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APRESENTAÇÃO

O livro de Daniel poderia ser intitulado O ROMANCE DA VIDA DE UM HOMEM. Entretanto, há no livro lances
tão dramáticos e inteiramente fora do campo pessoal que tal título não lhe ficaria bem. Poderia ser intitulado
AS VISÕES DE UM HOMEM DE DEUS. Também esse título não lhe ficaria bem, porque há no livro muitas
partes pessoais. Então, parece difícil encontrar um título que convenha ao livro ora em apresentação. O
melhor será deixar ao leitor o encargo de dizer o que o livro é depois de ler os comentários aqui
apresentados.

Não foi fácil escrever este Estudo. Isso pode ser provado pelo fato de que escrevemos, corrigimos, cortamos,
emendamos e tornamos a emendar o corrigido, no desejo de apresentar um trabalho modesto, popular, mas
ao mesmo tempo seguro na sua interpretação histórica e doutrinária. Como sabe qualquer leitor do livro, há
nele tantas visões, tantas aparições de seres sobrenaturais, que ficamos muitas vezes sem saber o que dizer.
Especialmente o capítulo 11, que versa sobre a guerra dos Ptolomeus e Selêucidas, constitui um pedaço de
história que mais se parece com um quebra-cabeças. Não é fácil extrair do histórico de Daniel todos os
elementos que entraram na revelação que Cristo lhe deu. Procuramos ser leais à história como tal e ao relato
do livro inspirado. Teria sido um deleite dar um capítulo sobre o Macabeísmo, mas enredemos que isso
estava fora do livro e fazemos apenas uma ligeira referência ao mesmo assunto quando tratamos do cap.
11:35. Aconselharíamos aos leitores deste Estudo o livro do autor, POVOS E NAÇÕES DO MUNDO ANTIGO,
onde há um breve esboço do que foi o famoso movimento asmoneano, denominado MACABEU. É um
episódio glorioso de uma família que teve a coragem de se levantar contra o Estado poderoso dos Selêucidas,
vencendo-os depois de muitas batalhas. Este estudo nos levaria, se fosse feito, ao tempo dos romanos, que
nessa altura dos acontecimentos já se encontravam no Oriente Próximo.

Assim, apresentamos ao povo amante da boa leitura este esforço, com o fim de popularizar o grande livro de
Daniel e ao mesmo tempo oferecer informações históricas que não se encontram à mão de leitores de poucos
vagares.

Oferecemos ao povo este Estudo, mas antes o oferecemos ao Senhor, em nome de quem procuramos fazer o
melhor possível. Uma coisa deve ser dita nesta apresentação: procuramos ser fiéis na interpretação da
história que o livro aborda, pois não têm sido poucos os que têm posto em dúvida certas partes do mesmo e
até o próprio livro quanto à sua autoria histórica. Não nos desculpamos se houver falhas e senões, porque
qual a obra humana perfeita? No mais, a Deus todo o louvor.

Para concluir, chamamos a atenção do leitor para três apêndices, que vêm no fim do livro. O primeiro
representa uma tentativa de interpretar em termos do futuro o capítulo 12. Não são poucos os historiadores e
curiosos que têm dito e escrito multa coisa que nos parece não constar do livro. A revelação que foi dada ao
profeta pelo SENHOR, que lhe apareceu por mais de uma vez, dá-nos a impressão de que ele quis deixar para
a humanidade informações a respeito das coisas do "Fim". O que parece é que se trata mesmo de uma
exposição dos acontecimentos que hão de preceder a Segunda Vinda do SENHOR. Se esta não for a
verdadeira interpretação, paciência. O leitor tem aí material suficiente para se orientar nos ensinos deste
capítulo, onde muita coisa é clara, mas também muita é obscura e misteriosa.

O segundo apêndice representa uma tentativa de dar aos leitores um esboço das causas da destruição da
nação israelita. Parece incrível que uma nação que nasceu sob os melhores auspícios, garantida por Deus, seu
autor, terminasse da forma que terminou. Então uma busca às causas desta destruição parece completar a
história do Velho Testamento.

Finalmente, sendo o livro de Daniel um dos últimos a ser produzido no Velho Testamento, e apresentando-
nos tantos problemas nacionais, pareceu-nos natural dar um esboço da história de Israel, a começar do Sinai.
É apenas um esboço histórico, e não a história toda, pois isso não caberia nos limites de um apêndice a um
livro. Se o leitor acompanhar, através dos 1.500 anos, os fatos fundamentais da história deste notável povo,
há de ver que foi um povo de grande capacidade sofredora, e, se sobreviveu, como tem sobrevivido, mesmo
depois do Velho Testamento, isto deve-se à divina providência, que, fiel a uma aliança feita com Abraão, tem
preservado esta gente durante 3.500 anos. É de fato um milagre, pois nenhum outro povo pode contar a sua
história em termos de milhares de anos. Se alguém desejar uma prova de que a Bíblia é a verdade, mire-se na
história dos hebreus . Eles aí estão, voltando à sua terra, depois de 2.000 anos expulsos dela, para assistirem
aos últimos acontecimentos que darão fim à história humana, para então entrarmos na segunda parte, que é
a eternidade.

Rio de Janeiro, novembro de 1975


INTRODUÇÃO

1. O AUTOR DO LIVRO

Não há dúvida de que o livro de Daniel foi escrito por ele mesmo, durante o cativeiro babilônico. Ele sempre
usa o verbo na primeira pessoa do singular, e sempre declara que as revelações que constam no livro foram
dirigidas a ele mesmo. O fato de que o livro trata de assuntos políticos que só se realizaram muitos anos
depois tem levado alguns comentadores a admitir que o Daniel caldeu não pode ser o seu autor. Dizem que
ele não podia adivinhar o que ia acontecer séculos depois da sua morte. Essa gente esquece que Daniel tinha
um Deus que lhe revelava os fatos que iriam suceder tempos depois. Neste sentido, tudo depende de
aceitarmos que há Deus e que este Deus conhece o principio e o fim de tudo. Para ele, não há nada
encoberto.

Daniel foi levado com o primeiro grupo de cativos, na primeira tentativa de Nabucodonozor de tomar a
cidade, em 597 a.C. O mundo dessa época era qualquer coisa só parecida com o mundo da 1 e da 11 Guerra
Mundial, dadas as diferenças do tempo. Nas introduções a outros livros já me ocupei da situação política
daqueles dias sombrios. Depois que o Império Assírio entrou em decadência, Faraó Neco veio do Egito para
ver se conseguia restaurar o antigo domínio egípcio naquelas regiões ao norte da Palestina. Lá os seus
exércitos se defrontaram com os de Nabucodonozor, e a batalha decisiva não foi fácil para qualquer das
partes em contenda. Isso tanto é certo que Neco voltou, dizendo que tinha vencido os exércitos inimigos, mas
o profeta Jeremias nos informa que isso não foi verdade (Jer. 46:2). De qualquer forma, na sua volta para o
Egito, parou em Judá, e, como o seu contendor estava distante, ele destronou Jeoacaz - que o povo tinha
colocado no trono pela morte de Josias, num confronto com este mesmo Neco - e colocou no trono o irmão,
Eliaquim, mudando-lhe o nome para Jeoiaquim. Este ficou submisso, naturalmente, ao rei do Egito, mas
quando chegou Nabucodonozor, que tinha demorado a descer até Jerusalém, prendeu o rei com duas cadeias
de bronze, para o levar a Babilônia (11 Crôn. 36:6; II Reis 24:1).

Era, naturalmente, intenção de Nabucodonozor tomar a cidade, mas notícias chegaram de Babilônia de que
seu pai tinha morrido, e ele entregou os exércitos aos seus generais e foi para Babilônia. Fez uma breve
pilhagem dos utensílios do templo, para não ir de mãos vazias, e levou um pequeno grupo de jovens príncipes,
entre os quais Daniel, Hananias, Misael e Azarias, aos quais puseram nomes babilônicos: a Daniel o de
Beltessazar, a Hananias o de Sadraque, a Misael o de Mesaque e a Azarias o de Abednego. O que foram estes
jovens em Babilônia, especialmente Daniel, veremos no decurso deste Estudo.

O livro consta de duas unidades. Os capítulos 1-6, que constituem o que se poderia chamar a parte literária, e
os capítulos 7-12, que representam a parte profética. Entretanto, esta distinção não é muito convincente, e
tanto isso é verdade que o livro como um todo tem sido atribuído a outro autor, que dividiu o seu trabalho em
duas partes. É fato bem conhecido que Daniel não foi, a rigor, um profeta, mas um estadista, que serviu a dois
impérios, o Babilônico e o Medo-Persa. Talvez seja por isso que o livro de Daniel não se encontra, no cânone
hebraico, na seção dos profetas, mas entre os Quetuvim ou Escritos. Isso, todavia, não lhe tira qualquer
mérito a que tem, indubitavelmente, direito. Por esta e outras razões, que apreciaremos no decurso do
Estudo, é que alguns críticos pretendem atribuí-lo a outro Daniel, dos tempos de Alexandre, e não ao Daniel
caldeu.

As igrejas cristãs, de modo geral, sempre aceitaram o livro como sendo de Daniel, e de pouco têm valido os
ataques a esta posição. Os hebreus sempre reconheceram a Daniel hebreu a autoria do livro, e, se o o
colocaram na coleção dos Escritos, onde se encontram os livros poéticos, é porque, de fato, Daniel foi mais
político que profeta. Apenas isso. Desde tempos imemoriais os mestres da Igreja sempre aceitaram a autoria
clássica do livro. Dúvidas sempre houve, como quanto a muitos outros livros. Porfírio, de Tiro (232-233 a.C.),
sustentou que o livro era produto de um judeu dos tempos dos Macabeus, no reinado de Antíoco Epifânio.
Esta opinião teve larga aceitação, mas não chegou a demolir a crença da autoria de Daniel caldeu. Durante os
séculos XIX e XX, quando a crítica alemã pretendeu demolir toda a história dos sagrados livros, foi a opinião de
Porfirio novamente trazida à baila. Para sustentar as suas opiniões, tentaram descobrir muitas lacunas
históricas no livro, afirmando que grande parte do mesmo se referia justamente ao período de Antíoco. Os
que negam o sobrenatural neste livro e noutros naturalmente descobrem muitas incoerências históricas.
Como é, diziam eles, que um homem do quinto século a.C. poderia escrever sobre fatos que só se realizaram
séculos depois? Todavia, não podendo negar in totum a autenticidade do livro, aventuram que muito do seu
material veio do tempo de Daniel, mas a composição deve pertencer ao segundo século a.C. Esta é uma
evasiva muito comum na crítica racionalista, isto é, que o material de certo livro é antigo, mas a sua feitura é
mais recente. De qualquer modo, fica evidente que a autoria de Daniel fica de pé.
Algumas das mais fortes alegações é que, por exemplo, o termo "caldeu" dá ensanchas a uma era posterior a
Daniel. Ora, o termo caldeu foi usado muito antes de Daniel escrever o seu livro, conforme vemos de 11
Crônicas 36:17, em que o rei da Babilônia é chamado rei dos caldeus.

Sobre esta autenticidade poderíamos citar algumas escrituras do Novo Testamento, por onde se conclui que
os escritores inspirados desta segunda parte da Bíblia não tinham dúvidas quanto ao autor deste livro: Mateus
10:23; 16:27 e refs., 19:23; 24:15; 25:31 e 26:64. Algumas das escrituras mais claras quanto aos
acontecimentos que aguardavam a nação israelita e o mundo mesmo, incluindo a igreja cristã, encontram-se
neste livro. Jesus foi incisivo em citar do livro os fatos que demonstrariam tanto o fim da nação hebraica
como o fim da era cristã. Para nós, pois, não há quaisquer possibilidades de dúvidas quanto à autoria do livro.

Tem-se discutido que Daniel, sendo hebreu, jamais poderia ter sido aceito no sacerdócio babilônico. Este é
um argumento sem valia, porquanto Daniel jamais alegou pertencer a tal sacerdócio. Ele era essencialmente
político (2:48 e 49), e só intervinha em assuntos religiosos quando era solicitado, face à incapacidade dos
adivinhos caldeus para decifrar enigmas. Daniel era a autoridade suprema nas questões insolúveis, e, sempre
que se apresentava, não trazia credenciais de ofício, mas, sim, de que era crente no Deus que revela os
segredos. Penso mesmo que se Daniel tivesse sido aliciado para entrar em qualquer ordem sacerdotal ou
religiosa, não a teria aceitado. Sempre estava pronto para servir aos reis nos assuntos públicos, e nesta
capacidade exerceu os mais altos cargos, tanto no governo de Nabucodonozor (2:48, 49; 5:29 e ss.), como no
governo persa. A sua atuação era essencialmente política e ele só aparecia em palácio quando era solicitado.

Tem sido contestada a parte que se refere ao estado de Nabucodonozor quando ficou louco. Todavia, um
escritor caldeu bem antigo, Abidemus, citado por Eusébio, e igualmente Berosius, o primeiro comentador da
história da Caldéia, têm, nos seus trabalhos, relatos que se aproximam muito do reiatado por Daniel, segundo
Josefo, Contra Apião 1:20. Naturalmente que um acontecimento palaciano e bem pouco encorajador para a
história não seria muito divulgado. Além disso, tratava-se apenas de uma doença anormal que havia
acometido o rei e que não seria para ser muito divulgada. Possivelmente, nem os babilônios teriam tomado
conhecimento do acontecimento. O fato de haver relatos similares nos escritores mais antigos basta para
corroborar o que Daniel menciona. Devemos ver que fatos desta ou mesmo de outra natureza não seriam
levados para fora dos círculos palacianos. Não havia telégrafos nem jornais e tudo se passaria dentro dos
domínios domésticos.
Uma outra objeção à autoria de Daniel reiaciona-se com o fato de existirem no livro alguns versos em
aramaico, e mesmo certa linguagem. O aramaico encontrado no livro é o que se convencionou chamar de
"Reich" ou Reino. Esta língua, ao tempo, estava-se difundindo entre os povos orientais, e especialmente
depois da queda de Jerusalém, e o desuso em que caiu o hebraico deu ensanchas a que o aramaico se
espalhasse. Quando so hebreus voltaram do exílio, voltaram falando aramaico mais do que hebraico, que não
era a língua falada na terra do seu cativeiro. O fato da existência do aramaico no livro não milita contra a
autoria de Daniel.

Alguns dos relatos do livro, especialmente os que se relacionam com a história dos gregos, têm sido usados
como prova de que Daniel não poderia relatar fatos que só ocorreram mais de dois séculos depois. Isso seria
um argumento irrespondível se Daniel tivesse falado por si, mas o que ele fez foi relatar o que o anjo Gabriel
lhe contou como uma revelação de Deus para o fim dos tempos. Se há Deus, que conhece a história antes de
ela ser, então Deus pode revelar fatos que só poderão acontecer milênios depois. Se fôssemos aceitar tal
argumento, teríamos de refugar toda a Bíblia, pois até Moisés falou da vinda de um profeta, a quem o povo
devia ouvir semelhantemente a ele (Deut. 18:15). A Bíblia é um livro profético e ninguém tem o direito de
negara este livro as prerrogativas de livro de Deus que ele tem. Aliás, esta é a pedra de toque de todo o
racionalismo - o sobrenatural. Agora mesmo, depois de tantos milênios, um teólogo alemão acha que deve
ser retirado do Novo Testamento todo elemento mítico, isto é, os milagres. Se tirarmos do Novo Testamento
ou do Velho o elemento sobrenatural, o que fica é uma carcassa sem nexo e sem sentido. A coisa melhor que
esta gente deveria fazer seria: 1) Provar cientificamente que Deus não existe. 2) Que a vida universal é
produto da geração espontânea. Isso feito, poderíamos, então, encontrar um campo comum para discussão,
mas enquanto Deus continuar a dominar nos céus e na terra como o Criador da vida, ninguém tem o direito
de, a título de fantasia ou do que seja, levantar-se contra o sobrenatural em qualquer livro da Bíblia.

(1) Certamente a intenção de Nabucodonozor foi a de levar Jeoiaquim para Babilônia, mas os acontecimentos
do momento o levaram a tomar outra posição. Submeteu Jeoiaquim ao seu domínio, mas este logo depois se
rebelou contra o conquistador, continuando no poder para fazer um dos piores governos que a pobre nação
teve.)
2. O PROPÓSITO DO LIVRO

O livro de Daniel é apenas uma peça na imensa engrenagem da revelação de Deus ao povo de Israel. Deus
escolheu esta pobre gente, vinda da escravidão egípcia, e a elegeu como seu povo. O Sinai guarda no silêncio
das suas montanhas os ecos desta transação. Por que Deus assim fez, só ele mesmo sabe. Ele declarou, em
mais de um passo, que não escolheu esta gente porque fosse a mais numerosa da terra nem mesmo a melhor,
mas porque quis. Era a sua promessa feita a Abraão, e quem pode contestar os modos e métodos da ação
divina na História? Escolheu este povo, deu-lhe leis e mandamentos, estruturou-o em nação, e já se foram
mais de 3 milênios e continua de pé, cada dia mais firme, tudo quanto Deus ordenou no Sinai. A existência
dos israelitas no mundo é a mais cabal prova de que Deus elegeu para si este povo, e, apesar de toda a
infidelidade do mesmo, Deus continua a conservá-lo. A razão por que Deus elegeu esta raça, quando poderia
ter escolhido outra, mais culta, não é de nossa apreciação. Ele tinha de escolher, e escolheu. Deus não é um
Deus solitário, escondido nos refolhos do universo. Ele é um Deus que se revela, e tanto o mundo como os
hebreus são elementos desta revelação. Deus só pode ser conhecido através dos atos praticados por seres
racionais, e é por meio deles que a sua natureza e propósitos são conhecidos. A natureza, como tal, não pode
revelar a Deus na sua natureza amorável; só o homem pode. Então escolheu os israelitas para esta tarefa. A
história desta gente é muito ingrata. Pouco depois de serem introduzidos na terra que Deus lhes destinara,
rebelaram-se, e pediram a Samuel que lhes desse um rei, à semelhança das nações, ao redor, desprezando,
assim, o Rei invisível, mas patente que eles tinham. Dali até hoje, a história desta gente é um rosário de
rebeliões, e foi por esta causa que a nação foi destroçada e o povo levado para Babilônia e mais tarde para os
quatro ventos da terra.

Deus tinha um plano, ao eleger esta gente como sua gente, seu povo. Ele teria de dar ao mundo o Messias, o
que iria resolver o problema do pecado na terra, e para tal realização carecia de um povo. Este povo seria
oráculo, o meio de preparação para a (vinda do desejado dos povos). Deus assim planejou e assim executou.
Todos os profetas da antiga dispensação afinam por este diapasão. Os profetas antes de Daniel e depois dele,
todos a uma, afirmam o plano e propósito de Deus. Poderia parecer, pelo fato de o povo ter sido levado
cativo para uma terra estranha, para um povo cuja língua ignorava, que tudo estava acabado. Nada disso. Os
planos de Deus não são para o tempo, mas para a eternidade. Os que testemunharam os acontecimentos de
Jerusalém nos dias de Nabucodonozor e seus generais deveriam ter concluído que tudo estava acabado. O
templo custoso e rico tinha sido arrasado, e de tudo que antes havia constituído uma nação próspera e
poderosa só restavam ruínas. Mas o que aconteceu foi apenas uma lição a ser ensinada aos hebreus e a quem
queira aprendê-la. O plano divino continuava de pé para o tempo e para a eternidade.
Então, parece que temos nestas palavras uma razão por que Daniel escreveu o seu livro. Apesar de estar
numa terra estranha como cativo, a chama da fé que revelou por mais de uma vez é patente nesta obra.
Aprouve a Deus levar este povo a Babilônia para que os babilônios soubessem que além de Marduque havia
outro Deus. Temos até a impressão de que nunca antes nem depois povo pagão algum teve oportunidade de
ouvir que só Deus era Deus. Os decretos de Nabucodonozor (3:29), Dario (6:25) e outros, mandados a todos
os povos da terra sob o domínio daquela nação, testificam que só o Deus de Daniel era Deus a ser adorado.
Deus foi muito louvado e engrandecido por intermédio do seu servo Daniel.

O livro de Daniel pode ser comparado ao Apocalipse. Só aquele reiata os fatos dos últimos dias ainda por
acontecer, com datas marcadas, como o capítulo 9:24-27, em que a vinda do Messias e a sua morte são
retratadas, e depois a volta de Jesus ao mundo, com o arrebatamento da Igreja. Dias e anos são contados de
um modo que nos maravilha. Se nos faltasse o livro de Daniel, não teríamos no Velho Testamento outro em
que os algarismos são oferecidos com tal precisão como se o sol do dia já estivesse raiando. As 70 semanas
do Messias, desde aquela revelação até o segundo advento, são qualquer coisa que nos assombra.
Igualmente, os últimos versos do capítulo 12, em que até os dias do milênio são contados, mas de modo
enigmático.

3. A POSIÇÃO DO LIVRO NO CÂNONE HEBRAICO

Em algumas listas do livros do Velho Testamento, Daniel aparece entre os demais profetas, mas na coleção
hebraica encontra-se na terceira parte, a chamada Hagiógrafa. Por quê? A posição do livro na terceira parte
da coleção dos sagrados livros tem dado motivos para os críticos dizerem que quando o livro foi escrito já o
Cânone estava fechado, o que só poderia acontecer lá para os dias de Alexandre, o Grande. A razão deve ser
outra, bem diferente. Como já vimos, Daniel foi mais estadista que profeta, portanto, o seu livro, no entender
dos colecionadores dos livros sagrados, só poderia ficar bem na terceira parte da coleção. Os autores dos
livros proféticos eram homens assim acreditados, tais como lsaías, Jeremias ou outro qualquer, enquanto
Daniel era mais empregado do governo estrangeiro do que mesmo profeta. No sentido técnico, Daniel não foi
profeta, não foi chamado para esse ofício. Eventualmente, recebeu grandes revelações divinas, mas sempre
dentro do seu serviço de funcionário publico. Nada obstante a sua função como estadista, o Novo
Testamento o reconhece como profeta (Mat. 24:15). O fato de o livro estar na terceira coleção hebraica de
modo algum desmerece o seu valor, porque o livros de muitos outros ilustres servos de Deus também lá
estão, com Salmos, Provérbios e outros. E, pois, uma questão de ponto de vista dos colecionadores, e isso
não dá direito a deslocá-lo da sua época, 500 a.C., para 250 a.C. Está bem caracterizada a época de Daniel no
reinos de Nabucodonozor, Dario, Ciro e outros. Ninguém poderia fala destes monarcas, como ele fala, se não
tivesse convivido com eles.

Ele retratava situações que nenhum homem poderia inventar. Também não tem base a alegação de que
Daniel teria escrito estas memórias e depois qualquer escritor teria aproveitado para redigir o livro com o
nome de Daniel ou outro Daniel mesmo. Todo o livro é um retrato de um homem que orava a Deus virado
para Jerusalém, um homem que era chamado pelos dominadores de então para interpretar revelações e dar-
lhes o sentido. Tudo isso de modo pessoal. A facilidade com que a crítica joga com os fatos a respeito dos
livros da Bíblia em nada recomenda a sua cultura e honestidade. Para esta gente tudo não passa de lendas e
mitos, que qualquer um pode manejar como bem lhe parecer.
ESBOÇO DO LIVRO DE DANIEL

PRIMEIRA PARTE

DANIEL, O ADMINISTRADOR (1:1-6:28)

CAPITULO I

DANIEL É ELEVADO A ADMINISTRADOR PÚBLICO (1: 1-21)

1. A Expedição de Nabucodonozor (1:1, 2)

2. Daniel e Seus Companheiros na Corte de Nabucodonozor (1:3-16)

CAPITULO II

O SONHO DE NABUCODONOZOR INTERPRETADO POR DANIEL (2:1-49)

1. Nabucodonozor Tem um Sonho Pavoroso (2:1-3)

2. Vamos ao Sonho de Nabucodonozor (2:4-13)

3. Daniel Salva a Situação (2:14-16)

4. Daniel Ora a Seu Deus (2:17 e 18)

5. Deus Ouve a Oração e Responde (2:19-23)

6. Daniel É Introduzido na Presença do Rei (2:24-30)

7. Daniel Revela o Sonho do Rei e o Interpreta (2:31-45)


8. A Atitude do Rei após a Interpretação do Sonho (2:46-49)

CAPITULO III

EPISÓDIO DA ESTÁTUA E A FORNALHA ARDENTE (3:1-30)

1. Uma Estátua de Ouro (3:1, 2)

2. As Autoridades Foram Convidadas (3:3-12)

3. Os Judeus São Chamados a Se Explicarem (3:13-18)

4. Rumo à Fornalha de Fogo Ardente (3:19-30)

CAPITULO IV

O SEGUNDO SONHO INTERPRETADO POR DANIEL (4:1-37)

1. O Sonho e a Proclamação (4:1-18)

2. Daniel Entra e Interpreta o Sonho do Rei (4:19-27)

3. Cumpre-se a Sentença (4:28-33)

4. É Restaurada a Razão a Nabucodonozor (4:34-37)

CAPITULO V

A FESTA DE BELSAZAR E A ESCRITA NA PAREDE (5:1-30)

1. A Profanação do Banquete (5:1-5)

2. Um Banquete Estragado (5:6-9)

3. Daniel Entra em Cena (5:10-30)

CAPITULO VI

UMA DURA PROVA PARA DANIEL NA COVA DOS LEÕES (6:1-28)


1. A Trama Contra Daniel (6:1-7)

2. Lavra-se o Decreto (6:8-13)

3. Daniel na Cova dos Leões (6:14-22)

4. A Punição dos Culpados (6:23, 24)

5. As Conseqüências da Fidelidade de Daniel (6:25-28)


SEGUNDA PARTE

REVELAÇÕES E PROFECIAS (7:1-12:13)

CAPITULO VII

A GRANDE REVELAÇÃO DO FIM (7:1-28)

1. A Visão de Daniel das Quatro Feras (7:1-8)

2. Uma Cena Celestial (7:9-14)

3. A Interpretação da Visão Apocalíptica (7:15-28)

CONCLUSÃO

CAPITULO VIII

VISÃO DE DANIEL DUM CARNEIRO E DUM BODE (8:1-27)

1. A Visão e Sua Interpretação (8:1-14)

2. Os Selêucidas em Cena (8:15-27)

CAPITULO IX

A ORAÇÃO DE DANIEL E AS SETENTA SEMANAS DO MESSIAS (9:1-27)

1. A Oração de Daniel (9:1-21)

2. Análise e Interpretação (9:22-24)

3. Os Prazos da Realização da Visão (9:25-27)


CAPITULO X

REVELAÇÃO PREPARATÓRIA (10:1-11:1)

CAPITULO XI

A GRANDE REVELAÇÃO SOBRE A HISTÓRIA FUTURA - GRANDES ACONTECIMENTOS (11:2-12:1)

1. O Prelúdio do Grande Conflito (11:2-4)

2. O Começo da Luta (1 1:5-45)

3. O Princípio do Fim (11:40-45)

CAPITULO XII

A PROFECIA DA ESPERANÇA (12:1-13)

1. Daniel Recebe o Encargo de Encerrar o Livro (12:4)

2. Uma Outra Visão (1 2:5-13)

APÊNDICE I - UM CAPITULO DESLOCADO

APÊNDICE II - INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO CATIVEIRO DE JUDÁ - UMA DERROCADA

APÊNDICE III - ESBOÇO HISTÓRICO DO POVO DE ISRAEL

BIBLIOGRAFIA
PRIMEIRA PARTE

DANIEL, O ADMINISTRADOR (1:1-6:28)

I - DANIEL É ELEVADO A ADMINISTRADOR PÚBLICO (1:1-21)

1. A EXPEDIÇÃO DE NABUCODONOZOR (1:1,2) (*)

No ano terceiro do reinado de Jeoiaquim, rei de Judá, Nabucodonozor, rei de Babilônia, veio a Jerusalém, e a
sitiou (v.1). Como nos informa o cronista (11 Crôn. 36:5), este rei foi posto no trono de Judá por Faraó Neco,
ao este estar de volta do grande encontro com as forças de Nabucodonozor no norte. Colocado no lugar do
seu irmão Jeoacaz, e naturalmente ajuramentado por Neco, de lhe ser fiel, o que não aconteceria, foi um mau
rei, não sendo fiei a ninguém. Nabucodonozor, o vencedor do encontro com Neco, veio no encalço deste,
mas não o encontrou mais. Cercou Jerusalém, e o Senhor lhe entregou Jeoiaquim e bem assim a cidade
mesma, da qual ele não se apossou, porque outros fatos o levaram a voltar logo para Babilônia. Levou,
entretanto, alguns vasos sagrados do templo e alguns dentre os nobres e príncipes, entre os quais Daniel,
Hananias, Misael e Azarias. O fato de Nabucodonozor não ter tomado a cidade devê-se, segundo informa
Heródoto, por intermédio de Flávio Josefo (Contra Apião), (1:19), ao falecimento do seu pai, e ele, para não
perder o trono, entregou as tropas ao comando do seu general e partiu para Babilônia (ver Jer. 22:18, 19;
36:30). Assim a cidade foi poupada por mais uns anos, graças ao problema pessoal de Nabucodonozor. A
cronologia de Daniel não concorda com os algarismos oferecidos por Jeremias. Este diz que Nabucodonozor
atacou Jerusalém no quarto ano de Jeoiaquim (Jer. 25:1; 46:2), enquanto Daniel diz que foi no terceiro ano do
reinado do mesmo Jeoiaquim. Acredita-se que esta insignificante disparidade devê-se ao fato de Daniel usar a
computação babilônica, que considerava o primeiro ano como sendo o segundo. Isto é, no primeiro ano
simplesmente deu-se o início da luta, enquanto esta se feriu mesmo no segundo ano. Não há, pois,
contradição entre os dois cronistas. Eram modos diferentes de computar um fato. Os palestinos contariam a
história justamente como nós a contamos, enquanto os babilônios a contavam de modo diferente, isto é,
dando o segundo ano como o primeiro de determinado acontecimento.

(*) A batalha de Carquêmis (605-606 a.C.), entre as forças de Nabucodonozor e as do Egito, marca o ponto
final do Reino de Judá e o início do grande Império Babilônico, que é o centro onde se vão desenrolar os
primeiros atos de Daniel.
DANIEL, O ADMINISTRADOR (1:1-6:28)

I - DANIEL É ELEVADO A ADMINISTRADOR PÚBLICO (1:1-21)

2. Daniel e Seus Companheiros na Corte de Nabucodonozor (1:3-16)

Os monarcas caldeus, e mesmo os de outros povos, cercavam-se de elementos escolhidos para servirem na
corte como intérpretes e conselheiros. Estes eram Especialmente treinados nas artes sortílegas, peritos em
adivinhação. Eram os feiticeiros reais, mas não tinham o sentido de menosprezo que o termo oferece em
português. Eram, pois, separados dos demais serviçais e instruídos devidamente para os fins a que se
destinavam. Ora, Daniel e seus companheiros despertaram logo a atenção dos cortesões, que os acharam
dignos de serem usados como eram os outros adivinhos do palácio. Então disse o rei a Aspenaz (v. 3). O
sentido da palavra Aspenaz é desconhecido, mas deve referir-se a um dignatário real de categoria,
especialmente encarregado de cuidar dos que estavam sendo treinados para o oficio de adivinhação. Os
escolhidos deveriam ser tanto de linhagem real, como da nobraza. Jovens sem nenhum defeito, de boa
aparência, instruídos em toda sabedoria, doutos em ciência (ciência oculta) e versados no conhecimento (v.
4). A ordem era que se lhes ensinasse a cultura e a língua dos caldeus (v. 4). Assim, separados para este fim
especial, foram mudados os nomes dos rapazes de acordo com os princípios religiosos da corte. A Daniel
deram o nome de Beitessazar, nome de um deus babilônico, a Hananias puseram o de Sadraque, a Misael o
de Mesaque e a Azarias o de Abednego, nome de uma divindade. Assim, "batizados", com estes nomes
caldeus, foi-lhes dada igualmente, por ordem superior, a dieta que deveriam observar, para que, depois do
tempo determinado pelo rei (v. 18), fossem apresentados a este para que visse como estavam de saúde e de
aspecto. Daniel assentou no seu coração não contaminar-se com as finas iguarias do rei, nem com o vinho
que ele bebia; então pediu ao chefe dos eunucos que lhe permitisse não contaminar-se (v. 8). A razão desta
decisão é que as comidas e bebidas reais teriam sido consagradas a qualquer divindade pagã, e, portanto, ele,
como bom judeu, não podia participar de comidas consagradas ou delicadas a deuses pagãos. Esta atitude de
Daniel e seus companheiros tem motivado muitos sermões e discursos, e vale por um toque de silêncio contra
o mundanismo daqueles e dos nossos dias. Um grupo de moços, escravos, que assim tomam a decisão de não
participar de coisas consideradas impróprias a suas consciências vale por uma lição, que nunca pode ser
esquecida. O chefe dos eunucos disse a Daniel: Tenho medo do meu senhor, o rei, que determinou a vossa
comida e a vossa bebida... Assim poríeies em perigo a minha cabeça para com o rei (v. 10). O caso era que, se
os moços se alimentassem de modo diferente, poderiam aparecer perante o rei, no tempo determinado, mais
magros e feios. Informa-nos o texto que Deus concedeu a Daniel misericórdia e compreensão da parte do
chefe dos eunucos (v. 9). A proposta de Daniel para ser feita uma prova foi aceita. Em lugar de comerem das
iguarias reais, comeriam legumes e frutas, e beberiam água, em vez de vinho. Era o que atualmente se chama
de "regime vegetariano". O prazo seria de dez dias; depois se veria como estavam os seus rostos (vv. 12 e 13).
Não só o regime era saudável, mas com eles estava o favor de Deus, que era a garantia. Ao fim dos dez dias
apareceram os rostos deles mais gordos e estavam mais robustos do que os que comiam das iguarias do rei (v.
15). Era a prova da fé em Deus. Com essa prova o cozinheiro-chefe tirou deles a ração oficial e deu-lhes a
comer verduras, e, em vez de vinho, água. Estes jovens estavam destinados a uma grande obra missionária
no pais, e o triunfo de tudo estava nas mãos de Deus. Possivelmente eles ignoravam o que os aguardava no
futuro, mas uma coisa fizeram confiaram no seu Deus. Em qualquer circunstância da vida, a fé ainda vale. A
entrega da vida nas mãos do Senhor é sólida garantia de sucesso. Coloque-se quem quiser nas condições dos
jovens hebreus. Como cativos, vivendo no palácio real, onde a vida dependia dos caprichos do rei, tentar
mudar uma ordem requeria muita fé e muita coragem.

Estes jovens receberam de Deus (v. 17) conhecimento e inteligência em toda cultura e sabedoria, mas a Daniel
deu o dom da interpretação de sonhos e visões, que muito o iria ajudar na sua obra futura. Daniel foi mesmo
bafejado pela graça divina para a obra que todos nós lhe reconhecemos. Os outros tiveram os seus dons, mas
não iguais aos de Daniel. O ambiente em Babilônia era o de feitiçaria, como o chamaríamos, em que as visões
e os sonhos ocupavam grande parte da vida, e isso dentro de pouco Daniel iria experimentar.

O verso 21 nos informa que Daniel continuou na sua obra até o primeiro ano de Ciro. Isso não quer dizer que
não fosse além deste período, mas sim, que ficou no serviço de, Babilônia por todo o tempo que durou o
reino, pois, nos dias de Ciro e até mais além, Daniel ainda servia no palácio. A menção de Ciro devê-se ao fato
de que foi no primeiro ano deste novo rei que o exílio terminou, e foi dada permissão para que todos
voltassem à sua querida terra e cidade, Jerusalém (ver 11 Crôn. 36:22, 23 e Esd. 1:1, 2). O exílio começou no
ano 586 a.C., e terminou com a queda de Babilônia, que caiu em poder de Ciro em 538 a.C. Damos como início
do exílio o reinado de Zedequias, justamente em 586 ou 585 a.C. Computando estes algarismos, verificamos
que os 70 anos do cativeiro preditos por Jeremias não estavam completos com a subida de Ciro ao poder,
conforme Jeremias 29:10, e também que os cativos não voltaram todos da primeira vez. Houve três idas de
cativos e três voltas, tendo ocorrido a última nos dias de Neemias, quando era rei de Babilônia Artaxerxes I, o
Longimano (464-424 a.C.), então se completando os 70 anos. O que foram o cativeiro e as suas bênçãos na
vida da nação hebraica não pode ser dito nestas páginas, mas, deixando de lado os sofrimentos e as
humilhações, podemos dizer que foi um período de grande progresso, porque, incontestavelmente, Babilônia
era um país desenvolvido para aqueles dias. Especialmente, os hebreus aprenderam a amar a Palavra de
Deus, abandonando a idolatria e apegando-se ao seu grande Livro. Então, por todo um longo período de 48
anos, desde Nabucodonozor até Ciro, Daniel foi a grande figura da história, e, como teremos ocasião de ver, o
grande administrador, o grande líder e a grande testemunha de Jeová. Não sabemos por quantos anos teria
ficado no reinado de Ciro. Ele já deveria estar bem velho nessa época.

