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INTRODUÇÃO

A visão mercantilista e capitalista apegada ao desejo de lucro, posse e


acumulação, contribuição em larga escala para a utilização ilimitada e irracional dos
animais, deixando em total descompasso a integridade física e psíquica desses seres
indefesos, mesmo com as leis protecionistas já existentes. As atitudes cruéis dos seres
humanos violentam os animais com as mais diversas formas de agressão, os quais
geralmente pagam com a própria vida o progresso tecnológico, o desenvolvimento das
ciências e a insensatez humana.

O homem muitas vezes utiliza-se da sua superioridade dita “racional” para se


impor sobre os animais lhe impondo ordens e quando não atendidas descontrolam-se
agredindo os animais. Outra situação constante é descontar suas frustrações, problemas
sociais, problemas econômicos e angústias, descarregando todos os sentimentos
negativos nos animais.

Ao analisar as atitudes humanas em relação aos animais não-humanos, Singer


mostra que o valor da vida de um ser não-humano está diretamente ligado à questão de
como devemos tratá-lo. Segundo Singer, nas situações comuns do dia-a-dia,
costumamos fazer certos tipos de exceções à nossa própria espécie. Por exemplo,
achamos correto praticar eutanásia com cães e gatos abandonados, mas não com
humanos abandonados. Em outros termos, costumamos colocar os seres não-humanos
fora do âmbito da consideração moral.

Atualmente, embora ainda não devidamente adequado a proteger os animais


como seres sencientes, dotados de sentimentos e sensações, o protecionismo aos
animais ganhou certo destaque, permitindo a proteção jurídica com a acepção da fauna
como bem ambiental.

Os abusos e maus tratos aos animais são considerados temas de grande


repercussão e amplamente discutidos em razão da relação entre os homens e animais,
bem como pelo desconhecimento de limites que implicam as atitudes de maus tratos.

Segundo Machado et. all (1994) maus tratos ou abusos são atos que se
caracterizam por se intencionais, contínuos e que ocasionam danos físicos, psicológicos
e sociais aos animais, sendo praticados por um agente agressor em condições de
superioridade.
HISTÓRICO DA DEFESA DOS DIREITOS ANIMAIS

Desde os princípios da humanidade existem pessoas e grupos sociais


preocupados com o trato dado aos animais e, também, ao longo da história se
desenvolveram toda classe de atitudes para com eles, inclusive reverentes. O debate
sobre direitos animais no século XX pode ser traçado no passado, na história dos
primeiros filósofos. No século VI a.C., Pitágoras, filósofo e matemático, já falava sobre
respeito animal, pois acreditava na transmigração de almas. Aristóteles, escreveu
no século IV a.C., argumentando que os animais estavam distantes dos humanos na
Grande Corrente do Ser ou escala natural. Alegando irracionalidade, concluía assim
sendo os animais não teriam interesse próprio, existindo apenas para benefício dos Seres
Humanos.

No século XVII, o filósofo francês René Descartes argumenta que animais não


têm almas, logo não pensam e não sentem dor, sendo assim os maus-tratos não eram
errados. Contra isso, Jean-Jacques Rousseau argumenta, no prefácio do seu Discursos
sobre a Desigualdade (1754), que os seres humanos são animais, embora ninguém
"exima-se de intelecto e liberdade". Entretanto, como animais são seres sencientes "eles
deveriam também participar do direito natural e que o homem é responsável no
cumprimento de alguns deveres deles, especificamente "um tem o direito de não ser
desnecessariamente maltratado pelo outro."

No século XVIII, um dos fundadores do utilitarismo moderno, o


filósofo britânico Jeremy Bentham, argumenta que a dor animal é tão real e moralmente
relevante como a dor humana e que "talvez chegue o dia em que o restante da criação
animal venha a adquirir os direitos dos quais jamais poderiam ter sido privados, a não
ser pela mão da tirania". Bentham argumenta ainda que a capacidade de sofrer e não a
capacidade de raciocínio, deve ser a medida para como nós tratamos outros seres. Se a
habilidade da razão fosse critério, muitos Seres Humanos incluindo bebês e pessoas
especiais, teriam também que serem tratados como coisas, escrevendo o famosos trecho:
"A questão não é: eles pensam? Ou eles falam? A questão é: eles sofrem".

