Você está na página 1de 27

A responsabilidade civil do incorporador e do construtor,

sob o ponto de vista consumerista


Barbara Heliodora de Avellar Peralta

Resumo: Inicialmente, pretendo abordar no trabalho em pauta, alguns aspectos da


responsabilidade civil do incorporador e do construtor, devido ao grande
desenvolvimento da atividade no mercado imobiliário. A contratação parece envolvente,
pois ao adquirir um imóvel na planta, estamos aparentemente realizando um excelente
negócio que em sua grande maioria é bastante proveitoso, do ponto de vista econômico.
A rentabilidade em voga é mais palpável se estamos diante de uma empresa confiável
e segura no mercado, onde os riscos são calculados. No entanto, mesmo diante de tais
características, podemos nos deparar com situações de empresas que não respeitam
seus clientes, bem como a função social do contrato e são desleais no decorrer da
execução destes tratos. Assim, baldada as previsões abusivas contratualmente diante
da proteção consumerista aplicável em nossas relações.

Sumário: 1. Introdução; 2. A responsabilidade do construtor 3. A responsabilidade do


incorporador e a multa do art. 35, parágrafo 5º da lei 4.591/64; 4. A solidariedade do
incorporador e do construtor; 5. A incidência do CDC no contrato de incorporação
imobiliária; 6. A inversão do ônus da prova; 7. A responsabilidade objetiva do
incorporador e construtor de unidades; 8. Da antecipação da tutela no caso da mora na
entrega da unidade; 9. O dano moral decorrente desta relação; 10. Conclusão; 11.
Bibliografia.

1. Introdução

Inicialmente, pretendo abordar no trabalho em pauta, alguns aspectos da


responsabilidade civil do incorporador e do construtor, devido ao grande
desenvolvimento da atividade no mercado imobiliário.

A contratação parece envolvente, pois ao adquirir um imóvel na planta, estamos


aparentemente realizando um excelente negócio que em sua grande maioria é bastante
proveitoso, do ponto de vista econômico.

A rentabilidade em voga é mais palpável se estamos diante de uma empresa confiável


e segura no mercado, onde os riscos são calculados. No entanto, mesmo diante de tais
características, podemos nos deparar com situações de empresas que não respeitam
seus clientes, bem como a função social do contrato e são desleais no decorrer da
execução destes tratos.

Assim, baldada as previsões abusivas contratualmente diante da proteção consumerista


aplicável em nossas relações.

2. A RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR

Inicialmente, cumpre assinalar que a responsabilidade do construtor decorre do contrato


de empreitada, onde uma das partes, denominado empreiteiro se obriga a realizar uma
obra por intermédio de terceiros ou pessoalmente, recebendo uma remuneração que é
fornecida pelo proprietário da obra.
A obrigação derivada de tal contrato é a de resultado, onde a obrigação principal é
executar a obra, como contratualmente pactuada.

Assim, deve ser certo e determinado o resultado, onde do contrário, gera o


inadimplemento ou mora contratual.

“A responsabilidade do construtor é de resultado, como já assinalado, porque se obriga


pela boa execução da obra, de modo a garantir sua solidez e capacidade para atender
ao objetivo para qual foi encomendada. Defeitos na obra, aparentes ou ocultos que
importem sua ruína total ou parcial configuram violação do dever de segurança do
construtor, verdadeira obrigação de garantis(ele é o garante da obra), ensejando-lhe o
dever de indenizar independentemente de culpa. Essa responsabilidade só poderá ser
afastada se o construtor provar que os danos resultaram de uma causa estranha- força
maior, fato exclusivo da vítima ou de terceiro, não tendo aqui, relevância o fortuito
interno.” [1]

Tendo em vista que a maioria dos defeitos de obra são ocultos, não seria razoável que
a responsabilidade do construtor cessasse com a entrega desta.

Por sua vez, estabelece o artigo 618 do CC/02 :

Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis,


o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco
anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do
solo.

Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não
propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao
aparecimento do vício ou defeito.”

Assim, verificamos que o prazo do caput é um prazo de ordem pública, devido sua
atenção ser voltada à coletividade e não somente as partes envolvidas, bem como
verificamos, se tratar de um prazo irredutível.

No que tange ao prazo do parágrafo único, o mesmo é decadencial, fazendo referencia


ao dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro em 180 dias decorrente
ao aparecimento do vício.

Temos que observar ainda que terceiros, estranhos ao contrato principal, podem vir a
sofrer danos decorrente desta relação. Neste caso, nós teremos a responsabilidade
extracontratual do construtor, onde diante de danos acarretados a este terceiro,
incidirá também a responsabilidade civil.

Tratando-se de danos pelo fato da obra, surge a responsabilidade independente da


comprovação de culpa, bastando que se comprove o dano e o nexo causal.

Saliente-se que há a possibilidade de inversão do ônus da prova, como será analisado


mais adiante.
Urge frisar que diante do dano ocorrido, torna-se imperiosa a responsabilidade solidária
do incorporador e do construtor, sendo a responsabilidade do construtor abalizada pelo
art. 618 do CC/02 e a do incorporador no art. 937 CC/02.

3. RESPONSABILIDADE DO INCORPORADOR

Cumpre notar que incorporação é toda atividade destinada a alienar frações ideais de
um terreno, vinculando-se a unidades autônomas, sem edificações a serem construídas
ou em construção sob regime condominial, podendo ou não o incorporador também
efetivar a construção do prédio (artigos 28 e 29 da Lei n.4591/64), in verbis:

“Art. 28. As incorporações imobiliárias, em todo o território nacional, reger-se-ão pela


presente Lei.

Parágrafo único. Para efeito desta Lei, considera-se incorporação imobiliária a atividade
exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou
parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas.”

Inicialmente, a lei que rege a obrigação do incorporador é a nº 4.591/1964 e a


responsabilidade pelos danos advindos da relação contratual, está expressa art. 43 da
referida lei.

“Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos,
determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as
seguintes normas:

II - responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os


adquirentes ou compromissários, dos prejuízos que a êstes advierem do fato de não se
concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras,
cabendo-lhe ação regressiva contra o construtor, se fôr o caso e se a êste couber a
culpa;”

Frise-se que a demora na entrega da obra, configura a mora do devedor e


conseqüentemente este estará obrigado a indenizar àquele que sofreu prejuízos
decorrentes da mora ou inadimplemento.

Uma das obrigações do incorporador está prevista no artigo 32 da lei em comento, onde
estabelece que o incorporador têm a obrigação de entregar o prédio de acordo com o
projeto de construção e o memorial descritivo. Assim, podemos observar com maior
clareza a obrigação de resultado decorrente do contrato de empreitada.

“Art. 32. O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter
arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos:

d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes;

g) memorial descritivo das especificações da obra projetada, segundo modelo a que se


refere o inciso IV, do art. 53, desta Lei”

Outras obrigações também decorrem do artigo 32, no entanto, não apresentam


complexidades de interpretações ou não são objetos de análise do presente trabalho, in
verbis:
“I - informar obrigatòriamente aos adquirentes, por escrito, no mínimo de seis em seis
meses, o estado da obra;

III - em caso de falência do incorporador, pessoa física ou jurídica, e não ser possível à
maioria prosseguir na construção das edificações, os subscritores ou candidatos à
aquisição de unidades serão credores privilegiados pelas quantias que houverem pago
ao incorporador, respondendo subsidiàriamente os bens pessoais destes;

IV - é vedado ao incorporador alterar o projeto, especialmente no que se refere à


unidade do adquirente e às partes comuns, modificar as especificações, ou desviar-se
do plano da construção, salvo autorização unânime dos interessados ou exigência legal;

V - não poderá modificar as condições de pagamento nem reajustar o preço das


unidades, ainda no caso de elevação dos preços dos materiais e da mão-de-obra, salvo
se tiver sido expressamente ajustada a faculdade de reajustamento, procedendo-se,
então, nas condições estipuladas;

VI - se o incorporador, sem justa causa devidamente comprovada, paralisar as obras


por mais de 30 dias, ou retardar-lhes excessivamente o andamento, poderá o Juiz
notificá-lo para que no prazo mínimo de 30 dias as reinicie ou torne a dar-lhes o
andamento normal. Desatendida a notificação, poderá o incorporador ser destituído pela
maioria absoluta dos votos dos adquirentes, sem prejuízo da responsabilidade civil ou
penal que couber, sujeito à cobrança executiva das importâncias comprovadamente
devidas, facultando-se aos interessados prosseguir na obra (VETADO).

VII - em caso de insolvência do incorporador que tiver optado pelo regime da afetação
e não sendo possível à maioria prosseguir na construção, a assembléia geral poderá,
pelo voto de 2/3 (dois terços) dos adquirentes, deliberar pela venda do terreno, das
acessões e demais bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação, mediante
leilão ou outra forma que estabelecer, distribuindo entre si, na proporção dos recursos
que comprovadamente tiverem aportado, o resultado líquido da venda, depois de pagas
as dívidas do patrimônio de afetação e deduzido e entregue ao proprietário do terreno
a quantia que lhe couber, nos termos do art. 40; não se obtendo, na venda, a reposição
dos aportes efetivados pelos adquirentes, reajustada na forma da lei e de acordo com
os critérios do contrato celebrado com o incorporador, os adquirentes serão credores
privilegiados pelos valores da diferença não reembolsada, respondendo
subsidiariamente os bens pessoais do incorporador.”(Incluído pela Lei nº 10.931, de
2004)

Como bem elucidou o nobre o Des. Sergio Cavalieri Filho[2], ao trazer a colação dos
ensinamentos de Aguiar Dias, citando a obra Responsabilidade civil em debate, 1ª Ed.,
Forense, pág. 54, in verbis:

“o incorporador e o responsável por qualquer espécie de dano que possa resultar da


inexecução ou da ma execução do contrato de incorporação . Trata-se de entrega
retardada, de construção defeituosa, de inadimplemento total, pondera Aguiar Dias,
responde o incorporador, pois e ele que figura no pólo da relação contratual oposto
aquele em que se coloca o adquirente da unidade ou das unidades autônomas.”

Analisaremos agora, a multa decorrente do artigo 35 da lei em seu parágrafo 5º, que
traz a previsão para o incorporador de um prazo para realizar a celebração do contrato
relativo a fração ideal de terreno e do contrato de construção e da convenção de
condomínio respeitando previsão do inciso “i” do artigo 32, ou seja, somente poderá
negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no RGI, os documentos
exigidos em lei, in verbis:

“Art. 35. O incorporador terá o prazo máximo de 45 dias, a contar do têrmo final do prazo
de carência, se houver, para promover a celebração do competente contrato relativo à
fração ideal de terreno, e, bem assim, do contrato de construção e da Convenção do
condomínio, de acôrdo com discriminação constante da alínea "i", do art. 32(Art. 32. O
incorporador sòmente poderá negociar sôbre unidades autônomas após ter arquivado,
no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos:
i:discriminação das frações ideais de terreno com as unidades autônomas que a elas
corresponderão). (Vide Lei nº 4.864/65 que altera o prazo máximo concedido ao
incorporador para 60 (sessenta) dias)

§ 5º Na hipótese do parágrafo anterior, o incorporador incorrerá também na multa de


50% sobre a quantia que efetivamente tiver recebido, cobrável por via executiva, em
favor do adquirente ou candidato à aquisição.”

