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Anemia Falciforme

Profª Ms. Vânia Luiza F. L. Sato


Anemia

● Diminuição da concentração de hemoglobina


● Homem – 13g/dl
● Mulher – 12g/dl
● Criança e gestante – 11g/dl

↘Classificação morfológica
 VCM
 HCM
 CHCM
↘Classificação fisiopatológica
 Falta de produção
 Perdas sanguíneas
 Destruição
Hemácia

Hemoglobina é o pigmento que dá cor as hemácias e tem a função vital de


transportar oxigênio dos pulmões aos tecidos.
Síntese de Hemoglobina

HEMOGLOBINA
Heme + Globina
Síntese das Globinas
O cromossomo 11 tem o agrupamento de genes tipo beta e que são conhecidos por RCG-beta, épsilon,
gama, delta e beta, enquanto que no cromossomo 16 o agrupamento de genes tipo alfa são identificados
por RCG-alfa, zeta, alfa1 e alfa2. RCG é a sigla de Região Controladora de Genes, e deste gene partem os
estímulos específicos para os respectivos genes que estão sob seu controle. A síntese genética de todos
esses genes ocorre de forma equilibrada para a produção das suas globinas correspondentes. As globinas
assim formadas se juntam em tetrâmeros para comporem os diferentes tipos de hemoglobinas normais

Esquema representativo dos genes nos cromossomos 16 e 11. As sínteses das globinas α, β, δ e γ ocorrem de forma
equilibrada. Esta representação explica como se compõe as principais hemoglobinas humanas após o sexto mês de vida.
Hemoglobinas embrionárias e fetal

Síntese das hemoglobinas


embrionárias e fetal. Há intrínseco
relacionamento genético e fisiológico
entre a evolução embrionária e fetal
com os tipos específicos de
hemoglobinas destas fases. Observe
que o embrião ao atingir o terceiro
mês de vida, quando o mesmo se
transforma em feto, pode ter quatro
tipos diferentes de hemoglobinas
atuantes: Gower1, Portland, Gower2, e
Hb Fetal. Com o desenvolvimento do
feto as hemoglobinas embrionárias
deixam de ser sintetizadas e a Hb Fetal
alcança níveis de concentrações
próximos de 100%.
Representação esquemática do equilíbrio das globinas

Após o sexto mês de nascimento os genes que sintetizam todas as globinas já se


tornaram estáveis, portanto, as globinas alfa se combinam com globinas beta, gama e
delta para formarem as hemoglobinas A, A2 e Fetal. As concentrações das hemoglobinas
de uma pessoa permanecem estáveis até o fim de sua vida. A Hb A por ter maior
concentração (92-96%) é a mais importante e seu tetrâmero químico é representado por
α2 β2.

As hemoglobinas glicadas
também podem ser
visualizadas por eletroforese
alcalina, e as mesmas se
posicionam discretamente
mais rápidas que a Hb A.
Equilíbrio das Globinas

A síntese balanceada entre os genes das globinas


alfa (cromossomo 16) e das globinas beta
(cromossomo 11) resulta no equilíbrio entre globinas
alfa e beta, alfa e delta e alfa e gama.

Hb Fetal (α2β2)  0 - 1%
 
  Hb A2 (α22)  2,0 - 4%

Hb A (α22)  96 - 98%

 
Anemia Falciforme

● Doença hereditária causada pela mutação de ponto no gene da


globina beta da hemoglobina.
● Esta mutação leva à substituição do aminoácido ácido glutâmico por
valina, com consequente modificação físico-química da molécula de
hemoglobina.
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

Como resultado das


radiações cósmicas no
período paleolítico (sentido
hipotético) o complexo CCTG A GGAG
gênico das hemoglobinas MUTAÇÃO
de habitantes de pelo CCTG T GGAG
menos três regiões da
África foi afetada por uma
mutação de bases
nitrogenadas (Adenina por
Timina).

Acreditam que essa mutação veio para proteger os “filhos” da morte pela malária.
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

Globina β 146 aas

RESÍDUOS ...5 ...6 7...


AMINOÁCIDOS PRO GLU GLU Hb A
B. NITROGENADAS CCT GAG GAG

B. NITROGENADAS CCT GTG GAG


Hb S
AMINOÁCIDOS PRO VAL GLU
RESÍDUOS ...5 ...6 7...
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

S
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

S
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

A troca de um único aminoácido


na posição 6 da globina Beta,
onde o ácido glutâmico (GAG)
foi substituído pela valina
(GTG), desestruturou a
molécula da hemoglobina em
situações específicas. Essa
modificação se manifesta
quando a molécula da
hemoglobina perde o oxigênio e
se torna desoxigenada.

