Você está na página 1de 2

AGOSTINHO

Confissões

Santo Agostinho, pintura de Philippe de Champaigne, no século 17.

 Santo Agostinho (354 – 430 d.C.): Aurélio Agostinho conhecido como Santo Agostinho de Hipona, foi um eminente
filósofo cristão da patrística e é o mais importante dos Padres filósofos da Igreja. Nasceu em Tagaste, na África. Foi
para Cartago estudar, passou por Roma, Milão e permaneceu o restante de sua vida em Hipona, cidade africana. Tem
forte influência do platonismo. Realiza uma síntese madura entre fé, filosofia e vida, considerando que a fé teria
recebido clareza da razão, mas também que a razão teria ganho estímulo e impulso da fé [credo ut inteligam inteligo
ut credam – creio para compreender e compreendo para crer] . Ele relaciona de forma mais profunda a relação entre a
Filosofia e a Teologia, com forte influência do platonismo. Deus é entendido como Ser, Verdade e Bem. A Trindade é
afirmada na identidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Formula a doutrina da criação a partir do nada. A
descoberta do eu interior profundo a partir da tensão entre a vontade humana e a vontade divina. A verdade é buscada
no interior de si e não no exterior. De certo modo, Agostinho antecipou o cogito cartesiano ao afirmar que ao duvidar,
sei que existo e que penso. Escreveu muitas obras das quais se destacam A Cidade de Deus e as Confissões. Este
último inaugura o gênero literário da escrita por confissão [que podemos utilizar em nossas vidas como método para o
„conhece-te a ti mesmo‟ e „torna-te quem tu és, sabendo quem és‟].Teve uma vida cheia de conturbações antes de se
converter ao catolicismo.
 Ética em Agostinho: “[...]As principais questões éticas que santo Agostinho discute são, portanto, herdadas da
tradição grega e tratadas com base nos ensinamentos do cristianismo. O problema da natureza humana e do caráter
inato da virtude, a origem do Mal, o conceito de felicidade, a liberdade e a possibilidade de agir de forma ética. A
doutrina cristã fornece as chaves para a solução dessas questões: a origem da virtude na natureza humana criada por
Deus, a queda e o pecado original como explicações das falhas humanas, a graça divina como possibilidade de
redenção e alcance da felicidade na vida eterna, e o livre-arbítrio ou liberdade individual concedido ao ser humano por
Deus, que torna os indivíduos responsáveis por seus atos. Dentre as questões centrais da ética agostiniana, que
marcam as principais doutrinas éticas na tradição cristã até hoje, selecionamos duas. A primeira é o problema da
origem do Mal, de grande importância para a época de Agostinho. Se o Deus criador é o Ser Perfeito e possui entre os
seus atributos a Suprema Bondade, identificada de certa maneira com a Forma do Bem platônica, como é possível a
existência do Mal? Teria o Deus sumamente bom criado o Mal? A doutrina maniqueísta, muito forte naquele período,
defendia a existência de dois princípios equivalentes, o Bem e o Mal, em luta permanente, com uma tendência de
identificação de ambos com Deus e o Demônio, respectivamente. Santo Agostinho, inspirado em Platão, defende que
só o Bem existe, sendo o Mal apenas a ausência, ou privação, do Bem. Deus, o Ser Perfeito, é sumamente Bom, mas
os seres criados, inferiores na ordem do Ser, são imperfeitos e finitos, perecíveis. Daí se origina o Mal como falha,
imperfeição. Esta é a solução ontológica, e também teológica, para o problema da existência ou da realidade do Mal.
A segunda grande questão está relacionada à primeira e diz respeito à liberdade humana. Se a natureza humana é
marcada pelo pecado original, a imperfeição originada na fraqueza de Adão, e faz com que o ser humano esteja
sujeito à tentação e aja contrariamente à lei moral, então haveria um determinismo que tornaria inevitável o pecado e,
por conseguinte, a ação antiética. Paradoxalmente, os indivíduos não seriam, em última análise, responsáveis por seus
atos, já que são levados ao pecado pela própria falha de sua natureza. Neste sentido, não teriam o domínio de suas
ações, pois suas atitudes seriam determinadas por esta falha. O ser humano é, assim, compelido a agir contrariamente
à ética. Se sua ação é determinada e ele é compelido, então não tem escolha ou liberdade e, portanto, não estaria
verdadeiramente pecando. O livre-arbítrio, ou liberdade individual, é, segundo santo Agostinho, a característica do ser
humano que o torna responsável por suas escolhas e decisões. Por isso, pode-se agir de forma ética ou não. O pecado,
ou o mal moral, resulta assim de uma escolha. A possibilidade de escolher nos é dada por Deus para que cada um seja
responsável por seus atos, sejam eles errados ou corretos.”1
 Obra Confissões: “Redigidas por volta do ano 400, as Confissões compõem uma obra de cunho autobiográfico em que
santo Agostinho reflete sobre sua formação até a sua conversão ao cristianismo. Relata a sua experiência de vida, as
angústias pessoais e intelectuais, e principalmente os dilemas morais que viveu. Sua adesão inicial ao maniqueísmo é
examinada, e é nesse contexto que discute a questão da natureza do Mal, mostrando como só depois de se converter
essa questão foi resolvida. O Mal, para ele, é falha, queda, desvio, corrupção, e não uma substância real como o Bem,
como apregoavam os maniqueus. A discussão sobre a criação reflete a influência de Platão, sobretudo do diálogo
Timeu, acerca da criação do Cosmo, e do neoplatonismo de Plotino, com a sua doutrina do Ser Supremo e dos graus
inferiores de seres que Dele emanam. No Timeu, o demiurgo cria o Cosmo organizando a matéria preexistente com
base nas formas ou ideias. No texto abaixo (Livro VII, Cap. 5), santo Agostinho expressa suas angústias e
questionamentos sobre a origem do mal e sobre por que Deus teria consentido a existência do mal. Conclui que foi
apenas sua fé inabalável que o permitiu entender o sentido da criação divina e perseverar em seu caminho. No
Capítulo 12 do mesmo livro, que aborda o problema do Mal, santo Agostinho mostra que este deve ser entendido
como privação, diminuição ou imperfeição, sendo que todas as coisas, enquanto existem e porque foram criadas, têm
algo de bom. No Capítulo 16 das Confissões esta concepção é explicitada, e Santo Agostinho então define o Mal não
como substância, ou seja, algo real, mas como desvio ou corrupção.”2

1
MARCONDES, Danilo. Platão. In.: Textos básicos de Ética. De Platão a Foucault. Rio de Janeiro: Zahar, 2014, p.50-51.
2
Ibid.,p.55-57.

Você também pode gostar