1
A classificação destes tribunais como Tribunais Internacionais é discutível.
impossibilitar a alegação de imunidade por parte
dos Estados. Note-se que o TPI depende da
colaboração dos Estados para o seu
funcionamento.
o Noção de DI
Noção dinâmica, aberta à evolução do DI:
“Ordenamento jurídica formado por normas (em
sentido amplo) e princípios que regulam as relações
jurídico-públicas próprias da sociedade internacional,
enquanto substrato subjectivo, relacional e material”;
De acordo com a proposta do Professor Bacelar
Gouveia, o DI regula as relações não tão só do conjunto
de sujeitos, mas também das relações particulares. As
relações entre dois Estados para aquisição de bens
(como um imóvel) são de Direito Internacional Privado,
já o estatuto do embaixador presente no Estado é de
Direito Internacional Público.
A questão da juridicidade do DI
Eficácia das regras de DI, impondo-se a “Lei do
Mais Forte” – trata-se de uma concepção do DI,
que confunde Direito com Força, fazendo o DI
depender da coacção, da efectividade em
concreto. Como é óbvio, o desrespeito geral do
DI coloca em causa a sua vigência efectiva, mas a
simples dificuldade de fazer cumprir o DI não
afecta a validade do mesmo. Note-se que o
comportamento dos sujeitos de DI revela um
apelo ao DI, agindo à luz do mesmo e
reconhecendo a sua vigência e validade.
Portanto, podemos afirmar que existe um
reconhecimento do ordenamento jurídico
internacional geral.
Traços fundamentais do DI
Policentricidade – afastado do paradigma do
Direito Estadual, que se encontra actualmente
colocado em causa, dadas as suas lacunas e
carências, ainda que dispondo de mecanismos de
coercibilidade. Veja-se a debilidade do sistema
penal estadual. No que concerne a esta
característica, entende-se a existência de vários
ordenamentos jurídicos num mesmo Estado
descentralizado, isto na óptica de um Estado, o
que revela que o paradigma interno também não
é tão monocêntrico. Transferindo esta realidade
para o panorama internacional (diferente do
modelo abstracto de paradigma estadual), o DI
consiste num ordenamento que não apresenta
uma dimensão unívoca, mas antes vários centros
de produção e relevância jurídica, isto é, diversas
esferas distintas, como os Estados e centros
regionais (por exemplo: NATO, UE, ASEAN, União
Africana), todos eles relevantes em matéria de
produção e aplicação do DI. Importa também
considerar o importante papel activo
desempenhado, na criação indirecta do DI, pelas
ONG. Constitui o reflexo da diversidade de
ordenamentos jurídicos, podendo ser uma
realidade positiva, na medida em que a
homogeneidade poderia não ser representativa
de toda a diversidade.
Fragmentaridade
o Horizontal – quanto ao objecto, o DI não
tem uma vocação totalizante, na medida
em que muitos domínios não são
abarcados pelo DI. Existem diversos
quadros de produção de DI, com a
existência de pontos de domínio
excepcionais e cada vez menores. Em
matéria de política ambiental, temos
regulação rígida e intensa na Europa e
regulação mais soft a uma escala mais
abrangente (como o Protocolo de Quioto).
Note-se que, inicialmente, o DI abrangia os
domínios indispensáveis à coexistência dos
cidadãos, evoluindo paulatinamente e
passando a abranger novos domínios.
o Vertical – o DI coloca-se numa perspectiva
de complementaridade com o Direito
Estadual, estabelecendo princípios que
serão desenvolvidos pelo Direito interno
dos Estados. A fragmentaridade coloca
dificuldades de aplicação, dada também a
falta de capacidade e, diga-se até, de
vontade dos principais agentes políticos de
o fazer cumprir.
o DI e figuras afins
Direito Internacional e Moral Internacional – os mais
cépticos em relação ao DI apontam a existência de uma
moral/ética humana que deve ser respeitada. Os
princípios de DI são fundamentais para a coexistência
dos indivíduos. A moral internacional remete-nos para
a existência de um apoio e solidariedade
internacionais, como o perdão de uma dívida (veja-se o
caso da tragédia do Haiti, face a uma situação de
calamidade) ou o dever moral, sem substância jurídica,
de prestar apoio internacional;
Direito Internacional e Cortesia Internacional –
cortesia internacional entre representantes de
diferentes Estados (chefes de Estado e Santa Sé),
normalmente atendida pelos Estados. Trata-se de um
conjunto de ditames que não se revelam fundamentais
e não possuem relevância jurídica;
Direito Internacional e Direito Internacional Privado –
enquanto o DI regula as relações jurídico-públicas em
que estão envolvidos sujeitos de DI, o Direito
Internacional Privado consiste num Direito interno e
público dos Estados, constituído por um conjunto de
regras e princípios que regulam as normas aplicáveis
entre particulares, quando estão em causa várias
ordens jurídicas, existindo uma conexão entre elas.
Neste caso, pretende-se saber qual o ordenamento
jurídico a aplicar. Já as normas constantes num tratado
internacional bilateral são de Direito Internacional
Público;
Direito Internacional e relações internacionais
-enquanto o DI se integra no domínio do “dever ser”,
as relações internacionais inserem-se no domínio do
“ser”, sendo uma ciência empírica que procura
conhecer as relações num quadro transnacional.
Surgem como disciplina autónoma nos EUA, após a I
Guerra Mundial para perceber o sucedido nesse
conflito armado;
Direito Internacional e Direito da União Europeia – o
Direito da União Europeia surge como criação fruto do
DI, com a celebração de tratados. Adquiriu autonomia,
pois é diverso nos seus traços gerais. É entendido como
um Direito sui generis, mais desenvolvido, que se pode
entender como qualitativamente distinto.
o Classificações do DI
(âmbito de aplicação) DI comum v. DI particular – o DI
comum tem aplicação global, como por exemplo a
Carta das Nações Unidas ou outros tratados com
vocação global; o DI particular tem um âmbito
subjectivo particular;
(hierarquia) DI fundamental v. DI ordinário – o DI
fundamental (ou constitucional) é composto por
princípios imperativos; no DI ordinário está em causa
uma relação de validade;
(âmbito material) DI geral v. DI especial – note-se que
o DI é um ordenamento global, um sistema unitário
com ramos de Direito. O DI geral é composto por
princípios e normas aplicáveis a todos os domínios; o DI
especial apresenta âmbitos materiais limitados (DI
ambiente, DI comércio, DI mar)
(criação) DI espontâneo v. DI convencional – o DI
convencional resulta de um acto voluntário dos sujeitos
de DI, ao contrário do DI espontâneo, como por
exemplo o costume;
(forma) DI não escrito v. DI escrito - note-se que
podem existir convenções celebradas oralmente (DI
não escrito).
Artigo 52.º
É nulo, um tratado cuja conclusão foi obtida pela ameaça ou o emprego da força em
violação dos princípios de Direito Internacional incorporados na Carta das Nações
Unidas.
2
O CIRDI (Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos) procura
Proporcionar os meios de conciliação e arbitragem dos diferendos relativos a investimentos entre
Estados Contratantes e nacionais de outros Estados Contratantes.
3
A proibição da guerra é introduzida, em 1928, pelo Pacto Briand-Kellog da Sociedade das Nações
(SDN), após discussões a partir da segunda metade do século XIX. Podemos aqui encontrar um
confronto entre o direito de legítima defesa (sujeito a condições estabelecidas) com a proibição do uso
da força.
o Na questão n.º2 apresentada, estamos perante uma relação
de cooperação entre Estados na prossecução de um interesse
comum;
o Na situação apresentada na questão n.º3, verificamos que foi
decretado um embargo de armas à RD Congo, devido à
existência de um conflito armado que cria uma instabilidade
regional directa ou indirecta. A intervenção do Conselho de
Segurança da ONU legitima-se por estamos perante uma
situação com reflexos externos, não violando o n.º7 do artigo
2.º da Carta das Nações Unidas, em matéria de ingerência na
vida dos Estados.
Artigo 2º
(…)
Artigo 24º
1. A fim de assegurar uma acção pronta e eficaz por parte das Nações Unidas, os
seus membros conferem ao Conselho de Segurança a principal
responsabilidade na manutenção da paz e da segurança internacionais e
concordam em que, no cumprimento dos deveres impostos por essa
responsabilidade, o Conselho de Segurança aja em nome deles.
