Amostras de expectoração ou equivalentes (aspirado gástrico em jejum).

• Amostras de LCR.

• Amostras obtidas por Punção aspirativa a partir de gânglios.

NOTA:
• Existem cada vez mais evidências da utilidade em outras amostras, particularmente
em crianças (fezes, urina..), apesar que ainda não está validado em Moçambique.
A baciloscopia continua sendo o teste de escolha para a
avaliação da resposta ao tratamento

• O Xpert MTB/RIF não deve ser usado para o controlo da resposta ao tratamento, pois
pode persistir positivo muito tempo após o fim do tratamento.

• Os pacientes com confirmação bacteriológica no início do tratamento da TB, deverão


fazer BK de controlo ao segundo mês.
Diagnóstico laboratorial de TB em pacientes HIV+:
Desafios

• Xpert MTB negativo não exclui TB em pacientes HIV+.

• O diagnóstico clínico/radiológico continua sendo chave para melhorar a


supervivência dos pacientes HIV+ com TB e doença avançada.

• Outros testes podem permitir a confirmação bacteriológica de TB (a seguir).


Teste TB-LAM (Urina)

• Teste TB-LAM = LipoArabinoManan.

• Teste TB-LAM é um antigénio da parede celular do BK.

• É excretado “inteiro” na urina de pacientes imunocomprometidos.

• Em pacientes com boa imunidade o Teste TB-LAM forma imuno-


complexos e não pode ser excretado na urina.

• A urina é fácil de coletar, além de ter baixo risco de biossegurança quando


comparado com as amostras de escarro (risco de transmissão).
Processamento de amostras TB-LAM
Leitura dos resultados (1)

• O teste TB-LAM é negativo quando não


aparece a linha na janela do paciente.

• O teste TB-LAM é inválido quando não


aparece a linha na janela do controle
(independente do aparecimento de linha
na janela paciente).
Leitura dos resultados (2)

• A intensidade da linha da janela


“Paciente” define o resultado do teste.

• O teste TB-LAM tem 4 graus de


positividade.

• Uma linha incompleta, ou mais clara


que a linha do grau 1 pode ser reportada
como “resultado indeterminado”.
Leitura dos resultados (3)

• Os graus 2, 3 e 4 são considerados positivos e o clínico deve iniciar


tratamento, se o paciente não estiver a fazer ainda.

• O grau 1 deve ser reportado como teste positivo, contudo, a interpretação


é complexa.
Interpretação dos resultados (1)

• O teste TB-LAM deve ser interpretado no contexto clínico.


• Num paciente com sintomas de TB deve ser considerado positivo e indicado
tratamento de TB.
• Num paciente completamente assintomático a atitude pode ser a de reavaliar com
um segundo teste, usando a primeira urina da manhã (o teste TB-LAM será
aplicado a pacientes com diagnóstico de HIV e com CD4 inferior a 200 cels/ml,
sendo que uma parte considerável deles não terá sintomas).
• Um resultado positivo débil (grau 1) deve ser tomado em conta atendendo a
outros achados (clínica de TB, alterações radiológicas no Rx ou ecografia..).
• Um teste negativo não exclui a infecção tuberculosa (não tem sensibilidade de
100%).
Interpretação dos resultados (2)
• O TB-LAM pode ser positivo no caso de infecção pela espécie Mycobacterium (M.
tuberulosis, leprae, avium…).

• Não deve ser usado em pacientes para os quais não esta indicado (exemplo: HIV
negativos ou HIV positivos com contagens de CD4 elevadas).

• O grau de positividade não está correlacionado com a carga de bacilos.

• Não permite fazer controlo da doença (não deve ser solicitado para avaliar resposta ao
tratamento).

