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DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 26 de Fevereiro de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Realidade actual do Direito Internacional (desde há 20/30 anos,
cuja perspectiva de consolidação não é clara)
o Realidade em mutação, com inclusão de elementos que
perturbam as relações de Direito Internacional e os conceitos
anteriormente vêm a sua validade e operacionalidade posta à
prova;
o Comunidade/sociedade internacional diferente do
paradigma jurídico clássico:
 Comunidade e sociedade: conceitos, normalmente,
utilizadas de modo indiferenciado que, todavia,
assumem significados distintos;
 Substrato da realidade internacional – comunidade (ou
povo, na noção de Georg Jellinek);
 Por comunidade, entende-se toda a agregação com um
elevado grau de solidariedade, que partilha uma
identidade comum. Comunidade também implica
sacrifício individual em nome do bem comum
(complexa). Tal é comum ao Estado, com aplicação
coerciva nas normas jurídicas, em que o povo se sujeita
à vontade, democraticamente manifestada, da maioria.
Se porventura existisse uma rebeldia ampla, seria
colocada em causa a vida da comunidade. Veja-se o
que acontece na Somália, em que o tribalismo e as
alianças diversas colocam em causa o ordenamento
jurídico;
 Numa comunidade, apesar das diferenças dos
indivíduos, existe uma união. Pelo contrário, na
sociedade, em que nos sentimos diferentes;
 A identidade nacional portuguesa construiu-se por
oposição a Castela. Todavia, a realidade
contemporânea coloca em causa esta identidade com
elevado grau de homogeneidade, dados os fenómenos
migratórios e religiosos. Com isto, coloca-se em causa a
noção de comunidade;
 A identidade nacional é constituída por valores
neutros, humanos, como é a dignidade da pessoa
humana, valor transversal aos seres humanos. Este
facto dificulta a criação de uma identidade própria de
uma nação. Trata-se de uma legitimação emocional e
não nacional;
 No plano internacional, não existe uma comunidade
com estas características das comunidades nacionais.
Nesta dimensão, estamos perante um substrato
diverso, que assenta em sujeitos institucionais, entes
abstractos que não podem partilhar dos elementos
identificativos dos povos (plural e fragmentada). Estes
sujeitos mantêm relações muito diversificadas entre
cerca de 200 Estados, formalmente reconhecidos como
tal, mas materialmente muito distintos entre si,
nomeadamente em matéria de princípios e valores que
os orientam. Politicamente, também são muito
diferentes;
 A realidade que subjaz aos sujeitos é muito diversa,
dada a realidade civilizacional marcada por choques ou
alianças de civilizações. Isto revela a multiplicidade de
civilizações, apesar da existência de elementos comuns.
Na verdade, os elementos mais profundos destas
civilizações são diversos, o que dificulta a definição de
um conceito universal de Direito Internacional. Não
podemos associar o paradigma estadual com o
paradigma internacional, dadas as diferenças visíveis;
 A comunidade internacional não apresenta uma
organização principal comum, evidenciando formas de
organização descentralizadas, o que dificulta a
aplicação e garantia do Direito Internacional. Os mais
cépticos colocam em causa a existência de um Direito
Internacional, dada a ausência de um legislador
internacional. Para estes, o Direito Internacional não
passa de um conjunto de normas de cortesia. Note-se,
portanto o carácter policêntrico da comunidade
internacional, o que não permite criar uma instituição
unitária;
 Autores como Thomas Hobbes consideravam que os
sujeitos de Direito Internacional viveram num Estado
de Natureza, firmando um “contrato social” que
conduziu à passagem para o Estado Social. Devemos
entender que a existência de relações entre estes
sujeitos exige a existência de um conjunto de regras
que as ordenem, apesar da realidade fragmentada.
Podemos por isso falar em sociedade internacional;
 Em síntese, é importante notar a seguinte dualidade:
 Comunidade apta para o espaço estatal;
 Sociedade apta para o espaço internacional.
 No futuro, podemos esperar que estes dois conceitos
se aproximem. A realidade internacional tende a criar
uma identidade que nos permita falar em comunidade
internacional.
 A propósito da realidade humana, há 100 anos
encontrávamos sociedades organizadas de modos
muito distintos. Note-se no Ocidente, em pleno
período de descolonização americana, a existência de
organizações arcaicas submetidas aos Estados
europeus; no Oriente, os modelos chinês e japonês
afastavam-se do modelo europeu. Actualmente, com
regimes políticos diferentes, notamos uma
aproximação a um modelo generalizado de Estado-
nação, ainda que, nalguns sítios, com dificuldade de
criação. Tende a criar-se uma homogeneização da
realidade humana.
 Institucionalização débil, mas progressiva , com a
actuação da Organização das Nações Unidas (ONU),
tendo em vista a criação de uma instituição global.
Note-se a diferença entre a realidade anterior a 1945
(fim da II Guerra Mundial) e a realidade posterior a esta
data. A progressiva instituição fica também a dever-se
à densificação de relações internacionais, através da
jurisdição. Verifica-se, também, uma homogeneização
do Direito aplicado à Humanidade, através de
princípios fundamentais comuns, que visam
salvaguardar a dignidade e desenvolvimento da pessoa
humana e não podem ser afastados. Já no século XVII,
há referência aos princípios fundamentais das nações
civilizadas;
 Após a II Guerra Mundial, foi adoptada diferente
legislação, como Pactos celebrados, a Declaração
Universal dos Direitos do Homem (DUDH) e acordos
regionais que consagram os princípios fundamentais.
Desta forma, tende-se a promover a criação de uma
identidade comum (unificação), uma solidariedade
entre os membros da comunidade;
 São raros os países que não participam no quadro
internacional económico-financeiro comum. Também
nesta área intervém o Direito Internacional,
nomeadamente em matéria preventiva, de regulação
das relações, com o objectivo de evitar efeitos
perversos especulativos (recorde-se crise económico-
financeira de 2008);
 A problemática das alterações climáticas exige uma
resposta comum da comunidade internacional.
Também aqui se denota a necessidade de criação de
legislação em matéria de actuação do Homem sobre o
planeta, apesar dos entraves colocados por alguns
países;
 Reflexos jurídicos da evolução do Direito Internacional:
 1967 – É assinada, por 98 países, a “Constituição
Espacial”, formalmente chamada de Tratado do Espaço
Exterior. Determina que tudo o que pertence a este
espaço exterior é um bem da Humanidade, não
podendo ser alvo de apropriação por nenhum Estado.
Aqui, denota-se que a Humanidade é tida como sujeito
de direitos. Contrapõe-se a tratados de apropriação
como o Tratado de Tordesilhas, datado de 1494 e
celebrado entre o Reino de Portugal e o recém-
formado Reino de Espanha;
 1982 – É assinada, em Montego Bay (Jamaica), a
Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.
Trata-se de um tratado multilateral celebrado sob os
auspícios da ONU, que define conceitos herdados do
Direito Internacional costumeiro, como “mar
territorial”, “Zona Económica Exclusiva”, “plataforma
continental” e outros, e estabelece os princípios gerais
da exploração dos recursos naturais do mar, como os
recursos vivos, os do solo e os do subsolo. Considera-se
que o espaço abismal do fundo marinho também é da
Humanidade, sendo que essa área só pode ser
explorada com proveito da Humanidade, isto é, com
benefício de todas as comunidades humanas;
 Estas convenções reflectem a existência de uma
comunidade humana, como sujeito de direito, o que
nos permite pensar numa evolução futura.

o Fases históricas do Direito Internacional


 Proto-história do Direito Internacional – realidade
anterior ao Direito Internacional, em sentido rigoroso,
como que embrionária deste, isto é, está na base do
desenvolvimento do Direito Internacional como hoje o
conhecemos. O Direito Internacional desenvolve-se no
quadro europeu e universaliza-se;
 Ius gentium ≠ Ius civile
 Ius gentium – Direito que regula as relações
entre romanos e estrangeiros, isto é, povos
submetidos ao Império Romano;
 Ius civile – Direito da civitas romana.
 As duas primeiras noções de DI, da autoria de Gaio e
Ulpiano, remetem-nos para uma proximidade entre ius
gentium e ius naturale;
 As três restantes definições já nos conduzem para uma
ideia de DI moderno.
 Francisco Suárez avança-nos com uma definição de DI,
enquanto Direito que todos os povos e nações devem
observar entre si, não abrangendo as relações internas
dos Estados, dado que estas não são
internacionalmente relevantes;
 Hugo Grócio é considerado o verdadeiro fundador do
DI, apesar das influências dos autores espanhóis,
Francisco de Vitória e Francisco Suárez.
 A História do DI é autónoma, atendendo à sua
especificidade face aos outros ordenamentos. Na Idade
Média, o Sacro Império Romano-Germânico, através de
princípios religiosos (cristãos), procurou representar a
comunidade internacional, de modo fracassado. Nota-
se, aqui, ainda uma não autonomização do Direito face
à Religião. A dissolução deste Império conduziu à
formação dos Estados, enquanto organização político-
social de uma dada comunidade, fixada num dado
território. Remete-se, aqui, para o Estado soberano
celebrizado por Maquiavel e Jean Bodin, chefiado por
uma autoridade (como o monarca);
 1.ª Fase – Formação do DI (1648-1815)
 Desde o Tratado de Paz da Vestefália, assinado
no dia 24 de Outubro de 1648 entre a França, a
Suécia, e o império germânico para pôr termo à
Guerra dos Trinta Anos, até ao Acto Final do
Congresso de Viena, assinado em pleno
Congresso;
 Estabelecimento, por parte dos Estados, de um
quadro internacional que regula as relações
jurídicas. Consagram-se princípios como a
soberania ou a não-interferência nos assuntos
internos dos Estados. Coloca-se um ponto final
na pretensão de poder temporal sobe reis e
Estados. Promove-se o princípio do equilíbrio
entre Estados, evitando tentações imperiais de
alguns Estados, através da criação de Estados-
tampão. Procura-se, deste modo, assegurar a
autonomia dos Estados, nomeadamente em
matéria religiosa, passando a religião a ser
determinada pelo príncipe, sem imposições
externas;
 O equilíbrio nesta época era precário, apesar do
estabelecimento de acordos. Neste período, o
uso da guerra para repor o equilíbrio era
considerado legítimo.
 2.ª Fase – Consolidação do DI (1815-1945)
 O Congresso de Viena foi uma conferência entre
embaixadores das grandes potências europeias,
que teve lugar na capital austríaca, entre 1 de
Outubro de 1814 e 9 de Junho de 1815, cuja
intenção era a de redesenhar o mapa político do
continente europeu, após a derrota da França
napoleónica na Primavera anterior, iniciar a
recolonização (como visto na Revolução Liberal
do Porto, no caso do Brasil), restaurar os
respectivos tronos às famílias reais derrotadas
pelas tropas de Napoleão Bonaparte (como a
restauração dos Bourbon) e firmar uma aliança
entre os signatários;
 Na sequência das invasões francesas, procura-se
assegurar os princípios que fundaram o DI, como
o princípio do equilíbrio entre Estados. A
Pentarquia ficou responsável por assegurar este
equilíbrio. Verifica-se também o reconhecimento
dos Estado como únicos sujeitos de DI, iguais
entre si, do ponto de vista jurídico, mas não
político;
 A consolidação do DI, desde Viena, contraria a
noção de soberania moderna, dado que se tinha
associada à noção de soberania a ideia de poder,
não aclamando a orientação de soberania, isto é,
o entendimento de que as pessoas são cidadãos
e não súbditos do detentor de soberania - a
soberania reside no povo;
 Surgem reivindicações dos membros da
Pentarquia, com guerras localizadas, com o
imperativo de reconhecer novos Estados na
Europa e na América Latina (fim da ideia de
Império), o que conduzirá à I Guerra Mundial;
 Estado entendido como sujeito de Direito
Internacional soberano, sem qualquer ente
superior a nível exterior e gozando de autonomia
a nível interno;
 O desenvolvimento técnico e económico do
século XIX, com a intensificação do comércio
internacional, impõe a necessidade de regulação,
nomeadamente em matéria de
telecomunicações. Recorde-se a invenção do
telégrafo, em 1837. Também o usufruto de vias
fluviais comuns exige regulamentação. Foram
criadas entidades técnicas, que ficam
responsáveis pela regulação, por exemplo em
matéria de propriedade intelectual;
 Trata-se de um período marcado por tensões
políticas, por reivindicações nacionalistas e um
desenvolvimento técnico em matéria de
armamento de guerra. Em consequência disto,
também se desenvolve a sensibilidade das
pessoas, intervindo mais directamente nos
conflitos, através do recrutamento militar
obrigatório. Esta questão torna-se uma matéria
da sociedade em si. Surge a necessidade de
regular os efeitos mais perversos que suscitam a
guerra. Entenda-se que a guerra não poderia ser
encarada como uma «continuação da diplomacia
por outros meios, como afirmara Carl von
Clausewitz, dadas as atrocidades praticadas. A
criação da Cruz Vermelha Internacional surge
com um conflito franco-germânico, na tentativa
de amenizar o sofrimento dos militares. Trata-se
de um sujeito de Direito Internacional, não
estadual, com finalidades específicas, em
matéria humanitária. Aumenta, assim, a
complexidade do Direito Internacional.
 3.ª Fase – O DI contemporâneo (1945-…)
 A cidade norte-americana de S. Francisco era, no
decurso da Segunda Guerra Mundial, o maior
centro de construção naval. No final do conflito,
em 1945, celebrizou-se por acolher uma
conferência onde se debateram os princípios da
Carta das Nações Unidas já esboçados na
Conferência de Dumbarton Oaks de 1944.
O primeiro acordo que veio estabelecer uma
nova organização internacional foi ensaiado na
Carta do Atlântico, um documento assinado por
dois dos mais influentes líderes mundiais: o
presidente norte-americano Franklin D.
Roosevelt e Winston Churchill, o primeiro-
ministro britânico.
 A 14 de Agosto de 1941, a bordo de um navio de
guerra na Costa de Newfoundland, estas duas
potências acordaram na criação de um sistema
de segurança a título permanente e, mais
abrangente, exprimiram o desejo de alcançar
uma colaboração no domínio económico mais
eficaz entre todas as nações.
Na Declaração das Nações Unidas, de 1 de
Janeiro de 1942, onde se juntaram os
representantes das 26 nações aliadas que
lutaram contra as potências do Eixo, foi pela
primeira vez utilizado o termo Nações Unidas
proferido pelo presidente dos Estados Unidos da
América, Franklin Roosevelt.
 Estes acordos tiveram como consequência uma
série de reuniões, envolvendo as principais
potências aliadas. Nelas começaram a
estabelecer-se os princípios de uma nova ordem
mundial e a traçar-se as linhas gerais de uma
futura instituição de carácter mundial capaz de
cumprir o objectivo a que a antiga Sociedade das
Nações se propusera: impedir uma nova guerra
mundial. Na Conferência de Ialta (Fevereiro de
1945), determinou-se a marcação de uma ampla
reunião internacional, com o objectivo de se
fundar a nova instituição. Assim aconteceu;
entre Abril e Junho de 1945, decorreu nessa
cidade norte-americana uma conferência
decisiva para o futuro mundial: no seu
seguimento, os delegados de 50 países (entre os
quais Portugal) assinaram a Carta das Nações
Unidas. A ONU recebia a sua certidão de
nascimento;
 Esta evolução do Direito Internacional culmina
com a Conferência de S. Francisco. Dá-se, aí, a
consagração do Estado e da sua soberania,
enquanto sujeito de DI, e de princípios aos quais
os Estados se vinculam. Envolvência de outros
sujeitos de DI no reconhecimento e promoção do
bem-estar dos cidadãos, defendendo os
princípios da dignidade da pessoa humana e
outros da tutela dos Direitos Humanos, da
cooperação ou da boa-fé;
 Note-se que esta conferência decorre no
culminar da II Grande Guerra, que apresentou
contornos distintos do primeiro grande conflito
mundial, na medida em que trouxe a ideia de
protecção da dignidade humana e a necessidade
de humanizar as relações internacionais.
 O DI Internacional traz de novo a consolidação
dos elementos anteriores. Note-se o importante
papel das Organizações Internacionais (de
âmbito regional e universal, que se multiplicam
de forma exponencial), juntamente com os
Estados. Algumas organizações apresentam um
modelo distinto do comum: basta atentar no
caso da União Europeia, organização supra-
nacional, que mantém uma relação de
verticalidade com os Estados;
 Evidencia-se, também, a generalização do
Estado, enquanto forma de organização política
da sociedade;
 Desenvolvimento exponencial do Direito
Internacional, com a assinatura de tratados
bilaterais e multilaterais em novos domínios,
como a protecção dos Direitos Humanos, tutela
do ambiente e comércio internacional.
 Multiplicação dos sujeitos de DI
o Estados – Cooperação entre Estados em
matéria de terrorismo, anteriormente
problema estadual ou inter-estadual que
adquiriu dimensão global. Trata-se de um
domínio prioritário da ONU, com
significativa proeminência no Conselho de
Segurança. O terrorismo legitimou
intervenções militares, que seriam de
legitimidade dúbia, mas tendo o
terrorismo assumido tal importância, a
guerra foi movida pela comunidade
internacional. Já no século XIX se haviam
criado convenções internacionais sobre a
guerra (ius belli)
o Organizações internacionais (OI), em
especial a ONU e a UE;
o Organizações Não-Governamentais (ONG),
com influência decisiva, nomeadamente,
em matéria ambiental, direitos humanos e
ingerência humanitária;
 Exemplos: Cruz Vermelha
Internacional e Médicos Sem
Fronteiras (sujeitos sui generis).
o Santa Sé e a Soberana Ordem de Malta;
o Indivíduos (a partir da II Guerra Mundial).

 Surgimento de Tribunais Internacionais, sendo


que os sujeitos cumprem o DI,
independentemente do Direito estadual e são
directamente responsabilizados pelos actos
praticados. Veja-se o caso dos Tribunais de
Nuremberga e de Tóquio, para julgar os
criminosos da II Guerra Mundial1, dos tribunais
para julgar os crimes praticados na ex-Jugoslávia,
no início dos anos 90, e no Ruanda, em meados
da mesma década. Estes factos constituem os
antecedentes históricos do estabelecimento do
Tribunal Penal Internacional (TPI), independente
dos Estados para o desenrolar do processo
penal. Apesar de revelar dificuldade em levar
avante algumas das suas acções, procura

1
A classificação destes tribunais como Tribunais Internacionais é discutível.
impossibilitar a alegação de imunidade por parte
dos Estados. Note-se que o TPI depende da
colaboração dos Estados para o seu
funcionamento.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 1 de Março de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 A classificação apresentada é uma possível apreciação
da evolução do DI Internacional. Note-se a existência
de outras classificações que fazem um hiato em 1989,
onde se verificaram algumas mudanças relevantes;

o DI Contemporâneo – Os desafios presentes


 A procura de um governo global, não formal, de um
quadro de regulação estável, axiologicamente
enquadrado, que permita à comunidade em
construção desenvolver-se e pôr cobro aos aspectos
negativos que a afectam.
o Critérios de definição
 Dificuldade de encontrar uma definição válida por
parte da doutrina e juspublicistas;
 Consideremos, com interesse metodológico, os
critérios avançados, que servem como base para
entender o objecto de estudo;
 Critério dos sujeitos – critério mais antigo, que
prevaleceu aquando da formação do Direito
Internacional, portanto desde a época moderna.
Segundo esta noção, o DI é o Direito instituído
por normas que regulam as actividades dos
sujeitos de DI. Esta noção encontra-se plasmada
naquilo que o Tribunal Permanente de Justiça
Internacional no caso Lotus.
o Crítica: critério desadequado para definir o
DI, pois “define-se a partir da própria
definição” como afirma o Dr. Jorge
Miranda. Os sujeitos de DI são entidades
abstractas e instrumentais, não se
cingindo aos Estados. Este critério tem
sido abandonado pelas suas limitações.
 Critério do objecto – encontra-se presente no
n.º7 do artigo 2.º da Carta das Nações Unidas, a
propósito das matérias que são e não são do
domínio das Nações Unidas.
o Crítica: não é possível determinar, em
absoluto, qual o objecto em causa no
artigo referido, ou seja, o que é
intencionalmente relevante para o Direito
Internacional e aquilo que faz parte do
domínio dos Estados. Trata-se de uma
divisão preferencial e não exclusivista.
Note-se que não é possível definir com
clareza qual o objecto do DI, pois as
selecções de aquilo que cai no âmbito
interno ou internacional são meras
tendências. A definição do objecto em
causa está dependente de outros
elementos, tais como os efeitos potenciais
ou os sujeitos envolvidos. A proliferação
de convenções internacionais torna este
critério demasiado abrangente e
inoperante. A autonomia dos Estados,
quanto à sua forma e organização
depende de princípios fundamentais,
como a democracia e os direitos humanos,
o que demonstra que estamos perante
uma questão extra-Estado.
 Critério das fontes normativas – trata-se de um
critério que utiliza como elemento de
delimitação da definição os actos internacionais.
É o critério defendido por Fausto de Quadros e
André Gonçalves Pereira.
o Crítica: Padece dos mesmos defeitos do
critério do objecto e trata-se de um
critério puramente formal, não
substancial, que apresenta um carácter
perene. Note-se também que as práticas
consuetudinárias, que estão na origem das
normas jurídicas, são igualmente válidas
em DI, para sujeitos internacionais.

o Noção de DI
 Noção dinâmica, aberta à evolução do DI:
“Ordenamento jurídica formado por normas (em
sentido amplo) e princípios que regulam as relações
jurídico-públicas próprias da sociedade internacional,
enquanto substrato subjectivo, relacional e material”;
 De acordo com a proposta do Professor Bacelar
Gouveia, o DI regula as relações não tão só do conjunto
de sujeitos, mas também das relações particulares. As
relações entre dois Estados para aquisição de bens
(como um imóvel) são de Direito Internacional Privado,
já o estatuto do embaixador presente no Estado é de
Direito Internacional Público.
 A questão da juridicidade do DI
 Eficácia das regras de DI, impondo-se a “Lei do
Mais Forte” – trata-se de uma concepção do DI,
que confunde Direito com Força, fazendo o DI
depender da coacção, da efectividade em
concreto. Como é óbvio, o desrespeito geral do
DI coloca em causa a sua vigência efectiva, mas a
simples dificuldade de fazer cumprir o DI não
afecta a validade do mesmo. Note-se que o
comportamento dos sujeitos de DI revela um
apelo ao DI, agindo à luz do mesmo e
reconhecendo a sua vigência e validade.
Portanto, podemos afirmar que existe um
reconhecimento do ordenamento jurídico
internacional geral.
 Traços fundamentais do DI
 Policentricidade – afastado do paradigma do
Direito Estadual, que se encontra actualmente
colocado em causa, dadas as suas lacunas e
carências, ainda que dispondo de mecanismos de
coercibilidade. Veja-se a debilidade do sistema
penal estadual. No que concerne a esta
característica, entende-se a existência de vários
ordenamentos jurídicos num mesmo Estado
descentralizado, isto na óptica de um Estado, o
que revela que o paradigma interno também não
é tão monocêntrico. Transferindo esta realidade
para o panorama internacional (diferente do
modelo abstracto de paradigma estadual), o DI
consiste num ordenamento que não apresenta
uma dimensão unívoca, mas antes vários centros
de produção e relevância jurídica, isto é, diversas
esferas distintas, como os Estados e centros
regionais (por exemplo: NATO, UE, ASEAN, União
Africana), todos eles relevantes em matéria de
produção e aplicação do DI. Importa também
considerar o importante papel activo
desempenhado, na criação indirecta do DI, pelas
ONG. Constitui o reflexo da diversidade de
ordenamentos jurídicos, podendo ser uma
realidade positiva, na medida em que a
homogeneidade poderia não ser representativa
de toda a diversidade.
 Fragmentaridade
o Horizontal – quanto ao objecto, o DI não
tem uma vocação totalizante, na medida
em que muitos domínios não são
abarcados pelo DI. Existem diversos
quadros de produção de DI, com a
existência de pontos de domínio
excepcionais e cada vez menores. Em
matéria de política ambiental, temos
regulação rígida e intensa na Europa e
regulação mais soft a uma escala mais
abrangente (como o Protocolo de Quioto).
Note-se que, inicialmente, o DI abrangia os
domínios indispensáveis à coexistência dos
cidadãos, evoluindo paulatinamente e
passando a abranger novos domínios.
o Vertical – o DI coloca-se numa perspectiva
de complementaridade com o Direito
Estadual, estabelecendo princípios que
serão desenvolvidos pelo Direito interno
dos Estados. A fragmentaridade coloca
dificuldades de aplicação, dada também a
falta de capacidade e, diga-se até, de
vontade dos principais agentes políticos de
o fazer cumprir.

o Relações jurídicas internacionais


 O paradigma estadual apresenta relações jurídicas de
subordinação, com uma hierarquia garantida. A nível
internacional, este modelo hierárquico é o menos
aplicado. Como exemplos deste tipo de relação, temos
a questão da manutenção da paz assumida no
Conselho de Segurança da ONU, estando os Estados
sujeitos às decisões nele tomadas e o Direito da União
Europeia;
 Constituem-se como principais imperativos de DI a
proibição de agressão, da escravatura e da pirataria e,
por outro lado, a liberdade dos mares e o respeito pela
soberania dos Estados;
 Nas relações de cooperação, estão em causa interesses
semelhantes, assumindo os sujeitos envolvidos
idênticos direitos e obrigações, com o mesmo sentido e
alcance, que se associam como um feixe;
 Nas relações de reciprocidade, estão em causa
interesses distintos que se cruzam, sendo que ao
direito de um corresponde o dever de outro. Trata-se
de uma relação de interdependência, típica dos
contratos, em que temos obrigações de sentido diverso
que se entrecruzam;
 As relações de cooperação e reciprocidade realizam-se
numa posição de horizontalidade, isto é, em situação
de igualdade dos sujeitos envolvidos;
 As relações de DI eram inicialmente de reciprocidade
(Direito Comercial), mas no final do século XIX e inícios
do século XX começam a desenvolver-se relações de
cooperação, paritárias, não havendo supremacia entre
sujeitos. Após a II Guerra Mundial, estas relações de
cooperação têm-se intensificado.

o DI e figuras afins
 Direito Internacional e Moral Internacional – os mais
cépticos em relação ao DI apontam a existência de uma
moral/ética humana que deve ser respeitada. Os
princípios de DI são fundamentais para a coexistência
dos indivíduos. A moral internacional remete-nos para
a existência de um apoio e solidariedade
internacionais, como o perdão de uma dívida (veja-se o
caso da tragédia do Haiti, face a uma situação de
calamidade) ou o dever moral, sem substância jurídica,
de prestar apoio internacional;
 Direito Internacional e Cortesia Internacional –
cortesia internacional entre representantes de
diferentes Estados (chefes de Estado e Santa Sé),
normalmente atendida pelos Estados. Trata-se de um
conjunto de ditames que não se revelam fundamentais
e não possuem relevância jurídica;
 Direito Internacional e Direito Internacional Privado –
enquanto o DI regula as relações jurídico-públicas em
que estão envolvidos sujeitos de DI, o Direito
Internacional Privado consiste num Direito interno e
público dos Estados, constituído por um conjunto de
regras e princípios que regulam as normas aplicáveis
entre particulares, quando estão em causa várias
ordens jurídicas, existindo uma conexão entre elas.
Neste caso, pretende-se saber qual o ordenamento
jurídico a aplicar. Já as normas constantes num tratado
internacional bilateral são de Direito Internacional
Público;
 Direito Internacional e relações internacionais
-enquanto o DI se integra no domínio do “dever ser”,
as relações internacionais inserem-se no domínio do
“ser”, sendo uma ciência empírica que procura
conhecer as relações num quadro transnacional.
Surgem como disciplina autónoma nos EUA, após a I
Guerra Mundial para perceber o sucedido nesse
conflito armado;
 Direito Internacional e Direito da União Europeia – o
Direito da União Europeia surge como criação fruto do
DI, com a celebração de tratados. Adquiriu autonomia,
pois é diverso nos seus traços gerais. É entendido como
um Direito sui generis, mais desenvolvido, que se pode
entender como qualitativamente distinto.
o Classificações do DI
 (âmbito de aplicação) DI comum v. DI particular – o DI
comum tem aplicação global, como por exemplo a
Carta das Nações Unidas ou outros tratados com
vocação global; o DI particular tem um âmbito
subjectivo particular;
 (hierarquia) DI fundamental v. DI ordinário – o DI
fundamental (ou constitucional) é composto por
princípios imperativos; no DI ordinário está em causa
uma relação de validade;
 (âmbito material) DI geral v. DI especial – note-se que
o DI é um ordenamento global, um sistema unitário
com ramos de Direito. O DI geral é composto por
princípios e normas aplicáveis a todos os domínios; o DI
especial apresenta âmbitos materiais limitados (DI
ambiente, DI comércio, DI mar)
 (criação) DI espontâneo v. DI convencional – o DI
convencional resulta de um acto voluntário dos sujeitos
de DI, ao contrário do DI espontâneo, como por
exemplo o costume;
 (forma) DI não escrito v. DI escrito - note-se que
podem existir convenções celebradas oralmente (DI
não escrito).