Vencido o tempo determinado (v. 18), que deveria ser de um ano, foram os jovens levados à presença do rei,
que os sabatinou, e entre todos não foram achados outros como Daniel, Hananias, Misael e Azarias; por isso
passaram a assistir diante do rei (v. 19). A estes moços Deus deu o conhecimento e a inteligência em toda
cultura e sabedoria (v. 17). Devemos acrescentar, "sabedoria e cultura em todas as ciências babilônicas".
Deus honrou a fé destes rapazes e, assim como eles conf !aram em Deus, ele confiou neles.

Por esta informação somos levados a reconhecer que Nabucodonozor não era apenas um comandante de
exércitos, mas um homem de cultura. Filho de rei, teria, naturalmente, sido educado para os misteres do
governo.

Sabe-se bem pouco da cultura babilônica ou sumeriana, o primeiro povo organizado entre os rios Tigre e
Eufrates, mas sabe-se o bastante para aquilatar que era um povo de alta cultura para a sua época. Ao redor
de 2500 a.C., já eles tinham um calendário astronômico igual ao nosso, com uma diferença apenas de dois
minutos, calendario este usado também entre os maias, astecas e tóltecas do México, o que vem demonstrar
que a grande cultura do centro sul-americano era de origem babilônica. Conheciam os planetas que nós
conhecemos, menos o Plutão, descoberto há pouco, e conheciam os eclipses e todas as fases da lua. O que se
conhece como Torre de Babei foi por eles engrandecida com sete andares, cada um com as cores de um
planeta, cores que eles atribuíam aos planetas. Na medicina, rivalizavam com os egípcios, seus irmãos,
peritos no embalsamamento dos mortos. Na cirurgia, eram os mestres daqueles dias, e, mesmo que a
medicina de modo geral estivesse ligada à religião, ainda temos de ver que grandes progressos, para o tempo,
tinham sido alcançados pelos babilônios, sucessores dos sumérios. As artes eram cultivadas em grande
escala, e disso temos uma amostra de uma pirâmide mandada construir pelo rei Zozer em 2800 a.C., para
guardar os mortos ilustres. Sobretudo, foram os primeiros a inventar a escrita conhecida como cuneiforme,
que consistia de tijolinhos, tabietes secos ao sol, em que, antes de ficarem duros, eram gravadas as letras com
um ponteiro de ferro. Esta escrita é irmã da chinesa e japonesa, e de outras escritas orientais, o que também
nos mostra que sua cultura e povo se disseminaram por todo o Oriente distante, tendo Babilônia como a
matriz.

Tudo isto e muito mais, que esta página dispensa, deve ser atribuído à cultura trazida por Noé do mundo
afogado no dilúvio, cultura que deveria, nos primeiros séculos, ser qualquer coisa de admirar, pois de outro
modo não sabemos como interpretar um tão alto grau de saber como o que os sumérios e caldeus nos
transmitiram. Noé e seus filhos, que viveram mais de 500 anos depois do dilúvio e que deveriam ser mestres
em ciências e artes, foram indiscutivelmente os artífices de todo este saber. Os que hoje admiram a
biblioteca de Assurbanipal, último rei assírio, composta de uns 30.000 volumes, tudo gravado nos tijolinhos,
podem calcular até que ponto teria chegado o saber daqueles dias. Infelizmente, agora só à custa da picareta
do arqueólogo é que podemos ir tomando conhecimento de uma parcela daquele saber, pois as gerações
posteriores se degradaram, provavelmente devido a muitas migrações, não sendo possível avaliar, na devida
medida, o que teria sido o saber daqueles primórdios. Os que tomam conhecimento de livros como o de
Pierre lvanoff, Descobertas na Terra dos Malas, e outros, e vêem o alto grau de cultura desses povos antigos,
que os espanhóis conseguiram destruir com a sua ignorância e à custa da pólvora, verificam que os malas
possuíam cultura, como já foi anotado, vinda de Babilônia, e podem então melhor aquilatar o que teria sido a
Babilônia dos dias de Nabucodonozor.

Não nos deve causar, pois, admiração que os oficiais de gabinete dos reis fossem treinados em todo o saber
caldaico, de que Nabucodonozor se orgulhava. Daniel e milhares de seus compatriotas não foram exilados
para uma terra selvagem, ignara, mas para uma terra de alta cultura, que também lhes teria servido no que
lhes interessasse. Por um lado, os exilados ensinaram a religião monoteísta, e receberam em troca o bafejo da
cultura vinda dos acádios e sumérios. O nosso Abraão era um homem altamente politizado e diplomata, um
poliglota capaz de se entender com hiteus e outros ocupantes da Palestina.
II - O SONHO DE NABUCODONOZOR INTERPRETADO POR DANIEL

1. Nabucodonozor Tem um Sonho Pavoroso (2: 1-3)

No segundo ano do reinado de Nabucodonozor (v. 1), teve este um sonho de difícil interpretação. Esta
expressão "segundo ano", pensam alguns, entra em conflito com os três anos de treinamento mencionados
no capítulo primeiro. A maneira babilônica de contar os anos, como vimos antes, era diferente da maneira
palestínica. O primeiro ano não era contado, porque era o começo; então o terceiro era mesmo o segundo
(ver II Reis 18:9, 10; Jer. 34:14 e Mar. 8:31). Portanto, Daniel estava mesmo no segundo ano. Com este sonho
e a sua interpretação, Daniel entra em cena, sendo por quase 50 anos o homem mais importante da corte
babilônica, e depois persa, onde ainda serviu. Não temos dados que nos habilitem a dizer o que teria sido a
sua atividade na corte dos persas, mas estamos certos de que, enquanto viveu, teve oportunidade de ser útil a
um governo liberal para aqueles dias, tão liberal que todos os povos antes sob o domínio babilônico viram o
sol da liberdade, inclusive o povo hebreu. Em nosso Estudo sobre Esdras e Neemias podemos tomar
conhecimentos das muitas atividades destes reinantes e ver como, para aqueles dias, eram monarcas liberais,
a começar por Ciro. Este autor tem um prazer muito especial em descrever algumas das atividades dos
monarcas persas, Ciro e Artaxerxes I, o Longimano.

Vamos, pois, entrar na apreciação das atividades interpretativas de Daniel, que tinha sido especialmente
dotado por Deus para esta tarefa (1:17). Daniel, se bem foi dotado para este ministério, melhor se
desincumbiu dele, pois através dos anos o encontramos ocupando postos de alta responsabilidade, como
seria o de Primeiro Ministro do reino, e outros. Sentimos que nem Esdras nem Neemias façam qualquer
referência a Daniel, pois ele estava vivo e forte quando Ciro tomou Babilônia. Ele interpretou o sonho de
Belsazar na noite em que Ciro entrou em Babilônia (5:1-31). Parece-nos natural que Daniel tomasse parte nos
preparativos para a salda do primeiro grupo de exilados rumo à Cidade Santa.

NOTA: Diz-se que alguém, dentre os exilados, teria mostrado a Ciro a escritura de Isaías (44:28-45:1,2) em que
Ciro é mencionado por nome mais de 200 anos antes de nascer, e que em face de tal fato milagroso é que ele
deliberou dar liberdade aos cativos. Possivelmente isso teria acontecido, mas devemos também levar em
conta que a política medo-persa era diferente da assírio-caldaica. Enquanto esta destruía as nacionalidades,
substituindo os povos, de maneira a tornar impossivel qualquer revolução, aquele tendia para a libertação
destes povos, em suas terras, pagãndo eles, naturalmente, os tributos ao vencedor.
2. Vamos ao Sonho de Nabucodonozor (2:4-13)

O rei ficou de tal modo perturbado que lhe fugiu o sono. Então, de acordo com o costume, mandou, às
pressas, chamar os que, pensava, poderiam adivinhar o que ele tinha sonhado. Para isso a corte mantinha
numerosos sábios e encantadores, peritos na arte de adivinhação. Chamados esses homens, queriam saber
qual tinha sido o sonho, para o poderem interpretar, mas o rei, ou porque tivesse esquecido o sonho, ou para
complicar a situação, não revelou o que tinha sonhado. Então os adivinhos disseram ao rei em aramaico: o
rei, vive eternamente! dize o sonho a teus servos, e daremos a interpretação (v. 4).

Esta palavra "em aramaico", ou árabe, tem sido motivo de muitas discussões. Porque Daniel empregou a
palavra usada pelos sábios, e não o termo hebralco? Em primeiro lugar, porque ele está apenas repetindo o
que foi ouvido. Por outro lado, ele emprega o aramaico ou siríaco daqui em diante até o capítulo 7
provavelmente para destacar o fato de que as interpretações do rei, como coisas de Babilônia, deveriam ser
escritas na língua da terra, enquanto as revelações de Deus, de 7 em diante, deveriam ser escritas na língua
sagrada. Todavia, os críticos entendem que Daniel não podia ou não devia usar a língua dos caldeus, uma vez
que estava escrevendo um livro para os judeus. Dai, pois, chegam à conclusão de que Daniel não é o autor
desta parte do livro. Uma conclusão muito simplória e fácil. O que sempre a crítica pretende é encontrar
falhas ou contradições, para anular um determinado livro ou uma parte dele. Não tem sido possível provar
que o aramaico usado no livro de Daniel seja posterior a essa data, mas, se o fosse, ainda não excluiria Daniel
da autoria do livro, pois ele mesmo poderia ter mudado a linguagem usada, ou outro o poderia ter feito, pelas
razões já alegadas.

Os motivos por que o rei não queria declinar o sonho podiam ser devido a ele mesmo o ter esquecido, ou
então para provar a sabedoria dos seus magos. A sentença era terrível. Se interpretassem o sonho, seriam
coroados de riquezas e grandes honras, mas se não o interpretassem seriam lançados na cova dos leões,
despedaçados e as suas casas feitas um monturo. Esta era a lei da terra - a vontade de um homem. Uma
ditadura como todas as da antigüidade, que só conheciam uma vontade - a do rei.

Os magos responderam pela segunda vez: Diga o rei o sonho a seus servos, e lhe daremos a interpretação (v.
7). Estabeleceu-se a luta. De um lado, o rei querendo saber o sonho, e do outro, os magos insistindo que o
sonho lhes fosse declarado. O rei começou a ficar agastado e declarou que os sábios tinham combinado para
o enganarem, dizendo mentiras e desculpas. Os magos confessaram a sua incapacidade para resolver o
problema do rei, e a sentença já estava lavrada, que era a vontade e a decisão do rei. Confessaram os magos
que o que o rei exigia só poderia ser encontrado entre os deuses, e estes não moram aqui na terra com os
homens (v. 11). Foram mais longe na sua defesa: Jamais houve rei grande e poderoso que exigisse tal coisa
dos seus servos, magos ou encantadores (v. 1 0). Nessa altura, acabou-se a paciência do rei, e a ordem saiu
para que aqueles homens e todos os sábios de Babilônia fossem mortos. Em tal caso também Daniel e seus
companheiros morreriam, porque já estavam na categoria de sábios e adivinhos. Seria uma calamidade,
porque a casta dos sábios e feiticeiros era muito numerosa.

3. Daniel Salva a Situação (2:14-16)

Então Daniel falou avisada e prudentemente a Arloque, chefe da guarda do rei: Por que é tão severo o
mandado do rei? Então Arloque explicou o caso a Daniel (vv. 14 e 15). Daniel não perdeu tempo. Foi ao rei e
pediu prazo, pois ele revelaria o sonho e daria a sua interpretação. Eis aqui uma confissão admirável. Como é
que Daniel sabia que iria interpretar o sonho e salvar a sua vida e a dos outros sábios? Daniel tinha um Deus
no céu e tinha já recebido provas de que Deus o ouvia. Demais a mais, seria o caso de dizer: se Deus não lhe
desse a interpretação, então seria o fim de todo aquele começo tão maravilhoso. Daniel devia ter provas de
que Deus o ouviria. Será assim conosco? Por que não

4. Daniel Ora a Seu Deus (2:1 7, 1 8)

Então Daniel foi para casa, e fez saber o caso a Hananias, Misael e Azarias, seus companheiros (v. 17). A
situação era muito grave, e só a oração salvaria esta gente. Ele conclamou os companheiros a orarem ao Deus
do céu. O texto não diz por quanto tempo ficaram em oração, mas parece que não poderia ser por muito
tempo porque o decreto estava assinado e deveria ser cumprido. Conforme o costume hebraico, não
comeriam nem beberiam até que o assunto fosse respondido por Deus. A isto se chama FÉ.
5. Deus Ouve a Oração o Responde (2:19-23)

Então foi revelado o mistério a Daniel, numa visão da noite (v. 19). Daniel bendisse o Deus do céu, o Deus que
perdura de eternidade à eternidade, pois dele são a sabedoria e o poder. É ele que muda os tempos e as
estações, remove reis e poderosos, e dá sabedoria aos sábios, e entendimento aos entendidos. Ele revela o
profundo e o escondido, conhece o que está em trevas, e com ele mora a luz. A ti, o Deus de meus pais, eu
rendo graças e te louvo porque me deste sabedoria e poder; e agora me fizeste saber o que te pedimos,
porque nos fizeste saber este negócio do rei (vv. 20-23). Linda oração. Até nós, ao escrever estas palavras,
nos sentimos dominados pelo sentimento de Daniel, agradecendo por si e seus companheiros, ao seu Deus,
que os livrou da morte certa e terrível. Revelado o Mistério, Daniel procurou o chefe da guarda para pedir
entrevista ao rei.

6. Daniel É Introduzido na Presença do Rei (2:24-30)

O chefe da guarda era justamente o homem a quem o rei tinha incumbido de destruir os sábios, e a quem
Daniel pediu prazo para resolver o caso. Arloque depressa introduziu Daniel à presença do rei e lhe disse:
Achei um dentre os filhos dos cativos de Judá, o qual revelará ao rei a Interpretação (v. 25). O rei perguntou:
Podes tu fazer-me saber o que vi no sonho e a sua interpretação? Daniel não se mostrou vaidoso e confessou
que o que o rei queria dos seus servos era coisa impossível, pois nem magos nem encantadores nem
astrólogos moderam revelar o sonho ao rei; mas há um Deus nos céus, o qual revela os mistérios (v. 28).
Daniel não quis a honra para si, nem se apresentou como o mais capaz dentre os sábios caldeus. Deu glória a
Deus e mostrou que só Deus é capaz de revelar estas coisas. Ao mesmo tempo deu uma lição ao rei, por pedir
dos homens o que só Deus sabe. Se o rei aprendeu a lição, não sabemos. O sonho era de natureza
escatológica, ou melhor, dizia respeito aos dias do Messias, e quem, neste mundo, poderia penetrar nos
mistérios do mundo por vir? (At. 2:17; I Tim). 4:1; Heb. 1:1). Daniel passa a explicar ao rei o sonho, mas
ressalva outra vez que o faz não porque seja mais capaz do que os outros sábios, mas para que se fizesse
saber ao rei o que iria acontecer nos séculos futuros. Outra vez louvamos a humildade de Daniel em não
querer a honra para si, mas para o seu Deus.
7. Daniel Revela o Sonho do Rei e o Interpreta (2:31-45)

O rei sonhou com:

1) Uma grande estátua, de imensa grandeza e beleza;

2) A cabeça era de fino ouro;

3) O peito e os braços, de prata;

4) O ventre e os quadris, de bronze;

5) As pernas, de ferro;

6) Os pés, em parte de ferro e em parte de barro. Que mistura tremenda!

No sonho, o rei viu uma pedra arrancada da pedreira sem auxílio de mão humana, a qual feriu a estátua, feriu
os pés de ferro e de barro e os esmiuçou. Depois foi esmiuçado o ferro, o barro, o bronze, o ouro e tudo; e a
pedra, que foi cortada sem auxílio de mão, se fez um montão de pedras que encheu toda a terra. De tudo só
restou mesmo a pedra.

A estátua era o rei de Babilônia, a quem o Deus do céu conferiu poder e honras e em cujas mãos foram
entregues os destinos do mundo de então, pois não havia outro império ou poder igual ao de Babilônia.
Depois de Nabucodonozor se levantaria outro reino, inferior, e um terceiro reino, de bronze, o qual teria
domínio sobre toda a terra. O quarto reino seria forte como ferro e tudo quebraria, sendo o mais poderoso
da terra. Eram então quatro os grandes reinos que se levantariam na face da terra e sobre os quais viria
dominar o Rei dos reis e Senhor dos senhores. Quais seriam estes reinos? As interpretações variam muito,
mas a verdade parece não estar muito escondida.

A pedra cortada sem mão representa o Messias que havia de vir e, segundo a figura, a mesma se faria um
montão, que encheria toda a terra. Esta pedra não tinha nenhuma relação com qualquer reino; foi arrancada
sem mão da pedreira. Não houve intervenção humana.

Há duas correntes de interpretação. Uma sustenta que os quatro reinos são: Babilônia, Média, Pérsia e
Grécia. Todavia, a Média e a Pérsia são um mesmo reino; e, portanto, não podem figurar como sendo dois.
Os medos se uniram aos persas e juntos tomaram Babilônia. Logo, não são dois reinos, mas um só.
A outra corrente acredita que a visão deve relacionar-se com o Império de Babilônia: o reino medo-persa,
Alexandre, o Grande, e os seus sucessores. Esta interpretação tem contra si o fato de que os sucessores de
Alexandre não conseguiram constituir um Estado, e, portanto, não podem figurar como sendo um dos quatro
constantes da visão.

A posição conservadora entende que os quatro reinos são: Babilônia, Medo-Pérsia, Grécia e Roma. Estes
quatro Estados correspondem muito bem à visão, pois são efetivamente quatro Estados. Segundo o versículo
44, durante os dias destes reinos, o Deus do céu suscitará um reino que não será jamais destruído. Este reino
não passará a outro povo. Esmiuçará e consumirá todos estes reinos, mas ele mesmo subsistirá para sempre.
Foi durante o último reino, o romano, que o Messias chegou, e não será sucedido, como foram os outros, que
em grande parte sucederam uns aos outros. No Império Medo-Persa, fundou-se o Império Grego, e no
Império Grego, por sua língua, filosofia, arte e letras, fundou-se o Império Romano, e com ele foi o fim.

Ainda, segundo alguns intérpretes, aguarda-se o renascimento do Império Romano, porque a estátua tinha
dez artelhos, em que se firmava o colosso. Uma revivescência do Império Romano tal como o conhecemos na
história parece que o Mercado Comum Europeu é um simulacro do Império Romano, composto de dez
Estados, numa confederação que se espera seja consolidada com a criação do Estado europeu. Atualmente,
há apenas um conglomerado de nove Estados, porque o décimo, à última hora, mediante um plebiscito, ficou
de fora, mas outro entrará. A suposição é que estes Estados se unam e formem um só Estado, ficando o
complexo como uma república federativa. Se isso acontecer, então os dez artelhos completarão o colosso.
Acredita-se ainda que o príncipe que há de surgir e fazer aliança com os judeus, durante os sete anos em que
Cristo estiver nas nuvens com a sua Igreja, seja um príncipe romano. Daniel apenas fala de um príncipe que
há de vir (9:26), o qual se converterá no "homem do pecado", rompendo o acordo com os judeus e
assentando-se no templo de Deus, querendo parecer Deus (11 Tess. 2:3,4). Se esse príncipe será romano ou
francês, Daniel não o diz, mas há boas evidências de que seja romano. Neste caso, o Império terá de ressurgir
ou será representado no Mercado Comum Europeu.
8. A Atitude do Rei após a Interpretação do Sonho (2:46-49)

Depois da interpretação que Daniel deu do sonho, o rei Nabucodonozor se inclinou e se prostou em terra, e
reconheceu que não há Deus senão o de Daniel e que ele é o Deus dos deuses. Daniel foi cumulado de
presentes e foi feito o governador de toda a província de Babilônia, uma espécie de prefeito. Então
aproveitou para apresentar os seus três companheiros, aos quais foram confiadas tarefas administrativas na
província, sendo que Daniel permaneceu na presença do rei. Não atinamos com os motivos porque
Nabucodonozor, com esta demonstração do poder e soberania de Deus, não se converteu, mas é certo que,
passado o momento de exaltação, ficou como era, pois logo depois mandou erigir uma estátua, pedindo que
todos a adorassem, e quem recusasse iria para a fornalha de fogo ardente, como aconteceu aos três amigos
de Daniel. A conversão é coisa do coração, e não da cabeça, e o coração do rei não foi tocado, de modo a se
converter da sua idolatria. Com a subida de Daniel aos píncaros da política, supóe-se que ele teria amolecido
na sua bravura e resistência ao lado de seu Deus, mas nós não acreditamos nisso, mesmo que tenhamos
contra nós o fato de que, na ereção e adoração da estátua, só é mencionada a resistência dos seus três
companheiros. Não podemos explicar onde estaria Daniel, que não interveio a favor dos seus companheiros.
São coisas que o texto sagrado nos oculta. Quanto a Daniel, foi fiel até o fim.

III - O EPISÓDIO DA ESTÁTUA E A FORNALHA ARDENTE (3:1-30)

O rei Nabucodonozor, não obstante o que, havia pouco, tinha presenciado, do poder e graça de Deus, ainda
se lembrou de mandar erigir uma estátua, por certo à sua pessoa. Quanto a erigir uma estátua nada havia em
contrário, porque era costume dos reis assírios mandarem erigir estátuas, para perpetuar o seu nome, para,
depois de morrerem, serem ainda lembrados. Nós também fazemos isso, mas não a nós mesmos, mas aos
nossos mortos ilustres. As nossas praças estão marcadas por essas estátuas, e todos nos consolamos com o
fato de que as gerações não esqueceram um D. Pedro I ou II, um Deodoro da Fonseca, etc. Nada há demais
nisso. Entretanto, Nabucodonozor mandou fazer uma estátua com fins de culto, quando tinha já visto que só
Deus merecia ser adorado. Talvez o fato da estátua do sonho, com a cabeça de ouro, lhe sugerisse mandar
fazer uma adequada honra a si mesmo.
III - O EPISÓDIO DA ESTÁTUA E A FORNALHA ARDENTE (3:1-30)

1. Uma Estátua de Ouro (3:1, 2)

Não temos de pensar numa estátua de ouro maciço, pois, pelas dimensões seria quase impossível. Sessenta
côvados de altura (40 metros) e seis (4 metros) de grossura. Talvez esta altura compreenda o pedestal com
alguns metros. Não se diz, mas é possível. Feita a estátua, foi colocada no campo de Dura, cujo local não foi
ainda identificado, mas deveria ser um arraial perto da cidade.

Feita a estátua, foram convocados todos os dignatários do reino para a inauguração, o que até aí não nos
ofende, mas o caso ia além. A estátua deveria ser adorada, e nisso parece que o rei estava mesmo obsecado
pela glória de sua pessoa e de seu reino. Não teria aprendido nada do que se passou com o sonho
interpretado por Daniel quanto à natureza de Deus, o único a ser adorado? Os pagãos ficam mesmo
obsecados pela idolatria e, como nos conta o Salmista, os que fazem os ídolos se tornam iguais a eles (Sal.
115). A idolatria embrutece os espíritos, e os ídolos dominam os seus adoradores. No caso de
Nabucodonozor, ele teve muitas oportunidades de se converter ao Deus de Daniel, mas nunca o fez.

2. As Autoridades Foram Convidadas (3:3-12)

O império estava dividido em cento e vinte e duas províncias no tempo de Xerxes, províncias estas espalhadas
por todo o império, que ia da Índia à Grécia. Não se diz que todos foram convocados, mas possivelmente os
de mais perto, todos os oficiais das províncias. Juizes, magistrados, tesoureiros, conselheiros e tantos quantos
exerciam qualquer parcela de autoridade no Estado. No dia aprazado, banda de música, composta de
trombeta, pífaro, citara, saltério e gaita de foles, e toda sorte de música lá estava. Seria uma solenidade
impressionante, tanto quanto uma festa oriental seria capaz de ser. O arauto real proclamava que todos
deveriam adorar a imagem de ouro que o rei tinha mandado fazer. Portanto, a adoração pessoal estava no
meio da festa, embora Nabucodonozor já deveria saber que, adoração, só a Deus. Quem recusasse adorar a
estátua seria lançado na fornalha de fogo ardente. A multidão seria incontável, e não faltaria o populacho,
para aumentara cena. Os judeus não compareceram, e isso foi notado por alguns tipos invejosos, que logo
foram contar ao rei que uns que "constituíste sobre os negócios de Babilônia" não estavam obedecendo à
ordem. Vê-se logo a ponta de despeito, mas, de qualquer maneira, o rei sentiu-se insultado com esta falta de
respeito à sua pessoa e à estátua.

3. Os Judeus São Chamados a Se Explicarem (3: 13-18)

Nabucodonozor, irado e sentindo-se insultado, mandou chamar a Sadraque, Mesaque e Abednego para virem
à sua presença, explicarse. Não sabemos por que Daniel não foi chamado nem é mencionado no texto. Onde
estaria? Não distante, porque os de muito longe ali estavam e ninguém podia faltar, e Daniel era o prefeito da
cidade, salvo se já tinha sido destituído. Não temos meios nem modos de explicar a ausência ou falta de
menção de Daniel. Supóe-se que estivesse em missão oficial a qualquer parte do império, mas isso não
explica, nada, porque as autoridades das províncias ali estavam. Ficamos mesmo sem saber o que pensar.
Daniel omitiu o seu nome nesta quadra e só ele sabe por quê.

Os seus companheiros vieram à presença do rei, e não tiveram dúvidas em dar as suas razões, depois que foi
observado que, ao toque da orquestra, se não se inclinassem, só um caminho teriam: a fornalha de fogo
ardente.

A resposta dos rapazes é comovente. Ó Nabucodonozor, quanto a isto não necessitamos te responder. Se o
nosso Deus, a quem servimos, quer livrar-nos, ele nos livrará da fornalha de fogo ardente, e das tuas mãos, ó
rei. Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que
levantaste (w. 16-18). Uma resposta destas vale por tudo. A isto é que se pode chamar de fé e determinação
de servir a Deus. O livro de Daniel só por esta confissão vale.

4. Rumo à Fornalha de Fogo Ardente (3: 19-30)

O rei ficou transtornado. Ele nunca tinha ouvido homem algum falar-lhe com tal ousadia e coragem. Furioso,
tanto pela desobediência como pela ousadia, mandou aquecer a fornalha sete vezes mais, ao ponto de matar
os homens que levaram Sadraque, Mesaque e Abednego. Atados com as suas roupas como se fossem um
embrulho, assim foram lançados na fornalha. Humanamente não havia salvação. Como para se certificar de
que não haviam escapado ou para ver se o Deus dos rapazes os livraria, o rei foi espiar por uma janelinha na
base da fornalha e ficou espantado em ver, em vez de três, quatro homens andando no meio do fogo.
Consultou se era verdade que tinham sido lançados na fornalha apenas três, e recebida a resposta que era
verdade, se chegou à boca da fornalha e chamou: Sadraque, Mesaque e Abednego, servos do Deus altíssimo,
saí e vinde! (v. 26). Ajuntaram-se então os cortesões todos, e verificaram que o fogo não tinha sequer
chamuscado as roupas e os cabelos dos rapazes. Milagre? Sim, grande milagre! O milagre tinha sido feito
por um que parecia ser filho dos deuses, segundo a concepção pagã. Este é o Filho do Deus vivo, o Cristo pré-
encarnado, que sempre esteve e está ao lado dos que lhe são fiéis. Que rebuliço teria havido no meio
daquela gente toda!

Os milagres são possíveis, sim, senhores. Onde há Deus verdadeiro, há lugar para milagres. Milagre é um ato
realizado no mundo externo, dentro das leis do Criador, por efeito do poder sobrenatural de Deus, e contrário
ao curso normal da natureza, mesmo que não seja contrário às leis naturais. Portanto, um milagre não deve
ser considerado meramente como uma obra poderosa de Deus, mas como uma obra poderosa destinada a
comprovar que existe Deus e que este tem propósitos redentores. A milagrosa libertação dos três
companheiros de Daniel da fornalha ardente tinha o fim de libertar os homens do poder do mal, mas visava
também mostrar o poder de Deus sobre a nação ímpia que havia feito Israel cativo, e ainda, depois de
diversas demonstrações da existência de Deus, continuava a praticar atos ímpios. Isso também tinha por fim
levar Nabucodonozor a reconhecer mais uma vez que não havia outros deuses, mas um só Deus (v. 29).
Embora o rei tivesse visto o que viu (2:47), ainda persistia na idolatria, por interesses escusos. Portanto, o
milagre teve dois fins: salvar as vidas de três homens inocentes e levar um governante a reconhecer que só
Deus é Deus e não uma estátua sem vida e sem fôlego. Duas providências beneficientes do bondoso Criador a
um tempo só.

Tem havido certas tentativas de desacreditar a história deste capítulo, alegando que Daniel usou nomes
gregos para designar os instrumentos da orquestra de Nabucodonozor. Ora, Daniel não conhecia costumes
gregos, é certo, mas a língua e os costumes gregos estavam muito espalhados pelo mundo, e ainda mais
porque os nomes dos instrumentos eram também já usados em outros países além da Grécia. Não nos parece
razoável esta objeção ao histórico de Daniel.

Vemos, assim, pouco a pouco, a divina providência operando no mundo pagão, de modo que temos de
reconhecer que a ida dos israelitas a um país estranho era um castigo por causa dos seus muitos pecados e
rebeliões, mas também um meio de levar estes povos a reconhecerem a existência único e verdadeiro, e
assim encontrarem um meio de salvação para as suas almas. Tudo nesse nosso mundo se move dentro do
plano beneficente de Deus, procurando, por meios estranhos, levar os homens ao conhecimento da verdade.
Já então o cativeiro não era propriamente um castigo, mas uma obra missionária também. Deus é
missionário, e todos os seus planos e propósitos têm esta feitura. No meio de tudo, é certo que os seres
humanos sofrem, mas não há seres inocentes, e, se eles servem ao plano divino, então são bem-aventurados.
Esta é a lição da História. No meio de muita indignidade e pecado, Deus sempre tem um modo ou outro de
demonstrar a sua existência e bondade.

Se escrevêssemos a história do sofrimento humano, e os benefícios que Deus trouxe à humanidade por meio
desses sofrimentos, escreveríamos a maior parte da mesma história e a mais tocante. Muito sangue tem sido
derramado cruelmente, sangue dos mártires, desde os alvores do cristianismo. Muita iniquidade tem sido
praticada contra os servos de Jesus Cristo, e, naturalmente, nós só vemos o nosso sofrimento e o de nossos
irmãos, mas quantas almas terão encontrado a vida eterna mediante o heroísmo desses mártires? Ninguém
sabe. Alguém escreveu que o sangue é a semente da Igreja. Na verdade, foi com sangue que ela nasceu, o
sangue do cordeiro de Deus, e de lá para cá o sangue tem jorrado em muitos lugares, e em muitos desses
lugares por causa da iniquidade e da maldade humana. Todavia, o testemunho destas vítimas tem sido a
semente que tem levado centenas e milhares ao céu. Quantas pessoas teriam encontrado o Deus de Daniel e
de seus companheiros por causa dos sofrimentos deles? Só Deus sabe. Então, quando a nossa vida é exigida
por qualquer verdugo, sentimos a agrura do sofrimento, mas possivelmente alguém entrou no céu mediante
o nosso testemunho. Conta-se que os crentes marchavam para o coliseu romano cantando hinos a Deus,
sabendo que feras esfaimadas os aguardavam lá dentro. Quantos romanos teriam sido salvos pelo
testemunho destes crentes? "O sangue é a semente da Igreja".
IV - SEGUNDO SONHO DE NABUCODONOZOR INTERPRETADO POR DANIEL (4:1-37)

Onde estava Daniel no incidente da lição passada, não sabemos e nem voltaremos ao assunto.

1. O Sonho e a Proclamação (4: 1-18)

Tem parecido a alguns comentadores que a linguagem dos versos 1-3 do capítulo 4 não é linguagem de um rei
pagão, e que tantas vezes se mostrou obstinado. E verdade que parece ser linguagem de um cristão do nosso
século. Todavia, sabendo da pertinácia com que Daniel usava a sua influência perante o rei, e sabendo que
ele mesmo assistia no palácio, e tomando em consideração os milagres anteriormente verificados, não nos
parece demais que Nabucodonozor fizesse esta proclamação em que (1) reconhece Deus como o Deus
Altíssimo, (2) que os seus sinais e maravilhas são poderosas, (3) que o seu reino é reino sempiterno e (4) que o
seu domínio é de geração em geração. Ele deveria estar plenamente convencido de que só Deus é Deus e que
o governo de Deus é para todos os tempos. Fica evidente também a influência de um homem como Daniel
junto dele, para o doutrinar e corrigir dos seus vícios idolátricos. A mensagem que ele mandou a todos os
povos da terra é uma mensagem missionária, como vimos no estudo anterior. Pela primeira vez na história
um homem tinha Governado sobre tantos povos, de línguas e costumes diferentes, pois todos os antigos
povos da Média e Pérsia estavam agora englobados debaixo do governo universal de um só homem. Estamos
longe de imaginar a influência deste governo, sobre todos os povos, mediante a presença dos cativos de
Israel. Agora era Nabucodonozor; depois veio o governo persa, ainda muito superior, em muitos sentidos.
Isso melhor podemos ver estudando os livros de Esdras e Neemias. Como eram magnânimos aqueles reis,
não obstante serem reis despóticos, senhores de sua única vontade. O próprio Xerxes, marido de Ester, talvez
um dos mais despóticos daquela geração de monarcas, veja-se como ele cedia às influências dos judeus. A
presença desta gente em Babilônia, quer nos tempos de Nabucodonozor e seus sucessores, quer nos dias de
Ciro e seus sucessores, fez com que eles fossem tocados e bafejados pela influência da religião hebraica.
Como já ficou dito, o cativeiro teve por fim ensinar os israelitas a serem mais fiéis ao seu Deus, e ao mesmo
tempo ensinar aos povos daqueles dias que a idolatria era uma violação do princípio de que só Deus é Deus.
Diz a Escritura: Eu, Nabucodonozor, estava tranqüilo em minha casa e feliz no meu palácio. Tive um sonho,
que me espantou. O sonho era de espantar mesmo. Conforme o costume, foram introduzidos os sábios de
Babilônia, os magos, os feiticeiros, encantadores, e o rei lhes contou o sonho, mas nenhum teve capacidade
para decifrar o enigma, ficando assim demonstrado que aqueles sábios eram apenas uma classe que
explorava os reis, nada sabendo dos mistérios ocultos no coração e mente divinos. Esta infelicidade de
sortilégios tem sido uma praga em todas as gerações e em todos os povos. Ainda agora, nos nossos dias, isso
se demonstra. Há, no Rio de Janeiro, 30.000 terreiros de macumba, outras tantas tendas espíritas e outras
seitas da mesma espécie, de modo que já alguns pesquisadores chegaram à conclusão de que há mais de
100.000 centros de espiritualismo, explorando a credulidade do povo. Não deve, pois, constituir admiração
que nos dias de Nabucodonozor houvesse esta gente, e cremos que nem era tão numerosa.

2. Daniel Entra e interpreta o Sonho do Rei (4: 19-27)

Demonstrada a futilidade daquela ciência caldaica, entra Daniel, em quem o rei reconhecia a existência do
espírito dos deuses santos (v. 8), reconhecimento que não fazia nenhuma honra a Nabucodonozor, porquanto
já tinha visto, por mais de uma vez, que Daniel tinha mesmo, como dizia, o espírito dos deuses santos. O que
intriga é que, depois de ter verificado a futilidade dos seus magos, ainda os convocasse antes de Daniel.
Parece que ele ainda estava indeciso quanto ao verdadeiro Deus, ou então cumpria um dever oficial,
chamando essa gente, pois era pagã e sustentada pelo Estado justamente para decifrar sonhos e visões, que
eram muito comuns, e a que os antigos davam muita importância. Daniel, desta vez, não pediu prazo para
interpretar o sonho, estranho como era. Por quê? Já estaria habilitado por Deus para esta tarefa? É o que
parece, pois Daniel não titubeou na interpretação, mas ficou perplexo quanto ao conteúdo do sonho (v. 19).
Era nada mais nada menos do que a ruína e destruição temporária do rei, e isso o afligia, pois, pessoalmente,
era bem tratado e muito respeitado no palácio. Admite-se que Nabucodonozor logo teria reconhecido mais
ou menos que se tratava de sua pessoa, por isso que ficou tão atrapalhado.
Ele viu uma árvore no meio da terra, cuja altura tocava os céus, e era vista até dos confins da terra (vv. 10 e
11). A sua folhagem e frutos eram abundantes, tudo muito rico como o seu reino. Foi então que viu um
vigilante, vindo do céu, clamando fortemente e dizendo: Derruba! a árvore, cortai-lhe os ramos, derriçai-lhe
as folhas, espalhai o seu fruto; afugentem-se os animais de debaixo dela, e as aves dos seus ramos. Mas a
cepa com as raízes deixa! na terra, atada com cadeias de ferro e bronze... Seja ele molhado do orvalho do céu,
e a sua porção seja, com os animais, a erva da terra. Mude-se-lhe o coração, para que não seja mais coração
de homem, e lhe seja dado coração de animal; e passem sobre ele sete tempos (sete anos). Esta sentença é
por decreto dos vigilantes, e esta ordem por mandado dos santos; a fim de que conheçam os viventes que o
Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens e os dá a quem quer (vv. 14-17). Esta era uma sentença
horrível para um homem orgulhoso e vaidoso como ele era. A destruição da árvore não importava na sua
erradicação, pois o tronco, amarrado com cadeias de ferro e bronze, deveria ficar na terra para ainda voltar a
frutificar. Tu, pois, ó Beltessazar, dize a Interpretação, porquanto todos os sábios do meu reino não me
puderam fazer saber a interpretação, mas tu podes; pois há em ti o espírito dos deuses santos (v. 18).