• No caso de TB-LAM positivo, devemos tentar a confirmação bacteriológica através


de testes como Xpert (ainda que o tratamento deve ser iniciado sem demora).
Pergunta

Qual é a sensibilidade do teste TB-LAM?


a) Detecta mais de 60% dos casos independentemente da contagem de CD4 do
paciente.
b) Detecta mais de 60% dos casos se a contagem de CD4 for menos de 200
cels/mm3
c) Detecta mais de 60% dos casos se a contagem de CD4 for menos de 50
cels/mm3
Resposta

Qual é a sensibilidade do teste TB-LAM?


a) Detecta mais de 60% dos casos independentemente da contagem de CD4 do
paciente.
b) Detecta mais de 60% dos casos se a contagem de CD4 for menos de 200
cels/mm3
c) Detecta mais de 60% dos casos se a contagem de CD4 for menos de 50
cels/mm3
TB LAM: Sensibilidade em função da contagens de CD4

70

%pacientes com tb detectados por TB LAM


CD4>200: Sensibilidade 4% 60

CD4<200: 39% 50
CD4<150: 45.7%
40
CD4<100: 51.7%
67
CD4<50: 66.7% 30
52
46
20 39

10

4
0
> 200 < 200 < 150 < 100 < 50

CONTAGEM CD4
Critérios para uso de TB LAM

• Pacientes HIV+
• Internamento: todos os pacientes HIV+ com sinais de perigo e que
requerem de internamento.

• Centros de saúde (ambulatório): Pacientes HIV+ com contagem de CD4 ≤


200 cels/mm3 independente dos sintomas; pacientes com condições de
estadio avançado (3 ou 4 da OMS).

Importante: TB-LAM negativo não exclui TB


Testes Diagnósticos para Infecção
Criptocóccica
Evolução natural da Infecção Criptocóccica

Infecção Meningit
Queda de por e
CD4 Criptococo Criptocóc
(sangue) cica (LCR)
Diagnóstico laboratorial da infecção por Criptococo

• CrAg = Antigénio de Criptococo.

• Teste CrAg: teste rápido que detecta antigénio de criptococo em soro, sangue total,
plasma e LCR.
• Detectado no soro dos pacientes HIV+ com infecção disseminada por criptococo e
no LCR dos pacientes com meningite criptocócica.
• Alta sensibilidade e especificidade (> 95%).

• CrAg é detectado em soro 22 dias antes do início de sintomas de meningite (em


média).
• Se for positivo, é um predictor muito forte de evolução para meningite criptocócica.
Concentração de CrAg em diferentes fluídos em relação ao
tempo da infecção

LCR
Pulmonar Extrapulmonar Meningite
Sangue, plasma
Concentração CrAg

ou soro

Urina

Amostra de
lavagem
bronco-alveolar

Infecção Tempo
Procedimento do TDR para deteção do CrAg (1)

1. Adicionar 1 gota de 2. Adicionar 40μL de


diluente LF num tubo amostra e homogeneizar
Procedimento do TDR para deteção do CrAg (2)

3. Mergulhar a parte branca do final


da tira do teste CrAg LF no tubo 2. Aguardar 10 minutos
Princípio de funcionamento do TDR (CrAg)
Interpretação dos resultados

 Duas linhas (teste e controlo),


independentemente da intensidade da linha
“teste”, indica resultado positivo.
 Uma única linha de controlo indica um resultado
negativo.
 Se a linha de controlo não aparecer, os resultados
são inválidos e o teste deve ser repetido.
Pergunta

No nosso contexto, quais são os pacientes que devem ser testados com CrAg?
a) Todos os pacientes HIV+.
b) Todos os pacientes HIV+ no início de seguimento.
c) Todos os pacientes HIV+ com contagem de CD4 <200 cels/mm 3 no início do
seguimento.
d) Todos os pacientes HIV+ com contagem de CD4 < 100 cels/mm 3 no início do
seguimento.
Resposta

No nosso contexto, quais são os pacientes que devem ser testados com CrAg?
a) Todos os pacientes HIV+.
b) Todos os pacientes HIV+ no início de seguimento.
c) Todos os pacientes HIV+ com contagem de CD4 <200 cels/mm 3 no início do
seguimento.
d) Todos os pacientes HIV+ com contagem de CD4 < 100 cels/mm 3 no início do
seguimento.
Fluxo de amostras para CrAg (1)

• Paciente com CD4 ≤ 200 cels/mm3 processamento automático de CrAg


na mesma amostra de soro.