 A democracia do Conselho de Segurança da ONU é, por vezes,


colocada em causa, mas temos de entender que o direito de veto
conferido a 5 membros permanentes (dos 15 membros) – Estados
Unidos da América, França, Reino Unido, Rússia (ex-União Soviética)
e República Popular da China – prende-se com o quadro
geoestratégico internacional, constituído por estas 5 potências
militares, vencedoras da II Guerra Mundial. Como se sabe, compete
ao Conselho de Segurança da ONU a manutenção da paz e
segurança internacionais. Portanto, podemos afirmar que
contrabalança-se aqui um critério aristocrático (adoptado) e um
critério democrático. Também se coloca em causa a legitimidade
dos referidos Estados ocuparem esta posição privilegiada (status
quo). Sobre esta matéria, devemos entender que o funcionamento
do Conselho de Segurança da ONU estaria em causa se, porventura,
fosse adoptado um modelo similar ao da Assembleia-Geral da ONU
(1 Estado – 1 voto). Não podemos criar democracias perfeitas em
sociedades imperfeitas, competindo ao DI melhorar o cenário
internacional.
 O Tribunal Penal Internacional constitui um importante
desenvolvimento no âmbito das Nações Unidas, não contando,
todavia, com a participação dos EUA, que celebraram convenções
com outros Estados para garantir a imunidade dos soldados
americanos. Não se duvida, porém, que os Estados Unidos virão a
ratificar o Tribunal Penal Internacional, instituído pelo Estatuto de
Roma. Por outro lado, note-se que a posição dos EUA deve-se aos
interesses particulares e aos riscos inerentes a tomar outra atitude,
dada a sua posição em importantes cenários de guerra, como por
exemplo no Afeganistão, em que apresentam um elevado grau de
envolvimento. Se, porventura, os EUA se retirassem destes cenários
de guerra, coloca-se a questão: estariam outros países dispostos a
assumir esta responsabilidade ou deixariam a situação tal como se
encontra?

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 5 de Março de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Ficha de Exercícios 1
o A propósito da questão n.º1 apresentada, note-se que:
 A desigualdade de situações económicas não implica
uma subordinação de um Estado perante outro;
 Na verdade, a negociação entre partes foi realizada
livremente e de boa-fé;
 Estamos perante uma relação jurídica de reciprocidade,
pois cada uma das obrigações jurídicas tem em vista a
salvaguarda de interesses próprios (interdependência
ou sinalagma). O incumprimento das obrigações por
uma das partes desvincula o outro Estado da relação
jurídica internacional;
 Um tratado realizado em situação de coacção é nulo,
como prevê a Convenção de Viena, assinada num
momento de descolonização, em que os Estados
tornados independentes estavam directamente
interessados nesta matéria. Por coacção, entende-se o
uso da forma, como se constata no artigo 52.º da
referida convenção.

Artigo 52.º

Coação de um Estado pela Ameaça ou Emprego da Força

É nulo, um tratado cuja conclusão foi obtida pela ameaça ou o emprego da força em
violação dos princípios de Direito Internacional incorporados na Carta das Nações
Unidas.

 Na discussão desta matéria, foi colocada a questão da


coacção económica, que acabou por não ser aceite
como razão invocável para a nulidade de um negócio,
dada a dificuldade de provar tal prática. A coacção
económica sucede entre Estados com diferente grau de
desenvolvimento, mas não só. Veja-se a relação entre a
UE e a Rússia, a propósito da distribuição de recursos
energéticos;
 O acordo celebrado entre Japão e Cabo Verde traz
também benefícios para este último;
 A coacção económica só é relevante, quando é violado
o princípio da independência ou não-ingerência na vida
dos Estados, pois caso contrário temos igualmente que
atender ao princípio do desenvolvimento, por parte
dos países desenvolvidos, de relações comerciais livres
com países em desenvolvimento. Contudo, mesmo
numa situação de bloqueio económico, não é
consensual a existência de uma agressão económica;
 Na Declaração do Milénio, verifica-se a preocupação
pela necessidade de promover o desenvolvimento de
países mais desfavorecidos, nomeadamente do
continente africano, que se encontra, todavia,
contrabalançada com outros princípios que protegem
os países desenvolvidos. Verifica-se, aqui, a
necessidade de distribuição equitativa da riqueza
gerada, o que na verdade não sucede. A globalização
tem beneficiado alguns países em detrimento de
outros, não promovendo uma distribuição equitativa,
mas também note-se que os benefícios gerados,
nomeadamente nalguns países asiáticos. A solução não
passa pela recusa da globalização, que coloca em causa
a sobrevivência dos países mais favorecidos, pois não
teriam acesso ao comércio internacional, não sendo
capazes de sobreviver numa economia fechada;
 Problemática das multinacionais – desde as
Companhias das Índias (ainda que apresentassem uma
dimensão mais reduzida), actores que não são sujeitos
de Direito Internacional, mas com uma dimensão
económica superior ao PIB de muitos Estados,
exercendo poder fáctico que se reflecte em
consequências jurídicas e políticas. Alguns entendem
que estas empresas dever-se-iam tornar sujeitos de DI,
ficando submetidas a este e cumprindo, por exemplo, o
princípio da não-ingerência na vida dos Estados.
Todavia, se tal sucedesse, não se poderia definir um
limite sobre aqueles que se podem assumir como
sujeitos de DI. Por outro lado, um acordo entre estas
empresas e Estados seria um acordo de Direito
Internacional, ao qual os Estados estariam vinculados.
Note-se que algumas destas empresas são “braços”
importantes de alguns Estados.
 O CIRDI2, criado a 14 de Outubro de 1966 e que
Portugal integra desde 1984, procura harmonizar as
relações entre Estados e empresas transnacionais,
procurando garantir um equilíbrio de protecções. Surge
por reivindicação das empresas, que não desejam ficar
absolutamente dependentes da orientação política dos
Estados;
 Podemos falar de “quase-tratados” entre Estados e
empresas transnacionais. Podendo os Estados sofrerem
consequências económicas por refutarem um acordo,
gozam de autoridade política que lhes permite tomar
esta opção;
 Apesar de apresentarem formalmente igual estatuto,
existe uma disparidade entre os diferentes Estados,
classificados como micro-estados até superpotências,
atentando no mapa físico/territorial deveras
desequilibrado. Portanto, quando falamos no princípio
da igualdade entre Estados, referimo-nos a uma
igualdade construída juridicamente e sustentada pelo
DI;
 4 Direitos que retratam a soberania de um Estado:
 Ius tractum (direito de celebrar
tratados/convenções);
 Ius legationis (capacidade de enviar e receber
representantes diplomáticos);
 Ius belli (direito de fazer a guerra, já que o uso do
poder militar era legitimado pela protecção de
direitos dos Estados)3;
 Direito de reclamação internacional.

2
O CIRDI (Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos) procura
Proporcionar os meios de conciliação e arbitragem dos diferendos relativos a investimentos entre
Estados Contratantes e nacionais de outros Estados Contratantes.
3
A proibição da guerra é introduzida, em 1928, pelo Pacto Briand-Kellog da Sociedade das Nações
(SDN), após discussões a partir da segunda metade do século XIX. Podemos aqui encontrar um
confronto entre o direito de legítima defesa (sujeito a condições estabelecidas) com a proibição do uso
da força.
o Na questão n.º2 apresentada, estamos perante uma relação
de cooperação entre Estados na prossecução de um interesse
comum;
o Na situação apresentada na questão n.º3, verificamos que foi
decretado um embargo de armas à RD Congo, devido à
existência de um conflito armado que cria uma instabilidade
regional directa ou indirecta. A intervenção do Conselho de
Segurança da ONU legitima-se por estamos perante uma
situação com reflexos externos, não violando o n.º7 do artigo
2.º da Carta das Nações Unidas, em matéria de ingerência na
vida dos Estados.

Artigo 2º

A Organização e os seus membros, para a realização dos objectivos mencionados no


artigo 1º, agirão de acordo com os seguintes princípios:

(…)

7. Nenhuma disposição da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervir


em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna de qualquer
Estado, ou obrigará os membros a submeterem tais assuntos a uma solução,
nos termos da presente Carta; este princípio, porém, não prejudicará a
aplicação das medidas coercitivas constantes do capítulo VII.

Trata-se de uma questão de manutenção de paz e segurança


internacionais efectiva ou apenas uma ameaça, que legitima a
intervenção. Também é importante notar que esta situação
de conflito propicia o tráfico de armas, o que
indiscutivelmente torna esta questão de âmbito
internacional.

Artigo 24º
1. A fim de assegurar uma acção pronta e eficaz por parte das Nações Unidas, os
seus membros conferem ao Conselho de Segurança a principal
responsabilidade na manutenção da paz e da segurança internacionais e
concordam em que, no cumprimento dos deveres impostos por essa
responsabilidade, o Conselho de Segurança aja em nome deles.

(…)

O Conselho de Segurança da Nações Unidas tem a capacidade


de agir unilateralmente, vinculando todos os Estados-
membros da ONU. Estamos perante uma relação de
subordinação, pois não é conferida liberdade aos Estados
para divergirem da decisão tomada, o que revela uma óbvia
perda de soberania dos Estados.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 8 de Março de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)

 Fundamento de juridicidade do DI
o Para os mais cépticos, o DI não pode ser entendido como
jurídico, mas como uma moral internacional, considerando
tratar-se de um conjunto de normas da vida internacional
com carácter moral, que resulta da razão dos sujeitos
envolvidos. Diferentes perspectivas sobre esta questão:
 No DI, não existe uma ordenação e um correspondente
ordenamento;
 Austin, referência do ordenamento da common law,
tem uma concepção negativista do DI, para pôr fim ao
“estado selvagem”, considerando que este não tem
carácter jurídico. Apesar de haver alguma coincidência
entre Direito e Moral, note-se os que valores do DI
buscam o que é justo, considerados como um
imperativo categórico;
 DI como “lei do poder” – trata-se de uma posição
seguida por autores que partilham do pensamento
hegeliano (soberania una, indivisível e inalienável) e
defendem o Estado como poder absoluto, insuperável,
sendo as regras internacionais provenientes das
relações entre Estados. Trata-se de uma concepção que
também não reconhece a juridicidade do DI, apesar de
existirem princípios jurídicos de DI que procuram
promover a cooperação internacional;
 DI como direito sui generis – reconhecendo uma
autonomia ao sistema jurídico das relações
internacionais, considera-se que este sistema se situa
num grau inferior, pois apresenta especificidades que o
demarcam dos restantes. Fica, todavia, aquém dos
aspectos fundamentais, dada a ausência de um
legislador internacional e de um órgão central. Para
alguns, este carácter sui generis torna o DI num Direito
incompleto, pois a sua plena efectivação fica
dependente da colaboração dos Estados, principais
sujeitos da criação do DI. Impõe-se, portanto, uma
articulação com o Direito Nacional, não sendo, por isso,
auto-suficiente;
 Muitos autores, provenientes de correntes
sociológicas, recusavam a existência de uma ordem
jurídica internacional, apenas reconhecendo a
existência de uma ordem social dotada de
coercibilidade, a qual o DIP não dispõe;
 Do nosso ponto de vista, o DI constitui, de facto,
Direito, porque é constituído por um conjunto de
princípios fundamentais de natureza jurídica, dotado
portanto de uma consciência jurídica internacional,
apesar da coincidência com princípios da moral.
Defende a justiça e a equidade. Os referidos princípios
conferem direitos e impõem obrigações. O DIP não é o
reflexo ou o equilíbrio do poder, pois este é colocado
em causa pelas relações de poder. Quando se verifica a
existência de um desequilíbrio, articula-se a aplicação
do DI. Portanto, não é o poder que legitima o Direito,
mas antes o contrário. Se, em matéria de regulação
económica internacional, podemos considerar que o DI
fica aquém da “criatividade” dos agentes económicos,
no domínio dos Direitos Humanos é bom reparar nos
grandes desenvolvimentos já efectuados. Note-se,
ainda, que a regulação nacional no domínio económico
também não se revela não avançada em relação ao
domínio internacional. Por outro lado e, na verdade, o
DIP apresenta as características sui generis
apresentadas, mas não em termos absolutos, pois
existem legisladores policêntricos (como sucede nos
Estados Federais) e organizações internacionais
tomando esta posição, desprovidos de coercibilidade,
mas com valor jurídico, ainda que não normativo (o
denominado soft law), com adaptação de resoluções
em diversos domínios com efeitos jurídicos, enquanto
diâmetro interpretativo, tendo uma base
consuetudinária (ius cogens). Esta realidade não
permite colocar o DI numa categoria inferior.
 A maior parte da regulação económica nacional
apresenta as características de soft law;
 A maior parte das normas constitucionais ficam
dependentes da articulação dos órgãos de
soberania para o regular funcionamento das
instituições democráticas, como a promulgação
de um diploma legal. Também os Direitos Sociais,
Económicos e Culturais não são susceptíveis de
aplicação coerciva;
 Na realidade, o DI tem, por natureza,
necessidade de se articular com o Direito
Nacional, para garantir a sua efectiva aplicação, o
que implica uma cooperação com as autoridades
nacionais;
 O princípio da subsidiariedade pretende
assegurar uma tomada de decisões tão próxima
quanto possível do cidadão, sendo o DIP não
autoritário com vocação totalizante, mas pelo
contrário flexível;
 O facto de os sujeitos de DI fazerem apelo a ele e
reconhecerem a sua indispensabilidade é a prova
da sua existência.

o Doutrinas voluntaristas da Escola Positivista, que se firma no


Direito Estadual, ainda que não existindo legislador central.
Para estes, o fundamento de validade é a vontade dos
Estados
 Teoria do “Direito Estadual Externo” – o DI regula as
relações internacionais do Estado, mas esta teoria nega
a existência de um DI, pois defende a existência de
vários Direitos Estaduais. Note-se que existem mais
sujeitos de DI para além dos Estados. Esta teoria
esquece-se que o DI e as suas normas sobrevivem para
além da vontade dos Estados. Considere-se, também,
que a formação de muitas normas de DI não parte da
vontade estadual, como o costume, assim como há um
conjunto de princípios fundamentais que se impõem
aos Estados, independentemente da sua vontade;
 Teoria da “Auto-limitação do Estado” – segundo esta
teoria, o Estado pode limitar a sua soberania (auto-
limitação), sendo esta a razão da validade do DI. As
mesmas críticas apresentadas na primeira teoria valem
para esta tese, referenciando-se a existência de
tratados internacionais que vinculam todos os Estados,
até aqueles que não o subscreveram. Esta teoria parte
de uma concepção de soberania absoluta, plena do
Estado, considerando que o DI não tem um
fundamento autónomo, na medida em que só vigora
porque os Estados podem, de modo livre e consciente,
auto-limitar a sua soberania. Trata-se de uma
concepção liberal do século XIX, que não faz sentido na
actualidade, dada a existência de princípios
fundamentais. Assemelha-se à teoria da autonomia do
Direito Privado. O fundamento do DI não assenta neste
consentimento dos Estados, mas assenta, na verdade,
nos valores e princípios fundamentais, que fazem parte
da consciência jurídica internacional;
 Teoria da “vontade comum dos Estados” –
fundamento de validade numa vontade comum dos
Estados, que não se confunde com o conjunto das
vontades individuais. Trata-se da formulação do
consenso como fundamento da validade. Esta teoria
encontra dificuldades na possibilidade de existir
vinculações diferenciadas ao DI, o que contradiz a
vontade comum.
o Tese normativista – fundamento da validade de uma norma
numa norma superior. Kelsen defende o primado do DI a
nível internacional, advogando nomeadamente as práticas
consuetudinárias, como o princípio pacta sunt servanda4
 Crítica: carácter excessivamente formalista e
hipotético, dada a dificuldade de encontrar uma
validade.
o Tese sociológica – o institucionalismo (Santi Romano)
considera o Direito como ordenamento indispensável à
organização social, em que os indivíduos tendem a criar
formas institucionais perenes. Quebra a especificidade do
Direito Internacional entre os outros possíveis.
 Crítica: o artigo 38.º do Estatuto do Tribunal
Internacional de Justiça apresenta um elenco de fontes
de direito que integra os princípios gerais de Direito

4
Pacta sunt servanda é um brocardo latino que significa "os pactos devem ser respeitados" ou mesmo
"os acordos devem ser cumpridos". É um princípio base do Direito Civil e do Direito Internacional.
reconhecidos pelas nações civilizadas, o que revela um
etnocentrismo do mundo ocidental.
Artigo 38.º
1. O Tribunal, cuja função é decidir em conformidade com o direito internacional as
controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará:
a. As convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam
regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b. O costume internacional, como prova de uma prática geral aceite como direito;
c. Os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas;
d. Com ressalva das disposições do artigo 59, as decisões judiciais e a doutrina
dos publicistas mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para
a determinação das regras de direito.
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade do Tribunal de decidir uma
questão ex aequo et bono, se as partes assim convierem.

Também a Resolução 2625, de 24 de Outubro de 1970


(Declarações sobre os Princípios de Direito
Internacional relativos às relações amigáveis e de
cooperação entre Estados, de acordo com a carta das
Nações Unidas), também conhecida como “Declaração
dos Sete Princípios”, apresenta os princípios gerais do
DI:
 Proibição do uso da força;
 Solução pacífica das controvérsias;
 Não intervenção nos assuntos de jurisdição
doméstica dos Estados;
 Obrigação de cooperação entre os Estados;
 Igualdade de direitos e autodeterminação dos
povos;
 Igualdade soberana dos Estados;
 Cumprimento de boa-fé das obrigações
internacionais.

Na Assembleia-Geral da ONU, composta por 192


Estados, a quase totalidade dos Estados, impera uma
fórmula democrática e temos a comunidade
internacional representada como um todo.
O Parecer do TIJ, no caso “Reparação dos prejuízos
sofridos ao serviço das NU” (1949), é-nos apresentado
um princípio da competência implícita reconhecida pelo
TIJ às Nações Unidas, apesar da Carta das Nações
Unidas não reconhecer esta personalidade e
capacidade jurídica. Aquando do conflito israelo-árabe
(1948), coloca-se em causa a personalidade jurídica das
Nações Unidas. O TIJ reconhece que a Carta das Nações
Unidas aplica-se a todos os Estados, mesmo os que nela
não participaram.

O ius cogens é constituído por um conjunto de


princípios erga omnes, que salvaguardam interesses da
comunidade internacional, não particulares, portanto
da titularidade de todos os sujeitos e que não estão
sujeitos ao seu consentimento. Trata-se de um direito
inderrogável, que não pode ser afastado pelas partes.
No caso “Barcelona Traction” (1970), encontramos uma
situação de contraposição entre direitos de cada sujeito
e direitos da comunidade, sendo que o Tribunal
Internacional de Justiça reconhece a existência de
princípios fundamentais (pacta sunt servanda, princípio
da boa-fé e outros relacionados com os direitos
humanos, como a proibição da escravatura, do
genocídio e do apartheid, oponíveis erga omnes). Note-
se que a Resolução 2625, apesar de não ser vinculativa,
foi imediatamente integrada na decisão do TIJ. A
Convenção de Viena reconhece a existência de ius
cogens, não indicando, porém, quais os princípios que o
integram. Este trabalho de identificação tem sido
desempenhado pela doutrina. De todo o modo,
podemos afirmar que os princípios fundamentais de
direitos humanos integram o ius cogens. Em 2006, é
reconhecido, pela primeira vez, o ius cogens.
o Teses jusnaturalistas – são mais antigas que as concepções
normativas. A Escola Hispânica encontra-se assente em
valores cristãos.
 Jusnaturalismo teológico ontológico – valores
humanos de natureza transcendente;
 Jusnaturalismo axiológico – valores da razão humana e
respeito pela dignidade humana. Esta tese cai por terra
no século XIX, com o Positivismo, renascendo no século
XX, com a necessidade de assentar o Direito em
valores.
 Crítica: Impossibilidade de encontrar uma
consciência jurídica comum assente em valores.

o Teses contemporâneas
 Neo-contratualismo liberal
 Teses deliberativas e da ética comunicativa – Modelo
europeu assente na deliberação, com a criação de uma
plataforma que promova uma comunicação entre
actores de Direito Internacional;
 Movimento CLS (Critical Legal Studies), Feminismo e
Teoria da “Public Choice” – orientações de DIP, no
âmbito da common law, dada a necessidade de
reformular o modelo vigente, respondendo ao
multiculturalismo existente.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 15 de Março de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 Distinção entre processos contenciosos e pareceres do TIJ:
enquanto os processos contenciosos conduzem à produção de
acórdãos vinculativos para a resolução de um litígio entre sujeitos
de DI e implicam respeito das partes pela decisão tomada (de
acordo com o ETIJ e a Carta das Nações Unidas), os pareceres não
são vinculativos, mas assumem relevante valor, sendo emitidos no
âmbito da competência consultiva do TIJ (exemplo: licitude do uso
de armas nucleares);
 A Resolução 2625 das Nações Unidas, de 1970, foi adoptada quando
a Assembleia-Geral das Nações Unidas (AGNU) já se constituía como
o fórum da comunidade internacional, considerada como um todo,
apesar de não apresentar representantes de todos os países. Estas
resoluções não são formalmente vinculativas aos sujeitos de DI,
porém o valor que lhes é atribuído é jurídico e relevantíssimo.
Nestes, a AGNU declara os princípios fundamentais vigentes na
comunidade internacional, o que se revela um acto de clarificação
relevante pelos Estados-Membros que integram o fórum. Note-se
que é excepcional a requisição de votações para clarificar posições
na AGNU, pois, na maioria das questões, há um consenso na
comunidade internacional. Trata-se de um facto com elevado
significado jurídico, apesar de se verificarem práticas contrárias a
estas posições;
 Para além dos princípios invocados pelo artigo 38.º do ETIJ,
podemos referir outros igualmente relevantes como o pacta sunt
servanda. A propósito do princípio da proibição do uso da força,
podemos encontrar uma contradição deste com o conflito militar
desencadeado pelos EUA, com resultados discutíveis, no Iraque.
Aquando deste facto, a Doutrina Bush invocou legítima defesa
preemptiva5, outro princípio fundamental que se contrapõe na
ocorrência de um ataque armado sobre um Estado. Veja-se o
exemplo de pressuposição da iminência de um ataque que conduziu
Israel a lançar um devastador ataque aéreo, marco inicial da Guerra
dos Seis Dias. O mesmo se aplica na iminência de um ataque nuclear
em que se pode justificar uma resposta anterior ao lançamento ou
no caso de Launch on Warning – LoW6. Por outro lado, a legítima

5
Por legítima defesa preemptiva, entende-se a resposta a um ataque iminente, não sendo possível
esperar que o dito ataque seja efectivado. Coloca-se a questão de qual o limite de legítima defesa
preemptiva.
6
Em 1837, desenrola-se um caso que opõe os Estados Unidos da América ao Reino Unido. O Canadá,
enquanto colónia britânica, estava a viver um período de lutas independentistas, tendo esta colónia
recebido um barco americano com armas de fogo, para auxiliar os povos locais nos movimentos pela
independência. O Reino Unido, invocando legítima defesa preemptiva, decide abater a referida
embarcação, defendendo os EUA que, sendo o barco seu, não poderia ser abatido, alegando também
que o barco não transportaria o referido carregamento de armas.
defesa preventiva não é admitida no âmbito do Direito
Internacional. Recorde-se que a legítima defesa preventiva apenas
tem lugar num quadro de ameaça provável. Também se denota
aqui um reavivar da noção de “Guerra Justa” do tempo dos clássicos
e desenvolvida por Santo Agostinho. Um caso que se pode enunciar
data de 1981, aquando do bombardeamento por Israel de uma
central nuclear, invocando legítima defesa preventiva, o que foi
imediatamente refutado pelas Nações Unidas, com os EUA à
cabeça;
 Também a propósito da Guerra Colonial desencadeada por Portugal
nas colónias africanas, discutiu-se se havia uma violação do
princípio da auto-determinação dos povos ou se estávamos perante
uma questão interna de Portugal, considerando as colónias
território nacional (as denominadas “províncias ultramarinas”).
Estávamos perante um conflito de princípios;
 Não podemos invocar a falta de validade do DI por ocorrerem
sucessivos incumprimentos do mesmo. Não podemos colocar em
causa o Direito (“dever ser”) pela ocorrência de factos contrários
(“ser”);
 O fundamento de validade do DI prende-se com a existência de uma
axiologia que subjaz ao DI, vigorando assim na comunidade
internacional, sendo ou não acatado pelos Estados;
 As teorias deliberativas partem da recusa de um “Direito
Internacional”, imperando a “Lei do Mais Forte”, procurando
superar a inexistência de uma axiologia através de um conjunto de
princípios;
 O “Contrato Social” não assenta numa teoria de valores, partindo da
ideia de existência de cidadãos iguais. Estes, para socializarem,
necessitam de um conjunto de normas que regulem as relações que
estabelecem. Rawls afirma que o conjunto de normas internacionais
é válido, desde que aceite pelos sujeitos, estes que se encontram
“cobertos” por um “véu de ignorância”, partindo de uma situação
de igualdade. Implica uma prognose póstuma para legitimar o
Direito Internacional, desde que as condições impostas forem
aceites por todos, num estado de pureza, que, na verdade, não
existe. A tese contratualista está sujeita a críticas, como são:
o Crítica multiculturalista – aceitando o raciocínio de Rawls,
derruba os pressupostos de que ele parte, que só fariam
sentido num determinado estado axiológico ocidental,
racional, universalista, que não existe. Todos os sujeitos
partem do seu estado de evolução cultural e civilizacional.
Esta crítica assenta no relativismo, na compreensão da
diferença;
o Crítica radicalista – aponta para aspectos mais concretos,
colocando em causa a axiologia do DI, pois a lógica do
“Contrato Social” está enviesada, isto é, não é neutral. O
“Contrato Social” parte de um princípio de autonomia, mas
segundo estes críticos não existe este idealismo, pois não só
não se reconhecem os quadros multiculturais, como são
colocados em causa outros valores. Note-se que a tese de
Rawls assenta num modelo económico-social demoliberal,
capitalista e numa visão homocêntrica (Natureza ao serviço
do ser humano). Esta visão conduz à sobreexploração de
recursos. É nesta crítica radicalista que se insere o movimento
dos Critical Legal Studies (CLS) e o feminismo, que assenta no
cuidado e na solidariedade. De acordo com esta crítica, a
proposta do “Contrato Social” conduz a uma desigualdade na
distribuição da riqueza, sob a aparência da liberdade e da
autonomia, beneficiando apenas uma parcela da sociedade.
Os CLS estão associados ao construcionismo social, surgindo
nos anos 60 e criticando o modelo dominante que não
permite que as minorias se expressem (mulheres, afro-
americanos, homossexuais), pois é um modelo assente na
máxima utilidade, não sendo por isso sustentável. O modelo
soberano do Estado necessita de ser reformulado, na
tentativa de conduzir a uma igualdade material, à
sustentabilidade dos seres vivos, a não encarar a soberania
como poder, a reconhecer a legitimidade das ONG e a
atender às reclamações das camadas marginalizadas,
respeitando a diferença. O modelo existente não consegue
impedir os abusos de poder dos Estados. Por outro lado, a
ideia multiculturalista também se pode revelar perigosa.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 19 de Março de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Fontes do DI
o Por fontes de DI, entendem-se os modos de formação e
revelação das normas jurídicas de Direito Internacional
(sentido formal de fontes de direito);
o O artigo 38.º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça
indica os elementos fundamentais em que o TIJ se baseará
para resolver os litígios que lhe são colocados. Trata-se,
meramente, de uma referência indirecta das fontes.
 Convenções internacionais – abrangem, lato sensu,
aquilo que é designado por tratado, que constitui uma
fonte de direito material, geradora de normas jurídicas
de DI.
 Não são, historicamente, a fonte primacial em
termos qualitativos e quantitativos, mas, na
verdade, a maioria do DI encontra-se plasmado
nos tratados, que nem sempre apresentam
normas jurídicas;
 Não constituem a fonte hierarquicamente
inferior;
 Revelam-se uma fonte de direito comum e
particular (no caso dos tratados bilaterais);
 É incorrecto afirmar-se que o tratado tão só
revela normas que preexistiam, como por
exemplo o costume, associando simplesmente
ao movimento de codificação. Na verdade, as
convenções criam normas jurídicas.
 Costume internacional – constitui a fonte sistemática
mais antiga.
 A prática é um elemento do costume, mas a
prova é um elemento que determina a existência
do costume. Tal noção revela resquícios de
voluntarismo;
 Não existe uma hierarquia entre as convenções e
o costume internacional, em valor abstracto.
Neste sentido, convenções e tratados têm igual
valor, podendo revogar-se reciprocamente,
aplicando-se o princípio lei posterior revoga lei
anterior (lex posterior derogat legi priori).

 Princípios gerais reconhecidos pelas nações civilizadas


– são normas do ponto de vista material, mas não o são
do ponto de vista formal, pois não constituem modos
de formação e revelação de normas jurídicas;
 Verificamos que estes princípios constam dos
tratados internacionais;
 Misturam-se fontes com normas, neste artigo.