(…)
Fundamento de juridicidade do DI
o Para os mais cépticos, o DI não pode ser entendido como
jurídico, mas como uma moral internacional, considerando
tratar-se de um conjunto de normas da vida internacional
com carácter moral, que resulta da razão dos sujeitos
envolvidos. Diferentes perspectivas sobre esta questão:
No DI, não existe uma ordenação e um correspondente
ordenamento;
Austin, referência do ordenamento da common law,
tem uma concepção negativista do DI, para pôr fim ao
“estado selvagem”, considerando que este não tem
carácter jurídico. Apesar de haver alguma coincidência
entre Direito e Moral, note-se os que valores do DI
buscam o que é justo, considerados como um
imperativo categórico;
DI como “lei do poder” – trata-se de uma posição
seguida por autores que partilham do pensamento
hegeliano (soberania una, indivisível e inalienável) e
defendem o Estado como poder absoluto, insuperável,
sendo as regras internacionais provenientes das
relações entre Estados. Trata-se de uma concepção que
também não reconhece a juridicidade do DI, apesar de
existirem princípios jurídicos de DI que procuram
promover a cooperação internacional;
DI como direito sui generis – reconhecendo uma
autonomia ao sistema jurídico das relações
internacionais, considera-se que este sistema se situa
num grau inferior, pois apresenta especificidades que o
demarcam dos restantes. Fica, todavia, aquém dos
aspectos fundamentais, dada a ausência de um
legislador internacional e de um órgão central. Para
alguns, este carácter sui generis torna o DI num Direito
incompleto, pois a sua plena efectivação fica
dependente da colaboração dos Estados, principais
sujeitos da criação do DI. Impõe-se, portanto, uma
articulação com o Direito Nacional, não sendo, por isso,
auto-suficiente;
Muitos autores, provenientes de correntes
sociológicas, recusavam a existência de uma ordem
jurídica internacional, apenas reconhecendo a
existência de uma ordem social dotada de
coercibilidade, a qual o DIP não dispõe;
Do nosso ponto de vista, o DI constitui, de facto,
Direito, porque é constituído por um conjunto de
princípios fundamentais de natureza jurídica, dotado
portanto de uma consciência jurídica internacional,
apesar da coincidência com princípios da moral.
Defende a justiça e a equidade. Os referidos princípios
conferem direitos e impõem obrigações. O DIP não é o
reflexo ou o equilíbrio do poder, pois este é colocado
em causa pelas relações de poder. Quando se verifica a
existência de um desequilíbrio, articula-se a aplicação
do DI. Portanto, não é o poder que legitima o Direito,
mas antes o contrário. Se, em matéria de regulação
económica internacional, podemos considerar que o DI
fica aquém da “criatividade” dos agentes económicos,
no domínio dos Direitos Humanos é bom reparar nos
grandes desenvolvimentos já efectuados. Note-se,
ainda, que a regulação nacional no domínio económico
também não se revela não avançada em relação ao
domínio internacional. Por outro lado e, na verdade, o
DIP apresenta as características sui generis
apresentadas, mas não em termos absolutos, pois
existem legisladores policêntricos (como sucede nos
Estados Federais) e organizações internacionais
tomando esta posição, desprovidos de coercibilidade,
mas com valor jurídico, ainda que não normativo (o
denominado soft law), com adaptação de resoluções
em diversos domínios com efeitos jurídicos, enquanto
diâmetro interpretativo, tendo uma base
consuetudinária (ius cogens). Esta realidade não
permite colocar o DI numa categoria inferior.
A maior parte da regulação económica nacional
apresenta as características de soft law;
A maior parte das normas constitucionais ficam
dependentes da articulação dos órgãos de
soberania para o regular funcionamento das
instituições democráticas, como a promulgação
de um diploma legal. Também os Direitos Sociais,
Económicos e Culturais não são susceptíveis de
aplicação coerciva;
Na realidade, o DI tem, por natureza,
necessidade de se articular com o Direito
Nacional, para garantir a sua efectiva aplicação, o
que implica uma cooperação com as autoridades
nacionais;
O princípio da subsidiariedade pretende
assegurar uma tomada de decisões tão próxima
quanto possível do cidadão, sendo o DIP não
autoritário com vocação totalizante, mas pelo
contrário flexível;
O facto de os sujeitos de DI fazerem apelo a ele e
reconhecerem a sua indispensabilidade é a prova
da sua existência.
4
Pacta sunt servanda é um brocardo latino que significa "os pactos devem ser respeitados" ou mesmo
"os acordos devem ser cumpridos". É um princípio base do Direito Civil e do Direito Internacional.
reconhecidos pelas nações civilizadas, o que revela um
etnocentrismo do mundo ocidental.
Artigo 38.º
1. O Tribunal, cuja função é decidir em conformidade com o direito internacional as
controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará:
a. As convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam
regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b. O costume internacional, como prova de uma prática geral aceite como direito;
c. Os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas;
d. Com ressalva das disposições do artigo 59, as decisões judiciais e a doutrina
dos publicistas mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para
a determinação das regras de direito.
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade do Tribunal de decidir uma
questão ex aequo et bono, se as partes assim convierem.
o Teses contemporâneas
Neo-contratualismo liberal
Teses deliberativas e da ética comunicativa – Modelo
europeu assente na deliberação, com a criação de uma
plataforma que promova uma comunicação entre
actores de Direito Internacional;
Movimento CLS (Critical Legal Studies), Feminismo e
Teoria da “Public Choice” – orientações de DIP, no
âmbito da common law, dada a necessidade de
reformular o modelo vigente, respondendo ao
multiculturalismo existente.
5
Por legítima defesa preemptiva, entende-se a resposta a um ataque iminente, não sendo possível
esperar que o dito ataque seja efectivado. Coloca-se a questão de qual o limite de legítima defesa
preemptiva.
6
Em 1837, desenrola-se um caso que opõe os Estados Unidos da América ao Reino Unido. O Canadá,
enquanto colónia britânica, estava a viver um período de lutas independentistas, tendo esta colónia
recebido um barco americano com armas de fogo, para auxiliar os povos locais nos movimentos pela
independência. O Reino Unido, invocando legítima defesa preemptiva, decide abater a referida
embarcação, defendendo os EUA que, sendo o barco seu, não poderia ser abatido, alegando também
que o barco não transportaria o referido carregamento de armas.
defesa preventiva não é admitida no âmbito do Direito
Internacional. Recorde-se que a legítima defesa preventiva apenas
tem lugar num quadro de ameaça provável. Também se denota
aqui um reavivar da noção de “Guerra Justa” do tempo dos clássicos
e desenvolvida por Santo Agostinho. Um caso que se pode enunciar
data de 1981, aquando do bombardeamento por Israel de uma
central nuclear, invocando legítima defesa preventiva, o que foi
imediatamente refutado pelas Nações Unidas, com os EUA à
cabeça;
Também a propósito da Guerra Colonial desencadeada por Portugal
nas colónias africanas, discutiu-se se havia uma violação do
princípio da auto-determinação dos povos ou se estávamos perante
uma questão interna de Portugal, considerando as colónias
território nacional (as denominadas “províncias ultramarinas”).
Estávamos perante um conflito de princípios;
Não podemos invocar a falta de validade do DI por ocorrerem
sucessivos incumprimentos do mesmo. Não podemos colocar em
causa o Direito (“dever ser”) pela ocorrência de factos contrários
(“ser”);
O fundamento de validade do DI prende-se com a existência de uma
axiologia que subjaz ao DI, vigorando assim na comunidade
internacional, sendo ou não acatado pelos Estados;
As teorias deliberativas partem da recusa de um “Direito
Internacional”, imperando a “Lei do Mais Forte”, procurando
superar a inexistência de uma axiologia através de um conjunto de
princípios;
O “Contrato Social” não assenta numa teoria de valores, partindo da
ideia de existência de cidadãos iguais. Estes, para socializarem,
necessitam de um conjunto de normas que regulem as relações que
estabelecem. Rawls afirma que o conjunto de normas internacionais
é válido, desde que aceite pelos sujeitos, estes que se encontram
“cobertos” por um “véu de ignorância”, partindo de uma situação
de igualdade. Implica uma prognose póstuma para legitimar o
Direito Internacional, desde que as condições impostas forem
aceites por todos, num estado de pureza, que, na verdade, não
existe. A tese contratualista está sujeita a críticas, como são:
o Crítica multiculturalista – aceitando o raciocínio de Rawls,
derruba os pressupostos de que ele parte, que só fariam
sentido num determinado estado axiológico ocidental,
racional, universalista, que não existe. Todos os sujeitos
partem do seu estado de evolução cultural e civilizacional.