Assim, a simples negociação de unidades antes deste registro, enseja a aplicação da


multa em favor do consumidor, devendo os responsáveis pagar uma multa
correspondente a 50% sobre a quantia que tiver recebido.

Ressalte-se que um sinal de reserva de imóvel já é suficiente para a incidência da multa,


se o incorporador não cumpriu os requisitos do art. 32.

Registre-se ainda que a multa em comento, não está condicionada a nenhum outro pré-
requisito do artigo 35, como por exemplo, seu parágrafo 4º, tendo em vista que o aludido
parágrafo, apenas concede uma opção ao adquirente de resguardar seu direito real de
aquisição à terceiros.

Assim, a multa pode ser exigida antes ou depois da faculdade do parágrafo 4º do aludido
artigo.

Neste sentido a Des. Leila Mariano[3], proferiu sua decisão com uma maestria ímpar
sobre o estudo em pauta.

“O fato determinante da aplicação da penalidade prevista no art. 35, §5º consiste no


simples descumprimento pelo incorporador de suas obrigações legais, sendo devida a
multa independentemente do fato de os adquirentes optarem pelo adimplemento ou pela
extinção do contrato.”

A ilustre Desembargadora ainda aduz os ensinamentos do Ministro BARROS DE


MONTEIRO em voto proferido como relator[4] sobre a dispensa de outros requisitos,
como do parágrafo 4º do artigo 35 para a execução da multa:

“O SR. MIN. BARROS MONTEIRO (Relator): - Desassiste razão à recorrente, conforme


bem evidenciou o Tribunal ‘a quo’, com base no voto proferido pelo Sr. Desembargador
Mário Machado durante o julgamento da apelação. O art. 35, § 4º, da Lei 4.591/64,
estabelece uma mera faculdade ao adquirente: a averbação da ‘carta proposta’ ou do
‘ajuste preliminar’ confere-lhe direito real oponível a terceiro. Já o § 5º independe da
formalização acima referida. O atraso imputável ao incorporador, excedente aos 60
(sessenta) dias contados da celebração do ‘ajuste preliminar’, dá ensejo a que o
adquirente possa exigir a sanção ali prevista por meio da execução, ou seja, a multa de
50% sobre a quantia por ele paga. Consoante assinalou o pronunciamento judicial acima
aludido: ‘não há, permissa venia, nenhum condicionamento a que, previamente à
cobrança executiva, seja registrado o documento preliminar no Registro de Imóveis.
Esse registro, como já se viu, é faculdade de que dispõe o adquirente. Nunca obrigação.
Muito menos pré-requisito para a execução’ (fl. 84). Tal foi, por sinal, a interpretação
atribuída a esta Corte aos referidos incisos legais. Quando do julgamento do REsp
96.841-SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, anotou: ‘Como se vê, tem sido decidido
que o fato determinante da aplicação da multa é o descumprimento pelo incorporador,
da sua obrigação de outorgar os contratos nos prazos fixados, sendo devida
independentemente do fato de o adquirente optar pelo adimplemento ou pela extinção
do contrato. Trata-se de sanção relativamente grave que a lei impõe ao incorporador
não porque tenha em vista a economia do contrato, no seu aspecto puramente
patrimonial, mas atendendo ao interesse social na regularidade de empreendimentos
dessa natureza’. Do quanto foi exposto, não conheço do recurso.”

Assim, verificamos que o consumidor pode e deve pedir a execução da multa,


independente da opção pela resolução do contrato.

Neste sentido, trazemos a conferência os demais julgados que servirão de fulcro para a
brilhante decisão supra mencionada:

“Direito civil e processual civil. Recurso especial. Incorporação imobiliária. Multa.


Aplicação. CDC. Matéria jurídica não apreciada pelo Tribunal de origem. Indenização.
Fatos e provas insuscetíveis de reexame.- Não se conhece do recurso especial no
tocante à matéria jurídica não apreciada pelo Tribunal de origem. - Ao concluir o Tribunal
Estadual pela ausência de culpa da incorporadora no atraso da entrega do imóvel,
lastreou-se nos fatos e provas apresentados no processo, o que impede a modificação
do julgado no particular em sede especial. - O art. 32 da Lei n.º 4.591/64 dispõe que a
incorporadora somente poderá negociar as unidades autônomas após ter arquivado, no
cartório competente de Registro de Imóveis, a respectiva incorporação. - O
descumprimento da obrigação que incumbe à incorporadora de proceder à outorga
válida do contrato de compra e venda de fração ideal de terreno no prazo fixado em lei,
impõe a aplicação da multa prevista no art. 35, § 5º da Lei n.º 4.591/64. Precedentes.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (REsp 678498/PB,
Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 25/09/2006, DJ
09.10.2006 p. 286)

“Incorporação. Atraso na celebração do contrato. Multa de 50% (art. 35, § 5º, da


Lei .591/64). Execução cabível. A multa prevista no art. 35, § 5º, da Lei 4.591/64 decorre
do descumprimento, pelo incorporador, da sua obrigação de outorgar ao adquirente o
contrato no prazo legal, independentemente da averbação a que se refere o § 4º do
mesmo preceito legal. Precedente. Recurso especial não conhecido. (REsp.
147.826/DF, Rel Min. BARROS MONTEIRO, Quarta Turma, julgado em 02/12/2003, DJ
29/03/2004)

“CONDOMÍNIO E INCORPORAÇÃO. APLICAÇÃO DOS ARTS. 32 E 35, PAR. 5. DA


LEI 4.591/1964. 1. O INCORPORADOR SÓ SE ACHA HABILITADO A NEGOCIAR
UNIDADES AUTÔNOMAS UMA VEZ REGISTRADOS OS DOCUMENTOS
PREVISTOS NO ART. 32 DA LEI 4.591/1964, SENDO SUSCETÍVEL DE SOFRER A
MULTA DO ART. 35, PAR. 5., NO CASO DE VIOLAÇÃO. 2. A QUALIFICAÇÃO
JURÍDICA DO NEGOCIO REALIZADO NÃO EMPANA A NATUREZA DA OPERAÇÃO
PARA AFASTAR A APLICAÇÃO DA MULTA, DESNECESSÁRIA A ASSINATURA DE
UM CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. 3. QUANDO A PROVA
REALIZADA NAS INSTANCIAS ORDINÁRIAS DEIXA CLARO QUE O
INCORPORADOR OFERECEU PARA VENDAS AS UNIDADES RESERVADA AO
AUTOR, QUE JÁ HAVIA PAGO DIVERSAS PARCELAS DO PREÇO AVENÇADO, E,
AINDA, REALIZOU O NEGOCIO EM DESCONFORMIDADE COM A LEGISLAÇÃO
PRÓPRIA, NÃO TEM RELEVÂNCIA A RECUSA DE ASSINATURA, PELO
ADQUIRENTE, DA PROMESSA DE COMPRA E VENDA. 4. RECURSO ESPECIAL
CONHECIDO E PROVIDO.” (REsp 58280/MG, Rel Min. CARLOS ALBERTO MENEZES
DIREITO, Terceira Turma, julgado em 15/10/1996, DJ 16.12.1996 p. 50863)

“CONDOMÍNIO E INCORPORAÇÃO (LEI N. 4591/64). OBRIGAÇÕES DO


INCORPORADOR PARA COM O ADQUIRENTE. MULTA. O INCORPORADOR SÓ SE
ACHA HABILITADO A NEGOCIAR SOBRE UNIDADE AUTÔNOMAS UMA VEZ
REGISTRADOS OS DOCUMENTOS PERTINENTES (ART. 32). A FALTA DO
REGISTRO, OS CONTRATOS FIRMADOS COM O ADQUIRENTE DEIXAM DE TER
VALIDADE, DAI A CORRETA INCIDÊNCIA DA MULTA PREVISTA NO PAR-5 DO ART.
35. 2. UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. QUESTÃO NÃO
PREQUESTIONADA (SUMULAS 282 E 356/STF). 3. RECURSO ESPECIAL NÃO
CONHECIDO.” (REsp 7119/SP, Rel. Ministro NILSON NAVES, Terceira Turma, julgado
em 09/04/1991, DJ 20.05.1991 p. 6529)

Em sentido contrário, algumas decisões ainda fazem a ligação da aplicação da multa


somente nos casos de extinção do contato. No entanto, acredito que não seria a sua
melhor interpretação da lei, que é expressa e ainda norteada pelos princípios da boa-
fé objetiva e probidade contratual.

Complementando, no tange ao patamar da referida multa, o Superior Tribunal de Justiça


julgou que tal previsão legal, será norteada pelas normas gerais que regulamentam a
mora. Neste sentido, os arestos abaixo ementados:

“CIVIL. INCORPORAÇÃO. MULTA. A multa prevista no § 5º do art. 35 da Lei nº


4.591/64, sujeita-se às regras gerais sobre a mora, estatuídas no art. 955 e seguintes
do Código Civil e este, em seu art. 924, permite ao julgador reduzir proporcionalmente
a pena estipulada para o caso de mora ou de inadimplemento, quando se cumpriu em
parte a obrigação. Considerando as peculiaridades da espécie em que, mais do que em
parte, a obrigação foi cumprida por inteiro, a multa fica reduzida para 10% (dez por
cento) do valor das parcelas pagas, fixados os honorários advocatícios em 10% sobre
o valor da condenação, já considerada a compensação pela sucumbência recíproca, e
as custas deverão ser suportadas na proporção de 40% pelos autores e 60% pela ré.
Recurso dos autores não conhecido. Recurso da ré parcialmente conhecido e nessa
parte parcialmente provido.” (REsp 200657/DF, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA,
Quarta Turma, julgado em 03/08/1999, DJ 12.02.2001 p. 120)

Ainda de forma mais clara, no voto do supracitado Acórdão, ponderou o ilustre relator
Ministro CESAR ASFOR ROCHA:

“A regra retro indicada não impõe outra condição para aplicação da multa senão a só
ocorrência do disposto no §4º do reportado art. 35. E tal se deu, por isso mesmo não há
que ser feito qualquer questionamento para aplicá-lo. Mesmo assim, quanto ao seu
percentual, pode ser estipulado com um certo temperamento, que dependerá das
peculiaridades de cada caso concreto. (...) Sendo assim, a multa há de ser aplicada,
mas seu percentual pode e deve ser ajustado a cada situação. E as peculiaridades da
espécie impõem inquestionavelmente a aplicação da multa, mas em baixo percentual,
por isso que o reduzo a dez por cento das importâncias pagas. Neste ponto, pois,
conheço parcialmente do recurso.”

