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DIFICULDADE

ALIMENTAR
R 4 I Z A B E L A F O G I AT O

NUTROLOGIA PEDIÁTRICA
• A alimentação ocupa um lugar central no desenvolvimento infantil, já que é em torno dela que se
organizam, desde o nascimento, os primeiros contatos entre mãe e o bebê, assim como também se
delineiam e se expressam os conflitos da dupla mãe – bebê.

• A alimentação desde o período gestacional influencia a preferência e os hábitos alimentares durante a


infância e a vida adulta.
 Em torno de 25-40% dos lactentes e crianças saudáveis apresentam algum sintoma de problema
alimentar.
 Entre crianças com doença gastrointestinal e problemas de desenvolvimento como prematuridade e
baixo peso ao nascer, a prevalência oscila entre 33-80%.
 Em um estudo foram entrevistadas 984 mães, 51% delas afirmavam que os filhos apresentavam
dificuldades alimentares
o 47% mencionaram que a criança não comia a quantidade oferecida;
o 43% mencionaram que a criança não tinha interesse pelo alimento;
o 40% mencionaram que as crianças comiam sempre os mesmos alimentos.
DEFINIÇÃO

•Dificuldade alimentar é a situação em que a criança apresenta uma menor aceitação alimentar,
com possíveis consequências físicas, emocionais e familiares, podendo influenciar, inclusive, em
seu crescimento e desenvolvimento, dependendo da duração, da intensidade e do diagnóstico
do problema, assim como da atuação da família e dos profissionais de saúde.
 Muitas crianças entre 1 e 3 anos comem uma variedade muito limitada de alimentos.

 Na idade pré escolar, também é comum as crianças atravessarem uma fase de alimentação bastante restritiva.

 Momentos de passagem evolutiva na vida da criança podem contribuir para manifestação de recusa alimentar
o Nascimento: exige intensa adaptação da criança e dos pais
o Desmame: fase de separação mãe-filho
o 2º ano de vida: interesse pelos alimentos se desloca para o ambiente e sua exploração por meio de brincadeiras.
o 3º ano de vida: tende a utilizar a recusa ao alimento como maneira de firmar sua posição, tentar controlar o
ambiente e fazer pequenos testes de independência. Demonstra preferencia pelos alimentos que conhece. Essas
situações se bem compreendidas e controladas pelos pais, tendem a ser temporárias. Quando persistem, os
sintomas podem indicar algum tipo de distúrbio ambiental ou relacional
FATORES DE RISCO
•Introdução alimentar precoce (antes dos 6 meses de idade)

•Introdução alimentar tardia (após os 7 meses)

•Práticas inadequadas durante o processo de introdução alimentar para aumentar a aceitação:


• Processar os alimentos;
• Utilizar seringas e mamadeiras no lugar de colheres;
• Oferecer preparos monótonos e inadequados para a idade.
CAUSAS

•Orgânicas

•Comportamentais/ psíquicas

•Socioeconômicas
•Muitas das dificuldades alimentares têm origem familiar, ou seja, ocorrem em famílias com
comportamentos inadequados

•Estudo recente mostra que em uma amostra representativa de mães com problemas
alimentares, aproximadamente metade das crianças apresentam dificuldades na alimentação.

•Não apenas as crianças devem ser diagnosticadas, mas também o comportamento da família, o
ambiente que vivem, o modelo familiar.
 Categorias estilos parentais

o Pais controladores/autoritários: subornam em troca de recompensa

o Pais negligentes/indiferentes

o Pais responsivos/confiáveis:

o Pais indulgentes/permissivos: não colocam limites


 A expectativa e ansiedade exagerada dos pais podem resultar em práticas alimentares ou medidas
disciplinares inapropriadas que acabam AGRAVANDO o sintoma alimentar da criança.

 Angústia, sentimento de frustração e sensação de impotência dos pais  medidas que tornam o
ambiente tenso, as refeições são associadas sempre com confronto.
Fisiopatologia - Classificação
1. Interpretação equivocada dos pais
2. Criança agitada com pouco apetite: crianças agitadas apresentam, em sua maioria, baixo apetite ou
recusa alimentar, em razão de estarem mais interessadas nos estímulos do ambiente do que
propriamente na alimentação. Ao manifestarem fome, saciam-se rapidamente e se “desligam” da
refeição após poucas garfadas, sendo difícil mantê-las a mesa.
3. Criança emocionalmente comprometida ou negligenciada: inclui crianças com apatia ou problemas
de vínculo com a mãe e/ou família, fazendo com que a apatia reflita no desinteresse pela comida e
pelo processo de se alimentar. – terceirização de cuidados, escolarização precoce...
4. Presença de doença orgânica: Importante diferenciar condições passageiras e de rápida resolução
como aftas, estomatites, das sistêmicas que podem ser agudas ou crônicas.
ANAMNESE
o Queixa e duração do problema
o História clínica da situação atual, com investigação da queixa principal e dos problemas secundários
o Investigação da história alimentar e de antecedentes gestacionais e parto
o Avaliação do DNPM, qualidade e higiene do sono e dinâmica de vida atual em domicílio e escolar
o Investigação sobre antecedentes patológicos e ambientais, doenças pregressas respiratórias,
gastrointestinais, vômitos, diarreias crônicas, náusea, sangramento intestinal, dor abdominal e tosse
crônica.
PRÁTICA CLÍNICA
 Dificuldade alimentar de breve duração <30 dias
o Crescimento normal e adequado para a idade
o Exame físico sem alterações
o Pais não angustiados ou com discreta preocupação
o Ausência de fatores de risco adicionais

