Proposta de atividade para Ensino Fundamental 1ª a 4ª série
Ilustração: Luiz Maia
As crianças começam a pensar sobre o mundo da ciência, das descobertas
científicas e das atividades dos cientistas já nas primeiras séries do Ensino Fundamental, algumas na Educação Infantil. Elas conhecem histórias em que existem personagens cientistas, pesquisadores que buscam a cura para doenças, exploradores de lugares desconhecidos, de "outros mundos", ou ainda de "outras formas de vida". Crianças e jovens apreciam os filmes de ficção científica, e sempre se interessam por notícias envolvendo exploração espacial, genética e DNA, novas invenções tecnológicas, em particular na informática. Filmes e noticiários sempre despertam o interesse de crianças e adultos para questões: "Mas isso é mesmo possível?", "O avião, ou a nave, agüentam essa velocidade?", "Como os astronautas conseguem flutuar no espaço, fora da nave?" "Como os cientistas conseguiram construir um laboratório embaixo d'água?", "Por que é impossível respirar em Marte?", "Por que algumas bactérias não morrem com determinado antibiótico?" "Por que o submarino não agüentou a pressão e explodiu?" Todas essas perguntas estão relacionadas a cenas de filmes ou documentários que os alunos podem assistir, seja em sala de aula, em casa ou no cinema. Essas perguntas, por sua vez, podem ser utilizadas por um professor como uma problematização, para dar origem a uma atividade de aprendizagem significativa. Essa problematização pode ser feita também de outras formas como, por exemplo, por meio de uma atividade experimental planejada pelo professor. A partir de situações como essas, alunos e professor podem desencadear estudos que proporcionem uma abordagem interdisciplinar dos conteúdos escolares. Em muitos desses casos, a abordagem interdisciplinar torna-se mesmo uma necessidade, pois os problemas reais, aqueles que ocorrem em nosso dia-a- dia envolvendo saúde, meio ambiente, saneamento básico, habitação, produção e distribuição de alimentos, por exemplo, não se restringem ao âmbito de uma única disciplina tradicional (lingüística, gramática, biologia, física, química, história, geografia, etc.), mas precisam ser compreendidos de forma global. Nesse sentido, os conhecimentos proporcionados pelas disciplinas envolvidas no problema devem servir de base para a sua possível solução. A proposta curricular contida nos Parâmetros Curriculares Nacionais apresenta os temas transversais como uma possibilidade de abordagem de problemas sociais complexos, que devem ser tratados em sala de aula e, a partir dos quais, o trabalho interdisciplinar pode ser desenvolvido. Os temas propostos nos PCNs são: Ética, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Saúde, Pluralidade Cultural e Trabalho e Consumo. Os critérios que levaram à escolha desses temas foram:
• urgência social de se encontrar soluções para muitos problemas
brasileiros; • abrangência nacional; • possibilidade de ensino e aprendizagem no Ensino Fundamental; • favorecer a compreensão da realidade e a participação social.
Para que o tratamento interdisciplinar de diferentes assuntos se complete é
preciso que, já no planejamento do ensino, fiquem claros os objetivos gerais do trabalho pedagógico a ser desenvolvido e, principalmente, é necessário que os conteúdos do ensino relativos a cada disciplina estejam bem definidos. Um equívoco muito comum entre os educadores que devemos evitar. Um professor vai trabalhar o texto de uma carta com seus alunos. Nesse texto, alguns fatos são descritos com o uso de números, indicando quantidades e datas. Apesar de não haver no planejamento nenhum conteúdo selecionado envolvendo objetivos educativos relacionados ao sistema de numeração, à escrita ou cálculo com números, esse professor diz que o trabalho pedagógico é interdisciplinar, pois na carta existem números que serão lidos. Mas, para que o trabalho pedagógico seja realmente interdisciplinar é preciso que os alunos estejam aprendendo, de forma inter-relacionada, conteúdos de duas ou mais disciplinas. Alunos de 3ª ou 4ª série podem ser desafiados a pesquisar quanta água a escola está gastando e pensar se essa quantidade está de acordo com as orientações dadas pelas companhias de tratamento e distribuição de água. Nesse trabalho, além de estudar a questão da obtenção, produção e distribuição de água potável para a cidade, os alunos podem aprender também a fazer e utilizar as médias aritméticas em matemática. A presença desse conteúdo está relacionada ao fato de que é muito comum, nessas discussões, o uso do "consumo médio" e do "consumo médio per capita". Os temas transversais saúde e meio ambiente também podem ser abordados neste caso. Um outro exemplo de trabalho pedagógico interdisciplinar que pode resultar em boas experiências de aprendizagem para os alunos das séries iniciais é pesquisar as origens dos diversos materiais com os quais uma carteira escolar é construída. O(a) professor(a) coloca uma carteira escolar em evidência sobre a mesa na frente de todos e pede aos alunos que procurem identificar todos os materiais utilizados em sua fabricação. Geralmente, esses materiais são metais (ferro, alumínio); madeira e derivados (tábuas, compensados ou aglomerados); e plásticos (ponteiras para os pés, cobertura de fórmica). Outros materiais como colas e tintas também podem ser lembrados. A partir dessa lista de materiais, a professora lança o desafio: Como cada um desses materiais são obtidos na natureza e por que transformações eles passam para chegar a serem utilizados na carteira escolar? Em seguida, os alunos podem ser divididos em equipes para trabalhar em pesquisas bibliográficas que os ajudem a responder suas questões. Convidar pessoas que trabalham nas áreas envolvidas para serem entrevistados pelos alunos pode, também, constituir-se em ótima fonte de pesquisa. Nesse trabalho, pode-se fazer uma abordagem física e química (transformações), e olhar o problema do ponto de vista da Geografia (localização das fontes e dos processos de transformação - fábricas -, e a necessidade de transportes). É possível, ainda, abordar a questão do ponto de vista histórico, comparando a forma como se produz uma carteira moderna com a forma como eram construídas as carteiras escolares no início do século XIX, quando o Brasil era ainda uma colônia portuguesa. Em ciências naturais, professoras e professores devem sempre estar atentos para evitar a compartimentalização do conhecimento. Por exemplo, quando o tema é corpo humano, é comum estudarmos com as crianças os sistemas orgânicos de forma isolada, levando a um ensino que separa respiração de digestão e de circulação, e que impede os alunos de relacionarem o que estão aprendendo com uma boa postura em relação à sua própria saúde.
Texto original: Vinicius Signoreli
Edição: Equipe EducaRede (http://www.educarede.org.br/educa/index.cfm?pg=oassuntoe.interna&id_tema=12&id_subtema=1&cd_area_atv=4)
Repensando o Ensino de Ciências e de Biologia na Educação Básica: o Caminho para a Construção do Conhecimento Científico e Biotecnológico_Junior&Barbosa_2009_txt