4. SOLIDARIEDADE DO INCORPORADOR E DO CONSTRUTOR


Não pairam dúvidas de que o incorporador e construtor, respondem solidariamente
pelos danos causados aos adquirentes das unidades pactuadas. Neste sentido,
trazemos a baila o entendimento do Professor Sérgio Cavalieri Filho [5] :

“Em nada altera esta conclusão o fato de ter sido a construção cometida ao construtor.
O incorporador continua responsável porque é o contratante. Responde também o
construtor, porque é causador direto do dano, e tem responsabilidade legal, de ordem
pública, de garantir a solidez e segurança da obra em benefício do seu dono e da
incolumidade coletiva, conforme já demonstrado.

Desta forma, quando o incorporador celebra contrato de incorporação com o construtor,


nada mais faz do que estender-lhe a sua obrigação, passando ambos a ser
responsável ela construção. O incorporador, na realidade, está apenas, se fazendo
substituir pelo construtor.”

Neste mesmo sentido, ilustra Arnaldo Rizzardo:

“Tanto que se impõe a responsabilidade solidária do dona da obra e do construtor, o


mesmo acontece relativamente ao incorporador e ao construtor. O incorporador figura
como o contratante junto aos adquirentes das unidades, enquanto o construtor é
considerado o causador direto do dano. No entanto, os adquirentes de unidade tem
ação direta contra o incorporador, facultando-se-lhes via responsabilizando o construtor.
Caso não acionado o ultimo, e se vier atender a postulação, reserva-se-lhe o direito de
regresso, a fim de reembolsar-se do montante pago.”[6]

Estabelece ainda o Art. 942 do CC/02:

“Art.942: Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam


sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um Autor, todos
respondem solidariamente pela reparação.”

In casu, incide ainda a previsão do artigo 7º parágrafo único, do CDC no mesmo


sentido.[7]

Ainda no que tange a solidariedade, estabelece o artigo 25 do CDC:

“Art.25: É vedada a estipulação contratual de clausula que impossibilite , exonere ou


atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.

Parágrafo primeiro: havendo mais de um responsável ela causação do dano, todos


responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores.
Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são
responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a
incorporação.”

Logo, o entendimento consolidado em sede doutrinaria e jurisprudencial é no sentido de


que há solidariedade do incorporador e do construtor no contrato de incorporação
imobiliária.

5. INCIDÊNCIA DO CDC NO CONTRATO DE INCORPORAÇAO IMOBILIÁRIA

Cediço que o adquirente pactuou um contrato de adesão e assume figura de consumidor


na relação jurídica formada, nos termos do art. 3º da lei consumerista que conceitua
como fornecedor toda pessoa que desenvolve atividade, entre outras, a de distribuição
ou comercialização de produtos e serviços.

Assim, o foro eleito é o do domicílio do consumidor, nos termos do art. 101, I do CDC.
Portanto, restando comprovada a relação de consumo, são aplicáveis as regras
previstas no CDC.

A jurisprudência já pacificou neste sentido:

“DES. PAULO CESAR SALOMAO - Julgamento: 15/02/2000 - NONA CAMARA


CIVEL 1999.001.18191 - APELACAO - 1ª Ementa
ACAO ORDINARIA RESCISAO DE CONTRATO COMPRA E VENDA DE IMOVEL
RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONSTRUTOR RESPONSABILIDADE OBJETIVA
DANO MORAL INDENIZACAO FIXACAO DO VALOR DESCONSIDERACAO DA
PERSONALIDADE JURIDICA C.DE DEFESA DO CONSUMIDOR Ação Ordinária de
rescisão e indenização. Edifício Palace I. Aplicação do Código de Defesa do
Consumidor. Danos materiais e morais. Desconsideração da autonomia da
personalidade jurídica. Procedência. O incorporador/construtor e' um fornecedor de
serviços `a luz dos conceitos claros e objetivos constantes do art. 3. do CDC. Salta
aos olhos, "máxima vênia", a ocorrência de fato gerador da rescisão do contrato de
compra e venda, pois publica e notória a insegurança resultante do evento para todos
os proprietários dos apartamentos que ficaram interditados por longos oito meses. O
caos que se instalou na vida daqueles que acreditaram nas promessas da Incorporadora
e' indescritível e, alem da rescisão, obvio que deve ela indenizar os prejuízos
efetivamente causados. A responsabilidade da Construtora, segunda Re', e'
objetiva como se ve no art. 12, do CDC e da primeira Re' encontra amparo no art. 28
do mesmo Código, que acolheu a teoria da desconsideração da personalidade jurídica
quando se trata de empresas coligadas, o que ocorre na hipótese em julgamento. O
dano moral resulta da dor intensa, da frustração causada e da humilhação a que foi
submetida a vitima. E' certo que sua fixação deve levar em consideração a natureza de
real reparação do abatimento psicológico causado, mas, por outro lado, não se pauta
no enriquecimento indevido. O montante deve proporcionar uma compensação pelo
desgosto, dor e tristeza sofridos, ao mesmo tempo em que representa uma sanção ao
infrator, alem do desestimulo a outras infrações. Para seu arbitramento devem ser
observadas as condições sociais e econômicas das partes envolvidas, sopesando o
Juiz, com bom senso, as circunstancias da causa em exame. A fixação do ilustre
Magistrado de primeiro grau não e' razoável, merecendo, diante das circunstancias, ser
aumentada para 500 (quinhentos) salários mínimos para cada um dos Autores.
Provimento do primeiro recurso e improvimento do segundo.” (SCK)

No que tange a incidência do CDC na presente demanda, resta nítido que mesmo com
a matéria regulada em lei específica, a lei consumerista intervém, quando favorável ao
consumidor, sendo denominado pela brilhante doutrinadora Claudia Lima Marques,
como diálogo das Fontes. E neste sentido, aclara Arnaldo Rizzardo [8]:

“Decorrendo a incorporação da atividade de fornecedor de produtos e serviços, exercida


pelo incorporador,tem incidencia o Codigo de DEFESA DO Consumidor. Ocorre que
se opera a atividade de construção e venda das unidades imibiliárias, as quais se
destinam para consumidores finais, que passam a usa-las para moradia ou para outro
uso pessoal. Esta pois submetida ao âmbito do art. 3º da Lei nº 8.078 a incorporação,
aplicando-se as regras sobre o fato do produto e do serviço (art. 12), e sobre os
vícios ou defeitos na qualidade(art. 18 e 20), não divergindo a disciplina sobre
incidência das mesmas regras à atividade do dono da obra e do construtor”.(rizzardo
551)
Corroborando o entendimento, segue a posição do Desembargador Sergio Cavalieri
Filho [9]:

“Dessa forma, os institutos e contratos continuam regidos pelas norma e princíios


que lhe são próprios , mas sempre que gerarem relações de conumo ficam
também sujeitos à disciplina do Código do Consumidor. E é isso que ocorre
também com a incorporação /construção.” Sergio 359

Sobre o tema pacífico, o STJ já posicionou favoravelmente:

“INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA – CONTRATO – CLÁUSULA ABUSIVA. O contrato


de incorporação, no que tem de esecífico, é regido pela lei que lhe é própria (Lei
4.591/1964), mas sobre ele também incide o Código de Defesa do Consumidor, que
introduziu no sistema civil princípios gerais que realçam a justiça contratual, a
equivalência das prestações e o princípio da boa-fé objetiva (...)(4ª Turma., REsp
80.036, Min. Ruy Rosado)

Impende ressaltar, que uma das causas tuteladas pelo CDC é o prazo imprevisto para
a entrega da coisa, como ensina o ilustre Desembargador e Professor Sérgio Cavalieri
Filho [10]:

“Em face dessa nova concepção contratual, são reputadas abusivas, entre outras,
cláusulas que estabelecem reajustes aleatórios nos contratos de compra e venda de
imóveis, ou com base em índices a serem escolhidos pelo incorporador, prazo impreciso
para a entrega da obra ou a sua prorrogação injustificável; a perda total das prestações
pagas em favor do credor que, em razão do inadimlemento do consumidor, pleitear
rescisão do contrato e a retomada do imóvel (Código de Defesa do Consumidor, art.
53).”

Devemos observar ainda, todos os deveres atinentes a contratação leal, respeitando a


função social do contrato, a boa fé objetiva, bem como todos de deveres decorrentes do
CDC expressos no artigo 6º, como por exemplo, o dever a informação, dever de redação
clara, proteção contra publicidade enganosa, dentre outros estipulados no mencionado
artigo.

Nesse diapasão, encontramos algumas clausulas abusivas no contrato de adesão,


que ferem direitos básicos do consumidor, expressos nos seguintes artigos, 39, V, X,
XI, XII, e 51 e 53 do CDC.

Eis algumas decisões em defesa do consumidor, por clausulas abusivas diversas:

DES. MAURO DICKSTEIN - JULGAMENTO: 31/03/2009 - DECIMA SEXTA CAMARA


CIVEL ORDINÁRIA. INCORPORAÇÃOIMOBILIÁRIA(...) EM UM DIÁLOGO ENTRE
FONTES COM AS DEMAIS NORMAS PERTINENTES. PRELIMINAR DE
EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA QUE IMPÕE A UTILIZAÇÃO DE ARBITRAGEM,
AFASTADA POR VIOLAR O ART. 51, VII, DO CDC. PRECEDENTES DO C.STJ.
APLICAÇÃO DA TEORIA DA BASE OBJETIVA, QUE NÃO EXIGE QUE OS FATOS
SUPERVENIENTES SEJAM EXTRAORDINÁRIOS E IMPREVISÍVEIS, MAS, TÃO-
SOMENTE, A CONFIGURAÇÃO DA ONEROSIDADE EXCESSIVA, TAL COMO
PREVISTA NO ART. 6º, V, DO CDC., E DEMONSTRADA NA ESPÉCIE. CLÁUSULA
LIMITADORA DA MAIOR PARTE DA RESTITUIÇÃO QUE SE AFIGURA,
IGUALMENTE, ABUSIVA (ART. 51, II, E IV, DO CDC.), DEVENDO SER RESTITUÍDO
O RESPECTIVO PERCENTUAL DETERMINADO NA SENTENÇA,REDUZINDO-SE
EQUITATIVAMENTE A CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA, NA FORMA DO ART.
413, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002(...) 2009.001.06634 - APELACAO - 1ª EMENTA

Como bem asseverado na sentença esgrimida, verificamos a previsão contratual de


arbitragem, em ofensa direta ao art. 51, VII do CDC, devendo ser considerada nula.

