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ANO 16 | no 177
R$ 19,90 | 4,90 €
m lher
CRIANÇAS
TRANSGÊNERO
E A BUSCA PELAS RAÍZES
Novos estudos
nas áreas de sexo e
A IDOLATR
GÊNIOS
RIA AOS
É UMA CILADA
gênero interessam
DO SENSO DE IDENTIDADE
O
A VIRADA NO
PES
SQUISAS MÉDICAS DEIXAM a todos D
DEBATE SOBRE
DIFERENÇ
ÇAS
ORGANISMO C AIS
FEMININO
EM SEGUNDO PLANO
ENTRE HOMEN
NS
E MULHERES
FÊMEA MONOGÂMICA,
00177
INFLUENCIAM A
DETERMINAÇÃO DO SEXO ESTEREÓTIPOS
O U T U B R O 2 0 17
ANO 16
52 Não só para
homens
Pesquisadores e médicos
precisam ir mais fundo
nas diferenças de gênero
para que possam
oferecer melhores
tratamentos às mulheres.
Marcia L. Stefanick
58 O retorno das filhas
desaparecidas
As tradições que dão
preferência a filhos na
Ásia — o que resulta em
milhões de meninas
mortas ou
negligenciadas —
começaram a mudar.
Monica Das Gupta
64 Trabalho de mulher
Quanto mais mulheres
contribuem para a
economia, melhor fica a
vida para todos. Por que
é tão difícil diminuir as
barreiras às
oportunidades para elas?
Ana L. Revenga e Ana
32 Homens promíscuos, 44 Quando sexo e Maria Munoz Boudet
mulheres castas gênero colidem
e outros mitos Estudos com crianças trans- 70 Armadilha do
de gênero gênero estão oferecendo brilhantismo
A noção de que diferenças insights fascinantes sobre Como a ênfase
comportamentais entre os gênero no cérebro. Muitas equivocada em relação à
genialidade sutilmente
sexos são inatas e imutáveis crianças trans apresentam
desencoraja as mulheres
não se sustenta sob identidades surpreendente-
e os afro-americanos de
escrutínio. Cordelia Fine e mente firmes em tenras
entrar em certos campos
Mark A. Elgar idades, por exemplo, e impor-
acadêmicos. Andrei
tantes diferenças separam
38 Existe um cérebro Cimpian e Sarah-Jane
meninas trans de meninos Leslie
“feminino”?
que gostam de cor-de-rosa.
Debate sobre eventuais 76 Efeito tesoura
Kristina R. Olson
diferenças entre cérebros No Brasil, o número de
de homens e mulheres 50 Além do XX e XY mulheres envolvidas
poderá ter profundas Uma infinidade de fatores com a física decresce à
implicações para define se uma pessoa é medida que a carreira
saúde e para mulher, homem ou se está progride. Débora
identidades pessoais. em algum ponto entre os Menezes, Carolina Brito
Lydia Denworth dois. Amanda Montañez e Célia Anteneodo
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5 Carta do editor
FÓRUM
7 África pode dar fim à malária
Mas a organização africana que combate a doença
precisa de dinheiro.
Carl Manlan
C I Ê N C I A E M PAU TA
8 Parem de atacar a saúde feminina
Esforços republicanos para desmantelar o sistema de cui-
dados de saúde dos EUA miram, injustamente, num
gênero.
9 Memória
10 Avanços
- O mais velho Homo sapiens?
8 - Sem brilho
- O protetor que imita pele
- No ritmo do coração
- Arco-íris do bebê
- Enxergando na neblina
- Vida de gigante
- A madeira é o novo aço
- Genes de corujões
- Navegando por toque
DE SAFIOS DO COSMOS E CÉU DO MÊ S
18 Fecha-se nosso olho sobre Saturno
Missão Cassini encontrou lagos e oceanos em satélites do
gigante dos anéis. Salvador Nogueira
C I Ê N C I A DA S AÚ D E
22 Apuro pediátrico
Novas iniciativas visam diminuir os obstáculos para a
15 descoberta de tratamentos úteis para as crianças.
Charles Schmidt
OBSERVATÓRIO
24 Do iogurte aos mamutes
A rapidez com que o CRISPR se espalhou e seu impacto
para o futuro da humanidade não tem precedentes.
Stevens Rehen
CÉTICO
25 Pós-modernismo versus Ciência
As raízes da atual loucura na Universidade.
Michael Shermer
81 Livros
CIÊNCIA EM GR ÁFICO
82 O fim
De que morre a maioria dos homens e mulheres?
22 Mark Fischetti
ALGUNS COLABORADORES
Cordelia Fine é professora de história ÜÍDODD§æ¡èÍ«Ò«OÍrDZù§ZD Monica Das Gupta÷µÍ«{rÒÒ«ÍD§« Sarah-Jane Leslie é professora de «µrÍD]ĂrÒ§Dæ§fD]õ«Z«OD§r
r«Ò«DfDZù§ZD§D f«Z«¡µ«ÍÜD¡r§Ü«Ò«ZD» frµDÍÜD¡r§Ü«frÒ«Z««DfD «Ò«DfDZDÒÒrfr®¨Þ§D $r¡OÍ«%ré<«ZrÒfräð®×f«
7§èrÍÒfDfrfr$rO«æͧrræ¡D 7§èrÍÒfDfrfr$DÍëD§fr 7§èrÍÒfDfr0ͧZrÜ«§» §ÒÜÜæÜ«Òµr§»ÒfrDÒr«µ§ĂrÒ
{r«éf«=«¡r§ÊÒ"rDfrÍÒµ Kristina R. Olson é diretora do ÜÍDOD«æZ«¡«fr¡þÍD{DµDÍD« rêµÍrÒÒDÒ§rÒÜrDÍÜ«Òõ«frr»
§ÒÜÜæÜræÒÜÍDD»3ræèÍ«¡DÒ µÍ«rÜ«5ÍD§Ò?«æÜdÂær÷Dµ«Df«
D§Z«$æ§fD» Débora P. Menezes÷µÍ«{rÒÒ«ÍD§D
ÍrZr§Ür÷J[ijeij[hed[H[n0Coj^i µrDæ§fD]õ«%DZ«§Dfrù§ZDÒ» 73» Charles Schmidt ÷«Í§DÒÜDfr
e\i[n"iY_[dY["WdZieY_[jo D÷µÍ«{rÒÒ«ÍDDÒÒ«ZDfDfr Ana L. Revenga÷rZ«§«¡ÒÜDZr{r Zù§ZDr¡0«ÍÜD§fd$D§r»
·=»=»%«ÍÜ«§däð®Ö¸» µÒZ««D§D7§èrÍÒfDfrfr Dfæ§ÜDf«Í浫
D§Z«$æ§fD» Carolina Brito÷µÍ«{rÒÒ«ÍD§D723»
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Mark A. Elgar÷µÍ«{rÒÒ«ÍfrO««D frÍDf««ÜÍDOD«fD§ÒÜÜæ]õ« Celia Anteneodo÷µÍ«{rÒÒ«ÍD§D 3rµÜZ·ééé»ÒrµÜZ»Z«¡¸r
rè«æÜèD§D7§èrÍÒfDfrfr r¡ÂærÒÜĂrÒfrµ«OÍrîDr 072«» µÍrÒfr§ÜD{r«éfD7§èrÍÒfDfr
$rO«æͧr»3ræÍ浫frµrÒÂæÒD Marcia L. Stefanick é professora de rÂæfDfr» Dµ¡D§»3ræµÍþê¡«èÍ«
ÒrZ«§Zr§ÜÍDr¡ÂærÒÜĂrÒÒ«OÍr« ¡rfZ§Df«r§ÜÍ«fr0rÒÂæÒDfr Salvador Nogueira ÷«Í§DÒÜDfr ZD¡DÒrrDèr§Ò«§DÍÜ»3D«
Ò§ZDf«rè«æÜè«fr 0Írèr§]õ«3ÜD§{«ÍfrµÍ«{rÒÒ«ÍDfr Ana Maria Munoz Boudet÷Zr§ÜÒÜD Zù§ZDrÒµrZDîDf«r¡ §«5éÜÜrÍ6c_Y^W[bi^[hc[h
Z«¡µ«ÍÜD¡r§Ü«ÒZ««µrÍDÜè«Òrfr «OÒÜrÜÍûZDr§rZ««DfDÒZ«D Ò«ZDÒù§«ÍfD0ÍñÜZD«ODÒ«OÍr DÒÜÍ«§«¡DrDÒÜÍ«§ñæÜZD»DæÜ«Í
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Lydia DenworthrÒZÍrèrÒ«OÍr D¡µ«ÜrÒÜrZ«¡¡ærÍrÒ¡DÒ YeceWY_
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Zù§ZDr÷DæÜ«ÍDfr?YWd^[Whoek èrDÒÍrDZ«§Df«òµÍrèr§]õ«fr Andrei Cimpian é professor
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ANO 16 – OUTUBRO DE 2017 CONTAS A PAGAR Siumara Celeste CENTRAL DE ATENDIMENTO AO LEITOR
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FÓRUM Carl Manlan ÷rZ«§«¡ÒÜDfD«ÒÜDf«$DÍ¡dfÍrÜ«ÍZr{r
F R O N T E IR A S DA C I Ê N C I A
C OM E N TA DA S P O R E S PE C I A LI S TA S fr«µrÍD]ĂrÒ§Dæ§fD]õ«Z«OD§r$r¡OÍ«%ré<«ZrÒfr
äð®×f«§ÒÜÜæÜ«Òµr§»ÒfrDÒr«µ§ĂrÒrêµÍrÒÒDÒ§rÒÜr
DÍÜ«Òõ«frr»
África pode dar milhões para acabar com o ebola de vez. Essa dinâmica deve con-
tinuar para o CDC fundado pela África. Alguns países africanos e
Parem de atacar
a saúde feminina
Esforços republicanos para desmantelar
o sistema de cuidados de saúde dos
EUA miram, injustamente, num gênero
Pelos editores
por lei a fornecer cuidados de maternidade a mães não seguradas.
Há algo de podre no estado de saúde das mulheres. Enquanto O projeto de lei, em sua forma atual, também bloquearia efe-
este artigo era escrito em julho, republicanos no Congresso tivamente financiamentos para a Planned Parenthood, que for-
faziam um frenético esforço para revogar e substituir a Lei de nece serviços de saúde reprodutiva a 2,4 milhões de mulheres e
Cuidados Acessíveis (ACA, na sigla em inglês), colocada em prá- homens. Suas clínicas já estão proibidas de usar financiamen-
tica pelo governo Obama. Pelo menos 22 milhões de americanos to federal para abortos, exceto em casos de estupro ou inces-
perderiam seu seguro saúde até 2026, pela mais recente versão to, ou quando a vida da mãe está em perigo, de acordo com a
deste plano — que inclui cortes substanciais no Medicaid [o pro- Emenda Hyde, de âmbito federal. Portanto, os cortes da Planned
grama de saúde social para famílias e pessoas de baixa renda e Parenthood afetariam principalmente serviços de saúde de roti-
recursos limitados] — e falta de seguro significa mais doenças e na, tais como exames ginecológicos, exames de câncer, testes de
morte para milhares, como mostram os dados. Esses cortes ame- DSTs e anticoncepção — e essas clínicas às vezes são a única fon-
açam afetar mais mulheres do que homens — seja por remover te para tais cuidados. Independentemente do lado em que você
uma cobertura básica de saúde, reduzir cuidados de maternida- esteja no debate pró-vida/pró-escolha, essas tentativas de remo-
de ou limitar acentuadamente os direitos reprodutivos. ver acesso a serviços tão básicos deveriam alarmar a todos nós.
É hora de tomar posição contra esta guerra à saúde das mu- O governo Trump também vem limitando a autorização da
lheres. Os desdobramentos atuais são só o mais recente insul- ACA para fornecer serviços de controle de natalidade. Uma pro-
to em uma longa história de medicina androcêntrica, muitas ve- posta vazada em maio sugeriu que a Casa Branca trabalhava na
zes impulsionada não por políticos, mas por cientistas e médicos. criação de uma isenção para permitir que quase todo emprega-
Antes da Lei de Revitalização dos Institutos Nacionais de Saú- dor opte por não cobrir a contracepção com base em motivos re-
de, de 1993, que exigiu a inclusão de mulheres e minorias em en- ligiosos ou morais. Em nível nacional, mulheres estão recorren-
saios clínicos em fase final de medicamentos e tratamentos, mu- do cada vez mais a anticoncepcionais reversíveis de longa dura-
lheres eram ativamente excluídas de tais testes porque cientistas ção (LARCs) altamente eficazes, tais como DIUs. A porcentagem
temiam que os ciclos hormonais femininos interferissem nos re- de mulheres com idades entre 15 e 44 anos que usam LARCs qua-
sultados. Essa omissão significou que mulheres não sabiam como se quintuplicou de 2002 a 2013. Uma cobertura menor para anti-
remédios em geral as afetariam. Sua reação a doenças e medica- concepcionais se traduz em um uso menos difundido e provavel-
mentos difere da dos homens, e mesmo hoje essas diferenças são mente significará mais gestações indesejadas e abortos.
pouco compreendidas. Mulheres relatam dores mais intensas do E abortos se tornarão mais difíceis. Depois do caso Roe ver-
que homens em quase todas as categorias de doenças, não se sabe sus Wade, muitos estados tentaram implantar leis para impedir o
por quê. Doenças cardíacas são o assassino número um de mulhe- funcionamento de clínicas de aborto. Esses esforços se intensifi-
res nos EUA; porém, elas são só um terço dos sujeitos de ensaios caram nos últimos anos, à medida que muitos estados promulga-
clínicos em pesquisas cardiovasculares, e menos de um terço dos ram as chamadas leis TRAP, desnecessariamente exigentes, que
ensaios que incluem mulheres relatam resultados por gênero. dificultam a operação dessas clínicas. Reconhecendo este fato, a
A investida republicana contra cuidados de saúde só vai pio- Suprema Corte anulou algumas dessas leis no Texas em 2016, mas
rar as coisas. A legislação proposta inclui disposições que permi- muitas ainda estão em vigor em outros estados. Em vez de tor-
tiriam aos estados eliminar os serviços conhecidos como “bene- narem as mulheres mais seguras, como alegam seus proponen-
fícios essenciais de saúde”, que compreendem cuidados de ma- tes, essas restrições interferem no direito que lhes foi garantido
ternidade. Antes de a ACA tornar a cobertura obrigatória, oito de pela Suprema Corte de interromper com segurança uma gestação.
cada 10 planos de seguro saúde para indivíduos e pequenas em- Tanto faz se a legislação de revogação-e-substituição for apro-
presas não cobriam tal serviço. Os cortes propostos teriam pou- vada ou não este ano, tais ataques são parte de uma guerra maior
co efeito em reduzir prêmios de seguro, e o custo seria transferi- e mais ampla contra a saúde de mulheres que não parece que vai
do para mulheres e suas famílias — que seriam obrigadas a fazer se abrandar em qualquer futuro próximo. Precisamos resistir a
um seguro privado ou entrar no Medicaid (que o projeto de lei li- essa investida. Deixa pra lá o “América Primeiro” — é hora de co-
mita consideravelmente) — ou para hospitais, que são obrigados locar as mulheres em primeiro lugar.
OUTUBRO
1967 Favelas:
estrutura e
evolução invisíveis
ver uma usina elétrica em larga
escala, e três turbogeradores de
3.000 quilowatts foram instala- 1867 Quinina
para malária
“A percepção comum é que os ocu- dos em 1916. O novo empreendi- “Entre os muitos agentes curativos
pantes que povoam as favelas mento provou ser uma bênção na que a química orgânica nos deu, a
peruanas são índios das monta- Toscana industrial, onde o atual quinina ocupa o primeiro lugar e o
nhas rurais que falam apenas qué- preço de guerra do carvão varia clorofórmio o segundo. Sem quini-
chua, que são analfabetos ignoran- de US$ 40 a US$ 50 por tonelada.” na, grandes áreas seriam inabitá-
1967
tes, desorganizados, um fardo eco- veis para europeus. A ‘fome de qui-
nômico para a nação — e também Cavalos de guerra nina’ nas ilhas Maurício mostrou a
que são um grupo organizado de “Como tudo mais, cavalos e mua- milhares quão insignificante uma
radicais que pretendem assumir o res são encontrados nesta guer- coisa, inclusive o ouro, pode se tor-
poder e comunizar as cidades do ra em números nunca vistos. nar em comparação com este sal
Peru. Constatei que, na realidade, Como tem sido necessário exer- salva-vidas. A busca por quinina
o povo das barriadas ao redor de cer um maior escrutínio de recur- artificial, no entanto, tem sido tão
Lima não se encaixa nessa descri- sos, tem se mostrado essencial infrutífera quanto a da pedra filo-
ção. A maioria foi morador urbano que até a última gota de energia sofal. Essa situação induziu certos
1917
por algum tempo (em média nove seja obtida de cada animal, para homens empreendedores a intro-
anos) antes de se mudarem da que nenhuma montaria ou bur- duzir as cinchonas na Índia, e suas
cidade para seus arredores e orga- ro de carga seja descartado até plantações ali agora prosperam
nizar as barriadas. Falam espa- que todos os meios para salvá- de tal maneira que não é preciso
nhol (embora muitos sejam bilín- -lo tenham sido esgotados. Por- haver mais temor de que o supri-
gues) e, de fato, seu nível educa- que cavalos são escassos; o che- mento de quinina algum dia falhe.”
cional é maior do que o do povo fe do exército já não pode aba-
em geral. À primeira vista, as bar- tê-los a tiros ou leva-los à morte Cuidado com o que deseja
riadas parecem coleções amorfas por exaustão de trabalho, nem “Por que toda casa não deve-
1867
de primitivas barracas de palha. ‘desativá-los’ confiando que mui- ria ter seu fio telegráfico? Quan-
Na realidade, porém, os assenta- tos outros serão obtidos. Em vez do o gás foi empregado pela pri-
mentos são configurados de acor- disso, ele precisa conservá-los meira vez para iluminação, só foi
do com projetos, muitas vezes em de todos os jeitos possíveis; por usado em edifícios e ruas públi-
consulta com estudantes de arqui- isso, temos o hospital de cam- cas, e mesmo agora, na Europa,
tetura ou engenharia. À medi- po para equinos, ilustrado aqui.” ele foi introduzido, mas só mode-
da que o tempo passa, a maioria radamente, em casas particula-
dos barracos são substituídos por res. Por que o fio do telégrafo não
estruturas mais permanentes.” pode ser amplamente difundido
como foi a tubulação de gás? Ima-
1917 Energia
vulcânica
“Na região central da Toscana, em
gine uma rede de tais fios instala-
da a partir de um ponto central na
cidade até a biblioteca ou a sala
1906, vapor vulcânico foi usado de estar de toda casa, e um acordo
pela primeira vez em uma máqui- para coletar notícias, semelhan-
na a vapor comum de cerca de te ao controlado pela agência de
quarenta cavalos-vapor de potên- notícias Associated Press. Através
cia, mas os sais de bórax e outras dos fios, então, esta notícia pode
SCIENTIFIC AMERICAN, VOL. CXVII, Nº 15; 13 DE OUTUBRO DE 1917
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AVANÇOS
ORIGENS HUMANA S
O mais velho
Homo sapiens?