• Se CrAg positivo no soro, 2 possíveis abordagens:


• Abordagem mais agressiva (Punção lombar para todos os casos).
• Abordagem em caso de capacidade limitada para PL.
Fluxo de amostras para CrAg (2)

• Abordagem mais agressiva: PL para realização de CrAg no LCR e tratar


segundo o resultado.

• Profilaxia de meningite se CrAg no LCR negativo.

• Tratamento da MC se CrAg no LCR positivo.


Fluxo de amostras para CrAg (3)

Abordagem menos agressiva:


• Despiste clínico e se for paciente sem nenhum sinal/sintoma de meningite:
iniciar profilaxia de meningite criptocócica.

• Se há qualquer evidência de possível envolvimento meníngeo, uma punção


lombar deverá ser realizada para confirmar a suspeita. Na falta de capacidade
para fazer PL, o tratamento disponível deverá ser iniciado, e o paciente
transferido para a US de referência com capacidade para um correcto
tratamento.
Por que o rastreio é apenas feito com CD4 <200?

• 80% dos casos de CrAg positivo acontecem em pacientes com CD4 <100
cels/mm3

• Outro 20% dos casos acontece em pacientes com CD4 100-200 cels/mm3

• A infecção disseminada por criptococo pode muito raramente acontecer


em pacientes com CD4 > 200 cels/mm3
Prevalência de
CrAg no soro em
pacientes HIV+
por países.
Nº estimado de casos de infecção por criptococos (2014)
Nº estimado de casos de MC por região (2014)
Testes serológicos para sífilis (RPR)

• A sífilis é uma ITS frequente na população geral em Moçambique (7%


RPR+ em mulheres em CPF em estudo de 20031).
• A progressão para neurossífilis é mais rápida e comum em pacientes com
HIV, particularmente com doença avançada.
• Todo paciente HIV+ com sinais/sintomas neurológicos, deve ser testado
para sífilis (RPR, outros testes com VDRL se disponíveis).
• Todo paciente HIV+ e com doença avançada deve ser testado para sífilis
(doença latente, tratável de forma simples).
Outras provas complementares em HIV avançado

• Hemograma/hemoglobina: a anemia é muito frequente em pacientes com


doença avançada e é um marcador prognóstico (anemia=mau prognóstico).
• Rx tórax: mesmo em pacientes sem queixas respiratórias, as alterações no Rx
tórax podem apoiar o diagnóstico de algumas doenças comuns,
particularmente TB.
• Ecografia toraco-abdominal: pode apoiar o diagnóstico de TB em pacientes
com doença avançada (frequentes achados como adenopatias, líquido livre
abdominal, abscessos esplénicos, derrame pleural ou pericárdico…).
• Retinoscopia: prova não invasiva que permite a identificação de lesões de
TB, toxoplasmose, CMV…
FASH: Focused
assesment with
sonography for HIV
Resumo de provas disponíveis para HIV avançado
Patologia Amostra Critérios Realização
CD4 Grau de Sangue Inicial
imunosupressão Mulher grávida
Em caso de falência
Pacientes com CD4 <350 (anual)
Xpert Tuberculose Expectoração, Clínica sugestiva (FESTA)
MTB/RIF LCR
TB Lam Tuberculose Urina CD4 < 200
CrAg Criptococose/meningite Sangue, LCR CD4 < 200
criptocóccica
RPR Sífilis latente, Sangue, LCR Mulher grávida
neurosífilis Clínica sugestiva
FASH Tuberculose N/A CD4 < 100
(ecografia) Suspeita de TB-EP
Retinoscopia Várias (TB, CMV, Toxo, N/A CD4 < 100
Folha de Exercícios 2:
Uso de testes rápidos para rastreio de IOs
Pontos-chave

• Em pacientes com doença avançada, especialmente naqueles com contagens de


CD4 baixas, alguns testes rápidos podem ajudar no diagnóstico de condições
frequentes.
• CrAg para diagnóstico de infecção por criptococos.
• TB-LAM, Xpert MTB/RIF para diagnóstico de TB.
• É necessários conhecer estes testes e saber interpretar o resultado.
• Outros exames complementares podem ajudar a orientar o diagnóstico de
pacientes HIV com doença avançada (hemograma, RPR, ecografia, Rx tórax).
Obrigado!

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