Daniel, que viu logo o sentido da visão, ficou atônito, porque tudo aquilo se referia ao rei, e era muito duro o
que ele tinha que lhe dizer. A antiga versão diz que Daniel ficou perplexo por uma hora, mas a Versão Revista
e Corrigida da Sociedade Bíblica do Brasil mudou este sentido, que é o que está conforme o texto hebraico.
Ficou perplexo por um tempo. Tem-se pensado que, se Nabucodonozor se tivesse arrependido, o mal
profetizado não se realizaria, mas isso não é dito no texto; e subentendido. Acreditamos que, se um
verdadeiro arrependimento de pecados viesse ao coração do rei, a sentença seria mudada, mas isso não era
fácil. Ninguém muda o coração apenas por querer ou desejar. Nem Daniel sugeriu o arrependimento, mas,
sim, que pusesse em ordem a sua casa antes que o dia clamoroso chegasse. Não poucos, entretanto, têm
insistido que o que Daniel disse era que se arrependesse dos seus pecados. O verso 27 diz coisa diferente,
mesmo que parecida.

A interpretação era qualquer coisa dramática para um homem do estofo do rei Nabucodonozor, e Daniel não
escondeu o fato por ser grave. Este é o decreto do Altíssimo que virá contra o rei, meu senhor: serás expulso
de entre os homens, e a tua morada será com o animais do campo, o dar-te-ão a comer ervas como aos bois,
e serás molhado do orvalho do céu (vv. 24 e 25). Na sentença havia uma esperança de que a cepa, assim
como foi vista na visão, ficaria segura até que a razão voltasse ao rei. Foi-lhe dado um grande prazo para que
colocasse em dia os seus negócios, e feita a advertência como disse Daniel: Põe a termo em teus pecados pela
justiça, e às tuas iniqüilidades usando de misericórdia para com os pobres; e talvez se prolongue a tua
tranqüilidade (v. 27).
3. Cumpre-se a Sentença (4: 28-33)

Caso Daniel tenha previsto uma mudança no plano divino, esta não ocorreu, porque tudo indica que o rei
continuou a sua vida como dantes. Há apenas uma possibilidade, talvez, que era a de confortar o coração do
rei.

Ao cabo de doze meses, passeando sobre o Palácio real de Babilônia, falou o rei, e disse: Não é esta a grande
Babilônia que eu edifiquei para a casa real, com o meu grandioso poder...? (w. 29 e 30). Nem acabou de falar
e uma voz de cima disse que tudo terminara.

Realmente, Babilônia, segundo nos informam os escritores antigos era mesmo um deslumbramento. O rio
Eufrates passava pelo meio da cidade, uma espécie de Capiberibe que passa pelo centro da cidade de Recife,
com jardins suspensos, onde as damas, ao cair da tarde, iam passear. Para aqueles dias era de fato uma
grande Babilônia, mas o pecado do rei, como o de muitos homens, foi o de atribuir tudo ao seu poder, e nada
ao poder de Deus. A lição fica para a história. A cidade era circundada por muralhas de dez metros de
espessura a 15 metros de altura, de modo que não havia possibilidade de ser atacada e vencida. Não
sabemos muito dos exércitos de Babilônia, mas achamos que não eram necessários, porque a cidade estava
segura e o império estava em paz, e também não havia no horizonte qualquer inimigo potencial. O grande
Império da Assíria tinha desaparecido e os pequenos Estados da Média e da Pérsia não estavam organizados
de modo a estarem em condições de tentar tomar a cidade. Se, em lugar de se louvar, o rei tivesse dado
graças ao Altíssimo, que ele já conhecia, então a sentença talvez não viesse.

Naquela mesma hora foi Nabucodonozor lançado fora do palácio, pois tinha virado um bruto, e o seu lugar
era entre os brutos. Comia erva como boi e os seus cabelos cresceram como as penas das águias. Suas unhas
eram como as das aves.
4. É Restaurada a Razão a Nabucodonozor (4: 34-37)

O trecho seguinte é da autoria de Nabucodonozor mesmo quando diz:

Mas ao fim daqueles dias, eu, Nabucodonozor, levantei os olhos ao céu, tornou-me a vir o entendimento, e
eu, bendisse o Altíssimo, e louvei e glorifiquei ao que vive para sempre (v. 34). Todo o restante do capítulo
consiste de uma confissão ao Deus do céu, que reina e governa para todo o sempre. O grande reconstrutor
de Babilônia voltou ao seu antigo esplendor e todos os cortesãos e conselheiros o procuraram, porque
durante a doença, a que dão o nome de liantropia, ninguém podia ter acesso a ele, pois era um animal como
qualquer outro, comendo da erva do campo e sendo molhado pelo orvalho do céu. O reconhecimento do
verdadeiro Deus por um potentado como Nabucodonozor era uma vitória da fé em Deus. Naqueles dias a
palavra do rei era coisa indiscutível, e todos se dobravam diante dela. A sua proclamação, que certamente foi
enviada a todas as províncias, teria tido um impacto formidável entre todos os povos. Repetimos outra vez
que a ida dos judeus para Babilônia teve um fim punitivo e um fim missionário. Parece-nos que em tempo
algum os povos da terra tiveram uma oportunidade como esta de saber que havia um Deus único e
verdadeiro contra a multidão dos seus deuses.

A doença de Nabucodonozor, que não consta como tal nas crônicas oficiais e nem poderia constar, também
não é relatada por qualquer dos poucos escritores daqueles dias, tais como Heródoto ou Berosius. Isto tem
servido para alguns tentarem desacreditar a autenticidade de Daniel. Ora, estes escritores, caso o assunto
tivesse chegado ao seu conhecimento, teriam outros motivos a que darem atenção, e não meramente a uma
doença, que nem teria saído das crônicas do palácio.

Concluímos esta ligeira apreciação do capítulo 4 dando louvores a Deus por ter sido tão benévolo em se fazer
conhecido a um rei pagão. Ele foi o maior dos homens públicos dos seus dias e depois dele só Ciro, o Persa, se
lhe pode igualar.

Entre os capítulos 4 e 5 há um longo período da história de Babilônia que Daniel deixou em branco. Na
verdade, o livro de Daniel não é uma história de Babilônia, mas uma série de visões, uma história das visões
do profeta. Dentro desse período devem cair a morte do rei e a sucessão de seu filho, Evii-Merodaque, e dois
reis seguintes, Neriglissar e Nabonido, ambos usurpadores. Aliás, a história de Nabonido vem contada no
capítulo 5 com relação ao seu filho Belsazar.
Dentro desse mesmo período cai a libertação do rei Joaquim, solto por Evii-Merodaaue no 37? ano do
cativeiro, conforme Jeremias (Jer. 52:31-34), em 56b ou 561 a.C. (II Reis 25-27-30). Portanto, uma série de
eventos que Daniel deixou em branco. Com o capitulo 5 começa outra história, a da libertação do povo,
cativo desde 597 a.C. até agora, 538, quando Ciro assumiu o poder. Alguns comentadores contam os 70 anos
do cativeiro a partir da guerra de Carquêmis em 605; outros em 597, quando Nabucodonozor assaltou a
cidade de Jerusalém pela primeira vez. Se contarmos os 70 anos a partir de 605 a 538, temos 67 anos, e não
70, mas teríamos os 70 em número redondo. Contando o cativeiro a partir de 597, teríamos apenas 59 anos.
Parece que estão certos os que contam os 70 a partir de 605 a.C., pois isso nos dá 67 anos, número
aproximado dos setenta anos de Jeremias (Jer. 25:1 1).

Outra coisa que nos tem dado muito que pensar é o fato de Daniel ter ocupado altas posições no reino de
Nabucodonozor e não ter intercedido a favor de Joaquim, que continuou preso até a morte do rei. Coisas da
história que nós não podemos explicar. Não há informação de que Joaquim voltasse a Jerusalém com os do
cativeiro. Portanto, deve ter morrido dentro desse mesmo período, isto é, depois da morte do rei
Nabucodonozor. Todavia, Daniel também não voltou, continuando a servir ao novo governo persa, como se
vê de Dan. 5:31. Daniel, como todos os outros profetas, não nos deu um histórico rigorosamente cronológico,
coisa que não preocupava os antigos escritores. O capítulo 7 nos dá relato de grave acontecimento ocorrido
no primeiro ano de Belsazar, portanto, antes da queda do reino de Babilônia. De qualquer maneira,
consideramos o capítulo 5 como o fim da primeira parte de Daniel, se é que nos é dado o direito de dividir a
história em duas partes, os capítulos 1-4 a primeira e os capítulos 5-12 a segunda parte, sendo esta composta
especialmente de visões do profeta.
V - A FESTA DE BELSAZAR E A ESCRITA NA PAREDE (5:1-30)

Poucos capítulos da Bíblia têm sofrido tantos ataques da parte dos críticos como este. Em primeiro lugar,
alegava-se a total ignorância do nome do rei nas crônicas babilônicas. O rei dessa época chamavase Nabonide
ou Nabonido, mas não havia qualquer referência a respeito de outro rei coincidente com este. Depois que a
arqueologia rompeu o mistério, viu-se que de fato houve um co-regente, que aqui recebe o nome de rei.
Nabonido teria ido para Susa, a linda capital de veraneio dos monarcas, e entregue os negócios do Estado ao
filho. Ora, se havia um homem que cuidava dos negócios reais e governava em nome do rei, nada mais
natural que se lhe aplique o título. Alega-se que a palavra aramaica malka não tem o sentido da palavra
sharru, rei, mas isso seria o de menos. Daniel não estava preocupado em distinções de palavras, mas em
funções exercidas. Ora, se Belsazar exercia o poder e governava, naturalmente quem escrevesse a história e
não tivesse as preocupações modernas de distinguir o reinante de um seu substituto com os poderes reais,
por certo faria como Daniel fez. Depois que o nome de Belsazar surgiu nos tabietes cuneiformes, a discussão
parou por um pouco, ficando apenas a de que não era costume um monarca delegar seus poderes a outra
pessoa. No caso vertente, Belsazar era filho e herdeiro do trono; logo, poderia ter recebido esta delegação de
poderes, como se diz atualmente.

Não devem admirar-se os críticos de que Nabonido tivesse delegado poderes reais a seu filho, porquanto isso
era, de modo geral, comum entre muitos povos antigos. O Assuero da Média tinha, como seu companheiro
de governo, um sobrinho, ao qual delegava poderes administrativos sempre que tinha de ausentar-se da sede
do governo.

Entre os egípcios esse costume era comum. Totmés I associou a própria filha Hatshepsut ao governo,
enquanto ele fazia a guerra aos hititas e mitânios, no Oriente Próximo, e foi nesta capacidade de governo que
ela pôde adotar o menino Moisés como filho, coisa que só poderia fazer como rainha que era.

A crítica nem sempre é bastante honesta para estudar os fatos e concluir à luz dos mesmos fatos. Há uma
notável má vontade para com os livros da Bíblia, de modo que todo e qualquer acontecimento menos comum
é levado logo à conta de fraude e falsidade, como se os escritores bíblicos não tivessem bastante critério para
distinguir entre o verdadeiro e o falso. Se o livro de Daniel conseguiu vencer esta batalha histórica, pouco
mais resta para contestar. Os escritores modernos, como R. D. Wilson, em Studies in the Book of Daniel,
1917, jorrou multa luz sobre esta contestação.
O que se depreende de um exame acurado do texto é que, sendo o Belsazar um jovem vaidoso, logo que o pai
lhe entregou a direção dos negócios reais, quis mostrar a sua importância perante os cortesãos e,
possivelmente', admitimos, teria ido além das medidas, convidando os grandes do reino, as mulheres dos
cortesãos e as meretrizes mesmo. Assim todos ficariam certos de que o moço governava mesmo, e não lhe
negariam apoio, caso o pedisse. Possivelmente, este teria sido o móvel do banquete.

1. A Profanação do Banquete (5: 1-5)

O rei Belsazar deu um grande banquete a mll dos seus grandes (v. 1). O texto sagrado tanto lhe dá o nome de
rei como menciona a pompa do banquete: a mil dignatários da corte, fora as mulheres e os criados. Somemos
tudo, e veremos mais de 1.500 pessoas ao redor da grande mesa palaciana. Até ai nem Daniel teria muito o
que dizer, no caso de ele ainda estar nas mesmas boas graças em que estava no tempo de Nabucodonozor.
Este morreu em 562 a.C. Já tinham decorrido 48 anos depois da destruição de Jerusalém, e Belsazar
encontrava-se no trono em 538. Por todo este tempo Daniel teve o seu dia e oportunidade de testemunhar
do seu Deus. Por morte de Nabucodonozor, sucederam-no diversos reis sem o pulso do rei falecido. Talvez o
mais notável tenha sido mesmo Nabonido. Possivelmente, Daniel teria caído um pouco da sua antiga nosição,
mas, pelo relato dos versos 10-1 6, segundo as palavras da rainha-mãe, vê-se que Daniel ainda pontificava
entre os magos de Babilônia.

O rei não apenas deu um grande banquete, mas, por vaidade ou maldade, mandou trazer do templo do seu
deus Marduque os vasos sagrados que o bisavô tinha trazido de Jerusalém e por eles bebeu e seus comensais.
A profanação estava patente, porque, quer os vasos fossem do templo de Jerusalém quer do templo de
Babilônia, não era razoável que por eles bebessem num banquete mundano. Aí é que se encontra a raiz da
profanação. Não era apenas o desprezo da sua própria religião, mas ele deveria saber da origem desses
vasos, que pertenciam à casa do Deus verdadeiro. Quando a festa estava no auge, diz o texto sagrado que:
No mesmo Instante apareceram uns dedos de mão de homem, e escreviam, defronte do candeeiro, na
caradura da parede do palácio real (v. 5)

2. Um Banquete Estragado (5: 6-9)

Somos informados pela arqueologia que as paredes do palácio eram revestidas de pintura branca, o que lhe
dava grande realce face à luz dos candelabros. Nessa altura, ' já todos meio tontos do vinho, é quando
aparece na caradura da parede a mão de homem escrevendo, e o rei via os dedos que estavam escrevendo (v.
5). Um pavor e assombro se apossou de todos os convivas, correndo cada qual para um lado, procurando
esconder-se daquela mão misteriosa, que tinha ido estragar a festa. Podemos imaginar o que seria o estupor
na sala, em gente supersticiosa, e mesmo em quem não fosse. Teriam perguntado uns aos outros o que seria
aquilo. O medo do rei era tal que as juntas dos seus lombos se relaxaram, e os seus joelhos batiam um no
outro (v. 6); uma viva descrição de quem assistiu de perto à cena tétrica e pavorosa.

Imediatamente o rei ordenou em voz alta que se introduzissem os magos e encantadores, feiticeiros e toda a
família de adivinhos, prometendo que aquele que decifrasse a escrita seria o terceiro no reino. Aqui está uma
outra prova da autenticidade de Daniel, pois o primeiro era Nabonido, o segundo Belsazar e o terceiro o que
decifrasse o enigma. Além disso, receberia uma comenda, constante de uma cadeia de ouro pendurada ao
pescoço, sinal de graduação no governo. Os sábios chamados ficaram também estupefatos, eles que nada
conseguiram entender da escrita nem do seu significado, Nem com a promessa da recompensa pôde alguém
atinar com o sentido da escritura. Aí a confusão teria tomado conta de todos e cada qual procuraria ou fugir
daquela sala mal-assombrada ou esconder-se daquela mão misteriosa. Imaginemos a confusão, pois eram mil
os comensais e mais os serventes, num todo de umas 1.500 pessoas, uns correndo de um lado para outro,
outros falando e os magos mudos, olhando a parede e a escrita. O rei de semblante perturbado, ou mudado,
e todos os grandes sobressaltados (V. 9).
3. Daniel Entra em Cena (5: 10-30)

A rainha-mãe, mulher de Neriglissar, ouvindo ou sabendo da confusão (ela não estava no banquete), entrou
na casa do banquete e disse ao rei: Há no teu reino um homem que tem o espírito dos deuses santos; nos dias
de teu pai... o rei Nabucodonozor...(v. 11 ). Se o livro de Daniel fosse do segundo século a.C., nós não teríamos
esta linguagem, is já não haveria rainha-mãe nem tradição alguma a respeito de Daniel. Esta é uma flagrante
prova da autenticidade do livro de Daniel. Esta declaração também nos mostra que Daniel, depois da morte
de Nabucodonozor, entrou em decênio, e só a rainha-mãe ainda conservava reminiscência das atividades
dele. Todos os outros estavam esquecidos ou nunca teriam ouvido falar nele.

Ela fez o elogio do profeta de um modo eloqüente, como se achando nele espírito excelente, conhecimento e
Inteligência... declaração de enigmas, etc. (v. 12). O fato de ela mencionar Nabucodonozor como pai de
Belsazar não deve constituir surpresa, porquanto era costume nos tempos antigos entre os orientais
chamarem os avós de pais. Portanto, Belsazar, que já vinha na terceira sucessão de reis, ainda era
considerado filho do velho Nabucodonozor. Toda esta história nos coloca justamente nos dias de Nabonido, e
não de Antíoco Epifânio ou outro do mundo grego. Diz-se ainda que a rainha-mãe, em Babilônia, ocupava
uma posição de relevo. O fato de ela não ter tomado parte no banquete parece claro; tratava-se de uma festa
mundana, de um quase deboche, e isso não era digno de uma rainha que se prezasse. Daniel entra; olha a
escrita na parede e pára, porque a sentença era mesmo de morte. Dispensa os presentes, dizendo ao rei que
desse os seus prêmios a outrem, mas ele leria a escritura. Esta atitude de Daniel parece demonstrar que ele
não andava em boa companhia com o rei; não estaria de acordo com a orgia que se fazia ou estaria
desgostoso por não ter continuado a gozar das honras que gozava com o velho Nabucodonozor. Começou
por mencionar o pai do moço Nabucodonozor. Deveria dizer bisavô, mas o costume era esse. Daniel fez
então um histórico da vida do velho rei e do que lhe tinha acontecido na doença, para concluir: Tu, Belsazar,
que és seu filho, não humilhaste e teu coração, ainda que sabias tudo Isto (v. 22) . Não se tinham passado
realmente muitos anos e as crônicas reais relatariam estas coisas. Portanto, por causa da tua rebeldia, e da
tua falta de reverência para com o Deus dos deuses, em cuja mão está a tua vida, e todos os teus caminhos, a
ele não glorificaste (v. 23). Por isso a escritura reza assim: MENE, MENE, TEQUEL, UFARSIM. MENE significa
contar: Contou Deus o teu reino, e deu cabo dele (v. 26). TEQUEL significa pesar: Pesado toste na balança, e
achado em falta (v. 27). PEAES (DE UFARSIM), significa dividir (ver Gên. 10:25, onde pelegue significa peres):
Dividido foi o teu reino e dado aos modos e aos persas (v. 28). (*)Naquela mesma noite foi morto Belsazar, rei
dos caldeus (v. 30).
Poucos relatos na Bíblia são tão trágicos como este. Pensa-se que Daniel, sabendo que aquela era a última
noite do rei, por isso recusou os seus presentes, mas nós não pensamos assim. Havia outros motivos para a
recusa.

Quando Belsazar deu o banquete, já as forças coligadas de Dario, o Medo, e Ciro, o Persa, cercavam Babilônia,
mas a cidade estava garantida com as suas muralhas em redor, e por cima das muralhas, nos torreões,
estavam as sentinelas, vigiando. Era, pois, de presumir que não havia perigo. Nós, porém, pensamos que
havia perigo, pois o inimigo conta com elementos que nós ignoramos, e este f o! o caso. A história conta que
Ciro mandou os seus sapadores desviar o curso do rio Eufrates, que corria pelo centro da cidade, e entrou a
pé enxuto na cidade, com as suas tropas, e parece que ainda se estava no salão das festas, comentando o fato
estranho da escrita na parede, quando Belsazar e outros muitos foram mortos.

O nosso texto diz que Dario, o Medo, com cerca de sessenta e dois anos, tomou o governo (v. 31). Não tem
sido pequena a contenda a respeito deste verso, porquanto alguns comentadores afirmam que Dario jamais
governou Babilônia. A interpretação que se tem dado é que Ciro continuou à frente de suas forças,
dominando o resto do império ou pretendendo ir mais além, até a Índia (como desejou Alexandre mais tarde),
entregando o governo da cidade a Dario. De qualquer modo, para nós, Dario era o governador (rei) de
Babilônia. Daniel não se enganou nem confundiu as funções dos dois reinantes. Dario viveu pouco e o reino
realmente passou a ser de Ciro, e foi ele quem proclamou a redenção dos hebreus do se cativeiro. Isto em
538 a.C. É bom refrescar a memória mais uma vez com as datas: O exílio começou em 597 a.C., sendo
Nabucodonozor, o rei, o grande construtor da cidade. Por sua morte, veio Evii-Merodaque, que governou
apenas por dois anos, sendo sucedido por Neriglissar até 555 a.C. Foi então que subiu ao trono de Babilônia, e
depois Ciro, em 538, dando liberdade a todos os cativos, que não eram apenas os judeus, mas todos os povos
daquela grande área, compreendida da Pérsia à Macedônia. Os livros de Esdras e Neemias e Ester devem ser
lidos em conexão com esta história, porque nos reiatam os acontecimentos depois da morte de Ciro, dado
atualmente como o fundador da Pérsia, que compreende apenas uma parte do que foi Babilônia.

Durante estes 59 anos, ou 60 que seja, a vida dos judeus se transformou. O cativeiro, é certo, terminou com a
subida de Ciro ao poder, mas muitos dos judeus estavam bem estabelecidos em Babilônia e suas províncias e
lá ficaram. As suas casas bancárias tinham correspondência com o Egito, onde havia uma grande colônia,
fundada com os fugitivos da Palestina, quando levaram Jeremias. Lá fundaram a cidade de Elefantina e
construíram um templo, que rivalizava com o de Jerusalém. Estes muitos não voltaram à Palestina, vindo
agora apenas uma leva com Zorobabel, para fundarem o templo; depois veio outra, com Esdras, e a última
com Neemias. Assim se completaram os 70 anos preditos por Jeremias. O livro do autor sobre Esdras,
Neemias e Ester esclarece muitos pontos que não podem ser dados aqui por estarem fora do estudo em
apreço. Parece-nos que ainda não terminou aqui a atividade de Daniel; depois do reinado de Ciro ele ainda
vivia. Não sabemos quando terminou o capítulo 12 deste seu grande livro, mas a promessa foi que ele iria em
paz, e no final se levantaria para receber a sua herança (12:13)

(*) A antiga versão da Bíblia continha a palavra UPHARSIM, sendo o "U" na língua aramaica, equivalente à
nossa conjunção "e". A Versão Revista e Autorizada da SBB traz esta palavra sem o "U" e com a conjunção "e",
seguida da palavra PARSIM.

VI - UMA DURA PROVA PARA DANIEL NA COVA DOS LEÕES (6:1-28)

Alguns comentadores incluem o verso 31 do capitulo 5 como o primeiro verso do capítulo 6. Nós, entretanto,
achamos que este verso cabe muito bem como fecho do capítulo 5, porque liga a morte de Belsazar com a
chegada das forças de Ciro. É questão de pequena monta. Todavia o capítulo 6 é, por muitos, impugnado
quanto à presença de Dario como reinante em Babilônia. Não poucos o identificam com Cambises, Astíages e
outros, que sucederam a Ciro, isto porque a história não registra o seu nome. Não havia historiadores
meticulosos naqueles dias como há hoje, e para nós o relato de Daniel basta, pois é um relato de Daniel basta,
pois é um relato natural de uma testemunha presente e que nesse reino voltou a gozar dos favores que
gozara nos dias de Nabucodonozor. Nos dias de Neriglissar e Evii-Merodaque de fato ele esteve esquecido,
para só aparecer na grande crise de Belsazar, quando voltou a ser a principal figura no reinado de Dario. Nada
se nos diz da sua atuação na restauração dos exilados, e isto nós sentimos, porque ele não estaria ausente
nessa quadra admirável. Mas isso também é de segunda importância. Efetivamente também sentimos certa
dificuldade em entender o capitulo 6, em que Dario é a principal figura, nada se dizendo de Ciro, mas
explicação dada antes talvez sirva para esclarecer o problema. Não padece dúvida que o rei principal era Ciro,
ou pelo menos assim parece, porque foi ele que acabou com o regime da escravidão instaurado por
Nabucodonozor. Mas, reconhecendo a dificuldade dos cronistas antigos, temos de suprir muita coisa que nos
falta. Cremos que, para o presente caso, estas explicações bastam. Por amor da elucidação deste texto difícil,
quanto à história de Babilônia, diremos que alguns admitem ter havido dois reinos: um persa e outro medo. A
história não nos autoriza esta conclusão. A história toda, desde a derrota da Assíria, é que dois Estados se
uniram para destruir o resto do antigo Império Assírio, de que Babilônia foi por muito tempo uma Parte. No
capítulo 6:8, medos e persas aparecem juntos, pelo que seria uma tentativa inútil forçar a história a contar-
nos de dois reinos independentes.

Este período da história de Babilônia, como, aliás, toda ela, é muito obscuro. Por isso alguns comentadores
admitem que Babilônia foi dividida em dois reinos, um medo e outro persa, visto como, segundo Daniel, o
reino foi entregue a Dario, o Medo. Neste mesmo contexto aparecem os dois, o medo e o persa, como uma
só entidade (6:8).

É igualmente muito estranha a história deste capítulo. Certamente nem Dario nem Ciro conheciam Daniel, ou
não o conheciam bem, pois, em tal caso, não teria valido muito a Intriga dos presidentes e sátrapas. Mas o
texto também nos informa que Daniel com punha o grupo de sátrapas que governavam as províncias em que
Dario dividira o império. Isso nos leva a ver que Dario não ignorava as atividades administrativas de Daniel.
Mais ainda, foi com grande relutância que ele botou Daniel na cova dos leões, pois nem dormiu naquela noite
e, pela manhã, muito cedo foi à cova para verificar se o Deus de Daniel teria ou não salvo o homem.

1. A Trama Contra Daniel (6: 1-7)

Daniel era um dos 120 administradores, e de tal modo se houve que os seus companheiros se encheram de
inveja. Havia nele, em Daniel, aquele espírito excelente, e o rei pensava até em estabelecê-lo sobre todo o
reino (v. 3). Em que consistia esta superioridade não sabemos, nem o texto o diz, mas possivelmente seria
colocado como chefe do grupo, uma espécie de superintendente-geral. Era isso que os outros não aceitavam.
Um exilado governar sobre eles não era tolerável.

Daí um plano diabólico. Um grupo, não os 120, mas alguns, pactuaram para botar Daniel a perder. Foram
juntos (v. 6), isto é, pactuaram juntos, indo ao rei com petição iníqua (v. 7), mediante a qual seria considerado
traidor o que violasse a lei que eles pediam. Muitos críticos acham que este relato não se compadece com a
situação geral. Acreditam estes críticos que o relato não corresponde ao espírito dos persas. Também nos
parece que o rei simplesmente foi apanhado numa intriga de que ele nem suspeitaria. Era, de fato, o sumo
pontífice da religião, e cabia-lhe defender a divindade, caso fosse ultrajada. O rei foi insensato em cair na
ratoeira, mas quem sabe dos modos como a petição teria sido urdida, pois bem poderiam ter dito que os
deuses nacionais estavam sendo ultrajados e que isso redundaria em prejuízo para a nação. Acreditamos que
eles não contaram a história como ela deveria ser contada. O que também causa certa suspeita é que os
medo-persas estavam no governo havia pouco tempo, e como é que já sabiam que uma lei persa não podia
ser mudada? Isso aconteceu também no reinado de Xerxes, no tocante a Mardoqueu (Ester 3:7-1 1). Dos
intrigantes não há quem se livre.

2. Lavra-se o Decreto (6: 8-13)

O rei foi colhido na intriga, em que estavam envolvidos presidentes e sátapras, conselheiros e governadores,
toda a camarilha governamental, a solicitar que fosse lavrado um decreto pelo qual, se alguém, no espaço de
trinta dias, fizesse petições a qualquer deus ou a qualquer homem, e não a ele o rei, fosse lançado na cova dos
leões. O rei teria até sentido certa vaidade real por ser designado que só ele poderia aceitar qualquer petição
entre os homens, sendo que qualquer que transgredisse esta lei seria lançado na cova dos leões. Daniel tinha
por costume orar no seu quarto com as janelas abertas na direção de Jerusalém, e isto, com certeza, era do
conhecimento de todos, e sabiam estes maus homens que Daniel não iria mudar, a despeito da existência de
um decreto real. Assim pensaram, e assim foi. Daniel continuou a fazer as suas petições a Deus, o seu Deus, e
depois da assinatura do decreto teriam ficado espias para ver se Daniel continuaria a orar ao seu Deus. O
texto nos informa que, quando Daniel soube que a escritura estava assinada, entrou no seu quarto, onde
havia janelas abertas da banda de Jerusalém, e três vezes no dia se punha de joelhos e orava, e dava graças
diante do seu Deus, como costumava fazer (v. 10). Não mudou seu costume de orar, a despeito da escritura
assinada, que o levaria à cova dos leões. As isto se chama fé e confiança em Deus. Ele estaria firme no
propósito de ficar com o seu Deus, houvesse o que houvesse, e ele já tinha a experiência dos seus três
Companheiros, que foram milagrosamente libertos das chamas da fogueira ardente. Então, que lhe
importava a vida, contanto que ficasse firme e fiel ao seu Deus? Se fosse do agrado de Deus que morresse nas
garras dos leões, morreria, mas, se não fosse, Deus o livraria. Esta foi uma decisão histórica, de grande valor.
A isto chama-se também depender de Deus.
Então aqueles homens foram juntos e, tendo achado Daniel a orar e a suplicar diante de Deus, se
apresentaram ao rei e, a respeito do interdito real, lhe disseram... (vv. 1 1 e 12). Esse Daniel, que é dos
exilados de Judá, não faz caso de ti, ó rei, nem do interdito que assinaste (v. 13). A intriga estava bem
tramada e nela estava envolvida a honra pessoal e o amor próprio do rei, que estava sendo desprezado por
Daniel. O rei, quando ouviu a história, ficou muito triste e por todo o dia lutou para livrar Daniel, e até o pôr-
do-sol se empenhou por salvá-lo. Isso nos dá a medida da estima e consideração que Daniel lhe merecia, mas
havia uma lei persa que não podia ser revogada de modo algum, sob pena de desmoralização do governo.
Então, que fazer?

3. Daniel na Cova dos Leões (6: 14-22)

O rei mandou chamar Daniel, por certo, para se certificar de que as testemunhas falavam a verdade. Daniel
teria sido firme. O texto ignora o diálogo havido entre o rei e Daniel, mas, pela linguagem do mesmo rei, fica
claro que houve tal diálogo. O rei terminou com estas palavras: O teu Deus, a quem tu continuamente
serves, que ele te livre (v. 16). O rei não tinha certeza do livramento, senão teria dito: O TEU DEUS TE
LIVRARA. Não foi isso que ele disse, mas: que ele te livre. Esta foi uma hora crucial para o rei e para Daniel.
Então pegaram Daniel e o jogaram pela abertura que haveria na boca da cova, talvez de cabeça para baixo.
Não adiantava, pois lá dentro já estava Um que o esperava, para o salvar. Coisa maravilhosa!

O rei perdeu o sono. Passou a noite em jejum e não quis ouvir música nem que houvesse qualquer
manifestação de regozijo, enquanto os caluniadores estariam exultando de contentes. De madrugada, ao
romper do dia, levantou-se o rei e foi com pressa à cova dos leões (v. 19), e com voz triste disse a Daniel:
servo do Deus vivo, dar-se-ia o caso que o teu Deus, a quem tu continuamente serves, tenha podido livrar-te
dos leões? (v. 20). Este monólogo não esperaria que fosse respondido; todavia, ele abrigava uma esperança
de que o Deus de Daniel o livraria dos leões. Não tinha certeza, mas esperava. Lá, do fundo da cova, Daniel
lhe respondeu: O meu Deu enviou o seu anjo, e fechou a boca aos leões (v. 22). Quanto a quem foi este anjo,
há muita suposição, mas, como no caso da fogueira ardente, bem poderia ter sido o Anjo, o Filho de Deus, o
Messias, que assim honrou a fé do seu servo.
Também se tem levantado objeções a esta história. Onde estaria a porta por onde entrou Daniel? Haveria
uma abertura no alto da cova por onde desceria o acusado, e bastante alta para não permitir uma fuga
improvável. Do lado haveria uma entrada por onde as feras eram alimentadas. Seria esta entrada fechada
com uma pedra que o rei selou com o seu selo.

4. A Punição dos Culpados (6: 23, 24)

O rei muito se alegrou que Daniel estivesse vivo. Fato igual jamais tinha acontecido. Ordenou o rei, e foram
trazidos aqueles homens que tinham acusado (caluniado) a Daniel, e foram lançados na cova dos leões, eles,
seus filhos, suas mulheres; e ainda não tinham chegado ao fundo da cova e já os leões se apoderaram deles, e
lhes esmigalharam os ossos (v. 24).

Não temos de supor que todos os 120 estivessem implicados na trama. Um pequeno grupo certamente.
Estes não tinham um anjo para tapar a boca dos leões e salvá-los. Naqueles dias e naquele reino não estava
em vigor a lei que punia os criminosos, mas salvava os filhos, pois os pais pagavam pelos filhos e os filhos
pelos pais. O preconceito de Moisés não vigorava lá (Deut. 24:16; Jer. 31:29).

5. As Consequências da Fidelidade de Daniel (6: 25-28)

Então o rei Dario escreveu um decreto a todos os povos e nações debaixo do sol, para que os homens tremam
e temam perante o Deus de Daniel; porque Ele é o Deus vivo (v. 25). O decreto era longo e minucioso. Jamais
antes rei algum decretara tal coisa. As 120 províncias tomaram conhecimento de que Deus salva e que
permanece para sempre. Graças pelos resultados da fé que Daniel exercitou perante aquela gente, resultados
estes que chegaram aos confins da terra. Assim, Daniel prosperou no reinado de Dario e Ciro, o Persa. Eram
dois reinados, e não dois reinos, como tem parecido a alguns comentadores. Mesmo que Dario não apareça
nas crônicas, ele reinou nos dias de Daniel, por pouco tempo, é certo.
SEGUNDA PARTE

REVELAÇÕES E PROFECIAS

I - A GRANDE REVELAÇÃO DO FIM (7:1-28)

1. A visão de Daniel das Quatro Feras (7: 1-8)

Damos a esta parte do livro a designação de Segunda Parte, porque efetivamente ela trata de assuntos um
tanto diversos dos tratados nos capítulos anteriores. São revelações e profecias, uma espécie de Apocalipse
do Velho Testamento, e, como o assunto tem grande sentido de futuro, carece de um tratamento muito
especial. Confessamos que, de todas as vezes que pensávamos escrever um Estudo sobre Daniel, parávamos
e pensávamos: Seremos capazes de abordar assuntos de natureza futura? Que entendemos de história antiga
para nos abalançarmos a escrever sobre tais assuntos? Todavia, entre a indecisão e o desejo de deixar nestas
páginas o nosso sentimento de crente, aceitamos o segundo. Se Deus nos ajudar, faremos tudo que estiver ao
nosso alcance para sermos fiéis na interpretação destas revelações e profecias.