Fósseis do Marrocos complicam
a história de humanos modernos
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AVANÇOS
Especialistas há tempos concordam que fósseis revelam uma população que não ÔøxäîÆxää¸UßxÔøxDäÇx`î¸älx³x³¸ääD
o H. sapiens surgiu na África. Até agora, os apresentava alguns de nossos traços carac- espécie”, diz Marta Mirazón Lahr, da Uni-
vestígios mais antigos aceitos eram resquí- terísticos, mas cujas formas anatômicas versidade de Cambridge. “É o crânio globu-
cios de 195 mil anos do sítio de Omo Kibish, poderiam ter evoluído e se transformado lar, com suas implicações para reorganiza-
e fósseis de 160 mil anos de Herto, ambos gradualmente em nossa forma moderna, ção cerebral, que torna um fóssil H. sapiens?
na Etiópia. Mas evidências de DNA e alguns relata o artigo que descreve os fósseis. Neste caso, a população de Irhoud era de
fósseis enigmáticos sugeriram que nossa Hublin diz que as descobertas não impli- primos próximos”, não de membros da nos-
espécie poderia ter raízes mais profundas. cam que a humanidade moderna tenha sur- sa espécie. Mas se um rosto pequeno e a
Em seu trabalho recente, Hublin e seus gido no Marrocos. Em vez disso, tomadas forma da mandíbula inferior forem os tra-
colegas desenterraram fósseis de outros em conjunto com outras descobertas de ços-chave, então os ossos de Jebel Irhoud
indivíduos de uma parte do sítio que os fósseis, sugerem que o surgimento de H. poderiam de fato ser de nossos ancestrais
mineiros não haviam tocado. Os achados sapiens foi uma questão pan-africana. Há — e, portanto, mudar o foco de cientistas
incluem ossos de crânios e de mandíbu- 300 mil anos, o primitivo H. sapiens já se que estudam as origens humanas moder-
las inferiores, artefatos de pedra e restos de espalhara pelo continente. A dispersão foi nas, da África subsaariana para o Mediter-
animais caçados. Várias técnicas datam a auxiliada pelo fato de que a África era bem râneo — diz Mirazón Lahr.
camada rochosa com os fósseis e artefatos diferente então — o Saara era verde, e não De qualquer modo, o achado pode
como tendo entre 350 mil e 280 mil anos. a proibitiva barreira desértica que é hoje. gerar um debate sobre quem criou os arte-
Os pesquisadores concluíram que os Mas nem todos concordam que sejam fatos da Média Idade da Pedra na África,
tamanhos e as formas dos crânios, mandí- fósseis de H. sapiens. John Hawks, da Uni- entre 300 mil e 40 mil anos atrás. Se o H.
bulas inferiores e dentes de Jebel Irhoud se versidade de Wisconsin-Madison, diz que sapiens já existia, ele poderia ser um bom
parecem com os de H. sapiens e não com os Hublin e seus colegas não compararam os candidato. Mas outras espécies humanas
de neandertais ou outros hominíneos. Mas achados com fósseis de 800 mil anos encon- também estavam em cena naquela época,
a caixa craniana, que encerra o cérebro, é trados na Espanha, de uma espécie chama- inclusive o H. heidelbergensis e o H. naledi.
alongada como a de humanos arcaicos, não da Homo antecessor: “Talvez [os fósseis] de Os achados de Jebel Irhoud “tornam
arredondada como a de seus equivalen- Jebel Irhoud estivessem evoluindo para os o quadro bastante complicado”, diz Chris-
tes modernos. Tais variações estão associa- humanos modernos, mas outra possibili- tian Tryon, da Universidade Harvard. Mas
das a diferenças em organização cerebral. dade é que estivessem retendo a morfolo- D³`¹³îDDl`¸³D§ä³`DÔøx¸ä`x³-
A equipe concluiu que os restos mortais de gia facial de uma população parecida com a tistas que estão procurando as origens de
Jebel Irhoud representam “precisamen- de H. antecessor, que pode ter sido o último nossa espécie têm seu trabalho talhado a
te a raiz de nossa espécie, o mais antigo H. ancestral comum de neandertais e humanos sua altura. Às vezes, as coisas mais conheci-
sapiens já encontrado na África ou em outro arcaicos africanos mais tardios”. das e familiares são também as mais miste-
lugar”, Hublin disse em uma entrevista. Os Os novos fósseis “suscitam importantes riosas. —Kate Wong
ßxälx`ßäîD§§Ôøl¸îßD³äx`îþ¸ßxløąx fazer um revestimento de display inspirado mente. Em testes, o material cravou menos
o brilho intenso ao compensarem tanto a em insetos no periódico Optica. lx¿Ìlxßxx`îF³`DÍÙÇß³`ÇD§UDßßxßD
iluminação de fundo como a luz ambiente. Quando muda de meio, a luz se cur- é o custo”, diz Stuart Boden, da Universida-
Outra abordagem, chamada controle adap- va e muda de velocidade devido a diferen- de de Southampton, não envolvido no estu-
tativo de brilho, usa sensores para aumen- ças em uma propriedade chamada índice do. Wu procura um parceiro comercial para
tar a luz da tela. Mas ambas as tecnologias de refração. Se a diferença for acentuada, expandir a tecnologia. —Morgen Peck
uma das principais defesas naturais do cor- vidas pelas células cutâneas e distribuí- cio deste ano em ACS Central Science. Ago-
po contra danos induzidos por radiação das ao redor de seus núcleos como melani- ra que a equipe sabe que as nanopartícu-
ultravioleta (UV) ao DNA. Sob a superfície na natural. las parecidas com melanina são tratadas do
da pele, células especiais segregam mela- As células “são capazes de processar mesmo jeito que melanina natural e real-
nossomos, que produzem, armazenam e [a nanopartícula sintética] e, então, con- mente protegem células, o próximo passo
transportam melanina. Essas estruturas são vertê-la em uma espécie de tampa sobre será determinar o mecanismo de absorção.
absorvidas por células da pele chamadas o núcleo”, diz o autor do estudo, Nathan —Matthew Sedacca
16 mm
coração Ele condensava uma bateria e sua placa de
circuito em um implante do tamanho de
$Dß`DÇDää¸ äx ¸ xþîD D§ø³ä
Ilustração de Tami Tolpa
Texas e do Baylor College of Medicine `¸³D§`¸¸ßx`øßä¸äx¸lDþxßäT¸lx Babakhani diz que seus colegas implan-
recentemente criou um regulador de bati- 2016. Uma bateria inserida abaixo da axila taram com sucesso seu novo marca-passo
mentos cardíacos que obtém sua energia transmite energia via micro-ondas para um em cinco porcos, regulando seus batimen-
øäD³l¸`߸¸³lDäxþxąlx¸äÍää¸ capacitor implantado no coração (ßD_¸). tos cardíacos em diversos ritmos sem efei-
äǧ`D`ßøßDäÇDßDDäøUäîîøcT¸lD O capacitor provoca as contrações muscu- î¸äDlþxßä¸ä'äD³Dä
¸ßDäD`ß`Dl¸ä
bateria e poderia reduzir as complicações lares que fazem o órgão bombear sangue. após algumas horas, mas ainda neste outo-
associadas a marca-passos convencionais. O dispositivo tem um efeito muito podero- no a equipe iniciará testes de longo prazo.
Quase 190 mil americanos receberam so em vista de seu minúsculo tamanho, diz Mesmo se o implante funcionar bem, ainda
um marca-passo em 2009. Os dispositi- Babakhani. Diversos chips menores do que exige um procedimento invasivo, diz James
vos tradicionalmente exigiam uma bate- uma moeda de dez centavos podem ser Chang, da Universidade Harvard, não
ria compacta, inserida pouco abaixo da cla- inseridos por todo o coração onde quer que envolvido no estudo. Mas ele, por exemplo,
þ`ø§Dj`¸¸äÔøxÇDääDDîßDþyälDä sejam necessários. O marca-passo é como anseia por ver marca-passos recarregáveis
þxDäxþT¸Dîy¸`¸ßDcT¸Í$DäÙ¸äÇ߸þ¸- “o maestro de uma sinfonia”, diz Mehdi äx¸ä³DäD§Dlx`ßøßDiÙäîxy`xßîD-
cam infecções, e elas são grandes e causam Razavi, que ajudou a criar o dispositivo. mente o futuro”. —Leslie Nemo
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AVANÇOS
NEUROCIÊNCIA
cores], mas, dependendo
GETTY IMAGES
mediram quanto tempo os nenês olhavam Skelton, da Universidade de Sussex. “Somos os mecanismos exatos, mas sabemos como
ĀDx³îxÇDßDD¸äîßDälx`¸ßxäjøD pré-programados para fazer distinções [de começar.” —Jane C. Hu
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AVANÇOS
SUÉCIA PAÍSES BAIXOS
N A S N OT Í C I A S
Começando em 2019, a montadora automotiva Para reprimir o envio de mensagens de texto
rápidas vender um milhão de tais carros até 2025. nacional de telecomunicações criaram uma
trava para bicicletas e um aplicativo que
bloqueiam o sinal e a conexão com a internet
enquanto a bicicleta estiver circulando.
—Leslie Nemo
CIÊNCIA DO SONO
a têm: se você trabalha Cry1, que também apareceu em membros
como barman ou músico, de sua família que relataram problemas
Genes de talvez jamais procure um lx丳¸Íääxx³x`¸l`DøDÇ߸îx³D
diagnóstico ou tratamen- conhecida por suprimir a ação das proteínas
“corujões” to, diz a autora principal mais importantes, fundamentais, do relógio,
do estudo Alina Patke, pes- ou ciclo circadiano CLOCK e BMAL, que
Uma mutação que afeta quisadora na Rockefeller, que ativam uma ampla gama de genes — inclu-
o ciclo circadiano pode äx Døî¸lx³î`D`¸¸³¸îþDDj sive alguns relacionados à vigília — duran-
estar mantendo algumas pessoas mas não tem a mutação. Para outros, no te o dia. A mutação causou a eliminação
acordadas até muito tarde entanto, especialmente estudantes univer- de uma porção da cauda da proteína CRY1,
sitários ou funcionários de escritórios, pode î¸ß³D³l¸DD³lDDäx`Dą³DäøÇßxä-
Algumas pessoas não conseguem ador- ser uma tortura. O novo estudo centrou-se são de CLOCK e BMAL. A equipe examinou
mecer até as primeiras horas da madruga- em uma mulher de 46 anos, que teve pro- cuidadosamente um banco de dados gené-
da — e não se sentem descansadas a blemas de sono a vida toda. “Normalmen- tico e encontrou outras 39 pessoas com a
menos que se levantem muito mais tarde te, ela ia para a cama por volta das duas ou mutação. A maioria também tinha horários
do que a maioria de nós. Esses “corujões” três horas da madrugada; às vezes até às 5 relativamente tardios para dormir e acordar.
podem sofrer de uma forma comum de ou 6 horas da manhã”, diz Patke. Daniel Kripke, professor emérito na Uni-
insônia, chamada síndrome do atraso das ø§xß`¸øx¸UäxßþDcT¸Ç¸ß¿ versidade da Califórnia não envolvido no
fases do sono (SAFS), que estudos sugeri- dias num recinto sem relógios nem jane- trabalho, destaca que estudos que exa-
ram ser pelo menos parcialmente heredi- las. Ela não só produzia o hormônio mela- minam grandes grupos em busca de liga-
tária. Agora, pesquisadores na Universi- nina, indutor de sono, de cinco a sete horas ções entre uma característica em particu-
dade Rockefeller descobriram uma muta- mais tarde do que pessoas comuns em lar e uma variante genética não encontra-
ção genética que poderia elucidar o que estudos anteriores, como seu sono também ram nenhuma conexão entre esta mutação
causa esses horários frequentemente incô- era estranhamente fragmentado, às vezes e a SAFS. Ainda assim, diz ele, o novo artigo
modos e complicados de sono. ocorrendo em breves cochiladas. Quando apresenta evidências convincentes de que
É claro que a SAFS não é necessaria- a equipe analisou seu DNA, eles encontra- ela poderia estar por trás de alguns casos
mente algo problemático para todos que ram uma mutação em um gene chamado da disfunção. —Veronique Greenwood
T E C N O LO G I A
tres no trânsito. Se o experimento for bem- de alto contraste, para representar o cru-
Navegando -sucedido, mapas podem ser instalados nos
13 mil semáforos de Nova York, diz o presi-
zamento de uma das oito possíveis pers-
pectivas de alguém que vai atravessá-lo.
por toque dente da Touch Graphics, Steven Landau.
Ele diz que os mapas são importantes
Um círculo saliente, um pouco mais eleva-
l¸jlx³î`Dl¸`¸¸Ù<¸`zxäîEDÔøÚjîD³-
Mapas táteis podem ajudar ǸßÔøx`¸³øßDcÆxä`DlDþxąDä`¸- to em braile como em texto padrão, mostra
cegos a atravessar cruzamentos plexas de ruas estão tornando mais difí- o ponto de partida de um pedestre, e uma
`§ÔøxÇxlxäîßxälx`x³îxäþäøDääDUD linha pontilhada delineia o caminho a ser
Pessoas em muitas cidades arriscam sua o que encontrarão depois de descerem do percorrido. Formas ovais simbolizam veícu-
vida toda vez que atravessam a rua. Em x¸¸jlD`D§cDlDÍîx`³¸§¸D
¸xĀÇx- los, com setas levantadas em uma extremi-
Nova York, mortes de pedestres rimentada na Dinamarca e na Suécia, mas dade de cada “carro” para mostrar a dire-
responderam pela maioria das fatalidades o teste de Nova York é inédito na América ção do tráfego em uma pista.
anuais de trânsito desde 2006. Para quem do Norte, segundo Landau. São Francisco e Sile O’Modhrain, que estuda tecnolo-
îxlx`z³`DþäøD§jDäîøDcT¸yä³ø- Toronto em breve poderão testar tais siste- gia tátil na Universidade de Michigan e não
larmente perigosa e está se agravando. mas também, acrescenta ele. envolvida no projeto, acredita que esses
No último verão, designers na Touch A equipe de Landau criou os mapas mapas poderiam mudar vidas. O’Modhrain,
Graphics, uma empresa que produz tec- usando o método de impressão ultravio- que é cega, diz que cruzamentos comple-
nologia de navegação que incorpora infor- leta: a tinta é impressa em uma superfície xos em Ann Arbor, Michigan, limitam os
mações de vários sentidos do corpo huma- e depois exposta a uma luz UV que a cura lugares onde ela pode viver. “Acho que esta
no, trabalharam com o Departamento antes que ela possa secar ao ar. Esse pro- seria uma ideia fantástica porque quan-
de Transportes de Nova York para testar cesso permite obter mais detalhes e menos do chego a um cruzamento sempre é difí-
mapas táteis — diagramas com traços tridi- espalhamento de tinta, o que é útil para cil saber quantas pistas terei de atravessar”,
mensionais e texto em braile — num cruza- `ßDßßE`¸äxßx§xþ¸ÔøxäT¸äø`x³- diz. Embora possa escutar o volume do trá-
x³î¸Çxßî¸lxø`x³î߸ÇDßDlx`x³îxä temente nítidos e claros para poderem ser fego e sentir de qual direção ele vem, diz
visuais. O projeto faz parte da iniciativa da sentidos por meio do tato. Cada mapa usa O’Modhrain, rotular as pistas poderia ser
cidade para acabar com mortes de pedes- formas tridimensionais e cores brilhantes, uma indicação útil. —Andrea Marks
Acabou. No último dia 15 de setembro, a espaçonave Cassini que não deve acontecer tão cedo.
concluiu sua última órbita ao redor de Saturno e mergulhou E é essa a maior angústia do fim da missão, na verdade.
na atmosfera do famoso planeta dos anéis. Foi uma missão Cortaram o cordão umbilical que existia entre a Terra e Satur-
como poucas na história. Praticamente nenhum problema no. Ao longo dos últimos 13 anos, ficamos (mal) acostumados
técnico ao longo do caminho, o que permitiu uma exploração de receber, a qualquer hora do dia ou da noite (espaçonaves
exaustiva — no bom sentido — do sistema saturnino. não dormem!), imagens e dados incríveis do incrível sistema
Ao longo de 13 anos, boa parte da superfície da lua Titã foi saturnino. O plano original era que a Cassini durasse quatro
mapeada com radar, revelando os lagos e mares de metano e anos. Mas as coisas foram caminhando tão bem que os cien-
etano que lá existem — e eram apenas hipóteses depois que tistas puderam ousar sonhar acompanhar a transição entre
a sonda Voyager 1 passou por aquelas imediações, em 1980. as estações saturninas. Manja “o inverno está chegando”?
Mais que isso, o companheiro de viagem da Cassini, o peque- A sonda chegou por lá no outono do hemisfério Sul e teve
no módulo europeu Huygens, realizou um pouso suave na a chance de esperar Saturno dar praticamente meia-volta ao
superfície titânica, revelando detalhes da composição, den- redor do Sol para ver como isso influenciava no clima do pla-
sidade e dinâmica atmos- neta e de suas luas. (Satur-
férica da lua – a única do no leva 29 anos para dar
Sistema Solar a ter invó- uma volta inteira em torno
lucro de ar comparável de nossa estrela mãe.)
ao da Terra. (Como aqui, Agora, tudo isso acabou.
lá também predomina o Novos estudos de Satur-
gás nitrogênio. Mas nada no dependerão de nos-
de oxigênio por lá, e mui- sos telescópios — que, por
to menos vapor d’água, a melhores que sejam, não
uma temperatura apenas chegam nem perto da van-
94 graus acima do zero tagem que é ter uma nave
absoluto.) in loco para estudar as coi-
A Cassini também fez sas —, e todos os detalhes
investigações intensas da que um dia vimos do dinâ-
lua Encélado. Ela era pra- Saturno e seus anéis, uma visão da Cassini que não teremos novamente tão cedo. mico ambiente saturnino
ticamente uma bola de passarão à lembrança.
neve a orbitar Saturno, com modestos 500 km de diâmetro, Os resultados da Cassini ainda impulsionarão pesquisas
até a sonda revelar toda a sua complexidade. Sob uma crosta por anos a fio. Entre as respostas finais que a sonda nos pro-
de gelo nova e cheia de rachaduras, um oceano de água líqui- meteu legar estão a composição detalhada da alta atmosfe-
da, em contato com um leito rochoso. Para completar o cená- ra de Saturno — detecção que a espaçonave fez e transmi-
rio, plumas de água são ejetadas para o espaço através de tiu para a Terra em tempo real durante seu mergulho pela
uma série de fraturas na região polar Sul. A Cassini investi- atmosfera do planeta — e a massa de seus anéis, que por sua
gou a composição das plumas e constatou que elas têm todos vez permitirá descobrir se eles são tão velhos quanto o Siste-
os ingredientes para alimentar um ecossistema microbiano ma Solar, com seus 4,5 bilhões de anos, ou tão jovens quan-
no interior da lua. to os dinossauros, com uns 100 milhões de anos. Ou seja, não
Infelizmente, contudo, o espectrômetro da Cassini não pararemos tão cedo de ouvir falar da missão. Mas, apesar dis-
tinha resolução suficiente para encontrar moléculas de ori- so, é inegável que, depois do dia 15 de setembro, os modestos
NASA/JPL-CALTECH
gem biológica, de forma que seguimos sem saber se Encé- 80 minutos-luz que nos separam do planeta dos anéis volta-
lado, além de habitável, é habitada. Essa é uma questão que ram a ficar do tamanho que realmente são para nós, cerca de
ficará para a próxima espaçonave a visitar o sistema, algo 1,5 bilhão de km.
O mês de outubro trará um estranho visitante aos céus da das chuvas de meteoros mais fascinantes, os Orionídeos.
Terra: o cometa 96P/Machholz. Trata-se de um astro de cur- Trata-se de uma das duas travessias anuais que a Terra faz
to período, que completa uma volta a cada 5,3 anos. No dia da órbita do famoso cometa Halley. Quando isso acontece,
27, ele atingirá sua máxima proximidade com o Sol, chegan- pequenos detritos deixados pelo astro adentram a atmosfe-
do bem mais perto dele que o planeta Mercúrio. E, felizmen- ra terrestre, produzindo os meteoros.
te, tanto o ângulo de sua órbita quanto a posição da Terra no O máximo da chuva vai se dar no dia 21, um sábado, e
Sistema Solar durante o periélio favorecem uma tentativa de a Lua estará num fino crescente, o que é uma ótima notícia
vê-lo. Ele deve ser visível ao amanhecer, logo antes de o Sol para os observadores. Sem o brilho lunar intenso e a obriga-
nascer, figurando sete graus a oeste do astro rei. ção de acordar cedo no dia seguinte, será uma ótima ocasião
Ou seja, a janela de observação é curta, entre a primeira para ver toda a beleza dos Orionídeos. O radiante — local de
luz da aurora e o despontar do Sol no horizonte. Mas, com onde parecem emanar os meteoros — fica na constelação de
um pouco de sorte e horizonte leste livre, é bem possível que Órion, que deve despontar no céu noturno durante a madru-
ele se torne visível mesmo a olho nu, com 2,9 magnitudes. E gada. Procure-a no horizonte leste após a meia-noite.
uma chance de ver um cometa à vista desarmada nunca deve Por fim, para quem gosta de caçar planetas, Urano é o
ser ignorada. Ainda mais em se tratando de um astro como o alvo preferencial em outubro. Ele entra em oposição no dia
Machholz, cuja composição é diferente de tudo que já se viu 19, e à 0h55 atinge sua menor distância da Terra no ano: res-
em objetos do tipo no Sistema Solar. Observações feitas em peitáveis 2,84 bilhões de quilômetros. Sua magnitude che-
2007 constataram que o cometa tem pouquíssimo carbono e ga a 5,7, perto do limite de acuidade da visão humana (5,5),
cianogênio — traços tão incomuns que já se chegou a aventar mas ainda invisível a não ser com binóculos ou telescópios.
a hipótese de que fosse um cometa extrassolar capturado pela Procure-o na constelação de Peixes.
gravidade do Sol depois de vagar pelo espaço interestelar.
E, por falar em cometa, o mês de outubro também traz uma Bons céus a todos! (S.N.)