No século XIX, Arthur Schopenhauer argumenta que os animais têm a mesma


essência que os humanos, a despeito da falta da razão. Sua crítica à ética Kantiana é
uma vasta e freqüente polêmica contra a exclusão dos animais em seu sistema moral,
que pode ser exemplificada pela famosa frase: "Amaldiçoada toda moralidade que não
veja uma unidade essencial em todos os olhos que enxergam o sol."
No início da década de 70 um grupo de filósofos da Univesidade de Oxford
começou questionar porque o status moral dos animais não-humanos era
necessariamente inferior à dos seres humanos. Esse grupo incluía o psicólogo Richard
D. Ryder, que cunhou o termo "especiecismo" em 1970.

Ryder tornou-se um contribuidor com o influente livro Animals, Men and


Morals: An Inquiry into the Maltreatment of Non-humans, publicado em 1972. Foi
numa resenha de seu livro para o New York Review of Books que Peter Singer, ,
resolveu em 1975 lançar Libertação Animal o livro é freqüentemente citado como a
"bíblia" do movimento de direitos animais, mas que na realidade não concede direitos
morais, nem legais para os animais não-humanos, pois basea-se no utilitarismo.

Desde fins do século XIX, a defesa dos direitos animais foi considerada parte da
corrente filosófica dominante no que concerne às relações humanas com a natureza, o
que se conhece como “proteção da natureza” ou “protecionismo”. Esta evoluiu, a partir
dos anos 1960, para a “conservação da natureza” ou “conservacionismo”, incluindo suas
variações como o “desenvolvimento racional” e logo o “eco-desenvolvimento”.
Finalmente, a partir dos anos 1990 a corrente ambiental majoritária se transformou no
chamado “desenvolvimento sustentável”, que é a base conceitual do ambientalismo
moderno. O ambientalismo reconhece os direitos animais, mas não os considera a pedra
angular do seu pensamento nem da sua ação que, em última instância, persegue o bem-
estar humano. 

O protecionismo da natureza reunia quase igualmente os “protetores de animais”


e os “protetores da natureza”. Mas, para alguns analistas, ambas as perspectivas nunca
foram realmente relacionadas entre si, pois cada uma pertencia a linhas marcadamente
diferentes da ética. Os primeiros dedicavam sua atenção especialmente aos animais
domésticos (cachorros, gatos e outros) e os segundos aos animais selvagens e aos
habitats destes. Progressivamente, os protetores dos animais foram se afastando mais da
“proteção da natureza” para se dedicar, quase que exclusivamente, aos direitos animais,
tendo incluído, ademais da sua oposição à caça de animais selvagens, a proteção aos
animais domésticos (cachorros, gatos) e domesticados (mamíferos e aves criadas para
consumo humano). 

Nas últimas duas décadas, uma ala dos protetores da natureza adotou como
critério de ação o “vegetarianismo” e, assim mesmo, muitos deles abraçaram conceitos e
atitudes bem mais extremas como no caso da denominada “libertação animal”. De outra
parte, os protetores da natureza são hoje muito raros, embora subsistam. São, dentro do
movimento ambiental no qual ainda se encaixam, os mais tradicionais e os que praticam
o que tem sido chamado de “ambientalismo contemplativo” que, na sua essência
utópica, procura manter uma natureza intocada. Na atualidade, os defensores dos
direitos animais não fundamentam seu pensamento na ecologia e na economia, que são
os alicerces do ambientalismo, ao que pode se somar a sociologia para dar lugar ao
socio-ambientalismo. Eles se fundamentam quase exclusivamente em uma perspectiva
ética da relação do ser humano com os outros seres do reino animal. Argumentam, não
sem razão, que a ética não pode deixar de lado direitos ou, pelo menos, um trato justo
aos demais seres vivos do planeta, especialmente aos animais.