O assunto tratado neste capítulo tem muito de comum com o do capitulo segundo. Lá, trata-se do sonho de
Nabucodonozor e os quatro reinos representados no seu sonho. Aqui trata-se de uma visão de quatro reinos
também, mas projetados num campo diferente. Lá, foi um sonho que Deus deu ao rei e que causou tanto
trabalho entre os adivinhos e feiticeiros. Aqui foi um sonho que o próprio Daniel teve. Há, assim, certas
semelhanças. No capítulo 2 Deus deu ao rei uma visão do que iria acontecer no decurso dos dias, e aqui o
mesmo Deus deu a Daniel a visão de grandes acontecimentos históricos, em que estava envolvida a sua
própria nação, elemento, aliás, também encontrado na primeira visão do rei. O sonho ocorreu no primeiro
ano do rei babilônico Belsazar, de que já nos ocupamos noutro lugar. O rei, que não o era, mas um sub-rei às
ordens do verdadeiro rei Nabonido, foi o rei em cujos dias, os últimos, aliás, tiveram lugar a festa bacanal e a
visão dos dedos escrevendo na caiadura da parede. Daniel chama a este moço de rei, e como o seu nome não
consta nas crônicas caldaicas, muita crítica tem sido feita a esta declaração do nosso profeta. Isso,
entretanto, já está esclarecido e podemos prosseguir sem receio de deixar qualquer coisa mal interpretada.
Daniel fala na terceira pessoa do singular, como se alguém estivesse falando por ele ou descrevendo o seu
sonho. Falou Daniel e disse: Eu estava olhando, durante a minha visão da noite, e eis que os quatro ventos do
céu agitavam o Grande Mar (v. 2). O Grande Mar aqui não se refere ao Mediterrâneo, como é o costume dos
escritores sagrados. Deve representar a grande humanidade, que se movimenta e agita no meio deste
Grande Mar, nem sempre se apercebendo de que por cima está o Grande Criador da mesma humanidade e
do mesmo Grande Mar, pois ele é o Criador de tudo que há em cima e embaixo e por todos os lados. No meio
está a humanidade que ele criou e que tão mal tem servido aos divinos propósitos. Os quatro ventos são ou
representam os quatro pontos cardiais, representam todos os lados. Eles são, pois, celestes poderes usados
pelo Criador para agitar as vagas marinhas, onde se movimenta a humanidade. Eles obedecem e cumprem
fielmente as suas missões, ora agitando as águas dos mares, ora açoitando a terra e varrendo os continentes,
ora soprando brandamente, como uma carícia divina que bafejasse a face da criança adormecida. Todos estes
elementos naturais Deus usa como lhe apraz e entende, no seu divino governo deste Grande Mar. Felizes os
que são capazes de entender este governo e a ele se submetem docilmente. Os rebeldes sempre encontram
outros ventos e outro mar pela sua frente. No sonho, Daniel viu emergirem do Grande Mar quatro animais
grandes, diferentes uns dos outros, como a diferenciar as diversas situações representadas por estas feras.
Perguntamos: Por que feras, e não outra coisa? Naturalmente, a humanidade rebelde é mesmo uma fera, e
todos os seus atos de rebeldia são como os de feras soltas e bravias.

O primeiro animal era como o leão, e tinha asas de águia, parecendo-se com a fera representada pela cabeça
de ouro do rei (cap. 2) e representava a Babilônia, conforme se pode ver de outras reverencias (Jer. 4:7;
49:19; Hab. 1:8; Ez. 17:3). Este simbolismo sempre representava Babilônia. Só mesmo uma pessoa vivendo
nos dias de Babilônia poderia apreender tal simbolismo. Os que querem fazer do nosso Daniel um Daniel
grego, dos tempos de Alexandre, têm de explicar estas dificuldades históricas. Babilônia era a mais majestosa
das cidades antigas, nenhuma, nem mesmo a grande Assíria o era tanto. O leão, majestoso, representava
perfeitamente essa grande metrópole. Era um leão com asas de águia. Que significa isso? A águia é outro
animal majestoso, a rainha das alturas, como o leão o é das planuras. Depois foram-lhe arrancadas as asas.
Como teria sido? Nabucodonozor, na sua loucura, teve as asas arrancadas. Depois, posto de pé como
homem, foi-lhe dado mente de homem, isto é, voltou a ser o que era antes, após passar pela humilhação de
virar animal. Esta alteração verificada na primeira besta, sem dúvida, refere-se mesmo a Babilônia antes e
depois da humilhação do rei.

O segundo animal, muito diferente do primeiro, era um urso, de função dupla. Trazia três costelas na boca.
Levantava-se sobre as patas de um dos lados, ficando as duas outros suspensas, como se quisesse andar sob
os pés de um lado só, coisa realmente impossível, denotando instabilidade e insegurança. Ao animal é
ordenado que devore muita carne, pois na boca trazia três costelas, cujo significado está ainda indeciso. O
número de "três" costelas também é sintomático e pensa-se que seja apenas uma maneira de arredondar um
determinado fato.
A terceira fera que se levantou do mar (humanidade) tinha a forma de um leopardo, ou pantera, animal de
ligeireza indescritível. Nas suas costas tinha quatro asas de aves (v. 6). A frase tinha nas costas quatro asas
pode ser traduzida "dos lados tinha quatro asas", e sua semelhança de animais com asas, vistos em Babilônia,
é coisa comum. E claro que o animal não voava, mas as asas significam ligeireza, rapidez. Tinha também este
animal quatro cabeças (v. 6), o que se tem pensado referir-se a quatro reis persas, também mencionados em
11:2, ou também aos quatro sucessores de Alexandre, mas acredita-se que em nenhum destes casos há
aplicação para esta figura. Pelo contexto, somos de parecer que o animal simboliza um reino de caráter
universal, dominando sobre os quatro ventos da terra. Em Daniel 2:39 há uma referência a este reino de
"bronze", que teria domínio sobre toda a terra.

A quarta fera, um animal terrível, espantoso e sobremodo forte (v. 7). Não é dito com que animal terrestre se
parece. Os maiores e mais fortes animais já foram descritos nas três feras precedentes. Este é qualquer coisa
indefinível e indescritível. Sabemos que tinha grandes dentes de ferro; ele devorava e fazia em pedaços, e
pisava aos pés o que sobejava, era diferente de todos os animais (v. 7). Uma fera destruidora. Uma fera com
dez chifres, e entre eles subiu outro chifre, pequeno, diante do qual caíram três dos primeiros chifres, e neste
pequeno chifre havia olhos, como de homem, e uma boca que falava com Insolência (v. 8). Este animal, como
se vê, oferece diversas conjeturas ou modos de interpretação, e nós vamos tentar, de vagar, ver o que
significaria tudo isto neste último animal.

Há três pontos a observar: Primeiro, é mencionada a fera sem lhe ser dado o nome; segundo, são
mencionados dez chifres sobre a cabeça da fera; em terceiro lugar, surge um pequeno chifre com olhos, que
falava insolências. Daniel mesmo parece que ficou surpreso ao examinar este animal; aliás, deveria ficar
surpreso com todo o conteúdo da visão. Ele anotou diversos particulares, que merecem menção. Primeiro,
uma fera com dez chifres; depois um outro chifre pequeno, falando insolências. Esta ponta pequena o era no
tamanho, mas não nos feitos. Ela parece relacionar-se com a do capítulo 8:3. Pelo menos em semelhança.
Talvez a pequenez do chifre sirva para destacar o que os outros não tinham: olhos e boca, falando
insolentemente. Esta diferença deve ter outro simbolismo, outra função que a dos chifres grandes. Pelo
visto, trata-se de um elemento capaz de proferir blasfêmias, de desafiar, por perto e por longe, pois estava
cheio de olhos. Um elemento perigoso.
I - A GRANDE REVELAÇÃO DO FIM (7:1-28)

2. Uma Cena Celestial (7: 9-14)

O verso 9 introduz-nos a uma cena celestial muito sugestiva e significativa. Foram postos uns tronos, e o
Ancião de dias se assentou (v. 9). Trata-se, já se vê, de um julgamento onde há trono e juiz. O "Ancião de
dias),; não é propriamente um velho, mas uma pessoa idosa, respeitável e venerável, como cabe a um
magistrado. As vestes do "Ancião de dias,) eram brancas como a neve, e isto está em conformidade com
diversos passos do Apocalipse (5:9-14 e refs.). O trono era de chamas de fogo, cujas rodas eram fogo ardente.
Um rio de fogo manava e saía de diante dele, milhares de milhares o serviam, e míriade de míriade estavam
diante dele; assentou-se o tribunal, e se abriram os livros (v. 1 0; ver Apoc. 5:1 1). Deus está no seu trono e o
tribunal está organizado, o julgamento é solene, a ver-se a multidão de serventuários prontos para atender a
qualquer ordem do supremo Juiz. Enquanto toda esta cena se preparava, a pequena ponta do chifre
continuava a falar insolentemente, como a desafiar o supremo juiz, rodeado de tantos milhares de milhares
de serventuários. Era um chifre muito ousado, a que nada fazia medo ou sentir receio. Enquanto Daniel
observava toda esta cena maravilhosa, viu quando o animal, a quarta fera, foi morto e destruída a pequena
ponta (v. 11). O seu corpo foi desfeito e entregue para ser queimado a fogo. Destruído o quarto animal e
destruída a pequena ponta, por certo somos ensinados que foi destruído o quarto reino simbolizado em todos
estes detalhes. Os outros três animais (reinos) continuam a existir, mas sem poder para governar. A sua
continuação da existência deve relacionar-se com a vinda do tempo determinado por Deus (v. 12).

A cena não estava terminada. Outros elementos de alta valia estavam ainda por surgir e Daniel confessa que,
nas suas visões da noite, depois de todo o cenário já descrito, viu vindo, com as nuvens do céu, UM como o
Filho do Homem e que dirigiu-se ao Ancião de dias, e o fizeram chegar até ele (v. 13). A vinda com as nuvens
do céu desperta em nossa mente um simbolismo evanescente e sublime, pois é UM que tem os ares como sua
morada, e não conta com elementos terrestres para se conduzir. Quando Jesus se apresentava como o Filho
do Homem tinha este simbolismo como base e também é o que Ezequiel apresenta em sua longa profecia.

A vinda deste UM, Filho do Homem, indica que o julgamento não ficou concluído, pois a Ele restava a palavra
final (ver as seguintes escrituras: Is. 19:1; Sal. 104:3; 18:10-18; Mat. 24:30; Mar. 13:26; poc. 1:7). Não temos
qualquer dúvida quanto a este Filho do Homem (não filho do homem), figura singular lídimo representante da
raça humana, e que domina sobre todos os reinos simbolizado nas quatro eras. A ele pertencem o Reino e a
majestade, a honra e a glória. O reino universal é dele, e não dos reinos simbolizados nas quatro feras.

Daniel diz claramente: Foi-lhe dado domínio e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas
as línguas o servissem; e seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído
(v. 14). Como Daniel nos informa, esta inigualável figura celestial, escoltada por míriades de míriades de seres
angelicais, foi levada até onde estava o Juiz supremo, e o reino eterno lhe foi entregue. Reino que não será
jamais destruído. É assim o reino de Cristo. Um quadro mais perfeito do governo e domínio de Cristo não
poderíamos esperar de uma visão profética. Só o Apocalipse tem figuras iguais. Somos gratos a Deus que, lá
dos confins da história, nos vem esta alegoria tão perfeita quanto seria possível, nos domínios humanos, a
respeito de nos,5o Senhor Jesus Cristo.

3. A Interpretação da Visão Apocalíptica (7: 15-28)

1) Naturalmente, esta visão de Daniel oferece muitas interpretações, tanto doutrinárias como históricas, e nós
nos surpreendemos com o fato, pois a Bíblia tem sido, e ainda é, o cenário de toda sorte de interpretações,
umas honestas e com o desejo de ensinar a verdade, outras com o propósito de fornecer material a
determinada escola. Nem toda interpretação é leal à verdade, com o fim de esclarecê-la. Muita só visa a
consolidar a posição de certa escola, e nada mais.

Os que sustentam que Daniel não foi o autor deste livro têm a sua interpretação. Para os tais os quatro
animais representam Babilônia, Média, Pérsia e Grécia. Mas esta interpretação falseia a história, porquanto
nunca existiram dois reinos separados como Média e Pérsia. Tudo quanto sabemos da história é que os dois
pequenos Estados se fundiram e nos deram o Estado Medo-Persa. Portanto, não é o livro de Daniel que é
culpado de um erro histórico, mas os eruditos que não interpretam a história como ela deve ser interpretada.
Afirmam os tais intérpretes que, se Roma, e não a Grécia, é representada pela quarta fera, então a
representação está errada, porquanto o Império Romano nunca pôde apresentar os dez reis representados
pelas dez pontas. Igual argumento apresentaríamos nós quanto à Grécia. Esta nunca teve dez reis. Portanto,
nem uma nem a outra podem ser representadas pela quarta fera. O número dez, entendem muitos
comentadores, é um número completo, que deve ser interpretado como referência a uma segunda fase da
história a ser realizada. Ninguém pôde descobrir dez reis sucessores de Alexandre; com maior facilidade se
descobriria uma sucessão de dez poderes, oriundos de Roma. Nem um nem outro dos dois Estados
atualmente oferece certificado de segurança histórica interpretativa. A história da fera não está completa,
dizemos da quarta fera. Ainda há muita coisa a ser vista, ao passo que a história da Grécia pode ser
considerada terminada.

Alegam mais estes intérpretes que a pequena ponta do capítulo 7 deve relacionar-se com a pequena ponta do
capítulo oito (8:23), mas acontece que esta ponta do capítulo 8 tem uma designação particular, que se refere
a um rei que se levantaria na Grécia (8:23), pois trata-se, nada mais nada menos, de Antíoco lII. Logo, a
pequena ponta do capítulo 7 não pode confundir-se com a do capítulo 8. Um exame acurado da descrição das
duas pequenas pontas mostrará que não podem ser idênticas. Se alguém se dispuser a um exame das duas
pontas, ficará logo convencido de que se trata de duas entidades diferentes. Uma verificação criteriosa da
fera, sem descrição, do capítulo 7 e a do capítulo 8, com a descrição do bode peludo (Grécia), mostrará quão
diferentes são os dois chifres. Mesmo a visão do capítulo 7 é uma e a do capítulo 8, outra. Cada qual trata
dum assunto totalmente diverso e divergente. Confundir as duas coisas ou as duas visões como ensinando
uma só coisa é forçar totalmente o sentido do texto e da história. Deus quis ensinar o que iria acontecer no
mundo, e o fez por meio de duas visões totalmente distintas.

Não adianta o argumento de que Dario representa um Estado e Ciro outro apenas porque Dario governou
Babilônia, embora o texto não afirme que ele governou antes de Ciro. Já vimos noutro capítulo a insegurança
desta fase da história de Babilônia, e daqui em diante não seria possível separar a Média da Pérsia, porquanto
agora eram um Estado só. Até maiores provas, que serão dadas adiante, temos nestas quatro feras a
representação de quatro Estados: Babilônia, Medo-Pérsia (um), Grécia e Roma. Tentar convencer que Daniel
interpretava o novo Estado Medo-Persa como dois estados é o mesmo que tentar negar a diferença entre o
dia e a noite, pois ele sempre se refere ao Estado em que governam os dois, Dario e Ciro, e ele mesmo foi
administrador de um Estado, pouco importando quem estaria à frente do governo, se Dario ou Ciro. Aliás,
Dario morreu pouco depois de instaurado o novo Estado, pelo que ainda se torna mais difícil a identificação
de dois Estados.

Há, presentemente, uma nova interpretação, já apresentada no estudo da visão do capítulo 2, a respeito dos
dez reis que apareceram, representados pelas dez pontas. Ofereceremos uma nova interpretação quando
tratarmos da interpretação dos quatro animais, ou seja, dos quatro reinos. Por ora, basta o que aqui fica
como preâmbulo desta longa e complicada história.

Ainda o fato de Daniel destacar uma vez Dario, o Medo, e outra Ciro, o Persa, de modo algum ajuda a
interpretação de que a Babilônia atual, descrita por Daniel, se constituía de dois Estados. Ele ora tratava com
um, ora com outro, consoante às situações.

Os adeptos desta interpretação dos dois Estados distintos, Média e Pérsia, igualmente confundem a visão de
Daniel, interpretando o Filho do Homem como Israel, sendo os santos do Altíssimo o mesmo Israel. A história
não se compadece desta interpretação. Jamais a designação de Filho do Homem se refere a Israel, ou os
santos do Altíssimo ao mesmo povo. Tanto o Velho como o Novo Testamento são unânimes em dar a
designação de Filho do Homem a Jesus Cristo, e a designação de os "santos do Altíssimo" aos crentes salvos
por ele. Jesus foi quem mais usou a designação de Filho do Homem, referindo-se, naturalmente, à sua
pessoa, e os "santos do Altíssimo" no Apocalipse são os salvos por ele.

Ainda em referência à ponta pequena, que falava insolentemente e blasfemava, refere-se certamente ao
"homem do pecado", mencionado por Paulo na sua II Carta aos Tessalonicenses (2:3). Uma interpretação
completa desta quarta fera só será possível quando examinarmos a nossa interpretação de que a quarta fera
não representa a Grécia, mas Roma. Aguardemos.

2) A outra escola, chamada dispensacional, concorda com o nosso ponto de vista, já exposto, de que as quatro
feras representam (1) Babilônia, (2) o Estado unificado de Média e Pérsia, (3) Grécia e (4) Roma. Note-se que
as quatro feras que emergem do Grande Mar (humanidade) são reinos temporais com uma finalidade
universal, pois a tanto parece que Daniel mesmo interpretou o fato da visão. Quanto às dez pontas da quarta
fera, representam reinos que deverão existir. A visão não era para aqueles dias, mas para um futuro distante.
Roma desapareceu da história, mas quem pode negar que ainda possa ressurgir? E esse o pensamento de
muitos comentadores. A história não está nas mãos dos intérpretes, mas nas de Deus. Portanto, bem pode
acontecer que antes da Segunda Vinda de Cristo, o Império Romano ressurja. Depois deste império é que
sairá a pequena ponta biasonante e blasfema. O príncipe que Daniel descreve em 9:26 pensa-se que seja um
príncipe romano, mas também pode não o ser. Será um príncipe a que Paulo dá o nome de "homem do
pecado". Tudo isto está relacionado com a Segunda Vinda do Senhor, como veremos ao estudarmos o
capítulo 9.
Alguns intérpretes entendem que os dez artelhos da fera do capítulo 2 devem servir para representar os dez
reinos que saíram do Império Romano. Preferimos deixar esta interpretação para o estudo do capítulo 9:24-
29. Por ora, tudo é terreno e destinado ao futuro. AIiás, nos dias de Daniel só existiam os dois reinos, o
medo-persa e Babilônia. Grécia e Roma estavam no futuro. Se aceitássemos uma interpretação nova, já
sugerida no estudo da visão do capítulo 2, teríamos uma próxima e quase imediata representação do
significado da quarta fera e das dez pontas.

O Império Romano desapareceu, é certo, mas os povos neolatinos bem o podem representar. Então os dez
povos do Mercado Comum Europeu (por enquanto nove apenas) bem podem representar estas dez pontas ou
dez rebentos que saíram da raíz do Império Romano. Isso se nos afigura plausível, mais do que esperar pela
restauração do velho Império Romano, para depois surgir o príncipe saído dele. Tudo indica que a vinda de
Cristo não está longe. É pensamento geral a proximidade desta vinda ou volta. Espera-se que estes povos do
Mercado Comum Europeu se fundam em um estado unido, com seu parlamento, sua moeda, seu governo
centralizado. Isso já está em cogitação. Não será fácil, porém é mais possível do que o aparecimento de um
império totalmente novo, a surgir ninguém sabe de onde.

Este autor esposa, com as devidas restrições, esta posição, pois que ele espera para breve a volta do Senhor,
para buscar o seu povo. Este príncipe, assim chamado por Daniel, tanto pode ser francês como alemão ou de
qualquer outro estado confederado, pois todos realmente são neo-romanos ou neo-latinos, menos o alemão
e estados escandinavos que entrarem nesta composição. O Império Romano era composto de raças de
muitas nações. Poucos eram romanos.

Conclusão

O simbolismo apresenta quatro feras, representando todas Estados saídos da humanidade. Na visão, Daniel
viu o Juiz julgando os povos e viu os santos do Altíssimo (não judeus) serem entregues ao seu Senhor. Esta é
uma parte da vitória final no juízo do mundo. O Filho do Homem já velo; os seus santos o aguardam de volta
em breve, e então reinarão com o seu Senhor para todo o sempre, pois o reino é eterno como eterno é o seu
Senhor. É o reino de sacerdotes, previsto em Êx. 19:6, reino que será estabelecido quando o Senhor voltar.
Se esta nossa posição e de outros tiver cabimento, então poderemos esperar para breve o aparecimento da
pequena ponta, que, segundo Paulo, quer parecer Deus e ser adorado como Deus, até que seja aniquilado
com o sopro da boca do Senhor. A chegada da pequena ponta está prevista para um tempo, dois tempos e
metade de um tempo. Não é fácil interpretar esta linguagem, mas ela se parece com o tempo em que a
pequena ponta, o príncipe, dominará por três anos e meio (Dan. 9: 27). Na metade da semana de anos, três
anos e meio, enquanto o Senhor está lá em cima nas bodas do Cordeiro, o Príncipe fará guerra sem trégua aos
crentes e não crentes, até que desça o Senhor e o aniquile. Se esta interpretação estiver correta, então o
verso 27 do capítulo 9 está de acordo com 7:25.
REVELAÇÕES E PROFECIAS

II - VISÃO DE DANIEL DUM CARNEIRO E DUM BODE (8:1-27)

Daniel foi muito privilegiado por lhe haverem sido dadas diversas visões respeitantes ao fim dos tempos, e
todas elas vaticinando o destino do seu próprio povo. Nenhum outro profeta (Daniel não foi bem um profeta)
teve tal privilégio de penetrar no âmago do futuro de Israel e até do cristianismo, pois a visão do capítulo 7
destina-se à vinda de Cristo ao seu povo, os "eleitos de Deus" ' Os escritores proféticos do Velho Testamento
lidavam com o povo em forma de tese, ensinos a respeito da conduta do povo. Daniel lidava com realidades
concretas do futuro, realidades que se projetariam na história de diversos povos com que o seu mesmo povo
estava envolvido.

Esta profecia é uma espécie de parênteses entre os capítulos 7 e 9, que, se fossem discutidos um após outro,
nos dariam um quadro perfeito do que estava para acontecer nos últimos dias. Entretanto, entre um- e outro,
entra o capitulo oitavo, que trata diretamente do governo da Grécia, em que o povo de Israel teve tão saliente
participação. De um modo geral, sejam quais forem as visões, todas elas se relacionam de um modo ou de
outro com o destino de Israel. Este capítulo é rico em informações deste quadro histórico.

1. A Visão e Sua Interpretação (8: 1-14)

Esta visão ocorreu no terceiro ano do reinado de Belsazar, o rei que deu o banquete bacanal, quando foi vista
a mão escrevendo na caiadura da parede. Vemos que o espaço de tempo entre esta visão e as outras foi
longo. Elas não se seguiram umas às outras. O banquete foi o último ato do reino de Belsazar, porque
naquela mesma noite foi morto e Babilônia passou às mãos dos medos e persas. Portanto, esta visão teve
lugar muito depois da experiência da fornalha ardente e da cova dos leões. O que se deu com o livro de
Daniel deu-se com todos os profetas; as suas visões ou ordens divinas não foram registradas na ordem em
que foram recebidas.
Ao profeta pareceu estar na cidadela de Susã, na província de Elão. Esta cidade é chamada noutras
passagens, de "fortaleza". Era a cidade de veraneio dos monarcas caldeus. A arqueologia já desenterrou ali
um palácio de mármore com os luxos de uma monarquia oriental. Foi ali que Nabonido veraneava, enquanto
o jovem Belsazar se banqueteava na capital, Babilônia. Parece certo que Daniel não estava lá, mas a visão lhe
foi dada como se ele lá estivesse.

Na visão viu um carneiro (v. 3) que estava diante do rio, e que tinha dois chifres, um maior que o outro, sendo
que o mais alto subiu por último. O carneiro dava marradas para o norte e para o sul. Era um carneiro
audacioso e valente. Estas marradas para toda parte simbolizam as guerras dos persas, que em pouco tempo
liquidaram o reino assírio e muitos outros povos orientais. Depois surge um bode (Alexandre), que vinha do
Ocidente (v. 5). Voando, não tocava o chão, tal a velocidade com que vinha. Atirou-se contra o carneiro
(Pérsia), feriu-o e quebrou-lhe um chifre. Lançou-o por terra, pisou-o debaixo das patas até o destruir. As
conquistas deste bode (Alexandre) foram fulminantes e não havia exércitos que lhe pudessem resistir. Os
amantes da história antiga podem confirmar a descrição de Daniel. Alexandre foi discípulo do grande filósofo
Aristóteles, de quem recebeu não apenas a instrução filosófica, mas o modo de vencer os inimigos. Conta-se
que ele, quando freqüentava uma escola na Grécia (era macedônio), costumava dizer que um dia se vingaria
das agressões dos persas, que, sendo senhores do mundo, ainda desejavam dominar a Grécia. As célebres
batalhas do passo de Dardanelos e a batalha naval de Salamina falam bem alto do tipo de guerra que os
persas, de 'tão longe, iam fazer à Grécia. A grande batalha naval de Salamina deu-se quando Xerxes, o
Assuero, marido de Ester, estava no governo. Tão logo Alexandre pôde convencer os gregos de que era
tempo de se desforrarem dos persas, reuniu tudo que tinha, e com uma coragem indómita atirou-se pelo
Oriente, nada estorvando a sua indómita coragem. Conta a história que havia numa cidade oriental uma
corda trançada e que aquele que fosse capaz de desfazer os nós seria o dominador de todo o Oriente.
Alexandre não perdeu tempo. Meteu a espada no "nó górdio", e cortou-o. Dali em diante nada lhe resistia.
Por isso, Daniel vê este bode como que voando rumo ao Oriente, tal a pressa com que se dispunha a
conquistar a velha Pérsia. Alexandre ficou imortalizado na história pela maneira como tratou o último rei dos
persas, por nome Dario, tomando-lhe as mulheres e filhas, e colocando-as numa tenda com guardas para as
protegerem e com ordem de matar quem quer que se aproximasse delas. Foi um guerreiro generoso que se
contentava em vencer o grande Império Persa, mas respeitava as mulheres do rei vencido.

Infelizmente, Alexandre se engrandeceu, como diz o profeta (v. 8), mas o chifre grande quebrou-se, saindo em
seu lugar quatro chifres menores. Depois de conquistar o Império Persa, estabeleceu o seu quartel general
em Babilônia, e lá, ou pelas orgias ou por outros motivos que a história ignora, morreu dez anos depois da
vitória. Compunham o seu estado-maior quatro generais, que na visão são representados pelas quatro pontas
pequenas. Morto o chefe, todos queriam tomar lugar, mas nenhum contava com o apoio militar para isso.
Depois de muitas lutas, decidiram dividir em quatro partes o império conquistado por Alexandre - Macedônia,
Trácia, Síria e Egito - cabendo cada uma a um general. Destas quatro partes, as que mais diretamente
interessaram à história dos israelitas foram o Egito, que coube a Ptolomeu, e a Síria, que coube a Seleuco. Os
outros dois, ou por estarem distantes ou por outros motivos, não interessaram a história. Mesmo ficando a
Síria ao norte e o Egito ao sul, era natural que nenhum outro se metesse no meio. De um dos quatro chifres
saiu um notável, de pequeno que era, tornou-se grande em poder (Antíoco).

Os versos 9-14 contam-nos em forma sintética um quadro dos mais tétricos da história atribulada de Israel,
história esta que gostaríamos de relatar aqui, mas é muito longa e triste. Por amor de uma breve informação
histórica, teremos de desenhar apenas alguns quadros, antes de passar adiante.

Ptolomeu I, sabendo que Seleuco tinha as suas vistas voltadas para a Palestina, adiantou-se a qualquer
tentativa do seu rival sírio, e, num sábado, invadiu a Palestina, onde foi recebido sem hostilidade. Ele, por sua
vez, também não cometeu qualquer brutalidade, convidando, até os judeus que desejassem, a ir para o Egito,
onde teriam tudo que quisessem. Lá já moravam muitos que tinham ido nos dias de Jeremias, e atualmente
estavam prósperos e bem situados. Muitos foram e lá ficaram. Ptolomeu II, o Filadelfo (285 a.C.), filho de
Ptolomeu I, continuou a boa política de seu pai, e os judeus continuaram a emigrar para o sul. Foi nesta
quadra que se deu a Versão conhecida como a Versão dos Setenta, cuja história, por ser longa, deixamos de
mencionar. A ela nos temos referido em muitos dos nossos livros.

Ptolomeu III, o Evergetes, continuou a política de seus antepassados, favorecendo em tudo os judeus, tanto os
que estavam na Palestina como os que tinham ido para o Egito. O seu sucessor, Ptolomeu IV, o Filopator, foi
obrigado a entrarem luta com Seleuco da Síria, e aqui começa a odisséia dos judeus. Vencendo os sírios,
voltou para o Egito, e na descida parou em Jerusalém e quis entrar no templo para ver o que estava lá dentro.
Os judeus em coro se levantaram contra ele, fazendo-o desistir, mas ao mesmo tempo criando uma
animosidade que não existia antes.
2. Os Selêucidas em Cena (8: 15-27)

Antíoco I e Antíoco II não molestaram os judeus nem se meteram na Palestina, mas Antíoco III era
megalomaníaco e ambicioso. Invadiu a Palestina, e os judeus, que já estavam desavindos com os Ptolomeus,
receberam-no como libertador, mal sabendo o que estava atrás de tudo. Para apaziguar os Ptolomeus deu a
sua filha Cleópatra em casamento a Antíoco Epifânio, prometendo-lhe como dote a Palestina, Celsíria e a
Fenícia, mas nada disso cumpriu. Durante o seu domínio na Palestina cometeu toda sorte de desatinos,
inclusive a de entrar violentamente no templo e oferecer uma porca no altar dos sacrifícios, com o que
cessaram os sacrifícios do templo, por ter sido profanado. Como nos informam os versos 9 e 10, era uma
pequena ponta que cresceu até atingir os exércitos dos céus, os palestinos, ofendendo até o Príncipe do
exército (Deus), dele tirando o sacrifício costumeiro por causa das transgressões (v. 12). O templo ficou
fechado por duas mil e trezentas tardes e manhãs, de 171-165 a.C., nos dias de Antíoco III, o Grande, e o seu
sucessor Antíoco IV, o Epifânio (ver Mat. 24:15).

Foram tais as atrocidades dos Antíocos, que os judeus se revoltaram, e uma família, a dos asmonianos, se
refugiou nas montanhas e desafiou o poder dos selêucidas. Dessa família nasceu o movimento apelidado de
"Macabeu", em que a família asmoniana enfrentou o poder dos Antíocos ou dos Selêucidas, desde 167 até
163, quando conseguiram fazer proclamar a independência da Palestina sob um governo nacional. A dinastia
de Davi foi assim restaurada, mas por pouco tempo, também porque as intrigas e invejas entre os próprios
judeus fizeram com que os romanos, a este tempo já com seus exércitos nos arredores da Palestina,
interviessem para apaziguar a contenda, mas com a mão de gato, para pouco depois anexarem a Palestina aos
seus muitos domínios. O tempo do fim (ou último tempo da ira, v. 19) não se refere ao fim de tudo, mas ao
fim das assolações dos Antíocos.

Assim, num breve bosquejo, procuramos dar a interpretação dos versos 9-14, que incluem um longo período
histórico, talvez o mais triste da história triste dos judeus. (História mais completa se encontra no capitulo 11.)

O próprio Daniel ficou tonto com a visão que não podia compreender, mas o atormentava. Foi então que se
apresentou diante dele um como homem, e ouviu uma voz de homem de entre as margens do rio Ulai, o qual
chegou junto dele para lhe interpretar o mistério, mas Daniel ficou mesmo sem entender o sentido de toda
aquela visão. Porém uma coisa ele entendeu. No determinado tempo do fim das calamidades dos Antíocos,
no tempo de Antíoco Epifânio, o feroz de cara e mestre em intrigas e mentiras (vv. 23-25), cessariam as
misérias previstas nesta visão.

A interpretação dada a Daniel pelo homem que veio para junto dele (era o mesmo Gabriel) já foi dada nas
linhas atrás. O templo foi depois purificado pelos Macabeus, que ressuscitaram todo o cerimonial antigo com
grande pompa, o qual bem poderia ter durado muitos anos, mas as fraquezas dos homens, a sua ambição,
não têm medidas, e sacrificam até os mais caros interesses nacionais e religiosos. Foi isso que aconteceu com
os judeus. Livraram-se dos Antíocos, mas caíram nas garras dos romanos, que dominaram a Palestina de 63
a.C. até 70 d.C., quando a cidade foi totalmente destruída e o templo arrasado. Se Daniel pudesse ter visto
todo este quadro lúgubre, que vai de 171 a.C., a 165 a.C., teria morrido do coração, pois era um patriota sem
igual. Ele ficou sem entender a visão, mesmo depois de explicada pelo homem que veio do rio Ulai. Ficou
doente por uns dias e depois se levantou para cuidar dos negócios do rei que estavam a seus cuidados. O
último tempo da ira não se refere ao fim de tudo, mas ao fim das perseguições dos Antíocos, como já foi dito
antes.

Uma palavra final a respeito da autenticidade deste livro. Se, como querem os críticos racionalistas, o livro é
produto de um Daniel dos dias de Alexandre, como poderia tal Daniel conhecer em minúcias a história
subsequente, que vai da morte de Alexandre em 323 até 165? Só mesmo Deus podia conhecer esta história.
(Os que desejarem informações mais minuciosas, podem ler o livro do autor Povos e Nações do Mundo
Antino, uma história do Velho Testamento, e o livrinho O Período lnterbipúico, do Pastor Enéias Tognini, que é
muito útil e informativo.)
III - A ORAÇÃO DE DANIEL E AS SETENTA SEMANAS DO MESSIAS (9:1-27)

Este capítulo compreende duas seções perfeitamente distintas, sem qualquer relação uma com a outra, a não
ser no fato de que foi em virtude da oração do profeta que o anjo Gabriel lhe trouxe a mensagem que se
encontra nos versos 20-27.

Se tivéssemos de medir o tempo que medeia entre a oração e o cumprimento da profecia dos últimos versos,
teríamos de partir da hora da oração até a eternidade pois as "setenta semanas do Messias" assim chamadas,
realmente penetram na eternidade. Não iremos, pois, tentar uma avaliação do tempo, mas dos fatos que se
relacionam com o mesmo tempo. Nem tampouco indagaremos por que Deus achou de mandar esta
mensagem ao seu profeta, coisa em que este não estaria pensando, pois a sua preocupação era a volta do seu
povo à terra desejada e a reconstrução do templo e da cidade. Todavia, nós agradecemos à divina
Providência esta admirável profecia, a única em todo o Velho Testamento que nos dá a medição do tempo nas
três etapas compreendidas nas sobreditas setenta semanas, até a chegada do Messias, sua vida e sua morte,
e as demais implicações desta gloriosa vinda.

1. A Oração de Daniel (9: 1-21)

A oração na vida de Daniel era um costume regular. No seu aposento de janelas abertas no rumo de
Jerusalém ele se encontrava com o seu Deus três vezes ao dia (6:1 0), não se devendo esquecer que
naturalmente o seu pensamento estaria sempre voltado para o seu Deus. Como homem desterrado de sua
pátria junto com o seu povo, era natural que esperasse de Deus uma solução para o caso. Isso o levaria a
viver em contínua oração, fora dos momentos aprazados ou costumeiros. Por isso também Deus o cumulou
de honras e privilégios, como talvez a nenhum outro. Pelo menos em relação a nenhum sabemos de tantas
comunicações divinas e tantas oportunidades de ser útil a seu povo e ao governo a que servia. Era homem de
oração. As honras do poder que os reis lhe conferiam não encheram o seu coração de vaidade, a ponto de se
esquecer que, afinal, era um desterrado e que só pela misericórdia divina poderia ter atingido as culminâncias
do poder público. Ele entendia bem o seu problema, e sabia que, não obstante o favor real, tinha ao seu lado
os inimigos, que não perderiam oportunidade para o destruir, se pudessem. Então, valia-se da oração, da
comunhão com o seu Deus, e nisso estava a sua força e vitória.

1) A data da oração (vv. 1 e 2)

A data desta oração está perfeitamente identificada. Foi no primeiro ano do governo de Dario, filho de
Assuero, da linhagem dos persas, ou seja, em 539 a.C. Noutras passagens já notamos que Babilônia caiu em
poder das forças coligadas dos medos e persas, forças que já tinham posto fim ao império ninivita. Ciro, que
era o chefe da coligação, teria continuado em campanha para dominar alguns focos de resistência ao invasor,
cabendo a direção dos negócios de Babilônia ao seu companheiro Dario. Já nos dedicamos a este fato noutros
lugares, pelo que nos sentimos desculpados por não darmos outros informes. Apenas diríamos que o nome
Assuero, que se julga ser mais um título que um nome propriamente, teria sido o inspirador de um outro
nome, bem familiar na história desta época, o Assuero, marido de Ester, a judia feita rainha, segundo o livro
de Ester. Em nosso estudo de Neemias e Ester damos amplas informações a respeito da controvérsia a
respeito deste Assuero.

Com a queda do governo de Nabonido, em que, parece, Daniel não tinha gozado das vantagens que tinha no
governo babilônico, ele volta à crista dos acontecimentos, pois a tanto nos leva a confissão do conhecimento
do novo reinante. Nesta oração parece evidente que a proclamação de Ciro, dando liberdade a todos os
cativos, tanto judeus como outros, ainda não teria ocorrido. Todavia, Daniel entendia, pelos livros (v. 2), que
o tempo da volta à mãe pátria estaria chegando. Os livros aqui referidos diziam respeito à profecia de
Jeremias quanto ao cativeiro de setenta anos, com a promessa da volta depois. Os setenta anos ainda não
estavam completos. Depende da interpretação que os diversos historiadores dão aos acontecimentos que
precederam a queda de Jerusalém. Alguns entendem que começa desde a guerra de Carquêmis, em que as
forças de Neco do Egito se bateram com as de Nabucodonozor, quando o mesmo Nabucodonozor se tornou
senhor da situação no Oriente Próximo em 608 a.C. Já se podia contar com o domínio babilônico, e, portanto,
com a queda de Jerusalém. Outros datam o cativeiro da primeira investida contra a Santa Cidade em 597,
enquanto ainda outros datam o período do cativeiro em 586 a.C., quando a cidade foi destruída. Assim, não
temos meios de computar exatamente os setenta anos. De qualquer sorte, para Daniel, de acordo com
Jeremias, o tempo estaria chegando, e ele se vira para o seu Deus, fazendo confissão de pecados e pedindo
misericórdia. Reconhece que o cativeiro foi uma lição necessária ao povo por causa das suas muitas
indignidades, o que se pode verificar na confissão do verso 8, em que ele declara que os fatos deveriam fazer
o povo corar de vergonha. Se todos os judeus teriam chegado a esta conclusão, não podemos afirmar, mas
os elementos mais piedosos, por certo, estavam convencidos de que os seus pecados é que tinham causado a
desgraça da nação.