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VISIBILIDADE DOS PLANETAS N
MERCÚRIO
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CIÊNCIA DA SAÚDE
Apuro pediátrico Embora os estudos clínicos com adultos sejam feitos nos EUA
há bem mais de cem anos, as empresas farmacêuticas não testa-
vam regularmente seus produtos em crianças até os anos 1990,
Novas iniciativas visam diminuir quando o governo federal começou a oferecer incentivos finan-
ceiros. Em 1997, a Lei de Modernização da Food and Drug Admi-
os obstáculos para a descoberta de nistration (FDA), a agência que controla alimentos e medicamen-
tratamentos úteis para as crianças tos, concedeu às companhias seis meses adicionais de proteção
de patente para cada droga testada em crianças, e, depois disso,
Charles Schmidt uma nascente infraestrutura de testes clínicos pediátricos come-
çou a tomar forma. Leis adicionais ampliaram essas propostas e
Pais que avaliam se devem inscrever um filho doente em testes criaram programas para o desenvolvimento de drogas pediátri-
clínicos costumam enfrentar emoções conflitantes. De um lado, cas nos NIH.
esperam que o experimento leve a um avanço no tratamento. Contudo, o problema das diferenças fisiológicas continua, e
De outro, vivem a incerteza e o medo de expor voluntariamente muitos médicos se sentem, compreensivelmente, receosos de cal-
suas crianças a uma terapia não comprovada que pode se reve- cular as dosagens corretas. Mas essa relutância não é o único de-
lar ineficaz ou mais prejudicial que o tratamento padrão. O que safio. Após excluir os testes que ainda estavam recrutando par-
os pais ignoram é que a contribuição de seus filhos ao conheci- ticipantes ou não tinham aberto as inscrições, a equipe de Har-
mento científico também pode se perder em um estudo que vard descobriu que a maior razão para o fracasso dos estudos é
talvez nunca seja concluído nem apareça na literatura médica que eles não conseguem atrair o número suficiente de crianças. A
O desperdício desse esforço é uma grande possibilidade, se- falta de inscrições costuma ser um problema nos testes com adul-
gundo um estudo de 2016. Pesquisadores da Universidade Har- tos também, mas as pesquisas pediátricas enfrentam desafios sin-
vard revisaram os mais de 550 testes clínicos pediátricos regis- gulares. Os pediatras que exercem a atividade na comunidade po-
trados pelo governo federal dos EUA entre 2008 e 2011 e desco- dem não ter tempo disponível para participar da pesquisa clíni-
briram que mais de 40% nunca foram encerrados ou, apesar de ca, em especial se trabalham longe de hospitais acadêmicos onde
concluídos, não foram publicados mesmo cinco anos depois. No os recursos para sustentar os testes clínicos são logo acessíveis.
total, mais de 77.500 crianças participaram dos estudos que pou- Além disso, simplesmente não há tantas crianças quanto adultos.
co ou nada contribuíram para o desenvolvimento de tratamen- Apenas 20% da população dos EUA têm menos de 14 anos. E as
tos para suas doenças porque a pesquisa sumiu da vista científica. crianças, felizmente, têm muito menos chances do que os adul-
Além da perda de tempo, dinheiro e recursos, essas falhas tam- tos de sofrerem de uma doença grave. “Portanto, por definição, a
bém são “trágicas porque, para começar, temos tão pouca infor- maior parte das doenças da infância é rara”, diz Danny Benjamin,
mação de testes clínicos com crianças”, lamenta Florence Bour- professor de pediatria na Universidade Duke.
geois, professora assistente de pediatria e emergência médica da Ronnie Guillet conhece todas as dificuldades de recrutamen-
Escola Médica Harvard, coautora do estudo. to por experiência própria. Professora da Universidade de Ro-
Estão em curso iniciativas para melhorar a situação. Pesquisa- chester, Guillet teve de encerrar em 2014 testes clínicos que po-
dores em universidades e centros médicos analisam seus proces- deriam ter esclarecido por quanto tempo os recém-nascidos de-
sos de trabalho para descobrir bloqueios ocultos ao cadastramen- veriam ser medicados se apresentassem convulsões. Cerca de um
to em testes clínicos pediátricos. Ao mesmo tempo, os Institutos em cada 200 bebês sofre de convulsões dias após nascerem e não
Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês) estão reunindo es- há consenso entre os médicos sobre o período do tratamento. Al-
pecialistas da academia, indústria e governo para tentar tornar guns mantêm a medicação apenas até que as convulsões parem.
os resultados mais amplamente disponíveis. Embora o progresso Outros a prolongam por várias semanas ou mesmo meses numa
seja gradual, os autores da proposta creem estar no rumo certo. tentativa de evitar que as convulsões voltem.
Guillet temia que o tratamento prolongado pudesse prejudi-
BATENDO CONTRA UM MURO car o cérebro da criança, embora ela também saiba que convul-
Por décadas, médicos que queriam prescrever medicações sões repetidas podem causar dano neurológico. A única forma de
para crianças ajustavam a dose para baixo a partir do recomen- saber como equilibrar os potenciais benefícios e riscos é por tes-
dado para um adulto, guiando-se apenas pelo peso delas. Mas os te clínico. Assim, após administrar aleatoriamente uma ou outra
mais jovens não são apenas adultos em tamanho menor. Sua fisio- forma de tratamento às crianças, ela planejava monitorar seu de-
logia muda rapidamente da infância para a adolescência, o que senvolvimento neurológico. Ela precisava inscrever 250 bebês em
significa que várias drogas podem desencadear efeitos imprevisí- dois anos para obter uma amostragem grande o suficiente a pon-
veis. Crianças não metabolizam o anestésico propofol, por exem- to de concluir que os resultados eram estatisticamente confiáveis.
plo, no mesmo ritmo dos adultos, o que leva à acumulação tóxica Mas os pais —e, para alguma surpresa de Guillet, enfermei-
em bebês. Recém-nascidos, crianças e adultos também metabo- ras neonatais — se mostraram céticos. “Alguns temiam colocar as
lizam anticonvulsivos de modo diverso, o que dificulta estimar a crianças em terapias longas e outros se preocupavam com o pla-
dose segura com base apenas em peso e tamanho. cebo”, diz. “Eles tinham receios parecidos, mas por razões opos-
tas.” Ela teve de cancelar o estudo porque apenas 13 crianças es- cias reguladoras, universidades e outras organizações para au-
tavam inscritas após um ano, e suas questões seguem em aberto. mentar o número de populações carentes — incluindo crianças
Atrair o número exigido de participantes para um estudo, no — que são ajudadas por estudos médicos. Entre os desafios que a
entanto, não garante que ele será publicado nem que seus resul- rede já identificou está a necessidade de melhorar a comunica-
tados serão amplamente compartilhados. Companhias farmacêu- ção entre profissionais que buscam inscrever novos participan-
ticas, por exemplo, têm um bom histórico de recrutar o número tes em pesquisas — os recrutadores — e os cuidadores de crianças.
suficiente de crianças para terminar suas pesquisas. Mas poucos “Os recrutadores não costumam dedicar tempo suficiente a
de seus resultados aparecem, de fato, nas publicações científicas entender as motivações e o dia a dia das populações que eles ten-
na comparação com testes acadêmicos pagos pelos NIH ou ou- tam atrair”, diz Yvonne Joosten, que dirige um dos programas da
tras organização independentes. “As farmacêuticas só se preocu- rede recém-fundada, no Centro Médico da Universidade Vander-
pam com a publicação se os resultados apoiarem seus objetivos bilt. Joosten começou a coordenar encontros da comunidade em
comerciais”, afirma Bourgeois, de Harvard. Em outras palavras, nome dos pesquisadores de testes clínicos antes do lançamen-
elas tendem a publicar apenas os estudos com resultados positi- to de seus estudos. Nas “sessões de escuta”, como ela as chama,
vos. Como ela e seus colegas escreveram em seu estudo de 2016, Joosten conversa com famílias para saber mais sobre as barrei-
eles consideram a não publicação uma “violação dos imperativos ras que podem impedir a participação. O transporte de e para os
éticos de compartilhar resultados de testes que envolvam sujeitos locais de estudo pode ser um obstáculo, ou os pais podem sentir
humanos”. Para pesquisadores em universidades, em contraparti- que será inútil se envolver se suas crianças ficarem em um grupo
da, o histórico de publicações é questão de vida ou morte, explica de controle. “Pesquisadores não são obrigados a ouvir conselhos
Bourgeois, portanto, “esperava-se que os testes acadêmicos gera- de membros da comunidade, mas os que o fazem com frequência
riam mais estudos publicados, e foi isso o que vimos.” ficam satisfeitos com os resultados”, diz ela.
No front de publicações, as agências federais estão se mobi-
UMA QUESTÃO DE CONFIANÇA lizando para garantir que os pesquisadores tornem seus resul-
Aprimorar um processo complexo como um teste clínico em tados visíveis — seja ou não em publicações científicas. Os pes-
geral exige maior coordenação e colaboração entre diferentes quisadores nos EUA precisam registrar novos testes e colocar os
grupos de pessoas. No outono passado, os NIH lançaram uma resultados finais em um banco de dados dos NIH aberto a con-
nova Rede de Inovação em Testes que reúne a indústria, agên- sultas, que pode ser encontrado em ClinicalTrials.gov. Quem não
o faz enfrenta pesadas penalidades previstas
na lei conhecida como Food and Drug Admi-
nistration Amendments Act, de 2007. A FDA
pode multar farmacêuticas que desrespeitam
a legislação em US$ 10 mil por dia, e os NIH
podem retirar o patrocínio a cientistas. Mas,
na prática, nenhuma companhia ou cientis-
ta financiado pelos NIH jamais recebeu qual-
quer punição. De acordo com Jerry Sheehan,
diretor assistente para políticas de desenvol-
vimento da Biblioteca Nacional de Medicina,
a lei de 2007 é repleta de ambiguidades a res-
peito de quais testes clínicos precisam ser re-
gistrados no site e quais tipos de resultados
devem ser divulgados.
Em uma tentativa de eliminar as brechas
na legislação, o Departamento de Saúde e Ser-
viços Humanos (de que fazem parte os NIH e a
FDA) emitiu extensas normas que esclarecem
em detalhes as exigências. As regras entraram
em vigor em janeiro. Falta saber se elas for-
necem aos clínicos as informações suficientes
para prescrever novas medicações — ou evitar
tratamentos desnecessários ou mesmo perigo-
sos — para crianças. Mas esse e outros esforços
devem, pelo menos, reduzir a chance de que
contribuições feitas pelos participantes mais
jovens de estudos científicos se percam.
versus ciência
Weinstein colocou suas objeções em um e-mail: “numa universi-
dade, o direito de falar — ou estar — jamais deve se basear na cor
da pele”. Em resposta, uns 50 furiosos estudantes interromperam
sua aula, cercaram-no, acusaram-no de racista e insistiram que
As raízes da atual loucura na universidade ele se demitisse. Weinstein afirma que a polícia do campus infor-
Michael Shermer mou a ele que o presidente da faculdade lhes pediu que recuas-
sem, mas ele foi forçado a se afastar para sua própria segurança.
Em um ensaio de 1946 no Tribune, de Londres, intitulado “Dian- Como a situação chegou a esse ponto? Uma tendência foi
te de seu nariz”, o escritor George Orwell observou que “todos apontada por Weinstein num ensaio em The Wall Street Journal:
somos capazes de acreditar em coisas que sabemos ser inverda- “Os tradicionais campos empírico e dedutivo, incluindo todas as
des, e, então, quando fica provado que estávamos errados, distor- ciências exatas, conviveram lado a lado com ‘teoria crítica’ pós-
cemos os fatos como que para provar que tínhamos razão. Inte- -modernismo e seus parentes baseados em percepção. Desde a
lectualmente, é possível manter esse processo por um longo criação, nos anos 1960 e 1970, dos novos campos orientados por
tempo: o problema é que, cedo ou tarde, a falsa crença se chocará justiça, essas visões de mundo incompatíveis vêm se repelindo
com a dura realidade, em geral em um campo de batalha”. mutuamente”.
Os campos de batalhas intelectuais hoje são as universidades, Em artigo para Quillette.com a respeito dos “Métodos por
onde as profundas convicções dos estudantes sobre raça, etnia, trás da insanidade do campus”, o pesquisador de pós-graduação
gênero e orientação sexual e sua justiça social avessa ao capita- Sumantra Maitra, da Universidade de Nottingham, relatou que
lismo, imperialismo, racismo, privilégio dos brancos, misoginia 12 dos 13 acadêmicos que protestaram contra Yiannopoulos eram
e “heteropatriarcado cissexista” se chocaram com a realidade de de “teoria crítica, estudos de gênero e de formação pós-colonial/
fatos contraditórios e visões opostas, levando ao caos e mesmo à pós-modernista/marxista”. Essa é uma mudança na teoria marxis-
violência no campus. Estudantes da Universidade da Califórnia ta do conflito de classes para conflito de política de identidades;
em Berkeley e agitadores externos, por exemplo, se rebelaram à em vez de julgar pessoas pelo conteúdo de seu caráter, elas ago-
simples menção de que os controversos conservadores Milo Yian- ra devem ser julgadas pela cor de sua pele (ou sua etnia, gênero,
orientação sexual etc.). “Pós-modernistas tentaram seques-
trar a biologia, dominaram grandes partes da ciência polí-
tica, quase toda a antropologia, história e inglês”, prossegue
Maitra, “e proliferaram as autorreferenciais publicações
especializadas, círculos de citações, pesquisas não repli-
cáveis, e o cerceamento do debate matizado por meio de
ativismos e marchas, instigando um grupo de estudantes
ingênuos a intimidarem quaisquer ideias contrárias.”
Estudantes estão sendo ensinados por esses professo-
res pós-modernos que não há verdade, que ciência e fatos
empíricos são meios de opressão do patriarcado bran-
co, e que quase todos na América são racistas e fanáticos,
incluindo seus professores, a maioria dos quais são liberais
ou progressistas dedicados a combater esses males sociais.
Dos 58 docentes de Evergreen que assinaram uma decla-
ração “em apoio aos estudantes”, pedindo punição contra
Weinstein por “colocar em risco” a comunidade ao conce-
der entrevistas à mídia nacional, eu contei apenas sete de
ciências. A maioria tem especialização em inglês, literatu-
nopoulos e Ann Coulter haviam sido convidados a falar (no fim, ra, artes, humanidades, estudos culturais, estudos sobre a mulher,
nunca o fizeram). Os estudantes da Faculdade Middlebury ataca- estudos da mídia e “cotidianos imperialismos, geografia interme-
ram fisicamente o autor libertário Charles Murray e sua anfitriã tropolitana e apropriação indevida”. Um curso chamado “resis-
liberal, a professora Allison Stanger, de quem puxaram o cabelo e tências fantásticas” é descrito como “um dojo para aspirantes a
torceram o pescoço, mandando-a para um pronto-socorro. guerreiros da justiça social”, com foco em “assimetrias de poder”.
Uma causa subjacente dessa situação pode ser vista no que Se alguém ensina estudantes a combater todas as assimetrias
aconteceu no Evergreen State College, em Olympia, Washington, de poder, não se surpreenda quando eles se voltarem contra seus
em maio, quando o professor autodeclarado “profundamen- professores e gestores. É o que acontece quando se separa fatos
te progressista” Bret Weinstein se recusou a participar do “Dia de valores, empirismo de moralidade, ciência de humanidades.
Há algumas décadas, a de Michigan, da qual par- em relação aos OGMs pode não
busca por informações so- ticiparam 1.059 pessoas, îxßßx§DcT¸`¸DxäÇx``lD-
bre as tecnologias usadas ÇxßîxDäøDßxx- de dessa tecnologia e, sim, com o
para desenvolver alimentos xão sobre o tema. Segun- medo do desconhecido.
era menor. Embora muitos ADRIANA BRONDANI do o trabalho, um percen- A mesma confusão foi observa-
÷ Oþ«Dd ¡rÒÜÍr r
fatores possam explicar a f«æÜ«ÍD r¡
«Âæû¡ZD tual representativo (38%) da em pesquisa brasileira condu-
procura recente, não pode- r
««D $«rZæDÍ» diz conhecer bem como zida pelo Ibope em 2016, na qual
rÒfr äð®® ÷ fÍrÜ«ÍD
mos ignorar o papel central rêrZæÜèD f« «§Òr« funciona a cadeia global apenas 17% dos participantes con-
que a internet hoje desem- fr §{«Í¡D]ĂrÒ Ò«OÍr da produção de alimentos. cordam que ingerem DNA diaria-
«ÜrZ§««D ·
¸»
penha para a democratiza- No entanto, praticamen- mente e 73% revelaram preocupa-
ção do acesso a dados, in- te o mesmo percentual de ção em consumir essa molécula.
clusive sobre o desenvolvimento entrevistados (37%) acredita que Como a preocupação das pes-
do que comemos. Com a atual de- apenas os OGMs possuem genes. soas tem se mostrado, com fre-
manda por informações, é impera- Para estes, não há genes em pro- quência, desproporcional quan-
tivo que a ciência associada a es- dutos convencionais. do comparada aos possíveis ris-
sas inovações se torne acessível. Ainda nos Estados Unidos, ou- cos das tecnologias, a comunidade
As diferenças de percepção en- tro estudo conduzido com meto- `x³î`DjKäþxąxäjäxÔøxäD
tre cientistas e público leigo a res- dologia semelhante revelou que sobre o quanto a opinião pública é
peito de diversas tecnologias são 84% dos entrevistados são favo- relevante na aceitação de produ-
fortemente evidenciadas no re- ráveis à rotulagem obrigatória de tos decorrentes de avaliações res-
latório Public and Scientists View’s transgênicos. Surpreendentemen- paldadas pela ciência. Entretanto,
on Science and Society, publica- te, quase o mesmo percentual é razoável excluir os consumido-
do pelo Pew Research Center em (80%) demonstrou apoio à hipó- res do debate sobre a produção de
2015. Em temas como vacinação e tese de rotular todos os alimen- alimentos?
alimentos transgênicos, o enten- tos que contenham DNA. Uma Diversos fatores psicológicos,
dimento sobre a segurança dessas vez que quase 100% do que con- culturais e econômicos podem le-
inovações é mais claro entre pes- sumimos têm essa molécula, esse var os consumidores a desenvol-
quisadores do que entre consu- achado sugere que a apreensão verem convicções divergentes
midores não vinculados à ciência.
Dentre os casos citados, a maior COMO VOCÊ AVALIA SEU CONHECIMENTO APENAS ALIMENTOS TRANSGÊNICOS
diferença se dá quanto aos orga- SOBRE O SISTEMA DE PRODUÇÃO POSSUEM GENES. ESSA AFIRMAÇÃO É
³ä¸ä x³xî`Dx³îx ¸l`D- GLOBAL DE ALIMENTOS? FALSA OU VERDADEIRA?
dos (OGMs). A pesquisa mostra
que 88% dos cientistas membros 80 80
ä×
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"DO«ÍDÜþÍ«fr
¡r«ÍD¡r§Ü«
r§÷ÜZ«frµD§ÜDÒ
FOTOS: BIGSTOCK
na nos debates. Se a academia não ³¹äjÇ߸ä丳Dälx`z³`DälD
se preocupar em comunicar suas vida, ainda precisamos avançar em
descobertas para além dos fóruns comunicação para diversos públi-
técnicos, a opinião pública conti- cos e no engajamento da socieda-
nuará refém de visões alarmistas e, de para que as percepções envol- PARA CONHECER MAIS:
sobretudo, infundadas. Com a atu- vendo produtos da ciência não se-
al disponibilidade de ferramentas jam dominadas pelo medo e pela Public and Scientists Views’s on Science and
Society»0ré2rÒrDÍZr§ÜrÍdäð®»Òµ«§ûèr
de comunicação, a falta de diálogo desinformação. r¡ÜܵcØØéé黵ré§ÜrͧrÜ»«ÍØäð®Øð®Øä¨Ø
µæOZD§fÒZr§ÜÒÜÒèréÒ«§ÒZr§ZrD§f
16% Ò«ZrÜëØ
VOCÊ É A FAVOR DE NÃO VOCÊ ACREDITA QUE, AO
What consumers don´t know about
QUE ALIMENTOS SE ALIMENTAR, INGERE: y´yï`D¨¨Ă®¹mym¹¹mjD´m¹ĀïDï
QUE CONTENHAM Dy`ïåUy¨yå»
ÍD§f«§2$DZDffr§D§f
Vitaminas e
INGREDIENTES 84% minerais 83%
DëÒ«§""æÒ»J^[<7I;8@ekhdWbd<«Þ𷨸d Þð¨®
TRANSGÊNICOS SIM
Þð¨×däð®×»
TRAGAM ESSA Carboidratos 76% Estudo de percepção sobre transgênicos
INFORMAÇÃO NO RÓTULO? na produção de alimentos»«§Òr«fr
Agrotóxicos 74% §{«Í¡D]ĂrÒÒ«OÍr
«ÜrZ§««Ddäð®×»Òµ«§ûèr
r¡ÜܵcØØZO»«Í»OÍØrÒÜæf«ÒrDÍÜ«ÒØrÒÜæf«fr
VOCÊ É FAVOR DE 20% Proteínas µrÍZrµZD«Ò«OÍrÜÍD§Òr§Z«Ò§DµÍ«fæZD«fr
NÃO 72%
QUE ALIMENTOS D¡r§Ü«ÒØ
QUE CONTENHAM Food Literacy and engagement poll.