Temos ainda a “a clausula unilateral que garante vantagem somente para o


fornecedor” onde não equilibra a relação jurídica e enfraquece ainda mais a posição
contratual do consumidor[11] .

Verificamos também a cláusula que estipula que a devolução das parcelas somente
ocorrerá após a venda do imóvel. A mencionada cláusula é abusiva devido a situação
de desigualdade que deixa o consumidor e caso a obra não seja concluída nunca, ficará
o consumidor sem receber o valor devido[12].

A clausula penal que estipula valor irrisório é também considerada abusiva, tendo em
vista que o valor deve compensar os danos acarretados ao adquirente e por vedar ao
principio constitucional da plana indenização[13].

Portanto, uma obra que não estipula um prazo para entrega da obra, um prazo elevado
e não razoável, de atraso na obra injustificadamente, as clausulas de decaimento,
reajustes aleatórios nos contratos de compra venda de imóveis ou com base em índices
a serem escolhidos elo incorporador, dentro outras são clausulas que não podem ser
regidas pela autonomia de vontade, pois estaria indo contra a própria razão de existir
um código consumerista.

Cristiano Heineck Schmitt [14], em sua obra “Clausulas abusivas nas relações de
consumo”, traz as formas de controle das clausulas abusivas, onde de forma mais
concisa, tentaremos demonstrá-las:

“O controle concreto”[15] ocorre quando a relação de consumo já foi concluída.

O “controle interno”[16] é o caso do art. 46 do cdc, onde o consumidor terá meios de


exercer tal controle. Já o “controle externo” é o exercido pelos órgãos administrativos e
judiciais.

O “controle antecipado”[17] é como o nome já diz, prévio e de acordo com o referido


autor, exercido em sua maioria na via administrativa e nos contratos de
adesão, “responsáveis pelo exame prévio, com aprovação, ou não, das condições
gerais dos negócios pré-confeccionadas, pelos fornecedores.”

Para o Autor, esta forma de controle é mais comum nos contratos de adesão diante da
leitura do art. 54 do CDC. Enquanto que o “Controle posterior[18]”, seriam as sanções
do art. 56 do CDC.

Já o “controle legislativo[19] poderá adquirir feição formal, no caso do art. 46, bem como
na sua forma material, exemplo do art. 51.”

O “Controle judicial”[20], admitindo algumas previsões favoráveis ao consumidor, como


a inversão do ônus da prova e a desconsideração da personalidade jurídica.

Por fim, o “controle administrativo[21] está na instauração do inquérito civil.


No que tange a segurança da obra, o artigo 12 e 14 do CDC, regulam a matéria
decorrente do defeito do produto ou do serviço e desta forma, o defeito na obra está na
ceara da responsabilidade objetiva, devendo o fornecedor provar por sua conta própria
que o defeito não existiu.[22]

Sobreleva acentuar que a responsabilidade pela a qualidade da obra, engloba os


materiais de baixa qualidade e a má técnica utilizada e os artigos 18 e 20 do CDC,
cuidam do vício do produto ou do serviço.

Aqui, temos que observar que os prejuízos decorrentes da ma qualidade de serviço e


de materiais, não compensam com a contraprestação realizada pelos adquirentes.

Deve atender ainda a um prazo normal e razoável com as características do produto,


portanto, se o defeito aparecer apos o prazo de 5 anos, consoante artigo 27 do CDC,
sendo um defeito decorrente da obra, o fornecedor será obrigado a reparar o dano.

A responsabilidade do construtor não termina com a entrega da obra. Temos a


responsabilidade pela segurança e qualidade da obra, com previsão no artigo 618 do
CC/02 c/c artigo 12 parágrafo 3º e 14 do CDC.

O mencionado prazo só começa a fluir a partir da ocorrência do acidente de consumo,


nada importando q esse acidente tenha ocorrido durante ou depois dos 5 anos. Nas
palavras do Professor Sergio Cavalieri F.[23]

“Em outras palavras, o prazo de garantia ou de segurança pelo código do consumidor


não e mais de apenas cinco anos, mas sim por todo o período de durabilidade razoável
da obra. A qualquer tempo em que o acidente ocorrer responde o
incorporador/construtor, só afastando a sua responsabilidade se provar que a obra não
tinha defeito, ou seja, que o acidente decorreu do tempo e do desgaste natural da obra
por falta de conservação. O defeito do produto devera ser examinado tendo em vista o
temo decorrido entre o momento em que foi colocado no mercado e a ocorrência do
dano. “

No tocante a qualidade da obra, esta pode parecer perfeita no momento da entrega da


unidade, no entanto, vícios ocultos acarretados de baixa qualidade dos materiais
empregados e/ou a má técnica utilizada, podem acarretar danos posteriores como
rachaduras, infiltrações, vazamentos, problemas hidráulicos. Saliente-se que estes
vícios podem não comprometer a segurança da obra, porém lhe diminui o valor e sua
utilidade.

Esta responsabilidade pelo vicio do produto ou serviço decorre da falta de conformidade


com a qualidade da coisa ou do serviço com sua perspectiva de durabilidade e utilidade.

6. DA INVERSÃO DO ÔNUS PROBANDI – Art. 6º, VIII da Lei 8.078/90

Cediço que o consumidor, pessoa natural, não se encontra no mesmo plano de


igualdade com o incorporador/construtor, até porque não dispõe de acesso as
informações internas, sendo, portanto hipossuficiente. Em sendo assim, poderá solicitar
a inversão do ônus da prova tendo preenchidos os seguintes requisitos:

- Verossimilhança das alegações do consumidor (a alegação do Autor é verossímil, visto


que trouxe provas irrefutáveis);

- Hipossuficiência técnica (falta de conhecimento técnico, específico).


Vejamos a posição da melhor doutrina:

“Neste enfoque, a Lei 8.078/90 prevê a facilitação da defesa do consumidor através da


inversão do ônus da prova, adequando-se à universalidade de jurisdição, na medida em
que o modelo tradicional mostrou-se inadequado às sociedades de massa, obstando o
acesso à ordem jurídica efetiva e justa”.[24] (Código de Defesa do Consumidor,
comentado pelos autores do anteprojeto, Ed. Forense Universitária, 5ª ed., pág. 119,
1997).

O entendimento pretoriano entende no mesmo diapasão (inclusive determinando a


prevalência do art. 6º, VIII sobre a regra do art. 333, I do CPC), in verbis:

Tribunal de Justiça de São Paulo. Prova – Ônus – Inversão – Admissibilidade –


Existência de verossimilhança nas alegações do autor – Provas do adimplemento não
apresentadas pela requerida – Inaplicabilidade do art. 333, I do Código de Processo
Civil, face à prevalência do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, por ser
norma específica – Recurso não provido. (Aplica-se a regra da inversão do Ônus da
prova, visto que há verossimilhança nas alegações do autor.(Apelação Cível n. 240.757-
2 – Presidente Prudente – Relator DEBATIN CARDOSO – CCIV 9 – V.U. – 22.09.94)

Tribunal de Justiça de São Paulo. INDENIZAÇÃO – Prova – Ônus – Inversão –


Cabimento – Comprovação do adimplemento não apresentada pela ré –
Inaplicabilidade do art. 333, I, do Código de Defesa do Consumidor, como norma
específica – Recurso não provido. (Apelação Cível n. 268.090-2 – Marília – 16ª Câmara
Civil – Relator: Soares Lima – 14.11.95 – V.U.)

Assim, há a possibilidade de inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII da
Lei 8.078/90.

7. DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO INCORPORADOR E CONSTRUTOR DE


UNIDADES

Elucida Arnaldo Rizzardo [25]:

“não se executando a obra de acordo com as revisões contratuais, ou


insatisfatoriamente, arca com a obrigação de indenizar, ou refazer a obra, por imposição
dos dispositivos acima indicados, reservando-se lhe os prazos para o exercício do
direito ou para remover a pretensão que lhe é assegurada.”

Inobstante a regulamentação específica da matéria, diante do já demonstrado “diálogo


das fontes” da escritora Claudia Lima Marques, a responsabilidade em pauta terá a
incidência do CDC e conseqüentemente a responsabilidade será OBJETIVA sendo,
portanto, suficiente a demonstração do dano efetivo suportado pelo Autor e o nexo
causal.

DES. NAGIB SLAIBI - Julgamento: 19/03/2008 - SEXTA CAMARA


CIVEL 2007.001.67456 - APELACAO - 1ª Ementa

Direito do Consumidor. Promessa de compra e venda de unidade imobiliária residencial


em construção. Restituição do valor pago, devido ao inadimplemento da obrigação de
entrega da coisa. Cabimento. Devolução de valor proporcional.As atividades do
incorporador e do construtor, voltadas para a construção de imóveis residenciais,
configura relação de consumo, com a solidária responsabilidade objetiva dos
mesmos pelos danos causados ao promitente comprador. Ao assumir os direitos e
obrigações da empresa sob o regime de liquidação extrajudicial, a sucessora, que já
atuava no setor, sabia bem do sistema de exigências para a retomada do
empreendimento, seja no âmbito da municipalidade seja no âmbito do agente financeiro,
com o que a circunstância não ampara a identificação da força maior. A sucessora, ao
assumir a obrigação de concluir o empreendimento, tornou-se responsável pelos
prejuízos causados pelo atraso na entrega da obra causado pela empresa sucedida
(STJ, REsp nº 260731/RJ, 3ª Turma, Ministro Carlos Alberto Menezes
Direito).Proporcionalidade na fixação da retenção de 30%. Teoria da causalidade
adequada.Desprovimento dos recursos, mantendo-se a sentença.

DES. NAGIB SLAIBI - Julgamento: 28/03/2007 - SEXTA CAMARA


CIVEL 2007.002.02966 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 1ª Ementa Direito do
Consumidor. Promessa de compra e venda de unidade imobiliária residencial em
construção. Pedido indenizatório com resolução contratual pelo inadimplemento da
obrigação de entrega da coisa. Denunciação da lide pretendida pela promitente
vendedora à construtora ora em estado falimentar. Descabimento.As atividades do
incorporador e do construtor, voltadas para a construção de imóveis residenciais,
configura relação de consumo, com a solidária responsabilidade objetiva dos
mesmos pelos danos causados ao promitente comprador.Pedido de antecipação
da tutela. Impossibilidade. Coisa julgada. Ausência dos requisitos.Desprovimento do
agravo.

Assim a falha no contrato de incorporação é fato do produto ou do serviço, nos termos


do art. 12 do CDC, sendo regida pela responsabilidade OBJETIVA e demonstrados os
danos que o adquirente vêm sofrendo, bem como o nexo causal, impõe-se o
necessidade da reparação civil.