Local da mudança de ácido glutâmico


por valina.
A ORIGEM DA HbS E DA ANEMIA FALCIFORME

A representatividade da 6
mudança de um aminoácido da
globina beta frente aos outros
aminoácido normais da
molécula de Hb SS.
Cada molécula de Hb tem 574
aminoácidos: 141 por cadeia
alfa (282) e 146 por cadeia beta
(292). Assim na molécula de Hb
SS há duas globinas beta com
a mutação Glu>Val.

6
Modelo estrutural da molécula
de hemoglobina
Esquema da oxigenação e desoxigenação da hemoglobina A

Fase 1- A hemoglobina está


completamente oxigenada (oxi-Hb) e a
molécula de 2,3-DPG está internalizada.
Fase 2- O início da liberação do oxigênio
(desoxigenação) se inicia com as
globinas alfa, e nesta fase a molécula de
2,3-DPG começa a se mover afastando
as duas globinas beta.
Fase 3- As globinas beta, à medida que
se afastam uma da outra, liberam suas
moléculas de O2, tornando a
hemoglobina desoxigenada (desoxi-Hb),
e a molécula de 2,3-DPG se expõe
completamente. Sua exposição indica
que a hemoglobina deve ser
reoxigenada quando o eritrócito que a
contém passar pela circulação arterial
dos pulmões.
● Eritrócitos contendo mais de 50% de Hb S, ao se desoxigenarem, passam a
modificar gradualmente as suas configurações, passando da forma globular (a)
para configuração discretamente alongada (b). Nesta fase, se essas células
receberem oxigênio e as Hb S se reoxigenarem, é possível que retornem para a
forma globular (fase reversível).

Porém, se as células com a


configuração (b) continuarem
perdendo oxigênio elas se
transformam em células
falciformes irreversíveis (c).
São justamente estas células
irreversíveis que causam a
oclusão vascular em vários
órgãos de quem tem doença
falciforme.
Alterações da Hb S desoxigenada em comparação com a Hb A oxigenada

(a) e (b) Quando as moléculas de Hb A e Hb S estão oxigenadas, portanto nos estados oxi-HbA e oxi-HbS,
elas se mantém independentes e solubilizadas dentro dos eritrócitos;
(c) Quando as moléculas de Hb A liberam oxigênio elas se tornam desoxigenadas (deoxiHb A) e continuam
independentes e solubilizadas;

(d) Quando as moléculas de Hb S


liberam oxigênio (deoxi-HbS) ocorre uma
alteração estrutural causada pela troca
do ácido glutâmico pela valina na
posição 6 da globina beta.
Dessa forma a valina mutante expõe
átomos de hidrogênio que se ligam às
porções hidrofóbicas das globinas alfa
(setas vermelhas).
Esta ligação faz com que as moléculas
de Hb S se agregam em formas de
polímeros lineares (setas verdes).
A formação de milhões de polímeros
transformam o eritrócito globular para a
configuração alongada, semelhante à
foice ou meia-lua
Principais eventos bioquímicos provocados
pela presença de moléculas de Hb S

● Esta modificação estrutural é responsável por alterações físico-


químicas da molécula de Hb no estado desoxigenado, culminando
no evento conhecido como falcização.

● O processo primário é a polimerização da deoxiHbS.

● Sob desoxigenação estabelecem-se contatos intermoleculares,


originando agregado de Hb polimerizada.

● A polimerização progride, com adição sucessivas moléculas de HbS,


à medida que a saturação de oxigênio diminui.

● Sob completa desoxigenação forma-se células em forma de foice.


A polimerização como causa da falcização

A troca do aminoácido
Glutâmico por Valina na
posição 6 da globina beta
desencadeia um processo
de agregação entre as
moléculas de Hb S na
desoxigenação, fato que
não ocorre na
hemoglobina normal, ou
Hb A.
Início da polimerização das
moléculas de Hb S durante a
desoxigenação .
A polimerização das moléculas de Hb S

SEQUÊNCIA DA NUCLEAÇÃO DAS


MOLÉCULAS DE Hb S

A formação de polímeros de moléculas de Hb S.