A ORIGEM DOS MAUS-TRATOS: O VALOR DA VIDA SENCIENTE E


AUTOCONSCIENTE

Para entendermos a razão do ser humano mal tratar animais não-humanos,


precisamos, segundo Singer, analisar a principal concepção do valor sagrado do ser
humano que explica as atitudes ocidentais em relação aos animais e a natureza. Quatro
argumentos, segundo Singer, nos fazem sustentar essa concepção. São eles: 1) somente
os seres humanos são conscientes; 2) somente os seres humanos têm almas imortais; 3)
as vidas humanas são propriedades de Deus. Deus deu aos homens o domínio sobre os
animais; 4) os seres humanos são “fim em si mesmos” e os animais são meros meios.
René Descartes afirma na obra Discurso do Método que os animais não possuem
mentes, comparando-os a meras máquinas1. Para Descartes, seres desprovidos de
consciência são incapazes de sentir dor.

Segundo Singer, sabemos que o sistema nervoso de todos os vertebrados,


sobretudo o de mamíferos e pássaros, é bastante parecido. Ao contrário do córtex
cerebral, que só se desenvolveu plenamente depois que nossos ancestrais se
diferenciaram dos outros mamíferos, o sistema nervoso básico evoluiu em ancestrais
mais distantes, comuns a nós e aos outros animais “superiores”. O córtex cerebral é
parte do cérebro associada às funções do pensamento e não aos sentimentos e emoções.
A parte do cérebro associada às emoções e aos sentimentos, o diencéfalo, mais
precisamente o sistema límbico, está bem desenvolvida em muitas espécies animais,
particularmente nos mamíferos e pássaros.

Compõem o sistema límbico: a amígdala, o hipocampo, tálamo, hipotálamo, giro


cingulado, tronco cerebral e setpo. A destruição experimental das amígdalas faz com
que o animal se torne dócil, sexualmente indiscriminativo, afetivamente
descaracterizado e indiferente às situações de risco. Um hipocampo intacto possibilita
ao animal comparar as condições de uma ameaça atual com experiências passadas
similares, permitindo-lhe, assim, escolher qual a melhor opção a ser tomada para
garantir sua preservação. O tálamo esta correlacionado com as reações da reatividade
emocional dos animais. O hipotálamo é a parte mais importante do sistema límbico. Ele
desempenha um papel nas emoções, especificamente, as partes laterais parecem
envolvidas com o prazer e a raiva, enquanto que a porção mediana parece mais ligada à
aversão, ao desprazer.

Por meio dessas semelhanças anatômicas, os cientistas têm observado que os


animais respondem fisiologicamente à dor física e psíquica (medo, ansiedade,
depressão, stress) da mesma maneira que os humanos o fazem. Por isso, quando sentem
alguma dor, os animais se comportam de um jeito muito parecido com o dos humanos, e
o seu comportamento é suficiente para justificar a convicção de que eles sentem dor e,
portanto, são conscientes.

Alguém pode objetar que essas similaridades entre humanos e animais passam
por cima de uma diferença vital: os humanos podem falar o que estão sentindo e os
animais não. Sabemos, contudo, que algumas espécies de animais podem de uma
maneira ou de outra se comunicar. Por exemplo, alguns chimpanzés podem aprender a
linguagem de sinais amplamente usada por deficientes humanos. Segundo Singer, não
se deve negligenciar as formas não-verbais de comunicação. Sabe-se que, muitas vezes,
as emoções podem se tornar mais aparentes quando expressas, por exemplo, por um
olhar ou uma ação, do que quando expressas por palavras. Charles Darwin, no livro A
expressão das emoções nos homens e nos animais, afirma: “muitas das formas não-
verbais usadas para transmitir emoções são usadas identicamente por outras espécies”2.
Por isso, segundo Singer, pode-se afirmar que é falsa a tentativa de Descartes de mostrar
que os animais são meras máquinas e, também, é falsa a tentativa de mostrar que a vida
humana tem valor único ou sagrado por ser a única na qual a consciência se manifesta.