 Decisões judiciais e doutrina dos publicistas – o artigo


59.º do ETIJ refere que os acórdãos apenas vinculam as
partes envolvidas no caso concreto, não vigorando
como regra de precedente;
 Esta alínea estabelece uma hierarquia entre
fontes directas de revelação (costume e
convenções internacionais) e fontes secundárias,
subsidiárias (jurisprudência e doutrina);
 Como crítica, podemos considerar que as
orientações jurisprudenciais deveriam constar do
elenco de fontes reveladoras de normas
jurídicas.
o No n.º2 do artigo 38.º do ETIJ não se refere a fontes de
Direito, dizendo respeito, na verdade, à aplicação num caso
concreto de um sentimento de justiça. Por outro lado, não
devemos confundir decisões ex aequo et bono com equidade,
pois as primeiras referem-se a decisões directas de aplicação
de justiça, enquanto a equidade constitui uma forma de
aplicação de princípios gerais de Direito (decisões equitativas)
e de suavização de aplicação do Direito;
o O artigo 38.º do ETIJ é susceptível de crítica por excesso, já
que abrange os princípios gerais como fonte, e por defeito, na
medida em que não faz referência aos actos unilaterais dos
Estados e organizações internacionais como fonte de Direito.
Note-se que, apesar disto, estes actos unilaterais não deixam
de ser reconhecidos e aplicados.
o Fontes Primárias:
 Costume
 Não tem carácter distinto do sentido de fonte de
Direito Estadual;
 Elemento material (corpus) – prática constante e
uniforme
o De verificação difícil;
o A existência de um costume implica uma
constância, uma continuidade dessa
prática por partes dos sujeitos de DI. A
prática tem de ser, igualmente, uniforme,
devendo manifestar-se do mesmo modo
ao longo do tempo;
o O costume é uma fonte que se vai
constituindo lentamente, radicado numa
prática constante que se vai consolidando.
Parte da iniciativa de alguns Estados, à
qual outros vão aderindo, tornando-se
numa prática jurídica;
o Na actualidade, com a rápida evolução
tecnológica, o costume não se revela
compatível com a realidade do presente,
levando o Direito a manifestar-se de modo
convencional;
o Nota-se, nos tempos mais recentes, uma
maior rapidez na consolidação do
costume, deixando de haver uma
exigência temporal tão grande. Tal pode
comprovar-se no caso “plataforma
continental”, em que o TIJ reconhece a
formação de uma prática costumeira, em
10 anos. Também a norma que considera
o espaço exterior é pertença da
Humanidade surge com uma prática
costumeira;
o Referência ao costume selvagem por
críticos franceses: significa que,
contrariamente ao que seria comum no
surgimento da norma costumeira, a opinio
iuris (animus) surgiria antes da prática
(corpus);
o Proposta: a prática deve ter ocorrido cada
vez que os sujeitos tiveram oportunidade
de a manifestar e deve ter um carácter
uniforme. Exige-se para a comprovação de
um costume, portanto, um largo conjunto
de sujeitos a associar-se à prática, sendo
por isso considerada relevante (por
exemplo, para a formação do princípio da
liberdade dos mares);
o Relevância da objecção aos costumes
locais, para a não vinculação dos Estados
objectores à prática costumeira;
o Tendência irrelevância das objecções nos
costumes comuns, dado que é suficiente
que um número significativo de sujeitos
tenha levado a cabo essa prática, de entre
aqueles que tiveram oportunidade de
praticar. Importa, portanto, o carácter
quantitativo e qualitativo da prática,
havendo uma generalidade do ponto de
vista geográfico e assumindo importância
na acção em causa;
o Manifestações de prática – como se
comprova e revela – através dos actos dos
órgãos internos e externos (por exemplo,
diplomáticos) dos sujeitos de DI. Note-se,
também, a importância da doutrina e da
jurisprudência no reconhecimento do
costume.
 Elemento psicológico (animus)
o Revela-se importante distinguir costumes
de usos, sendo que estes últimos
representam práticas sociais reiteradas,
mas desprovidas de convicção de
obrigatoriedade ou juridicidade. Os usos
não são fonte de Direito imediata, sendo
fonte mediata de acordo com o
reconhecimento da Lei;
o Os costumes resultam da sua própria
conformação, estrutura, constituindo-se
como práticas juridicamente obrigatórias,
vinculativas para os sujeitos. Na verdade,
revela-se difícil demonstrar este elemento
psicológico, pois:
 É necessário conhecer o ânimo, a
vontade das partes;
 Implica manifestação objectiva, com
projecção externa da generalidade
dos sujeitos. Através da
manifestação da prática por parte
de sujeitos de DI, entidades
institucionalizadas, revela-se
objectivamente possível concluir
essa juridicidade.
o O problema da objecção persistente de
uma prática que não é juridicamente
relevante, sendo que o Estado até pode
aderir à prática (casos “Haia de la Torre” e
“Plataforma Continental”);
o Presunção iuris tantum (do animus) – se o
Estado não se quiser vincular a essa
prática, tem de salvaguardar que não
pretende que ela esteja dotada de uma
convicção de obrigatoriedade. Esta
presunção é ilidível, desde que o Estado
prove que não está associada à prática em
questão uma convicção de
obrigatoriedade;
o Nos casos dos princípios fundamentais,
estes são dotados de uma convicção de
obrigatoriedade, apesar de não serem
aceites, de modo consentâneo, pelos
Estados (“costume selvagem”). O mesmo
sucede nas questões ambientais.
o Classificação:
 Âmbito – não tem de ser praticado
por todos e pode vincular apenas 2
Estados;
 Sentido – a questão do costume
contra tractum, isto é, contra
tratados que vinculam os Estados.
Este tipo de costume é válido, sendo
que a norma costumeira pode
revogar a norma do tratado.
 O artigo 27.º da Carta das
Nações revela-se um exemplo
paradigmático desta
realidade. Este artigo
relaciona-se com o sistema de
votação no Conselho de
Segurança da ONU. De acordo
com o artigo, exige-se uma
votação por maioria de nove
votos, tendo apoio dos
membros permanentes, que
têm de votar favoravelmente.
Todavia, vigora uma prática
costumeira, contrária à “letra
da lei”, que não exige o voto
favorável dos membros
permanentes, bastando a
abstenção.

Artigo 27º

1. Cada membro do Conselho de Segurança terá um voto.


2. As decisões do Conselho de Segurança, em questões de procedimento, serão
tomadas por um voto afirmativo de nove membros.
3. As decisões do Conselho de Segurança sobre quaisquer outros assuntos serão
tomadas por voto favorável de nove membros, incluindo os votos de todos os
membros permanentes, ficando entendido que, no que se refere às decisões
tomadas nos termos do capítulo VI e do nº 3 do artigo 52º, aquele que for
parte numa controvérsia se absterá de votar.

 Tratados
 A definição de tratado constante da Convenção
de Viena, e que faz referência aos “instrumentos
conexos” (por exemplo: protocolos), é
susceptível das seguintes críticas:
o Um tratado é obviamente um acordo de
vontades entre os sujeitos de DI, não
apenas os Estados;
o Um tratado não tem necessariamente de
ser escrito, podendo ser um acordo
meramente verbal. Esta situação de
acordo meramente verbal entenda-se que,
na actualidade, é marginal).
 Como proposta alternativa, podemos dizer que
um tratado é um acordo de vontades entre
sujeitos de DI, agindo nessa qualidade, que criam
normas de DI. Afasta-se dos acordos de Direito
Internacional Privado. Dos tratados, resultam
efeitos jurídico-internacionais, pois apresentam
conteúdo normativo jurídico internacional, não
meramente político, com normas vinculativas às
partes envolvidas;
 Distinção de figuras afins:
o Feixes de actos unilaterais – ao contrário
dos tratados em que a norma é criada só
na conjugação das vontades envolvidas
que se articulam, nos feixes de actos
unilaterais, cada acto de DI de per si
vincula aquele que o proferiu. Isto é, os
feixes de actos unilaterais são conjuntos
de actos unilaterais, de acordos de
vontades fragmentados, mas autónomos
juridicamente;
o Acordos políticos e gentlemen’s
agreements – não há critérios abstractos
pré-definidos para determinar se um
conjunto de intenções é juridicamente
relevante ou apenas de natureza política.
 Por tratado, entende-se todo aquele acordo de
vontades que cria direitos e obrigações e
constitui fonte de Direito. Já os acordos políticos
não têm carácter jurídico, não estão dotados de
normatividade e o seu cumprimento reside na
vontade e necessidade dos sujeitos;
 Apesar da internacionalização dos “quase
tratados”, estes não deixam de fazer parte do
Direito Privado. Esta internacionalização deve-se
à importância económico-financeira das grandes
multinacionais, sujeitos que não estão vinculados
ao DI. Alguns destes “quase tratados” revelam-se
contrários aos princípios fundamentais da
soberania nacional e da liberdade dos Estados
menos desenvolvidos. O CIRDI procura regular as
relações entre Estados e estes sujeitos e é
constituído pelos Estados que entendam integrá-
lo, podendo retirar-se dele a qualquer momento;
 Denominações de Tratados (entre outras)
o Convenção – noção genérica para designar
tratados solenes e acordos
o Carta, Constituição ou Estatuto
o Pacto
o Concordata – entre a Santa Sé e outros
sujeitos de DI
o Acta final ou geral
o Compromisso – designação usada para as
figuras afins que não são tratados.
 Classificações de Tratados (entre outras)
o Tratados-lei (obrigações que constituem
normas gerais e abstractas, com carácter
idêntico para todas as partes) e Tratados-
contrato (de natureza sinalagmática, com
duração limitada e subscritores restritos);
o Tratados bilaterais e Tratados
multilaterais;
o Tratados gerais (obrigam uma
generalidade de sujeitos, podendo ser
universais ou para-universais, não
limitando as partes envolvidas) e Tratados
restritos (apresentam condições que
limitam as partes que se podem vincular a
ele);
o Tratados abertos (admitem a adesão de
novos membros) e Tratados fechados
(restringem-se aos subscritores iniciais,
sendo intuitu personae7);
o Tratados solenes (sujeitos a determinadas
formalidades, como, por exemplo, a
ratificação dos Chefes de Estado) e
Tratados não-solenes;
o Tratados escritos e Tratados não escritos.

O Tratado da União Europeia é aberto e


restrito.

7
Os tratados intuitu personae baseiam-se, geralmente, na confiança entre as partes, sendo que apenas
o Estado vinculado pode executar a sua obrigação.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 22 de Março de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 Actos unilaterais dos Estados e Organizações
Internacionais
 Têm apenas um sujeito autor;
 Conteúdos apontados e consolidados
doutrinalmente para os Estados e outros sujeitos
de DI – podemos considerar, como actos
jurídicos internacionais autónomos:
o Notificação – um sujeito de DI leva ao
conhecimento de outros sujeitos,
determinados factos ou posições, cujo
conhecimento para os destinatários é
determinante, pois os factos notificados
são-lhe oponíveis. Consiste no
conhecimento formal do facto, não
havendo possibilidade, a partir desse
momento, de invocar desconhecimento;
o Reconhecimento – declara que conhece
um determinado facto ou pretensão e
considera que ele é conforme com o DI,
atribuindo-lhe efeitos jurídicos numa
esfera jurídica. Passa a ser oponível ao
autor do acto, resultando daí
consequências jurídicas;
o Renúncia – um sujeito de DI abdica de um
direito ou vantagem a que tinha direito;
o Promessa – assunção de um dado
comportamento para o futuro, do
interesse dos sujeitos de DI. O seu
desrespeito acarreta consequências
jurídicas;
o Protesto – um sujeito de DI insurge-se
sobre um determinado
facto/comportamento/pretensão de um
outro sujeito de DI, por não ser conforme
com o DI. O protesto acarreta
consequências para o seu autor.
 Os feixes de Actos Jurídicos
Internacionais são actos distintos
com sujeitos distintos.
 Como actos jurídicos internacionais não-
autónomos, mas com efeitos jurídico-
internacionais, temos a adesão, denúncia ou
ratificação de um acto de DI. Os efeitos jurídicos
encontram-se regulados noutros actos de DI;
 Os actos jurídicos internacionais autónomos e
não-autónomos têm valor jurídico em relação ao
DI.
 Os actos jurídicos internacionais autónomos e
não-autónomos distinguem-se dos actos
jurídicos internos com repercussões
internacionais indirectas, que têm âmbito
jurídico interno. Como exemplo destes actos,
temos a aprovação de um acto de DI pelo órgão
de soberania do Estado;
 Regime jurídico:
o A inexigibilidade de requisitos formais,
reconhecendo-se a admissibilidade de
actos tácitos (por exemplo: o
reconhecimento), com a excepção da
publicidade. A publicidade é exigida para o
acto entrar na esfera jurídica dos
destinatários;
o Vinculam o respectivo autor ao conteúdo
do mesmo;
o Podem ser revogáveis, dependendo da
análise e do contexto em que foram
levados aos respectivos destinatários. São,
contudo, irrevogáveis por uma vontade
unilateral, arbitrária. A revogação não é
livre.
o Do seu conteúdo, resultam efeitos
jurídicos, isto é, direitos e obrigações;
o Para uma promessa ou reconhecimento,
pode bastar uma nota de imprensa, desde
que pronunciada por quem de direito.
 Os actos das Organizações Internacionais (OI)
o São actos unilaterais adoptados por órgãos
de DI, no quadro das respectivas
competências. Existe a possibilidade de
reconhecimento de um facto fora do
âmbito da organização ou da realização de
um protesto;
o Actos secundários para cumprir o tratado
constitutivo da organização;
o Actos de eficácia interna (por exemplo,
uma resolução do Conselho de Segurança
da ONU sobre ameaça à paz de um Estado
ou sobre matéria de funcionamento de um
órgão) e externa;
o Actos normativos (criam regras jurídicas
aplicáveis a uma dada situação) e não
normativos (situações individuais e
concretas, de natureza administrativa ou
regulamentar, com eficácia externa);
o Actos preceptivos (criam regras
vinculativas, com obrigações positivas ou
negativas) e programáticos (orientações
para a acção dos destinatários, não
vinculativas);
o Actos exequíveis (executados
imediatamente – self-executing – pelas OI
e tribunais) e não exequíveis (necessitam
de um acto nacional para garantir a sua
exequibilidade);
o Os actos da AG e do CS das Nações Unidas
 Na opinião de alguns autores, os
actos do Conselho de Segurança
apresentam aplicabilidade directa
(actos exequíveis). A questão
também se colocou em Portugal, a
propósito do artigo 8.º, n.º3 da CRP,
discutindo-se se esta disposição
abrangeria as resoluções do
Conselho de Segurança. Recorde-se
que o referido artigo foi integrado
na Lei Fundamental a pensar na
integração de Portugal na
Comunidade Económica Europeia
(hoje União Europeia). De todo o
modo, a Carta das Nações Unidas
determina a vinculação dos Estados
às resoluções, mas não prevê a sua
aplicabilidade directa. Tal facto
revela-se importante, por exemplo,
no caso de um tribunal poder
aplicar, de imediato ou não, a
resolução. Devemos, assim, concluir
que os actos das NU não gozam de
aplicabilidade directa;
 As resoluções da Assembleia-Geral
das Nações Unidas não são
juridicamente vinculativas nas
esferas jurídicas dos sujeitos de DI.
Já as resoluções do Conselho de
Segurança são vinculativas ou
preceptivas, constituindo-se uma
obrigação de respeito dos membros
das Nações Unidas pelas proibições
e medidas prescritas;
o Os actos das instituições da União
Europeia
 Os regulamentos da União Europeia
têm aplicabilidade directa na ordem
jurídica interna dos Estados-
membros, podendo-se assim exigir à
Administração Pública que os
cumpra;
 Também a Convenção Europeia dos
Direitos do Homem tem
aplicabilidade directa na ordem
jurídica dos Estados-membros.

 Direito Internacional: Os Princípios Gerais de Direito


o O artigo 38.º do ETIJ faz referência aos outros elementos que
o Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça prevê como
passíveis de uso pelo Tribunal para resolução de litígios;
o Decisão ex aequo et bono ≠ Equidade – trata-se de uma
distinção de matriz anglo-saxónica adoptada
internacionalmente.
 A decisão ex aequo et bono é uma decisão jurídica não
normativa, de natureza material, para encontrar uma
solução razoável adequada. A faculdade de decisão ex
aequo et bono está condicionada, dada a existência de
normas inderrogáveis e a sujeição à vontade das
partes. Nunca o TIJ decidiu ex aequo et bono, o que
significa o afastamento do Direito dentro do que as
partes envolvidas permitem;
 A equidade integra-se nos princípios gerais de Direito,
que permite ao tribunal, na interpretação do Direito
positivo, suavizá-lo ou complementá-lo segundo
princípios equitativos (equidade infra legem ou
secundum legem). Muitas vezes, é o próprio Direito
positivo que aponta para a adopção de critérios
equitativos na aplicação das normas. Por exemplo, a
Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,
celebrada em Montego Bay (Jamaica) prevê a sua
interpretação à luz de princípios equitativos. O TIJ é
bastante profícuo na aplicação da equidade, não
necessitando de acordo das partes para a sua
aplicação, como se pôde verificar no caso “Plataforma
Continental”, de 1969, em que se verificou a
flexibilização das normas jurídicas através do recurso a
princípios equitativos.
 Aplicação de “considerações de humanidade” e de
“interesses legítimos” do ponto de vista económico-
financeiro a considerar na aplicação do Direito Positivo.

o Hierarquia do DI – elementos que compõem o Direito


Internacional (elementos normativos em sentido amplo)
 A concepção tradicional não era favorável à existência
de uma hierarquia do DI, com atribuição de um valor
superior ou inferior;
 Esta polémica ganha mais relevância após à II Guerra
Mundial, com a importância adquirida pelos princípios
fundamentais;
 Critério Formal – o artigo 103.º da Carta das Nações
Unidas propõe uma concepção piramidal dos
elementos normativos, sendo que os tratados
celebrados não podem ser contrários à Carta, sejam
eles anteriores ou posteriores a esta (não importa o
elemento cronológico);

Artigo 103º

No caso de conflito entre as obrigações dos membros das Nações Unidas em virtude
da presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional,
prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente Carta.
 Ao contrário das concepções voluntaristas, o critério
ético-valorativo reconhece a existência de um
conjunto de normas internacionais, que plasmam
princípios fundamentais, sobrepondo-se a todos os
restantes elementos normativos. Estamo-nos a referir
ao Direito imperativo que não pode ser afastado – ius
cogens.
 O ius cogens não é consensual, mas tem uma
aceitação cada vez maior;
 Todo o tratado contrário ao ius cogens incorre na
sua nulidade, pois viola normas inderrogáveis,
que só podem ser afastadas por normas de valor
idêntico;
 Todavia, existe uma dificuldade de determinação
e concretização do ius cogens, para além dos
riscos inerentes ao seu reconhecimento.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 26 de Março de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Apreciação de 3 casos julgados pelo Tribunal Internacional de
Justiça
o “Caso Plataforma Continental do Mar do Norte” (1969)
 Os factos e as alegações das partes
 Em 20 de Fevereiro de 1967, ocorreu o depósito
na Secretaria do Tribunal Internacional de Justiça
de dois compromissos, um concluído entre a
República Federal da Alemanha e os Países
Baixos, de 1 de Dezembro de 1964, e outro entre
a República Federal da Alemanha e a Dinamarca,
de 9 de Junho de 1965, ambos relativos à
delimitação das zonas da plataforma continental
do Mar do Norte pertencentes a esses países;
 Por decisão de 26 de Abril de 1968, o Tribunal
reuniu os dois processos e pronunciou-se, em
sentença proferida por 11 votos contra 6, em 20
de Fevereiro de 1967;
 Na sentença, o Tribunal examinou, para decidir
sobre as delimitações em causa, os problemas
relacionados com o regime jurídico da
plataforma continental levantados pelas partes;
 Objecto da disputa jurídica, a plataforma
continental é a parte do leito do mar adjacente à
costa, cuja profundidade em geral não excede
duzentos metros e que, a uma boa distância do
litoral, cede lugar às inclinações abruptas que
conduzem aos fundos marinhos. Sobre essa
plataforma e o seu subsolo, o Estado costeiro
exerce direitos soberanos de exploração dos
recursos naturais;
 A plataforma continental possui até hoje
relevante importância económica para os países
em questão. Diante dessa circunstância, os
países relacionados na disputa apresentaram à
Corte suas propostas e argumentos no intuito de
garantir seus direitos;
 A Dinamarca e os Países Baixos propuseram que
as delimitações deveriam ser feitas de acordo
com o “Princípio da Equidistância” (art. 6º da
Convenção de Genebra de 1958) sobre a
Plataforma Continental. Diz essa regra que se
não houver acordo entre as partes com o
objectivo de empregar outro método de
delimitação de plataforma continental, deve-se
aplicar o princípio da equidistância, salvo se a
existência de circunstâncias especiais for
reconhecida. Uma “Linha de Equidistância” é
construída, atribuindo a cada uma das partes
interessadas todas as porções da plataforma
continental mais próximas de um ponto da sua
costa que de qualquer ponto situado sobre a
costa da outra parte;
 Segundo a Dinamarca e os Países Baixos, a
República Federal da Alemanha estaria obrigada
a aceitar o método da equidistância em matéria
de delimitação, já que o emprego de tal método
provém de uma regra de direito internacional
geral ou costumeira;
 Os países autores acrescentaram que, mesmo
não existindo à época da Convenção de Genebra
nenhuma regra de direito internacional
costumeiro consagrando o princípio da
equidistância, tal regra teria surgido após a
Convenção, através da influência exercida por
esta e da prática dos Estados;
 A RFA, por sua vez, não concordava com a
aplicação do princípio da equidistância como
critério a ser utilizado para a delimitação porque,
segundo ela, reduziria drasticamente o que ela
estimava dever ser a sua justa parte da
plataforma continental em proporção ao
comprimento de seu litoral. A proposta
germânica era que a regra a ser aplicada seria
aquela, segundo a qual, cada um dos Estados em
causa deveria obter, proporcionalmente ao
comprimento do seu litoral, uma parte “justa e
equitativa” da plataforma continental disponível.
Tendo em vista a forma do Mar do Norte, cada
um dos Estados interessados poderia pretender
que a sua zona da plataforma continental se
estendesse até o ponto central do mar ou pelo
menos atingisse a sua linha mediana;
 Segundo o entendimento do Tribunal, uma vez
que a República Federal da Alemanha não
ratificou a referida Convenção, não estava
juridicamente obrigada pelos dispositivos do
artigo 6º, pois, ainda que a RFA tivesse ratificado
a Convenção de Genebra, poderia ter formulado
reserva ao art. 6º, conforme o disposto no artigo
12.º;
 A Dinamarca e os Países Baixos insistiam,
sustentando que o regime do artigo 6º da
Convenção teria se tornado obrigatório para a
Alemanha, que havia aceitado as obrigações da
Convenção pelo seu comportamento, as suas
declarações públicas e proclamações;
 O Tribunal discordou desse argumento,
afirmando que, no momento em que vários
Estados concluíram uma convenção que
especificava que a intenção de estar vinculado
pelo regime convencional dever-se-ia manifestar
de uma determinada maneira, não se poderia
presumir que um Estado que não tenha
cumprido essas formalidades estivesse vinculado
de outra maneira;
 Sobre o princípio da equidistância, o Tribunal
expressou a sua análise, afirmando que tal
princípio não se impunha como uma
consequência necessária da concepção geral do
regime jurídico da plataforma continental e não
era uma regra de Direito Internacional
costumeiro. Isso era confirmado pelo facto de
que o todo Estado poderia formular reservas ao
artigo 6º da Convenção;
 Mesmo propondo o princípio de uma repartição
da plataforma continental em partes justas e
equitativas, o Tribunal não aceitou a tese alemã.
O Tribunal considerou que cada parte tinha, a
princípio, direito às zonas da plataforma
continental que constituíssem o prolongamento
natural de seu território sob o mar. Não se
tratava de repartir ou partilhar essas zonas, mas
de delimitá-las;
 A doutrina da parte justa e equitativa, proposta
pela Alemanha, afastava-se totalmente da mais
fundamental das regras de direito relativas à
plataforma continental: os direitos do Estado
costeiro concernentes à zona de plataforma
continental que constitui um prolongamento
natural do seu território sob o mar existem em
virtude da soberania do Estado sobre este
território. O Tribunal concluiu que a situação
jurídica não obrigava as partes a aplicar o
método da equidistância, seja sob a Convenção
de 1958, seja como regra obrigatória de direito
internacional geral ou costumeiro. Assim, o seu
papel foi indicar às partes os princípios e regras
de direito em função dos quais a delimitação
deveria ser feita. Dispôs a sentença que, durante
as negociações, os factores a serem
considerados deveriam compreender:
o a configuração geral das costas das partes
e a presença de todas as características
especiais ou incomuns;
o a estrutura física e geológica e os recursos
naturais das zonas da plataforma
continental em causa, visto que são
conhecidos ou fáceis de determinar;
o a relação razoável que uma delimitação
operada em conformidade com princípios
equitativos deveria manter entre a
extensão das zonas da plataforma
continental pertencentes a cada Estado e a
largura de seu litoral medida seguindo a
direcção geral deste, levando-se em
consideração os efeitos actuais ou
eventuais de qualquer outra delimitação
da plataforma continental efectuada na
mesma região.

 Em resumo:
 Em 20 de Fevereiro de 1967, foram
apresentadas, junto do TIJ, reclamações
referentes à delimitação da plataforma
continental entre a República Federal da
Alemanha e Dinamarca, por um lado, e entre a
República Federal da Alemanha e da Holanda,
por outro. As partes solicitaram ao Tribunal que
aplicasse os princípios e normas do direito
internacional e, posteriormente, definisse os
limites a esse título;
 O TIJ rejeitou a alegação da Dinamarca e dos
Países Baixos, baseada em que essas
delimitações deviam realizar-se sob o princípio
da equidistância, definido no artigo 6.º da
Convenção de Genebra sobre a Plataforma
Continental (1958)8, que constituiria a
consagração escrita do direito consuetudinário
preexistente, relativo à “soberania” sobre o solo
e o subsolo. Para a tomada desta posição,
defende que:

8
Dinamarca e Países Baixos alegam que, a partir de 1958, este artigo constituía uma norma costumeira,
de acordo com a prática reiterada dos Estados. Se o artigo 6.º da Convenção fosse entendido como
costume, a RFA estaria necessariamente vinculada, por se tratar de uma norma costumeira
preexistente. O TIJ procura verificar se o artigo 6.º se terá consolidado como costume, pela prática
constante e uniforme. Para tal, apura o número de ratificações da Convenção e número de acordos de
delimitação da Plataforma Continental. Em relação a este último parâmetro, constata que foram apenas
15 acordos, um número muito pouco representativo, o que afasta a existência de uma prática uniforme.
Assim, o TIJ considera que estar-se-á, porventura, perante um costume embrionário, mas não um
costume consolidado.
 A República Federal da Alemanha, que não havia
ratificado a Convenção, não estava legalmente
vinculada às disposições do seu artigo 6.º, o que
contudo, não impede a formação de costumes
gerais;
 O princípio da equidistância não era uma
consequência necessária do conceito geral dos
direitos sobre a plataforma continental, nem
constituía uma norma de direito consuetudinário
internacional. Assim, considera que a Dinamarca
e a Holanda terão invertido o processo de
formação do costume (ver artigos 70.º e
seguintes do acórdão).9
 O TIJ rejeitou também as alegações da República
Federal da Alemanha, na medida em que
pretendia que fosse aceite o princípio da
distribuição da plataforma continental em partes
justas e equitativas. Decidiu que cada uma das
partes tinha um direito original sobre aquelas
áreas da plataforma continental, que constituíam
a extensão natural do seu território no mar e sob
ela. Não se tratava de distribuir ou repartir essas
áreas, mas de delimitá-las;
 O TIJ decidiu que as fronteiras (linhas de
delimitação) deviam ser definidas por acordo
entre as partes e sob princípios de equidade, e
indicou determinados factores que se teriam de
considerar com esse fim. Correspondia às partes
negociar sobre a base desses princípios, com
tinham aceitado fazer.10
 O TIJ entende que não há lugar a decisão ex
aequo et bono, isto é, aplicação de uma justiça
9
Recorde-se que, para a formação de um costume, tem de existir um elemento material (corpus)
articulado com o elemento subjectivo (animus).
10
Os artigos 85.º a 94.º do acórdão fazem referência à Convenção de Genebra e à Declaração Truman,
que reivindica que a delimitação se faria de acordo com uma negociação séria entre as partes,
atendendo às circunstâncias especiais, e recorrendo a princípios equitativos.
abstracta ao caso concreto, a partir da convicção
do julgador, pois os Estados pretendem uma
decisão ainda de Direito, que remeta para
princípios equitativos (equity), considerando os
interesses especiais dos sujeitos (questões de
orografia da costa), como por exemplo o
princípio da proporcionalidade, dotado de
flexibilização, em busca de uma decisão justa;
 Os Estados autores pretendiam uma decisão
igual, com uma divisão em três partes
semelhantes, mas note-se que uma decisão
equitativa não é uma decisão igualitária. Uma
decisão equitativa considera as circunstâncias
especiais para uma decisão justa e equilibrada.