Logo, diante da mora do incorporador em entregar a unidade ao adquirente, deve o


mesmo ser indenizado por qualquer prejuízo advindo desta mora.

Neste sentido, trazemos a baila o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça


do Rio de Janeiro:

DES. ORLANDO SECCO - Julgamento: 25/02/2008 - OITAVA CAMARA


CIVEL 2008.001.04181 - APELACAO - 1ª Ementa APELAÇÃO CÍVEL. Civil.
Consumidor. Contratos. Promessa de compra e venda de bem imóvel. Rescisão de
contrato c/c Indenização por Danos Materiais. Atraso na entrega da obra em mais de
sete anos. Inexecução do pacto. Mora contratual. Devolução de prestações. Lucros
cessantes.// Promessa de compra e venda de bem imóvel celebrado em 12/2004. Prazo
de entrega do bem em Fev./98. Pagamento das prestações até Março/98. Cláusula
contratual prevendo a prorrogação do prazo de entrega até 180 dias. Suspensão do
pagamento. Efetiva entrega da obra mais de sete anos após o prazo contratual previsto.
Alegação de caso fortuito e falta de recursos pela suspensão dos pagamentos pelos
promitentes compradores, como excludente de responsabilidade pelo atraso na entrega
da obra. Sentença de procedência parcial do pedido, determinando a devolução de
todos os valores pagos pela autora, mais um percentual fixado a título de lucros
cessantes a partir da data prevista para entrega do imóvel. Apelação. Alegação de (i)
inexistência de infração contratual ante a mora anterior da autora, e (ii) ausência de
prova quanto aos alegados lucros cessantes.// Demanda oriunda de promessa de
compra e venda celebrada com grupo econômico que, à exemplo de inúmeras outras,
pretende a rescisão ou execução completa do pacto em função de atraso de quase uma
década na entrega do bem objeto do contrato. Mora contratual confessa pela
construtora/incorporadora e que se consubstancia em fato público e notório em função
da enxurrada de ações com base no negócio jurídico celebrado, sendo, inclusive, objeto
de ação coletiva. Fortuito interno atribuível somente a parte contratual responsável pela
execução da obra. Entendimento consagrado no STJ, segundo o qual o promitente
comprador tem direito a perceber, a título de lucros cessantes, valor relativo a
alugueres desde a data prevista para a entrega do imóvel. Manutenção da sentença.
Pretensão recursal manifestamente improcedente e contrária ao entendimento já fixado
pela Corte quanto à matéria. Negativa de seguimento ao Apelo. Rescisão de contrato
aquisitivo de apartamento. ... Cabimento da reparação do dano material consistente
no valor do aluguel de imóvel correspondente ao prazo entre a data contratada
para a entrega do imóvel e a data da rescisão do contrato. (...) Apelação Cível nº
2006.001.15044)

“Compromisso de compra e venda de unidade imobiliária – descumprimento do prazo


convencionado para a entrega da obra por parte da promitente vendedora – Rescisão
do contrato –devolução das prestações pagas e indenização por perdas e danos –
cabimento- Índices de reajuste monetário e juros de mora previstos no contrato –
legalidade. O risco empresarial é inerente à atividade de incorporação e
construção civil ante os fatores aleatórios e imprevisíveis, sendo da exclusiva
responsabilidade da empresa promitente vendedora a sua ocorrência que afeta o
empreendimento imobiliário. Portanto, demonstrada a responsabilidade exclusiva da
ré pelo não cumprimento da obrigação, afigura-se como medida justa e inteiramente
compatível com as diretrizes do Código de Defesa do Consumidor a decisão que decreta
a rescisão do contrato e a devolução integral das parcelas pagas elo promitente
comprador e a indenização por perdas e danos emergentes, compreendendo estes
últimos, no caso, os alugueres virtuais devidos a partir da data final convencionada
para a entrega das chaves, até as restituições das quantias pagas pelo promitente
comprador. “(17ª câmara Cível, Apelação. nº 2003.001.11598, Rel. Des. José Geraldo
Antônio, data do julgamento 11/06/2003. DES. PAULO MAURICIO PEREIRA -
Julgamento: 07/04/2009 - QUARTA CAMARA CIVEL”

“2009.001.08614 - APELACAO - 1ª Ementa1) Incorporação imobiliária. Atraso na


entrega da obra. Indenização. Consignação em pagamento. Sentença de parcial
procedência. 2. Abusividade da cláusula contratual que prevê multa pelo atraso na obra,
em valor desproporcional às penalidades impostas ao consumidor. Majoração, a fim
de se adequar ao efetivo prejuízo suportado pelos autores, equiparável ao valor
do aluguel de imóvel semelhante. 3. Dano moral configurado. Indenização fixada por
ano de atraso na entrega do imóvel, mas cujo valor deve ser desde logo consolidado,
pois não pode se transformar em nova multa. 4. Em se tratando de pedido consignatório,
com efeito liberatório, o levantamento dos valores pelo credor é conseqüência lógica do
decreto de procedência. Para obstá-lo devem ser buscadas as vias próprias. 5.
Sucumbência da ré quase total. Não incidência do art. 21, CPC. 6. Provimento parcial
do recurso.”

“2007.001.18880 - APELACAO - 1ª EmentaDES. ANA MARIA OLIVEIRA - Julgamento:


19/06/2007 - OITAVA CAMARA CIVEL Ação de conhecimento objetivando a revisão de
contrato de promessa de cessão de direitos de imóvel em construção com pedido
cumulado de indenização por danos material e moral, fundada no inadimplemento da
promitente-vendedora que não concluiu a obra no prazo estipulado. Sentença que
determinou a entrega do imóvel acabado e com habite-se, no prazo de até noventa dias,
sob pena de multa diária de R$ 100,00, vedou a cobrança de juros moratórios sobre o
saldo devedor da Autora e condenou a Ré ao pagamento de indenização por dano
moral, e de lucros cessantes equivalentes ao valor locatício do imóvel, a serem
apurados em liquidação de sentença, além dos ônus da sucumbência. Apelação da Ré.
Agravo retido contra decisão que deferiu a inversão do ônus da prova em favor da
Apelada. Inversão do ônus da prova que constitui direito básico do consumidor.
Inteligência do artigo 6º, inciso VIII da Lei 8.078/90. Rejeição do agravo retido. Relação
de consumo. Responsabilidade objetiva. Dificuldades financeiras decorrentes da
inadimplência de terceiros e de promitentes compradores que não caracterizam motivo
de força maior a afastar a responsabilidade da Ré, por se tratar de fato previsível e
inerente à sua atividade. Atraso injustificado na entrega do bem. Falha na prestação do
serviço. Responsabilidade da Ré pela entrega do imóvel pronto e acabado, assumida
no contrato celebrado entre as partes. Cláusula penal abusiva se consideradas as
penalidades impostas ao comprador no caso de inadimplência, revelando sua natureza
tão-somente moratória. Indenização a título de lucros cessantes equivalente ao
valor locatício do imóvel que é devida, tanto mais que a Autora vem arcando com
despesas de aluguel para sua moradia. Dano moral configurado. Quantum da
reparação fixado em R$ 10.000,00, montante compatível com a repercussão dos fatos
narrados nos autos, observados critérios de razoabilidade e de proporcionalidade. Ônus
da sucumbência corretamente imposto à Ré por ter a Autora decaído de menor porção
do pedido. Desprovimento da apelação.”

“2006.001.12252 - APELACAO - 1ª EmentaDES. MARIA AUGUSTA VAZ - Julgamento:


23/05/2006 - PRIMEIRA CAMARA CIVEL AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL.
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL AINDA NA PLANTA. Atraso injustificado do réu na
conclusão da obra, ensejando reparação por perdas e danos em valor acima do previsto
na cláusula contratual que, abusiva, trouxe desequilíbrio à relação de consumo. Fixação
da multa mensal em aproximadamente 0,5% do valor do imóvel na época da
avença, refletindo montante médio de aluguel cobrado no mercado, corrigidos até
a data em que eram devidos, a partir da qual incidirão também juros. Aplicabilidade
plena do índice INCC e de juros simples às prestações negociais, eis que previstos no
instrumento, não se mostrando eles excessivamente onerosos ou geradores de
vantagem indevida. Inexistência de dano moral indenizável pelo mero inadimplemento
contratual. Súmula 75 do TJERJ. Dedução do valor já depositado em juízo da quantia
aferida pelos cálculos do juízo. Sentença que se reforma.”

Inobstante a responsabilidade objetiva do Código do Consumidor e seus requisitos já


demonstrados, são os requisitos da Responsabilidade contratual:

a) Existência de um contrato valido;

b) Inexecução do contrato: inexecução que se manifesta diante da mora do contrato.

c) Dano e nexo causal

Estamos diante da violação de um dever primário estabelecido no contrato e que gera


para o prejudicado o dever de ser ressarcido pelas perdas e danos sofridos.

Frise-se que sendo um contrato de relação consumerista, basta o consumidor preencher


os requisitos da lei.8.078/90 para ter seus prejuízos reparados.

Estabelece ainda o art. 389:

“Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e
honorários de advogado.”

Sabemos que o Código civil, estabelece em seu art. 475 que:


“A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir
exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e
danos.”

No tocante a ocorrência de caso fortuito ou força maior, muitos incorporadores e


construtores tentam se eximir da responsabilidade civil, alegando os tais institutos por
diversos fatores que na maioria das vezes não configura nem um caso, nem outro. Tais
argumentos são sempre os mesmos, assim elencaremos alguns a título de
demonstração.

Alguns costumam alegar que o atraso no pagamento por parte dos demais promitentes
cessionários é caso de força maior que excluía responsabilidade pelo atraso da obra e
parecem esquecer a teoria que norteia tal relação, “teoria do empreendimento” que não
pode ser transferido aos demais adquirentes. [26]

Outro argumento muito utilizado é o fato de a construtora não ter obtido financiamento
para continuar a obra, o que também não caracteriza força maior e deve ensejar a
aplicação do art. 14 do CDC[27]

Há também os que alegam o “boom imprevisível do mercado da construção civil e a


conseqüente escassez de Mao de obra, bem como material e equipamentos de
construção civil.

O que verificamos é que os incorporadores alegam a escassez de mão de obra, mas


não param de lançar empreendimentos, no dito período crítico.

Basta observar que se os incorporadores realmente estivessem realmente com


escassez de material e Mao de obra não poderia lançar tantos empreendimentos de
prazos certos e determinados neste período do “boom” sabendo da sua impossibilidade
no cumprimento da obrigação.

Portanto, seria ao menos dúbio, alegar um fato para se excluir de indenizar os danos
causados e outrora continuar exercendo a atividade com a mesma presteza sempre.