Além de afirmar que os animais são seres desprovidos de consciência, Descartes


também afirma que somente os seres humanos “possuem uma alma imortal, responsável
pelos nossos sentimentos e experiências mentais”. Com essa afirmação, Descartes
expressa, segundo Singer, um dogma dos cristãos ortodoxos. Para estes, dentre todas as
criaturas, somente os humanos foram criados à imagem de Deus. Os animais não têm
alma imortal e, por isso, suas vidas são desprovidas de valor. Com o argumento da alma
imortal, o cristianismo sustenta que apenas os humanos têm uma vida eterna após a
morte e que possuem um lado espiritual que os liga a Deus e aos anjos. Por faltar uma
justificação racional para acreditar em uma alma imortal, Singer questiona: por que é
errado matar um humano se ele viverá eternamente em outro mundo? A vida de um ser
humano neste mundo é apenas uma fração infinitamente menor da sua existência total,
enquanto que a vida de um ser não-humano neste mundo corresponde à sua existência
total. Por isso, não faz sentido dizer, conforme o argumento da alma imortal, que a vida
humana é mais valiosa. Singer ainda lembra que o mais intrigante para os cristãos na
questão de matar um ser com alma imortal, ou seja, um ser humano, é o fato de que ao
fazer isso condena-se-o ao destino eterno. Por exemplo, matar intempestivamente um
ser humano pecador representa sua condenação ao inferno por não lhe ser dada a chance
de arrependimento. Singer aponta que esse argumento é falho, pois poderse-ia matar
uma pessoa que não tem pecados com intuito de lhe dar a imortalidade evitando, assim,
pecados futuros. Por isso, não se pode defender que eles tenham um valor único,
especial, com o argumento de que os humanos possuem uma alma imortal.

Há mais de dois mil e trezentos anos, o filósofo grego Platão escreveu a obra
chamada Fedon. Neste diálogo, Sócrates, o personagem por meio do qual Platão
expressa sua posição, sustenta que é diferente tirar a vida de um animal não-humano e
de um ser humano. De acordo com Sócrates, “ao tirar a vida de um ser humano
causamos fúria aos deuses, enquanto que ao matar um animal podemos causar raiva
somente ao seu dono. Conseqüentemente, o dono de um animal pode matá-lo quando
quiser”.

A idéia de que os homens são propriedade de Deus influenciou a Igreja Romana.


Ela é sustentada por Aquino e pelo filósofo protestante Immanuel Kant. Para Aquino,
tirar a vida de um ser humano é pecar contra Deus, da mesma maneira que tirar a vida
de um escravo pode ser um pecado contra o seu dono. Deus é nosso dono e matar um
ser humano é usurpar do direito divino de decidir quem deve morrer ou viver. A visão
protestante, representada por Kant, diz que “os seres humanos são sentinelas da terra e
não podem deixar seus postos até que sejam salvos por uma ajuda beneficente”.
Segundo Singer, a Igreja Católica justifica o abate de animais para o consumo
humano com a História da Criação, presente no livro Gênesis da Bíblia. Ali, Deus fala
que criou todas as criaturas, homens e animais. Contudo, depois da criação do homem e
da mulher, foi dado àquele o poder sobre todos os animais que se movem na terra. Esse
domínio se intensifica ainda mais depois do dilúvio, no momento de escassez. De
acordo com Singer, essa passagem bíblica é interpretada por alguns escritores
da tradição judaico-cristã, como o momento em que Deus outorga os seus direitos de
domínio sobre os animais aos homens, justificando, desse modo, o uso que estes fazem
daqueles. Podemos chamar esta visão, segundo Singer, de Teoria Dominante. Uma das
implicações da teoria dominante, no contexto judaico-cristão, é que a vida dos animais
parece ter pouco ou nenhum valor. Singer diz que a Teoria Dominante deve ser
rejeitada, pois pode ser considerada uma tentativa fracassada de justificar as atitudes em
relação aos animais e o seu abate para alimentação humana.