Gorduras 71%
DNA TRAGAM ESSA $ZD§3ÜDÜr7§èrÍÒÜëdäð®Ö»Òµ«§ûèr
80%
INFORMAÇÃO SIM r¡ÜܵcØØ{««f»¡Òæ»rfæØDÍÜZrÒØ
DNA 17%
NO RÓTULO? ¡Òæ{««fÜrÍDZëD§fr§Dr¡r§Üµ«
A CIÊNCIA CONTRA-ATACA
EM TEMPOS DE PÓS-VERDADE, FOOD EVOLUTION MOSTRA-SE UM DOCUMENTÁRIO CONTEMPORÂNEO E RELEVANTE
FREDERICO FRANZ
äs
da está repleto de hipóteses assus-
tadoras que a ciência não só rejei-
ta, como diz o contrário. Apenas
para mencionar uma fonte de alta
`ßxlU§lDlxÇßxäx³îx³¸§xjD
Academia Nacional de Ciências,
Engenharia e Medicina dos Esta-
dos Unidos atestou, em 2016, que
em nenhum estudo foram encon-
tradas evidências de efeitos ad-
versos derivados do consumo de
transgênicos em seres humanos
ou em outros animais. 3Z«ÜÜ!r§§rfëd%r5ëÒ«§r5ÍDZr
Essa publicação se soma a di- 3rrD§d«ÜÍ«µ«ÍÜÍñÒf«¡r
versas que chegaram à mesma
conclusão: os transgênicos apro- transgênicos e fundadora do mo- rização da ciência. Para demonstrar
vados até hoje são tão seguros vimento Moms Across America, essa contradição dos tempos atuais,
quanto outros alimentos, inclusive Bx³ ¸³xā`øîîj DßD Ôøx `¸³D ¸ §x îßDą îDUy ¸ä lxǸx³-
do ponto de vista ambiental. Ape- mais em outras mães que postam tos de diversos cientistas e pesquisa-
sar disso, não é exatamente inco- nas redes sociais ou em blogs do dores. Para guiar o espectador, con-
mum que apareçam histórias alar- que em médicos ou em agências tamos com a narração de Neil de
mantes sobre o assunto, especial- governamentais. “Elas são reais, eu Grasse Tyson, doutor em astrofísica
mente na internet. É nesse ponto ³T¸ Çßx`ä¸ lx ø xäîøl¸ `x³î- e talvez um dos mais conhecidos di-
Ôøx¸§xl¸lßxî¸ß ³l`Dl¸ D¸ `¸Új DßDj `Dîx¹ß`DÍ þø§Dl¸ßxä `x³î`¸ä lD DîøD§lDlxÍ
Oscar de melhor documentário Vivemos em um período mui- O documentário estreou nos Es-
em 2009 se conecta muito bem à to particular na história da comu- tados Unidos em junho de 2017 e,
nossa realidade. A obra tenta tra- nicação. Com o advento da inter- no Brasil, terá sessões especiais
zer à tona o que, de fato, é ciên- net e das mídias digitais, nunca foi apresentadas pela 3`x³î` x-
cia e o que é crença cega, típica da tão farta a oferta de informações. rican Brasil. As exibições vão acon-
pós-verdade, em meio às discus- Apesar disso, paradoxalmente, esse tecer na semana mundial da ali-
sões sobre os transgênicos. A certo acesso ao conhecimento não veio mentação, dias 18 e 19 de outubro
¸x³î¸l¸§xjDDîþäîD D³î- acompanhado de uma maior valo- em São Paulo e dia 20 em Por-
to Alegre e em Goiânia. Para saber
¡r ÂærÒÜ«§D æÒ« fD mais sobre alimentos transgênicos
r¡«]õ« Z«¡« rÒÜÍDÜ÷D x ä¸Ußx `¸¸ Däääîß D¸ §xj UDäîD
f« ¡«è¡r§Ü« Z«§ÜÍD '$ `Dß §Dl¸ ³D 3`x³î` xß`D³
nas redes sociais ou acompanhar as
atualizações do site da revista.
1. 2. 3. 4. 5.
HOMENS PROMÍS- EXISTE UM QUANDO SEXO E ALÉM DO XX E XY NÃO SÓ
CUOS, MULHERES CÉREBRO GÊNERO COLIDEM AMANDA MONTAÑEZ PARA HOMENS
CASTAS E OUTROS “FEMININO”? KRISTINA R. OLSON página 50 MARCIA L. STEFANICK
MITOS DE GÊNERO LYDIA DENWORTH página 44 página 52
CORDELIA FINE E página 38
MARK A. ELGAR
página 32
SEXO DEVERIA SER SIMPLES, pelo menos no nível molecular. As explicações biológicas nos
livros didáticos consistem em X + X = Ƃ e X + Y = ƃ. Vênus ou Marte, rosa ou azul. Mas à medida que a ciência
olha com mais atenção, fica cada vez mais claro que um par de cromossomos nem sempre basta para distinguir
menina/menino, tanto do ponto de vista do sexo (características biológicas) como do gênero (identidade social).
No domínio cultural, essa mudança de perspectiva já foi amplamente aceita. As definições “não dualistas” de
gênero — pessoas transfemininas, não-binários, hijras (transgêneros e intersexuais da Índia, do Paquistão e de
Bangladesh) — entraram no vernáculo. Menos visíveis talvez sejam as mudanças que estão ocorrendo nas ciên-
cias biológicas. A imagem emergente que denota características “de menina” ou “de menino” revela o envolvimen-
to de complexas redes gênicas — e todo o processo parece estender-se muito além de um momento específico, seis
semanas após a concepção, quando as gônadas começam a se formar.
Em graus diversos, muitos de nós são híbridos biológicos em um contínuo masculino-feminino. Pesquisado-
res encontraram células XY em uma mulher de 94 anos e cirurgiões descobriram um útero num homem de 70, pai
de quatro filhos. Novas evidências sugerem que o cérebro consiste em um “mosaico” de diversos tipos de células,
algumas delas mais yin [femininas], outras mais yang [masculinas]. Essas descobertas têm implicações de longo
alcance, bem além de apenas atualizar os livros didáticos de biologia. Elas são relevantes em especial em questões
de identidade pessoal, saúde e bem-estar econômico de mulheres. Isso ocorre porque as discussões sobre diferen-
ças biológicas inatas entre os sexos persistiram muito além da hora em que deveriam ter sido abandonadas.
Em 1895, um artigo na Scientific American, “A mulher e o volante”, indagou se se deveria deixar que mulheres
andassem de bicicleta por causa de sua saúde física. Por fim, o artigo concluiu, o esforço muscular exigido é bas-
tante diferente do que é necessário para operar uma máquina de costura. Just Championnière, o eminente cirur-
gião francês autor do artigo, respondeu afirmativamente à pergunta que ele mesmo havia feito, mas apressou-se
em dizer: “Mesmo quando ela está à vontade, deveria se lembrar de que seu sexo não é destinado por nature-
za para violento esforço muscular... E mesmo quando uma mulher se preparou cautelosamente e treinou para o
exercício, sua velocidade jamais deveria ser a de um homem adulto em pleno vigor muscular”.
É claro, atitudes do século 19 podem ser descartadas de imediato por causa de seu divertido e singular cará-
ter arcaico. Mas, como mostra mais esta atual análise anual aprofundada de um tema de premente interesse fei-
ta por Scientific American, noções enraizadas sobre a inferioridade das mulheres persistem até agora, século 21
adentro. Isso é verdade até mesmo nas ciências, onde alguns campos enfatizam o brilhantismo intelectual, erro-
neamente associado a homens brancos, como pré-requisito para o sucesso, atitude que afasta potenciais candi-
datas femininas nas áreas de física e matemática.
Desde que Championnière escreveu para a Scientific American, o status das mulheres inegavelmente melho-
rou. Pelo globo, mulheres de países ricos e pobres fizeram grandes avanços em educação e saúde reprodutiva,
e assumiram mais papéis no processo de tomada de decisões. Mas não basta. Persistem barreiras econômicas
que impedem mulheres de ganhar acesso a capital e empregos, e serem remuneradas com um salário decente,
pelos empregos que encontram. Mais energia precisa ser investida também em pesquisar como doenças afetam
os sexos de maneiras diferentes — e em adaptar os tratamentos médicos às necessidades das mulheres. Para que
um mundo interligado prospere, mulheres têm de ser mais empoderadas para sustentarem a sua metade do céu
— uma questão que deveria exigir tanta atenção quanto mudanças climáticas e controle de armas nucleares.
A mudança só continuará se as instituições que de fato importam mantiverem-se abertas a ela. A investida dos
legisladores republicanos em Washington contra a saúde feminina é um obstáculo formidável. O bem-estar das
mulheres precisa ser visto como uma questão de interesse geral. A nova ciência de sexo e gênero tem a perspectiva
de ajudar a moldar a percepção pública e a formulação de políticas para reconhecer esta realidade. —Os editores
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HOMENS
PROMÍSCUOS,
MULHERES
CASTAS E OUTROS
MITOS DE GÊNERO
A noção de que diferenças comportamentais
x³îßx¸ääxĀ¸ääT¸³DîDäxøîEþxä³T¸äx
sustenta sob escrutínio
CORDELIA FINE E MARK A. ELGAR
Ilustrações de Yuko Shimizu
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
Será que este cenário faz você pensar numa artis- desenvolveram características tais como tamanho
ta muito festejada, famosa por desafiar as convenções e avantajado ou galhadas grandes para ajudar a derro-
transitar por uma série de belos jovens? É, achamos que tar a concorrência na luta por território, status social e
não faria. O estereótipo do homem ousado e promís- parceiras. Da mesma forma, geralmente é o macho que
cuo — e sua equivalente, a mulher cautelosa e casta — desenvolveu características puramente estéticas, atra-
EM SÍNTESE
está profundamente enraizado. A sabedoria que nos foi entes para as fêmeas, como uma plumagem deslum-
transmitida sustenta que diferenças comportamentais brante, um canto elaborado ou um odor delicioso.
A clássica explicação
evolutiva frf{rÍr§ entre homens e mulheres são inatas e aprimoradas pela Foi, no entanto, o biólogo Angus Bateman que, em
]DÒZ«¡µ«ÍÜD¡r§ÜDÒ seleção natural ao longo de milênios para maximizar meados do século 20, desenvolveu uma explicação con-
r§ÜÍr«¡r§Òr seus diferentes potenciais reprodutivos. Sob este ponto vincente de por que ser macho tende a levar à competi-
¡ærÍrÒÒæÒÜr§ÜD de vista, homens, em virtude de suas tendências inatas ção sexual. O objetivo da pesquisa de Bateman foi tes-
ÂærrDÒÍrrÜr¡æ¡ para competir e correr riscos, estão destinados a domi- tar uma importante suposição da teoria de Darwin.
µDfÍõ«ÂærÒrfrÒr§ nar no mais elevado nível de todos os domínios de ação Como a seleção natural, a seleção sexual implica que
è«èræd«ærè«æædr÷
humanos, seja na arte, na política ou na ciência. alguns indivíduos são mais bem-sucedidos do que
«OÒrÍèDf«r¡Ü«f««
Mas um olhar mais atento para a biologia e o com- outros. Portanto, se a seleção sexual age mais intensa-
Ír§«D§¡D»$æÜDÒ
frÒæDfDfrÒfr portamento de humanos e outras criaturas mostra que mente em machos do que em fêmeas, então os machos
ù§rÍ«dfrDZ«Íf« muitas das premissas iniciais criadas para explicar deveriam ter uma variedade maior de êxitos reproduti-
Z«¡rÒÜrµ«§Ü«fr essas diferenças estão erradas. Em muitas espécies, por vos, de fracassos deploráveis a grandes vencedores. Em
èÒÜDdÒõ«dµ«ÍÜD§Ü«d exemplo, a fêmea se beneficia por ser competitiva ou comparação, fêmeas deveriam ser muito mais pareci-
ǧDÜæÍDÒÈ» polígama. E mulheres e homens muitas vezes têm pre- das em seus sucessos reprodutivos. É por isso que ser
Mas pesquisas mos- ferências similares em suas vidas sexuais. Também está o equivalente animal de um brilhante artista beneficia
tram Âær¡æÜDÒfDÒ
cada vez mais claro que fatores ambientais herdados machos muito mais do que fêmeas.
Ò浫Ò]ĂrÒ{æ§fD
¡r§ÜDÒfrÒÜDrêµD
têm um papel no desenvolvimento de comportamentos Bateman usou moscas-das-frutas para testar esta
§D]õ«rÒÜõ« adaptativos; em humanos, esses fatores incluem nossa ideia. Embora a tecnologia para testes de paternida-
rÂæè«ZDfDÒ» cultura de gênero. Tudo isso significa que a igualdade de não existisse à época, ele inferiu a linhagem e o
Fatores ambientais, entre os sexos pode ser mais viável do que se supunha. número de diferentes parceiros de machos e fêmeas o
D÷¡fÒÒ«dµ«fr¡ melhor que pôde. Fez isso de forma bastante engenho-
frÒr¡µr§DÍæ¡ MACHOS RÁPIDOS, FÊMEAS MELINDROSAS sa ao usar moscas-das-frutas com diferentes mutações
µDµr{æ§fD¡r§ÜD§« A origem da explicação evolutiva passada e pre- genéticas, inclusive uma que torna os pelos nas asas
frÒr§è«è¡r§Ü«fr
sente da desigualdade entre gêneros é a teoria da sele- extralongos, outra que faz as asas se recurvarem para
Z«¡µ«ÍÜD¡r§Ü«Ò
ção sexual de Charles Darwin. Suas observações como cima, e outra ainda que torna seus olhos muito peque-
DfÂæÍf«Òdrè«æûf«Ò»
$æfD§]DÒZæÜæÍDÒ naturalista o levaram a concluir que, com algumas nos ou ausentes. Essas mutações às vezes são evidentes
µÍ«ÍrÒÒèDÒ§õ«Çèõ« exceções, na arena do galanteio e acasalamento, o desa- na prole, de modo que Bateman pôde estimar quantos
Z«§ÜÍDÈD%DÜæÍrîDd fio para ser escolhido em geral recai mais acentuada- descendentes cada adulto produziu ao contar o núme-
¡DÒDÍrrÒZÍrèr¡» mente sobre machos. Logo, machos, em vez de fêmeas, ro de diferentes mutantes entre as crias sobreviven-
www.sciam.com.br 35
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
sexual feminina, resultante da pílula anticoncepcio- dos potenciais custos e benefícios de uma ação arris-
nal e da revolução sexual, levou ao aumento das rela- cada em particular, não a sua atitude em relação ao
ções sexuais pré-maritais e do número de parceiros, risco per se, que explica a disposição de correr riscos.
especialmente no caso das mulheres. E tanto mulheres Esses custos e benefícios percebidos podem incluir não
como homens relatam preferências em grande parte só perdas e ganhos materiais, mas também impactos
similares para suas vidas sexuais. menos tangíveis em reputação ou autoconceito.
A segunda Pesquisa Nacional Britânica de Atitu- Essa nuance é importante porque, às vezes, o equilí-
des Sexuais e Estilos de Vida, por exemplo, baseada brio de riscos e benefícios não é o mesmo para homens
em uma amostra randômica de mais de 12 mil pessoas e mulheres por causa de diferenças físicas entre os
com idades entre 16 e 44 anos, entrevistadas por volta sexos ou normas de gênero, ou ambos. Considere, por
da virada deste século, constatou que 80% dos homens exemplo, o risco de um encontro sexual casual. Para
e 89% das mulheres preferiam a monogamia. Enquan- um homem, os ganhos incluem a quase certeza de um
to isso, o movimento feminista aumentou as oportu- orgasmo e talvez um aumento considerável de sua
nidades de mulheres entrarem e se destacarem em reputação como um “garanhão”. Para uma mulher, sen-
domínios tradicionalmente masculinos. Em 1920, só tir prazer sexual é muito menos provável quando se
84 mulheres estudavam nas 12 melhores faculdades trata de sexo casual, de acordo com um estudo em lar-
de direito que admitiam alunas, e para elas era quase ga escala de estudantes norte-americanos, publica-
impossível arrumar um emprego. No século 21, mulhe- do em 2012 por Elizabeth Armstrong, da Universidade
res e homens se formam em faculdades de direito em de Michigan, e seus colegas. E, graças ao duplo padrão
números quase iguais, e mulheres eram quase 18% dos sexual, sua reputação mais do que provavelmente será
sócios das firmas de advocacia, em 2015. prejudicada pelo episódio. Entre jovens australianos,
por exemplo, o sociólogo Michael Flood constatou que
RISCOS E BENEFÍCIOS o rótulo de “vagabunda, promíscua” carrega um “peso
À medida que refinamos nosso foco a partir desta moral e disciplinar mais forte... quando aplicado a
perspectiva mais ampla de padrões de gênero para um mulheres”. Além disso, uma mulher corre maiores ris-
exame mais minucioso das diferenças entre os sexos cos físicos, incluindo gravidez, doenças sexualmente
em comportamento, a familiar história evolutiva tor- transmissíveis e até ataques/agressões sexuais.
na-se ainda mais turva. Tome a disposição de correr A lente de riscos e benefícios distintos também
riscos, antes considerada um traço masculino por seu pode esclarecer a diferente propensão dos sexos de
papel em melhorar seu sucesso reprodutivo. Acontece se impor no trabalho. É difícil ver como uma jovem
que pessoas são bem singulares nos tipos de riscos que advogada, olhando primeiro para as muitas mulheres
estão dispostas a correr. O paraquedista não tem mais jovens do seu nível e depois para as poucas mulheres
chances de apostar dinheiro do que a pessoa que se sócias e juízas, pode ser tão otimista quanto à prová-
exercita na segurança de uma academia. É a percepção vel recompensa por “fazer acontecer” e fazer sacrifícios
podem ser. Um exemplo vem das fêmeas de insetos da mostraram que nos EUA hoje homens valorizam mais
família Tettigoniidae, que competem pelos machos que as perspectivas financeiras, a educação e a inteligên-
lhes trazem tanto sêmen como comida, de acordo com cia de uma parceira — e se importam menos com suas
os princípios de Bateman-Trivers. Porém, quando seu habilidades culinárias e domésticas — do que faziam
ambiente fica rico de pólen nutritivo, sua “natureza” há décadas. Enquanto isso, o clichê da solteirona inte-
competitiva diminui. lectual é uma relíquia: embora mulheres mais ricas e
O ambiente é igualmente importante para o com- mais bem instruídas outrora tivessem menos chance de
portamento adaptativo em mamíferos. Pesquisas se casar, agora elas são mais propensas a fazer isso.
publicadas a partir do final dos anos 1970 constataram Poderíamos, então, ver o dia em que as melhores
que mães de ratos cuidam de filhotes machos e fêmeas galerias de arte do mundo exibirão tanta arte criada
de jeitos diferentes. Os machos são mais lambidos na por mulheres como por homens? Nós certamente não
região anogenital porque as mães são atraídas pelo deveríamos permitir que as moscas-das-frutas de Bate-
nível mais elevado de testosterona na urina dos filhotes man nos dissessem que não.
machos. Curiosamente, o maior estímulo dessas lam-
bidas desempenha um papel no desenvolvimento de
PA R A C O N H E C E R M A I S
diferenças sexuais em partes do cérebro envolvidas no
comportamento básico de acasalamento dos machos. Testosterone Rex: Myths of sex, science, and society. Cordelia Fine. W. W. Norton, 2017.
Inferior: How science got women wrong—and the new research that’s rewriting the story.
Como observou o filósofo da ciência Paul Griffiths, Angela Saini. Beacon Press, 2017.
não deveria nos surpreender que fatores ou experiên- Rethinking Bateman’s Principles: Challenging persistent myths of sexually reluctant females and
cias ambientais que se repetem confiavelmente a cada promiscuous males. Zuleyma Tang-Martínez em Journal of Sex Research, Vol. 53, nos 4–5, págs. 532–
geração sejam incorporados nos processos de desen- 559; 2016.
www.sciam.com.br 37
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
EXISTE UM
CÉREBRO
“FEMININO”?
Debate sobre eventuais diferenças entre cérebros
de homens e mulheres poderá ter profundas
implicações para saúde e para identidades pessoais
LY D I A D E N W O R T H
A partir dessa descoberta inesperada, Joel desen- te) para favorecer sua hipótese. Outros críticos foram
volveu uma hipótese sobre diferenças cerebrais entre mais moderados. “Há grande variabilidade entre as
os sexos que suscitou ainda mais controvérsia numa pessoas e ela mostra isso maravilhosamente, mas não
área já saturada. Em vez de analisar áreas do cérebro quer dizer que não existam regiões do cérebro que, em
que diferenciam homens de mulheres, ela sugeriu que média, sejam diferentes em homens e mulheres”, diz
deveríamos considerar nosso cérebro como um “mosai- Margaret M. McCarthy, neurocientista da Universidade
co” (repropondo um termo já proposto por outros) com de Maryland, que estuda diferenças de sexo em ratos.
Lydia Denworth aspectos masculinos e femininos variáveis. Essa pró- Joel, por seu lado, concorda que a genética, hormô-
rÒZÍrèrÒ«OÍrZù§ZD
r÷DæÜ«ÍDfr?YWd
pria variabilidade e a superposição comportamental nios e o ambiente criam diferenças no cérebro segundo
^[Whoekm^_if[h0Wd entre os sexos — mulheres agressivas e homens empá- o sexo. Ela até concorda que, com informações sobre
_dj_cWj[`ekhd[o ticos e até homens e mulheres que exibem os dois tra- certas características do cérebro de uma pessoa, é pos-
j^hek]^j^[iY_[dY[e\ ços — sugerem que os cérebros não podem ser separa- sível deduzir, com alto grau de precisão, se pertence a
iekdZWdZbWd]kW][d dos em duas categorias distintas ou dimórficas. Essa um homem ou a uma mulher. Mas o inverso, ela desta-
æÜÜ«§däð®»
massa de 1.350 gramas alojada dentro do crânio não é ca, não é possível: olhar para uma pessoa, homem ou
ÜæD¡r§ÜrrD
ÜÍDODD§æ¡èÍ« nem masculina nem feminina, diz Joel. Com seus cole- mulher, e prever a topografia e cenário molecular do
Ò«OÍrDZù§ZDf« gas de Tel Aviv, do Instituto Max Panck para Ciências cérebro ou da personalidade, apenas sabendo seu sexo.