 Como vários Estados possuem uma plataforma


continental mais extensa que a aceite na Convenção
das Nações Unidas sobe o Direito do Mar (1982), esta
fornece indicações para os Estados interessados
submeterem as suas reivindicações em relação à
extensão da sua plataforma continental a uma
Comissão de Limites da Plataforma Continental,
igualmente estabelecida na Convenção;
 Também Portugal apresentou, recentemente, junto das
Nações Unidas, uma reclamação sobre os direitos do
nosso país sobre a plataforma continental;

o “Caso de Haya de la Torre ” (1950 e 1951)


 Os factos e as alegações das partes
 O caso de Haya de la Torre teve como Estados
intervenientes a Colômbia e o Peru;
 O facto que motiva a existência deste caso é o
asilo diplomático11 concedido, nos dias 3 e 4 de
Janeiro de 1949, pelo embaixador da Colômbia
em Lima, a Víctor Raúl Haya de la Torre,
fundador e líder da Alianza Popular
Revolucionaria Americana, responsável pela
tentativa falhada de golpe de Estado que ocorreu
no Peru, em 3 de Outubro de 1948. Haya de la
Torre estaria a ser perseguido pelas autoridades
peruanas e o governo colombiano decidiu
conceder-lhe asilo diplomático. Todavia, o
governo peruano queria capturá-lo enquanto ele
esteve em solo peruano12;
 A Colômbia afirmou que, de acordo com as
convenções em vigor – Convenção de Havana
sobre Asilo (1928) e a Convenção de Montevideu
sobre Asilo Político (1933) – e segundo o direito
internacional americano tinha direito para
decidir se a Haya de la Torre deveria ser dado
asilo, sendo que a sua decisão unilateral
vincularia o Peru. Note-se que, segundo a
Convenção de Montevideu, o asilo diplomático
implica a entrega do asilado às autoridades do
seu Estado;
 O acto praticado por Haya de la Torre havia sido
considerado delito comum, não sendo, portanto,
susceptível de asilo político;
 O TIJ declara que Haya de la Torre terá de ser
entregue, de acordo com a Convenção de

11
Importa distinguir o asilo político do asilo diplomático: enquanto o asilo político consiste numa forma
de protecção concedida a um estrangeiro, perseguido no seu território por delitos políticos, convicção
religiosa, situação racial; o asilo diplomático é concedido por um Estado, não no seu território, mas no
próprio território do Estado responsável pela perseguição do asilado, em locais imunes à jurisdição
deste, como por exemplo em embaixadas e representações diplomáticas, e em situações com carácter
temporário e de emergência.
12
Esta situação assemelha-se ao recente caso protagonizado pelo presidente deposto das Honduras,
Manuel Zelaya, que se encontra sob asilo diplomático do Brasil, na sua embaixada em Tegucigalpa.
Montevideu, às autoridades peruanas. A
Colômbia recusa-se fazê-lo;
 Peru e Colômbia integravam a Convenção de
Havana, que, contudo, não regulava
especificamente o que devia ser feito nestas
situações. Já a Convenção de Montevideu
regulava, no sentido de ser do Estado que
conferia protecção a qualificação do delito;
 Ora, note-se que o Peru recusou-se a assinar a
Convenção sobre Direitos e Deveres dos Estados
(Convenção de Montevideu, 1933), não estando
a ela vinculada. Por outro lado, poderíamos
considerar que o Peru estaria vinculado a uma
norma costumeira geral. Mas, na verdade, esta
norma não existe;
 No julgamento realizado em 20 de Novembro de
1950, o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ)
reconheceu que o artigo 38.º do Estatuto do
Tribunal Internacional de Justiça admite a
possibilidade dos costumes regionais, que
possam vincular a América Latina, apresentando
contudo especificidades. É importante
considerar a relevância da objecção, que se
demonstra mais determinante para a vinculação
dos Estados objectores. O Peru manifesta-se
reiteradamente contra a Convenção de
Montevideu, não estando vinculado à ela ou a
qualquer costume regional;
 O TIJ concluiu que não há costume regional, pois
estamos perante uma prática muito
inconsistente e a adesão a essa prática era
apenas uma manifestação de conveniência
política e não por ser juridicamente obrigatória.
Podemos assim concluir que, no que concerne ao
elemento psicológico (opinio iuris atque
necessitatis), esta prática não está dotada de
juridicidade. A norma da Convenção de 1933 não
era consuetudinária;
 O acórdão de 13 de Junho de 1951 diz respeito,
por seu turno, à exigência feita pelo Peru de
entrega imediata de Haya de la Torre, pois não
lhe havia sido concedido asilo político. A
Colômbia recusa-se a fazê-lo. Nesse caso, a
Colômbia tê-lo-ia de levar para o seu território,
conferindo o Peru um salvo-conduto13, para se
evitar a hipótese de detenção do asilado pelas
autoridades peruanas;
 O TIJ pronuncia-se sobre esta matéria e não
entende que haja lugar a uma entrega
obrigatória, dada a não vinculação do Peru à
Convenção de Montevideu (1933). Devem,
assim, os Estados negociar de boa-fé e encontrar
uma resolução pacífica para o diferendo
existente;
 Note-se que a concessão de asilo político por um
Estado implica a colocação em causa do regime
político do país de origem do asilado. Por este
motivo, esta solução não se revela, na maior
parte dos casos, viável;
 O TIJ apenas até vinculado à emissão de um
acórdão sobre a matéria que lhe foi colocada,
salvo se estivermos perante o domínio do
inquisitório, havendo então lugar a decisões que
extravasam a questão colocada.

13
Salvo-conduto é um documento emitido por autoridades de um Estado, que permite ao seu portador
transitar por um determinado território. O trânsito pode ocorrer de forma livre ou sob escolta policial
ou militar.
o “Caso do Direito de Passagem sobre o Território Indiano
(Portugal v. Índia) ” (1955-1960)
 Os factos e as alegações das partes
 A Índia procura acabar com os resquícios de
colonialismo no seu território. Para tal, decide
criar dificuldades de acesso dos portugueses aos
seus enclaves. A isto, acresce a resistência
crescente que colocava em causa a autoridade
de Portugal;
 Este caso entre Portugal e Índia foi submetido ao
TIJ por um requerimento do governo português,
no qual solicitou que o TIJ declarasse e julgasse
que Portugal era titular ou beneficiário de um
direito de passagem entre o seu território de
Damão14, os seus enclaves de Dadra e Nagar-
Aveli e entre cada um dos últimos, e que esse
direito compreendia a faculdade de trânsito de
pessoas e mercadorias, incluindo forças
armadas, sem restrições ou dificuldades e na
forma e medida requerida para o efectivo
exercício da soberania portuguesa nos referidos
territórios. Portugal ainda alegou que a Índia, ao
impedir o exercício do direito em questão,
atentou contra a soberania portuguesa sobre os
seus enclaves, bem como violou as suas
obrigações internacionais. O Estado Português
requereu que o TIJ decidisse que a Índia devesse
pôr um fim imediato nesta situação, permitindo
que Portugal exercesse o direito de passagem
reivindicado. O requerimento referiu-se
expressamente ao artigo 36.º (2.º parágrafo) do
ETIJ e às declarações através das quais Portugal e
Índia aceitaram a jurisdição obrigatória do TIJ.

14
Recorde-se que Goa, Damão e Diu foram possessões portuguesas até 19 de Dezembro de 1961,
aquando da ocupação pela União Indiana.
Artigo 36.º

(…)

2 - Os Estados partes do presente Estatuto poderão, em qualquer momento, declarar


que reconhecem como obrigatória ipso facto e sem acordo especial, em relação a
qualquer outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição do Tribunal em
todas as controvérsias jurídicas que tenham por objecto:

a) A interpretação de um tratado;

b) Qualquer questão de direito internacional;

c) A existência de qualquer facto que, se verificado, constituiria violação de um


compromisso internacional;

d) A natureza ou a extensão da reparação devida pela ruptura de um compromisso


internacional.

(…)

 Como se entende, Portugal reclama o exercício


do poder soberano naqueles territórios,
alegando inclusive que celebrou acordos escritos
não solenes no século XVIII, em que lhe é
conferida autoridade para administrar e se
impor. A Índia, por seu turno, contesta a
juridicidade destes actos, entendendo que não
constituíam fonte de DI e colocando em causa,
também, o seu alcance jurídico, isto porque
alguns dos actos eram acordos unilaterais de
senhores dos territórios. Note-se, contudo, que
os tratados não estão sujeitos a requisitos
formais escritos, o que aliás é declarado pelo
próprio TIJ;
 O TIJ procura, então, averiguar as relações entre
o Estado Português e a Coroa Britânica, no
século XIX, e o modo como se desenvolveram.
Estas relações estabeleciam-se através de
tratados e práticas levadas a cabo;
 Deste modo, Portugal alega que, pela existência
de uma prática constante, estamos perante uma
norma costumeira. A Índia rejeita esta posição,
não admitindo a existência de um costume local;
 O TIJ considera que pode haver lugar à existência
de um costume local, gerado numa relação entre
Portugal e as autoridades britânicas com a Índia,
que não colocou entraves à situação então
verificada;
 Resta verificar o alcance deste costume local. A
imposição de regras sobre os povos locais revela
uma soberania plena sobre os habitantes dos
territórios. Considera o TIJ que Portugal tem,
também, um absoluto direito de passagem, o
que lhe possibilitava a passagem de mercadorias
e pessoas, sem entraves ou necessidade de
autorização / notificação, de natureza civil;
 Agora, a questão principal relaciona-se com a
administração e o envio de forças policiais para
aquele território. A prática resulta de uma
convenção entre a Grã-Bretanha e Portugal,
datada do século XIX, que possibilitava a
passagem até 10 homens portugueses, sem
autorização, e a partir de 10 homens, com
autorização prévia. Esta obrigação não terá sido
respeitada em determinados momentos. Ora,
dada a necessidade de ter autorização para
passar, tal significa que não existe um direito de
passagem das autoridades portuguesas, que a
Índia não mais estava disposta a dar;
 O abandono dos territórios pelos portugueses
acabará por ocorrer, pouco tempo depois da
decisão do TIJ, após invasão ilegal protagonizada
pelos indianos;
 Na sequência deste caso, a Índia deixou de
conceder jurisdição ao TIJ para julgar casos em
que esteja envolvida. Tal facto impossibilitou o
recurso de Portugal, para o TIJ, da ocupação
ilegal dos seus territórios.

 Portugal esteve, até ao momento, envolvido em


3 casos julgados pelo TIJ:
o 1955-1960 – “Caso do Direito de Passagem
sobre o Território Indiano (Portugal v.
Índia) ”;
o 1991 – “Caso Timor-Leste (Portugal v.
Austrália);
o 2004 – “Caso Legalidade do Uso da Força
(Sérvia e Montenegro v. Portugal).

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 9 de Abril de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Princípios Gerais de Direito
o Hierarquia das normas de DI (regras e princípios)
 Artigo 103.º CNU – impossibilidade de celebração de
tratados contrários à Carta (hierarquicamente
superior), independentemente do conteúdo;
o Hierarquia das normas e fontes de DI – Princípios Gerais de
Direito
 Não se admitia uma hierarquia. Note-se que costume e
tratados encontram-se equiparados, enquanto fontes
de Direito, utilizando-se os critérios da especialidade
(lei especial derroga lei geral) e temporal (lei posterior
derroga lei anterior) para definir qual a norma a aplicar.
Todavia, actualmente, considera-se que há uma
hierarquia, nomeadamente em sede de princípios
gerais de DI, atendendo ao seu carácter axiológico, que
têm por isso um valor superior às normas pactícias ou
costumeiras;
 O TIJ reconhece a existência de um conjunto de
princípios imperativos oponíveis erga omnes. Fá-lo de
modo claro no acórdão do caso Nicarágua vs. EUA, com
os princípios da proibição do uso da força ou o
princípio da não ingerência;
 No acórdão de 2006, sobre o caso Congo vs Ruanda, o
TIJ atribui carácter de ius cogens a determinados
princípios. Reconhece que normas relativas à proibição
do genocídio são ius cogens. Assim, estabelece-se uma
hierarquia de DI;
 O TIJ reconhece a necessidade de considerar uma
hierarquia no parecer acerca do uso de armas
nucleares. Mesmo em situações-limite, que podem
justificar o uso de armas nucleares, como meio de
defesa, o Estado encontra-se condicionado às normas
de Direito Internacional Humanitário (DIH)15. Não
aplica a expressão ius cogens, mas o modo como
efectua esta salvaguarda significa que estamos perante
Direito Cogente;
 Há cada vez mais autores a reconhecerem a existência
de um conjunto de princípios fundamentais, essenciais
para a sobrevivência da comunidade, e que por ela
foram densificados e consagrados. Há uma
consciencialização jurídica da comunidade
internacional, que se traduz num conjunto de actos
positivos de DI (suporte de princípios fundamentais);
 Estes princípios são reconhecidos por todos como
emergentes na ordem internacional,
independentemente do seu fundamental, com
15
O Direito Internacional Humanitário (DIH) é um conjunto de normas que, em tempo de guerra,
protege as pessoas que não participam nas hostilidades ou deixaram de participar. O seu principal
objectivo é limitar e evitar o sofrimento humano em tempo de conflito armado. As normas consagradas
nos tratados de DIH devem ser respeitadas, não somente pelos governos e as suas forças armadas, mas
igualmente pelos grupos armados opositores ou por qualquer outra parte num conflito. As quatro
Convenções de Genebra de 1949 e os seus dois Protocolos Adicionais de 1977 são os principais
instrumentos do direito humanitário.
plasmação positiva. Oriundos do Direito interno,
contidos no quadro da ordem jurídica interna,
nomeadamente no quadro do Direito Privado, que
foram valendo para o Direito Público e Internacional;
 Não existe um quadro de princípios processuais e de
prova uniforme, para a resolução de litígios, em sede
de DI. Os primeiros tribunais internacionais16 eram
arbitrais, sendo o processo conduzido pelas partes,
sem normas de Direito Processual. Todavia, verifica-se
a admissibilidade de determinados princípios
processuais e de prova em DI;
 O princípio do estoppel, de origem anglo-saxónica,
aplica-se quando alguém procede de determinado
modo e a sua prática não tem cobertura legal, no
momento da sua constituição. Significa que uma parte
num processo vê precludido o direito de adoptar uma
atitude que contradiz o que ela expressa ou
implicitamente admitiu anteriormente, se da adopção
da nova atitude resulta prejuízo para a contra-parte.
Assim, qualquer pessoa não pode pretender eliminar
uma prática ilícita que realizou e solidificou, como
decorre do princípio do consentimento;
 Os princípios gerais de Direito Internacional, de
natureza jurídico-política, constam da Resolução 2625;
 Princípio da responsabilidade pelos actos ilícitos
realizados e pelos danos causados ou pelo risco
gerado. A propósito do risco gerado, note-se a
existência de comportamento lícitos adoptados que
podem acarretar danos para outros Estados, havendo a
possibilidade de pagamento de indemnização. Nestes
casos, revela-se determinante a autorização dos outros
Estados para a prática desse comportamento. Tal
exigência aplica-se, por exemplo, para a prática de
actividade perigosa junto da fronteira de outro Estado;
16
Recorde-se que o primeiro tribunal internacional foi o Tribunal Permanente de Justiça Internacional
(TPJI). Foi sucedido pelo Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), em 1946.
 Admissibilidade de princípios gerais restritos (≠
comuns, anteriormente referidos)
 Princípios gerais comuns – podem ter alcance
distinto em áreas restritas;
 Princípios gerais restritos – vigoram apenas para
alguns sujeitos de DI. Há que admitir princípios
gerais mais restritos, como por exemplo aqueles
que se relacionam com matéria de asilo político
e vigoram na América Latina. Também o
princípio da não ingerência tem uma especial
conotação nesta latitude. Esta realidade
relaciona-se com o carácter fragmentário do DI.

o Dificuldade de aceitar estes princípios como um


renascimento do Direito Natural
 O Direito Natural viveu a sua “idade de ouro” até ao
Positivismo (século XIX). Verifica-se algum
renascimento já no século XX. Revela alguma
dificuldade de adaptação à realidade internacional,
dada a fixação de princípios imutáveis que não
correspondem à evolução necessária da sociedade,
assente em relações voluntárias entre Estados;
 O reconhecimento da existência de princípios
fundamentais de DI não implica uma vinculação ao
Direito Natural.

o Funções dos Princípios Gerais de Direito (PGD)


 Legitimadora – núcleo axiológico essencial da ordem
jurídica internacional. Os princípios, sobretudo os de
coloração ética, permitem questionar a legitimidade
material das normas ou de outros princípios que com
eles estejam desconformes, podendo provocar a
respectiva invalidade material;
 Interpretativa – os princípios permitem determinar
preferências, entre as várias soluções hermenêuticas,
de outro modo todas igualmente possíveis;
 Integradora – os princípios possibilitam integrar
lacunas de regulamentação, assim, se colmatando a
ausência de critérios de decisão, derivada da falta de
normas especificamente aplicáveis. Dão uma solução
jurídica a uma situação que o exija, não ficando assim
desprovida desta, e garantindo a coesão da ordem
jurídica de Direito Internacional;
 Complementadora – os princípios têm a virtualidade
de, regulativamente, alargar a extensão da aplicação do
direito internacional. Determinação do alcance das
normas de DI, quando há um entendimento diverso.

o O ius cogens
 Normas imperativas, que não estão disponíveis à
vontade das partes, isto é, não podem ser afastadas
por elas;
 Trata-se de uma questão central do DI, no quadro da
Escola Espanhola Jusnaturalista. Note-se a importância
assumida por Hugo Grócio;
 Conjunto de princípios fundamentais à comunidade
internacional que se impunham às partes. Veja-se, a
propósito do princípio da proibição do uso da força, a
discussão sobre a licitude da “Guerra Justa” e a sua
admissibilidade;
 Verifica-se uma decadência do ius cogens com o
Positivismo, com o voluntarismo a afastar a existência
de normas imperativas involuntárias, que impõem
proibições de comportamentos. Os positivistas não
reconhecem a existência de normas que não surgem da
vontade das partes e que por elas não podem ser
afastadas;
 Ressurge já em pleno século XX, aquando da ocorrência
de factos insustentáveis, como crimes contra a
Humanidade e crimes de guerra;
 Discussão exaustiva sobre o ius cogens nas décadas de
50 e 60;
 Com a Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados (CVDTE), temos a consagração do ius cogens.
Trata-se de uma convenção geral, subscrita por um
número significativo de sujeitos, o que manifesta uma
adesão efectiva ao ius cogens. Nos termos desta
convenção, o ius cogens assume uma dimensão real e
concreta, passível de suscitar questões e conflitos,
competindo ao TIJ declarar a violação de ius cogens.
 O artigo 53.º CVDTE determina a nulidade de um
tratado com norma contrária a ius cogens;
 O artigo 64.º CVDTE refere-se a situações de
incompatibilidade superveniente, com a entrada
em vigor de norma de ius cogens;
 O artigo 71.º CVDTE apresenta as consequências
da existência de uma incompatibilidade entre
tratado e norma imperativa de Direito
Internacional Geral.

 De acordo com o artigo 53.º CVDTE, por norma de ius


cogens entende-se toda aquela que se encontra dotada
da característica de inderrogabilidade e que só pode
ser alterada por norma de DI com a mesma natureza.
 Problemas / Admissibilidade:
o O reconhecimento da existência de ius
cogens, enquanto princípios gerais com
carácter de inderrogabilidade e de
indisponibilidade da vontade das partes,
não é unânime. Para os autores cépticos,
verifica-se a impossibilidade de controlo
dos seus efeitos;
o Definição de ius cogens em termos
abstractos;
o Determinação das normas de ius cogens.
Os Princípios Gerais de Direito já assumem
este estatuto superior;
o Jurisprudência céptica – começa a revelar
abertura a estas normas a partir da década
de 70, com a existência de normas
internacionais imperativas, inderrogáveis e
oponíveis erga omnes. Em 2006, pela
primeira vez, utiliza a expressão ius
cogens, no acórdão do caso Congo vs
Ruanda, a propósito da proibição do
genocídio. Verifica-se um reconhecimento
das normas substantivas da Convenção de
Genebra (1949). Colocava-se em questão
se as regras de competência do TIJ
(normas de garantia) eram consideradas
ius cogens, sendo que, nesta matéria o
tribunal não admitiu ius cogens. Esta
situação resultou na não apreciação de
casos de genocídio cometidos pelo
Ruanda, devido à declaração de
incompetência do TIJ. Aliás, o Ruanda,
quando assinou a Convenção, apresentou
uma reserva sobre as normas de garantia
relativas à competência do TIJ17;
17
O TIJ elaborou um parecer em que considerou admissíveis reservas relativas à garantia destas normas
pelo TIJ.
o No quadro da América Latina, já foi
reconhecido pelo Tribunal Interamericano
de Direitos Humanos (TIDH) a existência
de ius cogens em relação aos direitos de
acesso a tribunal nacional e internacional
de Direito imperativo e inderrogável. Tem-
se procurado garantir a eficácia destas
normas de ius cogens em sede de tribunais
da América Latina;
o De acordo com a definição de ius cogens
da CVDTE, trata-se de normas de DI geral,
que têm de ser admitidas por toda a
comunidade internacional. Logo, não se
admite ius cogens regional, isto é, a
possibilidade de reconhecimento de ius
cogens numa sede mais restrita. Impõe-se
um número representativo, em termos
quantitativos e geográficos, que possa
corresponder à comunidade global (não
implica a totalidade);
o A propósito da inderrogabilidade do ius
cogens, uma norma só pode ser alterada
por outra de idêntico valor, assim
qualificada pelos sujeitos de DI. O
princípio da soberania18 constitui um valor
fundamental dos Estados, mas não faz
sentido atribuir-lhe valor de ius cogens,
pois este só deve abranger normas
reguladoras de comportamentos (sujeito
a perversibilidade). Apenas nestas
circunstâncias faz sentido a questão da
inderrogabilidade;
o Características do ius cogens –
imperatividade e Inderrogabilidade – as

18
Soberania constitui um conceito indispensável de DI, que qualifica o estatuto dos Estados.
normas de ius cogens não podem ser
afastadas ou restringidas, podendo ser
alteradas por norma superveniente de
igual valor;
o Artigo 2.º, n.º4 da CNU – proibição do uso
da força
 Contra práticas atentatórias da
independência política e económica;
 Trata-se de um princípio
fundamental, para fazer direitos na
ordem jurídica internacional;
 Sendo considerado ius cogens, fica
com carácter absoluto, o que não se
identifica com a admissibilidade de
uso da força em situações
excepcionais, como casos de ruptura
ou ameaça à paz, em que é
conferida legitimidade ao uso da
força;
 Este artigo remete para as
condições estabelecidas para o uso
da força. Assim, entende-se que o
carácter absoluto do ius cogens não
se coaduna com estas
circunstâncias;
 Também em situação de legítima
defesa é admissível o uso da força
(em face de ataque armado). Aliás,
encontra-se consagrado na Carta
das Nações Unidas como Direito
Natural, o que leva a considerar-se
um princípio de ius cogens, que
comprime a proibição do uso da
força.
o O problema do ius cogens prende-se com
a sua inderrogabilidade. Na opinião de
Wladimir Brito, este aspecto não deve ser
considerada para caracterizar o ius
cogens, na medida em que não constitui
característica de qualquer norma. Na
verdade, não há princípios absolutos;
o Admite-se, por outro lado, a
imperatividade e a indisponibilidade de
afastamento da norma. Agora, deve
entender-se a possibilidade de
derrogação, para salvaguarda de outros
princípios fundamentais, como sejam a
legítima defesa ou a paz internacional;
o Assim, qualquer comportamento de um
Estado contrário ao ius cogens é nulo;
o A partir do ataque às Torres Gémeas em
2001, surge uma nova noção de legítima
defesa.
o Ius cogens consensual
 Abrange uma série de princípios de
ordem pública;
 O princípio mais consensual é o
princípio da proibição do uso da
força;
 O princípio da proibição da
discriminação racial apresenta
adesão praticamente universal,
desde a década de 60;
 Direito humanitário internacional no
quadro do Direito da Guerra;
 Princípio da responsabilidade pelos
danos causados;
 Princípio da resolução pacífica dos
conflitos, de maior alcance que o
princípio do uso da força.

o Ius cogens não consensual


 Convenção sobre o Genocídio – ius
cogens admissível;
 Em matéria de direitos humanos,
admite-se ius cogens regional (na
Europa), cujo âmbito é maior do que
noutras esferas.
 Constitui situação polémica,
em matéria de direitos
humanos, a aplicação da pena
de morte, nos EUA, sobre
estrangeiros. Nos termos da
Convenção de Viena sobre
Relações Consulares19, prevê-
se o dever dos Estados,
quando detêm um nacional
de um Estado terceiro,
comunicarem esse facto aos
indivíduos que podem
conceder protecção. Nos
casos Lagrande e Avena, está
em causa a violação desta
norma da convenção. Nestas
situações, coloca-se a questão
se estamos perante direitos
individuais. O TIJ considerou,
por maioria, que estamos
perante direitos de
particulares, justificáveis de
per si.

19
Note-se que não é uma convenção de reconhecimento de direitos individuais.
o Não é admissível o princípio da soberania,
porque importa admitir a vontade das
partes. Note-se, ainda, que este princípio
também implica limitação de direitos;
o Admitamos que “A” e “B” celebram um
tratado, em 2003. “B” não cumpre o
contrato desde 2004. “A” reclama deste
facto em 2010. Há aqui uma violação do
tratado, mas não de ius cogens. Existe a
necessidade de protecção de valores
fundamentais da comunidade, como o
princípio pacta sunt servanda. O facto de A
não ter reagido de imediato pode decorrer
do princípio do consentimento;
o A violação de ius cogens não é admissível,
ou seja, não se admite conformação face a
um facto ilícito e reservas face às
disposições substantivas em causa no
tratado. Este último facto constituiria uma
alteração unilateral de uma disposição;
o O princípio da proibição do genocídio visa
a protecção da integridade das populações
alvo deste crime, que conduz à
degradação de uma comunidade,
individual ou colectivamente;
o O Direito Humanitário Internacional
integra um bloco normativo de tutela de
direitos. Encontra-se consagrado pelas
Convenções de Haia (1899 e 1907) e de
Genebra (1949). O TIJ entende que
estamos perante um conjunto de direitos
intransponíveis.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 12 de Abril de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 Parecer Armas Nucleares (TIJ – 1996)
o Questão colocada pela AG: É permitido, pelo DI, o recurso à
ameaça ou à utilização de armas nucleares, em alguma
circunstância?
 Esta formulação da questão conduziria a uma
presunção de ilicitude. A questão, correctamente
colocado, seria “É proibido, pelo DI, o recurso à ameaça
ou à utilização de armas nucleares, em alguma
circunstância?”, pois assim, de acordo o conhecido
adágio, tudo o que não é proibido, é permitido;
 O TIJ, exercendo jurisdição consultiva, entende que a
ameaça e o uso de armas nucleares são ambos ilícitos,
isto no que concerne à qualificação dos actos;
 Procedimento utilizado:
 Existirá norma costumeira que proíba este
comportamento?
o Corpus (elemento material) – não existe
uma prática reiterada de uso de armas
nucleares. Por outro lado, existe uma
prática reiterada de abstenção ou não
utilização de armas nucleares (desde
1945), isto ainda que sejam poucos os
Estados com acesso às armas nucleares20.
o Animus (elemento psicológico) – existe
uma convicção de ilicitude do uso de
armas nucleares. Note-se que são poucos
os Estados que possuem armas nucleares,
dadas as exigências de produção e/ou
aquisição deste tipo de armamento.
Temos de encontrar elementos que
comprovem que o não uso de armas
20
Recordar “Crise dos Mísseis de Cuba” (1962).
nucleares é proveniente de uma convicção
de ilicitude, sem quaisquer motivações ou
razões políticas inerentes. Trata-se apenas
de uma ideia de proibição pelo Direito,
juridicamente vinculável. Para verificar a
existência de um animus, o TIJ vai verificar
a existência de tratados de não-
proliferação celebrados, que não
estabelecem uma obrigação estrita de
desarmamento, mas que deve haver uma
obrigação de boa-fé. Trata-se de um
acordo celebrado sem prazos. O Tratado
de Não-Proliferação Nuclear é um acordo
celebrado entre Estados soberanos, em
1968, e assinado por EUA, União Soviética
(Rússia), China, Reino Unido e França
(declarados não-nucleares). Os Estados
nucleares ficam obrigados a não efectuar
ataques nucleares sobre os Estados não-
nucleares. Existem, também, tratados da
América do Sul que proíbem a utilização,
detenção e comercialização de armas
nucleares21. Os Estados de não-
proliferação não abdicam do uso de armas
nucleares, em legítima defesa. Com estes
dados, concluímos que não existe uma
proibição costumeira em absoluto do uso
de armas nucleares, o que não afasta o
princípio da proibição do uso da força.

 Verificamos agora, em termos convencionais, se


existe norma proibitiva desta conduta: não

21
Tratado de Tlatelolco (1969) – nome convencionalmente dado para o Tratado para a Proibição de
Armas Nucleares na América Latina e o Caribe. Ele é incorporado no Organismo para a Proscrição das
Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (OPANAL); Tratado de Rarotonga (1985) – Zona Livre de
Armas Nucleares do Pacífico Sul (contem reservas de Estados nucleares).
existem proibições convencionais gerais do uso
de armas nucleares. Todavia, o uso de armas
nucleares está sujeito ao princípio da proibição
do uso da força, excepto em situações de
legítima defesa (artigo 51.º CNU) ou autorização
dos membros do Conselho de Segurança. A
legítima defesa só é admitida como resposta a
um ataque armado, sob comunicação ao
Conselho de Segurança, até este tomar
medidas, dentro dos limites da
proporcionalidade e da necessidade (requisito
prévio da proporcionalidade)22. O requisito de
necessidade só é admissível se estiver em causa
a sobrevivência do Estado. A resposta está
submetida ao princípio da proporcionalidade,
relativamente aos efeitos provocados, como
limitação dos danos que se pode causar. Esta
resposta deve constituir uma forma de
neutralização do ataque iminente e encontra-se
submetida aos princípios fundamentais do
Direito Internacional Humanitário, o que
impede que o efeito bélico incida,
indiscriminadamente, sobre civis – “Cláusula
Martens”23;

22
Note-se que existe um elenco de armas de destruição maciça proibido por Lei.
23
A chamada “Cláusula Martens”, alcunha do Ministro de Relações Exteriores russo que a propôs, fixa
que, mesmo em situações de guerra não disciplinadas pelos convénios de Direito Internacional
Humanitário, haverá outras normas de direito consuetudinário a amparar as vítimas de qualquer
conflito armado. Os Estados que não se obrigaram através de convénios estarão sujeitos a estas normas
consuetudinárias. Deduz-se, destarte, que não há nenhum âmbito de conflito que não seja abrangido
pelo Direito Internacional Humanitário. Desta cláusula cerne, tem-se os princípios cogentes que
integram o Direito Internacional Humanitário. Os principais são o da necessidade militar e o da
humanidade, interdependentes entre si. Segundo o princípio da humanidade, em qualquer
circunstância, as vítimas de uma guerra devem ser salvaguardadas por uma série de directrizes
humanitárias, regras de trato humano. Como a violência é inevitável e inerente à guerra, o princípio da
necessidade militar, balizado pelo princípio da humanidade, procura delimitar o grau de violência
empregue num conflito bélico, para que se atenda ao limite indispensável ao alcance da vitória militar.
 Integrando a evolução da consciência
humanitária, é proibido o uso de armas
nucleares se estiverem em causa questões de
protecção ambiental (Direito Internacional
Ambiental), para salvaguarda das gerações
futuras;
 Conclusão: o TIJ não se pode pronunciar pela
licitude do uso, admitindo a utilização lícita em
situação de legítima defesa, estando em causa a
sobrevivência do Estado (questões-limite). Ainda
assim, preservam-se os princípios fundamentais
de Direito Internacional Humanitário. O presente
parecer não agradou a nenhuma das partes
envolvidas (Estados nucleares e Estados não-
nucleares).
-

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 16 de Abril de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Resolução da ficha “Analise a seguinte situação hipotética:”
o a) Considerando o diferendo existente:
 Princípio da resolução pacífica dos diferendos (sentido
mais amplo):
 Artigo 1.º CNU – objectivos das Nações Unidas:
manter a paz e segurança internacionais, por
meios pacíficos;
 Artigo 2.º, n.º4 CNU – princípio da proibição do
uso da força (este princípio tem aspectos que lhe
são sobreponíveis);
 Artigo 2.º, n.º1 CNU – princípio da igualdade
soberana entre os membros das Nações Unidas
(conjugado com o n.º7 do mesmo artigo);
 Artigo 2.º, n.º2 CNU – princípio da boa-fé e
princípio pacta sunt servanda;
 Artigo 2.º, n.º3 CNU – consagração do princípio
da resolução pacífica dos diferendos. Os artigos
33.º e seguintes apresentam várias formas de
resolução dos conflitos entre Estados.