A tese de que os animais são capazes de experimentar dor e prazer analogamente


aos seres humanos pode servir de argumento para rejeitar os fundamentos religiosos que
justificam um tratamento especial somente aos seres humanos. Resta, ainda, tratar da
idéia kantiana, comumente defendida, a saber, que os seres humanos são fim em si
mesmos. Segundo Kant, os animais não são autoconscientes, eles são meros meios que
existem para um fim. Este fim é o homem. Nós podemos fazer a pergunta, ‘Por que os
animais existem?’, mas perguntar ‘Por que o homem existe?’ é uma questão sem
sentido. Os nossos deveres em relação aos animais são, meramente, deveres indiretos
em relação à humanidade

Para Kant, o homem e, de modo geral, “todo o ser racional, existe como fim em
si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade”. Esse valor
também pode ser chamado de valor intrínseco. Podemos perceber na teoria kantiana a
distinção das coisas que têm valor absoluto ou incondicional, isto é, as coisas que são
boas em si mesmas independentemente de todas as condições, das coisas que têm valor
condicional, isto é, coisas cuja bondade depende de condições externas. De acordo com
Kant, a única coisa boa que possui valor absoluto é a boa vontade. Por outro lado, “o
valor de todos os objetos que possamos adquirir pelas nossas ações é sempre
condicional”. Os seres irracionais cuja existência depende, não da nossa vontade, mas
da natureza, têm, para Kant “apenas um valor relativo como meios e, por isso, se
chamam coisas, ao passo que os seres racionais se chamam pessoas, porque sua
natureza os distingue já como fins em si mesmos, quer dizer, como algo que não pode
ser empregado como simples meio”.

Singer rejeita o argumento do valor intrínseco dizendo que não podemos dar
algum tipo de dignidade ou valor a recém-nascidos, deficientes mentais, assassinos
psicopatas e negarmos esse valor a animais como baleias, gorilas, vacas, cavalos.
Segundo Singer, mais argumentos são necessários para justificar a crença de que
somente os seres humanos têm algum tipo de valor especial, dignidade ou que são “fins
em si mesmos”. Segundo Singer, é importante compreender que o mero fato de todos os
seres humanos pertencerem à mesma espécie não é uma justificação satisfatória para
sustentar a tese de que os seres humanos têm um valor moral maior. Singer usa o termo
especismo para designar o tratamento discriminatório dos humanos em relação aos seres
de outras espécies.

Alguém, segundo Singer, poderia dizer que existem diferenças significativas


entre as espécies. Ao comparar um ser humano com um animal, percebemos que os
seres humanos podem fazer coisas que os animais não fazem. Por exemplo, raciocinar
sobre questões abstratas, fazer uso de uma linguagem complexa, fazer planos e fazer
julgamentos morais. Contudo, isso é claramente falso ao compararmos animais com
todos os seres humanos. As crianças e os seres humanos debilitados intelectualmente
não são capazes de fazer um raciocínio abstrato, usar a linguagem, planejar o futuro ou
fazer julgamentos morais. Se, portanto, pensamos que são essas capacidades ou a
combinação delas que dão aos seres humanos um valor ou um status moral que os
animais não têm, então, não podemos sustentar que todos os seres humanos têm este
valor.
Feito um exame crítico dos fundamentos que defendem o valor único do ser
humano, Singer diz que nenhum deles pode ser sustentado. Por isso, assegura que a
tradição ocidental tem de ser abandonada. Para Singer, é impossível sustentar, sem uma
discriminação arbitrária e injustificada, que a vida de todo e qualquer indivíduo da
espécie Homo sapiens tenha um valor mais alto do que a de qualquer animal. Devemos,
portanto, abandonar a crença de que a vida humana tenha sempre um valor mais
alto. Ele aponta a opção de mudarmos de idéia: ao invés de pensarmos que toda vida
humana tem valor superior podemos pensar que a vida de uma pessoa tem valor único.
Singer conclui que o termo pessoa não deve ser definido de maneira equivalente a ser
humano.

