Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Bruna Diedrich
Aureliano Agostinho veio de uma família na qual seu pai era pagão e sua mãe
cristã. Nascido em uma cidade do norte da África (Tagaste), conseguiu espaço e
prestígio em Roma e Milão. Após uma crise existencial e espiritual, em 386,
converteu-se ao cristianismo. Em 395 tornou-se bispo em Hipona (norte da África),
onde ficou até sua morte. Em 430, aos 75 anos, morreu quando esta foi atacada e
saqueada. Suas principais obras são: O livre-arbítrio, Confissões e A Cidade de
Deus.
Com relação à sua Filosofia, é importante salientar sua crença anterior ao
cristianismo. Ele acreditava no maniqueísmo, uma doutrina persa que defende o
embate entre duas forças básicas (bem e mal), em uma luta infindável. Sua
interpretação das escrituras sagradas cristãs vai ser intimamente ligada a essas
concepções maniqueístas. Um dos principais problemas que ele buscou resolver é o
problema do mal, que será muito correlacionado com essa estrutura dualista, de
tensão constante e embate entre forças. Santo Agostinho foi professor
de retórica, ou seja, ensinava a arte da argumentação e persuasão. Em sua teoria,
buscava a integração da Filosofia grega e cristianismo. Em um momento anterior, a
Filosofia grega havia tanto sido perdida (através da falta de acesso aos fragmentos
originais) quanto sido proibida pela Igreja por seu potencial perigoso. Santo
Agostinho propõe essa conciliação entre fé e razão, utilizando de autores gregos e
da cultura greco-romana.
Por tal motivo, ele foi um dos principais representantes da Filosofia Patrística.
Essa linha teórica da Filosofia teve grande importância em um período de transição
entre a Antiguidade e a Idade Média. Quando, atualmente, estudamos os períodos
históricos, observamos as claras separações entre eles. Contudo, na época não era
assim, foi uma separação feita depois, para facilitar nosso estudo e nossa
compreensão. Afinal, as pessoas não acordavam e pensavam: até ontem vivi a
Idade Antiga, a partir de agora é a Idade Média. Seria um pensamento
completamente sem sentido e nexo. Portanto, é importante pensar sobre as
transições entre períodos.
A Filosofia Patrística, portanto, foi muito importante nesse momento. Não
seria possível uma simples imposição cultural e social, era preciso uma aceitação
dos dogmas e uma educação espiritual. Era necessário que, mesmo que fossem
impostos, os preceitos religiosos fizessem sentido. Essa vertente filosófica remonta
aos primeiros padres, fazendo referência ao termo ‘padre’ e ‘pai’, que fundaram as
bases filosóficas para solidificar o cristianismo.
Santo Agostinho é um desses grandes expoentes, um dos principais
representantes dessa escola. Em sua Filosofia, buscava essa conciliação entre a fé
e a razão, tendo uma grande influência da Filosofia platônica em seus escritos.
Assim como Platão, valorizava a busca introspectiva da verdade, através da
reflexão e autoconhecimento, chegando à verdade através do mundo das ideias. Por
apresentar uma desconfiança dos sentidos em sua teoria, não achava que a
verdade estaria no mundo sensível (real, acessado pelos sentidos).
1
Todos os materiais presentes foram adaptados de:
BUCKINGHAM, Will. et al. O Livro da Filosofia. São Paulo: Globo, 2011.
COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2017.
Sua preocupação substancial era a questão do mal. Observamos que o mal
existe, simplesmente observando a nossa volta. Coisas ruins, tais como violências e
injustiças, acontecem e isso é um fato incontestável. Essa situação observacional
sempre foi possível, inclusive na Idade Média. Porém, isso gera um problema para
os filósofos medievais, principalmente os patrísticos, que precisavam defender a
Igreja Católica do paganismo.
A questão que surge é o chamado problema do mal. Suponhamos que sim,
Deus exista e sim ele criou tudo. Todavia, o mal também existe. Se Deus é bom e
perfeito, como argumentam os filósofos medievais, qual a explicação para a
existência do mal no mundo? Essa será a principal preocupação de Santo
Agostinho. Para tal, é importante analisarmos algumas teses que ele defende.
A Superioridade da Alma
Ele defendia que há uma relação entre corpo e mente (espírito) e que esta é,
necessariamente, hierárquica. O espírito (alma) é superior e deve ser dominante em
relação ao corpo, que é dominado. Essa ideia carrega consigo resquícios do
maniqueísmo, que é essa premissa de que existem forças opostas, em tensão e
conflito constantes.
Nesse caso, o indivíduo saudável e temente a Deus, segundo Santo
Agostinho, submete as paixões e desejos mundanos ao intelecto, controlando suas
ações. A alma, portanto, está em superioridade em relação ao corpo.
Para o pecador, haveria uma inversão dessa lógica. Ele permite que o corpo
(e as paixões e desejos) dominem o espírito. A estrutura saudável e natural do
homem temente à Deus está sendo quebrada, uma vez que ele não está se
esforçando para poder exercer o domínio do espírito sobre o corpo. Aqui surge um
conceito-chave para o autor: livre-arbítrio. É necessário que o ser humano possa
escolher, optar por ações moralmente boas ou más, permitindo que exerça sua
liberdade.
A Questão do Mal
A definição de mal
Mesmo assim, ainda tem um problema que Santo Agostinho precisa resolver.
Se Deus criou todas as coisas, sendo o ser bom e perfeito que é, ele criou o mal?
Que o mal existe é irrefutável, pois basta observar a nossa volta (no nosso caso,
conversar com alguém ou pesquisar sobre notícias). Como uma criação divina seria
algo ruim?
Sua solução é a definição negativa de mal. A definição negativa é quando ao
invés de criarmos um conceito (por exemplo: mal é X ou Y), dizemos aquilo que ele
não é. É um tipo de definição muito utilizada quando trabalhamos por oposição (por
exemplo, a cor branca é comumente definida como a ausência de pigmentação, em
oposição à cor preta). O mal, para Santo Agostinho, é definido como a ausência de
bem, não algo que exista por si. Portanto, não é necessariamente uma criação.
Assim sendo, Deus não seria responsável pelo mal.
Para ilustrar sua tese, ele utiliza o exemplo do cego e do ladrão. Para, a
cegueira não é um conceito por si, mas a ausência da faculdade da visão. Da
mesma maneira, o ladrão não é desonesto, ele tem a ausência da honestidade. É
importante observar que ele não cria o novo conceito, utiliza de uma negação de
algo já existente (bem, visão, honestidade).