Assim, não há que se falar em exclusão de responsabilidade civil advindo do “boom” na


construção civil, exceto em casos que sejam efetivamente comprovados, devendo o
incorporador/construtor reparar os danos causados aos adquirentes, tendo em vista que
o alegado é, em muitas das vezes contraditório.

8. DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NO CASO DE MORA DO


INCORPORADOR/CONSTRUTOR NA ENTREA DA OBRA. Artigo 273, I do CPC

Diante da mora na entrega do imóvel podemos verificar em quase todos os casos, que
os adquirentes que residem de aluguel, fazem um planejamento mensal para poder
arcar com as prestações do empreendimento e do aluguel simultaneamente por um
período certo e determinado.

No entanto, tendo a obra extrapolado o prazo, inclusive da previsão contratual que prevê
um período geralmente de 180 dias ou 90 dias, deve o incorporador/construtor arcar
com os alugueis dos adquirentes no valor de um aluguel no mesmo patamar do imóvel
adquirido.

Cabe frisar, que este lapso previsto contratualmente deve ser razoável e não pode
caracterizar forma de excluir a responsabilidade no caso da mora, sendo muito extenso.
Assim, o prazo mais comum é o de 180 dias ou 90 dias, sendo que se um incorporador
estipula um prazo de 360 dias ou 400 dias está obviamente desproporcional ao objeto
do contrato, bem como está sendo desleal com a outra parte contratante, tentando
mascarar a possibilidade de uma futura reparação de danos decorrentes desta mora.

Diante do quadro em comento, alguns adquirentes acabam arcando com a manutenção


de dois imóveis por um tempo não programado, o que poderá causar danos na vida
financeira do mesmo.

Estando o adquirente nesta situação, com dificuldades em arcar com os gastos de dois
imóveis, devido ao comprometimento do orçamento, tendo em vista que este adquirente
acreditava já estar residindo no apartamento adquirido e estar livre de pagar aluguel,
deve exigir do incorporador que arque com as custas do aluguel até que seja entregue
a unidade adquirida.

No que tange a concessão da tutela, adverte o processualista LUIZ GUILHERME


MARINONI[28], in Manual do Processo de Conhecimento 5ª ed. Revista dos Tribunais,
p. 203:

“A tutela antecipatória pode ser concedida no curso do processo de conhecimento,


constituindo verdadeira arma contra os males que podem ser acarretados pelo tempo
do processo, sendo viável não apenas para evitar um dano irreparável ou de difícil
reparação (art. 273, I, do CPC), mas também para que o tempo do processo seja
distribuído entre as partes litigantes na proporção da evidência do direito do autor e da
fragilidade da defesa do réu (art. 273, II e § 6º, do CPC)”

No presente caso em pauta, são os requisitos para a concessão da medida:

- prova inequívoca da verossimilhança das alegações devendo ser demonstrada


claramente com a documentação (contrato de aquisição de unidade imobiliária,
escritura de compra e venda, contrato de aluguel, extratos bancários, etc...)
demonstrando a mora do incorporador/construtor na entrega da unidade pactuada.

- Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação: tendo em vista que o


adquirente está arcando com a manutenção de dois imóveis, o que não estaria
ocorrendo caso a obra estivesse sido entregue, demonstrando que a situação está
causando abalo financeira na vida do Adquirente ou outro dano advindo da relação
jurídica.

Ainda recentemente o Des. Marcus Faver em lapidar acórdão[29] derivado do processo


nº 2000.002.00050, decidindo IDÊNTICA questão, enfatizou a necessidade da
concessão da tutela para o pagamento do aluguel até que seja entregue o
imóvel, in verbis:

“Des. MARCUS FAVER - Julgamento: 15/02/2000 - quinta câmara cível


2000.002.00050 - agravo de instrumento - 1ª Ementapromessa de compra e venda de
apartamento em construção ATRASO NA ENTREGA DA OBRA TUTELA
ANTECIPADA LOCACAO DE IMOVEL aluguel obrigação de pagamento Agravo de
Instrumento. Tutela antecipada. Ação de natureza condenatória. Empresa de
construção imobiliária. Contrato de compromisso de compra e venda de apartamento,
com obrigação de entrega da unidade ate' maio de 1999. Não
cumprimento. Antecipação do pedido para compelir a construtora a pagar o aluguel
do adquirente ate' a entrega do imóvel. Pressupostos da medida evidenciadas.
Verossimilhança das alegações evidenciadas por prova inequívoca. Dano de
difícil reparação. É patente o receio de dano de difícil. Evidenciando-se que o
Autor encontrava-se na iminência de não ter condições de cumprir com a dupla
obrigação: o pagamento dos alugueres e o da prestação do imóvel prometido.
Decisão correta. Recurso desprovido.” (LCR)

“Des. Maria Henriqueta Lobo - Julgamento: 27/06/2000 - décima quarta câmara


cível 2000.002.04768 - agravo de instrumento - 1ª ementapromessa de compra e venda
de apartamento em construção ATRASO NA ENTREGA DA OBRA TUTELA
ANTECIPADA locação de imóvel ALUGUEL obrigação de pagamento Agravo de
Instrumento. Direito Civil. Promessa de Compra e Venda de Imóvel. Tutela
antecipada. Se o promitente comprador pagou as prestações do preço e o imóvel
não lhe foi entregue pelo compromissário vendedor, já' vencido o prazo ajustado
entre as partes, cabe a tutela antecipada para determinar que a construtora
antecipe o pagamento de um montante mensal correspondente a 1% (um por
cento) do valor do imóvel, estabelecido na escritura de modo a ensejar possa o
autor arcar com as despesas relativas ao aluguel de um imóvel em idênticas
condições. Provimento parcial do recurso.” (LCR)

No tocante ao requisito da reversibilidade da antecipação da tutela, o mesmo está


presente no próprio direito à aquisição do imóvel do adquirente.

Assim, deverá o adquirente solicitar a tutela no sentido de condenar o


incorporador/construtor a efetuar o pagamento do aluguel no patamar de 05% ou 1% do
imóvel adquirido, sob pena de multa a ser fixada pelo juízo ara o efetivo cumprimento
da decisão judicial.

Dessa forma, evitar-se-á a ocorrência de mais danos de difícil reparação ou irreparáveis


na vida financeira dos adquirentes.

Não é demais lembrar que diante de uma decisão interlocutória de tutela antecipada é
cabível o recurso de agravo de instrumento, diante da urgência da demanda,

9. O DANO MORAL DECORRENTE DESTA RELAÇÃO

Por derradeiro, deve ser analisado o dano moral decorrente do inadimplemento


contratual e suas conseqüências no plano subjetivo de cada indivíduo.

Nesse ínterim, verifica- se que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, lançou o seguinte
enunciado nº 75, inverbis:

“O simples descumprimento de dever legal, ou contratual, por caracterizar mero


aborrecimento, em princípio, não configura dano moral, salvo se da infração advém
circunstancia que atenta contra a dignidade da parte.”

Brilhantemente, DES. CARLOS EDUARDO PASSOS[30], aduz que tal premissa “ não
poderia ser aceita em termos absolutos e inflexíveis sob pena de graves injustiças”.

Aduz ainda que “nem todo inadimplemento contratual não causa conseqüências de
menor importância” e ,“nem por isso, o Código do Consumidor excluiu a presença do
dano moral (art. 6º, inc.VI, da lei nº 8.078/90)”.

Conclui ainda, “as regras de experiência (art. 335, do CPC) mostram os desmandos e
os descasos com que são tratados os consumidores ...”
Acredito que diante da constitucionalização do direito civil, publicização ou
ainda despatrimonialização, os direitos da pessoa humana, tornaram-se ainda mais
fortes.

Por este instituto, devemos interpretar o direito civil concomitantemente com os


preceitos constitucionais. E desta forma, não há como se excluir o dano moral ocorrido,
diante do enunciado mencionado, pelo simples fato de que tal dano é decorrente de
inadimplemento contratual.

Deve haver uma releitura das normas do direito civil, que regem as relações jurídicas e
conceder maior aplicação constitucional a estas relações.

Diante da previsão constitucional de que o dano moral é indenizável, no art. 5º e X, da


CRFB/88 veremos que tal direito sobrepõe ao direito de que no inadimplemento
contratual não há dano moral.

É claro que trata-se de descumprimento contratual e a súmula tem incidência sobre as


relações jurídicas, no entanto as normas que regulam o dano moral também incidem
sobre os adquirentes de boa Fe que realmente sofreram danos imateriais com
inadimplemento do incorporador e é preciso observar os parâmetros a conceder tal
reparação.

Sendo o dano moral, in re ipsa, logo não há que fazer prova, está provado por si só,
pelo simples ocorrido.

Ultrapassado este obstáculo, veremos que outro obstáculo é quando os julgadores


entendem que o dano moral pode ocorrer no inadimplemento contratual, no entanto o
atraso na entrega da unidade, de um ou dois ou cinco anos, não passou de “mero
dissabor”.

Não há como olvidar que os adquirentes, na grande maioria dos casos, dispensaram
esforços financeiros durante anos e no final destes intermináveis anos, somente
amargou a resolução do contrato pelo seu descumprimento.

Como aceitar que o descumprimento do contrato de incorporação seja apenas um mero


dissabor? Poderia ser um mero dissabor no caso de pessoas com altíssimo padrão
aquisitivo, onde aquele empreendimento seria apenas mais um em sua vida, que logo
seria substituído por outro sem ao menos ter sido visitado pelo adquirente investidor,
vez que em muitos casos a aquisição de um imóvel na planta é uma forma de
investimento.

Não pode ser considerado mero dissabor, uma família que junta economias durante
anos e após de todo o esforço empenhado se vê diante de um acontecimento que
desestabiliza toda a família e em muitos casos traz sim, um enorme abalo psíquico no
indivíduo, brigas e stress familiares.