Quando os filósofos se referem à “autoconsciência”, eles não usam este termo no


sentido popular, por exemplo, quando digo que sou um ser autoconsciente porque
percebo que sou a única pessoa que não está usando gravata num jantar.
Autoconhecimento, segundo Singer, pode ser o melhor termo para expressar o que os
filósofos dizem por “autoconsciência”. Um ser é autoconsciente, se ele é consciente de
si mesmo como uma entidade distinta das outras entidades desse mundo. Um ser
autoconsciente é consciente de si mesmo como existindo em um período de tempo,
ainda que seja curto. A racionalidade, provavelmente, já está incluída nessa concepção
de autoconsciência. Já a capacidade de sentir dor ou prazer é algo que, segundo Singer,
devemos ser capazes de distinguir da autoconsciência, ao menos na teoria. Isso não
significa que seja difícil saber quais animais são conscientes de si, pois no mundo
percebemos que um ser autoconsciente é sempre capaz de sentir dor e prazer.

Singer faz uma distinção entre “ser humano” e “pessoa”, usando o último
conceito para referir seres autoconscientes, ou seja, conscientes de si mesmos como
entidades distintas existindo ao longo do tempo. Esse ser, segundo Singer, será capaz de
ter desejos relativos a seu próprio futuro. Tirar a vida de “pessoas” sem o seu
consentimento significa frustrar seus desejos futuros. Por outro lado, segundo Singer,
matar uma lesma ou um recém-nascido de um dia não frustra nenhum desejo, pois as
lesmas e os recém-nascidos são incapazes de tê-los. Nesse sentido, Singer chega à
conclusão de que é possível que um ser humano – membro da espécie Homo sapiens –
não seja considerado uma pessoa e, também, que um animal não-humano seja
considerado uma pessoa.
Embora os argumentos de Regan tenham conseguido estender o respeito à vida
para outras espécies animais, Singer afirma que nesta proteção somente os animais
“superiores”, ou seja, somente os mamíferos parecem estar incluídos. Singer menciona
que animais como peixes, frangos, pássaros e os mamíferos menos inteligentes, como
ratos ou gatos, podem ser conscientes, pois possuem um sistema nervoso central, têm
comportamento parecido com o nosso em situações nas quais sentem dor, são capazes
de sentir emoções, mas não autoconscientes, capazes de se conceber como uma
entidade distinta existindo ao longo do tempo. Segundo Singer, pode ser que existam
animais conscientes, que não sejam autoconscientes.Por isso, o autor passa a investigar
duas questões: 1) a do valor que esses animais podem ter e 2) a de se eles, mesmo não
podendo ser considerados pessoas, têm ou não direito à vida.

É razoável acreditar que algumas formas simples de vida animal não tenham
desejos ou preferências conscientes. Ostras, amebas e mexilhões talvez devam ser
incluídos nessa categoria.

DELITOS QUALIFICADOS COMO CRIMES E PUNÍVEIS PELA LEGISLAÇÃO


BRASILEIRA

A constituição federal de 1988 prevê a proteção ao meio ambiente, a flora e a


fauna. Infraconstitucionalmente, diversas leis esparsas seguem o mesmo sentido, dando
azo às responsabilidades civil, administrativas e criminal de quem contra o ambiente
comete ilícito. Em seu art. 225, garante a todos o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-
lo para as presentes e futuras gerações. O direito penal ambiental surgiu com força para
tutelas os animais ainda que parcialmente. Repare-se que para a Lei das Contravenções
Penais, os maus-tratos aos animais eram delitos qualificados como contravenção penal,
conforme disposto em seu artigo 64. Com o advento da lei n° 9.605, de 12/02/1998,
chamada Lei de Crimes Ambientais (LCA), os maus tratos passaram a se enquadrados
como crimes, vez que revogou tacitamente o artigo das Contravenções Penais. Assim
mediante o art.32 da LCA, constata-se que a prática de atos de abuso ou crueldade
contra os animais, afere ao agente da conduta ilícita pena de detenção de 3 meses a 1
ano e multa de acordo com a gravidade do ilícito.