CONDUTA:
 Explicar a variabilidade do apetite no primeiro ano de vida e as oscilações no apetite entre uma
refeição e outra
 Reavaliação após 4 a 8 semanas
PRÁTICA CLÍNICA
 Dificuldade alimentar de moderada duração 1 a 3 meses
o Crescimento normal ou em ligeira desaceleração
o Exame físico sem alterações
o Pais com moderada frustração ou preocupação
o Possibilidade de existirem fatores de risco adicional (estilo parental ou expectativas inapropriadas, desavença conjugal)

CONDUTA:
 Estabelecer rotina alimentar;
 Acomodar a criança à mesa com os outros familiares;
 Evitar distrações;
 Não utilizar subterfúgios como os famosos aviãozinho ou trenzinho;
 Não forçar, ameaçar, punir ou obrigar a criança a comer;
 Não oferecer recompensa e agrado;
 Caso as instruções prévias não tenham sido cumpridas e os sintomas não tiverem melhorado, pode existir um problema físico não
detectado.
Triagem laboratorial
• Hemograma
• PCR
• Ferritina
• TGO; TGP; FA
• Creatinina; Ureia
• Lipidograma
• Glicemia de jejum
• Albumina
• Vitamina D
• TSH e T4 livre
• Cálcio total
• Urina
PRÁTICA CLÍNICA
 Dificuldade alimentar de longa duração >3 meses
o Velocidade de crescimento significativamente desacelerado com sinais de atraso de desenvolvimento
o Exame físico alterado
o Pais incapazes de cooperar com o tratamento ou que manifestam mal-estar com a situação
o Fatores de risco adicional

CONDUTA
o Apresentar os alimentos em quantidades pequenas para encorajar a criança a comer;
o Adotar o uso de utensílios adequados ao tamanho da criança;
o Para as crianças que ingerem grandes quantidades de leite, diminuir o volume e a frequência;
o Limitar o consumo de líquidos durante as refeições;
o Respeitar os períodos de pouco apetite e as preferências alimentares;
o Casos graves exigem assistência psicológica.
ORIENTAÇÕES
o Permitir que a criança conheça e aprenda sobre as características dos alimentos e/ou preparações;
o O principal objetivo é que a criança tenha estímulos sensoriais em relação aos alimentos, a fim de ampliar o leque de alimentos
conhecidos.
o Recomenda-se levar a criança ao supermercado, feira que permitam não apenas a observação dos produtos, mas também,
quando possível, tocar, sentir e experimentar os alimentos.
o Evitar atitudes imponentes/inoperantes no enfrentamento das dificuldades alimentares. Esse quadro de desânimo pode ser
evidenciado por frases como “hoje você não vai querer comer né” “será que você vai comer hoje” “será que vai acontecer esse
milagre”
o É aconselhável também estimular a autonomia da criança por meio de delimitação do espaço alimentar com o uso de cadeirões,
o que proporciona estabilidade ao prato e contenção do comportamento exploratório da criança.
o Refeições muito demoradas resultam em perda da atratividade do alimento, que esfria e fica espesso. É essencial acordar com os
pais que a criança não seja punida por não comer e que se faz necessário estipular um tempo limite para o inicio e o termino das
refeições
SELETIVIDADE ALIMENTAR
o Situação em que a criança apresenta recusa total ou parcial a determinados tipos de alimentos em
razão de características como cheiro, sabor, textura, aparência ou consistência.

o Outros aspectos sensoriais costumam estar envolvidos como baixa tolerância a ruídos ou sujeira e
desconforto em manipular produtos de determinadas consistências

o Pode ser leve com aversão a poucos alimentos ou grupos específicos como as frutas ou as verduras
ou ser mais extensa.