Esta crítica assenta no relativismo, na compreensão da
diferença;
o Crítica radicalista – aponta para aspectos mais concretos,
colocando em causa a axiologia do DI, pois a lógica do
“Contrato Social” está enviesada, isto é, não é neutral. O
“Contrato Social” parte de um princípio de autonomia, mas
segundo estes críticos não existe este idealismo, pois não só
não se reconhecem os quadros multiculturais, como são
colocados em causa outros valores. Note-se que a tese de
Rawls assenta num modelo económico-social demoliberal,
capitalista e numa visão homocêntrica (Natureza ao serviço
do ser humano). Esta visão conduz à sobreexploração de
recursos. É nesta crítica radicalista que se insere o movimento
dos Critical Legal Studies (CLS) e o feminismo, que assenta no
cuidado e na solidariedade. De acordo com esta crítica, a
proposta do “Contrato Social” conduz a uma desigualdade na
distribuição da riqueza, sob a aparência da liberdade e da
autonomia, beneficiando apenas uma parcela da sociedade.
Os CLS estão associados ao construcionismo social, surgindo
nos anos 60 e criticando o modelo dominante que não
permite que as minorias se expressem (mulheres, afro-
americanos, homossexuais), pois é um modelo assente na
máxima utilidade, não sendo por isso sustentável. O modelo
soberano do Estado necessita de ser reformulado, na
tentativa de conduzir a uma igualdade material, à
sustentabilidade dos seres vivos, a não encarar a soberania
como poder, a reconhecer a legitimidade das ONG e a
atender às reclamações das camadas marginalizadas,
respeitando a diferença. O modelo existente não consegue
impedir os abusos de poder dos Estados. Por outro lado, a
ideia multiculturalista também se pode revelar perigosa.
Artigo 27º
Tratados
A definição de tratado constante da Convenção
de Viena, e que faz referência aos “instrumentos
conexos” (por exemplo: protocolos), é
susceptível das seguintes críticas:
o Um tratado é obviamente um acordo de
vontades entre os sujeitos de DI, não
apenas os Estados;
o Um tratado não tem necessariamente de
ser escrito, podendo ser um acordo
meramente verbal. Esta situação de
acordo meramente verbal entenda-se que,
na actualidade, é marginal).
Como proposta alternativa, podemos dizer que
um tratado é um acordo de vontades entre
sujeitos de DI, agindo nessa qualidade, que criam
normas de DI. Afasta-se dos acordos de Direito
Internacional Privado. Dos tratados, resultam
efeitos jurídico-internacionais, pois apresentam
conteúdo normativo jurídico internacional, não
meramente político, com normas vinculativas às
partes envolvidas;
Distinção de figuras afins:
o Feixes de actos unilaterais – ao contrário
dos tratados em que a norma é criada só
na conjugação das vontades envolvidas
que se articulam, nos feixes de actos
unilaterais, cada acto de DI de per si
vincula aquele que o proferiu. Isto é, os
feixes de actos unilaterais são conjuntos
de actos unilaterais, de acordos de
vontades fragmentados, mas autónomos
juridicamente;
o Acordos políticos e gentlemen’s
agreements – não há critérios abstractos
pré-definidos para determinar se um
conjunto de intenções é juridicamente
relevante ou apenas de natureza política.
Por tratado, entende-se todo aquele acordo de
vontades que cria direitos e obrigações e
constitui fonte de Direito. Já os acordos políticos
não têm carácter jurídico, não estão dotados de
normatividade e o seu cumprimento reside na
vontade e necessidade dos sujeitos;
Apesar da internacionalização dos “quase
tratados”, estes não deixam de fazer parte do
Direito Privado. Esta internacionalização deve-se
à importância económico-financeira das grandes
multinacionais, sujeitos que não estão vinculados
ao DI. Alguns destes “quase tratados” revelam-se
contrários aos princípios fundamentais da
soberania nacional e da liberdade dos Estados
menos desenvolvidos. O CIRDI procura regular as
relações entre Estados e estes sujeitos e é
constituído pelos Estados que entendam integrá-
lo, podendo retirar-se dele a qualquer momento;
Denominações de Tratados (entre outras)
o Convenção – noção genérica para designar
tratados solenes e acordos
o Carta, Constituição ou Estatuto
o Pacto
o Concordata – entre a Santa Sé e outros
sujeitos de DI
o Acta final ou geral
o Compromisso – designação usada para as
figuras afins que não são tratados.
Classificações de Tratados (entre outras)
o Tratados-lei (obrigações que constituem
normas gerais e abstractas, com carácter
idêntico para todas as partes) e Tratados-
contrato (de natureza sinalagmática, com
duração limitada e subscritores restritos);
o Tratados bilaterais e Tratados
multilaterais;
o Tratados gerais (obrigam uma
generalidade de sujeitos, podendo ser
universais ou para-universais, não
limitando as partes envolvidas) e Tratados
restritos (apresentam condições que
limitam as partes que se podem vincular a
ele);
o Tratados abertos (admitem a adesão de
novos membros) e Tratados fechados
(restringem-se aos subscritores iniciais,
sendo intuitu personae7);
o Tratados solenes (sujeitos a determinadas
formalidades, como, por exemplo, a
ratificação dos Chefes de Estado) e
Tratados não-solenes;
o Tratados escritos e Tratados não escritos.
7
Os tratados intuitu personae baseiam-se, geralmente, na confiança entre as partes, sendo que apenas
o Estado vinculado pode executar a sua obrigação.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
Artigo 103º
No caso de conflito entre as obrigações dos membros das Nações Unidas em virtude
da presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional,
prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente Carta.
Ao contrário das concepções voluntaristas, o critério
ético-valorativo reconhece a existência de um
conjunto de normas internacionais, que plasmam
princípios fundamentais, sobrepondo-se a todos os
restantes elementos normativos. Estamo-nos a referir
ao Direito imperativo que não pode ser afastado – ius
cogens.
O ius cogens não é consensual, mas tem uma
aceitação cada vez maior;
Todo o tratado contrário ao ius cogens incorre na
sua nulidade, pois viola normas inderrogáveis,
que só podem ser afastadas por normas de valor
idêntico;
Todavia, existe uma dificuldade de determinação
e concretização do ius cogens, para além dos
riscos inerentes ao seu reconhecimento.
Em resumo:
Em 20 de Fevereiro de 1967, foram
apresentadas, junto do TIJ, reclamações
referentes à delimitação da plataforma
continental entre a República Federal da
Alemanha e Dinamarca, por um lado, e entre a
República Federal da Alemanha e da Holanda,
por outro. As partes solicitaram ao Tribunal que
aplicasse os princípios e normas do direito
internacional e, posteriormente, definisse os
limites a esse título;
O TIJ rejeitou a alegação da Dinamarca e dos
Países Baixos, baseada em que essas
delimitações deviam realizar-se sob o princípio
da equidistância, definido no artigo 6.º da
Convenção de Genebra sobre a Plataforma
Continental (1958)8, que constituiria a
consagração escrita do direito consuetudinário
preexistente, relativo à “soberania” sobre o solo
e o subsolo. Para a tomada desta posição,
defende que:
8
Dinamarca e Países Baixos alegam que, a partir de 1958, este artigo constituía uma norma costumeira,
de acordo com a prática reiterada dos Estados. Se o artigo 6.º da Convenção fosse entendido como
costume, a RFA estaria necessariamente vinculada, por se tratar de uma norma costumeira
preexistente. O TIJ procura verificar se o artigo 6.º se terá consolidado como costume, pela prática
constante e uniforme. Para tal, apura o número de ratificações da Convenção e número de acordos de
delimitação da Plataforma Continental. Em relação a este último parâmetro, constata que foram apenas
15 acordos, um número muito pouco representativo, o que afasta a existência de uma prática uniforme.
Assim, o TIJ considera que estar-se-á, porventura, perante um costume embrionário, mas não um
costume consolidado.