No artigo 32 consta que praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar


animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Podendo ser aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

Infelizmente alguns operadores do direito entendem tais cominações como jogo


de força entre seres humanos e animais, amparando, assim a impropriedade do art. 32 da
LCA, ao alegar que a pena prevista ao infrator é superior àquela prevista nos casos de
maus tratos com seres humanos. Para esses, a pena não deveria ser tão rigorosa daquela
avençada para crimes contra a pessoa humana.
É preciso sopesar o fato que mesmo com a pena cominada, os crimes de maus
tratos, abusos, explorações e mutilações feitas aos animais acontecem diariamente em
todas as cidades, em imensa quantidade, cujo agente ativo é o homem, caracterizado
como racional, e as justificativas fornecidas a essas práticas deploráveis são sempre as
mesmas: o Animal não colaborou ou não quis servir aos interesses para o ganho
financeiro do agente.

Ilustra-se como o exemplo dos cavalos que morrem nas ruas em razão de
inanição pois, cansados, desnutridos e sem qualquer condições orgânicas, físicas ou
emocionais são geralmente chicoteados, açoitado, machucados, violentados e forçados
ao trabalho escravo e à obediência de ordens humanas. Além desse triste e assíduo
exemplo nas cidades, há tantos outros esquecidos e não priorizados pelos homens que
requerem a aplicação do art. 32 da LCA, como acontece nos caso de gatos que tem suas
unhas extraídas por seus responsáveis, a fim de não estragar a mobília; nas situações
que os animais são comercializados como objeto de locação de serviços e são
explorados até a morte; submetendo-os a falta de alimentação e de água, além de maus
tratos físicos e químicos; ou então, como nos casos de animais domésticos submetidos a
cirurgias estéticas de corte de cauda e de pedaço de orelhas para satisfação do dono.

Cabe ao direito procurar colocar termo nessas praticas que sacrificam milhares
de vidas inocentes. Nesta ordem, a norma constitucional foi regulamentada com a LCA,
a qual englobou outros diplomas de proteção jurídica penal passa a ser o bem-estar dos
animais e sua integridade biológica, embora há quem defenda que o bem jurídico a ser
tutelado seria tão somente o equilíbrio ecológico. Nesta segunda acepção, tutela-se a
função ecológica da fauna e não propriamente ao animais, como elucida a Lei de
Proteção à fauna, Lei n° 5.197/67

A Lei dos Crimes Ambientais reordena a legislação ambiental brasileira no que


se refere às infrações e punições. A partir dela, a pessoa jurídica, autora ou coautora da
infração ambiental, pode ser penalizada, chegando à liquidação da empresa, se ela tiver
sido criada ou usada para facilitar ou ocultar um crime ambiental.

A lei n° 9.605/98, protege a fauna ao definir os crimes ambientais e dispor sobre


as sanções penais e administrativas resultantes de atividades e condutas lesivas ao
ambiente e aos bens ambientais. Dividida em oito capítulos, o capitulo V trata dos
crimes contra o ambiente e divide-se em cinco seções. A seção I, refere-se aos crimes
contra a fauna, nos quais estão elencados nove artigos que constituem tipos específicos,
dentre os oitenta e dois artigos da Lei. As condutas consideradas criminosas estão
previstas nos arts. 29 ao 37, previstos crimes dolosos, bem como a modalidade culposa.
Permite-se, inclusive, conceber crimes comissivos por omissão ou falsamente
omissivos. O novo diploma apresentou, também, a regra de co-autoria e participação
nos crimes contra os animais. Introduziu a responsabilidade penal da pessoa jurídica por
crime contra o ambiente, embora não tenha especificado as sanções cabíveis nos tipos
penais, a comprometer, de certa forma a aplicabilidade da lei.
A lei 5.197/67, Classifica como crime o uso, perseguição, apanha de animais
silvestres, a caça profissional, o comércio de espécimes da fauna silvestre e produtos
que derivaram de sua caça, além de proibir a introdução de espécie exótica (importada)
e a caça amadorística sem autorização do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Também criminaliza a exportação de
peles e couros de anfíbios e répteis (como o jacaré) em bruto. É constituída de 38
artigos. O crimes são puníveis com pena de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
CONCLUSÃO