o Em geral ocorre em crianças que sofreram algum tipo de trauma relacionado ao sistema digestório
NEOFOBIA
 Recusa em experimentar novos alimentos.
o Importante observar se está associada a outros traços de personalidade como níveis elevados de ansiedade,
timidez, negatividade e neofobia geral.
o Atuação: repetição à exposição de um novo alimento para que esse possa ser conhecido sem coerção ou pressão.
o É necessária uma rotina bem estabelecida para degustação de novos alimentos, na presença de familiares que
servirão de modelo.
USO DE SUPLEMENTOS
 Consenso brasileiro sobre a suplementação de crianças com dificuldade alimentar:

 Ingestão calórica-nutricional insuficiente;


 Peso, estatura e/ou IMC estiverem abaixo do recomendado ou desacelerando de acordo com a curva de
crescimento da criança;
 Quando o tempo para a reeducação alimentar for muito longo expondo a criança a risco nutricional ate que
seja implementada;
 Pais excessivamente ansiosos e incapazes de implementar as medidas educativas, com o objetivo de
assegurar nutrição adequada enquanto os pais possam ser também preparados;
USO DE SUPLEMENTOS
 Consenso brasileiro sobre a suplementação de crianças com dificuldade alimentar:

 Quando houver casos semelhantes na família que evoluíram mal sem a suplementação;
 Sempre que for detectada doença de base (orgânica ou psíquica) a ser tratada, mas for necessário tempo
longo para esse tratamento;
 Em uso de medicamentos que sabidamente reduzem o apetite;
 Em casos de seletividade alimentar ampla por muito tempo, abrangendo macro e micronutrientes;
 Suplementos modulares podem ser utilizados quando houver deficiência isolada comprovada na ingestão de
um macronutriente especifico ou prejuízo no estado nutricional da criança de acordo com a idade;
USO DE SUPLEMENTOS
 Consenso brasileiro sobre a suplementação de crianças com dificuldade alimentar:

 Polivitamínicos não tem indicação para o tratamento de dificuldades alimentares;


 Vitaminas isoladamente podem ser utilizadas para crianças que apresentam deficiências específicas;
 Poliminerais não tem indicação para tratamento das dificuldades alimentares.
USO DE OREXÍGENOS
 O uso de orexígenos/estimulantes do apetite: a utilização deve ser criteriosa e refletir o entendimento do fator
etiológico e não apenas servir como um apoio na substituição de uma adequada anamnese e diagnóstico

o Princípios ativos mais utilizados


 Ácido gama-aminobutírico (GABA);
 Vitaminas do complexo B (tiamina ou vitamina B1, riboflavina ou vitamina B2, piridoxina ou vitamina B6,
cianocobalamina ou vit B12);
 Cloridrato de L-lisina;
 Buclizina;
 Ciproeptadina.
ORIENTAÇÕES COMPORTAMENTAIS À
FAMÍLIA
 A família deve adotar uma resposta neutra diante de recusas ou preferencias alimentares;
 Atitudes, exemplos positivos relacionados aos alimentos;
 Iniciar pelos alimentos de que a criança gosta e gradativamente acrescentar novos;
 Incentivar a comer quanto, e se, quiser comer e nunca forçar nem chantagear;
 Sentar-se a mesa com a família;
 Iniciar incentivando o lactente a pinçar alimentos e interagir;
 Posicionar a criança sentada corretamente;
 Estimular autonomia;
 Não recompensar;
 Aceitar comportamentos normais para a faixa etária.
FOOD CHAINING
•Introduzir novos alimentos levando em conta as características dos alimentos já aceitos pela
criança, como textura, sabor, temperatura, aparência, dentre outras.
•O método parte da premissa que será mais fácil a aceitação de um alimento novo se ele for
parecido com o que a criança já conhece, come e gosta.
•Inicialmente é mais fácil expandir sabores do que texturas.
FOOD CHAINING
TRATAMENTO
•O tratamento de dificuldades alimentares é multidisciplinar
•É muito importante alinhar as expectativas da equipe de saúde com a família desde o início do
acompanhamento, a fim de evitar frustrações e abandono do tratamento.
•Os familiares devem ser informados que a melhora não acontece de forma linear e progressiva,
mas, sim, em saltos e quedas.
TRATAMENTO
•Não há tratamento medicamentoso para as dificuldades alimentares. Estratégias de intervenção
precoce aliadas ao acolhimento da família determinam melhores desfechos, reduzindo o risco
de complicações metabólicas ou nutricionais e de evolução para doenças, como distúrbios
alimentares.
OBRIGADA!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
•Fisberg M, Maximino P. A criança que come mal: atendimento multidisciplinar: a experiência do
CENDA - Centro de Excelência em Nutrição e Dificuldades Alimentares do Instituto PENSI -1ª ed-
Baureri, Manole, 2022.

•Palma D, Escrivão M. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar da UNIFESP-EPM – Nutrição


clínica na infância e adolescência, Manole, 2012.

•Almeida C, Mello E. Nutrologia pediátrica prática baseada em evidências - 2ª ed, Manole,2022.

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