Você está na página 1de 35

Cristianização dos visigodos na

Península Ibérica
Aula 08
Reinos bárbaros
Contatos culturais
Concílios ecumênicos sob a
Processo de evangelização
administração de Constantino
pelos bispos
 Concílio de Alexandria de 318 d.C. -
Contra Ário, sua doutrina e seus
partidários
 Sínodo de Cesareia de 319-320 d.C.
- A favor da readmissão de Ário.
 Concílio de Alexandria de 321 d.C. -
Excomungação de Ário
 Concílios na Bitínia e na Palestina
Direito canônico
entre 321-325 d.C - A favor da
readmissão de Ário.
 Sínodo de Alexandria de 325 d.C.
(antes de Niceia) - Contra Ário, sua
Concílios doutrina e seus partidários
ecumênicos  Concílio de Niceia de 325 d.C. -
Contra Ário, sua doutrina e seus
Partidários (presença direta de
Constantino)
Combatidos
(excomungado
s)

Procediment
os aos bispos
aos heréticos

Convertidos à Condenados
‘verdadeira aos ‘olhos de
doutrina’ Deus’
A função social do
imperator construída pelos
bispos Ecclesia – comunidade de
homens vinculados a deus
pela fé
Interlocutor e defensor da
ecclesia
Noção de unidade presente
desde o Concílio de Niceia
um Deus = um imperator
imperator

Bispos e imperator –
Imperator apresentava-se oferecimento de uma
como eleito, escolhido para explicação lógica sobre a
defender a unidade conexão de Deus e o mundo
representada pela ecclesia terrestre e o vínculo entre Ele
e o imperator
Pagus Ciuitas
(paganismo) (civilização)
Versa sobre o universo
Diretamente relacionado ao citadino (espaço da
ambiente camponês civilização) é o local por
(ambiente rural) excelência de projeção
institucional do cristianismo

Lugar em que se mantinha


vivo um paganismo ancestral
e animista forte junto aos O cristianismo e a figura
grupos sociais camponeses – episcopal ganham projeção
mantenedores de práticas social e política
pagãs não autorizadas pelo
poder imperial
A que grupo os germanos eram associados? Quais as
principais implicações sociais de tal caracterização?
Processo de evangelização e conversão dos
germanos
hospitalistas/foedus
estabelecimento dos
germanos dentro do
Império Romano

Estigmatização dos
Bárbaro/pagão #
germanos – infiéis,
bárbaro/cristão
selvagens, irracionais

Cristianização – busca Cristianização – ação de


pela negociação e inserção e aceitação no
inclusão no mundo interior da romanitas
político imperialromano ciuilitas
Conversão ao cristianismo

Bispo godo Úlfilas,


discípulo de Eusébio
de Nicomédia (sob
Divulgação do
Valente), liderou um
cristianismo ariano Arianismo
grande programa de
entre os visigodos
conversão dos
germanos ao
cristianismo
Por que o arianismo tornou-se mais
frequente entre os reinos germânicos?
Programa de
evangelização de
Úlfilas  Lembremos que, após Teodósio (379-395),
1. Organização de muitos bispos, adeptos do arianismo, foram
um corpo
eclesiástico, sob a desestimulados a permanecer no Império
liderança de Romano, muitos foram perseguidos e
Úlfinas,
construção de
destituídos de seus cargos eclesiásticos. Estas
Igrejas; circunstâncias favoreceram que tais bispos se
2. Elaboração de dirigissem para o limes, onde estavam
traduções do assentados os grupos germânicos, e
texto bíblico: do
latim para o propagassem a fé contrária à orientação política
gótico, o que do Império. Úlfilas pregou a doutrina de Ário
facilitou a
evangelização entre os visigodos quando ainda se instalavam
entre os na região das Gálias, por volta de 410-418.
visigodos.
Disputas por espaço dentro do cristianismo

Fortalecimento e
consolidação do
Visigodos, discurso cristão
influenciados por (credo niceno),
Úlfilas, adepto associado ao
do arianismo. O poder e prestígio
credo ariano da diocese de
tornou-se uma Roma – Gregório
marca distintiva I, o Magno (590-
entre germanos e 604) – forte
romanos programa de
combate às
heresias
Os visigodos