Levando em conta a posição sustentada por Singer quanto ao valor da vida de


seres humanos pode-se concluir que o argumento da tradição moral predominante,
segundo o qual a vida dos membros da espécie Homo sapiens têm um valor único ou
sagrado, não pode servir de base para justificar as atitudes humanas de exploração de
seres não-humanos. Por isso, devemos abandonar essa visão e reavaliar nossa
concepção especista da natureza. Por outro lado, ao distinguir eticamente a questão do
valor da vida de pessoas e de animais, da questão do sofrimento que lhes é causado para
matá-los,
Singer dá a impressão de não atribuir valor algum à vida de animais onsiderados
não-pessoas. Como pudemos perceber, Singer analisa o valor da vida de seres
considerados pessoas porque, segundo o autor, a idéia de que “pessoas” têm um “direito
à vida” é bastante popular. O uso de animais na alimentação ou nas experimentações
não significa somente a morte desses animais. Significa também dor e sofrimento. Suas
vidas são exploradas com a finalidade de, por exemplo, reduzir custos de produção.

Portanto, ao ordenamento penal, a lesão, os maus tratos e a mutilação dos


animais legitima a sanção imposta ao autor da infração, posto ser o bem jurídico
merecedor de tutela penal. A vítima o sujeito passivo é a humanidade e o próprio
animal, seja em consideração à integridade física e moral dos seres humanos.

Lastimavelmente, há que se consignar que as sanções previstas nessas leis ainda


deixam muita a desejar, seja por não prestarem a intimidar as condutas ilícitas, seja por
não serem hábeis a punir com rigor crimes contra os animais ou mesmo por não resolver
o problema principal que a superioridade imposta pelo homem sobre os animais. Ainda
que tardio, é momento para aplicação de nova e adequada postura ética-socioambiental,
mediante a inserção de educação ambiental conjugada com a normatização e controle
dea proteção jurídica dos Animais.
REFERÊNCIAS

 SINGER, PETER. Libertação Animal. Lugano: Rio de Janeiro, 1975. 357


paginas. ISBN: 8589958019
 Revista CFMV- Brasilia/DF – Ano XI – N°36
setembro/outubro/novembro/dezembro de 2005
 www.cep.unt.edu
 www.environmentalethics.ca
 Eu Gosto de Bicho: www.eugostodebicho.com.br
 Gabea: www.gabea.com.br
 Sos Cavalos: www.ufrgs.br/dafv/sos_cavalos.htm
 Imepa: www.imepa.org.br
 http://www.oeco.com.br/todos-os-colunistas/16407?task=view
 http://www.apasfa.org/leis/9605.shtml
 http://pt.shvoong.com/humanities/1803515-os-animais-irracionais-também-tem/
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMIÁRIDO - UFERSA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ANIMAIS - DCAn

DISCIPLINA: BIOÉTICA E MEDICINA LEGAL

DOCENTE: JOSUÉ

MAUS TRATOS AOS ANIMAIS

E IMPLICAÇÕES LEGAIS

MOSSORÓ-RN

JUNHO/2010
ALYSSON MAX OLINTO TORRES VERISSIMO

MAUS TRATOS AOS ANIMAIS

ETICA DO VETERINÁRIO

Trabalho referente à disciplina de


Bioética e Medicina Legal,
ministrada pelo Ms. Dr. Josué
como pré-requisito para compor a
nota da 3° avaliação.

MOSSORÓ-RN

JUlHO/2010

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