 Através da Resolução 2625, resolução declaratória de


direitos consuetudinários, encontramos os princípios
que regulam as relações amigáveis entre Estados. De
acordo com o 2.º princípio enunciado, nos parágrafos
enunciados, estão indicados os meios legítimos
(político-diplomáticos ou judiciais) para a resolução
pacífica dos diferendos, sem prejuízo de outros meios
pacíficos escolhidos pelas partes – princípio da
liberdade.

o b) Apreciação da declaração do novo governo de “A”


 Não é admissível a utilização de todo e qualquer meio
útil para garantir a resolução do conflito territorial. À
luz do Direito Internacional, vigoram os princípios:
 Princípio da proibição do uso da força (artigo
2.º, n.º4 da CNU), no quadro das relações
internacionais, para salvaguarda de qualquer
direito ou interesse, seja ou não objecto de
litígio. Este princípio também proíbe a ameaça
de uso da força, dada a equiparação, feita pelo
TIJ, em relação acto realizado efectivamente,
considerando ambos ilícitos;
 Também de acordo com o 1.º princípio da
Resolução 2625 das Nações Unidas, de natureza
consuetudinária e que vincula todos os Estados
(mesmo as não-partes, sendo por isso oponível
erga omnes):
o Deve ser adoptada uma posição de
abstenção ao recurso à força, para violar
limites territoriais definidos;
o O uso da força constitui uma agressão24
considerada um crime contra a paz;
o Privação ao princípio da autodeterminação
(veja-se o caso Portugal vs. colónias) não
permitida. Colocam-se sempre, nestes
casos, interesses políticos;
o Todo o Estado se deve abster da formação
de grupos e bandos armados (ver casos
Nicarágua vs. EUA e Congo vs. Uganda);
o Vinculação a consecuções de boa-fé para
desarmamento geral.

 Estamos perante uma ameaça indirecta, recordando


que o uso de armas nucleares está mais restrito, em
matéria de legítima defesa.

o c) Devemos considerar, de entre o elenco de formas de


manifestação possível, o protesto se revela a mais adequada,
por considerar que estamos na presença de uma acção
contrária ao Direito Internacional.

o d) À luz do Direito Internacional, devemos considerar que, a


serem verdadeiras as acusações, estamos perante um apoio a
facções internas, o que viola o princípio da não ingerência
nos assuntos internos de um Estado, previsto na Resolução
2625 (3.º Princípio).
 No caso Nicarágua vs. EUA, a potência mundial
americana alega um princípio que legitima a sua
prática, ou seja, no seu entender, haverá fins que
justificam tal intervenção, tais como a segurança, a
democracia e a promoção de direitos humanos,
entendidos como objectivos nobres que podem
legitimar tal prática (ver pp. 202-207 deste caso);

24
Não há definição legal deste crime, no quadro do Tribunal Penal Internacional.
 A intervenção do Estado não é legitimada com o
recurso à força económica, política ou cultural, que
constitua uma coerção;
 Ver também Caso Congo vs. Uganda, em que o Congo
reconhece a concessão de apoio às forças, mas se
entende que estamos perante uma situação de
ingerência e não de utilização de força;
 Será lícito que um Estado mantenha relações de
amizade com forças políticas internas de outros
Estados, importando considerar os objectivos e modos
de prestação desses apoios. Por exemplo, se essa
intervenção retira a liberdade de escolha de outro
Estado, não pode ser admitida essa nítida acção de
ingerência.
 Recorde-se os apoios conferidos ao Partido
Socialista (PS) por outros Estados, no período
pós-25 de Abril ou os apoios concedidos ao
Partido Comunista Português (PCP) pelos Estados
Soviéticos;
 Ver Acta Final de Helsínquia e o ponto 6
apresentado – não intervenção nos assuntos
internos. É feita referência a outras formas de
coerção económica, social e política por parte de
um Estado, tendentes a subordinar outro Estado,
obtendo vantagens de qualquer espécie.

 Relativamente à guarida concedida aos grupos que


desenvolvem actos terroristas, estamos também
perante uma violação de um princípio da Resolução
2625 – princípio da não-ingerência nos assuntos
internos de um Estado –, o que também pode conduzir
a uma violação da integridade política e territorial de
outro Estado.
o e) A decisão de nacionalização das empresas nacionais de B é
admissível à luz do princípio da soberania, dado que este
abarca o direito de administrar, de modo autónomo, o
território que se encontra sob a sua fiscalização. Recorde-se
que o princípio da soberania, modo de afirmação da
soberania estadual, abrange independência, plenitude e
exclusividade, nos termos da Resolução AG 3281, sobre
direitos e deveres económicos dos Estados. Ora, sendo assim,
este princípio abarca a soberania permanente sobre recursos
económicos (artigo 2.º, n.º2, alínea c) da Resolução 3281).
 A Resolução AG 3281 data de 1974, pleno período de
descolonização de Estados que partilhavam da
ideologia colectivista (ver caso Egipto vs. França, acerca
do Canal do Suez);
 Ainda assim, estamos perante uma prática que pode
ser violadora de compromissos contratuais. Se houver
controvérsias quanto à compensação a atribuir aos
proprietários das empresas, há lugar a aplicação da Lei
nacional do Estado e de julgamento nos tribunais
nacionais;
 Conclusão: a medida tomada pelo Estado A é válida à
luz do DI, dentro das condições impostas.

o f) A declaração do governante do Estado C, à luz do DI,


instiga os diferendos existentes, o que contraria o princípio
da resolução pacífica dos diferendos, conduzindo a uma
situação de maior instabilidade naquele quadro internacional.
O Estado C deveria ter uma particular cautela na declaração
que proferiu, visto que esta implica directamente a relação
entre A e B (3.º Parágrafo da Resolução AG 2625). Deste
modo, é colocada em causa a paz e segurança internacionais
e a vinculação aos objectivos das Nações Unidas. Trata-se de
um acto juridicamente censurável, com as consequências
que daí podem advir, nomeadamente através do Conselho
de Segurança da ONU, legitimado para agir nesse sentido.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 19 de Abril de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 Direito dos Tratados (CVDTE)
o Formado por um conjunto de normas consuetudinárias,
quanto à formação, e que se consolidam na prática dos
Estados, a partir do século XIX;
o Devido à ambiguidade quanto ao sentido/alcance das normas
e à necessidade de inovar em relação à concepção
tradicional, decidiu-se codificar o Direito, resolvendo as
questões controversas;
o Densificação dos tratados a partir da segunda metade do
século XX, que culmina com a Convenção de Viena sobre o
Direito dos Tratados (1969).
 Nesta convenção, apresentam-se normas que vinculam
os Estados, ainda que não sejam parte dela;
 Portugal só aderiu à convenção em 2003;
 As normas da convenção são, em grande parte,
supletivas, podendo ser afastadas pelas partes.
Todavia, as normas respeitantes às condições de
validade dos tratados não o são;

 Âmbito de aplicação da Convenção


 Do ponto de vista subjectivo: os tratados só
podem ser celebrados pelos Estados (âmbito
limitado);
 A Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados entre Estados e Organizações
Internacionais ou entre Organizações
Internacionais (1986) regula a celebração de
convenções por organizações internacionais;
 Condições de validade dos Tratados (artigos 1.º e 2.º
CVDTE)
 Acordos concluídos por escrito, na medida em
que os acordos não escritos têm, hoje, uma
importância residual;
 Esta CVDTE abrange todo o tratado (entenda-se
“tratado” em sentido amplo, como qualquer
acordo de vontades) celebrado entre Estados.
Subsidiariamente, também pode abranger
acordos no âmbito das Nações Unidas ou da
OCDE (em matérias económicas, sociais e
técnicas), se as matérias relacionadas com a
forma e a autenticação do texto não forem
reguladas pela organização internacional ou as
regras não forem afastadas pelas partes;
 Estes acordos podem estar plasmados em
diversos documentos escritos, como por
exemplo protocolos;
 Há acordos em que a organização internacional
não é parte activa na celebração do mesmo,
sendo apenas um mero fórum, para conferir
facilidades administrativas. Neste caso, aplica-se
a CVDTE tout court.

 Fases de celebração dos Tratados entre Estados (trata-


se de uma divisão doutrinal, na medida em que a
CVDTE reúne todas as fases na celebração e na
redacção do texto)
 Negociação
o Fase ampla, dividida em diversos
momentos:
 Pré-negociação – momento
preparatório informal, ainda que
seja formalizado por acordos
preliminares. Não há obrigações das
partes na negociação, devendo
apenas agir de boa-fé;
 Negociação geral – determina-se a
calendarização da negociação e os
subtemas materiais;
 Negociação específica – discussão
dos vários subtemas, obtendo-se
uma conciliação de interesses.

o Os tratados multilaterais gerais são na


maioria das vezes negociados sob a égide
de organizações internacionais, o que
conduz a uma complexificação das fases
de negociação.

o Habilitação negocial
 Não sucedia nos primórdios do DI,
mas já se revelava desta forma;
 Representantes a quem são
conferidos poderes pelo Estado
 Pode ser designado um
representante tão só para
uma fase do processo de
celebração;
 Carta de “plenos poderes”
conferida pelos Estados para
acreditação de um
representante.
o Habilitação funcional – de acordo com a
prática dos Estados, há personalidades que
podem vincular os Estados (habilitação
genérica);
 Habilitação funcional limitada – não
dispondo de carta de “plenos
poderes”. Sucede, por exemplo,
com:
 Embaixador, designado para
representar o Estado apenas
na adopção do texto;
 Representantes habilitados
junto de conferências ou
organizações internacionais
para negociarem e
concorrerem para a adopção
do texto.

o Habilitação específica
 Através de carta de “plenos
poderes”, acto que confere poderes
ao representante, ainda que possam
ser limitados;
 Em face do alargamento das
matérias alvo das convenções,
entende-se que outras
personalidades têm competência
de representação, sem o Estado
conferir carta de “plenos poderes”,
em virtude de diversas
circunstâncias.

o O artigo 8.º CVDTE prevê as situações em


que um acto é negociado por um
representante não habilitado (ausência de
poderes) para aquela fase do Tratado.
Nestas circunstâncias, o acto não produz
quaisquer efeitos jurídicos, entendendo-se
como inexistente juridicamente, ainda
que possa produzir efeitos se a falta de
“plenos poderes” for posteriormente
sanada.
 Esta situação distingue-se daquela
em que um representante
habilitado extravasa os poderes
conferidos pela carta de “plenos
poderes”, em que está em causa um
vício de consentimento. Nos termos
do artigo 47.º CVDTE, o facto de o
representante não respeitar as
restrições que lhe foram impostas
conduz a uma nulidade relativa dos
actos por ele praticados.

 Adopção do texto
o Coloca termo à negociação do texto;
o Perante tratados multilaterais, uma das
partes assume a posição de relator,
procurando fixar um texto que agrade a
todas as partes;
o O texto é adoptado, quando aprovado por
todos os Estados intervenientes, expressa
ou tacitamente (artigo 9.º CVDTE);
o O princípio-regra para a aprovação é a
unanimidade, sendo que um tratado
adoptado em conferência internacional
apenas exige uma maioria qualificada de
2/3 dos Estados para aprovação. Nestes
termos, o facto de um Estado não
concordar com o texto não impede a sua
aprovação. Aliás, tende-se a prescindir da
unanimidade do concurso de todos os
Estados.

o Pré-vigência do texto (artigo 24.º CVDTE)


– disposições do texto imediatamente
aplicáveis (efeito de pré-vigência), antes
da entrada em vigor stricto sensu;

o Autenticação do texto
 Redacção do tratado em diversas
línguas (≠ aprovação, numa só
língua), em que se pode fazer fé, do
ponto de vista jurídico;
 Texto torna-se definitivo, salvo
correcções gramaticais. Conteúdo e
forma jamais podem ser alterados;
 Assinatura ad referendum (sujeita a
posterior confirmação) – aplica-se
quando o representante não goza
de poder;
 Outros processos (art. 10.º CVDTE)
 Na égide de uma organização
internacional – apenas
assinatura do representante;
 Troca de cartas entre os
Estados (nos tratados
bilaterais).
 Assinatura diferida (artigo 81.º
CVDTE) – aplica-se para Estados que
não participaram na negociação ou
não adoptaram o texto sob as
formas prescritas. Permite aos
Estados serem parte originária do
tratado.
 Esta situação difere da adesão
de Portugal à CVDTE, em
2003, não constituindo parte
originária.

 Efeitos da autenticação (artigo 18.º


CVDTE)
 O Estado torna-se parte
contratante do Estado,
gozando do direito (e não
dever) a vincular-se;
 Obrigação de não privar o
tratado do seu objecto ou do
seu fim, na lógica do princípio
da boa-fé. Constituem formas
de privação do objecto todos
os actos que possam eliminar
ou descaracterizar o tratado.

 Partes do Tratado
 Preâmbulo (indicação das
partes, do processo de
negociação, dos objectivos
que se seguem e dos
princípios e valores
fundamentais que estão na
base do acordo, enquanto
elementos interpretativos
não vinculativos)
 Corpo dispositivo
 Parte complementar (não
obrigatória)
o Protocolos – têm valor
jurídico vinculativo,
equivalente ao corpo
dispositivo. Devem,
contudo, integrar esta
parte complementar,
dada a sua extensão;
o Declarações – actos
políticos que não são
juridicamente
relevantes. Apenas
ajudam a determinar a
vontade das partes.
Podem, por exemplo,
auxiliar à interpretação
das disposições do
corpo.

 Línguas oficiais em que se faz boa-fé


– línguas autênticas. Outras línguas
podem também adquirir valor
vinculativo, se assim for declarado.
Em matéria de reflexos
interpretativos, importa encontrar
um sentido comum entre línguas.

 Vinculação internacional dos Estados (art. 11.º


CVDTE)
o Manifestação de consentimento do
Estado;
o Não há modalidade com valor supletivo. A
determinação da modalidade que vincula
o Estado consta do acordo, de modo
expresso ou tácito;
o Discutiu-se, aquando da Convenção de
Viena, a definição de uma modalidade
primária. Se houvesse sido fixada uma
forma principal, seria a ratificação. Não se
obteve um acordo, dada a necessidade de
desformalização e pelo facto de os
próprios tratados poderem prever a
modalidade;
o Ratificação – forma mais solene e comum,
que significa a vinculação do soberano à
representação do Estado, assumida pelo
representante. Com a ratificação, é
associada a prerrogativa do Estado (pelos
parlamentos nacionais) nos tratados;
o Assinatura – também pode traduzir a
vinculação do Estado, através de
representante habilitado para tal, quando
o tratado o determina, ou se pode
determinar pelo tratado que era essa a
intenção. Pode, também, haver lugar a
assinatura ad referendum, como meio de
salvaguarda pelo Estado de um
assentimento interno. De todo o modo, a
vinculação do Estado dá-se desde o
momento da assinatura. A assinatura é,
actualmente, o mecanismo mais utilizado
na celebração de tratados, no sentido da
desformalização;
o O momento da troca dos textos do acordo
marca a vinculação dos Estados;
o A ratificação implica uma vinculação muito
intensa ou extensa do ponto de vista da
matéria. Aplica-se quando o tratado o
preveja ou se deduza pela sua intenção.
Trata-se de uma salvaguarda de
prerrogativa soberana, que envolve a
participação e aprovação do Parlamento.
Todavia, o acto de ratificação é da
responsabilidade do Chefe de Estado. Este
difere, do ponto de vista lógico, dos actos
constitucionais internos necessários,
relacionado com o problema das
ratificações imperfeitas (art. 46.º CVDTE);
o Em Portugal, o Presidente da República
ratifica por decreto presidencial, entregue
ao depositário, tal como sucedeu com o
Tratado de Lisboa;
o A assinatura ad referendum permite que
se proceda, plenamente, às diligências
internas;
o Ratificações simplificadas – para
salvaguarda de prerrogativas internas, em
que seria suficiente a assinatura, sob
reserva de aceitação interna. A aceitação e
a aprovação podem ter lugar sem
assinatura. Podem ser colocadas reservas
para vinculação internacional do Estado.
 Aceitação
 Aprovação (artigo 14.º CVDTE) –
instituída por causa da divisão de
poderes, nos EUA, entre Presidente
e Congresso americano. Vinculação
sujeita a aprovação pelo Congresso;
 Adesão (artigo 15.º CVDTE) – aplica-
se para Estados que não são
signatários de origem do tratado,
isto é, que não participam na
negociação e fixação do texto.

o Podem ser exigidas diferentes


modalidades de vinculação internacional,
em relação a cada Estado;
o Os tratados de amizade (tratados
bilaterais) estão, em regra, sujeitos a
ratificação, dada a substancial importância
política do acordo;
o A vinculação dá-se com a troca, depósito25
ou notificação26 dos instrumentos,
competindo ao depositário guardar os
instrumentos e registar o tratado junto do
Secretariado das Nações Unidas;
o A adesão constitui um acto internacional
autónomo, ainda que sujeito a
formalidades internas. Trata-se de um acto
que só faz sentido nos tratados
multilaterais abertos.
 Adesão unilateral – o Estado
notifica a sua adesão;
 Negociação de um tratado
modificativo, que conduz à
celebração de um tratado de
adesão.

o Só em condições restritas é que os vícios


respeitantes ao vínculo interno têm efeitos
externos (artigo 46.º CVDTE). Para tal

25
Comunicação, aos outros Estados, de um depósito.
26
Modalidade excepcional, apenas aplicável com um número reduzido de Estados.
situação se verificar, é necessário que
estejamos perante uma questão
substancial, em que há uma violação de
uma disposição fundamental do Estado
(vício relevante), devendo ela ser
objectivamente detectável pelos outros
Estados, isto é, existe uma obrigação de os
Estados terem conhecimento desse vício;

o Em regra, o Estado vincula-se a todo o


tratado.
 Excepções (artigo 17.º CVDTE):
 Exclusão de uma parte do
tratado;
 Disposições alternativas no
âmbito da Organização
Internacional do Trabalho
(OIT) – excepcional.
 Formulação de reservas (artigos
19.º a 23.º CVDTE) – nos termos do
artigo 2.º, alínea d) CVDTE, entende-
se por reserva o acto unilateral em
que o Estado exclui a sua vinculação
a algumas disposições do tratado ou
até as altera.
 Digladiam-se duas questões:
o Por um lado, o respeito
pela integralidade do
tratado;
o Por outro lado, com o
alargamento do
número de sujeitos de
DI, o objectivo de
conseguir a vinculação
do número mais
extenso possível de
Estados, pode implicar
a possibilidade de
formulação de reservas.
Se tal hipótese não
fosse conferida, poder-
se-ia verificar a
exclusão de vinculação
dos Estados.

 Admissibilidade das reservas


pela doutrina tradicional – só
seriam admitidas se fossem
unanimemente aceites pelos
restantes Estados. Trata-se de
uma questão que foi discutida
aquando da elaboração da
CVDTE, até aos finais da
década de 60. Na actualidade,
adopta-se uma posição mais
flexível, que permite a
vinculação do maior número
de Estados possível. Esta
questão é a mais controversa
da CVDTE, que, sobre esta
temática, apresenta
numerosas lacunas.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 23 de Abril de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 A constituição de reservas
revela-se o problema que
suscita maior controvérsia e
assume maior complexidade,
tratando-se de uma matéria
específica de DI;
 Por reserva, entende-se a
declaração pela qual um dos
Estados contratantes
pretende modificar ou excluir
disposições do Tratado.
Discute-se a possibilidade de
uma reserva limitar em
absoluto uma matéria do
tratado. Importa também
discutir o alcance da exclusão,
em função do objecto e do
fim do tratado;
 A inadmissibilidade de
reserva nos tratados
bilaterais resulta da
formulação do acordo por um
número muito reduzido de
Estados. Contudo, pode haver
uma solicitação de reabertura
das negociações;
 Existem declarações políticas
que não constituem reservas
– statements. Note-se que a
reserva resulta da
interpretação da declaração.
O facto de um Estado ser
parte de um tratado não se
traduz no reconhecimento de
um outro Estado. Veja-se, por
exemplo, a polémica do
reconhecimento de Israel
enquanto Estado de DI. Esta
matéria não modifica o
regime de direitos e
obrigações do tratado;
 Também declarações
interpretativas relativas ao
sistema jurídico interno não
produzem efeitos sobre o
tratado, sendo que, por isso,
não constituem reserva. O
Estado aponta um conjunto
de princípios a que se sente
vinculado e que podem
revelar a intenção do Estado
no tratado. Trata-se de uma
mera declaração que indica a
orientação do Estado em
relação ao tratado;
 Problema da admissibilidade
de reservas – esta questão
não se pode colocar em
abstracto. De acordo com a
doutrina tradicional, as
reservas teriam de ser aceites,
por unanimidade, pelos
Estados. Trata-se de uma
orientação restritiva que
permitia a um único Estado,
que negasse a reserva, impor
o abandono da mesma. Há
uma flexibilização das
reservas, tendo em vista a
reunião do maior número de
Estados possível nos tratados,
tal como pode ser constatado
no Parecer sobre o Genocídio,
em que o TIJ admitiu reservas
face a algumas orientações;
 A admissibilidade de reservas
(em abstracto) depende das
partes no Tratado, o que pode
conduzir ao impedimento de
aceitações de reserva. Nestas
circunstâncias, coloca-se a
questão se o Estado está ou
não vinculado ao tratado, se
a reserva lhe for negada.
Sobre esta matéria, existem
orientações divergentes,
sendo que para o Tribunal
Europeu dos Direitos
Humanos o Estado encontra-
se vinculado.
o A reserva tem de ser
confirmada no
momento da
vinculação aos tratados
(formulação oficial da
reserva), gozando os
Estados de um tempo
para apresentar
objecções;
o A vontade das partes
revela-se determinante
na admissibilidade de
reservas, em matéria
de incompatibilidade
com o objecto e fim do
tratado;
o Inadmissibilidade total
(ex: o ERTPI não admite
reservas ou salvaguarda
de situações que os
Estados pretendiam
proteger) ou parcial
(ex: CNUDM) /
expressa ou tácita;
o Incompatibilidade com
o objecto e o fim do
tratado – quando a
reserva coloca em
causa a razão de ser do
tratado, especialmente
em matéria de Direitos
Humanos, que tem de
ser entendida de modo
global e
interdependente. Não
há uma proibição total
de reserva de Direitos
Humanos,
nomeadamente sobre
os mecanismos de
salvaguarda;
o As reservas têm de ser
comunicadas por
escrito, directamente
aos Estados, ou através
do depositário,
notificando-se as
restantes partes.
 Aceitação de reservas –
segundo elemento que é
condição para a
admissibilidade de reservas;
o Necessidade de
aceitação de pelo
menos uma parte dos
Estados, senão não
produz efeitos jurídicos;
o Pode ser expressa ou
tácita;
o Aceitação
indispensável:
 Por todas as
partes, quando o
tratado implica
um grau de
vinculação plena
(artigo 20.º, n.º2
CVDTE);
 Aceitação tácita,
no prazo de 12
meses decorridos
(disposição
supletiva prevista
no artigo 20.º,
n.º5 CVDTE).

o Havendo um problema
de interpretação, pode
haver lugar a resolução
pacífica dos conflitos,
por exemplo através do
recurso aos tribunais
arbitrais;
o O Tratado da União
Europeia, em função do
seu objecto – laço de
ligação entre Estados,
de larga intensidade –
não admite reservas,
ainda que tal disposição
não se encontre
expressamente prevista
o A aceitação não é
necessária, se o
tratado admitir, no seu
texto, reservas;
o A apresentação de
objecção pode excluir
ou modificar o efeito
da reserva entre o
Estado objector e o
Estado que apresentou
a reserva, através de
declaração expressa.

o Efeitos da reserva
 Princípio da
relatividade: o
objectivo da
reserva é
aplicável nas
relações entre o
Estado que a
formulou e os
Estados que
aceitaram a
reserva
(normalmente
por via tácita). O
sentido da
modificação
passa a valer
entre esses
Estados;
 No caso de
objecção à
reserva: a
disposição sobre
a qual incide a
reserva não se
aplica entre
Estado objector e
aquele a
formulou,
podendo o
Estado objector
fazer com que o
Tratado não
vincule as
relações entre si
e o Estado que
formulou a
reserva.

o As reservas podem ser


revogadas, produzindo
efeitos desde o
levantamento da
reserva. O mesmo
sucede com as
objecções, que valem
com o seu
levantamento. Apenas
quem goza de
habilitação formal
pode formular
reservas.

 Entrada em vigor
o O tratado entra em vigor no momento em
que as partes o determinam;
o Caso nada seja determinado, o tratado
entra em vigor quando é ratificado pelo
último Estado, que deposita os
instrumentos;
o O mais vulgar é haver uma data fixada;
o A entrada em vigor vincula os Estados
contratantes a esse tratado;
o Pré-vigência: disposições que entram em
vigor com a assinatura;
o Aplicação provisória – por acordo das
partes, podendo o tratado produzir efeitos
antes da entrada em vigor do mesmo. Tal
pode suceder em tratados de natureza
técnica;

o As ratificações constituem actos livres, a


que os Estados não estão vinculados, mas
que podem adiar a entrada em vigor do
tratado. É costume fixar-se um prazo para
a ratificação, entrando o tratado em vigor
cumprido o prazo. Consequentemente, há
lugar a ratificação tácita. Nos tratados
multilaterais gerais, a regra para entrada
em vigor não implica a ratificação de todos
os Estados contratantes (a regra não é a
unanimidade), mas apenas de um número
significativo de Estados (por exemplo,
ERTIJ);

 Registo e publicação
o Artigo 80.º CVDTE – registo junto do
secretário-geral das Nações Unidas (artigo
102.º CNU), que trata da respectiva
publicação. Com isto, visa-se evitar a
“diplomacia secreta”, garantindo-se a
transparência;
o Os tratados que não tiverem sido alvo de
registo não podem ser invocados nas
Nações Unidas, nomeadamente junto do
TIJ, da Assembleia-Geral e do Conselho de
Segurança;
o Não há prazo para efectuar o registo;
o Nem todos os tratados são publicados na
íntegra, ainda que haja registo e
publicação dos elementos essenciais;
o A publicação não sucede, de todo, nos
tratados bilaterais, de natureza técnica,
económica ou administrativa, pois seria
impensável manter organizada uma
imensidão de tratados. De todo o modo,
os tratados encontram-se disponíveis
junto do Secretário-Geral da ONU e
acessíveis on-line.
 Interpretação, integração e aplicação dos Tratados. Requisitos de
validade e regime das invalidades. Suspensão, cessação da
vigência dos Tratados e recesso.
o Princípios fundamentais à interpretação (artigos 31.º e 32.º
CVDTE)
 Artigo 31.º CVDTE – princípio da boa-fé e respectivos
corolários:
 Princípio do absurdo – uma interpretação que
conduza a um resultado ambíguo deve implicar a
sua eliminação;

 Princípio do efeito útil – interpretação que mais


garanta que os fins do tratado se realizem. Não
se admite uma interpretação que não encontre
no elemento gramatical (texto que manifesta a
vontade das partes) uma correspondência;

 Princípio da soberania – prerrogativa de


afirmação do sujeito de DI, não se permitindo
presunção de limitação à soberania;

 Princípio dos efeitos implícitos – afirmado pelo


TIJ, este princípio impõe uma leitura com cautela
das normas que contêm efeitos implícitos num
tratado, não podendo estas normas ser
entendidas na sua mais ampla extensão.

 Artigo 32.º CVDTE – elementos complementares


 Elementos da interpretação:
o Gramatical – remissão para o sentido
corrente das disposições (≠ sentidos
especiais), entendidas como um todo;
o Elementos complementares a utilizar
numa situação de ambiguidade
 Teleológico – objecto e fim do
tratado;
 Sistemático – leitura do texto da lei
articulada e contextualizada;
 Histórico – por exemplo, trabalhos
preparatórios e actas que tenham
concorrido para a feitura do tratado.

 Fins da interpretação:
o Deve ser realizada em termos objectivos
(sentido comum), que atende em primeiro
lugar às normas do tratado, ainda que a
vontade das partes também possa ser
relevante;
o Deve, igualmente, ser actualista, tendo em
conta a prática dos Estados na aplicação
do tratado. Verificar, por exemplo,
acordos posteriores ao tratado, que o
vieram concretizar. Note-se que a
interpretação não pode desvirtuar, por
completo, o sentido das normas.

 Resultados da interpretação:
o Restritiva – só prevalece nos casos em que
a interpretação da vontade das partes é
determinante;
o Declarativa
o Extensiva – implica a devida cautela, em
ponderação com a soberania dos Estados,
que não pode ser advogada como
princípio fundamental.