A República Federal da Alemanha, que não havia
ratificado a Convenção, não estava legalmente
vinculada às disposições do seu artigo 6.º, o que
contudo, não impede a formação de costumes
gerais;
O princípio da equidistância não era uma
consequência necessária do conceito geral dos
direitos sobre a plataforma continental, nem
constituía uma norma de direito consuetudinário
internacional. Assim, considera que a Dinamarca
e a Holanda terão invertido o processo de
formação do costume (ver artigos 70.º e
seguintes do acórdão).9
O TIJ rejeitou também as alegações da República
Federal da Alemanha, na medida em que
pretendia que fosse aceite o princípio da
distribuição da plataforma continental em partes
justas e equitativas. Decidiu que cada uma das
partes tinha um direito original sobre aquelas
áreas da plataforma continental, que constituíam
a extensão natural do seu território no mar e sob
ela. Não se tratava de distribuir ou repartir essas
áreas, mas de delimitá-las;
O TIJ decidiu que as fronteiras (linhas de
delimitação) deviam ser definidas por acordo
entre as partes e sob princípios de equidade, e
indicou determinados factores que se teriam de
considerar com esse fim. Correspondia às partes
negociar sobre a base desses princípios, com
tinham aceitado fazer.10
O TIJ entende que não há lugar a decisão ex
aequo et bono, isto é, aplicação de uma justiça
9
Recorde-se que, para a formação de um costume, tem de existir um elemento material (corpus)
articulado com o elemento subjectivo (animus).
10
Os artigos 85.º a 94.º do acórdão fazem referência à Convenção de Genebra e à Declaração Truman,
que reivindica que a delimitação se faria de acordo com uma negociação séria entre as partes,
atendendo às circunstâncias especiais, e recorrendo a princípios equitativos.
abstracta ao caso concreto, a partir da convicção
do julgador, pois os Estados pretendem uma
decisão ainda de Direito, que remeta para
princípios equitativos (equity), considerando os
interesses especiais dos sujeitos (questões de
orografia da costa), como por exemplo o
princípio da proporcionalidade, dotado de
flexibilização, em busca de uma decisão justa;
Os Estados autores pretendiam uma decisão
igual, com uma divisão em três partes
semelhantes, mas note-se que uma decisão
equitativa não é uma decisão igualitária. Uma
decisão equitativa considera as circunstâncias
especiais para uma decisão justa e equilibrada.
11
Importa distinguir o asilo político do asilo diplomático: enquanto o asilo político consiste numa forma
de protecção concedida a um estrangeiro, perseguido no seu território por delitos políticos, convicção
religiosa, situação racial; o asilo diplomático é concedido por um Estado, não no seu território, mas no
próprio território do Estado responsável pela perseguição do asilado, em locais imunes à jurisdição
deste, como por exemplo em embaixadas e representações diplomáticas, e em situações com carácter
temporário e de emergência.
12
Esta situação assemelha-se ao recente caso protagonizado pelo presidente deposto das Honduras,
Manuel Zelaya, que se encontra sob asilo diplomático do Brasil, na sua embaixada em Tegucigalpa.
Montevideu, às autoridades peruanas. A
Colômbia recusa-se fazê-lo;
Peru e Colômbia integravam a Convenção de
Havana, que, contudo, não regulava
especificamente o que devia ser feito nestas
situações. Já a Convenção de Montevideu
regulava, no sentido de ser do Estado que
conferia protecção a qualificação do delito;
Ora, note-se que o Peru recusou-se a assinar a
Convenção sobre Direitos e Deveres dos Estados
(Convenção de Montevideu, 1933), não estando
a ela vinculada. Por outro lado, poderíamos
considerar que o Peru estaria vinculado a uma
norma costumeira geral. Mas, na verdade, esta
norma não existe;
No julgamento realizado em 20 de Novembro de
1950, o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ)
reconheceu que o artigo 38.º do Estatuto do
Tribunal Internacional de Justiça admite a
possibilidade dos costumes regionais, que
possam vincular a América Latina, apresentando
contudo especificidades. É importante
considerar a relevância da objecção, que se
demonstra mais determinante para a vinculação
dos Estados objectores. O Peru manifesta-se
reiteradamente contra a Convenção de
Montevideu, não estando vinculado à ela ou a
qualquer costume regional;
O TIJ concluiu que não há costume regional, pois
estamos perante uma prática muito
inconsistente e a adesão a essa prática era
apenas uma manifestação de conveniência
política e não por ser juridicamente obrigatória.
Podemos assim concluir que, no que concerne ao
elemento psicológico (opinio iuris atque
necessitatis), esta prática não está dotada de
juridicidade. A norma da Convenção de 1933 não
era consuetudinária;
O acórdão de 13 de Junho de 1951 diz respeito,
por seu turno, à exigência feita pelo Peru de
entrega imediata de Haya de la Torre, pois não
lhe havia sido concedido asilo político. A
Colômbia recusa-se a fazê-lo. Nesse caso, a
Colômbia tê-lo-ia de levar para o seu território,
conferindo o Peru um salvo-conduto13, para se
evitar a hipótese de detenção do asilado pelas
autoridades peruanas;
O TIJ pronuncia-se sobre esta matéria e não
entende que haja lugar a uma entrega
obrigatória, dada a não vinculação do Peru à
Convenção de Montevideu (1933). Devem,
assim, os Estados negociar de boa-fé e encontrar
uma resolução pacífica para o diferendo
existente;
Note-se que a concessão de asilo político por um
Estado implica a colocação em causa do regime
político do país de origem do asilado. Por este
motivo, esta solução não se revela, na maior
parte dos casos, viável;
O TIJ apenas até vinculado à emissão de um
acórdão sobre a matéria que lhe foi colocada,
salvo se estivermos perante o domínio do
inquisitório, havendo então lugar a decisões que
extravasam a questão colocada.
13
Salvo-conduto é um documento emitido por autoridades de um Estado, que permite ao seu portador
transitar por um determinado território. O trânsito pode ocorrer de forma livre ou sob escolta policial
ou militar.
o “Caso do Direito de Passagem sobre o Território Indiano
(Portugal v. Índia) ” (1955-1960)
Os factos e as alegações das partes
A Índia procura acabar com os resquícios de
colonialismo no seu território. Para tal, decide
criar dificuldades de acesso dos portugueses aos
seus enclaves. A isto, acresce a resistência
crescente que colocava em causa a autoridade
de Portugal;
Este caso entre Portugal e Índia foi submetido ao
TIJ por um requerimento do governo português,
no qual solicitou que o TIJ declarasse e julgasse
que Portugal era titular ou beneficiário de um
direito de passagem entre o seu território de
Damão14, os seus enclaves de Dadra e Nagar-
Aveli e entre cada um dos últimos, e que esse
direito compreendia a faculdade de trânsito de
pessoas e mercadorias, incluindo forças
armadas, sem restrições ou dificuldades e na
forma e medida requerida para o efectivo
exercício da soberania portuguesa nos referidos
territórios. Portugal ainda alegou que a Índia, ao
impedir o exercício do direito em questão,
atentou contra a soberania portuguesa sobre os
seus enclaves, bem como violou as suas
obrigações internacionais. O Estado Português
requereu que o TIJ decidisse que a Índia devesse
pôr um fim imediato nesta situação, permitindo
que Portugal exercesse o direito de passagem
reivindicado. O requerimento referiu-se
expressamente ao artigo 36.º (2.º parágrafo) do
ETIJ e às declarações através das quais Portugal e
Índia aceitaram a jurisdição obrigatória do TIJ.
14
Recorde-se que Goa, Damão e Diu foram possessões portuguesas até 19 de Dezembro de 1961,
aquando da ocupação pela União Indiana.