Z«¡µ«ÍÜD¡r§Ü« Humanas Cognitivas e Cerebrais, e da Universidade Apesar de o estudo ser muito controvertido, a
Ò«ZD» de Zurique, Joel testou sua ideia analisando imagens essência do que Joel propõe está correta, diz Catheri-
de ressonância magnética (MRI) de cérebros de mais ne Dulac, da Universidade Harvard, cujo trabalho com
EM PROCEEDINGS OF THE NATIONAL ACADEMY OF SCIENCES USA, VOL. 112, N O 50; 15 DE DEZEMBRO DE 2015
de 1.400 pessoas e demonstrou que a maioria delas, de camundongos confirma as descobertas de Joel: “há
FONTE: “SEX BEYOND THE GENITALIA: THE HUMAN BRAIN MOSAIC,” POR DAPHNA JOEL ET AL.,
fato, continha tanto traços masculinos como femini- uma enorme heterogeneidade entre as pessoas”. Defi-
nos. “Todos nós pertencemos a uma mesma população nitivamente, o fato abriu uma nova linha na discussão
altamente heterogênea”, ela observa. sobre o que significa ser macho e fêmea. Para os neuro-
Quando o trabalho de Joel foi publicado em 2015, os cientistas, não é mais suficiente procurar diferenças de
cientistas que partilhavam as mesmas crenças o elogia- sexo no cérebro. O debate agora está centrado na fon-
ram como um importante avanço. “O resultado foi um te, tamanho e significado dessas diferenças. Ele pode
grande desafio às ideias equivocadas vigentes”, escre- ter grandes implicações na forma como sexo e gênero
veu Gina Rippon, professora da Universidade Aston. são tratados dentro e fora do laboratório — e também
“Espero que ele possa revolucionar o século 21.” pode ter efeito relevante ao decidir se terapias e proto-
No entanto, pesquisadores que estudam as diferen- colos de tratamentos que usam drogas devem ser espe-
ças de sexo, há muito tempo, discordam taxativamen- cializados para mulheres e homens. “Nossa socieda-
te, opondo-se à metodologia e conclusões de Joel, bem de se baseia no pressuposto de que nossos genitais nos
como ao seu feminismo declarado. “O artigo é pura ide- dividem em dois grupos não só segundo capacidade ou
ologia mascarada de ciência”, diz o neurobiólogo Larry possibilidade reprodutiva, mas também em termos de
Cahill, da Universidade da Califórnia, que argumenta nosso cérebro ou características psicológicas”, diz Joel.
que os métodos estatísticos de Joel foram “manipula- “As pessoas acreditam que as diferenças se somam, que
dos” (embora não necessariamente conscientemen- se uma pessoa é feminina num traço será feminina em
EM SÍNTESE
Uma suposição
popularmente man-
O cérebro mosaico
tida DÒÒræÍDÂær«Ò äl
xßx³cDäx³îßx¸ääxĀ¸äx³`¸³îßDlD䳸`yßxU߸øD³¸§xþDßDKÇxß`xÇcT¸lxÔøx¸`yßxU߸y¸øDä`ø§³¸¸ø
Z÷ÍrOÍ«Òfr«¡r§Ò feminino. Um estudo realizado por Daphna Joel e colegas da Universidade de Tel Aviv conta uma história diferente. A
r¡ærÍrÒÒõ«§Ü ÇxäÔøäDlx ¸x§¸äî߸øÔøxø`yßxU߸îÇ`¸yøÙ¸äD`¸Új`¸U³D³l¸D§ø³äDäÇx`î¸äDä`¸ø³äx¸x³ä
fD¡r§Ürf{rÍr§ÜrÒ» x¸øî߸äÔøxDÇDßx`x`¸Dä
ßxÔøz³`Dxø§xßxäj§xþD³l¸K`¸³`§øäT¸lxÔøx¸ä`yßxU߸äøD³¸ä³T¸Çxß-
Novas pesquisas
îx³`xDl¸äîǸäläî³î¸ä`Dîx¸ßąDl¸äǸßäxĀ¸Í
controversas, §«
r§ÜD§Ü«dÒærÍr¡ Distribuição de volume de substância Regiões do cérebro mostrando as Resultados de scans cerebrais (cada coluna
ÂærD¡D«ÍDf«Ò cinzenta no hipocampo esquerdo maiores diferenças de sexo
Z÷ÍrOÍ«Ò÷æ¡¡«ÒD 33% na extremidade 33% na extremidade Lóbulo vermiano X
Z«frZDÍDZÜrÍûÒÜZDÒ mais masculina mais feminina Núcleo caudato direito
¡DÒZæ§DÒr da amostra da amostra Núcleo caudato esquerdo
{r¡§§DÒ» Hipocampo direito
O debate que se Hipocampo esquerdo
seguiu §Z«¡«f«ær Giro reto direito
rèD§Ü«æÂærÒÜĂrÒ Giro reto esquerdo
Ò«OÍrZ«¡«Òrê«r Giro frontal superior esquerdo, orbital médio
ù§rÍ«Òõ«Z«§Òfr Grito frontal superior direito, parte orbital
rados fora do “Extremidade Intermediária “Extremidade Giro frontal superior esquerdo, parte orbital
DO«ÍDÜþÍ«» masculina” feminina”
representa um indivíduo)
Femininos (representação de 55 dos 169 indivíduos do estudo original) Masculinos (representação de 37 dos 169 indivíduos do estudo original)
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
va. Mas McCarthy também enfatiza que a fonte das mulheres, como o volume coletivo dos corpos centrais
diferenças entre sexos nos humanos é mais complexa e extensões dendríticas das células nervosas (substân-
que entre os animais que não experienciam o gênero, cia cinzenta) e suas fibras conectoras (substância bran-
aqueles atributos psicológicos e sociais de cada sexo. ca). Eles encontraram um continuum de traços. Carac-
“Nos humanos, o simples fato de sermos criados com terísticas definitivamente feminizadas e masculiniza-
um determinado gênero desde o parto já provoca um das ocupavam as extremidades, e a zona intermediária
impacto biológico no cérebro”, ela comenta. Em seu mostrava uma mistura de traços.
livro Cérebro azul ou rosa, publicado em 2009, Eliot Depois, os pesquisadores avaliavam cada cére-
concorda, argumentando que a plasticidade — a for- bro e codificavam cada traço (veja o quadro nas pági-
ma como o cérebro muda diante da experiência — leva nas anteriores). Eles postularam que se os cérebros são
a mais diferenças entre os sexos no comportamento internamente consistentes, os traços que indicam dife-
do que a herança biológica. renças de sexo podem, com confiança, assumir padrões
Passar do cérebro para o comportamento leva às masculinos ou femininos. E uns poucos poderiam abri-
divergências mais contundentes. O estudo recente de gar traços masculinos e femininos. Mas entre 23% e
maior destaque, acusado de brincar com estereóti- 53% dos cérebros (dependendo do conjunto de dados)
pos, foi um artigo escrito por Ruben Gur, Raquel Gur continham traços das duas extremidades do espectro.
e Ragini Verma, todos da Universidade da Pensilvâ- Cérebros internamente consistentes eram raros — de
nia, publicado em 2014. O grupo utilizou imageamen- 0% a 8% dos casos estudados.
to de tensor de difusão (MRI de difusão), uma técnica Para explicar por que a variabilidade é impor-
que mostra a força das conexões entre neurônios, para tante, Joel cita como exemplo as razões para a prefe-
analisar quase mil cérebros de pessoas entre 8 e 22 rência por classes escolares com um só sexo. “(Clas-
anos. O estudo revelou que eles tinham conexões mais ses assim) assumem que meninos têm um conjun-
fortes dentro dos hemisférios direito e esquerdo, e elas to de traços — por exemplo, são mais ativos e menos
tinham conexões mais robustas entre os hemisférios. pacientes — e as meninas têm outro. Logo, devemos
Os pesquisadores concluíram que “os resultados suge- separá-los e tratar cada grupo diferentemente. O que
rem que os cérebros masculinos são estruturados para estamos mostrando é que, embora isso seja válido no
facilitar a conexnao entre percepção e ação coordena- nível de grupo, não vale no nível individual. Não se
da, enquanto que os femininos são desenhados para pode separar os alunos num grupo que é mais ativo,
facilitar as comunicações entre modos de processa- gosta de esportes, é bom em matemática e não gos-
mento analítico e intuitivo”. (Crítica: o estudo não fez ta de poesia, e outro grupo que é seu oposto perfeito.
a correção para o tamanho do cérebro.) Crianças assim são poucas.”
Para a maioria dos cientistas o trabalho de Joel
EM BUSCA DE VARIABILIDADE de demonstrar essa variabilidade é convincente. “A
Joel entrou nesse turbilhão. Vários estudos pré- contribuição de Daphna foi de mostrar, indivíduo
vios identificaram diferenças numa só caracterís- por indivíduo, a variabilidade dentro de cada gêne-
tica cerebral e depois as usaram para tirar conclu- ro”, diz Eliot. “Ninguém nunca publica esses dados.”
sões sobre populações inteiras — médias para mulhe- Mas muitos consideram problemática a forma de
res e homens. Joel e seus colegas fizeram o oposto: medir a consistência interna. Marco Del Giudice, da
usaram um levantamento de diferenças no nível de Universidade do Novo México, e seus colegas contes-
população, observadas num dado grupo, e pergun- taram o artigo de Joel no PNAS. Eles defendem que
taram o que se poderia afirmar para cérebros indivi- a definição de Joel e colegas, usada para a consistên-
duais. “São duas descrições do mundo”, diz Joel. As cia interna foi tão exagerada que acabou se tornando
duas mostram as mesmas diferenças no nível de gru- biologicamente implausível, se não impossível. Para
po. A questão mais crítica, no entanto, é: qual descre- provar, eles refizeram a análise de Joel usando con-
ve melhor o cérebro humano — a primeira, na qual juntos de variáveis biológicas completamente dife-
há um tipo de cérebro típico de homens e outro de rentes — por exemplo, comparando a variabilidade
mulheres, ou a segunda, na qual os cérebros da maio- entre aspectos faciais de três espécies de macacos de
ria das pessoas são um mosaico de características aparência muito diferente. Se o método de Joel for
masculinas e femininas? válido, pensou Del Giudice, os macacos devem mos-
Objetivamente, o estudo de Joel de 2015 propôs trar diferenças faciais claras (“internamente consis-
duas questões: qual o grau de acoplamento nos aspec- tentes”) entre as espécies.
tos que mostram diferenças entre mulheres e homens? Apesar das aparências nitidamente diferentes das
E os cérebros são “internamente consistentes”? Este três espécies, os aspectos que distinguem faces de qual-
último termo é uma medida que Joel desenvolveu para quer um dos macacos raramente indicaram consis-
determinar se todos os aspectos no cérebro de qual- tência interna como Joel a definiu — daí a visão de
quer pessoa eram masculinos ou femininos. Usando Cahill de que o estudo é “manipulado”. (Em resposta,
quatro grandes conjuntos de dados de MRI, sua equi- Joel argumenta que, embora a consistência interna em
pe identificou, em cada conjunto, vários traços que macacos fosse baixa, não existia variabilidade quando
apresentavam as maiores diferenças entre homens e se avaliava as espécies separadamente, enquanto que a
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
QUANDO
SEXO E GÊNERO
COLIDEM
Estudos com crianças transgênero estão oferecendo insights
fascinantes sobre gênero no cérebro. Muitas crianças trans
CÇßxäx³îClx³îlClxääøßÇßxx³lx³îxx³îxßxäx
tenras idades, por exemplo, e importantes diferenças separam
meninas trans de meninos que gostam de cor-de-rosa
KRISTINA R. OLSON
O CHEGAR
G À CAS
CA DE AMIGOS PARA JANTAR CERTA
noite no outo
ono
onn de 2008, me juntei ao
m jovem cco
mais onvidado da noite, Noah, de
cinco anos, q
que estava brincando no
sofá. Mal sabia eu que ele, sozinho,
mudariaa o curso da minha carreira.
Como o sou
s professora de psicologia do desen-
volvimento,n não é incomum para mim pas-
sar algguum tempo na mesa das crianças. Estu-
do co ommo crianças pensam sobre si mes-
mas e as pessoas ao seu redor, e alguns dos
meeu
m us insights vieram de conversas como
eesstta. Depois de um bate-papo informal
vi Noah olhar ao redor da sala, pare-
cer notar que ninguém estava olhan-
do e resgatar algo em seu bolso. A
revelação foi lenta, mas o resultado
inconfundível: um amado conjun-
to de bonecas Polly Pocket.
Ao longo dos anos seguintes,
tive a oportunidade de conhecer Noah muito bem e fiquei sabendo mais sobre o seu passado
(todos os nomes de crianças aqui são pseudônimos para proteger sua privacidade). De início,
os pais de Noah só haviam notado que ele era diferente de seu irmão nos anos de pré-escola.
Ele preferia brincar com coleguinhas do sexo feminino e com brinquedos que são mais comu-
mente associados a meninas, mas seus pais não se abalaram. À medida que ficou mais velho,
Noah deixou crescer seu cabelo antes curto e substituiu seu guarda-roupa razoavelmente neu-
tro em termos de gênero por um que dava destaque proeminente a tênis com luzes que bri-
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
AS RAÍZES DE GÊNERO
Mas de onde vem a sensação de gênero para iní-
cio de conversa? A ciência ainda está longe de ser con-
clusiva. Devido à idade precoce em que esse senso de
identidade pode surgir, pesquisadores têm procura-
do por sinais genéticos e neuroanatômicos em pesso-
as transgênero. Uma abordagem muito usada na gené-
tica é o estudo com gêmeos. Uma grande diferença
entre gêmeos idênticos e fraternos é que os primeiros
compartilham mais de seu material genético do que
os últimos. Se pesquisadores encontram mais concor-
dância em identidade transgênero entre gêmeos idên- CHARLIE dos por pares e até por suas próprias famílias tendem
ticos do que em fraternos, eles inferem que a gené- prefere roupas e a ter taxas elevadas de ansiedade e depressão. Esti-
tica desempenha algum papel. E, de fato, isso é exa- brinquedos mativas sugerem que mais de 40% dos adolescentes e
tamente o que os estudos iniciais estão constatando associados a adultos trans, em grande parte sem apoio, tentarão se
(embora gêmeos idênticos também possam comparti- meninas, mas se suicidar. Muitas famílias como a de Sarah relatam que
lhar mais aspectos de sua socialização e meio ambien- lx³î`D`¸¸ essas estatísticas devastadoras são a razão por que elas
te). Em uma revisão de 2012 da literatura, por exem- menino. Ele é apoiaram as transições precoces de seus filhos.
retratado aqui Meus colegas e eu estamos constatando — tanto em
plo, Gunter Heylens, da Universidade de Ghent, e seus
aos 10 anos.
colegas analisaram 44 conjuntos de gêmeos do mes- relatos de pais como nos das próprias crianças — que
mo sexo em que pelo menos um gêmeo se identificou jovens trans que fazem a transição social em tenra ida-
como transgênero. Eles descobriram que em nove dos de estão passando muito bem. Suas taxas de depressão
23 pares de gêmeos idênticos, ambos os irmãos eram comparam-se às de seus pares e as taxas de ansiedade
transgênero, mas entre os 21 pares de gêmeos frater- são só um pouco mais elevadas. Eles também demons-
nos do mesmo sexo não houve nenhum caso onde tram uma autoestima muito alta. Se esses indicadores
ambos fossem transgênero, sugerindo que a identida- de saúde mental irão se manter fortes à medida que
de transgênero tem alguma base genética. Apesar des- nosso bando de crianças trans entrar na adolescên-
ses resultados, no entanto, quais variações genéticas cia é algo ainda a ser constatado, e com certeza nossa
específicas estão envolvidas é uma questão em aberto. amostra, composta só por voluntários, não será plena-
Do mesmo modo, embora alguns estudos de neuro- mente representativa de todas as crianças trans vivas
ciência tenham mostrado que as estruturas cerebrais hoje. Porém, quando combinadas com trabalhos que
de pessoas trans se assemelham às de indivíduos com sugerem que intervenções na adolescência (que não
a mesma identidade de gênero, em vez de com as de envolvem apenas transições sociais, mas também tera-
pessoas com o mesmo sexo ao nascerem, essas desco- pia hormonal) estão associadas a uma saúde mental
bertas muitas vezes envolveram amostras pequenas e melhor, essas constatações sugerem que as altas taxas
ainda não foram replicadas. Complicando ainda mais de depressão, ansiedade e suicídio vistas em estudos
a interpretação dos resultados neurocientíficos está o prévios não são inevitáveis. Em vez disso, à medida
fato de cérebros mudarem em resposta a experiências, que o mundo conhece mais sobre pessoas transgêne-
portanto, mesmo quando diferenças aparecem, cien- ro, à medida que a rejeição e o bullying diminuírem, e
tistas não sabem se diferenças cerebrais estruturais ou à medida que esses jovens receberem apoio e interven-
funcionais causam a experiência de uma determinada ção em tenras idades, estamos otimistas de que os ris-
identidade de gênero ou se refletem a experiência da cos de saúde mental diminuirão também.
identidade de gênero. Turvando ainda mais as águas
já turvas, neurocientistas continuam a debater se mes- “MENINOS COR-DE-ROSA” E MENINAS MOLECAS
mo entre pessoas que não são transgênero existem A primeira pergunta que normalmente me fazem
diferenças confiáveis de sexo (ou gênero) em cérebros. quando falo sobre crianças transgênero é algo como:
Assim, enquanto o tema é uma linha ativa de trabalho “Você está dizendo que meninas molecas na realida-
em muitos laboratórios de pesquisa ao redor do mun- de são transgêneros?” ou “Eu costumava ser um meni-
do, conclusões definitivas sobre correlações genéticas no que adorava vestidos de princesa. Você está suge-
e neurais de identidade de gênero continuam difíceis. rindo que eu era transgênero?” É claro que nem todas
Talvez as perguntas mais importantes e decisivas as crianças que desafiam estereótipos sexuais como
sobre crianças transgênero, no entanto, digam respei- Sarah fez são transgênero. De fato, eu me arriscaria a
to ao seu bem-estar. Adultos e adolescentes transgêne- dizer que a maioria delas não é.
ro que não passaram pela transição social precoce de Uma dessas crianças é Charlie. Aparentemen-
crianças como Sarah e que foram muitas vezes rejeita- te, Charlie se parecia muito com Sarah nos primei-
de identidade
te ao da família de Sarah, a de Charlie o apresentou a sem registro de 32% dos adultos acreditavam que mulheres deveriam
outros meninos que adoravam coisas femininas. E ao gênero do usar calças em público. É certo que meninos femini-
mundo para um
longo dos anos, algumas dessas crianças, como Sarah, nos e meninas masculinas não são novidade, sendo
bebê nascido
fizeram uma transição social. Mas Charlie não. Recen- para uma mãe amplamente reconhecidos em muitas culturas nativas.
temente, perguntei a ele sobre sua decisão de não fazer que preferiu não Hoje, Sarah, de 14 anos, e Charlie, de 13, são adoles-
a transição. Ele explicou que sua família (às vezes com designar a centes autoconfiantes, inteligentes e muito esforçados.
criança como
a ajuda de um terapeuta) passou muito tempo falando Sarah toca piano, joga hóquei e começou a treinar atle-
sendo do sexo
sobre transições sociais e deixou claro que o apoiaria masculino ou tismo. Charlie toca numa banda e faz teatro. Ambos
feminino.
www.cbc.ca/news/canada/british-columbia/parent-fights-to-omit-gender-on-b-c-child-s-birth-certificate-1.4186221
se fosse isso o que ele quisesse. Charlie disse que con- são populares e dedicam mais tempo à busca de um
siderou essa possibilidade no fundo de sua mente por bom desempenho na escola e à complexidade das redes
vários anos, mas acabou decidindo que, embora gos- sociais de jovens do que a pensar sobre seus gêneros.
te abertamente e sem se envergonhar de coisas con- Ambos olham para o futuro, empolgados com as possi-
vencionalmente “de menina” (de fato, no próprio dia bilidades que os aguardam na faculdade e mais além.
em que o entrevistei, Charlie usava short cor-de-rosa, Sarah diz que quer criar filhos com seu futuro marido
uma camiseta violeta e uma echarpe cor-de-rosa para e almeja tornar o mundo melhor para jovens pessoas
ir à escola) e mesmo que ocasionalmente use um nome trans como ela. Charlie nutre sonhos de se mudar para
de menina no acampamento, no final das contas, ele Nova York para se apresentar na Broadway. Os dois
sente que é um menino. Conforme explicou sua mãe, adolescentes esperam que algum dia crianças como
Charlie disse que o que ele realmente queria era que o eles sejam aceitas por quem são, independentemente
mundo o aceitasse como ele é — que o deixasse vestir o dos rótulos de gênero que usem. Essa esperança todos
que quisesse e fazer o que quisesse. Mas ele não sentia nós podemos compartilhar e aplaudir.
que era uma menina de verdade.