 A interpretação dos tratados e os Direitos


Humanos:
o Tendência para a interpretação favorável à
tutela da esfera jurídica dos indivíduos, o
que não significa favor absoluto. Recordar
perigos da interpretação extensiva;
o Não se refere à tutela dos interesses dos
Estados (por exemplo, tratado sobre as
relações consulares entre Estados), mas
de indivíduos.

o Integração de lacunas
 Analogia – aplicação analógica dos princípios dos
Estados ao TIJ. Como exemplo de analogia, temos a
matéria relacionada com a personalidade e capacidade
jurídica da ONU;
 Princípios Gerais de Direito (PGD) – função integradora

o A aplicação dos tratados


 Princípio pacta sunt servanda – conclusão dos tratados
de modo consciente e livre, ficando o Estado obrigado
ao cumprimento escrupuloso das disposições a que
está vinculado;
 Aplicação temporal
 Aplicação provisória antes da vigência
 Não retroactividade – os tratados aplicam-se
para os momentos posteriores à entrada em
vigor, sendo que, no caso dos tratados
multilaterais gerais, estes entram em vigor desde
que completado o processo de vinculação de
todos os Estados, ainda que nem todos o tenham
ratificado. Aplicam-se, também, a situações de
continuidade, salvo se tal for excluído;
 Sucessão de tratados no tempo – decorre da
regra “lei posterior revoga lei anterior”.

 Aplicação subjectiva – os tratados apenas produzem


efeitos para os Estados-parte vinculados (princípio da
relatividade), salvo excepções de produção de efeitos
para terceiros, gozando de oponibilidade erga omnes.
Tal situação sucede, por exemplo, quando são
delimitadas fronteiras, em que se impõe uma
obrigação geral negativa, isto é, um respeito pela
delimitação de fronteiras. O mesmo se aplica em
tratados internacionais de neutralidade política de um
Estado (por exemplo: Pacto Federal Suíço, 1815), com
efeitos erga omnes;

 Artigo 38.º CVDTE – codificação do DI consuetudinário


 Tratados que codificam costume com efeitos
subjectivos mais amplos do que os Estados-parte
(por exemplo: CVDTE);
 Efeitos de tratados que adquirem o estatuto de
DI comum, por força do costume, aplicáveis à
generalidade dos Estados (com alcance
subjectivo mais amplo).
 Tratados normativos – estabelecem regimes objectivos
de DI, impondo-se aos Estados que não são parte (por
exemplo: Carta das Nações Unidas e CVDTE).
 Diferentemente se trata da CNUDM, a propósito
do património comum da Humanidade, matéria
inovadora que impõe normas aos Estados que
não são parte;
 Esta matéria assume importância em relação aos
vícios, ultrapassando-se o princípio da
relatividade;
 Produção de efeitos para terceiros:
o Desde que estes dêem o seu
consentimento expresso, após notificação;
o A previsão de direitos para o Estado
terceiro implica também consentimento,
passível de presunção;
o A revogação também implica
consentimento dos terceiros, seja sobre
direitos, seja sobre obrigações.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 26 de Abril de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


o Revisão e modificação dos Tratados
 Princípio de estabilidade dos tratados, representado
pelo princípio pacta sunt servanda, não implica que os
tratados não possam ser alterados, devido à evolução
da realidade social e dos Estados-parte. Portanto, não
vigora um princípio de imodificabilidade;
 Revisão ≠ Modificação
 Do ponto de vista substancial, não é uma divisão
relevante;
 Nestes processos, impera a vontade das partes.
 Revisão – tem a ver tão só com as alterações das
disposições do tratado, assumidas por todas as
partes (artigo 40.º, n.º2 CVDTE)
o Os Estados (Estados-parte e que se vão
tornar parte, ainda que não o venham a
ser futuramente, por discordância política,
por exemplo) que assinaram o tratado têm
o direito de participar na revisão, ainda
que não integrem o Tratado revisto;
o Com a revisão, podemos ter uma
revogação do Tratado anterior, por
incompatibilidade com o revisto – aplica-
se o critério da posteridade;

 Modificação – alterações das disposições do


tratado apenas entre algumas partes,
independentemente da vontade das restantes,
ainda que possam ter efeitos sobre terceiros, tais
como dificultar a aplicação do 1.º tratado ou
retirar-lhes direitos.
o Por exemplo, temos 2 tratados, com
Estados que são parte nos 2 tratados, e
outros num apenas.

o Normalmente, os tratados impõem limites


materiais (por exemplo: CNUDM) e
formais à revisão ou princípios
imodificáveis (ius cogens);
o Aplicação das regras gerais aplicáveis à
negociação e aprovação do texto (novo
tratado);
o Pode-se criar uma geometria variável, isto
é, certos Estados estarem vinculados a um
1.º tratado e outros a um 2.º tratado;
o Pode, também, o tratado prever
disposições de alteração somente a
respeito das relações entre algumas partes
(artigo 41.º, n.º1; artigo 41.º, n.º 2, i) –
condições suplementares)
 Artigo 41.º, n.º2 CVDTE – para
convenções internacionais, impõe-
se uma obrigação de notificação das
restantes partes, para estas
poderem levantar objecções (se,
porventura, forem colocados em
causa os seus direitos).

o Requisitos de validade dos Tratados


 Podem conduzir a vícios de natureza pactícia do
mesmo (diferentes regimes):
 Nulidade (ou nulidade absoluta) – sanção plena
de maior gravidade;
 Anulabilidade (ou nulidade relativa) – afectação
de parte do tratado, não sendo expurgado.
Menor gravidade.

 Requisitos subjectivos – consentimento das partes


 Vícios funcionais
o Irrelevância do desrespeito pelo direito
interno (artigo 27.º CVDTE), sem prejuízo
do artigo 46.º CVDTE (ratificação
imperfeita), para tentativa de
desvinculação ou incumprimento do
Tratado, por incompatibilidade com norma
constitucional ou ordinária, ainda que
acarretando as devidas responsabilidades,
e artigo 47.º CVDTE (excesso de
representação), em que representante
habilitado funcionalmente, com especiais
restrições, não respeita as limitações que
lhe foram colocadas. Se um representante
assina um tratado, não gozando de poder
funcional, o Estado pode:
 Sanar o vício, através da ratificação;
ou
 Alegar a incompetência do
representante, não ratificando.

o Artigo 46.º CVDTE – excepção da


ratificação imperfeita: situação de
irregularidade nos termos do
procedimento de aprovação
constitucionalmente consagrado (por
exemplo, pelo órgão legislativo);
o Artigo 47.º CVDTE – excepção do excesso
de representação: violação manifesta,
grave, objectivamente evidente27, em que
se presume que o representante está
habilitado para exercer aquele acto, mas
tal é a sua perceptibilidade, que pode
conduzir à desvinculação do Estado ou
mesmo à cessação do Tratado.

 Vícios materiais da vontade


o Situações relativamente raras, dada a
seriedade dos tratados;
o Apresentação dos vícios, por ordem
crescente de gravidade:
 Erro (artigo 48.º CVDTE)
 Há bastantes anos atrás,
verificavam-se erros em
matéria de posições

27
Comunicada à outra parte contratante ou nos termos da carta de “plenos poderes”.
geográficas com relevância
para o tratado e de
delimitação territorial;
 N.º1 – O erro deve incidir
sobre matéria fundamental
para a vinculação ao tratado e
não sobre aspectos
acessórios;
 N.º2 – Restrição
suplementar: o n.º1 não se
aplica, quando o Estado tinha
a obrigação de ter detectado
o erro (indesculpável) ou
quando o Estado contribuiu
para o erro;
 N.º3 – Excluem-se erros na
redacção do tratado.

 Dolo (artigo 49.º CVDTE)


 Intencionalmente provocado
por uma das outras partes,
resultado de artifícios
fraudulentos, que induzem o
Estado a uma percepção
enganosa;
 Tutela-se a confiança e a boa-
fé dos Estados;
 Implica menor grau de
exigência de declaração, em
relação ao erro.
 Corrupção do representante (artigo
50.º CVDTE)
 Acto que condiciona a
manifestação de vontade do
representante, que extravasa
as práticas políticas de
cortesia e agradecimento.
Traduz-se na oferta de algo
suficientemente valioso. Pode
directa ou indirectamente ser
levada a cabo por outra
entidade e não por agentes
do Estado.

 Coacção sobre o representante


(artigo 51.º CVDTE) e coacção sobre
o Estado (artigo 52.º CVDTE)
 Estamos perante vícios mais
graves, em relação à vontade;
 Nestes vícios, importa
considerar o princípio do
consentimento directo e o
princípio da proibição do uso
da força (coacção de natureza
militar e paramilitar);
 A questão da consagração da
coacção económica foi
requerida por Estados
soviéticos e Estados menos
desenvolvidos. Todavia, não
encontrou acolhimento junto
da maioria dos Estados e não
houve entendimento para a
sua fixação. A coacção
económica constitui um
conceito juridicamente difícil
de determinar. Continua a ser
utilizada para fazer prevalecer
a vontade de um Estado mais
poderoso sobre um Estado
menos desenvolvido,
podendo assumir
consequências jurídicas, mas
não relacionadas com a
validade do tratado.

 Coacção sobre o
representante (artigo 51º
CVDTE)
o Também se admite,
excepcionalmente,
sobre pessoas que
podem influenciar
decisivamente a
vontade do
representante (por
exemplo: coacção
sobre a família);
o Vício suficientemente
grave para conduzir à
nulidade do tratado.

 Coacção sobre o Estado


(artigo 52º CVDTE)
o Uso da força para
obtenção do
consentimento forçado
do Estado. Violação do
princípio da igualdade
entre Estados e do
princípio da proibição
do uso da força.

 Requisitos objectivos ou materiais


 O respeito do ius cogens – normas imperativas
de DI inderrogável. Constitui uma problemática
discutível a determinação dos princípios de ius
cogens, apresentando-se um regime que procura
compatibilizar esta questão.
o Artigo 53.º CVDTE – tomada de
comportamento censurável;
o Artigo 64.º CVDTE – ius cogens
superveniente. Ainda que não houvesse a
norma de ius cogens no momento da
conclusão do tratado (não havia
incompatibilidade), a partir do momento
que se consagra esse princípio, o tratado
torna-se nulo e cessa a sua vigência
(torna-se incompatível posteriormente).
 A violação do princípio da proibição
do uso da força e do princípio da
proibição do genocídio constituem
vício subjectivo e violação de ius
cogens, com diferentes efeitos em
cada caso.

 O artigo 103.º CNU – os acordos contrários à


CNU acarretam, nos termos da Carta, a nulidade
dos tratados.

 A subordinação a outro tratado –


incompatibilidade (parcial ou total) e vício de um
2.º tratado (suplementar) face a um 1.º tratado.
 A questão dos tratados normativos (por
exemplo: CNUDM28 ou Tratado do Espaço
Exterior) – subordinação de um 2.º tratado ao
tratado normativo.

 Requisitos formais
 Respeito pelas regras relativas à conclusão dos
tratados que vinculam as partes;
 Disposições da CVDTE não supletivas29, ou que
sendo supletivas, sejam aplicáveis.
o Artigo 66.º - dirimição de litígios de ius
cogens sujeito a reserva apresentada por
Portugal. A apresentação desta reserva
por Portugal, aquando da adesão em 2003
à CVDTE, suscita diversa discussão,
nomeadamente por contradizer o artigo
42.º CVDTE, em que se diz: A validade de
um tratado ou do consentimento de um
Estado em obrigar-se por um tratado só
pode ser contestada mediante a
aplicação da presente Convenção.30

o Regime das invalidades


28
O princípio da liberdade dos mares é de natureza consuetudinária e constitui ius cogens.
29
Os vícios da vontade e vícios materiais vinculam as partes, ainda que se celebrem, entre elas, outras
normas
30
Ver, a este propósito, o Decreto Presidencial de Vinculação à CVDTE, que apresenta uma salvaguarda
face a reservas apresentadas por outros Estados (objecção de reserva), disponível em:
http://dre.pt/pdf1sdip/2003/08/181A00/46624662.pdf
 Nulidade31
 Absoluta – não existe susceptibilidade de o vício
ser sanado ou ultrapassado
o Artigos 51.º e 52.º CVDTE – coacção sobre
o representante e sobre o Estado;
o Artigo 53.º CVDTE – insusceptibilidade de
produção de efeitos, com eliminação de
todos os efeitos produzidos, mesmo de
boa-fé, ao contrário do artigo 52.º CVDTE
(incompatibilidade originária);
o Artigo 64.º CVDTE – ius cogens
superveniente que torna nulo o tratado
contrário aos princípios de Direito
Cogente. Entende-se que esta situação
deverá conduzir à afectação total das
disposições do tratado, nos termos do
artigo 44.º, n.º2 CVDTE – princípio da
integralidade das disposições do tratado.
Esta posição é refutada pela Comissão de
Direito Internacional, responsável pela
redacção do texto da CVDTE (depois
concluído pelos Estados), que considera
que o tratado deve continuar em vigor.
Nos termos do artigo 64.º CVDTE, dá-se a
eliminação dos efeitos anteriormente
produzidos, com salvaguarda daqueles
produzidos com boa-fé.

 Relativa – apenas cessa a parte do tratado que


padece do vício, sendo que a nulidade pode ser
sanada, expressa ou tacitamente, neste último
caso com conhecimento anterior, revelando
atitude de conformação. Verifica-se na presença
de um vício de dolo, corrupção ou erro.

31
A distinção entre nulidade absoluta e relativa não é realizada na CVDTE.
o Efeitos
 Reconstituição da situação que
existiria se não houvesse o vício;
 Os vícios subjectivos relativos ao
consentimento de uma das partes
que incidam sobre a totalidade de
um tratado multilateral implicam a
possibilidade de desvinculação
dessa parte, não afectando o
tratado como um todo;
 Os vícios subjectivos e objectivos
que incidam sobre algumas
disposições e em que se aplique o
artigo 44.º, n.º3 CVDTE, implicam a
nulidade dessas cláusulas nas
relações entre o Estado, cujo
consentimento foi viciado e o(s)
outro(s) Estado(s). – questão de
divisibilidade, excluída em relação
a ius cogens ou coacção;
 Excepção prevista ao artigo 69.º,
n.º2, alínea b), nos termos do n.º3
do mesmo artigo, para a parte que
provocou o vício de consentimento
– princípio non venire contra
factum proprium;

o Processo (artigos 65.º a 68.º CVDTE)


 Notificação da parte que viu o seu
consentimento viciado, dirigida às
outras partes, com a intenção de:
 Desvinculação ao tratado;
 Nulidade (e cessação de
vigência) da totalidade do
tratado;
 Nulidade (e cessação de
vigência) de algumas
disposições.
o A propósito da nulidade
relativa, decorrido o
prazo para apresentar
objecções (12 meses),
pode o Estado
notificador proceder à
convalidação.

 Em caso de objecção:
 Resolução do diferendo nos
termos previamente
convencionados pelas partes
– princípio do consentimento
das partes –, com recurso a
mediação ou arbitragem, por
acordo das partes;
 Recurso aos meios do artigo
33.º CNU;
 Caso o recurso aos meios do
artigo 33.º CNU tenha sido
infrutífero, no caso de o
diferendo incidir sobre a
violação de ius cogens, é
possível o recurso por acordo
arbitragem, ou o recurso ao
TIJ. Qualquer das partes pode
recorrer ao TIJ, à margem dos
modos de atribuição de
competência ao TIJ, para
resolver ao litígio, sendo que
não são admitidas reservas a
este recurso (artigo 42.º, n.º1
CVDTE); quando o diferendo
incida sobre outro
fundamento, qualquer parte
pode solicitar recurso ao
processo de conciliação,
anexo à CVDTE, através do
Secretário-Geral da ONU.

o Suspensão da aplicação (temporariamente)


 Artigo 61.º, n.º1 CVDTE – tratado multilateral em que
uma das partes se pretende retirar, por
desaparecimento de um objecto essencial à execução
do tratado. Por exemplo, quando se extingue o objecto
do tratado (no seu núcleo, na sua essência), porque se
destrói;
 Artigo 62.º, n.º3 CVDTE – apenas em circunstâncias
excepcionais, como sejam:
 A modificação radical das circunstâncias
previstas no tratado;
 A inclusão de circunstâncias não previstas pelas
partes.
o A modificação de circunstâncias no interior
dos Estados, por exemplo de carácter
económico, é irrelevante;
o Restrição: estoppel (art. 45.º CVDTE) – se a
parte que reclama a suspensão da
aplicação contribuiu para essa alteração
das circunstâncias;
o Excepção admitida (por alguma doutrina):
nos tratados bilaterais de amizade (tratado
de aliança e de natureza política), com a
alteração radical do regime político.

 Artigo 59.º, n.º2 CVDTE – conclusão entre todas as


partes de um Tratado posterior sobre a mesma matéria
– princípio da sucessão dos tratados no tempo;
 Artigo 57.º CVDTE – previsão no tratado (verificados os
pressupostos/requisitos exigidos) ou por
consentimento de todas as partes (acordo expresso ou
tácito);
 Artigo 58.º CVDTE – por acordo entre certas partes;
 Artigo 60.º, n.os 1 e 2, alíneas a), b) e c) – violação por
parte do Estado, de conteúdo substancial, não
afectando direitos de outras partes.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 30 de Abril de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


o Cessação da vigência (eliminação dos efeitos consolidados)
 Compete às partes a decisão última, havendo causas
comuns para a suspensão de aplicação e cessação de
vigência;
 Causas (relativas às partes):
 O desaparecimento de uma das partes num
tratado multilateral não conduz à cessação de
vigência. O problema da sucessão de Estados é
tratado na Convenção de Viena sobre Sucessão
de Estados em Tratados (1978). O novo Estado
não sucede nos tratados do Estado anterior, no
que concerne à realidade político-jurídica,
podendo haver, contudo, sucessão automática.
Trata-se de uma questão negociada entre o
Estado que anteriormente tinha a jurisdição e o
novo Estado;
 Por consentimento de todas as partes;
 Denúncia nos tratados bilaterais – acto
unilateral que faz cessar a vigência de tratados
bilaterais;
 Conclusão de um tratado subsequente sobre a
mesma matéria – trata-se de um exemplo de
aplicação da lei no tempo, por incompatibilidade
entre tratado anterior e tratado posterior, ou
sendo essa a vontade das partes;
 Violação substancial (exceptio non adimpleti
contractus ou excepção do contrato não
cumprido) – não pode ser invocada se se
verificarem algumas das situações previstas no
artigo 45.º (estoppel):
o A parte que invoca a cessação de vigência
conformou-se com a violação, expressa ou
tacitamente;
o Implica rejeição do tratado por uma das
partes;
o Rejeição de ratificação obrigatória;
o Quando é rejeitado o objecto e fim do
tratado, de modo relevante.

 A ruptura das relações diplomáticas não coloca


termo à vigência dos tratados;
 Nos tratados bilaterais, pode-se colocar a
hipótese de cessação de vigência por situação de
hostilidade entre Estados. A doutrina inclina-se
apenas para a possibilidade de suspensão de
aplicação. Os tratados que regulam os conflitos e
os tratados humanitários não cessam vigência,
sendo que são precisamente estes que se
aplicam nessas circunstâncias.

 Causas (alheias às partes):


 Cessação de vigência prevista no tratado,
podendo ou não haver lugar a prorrogação;
 Num tratado (contrato), depois de cumpridas as
prestações entre partes, este cessa a vigência;
 Nos tratados multilaterais gerais, estes entram
em vigor, quando reunido um determinado
número de Estados que depositaram os
instrumentos. Excepto se o tratado o previr, este
não cessa a vigência se o número de partes for
inferior ao número necessário – prevalece o
princípio da estabilidade;
 No caso de violação substancial, compete às
outras partes decidir a retirada do Estado, sendo
que o tratado cessa vigência quando bilateral, e
suspende vigência quando multilateral;
 Quando uma parte é especialmente afectada
por uma violação de um outro Estado, este pode
unilateralmente retirar-se do acordo com essa
parte.

 Costume contra tractum: trata-se de uma


questão não consensual, sendo que a doutrina
admite desvinculação tácita.

o Denúncia e recesso
 Denúncia – acto unilateral mas não autónomo, cujas
condições em que pode ser activada estão reguladas
por outra legislação. Acarreta a cessação de vigência
apenas dos tratados bilaterais;
 Nos tratados multilaterais, a desvinculação de uma
parte assume a forma de recesso e só implica a
desvinculação (ou retirada) dessa parte, não
produzindo a cessação de vigência do tratado para
todas as partes;
 Caso o tratado não preveja a denúncia ou o recesso,
estes só poderão ter lugar com verificação de uma das
condições previstas no n.º1 do artigo 56.º CVDTE. A
denúncia não é um acto livre dos Estados, nem
constitui uma manifestação de soberania dos Estados.
Só há lugar a denúncia unilateral, quando o objecto e
fim permitem sair da economia do texto, analisado o
grau de intensidade das relações estabelecidas entre
as partes;
 Não é admissível o recesso nas convenções de
codificação (por exemplo: CVDTE) e nas que
constituem situações objectivas.

 No Tratado da União Europeia (até ao Tratado


modificativo de Lisboa), só por acordo de todas
as partes havia lugar a desvinculação de um
Estado.

o Processo relativo à suspensão, cessação de vigência,


denúncia ou recesso
 No caso de denúncia ou recesso ao abrigo do artigo
56.º, n.º1, a intenção deve ser comunicada com 12
meses de antecedência, em relação ao momento em
que ela opere (artigo 56.º, n.º2 CVDTE);
 O processo segue um regime idêntico ao regime para
as invalidades (artigos 65.º a 68.º CVDTE, para dirimir
litígios);
o Consequências da extinção de um tratado ou do recesso
num tratado multilateral
 1 – Determinadas pelas disposições do Tratado ou
resultantes de convenção entre as partes (artigo 70.º,
n.º1 CVDTE);
 2 – Supletivamente, aplica-se o artigo 70.º, n.º1, alíneas
a) e b) da CVDTE;

 Em especial, o caso de violação de ius cogens (artigo


71.º CVDTE), em que há obrigação de eliminação dos
efeitos que se gerariam e até dos efeitos que já se
geraram, o que não sucede com o artigo 70.º CVDTE.

 Direito dos Tratados – Normas Portuguesas relativas à conclusão


dos Tratados
o Podem assumir a forma de tratado (solene) ou acordo –
conceitos utilizados na CRP, com regime distinto do regime
internacional
 Tratado – para aspectos fundamentais da política
portuguesa.
 Vinculação mais solene, com ratificação pelo
Presidente da República;
 Fiscalização preventiva da constitucionalidade:
no caso de verificação, pelo TC, da existência de
inconstitucionalidade, ela pode ser ultrapassada
por confirmação da Assembleia da República;
 O artigo 277.º, n.º2 da CRP atenua os efeitos
perversos no plano internacional, numa situação
de inconstitucionalidade. Trata-se de algo
semelhante ao artigo 46.º CVDTE, que até se
revela mais exigente.
 Acordo – acto convencional com matéria e natureza
técnica específica.
 Aprovação pela Assembleia da República ou pelo
Governo, de acordo com as competências
atribuídas a cada órgão de soberania;
 A CRP apresenta um caso omisso, no que
concerne à confirmação do acordo pela AR, após
verificação de inconstitucionalidade em
fiscalização preventiva da constitucionalidade. A
doutrina admite, por maioria de razão, a
possibilidade de confirmação. É também essa a
orientação do Regimento da Assembleia da
República.

o Principais normas portuguesas relativas à conclusão dos


tratados
 Artigo 7.º CRP – dedicado às relações internacionais e
aos princípios que orientam a política externa de
Portugal, que adopta uma posição internacionalista e
plural;
 Artigo 8.º, n.º2 CRP – qualquer vinculação do Estado
Português a acto convencional implica aprovação ou
ratificação, não admitindo assinatura como modo de
vinculação – situação de desconformidade com o DI;
 Artigo 161.º, alínea i) CRP – reserva material ou
orgânica à forma de tratado;
 Artigo 277.º, n.º2 CRP – reciprocidade aceite pelo
Estado Português. O tratado não tem necessariamente
de deixar de vigorar no Estado Português, em caso de
inconstitucionalidade.
o Procedimento relativo à negociação e vinculação
 Negociação e ajuste
 Competência política do governo
o Condução das negociações, com
acompanhamento e informações
prestadas pelo Ministério dos Negócios
Estrangeiros (MNE);
o Ajuste (a rubrica e a assinatura aprovadas
pelo Conselho de Ministros, tacitamente
delegadas no Primeiro-Ministro) –
desconformidade com a CVDTE, pois o
Estado Português não atribui
competência ao Ministro dos Negócios
Estrangeiros para assinatura. Tal
circunstância pode ser ultrapassada com a
atribuição, pelo Primeiro-Ministro, de
carta de “plenos poderes” ou, por outra
via, através de assinatura ad referendum;
o Informação ao Presidente da República,
aos partidos e aos grupos parlamentares.

 Participação das organizações de trabalhadores


na Organização Internacional do Trabalho (OIT)
– negociação tripartida entre Governo,
organizações patronais e organizações de
trabalhadores.

 Aprovação
 Tratados – resolução da AR;
 Acordos
o Resolução da AR (obrigatória – os
indicados no elenco do artigo 161.º, alínea
i) da CRP e os de matéria de competência
reservada – artigos 164.º e 165.º CRP;
facultativa – que o governa entenda
submeter – artigo 161.º, alínea l);
o Decreto do Governo (os que não versem
sobre matéria da competência reservada –
absoluta ou relativa – da AR) – artigo
197.º, n.º1, alínea c) da CRP e artigo 200.º,
n.º1, alínea d) da CRP;

 Os acordos têm, obrigatoriamente,


de ser assinados pelo PR. É também
obrigatória a referenda ministerial.

 A desconformidade do regime interno português


de vinculação nos acordos com o regime
internacional – a necessidade de recorrer à
assinatura ad referendum, como salvaguarda de
aprovação posterior pelo Governo ou AR;

 Ratificação dos Tratados (acto livre), nos termos


do artigo 135.º, alínea b), através de decreto do
Presidente da República
o A não previsão de prazo pode suscitar
problemas políticos e jurídicos.

 Adesão (acto unilateral comummente praticado)


o Aplicação analógica das disposições
relativas à aprovação e ratificação, por
entendimento da doutrina, dado tratar-se
mais um caso omisso da CRP
 Publicação
 Em Diário da República, I Série, como condição
de vigência interna (mas não de validade), mas
não suficiente, pois exige-se a vinculação
internacional do Estado para vigorar no
território português, através de depósito ou
troca de instrumentos. Para além disso, exige-se
que esteja em vigor internacionalmente. Quando
entrar em vigor internacionalmente, o ministro
manda publicar despacho que declara a entrada
em vigor.

o Procedimento relativo à negociação e vinculação (eventual)


 Fiscalização preventiva da constitucionalidade
 Perante declaração de inconstitucionalidade de
“acordo internacional, deverá o diploma ser
vetado pelo PR (…) e devolvido ao órgão que o
tiver aprovado” – artigo 279.º, n.º1 CRP. O veto
por inconstitucionalidade pode ser ultrapassado
por confirmação pela AR ou por constituição de
reserva na matéria inconstitucional pelo
Governo ou pela AR.

 Referendo
 Referendo incide sobre o conteúdo. Não é
admitido levar a referendo matéria relacionada
sobre tratados de paz e rectificação de
fronteiras;
 No caso de “tratado que vise a construção e
aprofundamento da União Europeia”, é a
aprovação do próprio tratado que pode ser
submetida a referendo (artigo 295.º) – situação
especial, dada a complexidade da matéria.
o Procedimento para a desvinculação ou suspensão da
aplicação
 Não está regulada pela CRP, mas deve ter um
procedimento substancialmente idêntico ao da
vinculação (aplicação analógica), nomeadamente
assegurando a aprovação pelo órgão competente e a
intervenção do PR, para consulta e pronúncia.

o Relação entre o Direito Internacional e o Direito Interno


(relação abstracta, entre duas ordens jurídicas, que não são
absolutamente estanques e dependentes. Os direitos
nacionais constituem concorrência para a efectivação do
Direito Internacional Público)
 Dualismo – DI e direito interno constituem duas ordens
distintas que não admitem interpretação, isto é, o
plano internacional é distinto do plano interno;
 Monismo – o ordenamento jurídico é um só.
 Adoptando-se a posição do monismo, discute-se
o primado em situação de incompatibilidade:
o Monismo com primado do direito interno
– constitui a negação do Direito
Internacional. Esta orientação tem perdido
crédito, dado o processo de pluralidade
reconhecida entre ordens jurídicas, de
abertura exigida do ponto de vista social e
jurídico;
o Monismo com primado do DI – posição
defendida por Hans Kelsen.

 Posição adoptada: monismo com primado do DI


mitigado e diferenciado, tendo em consideração
as diferentes categorias de DI (comum, de
convenções internacionais, princípios
fundamentais ≠ tratados) e a especial
importância do direito constitucional, num
quadro de Estados soberanos, à luz de uma
orientação pluralista do Direito – posição de
Jorge Miranda.

 Sistemas de incorporação do DI nas ordens internas


 Recepção (associado ao monismo com primado
do DI)
o Automática (incorporação do DI sem
necessidade de qualquer formalidade);
o Condicionada (incorporação do DI com
algumas condições) – regime dos tratados
em Portugal.

 Transformação (para o DI convencional; vigora


no Reino Unido, para salvaguarda do papel do
Parlamento, e em Itália, onde vigora o dualismo,
graças ao papel desempenhado por Dionísio
Anzilotti, um dos principais dualista do século XX)
– excepcional e com limites. Não se aplicam
como actos de DI, dado o papel desempenhado
pelo Parlamento, que transforma o acto
internacional em acto interno.