Os visigodos nas Gálias (416-507)


O estabelecimento dos visigodos nas Gálias
Pacto de negociação ente
romanos e godos (416) – defesa
da causa romana

Os godos se responsabilizam-se
pela contenção dos vândalos,
suevos e alanos

Emergência da figura do rex


gothorum (líder político e
militar reconhecido pelo
imperador romano)
A consolidação do regnum romano-bárbaro

Rex gothorum

Dependências
Laços de fidelidade interpessoais (troca de
favores)

Aliança das elites locais


da Hispania com o rex Aliança da força militar,
gothorum das elites romano-
germânicas e do rex
(manutenção do status gothorum
social e privilégios)
Papeis assumidos pelo rex
 Sob o governo de Eurico
gothorum nas Gálias (466-484), com capital
(418-507) sediada na atual cidade
francesa de Toulouse, houve
Função
político- a criação do primeiro código
militar legislativo de todo o mundo
Enfraquecimen germânico (Código de
to da figura Eurico: estabeleceu uma
imperial unidade jurídica para todo o
romana território visigodo),
fundamental para
Promulgaçã
o de leis entendermos a organização
do poder visigodo nas Gálias,
além de percebermos as
influências romanas.
Código de Eurico e suas reformulações

1. Hispano-  (...) A solícita preocupação de um príncipe está


romanos e cumprida quando foram providenciados os
visigodos benefícios para futura utilidade dos povos. (...)
passam a se
submeter a um
quebradas as forças da antiga lei, tiver sido
conjunto de abolida a sentença que pretende impedir sem
leis válido razão o casamento de pessoas que são iguais por
para o dignidade e linhagem. E, por isto, removida a
território sentença da antiga lei (...) sancionamos esta lei
visigodo; que há de valer para sempre: que o godo possa, se
2. As leis quiser, ter uma mulher romana e que a goda possa
visigodas casar com um romano (...) e que o homem livre
procuraram
possa casar com qualquer mulher livre (...) obtido
adaptar o
Direito o solene consenso dos parentes e a licença do
Romano às conde (Cf. ESPINOSA, 1972, p. 23-24.)
suas
necessidades;
Enquanto isso, em Roma...
Os ostrogodos na península itálica
 476 – deposição de Rômulo
Augústulo por Odoacro,
pertencente ao grupo étnico
dos hérulos, general de
tropas romanas;
 Odoacro envia as insígnias
imperiais a Zeno (474-491),
imperador romano do
Oriente a fim de ‘unir’ o
Império;
 Zeno autoriza Teodorico, rei
dos Ostrogodos, a atacar
Odoacro (489)
 Os ostrogodos se
estabelecem na península
itálica;
Formação dos reinos ‘bárbaros’
 Com a perda gradativa de legitimidade política dos
imperadores romanos do Ocidente, a partir de meados do IV
século, os pactos de federação estabelecidos entre romanos e
germanos, como forma de organizar a ocupação das regiões
romanas pelos germanos, foram perdendo sua validade, um vez
que os assentamento germanos emancipavam-se gradativamente
política e economicamente.
 Em diversas regiões da Europa, o que se observava era uma
espécie de ´vazio de poder’ deixado pelos romanos. Nas cidades,
os germanos substituíram as autoridades romanas, na medida em
que assumiam funções e cargos administrativos e militares, antes
reservados aos representantes oficiais do Império. Nas grandes
propriedades rurais (villa), também perpetuaram laços de
fidelidade ou lealdade já presentes nas comunidades rurais nas
quais os germanos estavam organizados.
Os visigodos

Os visigodos na Península Ibérica (507-711)


O bispo Isidoro de Sevilha apresenta-nos Leovigildo (573-
586) como aquele que estendeu sua autoridade por meio da
guerra sobre os territórios da Hispania, Gália e sobre o reino
dos suevos; todos são anexados à gothia, ou seja, do mundo
visigodo.
Regnum hispano-visigodo

Cooptação das
Revisão e
elites locais
atualização das leis
(alianças)