1. A Oração de Daniel (9: 1-21)

2) Uma oração e confissão de pecados (vv. 3-9)

Orar sem confessar os pecados é hipocrisia. Também pedir a Deus favor sem reconhecer que dele é que vem
a justiça e que os nossos sofrimentos se derivam, não da ausência divina, mas dos pecados cometidos. Daniel
faz um histórico da dureza do coração dos seus antigos líderes e do seu povo. Temos pecado... e não demos
ouvidos aos teus servos (vv. 5 e 6). Quantas vezes Jeremias se avistou com os reis para os aconselhar a ouvira
Palavra de Deus! E uma vez ele foi com a promessa solene de Deus de que, se o povo ouvisse, continuaria na
terra (Jer 38:14-23). O espírito de rebeldia era de tal modo violento que nem a palavra do profeta nem as
promessas de Deus valiam. Então, não houve jeito, Jerusalém foi assolada, o templo destruído, e tudo
ocorreu como consta na história. Jamais se viu Deus tratando o povo com tanta brandura e tanto amor, e só
por amor da sua justiça é que se deu a calamidade.

Tudo isto veio agora ao coração e mente do profeta, que, em prantos, reconheceu a graça de Deus e sua
justiça, e a maldade do seu povo. A oração de Daniel é um dos tópicos mais tocantes da Bíblia: Senhor, a nós
pertence o corar de vergonha... ao Senhor nosso Deus pertence a misericórdia e o perdão (vv. 8 e 9). Depois
das muitas lamentações e reconhecimento de que a bondade de Deus é sem limites, e que, se tanto mal caiu
sobre Jerusalém, foi porque o povo e seus reis e profetas prevaricaram, o profeta vira-se para o Senhor e pede
que ouça a sua súplica.
Uma confissão que ignora os pecados cometidos não é confissão. Isso Daniel não esqueceu. Vale a pena
tomarmos esta oração como modelo de um pecador que se aproxima de seu Deus. Nada obstante, Daniel
também sabia que o seu Deus não era um castigador comum; era um Deus misericordioso, o que é
profundamente sentido por Jeremias, livro que Daniel conhecia bem.

3) Petição ao Deus misericordioso (vv. 10-21)

Agora, pois, ó Deus nosso, ouve a oração do teu servo (v. 17). Era o mesmo que dizer: Depois de tantos
sofrimentos, de tantas humilhações, ó Deus, torna para nós e sê misericordioso. Inclina, ó Deus meu, os teus
ouvidos... abre os teus olhos e olha para a nossa desolação e para a cidade que é chamada pelo teu nome (v.
18). Esta súplica reconhece que Deus ouve, que Deus vê, portanto, sendo um Deus diferente dos deuses que
eles adoravam antes do cativeiro, e mesmo dos deuses de Babilônia.

A pessoa divina é assim posta face a face com o adorador, como sendo duas pessoas, que se podem entender.
O verso 19 é uma súmula de reconhecimento do que Deus pode fazer em favor do povo e da cidade. Há três
verbos neste verso que merecem um bom sermão: "Senhor, OUVE, Senhor, ATENDE e Senhor, AGE, e faze
tudo isto depressa. Não te retardes."

Depois de suplicar por seu povo, como um intercessor verdadeiro, Daniel pede que Deus tenha compaixão da
cidade desolada, com os muros arrebentados, o templo destruído, talvez já tendo chegado o tempo de as
culpas terem sido expiadas. Confessa que, se tivessem feito as suas súplicas a Deus, ele teria mudado o curso
da história, e a realidade seria outra (v. 18). Deus então enviou o seu servo Gabriel, o homem, para instruir o
profeta a respeito do curso da História. Quantas vezes tinha este homem vindo a Daniel, não contamos, mas
muitas, e veio para instruí-lo não apenas no que estava sendo cumprido, mas no que estava ainda distante e
fazia parte da história do povo. Esta revelação é a única no Velho Testamento a respeito dos acontecimentos
que teriam lugar antes e depois da vinda do Messias. Compreende, pois, um período de mais de 400 anos,
como adiante veremos. Ele veio na hora do sacrifício da tarde, quando o templo estava funcionando. Aliás, a
petição de Daniel era quanto ao destino dos desterrados, mas Deus lhe deu uma visão das coisas atuais e das
futuras. Ao gosto deste autor, não há nada, em todo o Velho Testamento, igual a esta revelação, pois ela nos
leva ao Calvário e depois à Segunda Volta de Cristo, o Senhor. Compreende, então, vários milênios.
2. Análise e Interpretação (9: 22-24)

Alguns comentadores traduzem a semana como "setes", pois significa um período em sete partes, cuja
extensão, como já vimos, não é conhecida nem pode ser computada. Sê-lo-á um dia, mas não sabemos
quando. Nestas setenta "SEMANAS" de anos, muita coisa deveria ser realizada. Os judeus voltariam à sua
terra e reconstruiriam a cidade, pois o templo já estava sendo construído quando a visão foi dada. Estaria
pelo menos em vias disso. Os muros da cidade seriam devidamente reconstruídos, e o povo se prepararia
para uma das maiores realizações messiânicas. Nisso vemos o poder da oração. Daniel orou, e Deus deu a
resposta. Os setenta anos de exílio estavam no fim, e no dia em que Daniel teve a visão já a primeira leva de
judeus estaria na Cidade Santa para a reconstrução do templo e para tomarem tantas outras medidas, como
vimos nos livros de Esdras e Neemias (veja-se o Estudo deste autor sobre esses livros).

A oração de Daniel teve uma resposta que deve ser dividida em seis partes, três negativas e três positivas.
Vejamos estas partes do resultado da oração do grande homem de Deus:

1) Para extinguir a transgressão (v. 24). Esta transgressão era de fato muito grave e deveria ser extinta, sob
pena de ficar pesando para sempre sobre a consciência do povo judaico. Transgressão acumulada;
transgressões sem motivo e com motivo.

2) Dar fim aos pecados (v. 24). Esta é uma linguagem nova, com um sentido novo. O serviço sacrificial do
templo não tinha conseguido extinguir os pecados da nação e muito menos do mundo inteiro. Era, pois,
urgente que um novo sacrifício fosse oferecido, para que os pecados fossem eliminados. Uma permanente
maldição pairava sobre a cabeça da nação e do mundo, e não tinha havido meios de remover esta maldição.
Com o sacrifício que o Messias iria oferecer, seria lavada a culpa das maldições que Deus trouxe sobre a terra,
conforme o mesmo pai de Noé reconheceu (Gên. 5:29). A terra tinha sido amaldiçoada e até agora não tinha
havido sacrifício suficiente para remover esta maldição.

3) Expiar a iniqüidade (v. 24). Pecado e transgressão são termos levíticos que descrevem as várias fases da
conduta humana. Pecar é errar o alvo na vida, é não atinar com o destino que o bondoso Criador propôs a
cada um de nós. Transgressão é o ato de ultrapassar os limites impostos à conduta de cada indivíduo. Todos
erramos e transpomos os limites de nosso dever para com Deus e os semelhantes. Tudo isto seria
devidamente expiado, de modo que nem pecado, nem transgressão continuariam a pesar sobre a vida da
humanidade. Certamente que este sacrifício não seria efetuado no templo em Jerusalém, pois ali, com o
derramamento do sangue de touros e bodes, o pecado e a transgressão continuariam para sempre. Estes três
resultados são considerados negativos, porque tratam de remover pecados e transgressões existentes desde
o dia em que Adão pecou e trouxe a morte à terra com a sua transgressão. De então até a oração de Daniel
esta situação não tinha sido modificada, a despeito de tantos esforços, de tantos sacrifícios oferecidos,
sacrifícios que não podiam tirar os pecados. Apenas atendiam a um ritual que era um protótipo do grande
sacrifício que um dia seria oferecido. Em Levítico e através de todo o Velho Testamento, tudo que se vê é
apenas uma sombra das coisas futuras, como ensina o autor da Carta aos Hebreus.

A seguir, Gabriel dá a Daniel os outros elementos, que podem ser considerados positivos:

4) Trazer a justiça eterna (v. 24). Só Deus pode ter o meio de estabelecer a justiça eterna na terra. Só o
sacrifício do Messias poderia trazer para a terra os elementos de ' justiça colocados no coração humano por
meio do mesmo sacrifício do Messias e da operação do divino Espírito Santo no coração humano. Esta
atividade de trazer a justiça eterna à terra corresponde à primeira promessa de extinguir a transgressão.
Extinta a transgressão, seria estabelecida a justiça eterna. Uma coisa que se contrapõe à outra, pois,
enquanto durar a transgressão, não é possível haver justiça. Isso é o que a Bíblia ensina e a nossa experiência
confirma; os homens sempre sentiram a necessidade de estabelecer justiça na terra, mas, a transgressão
imperando no coração humano, não permite que a justiça opere. Há, em todos os povos modernos, um
aparelhamento de justiça que enobrece os seus inventores: tribunais inferiores, tribunais superiores e
tribunais supremos. Em nossa terra e em muitas outras há um ou mais tribunais; depois tribunais de alçada,
tribunais de recursos e, finalmente, a cúpula jurídica, com o Tribunal Supremo. Afora isso, um aparelhamento
policial que consome milhões de milhões de cruzeiros, homens aos milhares de milhares, incumbidos de fazer
prevalecer a justiça, mas tudo com resultados precários. O pecado continua e a injustiça também, e então, se
o estrago vem debaixo, lá em cima não pode haver remédio total. De qualquer modo, somos gratos aos
princípios da Bíblia que trouxeram todo este aparelhamento à humanidade. Se não fosse isso, ai de nós
todos!

5) Selar a visão e a profecia (v. 24). O Velho Testamento atesta o esforço divino em conduzir os homens a
Deus, e na oração de Daniel tomamos conhecimento da sua queixa de que, por causa das iniqüidades do
povo, dos juizes e dos sacerdotes, nunca a palavra de Deus prevaleceu. Os profetas aí estão como
testemunhas do esforço divino na restauração da humanidade, mas nem mesmo aqueles a quem foram
enviados deram ouvidos às suas reclamações. Os judeus são réus de transgressão dos mandamentos de Deus,
porque' a nenhum outro povo foram enviados tantos homens com tantas mensagens boas como a Israel por
meio dos profetas. Depois de um castigo tremendo, o povo foi levado em cativeiro para uma terra estranha, e
foi justamente por causa da rebelião contra os profetas do Senhor. Agora, com um novo sacrifício seria selada
a visão e a profecia. Não mais homem algum se levantaria para dizer: ASSIM DIZ O SENHOR. Efetivamente,
depois de Malaquias não se ouviu mais ninguém proclamar a mensagem de Deus. Por mais de quatro séculos
os judeus esperaram por uma palavra lá de cima, mas ela não veio. Quando João Batista apareceu no deserto
da Judéia, proclamando o batismo do arrependimento, muitos disseram: "Finalmente o Senhor visitou o seu
povo." A profecia e a visão foram seladas; foram terminadas. João Batista foi o último dos profetas, mas a sua
missão especial foi servir de abridor do caminho para o Messias poder passar. O Velho Testamento chegou ao
fim. Foi selado, fechado, e ninguém mais podia dizer: "Tive uma visão do Senhor." Estava tudo selado.

6) Para ungir o Santo dos Santos (v. 24). O templo dos judeus tinha três compartimentos. O lugar dos
sacrifícios, o lugar do incenso e o "Santo dos Santos", onde o sumo sacerdote entrava apenas uma vez no ano,
no dia da expiação nacional, com o sangue do bode "expiatório". Agora, conforme esta visão, o Santo dos
Santos iria ser ungido com o sangue do Messias, mesmo que o texto não diga assim. A frase é um pouco difícil
no texto hebraico, que significa "uma santidade de santidades", mas a tradução portuguesa é bem clara e
instrutiva. Sabemos que, tão logo o sacrifício do Calvário foi oferecido, o véu do templo que separava o lugar
santo do lugar santíssimo se rompeu de alto a baixo, como a indicar que agora qualquer pessoa podia entrar
livremente no Santo dos Santos, que é o Senhor Jesus Cristo. Esta é a lição do rasgamento do véu do templo.
Não há mais lugar privilegiado para sacerdotes oferecerem sangue alheio, pois Cristo entrou, uma vez por
todas, no Santo dos Santos e ofereceu um sacrifício válido para sempre (Carta aos Hebreus). É isso que a visão
de Daniel indica, que o Messias ungiria o Santo dos Santos (v. 24). Somos gratos ao bondoso Deus pela graça
que concedeu a esta pobre humanidade, oferecendo-lhe um sacrifício completo e final.

São estas seis declarações que constituem a mensagem de Deus ao seu servo Daniel. Tudo isto se deu por
intermédio da oração. A oração é o meio único que temos para que Deus abra os céus e faça descer a sua
bênção sobre nós.
3. Os Prazos da Realização da Visão - As Setenta Semanas (9: 25-27)

1) Desde a saída da ordem (v. 25).

Deve entender-se a ordem de Deus, e não qualquer edito ou determinação real por parte dos governantes.
Esta ordem pode relacionar-se com Ciro em 538, seu primeiro ano de governo, ou com Artaxerxes Longímano,
do qual Neemias teve permissão de ir a Jerusalém reconstruir os muros do templo (464-424). Entre os dois
períodos há um número de 74 anos, o que não significa muita coisa em relação a um longo período descrito
na visão. Do ponto de vista do término do período do exílio, nenhuma destas datas é significativa. Entre 585
a.C. e a saída do edito de Ciro medeiam 47 anos, e entre 585 e 464, cento e vinte e um anos. Portanto,
nenhum destes pontos de partida pode ser tomado como término do período do exílio. Deve ter-se em
mente que o cativeiro começou em 597, mas houve três deportações, em épocas diferentes, assim como
houve três voltas em épocas diferentes. Um termo médio é o que temos de procurar, e isso também não é
irrelevante. O que interessa para nós agora é a saída da ordem divina e a computação do tempo até o
Messias. Possivelmente, a saída da ordem divina deve coincidir com a ordem de Ciro de libertar os cativos em
538 a.C.

3. Os Prazos da Realização da Visão - As Setenta Semanas (9: 25-27)

2) Interpretação do texto.
Poucas escrituras oferecem tantas modalidades de pensamento e de interpretação como esta, e não poucos
têm tropeçado nesta interpretação. Oferecendo ao leitor o que nos parece ser a exatidão do mesmo texto, o
fazemos com um prazer todo especial, pois trata-se, nada mais, nada menos, de vislumbrar os tempos
gloriosos da primeira vinda do Senhor e também da segunda, coisas realmente muito queridas ao
pensamento cristão. Tanto da primeira, quando trouxe a expiação dos pecados e a expiação das iniqüidades
humanas, que veio estabelecer um reino onde a justiça seria a marca registrada do novo programa divino,
como da segunda, que veio trazer-nos a segurança de que, depois de fazer tudo isto, voltaria para levar
consigo todos que tivessem vivido conforme as normas preestabelecidas. A segurança da sua Segunda Vinda,
de que se ocuparam os escritores do Novo Testamento de muitas maneiras, vinda também prometida pelos
anjos quando ele foi assunto ao céu (At. 1:11), é um fato. Pois tudo isto, e muito mais que se poderia
escrever, está incluso neste maravilhoso texto de Daniel em dois versos apenas.

O anjo foi categórico, ao dizer a Daniel: Sabe e entende: desde a saída da ordem para restaurar e para edificar
Jerusalém, até o Ungido, o Príncipe, SETE SEMANAS; e em sessenta e duas semanas as praças e as
circunvalações se reedificarão... (v. 25)

A cidade que havia sido destruída por Nabucodonozor deveria ser reedificada dentro de sete semanas de
anos, como realmente se interpreta o texto. Eram então 49 anos. Zorobabel, acompanhado de um grande
número de exilados, já estava dando início a esta reconstrução, conjuntamente com a construção do novo
templo. Possivelmente Daniel não saberia em que estado estariam as coisas a este tempo e o que estariam
fazendo os exilados que haviam deixado Babilônia. Uma palavra, pois, de consolo para o profeta estava em
ordem. Neste cálculo está também a reconstrução dos muros da cidade, obra a que se consagrou Neemias,
por ordem de Artaxerxes Longímano em 464-424. Parece-nos que estes 49 anos seriam sufucientes para dar à
cidade destruída um novo aspecto. A expressão até o Ungido deveria vir depois da e em sessenta e duas
semanas, mas a ordem em que a revelação se encontra não altera em nada o sentido.
3) O período intermediário.

Depois das sete semanas, ou sete "setes", como também se interpreta, viriam as sessenta e duas semanas
para que as praças e circunvalações se reedificassem. Naturalmente, entende-se que estas sessenta e duas
semanas não se referem a Jerusalém, pois esta já estaria devidamente reparada. Referem-se ao período que
vai das sete semanas até o fim do Velho Testamento ou até a chegada do Messias (Ungido). São, então, 62 X
7 ou 434 anos, precisamente o período que abrange o resto da dispensação antiga conhecida como Período
Intermediário, em que não houve revelação alguma da parte de Deus. Se alguma diferença houver, será de
pouca valia, pois tratamos com períodos grandes e algarismos redondos. Assim, Daniel ficou informado de
que depois da restauração da sua querida cidade ainda um longo período esperaria a chegada do "Desejado
dos povos".

Esta reconstrução, digamos assim, seria efetuada em tempos angustiosos. Assim aconteceu. No capítulo 11
desta profecia estudaremos mui sucintamente o chamado período ptolemaico e selêucida. Foi um período
angustioso, aqui devidamente previsto pelo anjo Gabriel. Os que desejarem maiores informações do que as
que daremos devem munir-se de outros compêndios de história, para um conhecimento mais perfeito deste
angustioso período.

Depois das sessenta e duas semanas deste segundo período, não incluindo as sete anteriores, o MESSIAS seria
morto. O Messias nasceu em 5.a.C, e morreu aos 33 anos de idade. Portanto, este período está incluído nas
62 semanas já referidas. Tudo devidamente previsto e profetizado, como quem estivesse presente a tudo
que se passou neste longo estágio da história do povo hebreu.

Vemos, então, que as sete semanas e mais as sessenta e duas não perfazem o total de setenta. Falta uma.
Como interpretar esta falta de uma semana?
4) A era dos gentios.

Entendemos que com a morte de Cristo Deus interrompeu a história da revelação ao povo hebreu, uma vez
que o Messias foi rejeitado pelo povo a quem foi mandado (Mat. 15:24). O Messias fazia parte da Aliança
feita entre Deus e o povo hebreu, mas, uma vez que o rejeitaram, Deus sentiu-se desobrigado das injunções
desta Aliança, e deu o Messias a outros povos também, já previsto nos ensinos de Jesus. Veio então o período
dos gentios, a que Paulo, em Romanos 11:11 se refere: Pela sua transgressão veio a salvação aos gentios...
Vemos, pois, que a rejeição do Messias por parte dos judeus foi a oportunidade de os gentios ouvirem o
evangelho. Sobre este aspecto da revelação há uma enorme soma doutrinária, que envolve a maior parte dos
ensinos do apóstolo Paulo. Jesus mesmo deu ênfase a este aspecto da sua missão quando disse que tinha
ainda outras ovelhas, não deste aprisco (João 10:1 6). A gloriosa mensagem de João 3:16 já prevê a salvação
do mundo e não apenas dos ' judeus, pois o Concerto do Sinai só contemplava a nação israelita e ninguém
mais, de onde se conclui que, se os judeus aceitassem o Messias, nós, os pobres gentios, estaríamos
condenados à perdição eterna.

Esta semana, pois, está reservada, digamos assim, para os últimos dias da história deste mundo. Nós, os
gentios, estamos no ápice das sessenta e nove semanas, e a última será vivida nos trágicos dias do anticristo,
de que trataremos adiante.

5) Quem será o anticristo?

Quem será o povo de um príncipe, que há de vir? Aqui os intérpretes deste magno assunto se dividem, por
falta de base histórica para fazerem afirmações. Nós mesmos nos sentimos em dificuldade para opinar.
Todavia, não é possível deixar os leitores sem uma palavra que ao menos expresse opinião. Noutra página já
aludimos à organização de um novo império, que se está formando e que se pressupõe ser o substituto do
Império Romano desaparecido há séculos. O Mercado Comum Europeu, composto de dez Estados, ao ver de
muitos intérpretes, representa o sonho de Daniel cap. 7, onde aparece um animal com dez chifres,
correspondentes a dez reis, sendo que no meio deles se levantará outro, o qual será diferente dos primeiros...
(Dan. 7:24). Acredita-se que estes dez reis sejam uma representação dos dez Estados Europeus, que
constituem o grande império que há de surgir. Deste império surgirá um elemento, que representará a
pequena ponta que falava com insolência (Dan. 7:8). Será este o "príncipe" que há de destruir a cidade e o
santuário, e o seu fim será num dilúvio (v. 26). É possível que João se refira a este personagem, aliado à besta
que sobe do mar (humanidade), e que proferia arrogâncias e blasfêmias, tendo-lhe sido dada autoridade para
agir quarenta e dois meses (Apoc. 13:1-6). A diferença entre estes quarenta e dois dias e uma semana de
anos (Dan 9:27) não é grande, sabendo-se que estas datas e figuras são sempre coisas muito relativas em
relação com a doutrina a ser expressa.

Quem quer que seja este príncipe que há de vir... ele fará firme aliança com muitos por uma semana; na
metade da semana fará cessar o sacrifício e a oferta de manjares; sobre a asa das abominações virá o
assolador, até que a destruição, que está determinada, se derrame sobre ele (v. 27; Mat. 24:15).

6) Uma interpretação do sagrado texto - O MILÊNIO A VISTA.

Todos os cristãos estão com os olhos fitos no céu, esperando o cumprimento da promessa da Segunda Vinda
do SENHOR tal qual foi assunto ao céu (At. 1:11). Segundo muitos estudiosos, esta Segunda Vinda está
próxima. Não é lugar para entrarmos em apreciações de natureza demográfica ou social, mas nós temos
opiniões que não escondemos, e assumimos a responsabilidade delas. Tudo está a indicar que o ano 2000
verá o fim deste estágio da humanidade. A fome, a peste, os terremotos, o desassossego universal, guerras e
mais guerras, tudo isto se enquadra, de modo geral, nas palavras de nosso Senhor em Mat. 24:1-31,
especialmente o verso 15 e ss. Jesus não deixou o seu povo na ignorância das coisas do fim. Apenas o nosso
apego a esta vida nos tolhe a razão para apreciarmos os fatos que se vão desenrolando em nossos dias. Por
tudo que Jesus ensinou e por tudo que a história atual da humanidade nos ensina, estamos às portas do
grande evento, que culminará com o arrebatamento da Igreja. Este arrebatamento é que dará origem ao
cumprimento das profecias de Daniel, como acabamos de ver. Nós não podemos estudar uma escritura,
ignorando as outras. Portanto, somando tudo que Daniel nos ensina e tudo que Jesus disse, podemos
assegurar que o tempo está próximo. Não damos as datas, mesmo porque este não é nosso feitio, mas a
figueira já está adquirindo as folhas novas (Mat. 24:32). É só isso que ousamos afirmar.

7) A ressurreição.

Nesta segunda vinda, Cristo ressuscitará a sua Igreja e a levará ao seu encontro nos ares. Paulo, em I Tess.
4:13-16 e 1 Cor. 15:35-49, afirma que Cristo, na sua Segunda Vinda ressuscitará os seus crentes, e os que
estiverem vivos serão transformados e todos juntos irão ao encontro do Senhor nos ares. Sobre isto não há
dúvida. Paulo vai mais longe e afirma que todos devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que
cada um receba conforme o que fez por meio do corpo, o bem ou o mal (II Cor. 5:1 0). Este encontro nos ares
com Cristo ocorrerá logo depois da ressurreição e é o que alguns intérpretes afirmam ser um "peneiramento
da Igreja". Esta é a semana que faltava.

Conforme Daniel ainda o príncipe que há de vir fará firme aliança com muitos por uma semana (de anos).
Acredita-se que então se cumprirá o que Paulo afirma em II Tess. 2:3,4. "0 homem do pecado" deverá ser este
príncipe arrogante e blasfemo, que fará aliança com os judeus, que a este tempo estarão convencidos de que
o seu Messias está para vir (não é o nosso Messias ), e também a este tempo já estarão firmemente
estabelecidos em Jerusalém e se unirão por meio de uma firme aliança. Juntos construirão o templo, e o
mundo verá grandes e maravilhosas coisas, pois o príncipe fará grandes milagres e prodígios, ajudado pela
besta e o falso profeta (Apoc. 13:11-18). O número do "homem" aqui está e é 666.

Depois de três anos e meio, ou seja, na metade da semana (Dan. 9:27), o príncipe denunciará ou repudiará a
aliança, em virtude da recusa dos judeus de lhe prestarem culto e o adorarem, pois ele se entronizará no
templo como se fosse o próprio Deus (II Tess. 2:4), e, pela recusa dos judeus, descarregará contra eles todo o
seu furor. Conjuntamente com esta perseguição do anticristo, Deus derramará as pragas constantes de
Apocalipse 15, de modo que aqueles dias serão uma cópia do inferno na terra. O que serão não há linguagem
capaz de descrever. Basta o que Daniel diz: guerra e desolações são determinadas. Estarão, pois, completas
as 70 semanas.
No final desses três anos e meio, Cristo desce com a Igreja, para tomar conta do seu reino, e encontrará o
mundo em fogo. Muitos já morreram de fome, porque quem não adorasse a besta não poderia comprar nem
vender; e muitos morreram das pragas e das perseguições. Naturalmente, o anticristo fará oposição e guerra
a Jesus e dar-se-á. então a batalha do Armagedom (Apoc. 16:16). Os que morrerem pelo testemunho de
Cristo serão ressuscitados e juntos comporão o grupo dos salvos, mas não farão parte da Igreja.

Conjuntamente com a guerra do Armagedom, será aniquilado o exército amarelo, vindo do Oriente e que
atravessou o Eufrates, depois, que a sexta praga caiu sobre ele e o secou (Apoc. 9:16). Há quem acredite que
a China já está em preparativos para mandar este enorme exército para o Ocidente.

É bom advertir o leitor de que não estamos fazendo um estudo a rigor do Milênio e suas implicações, estamos
apenas apreciando o capítulo 9, versos 26 e 27 de Daniel. Há muitos tratados bons a respeito do Milênio, e
com fundamento especial sobre o Apocalipse de João. E, sem dúvida, um estudo interessante, e que diz
respeito, muito de perto, à esperança da volta de Cristo.

8) A guerra de Gogue e Magogue (Ez. 38 e 39).

Há intérpretes que admitem esta guerra se dar conjuntamente com a de Armagedom, mas nós temos opinião
diferente, baseados em Apocalipse 20:7-1.0. A Guerra de Gogue e Magogue será o último capítulo da história
da humanidade, e, pelo ensino do Apocalipse, nenhuma relação tem com a guerra do Armagedom.
IV - REVELAÇÃO PREPARATÓRIA (10:1-11:1)

No terceiro ano de Ciro, rei da Pérsia, foi revelada uma palavra a Daniel... (10:1). Não se sabe se o terceiro
ano de Ciro compreende os dois anos de governo de Dario, mas parece que não, a menos que se considere
coincidente o reino de Dario com o de Ciro, pois não eram reis independentes um do outro, mas reis que
governavam conjuntamente. Se esta interpretação estiver correta, então Ciro estava agora no terceiro ano de
governo do Império Medo-Persa. Os judeus, guiados por Zorobabel, já estavam em Jerusalém, fazendo
preparativos para a construção do templo, pois foram liberados no primeiro ano do reinado de Ciro. Daniel
estava de tal modo ligado aos interesses do governo que nem aparece nas crônicas do tempo, e nem uma
palavra há sobre a liberação do seu povo. Convém ainda observar que Daniel não escreveu um livro de
história, mas alinhou uma série de visões recebidas, e as colocou fora da ordem em que foram dadas. Cada
capítulo considera ou um sonho ou uma visão, sem qualquer relação com a história corrente. E bom notar
esta singular maneira de Daniel nos dar as suas visões, mencionando apenas o ano em que tal ou qual rei
dominava em Babilônia. Se ele nos desse um retrato das condições do povo no cativeiro, então o seu livro
teria outro sabor histórico. Não deu, e nós nos contentamos com o que temos, e até nos parece que, se nos
faltasse o livro de Daniel, nos faltaria um grande informativo histórico daqueles longínquos dias. Não fazemos
parte da escola que procura tirar o miolo da história de Daniel e nos oferece o resto, a casca. Para nós, e é
bom reafirmarmos este princípio, o que Daniel nos deixou é um retrato insubstituível, pois que a nenhum
outro profeta Deus deu tantas informações preciosas sobre a história corrente e do porvir. Haja vista, para
ilustrar, a história das guerras dos selêucidas e ptolomeus, cujos contornos só se encontram em Daniel.
Entretanto, elas cobrem um período longo da história dos judeus, história que todo estudante da Bíblia
aprecia e deseja conhecer.

Esta visão e a do capítulo seguinte, que separamos por amor à clareza, foram umas das que mais aterraram o
profeta. Ele entrou em contato com um personagem celestial, num dia aprazado e certo, o vinte e quatro do
primeiro mês (v. 4), quando o personagem celeste apareceu. Por três semanas não comeu carne nem bebeu
vinho, e nem óleo passou em sua cabeça, sinal de profundo pesar e sofrimento. A descrição que Daniel nos
dá do homem à beira do rio Tigre é descrição indefinível, parecida com aquela outra que João teve,
encontrada em Apoc. 1:14-20. Deve ser o mesmo personagem, o revelador dos segredos divinos.

A visão foi de tal ordem que Daniel ficou doente e sem poder cuidar dos seus negócios, os negócios do rei a
quem servia. No ano terceiro significa que Daniel, como temos feito notar, por vezes, continuou em Babilônia
mesmo depois do exílio. Por que ele não veio com os seus compatriotas, junto a Zorobabel, não sabemos. Ele
estava de tal modo identificado com as coisas em Babilônia que o seu zelo pela Santa Cidade não o impeliu a
voltar. Nessa altura, três anos depois da primeira volta, ele sabia que os seus compatriotas estavam às voltas
com a construção do templo, e isso lhe deveria tocar o coração sobremodo. Não parece que ele teria ficado
em Babilônia para ajudar a resolver quaisquer dificuldades que surgissem, porque a situação política era de
todo favorável aos judeus, e seria desnecessária qualquer interferência especial a seu favor. Dificuldades
surgiram mais tarde, depois da morte de Ciro, quando Cambises, chamado Assuero, tratou de impedir a
continuação do templo, do que tratamos longamente quando escrevemos sobre Esdras. Não nos consta que
Daniel tivesse intervido nessa situação. Também não sabemos muito da sua situação depois da morte de Ciro
e da subida de Cambises, ou o falso Smerdis ao poder, mas parece que sua estrela declinou depois da morte
de Ciro. Houve um período de incertezas no império nessa época, com a subida de Cambises ao poder, o
qual, ao que parece, não seria muito favorável aos judeus, pois até mandou parar as obras da construção do
templo. Daniel não se interessou em nos dar um relato da situação política do Estado, mas apenas das suas
revelações. Para não perder a sua identidade com o seu povo, ele continua a usar o nome caldeu de
Beitessazar. Com este nome ele continuaria a ser conhecido entre o povo, pois sabemos que muitos judeus
não voltaram à sua terra, bem estabelecidos que estavam na nova pátria, com altos negócios, que os
impossibilitaram de voltar, arriscando o certo pelo incerto. Em Babilônia a situação só se acalmou com a
subida ao poder de Dario e Artexerxes Longimano, que foram grandes amigos dos judeus. Perguntamos outra
vez: Por que Daniel não foi assistir à inauguração da casa do Senhor, pela qual ele tinha suspirado tanto? São
coisas que vêm à nossa mente e que não têm resposta. As notícias seriam levadas a Daniel e ele saberia de
tudo, mas, por motivos que ignoramos, declinou da viagem, que seria penosa para ele, pois agora estaria bem
idoso. Nem agora voltara nem mais tarde, com a vinda de Neemias, quando tudo era favorável aos judeus.
Tem parecido a alguns estudiosos que os negócios da Pérsia o prendiam demais, e ele não se sentia com
ânimo de pedir dispensa para ir à sua terra. Pelo que tudo indica, lá ele foi sepultado e no último dia
resplandecerá como estrela de primeira grandeza, com a ressurreição dos justos (1 2:3). Enquanto muitos se
levantarão na sua terra natal, ele se levantará numa terra estranha, para se reunir ao grande grupo agora dos
"sem terra", de que ele falou tão eloqüentemente. Ele será um "dos que a muitos conduziram à justiça" e
"resplandecerá como o fulgor do firmamento".
Na revelação anterior, Daniel ficou doente e a custo se levantou para cuidar dos negócios do rei (11:1). Esta
revelação, pelo seu porte e significado, deveria tê-lo amedrontado, pois a tal ponto vai dita revelação que até
a nós, que estamos familiarizados com a história daquela época, causa medo. Foi talvez a luta mais sangrenta
de todas que se feriram no Oriente naqueles dias, quando dois Estados, resultantes do Império Alexandrino,
mediram as suas forças, se defrontaram com poderosos exércitos, e em Que a sofredora cidade de Jerusalém
viu alguns dos seus piores dias. Os selêucidas e ptolomeus, na disputa de poder naquela área, mediram suas
forças a troco de quase nada. A guerra seria prolongada e dura. A outra guerra, mencionada no capítulo 8,
seria apenas um prelúdio desta. Esta é a descrição completa do que foi a luta entre os ptolomeus e os
selêucidas.

No capítulo 8, Daniel viu uma imagem da luta. Um carneiro com dois chifres, os reis da Média e da Pérsia
(8:20), e um bode peludo (8:21), que era o grande Alexandre. Este morreu pouco depois e o seu vasto
império foi, após muitas lutas entre os diversos generais, dividido em quatro partes: Trácia, Macedônia, Egito
e Síria (8:22). De uma ponta nasceram quatro, e uma foi terrível e sanguinolenta.

Uma pergunta inocente: Por que morreu Alexandre tão prematuramente? Quanto bem poderia fazer a este
mundo tão carente de grandes homens! Nós, amantes da história, não podemos deixar de lamentar o
desaparecimento prematuro de um homem do estofo de Alexandre, o Grande. Todavia, o Diretor da História
sabe por que ele morreu tão cedo, no começo da sua obra civilizadora. Quem sabe que caminhos lhe
adviriam, se vivesse, e que talvez até obscurecessem a sua glória guerreira e conquistadora. A nossa
admiração pelo governo medo-persa, por sua superioridade social e política, já foi expressa por mais de uma
vez. Alexandre consolidaria um império com uma cultura nova, uma filosofia diferente e que bem poderia dar
ao mundo outro colorido, além do que deu mesmo com a sua morte. Poderia também ser o contrário. Quem
sabe?

Voltando nosso pensamento para a visão de Daniel, notamos que os homens que estavam com ele nada viram
nem ouviram senão a ele. A visão era para ele, e só ele. Caso parecido temos na visão de Paulo, no caminho
de Damasco, cuja visão era só para ele; para os outros apenas o terror. O mesmo Jesus que apareceu a Paulo
apareceu a Daniel. A vestimenta de linho fino, a veste celeste, ombros cingidos de ouro puro, o seu corpo
luzente como berilo, o rosto como um relâmpago, os olhos como tochas de fogo, os braços e os pés luziam
como se fossem de bronze polido, e a sua voz como a voz de muitas águas. Isso tudo não era apenas o
suficiente para aterrar Daniel, mas para o matar. Porém o fim não era matar, e, sim, dar entendimento. Foi
assim que certa mão o tocou e o pôs de pé e lhe deu um título raras vezes dado a um ser mortal: DANIEL,
HOMEM MUITO AMADO (v. 1 1). Animou o profeta e pediu que estivesse atento ao que ia ouvir, declarando
que desde o primeiro dia em que Daniel aplicou o seu coração em oração a Deus é que o personagem veio:
mas o príncipe do rei da Pérsia me resistiu por vinte e um dias; porém Miguel, um dos primeiros príncipes,
velo para ajudar-me, e eu obtive vitória sobre os reis da Pérsia (v. 13). Quem seria este príncipe que resistiu
ao personagem celeste ao ponto de carecer da ajuda de Miguel? Eis uma pergunta difícil de responder.
Haverá alguém ou alguma coisa capaz de obstara obra divina? Há. Satanás, que aqui aparece como príncipe
dos reis da Pérsia, atrapalhou a obra de Deus e a tem atrapalhado muitas vezes. Ele tem muito poder e muita
liberdade no reino moral em que vivemos, e Deus, até o poderia destruir com o sopro da sua boca, não o faz
agora; sã fará no fim de tudo (Apoc. 20:10). De qualquer maneira somos informados da obra destruídora de
Satanás, que se coloca na frente do seu Criador para atrapalhar a obra da revelação.