Não defendo que a indenização do dano moral seja aplicado em qualquer caso de
inadimplemento decorrente de um contrato de incorporação imobiliária, sem observar
as regras atinentes a concessão, defendo que seja aplicado nos casos em que houve
um dano psíquico, sendo que um atraso, uma mora deste plano, em sua grande maioria
depreende-se um dano não apenas cotidiano, como se depreende do acórdão em
apelação cível nº 2008.001.28677:
“DES. CONCEICAO MOUSNIER - Julgamento: 19/11/2008 - VIGESIMA CAMARA
CIVEL Ação cominatória cumulada com indenizatória por danos materiais e morais.
Incorporação imobiliária. Atraso na entrega de unidade autônoma. Construção
inacabada. Sentença julgando parcialmente procedente os pedidos. Inconformismo da
ré. Entendimento desta Relatora quanto à manutenção da sentença guerreada. Relação
de consumo. Demora injustificada na entrega de unidade imobiliária. Teoria do risco do
empreendimento. A parte ré deve assumir os riscos de sua atividade, respondendo
pelos danos ocasionados ao autor. Inexistência de previsão para entrega da unidade
imobiliária. No caso em exame decorridos mais de 6 anos para entrega do
imóvel adquirido pela parte autora, as obras sequer estão concluídas. (...) Notório
que a situação em exame ultrapassa em muito os meros aborrecimentos do dia-
a-dia, não podendo ser considerada como simples inadimplemento contratual.
Dano moral passível de compensação. Quantum compensatório adequadamente
fixado pelo juízo a quo em R$ 20.000 (vinte mil reais), pois em consonância com
os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. CONHECIMENTO DO
RECURSO e DESPROVIMENTO DO APELO”

Não seria plausível que fosse necessário um dano incomensurável a gerar o dano moral,
como o caso da falência da maior incorporadora e construtora do Brasil, a ENCOL/S.A,
na década de 90, que abalou a vida de mais de 40.000 famílias.

Acredito fielmente que uma família que juntou anos economias para adquirir uma casa
própria e após anos aguardando a data prevista para a conclusão da obra, tenha que
esperar ainda a mora contratual prevista e ainda assim, mais alguns anos pela
inexecução do incorporador/construtor, tenha sentido um mero dissabor. A propósito,
veja-se a jurisprudência que corrobora tal aclaramento:

“DES. ODETE KNAACK DE SOUZA - Julgamento: 08/10/2008 - VIGESIMA CAMARA


CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. PROMESSA DE COMPRA E
VENDA DE BEM IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA EM MAIS DE OITO
ANOS. DANO MORAL CONFIGURADO. A LONGA DEMORA PARA A ENTREGA DO
IMÓVEL É FATO QUE NÃO PODE SER CONSIDERADO MERO ABORRECIMENTO,
JÁ QUE PROVOCA FRUSTRAÇÃO E ABALO PSICOLÓGICO NAQUELE QUE ESTÁ
NA EXPECTATIVA PELO RECEBIMENTO DA CASA PRÓPRIA. VALOR
CONDENATÓRIO ADEQUADAMENTE FIXADO. LUCROS CESSANTES NÃO
RECONHECIDOS, JÁ QUE OS AUTORES DEIXARAM DE CONTRIBUIR PARA O
PAGAMENTO DAS PARCELAS DO FINANCIAMENTO, EM MARÇO DE 2003.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.2008.001.50095 - APELACAO - 1ª Ementa”

Impende asseverar que a falta de respeito no trato dos direitos do consumidor gera dano
moral.[31]

O fato é que houve um claro avanço em nosso tribunal e inúmeros julgados podem
respaldar tais aclarações de incidência de dano moral:

“DES. TERESA CASTRO NEVES - Julgamento: 12/05/2009 - QUINTA CAMARA CIVEL


APELAÇÃO CIVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DE BEM IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA EM MAIS DE 02 ANOS, DANO
MORAL MANTIDO. LUCROS CESSANTES QUE DEVEM SER REPARADOS.
Promessa de compra e venda de bem imóvel celebrada em 21.05.96. Prazo de entrega
do bem em 30.05.99. Cláusula contratual prevendo a prorrogação do prazo de entrega
até 90 dias. Pagamento realizado integralmente. Efetiva entrega da obra mais de dois
anos após o prazo contratual previsto. Alegação de motivo de força maior como
excludente de responsabilidade pelo atraso da obra. Sentença de procedência parcial
do pedido, condenando ao pagamento de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), sendo
R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada autor, a título de danos morais. Dano moral
mantido, em razão do princípio tantum devolutum quantum apellatum.
Entendimento consagrado pelo STJ, segundo o qual o promitente comprador tem direito
a perceber, a título de lucros cessantes, valor relativo a alugueres desde a data prevista
para a entrega do imóvel. Consequente alteração da sucumbência, que agora deve ser
suportada pela apelada(...) 2009.001.13275 - APELACAO - 1ª Ementa”

“DES. REINALDO P. ALBERTO FILHO - Julgamento: 08/05/2009 - QUARTA CAMARA


CIVEL E M E N T A: Rescisão Contratual c.c. Indenização. Incorporação Imobiliária.
Instrumento Particular de Promessa de Cessão de Direitos Aquisitivos.I - Atraso na
entrega da unidade imobiliária incontroverso. Alegação que tal se ultimou por culpa da
construtora encarregada das obras. Tese que não se sustenta. No desenvolvimento de
suas atividades. Empreendedora poderia e deveria prever inadimplências e o mais
conexo, de modo a não onerar quem fielmente cumpre o contrato. Risco do
empreendimento.II - Autora que adimpliu as prestações pactuadas até um mês depois
da data aprazada para a entrega do imóvel. Mora exclusiva da Ré, impondo a rescisão
da avença, com a devolução de todos os valores pagos, sem qualquer retenção.III -
Mero inadimplemento contratual não caracteriza dano moral. Hipótese em lide que
se mostra excepcional. Frustração da casa própria interferiu no comportamento
psicológico da Apelada, para fins de acolhimento de tal verba.(...) 2009.001.23393 -
APELACAO - 1ª Ementa”

“DES. PAULO MAURICIO PEREIRA - Julgamento: 07/04/2009 - QUARTA CAMARA


CIVEL Incorporação imobiliária. Atraso na entrega da obra. Indenização. Consignação
em pagamento. Sentença de parcial procedência. 2. Abusividade da cláusula contratual
que prevê multa pelo atraso na obra, em valor desproporcional às penalidades impostas
ao consumidor. Majoração, a fim de se adequar ao efetivo prejuízo suportado pelos
autores, equiparável ao valor do aluguel de imóvel semelhante. 3. Dano moral
configurado. Indenização fixada por ano de atraso na entrega do imóvel, mas cujo
valor deve ser desde logo consolidado, pois não pode se transformar em nova
multa. 4. (...) 2009.001.08614 - APELACAO - 1ª Ementa”

“DES. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO - Julgamento: 17/03/2009 - QUINTA


CAMARA CIVEL DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPROMISSO DE COMPRA E
VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. FATO INCONTROVERSO.
IMPUTAÇÃO DE CULPA DO EMPREITEIRO. RETARDO PELO QUAL RESPONDE O
PROMITENTE VENDEDOR, QUE NÃO COMPROVA A OCORRÊNCIA DE
CIRCUNSTÂNCIA EXCLUDENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA, COM BASE NA
TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. DANO MORAL CARACTERIZAÇÃO.
FRUSTRAÇÃO E CONSTRANGIMENTO DO CONSUMIDOR, COM INAFASTÁVEL
ABALO EM SUA ROTINA PSICOLÓGICA. NEGADO PROVIMENTO AO PRIMEIRO
APELO.PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO ADESIVO 2009.001.06238 -
APELACAO - 1ª Ementa”

Há que se observar que no ramo de atividade em comento o prazo de entrega é uma


das principais causas que levam o consumidor a contratar, pois o atraso nas obras
causa inúmeros transtornos na vida dos adquirentes. Esposa deste entendimento a
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro[32].

“DES. LINDOLPHO MORAIS MARINHO - Julgamento: 07/10/2008 - DECIMA SEXTA


CAMARA CIVEL INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DE APARTAMENTO EM CONSTRUÇÃO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL
ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. CULPA EXCLUSIVA DO INCORPORADOR.
RESCISÃO DE CONTRATO. RESTITUIÇÃO DAS IMPORTÂNCIAS PAGAS. PERDAS
E DANOS. PREVISÃO CONTRATUAL DE RESSARCIMENTO. DANO MORAL.
OCORRÊNCIA. TRANSTORNOS QUE EXTRAPOLAM O MERO
ABORRECIMENTO.Havendo inadimplemento contratual por parte da incorporadora,
que não entrega a unidade no prazo avençado, e não logrando êxito em demonstrar as
excludentes de responsabilidade, deve devolver as quantias pagas, uma vez rescindido
o contrato.Havendo cláusula no instrumento particular de incorporação prevendo o
ressarcimento do adquirente em caso de atraso na entrega das chaves, faz o mesmo
jus à reparação pretendida.O dano moral se caracteriza em razão da demora na
entrega da unidade e na frustração da realização do sonho da casa própria,
estando a verba indenizatória bem fixada, não merecendo qualquer
censura.Recurso ao qual se nega provimento. 2008.001.30306 - APELACAO - 1ª
Ementa”

“DES. ANA MARIA OLIVEIRA - Julgamento: 08/07/2008 - OITAVA CAMARA CIVEL


Embargos infringentes. Ação de rescisão de negócio jurídico com pedido cumulado de
restituição de valores pagos, lucros cessantes e indenização por dano moral. Sentença
que julgou parcialmente procedente o pedido, para rescindir o negócio jurídico celebrado
entre as partes, condenada a construtora a devolver as quantias pagas, acrescidas de
juros e correção monetária, reformada em sede de apelação, em decisão não unânime,
para condenar a construtora ao pagamento de R$ 20.000,00, a título de indenização por
dano moral e lucros cessantes equivalentes ao valor locatício do bem, a serem apurados
em liquidação de sentença. Embargos infringentes objetivando que prevaleça a
conclusão do voto vencido que mantivera os termos da sentença. Partes que celebraram
contrato de compra e venda de imóvel em construção, cuja obra não foi concluída no
prazo avençado. Rescisão do contrato com a restituição dos valores pagos corrigidos e
acrescidos de juros. Atraso injustificado na entrega do imóvel que enseja o dever de
indenizar. Lucros cessantes não verificados por inexistir evidência de que a aquisição
do imóvel se destinava a locação. Dano moral configurado ante a frustração do
comprador que, apesar de efetuar os pagamentos, não logrou receber o imóvel.
Quantum da indenização fixado segundo critérios de razoabilidade e de
proporcionalidade. Provimento parcial dos embargos infringentes.2008.005.00164 -
EMBARGOS INFRINGENTES - 1ª Ementa”

Releva enfatizar, ainda, outras decisões do pretório excelso, acerca do tema:

“DES. NAMETALA MACHADO JORGE - Julgamento: 25/06/2008 - DECIMA TERCEIRA


CAMARA CIVEL Civil. Processual Civil. Incorporação imobiliária. Contrato de promessa
de compra e venda. Atraso na entrega da obra. Dano moral. Configuração.Tratando-
se de obrigação inerente ao direito de moradia, o atraso e principalmente os vícios
constatados na obra não configuram, diante das peculiaridades do caso, mero
inadimplemento contratual.Ao revés, os percalços por que passou a autora, que,
inclusive, levaram-na a despender quantia relativa a obras que competiam ao apelado,
a fim de que a casa que adquirira reunisse as condições mínimas para que fosse
ocupada, perpassam a fronteira do mero aborrecimento.Tal fato iniludivelmente
configura dano moral, pois abala sua integridade psicológica, causando-lhe tristeza,
angústia e sofrimento; e existe in re ipsa.Verba fixada em R$ 5.000,00, valor que
corresponde a justa reparação do prejuízo extrapatrimonial da parte. Recurso
provido. 2008.001.26174 - APELACAO - 1ª Ementa”