Comparações entre eritrócitos normal e falcizado

Microscopia eletrônica das células normal e falciforme. A modificação


morfológica da célula falciforme amplia a sua superfície de contato e
expõe moléculas de adesão, principal causa da oclusão vascular nesta
doença.
Fatores que influenciam o grau de polimerização da deoxiHbs

● Porcentagem de HbS intracelular


● Grau de desidratação celular
● Concentração de hemoglobina corpuscular média
● Tempo de trânsito dos glóbulos vermelhos na
microcirculação
● pH
Influência da falcização na membrana das células

A modificação da morfologia do eritrócito discóide para a forma


falcizada altera a disposição da dupla camada lipoprotéica, cuja
camada externa normalmente composta por fosfatidilcolina e
esfingomielina tem a “invasão” de moléculas de fosfatidilserina

Estrutura normal da dupla


camada lipoprotéica do
eritrócito discóide.
Representação esquemática da invasão da
fosfatidilserina na célula falciforme

Disposição organizada das Invasão de fosfatidilserina na camada


proteínas de membranas no lipoprotéica externa da membrana
eritrócito normal.

Hb A
Hb S

Fosfatidilcolina
Disposição desorganizada das
proteínas de superfície de
Fosfatidilserina membrana da célula falciforme.
Relação entre a superfície anormal da célula falciforme e sua aderência ao
endotélio vascular

As modificações da
disposição das proteínas
de membrana da célula
falciforme associada ao
seu processo de
falcização aumenta a
superfície de contato com
as células endoteliais
promovendo a aderência
entre as duas e a oclusão
vascular.

M.E. de varredura do eritrócito falcizado


no momento da sua aderência.
A oclusão vascular da célula falciforme

A “invasão” da fosfatidilserina promove a assimetria


da bicamada lipoprotéica das células falciformes.
Essa assimetria expõe componentes protéicos e
químicos da membrana que reagem com receptores
celulares do endotélio e causam à adesão cumulativa
das células falciformes ao endotélio e
consequentemente a oclusão vascular.

M.E. da oclusão
vascular
Mecanismos de aderência entre as células falciformes
e as células endoteliais

Corte transversal de uma artéria mostrando o


rolamento de eritrócitos normais no fluxo O eritrócito normal, discóide e bicôncavo apresenta
sanguíneo. um posicionamento simétrico de suas proteínas de
membrana, fato que permite um rolamento normal da
célula no fluxo sanguíneo.

O eritrócito falcêmico é deformado pela polimerização da


hemoglobina que desajusta a simetria das proteínas de
membrana, fazendo com que ocorra contatos anormais
com as células endoteliais e consequentemente o
processo de aderência das células falciformes ao
endotélio.
Alterações e complicações na anemia falciforme

Oclusão vascular

M.E. de Célula Falciforme Oclusão e Congestionamento Vascular

Tromboses e obstrução de pequenos vasos (necroses de ossos, cegueira,


necroses do baço, enfartos de pulmão, AVC.)
Consequências das deformações das células falciformes

Febre – secundária aos episódios de


crise dolorosa. Resultado da isquemia
tecidual e liberação de pirógenos
endógenos.

Crises dolorosas (musculares e dores


abdominais). Em crianças, edema doloroso
dos dedos das mãos e dos pés (dactilite).

Úlceras de membros inferiores.

Priapismo - é a situação onde o sangue que chega ao pênis


através das artérias, não consegue retornar ao corpo por uma
obstrução no conjunto de veias que drenam o pênis. Por esse
motivo, a pressão do sangue dentro do pênis é elevada, com
pouco oxigênio e a dificuldade do sangue chegar até as fibras
sensitivas do pênis, gera um quadro doloroso.
Consequências das deformações das células falciformes

Crises hemolíticas
(anemia e icterícia)

Crise de sequestração pelo baço (anemia


intensa)

Pode levar a choque hipovolêmico


Paciente com esplenomegalia
Consequências das deformações das células falciformes

•AVC – formação de trombos


•Priapismo – vasooclusão no fluxo de saída de sangue
• Crescimento e desenvolvimento
•Alterações renais – anemia crônica crises vasooclusivas na
medula renal
•Complicações pulmonares – hemácias chegam deoxigenadas e
com grande quantidade de polímeros de HbS
•Cirurgia e anestesia – hipóxia, hipoperfusão, estase e acidose
•Gravidez – placenta menor, grande índice de aborto, retardo do
crescimento intra-uterino, parto prematuro e mortalidade perinatal
Interferentes que induzem piora do quadro
em doentes falcêmicos