Conversão dos
godos ao
cristianismo niceno
Conquistas
- herdeiro da
militares Leovigil tradição imperial
do romana –
cerimônia da unção
(573-
586)
Prática do consórcio régio:
Leovigildo e Luiva I
A afirmação do discurso cristão niceno
As elites visigodas viam na adoção da
IMPORTANTE:
fé nicena uma forma de recuperar a
O arianismo
imagem de grandeza do antigo
deixou de ser Império Romano e de sua cultura
interessante para a clássica;
nova mentalidade
política visigoda As igrejas cristãs arianas eram
que sustentava a
unidade territorial,
marcadas pela total falta de unidade e
monárquica e isolamento (não eram tão bem
religiosa articuladas quanto o cristianismo
niceno), o que prejudicava projetos
políticos que ambicionavam promover
a unidade político-administrativa.
Processo de Conversão da Península Ibérica
visigoda ao cristianismo niceno (586)
Afirmação do
discurso cristão
• Os bispos buscavam garantir a niceno
soberania do sistema monárquico:
a autoridade régia passa a ser • “uma única fé para um único
resultado da vontade divina e tal
aspecto é sacramentado pela reino”
cerimônia da unção; • O discurso cristão niceno garante a
• O monarca se compromete a legitimidade do reino;
oferecer vantagens a eles;

III Concílio de
Toledo (589)
O poder dos bispos nicenos na gothia
 (...) Com as rendas de sua Igreja e da cidade,
aos quais ele ajuntava muitas vezes seus
recursos pessoais, o bispo era empreiteiro de
trabalhos públicos, edificava ou restaurava
os monumentos, consolidava as muralhas,
construía aquedutos, empreendia os
trabalhos de canalização, represava os cursos
d’água (Cf. GIORDANI, 1993, v. II, p. 309).

 Referência: GIORDANI, Mario C. História


dos reinos bárbaros. Petrópolis: Vozes,
1993. v. 1 e 2.
Isidoro de Sevilha:
representação de Sisebuto (612-621)
Fonte histórica  (...) Na era de 650 [616 d.C.], no segundo ano
Isidoro de Sevilha,
Etimologias, História do Império de Heráclio, depois de Gundemaro,
dos godos Sisebuto é chamado à dignidade real, reinando
durante oito anos e seis meses. Sisebuto, ao
Referências
bibliográficas início de seu reinado, levou os judeus à fé
católica pela força, porém não com sabedoria;
RODRIGUEZ pois obrigou pelo poder aqueles que devia atrair
ALONSO, Cristóbal.
(Org.) Isidoro de pela razão da fé, conforme está escrito: já por
Sevilla. Leon: Centro ocasião, já pela verdade, contanto que Cristo
de Estudios e
Investigación “San fosse anunciado. Foi brilhante em sua palavra,
Isidoro”, 1975. Edición
Bilingue. Livre
sábio em seus pensamentos e bastante instruído
tradução do latim e do nos conhecimentos literários (ISIDORO apud
espanhol pela Prof.
Dra. Renata Rozental
RODRIGUEZ ALONSO, 1975, p. 273).
Sancovsky.
Um processo violento e traumático?
1. Os novos governantes mantiveram as instituições
político-administrativas romanas. Ex: O código de
Teodósio embasou o Código Visigodo, numa fusão das
leis provinciais romanas e dos procedimentos legais
germânicos; os códigos eram escritos em latim;
2. Desde o século IV, os romanos estavam acostumados com
líderes bárbaros (civis e militares), nada havia de estranho
em tê-los como reis;
3. As cidades permaneceram como centros políticos e
religiosos; em muitas delas se percebe redução da
densidade demográfica, possivelmente em virtude da
cobrança dos tributos – processo de ruralização.
Aula complementar