Verificamos a legitima expectativa para a aquisição da casa própria, no percuciente


entendimento do Des. Heleno Ribeiro P. Nunes, seguido do Des. Wagner Cinelli:
“DES. HELENO RIBEIRO P NUNES - Julgamento: 27/06/2007 - SEGUNDA CAMARA
CIVEL DIREITO CIVIL. CONTRATO DE COMPRA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA EM
CONSTRUÇÃO. MORA DA CONSTRUTORA NO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO
DE CONCLUIR A OBRA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA. DANO MORAL. VALOR.
LUCROS CESSANTES. SUCUMBÊNCIA. 1) Se a construtora não concluiu a obra nos
prazos limites previstos no contrato, acertada a decisão que acolheu o pedido de
condenação da empresa ao cumprimento de obrigação de fazer, sob pena de multa, se
decorrido o prazo estabelecido para tal. 2) Esta sanção não se confunde com a cláusula
penal compensatória prevista no contrato celebrado pelas partes. 3) Embora a
princípio o inadimplemento contratual não caracterize dano moral, as
circunstâncias do caso concreto, em especial o largo tempo de atraso (mais de
dois anos) no cumprimento da obrigação de concluir a obra, supera o mero
aborrecimento, gerando profundo abalo psicológico no adquirente, o qual
caracteriza o alegado dano imaterial. 4) O valor de R$14.000,00 fixado a título de
dano moral atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade,
indenizando de forma justa o dano imaterial sofrido pelo consumidor. 5) Não
demonstrados os alegados lucros cessantes referentes aos rendimentos com a possível
locação do imóvel, esta parcela não pode integrar a indenização. 6) Se o autor formulou
três pedidos e apenas dois deles foram acolhidos, os ônus da sucumbência devem ser
proporcionalmente repartidos. 7) Provimento parcial da primeira apelação e
desprovimento da segunda. 2007.001.25116 - APELACAO - 1ª Ementa”

“DES. WAGNER CINELLI - Julgamento: 30/04/2008 - SEXTA CAMARA CIVEL


Apel(...)Frustração da legítima expectativa para aquisição da casa própria.
Transtornos causados ao consumidor que vão além do mero aborrecimento.
Consumidor que continua pagando as prestações, apesar do manifesto atraso na
obra. Incorporadora que se queda silente diante das notificações. Dano moral
ocorrente. Jurisprudência do TJ/RJ. Manutenção da sentença recorrida. Recurso
conhecido e desprovido. 2008.001.10899 - APELACAO - 1ª Ementa”

Segundo ponto que enseja avaliação é o arbitramento do dano moral. Cediço que este
deve ter em suporte os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, sendo justo
para a reparação do dano.

E crível a alegação que deve ser vedada o enriquecimento ilícito no momento da fixação
do dano moral, no entanto, o arbitramento deve além de reparar o dano causado, servir
de sanção para que sejam abolidas das praticas abusivas de tais comportamentos, bem
como educar o agente causador do dano.

E neste sentido, não podemos olvidar que uma empresa, ao ser condenada em valores
irrisórios aos seus movimentos financeiros, ignoram a condenação e continuam a
reiterar os atos ilícitos.

Devemos ter em mente que o correto é não cometer danos e a exceção é a sua
ocorrência.

Partimos do pressuposto basilar de que o consumidor, nos casos em que houve a


violação do direito deste, deve ser ressarcido e conseqüentemente, se esta condenação
transmitisse prejuízos efetivos as empresas, o que fatalmente verificaríamos, seria uma
alteração comportamental expressiva na maneira de exercer seus serviços e produtos
por parte das empresas, observando todos os direitos advindos da relação
consumerista.
Neste particular, é imperioso destacar que ao serem fixados valores insignificantes a
estas práticas, sabemos que as empresas não sofrem o efeito de “sanção” que
pretendia o legislador ao tecer a norma em aplicação.

A afirmativa ganha pujança especial, trazendo a colação dos ensinamentos do Professor


Sergio Cavalieri Filho[33]:

“... o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com seu
prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade
e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do
causador do dano, as condições sócias do ofendido e outras circunstâncias mais que
se fizerem presentes.”

Neste sentido, finalizo o artigo acreditando não pode haver uma inversão de valores na
sociedade, onde se deixa de punir a pratica de um dano em decorrência de uma
suposta “fabrica de dano moral”, pois se há uma imensa demanda de dano moral é
porque os fornecedores estão prestando um péssimo serviço.

O correto é que as empresas, seja por serem leais com seus consumidores, seja por
medo de sofrer um condenação pecuniária alta, passem a respeitar o consumidor. E
que seja abolido do cotidiano dos indivíduos, situações vexatórias a que são submetidos
diariamente ao reclamar por seus direitos. Não cabe mais em nosso mercado de
consumo nacional, o descaso e a falta de respeito com que são tratados os
consumidores brasileiros.

Conclusão

Diante do exposto, forçoso concluir que o contrato de incorporação imobiliária deve ser
analisado conjuntamente com o Código de Defesa do Consumidor.

A afirmativa ganha pujança especial tendo em vista que o nosso Código Consumerista
foi elaborado para nortear as relações jurídicas com a segurança que se espera de
qualquer relação contratual, pois devido ao patamar diferenciado em que se encontram
as empresas e os consumidores, estes realmente mereciam normas diferenciadas que
as equiparem.

Perseverando pelos princípios protetivos do consumidor, devemos analisar


cautelosamente as relações jurídicas consumeristas, pois inúmeras formas de clausulas
abusivas se apresentam com a difusão dos contratos de adesão e na maioria das vezes
os fornecedores, mesmo sabendo serem abusivas continuam prevendo-as
expressamente, pois apostam na tentativa de ludibriar senão todos, alguns
consumidores mais desinformados, o que é muito comum em nosso país devido ao
baixo grau de instrução da população.

Bibliografia:
Manual do Processo de Conhecimento 5ª ed. Revista dos Tribunais;
Código de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do anteprojeto, Ed. Forense Universitária, 5ª
ed., 1997;
Clausulas abusivas nas relações de consumo, 2ª edição, editora revista dos tribunais;
Responsabilidade Civil, Arnaldo Rizzardo, editora forense, 2005;
Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, Sergio Cavalieri Filho, Malheiros Editores;
www.stj.gov.br;
www.tj.rj.gov.br;
www.planalto.gov.br
Notas:
[1] Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, Sergio Cavalieri Filho, Malheiros Editores, página 344;
[2] Ob. Cit. Pág. 357;
[3] apelação cível nº 2007.001.55326, na 2ª Câmara cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro;
[4] REsp nº 147.826/DF
[5] Ob. Cit. Pág.. 357;
[6] Responsabilidade Civil, Arnaldo Rizzardo, editora forense, 2005, pág. 550;
[7] Art. 7 (caput)
Parágrafo único: Tendo mais de um Autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos
danos previstas nas normas de consumo.
[8] Op. Cit. Pág.551;
[9] Ob. Cit. Pág. 359;
[10] Ob. Cit. Pág.361;
[11] Ementário: 23/2004 - N. 10 - 02/09/20042003.001.11498 - APELACAO - 1ª Ementa DES.
MALDONADO DE CARVALHO - Julgamento: 25/11/2003 - NONA CAMARA CIVEL
[12] 2000.001.19407 - APELACAO - 1ª Ementa DES. SERGIO CAVALIERI FILHO - Julgamento:
20/03/2001 - SEGUNDA CAMARA CIVEL)
[13] (2002.001.15522 - APELACAO - 1ª Ementa/ DES. SERGIO CAVALIERI FILHO - Julgamento:
11/09/2002 - SEGUNDA CAMARA CIVEL)
[14] Clausulas abusivas nas relações de consumo, 2ª edição, editora revista dos tribunais, pág. 158;
[15] Ob. Cit. Pág 159;
[16] Ob. Cit. Pag 160;
[17] Ob. Cit. Pag. 160;
[18] Ob. Cit. Pag. 162;
[19] Ob. Cit. Pag. 162;
[20] Ob. Cit. Pag. 162;
[21] Ob. Cit. Pag. 163;
[22] Artigo 12 parágrafo 3º do CDC.
[23] Ob. Cit. Pag. 363;
[24] Código de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do anteprojeto, Ed. Forense Universitária,
5ª ed., pág. 119, 1997
[25] Ob. Cit. Pag. 550;
[26] 2009.001.05222 - APELACAO - 1ª Ementa. DES. CELSO PERES - Julgamento: 04/03/2009 - DECIMA
CAMARA CIVEL
[27] 2008.001.34067 - APELACAO - 1ª EmentaJDS. DES. MAURO NICOLAU JUNIOR - Julgamento:
29/07/2008 - OITAVA CAMARA CIVEL
[28] Manual do Processo de Conhecimento 5ª ed. Revista dos Tribunais, p. 203
[29] nº2000.002.00050
[30] A. Cível nº 2003.001.12499
[31]“DES. LUISA BOTTREL SOUZA - JULGAMENTO: 24/06/2009 - DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL
DIREITO CIVIL. RESCISÃO DE CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE
IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. INADIMPLEMENTO DA CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DA
OBRA QUE JUSTIFICA A RESOLUÇÃO DO CONTRATO E O RETORNO DAS PARTES AO "STATUS
QUO ANTE". DANO MORAL. OCORRÊNCIA. A FALTA DE RESPEITO NO TRATO DOS DIREITOS DO
CONSUMIDOR É GERADORA DE DANO MORAL. SE OS APELANTES RESTARAM VENCIDOS DEVEM
SUPORTAR POR INTEIRO OS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. 2009.001.18652 -
APELACAO - 1ª EMENTA”.
[32] 2009.001.08897 - APELACAO - 1ª Ementa “No ramo de atividade da autora, é notório que o respeito
aos prazos de entrega do serviço é uma das principais características que o consumidor procura ao
contratar, visto que o atraso em obras causa muitos transtornos aos clientes, que, muitas vezes, aguardam
sua conclusão para retornar às suas residências ou a seus estabelecimentos.”
[33] Ob. Cit. Pág. 116.

Informações Bibliográficas

PERALTA, Barbara Heliodora de Avellar. A responsabilidade civil do incorporador e do construtor, sob o


ponto de vista consumerista. In:Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 68, set 2009. Disponível em:
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6588>. Acesso em abr
2014.

Você também pode gostar