Meu trabalho está em andamento, mas dados pre-
liminares de outros sugerem que trajetórias de desen- PA R A C O N H E C E R M A I S
volvimento distintas podem diferenciar Sarah e Char- Mental health and self-worth in socially transitioned transgender youth. Lily Durwood et al. em Journal
lie. A intensidade com que uma criança gravita para of the Academy of Child and Adolescent Psychology, vol. 56, nº 2, págs. 116–123.e2; fevereiro de 2017.
brinquedos e roupas associados ao gênero oposto pode The TransYouth Project: http://depts.washington.edu/transyp
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
ALÉM DO XX E XY
7D ³³lDlx lx
Dî¸ßxälx³xäxøDÇxää¸Dyø§xßj¸x¸øäxxäîExD§øǸ³î¸x³îßx¸äl¸ä
Os seres humanos são socialmente `¸³l`¸³Dl¸äDÇxß`xUx߸äxĀ¸xz³x߸`¸¸DîßUøî¸äU³E߸äÍxälx¸¸x³î¸
x Ôøx ³Dä`x¸ä ¸øDîyD³îxä丸älx³îþDx³îx߸îø§Dl¸ä`¸¸Ùx³³¸Ú¸øÙx³³DÚÍ%¸x³îD³î¸jD`z³`D
DǸ³îD ÇDßD øD ßxD§lDlxøî¸DäDUøDÍlxîxß³DcT¸lxäxĀ¸U¸§¹`¸yxĀîßxDx³îx`¸Ç§xĀDjx³þ¸§þx³l¸
³T¸ ä¹ D³Dî¸Dj Dä øD³îß³`DlD`¸ßx¸ßDDlx
Dî¸ßxäx³yî`¸äxÔø`¸äÔøxäxlxäx³ß¸§DD¸§¸³¸l¸îxǸͳl-
þlø¸ä ³îxßäxĀ¸ä DÔøx§xäÇDßD¸äÔøDä¸lxäx³þ¸§þx³î¸äxĀøD§äxøxøDîßD¥xî¹ßDDîÇ`DäT¸`DßD`îxßąDl¸äǸß
øD lþxßä`DlD
DĀD lxläîùßU¸äj`¸¸lx`z³`DlxD§
DßxløîDäxÉpontilhado curvo). Uma pequena amostra desses
läîùßU¸ä x ¸ä `D³¸äÔøxäxøxäT¸DÇßxäx³îDl¸äDäxøßÍ0DßD`¸Ç§`DßD³lDDäj¸z³x߸`¸¸ÔøD§øDÇxä-
ä¸D äx lx³î`D ³x äxÇßxäxD§³D`¸¸äxĀ¸Ôøx§xyDîßUøl¸D¸³Dä`xßxx§DǸlx³T¸äxß`¸Ç§xîDx³îxl¸äxĀ¸
Dä`ø§³¸ ¸ø
x³³¸Í1øD³î¸DäDÇßx³lx¸ää¸UßxäxĀ¸xz³x߸jDäxääxäDîßUøî¸äÇDßx`xäxxäîx³lxßÇDßD
¸ß-
mar um espectro. —Amanda Montañez
FATORES QUE
DETERMINAM
O SEXO
Cromossomos 46XX 45X Mosaicismo
CONCEPÇÃO
45X/46XY
Órgãos sexuais Estruturas Estruturas internas e Estruturas externas Estruturas externas Clitóris aumentado, Um testículo, uma
internos e genitais internas externas femininas; femininas, femininas, estruturas lábios fundidos, gônada disgênica
externos e externas desenvolvimento estruturas internas internas atípicas; vagina curta, (desenvolvida de
femininas prejudicado masculinas testículos não descem ovários, útero e colo forma anômala);
do ovário (AIS completa) do útero normais genitais feminino,
masculino ou ambíguo
Características Hormônios femini- Ligeiras variações Possíveis períodos Baixo estrogênio Desenvolvimento Quantidades
secundárias nos (basicamente de feminino típico, menstruais irregu- puberal ausente atípicas de
do sexo estrogênio); carac- como elevados lares, redução da ou limitado testosterona;
(como mamas terísticas femininas níveis de hormônios fertilidade, aumento pode desenvolver
e pelos faciais) secundárias masculinos de pelos no corpo mamas
50 Scientific American Brasil, Outubro 2017 Gráfico de Pitch Interactive e Amanda Montañez
O espectro de gênero
my`{´`DD¨DàymùïDåyé uma
Uma mulher transgênero Uma pessoa não binária Um homem transgênero é
`¹´mcT¹´ïyàåyā¹åÕùyȹmyåyùàÿEà¹å
é uma pessoa a quem, com é aquela que não se uma pessoa a quem, com
caminhos ao longo de seu desenvolvimento.
base na sua anatomia, foi my´ï`D´y®`¹®¹ base na sua anatomia, foi
0yåå¹Då`¹®yååDmy`{´`Dï{®ù®D`¹´åïïùcT¹
atribuído o sexo masculino completamente femini- atribuído o sexo feminino
cromossômica de 46XY, como um masculino biológico
ao nascer, mas que se na nem completamente ao nascer, mas que se iden-
típico, mas uma mutação genética provoca uma
my´ï`D`¹®¹®ù¨yàÎ masculina. Esse indiví- ï`D`¹®¹¹®y®Î
my`{´`Dm¹¹à®»´¹mmà¹ïyåï¹åïy๴DÎD´D-
mù¹È¹myåymy´ï`Dà
tomia externa dos pacientes pode variar, de modo que
Uma mulher cisgênero é com os dois gêneros ou Um homem cisgênero é
pode ser atribuído à pessoa qualquer dos sexos ao nas-
uma pessoa a quem, com com nenhum deles, ou uma pessoa a quem, com
cer, mas na puberdade uma ressurgência de testoste-
base na sua anatomia, foi ȹmyåyàmy{´yà¹ù- base na sua anatomia, foi
rona promove as características masculinas. Como
atribuído o sexo feminino m¹j¹Õùyå´`DÕùy atribuído o sexo masculino
resultado, os pacientes que são criados
ao nascer e que também åyù{´yà¹ùïùDy´ïày ao nascer e que também
como meninas geralmente acabam se
åymy´ï`D`¹®¹®ù¨yàÎ feminino e masculino. åymy´ï`D`¹®¹¹®y®Î
my´ï`D´m¹`¹®¹¹®y´åÎ
A sexualidade se refere à orientação sexual do indivíduo ou ao tipo de pessoa por quem ele é
atraído. A sexualidade também é um espectro, mas está separada tanto do sexo como do gênero.
47XXY 46XY
Mutação gênica Mutação gênica Mutação gênica Mutação gênica Gene SRY
CYP21A2 AR SRD5A2 AMH ou AMHR2
Genitais Estruturas internas Estruturas externas Testículos Estruturas Ligeiras variações Estruturas genitais
ambíguos e externas predominantemen- pequenos; internas e externas do sexo masculino internas e externas
(AIS parcial) masculinas; útero, te masculinas ou am- estruturas externas masculinas típico como masculinas
trompas de Falópio bíguas; estruturas masculinas posição anômala
internas masculinas da abertura uretral
Gônadas disgênicas
podem ser removi-
das e os genitais mo-
m`Dm¹å ÈDàD ÈDày
cerem masculinos
Baixa testosterona; Baixa testosterona; Hormônios mas- Hormônios mascu- Ligeiras variações Hormônios mascu-
testículos pequenos; infertilidade culinos (níveis linos; característi- do masculino linos (basicamente
infertilidade, pelos fa- baixos ou nor- cas masculinas típico, como baixa testosterona); ca-
ciais reduzidos, mús- mais); característi- contagem de racterísticas mascu-
culos fracos, pode cas masculinas espermatozoides linas secundárias
desenvolver mamas
Tratamento hor-
monal pode pro-
mover caracterís-
ticas masculinas
FONTE: PESQUISA POR AMANDA HOBBS; REVISÃO TEMÁTICA POR AMY WISNIEWSKI Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Oklahoma, setembro de 2017 www.sciam.com.br 51
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
NÃO SÓ PARA
HOMENS
Pesquisadores e médicos precisam ir mais fundo nas diferenças de
gênero para que possam oferecer melhores tratamentos às mulheres
MARCIA L. STEFANICK
RESOLVENDO O PROBLEMA
As mudanças nas práticas vêm acontecendo faz
Pesquisa com viés tempo. Em 1990, cientistas, advogados e membros do
Congresso pressionaram os Institutos Nacionais de
Estudos médicos costumam envolver apenas representantes masculinos ou
Saúde (NIH, na sigla em inglês) a criar o Escritório de
não detalham as estatísticas para as mulheres quando elas são incluídas. Por Pesquisa da Saúde das Mulheres. Em 1991, a falecida
exemplo, uma análise de 2012 de terapias para doenças de artérias coroná- cardiologista Bernadine Healy, primeira e única mu-
rias descobriu que 355 de 427 artigos de publicações especializadas (83%) lher a dirigir os NIH, lançou a Iniciativa para a Saú-
não divulgaram dados sobre mulheres ou não analisaram os dados das de das Mulheres, que cadastrou 162 mil mulheres nos
mulheres em relação aos homens. A escassez de pesquisa torna mais difícil EUA. O estudo levou a mudanças importantes; sem
aos médicos a avaliação de tratamentos que poderiam ajudar as mulheres. ele, por exemplo, médicos podiam ainda acreditar que
40 Pesquisas sobre doenças das artérias coronárias deveriam receitar terapia hormonal para a maioria
Número de artigos em publicações
DE ROWENA J. DOLOR ET AL. COMPARATIVE EFFECTIVENESS REVIEW Nº 66. AGÊNCIA PARA PESQUISA E QUALIDADE
¡DZ«Òr«¡r§Ò»ÒÒ«
específicas para cada sexo geralmente não são divul- (como as pessoas reagem umas às outras devido ao gê-
µ«frrèDÍDÜrÍDµDÒ
gadas e, como a maioria dos participantes é homem, nero), que inserem influências poderosas na biologia.
FONTE: TREATMENT STRATEGIES FOR WOMEN WITH CORONARY ARTERY DISEASE: FUTURE RESEARCH NEEDS,
{DDÒ «æ µrÍ«ÒDÒ»
as descobertas podem não ser adequadas para mulhe- Médicos deixam de Por exemplo, homens são geralmente mais fortes que
é professora de
FONTE: “SEX BIAS IN NEUROSCIENCE AND BIOMEDICAL RESEARCH”, DE ANNALIESE K. BEERY E
de doença cardíaca” mesmo tendo um risco elevado de profissionais de saúde mental ainda atribuem cer-
um ataque fatal. Felizmente, novos testes podem de- ¡rfZ§Df«r§ÜÍ«fr tos sintomas quase só a mulheres, como “histeria”, en-
0rÒÂæÒDfr0Írèr§]õ«
tectar essa doença não obstrutiva e outros problemas quanto homens tendem a ser diagnosticados como
3ÜD§{«ÍfrµÍ«{rÒÒ«ÍD
mais comuns nas mulheres. Mas, para que os testes fr«OÒÜrÜÍûZDr “antissociais”. Esses preconceitos afetam os tratamen-
funcionem, um médico precisa considerar a possibili- §rZ««DfDÒZ«D tos e os resultados em termos de saúde.
dade de que uma jovem mulher possa ter doença car- fr$rfZ§DfD O preconceito é desenfreado quanto se trata do cé-
díaca e solicitar os exames. As pesquisas prosseguem 7§èrÍÒfDfr3ÜD§{«Íf» rebro. A psicologia popular adora a ideia de que ho-
para descobrir diferenças entre os sexos em riscos e DÜD¡O÷¡÷fÍrÜ«ÍD mens e mulheres têm cérebros diferentes. Relatórios
f«r§ÜÍ«fr
tratamentos benéficos, mas as diretrizes para preven- {rÍr§]DÒfr3rê«r¡ mostram que homens têm mais conexões corticais
ção e tratamento para as mulheres ainda são predomi- $rfZ§DrrÒÜñ dentro de cada um dos dois hemisférios do cérebro,
nantemente baseadas em dados masculinos. ÍrDîD§f«æ¡D¡µ« e as mulheres têm mais conexões entre os hemisfé-
A gravidez, agora reconhecida como um importan- ÜrÒÜrZ«¡¡ærÍrÒ rios. Mas deixam de mencionar que 86% a 88% de to-
te teste de estresse cardiovascular, também contribui ¡DÒèrDÒ das essas conexões combinadas são semelhantes, suge-
ÍrDZ«§Df«ò
para as desigualdades entre os sexos, embora os pes- rindo que os cérebros de homens e mulheres apresen-
µÍrèr§]õ«frf«r§]DÒ
quisadores só recentemente tenham começado a per- ZDÍfûDZDÒrD« tam mais semelhanças do que diferenças. As pesquisas
ceber as graves consequências de longo prazo. Pré-e- r§èrrZ¡r§Ü« também mostram que o desenvolvimento do cérebro
clâmpsia e hipertensão relacionada à gravidez, assim ÒDæfñèr» ao longo da vida é bastante influenciado pela neuro-
www.sciam.com.br 55
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
FONTES: “THE RECENT PREVALENCE OF OSTEOPOROSIS AND LOW BONE MASS IN THE UNITED STATES BASED ON BONE MINERAL DENSITY AT THE FEMORAL NECK OR LUMBAR SPINE”, DE
NICOLE C. WRIGHT ET AL., EM JOURNAL OF BONE AND MINERAL RESEARCH, VOL. 29, Nº 11; NOVEMBRO DE 2014 ( osteoporose); “GBD COM PARE”. INSTITUTE FOR HEALTH METRICS AND
EVALUATION, SEATTLE, WASHINGTON. ACESSADO EM JULHO DE 2017 http://vizhub.healthdata.org/gbd-compare (esclerose múltipla e doença cardíaca); “DEATHS: FINAL DATA FOR 2014”, DE
KEN NETH D. KOCHANEK ET AL., EM NATIONAL VITAL STATISTICS REPORTS, VOL. 65, Nº 4; 30 DE JUNHO DE 2016 ( Mal de Alzheimer); “MECHANISTIC PATHWAYS OF SEX DIFFERENCES IN
56 Scientific American Brasil, Outubro 2017 CARDIOVASCULAR DISEASE”, DE VERA REGITZ-ZAGROSEK E GEORGIOS KARARIGAS, EM PHYSIOLOGICAL REVIEWS, VOL. 97, Nº 1; JANEIRO DE 2017 (ilustrações do coração)
plasticidade — a capacidade de o cérebro se reajustar com o tem-
po. Se as experiências diárias de homens diferem de mulheres, di-
PROBLEMAS DO CORAÇÃO ferenças na estrutura e funções do cérebro devem ser esperadas.
Complicações cardíacas com frequência assumem formas diferentes Esse quadro complexo dificulta apontar causas e tratamentos
y®®ù¨yàyåy¹®y´åδåù`{´`D`Dàm D`Dy®®ù¨yàyå®DåÈà¹- para doenças cerebrais. Dois terços dos mais de 5 milhões de ame-
vavelmente é resultado do endurecimento e espessamento das paredes ricanos com mal de Alzheimer são mulheres, não só porque muito
do ventrículo esquerdo (_bkijhWe). Entre problemas no sistema elé- mais mulheres do que homens passam dos 65 anos, mas também
trico do coração, batimentos irregulares são mais comuns em homens,
porque mais mulheres adquirem a doença em todos os grupos
enquanto batidas aceleradas são mais comuns em mulheres — e certas
drogas podem tornar essa condição uma ameaça à vida. Doenças nas etários. Nas células femininas em envelhecimento, o emparelha-
ÿE¨ÿù¨Då`Dàm D`DåïD®Uz®ÿDàD®Î¹Eù¨¹ååD´ù ´y¹ååT¹®D¹àyå mento anormal dos cromossomos X maternos e paternos duran-
em mulheres, o que pode afetar os tratamentos; esse traço pode ter te a divisão das células pode ter seu papel. Nos homens, só o cro-
evoluído para impedir a perda de sangue excessiva durante o parto. mossomo X (materno) pode sobreviver à divisão da célula, e o
cromossomo Y pode não estar mais presente. Sexo certamente in-
fluencia a progressão da doença, e isso deve ser investigado.
eminino
TEMPO DE PERSONALIZAR
Entender mais as diferenças dos sexos vai aprimorar as diretri-
zes de saúde para os homens, também. Em 2015, os NIH lançaram
uma Iniciativa para Medicina de Precisão para enfrentar o proble-
entrículo
esquerdo ma de que a maioria dos tratamentos foi projetada para o “pacien-
te médio” e não para cada indivíduo. Espera-se que a medicina “de
precisão” ou “personalizada” leve em conta a variabilidade de ge-
nes, ambiente e modo de vida de cada pessoa. Mas estudos do ge-
Normal Sobrecarga de pressão noma que tentam apontar variantes genéticas ligadas a doenças
asculino
específicas têm, em geral, excluído os cromossomos X e Y, sugerin-
A adaptação de mulheres a uma condi- do que sexo não é um foco importante da medicina de precisão.
ção chamada sobrecarga de pressão difere A determinação de 2015 dos NIH para que pesquisadores con-
da dos homens. As paredes do coração siderem sexo como uma variável biológica em estudos com ani-
feminino tendem a engrossar, diminuindo a mais e humanos é promissora. No mesmo ano, os Institutos Cana-
entrada de sangue no ventrículo esquerdo.
denses de Pesquisa em Saúde lançaram um curso de treinamento
åÈDàymyåm¹`¹àDcT¹®Då`ù¨´¹åyD´D®j
enfraquecendo o poder de bombeamento. sobre sexo e gênero nas pesquisas de saúde. E a Liga das Univer-
sidades Europeias de Pesquisa emitiu um documento sobre como
integrar sexo e gênero na pesquisa. Em outubro de 2015, a Clíni-
Doença cardiovascular e circulatória ca Mayo realizou a Conferência de Educação Médica sobre Sexo e
(casos por 100 mil pessoas nos EUA, 2015)
Gênero. A reunião pediu que os participantes elaborassem um ro-
Prevalência Mortes teiro para integrar as evidências com base em sexo e gênero na
Doenças das artérias educação médica e para aprimorar o currículo nos cinco anos se-
2.500 guintes. Em 2016, uma comissão representando nove países de-
periféricas Mulheres
( , linhas contínuas) senvolvidos apresentou as diretrizes para a Equidade de Sexo e
Fibrilação e Homens Gênero em Pesquisas, prevendo procedimentos para a divulgação
ùïïyà DïàD¨ ( , linhas pontilhadas) de informações sobre sexo e gêneros em projetos, análises de da-
2.000
Doença isquêmica cardíaca 150 dos, resultados e interpretação de descobertas de estudos.
Esses avanços são animadores. É preciso mais. Talvez mais de-
Mulheres e homens têm
taxas diferentes de certas terminações, por meio de políticas e restrições ao financiamento.
condições, em particular Talvez seja necessário exigir a adoção de melhores práticas — pa-
1.500
doença isquêmica cardíaca drões de cuidados que devem seguir o código de ética do “não faça
`à`ù¨DcT¹ ´åù`y´ïy m¹ 100 mal” — para garantir que clínicos e prestadores de cuidados com
sangue no coração por cau- a saúde considerem diferentes sexos e gêneros em diagnósticos,
sa do estreitamento das ar-
1.000 exames e tratamentos. O benefício para homens e mulheres será
térias. Taxas de mortes cos-
tumam ser semelhantes. enorme. Sem um foco em sexo e gênero, os médicos não poderão
50 oferecer a medicina de precisão que todos esperamos receber.
Doença cerebrovascular
Cardiopatia 500
hipertensiva PA R A C O N H E C E R M A I S
Cardiomiopatia 0 Gendered research and innovation: Integrating sex and gender analysis into the
e miocardite research process. League of European Research Universities, setembro de 2015.
Cardiopatia reumática 0 Ampliação Exploring the biological contributions to human health: Does sex matter? Institute of
Medicine. National Academies Press, 2001.
7j[hc_debe]_WZei]h|ÒYei\e_h[j_hWZWZei[ijkZeiY_jWZei$ Projeto Inovações de Gêneros, Universidade Stanford: http://genderedinnovations.
stanford.edu
O RETORNO
DAS FILHAS
DESAPARECIDAS
ĉäîßClbÆxäÔøxlS¸Çßx
xßz³_CC§¸ä³C
Ásia – o que resulta em milhões de meninas
mortas ou negligenciadas – começaram a mudar
M O N I C A DA S G U P TA
Ilustração de María Corte
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
EM SÍNTESE Na China, ouvi histórias semelhantes. Um homem uma queda na proporção de gênero das crianças na
Até muito recente- disse, quando sua filha nasceu: “Minha esposa ficou parte noroeste do país, onde era muito alta. Na China,
mente, ¡æÜDÒZæÜæÍDÒ tão chateada que não queria cuidar da criança, e eu a escalada em tais proporções se estabilizou.