Artigo 36.º
(…)
a) A interpretação de um tratado;
(…)
o O ius cogens
Normas imperativas, que não estão disponíveis à
vontade das partes, isto é, não podem ser afastadas
por elas;
Trata-se de uma questão central do DI, no quadro da
Escola Espanhola Jusnaturalista. Note-se a importância
assumida por Hugo Grócio;
Conjunto de princípios fundamentais à comunidade
internacional que se impunham às partes. Veja-se, a
propósito do princípio da proibição do uso da força, a
discussão sobre a licitude da “Guerra Justa” e a sua
admissibilidade;
Verifica-se uma decadência do ius cogens com o
Positivismo, com o voluntarismo a afastar a existência
de normas imperativas involuntárias, que impõem
proibições de comportamentos. Os positivistas não
reconhecem a existência de normas que não surgem da
vontade das partes e que por elas não podem ser
afastadas;
Ressurge já em pleno século XX, aquando da ocorrência
de factos insustentáveis, como crimes contra a
Humanidade e crimes de guerra;
Discussão exaustiva sobre o ius cogens nas décadas de
50 e 60;
Com a Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados (CVDTE), temos a consagração do ius cogens.
Trata-se de uma convenção geral, subscrita por um
número significativo de sujeitos, o que manifesta uma
adesão efectiva ao ius cogens. Nos termos desta
convenção, o ius cogens assume uma dimensão real e
concreta, passível de suscitar questões e conflitos,
competindo ao TIJ declarar a violação de ius cogens.
O artigo 53.º CVDTE determina a nulidade de um
tratado com norma contrária a ius cogens;
O artigo 64.º CVDTE refere-se a situações de
incompatibilidade superveniente, com a entrada
em vigor de norma de ius cogens;
O artigo 71.º CVDTE apresenta as consequências
da existência de uma incompatibilidade entre
tratado e norma imperativa de Direito
Internacional Geral.
18
Soberania constitui um conceito indispensável de DI, que qualifica o estatuto dos Estados.
normas de ius cogens não podem ser
afastadas ou restringidas, podendo ser
alteradas por norma superveniente de
igual valor;
o Artigo 2.º, n.º4 da CNU – proibição do uso
da força
Contra práticas atentatórias da
independência política e económica;
Trata-se de um princípio
fundamental, para fazer direitos na
ordem jurídica internacional;
Sendo considerado ius cogens, fica
com carácter absoluto, o que não se
identifica com a admissibilidade de
uso da força em situações
excepcionais, como casos de ruptura
ou ameaça à paz, em que é
conferida legitimidade ao uso da
força;
Este artigo remete para as
condições estabelecidas para o uso
da força. Assim, entende-se que o
carácter absoluto do ius cogens não
se coaduna com estas
circunstâncias;
Também em situação de legítima
defesa é admissível o uso da força
(em face de ataque armado). Aliás,
encontra-se consagrado na Carta
das Nações Unidas como Direito
Natural, o que leva a considerar-se
um princípio de ius cogens, que
comprime a proibição do uso da
força.
o O problema do ius cogens prende-se com
a sua inderrogabilidade. Na opinião de
Wladimir Brito, este aspecto não deve ser
considerada para caracterizar o ius
cogens, na medida em que não constitui
característica de qualquer norma. Na
verdade, não há princípios absolutos;
o Admite-se, por outro lado, a
imperatividade e a indisponibilidade de
afastamento da norma. Agora, deve
entender-se a possibilidade de
derrogação, para salvaguarda de outros
princípios fundamentais, como sejam a
legítima defesa ou a paz internacional;
o Assim, qualquer comportamento de um
Estado contrário ao ius cogens é nulo;
o A partir do ataque às Torres Gémeas em
2001, surge uma nova noção de legítima
defesa.
o Ius cogens consensual
Abrange uma série de princípios de
ordem pública;
O princípio mais consensual é o
princípio da proibição do uso da
força;
O princípio da proibição da
discriminação racial apresenta
adesão praticamente universal,
desde a década de 60;
Direito humanitário internacional no
quadro do Direito da Guerra;
Princípio da responsabilidade pelos
danos causados;
Princípio da resolução pacífica dos
conflitos, de maior alcance que o
princípio do uso da força.
19
Note-se que não é uma convenção de reconhecimento de direitos individuais.
o Não é admissível o princípio da soberania,
porque importa admitir a vontade das
partes. Note-se, ainda, que este princípio
também implica limitação de direitos;
o Admitamos que “A” e “B” celebram um
tratado, em 2003. “B” não cumpre o
contrato desde 2004. “A” reclama deste
facto em 2010. Há aqui uma violação do
tratado, mas não de ius cogens. Existe a
necessidade de protecção de valores
fundamentais da comunidade, como o
princípio pacta sunt servanda. O facto de A
não ter reagido de imediato pode decorrer
do princípio do consentimento;
o A violação de ius cogens não é admissível,
ou seja, não se admite conformação face a
um facto ilícito e reservas face às
disposições substantivas em causa no
tratado. Este último facto constituiria uma
alteração unilateral de uma disposição;
o O princípio da proibição do genocídio visa
a protecção da integridade das populações
alvo deste crime, que conduz à
degradação de uma comunidade,
individual ou colectivamente;
o O Direito Humanitário Internacional
integra um bloco normativo de tutela de
direitos. Encontra-se consagrado pelas
Convenções de Haia (1899 e 1907) e de
Genebra (1949). O TIJ entende que
estamos perante um conjunto de direitos
intransponíveis.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
21
Tratado de Tlatelolco (1969) – nome convencionalmente dado para o Tratado para a Proibição de
Armas Nucleares na América Latina e o Caribe. Ele é incorporado no Organismo para a Proscrição das
Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (OPANAL); Tratado de Rarotonga (1985) – Zona Livre de
Armas Nucleares do Pacífico Sul (contem reservas de Estados nucleares).
existem proibições convencionais gerais do uso
de armas nucleares. Todavia, o uso de armas
nucleares está sujeito ao princípio da proibição
do uso da força, excepto em situações de
legítima defesa (artigo 51.º CNU) ou autorização
dos membros do Conselho de Segurança. A
legítima defesa só é admitida como resposta a
um ataque armado, sob comunicação ao
Conselho de Segurança, até este tomar
medidas, dentro dos limites da
proporcionalidade e da necessidade (requisito
prévio da proporcionalidade)22. O requisito de
necessidade só é admissível se estiver em causa
a sobrevivência do Estado. A resposta está
submetida ao princípio da proporcionalidade,
relativamente aos efeitos provocados, como
limitação dos danos que se pode causar. Esta
resposta deve constituir uma forma de
neutralização do ataque iminente e encontra-se
submetida aos princípios fundamentais do
Direito Internacional Humanitário, o que
impede que o efeito bélico incida,
indiscriminadamente, sobre civis – “Cláusula
Martens”23;
22
Note-se que existe um elenco de armas de destruição maciça proibido por Lei.
23
A chamada “Cláusula Martens”, alcunha do Ministro de Relações Exteriores russo que a propôs, fixa
que, mesmo em situações de guerra não disciplinadas pelos convénios de Direito Internacional
Humanitário, haverá outras normas de direito consuetudinário a amparar as vítimas de qualquer
conflito armado. Os Estados que não se obrigaram através de convénios estarão sujeitos a estas normas
consuetudinárias. Deduz-se, destarte, que não há nenhum âmbito de conflito que não seja abrangido
pelo Direito Internacional Humanitário. Desta cláusula cerne, tem-se os princípios cogentes que
integram o Direito Internacional Humanitário. Os principais são o da necessidade militar e o da
humanidade, interdependentes entre si. Segundo o princípio da humanidade, em qualquer
circunstância, as vítimas de uma guerra devem ser salvaguardadas por uma série de directrizes
humanitárias, regras de trato humano. Como a violência é inevitável e inerente à guerra, o princípio da
necessidade militar, balizado pelo princípio da humanidade, procura delimitar o grau de violência
empregue num conflito bélico, para que se atenda ao limite indispensável ao alcance da vitória militar.
Integrando a evolução da consciência
humanitária, é proibido o uso de armas
nucleares se estiverem em causa questões de
protecção ambiental (Direito Internacional
Ambiental), para salvaguarda das gerações
futuras;
Conclusão: o TIJ não se pode pronunciar pela
licitude do uso, admitindo a utilização lícita em
situação de legítima defesa, estando em causa a
sobrevivência do Estado (questões-limite). Ainda
assim, preservam-se os princípios fundamentais
de Direito Internacional Humanitário. O presente
parecer não agradou a nenhuma das partes
envolvidas (Estados nucleares e Estados não-
nucleares).
-
24
Não há definição legal deste crime, no quadro do Tribunal Penal Internacional.