Hábitos (vícios)  Fumo, Drogas, Álcool

Saneamento Deficiente  Infecções

Pobreza  Alimentação deficiente, cuidados básicos


comprometidos

Assistência médica deficiente  Mal orientação, medicação inadequada,


encaminhamento comprometido
Diagnóstico laboratorial

Hemograma  Diminuição de Hb e presença de


hemácias falciformes

Eritrócitos: 4.000.000/mm3
Hemoglobina: 10,0 g/dl
Hematócrito: 29%
VCM 72
HCM 25
CHCM 34
Diagnóstico laboratorial

Teste de solubilidade - consiste em avaliar a solubilidade da hemoglobina, que sob baixas tensões de
oxigênio, a HbS torna-se 100 vezes menos solúvel que na sua forma oxigenada. A HbS é insolúvel e
confere uma precipitação em forma de botão central, com halos bem mais claros nas bordas, a ausência de
HbS faz com que haja uma distribuição homogênea do sangue no papel filtro. Este exame não é
recomendado para neonatos, pois pode apresentar um falso negativo.
Diagnóstico laboratorial

Teste de Falcização  Sob baixa tensão de O2 os eritrócitos tomam a


forma característica de foice.

Teste de falcização
positivo em portador
de traço falciforme
(Hb AS) após cinco
horas de incubação
do sangue com
metabisulfito de
sódio a 2%.

Dosagem de Hb Fetal  Teste sensível que avalia a presença de Hb


Fetal.
Diagnóstico laboratorial

Eletroforese de Hb  Separação das bandas de Hb


Tratamento da anemia falciforme

· Hidratação
· Nutrição
· Educação e Higiene
· Transfusão
· Novas Propostas de Tratamento
· Transplante de Medula Óssea
Tratamento da anemia falciforme

● Hidroxiureia aumenta a produção da HbF, que dificulta a polimerização da hemoglobina defeituosa.


Dessa forma, reduz o risco de vaso-oclusão.
● 2017 a FDA aprovou L-glutamina oral em pó (Endari, Emmaus Medical, Inc) para
administração oral com indicação para redução das complicações agudas da AF em
pacientes adultos e pediátricos (>5 anos de idade).
● 2019 a FDA aprova primeira terapia direcionada para tratar pacientes com complicação
dolorosa da AF o medicamento Adakveo® (crizanlizumab-tmca) para reduzir a frequência
de crises vaso-oclusivas. O Adakyeo® inibe a selectina, a qual contribui para a aglomeração
das células, levando a crise vasooclusiva. A aprovação foi concedida à Novartis.
● 2019 a FDA aprovou o medicamento Oxbryta® (voxelotor) para o tratamento da AF. O
fármaco é um inibidor da polimerização da hemoglobina S desoxigenada, a anormalidade
principal da doença, com isso as células falciformes tendem menos a ligar-se entre si e a
serem menos destruídas. A aprovação foi concedida à Global Blood Therapeutics (GBT).
● Entre os medicamentos que podem ser acessados gratuitamente nas unidades de saúde estão: ácido
fólico, analgésicos, anti-inflamatórios, quelantes de ferro, imunobiológicos especiais e de
antibioticoterapia. Também está disponível o exame preventivo de Doppler Transcraniano que
identifica o risco de AVC em pessoas com AF, de 2 a 16 anos.
Tratamento da anemia falciforme

● Terapia gênica - novo tratamento curativo para a anemia falciforme,


para corrigir a mutação causadora da doença. A correção é realizada
diretamente no DNA de células-tronco da medula óssea do paciente,
pois essas são as células responsáveis pela fabricação do sangue. As
células-tronco serão coletadas do paciente, submetidas à edição gênica
e reinfundidas no paciente. A vantagem de tal procedimento é utilizar as
células do próprio paciente (autólogas), eliminando problemas
relacionados ao transplante alogênico.
● Para a terapia gênica, utiliza a tecnologia/ferramenta CRISPR-CAS9.
Nessa técnica, uma proteína guiada por um RNA específico corta a fita
de DNA no local da mutação; a correção da mutação utiliza um molde
de DNA contendo a sequência normal do gene.
Prevenção da anemia falciforme

· Aconselhamento Genético
· Screening em RN
· Screening pré-matrimonial
· Screening em doadores de sangue

A S A S

AA

A S

A S

S S
ANEMIA FALCIFORME
é problema NOSSO!

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