Vencido Satanás, o Senhor deu a Daniel a chave dos mistérios do porvir, para que o seu povo não fosse
colhido de surpresa e na ignorância. Nós não sabemos se o povo, de modo geral, teria tomado conhecimento
destas revelações, mas admitimos que os anciãos da nação não estariam ignorantes das ocorrências da
comunicação celeste.

No término da revelação, o personagem pergunta: Sabes por que eu vim a ti? Eu tornarei a pelejar contra o
príncipe dos persas; e, saindo eu, eis que virá o príncipe da Grécia (v. 20). Tudo isto é muito misterioso para
nós, mas está escrito, e aceitamos a escritura, mesmo que muita coisa escape à nossa inteligência. A
declaração que se não fosse o príncipe Miguei que esteve a seu lado, contra aqueles (v. 21), é prova muito
enigmática.

O restante da visão encontra-se no Capítulo 11, e dele nos ocuparemos no estudo seguinte. Depois da visão,
Daniel se levantou do seu abatimento e foi servir aos negócios do novo Estado, especialmente para animar o
velho Dario, que acabava de tomar o poder em Babilônia (11:1).
V - A GRANDE REVELAÇÃO SOBRE A HISTÓRIA FUTURA

GRANDES ACONTECIMENTOS (11:2-12:1)

O capítulo 11 é a continuação do 10. Por motivos de esclareci mento é que fizemos dos dois um capítulo. O
verso 1 do capítulo 11 é uma explicação pessoal a respeito dos seus deveres como funcionário público, mas
logo passa à grande revelação do homem visto nas margens do rio Tigre (10: 5,6). Foi este personagem divino
que deu a Daniel os dados históricos a respeito do grande conflito entre os selêucidas e ptolomeus, pois só ele
sabia o que ia acontecer séculos futuros. Esta visão pode ser comparada com a que João teve no Apocalipse
(1:12-16). O Jesus pré-encarnado entendeu de informar ao seu ministro a respeito dos grandes
acontecimentos futuros, em que o seu povo se veria envolvido sem ter procurado a contenda. Faremos a
nossa análise a mais simples possível.

Alguns escritores modernos, que procuram bruxas no escuro da noite, bem poderiam olhar para estas visões e
verificar que sempre houve visões e manifestações celestes, sem termos de aceitar que eram criaturas de
outros mundos. Deus nunca ficou sem testemunhas e sem manifestações, e algumas destas são atualmente
interpretadas à moda racionalista, que nenhum sentido tem para a vida espiritual da pobre humanidade. Esta
visão e a mensagem que trouxe têm muita aproximação com a visão do capítulo 8, de que já tratamos, mas
como esta era muito mais grave que a outra, então o próprio Deus veio trazer a Daniel os fatos que tanto iam
interessar ao seu próprio povo.

Uma guerra longa. Esta longa guerra foi ainda um dos resultados da morte de Alexandre, com a conseqüente
divisão do seu próprio império entre os seus quatro generais principais. A palavra usada no texto é guerra
mesmo, pois a palavra hebraica, sabá, tem este sentido aqui. Em alguns textos cuneiformes tem o sentido de
tempo, mas não aqui. Seria uma guerra de tal porte que o próprio Filho de Deus se abalançou a vir dar ao
profeta uma introdução do que seria a guerra dos selêucidades e ptolomeus. Esta não foi a primeira vez que
Deus baixou à terra para fazer comunicação idêntica ou semelhante. Os que desejam tirar vantagens destas
comunicações divinas e lhes falta o senso da medida levam tudo para o terreno das coisas astrais, mas Deus é
o Senhor desta terra e do seu povo, e sente-se desejoso de antecipar, aos seus videntes, os acontecimentos
futuros. Isso aconteceu no caso de Sodoma e Gomorra, e cidades da planície, e aconteceu muitas outras
vezes. Deus é o Deus da Revelação e também é o Deus do amor e da misericórdia, e não deixa nem o seu
povo nem o mundo, como um todo, na ignorância de muitos fatos futuros. Devemos entender esta visão e a
revelação que ela traz como uma demonstração providencial de Deus.

1. O Prelúdio do Grande Conflito (1 1: 2-4)

Antes desta guerra, quatro reis se levantariam na Pérsia. Estes deveriam ser Ciro, Cambises, Smerdis e Dario
Histaspes, que já consideramos quando estudamos o livro de Neemias. O quarto rei deveria ser um grande
monarca, rico, poderoso e mudado, conhecido como Assuero, o Xerxes, marido de Ester, a moça hebraica
escolhida para rainha (ver Ester 2:1-23). Foi o período mais rico da história da Pérsia, quando as naus persas
afrontaram os gregos, na batalha de Salamina. Portanto, tinham ainda de passar muitos dias antes que a
revelação se realizasse e nem Daniel chegaria a vê-Ia.

Depois destes reis e ainda outros, se levantaria um rei poderoso (v. 3) o que deve referir- se a Alexandre.
Efetivamente, Alexandre, em sua curta carreira e curta vida, fez o que quis e entendeu, mas o seu reino seria
arrancado e passaria a outros, fora dos seus descendentes (v. 4). Assim foi. Depois da morte do grande
guerreiro, nenhum havia com a dignidade e capacidade de o substituir, e todos se julgavam capazes e dignos.
Foi um período de lutas internas entre os próprios generais de Alexandre, até que, finalmente, concordaram
em dividir o império em quatro partes. O Egito coube a Ptolomeu, a Siria, a Antíoco (Seleuco), a Macedônia, a
Cassandro, a Trácia, a Lisímaco.
2. O Começo da Luta (1 1: 5-45)

Depois da partilha do espólio de Alexandre, os reis do Norte e do Sul se mantiveram em paz, cada qual
cuidando dos seus negócios, mas o demônio da guerra ou da cobiça em breve os atirou um contra o outro e
desse embate surgiu uma das mais sujas e cruéis guerras dos antigos tempos. Dessa guerra os contendores
são: do Norte, os selêucidas, chamados reis do Norte, e do Sul, os ptolomeus, denominados reis do Sul.
Talvez, para evitar um confronto perigoso, fizeram, depois de anos, uma aliança, dando o rei do Sul a sua filha
Berenice em casamento ao rei do Norte, mas tal casamento, como veremos, de pouco serviu (v. 6).

O rei do Sul, Soter I, (322-305), diz o texto, "será forte", e, sabendo que o seu rival selêucida tinha as vistas
voltadas para a Palestina, que não havia sido molestada por Alexandre, preparou um grande exército, e, num
sábado, sem qualquer aviso, cercou Jerusalém e tomou a cidade, tomando posse do país. Preparou tudo,
temendo uma invasão de Seleuco. Fez-se de amigo dos judeus e convidou a todos que desejassem ir ao Egito,
dizendo-lhes que lá encontrariam uma outra pátria. Acredita-se que muitos aceitaram o convite, visto como
lá já moravam muitos dos que tinham fugido da Palestina, com medo de Nabucodonozor, quando até o nobre
profeta Jeremias foi levado à força. Esta gente tinha prosperado muito, como também seus irmãos em
Babilônia, criando-se, assim, os dois grandes centros judaicos, um no Oriente e outro no Ocidente. Cedeu aos
judeus um quarteirão na cidade de Alexandria, onde se estabeleceram e gozaram de todas as liberdades. Este
Ptolomeu I abdicou do reino em 285, em favor do seu filho, ficando o Estado em boas mãos e seguro. Nesse
meio tempo, os dois reis se guerrearam fortemente, e tudo por causa da cobiçada Palestina. Finalmente
fizeram um acordo, que não era para valer por muito tempo, e dito acordo foi selado com o casamento da
filha do rei do Sul já mencionada (v. 6), por nome Berenice. Todavia, Antíoco tinha já outra esposa, Laodice,
terminando por divorciar-se desta. E esta encorajou os filhos a assassinarem Berenice e tirarem do caminho
este estorvo às suas ambições. É isto mesmo que nos diz o verso 6. Ela, porém, não conservará a força do seu
braço; ele não permanecerá, nem o seu braço; porque ela será entregue, e bem assim os que a trouxeram, e
seu pai, e o que a tomou por sua naqueles tempos (v. 6). Mas de um renovo da linhagem dela um se
levantará em seu lugar, e avançará contra o exército do rei do Norte, entrará na sua fortaleza, agirá contra
eles, e prevalecerá (v. 7). Este irmão de Berenice foi Ptolomeu III, o Evergetes. O seu antecessor, Ptolomeu II,
era doente, e, das duas guerras que fez contra Seleuco, pouco fez para se vingar do ultrage cometido contra
Berenice. Tudo que deveria ou poderia fazer ficou delegado ao seu filho Ptolomeu II, que era homem de
muita ação e coragem. Levou para o Egito os deuses sírios e um grande despojo, e por isso deixou em paz o
Reino do Norte, como reza o verso 8. Mais tarde, como desforra, avançou contra o rei do Su I, e a situação se
complicou bastante.

No reinado de Ptolomeu II, como vimos, os judeus foram cercados de todos os favores e garantias. Acredita-
se que foi nessa época que foi feita a LXX, cujas origens estão metidas entre muitas lendas. Segundo uma,
narrada por Flávio Josefo, Filadelfo tinha um bibliotecário cuja mania era conseguir os livros de todos os povos
para a grande biblioteca de Alexandria. Também ele mesmo teria desejado ler o Velho Testamento, mas não
conhecia o hebraico e então o caminho seria fazer uma tradução. Por sua influência, Filadelfo dirigiu-se ao
sumo sacerdote em Jerusalém, pedindo seis homens capazes de cada tribo. O sumo sacerdote, com alegria,
aceitou o pedido e mandou 70 homens versados em letras e capazes de fazer a obra. Conforme esta lenda,
que é muito complexa e mesmo inverossímil, os 70 homens reuniram-se em Alexandria e, divididos em grupos
de 2, ao fim de 72 dias deram a obra por terminada. A tradução que se conhece não se compadece dessa
tese, porque ela realmente parece ter sido. traduzida por gente que nem conhecia bem o hebralco e nem o
grego. Isto, todavia, é assunto para a crítica literária.

A outra versão reza que 70 sábios de Alexandria decidiram fazer a tradução, e a fizeram em 72 dias. Ao certo
não se sabe como a Septuaginta surgiu e isso também interessa menos; o que interessa é que as Sagradas
Escrituras foram vertidas para o grego e se tornaram a leitura obrigatória dos judeus helenistas, e, quaisquer
que sejam as falhas desta tradução, ela tem servido tanto aos gregos como aos romanos. Foi baseado nesta
versão grega que Jerônimo preparou a sua versão latina, conhecida como a Vulgata, da qual o Padre Antônio
Pereira de Figueiredo fez a versão portuguesa, conhecida como a versão católica oficial.

No capítulo 11:8-21 é apresentada uma série de guerras muito mal conhecidas e que iremos alinhando à
medida que prosseguirmos.

Com a morte de Ptolomeu II, o seu filho e sucessor determinou levar adiante a tarefa que seu pai não pôde
concluir. Como vimos páginas antes, Seleuco divorciou-se de Laodice, para casar com Berenice. Mas, como
nos informa Daniel (11:6), ela não conservará a força do seu braço... etc. Pelo texto. parece que ela foi
devolvida a seu pai Ptolomeu I, mas a história que se conhece é que Seleuco, instigado pela política, divorciou-
se dela e voltou a Laodice. Esta, com receio de uma outra troca, instigou seus filhos a assassinarem tanto a
Berenice como a Seleuco. Foram envenenados. A morte de Berenice foi a causa de uma outra série de
guerras, que veremos adiante. Ptolomeu II ainda tentou vingar-se da morte da filha, preparando duas guerras
contra Seleuco, mas do sucesso pouco se sabe. Daniel nos diz que de um renovo da linhagem dela um se
levantará em seu lugar, e avançará contra o exército do rei do Norte o entrará na sua fortaleza, agira contra
eles, e prevalecerá (v. 7). Efetivamente, logo que Ptolomeu II1 assumiu o poder, por morte de seu pai,
preparou um grande exército, e foi contra o rei da Síria, e prevaleceu, como diz Daniel. Outras guerras ainda
foram desfechadas, cujos detalhes escapam à história . Um dos resultados conhecidos desta guerra foi a
morte de Laodice, pelas forças de Ptolomeu III. A Síria, bem como Babilônia, que lhe estava sujeita, foram
tomadas e Ptolomeu Evergetes voltou da luta muito vaidoso, com certas razões. No tocante aos judeus, foi,
como seu pai, muito favorável a eles, o que os levou a prosperar grandemente.

Por morte de Evergetes, sucedeu-lhe o filho conhecido como Ptolomeu IV, o Filopator. Este se teria
contentado com as vitórias do pai e ficado no Egito, cuidando dos negócios internos, mas no quinto ano do
seu reinado, Seleuco, o conhecido Antíoco, o Grande, fez-lhe guerra, e este, depois de uma luta encarniçada,
venceu. os sírios na batalha de Ráfiá, deixando Ptolomeu senhor da Síria. E justamente isto que Daniel diz no
verso 9: Este avançará contra o rei do Sul (Egito), e tomará para a sua terra. Foi esta provocação que levou
Fitopator a levara Guerra à Sí ria. A Palestina já havia sido tomada por Seleuco lII, mas agora, com a derrota
dos sírios, Ptolomeu, vitorioso, desceu pela Palestina e, vaidoso, quis entrar no templo, para ver o que estava
lá por dentro, mas os judeus em coro gritaram tanto que ele se afastou, mas não perdoou aos judeus a
desobediência, maltratando-os dali em diante.

Ptolomeu V, ou Epifanos. Com a morte de Filopator, Antíoco de novo invadiu a Palestina, e os egípcios
prepararam um grande exército, comandado pelo General Scopus, mas foi vencido em Pâneas, no vale do
Jordão. Scopus, porque os judeus não o tinham ajudado, maltratou-os, e quando Antíoco veio à Palestina, os
judeus o receberam como libertador. Não chegou a invadir o Egito porque a este tempo já os romanos
estavam no Oriente. Para agradar aos romanos e estes fazerem as pazes com os egípcios, pensou em dar a
sua filha Cleópatra a Epifanes. Com este casamento a Palestina voltou ao domínio dos egípcios, e mais a
Ceie-Síria e a Fenícia, como dote. Assim Jerusalém voltava ao domínio dos egípcios. A história continua
confusa, como fizemos ver antes, pois as informações de Daniel não são claras ao Historiador. Parece que os
versos 11-17 descrevem as lutas desta época, em que os próprios romanos intervieram. E parece que o verso
17 descreve esta Iuta em que os selêucidas se contiveram e os egípcios se acalmaram, por meio do acordo
feito, em que ele daria uma jovem (Cleópatra) em casamento, para destruir o seu reino; Isto, porém, não
vingará, nem será para a sua vantagem (v. 17). O assunto parece girar em torno do que os selêucidas
esperavam, que esta moça Cleópatra, que, aliás, se tornou célebre na história, fosse um meio de destruir o
Egito. Os romanos, como vimos, já estavam no Oriente, e daqui em diante todos os assuntos teriam de ser
decididos à vista desta nova força. Por outro lado, os selêucidas também não cumpriram as cláusulas do
acordo. Parece que é isso mesmo que Daniel insinua, que isto não vingará nem será para a sua vantagem (v.
17). Desentendeu-se ainda com os romanos, que acabavam de ter uma estrondosa vitória com a tomada de
Cartago, sob o comando de Júlio Cipião, o Africano. No auge da desavença, os romanos invadiram a Siria,
travando-se renhida batalha, com a vitória dos mesmos em Magnésia, sendo Antíoco feito vassalo dos
romanos por 12 anos, e ainda exigiram um filho seu como refém.

Antíoco IV, o Epifânio. Com a morte de Antíoco lII, o trono da Siria foi ocupado por seu filho, que velo a ser
conhecido como Antíoco IV. Um dos seus primeiros atos foi trazer de Roma o seu irmão Antíoco, que lá
estava como refém, trocando-o por Demétrio, seu próprio filho. Com soldados pedidos ao rei de Pérgamo,
conseguiu apoderar-se do trono da Síria, e começou a reinar com o nome de Antíoco IV. Este é o homem vil a
que se refere Daniel no verso 21, o qual não tinha nem as condições nem o direito ao trono sírio, mas, com
lisonjas e intrigas, conseguiu tomar o poder. Aliou-se ao rei de Pérgamo e outros e com estas forças ao seu
dispor cometeu tantas tropelias que os seus contemporâneos o apelidaram de Epimanes, maluco, em lugar de
Epifanes, ilustre. O que foi o reino deste monarca só os reis das intrigas e traficâncias podem descrever. Para
se firmar no poder, tudo lhe era normal, entre dar a vida e matar, roubar e pilhar.

O verso 22 refere-se ao príncipe da aliança, que não se sabe bem quem seja, mas seria um dos seus aliados.
Depois de se assegurar no poder por meio de alianças que nunca cumpriu, de adulações, que sempre lhe
davam algum efeito, preparou as suas forças para ir atacar o Egito, o antigo rival da Síria.

Os versículos 25 a 28 devem referir-se a este guerreiro e suas tropelias. O Egito não pôde resistir, e caiu em
seu poder; isto também porque os aliados do Egito, na hora decisiva, se bandearam para o lado de Antíoco.
Com este desfecho estava também selada a sorte de Jerusalém, que agora iria pagar o preço de sua aliança
com o Egito. No meio de todo este curso de guerra, o que se nota, segundo Daniel, é que se estava no meio
de um mundo de intrigas, vilanias e traições. Até o costume da hospitalidade ele violou, em proveito dos seus
interesses. O texto nos informa que tanto Seleuco como Ptolomeu eram intrigantes, pois a uma só mesa
falarão mentiras (v. 27). Antíoco voltou para a Síria rico e cheio de dinheiro e poder, mas não para muito gozo
seu. O versículo 29 diz: No tempo determinado tornará a avançar contra o Sul; mas não será nesta última vez
como foi na primeira. Não há informações históricas desta outra guerra. Neste intermédio parece ter havido
outra luta, que Daniel não descreve. Nesta campanha contra o Sul, não logrou vitórias, porque navios de
Quitim (Chipre) lhe causaram tristeza. Voltou indignado, mas nada pôde fazer, porque eram naus romanas,
que já dominavam o Mediterrâneo, e contra elas ele não tinha poder. Isso, todavia, o enraiveceu mais ainda,
e se virou contra os que nada tinham a ver com o caso. Então atacou Jerusalém em um sábado e colocou um
altar pagão em frente ao altar dos sacrifícios. Muitos judeus, que já estavam helenizados e se tornaram
apóstatas, o apoiaram, e isso constituiu uma vergonha para a pobre nação judaica, que acima de tudo via o
seu próprio povo apoiando um tirano. Zangado com a derrota dos navios, ele se voltou contra a santa aliança;
e, tendo voltado, atenderá aos que tiverem desamparado a santa aliança (v. 30). Isto significa que os que o
apoiaram na sua profanação receberão favores e serão galardoados, com o desprezo dos seus compatriotas.

O que foram aqueles dias não pode ser descrito nesta página. Os fiéis foram submetidos a toda sorte de
martírios e sofrimentos, enquanto os apóstatas eram guindados a altas posições de mando. A corrupção
lavrava fundo na vida nacional dos hebreus e já não se sabia o que mais valia, se ficarem silêncio ou desafiar o
agressor. O templo estava fechado desde a ereção do santuário romano no lugar do altar dos sacrifícios. A
nação estava dividida. É como diz Daniel: Dele sairão forças que profanarão o santuário, a fortaleza nossa, e
tirarão o sacrifício costumado, estabelecendo a abominação desoladora... mas o povo que conhece o seu
Deus se tornará forte e ativo (vv. 31 e 32). Veja o que Jesus disse a respeito em Mat. 24:15-28. A situação era
de tal angústia que os dias de Antíoco eram como um prenúncio das aflições dos judeus nos dias em que os
romanos tomaram conta da Santa Cidade e assolaram a mesma cidade, o culto e a terra. Alguns
comentadores têm interpretado as af lições dos dias de Antíoco como os dias do anticristo, e têm mesmo
pensado que este era realmente o anticristo. A interpretação geral da Igreja Cristã é que estes dias
prefiguraram os do anticristo. Eram um protótipo, mas não os do anticristo. É verdade que em muitos
aspectos este pagão se assemelha ao que as Escrituras apresentam como sendo o anticristo, mas a maneira
como ele acabou não oferece os elementos necessários para que lhe atribuam as qualidades reais do
anticristo. Este, como já vimos, aparecerá nos dias do segundo advento de Cristo, durante os sete anos da
terrível provação judaica. Outros também têm sido apontados como o anticristo, tais como Nero e mais
modernamente Hitler. Todos estes foram protótipos, mas não eram o real anticristo. O que ensina o verso 33
é realmente uma forma de anticristo, mas apenas uma forma, e não o verdadeiro.

O verso 34 diz: Ao caírem eles, serão ajudados com pequeno socorro; mas muitos se ajuntarão a eles com
lisonjas. Admite-se que este verso seja uma profecia do movimento iniciado por Judas Macabeu, que
levantou o ânimo dos judeus desanimados e desafiou o agressor e impostor. O que foi esse movimento não
cabe nestas linhas, mas a história está aí, para quem desejar conhecer o que foi a resistência macabóla. Esta
luta, iniciada nos dias de Antíoco, se estendeu até 164 a.C., quando, pela intervenção dos romanos, as lutas
travadas entre os mesmos judeus tiveram um fim menos trágico. De 164 a 163 a.C., quando os Macabeus
conseguiram dominar a situação. com o apoio dos romanos, foi difícil saber quem dominava, se os
antioquianos ou os Macabeus, pois tantas e tão prolongadas formam as lutas, que era difícil saber a quem
atender. (1) A morte de Antíoco IV em 164 a.C., efetivamente não pôs fim às lutas, porque os seus sucessores
continuaram a batalha pela dominação da Palestina. Durante estes anos já os Macabeus conseguiram
arregimentar todos os elementos fiéis às tradições judaicas e formar um poderoso exército, que se defronta
com o exército sírio. Tudo isto constituiu um drama na vida nacional judaica. Só mesmo a leitura de um
tratado de história pode ajudar o leitor destas notas a entender a situação de modo geral. O primeiro livro
dos Macabeus, livro apócrifo, é um dos melhores tratados desta época infeliz.

O verso 36 do capítulo 11 diz: Este rei fará segundo a sua vontade, o se levantará e engrandecerá sobre todo
deus; contra o Deus dos deuses falará coisas incríveis, e será próspero, até que se cumpra a indignação; etc.
Não se sabe contra que deuses ele se levantou além do Deus dos deuses. É um ponto obscuro na intrincada
meada de fatos e acontecimentos desta época. Se ele desrespeitou os deuses assírios, não se sabe, mas
parece que apenas a sua conduta irreverente contra tudo que era religioso deve ser entendida como o
sentido deste verso. De modo geral, entendemos que Antíoco tinha a seu favor a indignação divina contra o
seu povo, pelas muitas maldades por este praticadas mesmo depois do cativeiro. E um povo que nunca
aprendeu a viver perto do seu Deus, e por essa causa tantas e tão terríveis provações lhe têm sobrevindo. Ao
serem escritas estas linhas, está sendo travada mais uma luta dos árabes contra os judeus, cujos resultados
não podem agora ser previstos, mas nós sentimos que, se este povo chamado por Deus tivesse sido fiei a seu
Deus, teria evitado a carnificina de Hitler e teria evitado as muitas lutas atuais com os seus primos árabes.
Eles só aprenderão quando o Cristo voltar, e assim mesmo depois da grande tribulação prevista no
Apocalipse.

(1) Os informes históricos que nos chegam daqueles dias mostram que o propósito dos selêucidas não era
tanto o domínio da Palestina, mas a helenização do povo aos costumes e modos de vida gregos. A Filosofia
grega, com os seus costumes, tinha avassalado o mundo oriental, e quem não adotasse esta norma de vida
era submetido a toda sorte de opressões. Muitos dos judeus adotaram o helenismo, e, como tais, ajudavam o
conquistador selêucida. Disso resultou que em Israel uns eram a favor da manutenção dos costumes
tradicionais e da religião dos antigos, enquanto outros davam as costas a estas tradições. Era uma nação
dividida. É isso o que nos diz o verso 14 do capítulo 11: Naqueles tempos se levantarão muitos contra o rei do
Sul; também os dados à violência dentre o teu povo se levantarão para cumprirem a profecia, mas cairão. A
vida grega, com os seus ginásios esportivos, as suas festas sociais (bacanais), era uma sedução para os jovens
judeus. Por isso a dificuldade de fazer uma frente unida contra o invasor do Norte. É possível que o verso 34
ainda se refira a esta divisão dos elementos nacionais judaicos. Os ptolomeus não chegaram a ser dominados
pela filosofia grega, mas os nortistas se converteram nos grandes arautos do helenismo.
3. O Princípio do Fim (11: 40-45)

Estes versos descrevem as lutas finais de Antíoco com o seu rival do Sul, e a descrição é o prelúdio da luta do
anticristo. Tudo ele assolará como um furacão. que nada respeita, para finalmente estabelecer as suas tendas
palacianas entre os mares (o Mediterrâneo) contra o glorioso monte sento, mas chegará ao seu fim, e não
haveria quem o socorra (v. 45). Este foi o seu fim, em 164 a.C., quando foi sucedido por um pouco de tempo
por seu filho Antíoco Eupator. Desta data em diante, nem os judeus tinham segurança nem os sírios, porque
o tempo era mesmo de confusão. Era o fim.

Deste ponto Daniel passa a outro assunto, fora dos limites da história Propriamente dita. Todo aquele que for
achado inscrito no Livro(12.1) será livrado. A referência aqui, já se vê, é aos eleitos para a vida eterna. O livro
de Daniel passa, de UM panorama todo histórico, para outro, totalmente diferente, que é o da vida eterna e o
juízo eterno. É certo que muitos caíram pela espada de Antíoco, mas muitos outros tinham já caído por outras
razões e motivos. Todos estavam a salvo das penas futuras, se os seus nomes estavam registrados no grande
Livro de Deus.

Parece-nos que o profeta não desejava terminar esta seção do seu livro, seção das mais trágicas da história do
pobre povo judeu, sem dar uma palavra de conforto tanto a ele mesmo como aos seus leitores futuros. A
revelação é assim mesmo; por um lado o cáustico contra o pecado; por outro, o bálsamo para o pecador. Esta
revelação f o! de tal natureza que o profeta ficou doente, e só depois de ser consolado é que se levantou e foi
cuidar dos seus deveres oficiais. Somos gratos ao bondoso Criador, que não nos deixa aterrados com os
nossos problemas e as nossas dificuldades e sempre vem em nosso auxílio.

Efetivamente, o que foi esta luta entre os ptolomeus e selêucidas só mesmo os que estão acostumados a
examinar contendas de conquistas e domínios são capazes de avaliar. Nós, que temos lidado com estes
assuntos por anos seguidos, graças ao nosso mister de professor da Bíblia, sentimos como é difícil entender
um capítulo como o da guerra entre estes dois povos antigos, que não tinham os tanques modernos nem os
apetrechos bélicos da guerra moderna, mas um tipo de guerrilha próprio da época, a que dificilmente
qualquer contendor seria capaz de escapar. Tudo já passou, mas as lições ficaram.
NOTA: Inegavelmente, os judeus, por causa dos seus pecados e por outras causas, nunca tiveram paz depois
da morte de Salomão. Os anos e lutas com os sírios e assírios e depois com os babilônios foram de tremendo
desgaste moral e físico. Foram mais de 550 anos de contendas. Depois da libertação do jugo babilônico, em
538, já outra guerra lhes foi apontada, guerra que teve inicio em 322 a.C. Desta data até 163, a luta foi o que
acabamos de relatar sucintamente. Em 163 conseguiram estabelecer um governo nacional, o governo dos
Macabeus, mas logo a seguir, em 63, os romanos se meteram na Palestina e de lá jamais saíram até que
destruíram a cidade e o templo em 70 na era cristã. Povo sofredor, quando deveria ser um povo contente e
feliz. Porque tudo isto? Eis uma pergunta que qualquer leitor poderá fazer. Quanto a nós, só temos uma
resposta: a desobediência à Palavra de Deus, pois, ao ser formada a nação no Sinal, Deus garantiu que seria o
seu Deus e eles seriam o seu povo, e nada lhes faltaria. Fartura de tudo e segurança contra os seus inimigos.
Se a lição tem proveito, ela aí está.

VI - A PROFECIA DA ESPERANÇA (12:1-13)

É com sentimento de gratidão a Deus que terminamos este nosso estudo, em forma simples, popular,
esquecendo as multas dificuldades do texto e mesmo as levantadas pela critica, para apenas nos determos na
parte que eleva e instrui, parte esta que constitui a principal da profecia. Se conseguimos o objetivo, Deus o
sabe, nós ficamos tranqüilos com o esforço despendido e o desejo de dar ao povo o melhor a que tem direito.

Muitos destes acontecimentos só poderão ser interpretados à luz de outras escrituras, especialmente as que
se referem aos últimos dias da existência da vida neste planeta. Quando tais acontecimentos tiverem lugar,
chegará a redenção para todos os que lutaram e deram a sua vida pela santa causa e todo o que for achado
inscrito no livro (da vida) verá a salvação (Dan. 12:1). Comparando esta escritura com a de Apocalipse 20:11-
15, temos o quadro completo. Como é que Daniel pôde varar tantos séculos, milênios mesmo, para nos dar
um panorama que só o Livro dos últimos tempos pode dar? Só pela inspiração divina. Os sofrimentos
daqueles dias não têm paralelo com quaisquer sofrimentos do passado. O que se presume das lutas do
anticristo, enquanto o Rei dos reis celebra as suas bodas com a sua Igreja lá em cima, excede todo e qualquer
entendimento. Já vimos isso ligeiramente quando estudamos os "setenta setes", por isso não voltaremos a
repetir aqui o que foi dito lá. Os fiéis, os eleitos, nada têm a temer, porque os seus nomes estão inscritos no
Livro da Vida, e ressuscitarão para a glória de Deus e do seu Cristo. Se Daniel aqui se refere à segunda
ressurreição, a dos perdidos e dos que se tiverem arrependido durante a tribulação, não se sabe ao certo. A
segunda ressurreição é a dos perdidos e vem com o juízo final, conforme a escritura acima citada.

O papel do Miguei protetor do povo eleito não é bem claro aqui, mas deve corresponder aos hebreus que
durante os dias do anticristo tiverem crido no Cordeiro, e que serão ressuscitados depois deste grande
conflito. Alguns comentadores alegam que, depois do arrebatamento da Igreja, com a salda do Espírito Santo
do mundo, não poderá haver mais conversões, mas nós entendemos que se trata de tempos anormais, e os
que nesta quadra angustiosa se arrependerem e crerem serão salvos, sem passar pelo processo natural de
receberem o Espírito Santo em seus corações. Esta é uma quadra em que os melhores teólogos não
concordam. O serviço do anjo Miguei durante aqueles tremendos dias será o de ajudar os crentes a reagirem
até a morte, de modo que os seus nomes sejam inscritos no Livro.

O verso 2 deve referir-se à última ressurreição, mas Daniel mistura a primeira ressurreição, que é a dos
justos, com a segunda, que é a dos injustos. Num lampejo profético naturalmente não cabia a interpretação
dos dois acontecimentos, que só o Novo Testamento esclarece. No seu quadro estão bem delineados os
contornos dos dois grandes acontecimentos. Os justos resplandecerão como o fulgor do firmamento (v. 3) e
os outros ressuscitarão para nojo e vergonha eterna. A Escatologia não pretende explicar tudo que vai
ocorrer naqueles eventos; há apenas idéias e suposições. Sabemos que os salvos resplandecerão como o
fulgor do firmamento, mas os perdidos sairão dos seus sepulcros tais como eram aqui, chagados, imundos, e
assim viverão eternamente. Acredita-se que todos os males da vida terrena aparecerão naquela nova
condição; o que aumentará as penas eternas. A linguagem de Jesus, ao referir-se aos perdidos, tirada dos
contornos da vida aqui, é um lugar onde o "bicho não morre", onde o fogo arde com vigor infernal, mas
certamente estas figuras representam quadros da vida física. Não nos parece que haja fogo para queimar as
almas no sentido físico, mas fogo de sofrimento e vergonha, nojo da condição de vida a ser vivida
eternamente. Alguns comentadores acham que o fogo que arde sem se consumir deverá ser o fogo da
consciência acusadora, junto com todas as mazelas que os perdidos levaram desta vida, e assim se tornarão
um nojo eterno. Qualquer que seja a interpretação que se dê a este quadro, ele é repelente e pavoroso.
Quando se passa por uma rua e se vê uma pessoa com as pernas sangrando, pernas mutiladas, rostos comidos
de câncer, sentimos uma verdadeira angústia que nos leva a retirar a vista de tais quadros. Imaginemos a
eternidade! Parece certo que os justos não verão estes quadros; só os perdidos o verão. Vale a pena sofrer e
lutar até a morte para poder resplandecer como astros no firmamento. Os que forem sábios, pois,
resplandecerão como o fulgor do firmamento refere-se aos que evangelizaram os perdidos e ganharam almas
para Jesus. Esta é a grande sabedoria a que todos podem fazer jus; pois, se há coisa fácil na vida, é falar aos
outros daquilo que está em nosso coração. Esta é a sabedoria que agrada a Deus, mais do que qualquer
outra, e toda e qualquer pessoa pode aproveitar-se dela.

1. Daniel Recebe o Encargo de Encerrar o Livro (1 2: 4)

Tu, porém, Daniel, encerra as palavras e sela o livro, até o tempo do fim (v. 4). O que acabava de ser revelado
ao servo do Senhor era segredo. Muitos o esquadrinhariam, e a sabedoria se multiplicaria até o tempo do
fim. Pensam alguns que esta é uma indicação do fim dos tempos. A inquietação do mundo, o seu
desassossego e a multiplicação do saber indicam o tempo do fim. Se isto é verdade, então estamos às portas
do fim deste mundo. A sabedoria não tem mais limite. As técnicas mais avançadas, as invenções mais
esquisitas aí estão para indicar que o fim está próximo. Os próprios mestres já não sabem o que fazer para
resolver os problemas do mundo. A explosão demográfica é uma ameaça, e não parece haver meios de
contê-la. As pílulas e outros inventos não estão produzindo resultados. Ao serem escritas estas linhas, a
população do mundo é calculada em 4.700.000.000, e acredita-se que até 1980 estes algarismos serão
duplicados. Aí, o que fazer com tanta gente? Onde achar alimento para tantos, quando com a metade muitos
já passam fome? Na índia, um país cuja área é menos que a metade do Brasil, tem mais de 600.000.000 de
habitantes, e muitos, efetivamente, lá morrem de fome. Dobre-se estas cifras, e pense-se no que vai
acontecer. No Brasil, esta terra de Canaã, com metade ainda por povoar, muitos já morrem de fome. Parece
que a única solução é a volta do Senhor, com a inauguração do outro estágio da vida, quando se poderá
passar sem comer feijão e farinha. Enquanto isso, a Palavra da Vida vai-se espalhando, mas ainda falta muito
para que ela atinja a todos e parece até que isso jamais acontecerá. A promessa de Cristo é que o evangelho
seria anunciado a todas as gentes, para então vir o fim. Naturalmente há muitos que ainda não ouviram as
boas-novas, mas os meios aí estão. Emissoras irradiam 24 horas por dia, em diversas línguas, e outras
emissoras estão sendo planejadas. Quanto a nós, não temos dúvida de que o fim está próximo. A Bíblia foi
um livro fechado, mas agora até os que a perseguiam também a difundem, quaisquer que sejam os motivos.
Do ponto de vista da sabedoria, não temos dúvidas de que ela vai a galope até o seu final. Nos últimos
cinquenta anos inventou-se o automóvel, o avião, os meios de comunicação são sem limites, os
computadores, com suas milhares de memórias, as técnicas mais modernas, tudo somado dá um total de
quase um infinito. Que falta ainda? Milhões estão perdidos, mas parece que jamais todo mundo irá aceitar o
evangelho, e não há mesmo na Bíblia tal promessa. Todo mundo ouvirá o evangelho, mas nem todos crerão
nele. Paralelo com a pregação do evangelho corre o mundo com as diversões e devassidões, distraindo as
criaturas, e o que parece é que esta situação não se modificará. As igrejas se multiplicam e os meios de
pregação também, mas o pecado vai na frente.