A intervenção do Estado não é legitimada com o
recurso à força económica, política ou cultural, que
constitua uma coerção;
Ver também Caso Congo vs. Uganda, em que o Congo
reconhece a concessão de apoio às forças, mas se
entende que estamos perante uma situação de
ingerência e não de utilização de força;
Será lícito que um Estado mantenha relações de
amizade com forças políticas internas de outros
Estados, importando considerar os objectivos e modos
de prestação desses apoios. Por exemplo, se essa
intervenção retira a liberdade de escolha de outro
Estado, não pode ser admitida essa nítida acção de
ingerência.
Recorde-se os apoios conferidos ao Partido
Socialista (PS) por outros Estados, no período
pós-25 de Abril ou os apoios concedidos ao
Partido Comunista Português (PCP) pelos Estados
Soviéticos;
Ver Acta Final de Helsínquia e o ponto 6
apresentado – não intervenção nos assuntos
internos. É feita referência a outras formas de
coerção económica, social e política por parte de
um Estado, tendentes a subordinar outro Estado,
obtendo vantagens de qualquer espécie.
o Habilitação negocial
Não sucedia nos primórdios do DI,
mas já se revelava desta forma;
Representantes a quem são
conferidos poderes pelo Estado
Pode ser designado um
representante tão só para
uma fase do processo de
celebração;
Carta de “plenos poderes”
conferida pelos Estados para
acreditação de um
representante.
o Habilitação funcional – de acordo com a
prática dos Estados, há personalidades que
podem vincular os Estados (habilitação
genérica);
Habilitação funcional limitada – não
dispondo de carta de “plenos
poderes”. Sucede, por exemplo,
com:
Embaixador, designado para
representar o Estado apenas
na adopção do texto;
Representantes habilitados
junto de conferências ou
organizações internacionais
para negociarem e
concorrerem para a adopção
do texto.
o Habilitação específica
Através de carta de “plenos
poderes”, acto que confere poderes
ao representante, ainda que possam
ser limitados;
Em face do alargamento das
matérias alvo das convenções,
entende-se que outras
personalidades têm competência
de representação, sem o Estado
conferir carta de “plenos poderes”,
em virtude de diversas
circunstâncias.
Adopção do texto
o Coloca termo à negociação do texto;
o Perante tratados multilaterais, uma das
partes assume a posição de relator,
procurando fixar um texto que agrade a
todas as partes;
o O texto é adoptado, quando aprovado por
todos os Estados intervenientes, expressa
ou tacitamente (artigo 9.º CVDTE);
o O princípio-regra para a aprovação é a
unanimidade, sendo que um tratado
adoptado em conferência internacional
apenas exige uma maioria qualificada de
2/3 dos Estados para aprovação. Nestes
termos, o facto de um Estado não
concordar com o texto não impede a sua
aprovação. Aliás, tende-se a prescindir da
unanimidade do concurso de todos os
Estados.
o Autenticação do texto
Redacção do tratado em diversas
línguas (≠ aprovação, numa só
língua), em que se pode fazer fé, do
ponto de vista jurídico;
Texto torna-se definitivo, salvo
correcções gramaticais. Conteúdo e
forma jamais podem ser alterados;
Assinatura ad referendum (sujeita a
posterior confirmação) – aplica-se
quando o representante não goza
de poder;
Outros processos (art. 10.º CVDTE)
Na égide de uma organização
internacional – apenas
assinatura do representante;
Troca de cartas entre os
Estados (nos tratados
bilaterais).
Assinatura diferida (artigo 81.º
CVDTE) – aplica-se para Estados que
não participaram na negociação ou
não adoptaram o texto sob as
formas prescritas. Permite aos
Estados serem parte originária do
tratado.
Esta situação difere da adesão
de Portugal à CVDTE, em
2003, não constituindo parte
originária.
Partes do Tratado
Preâmbulo (indicação das
partes, do processo de
negociação, dos objectivos
que se seguem e dos
princípios e valores
fundamentais que estão na
base do acordo, enquanto
elementos interpretativos
não vinculativos)
Corpo dispositivo
Parte complementar (não
obrigatória)
o Protocolos – têm valor
jurídico vinculativo,
equivalente ao corpo
dispositivo. Devem,
contudo, integrar esta
parte complementar,
dada a sua extensão;
o Declarações – actos
políticos que não são
juridicamente
relevantes. Apenas
ajudam a determinar a
vontade das partes.
Podem, por exemplo,
auxiliar à interpretação
das disposições do
corpo.
25
Comunicação, aos outros Estados, de um depósito.
26
Modalidade excepcional, apenas aplicável com um número reduzido de Estados.
situação se verificar, é necessário que
estejamos perante uma questão
substancial, em que há uma violação de
uma disposição fundamental do Estado
(vício relevante), devendo ela ser
objectivamente detectável pelos outros
Estados, isto é, existe uma obrigação de os
Estados terem conhecimento desse vício;
o Havendo um problema
de interpretação, pode
haver lugar a resolução
pacífica dos conflitos,
por exemplo através do
recurso aos tribunais
arbitrais;
o O Tratado da União
Europeia, em função do
seu objecto – laço de
ligação entre Estados,
de larga intensidade –
não admite reservas,
ainda que tal disposição
não se encontre
expressamente prevista
o A aceitação não é
necessária, se o
tratado admitir, no seu
texto, reservas;
o A apresentação de
objecção pode excluir
ou modificar o efeito
da reserva entre o
Estado objector e o
Estado que apresentou
a reserva, através de
declaração expressa.
o Efeitos da reserva
Princípio da
relatividade: o
objectivo da
reserva é
aplicável nas
relações entre o
Estado que a
formulou e os
Estados que
aceitaram a
reserva
(normalmente
por via tácita). O
sentido da
modificação
passa a valer
entre esses
Estados;
No caso de
objecção à
reserva: a
disposição sobre
a qual incide a
reserva não se
aplica entre
Estado objector e
aquele a
formulou,
podendo o
Estado objector
fazer com que o
Tratado não
vincule as
relações entre si
e o Estado que
formulou a
reserva.
Entrada em vigor
o O tratado entra em vigor no momento em
que as partes o determinam;
o Caso nada seja determinado, o tratado
entra em vigor quando é ratificado pelo
último Estado, que deposita os
instrumentos;
o O mais vulgar é haver uma data fixada;
o A entrada em vigor vincula os Estados
contratantes a esse tratado;
o Pré-vigência: disposições que entram em
vigor com a assinatura;
o Aplicação provisória – por acordo das
partes, podendo o tratado produzir efeitos
antes da entrada em vigor do mesmo. Tal
pode suceder em tratados de natureza
técnica;
Registo e publicação
o Artigo 80.º CVDTE – registo junto do
secretário-geral das Nações Unidas (artigo
102.º CNU), que trata da respectiva
publicação. Com isto, visa-se evitar a
“diplomacia secreta”, garantindo-se a
transparência;
o Os tratados que não tiverem sido alvo de
registo não podem ser invocados nas
Nações Unidas, nomeadamente junto do
TIJ, da Assembleia-Geral e do Conselho de
Segurança;
o Não há prazo para efectuar o registo;
o Nem todos os tratados são publicados na
íntegra, ainda que haja registo e
publicação dos elementos essenciais;
o A publicação não sucede, de todo, nos
tratados bilaterais, de natureza técnica,
económica ou administrativa, pois seria
impensável manter organizada uma
imensidão de tratados. De todo o modo,
os tratados encontram-se disponíveis
junto do Secretário-Geral da ONU e
acessíveis on-line.
Interpretação, integração e aplicação dos Tratados. Requisitos de
validade e regime das invalidades. Suspensão, cessação da
vigência dos Tratados e recesso.
o Princípios fundamentais à interpretação (artigos 31.º e 32.º
CVDTE)
Artigo 31.º CVDTE – princípio da boa-fé e respectivos
corolários:
Princípio do absurdo – uma interpretação que
conduza a um resultado ambíguo deve implicar a
sua eliminação;
Fins da interpretação:
o Deve ser realizada em termos objectivos
(sentido comum), que atende em primeiro
lugar às normas do tratado, ainda que a
vontade das partes também possa ser
relevante;
o Deve, igualmente, ser actualista, tendo em
conta a prática dos Estados na aplicação
do tratado. Verificar, por exemplo,
acordos posteriores ao tratado, que o
vieram concretizar. Note-se que a
interpretação não pode desvirtuar, por
completo, o sentido das normas.