 O caso português – análise do artigo 8.º CRP


o N.º1 – recepção automática do DI comum.
Evidencia o primado do DI mitigado.
 A questão do DI comum
convencional: a DUDH não constitui
um acto convencional, mas antes
um acto unilateral da AGNU.
o N.º2 – recepção condicionada de
convenções internacionais, sujeita a
ratificação ou aprovação (pela AR ou pelo
Governo) de modo regulamentar, à
condição da sua publicação oficial em
Diário da República, à vigência
internacional, com a vinculação de todos
os signatários ou do número necessário
previsto na convenção (a partir desse
momento vigora automaticamente) e à
vinculação internacional do Estado.

o N.º3 – Recepção automática das normas


de Organizações internacionais de que
Portugal seja parte, desde que tal esteja
previsto no tratado constitutivo (caso UE).
 Integrado com a Revisão
Constitucional de 1982, para
integração nas Comunidades
Europeias e recepção dos actos
imanados do Parlamento Europeu e
do Conselho Europeu;
 Aplicabilidade directa dos
regulamentos, acto unilateral da UE,
em que Portugal não participa como
Estado-parte, com produção de
efeitos na ordem jurídica dos
Estados-membros, sem necessidade
de acto de transposição;
 O artigo 8.º CRP continua a não
prever as condições de vigência dos
actos unilaterais, entendidos na sua
totalidade. Este n.º3 apenas
abrange os actos provenientes de
organizações em que Portugal seja
parte;

 Questão doutrinal:
 Na opinião de Jorge Miranda
e Jorge Bacelar Gouveia, o
n.º3, de alguma forma,
recepciona automaticamente
esses actos unilaterais, tal
como o n.º1;
 Já no entender de Fausto
Quadros e André Gonçalves
Pereira, esta posição
apresentada é refutável, não
admitindo que o n.º3
possibilite a recepção
automática desses actos.

 Aplicabilidade do n.º3 a actos de


outras Organizações Internacionais,
nomeadamente as decisões do
Conselho de Segurança da ONU – o
artigo 8.º, n.º3 estabelece a
condição de que a vigência
automática (aplicabilidade directa)
tem de se encontrar prevista no
tratado. Ora, as resoluções do
Conselho de Segurança das Nações
Unidas têm carácter obrigatório
para os Estados e autoridades
competentes, mas não se encontra
prevista a aplicabilidade directa (ou
efeito directo) na Carta das Nações
Unidas, pois estes actos não são
susceptíveis de produzir efeitos, de
per si. As resoluções do CS NU
implicam uma actuação das
autoridades competentes nacionais,
estando, por isso, dependentes da
ordem jurídica interna;
 O n.º3 do artigo 8.º não dá qualquer
indicação quanto ao alcance que os
actos da União Europeia têm na
ordem jurídica portuguesa;
 No caso de incompatibilidade entre
norma interna e norma
comunitária, qual prevalece?
 Para o Tribunal de Justiça da
União Europeia, prevalece a
norma comunitária32;
 Para os defensores dos
princípios constitucionais
fundamentais,
nomeadamente os Tribunais
Constitucionais, esta
orientação do Tribunal de
Justiça da União Europeia não
pode valer, dada a soberania
dos Estados e o não
reconhecimento da
superioridade da legislação
da UE em relação a princípios
fundamentais previstos na
Constituição;

32
Foi o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (anterior designação do Tribunal de Justiça da
União Europeia) o principal impulsionador e criador do Primado do Direito Comunitário, através de
diversos Acórdãos, que foram essenciais e tiveram um papel decisivo para podermos verificar a primazia
que é dada por este tribunal ao Direito Comunitário. O Primeiro foi o Acórdão Costa/ENEL de 15 de
Julho de 1964, onde está contida toda uma teoria das relações entre o Direito Comunitário e o Direito
Interno: Na base deste acórdão encontra-se um caso, preparado em Milão, que pretendia abordar a lei
Italiana sobre a nacionalização da energia eléctrica, e em que se denunciava que esta era antagónica
com disposições do Tratado da CE.
 Do ponto de vista político,
esta questão não é discutida.
O artigo 10.º da Constituição
Europeia (2004) estabelecia o
primado do Direito
Comunitário, o que terá
contribuído para o insucesso
do Tratado Constitucional,
chumbado, em referendo, na
França e na Holanda. Já o
Tratado de Lisboa (2007)
excluiu essa norma. Este
tratado apresenta uma
declaração anexa do serviço
jurídico do Conselho, em que
se diz que o Direito
Comunitário beneficia do
princípio do primado, no
seguimento daquilo que é a
jurisprudência consolidada do
Tribunal de Justiça. Todavia,
esta declaração não tem valor
jurídico vinculativo, tendo
apenas valor político e
integrando a chamada “soft
law”. Constitui, portanto, um
mero quadro de referência
jurídica e um elemento
interpretativo de um
compromisso político de
todos os Estados-Membros,
que manifestaram esta
orientação.
o N.º4 – recepção automática ou plena?
 O artigo 8.º, n.º4 responde a
questão colocada no n.º3, sobre as
normas comunitária que vigoram na
ordem jurídica nacional. Há o
reconhecimento inelutável que a
União Europeia não é uma qualquer
organização internacional, havendo
um vínculo de diferente intensidade.
Este n.º4 aceita o primado do
Direito Comunitário, salvo a
ressalva que impõe o respeito pelos
princípios fundamentais do Estado
de Direito Democrático. Os artigos
1.º, 2.º, 3.º e 288.º CRP constituem
limitações à abertura ao primado. Já
o artigo 7.º CRP, que consagra o
empenho do Estado Português nas
relações internacionais, pode
conduzir a uma orientação
diferente;
 Note-se que, o Estado Português
não contém o monopólio dos
princípios fundamentais do Estado
de Direito Democrático e que, aliás,
estão consagrados no Tratado da
União Europeia e integram as Leis
Fundamentais de outros Estados
europeus O Princípio da Democracia
e o Princípio do Estado de Direito
(“community of law” ou “rule of
law”) também pautam a acção do
Tribunal de Justiça, o que não
permite a recusa da aplicação do
Direito Comunitário, entendido com
um domínio à parte;
 Recorde-se que os protocolos
anexos aos Tratados têm o mesmo
valor do seu corpo dispositivo, ainda
que integrem as partes
suplementares. Tal verifica-se por
uma questão de funcionalidade ou
por apenas dizerem respeito a
alguns Estados;
 Importa salientar, também, que os
Tratados da UE foram aprovados
pela unanimidade dos Estados-
Membros, o que lhes confere uma
legitimidade política sólida;
 A Constituição dos Países Baixos é a
única dos Estados-Membros da
União Europeia que prevê a
prevalência de todo o Direito
Internacional face a uma norma
interna incompatível;
 Este n.º4 foi integrado com a
Revisão Constitucional de 2005,
aquando da discussão da
Constituição Europeia.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Quarta-Feira, 12 de Abril de 2010, 9h30-11h – Aula Teórica)


 O conflito entre normas de DI e normas
nacionais
o DI comum – formado pelos Princípios
Gerais de Direito e actos convencionais e
unilaterais normativos, com carácter
universal.
 Os princípios do artigo 7.º CRP, o
reconhecimento e empenhamento
evidenciados, e a sua consideração
como ius cogens;
 O artigo 16.º - cláusula aberta de
recepção formal – valor idêntico
 N.º2 – cláusula de recepção
da DUDH, tornando-a
constitucional.
 O artigo 29.º - valor
infraconstitucional, subordinado à
Constituição e à Lei. Outra doutrina
considera estarmos numa situação
de paridade. Trata-se de um artigo
que prossegue a cooperação
internacional em matéria penal
(judiciária e policial), como também
no quadro do Tribunal Penal
Internacional;
 Restante DI comum – valor
infraconstitucional e supralegal
(Jorge Miranda), supraconstitucional
(Gonçalves Pereira).
o DI convencional
 Valor infraconstitucional (é afastado
no caso de incompatibilidade com a
CRP) e supralegal. A consagração
directa ou indirecta sobre esta
subordinação em relação à
Constituição pode-se ser encontrada
através da possibilidade de
fiscalização da constitucionalidade.
A CRP revela-se omissa sobre esta
matéria (excepto artigo 8.º, n.º4),
ainda que faça referência ao
respeito pelo princípio da
constitucionalidade e imponha
meios apertados de controlo.
 A questão relativa ao DI
convencional da UE constitui
uma matéria controversa.

 Regime da inconstitucionalidade das normas de


DI
o Preventivo;
o Sucessivo (abstracta e concreta);
o Material;
o Orgânica e formal
 O artigo 277.º, n.º2 admite a
aplicação de normas de tratados
internacionais, regularmente
ratificados, ainda que desconformes
com a CRP, se se verificar que as
mesmas são aplicadas na ordem
jurídica dos restantes Estados-
membros (“aplicadas na ordem
jurídica da outra parte”). Isto
contraia, de algum modo, o disposto
no artigo 204.º CRP, que
impossibilita a aplicação, em
tribunal, de norma contrária à Lei
Fundamental.

 Desconformidade de actos legislativos com DI


o Inconstitucionalidade no caso da DUDH,
que assume estatuto constitucional;
o Desconformidade atípica no restante: as
normas internacionais não se integram na
pirâmide normativa da ordem jurídica
portuguesa. Portanto, não há
inconstitucionalidade, mas uma
desconformidade atípica, não afectando a
vigência e muito menos a validade do
Direito Internacional.
o Apenas as normas entendidas como
inconstitucionais é que não podem ser
aplicadas. Todas as restantes normas do
tratado, que se encontrem feridas de
inconstitucionalidade, vinculam o Estado
Português;
o A consequência jurídica de qualquer
incompatibilidade é a ineficácia, ou seja, a
impossibilidade de serem aplicadas as
normas internacionais desconformes,
ainda que não seja afectada a sua vigência
ou validade.
 Ficha de Exercícios – Direito dos Tratados I
o Grupo I
 A) Um tratado (entenda-se “acordo jurídico”) implica
um acordo de vontades entre sujeitos de DI, em que se
prevêem direitos e obrigações. No presente caso,
estaremos na presença de um acordo político de
manifestação da vontade comum, não sendo, por isso,
regulado pela CVDTE, visto que esta regula acordos
internacionais, celebrados por escrito, entre Estados.
 A CVDTE apresenta disposições inovadoras em
matéria de vícios, nomeadamente em relação a
ius cogens.

 B) A reunião referida enquadra-se na pré-negociação


(definição dos objectivos) e na negociação geral
(determinação dos subtemas e calendarização do
negócio);

 C) Habilitação negocial dos intervenientes:


 Ministro dos Negócios Estrangeiros do Estado A
– habilitação funcional genérica (artigo 7.º, n.º2,
a) CVDTE);
 Embaixador do Estado B – habilitação funcional
limitada, apenas para adopção do texto (artigo
7.º, n.º2, b) CVDTE);
 Ministros do Ambiente dos Estados A e B –
habilitação específica (artigo 7.º, n.º1, b) CVDTE),
para a prática de actos celebrativos, através de
carta de “plenos poderes”. Contudo, pode não
ser exigida carta de “plenos poderes”, se se
verificar que aquela personalidade está
habilitada. Ora, no presente caso, estão
cumpridos estes requisitos.
 D) Efeitos das assinaturas efectuadas:
 Assinatura ad referendum do Ministro do
Ambiente do Estado A: carece de confirmação
posterior que, quando obtida, começa a produzir
os seus efeitos, a partir da assinatura;
 Assinatura do chefe de gabinete: não está
habilitado para tal, não havendo produção de
efeitos, algo que pode ser sanado através de
autenticação do texto, tornando-se definitivo e
imutável (artigo 8.º CVDTE) – resposta à alínea
E).

 F) Apreciação dos argumentos à luz da CVDTE:


 Artigo 13.º CVDTE – troca de instrumentos de
vinculação;
 A nota diplomática do Estado B constitui um
protesto, sendo um acto juridicamente relevante
em que o Estado manifesta a desconformidade
com o Tratado;
 De acordo com o artigo 18.º CVDTE, são
estabelecidas obrigações para os Estados, ainda
que não se encontrem vinculados. Há uma
obrigação negativa de abstenção, à luz do
princípio da boa-fé (in contraendo);
 Havendo um compromisso de adopção de um
novo texto, não pode o Estado agir em sentido
inverso.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Quarta-Feira, 12 de Abril de 2010, 14h-17h – Aula Teórica)


 Ficha de Exercícios – Direito dos Tratados I (continuação)
o Grupo II
 A) Aplicação da CVDTE, nos termos do seu artigo 5.º,
visto que o tratado em causa constitui um acto
constitutivo de uma organização internacional;
 B) O Tratado foi adoptado nos termos do artigo 9.º,
n.º2 da CVDTE, cumprida a exigência de maioria
qualificada de 2/3 dos Estados;
 C) Possibilidade de admissão de assinatura diferida,
mantendo-se os Estados como subscritores originários;
 D) Adesão – constitui, enquanto fonte de direito, um
acto unilateral não autónomo, pois os requisitos
exigidos e os efeitos gerados estão regulados pelo
tratado (outra fonte de direito);
 E) Nos termos do artigo 24.º, n.º4 CVDTE, dá-se a
produção de efeitos a partir da adopção do texto, com
a assinatura – efeitos de pré-vigência (antes da entrada
em vigor do Tratado);
 F) O Estado C é o depositário dos instrumentos, cujas
funções se encontram previstas no artigo 77.º CVDTE.
De acordo com o artigo 76.º, n.º2 CVDTE, são funções
de carácter internacional, que exigem a adopção de
uma posição de imparcialidade;
 G) Os Estados não se encontram vinculados ao Tratado.
Recorde-se que a ratificação é um acto livre. As
obrigações previstas no artigo 18.º CVDTE, de acordo
com o princípio da boa-fé, só vigoram até os Estados
manifestarem a sua intenção de não se vincularem.
Como os Estados não ratificaram o Tratado, não se
encontram vinculados a ele;
 H) A formulação e aceitação de reservas em geral
encontram-se reguladas nos artigos 19.º e 20.º CVDTE.
 Por reserva, entende-se o acto unilateral que
modifica ou exclui disposições do tratado;
 Constituem requisitos exigidos para a
admissibilidade de reservas:
o Condição temporal – cumprida, no
momento da ratificação;
o Condição material – a reserva não é
proibida pelo tratado em questão, nem é
incompatível com o objecto e fim do
tratado.

 Importa, também, recordar a admissibilidade do


princípio da reserva, na tentativa de reunião do
maior número de Estados;
 No Parecer do TIJ sobre a Convenção do
Genocídio, não se admitem reservas sobre a
noção de genocídio, mas são admitidas sobre a
questão da competência do TIJ, ainda que os
Estados se mantenham adstritos às obrigações
substanciais. O mesmo se verifica no Parecer
sobre o caso Congo vs. Ruanda;
 O Estatuto de Roma sobre o Tribunal Penal
Internacional (ERTIJ) não admite reservas, mas
recorde-se que ele não define os tipos legais de
crime, apresentando antes disposições de
carácter processual;
 Cláusula 24.ª - mecanismo de controlo
garantístico das obrigações;
 A prática sobre a qual incidiu uma reserva não é
incompatível com o fim e objecto do Tratado.
Seria incompatível se incidisse sobre medidas de
fiscalização;
 Artigo 20.º, n.º3 CVDTE – aceitação de reserva
sujeita a condição suplementar: a reserva tem de
ser aceite pelo órgão competente da organização
internacional, senão não há produção de efeitos;

 Atente-se nas condições jurídicas desta decisão:


o O Estado não está vinculado ao tratado
ou
o O Estado não está vinculado ao tratado,
por se tratar de uma questão essencial
para a vinculação do Estado, admitindo-se
a desvinculação nesta matéria;
ou
o O Estado está vinculado ao tratado na
íntegra.

 I) O Estado F apresenta uma reserva, modificando os


termos da cláusula 25.ª. O Estado P formulou uma
declaração de objecção. Logo, nos termos do artigo
21.º, n.º3 CVDTE, as disposições (cláusula 25.º) sobre
as quais incide a reserva não se aplicam nas relações
entre estes Estados. Para além disso, apresenta uma
retaliação, ao recusar a participação de nacionais seus
em missões científicas no território do Estado F. Trata-
se de mais uma reserva modificativa da regra relativa
às missões de investigação.
 O mesmo sucede com a objecção e reserva
apresentada pelo Estado Português ao artigo
66.º CVDTE.

 J) Não estamos na presença de uma reserva, na medida


em que não incide sobre uma disposição do tratado.
Trata-se de uma declaração política, tão-só com
sentido político.
 K) O Estado W, que não esteve presente na convenção
internacional, decidiu aderir ao tratado, vinculando-se
ao mesmo, no dia 1/04/2008.
 L) Pode apresentar uma reserva no momento da
vinculação, que ocorre com a adesão.
 M) O Tratado em referência é multilateral, de
cooperação (≠ integração), com fins especiais, sendo,
do ponto de vista subjectivo, um tratado aberto, mas
não geral, na medida em que admite apenas os Estados
ribeirinhos do Mar da Palha (semi-aberto).

 Ficha de Exercícios – Direito dos Tratados II


o Grupo I
 A) Na medida em que o Estado C necessitava de
realizar o acto de ratificação e o depósito do seu
instrumento ocorreu a 20/8/2006, tendo sido
precisamente o último acto de manifestação de
consentimento, o Tratado entrou em vigor nessa data;
 B) Tratado multilateral, de cooperação, especial e, do
ponto de vista subjectivo, fechado, pois não se prevê a
abertura a outros Estados (apenas A, B, C, D);
 C) e D) Procedimento para requisição de nulidade da
cláusula:
 Encontra-se previsto nos artigos 65.º e seguintes
da CVDTE. Inicia-se com uma notificação, feita
por escrito;
 Nos termos do artigo 50.º, pode-se entender que
a oferta do quadro de Renoir visava corromper o
representante do outro Estado, que aliás
modificou a sua posição. Não se trata de uma
mera oferta ao Estado, para pertencer ao seu
património;
 Em função das circunstâncias, haverá lugar à
nulidade relativa, com convalidação, depois de
solicitada por um Estado;
 Tendo decorrido um ano desde o conhecimento
da prática ilícita até a requisição de declaração
de nulidade, poder-se-á entender que o Estado
requerente aceitou a situação tornada pública
em Dezembro de 2006 (artigo 45.º, b) CVDTE).
Note-se, ainda, que o novo Governo, desde Abril
de 2007 até Dezembro do mesmo ano, deixou o
tratado vigorar, conformando-se com a situação
verificada;
 Na nulidade absoluta, não havia lugar a
convalidação por parte do Estado, por
conformação deste;
 Há lugar a anulação parcial das cláusulas 3 e 4,
nos termos do artigo 44.º, números 2 e 4 da
CVDTE. O efeito é tão-só a desvinculação do
Estado em relação àquelas cláusulas, que
continuam a vigorar para as relações entre A, C e
D.

 E) No presente caso, o Estado C procura colocar fim à


cooperação com o Estado A, com fundamento no artigo
52.º CVDTE, relativo ao exercício de coacção sobre o
Estado, por ameaça do uso da força.
 Constitui um vício muito grave, que afecta o
consentimento consciente e livre do Estado e a
sua esfera jurídica;
 Também nos termos do artigo 2.º CNU (e do
artigo 53.º CVDTE), que é admitido como ius
cogens, que prevê o princípio da proibição do
uso da força, e de acordo com o princípio da
resolução pacífica dos diferendos entre Estados,
há lugar à nulidade absoluta, o que conduz a que
o Estado se desvincule do tratado na plenitude;
 Nesta situação, a proibição do uso da força cai
nos artigos 52.º e 53.º CVDTE;
 Os artigos 70.º e 71.º CVDTE prevêem a
eliminação de todos os efeitos gerados, até
aqueles cumpridos de boa-fé, isto se a alegação
se fundamentar no artigo 53.º CVDTE (ius
cogens). Diferente regime se prevê, caso
admitamos que a presente situação cai no artigo
52.º CVDTE, o que leva a que apenas os efeitos
produzidos de má-fé são eliminados;
 Recorde-se que todos os Estados, até aqueles
que não são parte do Tratado, podem solicitar a
declaração de nulidade se estiver em causa a
violação de uma norma imperativa de Direito
Internacional (ius cogens) – artigos 53.º e 64.º
CVDTE. Neste caso, o TIJ tem competência de
princípio para intervir, isto se as partes não
decidirem recorrer à arbitragem (artigo 66.º, a)
CVDTE).

 F) Estamos perante uma modificação subjectiva das


disposições do Tratado, realizada apenas por duas
partes, somente nas relações mútuas. O artigo 41.º,
n.º1, alínea b) apresenta um conjunto de condições
cumulativas (não alternativas) impostas para haver
lugar à modificação. Em princípio, os requisitos exigidos
estão cumpridos, não se colocando em causa direitos
de outros Estados nem se dificultando a posição
destes. Além disso, apresenta objectivos lícitos.
o Grupo II
 A) Admite-se a existência de uma violação substancial
do tratado (artigo 60.º, n.os 1, 2 e 3), na medida em que
há uma violação essencial por parte de B, que coloca
em causa o objecto e o fim do tratado.
 O presente tratado visa regular a protecção e
exploração dos recursos;
 O tratado proíbe o despejo de efluentes
químicos, que produzam um efeito nefasto
(ainda que reduzido) sobre a alga Margarida;
 Aplica-se o n.º2 do artigo 60.º CVDTE, visto
estarmos na presença de um tratado
multilateral, podendo haver lugar a suspensão
do tratado ou a cessação da vigência do mesmo,
de acordo com o critério dos Estados. Podem,
por outro lado, decidir-se por não seguir
nenhuma das opções, exigindo apenas o
pagamento dos danos causados, pois as
situações descritas até podem constituir um
benefício para o infractor;
 Nos termos do artigo 44.º CVDTE, pode haver
lugar a suspensão parcial;
 Há lugar a uma desvinculação de B às relações
que estabelecia com os restantes Estados,
mantendo-se contudo as relações existentes
entre os outros Estados (A, C, D);
 Note-se que o n.º5 do artigo 60.º CVDTE impede
a cessação de vigência ou a suspensão de
aplicação do tratado, estando em causa Direito
Internacional Humanitário.
 B) O Estado B pretende suspender a cláusula que
permite a captura do Fausto pelos restantes Estados:
 Analisando o 1.º parágrafo do caso prático
exposto, apenas o Estado B contém essa espécie;
 Nos termos do artigo 62.º, n.º1 CVDTE, uma
alteração fundamental das circunstâncias não
podia haver lugar à suspensão da cláusula, salvo
se:
o A existência dessas circunstâncias tiver
constituído uma base essencial do
consentimento das Partes em ficarem
vinculadas pelo tratado; e
o Essa alteração tiver por efeito a
modificação radical da natureza das
obrigações assumidas no tratado.

 Com a redução assinalável da população daquela


espécie (20% em 2 anos), poder-se-ia admitir que
estavam preenchidos os requisitos para a
suspensão da cláusula. Contudo, a alteração
substancial das circunstâncias foi provocada pelo
Estado B, com o lançamento de substâncias
prejudiciais, não havendo, por isso, lugar a
alegação (artigo 62.º, n.º2, alínea b).

 Ficha de Exercícios – Direito dos Tratados III


o Grupo II
 A) Poderá o PR não ratificar?
 Nos termos do artigo 161.º, alínea i), é da
competência da AR a aprovação da adesão;
 O Presidente da República poderá não ratificar,
visto tratar-se de um acto livre, fundamentando
essa sua posição por estar em causa a bondade
da referida organização. Trata-se, contudo, de
uma matéria em que a CRP se revela omissa,
nomeadamente sobre prazos;
 B) Nos termos do artigo 279.º, n.º4 da CRP, o tratado
pode ser ratificado, obtida uma maioria de 2/3 dos
deputados da AR, que confirmem a aprovação, o que
significa que a inconstitucionalidade pode ser
ultrapassada. Esta disposição vale para os acordos (não
solenes) aprovados pela AR e pelo Governo, por
interpretação extensiva, realizada pela doutrina, da
expressão “tratado internacional”. Estamos perante
mais uma questão em que a CRP é omissa.
 C) Havendo lugar a uma fiscalização sucessiva (após a
entrada em vigor), nos termos do artigo 282.º CRP (lido
com as devidas adaptações, dado que a sua redacção
foi elaborada a pensar em leis nacionais), e tendo sido
declarada a existência de inconstitucionalidade, há
uma desconformidade atípica, que impede a sua
manutenção em vigor, ainda que, de acordo com o
artigo 277.º, número 2 da Lei Fundamental, a
verificação da existência de inconstitucionalidade
orgânica (incompetência absoluta, relativa) ou formal
(reunião de quórum deliberativo) de tratado
internacional, regularmente ratificado, pode não
constituir impedimento para a aplicação das normas
nele constantes, desde que tais normas sejam
aplicadas na ordem jurídica das restantes partes,
excepto se a inconstitucionalidade declarada conduzir à
violação de uma disposição fundamental.
 Atente-se na limitação de efeitos para o futuro
(artigo 282.º, n.º4).
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Segunda-Feira, 17 de Abril de 2010, 16h-18h – Aula Teórica)


 Sujeitos de Direito Internacional
o Sujeitos jurídicos (ou entidades) detentores de personalidade
jurídica (ou subjectividade) internacional. Qualidade do ente
que pode ser titular de relações jurídicas internacionais;
o Importa distinguir a titularidade do objecto das relações
jurídicas internacionais;
o O conceito abstracto “personalidade jurídica” revela-se
insuficiente para determinar o objecto e fim da
personalidade. O sujeito tem igualmente de ser titular de
capacidade jurídica:
 De gozo – conjunto de direitos e obrigações que
podem integrar a personalidade jurídica;
 De exercício – instrumental à capacidade de gozo,
constitui a capacidade de, por si próprio, intervir nas
relações jurídicas internacionais. Um sujeito desprovido
de capacidade de exercício necessita de um
intermediário para fazer uso de direitos e obrigações
de que dispõe.

 Âmbito
 Genérica: os Estados são detentores de todos os
direitos e obrigações que o DI pode produzir
 Derivada: de acordo, por exemplo, com o
princípio da especialidade ou a natureza do
sujeito.

o Reconhecimento – constitui sempre um acto jurídico.


 De iure / de facto: distinção irrelevante, com mero
interessante histórico. O reconhecimento de facto visa
acautelar as consequências jurídicas do
reconhecimento;
 Definitivo / provisório: o reconhecimento definitivo é
irrecusável e inderrogável; o reconhecimento
provisório pode ser sujeito a recuo.
 Expresso / tácito: reconhecimento expresso é
declarado. Enquanto o reconhecimento tácito deduz-se
de outros actos jurídicos, como por exemplo a
apresentação de reclamação junto de um sujeito de DI
ou o estabelecimento de relações diplomáticas e
consulares;
 Pleno / Condicional: o reconhecimento pleno é
absoluto, imediato e incondicional em todos os
domínios; o reconhecimento condicional está sujeito à
verificação de um facto.

o Classificações dos sujeitos de DI


 Um dos elementos fundamentais para haver
reconhecimento como sujeito de DI é a existência de
um território que pertença ao sujeito e sobre o qual ele
exerce a administração;
 A Santa Sé é entendida por alguns como uma cidade-
estado, opinião que não é perfilhada pelas autoridades
eclesiásticas
 A classificação de um sujeito de DI como permanente
pressupõe uma vocação duradoura, que até pode ser
eterna.

o Os tipos principais de sujeitos de DI


 Os Estados constituem o paradigma de sujeitos de DI,
constituindo os principais sujeitos transversalmente,
com uma esfera jurídica imensa. Importa também
considerar entidades afins supra-estatais e infra-
estatais;
 A Humanidade, a Comunidade Internacional e os povos
gozam de um estatuto jurídico ambíguo, pois não são
reconhecidos unanimemente como sujeitos de DI.
 Humanidade – conjunto de todas as pessoas, de
modo contínuo (no passado e no futuro)
o A noção de “Área” constante da CNUDM
refere-se aos fundos marinhos do alto mar
(solo e subsolo). Constitui património
explorado e gerido em prol da
Humanidade, que é titular deste bem
comum;
o No Preâmbulo do Estatuto do TPI,
encontramos uma referência à
Humanidade, mais precisamente aos
crimes contra a Humanidade, que a
afectam como um todo, ferindo a
dignidade humana;
o O Espaço Exterior também é considerado
património da Humanidade.

 Comunidade Internacional
o Formada pelos Estados, organizações
internacionais e outras organizações e
estruturas;
o O TPI constitui uma entidade de referência
em matéria de crimes contra a
Humanidade.

 Os povos
o Direitos dos povos (em geral);
o Direitos dos povos (em particular).
o Os Sujeitos de DI
 Estados e entidades afins
 Definição tradicional de Estado soberano, por
Jellinek – constituído pelos elementos:
o Território: parcela de Estado no globo
delimitado, com ou sem território lagunar;
o Povo: trata-se de um conceito sociológico.
A conotação jurídica atribuída pelas
constituições é útil, mas apenas a
posteriori, estando associada à
nacionalidade ou à cidadania, o que
pressupõe um poder político que a
atribua. Esta situação encontra-se
estabilizada. Pelo contrário, existem
situações instáveis, relacionadas com o
princípio da auto-determinação dos povos,
como nos casos do Kosovo (em que a
última nacionalidade dos seus habitantes é
a sérvia) e de Portugal, nos anos 60, em
que, “do Minho a Timor”, igual cidadania.
Essa situação é admissível a nível
constitucional, mas não a nível
internacional. Em alternativa, avança-se
com a noção de população (constante da
Convenção de Montevideu), que reside
permanentemente no território,
excluindo-se os cidadãos estrangeiros.
Trata-se de uma noção demasiado neutra,
pois os elementos da população podem
não manter ligação efectiva (“ânimo de
vida em comum” no presente e para o
futuro). É, portanto, um elemento
subjectivo, que implica um passado em
comum. O conceito tradicional de povo
implicava uma comunidade com uma
identidade em comum, ao nível da
história, cultura, língua, religião. Trata-se
de uma noção ultrapassada, visto que as
sociedades actuais serem laicas e
multiculturais. No Kosovo, predomina a
religião muçulmana.
o Poder político: existem vários poderes
políticos possíveis. Entende-se que o
poder político deve ser legítimo,
democrático (a promoção da democracia é
objectivo da ONU) e pleno (reunião dos
meios financeiros e instrumentais e das
várias prerrogativas – executivo, judicial e
legislativo).