2. Uma Outra Visão (12: 5-13)

Dois (homens), um duma e outro da outra banda do rio Eufrates. Um deles perguntou ao outro, vestido de
linho (ver 10:5,6), quando se cumpririam estas coisas maravilhosas. Este levantou a mão direita e a esquerda
e jurou por Aquele que vive eternamente que isso seria depois de um tempo, dois tempos e metade de um
tempo. Daniel. não entendeu a linguagem, e perguntou qual seria o fim destas coisas. Tudo aqui está envolto
em mistério. Muitas interpretações são dadas a estes versos, mas tudo continua escuro. O mesmo Daniel
recebeu a ordem para não prosseguir, porque estas coisas estavam encerradas até o tempo do fim. Muitos
serão purificados, embranquecidos e provados; mas os perversos procederão perversamente, e nenhum deles
entenderá, mas os sábios entenderão (v. 1 0). Talvez estas palavras se refiram à duração do poder de Antíoco
e ao seu fim (ver 7:25). O personagem vestido de linho branco era o Messias pré-encarnado, que estava à
frente desta revelação, que tão de perto se ligava à sua atividade futura. É assim que ele aparece em Apoc.
1:13 e refs. O profeta não entendeu a mensagem, e perguntou, então, qual seria o fim. A resposta
enigmática foi que estas palavras estavam encerradas até o tempo do fim. Os algarismos referentes ao tempo
em que o costumado sacrifício seria tirado e posta a abominação são simbólicos. Podem ter qualquer relação
com o tempo de Antíoco, quando ele colocou um altar pagão na entrada do templo em Jerusalém,
profanando, assim, o templo, que ficou fechado até os dias da vitória dos Macabeus, quando foi
reconsagrado. Jesus se refere a certo tempo e fatos em Mat. 24.15. Pode referir-se ao tempo dos romanos,
quando tudo foi destruído, porém cremos que não. Pode também referir-se ao tempo do anticristo. Muitas
profecias têm mais de um cumprimento. Ao profeta foi dada a promessa de que descansaria, e, ao fim dos
dias, se levantaria para receber o seu galardão. Que esta promessa alcance a tantos quantos lerem este livro!

NOTA: Depois de darmos por encerrado o nosso estudo sobre o capítulo 12, pareceu-nos que alguma coisa
estava faltando e algum ensino adicional deveria ser oferecido, mas não desejamos incorporá-lo ao estudo
propriamente dito. Preferimos oferecer umas notas adicionais. em caráter inteiramente pessoal, por cuja
interpretação somos inteiramente responsáveis. De todos os comentários consultados, nenhum apresenta
uma apreciação que nos pareça merecer o último capítulo do grande livro d e Daniel. Portanto, as notas
encontradas nos Apêndices que seguem são uma tentativa toda particular para não deixar de dizer alguma
coisa do que parece ser o fecho não apenas deste livro, mas da história da humanidade.
APÊNDICE 1

UM CAPÍTULO DESLOCADO

Inegavelmente, o capítulo 12 não tem qualquer relação com o restante do livro nem mesmo com o capítulo
11. Não obstante, a maioria dos comentadores incluiu o primeiro verso como fecho do capítulo 11.

A expressão Nesse tempo dá uma idéia de ligação com os acontecimentos do capitulo anterior. Preferimos a
que a velha edição de Almeida dá, pois ela parece indicar um começo de história totalmente diferente da que
o capítulo 11 oferece. E naquele tempo, isto é, um tempo indeterminado, a ser indicado no restante do
capítulo, cujos acontecimentos nenhuma relação têm com o que acabava de ser indicado no capítulo 11, a
não ser no sentido paralelo. Aceitando esta interpretação, tentemos descobrir o que o Divino Revelador quis
deixar para o uso das gerações vindouras.

1. Haverá um Tempo de Angústia Qual Nunca Houve (12:1)

As angústias do povo hebreu durante as perseguições de Antíoco foram grandes e as suas humilhações não
foram menores. As aflições por ocasião da destruição de Jerusalém são quase indescritíveis. Só vendo os
últimos capítulos de Jeremias se pode fazer uma idéia do que foram aqueles dias. Todavia, nem umas nem
outras são para se comparar com as aflições descritas neste verso. Por outro lado, a expressão TEMPO DO
FIM aparece nos versos 4, 6, 9 e 12. Há, assim, uma reafirmação de que os acontecimentos aqui profetizados
teriam lugar no final de tudo, isto é, na segunda volta do Senhor. Então temos de virar muitas páginas até
chegarmos a este "fim".

Os intérpretes da escatologia ensinam que, depois da quebra da aliança feita entre o príncipe (9:26) e os
judeus, seguir-se-á uma era de tal tribulação, que palavras são inadequadas para descrever. Será a Grande
Tribulação a que Jesus mesmo se referiu em Mat. 24:15. O capítulo 16:1-13 do Apocalipse, admite-se,
descreve os horrores causados pelas pragas lançadas na terra, e tais horrores estão destinados justamente a
este tempo do fim. Mais ainda é o fato de estes horrores estarem ligados à guerra do Armagedom, guerra
que deverá ter lugar logo depois da descida do Senhor com a sua Igreja. Como nos ensina Daniel no capítulo
9, verso 27, esta tribulação ocorrerá durante os últimos três anos e meio, depois de rompido o acordo já
referido e antes da descida do Senhor. Acredita-se que os judeus são os principais visados nesta tribulação,
por causa das suas muitas faltas para com o seu Deus, mas todos os habitantes da terra participarão dela. Em
nosso estudo do referido capítulo 9, verso 27, demos informações a respeito. Durante esta perseguição do
príncipe, muitos se converterão entre os gentios e mesmo entre os judeus, que já terão despertado para a
realização de certos fatos relacionados com o Messias, que eles rejeitaram. A este tempo, eles mesmos
estarão pregando o aparecimento do "seu" Messias, que não é o nosso, mas levarão muitos a crer no Messias.
A frase, naquele tempo será salvo o teu povo, etc., crê-se que se refere aos judeus convertidos durante a
tribulação.

2. Muitos dos Que Dormem no Pó da Terra Ressuscitarão... (12:2)

Haverá uma ressurreição, que se considera paralela à que terá lugar na segunda volta do Senhor, mas esta
será só e unicamente da Igreja. A ressurreição aqui prognosticada será dos convertidos durante a Grande
Tribulação, que irão ajuntar-se à Igreja, mas não farão parte dela. O texto parece indicar uma ressurreição
geral, de bons e maus. Possivelmente os mortos incrédulos durante a Tribulação também serão
ressuscitados, pois a segunda ressurreição só terá lugar depois do Milênio, conforme Apocalipse 20:11-15.
Estes incrédulos ressuscitados aparecerão com vergonha e nojo, pois poderiam ter-se convertido como tantos
outros, e não o fizeram. Pelo visto, estamos, então, lidando com assuntos referentes à Segunda Vinda do
Senhor, pelo que, portanto, este capítulo representa o fecho da grande revelação de Jesus Cristo ao seu povo.
3. O Fechamento do Livro (12:4)

O Velho Testamento não contém toda a Revelação de Deus. Foi fechado quatrocentos anos antes da vinda de
Cristo, e ninguém teve coragem de o abrir. Muito se escreveu durante este período, considerado das sessenta
e duas semanas (9:26), mas nada do que se escreveu foi considerado inspirado.. Portanto, depois dos dias de
Daniel não houve revelação. Os profetas Ageu, Zacarias e Malaquias vieram depois, mas isso não invalida a
ordem dada. Daniel teve ordem para encerrar a visão.

4. Muitos o Esquadrinharão, e o Saber Se Multiplicará (12:4)

O que tem sido a luta entre conservadores e racionalistas a respeito dos sagrados livros é qualquer coisa que
escapa a uma análise como a que estamos fazendo. Grande tem sido esta batalha, mas a verdade continua a
flutuar como azeite por cima da água. Por outro lado, a busca da verdade está bem patente, especialmente
neste século, quando seitas e mais seitas se têm levantado, numa tentativa de dar à humanidade a última
palavra a respeito da Bíblia. Isso é qualquer coisa que admira. Ninguém está satisfeito com o que já se sabe
da Bíblia; muitos querem dar mais a seu respeito. É mesmo um esquadrinhamento. Por outro lado, o saber
humano jamais teve um surto tão grande. Universidades e mais universidades estão surgindo por toda a
terra. Aqui mesmo, em nosso Brasil, nunca se viu uma proliferação de escolas como agora. Cursos de uma
ciência e de outra, e parece que há mesmo uma febre de esquadrinhar os limites da capacidade humana, em
busca de novas realidades. Isso não existia antigamente. Só agora. Na Idade Média havia apenas meia dúzia
de universidades. Atualmente não se sabe o seu número. A ciência atingiu tal grau de desenvolvimento que
até os sábios se sentem perturbados com ela. Os computadores modernos, com suas milhares de memórias,
são qualquer coisa que teria escapado aos mais sábios adivinhos e astrológos antigos. O livro de Daniel está
sendo interpretado por vias indiretas, e isso nos anima e encoraja.
5. Quando Tudo Isso Aconteceria (12:7)

Depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo (v. 7). Há muita divergência quanto à
interpretação destas palavras, mas, tomando outros símbolos semelhantes, não temos dúvida em afirmar que
estes tempos se reduzem a três anos e meio, precisamente o que Gabriel disse a Daniel (9:27), a metade da
semana do anticristo. Nesta metade da semana o povo santo seria destruído no seu poder (v. 7), isto é, a
nação judaica, como tal, desapareceria, pois os judeus terminarão por aceitar o Messias, o nosso Messias,
convencidos pelos acontecimentos que se relacionarão com a sua vinda. Então se dará a destruição do povo
santo como povo, pois eles passarão a viver com a Igreja, mesmo que não façam parte dela. Nesta altura se
cumprirá o que Jesus disse: Desde agora já não me vereis, até que venhais a dizer: Bendito o que vem em
nome do Senhor! (Mat. 23:39). Os judeus aceitarão a Jesus, e o pacto ou aliança, rompido no Calvário, será
restaurado. A última semana que falta para as setenta, conforme 9:26, terá sido cumprida, e o pacto feito
entre Deus e Abraão será restaurado eternamente. Daniel não entendeu nem podia entender esta revelação,
e pediu ao anjo que lhe explicasse tudo com respeito ao tempo do fim, mas o anjo deu uma resposta que não
era resposta, porque não valia à pena tentar ensinar a um homem do quinto século antes de Cristo os
mistérios que nem mesmo os cristãos atualmente compreendem. Apenas alguns, os investigadores, podem
penetrar nestes assuntos. Este autor admite que os seus leitores também não entenderão muito de muita
coisa aqui descrita. Todavia, o anjo deu uma palavra de esperança ao profeta: Muitos serão purificados,
embranquecidos e provados; mas os perversos procederão perversamente, e nenhum deles entenderá, mas
os sábios entenderão (12:10). Quem serão estes sábios? Os doutores? Os cientistas? Nada disso. Os crentes
em Jesus entendem muito destas verdades, mesmo que não entendam muito dos seus mistérios, porque não
são para serem entendidos mesmo. Os crentes, de modo geral, são os sábios deste mundo, e os maiores
sábios da terra; inclusive cientistas de renome têm sido os crentes em Jesus. Faça-se uma lista dos grandes
sábios, e ver-se-á quantos ateus chegaram a influenciar o mundo com o seu saber.
6. Abominação da Desolação (Desoladora) (12:11)

Alguns intérpretes entendem que esta "abominação desoladora" se refere ao "altar pagão" que Antíoco
colocou no templo em Jerusalém, mas parece que não. Quando Jesus se referiu a esta abominação (Mat.
25:15), ele estava falando das coisas do fim, tanto de Jerusalém como do fim do mundo. Logo, não seria
possível deslocar no tempo este acontecimento, porquanto os dias dos Antíocos estavam muito distantes do
fim, seja de Jerusalém, seja do mundo.

Entendemos, pois, que Jesus se refere ao anticristo, quando, como já vimos em diversos passos, se assentou
no templo, querendo ser Deus, e proclamando a sua qualidade de Deus, o que provocou a grande
perseguição, denominada de Grande Tribulação. Demais a mais, Daniel está mesmo tratando das coisas do
fim dos tempos, e não parece fácil colocar esta abominação nos dias da perseguição de Antíoco, em 164 a.C.
O templo, tempos depois, foi reconsagrado, e o escândalo desapareceu. Leia-se atentamente o que Daniel
diz: Depois do tempo em que o costumado sacrifício for tirado... (1 2:1 1 ) virão as datas em que os dias do
mundo serão contados, datas estas que não se referem aos dias de Antíoco. Tudo está relacionado com o fim.

7. Haverá Ainda Mil Duzentos e Noventa Dias (12:11)

Depois que cessar o serviço do culto do templo, haverá um período de duzentos e noventa dias. Estes
duzentos e noventa dias são praticamente três anos e meio. Para sermos exatos, três anos são 1.279 dias,
faltando 11 dias para completar o número exato, mas nós já temos visto que estes algarismos são sempre
aproximados.

Não têm sido poucas as interpretações a respeito destas datas. Alguns as têm tomado como o tempo da volta
do Senhor, mas estes cálculos falharam redondamente, pois Cristo não voltou no ano 1290, nem mesmo no
ano 1335. Atribuir estes dias ao tempo de Antíoco também nos parece totalmente fora de computação, não
obstante as mais altas autoridades em assuntos do Velho Testamento, como o Dr. Edward J. Young, que
atribui esses dias ao tempo das perseguições de Antíoco. Ora, estas perseguições duraram de 260 a.C., até
164 a.C., ou seja, 96 anos, que, convertidos em dias, dão um número maior do que o que o texto permite.
Além disso, não vemos como se pode transferir acontecimentos relacionados com o "fim" para os de eras
muito anteriores. É bom recordar outra vez que todos os ensinos deste capítulo 12 se referem ao fim dos
tempos. Não vemos, pois, como se podem aplicar estes dias aos tempos da perseguição antioquiana.
8. A Nossa Humilde Interpretação Deste Texto

Não fazemos alarde de nossa erudição e muito menos de nossa infalibilidade, mas o que nos parece seguro,
tomando todos os textos que se referem ao (fim", os 1.290 dias, ou mesmo os 1.335, devem relacionar-se
com o período das perseguições do anticristo depois do rompimento do acordo com os judeus, período de
três anos e meio, segundo o mesmo Daniel em 9:27, quando diz textualmente: na metade da semana (de
anos) fará cessar o sacrifício e a oferta de manjares; sobre a asa das abominações virá o assolador, até que a
destruição, que está determinada, se derrame sobre ele (9:27). Em algarismos redondos, esta perseguição e a
colocação da "abominação" justamente de três anos e meio, ou sejam, 1.279 dias, é cálculo bem aproximado
do sagrado texto. Além disso, o apelo é que os fiéis se mantenham leais ao seu Deus, pois receberão o
galardão prometido. Muitos judeus aceitarão o domínio do anticristo, mas muitos outros não o aceitarão e
serão mortos, para depois ressuscitarem na volta do Senhor, juntamente com os que ficaram incrédulos. Não
desprezamos quaisquer interpretações, e há muitas, mas parece-nos esta estar conforme a totalidade dos
ensinos do capítulo 12.

9. Os Anticristos

Muito se tem escrito a respeito dos anticristos da história. Para alguns, Nero (Neron) foi o anticristo, e as
letras do seu nome com os valores numéricos dados ao alfabeto grego dão precisamente 666, o número do
"homem" conforme Apoc. 13:18.

Outros atribuíram a Hitler o título do anticristo. Um pastor batista do Rio provou, por meio de uma fórmula
matemática, que Hitler era justamente o "homem". Todavia, também este desapareceu e os fatos atribuídos
ao anticristo não se realizaram.

Antíoco IV foi dado como o anticristo, em virtude da interpretação de que o altar colocado no templo em
Jerusalém era a "abominação da desolação" a que Cristo se referiu em Mat. 24:15. Também aí não se realizou
nada do que a Bíblia prescreve para o anticristo. Vale dizer que este "homem), ainda não chegou. A nossa
interpretação do capítulo 9: 27 de Daniel, junto a outras escrituras, parece prevalecer. Este homem foi
devidamente caracterizado por Paulo, em II Tess. 2:3,4, como o homem da iniqüidade, o filho da perdição, o
qual se opõe e se levanta contra tudo que se chama Deus... ostentando-se como se fosse o próprio Deus. Isto
é o que o verdadeiro anticristo pretende fazer e fará quando chegar.

Conclusão

Muito do que aí fica dito pode não ser toda a verdade, mas deve ter muita realidade, porque a verdade
mesma ninguém conhece. Todos nós somos apenas meros especuladores a respeito da verdade, criaturas
desejosas de penetrar nos mistérios que Deus deixou para os iluminados. Uma coisa, entretanto, é certa:
Tudo que aí está e muito mais vai ser cumprido letra por letra, porque AQUELE que Daniel viu sobre as águas,
vestido de linho fino e revestido de ouro puro, ESSE jurou pelo que vive eternamente que isso seria cumprido,
depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo. Portanto, podemos ficar tranqüilos, que o que nós
agora não entendemos será entendido depois. Bem-aventurados os que seguem o seu caminho até o fim,
pois descansarão, e, ao f i m dos dias, se levantarão para receber a sua herança (1 2:13).

Há uma herança para nós, e por certo a receberemos, se prosseguirmos no caminho até o fim, quaisquer que
sejam as dificuldades que encontremos para entender os mistérios de Deus.
APÊNDICE 2

INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO CATIVEIRO DE JUDÁ - UMA DERROCADA

Em 597, depois de vencer os adversários na célebre batalha de Carquêmis e de se assegurar do trono de


Babilônia pela morte do rei Nabopolassar, Nabucodonozor atirou-se contra Judá, o último bastião que restava
de um mundo de violências, roubos e destroços. Esta batalha foi uma espécie de Dunquerque moderno. Era
o fim de uma era. Vencido Neco nesta batalha e retirando-se para o seu reduto nas margens do Nilo, depois
de matar Josias e substituir o filho deste, Jeocaz, que o povo tinha colocado no trono, nada mais restava (11
Crôn. 36:1-4). Era outro fim que se avizinhava.

1. As Causas Remotas de Tudo

O estudante da Bíblia menos afeito à história com as suas contradições perguntará: Onde estava Deus, que
tinha colocado esta gente na Palestina? Teria agora mudado de opinião, depois de tantos anos de gloriosa
convivência com o povo? A história é longa, mas merece um alentado capitulo, que o autor vai tentar
esboçar.

Tudo de mau começou com Salomão, o rei mais sábio da terra e o mais rico entre os ricos. Os primeiros 30
anos de governo, digamos assim, foram de fausto e glória. Não havia reino ou império que não desejasse
estar em boa forma com Salomão, e diz-nos o sagrado texto que de longe vinham potentados para ouvir a sua
sabedoria e conhecer o seu fausto (I Reis 10:24). I Reis 10:1-13, cita a rainha que veio da velha Etiópia,
carregada de riquezas, ouro e aloés, para presentear o grande rei dos judeus. O que ela viu, muitos outros, de
perto e de longe, viram e notaram, que jamais homem algum tinha mostrado tanto saber e tido tanta riqueza.
Isto mesmo Deus lhe prometeu, conforme se lê em I Reis 4:29-34. Nunca antes e nem depois houve homem
igual a Salomão. A construção do majestoso templo de Jerusalém excede muito a tudo que se possa imaginar
em matéria de construção religiosa e, quem sabe, mesmo civil. Esta fama e riqueza atraíram para Jerusalém
não só os cortesãos do mundo antigo, mas as princesas de toda a terra. Segundo nos informa ainda I Reis,
tinha o rei setecentas princesas, que haviam sido dadas de presente como embaixatrizes dos povos
associados e, de quebra, 300 concubinas. (1) Além de tudo e de todo este fausto, Salomão foi um grande
armador, construindo seus próprios navios em Eziom-Geber, juntamente com os peritos fenícios. Estes navios
iam à terra de Ofir, América do Sul, de onde voltavam carregados de ouro e outras preciosidades da terra (I
Reis 9:26-28). Já não restam mais dúvidas de que a terra de Ofir, que tantas dores de cabeça deu aos
historiadores, eram as terras hoje conhecidas como Bolívia, Peru e outras áreas, terra dos incas e dos pré-
incáicos e outros povos antigos. Era, pois, Salomão não apenas o homem mais sábio e mais rico, mas também
o mais ousado comerciante cujas naus conheciam todos os mares, desde o Mediterrâneo até o Atlântico norte
e sul. Um estudo aprofundado e minucioso parece que ainda está por fazer, mas, pelos relatos sucintos de
Reis e Crônicas, podemos fazer uma idéia do que era o império de Salomão, cujas fronteiras não são
conhecidas. A presença dos fenícios na América está sobejamente provada até por cidades recentemente
descobertas no Piauí, de que Amaral Neto, deputado federal, muito se ocupou e até fotografou. Pena que
Salomão não tivesse tomado posse deste continente! Recentemente têm sido encontradas tribos diferentes
de todas que se conhece no mundo indígena, de cabelos louros, olhos azuis e que estão sendo atraídos para a
nossa civilização. Esta gente deve a sua origem a remanescentes fenícios e hebreus que por aqui teriam
ficado, deslumbrados comas riquezas da terra, com a riqueza do pau-brasil, de que Salomão chegou até a
fazer os corrimões da sua casa real e do templo do Senhor (I Reis 10: 11 -1 3). Há, assim, uma velha história a
ser relatada por quem um dia se dispuser a um estudo tanto nos livros de Israel como nas crônicas dos povos
da América, inclusive os maias, astecas toltecas e outros, todos oriundos do Oriente, e que teriam cooperado,
no início da sua história, com os navegadores de Salomão.

(1) Por mais que o escritor queira ser benevolente com Salomão, não encontraria base para isso. Um homem
a quem Deus concedeu o que jamais concedeu a qualquer outro, sabedoria, honras, riquezas e tudo mais, foi
justamente o homem que mais de perto violou os sagrados preceitos de seus antepassados. Ele não apenas
caiu na poligamia - até seu pai caiu nessa fraqueza - mas amou mil mulheres, coisa de que jamais se ouviu na
história. Não havia mulher que lhe bastasse, pois até uma rainha visitante, lá da Etiópia, segundo a lenda,
pelo menos engravidou dele e teve um filho a que ela deu o pomposo nome de "Ieão da tribo de Judá", título
que pertence exclusivamente a Cristo.

Para manter o luxo nababesco do palácio, taxou duramente o seu povo, povo humilde, camponês, vinhateiro
e que não poderia ver com bons olhos um fausto como o de Salomão. Cada tribo tinha de prover para um
mês os gastos do palácio em milhares de bois, carneiros, aves e cereais. Depois de todo esse fausto, faltou-
lhe o senso da medida, e deu para servir aos deuses de suas mulheres, coisa abominável aos olhos do povo
israelita. Parece-nos que o fausto o desgastou prematuramente, pois antes dos 70 anos era um velho
decrépito. A fartura também faz mal, quando mal usada. Os que conhecem a história, daqui para diante
sabem em que deu tudo isso: uma derrocada espiritual e política, de que a nação jamais conseguiu levantar-
se. Infeliz Salomão!
2. Um Homem Poderoso e ao Mesmo Tempo Fraco

A desventura de Salomão foi meter-se com tantas mulheres, cada qual com o seu costume nativo, com a sua
cultura e com os seus deuses. Enquanto moço, capaz de dominar reis e imperadores, foi capaz de dominar
este mulherio, que deveria somar, entre mulheres e suas aias, umas cinco mil. Estas mulheres não vieram a
Jerusalém por amor a Salomão. Vieram como presentes de seus países, como uma espécie de embaixatrizes,
representando os seus países de origem. Trouxeram, naturalmente, os seus ídolos, aos quais prestavam o
culto nativo, mesmo no meio de um culto faustoso prestado ao Deus vivo e verdadeiro. Jerusalém seria o
centro do maior sincretismo religioso de todos os tempos. É de se admitir que tais mulheres não
pretendessem suplantar o culto do templo, mas, por certo, adorariam os seus deuses em capelinhas que
Salomão lhes construíra (I Reis 11: 4-8). Enquanto Salomão era moço pôde resistir a todos os percalços desta
situação, mas, ficando velho, e, ao que parece, prematuramente encanecido, quem sabe, devido aos muitos
problemas governamentais, pois era um potentado à moda oriental, governando sozinho, foi fácil a estas
mulheres convencê-lo a ir com elas, ora com uma ora com outra, adorar os seus deuses. Foi a sua desgraça e
a da nação. Conta-nos o autor de Reis: Nesse tempo edificou Salomão um santuário a Camos, abominação de
Moabe, sobre o monte fronteira a Jerusalém (na Betân ia moderna), e a Moloque, abominação dos filhos de
Amom. Assim fez para com todas as suas mulheres estrangeiras, as quais queimavam incenso e sacrificavam a
seus deuses (I Reis 11:7,8). Como uma coisa destas poderia acontecer em Jerusalém, o historiador não
entende. Onde estariam os ministros de Estado, os secretários do governo, que não evitaram tal calamidade?
Não se sabe. Parece que todos estavam obumbrados pela grandeza e nem viam o crime que se estava
praticando junto ao templo do Senhor. O homem mais poderoso do mundo foi dominado por um grupo de
mulheres. Este escritor tem declarado que o mulherio de Salomão não era uma demonstração de impulsos
sexuais, pois nenhum homem pode satisfazer a tantas mulheres, mas, sim, um problema político, à moda da
época. Salomão não deveria ter caído na idolatria pela influência destas mulheres, pois eram muitas e
violentas as admoestações contra a mesma em Israel. Há aqui um capítulo sobre psicologia social e sexual
que os estudiosos podem fazer por si mesmos. A poligamia era proibida em Israel, segundo o Decálogo e
doutrinas conexas, mas até o próprio Davi, homem austero e seguro, caiu nessa fraqueza quando ainda era
bandoleiro foragido de Saul. Depois de proclamado rei, ainda acrescentou ao seu harém outras mulheres.
Admite-se que Salomão não fez mais do que seguir as pegadas do pai, Davi, de onde se deve concluir que os
maus exemplos frutificam mais depressa que os bons. Fosse uma questão de exemplo doméstico, fosse uma
condição da política de Salomão ou as duas coisas, o fato é que era proibida a poligamia em Israel. Se um
homem quebra este princípio, deve esperar pelas conseqüências. Isso mesmo aconteceu a Davi, que chegou
ao triste episódio de ser desafiado por um dos filhos, e de até ver as suas concubinas violentadas
publicamente por este filho (11 Sam. 16:15-19). A poligamia teve desastrosos efeitos na vida familiar de Davi
e seu filho Salomão. Não nos demoraremos aqui para descrever os sobressaltos havidos quanto à
substituição de Davi no reino. Basta ler o que nos conta o historiador de I Reis 1:1-31.

3. As Consequências de um Erro

O erro de Salomão, como era de esperar, foi o desgosto de Deus em ver o descalabro religioso a que o rei
erudito tinha conduzido a nação. Como resultado do seu politeísmo, Deus se afastou tanto do governo da
nação como da nação mesma, prometendo romper os laços existentes e até não cumprir a promessa feita a
Davi de que nunca lhe faltaria sucessor no trono (I Reis 11 :9-13). Estava roto o contrato feito entre Deus e a
nação pela quebra do princípio de que em Israel só havia um Deus, e que os ídolos eram total e
absolutamente estranhos ao Concerto feito no Sinai mediante Moisés. Pela morte de Salomão, o seu filho
herdeiro do trono não soube, por incapacidade pessoal e também pela ação divina, manter o reino unido.
Durante os 40 anos de governo de Salomão, os pruridos de divisão entre as tribos do Norte, lideradas pela
poderosa tribo de Efraim, tinham sido sufocadas. Havia um desgosto natural entre as tribos do Norte e da de
Judá, ao sul, pois era em Jerusalém que estava o centro do culto nacional. Lá estava a sede do governo, lá
estavam o luxo e a opulência, enquanto as tribos do Norte tinham de trabalhar para manter este fausto. Cada
tribo tinha de oferecer mensalmente o sustento da casa real, coisa com que ditas tribos não concordavam e
cujo fausto detestavam. Os dias de liberdade vividos no deserto não morreram nunca. Agora eram submissos
a um governo que eles não tinham estabelecido. As influências da corte em Jerusalém não chegavam ao
norte, às tribos de Aser e outras, que só eram ouvidas para contribuir pesadamente. Uma divisão latente
dominava estas tribos: afastaram-se do governo do sul, que só se lembrava delas para o pagamento de
impostos, e nada mais, e os impostos não eram normais, eram considerados uma carga insuportável. Tão
fogo Salomão fechou os olhos, vieram as tribos do Norte, pedir a Roboão que aliviasse o seu jugo, a dura
servidão (I Reis 12:1-3). Era um pedido mais do que natural, porque, sabendo, como sabemos, que esta gente
amava a liberdade e que nunca tinha visto com bons olhos a centralização do poder em uma das tribos,
ficando as demais apenas para pagãr impostos, era de se esperar um desejo de mudança. Aparentemente,
pelo menos, era esta a situação, se bem que havia outros motivos mais profundos. Um jovem ambicioso
audacioso, capataz de Salomão, por nome Jeroboão, rapaz esbelto e inteligente, tomou a si o encargo de
acoroçoar o desgosto das tribos do Norte, prometendo que, se um dia fosse alguma coisa, daria ao povo
sofredor dias melhores. Este moço desleal não se desincumbiu apenas da tarefa que Salomão lhe havia dado
(I Reis 11:26-30). Era ele o chefe dos trabalhadores escravos, os remanescentes das tribos vencidas e que
tinham sido reduzidas à servidão. Este moço, enquanto cuidava dos "deveres do cargo, ia cavando a ruína do
soberano, prometendo o que não podia dar. Como o desgosto contra a casa de Davi lavrava fundo, ele se
aproveitou da "chance" para fazer a sua cama no centro do governo geral. Como isso chegasse aos ouvidos
de Salomão, o moço teve de fugir para o Egito, o reduto de todos os foragidos de Israel. Logo que Salomão
morreu, diz o texto que o mandaram chamar, mas, por uma leitura mais atenta, ele voltou por sua própria
deliberação, para se pôr à frente dos revoltosos. Com a recusa de Roboão, filho e sucessor de Salomão, de
aliviar os impostos, estourou a bomba.

4. Um Ato Impensado Resulta em Desgraça Nacional

De tudo que acabamos de ler, muito resumidamente, verifica-se que tanto da loucura de Salomão, em se
adaptar às exigências de suas mulheres, como da insensata resposta do seu filho às exigências justas do povo
do Norte, resultou a desgraça nacional. É certo que Deus teve a sua parte nesta tragédia, castigando a
desobediência de Salomão em se meter na idolatria de suas mulheres (I Reis 12:24). Efetivamente, estava
roto o contrato assinado no Sinai, de que o povo não teria outros deuses diante de Jeová (Êx. 20:2). Portanto,
a culpa de tudo que estava acontecendo deve ser atribuída a Salomão, o grande transgressor. Nem por isso
podemos desculpar a traição de Jeroboão em acoroçoar os descontentes nortistas pelas exigências que
estavam fazendo a Roboão. Há, assim, uma meada, cujas pontas devem ser procuradas dentro da história
mesma. Ao historiador não cabe a última palavra.

Proibido Roboão de fazer a guerra contra os rebelados irmãos nortistas, e determinada mesmo esta proibição,
Jeroboão, tipo ambicioso e sem grandes escrúpulos, sentiu-se à vontade para levar adiante os seus planos de
política nacional e religiosa. Não poucos críticos têm visto, nesta concessão, por parte de Deus, a um rapaz
sem moral e sem compostura, a função de promover o castigo resultante das violações salomônicas. Não nos
cabe julgar. Nós não pretendemos advogar as decisões divinas, mas apenas confirmar fatos da história, isto é,
que Deus age dentro da mesma história, lançando mão de homens que ele sabe antecipadamente serem
inadequados para determinadas tarefas. Além disso, onde Deus iria encontrar homens isentos de paixões e
interesses baixos? Todos são filhos da mesma massa, e, se é certo que nem todos prevaricam, os bons se
encontram dentro do tabuleiro histórico e entram em conjeturas em que nós mesmos sentimos que eram
incapazes para determinada obra. É assunto que pertence aos desígnios divinos e que não cabe ao homem
pesquisar. Convém, portanto, apenas referir, e com as devidas cautelas. O caso de Jeroboão I é um caso entre
outros em que nos parece que outro deveria ser o escolhido para esta tarefa, mas isso não é da nossa conta.
Deus, o grande Mestre da história, sabe o que faz e como o faz. A ele a glória por tudo que de bom ocorre nos
conciliábulos humanos, e a nós a censura por tudo que de mau ocorre nos mesmos conciliábulos. Apenas
para dizer mais uma palavra sobre este amargo assunto, diríamos: Quantas bênçãos advieram desta ruptura?
Quantas amarguras também? A história é feita destes pedaços de coisas boas e más, e, no final ajuste de
contas, verificar-se-á que Deus faz tudo bem feito e que nós é que não sabemos interpretar as suas
determinações.

Desta ruptura nacional, muita coisa a história tem para contar, e o que estamos fazendo aqui é apenas passar
por cima de um mundo em ruínas, cujos fundamentos não são por nós conhecidos. Uma coisa todos sabemos
muito bem: que Deus tolera muitos males, ou porque somos mesmo incapazes de fazer melhor ou porque
destes males ele tira coisas boas. Se Deus interviesse em todos os atos humanos, então não teríamos história
humana, mas divina. Por que ele permitiu (não consentiu) que Davi, o homem segundo o coração de Deus,
cometesse tantos desatinos, inclusive o do triste episódio de Bate-Seba e o infeliz Urias? Poderia tê-lo
evitado? Poderia, sim, mas então não haveria responsabilidade humana, e tudo que ocorre na face da terra
seria obra divina. Não é essa a concepção que temos das relações divinas com o gênero humano. Por igual
raciocínio, poderíamos dizer que Deus poderia ter proibido Satanás de tentar Adão e Eva e não criar o
problema que esta desobediência causou à pobre raça humana. Vistas as coisas por este prisma, pergunta-se:
Não é o homem responsável? É. Então o bem que faz e o mal que pratica pertencem à liberdade que Deus
outorgou às suas criaturas. Este nosso mundo é um mundo moral em que o bem e o mal convivem ou se
relacionam. Portanto, não poderia o divino Criador eliminar dos pensamentos humanos tudo que é mau, pois
assim destruiria a própria liberdade. Vistas as coisas por esta singela palavra, que nada tem de erudita nem
de defesa teológica, podemos avançar em nossa pesquisa, que nos deve levar às conclusões que
determinaram a queda e destruição de Jerusalém (ver I Reis 11:26-39).
5. Jeroboão, um Homem sem Escrúpulos

Assegurado de que a sua partida estava garantida pela proibição de Roboão lhe fazer a guerra, atirou-se ao
que lhe parecia, e a qualquer indivíduo, a sua segurança e futuro. Sabia que, não obstante as desavenças
entre as tribos nortistas e as sulistas, como já vimos, havia uma coisa que ele não poderia ignorar. Jerusalém
era um pólo de atração não apenas para os israelitas do Norte, mas para todo o mundo daqueles dias. Lá
estava o suntuoso templo, com os seus admiráveis sacrifícios litúrgicos; lá estava a sede do antigo governo de
Salomão, cuja memória não poderia ser esquecida facilmente; lá estava um sacerdócio respeitado e um clã
nacional, que era uma atração para todo mundo. Então, passados os momentos da crise, os israelitas no
Norte logo se recordariam das galas antigas, esquecendo os desgostos antigos também, e aos poucos
voltariam às boas relações com os irmãos judaítas. Como evitar tais contatos? Evitando que os irmãos do
Norte viessem ao Sul e aos poucos se acomodassem à nova situação. Se bem o pensou, melhor o fez.
Mandou fundir dois bezerros de ouro e colocou um em Dá, a tribo mais setentrional, a tribo de Dá, que por
escassez de terras boas se transplantou para o norte (ver Juizes 18). O outro em Betel, a cidade fronteiriça
com o sul, na divisão que acabava de dar-se. Ficavam, assim, os nortistas com dois lugares onde poderiam
adorar o seu Deus, sem as dificuldades de uma viagem longa e penosa a Jerusalém. Pensam os historiadores
que não era plano de Jeroboão provocar uma ruptura f inal entre o culto em Jerusalém e o praticado neste
dois centros. Isso parece ser razoável, porque a um bom político, e Jeroboão o era, não interessava criar tal
antagonismo. A história dos bezerros ainda não foi definitivamente explicada. Arão, no deserto, quando se
pensava que Moisés teria desaparecido nas montanhas do Sinai, fez um bezerro de ouro e o apresentou ao
povo como sendo o deus que havia tirado Israel do Egito (Êx. 32:4). Como é que o povo aceitou esta
declaração não se diz, mas, sim, que se assentou para comer e beber e se levantou para divertir-se (dançar ao
redor do bezerro). Que ligação haveria, na mente do povo, entre este bezerro de ouro e o Deus poderoso que
o havia tirado do Egito? Que o povo tem memória fraca, já o nosso provérbio reconhece, mas um povo que
havia assistido aos mais estupendos milagres e manifestações divinas, inclusive passar pelo Mar Vermelho a
pé enxuto, ter comido do pão caído do céu e bebido água tirada de um rochedo, como podia agora
reconhecer em um bezerro de ouro o Deus que havia praticado tantas maravilhas? É coisa que não se
entende, foi assim, sendo assim registrado. Vem agora Jeroboão com os seus dois bezerros de ouro, uma
repetição do caso de Arão e o povo. Ao que parece, nem contestou a afirmativa do novo reizinho. No altar
do templo construído por Salomão havia dois chifres que serviam para um criminoso segurar até que fosse
julgada a sua causa (ver I Reis 1:51). Há, assim, qualquer coisa que ainda não foi devidamente explicada a
respeitados bezerros. Dizer-se que os chifres do boi são o lugar onde reside a sua força ou resistência e que
os bezerros da Bíblia são uma demonstração do poder divino não convence.
Estavam, assim, estabelecidos três centros de culto a Jeová, um em Jerusalém, um em Betei e outro em Dá.
Admitimos, para não adiantar demasiado estas notas, que Jeroboão não tivesse em mente substituir Jeová
pelos bezerros, pois isso seria uma insensatez, mas sabendo-se que o povo sempre foi amigo dos ídolos -
embora fossem eles que arruinaram Salomão e posteriormente o Reino do Norte e até o do Sul era de se
prever o que aconteceu. Não temos a menor intenção de aliviar as culpas de Jeroboão I. Temos, sim, o desejo
de compor a história ou de interpretá-la. Nada mais do que isto.