Resultados da interpretação:
o Restritiva – só prevalece nos casos em que
a interpretação da vontade das partes é
determinante;
o Declarativa
o Extensiva – implica a devida cautela, em
ponderação com a soberania dos Estados,
que não pode ser advogada como
princípio fundamental.
o Integração de lacunas
Analogia – aplicação analógica dos princípios dos
Estados ao TIJ. Como exemplo de analogia, temos a
matéria relacionada com a personalidade e capacidade
jurídica da ONU;
Princípios Gerais de Direito (PGD) – função integradora
27
Comunicada à outra parte contratante ou nos termos da carta de “plenos poderes”.
geográficas com relevância
para o tratado e de
delimitação territorial;
N.º1 – O erro deve incidir
sobre matéria fundamental
para a vinculação ao tratado e
não sobre aspectos
acessórios;
N.º2 – Restrição
suplementar: o n.º1 não se
aplica, quando o Estado tinha
a obrigação de ter detectado
o erro (indesculpável) ou
quando o Estado contribuiu
para o erro;
N.º3 – Excluem-se erros na
redacção do tratado.
Coacção sobre o
representante (artigo 51º
CVDTE)
o Também se admite,
excepcionalmente,
sobre pessoas que
podem influenciar
decisivamente a
vontade do
representante (por
exemplo: coacção
sobre a família);
o Vício suficientemente
grave para conduzir à
nulidade do tratado.
Requisitos formais
Respeito pelas regras relativas à conclusão dos
tratados que vinculam as partes;
Disposições da CVDTE não supletivas29, ou que
sendo supletivas, sejam aplicáveis.
o Artigo 66.º - dirimição de litígios de ius
cogens sujeito a reserva apresentada por
Portugal. A apresentação desta reserva
por Portugal, aquando da adesão em 2003
à CVDTE, suscita diversa discussão,
nomeadamente por contradizer o artigo
42.º CVDTE, em que se diz: A validade de
um tratado ou do consentimento de um
Estado em obrigar-se por um tratado só
pode ser contestada mediante a
aplicação da presente Convenção.30
31
A distinção entre nulidade absoluta e relativa não é realizada na CVDTE.
o Efeitos
Reconstituição da situação que
existiria se não houvesse o vício;
Os vícios subjectivos relativos ao
consentimento de uma das partes
que incidam sobre a totalidade de
um tratado multilateral implicam a
possibilidade de desvinculação
dessa parte, não afectando o
tratado como um todo;
Os vícios subjectivos e objectivos
que incidam sobre algumas
disposições e em que se aplique o
artigo 44.º, n.º3 CVDTE, implicam a
nulidade dessas cláusulas nas
relações entre o Estado, cujo
consentimento foi viciado e o(s)
outro(s) Estado(s). – questão de
divisibilidade, excluída em relação
a ius cogens ou coacção;
Excepção prevista ao artigo 69.º,
n.º2, alínea b), nos termos do n.º3
do mesmo artigo, para a parte que
provocou o vício de consentimento
– princípio non venire contra
factum proprium;
Em caso de objecção:
Resolução do diferendo nos
termos previamente
convencionados pelas partes
– princípio do consentimento
das partes –, com recurso a
mediação ou arbitragem, por
acordo das partes;
Recurso aos meios do artigo
33.º CNU;
Caso o recurso aos meios do
artigo 33.º CNU tenha sido
infrutífero, no caso de o
diferendo incidir sobre a
violação de ius cogens, é
possível o recurso por acordo
arbitragem, ou o recurso ao
TIJ. Qualquer das partes pode
recorrer ao TIJ, à margem dos
modos de atribuição de
competência ao TIJ, para
resolver ao litígio, sendo que
não são admitidas reservas a
este recurso (artigo 42.º, n.º1
CVDTE); quando o diferendo
incida sobre outro
fundamento, qualquer parte
pode solicitar recurso ao
processo de conciliação,
anexo à CVDTE, através do
Secretário-Geral da ONU.
o Denúncia e recesso
Denúncia – acto unilateral mas não autónomo, cujas
condições em que pode ser activada estão reguladas
por outra legislação. Acarreta a cessação de vigência
apenas dos tratados bilaterais;
Nos tratados multilaterais, a desvinculação de uma
parte assume a forma de recesso e só implica a
desvinculação (ou retirada) dessa parte, não
produzindo a cessação de vigência do tratado para
todas as partes;
Caso o tratado não preveja a denúncia ou o recesso,
estes só poderão ter lugar com verificação de uma das
condições previstas no n.º1 do artigo 56.º CVDTE. A
denúncia não é um acto livre dos Estados, nem
constitui uma manifestação de soberania dos Estados.
Só há lugar a denúncia unilateral, quando o objecto e
fim permitem sair da economia do texto, analisado o
grau de intensidade das relações estabelecidas entre
as partes;
Não é admissível o recesso nas convenções de
codificação (por exemplo: CVDTE) e nas que
constituem situações objectivas.
Aprovação
Tratados – resolução da AR;
Acordos
o Resolução da AR (obrigatória – os
indicados no elenco do artigo 161.º, alínea
i) da CRP e os de matéria de competência
reservada – artigos 164.º e 165.º CRP;
facultativa – que o governa entenda
submeter – artigo 161.º, alínea l);
o Decreto do Governo (os que não versem
sobre matéria da competência reservada –
absoluta ou relativa – da AR) – artigo
197.º, n.º1, alínea c) da CRP e artigo 200.º,
n.º1, alínea d) da CRP;
Referendo
Referendo incide sobre o conteúdo. Não é
admitido levar a referendo matéria relacionada
sobre tratados de paz e rectificação de
fronteiras;
No caso de “tratado que vise a construção e
aprofundamento da União Europeia”, é a
aprovação do próprio tratado que pode ser
submetida a referendo (artigo 295.º) – situação
especial, dada a complexidade da matéria.
o Procedimento para a desvinculação ou suspensão da
aplicação
Não está regulada pela CRP, mas deve ter um
procedimento substancialmente idêntico ao da
vinculação (aplicação analógica), nomeadamente
assegurando a aprovação pelo órgão competente e a
intervenção do PR, para consulta e pronúncia.
Questão doutrinal:
Na opinião de Jorge Miranda
e Jorge Bacelar Gouveia, o
n.º3, de alguma forma,
recepciona automaticamente
esses actos unilaterais, tal
como o n.º1;
Já no entender de Fausto
Quadros e André Gonçalves
Pereira, esta posição
apresentada é refutável, não
admitindo que o n.º3
possibilite a recepção
automática desses actos.
32
Foi o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (anterior designação do Tribunal de Justiça da
União Europeia) o principal impulsionador e criador do Primado do Direito Comunitário, através de
diversos Acórdãos, que foram essenciais e tiveram um papel decisivo para podermos verificar a primazia
que é dada por este tribunal ao Direito Comunitário. O Primeiro foi o Acórdão Costa/ENEL de 15 de
Julho de 1964, onde está contida toda uma teoria das relações entre o Direito Comunitário e o Direito
Interno: Na base deste acórdão encontra-se um caso, preparado em Milão, que pretendia abordar a lei
Italiana sobre a nacionalização da energia eléctrica, e em que se denunciava que esta era antagónica
com disposições do Tratado da CE.
Do ponto de vista político,
esta questão não é discutida.
O artigo 10.º da Constituição
Europeia (2004) estabelecia o
primado do Direito
Comunitário, o que terá
contribuído para o insucesso
do Tratado Constitucional,
chumbado, em referendo, na
França e na Holanda. Já o
Tratado de Lisboa (2007)
excluiu essa norma. Este
tratado apresenta uma
declaração anexa do serviço
jurídico do Conselho, em que
se diz que o Direito
Comunitário beneficia do
princípio do primado, no
seguimento daquilo que é a
jurisprudência consolidada do
Tribunal de Justiça. Todavia,
esta declaração não tem valor
jurídico vinculativo, tendo
apenas valor político e
integrando a chamada “soft
law”. Constitui, portanto, um
mero quadro de referência
jurídica e um elemento
interpretativo de um
compromisso político de
todos os Estados-Membros,
que manifestaram esta
orientação.
o N.º4 – recepção automática ou plena?