§DÒDdZ«¡«r¡ tive de persuadi-la a amamentá-la”. Essas mudanças coincidem com uma rápida urba-
«æÜÍ«ÒæDÍrÒdèD«ÍîD Essas atitudes causaram efeitos de vida e morte. A nização e com mudanças sociais que ajudaram a tor-
èD¡¡r§§«Ò¡DÒf«
taxa natural de nascimento entre homens e mulheres nar as filhas mais valiosas para seus pais. Filhas já não
Âær¡r§§DÒdrZÍD§]DÒ
é de apenas cerca de 5% a 6% a mais de meninos do desaparecem de suas famílias biológicas e, em alguns
f«Òrê«{r¡§§«rÍD¡
{ÍrÂær§Ür¡r§Ür¡«ÍÜDÒ que de meninas. Mas em 2000, na China, havia 20% a casos, elas trazem homens adicionais de fora. Vin-
«æ§rr§ZDfDÒµ«Í mais de meninos nascidos. Este tipo de proporção dis- te anos depois do meu trabalho de campo em Busan,
ÒæDÒ{D¡ûDÒ» torcida entre gêneros foi encontrada em grande par- uma mulher na Coreia do Sul me disse: “Minha mãe
Gerações com menos te do leste da Ásia, do sul da Ásia, do sul do Cáucaso sofreu abusos quando era jovem porque tinha três
mulheres {«ÍD¡µÍræ e de partes dos Bálcãs. Nessas áreas, bebês mulheres filhas e nenhum filho. Agora que estamos crescidas,
fZDfDÒrÜDDæÒù§ZD são abortadas, mortas no nascimento ou morrem por ela está muito feliz porque continuamos perto dela.
D{rÜ«æÒæDÒÒ«ZrfDfrÒd
negligência. Por quê? Como disse a mulher de Busan, Ela diz que seus genros a tratam melhor do que filhos”.
DÜrÍD§f««ÒµDfÍĂrÒfr
ZDÒD¡r§Ü«r¡ÍD]õ«
trata-se de economia brutal. Historicamente essas cul-
µDÍDfr§ÜÍ«rµDÍD{«ÍD turas não permitem que as filhas adultas ajudem no EXPULSANDO MULHERES
frÍrĂrÒrµDûÒrÒ» domicílio dos pais ou herdem propriedades, o que Por séculos, a organização social da sociedade rural
Agora, uma igualdade diminui seu valor para a família biológica. na China, na Coreia do Sul e no noroeste da Índia
de sexos rÒÜñZ«¡r Mas, recentemente, o viés demográfico contra as afastou as filhas das famílias de seus pais. Quando as
]D§f«DÒr¡D§ÜrÍrd mulheres começou a mudar. Na Coreia do Sul há um mulheres se casavam, eram absorvidas pela família do
ÂæD§f«DÒZæÜæÍDÒZ«§ reequilíbrio das proporções de gênero entre crian- marido. Mão de obra nova em sua família biológica
Zrfr¡¡DÒèD«ÍrZ«
ças desde meados dos anos 1990, sendo que a propor- passava a ser fornecida por cunhadas que entravam,
§Ā¡Z«òÒ¡ærÍrÒdDÒ
ção de meninos em relação a meninas caiu de níveis enfatizando ainda mais o valor dos filhos. Uma estru-
µÍ«µ«Í]ĂrÒfrù§rÍ«
§«§DÒZ¡r§Ü«§õ« elevados para os biologicamente normais. Existe mes- tura social similar aparece em outras regiões com for-
¡DÒ{Dè«ÍrZr¡«Ò mo uma mudança de preferência por filhas na Coreia te preferência por filhos, incluindo o norte do Vietnã e
«ÒZ«¡ÜD§ÜD{«Í]D. do Sul hoje em dia. Na Índia, o censo de 2011 mostrou países do sul do Cáucaso.
Diferentes lugares e perdas parentesco que não favorece filhos de qualquer gêne-
ro. Em Taiwan e na Coreia do Sul, uma proporção
A Coreia do Sul, a China e o noroeste da Índia perderam muitas meninas substancial de pais vive com filhos casados, mas quase
durante o século 20 — vítimas de infanticídio ou negligência em nenhum deles vive com filhas casadas, segundo estu-
culturas patriarcais. Dados de recenseamento e pesquisas populacionais do a ser publicado que realizo com Doo-Sub Kim, da
FONTES: “‘MISSING GIRLS’ IN CHINA AND INDIA: TRENDS AND POLICY CHALLENGES,” GUO ZHEN, MONICA DAS GUPTA E LI SHUZHUO, EM ASIAN POPULATION STUDIES, VOL. 12, Nº 2. PUBLICADO ON-LINE 6 DE JUNHO DE 2016 ( crianças na Índia, idades 0–6, e crianças na Coriea do Sul e na China, idades 0–4 );
mostram queda no número de bebês e crianças pequenas do sexo Universidade Hanyang, em Seul. Nas Filipinas, os pais
feminino, em comparação com o dos meninos. O efeito não foi visto na têm a mesma chance de viver com filhos casados de
ambos os gêneros. Não surpreende que a proporção de
DADOS DO CENSO NACIONAL (China, Índia, Coreia do Sul ); WORLD POPULATION PROSPECTS: THE 2017 REVISION. EDIÇÃO EM DVD. DIVISÃO DE POPULAÇÃO, DEPARTAMENTO DE ASSUNTOS ECONÔMICOS E SOCIAIS, NAÇÕES UNIDAS, 2017 ( América do Norte, Europa Ocidental e norte da Europa)
DECLINE,” MONICA DAS GUPTA E LI SHUZHUO, EM DEVELOPMENT AND CHANGE, VOL. 30, NÚMERO 3; JULHO DE 1999
va financeiramente sua família biológica. Mas algu-
FONTE: “GENDER BIAS IN CHINA, SOUTH KOREA AND INDIA 1920–1990: EFFECTS OF WAR, FAMINE AND FERTILITY
mas relataram problemas, como serem humilhadas
Diminuição Percentual de Meninas em Relação a Meninos*
no total de nascimentos
Percentagem de mulheres dizendo Porcentagem do sexo masculino
to da vida urbana sobre a preferência em relação aos 50
filhos é tanto social quanto econômico. Viver numa
40
cidade reduz a centralidade do papel dos filhos na vida
de seus pais. Enquanto aldeões passam seus dias cer-
30
cados por membros do clã, residentes urbanos vivem e
trabalham nas configurações mais impessoais de apar- 20
tamentos e escritórios. A mudança alivia a pressão de
adaptação às expectativas tradicionais de dever filial e 10
de ter filhos para continuar a linhagem.
Nas áreas urbanas, as crianças que sustentam seus
Õùy ØÈày`åD® ïyà ù® ¨¹Û 54
pais tendem a fazê-lo menos por causa de regras for-
mais e mais porque acontece de morarem na mesma
53
cidade e de manterem relacionamentos sólidos com
seus pais. Dessa forma, a urbanização ajuda a supe-
rar a lacuna entre o valor atribuído a filhas e filhos. O 52
emprego e a educação feminina também aumentam o
apoio em potencial que elas podem oferecer. E, com o
51
maior acesso a aposentadorias e a sistemas de prote-
1980 1990 2000
ção social, as pessoas se tornam menos dependentes
de seus filhos para obter ajuda financeira.
As políticas governamentais também deram incen-
tivos para que a preferência masculina caísse em declí-
nio, encorajando a igualdade convencional para as para proibir a seleção de nascimentos mostrou pouco
mulheres. A Índia usou a ação afirmativa a fim de resultado sobre a proporção nacional de sexo de bebês.
aumentar a participação política das mulheres, crian- Os países da Ásia ainda estão se urbanizando rápi-
do quotas femininas para candidatos a posições nos do, portanto creio que a preferência por filhos continua-
governos locais. Os cientistas sociais descobriram rá a declinar. Os legisladores podem acelerar o processo
que, após a criação da política, estereótipos de gênero com medidas legais e outras que melhorem a igualda-
enfraqueceram entre a população como um todo, e as de de gênero. Eles também podem expandir o ativismo
aspirações das meninas para si próprias aumentaram. dos meios de comunicação e retratar mulheres ajudan-
O amplo uso dos meios de comunicação também do seus próprios pais idosos (não apenas seus sogros).
foi um aspecto básico dos programas de planejamen- Esses passos ajudam a mudar estereótipos de gênero e a
to familiar na Índia, na China e na Coreia. Cartazes e superar a preferência dos pais por filhos. Para as mulhe-
FONTES: “THE DECLINE OF SON PREFERENCE IN SOUTH KOREA: THE ROLES OF DEVELOPMENT
comerciais incentivam famílias pequenas, mesmo sem res — e para a sociedade em geral —, abordagens assim
DEVELOPMENT REVIEW, VOL. 33, Nº 4; DEZEMBRO DE 2007; DADOS DO CENSO NACIONAL
AND PUBLIC POLICY”. WOOJIN CHUNG E MONICA DAS GUPTA, EM POPULATION AND
filhos homens. Isso promove a visão de que filhas são podem gerar resultados melhores do que a proibição
tão boas quanto filhos para a felicidade familiar. Per- pura e simples de seleção do sexo no nascimento.
sonagens femininas nas novelas da TV indiana agora
trabalham fora e são ativas na vida pública, desafian-
do as visões antigas do lugar da mulher na sociedade. PA R A C O N H E C E R M A I S
Estudos mostram que a exposição a essas mensagens “Missing Girls” in China and India: Trends and Policy Challenges. Guo Zhen, Monica Das Gupta e Li Shuzhuo
está associada à redução na preferência pelos filhos. em Asian Population Studies, Vol. 12, nº 2, págs. 135–155. Publicado online em 6 de junho de 2016.
Também houve tentativas diretas para mudar as Sex Ratios and Crime: Evidence from China. Lena Edlund et al. em Review of Economics and Statistics,
Vol. 95, nº 5, págs. 1520–1534; dezembro de 2013.
proporções de gênero, proibindo-se o uso de tecnolo-
The decline of son preference in South Korea: The Roles of development and public policy. Woojin
gia para detecção e seleção pré-natal do sexo. Essas Chung e Monica Das Gupta em Population and Development Review, Vol. 33, nº 4,
proibições se iniciaram em vários países, mas tem págs. 757–783; dezembro de 2007.
havido pouca avaliação rigorosa sobre seu impacto Crisis of masculinity in Haryana: The unmarried, the unemployed and the aged. Prem Chowdhry
em Economic and Political Weekly, Vol. 40, nº 49, págs. 5189–5198; 3-9 de dezembro de 2005.
devido à falta de dados. A proibição, na Índia, em rela-
Why is son preference so persistent in East and South Asia? A Cross-Country Study of China,
ção à escolha do sexo parece ter tido um efeito modes- India and the Republic of Korea. Monica Das Gupta et al. em Journal of Development Studies, Vol. 40,
to, no máximo. Um esforço vigoroso feito na China nº 2, págs. 153–187; 2003.
www.sciam.com.br 63
A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
TRABALHO
DE MULHER
Quanto mais mulheres contribuem para a economia,
x§¸ß_CCþlCÇCßCî¸l¸äÍ/¸ßÔøxyîS¸l
_§
diminuir as barreiras às oportunidades para elas?
ANA L. RE VENGA E ANA MARIA MUNOZ BOUDET
frÒr§ÜÍr¡ærÍrÒr O primeiro obstáculo é a entrada: as mulheres pre- costumam ocupar postos de remuneração mais baixa
«¡r§ÒÍrÒÒÜr¡òÒ cisam ter acesso ao espaço econômico para participa- não importa em que setores estejam. Por exemplo, mu-
¡æfD§]DÒ» rem dele. Embora a força de trabalho feminina tenha lheres costumam ser professoras, enfermeiras e funcio-
Políticas e progra-
crescido muito na maior parte do mundo, uma subs- nárias de setor administrativo em vez de diretoras, mé-
mas Âærr§{Ír§ÜD¡
§«Í¡DÒÒ«ZDÒr§ÍD tancial diferença na participação é visível em todas as dicas e supervisoras. Mesmo como empresárias, elas
îDfDÒÒõ«DÒÒ«æ]ĂrÒ partes entre homens e mulheres — 53 pontos porcen- tendem a se concentrar em setores tradicionalmente
¡Dҵͫ¡ÒÒ«ÍDÒr tuais no Oriente Médio e Norte da África. Mesmo se as femininos como alimentos e produção de roupas.
frèr¡ÒrͧÜr§ÒZD mulheres conseguissem romper essa barreira, elas pro- Embora possamos discutir as preferências das mu-
f«ÒrrêµD§ff«Ò» vavelmente não competiriam em condições de igualda- lheres (e homens) por determinados setores, esses pa-
nas economias de serviços, as mulheres retornam ao trabalho, mas em es- rental para incluir os pais — nem sempre têm tanto su-
paços econômicos diferentes. cesso. Na Alemanha, a expansão das normas e da co-
80 Linha de regressão bertura da licença-maternidade levou mais mulheres a
força de trabalho (entre 15-64 anos, 2013
Porcentagem de mulheres participando da
do de mulheres por mercados e instituições. Quando dos países mulheres não podem fazer os mesmos tra-
poucas mulheres estão empregadas em um determina- balhos que homens. Muitos países da antiga União So-
do setor, os empregadores podem ter crenças tenden- viética são particularmente restritivos. Na Rússia, há
ciosas quanto às suas qualificações. Eles podem relu- quase 460 ocupações proibidas às mulheres, incluin-
tar em contratar trabalhadoras porque associam cus- do siderurgia, combate a incêndios, poços de petró-
tos extras, como licença-maternidade, com mulheres leo e motorista de ônibus. Outros países exigem que as
ou podem supor que elas não são a fonte principal de mulheres obtenham a permissão masculina para acei-
sustento e, portanto, carecem de motivação. Uma série tar empregos, abrir contas bancárias ou administrar
de estudos que comparam as reações de empregadores negócios. No Chile, os maridos têm o direito exclusi-
diante de currículos idênticos, exceto pelo fato de se- vo de administrar as propriedades do casal, indepen-
20
e mulheres — no trabalho doméstico, em investimen- programa e os resultados foram impressionantes. As
tos em capital humano e em tratamento pelos merca- jovens apresentaram probabilidade 72% maior de esta-
dos e instituições — não só impedem as oportunidades mulheres rem envolvidas em atividades geradoras de renda qua-
econômicas igualitárias, mas costumam fazê-lo de ma- detêm o posto tro anos mais tarde. Mas, mais importante, o progra-
neira que uma reforça a outra. Dedicar muito tempo à de chefes de ma mudou atitudes e aspirações. Por exemplo, as parti-
casa pode levar a mulher a selecionar ocupações que Estado ou cipantes tinham mais probabilidades de acreditar que
governo no
permitam maior flexibilidade de horários, mas as pren- mundo.
as mulheres devem ganhar dinheiro para suas famílias
dem a salários mais baixos. Isso é especialmente ver- e menos chances de se preocupar quanto a encontrar
dade se as opções de emprego formal têm restrições ao um bom emprego na idade adulta. Surpreendentemen-
trabalho de meio período, como é o caso de muitos pa- Meros te, essas mudanças ajudaram a diminuir 34% da taxa
íses em desenvolvimento. Saber de antemão que será
difícil conseguir um emprego e se adequar em uma 23%
dos assentos
de gravidez na adolescência, enquanto o número de ca-
samentos ou coabitações precoces caiu 62%.
área dominada pelos homens, como engenharia ou As autoridades precisam aprender com seus acer-
parlamentares
construção, pode desestimular meninas e jovens a ob- globais são tos e erros e também com os dos outros. Elas precisam
terem a educação e as competências necessárias para ocupados por articular claramente o que integra essa política e seus
buscar essas oportunidades. E repetidas experiências mulheres. impactos esperados. Tais iniciativas também precisam
de discriminação em disputa de vagas podem levar as ser testadas e avaliadas adequadamente antes de ga-
mulheres ao trabalho autônomo informal ou desenco- Ruanda tem nharem escala. Demasiadas intervenções dependem
rajar a participação no mercado de trabalho, o que rei- a maior apenas de boas intenções e intuições. Embora algumas
nicia todo o ciclo de desigualdades. representação possam apresentar realizações, muitas não chegam
feminina:
ao resultado esperado, que, nesse caso, significa fazer
A JUSTANDO AS SOLUÇÕES
Por que as mudanças continuam tão difíceis se so- 61%
das 80 cadeiras
mais mulheres entrar (e ficar) no mercado de trabalho.
Políticas e programas que demonstram maior poten-
mos capazes de identificar as raízes das desigualdades cial devem ser expandidos e intensificados. Eles não
de gêneros no empoderamento econômico? Para co- da câmara baixa devem parar mesmo quando os objetivos desejados pa-
estão em poder
meçar, a multiplicidade de fatores exige muitas ações de mulheres. reçam ter sido atingidos — acompanhamento de lon-
coordenadas para um mesmo objetivo. E, consideran- go prazo é especialmente importante quando se moni-
do-se que natureza, estrutura e funcionamento dos toram mudanças sociais e logísticas. O progresso exi-
mercados, instituições e normas são amplamente dife- ge ação constante, articulada e coordenada para fazer
rentes de país para país, não é possível adotar uma po- mercados, instituições e sociedades como um todo fun-
FONTES: FACTS AND FIGURES: LEADERSHIP AND POLITICAL PARTICIPATION, U.N. WOMEN www.unwomen.org/en/what-we-do/
lítica que sirva a todos. Conforme demonstramos, me- cionarem de forma mais justa para as mulheres, e mu-
leadership-and-political-participation/facts-and-figures (chefes de estado ou governo); WOMEN IN NATIONAL PARLIAMENTS:
SITUATION AS OF 1ST JUNE 2017, INTER-PARLIAMENTARY UNION www.ipu.org/wmn-e/world.htm (cadeiras parlamentares)
didas que foram bem-sucedidas em um contexto po- dar as antigas normas sobre o papel de mulheres e ho-
dem enfrentar resistências significativas em outro. mens em casa e no trabalho é uma prioridade. Recur-
Mas alguns princípios gerais se mostraram funda- sos para intervenções específicas para questões de
mentais para o sucesso dessas políticas. Para serem efi- gênero competem com outras medidas urgentes de de-
cazes, as políticas e as intervenções precisam mirar nos senvolvimento, como segurança alimentar e redução
múltiplos fatores subjacentes que causam as diferenças da pobreza. E objetivos como esses podem não ter efei-
de gêneros no acesso às oportunidades econômicas. Ou tos específicos para diminuir a desigualdade de gêne-
seja, elas precisam atacar diretamente as limitações ao ros. É por isso que é essencial contar com táticas tes-
tempo das mulheres que são provocadas por normas tadas e comprovadas em vez de depender muito pe-
sociais sexistas a respeito dos cuidados e trabalhos do- sadamente de ativismos e boas intenções. A maior
mésticos, e não tentar contorná-las. Para aumentar a igualdade de gênero pode ser conquistada com uma
produtividade, elas precisam preencher as lacunas em combinação de vontade política e medidas baseadas
informação, capacitação e acesso às redes profissio- em evidências. Mulheres e homens do futuro deverão
nais que limitam as oportunidades às mulheres assala- se beneficiar de uma sociedade mais igualitária.
riadas, agricultoras e empresárias. E precisam ajudar a
criar condições igualitárias em mercados e instituições
ao atacar as preferências discriminatórias. PA R A C O N H E C E R M A I S
Um caso promissor de intervenção dinâmica atin- Breaking the STEM ceiling for girls. Ana Maria Munoz-Boudet e Ana Revenga no blog Future
Development, Brookings Institution. Publicado on-line em 7 de março de 2017.
giu muitos desses objetivos. O programa Empodera-
àyDïyyy`ïå¹y´myàDÈå´ïy¨DU¹à®Dà§yïiDÕùD´ïïDïÿyyåï®DïyÎDavid Cuberes e
mento e Sustento para Adolescentes (ELA na sigla em Marc Teignier em Journal of Human Capital, Vol. 10, , nº 1, págs. 1–32; primavera 2016.
inglês), implantado em Uganda pela ONG Construin- World Development Report 2012: gender equality and development. Banco Mundial, 2012.