 Ius tractum – capacidade de assinar tratados e


acordos internacionais;
 Ius legationis – capacidade de enviar
Representantes de Política Externa para
entidades nacionais e/ou intergovernamentais
(i.e. Nações Unidas);
 Direito de reclamação internacional
 Ius belli – entendido, tradicionalmente, como a
“diplomacia por outros meios”´, nas palavras de
Clausewitz. A partir do século XX, apenas é
admitido o direito de legítima defesa. Este
conceito também pode abarcar a participação
activa em sistemas de segurança internacional.
Como vemos, a concepção actual é bastante
divergente da noção tradicional.

 Com a Convenção de Montevideu (1933), que


apresenta definição de Estado, foi acrescentado
um quarto elemento, associado ao poder
político, que corresponde à capacidade para
estabelecer relações internacionais;
 Ânimo intemporal, que pode terminar por
vicissitudes várias;

 Princípio da auto-determinação dos povos –


surgido no século XIX, com os nacionalismos,
este princípio não foi concretizado com a I
Guerra Mundial, sendo-o apenas com a Segunda
Grande Guerra. Traduz o ditame “cada nação,
um Estado; cada Estado, uma nação” 33.
Compreensivelmente, será impossível
concretizar este princípio na plenitude. No
espaço europeu, com exclusão da Rússia,
admite-se a existência de cerca de 200 povos,
mas apenas existem cerca de 50 Estados 34. A
libertação dos Estados colonizadores pode dar-se
por via da35:
o Independência;
o Integração noutros Estados (por exemplo,
o Kosovo pode integrar-se na Albânia, em
virtude de terem religião e língua comum
e já terem sido administrados em comum);
o Autodeterminação no interior do próprio
Estado – o modo de admitir uma livre
autodeterminação é o referendo (como
sucedeu, em 1999, em Timor). No Kosovo,
não houve referendo, mas as entidades
que declararam a independência foram
eleitas democraticamente. A maior parte
das auto-determinações não foi alvo de
referendo anterior.
33
As Resoluções 1514 e 1541 da AGNU direccionam-se para a libertação colonial dos impérios europeus.
34
A maior parte dos Estados surgiu em contradição com aquilo que se entendia, no momento, por
Direito Internacional, ainda que seja irrelevante o modo como se constituíram.
35
No caso específico da formação da Bélgica (1830), tratou-se de uma criação artificial após as guerras
napoleónicas, como “tampão” entre França e Bélgica. A sua consolidação deu-se por razões históricas.
 A Coreia constitui um Estado dividido
politicamente, não deixando de ser um só
Estado. Outro caso especial é aquele
protagonizado pela República Popular da China e
de Taiwan (Ilha Formosa), em que se suscita a
dúvida: será um só povo?
 No Tibete, temos um líder espiritual e temporal
(o Dalai Lama) com concentração de poderes
(não democrático);
 O referendo realizado no País Basco não foi
vinculativo. Note-se que o País Basco goza,
actualmente, de autonomia fiscal e de
segurança.

 Teorias do Reconhecimento dos Estados


o Declarativa: ainda que exista o aval de
outros sujeitos de DI e até de uma
entidade central, este é meramente
declarativo. Não existe constituição do
estatuto de sujeito de DI com o
reconhecimento, pois a existência de um
determinado sujeito de DI é independente
do reconhecimento, visto que não se
coloca em causa a existência de um sujeito
de DI. Com o reconhecimento, não se
altera o estatuto jurídico do Estado;
o Constitutiva – a personalidade jurídica só
se constitui com o reconhecimento.
 Pelo facto de existir o dever de não
reconhecimento de situações resultado de actos
contrários ao DI, alguns daqui retiram que o
reconhecimento do Estado é reconstitutivo;
 Importa, também, considerar a possibilidade de
reconhecimento prematuro, em situações que
não estão perfeitamente definidas, podendo
haver recuo posterior no reconhecimento;
 Um exemplo clássico do não reconhecimento da
conquista como modo de aquisição territorial é a
doutrina Stimson. Henry Stimson, então
Secretário de Estado dos Estados Unidos em
1932, não reconheceu a anexação da Manchúria
pelo Japão, como uma patente violação do
tratado Briand-Kellog de 1928 que renunciava a
guerra (contrário ao DI);
 No caso do Kosovo, é indiscutível que existe um
território, mas questiona-se se existe um povo
kosovar (parte albanês, parte sérvio, parte turco)
e poder político, aquando da declaração de
independência? E a declaração unilateral de
independência é contrária ao DI? Como não foi
exercida por menos não pacíficos, não é
contrária;
 O reconhecimento é relevante para o
estabelecimento de relações internacionais,
sendo também fundamental para o exercício de
uma esfera de direitos e obrigações, mas não é
constitutivo da personalidade jurídica
internacional;
 Muitos consideram que o Kosovo é uma questão
de facto sobre a qual o DI não versa, não
devendo por isso o TIJ intervir;
 Reconhecimento do Governo – é o Governo que
representa o Estado internacionalmente.
o Doutrina da legitimidade (Tobar ou de
Wilson) – necessidade de o Governo ter
uma base de legitimidade para
representar o povo (governo democrático,
isto é, não ilegítimo). Esta doutrina poderá
constituir uma ingerência nos assuntos
internos do Estado (excepto: governos no
exílio);
o Doutrina da efectividade – por razões
pragmáticas, prevalece esta doutrina, para
evitar situações de vazio jurídico.

 Estados de soberania restrita – não têm


plenitude de soberania, apresentam lacuna na
capacidade de exercício:
o Excluída – limitação na capacidade de
gozo;
o Limitada.

o Estados exíguos ≠ micro-estados – Os


Estados exíguos mantêm uma relação
privilegiada com um Estado vizinho, que
assume as prerrogativas (relação de
dependência); os micro-estados
apresentam dimensão territorial reduzida,
mas gozam de capacidade plena;
o Estados neutralizados – mantêm ius belli
em defesa própria (por exemplo: Suíça,
Áustria, Irlanda);
o Estados confederados – os Estados-parte
mantêm-se soberanos, sendo que a
confederação representa-os em política
externa;
o Estados não-soberanos – podem celebrar
tratados internacionais, com capacidade
internacional limitada pela Constituição
interna. Ucrânia e Bielorrússia na ONU,
antes de 1993, no quadro da URSS.
 Estados pró-estatais
o Beligerantes – de natureza político-militar,
lutam contra o Estado com jurisdição
sobre o território, para derrube ou
cessação. Sujeitos a reconhecimento
constitutivo de, pelo menos, um Estado,
que pode ser o Estado que sobre a
beligerância, para impor a vinculação do
beligerante ao DI, assumindo as
consequências da sua prática. Têm de ter
o controlo efectivo de uma parte do
território (governo de facto)
Desaparecem, enquanto sujeitos de DI, em
virtude de derrota no conflito ou por
integração no Estado ocupado;
o Insurrectos ou insurgentes – não
dominam uma parte do território (≠
beligerantes). Por exemplo, as FARC
(Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia);
o Movimentos de libertação nacional – são
pró-estatais, porque visam constituir um
Estado. Constituem requisitos: a
representação de um povo (ou nação) e o
controlo político (não de organização ou
de autoridade). Não implica, ao contrário
dos beligerantes, um elemento territorial.
A Organização para a Libertação da
Palestina (OLP) não tinha base territorial,
tendo o povo palestiniano declarado
independência em 1975.
o A Autoridade Palestiniana e os respectivos
territórios – entidade pré-estatal?
Encontra-se limitada em algumas parcelas,
não dispondo do controlo do Espaço
Marítimo e Aéreo.
 Estados infra-estatais
o Hong-Kong e Macau constituem territórios
infra-estatais com capacidade
internacional. Apresentam um âmbito
limitado de competência governativa
internacional.

 Instituições não estatais


 Santa Sé – sujeito de natureza espiritual /
religiosa, que não é constituído por povo ou
população, isto porque a população do Vaticano
é italiana. É entendida, por alguns, como uma
organização não-governamental (ONG), que
mantém relações com dezenas de Estados. O
Papa constitui o órgão dirigente, juntamente
com a Cúria Romana. Tem capacidade limitada,
aproximando-se daquilo que são as Organizações
Internacionais;
 Soberana Ordem de Malta – associada à Igreja
Católica, não é reconhecido por muitos como
sujeito de DI. Constitui um sujeito sui generis;
 Cruz Vermelha Internacional – reconhecida pela
generalidade, como sujeito de DI, a partir do
século XIX, gozando de algumas prerrogativas de
imunidade.

 Organizações internacionais
 Associações de sujeitos de DI (Estados, outras
organizações internacionais, outros sujeitos),
permanentes (com vocação duradoura), mas não
necessariamente sem termo, dotadas de direito
próprio (ordem jurídica da própria organização).
Constituem entidades finalistas (com fins gerais
ou especiais). Não têm base territorial (não é
direito constitutivo da organização, implicando
intermediação dos Estados);
 Capacidade de gozo limitada pelo princípio da
especialidade (não há competência de princípio);
 Classificações de OI
o Estrutura – trata-se de uma difícil
distinção, não havendo nenhuma
organização que assuma apenas uma das
possíveis classificações.
 Intergovernamentais – não perda
de soberania dos membros em favor
da OI;
 Supranacionais – classificação que
surge a partir da iniciação do
processo de integração europeia,
sendo conferidos à UE poderes
soberanos com as concomitantes
restrições aos Estados-membros. A
UE goza de capacidade de adoptar
actos sem necessidade de processo
internos dos Estados (artigo 8.º, n.º3
CRP). A UE tem também vertentes
mais próximas da
intergovernamentalidade.

 O indivíduo e outros entes particulares


 O indivíduo
o Titular ou objecto passivo de direitos e
obrigações constantes do DI (vêm
preenchendo este requisito), a partir da II
Guerra Mundial, com actos unilaterais e
multilaterais. Excepção feita, no quadro da
UE, em que torna sujeito activo.
o Goza do direito de queixa junto de um
Comité, que aprecia o respeito dos direitos
fundamentais (Direitos Civis e Políticos e
Direitos Económicos, Sociais e Culturais)
pelos Estados, não gozando, contudo, de
poder judicial. De todo, os Estados ficam
sujeitos à censura internacional;
o A possibilidade conferida ao indivíduo para
poder reclamar internacionalmente não
deixa o indivíduo desprotegido, face à
inacção do Estado;
o Ao nível da Convenção Europeia dos
Direitos do Homem (CEDH), é conferida a
possibilidade de um particular apresentar
queixa junto do Tribunal Europeu dos
Direitos Humanos (TEDH), encetando
processo judicial que pode conduzir à
condenação do Estado, com pagamento
de indemnização ao particular;
o A responsabilidade do TPI em crimes
internacionais e em crimes de guerra. A
jurisdição do TPI é obrigatória para os
Estados que assinaram o ERTPI. A
condenação de crimes internacionais pode
ser encetadas pelos Estados ou pelo TPI;
o Não são sujeitos com fins gerais;
o Apenas os indivíduos não podem sofrer
alterações que possam conduzir à perda
da condição de sujeito de DI.

 As ONG (pessoas colectivas sem fins lucrativos): do


ponto de vista formal, não são sujeitos de DI.
 A sua personalidade é, em rigor, regulada pela
Constituição do Estado;
 Participam, enquanto observadores, no
funcionamento de Organizações Internacionais;
 Apenas no quadro da Convenção Europeia dos
Direitos do Homem se lhes reconhece o direito
de apresentação de petições ou de queixa.

 As sociedades transnacionais (ou multinacionais): são


apenas sujeitos de Direito Interno.
 A regulação das relações económicas
internacionais desempenhada pelo CIRDI, numa
tentativa de estabilização das relações entre
Estados e empresas multinacionais;
 Desempenham um papel activo na defesa dos
seus interesses, não agindo em prol do DI.

o Direitos e deveres fundamentais dos Estados


 A questão do dever de ingerência humanitária
 Entendido como dever de responsabilidade
internacional;
 Dever de ingerência humanitária de Estados e
organizações internacionais (nomeadamente a
ONU ou a Cruz Vermelha Internacional), em
defesa dos interesses comuns da Comunidade
Internacional, dentro dos limites do
indispensável, para a salvaguarda da
Humanidade;
 Caso Birmânia – depois de catástrofe ambiental,
a França tentou encetar uma investida sobre o
Estado birmanês, um dos mais isolacionistas do
Mundo, tal como manifestado pelo Ministro dos
Negócios Estrangeiros francês, Bernard
Kouchner, também fundador dos Médecins sans
Frontières (MSF), para aceitar a ajuda
internacional destinada às vítimas do ciclone
“Nargis”;
 Obviamente, existem riscos associados a este
mecanismos, pois podem fomentar laivos
colonialistas nos Estados mais desenvolvidos.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

(Sexta-Feira, 21 de Abril de 2010, 11h-13h – Aula Teórica)


 Vicissitudes do Estado – circunstâncias de facto que afectam os
elementos constitutivos do Estado (população, poder político e
território)
o A irrelevância das vicissitudes políticas internas – princípio da
continuidade do Estado (havendo mudança de governo no
plano interno, mantém-se o Estado como sujeito jurídico de
DI);
o Os Tratados aos quais a Sérvia estava vinculada também
vinculam o Kosovo? Como resolver?;
o Sucessão da propriedade pública, arquivos e dívidas: por
exemplo, no caso da URSS, quem passa a ser titular?;
o Efeitos pessoais da sucessão de Estados - a questão da
nacionalidade
 Deve considera-se a vontade da pessoa, conferindo a
possibilidade de escolher a nacionalidade (a anterior ou
a nova). Como critério objectivo, há uma presunção
fundada na residência;
 Importa prevenir o risco de apatridia, tal como fez a
Convenção do Conselho da Europa na matéria, de
2006, que entrou em vigor a 1 de Maio de 2009.
 Domínio interno e domínio internacional – de apropriação
exclusiva pelos Estados
o Domínios internos
 Território
 Superfície terrestre lato sensu;
 Mar territorial – Há uma restrição à plena
soberania do Estado: o direito de passagem
inofensiva, aplicado a navios civis e militares.
Passagem contínua sem parar só com
autorização;
 Espaço aéreo – A coluna de ar situada sobre a
superfície terrestre e o mar territorial. O limite
superior é o espaço extra-atmosférico, cujos
critérios não estão perfeitamente determinados
(por exemplo: ausência de gravidade, colocação
de satélites). Não há direito de passagem
inofensiva idêntico ao do mar territorial. Para
aviação militar, é obrigatória autorização.

 Importa salientar, aqui, o princípio da soberania


sobre os recursos, consagrada na Carta dos
Direitos e Deveres Fundamentais (Económicos e
Sociais) dos Estados (Resolução 3281 (XXIV)
AGNU, 1974);
 Contudo, há deveres resultantes do DI que
condicionam e restringem a plena jurisdição do
Estado sobre o seu território (por exemplo: o
dever de proteger e preservar o meio marinho,
do artigo 193.º CNUDM), sem sanção pré-
determinada;
 Aplicação extraterritorial do direito estadual – no
interior dos edifícios diplomáticos e consulares e
sobre o pessoal a eles afecto e sobre os navios e
aeronaves aí matriculados no Estado (Princípio
do Direito do Estado de Bandeira). Importa,
contudo, salientar que as embaixadas não são
território do Estado representado. Contudo, por
força das relações diplomáticas, no interior dos
edifícios aplica-se o Direito do Estadual
representado.

o Domínios de extensão da jurisdição estadual - não fazem


parte do território dos Estados, sendo que a titularidade
destas zonas é internacional, ainda que se aplique a jurisdição
estadual.
 Zona contígua
 Plataforma continental – a reivindicação portuguesa
para a extensão da sua plataforma continental poderá
atribuir, ao nosso país, a jurisdição e novo território
marítimo, acrescentando 240 000 km2 a 1,3 milhões de
quilómetros quadrados, isto é, 14,9 vezes a área de
Portugal Continental. Com este acréscimo, Portugal
passará a ter uma área total de 3.027.408 km², o que
fará saltar de 11.ª maior Zona Económica Exclusiva
(ZEE) do mundo para 10.ª, imediatamente atrás do
Brasil com 3.660.955 km². A resolução de diferendos
associados à extensão da plataforma continental é
realizada de modo equitativo;
 Zona Económica Exclusiva

o Domínios internacionais
 Espaço aéreo internacional;
 Espaço exterior;
 Alto-mar – definido por exclusão de partes, não cai no
espaço sob jurisdição do Estado, desde as 12 milhas. O
princípio fundamental é o da liberdade de utilização
por todos os Estados, para os mais diversos fins, desde
que pacíficos (por exemplo, liberdade de circulação,
investigação científica, desde as 12 milhas. A ZEE e a
plataforma continental são para exploração
económica).
 Direito de visita, por suspeita de navio
estrangeiro levar a cabo actividade ilícita;
 Direito de hot pursuit – perseguição contínua
(de modo ininterrupto) de navio, em flagrante
delito, de navio estrangeiro, por prática de
infracção, na área de jurisdição de um Estado.

 Área – para além da ZEE e da plataforma continental;


 Antárctida – o Tratado de Washington (1958) não
prejudica reivindicação territorial, mas também não
deslegitima. Apresenta um estatuto ambíguo, havendo
alguns Estados vizinhos que têm reivindicações
territoriais. Em 16 de Dezembro de 2009, Portugal
deposita o instrumento de ratificação do Tratado da
Antárctida junto do Governo dos Estados Unidos da
América, sendo parte do Tratado, conforme é tornado
público pelo Aviso nº 28/2010, de 10 de Fevereiro de
2010.

 Estatuto jurídico destes espaços internacionais


(excepto a Antárctida, que é questionável)
 Res nullius (“coisa de ninguém”) – é importante
destacar que há res nullius inapropriável por ser
res publicae e apropriável, enquanto coisa sem
dono. No próprio Direito Romano, a apropriação
da res nullius era permitida, enquanto coisa
extra-patrimonial, isto é, que não se situava no
património de ninguém. Portanto, existe risco de
apropriação;
 Res communis omnium – domínio comum da
Humanidade;
 Domínio público da comunidade internacional.
 A Organização das Nações Unidas – criada depois do fracasso e
extinção da Sociedade das Nações, que assentava numa
organização inter-estadual, constitui uma organização universal,
aberta à entrada de todos os Estados. Trata-se de uma organização
complexa, multifacetada, constituída por órgãos diversos que
prosseguem o desenvolvimento dos Estados (FAO, OMS, UNESCO,
entre outras). A ONU ganhou alguma proeminência após a Guerra
Fria, encontrando-se actualmente numa fase de indefinição.

o Fins e objectos gerais e fundamentais (artigo 1.º CNU)


 Vertente securitária
 Manutenção da paz e segurança internacionais .
Ao contrário da concepção tradicional,
considera-se que este objectivo deve assumir um
sentido mais amplo, abarcando o
desenvolvimento económico, a promoção dos
Direitos Humanos e da Democracia;
 Promoção de relações amistosas entre nações.
 Todos os domínios imagináveis da realidade humana
 Promoção da cooperação internacional nos mais
diversos domínios (económico, social, cultural e
humanitário), salientando-se os direitos
humanos e as liberdades fundamentais.

o Princípios fundamentais (artigo 2.º CNU)


 Respeito pelo domínio reservado (n.º7) – já constava
do Pacto da SDN e apresenta como limitação o
princípio da especialidade (assuntos da jurisdição
interna dos Estados – núcleo soberano).
 Doutrina funcionalista de David Mitrany sobre a
Sociedade das Nações (SDN) e o seu fracasso,
relativa à ingerência na soberania dos Estados e
compreensível no momento em que foi
formulada: propõe uma nova forma de
abordagem das relações internacionais, dando
relevância aos aspectos técnico-sociais, que
exigem uma actuação premente da Humanidade.
Frisa a necessidade de desenvolvimento da
cooperação entre Estados, nos domínios técnico,
social e económico. Para tal, defende a criação
de uma organização internacional de natureza
funcional (e não politica), que incida sobre os
vários domínios técnico-sociais. Ora, isto conduz
à retirada de competência aos Estados, gerando-
se o efeito de spill-over36, que confere ao
processo de integração uma expansão
“automática”. Com isto, os Estados ver-se-iam
destituídos de competências reais. No entender
de Mitrany, desta forma seria possível garantir a
paz e segurança duradouras.
Na ONU, órgão político que reflecte o quadro
geopolítico derivada da II Guerra Mundial, há
aspectos de cooperação de políticas, quer seja na
AGNU, quer seja no CSNU, como também a
interacção de organizações internacionais
especializadas, de natureza funcional.
Limitações desta orientação:
- Não há, na realidade, uma transmissão de spill-
over automático;
- Necessidade de reforma das Nações Unidas,
pois não basta o desenvolvimento dos aspectos
técnico-sociais da Humanidade, dado o peso da
vertente política.

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Pressiona pela criação de uma burocracia voltada a administrar as questões referentes à integração,
de preferência com carácter supranacional, pois, dessa forma, poderia dirimir diferenças nacionais e
entre os diversos grupos sectoriais que se sentem ameaçados.
 Leitura do artigo 2.º, n.º7 da CNU
o Alcance da não “intervenção” nos
assuntos internos dos Estados
 Restrito: apenas não pode haver
tomada de decisões, por parte dos
respectivos órgãos da ONU, no
quadro das suas competências
(AGNU, CSNU), admitindo-se a
análise sobre as questões;
 Amplo: as Nações Unidas não se
podem debruçar sobre matérias
fora do seu âmbito, impedindo-se a
discussão internacional de assuntos
dos Estados (não podem ganhar
relevo internacional). Esta posição,
defendida por Hans Kelsen, limita
substancialmente a capacidade de
intervenção da ONU.

A orientação da ONU vai no sentido


restrito, como se pode constatar
pela agenda da AGNU, o que alarga
consideravelmente as faculdades
das Nações Unidas, expondo
internacionalmente determinadas
matérias.

o Delimitação do âmbito de domínio


reservado
 Formulação distinta daquela que
estava apresentada no Pacto da
SDN, que apenas abarcava os
assuntos da jurisdição exclusiva dos
Estados;
 Há um alargamento deste âmbito,
que abarca assuntos que não são
em absoluto internos. Isto
representa, de alguma forma, uma
“compensação” face à orientação
restrita anterior;
 A delimitação destes assuntos é
feita de acordo com:
 Critério jurídico: assuntos que
não forem objecto de
normação pelo DI, isto é, que
não sejam alvo de regulação
internacional;
 Critério político: são do
domínio internacional as
matérias que afectem as
relações internacionais. Não
caem na esfera jurídica dos
Estados todos os assuntos,
independentemente de haver
jurisdição internacional ou de
afastamento dos limites
territoriais.

o Não há limitações à aplicação do Capítulo


VII da Carta, relativo às penalizações
aplicados aos Estados, por ameaça à paz e
segurança internacionais, podendo haver
lugar a decisões vinculativas ou não
vinculativas;

o Conclusão: o domínio privado dos Estados


é constituído por praticamente nada,
fruto da densificação da estrutura das
relações internacionais. Não há domínios
que se possam excluir da actuação da
ONU, nem que seja, pelo menos, através
da pronúncia. A questão dos Direitos
Humanos, entendida pelos Estados como
pertencente ao domínio interno, foi sendo
alvo da intervenção da ONU, a partir dos
anos 60, com o Apartheid.

o Membros: só Estados (originários – artigo 3.º CNU; admitidos


– artigo 4.º CNU). A ONU é, actualmente, constituída por 193
Estados, reconhecendo-se a existência de 16 territórios sob
domínio colonial, em que não ocorreu auto-determinação.
 Admissão: constitui requisito substancial o Estado ser
“amante da paz”;
 Suspensão: por acção encetada por um Estado, que
coloque em causa a paz e segurança internacionais. Na
prática, a leitura não tem sido tão rigorosa;
 Expulsão: violação persistente dos princípios da Carta.

o Observadores – há diversas entidades e OI com estatuto de


observadores, como por exemplo a Santa Sé e a Organização
para a Libertação da Palestina (OLP);

o Órgãos (artigo 7.º CNU)


 Assembleia-Geral
 Todos os membros da ONU têm assento,
estabelecendo-se um estatuto de paridade entre
eles (1 membro = 1 voto);
 A acção de manutenção de paz e segurança
internacional é exercida, em primeira linha, pelo
Conselho de Segurança e, subsidiariamente, em
segunda linha, pela AGNU;
 Compete ao Secretário-Geral informar a AGNU
do exercício, pelo CSNU, das suas funções em
concreto, em matéria de manutenção da paz e
segurança internacionais;
 No caso do Kosovo, colocou-se em causa o
respeito, pela AGNU, das suas competências, nos
termos do artigo 12.º CNU. Estava em causa o
pedido de parecer (pela Sérvia) ao TIJ, à luz do
objectivo de respeito e desenvolvimento do DI (e
não sob o objectivo da paz e segurança
internacionais);
 Contudo, a AGNU pode ultrapassar a limitação
referida em caso de ameaça à paz, violação da
paz ou agressão e em que o CSNU se manifeste
incapaz de agir, podendo a AGNU actuar de
modo efectivo e útil, como no caso da Guerra da
Coreia (1950-53);
 Controlo político sobre os outros órgãos, através
dos relatórios apresentados pelo Secretário-
Geral e pelo Conselho de Segurança;
 Tem desempenhado um importante papel na
promoção da codificação do DI, com base no
trabalho da Comissão de Direito Internacional.

 Deliberação
o O voto registado só é pedido para
questões políticas mais sensíveis;
o Questões importantes / outras questões
(maioria das questões) – diferente
qualificação no Conselho de Segurança;
o Há alguns anos que se desenvolve um
esforço especial para alcançar decisões
por consenso, sendo a maioria das
resoluções adoptadas sem votação –
promoção da solidariedade entre Estados;
o No caso Kosovo, o pedido de parecer ao
TIJ foi submetido a votação (situação
excepcional).

 Reuniões
o Situação excepcional: as reuniões de
emergência relativas à Palestina ocorrem
concomitantemente, por decisão
deliberada pela maioria dos Estados, ainda
que sob protesto de Israel.

 Conselho de Segurança – tem como atribuição


principal a manutenção da paz e segurança
internacionais, agindo em nome dos Estados-Membros
e dos Estados não membros (efeitos erga omnes)
 Competências:
o Intervenção, convidando as partes
envolvidas num conflito político ou
jurídico que possa vir a constituir uma
ameaça à paz e segurança internacionais, a
resolvê-los através dos meios do artigo
33.º CNU;
o Formular recomendações por sua
iniciativa, por iniciativa de qualquer
membro ou, subsidiariamente, após
submissão das partes, a qual é obrigatória
na impossibilidade de resolução pelos
meios do artigo 33.º CNU;
o Pode convidar as partes envolvidas num
conflito a adoptar medidas provisórias,
que valem enquanto o conflito não
terminar (para a manutenção do statuo
quo).
 Atribuições:
o As recomendações ou “convites” do CSNU
constituem orientações / sugestões
propostas não vinculativas;
o As decisões do CSNU que não sejam
recomendações ou “convites” são
obrigatórias para os Estados-Membros,
emitidas sob a forma de resolução;
o A execução das decisões do CSNU cabe a
todos ou a alguns membros: a deliberação
para fim da agressão cabe para os Estados
intervenientes; a deliberação para não
intervenção no conflito aplica-se para os
restantes Estados;
o A adopção de medidas de natureza militar
dá-se através de comandos militares, por
acordo entre Estados (nunca houve acções
repressivas das Nações Unidas;
o O desrespeito pelas decisões do CSNU
constitui uma violação à Carta das Nações
Unidas;

 Deliberações:
o As “questões processuais” são decididas
por uma maioria de 9 favoráveis, não se
contando as abstenções;
o Nas “questões não processuais”, entre os
9 votos, têm de se incluir os votos
favoráveis dos membros permanentes
(que gozam de direito de voto) – princípio
aristocrático; a parte num conflito deve
abster-se; um costume contra tractum
consagrou a orientação de que uma
abstenção de um membro permanente
não impede a deliberação –
implementação de costume contra legem
(não se exigem 9 votos, podendo haver
abstenções);
o Duplo veto – a determinação do carácter
processual ou não processual de uma
questão considera-se uma questão não
processual (dada a importância que a
questão tem), pelo que fica sujeito ao veto
dos membros permanentes – costume
praeter legem.

 Conselho Económico-Social: coordena a acção dos


órgãos especializados;

 Secretariado Geral: órgão uninominal, constituído pelo


Secretário-Geral da ONU;
 Funções políticas e diplomáticas (mais
importantes: desenvolve esforços de mediação,
sendo a intervenção de um terceiro num conflito
entre Estados; acção importante em matéria de
bons ofícios, por atribuição do CSNU, para
aproximação das partes, com menor
estruturação formal em relação à mediação.

 Conselho de Tutela: territórios que se encontravam


sob a sua jurisdição e, entretanto, se tornaram
independentes.

 Tribunal Internacional de Justiça


 Competências
o Contenciosas – em litígios apenas entre
Estados (não entre OI nem particulares).
Não tem jurisdição obrigatória, só é
relativamente a ius cogens (presente na
CVDTE)
 A competência pode resultar da
Declaração prevista na “cláusula
facultativa de jurisdição obrigatória”
– declaração unilateral depositada
junto do Secretário-Geral da ONU.
 As cláusulas podem ter
âmbito genérico ou restrito
(apenas algumas questões);
 As cláusulas podem estar
sujeitas a condição de
reciprocidade (ambos os
Estados têm declarações
idênticas – condição
suplementar);
 De modo, há 66 declarações.

 A competência pode ser objecto de


um acordo ad hoc (a posteriori).

o Consultivas – no âmbito das respectivas


competências. O parecer das Armas
Nucleares foi pedido num primeiro
momento pela OMS, sendo que a matéria
da licitude não era da sua competência,
tendo, por isso, sido recusado.

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