O processo de cristianização entre os suevos


Os suevos na Galícia (409-585)
Os suevos na Galícia (409-585)
Essa região
(Península Ibérica)
sempre apresentou
um alto grau de
romanização. Os
reinos
independentes que
se formarão a partir
do IV século
derivam, por isso,
da mistura das
populações locais
galaico-romanas
(habitantes romanos
da Província da
Galícia) com os
germanos.
Os suevos no Império Romano
Crônica do bispo niceno Idácio
de Chaves (379-468) sobre os
Suevos, adeptos do arianismo suevos
 (...) Na Galícia, no mês de junho, arderam
casas de campo por causa dos raios, e
Estabelecimento dos alguns rebanhos de ovelhas ficaram
completamente carbonizados. Dos céus caía
suevos, como federados, carne misturada com as chuvas. Dois jovens
que estavam unidos um ao outro por sua
na Província da Galícia, carne, morreram. No convento bracarense
assistiu-se ao fenômeno do nascimento de
sob consentimento do gêmeos; um parto similar, porém de quatro,
imperador Honório registrou-se em Leon. (...) Os bárbaros
causam na Hispânia uma furiosa desolação
(393-423); (...) A fome maldita cresce de tal maneira
que o gênero humano chegou ao ponto de
devorar carne humana. Os hispanos que
haviam sobrevivido às pragas nas cidades e
fortificações viram-se submetidos à
escravidão dos bárbaros que asseguram o
seu domínio pelas províncias (IDÁCIO,
2004).
Comentários gerais sobre a fonte
 Para muitos historiadores, as
impressões de Idácio são de fato  Em 449, o rei Requiário propõe a
exageradas. conversão de todos os suevos
 Os contatos entre os habitantes ao credo niceno, tornando a
galaico-romanos e suevos não cidade de Braga importante
foram nem tão violentos, nem tão centro político e religioso.
dramáticos. Entretanto, apesar dos esforços
 Em 438 d.C., Hermenerico, rei do monarca, o arianismo
suevo, buscou acordos com prevaleceu entre os suevos
autoridades romanas, por
exemplo, demonstrando que seu  O reino suevo durou 175 anos.
reino havia constituído uma Nas várias tentativas de
organização administrativa e extensão de seus territórios,
territorial, a ponto de serem
acabam derrotados militarmente
realizados concílios episcopais.
pelos visigodos, em sucessivas
 E, ainda, o exército suevo pôde
batalhas entre 456 e 585, e seu
contar com contingentes de
reino é incorporado durante o
população galega (galaico-
governo de Leovigildo, monarca
romana) aderindo aos serviços
visigodo (573-586).
militares.
Fontes históricas
Reconstituição da planta baixa da igreja
Figuras do monacato suevo sueva de Dume, próxima à cidade de
Braga – planta cruciforme
 Martinho de Braga (Martinho
de Dume) – deixou diversos
escritos sobre a vida cenobítica
(vida de retiro espiritual e
isolamento, compartilhada por
várias pessoas): De
Correctione Rusticorum
(Correção dos Rústicos)
 Frutuoso, abade do Mosteiro
de Compludo e bispo da cidade
de Braga: Regula Monachorum
(Regra aos Monges) e a Regula
Communis (Regras Gerais)
Referências bibliográficas
 BASCHET, Jérôme. A civilização feudal: do ano mil à colonização da
América. São Paulo: Globo, 2006.
 ESPINOSA, Fernanda. Antologia de textos históricos medievais. Lisboa: Sá
Costa Editora,1972.
 GUERRAS, Maria Sonsoles. Os povos bárbaros. São Paulo: Ática, 1994.
(Princípios, 126).
 ______. Romanismo, Germanismo e Cristianismo no Século V-VI. Rio de
Janeiro:
 IFCS-Publicações, 1992. (Programa de Estudos Medievais, 1).
 IDACIO. Crônica. Galicia: Consello da Cultura Galega de Santiago de
Compostela, 2004. Livre tradução do galego pela Prof. Dra.Renata
Rozental Sancovsky.
 ROZENTAL, Renata. Historia Gothorum: As concepções do poder
monárquico em Isidoro de Sevilha. In: SEMANA DE ESTUDOS
MEDIEVAIS, 3., 2005, Rio de Janeiro. Anais. Rio de Janeiro:
IFCS/PEM/Divisão de Extensão, 1995. p. 58-64.

Você também pode gostar