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
ARMADILHA DO
BRILHANTISMO
Como a ênfase equivocada em relação à genialidade
sutilmente desencoraja as mulheres e os afro-
americanos de entrar em certos campos acadêmicos
A N D R E I C IM P I A N E S A R A H -JA N E L E S L I E
Sociologia Espanhol
60 Antropologia Literatura comparada
Linguística
Biologia molecular Disciplina com mais mulheres
Arqueologia
50 Neurociências Biologia evolucionária Representação igualitária
História Bioquímica Disciplina com mais homens
Estatística Clássicos
40 Ciências políticas
Estudos sobre o Oriente Médio
Química
Ciências da terra ¨¹å¹D
Economia
30 Ph.D. para afro-americanos
(todos os gêneros) Astronomia Matemática
Ciências sociais e humanidades Engenharia
20 Disciplinas STEM (Ciência, Tecnologia, Ciência da computação
Engenharia e Matemática) Física Composição musical
Neurociências Biologia molecular Estatística
10 Educação Química Bioquímica
Psicologia Engenharia
Física Matemática ¨¹å¹D
Ciências da Terra
0
Biologia evolucionária Astronomia Ciência da computação
Menos ênfase em brilhantismo como característica Maior ênfase em brilhantismo como característica
ACADEMIC DISCIPLINES”, SARAH-JANE LESLIE ET AL., EM SCIENCE, VOL. 347; 16 DE JANEIRO DE 2015
cuo. Outras coisas pareciam ser problemas maiores Não conseguíamos resolver a questão em tor- FONTE: “EXPECTATIONS OF BRILLIANCE UNDERLIE GENDER DISTRIBUTIONS ACROSS
no campo de Leslie, como a incapacidade de atrair no dessa discrepância. Nossos campos têm tanto em
mulheres e minorias. Apesar de uma atenção cons- comum – filósofos e psicólogos questionam como as
tante para as questões de sub-representação nos últi- pessoas percebem e compreendem o mundo, como
mos anos, e alguns esforços para aliviar a questão, as elas decidem entre o certo e o errado, como aprendem
mulheres ainda são menos de 30% dos doutores em e usam a linguagem, e assim por diante. Mesmo as
filosofia titulados em 2015; os afro-americanos consti- poucas diferenças salientes — como o maior uso, pelos
tuíam apenas 1% dos novos doutores. O campo da psi- psicólogos, de estatísticas e experimentos — estão
cologia, por outro lado, tem sido bem-sucedido em ficando indistintas hoje em dia, com o enorme aumen-
atrair e reter mulheres (72% dos doutorados recém- to da popularidade da filosofia experimental, na qual
-outorgados) e os afro-americanos detinham 6% dos os filósofos fazem pesquisas e experiências para explo-
diplomas de doutorado em 2015, o que certamente rar diferentes perspectivas acerca da moralidade, por
ainda está aquém da sua representatividade na popu- exemplo. Como dois campos tão estreitamente relacio-
lação em geral, mas é, no entanto, seis vezes a propor- nados podiam ser tão vastamente diferentes em rela-
cionalidade que a filosofia mantém. ção a seus participantes?
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A N OVA C I Ê N C I A D E S E XO E G Ê N E R O
40%
essas ideias em casa ou na escola poderia desencora- ma bastante direta. Reduzir falas sobre genialidade
jar jovens membros de grupos estereotipados a tentar e brilhantismo com alunos pode ser um jeito relativa-
seguir certas carreiras antes mesmo que coloquem o eram em mente fácil e eficaz de tornar certa área mais acolhe-
pé em um campus universitário. psicologia e em dora para membros de grupos que são estereotipados
Neste ponto, percebemos que precisávamos investi- ciências sociais. de forma negativa a esse respeito. Dados os atuais este-
gar a aquisição desses estereótipos. Por um lado, pode- reótipos, mensagens que retratam essa característica
ria ser que esse estereótipo aparecesse tarde no pro- como muito essencial podem desencorajar de manei-
cesso de desenvolvimento, depois de uma exposição ra desnecessária membros talentosos de grupos este-
contínua a uma contribuição cultural relevante (por reotipados. No entanto, as mudanças podem preci-
exemplo, retratos midiáticos de expectativa de bri- sar ir um pouco mais fundo do que apenas conversar, e
lhantismo e tendências relativas a gênero vindas de abordar alguns dos problemas arraigados e sistêmicos
pais, professores e colegas). Por outro lado, a evidência que acompanham o fascínio de um campo com o bri-
da psicologia do desenvolvimento sugere que as crian- lhantismo. Abster-se de mencionar o Dom não ajudará
ças são esponjas culturais — muito sensíveis aos sinais mulheres jovens na filosofia se o resto das práticas des-
em seus ambientes sociais. Na verdade, os jovens, nos sa área continuar implicitamente ancorado na ideia de
primeiros anos do ensino fundamental, parecem já que o brilhantismo é tudo que importa.
ter absorvido os estereótipos que associam matemáti- Outro ponto importante é que podemos ter de
ca a meninos e leitura a meninas. A partir dessa pers- intervir mais cedo do que se costuma pensar. Nossos
pectiva, poderíamos esperar que os estereótipos sobre dados sobre desenvolvimento indicam que alguns dos
FONTE: RECIPIENTES DE DOUTORADOS DE UNIVERSIDADES AMERICANAS: 2015. CENTRO NACIONAL
brilhantismo também fossem adquiridos no início da processos psicológicos que trabalham contra a diversi-
vida. dade nos campos que valorizam o brilhantismo podem
DE ESTATÍSTICAS EM CIÊNCIA E ENGENHARIA. FUNDAÇÃO NACIONAL DE CIÊNCIA, 2017
A fim de explorar essa ideia, questionamos cente- ser rastreados até o ensino fundamental. Esperar até
nas de meninos e meninas de cinco a sete anos para a faculdade para intervir já não parece ser a ação mais
mensurar se associavam ser “muito muito inteligente oportuna — nós, como sociedade, seríamos sábios
“(nossa tradução infantil de” brilhante”) a seu gênero. se estimulássemos uma perspectiva de crescimen-
Os resultados, publicados em janeiro na Science, foram to, e não uma mentalidade fixa, também em crianças
consistentes com a literatura relativa à aquisição pre- pequenas.
coce de estereótipos de gênero, e ainda assim foram
chocantes para nós. Meninos e meninas de cinco anos
não mostraram diferença em sua autoavaliação. Mas, PA R A C O N H E C E R M A I S
a partir dos seis anos, as meninas estavam menos pro- The frequency of “brilliant” and “genius” in teaching evaluations predicts the representation
pensas que os meninos a pensar que os membros de ¹Ā¹®y´D´mà`D´®yà`D´åD`à¹ååy¨måÎDaniel Storage et al. em PLOS ONE, vol. 11,nº 3,
Artigo e0150194; 3 de março de 2016.
seu gênero são “muito muito inteligentes”. Expectations of brilliance underlie gender distributions across academic disciplines. Sarah-Jane
Encontrar esses estereótipos tão cedo nos fez ques- Leslie et al. em Science, vol. 347, págs. 262–265; 16 de janeiro de 2015.
tionar se eles começam desde então a restringir os On Being an “African American Scientist”. Raynard S. Kington in Scientist, vol. 27, nº 5; maio de 2013.
interesses de meninos e meninas. Apresentamos outro www.the-scientist.com/?articles.view/articleNo/35251/title/On-Being-an-African-American-Scientist-
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A NOVA CIÊNCIA DE SEXO E GÊNERO
EFEITO TESO
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ROLINA BRITO E CÉLIA A
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Débora P. Menezes Carolina Brito Celia Anteneodo é
é professora é professora µÍ«{rÒÒ«ÍD§D07
§D73» §D723» 2«»ÒÜÍùÒ
µrÍÜr§Zr¡D«Í浫
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ÂærÒÜĂrÒfrù§rÍ«
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»
EM SÍNTESE
A esse tipo de comportamento dá-se o nome de ensino fundamental (EF) e a 3a série do ensino médio
A trajetória que
“efeito tesoura”, numa referência à forma do gráfico (EM) podem participar. As premiações consistem em
homens e mulheres
em que duas curvas complementares (no caso do sexo, medalhas de ouro, prata e bronze, havendo também
Òrær¡§DñÍrDfr
correspondentes a homens e mulheres) se afastam ou menções honrosas. Salientamos que os participantes {ûÒZD§«
ÍDÒÜr¡
até se cruzam, lembrando uma tesoura aberta. O even- que prestam os exames das OBF não necessariamen- µDfÍĂrÒf{rÍr§ÜrÒd
tual cruzamento, necessariamente no nível de 50%, te seguem carreiras científicas. Entretanto, essa par- Âærµ«fr¡ÒrÍ
refletiria a inversão da predominância de um grupo ticipação indica um interesse por enfrentar e resolver rêµÍrÒÒ«ÒDÜÍDè÷Òfr
sobre o outro. Mas mesmo quando não há cruzamento desafios da física. æ¡ÍñZ«Z«¡{«Í
das curvas, o seu afastamento indica que a situação de Para caracterizar a proporção de mulheres tam- ¡DÜ«Òr¡rD§ÜrD«
fræ¡DÜrÒ«æÍD»
disparidade se acentua com o tempo de progressão. bém nos diferentes estágios da formação e da carrei-
Entre o ensino
O efeito tesoura com relação aos sexos também ra de física, analisamos os perfis dos bolsistas do CNPq
médio e o
ocorre na área da física, tanto no Brasil como no res- (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e ÍrZ«§rZ¡r§Ü«
to do mundo. Mas em que idade ele se inicia? E qual Tecnológico) abrangendo a distribuição de bolsas des- Z«¡«µrÒÂæÒDf«Ífr
intensidade ele apresenta nas diferentes etapas da de os níveis de graduação (iniciação científica), pós- rêZrù§ZDd«§ă¡rÍ«
vida das mulheres ? -graduação (mestrado e doutorado) e de estímulo à frrÒDæ¡r§ÜDr«
Para medir a evolução do desempenho das meni- produtividade científica (pesquisadores). frDÒf¡§æ»
nas que se interessam por física durante o ensino fun- No box que apresenta as premiações da OBF, o pri- As causas para esse
{r§Ā¡r§«§Zær¡D
damental e médio, utilizamos como indicador o núme- meiro gráfico apresenta o percentual de premiações
ZDÍù§ZDfr¡«fr«Ò
ro de premiações nas Olimpíadas Brasileiras de Físi- na OBF (incluindo medalhas de ouro, prata e bronze,
Or¡ÒæZrff«ÒÂær
ca (OBF) ao longo dos anos de 2006 a 2015. As OBF, e também as menções honrosas) para alunas e alunos µ«ÒÒD¡§ÒµÍDÍ
patrocinadas e organizadas com o apoio da Sociedade de cada ano escolar, sendo mostradas as médias, com- «èr§Òr«ÒrÒÜrÍrþÜ
Brasileira de Física (SBF), ocorrem anualmente e alu- putadas sobre os anos desde 2006 a 2015. Como pode µ«ÒÜÍD§Ò¡Üf«Ò
nos de escolas públicas e particulares entre o 8º ano do ser visto na segundo gráfico do mesmo box, para cada frÒfrD§{ó§ZD.
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A NOVA CIÊNCIA DE SEXO E GÊNERO
O ESTEREÓTIPO DA PRINCESA
60
Uma possível causa está nos estereótipos e precon-
ceitos de gênero aos quais as crianças são expostas des-
40
de muito jovens. Alguns exemplos são os filmes da Dis-
ney, nos quais a maioria das personagens femininas são
20
princesas solitárias que não têm profissão e aguardam
a chegada de seus príncipes. Outros exemplos vem dos 0
games para meninas onde os objetivos, em geral, são ICj IC M D PQ
associados à limpeza de locais ou embelezamento pes-
soal, enquanto meninos são estimulados com jogos de
montagem, robótica ou esportes de ação. Percentual de sócios da SBF
Os impactos desses estereótipos têm consequências 100
que já foram quantitativamente medidas, como mos-
tra, por exemplo, um estudo publicado recentemente. 80
O artigo aponta que a autoconfiança das meninas sofre
uma mudança já aos 6 anos de idade. Para chegar a este 60
resultado, os autores contam histórias de pessoas “mui-
to inteligentes” — sem mencionar o gênero da pessoa — 40
a crianças e perguntam a elas qual o gênero dos perso-
nagens recém-apresentados. Aos 5 anos de idade, meni- 20
nos e meninas associam tais personagens inteligentes
ao seu próprio gênero. No entanto, apenas 2 anos mais 0
tarde, quando o mesmo estudo é repetido com crianças G B/M D
de 7 anos de idade, ocorre uma importante mudança: a
maioria já passa a associar um personagem inteligen-
te ao gênero masculino. Os autores discutem as impli- Percentual de bolsistas PQ
cações dessa associação com relação à escolha de profis-
100
sões: como matemática e ciências ditas “duras” são em
geral consideradas difíceis, as meninas desde que são já 80
muito jovens não se sentem aptas a seguir estas carrei-
ras por não se considerarem capazes. 60
Outros estudos apontam que fatores como a fal-
ta de modelos de mulheres de sucesso e a existência de 40
crenças e estereótipos negativos sobre as suas habilida-
des e sobre as suas possibilidades de ascensão podem 20
criar um sentimento de ‘’não pertencer’’ e desestimu-
lar, assim, a participação em áreas específicas. Cabe 0
mencionar que o “preconceito inconsciente” de gêne- 2 1D 1C 1B 1A S
ro se manifesta também na hora de avaliar candida-
CADÊ AS
tos, inclusive por parte das próprias mulheres, e que MENINAS?
a participação destas nos processos seletivos é tam- Alunos do
bém desigual. ensino funda-
O primeiro passo para mudar essa realidade é mental e
adquirir consciência do fenômeno e reconhecer que se médio partici-
trata, efetivamente, de um problema, já que diversida- pam da
de é essencial para a ciência e para qualquer ativida- Olimpíada
de criativa e de inovação. O segundo passo é identifi- Brasileira de
car os fatores que levam à disparidade de gênero, para Física na AGRADECIMENTOS – Agradecemos à Profa.
finalmente poder interferir adequadamente nessa rea- UFBA. Ao Belita Koiller, presidente da SBF, pela sugestão de
lidade. Uma tarefa neste sentido seria estimular o inte- lado, as premi- fazermos a análise dos dados da OBF, a Karina Buss
resse das meninas por ciências exatas ainda antes da adas no even- (UFSC), Daniela Hiromi Okido, Sofia Guse (UFRGS),
adolescência, apresentando para elas um cenário aco- to em 2016 e Marlon Ramos (Unicamp) pela contagem de dados
lhedor, no qual as mulheres sintam que podem vir a pela comissão e aos demais membros do GTG-SBF, Andrea Simo-
fazer parte e serem futuramente bem-sucedidas. lxz³x߸l¸ ne Stucchi de Camargo, Antonio Gomes Filho e João
Estudos recentes indicam não haver, nas fases mais evento Plascak por importantes sugestões
avançadas da carreira no Brasil, nenhum viés de gêne-
ro concreto no que concerne aos indicadores utiliza-
dos para a concessão de bolsas PQ. As conclusões des-
tes estudos devem servir de estímulo para que mais PA R A C O N H E C E R M A I S
mulheres aptas a obter as bolsas por produtividade y´myàåïyày¹ïĂÈyåDU¹ùï´ïy¨¨y`ïùD¨DU¨ïĂy®yàyyDà¨ĂD´m´ùy´`y`¨mày´Ýå´ïyàyåïåÎL.
resolvam encaminhar suas solicitações ao CNPq. Cabe Bian, S-J. Leslie, A. Cimpian, em Science 355, 389–391 (2017).
salientar porém que essa equidade ocorreu apenas a Bolsistas de produtividade em pesquisa em Física e Astronomia: análise quantitativa da
Èà¹mùïÿmDmy`y´ï `D my ¹®y´åy®ù¨yàyåÎ Menezes, D.P., Brito, C., Buss K., Anteneodo C.
partir da análise mais recente, que se baseou em dados ïïÈiëëĀĀĀÀÎå`DιàÎUàëïy´yà¹ë®DyåëDàÕùÿ¹åëÈàyåy´ïD`¹yåþyþ5yāï¹åë
do ano de 2016. Em estudos anteriores, realizados em mDm¹åþ%0Õþ÷ĈÀêþÿÎÈmÎ
2005 e 2010, ainda eram claramente perceptíveis dife- Produtividade em Pesquisa — CNPq, Física 2005-2010: uma análise comparativa. P. Duarte, M.
renças que demonstravam uma exigência maior para C.B. Barbosa e J.J. Arenzon. Instituto de Física — UFRGS.
Meninas na Ciência: Atraindo jovens mulheres para carreiras de ciência e tecnologia. C.Brito,
mulheres do que para homens situados nos mesmos D.Pavani, P.Lima Jr. — em Revista Gênero, v. 16, p. 33-50, (2005).
níveis de bolsas PQ. Science policies in the European Union, Promoting excellence through mainstreaming gender
Também esperamos que este texto seja útil para equalityjïïÈiëë`¹àmåÎyùà¹ÈDÎyùëÈùUë®Èà¹ÿ´ëm¹`åëþĀ¹þyïD´þy´þÀµµµĈÀÎÈmjÎ
que cientistas das áreas ligadas ao estudo de gênero Why Are Some STEM Fields More Gender Balanced Than Others? S. Cheryan, S.A. Ziegler, A.K.
Montoya, L. Jiang em Psychological Bulletin. Advance online publication, doi: 10.1037/bul0000052.
possam formular teses que ajudem a entender melhor Why Europe’s girls aren’t studyng STEM. Microsoft Coorporation.
as escolhas diferenciadas que, desde os ensinos fun- http://www.voced.edu.au/content/ngv%3A76105.
damental e médio, afastam as meninas da física e de Science faculty’s subtle gender biases favor male students. C. A. Moss-Racusina, J. F. Dovidio, V.L.
outras carreiras ligadas às ditas “ciências duras”. Brescoll, M.J. Graham e J. Handelsman — em PNAS 109, 41, 16474–16479, doi: 10.1073/pnas.1211286109.
A vida secreta
lista Reinaldo José Lopes reapresenta os Um de seus tópicos favoritos é a educação. Nos
da mente
brasileiros ao próprio passado, baseando- dois capítulos finais ele apresenta algumas das suas
-se em resultados de mais de 15 anos de hipóteses de pesquisa, entre elas a de que o ser huma-
trabalhos, pesquisas e estudos. Lopes con- no tem uma tendência a compartilhar conhecimen- Mariano Sigman
versou com especialistas de várias áreas to, “inata, como beber, comer ou buscar prazer. (...) Objetiva
— arqueologia, botânica e genômica entre Assim como Chomsky sugeriu que temos um instin- 288 páginas
elas — e foi a campo algumas vezes. Depa- to para a linguagem, eu e meu colega emulamos essa R$ 49,90
rou-se com uma região muito mais rica ideia ao propor que todos temos um instinto docen-
do que a retratada no ensino de História te”, escreve. — Marília Fuller
nas escolas, que abrigava populações den-
sas, tradições artísticas vibrantes, socie-
dades complexas que viviam em super-
aldeias e até mesmo redes de comércio Fórmulas para o cotidiano
em plena Amazônia. — Marília Fuller
Um algoritmo, tal como definido pela ciência
da computacão, é formado por uma sequência
de passos matemáticos destinados à resolução
de um problema. Eles são onipresentes em nos-
so cotidiano digital, fornecendo os resultados de
nossas indagacões nos mecanismos de busca, as
recomendações de filmes no Netflix etc. Mas e se
fosse possível escrever um algoritmo para resol-
ver problemas práticos, tal como encontrar um
apartamento para alugar, organizar uma biblio-
teca, decidir se está na hora de casar ou mesmo
distribuir os convidadoes entre as mesas na fes-
ta de casamento? Aventurar-se na solução des-
te tipo de problemas é o que propõem o jorna- Algoritmos
1499 — O Brasil lista Brian Christian e o psicólogo Tom Griffiths. para viver
antes de Cabral Apoiando-se em entrevistas com especialistas Brian Christian e Tom
Reinaldo José Lopes de diferentes áreas e pesquisas multidisciplina- ßîä
Harper Collins res, a obra revela muitos dos processos matemá- Companhia das Letras
246 páginas ticos os quais cada vez mais fazem parte de nos- 528 páginas
R$ 34,90 so cotidiano. — Marília Fuller R$ 69,90
www.sciam.com.br 81
CIÊNCIA
EM GRÁFICO
As cau-
O fim
sas de morte diver-
gem mais entre homens e
De que morre a maioria dos homens e mulheres?
mulheres com idades entre 15 e 45 Pode ser desconfortável pensar a respeito, mas senhoras e senhores mais idosos no mundo morrem de
anos. A disparidade é em grande causas muito parecidas, sobretudo de doenças cardiovasculares. Meninas e meninos também sucumbem a
medida provocada pelas taxas de mor-
talidade em países subdesenvolvidos; uma série semelhante de doenças, principalmente as contagiosas. Mas as diferenças nas causas de mortes
as diferenças em países desenvol- são acentuadas entre mulheres e homens jovens e de meia-idade, de acordo com o Instituto para a Avalia-
vidos são bem menos ção e Métricas de Saúde, de Seattle (gráfico maior). As mulheres têm mais chances de morrer de tuberculose,
pronunciadas. diarreia, doenças respiratórias e deficiências nutricionais. Os homens morrem por abuso de drogas, ferimen-
tos, lesões autoprovocadas e violência. Com tantas questões relacionadas aos sexos, as causas de morte são deter-
minadas muito mais por fatores sociais do que pela biologia (gráficos menores). —Mark Fischetti
Porcentual do total de mortes Porcentual do total de mortes
Mulheres: mortess em países de baixo ISD (2015) Mulheres: mortes em países de alto ISD (2015)
³øz³`Dää¸`Dä 100
Na comparação com as
SAÚDE, UNIVERSIDADE DE WASHINGTON, 2017. ACESSADO EM JULHO DE 2017
FONTE: “GBD COMPARE”, DO INSTITUTO PARA AVALIAÇÃO E MÉTRICAS DE