Os resultados destes dois centros de culto idolátrico logo se fizeram sentir na vida e na história do povo. De
tal maneira grassou o fervor pelos ídolos, que não houve um único rei, entre os 19 do Reino do Norte, que se
mantivesse incólume neste culto. Todos foram idólatras e com essa idolatria afundaram a pobre nação
nortista, a parte mais rica e mais culta da nação israelita. Os leitores dos livros de Reis e Crônicas podem ver
por si mesmos o quadro desolador que se desenrolou em Samária, a capital do Norte, fundada por Onri. Não
valeram as admoestações de profetas nortistas e até de sulistas, ali mandados por Deus, inclusive Amós. O
mal tinha lançado raízes profundas e nem mesmo as calamidades mandadas pela providência divina tinham
conseguido melhorar a situação. Onri entendeu que, para melhorar as suas relações internacionais, deveria
casar o filho Acabe com uma princesa fenícia por nome Jezabel, o que agravou ainda mais todo este quadro
desolador, pois ela trouxe para Samária uns mil profetas da sua terra para implantar oficialmente o culto
fenício e consolidar o que já existia do reinado de Jeroboão. As atividades de Elias, o profeta, os seus poderes
admiráveis, concedidos por Deus, de nada valeram para modificar a situação religiosa e moral.

Havia ao norte dois Estados, que já estavam fazendo sombra ao reino de Israel do Norte: a Síria e Nínive.
Muitas incursões fizeram estes monarcas em Israel, sendo todas elas atribuídas a ordens emanadas dos céus,
como uma maneira de tentar modificar a situação. Não havia perigo à vista ou remoto que fizesse mudar o
curso errado da história. Os livros de 1 e II Reis são o repositório destas incursões. Poderíamos aconselhar o
estudo do livro do autor POVOS E NAÇOES DO MUNDO ANTIGO e outros, que se encontram nas livrarias
evangélicas.

Esta situação se agravava dia a dia, e nem mesmo os castigos infligidos pelos sírios e assírios conseguiram
levar os monarcas nortistas a um raciocínio lógico e natural. Em 722 a.C., Samária, depois de um cerco de três
anos, caiu e os seus habitantes foram levados para as regiões da Assíria e Babilônia. É o que os historiadores
conhecem como a Diáspora ou dispersão. Desta gente nunca mais se teve notícia adequada. Por lá ficaram e
lá construíram sua vida à maneira dos povos para onde foram levados. Sabemos que esta gente não se
perdeu, porque na difusão do evangelho, 800 anos mais tarde, Paulo encontrou judeus por todas as cidades
asiáticas e européias. Eram os descendentes da Diáspora, que ainda continuavam mantendo a sua religião e
tradições paternas segundo lhes seria permitido pelos governos de então.

6. Desta Calamidade Política Restou Judá

O período que vai de 722 a.C. a 597, cobre apenas 125 anos, e, se considerarmos como ponto final aqueda de
Jerusalém em 585, temos 137 anos. Foi o período de vida da nação sulista. Parece, pela história, que a
destruição de Samária não afetou profundamente a vida e costumes do Reino do Sul, pois, pelo que nos
mostram os profetas da época, especialmente Isaías, Jeremias, Ezequiel e todos os chamados profetas
menores, isto é, cujos livros foram mais resumidos, a malsinada idolatria se havia apegado aos judaítas com o
mesmo diabólico impulso que destruiu o Reino do Norte. Parece até que dadas as diferenças de condições, os
irmãos sulistas superam em maldade idolátrica os irmãos do Norte. É lamentável tal confissão, mas ela
pertence à história.

Durante estes 125 ou 137 anos, o mundo oriental passou por profundas transformações políticas, situações
que por muitas vezes refletiram na vida de Jerusalém. Entre outras, poderíamos alinhar aqui a destruição, ou
quase isso, dos hiteus, povo notável dos dias antigos, povo ordeiro e laborioso. Não era dado a guerras de
conquistas. Babilônia, que depois dos acádios e sumerianos caiu em decadência, só se levantou um pouco
nos dias de Nabopolossar. A grande Nínive tornou-se a senhora do mundo oriental, e a sua história tem sido
estudada por grandes historiadores, cujos trabalhos não pertencem a estas notas. O Egito, de tão famosa
história, tinha também decaído depois das conquistas de Ramsés 11 e seu filho Merempta, para aparecer
como potência nos dias de Josias de Judá, isto é, em 608 a.C. O Faraó desses dias chamava-se Neco ou Necau.
Sabendo das disposições do novo general babilônio em se apossar dos restos do império ninivita, destroçado
por medos, persas e babilônios, teve o trágico encontro com Josias no monte Megido, quando foi morto. Do
encontro das forças egípcias e babilônicas, na celebrada batalha de Carquêmis, em 610 a.C., saiu vencedor
Nabucodonozor, que era o general de seu pai Nabopolassar. Neco voltou derrotado para o Egito, mas no seu
regresso fez uma visita a Jerusalém, exigindo dela pesado imposto de guerra e destituindo do trono o sucessor
de Josias, por nome de Jeoacaz, levando-o prisioneiro para o Egito, e colocando no trono a seu irmão
Jeoiaquim. Era o começo do fim. Se Neco tivesse vencido, a história seria diferente, nas segundo nos informa
o profeta Jeremias, Neco foi mesmo derrotado e só muito mais tarde é que o Egito deu mostras de ainda viver
nos dias de Ofra.

7. Avizinha-se o Fim

A idolatria, que destruiu o Reino do Norte, ia destruir igualmente o Reino do Sul, nada obstante os esforços de
Jeová para salvar o seu povo e conservar a teocracia com o culto admirável no templo de Jerusalém.
Jeremias, e por fim Ezequiel, nos dão um quadro sombrio e deplorável da situação dentro das muralhas da
cidade. Só mesmo um estudo paciente e cuidadoso pode dar a qualquer amigo da história antiga uma idéia
do que se passava em Judá. Não há palavras bastante claras e francas para dizer, em linguagem atual, o que
se passava ali, porque tudo se resumia num confronto entre os ídolos das nações vizinhas e o culto espiritual
de Jeová, culto iniciado nos montes do Sinai em 1440 a.C.

Vencido Neco na batalha de Carquêmis, Nabucodonozor se atirou contra Jerusalém, que, na suposição do
guerreiro daqueles dias, era uma ameaça (coisa infundada) ao desenvolvimento dos seus planos de
conquistas, que incluíram o próprio Egito. Portanto, era necessário destruir Jerusalém, para que o caminho
ficasse livre. O seu avanço contra a Santa Cidade deu-se em 597 a.C., quando o que havia de melhor na
cidade entre o povo e entre as riquezas em séculos foi levado para Babilônia. Melhor veremos o que se
passou consultando os livros de Reis e Crônicas. O rei Jeoiaquim foi ao encontro de Nabucodonozor
acompanhado de sua mãe e dos seus mais importantes auxiliares, possivelmente numa tentativa de apaziguar
os ânimos conquistadores do rei babilônico, mas de nada lhe valeu, porque foi preso e levado em cadeias para
Babilônia, onde ficou preso 37 anos (II Reis 25:27-30). Nos dizeres de II Reis 24:13, 14, Nabucodonozor levou
de Jerusalém todos os tesouros da casa do Senhor, e os tesouros da casa do rei e transportou para o cativeiro
toda a Jerusalém, todos os príncipes, todos os homens valentes, todos os artífices e ferreiros, ao todo dez mil;
ninguém ficou, senão o povo pobre da terra. Nesta primeira leva de cativos, além do rei, sua mãe e seus
conselheiros, foram também Daniel e seus companheiros, considerados no texto como príncipes.
Com esta introdução ao livro de Daniel, que acabamos de estudar, estamos, a nosso ver, capacitados para
julgar a história e as razões por que vamos encontrar Daniel entre os cativos. Não por algum mal que teria
feito, mas porque era um dos nobres da cidade, mesmo que nada saibamos da sua ancestralidade, e porque
foi colhido na rede de conquistas de Nabucodonozor.

Este autor desculpa-se por esta longa introdução, assim chamada, porque com ela o livro de Daniel se tornará
mais claro. Que assim seja.
APÊNDICE III

ESBOÇO HISTÓRICO DO POVO DE ISRAEL

Com o livro de Daniel encerra-se praticamente a história do povo israelita, e, se levarmos em consideração as
suas profecias, encerra-se até a história deste mundo, pois os capítulos 9 e 12, especialmente, cobrem o
período da Segunda Vinda. Todavia, esta parte da história escapa à nossa análise, a não ser a parte
propriamente escatológica, que não é mais história e, sim, os resultados de toda a história.

Foi com este pensamento trabalhando em nossa mente que nos pareceu útil dar, aos leitores que não podem
consultar enciclopédias, um esboço, apenas um esboço, da história deste povo admirável, o povo eleito, por
meio do qual nos vieram os profetas e o nosso Grande Salvador. Ao povo judeu nós devemos tudo que
constitui a nossa esperança de vida eterna. Assim, não parece demais gastarmos algumas páginas para pôr
em destaque as lutas e vitórias desta nobre gente que, apesar das suas muitas faltas, em sua própria história,
continua sendo um grande povo, e a mesma história ainda vai mostrar muita coisa que atualmente é apenas
profecia.

Faremos esta análise em dez períodos, para melhor compreensão do assunto, e acreditamos que os leitores
hão de concordar conosco com esta divisão.

1. Época de Moisés (1440-1400 a.C.)

Esta foi a época do grande legislador Moisés, cujo nome imortal encheu a história dos seus dias. A sua
legislação para o povo judaico transpôs as fronteiras da nacionalidade, para se espraiar por todos os
continentes. Não há povo culto que ignore esta legislação, assim como não há código civil ou penal que a
ignore também. Estão aí os seus cinco livros, conhecidos como o Pentateuco, para atestar o que afirmamos
aqui.
2. Época de Josué (1400-1390 a.C.)

Esta foi a época da conquista da terra e do estabelecimento do povo na possessão que Deus lhe tinha
destinado. Foi um período curto, mas de grande significado, pois agora estavam em sua terra. Nesta
conquista Josué destruiu 32 reizinhos. Diversos povos, que deveriam ter sido vencidos, não o foram, e isso
determinou, no futuro, muitos contratempos. Não havia grandes nações naqueles dias, a não ser o Egito, de
modo que os israelitas não tiveram problemas internacionais no seu estabelecimento na terra.

3. O Longo Período dos Juízes (1390-1044 a.C.)

Este longo período foi uma espécie de Idade Média do povo israelita. Com a morte de Josué não ficou
nenhum líder capaz de o substituir, e o povo, dividido em doze tribos, espalhadas por uma larga faixa de terra
palestínica, sem governo centralizado, viveu os piores dias da sua história primitiva. Algumas pequenas
nações, que não foram destruídas na conquista, procuraram tirar vantagem da falta de governo nacional,
submetendo os israelitas a duras provas. Pobreza, desorganização, desmoralização, muitas vezes, foi o
resumo da história dessa época. A não ser alguns juizes ilustres, como Débora e mesmo o famoso Sansão,
pouco temos a dizer de grandes vultos dessa época. Os grandes povos antigos, a não ser o Egito, tinham
desaparecido, e o Egito inexplicavelmente não interveio na vida do povo de Israel. Assim levaram a sua vida
até que chegou Samuel, o grande juíz e líder nacional, que deu ao povo alguns dias de glória. A obra do autor,
Estudo nos Livros de Josué, Juizes e Rute, seria útil aos que desejarem conhecer a história desta gente.
4. A época de Saul (1044-1004 a.C.)

Em certo sentido, a situação do período dos juizes continuou durante a vida e governo de Saul, o primeiro rei
de Israel. A sua falta de tino político, talvez a sua ambição de governante, criaram para o povo muitos
dissabores e contratempos. Por sua desobediência a uma ordem divina, de destruir a tribo dos amalequitas,
Deus cortou o seu reinado, ou melhor, a sua dinastia, passando-a a um jovem que muito ilustrou a nação:
Davi. A luta entre Saul e Davi por mais de 20 anos, foi, talvez, devido a um estado de loucura, o período mais
inseguro e cruel do povo, que mal se ia capacitando para a sua vida nacional. Foi, entretanto, o período da
organização monárquica e o começo de grandes dias de glória. Os inimigos em redor não molestaram a pobre
nação, a não ser os filisteus, um povo minúsculo, mas de grande agressividade, que disputavam com os
israelitas o domínio daquela região. Foi numa dessas contestações que Saul perdeu a vida, e com ele findou o
período de preparação para a monarquia.

5. A Era de Davi, o Cantor Rei de Israel (1 004-964 a.C.)

Esta foi a época mais brilhante da história do povo israelita, antes do grande Salomão. Foi ele quem dominou
os filisteus e outros pequenos povos, que se vinham engrandecendo nos últimos anos. Por meio de muitas
guerras e acordos políticos, lançou as bases do grande império de Salomão, seu filho e sucessor. O povo, que
não tinha conhecido uma autoridade nacional, viu, pela primeira vez, um governante reunir ao redor da sua
pessoa não apenas o seu próprio povo, mas outros povos que procuram a sua amizade. Alguns povos do
norte da Palestina, que se tinham mantido indiferentes nos últimos anos, sentiram que um grande poder se
levantava em Israel, e desafiaram o novo governante. Os novos irmãos ou parentes, como os amonitas e
moabitas, também se agitaram, com receio da hegemonia israelita na região, mas foram vencidos, e a ordem
terminou reinando por toda parte. Os fenícios, de grande cultura para a época, se aliaram a Davi nos
preparativos para a construção do templo nacional, fornecendo materiais muito necessários. Jerusalém, o
Bastião jebusita, a terra de Melquisedeque, foi conquistada e feita a capital do Estado israelita. Por 40 anos a
Palestina teve ordem e paz.

6. O Império de Salomão (964-924 a.C.)

Salomão, filho e sucessor de Davi, foi o homem mais ilustre no mundo desses dias. O seu imenso saber, a sua
força política, reuniram em Jerusalém todas as pequenas cortes mundiais, inclusive o próprio Egito, que,
durante esses séculos, não tinha molestado o povo israelita. Coube-lhe levar adiante os planos do pai, Davi,
na construção do grande templo em Jerusalém, que, segundo as melhores opiniões, era a obra mais suntuosa
do mundo, possivelmente superior mesmo aos grandes egípcios. Por sua sabedoria e favor divinos, todos os
pequenos povos da terra o procuravam e com ele se aliavam. Isso trouxe para Israel todas as embaixadas do
Oriente Próximo. Aliou-se aos fenícios na conquista de terras distantes, chegando as suas naus a conhecer
toda a América, desde o Rio de Janeiro até o Canadá. Recentemente foram descobertos documentos que
provam a presença dos fenícios em diversos pontos do Canadá. No Brasil, desde o Rio de Janeiro até o
Maranhão, há muitas provas da presença destes navegadores. Segundo informações dos livros dos Reis, os
navios de Salomão e fenícios vinham à terra de Ofir buscar ouro e madeira preciosa, por certo o pau-brasil.
De três em três anos, estes navios faziam a travessia do Atlântico, levando à sua terra grande quantidade de
ouro e outros valores. Foi uma época de fausto e grandeza. O ouro em Jerusalém era tanto que a prata não
tinha cotação.

Infelizmente, todo este fausto não durou. Com a decrepitude de Salomão, as suas mulheres lhe minaram a
religião, e o levaram a construir santuários a deuses de outros povos. Foi a sua desgraça e da sua nação, pois
o Concerto feito por Deus no Sinai era que não houvesse outro deus em Israel. Com a quebra do Concerto,
por causa destas divindades introduzidas em Israel, o império de Salomão ruiu internacionalmente, e
nacionalmente também, provocando a ruptura da nação. Não cabe numa ligeira nota tudo que se poderia
dizer de bom e de ruim a respeito de Salomão. Com a sua morte, a semente da ruptura nacional, que já
lavrara entre as tribos, consumou-se pela insensatez do seu filho Roboão.

7. Divisão da Nação em Duas Partes (924-722 a.C.)

Morto o grande líder, não houve, infelizmente, um sucessor de tino e saber político para contornar o
problema que já vinha lavrando fundo no seio do povo. As tribos do Norte sentiam-se preteridas pelas do Sul,
e também os muitos impostos lançados por Salomão, para fazer frente aos gastos da corte, terminaram por
dividir a nação, ficando duas tribos com Roboão, ao sul, e dez com Jeroboão, ao norte. Durante os anos que
medeiam entre a morte de Salomão, em 924, e 722, quando Samária foi tomada pelos assírios, a situação foi
sempre de guerras e desajustes entre as duas partes da nação. No sul houve grandes homens, como
Ezequias, Josias e outros, que tentaram, por meio de grandes reformas religiosas, salvar a nação, livrando-a da
proliferação dos cultos estranhos. No norte, Jeroboão, jovem ambicioso e de pouco escrúpulo, instituindo
centros de culto estranhos à Bíblia, um em Dá e outro em Betel, terminou por arruinar a pobre nação. Alguns
reis, notáveis do ponto de vista político, reinaram no norte, como Onri e seu filho Acabe, mas a sabedoria
política não bastava para uma nação teocrática. Era preciso ajuda de Deus, que eles não tinham, porque não
a procuravam. Foi a grande falta destes governantes julgarem que podiam governar um povo destinado a ser
o povo eleito de Deus, deixando de lado o próprio Deus. O que a história nos ensina é que sem Deus nenhum
povo pode ir muito longe. O pecado, os maus costumes sociais, em breve levam a nação à ruína. Essa é a
lição da história. Não valeram os grandes profetas Elias e Eliseu, para salvar a nação.

Durante esses anos, nações grandes e pequenas surgiram no Oriente, cada qual procurando estender os seus
domínios sobre os povos mais fracos. Os sírios, que nunca tinham tido grande projeção, tornaram-se povo
ambicioso e desejoso de dominar Israel. Mais para o leste, os assírios, que deram ao mundo grandes
guerreiros e conquistadores, pretendiam dominar todos os povos menores, e isso conseguiram. Tanto no
Reino do Sul como no do Norte, homens de Deus se levantaram para orientar os governos no sentido de que
não seria possível segurança sem Deus, mas, na maioria dos casos, parece que perderam o seu tempo. o
grande profeta Isaías, e depois Jeremias no Sul, para só mencionar dois dos mais notáveis, muito fizeram para
salvar a nação. A não ser num caso ou outro, os reis não lhes davam atenção . Enquanto isso, os povos
conquistadores iam lavrando em terras estranhas. Foi desse modo que, depois de várias incursões em Israel,
os assírios terminaram por destruir o Reino do Norte, destruindo sua capital Samária e levando o povo cativo
para as regiões do Tigre e do Eufrates. Coube a Sargão 11 as honras de vencer o Reino do Norte, destruindo a
sua capital. Outros, como Salmanezer e Tiglate-Pileser, lhe prepararam o campo para sua intervenção final.
Com a destruição de Samária, em 722, ficou Judá só, com o seu grande templo e o culto a Deus, que bem ou
mal, ia sendo praticado, até que também, por causa da idolatria, se arruinou.

8. O Mundo dos Grandes Conquistadores - Judá Sozinha (722-597 a.C.)

Esta foi a época de grandes guerreiros e conquistadores. O Egito tinha tido ocasiões de fazer guerra a outros
povos, como os hiteus e mitânios, mas, segundo as melhores interpretações, eram guerras repressivas contra
estes povos do norte. Nunca o Egito foi, nos tempos antigos, país conquistador. De agora em diante, o
mundo conheceu o que havia de pior em matéria de submissão de povos fracos e indefesos. Samária foi
destruída, mas ficava Jerusalém, que poderia ser considerada um bastião difícil de vencer, graças às suas
muralhas protetoras. Isso, entretanto, não intimidou Senaqueribe, rei assírio, de tentar dominar a cidade.
Estava no trono um rei piedoso e corajoso, o grande Ezequias, que tinha ao seu lado o não menos valoroso
lsaías, profeta de Deus. Senaqueribe tentou a tomada de Jerusalém, mas antes tinha de tomar bastiões
vizinhos, como Laquis, que não conseguiu dominar. Foi num desses arrancos que Senaqueribe encontrou o
seu túmulo político. Desafiando o rei ao Deus da nação, que ele qualificava como um deus igual aos outros
que já havia dominado, viu o seu exército ser destruído numa noite, com a morte de 180.000 dos seus
melhores soldados. Um anjo veio de noite e liquidou a arrogância de Senaqueribe. Vencido e humilhado,
retirou-se para sua terra, sendo morto por dois dos seus próprios filhos. Morto Senaqueribe, sucedeu-lhe um
dos seus filhos por nome de Esar-Hadom, que reinou até 669. Sucedeu-lhe Assurbanipal, grande líder político
e guerreiro (669-626). Este não se intrometeu nos negócios de Israel, mas atacou o Egito, destruindo as
cidades de Mênfis e Tebas em 663, e de passagem levou cativo para Babilônia o mau rei Manassés, que depois
se arrependeu dos seus muitos pecados e Deus o fez voltar a Jerusalém e ao governo. Faz parte da literatura
acanônica a chamada oração de Manassés, que alguns julgam espúria, enquanto outros a consideram
autêntica. A conversão deste jovem rei foi um dos atos mais notáveis praticados por Deus em favor de sua
nação. Por morte de Manassés, subiu ao poder seu filho Amom, que se comportou de tal maneira que os seus
auxiliares o assassinaram, e seu filho de oito anos, por nome Josias, foi coroado rei de Judá (II Reis 22). O
governo deste homem notável foi talvez de todos os bons o melhor. Procedeu a uma ampla reforma da
religião e dos costumes, erradicando a idolatria, que dominava e destruía a nação. Foi nessa época que se
descobriu o livro escondido no templo, que se julga ser o de Deuteronômio, da autoria de Moisés, e que tão
grande celeuma levantou no último século a respeito de sua autenticidade. Nós o consideramos autêntico, e
o fato apenas mostra que os sagrados manuscritos eram totalmente ignorados pelos governos e povo. O
governo de Josias passou à história como um dos mais ilustres, tanto no sentido político como religioso. O
mundo estava passando por um difícil momento, com o aparecimentos de diversos Estados, cada qual
pretendendo ter a hegemonia geral. A Assíria, que por muitos anos tinha dado as cartas, foi assaltada por
dois aliados, Ciáxares, da Média, e Nabopolossar, de Babilônia, em 626. Entenderam eles que era tempo de
terminar com a grande Nínive. Assurbanipai, o último grande rei assírio, tinha morrido, e não havia outro
capaz de lhe tomar o lugar. Por sua vez, Assurbanipal gastou os últimos anos a untando documentos
históricos para a sua grande biblioteca, calculada ter sido de 30.000 volumes, descurando as fronteiras do
império que tinha herdado. Assim foi fácil aos dois associados, Cláxares e Nabopolassar, este, pai de
Nabucodonozor, darem o golpe de morte em Nínive em 612. Nessa época foi chamado ao ministério
profético o grande Jeremias, enquanto Naum e Sofonias também trabalhavam por salvar Judá.

Em 609, Faraó Neco achou que seria tempo de se desforrar da humilhaçãacausada pelas conquistas de
Assurbanipal em sua terra, e organizou um poderoso exército para ir ao encontro dos exércitos de Nínive, mas
lá se defrontou com os vencedores de Nínive. Na ida, passou por Judá, e o bom Josias achou que devia barrar-
lhe o caminho, morrendo no monte de Megido e levando para o túmulo a esperança de seu povo e de seu
governo. Na volta do norte, Faraó Neco passou por Judá, destronou Jeoacaz, que o povo tinha colocado no
trono, e o levou para o Egito, impondo ainda um pesado tributo a Judá. Jeoiaquim, que sucedeu a seu irmão
no trono, não foi fiel a Faraó Neco e também foi um a quem Jeremias julgou indigno de um enterro real. Seu
irmão Joaquim reinou apenas três meses. Quando Nabucodonozor se aproximava de Jerusalém, foi ao seu
encontro com sua mãe e com os seus grandes. Nabucodonozor o amarrou com duas cadeias de bronze e o
levou a Babilônia, onde ficou preso até o 37.0 ano do cativeiro. Em seu lugar colocou o rei caldeu e tio
paterno de Jeoiaquim, por nome Zedequias, que reinou por onze anos, até a queda de Jerusalém. Habacuque
e Jeremias eram os profetas desse tempo.

Parece que Neco subestimou as forças ninivitas e os dois conquistadores de Nínive, e voltou derrotado para o
Egito. Talvez tenha sido por uma tentativa de desforra que se atirou contra Jerusalém e praticou os atos que
acabamos de mencionar.

A queda de Carquêmis em 606, onde as forças de Cláxares e Nabopolassar se defrontaram com as de Neco,
marca o ponto culminante da política dessa época e mesmo da história antiga. Assíria estava derrotada e o
Egito também foi vencido e nunca mais se levantou. Dos antigos impérios nada restava. Nos livros de
Crônicas, de Reis e de Daniel lemos que, em seguida a esta conquista, Nabucodonozor se atirou contra
Jerusalém, levando para Babilônia, além Jeoiaquim, 10.000 dos nobres de Judá, com uma grande presa em
objetos do templo e dos ricos da cidade, incluindo, nesta leva de prisioneiros, Daniel e Ezequias, em 597. Judá
bem poderia ter achado a hora de continuar a viver se aceitasse os conselhos de Jeremias, mas a política do
Egito, que nada mais poderia fazer, levou Zedequias a rebelar-se contra Nabucodonozor, o que levou este
monarca a voltar a Jerusalém disposto a destruíra cidade e o templo em 586 a.C. O que foram aqueles dias só
pode ser visto lendo-se Jeremias 51 e 52. Os cativos foram juntar-se a seus irmãos, que já estavam no
cativeiro havia onze anos, e lá ficaram até o tempo de Ciro, o Persa. Zedequias fugiu de noite, quando as
muralhas foram arrombadas, mas foi preso pelos soldados de Nabucodonozor e levado a Ribia, onde o rei
estava, sendo-lhe vazados os olhos e mortos os seus filhos, e assim, mesmo cego, foi levado a Babilônia, de
onde não mais voltou. Da cidade e do templo nada mais restava senão escombros. O povo mais pobre o rei
deixou ficar na terra, para cuidar dela e manter as cidades habitáveis, entregando o governo ao príncipe
Gedalias. Um mau elemento da nobreza e que tinha conseguido escapar, assassinou Gedalias e levou o resto
do povo, juntamente com Jeremias, para o Egito, onde mais tarde o mesmo Nabucodonozor os encontrou.
Estava, assim, terminada a vida de uma nação nascida sob os mais gloriosos auspícios divinos, e tudo por
causa da rebelião contra Deus. A leitura do livro de Ezequiel, escrito, em parte, antes da destruição da cidade,
nos mostra o esforço divino para salvar a cidade e o seu povo, mas a rebeldia não admitia qualquer boa idéia
e mesmo promessa de salvação. De agora até 538, com o advento de Ciro, Jerusalém era um montão de
ruínas.

9. Uma Época de Esperança e de Desolação (536-333 a.C.)

Jerusalém estava destruída; o templo arrasado; o povo disperso pelas regiões da Média, Pérsia e Babilônia.
Era o fim. Para aliviar a situação, lá estavam os profetas, mas até estes tinham perdido a confiança do povo.
Só restava uma vaga esperança de retorno à terra amada, mas esta esperança era muito vaga. Haja vista a
situação descrita por Ezequiel.

Em 561 morre Nabucodonozor e assume o poder do império o jovem Evil-Merodaque, que demonstrou um
espírito mais conciliador para com os deportados. Libertou Jeoiaquim da prisão, onde estivera desde 597, e
levou-o para o palácio, dando-lhe uma pensão vitalícia. Tinham já decorrido 37 anos desde a primeira leva de
cativos. Estavam, portanto, no meio do período previsto por Jeremias. Por morte de Evil-Merodaque, subiu
ao poder Nergal-Sarezer, que tinha tomado parte na destruição de Jerusalém (559-556) (ver Jeremias 39:3). A
Nergal-Sarezer sucedeu seu filho, ainda criança, sendo logo a seguir deposto pelo partido sacerdotal. Reinou
apenas 9 meses. Não havendo sucessor da linha real, foram buscar um aventureiro por nome Nabonido, que
reinou de 555 a 539. Este, entretanto, era mais dado a assuntos religiosos do que a coisas do governo,
entregando a direção do Estado ao seu filho Belsazar, muito nosso conhecido pelo banquete bacanal que deu
em seu palácio, quando a mão misteriosa apareceu na caiadura da parede com aquelas palavras fatídicas, que
só Daniel pôde decifrar (Dan. 5:24). Era chegado o fim do império de Nabucodonozor, que, como tantos
outros, durou muito pouco, mas deu ao mundo uma era de relativa paz e segurança.

Mas a este tempo o mundo se encontrava desassossegado. Movimentos de rebelião iam surgindo em
diversos pontos do império. Ciro, rei de Asã, estava expandindo a sua influência pela Pérsia e, em 549,
capturou Ecbatana, capital da Média. Estavam, assim, unidas a Média e a Pérsia' mas isso não bastava para
um conquistador do quilate de Ciro, e por isso dirigiu as suas vistas para a Asia Menor, mandando na frente de
seu exército um batalhão de camelos, que pôs em fuga a célebre cavalaria de Creso, rei de Lídia e o homem
mais rico do mundo de então. A cidade de Sardes, capital de Lídia, caiu em seu poder em 546 a.C. Faltava-lhe
tomar Babilônia, mas a tomada desta cidade era difícil, por causa das fortes muralhas de 10 metros de largura
e 15 de altura. O seu general, Gobrias, desviou o curso do rio Eufrates e entrou na cidade sem disparar uma
flecha. Nabonido e o seu filho Belsazar foram mortos, conforme a profecia de Daniel. Dario, seu associado da
Média, ficou como governador da cidade, enquanto ele terminava a submissão de algumas regiões rebeldes.
Ciro, por seu espírito liberal, dando liberdade a todos os povos cativos por Nabucodonozor, foi apelidado de o
Grande, e alguns historiadores o classificam como o "Batista" do Velho Testamento, por causa da sua
liberdade e amor à liberdade. Dando liberdade a todos os povos oprimidos, a deu também aos judeus, que
assim podiam voltar à sua terra, como voltaram os que desejaram, sob a liderança de Zorobabel, o
chesbbazar, em 538. Alguns dão 537 como o ano da volta. No segundo ano depois da volta foram lançados
os alicerces do novo templo em Jerusalém, mas pouco depois foram as obras paradas pelas intrigas dos
samaritanos perante Cambises, sucessor de Ciro, que havia sido morto numa rusga com grupos descontentes.
Este Cambises é quem o autor do livro de Esdras qualifica como sendo Assuero e Artaxerxes (ver Esdras 4:5-7).
Na obra do autor, Estudo nos Livros de Crônicas, Esdras, Neemias e Ester é desfeito este equívoco histórico,
pois a impressão geral é que o A!gsuero conhecido é o marido de Ester. Cambises, temendo a influência de
seu irmão Smerdis, assassinou-o, e a seguir invadiu o Egito, e, acometido de um ataque epiléptico, cometeu
toda sorte de desatinos, voltando sem conquistar o Egito, mas depois de multa destruição. Um homem que
pretendeu fazer-se passar por Smerdis (o falso Smerdis) tomou o governo, mas foi logo destituído, subindo ao
poder Dario, o Grande, cognominado Histaspes, em cujo governo as obras do templo continuaram, até serem
completadas no sexto ano de Dario (Esd. 6:15).
Este governante era do tipo de Ciro, dando plena liberdade aos povos cativos, e, no caso dos hebreus, cercou-
os de todas as garantias, inclusive custeando as despesas da construção do templo. De 521-485 a.C.,
governou o império com grande sabedoria, reorganizando os serviços públicos, e dividindo o dito império em
120 satrapias (províncias), de tal modo que foi possível a este conglomerado de povos sobreviver por mais
dois séculos. Os seus feitos foram esculpidos numa rocha em Beistum, em caracteres cuneiformes, persas e
elamitas. Esta inscrição, feita numa rocha de grande altura, deu muito trabalho aos arqueólogos, que não
podiam entender a escrita e nem sabiam como se poderia ter feito tal inscrição.

Um dos seus infelizes erros foi atacar a Grécia em 490, sendo derrotado na batalha de Maratona, retirando-se
para Pérsia, onde morreu, mas aconselhou o seu filho Xerxes, conhecido no livro de Ester como Assuero, a
prosseguir na campanha contra os gregos. Em 480 vamos encontrá-lo envolvido na mais célebre batalha da
antigüidade, a do desfiladeiro das Termópilas, onde os gregos lutaram até cair o último soldado. A sua
esquadra, muito superior à dos gregos, foi destruída na célebre batalha de Salamina, terminando por
convencer os persas que os gregos eram invencíveis. Para uma apreciação de parte da história de Assuero,
aconselhamos a leitura do livro de Ester, por onde se colhe a impressão de que Xerxes era nada mais nada
menos que um gozador da vida, metido com mulheres e vinho. Em parte assim era, mas foi também no seu
governo que a Pérsia atingiu o seu mais alto grau de riqueza e grandeza. Por sua morte (foi assassinado),
subiu ao poder outro soberano, não menos digno e notável, Artaxerxes Longímano, que reinou de 465-424.
Foi no governo deste Artaxerxes que Neemias teve licença para subir a Jerusalém e reconstruir os muros da
cidade, governando o povo com muita sabedoria e prudência. Neemias subiu a Jerusalém em 458, levando
consigo uma leva de cativos que desejaram acompanhá-lo. Foi a terceira leva de cativos voltando a
Jerusalém. Uma leitura atenta do livro de Esdras convencerá melhor o que foi este grande monarca, o último
dos mais ilustres.
10. O Tempo do Fim

Conforme o prognóstico de Daniel, capítulo 5, outro poder se estava levantando no leste, o grande Alexandre.
Os monarcas que sucederam a Artaxerxes Longímano não foram do estofo dos seus antecessores, e por isso e
por ter o Império Persa cumprido a sua missão civilizadora e providencial quanto aos judeus, outro poder
estava se aproximando. Os sucessores de Artaxerxes foram Xerxes 11 (424), Sogdiano (424423), Dario II, o
Notus (423-404), Artexerxes lI, o Minemom (404-358), Artexerxes lII, Codomano (335-330), este vencido por
Alexandre, o Grande. Depois da vitória de Alexandre, a Pérsia tornou-se o império de Alexandre até a sua
morte, pouco depois.

Com a morte de Alexandre, em 323 a.C., os judeus tiveram liberdade de prosseguir na prática de sua religião
sem serem molestados, até que as lutas entre dois dos generais de Alexandre, Seleuco e Ptolomeu, tentaram
a hegemonia do Oriente, envolvendo os judeus em suas contendas. O capítulo 11 de Daniel nos dá um retrato
da situação que se criou com essa disputa, que durou de 320 a 167 a.C., com a vitória dos Macabeus. De 167
a 163, tiveram o período mais brilhante de sua história recente, mas as intrigas, invejas e desavenças deram
oportunidade aos romanos de se meterem nos negócios judaicos em 63, dominando a Palestina até os
tempos de Cristo.

Para uma apreciação do que foi a luta entre os ptolomeus e os selêucidas, aconselhamos a leitura do Capítulo
XI desta obra. O fato mais notável deste longo período foi a ida de muitos judeus para o Egito no governo de
Evergetes (247-222 a.C.). Foi neste período que a Septuaginta foi vertida do hebraico para o grego, para
constituir um volume precioso na biblioteca de Alexandria. Na invasão da Palestina por Seleuco, o Antíoco
Epifanes, cognominado Epimanes (maluco) por seus patrícios, um altar pagão foi colocado no templo em
Jerusalém e o templo dedicado a Júpiter Olimpo, sendo então fechado, até ser reaberto pelo movimento
Macabeu, em 166 a.C, quando a liberdade religiosa voltou a imperar em Jerusalém. Sete guerras foram
travadas pelos Macabeus contra os sírios, até que aqueles os venceram, e estabeleceram a monarquia
davídica. Estas lutas, que duraram mais de um século, mostraram duas coisas: muitos judeus aceitaram o
helenismo pagão, gozando dos favores dos governantes selêucidas, e muitos ficaram fiéis a seu Deus e
sofreram torturas, perseguições e fome, mas venceram finalmente. Com a intromissão dos romanos nos
negócios da Judéia, houve a paz romana, mas, de modo geral, os judeus puderam viver a sua religião sem
serem molestados. No ano 5 a.C., nasceu o Salvador e outra história tem início, que só vai terminar com a
Segunda Vinda do Senhor.

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