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Salmo 120
INTRODUÇÃO
I- CLAMOR NA ANGÚSTIA
“Na minha angústia” são as primeiras palavras do salmista que já desnuda a situação
de sua alma. Ele estava angustiado, como se estivesse sufocado, preso. As circunstâncias
não lhes eram favoráveis. Sua alma estava necessitando de livramento, de ajuda. Neste
momento é fácil agir de modo equivocado, praticando ações erradas ou tomando decisões
desastrosas. Por outro lado, alguns não fazem nada e paralisam diante da dor. Ficam inertes
e sucumbem nas adversidades. O pior, muitos não se lembram de Deus e nestas ocasiões
cruciais estão afastados do Senhor. Que pena, mas o salmista informa o que se deve fazer
1CALVINO, João. Salmos Volume 4: Série Comentários Bíblicos. São José dos Campos – SP: Editora Fiel,
2009.
na angústia: “clamar ao Senhor”2. Clamar não é uma simples oração, mas indica falar algo
em voz alta, gritar, bradar. Ou seja, há uma intensidade nessa oração, pois a circunstância
o exige. Entretanto, clamar não apenas representa uma expressão intensa externa, ele pode
ser compreendido “não com gesto externo e violento ou elevação da voz, e sim com emoção
interior forte”3.
Outro fato interessante no texto é que o clamor é dirigido ao Senhor, o Deus da aliança,
do pacto. De certa forma, o salmista se utilizou de uma boa teologia quando selecionou este
nome específico para Deus. No Antigo Testamento, o Senhor era cultuado e celebrado por
meio de diversos nomes como: El, Elohim, El-Shaddai, entre outros. Contudo, quando o
salmista escolhe este nome, ele está propondo um relacionamento com o Senhor da aliança,
evocando, assim, todo o contexto do Deus do pacto, bem como suas promessas, desejos e
mandamentos.
O resultado é que o Senhor ouviu ao salmista. Sua oração foi atendida e o servo de
Deus encontrou conforto para sua alma. É importante observar que a oração foi atendida,
mas o salmo não mostra que a situação tenha sido solucionada instantaneamente. O fato é
um indício de que a resposta trouxe conforto e compreensão ao coração, mas não livrou
imediatamente da aflição. Assim, o fato do Senhor ouvir a oração não implica uma solução
fácil, mágica e instantânea.
Mas, qual foi a oração do salmista? Pelo que ele orava? “Senhor, livra-me dos lábios
mentirosos e da língua enganadora”. O salmista orava por livramento da difamação, pois
lábios mentirosos e línguas enganadoras estavam difamando sua honra.
Se admitirmos que tal experiência ocorreu com Davi, é marcante o fato de que uma
situação tão corriqueira, um pecado aparentemente tão pequeno e banal, como a fofoca,
trouxe tanto mal a um homem experimentado. Um guerreiro que se esvai na batalha contra
a difamação da mesma forma que se consume numa batalha heroica. A comparação é
imediata, a difamação pode ser tão cruel quanto uma guerra!
A mentira, como sugerido anteriormente, poderia se referir aos soldados de Saul que
prestavam falsos testemunhos acerca de Davi para acusá-lo e incriminá-lo injustamente. A
língua enganosa pode se referir a pessoas que sempre bajulam, que não são honestas. Assim,
poderia haver até mesmo entre os amigos de Davi, pessoas que o bajulavam, que estavam
sempre lisonjeando, sempre adulando em busca de vantagens. Ou seja, por todos os lados o
rei estava em apertos.
Por outro lado, o salmo pode se generalizado a uma situação em que o salmista pode
estar sofrendo de uma difamação, quando seu nome é “jogado na lama” por desafetos devido
a quaisquer circunstâncias.
O fato é que o salmista ora por livramento dessa enroscada.
Talvez inconformado e perplexo sobre o quê poderia levar uma pessoa a agir dessa
maneira sem o menor fundamento, o salmista como que inquerindo diretamente os próprios
acusadores desfere o questionamento: “Que te será dado, ou que te será acrescentado, língua
enganadora?”. Ou, de uma forma mais popular, “o que você vai ganhar fazendo isso?”
O questionamento visa mostrar a inutilidade de se agir dessa forma. Quer mostra que
não há paga alguma para uma obra dessa natureza. Não há recompensa, não há honra, nem
mérito. Por que, então, as pessoas insistem em agir assim? O que ganham com isso?
2Em vez de se queixar de sua situação, compartilhou-a com o Senhor. WIERSBE, Warren W. Comentário
Bíblico Expositivo: Novo Testamento. volume III. Santo André – SP: Geográfica Editora, 2006. p. 315.
3 Idem. p. 320.
Mas, o salmista igualmente responde sobre o “salário” desse mal feito. Baseado na
justiça de Deus ele pode mostrar que as consequências desse ato é um revés em forma de
“flechas do valente e brasas vivas de zimbro4!”.
Não é uma praga ou maldição que o salmista está fazendo, mas alertando aos
malfeitores sobre a justiça de Deus. Note que o salmista não diz que é ele quem atirará as
flechas, atacará aos linguarudos. Mas, assim como “o que o homem plantar, isso também
ceifará” é uma lei válida, da mesma forma, a boca que dispara difamações como flechas
ardentes receberá de volta flechas ardentes e brasas intensas5.
De certa forma, o Senhor não livra imediatamente o seu servo, mas o faz firme para
suportar a provação até o momento em que os maus serão julgados e pagarão por seus erros.
V- A RESILIÊNCIA DO JUSTO
Apesar de toda oposição e calúnia sofrida por longo tempo pelo salmista, o mesmo não
se corrompeu em seu caráter, mas deu uma mostra de resiliência cristã formidável. Ao invés
de retribuir mal com o mal, difamação com difamação, o salmista afirmou que era uma
pessoa da paz. Que seu coração não optava obstinadamente por guerras sem fim, pelo
confronto, pela briga. “Eu sou pela paz”.
Sua mensagem deixa transparecer que além da passividade, ele agia com iniciativa
para estabelecer a reconciliação. “Quando falo”, indica que o salmista dava oportunidades
de diálogo, de aproximação. Mas, em vão era sua tentativa, pois os seus inimigos
obstinadamente queriam a guerra, o confronto. Era um povo duro e de difícil
relacionamento6.
Esse é o desfecho do salmo. O servo do Senhor ainda sofrendo a angústia daqueles
que ao seu redor o espremiam com calúnias e difamações sem conta, mas sabendo que o
Senhor, a seu tempo o livraria, trazendo a recompensa devida aos atos dos malfeitores. No
final, a mensagem é de paciência e esperança no Senhor em meio às tribulações.
APLICAÇÕES
4 O zimbro (Retama roetam) é um arbusto ou árvore espinhosa muito popular no Oriente Próximo, usada para
fazer fogo porque garante um fogo demorado. CHAPMAM, M. L. et. al. Comentário Bíblico Beacon. volume 3.
Rio de Janeiro RJ: CPAD, 2005. p. 298.
5 É bem possível que o poeta tenha considerado as flechas e as brasas como representando as línguas e as
mentiras, que estavam sendo dirigidas contra ele, voltando-se assim, em vingança, contra aqueles que o haviam
difamado. Idem.
6 O salmista era um pacificador e tentou incentivar os vizinhos israelitas ímpios a também ser pacíficos, mas