O artigo 8.º, n.º4 responde a
questão colocada no n.º3, sobre as
normas comunitária que vigoram na
ordem jurídica nacional. Há o
reconhecimento inelutável que a
União Europeia não é uma qualquer
organização internacional, havendo
um vínculo de diferente intensidade.
Este n.º4 aceita o primado do
Direito Comunitário, salvo a
ressalva que impõe o respeito pelos
princípios fundamentais do Estado
de Direito Democrático. Os artigos
1.º, 2.º, 3.º e 288.º CRP constituem
limitações à abertura ao primado. Já
o artigo 7.º CRP, que consagra o
empenho do Estado Português nas
relações internacionais, pode
conduzir a uma orientação
diferente;
Note-se que, o Estado Português
não contém o monopólio dos
princípios fundamentais do Estado
de Direito Democrático e que, aliás,
estão consagrados no Tratado da
União Europeia e integram as Leis
Fundamentais de outros Estados
europeus O Princípio da Democracia
e o Princípio do Estado de Direito
(“community of law” ou “rule of
law”) também pautam a acção do
Tribunal de Justiça, o que não
permite a recusa da aplicação do
Direito Comunitário, entendido com
um domínio à parte;
Recorde-se que os protocolos
anexos aos Tratados têm o mesmo
valor do seu corpo dispositivo, ainda
que integrem as partes
suplementares. Tal verifica-se por
uma questão de funcionalidade ou
por apenas dizerem respeito a
alguns Estados;
Importa salientar, também, que os
Tratados da UE foram aprovados
pela unanimidade dos Estados-
Membros, o que lhes confere uma
legitimidade política sólida;
A Constituição dos Países Baixos é a
única dos Estados-Membros da
União Europeia que prevê a
prevalência de todo o Direito
Internacional face a uma norma
interna incompatível;
Este n.º4 foi integrado com a
Revisão Constitucional de 2005,
aquando da discussão da
Constituição Europeia.
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
Âmbito
Genérica: os Estados são detentores de todos os
direitos e obrigações que o DI pode produzir
Derivada: de acordo, por exemplo, com o
princípio da especialidade ou a natureza do
sujeito.
Comunidade Internacional
o Formada pelos Estados, organizações
internacionais e outras organizações e
estruturas;
o O TPI constitui uma entidade de referência
em matéria de crimes contra a
Humanidade.
Os povos
o Direitos dos povos (em geral);
o Direitos dos povos (em particular).
o Os Sujeitos de DI
Estados e entidades afins
Definição tradicional de Estado soberano, por
Jellinek – constituído pelos elementos:
o Território: parcela de Estado no globo
delimitado, com ou sem território lagunar;
o Povo: trata-se de um conceito sociológico.
A conotação jurídica atribuída pelas
constituições é útil, mas apenas a
posteriori, estando associada à
nacionalidade ou à cidadania, o que
pressupõe um poder político que a
atribua. Esta situação encontra-se
estabilizada. Pelo contrário, existem
situações instáveis, relacionadas com o
princípio da auto-determinação dos povos,
como nos casos do Kosovo (em que a
última nacionalidade dos seus habitantes é
a sérvia) e de Portugal, nos anos 60, em
que, “do Minho a Timor”, igual cidadania.
Essa situação é admissível a nível
constitucional, mas não a nível
internacional. Em alternativa, avança-se
com a noção de população (constante da
Convenção de Montevideu), que reside
permanentemente no território,
excluindo-se os cidadãos estrangeiros.
Trata-se de uma noção demasiado neutra,
pois os elementos da população podem
não manter ligação efectiva (“ânimo de
vida em comum” no presente e para o
futuro). É, portanto, um elemento
subjectivo, que implica um passado em
comum. O conceito tradicional de povo
implicava uma comunidade com uma
identidade em comum, ao nível da
história, cultura, língua, religião. Trata-se
de uma noção ultrapassada, visto que as
sociedades actuais serem laicas e
multiculturais. No Kosovo, predomina a
religião muçulmana.
o Poder político: existem vários poderes
políticos possíveis. Entende-se que o
poder político deve ser legítimo,
democrático (a promoção da democracia é
objectivo da ONU) e pleno (reunião dos
meios financeiros e instrumentais e das
várias prerrogativas – executivo, judicial e
legislativo).
Organizações internacionais
Associações de sujeitos de DI (Estados, outras
organizações internacionais, outros sujeitos),
permanentes (com vocação duradoura), mas não
necessariamente sem termo, dotadas de direito
próprio (ordem jurídica da própria organização).
Constituem entidades finalistas (com fins gerais
ou especiais). Não têm base territorial (não é
direito constitutivo da organização, implicando
intermediação dos Estados);
Capacidade de gozo limitada pelo princípio da
especialidade (não há competência de princípio);
Classificações de OI
o Estrutura – trata-se de uma difícil
distinção, não havendo nenhuma
organização que assuma apenas uma das
possíveis classificações.
Intergovernamentais – não perda
de soberania dos membros em favor
da OI;
Supranacionais – classificação que
surge a partir da iniciação do
processo de integração europeia,
sendo conferidos à UE poderes
soberanos com as concomitantes
restrições aos Estados-membros. A
UE goza de capacidade de adoptar
actos sem necessidade de processo
internos dos Estados (artigo 8.º, n.º3
CRP). A UE tem também vertentes
mais próximas da
intergovernamentalidade.
o Domínios internacionais
Espaço aéreo internacional;
Espaço exterior;
Alto-mar – definido por exclusão de partes, não cai no
espaço sob jurisdição do Estado, desde as 12 milhas. O
princípio fundamental é o da liberdade de utilização
por todos os Estados, para os mais diversos fins, desde
que pacíficos (por exemplo, liberdade de circulação,
investigação científica, desde as 12 milhas. A ZEE e a
plataforma continental são para exploração
económica).
Direito de visita, por suspeita de navio
estrangeiro levar a cabo actividade ilícita;
Direito de hot pursuit – perseguição contínua
(de modo ininterrupto) de navio, em flagrante
delito, de navio estrangeiro, por prática de
infracção, na área de jurisdição de um Estado.
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Pressiona pela criação de uma burocracia voltada a administrar as questões referentes à integração,
de preferência com carácter supranacional, pois, dessa forma, poderia dirimir diferenças nacionais e
entre os diversos grupos sectoriais que se sentem ameaçados.
Leitura do artigo 2.º, n.º7 da CNU
o Alcance da não “intervenção” nos
assuntos internos dos Estados
Restrito: apenas não pode haver
tomada de decisões, por parte dos
respectivos órgãos da ONU, no
quadro das suas competências
(AGNU, CSNU), admitindo-se a
análise sobre as questões;
Amplo: as Nações Unidas não se
podem debruçar sobre matérias
fora do seu âmbito, impedindo-se a
discussão internacional de assuntos
dos Estados (não podem ganhar
relevo internacional). Esta posição,
defendida por Hans Kelsen, limita
substancialmente a capacidade de
intervenção da ONU.
Deliberação
o O voto registado só é pedido para
questões políticas mais sensíveis;
o Questões importantes / outras questões
(maioria das questões) – diferente
qualificação no Conselho de Segurança;
o Há alguns anos que se desenvolve um
esforço especial para alcançar decisões
por consenso, sendo a maioria das
resoluções adoptadas sem votação –
promoção da solidariedade entre Estados;
o No caso Kosovo, o pedido de parecer ao
TIJ foi submetido a votação (situação
excepcional).
Reuniões
o Situação excepcional: as reuniões de
emergência relativas à Palestina ocorrem
concomitantemente, por decisão
deliberada pela maioria dos Estados, ainda
que sob protesto de Israel.
Deliberações:
o As “questões processuais” são decididas
por uma maioria de 9 favoráveis, não se
contando as abstenções;
o Nas “questões não processuais”, entre os
9 votos, têm de se incluir os votos
favoráveis dos membros permanentes
(que gozam de direito de voto) – princípio
aristocrático; a parte num conflito deve
abster-se; um costume contra tractum
consagrou a orientação de que uma
abstenção de um membro permanente
não impede a deliberação –
implementação de costume contra legem
(não se exigem 9 votos, podendo haver
abstenções);
o Duplo veto – a determinação do carácter
processual ou não processual de uma
questão considera-se uma questão não
processual (dada a importância que a
questão tem), pelo que fica sujeito ao veto
dos membros permanentes – costume
praeter legem.